Estudo Estrutural de Polímeros – I – Fundamentos Teóricos · mecanismos de polimerização....

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Estudo Estrutural de Polímeros – I – Fundamentos Teóricos Maria Aparecida da Silva Prado e Elaine Rose Maia Laboratório de Estudos Estruturais Moleculares,Físico-Química, Instituto de Química, Universidade de Brasília E_mail: [email protected] [email protected] 1.1 Introdução: o polietileno O polietileno (PE) descoberto em 1935, despertou especial interesse devido ao baixo custo de sua produção e à diversificação das possíveis aplicações devido às suas propriedades físico-químicas, como baixa reatividade química, leveza, capacidade de adesão, alta resistência ao impacto, baixa condutibilidade elétrica e térmica, entre outras. A molécula de polietileno é formada por uma seqüência de monômeros constituídos por dois átomos de carbono sp 3 , ligados covalentemente a dois átomos de hidrogênio, em isomeria trans. Esta disposição espacial conduz à redução das interações interatômicas e, o polímero estabiliza-se em uma conformação conhecida como um zig-zag planar, tendo os ângulos de torção θ iguais a 109, 5 0 e ângulos diedros, φ , iguais a 180 0 (Figura 1.1). C C C C C C C C C H C H H H H H H H H H H H H H H H H H H H n Figura 1.1 - O Polietileno em zig-zag planar. Esta polimerização ocorre, normalmente, a pressão e temperatura controladas, em presença de oxigênio molecular. Condições adicionais podem ser adotadas com a finalidade de obter o Polietileno com características físicas diversas decorrentes das diferenças de regularidade em sua arquitetura e peso moleculares, as quais estão associadas aos mecanismos de polimerização. O polietileno é formado por regiões cristalinas e amorfas e o grau de cristalinidade é determinado pela relação de domínios cristalinos e domínios amorfos. Um dos modelos mais usados para explicar as propriedades de polímeros parcialmente cristalinos é chamado micela franjada, denominação proposta por Hermann, em 1930 (Figura 1.2). Em seu estado semi cristalino, o PE pode ser representado por este modelo. A coexistência de pequenos cristalitos e regiões amorfas é representada por segmentos da cadeia polimérica perfeitamente ordenados em distâncias que correspondem a dimensão dos cristalitos.

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Estudo Estrutural de Polímeros – I – Fundamentos Teóricos Maria Aparecida da Silva Prado e Elaine Rose Maia

Laboratório de Estudos Estruturais Moleculares,Físico-Química, Instituto de Química, Universidade de Brasília

E_mail: [email protected]

[email protected]

1.1 Introdução: o polietileno

O polietileno (PE) descoberto em 1935, despertou especial interesse devido ao baixo custo de sua produção e à diversificação das possíveis aplicações devido às suas propriedades físico-químicas, como baixa reatividade química, leveza, capacidade de adesão, alta resistência ao impacto, baixa condutibilidade elétrica e térmica, entre outras.

A molécula de polietileno é formada por uma seqüência de monômeros constituídos por dois átomos de carbono sp3, ligados covalentemente a dois átomos de hidrogênio, em isomeria trans. Esta disposição espacial conduz à redução das interações interatômicas e, o polímero estabiliza-se em uma conformação conhecida como um zig-zag planar, tendo os ângulos de torção θ iguais a 109, 5 0 e ângulos diedros, φ , iguais a 180 0 (Figura 1.1).

C CC

CC C

CC

C

H

C

H H H

H H H H

HH

H H

H H

H H

H H

H H nFigura 1.1 - O Polietileno em zig-zag planar.

Esta polimerização ocorre, normalmente, a pressão e temperatura controladas, em presença de oxigênio molecular. Condições adicionais podem ser adotadas com a finalidade de obter o Polietileno com características físicas diversas decorrentes das diferenças de regularidade em sua arquitetura e peso moleculares, as quais estão associadas aos mecanismos de polimerização.

O polietileno é formado por regiões cristalinas e amorfas e o grau de cristalinidade é determinado pela relação de domínios cristalinos e domínios amorfos. Um dos modelos mais usados para explicar as propriedades de polímeros parcialmente cristalinos é chamado micela franjada, denominação proposta por Hermann, em 1930 (Figura 1.2). Em seu estado semi cristalino, o PE pode ser representado por este modelo. A coexistência de pequenos cristalitos e regiões amorfas é representada por segmentos da cadeia polimérica perfeitamente ordenados em distâncias que correspondem a dimensão dos cristalitos.

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Figura 1.2 - Representação do modelo micela franjada1

A mesma cadeia polimérica apresenta segmentos desordenados que compõe a região amorfa. Na região cristalina, as moléculas se organizam em unidades de cela onde a forma ortorrômbica é a mais estável (Figura 1.3). As cadeias, em posições paralelas na cela, são mantidas por interações de 20 ordem, do tipo forças de van der Walls.

Figura 1.3 – Empacotamento cristalino e cela unitária do Polietileno2

1.2 Conformação de uma cadeia polimérica

A compreensão da ciência de polímeros obedece a uma progressão natural, iniciando-se com a estrutura da cadeia e prosseguindo através da morfologia que conduz a um comportamento físico-mecânico. A estrutura física de materiais poliméricos está relacionada à macromolécula isolada (microestrutura) e à estrutura de agregados de macromoléculas (macroestrutura). A macroestrutura é essencialmente determinada pela microestrutura e esta é determinada pelas conformações sobre as ligações simples.

1 van Krevelen, D. W., Elsevier, New York, 1990. 2 Sperling, L. H., Wiley Interscience Ltd., New York, 1986.

3

A conformação de uma molécula é definida como uma das posições espaciais relativas adotadas por átomos ou grupos de átomos, através de rotações sobre as ligações.

