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YRAM DE OLINDA NEVES MIRANDA O USO DO SISTEMA DE TREINAMENTO E DESENVOLVIMENTO COMO ESTRATÉGIA CORPORATIVA: UM ESTUDO DE CASO UNIVERSIDADE FERNANDO PESSOA Faculdade de Ciências Humanas e Sociais Porto, 2016 I

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YRAM DE OLINDA NEVES MIRANDA

O USO DO SISTEMA DE TREINAMENTO E DESENVOLVIMENTO COMO

ESTRATGIA CORPORATIVA: UM ESTUDO DE CASO

UNIVERSIDADE FERNANDO PESSOA

Faculdade de Cincias Humanas e Sociais

Porto, 2016

I

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

II

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

III

YRAM DE OLINDA NEVES MIRANDA

O USO DO SISTEMA DE TREINAMENTO E DESENVOLVIMENTO COMO

ESTRATGIA CORPORATIVA: UM ESTUDO DE CASO

UNIVERSIDADE FERNANDO PESSOA

Faculdade de Cincias Humanas e Sociais

Porto, 2016

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

IV

YRAM DE OLINDA NEVES MIRANDA

DISSERTAO DE MESTRADO EM CINCIAS EMPRESARIAIS

O USO DO SISTEMA DE TREINAMENTO E DESENVOLVIMENTO COMO

ESTRATGIA CORPORATIVA: UM ESTUDO DE CASO

______________________________________________

Yram de Olinda Neves Miranda

Trabalho apresentado Universidade Fernando

Pessoa como parte dos requisitos para obteno do

grau de Mestre em Cincias Empresariais.

Porto, 2016

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

V

RESUMO

Diante de um cenrio de crescente competitividade no mercado de trabalho, as

organizaes tm realizado programas de treinamento com o intuito de buscar resultados

mais eficazes e obter vantagem competitiva. Esse estudo de caso teve como objetivo

principal identificar como as aes de treinamento e desenvolvimento so percebidas,

compreendidas e sistematizadas nas organizaes. A amostra comps-se de gestores e

colaboradores responsveis pela conduo do sistema de T&D de quatro empresas

sediadas na cidade de So Lus do Maranho. A pesquisa emprica baseou-se em uma

metodologia qualitativa, recorrendo a entrevistas semiestruturadas para obteno dos

dados, posteriormente analisados luz da anlise de contedo.

Os resultados evidenciam que as aes de treinamento e desenvolvimento realizadas nas

organizaes tem pouco carter estratgico se comparados aos preceitos tericos

elucidados pela investigao bibliogrfica que deu suporte a esse estudo. Considerando a

sistematizao de suas etapas e as metodologias trabalhadas, verificou-se que o sistema

de T&D tem sido utilizado de forma pouco sustentvel.

Os dados sugerem ainda que muitas aes so praticadas sem qualquer alinhamento s

estratgias corporativas e que o padro de certas culturas organizacionais inviabiliza o

suporte transferncia de aprendizagem. Quanto percepo dos participantes sobre as

atividades, discorre-se sobre a dificuldade de estabelecer relaes diretas entre os efeitos

das aes e os ganhos de produtividade, alm de desafios importantes a serem superados.

Palavras-chave: Treinamento; Desenvolvimento; Educao; Estratgia Corporativa.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

VI

ABSTRACT

In a context of growing competitiveness of the market, organizations have conducted

training programs in order to get more effective results and gain competitive advantage.

This case study aimed to identify how training and development actions are perceived,

understood and systematized in organizations. The sample had managers and employees

responsible for the conduct of T&D system of four companies based in the city of Sao

Luis. The research used a qualitative methodology and semi-structured interviews to

obtain data later analyzed according to content analysis.

The results show that the training and development activities carried out in organizations

has little strategic value compared to the theoretical principles elucidated by

bibliographical research that supported this study. Whereas systematizing the steps and

methodologies used, it was found that the T&D system has been used as an unsustainable

manner.

The data also suggest that many actions are practiced without any alignment to corporate

strategies and also that some organizational cultures do not enable support the transfer of

learning. About the perception of the participants, it discusses about the difficulty of

establishing direct links between the effects of actions and productivity gains, as well as

major challenges to be overcome.

Keywords: Training; Development; Education; Corporate Strategy.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

VII

memria da minha av Anzia,

fonte de amor e aprendizagem.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

VIII

AGRADECIMENTOS

A Deus, por mais um caminho que abriu em minha trajetria de vida e por mais uma

conquista que me permitiu alcanar.

Aos meus pais, pela dedicao e amor sem medida.

Ao meu amado marido, Vladimir, por todo suporte, amor, companheirismo e fora que

me d para seguir em busca dos meus sonhos.

Professora Doutora Teresa Toldy, por sua disponibilidade e ateno cuidadosa, por

partilhar seu conhecimento e sabedoria, por sua competncia em administrar dvidas e

emoes, por sua preciosa orientao a este trabalho.

Ao Professor Doutor Antnio Cardoso, pelos esclarecimentos, ateno e por sua parcela

de contribuio em minha formao acadmica.

Aos participantes do estudo, que se mostraram bastante solcitos em contribuir com dados

e informaes valorosas.

A todos meus amigos e familiares que deram apoio s minhas decises.

A todos aqueles que direta ou indiretamente contriburam para a concretizao desse

trabalho, a minha sincera gratido.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

IX

O ritmo em que os indivduos e organizaes aprendem

pode se tornar a nica vantagem competitiva sustentvel.

(Arie de Geus)

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

X

ndice Geral

ndice de Siglas .......................................................................................................................... XII

ndice de Figuras ....................................................................................................................... XII

ndice de Tabelas ....................................................................................................................... XII

INTRODUO ........................................................................................................................... 1

Captulo I O sistema de Treinamento e Desenvolvimento (T&D) ....................................... 4

1.1 Definies ........................................................................................................................... 4

1.2 O percurso da rea de T&D ............................................................................................. 7

1.3 Treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa .................................... 12

1.3.1 O conceito de estratgia ............................................................................................. 12

1.3.2 O T&D estratgico ..................................................................................................... 14

1.3.3 Os efeitos do treinamento para a produtividade ......................................................... 20

1.3.4 A resistncia mudana como um obstculo aprendizagem ................................... 23

1.3.5 O ambiente e o suporte organizacional ...................................................................... 25

1.3.6 O profissional de T&D ............................................................................................... 29

Captulo II T&D: etapas e metodologias .............................................................................. 31

2.1 As etapas do treinamento ............................................................................................... 31

2.1.1 Levantamento de Necessidades de Treinamento (LNT) ............................................ 31

2.1.2 Planejamento instrucional .......................................................................................... 34

2.1.3 Execuo do Treinamento .......................................................................................... 36

2.1.4 Avaliao de Treinamento ......................................................................................... 36

2.2 Mtodos e tecnologias instrucionais ............................................................................... 38

2.2.1 Programas corporativos .............................................................................................. 39

2.2.2 Mtodos de treinamento ............................................................................................. 41

2.2.3 Coaching .................................................................................................................... 43

2.2.4 Ensino Distncia EAD .......................................................................................... 44

Captulo III Metodologia ....................................................................................................... 46

3.1 Objetivos do estudo ......................................................................................................... 47

3.2 Tcnicas e Procedimentos ............................................................................................... 47

3.3 Instrumento de coleta de dados ...................................................................................... 48

Captulo IV Anlise e Discusso dos Resultados ................................................................. 63

4.1 Utilizao do T&D ........................................................................................................... 64

4.1.1 Quantitativo de profissionais ...................................................................................... 64

4.1.2 Gesto e execuo das atividades ............................................................................... 64

4.1.3 Frequncia da oferta ................................................................................................... 65

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

XI

4.1.4 Pblico-alvo ............................................................................................................... 65

4.1.5 Enfoque dos treinamentos .......................................................................................... 66

4.1.6 Levantamento de necessidades e planejamento das atividades .................................. 69

4.1.7 Avaliao das aes ................................................................................................... 71

4.2 Metodologias e tendncias na educao corporativa ................................................... 73

4.2.1 Tipos de treinamento .................................................................................................. 73

4.2.1.1 Mtodo formal ......................................................................................................... 73

4.2.1.2 A relevncia da prtica ............................................................................................ 74

4.2.1.3 Outros mtodos ....................................................................................................... 76

4.2.2 Uso de tecnologias virtuais ........................................................................................ 77

4.2.3 Presena de Universidades Corporativas (UCs) ......................................................... 79

4.2.4 Programas educacionais existentes ............................................................................ 81

4.3 Valorizao do T&D ....................................................................................................... 83

4.3.1 Alinhamento estratgico ............................................................................................. 83

4.3.2 Suporte transferncia ............................................................................................... 84

4.3.3 Investimentos em T&D .............................................................................................. 87

4.4 Percepo do T&D .......................................................................................................... 89

4.4.1 Resultados financeiros ................................................................................................ 89

4.4.2 Relao com a produtividade ..................................................................................... 90

4.4.3 Identificao e tratamento das resistncias................................................................. 91

4.4.4 Oferta de treinamentos das consultorias locais .......................................................... 93

4.4.5 Desafios do setor ........................................................................................................ 95

CONSIDERAES FINAIS ................................................................................................... 97

BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................................... 104

ANEXOS .................................................................................................................................. 111

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

XII

ndice de Siglas

ASTD American Society for Training and Development

ABTD Associao Brasileira de Treinamento e Desenvolvimento

BP(s) Business Partner(s)

