Post on 16-Nov-2015
description
UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC
CURSO DE DIREITO
MARLIA MILIOLI FERNANDES
A PUBLICIDADE ABUSIVA DIANTE DA HIPOSSUFICINCIA DA
CRIANA: UM ESTUDO LUZ DO PRINCPIO DA PROTEO
INTEGRAL
CRICIMA 2010
MARLIA MILIOLI FERNANDES A PUBLICIDADE ABUSIVA DIANTE DA HIPOSSUFICINCIA DA
CRIANA: UM ESTUDO LUZ DO PRINCPIO DA PROTEO
INTEGRAL
Trabalho de Concluso de Curso apresentado como requisito parcial para a obteno do grau de Bacharel no curso de Direito da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC. Orientadora: Prof. Rosangela Del Moro.
CRICIMA 2010
MARLIA MILIOLI FERNANDES
A PUBLICIDADE ABUSIVA DIANTE DA HIPOSSUFICINCIA DA
CRIANA: UM ESTUDO LUZ DO PRINCPIO DA PROTEO
INTEGRAL.
Trabalho de Concluso de Curso aprovado pela Banca Examinadora para obteno do Grau de Bacharel, no Curso de Direito da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC, com Linha de Pesquisa em Direito da Criana e do Adolescente.
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________ Prof. Rosangela Del Moro
Universidade do Extremo Sul Catarinense Orientadora
____________________________________ Prof. Fabrzio Guinzani
Universidade do Extremo Sul Catarinense
___________________________________________ Prof. Marcus Vincius Almada Fernandes Universidade do Extremo Sul Catarinense
CRICIMA, 02 DE DEZEMBRO DE 2010.
Dedico este trabalho minha me Janice, ao meu pai Roberto, minha irm Paula, s minhas avs Valda e Alietes e ao meu namorado Felipe, por todo apoio e incentivo recebidos durante a faculdade. todas as crianas que clamam por proteo.
AGRADECIMENTOS
Agradeo primeiramente a Deus pelo dom da vida, e pela capacitao
concedida, sem a qual no poderia ter realizado a presente pesquisa.
Aos meus pais Janice e Roberto, pela oportunidade que me deram, por
todo apoio e fora, no medindo esforos para que eu pudesse concluir este curso.
Aos demais familiares, em especial minha irm Paula e minhas avs
Valda e Alietes, por toda preocupao, incentivo e carinho.
De forma muito especial, ao meu namorado Felipe Borges dos Santos,
pela pacincia, apoio, fora, carinho e por ser um companheiro incansvel que me
incentivou direta e indiretamente em todos os momentos, sempre ao meu lado
desde o incio da faculdade.
minha professora orientadora, Rosangela Del Moro, pela pacincia,
dedicao, respeito, contribuio e conselhos prestados para realizao da
presente pesquisa monogrfica.
Aos professores Fabrizio Guinzani e Marcus Vincius Almada Fernandes,
por disporem de seu valioso tempo e por aceitarem prontamente em participar da
banca examinadora.
A todos os docentes do Curso de Graduao em Direito, pela
contribuio educacional que tornaram possveis a concluso deste curso
acadmico.
Dra. Eliza Maria Strappazon, pela oportunidade profissional junto de
sua equipe e, em especial, pelos seus conselhos e indicaes acerca dos
caminhos a serem seguidos para um brilhante crescimento profissional.
Meus agradecimentos tambm s minhas amigas e colegas de trabalho
Monique Rafaele Antunes, Mara Niehues Volpato e Juliane Abreu Nones, sempre
dispostas a auxiliar e escutar nos momentos em que as dificuldades surgiam.
Por fim, agradeo aos amigos da faculdade pelos momentos de
descontrao, pela fora na hora que precisei e por todo companheirismo
demonstrado.
.
[...] porque as crianas de hoje sero os
homens de amanh, e nas geraes
futuras que se assenta a esperana do
porvir.
Silvio Rodrigues
RESUMO
O presente trabalho trata da publicidade abusiva diante da hipossuficincia da criana, luz do princpio da proteo integral. O objetivo geral foi analisar se a exposio de crianas a publicidade abusiva viola o princpio da proteo integral, em funo da vulnerabilidade das mesmas. Para melhor compreender a matria proposta, o mtodo de produo utilizado foi o dedutivo, com tcnica de pesquisa bibliogrfica. O estudo se inicia pelo histrico do direito da criana e do adolescente no Brasil, e os princpios aplicveis a este direito. Realizou-se a anlise dos meios de controle como instrumento efetivo de proteo do consumidor, seja pblico, privado ou administrativo, e se estes meios protegem efetivamente o ser humano com idade de 0 a 12 anos incompletos, ou seja, a criana. Buscou-se tambm, verificar se o fato de a criana ser hipossuficiente, os tornam mais vulnerveis na relao de consumo. Pode-se dizer que um dos fatores mais significativos do presente estudo consiste em esclarecer que, apesar das constantes publicidades abusivas dirigidas ao pblico infantil, existem legislaes exclusivas vedando esse tipo de publicidade, porm as mesmas so desrespeitadas na prtica, para maior consumo das crianas, que por sua vez, acabam sendo persuadidas facilmente por todo tipo de publicidade.
Palavras-chave: Crianas. Hipossuficincia. Vulnerabilidade. Publicidade abusiva. Proteo integral.
LISTA DE SIGLAS
CBARP Cdigo Brasileiro de Auto-Regulamentao Publicitria
CDC Cdigo de Defesa do Consumidor
CONAR Conselho Nacional de Auto-Regulamentao Publicitria
CRFB/88 Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988
ECA Estatuto da Criana e do Adolescente
PROCON Procuradoria de Defesa do Consumidor
SUMRIO
1 INTRODUO ........................................................... Error! Bookmark not defined.1
2 O DIREITO DA CRIANA E DO ADOLESCENTE NO BRASILError! Bookmark not defined.3
2.1 A criana e o adolescente no Brasil no perodo anterior a CRFB/88Error! Bookmark not defined.
2.1.1 A doutrina do direito penal do menor ............... Error! Bookmark not defined.4
2.1.2 O cdigo de menores de 1927 ........................... Error! Bookmark not defined.5
2.1.3 Doutrina jurdica do menor em situao irregular ...................................... 17
2.2 Crianas e adolescentes no Brasil aps a CRFB/88 e ECA .......................... 18
2.3 Princpios norteadores do direito da criana e do adolescenteError! Bookmark not defined.
2.3.1 Princpio da proteo integral ........................... Error! Bookmark not defined.2
2.3.2 Princpio do melhor interesse ........................... Error! Bookmark not defined.4
2.3.3 Princpio da prioridade absoluta ....................... Error! Bookmark not defined.5
3 A PUBLICIDADE E SUAS REGULAMENTAES ............................................. 28
3.1 Conceito de publicidade ....................................... Error! Bookmark not defined.8
3.1.1 Distino entre publicidade e propaganda....... Error! Bookmark not defined.9
3.2 A publicidade abusiva ..................................................................................... 31
3.3 Limites da publicidade abusiva ....................................................................... 34
3.3.1 O sistema privado de controle da publicidade ........................................... 34
3.3.2 Controle administrativo ................................................................................ 37
3.3.3 O sistema pblico de controle da publicidade. Error! Bookmark not defined.8
3.3.3.1 Associao dos consumidores ...................... Error! Bookmark not defined.8
3.3.3.2 O PROCON ....................................................... Error! Bookmark not defined.9
3.3.3.3 O Ministrio Pblico ................................................................................... 40
3.4 As normas do sistema pblico de controle da publicidade.......................... 41
3.4.1 A publicidade e a CRFB/88 ......................................................................... 401
3.4.2 A publicidade e o CDC .................................................................................. 43
4 A PUBLICIDADE ABUSIVA DIRIGIDA CRIANA....... Error! Bookmark not defined.5
4.1 A crianas em face da publicidade ...................... Error! Bookmark not defined.5
4.1.1 A televiso como eficiente meio de publicidade ........................................ 50
4.2 Hipossuficincia da criana ................................. Error! Bookmark not defined.1
4.3 Vulnerabilidade da criana ................................... Error! Bookmark not defined.2
4.4 Distino entre vulnerabilidade e hipossuficincia Error! Bookmark not defined.4
4.5 Meios de proteo criana ................................. Error! Bookmark not defined.5
5 CONCLUSO ...................................................................................................... 60
6 REFERNCIAS ..................................................................................................... 62
11
1 INTRODUO
Este trabalho de concluso de curso tem como objetivo analisar a
publicidade abusiva diante da hipossuficincia da criana, luz do princpio da
proteo integral.
O princpio da proteo integral criana e ao adolescente foi
introduzido no ordenamento jurdico brasileiro atravs do artigo 227 da CRFB/88,
que declarou ser dever da famlia, da sociedade e do Estado assegurar, criana e
ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito vida, sade, alimentao,
educao, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito,
liberdade e convivncia familiar e comunitria, alm de coloc-los a salvo de toda
forma de negligncia, discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso.
E com base neste princpio que a criana deve ser protegida de
qualquer tipo de publicidade abusiva, visto ser esta cada vez mais comum nos dias
de hoje.
A necessidade das empresas que vivem da publicidade, de sobreviver
diante do extenso mercado de consumo, devido a grande concorrncia, fez com
que a publicidade dirigida ao pblico consumerista, avanasse junto com a
tecnologia, chegando ao ponto de ignorar a legislao existente.
Neste norte, o objetivo geral da presente pesquisa monogrfica verificar se
o CDC, juntamente com a CRFB/88 e o ECA, garantem efetivamente a proteo ao
consumidor, em especial, o mais hipossuficiente, a criana.
Para o desenvolvimento deste estudo adotou-se o mtodo dedutivo,
utilizando o procedimento monogrfico, com tcnica de pesquisa bibliogrfica.
O presente estudo ser dividido em trs captulos, a saber, no primeiro
captulo apresentar-se- um breve histrico acerca dos direitos da criana e do
adolescente no Brasil, bem como se tratar dos princpios inerentes criana e ao
adolescente.
No segundo captulo analisar-se- a publicidade e suas regulamentaes, o
instituto da publicidade, a publicidade abusiva, o controle administrativo e o sistema
pblico e privado de controle publicidade.
12
O terceiro captulo ocupar-se- do estudo da publicidade abusiva dirigida
criana, da hipossuficincia e vulnerabilidade das mesmas, bem como dos meios
de proteo s crianas diante desta publicidade.
