Edenir Vancini

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HIPÓLITO DA COSTA: ESCRITA NO CORREIO BRAZILIENSE, 1808-1813. Edenir Vancini 1 RESUMO O presente trabalho visa compreender o discurso do patrono da imprensa brasileira, Hipólito da Costa, a partir da escrita no Correio Braziliense (1808-1813). O mensário tinha por objetivo servir como instrumento de doutrinação das massas, em perspectiva as ações realizadas pela coroa portuguesa, na própria Metrópole, e para com as suas colônias, em específico a brasileira. Era publicado fora de Portugal e circulava de maneira clandestina no Brasil, porque Hipólito encontrava-se exilado em Londres. Pesquisamos nesta fonte - O Correio Braziliense, bem como era desenvolvida a abordagem desses feitos da coroa portuguesa, e as referidas ações políticas, especificamente no período que compreende o governo Joanino. Através da seleção de 11 (onze) textos que fazem referência à uma guia em específico do jornal, a “Miscellanea”. Nesta seção, estão pontuadas as reflexões do autor acerca de temáticas que relacionam Portugal vs Brasil, Portugal e as outras potências estrangeiras. PALAVRAS-CHAVE: Correio Braziliense; Hipólito da Costa; Discurso; Escrita. 1. INTRODUÇÃO A transmissão de notícias e acontecimentos através do mensário Correio Braziliense, se fez em grande partida, seguindo três gêneros da prática jornalística, o informativo, que enaltecia o parâmetro da publicação de toda a documentação oficial do governo português, como também os artigos publicados pelos mais importantes jornais da época; o interpretativo, que recorria em analisar o contexto dessas publicações e exteriorizar com o cenário, os fatos, e por último; o opinativo, o qual trazia a apreciação do editor do periódico acerca dos outros dois pontos. 1 Acadêmico da décima fase do curso de Licenciatura em História, da Universidade Federal da Fronteira Sul - UFFS

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HIPÓLITO DA COSTA: ESCRITA NO CORREIO BRAZILIENSE, 1808-1813.

Edenir Vancini1

RESUMO

O presente trabalho visa compreender o discurso do patrono da imprensa brasileira,

Hipólito da Costa, a partir da escrita no Correio Braziliense (1808-1813). O mensário

tinha por objetivo servir como instrumento de doutrinação das massas, em perspectiva as

ações realizadas pela coroa portuguesa, na própria Metrópole, e para com as suas

colônias, em específico a brasileira. Era publicado fora de Portugal e circulava de maneira

clandestina no Brasil, porque Hipólito encontrava-se exilado em Londres. Pesquisamos

nesta fonte - O Correio Braziliense, bem como era desenvolvida a abordagem desses

feitos da coroa portuguesa, e as referidas ações políticas, especificamente no período que

compreende o governo Joanino. Através da seleção de 11 (onze) textos que fazem

referência à uma guia em específico do jornal, a “Miscellanea”. Nesta seção, estão

pontuadas as reflexões do autor acerca de temáticas que relacionam Portugal vs Brasil,

Portugal e as outras potências estrangeiras.

PALAVRAS-CHAVE: Correio Braziliense; Hipólito da Costa; Discurso; Escrita.

1. INTRODUÇÃO

A transmissão de notícias e acontecimentos através do mensário Correio

Braziliense, se fez em grande partida, seguindo três gêneros da prática jornalística, o

informativo, que enaltecia o parâmetro da publicação de toda a documentação oficial do

governo português, como também os artigos publicados pelos mais importantes jornais

da época; o interpretativo, que recorria em analisar o contexto dessas publicações e

exteriorizar com o cenário, os fatos, e por último; o opinativo, o qual trazia a apreciação

do editor do periódico acerca dos outros dois pontos.

1 Acadêmico da décima fase do curso de Licenciatura em História, da Universidade Federal da Fronteira

Sul - UFFS

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A sua abordagem jornalística englobou variadas temáticas que circundavam temas

recorrentes no período. Em sua tese Aparecida M. da Silva (2010), relata um pouco sobre

a exposição dos fatos pelas guias do jornal:

[...] Nele, versou sobre questões inerentes às relações internacionais e

administrativas do governo português; a problemas que se expunham nas

colônias de Portugal, em especial no Brasil, revelados por seus

correspondentes, como a série de práticas despóticas praticadas por

governadores, longe dos olhos do soberano; falhas no sistema administrativo

português. Falou sobre os conflitos armados que assolavam a Europa. (SILVA,

2010, p. 85).

Sobre o Brasil, como supracitado em outro capítulo, a atenção de Hipólito estava

voltada para três eixos: a liberdade de imprensa, a qual não existia até meados do ano de

1822 e a declaração da independência brasileira; a segunda se concentrava sobre a

manutenção da pré-condição, que a elevação do Brasil a reino unido a Portugal e

Algarves, em 16 de dezembro de 1815, trouxe a ‘nação’ tupiniquim; e a terceira estava

diretamente ligada às práticas do regime político absolutista português em relação a sua

colônia e seus habitantes, aqui exclusivamente, se fala em Brasil.

