Das Ruas Para a Web... E Vice-Versa
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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Manaus, AM – 4 a 7/9/2013
Das Ruas Para a Web E Vice-Versa:
Os Cartazes De Protesto Como Folkcomunicação No Mundo Real E No Mundo
Virtual1
Agnes de Sousa ARRUDA2
Hércules Silva MOREIRA3
Universidade de Mogi das Cruzes (UMC)
Resumo
Este artigo apresenta estudo sobre o uso de cartazes de protesto como forma de
comunicação entre ativistas políticos e ciberativistas. Fundamentado nas teorias da
Folkcomunicação, atualizadas no que diz respeito à comunicação nos movimentos sociais e
aos meios nele utilizados, e também no que se refere à cultura da convergência,
cibercultura e redes sociais na internet, o objetivo é analisar como os grupos se
apropriaram, tanto da internet, quanto de um meio simples de comunicação, os cartazes,
para transmitir frases de efeito e vozes de comando durante os recentes manifestos contra a
corrupção no Brasil.
Palavras-chave: Folkcomunicação; cartazes; ativismo político; ciberativismo; Facebook.
Introdução
A Folkcomunicação, genuína teoria brasileira, foi proposta pelo professor pernambucano
Luiz Beltrão em sua tese de doutorado de 1967, publicada em 2001 pela EdiPUCRS. A
matéria dá conta de explicar que grupos às margens da sociedade, seja pela geografia, seja
pela falta de acesso à cultura de uma maneira geral, traduzem os conteúdos que são
produzidos pelos meios de comunicação convencionais para meios populares de
informação. Tal processo se dá por formas das mais variadas; da simples tradução oral
feita por trovadores, intermediadores que, na teoria beltraniana, são chamados de ativistas
midiáticos, a formas mais complexas, como a literatura de cordel.
Movimentos populares e ativismo político se enquadram nas manifestações
folkcomunicacionais justamente porque os objetivos de tais mobilizações são dar voz a um
grupo que, oprimido pelo sistema político vigente e pelos meios de comunicação de massa,
1Trabalho apresentado no GP Folkcomunicação, XIII Encontro dos Grupos de Pesquisas em Comunicação, evento
componente do XXXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
2Professora Coordenadora do curso de Comunicação Social da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC - SP); Mestre em
Comunicação e Semiótica pela Universidade Paulista (UNIP - SP); e-mail [email protected].
3Professor do curso de Comunicação Social da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC - SP); Mestrando em Políticas
Públicas na linha de pesquisa Políticas Culturais: Diversidade e Cidadania (UMC - SP); e-mail:
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revolta-se contra a situação e, unido aos seus pares, tem suas reivindicações, no mínimo,
ouvidas pelas autoridades.
Pode-se definir um ativista político como sendo aquele cidadão atuante em questões
políticas, defendendo seu ponto de vista, de uma maneira individual ou coletiva. Além de
estar engajado em causas que visam à mudança como consequência, por meio de
manifestações, por exemplo, ele não precisa estar necessariamente filiado a um partido
político. Para Mariangela Savoia (1989) o uso que uma pessoa faz de suas capacidades
humanas depende de sua motivação, de seus desejos, carências, necessidades, ambições e
até medos. A autora define “motivo” como sendo um fator interno que dá início, dirige e
integra o comportamento humano. A partir daí, as pessoas buscam uma forma de se
comunicar para que a transmissão de seus ideais possa ser disseminada entre a sociedade
de uma forma mais abrangente visando à coletividade.
Com o passar dos anos, no entanto, as formas de se comunicar vêm se alterando cada vez
mais rápido. O homem contemporâneo vive a expansão dos sinais comunicacionais;
expansão essa responsável pela quebra de barreiras espaço-temporais na comunicação
humana. Nesse contexto, estima-se4 que mais de 30% da população mundial seja de
usuários ativos da internet. Nos Estados Unidos, o número chega a quase 80% da
população e, no Brasil, supera os 45%.
