Crack e seco a luz do dia no Alto do Louvor

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popular 8 Domingo, 26 de julho de 2009 Jornal de Fato Na vida das garotas de programas do Alto do Lou- vor, o historiador Carlos Moura encontrou o objeto que precisava para fazer sua monografia de fim de cur- so na especialização em se- gurança pública e cidadania da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). A experiência an- terior numa especialização sobre tráfico internacional de seres humanos para fins sexuais mostrou que muitas histórias de mulheres que assumem o sexo como pro- fissão silenciam diante da violência física e psicológi- ca. "Nossa pesquisa está vol- tada para essa relação entre as profissionais do sexo e seus clientes, sem deixar, é claro, de abordar outros de- talhes no cotidiano da vi- da dessas mulheres. Mas, is- so só poderei divulgar quan- do o estudo estiver pronto, no fim de agosto", explica Carlos Moura. Para conhecer a fundo o ambiente em que estão inseridas as garotas de pro- grama que atuam no bair- ro, o pesquisador fez diver- sas entrevistas com as mu- lheres. "Fica evidente tam- bém que há uma resistên- cia por parte das garotas com homens que possam trazer problemas aos mo- radores. Elas não gostam dos que chegam para bagun- çar ou fazer algo que possa causar apreensão entre as fa- mílias que moram no lu- gar", ressalta. Um mergulho na vida das garotas de programa A gente só quer tranquilidade. Só isso!’ MORADOR do Alto do Louvor , que prefere o anonimato Pelo menos 90% do dinheiro que as profissionais do sexo ganham com os programas vai para a compra de crack’ CARLOS MOURA Pesquisador Fred Veras Prostituição resiste nas ruas do bairro, embora em decadência Droga e sexo em pleno dia no Alto do Louvor Uso de drogas por grupos de homens e mulheres durante o dia deixa moradores apreensivos ESDRAS MARCHEZAN Da Redação A relação do bairro com uma época do pas- sado em que a prostitui- ção virou marca da área encra- vada entre o Bom Jardim e o Centro traz, até hoje, ares de marginalização e repúdio para quem vive no Alto do Louvor. O passado ainda reflete no pre- sente, embora o perfil de seus habitantes tenha mudado. O co- mércio do prazer persiste, mas divide espaço com situações e problemas comuns das "casas de família". Mas, lidar com o passado do bairro não tem si- do fácil para alguns morado- res da área, principalmente de- pois que a prostituição se aliou ao tráfico de drogas. Os moradores são unânimes em afirmar que o tráfico de dro- gas começa a tomar conta de determinados pontos do bairro, antes tomados pelas garotas de programa. Em alguns, tráfico e prostituição dividem a mesma esquina. A unanimidade se re- pete quando os denunciantes fa- zem um pedido: o anonimato. "Todo dia a gente vê o pessoal fumando crack por aqui, e mos- trar a cara pode ser perigoso pa- ra quem dá de cara todos os dias com essas pessoas", afirma um morador do bairro. De fato, o uso de drogas por parte de mulheres e ho- mens no Alto do Louvor já não espera mais o escurecer. Num Abaixo-assinado pedindo atuação da Polícia no combate ao problema está sendo feito por moradores do bairro; mais de 300 pessoas já assinaram Mulheres fumam crack à tarde em ruas do Alto do Louvor Fred Veras Moradores afirmam que bairro está sendo usado como ponto de encontro de usuários Fred Veras fim de tarde da semana passa- da, a equipe de reportagem do DE FATO flagrou mulheres fa- zendo de um canto de parede em uma das ruas do Alto do Louvor ponto de encontro pa- ra o consumo de crack. A pre- sença da reportagem não ini- be as usuárias, que passam a mostrar à equipe o cachimbo usado no consumo da droga. "Pelo menos 90% do dinhei- ro que as profissionais do sexo do Alto do Louvor recebem dos programas hoje vai para a com- pra do crack. Grande parte de- las virou usuária da droga", afir- ma Carlos Moura, historiador e estudante do curso de Direi- to da Uern, que realiza uma pes- quisa sobre a violência pratica- da contra as garotas de progra- ma que atuam naquele bairro. Entre os moradores o me- do domina. "O que se pode es- perar de uma pessoa que está fazendo uso desse tipo de coi- sa (crack)? E pior é que quan- do faltar dinheiro para com- prar a droga, o que eles fazem? Assaltam, roubam, tudo para conseguir dinheiro. Nosso me- do é que os moradores fiquem reféns dessa situação", comen- ta um morador. Ele conta que muitas das pessoas que moram no local já organizaram um abaixo-assinado - com mais de 300 assinaturas até o momen- to -, pedindo providências aos comandos do II Batalhão da Polícia Militar (BPM), da De- legacia Regional de Polícia Ci- vil e da delegacia da Polícia Fe- deral na cidade. A intenção é que os órgãos atuem de forma a evitar que as ruas do bairro continuem a servir de pontos para consumo de drogas em grupo. "A gente só quer tran- quilidade. Só isso", afirma uma moradora.

