UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS CURSO DE DIREITO – BALNEÁRIO CAMBORIÚ NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA - NPJ
O CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E SUA APLICABILIDADE, SOB A LUZ DA LEI Nº 12.850, DE 02
DE AGOSTO DE 2013
JOSÉ MELO ALENCAR
Balneário Camboriú, junho de 2014
DECLARAÇÃO
DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PÚBLICA EXAMINADORA
BALNEÁRIO CAMBORIÚ, ____ DE ____________ DE 20__.
________________________________ Professor(a) Orientador(a)
No ato da entrega na Secretaria do NPJ, o(a) aluno(a) deverá levar
uma cópia do arquivo em formato PDF
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS CURSO DE DIREITO – BALNEÁRIO CAMBORIÚ NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA - NPJ
O CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E SUA APLICABILIDADE, SOB A LUZ DA LEI Nº 12.850, DE 02 DE
AGOSTO DE 2013
JOSÉ MELO ALENCAR
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel
em Direito. Orientador: Professor WELLINGTON CÉSAR DE SOUZA
Balneário Camboriú, junho de 2014
AGRADECIMENTO
Em primeiro lugar a Deus.
Agradeço também à minha esposa Andrea e minha
filha Gabriela, as quais souberam me apoiar e me
compreender nos momentos de isolamento na
confecção da presente monografia.
Também ao meu professor e orientador, Professor
Wellington César de Souza, pelos valiosos
ensinamentos.
E, por último, ao Dr. Marcelo Adriano Micheloti,
Juiz Federal em Itajaí/SC, por ter cedido obras de
sua biblioteca para a pesquisa na realização desta
monografia.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a minha filha Gabriela Gast
Melo Alencar, motivo maior de meus esforços, meu
pequeno raio de sol que ilumina e dá sentido à
minha vida;
à minha esposa Andrea Gast, companheira que
mesmo nos meus momentos de cansaço e mau
humor, soube me compreender e incentivar;
aos meus sogros Harold Gast e Ninfa Sá Gast (in
memorian), que sempre me apoiaram no alcance de
meu objetivo, e
aos meus pais José Liberato Alencar (in memorian)
e Maria de Melo Alencar, pelo apoio, confiança e
todo o amor que sempre me deram ao longo de
minha vida.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do
Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de
toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Balneário Camboriú, junho de 2014
José Melo Alencar Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do
Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando José Melo Alencar, sob o título o
conceito de organização criminosa e sua aplicabilidade, sob a luz da lei nº 12.850,
de 02 de agosto de 2013, foi submetida em junho de 2014 à banca examinadora
composta pelos seguintes professores: Wellington César de Souza, Orientador e
Presidente da Banca, MSc. Flávio Schlickmann, Coordenação da Monografia.
Balneário Camboriú, junho de 2014
Professor Wellington César de Souza Orientador e Presidente da Banca
José Artur Martins Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CP CPP CV DCOR DJE DJU FBI PCC PGC RHC
Código Penal brasileiro Código de Processo Penal Comando Vermelho Diretoria de Combate ao Crime Organizado Diário da Justiça Eletrônico Diário da Justiça da União Federal Bureau of Investigations Primeiro Comando da Capital Primeiro Grupo Catarinense Recurso em habeas corpus
STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça TJSC Tribunal de Justiça de Santa Catarina UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Associação Criminosa
Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes. 1
Coautoria
Quando várias pessoas participam da execução do crime, realizando ou não o verbo
núcleo do tipo. 2
Concurso de Pessoas
Quando duas ou mais pessoas concorrem para a prática de uma mesma infração
penal. 3
Crime
É um fato (injusto punível) provocado por uma CONDUTA HUMANA que,
juridicamente relevante, é tipificada e tem como componente o agente e, como
conteúdo, a figura da ilicitude, tornando passível de apuração da culpabilidade,
derivando daí uma punibilidade, uma vez provada àquela culpa (culpa lata). 4
Crime Doloso
Quando o agente quis o resultado, que se traduz no dano ou perigo de dano, ou
assumiu o risco de produzi-lo. 5
Crime Plurissubjetivo
Quando a norma incriminadora exige o concurso de duas ou mais pessoas. 6
1 BRASIL. Código Penal, Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm
2 GOMES, Luiz Flávio. Conceito de coautoria em direito penal. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 991. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/8120>. Acesso em: 19 de abril de 2014.
3 GRECO, Rogério. Código penal comentado. 7 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2013, p. 92.
4 FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, 3 ed., São Paulo: Ícone, 2002, p.152.
5 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 1 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 372
8
Crime Unissubjetivo ou Unilateral
Aquele que pode ser cometido por uma só pessoa. 7
Organização Criminosa
A associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e
caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de
obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática
de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou
que sejam de caráter transnacional.8
Partícipe
É a pessoa física que concorre na ação (ou omissão) de outrem, contribuindo para a
realização do tipo de ilícito.9
6 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. p. 379
7 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. p. 382
8 BRASIL. Lei 12.850, de 02 de agosto de 2013. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12850.htm
9 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. p. 356
9
SUMÁRIO
RESUMO........................................................................................... 12
INTRODUÇÃO .................................................................................. 13
CAPÍTULO 1 ..................................................................................... 16
1.1 BREVE HISTÓRICO ...................................................................................... 16
1.1.1 OS COQUILLARDS .......................................................................................... 18
1.1.2 OS NINJAS ..................................................................................................... 19
1.1.3 OS THUGS ..................................................................................................... 20
1.1.4 AS TRÍADES CHINESAS ................................................................................... 21
1.2 CRIME ORGANIZADO NO MUNDO ............................................................. 22
1.2.1 CHINA ........................................................................................................... 22
1.2.2 ITÁLIA ........................................................................................................... 24 1.2.2.1 Máfia ...................................................................................................................24 1.2.2.2 Camorra ..............................................................................................................25 1.2.2.3 Cosa nostra ........................................................................................................25
1.2.3 JAPÃO .......................................................................................................... 26
1.2.4 AMÉRICA LATINA E BRASIL ............................................................................. 27
CAPÍTULO 2 ..................................................................................... 31
ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA: PRINCÍPIOS E CONCEITOS ESSENCIAIS PARA A QUANTIFICAÇÃO DO TIPO DELITUOSO .. 31
10
2.1 PRINCÍPIOS INERENTES AO CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA: LEGALIDADE, ANTERIORIDADE, RESERVA LEGAL E TAXATIVIDADE ....... 31
2.1.1 PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL ........................................................................ 32
2.1.2 PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE ........................................................................ 32
2.1.3 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ............................................................................. 32
2.1.4 PRINCÍPIO DA TAXATIVIDADE ........................................................................... 35
2.2 CONCURSO DE PESSOAS .......................................................................... 36
2.2.1 TEORIAS SOBRE O CONCURSO DE PESSOAS ..................................................... 37 2.2.1.1 Teoria monista (unitária ou igualitária) da participação ..................................37 2.2.1.2 Teoria dualista (ou dualística) ...........................................................................39 2.2.1.3 Teoria pluralista .................................................................................................40
2.2.2 TIPOS DE CONCURSO DE PESSOAS .................................................................. 40 2.2.2.1 Coautoria ............................................................................................................40 2.2.2.2 Participação........................................................................................................41
2.2.3 REQUISITOS DO CONCURSO DE PESSOAS ......................................................... 42 2.2.3.1 Pluralidade de agentes e de condutas .............................................................42 2.2.3.2 Relevância causal de cada conduta .................................................................43 2.2.3.3 Liame subjetivo entre os agentes .....................................................................44 2.2.3.4 Identidade de infração penal .............................................................................44
2.2.4 ESPÉCIES DE CONCURSO DE PESSOAS ............................................................. 45 2.2.4.1 Concurso necessário .........................................................................................46 2.2.4.2 Concurso eventual .............................................................................................46
11
2.3 OS CONCEITOS DE CRIME E ORGANIZAÇÃO .......................................... 47
2.4 ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – O CRIME ORGANIZADO E SEU ENQUADRAMENTO LEGAL ............................................................................... 48
2.5 NOVO CONCEITO LEGAL DO CRIME DE QUADRILHA OU BANDO ........ 53
2.6 DIFERENÇAS ENTRE CRIMES PRATICADOS POR ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS E POR ASSOCIAÇÕES CRIMINOSAS ....................................... 55
2.6.1 ROUBO QUALIFICADO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA OU BANDO .......................... 55
2.6.2 ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA EM OUTROS TIPOS PENAIS PREVISTOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO ................................................................ 57 2.6.2.1 Associação para o tráfico – artigo 35 da lei nº 11343/2006 .............................58 2.6.2.2 Aplicabilidade do artigo 8º da Lei 8.072 de 1990, crimes hediondos, diante da Lei 11.343 de 2006, Lei de tóxicos ................................................................................59 2.6.2.3 Constituição de milícia privada – artigo 288 – A do Código Penal .................60 2.6.2.4 Extorsão mediante sequestro na sua forma qualificada .................................61
CAPÍTULO 3 ..................................................................................... 64
O CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA NA DOUTRINA E NOS TRIBUNAIS PÁTRIOS ............................................................. 64
3.1 O CONCEITO LEGAL DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA EM FACE AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E TAXATIVIDADE ........................................... 64
3.2 O PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE SANTA CATARINA E OS CRITÉRIOS UTILIZADOS PARA CARACTERIZAÇÃO DE ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS ...................................................................................................... 66
3.3 APLICABILIDADE DO CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL71
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 77
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................... 80
12
RESUMO
A presente monografia representa um estudo sobre a evolução do conceito de organização criminosa em nosso ordenamento jurídico. Serão abordadas as origens das denominadas organizações criminosas, desde os seus primórdios até os dias atuais, no mundo e no Brasil. Serão apresentados os principais princípios utilizados assim como os conceitos caracterizadores de diversos tipos penais de concurso necessário. A recente edição da Lei nº 12.850, de 02 de agosto de 2013 será analisada, para mostrar como a doutrina e a jurisprudência vêm atualmente aplicando o novo conceito de organização criminosa, na tentativa de combater o crime organizado no Brasil. Palavras-chave: crime organizado, associação criminosa, organização criminosa, concurso de pessoas.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto analisar o conceito de
organização criminosa no Brasil.
O objetivo institucional deste trabalho é realizar uma
monografia, a qual é requisito básico para obtenção do grau de Bacharel em Direito,
pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
A escolha desse tema deu-se em razão da atualidade do tema
e de sua complexidade.
Para tanto, no Capítulo 1, será abordado um histórico acerca
da origem das organizações criminosas pelo mundo, concentrando-se, ao final, no
crime organizado no Brasil.
No Capítulo 2, serão vistos conceitos essenciais para uma fiel
caracterização do tipo organização criminosa. Os princípios utilizados, como da
legalidade e da taxatividade, além de outros. Também será analisado o conceito de
concurso de agentes e suas teorias, bem como os diversos tipos de crimes em que
há a necessidade de pluralidade de agentes, como, por exemplo, associação para o
tráfico, roubo qualificado e outros.
O Capítulo 3 tratará especificamente sobre a posição da
doutrina em relação à legalidade do conceito de organização criminosa, trazido pela
Lei nº 12.850/2013. Serão colacionados também as recentes decisões dos tribunais
pátrios sobre o conceito de organização criminosa.
Nas Considerações Finais, que encerram a presente pesquisa,
serão abordados os pontos conclusivos de como a lei 12.850/2013 resolveu ou não
a problemática da conceituação de organização criminosa no Brasil.
As hipóteses levantadas para a presente monografia foram as
seguintes:
14
1ª hipótese – Embora seja um conceito trazido por uma lei
recente, alguns doutrinadores, como Luiz Flávio Gomes, já se manifestaram sobre o
tema, entendendo que há o descumprimento da garantia da taxatividade. Isto porque
a expressão “associação estruturalmente ordenada” necessitaria de uma
interpretação por parte do juiz. Outro ponto apontado como descumpridor do
princípio da taxatividade penal seria a formulação ampla, contida na expressão com
objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, o que
tornaria inconstitucional o atual conceito legal de organização criminosa.
2ª hipótese – O estudo feito na presente monografia
demonstrou que o Tribunal de Justiça de Santa Catarina adota como critério, nos
julgamentos de crimes cometidos por associações criminosas (antigo quadrilha ou
bando), a efetiva comprovação de vínculo associativo, revestido de estabilidade e
permanência, entre seus integrantes. Tem entendido também ser possível a
condenação por crime de organização criminosa mesmo que a conduta seja anterior
à entrada em vigor da Lei nº 12.850/2013, sob o argumento de que se trata de crime
permanente, a teor do disposto na Súmula 711 do STF, pois entende que a
organização criminosa nada mais é que o crime de quadrilha ou bando acrescido de
algumas características, que seriam os elementos normativos do tipo.
3ª hipótese – Aos poucos, vem se formando a jurisprudência
em nossos tribunais acerca da aplicabilidade do conceito de organização criminosa,
agora legitimado pela existência de uma lei. A questão que ainda não está
plenamente pacificada é se seria possível a condenação por organização criminosa
antes da definição legal do termo. Talvez a recente decisão do Superior Tribunal de
Justiça sobre o tema, no RHC nº 38674, venha por uma pá de cal sobre o tema.
Talvez não. Só o tempo dirá.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de
Investigação10 foi utilizado o Método Indutivo11, na Fase de Tratamento de Dados o
10 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83.
11 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86.
15
Método Cartesiano12, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas
do Referente13, da Categoria14, do Conceito Operacional15 e da Pesquisa
Bibliográfica16.
12 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.
13 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54.
14 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25.
15 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37.
16 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209.
CAPÍTULO 1
ORIGENS DAS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS
1.1 BREVE HISTÓRICO
O presente trabalho não pretende de forma alguma exaurir o
tema sobre organizações criminosas e métodos de combate às mesmas. O enfoque
maior se dará na evolução do conceito de organização criminosa, com destaque
para a legislação brasileira e como, com a edição da recente Lei nº 12.850/2013,
nossos Tribunais vêm julgando casos que envolvem esse tipo de criminalidade.
Mas para se entender a problemática atual do crime
organizado, necessário se faz uma incursão histórica em suas raízes. As
organizações criminosas remontam à Antiguidade. Não seria exagero afirmar que os
bandos de saqueadores ou de ladrões que, desde a Antiguidade rondavam à
espreita de viajantes desavisados, já formavam organizações criminosas.17
As notícia mais antigas acerca de organizações remontam ao
século VII a.C. Na Grécia Antiga havia duas formas de associações: Conselhos
ou Patronatos (criados pelas polis, objetivando compartilhar credos e cultos, e
edificar templos conjuntos); e Ligas (alianças político-militares constituídas com a
finalidade de garantir a defesa comum a todos os seus membros em frente ao
perigo de outros reinos ou ameaças de impérios). Já na Idade Média surgiu
uma forma de organização particular (com características militares),
moldada pelas lutas entre Cristianismo e Islamismo, e idealizada pelos movimentos
das cruzadas.18
Nos séculos XIV e XV, no Centro e Norte da Europa surgiu a
denominada Liga Hanseática, cuja finalidade era garantir o comércio mútuo
17
SIGNIER, Jean-François, Sociedades Secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas. São Paulo: Larousse, 2008, v.2, p. 136.
18 SIGNIER, Jean-François, Sociedades Secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas. p.
136.
17
na hansa19. É desse período também a Liga dos Cantões Suíços, um tipo de
organização defensiva, transformada posteriormente em confederação. Porém, foi
no século XX que ocorreu o verdadeiro “boom” das organizações do tipo
intergovernamental, quando o fenômeno atingiu características de relevo até global
e contornos de contemporaneidade, especialmente depois das surpreendentes
inovações provocadas pela Segunda Guerra Mundial nos âmbitos do comércio,
transporte, comunicação e tecnologia.20
Mas, como surgiram e evoluíram as organizações criminosas
propriamente ditas?
A trajetória da criminalidade acompanhou a própria evolução
das sociedades e suas civilizações. De acordo com Émile Durkheim21, na
Antigüidade os crimes se dividiram em duas categorias: os chamados religiosos
(seriam os crimes praticados contra os deuses, autoridades e seus representantes,
os costumes e tradições); e os crimes individuais (exemplos desses tipos de crime
seriam o homicídio, o roubo, a violência e as fraudes de toda espécie). Os primeiros
eram considerados crimes mais graves porque ao atentar contra a tradição e os
governantes, atingiam igualmente as divindades, que possuíam, no fundo, seu
caráter religioso. O segundo grupo de crimes ofendiam os indivíduos.
Nas sociedades inferiores, os crimes religiosos superavam
todos os demais. No ensinamento de Ana Luisa Almeida: 22
Para os povos primitivos, o crime consistia em não obedecer a prática do culto, em violar os rituais, não aderir aos costumes dos ancestrais e em desobedecer à autoridade fortemente constituída. Porém, com o passar dos tempos, quando avançam as civilizações, os atentados contra a pessoa humana e seu patrimônio passaram a impor-se sobre todos os outros delitos. À medida que as sociedades e as civilizações vão evoluindo, o crime se reduz mais e mais contra a pessoa, enquanto que as formas religiosas de criminalidade vão regredindo e sua pena enfraquecendo. Esse enfraquecimento não é devido a sua visão dos costumes, mas da própria religiosidade, cujo
19
Associação de mais de cinquenta cidades, denominadas burgos.
20 FERRO, Ana Luisa Almeida. Crime Organizado e Organizações Criminosas Mundiais, Curitiba:
Juruá, 2009, p. 16.
21 DURKHEIM, Émile. Deux Lois de L’Evolution Penale. L’Année Sociologigue. Paris, n. IV, 1899-
1900.
22 FERRO, Ana Luisa Almeida. Crime Organizado e Organizações Criminosas Mundiais, p. 17.
18
povo estava primitivamente envolvido, e os sentimentos coletivos, que eram sua base, vão gradativamente desaparecendo. É com o desenvolvimento da criminalidade humana que a criminalidade religiosa recua.
Assim, a criminalidade vai mudando e se manifestando de
outras formas. Passa do modelo religioso ao individual e deste ao coletivo,
culminando com a atual criminalidade das organizações criminosas e dos crimes
organizados.