A crítica de Hipólito da Costa, pode ser classificada em panfletária, e para se

chegar a essa conclusão, no presente trabalho, será utilizado o embasamento teórico,

estabelecido pela pesquisadora Aparecida Massena da Silva (2010), realizou em sua tese

de doutorado, e que por sua vez, se orientou no trabalho de Cibele Saliba Rizek e Wagner

de Melo Mourão, datado de 2006, com a titulação “Francisco de Oliveira: a tarefa da

crítica”, a qual trata sobre a percepção desse tipo de crítica - que se faz pelas posições

políticas em um determinado momento da história, e pela maneira que são tomadas

determinadas decisões pelos governos para sanar essas pendências político-

administrativas.

[...] revelam um grau de força efetiva de idéias e valores, em que o redator do

Correio Brasiliense externou uma visão de mundo politicamente articulada e

inserida nos eventos manifestos, no período de 1808 a 1822. Teve importância

substancial na formação da opinião pública de sua época, na medida em que

suscitou reflexões. (SILVA, 2010, p. 87).

E também:

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Foi proferido num período marcado por forte censura à liberdade de expressão,

imposta pelo governo português a seus territórios, em especial no Brasil até

1821. Cada texto apresenta o desenvolvimento completo de um argumento [...]

Em determinadas situações, o redator quebra uma norma estabelecida. Ao

proferir um ataque pessoal a uma autoridade, quebra a norma do protocolo,

colocando-se num plano de igualdade ou, até, de superioridade. (SILVA, 2010,

p. 87).

A força das palavras de Hipólito da Costa se concentravam em muito na figura de

D. João VI, na de seus ministros e chefes de gabinetes. Principalmente, nos seus atos de

corrupção e abusos de poder para com a sociedade portuguesa, incluindo-se a brasileira e

das demais colônias de Portugal. A finalidade da escrita estava em orientar, doutrinar,

tornar claro, e acima de tudo ‘corrigir’ as falhas administrativas do governo joanino, a

partir de sugestões ofertadas no periódico pela ótica de seu editor.

1.1 – Análise dos textos (1808-1813)

Nesse momento do trabalho serão analisados alguns textos, que foram pré-

selecionados na guia Miscelânea. Estes textos fazem referência ao Brasil, ao momento e

a condição que a colônia atravessa, e os desdobramentos em relação às guerras

napoleônicas – Inglaterra – França – Portugal – Espanha, dentre outros países. Todos

estes fatos estão englobados nos artigos publicados por Hipólito da Costa, no período de

1808 a 1813, perpassando 11 volumes do mensário. Para cada ano serão selecionados 1

(um) ou mais textos que após a leitura do jornal (pesquisa), consideramos que apresentam

debates significativos sobre a independência, a composição da administração-política da

coroa portuguesa no período, e o discurso monarquista do editor do periódico. A escolha

por estes artigos especificamente partiu da necessidade que se estipulou para o presente

trabalho abarcar, mas o jornal dispõe de uma série de textos, que no momento e para esta

pesquisa há necessidade de selecionar apenas alguns do contexto geral da coletânea.

1.1.1 - Texto 01: Pensamentos vagos sobre novo Império do Brasil – nº 1. Julho de

1808 - Seção Miscelânea, Vol. I. Autor e Editor: Hipólito da Costa.

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O primeiro texto se desdobra sobre os acontecimentos da Invasão Napoleônica a

Portugal, e a fuga da família real portuguesa; assuntos já tratados em outras instâncias no

presente trabalho. Contudo, a guia Miscelânea, tem maior flexibilidade na escrita, o que

permite de certa maneira, ao editor publicar boletins expressos das batalhas, e misturá-las

as demais notícias, intercalando com seus comentários e opiniões. O autor traça paralelos

com os acontecimentos de outras ‘nações’, estando estas conectadas ao assunto proposto,

ou apenas para afins de informação, de toda forma, a maneira que insere/diagrama,

corrobora com as questões tratadas, fazendo o leitor refletir sobre suas posições

ideológicas frente outros indivíduos em situações parecidas.

O desenrolar desse artigo trata basicamente sobre como a Espanha, está dividida

em dois grupos: os que apoiam a invasão (no caso os monarquistas), já que o Rei Carlos

IV se viu obrigado a abdicar a favor de Napoleão Bonaparte, que posteriormente repassa

o trono ao seu irmão José Bonaparte. Do outro lado, está concentrada a grande maioria

da população, que não se conforma, em entregar o seu país aos franceses, então se inicia

uma grande resistência dos espanhóis fazendo frente ao exército napoleônico.

Esse exemplo de resistência, de luta, é grifado algumas vezes pelo editor, que tenta

a partir desse fato, impulsionar o instinto de revolução nos brasileiros e portugueses que

aqui vivem, e se encontram indignados com os ‘mandos e desmandos’ da coroa

portuguesa. Outro ponto levantado por Hipólito é o fato de que o Príncipe Regente D.

João, não teria outra alternativa a não ser ‘levantar’ a sua corte de Portugal e transferi-la

para o Brasil, já que se ficasse não teria condições para enfrentar as forças francesas, e

possivelmente perderia, o trono, as colônias e também o direito de reaver a Espanha, que

por sua vez, com a abdicação dos parentes de sua mulher, por seu direito, nesses casos,

poderia reinar soberano sob a Península Ibérica.

