FSH - FACULDADE SANTA HELENA
SORAYA FONSECA DE ALBUQUERQUE
UMA HISTÓRIA, VÁRIOS ATORES E ALGUMAS MEMÓRIAS
RECIFE / 2009
SORAYA FONSECA DE ALBUQUERQUE
UMA HISTÓRIA, VÁRIOS ATORES
E ALGUMAS MEMÓRIAS Monografia apresentada à Coordenação do Curso
de Pós-graduação em Educação Especial: Estudos Surdos da Faculdade Santa Helena como requisito para obtenção do título de Especialista em Estudos Surdos.
Orientador: Profº Abdias Vilar de Carvalho
RECIFE / 2009
A345u ALBUQUERQUE, Soraya Fonseca de. Uma história, vários atores e algumas memórias \ Soraya Fonseca de Albuquerque; Recife; 2009.
Monografia de Especialização em Educação Especial: Estudos Surdos - FSH - Faculdade Santa Helena.
I. Teatro II. Experiência III. Intervenção Psicossocial IV. Memória
UMA HISTÓRIA, VÁRIOS ATORES E ALGUMAS MEMÓRIAS
SORAYA FONSECA DE ALBUQUERQUE
Monografia submetida ao corpo docente da Faculdade Santa Helena como parte dos requisitos necessários para a conclusão da Especialização em Educação Especial: Estudos Surdos.
Aprovado em ____de ____________ de 2009.
BANCA EXAMINADORA
______________________________________ Abdias Vilar de Carvalho
Orientador
______________________________________ Maria Izabel de Melo Monteiro
Examinadora
______________________________________ Zélia Maria Luna Freire da Fonte
Examinadora
RECIFE / 2009
À todos que lutam pelo respeito de ser diferente e com isso alimentam o mundo de maravilhas.
À quem revela a maravilha do mundo. A quem faz a diferença.
AGRADECIMENTOS
Teresa Campelo, pela amizade, pela sensibilidade de sua presença, pela disponibilidade de ensinar a crescer... Abdias Vilar, pelo carinho, paciência e cuidado de suas ações. A todos os idealizadores deste curso pelo esforço de fazer existir oportunidades de conhecimento e aprofundamento nos Estudos Surdos, pela forma de fazer pensar, presente desde o seu começo e pela grande relevância deste trabalho no momento político educacional que vivemos. Aos colegas e professores que fizeram deste período de encontros nascedouro de idéias e inquietações. Aos amigos e em especial à Ana Lucia, pela companhia e diálogos férteis. Aos meus familiares que me trazem o chão seguro que impulsiona vôos sonhadores.
“ Somos vozes num coro que transforma a vida vivida
em vida narrada e depois devolve a narração à vida,
não para refletir a vida, e sim,
mais corretamente, para agregar-lhe algo;
não uma cópia, mas uma nova dimensão;
para agregar com cada novela algo novo, algo mais à vida”
Carlos Fuentes (Extraído do texto: Narrativa e Self)
SUMÁRIO
1- INTRODUÇÃO Encenação...................................................................................................... 9 2- UMA HISTÓRIA VIVIDA Prólogo, Roteiro e Quatro Atos................................................................... 10 3- A FUNDAMENTAÇÃO DE UM OLHAR: INTERVENÇÕES PSICOSSOCIAIS Laboratório de Idéias...................................................................................... 20 4- COMPREENDER: PRIMEIRO PASSO PARA A TRANSFORMAÇÃO Interlocuções .................................................................................................. 28 5- CONCLUSÃO Epílogo............................................................................................................. 32 6- REFERÊNCIAS BLIBLIOGRÁFICAS Leitura Dirigida................................................................................................ 33 7- ANEXOS Registros Fotográficos.....................................................................................34
RESUMO
Esta monografia é escrita na forma de uma peça teatral e faz reflexões sobre as relações de diálogo desenvolvidas socialmente a partir de uma experiência vivida dentro do Centro Suvag de Pernambuco por ocasião da circulação da peça A Pedra do Reino no período de quatro anos. As reflexões trazidas por esta experiência foram compreendidas aos olhos teóricos das intervenções psicossociais e vislumbram reconstruir uma memória e buscar novos espaços de diálogo. PALAVRAS CHAVES: Teatro; Experiência; Intervenção Psicossocial; Memória.
ABSTRACT
This monograph is written in the form of a play and it reflects upon dialogic relatioships socially developed through an experience in the Centro Suvag de Pernambuco during four years, in the occasion of acting of the play A Pedra do Reino. The reflections brought up by that experience were understood through the theoretical perspective of psychosocial interventions with the aims to reconstruct memory and to seek for new spaces of dialoge. KEYWORDS: Theater; Experience; Psychosocial Intervention; Memory.
Encenação INTRODUÇÃO
O que trago como foco de reflexão neste trabalho é a história que presenciei
in loco e que se desenrola nos últimos quatro anos no Centro Suvag de
Pernambuco, Instituição sem fins lucrativos que desenvolve trabalhos direcionados à
construção e desenvolvimento da identidade e cultura dos sujeitos surdos.
Com o intuito de compreender as tantas mudanças que presenciei nesta
cena, trato de apresentar os personagens desta história e suas contribuições na
concepção de cada ato que será apresentado.
Os personagens são os grupos envolvidos nesta trama, o grupo formado pela
equipe do teatro, o grupo de atores da Companhia Teatral Mãos EmCena, o grupo
de funcionários e professores do Suvag, o grupo de alunos do Centro Suvag de
Pernambuco e seus familires e ainda os expectadores que viveram alguma destas
cenas. Cada um deles, com seu próprio modo de funcionar, passou por mudanças
durante o período aqui estudado e são elas, as mudanças, que ajudaram a formar o
desenho da cena.
O cenário e os figurantes também se transformam a cada ato, no entanto, as
apresentações do espetáculo A Pedra do Reino é o elemento cenográfico contínuo
que norteia a história aqui contada.
O título de uma história só é revelado quando há a descoberta do sentido
primordial do que está sendo contado. É esta busca que faço com as reflexões aqui
trazidas, mesmo sabendo que cada um que presenciou esta cena, seja dos
bastidores ou da platéia pode dar um título diferente e com ele um significado para
esta história.
A história que aqui será contada, se apresentará com um prólogo, um roteiro
de quatro atos, um epílogo, um laboratório de idéias que o leitor escolhe se vai lê
antes, durante ou depois da história e, por fim, algumas interlocuções que ora
complementam e ora interrogam a experiência vivida.
Prólogo
1- UMA HISTÓRIA VIVIDA
No final do ano de 2005 fui convidada a fazer um cenário para uma peça que
estava sendo ensaiada nas aulas de teatro que aconteciam no Centro Educacional
Bilíngüe do Centro Suvag de Pernambuco. No primeiro momento, propus construí-lo
junto aos alunos e professores de artes da escola. Como a demanda era a produção
de um trabalho plástico, o cenário, a insegurança de não saber a LIBRAS - Língua
de Sinais Brasileira - se contrapunha à facilidade que tinha com o desenho e a
expressão corporal, ferramentas que utilizei inicialmente como forma de
comunicação.
Durante os primeiros contatos com os alunos e professores das aulas de
teatro, foi ficando claro que ali não cabia uma construção coletiva do cenário, todos
estavam envolvidos no ensaio. Soube que tinham aula de artes em outro horário e
pensei que seria uma possibilidade. Não pude trabalhar com os alunos, mas dei
todas as orientações para que parte do cenário fosse feito com os alunos na aula de
artes. Por fim, quase que em sua totalidade, o cenário foi feito fora do Suvag em meu
próprio atelier. A busca por parcerias frustradas era apenas o primeiro traço que aos
poucos desenha a distância e a desagregação dos profissionais do Suvag com as
atividades das aulas de teatro.
