Post on 04-Dec-2015
description
2.2 A PSICOPATOLOGIA NA PERSPECTIVA DA ABORDAGEM
GESTÁLTICA
Adoecer é descobrir um jeito de sobreviver e preservar a estrutura do
“eu”, quando as condições do campo são vivenciadas como
desfavoráveis, imutáveis e inevitáveis.
2.2.1 O conceito e o desenvolvimento da neurose
Os teóricos da Gestalt Terapia desenvolveram uma compreensão dos
processos psicopatológicos do desenvolvimento a partir do estudo dos processos de
auto-regulação organísmica e das formas saudáveis de funcionamento da fronteira de
contato no campo organismo/meio. Para podermos definir o conceito de neurose dentro
dessa abordagem, precisamos partir da idéia de totalidade e de campo organismo/meio.
O pressuposto de que organismo e meio constituem partes de um mesmo todo, onde um
influencia o outro em constante relação de mutualidade, é um dos paradigmas centrais
da Gestalt Terapia. A outra idéia importante é que o organismo tende a ser uma unidade
integrada que se relaciona constantemente com seu meio e o órgão pelo qual se dá essa
relação é definido como fronteira de contato. Tudo que se passa no organismo, no nível
sensorial ou motor, se dá na fronteira de contato e é sempre uma função da interação
organismo/meio. Neste sentido, o estudo da neurose ou da forma com o indivíduo atua
em seu meio é o estudo dos processos da fronteira de contato. (PERLS, 1973/81)
A Gestalt Terapia acredita, portanto, que qualquer comportamento é
sempre uma função do campo organismo/meio. Nesta perspectiva, vai ser uma relação
de conflito existente entre o organismo e seu meio que inicialmente vai determinar a
neurose, embora aconteça depois um processo de internalização desse conflito. Sobre
isso, Perls (1942/75) esclarece: “o conflito mais importante que pode gerar uma
personalidade integrada ou neurótica é o conflito entre as necessidades sociais e
biológicas do ser humano. (...) Entretanto, com muita freqüência, o autocontrole
socialmente exigido pode ser conseguido às custas da desvirtualização ou deteriorização
de grande parte das funções da personalidade humana, gerando as neuroses individuais
e coletivas.” (p. 78-79)
A neurose é, então, o resultado da tentativa desesperada do indivíduo
para evitar o conflito e recuperar o equilíbrio na sua relação com o meio.
Todos os distúrbios neuróticos surgem da incapacidade do indivíduo
encontrar e manter o equilíbrio adequado entre ele e o resto do mundo
e todos têm em comum o fato de que na neurose, o social e os limites
do meio sejam sentidos como se estendendo demais sobre o indivíduo.
O neurótico é o homem sobre quem a sociedade influi
demasiadamente. Sua neurose é uma manobra defensiva para protegê-
lo contra a ameaça de ser barrado por um mundo esmagador. Trata-se
de sua técnica mais efetiva para manter o equilíbrio e o sentido de
auto-regulação numa situação em que sente que as probabilidades
estão todas contra ele. (PERLS, 1973/81, p. 45).
Essa estratégia de sobrevivência e de auto-regulação, no entanto, tem
como subproduto a alienação daquelas partes da personalidade que produzem o
desequilíbrio do campo organismo/meio, resultando na criação de conflitos internos,
que é a base do processo de formação das neuroses.
Em “Ego, fome e agressão”, Perls (1942/75) considera o ser humano
uma criatura essencialmente biológica com um impulso natural em direção ao equilíbrio
e faz uma adaptação do conceito biológico de auto-regulação para explicar sua visão
sobre o funcionamento psicológico. Neste sentido, toda pessoa possui uma tendência
inerente para organizar suas experiências em um todo significativo, através de processos
constantes de formação e destruição de figuras, pelos quais se dá a auto-regulação do
organismo ou seu ajustamento criativo no meio. Esse processo de auto-regulação,
portanto, se dá em um ciclo espontâneo onde uma figura dominante emerge de um
fundo indiferenciado, mobiliza energia, concentrando toda atenção sobre ela e após sua
satisfação ou fechamento, através de uma ação e de um contato com o meio, ela
desaparece gradualmente no fundo, de onde emerge uma nova figura. Este ciclo é o
processo existencial subjacente a toda experiência humana e representa o paradigma
pelo qual são descritos as formas de funcionamento saudável e patológico do indivíduo.
Para a gestalt terapia, esse fluxo natural de auto-regulação ou esse
processo de formação e destruição de figuras não interrompido é o estado saudável de
todo organismo. A expressão natural da vitalidade e do funcionamento saudável é o
impulso para atualização do Self ou para a completa realização de suas necessidades,
que requer, inevitavelmente, um contato satisfatório, sem interrupções, com o meio e
consigo mesmo.
Perls, Hefferline e Goodman (1951/97) definem a neurose como o
resultado de interrupções do ciclo de contato e da perda das funções de ego do Self, uma
vez que na interrupção do contato o que deveria ser rejeitado ou transformado é aceito
passivamente, tendo como conseqüência a divisão do Self. Como a interrupção do
contato e a aceitação passiva do que deveria ser rejeitado é uma forma de defesa do
Self, no sentido de tentar resolver um impasse existencial, no qual este se encontra
diante de uma situação que é, ao mesmo tempo, intolerável e inevitável, preferimos
dizer que a neurose é o resultado do enfraquecimento das funções de ego do Self.
Dizemos enfraquecimento, porque devido à condição de impotência, fragilidade e
dependência do neurótico diante do “outro”, suas funções de ego não são exercidas de
forma adequada às suas próprias necessidades, mas sim às necessidades que lhe são
impostas. Em fim, diante de situações intoleráveis, as quais não podem ser evitadas nem
transformadas, o Self, através de suas funções de ego, prioriza a necessidade de
sobrevivência em detrimento de seu prazer e de seu crescimento harmonioso,
produzindo as neuroses.
Na tentativa de descrever o funcionamento saudável do indivíduo e de
esboçar uma teoria que explicasse o nascimento da neurose, Perls (1942/75) postulou
estágios de desenvolvimento relacionados às etapas de nascimento dos dentes e
classificou esses estágios em pré-natal, pré-dental (amamentação), incisivo (mordida) e
molar (mastigação). A criança ao nascer faz a transição do estágio pré-natal,
caracterizado pela recepção passiva de oxigênio e de suprimento alimentar, para o
estágio pré-dental, onde ela terá que fornecer a si mesma seu próprio oxigênio e seu
alimento, através da respiração e da sucção. Com a erupção dos dentes incisivos e
depois dos molares, a criança desenvolve a capacidade para atacar ou enfrentar os
alimentos sólidos.
Perls (1942/75) via a possibilidade de interrupção do desenvolvimento
dessa capacidade como conseqüência da punição pelo ato de morder o peito da mãe. Ele
acreditava que a punição, ou a rápida e prematura retirada do peito, poderia resultar na
inibição do ato de morder ou agredir, de importância fundamental no processo de auto-
regulação organísmica e atualização do Self. O emprego dos dentes é, portanto, a
principal representação biológica de uma resistência oral saudável, feita pelo contato ou
pela agressão, e não de uma resistência neurótica, feita pela evitação do contato ou
interrupção deste. Quem não emprega seus dentes estará perdendo a capacidade para
empregar suas funções agressivas em seu próprio proveito. O fato de não preparar o
alimento para que este seja devidamente assimilado pelo organismo, terá repercussões
drásticas na estrutura de personalidade do indivíduo. Nos piores casos de pouco
desenvolvimento da capacidade de morder, mastigar e agredir, as pessoas continuam
sendo crianças de peito a vida inteira e, permanecendo com essa atitude, podem se
tornar eternas parasitas, esperando sempre algo em troca de nada, sem conseguir
alcançar o equilíbrio necessário para uma vida adulta baseada no princípio de dar e
receber.
O emprego dos dentes é a representação biológica principal da
agressão (...). Quem não emprega seus dentes mutilará sua habilidade
para empregar suas funções destrutivas em seu próprio proveito (...).
O fato de não preparar seu alimento físico para a assimilação terá
repercussões em sua estrutura caracterológica e atividades mentais.
Nos piores casos de pobre desenvolvimento dental, as pessoas
continuam, por assim dizer, sendo crianças de peito por toda a vida
(...). A criança de peito é um parasita de sua mãe e as pessoas que
mantém esta atitude durante a vida continuam sendo parasitas
ilimitados (...). Esperam sempre algo em troca de nada. Não
alcançaram o equilíbrio necessário para a vida de adulto, o princípio
de dar e receber. (PERLS, 1942/75, p. 149).
Desse modo, ao contrário da crença de Freud na primazia das
resistências anais, ligadas à retenção ou recusa em deixar sair, Perls (1942) acreditava
que existiam muitas outras formas de resistência e as mais importantes eram as
resistências orais, relacionadas à recusa em deixar entrar, referentes às primeiras
rejeições de alimento por parte da criança. O ato de repugnar, por exemplo, é uma
dessas resistências orais, é a rejeição emocional do alimento no momento em que este
entra na boca e no estômago, ou quando este contato é apenas imaginado. Na ausência
da resistência oral pela mordida ou mastigação, como conseqüência de uma imaturidade
ou inibição, a criança não encontra outra saída a não ser resistir pela repugnância, ou
seja, vomitando. O repugnar significa, portanto, uma oposição ao alimento, uma
interrupção do contato com algo que vem de fora, antes que este se converta em parte de
nós mesmos, é uma alienação ou evitação daquilo que pode ser nocivo ao organismo e
que não foi possível ser desestruturado pela agressão ou pelo contato.
Assim como a inibição do ato de morder pode gerar o ato de repugnar,
a inibição da repugnância pode gerar o ato de introjetar ou engolir inteiro. Neste sentido,
quando uma resistência natural é inibida pelo meio, o organismo, imediatamente, cria
outro tipo de resistência, ou de defesa, como forma de sobreviver ou de manter seu
equilíbrio diante de uma situação extremamente ameaçadora, que não pode ser
enfrentada diretamente. Por exemplo, se a criança é castigada por ter recusado um
alimento e é obrigada a comer aquilo de que não gosta, para resolver este conflito, ela o
engole inteiro e rapidamente sem sentir seu péssimo sabor. A introjeção é, portanto,
uma forma alternativa de resistência criada pelo organismo, depois de ter fracassado na
luta contra a imposição pelo outro de algo nocivo e repugnante. Embora seja uma forma
de deixar entrar, a introjeção é um tipo de resistência neurótica, na medida em que
interrompe o contato com o alimento, isto é, em vez de ser mastigado, ele simplesmente
é engolido inteiro.
“Na introjeção, a pessoa neutraliza sua própria existência ao evitar a
agressividade necessária para desestruturar aquilo que existe. É como se qualquer coisa
que existisse fosse inviolável; ela não vai mudá-la, deve aceitá-la tal qual ela lhe chega”
(POLSTER & POLSTER, 1973/79, p. 83).
Perls (1942/75) explica que a incorporação pelo organismo de coisas
que vêm de fora, é feita em três fases distintas: introjeção total, introjeção parcial e
assimilação, que correspondem às fases de sugar, morder e mastigar, referentes aos
estágios pré-dental, incisivo e molar do desenvolvimento dos dentes. Tanto na
introjeção total quanto na parcial, o material não é mastigado pelos molares trituradores,
permanecendo como um corpo estranho em nosso organismo. Em contraste com a
introjeção, vista como um processo patológico, Perls explica a assimilação como uma
forma saudável de incorporação do mundo através do contato, onde o material vindo de
fora é devidamente transformado pela mastigação ou agressividade natural do
organismo, facilitando, assim, sua completa integração à estrutura do Self.
Quero dizer que o alimento psicológico que nos oferece o mundo
externo – o alimento de fatos e atitudes sobre o qual se constróem as
personalidades – tem que ser assimilado exatamente da mesma forma
que nosso alimento real. Tem que ser desestruturado, analisado,
separado e, de novo, reunido sob a forma que nos será mais valiosa.
