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InstitutoTecnológicodeAeronáutica-SP 26e27.10.2017
13º Congresso Brasileiro
de Sistemas
ISSN:2446-6700
ALFABETIZAÇÃO MIDIÁTICA E INFORMACIONAL: COMPETÊNCIAS PARA UM MUNDO COMPLEXO E
CONTRADITÓRIO
Aline Pimenta Nascimento Marinês Santana Justo Smith Uni-FACEF Centro Universitário Municipal
de Franca Uni-FACEF Centro Universitário Municipal
de Franca [email protected] [email protected]
Resumo
A dinâmica tecnológica do mundo contemporâneo criou a necessidade de novas competências. A UNESCO, identificando essa necessidade, ao abordar o impacto da tecnologia nos meios de comunicação, desenvolveu a Alfabetização Midiática e Informacional (AMI) com o intuito de contribuir para uma conduta mais reflexiva, ética e efetiva das pessoas em seus diversos contextos. Dentre os vários tipos, contemplados nesse conceito, destaca-se a alfabetização publicitária. Sendo esta, de extrema relevância para uma sociedade vulnerável às pressões midiáticas do consumo exacerbado, sem a devida preocupação com as consequências futuras. Este estudo de caráter exploratório tem por objetivo discutir, à luz da visão sistêmica, a contribuição da AMI, como uma nova competência para reflexão e construção de comportamentos socialmente responsáveis para com o meio ambiente e para com as futuras gerações. Para tanto, a pesquisa bibliográfica e documental fundamentam as discussões arroladas e demonstram a relevância de novas competências para um mundo problemático. Palavras-Chave: Alfabetização Midiática e Informacional, Mídia e Publicidade, Visão Sistêmica.
Abstract
The technological dynamics of the contemporary world created the need for new competencies. UNESCO identifying this need, in addressing the impact of technology in the media, developed Media and Information Literacy (AMI) with the aim of contributing to a more reflexive, ethical and effective conduct of people in their different contexts. Among the various types contemplated in this concept, advertising literacy stands out. This being of extreme relevance to a society vulnerable to the media pressures of exacerbated consumption, without appropriate concern for future consequences. This exploratory study aims to discuss, under the prism of the systemic vision, the contribution of the AMI as a new competence for reflection and construction of socially responsible behavior towards the environment and for future generations. In order to do so, the bibliographic and documentary research support the
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discussions listed and demonstrates the relevance of new competencies to a problematic world. Keywords: Media and Information Literacy, Media and Advertising. Systemic Vision.
Introdução
O mundo está passando por uma série de transtornos. Alertas em torno dos altos
níveis de poluição, esgotamento de recursos naturais e desaparecimento de espécies estão
cada vez mais frequentes. Nesse cenário, o avanço tecnológico é apontado como um dos
principais responsáveis por essas transformações. Visto que os recursos tecnológicos têm
impactado de maneira significativa a forma como os seres humanos vivem, trabalham e se
relacionam. Assim, apesar de a tecnologia também oferecer benefícios, seu uso
indiscriminado tem ocasionado prejuízos para o meio ambiente e para a vida na Terra.
Tendo em vista que a humanidade não se encontra totalmente preparada para lidar
com essa revolução tecnológica, faz-se necessário o desenvolvimento de novas competências
a fim de contribuir para o uso consciente da tecnologia por toda a sociedade.
Nesse contexto, diante do fortalecimento das Tecnologias de Informação e
Comunicação (TICs), a UNESCO preocupada com o impacto da tecnologia, mais
especificamente nos sistemas de comunicação, elaborou uma metodologia baseada em um
conjunto de competências para promover o empoderamento dos cidadãos no acesso, uso e
compartilhamento de informações e conteúdos midiáticos. Assim, a alfabetização midiática e
informacional (AMI) procura oferecer subsídios para que os cidadãos desenvolvam uma
conduta mais crítica, ética e efetiva em suas atividades pessoais, sociais e profissionais.
Essa preocupação da UNESCO é assertiva, pois a mídia e a publicidade são os
principais indutores ao consumo exacerbado na sociedade contemporânea, e este, por sua vez,
é visto como um dos responsáveis pela situação de instabilidade em que se encontra o meio
ambiente, atualmente.
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Nesse sentido, o presente estudo tem por objetivo discutir, à luz da visão sistêmica, a
contribuição da AMI, como uma nova competência para reflexão e construção de
comportamentos socialmente responsáveis para com o meio ambiente e para com as futuras
gerações. Para tanto, em relação aos procedimentos metodológicos, as discussões
fundamentam-se na pesquisa bibliográfica e documental. Ademais, o caráter exploratório
configura este estudo, visto que se busca arrolar discussões teóricas de um tema ainda pouco
discutido na literatura, que são as inter-relações da alfabetização midiática e informacional
em uma sociedade ideologicamente vulnerável a valores imediatistas do consumo
exacerbado, impactando de forma sistêmica em diversas áreas da sociedade presente e futura.
Visão sistêmica para um mundo complexo e contraditório
O planeta tem vivido uma crise sem precedentes. O medo e a incerteza pairam sobre
todas as partes do globo. Seja pelo aumento da intolerância ideológica e religiosa, expressado
no acirramento dos conflitos armados no Oriente Médio e recorrentes atentados terroristas em
vários países da Europa. Seja pelo estremecimento das relações internacionais com a
ascensão de Donald Trump à presidência do país mais influente do mundo, Estados Unidos
da América, e seu polêmico discurso eleitoral. Ou ainda, pela crise ética e moral que não é
exclusiva, mas que atualmente assola principalmente o Brasil, em seus diversos escândalos
de corrupção e desvios de recursos. Outro fator alarmante é a corrida armamentista entre as
nações, fator preocupante, sobretudo pelo elevado poder de destruição em massa que as
armas nucleares apresentam, ao mesmo tempo em que é observado constantes provocações
entre essas potências. Nesse cenário instável, uma simples tomada de decisão pode culminar,
em um curto espaço de tempo, no extermínio de grande parte do planeta.
Enfim, o mundo está mergulhado em
[...] uma crise complexa, multidimensional, cujas facetas afetam todos os aspectos de nossa vida — a saúde e o modo de vida, a qualidade do meio ambiente e das relações
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sociais, da economia, tecnologia e política. É uma crise de dimensões intelectuais, morais e espirituais; uma crise de escala e premência sem precedentes em toda a história da humanidade. Pela primeira vez, temos que nos defrontar com a real ameaça de extinção da raça humana e de toda a vida no planeta (Capra, 2014, 21).
