O_Brazil_mental__esboço_critico_Sampaio_Bruno.pdf

497

Click here to load reader

Transcript of O_Brazil_mental__esboço_critico_Sampaio_Bruno.pdf

  • . . .

    .

    :

    "

    -~ '"'"' '1 . L , . ., '.. ~"" -

    BRU~O -------

    '

    .--~ . ' . ~ . (.. r:~. . .

    BRAZIL NIENTAL ESBO~O CR.ITICO -- 2 --~

    ~ULo ?t~ ~~ ~-~

    ,I ,. /,. . ~ -I

    ~

    Thc office of mind is to dire~t $Odcty

    'I . r _ ...... r

    PORTO LIVRARIA CHARDRON

    Dt Lalla lri, e4itarts 1898

  • . I - ; ) .. ' - . :)

    Propriedade dos editores

    Porto-lntpren

  • ..

    - .

    ./ /., -... .. t.t .....

    .J, (.. . -"

    .

    Nota preambular convinha que, aqui exarada, ella registrasse que no decorrer das paginas que vo se-guir alguns lapsos de reviso se encontram, em de-trimento da perfeita transcri po ou de vocabulos de liogoas estranhas ou do sentido de passagens no, mes-mo, texto.

    Mas, confessado isto, insistir, organisando qualquer pormenorisada resenha, seria ingenua impertinencia, afJrontosa, aliaz, para a especie de publico sentena de cuja cultura se prope a obra.

    L-fra, a primeira coisa que faz o compradOr de um livro, depois de lhe haver cortado as folhas, transportar da tabella as erratas para as respectivas paginas. Em Portugal, at hoje s deparamos com uma pessoa tendo esse habito e exercitando essa _pratica. Assim, na praxe de nossa leitura, o rol repositivo re-sulta sempre inutil. Nos compendios de aulas que se sentem effeitos maus, ou inoculando absurdos nos que aprendem ou, por inadvertencia, obrigand~os a um trabalho de rectificao escusado, (\\\~ \()U\~ \) \~"\\\.~

  • 'VI NOTA PREAMBULAR

    que, precioso, poderia aproveitar-se no avance de pro-gressivas acquisiaes.

    Mas aqui os alumnos esto sabidos. Elles que so os me3tres, a6 na I. Elles que tem de julgar e de-cidir, constituindo o jury, espontaneo, de exame: -ao auctor admittindo-o ou reprovando-o. Por isso, a fri-sada tarefd era, mais que muito, dispensavel. Dispen-sou-se.

    De resto, os enganos que, n'este volume, escapa-ram so, de si, quasi todos, insignificantes.

    Porto- Fevereiro, 1898 .

    . J. Pereira de Sampaio .

    ..

    "' A hora, final, de entregar este seu novo trabalho ao mercado, o auctor deseja cumprir o dever que, cm seu prece-dente volun1e, NOTAS no EXILIO, no lance analogo, cumpriu j tambem. O mais honroso logar cabe, de direito, leal solida-riedade de quem quer que proporcione ao tarefeiro as condies moraes em que sua actividade se exera. O auctor encontrou essa penhorante cumplicidade psychica. Para com tres distin-ctos cvalheiros, entre outros, sua gratid~ o fora a um in-discreto procedimento, melindrando-os, merc de irresistivel impulso, no escrupuloso timbre de sua modestia; mas a auda-cia derivou da confiana em que, relevando-o da falta, lhe deem venia os seus prezados e distinctos amigos Eduardo de Paiva, Jose Maria de Carvalho e dr. Jose Ventura dos Santos Reis, cujos nmes lhe immensamcnte grato inscrever em paginas que mui lhe devem, por ao seu auctor as tornarem, da arte dita, possveis.

    Assim volve o rythmo da nota das primeiras laudas do preambulo do volume de f893. Poisque nem sempre o exilio seja desterro; e a proscripo se exera, mesmo, a dentro de bonteiras.

  • ' L.

    r. ~ -.. .

    ADVERTENCIA EXPOSITIVA

    Conhecer as condies especificas e proprias da so-ciedade politica e economica brazileira : no para o publico culto portuguez um escusado dillettantismo de ociosidade litteraria; antes, importa interesse decisivo, desde que esteja demonstrado que Portugal no possa, na phase historica no s ainda no conclusa n1as ape-nas esboada, prescindir da tradiccional correlaciona-o com o Brazil.

    O asserto produzido legitima-se, de golpe, pelas na-turaes consideraes que brotam d'um simples relance sobre elucidativos quadros estatisticos.

    Assim, para 1893, um negociante illustrado da pra-a do Porto, o snr. Clem junior, registrou, n'utn es-tudo commercial, que o Brazil nos levara, pela expo1-lao nacional, productos na importancia de 7.155 con-tos. Ora, se~do o total d'aquella, em identico exercicio, de 23.408 contos, seguia-se, logicamente, que sin1ilhante paiz contribuira com quasi um tero, ou sejatn 30,5 por eento, ao passo que apenas do Brazil receberamos para

    eot~BUmmo 2.428 contos, ou sejam 6,30 da totalidade da importao.

    s c~nsideraes de ordem geral econom.\~a ~"\\."ta-

  • "VIU ADVERTENCJA EXPOSITIVA

    pre ~dditar aquellas que, mais particularmente, se re-portam d.o feitio psychologico das populaes anierica-nas com as quaes havemos de entreter um foroso com- mercio de amizade. E, dada a natural reciprocidade de relaes, se a Portugal convem saber o que seja oBra-zil e como que elle pensa, analoga noticia ao Brazil interessa, egualmente, pelo que a ns se refere e pelo que ns d'elle ajuizamos.

    Inspirado n'este criterio, o brazileiro Augusto de Carvalho publicou em Portug~l um farto volume de informao, que promoveu os encomios dos portugue-zes Alves Mendes, Innocencio Francisco da Silva, Ca-millo Castello Branco. Tambem no Brazil, no s ex-plicando Portugal con1o rehabilitando os luzitanos, de c e de l, das accusaes que alli lhes assacam, por vezes tm sabido a lun1e obras especiaes e, quando no seja seno pelo intuito, meritorias. No Rio-de-Janeiro, em 1857, publicava Joo Antonio de Carvalho e Oli-veira A defesa dos portuguezes na provineia doMara-nho. No mesmo anno apparecia tambem na capital do Imperio um opusculo, curioso, em cujas laudas Um bra-zileiro sustentava o caracterstico thema de A utilidade dos portuguezes no Brazil.

    De ento para c, apezar de tudo, se o Brazil mal aprecia Portugal, Portugal, en1 certa maneira, comple-tamente ignora o Brazil.

    Entendemos verdadeiro servio publico o tornar-lh'o, na medida do pouco que sabemos e podemos, co-nhecido. E, para conseguir o scopo a que convergimos, deliberamo-nos pela adopo e uso d'um processo que fizesse nossa lio no s mais accessivel como menos fatigante. Isto : em vez de agglomerarmos uma co-piosa missanga de miudas informaes, entendemos que melhor conviria desenhar as grandes correntes cri-ticas geraes alli dominantes. O Brazil mental, implici-blmente contendo-o, explicaria, interpretativamente, o

  • IX

    Brazil social. Essa precedencia pareceu-nos no s-mente logica con1o indispensavel.

    claro que este eriterio se presta a objecc:es, fa-cilmente etnergindo. Pde, con1 effeito, dizer-se que elle tende a dar a pre,alencia s funces superiores do es-pirito, attribuindo tuna predominancia abusiva aos fa-ctores sociaes mais altos, incontestaYelniente, tuas de infiuxos mais intermittentes, n1enos efficazes. Este Ino-do-de-, .. r muito trivial; a sua expresso mais corri-queira est etn certo logar, excedenten1ente, con1n1un1.

    aquelle que corre expressando-se pelo conceito de que a pratica valha mais do que a theoria, pois que s os praticos sejan1 que goyernem effectivatnente, etu-quanto os theoricos outra coisa no faan1 seno cahir em abuses e enganos, que at os tornan1 ridiculos.

    Sob este criterio, se pinta os ~philosophos a cahi-rem em poos, einbe, .. ecidos na conten1_plao das es-trellas. .\ssin1 se rabiscan1 cotnedia~ a caricaturar os mathematicos e as suas fan1osas distraces. Ora, a proposi~o orientadora, de que originariamente se de-riva, no exacta rigorosamente, ou antes ella confunde duas coisas dissin1ilhantes, estando, tuais ou n1enos, na verdade a certos respeitos, n1as encontrando-se conl-pletamente em erro a outros.

    Com effeito, toda a pratica presuppe uma theoria anterior, Yisto que o que praticar? , por definio, realisar uma ida previamente concebida. Por isso, no ba seno theoricos, no rigor da palaYra e feio 1niuda da analyse. Todos o so. O caso de quantidade. l""ns so-o sufficienten1ente; outros, insuffieientemente. To-da a differena est aqui; n1as smente aqui.

    D'isto se deduzem consequencias valiosas. lJ1na d'ellas que no ha confiicto essencial entre sciencia e arte. Refutando a classificao hierarchica de .\ugus-to Comte, o philosopbo inglez contetnporaneo Herbert Spencer Yiu_, com penetrante perspicac.ia, q_ue eaQ.a ~~\~"\\.-

  • X ADVERTENCIA EXPOSlTIV A

    cia, cada parte da sciencia representa ou pde repre-sentar para todas as outras o papel servir de instru-nlento.

    Elle estabelece a irrefragavel cer~eza de que nin-guem negar que a arte seja o conhecituento applicado. Assim, tal parcella da investigao scientifica que con-siste em conhecintento applicado arte. De sorte que podemos dizer que, logo que u1na previso em sciencia sabe do seu estado originariamente passivo e enipre-gada na obteno de outras previses, passa da theo-ria pratica, torna-se sciencia e1n aco, transforn1a-se em arte.

    N'esta conformidade se v, segundo Spencer, quan-to a destrina ordinaria entre a sciencia e a arte pu-ranlente de conveno; e, ao contrario, a difficuldade que ha e1n lhes descriminar um real separatisrno.

    Na verdade, no s a sciencia e a arte resultam unas na origen1 ; no s, de perpetuo, as artes se as-sistem uma d'outra; no s as sciencias e artes se pres-tam incessantemente mutuo soccorro- mas ainda as sciencias represen tan1 o papel de arte uma para a ou-tra, e a poro estabelecida de cada sciencia volve-se n'uma arte para a poro que crescendo vae.

    As consideraes prelilninares, e incontestaveis, justificam, em cheio, o programma d'este volume. Com effeito, a inspeco d'urna doutrina resulta, por com-pleto, utilitaria, visto como toda a doutrina seja ten-dencialmente um acto. No Brazil se exhibe o exemplo integralista da objectivao de shnilhante affirmativa. Uma corrente 1nental concretisou em instituies poli-ticas; e o republicanisn1o fluminense a simples ap-plicao do positivisn1o parisiense. De resto, escusado era o ensino do facto, pois que, quando o pensamento se move na esphera sociologica, a evidencia da intuio do prolegomeno torna-se ento flagrante.

    Para avaliarmos o grau de civilisao, a prosperi-

  • AD'\""ERTE~Cl.\ EXPSITl\- "- XI

    dade effeeti,a, as presun1pes. de futur\) d 'tuna sot'il"-dade determinada, cu1npre saber qual st'ja a doutrin1t alli dominante nos espiritos. Pelo JUOinento, se1n in ves-tigarmos tnesmo as origens d'~ssa doutrina, ha, \'Otutu-do, que inquirir do processo de esqui,ar tnua po~~ivt~l

    peti~o-de-principio, qual a q u~ ~xigi$se t) t~n tt~ndinl~nto de phenon1enos sociaes pelo exatne dt' crit

  • XII ADVERTENCIA EXPOSITIVA

    crise, patente, luzitana seria de que geito se amostrasse o caracter da elaborao mental synthetica que presi-diu at agora ao desenrolar da vida economica cone-ctiva. Mais comesinhamente: nos dominios da econo-mia politica, que doutrina hemos professaqo, com que trabalhos orientadores nos hemos atido'?

    - No seria facil a tarefa de o determinar, com as de-vidas peas justificativas em comprovante documenta-o; pois, como para. todas as coisas em Portugal, os en1pecilhos abrolham debaixo dos passos, desde o pri-meiro instante. No existem entre ns tabellas analy-ticas, indices methodicos, bibliographias racionaes. Es-t tudo a 1nonte; e quem quizer trabalhar ha-de fazer tudo, a comear por descobrir e ajuntar os materiaes.