φ

θ1

C1

C2

C4”

C4

C32

θ3

C’4

Figura 1.4 - Representação espacial relativa da posição do átomo de carbono C4

Na Figura 1.4, os carbonos C1, C2, e C3 definem um plano. O átomo C4 pode assumir qualquer posição relativa a este plano, descrita pela rotação da ligação 3 e definida pelo ângulo φ. Os pontos C’

4 e C”4 referem-se a posições do átomo C4, que são definidas pelos

ângulos φ = 0 e φ = π, respectivamente. Considerando o plano definido pelas ligações 2 e 3, a posição do átomo C5 (não mostrado na figura) é definida, em relação aos átomos C2, C3 e C4 por um ângulo φ2 a partir da rotação da ligação 4.

Deste modo, a conformação de uma molécula com n ligações pode ser definida por (n – 2) ângulos de rotação sobre estas ligações. Se a unidade de repetição apresentar segmentos sobre os quais a rotação não é permitida, a análise da conformação tornar-se-á um pouco mais complexa, mas pode ser descrita adequadamente, estabelecendo restrições a valores dos ângulos sobre cada ligação simples. Impedimento estérico ou de outra natureza sobre as rotações das ligações simples, restringe os valores que φ pode assumir. O número total de conformações que uma molécula pode assumir cresce exponencialmente com o número de ligações sobre as quais a rotação é permitida. Para valores de n muito grandes uma análise direta das conformações não é certamente possível e uma aproximação estatística deve ser adotada3. As propriedades físicas de materiais poliméricos estão intimamente relacionadas às características estruturais de suas moléculas e, em princípio, podem ser avaliadas pela média sobre todas as conformações da cadeia. Uma propriedade física que dependa da conformação molecular pode ser expressa como função de uma dimensão média. Uma quantidade que fornece uma medida útil da característica configuracional ou espacial de uma molécula de polímero é a distância r, entre os grupos finais de uma cadeia. Esta quantidade é chamada de distância ponta-a-ponta (distância end-to-end). Uma outra medida do tamanho efetivo da molécula do polímero é o raio de giração Rg

4. Considerando que a cadeia é um conjunto de elementos de massa, localizados a uma distância ri do centro de gravidade, o raio de giração é definido como:

∑∑

= ii

g m

mrR

2

2

i4 Bovey, F. A. & Winslow, F. H., Macromolecules: An Introduction to Polymer Science, Ed. Acad. Press, (1979).

3 Flory, P. J., Principles of Polymer Chemistry, Ed. George Banta Inc., Wisconsin, USA, (1973).

4

onde m é a massa de cada elemento ou segmento na cadeia polimérica.

1.3 Distribuição estatística das distâncias ponta-a-ponta

O modelo matemático de uma cadeia no espaço pode ser descrito como uma cadeia hipotética linear, constituída de ligações de tamanho l e o ângulo θ entre segmentos sucessivos, pode assumir todos os valores de 0 a π com igual probabilidade. O ângulo φ é igualmente irrestrito. Tal modelo é conhecido como cadeia livremente articulada. Nenhuma cadeia polimérica real conhecida se comporta, ainda que aproximadamente, como este modelo. Mas as propriedades estatísticas de uma cadeia real para a qual o ângulo θ é fixado e φ é restrito a alguns valores, não terão características diferentes de uma cadeia livremente articulada∗. Esta cadeia hipotética pode ser formada por um conjunto de n vetores de igual magnitude, porém de direção livre. O vetor r, de uma ponta a outra da cadeia, representa a soma dos vetores que, por sua vez, representam as ligações (Figura 1.5).

xl

Figura 1.5 – Representação vetorial de uma cadeia livremente articulada♦.

Inicialmente, considera-se a projeção da configuração em um eixo de coordenadas, por exemplo, o eixo x. Assumindo que cada ligação é capaz de escolher qualquer direção com igual probabilidade, define-se a média da componente x , como zero. No formalismo matemático tem-se:

( ) 0dlx lpll0 xxx == ∫

− l (01)

onde p(lx)dlx é a probabilidade de que a projeção esteja entre x e x + dlx.

Se coordenadas polares forem consideradas, com ϕ representando o ângulo entre a ligação e a direção x, então lx=lcosϕ. A probabilidade p(lx)dlx deve ser proporcional a medida do ângulo sólido das direções da ligação sobre as quais lx se encontra. Este ângulo é 2πsenϕdϕ e o ângulo total é 4π, portanto:

(02) ϕϕddllp xx sen21)( =

∗ cf. ibid ref. 4 ♦ cf. ibid ref. 3

5

e a eq. (01) pode ser escrita como:

(03) 0dcossenl

21l

0x == ∫− π

ϕϕϕ

O quadrado médio da projeção do vetor ligação é diferente de zero:

( )

3ll

dcossenl21l

dxlpll

22x

0222

x

xl0

2x

2x

=

=

=

π ϕϕϕ

(04)

Assim, a raiz quadrada média é dada por

3ll 2

x = (05)

Escolhida a direção x, a probabilidade de lx assumir valores entre x e x + dlx é W(x)dx. Se n+ e n- representam o número de ligações que contribuíram positiva e negativamente, então, x pode ser definido como:

3l)nn(x −+ −= (06)

Para valores de |n+ - n-| << n, a probabilidade para um determinado valor de x é expressa pela gaussiana:

( ) dxedxxW x22

21)( βπ

β −= (07)

lnln x21

21

2

23

21

=

(08)

Considerando os componentes do vetor r nas coordenadas x, y e z. Sabendo-se que W(x)dx é a probabilidade de x assumir valores entre x e x + dx, equivalentes expressões podem ser empregadas para a probabilidade, W(y)dy e W(z)dz, para as componentes y e z. Desde que n seja grande e x muito menor do que nl, W(y) torna-se independente de x. E, consequentemente W(z) é independente de x e y quando n for grande e x << nl e y << nl. O produto das propriedades separadas resulta na probabilidade W(x, y, z)dxdydz de que os componentes de r estejam entre x e x + dx, y e y + dy, z e z + dz.