Segundo Arruda e Oliveira (2013), pesquisa divulgada pelo Ibope Media no final de 20125
informa que, só no Brasil, 94,2 milhões de pessoas já estavam, à época, conectadas à rede
mundial de computadores. O relatório considerou pessoas com mais de 16 anos com acesso
em qualquer ambiente (domicílios, trabalho, escolas, lanhouses etc.), além de crianças e
adolescentes de 2 a 15 anos com acesso domiciliar. Os dados representam crescimento de
8,8% em relação ao mesmo período do ano anterior.
O cenário é, assim, propício para a transposição daquilo que se vive no dito “mundo real”
(concreto) para o que Pierre Lévy, em1999, chamou de ciberespaço. Segundo o autor,
ciberespaço é
o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das
memórias dos computadores. Essa definição inclui o conjunto dos sistemas de
comunicação eletrônicos (aí incluídos os conjuntos de redes hertzianas e telefônicas
clássicas), na medida em que transmite informações provenientes de fontes digitais
ou destinadas à digitalização. (LÉVY, 1999, p. 92)
4 Dados do Google Public Data (2011).
5 Publicada na revista Info Exame (2013).
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Esse processo, conforme explica Henry Jenkins (2009), é chamado de convergência. Sobre
o assunto, o autor explica que não se trata simplesmente da transposição do conteúdo de
uma mídia para a outra, ou, em um exemplo simples do universo da comunicação, da
disponibilização do arquivo PDF de um jornal impresso no site do veículo, mas sim de
uma nova maneira de interação entre emissor e receptor da mensagem, na qual os agentes
se confundem no processo, tornando o receptor interlocutor, agente participativo na
transmissão das informações. Para Jenkis (2009, p. 343) a convergência é “onde as novas
mídias colidem, onde a mídia corporativa e a mídia alternativa se cruzam, onde o poder do
produtor e o poder do consumidor interagem de maneira imprevisível”.
Os hábitos sociais seguem o mesmo caminho. Redes sociais, agora na internet, são
fenômenos de popularidade, sendo o Facebook6a grande vedete da rede, com mais de 1
bilhão de usuários em março de 20137.
Sendo o ativismo político uma manifestação popular e, em consequência, social, o
fenômeno acompanha a evolução da comunicação e, hoje, o ciberativismo tem se
destacado em meio à onda de protestos que ocorre pelo mundo todo.
A partir do ciberativismo, as pessoas encontraram uma forma de expor suas ideias e
protestar utilizando os meios eletrônicos de comunicação. A internet aparece com destaque
nesse contexto, afinal por meio dela, muitos grupos conseguem se organizar e propagar as
mensagens de forma rápida, transformando-a em uma espécie de alternativa aos já
tradicionais meios de comunicação de massa. Dessa forma, os ciberativistas conseguem
ampliar suas reivindicações por meio da liberdade de expressão que a web oferece aos
usuários. De acordo com David de Ugarte (2008), ciberativismo não é uma técnica, e sim
uma estratégia, afinal as pessoas publicam na rede já esperando um retorno ou até mesmo
uma recomendação para que outras pessoas tenham acesso ao conteúdo divulgado.
O brasileiro também faz parte desse contexto de protestos, principalmente considerando o
recente cenário político e econômico do Brasil, olhando a fatia dos últimos 10 anos,
quando se tem dois panoramas: o primeiro é que a inflação foi controlada, mas com a alta
6Facebook é uma rede social na internet fundada em 2004, cuja missão é “to give people the power to share and make the
world more open and connected” (Key Facts, 2013). Em tradução livre do conteúdo oficial da empresa, tem-se a
informação de que as pessoas usam o Facebook para permanecerem conectadas com seus amigos e família, para
descobrir o que está acontecendo no mundo e para compartilhar e expressar o que é importante para elas.