Um outro momento que ajuda o desenho da situação desagregada vivida foi
quando durante o período que estava assistindo aos ensaios da peça, dois
professores de teatro viajaram e eu assumi por um tempo os ensaios. Não existiu
nenhuma aproximação ou colaboração dos profissionais do Suvag.
Como de praxe, no dia da formatura dos alunos foi apresentada uma peça
com as crianças e adolescentes que participavam das aulas de teatro. Além do dia
de entregar os croquis desenhados com o figurino para a coordenação e tirar
dúvidas dos familiares sobre os mesmos, o dia da apresentação foi a única vez em
que percebi um contato, mesmo que intermediado pela peça, entre os professores,
funcionários do Suvag, os professores de teatro e os familiares dos alunos que
estavam assistindo. Digo em separado, professores do Suvag e professores do
teatro por que é vivido desta maneira.
Após a apresentação, neste mesmo fim de ano, os dois professores de teatro
anunciam que em 2006 não poderiam mais dar as aulas de teatro porque viajariam
para fora do estado. Neste momento, fui convidada a assumir este trabalho. É a
partir daqui que começa a história que vou contar.
Roteiro
Primeiro Ato - A Pedra do Reino 2006
No ano de 2006, quando iniciei as aulas de teatro com os alunos do Suvag me
foram feitas duas exigências em tom de conversa. Uma das coordenadoras contou
que ao final de cada ano precisava que fosse apresentada uma peça e pediu que
houvesse o compromisso de não faltar. Ao aceitar, me disponibilizei a aprender a
LIBRAS –Língua de Sinais Brasileira - mesmo que não tenha sido exigido pelo
Suvag como condição de trabalho.
Procurei saber que outras encenações haviam acontecido nos anos anteriores
e se havia registros das apresentações ou das metodologias utilizadas. Não tive
respostas que pudessem nortear a compreensão do trabalho que estava sendo
desenvolvido. Todas as falas eram vagas e apáticas. Sem saber a LIBRAS, contei
apenas com a criatividade junto às experiências de arte-educadora por mais de três
anos no Movimento Pró-Criança, de um olhar clínico que começara a exercitar
durante a formação em Psicologia e dos aprendizados tidos como atriz de um grupo
de teatro de rua. Além dos livros de jogos teatrais que busquei, estas foram a base
das aulas que ofereci aos alunos.
Na busca de compreender o tamanho descaso com o que estava sendo
objeto nas aulas de teatro, percebi que estas, aconteciam no momento em que toda
a equipe do Suvag fazia uma reunião pedagógica. Compreendi a cobrança para não
faltar e a inexistência de diálogo entre estes dois grupos, o do teatro e o do Suvag.
Neste momento ficou claro que o que era gerado por estes dois grupos não era
compartilhado e por isso a tamanha falta de conhecimento entre as duas partes.
Uma cisão se apresentava de modo bastante resistente.
Com as expressões do rosto e os poucos sinais – vocábulos gestos-visuais
estruturantes da LIBRAS – que os alunos me ensinaram percebi o desconforto e a
surpresa que tinham de não ter mais os dois professorescom quem estavam
habituados. Soube então, que muitos profissionais já haviam dado aula de teatro,
mas que não ficavam por muito tempo.
Os alunos sempre se mostraram disponíveis a utilizar o espaço das aulas
para dar vazão à enxurrada de possibilidades expressivas que tinham no corpo.
Como não sabia a língua deles era quase impossível distinguir a linguagem de sinais
e a linguagem apenas corporal utilizada no teatro. A imagem corporal, objeto de
comunicação constituinte da LIBRAS, ia sendo ofertada de modo bastante natural à
comunicação inter-pessoal e à criação de cenas. Apenas com o passar do tempo fui
compreendendo a receptividade que se passava ali.
O Centro Suvag de Pernambuco tem um Centro Educacional Bilíngüe onde
todas as aulas são dadas em LIBRAS e em português escrito. Um ambiente que na
maioria das vezes é o responsável por apresentar aos seus alunos a língua de
sinais. Como grande parte das pessoas surdas são filhos de pais ouvintes e por este
motivo não têm acesso a sua língua natural dentro de casa, elas desenvolvem um
vínculo diferenciado com a escola, ambiente que o introduz no mundo abstrato da
linguagem. O Suvag termina por ser um ambiente que é sustentado por um vínculo
afetivo-cultural, talvez este seja um dos motivos, que as crianças e adolescentes se
disponibilizem com tanta facilidade às atividades propostas.
Sabendo da impossibilidade de diálogo institucional, convidei um amigo que já
conhecia o Suvag a partir das minhas falas inquietas. Ele era artista circense e
recém formado em psicologia. André Nascimento, meu novo colega começa a dividir
comigo a experiência da falta de referências para aquele trabalho. Ao levarmos a
sério este trabalho, começamos a nos mostrar ávidos por fazer teatro com aquele
grupo que parecia não ser visto em seu potencial de formação de grupo e de criação
estética.
Surgiu a idéia de que a peça do final do ano poderia ser apresentada em um
teatro, e sendo assim, os espectadores não seriam como todo ano apenas as
famílias e funcionários do Suvag. Esta proposta foi apresentada às duas
colaboradoras do Suvag, que juntas acataram a idéia e não mediram esforços para
que ela se concretizasse.
Neste momento houve a primeira interlocução entre a equipe de teatro e o
Suvag. Se antes o Suvag produzia uma cisão com este grupo, foi a cisão que deu
oportunidade de criação de um novo grupo, a Companhia Teatral Mãos EmCena,
que ainda sem nome, começa a lutar pela sobrevivência. Desde sua criação, ora se
insere ora se afasta do Suvag.
As atividades artísticas da escola tinham como tema central de 2006 as obras
de Ariano Suassuna, foi quando uma das colaboradoras do Suvag sugeriu que a
peça fosse criada a partir do romance A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do
Vai e Volta, deste autor. Depois de aceito o desafio, afinal de contas são mais de
600 páginas de complexidade literária A Pedra do Reino foi produzida com recursos
financeiros mínimos. Durante as aulas de teatro no Suvag trabalhamos com o Teatro
de Sombras e técnicas de expressão corporal que foram utilizadas na peça. Antes de
saber quem apresentaria a peça, usávamos técnicas que davam para todos os
alunos participarem nas aulas da quinta-feira. Por exemplo, como queríamos
trabalhar com o teatro de sombras, depois que os alunos experimentaram esta
técnica individualmente, fizemos mini-grupos que contavam histórias pelas imagens
em sombra, ora histórias inventadas ora direcionadas por nós.
No segundo semestre deste ano, o novo professor de teatro precisou deixar o
Brasil para fazer um mestrado e um amigo seu, Marco Bonachela, assumiu junto
comigo a conclusão da montagem. As aulas de quinta-feira começaram a ser
insuficientes para ensaiar. Na hora de conseguir mais horários para os ensaios
tivemos novamente o diálogo intermediado pelas duas colaboradoras do Suvag.
A Pedra do Reino se apresentou pela primeira vez no Teatro Apolo em
Dezembro de 2006, nela o prólogo foi feito com a linguagem videográfica, dirigida
por Marco Bonachela. Como não tinha verba para contratar novos profissionais, além
de dividir a direção com André Nascimento e Marco Bonachela, fiz o cenário e o
figurino com orientação do artista plástico Joelson Gomes. Começa-se a delinear um
grupo de teatro que de forma autógena consegue viabilizar os próprios projetos de
ação.
