Teoria Geral do Direito
CURSO DE EXTENSÃO
Coordenação: Paulo de Barros Carvalho
Aula 6
Teoria da Incidência da Norma jurídica
Profª Drª Clarice von Oertzen de Araujo
CORRENTES DO
POSITIVISMOa) Positivismo legalista: A ciência do
Direito não pode ser uma ciência como
as outras, porque ela não tem como
objeto os fatos empíricos, mas as
normas jurídicas (Kelsen) ou a
linguagem jurídica (Bobbio), e não
pode, consequentemente, ser
submetida aos mesmos princípios
metodológicos que as outras ciências,
como o princípio de verificação.
CORRENTES DO
POSITIVISMOb) Positivismo de Comte: é precisoconstruir uma ciência empírica dodireito sobre o modelo das ciências danatureza. É necessário dar a essaciência um objeto suscetível de serobservado diretamente: os fatossociais, as decisões judiciais, esubmetê-la ao princípio de verificação.É a corrente do positivismo seguida porPontes de Miranda, que propõe umametodologia para se explicar o Direito.
PONTES DE MIRANDA
A primeira e principal grande obrasobre sistema do Direito escrita noBrasil foi o livro Sistema de ciênciapositiva do Direito, escrita por Pontesde Miranda em 1922. A obra segue alinha do positivismo de AugustoComte.
Pontes de Miranda propõe umaanálise a partir da física, dageometria, da matemática, maisavançadas, para o Direito.
Conceito tradicional de
Incidência Trecho do voto do EXMO. SR. Ministro
Humberto Martins Relator do Resp n. 631.563-MG:
“ Todo fato jurídico desencadeia-se daincidência de um suporte fático sobre umdeterminado fato, juridicizando-o paraadentrar no mundo jurídico. A síntese daconcepção do fato jurídico emergecristalinamente do escólio de Pontes deMiranda, (in “ Tratado de Direito Privado ”Tomo I, p. 126), verbis:
“O fato jurídico é o que fica do suporte fáticosuficiente, quando a regra jurídica incide eporque incide. (...)
Conceito de Incidência “Fato jurídico é, pois, o fato ou complexo
de fatos sobre o qual incidiu a regrajurídica; portanto, o fato de que dimana,agora ou mais tarde, eficácia jurídica,talvez condicionalmente, ou talvez nãodimane, eficácia jurídica”
DESCONSTRUÇÃO: FATO JURÍDICO,INCIDÊNCIA, REGRA JURÍDICA, FATOOU COMPLEXO DE FATOS (SUPORTEFÁTICO), EFICÁCIA JURÍDICA.
A ESTRUTURA DAS REGRAS
JURÍDICAS
O ASPECTO GEOMÉTRICO:
Para Pontes de Miranda, o fato jurídicoé um polígono e o suporte fático é umpoliedro
Um quadrado é um polígono, e umcubo é um poliedro.
H C
Determinismo, causalidade,
mecanicismo. Doutrina filosófica também adotada como princípio
heurístico na pesquisa científica, que concebe anatureza como uma máquina, obedecendo arelações de causalidade necessárias,automáticas e previsíveis, constituídas pelomovimento e interação dos corpos materiais noespaço. Está nas origens da ciência moderna,com Galileu, Newton e Descartes, como doutrinaque considera todos os fenômenos naturaispassíveis de quantificação e geometrização, emdecorrência de sua organização em leisuniversais de causalidade mecânica. A físicaquântica tornou o mecanicismo ultrapassado noâmbito científico.
O Modelo tradicional de
incidência O modelo tradicional de incidência
jurídica formulado por Pontes deMiranda é um modelo geométrico-mecânico.
A matemática constrói relaçõespossíveis dentro de uma sintaxe, coma qual é coerente, sem se preocuparcom a realidade.
As verdades matemáticas sãonecessárias, chegando a conclusõesderivadas necessariamente de suaspremissas.
O Modelo tradicional de
incidência Ao construir seus objetos na forma de
hipóteses e delas extrair consequênciasnecessárias, a matemática não lida comquestões de fato.