Essa ameaça de extinção é real não apenas pela questão nuclear, mas principalmente
pela condição de desequilíbrio e instabilidade em que se encontra o meio ambiente,
atualmente.
Nesse contexto, é sabido que o discurso sobre o impacto negativo das ações humanas
no meio ambiente começou a ganhar relevância na década de 1970, tendo a Conferência das
Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano como um dos principais marcos. O
documento resultante desse encontro alertava para os patamares danosos de poluição do ar,
da água, da terra e contaminação dos seres vivos; grande instabilidade no equilíbrio ecológico
da biosfera; extinção e esgotamento de recursos não renováveis e o surgimento de graves
deficiências, com reflexos na saúde física, mental e social do ser humano (ONU, 1972).
Além disso, o sistema econômico vigente obcecado pelo crescimento e expansão tem
intensificado o uso da tecnologia em busca de um aumento expressivo de produtividade e,
consequentemente, vem transformando o meio ambiente. Essa nova realidade tecnológica
trouxe fontes de estresse físico e psicológico à vida cotidiana da maioria das pessoas, que
passaram a conviver diariamente com congestionamento de tráfego, ruídos irritantes,
poluentes químicos, riscos de radiação e envenenamento da água e do ar devido ao descarte
irregular de resíduos químicos tóxicos, etc. (Capra, 2014).
Em busca de lucros crescentes, foram desenvolvidas verdadeiras sociedades de
consumo, que induzem à aquisição de uma infinidade de produtos com cada vez menos
utilidade. Entretanto, para a produção desses artigos foram desenvolvidas tecnologias que
envolvem o consumo intensivo de produtos químicos complexos, além de gigantescos
volumes de energia. Desse processo resultam dois grandes problemas. Primeiro, por não se
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mostrar lucrativo, o investimento no tratamento apropriado e na reciclagem dos resíduos
químicos resultantes desse processo produtivo não ocorreu, inicialmente. Por isso, por
décadas a fio, o lixo tóxico industrial foi despejado no solo sem que fossem tomadas as
devidas providências, convertendo-se, hoje, em verdadeiras "bombas-relógio tóxicas”,
espalhadas em milhares de depósitos químicos perigosos. Segundo, a excessiva quantidade de
energia consumida nos processos produtivos é derivada, na maioria das vezes, de
combustíveis fósseis. Com o declínio desses recursos naturais, a própria energia vem se
tornando um recurso cada vez mais escasso e dispendioso. Fato é que os países
industrializados têm explorado ferozmente os recursos oriundos de combustíveis fósseis, e
essa exploração predatória pode vir a causar perturbações ecológicas e um sofrimento
humano sem precedentes (Capra, 2014).
Para Schwab (2015), fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial,
estamos à beira da Quarta Revolução Industrial. Uma revolução capaz de transformar
substancialmente a forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos, diferente de
qualquer coisa já experimentada anteriormente pela humanidade, em virtude de sua escala,
alcance, velocidade e complexidade. Sua principal característica é a fusão de tecnologias
possibilitando a convergência das esferas física, digital e biológica. Dessa forma, na Quarta
Revolução Industrial são previstas transformações em sistemas inteiros de produção,
gerenciamento e governança, além do impacto na saúde e nas relações humanas. E, por ser
imprevisto seu desenrolar, é preciso que o acompanhamento dessas mudanças seja realizado
de forma integrada e abrangente, envolvendo todas as partes interessadas da política global,
os setores público e privado, os organismos não governamentais, a academia e a sociedade
civil (Schwab, 2015).
Clamando a responsabilidade de todos os setores da sociedade, Schwab (2015) afirma
ser imprescindível a adoção de uma visão globalmente compartilhada pautada nas pessoas e
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em valores e objetivos comuns. Para tanto, a compreensão de como a tecnologia está
afetando a vida das pessoas e reformulando os espaços econômicos, sociais, culturais e
humanos é fundamental. Desse modo, faz-se urgente a construção de uma nova consciência
coletiva e moral, a começar pela percepção do impacto de decisões e ações exercidas
enquanto cidadãos, consumidores e investidores. Apesar de suas transformações
exponenciais, essa revolução tecnológica pode ser controlada. A valorização das pessoas e o
investimento na capacitação destas é a chave para moldar a Quarta Revolução Industrial e,
assim, direcioná-la para um futuro que reflita objetivos e valores comuns. (Schwab, 2015).
Schwab (2015) sugere a adoção de uma visão globalmente compartilhada,
corroborando o pensamento de Capra (1996, p. 25) de que é preciso ter “uma visão de mundo
holística, que conceba o mundo todo integrado, e não como uma coleção de partes
dissociadas”. Seu pensamento à luz da teoria sistêmica “considera o mundo em função da
inter-relação e interdependência de todos os fenômenos” (Capra 2014, p. 42). Dessa forma,
“à semelhança de todas as outras criaturas vivas, pertencemos a ecossistemas e também
formamos nossos próprios sistemas sociais. Finalmente, em nível ainda maior, há a biosfera,
o ecossistema do planeta inteiro do qual nossa sobrevivência é profundamente dependente”
(Capra 2014, p. 277).
Portanto, compreender o mundo com o olhar sistêmico é admitir que todos os seres
vivos, dos mais simples aos mais complexos, todos se inter-relacionam de alguma forma e se
afetam mutuamente. Extrapolando essa percepção a níveis globais, é preciso entender que as
“[...] as ações e os investimentos realizados por nações, mesmo as mais fechadas, [...]
[impactam] no restante do mundo” (Marcial, 2015, p. 11).
Por essa razão,
as escolhas sociais vitais com que nos defrontamos já não são locais — opções entre mais estradas, escolas e hospitais —, nem afetam meramente uma pequena parcela da população. São escolhas entre princípios de auto-organização — centralização ou descentralização, intensidade de capital ou intensidade de trabalho, tecnologia pesada
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ou tecnologia branda — que afetam a sobrevivência da humanidade como um todo (Capra, 2014, p. 381). Sendo assim, tendo em vista a amplitude do impacto de suas decisões perante o
mundo, cabe a cada nação a responsabilidade de optar por escolhas mais conscientes em prol
de um futuro melhor para todos, ou seja, a adesão de uma visão globalmente compartilhada,
assumindo valores e objetivos comuns, como defendido por Schwab (2015).