Ficava perceptível que muitos dos familiares não acreditavam que seria
possível fazer um peça que fosse além das pequenas cenas que eles assistiam todo
fim de ano por ocasião da formatura da escola. O mesmo espanto vinha dos
professores do Suvag.
Levar os alunos e o nome do Suvag para um palco revelou-se como um meio
de reconhecimento de potencialidades que até então haviam passado
despercebidas. O orgulho de ver o filho atuando, trouxe para algumas famílias a
condição para não trocar o filho de escola, pois o movimento de saída dos alunos
tem aumentado na mesma proporção que o discurso da educação inclusiva toma
espaço na sociedade.
A repercussão da formação de uma companhia de teatro não se encerra entre
as famílias. Os alunos, entre 7 e 20 anos, tiveram a possibilidade de mostrar toda a
expressão vinda dos seus corpos de uma maneira diferente, mas não menos
expressiva que a língua de sinais. Começa-se aqui um novo ato, com sujeitos que
conhecem bem mais seus próprios corpos e possibilidades de expressão. Sujeitos
ávidos por legitimar sua cultura.
Segundo Ato - A Pedra do Reino 2007
Algumas mudanças se deram durante o ano de 2007. O grupo de teatro
agregou novos integrantes com o intuito de aprofundar o trabalho feito no ano
anterior. A entrada de Carolina Longman, intérprete surda, tornou possível
aprofundar a compreensão do texto e a descoberta de sinais para nomear questões
subjetivas e técnicas que surgiam nos ensaios e nas aulas de teatro do Suvag. As
aulas de teatro da quinta criaram uma outra forma com a entrada de Jadson
Cristovão, ator principal na Pedra do Reino.
A relação de respeito e admiração que os surdos têm pelo professor e ator
Jadson, juntamente com sua expressão corporal, que se mescla com a LIBRAS e faz
movimentos maiores e intensos, permitiram que os conteúdos fossem repassados de
maneira bem mais orgânica. Não havíamos conseguido trabalhar ainda, dada a
pouca fluência da equipe de Teatro nesta língua, de forma que provocasse reflexões
mais profundas em relação às simbologias das imagens utilizadas durante a peça.
Alcançar esta reflexão levou a uma compreensão diferenciada sobre o fazer teatral e
ao sentido da imagem, presente em todas as produções do sujeito surdo, no
cotidiano e nas produções plásticas em geral.
Com o apoio financeiro proporcionado pelas colaboradoras do Suvag e a
presença de Carolina e Jadson, professores do Suvag, pudemos aprofundar e trazer
novas modalidades do fazer teatral. Além das técnicas do teatro de sombras e de
vídeo utilizadas com sucesso no ano anterior, melhoramos a qualidade estética do
espetáculo com a utilização de técnicas circenses, dadas por José Carlos, novo
integrante do grupo do teatro. Além disso, pudemos melhorar a expressão corporal
dos atores e construir novos cenários e figurinos feitos especialmente para a peça.
Reconhecido o potencial do grupo, estava dada a possibilidade de continuar
os ensaios da Pedra do Reino, pois havia ficado claro que um ano não tinha sido
suficiente para desenvolver o máximo que o grupo poderia. Desta maneira, e
novamente por intermédio das colaboradoras do Suvag, ficou acordado que não
trabalharíamos em uma nova peça para o final do ano, mesmo gerando
controvérsias na escola.
As novas discurssões e técnicas surgidas neste ano beneficiaram não apenas
o grupo de atores que encenava A Pedra do Reino. Estas atividades foram
trabalhadas durante as aulas de teatro do Suvag, onde todos os alunos
participavam.
O envolvimento dos familiares e de alguns funcionários durante este ano foi
bem diferenciado, cada um deles se disponibilizou e contribuiu como pode e com o
que sabia fazer para ajudar a concretizar todas as mudanças que tinham sido
propostas para a encenação. Neste momento todos faziam parte do mesmo grupo e
tinham o mesmo desejo de continuidade, neste momento se deu a formação
compartilhada da Companhia de Teatro Mãos EmCena.
O Suvag estava diferente e cabia todos. As mães que sabiam costurar
organizaram um rodízio de trabalho, levaram as maquinas de costura, fitas métricas
e todo o material que configurou um grande atelier de costura. O mesmo aconteceu
com algumas mães que se disponibilizaram a aprender e fazer a tapeçaria que foi
utilizada tanto no figurino como em parte do cenário. Enquanto isso, na cozinha
estavam as mães que gostavam de cozinhar. O Suvag tinha cheiro de comida de
mãe, e na hora do almoço e dos lanches, quando todos se encontravam, virava uma
grande casa com a família completa. Este casa espaçosa existiu quase que por
todas as férias escolares.
Em Julho fomos nos apresentar no Festival de Inverno de Guaranhuns,
viajamos todos juntos, atores, familiares e técnicos. Lá, como em todos os lugares
que nos apresentamos, vimos lado a lado olhares de estranheza, encantamento,
admiração e orgulho. Após chegar de viagem fomos convidados a apresentar a peça
no Teatro Santa Isabel no Dia Nacional do Surdo, 27 de Setembro. Dia em que se
comemoram as lutas conquistadas e se reivindicam as que estão por vir.
A partir da experiência de viajar para apresentar a peça começa-se a delinear
algumas características do grupo. Devido à pouca idade de alguns atores ou a
impossibilidade de viajar em apresentações, o grupo criou uma característica de
rotatividade de atores que torna possível que mais crianças e adolescentes tenham a
experiência de atuar. No entanto, a cada nova apresentação o grupo precisava de
novos horários para ensaiar que não interferissem nas aulas de teatro nem nas
disciplinas curriculares da escola.
Mesmo que o grupo seja composto por alunos e ex-alunos do Suvag sempre
tentamos conquistar novos lugares para este grupo. As aulas de teatro também
começam a se configurar melhor como aulas de artes integradas devido as tantas
possibilidades expressivo visuais desta modalidade artística, no entanto, estas aulas
continuam sem dialogar com o currículo escolar.
Depois de muito falar dos incômodos surgido em 2006, a equipe de teatro foi
convidada a participar das reuniões pedagógicas da escola. Nela podíamos agora
falar e ouvir reflexões sobre metodologias, sobre especificidades de alguns alunos,
sobre mudanças de comportamento percebidas desde o começo do trabalho
desenvolvido nas aulas de teatro e em outras disciplinas da escola. Começa-se a
estabelecer um momento propício às trocas de experiência.
Terceiro Ato- A Pedra do Reino 2008
A equipe do teatro foi desenvolvendo um ritmo próprio de trabalho dentro do
Suvag. Desta forma durante o ano de 2008 esta equipe se transformou na equipe
gestora de projetos culturais. Fizemos projetos para tentar financiamento à produção
cultural que estava nascendo.
Sabendo que este ano não teria apresentações da Pedra do Reino, a
Companhia começou os laboratórios de criação para a nova peça enquanto
esperava os resultados de seleção dos projetos, que só aconteceu no segundo
semestre. Entre outras aprovações, tivemos duas delas direcionadas a Companhia
Teatral Mãos EmCena.
Ao mesmo tempo que a escola conseguia transformar os horários do Ensino
Fundamental I para horário integral, conseguimos ter mais horários com o Ensino
Fundamental II para fazer as oficinas de criação para a nova peça. Sem que fosse
previamente acordado entre Suvag e equipe do teatro, íamos desenvolvendo nossas
ações de forma quase autônoma alegando a importância do teatro para os sujeitos
surdos. Nesta fase do trabalho já estávamos inseridos em outros horários da escola
além da quinta-feira, onde continuávamos trabalhando com todos os alunos a partir
da segunda série.