Aparecida M. da Silva traça um paralelo entre o ocorrido em solo espanhol e os

desdobramentos com a instalação da corte no Rio de Janeiro:

Esses acontecimentos na Espanha estariam intimamente ligados com os do

Império do Brasil por dois motivos especiais: justificavam a mudança da corte

portuguesa; e davam à família de Bragança o direito ao trono espanhol, como

de se apossar das suas colônias que ficassem ao seu alcance. [...] Nessa

discussão Hipólito faz referência à questão da união, ao opinar que a Inglaterra

poderia ter desmembrado as colônias espanholas de sua metrópole, não tendo

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feito por não "adotar este modo de hostilidade, que tende a revoltar o povo

contra o seu governo." (SILVA, 2010, p. 88-9).

A política de ‘boa vizinhança’ da Inglaterra para com todos os países europeus

invadidos ou em risco de invasão francesa, a deixava na situação de ‘nação pacificadora’,

e provavelmente a única capaz de medir forças com os generais e exércitos incorporados

de Napoleão, e promover a paz por todo o continente europeu, parte do africano e asiático.

Posterior há esses apontamentos, Hipólito muda o foco, e concentra-se na má

administração portuguesa, em relação a Metrópole e também a nova corte, o Brasil. Se

baseia, no fato que a colônia sempre ficou desassistida, em segundo plano, e por vezes

nas mãos de governantes relapsos, que defendiam somente os interesses da coroa e os

seus próprios, muitas vezes por ‘debaixo do pano’, sendo que o próprio rei estive em

desaviso.

Para terminar, determina que as transformações só não virão se D. João decidir,

por própria conta, dominar os territórios espanhóis na América do Sul. Sendo assim, a

campanha militar empreenderia muitos recursos e tempo do soberano, e este não disporia

desses dois fatores para investi-los no Brasil. Como pode ser visto, nesse recorte do texto,

escrito na língua portuguesa do período, apresentava uma grafia ‘diferente’, mas que em

muitos momentos se assemelha aos radicais contemporâneos do idioma2:

Ás vantagens porém, que o Povo do Brazil pode, e tem direito de esperar, de

ter la o seu Governo, seriam nullas, ou ao menos sumamente diminutas, se o

Soberano emprehendesse agora tomar posse á força d’armas, de todo o

Territorio Americano, aque tem direito por parte da Princeza Sua Mulher.

(CB3, 1808, vol. 1, p. 65).

Para os brasileiros, restava a esperança de melhorias em todas as esferas da

sociedade, pois a instalação da corte reconduziria os recursos financeiros para o solo

brasileiro, já que por muito tempo, tudo de precioso e lucrativo por essas terras, era

extraído e levado de navio através do Atlântico para a Europa, onde seria redistribuído.

A possibilidade de reinar sobre as colônias espanholas por muito tempo ‘visitou’ os

pensamentos de D. João e também da Princesa Carlota Joaquina. Para ela, era a chance

2 Em relação as demais citações diretas, todas serão traduzidas para atual conjectura da língua. 3 Ver. Lista de Abreviaturas.

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de recuperar o brilho de sua dinastia, afastada do trono, por Napoleão. Para tal,

considerava-se preparada para ser Rainha, sem o marido, pois fora educada para executar

essa tarefa desde a infância, quando era Infanta do Reino da Espanha.

1.1.2 - Texto 02: Estabelecimento da Imprensa no Brasil – nº 5. Novembro de 1808

- Seção Miscelânea, Vol. I. Autor e Editor: Hipólito da Costa.

O texto em questão é relativamente curto, mas direto o suficiente para deixar os

leitores atentos para a situação do surgimento da imprensa brasileira. O primeiro

parágrafo começa com uma elucidação acerca do regimento das leis, a importância das

mesmas, ou a ‘desimportância’, quando estas representam um atraso para a sociedade.

Hipólito explicita o que a ausência de uma imprensa livre, ou simplesmente, a falta de

uma tipografia para a impressão de periódicos, livros, panfletos, ou demais formatos de

impressos influencia na propagação de ‘prejuízos’ morais e intelectuais para uma

determinada sociedade; o editor discorre sobre estar à mercê da condição de ignorância,

viver a margem, sem as possibilidades de descobrir universos novos, nas variadas áreas

que o conhecimento oferece através da leitura.

Demonstra sua felicidade para com os rumores da instalação da tipografia na

cidade do Rio de Janeiro, mas ao mesmo tempo, já apresenta seu descontentamento para

com as restrições que o governo português continuará promovendo no campo das

impressões e na sua circulação. Na introdução do terceiro parágrafo é contundente, o teor

de sua crítica. A mesma, se inicia com ares de doutrinação, como pode ser observado no

recorte abaixo:

Eu quero aqui registrar esse fato, para que fique em memória, e omitirei

algumas reflexões sobre o Governo Português, a este respeito; por que espero

que está lição, que os tempos nos oferecem, lhes abra os olhos, dando-lhes a

conhecer, que só a prosperidade do povo é que faz a prosperidade do Governo,

que quando se põem obstáculos, e entraves ao progresso, e propagação das

ciências, devem ficar tão raros os homens sábios, que quando o Governo

precisar deles, de repente, não os acha, e vê-se obrigado ou a lançar mão de um

homem instruído, mas sem boa moral; ou de um homem bom, mas estúpido,

ou ignorante, e quanto menor é o número de gente instruída, menos

probabilidade há de que o Estado seja servido por homens virtuosos e Sábios.