7 Dados fornecidos pela empresa em junho de 2013.
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do dólar
8 e a chegada de novas empresas ao País, o governo não conseguiu segurar a alta
de alguns produtos e a concorrência estrangeira; o segundo é que, mesmo com os
benefícios sociais implantados pelo Governo Federal, a sociedade, principalmente o grupo
formado por aqueles cidadãos que não recebem tais benefícios, começa a questionar por
um programa mais sustentável que gere renda e não apenas a distribua.
A criação dos programas de transferência de renda vem exercendo impacto na
redução das desigualdades sociais, apesar dos programas instituídos não atenderem a
todas as pessoas em situação de vulnerabilidade social, ou em situação de violação
dos direitos, tendo como público-alvo apenas os mais pobres ou indigentes, e do
valor dos benefícios estar abaixo do salário mínimo – cerca de 1/3 dele. (VIEIRA E
AMARAL, 2008, pg. 131)
V de Vinagre
Insatisfeitos com a atual situação política e econômica do País, os brasileiros, após anos de
inércia (a última grande movimentação popular aconteceu em 1992 pedindo o
impeachment do então presidente Fernando Collor9), iniciaram uma grande mobilização
nacional (Terra Notícias, 2013). As grandes manifestações tiveram início em março de
2013 em Porto Alegre (RS), seguindo para a “Revolta do Busão” em Natal (RN), passando
por Goiânia (GO) e pelo Rio de Janeiro (RJ) em maio, e culminando nas grandes passeatas
na Avenida Paulista, em São Paulo (SP), no mês de junho, seguidas por caminhadas que,
juntas, levaram mais de 250 mil pessoas às ruas em todo o Brasil no dia 17 de junho de
2013.
Inicialmente contra o aumento das tarifas do transporte público coletivo, com o passar dos
dias as manifestações ganharam corpo e, em meio às reivindicações populares, outros
temas passaram a surgir dentre as palavras de ordem, entre eles a retirada de duas
Propostas de Emendas à Constituição (PEC) da votação no Congresso Nacional, a saída do
político Renan Calheiros (PMDB) da presidência do Senado e a criação de uma Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) que apure os gastos com estádios e infraestrutura para a
Copa do Mundo de 2014.
Marcados pela violência entre manifestantes e Polícia Militar, os protestos ganharam
projeção internacional, principalmente, pela truculência da PM em situações
aparentemente amenas, como o caso do jornalista que foi detido por “porte de vinagre”,
8Matéria do Correio Braziliense de junho de 2013.
9 Movimento dos Caras Pintadas – InfoEscola (2013).
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pois usaria o líquido para amenizar o desconforto causado pelas bombas de efeito moral
(Último Segundo, 2013), tornando o caso uma referência para o assunto.
Mídia Radical
Nota-se que, por meio de manifestações populares, diversas formas de mídia começam a
ser apropriadas pelos grupos a partir de seu descontentamento; ou seja, em meio a
protestos, aparecem novas e velhas formas de se fazer comunicação. Segundo Peruzzo
(1995) nesse patamar a “nova” comunicação é um grito antes sufocado de denúncia e
reivindicação por transformações. Ela vai dos pequenos veículos de comunicação dirigida
à comunicação grupal chegando aos meios massivos.
Numa conjuntura em que vem à tona a insatisfação de amplos setores devido às
precárias condições de existência do povo e as restrições à liberdade de expressão,
desenvolvem-se meios de comunicação “alternativos” dos setores populares, não
sujeitos ao controle governamental ou empresarial direto. (PERUZZO, 1995, p. 29)
Aliado aos motivos dos protestos, chama a atenção as formas individuais e coletivas de
manifestar ideias, compartilhar insatisfações e até mesmo reivindicar alternativas como
forma de manifesto. Para John Downing (2002), a mídia radical geralmente serve a dois
propósitos precedentes: expressar verticalmente, a partir dos setores subordinados,
oposição direta à estrutura de poder e seu comportamento e obter, horizontalmente, apoio e
solidariedade, construindo uma rede de relações contrária às políticas públicas ou mesmo à
própria sobrevivência de estrutura de poder.