Porém, o exato momento histórico em que a criminalidade
individual passou para a coletiva e desta para a do crime organizado, não se pode
precisar. O que se sabe é que se pode encontrar sementes do crime organizado
junto a certos tipos de crimes que iam sendo praticados por grupos (bandos,
gangues, quadrilhas) em diferentes épocas da História, em especial quando o delito
começou a apresentar características de crime profissional, propagando-se em
escala e consumando-se através de associações permanentes. Com o passar do
tempo, os grupos criminosos desenvolveram os mais diversos tipos de associações.
Na sequência, serão abordados modelos iniciais do crime
organizado, como os Coquillards da França, passando às organizações criminosas
mais complexas e estruturadas, verdadeiras empresas do crime, como a Máfia
italiana, as Tríades Chinesas, a Yakuza, entre outras, finalizando com as principais
organizações criminosas brasileiras.
Dessa forma, passo a uma rápida exposição sobre algumas
dessas organizações criminosas.
1.1.1 Os coquillards
Em 1454, surge em Dijon, na França, a chamada “seita da
Coquille 23, um vasto bando organizado de ladrões e bandidos. Na mesma época,
por ocasião de uma ação da polícia, um ateliê de falsificação de moedas foi
descoberto. Rapidamente, as suspeitas recaem sobre um bando de “companheiros
ociosos e vagabundos que [...] não fazem nada, a não ser beber, comer e gastar,
jogar dados, baralho e [...] levam vida dissoluta”, como afirma um relatório de polícia
23
Coquille em francês significa concha, casca.
19
da época. O Procurador Jean Rabustel, encarregado do caso, descobre que alguns
cidadãos de Dijon protegiam esse bando suspeito e se beneficiariam com suas
recompensas. Rabustel também descobre que um sargento da cidade chamado
Jaquot de la Mer mantinha uma casa de tolerância onde membros do bando
costumavam frequentar. 24
Graças ao testemunho de um barbeiro local, que informou que
certos membros da quadrilha frequentavam sua barbearia e que desse modo ficou
sabendo dos planos do bando, Rabustel mandou prender diversos homens do
bando, dos quais obteve confissões. Estes admitiram pertencer a uma confraria
cujos membros se autodenominavam “Coquillards” ou “Companheiros da Coquille”,
nome do qual nunca se chegou a descobrir o segredo. 25
Descobriu-se tratar-se de uma sociedade bem hierarquizada: à
sua frente se encontrava um “Rei da Coquille”, que dirigia os companheiros, entre os
quais havia a distinção entre mestres e aprendizes. A seita de Coquille formava uma
verdadeira corporação do crime, na qual cada um tinha sua especialidade:
“arrombadores de portas, arcas e cofres” estavam no mesmo nível dos “salteadores
dos bosques e das estradas, ladrões e assassinos”. Outros se especializavam nos
jogos de cartas e dados ou ainda na cunhagem de moedas falsas.
A sede da organização era Dijon, mas de lá se irradiava para
diversos locais da França. Os seus membros usavam codinomes e uma língua
misteriosa que lhes permitia conversar entre si, sem que fossem compreendidos
pelos que não pertenciam à sociedade.
1.1.2 Os ninjas
Os ninjas, também conhecidos como “guerreiros das sombras”,
aparecem pela primeira vez no fim do período Heian, no século XII. Aldeias inteiras
se fazem notar por uma habilidade no combate fora do comum. Alguns relatam que
essas populações são originárias da China e que, expulsas pelo imperador, vagaram
24
SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p. 138.
25 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
138.
20
pelas províncias do Norte e da Coréia. Dizem ainda que os ninjas seriam
descendentes diretos do último herdeiro da Dinastia Qin, derrubada em 206 a.C. 26
Teria sido durante o período de fuga, que os ninjas adquiriam
conhecimentos inacessíveis ao comum dos mortais. Chegando ao fim de sua
viagem, teriam se instalado no sul de Kyoto, a pedido das autoridades locais. É que
lá, no isolamento das montanhas de Iga, teriam fundado o clã dos Hattori, no qual os
segredos da arte ninja foram transmitidos de geração em geração.
Os ninjas se dividiam em uma hierarquia de três graus: O
primeiro, o dos jonin, era composto dos elementos mais experientes, encarregados
de elaborar os planos de ação. O segundo era o dos chunin que preparavam as
intervenções e, por fim, o terceiro reunia os genin, executores mais ou menos
experientes. 27
Os ninjas foram primeiramente utilizados pelos daimyo, os
senhores, como espiões e assassinos. Durante a era Sengoku (1467-1568), o Japão
se dividia em clãs rivais, e nessa lutas feudais, os ninjas eram recrutados para
descobrir os planos e os objetivos do inimigo. A partir do final do século XVI, o
retorno à ordem deixou os ninjas sem emprego. Tornaram-se então bandidos e
assassinos temíveis, tanto que, em 1581, a região de Iga foi dominada pelo bando.
Foram necessários 46.000 homens para derrotar cerca de 4.000 ninjas, os quais só
sobreviveram na lenda. 28
1.1.3 Os thugs
A história dessa organização remonta ao século XIII, época em
que aparece a primeira menção acerca de sua existência. O termo que os designa
(Thugs) deriva de uma raiz sânscrita que significa “enganar”, “roubar”. 29
26
SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p. 140.
27 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
141.
28 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
141.
29 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
142.
21
Porém, é no século XIX, quando a Índia está sob o domínio
britânico, que as ações dos Thugs cresceram de maneira assustadora, sobretudo
nas metrópoles. Todos ficam surpresos e assustados diante dos relatos de
assassinatos bárbaros. Os Thugs se reuniam em bandos várias semanas por ano,
em geral longe de sua região natal, a fim de cometer seus crimes. Na maioria das
vezes, seus métodos consistiam em se fazer passar por mercadores ou peregrinos,
a fim de juntar-se a caravanas. Quando a oportunidade surgia, estrangulavam a sua
vítima por trás com um pedaço de tecido de nó corrediço, o roomal. 30
Fiéis ao seu nome, usando de astúcia e dissimulação,
enganavam suas vítimas para despojá-las de seus bens, em honra de Kali, a deusa
negra da destruição, que invocavam no momento do assassinato.
Curiosamente, os Thugs só atacavam os homens, poupando
as mulheres e as crianças. Quanto aos britânicos, também os evitavam,
provavelmente por temor a represálias.
Porém, foi justamente um inglês que pôs fim à opressão dos
Thugs. Em 1828, o coronel William Sleeman foi nomeado administrador do distrito
de Jabalpur, na Índia central. Promovido a “Diretor Geral encarregado da repressão
dos Thugs”, Sleeman lança-se numa gigantesca operação policial; detenções,
encarceramentos e confissões se sucedem. Chovem as condenações à morte. Sob
a ação de Sleeman, os Thugs caem, e, em 1853, a sinistra organização criminosa
chega ao fim. 31
1.1.4 As tríades chinesas
A Tríade original era uma sociedade secreta antiga que surgiu
em oposição à dinastia manchu dos Qing, no final do século XVII. Seus fundadores
teriam sido monges do mosteiro de Shaolin, onde o kung-fu foi criado e ensinado.
30
SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p. 142.
31 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
143.
22
Era uma sociedade que propunha-se a restaurar a antiga dinastia Ming. Para tanto,
apoiou durante séculos toda espécie de revoltas contra os manchus. 32
Porém, já na metade do século XIX, exageros são notados.
Alguns de seus membros, rompendo com o ideal das origens, exercem uma
violência gratuita a serviço de seus interesses particulares e em detrimento das
populações camponesas. Grupos da Tríade se tornaram gangues de ladrões e
assassinos. Em 1949, a Tríade é declarada uma organização fora da lei. Os seus
membros fogem da China popular, dominada pelos comunistas, e se instalam em
territórios chineses próximos: Hong Kong, Macau e Taiwan. Porém, agora, as suas
práticas e símbolos são postos exclusivamente a serviço do crime organizado. 33
1.2 CRIME ORGANIZADO NO MUNDO
1.2.1 China
As Tríades chinesas dominam o crime organizado na China.
Essas associações mafiosas se dividem em três graus. No topo está um chefe, o
“cabeça de dragão”. Ele dá as grandes orientações ao seu grupo, porém, nunca
participa diretamente das operações. Sua verdadeira identidade é conhecida por
poucos. Sob suas ordens, estão vários responsáveis que conservam seus nomes
tradicionais: “Leque de papel branco” cuida das finanças; “Bastão Vermelho”,
especialista em artes marciais, é o encarregado do respeito à lei interna. “Sandália
de Palha” é o delegado das relações exteriores do grupo, enquanto o “Mestre do
Incenso” é o responsável pelo recrutamento e preservação da tradição. E, na base
da pirâmide, estão os “soldados”, o braço armado da organização. 34
Mistura do antigo e do moderno, as Tríades possuem seus
tentáculos não apenas na Ásia, mas no mundo todo. Essas sociedades criminosas
32
SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p. 146.
33 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
147.
34 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
148.
23
são comparáveis às máfias italianas: praticam em grande escala a extorsão, o tráfico
de seres humanos e o tráfico de drogas.
Atualmente, são seis as grandes Tríades chinesas conhecidas:
Sun Yee On, a Federação Woo, 14 k, o Bando dos Quatro Mares, o Bambu Unido e
o Grande Círculo. 35
Sun Yee On (“Virtude Nova e Paz”) é não apenas a mais
importante das Tríades, mas constitui também, com seus 50.000 membros, o grupo
mafioso mais numeroso e mais vasto do planeta. A partir de sua base em Hong
Kong, se espalha por toda a Ásia, Estados Unidos (está presente em todas as
cidades americanas) e Canadá. Desde a abertura econômica da China, ela investiu
milhões de dólares nas zonas francas litorâneas, a fim de lavar uma parte de seus
lucros, para maior proveito de Pequim. De resto, contatos teriam ocorrido entre
membros do governo comunista e líderes da Sun Yee On. Essa tríade é
particularmente ativa na indústria cinematográfica pornográfica, que na China
representa um setor em plena expansão econômica.
Apesar de serem organizações criminosas, o governo chinês
revela uma surpreendente indulgência em relação às tríades, porque compreendeu
que poderia tirar proveito desses grupos ricos, aplicando uma grande parte de seu
dinheiro sujo sob forma de investimentos na China. Em 1995, o ministro chinês da
Segurança Pública, Tao Siju, declarou que “os membros das tríades não são todos
gângsteres. Se são bons patriotas, se garantem a prosperidade de Hong Kong,
devemos respeitá-los. [...] O governo chinês está feliz em unir-se [a eles]”.36
Nessas condições, compreende-se que a República Popular da
China não tem interesse em lutar contra essas sociedades criminosas extremamente
poderosas.
35
SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p. 149.
36 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
149.
24
1.2.2 Itália
Na Itália tem-se a atuação de alguns grupos criminosos, dentre
eles destacam-se a Máfia, a Camorra e a Cosanostra.
Para uma melhor compreensão sobre o tema, serão
apresentadas a seguir as principais características a respeito das organizações
citadas.
1.2.2.1 Máfia
A “honrada sociedade”, como a Máfia se autodenominou
durante muito tempo, nem sempre foi uma sociedade internacional do crime. Ela
surgiu na Itália quando, em 1860, a queda dos Bourbons, que reinavam na ilha havia
séculos, permitiu aos sicilianos acreditar em dias melhores. Mas logo ficariam
desencantados diante das medidas do novo governo italiano que envia funcionários
do norte da ilha e aumenta o peso dos impostos. Quando a lei sobre o alistamento
militar obrigatório é votada, um considerável número de homens se embrenha nos
bosques. 37
O descontentamento cresce, os atos criminosos aumentam e o
poder central logo se sente desamparado. O deputado italiano Crispi afirma que “a
população siciliana detesta o governo da Itália”. É nesse contexto quase anárquico
que se organiza um contrapoder oficioso. Redes, baseadas em clãs familiares, vão
formando, aos poucos, um “sistema paralelo de autoridade”, que se torna a única
garantia da ordem social. De um lado, essas redes canalizam as violências dos
saqueadores e, de outro, favorecem a eleição de candidatos do norte, que, uma vez
no poder, irão lhes favorecer. 38
Rapidamente, esses grupos montam um sistema de extorsão
junto à população, mediante o pagamento de sua proteção. Logo estendem sua mão
controladora sobre certos tipos de comércio, como o do gelo ou do contrabando de
37
SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p. 150.
38 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
150.
25
café. Aqueles que tentam resistir-lhe são implacavelmente assassinados, como o
prefeito de Palermo, em 1893. Nasce a Máfia.
1.2.2.2 Camorra
Se a Sicília gerou a máfia mais poderosa e mais conhecida da
Itália, no sul da península, em Nápoles, surgiu outra importante organização
criminosa: a Camorra napolitana.
Essa máfia difere de sua prima siciliana por seu
desenvolvimento no meio urbano e por sua ausência de organização piramidal. Mais
de 80 clãs dividem entre si a cidade e seus arredores que, segundo seus interesses,
se unem ou se opõem, o que caba por provocar acertos de contas sangrentos. A lei
do silêncio protege os clãs, tanto mais que seu apoio é necessário se alguém quiser,
por exemplo, abrir uma loja, encontrar uma moradia ou simplesmente não ter o seu
carro roubado. 39
A Camorra desempenha, como no passado, o papel de um
poder paralelo. Obtém boa parte de seus lucros do contrabando de cigarros (que em
Nápoles corresponde a dois terços dos cigarros vendidos) e da extorsão (que
envolve metade do comércio e todas as empresas de construção). Sua experiência
no contrabando de cigarro lhe permitiu passar facilmente ao tráfico de drogas nos
anos 70. Atualmente, tira o essencial de seus recursos desse comércio lucrativo,
organizado desde a América Latina, em especial na Colômbia e na Bolívia. 40
1.2.2.3 Cosa nostra
No início do século XX, quase dois milhões de sicilianos,
impelidos pela pobreza, migram para os Estados Unidos. Uma vez lá, tendem a
reproduzir as redes de proteção da máfia italiana. Batizada de Mano Nera (Mão
Negra), a organização ítalo-americana extorque os mercadores e lojistas italianos e
estende sua mão sobre o comércio de frutas e de azeite. Particularmente ativa em
Nova Iorque (liderada por Salvatore “Lucky” Luciano) e em Chicago (sob o comando
39
SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p. 153.
40 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
155.
26
de Al Capone, conhecido como “Scarface”), a organização é mais criminosa que sua
coirmã siciliana. 41
Suas atividades se voltam rapidamente para setores mais
lucrativos, como o tráfico de álcool, de drogas e a prostituição. Todavia, as velhas
regras de honra em uso na Sicilia ainda subsistem. Porém, a entrada em vigor, nos
Estados Unidos, da Lei Seca (Prohibition), transforma o espírito da organização.
Com os acertos de contas sangrentos entre gangues rivais, os valores tradicionais
cedem lugar às lutas pelo poder. A Mano Nera torna-se então uma máfia muito mais
poderosa, criminosa e violenta, um verdadeiro sindicato do crime: a Cosa Nostra. 42
1.2.3 Japão
A Yakuza, a máfia japonesa, está presente em praticamente
todos os setores da economia informal do Japão, desde os jogos a dinheiro até o
tráfico do “diamante branco 43. A Yakuza também controla a extorsão, a prostituição
e o tráfico de armas.
As três principais famílias são Yamaguchi (grupo acima),
Inagawa e Sumiyoshi. A Yamaguchi-gumi é hoje a mais poderosa organização
criminosa do Japão. O chefão da Yamaguchi era Kazuo Taoka, que sobreviveu a
vários atentados, incluindo o mais perigoso, em 1978, quando levou um tiro no
pescoço. 44
Taoka morreu em julho de 1981 de ataque cardíaco, dando fim
a um mandato de 35 anos. Desde 1989, o oyabun (pai), Yoshinori Watanabe, é o
chefe do clã. 45
41 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p. 156.
42 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p. 157.
43 A anfetamina, cujo consumo não para de crescer no Japão.
44 EMI, Claudia. Por Dentro da Yakuza, 30 de dezembro de 2009. Disponível em: http://madeinjapan.uol.com.br/2009/12/30/por-dentro-da-yakuza/. Acesso em: 29 de março de 2014.
45 EMI, Claudia. Por Dentro da Yakuza, 30 de dezembro de 2009. Disponível em: http://madeinjapan.uol.com.br/2009/12/30/por-dentro-da-yakuza/. Acesso em: 29 de março de 2014.
27
O poder da Yakuza é impressionante. A máfia japonesa
controla mais de 80% do tráfico de drogas no arquipélago; explora apostas ilegais
em corridas de cavalos, bicicletas e lanchas; promove diversas modalidades de
jogos de azar e administra centenas de lojas de Pachinko. 46
A prostituição e a pornografia também são controladas pela
yakuza, que “importa” mulheres da China, Coréia, Tailândia e Filipinas. Outras
marcas registradas da yakuza são a extorsão, a agiotagem e a cobrança de dívidas.
Os mafiosos cobram altas somas de dinheiro tanto de pequenos comerciantes
quanto de grandes empresas. 47
1.2.4 América latina e Brasil
Na década de 70, uma nova droga surge no mercado
americano: a cocaína. Com efeitos mais poderosos e devastadores que a maconha,
ela provém da Colômbia, de onde é exportada clandestinamente para a Flórida.
Esse comércio ilegal logo se organiza. Em Medellin, Pablo Escobar assume a chefia
desse tráfico lucrativo, usando de violência e intimidação. Quando foi morto em
1992, pela polícia, Escobar dirigia o maior cartel mundial da droga, o Cartel de
Medellin. 48
Os tradicionais cartéis da América Latina se constituíram com o
único objetivo de revenda de drogas. Seus membros se assemelham a soldados que
não são nem iniciados nem obrigados a respeitar qualquer código de honra. Esses
bandos criminosos estão apenas encarregados de encaminhar as mercadorias e
proteger sua fabricação. Eles fazem reinar o terror nas regiões onde agem,
praticando intimidação e corrompendo agentes públicos. Polícia, exército, alfândega
e justiça são infiltradas e compradas. 49
46
EMI, Claudia. Por Dentro da Yakuza, 30 de dezembro de 2009. Disponível em: http://madeinjapan.uol.com.br/2009/12/30/por-dentro-da-yakuza/. Acesso em: 29 de março de 2014.