    Iniciadores, pela descoberta do can1inho maritimo para as Indias, do movimento 1nercantil e industrial moderno; creadores do systema colonial; fundadores, com nossas descobertas, do regimen capitalista que attinge o alto momento ascencionante de sua curva eyo-lutiva eln nossos canados dias, no nos fatigamos, aliaz, com estudos, e descuramos, por completo, a nos-sa educao como commerciantes e industriaes. No desmentimos os assertos do embaixador Caverel e do viajante Linschoot, quando, um e outro, a distancia no tempo e no espao, ou em Goa, sobre palanquins, ou, no Terreiro do Trigo, bifurcados em mulas pomposas, descrevem os negociantes portuguezes d'essas epochas como o typo da indolencia, do fausto, dos addiamentos e da embofia.

    A nossa litteratura economica pobrissima; e no-se texn cuidado em organisar uma resenha por ordem de auctores ou por ordem de assumptos.

    Ha-as (mesmo) n'esta visinha e, parallelamente, to decadente Hespanha. Sem nos reportarmos ao ar-tigo ~conomistas espanoles do Diccionario de Arguel-Jes_, coteje-se a preciosa Biblioteca de los economistas

  • ADVERTENCIA EXPOSITIVA Xlll

    espaioles de los siglos XVI, XVII y XVIII, cornpen-dioso archivo de Colmeiro.

    Entre ns no apparecem mais do que nlonogra-phias isoladas, como a excellente, aliaz, que, depois de Lopes de Mendona, consagrou ao publicista portuguez Oliveira Marreca outro illustre publicista, Rodrigues de Freitas.

    Estudos systematicos sobre os arremedos da supe rior especulao economica luzitana antigamente entre-tecidos, no deparamos tnais do que com os ensaios es-tampados nas columnas do Instituto, revista de Coim-bra, pelo professor da cadeira de finanas _na nossa Universidade, snr. dr. Jos Frederico Laranjo. Este foi um, seno o unico, representante do socialisn1o de cathedra no alto ensino entre ns. Isto at o advento da nova, ultima gerao, em que se distinguem, prin-cipalmente, os snrs. Affonso Costa, com o seu livro de analyse critica da encyclica pontifcia De conditione opificum :., de 15 de Maio de.1891, e o snr. Silva 1.\Icn-des cotn a abundante e excellente exposio, que fez, da historia e doutrina do socialismo libcrtario ou anar-chismo. (

    }las (revertendo), como vista de conjuncto, no nos chegaram outiva, sobre o painel schematico da nossa litteratura econotnica, mais do que as copiosas paginas que ao thema dedicou o snr. Jos de Arriaga em um dos capitulos de introduco sua Historia da Revoluo de 1820, qual o critico politico francez Seignobos qualificou de prolixa e1n detnasia.

    Se esse trabalho preparatorio estivesse feito, ns marcariamos com rigr as datas do advento successi-vo das doutrinas econornicas que teen1 orientado os nossos estadistas ... para nossa calatnidade e ruina.

    Com effeito, Portugal parece destinado a esgotar os absurdos, como etn justo castigo das suas depreda-oes, vio1enciss e injustias seculares. E d' e\\a% \\.\\.() \.()\

  • XI"\'" ADVERTENCIA. EXPOSITIVA

    o Brazil, de que ra nM occupemos, das victin1as a que menos soffreu.

    Fartamo-nos, ento, de viver do monopolio; e esta-mos, hoje; ameaados de morrer da concorrencia. De-pois de nos empobrecermos pelos effeitos do erro impU-cito no systema n1ercantilista, agonisamos agora sob as garras do syste1na industrialista.

    Feriu-nos a proteco 'e fere-nos o livre-cambio. Poz-nos o destino beira dos labios gretados o calice das contradies economicas. Proudhon enchera-o do vinho amargo das antinomias kantianas. A nossa febre sorveu-o at s fezes. .

    Dos sophisn1as de alguns candidos proveio a der-radeira illuso. Victimou-nos a espantosa Inystifica-o da eschola oriunda de Manchester. Descendentes dos antigos orthodoxos do catholicismo, depositamos a mesma intolerancia e, apaixonada, fanatica ~uperstio em outros dogmas, menos veneraveis, os do econo-mismo chan1ado liberal.

    Na sua accessibilidade, a apparente clareza do sim-plisnlo da theoria seduzia-nos. Era moda sr-se livre-cambista, como reaco contra os botocudos calas-de-coiro que pitadeavam o seu shnonte s ramalhoas dos lenos de Alcobaa. Cobden foi biographado; narra-ram-se as campanhs da anti-corn-law league, e o hu-mr, de ba feio e excellente companhia, de Frede-rico Bastiat deslumbrou.

    Os Sophistnas economicos so, das obras typicas da economia classica, unta das raras vertidas em portu-guez. A coexistencia d' esta sym pa thia co1n a ausencia de transplantes para livros decisi~os, fundamentaes, como o d'um Ado Smith ou o d'um Ricardo, demons-tra, ao mesn1o tempo, a mediocridade da cultura e a corrente da ideao.

    Seguia no plano indicado, que era, de resto, sym-pathico ndolencia nacional. Para que haviantos de

  • ADVERTF!!'CIA EXPOSITIV .\ XV --------------

    ser ind ustriaes, se a industria estrangeira nos fornecia melhor e mais brato '? Para que haviamos de ser nave-gadores, se os paquetes estrangeiros eram maravilhas de conforto que nunca attingirian1os '? Para que havia-mos de sacrificar o consurnidor aos tentamens hnper- feitos da produco '? Porque esta era a preoccupao: . o conszunidor. Cotno se houvesse consuntidor que, para o ser, no tivesse de ser, de per si ou de per ou-tretn, prviamente productor!

    Pela ladeira, fn1oR resvalando. En1purraran1-nos, cotn suave sabr, Joo-Baptista Say, 1\lichel Chevalier, Garnier, toda a scientifiquice que grulha nas publica-es postas em vasta circulao pela casa Guillauntin. Resume-se no Diccionario de Coquelin, condensadr notorio que nos saturou, a todos, de chirneras e enlba-lou de vises, quando, moos, preludiavan1os, no offi-cialismo das aulas, thP.mas aridos em in1portunas dis-sertaes de aguadas frias. .

    Ao movbnento no se oppuzeran1 obices idoncos. Podia sl-o o excessivo exaggero d'um Gouraud, tatu-bem vertido, aliaz, para nossa linguagetn, por quetn quer que converso das corredias preleces do livre-cambio, emigrao, em Inglaterra, Inanhosatnente ciciado'? Podia sl-o con vcniententente '? No, decerto.

    De modo que a concluso resultou esta trenlen-da realidade historica : a crise, financeiro-economica, actual.

    Eis como bom e como convn1 estudar as doutri-nas e eis, ainda, por que cumpra aturar as massadas. Vae ahi o melhor e maior dos nossos interesses.

    E no se pense que, assim julgando, contrarian1os a intuio, geral, conhecida pelo designativo non1e de -xa concepo materialista da historia, qual, no corpo do

    volu~e, ao diante, nos haveremos de reportar. Porque, do que, aqui, nos occupamos do eo~o\\a-rio pratico do theoren1a abstracto e no

  • XVI ADVERTENCIA EXPOSITIVA

    concreta do axioma elementar de que esse theorema derive.

    N'este sentido, o effeito da idealidade sobre a rea-lidade, da transcendencia sobre a immanencia, do sub-jectivo sobre o objectivo, no s primacial como no

    . pde ser nem sequer diminuido, quanto mais, contesta-damente, negado.

    Cumpriria exemplificar'? Decerto que seja escusado. Mas desde os tentamens (no obstante, entendendo-os, os reparos de Menendez Pelayo), desde os tentamens

    -d

  • ADVERTENCIA EXPOSlTIV A xvn

    dana que similhante inveno produziu na vida do homem.

    Concomitante e consequentemente que a delibe-rativa graa preestabelecera que fsse Jorge Ste-phenson, natural de Wyglam, na Northutnberland, onde nasceu em 1781, o destinado a ser o fundador dos caminhos de ferro, rlepois que Blanket fra o pri-meiro que teve o valor de fazer o~posio aos dictatnes dos sabios e preoccupao geral do publico, provan-do que cotn certa quantidade de pezo da n1achina se attingia o bastante para a adherencia entre os carris e as rodas lisas, de Inolde a dispensar qualquer genero de engrenagens ou alavancas, realisando setn attrictos, simples e naturalmente, a propulso. Apczar de tudo, foi uma pessoa leiga em n1achinaria quem deu a Ste-phenson o conselho de inverter o principio atlli in-contrariado, e de atravessar a caldeira com tubos de pouco dia metro, por meio dos q uaes, em vez da agua, circulasse a chamma da fornalha. Dito e feito; a nova disposio surtiu resultado, consentindo na extraordi-naria rapidez con1 que a nova locomotora produzia va-por facilitando unta velocidade que Stephenson jtnais havia sonhado conseguir.

    c Desde Papin, quantos genios haviatn tido (excla-ma o Leixner citado) que applicar as suas faculdades, sacrificar o seu tempo e seus recurso R para que se chegasse locontotora pratica, que to colossaes tnu-danas provocou na vida e tnodo de ser das naes !

    Sem embargo, tanto Watt corno Stephenson se no preoccupavam nem attendiam tnais do que a questes de engenharia de Inachinas, cujo repercussivo effeito (economico, politico, social, juridico e Juoralista, reli-gioso e esthetico) lhes escapava inteiran1ente. Faziam um ntundo novo, de cima a baixo, se1n daren1 por isso. Na Escossia, o con1panheiro e an1igo de Ado Stuith nio poderia prever que, das suas sinl\.)\es CO\\~~m\'\\a-

    \\

  • .

    XVIII AD\'"E"TE:SCIA EXP081TlYA

    es cerca do 1neneio de embolos ern gavetas de va-por, h ou v esse de irron1per, 1nais tard~, o incendio das Tulherias, arrazadas pelos batalhes federados que, na praa da Casa da Can1ara, proclan1aran1, etn Maro de 1871, a Con1n1una de ~aris.

    l'Ias, nen1 por isso, ao ensasta .ctitico deixa de ca-ber a responsabilidade de inquirir da fonte analytica dos successos, afim de, desenhando o carae.ter das na-es, retratar a physionotnia dos ten1pos. E' a obriga que, consoante dissetnos, mais relevantemente se anto-lha para o que toca orientao generica superior da 1uarcha das sociedades civilisadas.

    Depois, a necessidade, in1prescriptivel e fundamen-tal, de se apurar a doutrina por que se orientaram, syn-creticatnente, os estadistas que geriran1 os negocios d'uru paiz-- condio indispensavel para; ntesn1o, se lhes derimir, cotn equidade, o grau de suas responsa-bilidades n1oraes, quer n'urna obra de utilidade quer n'urna n1archa de desastres.

    Seria injusto que se ton1asse conta de deslealda-de civica ou de traio patriotica o erro que redundou, todavia, etu prodigiosos desastres conectivos. Pode acontecer que um hon1e1n seja funesto, con1 a nl'elhor sinceridade no corao; poisque j a caroliee professa de que de boas intenes esteja o inferno vestido e cal-ado.

    Poderiarnos citar exetnplos de casa, celebres por Inais de un1 motivo. Asshn: o diploruata nefasto que negociou o tractado da India e o tractado de Loureno Marques. S'o dois diplomas de tal natureza que s se explicariarn por inepcia irreruissivel ou por rn f nia-nifesta. ()ra, corno ningnetn vil por prazer, a no ser em casos de degenerescente aberrao, deduzir-se-hia que o n1inistro se vendeu .

    .A tletnocracia desconfiada, de seu natural; e, in-felizruente, a experiencia historica ten1 den1onstrado

  • .-\ll\"ERTE~CI.\ EXPlSITlYA XI~ ---------------------

    que, por ,ia de regra, possue para isso razes de sobra. Comtudo, tnuitas ,ezes se engana, con1o o infeliz

    delirante que perseguetu hallucinaes, auditivas ou visuaes. Discutindo a thPoria da balanc;a do conlnt(lrcio, enganou-se Proudhon, attribuindo sedur.~o do oiro inglez a syntpathia doutrinaria provocada tqu

  • XX AD\"ERTENCIA EXPOSITI'\"' A -------------------------------------------------

    J. Scott Keltie, como os rotos de Tolentino, ji distri-buindo fatia~ para a sonhada ban1bocha que vota a 77te partition of .-tfrica. Ent aguar os appetites, recorre a seus infor1nes J. Theodoro Bent, quando no reconoavo felpudo das orelha~ cabelludas do tijoloso amigo John Bul1 j tilinte o ouro, imaginado escorrendo das proxi-nlas e decishyas excavaes e exploraes da ophiresca regio onde tnna archenlogia interesseira esquadrinhe The ruined citie.'l of Mashonaland.

