Diálogo e a Dialogicidade No Clown (Para Orientação 1.2)

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I. O Que é Clown?

Clown, tradução inglesa para o termo palhaço, entretanto as duas palavras se

diferentes etimológicamente. A palavra palhaço deriva do italian do paglia que significa

palha. Os cômicos circenses costumavam preencher suas roupas com palha. Com isso,

além de deformar o corpo com aspectos de grandes nádegas, seios avantajados ou

enormes barrigas, o revestimento de palha amortecia as quedas e dava proteção para as

acrobacias. Para tanto, estes cômicos ficaram conhecidos como pagliaccio, exatamente

pela presença da palha no seu vestuário e é deste termo que, posteriormente, resulta no

termo palhaço. (RUIZ apud SACCHET 2009)

O termo clown começou a ser utilizado na Inglaterra do século XVI. Originou-

se de palavras que indicavam tipos camponeses, rústicos, pessoas que viviam nos

campos, longe das capitais e cidades grandes. Eram pessoas de baixa escolaridade e

cultura rústica, conhecidas por clod e colonus. Esses termos, que podem ser traduzidos

tanto para bronco, estúpidos, grosseiros, como também para matuto, jeca ou caipira

serviam tanto para se referenciar a esse grupo de pessoas quanto para ofender, com isso

os termos passaram a compreender-se com peso pejorativo. (CASTRO apud SACCHET

2009)

Foi traduzido para o português como palhaço, mas tanto o termo clown quanto

o termo palhaço são usados atualmente no pais. Há uma cisão conceitual advinda de um

distanciamento teórico entre diferentes escolas e tradições artísticas presentes no Brasil

e no mundo, e que dá ao termo clown uma enfase maior. Por um lado o declínio e a

desvalorização do circo tradicional, mambembe, de lona desvaloriza o termo palhaço.

Por outro a ascensão da tradição teatral aliada à produção de pesquisa acadêmicas, que

proporcionaram um aprofundamento teórico, fortaleceram o termo clown. Com isso, os

dois termos passaram a ser utilizados para discriminar as duas práticas. Clown ficaria

para designar a tradição mais teatral, acadêmica e palhaço para designar o artista de

circo e feira. (SACCHET, 2009) Esta pesquisa utilizará os termos clown e palhaço de

forma genérica, sem distingui-los entre si. Podem ser utilizados livremente, mas sempre

designarão o mesmo sentido.

Na tradição circense, até meados do século XIX, o clown caracterizava-se por

satirizar e parodiar os números do próprio circo, com isso, todo artista cômico

responsável por estas sátiras passaram a ser conhecidos como clowns. No campo do

circo, designava-se ao clown a participação em pequenas cenas que exploravam o

caracter lúdico e tolo das experiências humanas. Desde então até a contemporaneidade

“O jogo do clown se centra no paradoxo de não se levar muito a sério, o que

permite com que ele brinque com o que quer que seja. Desta maneira pode tocar

em tabus e explicitar aquilo que não pode ser dito senão a partir do próprio fato

colocado ao avesso.” (DORNELES, 2003, p.17).

Essas cenas começaram a ser executadas por duas figuras distintas, mas

essencialmente clownescas; O Clown Branco e o Augusto. O Branco personifica o

caráter apolíneo. Seus gestos são exatos e majestosos, educados e com trajes sempre

elegantes. Nomeado assim pelo seu tipo de maquiagem que cobria todo o rosto de um

branco intenso e ressaltava apenas as sobrancelhas e de vermelho intenso a boca e as

orelhas apenas. Essa figura recebe ordem própria e demonstra superioridade em

referência ao Augusto, mas ainda assim cômica. O tipo Augusto, por sua vez, revela o

dionisíaco. Suas características revelam as raízes do nome clown. Bronco, estúpido e

desajustado o Augusto se apresenta como a figura mais próxima do que se pensa sobre

palhaço no senso comum. O seu nariz vermelho remete a estupidez de cair de cara no

chão e do álcool ingerido, que avermelha o nariz e as bochechas. (BOLOGNESI,

2003).

O clown traz consigo uma liberdade cênica e existencial. Mesmo a dialogar

com as técnicas cênicas mais clássicas, onde o texto, marcações dos atores e demais

aspectos desta linguagem são bastante presentes, o clown não recebe este rigor na

execução de seus números e pode negar o virtuosismo das técnicas circenses. Ele brinca

com sua performance tal qual brinca com as questões humanas que aborda.