(CB, 1808, vol. 1, p. 393-4).

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Esse comentário, ilustra o indivíduo letrado e detentor das ideias iluministas e

liberais que era Hipólito da Costa, e por ter adquirido esse conhecimento no exercício de

sua função como funcionário público da Imprensa Régia Portuguesa, se viu no direito de

retribuir através de seu mensário, de retransmitir esse ideário ou conjunto de saberes. É

perceptível, a defesa pela educação, por uma imprensa livre de censores, e também o

assentamento de suas proposições acerca do ser humano, sendo que este é responsável

direto pela manutenção da soberania de um país/nação, sendo que o despreparo é a

ruína/colapso de um sistema, que se ‘faz bonito’, mas não funciona, ou seja, exerce força

no papel, todavia na prática peca por não ter subsídios teóricos para provocar o

entendimento básico do texto.

Para concluir o artigo, o editor, informa sobre a aquisição de impressos, já que até

o presente momento, no ano de 1808 não havia um local apropriado para a impressão dos

mesmos, sendo que todo e qualquer tipo de estabelecimento tipográfico era

expressamente proibido no Brasil. A soma de “CEM LIBRAS ESTERLINAS!!!”, se faz

em caixa alta, para grafar o repúdio do autor em gastar tamanha quantia em algo, que

poderia ser produzido por qualquer pessoa com conhecimento na área, em solo brasileiro.

Termina congratulando os brasileiros sobre a novidade, e condena mais uma vez a demora

do governo português, em estabelecer tal modelo de tipografia para suprir a demanda de

suas publicações oficiais.

1.1.3 - Texto 03: Sessão: Reflexões sobre as novidades desse mês – nº 15. Agosto de

1809 - Seção Miscelânea, Vol. 3. Autor e Editor: Hipólito da Costa.

Em muitos de seus volumes, o Correio Braziliense, apresenta uma sessão

chamada Reflexões. O conteúdo dessa guia complementar é um comentário mais

direcionado por parte do editor do periódico para os acontecimentos do mês vigente. É

recorrente aparecer tópicos e artigos relacionando pequenos fatos do Brasil, Inglaterra,

França, Espanha, Portugal, Estados Unidos, Rússia, Alemanha, entre outros. Como

comentado anteriormente, são poucos os textos que dão ênfase a temática Brasil, mas nas

‘Reflexões sobre as novidades desse mês’, há espaço específico para tratar das questões

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vividas no Rio de Janeiro pela Corte no momento. Então por esse motivo, para uma

melhor análise do discurso de Hipólito da Costa, o presente trabalho também aproveitará

o contexto desses pequenos recortes temporais acerca do cotidiano brasileiro. Hipólito da

Costa começa demonstrando sua imensa tristeza em relação às medidas administrativas

tomadas pelo governo português em relação ao Brasil, contudo, este pequeno relato está

inserido nas práticas de despotismo no estado do Pará. O autor destaca sobre a troca de

sujeitos no cargo de governador; onde saiu “um déspota para outro déspota”.

Para finalizar a nota, declara que se as práticas continuarem, vai trazer em cada

exemplar (mensal – volume), a lembrança do fato e a persona que a encabeça:

[...] De boa vontade me reprimo não circunstancio fatos; por que a testa da

repartição militar está um dos homens de quem espero mais; mas se até o

Conde de Linhares for com a torrente, e se fizer de cúmplice dos despotismos

dos mais, eu farei com que fiquem recordadas as ações dele e dos outros, que

só pode fazer com que se não analisem por agora esperanças de reforma, que

ainda restam; o que talvez não tenham outro fundamento senão os seus desejos;

mas enfim esperemos, e no entanto se vão ajustando materiais para a história

negra. (CB, 1809, vol. 3, p. 236).

Como já referido em outro momento, o Conde de Linhares, Rodrigo de Souza

Coutinho era o responsável pela Imprensa Régia Brasileira. Hipólito da Costa o referencia

em seu comentário, utilizando os termos ‘um dos homens de quem espero mais’, pois era

um homem à frente do seu tempo, político engajado, foi um grande incentivador das

manufaturas no Brasil. O Conde de Linhares seguia a linha do Marquês de Pombal; queria

reestruturar os pilares da administração pública portuguesa, como pode ser visto no artigo

de Prof. Doutor Antonio Paim (2009):

Basicamente, buscou soluções duradouras, como forma de superação do

“sistema restritivo e colonial que existia”. Não se tratava de que D. Rodrigo

estivesse trabalhando para a independência do Brasil. Seu empenho consistia

em proporcionar ao país autonomia econômica. Exemplo de tal empenho pode

ser documentado pelo seguinte fato: em fins de 1808 faltava carne no Rio de

Janeiro. A solução encaminhada por D. Rodrigo foi abrir um caminho

permanente entre São Paulo e a Região das Missões, onde se implantara a

pecuária. (PAIM, 2009, p. 268).

