Escola Estadual Afonso Pena.(Acervo fotogrfico Museu Mineiro)
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ISBN: 978-85-99528-10-5
Pereira, Jnia Sales
P436e Escola e Museus: dilogos e prticas / Jnia Sales Pereira,
Lana Mara de Castro Siman, Carina Martins Costa, Silvania Sousa do Nascimento. -
Belo Horizonte: Secretaria de Estado de Cultura / Superintendncia de Museus;
Pontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais / Cefor, 2007.
128 p.
1. Museus e escolas. 2. Museus - aspectos educacionais. 3. Patrimnio cultural.
4. Cultura. I. Siman, Lana Mara de Castro. II. Costa, Carina Martins. III. Nascimento,
Silvania Sousa do. IV. Pontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais. V.
Secretaria de Estado de Cultura.
CDD - 708
Catalogao da Fonte : Biblioteca da FaE/UFMG
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ESCOLA E MUSEU
DILOGOS E PRTICAS
SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA DE MINAS GERAIS
SUPERINTENDNCIA DE MUSEUS
PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DE MINAS GERAIS/CEFOR
BELO HORIZONTE - 2007
JNIA SALES PEREIRA
LANA MARA DE CASTRO SIMAN
CARINA MARTINS COSTA
SILVANIA SOUSA DO NASCIMENTO
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Governador do Estado de Minas Gerais
ACIO NEVES
Vice-Governador do Estado
ANTONIO AUGUSTO JUNHO ANASTASIA
Secretria de Estado de Cultura
ELEONORA SANTA ROSA
Secretrio Adjunto
MARCELO BRAGA DE FREITAS
Superintendente de Museus
SILVANIA SOUSA DO NASCIMENTO
Diretoria de Desenvolvimento de Aes Museais
FRANCISCO CARLOS DE ALMEIDA MAGALHES
Diretora de Desenvolvimento de Linguagens Museolgicas
ANA MARIA WERNECK
Pontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais
Gro Chanceler
DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO
Reitor
PROF. EUSTQUIO AFONSO ARAJO
PUC Minas Virtual
Diretora de Ensino a Distncia
MARIA BEATRIZ RIBEIRO DE OLIVEIRA GONALVES
CEFOR PUC MINAS
Coordenao Geral
CARLA FERRETTI SANTIAGO
Coordenao Acadmico Pedaggica:
LANA MARA DE CASTRO SIMAN
LORENE DOS SANTOS
VALRIA DE OLIVEIRA ROQUE DE ASCENO
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Diretor do Museu Casa Guimares Rosa /Cordisburgo
RONALDO ALVES DE OLIVEIRA
Presidente da Associao de Amigos do Museu Casa Guimares Rosa
SOLANGE AGRIPA TOMBINI
Projeto grfico/ilustraes
FREDERICO S MOTTA
Gesto financeira
VIA SOCIAL PROJETOS CULTURAIS LTDA
Participao especial
FRANCISCO RGIS LOPE RAMOS
ARACI RODRIGUES COELHO
SORAIA FREITAS DUTRA
Realizao
GOVERNO DE MINAS, SUPERINTENDNCIA DE MUSEUS E CEFOR PUC - MINAS
Patrocnio
CEMIG - GOVERNO DE MINAS GERAIS
Apoio
MINISTRIO DA CULTURA - Lei de incentivo Cultura
Agradecimentos
CLUDIA ROSE RIBERIO SILVA, MRIO CHAGAS, ANA MARIA WERNECK, MEIRI ANA MOREIRA CASTRO SILVA,
GRECIENE LOPES, JOANNA GUIMARES FERNANDES, CARLA FERRETI SANTIAGO, RICCY ANDERSON, FERNANDA DINARDO.
Agradecimentos a instituies
MUSEU MINEIRO, MUSEU ABLIO BARRETO, MUSEU MARIANO PROCPIO, MUSEU DA MAR.
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REALIZACAO
PATROCNIO APOIO
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SUMRIO
Apresentao
PARTE I - ESCOLAS E MUSEUS: DIALOGIA E REFLEXO
EDUCAR POR MEIO DO DILOGO ...........................................................................................18
Um dilogo entre educadores sobre o museu ........................................................................20
PARTE II - A ESCOLA VAI AO MUSEU
DILOGOS COM OS MUSEUS ..................................................................................................32
Formao profissional por meio das prticas educativas no Museu .......................................34
Leitura de objetos museais......................................................................................................41
Detetives no museu.................................................................................................................52
Balaio de Idias - Abordagem dos museus pelas escolas .....................................................65
Balaio de Idias - Planejando a visita ao museu ...................................................................68
PARTE III - REPERTRIO DE PRTICAS EDUCATIVAS EM MUSEUS
EDUCAR ATRAVS DE FRAGMENTOS
Cenrios e Experincias
Museu do Cear, Projeto Patativa ...........................................................................................76
Museu Histrico Ablio Barreto, Belo Horizonte, Projeto "Onde mora a minha histria" - MHAB
e Escola Jos Maria Alkmin, Bairro Serra Verde .....................................................................81
Museu da Mar, Rio de Janeiro ..............................................................................................83
Museu dos Cavalcanti, Oficinas do Tempo e do Espao ........................................................86
Museu Mariano Procpio - Projeto Uma casa e seus segredos ..........................................92
Museu Mineiro - Escola vai ao Museu... Museu vai a Escola... ............................................97
EDUCAR POR MEIO DOS SENTIDOS
Balaios de Idias
Sensibilizao de pblicos - O uso do caleidoscpio ...........................................................103
Sensibilizao de pblicos - O uso das caixas sensoriais.....................................................105
Sensibilizao esttica - A casa do Fazer ..............................................................................107
Concluso
..............................................................................................................................................112
Bibiografia ............................................................................................................................116
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APRESENTAO
A Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais, por intermdio de sua Superintendncia de
Museus - Sum, alm da gesto de suas unidades Museu Mineiro, em Belo Horizonte; Museu Casa
Guimares Rosa, em Cordisburgo; Museu do Crdito Real, em Juiz de Fora, Museu Casa Alphonsus
de Guimaraens, em Mariana, e Museu Casa Guignard, em Ouro Preto vem se consolidando como
difusora de conhecimento sobre o patrimnio museolgico mineiro.
Sua criao, em 1979, fez parte das aes preservacionistas que marcaram os anos 1970, com a
instalao do Instituto Estadual do Patrimnio Histrico e Artstico de Minas Gerais a consolidao
de uma primeira rede de museus mineiros e a demarcao de nosso patrimnio edificado.
Ultrapassando sua maioridade no sculo XXI, a Sum desloca sua agenda para os objetos museais
entendidos na dimenso de fragmentos de cultura presente em cerca de 300 museus identificados
no estado.
Aproximar desse universo de questes sempre um desafio, e nesse momento foi escolhido a inter-
face da Escola como vetor de transformao. A presente obra: Escola e Museu: dilogos e prticas,
escrito em parceria com a equipe do CEFOR - PUC Minas, agrega a ao constante de formao e
atendimento ao pblico da Sum ao olhar reflexivo da escola. Os cenrios reais e fictcios buscam pro-
mover o distanciamento do fazer museolgico e registram algumas prticas bem sucedidas de for-
mao e de fruio cultural quotidianamente vivenciados pelas equipes dos museus. Essa obra, via-
bilizada com recursos da Lei de Incentivo Cultura/Minc em parceria com a CEMIG, foi acolhida pela
Associao de Amigos do Museu Casa Guimares Rosa e traz em seu cerne discusses que atendem
demanda tanto das equipes dos museus quanto dos professores preocupados em ampliar o hori-
zonte cultural de nossos jovens. As trs partes que compem a obra abrem mltiplos espaos.
Mais que um guia de ao educativa apresentamos um convite, uma provocao para a construo
de debates, de dilogos. A Secretaria de Estado de Cultura espera assim colaborar com o
amadurecimento das reflexes que permeiam a prtica educativa dos museus.
Eleonora Santa Rosa Silvania Sousa do Nascimento
Secretria de Estado de Cultura Superintendente de Museus
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INTRODUO
Os museus so ambientes culturais e educativos. Pretendem educar por meio da sensibiliza-
o e cultivam a comunicao e produo de significados a partir de seus objetos, exposies,
propostas educativas e outras. A exposio muitas vezes requer o uso da palavra, mas
preenche o espao tambm com outros sentidos, com outra materialidade, com outras si-
gnificncias. Luz, sombra, vazios, tridimensionalidade... vidros, textos e objetos... cole-
cionadores, pesquisadores, muselogos, agentes educativos, visitantes... setas, cores,
direes... memrias, esquecimentos... fios tecidos nos mltiplos gestos de interpretao.
So tambm territrios de educao do olhar, pois neles so encenados gestos, sentidos e
movimentos imaginativos diversos.
O museu reconhecidamente, ainda, uma instituio de memria das sociedades, das naes, dos
grupos, das comunidades e, portanto, detentora de colees , de indcios patrimoniais e iden-
titrios. Trata-se de instituio social, cultural e histrica, promotora de argumentos culturais, polti-
cos e ticos, vinculando-se, por isso, a uma temporalidade e s peculiaridades de uma sociedade.
, tambm, ambiente de encantamento, entretenimento, admirao, confronto e dilogo.
MUSEU - Um museu uma instituio permanente, sem fins lucrativos, a servio da sociedade e de seu
desenvolvimento, aberta ao pblico, que adquire, conserva, pesquisa, divulga e expe, para fins de estudo,
educao e lazer, testemunhos materiais e imateriais dos povos e seu ambiente.
(Revista Museu, ICOM www.revistamuseu.com.br)
EXPOSIO - exibio pblica de objetos organizados e dispostos com o objetivo de comunicar um conceito
ou uma interpretao da realidade. Pode ser de carter permanente, temporrio ou itinerante.
(Revista Museu - www.revistamuseu.com.br
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As dimenses espaciais, materiais e simblicas impem-se ao visitante, pela grandiosidade
de sua prpria edificao, como no Museu Paulista e seus jardins simtricos; pela singulari-
dade, como os museus-casa, que abordam a simbologia e fazeres da vida cotidiana; ou, ainda,
pelo ambiente reconstrudo como cascas simblicas que permitem olhar para os mltiplos
usos: museu que foi priso, que foi residncia, que foi roa... A relao do museu com seus
objetos e seu entorno convida o visitante a ser um viajante do presente no passado, instigan-
do-o a revisitar o seu prprio tempo, lugares, paisagens e expresses e os tempos, lugares,
paisagens e expresses de outros grupos, culturas e sociedades que com eles se conectam.