Para tanto, faz-se extremamente necessário que também os processos e as atividades
econômicos passem a ser interpretados pelos pressupostos sistêmicos, visto que os problemas
econômicos atuais são problemas sistêmicos, e interferem nas esferas sociais, culturais e
ecológicas, simultaneamente (Capra, 2014).
O planeta Terra é o mais prejudicado por essa falta de percepção sistêmica. Afinal, os
interesses econômicos, como o crescimento a qualquer preço e o estímulo ao consumo
excessivo, têm afetado a sua capacidade de auto-organização. Sendo um sistema vivo, a
biosfera é capaz de regular o meio ambiente planetário através de uma gigantesca variedade
de processos, tais como os relacionados à composição química e termodinâmica da
atmosfera, o conteúdo salino dos oceanos, entre outros, a fim de que sejam mantidas as
condições ótimas para a manutenção e evolução da vida. Entretanto, por conta da ganância
humana, a Terra tem apresentado uma série de desequilíbrios que interferem diretamente nos
processos auto-organizadores e, consequentemente, pela primeira vez na história, o mundo
defronta-se com uma forte ameaça de extinção da raça humana e de toda a vida no planeta
(Capra, 2014).
Para Sheng (2001), essa realidade é justificada pelas instituições sociais, pelos
sistemas de informação e pelos valores adotados pela sociedade. Segundo o autor,
as atividades humanas são condicionadas pelas instituições sociais. As instituições sociais são baseadas em sistemas de informação que supostamente expressam os valores de uma sociedade. Os sistemas de informação existentes podem refletir valores verdadeiramente impróprios de uma sociedade (tal como desigualdade) ou falharem em realmente
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refletir valores sociais apropriados (tal como a preocupação pelo bem-estar das gerações futuras) (Sheng, 2001, p. 170). Por essa vertente, pode-se dizer que há muita informação quanto à necessidade de se
preservar e cuidar do meio ambiente adotando-se uma mudança de conduta. No entanto, os
sistemas de informação, principalmente através da mídia e da publicidade, expressam valores
inapropriados ao exaltarem o ter em detrimento do ser. Dessa maneira, estimulam o consumo
excessivo e a degradação ambiental, indiretamente. Por isso,
precisamos [...] mudar os valores sociais impróprios existentes, ou modificar os sistemas de informação existentes que falham em expressar valores sociais apropriados. Quando os valores e sistemas de informação forem corrigidos, é preciso então assegurar que as instituições sociais operem à base de sistemas de informação que verdadeiramente exprimam valores representativos e informados, e que sejam nutridos pela sociedade como um todo (Sheng, 2001, p. 170). Fica claro, portanto, a urgência de uma profunda mudança de valores bem como a
reestruturação dos sistemas de informação e educação, como base para o restabelecimento do
equilíbrio e da flexibilidade nas economias, tecnologias e instituições sociais (Capra, 2014).
Importante ressaltar que a reestruturação dos sistemas de informação também implica
no cerceamento e na reorganização da publicidade. Em contra partida aos anúncios que
estimulam e estabelecem altos padrões de consumo, é vital que seja concedido o mesmo
espaço de tempo à informação disponibilizada por órgãos de defesa do consumidor e do meio
ambiente (Capra, 2014). Além disso, considera-se que “as restrições legais à publicidade de
produtos nocivos à saúde, supérfluos e consumidores vorazes de recursos seriam o método
mais eficaz de reduzir a inflação e caminhar ao encontro de um tipo de vida ecologicamente
harmoniosa” (Capra, 2014, p. 399).
Diante disso, faz-se necessária a discussão da publicidade na condição de indutora ao
consumo exacerbado como um dos grandes entraves à adoção de uma visão globalmente
compartilhada, bem como sua contribuição para o aumento da vulnerabilidade da sociedade.
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A estreita relação entre mídia, publicidade e consumo exacerbado
O avanço tecnológico ocorrido nos últimos tempos revolucionou as formas de
comunicação existentes de maneira significativa, possibilitando a transmissão de informações
a um fluxo e velocidade jamais vistos.
A partir desse momento, “as inovações tecnológicas e os novos recursos da mídia
passaram a cumprir papel crucial na vida dos indivíduos, alterando suas formas de agir e
pensar” (Caniato e Rodrigues, 2015, p. 143).
Por essa razão, o conteúdo oferecido pelos meios de comunicação passa a induzir a
construção de valores, regras de comportamento, projeções e imagens simbólicas capazes de
modificar profundamente o modo de vida nas sociedades urbanas modernas (Capra, 2005).
Nesse sentido, Thompson (2011, p. 28) esclarece que “o uso dos meios de
comunicação transforma a organização espacial e temporal da vida social, criando novas
formas de ação e interação, [...]”. Além disso, para o autor, o “[...] o desenvolvimento da
mídia não somente enriquece e transforma o processo de formação do self, como também
produz um novo tipo de intimidade que não existia antes e que se diferencia [...] da interação
face a face” (Thompson, 2011, p. 265).
Para efeito de esclarecimento, “chamamos de “mídia” os meios de comunicação de
massa, em que livro, jornal, revista, rádio, cinema, televisão e internet são considerados os
mais comuns” (Basaglia, 2017, p. 76, grifo da autora). Dentro desse sistema, a publicidade
destaca-se com a finalidade de promover vendas e relações públicas. Por suas características,
apresenta-se como um poderoso e rápido instrumento de se contatar consumidores espalhados
em diferentes áreas geográficas e de diversas classes socioeconômicas (Silva, 2005).
Diante do fortalecimento da publicidade, impulsionado pelo desenvolvimento
tecnológico nos meios de comunicação, Benjamin, Bessa & Marques (2013, p. 48) alertam
para o aumento da vulnerabilidade do consumidor, na medida em que “o mundo virtual
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modificou os hábitos de consumo, mudou o tempo do consumo, agilizou informações e
expandiu as possibilidades de publicidade, agravando os conflitos de consumo e a própria
vulnerabilidade informacional, técnica, fática e jurídica do consumidor”.
Segundo Coelho (2003), o desenvolvimento da publicidade está atrelado ao
desenvolvimento da sociedade de consumo. Consequência do processo de industrialização,
essa sociedade traça suas estratégias de incentivo ao consumo tendo a publicidade como
componente mais importante, sendo essa prática exercida desde o final do século XIX.