Se for meramente engolido inteiro não contribui para o
desenvolvimento de nossas personalidades. Pelo contrário, nos torna
algo semelhante a uma casa tão superlotada com coisas de outras
pessoas que não sobra lugar para as coisas do dono. (PERLS, 1975/81,
p. 47)
Polster & Polster (1973/79) esclarecem, no entanto, que nem toda
introjeção é patológica, nem sempre o material introjetado é tóxico e nem permanece
inteiro dentro do organismo, às vezes ele pode ser nutritivo e assimilável. A criança,
quando ainda não consegue mastigar, não pode transformar a substância para melhor lhe
satisfazer, a única coisa que ela consegue é aceitar passivamente o alimento ou colocá-
lo para fora, quando este lhe for repugnante e se não existirem fortes ameaças de
punição ou de perder o amor dos pais, por ela ter desobedecido ou recusado o alimento.
Quando o ambiente é de fato benéfico e merecedor de confiança, o material que ela
recebe, na maioria das vezes, é nutritivo, assimilável e agradável. Uma vez que é
permitido à criança recusar o alimento que não lhe agrada, os pais passam a reconhecer
as verdadeiras preferências e necessidades de seus filhos, procurando sempre lhes
oferecer aquilo que de fato pode lhe proporcionar satisfação, bem-estar e crescimento.
No entanto, se o ambiente não for confiável e benéfico o material oferecido à criança
pode ser tóxico e desagradável por ser incompatível com suas necessidades e caso seja
introjetado, permanecerá como um corpo estranho e nocivo dentro do próprio
organismo, impedindo seu processo natural de auto-regulação e crescimento.
Smith (1988) descreve, de forma clara e sucinta, o aspecto dinâmico e
patológico da introjeção, seu papel na construção da neurose e na interrupção do
processo de auto-regulação organísmica. Na opinião desse teórico todo processo de
interrupção do ciclo de contato está baseado na dinâmica do introjeto tóxico. Durante os
primeiros anos de seu desenvolvimento, a criança manifesta espontaneamente suas
necessidades e sentimentos e, muitas vezes, recebe de seus pais mensagens proibitivas
que bloqueiam seu impulso natural para auto-regulação ou para busca da realização de
suas necessidades. Devido a profunda dependência da criança em relação a seus pais, as
mensagens proibitivas são introjetadas, engolidas inteiras. Durante essa fase do
processo de socialização, muitas das mensagens introjetadas são bio-negativas, isto é,
são mensagens arbitrárias que não dão suporte à vitalidade da criança. As mensagens
bio-negativas são, portanto, introjetos tóxicos. Estes introjetos usualmente são mantidos
durante muito tempo de forma desconhecida e desintegrada do Self. O resultado disso é
a divisão interna da personalidade ou o conflito entre partes próprias do Self e partes
introjetadas, levando a um processo de alienação daquilo que verdadeiramente pertence
à sua estrutura.
A mensagem proibitiva, como uma voz introjetada, faz com que a
ameaça de perder o amor dos pais, por ter desobedecido a estes, se torne uma crença
fóbica, condicionada a uma catástrofe iminente, sempre que as leis proibitivas não
forem respeitadas. O introjeto tóxico carrega consigo um “deveria” ou “não deveria”
associado a uma expectativa de catástrofe. Quanto maior for o número e a variedade de
introjetos tóxicos, mais fóbica a pessoa se tornará e menos vitalidade ela terá, tornando-
se cada vez mais neurótica. A interrupção do contato, segundo Smith (1988), é,
portanto, a essência da diminuição da vitalidade e a introjeção é o processo que permite
a criação da neurose, é o processo pelo qual as mensagens tóxicas são incorporadas sem
serem assimiladas ou integradas devidamente ao Self.
Ao longo do processo de desenvolvimento, observa-se que a
resistência, inicialmente feita pela criança contra coisas vindas de fora ou contra
imposições externas, aos poucos vai se transformando numa resistência contra coisas
vindas de dentro de si mesma, se tornando um sabotador internalizado, que impede a
realização das necessidades do próprio Self, bloqueando seu processo de auto-regulação
organísmica. É esse tipo de resistência, a interrupção, evitação do contato com aspectos
próprios do Self que gera a neurose. Breshgold (1989) explica claramente como
acontece essa alienação da própria experiência, através do seguinte exemplo:
Na infância, um paciente fez o ajustamento criativo de aprender a não
tomar consciência da raiva em relação a seus pais. Isto foi necessário,
porque ele seria seriamente punido pelos pais, caso desse qualquer
sinal de sua raiva contra eles. A experiência de sentir raiva dos pais e
não poder expressá-la foi intolerável. Sentir a raiva e ter que contê-la
era uma interrupção forçada da auto-regulação organismica. Por isto,
nesta situação, a coisa mais adaptativa a fazer era não ficar com raiva
e evitar a ´awareness´ da raiva. Para que isto pudesse ser mantido, foi
necessária a introjeção das atitudes paternas – sentir raiva dos pais é
uma coisa má – e a retroflexão, tensionando os músculos para segurar
a raiva e, provavelmente, direcionando esta agressão de volta para si
mesmo. (BRESHGOLD, 1989, p. 93)
Neste sentido, a neurose se caracteriza por uma estrutura de Self
fragilizada e dividida em duas partes que lutam constantemente uma contra a outra
(dominador e dominado). A parte introjetada ou falsa (dominador - não devo sentir
raiva), formada basicamente a partir do medo de ser punida ou abandonada, por garantir
a sobrevivência da criança, torna-se a parte mais forte, enquanto a parte verdadeira ou
não introjetada (dominada - sinto raiva) torna-se mais fraca, submetendo-se às
imposições da parte introjetada, tornando-se alienada e projetada para fora das fronteiras
do Self. A alienação e a projeção, portanto, são formas de defesa ou de evitação e
interrupção do contato com aquelas experiências que entram em conflito com os
introjetos bionegativos, forçosamente reconhecidos pelo Self como fazendo parte de sua
própria estrutura (PERLS, 1975/81).
O potencial humano é diminuído tanto pelas ordens não apropriadas
da sociedade, como pelo conflito interno. A parábola de Freud sobre
as duas serventes brigando, resultando em ineficiência, é, na minha
opinião, novamente uma meia verdade. Realmente são os patrões que
brigam. Nesse caso, os patrões que brigam são os que Freud chamou
de superego e id. O id, na conceituação de Freud, é um aglomerado de
instintos e de lembranças reprimidas. Na realidade observamos que
em cada caso, o superego é oposto à uma entidade personalizada que
poderia ser chamada de infraego. Na minha linguagem, eu chamo os
patrões que brigam de dominador (topdog) e dominado (underdog). A
batalha entre os dois é tanto interna quanto externa. (PERLS, 1975/77,
p. 24)
Perls (1975/77) explica que o dominador pode ser descrito como
exigente, punitivo, autoritário e primitivo. Ele manda continuamente, com afirmação do
tipo “você deveria”, “você precisa” e “porque você não”. Estranhamente, todos nós nos
identificamos, tão fortemente com nosso dominador interno que não questionamos mais
sua autoridade. Aceitamo-la como ponto pacífico. O dominado, por sua vez, desenvolve
uma grande habilidade em fugir das ordens do dominador. Normalmente, com a
intenção de concordar apenas parcialmente com o dominador, ele responde: “sim,
mas”..., “estou tentando muito”, “da próxima vez farei melhor”, etc.
Na neurose, por conta do conflito entre “dominador” e “dominado”
internalizado, o que é essencialmente próprio do Self é alienado e colocado para fora
das fronteiras (projeção), enquanto o que é essencialmente próprio do outro é
identificado e colocado para dentro das fronteiras (introjeção). Desse modo, através de
sucessivos processos de falsa alienação (projeção) e falsa identificação (introjeção) a
função de ego do Self perde a capacidade de fazer a adequada discriminação entre o que
é próprio do Self e do outro, entre o que é identificável e alienável, entre o que é tóxico
e nutritivo no campo organismo/meio. Com essa incapacidade para fazer identificações
e alienações de forma adequada, cria-se uma confusão de limite entre o Self e o não
Self, entre o que vem de dentro e de fora. Por isso Perls, Hefferline e Goodman,
(1951/97) dizem que a neurose é o resultado da perda das funções de ego do Self. Como
conseqüência da perda das funções de ego e da interrupção do contato na fronteira
organismo/meio, acontece inevitavelmente uma percepção distorcida ou diminuída da
realidade e de si mesmo.
A diminuição do contato com o meio e consigo mesmo, torna o
neurótico confuso e inseguro sem poder mais identificar com clareza suas próprias
necessidades. Ele deixa de ser criativo e espontâneo e está sempre controlando a si
mesmo para não cometer erros ou desagradar o outro. Seu fluxo de conscientização ou
de contato com sua experiência no aqui e agora está constantemente sendo bloqueado.
Ele funciona basicamente pela interrupção de si mesmo, de sua respiração, de suas
emoções e de sua atuação no mundo. Sua vida está repleta de dúvidas, medos e
situações inacabadas que o fazem ficar preso ao passado e repetir compulsivamente os
mesmos padrões de comportamento ou de ajustamento empregados anteriormente, na
tentativa desesperada de fechar o que ficou em aberto.
Na interrupção do contato está a origem da situação inacabada.
Quando o processo de formação de figura é interrompido, a figura não é completada,
consequentemente ela não retorna inteiramente para o fundo ou não desaparece
completamente do campo, permanecendo marcas, fantasmas, lembranças ou impressões
da imagem de uma figura que ficou incompleta, de uma gestalt que ficou aberta ou de
uma necessidade que ficou insatisfeita. Após sucessivas interrupções do contato, o
campo perceptivo vai se tornando cada vez mais confuso, situações inacabadas do
passado passam a interferir na percepção da situação atual e a pessoa passa a perceber o
mundo com lentes embaçadas que distorcem a realidade. Aos poucos ela vai perdendo a
capacidade de separar e estabelecer limites ente ela e o outro; vai se misturando e se
confundindo com o meio, perdendo o contato com a realidade. Cada vez mais as
situações inacabadas insistem em voltar ao primeiro plano da consciência para serem
concluídas, contaminado e perturbando o campo sem deixar que a próxima figura emirja
de forma clara.
As próximas figuras serão inevitavelmente pouco definidas e
intensamente permeadas de significados e aspectos referentes às figuras não
completadas anteriormente. Esse fenômeno de contaminação e perturbação do campo
pode ser compreendido em outros termos como sendo o resultado de mecanismos de
projeção ou de transferência onde a pessoa traz para o presente os significados
referentes às situações do passado e percebe o outro, a relação com este ou a realidade
atual, de maneira deformada pelos conteúdos próprios de seu mundo interno e subjetivo.
É claro que esse fenômeno de perturbação do campo pela contaminação de figuras
inacabadas é inevitável e de certa forma faz parte do processo natural de relação com o
outro e com a realidade. Esse fenômeno, no entanto, gera neurose quando ele se torna
predominante, impedindo o contato pleno com o outro e consigo mesmo, que interfere
na recuperação do equilíbrio organismo/meio, no processo de integração e atualização
do Self.
A fuga, evitação ou interrupção do contato, como já podemos
perceber, é uma das principais características da neurose. Por outro lado, a destruição
pela agressão do que é nocivo à integridade do Self, é característica do funcionamento
saudável, pois envolve confronto e contato não interrompido. É importante esclarecer,
no entanto, que nem sempre a fuga e a evitação são patológicas. No princípio, esse
mecanismo pode ter sido a única saída encontrada pelo Self, no sentido de preservar sua
integridade e manter seu equilíbrio com o meio. Desse modo, todos os tipos de
interrupção do contato são potencialmente saudáveis, desde que sejam adequados à
realidade do momento, que representem uma forma criativa de adaptar-se ao meio, que
não sejam uma mera repetição automática e inconsciente de padrões arcaicos de
comportamentos aprendidos no passado, por terem sido eficientes em algumas
situações, mas que agora se tornaram inadequados e obsoletos.