47 EMI, Claudia. Por Dentro da Yakuza, 30 de dezembro de 2009. Disponível em:
http://madeinjapan.uol.com.br/2009/12/30/por-dentro-da-yakuza/. Acesso em: 29 de março de 2014.
48 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
166.
49 SIGNIER, Jean-François. Sociedades secretas: sociedades secretas iniciáticas e criminosas, p.
166.
28
No Brasil, duas grandes facções do crime organizado se
destacam: o Comando Vermelho (CV), fundado no Rio de Janeiro, e o Primeiro
Comando da Capital (PCC), oriundo de São Paulo.
O Comando Vermelho foi a primeira forma de organização do
criminoso comum no Brasil. Ainda é a maior e mais importante organização do crime
no país. Neste grupo estão os principais interlocutores com os grandes exportadores
de drogas, especialmente colombianos, bolivianos e paraguaios. É também pelos
corredores do tráfico do CV que chegam ao Brasil as armas de guerra. 50
Seu surgimento remonta ao regime militar, nos anos 1970,
quando detentos comuns que assaltaram bancos foram mantidos juntos com presos
políticos no presídio de Ilha Grande, no Rio de janeiro. "A justificativa era que ambos
haviam infringido a lei de segurança nacional e foram, assim, mantidos em uma ala
para punir tal crime", disse um coronel da Polícia Militar. 51
O Comando Vermelho nasceu com o nome de Falange
Vermelha, uma mescla de ideologia de esquerda com o objetivo de se capitalizar
através do crime. Da mesma forma como hoje, quando as ordens para ações
criminosas partem de presídios, antigos presos políticos elaboravam planos que
eram executados por criminosos comuns fora dos presídios. Com a consolidação
das favelas, nos anos 1980, criminosos ligados ao grupo da Ilha Grande viram no
tráfico de cocaína a chance de um lucro fácil e mais rápido que os assaltos. Era o
fim da Falange e o início do Comando. 52
A favela em explosão demográfica foi o ambiente ideal para a
proliferação da facção. A primeira metralhadora apreendida no Rio de Janeiro foi no
morro da Mineira, em 1984. Até o final dos anos 1980, o crescimento do negócio do
tráfico originou conflitos de interesses que acabaram causando o primeiro racha no
50
AMORIM, Carlos, CV-PCC: a irmandade do crime, Rio de Janeiro, Record, 2011, p. 31.
51 FREITAS, Hermano, Facções criminosas do Rio tiveram origem nos presídios, 01 de dezembro
de 2010. Disponível em: http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/faccoes-criminosas-do-rio-tiveram-origem-nos-presidios,d04970e46f6ea310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html. Acesso em 30 de março de 2014.
52 FREITAS, Hermano, Facções criminosas do Rio tiveram origem nos presídios, 01 de dezembro
de 2010. Disponível em: http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/faccoes-criminosas-do-rio-tiveram-origem-nos-presidios,d04970e46f6ea310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html. Acesso em 30 de março de 2014.
29
Comando Vermelho: o Terceiro Comando. "Elas se odeiam porque todas as facções
criminosas tiveram como origem dissidências entre elas", disse um oficial da Polícia
Militar. 53
São Paulo é o novo cenário da expansão do crime organizado.
O PCC, que se intitula o “partido do crime”, é a força hegemônica. Cresce numa
velocidade alucinante. Aparentemente, controla 30 mil detentos em todo o estado. É
uma grife quase irresistível para o jovem seduzido pelo crime. Ser do “partido” é uma
espécie de credencial que atesta a qualidade do criminoso. 54
A facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), a
maior e mais organizada do país hoje, foi criada por oito presos, em 31 de agosto de
1993, no Anexo da Casa de Custódia de Taubaté (130 km de São Paulo), o
Piranhão, tida naquela época como a prisão mais segura do Estado. 55
Bons de bola, os oito começaram a se destacar no presídio por
causa dos jogos de futebol. No dia 31 de Agosto de 1993, eles marcaram uma
partida contra outros companheiros. Já tinham planejado matar dois desafetos
durante o jogo e foi o que aconteceu. Após as mortes, eles se reuniram e
começaram a discutir o que mais poderiam fazer além de jogar bola e exterminar
companheiros. Foi aí que tiveram a ideia de formar um “partido” (é assim que
integrantes do PCC se referem a facção), um sindicato onde seriam os
representantes dos detentos de todo o Estado de São Paulo. 56
O “partido” se chamaria Primeiro Comando da Capital – PCC.
Em 2003, Marco Willians Herbas Camacho, o “Marcola”, assumiu o comando do
PCC. Marcola, nasceu em 25 de novembro de 1968 e sua condenação é de 39
53
FREITAS, Hermano, Facções criminosas do Rio tiveram origem nos presídios, 01 de dezembro de 2010. Disponível em: http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/faccoes-criminosas-do-rio-tiveram-origem-nos-presidios,d04970e46f6ea310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html. Acesso em 30 de março de 2014.
54 AMORIM, Carlos, CV-PCC: a irmandade do crime, p. 34.
55 FOLHA DE SÃO PAULO, Facção criminosa PCC foi criada em 1993, 14 de maio de 2006.
Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u121460.shtml. Acesso em 30 de março de 2014.
56 RODRIGUES, Alan, Como nasceram as facções, 14 de janeiro de 2013. Disponível em:
http://www.istoe.com.br/reportagens/22098_COMO+NASCERAM+AS+FACCOES. Acesso em 30 de março de 2014.
30
anos, 3 meses e 20 dias por roubos e assaltos a bancos. Foi preso pela primeira vez
em 1986, quando tinha 18 anos. Fugiu da cadeia em 97, foi preso novamente e fugiu
outra vez em 98, sendo recapturado em 1999. Desde então, não saiu mais da
cadeia.
O governo brasileiro faz alguns esforços para combater o
narcotráfico. A Polícia Federal é recordista continental na apreensão de cocaína e
maconha 57. Dentro da Polícia Federal existe a Diretoria de Combate ao Crime
Organizado – DCOR. Porém, infelizmente, o que se constata na realidade é que o
poder paralelo do crime organizado está mais bem estruturado e muito melhor
equipado do que o poder legalmente constituído.
Após esse breve histórico acerca das origens do crime
organizado, abordando algumas das principais organizações criminosas no Brasil e
no mundo, chega-se à conclusão de que para se combater esse tipo de
criminalidade é preciso agir com extremo rigor, pois a complexidade das
organizações criminosas, com suas várias ramificações e penetrações no espaço
público, corrompendo o poder estatal legalmente constituído, tornaram-se como um
vírus, uma doença de difícil combate e que atualmente possui influência no mundo
todo.
Em uma tentativa de combater a esse tipo de criminalidade, foi
promulgada recentemente a Lei nº 12.850, de 02 de agosto de 2013, que apresentou
o conceito de organização criminosa e modificou o artigo 288 do Código Penal, em
relação à quantificação de agentes para configuração do crime de associação
criminosa, sendo esse o tema do próximo capítulo desta monografia.
57
AMORIM, Carlos, CV-PCC: a irmandade do crime, p. 26.
31
CAPÍTULO 2
ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA: PRINCÍPIOS E CONCEITOS
ESSENCIAIS PARA A QUANTIFICAÇÃO DO TIPO DELITUOSO
2.1 PRINCÍPIOS INERENTES AO CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA:
LEGALIDADE, ANTERIORIDADE, RESERVA LEGAL E TAXATIVIDADE
Há princípios que constituem a base do Estado Democrático de
Direito, pois sem eles não seria possível existir a segurança jurídica, tão essencial
em uma sociedade democrática. São eles os princípios da legalidade, da
anterioridade, da reserva legal e da taxatividade.
Não obstante se tratem de princípios distintos, muitas vezes se
confundem, gerando dúvidas em relação ao conteúdo e extensão de cada um.
Apesar de distintos, eles se complementam.
O princípio da legalidade é a soma do princípio da reserva legal
e do princípio da anterioridade. Chega-se a essa conclusão da leitura do inciso
XXXIX do artigo 5º da Constituição Federal 58 e do artigo 1º do Código Penal. 59
Ambos os dispositivos preveem o princípio da legalidade: para existir um crime, deve
existir uma lei (reserva legal), e essa lei deve ser anterior ao crime (anterioridade). É
o mesmo raciocínio para a pena, que deve ter prévia (anterioridade) cominação legal
(reserva legal).
Para Fernando Capez: 60
O princípio da legalidade é gênero que compreende duas espécies: reserva legal e anterioridade da lei penal. Com efeito, o princípio da legalidade corresponde aos enunciados dos arts. 5º, XXXIX, da Constituição Federal e 1º do Código Penal [...] e contém, nele embutidos, dois princípios diferentes: o da reserva legal, reservando para o estrito campo da lei a existência do crime e sua
58 Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.
59 Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.
60 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 57.
32
correspondente pena (não há crime sem lei que o defina, nem pena sem cominação legal), e o da anterioridade, exigindo que a lei esteja em vigor no momento da prática da infração penal (lei anterior e prévia cominação). Assim, a regra do art. 1º, denominada princípio da legalidade, compreende os princípios da reserva legal e da anterioridade.
Conclui-se, portanto, que o princípio da legalidade traz em seu
bojo os princípios da reserva legal e da anterioridade, embora todos sejam aplicados
de forma autônoma.
2.1.1 Princípio da reserva legal
Pois bem, feita essa explanação, pode-se dizer que o princípio
da Reserva Legal determina que apenas lei strictu sensu, ou seja, lei ordinária ou
complementar, pode versar sobre matéria penal, sendo vedada a criação de leis
penais por medida provisória, lei delegada e resolução.
2.1.2 Princípio da anterioridade
O princípio da anterioridade diz que a lei penal deve ser
anterior ao fato tido como crime. Ou seja, na época em que foi praticado o ato, a lei
penal que o tipifica já deve estar em vigor. 61 A regra definida pelo princípio da
anterioridade é o da irretroatividade da lei penal, sendo excepcionalmente admitido
que a lei penal reatroaja desde que seja para beneficiar o réu. 62
2.1.3 Princípio da legalidade
Assim, estabelecidos os conteúdos dos princípios da reserva
legal e da anterioridade, define-se o princípio da legalidade como sendo aquele que
determina que certa conduta humana só poderá ser considerada como uma conduta
criminosa se, à época em que foi praticada, já existia uma lei ordinária ou
complementar que a tipificava como crime.
61
tempus regit actum, O tempo rege o ato. Expressão em latim.
62 novatio legis in mellius expressão em latim.
33
O princípio da legalidade constitui um dos pilares do Estado
Democrático de Direito, em sua concepção liberal democrata, posto sua inclinação
natural de subordinação à lei.
Segundo Pedro Lenza: 63
O princípio da legalidade surgiu com o Estado de Direito, opondo-se a toda e qualquer forma de poder autoritário, antidemocrático. Esse princípio já estava previsto no art. 4º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. No direito brasileiro vem contemplado nos arts. 5º, II; 37; e 84, IV, da CF/88. O inciso II do art. 5º estabelece que ‘ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude lei.
O princípio da legalidade constitui-se um verdadeiro
instrumento limitador do jus puniendi (direito de punir) do Estado, ao estabelecer que
somente se poderá legislar em matéria penal de acordo com o devido processo
legislativo previsto na Constituição Federal, não podendo a lei penal retroagir, salvo
se for em beneficio do réu. Trata-se de uma garantia fundamental, prevista no artigo
5º da Constituição da República Federativa do Brasil.
Luiz Régis Prado 64 diz que:
Pelo princípio da legalidade – determinação – o legislador deve descrever da forma mais exata possível o fato punível. Diz respeito, em especial à técnica de elaboração da lei penal, que deve ser suficientemente clara e precisa na formulação do conteúdo do tipo de injusto e no estabelecimento da sanção para que exista segurança jurídica. Esse corolário do princípio da legalidade opera, portanto, como garantia individual diante do poder punitivo estatal, contribuindo para a exata compreensão do Estado de Direito ao reconhecer a capacidade inerente ao ser humano de se autodeterminar conforme os comandos normativos.
Acredita-se que sua origem remonta à Magna Carta Inglesa, de
1215, do reinado do Rei João Sem Terra, cujo artigo 39 dispunha: “Nenhum homem
livre será detido, nem preso, nem despojado de sua propriedade, de suas liberdades
ou livres usos, nem posto fora da lei, nem exilado, nem perturbado de maneira
63
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 880.
64 PRADO, Luiz Regis. Direito penal econômico: ordem econômica, relações de consumo, sistema
financeiro, ordem tributária, sistema previdenciário , lavagem de capitais e crime organizado. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 396.
34
alguma; e não poderemos, nem faremos pôr a mão sobre ele, a não ser em virtude
de um juízo legal de seus pares e segundo as leis do País.”
Porém, foi na Revolução Francesa, que o princípio surgiu nos
termos exigidos pelo Direito Penal, vindo insculpido nos artigos 7º, 8º e 9º 65 da
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Também tem previsão no art. 9º da Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) 66 e no art. 15 do Pacto
Internacional sobre Direitos Civis e Político.
Para Pedro Lenza: 67
O art. 5º, inciso XXXIX da Constituição Federal consagra a regra do nullum crimen nulla poena sine praevia lege. Assim, de uma só vez, assegura tanto o princípio da legalidade (ou reserva legal), na medida em que não há crime sem lei que o defina, nem pena sem cominação legal, como o princípio da anterioridade, visto que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.
Da definição acima se conclui que ninguém poderá ser
responsabilizado por um crime que ainda não tenha previsão legal, ou seja, não
pode haver pena sem prévia determinação da lei porque esta deve ser anterior ao
fato.
Segundo o ensinamento de Rogério Greco: 68
65
BRASIL. Declaração dos direitos do homem e do cidadão. Disponível em: http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/direitoshumanos/declar_dir_homem_cidadao.pdf. Acesso em: 29 de março de 2014. Art. 7º. Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei e de acordo com as formas por estas prescritas. Os que solicitam, expedem, executam ou mandam executar ordens arbitrárias devem ser punidos; mas qualquer cidadão convocado ou detido em virtude da lei deve obedecer imediatamente, caso contrário torna-se culpado de resistência. Art. 8º. A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias e ninguém pode ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada. Art. 9º. Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei.
66 BRASIL. Convenção americana sobre direitos humanos. Disponível em:
http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm. Acesso em: 29 de março de 2014. Ninguém poderá ser condenado por atos ou omissões que, no momento em que foram cometidos, não constituam delito, de acordo com o direito aplicável. Tampouco poder-se-à impor pena mais grave do que a aplicável no momento da ocorrência do delito. Se, depois de perpetrado o delito, a lei estipular a imposição de pena mais leve, o delinquente deverá dela beneficiar-se.
67 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. p 915.
35
A lei é a única fonte do Direito Penal quando se quer proibir ou impor condutas sob a ameaça de sanção. Tudo o que não for expressamente proibido é lícito em Direito Penal. Por essa razão, Von Liszt diz que o Código Penal é a Carta Magna do delinquente.
E por ser uma garantia fundamental, o princípio da legalidade
confere cinco características à lei penal: a lei penal deve ser anterior, escrita, estrita,
necessária e taxativa.
2.1.4 Princípio da taxatividade
O princípio da taxatividade ou do mandato de certeza vem
implícito no princípio da reserva legal e, consequentemente, da legalidade. Esse
princípio diz que a lei penal deve ser taxativa, certa. Ou seja, a conduta incriminada
deve estar descrita de forma pormenorizada, com todos os seus elementos
essenciais e circunstanciais, de modo a não pairar dúvidas sobre a conduta.
O princípio da taxatividade impede que a lei penal seja
ambígua ou que tenha uma descrição imprecisa da conduta, situações que
favorecem interpretações arbitrárias da lei penal. O princípio da taxatividade garante
a segurança jurídica.
No ensinamento de Guilherme de Souza Nucci: 69
O princípio da taxatividade “significa que as condutas típicas, merecedoras de punição, devem ser suficientemente claras e bem elaboradas, de modo a não deixar dúvidas, em relação ao seu cumprimento, por parte do destinatário da norma. A construção de tipo penais incriminadores dúbios e repletos de termos valorativos vagos pode dar ensejo ao abuso do Estado na invasão da intimidade e da esfera de liberdade dos indivíduos. Aliás, não fossem os tipos taxativos – limitativos, restritos, precisos – e de nada adiantaria adotar o princípio da legalidade ou da reserva legal. Este é um princípio decorrente, nitidamente, da legalidade.”
O doutrinador Fernando Capez 70, em relação ao princípio da
taxatividade diz que:
68
GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 14 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2012, p. 94.
69 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 10 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2010, p. 48.
70 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal – parte geral. p. 62.
36
A lei penal deve ser precisa, uma vez que um fato só será considerado criminoso se houver perfeita correspondência entre ele e a norma que o descreve. A lei penal delimita uma conduta lesiva, apta a pôr em perigo um bem jurídico relevante, e prescreve-lhe uma consequência punitiva. Ao fazê-lo, não permite que o tratamento punitivo cominado possa ser estendido a uma conduta que se mostre aproximada ou assemelhada.
Assim, enquanto o princípio da anterioridade da lei penal se
vincula às fontes do Direito Penal, o princípio da taxatividade exige a formulação
técnica da lei penal e indica o dever imposto ao legislador de proceder, quando
redige a norma, de maneira precisa na determinação dos tipos legais, para se saber,
taxativamente, o que é penalmente ilícito e o que é penalmente admitido.
2.2 CONCURSO DE PESSOAS
O concurso de pessoas ou concurso de agentes acontece
quando duas ou mais pessoas se unem para o cometimento de um ilícito penal.
Embora não traga um conceito para o concurso de pessoas, nossa legislação a
prevê no artigo 29 do Código Penal, o qual prescreve que quem, de qualquer modo,
concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua
culpabilidade.
A teoria adotada pelo legislador é a monista, a qual será
abordada no próximo tópico.