( ) dxdydyez,y,xW22r

3

21β

πβ −

= (09)

6

Onde r é a magnitude do vetor soma, e representa r2 = x2 + y2 + z2

Se uma das pontas de uma cadeia livremente articulada estiver situada na origem de um sistema de coordenadas (Figura 1.6), permitindo a esta cadeia assumir qualquer configuração randômica, a probabilidade de que a outra ponta esteja no elemento de volume dxdydz é dada pela eq. 09.

z

dx dy dz

ry

x

Figura 1.6 – Configuração espacial de uma cadeia de polímero onde uma das pontas da cadeia constitui a

origem do sistema de coordenadas∗.

Se um grande número de cadeias poliméricas idênticas adotar a mesma origem, então W(x, y, z)dxdydz representa a densidade de distribuição das pontas destes vetores. A probabilidade ou a densidade depende apenas da magnitude de r e não da sua direção.A função desenvolvida na eq. 09 é mostrada graficamente na Figura 1.7. A posição mais provável de uma ponta relativa à outra é quando estas coincidem, isto é, a r = 0. A probabilidade decresce monotonicamente com r. A equação só é satisfatória para valores de r muito menores do que nl. A probabilidade de que r assuma certos valores, independentemente da direção vetorial, será dada por W(x, y, z) multiplicado pelo volume total de todos os elementos de volume, a uma distância r da origem. Este volume é dado por 4πr2dr e a probabilidade de que o tamanho do deslocamento da cadeia tenha um valor entre r e r + dr, independentemente da direção é:

W(x

( ) drr422

edrrW 2r3

21 ππβ β−

= (10)

Figura 1.7 – Distribuição gaussiana do vetor r A função de distribuição radial exibe um máximo a valores de r maiores do que zero,

como mostrado na Figura 1.8. W(r) será máximo para valores de r iguais a

W(

β1r =

∗ cf ibid ref. 3

7

(11)

Figura 1.8 – Distribuição radial do vetor r

Este resultado parece inconsistente com a conclusão de que a função probabilidade W(x, y, z), possui um máximo para r igual a zero. Pode-se evitar esta confusão através do conhecimento formal do significado destas duas funções. Se a origem das coordenadas é tomada como um dos finais da molécula, W(x, y, z) representa a probabilidade por unidade de volume, de encontrar o outro final da cadeia em determinado ponto a (x, y, z). Considerando-se um sistema com muitas cadeias, ν em número, W(x, y, z) representa a distribuição dos pontos finais e νW(x, y, z) representa a densidade ou o número por unidade de volume em x, y e z. Por outro lado, W(r) representa a probabilidade por unidade em r independente da direção. Obtém-se W(r), multiplicando W(x, y, z) pelo tamanho do elemento de volume através do qual r é constante. O tamanho deste elemento de volume, 4πr2dr, aumenta com r2, e este fato é responsável pela diferença entre as duas funções. Assim, embora a distribuição de densidade sempre diminua com o aumento de r, o volume total de todos os elementos de volume, a uma distância r da origem, aumenta com r2.

A média sobre r, ao contrário de seus componentes, está restrita a valores iguais ou maiores do que zero.

( ) ( )∫∫∞∞

=00

drrWdrrrWr (12)

W(r) do denominador é normalizado e a integral vale 1. Substituindo W(r)dr da eq. 10 temos:

βπ 212r = (13)

e o quadrado médio da distância ponta-a-ponta é:

( )∫∞

=0

22 drrWrr (14)

resolvendo, temos:

(15)

Para a cadeia livremente articulada, β assume o valor dado na eq. 08. Substituindo a eq. 08 na equação 13, tem-se:

22

23β

=r

21ln38r π= (16)

E a substituição na eq. 15 resulta em:

8

2

12 ln=r (17)

A eq. 17 é particularmente notável, porque equaciona a analogia entre a configuração de uma cadeia livremente articulada e o caminho descrito por uma partícula difusa. De acordo com a teoria da difusão, o deslocamento médio quadrado de uma partícula difusa é proporcional ao tempo. Considerando que a partícula se move em uma velocidade fixa a determinada temperatura, fica claro que o tempo corresponde ao tamanho da cadeia do polímero. Portanto, a eq. 17 pode ser considerada como uma conseqüência necessária da analogia existente entre os dois fenômenos.

1.4 Restrições de ângulos para uma cadeia polimérica

Em um polímero real, a direção assumida por uma dada ligação é fortemente influenciada pela direção do seu antecessor. As orientações de ligações mais longínquas, referentes ao segundo, terceiro e até quarto vizinhos podem sofrer variações devido a ligeiras modificações da ligação sob observação, mas a orientação do antecessor imediato é de grande importância. A natureza exata destas restrições depende especificamente da estrutura da unidade de repetição da cadeia. O efeito resultante de tais restrições pode ser visto na Figura 1.9, onde cada passo está sujeito a uma variação na direção que, comparada ao passo anterior, não pode exceder a 90 o. Esta restrição fica muito mais clara quando se comparar a Figura 1.9 à Figura 1.5, onde se vê uma cadeia livremente articulada para o mesmo número de passos. Se, ao invés de tomar ligações individuais como elementos estatísticos, escolhe-se seqüências com m ligações cada, pode-se aproximar uma cadeia real de uma cadeia livremente articulada.5

Figura 1.9 – Representação de uma cadeia com ângulos restritos a -π/2 e + π/2.