Cenicamente ele adquire a liberdade de improvisar sem avisar com antecedência aos

seus parceiros, subverte os sentidos originais das palavras e do próprio roteiro e quebra

com as construções predefinidas dos personagens. Espera do público que apenas não o

levem ele tão à sério. Mas enquanto ele demonstra fingir um quadro de sensações e

sentimentos, ao mesmo tempo faz o público desconfiar que aqueles são realmente os

sentimentos que possui (DORNELES, 2003).

Observações genéricas e superficiais podem perceber o clown como um

personagem criado por um ator para ser utilizado num enredo cênico. Reconhece-se o

clown como estado de prontidão e brincadeira em que o sujeito se permite caricaturar e

expandir ele mesmo na sua fragilidade e no seu grotesco. Na busca deste estado se faz

necessário que o individuo entre em contato com o seus fracassos, com o que há de mais

vergonhoso em si e passe a se reconhecer como frágil ao romper com o próprio

narcisismo. Assim “inverte a lógica do fazer para o ser, pois o que ele mostra é a si

mesmo. Precisa ser e não representar. Precisa entrar em ‘estado-clown’, que é o de ser

simplesmente, sem o esforço que existe no ‘parecer’” (DORNELES, 2003, p. 52).

O clown não foi inventado por uma pessoa especifica, tão pouco um produto

exclusivamente ocidental. O arquétipo desta figura vai além da maquiagem já

conhecida, das roupas engraçadas e da voz excêntrica. Elementos que constituem a base

arquetípica do clown são encontrados tanto em figuras da civilização egípcia 2500 a.C.

como em tripos Indígenas Norte Americanas. Os ancestrais da figura do clown estão

ligados sempre a indivíduos excêntricos e que permeiam a margem das civilizações, ou

seja, pessoas consideradas esquisitas por beberem demais, serem loucas, deformadas ou

que protagonizam cenas bizarras, elementos ligados à loucura e aos xamãs que

subvertiam a ordem litúrgica e social, mas muitas vezes ligados também à cura,

aconselhamento e vidências. As atitudes cômicas dos clowns possibilitavam fenômenos

terapêuticos. Quando o clown lida com questões de cunho escatológico ou sexual, por

exemplo. "Rindo de assuntos tabus, a comunidade confronta a inibição de uma maneira

aberta e substitutiva" (TOWSEN, apdu DORNELES, 2003. p.19).

Na Idade Média, festas de caráter cômicos eram produzidas e frequentadas pelo

próprio clero católico. O contexto profano e que subvertiam a hierarquia e a seriedade

da Igreja Católica não agradavam à instituição, mas era tolerado. Dentre os vários tipos

que participavam da festa, homens vestidos de mulher, outros com roupas extravagantes

e coloridas, outros a imitar animais, havia também os clowns. Estes atuavam com gestos

obscenos, atos grosseiros e escatológicos (DORNELES, 2003).

Bakhtin (apud DORNELES, 2003) afirma que estas festas davam voz aos

pensamentos, eram a fala do povo. Enquanto a Igreja contemplava o plano espiritual,

eles contemplavam o profano e o grotesco, desmistificavam os jargões religiosos,

colocavam ao avesso a moral e os costumes vigente e mexiam com a estrutura

iconográfica da Igreja. Essa conduta de profanar o divino e colocar as estruturas

clericais faz do clownesco uma religião pelo avesso. Enquanto a Igreja trabalha com o

religare divino, o clown, com o riso, faz o caminho inverso e religa o homem à sua

humanidade. (DORNELES, 2003)

Alguns grupos de clowns passavam a ganhar um poder indireto, mas

oficializado. Quando a Igreja proibiu uma dessas festas, o Duque de Burgundy assinou

um decreto onde ordenava que a festa fosse mantida. Com isso um grupo chamado

Companhia de Fools se consolidou, com um papel excêntrico no social. Os membros

dessa companhia tomavam para si a tarefa de promover shows de humilhação, a satirizar

atos que feriam os bons costumes, como o roubo e espancamento de esposas. Estas

festas começaram a tomar proporções cada vez maiores, desdobrando-se no carnaval e

diversas outras festividades. (DORNELES, 2003)