Na visão do autor, o papel da publicidade está diretamente ligado ao processo de
construção da sociedade capitalista. Com a expropriação dos meios de produção de posse dos
trabalhadores, como a terra e as ferramentas artesanais, restara a estes tornarem-se
assalariados, prestando serviços para produtores rurais e industriais.
Dessa forma, ficou determinada a impossibilidade dos trabalhadores produzirem seus
próprios meios de subsistência. Assim, a satisfação de suas necessidades e as de seus
familiares condicionou-se à compra de mercadorias. Por esse motivo, os trabalhadores
passaram a depender das empresas produtoras e cada uma delas, por sua vez, começa a criar
estratégias de divulgação visando a convencer os operários a adquirirem os seus produtos e
não os dos concorrentes (Coelho, 2003).
A perda do controle sobre os meios de subsistência representa, também, uma perda
significativa da capacidade (poder) de definição das características destes meios, ou seja, de
agora em diante, as empresas que determinam quais são as necessidades e como elas devem
ser satisfeitas. Desse modo, “as necessidades perdem seus atributos genéricos, universais,
manifestando-se sempre de forma singularizada” (Coelho, 2003, p. 7).
Com o poder de definir necessidades de posse da sociedade capitalista de consumo
fica difícil [quase impossível] “[...] saber o que é uma necessidade real e o que é uma
necessidade criada pela publicidade” (Coelho, 2003, p. 7), afinal, novas necessidades são
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geradas a todo o momento. Por sua vez, esse excesso de necessidades engendrado pela
publicidade provoca confusão, intensificando a vulnerabilidade do consumidor.
O pensamento de Coelho (2003) sobre as ações da sociedade capitalista de consumo
corrobora a percepção de Guattari (2001) sobre o Capitalismo Mundial Integrado, por ambos
concentrarem-se no campo da subjetividade, algo bem mais profundo e diretamente
relacionado à geração de novas necessidades.
Dessa maneira, há o processo de geração de novas necessidades paralelamente ao
processo retroativo dessas, no qual se busca a autorreprodução do modo de produção
capitalista e todo o sistema social/político subjacente. Sendo originados das necessidades dos
consumidores, esses padrões são aceitos sem resistência (Adorno e Horkheimer, 1985).
Na perspectiva de Guattari e Rolnik (2000, p.26), o Capitalismo Mundial Integrado é
administrado por forças sociais que “compreenderam que a produção de subjetividade talvez
seja mais importante do que qualquer tipo de produção, mais essencial até do que petróleo e
energias”. Sendo assim, é possível capitalizar o não capitalizável, ou seja, seres, valores,
modos de ser e de fazer, atitudes, etc.. Através de investimentos culturais e tecnológicos,
subjetividades são produzidas sutilmente (Pelbart, 2003).
Nesse sentido, Tavares e Vargas (2017), tendo como referência a conceituação de
Império em Pelbart (2003), observam que o capitalismo, para manter-se e expandir-se,
necessitaria de capturar não mais territórios físicos, mas sim, o desejo de milhões de
consumidores. Desse modo, conectar o desejo dos consumidores na máquina de consumo,
garantiria ao fluxo de capital circular, instaurando uma nova e promissora relação entre
capitalismo e subjetividade. Com o auxílio da mídia e da publicidade, obter-se-ia a
colonização do inconsciente.
Perante essa colonização, Bauman (2007) alerta para a difusão de padrões de
consumo em todos os aspectos e atividades da vida, penetrando o marketing em áreas da
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existência que até pouco tempo se encontravam fora dos domínios das trocas monetárias e,
que não eram contabilizadas pelas estatísticas do PIB. Consequentemente, de uma maneira
sutil e cuidadosamente disfarçada os consumidores vão sendo induzidos a transformarem-se
em mercadorias, adquirindo aos poucos e para sempre as capacidades esperadas e exigidas de
uma mercadoria vendável (Bauman, 2008).
Logo,
tudo o que é produzido pela subjetivação capitalística – tudo o que nos chega pela linguagem, pela família, e pelos equipamentos que nos rodeiam não é apenas uma questão de ideia, não é apenas uma transmissão de significações por meio de enunciados significantes. Tampouco se reduz a modelos de identidade, ou a identificações com polos maternos, paternos, etc.. Trata-se de sistemas de conexão direta entre as grandes máquinas produtivas, as grandes máquinas de controle social e as instâncias psíquicas que definem a maneira de perceber o mundo (Guattari e Rolnik, 2000, P.27). Ademais, Tavares e Vargas (2017) analisam os modos de produção capitalísticos
como integrantes de importantes sistemas de submissão, habilmente dissimulados através da
articulação dos sistemas de significação nos quais estão inseridos os indivíduos, como o
campo da cultura e do consumo. “Em processos complementares, enquanto o capital se
ocuparia da sujeição econômica, a cultura se ocuparia da sujeição subjetiva, integrando todos
os níveis da produção e do consumo” (Tavares e Vargas, 2017, p. 157).
Adorno e Horkheimer (1985) abordam o estreitamento entre a esfera econômica e
cultural. Ao cunhar o termo “indústria cultural” os autores ressaltam a mercantilização da
cultura tendo o objetivo de coibir o pensamento reflexivo e contribuir para a dominação do
modo capitalista através da padronização e reprodução de comportamentos sugeridos.
Portanto, a indústria cultural através da padronização de subjetividades elimina todas
as diferenças e possibilidades de dissensões. Assim, a consciência dos indivíduos é produzida
em grande escala e todos tornam-se homogeneizados: todos assistem aos mesmos programas,
consomem os mesmos produtos, usam as mesmas roupas e, de maneira estrutural, acabam
por adotar os mesmos pensamentos, sentimentos, desejos e atitudes (Caniato e Santos, 2003).
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Por conseguinte, a indústria cultural atua nos indivíduos no âmbito da semiformação,
produzindo sujeitos “novos”, sujeitados ao processo de reprodução da sociedade capitalista
em sua configuração vigente (Maar, 2001).
Em relação à produção de subjetividades voltadas ao consumo, Capra (2005)
identifica como valor central da sociedade capitalista contemporânea – ganhar dinheiro –
atrelado ao reforço constante de infinitas mensagens publicitárias de que a acumulação de
bens materiais é o caminho que conduz à felicidade, o objetivo de toda a existência.
