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PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DO RIO GRANDE DO SULFACULDADE DE TEOLOGIA
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM TEOLOGIAMESTRADO EM TEOLOGIA SISTEMTICA
Porto Alegre2014
ANDERSON LIMA
EXPERINCIA DE F E O
SEGUIMENTO DE CRISTO EM
DIETRICH BONHOEFFER
Prof. Dr. Urbano Zilles
Orientador
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ANDERSON LIMA
EXPERINCIA DE F E O SEGUIMENTO DE CRISTO EM DIETRICHBONHOEFFER
Dissertao apresentada como requisitoparcial para obteno de grau de Mestreem Teologia, do Programa de Ps-graduao em Teologia da PontifciaUniversidade Catlica do Rio Grande doSul. rea de concentrao: TeologiaSistemtica.
Orientador: Prof. Dr. Urbano Zilles
Porto Alegre
2014
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Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)
L732e Lima, Anderson
Experincia de f e o seguimento de Cristo em DietrichBonhoeffer / Anderson Lima. Porto Alegre, 2014.
93 f.
Diss. (Mestrado em Teologia) Fac. de Teologia, PUCRS.
Orientador: Prof. Dr. Urbano Zilles.
1. Teologia. 2. F. 3. Jesus Cristo. 4. Bonhoeffer, Dietrich
Crtica e Interpretao. 5. Cristologia. I. Zilles, Urbano. II. Ttulo.
CDD 232
Ficha Catalogrfica elaborada porVanessa Pinent
CRB 10/1297
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AGRADECIMENTOS
Agradeo a Deus por ter sido to misericordioso e bondoso para comigo
nesses ltimos anos. indizvel minha gratido. S me resta devotar-me
completamente a Ele.
A minha esposa e aos meus filhos, obrigado por me encorajarem sempre.
Vocs foram incrveis ao longo desses dois anos. Vocs so a razo de tudo isso,
eu os amo muito. Sem vocs este trabalho no seria realidade.
A meus pais por estarem sempre ao meu lado. Obrigado por todo o apoio e
amor incondicional. Hoje posso voar mais alto porque vocs sempre acreditaram em
mim.Ao meu irmo Robson e sua esposa Raquel, que, alm dos laos familiares,
so meus parceiros ministeriais, e durante esses dois anos do mestrado seguraram
as pontas quando eu mais precisava.
Ao professor Dr. Urbano Zilles. T-lo como orientador no privilgio de
muitos e por isso sou grato a Deus por t-lo tido. Sua humildade e sabedoria
continuaro me ensinando.
Aos professores e funcionrios do Departamento de Teologia da PUCRS.Em especial ao Prof. Dr. Leomar Antnio Brustolin, coordenador do PPG, por ter me
oportunizado essa grandiosa experincia que foi o mestrado. Obrigado por acreditar
em mim.
Aos colegas de mestrado, pelo companheirismo ao longo de todo o tempo,
em especial meu irmo de corao Adriano de Souza Lima.
Ao PROBOLSAS Programa de Bolsas de Mestrado e Doutorado da
PUCRS, pela valiosa contribuio para a realizao desta pesquisa. famlia Catch the Fire Novo Hamburgo (Igreja e Escola), congregao da
qual sou pastor, que indiretamente participou e apoiou este projeto. Nela pude ver o
quanto a experincia de f necessria para uma caminhada genuna com Cristo.
Ao meu amigo Diego dos Santos Wingert, o maior autodidata que conheo.
Obrigado pelo encorajamento, pelos livros emprestados e pelas oraes.
A Sociedade Internacional Dietrich Bonhoeffer, em especial der Felisbino
de Souza, sou grato por todo o apoio oferecido.
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Se sou eu que digo onde Deus deve estar, eu sempre achareium deus que me corresponde de alguma maneira, condescendente, se acomoda ao meu jeito de ser. Mas se Deus mesmo que diz onde ele quer estar, ento esteprovavelmente ser o lugar que no corresponde ao meu jeitode ser, que no me agrada nem um pouco. Este lugar, porm, a cruz de Cristo, como o exige o Sermo do Monte.
Dietrich Bonhoeffer, escrevendo ao seu cunhado RdigerSchleicher (MILSTEIN, 2006).
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RESUMO
Esta dissertao reflete sobre o tema Experincia de F e o Seguimento de Cristo,
analisado pela tica do Telogo Dietrich Bonhoeffer. Buscamos averiguar em que
medida a experincia de f de fato influencia na genuna caminhada com Cristo.
Para fundamentar a questo, percorremos, atravs de uma anlise bibliogrfica, a
vida e a obra de Dietrich Bonhoeffer. No primeiro captulo, apresentamos o contexto
histrico em que Bonhoeffer estava inserido, como guerras, perodo entre guerras e
o Cristianismo, alm de sua biografia. No segundo captulo, a partir de uma anlise
de suas obras, buscamos apresentar sua teologia, sob a tica da experincia de f.
No terceiro e ltimo captulo, o enfoque a experincia de f e o seguimento deCristo propriamente dito. Analisam-se os conceitos, Dietrich Bonhoeffer e sua
experincia de f, salvao e martrio. Apresenta-se tambm uma breve anlise do
movimento pentecostal e da Teologia, contribuindo para afirmar a necessidade de
uma experincia de f genuna para um real seguimento de Cristo.
Palavras-chave:Experincia; F; Cristo; Seguimento; Dietrich Bonhoeffer.
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ABSTRACT
This thesis reflects on the theme of Faith Experience and Discipleship, analyzed from
the perspective of the theologian Dietrich Bonhoeffer. We seek to determinate how
the experience of faith actually influences the genuine walk with Christ. In support of
the issue, we have come through a literature review of the life and work of Dietrich
Bonhoeffer. The first chapter discusses the historical context in which Bonhoeffer
was inserted, as wars, the interwar period and Christianity, besides his biography. In
the second chapter, from an analysis of his works, we seek to present his theology
from the perspective of the experience of faith. In the third and final chapter, the
focus is the experience of faith and discipleship of Christ itself. Analyzes theconcepts, Dietrich Bonhoeffer and his experience of faith, salvation and martyrdom,
and a brief analysis of the Theology and Pentecostal movement, helping to affirm the
need for a genuine experience of faith to a real following of Christ.
Keywords: Experience; Faith; Christ; Discipleship; Dietrich Bonhoeffer.
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LISTAS DE SIGLAS
ALAmrica Latina
EUAEstados Unidos da Amrica
ExLivro de xodo
HeLivro dos Hebreus
IsLivro do Profeta Isaas
MtEvangelho de Mateus
RSResistncia e Submisso
TmCarta de Paulo a Timteo
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SUMRIO
1 INTRODUO ................................................................................................... 9
2 CONTEXTO HISTRICO E DE VIDA DE DIETRICH BONHOEFFER ............ 13
2.1 ANOS DE TRANSFORMAO: PRIMEIRA GRANDE GUERRA (1914-1918)142.2 O PERODO ENTRE GUERRAS: 1919-1939 .................................................. 192.3 SEGUNDA GRANDE GUERRA: 1939-1945 .................................................... 222.4 O CRISTIANISMO E AS GUERRAS MUNDIAIS ............................................. 242.5 VIDA E OBRA DE DIETRICH BONHOEFFERO TELOGO ....................... 272.6 VIDA E OBRA DE DIETRICH BONHOEFFERO MILITANTE E PRISIONEIRO .................................................................................................................................. 32
3 TEOLOGIA DE DIETRICH BONHOEFFER ..................................................... 38
3.1 A PRECIOSA GRAA, COM SUAS CONSEQUNCIAS ............................... 393.2 A EXPERINCIA DO CHAMADO E DO SOFRIMENTO ................................. 423.3 O PRIMEIRO SERMO DE JESUS ................................................................ 463.4 A VINGANA E O AMOR AO PRXIMO ....................................................... 483.5 DISCIPLINAS ESPIRITUAIS ........................................................................... 523.6 A IGREJA E O DISCPULO ............................................................................. 55
4 EXPERINCIA DE F E O SEGUIMENTO DE CRISTO ................................ 60
4.1 CONCEITOS: EXPERINCIA, F E SEGUIMENTO ...................................... 614.2 CONTRIBUIES DA TEOLOGIA DE DB PARA A EXPERINCIA DE F E O
SEGUIMENTO DE CRISTO ............................................................................ 664.3 EXPERINCIA DE F E SALVAO ............................................................. 704.4 EXPERINCIA DE F E MARTRIO ............................................................... 744.5 BONHOEFFER E O PENTECOSTALISMO BRASILEIRO .............................. 774.6 A TEOLOGIA, A EXPERINCIA DE F E O SEGUIMENTO DE CRISTO ..... 82
5 CONCLUSO ................................................................................................. 87
REFERNCIAS ............................................................................................... 90
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1 INTRODUO
Com o advento da Modernidade, a realidade de um Deus sobrenatural, que
criou e controla o universo, passou a ser questionada. Na modernidade, no se tem
espaos para a realidade sobrenatural. At se considera a possibilidade da
existncia de Deus, mas um deus reduzido a um mero conceito de interiorizao do
prprio ser humano e que no pode ser objetivamente percebido.1
O desenvolvimento da cincia causou um divrcio entre a teologia e a
espiritualidade, principalmente no mundo Ocidental, fazendo com que a teologia
ocidental se inclinasse mais razo raciocinante.2 Nesse contexto, a Teologia
sentiu os efeitos da reduo do homem a sua razo e desta razo instrumental,sobretudo a partir do Iluminismo, quando tentada a reduzir a liturgia e a vida crist a
um discurso racional.3
Na ps-modernidade, o abandono dos mtodos racionalistas e cientficos e a
aproximao do sagrado produziram, em contrapartida, uma espiritualidade sopa de
letrinhas, na qual Jesus Cristo equiparado com gurus, horscopos, numerlogos,
astrlogos, mgicos, etc.4 Zilles, ao abordar o tema da racionalidade e
espiritualidade, afirma:
Nesse mundo, produto da racionalidade tcnico-cientfica, encontramos ohomem contemporneo, tentando reconquistar sua espiritualidade, como orecurso ao ocultismo, o interesse dos ocidentais pela meditao oriental, aexploso de movimentos religiosos e a sensibilidade pelo transcendente daexperincia.5
Se na modernidade as pessoas gritavam Deus est morto, hoje
proclamam: Marx tambm e eu j estou doente de morte6. Essa espiritualidade
diversificada e a deriva grave da teologia para um lado de um intelectualismoesterilizante7delegam ao telogo um papel fundamental na sociedade.
A Modernidade no conseguiu responder a todos os questionamentos
humanos, alm de criar outros, com os quais a ps-modernidade igualmente no
est sabendo como lidar. Toda essa busca, se no orientada, pode levar a encontrar
1GONDIM, Ricardo. Fim do Milnio:Os Perigos e Desafios da Ps-modernidade na Igreja, p. 10.