    Quanto, porm, ao absurdo critico de cujo consp&-cto, analyticarnente, derivamos, elle no deve, de rea-to, granden1ente, estranhar-se, pois que n'uma abusio similhante, n'u1u engano do tnesn1o genero, prove-niente de identico erro, cahiu nada menos do que um verdadeiro genio, o fundador incontestado da econo-nlia politica, pron1ovida, to s, por elle, ao rigor d'un1a sciencia regular e definitivamente constituida: Ado Smith, em duas palavras, para que esse grande nme registremos.

    De sua obra na seco e1n que debate o schema doa tractados de cornmercio, assombra a candura theorica, a ingenuidade doutrinaria do eminente escossez.

    Ahi, pretende elle provar que o tractado de Methwen foi uma enorn1e desgraa ... para quem? Para a Ingla-terra ! E que, graas a esse incompara vel erro dos es-tadistas britnnnicos, Portugal floresceria sobre as rui-nas de AI bion sacrificada ...

    Eis um exetnplo da incapacidade historica do me-thodo, deductivo, peculiar do economisn1o classico. No pde ser mais flagrante nem mais decisivo.

    Cotntudo, veja-se o que seja o aferro s doutrinas e quanto o fanatismo scientifico cga, como o fanatismo religioso!

    Depois que Ado Smith escreveu aquellas barbari-dades, a evidencia dos factos mettia-se pelos olhos den-tro, conforme vulgarmente se dizer-se. Despidos de

  • ADY ERTE~CJA EXPOSITIY A XXI

    preconceitos sectaristas, os sitnples historiadores, rela-tando a dccadencia succcssiva de Portugal c o succes-sivo engrandecin1ento conconlitante da Inglaterra, re-feriram o connexo ph('nomeno ao duplo effeito, pro-gressivo e regressivo, do tractado de 1\leth\ven. Tor-nou-se truismo na polen1ica doR jornalistaR e nos estu-dos dos publicistaR. l.Tn1 norte-atnericano, Carey, de-monstrou minuciosamente que a Inglaterra utna creao de Portugal. Urn alletno, Harttnann, procla-mou essa den1onstrao cotno irrefutavel.

    Pois ben1! Abra-se o Diccionario de Economia po-litica, da casa Guillatunin, valhacouto de quantos cas-tanhas-piladas, genero l\lolinari, brotarn ainda da sa-fara leiva do egoisruo conservanti~ta. NaR ulthnas, n1ais recentes edies, busque-se o artigo eRpecial, e pas-me-se. Por' no se con1prchende co1no profissionaes-visto que em tudo os haja- attribua1n as adulterantes fal-sificaes ao corollario supposto do supposto em bus te do referido convenio por l\leth\\'en, etn Lisboa, nego-ciado a prol da industria uos lanificios londrinos.

    Asshn occorre na, naturahuente to curiosa e pro-veitosa para o leitor inglez, Ilistory and description of moderll, 1oi1z~ co1u zuna insinuante CO\\\\)~\.e\\.e\a ~~

  • XX li AD\~~nTENCIA EXPOSITI ,. A

    copo, escripta pelo snr. Cyrus Redding, j, en1 1833. Mas este caso typico e farnoso do traetado de Me-

    th,ven dernonstra ben1 a exaco do asserto de que procedemos en1 estas perfunctorias consideraes. Mette a v-erdade pelos olhos, disserrtos. Brutahnente. A' n1aneira anglica. A box.

    1\'Iostra, irrefraga velntente, que, cotno e8cre,~er~Ios, cumpre no perder de vista a~ doutrina~ que profes~ sem os que governatn, poisque o rual e o bern de citna veen1, diz o nosso povo, aquecendo-se lareira, nos dias chorudos de tnatana de porco, ou, no adro, pela qua-dra cahnosa, refrescando da soalheira.

    Certo que possa contestar-se o conceito, poisque, pelo que toca syn1 bolisao d'uma sociedade, no que ella tenha de basilar. intin1o e profundo, no que significa a sua ordem de raiz (o tnodo econotnico, a lei civil, a affe.ctividade moral, o estituulo religioso), todo o go-

    " verno representativo. Pelo suffragio indirecto, to representativo , n'este sentido, Felix Faure cotno, pelo absurdo do naschnento, Nicolau II.

    Mas entenda~se ben1. S n'este sentido; de certa maneira atn pio, e restricto vez. No processo geral politico, a necessidade da ordem, a tendencia a obe-

    . decer (isto , a inercia do a tomo, no grave a affinida-de para o repouso), a ignorancia e disperso das mas-sas entregan1-as aos governantes, que so, effectiva-mente, n'esse tanto, dirigentes. Or:.., esse tanto, assim

    como pde conduzir gloria, pde tarn betn guiar para a catastrophe. D'ahi, as responsabilidades dos governos e a justia das revolues.

    Na verdade, facil e commodo dizer que os povos teem o governo que merecem. Isso, como indignada-mente o observa o moderno sociologo belga Guilherme de Greef, justifica todas as reaces, garante todas as palinodias.

    Toda via, con1 eff~itiJ, na se ri~ das causas e suas

  • AI>VERTJ.~:r\CIA EX.PO~lTl\. A XXI H

    consequencias, a consequencia reage scnnpre sobre a sua causa, e , assim, causa da causa. Ern politica, os gover-nantes dependen1 do caracter dos governados ; mas, por sua vez, actuan1 sobre estes e n1odificarn-os a seu geito e shnilhana.

    D'aqui succede que no s a sua itnportancia cres-ce, como a sua responsabilidade se a vol unta.

    Por este desvio, eis-nos de regresso. Isto , assen-tamo~ ( par~ce-nos que sem ensejo de duvidas ainda) que do caracter das doutrinas, as rnais abstractas, as mais theoricas, as 1nais confinadas no seu isolamento scientifico, pde, para os povos, governados por ho-Jnens cujo cerebro essas doutrinas, at 1ura1nente es-peculativas, 1nanden1 - advirem calatnidades ou benef-cios, segundo o caracter particular ( racional e exacto ) d'essas doutrinas alludidas.

    So banalidades, verdadeiros truisn1os '? E estive-olos eon1 o afan de ennegrece1 as ti e as, collocadas deante de ns, para, no fhu de contas, attingirtnos si-milhantes logares-comrnuns?

    }las, banalidades-banalidades, o facto que, n'el-. las, e etn seu effeito salutar, se no attenta. Por in-..,

    . tern1edio d'ellas no vtnos, por exernplo, esmerilhar a explicao do earacter especifico da evoluo, financei-ra e econornica, da historia portugueza. Sem en1bargo, ~ eu1npria. No verdade'? Todavia, o exeruplo estava dado, e o ensino inicia-

    ra-se. No final do quarto volun1e da sua Historia de Portugal nos seculos ~\VII e ~YJTJJI, Rebello da Silva promovera, ruodernamente, a analyse historica do es-

    r tado econont\co e social da monarchia. \

    Ahi votara pro1nptos e pegados captulos s theses ~-~ concernentes p:>pulao e agricultura; industria fa-~ ~- bril ; ao conunercro at ao xv seculo, nos seculos XYI

    8 XVII. Mas, co1n n JJOJJJ J.,\'l desenxa h ida do ~e\\ est'!\(), \."\.(\

  • I XXIV ADVERTENCIA EXPO~lTIVA

    seu academis1no tam perfeito ( tam perfeito que no . presta para nada), o nosso illustre correligionario ex-tincto Latino Coelho - cuja erudio era prodigiosa-dedicou-se, mais restrictamente, a, ao effeito das dou-trinas preconcebidas, o observar na physionomia, tno-ral e social, das culminantes figuras politicas. So ex-cellentes, por similhante mot~vo, as paginas que, em

    ~ua Historia politica e militar de Portugal, desde os fins do XVIII seculo at 1814, elle consagra legisla-o economica do marquez de Pon1bal; aos principios em que se firmava; ao conceito do Estado considerado como emprezario e fabricante universal : aos monopo-lios etc.

    Ainda assim, repetimos, a este aspecto da nossa questo collectiva, no se tem attendido com o minu-cioso melindre que elle exige. Salvo se exceptuarmos, na aliaz curta bibliographia provocada pela crise fi-nanceiro-economica actual, o volutne, que passou des-percebido, do snr. Silva Cordeiro, e que archiva reaes meritos, aliaz, para o tornarem mui notorio.

    As illuses de um doutrinarismo criticamente in-consistente mantiveram-se, comtudo, atravez das flu-ctuaes das crises politicas successivas, formando substancialmente a trama ( apezar de todas as inter-

    mitten~es divergencias de detalhe) do programma com-mum dos dois grandes partidos conservadores em Portugal, os chamados progressistas e os regenerado-res chamados.

    Estes abdicaran1 provisoriamente, certo. Abdi-caram fora, merc do esthnulo creado pelas recla-maes n'um instante de perigo commum, sentido, por egual, na opulencia e na penuria, homologas, de indus-triaes e de operarios. Em ollectivos cumicios, requere-ram, com effeito, pela reforma-n'utn sentido de pro-teco s industrias nacionaes -das pautas vigentes, data, na metropole e nas colonias.

  • ADVERTRNCIA EXPOSITIYA

    Mas era sobreposse. Viu-se. Regressaram.

    XXY

    Encontram-se, pois, de vez, parece, como quando rebentou o debate theorico entre o seu leader periodi-queiro, Duarte Gustavo Nogueira Soares, na Revoluo de Seternbro dissertando, e o defensor estrenuo do tra-balho nacional, impolluto Joaquim Henriques Fradesso da Silveira, no Jornal do Corn1nercio con1batendo.

    Vencedor em Inglaterra, Cobden avanava sobre o continente. Era a consequencia logica, o desfecho da sua can1panha no interior. Conferenciara com Michel Chevalier. No seu chilnerico anglicis1no, o huperador escrevera ao tninistro-de-es.tado a fan1osa carta que ini-ciou a nova politica con1mercial da Frana. Lunatica-mente, rebusca n'ella os seus principios queridos o obstinado Fradesso da Silveira; e o opusculo, valioso como documento historico, encerra-se com curtos ar-tigos de Sebastio Bettamio d' Almeida, notabilidade da epocha.

    Concluso: O bom filho a casa torna. A Regenerao no olvi-

    dara os seus precedentes. Br.eve recahin1os no fatal bar-ranco em que afocinhara, de bruos, o conde de Casal Ribeiro, quando, e1n 1867, negociou o tractado com-marcial com a Frana.

    1\las ento este rhetorico tinha desculpa. A econo-mia politica classica estava no apogeu do .. seu triun1pho. Quem diria- a essa hora j remota- que poderia ser presidente do conselho de ministros um estadista, il-luminado, que, em materia de pautas, professasse as ideias do snr. Mline '? List era un1 retrogrado ; e o zoll-tJerein, u1na chimera.

    Todavia, o snr. Hintze Ribeiro, esse, volveu a lr hoje .pela cartilha do padre-mestre Adrio Forjaz.

    Como pela mesma voltou a soletrar o ~n.~. ~~~~ ~ Luciano de Castro, cornn1inativan1ente endeTe~a~~~ a(.)

    (' .. .

    I ~

    ,

  • XXVI ADV ER TENCIA EXPOSITIV A

    trabalho nacionalista (e, por consequencia, ao futuro, politico e economico, de Portugal ) o cartel tremendo que se dissimulou nas blandicias do retirado, attenua-do projecto de lei ao exclusivo da montagem de fa-bricas em a nossa Africa Occidental referente.

    Estes casos concretos, .os trouxetnos, todos, em nossa corroborante confirmao. Elles rnostram o ri-

    gor do thema que, tomando philosophos e estadistas como s~ccedaneos representativos do paiz, demons-tram que as naes. (consoante a phrase contracta de Littr) no aperfeioam nunca o seu estado mental sem aperfeioarem concorrentemente o seu estado social.

    Concluindo : ficou, parece-nos, provado que preli-minarmente cumpria, para o caso, conhecer; pois, o Brazil mental.

    No proposito, justificar-nos-hia uma lio famosa. Foi a de n1.mc de Stael, com respeito Allemanha. Che-gou esta dama insigne at s minucias psychologicas sobre a influencia do espirito cavalheiresco. sobre o amor e a honra, e discorreu cerca da aco do en-thusiasJno sobre o que, ao tempo, se chamava as lu-zes e sobre a felicidade.

    Na revertencia syn1etrica, do conceito social inci-dindo sobre a ideao personalista, o critico romanti-co Schlegel ~eixara estabelecido como que o ponto-de-honra explica o theatro hespanhol. Fechando o cy-clo, o moderno Forneron comprehende na amplitude do criterio toda a sociedade hespanhola, quando rese-nha a historia de Philippe II.

