Caderno v Matemática Final
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Ministrio da EducaoSecretaria de Educao Bsica
Formao de Professores do Ensino Mdio
MATEMTICA
Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Mdio
Etapa II - Caderno VCuritiba
Setor de Educao da UFPR2014
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MINISTRIO DA EDUCAO
SECRETARIA DE EDUCAO BSICA (SEB)
MINISTRIO DA EDUCAO SECRETARIA DE EDUCAO BSICA Esplanada dos Ministrios, Bloco L, Sala 500 CEP: 70047-900 Tel: (61)20228318 - 20228320
Brasil. Secretaria de Educao Bsica. Formao de professores do ensino mdio, Etapa II - Caderno V: Matemtica / Ministrio da Educao, Secretaria de Educao Bsica; [autores: Ana Paula Jahn... et al.]. Curitiba: UFPR/Setor de Educao, 2014. 49p. ISBN 9788589799966 (coleo) 9788584650019 (v.5) Inclui referncias Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Mdio 1. Ensino mdio. 2. Professores - Formao. 3. Matemtica Estudo e ensino. I. Jahn, Ana Paula. II. Universidade Federal do Paran. Setor de Educao. III. Matemtica. IV. Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Mdio. V. Ttulo. CDD 373.19
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANSISTEMA DE BIBLIOTECAS BIBLIOTECA CENTRAL
COORDENAO DE PROCESSOS TCNICOS
Andrea Carolina Grohs CRB 9/1384
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MATEMTICAEtapa II Caderno V
AUTORESIole de Freitas Druck
Maria Cristina Bonomi
Viviana Giampaoli
Ana Paula Jahn
Italo Modesto Dutra
COORDENAO DA PRODUOMonica Ribeiro da Silva (organizadora)
Culi Mariano Jorge
Eloise Medice Colontonio
Glian Cristina Barros
Giselle Christina Corra
Lia de Cssia Fernandes Hegeto
LEITORES CRTICOSCassiano Roberto Nascimento Ogliari
Fernando Pereira dos Santos
Joo Carlos Araujo
Maria Tereza Carneiro Soares
REVISOGiselle Christina Corra
PROJETO GRFICO E EDITORAOVictor Augustus Graciotto Silva
Rafael Ferrer Kloss
CAPAYasmin Fabris
Rafael Ferrer Kloss
ARTE FINALRafael Ferrer Kloss
COORDENAO GERAL E ORGANIZAO DA PRODUO DOS MATERIAIS
Monica Ribeiro da Silva
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Caro Professor, Cara Professora
Com vistas a garantir a qualidade do Ensino Mdio ofertado no Pas foi institudo por meio da Portaria Ministerial n 1.140, de 22 de novembro de 2013, o Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Mdio. Este Pacto contempla, dentre outras, a ao de formao continuada dos professores e coordenadores pedaggicos de Ensino Mdio por meio da colaborao entre Ministrio da Educao, Secretarias Estaduais de Educao e Universidades.
Esta ao tem o objetivo central de contribuir para o aperfeioamento da formao continuada de professores a partir da discusso das prticas docentes luz das novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio DCNEM (Resoluo CNE/CEB n 2, de 31 de janeiro de 2012). Nesse sentido, a formao se articula ao de redesenho curricular em desenvolvimento nas escolas pblicas de Ensino Mdio a partir dessas Diretrizes.
A primeira etapa da Formao Continuada, em conformidade com as DCNEM, trouxe como eixo condutor Os Sujeitos do Ensino Mdio e a Formao Humana Integral e foi composta pelos seguintes Campos Temticos/Cadernos: Sujeitos do Ensino Mdio e Formao Humana Integral; Ensino Mdio e Formao Humana Integral; O Currculo do Ensino Mdio, seus sujeitos e o desafio da Formao Humana Integral; Organizao e Gesto do Trabalho Pedaggico; Avaliao no Ensino Mdio; e reas de Conhecimento e Integrao Curricular.
Nesta segunda etapa, dando continuidade ao eixo proposto, as temticas que compem os Ca-dernos de Formao do Pacto so: Organizao do Trabalho Pedaggico no Ensino Mdio e reas de Conhecimento do Ensino Mdio, em consonncia com as proposies das DCNEM, considerando o dilogo com o que vem sendo praticado em nossas escolas, a diversidade de prticas e a garantia da educao para todos. A formao continuada propiciada pelo Pacto auxiliar o debate sobre a Base Nacional Comum do Currculo que ser objeto de estudo dos diversos setores da educao em todo o territrio nacional, em articulao com a sociedade, na perspectiva da garantia do direito aprendiza-gem e ao desenvolvimento humano dos estudantes da Educao Bsica, conforme meta estabelecida no Plano Nacional de Educao.
Destacamos como ponto fundamental que nesta segunda etapa seja feita a leitura e a reflexo dos Cadernos de todas as reas por todos os professores que participam da formao do Pacto, consi-derando o objetivo de aprofundar as discusses sobre a articulao entre conhecimentos das diferen-tes disciplinas e reas, a partir da realidade escolar. A perspectiva de integrao curricular posta pelas DCNEM exige que os professores ampliem suas compreenses sobre a totalidade dos componentes curriculares, na forma de disciplinas e outras possibilidades de organizao do conhecimento escolar, a partir de quatro dimenses fundamentais: a) compreenso sobre os sujeitos do Ensino Mdio con-siderando suas experincias e suas necessidades; b) escolha de conhecimentos relevantes de modo a produzir contedos contextualizados nas diversas situaes onde a educao no Ensino Mdio produzida; c) planejamento que propicie a explicitao das prticas de docncia e que amplie a diver-sificao das intervenes no sentido da integrao nas reas e entre reas; d) avaliao que permita ao estudante compreender suas aprendizagens e ao docente identific-las para novos planejamentos.
Espera-se que esta etapa, assim como as demais que estamos preparando, seja a oportunidade para uma real e efetiva integrao entre os diversos componentes curriculares, considerando o im-pacto na melhoria de condies de aprender e desenvolver-se dos estudantes e dos professores nessa etapa conclusiva da Educao Bsica.
Secretaria da Educao Bsica
Ministrio da Educao
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Sumrio
Introduo / 6
1. Contextualizao e contribuies / 8
1.1 A contribuio da Matemtica como saber escolar e sua
relao com as necessidades da vida cotidiana / 8
1.2 Os tipos de pensamento matemtico e sua relao com o fazer escolar / 9
1.3 Reconhecimento das prticas de docncia: a relao da Matemtica
com outras reas e outros componentes curriculares / 12
2. Os sujeitos estudantes do Ensino Mdio e os direitos aprendizagem e ao desenvolvimento humano na rea de Matemtica / 15
2.1 Centralidade do estudante / 16
2.2 A Matemtica na formao dos jovens do Ensino Mdio / 19
3. Trabalho, cultura, cincia e tecnologia na rea de Matemtica / 24
3.1 Breves consideraes histricas / 25
3.2 Conhecimentos matemticos pertinentes a um currculo de Ensino Mdio elaborado
com base nas dimenses do trabalho, cultura, cincia e tecnologia / 27
4. Dilogo entre as reas do conhecimento escolar: princpios e proposies pedaggico-curriculares / 32
4.1 Para finalizar... / 41
Referncias / 43
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6Matemtica
Introduo
Qual o papel que a Matemtica escolar pode desempenhar na formao humana integral dos estudantes do Ensino Mdio?
Cara Professora, caro Professor, neste Caderno buscamos discutir e apontar possibilidades de res-
postas a essa questo. Evidentemente, a pergunta colocada abrangente e no h resposta simples nem
nica para ela. No entanto, uma reflexo a esse respeito necessria, no apenas por parte dos professores
de Matemtica, mas tambm por todos os que atuam no Ensino Mdio, se acreditamos que a ao curri-
cular integrada entre as reas de conhecimento fundamental para o favorecimento da formao humana
integral.
Sabemos bem do estigma que a Matemtica escolar tem de ser inacessvel, desinteressante e intil.
Isso reflexo das abordagens equivocadas que dominam o ensino desta cincia. Com isso, na escola, essa
rea tem mais contribudo para gerar inseguranas e frustraes nos estudantes do que real aprendizagem.
Buscamos, aqui, discutir as caractersticas especficas da Matemtica, capazes de favorecer de fato o de-
senvolvimento humano na escola.
Em particular, a Matemtica propicia o desenvolvimento de quatro tipos especficos de pensamen-
to: indutivo, lgico-dedutivo, geomtrico-espacial e no-determinstico. Muitos de seus conhecimentos
so teis em vrias situaes do cotidiano, alm de serem inmeras as articulaes possveis com as outras
reas de conhecimento ou componentes curriculares, intrnsecas a situaes problemas em diversos mbi-
tos. Essa discusso feita na Unidade 1 desse Caderno.
Ao longo da Unidade 2, coloca-se em pauta a centralidade do jovem com seus desejos e interes-
ses, esclarecendo que as diferentes aprendizagens so direitos de todos os jovens e que as reas precisam
encontrar maneiras adequadas para possibilitar a consecuo de tais direitos, focando particularmente as
potencialidades da Matemtica em contribuir com o estabelecimento e a execuo de atividades integra-
doras.
Na Unidade 3, apresentamos algumas contribuies da Matemtica desenvolvidas ao longo da his-
tria que evidenciam a integrao desta rea com as dimenses do trabalho, cultura, cincia e tecnologia,
desde suas origens. Tambm apontamos a necessidade da escolha de conhecimentos/contedos da rea
que, por se relacionarem intrinsecamente com essas dimenses, merecem ser destacados num currculo
desenvolvido a partir das mesmas, como proposto nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Mdio (DCNEM).
Na Unidade 4, inicialmente fazemos uma reflexo sobre o papel do trabalho como princpio educa-
tivo e da pesquisa como princpio pedaggico, enquanto norteadores de abordagens pedaggico-curricula-
res que visem uma formao integral. Em seguida, a partir de exemplos de prticas escolares, envolvendo
a rea de Matemtica, buscamos um entendimento mais concreto sobre as efetivas potencialidades de
articulao de conhecimentos matemticos com as demais reas, em atividades de carter integrador.
Salientamos que este Caderno pretende oferecer subsdios para a reflexo dos professores de todas
as reas. Seu objetivo, portanto, no inclui discusses e reflexes mais aprofundadas sobre conhecimentos
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7Formao de Professores do Ensino Mdio
especficos da rea de Matemtica. Essa temtica seguramente necessria no contexto das finalidades
do Ensino Mdio constantes das atuais DCNEM e estar presente na terceira etapa da formao do Pacto
Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Mdio, momento em que sero promovidas discusses mais de-
talhadas sobre conhecimentos fundamentais de cada rea de conhecimento.