No entanto, se este se utilizasse de práticas ou manobras administrativas não

convencionais, nada impediria o editor do Correio Braziliense de escrever uma nota de

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repúdio, condenando suas atitudes. Para Hipólito da Costa, era possível existir uma

‘nação’ portuguesa, em que o governo articulasse melhor para que as benesses

abrangessem todas as camadas da população, sem que necessariamente o povo sublevasse

contra o Estado por melhorias. É possível perceber, que o editor tomava partido para que

mudanças ocorressem, e transformassem o cotidiano português, tanto na metrópole como

nas colônias, contudo, sonhava em um Brasil transformado em reino, com representação

política das camadas populares, mas estas seriam apenas ‘reguladoras’ do bom

funcionamento da máquina de Estado, enquanto a direção ainda caberia a poucas cabeças

pensantes.

1.1.4 - Texto 04: Necessidade de reforma no Governo do Brazil – nº 36. Maio de 1811

- Seção Miscelânea – Seção Reflexões do Mês. Vol. 6. Autor e Editor: Hipólito da

Costa.

Ao longo de quase todo o volume 5, o qual compreende os meses de julho à

dezembro de 1810, precisamente na guia Miscelânea, na sessão de Reflexões do Mês,

Hipólito da Costa, reservou a escrita acerca do Brasil, para falar sobre corrupção no

governo e má administração. Nesse período, contextualiza a falta de responsabilidade dos

servidores públicos do alto-escalão com os gastos na máquina pública, e os excessos e

extravagâncias desnecessárias apresentadas no modo de vida da corte, instalada na cidade

do Rio de Janeiro desde o ano de 1808. Situa as condições que se encontravam o Erário,

e em contrapartida os vários empréstimos tomados juntos a coroa inglesa para a

manutenção do Estado Português.

No artigo, titulado como ‘Necessidade de reforma no Governo do Brazil’, o editor

do periódico Correio Braziliense, ressalta mais uma vez, a importância de reformas

político-administrativas no governo de Português, em relação ao Brasil e a sua ‘nova’

conjuntura e posição diante das outras potências estrangeiras.

Para Hipólito o ‘Império do Brazil’ era uma ‘realidade’ quase concretizada, a não

ser pelos percalços administrativos e pela falta de habilidade política de alguns ministros

e conselheiros, e é claro não eximindo de culpa a Vossa Majestade, o Príncipe João, filho

de D. Maria I. No início do artigo é possível ver a insatisfação destilada pelo editor, na

condução do “novo”, ao mesmo tempo “velho” modelo português de governar,

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acrescentando ainda a volta de práticas administrativas que haviam se tornado

anacrônicas em Portugal, e que voltaram com força na realocação da Corte no Brasil.

Sendo a essência desse sistema a falta ou ausência de liberdades, como pode ser visto

nessa fala do autor:

Nenhum povo pode ser feliz sem gozar daquela liberdade racional, que é a base

da sociedade civil; e nenhum Estado pode ser respeitado das outras Potências

Estrangeiras; sem que a afeição dos naturais pelas suas instituições pátrias; os

leve ao ponto de sacrificar, sendo necessário, os bens, as fortunas, e as vidas.

(CB, 1811, vol. 6, p. 567).

Na continuidade do texto, Hipólito destaca a falta de efetividade das cortes no

Brasil, como não havia candidatos com ‘sangue puro’, estes não poderiam representar

suas cidades ou vilas, pela falta de nobreza titular, deixando assim, o controle destas

centralizada na figura do monarca e de seus conselheiros. Uma prática, que aos olhos do

editor do periódico atrasava a prosperidade da ‘nação brasileira’. Nesse ponto, é possível

mais uma vez verificar à luta de Hipólito da Costa acerca de uma monarquia absolutista,

e seu total apoio a instalação de uma monarquia constitucional aos moldes do Reino

Unido, considerado por ele, como sendo o modelo mais abrangente e seguro de

administração-política, e o seu repúdio ao modelo francês de ‘reformar’ o Estado, o qual

foi feito pelo povo.

[...] gritam contra toda reforma; por que lhe faz conta perpetuar os abusos com

que se engordam; mas como isso não se pode dizer às claras, alegam com seu

reisado argumento das desgraças que sobreviveram à França, por querer

reformar os abusos. Porém, nós somos de opinião contrária, e julgamos que a

oposição, do antigo governo da França, em não querer admitir a reforma dos

abusos que todos sabiam serem necessárias, é quem causou os horrorosos

males, que cobriram de luto à monarquia, e chegaram até a família real. [...]

(CB, 1811, vol. 6, p. 568).

É possível ver neste fragmento e em outras partes do contexto das reflexões do

autor, o seu desprezo por reformas elaboradas e executadas pela sociedade em geral. Estas

seriam um risco desnecessário, se o governo se utilizasse de seus mecanismos para

implementar e manter um conjunto de regras que permitissem a população viver de

maneira digna e respeitosa, e com vias de ‘poder’ para controlar possíveis abusos da

monarquia, a ‘nação’ se conduziria rapidamente para a prosperidade. Sendo, que este

‘poder’ estaria pré-determinado apenas há uma representação nas juntas ou cortes

democráticas (Assembleias). Uma possível elucidação acerca do assunto são essas duas

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falas de Hipólito (CB, 1811, p. 569 e 573): “É necessário limitar o poder da coroa; para

o conservar; e para o fazer respeitar.” e também “desejamos as reformas, mas feitas pelo

Governo; e ungimos que o Governo as deve fazer em quanto há tempo; para que se evite

serem feitas pelo povo.” A limitação ao poder da monarquia, encontrada nas falas

supracitadas acima, seriam em relação aos ministros, como explica na sequência o autor

do jornal, e não propriamente a figura do monarca. Para Hipólito, extrair esse poder é

também acabar com o sistema de proteções a indivíduos da corte, o sistema de indicações

e reduzir os gastos do erário com supérfluos da corte, o que de fato para o mesmo, estaria

sugando o erário português (brasileiro) para fora de seu território.