    Da mesm'arte se devem apreciar as previses po-liticas, conforme as chimericas do ultramontano Mon-talembert, gisando o futuro da Inglaterra. Mesmo as, mais positivas, conjecturas economicas, como quando, a proposito de Sydney Smith, o snr. Chevrillon, em nossos dias, estuda o renascin1ento das ideias liberaes,

    no seculo XIX, na Inglaterra tambem.

  • .. . ..

    ADVERTENCIA EXPOSITIV A xxvn

    Pde, at, o criterio orientador desenrolar-se etn corollarios de feitio immediatamente pratico.

    Com effeito, em 1889, como consequencia d'un1 concurso aberto na Eschola das sciencias politicas em Paris, informa-nos o snr. Emilio Boutmy que o anti-go alumn.o d'essa eschola Max Leclerc fra encarregado d'uma misso especial na Inglaterra.

    Ora, o assumpto do inquerito que lhe haviam sol-licitado emprehendesse pde resumir-se n'isto, a saber : que cumpria elle apurasse quaes as correntes 1nentaes sob cujo influxo, do outro lado da Mancha, as classes superiores e medias se fortnam e constituem, ellas, essas camadas prevalecentes onde (pensava-se e diz-se) a politica recruta os seus parlamentares e os seus di-

    . plomatas, a administrao os seus funccionarios, a guer-ra e a marinha os seus officiaes, a industria os seus di-rectores technicos, o commercio os seus agentes, a phi-

    .. Iosophfa to profundos pensadores, a litteratura, a his-toria e a sciencia tantissimos talentos originaes e in-tensivos.

    De conta propria, nos dmos a inquirio analoga pelo q.ue toca grande republica transatlantica que fala a nossa lingua e onde pullula a gente de nossa es-tirpe.

    D'ahi, O Brazil Mental. Incompleta assim, a obra cumpriria que, logica-

    mente, terminasse por O Brazil Social. Se nos seja licito, ou no, abalanar-nos escriptu-

    ra d'esse novo .volume, ao publico de Portugal e do Braz que (com o genero de acolhida a este dispensa-do) compete decidir.

  • .

    c

    -

    .

    ...

  • -

    I

    I

    !: Das coisas, du intelligencia ou da aco, signal .

    ~ curioso que ns outros, portuguezes, das classes cul-t tas, nos no interessemos seno restrictamente pe-

    las que nos \'"in de Frana e mais particularmente Franca se referoiu. ~ .

    No podetnos negar a nossa procedencia, e a gra-. tido inconsciente da origem sobreleva a todos os

    conceitos que un1a observao critica ou uma refie-. xo inaffectiva possa1n e tenham tentado erigir con-tra essa sympathia, que resulta irresistivel, porque,

    r eomo vulgarmente se diz~ nos est na massa do san-~e. .

    Nenhumas relaces de conveniencia econcnnica, . .

    de affinidade ethnica, de contiguidade territorial ou de proximo parentesco, at, logratn vencer essa pre-erente prevalencia da Frana, nas nossas sympathias

    em nossas tnnditaces . .

    ..

  • 2 O llRAZIL !\lENTA I..

    Assim que o visinho de ao p da porta nos no Inerece o cuidado de uma atteno escrupulosa; e, odiando-a, ns ignoramos a Hespanha. Debalde, a es-peculao Inercantil tentou, por Yezes, vulgarisar, no nosso publico ledr, o conhechnento da litteratura do pretendido inimigo tradiccional. Tomou, .certo, a obra de fancaria dos faiseurs madrilenos; mas essa, era, naturaln1ente, a mais de protnpto accessivel, vis-to como o grande publico, em toda a parte do mun-do, se deixa arrastar melhor pelas visualidades d'uma phantas1nagoria extreme. 1.\Ias, ainda assim, o effeito surtido no correspondeu

  • O BRA ZIL MENTAL 3

    do prodigioso successo da Mui/ter adultera~ por Pe-rez Escrich. Foi durante alguns mezes verdadeira 1naravilha o attractivo beato d'estas combinaces he-

    terocJitas, em que o bedum do sangue dos assassi-nios se casa con1 o incenso mystico da liturgia ca-tholica. Afinal, porm, houve uma reacao de boin-senso e o fundo voltairianista das novas gera~es portuguezas rebellou-se victoriosamente contra essa in,Taso derradeira da incorrigvel superstio cas-telhana. Escrich passou, o que foi magnifico; n1as ninguem o substituiu, o que resultou pessimo.

    Infructiferos destacaratn, tambem, os esforos realisados por vezes para .proporcionar ao leitor lu-sitano. utna vista de conj une to da arte h espanhola, dada palavra arte a ampla expresso que lhe con-\:"em e entendendo a litteratura no sentido, vasto e profundo, que lhe cabe. Todavia, alguns dos traba-lhos cffectuados con1 a Inira em alvo similhantc eram, na verdade, excellentes. Citaremos, por tne-moria, o livro do snr. Jos Shnes ])ias, intitulado . .4 Heapanha Moderna. Elle propoz-se representar, para

    ns, o papel util dos volun1es congeneres estampados em Frana por Ch. de Mazadc, por Antonio de Latour, mais 1nodernan1ente por Gustave Hubbard. Primiti-vamente dados estampa nas columnas da revista

    . litteraria conimbricense, A Follta~ os capitulos de que se compe o livro do snr. Simes Dias so, em geral,

    ~ ~ completos, sompre exactos na informao e altunia-dos por luz eritica, seno intensa, pelo 1nenos nitida e clara. A obra, porm, seguiu quasi despercebida, no obstante as suas qualidades reaes e sem mnbar-

  • 4 O BRAZII.. !\IENT A l.

    go dos servios que poderia p~estar nossa cultura, restricta e insufficiente.

    Com respeito Hespanha, pde, talvez, allegar-se, para desculpa da nossa exquisita incuriosidade e in-crivel desleixo, o facto da antipathia historica, que recorda de continuo os perigos da absorpo recea-da e se repasta das lembranas crueis de Aljubarro-ta e de Montes-Claros. Mas, se para nos garantir da Hespanha, que nos lanau1os nos braos da Ingla-terra, trespassando-lhe Tanger e Botnbaint; se o nos~ so amr pela gente britannica nos esteve, por um fio, a fixai-a de vez em casa, cedendo-lhe, cotno depois de Rebello da Silva nol-o registra, en1 sua preciosa colleco de nossos tratados, o snr. Judice Biker, cedendo-lhe nada Inenos do que Setubal; se, de ps

    e mos, a ella nos entregan1os, pelos convenios com-Inerciaes, no typo d'esse fa1noso de Methwen cujos perniciosos corollarios se solveram j n"un1 logar-cointnuin da rhetorica jornalstica; se tudo isto se deu e se a influencia ingleza em nossa politica e vi-da social, no que de indestructivelrnente organico ella possue, contina a ser preponderante, cotno inin-terruptainente at aqui: parece que nos deveria ser thetna de estudo persistente e duradouro a cxisten-cia mental da Inglaterra. Nas suas 1nanifestaes mais interessantes c agradaveis, ao menos; j que a frivo-lidade do nosso cerebro meridional no nos conce-desse alcandorar-nos s culminancias das especula-es philosophicas ou das investigaes scientificas.

    Tal, porm, no succede, corno noto rio; o mes-tuo idiotna inglez aqui raro e Inal conhecido, at da cJassc n1crcantil, que quasi no ne!lnceia, aliaz, seu tra-

  • ..

    O BRAZIL liENT A L

    fico exterior n1ais do que eo1n as praas de J.Jondres, d~ Jlanchester, de Bir1ninghan1, de Liverpool. ~~sta -...ontradico feriu, etn tempos, o ensaist1: Carlos dt~ .31azade, que a archivou entre os soporferos doutri-narismos da Revista dos doia-1nundoa. No surge, de resto, viajante, d'estes que legislan1 sobre a psycho-logia d'nn1 paiz, co1n a habilitao de quinze dias de residencia pelos noteis da sua capital,- que no con-signe en1 seus calepinos sirnilhante surpreza, exhibi-da Jogo de chofre pelos portuguezes aos olhos do fo-rasteiro mettedico e intr

  • 6 O BRAZIL MENTAL

    1nandados correr pelas bibliothecas econotnicas das duas grandes cidades do norte e do sul do paiz, no se descobre, para amostra, o n1ne de un1 unico lit-terato que, indigena, houvesse reeebido a consagra-o do publico londrino.

    E1n epocha affastada, alguem tentou acclimatar Carlos Dickens, cuja notoriedade se insinuara seu tanto, tnerc da meiga popularidade de Julio J)iniz.

    Compa~:ava-se u1n com o outro, graa~ a esta balda esteril dos parallelos, que constituiratn detestavel ge-nero litterario no ensino ~lassico. Con1o quer que o romancista portuense houvesse escripto o seu livro typico de costumes da sua terra, Unta fantilia lngleza,

    cuidou-~e, logo-logo, de pr e1n relevo a persona-lidade do auto-biographo de David Copperfield. Mais achegada pareceria a lembrana de As 1nen!orias de Plsislralo (}axlon., de Bulwer-Lytton; n1as este ap-pellido barbaro que era justamente ignorado ou desdenhosamente se refugava, consoante o merecia o seu ar intonso, apezar do aristocratismo de sua pro-genie, estylo, tnaneiras e costu1nes. Fica1nos por Di-ck.ens; .traduziran1-se algumas das sua~ enternecidas las do Natal, essa com1novente historia de Serooges,

    . o avaro cuja dureza mn sonho 1noralista converte e diverte, o que o interessante. Mais tarde, a intelli-gente esposa do publicista Oliveira Martins illustrou o rodap, cotno se diz no Brazil, do Conunercio do ]:Jor-to cotn a ex.hibio de algu1nas das physionomias ca-racteristicas do mestre eximio, quaes sejatu Nicolau Nickleby e Oliveiros Twist. Co1n a anterior verso da bizarra novella anonpna de Ginx,s baby_, que, da

    penna de Ra1nalho Ortigo, foi dada etn brinde pela

    ..

  • O BRAZIL MENTAL 7

    gazeta portuense .A Actualidade_, de Ansehno de Mo-raes,~ quasi tudo; con1 pouco 1nais, pde descer o panno.

    Ora, no admira que este abandono se verifique para com a Hespanha e para com a Inglaterra: quan-do u1n paiz existe que, naturalmente, parece que de-':"'eria captar, desde o primeiro mo1nento, todas as attones e protnover entre ns as n1ais vivas e per-manentes curiosidades, por isso que a elle tudo nos prende e com indissolubilidade liga. Esse paiz, evi-denteinente, o Brazil; escusado seria que o no-meassemos; prolixo resulta faze l-o. Bastaria, con1 ef-feito, designai-o; tnas, explicita ou implicitainente, o facto que a nossa ignorancia a respeito d'elle corre parelhas, se no mde 1neas com a de que sotlremos ~\cerca das duas naes por cuja lio encetamos as tiras bra~cas que se amontoam diante de ns.

    Do Brazil nada se sabe em Portugal, seno que venceu o Lopez, do Paraguay, que exporta caf e que possue o condo especialissiman1ente .nlimoso de uma arv-ore das patacas, a qual, sacudida a ten1po e horas, desata e1n fructos de dobres e cruzados, des-prendidos setn fin1 e se1n termo, n'uma prodigalidade tropical luxuriante e absurda.

    Quanto vida espiritual "do Brazil, nada ou quasi nada se apurara.

    Sabia-se, shu, rnas vagan1ente, qun florescia no Rio utn romancista de inveno e desrripo, por nome Jos de ~~lencar. Este hometn escrevera utna especie de poema em prosa, chamado o Guarany _, o qual fOra n1usicado por um mulato Cat\~% \'-,\)'-'.\~J~ .. So~ra~e que a obra recebera a consa~ta~~ ~c

    plsteias entendidas da Italia; e, q\lando n~~ ~\)'-'.~

  • ~ O BRAZIL llENT.-\1. ---- ---- - - - -- -------

    tos, ou pelas bandas regiinentaes nos jardins, se ou-viram trechos da opera, conveio-se e1n que o raio do tnacaco tinha sua habilidade.

    Mais ao -deante, n'um dos barraces que no Porto usurpam o titulo de theatros, a auqacia etnprehen-dedra de Cyriaco de Cardoso poz etn scena a pea do maestro paulista. Houve certo assombro, depois da primeira audio. A frescttra da melodia, a graa e a paixo de que a obra palpita surprehenderam e cotnmoveram. Admirou-se a notavel sciencia de com-posio de que o moo auctor dra provas cabaes. Concordou-se em que elle tinha logar distinctissimo entre os compositores de segunda plana, perfeita-mente ao par d'um Marchetti ou d'utn P-onchielli.