2BOFF, Clodovis. Teoria do Mtodo Teolgico,p. 137.
3ZILLES, Urbano. Desafios Atuais para a Teologia,p. 75.4
ZILLES, Urbano. Desafios Atuais para a Teologia,p. 62.5ZILLES, Urbano. Desafios Atuais para a Teologia,p. 61.
6GONDIM, Ricardo. Fim do Milnio:Os Perigos e Desafios da Ps-modernidade na Igreja, p. 19.
7BOFF, Clodovis. Teoria do Mtodo Teolgico,p. 151.
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respostas erradas. O ser humano sempre buscou a Deus e sempre se inclinou a
Deus ou a dolos criados no Ocidente e Oriente,8portanto, afirma Boff que se no
nos cuidarmos, poderemos ser vtimas e prisioneiros da unilateralidade da razo...
Neste caso, construiremos falsos deuses, achando que o mundo real se reduz ao
mundo da cincia.9
Esse cuidado de extrema importncia e nesse aspecto que a discusso
entre experincia de f e seguimento de Cristo se torna assunto relevante para a
igreja nos dias atuais. Alm do tema, a escolha do autor ocorre tendo em vista a
difcil tarefa de separar sua teologia de sua vida pastoral. Dietrich Bonhoeffer, mais
do que um telogo, foi uma existncia teolgica, na qual a palavra maior foi a morte
martirial.10Em Bonhoeffer, biografia e teologia se mesclam como em nenhum outrotelogo do sculo XX, afirma Gibellini.11 Com o livro Discipulado, Bonhoeffer
apresenta uma proposta de tornar a Cristologia acadmica em Cristologia prtica,
buscando entender o que Cristo tem para ns e o que Ele pede de ns hoje!12
Bonhoeffer tem varias de suas obras traduzidas para o portugus e tem sido
apreciado por alguns setores da igreja brasileira. Contrariamente a isso, pouco tem
sido o material acadmico produzido no Brasil, relacionado ao telogo alemo13.
Trabalhos relacionados a tica, como o de Chaves14
e Peruzzo15
; tambm na analisedo neo-pentecostalismo brasileiro, como o de Nunes16e Caldas17; da receptividade
da teologia de Bonhoeffer na AL, como o de Ramos18; ou do cristianismo a-religioso
de Bonhoeffer, analisado por Barcala19, so exemplos de trabalhos acadmicos,
apresentados no Brasil. Neste trabalho procurar-se- analisar uma face ainda
pouco explorada, o da experincia de f de Bonhoeffer, com sua teologia e
espiritualidade.
8BOFF, Clodovis. Teoria do Mtodo Teolgico,p. 63.
9BOFF, Clodovis. Teoria do Mtodo Teolgico,p. 69
10HAMMES, rico. Cristologia e Seguimento em Dietrich Bonhoeffer. Revista TeoComunicao, p. 498.11GIBELLINE, Rosino.A teologia do Sculo XX, p. 106.12
GIBELLINE, Rosino.A teologia do Sculo XX, p. 109.13
CALDAS, Carlos. Bonhoeffer no Brasil. Revista Caminhando, p. 134.14CHAVES, Irnio Silveira. tica protestante e modernidade. A formulao de uma proposta tica a partir de
Dietrich Bonhoeffer, 2006.15
PERUZZO, Tula Maria Ribeiro Diorio. O Desenvolvimento do Pensamento tico de Dietrich Bonhoeffer: Atica da responsabilidade num mundo tornado adulto, 2010.
16
NUNES, Eber. Da burocracia para a profecia: mudanas no neopentecostalismo brasileiro, 200817CALDAS, Carlos. Bonhoeffer no Brasil. Revista Caminhando, 2008.18
RAMOS, Luciana Soares.A recepo da teologia de Dietrich Bonhoeffer na Amrica Latina , 2007.19BARCALA, Martin. Cristianismo Arreligioso:Uma Introduo Cristologia de Dietrich Bonhoeffer, 2010.
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Partindo do pressuposto da ruptura ocorrida, principalmente no Ocidente,
entre Teologia e Espiritualidade, atravs do estudo da vida de um telogo, na qual
sua teologia se mistura com sua vida, busca-se analisar o quanto de suas
experincias de f, de sua espiritualidade, de fato influenciaram sua teologia e,
consequentemente, seu seguimento de Cristo. Realmente preciso desenvolver
espiritualidade para ser um telogo?
Como j mencionado, o papel do telogo nos dias atuais tem se tornado de
grande importncia, no entanto, que tipo de teologia estamos apresentando? Qual a
relevncia daquilo que falamos para uma sociedade que est atrs de respostas? A
crise do sentido torna-se caracterstica peculiar da inquietude ps-moderna20 e
Dietrich Bonhoeffer tem muito a contribuir com tudo isso. Em uma jornada por seusescritos publicados em vida e o resgate de suas obras pstumas, buscar-se-
encontrar indcios que nos conduzam a uma resposta satisfatria, alimentando o
esprito do leitor e encorajando-o a construir seu prprio itinerrio de f.
Para isso, a busca por respostas aos questionamentos supramencionados
se d a partir do captulo primeiro, no qual se apresenta uma abordagem histrica do
perodo em que viveu Dietrich Bonhoeffer. Ser feita uma anlise do ambiente social
e poltico de sua infncia, que foi a Primeira Grande Guerra Mundial; suaadolescncia, o perodo entre guerras; at sua vida adulta, durante a Segunda
Grande Guerra. Sero analisadas tambm as implicaes do cristianismo ao longo
de todo esse perodo e a vida e obra de Dietrich Bonhoeffer, sendo separadas em
dois perodos: o primeiro enquanto telogo; e o segundo enquanto militante e
prisioneiro de Hitler.
No segundo captulo, ser apresentada brevemente a teologia de Bonhoeffer
a partir de uma leitura da experincia de f. Com a anlise das obras DiscipuladoeResistncia e Submisso, e com o auxlio das obras Vida em Comunho e
tica, que contribuiro para melhorar a anlise, procurar-se- verificar em que
medida a experincia de f de Dietrich Bonhoeffer de fato influenciou em sua
Teologia. Sero abordados os temas da Graa Preciosa, do chamamento do Mestre
e como esse chamamento se relaciona com o sofrimento do discpulo. Tambm ser
abordada uma questo polmica na vida de Dietrich Bonhoeffer, no que se refere ao
amor ao prximo e vingana, alm das disciplinas espirituais de Bonhoeffer, algo to
20FORTE, Bruno. Escuta do Outro:filosofia e revelao, p. 148.
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importante em sua vida. Alm disso, ser mencionada a relao entre igreja e
discpulo, com suas implicaes e responsabilidades.
No terceiro e ltimo captulo, ser abordado propriamente o tema
experincia de f e seguimento. Com a conceituao de experincia e f, intentar-
se- criar limites para analisar o que significa uma autntica experincia de F.
Atravs de uma anlise da teologia de Dietrich Bonhoeffer, buscar-se- encontrar as
implicaes diretas das experincias de f de Bonhoeffer para a composio de sua
teologia.
A experincia de salvao e martrio, com suas implicaes, tambm sero
abordadas neste trabalho, sempre luz da experincia de f. Mesmo que
Bonhoeffer tenha vivido em tempos diferentes e distante da realidade brasileira,acredita-se que sua teologia pode contribuir significativamente para a igreja
brasileira e principalmente a igreja pentecostal, que tambm enfocada no terceiro
captulo. Por ltimo, mas no menos importante, ser apresentada uma anlise da
teologia e da experincia de f, os contrastes e aproximaes, visando um
seguimento de Cristo, autntico e frutfero.
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2 CONTEXTO HISTRICO E DE VIDA DE DIETRICH BONHOEFFER
Neste captulo ser apresentado primeiramente o contexto histrico em que
Dietrich Bonhoeffer estava inserido, seus paradigmas e transformaes. Imerso em
uma cultura de guerra desde seu nascimento, Bonhoeffer extrai de suas
experincias pessoais e de f foras para ver os princpios cristos em que
acreditava serem vividos no somente pela igreja, mas pela sociedade como um
todo. Ser apresentado um breve relato de sua biografia, suas experincias e sua
produo teolgica, para posteriormente analisar sua teologia. Na narrativa histrica,
ser adotado as obras de Eric Hobsbawn, A Era dos Impriose Era dos Extremosjunto com outros autores que corroboram com o posicionamento de Hobsbawn.
Quando se busca entender algo ou algum, existe a necessidade de
compreender um pouco mais do que simplesmente a pessoa ou o fato em si. Para
conhecer algum existe a necessidade de conhecer tambm o meio em que est
inserido, qual o contexto do ocorrido. A psicologia entende, que o que somos
resultado de algo ou algum ter nos estimulado a isso.
Mesmo no cognitivismo, que entende que o conhecimento construdo pelainterao da pessoa com o meio e vice versa,21 postula-se que a formao do
conhecimento e a resposta que damos a isso so o resultado da relao entre o
homem e o meio em que vive. O fato que somos produto do meio, o que somos
hoje resultado de experincias e escolhas do passado.
Dietrich Bonhoeffer nasce e cresce em um dos perodos de maior
transformao da histria da humanidade no que tange s relaes sociais, a
primeira metade do sculo XX, com suas duas Grandes Guerras Mundiais.A afirmao do filsofo Thomas Hobbes que define que a guerra no
consiste apenas na batalha, ou no ato de lutar, mas no lapso de tempo durante o
qual o desejo de rivalizar atravs de batalhas suficientemente conhecido,22
explicita que a guerra e seus efeitos no so apenas sentidos durante o tempo da
batalha em si, mas tambm durante tudo o que envolve o tempo pr e ps-guerra. O
clima de tenso vivido pela populao e as consequncias dos atos de seus
21SCHULTZ, Duane P. SCHULTZ, Sydney Ellen. Histria da Psicologia Moderna, p. 230, 431.
22HOBBES, Thomas. Leviathan, parte I, cap. 13 apud HOBSBAWN, Eric J.A Era dos Imprios,p. 418.
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governantes em tempos assim influenciam diretamente o seu comportamento e,
consequentemente, a estrutura cultural de uma nao.
Dietrich Bonhoeffer vive em um tempo de grandes transformaes, no
somente em seu pas, a Alemanha, mas em toda a populao mundial:
Ningum que tenha vivido uma vida adulta, tanto antes como depois de1914-1918, em qualquer lugar da Europa e, cada vez mais, em amplasreas fora do mundo europeu, poderia deixar de observar que os temposhaviam mudado dramaticamente.23
Hobsbawn deixa claro que o perodo ps Primeira Guerra Mundial foi de total
mudana para a humanidade. Econmica, poltica e socialmente, os pases da
Europa em um curto espao de tempo tiveram suas estruturas chacoalhadas pelasconstantes mudanas oriundas das guerras e revolues.