Com o aumento da equipe nas aulas de teatro, desde 2007 os conteúdos
trabalhados em sala passaram a abranger muitas modalidades das artes, sem
esquecer que tínhamos olhares bem diferenciados dentro da equipe, pois éramos
profissionais de diferentes experiências de formação e de vida. A equipe tem um
artista de rua, palhaço e bailarino, um mágico, professor e ator, uma psicóloga,
artista plástica, atriz e arte-educadora, um estudante de comunicação, ator e
dançarino e uma professora e intérprete. Ter dois surdos nesta equipe fez o grupo se
fortalecer. O que sempre propomos foi fazer teatro com a possibilidade de junção de
várias modalidades artísticas. Este hibridismo de linguagens estéticas vai ficando
claro tanto nas produções teatrais do grupo, como nas propostas de trabalho das
quintas-feiras.
Aprovamos um projeto pelo BNB de Cultura para entrar em temporada com A
Pedra do Reino e outro pelo Funcultura para a montagem e temporada da nova peca
do grupo Andar...Sem Parar... de Transformar... .
Quarto Ato - A Pedra do Reino 2009
Em 2009, antes de começarmos as apresentações pelo BNB, fomos
convidados pela Fundarpe a participar de um evento denominado “XVII Cavalgada à
Pedra do Reino” em São José do Belmonte, interior de Pernambuco, evento anual
que homenageia a história local e as esculturas naturais que deram nome ao
romance escrito por Ariano Suassuna. Ainda nesta cidade fomos à praça onde
aconteciam festejos e encontramos pessoas que faziam parte da Associação da
Pedra do Reino.
Entre conversas e fotos os jovens atores descobriram que naquela cidade
todo ano existia a encenação da cavalgada, cena que aparece na nossa montagem.
Esta informação causou orgulho, mas também um certo ciúme. Neste evento o grupo
teve contato com a cultura viva do lugar. Neste momento os adolescentes
procuraram saber se havia surdos na cidade. Os moradores não souberam informar,
mas, um dos surdos da própria equipe do teatro informou que conhecia uma
Associação de Surdos em Serra Talhada, onde estávamos hospedados.
Logo depois de voltar à Recife fomos organizar nossa viagem mais longa,
onde apresentamos A Pedra do Reino em Valença, na Bahia. A peça fez parte da
programação do Seminário Encontros com a Inclusão: “Currículos e práticas
pedagógicas numa educação para todos” promovido pelo Núcleo de Estudos e
Pesquisa sobre Educação Especial e Inclusão – NUPESPI- e pela Universidade do
Estado da Bahia-UNEB. Liliane Longman, que tinha recém assumido a direção do
Suvag, foi uma das convidadas a abrir o evento, em sua fala, momento de muita
emoção, ficou clara a relevância da companhia de teatro estar ali naquele momento.
Pessoas tanto da equipe do teatro como técnicos que viajaram pela peça
tiveram participações no evento, eu e Marco nos inscrevemos pelo Suvag e
apresentamos um trabalho, Carolina, Jadson, Leane, Eli Maria, Irton e os atores
assistiram a algumas palestras e mesas que aconteciam antes ou depois dos
ensaios e nos horários vagos. Observei que não perdiam oportunidade de se
posicionarem a respeito dos temas discutidos.
As discussões ali levantadas afirmavam o grupo dentro da luta dos surdos por
escolas bilíngües. E acima de tudo por lugares que respeitem sua língua natural, a
língua de sinais, o modo singular de produção de cultura e conhecimento estruturado
pela experiência espaço visual e pelo encontro dos pares que muitas vezes se dá
inicialmente no encontro dos colegas e professores surdos.
Nesta viajem também houve uma outra novidade. Uma primeira tentativa de
utilizar a viajem para a aprendizagem de conteúdos de geografia e história. Os
professores destas disciplinas escolares passaram algumas atividades para serem
feitas pelos alunos durante a viagem. Soube desta atividade na hora da viajem e
depois que voltamos não tive notícias dos resultados obtidos.
A Companhia Teatral que surgiu das aulas de teatro do Suvag, hoje habita
novos espaços de produção cultural, um deles foi conquistado participando da
abertura do Festival Estudantil de Teatro e Dança do Recife quando apresentou A
Pedra do Reino no Teatro Apolo. Neste evento a peça foi indicada aos prêmios de
melhor Figurino e melhor Cenário. O primeiro troféu foi o de melhor Figurino e o
segundo veio pelo Prêmio Especial do Júri, justificado pelo porte do espetáculo
trazendo pessoas com necessidades especiais. Vale salientar que não houve outra
peça apresentada por surdos.
Vejo em cada evento que surge uma dinâmica de acontecimentos bem
parecida com a que foi vista dentro do Suvag, entre os atores e entre seus familiares
por ocasião das apresentações. É a partir do objeto apresentado, no caso a peça,
que conseguimos galgar espaços de reconhecimento a partir do sentimento de
admiração pela qualidade presenciada que se confunde como uma espécie de susto
e se transforma em consciência de si, de ser surdo, de ter orgulho e vontade de ir
mais longe.
As duas últimas apresentações financiadas pelo BNB aconteceram em Recife,
no Teatro Barreto Junior e participaram da programação de eventos em homenagem
ao Dia do Surdo. No segundo dia de apresentação, dia 28 de Setembro, mesmo dia
da passeata do Dia do Surdo, foi dado convite para os surdos que quisessem assistir
a peça. A platéia tinha muitos surdos, era a última apresentação prevista neste
projeto, o intervalo entre esta e a apresentação anterior foi de apenas 3 dias e por
isso não fizemos ensaio. Ouvi comentários que aquela foi a melhor das
apresentações.
Todas as apresentações de 2009 tiveram no elenco alguns adolescentes com
dificuldades cognitivas e emocionais. Este fato causou inicialmente mal estar entre
alguns atores que tinham menos tolerância com erro de cena e fez com que
surgissem duplas de trabalho onde alguém estaria sempre atento para situar o
colega caso houvesse necessidade. Esta situação foi de muito aprendizado, hoje,
quando um desses sai de cena orgulhoso, vibramos todos juntos.
A cada apresentação o grupo se fortalece. Aprendem que teatro é trabalho
coletivo, que é preciso confiar e estar atento uns aos outros. Que todas as
responsabilidades precisam estar claras e isso não quer dizer não poder pedir ajuda
ou ajudar. Entre tantos crescimentos, levar o grupo para diferentes lugares e levar
uma peça de qualidade para diferentes públicos e contextos sociais tem sido uma
maneira de lutar pela questão surda, de mostrar que temos muito a aprender com a
cultura surda. Aos poucos os surdos conquistam lugares sociais de reconhecimento.
Laboratório de idéias
2- A FUNDAMENTAÇÃO DE UM OLHAR: INTERVENÇÕES PSICOSSOCIAIS
Neste capítulo abordarei o diálogo, modo de comunicação capaz de dar
sentido às experiências vividas, como um sinal-sintoma que revela um grupo ou uma
situação coletiva.
O diálogo é o modo de comunicação criado pelos seres humanos para
possibilitar a conscientização da existência social. Neste sentido, trato a
comunicação como algo dos sujeitos humanos em relação.
Sobre a comunicação, âmago das construções sociais, Serge Moscovici traz
que “o objeto central e exclusivo da Psicologia Social, deve ser o estudo de tudo o
que se refira à ideologia e a comunicação do ponto de vista de sua estrutura, sua
gênese e sua função”. (apud Pedrinho Guareschi, 2005 p. 82) Deste modo,
perceberemos, também, como estas instâncias sociais tem influído na construção e
reprodução do mundo contemporâneo e nos questionamentos freqüentes a respeito
da ética e dos modos de subjetivação que estamos construindo.
