O CRUCIFIXO DE SÃO DAMIÃO
Centro Franciscano de Espiritualidade – Piracicaba/SP.
Vamos ver de perto o crucifixo de São Damião, aquele
que falou com São Francisco de Assis no começo de sua vida de conversão, e com Santa Clara
durante seus quarenta e dois
anos de mosteiro.
Nosso crucifixo é um hino à
santidade de Deus, expressa na luz e
na beleza.
É um ícone feito há novecentos anos, colorido, pintado
em um pano colado numa tábua de
nogueira. Tem 2,10 ms de altura e 1,30
ms de largura,2 cm de espessura.
TEOLOGIA DA LUZ O grande destaque do Crucifixo de São
Damião são os seus enormes olhos. São
grandes, brancos, têm linhas pretas e
vermelhas acima e abaixo para se
destacarem mais.
São olhos de amor, de paz, que se dirigem
para todos, mesmo os que estão longe,
oferecendo a luz de Deus.
O jovem Francisco deve ter ficado extasiado com tanta luz deste
Cristo. É Jesus na Cruz, é Jesus na ressurreição e é Jesus na
Ascensão. Sempre luminoso.
Porque ele é “a luz que brilhou nas trevas” (Jo 1,9-10)
A luz do Crucificado fez Francisco olhar para si mesmo e perceber que, lá dentro, tudo
era escuridão. Sem que se desse conta, a luz de Deus já fizera com que aprendesse a
olhar para dentro.
“Sumo e soberano Deus, iluminai as
trevas do meu coração. Dai-me
uma fé reta, esperança certa, caridade perfeita,
bom senso e conhecimento,
Senhor, para que eu cumpra o vosso santo e verdadeiro
mandamento.
Então orou:
São Francisco
orando diante do
Crucifixo de São Damião, na concepção artística de Gioto, na
basílica do Santo em
Assis.
É um sangue que se derrama sobre
todos, até sobre os Anjos, porque
todos precisamos dele, nós que
temos uma vida alimentada por seu
Corpo e Sangue.
No Crucifixo de Francisco e Clara há o mínimo de Sangue:
é o que brota das chagas e nos liberta
da obsessão de querermos ser
deuses.
Chamamos a atenção para o fato de que, no
ícone de São Damião, o sangue brota sempre
como uma flor, que traz vida para o mundo. É um
sangue que já não martiriza o Crucificado; enaltece o Ressuscitado.
Outro fato importante é que o sangue é derramado por um Cristo glorioso, para demonstrar
que, graças a esse sangue,
nós ganhamos a vida divina.
As chagas dos pés de Jesus derramam o
sangue de vida sobre outras
pessoas representadas na parte de baixo da
cruz. A única ainda
identificável é São Pedro, sobre
quem Jesus edificou o seu
povo novo.
A parte mais alta do crucifixo de São Damião foi reservada para localizar o céu. Vemos Jesus
glorioso que sai do mundo dos humanos na Ascensão e chega ao mundo da Trindade,
representado pelo semi-círculo onde está Deus, simbolizado na mão e no dedo estendido como
o Pai e o Espírito Santo.
Os dez santos representam todas as pessoas que estão no céu. O fato de serem todos
parecidos também pode indicar que, na vida eterna, seremos todos irmão porque Deus
será tudo em todos.
No Crucifixo de São Damião são
apresentados dez santos no céu: cinco de cada lado de Jesus.
Dez é um número simbólico
representando a totalidade.
Nesta parte do crucifixo estão representados os Santos da terra, que segundo o evangelho de São João estavam ao pé da Cruz: Nossa
Senhora e São João à esquerda, Maria Madalena, Maria mãe de Tiago e o centurião à
direita.
À esquerda, em tamanho bem menor, está o soldado São
Longino, que teria dado a lançada em
Jesus.A direita há outra figura pequena, em que alguns vêem um sumo sacerdote, em
atitude petulante, provocando Jesus
para descer da cruz.
Nossa Senhora tem o manto branco da luz, um vestido de vermelho
escuro, símbolo do amor intenso. A túnica violeta recorda que ela é a
Arca da Aliança, que traz o Salvador. De fato, o forro da Arca da Aliança
era violeta. Maria indica Jesus como fez
nas bodas de Caná.São João tem lugar de destaque junto a Nossa Senhora, para quem está
voltado, como se a ouvisse. Tem um manto rosado do amor e uma veste
branca da pureza. Faz o mesmo gesto de indicar Jesus porque foi um dos maiores anunciadores de Jesus, e o
nosso Crucifixo está todo fundamentado
na sua teologia.
Maria e João estão se aceitando como mãe e
filho.
Observe-se que Maria está na extrema direita de
Jesus, o lugar de honra. João e Madalena, que
estão mais perto de Jesus, estão voltados para o
outro lado, porque João fala com Nossa Senhora, e
a Madalena fala com Maria mãe de Tiago.
Maria Madalena tem a cabeça quase encostada com a da outra
Maria, porque lhe confia um segredo ou porque comentam a ressurreição, de que foram as
primeiras testemunhas.