Segundo Perls (1975/81), a evitação biológica de contatos perigosos,
em geral, é importante para a auto-preservação e manutenção de conceitos com os quais
nos identificamos, que estão dentro de nossas fronteiras e que são valiosos para nós.
Qualquer coisa que ameace deteriorar o todo ou as partes do Self é percebida como
perigosa ou hostil e tem que ser aniquilada, seja por meio do contato (destruição) ou da
interrupção deste (fuga). A desvantagem da fuga é quando ela se torna crônica, gerando
a possibilidade de uma desintegração mais profunda do Self. Todo contato, seja ele
hostil ou amistoso, acrescenta novas experiências, que, ao serem integradas por
assimilação, contribuem para o desenvolvimento de nossas potencialidades, desde que
não esteja carregado de perigo insuportável, ameaçando nossa estrutura. Nestes casos,
fugir ou evitar o contato pode ser uma resistência ou defesa natural do organismo contra
a possibilidade de um sofrimento ou de um conflito intolerável.
Com base nessas idéias, Delisle (1999-b) explica que a introjeção,
enquanto defesa e interrupção do contato, é a única alternativa da criança diante de uma
situação a qual não pode ser evitada pela fuga, nem tão pouco transformada pelo
contato, sendo vivenciada como um verdadeiro impasse existencial. Esse impasse
existencial, portanto, é caracterizado por uma experiência que é, ao mesmo tempo,
intolerável (carregada de hostilidade e ameaça insuportáveis) e indispensável, isto é, a
criança é obrigada a se submeter passivamente à essa situação, sob pena de perder o
amor da mãe ou de ser rejeitada por ela, uma vez que depende de forma absoluta desta,
tanto em termos físicos quanto psico-emocionais.
Delisle (1999-b) chama essas experiências tóxicas introjetadas de
microcampos introjetados. Uma vez introjetados, esses microcampos precisam ser
mantidos como fundo, pois se eles vierem à tona, o mesmo impasse existencial pode ser
revivido e com ele toda uma experiência intolerável. Para manter os microcampos
introjetados no fundo, o Self mobiliza todas as defesas; isto é, todos os mecanismos de
interrupção do contato são utilizados pelo eu (função ego do Self), no sentido de
impedir que a experiência introjetada seja revivida. Embora os microcampos sejam
mantidos no fundo, eles estão constantemente ameaçando vir à tona. Por serem
situações inacabadas, eles precisam emergir como figura para que o contato seja
completado e assim poderem ser assimilados devidamente e integrados à totalidade do
Self.
Desse modo, os microcampos introjetados contaminam as novas
figuras distorcendo a percepção da realidade externa. Nos estados psicóticos, eles
podem até substituir essa realidade. Já que a percepção da realidade é distorcida e
contaminada, o contato com o novo, ou a nova experiência não pode ser vivida, na
maioria das vezes, o que é vivido é uma reedição da situação inacabada do passado.
Este fenômeno se assemelha à compulsão à repetição de Freud ou ao apego da libido
aos objetos maus internalizados de Fairbairn. A repetição na reurose é, portanto, a
externalização ou projeção de microcampos introjetados no mundo externo e a
reativação das mesmas respostas defensivas. Neste sentido, os transtornos da
personalidade se caracterizam por seus paradoxos. Ao mesmo tempo que existe um
desejo de se livrar dos microcampos introjetados, eles são preservados; ao mesmo
tempo que eles emergem para serem assimilados através do contato, esse contato é
novamente interrompido; ao mesmo tempo que as situações inacabadas são desviadas
da consciência e empurradas para o fundo, elas retornam, contaminando o campo
presente; ao mesmo tempo que os mecanismos de bloqueio do contato protegem o Self,
eles impedem sua mudança e crescimento; ao mesmo tempo que a introjeção resolve um
conflito externo, ela cria um conflito interno... e assim por diante.
De acordo com Delisle (1999-b), o ciclo vicioso das neuroses,
mantido pela repetição de experiências intoleráveis e de respostas rígidas e obsoletas,
acontece porque os microcampos introjetados formam um campo de força, atuando no
sentido de manter viva a experiência intolerável no mundo interno, como se isto fosse
necessário à sobrevivência do Self, já que impede que esta experiência seja revivida na
relação com os objetos externos com o mesmo sofrimento e intensidade. Embora a
projeção ou externalização dessas experiências estejam sempre acontecendo sob a forma
de distorção da realidade e com sensação de perigo iminente, elas não são revividas
plenamente ou reproduzidas com a mesma intensidade, já que são interrompidas no
ponto que antecede à vivência do impasse original, que causou a introjeção primária ou
a situação prototípica inacabada.
Na experiência originária da neurose, primeiramente o Self, através de
sua “função ego”, não conseguiu transformar, nem evitar a experiência intolerável.
Como única defesa possível, ele internalizou essa experiência que se tornou um
microcampo introjetado desintegrado da totalidade do Self. A partir dessa introjeção do
que era tóxico ou intolerável, o Self perdeu sua unidade e se dividiu, ficando dividida
também sua “função ego”, que passa a agir paradoxalmente, respondendo a interesses
opostos. Por um lado, ela procura repetir a experiência intolerável, por outro lado,
interrompe o contato com ela. A energia necessária para que ocorra o contato e
assimilação dessa experiência é desviada para a mobilização dos bloqueios de contato.
Essa ambivalência da função de ego do Self pode ser compreendida pela existência de
dois eus secundários que surgem do eu primário a partir da introjeção tóxica “eu
dominador” e “eu dominado”.
A “função ego” dividida nas neuroses atua no sentido de eliminar as
oportunidades de mudança, para manter a integridade do campo introjetado e assegurar
que os elementos do campo atual, que porventura possam invalidar o microcampo
introjetado, permaneçam no fundo, de forma imperceptível; enquanto aqueles que são
confiáveis para confirmá-lo, sejam evidenciados como figura.
De forma sucinta, podendo descrever o processo de auto-regulação do
Self nas neuroses, do seguinte modo: O Self como um todo, através de suas funções, na
medida em que interage com o meio, busca o equilíbrio dentro desse campo. Em
determinados momentos, esse campo se configura de tal forma que desperta imagens
adormecidas, figuras incompletas, reativando situações inacabadas, gerando uma tensão
dentro desse campo que mobiliza toda uma energia que motiva o Self a envolver todas
as suas funções na tarefa de recuperar o equilíbrio. É a “função id” que capta em
primeira mão o sinal de tensão e desconforto e envia para o ego a mensagem carregada
de energia, forçando-o a fazer alguma coisa no sentido de fechar a figura incompleta e
aliviar a tensão. A “função ego” do Self interpreta a mensagem, volta-se para fora,
presta atenção no que está acontecendo, e tenta escolher uma ação mais adequada.
Nas neuroses, no entanto, a ação mais adequada, que o ego consegue
empreender para diminuir a tensão, é interromper o contato com o objeto ameaçador,
fugindo da situação que lhe parece ser a repetição do que foi insuportável no passado. A
primeira falha do ego na busca pela recuperação do equilíbrio, foi uma percepção
distorcida da realidade, que gerou uma ação “inadequada”. A ação “inadequada” foi a
defesa em vez do enfrentamento. Mas na sua condição de fragilidade é o máximo que
ele pode conseguir. A “função id” é pressionada pela força do microcampo introjetado e
contamina fortemente a “função ego” do Self, produzindo, através desta, evitação do
contato, fixação, manutenção da imaturidade e da divisão do Self, em vez de produzir
contato, assimilação, integração, reorganização, mudança e crescimento do Self. A
“função personalidade”, por sua vez, não consegue integrar o novo, já que o contato
com este é interrompido, tudo que ela faz é reafirmar a constituição das defesas para
preservação do Self, através da manutenção dos microcampos introjetados, que
perpetuam a relação de conflito entre os vários eus secundários e reforçam a estrutura de
cada um deles separando cada vez mais um do outro.
Resumidamente, podemos definir a neurose como uma perturbação
do funcionamento da fronteira de contato, caracterizada por processos rígidos e
repetitivos de interrupção do contato com o outro e consigo mesmo, desencadeados por
uma percepção distorcida da realidade, dificultando a recuperação do equilíbrio no
campo organismo/meio e impedindo a reorganização e o crescimento do Self.
De um modo geral, a neurose pode ser descrita a partir das seguintes
características:
1. Relutância em se envolver e se entregar completamente à experiência do aqui e
agora, desligando-se das lembranças do passado e das expectativas de futuro.
2. Falta de delimitação clara das fronteiras do “eu”, gerando confusão de limite
entre si mesmo e o outro, realidade interna e externa.
3. Dificuldade para empregar sua energia em uma ação consciente e responsável,
em direção ao objeto real de satisfação de suas necessidades existente no mundo
fora de si mesmo.
4. Incompetência para discriminar o que é tóxico e nutritivo no meio externo,
abrindo e fechando suas fronteiras de acordo com as circunstâncias atuais do
campo organismo/meio.
5. Incapacidade para perceber com clareza e aceitar sua própria experiência,
expressando livremente seus pensamentos, sentimentos e necessidades, sem
bloquear o fluxo de sua própria consciência.
6. Seu campo perceptivo é desorganizado e confuso pela falta de nitidez da figura
emergente, causando desorientação e dúvida no sujeito, mobilização insuficiente
de energia e ações inadequadas às condições atuais do campo organismo/meio,
que se repetem de modo inflexível, uma vez que foram eficientes como defesa
em situações do passado.
7. A figura emergente se mistura ou é bloqueada por figuras não completadas,
anteriormente relacionadas aos introjetos bio-negativos, ou é bloqueada por
estas, fazendo com que o campo seja percebido de forma distorcida e a figura
atual seja mal definida.
8. Dissociação do “eu” em “dominador” (introjeção bio-negativa) e “dominado”
(experiência organísmica), gerando um permanente conflito entre essas
polaridades, tendo como resultado um “eu” fragilizado, caracterizado por uma
auto-estima e um auto-apoio bastante deficientes.
9. Na maioria das vezes, a pessoa neurótica possui um auto-conceito muito rígido,
baseado em valores, normas e exigências impostos pelos outros, os quais
tiveram que ser introjetados e cujas necessidades subjacentes eram opostas
àquelas inerentes ao “eu original”.
10. O neurótico se caracteriza pela maneira pessimista de sentir a realidade e as
relações que configuram seu universo pessoal, gerando um sentimento de
angústia persistente, sem que sua situação objetiva justifique essa vivência.
2.2.2 Os processos de interrupção do contato
Segundo a Gestalt Terapia, os diversos tipos de neurose podem ser
descritos através dos vários tipos de interrupção do contato, à medida que estes se
processam fora da “awareness”, de forma obsoleta, rígida e repetitiva, dando origem aos
padrões de comportamentos característicos de cada transtorno de personalidade.
Embora sejam descritos separadamente, os mecanismos de bloqueio
ou distúrbios da fronteira de contato estão intimamente relacionados entre si e ao
mesmo tempo que se diferenciam pelos seus aspectos específicos, próprios da
identidade de cada um deles, eles também se assemelham pelos seus aspectos gerais,
típicos da neurose como um todo. Todos eles são formas de evitação do contato; são
maneiras de se defender dos conflitos intoleráveis que ameaçam a estrutura do “eu”; são
também resultantes da incapacidade do “eu” para distinguir, apropriadamente, o que é
seu e o que é do outro. Além disso, esses mecanismos não são utilizados isoladamente,
eles se organizam de uma forma apropriada a cada situação, da maneira como esta é
percebida e interpretada por cada pessoa. Quando um determinado distúrbio emerge
como figura os outros permanecem como fundo. Cada pessoa utiliza preferencialmente
determinadas formas de organização dos distúrbios, que resultam nas características
típicas de sua personalidade ou modo de estabelecer contatos com o outro e consigo
mesma (DIAS, 1994).