Nessa lógica capitalista, a felicidade deve ser instantânea, a satisfação das
necessidades deve ser imediata. A regra é consumir sem esperar, não renunciar a nada.
Assim, “as políticas do futuro radiante foram sucedidas pelo consumo como promessa de um
futuro eufórico” (Lipovetsky, 2004, p.60-61).
Entretanto,
a sociedade de consumo consegue tornar permanente a insatisfação. Uma forma de causar esse efeito é depreciar e desvalorizar os produtos de consumo logo depois de terem sido alçados ao universo dos desejos do consumidor. Uma outra forma, ainda mais eficaz, no entanto, se esconde da ribalta: o método de satisfazer toda necessidade/desejo/vontade de uma forma que não pode deixar de provocar novas necessidades/desejos/vontades. O que começa como necessidade deve terminar como compulsão ou vício. E é isso que ocorre, já que o impulso de buscar nas lojas, e só nelas, soluções para os problemas e alívio para as dores e a ansiedade é apenas um aspecto do comportamento que não apenas recebe a permissão de se condensar num hábito, mas é avidamente estimulado a fazê-lo (Bauman, 2007, p. 106).
Nesse contexto, o consumo é veiculado como a única fonte de satisfação, única
solução para os problemas e anseios da vida moderna. Uma armadilha para os consumidores,
pois ao se depararem novamente com a insatisfação, acabam entrando em um círculo vicioso
e compulsivo.
Tal é a perversidade da lógica capitalista que a sociedade de consumo não reconhece
distinções entre classes. Dessa maneira, em qualquer lugar do mundo, o pobre é forçado a
utilizar seus poucos recursos com objetos de consumo sem sentido, a fim de adequar-se aos
padrões “ideais” e evitar a humilhação social e o sentimento de inadequação (Bauman, 2007).
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Diante desse cenário e considerando as condições atuais do planeta apresentadas na
seção anterior, entende-se que “a forma atual do capitalismo global é insustentável dos
pontos de vista ecológico e social, e por isso não é viável a longo prazo” (Capra, 2005, p.
176). Portanto, “o grande desafio do século XXI é da mudança do sistema de valores que está
por trás da economia global, de modo a torná-lo compatível com as exigências da dignidade
humana e da sustentabilidade ecológica” (Capra, 2005, p. 268).
No caminho a ser percorrido, a educação desponta como recurso imprescindível para
a sociedade contemporânea. Somente a educação é capaz de atribuir liberdade de
pensamento, discernimento, sentimentos e imaginação a toda a sociedade. Esses requisitos
são essenciais para que os indivíduos permaneçam, tanto quanto possível, donos de seu
próprio destino (Delors, 1998).
Além disso, através da educação é possível construir um modo de vida sustentável e
globalmente compartilhado – que possa estabelecer a harmonia entre seres vivos, relações
sociais, meios produtivos e o meio ambiente –, respeitando a condição de inter-relação e
interdependência a que se submetem todos os seres vivos e as nações.
Para tanto, a alfabetização midiática e informacional procura oferecer subsídios para a
construção de uma sociedade mais responsável e menos vulnerável aos apelos midiáticos do
consumo exacerbado, priorizando a adoção de valores apropriados e objetivos comuns.
Alfabetização midiática e informacional: competências para um mundo problemático
Como já mencionado, o restabelecimento do equilíbrio e da flexibilidade nas
economias, tecnologias e instituições sociais está vinculado a uma reestruturação dos
sistemas de informação e educação (Capra, 2014). Visto que a realidade da sociedade
contemporânea exige cada vez mais de seus integrantes habilidades para lidar com uma
imensa gama de informações que permeiam diariamente sua vida cotidiana, saber lidar com o
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fluxo acelerado de informações e, principalmente, dar-lhes significado e interpretá-las, é
tarefa imprescindível dos sujeitos modernos (Guareschi, 2000).
Para efeito de conceituação, entende-se por informação um instrumento capaz de
transformar a consciência dos indivíduos e a de seu grupo social, sendo capaz de produzir
conhecimento, modificando seu estoque mental de saber e trazendo benefícios para seu
aprimoramento e para a sociedade em que vive (Barreto, 2002).
Para Araújo (1994, p. 84) a informação é a mais poderosa força de transformação do
indivíduo. Segundo a autora, “[o] poder da informação, aliado aos modernos meios de
comunicação de massa, tem a capacidade ilimitada de transformar culturalmente o homem, a
sociedade e a própria humanidade como um todo”.
Nesse sentido, Smit e Barreto (2002) analisam a tecnologia como facilitadora de
maior e melhor acesso às informações disponíveis. Todavia, é preciso considerar que “a
evolução tecnológica [...] aumentou a necessidade de cada vez mais qualificações e
competências humanas” (Piketty, 2014, p. 340). Por isso, diante da enorme quantidade de
informações existentes, Smit e Barreto (2002) asseveram a necessidade de qualificação por
parte dos receptores da informação (consumidores). Para eles, é preciso desenvolver
competências que possibilitem uma melhor assimilação da informação, para que esta, bem
compreendida, traga benefícios para o aprimoramento pessoal e dos espaços de convivência.
Fleury e Fleury (2001) esclarecem que a definição de competência está relacionada a
um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes, ou seja, um conjunto de capacidades
humanas. Dessa forma, a competência é considerada como um estoque de recursos que o
sujeito detém a fim de realizar um alto desempenho.
Tendo em vista o conceito de competência associado ao poder da informação, fica
evidente a relevância da competência em informação na sociedade contemporânea, afinal, ela
está direcionada a “[...] um saber agir responsável e reconhecido, que implica mobilizar,
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integrar, transferir conhecimentos, recursos, habilidades, que agreguem valor, direcionados à
informação e seu vasto universo” (Fleury e Fleury, 2000 apud Dudziak, 2003, p. 24).
Para Belluzzo (2010, p. 23) a competência em informação
[...] constitui-se em processo continuo de interação e internalização de fundamento conceituais, atitudinais e de habilidades específicas como referenciais à compreensão da informação e de sua abrangência, em busca da fluência e das capacidades necessárias à geração do conhecimento novo e sua aplicabilidade ao cotidiano das pessoas e das comunidades ao longo da vida.
Nessa perspectiva, considera-se como um sujeito competente em informação aquele
que adota “um comportamento informacional apropriado para identificar, mediante qualquer
canal ou meio, a informação adequada às suas necessidades informacionais, levando ao uso
sábio e ético da informação na sociedade” (Johnston e Webber, 2003, p. 348).