Por fim, ressalta-se que esta monografia tem como objetivo alertar a
comunidade acadmica e a sociedade em geral acerca das constantes
publicidades abusivas dirigidas crianas, e as conseqncias que este tipo de
publicidade pode trazer a elas, porque mesmo com as legislaes existentes, essa
prtica cada vez mais comum nos dias atuais.
13
2 O DIREITO DA CRIANA E DO ADOLESCENTE NO BRASIL
Neste primeiro captulo, apresenta-se um breve histrico sobre o direito das
crianas e dos adolescentes no Brasil e dos princpios relacionados a tal direito.
2.1 A criana e o adolescente no Brasil no perodo anterior a CRFB/88
A histria das crianas e dos adolescentes no Brasil foi marcada pela
negao de um lugar especfico para a infncia, tendo em vista que no havia
reconhecimento da condio peculiar de desenvolvimento que pudesse diferenciar
a infncia da fase adulta (CUSTDIO, 2009, p. 11).
Neste sentindo, concluiu Garcia, citado por Custdio:
No momento em que infncia descoberta, ela comea a ser percebida por aquilo que no pode, por aquilo que no tem, por aquilo que no sabe, por aquilo que no capaz. Para a sociedade, reproduz uma definio negativa da criana (2009, p. 12).
Inicialmente as crianas e adolescentes no eram considerados sujeitos de
direito, e sim objetos de direito. A nova definio somente se deu com a CRFB/88,
que deixa a Doutrina Jurdica da Situao Irregular para adotar a Doutrina Jurdica
da Proteo Integral (VIEIRA; VERONESE, 2006, p. 17).
Acerca dos primeiros sinais sobre a infncia, ensinam Vieira e Veronese:
Um das primeiras iniciativas sociais que merece destaque no atendimento criana o surgimento, em 1738, na Santa Casa de Misericrdia do Rio de Janeiro, da chamada Roda dos Expostos. Tratava-se de atendimento eminentemente altrusta, no evidenciando nenhuma espcie de poltica pblica. Constatamos em nossos estudos que a primeira instituio a ocupar-se da assistncia populao infanto-juvenil foi a Igreja Catlica, por intermdio de diversas ordens religiosas. Essa assistncia caracterizava-se pelo estilo caritativo, ou seja, bastaria sanar as necessidades primrias de ter um teto para se proteger, alm do alimento para subsistir. Neste modelo no se negava o ensino, mas ele se restringia ao aprendizado de um ofcio e/ou atividades domsticas e educao familiar, a qual se limitava autoridade-obedincia, de sorte a preparar as pessoas desprovidas de bens para as atividades servis (2006, p. 18). (grifo do original)
As normas existentes acerca das condies dignas de vida das crianas e
adolescentes so recente no Brasil. O Brasil Colnia e o Imprio pouco se
preocuparam com estas condies.
14
No Brasil Colnia e Imprio, o atendimento e a legislao eram voltados criana abandonada, geralmente com o atendimento por instituies privadas, voltadas para a Igreja, imperando a fase filantrpica assistencial, como modelos herdados de Portugal, calcados nas Santas Casas de Misericrdia (dotadas do sistema de roda dos expostos) ou, a partir de 1726, com as casas dos expostos (DANDREA, 2005, p. 19).
As primeiras mudanas no tratamento das crianas e dos adolescentes,
vieram com a mudana do Brasil Imprio para Repblica.
Neste perodo a criana passa a ser valorizada, tanto na famlia como na
sociedade, por estarem em fase de formao, j que poderiam ser modeladas para
se tornarem homens de bem, teis para o progresso da nao (RIZZINI, 1997, p.
25).
Observa-se, ento, que o objetivo de progresso da nao que fez com que
o Estado tomasse as primeiras providncias em relao s crianas e os
adolescentes.
Para Custdio ocorreu interesse pela infncia por parte dos juristas, no
perodo da Proclamao da Repblica, quando da abolio da escravido. Neste
momento, crianas e adolescentes pobres, comearam a circular por centros
urbanos das pequenas cidades, em busca da sobrevivncia, e com isso acabavam
perturbando as elites locais (2009, p. 14).
Diante disso, foi aprovado em 12 de outubro de 1927 o primeiro Cdigo de
Menores.
2.1.1. A doutrina do direito penal do menor
A Doutrina do Direito Penal do Menor vigorou a partir da entrada em vigor do
primeiro Cdigo de Menores no Brasil, institudo atravs do Decreto 5.083, de 1 de
dezembro de 1926, e manifestou-se pelo interesse governamental na elaborao
de uma legislao que consolidasse toda a produo normativa referente matria
(CUSTDIO, 2009, p. 16).
A citada doutrina tinha como objetivo apurar a delinqncia praticada pelo
chamado menor. Esta doutrina tinha como base a teoria do discernimento, a qual
determinava a responsabilidade penal do adolescente menor de 14 anos (VIEIRA;
VERONESE, 2006, p. 20).
15
Devido subjetividade que a teoria do discernimento suscitava no momento
de se aplicar ou no a sano penal, haviam muitas dvidas entre os operadores
jurdicos que procuravam basear sua atuao na comprovao da capacidade
intelectual do menor delinqente (VIEIRA; VERONESE, 2006, p. 22).
Posteriormente, com base nesta doutrina, foi aprovado o Cdigo de Menores
de 1927.
2.1.2 O cdigo de menores de 1927
O Projeto de Lei, iniciado pelo Juiz Jos Cndido Albuquerque de Mello
Mattos, objetivava uma proposta de consolidao da legislao sobre o menor, e
teve como conseqncia o Decreto 17.943-A, de 12 de outubro de 1927, que
estabeleceu o primeiro Cdigo de Menores da Amrica Latina, mais conhecido
como Cdigo Mello Mattos (SOUZA, 2008, p. 21).
De acordo com a nova lei, caberia ao juiz decidir-lhes o destino. A famlia,
independente da situao econmica, tinha o dever de suprir adequadamente as
necessidades bsicas das crianas e jovens, de acordo com o modelo idealizado
pelo Estado. Medidas assistenciais e preventivas foram previstas com o objetivo de
minimizar a infncia de rua (AMIN, 2010, p. 6).
O Cdigo de Menores de 1927 modificou o tratamento da questo dos
menores, pois determinava que fossem considerados o estado fsico, moral e
mental da criana, alm da situao moral, social e econmica dos pais. O Cdigo
classificava os menores em duas categorias: abandonados e delinqentes (VIEIRA;
VERONESE, 2006, p. 22).
O referido Cdigo vetou o processo penal de qualquer espcie para menores
de 18 anos, alm de dispensar a pesquisa de discernimento. Para substituir esse
tipo de punio, o menor delinqente estava sujeito medida de internao, com
nfase na educao, podendo durar de trs a sete anos (VIEIRA; VERONESE,
2006, p. 24).
Custdio, corroba com o exposto:
O Cdigo de Menores veio alterar e substituir concepes obsoletas como as de discernimento, culpabilidade, penalidade, responsabilidade, ptrio poder, passando a assumir a assistncia ao menor de idade, sob a perspectiva educacional. Abandonou-se a postura anterior de reprimir e punir e passou-se a priorizar, como questo bsica, o regenerar e educar.
16
Desse modo, chegou-se concluso de que questes relativas infncia e adolescncia devem ser abordadas fora da perspectiva criminal, ou seja, fora do Cdigo Penal (2009, p. 16).
Diante disso, percebe-se a importncia do Cdigo de Menores de 1927,
tendo em vista que substitui concepes como as de discernimento e penalidade,
passando a relevar a questo da educao do menor.
Para Custdio: A principal caracterstica da poltica proposta pelo Cdigo de
Menores de 1927 era a institucionalizao como via necessria para a soluo dos
problemas considerados como essenciais organizao social (2009, p. 17).
Com o intuito de disciplinar a infncia foi justificvel at a explorao do
trabalho infantil. Souza explica que uma tendncia em relacionar o trabalho infantil
como forma de evitar a criminalidade ou dito como melhor trabalhar do que
roubar (2008, p. 267).
O objetivo de Mello Mattos no foi alcanado, j que inexistiram recursos e
autonomia para atuar no gerenciamento e criao dos institutos de atendimento
(VIEIRA; VERONESE, 2006, p. 24).
Foi criado, atravs do Decreto n. 3.779 de 1941, o Servio de Assistncia a
Menores (SAM) que tinha como objetivo centralizar a execuo de uma poltica
nacional de assistncia aos menores desvalidos e infratores (VIEIRA; VERONESE,
2006, p. 25).
Neste sentido Vieira e Veronese explicam que:
A decadncia do SAM e o Golpe Militar de 1964 determina a criao de um novo modelo de poltica para a realidade infanto-juvenil. Do ponto de vista do Estado, fazia-se necessrio alterar o modo de interveno para atacar com maior eficcia a problemtica dos menores carentes e abandonados. Da represso, dever-se-ia passar ao assistencialismo (2006, p. 25). (grifo no original)
Em 1964, com a permanncia de problemas relativos aos menores, foi
criada a Lei n. 4.513, que definia a Poltica Nacional de Bem-Estar do Menor
(PNBEM) e criava a Fundao Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM), que
tinha como objetivo acabar com a represso e segregao do regime anterior,
definindo diretrizes educacionais (VIEIRA; VERONESE, 2006, p. 26).
Contudo Custdio afirma:
No final da dcada de 1970, a Fundao Nacional do Bem-Estar e sua respectiva poltica j eram alvo de criticas contundentes sobre o modelo
17
adotado, inclusive de vrios organismos internacionais. Como resposta a essa condio, o Governo brasileiro cria em 11 de dezembro de 1978 a Comisso Nacional do Ano Internacional da Criana. O resultado dos trabalhos da referida comisso seria a base para a declarao formal da Doutrina do Menor em Situao Irregular no Brasil (2009, p. 19).
Portanto, no dia 10 de outubro de 1979 instituda pela Lei 6.697 entra em
vigor a Doutrina do Menor em Situao Irregular, atravs da vigncia do Cdigo de
Menores.
2.1.3 Doutrina jurdica do menor em situao irregular
A Doutrina do Menor em Situao Irregular incorporada pelo Cdigo de
Menores de 1979 e adotou posio voltada aos efeitos e no s causas dos
problemas referentes aos menores, pois trata de situaes irregulares em que se
situavam crianas ou adolescentes. Novamente deixada de lado a preveno e
proteo infncia, dando nfase para que o modo de interveno pblica ocorra
posteriormente ao surgimento da chamada situao irregular (VIEIRA;
VERONESE, 2006, p. 27).
