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Mutum
Pantoja Ramos
Foto: Mutum/ Manoel Rodrigues Martins, Portel-Pa, 2014.
Setembro de 2015.
2
Prefácio
Mutum foi escolhido como nome de minha quarta obra poética, na atitude
de homenagear tão amazônica ave, tão pouco prestigiada diante dos pássaros
internacionais! Pra quê a águia? Pra quê o falcão? Sou mais o mutum local.
Talvez este elaborado reflita minha fase de questionador da Globalização e de
seus efeitos. Etapa esta de aprendiz de escritor que vem sendo polida desde
2013, com o contato mais detalhado da obra do educador Paulo Freire, do
Geógrafo Milton Santos, do francês filósofo Edgar Morin, do professor
marajoara José Varella e por aí vai. Não que não me interessasse
anteriormente, sim estava com estes sentimentos para mover-me pelos rios da
Amazônia, só não sabia que fazia o debate sobre Desenvolvimento Local. E ali,
de butuca, tentei dar pitadas líricas ao que concluía, sal que dá gosto à luta que
detemos nós os socioambientalistas, açúcar para enfrentar os amargos de
tantos desgovernos e ganâncias dos “lucrosos” (desculpe os tuberculosos pelo
uso de seu sufixo), doentes pelo dinheiro, esperança que haja justiça para os
que tombam diante dos assassinos de gerações inteiras.
Sinceramente não sei o caminho a percorrer, só não quero ir sozinho.
Teremos mais chances juntos de chegar ao melhor de amanhã.
Pantoja Ramos.
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Sumário
Rio Pará .................................................................................................................................. 4
Recado à Sina ......................................................................................................................... 5 Mutum Pensador ..................................................................................................................... 7 Diálogo do etílico pai que eu queria ter .................................................................................. 8 O Cavaleiro Flor-de-Lis Contra a Maldade e o Dragão ....................................................... 10
À Foz .................................................................................................................................... 12 O Mato .................................................................................................................................. 13
Solar ...................................................................................................................................... 15 Ode aos vendedores .............................................................................................................. 17
ÊÊÊ Suprimo ........................................................................................................................ 19 Sambinha da Cubana ............................................................................................................ 21 Um dia na vida de João Impigem de Oliveira Pano Branco ................................................. 23
ReÁrvore .............................................................................................................................. 25 Para os piedosos de si mesmo, a Peconha ............................................................................ 27
O Processo de Jack ............................................................................................................... 28 EI BALSA!! .......................................................................................................................... 30 Organizados! ......................................................................................................................... 33
PIB Curralinho ...................................................................................................................... 36
Dona Lupita da Palafita ........................................................................................................ 38 Fulana e Beltrana .................................................................................................................. 41 Ébrio ..................................................................................................................................... 43
Velha Margarida ................................................................................................................... 45 Se eu fosse escrever um brega seria assim ........................................................................... 48
O Que Passa Ju? ................................................................................................................... 50 Mãe e Pai .............................................................................................................................. 52 Parque ................................................................................................................................... 54 Natal de Alguém Amazônico ............................................................................................... 56 Menino Pássaro .................................................................................................................... 57 Dona Senhora ....................................................................................................................... 59
3 Passagens ao menos, Por Favor ......................................................................................... 60 Aerofotoconsciência ............................................................................................................. 62 In Memoriam de Hoje........................................................................................................... 64
Sentido .................................................................................................................................. 66 Termo de Ajustamento de Conduta do Homem Para a Floresta .......................................... 68
4
Rio Pará
Belém, de Janeiro de 2015.
Rio Pará que não é rio
Leve-me pra longe
Das coisas ruins da vida
Navegue navegue navegue
Vazante vazante vazante
Vazante é meu olhar pra ti
Sobe um turbilhão de água
Sobe um turbilhão de mágoa
Rio Pará que não é rio
Diga que sou inocente
Das coisas que na terra fiz
Vai barco vai barco
Leve-me à liberdade
Decidido é meu olhar pra ti
Bate-me um forte vento
Bate-me um contentamento
Penso num banjo
A tocar para mim
Tá dizendo em suas notas
Que a vida segue
Rio Pará
Pára o rio
E começa a encher
Navego navego navego
Enchente enchente enchente
Enchente é essa fé em mim
Xxxxxxxxxxxxxxx
5
Recado à Sina
Rio Xingu, Porto de Moz, 14 de novembro de 2014.
“cumpra a Sina, cumpra a Sina...”
“cumpra a Sina, cumpra a Sina...”
E esta voz que me persegue
Parece às vezes até bater
Fez das noites tantos dias
Longo alvorecer
E este espelho é um chato
Vive sempre me lembrando
Da tarefa feito fardo
Os pés vão se arrastando
Quando pude eu fugi
Mas a mente me encontrou
Eu mandei recado à Sina
Você não dominou
Não adianta trazer sua trapaça
Com tantos elogios
Um mar de gente me conhece
Só me entendem os rios
Não ouso ser santo
Tanto que eu mal sei rezar
Revolto-me com o pranto
Tanto da injustiça que há
No meio errando
Tanto no bom intento ajudar
Oferto um canto
Quando o nosso medo chegar
6
A peça não encaixou
A ideia não é esta
Risca-risca esta frase
Um estalo durante a siesta
Pergunta a doutora “qual é a procura?”
“O que enfim te agonia?”
Disse que trabalho o caos
Pra compor sinfonia
Procuro a verdade
Sabe? Como a vida caminha
Percebo a metade
Sabe? Atrapalha-me a Sina
E quando acho por um momento
Lento daquilo que eu possa ser
A Sina cresce em seu tormento
Tento no vento me esconder
“E cumpra sua Sina...
cumpra agora sua Sina...”
Não é bem assim
Não é bem assim
xxxxxxxxxxxxxxxxx
7
Mutum Pensador
Almeirim, 24 de junho de 2014.
Veterano escroto eu sou
Cabocão do interior
Mutum
Como pareço com você
E discreto ando com pose
E não há amargo ou doce
Mutum
Aqui não tem pavulagem
Pra quê a águia?
Se eu posso ser elegante
Pra quê o falcão?