Ainda de acordo com Belluzzo (2010), as pessoas competentes em informação são
capazes de identificar suas necessidades informacionais e estabelecer onde e como acessar
efetivamente a informação necessária. Ademais, são passiveis de avaliar a relevância e a
pertinência do conteúdo acessado, conseguindo organizar e transformar a informação em
conhecimento. Dessa maneira, aprendem a aprender de forma contínua e autônoma.
É preciso destacar que a competência em informação é conquistada através da
educação. E por isso, em consonância com o pensamento de Belluzzo (2010), Delors (1998),
no Relatório preparado para a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (UNESCO) sobre a educação para o século XXI, preconiza ser a capacidade de
aprender a aprender um dos pilares da educação ao longo de toda a vida, ou seja, um processo
contínuo e permanente de educação.
Para Delors (1998), a educação ao longo de toda a vida é o meio de se chegar ao
exercício de uma cidadania ativa. Procurando contribuir para que cada indivíduo seja
autônomo e saiba conduzir o seu destino, num mundo onde a rapidez das mudanças associado
ao fenômeno da globalização modifica a relação entre indivíduos, espaço e tempo.
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Levando em conta a velocidade das mudanças tecnológicas e as preocupações da
UNESCO em construir uma educação ao longo de toda a vida, na década de 1960 a expansão
dos veículos de comunicação de massa, principalmente a televisão, gerou grandes
inquietações. Para a UNESCO, ficou latente a necessidade de uma educação que permitisse a
capacitação crítica para fazer frente a essa nova modalidade de comunicação (Gonnet, 2004).
Dessa maneira, instituiu-se a preocupação com a educação direcionada para as mídias,
inicialmente denominada mídia-educação. Assim, segundo o conceito elaborado pela
UNESCO em 1979, a mídia-educação compreende:
Todas as maneiras de estudar, aprender e ensinar em todos os níveis (...) e em todas as circunstâncias, a história, a criação, a utilização e a avaliação das mídias enquanto artes práticas e técnicas, bem como o lugar que elas ocupam na sociedade, seu impacto social, as implicações da comunicação mediatizada, a participação, a modificação do modo de percepção que elas engendram, o papel do trabalho criativo e o acesso às mídias (UNESCO, 1984 apud Bévort e Belloni, 2009, p. 1086). Com o passar do tempo, o termo mídia-educação evoluiu para letramento,
alfabetização ou competência midiática utilizados na Espanha e nos países latino-americanos
e a expressão media literacy é mais recorrente na língua inglesa (Wilson et al, 2013).
Importante ressaltar, a UNESCO (2016) prioriza o termo alfabetização ao analisar sua
evolução ao longo das últimas décadas. Em resposta ao maior poder e impacto da
informação, o termo adquire aspectos situacional, pluralista e dinâmico. Dessa forma, os
indivíduos passam a necessitar de desenvolver múltiplas alfabetizações tais como:
“ciberalfabetização, alfabetização digital, e-alfabetização, alfabetização informacional,
alfabetização midiática, alfabetização em notícias, alfabetização tecnológica ou de TIC e
muitas outras” (UNESCO, 2016, p. 27).
Nessa linha de pensamento, a UNESCO (2016, p. 29) entende que a expressão
alfabetização midiática está relacionada com a “[...] habilidade de compreender, selecionar,
avaliar e usar as mídias como fornecedor, processador ou produtor de informação”.
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Para García-Ruiz, Ramírez-García e Rodríguez-Rosell (2014), a educação midiática,
tendo por base a tecnologia, é fundamental para a formação de indivíduos mais criativos,
participativos e com mais responsabilidade e visão crítica. Além disso, com a alfabetização
midiática esses indivíduos estariam mais aptos a refletir sobre suas relações com o meio em
que vivem e a desenvolver valores apropriados e princípios éticos.
Diante disso, as autoras indicam a relevância de se introduzir dentro da alfabetização
midiática aspectos morais que possam contribuir para o discernimento frente às decisões de
consumo a serem tomadas. Seria possível, assim, buscar um equilíbrio entre as necessidades
verdadeiras e as necessidades subjetivamente engendradas, um equilíbrio entre a razão e a
emoção (García-Ruiz, Ramírez-García e Rodríguez-Rosell, 2014).
Referindo-se à realidade atual de como a informação é produzida e consumida, as
autoras utilizam o termo ‘prosumidor’, cunhado por McLuhan na década de 1970, para
afirmar que na sociedade contemporânea é possível ser simultaneamente produtor e
consumidor de informação, assumindo papel de protagonista diante dos novos meios de
comunicação (García-Ruiz, Ramírez-García e Rodríguez-Rosell, 2014).
Portanto, mediante a alfabetização midiática, um sujeito prosumidor adquire uma
gama de competências que o capacita para o desempenho do papel de consumidor de
recursos audiovisuais e o de produtor de mensagens e conteúdos de forma autônoma e
criativa (García-Ruiz, Ramírez-García e Rodríguez-Rosell, 2014).
Considerando a relevância dos temas competência em informação e a alfabetização
midiática e a estrita ligação entre ambas, a UNESCO nas últimas décadas tem optado pela
junção dos termos em um conceito composto: Alfabetização Midiática e Informacional
(AMI). Desse modo, o novo conceito passa a assumir a seguinte definição:
[...] um conjunto de competências que empodera os cidadãos para acessar, recuperar, compreender, avaliar, usar, criar e compartilhar informações e conteúdos midiáticos de todos os formatos, usando várias ferramentas, com senso crítico e de forma ética e
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efetiva, para que participem e engajem-se em atividades pessoais, profissionais e sociais (UNESCO, 2016, p. 29). Logo, o objetivo principal da AMI é promover o empoderamento das pessoas para
que exerçam seus direitos universais e suas liberdades fundamentais. Assim como a liberdade
de opinião e de expressão, e para que procurem transmitir e receber informações,
aproveitando as oportunidades emergentes de maneira mais eficaz, ética e eficiente, em busca
do benefício de todos os indivíduos (UNESCO, 2016).
Dessa maneira, a AMI pode ser concebida como um modelo evolutivo que tem como
origem a relação entre as dimensões tecnológica, política, econômica, social e cultural.