Para Liberati a doutrina no relacionava nenhum direito, a no ser aquele
sobre a assistncia religiosa, no trazia nenhuma medida de apoio famlia,
tratava da situao irregular da criana e do jovem, que, na verdade, eram seres
privados de seus direitos (1993, p. 13).
As situaes que caracterizavam a situao irregular estavam previstas no
artigo 2 do referido cdigo:
Art. 2 Para os efeitos deste Cdigo, considera-se em situao irregular o menor: I - privado de condies essenciais sua subsistncia, sade e instruo obrigatria, ainda que eventualmente, em razo de: a) falta, ao ou omisso dos pais ou responsvel; b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsvel para prov-las; Il - vtima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsvel; III - em perigo moral, devido a: a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrrio aos bons costumes; b) explorao em atividade contrria aos bons costumes; IV - privado de representao ou assistncia legal, pela falta eventual dos pais ou responsvel; V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptao familiar ou comunitria; VI - autor de infrao penal.
18
Pargrafo nico. Entende-se por responsvel aquele que, no sendo pai ou me, exerce, a qualquer ttulo, vigilncia, direo ou educao de menor, ou voluntariamente o traz em seu poder ou companhia, independentemente de ato judicial (BRASIL, 2010a).
Essas situaes foram definidas por Nogueira, citado por Pereira:
[...] como situaes de perigo que podero levar o menor a uma marginalizao mais ampla, pois o abandono material ou moral um passo para a criminalidade. [...] A situao irregular do menor , em regra, conseqncia da situao irregular da famlia, principalmente com a sua desagregao (2008, p. 15).
A doutrina da situao irregular tinha como caracterstica a concepo da
criana como objeto, estigmatizando-a como em situao irregular, ignorando seus
direitos, geralmente reduzindo-a a condio de incapaz (CUSTDIO, 2009, p. 22).
Sobre o tema, Viera destaca:
[...] Enquanto o mundo comea a compreender que a criana no um mero objeto, mas pessoa que tem direito dignidade, ao respeito e liberdade, a legislao brasileira perpetuava a viso de que crianas e adolescentes se igualavam a objetos sem autonomia, cujos destinos seriam traados pelos verdadeiros sujeitos de direitos, isto , pelos adultos (2005, p. 22).
Esta doutrina centralizou as funes jurisdicionais, concentrando-as no Juiz
de Menor. A CRFB/88 rompe com a doutrina da situao irregular em seu artigo
227.
2.2 Crianas e adolescentes no Brasil aps a CRFB/88 e o ECA
A CRFB/88 introduziu a Declarao Especial dos Direitos Fundamentais da
Criana e do Adolescente, introduzindo a Doutrina Jurdica da Proteo Integral e
consagrando os direitos especficos que devem ser universalmente reconhecidos
(PEREIRA, 2008, p. 19).
Neste sentido:
Com segurana, pode-se afirmar que a transio da doutrina da situao irregular do menor para a teoria da proteo integral estabeleceu-se gradativamente a partir da consolidao dessas praticas e experincias ocorridas durante toda a dcada de oitenta, com nfase no processo de elaborao da nova Constituio, que, posteriormente, seria o elemento constitutivo das bases do Direito da Criana e do Adolescente no Brasil (CUSTDIO, 2009, p. 24-25).
Tanto as contribuies de aes e experincias humanitrias, como o
desenvolvimento terico e civilizatrio serviram para mudana da viso da infncia
19
da situao irregular para doutrina da proteo integral, a qual assegura os
direitos fundamentais criana e ao adolescente (RAMIDOFF, 2008, p. 33).
Esta doutrina estabelece que crianas e adolescentes sejam considerados
sujeitos de direito, e no mais objetos de direito, sendo que em funo da condio
especial de desenvolvimento destas, as mesmas tm prioridade absoluta na
garantia e efetivao de seus direitos (VIEIRA; VERONESE, 2006, p. 30).
Dandrea corroba: somente em 1988, com a promulgao da Constituio
Federal Brasileira, a criana e o adolescente passaram a ser tratados como
sujeitos de direitos (2005, p. 20-21).
Com esta doutrina, passou-se a abranger a totalidade das crianas e
adolescente, e no somente queles menores abandonados ou delinqentes. So
garantidos direitos a todos, com idade entre 0 18 anos.
Inaugura-se a uma fase enriquecedora, na qual a vitria estava anunciada, pois o enfrentamento entre doutrina jurdica da situao irregular perdia adeptos na mesma proporo em que os valores da proteo integral ganhavam novos aliados. Finalmente, essa dcada conviveria uma utopia mobilizadora para a construo da sociedade, onde todos poderiam gozar de direitos humanos reconhecidos como fundamentais na nova Constituio que se elaborava. Estava traada a oportunidade histrica para sepultar o menorismo no Brasil (CUSTDIO, 2009, p. 25).
A partir da implantao desta doutrina, no se tem mais o objetivo de salvar
o infante de uma situao irregular em que se encontrava, e sim garantir o direito a
todas as crianas e adolescentes, com o apoio da famlia, da sociedade e do
Estado, que passam a ter obrigao de garantir com absoluta prioridade a
concretizao dos direitos elencados no artigo 227 da CRFB/88:
Art. 227 - dever da famlia, da sociedade e do Estado assegurar criana e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito vida, sade, alimentao, educao, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria, alm de coloc-los a salvo de toda forma de negligncia, discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso (BRASIL, 2010b).
Assim, lecionam Vieira e Veronese:
A noo de melhor interesse da criana foi fundamental para romper com o paradigma da Doutrina do Menor em Situao Irregular. Quando a Conveno Internacional sobre os Direitos da Criana, a Constituio Federal de 1988 e o Estatuto da Criana e do Adolescente estabelecem que o Estado, a famlia e a sociedade devem atuar sempre conforme o
20
melhor interesse de toda e qualquer criana, enquadre-se ela ou no em uma das situaes definidas como irregulares, passa-se de um modelo parcial que regulava somente algumas situaes irregulares para um modelo integral segundo o qual todas as crianas e adolescentes devem ter seus direitos preservados (2006, p. 34).
Em novembro de 1989 foi aprovada a Conveno Internacional sobre os
Direitos das Crianas, sendo ratificada pelo Brasil em 21 de novembro de 1990,
pelo Decreto n 99.710 (PEREIRA, 2008, p. 18).
Para compreender melhor esta Conveno, Pereira explica-nos:
fruto de um esforo conjunto entre vrios pases que, durante dez anos, buscaram definir quais os direitos humanos comuns a todas as crianas, para a formulao de normas legais, internacionalmente aplicveis, capazes de abranger as diferentes conjunturas socioculturais existentes entre os povos. A Conveno consagra a Doutrina Jurdica da Proteo Integral, ou seja, que os direitos inerentes a todas as crianas e adolescentes possuem caractersticas especficas devido peculiar condio de pessoas em via de desenvolvimento em que se encontram, e que a polticas bsicas voltadas para a juventude devem agir de forma integrada entre a famlia, a sociedade e o Estado (2008, p. 22).
Com esta Conveno notvel que o movimento popular brasileiro j havia
ensejado um (re)alinhamento democrtico interno com as diversas dimenses
humanitrias dos direitos quelas pessoas que se encontrassem na condio
peculiar de desenvolvimento da personalidade (RAMIDOFF, 2008, p. 21).
Para Pereira ao ratificar essa Conveno o Brasil incorporou, em carter
definitivo, o princpio do melhor interesse da criana em seu sistema jurdico [...]
(2000, p. 7).
Alm do princpio citado acima, para Pereira, a criana e o adolescente
devero ser considerados prioridade imediata e absoluta, sendo resguardados
seus direitos fundamentais (2008, p. 22).
A CRFB/88 constituiu a base fundamental do Direito da Criana e do
Adolescente, inter-relacionando os princpios e diretrizes da teoria da proteo
integral, provocando um reordenamento jurdico, poltico e institucional do Estado
(CUSTDIO, 2009, p. 26).
Foi a partir deste perodo que as crianas e os adolescentes tiveram ateno
e a proteo, construdas sobre um processo de mobilizao popular de cunho
democrtico e humanitrio que ps fim ditadura militar e originou a Assemblia
Nacional Constituinte (MACHADO, 2003, p. 55).
21
A CRFB/88 levantou a questo da criana e do adolescente como prioridade
absoluta pela primeira vez. Assim, Cury; Nudez e Silva ensinam:
A inspirao de reconhecer proteo especial para a criana e o adolescente no nova. J a Declarao de Genebra de 1924 determinava a necessidade de proporcionar criana uma proteo especial; da mesma forma que a Declarao Universal dos Direitos Humanos das Naes Unidas (Paris, 1948) apelava ao direito a cuidados e assistncia especiais; na mesma orientao, a Conveno Americana sobre os Direitos Humanos (Pacto de San Jos, 1969) alinhava em seu art. 19: Toda criana tem direito s medidas de proteo que na sua condio de menor requer, por parte da famlia, da sociedade e do Estado (1996, p. 12).
Sendo reconhecidos os direitos das crianas e dos adolescentes na
CRFB/88, estes receberam um instrumento importante com a aprovao do
Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA), Lei 8.069, de 13 de julho de 1990,
representando um marco na histria de afirmao dos direitos da criana e do
adolescente (SOUZA, 2008, p. 32).
O art. 3 , ECA, dispe que criana e o adolescente gozam de todos os
direitos fundamentais inerentes pessoa humana.
Para Veronese: Apesar de toda inovao no que tange assistncia, proteo, atendimento e defesa dos direitos da criana e do adolescente, constantes na Constituio Federal, estes no poderiam se efetivar se no regulamentados em lei ordinria. Se assim no fosse, a Constituio nada mais seria do que uma bela mas ineficaz carta de intenes. Portanto, o Estatuto da Criana e do Adolescente Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, surgiu com a difcil e nobre tarefa de viabilizar os citados direitos (1999, p. 47).
Portanto, todos os direitos das crianas e dos adolescentes que esto
presentes no ordenamento jurdico brasileiro, sobrevieram a partir da Doutrina
Jurdica da Proteo Integral.
2.3 Princpios norteadores do direito da criana e do adolescente
As legislaes, atualmente, fixam princpios para guiar o Estado e a
sociedade, com a finalidade de promover o bem-estar individual e coletivo de seus
integrantes, os quais so tambm dotados de validade positiva (PEREIRA, 2000, p.
22).