[...] Depois que a Família Real se passou para o Brasil, se tem pedido

empréstimos avultados à Inglaterra; hipotecou-se para seu pagamento as

rendas da Madeira, e parte dos produtos dos diamantes, do pau-brasil, do

marfim, e da urzela; artigo que, por uma lei, deviam ser administrados pelo

Banco Nacional do Rio de Janeiro, e que no entanto por um ato arbitrário (e

assim se chamam todo os atos que são contra as leis) são administrados por

outros homens, que não foram legalmente nomeados; [...] (CB, 1811, vol. 6, p.

570).

Diante das dívidas contraídas, da ausência de reformas e liberdades, que outras

nações nesse período já ostentavam, o editor deixa uma pergunta no ar, para os então

ministros portugueses, (CB, 1811, p. 572): “Perguntamos aos Senhores do Governo do

Brasil: quanto tempo supõem que poderão conservar os povos, com esse sistema das

rolhas na boca?” Essa ‘deixa’ resvala na liberdade de imprensa, que não existe em

Portugal e mantém a negativa no Brasil. O autor subentende, que se mantém a boca do

povo fechada; o mesmo se faz com os olhos, impedindo que as ideais liberais adentrem o

território brasileiro através de um jornal português com livre circulação.

Para terminar o artigo, indica a possibilidade de que com a abertura política e o

processo de independência na América Espanhola, o governo deveria se espelhar nessa

situação e liberar o uso da palavra impressa; sendo que se isso não fosse possível, não era

de se surpreender que um novo periódico escrito em português, fosse publicado em

Caracas, capital da Venezuela, ou em Buenos Aires, capital da Argentina e assim,

propagar as manchetes até então proibidas no Brasil, provocando abalos na máquina de

governo português.

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1.1.5 - Texto 05: Reflexões sobre as novidades do mês – Brazil4

Consternado com o descaso na administração pública, Hipólito da Costa escreve

sobre a temática por mais alguns números de seu periódico; ora dando dicas e possíveis

soluções para contornar os infortúnios político-administrativos da coroa portuguesa e por

oras tecendo críticas e traçando paralelos com ideias e propostas que deram certo em

outros países, aos quais em seu âmago considera, como ‘potências estrangeiras.

Exemplo disso, é a sua vontade em ver a soberania de Portugal e do Brasil a salvo

dos ‘corruptores’, indivíduos estes, que ocupam altos cargos na corte portuguesa junto a

figura do príncipe. Em alguns momentos, é possível perceber que o editor do jornal não

quer fazer má imagem do monarca perante os seus leitores, acreditando que o mesmo,

não é total culpado pelo ‘desequilíbrio’ no Estado português, mas sim as pessoas que lhe

rodeiam. Para confirmar tal situação, um pequeno fragmento de escrita do Correio

Braziliense:

Quantas vezes entramos na discussão dos males, que tem causado o mau

sistema de administração do Brasil, é com a esperança de que, fazendo

conhecidas origens das desordens tenhamos a doce satisfação de ver o

Soberano feliz, com a consolação de reinar sobre um povo, que deve o seu

estado de prosperidade a esse Soberano; e de ver um povo, entre o qual fomos

criados e educados, gozando das vantagens, e bens, que a natureza lhe conferiu;

[...] (CB, 1812, vol. 8, p. 93).

Para Hipólito, diante de tantas injustiças particulares vividas, ele se coloca no

lugar do povo, e deixar de lado a sua “neutralidade” de jornalista para ressaltar o desejo

e a esperança de todo um coletivo, que embasado em situações cotidianas poderia vir a

se lançar/buscar transformações para o seu meio; reiterando sempre, apenas como

cobranças e pequenas interferências, já que existia uma confiança especial no monarca

para dirigir os rumos da nação portuguesa e brasileira, num futuro próximo.

Contudo, em outros momentos vale-se lembrar, de uma das normas da instituição

da Imprensa Régia Portuguesa: “fiscalizar que nada se imprimisse contra a religião, o

governo e os bons costumes”; o termo grifado rememora a máquina de Estado portuguesa

4 Seção Miscelânea. Vol. 8. Autor e Editor: Hipólito da Costa. nº 44 e 46. Edições de Janeiro e Março de

1812.

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e, basicamente o seu regente: o príncipe. Nesse caso, vale ressaltar que os ‘elogios’ ou

demonstrações de respeito por parte do editor, poderiam estar ligadas à esse

enquadramento das regras gerais da censura, uma ‘possível’ e ‘sincera’ consideração pelo

monarca e/ou todavia apenas servisse como uma orientação ao autor para não arranjar

maiores problemas com a coroa portuguesa, apesar de usufruir da proteção britânica essa

não era de toda infalível.