A base deste modelo é descrita da seguinte forma: em uma cadeia real, a direção é gradualmente perdida devido à presença ocasional de conformações gauche†. Esta perda gradual da direção é modelada por um pedaço da cadeia ( um elemento estatístico) onde a linearidade é preservada. No final do segmento a continuidade da direção é completamente perdida. A direção do próximo segmento estatístico não tem nenhuma correlação com o precedente.

Na Figura 1.9, a escolha de cinco elementos estatísticos é mostrada em linhas pontilhadas. A direção assumida por um elemento será quase independente do elemento 5 Kunh, W., & Grün, F., Kolloid Z., (1939) ( citado por Flory, P. J. USA, (1973). † cf. item 1.10, pág. 15.

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anterior, permitindo que o número de ligações, m, por elemento seja significativamente grande e variável. Entretanto, uma distribuição estatística correta da distância ponta-a-ponta para uma cadeia como um todo será obtida se cada elemento for substituído por um elemento de tamanho igual a raiz quadrada média dos elementos reais consistindo de m ligações. Dentro deste novo conceito, os elementos estatísticos tornam-se randômicos em orientação e fixos em tamanho. O problema da configuração reduz-se ao de uma cadeia livremente articulada, consistindo de n' = n/m elementos cada um de tamanho l’.

Tem-se, portanto que a distribuição estatística do deslocamento do vetor r para uma cadeia real será a mesma (aproximadamente gaussiana) como para uma cadeia livremente articulada. O parâmetro β será diferente, e a eq. 08 deve ser substituída por

( ) 212ln23 ′′=β

(18)

É importante que m seja suficientemente grande para tornar desprezível a influência de um elemento na direção do próximo. Ao mesmo tempo, deve-se ter cuidado para não fazer n' menor do que o necessário (aproximadamente igual a dez) para uma aproximação gaussiana segura. Dentro destes limites, a escolha de m permanece arbitrária.

A discussão anterior de cadeias equivalentes requer que a raiz quadrada da média quadrada da distância ponta-a-ponta das cadeias seja igual. Para definir completamente uma

cadeia equivalente, seu tamanho, quando estendida, deve ser igual ao da cadeia real. Assim, uma cadeia equivalente à cadeia estendida será uma cadeia real, com todas as restrições aos ângulos removidas. Então n' e l' (e portanto m) para uma cadeia equivalente são definidos por:

lnnl ′′= (19)

( ) 212 nlr ′′= (20)

22 lnr ′′= (21)

Esta hipotética cadeia equivalente deve se assemelhar, em comportamento estatístico, a uma cadeia real de tamanho n e distância ponta-a-ponta média igual a (r2)1/2.

1.5 Conformação de uma única cadeia de polímero

Sob certas condições, interações entre os segmentos mais distantes de uma cadeia longa podem ser negligenciadas permitindo descrever os estados conformacionais de uma cadeia flexível. A cadeia polimérica assim definida é chamada cadeia não perturbada. Na prática, a conformação média das cadeias, observadas em soluções diluídas a uma certa temperatura, chamada de temperatura Θ (ou temperatura de Flory) aproxima-se muito a uma cadeia não perturbada.

Uma cadeia em solução diluída pode ser representada como um coil, continuamente variando sua forma sob ação do movimento térmico randômico. Um solvente é dito ser ‘bom’ quando as interações solvente polímero permite a expansão do coil, de suas

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dimensões não perturbadas em proporção à extensão destas interações. Em um solvente ‘pobre’ as interações são fracas e a expansão do coil ou perturbação é restrita.

Este sistema pode ser descrito pela equação termodinâmica fundamental que relaciona a energia livre de Gibbs como função da entalpia H e da entropia S, G = H – TS. Quando a variação de energia livre da mistura ∆Gm ≤ 0, tem-se uma solução homogênea, isto é, quando a energia livre da solução G12 é menor do que a energia livre dos componentes separados, G1 e G2 (polímero – solvente).

∆Gm = G12 – (G1 + G2)

Para solventes ‘bons’, (G1 + G2) é maior do que G12 e ∆Gm é negativo. Para solventes ‘pobres’ G12 é maior e ∆Gm é positivo. Sob certas condições, chamada condições Θ ∆Gm é igual a zero e a equação que descreve o sistema pode ser escrita como: ∆H = T∆S. O polímero está em seu estado não perturbado.

Os desvios da idealidade para um polímero podem ser tratados selecionando a temperatura para qual ∆H = T∆S. A temperatura para a qual esta condição prevalece é chamada de temperatura de Flory ou temperatura Θ.

A temperatura Θ é um estado bem definido da solução de polímero, no qual o polímero está em uma condição não perturbada. Acima da temperatura Θ ocorre uma expansão do coil, causada por interações com o solvente, enquanto que abaixo desta temperatura os segmentos do polímero atrai um ao outro, e uma eventual separação de fase ocorre6.

1.6 Análise conformacional de cadeias poliméricas

Cadeias poliméricas ocupam um volume no espaço e as dimensões de qualquer macromolécula são influenciadas por ângulos de ligação e por interações entre os elementos da cadeia. Estas interações podem ser classificadas em dois grupos: interações de curto alcance e interações de longo alcance. A primeira ocorre entre átomos vizinhos ou grupos de átomos e são usualmente forças de repulsão estérica causadas por overlap de nuvens eletrônicas. As interações de longo alcance são compostas de forças atrativas e repulsivas, (interações van der Waals) entre segmentos separados em uma cadeia que ocasionalmente se aproximam devido a flexibilidade molecular.

Para cadeias reais de polímeros existem impedimentos que restringem cada ligação a um pequeno número de estados rotacionais distintos. A faixa de valores acessível para o angulo φ é severamente restrita por interferências estéricas entre as sucessivas unidades da cadeia. Consequentemente, a suposição de rotação livre não se aplica a cadeias poliméricas.

