8/6/2019 Tião Rocha - Revista Escada - Junho 2011
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número 06 | ano 02 abril a junho 2011Publicação Sinepe/PR
Bullying e cyBer Bullying:
como agir contra eles?
Entrevista
Tião Rocha explica adiferença entre educação eescolarização
Hora certa
Quando seu flho podecomeçar a pegar ônibus e ir ao shopping sozinho?
Escolha profssionalFazer vestibular no meio doano vale a pena?
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T / Marília Bobato
F / Danilo Verpa
en.tre.vis.ta / Tião Rocha
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educação
escolarização Antropólogo por formaçãoacadêmica, educador po-pular por opção política efolclorista por necessidade.
Tião Rocha é o responsável pelo CentroPopular de Cultura e Desenvolvimento(CPCD), uma organização não governa-mental, sem ns lucrativos, fundada em1984, em Belo Horizonte/MG. A missão:educar. O formato: pedagogia do abraço, dobrinquedo, da roda. O local: embaixo de umpé de manga ou onde tiver interessados.
Colecionador de prêmios por sua iniciativa,Tião convida os brasileiros a sair do estadode latência, das discussões sem m em
congressos e fóruns para praticar a Educa-ção. Em entrevista para a revista Escada,falou durante uma hora em ritmo acelera-do. Ao fundo, música instrumental que,segundo o mineiro, rege seu trabalho tantopara inspirar como para relaxar, se é queisso é possível para quem quer construircidades educativas.
Revista Escada - O folclore brasileiro é muito rico e
passa mensagens através de gerações. A educação
também tem essa função?
Tião Rocha - O folclore é uma das áreas da Antro-
pologia, é cultura popular. Tem a ver com as mi-
nhas origens, então primeiro foi uma necessidade
pessoal, porque percebi que o sentido da vida estána cultura herdada e na continuidade. Depois veio
como um instrumento de aprendizagem e para
mim a educação é isso, é no plural, é troca. Então,
o folclore é uma bela forma de conhecimento.
RE - Você atuou durante anos como professor.
Como foi a decisão de se distanciar da sala de aula?
T - Tive o que os americanos chamam de insight,
que para nós mineiros é um clarão mesmo. Na
época decidi: não quero mais ser professor, quero
ser um educador. Porque professor é aquele que
ensina, enquanto educador é quem aprende. Isso
foi há quase 30 anos, eu era professor da Uni- versidade Federal de Ouro Preto e percebi que
era um tal de “eu te cito, você me cita”. Os temas
importantes cavam apenas entre as pessoas que
assistiam e participavam das bancas, até porque
eram pagos para isso. Então, as portas foram se
fechando, enquanto eu queria que se abrissem. E
decidi pedir a conta, era concursado e até então
nenhum professor nunca havia pedido demissão.
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RE - Como vê a educação brasileira hoje?
T - Existe uma diferença muito grande entre educação eescolarização. Mas é importante lembrar que a escola é umreexo da sociedade. Escola é o local de escolarização, já a
educação é um processo permanente, até porque a aprendi-zagem é para a vida toda. É possível aprender em todos oslugares, na rua, no convívio com o outro... Hoje escuto mui-ta gente dizendo: “estou estudando para ser alguém na vida”.
Diploma eleva salários, cargos... mas essa é outra história.
RE - Então é possível fazer educação sem escola?
T - Sim, nas localidades que o CPCD começou suas ativida-des não havia escola, ou onde existia, alguns estudantes iame outros não. Mas frequentavam pelos mais diversos mo-tivos, como merenda, Bolsa-Família. Isso faz parte de umapolítica seletiva, excludente e preconceituosa que priorizanúmeros sem qualidade e acaba gerando um processo deindiferença.
RE – Como cam alunos, professores e a escola nesse cenário?
T - É preciso uma mudança por parte de pais e alunos, que
eles sejam aliados dos professores. E se quiserem brigar,essa briga deve ser contra o sistema. Nesse processo demudança, a missão de toda escola seria não perder nenhumaluno. Assim, a escola vai ser referência e encontrar seufoco: a escola quer formar cidadãos ou pessoas para o mer-cado de trabalho? Trata-se de uma mudança ética.
RE – Mas, como ensinar ética para uma sociedade?
T - Defendo a criação do setor zero. O mundo está dividi-do em 1º setor que é o Estado; 2º setor, o mercado e 3º, asociedade. O setor zero seria comandado pela ética, comcorrupção zero, fome zero, analfabetismo zero.
RE - Foi a partir disso que surgiu o Centro Popular de Culturae Desenvolvimento?
T - O CPCD surgiu com um grupo de amigos a partir da minha vontade de aprender. Trata-se um instituto que faz perguntas.
RE - Os projetos do CPCD estão em mais de 20 cidades brasi-
leiras e em três países (Angola, Moçambique e Guiné-Bissau).
Quantas pessoas já foram beneciadas pelo CPCD até hoje?
T - São 27 anos de trabalho e cerca de 2 mil meninos porano, o que signica mais de 50 mil alunos. Dali também for-mamos muitos educadores que dão continuidade ao nossotrabalho. São pessoas generosas que aplicam a pedagogia doabraço, do brinquedo, da roda, nossa forma de ensinar.