São muitas as construções e criações humanas de instrumentos de
comunicação sofisticados como a linguagem e a mídia. Estes mesmos têm a
capacidade de maravilhar, no que se refere às possíveis trocas sociais e, desta
forma, produzem uma fluidez cultural que perpassa o âmbito do global. No entanto,
quando esta comunicação não reserva princípios éticos e é utilizada como forma de
manipulação social, causa um grande déficit na mobilidade e conscientização do
poder de vários grupos sociais, sendo estes o público prioritário na ação de
psicólogos sociais.
Para Pedrinho Guareschi (2005) a Psicologia Social só pode ser entendida a
partir do conceito de relação. Tal conceito, fundamental para a compreensão do ser
humano, da sociedade, do que é social e do que é um grupo, traz valores
específicos que questionam a consciência e leva ao tornar-se mais livre e
responsável.
A concepção de ser humano como relação implica na necessidade de uma
alteridade, de um outro não separado, o que desdobra em questionamentos e
reflexões que trazem o outro ou os outros como parte constituinte do próprio ser.
Assim, a percepção dialética da relação nos ajuda a perceber que nem sempre ela, a
relação, é quem une ou liga duas coisas, por vezes, algumas coisas necessitam de
outras para serem elas mesmas.
No capítulo anterior, pudemos perceber que ao mesmo tempo que o grupo de
teatro que prestava um serviço contratado pela instituição Suvag, e por isso estava
inserido nas atividades por ela proporcionadas, precisou de um objeto, a peça, ou de
interlocutores externos, como as pessoas colaboradoras ou os pais dos atores para
que a experiência fosse legitimada e pudesse continuar.
Ver o social como relação, falar de um ser que implica outros, leva-nos a
entender os fenômenos da realidade humana com mais profundidade e sem
reducionismos. Este caminho foi trilhado graças a críticas de estudiosos da
Sociologia e da Psicologia, indicando tanto de uma parte quanto de outra o
reducionismo ao social e ao individual, respectivamente. A Psicologia Social mostra
a superação destes aparentes extremos. Está aí o peso que devemos dar à relação.
A formação do grupo social não depende de número, tipo ou distância entre
as pessoas, mas sim do envolvimento ou contribuição que cada pessoa pode investir
de si neste grupo, isso é, na relação. A formação de um grupo depende da junção de
relações, influindo o tipo, a duração e, principalmente, quem as controla. Pensando
assim, Guareschi(2005) diz que estudos de grupos devem, cada vez mais, dar
atenção às relações vividas.
Estar dentro e ao mesmo tempo fora foi a condição dada na experiência com
o Suvag. Estar em seu ambiente direcionou as idéias para propor ações, no entanto
a condição de também estrangeiro vivida fez com que muitas das ações fossem
desenvolvidas sem muitas interferências, sejam elas castradoras ou acolhedoras.
A ética das relações perpassa nossa discussão à medida que é ela que
legitima, de alguma forma, o convívio social, o viver em comunidade através de
regras e valores compactuados por um grupo social. Neste sentido, ser ou não ser
ético, depende da presença de julgamento do outro. Percebe-se, na atualidade, que
o conceito de ética tem sido erroneamente tomado como uma decisão pessoal, ou
seja, individualizada. O mesmo acontece com a epistemologia quando admite que a
compreensão das coisas pode depender de um só indivíduo, esquecendo-se que
qualquer objeto de conhecimento vem intrínsecamente acompanhado de modelos e
conceitos.
Não por acaso, as ações propostas pela equipe de teatro junto aos surdos
que tiveram um resultado mais palpável foram as que já nasceram direcionadas para
fora da instituição. As apresentações da peça, artigos, debates e entrevistas e os
vários projetos feitos para conseguir financiamento, são alguns exemplos.
A partir dessas ponderações fica clara a importância de pensarmos a relação
e revela-se o salto qualitativo possível a partir da compreensão da vida social, da
comunidade e do nosso mundo cotidiano.
É nesta síntese dialética que as situações vividas, fazendo parte das relações,
tornam possível processos como a identificação e a singularização de um grupo,
formando as tessituras da sociedade.
O intuito do trabalho desenvolvido pela equipe de teatro não é apenas fazer
apresentações das peças, mesmo sabendo que por si só já trazem muitas
contribuições e reflexões. Cientes da importância da experiência vivida, boa parte
das atividades que fizemos no teatro estão registradas por fotografia, filme,
relatórios, avaliações e planejamentos de aula. Os frutos destes anos de trabalho
ainda estão sendo gerados e acredito que podem trazer muitas contribuições, por
exemplo na construção de metodologias pedagógicas para surdos.
Pensar uma sociedade como algo pronto, com um enfoque funcionalista ou
sistêmico, perde de vista as possibilidades de esmiuçar que tipos de relações
marcaram suas origens ou se ainda deixam marcas. A teoria histórica crítica admite
a sociedade de acordo com suas relações, como passível de mudanças. Os conflitos
e diferentes pensamentos surgidos em cada sociedade a legitimam, pois as
“superestruturas”, como diz Guareschi(2005), são as responsáveis pela organização
necessária que faz com que as sociedades saiam dos níveis de tensão exagerados e
possam ter continuidade. As instituições são formuladas a partir da materialização
destas tensões geradas pelas idéias e ideais de grupos hegemônicos.
Entre as tantas instituições, que tem a função de reproduzir os valores e as
práticas centrais da sociedade, como escolas, igrejas e os meios de comunicação
social, são estes últimos que nos dias atuais, em meio ao profundo desenvolvimento
tecnológico, detém o papel de maior abrangência social.
O poder viver a comunicação como algo favorável ao desenvolvimento em
sociedade não tem sido experienciado; no lugar disso existe uma exposição
unilateral de informações que terminam por formar uma relação doentia entre a
realidade vivida de fato e a realidade que invade as casas para construir
subjetividades alienadas de uma consciência crítica sobre a própria vida.
Na busca de compreender e dar espaço às tantas falas sociais se faz
necessário o realce das várias linguagens presentes em determinados grupos.
Linguagens estas que podem emergir nas falas ou serem apropriadas a partir delas.
Onde encontrar estas possibilidades? Onde é possível criar tais possibilidades? Será
que os tantos grupos socias não sabem onde encontrá-las ou o que existe, de fato, é
a falta do exercício de poder incentivado pelas políticas vigentes que terminam por
levar os sujeitos à desesperança e desmotivação no que se refere a ir em busca? É
a este público, tão privado do poder da própria fala, a quem as intervenções mostram
o acesso a possíveis diálogos prósperos.
São os questionamentos a respeito da própria situação vivida, por
assim dizer, a consciência social dos fatos experienciados que fazem refletir sobre o
modo naturalizado de pensar tais fatos. Desta maneira, qualquer tipo de intervenção,
seja ela artística ou psicossocial, trazem o pensamento, ou o questionamento, ou
respostas inesperadas e que muitas das vezes trazem o sentido que há muito havia
se perdido ou sido encoberto. Abordar fatos corriqueiros ou rotineiros que pareciam
não levar a lugar algum podem ser a amálgama de transformação de uma vida, seja
ela vista como individual ou grupal.
O diálogo de interação criado nas relações de uma comunidade ou um grupo
pode provocar questionamentos-resposta incomuns até então, de tal forma que
potencialize mudanças. Assim, fica claro que nenhuma ação social existe por si só
sem o diálogo com o outro.
Vencer o silêncio inerte tão pregado pelo modo segregador de viver
experiências inter e intra-grupais isoladas impede a transformação deste silêncio em
um silêncio reflexivo que possibilite falas posteriores. E aqui, fala quer dizer
consciência do poder social. O propósito de toda intervenção social é dar passagem
a esta transformação.