O que se destaca, no entanto, é o fato de que, conforme mencionado anteriormente, em
época de expansão dos sinais comunicativos, de comunicação veloz, via satélite, que vence
o tempo e o espaço, os manifestantes têm utilizado de uma maneira extremamente simples
para comunicar e passar suas ideias adiante. Os cartazes de protesto, de conteúdo bem-
humorado e inteligente, tomaram as ruas e as redes sociais na internet de maneira intensa.
Não fosse só isso, esse conteúdo também levanta discussão: ao utilizar hashtags10
,
memes11
, piadas internas das redes sociais na internet12
e outros elementos da linguagem
10Hashtags são palavras-chave que, na internet, antecedidas pelo símbolo "#", designam o assunto o qual está se
discutindo. Elas viram hiperlinks dentro da rede e são indexáveis pelos mecanismos de busca. Sendo assim, usuários
podem clicar nas hashtags ou buscá-las em mecanismos como o Google para ter acesso a todos que participaram da
discussão.
11O termo ‘Meme de Internet’ é usado para descrever um conceito que se espalha via internet.
12Raquel Recuero (2009, p. 102) explica que os sites de redes sociais são “uma consequência da apropriação das
ferramentas de comunicação mediada pelo computador pelos atores sociais. Sites de redes sociais são os espaços
utilizados para a expressão das redes sociais na Internet”. A autora ainda afirma que “o surgimento da Internet
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wébica no meio impresso, bem como notar que as imagens dos manifestantes segurando
seus cartazes durante as passeatas nas ruas de todo Brasil se tornaram hit na internet
durante o processo de manifestação, observam-se sinais de que, assim como previa Pierre
Lévy em 1999, não existe mais diferenciação entre mundo real e mundo virtual.
Segundo ele,
o computador não é mais um centro, e sim um nó, um terminal, um componente da
rede calculante. Suas funções pulverizadas infiltram cada elemento do tecno-
cosmos. No limite, há apenas um único computador, mas é impossível traçar seus
limites, definir seu contorno. É um computador cujo centro está em toda parte e a
circunferência em lugar algum, um computador hipertextual, disperso, vivo,
fervilhante, inacabado: o ciberespaço em si. (LÉVY, 1999, p. 44)
Observando o fenômeno dos cartazes a partir dos estudos de Lévy, pode-se deduzir que a
contemporaneidade chegou ao momento em que a conexão à World Wide Web se dá por
completa, inclusive, pelos grupos folk, ou seja, de acordo com a definição dada por Luiz
Beltrão (1980), aqueles formados às margens “de duas culturas e de duas sociedades que
nunca se interpenetraram e fundiram totalmente” (BELTRÃO, 1980, p. 39). Analisar como
tal fenômeno se manifesta, a fim de contribuir para os estudos da Folkcomunicação em
geral, e, em específico, da disciplina em sua forma contemporânea, com o surgimento e a
disseminação da internet, é o objetivo deste trabalho.
Mídia Primária, Secundária e Terciária
Norval Baitello Junior (1998), ao traduzir a obra do alemão Harry Pross, Medienforschung
(Investigação da Mídia), sob a ótica da semiótica da cultura13
, apresentou uma
classificação para os meios de comunicação. Segundo o autor, o corpo é a mídia primária:
Os sons e a fala, os gestos com as mãos, com a cabeça, com os ombros, os
movimentos do corpo, o andar, o sentar, a dança, os odores e sua supressão, os
rubores ou a palidez, a respiração ofegante ou presa, as rugas ou cicatrizes, o sorriso,
o riso, a gargalhada e o choro são linguagens dos meios primários. (BAITELLO,
1998, p. 12)
proporcionou que as pessoas pudessem difundir as informações de forma mais rápida e mais interativa. Tal mudança
criou novos canais e, ao mesmo tempo, uma pluralidade de novas informações circulando nos grupos sociais”.