Esperamos contribuir com pistas fecundas para reflexes sobre possveis respostas pergunta ini-
cial, no apenas na teoria, e que sejam inspiradoras para as transformaes necessrias da prtica escolar
no Ensino Mdio, na busca pelo desenvolvimento humano e pela formao integral.
Desejamos um bom trabalho a todos e a todas!
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8Matemtica
1. Contextualizao e contribuies
1.1 A contribuio da Matemtica como saber escolar e sua relao com as necessidades da vida cotidiana
O fato de a Matemtica estar to intimamente ligada atividade
escolar e, ao mesmo tempo, a um conhecimento por vezes descrito
como inalcanvel por muitos estudantes e adultos que j concluram
a Educao Bsica, torna a rea particularmente importante no con-
texto educacional. Isso porque se faz necessrio construir experin-
cias em educao matemtica capazes de superar barreiras e distncias
criadas por relaes improdutivas entre o professor, o estudante e o
conhecimento. Tais relaes so reforadas por abordagens escolares
incapazes de produzir comunicao efetiva entre os saberes dos estu-
dantes ou as suas necessidades de aprendizagem e o conhecimento,
mediada pelos professores. Sobre essa problemtica refletiremos com
mais detalhes nas demais unidades do Caderno.
Por outro lado, h um claro reconhecimento social da impor-
tncia do domnio bsico dos conceitos e das ferramentas que a Ma-
temtica oferece para a vida humana. Tal reconhecimento , muitas
vezes, confundido com a garantia de mais espao no currculo para
a Matemtica, o que no necessariamente implica em maior qualida-
de das aprendizagens em Matemtica. Em especial no Ensino Mdio,
onde h treze disciplinas/componentes curriculares obrigatrios de
acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio
(BRASIL, 2012), preciso olhar com cuidado as atividades desses
componentes e de outros definidos nas escolas, para se aproveitar das
inmeras relaes existentes entre os conceitos e assuntos que todos
eles podem englobar. Atividades integradoras entre as reas de conhe-
cimento sero discutidas na Unidade 4.
Que tal nos debruarmos um pouco mais sobre os argumentos
apresentados at aqui? Professores, qual a importncia dos conhe-
cimentos de Matemtica abordados com seus estudantes no Ensino
Mdio? Essa pergunta, por mais simples que parea, pode auxiliar na
reflexo sobre a insuficiente relao entre os conhecimentos matem-
ticos tratados na escola e o cotidiano da maioria dos estudantes brasi-
leiros. E tal pergunta tambm precisa ser levada em considerao por
aqueles professores que no so da rea de Matemtica. Isso porque
Sugerimos a leitura do artigo Por que se ensina Matemtica? de autoria de Ubiratan DAmbrsio, um dos pioneiros na pesquisa em Educao Matemtica no Brasil, disponvel em:
h t t p : / / a p o i o l o n d r i n a .pbworks .com/f /Por%20que%20ensinar%20Matema-tica.pdf
Esse texto pode suscitar algumas reflexes relati-vas unidade. Faremos uso desta leitura no fi-nal da seo na atividade compartilhada.
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9Formao de Professores do Ensino Mdio
No Ensino Mdio, com-preendem-se como cam-pos da Matemtica esco-lar: nmeros e operaes, funes, equaes algbri-cas, geometria analtica, geometria, estatstica e probabilidades.
No Guia do Livro Didtico do PNLD 2012 (BRASIL, 2011, p. 14-16; p. 24-26) apresentam-se conceitos fundamentais para a com-preenso dos diferentes ti-pos de pensamento mate-mtico, trazendo inclusive um breve resgate histrico sobre a questo. Professo-res, isso pode ser conferi-do no link: www.fnde.gov.br/arquivos/category/125-guias?download=5512:pnld-2012-matematica.
precisamos garantir a ampliao de tais conhecimentos no sentido de
possibilitar o acesso desses estudantes s prticas sociais que lhes per-
mitam uma leitura de mundo mais crtica, bem como a compreenso
dos modos de produo de conhecimento em diversas reas.
Caros professores, se pararem para pensar, rapidamente podero identificar vrias situaes nas quais os conhecimentos de Matemtica so usados no dia a dia. Que tal agora tentar fazer esse exerccio pensando na relao entre os conceitos e contedos do seu componente curricular que envolvem Matemtica, e onde
eles se aplicam no cotidiano? H conceitos/contedos matemticos que voc no consegue relacionar ao seu cotidiano? Anote suas
concluses para posterior compartilhamento com os demais co-legas.
Como j comentamos anteriormente, h muitas escolhas em re-
lao aos contedos trabalhados na escola que so feitas sem levar em
considerao as necessidades dos estudantes e, principalmente, sem
que se procure organizar contextos em diversas reas que auxiliem
na atribuio de significados pelos estudantes. No texto Por que se
ensina Matemtica?, apresentado no primeiro Saiba Mais desta
Unidade, h algumas pistas que podero auxiliar nessas escolhas e na
organizao de seu planejamento.
1.2 Os tipos de pensamento matemtico e sua relao com o fazer escolar
Caracterizar o pensamento matemtico no tarefa trivial, por
mais que se queira. Em se tratando da Matemtica para a escola de
Educao Bsica, essa tarefa se torna ainda mais delicada, uma vez
que se faz necessrio superar certas tradies que vm caracterizando
a escolha de contedos escolares sem a devida ateno necessidade
de explorar as caractersticas dessa cincia, de modo que favoream o
desenvolvimento integral.
Mesmo com critrios de validao baseados em princpios lgi-
cos comuns a todos seus campos, o fazer matemtico mobiliza quatro
diferentes tipos de raciocnios ou intuies: o pensamento indutivo
(ou raciocnios plausveis, presentes no ato de criao matemtica, na
formulao intuitiva de novas conjecturas a serem validadas posterior-
mente); o raciocnio lgico-dedutivo (prprio da lgebra e Geometria,
por exemplo, e de tudo que diz respeito a provas de propriedades em
Pensando nas relaes da Matemtica com o coti-diano, o link proposto ser-ve de provocao, Onde est a Matemtica na En-genharia Civil?, ao mes-mo tempo, sugere-se uma atividade feita por um professor que tem a inten-o de ampliar os conheci-mentos a respeito de uma rea de atuao humana na modificao do espao. http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnica-Aula.html?aula=27230
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Matemtica
todos os campos da Matemtica); a viso geomtrico-espacial (necessria para o aprendizado significativo
da geometria e de suas aplicaes) e o pensamento no-determinstico (caracterstico da estatstica e da
probabilidade, campos que estudam eventos que envolvem aleatoriedade).
Vamos explorar um pouco mais essas ideias? Muitas atividades e exemplos podem ser pensados no
sentido de construir estruturas que permitam a utilizao de cada tipo de pensamento.
No caso do pensamento indutivo, podemos conceber atividades que possibilitam aos estudantes
construir determinadas hipteses, por exemplo, em relao a alguns algoritmos elementares: por que o
resto de uma diviso no pode ser maior que o divisor? E como esse fato pode ser relacionado represen-
tao decimal dos nmeros racionais? Outra situao na qual utilizamos o pensamento indutivo, quando
generalizamos a partir de alguns casos particulares, como por exemplo, para a validao do Teorema de
Pitgoras a partir do que sugerem as imagens na figura a seguir.
Figura 1: Voc v o Teorema de Pitgoras?
FONTE: Os autores (2014)
Na figura anterior se pode visualizar, indutivamente, que a rea do quadrado da hipotenusa equi-
vale soma das reas dos quadrados dos catetos de um tringulo retngulo. Por outro lado, se atribuir-
mos valores genricos s medidas dos catetos e da hipotenusa do mesmo tringulo e utilizarmos, como
conhecimentos prvios j deduzidos, a expresso do trinmio do quadrado perfeito e as frmulas para a
obteno das reas do quadrado e dos tringulos, pode-se empregar o raciocnio lgico-dedutivo em uma
demonstrao algbrica do Teorema de Pitgoras.
Para o raciocnio lgico-dedutivo necessrio observar a utilizao de determinadas regras, que
podem ser simplesmente tomadas como verdadeiras ou provadas anteriormente e, a partir dessas regras,
construir novas. Assim, usamos raciocnio lgico-dedutivo na deduo da relao fundamental da trigo-
nometria (senx + cosx=1) a partir do Teorema de Pitgoras e das definies das funes seno e cosseno
no crculo trigonomtrico, por exemplo. Da mesma forma, o fazemos quando provamos a validade da
propriedade (b) a partir da propriedade (a), enunciadas a seguir:
(a) Duas retas so paralelas se, e somente se, os ngulos correspondentes determinados por elas com
uma reta transversal tm medidas iguais.
(b) Uma reta que corta dois lados de um tringulo paralela ao terceiro lado do mesmo tringulo se,
e somente se, determina um tringulo semelhante ao primeiro.
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Formao de Professores do Ensino Mdio
A primeira propriedade usualmente estudada no Ensino Fundamental II, enquanto que a segunda
muito til no Ensino Mdio.
Sabemos que a Geometria Analtica um campo da Matemtica que estabelece importantes rela-
es entre os registros grficos e algbricos de funes, o que permite, inclusive, a utilizao de programas
computacionais grficos. Assim, dois registros distintos dados - um grfico e uma equao - representam
a mesma funo se as coordenadas cartesianas de todos os pontos do grfico satisfazem a equao e, vice-
versa, se todas as solues da equao forem coordenadas de pontos do grfico dado. Consequentemente,
a propriedade (b) comentada anteriormente que nos permite comprovar, por meio de raciocnio lgico-
dedutivo, que qualquer equao do tipo y = ax + b representa uma reta no plano cartesiano.
No caso da viso geomtrico-espacial, as estruturas que permitem o uso de tal pensamento advm
da interao com os objetos e com os movimentos no espao fsico. Podemos caracteriz-lo a partir da
construo de representaes mentais que possibilitam, por exemplo, reconhecer caractersticas de figuras
geomtricas ( um paraleleppedo? um cubo?), interpretar relaes entre objetos no espao e estimar
reas e volumes sem medio direta; antecipar resultados de transformaes de figuras planas e objetos
espaciais (o que acontece quando giramos um tringulo em torno de um dos seus lados?); produzir e inter-
pretar representaes planas de objetos espaciais, plantas baixas de construes, mapas de diversos tipos,
ou maquetes. Observa-se que o desenvolvimento de viso geomtrico-espacial, em muitas situaes, pode
propiciar raciocnios indutivos e vice-versa.