Se meu olhar é penetrante
Mutum safo e comandante
Jovem velho tipo eu sou
Minha crista vermelhou
Mutum
Fica só guaribando
Já não devo a qualquer que fosse
Passarada encantou-se
Mutum
De butuca vai pensando
Não sou condor
Mas meu voo abraça o tudo
Não gavião
Mas meu bico rasga profundo
Só na manha cisco o mundo
xxxxxxxxxxxxxxx
8
Diálogo do etílico pai que eu queria ter
Melgaço, 04 de setembro de 2014.
“Uma onça me estranha
Tão estranha-mente
Um corpo cai
Assim lenta-mente
Segredos severos
De quem a mente trai
Apenas flutua
De tão vaga-mente
Olhar bem distante
E sincera-mente
Não conto o sigilo
Que guardam as pessoas de tudo
Aparente sorri Robin Williams
Num espelho sim
Do outro lado a soma dos medos
Dizia não, dizia não
Aposto no cinco
Que marcada-mente
Rebate no três
Que rápida-mente
Imagino o seguir
Esferas passando na mesa
Levando consigo a mente
A moça no canto
Esquisita-mente
Fugia de todos
Tão gulosa-mente
E vejam dali
A luta eterna travada
No vai-e-vem do que é a mente
9
Na tua frente rebelde é o cantor
Cheio de si tem
Mas não passa daquela criança
Que chora pela mãe, cadê sua mãe?”
Embriagado de mim
Que vivo só-mente
Escrevo apressado
Paradoxal-mente
Eu quase bebi
Do pai etílico da estrada
As doces férias da mente
xxxxxxxxxxxxxxxxx
10
O Cavaleiro Flor-de-Lis Contra a Maldade e o Dragão
Belém, 19 de março de 2015
A minha espada cortou o vento alísio
E Cavaleiro
Eu fui certeiro
Este menino treina nos montes altos
Jurou ser justo
A todo custo
Embora o susto
E Deus me livre!
Meu Deus me guarde!
Não permita que eu seja herói
Apenas servo do que é certo
Não permita que fique agora cego
Quando criança tudo era mais claro
De um bambu eu fiz espada arte
E sonhador
Preguei o amor
Este menino gritou aos montes altos
Jurou salvar
Sacrificar
Convêm calar
E Deus me guarde!
Deus me proteja!
Neste momento eu vejo o Dragão
Quem é o inimigo então duvido
Qual será do correto o sentido?
Não é tão simples quanto pensava
Deus me proteja
Deus me assegure
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Que eu possa pensar na escolha
Quem deve enfrentar a Maldade?
Quem deve representar a Verdade?
Escolho o menino e sua espada
xxxxxxxxxxxxxxxxxxx
12
À Foz
Belém, 17 de fevereiro de 2015.
Um sapo
E uma cobra
Em um barranco
Juraram trégua, pois queriam
Ver onde era a Foz
Talvez
Se brigassem
Seriam normais
E solenes diziam ao barranco
"Nos leve à Foz"
Foi um calor danado
O sol a pele queimava
Mas tinham imaginado
Que o paraíso estava
A léguas
De sua rota
Longe do que é trivial
E pediam ao Amazonas
"Apresente sua Foz"
E como chovia forte
Um vendaval desatino
Sem reclamar da sorte
Até que chegaram ao destino
Uma cobra
E um sapo
Maravilhados
Boquiabertos com infinito
Juntaram-se à Foz
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O Mato
Monte Dourado, 07 de abril de 2015.
Neblina
Cheiro de orvalho
Antes do sol levantar
Caminho pelo caminho
Não quero o asfalto
Prefiro o capim molhado
No meu tornozelo
Eu diria gelada a terra
Saiu a preguiça
Sendo eu mais livre
Mato da vida
Mato
Mato
Ao contrário do homônimo
Mato
Mato
Sereno
Largando a função
Aos poucos eu vejo o dia
O ar puro
Alimenta o sangue
Sangue forte pra hoje
Atitude de ser
Cai fora o medo
Sendo eu mais Mato
Mato da vida
Mato
Mato
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Não firo ninguém
Sou vida
Mato da vida
Mato
Mato
Esquentou
Pra si caminhando
Tomei conta do trampo
A flor
Abriu pro meus olhos
Abriu pro mundo inteiro
A porta do mato
Incerto eu vou
Na certeza que sou
Mato
Mato
xxxxxxxxxxxxxx
15
Solar
Melgaço, 12 de julho de 2014.
Solar
Ouvi que dava certo
Mas dá medo agir
A ideia estava perto
O óleo a me iludir
Melhor manter-me quieto
Intuição vou fingir
Escuro ficou descoberto
Voltei-me para o céu
O que queres me dizer?
Minha mente a revolver
Deve ser solar
Solar
Tão claro como a água
Energia que implante
Dos seres excitante
Arrisco um palpite
Vejo o Homem bem mais livre
Mas sendo solar
Solar
Sem lares afogados
Sem pulmões esfumaçados
Sem gritos amordaçados
Com a benção do Rei
Viveremos novo dia
Vira lastro alquimia
Gente sim solar
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Solar
Comum para meu neto
Rotina a luzir
O Sol à Lua inverso
Recarga barco partir
Independente correto
A consciência seguir
Larga a ganância, alerto
Pensa caboclo que veio o tempo
Na voltagem do querer
Na amperagem do saber
Do que é solar
Solar
Tão óbvio o circuito
A lâmpada brilhante
Vê do espaço o migrante
Que lá de cima aviste
Da ciência que existe
Terra é solar
Solar
Com fios conectados
Ao invisível irradiados
Saturno e Órion plugados
São ligados ao infinito
Ciclo fim que inicia
A galáxia bateria
Fonte do solar
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17
Ode aos vendedores
Belém, 07 de novembro de 2014.
VEM AQUI QUE É DO BOM!!
VEM AQUI QUE É DO BOM!!
Saquinho plástico
Nó bem na ponta
Jarra de suco
Perdi já a conta
Congela o dedo
Frio que tem dor
Altura alça
De um isopor
Fruti os sabores
Diversa a cor
Eu hoje matei seu calor
Que alívio frescor
VEM AQUI QUE É DO BOM!!