CHA(s) Conhecimento(s), Habilidade(s) e Atitude(s)

EAD Ensino Distncia

IMPACT Modelo Integrado de Avaliao de Impacto de Treinamento no Trabalho

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

LNT Levantamento de Necessidades de Treinamento

MAIS Modelo de Avaliao Integrado e Somativo

PDI Planos de Desenvolvimento Individual

RH Recursos Humanos

ROI Retorno sobre Investimentos

SEBRAE Servio de Apoio s Micro e Pequenas Empresas

T&D Treinamento e Desenvolvimento

TD&E Treinamento, Desenvolvimento e Educao

TI Tecnologia da informao

UC(s) Universidade(s) Corporativa(s)

ndice de Figuras

Figura 1: Representao do sistema de TD&E .............................................................. 19

Figura 2: Analogia entre um sistema de aprendizagem organizacional e um

sistema de produo padro .......................................................................................... 33

Figura 3: Avaliao de necessidades no nvel do indivduo ......................................... 46

ndice de Tabelas

Tabela 1: 5W2H ........................................................................................................... 47

Tabela 2: Descrio da amostra .................................................................................... 62

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

1

INTRODUO

O sculo XX marcou a sociedade e, consequentemente, as organizaes com o advento

de diversos fenmenos, dentre os quais podemos citar: a globalizao, que influenciou

mercados, polticas e economias internacionais, bem como as relaes culturais e

humanas; e a veloz ascenso da tecnologia da informao, que alterou a maneira como

nos comunicamos e criamos nossas redes de relacionamento. Esse cenrio desencadeou

o acirramento da concorrncia no universo empresarial e a exigncia de produtos cada

vez mais diferenciados, na esfera social.

O novo cliente no busca mais o produto pelo produto, mas espera que com ele obtenha

o dito valor agregado, isto , a sociedade passou a exigir valores intangveis quilo que

consome, tais como segurana, status, diferenciao, exclusividade, reconhecimento,

conforto, etc. Para atender a essa nova demanda do consumo, as empresas requerem que

seus colaboradores acompanhem essas transformaes, atravs da criatividade, inovao

e acrescentando valores no relacionamento com os clientes at ento irrelevantes.

O recurso do conhecimento humano ganhou notria relevncia para as empresas, pois as

atuais dinmicas organizacionais desafiam as tradicionais formas de se encontrar solues

para os problemas e oportunidades. Na economia contempornea, qualquer produto nada

mais do que a representao do conjunto de conhecimentos extrados do meio laboral.

Nesse contexto, para garantir a sobrevivncia no mercado deste sculo, as organizaes

devem fazer do processo de aprender uma necessidade urgente para o momento.

Vivemos a chamada Era do Conhecimento, e, para o mundo empresarial, a vantagem

competitiva aumenta medida que se dispe de informao. De tal modo, faz todo sentido

valorizar os processos de aprendizagem dentro das organizaes. A maneira como as

informaes so disponibilizadas, acessadas e processadas crucial para o bom

desempenho organizacional. Assim, investir no desenvolvimento do empregado, na

gerao de novos conhecimentos condio bsica para o desenvolvimento

organizacional.

Para dar conta das demandas de capacitao, educao continuada, treinamento e

desenvolvimento humano, muitas organizaes investem grandes quantias em programas

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

2

de Treinamento e Desenvolvimento (T&D), objetivando o retorno produtivo, seja ele o

desenvolvimento do empregado na organizao e na vida social e/ou o retorno financeiro.

Os treinamentos corporativos, portanto, alm de sua tradicional tarefa de qualificar o

colaborador interno, surgem tambm como alternativa para o enfrentamento de

problemas e desafios do mercado atual. a isso que se chama aqui de uso do sistema de

treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa, isto , a utilizao de

ferramentas da educao para sanar possveis gaps tcnicos e/ou comportamentais no

corpo de profissionais das organizaes e prepar-los para desafios emergentes.

Espera-se que as aes de T&D possibilitem a mudana de atitude, de comportamentos,

e, em um nvel mais profundo, de pensamentos dos indivduos envolvidos. Em geral,

quando no oferecidas internamente, as organizaes buscam estas solues corporativas

externamente, atravs de profissionais ou consultorias especializadas na oferta de tais

recursos.

Visando entender esse setor como componente estratgico, o presente trabalho se props

a investigar como as aes de T&D so trabalhadas, compreendidas e percebidas pelos

gestores de organizaes da cidade de So Lus do Maranho. Pretendeu-se investigar

como as organizaes fazem a gesto e atendem suas necessidades de treinamento e

desenvolvimento e como se d a atuao dos profissionais do setor. Buscou-se tambm

conhecer qual a viso que possuem quanto s solues de treinamento oferecidas por

consultores locais, averiguar se as empresas utilizam as ferramentas de treinamento e

desenvolvimento de forma estratgica e captar as tendncias da rea de T&D, seus

desafios e oportunidades.

Dessa forma, o contedo est dividido em quatro captulos. O primeiro deles traz

conceitos tericos sobre o sistema de treinamento e desenvolvimento (T&D), abordando

definies importantes sobre o tema, o percurso da rea de treinamento e

desenvolvimento. Discute-se ainda seu uso como estratgia corporativa.

No segundo captulo, procedeu-se explicao dos mtodos e tecnologias instrucionais

mais utilizados nas organizaes e das etapas do T&D, entendendo sua sistematizao

como capital para o seu desenvolvimento como recurso estratgico.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

3

No terceiro captulo, explicita-se os detalhes da pesquisa realizada, a qual teve como

estratgia investigativa o mtodo do estudo de caso, recorrendo investigao qualitativa

dos fenmenos. Os dados foram obtidos a partir de entrevistas semiestruturadas e

interpretados luz da tcnica de anlise de contedo. Ainda que em um trabalho de cunho

interpretativo como esse seja difcil eliminar-se qualquer subjetividade, fez-se um esforo

para direcionar os dados de forma objetiva.

O quarto captulo apresenta os resultados obtidos com a pesquisa exploratria, bem como

as discusses relevantes relacionadas com o contedo terico de apoio. Tendo-se

estruturado os dados em categorias e subcategorias, estas sero apresentadas conforme a

sequncia das anlises realizadas.

Por fim, nas consideraes finais, buscou-se realizar uma sntese dos assuntos abordados,

principais ideias e destacar as caractersticas limitantes do estudo.

Acredita-se que este trabalho alcanou seus objetivos iniciais, satisfazendo as

curiosidades de investigao. Prope-se a no se fazer dele um estudo encerrado, ao

contrrio, tratou-se de um passo inicial rumo maior especializao, conhecimento e

aplicao da rea de treinamento e desenvolvimento por parte de sua autora. Espera-se

que sua leitura leve ao interesse pelo tema e motive a novas pesquisas e ao uso estratgico

do sistema de T&D.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

4

Captulo I O sistema de Treinamento e Desenvolvimento (T&D)

1.1 Definies

O sistema de Treinamento e Desenvolvimento (T&D) corresponde forma como os

processos de aprendizagem so organizados e sistematizados dentro das organizaes.

Por integrar processos distintos, faz-se necessrio definir cada um deles para compreender

como se complementam.

Sobre treinamento de pessoas, a literatura oferece uma vasta lista de conceitos. Dentre

eles, traz-se aqui o de Marras (2000) o qual evidencia que treinamento pode ser entendido

como um processo de assimilao cultural a curto prazo, que objetiva repassar ou reciclar

conhecimentos, habilidades ou atitudes relacionadas diretamente execuo de tarefas

ou sua otimizao no trabalho.

Hinrichs (1976 cit. in Bastos, 1991) assevera que treinamento pode ser definido como

quaisquer procedimentos de iniciativa organizacional cujo objetivo ampliar a

aprendizagem entre os membros da organizao. Tal definio torna-se relevante pelo

facto de o autor destacar alguns aspectos complementares a ela, tais como: a

intencionalidade das aes (contribuir para a eficcia organizacional); a considerao da

aprendizagem como a necessidade de mudana de comportamentos face necessidade da

organizao; a noo sistemtica agregada ao conceito de treinamento; e a compreenso

de que o comportamento envolve tambm cognies e sentimentos. Bastos (1991) ressalta

que Hinrichs conseguiu restringir a amplitude conceitual do treinamento ao considerar o

critrio de intencionalidade em produzir melhorias no desempenho e o controle desse

processo pela organizao.

Em sua definio, Galvo (2006, p. 44) pontua:

Treinamento, como qualquer processo educacional, resultado de um processo de aquisio de

conhecimento com o consequente desenvolvimento, por parte do indivduo, de habilidades, a fim de

se comportar em determinado papel ou situao.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

5

Este autor chama a ateno para a percepo que ora pode-se ter acerca de treinamento

como a de adestramento de animais, uma vez que pode ser encarado como um processo

que espera respostas condicionadas a estmulos.

Fontes (1971) traz uma definio de treinamento em um sentido amplo, relacionando-o

como um instrumento da direo, com objetivos econmicos, sociais e culturais

especficos. O autor aborda diferentes conceitos, uns dando nfase capacitao da

equipe para eliminar a diferena entre o desempenho atual e os objetivos propostos, outros

a aspectos estritamente econmicos, e faz uma importante observao quando diz que

qualquer conceito de treinamento empresarial tem que estar implicitamente condicionado

aos progressos da produo e aos aspectos humanos e sociais.