Embora a necessidade teórica estejarelacionada às conclusões matemáticas,isso não significa infalibilidade.
A matemática não é uma ciênciapositiva, pois „constrói‟ em seu interior ashipóteses com as quais opera,independentemente do universo dosfatos.
O Modelo tradicional de
incidência Sendo puramente hipotético, todo o
raciocínio matemático é dedutivo e
definitivo, pois cada etapa deste
raciocínio consiste na aplicação de
uma regra.
As demonstrações matemáticas têm
uma infalibilidade teórica
A infalibilidade da incidência em
Pontes de Miranda é uma conclusão
matemática.
A ESTRUTURA DAS REGRAS
JURÍDICAS
Para que ocorra a incidência deve haver umasubsunção entre aspectos do suporte fático eda hipótese da regra (hipótese de incidência).Esta operação chama-se subsunção.
H C
INCIDÊNCIA E SUBSUNÇÃO
INCIDÊNCIA: GEOM. Encontro de duas linhas, deduas superfícies, ou de uma linha com umasuperfície; encontro de algo com uma superfície(a incidência de um raio luminoso). (In DicionárioHouaiss).
SUBSUNÇÃO: ato ou efeito de subsumir
SUBSUMIR: inclusão da espécie no gênero, assimcomo inclusão do indivíduo na espécie (InHEGENBERG, Leonidas. Dicionário de Lógica).
SUPORTE FÁTICO E FATO
JURÍDICO O fato jurídico revela-se e é gerado a partir de uma
face ou aspecto do poliedro que é o fato social. Ofato jurídico, produto da incidência, na condiçãode aspecto ou face eleito, é similar ao tipo descritopela hipótese contida na regra jurídica. Asqualidades do fato social provocam uma inferênciapor similaridade (SUBSUNÇÃO) na mente dointérprete. A face do poliedro, fato social e objeto,que se faz representar pela incidência, é lançadapara o interior da ordem jurídica, na condição de
fato jurídico.
PONTES DE MIRANDA
“em geometria euclidiana o fatosocial é poliedro ou melhor, corposuscetível de deformaçõessistemáticas, segundo o aspectopelo qual vai ser visto” . MIRANDA.Pontes de. Sistema de CiênciaPositiva do Direito. Tomo 1. cit., p.284.
INCIDÊNCIA DA REGRA
JURÍDICA
Norma jurídica
= fato jurídico →eficácia jurídica
Suporte fático
MORAES, Bernardo Ribeiro de. Teoria do Fato Jurídico. Plano da Eficácia. 1ª Parte. São Paulo, Saraiva, 2003, p. 10.
A INCIDÊNCIA E A
SUBSUNÇÃO
Regra jurídica (texto de lei em vigor)
1) eficácia legal = incidência
Suporte fático
H C
A INCIDÊNCIA DAS REGRAS
JURÍDICASRegra jurídica (texto de lei em vigor)
2) eficácia jurídica =implicaçãoentre o fato jurídico e as relações dele decorrentes
Suporte fático
H C
SEQÜÊNCIA DA POSITIVAÇÃO
1) Elaboração da regra jurídica: processo legislativo;2) Início da vigência da lei;3) Ocorrência do suporte fático (suficiente);4) Incidência ou subsunção entre os aspectos do
suporte fático e os da hipótese normativa =EFICÁCIA LEGAL;
5) Implicações decorrentes da formação do fatojurídico = EFICÁCIA JURÍDICA
6) A partir dos efeitos irradiados pela eficácia jurídicaé que se configuram os direitos e deveres entre ossujeitos de direito relacionados no consequente danorma em sentido estrito.
INCIDÊNCIA: ORIGEM NA FÍSICA
CLÁSSICA E NA GEOMETRIA
Para Pontes de Miranda o mundo jurídico estáinserido no mundo total e a sua formação éresultante da INCIDÊNCIA das regras jurídicas.Diferentemente das leis gerais, coincidentes comos fatos do mundo, a eficácia da lei jurídica é a deincidir, criando os fatos jurídicos.