Conexes nem sempre familiares aos visitantes, mas provocadoras do alargamento de seus
horizontes temporais e espaciais.
Como olhar o museu e no pensar em sua espacialidade e em sua concretude, em smbolos
repletos de significados? Portas concretas, portas simblicas que se abrem para o contato
com o outro, com o diferente. Ambientes aparentemente iguais em suas formas, mas singular-
mente diferentes em seus usos.
Como olhar o museu e no pens-lo como um espao que preserva e educa? Educa no
somente pela sua materialidade, mas tambm pelas palavras1, pelos gestos, pelos saberes,
pela sonoridade e silncios, pelas relaes que nele se estabelecem.
Para quem fala o museu e como
fala? Os museus falam para dife-
rentes pblicos e, de uma forma
muito intensa, para os pblicos
escolares. Os museus falam por
meio de vrias lnguas e por meio
de vrias linguagens. E as lingua-
gens, em suas entonaes, seus
ritmos, suas paragens...
MEMRIA - A elaborao da memria se d no presente e para
responder a solicitaes do presente (MENEZES, 2000, p.93). Os
museus so espaos de memria e esquecimento e, portanto, re-
presentam disputas entre narrativas. Distinguir entre conjunturas
favorveis ou desfavorveis s memrias marginalizadas de sada
reconhecer a que ponto o presente colore o passado. Conforme as
circunstncias, ocorre a emergncia de certas lembranas, a nfase
dada a um ou outro aspecto. (...). Assim, tambm, h uma perma-
nente relao entre o vivido e o aprendido, o vivido e o transmiti-
do. (POLLACK, 1989, p. 6).
1 No museu, a palavra uma espcie de ponte lanada entre mim e os outros (BAKHTIN, 1929, p.113)
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E as linguagens, em seus diferentes suportes-auditivos, visuais, digitais, transformam o
aprendizado, capaz de desenvolver habilidades diversas e aprimorar o senso esttico e crtico,
bem como o gosto pelo diverso.
E para que o museu nos fale em suas diferentes linguagens, o tempo de aprender exige outra
cadncia, outros compassos e outros ritmos, diferentes do que lhes impem, muitas vezes, as
visitas escolares. Os projetos educativos podem durar horas, semanas, meses. Ou minutos.
Um determinado objeto ou sesso de uma exposio pode convidar para uma pausa maior,
outro a dispensa, outros nos convidam ao dilogo com aqueles que nos acompanham. Outros,
ainda, nos so indiferentes.
Um ligeiro passar de olhos na programao dos museus permite vislumbrar o dinamismo
dessas instituies. Uma anlise mais detida possibilita perceber as diferentes concepes de
aprendizagem em jogo, o que influi significativamente em seu potencial educativo e nos li-
mites da relao entre museus e escolas.
Tomamos, assim, o desafio de apresentar e discutir algumas concepes educativas que con-
sideramos promissoras. Essas se apresentaro focadas na especificidade do espao museal,
antenadas com questes advindas do profcuo dilogo entre a museologia e a educao, que
tm como objetivo central a compreenso dos desafios e perspectivas anunciados na pro-
moo de uma educao em seu sentido pleno.
Este Livro se organiza a partir da compreenso de que a educao se realiza em vrios ambi-
entes sociais e culturais e de que necessria e urgente a ampliao do debate entre as insti-
tuies e os diferentes sujeitos de ao educativa. Sua pretenso apresentar algumas
reflexes, contextos, experincias e idias que possibilitem o fortalecimento do movimento -
j em curso - de parceria entre escolas e museus atravs do enfrentamento de dimenses con-
stitutivas da ao educativa .
O texto est organizado em trs partes. Na primeira, Escolas e Museus: dialogia e reflexo,
voc encontrar um texto construdo na forma de um dilogo entre educadores das escolas e
dos museus. O educador inserido em ambientes escolares questiona o papel do museu, busca
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compreender as mltiplas maneiras de uso do museu e de suas potencialidades educativas.
O educador do museu no s responde quele educador, mas se sente por ele provocado a
melhor conhecer o seu prprio ofcio; e ambos constroem, por meio do dilogo, novas vises
e vislumbram possibilidades, tanto no mbito da escola, quanto no mbito do museu, como
na relao entre ambas as instituies.
A segunda parte, A Escola vai ao Museu, traz reflexes promovidas a partir de experincias
que conferem centralidade aos objetos museais e s aes docentes, em situaes em que lin-
guagem e interaes ampliam as possibilidades educativas da escola. Os gestos educadores
relatados implicam uma valorizao dos objetos museais como mediadores de interpretao e
de promoo de novos e mltiplos significados por crianas e professores em sua relao com
ambientes museais. Essa ser tambm uma oportunidade de reflexo sobre alguns desafios da
formao profissional circunstanciada pela vivncia da escola e do museu como ambientes
educadores. Mantendo a intencionalidade de problematizao da busca do museu pela esco-
la, ainda nessa seco do texto voc encontrar o que chamamos de Balaio de Idias, um
conjunto de indicaes e aes prticas que compem um acervo de idias para inspirar, con-
frontar e inseminar a sua prtica profissional.
A terceira seo intitula-se Repertrio de prticas educativas em museus e enuncia o poten-
cial educativo dos museus. dividida em duas partes, uma composta de Cenrios e
Experincias em Museus e seus desafios educativos e a segunda constituda de trs Balaios
de Idias, que sinalizam para a promoo de uma educao plena de significados e permeada
pelos fundamentos de uma educao dos sentidos.
AO EDUCATIVA - procedimentos que promovem a educao no museu, tendo o acervo como centro de suas
atividades. Pode estar voltada para a transmisso de conhecimento dogmtico, resultando em doutrinao e
domesticao, ou para a participao, reflexo crtica e transformao da realidade social. Neste caso, deve ser
entendida como uma ao cultural, que consiste no processo de mediao, permitindo ao homem apreender,
em um sentido amplo, o bem cultural, com vistas ao desenvolvimento de uma conscincia crtica e abrangente
da realidade que o cerca. Seus resultados devem assegurar a ampliao das possibilidades de expresso dos
indivduos e grupos nas diferentes esferas da vida social. Concebida dessa maneira, a ao educativa nos
museus promove sempre benefcio para a sociedade, em ltima instncia, o papel social dos museus.
In: Revista Museu www.revistamuseu.com.br
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Em todo o Livro voc encontrar verbetes, termos e explicaes dispostos na forma de um
glossrio disperso pelo texto, compondo um universo conceitual e reflexivo que pretende ofe-
recer mais aprofundamento s discusses, convidando pausa e anlise mais cuidadosa das
temticas abordadas.
Este texto , portanto, um convite troca experiencial, pressupondo que o leitor far tambm
suas interrogaes e provocaes ao texto e s narrativas que o compem. Privilegiando o
debate, no pretende este texto ser um roteiro prescritivo de aes educativas, mas uma refe-
rncia para ser questionada, acrescida, modificada e, assim, cumprir o papel provocador de
outras tantas conversas sobre as potencialidades educativas que os museus oferecem s esco-
las e aos educadores em geral.
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PARTE I
ESCOLAS E MUSEUS:
DIALOGIA E REFLEXO
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EDUCAR POR MEIO DO DILOGO
Voc j parou para pensar no poder do dilogo? J pensou tambm que o dilogo com outros
profissionais pode ser importantssimo para a sua formao como educador?
O dilogo entre profissionais permite a socializao de prticas e descobertas, o confronto de
concepes, o exerccio de atitudes - como ouvir idias, concordar ou no com argumentos - e
o cultivo da prtica de reviso de concepes prvias. Esse processo de mo-dupla - emisso e
recepo de idias - pode gerar, em ambos os sujeitos de um dilogo, movimentos tanto de
reafirmao de idias anteriores quanto de reconsiderao de outras. Por isso, num contexto
dialgico podem ocorrer deslocamentos de concepes anteriores e apreciao de antigas
idias. Quando realizado de forma propositiva, o dilogo promove descobertas importantes, mas
um princpio fundamental para que isso ocorra a abertura ao novo, ao diferente e provocao.
Os dilogos tambm nos proporcionam maior compreenso de quantos argumentos podem
ser utilizados para favorecer uma mesma idia e de que maneira podemos mobilizar nosso
pensamento para criar argumentos mais coerentes e afinados com o que pensamos.
Ao participarmos de um dilogo, portanto, podemos nos tornar mais conscientes do que de
fato pensamos sobre uma srie de coisas, compreendendo, ao mesmo tempo, como poss-
vel pensar diferente, se esse for o caso. Num dilogo de idias contrastantes, tambm apren-
demos que a emergncia de oposies argumentativas pode ocorrer sem oposies pessoais.
Um bom debate de idias pode fortalecer amizades, especialmente quando os envolvidos tm
a compreenso de que muito do que pensam sobre as coisas do mundo tambm se afirma em
situaes de contradio.
18
DIALOGISMO - No dialogismo, o sujeito portador de seu prprio discurso, atuando num espao real de inter-
ao e constitui-se sujeito tambm medida que interage com os outros, com os objetos e com as circunstn-
cias. A cada movimento interlocutivo, nessa perspectiva dialgica, a linguagem se reconfigura, reconstri-se,
e, dessa maneira, tambm o sujeito se reconstri. (GERALDI, 1995).
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PROCESSO MUSEOLGICO - Assim como na educao, o processo museolgico compreendido como aoque se transforma, que resultado da ao e da reflexo dos sujeitos sociais, em determinado contexto, pass-
vel de ser repensado, modificado e adaptado em interao, contribuindo para a construo e reconstruo do
mundo. Da, o sentido de associarmos o termo processo s aes de musealizao, compreendido como uma
seqncia de estados de um sistema que se transforma, por meio do questionamento reconstrutivo, e que, ao
transformar-se, transforma o sujeito e o mundo. A utilizao do termo processo permite atribuir, portanto, as
dimenses social e educativa Museologia (SANTOS, 2002, p. 314).
Pense como esse movimento fundamental aos processos formativos que os professores viven-
ciam com seus alunos, pois ele indica o valor dos argumentos constitudos na interao entre
sujeitos, processo que pressupe situaes de dialogia , concepo muito cara docncia.
O que voc ler a seguir um dilogo travado entre Ivan, um educador em atuao numa esco-
la de Ensino Fundamental, e Alice, uma educadora que tem experincia profissional de desen-
volvimento de projetos educativos em museus.
