Globalização e MedicalizaçãoSuely Rozenfeld
10 nov [email protected]
DEUS ME LIVRE DE SER NORMAL ! Prof Hermógenes
DEUS ME LIVRE DE SER NORMAL ! Prof Hermógenes
CENÁRIOS
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
CENÁRIO II – Medicalização: alguns exemplos
CENÁRIO III – Terapia Hormonal. Um caso sério!!!
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
Do individualismo ao consumismo
Individualismo - conquista do iluminismo na segunda metade do século XVII virou tragédia no século XXI
Fim do século XIX = Da produção, do trabalhador ao consumo, ao consumidor (Revolução industrial )
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
Cultura consumista, nascida no último quarto do século XIX: prazer passageiro, satisfação instantânea, parcerias temporárias
Consumismo: não é acumular bens mas usá-los e descartá-los para abrir espaço para outros bens
Consumidor = dominado, controlado, preso ao seu senhor: “O Mercado”
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
Consumidor é cool= distante, conservador, com expectativas rebaixadas e compulsão elevada
A integração social se dá pelo consumo: é preciso “pertencer“ a alguma comunidade de consumidores
As comunidades (de portadores de doença, de “curadeiros”, de serviços, de produtos) surgem e desaparecem
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
Velocidade substitui permanência Mais importante do que definir para onde se vai
é importante ir (estabilidade=fracasso) A solidez, a permanência, a constância estão
fora de moda. Coalizões flutuantes e inimizades à deriva se aglutinam por curtos períodos de tempo
A seta do tempo não tem trajetória numa economia política continuamente replanejada: o capital está impaciente, quer retorno rápido
Quando se esquia sobre gelo fino, a salvação está na velocidade (Emerson in Bauman, 2003)
Quando se esquia sobre gelo fino, a salvaçãoestá na velocidade (Emerson in Bauman, 2003)
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
A midia – tv, rádio, jornais, internet - colabora...
Quem se lembra dos planos de governo do último governo?
Defensores da globalização: é atrasado entender que é preciso ter compromissos duradouros e retirar lições do passado
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
Contradições passam “despercebidas”!!!
Gastos da indústria de alimentos (EUA)= 21 bi dólares/ano para promover produtos sofisticados
Faturamento da indústria de produtos dietéticos (EUA)=32 bi de dólares
Los Angeles= habitantes pagam 800 bi de dólares/ano para queimar petróleo
Los Angeles=asma, bronquite e problemas respiratórios causados por poluição são causas importantes de internação
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
A quantidade substitui a qualidade No mundo globalizado há duas autoridades que
dão segurança: os expertos e os números
Os números estão em alta, as reflexões em baixa
A propaganda, como demiurgo, serve à criação e manutenção do prestígio de ambos
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
Do “direito às diferenças” a “cada um come o que gosta“
Justiça social Respeito às diferenças culturais
Demandas por reconhecimento “libertadas” do conteúdo de justiça social e retiradas da área política
Demandas por reconhecimento “libertadas” do conteúdo de justiça social e retiradas da área política
+ Crescimento selvagem da desigualdade Crescimento selvagem da desigualdade
= COLAPSO DAS DEMANDAS COLETIVAS POR
REDISTRIBUIÇÃO E PELA IGUALDADE COLAPSO DAS DEMANDAS COLETIVAS POR
REDISTRIBUIÇÃO E PELA IGUALDADE
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
Quem sai ganhando? (com esse modelo de globalização consumista)
Poderes econômicos extra-territoriais Mas ... eles viajaram na companhia, entre
outros, dos intelectuais... “Coragem (para levantar-se contra o status quo)
é uma qualidade que os intelectuais, outrora famosos pelo seu radicalismo estrepitoso, perderam na busca de seus novos papéis e nichos como expertos, pesquisadores acadêmicos ou celebridades da mídia“ (Bauman, 2001)
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
O estado abriu mão de presidir o processo de integração social ou manejo sistêmico
A regulação normativa e a construção da idéia de nação, foram tarefas que saíram da sua jurisdição e foram delegadas
Agências, Fundações, ONGs: livres para criar e independentes
Regulação normativa perde o sentido, diante dos poderes sedutores do excesso, da liberdade de consumir
CENÁRIO I - Globalização – como e para quem?