CHOPP DE AÇAÍ!
MINHA CUBA FAZ ATÉ SOM!!
O MEU DIA CUMPRI!
Novo jambu
Goma fervente
Fogo aceso
Panela quente
Queima o dedo
Suporta a dor
Cuia limpinha
Serve o senhor
Camarão rosa
Sinta o sabor
O lábio tremeu da mistura
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Tucupi da loucura
VEM AQUI QUE É DO BOM!!
TACACÁ DA ESQUINA!
PRO ENCARGO TENHO O DOM!!!
PROVA UM POUCO MENINA!
A bananeira
Empresta a folha
Leite dois tipos
O doce e nem tanto
Coco ralado
Marca da dor
Pano à cabeça
Faça um favor
Baixa a caixeta
Tampa incolor
Macia pra tu merendares
Pro café que preparaste
VEM AQUI QUE É DA BOA!!
TAPIOCA, VIZINHA!
MINHA VOZ LONGE VOA!!
SIGO A LADAINHA!
A molecada segue a buzina
Cheiro de margarina
VEM AQUI QUE É DO BOM!!
TENHO QUENTE PIPOCA!
PRO PASSEIO COM O AMOR!!
OU FALAR DE FOFOCA!
VEM AQUI QUE É DA BOA!!
ESSA VISTA DO DIA!
ESSA GENTE FORTE PESSOA!!
VEJO A POESIA!
19
ÊÊÊ Suprimo
Furo de Breves, 15 de outubro de 2014.
Pec
Pec-pec
Pec-pec-pec
Pec-pec-pec-pec-pec…
Rabeta, rabetinha, rabetona
Rabetar
Que coisa mais antiga
Era aquilo de remar
Tenho pressa discunforme
Camarão vai estragar
Depois volto bem tranquilo
Após rasas esvaziar
Rabeta, rabetar, rabetinha
Rabetona
Atrasado vou pro culto
Me arranja uma carona
Maresia, vem a chuva
A sombrinha se armou
Vem o sol forte quentura
Sopra o vento o frescor
Rabeta, rabetona, rabetar
Rabetinha
Quantas cargas tu aguenta?
Quantos fardos de farinha?
Vai o neto, vai o avô
Vai a mãe, vai o pai
Vão os filhos, vai a sogra
Vê cachorro se não cai
Rabetona, rabetar, rabetinha
Rabeta
20
Voadeira vai perder
E o moleque faz careta
Quase um pedaço de tábua
Quase um pedaço de gente
Passa rente, molha o homem
“Mas que é isso meu parente??!!”
Rabeta, rabetinha, rabetona
Rabetar
Eis que vejo um beija-flor
Lá cheirando aturiá
É um mundo tão afobado
Eu me pus a contemplar
Mesmo a vida tão corrida
Vez em quando vou remar
Pec-pec-pec-pec-pec…
Pec-pec-pec
Pec-pec
Pec…
xxxxxxxxxxxxx
21
Sambinha da Cubana
Belém, 02 de fevereiro de 2015.
Conceiçón
Dizia o que eu tinha
Conceiçón
Curou minha murrinha
Estrangeira
A cubana
Cuidadosa
Tão sem fama
Conceiçón
Dormia em minha casa
E comia
Acari feito na brasa
Era simples
Era séria
Combatia
A miséria
Conceiçón
Falou que foi caçada
Medicina
Não pode fazer nada
De Brasília
Veio a culpa
Foi-se embora
Lá pra Cuba
Conceiçón
Cadê minha receita?
Aumentou
Na casa a maleita
Num visita
O doutor
22
Nem reparte
Nossa dor
E foi assim que faz dez anos
Que a gente soube dos cubanos...
xxxxxxxxxxxxxxx
23
Um dia na vida de João Impigem de Oliveira Pano Branco1
Belém, 20 de setembro de 2014.
Mulher me trocou por outro alguém
Na rua minha mala jogou
Perdi do meu bolso uma nota de cem
Japiim na moleira cagou
Tropecei bem na unha encravada
Rasgou a rede puída
Toalha caiu dentro da privada
Estourou a minha nascida
Rasa de açaí vi tombar no rio
Na perna fisgou uma arraia
Hoje me estranhou o cão que crio
Cordão me roubaram na praia
Queimou o meu rádio novinho
Um raio veio no telhado
Comboia topou-me no caminho
Feijão eu comi bem queimado
Eu subo no barco que construí
Rezo bem alto em mim
Dedico todo o meu sorrir
O mal sempre tem um fim
Pra um obrigado um florir
Uma criança eu vi
Tudo que valha em si
Minha força vem de Ti
Polícia achou que era bandido
Livrei-me, mas ainda apanhei
Ao abrir a boca engoli mosquito
1 De uma estória a mim contada por Celso Couto
24
Da estiva da vila eu despenquei
Pisei na rama do murumuru
Morcego mordeu-me a orelha
No porre dormi com um mutum
Rasparam-me a sobrancelha
Ex-sogra disse que eu não prestava
Cunhado deixou um prejuízo
A rasga-mortalha me agourava
Doeu-me o dente do juízo
O barco encalhou na vazante
Na terra das carapanãs
Um breu é o que vejo adiante
Pousou no meu ombro chicuã
Saia fora e voa pra os teus
Não acabas com sonhos meus
Não terei a morte daquele Orfeu
A Santa já intercedeu
Escritura que me valeu
Motivo do amor comoveu
Se ainda não convenceu
Eu teimo sendo de Deus.
xxxxxxxxxxxxxxxxxxx
25
ReÁrvore
Rio Amazonas, Costa de Almeirim, 20 de julho de 2014.