J no caso do pensamento no-determinstico, entramos no campo da incerteza e da variabilidade,
duas noes que, para muitos, parecem no ter relao com a Matemtica. Entretanto, so inmeras as
situaes nas quais interagimos fazendo uso desse tipo de raciocnio: a definio de critrios e condies
que influenciam determinados fenmenos sociais (como movimentos migratrios, inteno de voto) ou
ambientais (probabilidade de chuva ou de tempestade ou valores de variao da umidade relativa do ar);
a escolha de trajetos no bairro, em uma cidade ou oferecidos por sistemas de localizao (GPS) levando
em considerao o tempo de trajeto, o trfego, dentre outros.
Muitas das escolhas de contedos feitas por ns professores parecem indicar uma abordagem mais
concentrada em um determinado tipo de pensamento matemtico, a saber, o raciocnio lgico-dedutivo.
Ainda assim, muito caracterstico das abordagens mais tradicionais, confundir o pensamento lgico-de-
dutivo com a simples memorizao de regras e frmulas. Tal equvoco frequente induz a deturpaes so-
bre a concepo da prpria natureza da Matemtica. Procedimentos e regras podem ter sua validade efeti-
vamente comprovada apenas por meio de raciocnios lgico-dedutivos. Decorar no pode ser sinnimo de
raciocinar. Executar procedimentos padro sem compreenso, em exerccios repetitivos, no promove o
desenvolvimento de raciocnio nem a aprendizagem significativa dessa cincia. A memorizao de certos
procedimentos, por meio da repetio de tcnicas ou regras de uso muito frequentes pode at ter utilidade
na continuidade dos estudos nessa rea. O indesejvel a simples prescrio de regras, sem prvia discus-
so e validao pelos estudantes, pois no contribui para a formao integral almejada.
importante proporcionar experincias escolares que promovam o desenvolvimento desses quatro
tipos de raciocnios ou intuies, fazendo escolhas mais adequadas s necessidades de compreenso e usos
dos conhecimentos matemticos em contextos enriquecedores. Para tanto, torna-se fundamental um equi-
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Matemtica
lbrio no uso das ferramentas que a Matemtica oferece, no sentido de
construir experincias que promovam o desenvolvimento dos diferen-
tes, todavia articulados, modos de raciocinar da Matemtica, possibili-
tando aos estudantes mobiliz-los em todas as reas de conhecimento.
1.3 Reconhecimento das prticas de docncia: a relao da Matemtica com outras reas e outros componentes curriculares
A organizao curricular do Ensino Mdio tem uma base nacional comum e uma parte diversi-ficada que no devem constituir blocos distintos,
mas um todo integrado, de modo a garantir tanto conhecimentos e saberes comuns necessrios a todos os estudantes, quanto a formao que consi-dere a diversidade e as caractersticas locais e es-pecificidades regionais. (BRASIL, 2012, art. 7)
com esse esprito que as DCNEM tratam da organizao cur-
ricular para essa etapa da Educao Bsica. Nesse sentido, precisamos
dar especial ateno s prticas pedaggicas institudas e encontrar
solues que tentem alcanar o que o texto das Diretrizes prope em
relao s reas de conhecimento: o currculo deve contemplar as
quatro reas do conhecimento, com tratamento metodolgico que evi-
dencie a contextualizao e a interdisciplinaridade ou outras formas
de interao e articulao entre diferentes campos de saberes especfi-
cos. (BRASIL, 2012, art. 8 1)
A partir de uma reflexo sobre o texto das DCNEM, que pr-
ticas na docncia so mais frequentes na rotina de sua escola? O que
precisamos reorganizar para nos aproximarmos do que se prope nas
Diretrizes?
A organizao por reas de conhecimento no dilui nem exclui componentes curriculares com especificidades e saberes prprios construdos e
sistematizados, mas implica no fortalecimento das relaes entre eles e a sua contextualizao para apreenso e interveno na realidade, re-querendo planejamento e execuo conjugados e cooperativos dos seus professores. (BRASIL, 2012, art. 8 2)
No seria a interdisciplinaridade, ou outras prticas integrado-
ras da Matemtica com outros diversos conhecimentos de diferentes
reas para a compreenso ou reas de conhecimento, uma forma de
As duas obras a seguir so exemplos de uso dos conhecimentos de mate-mtica em diversas reas da atuao humana. So elas: A matemtica nos tribunais: uso e abuso dos nmeros em julga-mentos (SCHNEPS & COLMEZ, 2014); e Os Nmeros (No) Mentem: como a Matemtica pode ser usada para enganar voc (SEIFE, 2012). Uma similaridade entre as duas obras que as mesmas descrevem uma srie de atividades nas quais o co-nhecimento matemtico pode ser usado como uma ferramenta para construir narrativas no necessaria-mente verdadeiras. Pen-sando em atividades que estabeleam pontes entre a Matemtica e os demais componentes curricula-res, essas obras podem ser uma boa fonte de inspira-o para o planejamento coletivo.
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Formao de Professores do Ensino Mdio
garantir espaos curriculares mais interessantes para todos, pela construo de contextos de fato signi-
ficativos para os estudantes? Essa uma questo de extrema relevncia pois, como sabemos, bastante
comum a disputa de espao/tempo escolar entre disciplinas - os treze componentes curriculares obriga-
trios previstos nas DCNEM. Assim, a otimizao de espao/tempo pode abrir caminhos para atividades
integradoras, das quais participem especialistas de diferentes componentes curriculares. Tais atividades,
alm de trazerem vantagens no aporte de contextualizao e atribuio de significados aos estudantes,
requerem um planejamento coletivo, o que certamente implicar na discusso sobre a relevncia e per-
tinncia de vrios dos contedos abordados.
importante salientar que contextualizao e interdisciplinaridade so, muitas vezes, reduzidas
ao uso de situaes-problema ou exemplos simples em atividades de Matemtica que envolvem concei-
tos de outros diversos conhecimentos de diferentes reas para a compreenso curriculares/disciplinas,
sem estabelecer relaes mais consistentes entre eles. Assim, no podemos chamar de contexto um pro-
blema sobre movimento retilneo uniforme ou velocidade mdia, cujo nico objetivo que o estudante
escreva e resolva uma equao. Contexto no mero pretexto. No mbito do que estamos propondo
aqui, preciso que se reconhea a diferena entre exemplos simples e contextos que requerem a nego-
ciao conjunta de diversos pontos de vista, intrinsecamente pertinentes a mais de um componente ou
rea. Ou seja, verdadeiros contextos, no sentido de abordagens didtico-pedaggicas com potencial de
favorecer aprendizagens significativas, precisam envolver necessariamente diversos conhecimentos de
diferentes reas para a compreenso mais abrangente de uma situao-problema relevante. Essas ques-
tes sero retomadas em outros momentos nas Unidades 3 e 4.
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Matemtica
REFLEXO E AO
Caro Professor, cara Professora,
No texto dessa Unidade fizemos a afirmao de que h um predomnio, nem sempre desejvel, do
pensamento lgico-dedutivo nas atividades propostas em Matemtica. Voc, Professor de Matemtica,
concorda com isso? Ou o dominante mesmo a mera prescrio de regras e procedimentos sem compro-
vao?
Vamos pensar sobre o assunto? Nos exemplos que usamos no texto, h a indicao de atividades
que podem ser pensadas por vrias reas ou componentes curriculares. Propomos que, em grupo, seja
analisado um conjunto de atividades realizadas com os estudantes no perodo de uma semana. O ideal
que sejam analisadas as atividades de todos os componentes curriculares de uma determinada turma de
estudantes na tentativa de observar e identificar os tipos de pensamento matemtico que possam estar
presentes nessas atividades. Sugerimos o uso da seguinte tabela:
Componente curricular Breve descrio da Atividade Tipos de pensamento matemtico envolvidos
... (acrescentem as linhas que forem necessrias)
Com os dados completos dessa tabela, possvel identificar os tipos de pensamento matemtico
em todas as atividades? Quais sero os tipos de pensamento mais frequentes na sua rea? A partir das ex-
plicaes e exemplos feitos no texto, pode-se verificar o que foi afirmado em relao a ser o pensamento
lgico-dedutivo o mais usado nas atividades de Matemtica? Como produzir maior equilbrio em relao
aos diversos tipos de pensamento matemtico? Como isso pode auxiliar em planejamentos individuais e
coletivos que apontem a escolha do que ser trabalhado com os jovens? importante que o produto dessa
reflexo possa ser utilizado em comparao com as outras atividades que propomos adiante.
Compartilhem essa tabela e suas reflexes em formato de artigo publicando-as no Portal EMdialo-
go, disponvel em: http://www.emdialogo.uff.br
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Formao de Professores do Ensino Mdio
2. Os sujeitos estudantes do Ensino Mdio e os direitos aprendizagem e ao desenvolvimento humano na rea de Matemtica
Professores, lembramos que no Caderno II da Etapa I desta For-
mao foi apresentada a ideia do jovem como sujeito do Ensino Mdio.
Foram fornecidas chaves analticas que possam facilitar o processo
de aproximao e conhecimento dos estudantes que chegam escola
como jovens sujeitos de experincias, saberes e desejos. (BRASIL,
2013a, p. 8). Foi apresentada ainda, na seo 1.1, a noo de juventu-
de, explicitando a ideia de que, na verdade, existem juventudes, no
plural, para enfatizar a diversidade de modos de ser jovem existente.
(BRASIL, 2013a, p. 16)
Observou-se tambm que os diversos problemas da juventude
na escola referem-se mais a questes de relacionamento entre jovens,
professores e instituies e que a busca de culpados pelos conflitos
vivenciados na escola revela-se completamente infrutfera. De fato,
a anlise dessas relaes mostra que o problema no est reduzido
somente aos jovens ou escola e seus professores. importante perce-
ber que a instituio escolar faz parte de um espao social mais amplo.
Assim todas as questes que a envolvem evidenciam dificuldades que,
numa viso macro, so encontradas de alguma forma nesse espao.
Estando isso claro, torna-se necessrio estabelecer estratgias
para que a escola busque espaos de convivncia onde todos se sin-
tam instigados a participar da construo de conhecimentos. funda-
mental superar a tendncia de procurar de quem a culpa, relativa
quela problemtica, e desenvolver um novo olhar para a instituio
escolar e para as relaes entre seus diferentes agentes, no esquecen-
do da insero de todas as juventudes, com seus saberes, desejos e
direitos, na escola.