Com a contra-reforma se baniu esse humor mais chulo e baixo, no entanto no

Carnaval ainda se permitia um humor comedido, um riso subversivo e menos explicito

que nas outras modalidades. O debate que discute até onde pode ir o humor já existe

desde 1558. Até o renascimento as piadas ofensivas eram mais aceitas. Os próprios

padres muitas vezes eram humorados e bufonescos. A ideia de pudor começou a ser

construída durante essa época, já que antes disso até carnificinas eram proporcionadas

para o lazer da corte, junto com bobos, malabaristas e mágicos. Com uma ideologia que

propunha um processo civilizatório, em 1520, os costumes começam a mudar

drasticamente. Proibiu-se o riso e piadas na hora das missas ou que usasse como tema a

religião e os sermões dados pelos padres. Na mesma época começa o declínio do bobo

da corte e aparecem os livros de costumes que delineavam as atitudes de etiqueta. Estes

livros desaconselhavam as gargalhadas e se não contidas, que ao menos se escondessem

os dentes com as mãos (DORNELES, 2003).

(sugestão: É preciso fazer um link do primeiro capítulo para o segundo capítulo. Não é

interessante começar a fala de Gesltat-terapia no seco. Se tiver mais informação sobre

esse lado mais subjetivo do clown, como o Estado-Clown, acho válido acrescentar

mais.)

II. O Que é Gestalt-terapia?

A Gestalt-terapia conhecida como uma teoria psicoterápica existencial-

fenomenológica, estabelecida por Frederick Perls e Laura Perls, na década de 1940,

utiliza-se do diálogo como instrumento de conscientizaçãodos dos consulentes com o

objetivo de torná-los conscientes do que fazem, como fazem, como podem transformar-

se e, concomitantemente, aprender a aceitar e valorizar a si mesmo. (YIONTEF, 1998)

A abordagem gestáltica percebe o homem como ser relacional, provido de

singularidade e liberdade para realizar escolhas vividas, entretanto com angústia e

inquietação, já que não pode escolher todas as coisas e precisa renunciar a muitas

possibilidades. (CARDELLA, 2002) (Aprofundar este paragrafo)

Assim, tanto para a gestalt-terapia como para o existencialismo, o homem se

apresenta como intérprete mais fiel de si mesmo, centro de sua própria liberdade e

libertação, detentor do pode sobre si mesmo, ainda que, momentaneamente, tenha

perdido essa aptidão para autogovernar-se. O homem, ser em projeto, faz-se em

processo, capaz de fazer opções e escolher o que deseja ou pretende ser. Livre para

realizar suas escolhas e, portanto, responsável por suas ações (idem, p.35).

A gestalt-terapia aborda tanto os aspectos subjetivos percebidos no presente,

como os aspectos objetivos observados. Ela lança mão de awarness e/ou insight. O

insight se dá na compreensão clara da estrutura, situação e da formação de padrões do

campo perceptivo, de tal maneira que as realidades significativas ficam aparentes. A

awaraness, por sua vez, se dá na maneira como o individuo se torna consciente,

essencial para a investigação fenomenológica. Com isso, a Gestalt-terapia utiliza-se da

awaraness e da experimentação para alcançar insight. (YONTEF, 1998) - (Trabalhar

um pouco mais o conceito de Awarenesse. Fazer uma conexão entre o conceito de

Awareness e Contato.)

Nota-se, em toda obra de Perls, o cuidado em esclarecer as relações de

individuo e sociedade, e articular os níveis biológico e sociocultural (TELLEGEN,

1984). Kurt Goldstein é apontado por Perls como o introdutor do conceito de

organismo como um todo e que não se pode separar o organismo do ambiente. “Assim,

temos sempre que considerar o segmento do mundo em que vivemos como parte de nós

mesmos. Aonde quer que vamos, levamos sempre uma espécie de mundo conosco”

(PERLS, 1977. p.21)

O campo é o todo, no qual as partes estão em relacionamento imediato e

reagem umas às outras, e nenhuma deixa de ser influenciada pelo que acontece em outro

lugar do campo. A partir disto, iremos compreender como o individuo faz contato e

como este contato se relaciona nesse campo (YONTEF, 1998).