A energia das moléculas depende das interações entre átomos ou grupos de átomos não ligados intra e intermolecularmente, das muitas conformações possíveis teoricamente, apenas algumas são energeticamente favoráveis. As distribuições destas conformações são governadas pelas leis da termodinâmica e da mecânica estatística7. As conformações de mais baixa energia são preferidas pelo fator de Boltzmann, exp (-E/kT), onde E é a energia da molécula numa conformação particular, T é a temperatura absoluta e k é a constante de Boltzmann. 6 Cowie, J. M. G., Polymer: Chemistry & Physical of Modern Materials, Ed Great Britain, London, (1973) 7 Elias, Hans-Georgs, Macromolecules: Structures & Properties, Ed. Plenum Press, N.Y., (1977)

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Interações repulsivas ocorrem quando dois átomos se aproximam suficientemente, levando a um aumento da energia e o fator de Boltzmann elimina estas conformações. Grupos atômicos não polares são atraídos entre si, levando a uma diminuição de energia, e mantendo-se a uma distância onde forças repulsivas e atrativas se compensam. A conformação de uma molécula, (ou a distribuição de conformação) é o resultado de todas as interações intra e intermoleculares.

Os sistemas poliméricos podem ser estudados, em um enfoque de energia conformacional de suas macromoléculas, em três situações: as cadeias estão envolvidas por moléculas de solvente, como em uma solução polimérica; as macromoléculas estão envolvidas por outras macromoléculas, como em um polímero sólido ou polímero fundido; e uma única molécula. Estes sistemas podem ainda estar associados, formando sistemas mais complexos. No caso de uma única molécula, esta tenderá a maximizar os contatos intramoleculares e isto resultará em uma conformação, de menor energia, mais ou menos esférica. Nos dois primeiros casos, os contatos intermoleculares diminuem a energia das moléculas apreciavelmente, e a conformação de menor energia não será necessariamente aquela referida acima. Moe et al. mostraram que uma cadeia isolada (no vácuo) comporta-se como uma típica cadeia não perturbada8.

1.7 Mecânica e dinâmica moleculares

O uso de métodos computacionais para a solução de muitos problemas qualitativos e quantitativos na química tem, desde a década de 70, tomado grande impulso com o surgimento dos campos de força mecânico moleculares. Estes representam uma interface entre os conhecimentos científicos desenvolvidos pela matemática, física e química, constituindo uma nova área de investigação da ciência moderna.

O estudo dos sistemas moleculares, em termos de interações atomísticas, tem por objetivo a previsão e descrição da estrutura e estabilidade dos sistemas em referência, seus diferentes estados energéticos e seus processos reativos internos∗. O primeiro ponto, envolve

a previsão do estado do sistema em seu nível de mais baixa energia; o segundo, a previsão da energia livre relativa de diferentes estados e o terceiro, a previsão do processo dinâmico de diferentes estados.

Dois problemas básicos se apresentam durante uma simulação computacional de sistemas moleculares: o tamanho do espaço configuracional, ou espaço de fase, que é acessível ao sistema molecular; e a precisão da função de interação atômica, ou campo de força, que é usado para modelar o sistema.

1.8 O tamanho do espaço configuracional

A simulação de sistemas moleculares gera um conjunto de configurações representadas estatisticamente, chamado ensemble (ou conjunto). As propriedades do sistema são definidas como a média sobre o ensemble ou integrais sobre o espaço configuracional. O conjunto de configurações gerado pode ser representativo do estado do sistema, se a amostragem do

8 Moe, N. E. & Ediger, M. D., Macromolecules, 29, (1996). ∗van Gunsteren, W. F. & Berendsen, H. J. C., Angew. Chem. Int. Ed. Engl. 29, (1990)

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espaço de fase (ou espaço configuracional) for suficientemente extensa. A integração sobre um sistema de muitas partículas, envolverá muitos graus de liberdade e, como conseqüência, ela pode ser realizada apenas sobre parte do espaço configuracional.

Ao se definir um modelo para o qual uma propriedade específica será calculada, somente os graus de liberdade, dos quais dependem a propriedade de interesse, devem ser incluídos explicitamente. Geralmente, o tamanho do sistema é mantido tão pequeno quanto possível para permitir uma amostragem suficiente dos graus de liberdade que devem ser simulados. Portanto, um dos problemas básicos se refere à definição do nível de aproximação do modelo, tais como os graus de liberdade que são essenciais a uma avaliação coerente da quantidade ou da propriedade de interesse que podem, ou não, ser suficientemente exemplificadas. Esta escolha envolve, de um lado, o compromisso entre o tipo e o número de graus de liberdade e, de outro, a capacidade computacional com a qual se pode contar.

1.9 Campo de forças ou função de interação atômica

A precisão dos resultados qualitativos e quantitativos obtidos por simulação dependerá da qualidade das suposições, aproximações e limitações que estão implícitas no modelo molecular e no campo de força ou função de interação atômica.

No método Mecânico Quântico, a suposição básica para a modelagem é a validade da aproximação de Born-Oppenheimer que separa os movimentos eletrônico e nuclear. As interações eletrônicas e atômicas são descritas pela Lei de Coulomb e pelo Princípio de Exclusão de Pauli. Uma descrição formal de sistemas a baixas temperaturas, dos movimentos detalhados de átomos leves como o hidrogênio, ou das reações químicas, requerem um tratamento mecânico quântico. Neste caso, a energia do sistema atômico-molecular é avaliada pela resolução da equação de Schrödinger e não por meio de funções empíricas de energia9. Excluídos os sistemas descritos no parágrafo anterior, torna-se relativamente seguro assumir que um sistema molecular é governado pelas leis da mecânica clássica, e a precisão destas aproximações será suficiente. O sistema será descrito por massas pontuais, que se movem em um campo de potencial efetivo, o qual depende apenas das coordenadas instantâneas destas massas pontuais. Os sistemas moleculares serão, então, descritos como partículas, com cargas q centradas nas coordenadas atômicas, separadas por distâncias interatômicas e conectadas entre si por “molas” de constante de força particulares.