O jovem chega ao Ensino Mdio proveniente de diferentes tri-
bos e pode, eventualmente, vir a se integrar em algum novo grupo
a partir da realidade vivida na escola. importante que a instituio
acolha os interesses juvenis. Para tanto, convm que as escolas de En-
sino Mdio desenvolvam projetos educacionais, de qualidade social,
adequados s caractersticas das juventudes que a frequentam, permi-
tindo que muitos dos desejos que trazem se transformem em projetos
que possam ser perseguidos e concretizados. Professores, no Parecer
das DCNEM, (BRASIL, 2011, p. 9) indica-se a necessidade da rein-
Para conhecimento da completude sobre a ex-tenso dos direitos legais, a Emenda Constitucional n 59, de 11 de novembro de 2009 pode ser acessada pelo link:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc59.htm
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Matemtica
veno da escola. Vamos refletir sobre como a Matemtica pode contribuir nesse processo? Como ins-
tigar estudantes com a Matemtica escolar quando a sala de aula vista como um local desinteressante,
caracterizado por poucas interaes, ausncia de espontaneidade e de questionamentos?
Esta unidade est organizada em duas sees. Na primeira discutida a centralidade do jovem no
processo educativo, e mais especificamente, sero apresentadas algumas ideias de como o ensino de Mate-
mtica pode enfatizar tal centralidade. Na segunda seo, faz-se uma reflexo sobre o papel da Matemtica
no trabalho com projetos.
2.1 Centralidade do estudante
Os jovens fazem parte de grupos sociais diferentes constitudos a partir, por exemplo, de interes-
ses, convenincias, afinidades ou proximidades regionais. No podemos esquecer tambm que muitos
vivem num mundo virtual no qual esto permanentemente conectados uns com os outros, mesmo no
estando prximos fisicamente, mas acessveis e presentes o tempo todo.
Uma formao matemtica integral na Educao Bsica demanda que os saberes dos estudantes
sejam valorizados nas suas prprias formas de representao e expresso, e contrastados com os conhe-
cimentos historicamente estabelecidos, garantindo a integrao de suas vivncias e experimentaes com
aquelas prprias cincia. fundamental situar a relao dos estudantes com a Matemtica na perspec-
tiva de um sujeito ativo e social que atua na produo e transformao das realidades e da sua prpria
existncia. Neste sentido, torna-se essencial que contextos de seus efetivos interesses sejam considerados
na escola. A fim de estabelecer um permanente dilogo entre esses saberes e a prtica educativa, particu-
larmente em Matemtica, desejvel buscar situaes que possibilitem aos jovens perceber a presena
de conhecimentos desta rea em atividades diversas, sendo elas artsticas, esportivas, educacionais, de
trabalho, ou outras.
Observem, por exemplo, o trecho da msica Captulo 4, Versculo 3 dos Racionais MCs que des-
tacamos a seguir:
60% dos jovens de periferia sem antecedentes criminaisj sofreram violncia policial. A cada 4 pessoas mortas pela polcia, 3 so negras. Nas universidades brasileiras apenas 2% dos estudantes so negros. A cada quatro horas, um jovem negro morre violentamente em So Paulo. ... Vinte e sete anos contrariando a estatstica. Seu comercial de TV no me engana. Eu no preciso de status nem fama. Seu carro e sua grana j no me seduz...
Professor, professora, sugerimos a leitura da reportagem publicada no Es-tado, disponvel em: http://goo.gl/fSxBSv, na qual, Fbio Porchat, jo-vem ator e comediante, apresenta questionamentos quanto ao ensinar e o aprender a partir de sua experincia como estudante. Voc considera que seus estudantes tm a mesma percepo da escola?
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Formao de Professores do Ensino Mdio
No contexto de gneros musicais da preferncia de certos grupos de jovens, possvel encontrar
textos como esse que tm o potencial de favorecer um trabalho integrado com professores de vrias reas,
no verdade?
A seguir, foram selecionados, para uma discusso mais aprofundada, dois aspectos que tm se mos-
trado muito presentes em todas as juventudes ou tribos que chegam ao Ensino Mdio atualmente: a
perda da curiosidade inerente infncia e a conexo com o mundo virtual, particularmente com as redes
sociais. Tal escolha deve-se ao fato de considerarmos ser a Matemtica uma rea especialmente propcia
para favorecer tanto a recuperao da curiosidade perdida, como para acolher e contrastar a febre de
conexo com o mundo virtual, dominante entre os jovens, com os conhecimentos matemticos escolares.
O tema das juventudes amplo e certamente no se esgota nesses dois aspectos.
Desde criana, o estudante normalmente possui um vasto repertrio de perguntas que vo desde o
por que?, como?, o qu? at algumas mais elaboradas do tipo e se fosse assim....? Ao chegar
escola, seu carter inquiridor, curioso, est sempre presente. H tantas coisas para descobrir, interesses
variados, estmulos interessantes
Entretanto, conforme os anos escolares vo passando, em geral a curiosidade vai tristemente dimi-
nuindo, no mesmo? Ser porque ela foi vetada por procedimentos autoritrios ou paternalistas? Paulo
Freire j refletiu sobre isto:
Se h uma prtica exemplar como negao da experincia formadora a que dificulta ou
inibe a curiosidade do educando e, em consequncia, a do educador. que o educador que, entregue a procedimentos autoritrios ou paternalistas que impedem ou dificul-tam o exerccio da curiosidade do educando, termina por igualmente tolher sua prpria curiosidade. Nenhuma curiosidade se sustenta eticamente no exerccio da negao da outra curiosidade. [...] Como professor devo saber que sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que me insere na busca, no aprendo nem ensino. (FREIRE, 1996, p. 94)
Ao chegar no Ensino Mdio, de um modo geral, as questes de diversos jovens frequentemente no
envolvem problemticas muito elaboradas, as perguntas so cada vez mais particulares, localizadas, com
interesses imediatos.
Nos dias de hoje, dada a facilidade de acesso informao, muitos jovens, se porventura tiverem
algum questionamento ou pergunta, acreditam que a Internet possa responder e, na sua viso, de forma
rpida e eficiente. Na verdade, sites de busca podem fornecer respostas satisfatrias, mas, na maioria das
vezes, necessrio um nvel de crtica e questionamento adequados, no sendo possvel aceitar, a priori,
todas as opes que aparecem como resposta. Evidentemente, dependendo da pergunta colocada, ser ne-
cessria, alm de uma seleo criteriosa, uma leitura cuidadosa e aprofundada do material escolhido para
poder concluir sobre o assunto pesquisado. Em todo caso, o discernimento e a crtica so caractersticas
importantes a serem desenvolvidas no estudante do Ensino Mdio. essencial, paulatinamente, conduzir
o jovem para uma reviso de seus saberes ou crenas, e para, em particular, uma desmistificao do poder
absoluto da Internet.
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Matemtica
Especificamente em atividades matemticas, fundamental a
crtica relativa aos resultados obtidos na mquina, como no caso das
aproximaes de nmeros com infinitas casas decimais. O que uma
limitao natural da mquina pode possibilitar uma discusso frut-
fera com os estudantes, que envolve um preconceito relativo to di-
fundida exatido na Matemtica. De fato, numa mquina, seja ela uma
calculadora relativamente simples ou o mais sofisticado computador,
no h espao para o infinito. No visor ou na tela sempre aparecer
uma quantidade finita de dgitos, o que, no caso de um nmero com
infinitas casas decimais, constitui uma aproximao. Outro exemplo
interessante pode ser observado numa curva desenhada utilizando um
software grfico, onde possvel perceber que, na realidade, tal curva
constituda por uma coleo de segmentos de reta. Novamente, tal
situao merece uma reflexo interessante com os estudantes.
Professores, consideramos importante ter claro que a utilizao
de qualquer tipo de tecnologia digital no tem por objetivo a simples
reduo do tempo empregado em determinada atividade que poderia
ser realizada manualmente. Isso pode at ocorrer, mas no o princi-
pal objetivo. O essencial abrir o leque de possibilidades para o fazer
e o pensar matemtico, buscando reconhecer e valorizar os conheci-
Caro professor, cara pro-fessora, o texto e o vdeo de Michel Serres apresen-tam interessantes e provo-cativas ideias para sua re-flexo sobre a importncia da insero das tecnolo-gias digitais na escola.
http://goo.gl/0Is2FN
Figura 2: Jovem e Celular.
FONTE: Multimeios - SEED/PR (2014).
Disponvel em: http://goo.gl/utMRpC
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Formao de Professores do Ensino Mdio
mentos e diferentes formas de expresso dos estudantes, a fim de estabelecer um permanente dilogo com
a prtica educativa.
Nos dias de hoje, as transformaes culturais mais decisivas provm de mutaes tec-nolgicas. Assim sendo, as relaes entre cultura e comunicao se modificam e se
acentuam para a atual gerao juvenil. Com efeito, as tecnologias da informao e da comunicao (TICs) transformam-se em verdadeiras marcas de identidade dos jovens assim como so instrumentos de demarcao de fronteiras sociais. (BRASIL, 2014, p. 79, grifos nossos)
Como sugere Moran, a educao escolar precisa compreender e incorporar mais as novas lingua-
gens, desvendar os seus cdigos, dominar as possibilidades de expresso e as possveis manipulaes.
importante educar para usos democrticos, mais progressistas e participativos das tecnologias, que facili-
tem os processos de construo do conhecimento. (MORAN, 1999, p. 5-6). E ainda, se por um lado as TIC
favorecem a comunicao e a identificao entre os jovens propiciando novos processos de socializao,
por outro, podem tambm produzir novas e mais severas formas de excluso social, aprofundando as
desigualdades sociais. (BRASIL, 2014, p. 80)
De qualquer forma, preciso ter claro que urge a educao para as mdias, a fim de compreend-las
em seus alcances, critic-las e utiliz-las da forma mais abrangente. Cabe escola ser um lugar importante
no qual o jovem possa desenvolver sua capacidade de utilizao dessas mdias, para inclusive, exercer
plenamente sua cidadania.
Outro fato a ser considerado que, em geral, os jovens sabem mais e melhor utilizar as ferramentas
informticas do que os adultos. A possibilidade que se abre dessa maneira a de os estudantes poderem
vir a compartilhar conhecimentos com o professor. Em geral, tal situao pode ser muito prazerosa porque
os estudantes se sentem valorizados por possibilitarem aos seus professores a aprendizagem: os papis se
invertem na sala de aula.
Frota e Borges (2004, p. 2) esclarecem que superar as barreiras para o uso efetivo de tecnologias di-
gitais na sala de aula depende de dois movimentos: do professor enquanto sujeito, no sentido de se formar
para uma incorporao tecnolgica; e do sistema educacional como um todo, enquanto responsvel pela
implantao de condies para essa formao e demais aspectos relativos tal insero.
2.2 A Matemtica na formao dos jovens do Ensino Mdio
Uma das principais finalidades da Matemtica a de desenvolver as capacidades de formular
e resolver problemas, de comunicar, de analisar criticamente uma situao, considerando suas di-
ferentes possibilidades ou restries. O ensino de Matemtica com tal foco favorece a formao de
cidados aptos a realizar intervenes na realidade, a partir da compreenso de problemas e situaes
da sociedade atual.