Ademais, a AMI, também, está muito interligada à diversidade cultural e à diversidade
linguística que permeia as competências culturais, auxiliando a promoção do diálogo
intercultural (UNESCO, 2016).
Nessa perspectiva, a UNESCO (Wilson et al, 2013) entende que a definição da AMI,
reúne em apenas um conceito os vários conceitos inter-relacionados dentro das diversas
noções de alfabetização existentes, tais como alfabetização informacional, alfabetização
midiática, alfabetização em TIC e alfabetização digital, entre outras. Na Figura 1 se encontra
a representação dessas variações.
Figura 1 – A ecologia da AMI: noções de AMI
Fonte: Adaptado de Wilson et al, 2013, p. 19
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Nesse contexto, os diferentes tipos de alfabetização se complementam e se sobrepõem
na medida em que se referem aos aspectos apresentados na Figura 2.
Figura 2 – Aspectos de convergência entre os tipos de alfabetização
Fonte: Adaptado de UNESCO, 2016.
Analisando os aspectos de convergência entre os diversos tipos de alfabetização
contemplados no conceito de alfabetização midiática e informacional (AMI) entende-se que
há uma preocupação com a promoção dos direitos humanos e liberdades fundamentais,
Aspectos de convergência Tipos de alfabetização
Objetos de interesse
A alfabetização informacional está relacionada a como são gerenciados os dados e as informações de qualquer formato, usando diferentes ferramentas tecnológicas. A alfabetização midiática mantém sua ênfase nas mídias para uma boa democracia e um bom desenvolvimento. [...] Existe, atualmente, uma convergência teórica e empírica, mesclando alfabetização midiática, alfabetização informacional, alfabetização em TIC e alfabetização digital, o que exige um novo conjunto que combine competências e mecanismos colaborativos.
Abordagem com base em
direitos
Todos os quatro tipos de alfabetização estimulam a promoção dos direitos humanos e liberdades fundamentais, especialmente a liberdade de expressão e o acesso à informação (consulte a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas, Artigo 19). A alfabetização midiática está especificamente relacionada à liberdade de expressão, liberdade de imprensa e pluralismo midiático, ao passo que a alfabetização informacional ressalta o direito de buscar, receber e transmitir informações e ideias por meio de qualquer mídia sem considerar fronteiras. A alfabetização digital se refere às informações (digitais) e à abertura, à pluralidade, à inclusão e à transparência de qualquer TIC, em particular, na internet.
Pensamento crítico e reflexivo
As alfabetizações mencionadas enfatizam a avaliação crítica das informações e do conteúdo midiático, além de exigirem uma compreensão das funções dos provedores de mídia e informação (produtos, serviços e processos) na sociedade.
Produção de competências
Todas as alfabetizações têm em comum o objetivo de produzir a habilidade nas pessoas de acessar, avaliar, criar e compartilhar as informações e as mensagens da mídia ao usar vários meios, incluindo as TIC. Embora seja importante reconhecer as diversas origens desses modelos, elas claramente são compatíveis entre si e se complementam.
Impacto na vida pessoal,
social e profissional
Os vários tipos de alfabetização já referidos são essenciais para os cidadãos – crianças, jovens, mulheres e meninas, pessoas com necessidades especiais, grupos indígenas e minorias étnicas –, pois permitem que eles se mantenham informados, envolvidos e engajados no desenvolvimento social, econômico e político como colaboradores iguais. As informações, os conteúdos midiáticos e quaisquer produtos/serviços digitais também exercem uma grande influência na vida pessoal, social e profissional. A alfabetização midiática possui fortes conotações sociais, enquanto que a alfabetização informacional está relacionada à criação e ao uso bem-informado do conhecimento e dos processos de aprendizagem. Esses dois conceitos incluem a noção da AMI para o lazer, principalmente ao usar as TIC digitais.
Abordagem interdisciplinar
A alfabetização informacional e a alfabetização midiática ajudam a fornecer as competências necessárias para a vida no século XXI e a necessidade de lidar com enormes volumes de dados, informações e mensagens de mídia viabilizados por diferentes plataformas e provedores de informação e comunicação. É uma atitude lógica combinar esses modelos (alfabetização midiática e alfabetização informacional) com outros modelos complementares, como a alfabetização em TIC e a alfabetizaçãodigital, que podem ser usados para desenvolver um conjunto de competências necessárias no novo ambiente tecnológico, além de poderem ser viabilizadas conjuntamente. Essa integração pode ajudar a promover a participação das pessoas nas sociedades do conhecimento.
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especialmente a liberdade de expressão e o acesso à informação a todos os cidadãos –
crianças, jovens, mulheres e meninas, pessoas com necessidades especiais, grupos indígenas
e minorias étnicas – na intenção de que se mantenham informados, envolvidos e engajados
como colaboradores ativos no desenvolvimento social, econômico e político. Por essa razão,
a alfabetização informacional e a alfabetização midiática ajudam a fornecer as competências
necessárias para a vida no século XXI frente a necessidade de lidar com enormes volumes de
dados, informações e mensagens de mídia veiculadas nas diferentes plataformas e provedores
de informação e comunicação (UNESCO, 2016).
Em relação às competências, é importante destacar que o Marco de Avaliação da AMI
propõe 12 competências principais, todavia a UNESCO não estabelece um padrão comum de
competências em AMI, mas oferece sugestões às instituições nacionais para elas decidam
sobre o padrão nacional das competências em AMI mais adequado (UNESCO, 2016).
Essas 12 competências propostas pelo Marco de Avaliação da AMI, distribuem-se em
3 subáreas de acordo como os componentes: acesso, avaliação e criação. Com base nesses
componentes, uma série de atividades relacionadas à AMI foi definida e recomendada
(UNESCO, 2016). Para melhor entendimento, disposta na página seguinte, a Figura 3
apresenta um resumo dos componentes, das atividades e das competências em AMI.
Nesse sentido, Alexander (2007 apud Grizzle, et al, 2016, p. 165) ressalta que a AMI
pode estimular capacidades fundamentais e promover a liberdade de expressão em múltiplas perspectivas, protegendo, assim, culturas vulneráveis daquilo que alguns especialistas chamam de “colonização das mentes”, como quando modos de consumo e formas de viver [...] são adotados sem senso crítico [...]”. Diante desse cenário, dentre os diversos tipos de alfabetização contemplados pela
AMI, o presente estudo destaca a alfabetização publicitária como de extrema relevância para
a sociedade atual.