O sentimento de estrangeirismo vivido na experiência relatada anteriormente
pode ser apontado como um dos sintomas da impossibilidade da fala institucional,
ficando assim claro que se dá a perda da possibilidade de dar sentido em todas as
partes e grupos envolvidos. Entre os grupos citados neste trabalho, talvez seja o
grupo de atores os que melhor apreenderam a experiência. Eles são a interseção de
todos os grupos.
É crucial apontar que as intervenções psicossociais não devem ser
confundidas com práticas ou políticas assistencialistas. Faz-se necessário que ações
interventivas pautem-se na importância do empoderamento, que permite o
protagonismo e a iniciativa dos atores sociais na construção de sua própria história.
É crucial opor-se ao movimento de criação da dependência em que os sujeitos
vêem-se passivos e desresponsabilizados pelas escolhas de suas ações.
Além do empoderamento, existem outros princípios que merecem ser
abordados para ser possível compreender a que se prestam as intervenções
psicossociais e o que nelas é essencial.
Pedrinho Guareschi (2005), ressalta que compreendendo a sociedade como
uma relação entre pessoas e grupos, reconhecemos que é impossível não agir, pois
até a omissão ou a permissão são ações, ainda que negativas. Uma ação ativa
abarcaria tanto fazer com que algo aconteça como impedir o mesmo. Nesse sentido,
não existe ação neutra, considerando que toda ela contém um componente
valorativo e posicionado.
Se assumirmos que cada grupo ou comunidade não são neutros em relação
às situações sociais e à construção de sua subjetividade, então devemos assumir
que o interventor também não está alheio, dado que também é um ser social.
Desta forma, o posicionamento é um princípio que se mostra fundamental nas
intervenções psicossociais que estamos tomando como ponto de reflexão a
experiência de constituição de um teatro com surdos numa escola de Surdos.
Partindo dessa compreensão, pode-se dizer que atuar para aliviar o
sofrimento psicológico humano ou facilitar uma reflexão a respeito da situação vivida
exige do interventor, um posicionamento crítico e consciente, de forma a reconhecer
quais são os valores que permeiam seu trabalho e afetam os sujeitos com quem lida.
Esse posicionamento permite a discussão de concepções mais abrangentes
acerca do fenômeno psicológico. Ao sabermos que este não é restrito ao sujeito,
subtende-se que ser diferente não é ser doente, anormal ou digno de classificação
nos manuais criados pela sociedade.
Infelizmente, a psicologia e outros lugares de saberes sociais passaram muito
tempo diagnosticando problemas em indivíduos ou grupos, esquecendo da devida
influência dos contextos sociais, tendendo sempre a naturalizar diferenças criadas
socialmente.
Bock (2002) nos lembra que o fenômeno psicológico não se faz apenas de
abstrações, ideologias e filosofias. Ele também é formado a partir de aspectos
bastante concretos, refletindo as condições sociais, econômicas e culturais dos
indivíduos.
Não há motivos justos, como diz Moreira (2002), para se psicopatologizar
reações que muitas vezes são normais a um contexto opressor. Portanto, é
importante estarmos atentos para não naturalizá-las e torná-las mais uma vez
emudecidas. Afinal de contas, estas reações podem ser encaradas tanto como
verdadeiros sintomas da doença social e estarem necessitando da fala, quanto como
um indício da busca pela saúde.
Além do compromisso ético de estarmos atentos a que tipo de fala está sendo
levada ao diálogo, é preciso cuidar para que a linguagem utilizada seja adequada e
respeitadora para com o grupo em questão. O saber científico, pela própria história
tende a menosprezar os saberes empíricos ou próprios de um grupo de tal forma que
inibe pelo poder-saber as manifestações culturais de um grupo. Para promover a
troca de informações interpessoais e intragrupais de maneira facilitadora e
integradora, é indispensável questionar e ressignificar a linguagem científica,
utilizada muitas vezes como única maneira de proceder na construção do
conhecimento.
Lévy et al. (1994) afirma que decerto uma linguagem estruturada a partir do
pensamento racional possibilita a comunicação universal e o desenvolvimento
científico e tecnológico. Porém, essa forma de expressão deixa margem para
aqueles que se consideram especialistas protegerem e ocultarem um saber
indevidamente. Tal fato ocorre quando se tenta impor sobre os que “não sabem falar”
ou falam de uma maneira “diferente”, uma relação de poder baseada na alta
tecnicidade das palavras ditas formais.
O mau uso do discurso erudito ou da palavra convencionada pode criar uma
barreira entre o interventor e o sujeito à medida que o último vê negligenciado um
aspecto de sua cultura. Não se trata de ser displicente com erros gramaticais ou
semântica, e sim de ignorar todo um imaginário popular consolidado ao longo de
anos e apoiado em determinada maneira de expressar-se de grupos específicos, que
no caso dos surdos tem o agravante que é ter uma língua gesto-visual numa nação
que comodamente solicita oralidade.
A imensa riqueza nas conotações não-técnicas da linguagem tem potencial de
gerar reflexões suficientemente sérias entre adolescentes, moradores de rua,
empresários, artistas e outros grupos com seus respectivos jargões, gírias ou
metáforas, sem que haja uma divisão entre quem detêm o poder da retórica e quem
“não sabem falar”.
É a partir da colaboração de um grupo real, portador de falas reais que tratam
de sentimentos e vidas reais que se torna possível o reconhecimento e a capacidade
de apropriar-se de determinados aspectos em um grupo, como sua história, sua
cultura e sua língua, que constituem o fortalecimento deste.
Por vezes a fala do interventor procura lugares silenciosos para ecoar e
produzir diálogo. Não que o silêncio de alguns grupos sejam vazio, mas para ele é
preciso ser dada a possibilidade de ser reconhecido em alguma forma. A fala que
vem de fora ajuda a elaborar os conteúdos que até então não eram claros ou não
tinham como serem expressos. Estamos em situação de emergência social e
precisamos transformar o silêncio visto em tantos grupos em falas que criem
situações mais acolhedoras e enriquecidas sócio-culturalmente.
Quando o empoderamento e a mobilização tornam os sujeitos posicionados e
coerentes em suas ações, sentimentos e pensamentos, o mesmo será um
multiplicador destas práticas. Assim opera-se no sujeito uma mudança de papéis,
onde a passividade em suas relações sociais dão lugar a disseminação das próprias
convicções éticas e políticas.
A importância dada às intervenções psicossociais nesta ocasião trata da
necessidade do se dar conta do poder social que se torna possível a partir da
tomada de consciência da situação vivida e dos questionamentos aos modos
vigentes que parecem legitimar algumas divisões de poder. No entanto, na
perspectiva foucaultiana: Compreender o poder como multiplicidade de correlações de forças imanentes ao domínio onde se exercem e constitutivas de sua organização é nomeá-lo como uma situação estratégica complexa numa determinada sociedade esta onipresença do poder aponta que ele provém de todos os lugares, atuando em um nível micropolítico e sendo exercido a partir de inúmeros pontos e em meio a relações desiguais e móveis. O poder surge de baixo e se distribui por lateralidades, possuindo um papel produtor nos diversos afrontamentos locais: as relações de poder são intencionais, pois são exercidas a partir de cálculos, miras, objetivos”. CRUZ (2006,pág.118)
Não se trata aqui de negar as classes sociais ou até a luta de classes. Trata-
se de atentar para a utilização de uma falsa neutralidade nas relações, a
naturalidade que tantas vezes é instituída em situações originadas no contexto social
e ainda às tantas técnicas de intimidação e persuasão implícitas nas linguagens
contemporâneas como modo de segregação social, de encobrir pontos de
singularidades.