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Uma reportagem sobre o uso de drogas no Alto do Louvor, em Mossoró, Rio Grande do Norte

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popular8 Domingo, 26 de julho de 2009Jornal de Fato

Na vida das garotas deprogramas do Alto do Lou-vor, o historiador CarlosMoura encontrou o objetoque precisava para fazer suamonografia de fim de cur-so na especialização em se-gurança pública e cidadaniada Universidade do Estadodo Rio Grande do Norte

(UERN). A experiência an-terior numa especializaçãosobre tráfico internacionalde seres humanos para finssexuais mostrou que muitashistórias de mulheres queassumem o sexo como pro-fissão silenciam diante daviolência física e psicológi-ca.

"Nossa pesquisa está vol-tada para essa relação entreas profissionais do sexo eseus clientes, sem deixar, éclaro, de abordar outros de-talhes no cotidiano da vi-da dessas mulheres. Mas, is-so só poderei divulgar quan-do o estudo estiver pronto,no fim de agosto", explica

Carlos Moura.Para conhecer a fundo

o ambiente em que estãoinseridas as garotas de pro-grama que atuam no bair-ro, o pesquisador fez diver-sas entrevistas com as mu-lheres. "Fica evidente tam-

bém que há uma resistên-cia por parte das garotascom homens que possamtrazer problemas aos mo-radores. Elas não gostamdos que chegam para bagun-çar ou fazer algo que possacausar apreensão entre as fa-mílias que moram no lu-gar", ressalta.

Um mergulho na vida das garotas de programa

A gente só quer

tranquilidade.

Só isso!’

MORADOR

do Alto do Louvor, que prefere o anonimato

Pelo menos 90% do dinheiro

que as profissionais do sexo

ganham com os programas

vai para a compra de crack’

CARLOS MOURA

Pesquisador

Fred Veras

Prostituição resiste nas ruas do bairro, embora

em decadência

Droga e sexo em pleno dia no Alto do LouvorINSEGURANÇA

Uso de drogas por grupos de homens e mulheres durante o dia deixa moradores apreensivos

ESDRAS MARCHEZANDa Redação

A relaçãodo bairrocom umaépoca do pas-sado em quea prostitui-

ção virou marca da área encra-vada entre o Bom Jardim e oCentro traz, até hoje, ares demarginalização e repúdio paraquem vive no Alto do Louvor.O passado ainda reflete no pre-sente, embora o perfil de seushabitantes tenha mudado. O co-mércio do prazer persiste, masdivide espaço com situações eproblemas comuns das "casasde família". Mas, lidar com opassado do bairro não tem si-do fácil para alguns morado-res da área, principalmente de-pois que a prostituição se aliouao tráfico de drogas.

Os moradores são unânimesem afirmar que o tráfico de dro-gas começa a tomar conta dedeterminados pontos do bairro,antes tomados pelas garotas deprograma. Em alguns, tráfico eprostituição dividem a mesmaesquina. A unanimidade se re-pete quando os denunciantes fa-zem um pedido: o anonimato."Todo dia a gente vê o pessoalfumando crack por aqui, e mos-trar a cara pode ser perigoso pa-ra quem dá de cara todos os diascom essas pessoas", afirma ummorador do bairro.

De fato, o uso de drogaspor parte de mulheres e ho-mens no Alto do Louvor já nãoespera mais o escurecer. Num

Abaixo-assinado

pedindo atuação da Polícia no combate ao

problema está sendo

feito por moradores

do bairro; mais

de 300 pessoas já assinaram

Mulheres fumam crack à tarde em ruas do Alto do Louvor

Fred Veras

Moradores afirmam que bairro está sendo usado como ponto de encontro de usuários

Fred Veras

fim de tarde da semana passa-da, a equipe de reportagem doDE FATO flagrou mulheres fa-zendo de um canto de paredeem uma das ruas do Alto doLouvor ponto de encontro pa-ra o consumo de crack. A pre-sença da reportagem não ini-be as usuárias, que passam amostrar à equipe o cachimbousado no consumo da droga.

"Pelo menos 90% do dinhei-ro que as profissionais do sexodo Alto do Louvor recebem dosprogramas hoje vai para a com-pra do crack. Grande parte de-las virou usuária da droga", afir-ma Carlos Moura, historiadore estudante do curso de Direi-to da Uern, que realiza uma pes-quisa sobre a violência pratica-da contra as garotas de progra-ma que atuam naquele bairro.

Entre os moradores o me-do domina. "O que se pode es-perar de uma pessoa que está

fazendo uso desse tipo de coi-sa (crack)? E pior é que quan-do faltar dinheiro para com-prar a droga, o que eles fazem?Assaltam, roubam, tudo paraconseguir dinheiro. Nosso me-do é que os moradores fiquemreféns dessa situação", comen-ta um morador. Ele conta quemuitas das pessoas que moramno local já organizaram umabaixo-assinado - com mais de300 assinaturas até o momen-to -, pedindo providências aoscomandos do II Batalhão daPolícia Militar (BPM), da De-legacia Regional de Polícia Ci-vil e da delegacia da Polícia Fe-deral na cidade. A intenção éque os órgãos atuem de formaa evitar que as ruas do bairrocontinuem a servir de pontospara consumo de drogas emgrupo. "A gente só quer tran-quilidade. Só isso", afirma umamoradora.