1.9.1 A construção de um campo de forças

Um campo de força mecânico molecular emprega funções empíricas de energia com uma expressão matemática que deve ser capaz de representar as diferentes contribuições energéticas associadas aos diversos graus de liberdade clássicos deste sistema de partículas. Neste caso, funções empíricas de energia são desenvolvidas e utilizadas de modo a representarem as interações entre os átomos do sistema. Admite-se que as várias contribuições energéticas, associadas aos graus de liberdade moleculares, e representadas por comprimento de ligação, ângulos de valência e diedros torsionais, são independentes e aditivas.

9 Burket, U. & Allinger, N. L., Molecular Mechanics, ACS Monograph, Washington, (1982)

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As contribuições oriundas das interações não ligadas – intra e intermoleculares – e representadas pelas forças de van der Waals, eletrostáticas e ligações de hidrogênio, são consideradas da mesma forma. No entanto, a construção de um campo de forças, por sua própria simplicidade ao conter apenas funções de fácil e rápida avaliação por métodos computacionais, exige que uma variedade de compromissos sejam firmados na sua construção. O desenvolvimento de tais funções empíricas baseia-se na proposição de modelos de interação em nível atômico-molecular, de procedimentos de parametrização bastante complexos e, fundamentalmente, sua validação depende de uma grande variedade de testes metodológicos. Para cada nível de aproximação do modelo molecular, existe um tipo correspondente de campo de forças. A escolha de um campo de forças particular dependerá da propriedade e do nível de precisão requeridos. O nível de simulação a ser usado vai depender das propriedades específicas que se quer analisar. Vários campos de força são disponíveis e correspondem a diferentes níveis de aproximação10. Cada campo de forças emprega aproximações físicas que limitam sua precisão e aplicação. Suas parametrizações podem ser obtidas tanto a partir de dados experimentais, como de dados computacionais de elevada qualidade, incluindo os cálculos mecânico- quânticos11.

1.9.2 A expressão matemática de um campo de forças

Geralmente, a expressão matemática de um campo de força mecânico-molecular para um sistema de N átomos com massa (i = 1, 2, ...N) e vetores das posições cartesianas ri, pode ser escrito como a soma de contribuições energéticas, na forma:

(22)

( ) [ ] [ ]

( )[ ] ( ) ( )( )( )

∑∑

∑∑∑

+−+−++

−+−+−=

jipares ijr

ji

ijijdiedros

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O primeiro termo representa a deformação da ligação covalente interagindo ao longo da ligação b. O potencial é harmônico, com uma energia mínima no tamanho da ligação b0 e a constante de força K0 varia com o tipo de ligação. O segundo termo descreve os ângulos de valência de forma similar. Duas formas são usadas para as interações entre ângulos diedros: um termo harmônico para ângulos diedro que não podem fazer transição, por exemplo, aqueles dentro de um ciclo aromático, e um termo senoidal para os outros ângulos diedros φ, os quais podem girar livremente. Os últimos termos representam a soma das interações não ligadas efetivas, compostos por termos de interações de van der Walls, de Coulomb entre átomos i e j, com cargas qi e qj a uma distância rij. Alguns campos de forças contêm termos cruzados, os quais associam diretamente deformações e ângulos de ligações. A escolha de um campo de força particular deve se basear no tipo de sistema que se deseja simular, nas propriedades de interesse e na precisão desejada para os resultados.

10 Halgren, T. A. & Nachbar, R. B., J. Computational Chemistry, 17, (1996). 11 Yin, D. & Mackerell, Jr, A. D., J. Computer Chemistry 19, (1998).

14

1.9.3 O campo de forças PCFF

As expressões analíticas do Polymer Consistent Force Field ( PCFF ) que são usadas para representar uma superfície de energia para moléculas poliméricas são mostradas na equação abaixo12.

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A parametrização desta expressão matemática foi baseada em cálculos mecânicos quânticos e simulações moleculares para metais, ácidos, álcoois, alcanos, alcenos, amidas aminas, aromáticos, éteres e ésteres13. O PCFF apresenta parâmetros para grupos funcionais contendo H, Na, Ca, C, Si, N, P, O, S, F, Cl, Br, I, Ar, He, Ne, Kr, Xe, carboxilatos, carbonatos, fosfazenos, uretanas, silosianos, silanos, ureas14, e zeólitas15. Além de parâmetros para estes grupos contém, também, parâmetros de Lennard-Jones para os metais Li, K, Cr, Mo, W, Fe, Ni, Pd, Rt, Cu, Ag, Au, Al, Sn e Pb.

O PCFF foi desenvolvido para aplicações em polímeros e materiais orgânicos. É útil para policarbonatos, resinas melominadas, polisacarídeos, outros polímeros, materiais 12 Polymer 4.0.0, Molecular Simulation Inc., 9865 Scranton Road, San Diego, CA, USA, (1996). 13 Maple, J. R. et al., J. Computational Chemistry, 15, (1994). 14 Sum, H. et al., J. Computational Chemistry, 15, (1994). 15 Hill, J. –R., Sauer, J., J. Phys. Chem., 98, (1994).

15

orgânicos e inorgânicos, contendo em torno de 20 metais, carboidratos, lipídeos, ácidos nucléicos, além de energias coesivas, propriedades mecânicas, compressibilidade, capacidade calorífica, derivados da superposição de estruturas cristalinas e constantes elásticas.