Para Vasconcelos (1999) treinar educar, ensinar, mudar o comportamento, fazer com

que as pessoas adquiram novos conhecimentos, novas habilidades, ensin-las a mudar

de atitudes. No sentido mais profundo, treinar ensinar a pensar, a criar e a aprender a

aprender.

J o conceito de desenvolvimento se refere a um processo lento e gradativo que conduz

ao conhecimento de si prprio e realizao de suas potencialidades (Nadler, 1984 cit. in

Mouro e Martins, 2010). Para o criador da expresso desenvolvimento de recursos

humanos, Leonard Nadler, o termo diz respeito promoo de processos de

aprendizagem visando o crescimento individual dos colaboradores sem, contudo,

direcion-los para uma trajetria profissional especfica (Vargas e Abbad, 2006).

Para Bastos (1991) o desenvolvimento tido hoje como um conceito mais amplo,

envolvendo outras funes alm de treinamento, prendendo-se dinmica das prprias

organizaes em sua trajetria de tratar de forma mais abrangente seus colaboradores.

Assim, o desenvolvimento engloba e no substitui o conceito de treinamento.

Reunidos numa s definio, Vargas (1996, p. 127) conceitua o sistema da seguinte

maneira:

Treinamento e desenvolvimento so a aquisio sistemtica de conhecimentos capazes de provocar,

a curto ou longo prazo, uma mudana na maneira de ser e de pensar do indivduo, atravs da

internalizao de novos conceitos, valores ou normas e da aprendizagem de novas habilidades.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

6

Outros autores propem ainda a associao do termo educao ao conceito do sistema,

por se tratar de um processo de maior escala que engloba outros processos de

aprendizagem. Do latim educere, educar significa conduzir para fora, extrair aquilo que

j est dentro do ser humano, manifestar um potencial inerente ao ser (Loures, 2006).

Embora intensamente discutida por diversos tericos, parece ser consenso de que a

educao se trata de um processo psicolgico que ocorre no nvel individual, refletindo

alteraes de comportamentos duradouras. Ocorrendo a aprendizagem em um nvel

interior, o indivduo deve lider-la, j que ele deve ser o maior interessado em seu

crescimento, cabendo s empresas agirem como facilitadoras desse processo (Fleury e

Fischer, 1998).

Em suma, os trs conceitos podem ser assim sintetizados:

a) Treinamento: evento educacional que facilita a aquisio, reteno e transferncia

da aprendizagem para funes especficas de trabalho.

b) Desenvolvimento: processo gradativo que leva ao autoconhecimento e ao

aumento das potencialidades do sujeito dentro e fora do contexto de trabalho a

partir da internalizao de novos conceitos, valores e habilidades.

c) Educao: processo psicolgico individual decorrente da aprendizagem de novos

contedos que aumenta a capacidade para resolver problemas e a manuteno de

novos comportamentos.

A figura 1 a seguir ilustra o posicionamento dos trs conceitos apresentados sob a tica

das estruturas de conhecimento envolvidas.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

7

Embora seus limites conceituais sejam tnues, do ponto de vista dos processos de

aprendizagem nas organizaes, os conceitos se complementam e agrupam-se em uma

nica definio: Treinamento e Desenvolvimento (T&D) ou Treinamento,

Desenvolvimento e Educao (TD&E) representando, portanto, o sistema que rene as

aes de educao oferecidas pelas empresas, visando o crescimento individual das

pessoas aliado ao crescimento organizacional.

Uma vez integrados os conceitos, o que se versa sobre a eficcia desse sistema e, mais

especificamente, sobre a maneira como as aes de aprendizagem que decorrem dessa

trade so tratadas nas organizaes, que sejam capazes de provocar, suscitar e estimular

a mudana de comportamentos para fazer face a novas realidades.

1.2 O percurso da rea de T&D

A rea de treinamento de pessoal pode ser caracterizada pelo esforo realizado pelas

empresas para promover aquisio de novos contedos, ampliao de conhecimentos e,

consequentemente, mudana de comportamentos por parte de seus colaboradores. Dado

que cada organizao apresenta demandas especficas e situacionais, tradicionalmente,

pensa-se no treinamento como um instrumento em que o indivduo desenvolve aptides

para executar uma determinada tarefa ou atividade, de forma a aumentar seu desempenho,

satisfao e produtividade.

O termo Treinamento e Desenvolvimento (T&D) surgiu nos anos 1970, institudo pela

American Society for Training and Development (ASTD) e, desde ento, a rea de T&D,

Figura 1: Representao do sistema de TD&E

Fonte: Adaptado de Vargas e Abbad (2006)

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

8

como ficou conhecida, vem sendo revisada, periodicamente, pela Annual Review of

Psycology com uma subrea da Psicologia do Trabalho (Vargas e Abbad, 2006).

Comumente, pensa-se em T&D como um subsistema da rea de Recursos Humanos

responsvel por possibilitar a superao de deficincias na performance do corpo de

colaboradores das empresas, bem como por prepar-los para novas funes e/ou

tecnologias do trabalho. Autores como Salas e Cannon-Bowers (2001) vo alm e

consideram a rea de T&D como uma cincia, com objeto de estudo e corpo terico

definidos. Em suma, o objetivo central da rea de treinamento nas organizaes consiste

em favorecer um ambiente de contnuo aprendizado, fazendo convergir objetivos

culturais, econmicos e sociais prprios, para o alcance dos resultados organizacionais.

Oliveira (2006) afirma que a presena de T&D nas empresas decorreu da percepo de

que o sistema de ensino formal e o mercado de trabalho seriam incapazes de formar em

quantidade e qualidade os profissionais que deveriam ocupar os postos de trabalho

disponveis. Assim, por muitos anos, as aes de treinamento decorreram da necessidade

de profissionalizao interna, dado que a educao formal no apresentava solues para

as demandas organizacionais.

O facto que fazer T&D dentro das organizaes uma atividade que sempre

acompanhou o processo de produo empresarial. Seria possvel argumentar que,

quando o mestre, nas oficinas de trabalho, procurava transmitir os segredos e artes de seu

ofcio aos aprendizes, j praticava T&D (Loures, 2006, p. 135).

A rea consolidada surgiu em meados do sculo XIX, como uma das formas do ensino

profissionalizante, nos Estados Unidos, com o despontamento de grandes empresas

industriais. Na dcada de 1880, as aes de treinamento comeam a ser sistematizadas

nas indstrias, havendo uma aproximao entre essas e as escolas. Empresas como Hoe

& Co (1872), Westinghouse (1888) e General Eletric (1901) constituram escolas

profissionalizantes objetivando a qualificao de seus operrios (Oliveira, 2006).

Os conceitos da Administrao Cientfica de Taylor davam sustentao terica s

iniciativas de formao surgidas dentro das empresas. Caracterizado por sua nfase na

tarefa, o taylorismo visava a alta eficincia nos nveis operacionais a partir da diviso das

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

9

funes dos trabalhadores, rigor metodolgico, economia de esforos, controle de tempos

e movimentos, entre outras alternativas que preconizavam a otimizao do binmio

trabalho x custo:

A notvel economia de tempo e o consequente acrscimo de rendimento, possveis de obter pela

eliminao de movimentos desnecessrios e substituio de movimentos lentos e ineficientes por

movimentos rpidos em todos os ofcios, s podero ser apreciados de modo completo depois que

forem completamente observadas as vantagens que decorrem dum perfeito estudo de tempo e

movimento, feito por pessoa competente (Taylor, 1990, p. 33).

O foco na capacitao dos colaboradores era estritamente tcnico, isto , objetivava a

efetivao rigorosa do trabalho prescrito nas plantas fabris, e a funo do treinador de

operrios tornou-se essencial para a conduo do negcio (Oliveira, 2006). O percurso

do T&D, assim, sempre acompanhou os modelos de administrao vigentes, e sofreu

influncia de diversas reas do conhecimento, incorporando, por exemplo, conceitos da

psicologia, pedagogia, administrao, engenharia e tecnologia da informao (Pilati,

2006).

Pilati (2006) reala a rea militar como uma das reas de atuao que mais influenciou a

sistematizao das aes de treinamento, destacando, em especial, os estudos de R.

Gagn, autor que comeou a esboar os princpios de aprendizagem essenciais para o

ensino. Estudando o resultado da instruo programada para muitas funes militares, ele

observou que no havia efetividade na prtica intensa e repetitiva de comportamentos a

serem executados no cargo, principalmente naquelas atividades que possuam boa

quantidade de imprevistos, como resoluo de problemas em equipamentos. Diante disso,

props que o planejamento da instruo se baseasse em uma criteriosa observao e

descrio de tarefas do cargo, identificando o conjunto de tarefas que so essenciais para

o desempenho final esperado. Assim, tais informaes auxiliaram o desenvolvimento de

uma lgica sistmica de treinamento, pois alteraram a forma como as aes instrucionais

deveriam ser planejadas e executadas para alcanarem a mxima eficincia possvel,

aproximando mais o comportamento humano do trabalho.

Bastos (1991) discorre sobre o percurso histrico da rea de treinamento nas

organizaes, dividindo-o em quatro ondas as quais, mesmo apresentando semelhanas

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

10

em um mesmo perodo de tempo, se diferenciam pelas caractersticas presentes nas

organizaes em cada dcada, a saber:

Primeira onda Treinamento para o trabalho de 1950 a 1970: as aes de

treinamento visavam o desenvolvimento de habilidades tcnicas voltadas para o

trabalho. Os recursos humanos eram considerados peas do processo produtivo1.