Derrubaste
Arrancaste
Minha raiz ficou tão ferida
Sem um chão
Sem razão
Um vendaval foi a sua partida
Meus restos
Tão honestos
As sementes que foram ao vento
Acharam
Pousaram
Nova terra esperando momento
Que fértil bom terreno
Assim eu germino
Que reina tempo ameno
Assim determino
Nova planta
Que levanta
Questionável se era de lei
Tronco exposto
E desgosto
Acredito que aqui ficarei
Tantas pragas
Chuvas vagas
Num resistir em nome de mim
À queimadas
Enxurradas
Até vergo, mas venço a ti
26
Cresço longe dali
O sol vem a pino
Parasita em si
Hoje fulmino
Atualmente
Já não sou mais aquela arvoreta
Sou muito menos
A árvore que sangrou cortada
Você cupim envenenei
Você machado eu quebrei
E nesta altura todos me veem
A copa agrada a outro alguém
ReÁrvore
Manter
Eu predomino
ReÁrvore
Querer
Eu predestino
xxxxxxxxxxxxxxx
27
Para os piedosos de si mesmo, a Peconha
Almeirim, 20 de julho de 2014.
Mais moeda me pede
Centavo que és
Como posso te deixar ir
Sem ao menos te dizer
Eu te dou, mas oferto peconha
Pouco tenho, mas faço a peconha
Quer açaí então pega a peconha
Quando desceres terá mais vergonha
Pára de ser vítima
Indigente que és
Enquanto eu tô na lida
Ficas nessa besta queixa
Faz o seguinte, pega o matapi
Vê se te mexe, vai com o matapi
Camarões pulam de seu matapi
Até os pequenos lutam no fim
Não deixe que traíra vença tão fácil assim
Conheci porcos que varavam roçados na cara de macaco
Vai trampar, é suor de farinha
Deixa a frescura, suor de farinha
Pra resultado, suor de farinha
Te sai amoado da vida mesquinha
Caiu uma manga no jirau da tua cozinha
Pra plantar o abacaxi tem que ter a parte da mucura
Tá com pressa? Óleo de andiroba
Teu remédio é a pura andiroba
Paciência, óleo de andiroba
Que escorre quando escolhe a hora
28
O Processo de Jack
Rio Amazonas, Costa de Almeirim, 20 de julho de 2014.
Jack viu parado no sinal
Um homem abrindo a carteira
Surgiram notas que mexiam
Entregues a outro sem um rosto
Saíram do bolso de ambos
Baratas
Naquele prédio em construção
Havia a placa que gargalhava
E um tísico ali a ruminar
Lia prazos e monetários
Cercavam seres que o zombavam
São ratos
Bichos nojentos
Cães babando vinham lhe intimidar
Saiam fora!
Aguente firme Jack!
Aguente firme Jack!
A rua fede a algo podre
O mato esconde a canalhice
Que adoecem os passantes
E grudam nas pernas das crianças
Os vermes
Asquerosos
Lá no alto e embaixo seguia um rio límpido
Sem alcance
Por que será Jack?
Tome cuidado Jack!
Por que será Jack?
Olha a pergunta Jack!
Jornal de hoje tu vês um corpo
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Tv ligada tu vês um porco
Sistema vivo te faz um morto
Ouvi discurso parece um arroto
A toga deixa um fio solto
Um grilo pula de um galho a outro
Dois caras suspeitos em uma moto!
Parece o fim
Ao lado de Jack pediram uma informação
Ao longe disparos
Mataram alguém Jack!
Um pouco você Jack!
Por que será Jack?
É a sarjeta Jack!
O que será Jack??
Daqui pra frente Jack??
xxxxxxxxxxxxxxxxxx
30
EI BALSA!!
Baía de Melgaço, 01 de novembro de 2014.
“Da Lama ao Caos
Do Caos à Lama
Um Homem Roubado
Nunca se engana...”
Chico Science & Nação Zumbi – Do Caos à Lama
Voou a tesoura
Pra longe da queda
E uma preguiça caiu no rio
Rasgou o cipó
Com a minha vida
E jovens foram caindo um a um
Ei Balsa! Ei Balsa! Balsa volta aqui!
Que levas? Que levas? Que levas daqui?
Levas o que tenho!
E o que não tenho!
Rico lenho!
Pobre venho!
Pobre massa!
Não mais caça!
Longe passa!
A ricaça!
Tira graça!
Lá da balsa!
Nota falsa!
Velha valsa!
Faltou-me abrigo
Pouca parede
E hoje choveu na minha rede
31
Mal tenho casa
Ralo assoalho
E um morcegão visitou minha filha
Ei Balsa! Ei Balsa! Balsa volta aqui!
Que levas? Que levas? Que levas daqui?
Toram tudo!
E futuro!
Se apuro!
Testa um furo!
É o sistema!
Que condena!
Tem um lema!
Pobre pena!
Rico encena!
Na novena!
Reza ao esquema!
Mete a lenha!
Mil angelins
E um bocado
De louro-faias que quase não vejo
Tão nobre ipê
Vai humilhado
Vendido por uns parcos trocados
Ei Balsa! Ei Balsa! Balsa volta aqui!
Que levas? Que levas? Que levas daqui?
Maçaranduba!
Cupiúba!
Itaúba!
Minha culpa!
Timborana!
Piquianara!
Quanta grana!
Cedrorana!
32
Mata rala!
Medo cala!
Surge a mala!
De mudança!
Tem Mudança??
Tem Mudança??
Tem Mudança??
xxxxxxxxxxxxxx
33
Organizados!
Rio Amazonas, próximo a Santarém, 25 de abril de 2015.
Disse o passado para o presente: Caim tem que parar de matar
Abel. Só assim teremos a continuidade da criança, da flor e do
beija-flor. Do rio, do ipê e do amor...