2.2.2.1 Introjeção
Para Perls (1943/75), a introjeção é um processo de internalização
passiva ou seja, é engolir inteiro algo que vem de fora ou que pertence ao outro, sem
mastigar, sem utilizar a agressividade oral para desestruturar o que é oferecido pelo
meio, no sentido de torná-lo mais assimilável e compatível com as necessidades do
organismo.
De acordo com Delisle (1999-b), a introjeção foi a única alternativa de
sobrevivência do organismo diante de uma situação de impasse existencial, onde a
experiência, ao mesmo tempo que era intolerável, era também indispensável ou
inevitável. Nesse caso, a experiência introjetada é tóxica e bio-negativa, permanecendo
no fundo de modo desintegrado da estrutura original de Self, produzindo uma divisão
interna em sua estrutura, que é a raiz de todas as neuroses.
Quando esse processo de introjeção se torna um padrão de
funcionamento ou um mecanismo de defesa habitual utilizado pelo indivíduo,
cronicamente ele passa a conter seus impulsos para morder, agredir, rejeitar ou
modificar qualquer coisa que é intolerável e imposta pelos outros. Desse modo, ele se
submete às imposições do meio, engolindo sem mastigar e sem saborear aquilo que ele
não gosta, mas que não pode recusar por ser indispensável, já que é oferecido por
pessoas consideradas por ele como superiores, poderosas, temidas, admiráveis e pelas
quais ele precisa ser aceito, amado e valorizado.
“A introjeção é o mecanismo neurótico pelo qual incorporamos em
nós mesmos normas, atitudes, modos de agir e pensar, que não são verdadeiramente
nossos (...) É a tendência para fazer o si mesmo responsável pelo que na realidade faz
parte do meio.” (PERLS, 1975/81, p. 48-49)
A pessoa que introjeta, nunca tem a oportunidade de desenvolver sua
própria personalidade, porque está muito ocupada em ficar com os corpos estranhos
alojados em seu sistema. Quanto mais se sobrecarrega com introjeção, menos lugar
existe para expressar ou mesmo para descobrir como ela é de fato. Ela é incapaz de
distinguir, em sua personalidade total, as partes que são realmente suas, daquelas que
lhe foram impostas pelo meio (PERLS, 1981).
Para Polster e Polster (1973/79), a introjeção também é definida como
um mecanismo pelo qual o neurótico aceita sem questionar e engole sem mastigar
valores e atitudes de outras pessoas.
Com isto, ele neutraliza sua própria existência ao evitar a
agressividade necessária para desestruturar aquilo que existe. É como
se qualquer coisa que existisse fosse inviolável; ele não vai muda-la;
deve aceitá-la tal qual ela vem a ele. (...) A vida se torna somente uma
variação daquilo que ele já experimentou e se arma com um escudo
contra qualquer coisa nova, reduzindo a novidade que pode advir de
um senso de imediaticidade da experiência. (POLSTER e POLSTER,
1973/79, p. 83).
De acordo com Perls, Hefferline e Goodman (1951/97), o introjetor
tem seu próprio desejo frustrado e seu afeto invertido antes mesmo que ele o reconheça.
A inversão do afeto é feita através de sua inibição. O que ele quer é sentido como
imaturo e repugnante. Se ele tem um impulso para rejeitar algo, um alimento forçado,
por exemplo, ele convence a si mesmo que isto é bom para ele e é o que ele realmente
quer. Então ele morde o alimento e o engole sem mastigar e sem saborear. Em relação
ao ambiente, a atitude do introjetor é resignada, aceitando-o infantilmente. Ele não pode
identificar o que é dele e alienar o que não lhe pertence. Toda realidade para ele está no
ambiente social; ele se constitui a si mesmo através da identificação com os padrões
sociais e da alienação daqueles que seriam, potencialmente, seus próprios padrões.
Perls et al. (1951/97) acrescentam que o introjetor aceita qualquer
opinião autoritária, mesmo que esta seja oposta ao que ele pensa e acredita. Sua
satisfação é masoquista, sua repugnância é contida, seus maxilares são forçados a se
abrirem para sorrir, sua pélvis é retraída e sua respiração é puxada para dentro. Este
comportamento masoquista foi a única possibilidade de ajustamento criativo ao
ambiente, numa estrutura de infligir dor a si mesmo, a partir da aceitação de falsas
identificações.
“A impaciência para engolir algumas coisas, a preguiça em ter que
trabalhar muito para engoli-la ou a avidez em obter o máximo tão rapidamente quanto
possível, são tendências que levam à introjeção (...) O introjetor quer ser mimado. Está
sempre pronto para o símbolo, para a super simplificação, o truque, a lição que deve ser
repetida obssessivamente.” (POLSTER e POLSTER, 1973/79, p. 83-84)
Segundo Ribeiro (1997), a introjeção é o processo pelo qual obedeço e
aceito opiniões arbitrárias, normas e valores que pertencem a outros, engolindo coisas
sem querer e sem conseguir defender meus direitos por medo da minha própria
agressividade e dos outros. Desejo mudar, mas temo minha própria mudança, preferindo
a rotina, simplificações e situações que são facilmente controláveis. Penso que as
pessoas sabem melhor do que eu o que é bom para mim. Gosto de ser mimado. O
mecanismo de cura que corresponde à introjeção é a mobilização que, de acordo com
Ribeiro (1997), é definido como sendo o processo pelo qual a pessoa sente necessidade
de se mudar, de exigir seus direitos, de separar suas coisas das dos outros, de sair da
rotina, de expressar seus sentimentos exatamente como sente e de não ter medo de ser
diferente.
De acordo com o processo de validação teórica da Escala de
Avaliação do Estilo de Contato (DIAS, 1994) onde foram consultados 21 peritos em
Gestalt Terapia acerca da adequabilidade dos itens referentes a cada distúrbio da
fronteira de contato, a introjeção pode ser definida como um processo de interrupção do
contato no qual a pessoa manifesta as seguintes características:
para se sentir aceita pelos outros é capaz de assumir a responsabilidade pelos
erros que não cometeu;
em geral aceita opiniões e concorda facilmente com as outras pessoas;
prefere as soluções mais fáceis e rápidas, mesmo que estas não satisfaçam
plenamente seus objetivos;
para se relacionar bem com os outros, sente que precisa fazer tudo para agradá-
los;
sente-se mais segura quando se limita a viver a rotina de seu dia a dia;
procura evitar, sempre que possível, tudo que é novo e diferente;
costuma se basear na opinião dos outros para tomar suas decisões e fazer suas
escolhas;
assume com facilidade as tarefas que os outros lhe impõem;
costuma seguir as normas e os valores exigidos pela sociedade;
em situações de conflito costuma achar que ela está errada e os outros estão
certos;
acha melhor abrir mão dos seus interesses do que ter que brigar por eles;
é uma pessoa conservadora e procura cultivar os valores de sua família;
costuma se sentir culpada quando não consegue satisfazer as expectativas dos
outros;
procura aceitar a vida como ela é, sem tentar modificá-la.
2.2.2.2 Projeção
Segundo Polster e Polster (1973/79), o projetor é um indivíduo que
não pode aceitar seus sentimentos e ações porque “não deveria”, sentir ou agir daquela
forma. O “não deveria” é realmente um introjeto básico que rotula como intragável o
sentimento ou ação de quem o projeta. Para resolver este dilema, ele não reconhece a
sua própria travessura, mas em vez disso a atribui a uma outra pessoa, que certamente
não é ele. O resultado é uma cisão clássica entre suas características reais e o que ele
conhece delas, entretanto, ele está estranhamente consciente delas em outras pessoas.
Perls (1975/81) explica que a projeção é a tendência para fazer o meio responsável pelo
que se origina na própria pessoa.
“Na projeção deslocamos a barreira entre nós e o resto do mundo
exageradamente a nosso favor, de modo que nos seja possível negar e não aceitar as
partes de nossa personalidade que consideramos difíceis, ofensivas ou sem atrativos.”
(PERLS, 1975/81, p. 50)
A pessoa que projeta, portanto, vê seus introjetos como se fossem
próprios dela e vê as partes realmente suas como introjeções indigeríveis, das quais
deveria se livrar. Projetando, ela espera se livrar de suas introjeções imaginárias, que de
fato são aspectos de si mesma.
“A pessoa super alerta e super cautelosa, que diz que quer ter amigos e
ser amada, mas ao mesmo tempo diz que você não deve confiar em ninguém, que todos
estão a fim de saquear o que poderia, é uma projetiva por excelência.” (PERLS,
1975/81, p. 51)
Perls, Hefferline e Goodman (1951/97) esclarecem que o que o
projetor deseja profundamente é a aproximação e o contato, mas como ele tem medo e
não consegue fazer nada, procura induzir as outras pessoas a fazerem isso por ele. Ele
não se move, mas fica intranqüilo; comunica-se em silêncio; fica de mau humor,
meditando, planejando, mas se o “outro” capta seus sinais e se aproxima, emerge uma
ansiedade intensa.
O projetor é uma pessoa que mastiga em demasia seus planos e
preocupações que são cheios de pensamentos altamente coloridos. Esta é a única
atividade possível para um self que tem uma estrutura rígida e que enfrenta o ambiente
inibindo seu próprio poder de ação, mantendo-se imóvel, desfrutando de seus
pensamentos flutuantes. É quase a situação de um relaxamento induzido por imagens
hipnóticas, no entanto, em vez de relaxamento, existe uma estrutura de músculos rígidos
onde a imagem mais atrativa torna-se colorida de dor e ameaça (PERLS, et al.,
1951/97).
Ribeiro (1997) descreve a projeção como um processo pelo qual a
pessoa, tendo dificuldade em identificar o que é seu, atribui aos outros a
responsabilidade pelos seus fracassos. Desconfia de todo mundo como prováveis
inimigos, sente-se ameaçada pelo mundo em geral. Pensa demais antes de agir e
identifica facilmente nos outros dificuldades e defeitos semelhantes aos seus. Tem
dificuldade para assumir responsabilidade pelo que faz e gosta que os outros façam as
coisas no seu lugar. De acordo com este autor, o mecanismo de cura relacionado com a
projeção é a ação descrita como sendo o processo pelo qual o indivíduo experssa mais
confiança nos outros, assume responsabilidade pelos seus próprios atos, identifica em si
mesmo as razões de seus problemas, age em nome próprio sem medo de sua própria
ansiedade.
Na Escala de Avaliação do Estilo de Contato (DIAS, 1994) os itens
que descrevem as características do projetor são:
procura resolver sozinho e silenciosamente as questões de interesse próprio, que
podem despertar cobiça e inveja nas outras pessoas;
sente que o mundo é perigoso e traiçoeiro;
em geral, fica com um pé atrás nos seus relacionamentos com as pessoas;
acha difícil descobrir em si mesmo os defeitos que aponta nos outros;
tem uma tendência para desconfiar da maioria das pessoas;
acha mais fácil culpar os outros pelos seus erros e suas derrotas;
pensa que os outros, por inveja, lhe impedem de conquistar seus objetivos;
tem uma tendência para desvalorizar e afastar as pessoas que julga ameaçadoras
e/ou inferiores a ele;
em geral, sente-se perseguido e prejudicado pelos outros;
nas questões de interesse grupal, procura induzir as outras pessoas a tomarem as
decisões, no sentido de se livrar de qualquer responsabilidade;
sente que tem facilidade em perceber as intenções, planos e necessidades das
outras pessoas, utilizando suas intuições para se defender;
em situações de conflito, costuma achar que ele está certo e os outros estão
errados;
quer ter amigos, mas tem dificuldade de se aproximar e confiar nas pessoas.