O conceito de concurso de pessoas vem sendo feito pela
doutrina. Rogério Greco 71 assim define concurso de pessoas:
Quando duas ou mais pessoas concorrem para a prática de uma mesma infração penal. Essa colaboração recíproca pode ocorrer tanto nos casos em que são vários os autores como naqueles em que existirem autores e partícipes.
Guilherme de Souza Nucci 72 define concurso de pessoas
como sendo a:
71
GRECO, Rogério. Código penal comentado. 7 ed., Rio de Janeiro: Impetus, 2013, p. 92.
72 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado, p. 295.
37
Cooperação desenvolvida por várias pessoas para o cometimento de uma infração penal. Chama-se, ainda, em sentido lato: coautoria, participação, concurso de delinquentes, concurso de agentes, cumplicidade.
Para René Ariel Dotti: 73
O crime pode resultar de um fato coletivo. A realização do ilícito reúne duas ou mais pessoas que se unem, facultativamente, para o melhor êxito da empreitada delituosa ou obrigatoriamente, quando o próprio tipo legal exige essa concorrência de atuações. Apresenta-se, então, o concurso de pessoas.
Dessa forma, conforme exposto pelos referidos autores
entende-se por concurso de pessoas a concorrência de várias pessoas para a
realização do crime. Por conseguinte, após a análise feita, serão apresentadas as
teorias a respeito do concurso de pessoas.
2.2.1 Teorias sobre o concurso de pessoas
Definido o que seria o concurso de pessoas, delineia-se um
problema sobre o tema: o concurso de pessoas constitui um ou vários delitos? Para
se responder a essa questão da criminalidade coletiva, surgiram três teorias: Teoria
Monista, Teoria Dualista e Teoria Pluralista.
2.2.1.1 Teoria monista (unitária ou igualitária) da participação
Segundo essa teoria, o crime, mesmo que praticado por várias
pessoas em colaboração, continua sendo único e indivisível. De acordo com esse
entendimento, o sujeito que concorre para a prática do crime, causa-o na sua
totalidade e responde por todo o crime, já que este é o resultado da conduta de cada
um e de todos indistintamente. Não há distinção entre autor, partícipe, instigador,
cúmplice, etc. Todos são considerados autores ou coautores do crime.
É a teoria adotada pelo Código Penal de 1940, em seu art. 25:
“quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este
cominadas”. Conclui-se que toda a pessoa que contribui para a produção do delito, o
causa em sua totalidade e, portanto, por ele deve responder integralmente.
73
DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: Parte Geral. 1 ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 352
38
Por razões de política criminal, entendeu o legislador que todos
os participantes do crime são autores dele, evitando, desse modo, questões que
poderiam decorrer das definições de autor, coautor e partícipes.
Com a reforma penal de 1984, que dispôs no art. 29 que
“quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este
cominadas, na medida de sua culpabilidade”, o legislador continua adotando a teoria
monista, pois deixou expresso que existe um só crime e que todos por ele
respondem. Porém, talvez em razão de críticas e decisões injustas em face da teoria
monista, o legislador procurou abrandar a teoria monista, distinguindo a punibilidade
de autoria e participação.
Para Raúl Zaffaroni, 74 o fato do artigo 29 do Código Penal
estabelecer que:
Quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade, não pode ser entendido que “para o Código, todos os que concorrem ‘para o crime’ sejam autores, e sim, que todos os que concorrem têm, em princípio, a mesma pena estabelecida para o autor”.
Aliás, essa afirmação encontra-se na primeira parte do
parágrafo 2º do mesmo dispositivo, textualmente: “Se algum dos concorrentes quis
participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste”.
Logo, conclui-se que, se o próprio Código Penal, na parte
relativa a concurso de pessoas, prevê a possibilidade de algum dos agentes ter
querido participar de um crime menos grave do que o que efetivamente foi praticado
pelos demais, é óbvio que a teoria monista não foi admitida de forma simplista.
Nesse ponto, bastante esclarecedora a lição de Cezar Roberto
Bitencourt 75, para quem a reforma penal de 1984:
Adotou, como regra, a teoria monista, determinando que todos os integrantes de uma infração penal incidem nas sanções de um único e mesmo crime e, como exceção, a concepção dualista, mitigada,
74
ZAFFARONI, Eugenio Raul e PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: Parte Geral. 4 ed., São Paulo:,Revista dos Tribunais, 2002, p. 665.
75 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: Parte Geral. 7 ed., São Paulo: Saraiva,
2002, v. 1, p. 378.
39
distinguindo a atuação de autores e partícipes, permitindo uma efetiva dosagem de pena de acordo com a efetiva participação e eficácia causal da conduta de cada partícipe, na mediada da culpabilidade perfeitamente individualizada. Na verdade, continua o mestre, os parágrafos do art. 29 aproximaram a teoria monista da teoria dualística ao determinar a punibilidade diferenciada da participação.
Dessa forma, após a análise da teoria monista será
apresentada a teoria dualista ou dualística.
2.2.1.2 Teoria dualista (ou dualística)
De acordo com essa teoria, nos casos de condutas delituosas
praticadas em concurso existem dois crimes: um para os que realizam a conduta
típica propriamente dita descrita na lei. Seriam os autores. O outro crime seria para
aqueles que praticam uma atividade secundária no evento delituoso sem que sua
conduta configure a descrição contida no tipo penal. Esses seriam os partícipes.
Rogério Greco 76 ensina que:
Para essa teoria, haveria uma infração penal para os autores e outra para os partícipes. Manzini, defensor da mencionada teoria, argumentava que ‘se a participação pode ser principal e acessória, primária e secundária, deverá haver um crime único para os autores e outro crime único para os chamados cúmplices stricto sensu. A consciência e vontade de concorrer num delito próprio confere unidade ao crime praticado pelos autores; e a de participar no delito de outrem atribui essa unidade ao praticado pelos cúmplices’. Tomando emprestado o exemplo acima, teríamos uma infração para aquele que induziu os agentes à prática do crime de furto e outra para os coautores, isto é, para aqueles que subtraíram a coisa alheia.
Existem duas ações no crime: a principal, que é praticada pelo
autor que executa o verbo contido no tipo penal; e a secundária ou acessória, que é
praticada pelos partícipes, ou seja, aqueles indivíduos que fazem parte do plano
criminoso, quer seja instigando ou auxiliando o autor a cometer o crime, porém, não
executam o verbo previsto no tipo penal.
76
GRECO, Rogério. Curso de direito penal. p. 417-418.
40
2.2.1.3 Teoria pluralista
Para essa teoria, a pluralidade de agentes corresponde a um
concurso de ações distintas e, logo, uma pluralidade de delitos. Cada participante
contribuiria com uma conduta própria. Para a teoria pluralista, existiriam tantos
crimes quantos fossem os participantes do fato delituoso. Cada indivíduo envolvido
na empreitada criminosa cometeria um crime próprio e autônomo.
Nas palavras de Rogério Greco: 77
Seria como se cada autor ou partícipe tivesse praticado a sua própria infração penal, independentemente de sua colaboração para com os demais agentes. Assim, se alguém tivesse induzido duas outras pessoas a praticar um delito de furto, teríamos três infrações penais distintas. Uma para cada um dos agentes. Ou seja, uma para o partícipe e uma para cada um dos coautores, isto é, para aqueles que realizaram a subtração da coisa alheia móvel.
A maior falha dessa teoria é que as condutas de cada um dos
envolvidos no crime não são autônomas, e nem podem ser consideradas como tal,
uma vez que convergem para uma ação única com objetivo e resultado comum.
Como citado anteriormente, a teoria adotada pelo nosso
Código Penal é a teoria monista, porém, de forma mitigada, pois o legislador
entendeu por bem diferenciar coautor de partícipe, dois conceitos que serão
abordados adiante.
2.2.2 Tipos de concurso de pessoas
Existem dois tipos de concursos de pessoas, segundo a
doutrina: coautoria e participação.
2.2.2.1 Coautoria
A coautoria ocorre quando várias pessoas realizam a conduta
principal do tipo penal. Há diversos executores do tipo penal. Como exemplos, pode-
se citar o crime de estupro (artigo 231 do Código Penal) e o crime de roubo (artigo
157 do Código Penal).
77
GRECO, Rogério. Curso de direito penal. p. 417.
41
De acordo com Fernando Capez: 78
Todos os agentes, em colaboração recíproca e visando ao mesmo fim, realizam a conduta principal. Na lição de Johannes Wessels, ‘coautoria é o cometimento comunitário de um fato punível mediante uma atuação conjunta consciente e querida’. Ocorre a coautoria, portanto, quando dois ou mais agentes, conjuntamente, realizam o verbo do tipo.
Os coautores podem ter o mesmo tipo de ação no crime. Um
exemplo seria, no crime de homicídio, todos os coautores atiraram na vítima.
Usando o mesmo crime como exemplo, podemos ter coautores com participações
distintas: um planeja o crime e o outro o executa.
O jurista e professor Luiz Flávio Gomes 79 também entende que
ocorre coautoria quando várias pessoas participam da execução do crime,
realizando ou não o verbo núcleo do tipo. Dessa forma, para o renomado
doutrinador todos praticam fato próprio.
2.2.2.2 Participação
A participação ocorre quando um dos agentes não pratica os
atos executórios do crime, mas, ele, de qualquer modo, concorre para o crime, isto
é, ele, de alguma forma, concorreu para a realização da conduta típica e antijurídica.
Essa segunda pessoa, denominada de partícipe, não realizou
nenhum ato executório para a consumação do delito, mas devido a uma ligação com
o autor, responderá pelo crime. O partícipe não executa os atos próprios, porém,
também responde pela conduta. Seria o indivíduo que colabora para que um
terceiro cometa um crime, no entanto, não possui o controle da ação tampouco o
poder para concretizar a figura típica. Como exemplo de partícipe, podemos citar, no
caso de um crime de estupro, a pessoa que fica em frente à porta do banheiro onde
está ocorrendo o crime, evitando a entrada de outras pessoas.
Rogério Greco 80 afirma que:
78 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: Parte Geral. p. 365.
79 GOMES, Luiz Flávio. Conceito de coautoria em direito penal. 19 de marco de 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/8120>. Acesso em: 19 de abril de 2014.
80 GRECO, Rogério. Curso de direito penal. p. 436.
42
Não raras vezes, o protagonista pode receber o auxílio daqueles que, embora não desenvolvendo atividades principais, exercem papéis secundários, mas que influenciam na prática da infração penal. Estes, que atuam como coadjuvantes na história do crime são conhecidos como partícipes.
A participação será sempre uma atividade acessória. Para que
se fale em partícipe, é necessário que exista um autor do fato tido como delituoso. A
participação pode ser moral ou material. Rogério Greco 81 assim as define:
Diz-se moral a participação nos casos de induzimento (que é tratado pelo Código Penal como determinação) e instigação. Material seria a participação por cumplicidade (prestação de auxílios materiais).
Completa, ainda o renomado autor Rogério Greco 82 ensinando
o que seria induzimento e instigação:
Induzir ou determinar é criar, incutir, colocar, fazer brotar a ideia criminosa na cabeça do agente/autor. Nessa modalidade de participação, o autor não tinha a ideia criminosa, cuja semente lhe é lançada pelo partícipe. A participação por instigação limita-se a reforçar, estimular uma ideia criminosa já existente na mente do autor. A função do partícipe, com a sua instigação, é fazer com que o agente fortaleça a sua intenção delitiva.
A participação material ou cumplicidade se configura quando o
indivíduo, dolosamente, presta auxílio à ação criminosa de outrem, efetivamente
ajudando na preparação ou execução do delito.
2.2.3 Requisitos do concurso de pessoas
Do conceito doutrinário de concurso de pessoas podem-se
extrair quatro requisitos necessários para a sua configuração. São eles:
2.2.3.1 Pluralidade de agentes e de condutas
Para que se tenha um concurso é necessário que haja uma
pluralidade. É impossível se falar de concurso de pessoas sem que haja pelo menos
duas pessoas e, consequentemente, duas condutas, no mínimo.
81
GRECO, Rogério. Código penal comentado. p. 98.
82 GRECO, Rogério. Código penal comentado. p. 98.
43
Segundo Fernando Capez,83 textualmente:
Para que haja concurso de agentes, exigem-se, no mínimo, duas condutas, quais sejam, duas principais, realizadas pelos autores (coautoria), ou uma principal e outra acessória, praticadas, respectivamente, por autor e partícipe. Da mesma forma que ‘uma andorinha não faz verão’, uma só conduta não caracteriza o concurso de pessoas.
No mesmo sentido é o ensinamento do Professor René Ariel
Dotti 84 o qual apresenta que o concurso de pessoas na infração penal, em qualquer
de suas modalidades, é, em síntese, a soma de comportamentos individuais que
realizam a figura do ilícito.
2.2.3.2 Relevância causal de cada conduta
Além da pluralidade de agentes e de condutas, também é
necessário que em meio a todas as condutas seja possível vislumbrar o nexo de
causalidade entre elas e o resultado ocorrido. A conduta particular de cada autor ou
partícipe deve concorrer objetivamente para a produção do resultado. Isto é, cada
ação ou omissão humana (conduta) deve ter importância, deve ser relevante,
perante a cadeia causal de eventos, para a verificação daquele crime, contribuindo
objetivamente para tanto.
Fernando Capez 85 informa que:
Se a conduta não tem relevância causal, isto é, se não contribui em nada para a eclosão do resultado, não pode ser considerada como integrante do concurso de pessoas. Assim, por exemplo, não se pode falar em concurso quando a outra conduta é praticada após a consumação do delito. Se ela não tem relevância causal, então o agente não concorreu para nada, desaparecendo o concurso.
Assim, condutas irrelevantes ou insignificantes para a
existência do crime são desprezadas, elas sequer são admitidas como participação
no evento delituoso. Afinal, a participação exige um mínimo de eficácia causal na
realização da conduta típica criminosa.
83
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: Parte Geral. p. 371.
84 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: Parte Geral, p. 353.
85 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: Parte Geral. p. 371.
44
2.2.3.3 Liame subjetivo entre os agentes
O terceiro requisito necessário é a existência de um vínculo
psicológico ou normativo entre os agentes, de modo que se configure a unidade na
empreitada delitiva. Exige-se, por conseguinte, que o sujeito manifeste, com a sua
conduta, consciência e vontade de atuar em obra delitiva comum.
Rogério Greco 86 afirma que:
Se não se conseguir vislumbrar o liame subjetivo entre os agentes (crimes dolosos), cada qual responderá, isoladamente, por sua conduta. E segue: No caso clássico em que A e B atiram contra C, sendo que um deles acerta mortalmente o alvo e o outro erra, não se sabendo qual deles conseguiu alcançar o resultado morte, dependendo da conclusão que se chegue com relação ao vínculo psicológico entre os agentes, as imputações serão completamente diferentes. Se dissermos que A e B agiram unidos pelo liame subjetivo, não importará saber, a fim de condená-los pelo crime de homicídio, qual deles, efetivamente, conseguiu acertar a vítima, causando-lhe a morte. Aqui, o liame subjetivo fará com que ambos respondam pelo homicídio consumado. Agora, se chegarmos à conclusão de que os agentes não atuaram unidos pelo vínculo subjetivo, cada qual deverá responder pela sua conduta. No caso em exame, não sabemos quem foi o autor do resultado morte. A dúvida, portanto, deverá beneficiar os agentes, uma vez que um deles não conseguiu alcançar o resultado morte, praticando, assim, uma tentativa de homicídio. Dessa forma, ambos deverão responder pelo crime de homicídio tentado.
Assim, os participantes têm que atuar com o mesmo objetivo, a
mesma vontade de realizar determinado delito. Para isso, não se faz necessário um
acerto prévio entre eles, basta que um agente adira à vontade dos demais. Se não
ficar plenamente demonstrada a existência do liame subjetivo entre os agentes não
há que se falar em concurso de pessoas.
2.2.3.4 Identidade de infração penal
Não há que se falar em concurso de pessoas se a concorrência
criminosa, envolvendo dois ou mais agentes, cada um com sua conduta, unidos por
vínculo subjetivo, não se destinar à prática de certa e determinada infração penal.
86
GRECO, Rogério. Curso de direito penal. p. 416-417.
45
Rogério Greco 87 afirma que os agentes, unidos pelo liame
subjetivo, devem querer praticar a mesma infração penal. Seus esforços devem
convergir ao cometimento de determinada e escolhida infração penal.
Dessa forma, após a análise dos referidos requisitos, conclui-
se que, apenas quando pelo menos duas pessoas, unidas pelo liame subjetivo,
praticarem condutas penalmente relevantes, com o intuito de cometer a mesma
infração penal restará caracterizado o concurso de pessoas.
2.2.4 Espécies de concurso de pessoas
Os crimes são classificados, quanto ao número de pessoas,
em dois tipos: os monossubjetivos (aqueles que podem ser cometidos por um sujeito
apenas) e os plurissubjetivos (crimes que exigem pluralidade de agentes para a sua
prática. Um exemplo seria o crime de rixa, previsto no artigo 137 do Código Penal).
Desse modo, existem duas espécies de concurso: o concurso
necessário (nos casos de crimes plurissubjetivos) e o concurso eventual (nos casos
de crimes monossubjetivos).
Para Guilherme de Souza Nucci: 88
O crime plurissubjetivo é aquele que, para configurar-se, exige a presença de duas ou mais pessoas (ex.: quadrilha ou bando, rixa, bigamia, etc.) enquanto o unissubjetivo é aquele que pode ser praticado por uma só pessoa (ex.: homicídio, roubo, estupro, etc.). O crime plurissubjetivo, justamente porque exige mais de uma pessoa para sua configuração, não demanda a aplicação da norma de extensão do art. 29 (quem concorre para o crime incide nas suas penas), pois a presença de dois ou mais autores é garantida pelo tipo penal. As quatro pessoas que compõem uma quadrilha são autores do delito previsto no art. 288 do Código Penal. Por outro lado, quando o crime é unissubjetivo, mas, na prática, é cometido por dois ou mais agentes, utiliza-se a regra do art. 29 para tipificar todas as condutas, pois certamente cada um agiu de um modo, compondo a figura típica total. Em um roubo, como já se mencionou, é possível que um autor aponte o revólver, exercendo a grave ameaça, enquanto outro proceda a subtração. Ambos praticaram o tipo penal do art. 157 em concurso de pessoas, necessitando aplicar a regra do art. 29.