A eficácia legal é aquela que emana da incidência econcorre para a formação do mundo jurídico.Diferente dela é a eficácia jurídica, que depende daincidência como seu pressuposto, é propriedadeou atributo dos fatos jurídicos e é decorrência dacausalidade normativa.
INCIDÊNCIA E APLICAÇÃO
PONTES DE MIRANDA
“A incidência da lei independe de sua aplicação” (TDP1§4º).
„É falsa toda teoria que ligue o reconhecimento da regrajurídica a sua força de incidência, ou de aplicação”.
“A incidência é técnica que mais de perto copiou amecânica das leis físicas”.
“Não foi nem é possível a regra jurídica de realizaçãopuramente mecânica: se ela coincidisse com os fatos,não precisaria de eventual aplicação; nem seria possívela cisão lógica e política „incidência – aplicação’”.
Incidência e determinismo
“O método da Ciência do Direito tem de ser aindução, mas sem que, para o conhecimentoprévio do fenômeno social, se prescinda domecanismo puro. É a isso que havemos deprover com a concepção geométrico-mecânica,que serve à ciência pura ou teórica, e com aindução e os demais métodos científicos, quepertencem à ciência concreta ou prática”(Pontes de Miranda, Sistema de CiênciaPositiva do Direito – Tomo I , p. 64).
Infalibilidade da incidência
“A incidência da lei, pois que sepassa no mundo dos pensamentose nele tem de ser atendida, opera-se no lugar, tempo eoutros“pontos” do mundo em quetenha que ocorrer, segundo asregras jurídicas. É, portanto,infalível”.
INCIDÊNCIA X APLICAÇÃO
“A causação, que o mundo jurídico prevê, éinfalível, enquanto a regra jurídica existe: (...) e aaplicação injusta da regra jurídica, ou porque senão haja aplicado a regra jurídica, com ainterpretação que se esperava, ou porque nãose tenha bem classificado o suporte fático, nãodesfaz aquele determinismo: é o resultado danecessidade prática de se resolverem os litígios,ou as dúvidas, ainda que falivelmente; isto é, danecessidade de se julgarem os desatendimentosà incidência” ( Pontes de Miranda, TDP I - § 6º).
INCIDÊNCIA X APLICAÇÃO
A aplicação, por ser posterior, de ordinário, àincidência, não se há de confundir com essa.(...) A despeito dos erros, as decisões judiciaispodem transitar em julgado, sem caberrescisória, ou precluir o prazo da açãorescisória. É a antinomia da incidência e doerro de aplicação. (...) Se houve sentençainjusta e transitou em julgado, sem mais caberação rescisória, ou se transitou em julgado eprecluiu o prazo para a rescisória, a aplicaçãoinjusta apagou para sempre a incidência; e oassunto daí por diante só interessa à ética(Pontes de Miranda)
Derivação e Positivação
Derivação é operação lógico-semântica na qual searticula uma unidade normativa a outras que lhe sãosobrepostas ou sotopostas na hierarquia do conjunto.
Todo esforço de positivação pressupõe outro, dederivação. Com isso, o jurista compõe o cálculo denormas, conjugando-as para agrupá-las, medianteiniciativas de coordenação ou em movimentosascendentes e descendentes sugestivos desubordinação.
Porém, nem todo trabalho de derivação culminará naponência de normas e, logo, em positivação. Éexemplo disso o trabalho do estudioso do direito que, adespeito de percorrer todo o itinerário do pensamentojurídico na atribuição de sentido ao texto legislado, nãoé capaz de obrigar ninguém apenas por meio de suasconclusões.
Derivação e Positivação
“O sistema do direito oferece uma
particularidade digna de registro: suas
normas estão dispostas numa estrutura
hierarquizada, regida pela
fundamentação ou derivação que se
opera tanto no aspecto material como no
formal ou processual, o que lhe imprime
possibilidade dinâmica, regulando, ele
próprio, sua criação e suas
transformações (Paulo de Barros
Carvalho)”.
Derivação e Interpretação
• O movimento da derivação estáintegralmente contido no âmbito dainterpretação.
• Todavia, a interpretação é termo maisabrangente: atividade que atribui sentidoao texto normativo ou o próprio resultadode tal elaboração (questãoprocesso/produto).