1.10 A superfície de energia potencial

Do exposto anteriormente, a simulação de um sistema molecular emprega um conjunto de funções empíricas, que constituem um campo de forças, e contém parâmetros ajustáveis que são otimizados para obter a melhor concordância possível com dados obtidos por técnicas experimentais e cálculos ab initio de alta qualidade.

Entretanto, do ponto de vista estritamente teórico, pode-se dizer que o conjunto de funções interativas a que se refere na construção de um campo de forças é derivado para reproduzir a superfície de potencial de um sistema molecular particular. Uma superfície de potencial é uma “superfície” multidimensional que descreve a energia de um sistema molecular em termos das posições nucleares dos átomos que o compõem. Tal superfície é, freqüentemente, chamada de Superfície de Energia Potencial (Potential Energy Surface – PES). Propriedades dinâmicas e termodinâmicas do sistema são determinadas pela natureza da superfície de energia potencial. É a PES que controla processos como o folding de cadeias poliméricas e transição vítrea. Análise do espaço conformacional molecular, sobre o qual a superfície de energia potencial está definida, é usada para localizar estruturas estáveis e estudar a flexibilidade molecular16.

A Superfície de Energia Potencial tem origem no entendimento de que a energia de um sistema molecular, em seu estado eletrônico fundamental, é uma função explícita das coordenadas eletrônicas e nucleares. Na aproximação de Born-Oppenheimer para a mecânica molecular, os movimentos dos núcleos atômicos são estudados enquanto contribuições eletrônicas são avaliadas de maneira implícita. O tratamento teórico é tal que os núcleos atômicos se movimentam em uma espécie de potencial médio associado à presença de elétrons. Este procedimento permite, portanto, a definição de uma superfície de energia potencial, em termos das posições nucleares.

Como ilustração, esta superfície será representada por uma molécula simples, o butano (Figura 1.10). Considerando apenas a superfície unidimensional, que corresponde a rotações sobre a ligação central C—C, obter-se-á uma superfície de energia potencial como a descrita na Figura 1.10. Para mudanças nas posições nucleares que correspondem a uma rotação completa (00 a 3600), são localizados três mínimos na superfície obtida, separada por máximos de altura moderada. Estes três mínimos de energias correspondem a três estados conformacionais estáveis: uma forma anti e duas formas gauche (Figura 1.10)∗. A forma anti é de menor energia e refere-se a um mínimo global e a forma gauche a um mínimo local. Na passagem de uma conformação estável a outra, a molécula deve ultrapassar, em energia, o máximo que as separa. Para tanto, em relação àquele primeiro mínimo, os comprimentos de ligação serão modificados e ângulos de ligação serão de alguma forma, deformados,

16 Becker, O. M., J. of Computational Chemistry, 11, (1998) ∗ Binder, K. & Paul, W., J. Of Polymer Science, 35, (1997)

16

comparando com os valores de equilíbrio naquele mínimo particular. A energia do sistema aumentará até que o máximo na superfície que interconecta os dois mínimos particulares seja alcançado; depois disso, ela começa a ter seu valor diminuído até que o outro mínimo seja alcançado.

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Figura 1.10 - Conformações que correspondem aos mínimos de energia na Superfície de Energia Potencial.

1.11 A análise conformacional

Certa terminologia é bastante útil considerando as estruturas envolvidas ao longo desta superfície de potencial. Qualquer ponto da superfície que corresponde a um mínimo é referido como confórmero. Os demais pontos na superfície que podem ser definidos, por considerações de simetria, por exemplo, mas que não corresponde a mínimos de energia, definem diferentes conformações.∗

Proceder-se-á investigação das várias conformações definidas sobre uma superfície de energia potencial, buscando nela caracterizar a presença de mínimos e máximos de energia. Este conhecimento do espaço de fase é um dos problemas fundamentais da química computacional, a análise conformacional sistemática.

Para moléculas mais complexas do que a descrita anteriormente, por exemplo, que possuam vários graus de liberdade associados, existirá um grande número de mínimos de energia, com diferentes profundidades, associados àquelas torções, os “poços de potencial” que definem os mínimos locais energéticos. Em um ambiente particular, a molécula pode ser descrita, pelo confórmero de estrutura correspondente ao mínimo de maior profundidade – o mínimo global. Em uma segunda aproximação, a molécula pode ser descrita por uma mistura em equilíbrio de diferentes confórmeros, cada um correspondendo a um diferente mínimo da PES, cujas populações individuais são estabelecidas de acordo com a Lei de Distribuição de ∗ cf. ibid ref 9.

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Boltzmann. Em uma última aproximação, um pouco mais refinada, a molécula em um mínimo de energia não corresponde a uma descrição onde há ausência de movimento. Em um mínimo particular sobre a PES, a molécula apresenta movimentos nucleares vibracionais em torno de suas posições de equilíbrio, devido a excitações de origem térmica, que podem modificar a distribuição populacional de confórmeros, numa razão que corresponde a energia livre de Gibbs.

A Superfície de Energia Potencial pode ser caracterizada por seus mínimos, os quais correspondem a configurações estáveis, e por regiões de transição que interconectam os mínimos. Para sistemas pequenos, com poucos mínimos, é possível usar uma aproximação direta e descrever a superfície de energia potencial inteira. Para sistemas com muitos graus de liberdade, com um número importante de mínimos, uma aproximação direta torna-se muito difícil.

1.12 Métodos de varredura no espaço configuracional

Uma vez que o modelo molecular e o campo de forças tenham sido definidos, um método de busca no espaço de fase para configurações de baixa energia deve ser selecionado. Os vários métodos disponíveis apresentam vantagens e desvantagens, que dependerão da forma e tipos das funções de energia V( r ), do número de graue de liberdade (tamanho do sistema) e do tipo de graus de liberdade (coordenada cartesiana versus outras coordenadas) do sistema.