2.2.2.3. Confluência
Segundo Perls (1975/81), quando o indivíduo não sente nenhuma
barreira entre si e seu meio, quando sente que ele próprio e o meio são um, está em
confluência com este meio.
As partes e o todo são indistinguíveis entre si (...) A pessoa em quem a
confluência é um estado patológico, não pode discriminar entre o que
ela é e o que as outras pessoas são. Não sabe onde ela termina e
começam os outros. Como não se dá conta da barreira entre ela e os
outros, não pode entrar em bom contato com eles. Nem pode evitar
envolver-se com eles. De fato, não consegue sequer fazer contato
consigo mesma. (PERLS, 1975/81, p. 25)
Para Polster e Polster (1973/79) a confluência é um fantasma
perseguido pelas pessoas que querem reduzir a diferença par moderar a experiência
perturbadora da novidade e da diversidade. É uma medida paliativa através da qual se
parte em busca da concordância superficial, um contrato de não balançar o barco.
O confluente embarca num acordo assimétrico com a sociedade; ele
faz todas as coisas que pensa que a sociedade demanda, ele nem
mesmo tem pensamentos ou adota idéias ou metas, a não ser aquelas
que a sociedade aprova ou fomenta (...) Não há recompensa intrínseca
naquilo que ele faz, pois as suas ações são determinadas por um outro
desconhecido, que é quem eventualmente faz com que ele tenha valor.
Ele não faz coisas simplesmente porque gosta; ele não mantém um
contato suficiente consigo mesmo para saber quando ele gosta do que
faz. Ele se concentra principalmente em saber se os outros gostam.
Assim, quando a recompensa não vem numa medida suficiente, ele se
torna magoado, ressentido ou desconfiado e firmemente convencido
de que as pessoas não são boas, coisa nenhuma! Ou, em vez disso, ele
pode voltar-se contra si mesmo, e suspeitar de que, se tivesse tentado
com mais empenho, ou se tivesse feito tal ou tal coisa, ele teria
conseguido. Ele assume a posição de que a sociedade concordou com
o contrato, e que foi ele quem violou os seus termos. (POLSTER e
POLSTER, 1973/79, p. 97)
Perls et al. (1951/97) dizem que na confluência, a mandíbula foi
marcada pela suspensão da mordida do lactente com seus dentes, no momento em que
ele deveria partir para um alimento mais sólido, mas não lhe foi dado. A permanência
num estágio anterior provocado pela suspensão da mordida, de uma ação mais agressiva
no meio, produz uma paralisia muscular que impede qualquer sensação. Culturalmente,
as respostas confluentes são as mais rudimentares possíveis, semelhantes às de um bebê.
O objetivo é ganhar o outro para que este faça todo o esforço por ele. Neuroticamente, o
confluente não reconhece a nova tarefa no todo, ele se agarra à satisfação de algum
comportamento já realizado e a nova excitação vai embora. Sua atitude em relação ao
ambiente é de impedir que o comportamento realizado seja abandonado para evitar
assumir uma nova tarefa.
“Os antídotos para a confluência são o contato, a diferenciação e a
articulação. O indivíduo deve começar a experimentar escolhas, necessidades e
sentimentos que são seus, e que não têm que coincidir com os de outras pessoas (...) Ele
deve aprender que pode encarar o terror da separação destas pessoas e ainda permanecer
vivo.” (POLSTER e POLSTER, 1979, p. 97)
Ribeiro (1997) define a confluência como sendo o processo pelo qual
a pessoa se liga fortemente aos outros, sem diferenciar o que é seu do que é deles,
diminui as diferenças para sentir-se melhor e semelhante aos demais e, embora com
sofrimento, termina obedecendo a valores e atitudes da sociedade ou dos pais. Gosta de
agradar aos outros, mesmo não tendo sido solicitada e, temendo o isolamento, ama estar
em grupo, agarrando-se firmemente aos outros, ao antigo, aceitando até que decidam
por ela coisas que lhe desagradam. A retirada é o mecanismo de cura referente à
confluência, explicado por Ribeiro (1997) como sendo o processo pelo qual a pessoa sai
das coisas no momento em que deve sair, percebendo o que é seu e o que é dos outros,
aceita ser diferente para ser fiel a si mesma, ama o “eu” e aceita o “nós” quando lhe
convém, procura o novo e convive com o velho de uma maneira crítica e inteligente.
De acordo com itens referentes à confluência na Escala de Avaliação
do Estilo de Contato, a pessoa que funciona em confluência é aquela que:
Acha difícil fazer suas escolhas e tomar suas decisões quando não tem o apoio e
a aprovação das pessoas que lhe cercam.
Procura manter suas relações em perfeita harmonia, evitando qualquer tipo de
conflito ou desentendimento.
Em geral, não consegue perceber com clareza aquilo que realmente quer.
Acha fundamental conviver bem com os outros, mesmo que para isso tenha que
abrir mão de seus próprios interesses.
Sente que precisa do apoio de outra pessoa para definir seus objetivos e traçar
seu caminho.
Tem necessidade de fazer o que os outros querem e quando não consegue, sente-
se culpada.
Costuma se envolver tanto com o “outro” com o qual se relaciona afetivamente,
que pode chegar ao ponto de se misturar e se confundir completamente com ele.
Para evitar ser abandonada por alguém que gosta, se dedica inteiramente a ele
esquecendo de cuidar de si mesma.
Em geral, sente-se insegura quando está só.
2.2.2.4 Egotismo
O egotismo é uma exacerbação da capacidade da pessoa em se
perceber ou se auto-observar; em ter consciência de seus objetivos e do que precisa
fazer para realizá-los. Como essa auto-consciência exagerada acontece também no
momento do contato final, ela impede o envolvimento com o outro, impede que a
pessoa se entregue, se largue e se permita fluir espontaneamente nesse contato, sem
medo de perder seus próprios limites. No egotismo a fronteira que separa o eu do outro
está tão rigidamente definida que dificilmente ela se abre para incluir aspectos da
realidade externa. Neste sentido, a consciência é ampla no que diz respeito à própria
pessoa, mas é pobre no que se refere ao outro e às circunstâncias ambientais. Por isso, o
egotista ao prestar muito atenção a si mesmo e às suas próprias necessidades, não
enxerga ou nega a demanda do meio, fazendo com que sua ação se torne inadequada e
seu contato insatisfatório, tendo como resultado a frustração e mais tensão, em vez de
relaxamento (DIAS, 1994).
O egotista tem medo de entrar em confluência com o outro, de perder
seus próprios limites e desse modo, perder sua identidade ou individualidade,
fracassando na realização de suas próprias metas, desejos e necessidades. Ele esquece
que para satisfazer suas metas ele precisa do contato verdadeiro com o outro e não
apenas utilizá-lo como instrumento de realização de seus desejos; como também
esquece que a constituição de sua própria individualidade depende da relação com o
outro, do diálogo entre as diferenças.
Perls, et al. (1951/97) explicam o egotismo como um mecanismo que
interrompe o processo de ajustamento criativo no momento do contato final. Quando
tudo está preparado para o contato final, a liberação do auto-controle é bloqueada e a
manifestação espontânea da ação, apropriada às demandas do organismo e do meio, é
interrompida. Desse modo, o egotista está sempre mais voltado para si do que para o
outro e sua espontaneidade é inibida por uma maior deliberação da introspecção.
De acordo com Perls, Hefferline e Goodman (1951/97), no egotismo a
pessoa se divide em observador e observado e tem um auto-controle excessivo
interrompendo o fluxo natural de sua ação no meio. O egotista procura, antes de tudo,
confiar nele mesmo e estar sempre seguro de que todas as possibilidades do campo
foram de fato esgotadas, para se prevenir contra as possíveis surpresas e frustrações. Por
isso, antes de agir, ele pensa em todas as alternativas de ação e possíveis resultados,
deixando de agir espontaneamente e frustrando-se inevitavelmente. O egotista é contra
as surpresas do ambiente e uma de suas características é a maneira ultrapassada e
obsoleta de reagir, sem levar em conta a situação do momento, numa atitude de
desprezo pelo mundo, com uma predisposição para impor sua vontade, em detrimento
das demadas do meio. Segundo Clarkson (1989), o egotista está tão preocupado com
seu próprio desempenho que acaba se privando de vivenciar plenamente a satisfação do
contato realizado, já que não houve um envolvimento suficiente no momento do contato
final. Neste sentido, a satisfação não pode ser vivenciada plenamente, quando o contato
não foi completado de forma satisfatória.
“O egotismo, no momento do contato com o ambiente, priva a pessoa
de verdadeiramente dar ou receber. Portanto, ele interfere no sentimento de estar
‘completo’ ou realmente satisfeito.” (CLARKSON, 1989, p. 55)
Como esclarece Yontef (1988 apud CLARKSON [1989], p. 55): “o
egotista crônico pode resultar em habituais padrões de personalidade descritos como
distúrbios narcisistas de personalidade, onde a falta de empatia, o penetrante padrão de
grandeza e a hipersensibilidade para avaliar os outros se tornam rígidos.”
Para Ribeiro (1997), o egotismo é um processo pelo qual a pessoa se
coloca sempre como o centro das coisas, exercendo um controle rígido e excessivo no
mundo fora dela, pensando em todas as possibilidades para prevenir futuros fracassos
ou possíveis surpresas. Impõe tanto sua vontade e desejos, que deixa de prestar atenção
ao meio circundante, usufruindo pouco e sem vibração o resultado de suas
manipulações, tendo muita dificuldade em dar e em receber. A satisfação é o processo
saudável relativo ao egotismo que, segundo Ribeiro (1997), se caracteriza pela
experiência na qual a pessoa vê que o mundo é composto de pessoas, que o outro pode
ser fonte de contato nutritivo, que o prazer e a vida podem ser co-divididos, que pensar
em possibilidades é pensar em crescimento, que é possível desfrutar dividindo, e que o
mundo externo pode ser fonte de prazer.
Podemos descrever, portanto, a pessoa egotista como aquela que:
Costuma pensar e se preocupar muito mais consigo mesma do que com o
“outro”.
Em geral, se preocupa excessivamente com seu próprio desempenho,
procurando fazer tudo da melhor forma possível.
Sente que qualquer fracasso pode afetar profundamente sua vaidade e sua auto-
estima.
Na maioria das vezes, sua espontaneidade é bloqueada pelo excesso de controle
e observação de si mesmo.
Planeja tudo com muito cuidado, no sentido de se prevenir contra possíveis
surpresas e frustrações.
Tem dificuldade em dar e receber, empobrecendo seu contato com o “outro”.
Geralmente manifesta uma atitude de desprezo pelo mundo com uma
predisposição para impor sua vontade em detrimento das desmandas do meio.
Acha indispensável preservar sua privacidade.
Sente-se superior e mais capaz em relação à maioria das pessoas.
Costuma manter suas emoções e sentimentos sob controle para evitar que estes
interfiram na execução de suas tarefas.
Na medida do possível, calcula friamente suas reações, no sentido de evitar
imperfeições que possam prejudicar sua imagem.
Sente que é mais fácil ser admirado e valorizado pela sua competência
profissional e pelo seu caráter ilibado do que pela sua generosidade e
sensibilidade afetiva.
Costuma super valorizar seus talentos individuais.
2.2.2.5 Retroflexão
Polster e Polster (1973/79) explicam que a retroflexão salienta a
capacidade humana central que uma pessoa tem de se dividir em observador e
observado. A retroflexão é uma função hermafrodita em que o indivíduo volta para si
mesmo o que ele gostaria de fazer a alguma outra pessoa, ou faz a si mesmo o que ele
gostaria que alguma pessoa lhe fizesse.