Os resultados do ps-guerra para a Alemanha, perdedora da Primeira
Guerra Mundial, a ascenso do Comunismo e a Revoluo Russa, a crise
econmica dos anos 30, o despertar de um novo lder salvador da ptria, tudo isso
foi de fundamental importncia na formao cultural do povo alemo, de modo que
no foi diferente para Dietrich Bonhoeffer. Portanto, a formao social, poltica e
teolgica de Dietrich Bonhoeffer est marcada pela poca de vida e estruturao doTelogo, e para compreend-lo melhor necessrio analisar seu contexto histrico
e familiar.
2.1 ANOS DE TRANSFORMAO: PRIMEIRA GRANDE GUERRA (1914-1918)
Desde 1815 no houvera nenhuma guerra das grandes potncias europeias.
Vivia-se em uma aparente paz, com grandes transformaes econmicas na maioria
dos pases da Europa. Na verdade, a paz era normalmente resultado de uma guerra,
assim, um perodo memorvel de paz depende do resultado da guerra anterior e da
imposio desse resultado.24As vtimas de guerras e invases, durante o final do
sculo 19 e incio do sculo 20, eram pases do mundo no europeu e que
geralmente no tinham condies de oferecer resistncia. Uma das excees foram
os japoneses, que conquistaram notoriedade quando venceram a Rssia em 1904-
1905.
23HOBSBAWN, Eric J.A Era dos Imprio,p. 454.
24BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo,p.298.
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Porm, a possibilidade de uma guerra no somente preocupava os governos
europeus, mas tambm a populao. Nos anos de 1880, Friedrich Engels j
analisava as probabilidades de uma guerra mundial, e o filsofo Nietzsche saudou a
militarizao da Europa e predisse que viria uma guerra que diria sim ao animal
brbaro, ou mesmo selvagem, que existe entre ns.25
A preocupao com a guerra fez surgir o Congresso Mundial para a Paz, em
1890, tendo o prximo previsto para Viena em 1914. Depois de outras reunies
subsequentes, os governos declararam seu compromisso, embora terico, em
manter a paz. Contudo, em 1900 a guerra ficou visivelmente mais prxima e nos
anos 1910 podia ser e era considerada iminente.26
Apesar de tudo, no se esperava a declarao desta guerra. Mesmo emmeio crise internacional de julho de 1914, no se acreditava que se estava beira
de uma guerra de propores mundiais. Mesmo depois da declarao de guerra por
parte da ustria em relao Srvia, acreditava-se que, como nas vezes anteriores,
uma soluo seria encontrada. Assim, para os que nasceram aps 1914, difcil
imaginar como a crena de que uma guerra mundial no podia realmente
acontecer est profundamente enraizada no tecido da vida antes do dilvio.27
Segundo Hobsbawn,28
dos anos de 1871 a 1914, a principal funo dosexrcitos era civil. Para os jovens o alistamento era mais visto como um rito de
passagem do garoto fase adulta. Os exrcitos tinham mais uma funo civil do que
militar, participando com a Banda Militar de eventos em parques e festejos pblicos.
Evidentemente, o exrcito e raramente a marinha podiam ser mobilizados
para conter alguma manifestao ou protesto em momentos de crise social, porm,
os governos, principalmente aqueles que se preocupavam com a opinio pblica,
cuidavam como e quando os usavam.Alguns civis, ao contrrio dos militares, previram a guerra. Ivan Bloch, um
financista judeu, publicou seis volumes do que chamou de Technical, Economic and
Political Aspects of the Coming War, que Hobsbawn considera como:
um trabalho proftico que predizia o empate militar da Guerra detrincheiras, o que levaria a um conflito prolongado cujos aspectos
25
NIETZSCHE, Friedrich. Wille zur Macht, loc. Cit., p.92 apud HOBSBAWN, Eric J.A Era dos Imprios, p. 419.26HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 419
27HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 420.
28HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 420
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econmicos e humanos intolerveis exauririam os beligerantes ou os fariammergulhar na revoluo social.29
Enquanto apenas alguns observadores civis compreendiam o carter
catastrfico de uma possvel guerra futura, os governos, um tanto alheios a isso,
lanaram-se corrida para se equiparem com a nova tecnologia, que j vinha sendo
desenvolvida desde a dcada de 1880. Foi a chamada tecnologia da morte, na qual
se desenvolveu rapidamente o poder das armas de fogo de pequeno porte e da
artilharia, motores-turbina que transformaram os navios de guerra, de uma
blindagem protetora mais eficaz e de uma capacidade de poder carregar mais
armas.30
Em decorrncia disso, os gastos militares comearam a aumentar
consideravelmente pelos pases do ocidente. Um pas que investiu bastante nesse
perodo foi a Alemanha, que passou de 90 milhes de marcos em gastos navais por
ano, em meados da dcada de 1890, para 400 milhes nos anos de 1913 e 1914.31
As armas de guerra tambm evoluram:
O poder de fogo das metralhadoras mais modernas e das armas pesadas,puxadas por cavalos, era to devastador que os soldados que avanavam
contra o inimigo eram dizimados aos milhares, e os que os substituam,tambm acabavam tendo o mesmo destino.32
Assim surge a chamada indstria da guerra, na qual empresas passaram a
ser cuidadas e literalmente financiadas pelos governos para manterem suas
produes compatveis a uma possvel demanda em caso de guerra. A corrida
armamentista fez com que as empresas privadas com produo blica crescessem
grandemente e absorvessem grande parte da mo de obra. Essas empresas se
modernizaram e passariam a se beneficiar grandemente caso uma guerra fosse
deflagrada por pases consumidores de seus produtos.
Contudo, a guerra mundial no pode ser explicada como uma conspiraode fabricantes de armas, mesmo fazendo os tcnicos, com certeza, omximo para convencer generais e almirantes, mais familiarizados comparadas militares do que com a cincia, de que tudo estaria perdido se elesno encomendassem o ltimo tipo de arma ou navio de guerra.33
29HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 423.
30HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 42431
W. ASHWORTH, Economic Aspects of Late Victorian Naval Administration, in Economic history Review, XXII,1969, p. 491 apud HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 424-425.
32BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo, p.299.
33HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 427.
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inegvel que o acmulo de material blico, principalmente nos ltimos
cinco anos que antecederam a 1914, empurraram para uma situao explosiva.
Porm a Europa no foi guerra devido corrida armamentista como tal, mas
devido situao internacional que lanou as naes nessa competio.34
Hobsbawn35 afirma que qualquer historiador que queira explicar por que
ocorreu a Primeira Grande Guerra mergulha em guas profundas e turbulentas. A
Revoluo Russa de 1917 acusava o imperialismo como um todo, j os aliados
vencedores da guerra culpavam exclusivamente a Alemanha, pedra angular do
tratado de paz de Versalhes em 1919. O surgimento da Segunda Grande Guerra
corroborou para essa teoria e ressurgiram os debates sobre a culpabilidade alem.
Contudo, indubitvel que nenhum governo de qualquer das grandespotncias, de antes de 1914 queria seja uma guerra europeia generalizada,seja mesmo ao contrrio dos anos de 1850 e 1860 um conflito militarrestrito com outra grande nao europeia.36
Depois do assassinato de um arquiduque austraco por um estudante
terrorista em 1914, a ustria sabia que poderia iniciar uma guerra mundial ao
provocar a Srvia. Assim, Hobsbawn37 diz que descobrir a origem da Primeira
Guerra Mundial no o mesmo que descobrir o agressor. Sua origem repousa na
situao internacional em processo de deteriorao, escapando do controle dos
governos dos pases europeus.
A Primeira Guerra mundial foi a culminncia de um amplo processo decompetio de mercados e de conflitos entre velhos e modernos Estadoseuropeus, particularmente a Alemanha, Inglaterra e Frana. A corridaarmamentista entre a Frana revanchista e a Alemanha expansionista e adisputa dos mares com a Inglaterra levaram primeira conflagraomundial. Alm disso, a necessidade de conquista de novos mercados erauma decorrncia dos avanos do capitalismo.38
Aos poucos comearam a surgir dois grandes blocos na Europa, um
comandado pelo imprio Alemo e, do outro lado, a Frana, que havia sofrido
anteriormente com invases dos alemes e tomada de territrio. Alianas entre
pases europeus comearam a ser formadas, uma prtica que vinha sendo
desenvolvida por alguns pases estrategistas desde a dcada de 1870.
34HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 427.35
HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 428.36HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 429.
37HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 431.
38MOTA, Carlos Guilherme. Histria Moderna e Contempornea. p. 291.
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Hobsbawn afirma que so trs os problemas que transformaram esse
sistema de alianas em uma bomba-relgio: a situao do fluxo internacional,
desestabilizado por novas ambies e problemas entre os pases; a lgica do
planejamento militar, que acabou por estabelecer quem estava de qual lado dos
blocos; e por ltimo a integrao da Gr-Bretanha ao bloco pertencente Frana.39
Formaram-se posteriormente as chamadas Trplices, na qual aparece a Trplice
Aliana, composta pelo Imprio Alemo, Imprio Austro-Hngaro e o Reino da Itlia,
e a Trplice Entente, com Reino Unido, Frana e Imprio Russo.
Um fator de extrema importncia nessa dinmica de relaes internacionais
de paz a questo do desenvolvimento econmico. O crescimento do capitalismo
empurrou o mundo inevitavelmente em direo a uma rivalidade entre os Estados, expanso imperialista, ao conflito e guerra.40A partir desse momento dificilmente
se concebia uma grande nao que ao mesmo tempo no fosse detentora de uma
grande economia. Hobsbawn diz que formulava simplesmente um princpio de
proporcionalidade: quanto mais poderosa for a economia de um pas, maior ser a
sua populao, maior o lugar de sua nao-Estado.41
Como j mencionado, a Alemanha investiu fortemente em sua esquadra
naval, ameaando, assim, o domnio britnico sobre guas consideradas vitais,como o Mediterrneo, o Oceano ndico e a orla do Atlntico. Enquanto a Gr-
Bretanha almejava a preservao do status quo, a Alemanha buscava a sua
modificao.
O assassinato do arquiduque Francisco Fernando, herdeiro da coroa
imperial austraca, acabou sendo o estopim para a deflagrao da guerra. A crise
em 1914 foi totalmente inesperada:
Nenhum ministrio das relaes exteriores esperava problemas em junhode 1914, e personalidades pblicas h dcadas eram assassinadas comuma certa frequncia. Em princpio, ningum se preocupou com o fato deuma grande nao intervir pesadamente num vizinho pequeno eproblemtico. Desde ento, cerca de cinco mil livros foram escritos paraexplicar o aparentemente inexplicvel: como dentro de pouco mais de cincosemanas aps Sarajevo, a Europa se encontrava em guerra.42
39
HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 433.40HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 437.
41HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 440.
42HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Imprios, p. 446.
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A Alemanha decidiu dar apoio ustria, ou seja, no tentou acalmar a
situao. Qualquer evento, por menor que fosse, nesse perodo de 1914, poderia
levar ao confronto. Basicamente, as crises internas e externas dos ltimos anos,
anteriores a 1914, fundiram-se. A guerra deflagrada e, no incio de 1918, a
Alemanha ainda tinha chances de lutar e vencer, ou mesmo negociar uma paz
favorvel. Corajosamente, a Alemanha avanou em guerra, porm, aos poucos o
destino da guerra se vira contra a Alemanha, que comeou a sofrer com o acesso
comida e munies aos homens do front de batalha.43
Na Alemanha, medida que o inverno de 1918 se aproximava, a moral dos
civis e mesmo dos soldados comeou a dar sinais de cansao.44Alimentos e roupas
eram escassos devido aos bloqueios dos inimigos e em 11 de novembro aAlemanha e seus aliados assinam o armistcio. Dos 8,5 milhes de soldados e
marinheiros que morreram na Primeira Guerra Mundial, a Alemanha foi a que mais
perdeu, seguida pela Rssia, Frana, Austro-Hungria, Inglaterra e seu imprio.45
O ps-guerra foi marcado por cifras de milhes, no de populao de um
pas, ou seu crescimento econmico, mas por vtimas da guerra. Uma revoluo
econmica e social sucedeu os tempos de crise.
O perodo ainda em curso, que sucedeu a essa era de runa e transio ,provavelmente, o mais revolucionrio j vivido pela espcie humana, emtermos de transformaes sociais que afetam os homens e as mulherescomuns do mundo.46
2.2 O PERODO ENTRE GUERRAS: 1919-1939
A paz que veio do ps-guerra parecia trazer de volta o que se tinha antes de
1914. As fbricas deixaram de produzir material de guerra para voltar a suasprodues normais, a vida urbana voltava normalidade. Todavia, no passou muito
tempo sem que o mundo percebesse que a paz posterior a 1918 no era a
continuao da paz anterior a 1914. O grande cataclismo gerado pela guerra alterou
no somente a vida na Europa, mas tambm no mundo.47
43BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo,p.301.44
BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo,p.301.45BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo,p.301.
46HOBSBAWN, Eric J.A Era dos Imprios, p. 461.
47PABN, Jess; SOSA, Luis de; COMELLAS, Jos Luis. Histria Contempornea General, p. 703.
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Mundialmente, o quadro entre guerras assim se define: a revoluosocialista se aprofunda na Rssia aps 1917; o capitalismo monopolista seexpande, centralizando-se, contudo, nos Estados Unidos [...]; regimesfascistas so implantados na Alemanha, na Itlia, Espanha, Portugal,Japo, etc.48
Para entender o contedo histrico do que se chama perodo entre guerras,
necessrio avaliar a natureza dessas consequncias. Antes de qualquer coisa, a
perda de vidas humanas; perdas materiais e morais; a consequncia da paz
conforme dita por aqueles que venceram a guerra sobre os vencidos; multiplicao
de fronteiras e nacionalismos fomentados; e a concomitante revoluo Russa,
trazendo o triunfo Leninista do comunismo sovitico, e o perigo de um sovietizao
do resto do mundo.49
Talvez o que mais se destaca o giro poltico do mundo todo em direo
democracia, pases vencidos acabam adotando governos mais liberais. A mulher
ganha um papel de destaque na sociedade, tendo seus direitos reconhecidos em
todas as legislaes.50
A economia tambm sofreu com o ps-guerra uma transformao nas
classes sociais, e a classe mdia foi a que mais sofreu. Uma reforma agrria foi
necessria, redistribuindo de grandes latifundirios para novos campesinos. Trsatos perfeitamente complementrios entre si se uniram: a inflao, o excesso de
mo de obra e a reduo das necessidades de produo, como consequncias do
cessar da guerra.51
A indstria alem, paradoxalmente se salva dessa situao, visto a
necessidade de reparar todos os danos causados pela guerra. No entanto, aos
pases vencedores como Gr-Bretanha e Frana, milhes ficaram desempregados.
Um dos atos mais chamativos do ps-guerra o desencanto que seobserva na maioria dos pases vencedores. A paz havia chegado envoltaem promessas de felicidades e prosperidades futuras, e aquelas haviamficado quase sempre nas palavras dos discursos e nos parabns dosestadistas.52
Outros dois pases acabaram fortalecidos no ps-guerra, Estados Unidos e
Japo, ambos participantes marginais da guerra. Diante de uma Europa desfeita e
48MOTA, Carlos Guilherme. Histria Moderna e Contempornea,p. 294.49
PABN, Jess; SOSA, Luis de; COMELLAS, Jos Luis. Histria Contempornea General, p. 703.50PABN, Jess; SOSA, Luis de; COMELLAS, Jos Luis. Histria Contempornea General, p. 703.
51PABN, Jess; SOSA, Luis de; COMELLAS, Jos Luis. Histria Contempornea General, p. 705.
52PABN, Jess; SOSA, Luis de; COMELLAS, Jos Luis. Histria Contempornea General, p. 707.
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empobrecida, distantes geograficamente do conflito e com mnimas perdas,
encontraram uma oportunidade de crescimento frente ao mercado internacional.
De todas as potncias europeias vencidas na guerra, a Alemanha foi a que
menos perdeu territrio, nada comparado s perdas de ustria e Turquia.53 No
entanto, esse no era o seu problema maior, pois para a Alemanha a grande
questo foram os embargos colocados pelos pases vencedores da guerra sobre a
vencida e considerada culpada por tudo, a Alemanha.
Cabia a ela o conserto das potncias do mundo, impedindo-a de participar
das discusses diplomticas e expanso colonial. Outra dura condio foi a de
pagar pelos prejuzos da guerra, sendo fixado, depois da Conferncia de Londres
em 1921, o valor de 33 bilhes de dlares, pagos em 20 anos, hipotecando aeconomia alem pelas prximas duas dcadas.54
Se no tivesse ocorrido a Primeira Guerra Mundial, provavelmente Hitler no
teria ficado conhecido nem recebido tanto apoio, pois o povo ainda andava em
amargura pela derrota e necessitava de um Salvador que recuperasse a nao e
sua autoestima. Sem a Grande Guerra, Inglaterra e Frana continuariam dominando
o mundo econmico, fato que no ocorreu, pois tiveram que contar com a economia
dos Estados Unidos da Amrica, que financiaram boa parte da guerra, trazendo-ospara o cenrio econmico mundial.55A falta de experincia dos americanos no que
se refere liderana da economia mundial fez com que a aparente estabilidade
econmica mundial durante os anos vinte, fosse interrompido por uma crise
importante do perodo entre guerras, a chamada depresso de 1930, que atinge
no somente os EUA, como a todos os pases da Europa.56 Em suma: entre as
guerras, a economia mundial capitalista pareceu desmoronar. Ningum sabia
exatamente como se poderia recuper-la.
57
Como tentativa de resposta a isso surge o comunismo sovitico,
proclamando-se como uma alternativa superior ao capitalismo, e destinado pela
histria a triunfar sobre ele.58 Grandes transformaes aconteceram na Rssia,
aps a Primeira Guerra Mundial e com a Revoluo Russa, liderada por Lennin.
53PABN, Jess; SOSA, Luis de; COMELLAS, Jos Luis. Histria Contempornea General, p. 724.
54PABN, Jess; SOSA, Luis de; COMELLAS, Jos Luis. Histria Contempornea General, p. 724.55
BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo, p. 302-303.56PABN, Jess; SOSA, Luis de; COMELLAS, Jos Luis. Histria Contempornea General,p. 743.
57HOBSBAWM, Eric J. Era dos Extremos:o breve sculo XX: 1914-1991, p. 91.
58HOBSBAWM, Eric J. Era dos Extremos:o breve sculo XX: 1914-1991, p. 63.
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Derrubando o regime czarista, d as classes trabalhistas um lugar de destaque.
Desgastada pela guerra mundial, estava tambm desfeita devido a sua guerra civil,
a agora Unio Sovitica precisava construir tudo.59 A transformao causada por
essa revoluo foi to impactante ao ponto de Hobsbawn afirmar que a histria do
Breve Sculo XX no pode ser entendida sem a Revoluo Russa e seus efeitos
diretos e indiretos.60
Assim, viu-se desenvolver duas frentes: Hitler, na Alemanha, e Stalin, na
Rssia, moldaram a guerra que estava por vir; foram os lderes decisivos quando a
guerra explodiu em 1939, e rapidamente se tornaram aliados.61Estava um cenrio
novamente montado para mais uma guerra.
2.3 SEGUNDA GRANDE GUERRA: 1939-1945
Adolf Hitler, de uma cidade da ustria, assimila o antissemitismo de Viena e
parte do patriotismo que existia em Munique quando deflagrada a Primeira Grande
Guerra em 1914, um soldado condecorado por sua coragem na frente ocidental,
mas tambm atordoado com a perda da moral no final da guerra em 1918.
Em 1919, com 30 anos de idade, torna-se lder de um partido poltico,chamado Partido Nacional-Socialista Alemo. Hitler conhecia a Alemanha e sua
histria; brilhante orador, aquecia o corao dos alemes ainda atnitos com os
resultados da Primeira Guerra e carregados de um sentimento de injustia.
A depresso de 1930 contribuiu para que Hitler prosperasse em cima do
medo e da incerteza, fazendo com que o povo alemo visse nele o defensor da lei e
da ordem. O medo do comunismo que assolava a Europa e o mundo lhe rendeu
cada vez mais apoio dos pequenos fazendeiros e donos de lojas.Apelando em sua oratria para o orgulho alemo, explorava o
ressentimento generalizado de que a Alemanha havia sido derrotada injustamente
num jogo no qual h muito tempo o pas se sobressaia, o jogo da guerra.62
De 1930 a 1932, o partido de Hitler segue ampliando sua votao a ponto de
se tornar o maior partido poltico alemo. Em janeiro de 1933, forma uma coalizo
de partidos menores de direita no qual Hitler eleito o chanceler. A perseguio
59
PABN, Jess; SOSA, Luis de; COMELLAS, Jos Luis. Histria Contempornea General,p. 730.60HOBSBAWM, Eric J. Era dos Extremos:o breve sculo XX: 1914-1991, p. 89.
61BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo, p. 304.
62BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo, p. 305.