Quando a má sombra quiser
Atrapalhar teu caminho
Lembras que afinal tens fé
Recordas, não estás sozinho
Acredite na força do pensamento
Se quiseres ajuda neste momento
Eu rezarei
Tu rezarás
Ele rezará
Nós rezaremos
É bom rezar pra fortalecer a alma
Nós rezaremos
Se acaso um trovão te assustar
Ofereço mão para te acalmar
Se disserem teus braços fracos
Eu defendo só não estão aquecidos
Ameaças trazem o medo confuso
Juntos podemos afastar este intruso
Eu vou orar
Tu vais orar
Ele vai orar
Vamos orar
Não te curves ao que é indigno
Valor tu tens
34
É bom mostrar os teus bens
A amizade e amor dos seus
Sei que as vezes é duvidoso
Pois falamos de seres humanos
Só que Boa Vontade nos foi presente
Que interessante é essa gente
O Tempo Ano Novo União Esperança
Eu rezarei
Tu rezarás
Ele rezará
Nos rezaremos
Pra deixar a luz abençoar
Nós rezaremos
Quando o desespero chegar junto
Não te entregues aos poderosos
Mais do que isso digas ao mundo
Aqui tem fortes carne e ossos
Jeová há de dar-te asas abertas
Tupã suas vidas deseja libertas
Chama Tupã - Jeová
Chama Jeová - Tupã
Pra dançar
Pisa
Pisa ligeiro
Pisa
Pisa ligeiro
Quem não
Aguenta a formiga
Não assanha
O formigueiro
Pisa
Pisa ligeiro
35
Pisa
Pisa ligeiro
Quem não
Aguenta a formiga
Não assanha
O formigueiro
Pisa
Pisa ligeiro
Pisa
Pisa ligeiro
Pisa ligeiro
Eu vou orar
Pisa ligeiro
Tu rezarás
Pisa ligeiro
Ele vai orar
Pisa ligeiro
Nós rezaremos
É bom ter fé pra Inflar o peito
Nós já vencemos!
xxxxxxxxxxxxxx
36
PIB Curralinho
Curralinho, 06 de março de 2015.
Eis que caminho para o porto de Curralinho.
Duas da manhã.
Duas vezes eleita a menor economia do país.
Chuva fina, lama grossa
Pula-se aqui e acolá.
Um título de pobre dado pelos globalizados
De um país de muitos corruptos.
No frio da pouca camisa que me protege
Quatro homens naquele canto escuro comentam
Não sei se é escárnio
Sei lá se é assalto
Ainda bem que chuvisco os mantém quietos.
Nem a cachorrada sai pro cio.
Nem o café queima tanto.
Moto-taxistas se acotovelam em busca de uma corrida
O carreteiro à espera da carga
Que seja pesada.
Pessoas que vêm e vão com suas cargas
Que não sejam tão assim pesadas.
Em cima das cabeças como a juntá-los o chuvisco
Intensa madrugada.
O frio vento.
Mas quem conhece
Só quem amanhece
Descobre os curralienses.
Alegres
Cordiais
Ricos
37
Não de um Produto Interno Bruto
PIB
Mas de uma Pulsante Inquietação Brasileira
PIB.
xxxxxxxxxxxxxxxx
38
Dona Lupita da Palafita
Rio Pará, 26 de fevereiro de 2015.
O que você me diz disso?
Ela deitada na mesma ponte
Aposto que a condenou
No primeiro ajeitar do corpo
Não diga que não viu
Suas acertadas curvas
E agora ela levanta pra um novo dia
Ei moço da baiúca
Lhe veja um café
Ela aposta dez contos
Pra testar de novo a fé
Sabe o cara que lhe jurou o amor?
Ela fez de um jeito que até o espantou
Atire a primeira pedra
Quem não pensa em luxo
Ou luxúria
Hipócritas!
Impostores vocês todos
Enquanto isso segue ela cantando
E desfilando
Tábua vergando
Se magoando
Com nomes tantos
O que você me diz disso?
Ela toda arrumada
Aposto que não conheceu
O zelar dos cadernos dos filhos
Não diga que não viu
Sua correta postura
39
E agora ela cochila um pouco da lida
Ei pequena mais velha
Já fizeste a tarefa?
Ei pequenino
A camisa está assim inversa
Sabe a casinha que jurou arrumar?
Tá vendo um jeito de logo comprar
Atiraram a primeira pedra
Quem não pensou em proteger
Ou zelar
Coragem!
São tão importantes vocês todos
Por tudo isso que vive lutando
Se enojando
E vomitando
E vai contando
Os sonhos quantos
E se deitando
Posicionando
Realizando
Os sonhos quantos...
O que você me diz disso?
Ela deitada na mesma ponte
Aposto que não conheceu
O zelar dos cadernos dos filhos
Aposto que condenou
Sua correta postura
E agora ela cochila pra um novo dia
Ei moço da baiúca
Lhe veja um café
Ei pequenino
A meia menino tá errada no pé
40
Sabe o cara que lhe jurou o amor?
Tá vendo um jeito de logo arrumar
Atiraram a primeira pedra
Quem não pensa em luxo
Ou zelar
Coragem!
Impostores vocês todos
Por tudo isso que vive lutando
E desfilando
Tábua vergando
E vai contando
Os sonhos quantos
Se magoando
Com nomes tantos
Realizando
Os sonhos quantos...
xxxxxxxxxxxxxxx
41
Fulana e Beltrana
Belém, 17 de março de 2015.
Duas almas calejadas
Mal amadas
Tudo errado pra dar certo
Ex-detentas da piedade
Da cidade
Preconceito perto
E vão de mãos dadas
E vão de mãos dadas
E nós com isso?
Cidadãs adversas
Nas conversas
Apontadas são
Pequenez da fala
Cena cala
Ali tem paixão
E vão de mãos dadas
Insistem em mãos dadas
E tu com isso?
Na província deste Norte
Reparam uns machos
Desbancados
Infelizes
Duas calmas verdadeiras
São sereias
Cantam para a gente
42
Na saúde e na doença
Tem presenças
Juram eternamente
E vão de mãos dadas
E vão de mãos dadas
E o mundo com isso?
xxxxxxxxxxxxxxx
43
Ébrio
Portel, 28 de abril de 2015.
À noite naquela praça
Com aqueles problemas
Eu tava amuado
Os filhos dor de cabeça
Será que não acordam?
No trabalho um nó tático
Que dinheiro apertado
De repente parou em frente
Um ébrio desajeitado
E disse:
"Pessoa cidadã
Eu canto os raios da manhã
E minha reza não é vã
Ali tem uma estrela
Não é bela?
Eu acho bela"
Só o que faltava um poeta
Maltrapilho um boneco
Testa de um suor
De um delirium tremens
Sua língua enrolada
Dialeto povo antigo
Tão atual do que preciso
E assustou - me o elogio
"Gentil homem solidão
É ouro a sua atenção
44
A loucura me foi o padrão
Ali tem uma donzela
Naquela estrela
Não podes vê - la?