    A novella, porm, que o librettista versificara era desconhecida. O enredo da opera sabia-se pelos tolhe-tos achamboados que, a dinheiro de contado, se dis-tribuem no camaroteiro, antes de ron1per o especta-cuJo. Ainda estava longe a data en1 que, entre nossa gente, havia de circular o elegante opusculo, redigido n'um lexico turgido pelo talentoso e mallogrado pe-riodista portuguez, Francisco Pacheco.

    Se o romance de Jos de Alencar, sen1 e1nbargo da toada europeia que lhe facultou a dramatisao lyrica de Carlos Gomes, era desconhecido, que dizer do tam ignorado quam abundante Joaquim Manuel de Macedo?

    Todavia- caso raro, unico talvez -lnna das obras iniciaes, e das mais typicas, de :\lacedo fra reproduzida, qui por contrafaco, em Portugal.

    Com effeito, n'esta nobre e setnpre leal cidadP da Virgem, o editor da Bibliotheca da~ Damas, Jost~

  • O BRAZIL ~IENT A I~

    J. .. uureno dn Sousa, intcrcalaYa na sua colleco, pP-los annos d'~ -1855-1856, en1 dois totnos bojudo~, o .. floro loiro. Eis aqui un1 facto que s n1uito mais tard.-se havia de repetit quando os periodist'as portuenses E1nygdio de Oliveira e Gualdino de Catnpos repro-duziratn, respectivan1ente, nas sua~ gazetas, Folha 1\'!"ova e Jornal da Manh., o printeiro: As Metnorirut pustltunta8 de Braz (}uba8., por :\I achado de Assis: o segundo: ]Jitilonlena BoryecY_, por Aluizio de .A.zn-vedo.

    Nenhun1a tentati,ra analoga do snr. Jos Simes Dias relativatnente

  • 10 O BRAZIL MENTAL

    (que, aliaz, portuguez e portuense), Raymundo Cor-ra, Luiz Guimares, Luiz Murat, Theophilo Dias.

    O sacerdote-jornalista extrema-se pelas galas de uma oratoria emphatica e pela virulencia d'um tem-peramento brigo e injurioso. Nada mais repugnante do que a phrase pejorativa que enderea ao seu an-tigo condiscpulo Anthero de Quental. Ninguem ha-via que ignorasse que esse homem estava soffrendo cruelmente de enfermidade tarde reconheeida, a qual o fizera andar em penosa carreira pelas clnicas de Portugal e da Frana. D'ahi, o seu retrahirnento; a sua absteno litteraria; o silencio, s~ d' onde a onde interrompido .pelos gritos funebres dos seus desolados sonetos. Pois, com christ caridade, o saudavel, rijo Senna Freitas declara julgar que elle no tractava

    rnais de fazer philosophia nem poesia, mas simples-mente boa hematose ou boas carnes.

    Habitando o Brazil, o atrabiliario sacerdote nle-nos cura de fazer-lhe a critica do que de fazer-lhe a crte. Reserva as suas grosserias para os distantes litteratos luzitanos; todavia, os seus panegyricos dos jovens poetas brazileiros nada de novo ou original nos ensinam. No passam de declamaes pomposas, pelas quaes se no fica fazendo ideia de seus 1neritos peculiares e especficos.

    Quanto s obras, expositivas, de largo folego, el-las so, conhecidamente, o Brsil litteraire~ de Fer-nando Wolf, e .o Resu1no de historia litteraria pelo eonego doutor Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro.

    O livro do erudito austriaco tem ainda hoje uti-lidade real para o estudioso, sem e1nbargo dos sar-

    casmos de Tobias Barreto, cuja eschola o snr. Jos

  • ..

    I

    O BRAZIL MENTAL ii

    ,-erissiino, na Revista brazileira, qualifica de pessi-rna. A elle se refere elogiosamente o snr. Theophilo J3raga, que no seu Parnaso portuguez 1noderno, edi-tado em Lisboa, e1n 1.877, encerra con1posies dos ''"ates brazileiros Alvares de Azevedo, Gonalves l)ias. Casimiro de Abreu, Junqueira Freire, Gonalves do llagalhes, Fagundes V arella, Castro Alves, J oaquhn Serra, Sousa Pinto (o qual portuguez e portuense. tambem, aliaz ), Bernardo Guhuares, l\Iachado de .A.s sis, Bruno de Seabra, Luci o de l\Icndona, Narcisa Anta-lia, Bcttencourt Sa1npaio, ])ias Carneiro, Vieira de Sou-sa, F. de l\Iattos, ~,ranco de S, Filgueiras Sobrinho. Gonalves Crespo (que adoptou a nacionalidade por-tugueza ), Quirino dos Santos e Octaviano Hudson. No estudo da poesia tnoderna portugueza, que precede a collecco referida, o sabio lente de litteraturas tno-

    dernas no Curso superior de lettras do Lisboa dedica o seu segundo capitulo analysc da poesia lyrica do Brazil, a qual considera superior c1n vchetnencia sen-timental e eill novidade de fr1nas ao lyristno portu-guez. Ahi fixou, segundo elle, o Inotivo da persisten-cia da serranilha portugueza na 1nodinha hrazileira e no seu lyrisn1o 1noderno. Esta seco de alta cri-tica littcraria foi retomada e desenvolvida pelo epi-gono Jos Antonio de ~,reitas, no seu trabalho espe-cial sobre o Lyrisn~o brazileiro.

    Todavia, publicaes corno esta ultirna e a do conego Pinheiro tec1n, para sua con1prehenso, o de-feituoso contra de presuppre1u conhceido o assuin-i pto. Refere1n-se a obras, que ilnaginarn j lidas, e

    l_-- apreciam escriptores, cujo texto consideram ~~~~\.u.f mente adquirido.

  • . .

    . 12 O BRAZI L MENTAL ---------- -------- ------

    Quando a hypothese, por1n, no se eontlrtna, o ensino de livros taes resulta inteitamente perdido c.

    " .

    a sua leitura torna-se d'um fastio mortal. E por isso que os n1odernos crticos additatn utna selecta de trechos das melhores composies, en1 prosa e verso, pertencentes aos auctores julgados. Assiln o fez o j citado Fernando \\7 olf, cujos quilates ainda ultima-ln ente, na Revi8la da Socledade de Instruco do Porto~ a vasta competencia de D. Carolina Michaelis de Vasconcellos cotejo~ e aferiu. Todavia, silnilhante processo destaca cotno artificial c superficial; eU e desarticula as cotnposies e on'de o seu e1npirismo resalta flagrante pelo que toea s narrativas segui-das, historicas ou de fico. ,

    Os ensastas conten1poraneos recorreratn ao, Inais shnples e natural, procediinento da dem~nstrao suc-cessiva, de par e passo que se vai expondo e referin-do. Estudando Carlos Dickens, por exe1nplo, o insi-gne Taine desenha o plano schematico da sua ana-

    . lyse. Estabelece, perante os olhos do leitor, que, pri-Ineiramente, elle se ptope tractar da lucidez e inten-sidade da imaginao em Dickens; depois, da audacia e _vehemencia da sua phantasia. Ellc dir cotno que no inglez os objectos inanimados se personificam e se apaixonanl. Logo deduzir como a sua concepo se avisinha da viso. E, consequententente, cm como se approxilna da Inonotnania. Para isso, exemplifica-r, cotnnoseo aprendendo como que elle pinta os allucinados e os doidos.

    Ora bem. Havendo d'est'artc bosquejado o seu plano, Taine principia de desenrolar diante de ns o

    tecido fino de sua espec.ulf1 rao, E desde

  • O BRAZU. ~~1!!~T A 1. 13 -----.- -- - --- - - -- --- ----- ------------

    que un1 lllUinento ideativo, preciso e recortado, dcter-tninado (~ categorico, se detlna, ellr traeta, iintnedia-tamente!' de co1nprovar o asserto que adcantara Inos-trando, po1 u1n exemplo do seu auctor, q ne o critico d'cstc no inventa ne1n desvaira.

    Assitn, vai intercalando no proprio texto as trans-t~ripcs q uc df~ J)ickens entende idoneas e oppor-tunas. No se contenta; isto lhe no abasta. ~~' en1 notas, pe no original inglez as passagens aptoyeita-das. Para que no possa restar sotnhra de duvida, concernenteutnnte fidedigna exac~~o que se preten-de. Desfila1n, pois, da acurada edio Tauschniz, os personagens fundatnentaes nas situaes decisivas, aqui ~lartinho Chuzzle,vit, logo o banqueiro Dotnbey.

    }4~ntre ns, uma obra d' esta especic, regular e systetnatica, no se tentou sequer. I>elo conttario, un1 livro surgiu, que, inYoluntariatnente potventura, ten-deu para falsificar o critcrio portuguez ecrca da pro-ducco litteraria hrazileira .

    Estatno-nos recordando do (.'ancione~ro ale!Jre, de Ccunillo Castello Branco. li,oi unta eontpilao ar-ranjada precipitadatncntc, e1n hora a1narga da atnarga caligcn1 1noral que entencbreeeu os ultiinos annos do prht1acial cseriptor. Elle riu alli un1 riso cruel, que cerce dissitnulava Inuitissitnas dures . ..:\s suas aprecia-es fra1n injustas quasi sempte, cotno injustissilna a que, precisa1ncnte 1nais desastrada, foi 1nais inten-samente sareastiea. Calcula-se que nos ref('rilnos s linhas votadas a ~.,agundcs ,-arella, eujo intpeto ly-rico t~ de soberba pujan~a. ])'urna idealidade tna-ra,Uhosa, u estro de Fagundes \arolJa teru a pureza transcendt~nte do eo1ueito platonista, a

  • 14 O BRAZIL MBNTAL

    1nanado na incarnao do genio sul-americano. Todo o avatara , etymologica e ontologicamente, uma de&-eida. Mas a intuio tornou ... se-nos affim, abando-nando a fria immobilidade da raso pura. Recebeu a transfuso do sangue das paixes:

    O que eu adoro em ti no so teus olhos.

    Jlara que confesse:

    o que eu adoro ein ti, ouve, e tu'ahna.

    O volume de Camillo Castello Branco provocou no Hrazil uma tempestade de coleras; gemeram os prlos eom a pressa de folhetos, mais ou menos arrieirados, remettidos sobranceira maestria do solitario de S. :\liguei de Seide. D'aqui resultou essa opulenta seri~ de objurgatorias contra Os criticos do Cancioneiro rtlegre. Nunca a ,.invectiva attingiu tam vibrantes,

    (~xtremes effeitos; raramente, o desprezo encontrou nota litteraria mais perfeita, em sua enxovalhante n1ira. Essa colleco uma obra-prima de insolencia: Pila marca, na triste historia dos desmandos da po-lemica indgena.

    Mas o conhecilnento da physionon1ia 1nental bra-zileira que escapara; anjes, os traos se confundi-ram e a perspectiva se falseou.

    Entretanto, o editor l)avid Corazzi, de Lisboa, engenhoso e constante, iniciara a publicao da sua

    Bibliotheca Universal, antiga e nlodern, copiada~ tnanitestamente,. do plano da Bibliotheca Nacional .. tranceza; mas com outra probidad, reproduzindo

  • w -- --- I

    O BRAZIL :MENTAL i5

    ,.

    os textos em sua integra exaco e sem os Inuti-lar, como os livreiros parisienses no escrupulisan1 de fazer, para que, no numero de paginas prefixo, caiba1n. N'esse archivo se topa con1 o Poe1na do frade~ de .A.lvares de Azevedo; cotn as Se.xtilltas de },rei Anto~. de Gonalves Dias; com os Poetnad e rol icos, de AI v arenga; con1 a I racenta ~ de Jos de Alencar.

    A breve trecho, porn1, a ernpreza sossobrou; c, 1nais uma vez, a idea de tornar conhecido o Brazil a Portugal se perdeu, pelo insuccesso connexo.

    Confessemos, franca1nente, no lance, que, at !889, isto at ~ data da proclamao da republica no -Rio-de-Janeiro, de banda da gente portugueza no despon-tara o n1aior interesse por inquirir do desenvolvi-mento mental hrazileiro. E o motivo residia em que -para a intelligencia- o Brazil no contava. No se suppunha que brazileiros fssem capazes de n1ais do que de vigiar pelos engenhos do assucar. Recente-Jnente, j frisa1nos este ignaro desdem ao discor-rermos a proposito de Carlos Gomes.

    Aqui relembrarell)os, s, utn episodio anedoctico, que en1ine~tcmente significativo.