22
Desta feita, vejamos o dispositivo do Cdigo de Processo Civil acerca dos
princpios: Art. 126: O juiz no se exime de sentenciar ou despachar alegando
lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe- aplicar as normas
legais; no as havendo, recorrer analogia, aos costumes e aos princpios gerais
de direito (BRASIL, 2010c).
Para Espndola, os princpios compreendem a base de um sistema de
ideias, e servem como guia de orientao para as mais diversas decises. ,
portanto, o pilar do ordenamento jurdico, onde todos os demais pensamentos e
ideias se fundamentam (1998, p. 47-48).
Sobre os princpios atinentes ao direito da criana e do adolescente,
Veronese explica:
Os princpios a serem seguidos na interpretao do Estatuto da Criana e do Adolescente so: os fins sociais, o bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos e a condio da pessoa humana em desenvolvimento. Este ltimo princpio estabelece uma condio relevante para diferenciar o tratamento da criana e adolescente a partir de um ponto de vista privilegiado, ou seja, prioritrio (art. 6) (2006, p. 17).
Diante disso, cabe-nos expor alguns princpios referentes ao direito da
criana e do adolescente.
2.3.1 Princpio da proteo integral
A proteo integral tem suas razes mais prximas na Conveno
Internacional dos Direitos da Criana, aprovada pela Assembleia-Geral das Naes
Unidas em 20.11.1989 e ratificada pelo Brasil em 20.09.1990 (CURY, NUDEZ E
SILVA, 1996, p. 16).
Conforme se depreende da deciso proferida pelo Tribunal de Justia de
Santa Catarina nos autos do Agravo de Instrumento n. 2003.021707-0 (anexo I), da
lavra do Desembargador Srgio Paladino, o ECA alicera-se, dentre outros, no
princpio da proteo integral, sujeitos de direitos que demandam tratamento
especial, porque so seres em desenvolvimento, consagrando a CRFB/88 tal
princpio em seu art. 227, 3, inciso V. A teoria da proteo integral, que
substituiu a da situao irregular, concretiza-se com o recebimento de proteo e
prioridade absolutas, incumbindo famlia, sociedade e ao Estado a observncia
da regra que a torna efetiva.
23
A proteo integral diz respeito aos direitos prprios dos cidados em
formao, que se diferenciam dos demais direitos fundamentais da pessoa
humana. Este princpio est previsto tambm no art. 1 do ECA, onde foram
garantidos direitos especiais e especficos criana e ao adolescente
(HENRIQUES, 2006, p. 132).
Para Vercelone:
Trata-se da tcnica legislativa usual quando se faz uma revoluo, quando se reconhece que uma parte substancial da populao tem sido at o momento excluda da sociedade e coloca-se agora em primeiro plano na ordem de prioridades dos fins a que o Estado se prope. Desta vez no se trata de uma classe social ou de uma etnia, mas de uma categoria de cidados identificada a partir da idade. Mas trata-se, contudo, de uma revoluo, e o que mais impressiona o fato de que se trata de uma revoluo feita por pessoas estranhas quela categoria, isto , os adultos em favor dos imaturos (2000, p. 17).
Veronese ensina:
O Estatuto da Criana e do Adolescente, ao dispor sobre a proteo integral criana e ao adolescente afirma que a criana a pessoa de 0 at 12 anos incompletos. Pessoa, por seu turno, o ser que se forma na concepo, e a partir deste momento d-se o incio da proteo integral. Refora ainda mais esse entendimento a redao do art. 7 do Estatuto da Criana e do Adolescente, que assegura a proteo vida e sade da criana mediante a efetivao das polticas sociais pblicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condies dignas de existncia. Consoante se depreende do art. 8 e seus pargrafos, o inicio da proteo integral ocorre com aquele que no nasceu, mas j fora concebido, ou seja, o nascituro, quando assegurada gestante o atendimento pr e perinatal (2006, p. 16-17).
Este princpio visa garantir a proteo integral criana e ao adolescente,
tendo em vista que a partir da doutrina jurdica da proteo integral, a criana e o
adolescente passaram a ser vistos como sujeito de direito. Portanto, com base
neste princpio, a famlia, o Estado e sociedade, devem assegurar proteo integral
criana e ao adolescente, bem como o legislador e o aplicador da lei, devem
levar em conta a existncia deste princpio.
Segundo Henriques:
integral porque assim est assegurado no art. 227 da Constituio Federal, quando prev os direitos fundamentais de todas as crianas e adolescentes, sem qualquer tipo de discriminao, bem como por se contrapor teoria do direito tutelar do menor antes adotada pelo revogado Cdigo de Menores, que considerava apenas as crianas e os
24
adolescentes em situao irregular, conforme previsto no art. 2 daquela revogada lei (2006, p. 132).
Vercelone observa: em fora da proteo integral, crianas e adolescentes
tm o direito de que os adultos faam coisas em favor deles (2000, p. 33).
O termo proteo pressupe um ser humano protegido e um ou mais seres
humanos que o protegem, isto , basicamente, um ser humano que tem
necessidade de outro ser humano. Este segundo ser humano deve ser mais forte
do que o primeiro, pois deve ter capacidade para proteg-lo. A proteo pressupe
uma desigualdade (um mais forte do que o outro) e uma reduo real da
liberdade do ser humano protegido: ele deve ater-se s instrues que o protetor
lhe d e defendido contra terceiros (outros adultos e autoridade pblica) pelo
protetor (VERCELONE, 2000, p. 19).
Diante disso, tem-se que as crianas e os adolescentes so sujeitos de
direitos, tendo inclusive, mais direitos que os outros cidados, pois diante do
princpio da proteo integral, lhes so conferidos direitos especficos, de acordo
com a sua peculiar condio de pessoa em formao.
2.3.2 Princpio do melhor interesse
Com o advento da Conveno Internacional sobre os direitos da criana,
ratificada pelo Brasil atravs do Decreto 99.710/90, o princpio do melhor interesse
da criana passou a integrar o quadro de princpios no sistema jurdico brasileira,
com base no artigo 5, 2 da CRFB/88 (PEREIRA, 2000, p. 21-22).
Conforme ensinamento de Pereira, este princpio foi consolidado no
ordenamento jurdico brasileiro com bases constitucionais e estando includo entre
os direitos e garantias adotados pelo ordenamento ou dos Tratados Internacionais
em que o Brasil faz parte (2008, p. 39).
Corroboram com o exposto, Vieira e Veronose:
Um dos principais fundamentos da doutrina da proteo integral o princpio do melhor interesse da criana. Conforme este princpio da Conveno (que foi traduzido impropriamente para o portugus como princpio do interesse maior da criana), quando houver um conflito entre interesses de crianas e interesses de outras instituies, os primeiros devem prevalecer. A aplicao do princpio do melhor interesse da criana no pode servir como justificativa para uma atuao meramente assistencialista no trato das questes relacionadas infncia, a qual
25
perversa, pois, no mais das vezes, impede a efetiva mudana. A noo de melhor interesse da criana foi fundamental para romper com o paradigma da doutrina em situao irregular. Quando a Conveno Internacional sobre os Direitos da Criana, a Constituio de 1988 e o Estatuto da Criana e do Adolescente estabelecem que o Estado, a famlia e a sociedade devem atuar sempre conforme o melhor interesse de toda e qualquer criana, enquadre-se ela ou no em uma das situaes definidas como irregulares, passou-se de um modelo parcial que regulava somente algumas situaes irregulares, para um modelo integral, segundo o qual todas as crianas e adolescentes devem ter seus direitos preservados (2006, p. 33-34).
Para Maciel, este princpio garante os direitos fundamentais s crianas e
aos adolescentes, bem como norteia o legislador, o aplicador e a todos os que se
defrontam com as exigncias da infncia e juventude (2007, p. 28-29).
A participao das crianas e dos adolescentes na sociedade tornou-se
primordial, tendo em vista que de simples coadjuvantes passaram a personagens
principais, adquirindo direitos fundamentais e possuindo a faculdade de serem
ouvidos em tudo aquilo que lhes diz respeito (PEREIRA, 2000, p. 389).
Para Pereira:
Sob este aspecto, foroso admitir que a lei influiu de maneira definitiva para que as mudanas tivessem lugar obrigando no s o Governo e a famlia, mas toda a populao a repensar o modo de tratar esse seres em condio peculiar de desenvolvimento (2000, p. 389)
O princpio do melhor interesse alm de estabelecer uma diretriz vinculativa
para encontrar as solues dos conflitos, deve buscar mecanismos eficazes para
fazer valer, na prtica, essas mesmas solues (LAURIA, 2002, p. 37).
Diante disso, verifica-se que o princpio do melhor interesse favorece a
criana e o adolescente em relao s demais pessoas, sempre que houver
conflito de interesses.
2.3.3 Princpio da prioridade absoluta Prioridade absoluta criana e ao adolescente quer dizer que a proteo a
estes deve estar em primeiro lugar, pois este princpio tem como objetivo o
resguardo de seus direitos fundamentais.
Segundo Henriques: o princpio da prioridade no deixa de ser uma
complementao ao princpio da proteo integral, na medida em que, para se
26
garantir a proteo integral das crianas, muitas vezes ser imprescindvel garantir-
se a sua prioridade no tratamento (2006, p. 137).
Para Maciel (2007, p. 20), o princpio da prioridade absoluta visa dar
prioridade ao atendimento de crianas e adolescentes, seja na via judicial,
extrajudicial, administrativo, social ou familiar. Este princpio tem como objetivo
realizar a proteo integral, assegurando primazia para facilitar a realizao dos
direitos fundamentais estabelecidos no artigo 227, caput, da CRFB/88, bem como o
que est previsto no caput do artigo 4 do ECA:
Art. 4. dever da famlia, da comunidade, da sociedade em geral e do poder pblico assegurar, com absoluta prioridade, a efetivao dos direitos referentes vida, sade, alimentao, educao, ao esporte, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria. Pargrafo nico. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteo e socorro em quaisquer circunstncias; b) precedncia de atendimento nos servios pblicos ou de relevncia pblica; c) preferncia na formulao e na execuo das polticas sociais pblicas; d) destinao privilegiada de recursos pblicos nas reas relacionadas com a proteo infncia e juventude (BRASIL, 2010d).
Segundo Veronese a garantia da prioridade compreendida no pargrafo
nico do artigo 4, ser promovida e fiscalizada pelo Ministrio Pblico nos termos
de suas funes institucionais (2006, p. 16).
A prioridade para criana e o adolescente deve ser aplicada pela famlia,
comunidade, sociedade e Poder Pblico. O princpio da prioridade absoluta, como
o prprio nome j diz, absoluto, e no cabe qualquer questionamento de seu
contedo (MACIEL, 2007, p. 26).