(RECUERO, 2009, p. 116)
13“Semiótica da Cultura é uma disciplina teórica dos estudos russos. Constituiu-se no Departamento de Semiótica da
Universidade de Tártu, Estônia, nos anos 60, em meio aos encontros da ''Escola de verão sobre os sistemas modelizantes
de segundo grau'', reunindo professores da universidade local e também de Moscou. Explorando fronteiras com vários
campos do conhecimento, deriva seus princípios da Lingüística, da Teoria da Informação e da Comunicação, da
Cibernética e, evidentemente, da Semiótica.” (PUC-SP, 2013).
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É, a mídia primária, a mais complexa, a mais concreta, a que mais vincula os agentes da
comunicação, emissor e receptor, na troca de informações. No entanto, a mídia primária é
perecível; para se estabelecer comunicação com o corpo, é necessária a presença do mesmo
em um espaço e em um tempo únicos, e, na ânsia de se perpetuar no tempo e no espaço, o
homem deu origem à mídia secundária, ou seja, “o uso de ferramentas comunicativas com
a finalidade de amplificar suas mensagens no tempo, no espaço ou na intensidade”
(BAITELLO, 1998, p. 13). A mídia secundária fundamenta-se na presença de um aparato
mediador entre emissor e receptor. “Em princípio, cores e pinturas corporais, máscaras e
vestimentas festivas, adornos e outros objetos com a função de acrescentar ao corpo uma
informação” (BAITELLO, 1998, p. 13).
Muito embora mais duradoura, a mídia secundária perde em complexidade das
informações transmitidas; o que Vilém Flusser, também elucidado por Norval Baitello
(2006) chama de “escada da abstração”. Na mídia secundária perde-se a
tridimensionalidade e, na mídia terciária, que vem a seguir com a invenção da eletricidade,
o que antes era bidimensional, mas ainda concreto, passa a ser nulodimensional, abstrato,
com imagens formadas por
(...) uma fórmula, um cálculo, um algoritmo (que apenas se projeta sobre um
suporte qualquer: papel, vidro, parede e até mesmo a névoa, o vapor ou o ar). Elas
são nulodimensionais, uma vez que a última dimensão espacial que lhes restava
também é subtraída. (BAITELLO, 2006, p. 4-5).
Enquadram-se, então, nessa classificação, as manifestações populares, passeatas,
caminhadas, como mídia primária, máxima vinculadora entre emissores e receptores da
mensagem por seu extremo contato físico; os cartazes, objeto de estudo deste artigo, como
mídia secundária, ou seja, extensão do corpo que está nas ruas protestando, e o Facebook,
responsável pela linguagem dos cartazes em questão e pela disseminação de suas imagens
para o mundo, como mídia terciária.
Os Cartazes dos Protestos
A partir do cenário descrito, e para entender como se dá a apropriação, por meio dos
manifestantes, de duas formas de mídia aparentemente tão distintas, os cartazes e as redes
sociais na internet, foram selecionados cartazes das manifestações brasileiras do mês de
junho de 2013 divididos em duas categorias: a primeira, referente às imagens de 1 a 4, diz
respeito aos cartazes com conteúdo alusivo à linguagem wébica, retirados dos
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Tumblrs
14Melhores Cartazes (2013) e Cartazes do Protesto (2013), e, a segunda, referente
às imagens de 5 a 8, são prints da rede social na internet Facebook de usuários que
publicaram os cartazes em suas timelines15
, conforme segue:
Imagem 1: Aproveitando a visibilidade internacional, esse manifestante fez um cartaz em
inglês com a expressão “Hoje a jiripoca vai piar”. O uso de hashtags com as palavras de
ordem “Occupy Brasil” e “Ocuppy Gezi”, em alusão aos manifestos populares que também
estão acontecendo em Istambul, na Turquia, mostram a migração da linguagem wébica
para o meio impresso.