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aos judeus, a supresso dos sindicatos de trabalhadores e a opresso das
liberdades civis estavam em andamento.63Em 1934, morre o j idoso presidente
alemo, e Hitler, com o consentimento popular, assume o controle, sendo na
verdade mal preparado para o poder, uma vez que era fraco administrativamente e,
at chegar ao poder, tinha alcanado somente a patente de cabo do exrcito.
Com a chamada depresso de 1930, o sentimento de impotncia
assombrou muitas naes industriais que haviam lutado na guerra. Assim, a
depresso entregou a Hitler o poder de quebrar o tratado de paz firmado no final da
guerra. Quando ele iniciou o rearmamento da Alemanha, a Liga das Naes64 se
encontrava fragilizada demais para poder intervir.
Em 1936 Hitler invade o Vale Reno, menosprezando o Tratado deVersalhes. Continua sua investida no rearmamento, na construo de estradas de
alta velocidade e na recuperao da indstria automobilstica, fatos que ajudaram a
diminuir a taxa de desemprego. A moral e o amor prprio alemo alavancaram a
Alemanha.65Em maro de 1938, o exrcito de Hitler invade a ustria e em outubro
a parte germnica da Tchecolslovquia, rasgando pgina por pgina o Tratado de
Versalhes.
A Segunda Grande Guerra inicia em setembro de 1939, com a invaso daPolnia por parte de Hitler, contando com a ajuda da Unio Sovitica. A Polnia foi
esmagada antes que Frana e Inglaterra pudessem reagir. Nos anos de 1940 e
1941 Hitler tomou quase toda a parte central e ocidental da Europa.66No ms de
junho de 1941, Hitler entra na Unio Sovitica, e em dezembro foras japonesas
comearam a conquista de colnias britnicas, francesas e holandesas do sudeste
da sia.67
Basicamente, a Segunda Grande Guerra consistia em duas guerrasdistintas, uma na Europa, com os alemes, e a outra no leste da sia, com os
japoneses. A impressionante vitria do exrcito alemo na Europa Ocidental em
1940, exps a fragilidade das colnias inglesas e francesas, encorajando os
63BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo, p. 305.64
Liga das Naes, ou Sociedade das Naes, com sede em Genebra, na Sua, era composta pelos seus 32pases fundadores, alm de 13 convidados. A Alemanha seria admitida em 1926 e a URSS em 1934. Foi umaorganizao internacional que se reuniu em Versalles para firmar o acordo de paz entre os pases da Primeira
Grande Guerra. Cf. MOTA, Carlos Guilherme. Histria Moderna e Contempornea, p. 290.65BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo, p.308.
66BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo, p. 308
67BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Cristianismo, p. 303
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japoneses em 1941 a atacarem as bases da Birmania, Hong Kong e at Pearl
Harbor, fazendo com que os Estados Unidos, aps o ataque areo a Pearl Harbor,
entrassem de vez na guerra. Travava-se uma guerra de propores globais que
duraria at 1945.
Assim, as duas guerras se tornaram uma s, com Alemanha e Japo lutando
do mesmo lado e os Estados Unidos, Inglaterra, China e a maioria das naes de
outro. Agora sim, configurava uma Guerra Mundial.
Como a Alemanha estava frente no que diz respeito ao desenvolvimento
da cincia, em especial a fsica, era de se esperar o atrelamento da cincia guerra.
No entanto, como a preocupao da Alemanha era mais a purificao da raa do
que procurar conhecimento, os Estados Unidos aos poucos foram assumindo aponta no desenvolvimento de pesquisas nucleares.
A Alemanha foi finalmente conquistada em 1945, um pouco antes de os
Estados Unidos terem a oportunidade de testar a primeira bomba nuclear, fato que
aconteceu depois, pois ainda restava a rendio do Japo. Com a rendio do
imperador japons depois da destruio de Hiroshima e Nagasaki por bombas
nucleares americanas em agosto de 1945, o fim da guerra decretado, a Europa se
divide em duas, as democracias controlavam a parte ocidental e a Unio Sovitica aparte Oriental, incluindo a Alemanha.68
2.4 O CRISTIANISMO E AS GUERRAS MUNDIAIS
O Cristianismo vinha de uma grande ascenso mundial, de 1780 at 1914.
Enquanto que at 1600 as grandes potncias mundiais, Portugal e Espanha, eram
catlicas, 300 anos mais tarde pases como Gr-Bretanha, Alemanha, Holanda e atmesmo os Estados Unidos, preparavam-se para entrar no grupo das mais vigorosas
potncias coloniais, pases de predominncia protestante e de grande apoio a seus
missionrios.69 Assim, esforos missionrios foram empregados na converso de
asiticos e africanos. Blainey descreve que em 1900, pregadores e professores
cristos tinham alcanado quase todos os territrios do mundo, exceto regies
afastadas da frica e trechos das montanhas da Nova Guin.70
68BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Mundo, p. 313 e 315.
69BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Cristianismo, p. 292.
70BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Cristianismo, p. 294.
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Com o advento da tecnologia, observadores concluam que o mundo estava
encolhendo, tendo em vista que a primeira dcada do sculo vinte foi marcada por
grandes evolues, como o voo do primeiro avio e a transmisso de mensagens
sem a necessidade de fios. Acreditava-se que, com isso, as naes se aproximariam
e haveria mais dilogo entre elas, reduzindo as chances de uma guerra, o que
posteriormente se viu no se concretizar.
Uma questo a ser analisada que as grandes naes que primeiro se
engajaram na Primeira Guerra Mundial eram de profisso Crist, com exceo de
Japo e Turquia. Assim, catlicos e protestantes lutavam lado a lado, mas tambm
em lados opostos.71
Alguns lderes cristos da poca tentaram impedir o incio da guerra. Nomescomo o do arcebispo de Canterbury, Randall Davidson, mostrou-se preocupado com
a possibilidade de uma guerra entre Gr-Bretanha e Alemanha. Mais tarde, em
1909, ele apresenta o telogo alemo Adolf Von Harnack ao rei Eduardo VII, e
explicita que seria impensvel uma guerra entre esses dois pases, o que mais tarde
veio a acontecer.72
Com o fim da Primeira Guerra Mundial o saldo de mortos era em sua
maioria Cristos, provavelmente 90%, diferentemente do que ocorreu na SegundaGrande Guerra, na qual a investida foi avassaladora contra judeus. Segundo os
ensinamentos de Blainey, a Primeira Guerra Mundial, porm, na verdade uma
competio suicida para a Europa e a supremacia global, terminou com dois
derrotados: de um lado, a Europa, e, de outro, sua frgil civilizao crist.73
A revoluo na Rssia em 1917 desferiu um golpe muito forte nos cristos.
Lennin, o lder revolucionrio, classificou o cristianismo como uma das coisas mais
odiosas da face da Terra.
74
No ano de 1918, todos os seminrios foram fechados emuitas igrejas transformadas em museus, templos do atesmo ou mesmo depsitos,
em territrios russos.
Se os primeiros anos depois do fim da Primeira Guerra Mundial registrarama rpida disseminao do atesmo na nova Unio Sovitica, a disseminaofoi ainda mais rpida depois do trmino da Segunda Guerra Mundial. Em
71
BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Cristianismo, p. 295.72BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Cristianismo, p. 296.
73BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Cristianismo, p. 297.
74BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Cristianismo, p. 298.
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1945, as foras russas ocupavam o leste europeu, onde permaneceriam porquase meio sculo.75
Durante a dcada de 1920, o Partido poltico de Hitler, recm criado, tornou-
se um dos grandes opositores do comunismo russo e um grande expoente do
nacionalismo alemo. Mesmo que muitos cristos no concordassem com a
ambio excessiva de Hitler, votaram nele, pois admiravam seu nacionalismo.
Depois de assumir o controle total da Alemanha, Hitler fecha o parlamento e
mostra seu desprezo para com a igreja catlica, na qual havia sido criado. No
somente com os catlicos, mas tambm interfere com os protestantes, incentivando
a diviso e a criao de um novo ramo do luteranismo, aos simpatizantes do
nazismo. Um grupo de pastores luteranos, no qual Dietrich Bonhoeffer fez parte,
resistiu a Hitler e a suas ideias, pagando um alto preo por isso.
Em apenas cinco anos, na Alemanha, o cristianismo foi substitudo pelo
nazismo como credo dominante. Diferentemente do Cristianismo, o altar do nazismo
no ficava nos templos e sim dentro de cada alemo, cada cidade, vila, tradio,
pois viam em Hitler um novo messias.
Hitler acreditava equivocadamente que os judeus eram responsveis pela
derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial e, em 1941, resolve aproveitar a
oportunidade de eliminar os judeus que ainda viviam na Europa. Crianas, jovens e
velhos, ningum foi poupado, ao todo 5 milhes de judeus foram assassinados com
eficincia cientfica.76
O cristianismo acabou por no escapar de uma responsabilizao indireta
pelo holocausto77. Judeus e cristos tinham sido rivais por longos perodos. Alguns
cristos acusavam os judeus pela crucificao de Jesus. Por outro lado, os cristos
tambm entendiam que tinham uma dvida para com os judeus, visto acreditarem,assim como eles, que o Velho Testamento, livro sagrado das sinagogas judaicas,
era igualmente inspirado e de que o prprio Cristo veio dos judeus.
Assim, essa Alemanha que por muito tempo foi referencial de civilizao
ocidental, na msica, artes, literatura, arquitetura, cincias sociais e principalmente
cincia e tecnologia, passa a revelar outro lado.
75BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Cristianismo, p. 306.
76BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Cristianismo, p. 302
77BLAINEY. Geoffrey. Uma Breve Histria do Cristianismo, p. 302
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2.5 VIDA E OBRA DE DIETRICH BONHOEFFERO TELOGO
Na cidade de Breslau, na Alemanha, nasce Bonhoeffer e sua irm gmea
Sabine em 04 de fevereiro de 1906.78 Karl Bonhoeffer, pai de Bonhoeffer, era
professor de psiquiatria, um homem de autoridade, fala mansa, mas decisivo.
Compreendia sua ascendncia burguesa, pois sua famlia tinha influencia na
sociedade alem da poca e Bonhoeffer entendia o papel que cabia a ele devido a
esse legado. A me, Paula Bonhoeffer, de origem nobre,79tinha o dom da msica e
completava seu marido. Os Bonhoeffer alugaram uma casa com um amplo e lindo
jardim, que dava liberdade para as crianas brincarem.As crianas no eram enviadas ao culto infantil, a prpria me os ensinava
acerca da palavra de Deus e tambm a msica. Bonhoeffer era to bom ao piano
que chegou a cogitar a possibilidade de se tornar um pianista.80Seus trs irmos
mais velhos, semelhantes ao pai, tinham dons na rea das cincias naturais. Todos
os filhos eram inteligentes e compreendiam que lhes cabia um papel importante no
mundo no qual estavam inseridos.