Consolidar ações, estabelecer o rumo, pensar o conjunto,
fiscalizar, punir, programar a
longo prazo, liderança
Atividades meio vs atividades fim Atividades meio vs atividades fim
+ Soluções biográficas para contradições sistêmicas Soluções biográficas para contradições sistêmicas
= COLAPSO DAS DEMANDAS COLETIVAS POR JUSTIÇA
CONTRA CRIMES CORPORATIVOS COLAPSO DAS DEMANDAS COLETIVAS POR JUSTIÇA
CONTRA CRIMES CORPORATIVOS
Reunir, participar de seminários, fazer projetos, criar normas, viajar, aplicar
recursos, executar orçamento, criar um site, participar de um chat, trabalho em
equipe
CENÁRIO II – Medicalização
„Negociando“ doenças (diseases mongering)
Alargamento do limite das doenças, tal como definidos cientificamente
Convencer pessoas saudáveis que elas estão doentes e convencer pessoas que estão um pouco doentes que elas estão muito doentes Aumento do mercado para vendedores e
administradores de insumos (medicamentos, equipamentos, exames laboratoriais, etc)
PlosMedicine, 2006PlosMedicine, 2006
CENÁRIO II – Medicalização
Exploração da ansiedade diante da nossa fragilidade e da nossa fé nos avanços científicos e na inovação
Os departamentos de marketing da indústria farmacêutica contratam agências de publicidade qualificadas para promover a criação de novos distúrbios médicos e disfunções
Os departamentos de marketing da indústria farmacêutica contratam agências de publicidade qualificadas para promover a criação de novos distúrbios médicos e disfunções
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 1- Disfunção erétil
Sexualidade – muita repressão no passado vs supervalorização no presente. Mito da performance. Busca de soluções mágicas.
Site da Pfizer : 50% de homens na população acima de 40 anos tem dificuldades para obter e manter a ereção (conclusão baseada em estudo de pacientes em clínica urológica de centro universitário!!!!)
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 1- Disfunção erétil
Viagra da Pfizer (1998)- produto para disfunção erétil (em casos de diabetes e lesões na coluna vertebral) se transforma em produto para aumentar a capacidade/duração da ereção em homens normais. Inclusão de mulheres nos problema - de 1997 a 2004
Efeitos adversos: dor de cabeça, dispepsia, distúrbios visuais, rinite, IAM(?)
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 2- Déficit de atenção
Déficit de atenção com hiperatividade na infância (DAH):
Reconhecido como doença - Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais para classificação das doenças (Associação de Psiquiatria Norte-americana)
Empresas farmacêuticas tem usado a Internet para ter acesso a professores de escolas. Professores: mediadores da relação familia e complexo médico-industrial
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 2- Déficit de atenção
Tratamento farmacológico - psicoestimulantes (Ritalina: metilfenidato)
Efeitos adversos – insônia, nervosismo (comuns),cefaléia, sonolência (ocasionais) visão embaçada, angina, distúrbio de crescimento (raras). Dependência física ou psíquica.
Mecanismo de ação não é claramente conhecido
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 2- Déficit de atenção
Estratégia da indústria ~ propagandistas junto aos estudantes de medicina
Novartis (fabricante da Ritalina) tem sites educacionais com informações específicas para professores, em página intitulada „Se os pais perguntarem...)
Discussão sobre ética na venda de fast-food nas escolas vs consequências da infiltração da indústria farmacêutica nas escolas
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 3- Transtorno bipolar
Anúncio na TV (2002) logo depois da concessão de registro da olanzapina da Eli Lilly, para tratamento de mania....
Mulheres em situações de humor distintas, tratadas com anti-depressivos. Definição de distúrbio bipolar. Sem menção de fármacos. Divulgação de site da Lilly com questionário sobre distúrbios de humor
Variações normais de humor vs doença
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 3- Transtorno bipolar
Litio – pós década de 1950: tratamento do M da PMD; profilaxia de crises de PMD
O termo „estabilizador de humor“ nasce em 1995!
TB – incluido no Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (1980). Diagnóstico incluía internação por episódio de mania
A era do anticonvulsivantes
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 3- Transtorno bipolar
Bipolar disorder is often a lifelong illness needing lifelong treatment; symptoms come and go, but the illness stays; people feel better because the medication is working; almost everyone who stops taking the medication will get ill again and the more episodes you have, the more difficult they are to treat (Eli Lilly- fabricante da olanzapina)
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 3- Transtorno bipolar
Medicines are crucially important in the treatment of bipolar disorders. Studies over the past twenty years have shown beyond the shadow of doubt that people who receive the appropriate drugs are better off in the long term than those who receive no medicine (Janssen- fabricante da risperidona)
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 3- Transtorno bipolar
Evidência de efetividade - apenas alguma para litio e olanzepina
Contrafacção antipsicóticos: aumento da
mortalidade, suicídios, discinesia tardia. Aumento, em série temporal, da prevalência de internação por TB, apesar do tratamento
antidepressivos: tendência suicídio
Ensaios com estabilizadores de humor para prevenção de
episódios MD e risco de suicídio
CENÁRIO II – Medicalização Exemplo 3- Transtorno bipolar
O LIVRO THE BIPOLAR CHILD, LANÇADO NOS EUA EM 2000, VENDEU
70000 CÓPIAS EM 6 MESES!!! APÓS LER O LIVRO, UMA MÃE
CONSEGUIU CONVENCER O MÉDICO QUE SUA FILHA DE 2 ANOS DE IDADE ERA PORTADORA DE TRANSTORNO
BIPOLAR E FOSSE MEDICADA!!!!