Segunda onda Treinamento para a gerncia e superviso de 1960 a 1980: a

onda anterior gerou tecnologia eficaz para lidar com trabalhos repetitivos e

automatizados, impondo que a tarefa de administrar a fora de trabalho fosse mais

exigente e demandasse maior preparo e refinadas habilidades pessoais dos gerentes

e supervisores. As aes de qualificao se voltaram para a operao dos processos

tecnolgicos, diferenciando a perspectiva dos recursos humanos no processo

produtivo2.

Terceira onda Desenvolvimento organizacional e tecnologia do desempenho

de 1970 a 1990: as aes de treinamento ganham maior relevncia, dado o

acirramento da concorrncia comercial. Aumenta a importncia da educao aberta

e continuada, e o prprio trabalhador passa a individualizar o processo de T&D nas

organizaes, pois identifica e prioriza suas necessidades de treinamento. vlido

ressaltar que, nesse momento, pregava-se o abandono do modelo taylorista/fordista

para a implantao de modelos mais orgnicos, sendo necessrio focar a reteno

e capacitao de pessoas para atuar num ambiente de instabilidade, alm de primar-

se pela existncia de equipes mais enxutas e pela manuteno das pessoas mais

qualificadas.

Quarta onda Informao, conhecimento e sabedoria de 1980 aos dias atuais:

as aes de capacitao do nfase ao desenvolvimento de habilidades criativas, ao

1 A comparao de treinamento com adestramento pode ter origem nesse perodo no qual vigoravam os

preceitos da Administrao Clssica e os treinamentos preconizavam a adaptao rigorosa do trabalhador

aos aspectos fsicos do trabalho. Com o aparecimento da Escola das Relaes Humanas, o treinamento

passou a abranger aspectos psicossociais do indivduo, visando a capacitao dos trabalhadores no

somente para o desempenho tcnico de suas tarefas, mas tambm para integr-los ao ambiente

organizacional e aos relacionamentos interpessoais (Campos et al., 2004) 2 Sobre esse perodo, Caldas, Tonelli e Lacombe (2002) dizem que o T&D ganhou nfase porque, em

primeiro lugar, as tarefas ficaram mais complexas e, em segundo, porque a sofisticao tecnolgica do

trabalho tornou a substituio de funcionrios bem mais cara, o que favorece a reteno das pessoas nas

organizaes.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

11

preparo para a tomada de decises e, principalmente, mensurao dos resultados

das iniciativas de treinamento. As organizaes passam a investir na capacitao de

todos os nveis hierrquicos, almejando aperfeioamento mais amplo da sua fora

de trabalho.

Quanto ao percurso no Brasil, o sistema de T&D como hoje o compreendemos foi

introduzido no pas em meados da dcada de 1950, quando a economia brasileira recebeu

maior impulso para a industrializao, replicando o modelo americano. Entre os anos

1960 e 1990, o governo criou incentivos fiscais para as empresas brasileiras custearem

expressiva parcela de seus treinamentos, com o intuito de acelerar a formao da mo de

obra qualificada no pas. Um desses incentivos se deu atravs da lei n 6.297 de 1975, a

qual permitia a deduo em dobro, at 5 por cento do lucro tributvel das empresas, de

despesas com projetos de formao profissional aprovados pelo Ministrio do Trabalho.

Nos anos 1990, porm, a lei foi extinta pelo presidente Collor (Oliveira, 2006).

Um marco importante para a rea aconteceu em 1980, quando foi editado o Manual de

Treinamento e Desenvolvimento da Associao Brasileira de Treinamento e

Desenvolvimento (ABTD) que reuniu 32 artigos de profissionais dedicados aos estudos

em T&D. Mais ainda, foi tambm em 1980 que se realizou o primeiro e nico congresso

mundial de T&D sediado no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro (Borges-Andrade;

Oliveira-Castro, 1996).

Com todas as mudanas no cenrio mundial ocorridas no sculo XX, a rea de

treinamento deixa de ter um enfoque puramente finalista como outrora, e passa a ganhar

um posicionamento estratgico. A educao nas corporaes, por muito tempo

considerada como pontual, tcnica, de natureza estritamente imediatista e carente de viso

sistmica, no terceiro milnio, encarada como um processo essencial para a

disseminao de conhecimentos, valores e desenvolvimento de competncias tcnicas e

comportamentais. O treinamento formal e tradicional no atende mais certos contextos

dessa nova realidade, em que se destaca relaes mais complexas e dinmicas, interna e

externamente (Pacheco et al., 2009).

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

12

1.3 Treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa

1.3.1 O conceito de estratgia

Derivado do grego strategos, a palavra estratgia, em seu significado literal, corresponde

arte do general, isso porque remonta ao histrico de seu uso militar, significando o

caminho a ser dado visando vitria: o chefe do exrcito, em situaes de guerra,

formulava os planos necessrios para o alcance de um objetivo especfico.

Posteriormente, a palavra tambm ficou associada a jogos, e hoje, usa-se comumente para

designar o conjunto de planos e aes que visam a consecuo de um determinado

objetivo em qualquer contexto (Oliveira, 2004).

A noo de estratgia no que tange s organizaes diz respeito a conhecer o contexto

organizacional, suas premissas e traduzi-las para a aplicao s pessoas, processos e

clientes, isto , um guia das aes definidas em um plano que conduzem a um conjunto

de resultados tambm definidos, como produto de comportamentos organizacionais. Uma

estratgia deve estar voltada para dentro da organizao e tambm para fora, com foco

nos competidores, no meio ambiente e no clima dos negcios (Oliveira, 2004).

Andrews (1997) define estratgia como sendo um padro de decises que determinam e

revelam seus objetivos, produzem as principais polticas e planos, identificam o segmento

de negcio no qual a empresa est, o tipo de organizao econmica e humana que ela

ou pretende ser e a natureza das contribuies econmicas e no-econmicas a serem

oferecidas aos acionistas, colaboradores, clientes e comunidade. Assim, para a

delimitao de uma estratgia, importante que uma organizao estabelea sua misso,

viso, valores e objetivos, os quais iro nortear o desenho de planos para conduzir as

aes relevantes para o negcio.

Aliado ao conceito de estratgia, surge o de vantagem competitiva definida como

qualquer caracterstica do produto ou servio da empresa que os clientes reconhecem

como um diferenciador positivo em relao a outras e, por isso, so atrados para comprar

da empresa (Zaccarelli, 1996). Isto , a estratgia organizacional pode ser entendida

tambm como a formulao de meios na busca de vantagem competitiva.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

13

Ter vantagem competitiva no mercado atual no se trata somente de fornecer produtos de

qualidade, mas sim de ter capacidade para administrar as interaes da empresa com seus

stakeholders. Faz-se necessrio que as empresas observem quais elementos devem ser

levados em considerao para maximizar suas possibilidades de alcance de sucesso e

prolongamento de resultados favorveis. Agir estrategicamente, portanto, desenvolver

aes sustentveis.

Ohme (1983 cit. in Oliveira, 2004) fala de estratgia competitiva definindo-a como um

conjunto de planos, polticas, programas e aes desenvolvidos por uma empresa para

ampliar ou manter, de modo sustentvel, suas vantagens competitivas frente aos

concorrentes. Chiavenato (2004, p. 71) afirma que a estratgia organizacional representa

(...) a maneira pela qual a empresa se comporta perante o ambiente que a circunda, procurando

aproveitar as oportunidades e neutralizar as ameaas potenciais que rondam os seus negcios.

O autor ressalta ainda que deve a estratgia ser projetada a longo prazo, com vistas a

atender a misso, focalizar a viso e enfatizar os objetivos organizacionais. Assim, para

a formulao de uma estratgia competitiva necessrio identificar as ameaas e

oportunidades existentes nos ambientes interno e externo organizao.

Motta (2001), em suas consideraes sobre a estratgia organizacional, ressalta que a

prtica da estratgia resulta em um processo interativo no qual a empresa testa o seu

prprio futuro atravs de um aprendizado contnuo. Chiavenato (2004) tambm defende

esse posicionamento e afirma que a estratgia um mecanismo de aprendizagem

organizacional atravs do qual seus envolvidos aprendem com a retroao decorrente de

erros e acertos nas suas decises e aes globais.

Para ser bem-sucedida, portanto, a estratgia precisa ser colocada em ao por todas as

pessoas da organizao. E nesse ponto que podemos inserir as aes de gesto de

pessoas, em especial as aes de treinamento e desenvolvimento, como um componente

de relevncia estratgica.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

14

1.3.2 O T&D estratgico

Infelizmente a rea de T&D dentro das organizaes vista, com frequncia, apenas

como a ocorrncia de cursos e programas de desenvolvimento, o que no condiz com a

realidade da rea. Quando se fala em treinar, desenvolver e educar pessoas, certamente

est-se falando de um processo que no tem receitas prontas, vlidas igualmente para

todos os indivduos. Cada pessoa, antes de ser um colaborador, traz consigo um conjunto

de experincias que a torna nica. Sejam as aes de capacitao de ordem tcnica ou

comportamental, cada pessoa precisar de um tempo individual para incorporar e

processar cada nova informao.