    Quando cm Portugal se soube que um litterato brazileiro, de nome arrevezado, Sylvio Romero, es-crevera e publicara uma e~pecic de historia da Pll'i-loaoJJ!tia no Brazil~ cm Portugal foi, aps o pas1no, um successo de gargalhadas. Ora isto? ! )) dizia-se s mezas dos cafs, nas palestras dos jovens curiosos de espirito. Co1n que ento: a philosophia do Brazil? Hein? Esta nem ao diabo Ie,nbra! Se fssc a carne-

    secca do Brazil, ou a feijoada do 1\razil ... ~\a%., a~\)"t~.,

  • 16 O HRAZII~ ?.IENTAL . --- ---------------------

    a philosophia do Brazil. Valha-nos Deus!)) E riam, jubilosos da sua sufficiencia.

    Com cffeito, o brazileiro tornara-se para o por-tuguez o typo de utn grotesco infinito. De longe se lhe attribuian1 todos os vicios, todos os dislates, toda a sordidez possivel e hnpossivel, de alma e corpo. Da-va-se esta coisa insensata: Portugal no totnava a s-rio o Brazil.

    Podia, mesmo, o Brazil aventurar-se nas te1ne-1idades de vastas guerras, como essa do Paraguay, que inflamrnou a 1:nusa patriotica de Tobias Barreto , e de toda a nova gerao poetica de Pernatnbuco . . t\.s sympathias, reaes, verdadeiras, sinceras dos por-tuguezes estavam com o Lopez. E o jornalista por-tuense Urbano Loureiro publicou uns pamphletos se-Inanaes, de irriso e tro~~a s glorias brazileiras, s suas batalhas navaes, aos seus ataques consceutivos de Hurnait. Inventaratn-se historietas picarescas, pondo etn duvida a capacidade, o mro botn-senso dos generaes brazileiros. Foi celebre essa do : Ba idea~ stJ Soares~ que rehahilitou um credito litterario. lnj ustatnente (pelo erro apreciativo, proprio dos con-disc.ipulos estudiosos, isto dccoradrcs) un1 rnoo ta-lentoso fra at ento conhecido pela alcunha do Bra-yuinlta Asneira. A chacota de Urbano Loureiro havia, de resto, tomado propores taes que o consul geral do Brazil cm Lisboa, Porto-Alegre, utn dos iniciadores do rornantismo no Brazil, julgou cutnprir-lhe intervir. Escreveu uma carta ao desabusado satyrista tripeiro, c1ue d'ella fez a base d'utn folheto caustico ~ontra o

    J~razil e os seus nacionaes. Apropriou-se u1n titulo de .Alphonse Karr; e.hatnou-lhe Unt punhado de verdades.

  • O BBAZIL liENTAL 11 --------- - - -------------

    .

    (Juando o hnperador veio

  • ts O BRAZIL MENTAL ------------- ------------------

    servir-, ousou Inanifestar o seu desgosto e no se deu a esconder o seu tedio.

    Accusaram~ de menos prilnr no trato, o que no deixava de ser certo. mas o que se explicava c desculpava face do motivo que assignalamos. Quan-do, finalmente, elle se despediu com o deploravel in-cidente da recusa do pagamento da conta da estala-gem, por a achar salgada, ninguem reparou na cy-nica explorao da estalajadeira, n1as todos os olhos se fixaram na figura triste d'um tam grande principe regateand.o miserias de azeites e vinagres.

    Emfim, foi um desastre pezado essa viagem in-genun; e ella mais confirmou a presumpo, j radi-cada, cerca do Brazil e dos brazileiros.

    J radicada dissemos; nada contribuira para esse effeito co1no a longa no v ellistica de Camillo Castello Branco. O personagem central dos seus rotnances, aquelle roda de quem gravita. todo o systema da aco : o brazileiro. D'aqui, procede, 1nesmo, certa monoto-nia, que a critica, nas horas co1nbatentes, se no es-queceu de lanar em rosto ao mais significativo re-presentante do condicionalismo subjectivo portuguez n'este nosso tempo de agora.

    Por !869, o snr. Luciano Cordeiro exercia a ana-lyse no sentido pretencioso e infantil do mestre-escho-la, que offerta coras ou d palmatoadas. Estava-se na eoncepo primordial, que Gustave Planche consubs-tanciara na integra e1n Frana modernamente. Ellc era, positivamente, quem dava as cartas. Ora, justifi-cando o que considerava um dos grandes defeitos de

  • -.-.:- .. -

    O BRAZIL MENTAL 19 --------------------:-----

    Cainillo, j ento, no seu L-ivro de critica~ notava elle que diflicil seria encontrar obra do romancista Dli-nhoto cujos caracteres no con1prehendessem prhna ..... tialmente o ricasso, labrgo, cynico e co~mendador.

    Reputa Luciano Cordeiro este typo falso: cha-ma-lhe O pseud_o-brazileiro.)) A mesma intuio teye mais tarde o snr. Luiz de Magalhes, o qual foi betn longe. Cahiu na ingenuidade opposta. Pretendeu rc-habilitar o typo do brazileiro. Para isso, escreveu nn1 romance .. de these, com exterioridades, de dialogo e descripo, naturalistas; no fundo, o que os russos chamam uma obra de tendencia.

    Esta novena, mais falsa ostructuralmente do f(Un as suas antagonicas, , conto ellas, em sua genera-lidade representadra, tam insignificativa e impto-vante como as outras. Intitula-se O brazileiro Soa-

    - rea~ e ten1 un1 prefacio de Ea de Queiroz, cautelo-&amente parco de enco1nios. Co1n ardil jesutico, ro-togia-se no conceito moralista; no diz ao auctor

  • u RRAZIL MENTA I. - - -------------------------

    uunuoravel nuutero das Farpa~ que (com. o snr. Ra-uudho Ortigo, cuja collaborao n"esse fasriculo de-Yt~ ser pequena, se alguma , mesn1o) consagrou digresso do ilnperador pela Europa .. particularmente na sua passagem por Lisboa.

    O nosso brazileiro-assiiu lhe ehatnamos, porque Jlfllt.Yo ~eja. Nosso, pela origem, pelas inclinaes, pelos

    eustutues. E o portuguez repatriado. E o torna-Yiagein. Portanto.-no discutindo por agora a ,-alia pes-

    soal .' u effeito sorial desto t'letnento das nacionali-dadt\s portuf(neza e brazileira-, a ironia. quer fun-dada qu~r erronea .. passa de lado do brazileiro, no o attinge. no o toc-a .. no lhe entbarra sequer. Porque n hrazileiro . naturahnentc, o brazileiro legitimo, o hrazileiro-natu. aqutlh~ que, pela tue ( raran1ente pelo

    JHit~ ). pt~rt(~nre i\ tPrra brazilcira. ( )rn. PStP. dt~~u'onhPrh.uuol-o n~ . .:\l~utuas vezes, to s, destaeuu cn1 frente da

    nnssa rontpr~h~nsividade: tuas.. d"~ssas.. setnpre, re-Yt~~tiu un1 asperto que no nos torna,-a nada agra-da,pJ sua t'ontetnpla-o.. hPnl rou1u st' nos no fazia fnt'il seu t~-x.anu~. l ~tuas d\~ssas ft~itas. cllt~ ~ra temeroso llttra n~. eo1no quando st~ .. u-nrda,-a. Pll\ lugubre re-hatt'. n rPnlinist~Pntin d,ls insurr~i\"t""S anti-portugue-:1-as. tl tUllllt.. dt~ Nunt .. s :\laehadu t' a sua dedicaco

    ht'roit"a estJUiYa\-atn-st~-nos: tuas as fuziladas de Per-nanthurn ainda nns a~itav .. nn no sohrt~salto de que

    pt~rdPsst'lll a partida as tropas tit~is ao ~overno consti-tnitln. t~ tJUt~ para os nnssos eontt~rrant~os. alli residen-l's. 1"\']ll"~s,~nt.aYant a Jlarantia da sP~uran-a. Outras

    ',~7.l's. a lhlstilidatlt~ aprt~s,~ut ... l\.,1-St' Jnlh .. nte c aberta, ,.,,no 11os IIJoru'llhls r .. ~ .. ,.,~n\t""S ,\a \'"''\''\~a\\da desca-

  • O BRAZIL :'\lENTAL ~ --------- --

    ....

    bt~llada do ~err tnaratista quf~ redigia a Tribunn du Par. Sl tnto (' tnc appareeia1n!' tinlidantentt\ nas nossas livrarias folhPtos conccrnent~s aos hrazil~iros-brazileiros, suas aspiraes, juizos, vicios e '~ir..:.. tudes. Cotuprehende-se que, na angustia do lanet' apretniantP, o retrato no fssc favorPcido ~ e entPn-dein-se os clatnres de alarnte, soltos pelo snr. Gonu~~

    Pt~r(~heiro, por cxetnplo, quando do insulto. da ban-deira portt1gucza, arrastada pela lauta das ruas!' rn-tre uivos de assoldadados capangas.

    ~las, logo passada a crise, tudo volvia (t indoh~n'~ia consuetudinaria ~ e nin~uern se affii~ia por apurar. afinal, quetn era e o que pensava esse btazilciro, a cujo uggrcgado politico a rhctoriea dos scrntns rlP gala adregara eha1nar, donrle a onde: a naito irn1it. Fali ar brazileiro, era ntau. ~las pensar hrazileiro, POinn de algue1n que de l voltara se lautcntaYa algtutn que c~i ficara, era p~ssimo.

    Quanto aos portuguezes quE~ de vez tornavant do Brazil, no esereviatn tontos de viagE~ns. Erarn ho-Jnens do trabalho, que regressava1n a rlescanar dn longos annos de utn labr indefnsso. l\ sua obrigaro no era n~gor.iar r.urtapaeios. E os Jitteratos, de con-dio ou profisso!' que ia1n ao Jhazil: por via, dn tE~gra, por l'i se dcixavarn ficar. ()uo isto de n1orrer dt' fonte pelo gaudio de pingar borres do tinta subrf' quadrados de alnu1sso s seduz quen1 (~ irreductiv~IInente tnaluco, solerune n incnravPl. Por li se deixa-ram ficar, pois, ~rn~sto Cibro, .A.ugusto En1ilio Za-luor c n Inais t~rnin~ntE~ de todos, o eonsnlhPiro .los' Feliciano de Castilho Barreto e Noronha.

    De 1oodo (1ue a inforuta~o pertnan~~.\.a \'\\.~\\\\\-

  • 2! O BRAZIL MENTAL

    eiente. No lhe -corrigia1n os defeitos aquellas obras que, apezar de suas qualidades, se resentiam dos pre- . conceitos j levados d'aqui, como o volume No Bra.-

    ~~~~ do snr .. Silva Pinto. S nos nossos ultimos dias que principia a brotar um genero que at hoje era ilnpossivel : o de livros cerca do Brazil que no des-obedeam aos tnandados da simples justia impera-tiva. Ainda ha pouco appareceu o opusculo do snr.

    ,

    .J oo Chagas, i;ntitulado: De bond. E precioso de li-geira vivacidade; chronica despretenciosa e corren-te, dissimula um grande serio, que faz o seu fundo. A sua leitura, prompta e facil, impressiona, aliaz, pelo

    ,

    incisivo dos conceitos. E um folhethn que diz algu1na COISa.

    Entrementes, pois que s agora cotneamos a c.o-nhecer o Brazil, temos vindo phantasiando u1n Bra-zil de conveno- nada attrahente, valha a verdade. A culpa era nossa; poisque o typo do brazileiro, se o no creamos, o defortnamos ns.

    E aqui se consigne o erro do snr. Luciano Cor-deiro, quando parece suppr produco exclusiva, o da s responsabilidade de Carnillo Castello Bran-eo, essa figura do brazileiro, cuja repetio no qua-dro o embaraca e aborrece .

    Nada mais inexacto. O brazileiro dos romances de Camillo Castello Branco corresponde ao que, na technica das peas de theatro, se chama o centro dratnatico; eU e constringe o nodulo da aco.

    Porque? Porque seja que1n tenha o desfecho das crises na

    rno, sendo o detentr do sentido economico da pea. ~~lle o homen1 do dinheiro. e nenhu1na apostrophe

  • O RRAZIL 1\IENT A I. 23 -------------------------------------- ----

    tam verdadeiru P eterna~ como o verdadeiro, eterno Mephistopheles:

    Dio delfo;o, del rnondo signor!

    Assim, considcrr-se a vivida interpretao da fervilhante cotnedia humana moderna. Realisou-a a sagacidade critica de um Taine, desde que estuda Balzac nas camadas profundas do seu talento inqui-sitivo. Retenha-se a hnportancia que elle attribue ao dinheiro na confcc~o do drama actual; note-se o c!uidado que pe no desenho dos seus avarentos, um t.iobseck., um Grandet.