Vale à pena acreditar que as construções coletivas possíveis, no sentido
trazido neste capítulo, ampliam os espaços de diálogo social e transformam o mundo
em um lugar mais acolhedor e menos desautorizador para todos e, mais ainda, para
comunidades e grupos que foram e ainda são segregadas socialmente.
Na ética do discurso, trazida por Guareschi: Quem faz parte de uma comunidade, quem partilha o mesmo mundo da vida, pode se entender. Podemos, através da fala e da comunicação, trocar idéias, estabelecer um diálogo, levar a diante uma argumentação. E se houver algum ruído nesta comunicação, a única maneira de superá-lo e chegarmos a um entendimento é, novamente e somente, através da própria fala, da comunicação. GUARESCHI(2004,pág.118)
As desautorizações direcionadas à grupos e coletividades que tem suas
experiências sociais excluídas da historia oficial, empreendida com o modelo
moderno e mecanicista, produz focos de construção de novas subjetividades
reativas. Estas emergem como resistência e ruptura que não se encerram nos
movimentos sociais tradicionais, mas utilizam o corpo como espaço de manifestação
capaz de autorizar a prática de outros poder-saber. Neste sentido, O que as novas subjetividades colocam em jogo são os critérios de uma estética da existência: a produção da vida como uma obra de arte, elaboração estilística do eu no caminho de construção de um grupo-sujeito. Produzir novas experiências de sentido dentro das condições históricas dentro da contemporaneidade, é apostar na emergência de subjetividades que causam rupturas em diversos e simultâneos pontos da rede de poder.CRUZ (2006,pág. 123)
Como visto na fundamentação trazida neste capítulo, compreender como se
dá a dinâmica de um grupo de convivência e como acontecem as relações neste
contexto torna possível situar as diferentes ações e reações presentes em uma
situação vivida coletivamente. Feito isso, abre-se possíveis caminhos para os
mecanismos de transformação grupal, objeto de estudo que me alio para
compreender a experiência no Centro Suvag de Pernambuco.
Interlocuções 3 - COMPREENDER: PRIMEIRO PASSO PARA A TRANSFORMAÇÃO
Para melhor compreender a experiência trazida neste trabalho farei algumas
interlocuções que ajudarão a situar como os surdos se constituíram como grupo e
quais seus modos de se relacionar com um mundo onde a maioria da população é
ouvinte e tem como parte de sua história a negação social a grupos culturalmente
diferentes.
Neste contexto situo a relevância do Centro Suvag de Pernambuco e as
apresentações do espetáculo A Pedra do Reino como prismas reveladores de parte
da situação atual vivida pelos surdos. Traçarei aqui, em um paralelo de linhas não
distantes, a forma como têm se dado as relações entre os grupos citados no primeiro
capítulo e a forma como os surdos se configuram como sujeitos de uma cultura em
busca de reconhecimento social.
Refletir sobre como a história dos surdos foi escrita e o que foi feito com as
memórias deste grupo deixa claro a importância do apropriar-se do lugar de
produtores de cultura na construção de sua história real. A cultura é o legado de um
grupo a toda a humanidade, desta forma, uma possibilidade de legitimação social de
uma história.
Ao ter grande parte de sua história escrita por ouvintes, a cultura dos surdos
sofreu tamanhos recortes a ponto de possibilitar a criação de estereótipos que
apontam para as tantas nomeações e classificações dadas ao sujeito surdo no
decorrer da história.
Dentre as transformações históricas do conceito de cultura, apontadas por
Strobel (2008), uma autora surda, o mais nociva tanto para o surdo como para toda a
humanidade, foi a da tentativa de homogeneizar a cultura em busca da perfeição. A
maneira pejorativa de olhar para as diferenças e a alteridade, e ainda, a tentativa de
aniquilar as formas diferentes de estar no mundo entre os sujeitos trouxeram
grandes prejuízos existenciais aos surdos. Fato ainda não superado historicamente.
Ampliar o conceito de cultura permitindo que toda a pluralidade existente na
ou nas culturas possa ser legitimada e ter os devidos reconhecimentos como
contribuição social, é compreender que uma cultura é permanentemente constituída
e atualizada com a experiência vivida. Sendo assim, a cultura não se encerra no
presente, ela traz uma memória de gerações anteriores e inclui perspectivas futuras,
sonhos, desejos e uma motivação que permite a continuidade desta. É o contato
com o espaço cultural que traz as demandas de ação, crescimento e possibilidade
de identificação e pertencimento de um grupo.
Dentro da experiência trazida no primeiro capítulo, pudemos perceber que a
formação da Companhia Teatral causou um estado de mudanças estruturais que
foram acontecendo desde então como um (re)surgimento de algo recalcado
socialmente. Mesmo que este evento se desse dentro de uma instituição
comprometida com estes sujeitos, a experiência vivida se revelou enquanto forte
sentimento de presenciar o inesperado. Sentimento este que a medida que não é
externado pelas palavras ou pelos sinais, no caso das pessoas falantes da LIBRAS,
não revela sentido para tal experiência. Sentido este que possibilitaria a vivência de
transformações reflexivas e práticas.
O movimento de legitimar uma experiência vivida, envolve a disponibilidade
ou não para mudanças, sejam elas pessoais, sociais, institucionais ou grupais. O
movimento de resistência à experiência vivida muitas vezes toma o sujeito exposto à
transformação de modo a impossibilitá-lo de ver o sentido de sua ação ou não-ação.
A instituição Suvag tem em seu quadro de profissionais pessoas que estão
desde a sua fundação. Talvez este fato influencie a pouca prática da auto-avaliação,
por vezes se faz necessário que um olhar estrangeiro à situação vivida
cotidianamente traga reflexões que provoquem a confirmação de um lugar ou a
migração para outros, mais condizentes as situações emergentes. Talvez o fato do
Suvag ser a única escola só de surdos de Pernambuco também colabore com a
manutenção de uma certa posição de comodidade.
Segundo Strobel(2008) admitir a construção coletiva de uma cultura além de
trazer o reconhecimento do seu potencial transformador legitima a diferença que
emerge em cada grupo de uma tessitura social.
A partir desta compreensão de cultura, pode-se dizer que:
Cultura surda é o jeito de o sujeito surdo entender o mundo e de modificá-lo a fim de torná-lo acessível e habitável ajustando-os com as suas percepções visuais, que contribuem para a definição das identidades surdas e das “almas” das comunidades surdas. Isto significa que abrange a língua, as idéias, as crenças, os costumes e hábitos do povo surdo. ( STROBEL,2008, p. 24)
A comunicação inter e intrasocial dos surdos dada pela língua de sinais junto
a um conjunto de recursos como modos de ser, sentir, pensar e agir específicos
deste sujeito que tem seu melhor desenvolvimento quando existe um contato entre
os seus iguais. Este contato é em parte proporcionado pelo Suvag. Digo em parte
porque o contato com a história dos surdos e a interação com surdos adultos, que
tenham um experiência de mundo para além dos muros da escola, apenas
começaram a ser pensada neste ano de 2009. Como cita a autora:
[...] muitas vezes a formação de identidades surdas é construída a partir de comportamentos transmitidos coletivamente pelo “povo surdo”, que ocorre espontaneamente quando os sujeitos surdos se encontram com os outros membros surdos nas comunidades surdas. ( STROBEL,2008, p. 33)
Sabendo que um grupo se constitui com o compartilhamento social, parece
que não se deixou espaço para o diálogo com o que vem de fora. Apresentar o
mundo é dar a possibilidade de produzir uma fala condizente com a experiência
vivida nos lugares de encontro e nas trocas com e entre os surdos. Este grupo
sempre busca locais predispostos às formações de novas subjetividades e auto-
reconhecimentos. A escola é apenas um destes lugares. Um dos outros possíveis é
o lugar de produtor de cultura.