A palavra contato baliza o intercâmbio entre o individuo e o ambiente que o

circunda dentro de uma visão de totalidade, visto que o organismo e meio são um todo

indivisível. Com isso, o contato se caracteriza como dinâmico, ativo e dependerá

sempre do acordo entre as partes envolvidas (D’ACRI; et. Al. 2012).

O contato não pode aceitar a novidade de forma passiva ou meramente se ajustar

a ela, porque a novidade deve ser assimilada. Ele ocorre no limite denominado fronteira

de contato. A fronteira une e separa tornando-se mais ou menos permeável, e, dessa

forma, favorece, dificulta ou impede o contato (idem)

O contato mostra-se como o reconhecimento do outro, o lidar com o outro, o

diferente, o novo e o estranho. Numa situação de contato, estamos inevitavelmente

sujeitos à possibilidade da novidade e do imprevisto (LOFFREDO, 1994). As trocas

nutritivas entre o organismo e o ambiente contêm experiência que possibilitam o

desenvolvimento do organismo. O que for assimilado pela seletividade do contato, será

aceito como nutritivo na experiência vivida e única deste organismo, e assim, o

significado do nutritivo determina-se a partir do sentido peculiar de organismo, ou seja,

de cada individuo. A troca se faz no diferente, nas possibilidades de mudança, e o

inassimilável será descartado (D'ACRI; et al, 2007).

Esta forma de fazer contato se liga diretamente à identificação e alienação. “Eu

me identifico com meu movimento (...). O eu parece ser mais importante que o outro”

(PERLS, 1977, p.23). A alienação se refere ao estranho, ao inimigo desconhecido que

está além da fronteira.

O contato possibilita que a relação ocorra, e permite a união e a separação entre

as pessoas. O encontro acontece sempre em três direções; comigo, com o outro, com o

mundo. Essa dualidade entre união e separação permitem que o ser humano possa

identificar as diferenças de sua própria identidade com a do outro. O sujeito se percebe

na diferença e na troca se motiva a buscar a mudança (PONCIANO, 1997).

A função do olhar possibilita o contato consigo mesmo e promove o contato

evidencial, descrito como a habilidade do organismo de perceber acontecimentos ou

ações que não pertencem ao próprio ato de olhar. Ambas as formas se fazem essenciais

na existência do sujeito e o equilíbrio se torna crucial. Contudo, o contato visual nem

sempre acontece e levará a experiências desprazerosas àqueles sujeitos que se

encontram em seu limiar. A fim de evitar a sobrecarga, o ser humano faz uso de dois

bloqueios na tentativa de impossibilitar o contato; a deflexão e o olhar fixo. Ambas

objetivam impedir o contato pleno com o outro, no entanto a deflexão consiste em

desviar o olhar do objeto de contato e o olhar fixo em olhar fixamente ao contrair os

músculos oculares que promove o contato morto. (POLSTER; POLSTER, 2001)

(Falar mais sobre o olhar (POLSTER: POLSTER, 2001, p. 142)

A Gestalt-terapia baseia-se no conceito de existencialismo dialógico, ou seja, no

processo de contato e de afastamento Eu-tu. Um diálogo existencial acontece quando

dois indivíduos se encontram como pessoas, em que cada um é impactada por e

responde ao outro. Não se trata de monólogos sequenciais preparados. O diálogo na

Gestalt-terapia foi ampliado para incluir um encontro entre duas pessoas, mesmo sem

palavras, como, por exemplo, a usar gestos e sons não-verbais. Um pianista poderia

dialogar com uma orquestra. Dois dançarinos podem dialogar sem palavras (YONTEF,

1998).

A atitude dialógica, assim como a atitude clownesca, dirige-se a outra pessoa de

modo a não trata-la como um objeto a ser manipulado. O Gestalt terapeuta faz o seu

contato com uma atitude eu-tu, em vez de utilizar-se de uma postura controladora, de

condicionamento e manipulação, de exploração do consulente e outras formas de eu-

isto. Os terapeutas que vão ao encontro dos consulentes, com a visão de que eles não

são capazes de se auto-regularem não tratam o outro como uma pessoa. O compromisso

com o diálogo mostra-se no relacionamento baseado no que a pessoa está a

experienciar, e respeito ao que o outro experiencia.