1.12.1 Método de varredura sistemática

Para um sistema molecular com poucos graus de liberdade e, se a função de interação V(r) não apresentar uma grande diferença energética entre os mínimos, é possível sistematicamente visitar o espaço configuracional completo do sistema. O esforço computacional requerido para uma busca sistemática de configurações, cresce exponencialmente com o número de graus de liberdade. Somente sistemas moleculares pequenos podem ser tratados por este método. O número de graus de liberdade que ainda pode ser tratado, dentro de um tempo computacional razoável, depende fortemente da complexidade da função V(r), ou seja, o tempo requerido para computar V(r) para cada configuração.

1.12.2 Método de varredura randômica

Para um sistema com muitos graus de liberdade, uma busca direta do espaço configuracional é impossível. Então um conjunto de configurações pode ser gerado por uma amostragem randômica. Uma vez que cada configuração é dada pelo seu fator de Boltzmann como fator peso na coleção, o conjunto torna-se um ensemble de configurações. Este fator pode ser escrito como:

TbkrV

e)(− (24)

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Um método de busca randômica muito usado é o Monte Carlo, no qual um conjunto de configurações é gerado por um algoritmo que assegura que a ocorrência de configurações é proporcional a seu fator de Boltzmann.

1.12.3 Método de simulação por dinâmica

Um outro método de busca no espaço de fase, é aquele que permite gerar um ensemble de configurações através da lei de movimento aplicada a átomos do sistema molecular. Dentre as técnicas usadas para obter informações dinâmicas sobre o sistema estão a Dinâmica Molecular (DM), onde a equação de Newton para o movimento é integrada sobre o tempo e a Dinâmica Estocástica (DE), na qual a equação de Langevin para o movimento Browniano é integrada sobre o tempo.

1.12.3.1 Simulação por dinâmica molecular

Na Dinâmica Molecular, uma trajetória (configurações em função do tempo) é gerada pela integração simultânea das equações do movimento eq. 25 e eq. 26, para todos os átomos do sistema molecular.

(25) ii

i Fmdt

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(26)

i

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A força no átomo i e notada por Fi e o tempo, como t.

A simulação por dinâmica molecular requer cálculos do gradiente da energia potencial V(r), o qual deve ser uma função diferencial das coordenadas atômicas ri. A integração da equação 25 é efetuada em pequenos intervalos de tempo, ∆t, tipicamente de 1 – 10fs para sistemas moleculares. Quantidades estatísticas de equilíbrio podem ser obtidas através da média sobre a trajetória. Esta deve ser suficiente para formar um conjunto representativo do estado sistema. Esta técnica possibilita ainda o estudo do sistema no estado de não-equilíbrio. A DM é usada eficientemente para visitar o espaço configuracional porque a energia cinética, presente no sistema, permite que barreiras de energia da ordem de kT por grau de liberdade sejam ultrapassadas. O aumento da temperatura permite que uma importante parte do espaço configuracional seja visitado, gerando uma série de diferentes conformações.

A altas temperaturas, a energia total e a potencial são monitoradas e flutuações mais fortes podem indicar trocas conformacionais significativas. Quando ocorrem mínimos na energia total, o sistema é resfriado lentamente e equilibrado a temperatura normal (300 K). Este procedimento permite que diferentes conformações, com energias livres comparáveis, sejam obtidas.

A MD é um método eficiente para amostragem do espaço conformacional para moléculas razoavelmente pequenas. Para moléculas muito grandes, que apresentam um fold

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topológico, a MD deve ser conduzida de forma cuidadosa, pois esta técnica não gera rearranjos topológicos. Mesmo quando as barreiras, que separam duas regiões de baixa energia topológica do espaço conformacional, são da ordem de kT, o tempo necessário para transpô-las pode ser muito maior do que aquele disponível em uma simulação. Portanto, o fator temperatura é essencial para que barreiras energéticas possam ser transpostas em um tempo computacional viável.

A metodologia conhecida como “simulating annealing” representa um protocolo de simulação onde, em uma trajetória efetuada a altas temperaturas, configurações sejam isoladas em intervalos periódicos. Estas configurações são resfriadas lentamente, também por períodos constantes e minimizadas energeticamente. Por exemplo, isola-se uma configuração a cada 10 ps, faz-se um resfriamento progressivo de 50 K em 50 K e a minimização energética, por determinado algoritmo, é efetuada a cada 50 K.

Desta forma, o sistema geralmente atinge um estado de energia menor do que quando é conduzido bruscamente de uma posição em alta temperatura a uma temperatura mais baixa, como a ambiente.

1.13 Conclusão: condições iniciais, termalização e métodos de análises

O resultado de uma simulação deve ser independente das posições atômicas e velocidades iniciais do sistema em estudo. A configuração inicial de um sistema molecular pode ser obtido de diversas fontes, tais como, estrutura de raio x, cálculos de distância geométrica, construção do modelo, etc. As velocidades iniciais são escolhidas como zero ou obtidas através de uma distribuição de Maxwell.

As simulações dinâmicas são conduzidas em duas etapas: o equilíbrio e a coleção de dados. Para a etapa de equilíbrio, velocidades aleatórias são atribuídas aos átomos de acordo com a distribuição de Maxwell-Boltzmann, em torno da temperatura desejada. O período de termalização requerido dependerá do tempo de relaxação das propriedades de interesse. A simulação é monitorada de forma a obter resultados no equilíbrio.

A principal utilidade da simulação molecular é analisar os processos moleculares em um nível atômico. Os resultados são geralmente analisados tomando a média sobre o tempo, ou média sobre a simulação com diferentes condições iniciais das propriedades de interesse.

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20

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