Na reserva de direito e uso de seu periódico, Hipólito da Costa, replicou no início

desse volume, uma carta escrita por D. Souza Coutinho. O conteúdo tecia elogios

valorosos a figura de D. João, Príncipe Regente de Portugal e do Brasil; tais considerações

ao monarca o elevavam a posto de uma divindade. A audiência do Correio Braziliense,

por sua vez, despertou em um político inglês, não nominado, a descrença nos fatos da

epístola. Este, redigiu uma nota em outro periódico, de natureza inglesa, relativizando

sobre D. João e sua condição de ‘Ser Divino’, e descreditando o jornal de Hipólito, pela

menção dos fatos, pela publicação e pelo despreparo do jornalista para lidar com certas

situações. A resposta do editor, vem a colaborar com a escrita dos últimos parágrafos

dessa pesquisa, sobre a posição do mesmo em relação aos fatos e tendências.

O escritor desta carta, politicamente, nos intenta puxar para a questão de

quanto S. A. R. o Príncipe Regente do Brasil merece os elogios. Essa manobra

nos da a conhecer o diplomático, e vemos aqui o desejo de provocar a falar de

seu Soberano, a fim de que se na força do argumento nos escapasse alguma

coisa contra ele, armar sobre isso os seus Castelos. (CB, 1812, vol. 8, p. 395).

E também:

Olhe Senhor Político; tem sido nosso grande cuidado nunca meter o nome do

Soberano em nossas discussões sobre as políticas de Portugal e Brasil, e por

duas razões. Uma por que estamos persuadidos, de que nem os erros dos

ministros, nem as maldades dos executores das ordens, se devem jamais

imputar sobre o Soberano; e outra por que sabemos, mais das vezes, mui

positivamente, as fontes dos males, que repreendemos. (CB, 1812, vol. 8, p.

395).

Sobre estes dois apontamentos, o autor do jornal, ainda elucida o estudo da

Teologia e a história de Basílio (Gregos), as quais haviam citadas pelo político inglês em

questão, para ‘desmerecer’ o monarca português. Para fechar o texto, Hipólito convida o

tal político, a lhe continuar escrevendo, caso as explicações não tenham sido satisfatórias

(CB, 1812, p. 396): “Se esta explicação ainda não o satisfaz; escreva mais, e ouvirá o

resto”.

Page 14: Edenir Vancini

1.1.6 - Texto 06: Relações da Corte do Rio de Janeiro com as Potências Europeias5

Por esse período do século XIV, a Europa já estava ciente das informações

oriundas do Império Russo sobre a Grande Armée6, de Napoleão, que havia marchado

em retirada após sucessivos infortúnios causados pelo General Inverno e a tática de

combate ‘terra arrasada’ do exército russo. Na sequência, as nações europeias se uniram

para mais uma vez enfrentar Bonaparte, e devolver a tranquilidade ao continente. Em 16

de outubro de 1813, em Leipzig, as forças de Napoleão bateram as da coalizão, de maneira

desesperada, com muito sacrifício, logo muitas pressões forçariam o imperador francês a

repensar suas novas manobras.

Como já havia de se esperar em Portugal e no Brasil, os comentários já se faziam

presentes sobre o possível futuro da ‘nação’ portuguesa e se cogitavam quais rumos

deveriam ser tomados. A partir da escrita de Hipólito nesse texto, é possível identificar

um sentimento de cautela por parte dos políticos de D. João, logo que, acreditavam na

insuficiência do reino em se manter sozinho frente as forças napoleônicas que ainda

rondavam a Península Ibérica. Este por sua vez, através desse artigo clama para que a

população em geral acredite em suas forças físicas e morais, e lute com as armas que tem

contra o que chama de ‘Revolução Francesa’. Conclama para que seus compatriotas

observem o exemplo da Inglaterra, que se manteve firme diante das ameaças, e que por

sua vez Portugal foi a última nação a cair nas mãos francesas, mas para esse mesmo

assunto, a ressalvas nessa conquista.

Neste sentido imputamos à covardia, a opinião daqueles Políticos Portugueses,

que asseveram que Portugal não tem forças nem meios de se defender, ou

sustentar sua dignidade como nação: obram em consequência desses

princípios. É portanto nossa intenção mostrar aqui o contrário; e que se

Portugal não goza entre as Potências da Europa uma dignidade mui conspícua,

não é por falta de meios, mas sim pela covardia de alguns Políticos, que tem

estado, o estão à frente dos Negócios Públicos. (CB, 1813, vol. 11, p. 810).

5 Seção Miscelânea. Seção Reflexões. Vol. 11. Autor e Editor: Hipólito da Costa. nº 66. Novembro de 1813.

6 Nome dado ao exército de Napoleão, também chamado de La Grande Armée (O Grande Exército).

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As suas prerrogativas se baseavam na fala de Lord Liverpool7, em 4 de outubro,

na Casa dos Pares, em Londres, sobre a conjuntura de Portugal como ‘nação’ e seu

exemplo de luta contra as forças francesas em sua invasão.

“Portugal (disse Lord Liverpoll), nação pouco poderosa, e talvez, naquele

momento particular, a menos militar da Europa, se fez formidável, e resistiu

com bom sucesso às mais bem disciplinadas tropas da França. [...] foi Portugal,

quem começou a dar a esta guerra novo caráter, tornando-a guerra nacional,

em vez de guerra dos Governos que até então era. (CB, 1813, vol. 11, p. 812).