Nesta linha, Veronese explica:
Por absoluta prioridade devemos entender que a criana e o adolescente devero estar em primeiro lugar na escala de preocupao dos governantes. Entendemos que, na rea administrativa, enquanto no existissem creches, escola, posto de sade, atendimento preventivo e emergencial s gestantes, condies dignas de moradia, trabalho, no se deveria ter como principais aes do tipo: asfaltar ruas, construir praas, sambdromos, monumentos etc., porque a vida, a sade, o lar, a preveno e o tratamento de doenas so mais importantes que as obras de concreto que ficam para demonstrar o poder do governante (2006, p. 16).
27
O princpio da prioridade absoluta serve tanto como critrio interpretativo na
soluo de conflitos, como refora verdadeira diretriz de ao para a efetivao dos
direitos fundamentais, na medida em que estabelece a prioridade na realizao das
polticas sociais pblicas e a destinao privilegiada dos recursos necessrios
sua execuo (CUSTDIO, 2009, p. 35).
Conclui-se, ento, que em qualquer circunstncia a criana e o adolescente
devem receber proteo imediata, com prioridade em relao aos outros seres
humanos.
28
3 A PUBLICIDADE E SUAS REGULAMENTAES
Neste captulo, se estudar a publicidade e suas regulamentaes, mediante
o sistema privado, administrativo e pblico de controle.
3.1 Conceito de publicidade
Cumpre ressaltar acerca do surgimento do conceito de publicidade, termo
este que tem origem no latim publicus, que significava expor ao pblico, publicar.
No Brasil, o termo publicidade surgiu atravs da adaptao ao francs, publicit,
que significa qualidade do que pblico, ou carter do que feito em pblico
(MARTNEZ, 2001, p. 76).
O objetivo principal da publicidade persuadir os consumidores, para
adquirir determinados produtos ou servios, sem jamais informar suas limitaes,
pois o objetivo da publicidade informar para vender (HENRIQUES, 2006, p. 38).
SantAnna, define publicidade da seguinte maneira:
A publicidade um meio de tornar conhecido um produto, um servio ou uma firma. Que seu objetivo despertar, na massa consumidora, o desejo pela coisa anunciada, ou criar prestgio ao anunciante. Que faz isso abertamente, sem encobrir o nome e intenes do anunciante. Que os anncios so matrias pagas (2001, p. 76).
Saad, Saad e Castello Branco (2006, p. 491), por sua vez, acrescentam o
seguinte acerca da publicidade:
unnime o consenso de que publicidade uma forma de comunicao identificada e persuasiva visando a divulgao de um evento ou dirigida aos consumidores de determinado produto ou servio. Nesse conceito, vislumbra-se a utilizao, pela publicidade, de todos os meios de comunicao, sejam eles de massa ou no, desde que permitam a materializao da idia encerrada no vocbulo: tornar pblicos uma mercadoria ou um servio.
Para Martnez (2001, p. 76), identifica-se a primeira caracterstica do termo
publicidade como a ao humana de levar algo ao conhecimento pblico.
A publicidade uma forma de marketing indispensvel para venda de
produtos e servios. Sem ela, as demandas reduziriam, e consequentemente
milhares de pessoas perderiam o emprego. Diante deste crculo de produo,
29
salrio e consumo, verifica-se que a publicidade um bem necessrio para prtica
comercial (MARTNEZ, 2001, p. 35).
Com base nestes ensinamentos verifica-se que a publicidade um
importante veculo de comunicao entre o consumidor e o fornecedor, objetivando
um reconhecimento da populao, e para isso utiliza-se de meios de comunicao
para expor uma marca, um produto ou um servio (SANT'ANNA, 2001, p. 76).
Martinez ensina:
[...] a publicidade de consumo pode, enfim, ser definida como o ato lcito, efetuado s expensas do fornecedor, voltado a levar ao conhecimento exclusivo do pblico consumidor uma imagem ou uma mensagem com um contudo informativo, com fins econmicos destinados a fomentar direta ou indiretamente a realizao de negcios jurdicos de consumo: diretamente quando vier a ofertar a realizao de um negcio jurdico de consumo e indiretamente quando vier a divulgar a pessoa do fornecedor ou seus bens de consumo, para que o consumidor, quando da realizao de um negcio jurdico de consumo, prefira este ao da concorrncia (2001, p. 80).
O aumento do consumo no mercado cresceu com o decorrer do tempo,
devido ao aumento do mercado publicitrio, que atualmente faz parte do cotidiano
e influencia as pessoas, no somente a adquirir bens, mas tambm influencia no
comportamento dos seres humanos (HENRIQUES, 2006, p. 21).
sabido que a publicidade oferece benefcios tanto ao consumidor quanto
ao fornecedor, e gera para as empresas um retorno financeiro, que na maioria das
vezes o objetivo da divulgao publicitria (SANT'ANNA, 2001, p. 76).
Ocorre que para trazer benefcios necessrio um controle, para que a
publicidade no passe a trazer malefcios aos consumidores. Neste sentido, Nunes
explica:
A publicidade como meio de aproximao do produto e do servio ao consumidor tem guarida constitucional, ingressando como princpio capaz de orientar a conduta do publicitrio no que diz respeito aos limites da possibilidade de utilizao desse meio (2009, p. 66).
Diante do que foi exposto, resta claro o conceito de publicidade perante a
sociedade de consumo. Ocorre que diariamente as pessoas confundem a
publicidade e a propaganda, ou seja, interpretam como se fossem sinnimos. A
seguir, cabe-nos distinguir tais termos.
3.1.1 Distino entre publicidade e propaganda.
30
Para melhor compreenso do tema, cabe distinguir os termos publicidade e
propaganda, sendo que neste trabalho o foco da pesquisa a publicidade.
Diferencia-se publicidade de propaganda inicialmente pelo significado
originrio de cada palavra, ambas oriundas do latim.
Segundo Martnez Propaganda uma palavra latina derivada do gerndio
do verbo propagare. Significa a disseminao ou a propagao de princpio, ideias,
conhecimentos ou teorias (2001, p.81).
Entretanto Santanna define: a palavra publicidade deriva do latim publicus,
que designa a qualidade do que pblico, de tornar pblico um fato, uma idia,
chegando at a ser interpretada como o ato de vulgarizar (2001, p. 75).
Chaise (2001, p. 9) afirma que os termos publicidade e propaganda so
utilizados indistintamente por muitos autores e profissionais da rea publicitria,
bem como no dia-a-dia do mercado. Porm, embora usados como sinnimos, no
significam rigorosamente a mesma coisa.
Segundo Henriques, a publicidade tem sempre natureza comercial, j a
propaganda visa difundir por meio da propagao de princpios e teorias, sistema
ideolgico de contedo social, poltico, tico, moral, econmico ou religioso, sem
carter comercial (2006, p.37).
SantAnna explica:
Vemos, pois, que a palavra publicidade significa, genericamente, divulgar, tornar pblico, e propaganda compreende a idia de implantar, de incluir uma idia, uma crena na mente alheia. Comercialmente falando, anunciar visa promover vendas e para vender necessrio, na maior parte dos casos, implantar na mente da massa uma idia sobre o produto. Todavia em virtude da origem eclesistica da palavra, muitos preferem usar publicidade, ao invs de propaganda; contudo hoje ambas as palavras so usadas indistintamente (2001, p. 75).
A propaganda, assim como a publicidade, no deixa de ser uma forma de
divulgao, porm de carter no econmico, que direcionada a levar ao
conhecimento das pessoas uma idia, teoria ou crena, visando o convencimento
ou esclarecimento de outro (MARTNEZ, 2001, p. 82).
Para Mello, a propaganda tem sentido diverso da publicidade, pois
enquanto a primeira pode ter apenas carter informativo, cultural ou educativo, sem
31
fins lucrativos, a segunda sempre detm a funo de criar necessidades de
consumo, com finalidades econmicas (1998, p. 81).
Nesta mesma linha, Almeida explica:
Tecnicamente, os dois conceitos diferem: enquanto a publicidade representa uma atividade comercial tpica, de mediao entre o produtor e o consumidor, no sentido de aproxim-los, j a propaganda significa o emprego de meios tendentes a modificar a opinio alheia, num sentido poltico, religioso ou artstico (2003, p. 85).
Rodycz corroba com o ensinamento:
Publicidade sempre de natureza comercial. Propaganda uma tcnica que visa obter a adeso a um sistema ideolgico, poltico, social, econmico ou religioso; utiliza meios idnticos aos da publicidade, tem finalidade de provocar, do mesmo modo, uma deciso de adeso, mas seu objeto de natureza ideolgica e no comercial (1993, p. 59).
Cabe salientar que a CRFB/88 no faz distino entre os termos publicidade
e propaganda. Em seus artigos ela traz a propaganda (art. 220, 3 , II),
propaganda comercial (art. 22, XXIX, e 4 do artigo 220), publicidade dos atos
processuais (art. 5, LX) e por fim, publicidade (art. 37, caput e 1) (NUNES,
2009, p. 418).
Portanto, conclui-se que o fim econmico e comercial o principal distintivo
entre a propaganda e a publicidade.
Porm, no presente trabalho ser utilizado apenas o termo publicidade, de
acordo com as conceituaes acima explicadas, ou seja, a forma de divulgao de
um produto ou servio, com fim comercial.
3.2 A publicidade abusiva
O CDC prev dois tipos de publicidade ilcita: a enganosa e a abusiva. A
publicidade enganosa est ligada quilo que se pretende inserir no mercado,
levando o consumidor ao erro na escolha do produto ou servio, por acreditar nas
vantagens expostas na oferta. J a publicidade abusiva, diz respeito a forma de
abordagem do consumidor, no sendo obrigatrio qualquer vnculo da nocividade
da publicidade com as caracterstica do produto ou servio oferecido
(HENRIQUES, 2006, p. 76).
Primeiramente, cabe-nos trazer a tona o texto de lei que distingue estes
termos, qual seja, o artigo 37 do CDC:
32
Art. 37. proibida toda publicidade enganosa ou abusiva. 1 enganosa qualquer modalidade de informao ou comunicao de carter publicitrio, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omisso, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, caractersticas, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preo e quaisquer outros dados sobre produtos e servios. 2 abusiva, dentre outras a publicidade discriminatria de qualquer natureza, a que incite violncia, explore o medo ou a superstio, se aproveite da deficincia de julgamento e experincia da criana, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa sua sade ou segurana (BRASIL, 2010e).