Ivan quer compreender de que maneira ele pode, como docente, fazer uso dos museus e foi
assim que o dilogo se iniciou. Ele conhece pouco sobre as possibilidades da relao escola-
museu. Alice, por sua vez, portadora de um conjunto de experincias em setor educativo de
museus e toma as questes de Ivan como uma oportunidade para rever e ampliar a compreen-
so de suas aes como educadora nos museus e do significado do processo museolgico.
Esses personagens travam um dilogo que esperamos ser instrutivo tanto para os professores
como para aqueles que se encarregam de promover as aes educativas dos museus.
Voc ver que Ivan busca compreender melhor o que so os museus, como funcionam e como
atuam os educadores de museus. Alm disso, ele deseja conhecer algumas peculiaridades e as
oportunidades que ele pode explorar a partir da relao escola-museu, problematizando e
superando, dessa forma, algumas de suas concepes anteriores. Alice usa a oportunidade para
afinar seus argumentos, mas tambm se v diante de questes incmodas e provocativas. Ela
tambm sair do dilogo mais reflexiva e mais questionadora de suas prticas e concepes.
Sugerimos que voc faa sua leitura de maneira a conversar com os sujeitos, indicando, nesse
movimento de ler, que concepes voc reafirma, que outras voc ressignifica, que outras tantas
voc cria.
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UM DILOGO ENTRE EDUDADORES SOBRE O MUSEU
IVAN - Alice! Que bom poder falar com voc. que eu soube, por um amigo, que voc
pode me esclarecer dvidas sobre os museus!
ALICE - Vamos conversar para ver em que medida eu posso lhe ajudar. Estou disposio!
IVAN - Eu no sei de fato o que so os museus hoje em dia e tenho dvidas sobre as suas
finalidades educativas e sobre os servios que eles oferecem, principalmente para pro-
fessores.
ALICE - Essa uma boa questo. Normalmente, os professores, ao longo de sua trajetria
como estudantes ou como professores, j visitaram diferentes museus. No entanto, os
museus vm mudando muito nas ltimas dcadas, esforando-se por promover, por meio
da ao de seu setor de ao educativa, vrias atividades de atendimento ao pblico.
IVAN - Mudando... Como assim? Gostaria de saber um pouco mais sobre isso, pois eu
sempre achei os museus uma coisa meio chata, cansativa de visitar. Conte-me a
respeito dessas mudanas.
ALICE - Sobre esse assunto, h uma extensa bibliografia e, para aprofundamento, penso
que demandaria de ns mais investimentos em leitura e discusses. Mas, inicialmente,
interessante pensarmos que os museus so instituies socioculturais criadas com fina-
lidades diversas, entre elas a de melhor conservar os registros da cultura humana, sele-
cionados como importantes em um dado momento. At muito recentemente, os museus,
em sua maior parte, se restringiam a conservar e a expor a memria dos grandes acon-
tecimentos da memria oficial das naes, por exemplo, atravs das pinturas, dos obje-
tos, do imobilirio dos palcios ou das residncias oficiais, das armas, dos smbolos
nacionais e regionais de grandes batalhas2.
IVAN - mesmo! Como o Museu da Repblica no Rio de Janeiro...
ALICE - Hoje em dia, a grande maioria desses museus tambm vem mudando e inmeros
deles passaram a deixar claro que sua exposio reveladora de uma leitura dos acon-
tecimentos, de um olhar, de uma seleo, entre outras possveis. Enfim, os museus pas-
sam a questionar o prprio papel e lugar construdo para ele pela sociedade. Ele no
20
2 Ver, a respeito da histria dos museus e do surgimento dos primeiros museus no Brasil, entre outros: JULIO, 2002.
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pretende mais expor a verdade, a nica verdade sobre os acontecimentos, sobre um
personagem ou uma temtica.
IVAN - , isso interessante... Mas, como o museu rompe com essa idia?
ALICE - Por exemplo, comunicando a idia de que composto de linguagens e interpre-
taes da realidade, construdas historicamente e selecionadas pelas suas equipes para
essa finalidade, portanto, de que o museu fruto de escolhas, de intencionalidades e de
pesquisas3.
Ivan - Eu achei bacana essa idia, mas voc poderia dar um exemplo para que eu compreen-
da melhor?
ALICE - Ah, vamos pensar nas exposies. No sei se voc j notou que muitos museus
tm exposies permanentes e temporrias. As exposies permanentes, em geral, os
caracterizam, pois sobre elas recai normalmente a centralidade temtica do museu. Por
exemplo, o Museu do Ouro, Museu da Independncia, Museu de Astronomia e outros. As
exposies temporrias no s aproveitam parte do acervo que no foi explorado na
exposio permanente, como tambm so palcos de inovaes, ousadias, aprofunda-
mento de temas e conceitos.
Possuem a caracterstica do dilogo com o contemporneo....
IIVAN - Ento, as exposies permanentes no dialogam com o contemporneo?
ALICE - Essa uma questo em que eu no havia pensado... Mas acho que voc
abordou um aspecto muito importante que me pe a pensar sobre a natureza das
exposies permanentes. Acho que pensar, sobretudo, se essas exposies nunca
inovam ou se somos ns que no estamos levando novas questes a elas.
IVAN - Voc quis dizer que o pblico pode tornar uma exposio permanente como uma
exposio contempornea?
ALICE - , d o que pensar!
21
3 Vejamos um trecho do texto que apresenta a nova exposio de longa exposio do Museu Histrico Ablio Barreto "Belo Horizonte
- Tempo e movimentos da Cidade Capital". Ela foi organizada de forma a sugerir ao pblico novos sentidos e interpretaes sobre
a dinmica e a histria da cidade, assumindo o Casaro e seu entorno imediato como elementos estruturadores e integrantes de uma
narrativa sobre Belo Horizonte.. Ref.: Agenda Museu Histrico Ablio Barreto, abril 2007.
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ALICE - Ah! Voc me fez lembrar do Museu de Casa de Guimares Rosa, em
Cordisburgo, MG, que tem uma exposio permanente, mas que dialoga com o
pblico de maneira dinmica e inovadora, por exemplo, por meio do projeto dos
Miguilins4.
IVAN - Voc est me fazendo ficar cada vez mais curioso, quero muito saber a
respeito das possibilidades educativas dos objetos, das exposies e de outros pro-
jetos desenvolvidos pelos museus.
ALICE - Esse um assunto mais longo e penso que podemos voltar nossa conver-
sa depois de conhecer tudo o que o texto vai conter.
Ivan - Pra falar a verdade, eu tive poucas oportunidades de conhecer museus dife-
rentes...
ALICE - Sabe, hoje ns assistimos ao aparecimento de vrios outros tipos de
museus. Voc j ouviu falar no Museu da Pessoa5, no Museu da lngua Portuguesa6,
no Museu de Artes e Ofcios7 e outros? Eles so, portanto, instituies de preservao da
memria social que uma sociedade, uma pessoa ou um grupo pode criar. Eles podem
ser temticos, ou seja, organizam-se em torno de um assunto, um tema ou um acervo
22
4 No Museu Casa de Guimares Rosa, criado em maro de 1974, em Cordisburgo, MG, funciona o Grupo de Contadores de Estrias
Miguilins, composto atualmente de 53 jovens que estudam, narram e encenam trechos da obra de Guimares Rosa, renomado
escritor mineiro, autor, entre outros, de Grande Serto Veredas. O museu em questo destaca-se por sua forte relao com a comu-
nidade de Cordisburgo, em especial pela vinculao estabelecida entre o museu e a Associao Comunitria Estrelas do Serto e a
Sociedade Amigos do Museu Casa de Guimares Rosa, bem como com moradores da cidade de Cordisburgo, alm de iniciativas,
estudos e projetos sob responsabilidade de pesquisadores vinculados a Centros Universitrios do pas, entre eles a USP e a UFMG.
Vide: ALMADA; DARDOT, 2006. Sobre o museu ver em: http://www.cultura.mg.gov.br5 Ser um lugar onde qualquer pessoa pode eternizar sua histria de vida. Esta a misso do Museu da Pessoa. Criado em 1991, com
metodologia prpria para o registro de depoimentos, a instituio formou um acervo pioneiro com histrias de vida, fotos e docu-
mentos, transformando a memria em estratgia de valorizao das pessoas. (...) A idia original surgiu entre 1988 e 1991 quando
Karen Worcman, uma das fundadoras do Museu da Pessoa, coordenava o projeto de histria oral na pesquisa "Heranas e lem-
branas: imigrantes judeus no Rio de Janeiro", que resultou em 200 horas de depoimentos gravados. (MARIUZZO, 2006).6 Museu da Lngua Portuguesa ou Estao da Luz da Nossa Lngua, So Paulo, SP. um museu interativo, inaugurado em maro de
2006, sobre a lngua portuguesa, localizado na cidade de So Paulo, no histrico edifcio Estao da Luz, no Bairro da Luz, conce-
bido pela Secretaria da Cultura de So Paulo, em conjunto com a Fundao Roberto Marinho. No Museu o pblico convidado a
realizar passeios sensoriais pelo idioma, o que inclui a explorao dos sentidos, a explorao dos objetos e tambm recursos inte-
rativos como jogos, filmes e atividades em grupo. Ver em www.estacaodaluz.org.br 7 Museu de Artes e Ofcios um espao cultural inaugurado em dez de 2005, dedicado s artes e ofcios e ao trabalho no Brasil. uma
iniciativa do Instituto Cultural Flvio Gutierrez, e funciona nos prdios histricos da Estao Central, em Belo Horizonte, MG. A coleo
mostra a riqueza da produo popular na era pr-industrial: os fazeres, artes e ofcios que deram origem s profisses contemporneas.