A mão da ganância
A face da intolerância
Deprimiu - me a ânsia
Aqui tens um ébrio
Cheio de tédio
Quem leva a sério?
Ouça esta voz amiga
Olhai a formiga
Que só ao trabalho destina
O que és homem?"
Foi - se o ébrio assim
Tchau ébrio
Cambaleando ali
Tchau ébrio
Recita versos sem fim
Foi - se o ébrio
Alertado eu me vi
xxxxxxxxxxxxxxxxxxx
45
Velha Margarida
Belém, 02 de outubro de 2014.
Margarida aprontou-se
Logo cedo
De um punhado de milho
Arremesso
Umas patas se bicando
Pato aceso
A lagarta de fogo
Tem-lhe medo
Vira a costa do biju
Vem o leite
Mão tremida no cabelo
E enfeite
Vestido estampado
Velha Lady
A sombrinha meio torta
Que se ajeite
Antes de sair
Uma reza
Bolsa pensa
Se não pesa
Pisa à rua
E começa o dia
“Bom dia Seu Tonho
Como vai?”
“Bom dia Dona Graça
Ô meu pai!”
“Tu soubeste da Filó?
Mas que dó!”
“Quem diria do prefeito?!
Foi bem feito!”.
46
Tem visita às nove horas
Mulher prenha
Lá do quarto se escuta
Dor que tenha
Senhora do Bom Parto
É a senha
A parida do bom ser
Que se empenha
Vem o cheiro amargo
Que procede
Andiroba mela
Tanto fede
Tão cansado é o embalo
De sua rede
O diploma pregado
Na parede
Obrigado comadre
Margarida
Gratidão para o sempre
Margarida
“Que que é isso comadre?”
Despedida
“Só respeita o resguardo”
Que avisa
“Boa noite penteadeira”
Que fechou
Mesa dura solitária
Que jantou
“O que disse lamparina?”
Apagou
A aurora da infância
Faiscou
“Vem menino bora viajar?”
47
“Vê os olhos das gentes lhe falar”
“Recomeço no andar que fazes”
“Eu matuto nas ideias que cases”
“Vem ispia a cigarra
A cantar”
“Te esconde do trovão
A te ralhar”
“Arremeda a plantinha
Balançar”
“Sai da chuva senão vai
Amofinar”
Margarida parou de dar bom dia
Margarida assuntos não havia
Margarida quietou a sua rede
Um orgulho pregado na parede
xxxxxxxxxxxxxxxxxx
48
Se eu fosse escrever um brega seria assim
Santarém, 23 de outubro de 2014.
Eu achei na caixa
Uma carta a ti
Que tal se...
Reescrevesse a carta
Reescrevo a carta
Que rezou o amor
Saudade que me marca
Abandono só o que restou
Reescrevo a carta
Que me disse não
E quase que me mata
Veneno ilusão
Olá a quanto tempo?
Espero te ver bem
Entraste em um convento?
Ou casaste maridos mais de cem?
Reescrevo a carta
Conto como estou
Barriga bem mais farta
Prudente vou que vou
Reescrevo a carta
Lembro sua foto
A curva mais exata
Sentada em uma moto
Escrevo essas linhas
Tentando te rever
Desculpe falhas minhas
49
Prometo agora respeitar você
Reescrevi a carta
Pra depois guardar
Recordo bem da tapa
Melhor não provocar
xxxxxxxxxxxxxxxx
50
O Que Passa Ju?
Muaná, 29 de março de 2015.
Pra que a tristeza?
Ju Ju Ju
Pra que a deprê?
Ju Ju Ju
Não te avisaram que seria brabeza?
Vão te vaiar
Vão avacalhar
Vão te apontar
Vão azucrinar
Vão até dizer
Tu não merecer
Vão te dar o último lugar
Olhe o que veio
Ju Ju Ju
Raiar de Sol
Ju Ju Ju
Até parece que foi pra ti que ele veio
A manhã cantou
A nuvem passou
O bem te vi voou
O céu serenou
A estrela encantou
O sonho chegou
Lembras que o Sol de ontem voltou
Quer reagir?
Ju Ju Ju
51
Quer enfrentar
Ju Ju Ju
Ué e não fazes isto todo tempo?
Vós partes pra luta
Vós vence a disputa
Vós responde à insulta
Vós estudas e assuntas
Vós proteges e juntas
Vós o medo ocultas
Veja ao redor então o que fundas
Queres ir longe?
Ju Ju Ju
Qual o limite?
Não te avisaram que isto depende da Ju?
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
52
Mãe e Pai
Rio Amazonas, Gurupá, 09 de novembro de 2014.
Mãe tá de cama
Pior, pior
É comigo hoje
Mãe tá de cama
Pior, pior
É conosco hoje
Como ela corta o frango?
Hum...
Como ela acerta o gosto de todos?
Eu só sei que ela mistura
Um pouco de amor,
De salsinha
O pensar em mim
E o limão
Que almoço bom!
Pai tá de cama
Pior, pior
É comigo hoje
Pai tá de cama
Pior, pior
É conosco hoje
Como ele serra a tábua?
Hum...
Como ele suporta tanto peso junto?
Eu só sei que ele carrega
O meu crescer
E o flechal
O pensar em mim
53
E as ferramentas
Que cama tão boa!
Não precisa Mãe e Pai levantar
É conosco hoje
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54
Parque
Macapá, Fortaleza São José, 13 de dezembro de 2014.
Hoje serei criança
Vou correr de ti
Peguei!
Escancarar sorrir
Voei!
Vou contar bolhas de sabão
Hoje te imitarei
Corda que pulei
Um, dois
Trampo eu deixei
Depois
Levantar na voz sua canção
Ensina a mim
O que é viver
A novamente
Sonhar
Explica o tempo
No teu olhar
Quem te inventou
No amar?
Hoje serei você
Carregar a bola
Jogar
No tocar da música
Dançar
Ser a esperança andante
Hoje fui criança
De tanto correr
Cansei
Este bom momento
55
Guardei
Maré enchente és e eu a vazante
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56
Natal de Alguém Amazônico
Belém, 20 de Dezembro de 2014.