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Matemtica
Os tipos de raciocnios ou intuies pensamento indutivo, raciocnio lgico-dedutivo, viso
geomtrico-espacial, pensamento no-determinstico so peculiares ao fazer matemtico, como
discutido na Unidade 1, expressos por meio de linguagens que lhe so prprias. Cabe Matem-
tica escolar propiciar aos estudantes o desenvolvimento de tais modos de pensar e a apropriao
significativa das formas de representar objetos matemticos. Para tanto, ser importante promover
aes didtico-pedaggicas que levem os jovens a realizar atividades tais como: explorar/experi-
mentar, fazer conjecturas, procurar generalizaes ou o que h de invariante numa situao, entre
outras, e tambm a fazer os registros de suas observaes e hipteses, usando diferentes tipos de
representaes.
importante fazer com que o estudante compreenda que, em Matemtica, no basta uma
hiptese ou conjectura ser verificada em um ou alguns casos para concluir-se que a afirmao seja
verdadeira sempre. imprescindvel encontrar propriedades e argumentos matemticos para vali-
d-la ou fornecer um contraexemplo para rejeit-la, assim como poder comunicar suas concluses
em linguagem apropriada. Tais procedimentos levam ao desenvolvimento de aspectos essenciais
da competncia matemtica e de repertrio de linguagens especficas que permitem a comunicao
adequada das ideias na rea. nessa perspectiva que o ensino pode contribuir para desenvolver uma
atitude positiva face Matemtica e, de modo mais amplo, face cincia. De fato, levar os estudan-
tes a desenvolver a atitude/curiosidade de formular conjecturas e procurar valid-las, desenvolve o
esprito crtico, a capacidade de argumentao e a criatividade.
Entretanto, tradicionalmente a Matemtica escolar privilegia clculos e memorizao e o
ensino focado em tcnicas operatrias e prescrio de procedimentos, sem justificativas; tambm,
as avaliaes costumam restringir-se a repeties das mesmas tcnicas ou procedimentos. Assim
os estudantes incorporam a ideia de que Matemtica to somente executar aes do tipo: calcu-
lar, efetuar, simplificar, determinar etc. E mais, a nfase no seu carter tcnico e formal, a
falta de conexo entre os diferentes campos e suas aplicaes limitam a percepo dos jovens que
acabam considerando a Matemtica como um mero conjunto de regras, frmulas e procedimentos.
Pensando novamente naquela criana curiosa, que chega no incio da escolaridade querendo
saber ... e se fosse...?, podemos observar sua busca por situaes novas, talvez mais gerais, que-
rendo eventualmente descobrir padres, regularidades, o que mantidas as devidas propores, se
aproxima da atitude de uma pessoa que quer estudar ou produzir Matemtica. importante que esse
tipo de atitude seja estimulado nos jovens que, muitas vezes, perderam a curiosidade. Cabe ao pro-
fessor, nos espaos de aprendizagem de Matemtica em todos os nveis escolares, particularmente
no Ensino Mdio, resgatar essa salutar caracterstica do ser humano.
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Formao de Professores do Ensino Mdio
Precisamos ter presente que, segundo Machado (2000), mais
do que ministrar contedos, cabe ao professor a tarefa de estimular
a elaborao de projetos. Uma vez que um projeto nasce de uma
pergunta, importante ento fazer renascer nos estudantes a capa-
cidade de formular perguntas.
Para o autor, o conhecimento exige a capacidade de es-
tabelecer conexes entre elementos informacionais, aparen-
temente desconexos, processar informaes, analis-las, rela-
cion-las, (...) organizlas em sistemas. (MACHADO, 1995,
p. 67-68). E, continuando, adverte sobre a necessidade de
[...] administrar conhecimentos disponveis, construir novos conhecimentos, administrar da-dos ou informaes disponveis, organizar-se para produzir novos dados e informaes, sem-pre em razo de uma ao intencional tendo em vista atingir objetivos previamente traa-dos, ou seja, visando realizao de um projeto. (MACHADO, 1995, p. 68, grifo nosso)
Acima do conhecimento existe o nvel da inteligncia que, se-
gundo o autor, pode ser associada capacidade de ter projetos. Mais
ainda, importante ter claro que o homem no vive sem projetos, sem
desejos, sonhos, bem como no possvel ter projetos pelos outros.
A inteligncia humana se revela na capacidade do homem esta-
belecer seus objetivos e em sua busca para concretiz-los, ou seja, em
sua capacidade de elaborar e executar um projeto.
Assim, um dos grandes objetivos da escola o de fazer com que
seus estudantes, tanto considerados individualmente como em grupos,
tenham interesses, questionamentos, queiram encontrar respostas para
suas perguntas ou, em poucas palavras, venham a ter projetos. Nesse
sentido, muito importante favorecer a formulao de perguntas por
parte dos estudantes.
Observe, professor e professora, que s possvel pensar em
uma pergunta sobre um tema se existe algum conhecimento a seu res-
peito. Assim, em lugar de apenas propor exerccios para verificar se
os estudantes conhecem as tcnicas para resolv-los, ser interessante
solicitar tambm que eles prprios proponham questes para, em se-
guida, discuti-las e validarem ou no suas respostas. Se o estudante
no aprendeu, no conseguir propor uma questo ou problema in-
teressante, original e criativo. E depois, nem mesmo saber resolver
Os projetos que destaca-mos nesta unidade so os referentes pesquisa como princpio pedaggi-co. Esses projetos podem tambm ser tratados como componentes curriculares, diferentes dos obrigat-rios. Vale salientar que estes no esto desvincu-lados dos projetos de vida dos estudantes, como vi-mos na Unidade 3 do Ca-derno II da Etapa I.
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Matemtica
com compreenso, de maneira a avaliar criticamente os resultados,
inclusive porque acredita que resolver significa simplesmente dar uma
resposta reproduzindo uma tcnica j apresentada em sala de aula.
Talvez seja importante insistir: uma vez que se espera que o
estudante aprenda a ter projetos e, ainda antes, seja capaz de se fazer
perguntas, torna-se necessrio estimul-lo o tempo todo para isto. Ser
tambm possvel estabelecer entre os estudantes a permuta de ques-
tes criadas por eles prprios. Evidentemente, tal trabalho fornecer
muitas informaes. A questo proposta pelo estudante pertinente?
A questo proposta original? criativa? Estas e outras questes que
o professor considerar relevantes, viro a constituir um repertrio in-
teressante para que conhea melhor cada um de seus estudantes, po-
dendo ser parte de uma avaliao diagnstica qualitativa de sua classe.
Para concluir, convm salientar trs pontos: a) o estudante que
no conseguiu formular uma questo de maneira adequada no poder
ser menosprezado, mas estimulado a tentar fazer uma nova pergunta
melhor elaborada; b) atividades investigativas costumam favorecer o
engajamento dos jovens e, naturalmente, provocam questionamentos;
c) finalmente, no esqueamos que, ao ser desafiado, o jovem procura
dar uma resposta altura do esperado.
Cabe ainda uma reflexo sobre o importante papel da avalia-
o do processo educativo, particularmente em atividades com proje-
tos. necessrio possibilitar que cada um dos estudantes compreenda
suas aprendizagens e desenvolvimentos nesses processos e que estes
possam ser identificados pelos professores, assim como analisar os
sucessos e dificuldades de percurso para novos planejamentos.
importante que a avaliao de um projeto seja cuidadosamen-
te prevista e imaginada em cada etapa da execuo, ou seja, uma ava-
liao contnua. Mas afinal, o que deve ser avaliado?
Evidentemente, necessrio avaliar a consecuo dos objeti-
vos, mas isso no basta. Todas as aes empreendidas precisam ser
avaliadas, isto , importa examinar o percurso e no apenas os resulta-
dos obtidos. Na execuo de qualquer projeto, podem ocorrer mudan-
as de rota, justamente em funo dessa avaliao processual.
Uma avaliao adequada necessita considerar todas as aes,
observar como e porqu foram realizadas e tambm a participao de
todos e cada um dos agentes envolvidos, isto , que desempenharam
algum papel para o desenvolvimento do projeto.
Como afirmam Pon-te, Brocado e Oliveira (2003), investigar procu-rar conhecer o que no se sabe. Em portugus, com um significado muito pr-ximo, seno equivalente, temos os termos pesqui-sar, inquirir, examinar. Para esses pesquisadores em Educao Matemtica, as atividades investiga-tivas so de natureza ex-ploratria e aberta. Numa investigao matemtica, parte-se de uma questo geral ou de um conjunto de informaes a partir das quais se procura for-mular pergunta(s) e pro-duzir diversas conjecturas. Depois, testam-se essas conjecturas algumas podem ser descartadas ou abandonadas por meio de contraexemplos, e outras, por se revelarem corretas, podem ser aprofundadas. interessante observar que nesse processo, novas questes ou conjecturas surgem ou so formula-das e aquelas iniciais so eventualmente modifica-das ou abandonadas. As conjecturas que subsistem estimulam a busca da ne-cessria validao mate-mtica. Desta forma, a ati-vidade adquire certo grau de imprevisibilidade e demanda do professor fle-xibilidade para lidar com as novas situaes que podem surgir ao longo do processo. Para conhecer mais sobre a perspectiva desses autores, sugerimos a leitura do artigo:
PONTE, J. P. Investiga-o sobre investigaes matemticas em Portugal. Investigar em Educao, 2, p. 3-10. Disponvel em:
http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/jponte/docs-pt/03-Ponte(Rev-SPCE).pdf
Acesso em: 24/7/2014.
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Formao de Professores do Ensino Mdio
Na dependncia do projeto, instrumentos de avaliao podero
ser variados e diferentes, como: observaes, dirio de bordo, regis-
tros de aes e resultados, discusso entre os personagens (autoavalia-
o), discusso em grupos; diagnstico final sobre as transformaes
obtidas, comparativamente com um diagnstico inicial.
REFLEXO E AO
Caro Professor, cara Professora,
Nessa unidade discutimos sobre as juventudes no Ensino Mdio
e do reconhecimento que, em geral, a curiosidade e a criatividade so
pouco exploradas no cotidiano da escola para esses grupos. Vamos,
ento, fazer um exerccio em torno da construo de um projeto que
possa sustentar um trabalho coletivo dos estudantes e uma interao
entre os diversos componentes curriculares? Isso pode ser realizado
entre vocs professores e, depois, transposto para um planejamento
nas atividades da escola junto com os jovens.