Ao percorr-la, com o suporte de recursos museogrficos e de aes educativas, o visitante poder ver um amplo painel da histria e
das relaes sociais do trabalho no Brasil, nos ltimos trs sculos In: www.mao.org.br
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PRESERVAO - O grande desafio do sculo XXI, e no s do museu, a questo do patrimnio cultural, de a
pessoa sentir que tem valor, que dona e que aquilo dela e ela precisa preservar. Porque, geralmente, a
preservao dentro dos museus uma preservao artificial, digamos assim, pois feita dentro de uma insti-
tuio, que fez uma escolha de valor de determinados objetos. A coisa mais complicada do sculo XX fazer
poltica de acervo, definir o que a gente vai guardar para a gerao futura. Nisso ns continuamos guardando
o resultado da excluso, eu no tenho visto a promoo da incluso nas escolhas do que preservar (CORSI-
NO, 2004, p. 426).
especfico (privado ou pblico). Por isso, um museu sempre o resultado das
escolhas que uma comunidade especfica, um sujeito ou um rgo pblico fez na tentati-
va de preservao de registros que esses agentes pretendem preservar. Eles so institui-
es de memria, portanto, de vrias memrias: da histria, da vegetao, da paisagem,
das tcnicas de produo, dos fazeres cotidianos, dos grandes feitos nacionais, dos va-
lores, das tradies, das expresses artsticas dos homens. Eles so ambientes histricos,
construdos e reconstrudos pelos processos de seleo realizada por algum em algum
contexto circunstancial.
IVAN - Puxa vida... Voc conhece esses vrios tipos de museus? E j teve experincia,
como educadora em muitos deles?
ALICE - No... Eu conheo apenas alguns e tambm me considero em processo de for-
mao, alis, a gente nunca est pronto, no mesmo? Estamos sempre buscando, por
meios os mais diversos, nos formar. Alm disso, os museus so instituies de pesquisa
e, por isso, requerem de ns uma postura investigativa permanente. Estamos sempre em
formao, portanto, e tambm temos dvidas sobre a funo do museu, sobre a nossa
atuao profissional como educadores de museu...
IVAN - Mas o que eu gostaria de aprofundar mesmo a respeito das possibilidades educa-
tivas dos museus. Como que eles realizam sua funo educativa? Em que eles se dife-
renciam das escolas? E mais, como que eu, um educador, posso me apropriar dessa
potencialidade que os museus oferecem?
ALICE - Os museus so instituies educadoras, tenham ou no um setor especfico
encarregado da ao educativa. Ele exerce a sua funo educativa na sua relao com
os visitantes e dos meios dos quais se vale para comunicar com os diferentes pblicos,
entre eles o pblico escolar.
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Os museus tm na comunicao uma de suas finalidades e funes. Mas eu falo de uma comunicao
dialgica e reflexiva, concebida como processo de mediao entre sujeitos, objetos e propostas. Por
isso, eles tambm so educadores, pois a comunicao que eles realizam pretende possibilitar a con-
struo de uma relao renovada dos sujeitos com os registros de memria e o patrimnio, apresen-
tando-se como instituio portadora de uma postura tica, formativa e humanizadora.
IVAN - Voc est dizendo que eles tm uma linguagem prpria, diferente da linguagem da
escola?
ALICE - Eu tenho pensado muito nisso ultimamente. Sabemos que o museu promove sua
maneira a circulao e produo de novos significados, saberes e conhecimentos. E o faz
por meio da linguagem museolgica em que esto presentes, por exemplo, a materiali-
dade e originalidade de objetos e registros, a concepo das exposies, os recursos do
ambiente como formas de comunicao e o cuidado com o gosto esttico. Tem algo dife-
rente das escolas nesse sentido, no? Mas eu tambm compreendo que eles constroem
um discurso prprio.
IVAN - Como assim, um discurso?
ALICE - Um discurso uma forma de dizer, ou seja, o modo como se diz numa situao
de comunicao, nesse caso, do museu com os seus pblicos. Por exemplo, cada museu
tem uma forma de apresentar temticas e discusses, de dispor os objetos, numa tal
seqncia escolhida, altura ou no dos olhos do transeunte, com redoma ou no, pen-
durado ou no... Enfim, h uma preparao prvia do museu para o convite do olhar e da
compreenso da comunicao pretendida. Esse discurso - que pressupe uma elabo-
rao do objeto museal e seleo de argumentos - nem sempre ser compreendido total
ou igualmente por todos os sujeitos. Ele poder tambm ser fragmentrio, lacunar.
IVAN - Quer dizer, ento, que no h um padro de linguagem para museus?
COMUNICAO - A abordagem da transmisso, baseada numa viso de estmulo-resposta, v a comunicao
como um processo de dar informao e enviar mensagens, transmitindo idias atravs do espao de uma fonte
de informao instruda para um receptor passivo. A abordagem cultural compreende a comunicao como
uma srie de processos e smbolos de ampla sociedade atravs da qual a realidade produzida, mantida,
reparada e transformada. A comunicao compreendia como um processo de partilha, participao e asso-
ciao. Crenas e valores so partilhados e explorados juntos atravs de atos comunicativos (CABRAL, 2004,
p. 325).
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ALICE - H um padro convencional, por exemplo, aquele em que os objetos so organi-
zados linearmente em exposies permanentes, segundo uma lgica cronolgica, geral-
mente acompanhados de legendas auto-explicativas. Mas a museologia plural e per-
mite que lancemos mo de linguagens novas, inovando e assumindo desafios que a
expografia e as diversas relaes com os pblicos anunciam todo dia. Por isso, voc
encontrar museus que romperam com lgicas convencionais, conscientes da variedade
dos pblicos e de como possvel criar . Em outros, ainda, mesmo mantendo as
exposies permanentes segundo a lgica mais convencional, h equipes educativas
muito criativas e isso torna o trabalho com os pblicos bastante instigante, dialgico e for-
mativo. Por exemplo, o fato de alterarmos a sinalizao do roteiro de percurso de uma
exposio pode interferir na relao que o pblico estabelece com a exposio e suas
interpretaes. Muda, tambm, quando o agente educativo adota posturas provocativas,
instigando os visitantes com perguntas, reflexes...
IVAN - Ento, pelo que eu estou entendendo, tambm falta, em determinados pblicos,
uma preparao anterior para poder compreender o museu naquilo que ele pretende
comunicar.
ALICE - Esse um desafio que est feito para os museus e tambm para as escolas. Os
museus, de sua parte, podero reunir bons argumentos, proporcionando ao visitante
vrias experincias de comunicao enriquecedoras e elucidativas. E ele, o discurso do
museu, pode tambm ser provocativo, suscitando posturas de estranhamento, dvida,
questionamento e at mesmo de incmodo. E as escolas?
IVAN- Como voc disse, esse um desafio. Esse dilogo est sendo muito construtivo.
Sabe, quando eu comecei a atuar como professor, eu imaginava que os museus eram
instituies... estticas, digamos assim. Sabe aquela idia de que o museu lugar de
coisa velha, de guardar colees?
ALICE - Essa representao ainda pode ser encontrada em alguns museus como tambm
25
EXPOSIO - Ao contrrio do procedimento mais usual dos museus, em que a exposio o ponto de parti-
da no sentido de estabelecer uma interao com o pblico, (...) a exposio , ao mesmo tempo, produto de
um trabalho interativo, rico, cheio de vitalidade, de afetividade, de criatividade e de reflexo estabelecida no
processo que antecedeu a exposio e durante a montagem, alm de ser ponto de partida para outra ao de
comunicao. (SANTOS, 2002, p.313.)
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em algumas escolas. Muitos museus vm repensando o seu papel, a sua relao com a
memria, a sua relao com o pblico, descobrindo, assim, seu vasto potencial comu-
nicativo. O fato de alguns se revelarem para os pblicos, ou seja, comunicarem quais so
as concepes que fundamentam seu trabalho j indcio de uma renovao. H, ainda,
aqueles que elaboram propostas dirigidas a pblicos diferenciados (diferenas gera-
cionais, de gnero, pblicos com ou sem escolaridade, pblicos com necessidades espe-
ciais, etc.) e esse movimento vem alterando seu perfil, transformados em territrios de
interao, de convvio e de respeito s diferenas.
Por todas essas razes o museu no lugar de coisa velha ou um lugar de preservao do
passado sem vinculao com o presente. Ele um lugar dinmico tambm para seus profis-
sionais. Ele um lugar vivo, em que emergem propostas, aes e uma pluralidade de signifi-
cados produzidos pelos pblicos em seus momentos de interao.
No caso do dilogo com a escola, podem surgir projetos comuns que indiquem demandas
para os museus.
IVAN - , voc tem razo. Fico pensando que os museus permitem que os professores os
tematizem, faam recortes de acordo com interesses comuns. isso mesmo ou no?
ALICE - Sim, esse um movimento fundamental desse dilogo que, entre escola e museu,
apenas est comeando. H alguns museus que oferecem aos professores da Educao
Bsica algumas oportunidades formativas, como cursos, oficinas, visitas prvias e con-
versas preliminares com a equipe educativa. Mas cada museu e escola tm que enfrentar
o desafio de propor projetos adequados sua realidade e s prticas educativas em
curso.
Esse dilogo se encerra aqui, embora permaneam ainda muitas questes em aberto para Ivan
e para Alice. E para voc? Voc provavelmente tambm levantou outras questes...
Depois do dilogo, Ivan fez um registro dos pontos que considerou mais relevantes. O seu re-
gistro ficou assim:
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1 - Os museus so instituies sociais, culturais, patrimoniais, comunicativas e educadoras.
2 - Os museus podem estabelecer relaes propositivas com as escolas.
3 - A educao em museus tem singularidades que a diferenciam da educao escolar. O museu
um ambiente no formal de educao.
4 - O museu tem um discurso, que a forma como ele se comunica com os pblicos, como organiza
seus argumentos e como faz uso das mltiplas linguagens.
5 - A linguagem do museu interfere na relao que os pblicos estabelecem com ele.
6 - Os professores so pessoas que preferencialmente deveriam fazer uso cultural dos museus e
isso ajuda em seu exerccio profissional. Podemos dizer, ento, que os professores so agentes cul-
turais e que ao explorar essa face de sua formao eles tm em mos recursos educativos muito
interessantes.
7 - possvel que os professores explorem o museu de maneira interativa, dialgica e reflexiva com
seus alunos, criando oportunidade de que seus alunos sejam tambm sujeitos autnomos para a
fruio cultural.
8 - Ao sarem de uma postura passiva, os professores podem ajudar o museu a potencializar sua
funo educativa. E o contrrio tambm vlido. Mas o princpio dessa relao a construo par-
tilhada de projetos.
Alice tambm fez suas anotaes e pensou, em especial, no que esse dilogo trouxe de ele-
mentos para a sua prtica educativa no museu. Veja o seu registro:
1 - A educao ocorre em vrios ambientes sociais e a escola um ambiente privilegiado.
2 - As escolas so ambientes sociais, culturais, educativos e histricos, tais como o museu. Mas a
educao escolar tem suas peculiaridades. Como planejar a ao educativa no museu compreen-
dendo essa peculiaridade?