Imagem 2: Levada pelos manifestantes, a faixa faz alusão à força dada às redes sociais na
internet como meio de protesto, só que no caso, a rede foi para o mundo concreto. É
possível observar, nas mãos de outros manifestantes, muitos outros cartazes de protesto.
14Tumblr é uma plataforma online para publicação no formato blogada de conteúdo multimídia.
15Timeline é um termo utilizado nas principais redes sociais na internet, como Facebook, Twitter e Tumblr, para descrever
a sequência de postagens recebidas e listadas em ordem cronológica na página principal das redes.
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Imagem 3: Considerada apática pelas gerações anteriores, que lutaram em outros
movimentos nacionais, a juventude brasileira contemporânea, que até então protestava
apenas pelos meios online, foi às ruas. No cartaz em questão, o manifestante faz alusão ao
tema, dizendo que deixou o Facebook para protestar no mundo concreto.
Imagem 4: O cartaz dessa jovem, além de trazer a hashtag com a voz de comando “Vem
Pra Rua”, faz alusão aos usuários de internet que passam o dia em sites de pornografia
(XVídeos) e, por isso, os convoca para se mobilizarem.
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Imagem 5: Os cartazes se tornaram vedete nas redes sociais na internet, principalmente no
Facebook, onde milhares de usuários compartilharam as imagens de manifestantes com
seus anúncios. Na foto, percebe-se a popularidade da publicação que, até o momento do
print, tinha 2.584 curtidas, 8.966 compartilhamentos e 180 comentários.
Imagem 6: Metalinguístico, este cartaz publicado na rede social na internet demonstra que,
de fato, a mídia tem sido efetiva para os protestos.
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Imagem 7: Já esse cartaz é alusivo à linguagem informática de maneira geral.
Imagem 8: Por fim, outro cartaz popular na rede social faz alusão ao dinheiro gasto nos
preparativos da Copa do Mundo de 2014 no Brasil em detrimento de serviços básicos, no
caso, a saúde.
Considerações Finais
O homem contemporâneo vive a expansão dos sinais comunicativos. Quebrando a barreira
do espaço-tempo com a comunicação via satélite, no entanto, há uma gradativa perda de
complexidade e de vinculação entre os agentes comunicativos, ou seja, emissor e receptor.
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Talvez por conta disso, o regresso às raízes primárias da comunicação tenha se feito tão
presente nas manifestações político-sociais que têm acontecido no Brasil e no mundo
recentemente. Dando voz aos oprimidos pelo sistema e pelos meios de comunicação de
massa, as passeatas e manifestos apresentados neste trabalho reuniram milhares de pessoas
pelo ideal de um País sem corrupção. Apesar de estarem no mundo concreto, tais
movimentos também despontaram na internet, principalmente nas redes sociais online, e
levantaram a questão do “quem veio primeiro”, ou seja: as manifestações saíram da
internet e foram para as ruas ou das ruas foram para a internet? Difícil saber; ainda mais
depois de observar que os cartazes utilizados nas manifestações apresentam linguagem
wébica e que, na web, as imagens dos manifestantes com esses cartazes ganharam espaço
de tamanho destaque. No entanto, é nítido e notório o fato de que os grupos folk estão na
internet e que se apropriaram dela para transmitir suas mensagens da mesma forma que um
simples cartaz em meio a uma multidão ainda é mídia importante no processo
comunicacional. Vive-se, assim, uma nova fase da Comunicação como um todo e da
Folkcomunicação em especial; fase essa em que se admite a internet como parte da vida
cotidiana num contexto muito maior, no qual o homem, gregário em sua essência,
comunica de todas as formas que lhe são conhecidas e permitidas.
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