Muitas vezes, as organizaes so impelidas a comprar produtos de prateleira, isto ,

aes de capacitao provenientes de consultorias externas que em nada se adequam s

estratgias organizacionais. Passado um tempo, verifica-se que nada mudou (Vilhena e

Junqueira, 2006).

No incomum encontrar organizaes cuja rea responsvel por T&D tem a reputao

de ser ineficiente e dispendiosa, j que os resultados decorrentes de suas iniciativas, pouco

so percebidos. Como ento promover aes de aprendizagem organizacional eficazes?

Para tratar dessa questo, frequente na literatura duas expresses que, para alguns

tericos, tm o mesmo significado, enquanto, para outros, apresentam significados

distintos: Organizaes de aprendizagem e Aprendizagem organizacional.

Loiola, Nris e Bastos (2006) admitem uma impreciso conceitual acerca das duas

expresses explicada por uma polissemia de disciplinas que estudam este campo, bem

como pelo desenvolvimento de uma literatura de carter prescritivo e voltada para

resultados de curto prazo por parte de consultores da rea, em oposio ao fenmeno da

aprendizagem organizacional estudado por acadmicos.

Esta falta de um corpo terico convergente sobre o conceito de aprendizagem

organizacional tambm constatada por Steil (2006, p. 54) quando afirma:

Embora as expresses aprendizagem organizacional e organizaes de aprendizagem sejam

utilizadas por alguns autores com o mesmo significado, existe uma clara distino entre elas. A

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

15

primeira objetiva descrever e compreender processos e comportamentos, e pautada pelo rigor

cientfico (abordagem normativa, descritiva), enquanto a segunda busca desenvolver um estado

ideal, um conjunto de recomendaes baseado em experincias de empresas de consultoria sobre as

melhores prticas para se criar uma organizao que aprende (abordagem prescritiva).

Um dos autores mais influentes dessa ltima vertente Peter Senge (1998) que aborda as

organizaes de aprendizagem como instituies nas quais se valoriza o aprendizado

coletivo e propicia um ambiente de trabalho em que os colaboradores teriam liberdade e

estmulo para inovar atravs da colaborao mtua.

A crtica por parte de acadmicos quanto a esse posicionamento reside em suas principais

caractersticas: (a) a associao de uma valncia positiva ao conceito de aprendizagem,

isto , organizaes que aprendem seriam aquelas bem-sucedidas; (b) a negligncia de

contingncias culturais distintas de ambientes tpicos de economias desenvolvidas; e (c)

o carter prescritivo que assume, dado a nfase na orientao prtica de grande parte

desses estudos (Loiola, Nris e Bastos, 2006).

Para o presente trabalho, ser considerada a abordagem da aprendizagem organizacional,

pois compreendendo o fenmeno da aprendizagem como um processo fruto de uma

construo social, depreende-se que o conhecimento criado pelos indivduos

transformado em aes concretas voltadas aos objetivos organizacionais. Ademais, o

processo de aprendizagem, sob uma perspectiva psicolgica, individual, e seus efeitos

podem se propagar pelos grupos, equipes e pela organizao como um todo.

atravs desta perspectiva que se pode pensar que os processos de aprendizagem

perpassam pela cultura organizacional, mais ainda, relevante destacar que o humano e

o social no se separam, no existindo descontinuidade entre conhecimento, aprendizado

e mudana. Nas palavras de Leito e Rousseau (2004 cit. in Loiola, Nris e Bastos, 2006,

p. 119):

Toda mudana implica mudar o conhecimento e mudar o conhecimento significa aprender, porque

todo conhecimento aquilo que aprendemos ao longo da vida. Os trs fenmenos esto

ontologicamente associados.

Entendendo a aprendizagem organizacional como um processo, tratemos agora de seu

insumo: o conhecimento organizacional. Comecemos por sua definio dada por Nonaka

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

16

e Takeuchi (1997): a criao do conhecimento organizacional deve ser entendida como

um processo que amplia organizacionalmente o conhecimento criado pelos indivduos,

cristalizando-o como parte da rede de conhecimentos da organizao. Em suma, trata-se

de qualquer informao que possa ser utilizada a favor da organizao e que se aplique

s suas atividades.

Os autores propem um modelo de criao do conhecimento organizacional que

transforme o conhecimento tcito em explcito e vice-versa. O primeiro diz respeito a um

tipo de conhecimento pessoal, automatizado, sobre o qual os indivduos no se

questionam ao agir e est ligado, portanto, atividade prtica. J o segundo, ao contrrio,

codificado, pode ser transmitido em linguagem formal e facilmente compartilhado

dentro das empresas, no exigindo contato pessoal.

O desafio para os profissionais do conhecimento como criar um ambiente e estruturas

que favoream a transformao do conhecimento individual em conhecimento

organizacional.

Indivduos aprendem em organizaes, mas esta aprendizagem pode ou no contribuir para a

aprendizagem organizacional. A aprendizagem organizacional na medida em que: (1) realizada

para alcanar propsitos organizacionais; (2) compartilhada ou distribuda entre os membros da

organizao; e (3) os resultados da aprendizagem so incorporados em sistemas, estrutura e cultura

organizacionais (Snyder e Cummings, 1998 cit. in Steil, 2006, p. 58).

Assim, a aprendizagem organizacional consiste na transferncia do conhecimento

individual na organizao, de forma que esse seja desenvolvido e disseminado em

mltiplos nveis.

Galvo (2006, p. 44) promove uma interessante reflexo quando diz que tudo na vida

pode ser treinamento porque tudo depende do grau de conscincia que temos diante de

cada informao. possvel afirmar, portanto, que qualquer situao de trabalho pode

se tornar uma oportunidade de aprendizagem, desde que o indivduo que aprende esteja

disponvel a desvincular-se de seus modelos mentais e possibilite a ampliao da

conscincia e a promoo de insights. Especialmente no que tange ao aprendizado de

novos comportamentos a partir de treinamentos comportamentais, o autor postula ainda

que somente a partir da conscincia da observao reflexiva possvel desfazer-se de

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

17

vcios e generalizaes, reformular conceitos, possibilidades e hipteses que permitiro

uma nova experincia:

Todos ns j nos propusemos a adotar novos comportamentos e nos surpreendemos repetindo

comportamentos que no queramos mais. Trabalhar com comportamentos requer compaixo,

respeito e o entendimento de que incorporar novas atitudes implica ser capaz de abrir mo de

significados anteriores. Todos agem de acordo com sua natureza e tm motivos para atuar de

determinada forma, assim, transformar um comportamento implica conter nossos impulsos, romper

com nossos confortos e, principalmente, correr riscos (Galvo, 2006, p. 49).

Mouro e Marins (2010) complementam esse entendimento quando trazem o conceito de

empregabilidade definido como a responsabilizao do indivduo pela obteno e

manuteno do seu emprego, atravs de formao e aperfeioamento contnuo,

ratificando a importncia do colaborador no se posicionar como sujeito passivo dos

processos de educao promovido pelas empresas, mas sim como agente do seu prprio

desenvolvimento.

Conforme Abbad e Borges-Andrade (2014), existem dois tipos de aprendizagem nas

organizaes: a natural e a induzida. A primeira acontece de maneira informal,

espontnea, por intermdio das consequncias resultantes do comportamento individual

e da equipe no trabalho, por observao, regras e crenas transmitidas pelos funcionrios

mais antigos, atravs de orientaes de superiores, por imitao, tentativa e erro,

conversas com pares, colegas, clientes etc. Ou seja, a aprendizagem informal acontece

independente da iniciativa deliberada da instituio. J a aprendizagem induzida ou

formal ocorre quando promovida por iniciativa da organizao de trabalho, que estrutura

previamente condies de ensino-aprendizagem para que seus membros aprendam. E

nessa ltima tipologia que se enquadram as aes de T&D, pois so planejadas e

orientadas para atender necessidades especficas do trabalho. Alm disso, segundo os

autores, so aes

(...) deliberadamente arranjadas, visando aquisio de competncias para superar deficincias de

desempenho no trabalho, preparar empregados para novas funes, adaptar mo de obra para a

introduo de novas tecnologias ou promover o livre crescimento profissional ou pessoal dos

membros de uma organizao (Abbad e Borges-Andrade, 2014, p. 247).

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

18

Ao nvel organizacional (macro), as aes de T&D podem favorecer o que outrora se

chamou de vantagem competitiva, ao nvel individual (micro) podem possibilitar o

desenvolvimento de competncias, as quais podem ser medidas em termos de

desempenho e resultados. Logo, o conceito de T&D est tambm atrelado ao conceito de

competncia que segundo Abbad e Borges-Andrade (2014) diz respeito combinao de

conhecimentos, habilidades e atitudes (CHAs) que o indivduo dispe para alcanar os

objetivos no trabalho. Nesse sentido, a efetividade de um treinamento s pode ser avaliada

mediante a transferncia de conhecimentos, habilidades e atitudes aprendidos para o

ambiente de trabalho.

O desenvolvimento de competncias d-se por meio da aprendizagem, envolvendo a

aquisio de conhecimentos, habilidades e atitudes (CHAs). A aprendizagem, nesse

contexto, significaria o processo pelo qual se adquire a competncia e o desempenho da

pessoa no trabalho representaria uma expresso de suas competncias, uma manifestao

daquilo que ela aprendeu ao longo de sua vida (Freitas e Brando, 2005). As organizaes

investem em T&D com o intuito de desenvolver competncias complexas, de forma que

seus integrantes possam aplicar no trabalho, de modo cada vez mais eficaz e coordenado,

diferentes combinaes de habilidades psicomotoras, cognitivas e afetivas (Abbad e

Borges-Andrade, 2014).