No Maranhão, por exemplo, a pedagogia foi usada para salvaros meninos da mortalidade infantil. Na região, percebemosque os médicos entendem de doença e não de saúde; lá ascrianças estavam morrendo aos borbotões. Foi pela ética, nos-so instrumento de formação, que percebemos que dá para tersaúde sem médico, sem hospitais. Pela educação foi possívelensinar hábitos saudáveis para aquela população e diminuir oscasos de mortalidade infantil. Essa é nossa pedagogia.
RE - O que você espera dos cidadãos que participam do Centro
Popular de Cultura e Desenvolvimento? T - Que sejam felizes. Essa é nossa razão de viver, até porque
vida não tem segundo turno. O que todo cidadão precisa éser livre, feliz, ter saúde e educação.
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É possível aprender emtodos os lugares, na rua, no
convívio com o outro...
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RE - Você já provou que é possível fazer
educação em baixo de um pé de manga
com o Projeto Sementinha, além de ou-
tros inúmeros projetos do CPDC. Onde
vocês desejam chegar?
T - Tenho pressa, meu tempo é reduzidoe minha missão é maior. Quero praticarprojetos abrangentes, precisamos cons-
truir cidades educativas. Cidades comoportunidades de aprendizado, combibliotecas 24 horas que seriam tão im-portantes quanto os hospitais 24 horas.
A lógica hoje são plataformas, não maisprojetos. Uma plataforma sustentávelque é possível em cidades com até 50 milhabitantes, que é 95% do Brasil.
Conheça alguns projetos sociais do CentroPopular de Desenvolvimento e Cultura:
Projeto sementinha
[Escola debaixo do pé de manga]
Foi o primeiro projeto desenvolvidopelo CPCD. Teve inicio em 1984 na
cidade de Curvelo (MG). É destinadoa crianças de 4 a 6 anos, não atendidas
pela rede pública e particular.
O projeto desenvolve a auto-estima ea identidade, trabalha a consciênciacorporal e cuidados da higiene e saúde.Procura cultivar em cada criança asemente dos valores de cidadania. OSementinha, dentro da sua concepçãode um projeto itinerante, desenvolve amaioria das atividades na própria comu-nidade por meio de passeios e excursõescom o objetivo de melhor conhecer eengajar a cultura local. Transforma todosos espaços em “escola” e toda “escola” em
centro de cultura comunitária.
cidade educativa
[De UTI Educacional à Cidade Educativa]
O princípio norteador da propostabaseia-se na crença e na convicção
que, mais do que a denúncia de nossasmazelas sociais e exposição dos retra-tos de nossas misérias econômicas ede nossas injustas relações humanas,temos em cada comunidade, por maisdistante, pobre, longínqua ou carenteque seja, um acervo signicativo de
respostas e alternativas, capazes demudar radicalmente o quadro da desi-gualdade social e o “status” de imobi-lismo em que se encontra.
A proposta é dar a todos os saberes, fa-zeres e quereres sociais existentes nasdiversas comunidades rurais e perifé-ricas de Araçuaí, o espaço privilegiadodo conhecimento a ser apreendido, ou,em outras palavras, pensar e agir paratransformar cada uma destas micro-comunidades em núcleos geradores deaprendizagem permanente para todosos meninos e jovens da cidade.
Semelhante à UTI médica, a UTI edu-cacional também pressupõe a existên-cia de uma série de procedimentos:urgência do atendimento, ecácia das
condutas, atenção e cuidados redobra-dos, convocatória do que há de melhor
em termos de recursos, competênciase especialidades, e atuação coordenadaem função do objetivo: evitar a “mor-te”. No caso, a “morte-cidadã”, provo-cada pelo analfabetismo e por todas asdoenças e moléstias sociais, políticas eeconômicas que ela produz e alimenta.
Projeto ser criança
[Educação pelo brinquedoou Brinquedoteca]
Estudar brincando, plantar e comer,
conversar e aprender, jogar e cantar,criar e ensinar, pintar e limpar, fazer ereciclar, dançar e sonhar, ser e ousar,respeitar e crer, rir e cuidar-se sãoalguns dos muitos verbos praticadosno dia-a-dia desse projeto por centenasde meninos e meninas, em horárioscomplementares à escola formal eem espaços comunitários repletos dealegria, prazer e generosidade.
O projeto implementa ações educa-
tivas e de formação humana, provo-cando uma interferência positiva emodicadora na vida das crianças e
adolescentes participantes.
Todas as pessoas participantes da vidadas crianças são consideradas educa-doras, independentemente de idade oufunção, sejam eles pais, outros alunos,além dos professores.
A regra geral na aplicação dessa losoa
é o respeito às diferenças e singularida-des individuais: cada ritmo, cada fazer,cada saber. O projeto, mais do que umainiciativa social, tornou-se uma tecno-logia educacional ao ser implantado,através da Lei Municipal de Educação,em municípios como São Francisco e Araçuaí/MG, multiplicando seu alcance.
Para saber mais: www.cpcd.org.br
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