Neste trabalho enfocar-se- a publicidade abusiva, sendo prevista no artigo
37, 2 do CDC, mais precisamente em sua parte final onde prev, [...] se
aproveite da deficincia de julgamento e experincia da criana, e sendo proibida
pelo art. 6 deste mesmo diploma legal:
Art. 6 So direitos bsicos do consumidor: [...] IV - a proteo contra a publicidade enganosa e abusiva, mtodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra prticas e clusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e servios (BRASIL, 2010e).
Marques, Benjamin e Miragem definem: , em resumo, a publicidade
antitica, que fere a vulnerabilidade do consumidor, que fere valores sociais
bsicos, que fere a sociedade como um todo (2004, p.482).
Segundo Almeida:
Esse tipo de publicidade no chega a ser mentirosa, mas distorcida, desvirtuada dos padres da publicidade escorreita e violadora de valores ticos que a sociedade deve preservar. Alm disso, deturpa a vontade do consumidor, que pode, inclusive, ser induzido a comportamento prejudicial ou perigoso sua sade de segurana (2003, p. 117).
A publicidade abusiva deixa de lado questes de ordem moral, tica ou
social, esquece a existncia de valores culturais para venda de produtos ou
servios, ou mesmo a inexperincia de crianas ou de outras classes de
consumidores com baixa capacidade crtica (JACOBINA, 1996, p. 95).
Nunes acrescenta:
Aqui tambm importante frisar que para a caracterizao da natureza abusiva de um anncio no necessrio que ocorra de fato um dano ao consumidor concreto ou uma ofensa concreta. Basta que haja perigo; que exista a possibilidade de ocorrer o dano, uma violao ou ofensa. A
33
abusividade, alis, deve ser avaliada sempre tendo em vista a potencialidade do anncio em causar um mal (2009, p. 478).
Ocorre que quando uma publicidade abusiva veiculada pode-se impedir
sua transmisso individual ou coletivamente, atravs do Procon, por exemplo, pois
o artigo 81 e seguintes do CDC garantem a possibilidade de ajuizar a defesa do
consumidor individualmente ou a ttulo coletivo.
Fonteles explica:
Sendo, portanto o judicirio acionado, seja individual ou coletivamente, por meio de seus rgos pblicos de defesa do consumidor, poder determinar a supresso tanto do anncio veiculado como da campanha inteira do anunciante ou parte dela. Pode tambm o judicirio impedir a publicao e/ou transmisso do anncio como medida preventiva, segundo o que est determinado no art. 6, VI do CDC (2008, p. 35).
Segundo Fonteles, a agncia como produtora do anncio, responde
solidariamente com o anunciante, independentemente de haver clusula contratual
entre ambos que tenha a previso de que uma vez aprovado o anncio pelo
fornecedor, isenta a agncia de um possvel dano (2008, p. 35).
O CDC em seus artigos 67 e 68, prev a publicidade abusiva como crime: Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva: Pena Deteno de trs meses a um ano e multa (BRASIL, 2010e). Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua sade ou segurana: Pena - Deteno de seis meses a dois anos e multa (BRASIL, 2010e).
Para Fonteles, a medida condenatria mais importante e eficaz aplicada pelo
judicirio nesses casos aplicar ao fornecedor a obrigao de realizar a
contrapropaganda (ou contrapublicidade) (2008, p. 36).
O CDC assim estabelece:
Art. 60. A imposio de contrapropaganda ser cominada quando o fornecedor incorrer na prtica de publicidade enganosa ou abusiva, nos termos do art. 36 e seus pargrafos, sempre s expensas do infrator. 1 A contrapropaganda ser divulgada pelo responsvel da mesma forma, freqncia e dimenso e, preferencialmente no mesmo veculo, local, espao e horrio, de forma capaz de desfazer o malefcio da publicidade enganosa ou abusiva (BRASIL, 2010e).
34
O objetivo da contrapropaganda atingir as mesmas pessoas que foram
submetidas publicidade abusiva ou enganosa, para tentar anular os malefcios
causados por esta (NUNES, 2009, p. 476).
Como exemplo clssico da contrapropaganda, tem-se a publicidade dirigida
ao cigarro, que anuncia o produto e em seguida expe os riscos causados por este
produto, tanto na televiso, quanto na embalagem deste produto.
Cabe salientar que os efeitos da publicidade abusiva atingem a toda
populao, portanto qualquer pessoa legtima para demandar eventual prejuzo,
portanto possui carter difuso1 (MIRAGEM, 2008, p. 172).
Verifica-se, portanto, que todas as pessoas, independente de idade, correm
o risco de serem atingidas e sofrer as conseqncias da publicidade abusiva, da
ento, a necessidade de controle desta publicidade.
3.3 Limites da publicidade abusiva
Atualmente o controle da publicidade no Brasil feito atravs de trs
maneiras distintas: o sistema privado, a via administrativa e a via judicial.
necessrio o controle da publicidade, tendo em vista que atualmente
existe o problema na sociedade moderna, em administrar o seu tempo. E diante
disso, no momento de fazer escolha de seus produtos ou servios, as pessoas
acabam confiando cada vez mais na publicidade que lhe apresentada
(HENRIQUES, 2006, p. 97).
Diante disso, sero estudadas trs maneiras de controle da publicidade.
3.3.1 O sistema privado de controle da publicidade
O CONAR o principal rgo responsvel pelo sistema privado de controle
da publicidade.
Este Conselho foi criado em 1980, constitudo em uma sociedade civil sem
fins lucrativos, objetivando zelar pela comunicao, oferecer aos profissionais da
publicidade e propaganda uma assistncia tcnica sobre a tica publicitria,
1 Prerrogativa jurdica cujos titulares so indeterminados, difusos. Um direito difuso exercido por um e por todos, indistintamente, sendo seus maiores atributos a indeterminao e a indivisibilidade. difuso, p. ex., o direito a um meio ambiente sadio." (ACQUAVIVA, 1999, p. 286)
35
divulgar os princpios norteadores e as normas do CBARP com o objetivo de
aclarar a opinio pblica acerca do ramo publicitrio, e, por fim, funcionar como
rgo judicante nos litgios ticos que envolvam a indstria publicitria (MARTNEZ,
2001, p. 168-169).
O CONAR organizado por agncias publicitrias, anunciantes, veculos de
comunicao, que aderem a este conselho e consequentemente as regras de auto-
regulamentao se destinam a eles (FONTELES, 2008, p.38).
Chaise define:
A Auto-regulamentao foi decorrncia da necessidade de manter a confiana dos consumidores nas mensagens veiculadas. Os profissionais da publicidade se aperceberam de que, no momento em que a publicidade deixasse de convencer os consumidores, no mais cumpriria sua funo primordial. Um dos objetivos da auto-regulamentao, portanto, melhorar a imagem social da publicidade (2001, p. 25).
Segundo Henriques:
Para a consecuo de seu objtivo, o CONAR atende denncias de eventuais irregularidades em peas publicitrias, que podem ser realizadas por (I) seus associados, (II) autoridades diversas, (III) consumidores em geral, ou (IV) sua prpria diretoria (2006, p. 112).
A composio do CONAR d-se por uma assemblia geral, um conselho
superior e um conselho fiscal, o qual tem como responsabilidade a administrao
geral, alm de um conselho de tica (MARTNEZ, 2006, p. 170).
O conselho de tica supracitado, indispensvel ao CONAR, isto porque
este conselho soberano na fiscalizao, julgamento e deliberao no que tange
ao cumprimento dos anncios publicitrios ao que regulamenta o CBARP
(MARTNEZ, 2006, p. 170).
Acerca do funcionamento do CONAR, Martinez esclarece:
A atuao procidemental deste rgo se inicia por ofcio ou por requerimento, que por sua vez contm uma denncia, queixa ou reclamao. Nesse sentido, segundo entendimento do prprio CONAR, cuja terminologia lhe peculiar, no contendo nenhuma sinonmia semelhante terminologia utilizada no Direito, a denncia aquele pedido inicial realizado por uma autoridade pblica, a queixa aquele pedido inicial realizado pelos consumidores e a reclamao aquele pedido inicial realizado por um membro associado da prpria instituio ou pelo Servio de Monitoria permanente de mercado da prpria instituio (2006, p. 172-173).
36
Aps a denncia, queixa ou reclamao efetivada inicia-se um processo de
investigao da acusao realizada. Este procedimento investigativo tem como
objetivo apenas averiguar os fatos, verificando-se se h realmente alguma
irregularidade na publicidade em anlise (MARTNEZ, 2006, p. 172-173).
Se a denncia, queixa ou reclamao for julgada procedente pelo Conselho
de tica, o anunciante e agnica publicitria responsveis pela publicidade em
questo, podem receber deste conselho a suspenso da divulgao da publicidade
ou surgerir-lhe correes (HENRIQUES, 2006, p. 112).
Martnez explica:
Fora o arquivamento do caso, estas so as sanes previstas por este sistema de controle da publicidade que, se bem analisadas, demonstram no ter este sistema de controle uma ndole reparatria ao no se dirigir soluo dos danos j efetivamente causados aos consumidores; visa apenas a proteo daqueles consumidores ainda no lesados pela publicidade de consumo, enfim julgada como patolgica. Assim, quando da ocorrcnia de uma publicidade negocial de consumo patolgica, o sistema privado de controle da publicidade age apenas no sentido de recomendar que a veiculao do anncio publicitrio seja suspensa ou alterada para que este no cause mais danos ao consumidor, no tendo, todavia, meios para obrigar o anunciante a cumprir o contedo preceptivo anteriormente emitido (2006, p. 174).
O CONAR possui trs formas possveis de punio: a advertncia (a
aplicao destinada a anncios que no so potencialmente nocivos aos
consumidores), a recomendao de alterao ou correo do anncio (aos casos
em que a simples alterao de parte do anncio j seja suficiente para que ele
deixe de infringir as regras de tica e uma vez alterado, ele pode voltar a ser
vinculado) e a recomendao aos veculos de comunicao social que sustem a
divulgao do anncio (este anncio no poder mais ser veiculado mesmo que
venha a sofrer alteraes) (MARTNEZ, 2006, p. 175).
Quando uma destas sanes no cumprida, o Conselho de tica pode
impor uma advertncia oral ou escrita, com a suspenso de at 12 (doze) meses
do Conselho ou mesmo uma eliminao do quadro social do mesmo (MARTNEZ,
2006, p. 176-177).