Maria, mãe de Tiago representa todo o grupo de mulheres que
sempre seguiram Jesus e cuidavam dele. Muitas delas
estavam ao pé da cruz.O centurião não tem auréola. Por alguns é interpretado como o centurião que comandou a crucifixão de Jesus e mostra três dedos porque
reconheceu a Deus depois da crucifixão. Para outros é o centurião bondoso cujo filho Jesus curou.
Por trás do ombro do centurião, vê-se uma
cabecinha encimada por três curvas. Há quem veja
nela o próprio pintor, o iconógrafo.
Outros dizem que é o filho do centurião, curado por
Jesus, e as outras pessoas de sua
família.
Parece preferível ver a multidão que estava aos
pés da cruz.
Detalhes: um galinho e uma fogueirinha poderiam estar
indicando que a figura abaixo é São Pedro, que negou Jesus
junto à fogueira e ouviu o galo cantar. Foi testemunha da
ressurreição.
As conchinhas, que cercam todo o ícone, eram símbolo da vida eterna, porque costumam ser
bonitas e duráveis. Parece que foram acrescentadas à tábua
original.
Nos dois extremos horizontais da cruz de São Damião, estão duas
figuras semelhantes, que se dirigem a Jesus. Há discordância na sua interpretação. Alguns vêem dois anjos, que estariam no túmulo
quando Maria Madalena e a outra Maria foram preparar o corpo de
Jesus com mirra e foram as primeiras testemunhas da
ressurreição.Outros, como nós, vêem as santas mulheres. Os ícones da
ressurreição costumavam representar as “myrrophores”, isto é, as que levavam mirra.
derrama o sangue mas não está todo ensangüentado, tem os pés bem plantados, os cabelos bem
arrumados e os braços em posição
de oração.
O Cristo de São Damião não está
morto, É o Cristo que, morrendo,
venceu a morte. Por isso, não tem coroa de
espinhos,
Na iconografia síria, de onde é originado este
crucifixo, a ressurreição era simbolizada por
um caixão aberto. Por isso, ele
também repousa sobre um fundo
negro,mas, todo luz,é vencedor da
morte.
Um sinal da vitória e da ressurreição neste ícone é o pano que reveste Jesus:
Sua construção é bem elaborada, com um nó
caprichado e debruns de ouro. De fato, os crucifixo mais antigos costumavam
representar Jesus com paramentos sacerdotais e
até mesmo com vestes régias, usando uma coroa
de ouro na cabeça.
Jesus está dentro de um círculo vermelho. É nosso mundo. Jesus está saindo dele: seus pés, um acima do outro demonstram que está subindo. Como está com a cabeça e a mão
direita fora do círculo, está saindo do nosso mundo.
Chegando junto aos santos e ao meio-círculo da
Trindade, está entrando no mundo do mistério, que
ainda temosque descobrir para ir
tendo vida plena.
No alto da Cruz, três círculos se sucedem, diminuindo de baixo
para cima. O Crucificado-Ressuscitado é o maior e mais
próximo. O da ascensão já menor, porque está mais longe.
O do Pai e do Espírito Santo, além de ser o mais afastado e, por isso, menor, contém só a
metade de baixo.
Nós não vemos o Pai e o Espírito Santo, porque eles são
comunicados na Palavra, que é Cristo, o Filho. Sobre o Pai e o
Filho, só sabemos o que o Cristo revelou, e há muito
mais – toda uma outra metade,para nós ainda virmos a
conhecer.
Sob a mão direita de Jesus, dois anjos parecem conversar, fazendo gestos de admiração. Devem estar comentando o
amor imenso de Jesus pela humanidade, pois deu sua própria vida por ela.
Mas também podem estar comentando que a crucifixão e ressurreição de Jesus tiveram resultado muito maiores, pois o sangue da mão direita, brotando da chaga como uma
flor, também cai sobre eles.
Sob a mão esquerda de Jesus,outros dois anjos equilibram os seus
companheiros do lado esquerdo.
Dá para observar que esse braço da cruz está fora do alinhamento. Talvez queira mostrar que em nossas vidas sempre
há um lado “esquerdo”, falho.
O encontro com o crucifixo de São Damião foi a maior transformação na vocação inicial de São Francisco. Ele
passou a ver a presença do Crucificado em toda parte.
Por isso rezava sempre quando encontrava uma cruz:
“Nós vos adoramos, santíssimo Senhor Jesus Cristo, aqui em todas as vossas
igrejas que estão em todo o mundo, e vos bendizemos, porque, pela vossa santa cruz,
remistes o mundo”. (1Cel 45)
O Crucifixo que São Francisco e Santa Clara encontraram na igreja de São Damião iluminou as suas
vidas.
Traz até hoje a luz de Deus para tantas pessoas!
Essa pequena apresentação quer mostrá-lo e ajudar a descobrir alguns de seus interessantes
segredos.
Quer ajudar a receber a sua luz e a sua bênção, para passar adiante.
Texto: Frei José Carlos Corrêa Pedroso, OFMCap
Figuras: Crucifixo de São Damião
Música: Doce é sentir (Francisco e Clara – o musical)
Montagem: Irmã Magali Gavazzoni FCM
Paz e Bem
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