Nesse sentido, a ‘nação’ portuguesa deveria olhar para si mesma, e encontrar as

forças necessárias para se levantar e reconstruir os espaços físicos e os morais que haviam

sido destruídos por Napoleão Bonaparte em sua invasão, no ano de 1808. O apoio inglês

nas esferas financeiras, de logística, e militar foi imprescindível para a manutenção do

reino português, contudo, o preço foi alto. Apesar de ressaltar a Inglaterra como uma

nação a ser seguida de exemplo, e talvez por assim ser, Hipólito, considera a revisão de

certos acordos entre as duas partes, para que a ‘desvantagem’ comercial ficasse mais

branda, e Portugal pudesse respirar sem os sopros vindouros ingleses.

O Brasil deveria dar o ouro; e Portugal à gente; mas S. A. R. acha-se só no seu

Conselho, e todas as vezes que a falta de dinheiro, os seus financiamentos não

sabem cogitar outro meio, senão pedir emprestado para a Inglaterra. [...] Não

é assim, que uma nação que tem a possibilidade de figurar; pode nunca chegar

a ser poderosa. (CB, p. 814, vol. 11, 1813)

É dessa maneira, que Hipólito da Costa, editor do Correio Braziliense, traça seus

paralelos, tece suas críticas, exemplifica e oferta dicas, sempre cogitando melhoras na

administração e na política de Portugal. Acredita piamente num belo momento para o

Brasil talvez como ‘nação’, como reino; através de uma independência e o

estabelecimento de uma monarquia constitucionalista, aos moldes da Inglaterra, ao

mesmo passo, que Portugal faça o mesmo diminuindo o poder dos ministérios e

fortalecendo as câmaras dos deputados; dignificando o papel do monarca e diminuindo a

7 Robert Banks Jenkinson, 2º Conde de Liverpool, KG foi um político britânico, que por mais tempo foi

primeiro-ministro do Reino Unido, enquanto foi primeiro-ministro, entre 1812 a 1827. Arquivo Nacional

do Governo do Reino Unido. Disponível em https://www.gov.uk/government/history/past-prime-

ministers/robert-banks-jenkinson-earl-of-liverpool . Acesso em 10 de junho de 2015.

Page 16: Edenir Vancini

influência de seus conselheiros. Acreditava, em dois reinos prósperos, unidos, talvez

como reinos-irmãos, que se auxiliam mutuamente nas dificuldades e nas benesses.

2. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do caminho percorrido neste trabalho conseguimos perceber que

esmiuçando o Correio Braziliense, que apesar do seu título, a sua escrita não está

propriamente concentrada nas relações sociais, políticas e econômicas brasileiras, mas

sim num conjunto de ações da Coroa Portuguesa para com os demais países europeus,

diante das transformações no cenário mundial, no período em questão. É perceptível a

preocupação política na escrita do editor-chefe, Hipólito da Costa, e está norteia o seu

trabalho.

A escolha pela Guia “Miscelanea”, facilitou a realização dessa pesquisa, pois a

compreensão e fluência empregada na escrita dessa sessão do periódico se fazem de

maneira mais simples em relação às demais guias. Os termos próprios da documentação

oficial e a vigência da língua portuguesa, que no período compreendia uma grafia

diferente da atual, nas demais ‘seções’ do mensário determinam um processo de leitura

mais rigoroso, denso, onde se faz necessária por vezes o uso de uma ferramenta jurídica,

como um manual, do mesmo modo que, um conhecimento básico (prévio) na área.

Outro ponto levantado sobre a análise de jornais e que por vezes tornou a pesquisa

um tanto ‘complexa’, dialoga com a dificuldade de ‘garimpar’ os dados em suas páginas

e a ausência por vezes da fidedignidade, objetividade, neutralidade, credibilidade e o

distanciamento do seu próprio tempo, o que de certa maneira, explica a escassez dos

impressos (periódicos) na construção da historiografia brasileira, pois os mesmos por

muito tempo foram ‘descartados’, como uma possibilidade de fonte na escrita da História,

sendo que a explicação se dá nos seguintes parâmetros, Luca:

[...] os jornais, pareciam pouco adequados para a recuperação do passado, uma

vez que essas “enciclopédias do cotidiano” continham registros fragmentários

do presente, realizados sobre o influxo de interesses, compromissos e paixões.

Em vez permitirem captar o ocorrido, dele forneciam imagens parciais,

distorcidas e subjetivas (LUCA, 2005, p. 112).

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Para não incorrer em anacronismos de espaço temporal e terminologias da escrita

portuguesa na época, o estudo foi direcionado sobre a perspectiva da pesquisa

documental, respeitando a grafia das palavras e dos conceitos construídos pelo editor ao

longo do seu texto, diga-se o Correio Braziliense.

Contudo, percebemos ainda muitas lacunas que mereceriam aprofundamento e

futuras pesquisas, pela relevância que o Correio Braziliense tem para a compreensão do

surgimento da imprensa no Brasil, o discurso jornalístico e o seu papel junto à sociedade,

no início do século XIX. Um discurso político que por sua vez, se mostrava monarquista,

sendo o qual, se baseava no modelo inglês, uma monarquia constitucional; onde se

reconhece a figura do monarca (chefe simbólico do poder executivo), mas existe uma

limitação de seus poderes através das leis fundamentais (constituição).

3. REFERÊNCIAS

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