Visto que a publicidade exerce influência em todos os aspectos da vida, é preciso uma
alfabetização midiática e informacional com foco na publicidade para que os indivíduos se
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tornem capacitados a se posicionarem de forma crítica e reflexiva perante a avalanche de
‘convites’ ao consumo exacerbado constantemente divulgados pelos meios de comunicação.
Figura 3 – Resumo dos componentes, das atividades e das competências em AMI
Fonte: UNESCO, 2016, p. 59
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Esse posicionamento reflexivo é de extrema necessidade porque a publicidade
seleciona programas segundo seus princípios e valores, e estes raramente oferecem um
conteúdo culturalmente enriquecedor. Desse modo, há a possibilidade de confundir ou até
mesmo iludir aqueles com menor capacidade de reflexão crítica. Por isso, acredita-se que
grandes companhias de publicidade muito raramente irão patrocinar programas de fundo
crítico e ideológico como as atividades da indústria militar, a denúncia do perigo de plantas
transgênicas, a degradação ambiental, etc. (Guareschi, 2000).
Assim sendo, a mercê de um conteúdo pouco instrutivo, a sociedade acaba por não
informar-se adequadamente sobre importantes questões. Como por exemplo, informar-se de
que “a utilização excessiva dos recursos naturais, o grande desenvolvimento tecnológico e o
consumismo exacerbado, dentre outros fatores, geraram o desgaste do meio ambiente
natural” (Lemos, 2014, p.78). E que este desgaste coloca em cheque tanto a sua
sobrevivência quanto a do planeta inteiro.
Portanto, faz-se mais do que urgente o investimento em educação de qualidade, além
de ser condição indispensável para a construção de uma sociedade sustentável, é essencial
para a viabilização de sociedades livres, participativas e democráticas. Paralelamente, a
alfabetização midiática e informacional (AMI) capacita indivíduos em cidadãos livres,
críticos e autônomos, capazes de aprender a aprender em uma educação ao longo de toda a
vida (UNESCO, 2016).
Reconhecendo o potencial da AMI, muitas nações, estabelecendo parcerias entre
governos e instituições não governamentais, estão criando estratégias para sua
implementação em setores vulneráveis de cada localidade. Na África do Sul, por exemplo, foi
desenvolvido o Media Action Plan (MAP), um plano de ação midiático para informar sobre
HIV, AIDS e o papel da política de gênero, além de mitigar os efeitos da pandemia na
indústria midiática. Em Marrocos, o governo decidiu adaptar o currículo nacional e realizar
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um programa-piloto para inserir a AMI. Por sua vez, o Instituto Nacional de Saúde e Bem-
Estar da Finlândia produziu e enviou a todas as creches do país as diretrizes nacionais para a
educação midiática. Pensando no longo prazo, em Cingapura foi desenvolvido um plano de
dez anos, a estratégia Intelligent Nation 2015 (iN2015), com o intuito de ajudar na
compreensão do potencial que o acesso à mídia e à informação pode proporcionar a
indivíduos, governo e empresas nos níveis micro e macro da sociedade. (Grizzle, et al, 2016).
Enfim, esses são alguns dentre os vários exemplos existentes sobre a implementação da AMI
pelo mundo.
Considerações Finais
O presente estudo procurou discutir, à luz da visão sistêmica, a contribuição da AMI,
como uma nova competência para reflexão e construção de comportamentos socialmente
responsáveis para com o meio ambiente e para com as futuras gerações.
Tendo em vista as discussões teóricas arroladas nesse trabalho, pode-se dizer que a
AMI desponta como um dos caminhos à construção de uma sociedade menos vulnerável às
pressões midiáticas do consumo inconsciente e exacerbado. A AMI procurando contribuir
para a tomada de consciência da humanidade, em torno do impacto que suas decisões podem
causar ao meio ambiente e, consequentemente, às futuras gerações, incentiva o pleno
exercício da cidadania, por meio do pensamento reflexivo, ético e efetivo. Esse despertar de
consciência necessariamente passa pelo autoconhecimento, pela percepção de si mesmo
enquanto ser social, que influencia e ao mesmo tempo é influenciado, tanto no micro quanto
no macro ambiente. Assim, essa conexão entre seres vivos, relações sociais e meio ambiente,
muito bem elucidada pela visão sistêmica, nos remete à condição de inter-relação e
interdependência em que vivemos. Desse entendimento, depreende-se que as menores ações
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de uma criança ou de uma nação impactam o planeta Terra inteiro e as consequências são
sofridas por todos, mesmo que de formas e amplitudes diferentes.
Com a ausência dessa percepção sistêmica, a humanidade tem provocado graves
desequilíbrios ecológicos, prejudicando as condições autorreguladoras da biosfera e
comprometendo a sobrevivência da vida no planeta. Além disso, apesar do imenso potencial
científico-tecnológico em que o mundo se debruça atualmente, jamais estivemos tão
perdidos. Diante de tanto progresso material, as pessoas se afastaram delas mesmas e pararam
de valorizar as relações humanas. O diálogo pessoalmente com os familiares, vizinhos,
amigos e colegas são cada vez mais raros; o trânsito é palco da intolerância e da impaciência;
as escolas estão cheias de crianças ansiosas e estressadas, etc.. Esses são alguns sintomas de
um mundo caótico e problemático guiado, na maioria das vezes, pela busca incessante de
bens e conquistas materiais.
Para alterar essa realidade, a Terra carece de uma profunda mudança de valores. É
preciso despertar os valores da ética e da solidariedade, construir uma nova consciência
coletiva e moral, menos consumista e mais responsável, e que seja adotada e compartilhada
globalmente. Para tanto, a AMI, em seu caráter interdisciplinar e multidimensional, pode ser
considerada como uma ponte para o início dessa necessária transformação.
Nesse contexto, espera-se que, em futuro não muito distante, a AMI possa fazer parte
da rotina de nossas crianças em todo o mundo, contribuindo para que venham a se tornar
cidadãos menos vulneráveis e mais reflexivos e, por consequência, possam tomar decisões
mais assertivas em suas relações de consumo.
Por fim, espera-se que a AMI venha fazer parte também do contexto pessoal, social e
profissional de nossos jovens, adultos e idosos, para que, de uma forma sistêmica e
abrangente, sejamos melhores seres humanos, buscando viver em sintonia com os demais
seres vivos, com o meio ambiente e as futuras gerações.
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