Formulem uma ou mais perguntas em uma rea de interesse
do grupo. Percebam que necessria uma negociao para a escolha
dessas questes. Como foi a de vocs? A partir das escolhas feitas
elaborem um projeto. Para tanto, propomos discutir as justificativas
(por que o projeto importante?) e os objetivos ou finalidades (o que
se pretende alcanar com o projeto?). Outra discusso fundamental
tem a ver com a metodologia ou planejamento de atividades (como o
projeto ser desenvolvido?). Por fim, quais instrumentos podem ser
utilizados para a compreenso sobre o quanto os objetivos foram atin-
gidos e sobre a adequao do planejamento? (Avaliao processual e
das aprendizagens).
Cada rea de conhecimento ou componente curricular consegue
se inserir nesse trabalho? Como identificar conhecimentos da rea a
partir das escolhas feitas por vocs? Como planejar atividades como
essa no seu contexto? preciso modificar a diviso dos tempos e re-
pensar os espaos da escola?
Se ficaram interessados, sugerimos como leitura suplementar a
seguinte obra: Trajetrias Criativas - Caderno 7 - Iniciao Cientfica
disponvel em: http://goo.gl/HFLxDc
Aqui sugerimos uma lei-tura complementar que pode ser interessante. O texto do Prof. Paulo Abrantes e trata de avalia-o no contexto da Educa-o Matemtica. Mesmo para quem no professor de matemtica, muitas das reflexes propostas ali po-dem ser aproveitadas para todas as reas.
ABRANTES, P. Avalia-o e Educao Matem-tica. Srie Reflexes em Educao Matemtica. MEM/USU - GEPEM, (1995).
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Matemtica
3. Trabalho, cultura, cincia e tecnologia na rea de Matemtica
No Caderno IV da Etapa I da Formao de Professores do Ensino Mdio, foi feita uma discusso
aprofundada sobre o papel de eixo integrador entre os conhecimentos de distintas naturezas, que as atu-
ais DCNEM atribuem s dimenses do trabalho, cultura, cincia e tecnologia nessa fase escolar. L so
explicitados os significados em que cada uma dessas dimenses entendida nas Diretrizes, e tambm
destacada a importncia de que o ensino escolar aborde os contedos como conhecimentos construdos historicamente que se constituem como condio necessria para que os educandos possam construir novos conhecimentos e compreender o processo histrico e social pelo qual os homens produziram e pro-
duzem sua existncia, com conquistas e problemas. (LUKCS apud BRASIL, 2013c, p. 25, grifo nosso)
Nesta Unidade iremos apresentar algumas reflexes sobre como a Matemtica articula-se espe-
cialmente com as quatro dimenses integradoras, mas, tambm com as demais reas de conhecimento no
Ensino Mdio. Professor, professora, sugerimos fortemente que releia as pginas de 20 a 36 do Caderno
IV citado. Aqui destacamos alguns trechos dos Caderno III e IV da primeira fase da formao, apenas para
relembrar os significados que as DCNEM fixaram para essas dimenses, mais amplamente discutidas nas
pginas acima mencionadas.
Entendemos como trabalho o modo pelo qual o ser humano produz para si o mundo, os objetos e as condies de que precisa para existir. [...]
Nessa perspectiva, se identificamos o trabalho com essa ao transformadora consciente
do ser humano, chamaremos de cultura o conjunto dos resultados dessa ao sobre o mundo. [...] A cultura o prprio ambiente do ser humano, socialmente formada com valores, crenas, objetos, conhecimentos etc. (BRASIL, 2013c, p. 21-22, grifos dos au-tores) A esta concepo de trabalho est associada a concepo de cincia e tecnologia: co-nhecimentos produzidos, sistematizados e legitimados socialmente ao longo da histria, como resultado de um processo empreendido pela humanidade na busca da compreen-so e da transformao dos fenmenos naturais e sociais. (BRASIL, 2013b, p. 23, grifos dos autores)
Alm disso, as DCNEM preveem no seu artigo 5, alnea VIII, que a Organizao do Ensino Mdio
baseia-se na integrao entre educao e as dimenses do trabalho, da cincia, da tecnologia e da cultura
como base da proposta e do desenvolvimento curricular. (DCNEM, 2012, grifo nosso). No artigo seguinte, l-se,
Art. 6 O currculo conceituado como a proposta de ao educativa constituda pela seleo de conhecimentos construdos pela sociedade, expressando-se por prticas esco-lares que se desdobram em torno de conhecimentos relevantes e pertinentes, permeadas pelas relaes sociais, articulando vivncias e saberes dos estudantes e contribuindo para o desenvolvimento de suas identidades e condies cognitivas e socioafetivas. (BRASIL, 2012, grifo nosso)
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Formao de Professores do Ensino Mdio
em que o nosso grifo tem por objetivo explicitar uma das ideias que norteou a organizao dessa Unidade
3. A outra ideia partiu do destaque da citao anterior de Lukcs.
Ao longo do tempo, o homem desenvolveu por razes de sobrevivncia, meios para suprir necessi-
dades, realizando, em geral, avanos em benefcio da humanidade. Por outro lado, intervenes na natu-
reza foram feitas tambm no sentido de domin-la, para satisfazer necessidades momentneas de grupos
especficos, a servio de interesses econmicos ou outros de grupos com maior capacidade de influenciar
o poder. At hoje, observamos aes equivocadas nessa mesma direo, apesar da maior informao sobre
a necessidade de desenvolvimento sustentvel do ser humano no planeta. Reflexes sobre esses assuntos
favorecero uma formao de cidados conscientes e capazes de analisar as contradies, os avanos e os
retrocessos que homem fez para constituir a sociedade contempornea.
O que segue pretende explicitar, a partir da rea de Matemtica e em situaes mais concretas, as
questes discutidas de forma geral anteriormente e no Caderno IV, antes mencionado. Inicialmente, faze-
mos uma breve discusso sobre a Matemtica na histria, salientando como a produo desses conheci-
mentos teve ligaes estreitas com trabalho, cultura, cincia e tecnologia. A seguir, discutiremos exemplos
de conhecimentos e conceitos matemticos prprios do Ensino Mdio, que consideramos relevantes e
pertinentes se quisermos pensar um desenvolvimento curricular que efetivamente seja embasado nas di-
menses do trabalho, cultura, cincia e tecnologia.
3.1 Breves consideraes histricas
As origens dos conceitos matemticos so to antigas quanto a prpria cultura. As motivaes
para a construo desses conceitos foram problemas ligados, por exemplo, ao comrcio, agricultu-
ra, s construes de grande porte ou s observaes e registros sobre corpos celestes, com a finalida-
de de produzir objetos ou condies necessrias para a existncia humana (trabalho), o que acarretou
o desenvolvimento de cincia e tecnologia, constituindo portanto a cultura das respectivas pocas e
sociedades. Em particular, a resoluo de tais problemas de ordem prtica, ou de questes culturais
mais amplas, acabou por gerar conhecimentos, e dentre eles, conhecimentos matemticos.
Assim, por exemplo, o desenvolvimento de calendrios foi uma questo central na China anti-
ga, e os babilnios elaboraram sistemas de clculo de reas e mtodos para a resoluo de problemas
comerciais, como estimativas de tempos, clculos para a fixao de preos e emprstimos, dentre
outros. Por sua vez, os egpcios usaram conhecimentos matemticos para a construo de suas pi-
rmides e, na Grcia antiga, Arquimedes (287 a.C. 212 a.C.) utilizou conhecimentos matemticos
para construir diversos tipos de artefatos.
Gerada a partir de necessidades sociais ligadas, entre outras, economia, poltica ou at a
questes blicas, a Matemtica foi uma produo humana, e portanto, uma manifestao cultural,
sendo enquanto produo humana, tanto determinante quanto determinada pelo trabalho, pela cincia
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Matemtica
e pela tecnologia. So exemplos disso, na Antiguidade, os relgios solares e as construes arquite-
tnicas de grande porte ou catapultas de longo alcance. Alm disso, desde as inscries deixadas em
cavernas, podem-se constatar atividades tipicamente humanas de registrar, figurativamente, animais
ou cenas de caa. Enfim, registros imagticos de legados culturais de suas pocas.
Ao longo do tempo, os registros foram se transformando em acervos de esquemas de repre-
sentao, talvez primrdios das representaes hoje prprias Geometria. Embora a origem desse
campo matemtico possa ser encontrada no antigo Egito, onde surgiu a necessidade de se efetuar
medies da terra devido s inundaes peridicas do rio Nilo, so da Grcia antiga os primeiros re-
gistros encontrados de ideias desenvolvidas de maneira axiomtica, ou seja, explicitando raciocnio
lgico-dedutivo.
Assim, no sculo VI a.C., a escola pitagrica unia Matemtica, Filosofia e misticismo, deixan-
do registros de importantes relaes entre nmeros e figuras geomtricas. O legado de Os Elementos,
de Euclides de Alexandria (sculo III a. C.), imprime a marca at hoje caracterstica da Matemtica
como cincia hipottico-dedutiva. Primeiro tratado sistemtico encontrado sobre o conjunto dos co-
nhecimentos matemticos desenvolvidos da Grcia antiga, a obra contm a teoria axiomtica sobre a
Geometria Euclideana plana e espacial e a importante contribuio da teoria das propores de Eu-
doxo de Cnido (390 a.C. - 338 a. C.).
Ao longo da histria, algumas pessoas despontaram como dotadas de uma formao integrada,
como atestam as obras que deixaram. No Renascimento, Leonardo da Vinci (1452 1519) merece
destaque por ter sido - como se diria nos dias de hoje - matemtico, engenheiro, inventor, anatomista,
pintor, escultor, arquiteto e botnico. bastante conhecido o uso que fez de geometria e de propor-
es tanto em seus quadros e esculturas, como nas construes que projetou. Os esboos encontrados
de suas obras mostram com clareza a integrao da cincia com a arte, da matemtica com a biologia,
Um dos autores de uma importante edio de Os Elementos foi Teon de Alexandria, pai da primeira mulher considerada matemtica: Hiptia (370 415), uma das mulheres mais relevantes do incio da era crist. Seus estudos incluram tambm fsica, astronomia e filosofia, sendo a ltima
diretora da Biblioteca de Alexandria.
Professores, sugerimos assistir ao filme espanhol Alexandria dirigido
por Alejandro Amenbar de 2009, que relata a histria de Hiptia. Ele abre portas para reflexes sobre o contexto histrico, a valorizao da cincia,
o papel da mulher, questes que podem ser discutidas em sala de aula.
Sobre as contribuies de Eudoxo, vale a pena ler o artigo do educador matemtico Vicenzo Bongiovanni em:
http://goo.gl/A3FVz9
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Formao de Professores do Ensino Mdio
e outras integraes tantas que se consigam elencar, como atesta o
famoso esboo do Homem Vitruviano, a seguir reproduzido.