Sobre a efetividade do CONAR, Costa ensina:
37
Embora as penalidades mencionadas sejam a nvel de recomendao, at porque o poder sancionador pertence ao Estado, as decises do Conar so inteiramente acatadas, pois, alm de ser uma entidade respeitvel, representa a posio de pelo menos seis grandes entidades associativas alm de associados de alto potencial o que significa o afastamento definitivo ou a marginalizao do infrator, do ramo publicitrio, que luta pela no maculao de sua imagem idnea (1993, p. 158).
Apesar da efetividade do controle privado, a adoo do sistema pblico de
controle imprescindvel, pois por mais efetiva que seja a fiscalizao do CONAR
no campo tico, sempre poder ocorrer um desapercebimento, onde a garantia
pblica torna-se mais que necessria (MARTNEZ, 2006, p. 179).
Nesta linha:
Desse modo, com relao ao controle da publicidade negocial de consumo, o CONAR tem atuao meramente auxiliar do sistema pblico de controle da publicidade, em razo de no possuir fora coercitiva suficiente em suas decises para obrigar os anunciantes a cumprir os negcios juridicos assumidos. Por outro lado, com relao verificao da ocorrncia da enganosidade e da abusividade da publicidade de consumo, negocial ou institucional, observa-se que o CONAR tem uma atuao conjunta ao sistema pblico de controle da publicidade, por vezes suficiente para solucionar corporativamente os casos ocorridos (MARTNEZ, 2006, p. 181).
Ocorre que o controle exercido pelo CONAR no totalmente eficaz, uma
vez que depende do contrato que as empresas publicitrias tm com este rgao.
Da ento, a necessidade de punio atravs do sistema pblico de controle.
3.3.2 Controle administrativo O controle administrativo da publicidade realizado atravs do poder pblico
em seus diversos nveis e especializaes. Portanto, cabe a administrao
controlar os deveres impostos pelo microssistema, aos fornecedores das
mensagens publicitrias, tambm para que sejam reprimidas e punidas
(HENRIQUES, 2006, p. 108).
O CDC em seu art. 55, 1 prev o controle administrativo da publicidade:
Art. 55. A Unio, os Estados e o Distrito Federal, em carter concorrente e nas suas respectivas reas de atuao administrativa, baixaro normas relativas produo, industrializao, distribuio e consumo de produtos e servios. 1 A Unio, os Estados, o Distrito Federal e os Municpios fiscalizaro e controlaro a produo, industrializao, distribuio, a publicidade de produtos e servios e o mercado de consumo, no interesse da
38
preservao da vida, da sade, da segurana, da informao e do bem-estar do consumidor, baixando as normas que se fizerem necessrias (BRASIL, 2010e).
Esse tipo de controle consiste na aplicao de multa e imposio da
contrapropaganda aos agentes publicitrios, conforme preceitua o art. 56, I e XII do
CDC, sem prejuzo de sanes penais e civis (FONTELES, 2008, p. 41).
Diante disso, cabe-nos entender como o sistema pblico, controla a
publicidade.
3.3.3 O sistema pblico de controle da publicidade
A distino entre o sistema privado e o sistema pblico de controle da
publicidade, que o sistema pblico no composto apenas de um rgo com a
responsabilidade de regular a publicidade, mas sim de diversos rgos, cada um
com sua responsabilidade especfica (MARTNEZ, 2006, p. 181).
A existncia do sistema pblico de controle da publicidade imprescindvel,
j que o poder de punio do Estado ultrapassa a esfera comercial, atingindo
sanes de ordem jurdica, ou seja, impondo mais respeito s leis (CHAISE, 2001,
p. 28).
A seguir, passa-se a expor os diversos rgos da esfera pblica.
3.3.3.1 Associaes de consumidores
As associaes de consumidores, apesar de possurem natureza jurdica de
direito privado, devem estar auxiliando o sistema pblico de controle da
publicidade, com a funo de analisar os anncios, os contedos, as informaes
expostas pelos fornecedores acerca das caractersticas dos produtos
comercializados onde, quando observarem irregularidades, devem propor aes
coletivas ou at mesmo encaminhar denncias aos rgos competentes para que
estes defendam os direitos e interesses dos consumidores (MARTNEZ, 2006, p.
184).
Nunes colabora:
Nada impede que a associao cumpra vrios fins, dentre os quais a proteo dos interesses e direitos dos consumidores, como, por exemplo, pode-se dar at com um Sindicato, que a partir da Constituio Federal de
39
1988 tem a mesma natureza de associao. Basta que o Sindicato inclua entre seus objetivos institucionais a defesa do consumidor (2004, p. 704).
Deve-se porm ressaltar que, apesar da importncia e essencialidade das
associaes de consumidores, onde at o CDC tem como proposta estimular a
criao de associaes, este tipo de organizao ainda no muito comum no
Brasil (MARTNEZ, 2006, p. 184).
Essa caracterstica de ausncia de associaes d-se pela cultura do
brasileiro, que no tem como hbito social associar-se para solucionar suas lides,
preferindo buscar seus interesses individualmente. Responsabiliza-se tambm o
Poder Pblico que pouco busca o cumprimento do disposto no CDC (MARTNEZ,
2006, p. 184).
A defesa coletiva no Brasil, portanto, necessita de mais incentivos pblicos,
onde o dever do poder pblico de incentivar a criao das associaes deve ser
cumprido, bem como o cidado deve exigir tal obrigao de seus representantes
polticos, visto que tal icentivo uma previso do prprio CDC (MARTNEZ, 2006,
p. 186).
Portanto, verifica-se que este meio de proteo ao consumidor, pouco
utilizado no Brasil.
3.3.3.2 O PROCON
O PROCON (Procuradoria de Defesa do Consumidor), foi criado
primeiramente em So Paulo no ano de 1978, posteriormente difundida por todo o
Brasil, atingindo uma representatividade considervel, sendo considerado um dos
maiores rgos pblicos de defesa do consumidor da Amrica Latina (MARTNEZ,
2006, 186-187).
Martnez explica acerca da funo do Procon:
Como rgo integrante do sistema pblico de controle da publicidade, o PROCON tem uma atuao especial em face da ocorrncia patolgica da publicidade negocial de consumo, sendo a autoridade pblica incubida de aplicar as sanes administrativas em face desta ocorrncia, propor aes coletivas e, principalmente, atuar diante das reclamaes individuais dos consumidores, quando pretensamente lesados pelo no cumprimento do contedo ofertado em uma publicidade deste tipo, atividade que se d mediante um procedimento conciliatrio com vistas ao cumprimento do
40
que foi ofertado ou a reparao dos danos causados aos indivduos participantes das relaes de consumo (2006, p. 187).
Alm da funo de atender a sociedade em suas necessidades ao serem
lesados, o PROCON tambm agem de forma preventiva, no campo da divulgao
para a populao de seus direitos como consumidores (MARTNEZ, 2006, p. 188).
No que diz respeito represso:
Por sua vez, o PROCON brasileiro tambm tem competncia para impor a realizao da publicidade corretiva e de sanes pecunirias; todavia, este no est legitimado a ordenar a suspenso da veiculao de uma publicidade de consumo que viole as normas do CDC, em razo da estrutura do Direito brasileiro que destina tal ao coercitiva somente ao poder judicirio (MARTNEZ, 2006, p. 189).
Verifica-se portanto, que o PROCON, diferentemente da Associao de
Consumidores, utilizado diariamente pelos consumidores, sendo a prtica de
defesa mais comum no Brasil. Podendo este rgo municipal, agir preventivamente
com fiscalizaes e anncios, bem como, aps o ato lesivo causado ao
consumidor.
3.3.3.3 O Ministrio Pblico
A atuao do Ministrio Pblico na rea de defesa do consumidor surgiu
primeiramente no Estado de So Paulo, no ano de 1983, posteriormente, em 1984,
em Santa Catarina. Surgiu o Ministrio Pblico Consumerista nesta poca com a
funo de primordialmente atuar ao lado dos PROCONs, no mbito administrativo,
visto que ainda no havia legislao especfica acerca da matria (MARTNEZ,
2006, p. 190).
Conforme ensinamento de Martnez: aps a edio do CDC, o Ministrio
Pblico passou a agir com legitimidade nas lides judiciais que envolviam casos que
infringiam o referido cdigo, em todos os casos, inclusive nos anncios publicitrios
lesivos (2006, p. 190).
Nunes corroba:
Ento, consigne-se, desde j, que a ampliao posta na Carta de 1988 foi conseqncia natural da consolidao do Estado Democrtico de Direito, que demanda a necessidade de existncia de um rgo, como o Ministrio Pblico, capaz de zelar pelo pleno exerccio da cidadania, o que, claro, impe amplo controle de todas as normas do sistema jurdico brasileiro (2004, p. 703).
41
Sobre o assunto, leciona Martnez:
considerado como o mais habilitado e estruturado por ser a nica instituio pblica realmente presente em todas as comarcas do pas, cujos membros tem legitimidade para defender, em juzo os interesses dos consumidores em face das infraes que os afetam coletivamente pelos desvios dos atos publicitrios (2006, p. 191).
E ainda:
Dessa maneira, a efetividade da atuao do Ministrio Pblico, como parte integrante do sistema pblico de controle da publicidade, buscada com a utilizao integrada destes dois instrumentos postos a sua disposio para o controle da publicidade, possibilitando a obteno de cleres solues para as lides de consumo, em face da ocorrncia patolgica dos atos publicitrios, em mbito coletivo, muitas vezes sem a necessidade da instaurao do procedimento judicial que, s em ltimo caso adotado aps se esgotarem todas as formas conciliadas de soluo do conflito (MARTNEZ, 2006, p. 195).
Assim como nas diversas reas do direito, o rgo ministerial
importantssimo no que diz respeito a defesa do consumidor, eis que tem
legitimidade para defender e fiscalizar todo o tipo de publicidade abusiva que
prejudica o consumidor.
3.4 As normas do sistema pblico de controle da publicidade
As normas do sistema pblico de controle da publicidade podem ser
subdivididas em trs blocos, sendo eles: primeiramente o fundamento para o
surgimento de qualquer outra regulamentao, que a CRFB/88, o segundo bloco
estaria sendo composto pelo CDC e finda o terceiro bloco as demais legislaes
ordinrias (MARTNEZ, 2006, p. 202).
A seguir, far-se- um breve comentrio acerca da publicidade interligada a
estas legislaes.
3.4.1 A publicidade e a CRFB/88
A CRFB/88 regulamenta em alguns de seus artigos a publicidade. Vejamos:
42
Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes: [...] IX - livre a expresso da atividade intelectual, artstica, cientfica e de comunicao, independentemente de censura ou licena (BRASIL, 2010b).