87
GRECO, Rogério. Curso de direito penal. p. 417.
88 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. p. 297-298.
46
A seguir, serão abordados os dois tipos de concursos de
pessoas, o concurso necessário e o concurso eventual.
2.2.4.1 Concurso necessário
Configura-se no caso de crime plurissubjetivo, ou seja, é
obrigatória presença de um número mínimo de pessoas para a configuração do
crime. O próprio tipo penal conterá em seu texto a necessidade de participação de,
no mínimo, duas pessoas. Um exemplo é o delito de quadrilha ou bando, art. 288 do
Código Penal.
Segundo Fernando Capez 89, o concurso necessário “refere-se
aos crimes plurissubjetivos, os quais exigem o concurso de pelo menos duas
pessoas.”
René Ariel Dotti 90 define o concurso como necessário quando
“a realização do verbo constante do tipo requer a conjugação das condutas.”
Dessa forma, no concurso necessário, a norma incriminadora
exige uma pluralidade de agentes para que o crime possa ser cometido. A
pluralidade de autores é elemento do tipo.
2.2.4.2 Concurso eventual
Sua configuração se dá na ocorrência de um crime
monossubjetivo, ou seja, no caso de um crime que pode ser praticado por uma
pessoa apenas, mas que eventualmente é praticado por duas ou mais pessoas.
Ocorre o encontro casual de duas ou mais pessoas para a prática do crime. Nesse
caso, aplica-se a regra do artigo 29 do Código Penal.
Para Fernando Capez 91, o concurso eventual:
Refere-se aos crimes monossubjetivos, que podem ser praticados por um ou mais agentes. Quando cometidos por duas ou mais pessoas em concurso, haverá coautoria ou participação, dependendo da forma como os agentes concorrem para a prática do delito, mas
89
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: Parte Geral. p. 360.
90 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: Parte Geral. p. 352.
91 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: Parte Geral. p. 361.
47
tanto uma como outra podem ou não ocorrer, sendo ambas eventuais. O sujeito pode cometer um homicídio sozinho, em coautoria com alguém, ou, ainda, ser favorecido pela participação de um terceiro que o auxilie, instigue ou induza.
Dessa forma, no concurso eventual pode haver a participação
de vários autores em um crime, mas que não é indispensável para que o crime
exista, como acontece no concurso necessário.
Adiante será analisado o conceito jurídico e legal de crime
organizado e organizações criminosas.
2.3 OS CONCEITOS DE CRIME E ORGANIZAÇÃO
Segundo o Dicionário Jurídico Universitário, crime é “toda
violação imputável, dolosa, ou culposa da lei penal, também, da violação voluntária
da norma penal por ação ou omissão, ainda, do fato imputável, doloso ou culposo,
da lesão efetiva de um direito protegido pela lei.” 92
Diz Assis Toledo que crime é “um fato humanos que lesa ou
expõe a perigo bens jurídicos (jurídico-penalmente) protegidos.” 93
Segundo o ensinamento de Romeu Falconi: 94
Crime é um fato (injusto punível) provocado por uma CONDUTA HUMANA que, juridicamente relevante, é tipificada e tem como componente o agente e, como conteúdo, a figura da ilicitude, tornando passível de apuração da culpabilidade, derivando daí uma punibilidade, uma vez provada àquela culpa (culpa lata).
O conceito mais utilizado, todavia, para crime é de que se trata
de uma conduta típica, antijurídica (ilícita) e culpável.
René Ariel Dotti explica esse conceito: 95
92
NETTO, José de Oliveira. Dicionário jurídico: terminologia jurídica e latim forense, 3 ed., São Paulo: Edijur, 2008, p. 192.
93 TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal, 5 ed., São Paulo: Saraiva,
1994, p. 80.
94 FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, 3 ed., São Paulo, Ícone, 2002, p.152.
95 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. p. 300.
48
A conduta é representada por uma ação ou omissão humana dirigida a um fim; a tipicidade é a adequação, objetiva e subjetiva, dessa conduta a uma norma legal; a ilicitude é a qualidade de um comportamento não autorizado pelo Direito e a culpabilidade é o juízo de reprovação que recai sobre a conduta do sujeito que tem ou pode ter a consciência da ilicitude e de atuar segundo as normas jurídico-penais.
Definido o conceito de crime, a seguir será abordado o conceito
de organização.
Segundo o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa,
Organização é a “associação ou instituição com objetivos definidos.” 96
A palavra Organização vem do grego "organon”, que significa
instrumento, utensílio, órgão ou aquilo com que se trabalha. Então, uma organização
nada mais é do que uma forma estabelecida, com regras definidas, para se atingir
um determinado objetivo. As organizações podem ser criadas para o alcance dos
mais diversos objetivos: uma simples organização doméstica, organizações
empresariais em diversos ramos (do entretenimento, da área da saúde, educacional,
etc.) e até as criminosas.
Seja qual for o fim da Organização, ela se baseia na forma pela
qual as pessoas se interrelacionam entre si e na ordenação e distribuição dos
elementos envolvidos, com vista a uma mesma finalidade.
2.4 ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – O CRIME ORGANIZADO E SEU
ENQUADRAMENTO LEGAL
O Federal Bureau of Investigations (FBI) define crime
organizado como qualquer grupo que tenha uma estrutura formalizada cujo objetivo
seja a busca de lucros através de atividades ilegais. Esses grupos usam da violência
e da corrupção de agentes públicos. Para a Pennsylvania Crime Commision, as
principais características das organizações criminosas são a influência nas
96
FERREIRA, Aurélio Buarque. Miniaurélio: o dicionário da língua portuguesa, 6 ed., Curitiba: Positivo, 2004, p.596.
49
instituições do Estado, altos ganhos econômicos, práticas fraudulentas e coercitivas.
97
A Academia Nacional de Polícia Federal do Brasil enumera 10
características do crime organizado, quais sejam: 1) planejamento empresarial; 2)
antijuridicidade; 3) diversificação de área de atuação; 4) estabilidade dos seus
integrantes; 5) cadeia de comando; 6) pluralidade de agentes; 7) compartimentação
98; 8) códigos de honra; 9) controle territorial; 10) fins lucrativos.
De acordo com Vilian Bollmann, 99 textualmente:
Em linhas gerais, é possível dizer que, no plano teórico ou doutrinário, a macrocriminalidade corresponde a uma criminalidade realizada em moldes empresariais, explorando o crime como um empreendimento lícito, com organização e métodos próprios dos empresários. Como tal, relaciona-se tanto com o crime organizado do tipo mafioso quanto nos crimes contra a economia popular (que vão desde a venda de economia falsificada e fraude na emissão de títulos até os crimes falimentares), abrangendo também a agiotagem, o tráfico internacional de drogas e fraudes contra instituições financeiras, contra os consumidores e contra a administração pública, etc.
O Decreto nº 5.015, de 12 de março de 2004 promulgou, em
nosso ordenamento jurídico, a Convenção das Nações Unidas contra o Crime
Organizado Transnacional (Convenção de Palermo), adotada em Nova York em
novembro de 2000. Segundo esta convenção, grupo criminoso organizado é o grupo
estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando com o
propósito de cometer uma ou mais infrações graves com a intenção de obter, direta
ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material.
Ademais, de acordo com a referida Convenção, infração grave
seria aquela punível com uma pena de privação de liberdade, cujo máximo da pena
não seja inferior a quatro anos ou com pena superior e grupo estruturado diz
97
OLIVEIRA, Adriano, Crime Organizado: é possível definir?, Março de 2004. Disponível em http://www.espacoacademico.com.br/034/34coliveira.htm#_ftn6. Acesso em 03 de abril de 2014.
98 “Esta característica faz com que as atividades das diversas etapas ou níveis de organização não
sejam conhecidas por ouros setores. Presta-se, principalmente, como elemento de segurança contra as tentativas de infiltração das Agências de Controle” (Polícia de prevenção e repressão a entorpecentes – Departamento de Polícia Federal, 2001).
99 BOLLMANN, Vilian. Curso Modular de Direito Penal. Organizadores: Tadaaqui Hirose e José
Paulo Baltazar Júnior. 1 ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010, p. 161.
50
respeito a um grupo formado de maneira não fortuita para a prática imediata de uma
infração, ainda que os seus membros não tenham funções formalmente definidas,
que não haja continuidade na sua composição e que não disponha de uma estrutura
elaborada.
Porém, esse conceito não foi adotado em nosso ordenamento
jurídico. O Supremo Tribunal Federal, no HC nº 96.007/SP, 100 decidiu que o
conceito trazido pela Convenção de Palermo não deveria ser adotado para regular
os procedimentos dispostos na Lei 9.034/95. O Ministro Marco Aurélio afirmou que
“a definição emprestada de organização criminosa seria acrescentar à norma penal
elementos inexistentes, o que seria uma intolerável tentativa de substituir o
legislador, que não se expressou nesse sentido”.
Rômulo de Andrade Moreira101 teceu comentários ao
entendimento do STF ao julgar o tema no HC nº 96.007, dizendo que:
Antes de qualquer consideração, louvemos a acertada decisão da Turma do STF, pois atentou para o princípio da legalidade, absolutamente inafastável em um Estado Democrático de Direito, ainda mais quando se trata de estabelecer uma exata definição acerca de uma estrutura criminosa, que permite ao Estado autorizar contra o indivíduo, ainda presumivelmente inocente, atos investigatórios invasivos de sua privacidade. Lucidamente esclareceu, ainda, que ‘evidentemente que não desconhecemos nem negamos a existência de organizações criminosas, inclusive em nosso País, mas é preciso que, antes de qualquer coisa, dê-se um conceito legal para aquelas estruturas criminosas, tal como fez, por exemplo, o Código Penal, no art. 288, ao conceituar quadrilha ou bando, e a Lei nº 11.343/06, no art. 35 (Associação para o Tráfico – Lei de Drogas).
Em julho de 2012, surge, com a entrada em vigor da Lei nº
12.694, o primeiro conceito legal de organização criminosa. Essa lei dispõe sobre o
processo e o julgamento colegiado em primeiro grau de jurisdição de crimes
praticados por organizações criminosas. Em seu artigo 2º, dispõe que organização
criminosa é a associação de três ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e
caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de
100
STF, 1ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, data de julgamento: 12/06/2012, DJE de 08/02/2013.
101 MOREIRA, Rômulo de Andrade. O Supremo Tribunal Federal decidiu que no Brasil não há
organização criminosa: e agora? Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal n. 47. Abril/maio de 2012. Porto Alegre: Magister, p. 21.
51
obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática
de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a quatro anos ou que sejam de
caráter transnacional.
A Lei nº 12.850, de 02 de agosto de 2013, trouxe muitas
mudanças conceituais e estruturais, no que diz respeito ao combate ao crime
organizado no Brasil. A lei trouxe o conceito de organização criminosa e dispôs
sobre sua investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais
correlatas e o procedimento criminal. Também alterou alguns artigos do Código
Penal e revogou a Lei nº 9.034/95.
A recente lei, em seu §1º do Art. 1º, define o que vem a ser
uma organização criminosa, sendo a associação de quatro ou mais pessoas
estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer
natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam
superiores a quatro anos, ou que sejam de caráter transnacional.
A nova lei trouxe mudanças significativas em relação à anterior,
quanto ao conceito de organização criminosa, como por exemplo, o número mínimo
de integrantes exigidos passa a ser de quatro pessoas, e não apenas três como
previa a lei anterior.
Outra mudança diz respeito ao novo conceito que não abrange
apenas crimes, mas infrações penais, que incluem crimes e contravenções. Agora
são punidas as infrações com pena máxima superior a quatro anos, e não mais as
com pena máxima igual ou superior a este patamar.
Crimes como o furto simples, artigo 155 do Código Penal, a
receptação, artigo 180 do Código Penal, e a fraude à licitação, artigo 90 da Lei
8.666/90, cuja pena máxima é igual a quatro anos, não podem ser enquadrados
como crime organizado pelo novo conceito legal. Já o contrabando e o descaminho,
artigo 318 do Código Penal, que também tem pena máxima igual a quatro anos,
porém, são na sua essência transnacionais, estão incluídos na nova conceituação
legal.
52
Ademais, a nova lei, também estendeu o conceito de
organização criminosa às infrações penais previstas em Tratados Internacionais
quando caracterizadas pela internacionalidade.
De acordo com Guilherme de Souza Nucci, 102 organização
criminosa é:
A associação de agentes, com caráter estável e duradouro, para o fim de praticar infrações penais, devidamente estruturada em organismo pré-estabelecido, com divisão de tarefas, embora visando ao objetivo comum de alcançar qualquer vantagem ilícita, a ser partilhada entre os seus integrantes.
O tipo subjetivo é o concurso necessário de quatro ou mais
pessoas em comunhão de esforços e unidade de desígnios. Deve haver uma
estrutura ordenada, em que cada membro possua uma função e obedeça à
hierarquia da organização.
Essa associação deve ser voltada a um fim específico e
autônomo, independente da vontade individual de seus integrantes. O fim
invariavelmente é a obtenção de vantagens de qualquer natureza e o meio de
obtenção dessas vantagens é a prática de atividades ilícitas. Mas não basta ser
qualquer atividade ilícita. A lei estabelece que sejam infrações penais com penas
máximas superiores a quatro anos, ou que por si só caracterizem delito de caráter
transnacional.
O fim, o objetivo, enfim, a vontade da organização criminosa
não se confunde com a vontade individual de seus membros, ela tem seu objetivo
próprio, como uma empresa. E disso decorre que a associação deve ser
permanente e não apenas reuniões esporádicas objetivando a obtenção de
vantagem ilícita
Para restar configurada a existência da organização criminosa,
ela deve estar estruturada, com tarefas divididas entre seus membros, mesmo que
seja de maneira informal, com a clara existência de uma hierarquia entre seus
integrantes e o seu fim precípuo deve ser a prática de atos ilícitos, em que as penas
102
NUCCI, Guilherme de Souza. Organização Criminosa: Comentários à Lei 12.850, de 02 de agosto de 2013, 1 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 14.
53
máximas cominadas sejam superiores a quatro anos, ou que por si só caracterizem
delito de caráter transnacional.
Trata-se de crime autônomo, que exige a associação de pelo
menos quatro pessoas para a prática de infrações penais graves, ou seja, aquelas
com penas superiores a quatro anos de prisão.
É crime formal, consumando-se com a mera associação de
pessoas, independentemente da execução dos crimes que motivaram a
organização. Trata-se de crime permanente, aquele em que a lesão ao bem jurídico
continua após o momento consumativo do ilícito, possibilitando, dessa forma, a
prisão em flagrante dos integrantes da organização criminosa a qualquer tempo,
sem prejuízo dos outros crimes que eventualmente tenham sido cometidos em
concurso de crimes.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois trata-se de
crime comum, de concurso necessário e de condutas paralelas, uma auxiliando a
outra. O sujeito passivo é a sociedade e o bem jurídico tutelado, a exemplo do crime
de quadrilha ou bando, atualmente denominado como associação criminosa, é a paz
pública.
2.5 NOVO CONCEITO LEGAL DO CRIME DE QUADRILHA OU BANDO
O Código Penal, com a edição da Lei nº 12.850/2013, que
alterou a redação do artigo 288 do diploma legal, 103 abandonou o conceito de
quadrilha ou bando, substituindo-o por associação criminosa, reduzindo, para sua
configuração, o mínimo de três pessoas.
Manteve, no entanto, a pena de reclusão de um a três anos,
alterando a causa de aumento da pena do parágrafo único, que passou a determinar
o aumento de pena de até a metade se a associação é armada ou se houver a
participação de criança ou adolescente.
Entende-se por associação criminosa a união estável e
permanente de, no mínimo, três pessoas com o objetivo praticar uma série 103
Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes.
54
indeterminada de crimes. De acordo com o artigo 288 do Código Penal, a quadrilha
ou bando é um crime autônomo, que se consuma independentemente da prática de
qualquer delito planejado pelos integrantes do grupo criminoso. Destaca-se que na
prática é muito difícil, quase impossível, desorganizar uma quadrilha antes que ela
pratique ao menos um crime. O que ocorre, na maioria das vezes, é se a quadrilha
devidamente constituída praticar algum delito, seus membros responderão pelo
crime de associação criminosa (art. 288 do Código Penal) e pelo crime praticado, em
concurso material.
Rogério Sanches Cunha, 104 ensina que:
Associar-se significa reunir-se em sociedade para determinado fim (tornar-se sócio), havendo uma vinculação sólida, quanto à estrutura, e durável, quanto ao tempo (que não significa perpetuidade). É muito mais que um mero ajuntamento ocasional ou encontro passageiro, transitório (típico de concurso de agentes).
Segundo Rogério Greco: 105
Trata-se de crime comum, tanto no que diz respeito ao sujeito ativo quanto ao sujeito passivo; doloso (não havendo previsão para a modalidade de natureza culposa); comissivo (...); de perigo comum e concreto (embora haja divergência doutrinária nesse sentido, pois que se tem entendido, majoritariamente, tratar-se de crime de perigo abstrato, presumido); de forma livre; permanente, plurissubjetivo, plurissubsistente (...); transeunte (como regra, pois na maioria dos casos não será necessária a prova pericial).
Dessa forma, alguns comentários merecem ser tecidos em
relação à mudança trazida pela Lei 12.850/13 ao crime tipificado no artigo 288 do
Código Penal quanto ao número de agentes, diminuiu-se de quatro para três, porém,
foi incluído o fim “específico”, qualificando o fim da associação de pessoas.
Antes da alteração, não era necessário que o fim da
associação fosse à prática de crimes. Agora, porém, a prática do delito tipificado no
artigo 288 do Código Penal só se configura se houver o fim específico da execução
de crimes.
104
CUNHA, Rogério Sanches. Direito penal: Parte Especial, 4 ed, Salvador: Jus Podium, 2012, p. 644.