Steil (2006) discorre que, tradicionalmente, programas de capacitao objetivam

desenvolver competncias individuais. Porm, a aplicao de conhecimentos na criao

de novos produtos e processos que garantam vantagem competitiva para a organizao

no se trata de uma tarefa individual, mas sim de um grupo ou equipe.

sobre aes de capacitao voltadas unicamente a uma melhoria individualista que recai

a crtica de Pacheco et al. (2009). Estes autores comentam que grupos mais tradicionais

insistem em enfatizar a transmisso do conhecimento com aes de carter individualista,

as quais consideram arcaicas e obsoletas, embora eficientes quanto ao seu amparo

tecnolgico e tcnico. Para eles, estes grupos resistem s mudanas dos conceitos de

aprendizagem e educao corporativa, que hoje apontam para uma viso coletiva, voltada

para o desempenho de equipes e de carter integrador, cuja essncia do sucesso est na

articulao do humano com a tcnica, as tecnologias e a integrao de setores.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

19

A mudana na dinmica de aprendizagem corporativa vem sendo amplamente debatida, pois se trata

de um grande desafio: revogar o uso de tecnologias de educao individualistas e absorver o

empenho na educao e desenvolvimento de competncias por meio de parmetros grupais (Pacheco

et al., 2009, p. 52).

Na verdade, Pacheco et al. (2009) concluem que o carter individualista da educao est

presente em vrios contextos socioculturais de nossa sociedade, a qual enfatiza o xito e

sucesso pelo esforo e desempenho individual. Ressalvam, contudo, que prticas

coletivistas so mais facilmente absorvidas em empresas inovadoras, e no naquelas com

modelos arraigados a crenas e costumes.

Portanto, para se pensar em aes efetivas de treinamento e desenvolvimento,

necessrio abord-las a partir de uma viso sistmica, preocupada com o contexto

organizacional. Conforme j apontado, o treinamento uma das alternativas de se suprir

gaps de competncias nos indivduos, para que alcance um melhor desempenho nas

tarefas relacionadas aos seus objetivos, bem como aos da organizao. E nisso que

concerne se se pensar nas aes de T&D como ferramentas estratgicas ou solues

corporativas. As aes de T&D estratgicas sero aquelas que, uma vez identificadas as

necessidades e objetivos da organizao, no so planejadas aleatoriamente, mas esto

sim direcionadas aos valores estratgicos.

Os processos de capacitao e desenvolvimento de pessoas dentro das organizaes

podem, muitas vezes, ser percebidos como um conflito de interesses, pois de um lado

tem-se a necessidade de resultados imediatos, e de outro um processo dependente de

amadurecimento cognitivo-emocional, o qual demanda tempo e investimento a mdio e

longo prazos (Pacheco, 2009). Nessa medida, Rocha (1998 cit. in Campos et al., 2004)

coloca que raramente se percebe a aplicao efetiva do contedo transmitido num

treinamento.

Na prtica, observa-se que a dissonncia ocorre quando o que proposto nas atividades

de T&D desconsidera as demandas do negcio e o ambiente organizacional. Lobos (1985)

identifica duas causas para justificar essa dissonncia de objetivos. A primeira delas seria

a incerteza das informaes que sustentam o Planejamento de Recursos Humanos, pois

muitas delas tratam-se de meras projees dos recursos necessrios e no tem maior valor

informativo para a tomada de decises: as empresas estariam mais concentradas em

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

20

quantificar os meios de capacitao utilizados do que em qualificar os resultados obtidos.

A segunda causa seria a prpria natureza da organizao empresarial moderna, pois,

segundo o autor, as respostas administrativas da empresa s incertezas ambientais ou ao

capricho de seus dirigentes so to rpidas ou espasmdicas que contribuem para

desatualizar ou para desorientar o Planejamento de Recursos Humanos.

Ainda sobre essa questo, Byrne (1999 cit. in Steil, 2006) diz que as perspectivas

tradicionais de treinamento no atingem seus objetivos em funo de problema em uma

das seguintes categorias: (a) o treinamento no possui um foco definido; (b) o treinamento

no possui apoio da gerncia; (c) o treinamento no planejado e conduzido de forma

sistematizada; e (d) o treinamento no est relacionado com outras iniciativas

organizacionais.

Concluindo, percebe-se que todos esses fatores interferem na eficcia dos treinamentos,

tornando-se atividades isoladas, repetitivas, desmotivadoras, por vezes entendidas como

uma forma de fuga ao trabalho ou, pior, como punio, ao invs de serem percebidas

como atividades que proporcionam uma melhoria de sua capacidade e produtividade.

Portanto, as incertezas quanto aos efeitos do treinamento decorrem quando de um lado

temos um investimento financeiro (muitas vezes vultosos) em atividades de capacitao

como a prescrio de lista de cursos e workshops e, de outro, um funcionrio que no

identifica correlao direta do treinamento com seu trabalho (Steil, 2006).

1.3.3 Os efeitos do treinamento para a produtividade

Apesar de toda essa discusso acerca da eficincia estratgica quanto a prxis do T&D,

parece ser consenso o inegvel retorno produtivo que estas aes provocam dentro das

organizaes. De forma estratgica ou no, em muitos casos verifica-se os resultados da

rea como ganhos imensurveis. No toa, vemos que, nos ltimos anos, os estudos de

avaliao dos impactos do treinamento no trabalho vm crescendo significativamente, e

seus achados vem contribuindo para embasar a forma de se conduzir as aes de T&D

rumo a resultados produtivos. Steil (2006) representa a relao entre a aprendizagem

individual, a aprendizagem organizacional e o aumento da produtividade na figura

abaixo, fazendo aluso a um sistema de produo padro:

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

21

A autora traz importantes constataes ao analisar diversas pesquisas internacionais sobre

os efeitos do uso de treinamentos. Uma delas, realizada pelo Instituto Nacional para a

Pesquisa Econmica e Social na Inglaterra nos anos de 1983 e 1991, tratou de investigar

as possveis razes para as diferenas de produtividade entre Inglaterra, Alemanha,

Frana e Holanda no segmento manufatureiro e na indstria de servios hoteleiros.

Constatou-se que as empresas alems produziam 63% a mais por trabalhador/hora do que

as empresas inglesas, francesas e holandesas. Esse resultado estava diretamente

relacionado com o maior nvel de habilidade e conhecimento dos trabalhadores alemes,

o qual no afeta apenas o tipo, a variedade e a qualidade do produto, mas tambm a

flexibilidade e a velocidade do processo de produo. Outras pesquisas citadas por Steil

(2006) cruzaram diversas variveis e trazem diversos tipos de correlaes entre o

investimento em treinamento e ganhos de produtividade: ganho de percentual produtivo,

aumento na taxa de retorno para investidores, reduo do turnover, aumento do

desempenho financeiro, aumento de salrios, entre outras evidncias comprovadas.

Outros efeitos organizacionais possveis descritos na pesquisa de Freitas e Borges-

Andrade (2004) so: aquisio de novos clientes; compra de outras organizaes; adoo

de novas tecnologias; melhorias no clima organizacional; reduo do absentismo,

rotatividade e taxas de acidentes de trabalho; ganhos de metas de produtos, quantidade,

Figura 2: Analogia entre um sistema de aprendizagem organizacional

e um sistema de produo padro

Fonte: Steil (2006, p. 7)

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

22

qualidade e variedade da produo; ganho de imagem, satisfao dos consumidores e

acionistas, entre outros.

Moreira (2006) fala ainda de efeitos colaterais das aes de T&D se referindo aos

benefcios que no so contabilizados diretamente como aprendizagem, como por

exemplo, a possibilidade de receber novas informaes e ter participao para dar

opinio, discutir e, consequentemente, aceitar novas realidades. Esta talvez seja uma das

mais fortes contribuies da ao de T&D: envolver, informar, ouvir, refletir e propiciar

que todos tenham participao nos processos de mudanas (Moreira, 2006, p. 233). Tais

contribuies so efeitos motivacionais intensos e determinantes para a realizao de

resultados, despertam o sentimento de reconhecimento e valorizao por parte dos

colaboradores, integrando e fortalecendo as equipes de trabalho.

Apesar da relao treinamento x produtividade ter-se transformado em um axioma e ser

grande a quantidade de estudos que comprovam correlaes positivas entre o uso de

instrumentos da educao e o aumento da produtividade, tambm recorrente nas

pesquisas e trabalhos da rea a complexidade quanto mensurao de seus ganhos. O

estabelecimento de ferramentas que faam relao direta entre a prtica do T&D e a

obteno de vantagens competitivas, especialmente aquelas associadas a ganhos

financeiros, ainda um desafio para a rea. Alguns autores sugerem o uso do ROI (retorno

sobre investimentos) como a metodologia ideal a ser utilizada para avaliar o impacto do

treinamento para a organizao, coletando dados sobre dois aspectos de sua equao: os

custos do treinamento e o que gerou de resultado financeiro. No obstante, outros autores

questionam a ferramenta:

A primeira parte da equao simples de calcular. Basta ter um registro sistemtico dos custos com

a produo e execuo do treinamento, tais como despesas com o planejamento instrutores, tutores,

passagens, hospedagem e produo de material. As dificuldades ocorrem quando se tenta mensurar

o valor financeiro da contribuio do treinamento e isolar as outras variveis organizacionais que

tambm contribuem para os resultados. (...). Dessa forma, avaliar treinamento no nvel da

organizao mais abrangente que utilizar o ROI, por ser necessrio mensurar outras mudanas

organizacionais ocorridas em funo do treinamento, tais como efeitos nos processos de trabalho,

na produtividade, no clima e na cultura da organizao (Freitas e Borges-Andrade, 2004, p. 46).