No ano de 1912 se mudam para Berlim, quando o pai assume o cargo dediretor do hospital universitrio de caridade da cidade e, simultaneamente, passa a
ocupar a cadeira de psiquiatria e neurologia mais importante da Alemanha. Moram
em um bairro de professores, o que cria um ambiente propcio ao estudo e ao
desenvolvimento intelectual.
Quando Bonhoeffer completa 08 anos, eclode a Primeira Guerra Mundial.
Sem saber exatamente o que estava acontecendo, v uma Alemanha abraar um
patriotismo ferrenho, quando seu imperador afirma no mais conheo partidos,conheo alemes apenas.81
No ano de 1917, seu irmo Walter se alistou para a guerra. No dia 23 de
abril de 1918, Walter foi ferido gravemente e veio a falecer cinco dias depois, aos 18
anos de idade. Esse evento abalou a famlia Bonhoeffer e talvez tenham sido esses
acontecimentos que amadureceram em Bonhoeffer a ideia de estudar teologia.
78
NAVARRO, Juan Bosch. Diccionario de Telogos/as Contemporneos, p. 157.79O pai era pregador junto a corte do Imperador Guilherme II.
80MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer. Vida e Pensamento, p. 12.
81MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 14.
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Quando conclui o ensino mdio foi questionado sobre seu sonho profissional
e responde: Teologia. Agora ele o tinha revelado a todos, agora os enigmas de sua
vida deveriam ser resolvidos em seu ntimo.82Para seu pai, era um desperdcio de
talento, pois acreditava que a igreja era um lugar antiquado e mesquinho.
Bonhoeffer em resposta diz: Ento vou reformar a igreja.83
Em 1923, inicia seus estudos em Tbingen. Devido a um acidente patinando
no gelo, teve que interromper seus estudos, e foi presenteado por seus pais, em
cumprimento dos seus 18 anos, com um perodo de estudos em Roma. Ali,
frequentava seminrios e cultos. Foi o incio de sua jornada ecumnica e da
compreenso do que de fato significa ser igreja. Acho que estou comeando a
compreender o conceito igreja,84afirmou depois de ter participado de uma missa naIgreja Trinit dei Monti.
Bonhoeffer volta para casa e continua seus estudos tendo como seu
professor o telogo Adolf von Harnack, amigo da famlia. Este relacionava o papel
da igreja com o estado e do estado com a igreja. Essa teologia era contestada pelo
at ento desconhecido telogo suo Karl Barth, que dizia que a igreja no poderia
depender do estado, mas tambm no poderia ser apoltica. Bonhoeffer entende
ambas as posies e segue uma linha mais semelhante a Barth,85
no excluindo aideia de que a Palavra de Deus e o prprio Cristo so a essncia de nossa f.
No ano de 1927, Dietrich Bonhoeffer, agora com vinte e um anos de idade,
escreve sua tese de doutorado, sobre o assunto igreja, Sanctorum Communio
(Comunho dos Santos). Para ele, igreja o Cristo que existe como comunidade,
Cristo a palavra de Deus para mim, ele no apenas pregado na igreja, mas a
igreja, ela mesma este corpo de Cristo.86
Assume o culto infantil na igreja Grunewald e de maneira viva e empolgantecontava as histrias bblicas para as crianas. Porm, seu estgio prtico para
formao pastoral acontece em Barcelona de 1928 a 1929, em uma pequena
comunidade alem.
82MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 18.83
MILSTEIN, Werner.
Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 18.84MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 19.
85BARCALA, Martin. Cristianismo Arreligioso: Uma Introduo Cristologia de Dietrich Bonhoeffer, p. 19.
86MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 21.
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Buscando abrir a possibilidade de uma atuao docente, escreve um
trabalho para sua habilitao intitulado Akt und Sein (Ato e Ser), em 193087, que
visava responder a pergunta de como o ser humano compreendia Deus. Deus no
est livre do ser humano, mas para o ser humano. Ele se torna compreensvel em
sua palavra na igreja.88
Com 24 anos, consegue uma bolsa de estudos no famoso Union Theological
Seminaryem Nova Iorque, no qual permanece por um ano, de 1930 a 1931.89Ali ele
aprende a relacionar a teologia com a ao social, tambm conhece as igrejas de
negros do Harlem. A msica enfeitiava e via a f, vida e ao em um movimento
indissolvel. Seu amigo Paul Lehmann reconhece o valor do jovem telogo alemo e
intenta que ele assuma uma cadeira de teologia no seminrio nos Estados Unidos.Voltando dos Estados Unidos, Dietrich Bonhoeffer vai lecionar na faculdade
de Berlim, iniciando sua preleo em 1932 com o tema a essncia da igreja. Para
ele Jesus era o centro do evangelho, mas experimentado atravs da igreja. A
Palavra de Deus era importante para ele e orava em sala de aula.
Enquanto ensinava seus alunos em sala de aula sobre a igreja, vivia essa
experincia na comunidade com um grupo de confirmandos, preparando-os para o
dia da confirmao. No dia 13 de maro de 1932, chega esse dia, DietrichBonhoeffer os encoraja a seguir adiante na vida, com esperana, no permitindo que
ningum a tome, independente do futuro negro que possa vir. Desafia-os a entrar
por portas at ento no conhecidas.
Utiliza-se do exemplo de Jac, sua sada para uma terra desconhecida e seu
retorno para fazer as pazes com seu irmo. Comenta sobre as dificuldades que
enfrentou e que para alcanar a Terra prometida no se pode aproximar como
pecador. Para se tornar santo, Jac desafia o prprio Deus, no permitindo que sev sem abeno-lo. Depois de encontrar Deus, Jac encontra seu irmo, assim,
encoraja seus confirmandos a buscarem a Deus, que se manifesta em Cristo que se
fez nosso irmo e atravs da comunidade nos encontramos com Ele. Encerra seu
discurso estimulando-os a no O deixar ir sem os abenoar e cita: Se Deus por
ns, quem ser contra ns.90
87
BARCALA, Martin. Cristianismo Arreligioso: Uma Introduo Cristologia de Dietrich Bonhoeffer, p. 19.88MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 22.
89NAVARRO, Juan Bosch. Diccionario de Telogos/as Contemporneos, p. 157.
90BONHOEFFER, Dietrich. Prdicas e alocues,p. 35-39.
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Depois do que experimentou nas igrejas do Harlem, em que culto e ao
social se completavam, junto com uma amiga de sua irm abre a casa da juventude
em Charlottenburg, na qual qualquer jovem desempregado poderia encontrar
conselho e recebia formao complementar.
No mesmo dia em que Dietrich Bonhoeffer faz a confirmao de seus
jovens, em 13 de maro de 1932, foi eleito o parlamento, e o Partido Nacional-
Socialista, tendo como seu presidente Adolf Hitler, recebe o maior nmero de votos.
O pas passava por srios problemas econmicos; na poltica externa a ento
poderosa Alemanha tinha se tornado insignificante e, aos olhos de muitos, Hitler
seria o homem forte que traria a Alemanha de volta ao seu lugar. Quando, em 30 de
janeiro de 1933, menos de um ano depois, Hitler assume como chanceler doimprio, e Rdiger Schleicher, esposo de rsula, irm de Dietrich Bonhoeffer,
declara: Isso uma guerra.91 Parecia ser esse o sentimento de toda a famlia
Bonhoeffer.
Dietrich Bonhoeffer, dois dias depois de Hitler assumir o principal comando
da Alemanha, faz uma transmisso radiofnica (que acabou por ser interrompida)
com o tema: OFhrer e o indivduo da nova gerao. Diante da atual venerao a
Hitler, Bonhoeffer adverte:
Se o Fhrer se deixar levar pelos governados a ser o seu dolo e ogovernado sempre esperara isso dele - a imagem do lder [Fhrer]descambar para a do tentador (Verfhrer) [...] governante e governo quese divinizam afrontam a Deus.92
O poder de Adolf Hitler aumentava cada vez mais e a cada lei aprovada era
mais uma possibilidade de aumentar seu domnio, transformando a Alemanha de
uma repblica para uma ditadura. A lei Ariana de 07 de abril de 1933, que tinha o
nome oficial de Decreto para Recomposio do Funcionalismo Pblico,93 na
verdade era uma forma de demitir a todos que tinham f ou ascendncia judaica.
Dentro do mesmo ms, Dietrich Bonhoeffer um dos primeiros telogos a
falar sobre a igreja e a questo dos judeus. Ele destaca trs funes da igreja frente
ao do Estado. Primeiro deve perguntar ao estado se seu poder e seu agir so
legtimos; em segundo lugar, se a igreja est comprometida realmente com as
91MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 35.
92MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 35.
93MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 36.
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vtimas, quer sejam pertencentes igreja ou no; e, em terceiro, afirma que no se
pode apenas cuidar das vtimas, mas de fato se envolver no processo. Essa
declarao escandalizou muitos pastores que, em protesto, deixaram o recinto.
Um ano mais tarde Bonhoeffer escreve a um amigo dizendo que todos os
cristos deveriam suportar at o sangue. Essa declarao demonstra que mesmo
no desejando o martrio, ele estava pronto para isso.
Dentro da igreja evanglica existia um bom nmero de cristos partidrios
do nacional socialismo. Estes se reuniam em um grupo chamado de teuto-
cristos94e queriam incorporar igreja os Princpios do Lder (Fhrerprinzip). O seu
candidato era Ludwig Mller, que acabou ganhando as eleies para bispo em julho
de 1933.Dietrich Bonhoeffer opunha-se a Ludwig Mller e fez campanha ferrenha
contra ele. Apoiava os pastores comprometidos com o evangelho e a igreja, no
entanto, tudo foi em vo, uma vez que no somente perdeu as eleies como
tambm a sua igreja. Em decorrncia do fato diz:
Igreja permanece igreja! Confessa, confessa, confessa!, foi sua prdica nodia da eleio eclesistica. Em conjunto com o professor de ErlangenHermann Sasse, elaborou uma confisso de f que se tornaria conhecida
como Confisso de Betel e mais tarde seria a base da famosa Confisso deBarmen. Era a base de uma igreja que conscientemente se denominavaIgreja Confessante.95
Em setembro de 1933, a igreja territorial da Prssia assume o pargrafo
ariano. Dietrich Bonhoeffer aceita um pastorado na cidade de Londres, mesmo que
os conselhos de Karl Barth fossem contrrios a essa deciso. A atitude de ir foi
acertada, no entanto, pois pde ajudar emigrantes alemes que precisaram fugir por
motivos religiosos ou polticos.De 29 a 31 de maio de 1934, na cidade de Barmen, ocorre uma assembleia
que em seis teses condena a doutrina dos Teuto-Cristos. Barth elabora uma
proposta que aceita pelos delegados presentes. Este documento ficou conhecido
como Confisso de Barmen. Nesta mesma assembleia criada a Igreja
Confessante, que se ope aos Teuto-Cristos, repudiando sua doutrina de alm da
Palavra de Deus aceitar outros acontecimentos e poderes, figuras ou verdades
94MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 38.
95MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 40.
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como se fossem revelao de Deus.96O Objetivo da Igreja Confessante no era
constituir uma igreja paralela, mas foi um movimento confessional de dentro da
nica igreja evanglica na Alemanha, reunido em torno dos pastores Martin
Niemller, Karl Barth e Dietrich Bonhoeffer.97Por fim, acabou acontecendo a diviso
entre as igrejas e a luta de cada uma em conquistar seu espao.
Bonhoeffer acompanha o desenrolar dessa assembleia e luta para que a
Igreja Confessante seja a nica igreja reconhecida pelo Conselho Mundial de
igrejas, o que no acontece. Ele convocado pela igreja Confessante a fundar e
dirigir um de seus seminrios de pregadores, e entende que a hora de retornar
Alemanha.
2.6 VIDA E OBRA DE DIETRICH BONHOEFFERO MILITANTE E PRISIONEIRO
Retornando Alemanha, funda o Seminrio de Finkenwalde, para
pregadores. O tempo com esses jovens telogos no seminrio foi descrito
posteriormente por Bonhoeffer como o tempo mais pleno tanto no terreno pessoal
como no profissional.98No seminrio de Finkenwalde, ele transbordava sobre seus
alunos, que viam no seu mestre um homem de grande ortodoxia e profundaortopraxia.
Buscava ser tratado igualmente como os demais frequentadores do
seminrio. Enquanto para outros professores o importante era ensinar a pregar e
catequizar, para Bonhoeffer a preocupao era ensinar-lhes a orar e meditar nas
escrituras. A correta exegese do texto eles haviam aprendido nas universidades, o
que lhes faltava agora era deixar o texto falar por si s. Por meio de longas esperas
e silncio, eles iriam experimentar que o texto pode ser o nosso senhor.
99
Nestecontexto ele escreve o livro Vida em Comunho.
Durante esse tempo, Bonhoeffer no apenas chamava a ateno dos
seminaristas pelo seu estilo de vida, mas suas prelees iam alm de ensinos
teolgicos e compreenso do ministrio, uma vez que ele buscava alcanar o ponto
central de sua teologia: o discipulado. Fazia diferena entre graa barata e graa
preciosa; sua meditao estava centrada no sermo do monte, em MT 5, 6 e 7.
96
MILSTEIN, Werner.
Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 42.97NAVARRO, Juan Bosch. Diccionario de Telogos/as Contemporneos, p. 158.
98MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 46.
99MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 49.
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Bonhoeffer entendia que a caminhada crist exigia grande responsabilidade e
comprometimento com Cristo e sua Palavra.
No dia 01 de maio de 1935, Hitler anuncia uma nova convocao militar, os
jovens ficaram empolgados, inclusive os do seminrio de Bonhoeffer. Porm, ele
afirmava que para um cristo deveria existir a possibilidade de negar o servio
militar, afinal, as palavras de Jesus no sermo do monte exigiam que se deixasse a
violncia e amasse seus inimigos. Essa afirmao causou certo desconforto at
mesmo para alguns da igreja Confessante, acostumados com os discursos dos
teuto-cristos, conclamando a igreja a se libertar do velho testamento com sua moral
judia mercantilista.
No final de 1935, no dia 02 de dezembro, aprovada a Lei para aSegurana da Igreja Evanglica,100que, como consequncia, fechou os seminrios
da igreja Confessante. Na mesma noite Bonhoeffer reuniu seus seminaristas dando-
lhes a liberdade de ir embora; todos ficaram. Dois anos mais tarde a Gestapo
interditaria o local. Em maro de 1936, ele acusado pelo Ministrio de Relaes
Exteriores da Igreja de pacifista e inimigo do estado, e o ministro da Educao
cassa-lhe a licena para lecionar, o que continua a fazer clandestinamente.
Por este tempo, Bonhoeffer conhece Maria von Wedemeyer, uma jovem compraticamente a metade de sua idade, com quem noivaria mais tarde. Ela era neta de
Ruth von Kleist-Retzow, uma nobre que apoiava o seminrio de Finkenwalde e
abrigava Bonhoeffer em sua casa. Ali nascem os primeiros escritos de seu livro
tica, livro esse que viria a ser continuado dentro do crcere.
Bonhoeffer lembrava seus alunos de que Jesus era judeu e entendia a igreja
do Novo Testamento como irm da igreja do Velho Testamento, dignas de desfrutar
dos mesmos direitos. Essas afirmaes eram corajosas se levados em conta ocrescente dio e a perseguio aos judeus na Alemanha de seu tempo. Diante de
um espancamento por parte dos militantes da SS a um pastor de descendncia
judia, Bonhoeffer o hospeda em seu seminrio, cuida dele e encaminha sua
emigrao. Diante desse fato ele diz: a igreja do discipulado tambm a igreja do
amor ao prximo: a igreja s igreja se ela existir para os outros.101
Em 29 de abril de 1937, o seminrio de Finkenwalde foi totalmente fechado
pela Gestapo. Para que os trabalhos continuassem, pastores da igreja Confessante
100MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 54.
101MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 57.
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assumiram os seminaristas como seus auxiliares, fato que tambm acontece com
Bonhoeffer, que passa a ser pastor auxiliar. As aulas continuavam em uma casa
vazia na Pomernia, que em maro de 1940 tambm foi fechada pela Gestapo.
Cada vez mais se repetiam as prises de ex-seminaristas de Finkenwalde.
A guerra estava no ar e consequentemente a convocao para o exrcito.
Ao mesmo tempo em que Bonhoeffer estava decidido a no servir ao exrcito, ele
sabia as consequncias de sua deciso para a igreja Confessante. Seus amigos
americanos Reinhol Niebuhr e Paul Lehmann vieram em sua ajuda e o convidaram
para ir aos Estados Unidos.
No dia 02 de junho de 1939 ele parte, porm seus pensamentos
permanecem na Alemanha. Mesmo sabendo que sua vida corria risco ficando naAlemanha e que a melhor opo seria partir, ele no consegue ficar longe do seu
povo, sabendo que os seus esto em perigo. Sua viagem aos Estados Unidos dura
pouco e em agosto de 1939 ele retorna Alemanha, deixando seus amigos
americanos confusos. Para justificar sua partida ele diz a Reinhold Niebuhr: Depois
da guerra, eu no terei direito de participar na reconstruo da vida crist na
Alemanha se eu no compartilhar agora das privaes pelas quais passa meu
povo.102
O texto do Apstolo Paulo a Timteo, em 2Tm 4,21, uma palavra de
confirmao a Bonhoeffer de sua deciso de sair dos Estados Unidos e voltar para a
Alemanha. Em seu momento de meditao diria ele l o texto em que Paulo pede a
Timteo que se apresse em vir ao seu encontro, antes da chegada do inverno. Com
essa passagem martelando em sua cabea o dia todo diz:
No que sejamos necessrios ou que seremos usados (por Deus?), massimplesmente porque nossa vida est l e porque abandonamos nossavida, a destrumos, se no estivermos juntos. No nada piedoso, mas,algo quase vital. Deus, porm, no age somente por meio de motivaespiedosas, mas tambm por meio das vitais.103
Em sua volta, Dietrich Bonhoeffer j estava envolvido nos planos daqueles
que lideravam a resistncia, mas neste ponto era apenas conivente e no cmplice.
Para Bonhoeffer, uma tica teolgica que no inclusse uma ao poltica no
poderia ser concebida.
102MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 62.
103MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 63.
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Com a ecloso da Segunda Guerra Mundial, no dia 01 de setembro de 1939,
e os acontecimentos em sequncia, com vitrias aps vitrias, deram a Hitler status
de um grande lder, de um libertador, messias. A populao o ovacionava e a igreja
no ficou para trs, celebrando culto de aes de graas pelo maior estrategista de
todos os tempos.104
Junto com seu amigo Eberhard Bethge, Dietrich Bonhoeffer continua
trabalhando com a igreja Confessante e levando a resistncia para o interior da
Pomernia. No somente Bonhoeffer, mas sua famlia tambm no era partidria a
Hitler. Junto com seu irmo Klaus, seu cunhado Rdiger Schleicher e com a
liderana de Hans von Dohnanyi (secretrio pessoal do ministro da justia) formam
um crculo de resistncia a Hitler. Bonhoeffer poderia contribuir sobremaneira a essegrupo, por suas relaes ecumnicas, possibilitando, assim, contato com outros
governos.
Nas aes da resistncia inicia-se o planejamento de tirar a vida de Hitler. A
luta interna de um cristo em participar da morte de outrem vem a sua conscincia e
sobre isso ele escreve:
Os alemes somente hoje esto comeando a descobrir o que significa
responsabilidade livre. Esta se baseia num Deus que exige o livre risco def e ao responsvel e que anuncia perdo e consolo a quem se tornapecador nesta empreitada.105
O escritrio da Resistncia envia Dietrich Bonhoeffer para Munique, em
novembro de 1940, no qual fica em um convento em que encontra alguns monges
catlicos envolvidos com a resistncia. Ali fica por quatro meses e encontra tempo
para continuar seus escritos sobre o livro tica, que acabaria sendo uma obra
pstuma, aps o recolhimento de manuscritos e bilhetes.
Pelo seu conhecimento ecumnico, Bonhoeffer comea a viajar por alguns
pases, levando informaes sobre a perseguio aos judeus e ser um dos contatos
com os pases aliados. Bonhoeffer tambm participara da fuga de 14 pessoas, que
saram como se fossem espies alemes, mas na verdade eram judeus. A princpio
ficou encoberto, mas aos poucos os nomes de quem participou foi sendo conhecido,
e o de Bonhoeffer foi um deles.
104MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 66.
105MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p.69.
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Muitos atentados a Hitler foram projetados, porm, sem sucesso. Em alguns
deles, Bonhoeffer e seus irmos de resistncia estavam envolvidos. A Gestapo
estava atenta e a resistncia tambm. No dia 05 de abril de 1943, uma revista na
casa de Hans von Dohnanyi e depois na de Bonhoeffer, terminado aquele dia com
sua ida priso de Tegel, acusado de conspirador poltico contra o regime do III
Reich.106 No mesmo dia sua irm Christine e seu marido Hans von Dohnanyi
tambm foram presos.