Professor, professora, que tal aproveitar um pouco de sua
curiosidade a partir dessa imagem? Procure listar, a partir dela, noes especficas do seu componente curricular que capaz de
identificar. A ideia que no espao coletivo de discusso, ao final
da Unidade, todos os professores possam refletir em conjunto so-bre a complexidade de leituras possveis para esse esboo de Leo-nardo da Vinci.
3.2 Conhecimentos matemticos pertinentes a um currculo de Ensino Mdio elaborado com base nas dimenses do trabalho, cultura, cincia e tecnologia
Retomemos consideraes feitas no Caderno II da Etapa I:
O que muda na organizao curricular de uma escola a qual se fundamenta na possibilidade in-tegradora da articulao entre trabalho, cultura, cincia e tecnologia? [...] Essa mudana exige que cada comunidade escolar reflita, discuta e
estabelea novos consensos mnimos acerca das
Marcus Vitruvius foi um arquiteto romano em I a.C., autor do famoso tratado sobre arquitetura intitulado De Arquitetu-ra, de dez volumes. No livro III o autor indica o que considera como as propores de um corpo humano. Assim surgiu a ideia de Homem Vitru-viano. Posteriormente, no Renascimento, Leonar-do da Vinci, para ilustrar suas notas a respeito desta obra, realiza o famoso de-senho apresentado aqui. O artista, nessa obra, especi-fica mais precisamente as propores que conside-rou serem as ideais, dos pontos de vista tanto ana-tmicos como artsticos. Mais informaes no link:
http://www.uff.br/cdme/rza/rza-html/rza-vitruvian-br.html
Figura 3: Homem Vitruviano.
FONTE: Wikimedia (2014).
Disponvel em: http://goo.gl/UyFWNh
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Matemtica
concepes de educao, de cincia, de tecnolo-gia, de trabalho, de cultura, de ser humano.
Enfim, o redesenho curricular tendo como eixo
estruturante as dimenses do trabalho, da cin-cia, da tecnologia e da cultura exige a atualiza-o do Projeto Poltico-Pedaggico das unidades escolares (BRASIL, 2013b, p. 38)
Nessa perspectiva, no esqueamos que a funo primordial de
um currculo no a de conduzir as atividades de ensino, mas sim a
de propor os caminhos que melhor possibilitem o aprendizado dos
estudantes na direo da formao integral pretendida. Currculo
percurso escolar. Deve refletir os caminhos mais adequados a serem
trilhados para que os estudantes, com suas caractersticas pessoais, so-
ciais, econmicas e culturais prprias, possam caminhar efetivamente
na direo dos direitos aprendizagem e ao desenvolvimento humano
previstos nos textos legais. Ser assim necessrio, na construo de
uma proposta curricular, fazer escolhas condizentes com os objetivos
pretendidos e coerentes com as convices e cultura prprias de cada
equipe, em sua escola. No ser necessrio superar a tradio en-
ciclopedista do Ensino Mdio, com 13 disciplinas, todas buscando
cumprir um extenso programa, refm apenas do objetivo preparar
para o vestibular? Se o foco a formao integral, no ser necess-
rio reorganizar, repensar os componentes curriculares, possibilitando
espaos que promovam uma efetiva articulao entre reas? Nesse
caso, tambm a avaliao merecer ser compartilhada para no cor-
rer o risco de provocar uma fragmentao ainda maior, com mais do
que 13 componentes, envolvendo instrumentos e notas ou pareceres
descritivos separados. Pensar em integrao requer a produo de
instrumentos de avaliao tambm integrados, que permitam um olhar
global sobre as aprendizagens dos estudantes.
A seguir apresentamos algumas consideraes que envolvem
conhecimentos matemticos fundamentais, nas quais a Matemtica e
as demais reas de conhecimento ou seus componentes possam intrin-
secamente ser articulados por via das dimenses do trabalho, cultura,
cincia e tecnologia. Professores, tambm buscamos fornecer elemen-
tos que enriqueam suas reflexes visando as formulaes de novos
currculos. Ressaltamos que as propostas apresentadas no abrangem
todos os contedos matemticos que podem ser considerados. Fize-
mos uma seleo de conhecimentos e, portanto, certamente omitimos
possibilidades importantes ou interessantes. Contamos com que vo-
O Guia do Livro Didtico do PNLD 2012 (BRA-SIL, 2011) pode ser um material interessante para consulta sobre os campos de conhecimentos mate-mticos do Ensino Mdio, com destaques para suas caractersticas e relevn-cia na formao geral dos estudantes, especialmente no trecho das pginas 16 a 38.
www.fnde.gov.br/arquivos/category/125-guias?down-load=5512:pnld-2012-mate-matica.
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Formao de Professores do Ensino Mdio
cs, professores, inspirados nas ideias apresentadas, possam imagi-
nar um currculo onde os conhecimentos matemticos contemplados
sejam aqueles que considerem os mais relevantes para uma formao
integral.
Funes se constituem em um campo da Matemtica no Ensino Mdio que emergiu de questes pertinentes aos mbitos das quatro
dimenses articuladoras de currculos. Foram desenvolvidas como
modelos para a compreenso de fenmenos variados e so amplamen-
te utilizadas em muitos mbitos da atividade humana, como: Fsica,
Qumica, Biologia, Astronomia, Economia, Sociologia, Comunica-
o, Demografia, Informtica, Engenharia, entre outros. Assim, por
exemplo, funes trigonomtricas so teis para descrever fenmenos
peridicos, como no caso do movimento de um pndulo; as funes
logartmicas servem para descrever o decaimento radioativo de is-
topos de elementos qumicos. Em 1798, o economista e demgrafo
ingls Thomas Malthus (1766-1834) formulou um modelo para des-
crever a populao presente em um ambiente como uma funo ex-
ponencial do tempo. Esse modelo e suas posteriores modificaes so
aplicados, por exemplo, ao estudo do crescimento de bactrias. Mode-
los matemticos so teis para fazer previses sobre o comportamento
de fenmenos, porm, por serem abstratos e ideais, os resultados ob-
tidos sero sempre aproximaes. Do ponto de vista de uma formao
integral, a importncia do estudo de funes reside muito mais nas
conexes com as situaes que as originaram do que, por exemplo, no
mero treinamento de propriedades para a resoluo de equaes como
as que envolvem funes trigonomtricas ou logartmicas.
de se destacar ainda o uso cada vez mais crescente e impor-
tante de funes para o desenvolvimento de processos e artefatos: na
programao de aplicativos computacionais, em aparelhos de eletro-
cardiograma, na construo civil de grande porte, na construo e lan-
amento de foguetes espaciais, em antenas parablicas e telescpios,
em aparelhos de tomografia ou de ressonncia magntica, apenas para
citar alguns.
Ao longo da histria, a humanidade desenvolveu muitos ins-
trumentos de maneira criativa, com maior ou menor preciso diante
da necessidade de medir grandezas. O emprego de instrumentos, processos e unidades de medida adequadas para registrar e interpretar
medies nunca exato, sempre aproximado. Consequentemente,
importante o desenvolvimento da percepo sobre o grau de aproxi-
No Guia do Livro Didti-co do PNLD 2008 (BRA-SIL, 2007), na seo A Matemtica no mundo de hoje (p. 12-14) voc pode encontrar reflexes inte-ressantes sobre o que so modelos matemticos.
http://www.fnde.gov.br/ar-quivos/file/1947-guia-pnld-2008-matematica
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Matemtica
mao que condizente com os objetivos de cada situao. Por exem-
plo, para executar uma receita culinria, uma balana de preciso di-
gital suficiente, porm, um laboratrio farmacutico utiliza balana
analtica para a anlise de determinada grandeza submetida a certas
condies ambientais.
A geometria est presente em todo lugar. Diferentes povos tm utilizado figuras geomtricas em diversas manifestaes culturais,
como em tecidos e mscaras africanas, em mandalas como os yan-
tras indianos, e a pintura corporal da etnia Kayap do Brasil. Padres
geomtricos tambm podem ser encontrados no artesanato brasileiro
como na cermica Marajoara, nos bordados fil alagoanos e na renda
renascena de origem pernambucana. Por sua vez, existiram vrios
movimentos artsticos relacionados geometria. Entre eles o Neo-
plasticismo, cujo criador e principal terico foi Piet Mondrian (1872-
1944) e o cubismo, sendo um de seus representantes o pintor Pablo
Picasso (1881-1973). No Brasil, em 1954 surgiu o Grupo Frente, do
qual Lygia Clark (1920-1988) foi uma das fundadoras. Ela apresentou
uma srie de obras nas quais os elementos geomtricos so centrais,
como em Superfcies Moduladas, 1955-57. Essas sries de obras
so instigantes e incentivam a participao ativa do observador que
pode transform-la numa nova obra. Outro grande artista plstico que
utilizou a geometria como inspirao Hlio Oiticica (1937-1980).
Como exemplo citamos a obra Magic Square # 5 (1977) localizada em
Inhotim, no estado de Minas Gerais. Nesta proposta, pode-se brin-
car com as posies ou localizaes do observador e as perspectivas
de suas vises, criando mltiplos trabalhos artsticos diferentes.
Professores, vocs conseguem idealizar uma exposio ins-pirada na obra de Lygia Clark ou Hlio Oiticica como uma ma-neira de mobilizar conhecimentos de todas as reas, a partir das dimenses do trabalho, cultura, cincia e tecnologia? Anotem suas ideias para compartilhar posteriormente com os colegas das de-mais reas.
interessante observar tambm que a localizao espacial e a criao de sistemas de referncia so fundamentais para o desenvol-vimento de vrias atividades humanas, que vo desde a confeco de
mapas impressos ou virtuais, at a determinao de rotas e distncias,
com o uso do GPS (Global Positioning System).
Reconhecer a existncia de incerteza fundamental para o de-senvolvimento do pensamento matemtico no-determinstico. Ela
Materiais interessantes sobre Lygia Clark podem encontrados em http://www.lygiaclark.org.br/noti-ciaPt.asp Informaes sobre Hlio Oiticica e Inhotim podem ser obtidas nos portais http://www.heliooiticica.org.br/home/home.php
http://www.inhotim.org.br/inhotim/arte-contemporanea/obras/invencao-da-cor-pene-travel-magic-square-5-de-lu-xe/
A obra Magic Square # 5 serviu como cenrio do v-deo musical Pelos Ares, de Adriana Calcanhoto, ht-tps://www.youtube.com/wa-tch?v=1nPTwUxTxR8&lis-t=RDHC7-vx5sCyN2k
Uma atividade relaciona-da ao GPS est descrita em:
http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=43507
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Formao de Professores do Ensino Mdio
est presente na vida dos jovens, por exemplo, em relao ao mercado de trabalho e seus riscos. (BRA-
SIL, 2013a). Nos mais diferentes mbitos tenta-se quantificar as incertezas utilizando probabilidade e estatstica, como no mercado financeiro, pesquisas de inteno de voto ou no esporte.