Embora tenha se tornado referncia mundial para mensurao e avaliao, acredita-se que

essa ferramenta seja mais direcionada para programas formais, como MBA, cursos de

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

23

especializao e tcnicos, e no responde avaliao de outros programas de

aprendizagem e, logo, do desempenho dos profissionais (Pacheco et al., 2009).

Mesmo diante dessa complexidade na mensurao de seus efeitos, unanimidade entre

os estudiosos os efeitos da educao no nvel individual, da equipe e da organizao.

importante considerar, portanto, que aes de T&D possuem efeitos potenciais para a

produtividade, e, se pensadas a partir de um vis estratgico e sistmico, estes efeitos iro

tambm depender de outras variveis, especialmente aquelas que resultam do suporte

dado pelo ambiente organizacional.

1.3.4 A resistncia mudana como um obstculo aprendizagem

Levando em considerao as consequncias do treinamento para as empresas, Bricchi

(1998) adverte para alguns obstculos que podem ser identificados no processo de

mudana-aprendizagem que precisam ser ultrapassados para que as aes de capacitao

promovam sucesso e satisfao a ambas as partes engajadas na sua execuo. O principal

deles trata-se da resistncia individual mudana, uma vez que certos programas de T&D

fixam-se nos aspectos tcnicos, deixando questes atitudinais de lado. O autor alerta que

at uma mudana na forma de operar uma mquina pode no acontecer como se prev,

caso o operador no esteja conscientizado da importncia e do motivo da mudana.

Assim, no apenas a forma de manuseio que muda, mas todo comportamento e a

maneira de pensar que deve ser alterada.

Loures (2006) discorre que desde os anos 1980 foram empreendidas diversas tentativas

para lidar com um mundo em plena transformao. Cita a gesto de qualidade total, a

reengenharia de processos, a gesto do conhecimento, entre outras tantas frmulas de

sucesso, como denomina, e afirma que os processos de transformao tm falhado em

cerca de 80% das corporaes, segundo pesquisas. Isso, de acordo com ele, se deve

resistncia humana mudana a qual se faz presente sempre que a mudana implica em

alterar hbitos, atitudes ou comportamentos.

Por outro lado, Galvo (2006), num tom mais crtico, ao abordar a temtica do

treinamento comportamental, diz que h uma tendncia em convencer as pessoas sobre a

necessidade de mudana. Enfatiza que nunca encontramos pessoas contrrias ao

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

24

progresso e s mudanas, mas encontramos muitas contrrias desumanizao das

relaes e ao desrespeito sua individualidade. Desse modo, o autor afirma que treinar

comportamentos no poderia nunca ser um processo de pasteurizao e eliminao de

todos os germes e perigos (Galvo, 2006, p. 53). Entende-se dessa leitura que o

profissional do conhecimento deve respeitar as individualidades e resistncias surgidas,

e no as ignorar a favor de uma lgica da mudana pela mudana.

Nesse mesmo vis, Macian (1987) considera que nunca deve ser ignorada a dimenso

pessoal nos planos de treinamento, garantindo ao indivduo sua condio de criatura

humana, capaz de atuar conscientemente como um agente de mudana do cenrio

produtivo. Para essa autora, o grande dilema do processo de treinamento empresarial

que de um lado existe a necessidade de se especializar o funcionrio, montando seu perfil

em funo dos moldes de conduta previstos pela empresa, o que de certa forma

corresponde a um processo de instrumentalizao da pessoa humana; de outro lado, existe

o dever de no aprisionar a criatura humana a regras e padres predeterminados, no

somente por um problema de conscincia moral, como tambm pelas consequncias

desastrosas que podem advir para a prpria empresa, decorrentes da produo de um

prottipo de rob, morto em termos de criatividade e imaginao, incapaz de propor

novos processos ou de transpor fronteiras tradicionais na busca de novas propostas.

Para Bricchi (1998), as pessoas sofrem com o desconforto ou insegurana gerados por

fatores relacionados indiretamente ao treinamento. Portanto, para que o treinamento d

resultados satisfatrios, no se pode abster da vontade do ser humano de apreender,

reciclar-se e mudar. A autora ressalta a importncia de se atentar para a necessidade de

compatibilizar pontos como as percepes do funcionrio e da empresa quanto ao que

precisa ser melhorado; o funcionrio deve ter potencial e estar motivado para aprender,

alm de ter suas ansiedades e medos detectados; os princpios e valores implcitos no

contedo devem ser praticados pelos superiores; o objetivo final a ser atingido deve estar

bem definido.

Mudar fator de aprendizagem, porm um processo incmodo e resistir a mudana

um ato natural dos seres humanos, pois diz respeito a sair de um estado experimentado e

controlado para outro, novo, desconhecido e inseguro. Assim, natural encontrar foras

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

25

contrrias aos processos de transformao e aprendizagem, principalmente quando

impostas externamente.

1.3.5 O ambiente e o suporte organizacional

Parece importante s organizaes a execuo de aes de treinamento e

desenvolvimento no apenas alinhadas sua estratgia, mas tambm adequadas s

necessidades de aprendizagem de seus colaboradores. importante ressaltar que as aes

de T&D configuram-se como uma das maneiras de se desenvolver competncias dentro

das organizaes, provavelmente a maneira mais planejada, sistematizada e estruturada

para se propor aprendizagem, porm o principal espao de aprendizagem dentro das

organizaes seja o prprio ambiente de trabalho.

Nesse ambiente, as relaes so sustentadas por um processo o qual alguns tericos do

comportamento organizacional chamam de processo de socializao, podendo ser

definido como o meio pelo qual a organizao busca amoldar, em nveis diversos, o

indivduo s suas necessidades (Motta, 1993 cit. in Loiola, Nris e Bastos, 2006). O

processo de socializao garantiria a replicao de padres de condutas estratgicas,

operacionais, administrativas, mercadolgicas e relacionais. Desse modo, a aprendizagem

organizacional no se limita soma das aprendizagens individuais, mas advm das

relaes e conjunes que ampliam o potencial do conhecimento gerado ou adquirido

pelos indivduos (Loiola, Nris e Bastos, 2006). Em suma, trata-se de um mecanismo

dinmico que exerce uma forma de controle social dentro das organizaes, difundindo

conhecimento entre seus membros e convertendo-o em conhecimento organizacional.

Assim, todo processo de socializao implica em aprendizagem e mudana de

comportamento.

Quanto a isso, Gnyawali e Stewart (2003 cit. in Loiola, Nris e Bastos, 2006, p. 123)

asseguram que:

Para que a aprendizagem organizacional ocorra, as organizaes devem possuir mecanismos

internos e processos que permitam a acumulao e distribuio de informaes relevantes. Tambm

precisam de mecanismos de suporte e dilogo e interao, de modo que o conhecimento

organizacional venha a ser desenvolvido e disseminado por toda a organizao.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

26

Tal assertiva demarca a incontestvel influncia que o ambiente exerce para o mecanismo

de aprendizagem dentro das empresas. Um ambiente que estimule e d suporte ao

aprendizado essencial para gerar mudana de comportamento e, consequentemente,

obter ganhos de desempenho e produtividade, especialmente quando esse aprendizado

decorre de um processo formal e intencional ofertado pelas prprias organizaes. Do

contrrio, os programas de treinamento sugeridos no sero efetivos e certamente cairo

em uso indiscriminado e pouco estratgico.

As iniciativas formalmente planejadas para desenvolver os CHAs advm de diferentes

demandas da organizao, como o surgimento de novas polticas, mudanas de processos,

rotinas e sistemas, ou ainda pela necessidade de desenvolvimento de hiatos

comportamentais ou baixo desempenho. Quanto a este ltimo, Abbad, Freitas e Pilati

(2006, p. 232) advertem:

H situaes em que no faltam ao profissional os CHAs necessrios ao trabalho. Tampouco lhe

falta motivao para demonstrar suas competncias profissionais. O que falta condio propcia

para a demonstrao da competncia.

Portanto, nem toda demanda organizacional tem como remdio a execuo pura e

simples de aes de T&D. Por outro lado, o suporte oferecido pelo contexto

organizacional exerce papel capital para a aquisio e manuteno de novas

competncias.

Quanto a esse preceito ambiental, encontra-se na literatura diversos conceitos que

abrangem o papel e influncia do ambiente de trabalho, tais como suporte organizacional,

suporte ou clima transferncia e suporte ou cultura de aprendizagem contnua. Embora

abranjam variveis internas que antecedem ou sucedem o desempenho avaliado, eles

diferem entre si quanto ao foco de anlise.