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3 - A escola compreende no somente o valor do uso da fala do professor nos processos de medi-
ao, mas tambm do silncio provocativo e as oportunidades de aprendizagem aluno-aluno que as
interaes proporcionam.
4 - As prticas dos professores so variadas e no podemos dizer que h um padro de ao
docente. Essa compreenso pode favorecer as abordagens que o museu faz das escolas.
5 - O museu no pode desprezar os recursos educativos de que a escola j dispe, favorecendo as tro-
cas e parcerias. Quanto a isso, importante problematizar a representao de professor que o museu
construiu, desconstruindo a imagem de um profissional passivo e pouco capaz de compreender as
aes museais.
6 - O aprendizado do respeito diversidade e a construo de uma sociedade democrtica so
desafios para qualquer instituio educativa e, nesse caso, tanto para o museu quanto para a escola.
E voc, que reflexes fez durante a leitura desse dilogo?
Que perguntas faria para Alice?
Que sugestes faria para Ivan?
Como voc compreende a relao escola-museu?
Que experincias tem para socializar?
Faa o seu prprio movimento! Inicie outro dilogo!
28
SILNCIO - O silncio no o vazio, o sem-sentido; ao contrrio,
ele o indcio de uma totalidade significativa. Isto nos leva com-
preenso do "vazio" da linguagem como um horizonte e no como
falta. (ORLANDI, 1997, p. 70).
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Para refletir...
No existe a primeira nem a ltima palavra e no h limites para o contexto dial-
gico (...). Nem os sentidos do passado, isto , nascidos no dilogo dos sculos pas
sados, podem jamais ser estveis (...): eles sempre iro mudar (renovando-se) no
processo de desenvolvimento subseqente, futuro do dilogo. (...) No existe nada
absolutamente morto: cada sentido ter sua festa de renovao. Questo do grande
tempo (BAKHTIN, 2003).
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PARTE II
A ESCOLA VAI AO MUSEU
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DILOGOS COM OS MUSEUS
Acabamos de participar de um dilogo entre um professor e uma educadora de museus. Por
meio desse dilogo pudemos perceber os desafios que se estabelecem para os educadores na
sua relao com essa instituio cultural que o museu.
Nesta sesso sero destacadas experincias que evidenciam metodologias de dilogo com os
objetos que embasam o que temos denominado de educao patrimonial ou educao por
meio do patrimnio .
O que e como explorar o que esses espaos oferecem para a aquisio de conhecimentos,
para uma educao dos sentidos e do olhar e para a formao de atitudes diante do outro e
dos bens culturais?
Nesta seo voc encontrar trs experincias de ao educativa em que a escola vai ao
museu. Na primeira, tem-se um cenrio fictcio, uma visita escolar ao Museu da
Industrializao de Minas Gerais, em que est problematizada a abordagem convencional que
a escola faz do museu, aquela em que o museu utilizado para comprovar, ilustrar ou com-
plementar aspectos relacionados aos contedos desenvolvidos na escola. A experincia per-
mite compreender as potencialidades formativas envolvidas na relao que se estabelece entre
educadores - em museus e escolas - indicando o quanto rica a troca experiencial constru-
da na partilha de percepes e de aprendizagens profissionais. Nessa experincia voc poder
perceber de que maneira o professor faz uso do museu e de que forma suas intencionalidades
EDUCAO PATRIMONIAL - A expresso produtora de mltiplas interpretaes que envolvem a construo do
saber a partir de bens culturais e a compreenso dos embates envolvidos na composio de um repertrio de
bens e indcios a serem preservados e/ou destrudos. Como fundamento formativo, a educao patrimonial
pressupe, tambm, que os sujeitos se compreendam na histria, instigando-os a compreender seu universo
scio-cultural e a trajetria histrico-temporal em que esto inseridos. O termo utilizado, ainda, para desi-
gnar um processo permanente, planejado e sistemtico que objetiva oportunizar aos sujeitos uma sensibiliza-
o para a preservao do patrimnio, contribuindo para apropriao e crtica dos pressupostos e valores
advindos de suas heranas culturais.
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educativas (em que esto tambm os contedos) informam a relao que ele estabelece com
o museu, com a educadora desse ambiente e com as percepes que os alunos tm da pro-
posta desenvolvida.
A seguir, voc encontrar dois textos: Leitura de Objetos Museais, que tem como desdobra-
mento o relato de experincia da professora Araci Rodrigues Coelho, intitulado Entendendo
um pouco da sociedade e da histria da escola atravs de objetos: uma experincia de visita
ao Museu Escola e o relato de experincia da professora Soraia Freitas Dutra, intitulado
Detetives no Museu, em que so analisadas dimenses da ao educativa com crianas por
meio da mediao dos objetos culturais.
Esperamos que a leitura dessas trs experincias possa suscitar as mltiplas potencialidades
que a interface museu e escola oferece, compondo um rico repertrio de prticas, metodolo-
gias e reflexes capazes de inseminar a sua prtica e a sua experincia de formao profis-
sional na escola e no museu.
Compem essa seo dois Balaios de Idias. No primeiro, problematizado o uso que as
escolas convencionalmente fazem do museu, indicando alternativas para aprofundamento
dessa relao interinstitucional. No segundo, h indicaes para composio de planejamen-
tos da ao educativa empreendida pela escola junto ao museu.
PATRIMNIO - conjunto de processos criadores e dos bens criados
revistos e reinterrogados permanentemente que evidenciam as ca-
ractersticas e os modos prprios de uma sociedade e que permitem
reconhecer neles a presena da vida social e cultural, assim como
essa sociedade e essa cultura se percebem e se reconhecem atravs
daqueles processos e daqueles bens por ela criados e recriados ao
longo do tempo. (ANDRADE, 2006).
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FORMAO PROFISSIONAL POR MEIO DAS PRTICAS EDUCATIVAS NO MUSEU
O professor de histria Bruno Pires entra em contato com o Museu da Industrializao de
Minas Gerais8 para solicitar uma visita monitorada com uma turma de alunos de 8a srie do
Ensino Fundamental. Eles esto estudando a Revoluo Industrial e a visita ao Museu lhe
pareceu muito oportuna, embora ele no saiba muito bem como fazer uso do museu e de suas
possibilidades educativas. Ele tinha em mente uma visita ilustrativa do contedo. Ele con-
versa com Ceclia Mendes, profissional do museu responsvel pelo setor de atendimento a
escolas. Eles marcam uma visita prvia do professor, em que ele pde conhecer o acervo, as
exposies e propostas, pde dizer de suas expectativas como professor e teve a oportunidade
de conhecer a proposta educativa do museu. Ceclia falou da necessidade de que os profes-
sores repensem o uso corriqueiro que eles fazem do museu, visto como instituio detentora
de um passado esttico, de objetos antiquados e desprovidos de vida e como lugar para que
os alunos anotem as informaes de legendas dos objetos em exposio.
A partir do dilogo com Ceclia e de sua aprendizagem a respeito do museu e de suas finali-
dades, Bruno construiu uma proposta para levar sua turma. Entre outras questes, ele expli-
cou o que um museu, de que feito, como se organiza e o que ele oferece ao pblico. Ele
projetou para a turma um videodocumentrio emprestado por Ceclia, que apresentava breve-
mente a histria da criao do museu e da organizao de sua primeira exposio. Props pre-
viamente que cada aluno fizesse o percurso da visita e que, no seu decorrer, escolhesse um
objeto de sua preferncia para com ele estabelecer uma conversa prolongada, imaginando
seus usos possveis na histria da indstria mineira, o tipo de trabalhador que o teria fabrica-
do, o tipo de material de que foi feito, sua importncia numa cadeia produtiva e tambm o tipo
de trabalhador que o operava. Sobre isso, props que cada um pensasse nos ofcios industri-
ais j extintos e nas novas formas de trabalho industrial que a sociedade j criou e que esto
ausentes naquele acervo. A idia do professor era que cada aluno apresentasse na escola uma
pequena dramatizao sobre o que ele percebeu, pensou e imaginou sobre a fabricao, uso
e funo daquele objeto histrico no processo de industrializao de Minas Gerais.
34
8 Cenrio e situaes fictcias.
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No dia da visita, Ceclia os acompanhou e foi dialogando com as perguntas dos alunos e atuou
tambm propondo questionamentos e dvidas a respeito do que eles viam, percebiam e pen-
savam. Bruno se juntou a ela e o dilogo com a turma fez com que Ceclia pudesse compreen-
der melhor as representaes que os alunos faziam do processo industrial. Eles dois perce-
beram, por exemplo, que os alunos achavam que a indstria s indstria se o trabalho
mecnico puder ser substitudo pelo trabalho robotizado e, por isso, eles tinham dificuldade
de compreender a manufatura como parte do processo de industrializao. A partir dessa
descoberta, Ceclia criou posteriormente um ambiente no museu - um tnel interativo - em
que cada pessoa tinha, durante o percurso, que dispor os ofcios da industrializao mineira
num quadro de referncias e pistas. A atividade permitia diferentes desenhos, de modo que a
cada resultado ela dialogava com o visitante a respeito de suas idias e percepes. Bruno
tambm pde aprender mais sobre a funo educativa dos museus, sua linguagem e sobre a
importncia da mediao cultural nos processos formativos de seus alunos.
Na atividade de retorno escola, ele vivenciou a dramatizao com os alunos e, ao fim, cri-
aram uma engrenagem corporal, um grande corpo no ptio da escola, reunindo movimentos
corporais que cada um conseguiu pensar sobre a atividade industrial. Isso permitiu que eles
discutissem a mecanizao do trabalho humano. Finalizaram a unidade debatendo o filme
Tempos modernos de Charles Chaplin, 1936. Na avaliao da atividade, um dos alunos indi-
cou como ponto negativo o fato de que eles no puderam tocar os objetos... Outro achou legal
a presena do professor durante o percurso da visita, pois ele havia visitado um arquivo ante-
riormente e o professor no os havia acompanhado, por isso ele ficou sem chance de conver-
sar durante a visita. Outro, ainda, sentiu falta de mais informaes sobre os objetos. Ao final,
um dos alunos abordou Bruno e disse: Professor, eu nunca tinha visitado um museu. H ou-
tros aqui por perto?.
35
QUE CONCEPO DE EDUCAO O CENRIO NOS APRESENTA?
DE QUE MANEIRA SE ESTABELECEU A RELAO EDUCATIVA ENTRE MUSEU E ESCOLA? E ENTRE ESCOLA E MUSEU?