O jovem, para poder exercer inteiramente a cidadania, necessitar perceber que os nmeros, taxas,
ndices e estimativas que so apresentadas nas mdias envolvem certo grau de incerteza e aleatoriedade, mesmo que as pesquisas tenham sido feitas com o maior rigor metodolgico. A estatstica est presente em vrios campos, como por exemplo, no estudo da efetividade e segurana de um medicamento, em
anlises do funcionamento de um sistema, em campanhas eleitorais e mesmo em msicas, como vimos
na Unidade 2, na letra Captulo 4, Versculo 3 dos Racionais MCs. Logo, suas produes acabam in-
fluenciando, de alguma maneira, em inmeras atividades do ser humano todas as dimenses. Assim, a
importncia do estudo de estatstica no Ensino Mdio reside muito mais em favorecer a leitura adequada
e crtica de informaes do que a simples construo de tabelas e grficos.
REFLEXO E AO
Professor, professora, no decorrer desta Unidade propusemos dois exerccios individuais de re-
flexo a partir da sua especialidade. Chegou o momento de compartilhar suas ideias e anotaes com os
demais colegas.
a) Sobre o Homem Vitruviano propomos que:
- Compartilhem as anotaes feitas anteriormente sobre o que identificaram no desenho de Leonar-
do da Vinci.
- Explicitem quais articulaes percebem nessa obra com as dimenses do trabalho, cultura, cin-
cia, e tecnologia, compatveis com a poca em que ela foi produzida pelo artista.
b) Sobre a exposio idealizada:
- Compartilhem e debatam as anotaes feitas anteriormente sobre a idealizao da exposio.
- Registrem os conhecimentos que consideraram mobilizados em cada rea de conhecimento e as
articulaes identificadas com as dimenses do trabalho, cultura, cincia e tecnologia.
A partir desses dois exerccios de reflexo e combinando com as reflexes realizadas nas outras
duas unidades, definam critrios para a modificao das rotinas e apontem as dificuldades percebidas para
a implementao efetiva de novas rotinas de trabalho que permitam planejamentos integrados.
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Matemtica
4. Dilogo entre as reas do conhecimento escolar: princpios e proposies pedaggico-curriculares
O desenvolvimento das discusses e propostas que faremos
nessa unidade baseado principalmente nos dois princpios destaca-
dos nas DCNEM como norteadores para a organizao dos currculos
e para a sua consecuo na prtica escolar: o trabalho como princpio
educativo e a pesquisa como princpio pedaggico.
O trabalho aqui ento entendido no seu sentido ontolgico,
como lemos em Lukcs (1981), inerente espcie humana e primeira
mediao na produo de bens, conhecimentos e cultura. O trabalho
como princpio educativo se consubstancia em atividades criativas,
portanto prazerosas, com as quais os estudantes, de maneira solidria,
se transformam, criam e recriam conhecimentos, cincia, tecnologia
e, portanto, cultura, ao mesmo tempo em que se desenvolvem para
assumir seus lugares na sociedade como cidados conscientes de seus
direitos e deveres. (BRASIL, 2013c, p. 29)
Por seu lado, a pesquisa como princpio pedaggico
[...] contribui para a construo da autonomia intelectual do educando e para uma formao orientada pela busca de compreenso e solues para as questes tericas e prticas da vida coti-diana dos sujeitos trabalhadores. Afinal, formar
integralmente os educandos implica no s que estes aprendam o significado e o sentido das
cincias, das tecnologias, das prticas culturais etc., mas preciso fundamentalmente formar as pessoas para produzirem novos conhecimentos, compreender e transformar o mundo em que se vive. (BRASIL, 2013c, p. 35-36)
So pertinentes as justificativas sobre a importncia desses
princpios e sobre possveis maneiras de concretiz-los na prtica es-
colar descritos em uma publicao recente da UNESCO:
Entendido como a forma de o ser humano pro-duzir sua realidade e transform-la, de se cons-truir e de se realizar, o trabalho tomado como princpio educativo originrio, articulando e in-tegrando as diferentes disciplinas ou reas de co-nhecimento. Isso quer dizer que toda a aprendi-zagem ter origem ou fundamento em atividades dos estudantes que visam, em ltima instncia, a uma interveno na sua realidade. Nessa pers-
Vale a pena consultar a publicao da UNESCO Currculo integrado para o Ensino Mdio: das nor-mas prtica transforma-dora, onde desenvolvida uma proposta de prottipo curricular para o Ensino Mdio voltado para uma formao bsica para o trabalho e s prticas so-ciais. Nesse documento h tambm muitas sugestes de possibilidades para o planejamento pedaggico nas quatro reas de conhe-cimento constantes nas Diretrizes para a organiza-o dos currculos do En-sino Mdio. Ele pode ser acessado pelo endereo eletrnico abaixo:
http://goo.gl/rplrIX
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Formao de Professores do Ensino Mdio
pectiva, o currculo ser centrado no planejamento (concepo) e no desenvolvimento de propostas de trabalho individual e coletivo (execuo). Cada estudante as usar para produzir e transformar sua realidade e, ao mesmo tempo, desenvolver-se como ser hu-mano.
Associada ao trabalho, a pesquisa vista como um instrumento de articulao entre o saber acumulado pela humanidade e as propostas de trabalho que estaro no centro do currculo. Como forma de conhecimento e de crtica da realidade, a pesquisa se apoia-r nas reas de conhecimento ou nas disciplinas escolares, para auxiliar na definio
da metodologia e dos instrumentos de investigao, na identificao das variveis de
estudo e na interpretao dos resultados. Ao mesmo tempo, a anlise dos resultados da pesquisa, tambm apoiada pelas reas ou pelas disciplinas, apontar as atividades de transformao (trabalho) que so necessrias e possveis. (UNESCO, 2013, p. 198)
Analogamente ao que foi feito na unidade anterior, retomamos aqui a reflexo sobre o que foi dis-
cutido no Caderno III da primeira etapa da formao, especialmente na Unidade 4 (BRASIL, 2013b, p. 36-
43), do qual sugerimos a releitura. A partir de exemplos, buscamos um entendimento mais concreto sobre
as efetivas potencialidades de articulao de conhecimentos matemticos com conhecimentos das demais
reas ou componentes, em atividades escolares de carter integrador. Nos termos de Brasil (2013b):
Assim, as propostas voltadas para o ensino mdio, em geral, esto baseadas em meto-dologias mistas, as quais so desenvolvidas em, pelo menos, dois espaos e tempos: um voltado para as denominadas atividades integradoras e outro destinado ao aprofunda-mento conceitual no interior das disciplinas. a partir da que se apresenta uma possi-bilidade de organizao curricular do ensino mdio que potencialize uma ampliao de conhecimentos em sua totalidade e no por suas partes isoladas. (BRASIL, 2013b, p. 40, grifos nossos)
Nesse pequeno trecho so fornecidas vrias pistas do que seja necessrio para um redesenho cur-
ricular, o qual possibilite abordagens pedaggico-curriculares favorecedoras do papel formativo que as
DCNEM preveem para essa etapa escolar. A grade horria usual, com aulas de 50 minutos para que cada
disciplina cumpra um programa (em geral voltado para contedos de vestibulares), seguramente muito
contribui para a fragmentao do ensino, tradicionalmente observada no Ensino Mdio. As grades horrias
tradicionais dificultam enormemente a possibilidade de que as aqui chamadas atividades integradoras, superem o carter de ser apenas uma superposio de aplicaes simultneas de alguns conhecimentos
de diferentes componentes. Se isso mais do que a fragmentao e a falta de dilogo absoluto entre componentes ou reas de conhecimento, ainda muito menos do que o proposto nas DCNEM para a
formao integral dos estudantes. Cabe ainda observar que o espao tradicional de uma sala de aula, com
lousa, giz, sua disposio de carteiras e os estudantes sentados em linhas e colunas, de frente para o pro-
fessor expositor, tampouco favorece atividades mais dinmicas e que envolvam a iniciativa dos estudantes
em pesquisas ou a elaborao de produtos coletivos, eventualmente imprescindveis em abordagens peda-
ggico-curriculares que privilegiem o protagonismo dos estudantes no seu prprio processo de aprendiza-
gem, e que tenham por base o trabalho como princpio educativo.
Por todas essas razes, torna-se necessrio reorganizar os tempos e os espaos escolares para po-
der obter-se um currculo que estimule o protagonismo dos estudantes no seu prprio desenvolvimento
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Matemtica
e aprendizagem, ao mesmo tempo em que promova a integrao dos conhecimentos de todas as reas de
conhecimento, articuladas pelas dimenses do trabalho, cultura, cincia e tecnologia.
Salientamos novamente a necessidade de que, em cada escola, a organizao de um currculo por
reas de conhecimento no Projeto Poltico-Pedaggico (PPP) seja estabelecida a partir do entendimento
e dos acordos possveis entre os educadores de todas as reas. Sem dvida, h mais um desafio para a
equipe escolar, a saber, o planejamento de atividades que contemplem de maneira efetiva a construo de
conhecimentos de seu componente curricular, integrada a outros componentes e/ou reas. Assim, tambm
os professores da rea de Matemtica necessitaro repensar e reconhecer as possibilidades de contribui-
es em atividades integradoras, a partir dos conhecimentos que lhe so prprios, que possuam um alto
potencial de articulao com contextos autnticos das demais reas e sejam relevantes para a formao
integral dos estudantes.
Mas como colocar na prtica de atividades escolares a pesquisa como princpio pedaggico? Mais
ainda, qual o papel dos professores em tais atividades? Certamente as respostas a estas perguntas no so
bvias nem nicas. No h receita infalvel para tanto. Vamos refletir juntos sobre elas?
Assumir a pesquisa como princpio pedaggico significa buscar situaes de interesse que contem-
plem a diversidade dos estudantes e permitam questionamentos. A partir destes, os estudantes podero
protagonizar investigaes que levem a um entendimento mais completo da situao questionada e possi-
bilitem intervenes transformadoras. Cabe aos professores serem mediadores desse processo: a media-
o do professor essencial, possibilitando aos estudantes atingirem nveis de desempenho e pensamento
que no conseguiriam por conta prpria, incentivando-os a se confrontarem com outros pontos de vista
e, assim, reconstrurem seus entendimentos e a compreenso do que investigam. (MORAES, 2010, p.
142). Segundo explicam Galiazzi e Moraes (2002) o processo de educar pela pesquisa pode ser caracteri-
zado por crculos reiterativos de trs movimentos principais questionamento, construo