Um sujeito ou um grupo que surpreende a expectativa do ambiente em que
ele vive ou sua própria história pode ter seus atos automaticamente acompanhados
pelos “esquecimentos estereotipados” tão bem descritos por Benjamim (Strobel,
2008, p.91). Ou no lugar disto pode lutar pelo seu e por tantos outros personagens
esquecidos de uma história.
Apenas depois do período de negação cultural e de lutas políticas e sociais
buscando o reconhecimento de sua cultura, os surdos puderam se apropriar do lugar
de produtores culturais, de falantes da língua de sinais, da experiência visual e de
seus “artefatos culturais” salientados por Strobel(2008) como um modo de
reconhecimento.
Os meios tecnológicos à medida que tem a visão como um dos principais
meios de relacionar-se com o mundo traz os surdos como integrantes culturais que
não só propõem novas tecnologias, como se atualizam no mundo a partir delas. São
muitas as possibilidades contemporâneas para a utilização da imagem como
linguagem comunicativa. Vídeo, fotografia, designer gráfico, paisagismo de espaços
reais ou virtuais, desenvolvimento de softwers, cinema, animação, ilustração, sem
falar das tantas possibilidades de interação com artes mais veteranas como as artes
plásticas e o teatro. Estamos a caminho de uma unidade a partir da diferença.
Isso não quer dizer deixar de integrar um grupo, mas sim, de poder ter um ou
mais grupos de pertença, onde a história construída os agregue e reconheça sua
colaboração histórica e cultural. Neste sentido, Strobel(p.92) ressalta que existem
muitas possibilidades de comunicar a história cultural dos surdos - “utilizando da
língua de sinais, desenhos, expressões faciais, corporais, imagens visuais, artes,
movimentos de lutas, criações, pedagogias...”. Apenas precisaria fortalecer o
sentimento de pertença deste grupo.
Dada a necessidade de oferecer lugares que proporcionem o fortalecimento
dos sujeitos surdos e dado os poucos espaços capazes de proporcionar o encontro
deste público, explicita-se a importância de novos lugares de concentração e
estímulo a produção cultural. E mais ainda de lugares capazes de acolher e divulgar
aspectos materiais e imateriais produzidos.
Em seu livro As imagens do outro sobre a cultura surda Strobel (p.38) traz que
as “atitudes do ser surdo, de ver, de perceber e de modificar o mundo” estão
representados nos artefatos culturais da cultura surda. São estes: A experiência
visual; o modo lingüístico; a experiência familiar; a literatura surda; a vida social e
esportiva; as artes visuais; a política; e os materiais desenvolvidos para proporcionar
uma melhor acessibilidade aos e nos ambientes de convívio.
Como pudemos perceber, compreender estes artefatos culturais é defender
contribuições para uma representação positiva e melhor condizente dos surdos e da
cultura surda. Eles perpassam toda a vida cotidiana, pessoal, social, intelectual e
política dos surdos compondo lugares de legitimação do ser surdo.
As trocas culturais apenas podem se dar quando uma série de conhecimento
de mundo se instaura possibilitando o entendimento do ser surdo. Assim, firmar-se
como integrante de um grupo é a estrutura necessária para que sujeitos seguros de
sua história permitam-se ir ao encontro do mundo. Se estamos sempre nos
reestruturando é preciso algo que nos sustente atentos ao mundo ao longo do
tempo.
O que se quer nesta busca de novos espaços não se trata de uma inclusão no
sentido de ser incluído; a inclusão já está posta (cultura surda junto a outras); trata-
se de reconhecer nestes espaços de encontro à relevância que já existe.
Epílogo CONCLUSÃO
Hoje parte dos adolescentes que se formaram no Suvag durante este
percurso e continuam fazendo parte da Companhia de Teatro formaram um grupo
que luta pelos direitos dos surdos. Este grupo que tem um espaço para fazer seus
encontros no Suvag busca parcerias para as peças, produz um Jornal do Suvag e
vídeos para a internet. Pela grande familiaridade com as ferramentas da internet e
tecnologias visuais, não só este grupo, mas muitos surdos têm nos meios
tecnológicos uma ferramenta de interação social.
A formação da Companhia de Teatro Mãos EmCena tem trazido repercussões
imensuráveis, que vem deixando clara sua abrangência quando impulsiona a
transformação de vários grupos que vão além dos citados nesta história. A própria
Companhia de Teatro com seus atores e técnicos, a equipe que dá aulas de teatro
na quinta-feira, os funcionários do Suvag, os familiares dos atores, as outras
crianças e jovens surdos que tem vontade de fazer teatro, os familiares que ao trazer
seus filhos para estudar no Suvag procuram o grupo de teatro, cada pessoa que foi
platéia em algum momento, os grupos e instituições que lutam pela cultura de
grupos, artistas visuais, atores... foram tocados por esta experiência.
A história que contei nesta monografia vislumbra por mais lugares de diálogo
dentro e fora do Suvag. Este trabalho está contextualizado com os projetos que
estão sendo desenvolvidos ou pensados pela equipe de teatro do Suvag. Os
projetos pensados tem a cultura e a memória dos surdos como objetivo principal. Um
deles, O Ponto de Cultura Surda Vozes Visuais, projeto de rede nacional, tem suas
ações voltadas para divulgar, catalogar, estimular e produzir as histórias e a cultura
dos surdos.
A vontade de fazer teatro e história tem estado cada vez mais enraizada em
todos que fizeram esta história acontecer. O lugar que buscamos é o de poder
dialogar com os vários grupos aqui citados de forma que se produzam sentidos e
falas a partir desta experiência. Sentidos quem vão bem além do fazer teatral.
Leitura Dirigida REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CRUZ, Jorge(Org.); Gilles Deleuze: Sentidos e Expressões; Rio de Janeiro: Editora Ciência Moderna, 2006 BOCK, Ana M. B.; GONÇALVES, M. Graça M.; FURTADO, Odair (Orgs.) Psicologia sócio-histórica: uma perspectiva crítica em psicologia. São Paulo: Cortez Editora, 2002. GOOLISHIAN, H. A. E ANDERSON, H. Narrativa e self: Alguns dilemas pós-modernos da psicoterapia. In Novos Paradigmas, Cultura e Subjetividade. SCHNITMAN, D. (ORG). Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. GUARESCHI, Pedrinho. Psicologia Social Crítica como prática de libertação, 3.ed., Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005. HALL, Stuart; A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro. 7. ed. ,Rio de Janeiro: DP&A, 2002. LÉVY, André et al. Psicossociologia: Análise social e intervenção. Petrópolis: Vozes, 1994. MOREIRA, Virgínia; SLOAN, Tod. Personalidade, ideologia e psicopatologia crítica. São Paulo: Escuta, 2002. STROBEL, Karin. As imagens do outro sobre a cultura surda. Florianópolis: editora da UFSC, 2008. SUASSUNA, Ariano Vilar. Romance d’ A Pedra do Reino e o Príncipe do sangue do Vai-e-Volta: romance armorial – popular brasileiro; prefácio \de Rachel de Queiroz, posfácio \ de maximiniano Campos. 4. ed. , Rio de Janeiro, J. Olympio, 1976.
Registros Fotográficos
ANEXOS
Ensaios de A Pedra do Reino
Filmagem do prólogo de A Pedra do Reino
Cenas das Apresentações de A Pedra do Reino
Teatro de Sombras
Pastoril
Julgamento Prisão de Quaderna
Apresentação em uma tenda de circo no Festival de Inverno de Garanhuns - PE
Apresentação no Teatro Santa Isabel - Recife PE Fonte: Centro Suvag de Pernambuco entre 2006 e 2009
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