QUE PECULIARIDADES TEM O MUSEU? COMO POTENCIALIZAR A SUA FUNO EDUCATIVA?
COMO O PROFISSIONAL DE MUSEUS PODE DIALOGAR COM AS DEMANDAS E EXPECTATIVAS DA ESCOLA? COMOPODE APRENDER COM ELAS E ATRAVS DELAS?
COMO A ESCOLA PODE DIALOGAR COM OS MUSEUS? COMO A ESCOLA PODE APRENDER COM OS MUSEUS E ATRAVS DELES?
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O cenrio nos apresenta um professor que, ao realizar a abordagem de um contedo com seus
alunos, prev um uso inicial do museu que praticamente ilustrativo de sua proposta didti-
ca. Em dilogo com a educadora do museu, ele pde descobrir que, alm da veiculao da
informao - que uma das finalidades do museu - h tambm a possibilidade de produo
do conhecimento e aprimoramento das formas de interpretao da realidade histrica pelos
objetos, com eles e por meio deles. Vemos uma educadora que conhece possibilidades rein-
ventivas que uma visitao oferece ao prprio museu, alm do fato de compreender razoavel-
mente bem o debate acerca dos horizontes interpretativos que a educao em museus possi-
bilita. Essa experincia permite, ainda, que percebamos a importncia da flexibilizao das
propostas educativas - nos dois ambientes - e as possibilidades que a mobilizao de recur-
sos sensoriais como gestos, movimentos e deslocamentos oferecem compreenso de men-
sagens e ao exerccio da percepo, especialmente para aquela faixa etria. Mas, sabemos,
essas prticas so raras.
Essa experincia nos permite analisar aspectos da interface educativa escola-museu. um
mbito possvel, entre tantos outros que sabemos existir. O professor sujeito do processo
educativo, aprende com as oportunidades formativas que vivencia e est aberto ao dilogo
proporcionado pela equipe do museu e pelos alunos. Como instituio formadora, o museu
tambm se institui no lugar de promoo do trabalho compartilhado e do dilogo.
A atividade desenvolvida permitiu aprendizagens multidirecionais, compartilhadas e a pro-
moo da necessria transformao de rotinas profissionais. Nesse sentido, ela foi formadora
para ambos os profissionais e tambm para os alunos. Mesmo estabelecendo uma relao a
princpio tida como convencional - em que a escola vai ao museu meramente para receber
informaes ilustrativas de um contedo j desenvolvido em classe - o processo viria a trans-
form-la em oportunidade de formao e aprendizagens mtuas.
O contexto tambm permite refletir sobre o papel da informao nos museus. Por vezes ampla-
mente criticado quanto a isso, o museu, contudo, tambm tem um papel informativo. No
reside na informao veiculada um mal a ser combatido. O mal reside em se transformar a
informao de dados, fatos e acontecimentos do passado na nica finalidade dos museus,
como se bastasse a sua transmisso aos alunos e demais pblicos para que o papel educati-
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vo dos museus tivesse sido plenamente realizado. Mais que isso, a informao pressupos-
to primordial para produo de perguntas, levantamento de suposies e criao de imagens
mentais. A informao muitas vezes a ponte, mas no o ponto de chegada, pelo menos no
o ponto principal. Ela meio para se chegar reflexo necessria (nem sempre exercitada). A
informao , se utilizada de maneira reflexiva, possibilita a criao de exerccios de problema-
tizao do passado, de um passado que sabemos ser dvida, angstia e embate, mais do que
certeza, verdade e harmonia. O professor lanou mo do que o museu possibilitava no plano
das informaes e fez seus recortes, desafiando cada aluno escolha de um objeto para pro-
mover movimentos vrios, tanto de compreenso quanto de simbolizao. Utilizou o pensa-
mento, os gestos, os sentidos. Ainda assim, um dos alunos se ressentiu de mais informaes
sobre os objetos do museu.
Mas o museu ambiente educativo peculiar. Ele tem um acervo de registros selecionados da
vivncia scio-histrica. Ele tem, afinal, materialidade e oportunidades de simbolizao no
encontradas na escola. E a partir de uma educao para olhar atravs dessa materialidade
(dispersa, contraditria, lacunar e plural) que se realiza seu papel educador, sua peculiaridade
e sua potencialidade. Nesse sentido, ao fazer com que cada aluno escolhesse um objeto para
olhar por ele (e no meramente para ele), o professor pde incentivar um exerccio funda-
mental produo e socializao de significados. Ao pautar o movimento de apropriao
reflexiva de um objeto por aluno, o professor se props a encontrar representaes variadas e
soube aproveit-las para transformar o estudo da histria da industrializao numa reflexo
mais abrangente sobre o processo de trabalho, o fabrico de utenslios na histria e a crise do
emprego na atualidade, por exemplo.
37
INFORMAR - (...) O educador no pode furtar-se, em determinados momentos, de informar. E no pode na
medida mesma em que conhecer no adivinhar. O fundamental, porm, que a informao seja sempre pre-
cedida e associada problematizao do objeto em torno de cujo conhecimento ele d esta ou aquela infor-
mao (FREIRE, 2006, p. 65).
PASSADO - A escrita, a impresso, portanto, a possibilidade de um documento resistir ao tempo e acabar um
dia sobre a mesa do historiador no conferem a esse vestgio particular uma verdade suplementar diante de
todas as outras marcas do passado: existem mentiras gravadas no mrmore e verdades perdidas para sempre
(ROUSSO, 1996, p. 87).
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Esse exemplo de interface educativa nos possibilita, alm disso, pensar sobre o papel da edu-
cao em museus. A educadora revelou-se profissional consciente da importncia do dilogo
com a escola para o prprio museu. Afinal, se so as escolas grandes beneficirias de aes
educativas museolgicas, so tambm elas grandes colaboradoras dos museus. Ceclia
aproveitou a relao com os alunos e com o professor para avaliar de que maneira os jovens da
atualidade concebem o processo de industrializao e descobriu que h vrios elementos da
contemporaneidade que interferem na forma como eles percebem a histria da indstria. Com
essa avaliao, foi possvel criar uma atividade interativa no museu, que traria elementos novos
para redimensionamento, para outros jovens, da compreenso dos processos industriais.
O cenrio tambm permitiu perceber que a profissional do museu concebe sua prtica como ativi-
dade formativa e o museu como instituio mutante. Quanto a essa mutabilidade, interessante
pensarmos no papel que podem exercer as instalaes provisrias. Elas podem dinamizar as
exposies permanentes, exercendo uma das faces mais desafiadoras do museu, que ser expe-
rimental. Contudo, mesmo contando apenas com instalaes e propostas permanentes, o museu
pode ser utilizado como ambiente experimental, especialmente porque permite diferentes usos,
apesar da disposio muitas vezes esttica de suas propostas permanentes, da escassez de recur-
sos e da limitao de pessoal. Ao pensar-se como experimental, o museu poder romper a rigidez
das propostas imutveis, colaborando para fazer circular outros pensamentos, idias, percepes.
Dessa forma, a relao entre os educadores (em museu e na escola) aconteceu de maneira
dialgica e propositiva, em que cada um assumiu o seu papel, sendo, ambos, sujeitos ativos
e autores de gestos de interpretao dos processos vividos nos dois ambientes. Existe a pos-
sibilidade (de fato j experimentada em alguns museus) de que os prprios estudantes criem
as exposies, aprendendo, pelo fazer, a linguagem museolgica, suas lgicas e potenciali-
dades. Esse movimento possibilita aos jovens refletir no somente sobre os objetos e sobre a
histria, mas fundamentalmente sobre o museu, suas finalidades, processos e sobre seu valor
social e comunitrio. Alm disso, permite que experimentem sua capacidade protagonista, um
fundamento da educao de jovens cidados.
Essa experincia fictcia nos permite, ento, compreender e refletir sobre os desafios coloca-
dos relao escola-museu visando valorizao da circularidade e a parceria, fazendo fluir
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saberes e propostas numa via de mo-dupla. Ao compreender e afirmar suas potencialidades
educadoras, o museu no assumir o papel da escola, mas, antes, assumir o seu prprio
lugar, que de estmulo sensibilidade para a compreenso e valorizao dos registros cul-
turais pelos alunos, de maneira dialogada com a escola, mas tambm a partir das demandas
que a escola oferece, mas fundamentalmente a partir da compreenso de seu papel como edu-
cador social. preciso, nesse sentido, vislumbrar os elementos estticos, patrimoniais e
educativos que o museu possibilita e que a escola pode explorar.
Alm disso, urgente estabelecer formas dialogadas de parceria museu-escola, no sentido da
ampliao das redes formativas que essa relao propicia. Nesse sentido, o papel do museu
no o de substituir a escola em sua funo educativa, mas, antes, o de oferecer novas for-
mas mediacionais concretizadas por via de linguagens, acervos e argumentos que lhe so
peculiares.
De outra parte, cabe tambm ao museu o estreitamento do dilogo com a escola, perscrutan-
do e refletindo sobre as demandas que ela lhe apresenta - seu sentido, as concepes impli-
cadas e os limites e possibilidades de ao do museu nesse dilogo. Por isso, preciso ter
clareza de que nem sempre ser possvel e necessrio atender a demandas especficas advin-
das da escola - em alguns momentos ser necessrio propor modificaes ou mesmo a sub-
stituio de uma demanda por outra, instrumentalizando a escola com vistas ressignificao
de algumas de suas concepes iniciais.
O contexto tambm nos permite avaliar que a materialidade assumida como testemunho e
indcio, compreendida, sentida e estudada em sua dimenso criadora, o que incorpora
reflexes sobre os fazeres, ofcios e trabalhos e suas transformaes scio-histricas. Ao ser
tratada como testemunho, a materialidade tambm indicativa de uma intencionalidade teste-
munhal de um tempo histrico outro, diverso e estranho. Ao ser tratada como indcio,
assumida como lembrana daquilo que falta e irremediavelmente se foi, resultante de uma pro-
teo que garantiria apenas uma histria indicial e lacunar, por isso mesmo instigante e espe-
ranosa de novas percepes e gestos de preservao.
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Comparecem aos universos dos museus tambm os sons, os cheiros, o silenciamento, a
destruio, o esboo, o rascunho... Comparece o vazio... o ambiente desabitado, o cho
descoberto... e, ainda, as dimenses rituais, os segredos e os subterfgios da memria. Em
todas essas dimenses o museu cumpre seu papel educativo porque proporciona elementos,
signos e movimentos de sensibilizao para o cultivo de uma esttica da compreenso e do
aprendizado de simbolizao da realidade. Caso se resuma a uma dessas dimenses, o museu
se furtar ao exerccio de suas potencialidades mais abrangentes, fazendo transformar em ru-
nas e marginalidade, talvez, os gestos interpretativos e afetivos que os sujeitos possam fazer.
