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A BOLA

Sexta-feira26 de Março de 2010

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Stefan Edberg esteve em Portugal pela segunda vez, para a apresentação da Cas-cade Sports Academies, em Lagos, da qual é parceiro e conselheiro. No ano passado,no Verão, participou no torneio Vale do Lobo Grand Champions, e ficou com boa ima-gem do país, que agora reforçou. «Da perspectiva de um sueco, que conhece poucode Portugal, fiquei muito bem surpreendido. Vindo do Norte da Europa, é natural gos-tar do clima temperado. O Algarve tem uma costa muito bonita e dramática. As pes-soas têm sido muito simpáticas comigo, os espaços estão muito limpos e, pelo quesei, há pouca criminalidade, quando comparado com outros locais, mesmo na Euro-pa. Parece uma zona muito boa para passar uns belos dias», disse o antigo tenista,que não sabe se voltará para jogar em Vale do Lobo, este ano. «Vou tentar, mas vaiser difícil — os meus filhos vão estar a fazer muitas coisas nessa altura...»

Surpreendido com Portugal

DEIXOU o ténis em 1996,depois de uma carreira degrande sucesso. Comopassouapreencherotem-po livre?

— Passo a maior parte do tempona Suécia, onde vivo. Os meus filhosestão na escola, vou levá-los e bus-cá-los muitas vezes. Não viajo mui-to e dedico-me ao meu principaltrabalho, que tem a ver com produ-tos financeiros e com imobiliário. Oténis ainda faz parte da minha vida,mas, agora, de forma menos signi-ficativa do que antes.

— Sente saudades?— Para ser franco... nem por isso!

Talvezaspessoaspensemqueeude-via sentir falta de jogar ao mais altonível. Foi muito bom ter tido a opor-tunidade de jogar ténis profissional,mas uma carreira dura 10 ou 15 anose há outras coisas para fazer na vida.Senti a necessidade de afastar-me,embora tenha sempre mantido al-gum contacto. Não deixei o ténis emabsoluto,continuoaterprazeratrei-nar-me e a jogar. É bom jogar ape-nas uma hora, suar um bocado. Sin-to-me bem e é isso que faço todas assemanas.

— Que idade têm os seus filhos?—OmeufilhoChristophertem13

anos e minha filha Emily 17.

— É escusado perguntar se jo-gam ténis.

—[Risos]OChristopherjoga,masa Emily não.

— Acha que ele gostava de seguiro exemplo do pai?

— Não. Acho que eles gostam depraticar desporto mas não pensamem ser profissionais, o que, de cer-

Entrevista de

NUNO PARALVAS

O antigo tenista a fa-lar como foi no ‘court’: sere-no, fluente, racional, sóbrio eassertivo. Deixou de jogar há14 anos mas mantém-seatento ao ténis, divertindo-senalguns torneios para vete-ranos. Mas pouco mais. De-dica mais tempo aos negó-cios e até prefere que osfilhos não sigam as suas pi-sadas. Saiba porquê...

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STEFAN EDBERG

Stefan Edberg esteve 72 semanas no primeiro lugar do ‘ranking’ ATP e é ainda o oitavo na lista dos tenistas com mais prémios arrecadados

ta forma, é muito bom para mim.Ser profissional é bom, mas exigemuito trabalho, muitas horas de de-dicação.Nemtodaagenteprecisadechegar ao mais alto nível para tirarprazer do desporto.

—Venceu,recentemente,umtor-neiodoATPChampionsTournoqualganhou a John McEnroe e GoranIvanisevic [interrompe]...

— ... Ainda consigo vencer al-guns dos mais velhos [risos].

—Nãoconseguiriavenceralgunsdos mais novos?

— Não! O ténis mudou, tornou-se muito físico. Os jogadores de hojesão muito fortes, batem a bola commais força e a tecnologia tambémajudou, especialmente as cordas dasraquetas que permitem fazer me-lhor os spins. Nadal e Federer ele-varam o nível do jogo. Os melhoressão realmente bons e o jogo está in-

com os melhores e para se avaliar onível do jogo. Seguramente que emPortugal é bom, mas os jogadorestêm de ser postos à prova. É neces-sário que logo aos 12 anos se perce-ba qual o nível do jogo.

— Essa será uma das razões paraque a Suécia tenha tão bons talen-tos no ténis?