Conforme a terapia gestáltica, a autorregulação se configura como a base para a confiança na

fonte da vida, e por meio dela nos dirigimos à realização como a melhor expressão de nós

mesmos. Uma forma de reconhecermos o que somos e confiar que, se deixar de lado o controle,

chegaremos a ser quem somos (D’ACRI; et. al., 2012, p.32).

Não se mostra necessário programar, incentivar ou inibir de maneira deliberada.

Deixam-se as coisas livres, elas regularão a si próprias de maneira espontânea, e se elas

forem perturbadas, tenderão a reequilibrar-se (PHG, 1997). A auto-regulação dá-se no

processo pelo qual o organismo interage com seu meio, ou processo pelo qual o

organismo satisfaz suas necessidades na busca de um equilíbrio que se apresenta sempre

dinâmico (CARDELLA, 2002).

A vida caracteriza-se por um jogo permanente de estabilidade e desequilíbrio. A

satisfação de uma necessidade traz estabilidade ao individuo, enquanto o surgimento de

uma nova necessidade o desequilibra, gera tensão, e o motiva na busca de uma nova

satisfação (p.46). (Quem é o autor dessa belezinha?).

O ajustamento criativo se dá nesta auto-regulação, na abertura ao novo, no

contato vivo, referindo-se à formação de novas configurações pessoais, ou gestalten, a

partir da entrada de novos elementos através da experiência de contato. Ou seja, o

ajustamento criativo acontece como superação de antigas estruturas relacionais que já

não funcionam, através de um processo de re-estruturação com a integração do novo

(LOFREDO, 1994). Trata-se da auto-regulação do fluxo figura/fundo através do

contato. No livro, Gestalt-terapia os autores definem psicologia como o estudo dos

ajustamentos criativos. Seu tema é a transição sempre renovada entre a novidade e a rotina que

resulta em assimilação e crescimento. Correspondentemente, a psicologia anormal é o estudo da

interrupção, inibição ou outros acidentes no decorrer do ajustamento criativo. (PERLS;

HEFFERLINE; GOODMAN, 1951/1997, p. 45).

O ajustamento criativo se define como característica do processo de maturidade,

como relacionamento entre o individuo e seu meio no qual há responsabilidade da

pessoa em reconhecer e conduzir de modo bem-sucedido sua própria vida. Além disso,

o mesmo se torna capaz de criar condições vantajosas para seu bem-estar. “No

ajustamento saudável, a criatividade pode ser entendida como a posse pelo individuo da

aptidão de se orientar pelas novas exigências das circunstâncias, possibilitando inclusive

uma ação transformadora.” (D’ACRI; et. al., 2012, p.21). O ajustamento criativo torna-

se fundamental à autorregulação humana, pois, os ajustamentos podem se cristalizar,

assumir formas crônicas de relação em determinado âmbito da vivência e adquirir

formas alienadas das condições atuais.

Uma das características que definem um gestalt-terapeuta é a busca do estilo próprio. Nesse

sentido, se as características pessoais do terapeuta são enfatizadas como instrumento de trabalho

numa abordagem fenomenológico-existencial, esse instrumento deve tornar-se cada vez mais

afinado e único, para que ele possa colocar-se na relação terapeuta-cliente de forma mais

genuína (LOFFREDO, 1994, 93).

O terapeuta deve colocar-se, tanto quanto

possível, na experiência do outro, sem julgar, analisar ou interpretar, enquanto retém

simultaneamente um sentido da própria presença, independente e autônoma. A prática

desta inclusão fornece um ambiente de segurança para o trabalho fenomenológico do

paciente, e, pela comunicação da compreensão da experiência do paciente, ajuda-o a

tornar mais aguda a sua auto-awareness. Com regularidade, critério e discriminação ele

expressa suas observações, preferências, sentimentos, experiência pessoal, pensamentos,

como parte do relacionamento terapêutico. (YONTEF, 1998) “O terapeuta também,

como o artista, age a partir de seus próprios sentimentos, usando seu próprio estado

psicológico como um instrumento da terapia” (POLSTER, 2001, p.35).