A pessoa que retroflexiona trata a si mesma como originalmente quis
tratar as outras pessoas ou objetos. Deixa de dirigir suas energias para
fora, na tentativa de manipular e provocar mudanças no meio que
satisfaçam suas necessidades, ao invés disso, redirige sua atividade
para dentro e se coloca no lugar do meio como alvo de seu
comportamento. À medida em que faz isto, cinde sua personalidade
em agente e paciente da ação. (PERLS, 1975/81, p. 54)
De acordo com Perls, Hefferline e Goodman (1951/75) na retroflexão
a energia é mobilizada e orientada para a situação presente no ambiente, mas ela é
interrompida antes de ser empregada numa ação apropriada. Neuroticamente o
retrofletor não pode enfrentar a situação porque ele tem medo de ferir ou ser ferido,
destruir ou ser destruído. Por isso suas energias e ações são voltadas contra o único
objeto seguramente disponível no campo que é sua própria personalidade e seu corpo.
Em geral o retrofletor se culpa e se arrepende por ter agido dessa ou daquela maneira.
Dificilmente ele se sente adequado e satisfeito nas suas relações com o meio. Na
tentativa de evitar a frustração, a culpa e o arrependimento, ele corrige e revisa repetidas
vezes o que já fez, tentando, obsessivamente, apagar os erros e a sujeira do passado. Seu
objetivo é melhorar e aperfeiçoar sua atitude no presente, por isso, antes de agir ele
pensa e repensa compulsivamente.
Perls, et al. (1951/75) ressaltam ainda que a satisfação do retrofletor
está na sensação de controle ativo sobre si mesmo e em manter-se ocupado com
questões preocupantes. Seus planos e idéias são, em geral, sérios e honestos mas são
desgastados pela hesitação e timidez que bloqueiam suas ações concretas no meio.
Para Zinker (1977/79) as compensações de quem retroflexiona
residem na independência e confiança em si mesmo; em fazer sozinho as coisas melhor
do que os outros poderiam fazer para ele; na sua vida privada e no desenvolvimento de
suas atitudes e talentos individuais.
A retroflexão somente se torna catacterológica quando se torna um
distanciamento crônico entre forças mutuamente opostas dentro do
indivíduo. O ritmo natural entre a espontaneidade e a auto-observação
é perdido e a perda deste ritmo divide o homem em forças
autolimitantes (...) Quando uma pessoa retroflete repetidamente, ela
bloqueia as suas saídas para o mundo e permanece sob o controle de
forças opostas, mas estagnadas. (POLSTER e POLSTER, 1973/79, p.
89)
De acordo com Ribeiro (1997) a retroflexão é o processo pelo qual a
pessoa dirige para si mesma a energia que deveria dirigir a outrem. Arrepende-se com
facilidade por se considerar inadequada nas coisas que faz, por isso as faz e refaz várias
vezes, para não se sentir culpada depois. Gosta de estar sempre ocupada e acredita poder
fazer melhor as coisas sozinha do que com a ajuda dos outros. Deixa de fazer coisas
com medo de ferir e ser ferida. Sente, muitas vezes, que é inimiga de si mesma. Para
este autor, o processo saudável que pode anular a retroflexão é o contato final no qual o
indivíduo sente a si mesmo como sua própria fonte de prazer, nutrindo-se do que quer
sem intermediário, relacionando-se com as pessoas de maneira direta e clara, usa sua
energia para usufruir com os outros o prazer do momento.
Segundo os itens da Escala da Avaliação do Estilo de Contato a
pessoa que retroflexiona tem as seguintes características:
Costuma fazer a si mesmo aquilo de que gostaria de fazer aos outros ou que os
outros lhe fizessem.
Sente que se basta e que pode viver muito bem sem precisar dos outros.
Costuma compensar seu estado solitário com o amor que tem por si mesmo (a).
Em geral o contato físico com as outras pessoas lhe incomoda.
O medo do fracasso lhe faz desistir de projetos importantes.
Costuma controlar excessivamente seus impulsos de choro e de raiva.
Prefere ficar só do que dividir com alguém suas carências e dificuldades.
Pensa e analisa tanto, antes de tomar qualquer decisão, que acaba perdendo a
oportunidade de conseguir o que quer.
Geralmente, dá e faz a si mesmo (a) aquilo que gostaria de dar e fazer aos
outros.
É tão cauteloso (a) e prudente em tudo que faz, que acaba limitando sua
criatividade.
Acredita que pode fazer muito melhor sozinha aquilo que deveria fazer com a
ajuda de outras pessoas.
Perde oportunidades de seu interesse porque não consegue tomar decisões
rapidamente.
2.2.2.6 Proflexão
A Proflexão, como explica Croker (1981), pode ser melhor
compreendida quando colocada em paralelo com a retroflexão. Enquanto na retroflexão
a pessoa faz a si mesma o que gostaria de fazer ao outro ou que o outro lhe fizesse, na
proflexão a pessoa faz ao outro o que gostaria de fazer a si mesma ou que o outro lhe
fizesse. Ao contrário do retroflector, o proflector não desiste de conseguir com que o
outro faça alguma coisa para ou por ele e quando ele encontra resistência às suas
investidas, sua reação é redobrar suas manipulações. Semelhante ao retroflector, no
entanto, o proflector também tem medo de se manifestar clara e inteiramente, de
demonstrar suas carências e fraquezas e de pedir ao outro o que precisa. Enquanto na
retroflexão a energia, que normalmente deveria fluir para fora em direção ao meio
ambiente, é revertida para dentro em direção ao próprio indivíduo, na proflexão existe
um fluxo de energia para fora, porém, seu principal objetivo não é fazer um contato
direto com o outro e sim induzi-lo a dar um tipo de resposta que é esperado pelo
proflector. O que o proflector quer, de fato, é que o outro imite seu gesto, faça o mesmo
que ele fez ou lhe responda da maneira como ele deseja.
Na proflexão, a energia não é adequadamente empregada na
manifestação direta de um pedido ou desejo, pelo contrário, a pessoa que proflete utiliza
sua energia para manipular o outro e fazer com que este lhe dê o que ela precisa. Essa
manipulação, no entanto, pode ser ativa ou passiva. Na manipulação ativa, o proflector
procura descobrir as necessidades e preferências do outro e trabalha duro para poder
atendê-las da melhor maneira possível. Em contra partida, ele espera que o outro lhe
faça o mesmo e atenda às suas expectativas de forma análoga. Na forma passiva de
manipulação, o proflector se submete passivamente ao outro. Seus esforço é feito,
principalmente, no sentido de aceitar, resignadamente, tudo o que o outro lhe faz
esperar, pacientemente, que um dia o outro se sinta culpado ou devedor e resolva lhe
recompensar fazendo o que é esperado que ele faça. Tanto o proflector ativo quanto o
passivo buscam satisfazer as expectativas do outro para que este também satisfaça as
suas que, como aquelas, nunca foram diretamente expressas. As expectativas do outro
imaginadas pelo proflector são, portanto, apenas meras projeções das expectativas dele
próprio que estão inconscientes. O proflector, inconscientemente, acredita na seguinte
suposição: “se eu fizer isso por ele, finalmente ele também terá de fazer o mesmo por
mim”.
A proflexão pode se tornar um problema doloroso, quando o outro não
coopera, isto é, quando fracassa em responder na medida das expectativas do proflector.
Isto gera ressentimentos, às vezes, somente no proflector, outras vezes, também na outra
pessoa. Esta pode se sentir manipulada ou ficar resentida pelo fato de nunca conseguir
satisfazer as expectativas do proflector, ao fazer isso à seu modo, fique ressentida pelo
fato do proflector não perceber seu esforço e dedicação. Esse ressentimento, às vezes,
pode chegar às margens do desespero, uma vez que as pessoas que proflectam parecem
não aceitar o outro como ele é. Esse fato se deve a um tipo de cegueira que é típica da
proflexão. O outro é basicamente uma espécie de tela onde o proflector projeta suas
próprias expectativas. Como o proflector não tem suficiente consciência de si mesmo
(Self-awareness) ele não percebe seu comportamento em relação ao outro como sendo
manipulativo, por esse motivo, ele experimenta um amargo ressentimento quando o
outro não lhe responde exatamente como ele espera e diz indignado: “depois de tudo
que eu tenho feito por ele”.
Para Ribeiro (1997) a proflexão é o processo pelo qual a pessoa deseja
que os outros sejam como ela deseja que eles sejam, ou deseja que eles sejam como ela
própria é, manipulando-os a fim de receber deles aquilo de que precisa, seja fazendo o
que eles gostam, seja submetendo-se passivamente a eles, sempre na esperança de ter
algo em troca. Tendo dificuldade de se reconhecer como sua própria fonte de nutrição,
lamenta profundamente a ausência do contato externo e a dificuldade do outro em
satisfazer às suas necessidades.
Ribeiro (1997) explica também que o mecanismo de cura relacionado
com a proflexão é a interação caracterizada pelo processo no qual a pessoa se aproxima
do outro sem esperar nada em troca, age de igual para igual, dá pelo prazer de dar,
convive com as necessidades do outro sem esperar retribuição, sente que se relacionar
com o outro lhe ajuda a se perceber como pessoa.
As características da proflexão podem ser descritas, mais
operacionalmente, através dos seguintes enunciados:
Costuma dá ao outro aquilo que gostaria de receber.
Possui uma tendência para não pedir diretamente, em vez de pedir, ela recorre à
manipulação.
Na maioria das vezes, o que faz pelo outro é aquilo que ela gostaria de fazer por
ela mesma ou que o outro lhe fizesse.
Embora precise muito do outro, não gosta de demonstrar para ele suas carências
e suas fraquezas.
Procura demonstrar ser o que não é, no sentido de conquistar o outro.
Sente que se pedir diretamente o que precisa vai receber um não, pois não tem
certeza quanto ao seu merecimento, por isso se utiliza de manipulações.
Em geral, o que ela quer mesmo é que o outro imite seu gesto e lhe responda da
maneira como ela deseja.
Tem uma grande necessidade de que o outro preencha suas carências, já que lhe
faltam auto-suporte, auto-confiança e auto-estima.
Procura satisfazer as necessidades e as expectativas do outro da melhor forma
possível e espera que o outro lhe faça o mesmo.
Costuma aceitar resignadamente toda frustração que o outro lhe causa,
esperando pacientemente que um dia ele se arrependa e resolva lhe recompensar
por todo seu sofrimento e dedicação.
Em geral, assume o papel de vítima ou heroína. Sofre sem reclamar; não desiste
de fazer tudo pelo outro, mesmo que este não faça nada por ela, no entanto
constrói silenciosamente uma profunda mágoa com relação a ele.
2.2.2.7 Deflexão
De acordo com Clarkson (1989) defletir significa evitar o contato
direto com outra pessoa. É uma forma de reduzir a consciência do impacto do contato
com o ambiente, tornando-o vago, generalizado ou suave. Em vez de falar diretamente
de seus sentimentos com toda intensidade de suas emoções, a pessoa escolhe uma
linguagem abstrata, descrições vagas ou evita o contato pelo olhar. A pessoa que
deflete, habitualmente, não usa sua energia de forma efetiva no sentido de obter um
“feedback” satisfatório dos outros e do ambiente.
Segundo Polster e Polster (1973/79), defletir é uma forma de retirar o
calor do contato real. Isto se faz através de uma fala excessiva, dando pouca atenção ao
que a outra pessoa diz, não encarando o outro com quem conversa, sendo mais abstrato
do que específico, sendo polido em vez de ser direto, usando uma linguagem
estereotipada em vez de original, substituindo as emoções intensas pelas suaves, falando
sobre o passado quando o presente é mais relevante, falando a respeito de alguém, em
vez de falar direto para esse alguém quando ele está presente, ignorando a importância
daquilo que a outra pessoa acabou de dizer. Todas estas deflexões tornam a vida diluída.