O LIVRO THE BIPOLAR CHILD, LANÇADO NOS EUA EM 2000, VENDEU
70000 CÓPIAS EM 6 MESES!!! APÓS LER O LIVRO, UMA MÃE
CONSEGUIU CONVENCER O MÉDICO QUE SUA FILHA DE 2 ANOS DE IDADE ERA PORTADORA DE TRANSTORNO
BIPOLAR E FOSSE MEDICADA!!!!
Táticas para negociar doenças
1. Fazer com que uma função normal pareça ter algo errado e deva ser tratada
2.Criar sofrimento onde não necessariamente existe
3.Definir uma população tão grande quanto possível para sofrer a „doença
4.Definir a condição como deficiência ou desequilibrio hormonal
5. Conseguir os „spin doctors“ certos
6. Criar contextos de forma particular
7. Usar seletivamente as estatísticas para exagerar os benefícios do tratamento
8.Usar o desfecho errado
9. Promover tecnologia como mágica sem riscos
10-Atribuir a um sintoma comum um significado especial e fazê-lo parecer um sinal de doença séria
Lynn Payer, PlosMedicine, 2006
Lynn Payer, PlosMedicine, 2006
CENÁRIO II – Medicalização e globalização
CONSIDERANDO:
Do individualismo ao consumismo
A velocidade substitui a permanência
Contradições passam “despercebidas”!!!
A quantidade substitui a qualidade
Do “direito às diferenças” a “cada um come o que gosta“
Quem sai ganhando? (com esse modelo de globalização consumista)
CENÁRIO II – Medicalização e globalização
CONSIDERANDO:
O Estado abriu mão de presidir o processo de integração social, regular os entes econômicos, construir a idéia de nação
Delegou a Agências, Fundações, ONGs tarefas essenciais e anteriormente privativas do Estado
CENÁRIO II – Medicalização e globalização
AS ORGANIZAÇÕES TEM CONDIÇÕES DE
Enfrentar os desafios de incorporar tecnologias do conhecimento?
Conduzir, protagonizar e levar adiante o processo de promoção da saúde e de prevenção de doença, maximizando os benefícios e reduzindo ao máximo os danos causados pela iatrogenia e pela fome de lucros?
CENÁRIO III – Terapia Hormonal. Um caso sério!
Women's Health Initiative Randomized Controlled Trial
Objetivo: avaliar benefícios e riscos mais importantes das preparações hormonais mais usadas nos EUA
Desenho: ensaio randomizado, controlado, de prevenção
primária, planejado para durar 8,5 anos
16 608 mulheres na pós menopausa (50-79a) foram recrutadas por 40 clinicas entre 1993-1998
CENÁRIO III – Terapia Hormonal. Um caso sério!
cont. Intervenção: estrógenos equinos conjugados
0,625 mg/d+acetato de medroxiprogesterona 2,5 mg/d, comp. (n = 8506) ou placebo (n = 8102).
Resultados: maio 2002 (após 5.2 anos de seguimento), o
comitê de monitoramento recomendou interromper o ensaio
os testes estatísticos para câncer invasivo de mama excediam os limites de interrupção para efeitos adversos. Os riscos excediam os benefícios
CENÁRIO III – Terapia Hormonal. Um caso sério! cont.
Excesso de risco absoluto por 10 000 pessoas ano ATRIBUÍVEIS AO PRODUTO:
7 casos de eventos coronarianos a mais 8 casos de derrames a mais 8 casos de embolias pulmonares a mais 8 casos de câncer de mama invasivos a mais
Reduções de risco absoluto por 10 000 pessoas ano ATRIBUÍVEIS AO PRODUTO:
6 casos de câncer colorretal a menos 5 casos de fratura de quadril a menos
Excesso de risco absoluto de eventos: 19 por 10000 pessoas-ano
Propostas
Os mercados não toleram a economia do não mercado. É preciso estimular os meios de subsistência não monetários. Não definir os cidadãos pelo que são capazes de consumir
Aproximar a produção acadêmica da vida real Os profissionas de saúde têm muito a dizer (e a
fazer!!). Em particular os epidemiologistas, os gestores, os cientistas sociais, os da regulação
A ética deve ocupar o lugar da estética
Propostas
Consumistas e não consumistas são ficções, estereótipos, os lados de um long playing: vale a pena minar o Lado B de cada um de nós.
É preciso reverter a fluidez, a fragilidade e a transitoriedade
O ciberespaço é cheio de não política. Não abusar!
Não resolver a angústia rebaixando as expectativas: vamos querer o melhor!!
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