Os primeiros doze dias ele passou em isolamento, sem roupa limpa, sem
sabonete, e o po era jogado ao cho sujo de sua cela. Dietrich Bonhoeffer sofria
com a solido e a saudade da famlia, e chegou a pensar em suicdio. Das celas
prximas a ele, ouvia os gemidos daqueles condenados morte.Aos poucos a situao de Bonhoeffer foi mudando, principalmente quando
descobriu-se que ele era sobrinho do general de brigada Paul von Hase, qual a
priso de Tegel estava subordinada.107 Comeou a ganhar uma poro maior de
comida, ter sua cela lavada, roupas limpas e a permisso de escrever e receber
cartas para seus pais e sua noiva. Alm disso, os guardas comearam a ouvi-lo e a
pedir-lhe conselhos; uma nova jornada de vida estava nascendo, agora entre as
grades. Ali ele encontraria pessoas que nunca ouviram falar da f Crist e acercadesta experincia diz: Eu quero falar de Deus no nos limites, mas no centro, no
nas fraquezas, mas sim na fora, portanto no na morte e no pecado, mas na vida e
no bom do ser humano... Jesus no chama a uma nova religio, mas vida.108
Em um dos momentos de passear no ptio da priso, um dos presos, um
catedrtico italiano chamado Gaetano Latmiral, pergunta-lhe como havia chegado
resistncia e responde que ele, como pastor, no tinha apenas a obrigao de
consolar as vtimas de um homem enlouquecido dirigindo a toda velocidade em umarua cheia de gente, mas que deveria tentar par-lo.109
Bonhoeffer tinha uma vida devocional prtica. Iniciava e encerrava o seu dia
com uma meditao bblica, acordando s seis horas da manh e fazendo
exerccios. Depois do caf, se ocupava em escrever at a hora do almoo, a tarde
lia outra literatura e voltava a escrever. Ele havia se jogado nos braos de Deus,
com todas as suas dvidas e esperanas, acreditando que somente Ele o
106
NAVARRO, Juan Bosch. Diccionario de Telogos/as Contemporneos, p. 157.107MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p.80.
108MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 92.
109MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 82.
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conheceria.110Em suas cartas na priso, v-se a profunda e slida f, e a grande
esperana de que sairia dali e poderia ajudar a reerguer a Alemanha e sua igreja
crist. Dessas cartas e das demais escritas at o dia do seu martrio, formaram o
livro Resistncia e Submisso(obra pstuma).
No dia 05 de outubro de 1944, so apresentados os documentos que
incriminavam Hans von Dohnanyi e, consequentemente, Bonhoeffer e os demais
envolvidos na resistncia. Dietrich Bonhoeffer transferido da priso de Tegel para
o temido quartel general da Gestapo. Quando as bombas dos aliados sacodem o
edifcio da Gestapo, Bonhoeffer diz: Uns confiam em carros, outros em cavalos;
ns, porm, nos gloriaremos no Senhor nosso Deus,111citando o Salmos 20,7 da
Escritura Sagrada.Bonhoeffer levado ao campo de concentrao de Buchenwald no dia 07 de
fevereiro de 1945. No dia 1 de abril podiam-se ouvir os canhes americanos,
anunciando que as tropas aliadas estavam bem perto. Porm, a esperana por
libertao dura pouco. Os presos so retirados e levados a diferentes campos de
concentrao. Bonhoeffer acabar indo para Flossenbrg, porm, antes de chegar
ao destino o nibus quebra e ficam hospedados em uma escola de Schnberg. No
domingo aps a Pscoa solicitado que Bonhoeffer compartilhe uma meditao. Elefalou sobre o texto de Is 53,5, pelas suas pisaduras fomos saradose o versculo
correspondente do NT, em 1Pe 1,3. Comentou sobre o tempo em que eles estavam
na priso, salientando que agora eram pessoas livres.
Logo aps terminar, dois homens aparecem e o chamam: Prisioneiro
Bonhoeffer, preparar-se e vir junto.112Ele pede a Payne Best, oficial ingls e seu
companheiro de cela, que dissesse ao bispo George Bell: Para mim chegou o fim,
mas tambm o incio. Com ele eu creio na irmandade fraternal (...) .
113
Payne Bestescreveria sobre Bonhoeffer: Dentre as muitas pessoas que conheo, ele foi uma
das poucas de quem seu Deus realmente estava prximo.114
Bonhoeffer levado a Flossenbrg e no dia 09 de abril de 1945 enforcado
junto com outros integrantes da resistncia. Seu corpo foi queimado e enterrado,
como milhares de outros.
110MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 83.111
MILSTEIN, Werner.
Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 94.112MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 97.
113MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 97.
114MILSTEIN, Werner. Dietrich Bonhoeffer: Vida e Pensamento, p. 97.
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3 TEOLOGIA DE DIETRICH BONHOEFFER
Para alguns autores, a produo teolgica de Dietrich Bonhoeffer deveria ser
divida em dois momentos: perodo antes da priso e perodo enquanto encarcerado,
como que se as cartas da priso115 e o livro tica116 fossem distintos
teologicamente das demais obras escritas anteriormente. A proposta deste captulo
analis-los como um todo, sem ruptura ou distino, mas buscando compreender
sua teologia, no contexto de sua obra. Como o autor mesmo afirma em 22 de abril
de 1944, depois de meses preso: Certamente aprendi muitas coisas mais, mas no
creio que tenha mudado muito. H pessoas que mudam e algumas que dificilmente
conseguem mudar. Creio que nunca mudei muito...117Neste captulo, dar-se- ateno especial s obras Discipulado e
Resistncia e Submisso.Buscar-se- compreender como a teologia apresentada
em sua principal obra, Discipulado, na verdade posteriormente colocada em
teste, vivida na ntegra, pelo autor em seu perodo de resistncia, sua priso e as
suas cartas, escritas a partir da cela 92 de Tegel. Com a ajuda das obras Vida em
Comunho e tica, buscar-se- embasar subsdios suficientes para sustentar a
no ruptura de sua teologia.Sero analisados os aspectos referentes graa de Cristo, como cada
discpulo deve se relacionar com ela e ser transformado a partir dela. Depois que a
graa alcana a vida do discpulo, ele tem condies de ouvir o chamado, o vinde do
Senhor, que o leva a uma vida de comunho com Ele e com seus irmos. Em meio
a esse chamado, o discpulo experimentar a solido e o sofrimento, caractersticas
importantes na formao do carter do discpulo, fazendo-o semelhante a Jesus.
Ser abordado o tema vingana e amor ao prximo, sendo este o pontotalvez mais controverso na teologia de Bonhoeffer, quando analisado dentro do
contexto de um pastor, mrtir, profeta, espio e conspirador contra o regime Nazista
e em particular contra a vida de Adolf Hitler.
Fica destacado na vida e na teologia de Bonhoeffer o quanto ele valorizava a
espiritualidade e nela suas disciplinas. Atravs de uma vida de orao, de meditao
115
Refere-se Obra Resistncia e Submisso.116 Obra pstuma, aps coleta fragmentada de escritos de Bonhoeffer durante sua estada na priso eanalisados com a produo feita antes de sua priso, ainda em liberdade.
117BONHOEFFER, Dietrich. Resistncia e Submisso, p. 364.
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nas Sagradas Escrituras, de louvor e adorao, ensinava seus discpulos em
Finkenwalde, mantendo as mesmas prticas na priso em Tegel.118
Portanto, neste captulo sero analisadas essas prticas espirituais, bem
como a vida da igreja, enquanto corpo de Cristo, batismo, Santa Ceia, vida santa e
comprometida. Seguem, portanto, as observaes dos ensinos de Bonhoeffer
compartilhados em o Discipuladoe tambm no rico material teolgico coletado em
Resistncia e Submisso.
3.1 A PRECIOSA GRAA, COM SUAS CONSEQUNCIAS
Este pastor Luterano e profcuo telogo introduz o tema discipulado ou
seguimento119fazendo um paralelo da mensagem pregada nas igrejas e a pregada
por Cristo. Estamos de fato mostrando o evangelho de Cristo ao necessitado, ou
apenas lhe enchendode conceitos e regras de homens, questiona o autor. Este
questionamento foi feito h mais de sete dcadas e continua atual, sem abrir mo da
realidade e necessidade da igreja, mas interpela o que essa igreja est de fato
passando aqueles que com ela tem andado.
Bonhoeffer afirma que (...) se o prprio Jesus, e to somente Jesus com
sua Palavra, estivesse em nosso meio na pregao, seria outro o grupo de pessoas
a escutar a Palavra e outro o grupo a rejeit-la.120Diz que a mensagem pregada tem
dificultado as pessoas a tomarem uma deciso autntica por Jesus. Questiona se de
fato no estamos pregando em demasia opinies e convices pessoais ao invs de
pregarmos Jesus. Nessa perspectiva prope, atravs do discipulado, desenvolver
seguidores autnticos de Cristo.
atravs do discipulado autntico, baseado nas Sagradas Escrituras, que
nos traz a libertao de preceitos humanos, os quais nos oprimem e nos
sobrecarregam. Conhecereis a verdade e ela vos libertar(Jo 8,32). Assim, com o
discipulado que aprendemos a nos livrar do jugo pesado de nossas prprias leis e a
abraarmos o jugo suave de uma vida seguidora dos ensinamentos de Cristo.
118Em 8 meses de recluso, alm de sua meditao diria, havia lido duas vezes e meia o Velho Testamento,
conforme confisso feita a seu amigo Eberhard Bethge. BONHOEFFER, Dietrich. Resistncia e Submisso,p.176.
119Nachfolge, titulo original em alemo.
120BONHOEFFER, Dietrich. Discipulado, p. 5.
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Em sua obra Discipulado, traz a distino entre graa barata e graa
preciosa e inicia sua apresentao, declarando que a graa barata inimiga mortal
da igreja.121Afirma que a graa barata justifica o pecado enquanto a graa preciosa,
o pecador. Na graa barata o mundo encontra fcil abertura para justificar seus
pecados,
[...] a pregao do perdo sem arrependimento, o batismo sem adisciplina comunitria, a Ceia do Senhor sem confisso de pecados, aabsolvio sem confisso pessoal. A graa barata a graa semdiscipulado, a graa sem cruz, a graa sem Jesus Cristo vivo, encarnado.122
Esses princpios foram vividos e ensinados por Bonhoeffer no Seminrio de
Finkenwalde, sua escola para pregadores. Ele acreditava que a vida da Igreja era,alm de um encontro com o divino, tambm um relacionar-se com o prximo. Dentro
dessa dinmica, a prtica da espiritualidade era fundamental para a manuteno da
f e do verdadeiro seguimento do mestre.123
A graa preciosa o tesouro oculto no campo, de modo que aquele que o
encontra vende tudo o que tem para adquiri-lo. o chamado de Jesus Cristo que faz
pescadores largar suas redes e O seguir. A graa barata nos distancia de Cristo,
pois no nos encoraja a um discipulado, antes nos conduz a uma desobedincia. Agraa preciosa porque, ao mesmo tempo que exige do ser humano sua prpria
vida, d
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