105 GRECO, Rogério. Código penal comentado. p. 865.
55
2.6 DIFERENÇAS ENTRE CRIMES PRATICADOS POR ORGANIZAÇÕES
CRIMINOSAS E POR ASSOCIAÇÕES CRIMINOSAS
Para se distinguir qual tipo penal aplicar ao caso concreto, é
preciso lançar mão do princípio da especialidade. Como a Lei das Organizações
Criminosas é especial em relação ao Código Penal, é necessária a verificação da
existência de determinados requisitos para que o delito se enquadre no artigo 2º da
Lei 12.850/2013 ou na regra geral do artigo 288 do Código Penal.
Segundo Adel El Tasse: 106
A aplicação da Lei nº 12.850/2013, no aspecto da tipificação de organizações criminosas, bem como na habilitação dos métodos excepcionais que disciplina, fica vinculada ao atendimento das seguintes exigências: a) formação de grupo de, no mínimo, quatro pessoas; b) prática, por esse grupo, de infração penal cuja pena máxima seja superior a quatro anos; c) comprovação da existência de organização estrutural do grupo; d) comprovação da existência de divisão de tarefas entre os integrantes do grupo; e) finalidade da organização de obtenção de qualquer vantagem, distinta da inerente ao próprio crime meio praticado pelo grupo; f) não atuação com característica paramilitar; g) não atuação como milícia, ou seja, com controle de território ou de pessoas em um território, por meio coativo.
Dessa forma, se não for comprovado qualquer dos requisitos
em destaque, a matéria deve ser analisada sob o aspecto dos artigos 288 ou 288-A
do Código Penal, pois a Lei nº 12.850/2013 defere seus meios investigativos
somente para o crime de organização criminosa.
2.6.1 Roubo qualificado e formação de quadrilha ou bando
O artigo 157, §2º, II, do Código Penal tipifica o crime de roubo
qualificado pelo concurso de pessoas, o qual prescreve que subtrair coisa móvel
alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência à pessoa, ou
depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência a
pena é de reclusão, de quatro a dez anos aumentando-se de um terço até metade
se há o concurso de duas ou mais pessoas.
106
TASSE, Adel El, Nova Lei de Crime Organizado, agosto de 2003. Disponível em: http://atualidadesdodireito.com.br/adeleltasse/2013/08/22/nova-lei-de-crime-organizado/. Acesso em 01 de maio de 2014.
56
Apesar de ainda existir certa divergência doutrinária e
jurisprudencial, tem-se firmado o entendimento de que não ocorre o bis in idem,
dupla punição, quando o réu é condenado pelos crimes de associação criminosa
(antiga quadrilha ou bando) e roubo qualificado pelo concurso de pessoas, pois
tratam-se de infrações distintas e independentes, que protegem bens jurídicos
diversos, quais sejam, a paz pública e o patrimônio.
Neste sentido, Weber Martins Batista 107 o qual, ao tratar sobre
a qualificadora no concurso de agentes para o crime de roubo e o crime de quadrilha
ou bando, entende que:
A associação de quatro ou mais pessoas para a prática de crimes, indeterminadamente, não é imprescindível, não é meio necessário à prática de roubo em concurso de agentes. A razão da incriminação daquele crime e o motivo de agravamento da pena deste último derivam de razões diferentes. Num caso, busca-se proteger o sentimento de tranquilidade e segurança das pessoas, bem jurídico que é atingido mesmo quando não se chega a ser praticado nenhum dos delitos que eram a razão da associação. No outro, no roubo qualificado pelo concurso de agentes, a punição mais severa visa a evitar maior facilidade do cometimento do crime, o que ocorre quando são dois ou mais executores. Sendo assim, porque diversa a vontade do Estado, ao definir os fatos puníveis, e diferentes os bens jurídicos protegidos pelas pessoas atingidas, não há como falar, na hipótese, em progressão criminosa ou em crime progressivo, em antefato ou pós-fato impuníveis.
Em sentido contrário está o doutrinador Rogério Greco 108, o
qual entende que:
A reunião de pessoas estará servindo, duas vezes, à punição dos agentes, razão pela qual, mesmo havendo a possibilidade de, no caso concreto, até receberem penas menores, situação não incomum no Código Penal, não podemos tolerar o bis in idem. Sendo assim, somos partidários da segunda posição, que não permite o concurso entre o crime de quadrilha ou bando com qualquer outra infração penal em que o concurso de pessoas é utilizado como qualificadora ou majorante.
107
BATISTA, Weber Martins. O Furto e o Roubo no Direito e no Processo Penal, 2 ed., Rio de Janeiro, Forense, 1995, p. 265-266.
108 GRECO, Rogério. Código penal comentado. p. 867-868.
57
A jurisprudência ainda não é totalmente pacífica quanto ao
tema. No sentido de que não pode haver concurso entre os tipos penais em estudo,
há o seguinte julgado:
Não pode haver concurso entre quadrilha e roubo, ambos qualificados por concurso de pessoas ou emprego de armas, pois redundaria em dupla qualificação pelo mesmo fato.109
Porém, vem se consolidando em nossos tribunais o
entendimento de que é possível o concurso entre os crimes dos artigos 288 e 157,
§2º, II, ambos do Código Penal. Nesse sentido é o entendimento da 5ª turma do
Superior Tribunal de Justiça:
Não há o que se falar em bis in idem na condenação por crime de quadrilha armada e roubo qualificado pelo uso de armas e concursos de pessoas, tendo em vista a autonomia e independência dos delitos.110
Assim, conforme a análise dos julgados, os tribunais entendem
que não há dupla punição aos infratores em concurso de crimes entre os delitos de
roubo e quadrilha ou bando, pois são infrações autônomas e distintas inclusive sobre
os bens jurídicos tutelados. Ademais, a formação de quadrilha ou bando, constitui
crime de perigo abstrato e o delito de roubo qualificado pelo uso de arma e pelo
concurso de pessoas configura perigo concreto.
2.6.2 Associação criminosa em outros tipos penais previstos no ordenamento
jurídico pátrio
A associação criminosa prevista no artigo 288 do Código Penal
tem sempre o fim de cometer crimes em geral. Já a prevista em leis especiais, por
exemplo, art. 35 da Lei nº 11.343/06 – Lei de Drogas e artigos 16 e 24 da Lei nº
109
STF, 1ª Turma, Rel. Min. Néri da Silveira, data do julgamento: 31/08/1984, DJU 28.6.85. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28HC%24.SCLA.+E+62563.NUME.%29+OU+%28HC.ACMS.+ADJ2+62563.ACMS.%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/c4lhoan. Acesso em 10 de maio de 2014.
110 STJ, 5ª Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, data do julgamento: 17/08/2006, DJU 11.9.2009. Disponível
em: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=2457095&num_registro=200600170429&data=20060911&tipo=51&formato=PDF. Acesso em 10 de maio de 2014.
58
7170/83 – Lei de segurança nacional, aqui não há numero mínimo de integrantes
que se destinam ao cometimento de crimes específicos. Assim, como a antiga
quadrilha, a associação prevista em leis especiais é crime autônomo, que se
consuma independentemente da prática dos crimes definidos em lei.
Dessa forma, serão abordadas as principais características
acerca das leis supracitadas, iniciando com comentários a respeito da Lei 11.343/06,
conhecida como Lei de drogas.
2.6.2.1 Associação para o tráfico – artigo 35 da lei nº 11343/2006
A Lei de Tóxicos, no seu artigo 35 111 prevê o crime de
associação para o tráfico.
Da letra fria da lei pode-se afirmar que, para a configuração do
delito de associação para o tráfico é necessário o vínculo estável entre pelo menos
dois agentes para a prática dos crimes previstos no artigo 33, caput e §1º e artigo
34, da Lei Antidrogas.
O bem jurídico tutelado no crime de associação para o tráfico é
a saúde pública.
Não obstante possua a mesma natureza jurídica do crime
tipificado no artigo 288 do Código Penal, o tipo penal de associação para o tráfico
apresenta duas particularidades em relação à associação prevista no Código Penal:
número mínimo de dois participantes na empreitada criminosa e o propósito
direcionado à prática específica dos dois tipos de crimes de tráfico ilícito de drogas
previstos na Lei Antidrogas (artigo 33, caput e §1º, e artigo 34).
Trata-se de crime comum e de perigo presumido: pode ser
praticado por qualquer pessoa imputável. Para que a tutela penal se aplique, basta
apenas que duas ou mais pessoas se associem com a finalidade de praticar as três
espécies de crime relacionadas ao tráfico ilícito de drogas, estabelecidas nos artigos
34, 35 e 36 da Lei 11343/2006.
111
Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1
o, e 34 desta Lei [...]
59
É crime plurissubjetivo, de concurso necessário ou de condutas
paralelas. No caso, não se trata de coautoria, mas de crime coletivo (no mínimo,
dois agentes) praticado em conjunto. É crime formal (para a sua consumação, não
importa se os crimes pretendidos ou planejados chegaram a ser praticados) e
permanente.
Oportuno o ensinamento do Mestre Nelson Hungria: 112
Não obstante, refira-se ao antigo crime de quadrilha ou bando, também vale para o delito de associação para o tráfico: o momento consumativo do crime é o momento associativo, pois com este já se apresenta um perigo suficientemente grave para alarmar o público ou conturbar a paz ou tranqüilidade de ânimo da convivência civil.
Por ser tipo penal autônomo, em razão do perigo presumido
apresentado pela simples associação criminosa, a lei incrimina e pune a mera
conduta do indivíduo que participa ou adere a um grupo de, no mínimo, dois
agentes, que estão com o intuito de praticar os crimes previstos na Lei nº
11343/2006. Se o grupo vier a cometer os crimes planejados, os membros
responderão por estes em concurso material com o delito de associação para o
tráfico, artigo 35 da Lei nº 11.343/2006.
2.6.2.2 Aplicabilidade do artigo 8º da Lei 8.072 de 1990, crimes hediondos,
diante da Lei 11.343 de 2006, Lei de tóxicos
O artigo 8º da Lei nº 8072/90 dispõe que será de três a seis
anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de
crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou
terrorismo.
Uma questão surgiu da análise do artigo 35 da Lei Antidrogas
em cotejo com o artigo 8º da Lei dos Crimes Hediondos: seria o delito de associação
para o tráfico um crime hediondo? A resposta seria não.
Primeiro, porque como a Lei 11.343/2006 é posterior, ela
revoga as disposições em contrário às suas normas, como é o caso do artigo 8º da
112
HUNGRIA, Nelson e FRAGOSO, Heleno Cláudio. Comentários ao Código Penal, Rio de Janeiro: Forense, 1980, v. 4, p. 177.
60
Lei 8072/90. Segundo, porque a nova Lei Antidrogas é especial, específica, criando
seus próprios tipos penais, assim como um rito processual próprio. Assim, retirou o
crime de tráfico ilícito propriamente dito e os seus tipos associados do campo de
incidência da Lei dos Crimes Hediondos. Portanto, o crime de associação para o
tráfico deve ser tratado apenas no âmbito da Lei 11.343/2006.
Concluindo, a partir da entrada em vigor da Lei nº 11343/2006,
o artigo 8° da Lei nº 8072/90 aplica-se apenas aos crimes hediondos cometidos em
quadrilha ou bando, mas não aos participantes da associação criminosa descrita no
artigo 35 da Lei Antidrogas.
2.6.2.3 Constituição de milícia privada – artigo 288 – A do Código Penal
O delito de constituição de milícia privada foi inserido no nosso
ordenamento jurídico pela Lei nº 12.720, de 27 de setembro de 2012, que
acrescentou o artigo 288-A ao Código Penal. 113
Rogério Greco 114 entende que:
Paramilitares são associações ou grupos não oficiais, cujos membros atuam ilegalmente, com o emprego de armas, com estrutura semelhante à militar. Atuam, ilegal e paralelamente as forças policiais e/ou militares. Essas forças paramilitares utilizam as técnicas e táticas policiais oficiais por elas conhecidas, a fim de executarem seus objetivos anteriormente planejados. Não é raro ocorrer – e, na verdade, acontece com frequência – que pessoas pertencentes a grupos paramilitares também façam parte das forças militares oficiais do Estado, a exemplo de policiais militares, bombeiros, policiais civis e federais.
Milícia armada, segundo Marcelo Rodrigues da Silva 115,
citando Rogério Sanches Cunha é um:
Grupo de pessoas (civis ou não) armado, tendo como finalidade (anunciada) devolver a segurança retirada das comunidades mais
113
Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código.
114 GRECO, Rogério. Comentários sobre o Crime de Organização de Milícia Privada: Art, 228-A
do Código Penal. Disponível em: http://www.rogeriogreco.com.br/?p=2179. Acesso em 03 de maio de 2014.
115 SILVA, Marcelo Rodrigues da. Constituição de milícia privada. Artigo 288-a do Código Penal:
uma lei fadada ao fracasso? Comentários à Lei nº 12.720/2012. 16 de outubro de 2012. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/22822. Acesso em 03 de maio de 2014.
61
carentes, restaurando a paz. Para tanto, mediante coação, os agentes ocupam determinado espaço territorial. A proteção oferecida nesse espaço ignora o monopólio estatal de controle social, valendo-se de violência e grave ameaça.
Por falta de uma lei regulamentando esse tipo penal, coube à
doutrina e a jurisprudência a tarefa de aplicar o tipo penal ao caso concreto. Uma
das problemáticas que se apresenta é em relação ao número mínimo de
participantes para se entender como configurado o tipo penal previsto no artigo 288-
A do Código Penal.
Existem duas correntes: 116
A 1ª corrente entende que o número mínimo seria de três pessoas, uma vez que não se pode cogitar a existência de um grupo de uma ou duas pessoas. Para a 2ª corrente, o número mínimo seria de três pessoas utilizando-se de uma interpretação sistemática com o crime de associação criminosa, previsto no artigo 288 do Código Penal.
Ademais, outro ponto importante é não confundir concurso de
pessoas com o crime de milícia privada. A principal diferença é que no concurso de
pessoas, a associação é momentânea, na constituição de milícia privada, a
associação é estável e permanente para a prática dos crimes.
2.6.2.4 Extorsão mediante sequestro na sua forma qualificada
O crime de extorsão mediante sequestro na sua forma
qualificada, descrito no artigo 159 do Código Penal, determina que sequestrar
pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como
condição ou preço do resgate resulta em pena de reclusão, de oito a quinze anos. O
§ 1º do referido artigo prescreve um aumento de pena se o sequestro dura mais de
vinte e quatro horas ou se o sequestrado é menor de dezoito ou maior de sessenta
anos, ou se o crime é cometido por bando ou quadrilha.
Não obstante o artigo não ter alterado o seu texto, eis que o
crime de quadrilha ou bando não mais existe, tendo sido modificado pela novel Lei
12.850/2013 para associação criminosa, o que houve foi apenas uma modificação
116
SILVA, Marcelo Rodrigues da. Constituição de milícia privada. Artigo 288-a do Código Penal: uma lei fadada ao fracasso? Comentários à Lei nº 12.720/2012. 16 de outubro de 2012. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/22822. Acesso em 03 de maio de 2014.
62
do nomen iuris, denominação jurídica, do crime previsto no artigo 288 do Código
Penal.
A doutrina diverge se há ou não ocorrência de bis in idem na
aplicação de concurso de crimes entre os artigos 159, §1º e 288 do Código Penal.
A corrente minoritária entende que não é possível a existência
de concurso material entre a extorsão mediante sequestro qualificada e o crime de
associação criminosa, pois estaria ocorrendo bis in idem.
Esse é o entendimento de Rogério Sanches Cunha. 117 Para o
doutrinador:
O §1º qualifica o crime quando é cometido por quadrilha ou bando. Aqui, como se pode notar, justifica-se a elevação da pena em razão da maior periculosidade ostentada pelos agentes. Obviamente não se aplica o tipo do art. 288 do CP, evitando-se o bis in idem.
Já para a corrente majoritária não existe o bis in idem ao se
aplicar os dois artigos para um mesmo delito.
Fernando Capez 118 é adepto dessa corrente, para quem:
Não há que se falar em bis in idem, uma vez que os momentos consumativos e a objetividade jurídica entre tais crimes são totalmente diversos, além do que a figura prevista no artigo 288 do Código Penal existe independentemente de algum crime vir a ser praticado pela quadrilha ou bando. Do mesmo modo que não há dupla apenação entre associação criminosa [...] e o tráfico por ela praticado, aqui também incide a regra do concurso material.
Rogério Greco 119 também entende pela possibilidade da
ocorrência do concurso, pois:
Que a própria lei penal foi quem se referiu ao crime cometido por quadrilha ou bando, já reconhecendo, anteriormente, a sua existência. Assim, a maior gravidade residiria justamente no fato de ter sido praticado pelo grupo criminoso, não reunido eventualmente com esse propósito, mas sim unido, de forma duradoura, para a
117
CUNHA, Rogério Sanches. Direito Penal: Parte Especial, 4 ed., Salvador: Jus Podium 2012, p. 288.
118 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, 2 ed. São Paulo: Saraiva 2003, v. 2, p. 414.
119 GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 7 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2013, p. 509.
63
prática de um número indeterminado de crimes, podendo-se contar, entre eles, o delito de extorsão mediante sequestro.
A jurisprudência majoritária também entende pela inocorrência
de bis in idem. Cito o seguinte julgado, a título exemplificativo:
[...] É perfeitamente possível a coexistência entre o crime de formação de quadrilha ou bando e o de extorsão mediante sequestro pelo concurso de agentes, porquanto os bens jurídicos tutelados são distintos e os crimes, autônomos. Precedentes do STF. Não há falar em bis in idem no caso porque, enquanto a formação de quadrilha ou bando, tipificado, aliás, em sua forma simples, constitui crime de perigo abstrato, o delito de roubo qualificado pelo uso de arma e pelo concurso de pessoas configura perigo concreto. [...]120
No mesmo sentido é o entendimento do Tribunal de Justiça de
Santa Catarina ao julgar a seguinte apelação criminal:
[...] Alegação de bis in idem diante da condenação pela formação de quadrilha (art. 288 do CP) e sequestro majorado pelo concurso de agentes (art. 159, § 1º, do CP). Não ocorrência. Delitos autônomos. Distinção dos bens jurídicos tutelados pelas normas penais incriminadoras. Condenações mantidas. Dosimetria acertada. Circunstâncias do art. 59 do CP devidamente aplicadas. Pleito de concessão do direito de recorrer em liberdade. Inacolhimento. Permanência dos acusados segregados durante toda a instrução processual. Presença dos requisitos do art. 312. Sentença mantida. Recurso desprovido.121
Dessa forma, após a análise da doutrina e jurisprudência, a
respeito da divergência na aplicação de concurso de crimes, adiante será abordado
o tema referente ao crime de genocídio com a participação de concurso de pessoas.