Em dezembro choveu no chão da Amazônia
Lavou todas as minhas agonias
Tanta gente igual a mim que assim sonha
Bem mais justo e mais leve nossos dias
Talvez a estrela de Belém esteja por aí
Para expurgar tudo que existe de mal
Da rua cimentada
À várzea inundada
Que bom é um abraço de Natal
Imagino o quanto pode ser bonita a neve
Brancura que dizem até a vista se perder
Contudo nosso Norte nada há que se deve
As flores ali deixadas tão gentil o Ipê
O homem que ilumina a sua casa de luzes
A mulher que traduz sua arte em um pano
Vaga-lumes no olhar
Jesus filho a remar
Pro rumo de um Feliz Novo Ano
A enchente vai tomando devagar seu lugar
Na rede o inverno deita junto a família
A manga avisa que começa a aterrissar
Junto-a risonhos eu e minha filha
São tesouros que inspiram os tristonhos
Convidam a todos nós para a dança
Se puder que venham mais
No peito tendo a paz
Abraçados com a Esperança
57
Menino Pássaro
Baía do Guajará, 26 de março de 2015.
Menino
Ou Pássaro
Parado ali pensando
No teu mundo
Empresta ele um pouco
Pra mim?
Apego
Ou desapego
Silêncio comentando
Diz-me tudo
Traduz o teu encanto
Ouvi
Só entendi
Quando me desprendi
Agora sei que nada sei
O que passas
No teu sonho?
Eu fico imaginando
Curioso
Você tá idealizando
Aprendi
Intransigente!
Até insolente!
Fui obrigado a repetir
Até aprender a lição
Do amor em sua mão
A rodinha gira em teu sorrir
58
Pássaro
Ou Menino
Minha vida recomeçando
Quando fundo
Te pego reparando
Em mim
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59
Dona Senhora
Rio Amazonas, Costa de Almeirim, 20 de julho de 2014.
Alvorecer
O açúcar e o café
O cheiro e o sentir
Dona Senhora de mim
Banho saído
A toalha e o vestido
Perfume que segui
Dona Senhora de mim
Tudo está em ordem
Compras no armário
Casa enfeitada
Rotina imprevisível
Luar e sofá
A Tv e o olhar
Entremãos ali
Dona Senhora de mim
Tudo está em ordem
Contas a pagar
Guardados recibos
Exato indiscutível
Baby doll
Travesseiro e lençol
Amor e sorrir
Dona Senhora de Mim
xxxxxxxxxxxxxxx
60
3 Passagens ao menos, Por Favor
Rio Pará, 08 de março de 2015.
Viagem da vida
Ao menos três bilhetes
Faz favor
Menina repara
Menino observa
Suponho
Doce ilusão
Traga Pasárgada
Inocente
De quem dizia infinito
Foi diluída
Implacável sim
Expulsou - nos o Tempo
Tá
Mas vixe - Maria
Pior foi aquilo da dor
Tanto trauma
Tomei um remédio
Receita do Tempo
E já tava desconfiado
Dos céus
Quando
Um anjo me apareceu
Arredou a tormenta
E disse: "assim que é Amor".
Caminho prestado
Jornada cumprida
Falo aos jovens
Empresto um atalho
61
Mas sei que é normal não ouvirem
Terás um sol
Que julgas não se pôr
Fogos de artifício
A embalar os teus sonhos
Malvado Tempo
Como era mesmo o nome
Daquele primeiro filme?
Mas ah
Que arrepia a espinha
Memória do horror
Que também tive
Que burrice!
Cova dos leões
Fugi quase à morte
E já sendo um ateu
Da vida
Acreditem
Eis que brotou no meu jardim
Flor que convenceu a mim
Que existe o Amor
Quando eu já tinha perdido
A fé
Olha
Nasceu ali no meu quintal
Belo nascer do dia frugal
Pra eu plantar o Amor.
xxxxxxxxxxxxxxxxxx
62
Aerofotoconsciência
Belém, 23 de agosto de 2014.
Estou ciente
da não consciência
estou senhor
do fim de sua paciência
Perdi o recibo de pagamento
a data caiu no esquecimento
e temos a luta do feijão e do sonho
Distraiu-me a luz do sol
distraiu-me o som do vento
você reparou o passarinho?
Viu como parece com nosso filho?
Foi minha atenção à estrela
foi minha atenção àquela luz
vi que não estava plena
minha mente não terrena
Um desespero trago
do vagar que eu vou
uma revolta eu sinto
do limbo que sou
Comprei errada aquela fruta
por não contar paguei a multa
repetição tornou-me um duvidoso réu
Tudo culpa daquela nuvem
tudo culpa da nuvem dragão
a folha que caiu
se juntou a outras mil
63
Se eu colar fica inteiro
do copo eu acho meio cheio
tudo culpa da beleza
o mundo quer que eu escreva
Talvez seja artista
ou quem sabe autista
serei equilibrista
Quer que eu aterrisse agora?
Comando que a mim devora
pois irei me concentrar
e a pia consertar
Mesmo estando atribulado
mesmo estando com vergonha
sabe amor, eu te comparo
com a linda Amazônia
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
64
In Memoriam de Hoje
Almeirim, 25 de junho de 2014.
O Sol se põe todo dia é aquilo que destina
O Grande Homem quando se vai ainda ilumina
Tive um sonho assim
Não morria
A flor de jasmim
Sentiria
Como Deus o quer
Eu mantive a fé
Apesar de o corpo ruir
Tanta dor a me corroer
Vi da janela um pai a correr
Seu bebê fujão
Bolha de sabão
Resolvi ao Senhor escrever
Obrigado
Pelo fim de ato
Pelo Ser de fato
De ter sido amado
Obrigado
Por ter tido a chance
Da criação
Eu ter sido amante
O Sol se põe todo dia é aquilo que destina
O Grande Homem quando se vai ainda ilumina
Agradeço à trave
65
Que impediu
O meu gol de tarde
Que refletiu
Não se ganha todas
São bobagens modas
E com isso aprendi
Lancinante que me arranca um gemido
Ainda assim lembro-me do amigo
Gente tão sapeca
Jogo de peteca
Joga mais que eu duvido
Obrigado
Pela molecagem
Da mocinha a imagem
Do topete vaidade
Obrigado
Por beijar à lua
Primeira vez
Sabor que continua
Agradeço
Pelo que lutei
Pelo que amei
Pelo que cantei
Agradeço
Pelo sol da manhã
Poente agora
Foi a Vida minha irmã
O Sol se põe todo dia é aquilo que destina
O Grande Homem quando se vai ainda ilumina
xxxxxxxxxxxxxxxxxxx
66
Sentido
Belém, 31 de março de 2015.