A ação, portanto, está fora do alvo, é mais fraca e menos efetiva. O contato pode ser
defletido pela pessoa que inicia a interação ou pela que responde. O deflector que inicia
a ação frequentemente sente que não está conseguindo muito com o que está fazendo,
que seus esforços não produzem a recompensa desejada. Além do mais, ele não sabe
como explicar a perda. O que responde, deflete o efeito de uma outra pessoa quase
como se possuísse uma blindagem invisível, freqüentemente experiencia a “si mesmo”
como indiferente, aborrecido, confuso, inútil, cínico, não amado, sem importância,
deslocado. Quando a energia defletida pode ser novamente dirigida, o senso de contato
é intensificado.
“A pessoa defletora não colhe os frutos da sua atividade. As coisas
simplesmente não acontecem. A pessoa fala e se sente mal recebida ou mal
compreendida. Suas interações negam fogo, não realizando aquilo que ela poderia
razoavelmente esperar. Muito embora um indivíduo possa se comunicar de uma forma
válida ou acurada, se ele não atingir a outra pessoa, ele não será sentido plenamente.”
(POLSTER e POLSTER, 1973/79, p. 94)
A deflexão, aqui, é descrita como uma forma de diminuir a
intensidade do contato com outras pessoas ou com estímulos do meio ambiente. Caffaro
(1991), no entanto, diz que na deflexão o indivíduo reduz a intensidade do contato, tanto
com outras pessoas, quanto com aspectos de si mesmo. Neste sentido, como afirma
Latner (1986 apud SMITH [1988]), a deflexão é um importante mecanismo psicológico
que equivale àqueles de negação, sublimação e repressão. Segundo Smith (1988), a
deflexão é essencialmente um processo de ofuscamento da “awareness”, é o processo
pelo qual o Self, através de suas funções de ego, faz a alienação, negação ou repressão
das experiências ou dos estímulos considerados nocivos e ameaçadoras à preservação de
sua integridade e equilíbrio, provenientes tanto de fora, quanto de dentro do próprio
organismo. Nos estágios do ciclo de contato e retraimento, onde o sistema organísmico
básico envolvido é o sensorial, isto é, nos estágios de necessidades, emoção, satisfação e
retraimento, a deflexão atua como um processo de evitação da “awareness”.
De acordo com Ribeiro (1997) a deflexão é o processo pelo qual evito
contato pelos meus vários sentidos, ou faço isto de uma maneira vaga e geral,
desperdiço minha energia na relação com o outro, usando um contato indireto,
palavreado vago, inespressivo ou polido demais, sem ir diretamente ao assunto. Sinto-
me apagado, incompreendido, pouco valorizado, afirmando que nada dá certo em minha
vida e sem saber por que as coisas acontecem como acontecem. A consciência é o fator
de cura que impede a deflexão e é descrito por Ribeiro como sendo o processo pelo qual
o indivíduo se dá conta de si mesmo de uma maneira mais clara e reflexiva; está mais
atento ao que acontece à sua volta, percebendo-se relacionando com mais reciprocidade
com as pessoas e coisas.
Com base nos itens da Escala de Avaliação do Estilo de Contato
(DIAS, 1994), a pessoa que utiliza a deflexão como um mecanismo de bloqueio habitual
em suas relações com o outro e consigo mesma, pode ser descrita a partir das seguintes
características:
geralmente não consegue se esforçar o suficiente para obter os resultados que
espera em seus empreendimentos;
quando consegue descobrir o que realmente quer, dificilmente sabe como fazer
para atingir seu objetivo de modo satisfatório;
quando alguma coisa lhe incomoda, faz tudo para esquecer ou deixar de lado,
em vez de enfrentar o problema para tentar resolvê-lo;
quando vai expor uma idéia ou fazer um pedido, fala tão superficialmente e com
tantos rodeios, que dificilmente as pessoas lhe compreendem;
quando se sente agredida por alguém, costuma evitar o confronto isolando e
desprezando essa pessoa;
tem dificuldade para assumir conscientemente suas necessidades e satisfazê-las
de forma rápida e eficiente;
em seus relacionamentos geralmente se sente insatisfeita, mal compreendida e
mal recebida pelos outros;
não consegue ser assertiva, clara e direta em suas comunicações e em seus
contatos em geral.
2.2.2.8 Dessensibilização
Em “Ego, Fome e Agressão”, Perls (1942/75) se refere à idéia de
dessensibilização quando afirma que a resistência sensorial mais freqüente é a
“escotomização”, uma espécie de disfunção sensorial pela qual a percepção de certos
estímulos é evitada. Mais adiante, ele usa o termo dessensibilização para definir um tipo
de sensibilidade diminuída ou de entorpecimento que impede o contato pleno com a
realidade.
A dessensibilização, como é explicada por Enright (1970 apud
SMITH [1988]), também pode se tornar uma forma de “escotoma” ou ponto cego, que
também quer dizer redução sensorial, frigidez. Para esse autor, a dessensibilização e´,
essencialmente, a diminuição da “awareness” pela redução da acuidade de uma
modalidade sensorial, como escutar, enxergar, etc.
Zinker (1977/79), quando descreve a interrupção entre as fases de
retraimento e sensação do ciclo de contato, menciona um certo tipo de distúrbio onde a
pessoa não se dá conta dos estímulos provenientes do próprio corpo ou do ambiente.
Embora ele não dê um nome para esse distúrbio, que segundo sua descrição, se trata de
uma espécie de evitação do contato e da “awareness” de sensações e experiências que
perturbam o Self, fica claro que, nessa ocasião, ele está falando de um processo de
dessensibilização ou deflexão.
Segundo Smith (1988) a “awareness” pode ser ofuscada por um
processo de dessensibilização e deflexão. A dessensibilidade se dá em relação às
percepções externas e internas (propriocepções), no entanto, freqüentemente, esse
processo não tem sido diferenciado da deflexão e, algumas vezes, um tem sido
submetido ao outro.
Nas descrições feitas por Clarkson (1989) sobre a dessensibilização e
deflexão, também fica evidente a semelhança entre esses dois distúrbios. Como ela
mesma afirma, a dessensibilização ocorre quando sensações vindas do corpo e do
ambiente são bloquadas e ignoradas. Mais adiante, sobre a deflexão ela diz: “a
disfunção na fase da ‘awareness’ ocorre quando a pessoa não está plenamente
consciente de suas próprias necessidades ou das demandas do meio ambiente” (p. 47).
De acordo com Ribeiro (1997) a dessensibilização é um processo pelo
qual a pessoa se sente entorpecida, fria diante de um contato, com dificuldade para ser
estimulada, e sente uma diminuição sensorial no próprio corpo, não diferenciando
estímulos externos e perdendo o interesse por sensações novas e mais intensas. Segundo
este autor, a sensação, que consiste no processo inverso à dessencibilização, é definida
como sendo a experiência na qual o indivíduo sai do estado de frieza emocional, sente
melhor a si mesmo e às coisas, está mais atento aos sinais que seu corpo lhe manda ou
produz, sente e até procura novos estímulos.
2.2.2.9 Fixação
Em “Ego, Fome e Agressão”, Perls (1947) descreve a fixação como
um dos vinte e dois mecanismos de evitação envolvidos na neurose, onde se pode
observar um excessivo apego a uma pessoa ou situação. A este tipo de fixação, sempre
se apresenta o seu oposto que é a evitação do contato com qualquer coisa que está fora
das fronteiras. Não é fácil saber o que vem primeiro, se o medo do contato com o novo
ou o ato de agarrar-se a situações familiares.
A fixação é apresentada por Swanson (1988) como um oposto polar
da deflexão. Como ele explica, deflexão é voar sobre, passar rapidamente de uma figura
para outra e fixação é ficar com o antigo e familiar, permanecer compulsivamente com a
mesma figura.
“Na fixação a pessoa não parte para o novo, não muda, não se move
em direção à próxima figura. Como a deflexão, uma fixação rígida, também resulta na
redução da qualidade e da intensidade do contato.” (SWANSON, 1988, p. 18)
Esse teórico explica ainda que em termos da visão, fitar é uma forma
de fixação, como olhar de relance é uma forma de deflexão. Na fixação, portanto, está
faltando o movimento de exploração curiosa necessária à criação de figuras vivas e
interessantes. Ficar enfadado e aborrecido é o que resulta da atenção mantida naquilo
que já não é mais interessante, nutritivo. A fixação também pode resultar numa espécie
de transe hipnótico da consciência. Ficar fora do ar em frente à televisão é um exemplo
comum disso.
Swanson (1988) afirma que uma descrição do relacionamento polar
entre deflexão e fixação pode ser encontrada em Perls, hefferline e Goodman (1951/97).
No capitulo entitulado “Contatando o ambiente”, duas dificuldades opostas, presentes
no processo de formação figura/fundo, são descritas por Perls, Hefferline e Goodman. A
primeira dificuldade é descrita como uma incapacidade para esvaziar completamente o
fundo onde as figuras se tornam pouco unificadas. A segunda dificuldade oposta é
descrita como uma atenção compulsivamente deliberada onde a figura se torna tão
fixadamente focalizada, que novos interesses não são permitidos sair do fundo para o
primeiro plano.
Partindo dessa perspectiva colocada por Swanson (1988), podemos
dizer que Zinker (1977/79) também faz uma descrição desse relacionamento polar entre
deflexão e fixação. Este teórico fala de um distúrbio que bloqueia o ciclo de contato
entre as fases contato/retraimento e retraimento/sensação, ao qual ele dá o nome de
“perturbação do ritmo”. Segundo ele, a perturbação do ritmo acontece quando o
indivíduo interrompe o contato e se retira deste prematuramente, não conseguindo levar
até o ponto culminante de sua experiência, ou quando se agarra ao contato e vai além de
seu ponto de rendimento ótimo, tendo sensações de fadiga e embotamento.
Sair do contato prematuramente e passar rapidamente de uma figura
para outra correspondem à incapacidade para esvaziar completamente o fundo que é
uma característica da deflexão, segundo Swanson (1988). Por outro lado, permanecer
compulsivamente com a mesma figura, agarrar-se ao antigo e familiar e ficar no
contato, indo além de seu ponto de rendimento ótimo, como forma de evitar o
surgimento de uma nova figura, é fixação.
Para Ribeiro (1997), a fixação é o processo pelo qual o indivíduo se
apega excessivamente às pessoas, idéias ou coisas, e temendo surpresas diante do novo
e da realidade, sente-se incapaz de explorar situações que flutuam rapidamente,
permanecendo fixado em coisas e emoções, sem verificar as vantagens de tal situação.
Por outro lado, a fluidez, que é o inverso da fixação, é o processo saudável pelo qual o
indivíduo se movimenta, localiza-se no tempo e no espaço, deixa posições antigas,
renova-se, sente-se mais solto e espontâneo e com vontade de criar e recriar sua própria
vida.
2.2.3 As tendências para fixação na abertura e no fechamento e sua relação
com os processos de interrupção do contato
Alguns teóricos da Gestalt Terapia, como Swanson (1988) e Crocker
(1988), partindo do pressuposto de que a experiência humana se dá na fronteira de
contato organismo/meio, através de um processo de formação e destruição de figuras,
caracterizado por um ritmo apropriado de contato e retraimento, acreditam que as
pessoas, de uma maneira geral, se diferenciam basicamente por duas formas de
funcionamento, ou dois tipos de personalidade: ou elas tendem a se fixar contato,
permanecendo numa postura de abertura, confiança e aproximação indiscriminada com
relação aos outros, ou tendem a se fixar no retraimento, permanecendo numa postura de
fechamento, desconfiança e afastamento generalizado com relação ao mundo fora delas.
Neste sentido, essas duas tendências se caracterizam pela rigidez e
fixação em uma das polaridades do ciclo de contato: abertura ou fechamento,
aproximação ou afastamento, e constituem formas de defesa desenvolvidas pela função
ego do Self, no sentido de evitar conflitos na relação com seu próprio mundo interno ou
externo. Desse modo, as defesas típicas de cada uma dessas duas tendências, se
manifestam através de padrões rígidos de comportamento, que visam,
fundamentalmente, preservar a estrutura de “eu” do Self ameaçada, constantemente,
pela emergência de figuras ligadas às situações inacabadas do passado. Esses padrões de
comportamento, utilizados como defesa do “eu”, são construídos, basicamente, através
das várias formas de interrupção do contato, as quais se organizam de modo particular
em cada indivíduo, caracterizando sua personalidade.