— Tivemos uma geração de ouro,tivemos Bjorn Borg. O ténis tor-nou-se muito popular e construí-ram-se courts por todo o lado, ostreinadores eram muito bons e tra-balhámos muito. Os resultados nãoaparecemdeumdiaparaoutro.Tudoleva o seu tempo. Depois da geraçãode ouro, continuámos a ter jogado-res muito bons.

— O ATP tem um prémio de des-portivismo com o seu nome. Qual asua opinião sobre a decisão de An-dré Agassi ter revelado, num livro,o consumo de drogas?

— Não é uma história bonita. Éuma história que não queremos ou-vir. Não sei quais foram as razõesque o levaram a fazê-lo, nem li o li-vro, mas tomei conhecimento doassunto e ouvi comentários negati-vos — tenho a opinião de que todasas pessoas têm liberdade de expres-são e podem fazer o que entendem,mas acho que seria preferível recor-dá-lopeloquefeznoscourts,semterdeolharparaestetipodecoisas.Nãoébomouvirqueelelamentapeloste-nistas com quem jogou.

— Mas essa confissão tambémnão pode servir de alerta?

— Sim, é verdade. É uma opiniãoque muitas pessoas têm e, na verda-de, todos os indivíduos, de uma ououtra forma, cometem erros. Masele era um exemplo e agora muitoslevantam questões e olham de ma-neira diferente para ele. Isso mudou.Pelo menos é o que oiço.

«Revejo-me em Federer»TÉNISMais desporto

CARLOS VIDIGAL JR/ASF

Data de nascimento— 19 de Janeiro de 1966 (44 anos)Naturalidade — Vastervik (Suécia)Altura — 1,88 mPeso — 77 kgCarreira — 1983 a 1996Vitórias — 806Derrotas — 270Títulos — 42‘Grand slams’ — Austrália (1985e 1987), Wimbledon (1988 e 1990)e Estados Unidos (1991 e 1992)‘Ranking’ — 72 semanas número 1‘Prize money’ — 20,63 milhões dedólares (15,24 milhões de euros,ao câmbio actual), oitavo na listados tenistas que mais receberam

j STEFAN EDBERG

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teressante.Hánovosvaloresquepo-dem discutir os jogos com eles. Porexemplo Del Potro, Murray, Cilic,Djokovic, Roddick.

— Acha que tinha alguma hipó-tese de ganhar um set a Federer?

— Não, não, não [risos]. Talvezum jogo, mas não há comparaçãopossível. Eles são os melhores, trei-nam todos os dias e são muito maisnovos. A diferença é muito grande eeueramuitomelhorhá20anos.Masachoqueaindapodiapassarumbombocado treinando-me com eles.Agora um jogo... seria muito duro!

— Muitas pessoas dizem que Fe-dereréomelhorjogadordesempre.Qual a sua opinião?

— Concordo em absoluto. Nãoconsigo ver outro jogador tão com-pleto. Tem um recorde de vitóriasem Grand Slams. Além do registofantástico,temhipótesedecontinuar

aganharmaisalgunstorneios,oqueé extraordinário. É o que mais gos-to de ver jogar.

— Que outros tenistas admira?— Cilic tem um grande talento e

pode tornar-se um dos melhores domundo,Djokovicjáprovouquepodebater-se com Federer e Nadal. Hámuitos bons, mas, para mim, Fede-rer está acima deles, é tremendo. Decertaforma,revejo-meumpouconasua maneira de jogar, muito fluen-te. Ele consegue fazer imensas coi-sas com a bola, mudar tácticas e fazparecer tudo fácil no court. Tam-bém é impressionante ver Nadal, asua entrega física invulgar e a suaforçamentalemmomentoscruciais.

—Conhecealgunsjogadorespor-tugueses?

— Não. Houve alguns no meutempo, mas... não me lembro.

—FredericoGilouRuiMachado?— Não.

— Portugal tem grandes talentosno futebol e poucos no ténis. A Sué-cia continua a ter grandes tenistas.Há alguma explicação para que issoaconteça?

— Obviamente, há talentos emPortugal, mas talvez sejam encami-nhados para o futebol. Em primeirolugar, no ténis são necessárias in-fra-estruturas. Acredito que Portu-gal as terá, mas também bons trei-nadores, boa liderança. Para se serum bom jogador de ténis é necessá-rio, além de elevado conhecimentodo jogo, viajar muito para competir

Foi muito bom ter sidotenista profissionalmas senti necessidadede me afastar umpouco. Há outras coisaspara fazer na vida

STEFAN EDBERGantigo n.º 1 do ‘ranking’ ATP