Assim, após terem sido analisados alguns crimes praticados
por organizações criminosas previstos em nosso ordenamento jurídicos, o presente
trabalho, em seu próximo capítulo, apresentará como o tema do conceito legal de
organização criminosa vem sendo tratado pelos nossos tribunais.
120
STJ, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em: 07/12/2010, DJE de 17/12/2010. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&Seq=13082937&sReg=200802752933&sData=20101217&sTipo=5&formato=PDF. Acesso em 10 de maio de 2014.
121 TJSC, rel. Des. Sérgio Izidoro Heil, julgado em: 18-12-2012. Disponível em:
http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/busca.do#resultado_ancora. Acesso em 10 de maio de 2014.
64
CAPÍTULO 3
O CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA NA DOUTRINA E
NOS TRIBUNAIS PÁTRIOS
3.1 O CONCEITO LEGAL DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA EM FACE AOS
PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E TAXATIVIDADE
Uma primeira questão que surge é se o novo conceito legal de
organização criminosa desrespeita os princípios da legalidade e da taxatividade (ou
mandato de certeza). Para se responder a essa questão, é necessário verificar,
portanto, se o novo conceito trazido pela Lei nº 12.850/2013 está de acordo com o
princípio da legalidade, especificamente com a proibição de leis e penas
indeterminadas, isto é, se não é impreciso ou amplo demais.
O Direito Penal tem como uma de suas principais
características o seu formalismo ao extremo. Desse formalismo, surgiu o princípio da
legalidade, voltado a “transformar a intervenção penal em um exercício de poder
controlado.” 122 O princípio da legalidade funciona para evitar punições arbitrárias ou
baseadas em leis imprecisas ou retroativas.
Um dos postulados do princípio da legalidade é a proibição de
leis penais e de penas indeterminadas. É o chamado princípio da taxatividade.
O princípio da legalidade se realiza por meio da descrição de
condutas proibidas em tipos legais, isto é, através da tipificação das condutas que se
quer proibir. Assim, o tipo cumpre a sua função de garantia do princípio quando é
redigido de maneira clara, que da simples leitura do texto possa-se saber, com
certeza, qual conduta é proibida.
122
CASTANHEIRA, Beatriz Rizzo. Organizações Criminosas no Direito Penal Brasileiro: o estado de prevenção e o princípio da legalidade estrita. São Paulo: Revista Brasileira de Ciências Criminais, outubro-dezembro/1998, p. 112.
65
Portanto, conclui-se que um dos principais objetivos deste
princípio é que o legislador utilize uma linguagem clara e precisa na redação das
normas penais.
Anteriormente à existência de conceito legal de organização
criminosa em nosso ordenamento jurídico, Guilherme de Souza Nucci rechaçava a
aplicação do conceito elaborado pela Convenção de Palermo. Segundo o referido
doutrinador: 123
Esta Lei representa outra construção casuística, sem respeito ao princípio da taxatividade. A lacuna advém da ausência de definição do que vem a ser organização criminosa. A ilogicidade foi a equiparação, para os mesmos fins, desse tipo de empresa-crime à quadrilha ou bando e à genérica expressão associação criminosa de qualquer tipo. Por isso, pode-se definir a organização criminosa como a atividade delituosa exercitada em formato ordenado e estruturado, podendo ser constituída por qualquer número de agentes, desde que, no mínimo, existam duas pessoas associadas para tanto.
Para Luiz Flávio Gomes, 124 o conceito de organização
criminosa trazido pela Lei nº 12.850/2013 fere o princípio da legalidade (porém, com
reservas, em razão das expressões vagas que utiliza). Ainda afirma o doutrinador
que o descumprimento da garantia da taxatividade parece evidente.
Também Adel El Tasse 125 entende que o novo conceito trazido
pela Lei nº 12.850/2013 fere o princípio da taxatividade. Para ele:
No plano teórico, o objetivo de lucro sempre foi apontado como traço indicativo da criminalidade organizada, entretanto o legislador brasileiro optou por uma formulação ampla, contida na expressão com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, o que permite profundo debate sob o ponto de vista do não atendimento ao princípio da taxatividade penal, o que já inquinaria de absoluta inconstitucionalidade o modelo conceitual de organização criminosa hoje existente, em consequência impediria a aplicação do tipo delitivo do artigo 2º, o que representa o efetivo
123
NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 3 ed. São Paulo: RT, 2008, p. 250-251.
124 GOMES, Luiz Flávio. Organização Criminosa: um ou dois conceitos? 19 de setembro de 2013.
Disponível em http://atualidadesdodireito.com.br/lfg/2013/09/19/organizacao-criminosa-um-ou-dois-conceitos-2/. Acesso em: 10 de maio de 2014.
125 TASSE, Adel El. Nova Lei de Crime Organizado. Disponível em
http://www.codigoslex.com.br/doutrina_24840822_NOVA_LEI_DE_CRIME_ORGANIZADO.aspx. Acesso em: 10 de maio de 2014.
66
posicionamento do autor. Finaliza El Tasse dizendo que, em outras palavras, não se pode entender como ‘qualquer vantagem’ algo que integra os elementos estruturais do próprio tipo penal do delito meio da organização criminosa, de sorte que a demonstração de que o agente promocionou, constituiu, financiou ou integrou um grupo de, no mínimo, quatro pessoas para a prática de crime, é insuficiente a atender as exigências do tipo, pois este exige a efetiva demonstração de que o núcleo delitivo foi praticado com uma finalidade específica, não sendo a prática de crime esta finalidade, até porque esta é inerente ao se falar estar diante de um tipo penal, afinal não se pode admitir que a reunião de pessoas para fins lícitos seja delito.
De certa forma, entende-se também ser essa a posição de
Guilherme de Souza Nucci 126 ao afirmar que:
O ponto faltoso da lei é a ausência de especificação da ilicitude da vantagem, pois é absolutamente ilógico o crime organizado buscar uma meta lícita. Afinal, o meio para alcançar a referida vantagem se dá por meio da prática de infração penal, o que demonstra a ilicitude do proveito auferido.
Assim, conclui-se que a parte da doutrina vem se formando no
sentido de entender que o novo conceito de organização criminosa trazido pela Lei
nº 12.850/2013 não respeita, em sua totalidade, o princípio da legalidade, no que
tange à sua taxatividade.
3.2 O PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE SANTA CATARINA E OS
CRITÉRIOS UTILIZADOS PARA CARACTERIZAÇÃO DE ORGANIZAÇÕES
CRIMINOSAS
No âmbito do Estado de Santa Catarina, o Poder Judiciário
local também enfrenta situações em que são julgados grupos que podem vir a
caracterizar uma organização criminosa, como é o caso do PGC.
O PGC (Primeiro Grupo Catarinense) é uma organização
criminosa atuante no estado de Santa Catarina. Essa organização teve início há
cerca de dez anos, na penitenciária de São Pedro de Alcântara, na Grande
Florianópolis, com sorteio de televisões para os intitulados "brothers", como eram
126
NUCCI, Guilherme de Souza. Organização criminosa: comentários à Lei 12.850/2013. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 15.
67
chamados os prisioneiros. Esgotada essa estratégia, o grupo recorreu à violência e
ao extermínio da oposição.
O PGC já organizou duas ondas de ataques nas ruas de
cidades catarinenses. A primeira aconteceu em novembro de 2012, durou uma
semana e atingiu 16 cidades em 58 ataques. A segunda se estendeu por 25 dias e
atingiu 37 cidades do Estado em 112 ataques. Hoje, o PGC conta com quase 2.000
homens em 47 presídios de 36 cidades, segundo o promotor Alexandre Graziotin, do
Ministério Público (MPE-SC). 127
Segundo notícia publicada no sítio UOL Notícias, pelo jornalista
Renan Antunes de Oliveira: 128
O fundador do PGC é o traficante condenado Nelson de Lima, apelidado "Setenta". Ele montou o comando com um "ministério" de 20 detentos e escreveu o estatuto do PGC: cada membro nas ruas deve pagar R$ 100 por mês ao PGC ou 10% de cada assalto. Os ministros ocupam em sua maioria o Pavilhão 4 de São Pedro, oferecendo garantia aos demais presos da facção: ninguém se mete com aqueles que usem a tatuagem de uma carpa, que identifica o PGC. Só não há garantias para delatores e para "duques", apelido dado aos estupradores.
Com a edição da Lei nº 12.850/2013, o Poder Judiciário
catarinense adotou o conceito legal de organização criminosa em casos de crimes
praticados não só pelo PGC, mas também por outras organizações menores. Como
exemplo, o seguinte julgado:
O impetrante sustenta, ainda, a atipicidade penal quanto ao suposto crime de organização criminosa, uma vez que a lei tipificadora deste delito somente entrou em vigor após a data do fato. Para tal aferição, faz-se necessário um breve relato acerca do ocorrido. A Lei n. 12.850/13 entrou em vigor em meados do mês de setembro de 2013. A denúncia narra que a organização criminosa perdurou durante os anos de 2011 e 2013 (fl. 53). Em 24 de outubro de 2013 o paciente teve decretada contra si a prisão preventiva (fl. 90), cujo mandado foi
127
OLIVEIRA, Renan Antunes de. Facção criminosa chega a 10 anos com violência como estratégia de marketing em Santa Catarina. 23 de fevereiro de 2013. Disponível em: http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/02/23/faccao-criminosa-chega-a-10-anos-com-violencia-como-estrategia-de-marketing-em-santa-catarina.htm. Acesso em 04 de maio de 2014.
128 OLIVEIRA, Renan Antunes de. Facção criminosa chega a 10 anos com violência como
estratégia de marketing em Santa Catarina. 23/02/2013. Disponível em: http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/02/23/faccao-criminosa-chega-a-10-anos-com-violencia-como-estrategia-de-marketing-em-santa-catarina.htm. Acesso em 04 de maio de 2014.
68
cumprido em 18 de novembro do referido ano. Nesse contexto, considerando que a organização criminosa trata-se de crime permanente, aplica-se o teor da Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual "a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.129
Abraçando o entendimento de que o crime de organização
criminosa é um crime permanente, o Tribunal de Justiça, no julgado acima, entendeu
pela possibilidade de condenação pela prática do crime, mesmo que ele tenha se
iniciado antes da entrada em vigor da Lei nº 12.850/2013. No mesmo sentido, cito os
doutrinadores Luiz Flávio Gomes e Raúl Cervini. 130
Apesar de na época dos fatos não haver uma conceituação legal do que se entendia por ‘organização criminosa’, não há impedimento para sua caracterização. Isso porque, com os arts. 1º e 2º da Lei n. 9.034/95, o legislador estabeleceu o mínimo, que é o crime de quadrilha ou bando, e deixou por conta do intérprete a tarefa de fixar os restantes contornos da organização criminosa.
Desse modo, o entendimento que vem sendo adotado pelo
Tribunal de Justiça de Santa Catarina é de que o crime de organização criminosa é
o crime de quadrilha ou bando acrescido de algumas características, características
essas que são elementos normativos do tipo.
É importante destacar a diferenciação que o Tribunal de Justiça
de Santa Catarina faz entre o antigo crime de formação de quadrilha (atual
associação criminosa) e o crime de organização criminosa, segundo entendimento
jurisprudencial proferido pelo referido Tribunal:
No primeiro tipo há associação de três ou mais pessoas com a finalidade de cometer crimes. Independentemente da consumação dos delitos a que se propõe a reunião premeditada do grupo já é punível, pois implica abalo à ordem pública. No segundo caso, também há agrupamento de pessoas, mas este se dá de maneira organizada e sofisticada, "com articulação, relações, ordem e objetivo, com intenso respeito às regras e à autoridade do líder" (MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime organizado - aspectos gerais e mecanismos legais. Atlas. 3. ed. São Paulo, 2009, p. 9). A reunião
129
TJSC, rel. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho, julgado em: 01/04/2014. Disponível em: http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/busca.do#resultado_ancora. Acesso em 10 de maio de 2014.
130 GOMES, Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Crime organizado. Revista dos Tribunais. 2. ed. São Paulo,
1997, p. 89-90)
69
remete à organização empresarial, com padrões hierárquicos e previsão de acumulação de riquezas.131
O Desembargador Sérgio Paladino, do Tribunal de Justiça de
Santa Catarina, ao julgar Apelação Criminal nº 2007.060827-8, de 21.09.2009, assim
se pronunciou acerca das características das organizações criminosas:
[...] consideramos como características da organização criminosa as seguintes: a) estabilidade e permanência da associação; b) número mínimo de três membros, sendo mais comum a existência de numerosos integrantes, [...]; c) sofisticação estrutural, embora mínima, com molde e planejamento empresarial, capacidade de adaptação, padrão hierárquico, liderança definida, [...]; d) fim do cometimento de uma série indeterminada de infrações penais, muitas sem vítimas diretas ou com vítimas difusas, pelo objetivo prioritário do lucro, [...]; e) ligação estrutural ou funcional com o Poder Público ou com alguns de seus representantes, preferencialmente autoridades públicas, sobretudo pela corrupção, [...]; f) penetração no sistema econômico, marcada pela formação e promoção do desenvolvimento e da manutenção de mercado econômico paralelo, [...]; g) grande capacidade de perpetração de fraude difusa; h) considerável poder de intimidação, com imposição da regra do silêncio e recurso à violência e a ameaças [...]; i) uso de instrumentos e recursos tecnológicos avançados, principalmente em termos de telecomunicação, informática e armas; j) emprego do assistencialismo, objetivando alcançar algum grau de 'legitimação' social, pela conquista da simpatia, do respeito [...] das comunidades carentes sob sua área de influência, dificultando os mecanismos da persecução penal; k) cultivo de valores e padrões comportamentais compartilhados por uma parcela social; l) territorialidade; m) estabelecimento de uma rede de conexões com outras organizações ou grupos criminosos [...]; n) transnacionalidade ou tendência à transnacionalidade, significando a internacionalização de suas atividades ou operações ilegais, a exemplo da lavagem de dinheiro, [...].132
Desse modo, no entendimento do TJSC, as características
principais de uma organização criminosa, ao julgar casos que envolvam esse tipo
penal, além de outras, são a estabilidade da associação, um mínimo de três
membros, estrutura empresarial e hierárquica, o objetivo de praticar infrações penais
para a consecução de lucro e poder, a ligação com o Poder Público ou com alguns
de seus representantes para a garantia de impunidade, a infiltração no sistema
econômico, o considerável poder de intimidação, a ligação com outras associações
131
TJSC, 2ª câmara criminal, rel. Des. Getúlio Corrêa, julgado em 18/03/2014. Disponível em: http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/busca.do#resultado_ancora. Acesso em 10 de maio de 2014.
132 TJSC, 2ª câmara criminal, rel. Des. Sérgio Paladino, julgado em 18/03/2014. Disponível em:
http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/busca.do#resultado_ancora. Acesso em 10 de maio de 2014.
70
ilícitas além de tendência à transnacionalidade. Cito, como exemplo, o seguinte
julgado:
[...] a organização criminosa pode ser conceituada como a associação estável de três ou mais pessoas, de caráter permanente, com estrutura empresarial, padrão hierárquico e divisão de tarefas, que, valendo-se de instrumentos e recursos tecnológicos sofisticados, sob o signo de valores compartilhados por uma parcela social, objetiva a perpetração de infrações penais, geralmente de elevada lesividade social, com grande capacidade de cometimento de fraude difusa, pelo escopo prioritário de lucro e poder a ele relacionado, mediante a utilização de meios intimidatórios, como violência e ameaças, e, sobretudo, o estabelecimento de conexão estrutural ou funcional com o Poder Público ou com algum(ns) de seus agentes, especialmente via corrupção - para assegurar a impunidade, pela neutralização da ação dos órgãos de controle social e persecução penal -, o fornecimento de bens e serviços ilícitos e a infiltração na economia legal, por intermédio do uso de empresas legítimas, sendo ainda caracterizada pela territorialidade, formação de uma rede de conexões com outras associações ilícitas, instituições e setores comunitários e tendência à expansão e à transnacionalidade, eventualmente ofertando prestações sociais a comunidades negligenciadas pelo Estado. E crime organizado é a espécie de macrocriminalidade perpetrada pela organização criminosa.133
Quanto aos julgamentos de crimes cometidos por associações
criminosas (antigo quadrilha ou bando), o TJSC vem adotando como critério a
efetiva comprovação de vínculo associativo, revestido de estabilidade e
permanência, entre seus integrantes. Nesse sentido:
[...] A associação estável e permanente é a nota característica que diferencia os crimes de quadrilha ou bando do concurso de pessoas (coautoria ou participação) para a prática de delitos em geral. Na quadrilha ou bando é imprescindível o vínculo associativo, revestido de estabilidade e permanência, entre seus integrantes. Em outras palavras, o acordo ilícito entre quatro ou mais pessoas deve versar sobre uma duradoura, mas não necessariamente perpétua atuação em comum, no sentido da realização de crimes indeterminados ou somente ajustados quanto à espécie, que pode ser de igual natureza ou homogênea (exemplo: furtos, estelionatos e apropriações indébitas), mas nunca no tocante à quantidade.134
133
TJSC, 2ª câmara criminal, rel. Des. Getúlio Corrêa, julgado em 18/03/2014. Disponível em: http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/busca.do#resultado_ancora. Acesso em 10 de maio de 2014.
134 TJSC, 2ª câmara criminal, rel. Des. Jorge Schaefer Martins, julgado em: 02/05/2013. Disponível
em:http://app6.tjsc.jus.br/cposg/pcpoSelecaoProcesso2Grau.jsp?cbPesquisa=NUMPROC&Pesquisar=&dePesquisa=20100176427. Acesso em 10 de maio de 2014.