    Objectar-se-ha, porm, que estes no constituem e lasse social parte; no forma1n, por asshn dizer, nacionalidade na nacionalidade. Mas esquece quem tal allegue a figura proeminente de Nucingen, des-tacada n'utn departatncnto to parte que a algara-via insonte do seu francez tudesco torna quasi im-ntanuseavcis os livros por onde elle perpassa.

    Figura de chave. em romance de chave, Nucin-gen, ou o baro ltothsehild, representa o judeu afran-cezado. No sentido de possuidor do capital, tam s, Hotenda-se,- o f(UP signit1ca o judeu em Frana significa-o o brazileiro em Portugal. Elle , pois, nota indispensavel no agcncaiamento da novella portugueza ~ontetn poranea.

    E no exc.Iusivarnente na vida Ininhota, como o pretende o snr. J4~a de Queiroz, illudido pela prefe-rcncia do dotnicilio. tuna ''"ez aqui fixado o brazileiro. Essa preforenria detertnina-se, com rigr, pela origetn da procedencia. Ctnntudo, na contnua ahsorQo f\.UO

    _.j

  • 24 O BRAZIL MBNT.AI#

    as cidades exercetn sohre as aldeias, o brazileiro tend~ tambem a deslocar-se para os grandes centros. O snr.

    J4~a de Queiroz falia patuscan1ente da syn1pathia d'el-le pelo l>edro Alexandrino, casaro amarello ao caes do Sodr, onde, em ten1pos idos, havia urn hotel, fre-quentado, de escQlha, pela gente que etnbareava ou desctnbarcava, visto ficar alli perto, a geitn de partir. O Inesrno snr. Ea de Queiroz, nos 1Jiaina, allude, d(~ passagen1, rapidan1ente, mere do escabroso da si-tuao,

  • O RRAZII., ~~E~T A L 25 ----- ------- ---------- -- --. - -- - .... -------. -

    c~asar, pois t[UC nlle que_ pdt"' disp,)r do dinheiro necessario para levanta~ a charulu .

    . \ssirn o annuncia, lof!O de rotne~~o, o enthusiasta . .\prigio Fafes :

    J>a1a a de.flpe:a do therrtro HOl:o O dinheiro rne empresta nteu con11Jad1e, fJ gJande A1tht.u Jligode:~, que na (rota Veio ha 1>ouco tlo Rio, e vent l'otettte,

    Tra~ infindo dinheiJo, JJfll)apaim~, .11d,tu e bugio . .;: tra: n1 il cou:~as.

    Pela sua idade, polos seus haY('res, pela sua con-~cquente respeitabilidade soeial, o rninciro o tno-ti,-u du entrec.ho; por isso, justantente, na vida fa-

    '~thia da irnaginao thcatral, o po,~ta o prope (~ aponta para barbas, que eru a designa~o coeva do nosso centro aetual. l\tlas aqui a Yuidadn do hrazilciro, 'fue se no quer sentir, Inuito tncno~ rcronhcccr, ve-lho .. rcag(\ pruYot'a a desordetn, destnaneha todas as eotnhinaes, tollu~ndo, egoisti(atnPnte! a renovao do

    th(~atro naeional. O rotnantis1no accentuou o traro raricatural.

    OriPnta-nos, no eonceito critico, o folhethn por Alrnei-da (.7arrett votado ao desenho do personagem gro-tesco e da situaeo cotnica de O brazileiro e1n /.;isboa .

    Na sua rndaern definitiva, ficou etn frtua de carta, es(ripta .. da (~pital lusitana, por uu1 hrazileiro

  • 26 O BRA1.1L MENTAL - -- ----------

    ...

    incorrigiveln1ente subsistindo no b razileiro) perma-nece fixo durante toda a sua carreira litteraria. -Ainda no termo e ao cabo. Assim, no capitulo m do ro-tnance Helena, que ficou incompleto, por morte do escriptor na epocha em que o andava elaborando, l-se o nome de Spiridio Cssino di Mello i Matoss, farolamente abrazileirado. o preto mordomo, que teria import~nte papel na parte romanceada. Ora, o tnais curioso que aquelle nome exquisitorio no pertence inventiva de Garrett; elle o tomou da realidade. Com effeito, o Dicc'ionario }Jopular, diri-gido por Pinheiro Chagas, traz no Jogar idoneo:-lJiello e Mattoa (Cassiano Espiridio ), n1agistrado bra-zileiro.- Ao lance, no parece a Gomes de Amorim que o acaso collaborasse tam admiravelmente na obra do poeta, para dar dois nomes eguaes. Explica que certamente se namorou o auctor da combinao, ado-ptando-a sem malevolencia )). De seguro; mas no sem malignidade.

    11arece, pois, face do exposto, que no se pde exigir u1na doculnentao litteraria mais completa da permanencia do typo brazileiro entre ns; mas o snr. Ea de Queiroz erra, por fr1na diversa, quando lhe imprime uma generalidade que elle no comporta. Assim, na sua espirituosa monographia do brazileiro, o humour)) do redactor capital das Farpas extravasa. Por um exaggero de itnaginao logica, proprio das nossas raas hypcrbolicas, elle insinua que a gargalhada COm que acolhelllOS O bra-zileiro foi ta1n clamorosamente estrepitosa que se ouviu por essa Europa fra. Um ta1n grande riso cha1nou as attenes cos1nopolitas. Repararan1 e ri-

  • O BRAZIL MENTAL 27 ----------------

    ratn logo, ta1nbetn. J)e modo que c1n ~.,ranca, ctn Hespanha, em ltalia, o Brazileir~ penetrou triutn-phantemente, de guarda-sol azul e1n rolo e chapcu na nuca, entre uma hilaridade pasn1osa- na regio dos grotescos. E o Brazileiro tornou-se asshu para a raa latina, essa caduca sabia da ironia,- o deposito do riso. Com efleito. O riso communicati,ro, e a ex-pansibilidade do escarneo promove a intitao, certo.

    f) peor que tudo isto radicalmente falso. () snr. Ea de Queiroz confunde. o brazileiro, d~

    interesse restricto, com o an1ericano, que utua cu-riosidade universal. No seu typo yankec, que o antericano feriu, pelo seu mercantilista utilitaristno. H)-pertrophiando ainda os traos antipathicos da phy-

    ~innoinia ingleza, o atncricano irritou; a propria ca-ricatura indignou-se. O riso azedou e a co1nedia de-rimiu em satyra quasi pessoal, co1n etiquetas e en-dereos, laia classica aristophanesca .

    ... l\lguns escriptores dra1naticos inquietarant-sn eutn o inaproposito do Oncle Sa1n~ de VictoriBn Sur-doli. As opinies politicas do auctor desagradavan1, pelo seu tom carregadatnente reaccionario. Assiln, as censuras choverarn, inflingidas ao leviano franrez, o qual poderia concorrer para desviar as raras affci-es que ainda qucdavatn restando, etn seu infortu-nio,

  • O RRA7.1L )fi!NT A L ---. - - - --- ------- ------ --.---

    ~a sua c-ullahorao cryptoninta da r;e Pari-'~;,.,,,,. TainP no olvidara d~ flagellar o materia-listnu da C'ondi~o ntoral dos yank.e~s:

  • O BRAZU .. MESTAL 29 ----- - -------- -- ---- ------- --------

    (~ularista distingisse o conceito colleetivo e que a Ino-derao do tom, no juizo esthetico do aincricanisn1o, de causa sin1ilhante ou analoga deri\:.e. Tcn1os o typo de Clarkson, que ~c encarrega de dar sanco theo-ria, de sciencia phantasista, explanada co1n respeito aos vibries por J)utnas filho, nas incongruencias da sua ulthna 1naneira. Tetnos a improvisao bonhotn-tnica do Tio da Atnerica_, etn que Julio Vcrne en-contra a situao da fa1nilia portugueza cotn o bra-zileiro.

    Como quer que seja, c revertendo ao ponto-de-partida, o brazileiro que a nossa litteratura dchuxou no o brazileiro que nos in1porta conhecer. llouve aqui erro. E o que curioso que tanto se cnga-narain os portuguezes natos, talhando a carapua, con1o enfiando-a os nati,istas brazileiros, em cujas cabecas ella no entra, aliaz .

    Assiln, quen1, tnn ba-vcrdadc, tinha raso de se irritar con1 os sarcasn1os da litteratura, alfacinha ou ntinhota, era1n os portuguczes da colon.ia, poisque para elles, quando de regresso, que as chufas se

    re1nettian1~ Tal a contradico das .coisas!, esses tran1 quetn applaudiu e transportou, 1nais tarde, o tinr. Ratnalho Ortigo e1u triumpho pelos gabinetes de leitura c clubs de gytnnastica, entre salsifrs e alteres.

    Que1n se irritou, sob syn1etricn contrascnso, f-rarn os brazileiros-natos.

    lndignara1n-se, ao 1nais alto ponto; excedcran1-so e1n invectivas; fran1 coutiros, na dcspropor~~o de uas arrentettidas; prestaratn o caehao

  • :10 O BRAZIL )IENTAL

    tnctteu recebei-o, na praia de Pernambuco, com un1 eip de Petropolis. Como aquell'outro Thomaz Junior .. que, na substituio brazileira de Filho, outhorgou o nome s offensivas cabriolas obscenas do azedu1ne. de Canlillo Castello Branco.

    -E que, povo novo, com toda a frescura primave-ril (o mpeto, a confiana, o orgulho) o brazileiro no supporta a ironia. Magna-se, como d'uma grave in-

    , -juria, pela mais somenos brincadeira. E ingenuo e altivo. E, pois que a adolescencia seja o tempo do bu-o, para os indivduos como para as naes, o Bra-zil , um pouco, pelludo. D sorte ; encavaca, zanga-se. E logo lhe acodem, em replica, as palavradas, punhos eerrados, ameaas.

    Isto que prova? Que joven e que te1n brio. llonra lhe Seja.

    No theorisamos arbitrariamente; crticos, subtis f~ argutos, de nascena brazileira, deram f d'este pe-euliarismo da idyosincrasia moral dos seqs compa-triotas.

    Assim, n'um dos numeros, recentes, da ultima serie da Revista Brazileira~ o snr. Jos Verisshno verifica que a ironia, como o humour , mais ainda talvez que elle, estranha indole brazileira. Ge-neralisa e explica em como a ironia insupportavel ao brazileiro. A ironia, define, o insulto do civili-sado. Por isso, conclu~, as naturezas primitivas, ao invez do que se suppe commurnmente, so extraor-dinariamente sensveis ironia. Incapazes de lhe conl-prehenderetn os matizes, a sua sensibilidade exagge-ra-lhe os intuitos e o alcance.

    Postas, assiJn, as coisas, comnrehende-se corno

  • O RRAZIL l\IENTAI. 3t -- ---- ----- -------

    inoffensivas boutadea de folhetinistas lisbonenses se transfortnassent em coisa grave e sria. V-se por que fsse considerado aggress~s forn1aes o que no passava de debiques, mais ou tuenos aprin1orados no gosto. E entende-se o motivo d'un1 corollario pessi-mo, o qual consistiu em distanciar n1ais a Inentali-dade portugueza da b~azileira.

    Cotn effeito, os nossos irtnos de al1n-tnar co-tnearatn de antipathisar comnosco cordealmentc. l"lais francos, no occultaran1 a sua hostilidade. l)ro-clamaratn-nol-a rudernente, se1n anthages. No care-c-eram de procurao; no nol-o n1andaram insinuar por outros. Disseram-no l-o carrntent ~ na bochecha .

    . A.s novas geraes extre1naran1-se, ento, no des-prezo, que timbraram de exhihir, por nossa especula-o esthetica, philosophica, critica. Pagara1n-nos de desdens ~ orgulhara1n-se de nos dizer coisas feias; c. ('Orno crcancas atnuadas, dram em nos cha1nar no-

    Ines. Despicaram-se, no tem duvida nenhun1a. Na Inultiplicidade dos seus desconnexos ensaios.

    atravez dos quaes a educao precipitada de u1n cs-pirito poderoso se vae contradictorian1ente operando~ uma caracterstica ha que e1n Tobias Barreto se no

    ,

    desn1ente. E o tedio pela cultura portugueza; affecta se1npre uma soberba repulsa pelos grandes no1nes da nossa evoluo litteraria, ainda pelos cuhninantes.