Eu joguei um punhado de terra
Imagino ser o fim de uma dor
Qual o sentido do novo ir primeiro?
É um fato fenômeno da pergunta
Um casebre que caiu com a chuva
Este sou eu diante de sua partida
Nasceu pra alegrar o meu dia
Nasceu pra ser utopia
Nasceu daquilo que seria
O auge da poesia
Se foi em uma ironia
Do barro agora não queria
Eu ponho culpa no que não posso ver
Deus dá-me um tempo.
Perdeu a cor o arco íris da tarde
Da manhã já não sinto o Sol
Da noite são os medos da memória
O tempo todo transtorno do que falta
Na cabeça a revolta do apego
Mar revolto a engolir os navios
Nascera para um projeto
Nascera de um amor mais perto
Nascera para me deixar certo
Que lindo seria o verso
Ficara porém o inverso
Mais que perfeito não foi começo
Não tem mais ninguém pra culpar
Deus podia te salvar acho eu
67
A voz não saiu para cantar
A estrada não teve um horizonte
Mas como se antes você existia
Qual o motivo de agradecer à vida?
Caiu a ficha o nome disso é Amor
Nasceu pois meu verbo é amar
Nasce porque vivo a admirar
E eu a buscar no meu respirar
Tá aqui o SENTIDO de ser e recriar
Deus senta aqui comigo
Bora conversar...
xxxxxxxxxxxxxxxx
68
Termo de Ajustamento de Conduta do Homem Para a Floresta
Debaixo de árvores, 19 de fevereiro de 2015.
CONSIDERANDO a floresta um patrimônio público onde o
público refere-se a todos os seres vivos.
CONSIDERANDO que nós, seres humanos, somos parte da
natureza e não donos dela.
CONSIDERANDO que você e eu temos direito de ver
crescer filhos e netos felizes com o cantar dos pássaros no alvorecer e no
poente dos dias que presenciarem.
CONSIDERANDO que as florestas não têm culpa de nossa
estranha ganância por aquilo que chamamos dinheiro.
CONSIDERANDO a magia de uma floresta ser uma
bagunça misteriosamente organizada e eficiente quando respeitada.
CONSIDERANDO que ao amar as florestas, amamos nossa
origem sobre a Terra, onde espiritualidade que temos procura entender o
significado desses laços.
CONSIDERANDO a parteira, a grávida, a andirobeira e o
óleo de suas sementes.
CONSIDERANDO o senhor, o rio, a jacareúba e a canoa.
CONSIDERANDO o menino, a menina, a fruta e o
piquiazeiro.
CONSIDERANDO a beleza do germinar de uma planta.
As pessoas resolvem celebrar o presente Termo de
Ajustamento de Conduta, com fundamento na Lei da Vida e da Criação,
explicada cientificamente ou não, baseada na Fé de que iremos evoluir e assim
continuar justificando nossa presença neste planeta ao mesmo tempo em que
69
nos protegeremos dos efeitos negativos de nossas próprias ações e reações.
Como prova desta intenção, cuidaremos das florestas com o valor que elas
merecem, mediante as seguintes cláusulas:
Cláusula Primeira - do Objeto
Não se tratarão as florestas como mero objeto, nem as mencionaremos como
empecilho ao nosso crescimento.
Cláusula Segunda - das Obrigações
As pessoas comprometem-se a preservar e conservar os rios, flora e fauna
para provar gratidão a tudo que é sagrado e bom. Se derrubar uma árvore,
plantará duas no lugar. Não mergulhará no mesmo rio, como diz o sábio, mas se
preocupará em mantê-lo salvo para que outros possam refletir nesta filosofia.
Caçará para alimentar sua família, porém com o profundo respeito de não
ultrapassar os limites do círculo da vida.
Cláusula Terceira - da Inadimplência
Em caso de descumprimento das cláusulas anteriores, Gaia cobrará com juros e
outras correções a multa de 5 graus centigrados a mais de calor, 5 bilhões de
pessoas a mais com sede e fome, terrenos estéreis e desoladores, valores
somados até o ano de 2200.
Cláusula Quarta - das Disposições Gerais
A Humanidade estará disposta a mudar a sua atitude diante de tudo que fez de
irresponsável diante das mesmas florestas que cercaram sua infância e
imaginário de aventuras e brincadeiras.
Os homens e mulheres de boa vontade serão maioria no mundo e estarão
vigilantes aos ambiciosos que tentarem ser proprietários de nosso passado,
presente e futuro.
Reconheceremos que todos nós somos Povos da Floresta ao perceber que sem
ela não temos essência.
A semente terá mais valor que o diamante.
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Cláusula Quinta - dos Prazos e Vigências
O prazo deste Termo de Ajustamento de Conduta será o tempo necessário
para o nosso completo entendimento sobre animais e plantas, ajudando-nos nas
respostas sobre o Sentido da Vida.
Cláusula sexta - da Publicação
O mais breve possível.
Cláusula sexta - do Foro
Litígios serão resolvidos pela sensatez e paz de espírito.
Resoluções sobre o cuidar da floresta deverão ser construídas coletivamente.
Se o presente Termo de Ajustamento não convir, que seja melhorado em sua
íntegra para o bem de todos os seres.
Por estarem justos e compromissados, firmam o presente instrumento em duas
vias de igual teor e forma para que, assim, produza os seus efeitos físicos e
metafísicos.
Assinam:
As Pessoas de Hoje:__________________
As Pessoas de Amanhã:_________________
Testemunha: ________________________ (Aquele que criou a Vida)
xxxxxxxxxxxxxxxxxx fim xxxxxxxxxxxxxxxxxxx