O que essa anlise te sugere? Que outras questes voc abordaria/ observaria?
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LEITURA DE OBJETOS MUSEAIS
Se os objetos no podem ser tocados, no devem perder a
qualidade de 'tocantes', de alimentar percepes marcantes
(RAMOS, 2004).
Os objetos museolgicos possuem vrias cascas simblicas e somente exerccios atentos
de leitura permitem descobri-las e interpret-las. Voc um importante mediador para este
exerccio e deve sempre estimular o aprofundamento da percepo visual, por meio de
questes que provoquem o aluno a olhar o objeto de outras formas.
O trabalho com fontes histricas em museus envolve prioritariamente vestgios materiais.
Nesse sentido, os objetos so como ndices de um passado que foi interpretado pela argumen-
tao histrica, sendo, tambm, apropriados por gestos de preservao e recebem, nesse
movimento, novos significados. De acordo com Francisco Ramos, (...) preciso exercitar o
ato de ler objetos, de observar a histria na materialidade das coisas (RAMOS, 2004, p.21).
Mas tambm possvel exercitar o ato de ler atravs dos objetos (MENEZES, 2000), perscru-
tando-lhes significados outros, no ditos ou no suspeitados. Esse movimento pressupe
comparaes entre objetos, compreenso de linguagens dos objetos e do museu, alm da
liberdade de produo de novos enunciados e gestos de imaginao.
Compe esse cenrio educativo o aprendizado da observao desnaturalizada dos objetos
museais. Tanto o objeto museolgico quanto os objetos do cotidiano podem ser ressignifica-
dos nesse aprendizado. A comparao entre objetos do presente e do passado um caminho
para trabalhar a noo de historicidade e compreender diferentes relaes entre objeto-
sociedade. Podemos refletir com as crianas, por exemplo, sobre a pequena vida til dos obje-
tos contemporneos, em comparao com a perenidade dos objetos do passado.
Muitas vezes a aproximao espontnea entre o visitante e o objeto marcada pela curiosi-
dade. Diante de um vestgio material do passado, ele usa seus sentidos para l-lo: observa,
cheira, ouve e, se deixarmos, experimenta e toca.
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Ao utilizarmos as estratgias de observao e anlise de um objeto do passado, vrias
questes podem ser aprofundadas a partir da reflexo sobre suas permanncias e transfor-
maes em relao funo, composio, valor, tcnica de produo e forma, por exemplo.
Por outro lado, podemos refletir sobre sua permanncia fsica e o sentido de sua seleo para
uma exposio museolgica. importante, nesse momento, dialogar com os visitantes sobre
a perda do valor de uso dos objetos.
Segundo Francisco Ramos, torna-se fundamental estudar como os seres humanos criam e
usam objetos. Por outro lado, igualmente necessrio refletir sobre as formas pelas quais os
objetos criam e usam os seres humanos (RAMOS, 2004, p. 36).
O Museu Imperial organizou um importante guia de educao patrimonial, em parceria com o
Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional, em 19999 . Optamos por reproduzir as
sugestes da seo Descobrindo um objeto, que fornecem uma gama de questes para vi-
sitas dialgicas, nas quais o agente educativo pode selecionar alguns objetos e l-los com os
visitantes, de acordo com as peculiaridades dos mesmos10. O educador, na escola, pode tam-
bm utiliz-la como parte do exerccio de educao do olhar e de compreenso do museu.
importante que as equipes educativas dos museus criem roteiros temticos para a abordagem
de seu acervo e selecionem, em momentos de recepo a pblicos, alguns objetos para a
leitura. O mesmo movimento pode ser realizado pela escola. Caso contrrio, a visita pode se
tornar enfadonha e cansativa, tal como as visitas monolgicas, centradas na transmisso de
datas, fatos histricos ou detalhes.
A proposta do roteiro a seguir fornecer um exerccio de estmulo percepo e anlise, que
poderia ser entregue aos visitantes ou, ainda, trabalhado na escola com algum objeto signi-
ficativo para os alunos, como parte do exerccio preliminar de desnaturalizao dos objetos e
de compreenso criteriosa de seus significados. Os movimentos de observao e anlise
mobilizados requerem, do observador, o levantamento de hipteses, o exerccio da imagi-
nao histrica e a descrio analtica e comparativa dos objetos. Essas habilidades podem
ser estimuladas nas aes educativas tanto pelos educadores na escola quanto no museu.
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9 Horta (1999).10 Vide tambm em Barbuy,1995, p.17-23.
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SEO DESCOBRINDO UM OBJETO11
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ASPECTOS PRINCIPAIS
A OBSERVAR
OUTRAS PERGUNTAS ASPECTOS DESCOBERTOS
PELA OBSERVAO
ASPECTOS A PESQUISAR
ASPECTOS FSICOS
O QUE PARECE SER ESTE
OBJETO?
Que cor tem?
Que cheiro tem?
Que barulho faz?
De que material feito?
O material natural
ou manufaturado?
O objeto est completo?
Foi alterado, adaptado
ou consertado?
Est usado?
CONSTRUO
COMO FOI FEITO?
Onde foi feito?
Foi feito a mo ou
a mquina?
Foi feito em uma pea
nica, ou em partes
separadas?
Com uso de molde ou
modelada a mo?
Como foi montado?
(com parafusos, pregos,
cola ou encaixes?)
FUNO
PARA QUE FOI FEITO?
Quem o fez?
Para que finalidade?
Como foi ou usado?
O uso inicial foi
mudado?
11 Horta, 1999, p.14.
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ASPECTOS PRINCIPAIS
A OBSERVAR
OUTRAS PERGUNTAS ASPECTOS DESCOBERTOS
PELA OBSERVAO
ASPECTOS A PESQUISAR
FORMA (DESIGN)
O OBJETO TEM UMA
BOA FORMA? BEM
DESENHADO?
De que maneira
a forma indica
a funo?
Ele bem adequado
para o uso
pretendido?
O material utilizado
adequado?
decorado,
ornamentado?
Como a decorao?
O que a forma e
decorao indicam?
Sua aparncia
lhe agrada?
VALOR
QUANTO VALE ESTE
OBJETO?
Para as pessoas que
o fabricaram?
Para as pessoas
que o usam?
(ou usaram?)
Para as pessoas
que o guardaram?
Para as pessoas
que o venderam?
Para voc?
Para um banco?
Para um museu?
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Ao fazer uso dessa ficha, interessante que o educador crie situaes de partilha de per-
cepes, pois as respostas provavelmente sero mltiplas e a riqueza da aplicao dessa ficha
reside na possibilidade de exerccio do olhar, de emergncia tambm de diferentes formas de
olhar os objetos, atribuir valor sua materialidade, contornos e detalhes e construir hipteses
vrias sobre sua trajetria e constituio histrica. Podem ser propostos exerccio de estmu-
lo percepo e anlise de diferentes objetos, por exemplo, compondo-se, em sala de aula,
um quadro de confrontos e comparaes... O importante, como dizem as autoras do Guia
Bsico de Educao Patrimonial, evitar limitar sua prpria capacidade [das crianas/alunos]
de propor perguntas e respostas (1999, p.14).
Ao fazer emergir diferentes olhares e percepes, a partir do roteiro, voc poder perceber
vrias elaboraes conceituais e simblicas. No perca a oportunidade, portanto, de criar um
ambiente de socializao e confronto de hipteses e percepes, pois os movimentos intera-
tivos podem proporcionar muitas situaes educativas nesse cenrio de anlise dos objetos
mediado pela ficha citada. Quantas vezes no nos surpreendemos com um detalhe desperce-
bido? Um desenho, uma gravao, um escrito. Mudar a perspectiva do olhar sobre o objeto
tambm nos leva a descobertas interessantes. Experimente olhar por baixo dos mveis, atrs
das pinturas, por cima das esculturas, de longe, de perto...
Dialogue com outros profissionais, estabelea parcerias, formas de interao e movimentos de
socializao de experincias, impresses, descobertas.... Assumir a tarefa de ler os objetos
fundamental para a equipe educativa e exige muita observao e pesquisa. Exige, muitas
vezes, uma compreenso do valor das parcerias com as escolas e de como o processo educa-
tivo do museu pode ser potencializado nesse sentido. Por isso, essa ficha pode ser utilizada
tanto pelos educadores na escola quanto no museu.
Veja como uma professora de sries iniciais de Ensino Fundamental realizou um trabalho de
Descoberta de objetos utilizando a ficha citada como inspirao. Veja tambm o texto cole-
tivo produzido pela professora e sua turma em visita ao Museu da Escola - Centro de
Referncia do Professor, Belo Horizonte.
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ENTENDENDO UM POUCO DA SOCIEDADE E DA HISTRIA DA ESCOLA ATRAVS DE
OBJETOS: UMA EXPERINCIA DE VISITA AO MUSEU ESCOLA12
Apresentaremos de forma sucinta uma experincia que foi desenvolvida junto a uma turma de
alunos do 2 ciclo do Ensino Fundamental. Inserida no projeto Educao Patrimonial, um dos
projetos gerais desenvolvidos pelos professores de Histria e Geografia da Escola Fundamental
do Centro Pedaggico13, ocorreu no segundo semestre de 1998. Seus objetivos principais foram:
estimular o processo de construo de conhecimentos e raciocnios histricos, enfocando a
Educao Patrimonial e construir significado para a expresso - respeito e conservao do
patrimnio pblico, muito recorrente nas escolas e em diversos espaos sociais atualmente.
Tal trabalho foi realizado partindo de uma compreenso ampla do conceito de patrimnio que,
para alm da dimenso histrica, inclui outras dimenses, como a natural, artstica e/ou cul-
tural. A fim de concretizar tais objetivos, considerando o nvel de desenvolvimento cognitivo
dos alunos, crianas de 9 e 10 anos, os estudos foram realizados em torno de um lugar de
vivncia comum a todos os envolvidos: a Escola. Uma ao fundamental do projeto consistiu
em visitar com os alunos o museu da Escola do Centro de Referncia do Professor da
Secretaria de Estado de Minas Gerais.