Suporte organizacional referese percepo global desenvolvida pelos trabalhadores

sobre o quanto a empresa valoriza suas contribuies e cuida de seu bem-estar, isto , do

comprometimento da organizao para com eles (Abbad, Freitas e Pilati, 2006). Assim,

percepes desfavorveis podem gerar problemas de desempenho em decorrncia de

restries situacionais no ambiente de trabalho.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

27

Suporte transferncia um constructo correlato ao suporte organizacional, exprimindo

a opinio do treinando acerca do nvel de apoio ambiental participao em atividades

de treinamento e ao uso das novas habilidades aprendidas no trabalho. Tal conceito

recorrente nos estudos sobre T&D e abarca trs dimenses, a saber: apoio gerencial ao

treinamento, suporte psicossocial transferncia e suporte material transferncia. A

primeira, diz respeito s condies no ambiente pr-treinamento para apoio participao

em treinamentos. A dimenso do suporte psicossocial a que merece especial ateno,

pois a mesma corresponde ao apoio de pares, colegas e chefias dado ao participante ps-

treinamento para utilizao no trabalho das habilidades aprendidas, referindo-se a

presena de condies facilitadoras e/ou inibidoras da aprendizagem no local de trabalho.

Por fim, a dimenso do suporte material transferncia corresponde opinio do

participante acerca da qualidade, quantidade e disponibilidade de recursos fsicos,

materiais e financeiros para a transferncia de treinamento (Abbad, Freitas e Pilati, 2006).

Suporte ou cultura de aprendizagem contnua diz respeito percepo do trabalhador

sobre a ocorrncia de condies favorveis de aprendizagem contnua no grupo de

trabalho para aquisio, reteno e recuperao de conhecimentos e habilidades

adquiridos (Abbad, Freitas e Pilati, 2006). Tal conceito coaduna-se ao conceito de

socializao outrora discutido, tendo em vista a relevncia das relaes sociais para o

fortalecimento de hbitos culturais.

Organizaes so vistas como propcias aprendizagem, quando as tarefas so realizadas em

um contexto de interao e interdependncia, e os integrantes da organizao compreendem

as tarefas e responsabilidades dos colegas, e reconhecem a inter-relao entre suas rotinas de

trabalho. Assim, cooperao e coeso entre empregados, supervisores, grupos e unidades

funcionais provavelmente encorajam e reforam a aquisio de novos CHAs que podem

posteriormente, nesse contexto, institucionalizar-se (Abbad et al., 2006a, p. 400).

O suporte transferncia a varivel mais frequentemente analisada em pesquisas da

rea e comprovadamente testada sua predio para a transferncia de treinamento, e a

varivel suporte psicossocial tida como o principal preditor do impacto de treinamento

no desempenho do indivduo (Freitas, 2005). Mouro e Marins (2010), por exemplo, em

uma pesquisa realizada com 220 trabalhadores de sete empresas privadas do Estado do

Rio de Janeiro acerca da motivao para aprender e as crenas sobre o sistema de

treinamento, verificaram que os participantes que estavam no evento por imposio da

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

28

chefia tiveram uma motivao mais elevada para a realizao do mesmo e que a

motivao para aprender est diretamente relacionada s impresses positivas que o

indivduo cria sobre o seu ambiente de trabalho. As autoras afirmam que provvel que

os colaboradores tendam a ficar mais motivados se perceberem que o contedo aprendido

em determinado treinamento seja demandado pela organizao, isto , quando percebem

que aquela capacitao apresenta valor instrumental para a organizao.

Ainda sobre a investigao citada, as autoras comentam os resultados da pesquisa de

Sallorenzo (2000 cit. in Mouro e Marins, 2010) a qual demonstrou que a motivao do

treinando aps o treinamento tem uma relao mais estreita com resultados a curto prazo,

mas medida que o participante se distancia do evento instrucional, o resultado das

mudanas comportamentais passa a ser cada vez mais controlado pelo ambiente. Logo, a

aprendizagem pode ser mais eficaz quando os colaboradores acreditam na relevncia e

necessidade do treinamento.

Leito (1996), da mesma forma, comprovou em seu estudo que a existncia de controle

dos colaboradores pelos chefes, de amizade entre colaboradores e de clareza quanto s

regras e polticas da empresa est altamente relacionada com a ocorrncia da transferncia

de treinamento. A existncia de acompanhamento sistemtico e direcionado para o

desempenho, cobrana de aplicao de normas e polticas da empresa, a existncia de

abertura para inovar e o espao para os treinados tomarem suas prprias decises tambm

so fatores arrolados dinmica da transferncia.

O que se pretende ratificar com esses achados cientficos que, para garantia da

efetividade das aes de capacitao desenvolvidas nas empresas, alm da aplicao de

tcnicas e metodologias eficientes, que estejam de acordo com as necessidades do

pblico-alvo e estrategicamente desenhadas, o papel do contexto organizacional tem

influncia direta no impacto do treinamento no trabalho, em especial, a conduo e

envolvimento dos lderes junto ao processo de aprendizado de seus liderados.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

29

1.3.6 O profissional de T&D

Alguns autores atribuem a falta de escopo estratgico dos treinamentos aos profissionais

da rea. Coulson-Thomas (2000), por exemplo, realizou um estudo por cerca de dois anos

junto aos responsveis pelo T&D de 69 empresas. Seus achados revelaram que as

atividades da rea estavam contribuindo pouco para a criao e disseminao de novos

conhecimentos e incremento do capital intelectual das empresas e, empregadas

isoladamente, pouco relacionavam-se aos processos centrais do negcio. Para o autor, os

profissionais responsveis pelo T&D no possuam conhecimento aprofundado sobre as

possibilidades de como a rea pode contribuir para os objetivos corporativos.

Regalbuto (1993 cit. in Steil, 2006), num estudo semelhante, atribuiu a falta de retorno

das atividades de T&D s seguintes caractersticas dos profissionais da rea: no

compreendem a relao entre o treinamento e outras intervenes para o aumento do

desempenho organizacional e/ou medem seus resultados atravs do nmero de pessoas

treinadas em sala de aula.

Observa-se que a rea , frequentemente, ocupada por psiclogos, pedagogos e

administradores. Ademais, trata-se de formaes que abordam em seu escopo terico-

prtico tecnologias instrucionais, conhecimentos de metodologia cientfica, ferramentas

de investigao, entre outras disciplinas relevantes para o contexto de ensino-

aprendizagem.

Em meio aos principais desafios para os profissionais da rea, pode-se citar: ser capaz de

entender e descrever os comportamentos existentes; descrever os comportamentos

esperados de forma objetiva e realista; analisar o contexto e os mecanismos de apoio aos

comportamentos atuais que devem ser eliminados; e descrever ferramentas para apoiar os

comportamentos desejados. Os agentes de transformao comportamental no devem ter

as respostas para todos os questionamentos, basta que consigam apont-los (Galvo,

2006).

Borges-Andrade (2014) ressalta que o sucesso do profissional de T&D exige

competncias tcnicas, habilidades polticas e estratgicas especficas. Quanto s

primeiras, destaca-se as competncias de: construo e aplicao de instrumentos de

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

30

avaliao de necessidades e de resultados; planejamento instrucional e programao e

coordenao de eventos; anlise e interpretao de dados de avaliao; administrao de

conflitos entre as partes envolvidas em T&D; captao e negociao de recursos; deciso

sobre prioridades que contrariam interesses; gesto de pessoas com qualificaes

bastantes diversificadas. Quanto s habilidades polticas, refere-se a: identificar ameaas

e oportunidades no contexto externo das organizaes; interpretar o sentido de metas

institucionais e transform-las em objetivos de programas de T&D; diagnosticar

fortalezas e debilidades internas; compreender a natureza das relaes sociais existentes

no universo organizacional e o papel do T&D para fortalec-las ou mud-las.

Campos et al. (2004, p. 440), iteram que

O profissional responsvel pelo treinamento no poder ser o nico responsvel pelos resultados

positivos ou negativos que venham a ser atingidos, pois treinar pessoas exige a composio de um

cenrio formado por treinandos, treinadores, organizao, objetivos, tempo e recursos disponveis,

dentre outros, contando ainda com a variao do grau de comprometimento dos envolvidos.

Assim, para o desenvolvimento de aes de treinamento eficazes imprescindvel

considerar o papel do profissional de T&D. O que se percebe que o papel deste

profissional deve estar vinculado estratgia da organizao, sendo ele um articulador de

ferramentas da educao direcionadas aos objetivos corporativos.

O uso do sistema de treinamento e desenvolvimento como estratgia corporativa: um estudo de caso

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Captulo II T&D: etapas e metodologias

At aqui, vimos que a efetividade de um programa de treinamento apresenta um certo

grau de complexidade, dado as diversas variveis envolvidas: organizacionais,

ambientais, culturais, individuais, dentre outras. O presente captulo pretende apresentar

mais algumas variveis das quais certamente qualquer atividade de treinamento e

desenvolvimento precisa prezar: etapas, metodologias e tcnicas instrucionais.

2.1 As etapas do treinamento

2.1.1 Levantamento de Necessidades de Treinamento (LNT)

A etapa de levantamento, avaliao, anlise ou diagnstico de necessidades de

treinamento o primeiro passo rumo gesto de um eficaz programa de T&D. O LNT

pretende identificar as condies antecedentes implantao de qualquer ao de

treinamento, como as caractersticas dos treinandos, motivaes, o grau de suporte

ambiental, etc. O reconhecimento do hiato existente entre os desempenhos manifestados

pelas pessoas e aqueles esperados aumenta a probabilidade de xito.

Segundo Abbad, Freitas e Pilati (2006), possvel identificar trs tipos bsicos de

situaes que geram necessidades de T&D nas organizaes: mudanas provocadas por

fatores externos, mudanas internas e ocorrncia de lacunas de competncias ou desvio

de des