Seguindo este raciocínio, entendemos que a personalidade é o
resultado de um processo individual de adaptação às circunstâncias do campo
organismo/meio, pelo qual são aprendidos e fixados determinados tipos de
comportamento, caracterizados por formas específicas de estabelecer ou evitar o contato
com o outro e consigo mesmo. Para a Gestalt Terapia, os elementos básicos
constitutivos da personalidade de cada indivíduo são os processos da fronteira de
contato, os quais podem ser saudáveis ou neuróticos, de cura ou de bloqueio.
Com base na descrição dos vários tipos de interrupção de contato,
constatamos que a deflexão e a dessensibilização são processos semelhantes, na medida
em que ambos se referem a uma diminuição da sensibilidade, consciência ou contato
com estímulos internos e externos, considerados ameaçadores à estrutura do “eu”.
Consideramos, portanto, essas duas formas de bloqueio do contato como defesas básicas
existentes em qualquer tipo de neurose. A fixação também é um desses mecanismos
típicos da neurose, que aparentemente não é utilizado de forma mais persistente apenas
em algumas estruturas específicas.
De acordo com estudos teóricos já realizados (DIAS, 1994) a respeito
da relação existente entre os processos de interrupção do contato, as tendências para
fixação na abertura e no fechamento, a introjeção, a confluência e a proflexão se
caracterizam essencialmente por um estado de abertura da fronteira de contato,
manifestado por uma atitude de confiança, apego e identificação com o outro, enquanto
a projeção, o egotismo e a retroflexão refletem uma postura de fechamento da fronteira,
evidenciada por uma atitude de desconfiança, desapego e alienação do outro. Isto
significa que todos esses mecanismos são típicos do funcionamento neurótico. Nas
neuroses de fixação na abertura, a introjeção, a confluência e a proflexão aparecem
geralmente como figuras, enquanto a projeção, o egotismo e a retroflexão são mantidos
como fundo. De modo semelhante, nas neuroses de fixação no fechamento, a projeção,
o egotismo e a retroflexão se revelam como figuras, enquanto a introjeção, a
confluência e a proflexão permanecem como fundo. É importante salientar que do
mesmo modo que essas duas tendências neuróticas representam dois estados opostos de
fixação da fronteira de contato, os processos de introjeção, confluência e proflexão
apresentam características contrárias àquelas típicas da projeção, egotismo e retroflexão,
respectivamente.
Os processos de deflexão, dessensibilização e fixação, no entanto,
produzem características neuróticas que são comuns a essas duas tipologias básicas de
personalidade. A deflexão, enquanto processo de bloqueio da consciência; a
dessensibilização enquanto mecanismo de defesa contra a sensibilidade corporal,
emocional e afetiva; e a fixação como uma tendência à rigidez e ao apego exagerado às
pessoas, coisas, idéias, pensamentos, emoções, lembranças, etc, são todos próprios do
funcionamento neurótico em geral, no qual a consciência, a capacidade para perceber
sensações e agir espontaneamente, seguindo o fluxo natural da experiência no aqui e
agora, no sentido de promover a auto-regulação organísmica, acontecem de modo
bastante deficiente, produzindo insatisfação e estagnação no processo de crescimento do
“eu”.
Os mecanismos de deflexão, dessensibilização e fixação funcionam
tanto como figura quanto como fundo nas duas tendências neuróticas,
indiscriminadamente. Embora sejam utilizados diferentemente em cada uma dessas
tendências, eles não determinam, especificamente, um estado de abertura ou de
fechamento da fronteira. Ou melhor, não é a fixação em algo, nem o bloqueio da
sensação ou da consciência de certas figuras que vai definir o processo de fixação em
um dos estados da fronteira de contato, mas sim a localização ou a fonte de onde
emergem essas figuras, estímulos e objetos, que vão produzir experiências boas ou más,
em relação às quais irão se desenvolver processos de fixação, deflexão e
dessensibilização. A fixação pode se dar com relação a objetos internos e externos, a
coisas e idéias, pessoas e comportamentos, pensamentos e sentimentos, etc. A deflexão
também pode ser uma evitação da consciência de determinadas sensações, experiências,
sentimentos, impulsos, necessidades, ações, etc., ou pode ser uma evitação do contato
direto com o outro, através de um olhar desviado ou de uma fala impessoal, superficial e
imprecisa, etc. Da mesma maneira, a dessensibilização pode acontecer como uma
interrupção do contato com o próprio corpo, quando são bloqueadas as sensações
proprioceptivas, ou como uma interrupção do contato com o outro, quando é
interrompida a sensação de prazer no momento em que seu corpo é acariciado por outra
pessoa.
Os contatos com os mundos interno e externo não são processos
desvinculados um do outro. Como todo contato se dá na fronteira entre esses dois
mundos, ele sempre inclui a participação dessas duas realidades, as quais se constituem
mutuamente no decorrer da relação entre elas. Ou seja, o contato com uma polaridade
sempre leva à conscientização da outra; o contato com o “outro” sempre promove uma
redefinição do próprio “eu”, embora um processo seja figura e o outro fundo. Quando o
meio externo é figura, o meio interno é fundo e neste sentido, o contato do momento é
com o meio externo. No entanto, esse contato do momento, ou essa figura, é gerada e
apoiada por um fundo que define seu sentido atual e que, no momento seguinte, pode se
tornar também figura.
Neste raciocínio, podemos entender o funcionamento da fronteira de
contato como um movimento de abertura e fechamento alternado em relação a si mesmo
e ao outro, às realidades interna e externa. Quando a pessoa está voltada para o outro,
sua fronteira está totalmente aberta para ele, sua fronteira está desprotegida em relação
ao meio externo e protegia em relação ao meio interno, ou seja, o outro é figura e o
próprio “eu” é fundo. Por outro lado, quando a pessoa está voltada para si mesma, sua
fronteira está aberta para dentro e fechada para fora, ou seja, o próprio “eu”, o próprio
corpo e o próprio mundo interno são figuras, enquanto o outro e o mundo externo
permanecem como fundo. Nesse caso, o contato maior é consigo mesma e não com o
outro.
Baseados nisso, podemos definir a personalidade fixada no
fechamento como aquela que mantém suas fronteiras fechadas na direção do meio
externo, controlando rigidamente tudo que sai, ou que é dado para o outro, como
também tudo que entra, ou que é recebido do outro. Em compensação, suas fronteiras
estão abertas na direção do mundo interno ou do próprio “eu”. Desse modo, nessas
pessoas o contato consigo mesmas é mais intenso, tornando-as mais introvertidas, mais
voltadas para dentro do que para fora. De maneira inversa, podemos explicar a
personalidade fixada na abertura. Nesse caso, o contato com o meio externo é mais
intenso, sendo mais difícil a percepção e o contato consigo mesma. A consciência dos
processos e objetos internos é diminuída, seu foco é o outro, é o que está fora e não o
que está dentro de si mesma, fazendo com que ela se torne mais extrovertida.
Seguindo esta idéia, podemos dizer que as pessoas com tendência para
o fechamento da fronteira têm mais facilidade em lidar e se apegam mais ao que está
dentro do que ao que está fora. Elas procuram se defender e bloquear o contato, através
da dessensibilização e da deflexão, muito mais com os outros do que consigo mesmas.
Por outro lado, as pessoas com tendência para abertura, são mais fixadas nos objetos e
processos referentes ao mundo externo. Isto é, elas têm mais facilidade em lidar e se
apegam mais ao que está fora do que ao que está dentro. Dessa maneira, essas pessoas
utilizam a deflexão e a dessensibilização para se protegerem mais das coisas que vêm de
dentro, do que das coisas que vêm de fora; precisando se defender mais de si mesmas,
do que dos outros; seu mundo interno parece ser mais ameaçador do que seu mundo
externo.
Nestes termos, a tendência para fixação na abertura é constituída por
um conjunto de traços tipicamente neuróticos, os quais têm como base uma abertura
indiscriminada da fronteira em relação ao que vem de fora, permitindo a internalização
de elementos tóxicos e nocivos ao próprio Self. Desse modo, podemos dizer que, de
acordo com as características da introjeção, confluência e proflexão, as neuroses com
tendência para fixação na abertura podem ser identificadas a partir da seguinte
descrição: o indivíduo aceita tudo e não se opõe a quase nada que lhe é imposto. Engole
inteiro quase tudo que é compatível com sua estrutura introjetada de “eu”. Evita
qualquer conflito através da submissão, concorda facilmente e costuma fazer o que é
esperado pelos outros, abrindo mão de seus próprios interesses e necessidades. Não
consegue tomar suas próprias decisões e fazer suas escolhas com base em sua própria
experiência. Precisa do outro para saber o que quer e para definir o que é melhor para si
mesmo. Tem medo de ficar só, por isso se entrega totalmente, supervaloriza o outro e se
sente completamente dependente deste. Não tem capacidade para atuar de forma
agressiva, que é necessária em todo contato com o novo, uma vez que sua agressividade
foi amplamente diminuída. Ele não sabe lutar, discordar ou pedir diretamente, apenas
aceita ou manipula. Como não conseguiu desenvolver um suficiente auto-apoio, ele é
extremamente voltado para os outros, pois acredita que só através destes é possível
encontrar sua própria felicidade. Por esse motivo ele investe toda sua energia em
agradá-los e satisfazer suas expectativas, para que este lhe proporcione aquilo que ele
precisa, sem saber como conseguir o que deseja através de seus próprios recursos, de
forma direta e independente.
Por outro lado, estudando os mecanismos: Projeção, Retroflexão e
Egotismo, percebemos claramente que estes tipos de bloqueio do contato levam a uma
tendência para fixação no fechamento. Reunindo suas características, teremos a
descrição básica das neuroses que se configuram como fixadas no fechamento: o
indivíduo se fecha dentro de si mesmo, criando uma barreira que bloqueia o contato
com os outros. Ele faz isso porque projetou no meio tudo que fazia parte dele mesmo,
mas era considerado intolerável. Agora ele se defende do mundo, pois acredita que as
outras pessoas têm tudo que ele acha perigoso e ameaçador. Toda energia e ação que
deveriam ser orientadas para fora são voltadas para dentro do próprio organismo. Ele se
fecha para o outro, porque também tem medo de ser invadido ou sufocado. Em geral
procura ser auto-suficiente, pois não confia em quase ninguém. Faz a si mesmo aquilo
que gostaria de fazer aos outros ou que os outros lhe fizessem. Culpa as pessoas por
tudo e acha que pode se tornar vítima do mundo, se não se cuidar e se proteger dos
outros. A relação dessa pessoa consigo mesma é de falsa admiração e enaltecimento e
com os outros é de falsa rejeição e desvalorização, já que no fundo ela se sente inferior e
incapaz. Ela está sempre muito preocupada consigo mesma, como se estivesse
constantemente numa luta de vida ou morte com o mundo. Para suportar o isolamento,
ela tenta se amar e se relacionar consigo mesma. Está sempre se auto-observando e em
contato vivo com seus próprios pensamentos, sentimentos, gestos, etc. Planeja e mastiga
excessivamente seus planos, sua atuação tem que ser quase perfeita, não pode errar um
milímetro, não pode falhar, não pode perder uma batalha, pois se isto acontecer, o outro
pode lhe dominar ou destruir. Controla sua raiva e seu amor porque tem medo do que
pode acontecer se deixar que estes sentimentos sejam liberados completamente. Não
agride, porque tem medo de destruir ou de ser destruído, nem se aproxima muito,
porque tem medo de sufocar ou de ser sufocado.