Art. 220: A manifestao do pensamento, a criao, a expresso e a informao, sob qualquer forma, processo ou veculo no sofrero qualquer restrio, observado o disposto nesta Constituio (BRASIL, 2010b).
Com embasamento nestes dispositivos supra mencionados, publicitrios
recriminam a constitucionalidade do sistema pblico de controle da publicidade,
fundamantando tal pensamento na liberdade de expresso garantida
constitucionalmente (MARTNEZ, 2006, p. 202-203).
Pasqualotto corroba:
As restries que se fazem publicidade so freqentemente confrontadas com argumentos em favor da liberdade de expresso. Segundo essa linha de raciocnio, a publicidade seria uma forma de expresso protegida constitucionalmente e, por isso, no seria suscetvel de restries. Ela seria uma espcie de liberdade de palavra, de manifestao do pensamento ou de liberdade de expresso artstica. Qualquer forma de limitao constituiria uma espcie de censura (1997, p. 64).
Porm, apesar de observar a crtica efetuada pelos publicitrios, deve-se
lembrar que a CRFB/88 garante realmente a liberdade de expresso, de
pensamento, de criao e de informao, entretanto, esto presentes no mesmo
diploma legal outras garantias e direitos que devem ser observados em detrimento
do direito anteriormente mencionado (MARTNEZ, 2006, p. 203).
Apesar de CRFB/88 ter garantido a liberdade de expresso, tambm criou
ao mesmo tempo mecanismos que atribuem ao Estado o direito de controlar
determinadas atuaes dos meios de comunicao, atravs do art. 220, 3, logo,
tambm dos anncios publicitrios, com o objetivo de garantir o direito dos
consumidores (MARTNEZ, 2006, p. 204).
Esse controle efetivado pelo Estado, alm de garantir uma segurana no
meio consumerista, tambm evita que abusos sejam cometidos pelos informes
publicitrios, observando portanto que no se trata de uma maneira inconstitucional
43
de censura, mas sim de um instrumento eficaz de proteo para a populao
(NERY JR., 1992, p. 67).
Nota-se que o sistema pblico de controle da publicidade fundamentado
em dispositivos constitucionais, garantindo maior proteo ao consumidor.
3.4.2 A publicidade e o CDC Foi com o advento do CDC que a publicidade passou a ser especificamente
regulamenta por lei, nos arts. 30 38, sendo que no limita o seu desenvolvimento
nem consubstancia censura (HENRIQUES, 2006, p. 28).
Acerca do CDC, pode-se mencionar que a principal legislao no que
tange ao sistema pblico de controle da publicidade, sendo nele caracterizado e
definido o que uma publicidade de consumo bem como suas divises enganosas
e abusivas (MARTNEZ, 2006, p. 206).
O CDC trata especificamente da publicidade inicialmente no artigo 36:
Art. 36. A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fcil e imediatamente, a identifique como tal. Pargrafo nico. O fornecedor, na publicidade de seus produtos ou servios, manter, em seu poder, para informao dos legtimos interessados, os dados fticos, tcnicos e cientficos que do sustentao mensagem (BRASIL, 2010e).
Importante salientar que todas as informaes fornecidas pelo fornecedor,
neste caso, produtor, agncia ou anunciante, sejam de real efetividade, onde tudo
o que oferecido ou informado deve ser verdico (SAAD; SAAD; CASTELLO
BRANCO, 2006, p. 492).
E, Saad, Saad e Castello Branco (2006, p. 492) complementam:
Acreditamos que essa exigncia no deixa de envolver a agncia responsvel pelo programa publicitrio. No preparo das mensagens ao pblico, no deve basear-se em breves informaes sobre o produto; assiste-lhe direito de solicitar ao anunciante (ou ao fornecedor) esclarecimentos que dem publicidade, veculada pelo rdio, televiso ou outros meios de comunicao de massa, a autenticidade exigida pelo Cdigo de Defesa do Consumidor. Sempre existe a possibilidade de um anncio inverdico dar causa a danos pessoais ou materiais ao consumidor.
Lembra-se que o CDC vai ao encontro da CRFB/88, resguardando
primordialmente o princpio da livre manifestao do pensamento, observando
44
sempre o interesse e os direitos garantidos aos consumidores, atribuindo disciplina
a publicidade e propaganda (SAAD; SAAD; CASTELLO BRANCO, 2006, p. 488).
Henriques ensina:
O sistema repressivo do Cdigo de Defesa do Consumidor pe disposio do consumidor diversos mecanismos, sendo que, no tocante publicidade, existem trs esferas de proteo: (I) possibilidade de o consumidor receber indenizao patrimonial e moral pelos danos que tiver sofrido; (II) aplicao de penalidades administrativas; (III) aplicaes de sanes penais (2006, p. 98).
Portanto, verifica-se que o CDC uma ferramenta importantssima para
efetiva proteo ao consumidor, visto que trata especificamente acerca da
publicidade, proibindo qualquer tipo de publicidade ilcita.
45
4 PUBLICIDADE ABUSIVA DIRIGIDA CRIANA
Neste captulo, se estudar a vulnerabilidade e hipossuficincia da criana
diante da publicidade abusiva, bem como os meios de proteo criana.
4.1 A criana em face da publicidade
Atualmente s crianas, entendidas como indivduos entre 0 e 12 (doze)
anos incompletos, esto sendo cada vez mais alvos de publicidade abusiva no
Brasil.
A publicidade dirigida criana deve ter limites restritos porque a criana,
diferentemente do adulto, no possui discernimento para compreend-la em sua
magnitude. Para a criana, mais difcil at mesmo reconhecer a mensagem
publicitria como prtica comercial que , ainda que no seja clandestina,
subliminar ou disfarada. Ao contrrio do adulto, que possui mecanismos internos
para compreender as diversas artimanhas utilizadas pela publicidade, a criana
no tem condies de se defender dos instrumentos de persuaso criados e
utilizados pela to poderosa indstria publicitria. Deve, por isso, ser
cuidadosamente protegida (SANTOS, 2007, p. 223-224).
Nesta linha:
[...] o mercado publicitrio uma poderosa indstria, cheia de artimanhas e mtodos eficientes, capazes de formar o convencimento das pessoas de uma maneira geral e principalmente dos consumidores, reais e potenciais. Dispe, para tanto, de grande arsenal de mecanismos, tais como pesquisas e estudos comportamentais de todas as espcies e para todas as questes que se coloquem. Na briga de foras, mesmo o adulto, em relao publicidade, uma formiguinha frente a um elefante. A criana, nesse universo, , ento, uma micropartcula infinitamente mais vulnervel. , alis, juridicamente hipossuficiente frente a toda e qualquer publicidade (HENRIQUES, 2006, p. 151).
A criana atualmente considerada como uma importante consumidora,
com ativa participao no mercado. As agncias, os publicitrios, anunciantes e
comerciantes, envolvem e seduzem as crianas atravs da publicidade abusiva, se
aproveitando da deficincia de julgamento e experincia das mesmas
(HENRIQUES, 2006, p. 15).
Henriques expe acerca de algumas realidades atuais:
46
Hoje em dia, a criana em idade escolar j recebe mesada e possui, com isso, certo livre arbtrio para fazer suas escolhas, muitas vezes fazendo pequenas compras ao seu bel prazer. Mesmo as compras maiores, quando dirigidas ao pblico infantil, saem realizadas de acordo com a vontade das crianas, at porque, como atenta Paulo de Saller Oliveira, [...] o brinquedo produzido na sociedade capitalista procura seduzir tanto os filhos quanto os pais. Os primeiros, para se sentirem atrados; os segundos, para que adquiram os brinquedos para os filhos (2006, p. 150-151). (grifo no original)
Segundo Mothersbaugh, Best e Hawkins (2007, p. 65-66) mesmo sem
ganhar dinheiro, as crianas vm assumindo um papel cada vez mais ativo na
escolha de produtos. Elas so fortes influenciadoras.
Verifica-se que recebendo dinheiro ou no, a criana uma importante
consumidora para no mercado atual.
Montigneaux explica:
Ator econmico de primeira classe, a criana considerada cada vez mais responsvel nos mecanismos de consumo [...] Seu poder de compra considervel, que este seja conseqncia, diretamente, do dinheiro da mesada que as prprias crianas gerenciam, seja indiretamente por intermdio de pedidos acolhidos. Trata-se de uma populao fortemente influenciadora, participantes das decises de compras de produtos e servios que lhe dizem respeito diretamente ou que fazem parte do conjunto familiar. [...] A introduo de personagens atrativos ao pblico infantil em embalagens de produtos ou de personagens licenciados que fazem sucesso entre os pequenos nos mais diferentes produtos contribui para que a criana seja atrada e induzida a querer determinado produto, no pela sua qualidade ou caractersticas nutricionais, mas para garantir a obteno do brinquedo. No raro, as crianas pressionam seus pais para que adquiram certo produto que viram na televiso ou que contm determinado personagem como anunciante. O posicionamento das crianas de pedir insistentemente um produto responsvel por muitos desgastes familiares e sociais. Essa estratgia, altamente recomendada entre os publicitrios para impulsionar a venda de determinados produtos (2003, p. 17-18).
Essa grande influncia que crianas possuem sobre seus pais,
conseqncia do modo de vida urbano atual. Com o grande risco de violncia, e
com o pouco tempo dos pais para cuidar e brincar com seus filhos, as crianas
esto diuturnamente expostas mdia como televiso, internet, MP3 playres, entre
outros (FONTELES, 2008, p. 59-60).
Os pais para compensarem as horas passadas longe dos filhos devido ao
trabalho e a movimentada vida urbana, procuram compensar-lhes com presentes,
47
levando-os ao shopping para passear, por exemplo. As crianas por sua vez, no
tm noo de limites e anseia por satisfaes imediatas do que lhe
estrategicamente oferecido, e os pais para agradar, acabam adquirindo os produtos
que os filhos desejam (FONTELES, 2008, p. 61).
Se, por um lado os pais precisam que os filhos se ocupem em frente aos
aparelhos eletrnicos, por outro a luta contra a televiso caracteriza-se pela forma
desleal com que estratgias so utilizadas para agradar as crianas e,
maciamente,estimul-las ao consumo. O consumo infantil fatura cerca de US$ 15
bilhes por ano e, o poder de persuaso das crianas nas compras dos adultos
aproxima-se de US$600 bilhes. Ou seja, o marketing infantil, que anteriormente se
restringia ao campo das empresas de brinquedos,