A professora vai ao museu
Para a concretizao dos objetivos com a visita, a professora realizou uma visita prvia ao
museu, expondo os objetivos do trabalho e a possibilidade da instituio de atend-los. Em
seguida, elaborou o planejamento do trabalho a ser desenvolvido junto aos alunos no dia
12 Esse relato de experincia a sntese de um trabalho maior, coordenado e realizado pela professora Araci Rodrigues Coelho, em que
houve longas discusses e diversas atividades - entrevistas, leituras, registros, exposio de objetos, entre outras - que ocorreu ao
longo de vrias aulas, no ano de 1998. Araci Rodrigues Coelho professora da Escola Fundamental do Centro Pedaggico da UFMG,
doutoranda em Educao UFMG e membro do LABEPEH (Laboratrio de Estudos Pesquisas em Ensino da Histria - UFMG).13 A Escola Fundamental do Centro Pedaggico da UFMG tem sua origem no antigo Ginsio de Aplicao da UFMG, criado 1946. Ao
ministrar o Ensino Fundamental tem por finalidade constituir-se como campo de investigao e reflexo sobre a prtica pedaggica
e contribuir para renovaes educacionais na busca de caminhos para os desafios do cotidiano escolar brasileiro. Alm disso,
espao de estgio para alunos dos diferentes cursos de Licenciatura da Universidade.da Universidade.
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agendado, incorporando a ele as expectativas da turma em relao ao museu. Outra iniciativa
importante foi a leitura e adaptao do texto Entendendo a sociedade atravs de objetos14.
As crianas se preparam para a visita ao museu
A professora inicia o seu trabalho de preparao das crianas visita ao museu reservando algu-
mas aulas para a aprendizagem do conceito de patrimnio. Ao trabalhar esse conceito em suas
vrias dimenses, privilegiou a relao de lugares e objetos de significao pessoal e familiar
dos alunos e, em seguida, introduziu a reflexo sobre a funo social dos objetos dos museus.
Nesse sentido, foram promovidas discusses e o reconhecimento, por parte dos alunos, de sua
escola como patrimnio (nas vrias dimenses citadas) e, ainda, pelas comparaes de sua
escola, tanto com outras escolas atuais quanto, com as escolas em que os pais e avs estu-
daram. Essas atividades levaram os alunos/as a suspeitar que na poca em que alguns dos fami-
liares, principalmente avs, eram alunos, havia uma forma de escola diferente das atuais. A pro-
posta de visitar o Museu da Escola existente em Belo Horizonte aproveitou o interesse em
esclarecer essa suspeita, conhecendo melhor sobre como eram as escolas em outras pocas.
A visita foi planejada com os alunos como momento de aprendizagem. Para alm da diverso
(uma dimenso tambm importante e contemplada na visita), aquela atividade teria como
objetivo o aprofundamento de conhecimentos sobre a histria da escola e sobre a importn-
cia da preservao e conservao dos objetos que so guardados e expostos em um museu.
Vale destacar que esse segundo objetivo representava a compreenso daquela atividade no
museu como uma oportunidade privilegiada para retomar as discusses em torno da funo
social dos museus e seus objetos, j iniciadas ao longo do projeto.
Antes da visita, a professora realizou uma leitura coletiva da introduo do texto Entendendo
a sociedade atravs de objetos, seguida de comentrios e explicaes, principalmente em
relao s dicas que ele fornece sobre a necessidade de observar (a forma, os smbolos e mar-
cas) e dialogar com os objetos de um museu por meio das perguntas: como e quem fez? Quem
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14 Barbuy (1995). Por se tratar de um texto com uma linguagem mais prxima da dos alunos e por vir ao encontro da perspectiva de
trabalho que se desenvolvia neste Projeto, este texto foi escolhido entre outros produzidos sobre o tema pelo Museu Paulista.
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usou e como? Dicas que, relacionadas com outras trazidas de casa, foram eleitas como refe-
rncias para a atividade a ser desenvolvida no Museu da Escola. Depois desse trabalho, o texto
de Barbuy (1995) foi retomado, agora com cada aluno possuindo uma cpia da adaptao do
original15, quando foram feitas leituras individuais e coletivas visando compreenso e inter-
pretao do texto. Essas atividades foram complementadas com outras estratgias, como o
registro em dupla da compreenso e das dvidas sobre cada dica para apresentar turma, em
discusso coletiva, principalmente acerca das relaes estabelecidas entre os objetos do
Museu Paulista referidos pelo texto e os observados no Museu da Escola. A professora fina-
lizou essa parte da atividade solicitando que cada aluno reescrevesse uma das dicas do texto
sobre o Museu Paulista adaptando-as a um objeto do Museu da Escola.
Devemos notar que se tratava de um desafio que exigia o esforo, agora concreto e bastante
novo, de sistematizar o dilogo com os objetos, relacionando-os com a poca em que eles
eram usados e tambm com o tempo atual.
Antes, durante e depois da visitao e da escrita dos textos individuais, a professora acompa-
nhou, instigou, dialogou com os alunos e os estimulou realizao de novas perguntas,
enunciao de suas percepes e compreenso e partilha dos significados produzidos no
processo de conhecer um museu e seu acervo. O trabalho finalizou com a construo de um
texto coletivo, resultado de muito trabalho da professora (explicaes e novas exemplifi-
caes) e dos alunos, que precisaram vencer suas resistncias s inmeras crticas e rees-
crever o primeiro texto individual feito em casa.
Vamos leitura do texto que foi produzido de forma coletiva pelos alunos, com o trabalho de
mediao da professora. Voc ver o quanto foi importante o trabalho realizado pela escola,
pela professora, pelos alunos, antes, durante e aps a visita.
15 Do texto original a professora retirou alguns aspectos que seriam pouco elucidativos para crianas mineiras que no conhecem o
museu paulista, assim como algumas imagens que ficaram pouco ntidas na reproduo.
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ENTENDENDO A SOCIEDADE - e um pouco da educao - ATRAVS DE OBJETOSVisitando o Museu da Escola, pudemos observar muitas coisas interessantes, pois,
observando seus objetos com muita ateno e procurando fazer relaes entre os
que ali esto expostos, as escolas que conhecemos e nossa prpria poca, muita coisa vai
comear a ganhar sentido. Comeamos a perceber que aqueles objetos
que considervamos apenas como coisas velhas, achando que no tinham nada a
ver conosco, porque na sua maioria so de um outro tempo, servem, na verdade,
para compreendermos uma poro de coisas que acontecem todos os dias em nos-
sas vidas, em nossas escolas, em nossas cidades, em nosso pas.
Para isso, seguimos algumas dicas encontradas em um texto sobre um outro museu que
lemos e discutimos e tentamos relacionar com a visita que fizemos ao Museu da Escola de
Minas Gerais. A primeira delas tem a ver com a forma dos objetos. No Museu da Escola,
observamos a forma das carteiras e como elas esto organizadas e pudemos ter idias e
perguntas sobre o modo como as professoras davam aula e onde ficavam os alunos.
Verificamos que em uma dessas salas de aula, quase tudo era muito diferente: o quadro era
preto e no verde, como os de hoje. Por isso ainda o chamamos de quadro negro? As
carteiras com os ps de ferro eram presas ao cho, fazendo que a sala s pudesse ser orga-
nizada com as carteiras enfileiradas. No era possvel trabalhar em grupos?
Ligados aos objetos, ainda observamos se nesses havia smbolos e/ou marcas, pois elas
tambm podem nos dizer muita coisa. Um exemplo disso a presena dos smbolos
nacionais (hinos nos cadernos, bandeira do Brasil na sala, brases em livros, etc.) que
pudemos ver em grande quantidade no Museu da Escola. Atravs desses smbolos ima-
ginamos como era construda nas escolas a idia de ptria e o sentimento de patriotismo, na
medida em que todos aprendiam a cantar os hinos, a venerar e respeitar algumas pessoas
apresentadas como heris, sem qualquer crtica.
Outro movimento que aprendemos foi a perguntar: como que um objeto foi feito? Por quem?
Para que ele serve ou servia? Essas perguntas so importantes, por exemplo: os trabalhos
de entalhes de madeira e ferro encontrados nas carteiras e nas mesas do professor. Refletindo
sobre as perguntas, pudemos pensar que eram feitos com diferentes ferramentas e que at
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certa poca cada pea era nica, pois era feita individualmente. O tempo que uma pessoa le-
vava fazendo um mvel era longo e o ritmo de vida muito diferente.
Tambm pensar sobre os materiais e tcnicas com que feito um objeto importante para
entendermos a prpria relao das pessoas com o ambiente numa certa poca. No Museu da
Escola encontramos objetos existentes at hoje nas escolas, porm os materiais daqueles
eram muito mais resistentes. o caso do quadro negro, feito de ardsia e madeira. E tambm
do lpis de ardsia, prprio para o miniquadro - usado para treinar a letra antes de passar para
o caderno. Ser que no existia muito papel naquela poca?
Quando olhamos um objeto, muita gente quer saber: quem o usou? Fazer sempre essa pergun-
ta uma outra dica, pois ela pode nos trazer explicaes sobre muita coisa de uma sociedade.
O burrinho, por exemplo, foi usado pelas professoras, que o colocavam pendurado na mesa dos
alunos indisciplinados ou que erravam os exerccios. Naquele tempo, as professoras pensavam
que os alunos iriam ficar mais espertos com eles e no ficariam fazendo bagunas nas aulas
delas. Hoje, podemos achar at divertido, mas algum j se imaginou no lugar do menino que
tinha que ficar com o burrinho? Os alunos deviam ficar pensando que as professoras os
achavam burros, incompetentes. Ento deviam se achar uns fracassados...
Assim, a relao das pessoas com os objetos que as cercavam podia ser muito diferente
daquela que conhecemos hoje. importante pensarmos que todos os objetos que nos cer-
cam esto relacionados com nosso modo de vida, com a sociedade que pertencemos.
Concordamos com o texto que lemos, que impossvel guardar todos os tipos de objetos
existentes e por isso que temos que fazer uma seleo de acordo com o que julgamos mais
importante. Depois que esto nos museus, esses objetos devem passar a ser considerados
parte de nosso patrimnio cultural. Isto quer dizer que eles sero exemplos concretos da
sociedade que os produziu e utilizou.
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Avaliando a visita.....
A professora, ao avaliar o resultado de escrita final dos alunos - texto tambm revisado e estru-
turado com a sua orientao - considerou que os alunos, na sua maioria, conseguiram ali-
nhavar de forma satisfatria os objetivos perseguidos na visita ao Museu da Escola.
Consider