Recortes

Um cômico que se apresenta ao mundo como descrito por Renato Ferracini (2003,

p217) “como a dilatação da ingenuidade e da pureza inerente a cada pessoa [...] é lírico,

inocente, ingênuo, angelical, frágil”. Completada por Luiz Otavio Burner (apud

FERRACINI) como alguém que “nunca interpreta, ele [o clown] simplesmente é. Ele

não é uma personagem, ele é o próprio ator a expor seu ridículo, mostrando suas

ingenuidades”. Mas não só isso, este trabalho vê o clown como um estado, assim como

Kasper (2004) “o que nosso trabalho busca apreender é a potência – enquanto poder de

fazer-, o que se aciona como palhaço, como o clown.” E essa potência não se exprimi

apenas na ingenuidade e delicadeza lírica, mas também no grotesco. Palhaços como

Chacovachi e Palhaço Azia que trabalham com o grotesco e com a agressividade.

Também conhecidos como bufões, eles são uma outra faceta possível do estado clown,

onde a exacerbação vem do bufo, da agressividade.

O jogo como terapia / Improvisação terapêutica

“Pratica coletiva que reúne um grupo de “jogadores” (e não atores) que improvisam

coletivamente de acordo com um tema anteriormente escolhido e/ou precisado pela

situação.” (PAVIS,2008, 222p.)

O jogo, em grupo ou individual, é uma terapia em si. Proporcionar um espaço

lúdico para o individuo jogar e expressar comportamentos sociais exercidos no mundo é

uma terapêutica com aplicações imediatas. O ato de jogar é sempre uma experiência

criativa. Uma experiência que se situa no continuum espaço-tempo da vida.

(WINNICOTT in RYNGAERT, 2009, 35)

Presença.

A presença se mostra como uma qualidade difícil de se descrever. Não se percebe pela

observação superficial do físico, mas sim pela sensação da energia vital do individuo. A

presença não se caracteriza pela demonstração corpórea de atenção. Estar presente é

estar disponível e imerso na situação imediata ao mesmo tempo que se está aberto aos

acontecimentos e as mudanças que eles podem proporcionar. “Estar no jogo

desencadeia uma disponibilidade sensorial, motora [e afetiva] que libera um potencial

de experimentação. (RYNGAERT, 2009, 55p)

A escuta

“Aparentemente nada mais simples: escutar um parceiro consiste em se mostrar

atento a seu discurso ou a seus atos e, consequentemente, reagir a eles. Muitos [...]

simulam escutar, manifestam por algumas mímicas que são todo ouvidos ou opinam

ostensivamente com a cabeça. [...] A verdadeira escuta exige estar totalmente receptivo

ao outro.” (RYNGAERT, 2009, 56p)

Ingenuidade

A postura ingenua consiste na “capacidade de não antecipar o

comportamento do outro mediantes suas próprias reações.” (57p)

REFERENCIAS

BOLOGNESI, M. FERNANDO. Palhaços. São Paulo: Editora Unesp, 2003. CARDELLA, Beatriz Helena Paranhos. A construção do psicoterapeuta: uma abordagem gestáltica. São Paulo: Summus, 2002. CARDELLA, Beatriz Helena Paranhos. A construção do psicoterapeuta: uma abordagem gestáltica. São Paulo: Summus, 2002. D'ACRI, Gladys; LIMA, Patrícia; ORGLER, Sheila (Org.) Dicionário de gestalt-terapia: "gestaltês". São Paulo: Summus, 2012. DORNELES, J. LEAL. Clown, o avesso de si: uma análise do clownesco na pós-modernidade. Rio Grande do Sul, 2003.

FERRACINE, RENATO. A arte de não interpretar como poesia corpórea do ator. 2ª ed. São Paulo: Editora Unicamp, 2003. 300 p. LOFFREDO, A.M. A cara e o rosto: ensaio sobre gestalt-terapia. São Paulo: escuta, 1994. PERLS, Frederick, Salomon. Gestalt-terapia explicada. São Paulo: Summus, 1977. POLSTER, Erving; POLSTER, Miriam. Gestalt-terapia integrada. São Paulo: Summus, 2001. 321 p. RIBEIRO, Jorge Ponciano. O ciclo do contato: temas básicos na abordagem gestáltica. São Paulo: Summus, 1997. 102 p. SACCHET , P. O. FREITAS. Da discussão “clown ou palhaço” às permeabilidades de clownear-palhaçar. Porto Alegra, 2009. TELLEGEN, Thérère Amelie. Gestalt e grupos: uma perspectiva sistêmica. São Paulo: Summus, 1984. YONTEF, Gary M. Processo, diálogo, awaress. São Paulo: Summus, 1998.