    Resulta curioso, como modelar exen1plo, o estudo ccrca da reedio dos OjJuaculoa de Alexandre Het-culano. Elle tem a data de Julho e l)ezenllJro de 1H7H

    f~ pertence colleco subordinada ao titulo genericu de Enaaioa e estudos de phllosopll_ia e critica ( pri-meira Jivrao )) (si c), segundo o abOl\\\n.a:~~\ \\\\.\\\-

  • O BBAZII4 MENTAL ________ _. ----

    chnno brazileiro ). Coincide cotn as analyses congc-neres portuguezas, de Ramalho Ortigo, nas Farpa.a; de Thcophilo Braga, na Biblioyrapltia critica de hia-toria e litteratura~ dirigida conco1nitanten1entc co1n Adolpho Coelho. Nada adeanta, cm sua facil dotnons-trao das contrariedades insanaveis do espirito de .Alexandre Herculano, pquco apto dialcctica. Sua cultura, como seu entendimento, .era essenciahnente, de transio. lVIas o que significativo o ntalevolo e1npenho com que o brazileiro procura revelar que o portuguez no ~~ un1 historiador digno de perten-cer

  • O BRAZIL MENTAL 33 ----------- ----- -------- --

    ingenuo do dizer orgulhoso, poisque elle, Schrefer~ que conc

  • "

    34 O BRAZIL l\IENTAL

    Aqui, ha dois erros. O primeiro -e fundamen-tal- consiste em despedir a competencia d'um his-toriador, porque elle no seja um certo genero de his-toriador.

    No queremos acreditar que Tobias Bari'eto re-cusasse entrada no concilio . dos divinos ao inglez Hallam - poisque, guarda-porto do Olympo, car-rancudo, ao guichet, reclame as senhas.

    E, todavia, onde, na obra de Hallam, encontra-renlos os retratos de Carlyle ou as scenas de con~ juncto de Macaulay? Um historiador colorista e nar-rativo como Thierry pde acaso medir-se pela craveita philosophica d'um Guizot? E a energia evocatriz de

    Michelet no . d~ferente coisa da habilidade vulga-risante de T)liers ?

    Depois-o segundo erro. Para fazer o retrato dfl Sylla, preciso que pouse deante de nossas reminis-cencias Sylla. Mas se no fr o .ensejo de retrata Sylla? Caso .Mommsen tivesse de desenhar Joo Fer-nandes, as suas paginas vibrariam, na nossa retentiva romantica, com a intensidade de que vivem as que a Cesar consagro? Ora, onde tinha Herculano, para no 1narmore sagrado lhes talhar as estatuas, os Lutheros e os Carnot? As figuras que desfilavam por deante d'elle no exhibiam mai_s que as mascaras exiguas de principiculos medievaes, de solarengos anonymos quasi, de bispos esquecidos, n1esmo data de suas faanhas- ignorados.

    Todavia, quando algurna personalidade d~ rnaiS. poderoso relevo destacava, no lhe faltavam na pa~ leta tintas. Que o diga a letnbrana do fundador da

    monarchia. At, aspero e abrupto, de admirar corru~

  • III . '

    O Bl\AZlL MENTAL 35 -------

    a Hereulano no escasseia1n as meias cres, para eu-brir as physionq1nias pardas, equivocas, que se es-~oam, qual essa do negocia~or Duarte da Paz, na Historia da Inquisio.

    :\las Tobias Barreto no buscava desinteressarla-lllcnte a verdade. Apaixonado, proeedia para conellt-so j predeterminada .

    . A.ssim, cascalha da preteno que, assevera, ti-nha Alexandre Herculano de ser cm sua terra o que foi na Allemanha Leopoldo Ranke, isto chefn de escola, mestre insuperavel.

    .A.ttenta a miseria da nossa der.adencia, no prln dizer-se, infeliztnente, que Alexandre Herculano fss~ chefe de escola, poisque raros discipulos logrou. To-davia, no desaproveitados, de todo.

    Se de Rebello da Silva no mereeem contar-se st~no os dois ultimos volun1es da sua Historia e a sua~ \t&liosa, Me1noria sobre n agricultura~ em nossos dia!-\ .. compensando, appareceu utna d'estas composi~es capitaes que no deshonratn os modelos c enobrneeru a epocha em que surgem. Referimo-nos Historia da administrao publica~ do snr. Gama Barros, trabalho para nossa vergonha, mais conhecido e justatn(~ntn reputado e1n Hespanha do que entre ns. D'elle .. to-davia, com acerto disse Oliveira 1\lartins que nan livro digno de h9mbrear com os do grande Hnrcn-lano, e que por signal seria impossvel fazer so u nosso historiador no tiYesse desbravado o campu.)l Por isso, memora como tributo de respeito >l essa obra fundamental.

    De resto, o desastran1ento de Tobia~ \\\\"t'"'"\.\' avulta co1npleto; poisquo, d'entre todos \)~ \\.\%\'-'"t\\\.-

  • 36 O BRAZIL MENTAL

    dores allemes contetnporaneos, vai, para, e1n doloso confronto, amesquinhar Herculano, ~scolher precisa-rnente aquelle que m3:is affinidade offerece com o nosso portuguez.

    Visto que parea qui exaggerado encomio o que en1 nossa bcca no transcende os limites da vulgar equidade, buscaremos em estranho juizo a confirma-o do que allegamos.

    Assim, com effeito, um critico britannico, tractan-do de caracterisar Jo alto particularismo do talento de Herculano,.de quem que o approxima, para que o leitor, desprovido do conhecimento do idio1na por-tugez, o possa aferir? De Ranke, exactamente.

    Diz elle, fallando das influencias exoticas no es-pirito de Herculano: ~.. in late r life h e was attra-cted to the new Ger1nan School of historians foun-ded by Ranke; and perceived that his thrue vocation was scientific history. Seguidamente~ ju,lga do 1nodo eotno Herculano realisou sua vocaco. Escreve:

  • O BRAZIL liENTAL 37

    at1ctores allen1es, na epocha presente, e em artigos consagrados ao desenvolvimento historico de Portu-p:al, sob as suas diversas relaes, demonstrem no eonhecer os trabalhos de Herc.ulano, deixando de tnencional-os ao lado de outros, pertinentes ao as-sumpto.

    espantoso. espantoso que esta carencia d._~ ,_~itao de Herculano prove contra Herculano e no prove contra os allemes. Como se no diccionario po-litico de Bluntschli, no artigo Brazil_, se no citasse

    ,

    \"'"arnhagen e isso provasse contra 'rarnhagen. E es-pantoso, realmente. Ou, antes, no , desde que Tobia~ Barreto estranha que, n'un1 artigo sobre Pombal, no apparea citado Herculano, que no possue trabalhn algum cerca de Pombal. Herculano cerca de Pom-bal! Por que carga de agua? Por mr da Inquisio? Mas a historia da Inquisio de Herculano s tracta . de sua origetn e estabelecimento em Portugal. Ent:1o por que seria que o snr. Bau1ngarten, que pelo non1e no perca, se havia de desvairar, cata de forragca-mentos impossveis, pelos Ineandros herculanescos '?

    No. A questo outra. O que in1porta qut~ fique be1n estabelecido que ao no1ne de Herculano no quadra o acatcnnento das novas geraes bra-zileiras.

    Por isso, o con1panhciro, dissidente discpulo e amigo dedicado de Tobias Barreto, o snr. Sylvio Ro-Jnero no hesita perante o 1nau-gosto de confrontos (~Om illustraes congeneres brazilciras. O norne que. naturalmente, lhe acode o de ~,rancisco Adolphu Varnhagnn. Em cada tne sopeza os rneritos. Balan-cea. :\las a "-erdade por tanta maneira \\a~tan.\~ \\"-'\

  • 38 O BRAZIL MBNTAL

    lht~ no resta seno ceder. Bate e1n retirada, porut tesalvando.

    Declar~: Si ( como elles escrevem), si a Hia-to ria do Brazil de Varl}hagen no comparavel 1/iatoria de Portugal~ Herculano, por sua vez, nada possue que se possa comparar ao trabalho do nosso historiador: Lea origines touraniennea dea A1nericains Tu pi Caribea.

    Pois, apezar de tudo, no primeiro volume da sua 1/iHloria da litteralura brazileira., o mesmo snr. Syl-vio Rotnero combate a theo~ia que se encontra ex-

    . pendida n' essa obra, a qual reputara, aliaz, magnifica. Ahi accusa o snr. Theophilo Braga de a haver plagia-do, quando certo que, no capitulo em o Parnaau JJOrtuguez consagrado ao I yrismo brazileiro, o illustre professor lisbonense, por duas vezes, que no . uma, se reporta ao trabalho de y arnhagen. Seria talvez de lhe no citar o nome, resto da anhnadverso an-tiga, quando a vaidade hierarchica do historiador brazileiro provocou o justo riso do critico portuguez, quo ___;lhe no tinha dado

  • . - -

    O BRAZIL MENTAL 39 ------- ----------------------------

    havo sim, 1nas cah.\nlnia tambem) de que o Crinte do l 1t:zdre An~aro no passava de uma traduco da Faute

    -tle l,abbt! Nouret., de Entile Zola. No se ficou por ahi. Accrescentou que 9 para1~so do Primo Bazilio, bniuca do Bairro-... .c\.lto em Lisboa, casa-de-passe infe-ft.--:t, era a reproduco do paradou., cheirosa flores-ta, rniniaturando uma edio-diamante do Paraso ge-Ju~sico. No se ficou ainda por ahi. Declamou contra a hnmoralidade indecente da scena da sensaco no-

    ,.a. Mas no se recordara da escandalosa orgia em JUO a Luciola de Alencar se degrada tanto cotuo no

    s~ permittiria jmais a mesma Fanny de Feydeau . . A.ssirn, quando appareceu a Patria., de Guerra

    .lttnqueiro-se da vulgaridade do quadro de costu-nu,g licito reYoat para as zonas transcendentes da t~popa.

    A profunda significao d'esse livro escapou in-tt~iramente aos crticos brazileiros. forca de tnali-

    gnidade, chegaratn a ser sandeus. No conseguiran1 C"unfugir da tnediocridade dos reparos propriamente

    ~unstructivos, plasticos, de technica e carpinteira-J.Cf~m. Ficaram, irreductivelmente, Iitteratos. Fal-tou-lhes a emo~o moral, que, unica, as torna intel-ligiveis, a obras d'esta alta categoria.

    A.ssi1n, o que, a proposito do poema ntaravilhoso ele Guerra J unqneiro.. se perrnittiu escrever o snr. \" ulenthn de Magalhes foi, inteiratnente, deplorando. Jt~lle, na sua futilidade de janota da rua do Ouvidor, no percebeu o inunenso alcance, historico e politico. da ideao _ do poeta. R.. todavia, certa obrigao. 1nai6rmente que os sBus eonterraneos, tinha para is-!40. aps u1na rt~-.';P- que inutil 1nas recen\~ \)\".~~.~~\-

  • '

    I

    40 O BRAZlL MENTAL

    nao pela terra lusitana, que fra a de seus paes. De resto, o .simples prodigioso successo-de-livta-

    ria, em Portugal alcanado, pela obra. de Guerra Jun-queiro-successo que no deveria ser, por certo, ignorado no Rio e que demandava uma explicao-o tinha de elucidar, a elle, pseudo-critico, prompto na invectiva e facil em ricanar.

    Ora, esse successo foi, na verdade, tam vasto que elle constituiu uma fulminante excepo. na mo-dorra tradiccional do nosso mercado.

    -E interessante e ensinativa a coincidencia; tes-:; temunha .do avance do esprito publico. Foi um d~ comento de psychologia collectiva muito par~ orgu-lhar a faina d'aquelles que, por diversa maneira, se tinham atlli empenhado em pron1over uma con-sciencisao crescente do juizo popular.

    Fra o caso que, havia trinta e quatro annos, um triumpho analogo no negocio de livros se consum-mara no balco da lusitana livraria.

    Deu-se quando do apparecimento do rotnance=-poema Dom Jayme~ de Thomaz Ribeiro, livro Inenos que Inediocre, como factura artstica, e lastimoso, en-to, como thema concepcional. ' Era urna emphatica declatnativa contra o jugo castelhano dos sessenta annos, sem verdade historica. O auctor esquecia, consoante em geral ainda acontece!' que ns nunca estivemos annexados consubstancial-mente Hespanha, 1nas, to s, constituimos con1 ella, segundo os co1npromissos das dJrtes de Tho-mar, uma especie de dualismo politico, sob a simples unidade da dupla cora em uma n1esma cabea, con-

  • I ....... .,

    O BBAZIL !\IBNTAL -11 .

    --

    tor1ne SlU~(~edc hoje co1n a Sueeia-Noruega e c~orn a .-\ustria-Hungria.

    Conto realisao csthetica, o poema no podia ser un1 doeutnento 1nais desgraado da deca