71
De todo o exposto neste tópico, conclui-se que o Tribunal de
Justiça de Santa Catarina vem adotando como critério, nos julgamentos de crimes
cometidos por associações criminosas (antigo quadrilha ou bando), a efetiva
comprovação de vínculo associativo, revestido de estabilidade e permanência, entre
seus integrantes. Tem entendido também ser possível a condenação por crime de
organização criminosa mesmo que a conduta seja anterior à entrada em vigor da Lei
nº 12.850/2013, sob o argumento de que se trata de crime permanente, a teor do
disposto na Súmula 711 do STF.
Tem o TJSC entendido, ainda, que a organização criminosa é o
crime de quadrilha ou bando acrescido de algumas características, que seriam os
elementos normativos do tipo.
Porém, um julgado recente do Superior Tribunal de Justiça
pode vir a mudar o entendimento do TJSC em relação à possibilidade de ocorrência
do delito de organização criminosa para fatos ocorridos antes da entrada em vigor
da Lei nº 12.850/2013. É o que será apresentado a seguir.
3.3 APLICABILIDADE DO CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA PELO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Naquele que ficou conhecido como o “mais longo julgamento
da história do Supremo Tribunal Federal”, a Ação Penal nº 470 (chamada de
‘mensalão’), discutiu-se sobre a inexistência de definição, no ordenamento jurídico
brasileiro, do termo organização criminosa, o que implicaria reconhecimento da
ilegalidade quanto à imputação pelo crime de lavagem de dinheiro, que possuía
como pressuposto a participação em organização criminosa.
O Ministro do STF, Joaquim Barbosa, não seguiu a
jurisprudência da 1ª Turma daquela Corte, decidindo que o conceito de organização
criminosa poderia ser extraído tanto da Convenção de Palermo quanto do artigo 288
do Código Penal, que tipifica o crime de quadrilha ou bando.
Com esse posicionamento, pairou certa dúvida sobre o
entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca do conceito de organização
72
criminosa. Mas, recentes decisões da Suprema Corte foram no sentido de consolidar
o entendimento firmado quando do julgamento do HC 96007.
Cito, nesse sentido, trechos da decisão proferida pelo Ministro
Celso de Mello, nos autos do HC 111021-PE, Julgamento em 11/10/212, o qual, ao
conceder liminar para suspender o trâmite de ação penal, disse que:
A Constituição da República somente admite a lei interna como única fonte formal e direta de regras de direito penal, aí incluída a definição de noções e diretrizes aplicáveis ao plano da repressão criminal, como a própria formulação conceitual de organização criminosa, e enfatizando que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento (ora em curso) da AP 470/MG, está corroborando essa orientação, fazendo prevalecer juízo absolutório em relação às imputações penais fundadas no inciso VII do art. 1º da Lei nº 9.613/98, na redação anterior ao advento da Lei nº 12.683/2012, por entender inexistente, em nosso ordenamento positivo, legislação interna definidora do conceito de ‘organização criminosa’. Em matéria penal, prevalece o postulado da reserva constitucional de lei em sentido formal, pois – é sempre importante enfatizar – a Constituição da República somente admite a lei interna como única fonte formal e direta de regras de direito penal. Esse princípio, além de consagrado em nosso ordenamento positivo (CF, art. 5º, XXXIX), também encontra expresso reconhecimento na Convenção Americana de Direitos Humanos (artigo 9º) e no Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos (artigo 15), que representam atos de direito internacional público a que o Brasil efetivamente aderiu.135
O entendimento que vinha sendo aplicado pelo Superior
Tribunal de Justiça, em relação ao conceito de organização criminosa, era feito com
base na Convenção de Palermo, da qual o Brasil é signatário. Porém, um acórdão
publicado no dia 05 de maio de 2014, no Recurso em Habeas Corpus nº 38.674,
mostrou um novo entendimento da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça.
Segundo esse entendimento, a organização criminosa não
pode ser usada como crime antecedente do delito de lavagem de dinheiro antes da
edição das leis nº 12.694/2012 e nº 12.850/2013, que incluíram o conceito de
organização criminosa no âmbito da legislação pátria.
135
STF, rel. Min. Celso de Mello, julgado em: 11/10/2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28HC%24%2ESCLA%2E+E+111021%2ENUME%2E%29&base=baseMonocraticas&url=http://tinyurl.com/c4ot7z9. Acesso em 10 de maio de 2014.
73
Esse novo entendimento da 6ª Turma trancou processo que
acusa um casal de São Paulo da prática do crime de lavagem de dinheiro por fatos
ocorridos em 2006 (antes da edição das leis nº 12.694/2012 e 12.850/2013). Os
ministros entenderam que o processo só deve continuar em relação à acusação pelo
delito de falsidade ideológica.
Segundo notícia publicada por Felipe Luchete, no site
Consultor Jurídico:
Ao avaliar Recurso em Habeas Corpus no dia 24 de abril, o colegiado considerou ‘inviável a responsabilização criminal [dos réus], visto a atipicidade da conduta narrada na exordial acusatória, pois, à época dos fatos, [era] carente a descrição normativa do que seria compreendido por organização criminosa’. A decisão foi unânime. O pedido foi feito pelos advogados Gustavo Cambauva e Rubens Contador Neto, do escritório Cambauva & Contador. Eles recorreram contra acórdão da 2ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça paulista, que negara o trancamento. ‘A decisão é importante porque abriu um precedente no STJ, com reflexo em outros processos em andamento’, afirma Cambauva. [...] a própria ministra Maria Thereza de Assis Moura, relatora do caso, diz em seu voto que havia entendimento contrário na 6ª Turma. O colegiado reconhecia que a organização criminosa já estava definida no ordenamento jurídico pelo Decreto 5.015/2004, que ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, conhecida como Convenção de Palermo. Tese semelhante foi adotada pela 5ª Turma, como no HC 171.912.136
O Supremo Tribunal Federal já havia reconhecido a atipicidade
do crime de organização criminosa quando do julgamento do HC 96.007 pela 1ª
Turma. Na ocasião, o ministro Marco Aurélio disse não ser possível a aplicação da
hipótese prevista no artigo 1º, inciso VII, da Lei 9.613/1998 (a organização criminosa
era um dos crimes antecedentes necessários para a configuração do crime de
lavagem de dinheiro) Aliás, todos os incisos do artigo 1º da Lei 9.613/1998 foram
revogados pela Lei 12.683/2012.
A ministra Maria Thereza de Assis Moura, relatora do RHC nº
38674, afirmou que o Supremo Tribunal Federal firmou posicionamento sobre o
tema no julgamento da Ação Penal 470, conhecida como “o processo do mensalão”.
136
LUCHETE, Felipe. STJ diz não haver organização criminosa antes de 2012. 08 de maio de 2014. Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-mai-08/stj-reconhece-inexistencia-organizacao-criminosa-antes-lei-especifica. Acesso em 10 de maio de 2014.
74
Nesse julgamento, o Supremo considerou que “seria incabível apropriar-se da
definição do crime de quadrilha para delimitar a consistência da famigerada
organização criminosa”.
A seguir, transcrevo parte do voto proferido pela Ministra Maria
Thereza de Assis Moura, no RHC nº 38674:
Não obstante anterior entendimento desta Sexta Turma, torna-se inviável a responsabilização criminal, visto a atipicidade da conduta narrada na exordial acusatória, pois, à época dos fatos, carente a descrição normativa do que seria compreendido por organização criminosa, considerado crime antecedente à lavagem de dinheiro. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. [...] De se notar que, com o advento da Lei n.º 12.850/13, de 5.8.2013, pá de cal pôs-se na discussão sobre a consistência do termo ‘organização criminosa.
O Superior Tribunal de Justiça adotava o entendimento de que
o conceito de organização criminosa estava previsto no nosso ordenamento jurídico
desde o Decreto nº 5.015, de 12 de março de 2004, que promulgou o Decreto
Legislativo nº 231, de 29 de maio de 2003, que, por sua vez, ratificou a Convenção
das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de
Palermo). Nesse sentido:
O inciso VII do art. 1º da Lei nº 9.613/98, com redação anterior a Lei 12.683/2012, não se refere a ‘organização criminosa’ como um crime antecedente do crime de lavagem de ativos, pois inexiste esse tipo penal no direito brasileiro. O referido dispositivo se refere a um crime praticado por uma organização criminosa, ‘sujeito ativo’ que se encontra definido no ordenamento jurídico pátrio desde o Decreto n.º 5.015, de 12 de março de 2004, que promulgou o Decreto Legislativo n.º 231, de 29 de maio de 2003, o qual ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo) e, atualmente, está conceituado pela Lei 12.683/2012. O conceito de organização criminosa funciona como um elemento normativo desse tipo penal.137
Porém, ao julgar o HC nº 96.007/SP, o Supremo Tribunal
Federal adotou entendimento diverso, ou seja, de que à época não existia no
ordenamento jurídico pátrio previsão normativa suficiente para se concluir pela
existência do crime de organização criminosa. O aresto restou assim ementado:
137
STJ, 6ª Turma, rel. min. Alderita Ramos de Oliveira, julgado em 18/12/2012. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=25510402&sReg=201001913605&sData=201303&sTipo=51&formato=PDF. Acesso em 10 de maio de 2014.
75
TIPO PENAL – NORMATIZAÇÃO. A existência de tipo penal pressupõe lei em sentido formal e material. LAVAGEM DE DINHEIRO – LEI Nº 9.613/98 – CRIME ANTECEDENTE. A teor do disposto na Lei nº 9.613/98, há a necessidade de o valor em pecúnia envolvido na lavagem de dinheiro ter decorrido de uma das práticas delituosas nela referidas de modo exaustivo. LAVAGEM DE DINHEIRO – ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E QUADRILHA. O crime de quadrilha não se confunde com o de organização criminosa, até hoje sem definição na legislação pátria.138
Porém, essa tese ainda não estava pacificada, especialmente
porque ainda pendia de julgamento a Ação Penal nº 470, da relatoria do Ministro
Joaquim Barbosa, na qual o tema era debatido.
Após o julgamento da conhecida ação penal do “mensalão”, o
pleno do Supremo Tribunal Federal firmou posicionamento no sentido da
necessidade de um tipo penal próprio para o crime de organização criminosa, o que
não existia ao tempo dos fatos descritos na referida ação penal. Salientou, ainda,
que não seria possível utilizar-se a definição do crime de quadrilha para caracterizar
a existência de organização criminosa.
Para finalizar, transcrevo parte do voto-vista do Ministro
Rogério Schietti Cruz, proferido no Recurso de Habeas Corpus acima referido, sobre
a conceituação de organização criminosa:
Outrossim, atento à novel jurisprudência da Corte Suprema, entendo, que, por respeito ao princípio da legalidade, disposto no artigo 5º, XXIX da Constituição Federal, restaria incabível a tipificação da conduta dos recorrentes como integrantes de organização criminosa sem um tipo penal que a definisse. [...] Não se pode olvidar que com a entrada em vigor da Lei n. 12.683/2012 – que exclui o rol taxativo dos delitos antecedentes à lavagem de dinheiro – e da Lei n. 12.850/2013 – que conceituou organização criminosa -, caiu por terra toda a discussão acerca desse tema. Entretanto, no caso em tela, os delitos descritos na inicial acusatória ocorreram ‘no período compreendido entre os meses de março de 2002 e janeiro de 2011’ (fl. 28), portanto, antes da entrada em vigor dos mencionados dispositivos legais e, consequentemente, antes da definição legal de organização criminosa em nosso ordenamento jurídico.139
138 STF, 1ª Turma, rel. Min. Marco Aurélio, julgado em: 12/06/2012. Disponível em: http://redir.stf.jus/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=3390584. Acesso em: 10 de maio de 2014.
139 STJ, Min. Rogério Schietti Cruz. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=34668789&num_registro=201301745496&data=20140505&tipo=3&formato=PDF. Acesso em 10 maio de 2014.
76
Da análise dos julgados recentes do STF, observamos que o
entendimento que vem prevalecendo é o de que o crime de organização criminosa,
antes da entrada em vigor da Lei nº 12.850/2013, consistia em um conceito muito
vago. E isso feria o princípio da legalidade, pois não existia a definição do tipo penal
de organização criminosa na legislação brasileira, indispensável para a
criminalização do comportamento do agente.
Prevalecente, então, o entendimento do STF de que, quando
se trata de matéria penal, prepondera o princípio da reserva constitucional de lei em
sentido formal, ou seja, a nossa Constituição da República Federativa do Brasil
somente admite a lei interna como única fonte direta e formal do Direito Penal.
Desse modo, de acordo com a nova jurisprudência dos
Tribunais Superiores e, em atenção ao princípio da legalidade, disposto no artigo 5º,
XXXIX da Constituição Federal, incabível a condenação sobre o argumento de ser
integrante de organização criminosa sem um tipo penal que a definisse.
Assim, verifica-se que houve essa recente mudança de
entendimento acerca da aplicação do conceito de organização criminosa pelos
Tribunais Superiores pátrios, que vinham entendendo ser possível aplicar a definição
de organização criminosa descrita na Convenção de Palermo, mas que, com o
advento da Lei nº 12.850/2013, agora entendem que somente é possível o
processamento do indivíduo pela prática do crime de organização criminosa, quando
tal ocorreu após a vigência da referida lei.
77
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O crime organizado é um fenômeno atual e globalizado, que
deve ser combatido. Inegável que a Lei nº 12.850, de 02 de agosto de 2013 veio
preencher uma lacuna existente no ordenamento jurídico brasileiro: a definição legal
do que vem a ser uma “organização criminosa”, não obstante tal termo já existisse
na legislação penal e processual penal. A nova lei criminalizou a conduta de
simplesmente “pertencer” a uma organização criminosa.
Para melhor explanação do tema, dividiu-se o trabalho em três
capítulos.
No primeiro foram abordadas as origens das organizações
criminosas, como esse tipo de criminalidade surgiu e evolui no decorrer do tempo
até atingir as proporções atuais. Como ela está impregnada em vários países do
mundo, como os Estados Unidos, a Itália e o Japão. Foi relatado também como o
crime organizado age no Brasil, através do PCC e do Comando Vermelho.
O segundo capítulo tratou das formas de concursos de
pessoas, suas teorias, requisitos e espécies. Também foram vistos os princípios
basilares que norteiam nosso ordenamento jurídico.
Ainda no capítulo dois, foi apresentada a evolução do conceito
de organização criminosa, mostrando os diversos tipos de delitos que podem ser
praticados por grupos criminosos, como, por exemplo, a extorsão mediante
sequestro e a associação para o tráfico.
No terceiro e último capítulo a abordagem concentrou-se em
como a doutrina e jurisprudência pátrias vem entendendo e aplicando o conceito
legal de organização criminosa, trazido pela lei nº 12.850/2013. Assim, foram
analisados alguns julgados recentes dos nossos tribunais, incluindo recente decisão
proferida em maio de 2014, pelo STJ, no RHC nº 38674 acerca da aplicabilidade do
novo conceito legal de organização criminosa.
78
Por fim, retomam-se as perguntas e a hipóteses apresentadas
na introdução:
Pergunta – O conceito trazido pela lei 12.850/2013 fere o
princípio da legalidade, no que tange à taxatividade?
1ª hipótese – Embora seja um conceito trazido por uma lei
recente, alguns doutrinadores, como Luiz Flávio Gomes, já se manifestaram sobre o
tema, entendendo que há o descumprimento da garantia da taxatividade. Isto porque
a expressão “associação estruturalmente ordenada” necessitaria de uma
interpretação por parte do juiz. Outro ponto apontado como descumpridor do
princípio da taxatividade penal seria a formulação ampla, contida na expressão com
objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, o que
tornaria inconstitucional o atual conceito legal de organização criminosa. A hipótese
foi confirmada.
Pergunta – O Tribunal de Justiça de Santa Catarina utiliza
como critério no julgamento de crimes cometidos por organizações criminosas a
conduta delitiva anterior à vigência da Lei nº 12.850/2013?
2ª hipótese – O estudo feito na presente monografia
demonstrou que o Tribunal de Justiça de Santa Catarina adota como critério, nos
julgamentos de crimes cometidos por associações criminosas (antigo quadrilha ou
bando), a efetiva comprovação de vínculo associativo, revestido de estabilidade e
permanência, entre seus integrantes. Tem entendido também ser possível a
condenação por crime de organização criminosa mesmo que a conduta seja anterior
à entrada em vigor da Lei nº 12.850/2013, sob o argumento de que se trata de crime
permanente, a teor do disposto na Súmula 711 do STF, pois entende que a
organização criminosa nada mais é que o crime de quadrilha ou bando acrescido de
algumas características, que seriam os elementos normativos do tipo. Hipótese
confirmada.
Pergunta – O conceito de organização criminosa previsto na
Lei nº 12.850/2013 pode retroagir para alcançar fatos ocorridos antes da sua
edição?
79
3ª hipótese – Aos poucos, vem se formando a jurisprudência
em nossos tribunais acerca da aplicabilidade do conceito de organização criminosa,
agora legitimado pela existência de uma lei. A questão que ainda não está
plenamente pacificada é se seria possível a condenação por organização criminosa
antes da definição legal do termo. Talvez a recente decisão do Superior Tribunal de
Justiça sobre o tema, no RHC nº 38674, venha por uma pá de cal sobre o tema.
Talvez não. Só o tempo dirá. Hipótese parcialmente confirmada.
As breves considerações feitas neste trabalho não esgotam
todas as questões que podem ser suscitadas ante a Lei 12.850/13. Tampouco
aprofundam a discussão sobre os temas abordados.
Pode-se afirmar que a lei trouxe pontos positivos, como é o
caso do tema desta monografia, ou seja, a tipificação adequada de organização
criminosa. Não se nega, por outro lado, as falhas no conceito, que, por sua
amplitude, acaba ferindo o princípio da legalidade, no que tange à taxatividade,
demandando uma cuidadosa interpretação por parte dos operadores do direito.
Conclui-se este trabalho com a certeza de que, apesar de suas
falhas, a Lei das Organizações Criminosas, como ficou conhecida a Lei nº
12.850/2013, contribui de modo positivo para nosso ordenamento jurídico e uma
grande aliada no combate ao crime organizado que assola nosso país.
80
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