• A interpretação reformula o textoexaminado e oferece dele outra formade expressão quando se põeintersubjetivamente.
Derivação e Interpretação
A interpretação é pressuposto
indeclinável da aplicação como
atividade que reflete a positivação do
Direito.
A integração também implica a
atividade de interpretação.
A derivação está para a interpretação
assim como a positivação está para a
aplicação do Direito
Formalizando: “D : I :: P : A”.
Direito e interpretação
Não há fenômeno jurídico semprescrições escritas. O Direito não semanifesta sem linguagem. Alinguagem é o veículo, o plano deexpressão do Direito.
A interpretação consiste na atribuiçãode valores a essa linguagem,conferindo a ela significações ereferências a objetos. Essa atribuição,entretanto, não é puramenteindividual, mas participa da naturezade uma convenção social, coletiva.
Enunciados e normas
Qualquer frase lavrada em documentosnormativos tem o status de normajurídica em sentido amplo.
Apenas o esquema lógico do juízohipotético recebe o nome de normajurídica em sentido estrito.
As normas em sentido estrito nãodispensam o trabalho de interpretação econstrução de significado.
O brocardo interpretatio cessat in clarisnão tem nenhum sentido.
A intermediação da forma
Primado da intermediação da forma: aqueleque pretenda simplesmente conhecer oconteúdo jurídico do Direito Positivo terá quepartir da forma dos enunciados prescritivos.São eles que constituem a base empíricacom a qual serão compostos os juízoshipotético-condicionais que constituem oconteúdo, a significação das normasjurídicas.
Quando as normas são construídas,novamente se recorre ao plano da forma ouda expressão para que tal elaboração se dêao conhecimento intersubjetivo.
Normas jurídicas em sentido estrito
A regra jurídica é uma construção de sentido,
elaborada a partir do plano de expressão dos
enunciados prescritivos. Assim, a norma em
sentido estrito encontra-se no plano do
conteúdo e tem a estrutura de um juízo
hipotético condicional: a hipótese (H) descreve
um fato futuro de possível ocorrência. A
conseqüência (C) prescreve uma relação
jurídica em que a conduta vem regulada sob a
forma de uma obrigação, uma proibição ou
uma permissão.H C
INCIDÊNCIA E APLICAÇÃO:
PAULO DE BARROS CARVALHO
“A aplicação das normas jurídicas seconsubstancia no trabalho de relatar, medianteo emprego de linguagem competente, oseventos do mundo real-social (descritos noantecedente das normas gerais e abstratas),bem como as relações jurídicas (prescritas noconsequente das mesmas regras). Issosignifica equiparar, em tudo e por tudo,aplicação a incidência, de tal modo queaplicar u‟a norma é fazê-la incidir na situaçãopor ela juridicizada. E saliente-se, neste passo,que utilizo „linguagem competente’ comoaquela exigida, coercitivamente, pelo direitoposto” (CDT, 24ª ed., p. 122).
INCIDÊNCIA E APLICAÇÃO
PAULO DE BARROS CARVALHO
“Não se dará a incidência se não houver um serhumano promovendo a subsunção epromovendo a implicação que o preceitonormativo determina. As normas não incidempor força própria (...) requerem o homem,como elemento intercalar, movimentando asestruturas do direito” (FJI, 6ª ed., p.11).
Postulados:
a) descabimento da distinção entre incidênciajurídica e atividade de aplicação do direito;
b) Diferença entre evento e fato.
Aspectos lógicos da
incidência
implicação automática e infalível:
nexo de imputação entre
hipótese e conseqüência da
norma
subsunção Fj = fato jurídico
H C
eventoFj
Incidência e interpretação
• Ainda que inclua operações lógicas, aincidência não prescinde dainterpretação, seja dos textos legais,seja dos fatos sociais.
• O destinatário e o aplicador precisamreconhecer e nomear as situaçõesconcretas para aplicar a elas ascategorias jurídicas e seus conceitos.
• O trabalho de investigação e seleção depredicados para se operar a subsunçãoenvolve uma margem de apreciaçãovalorativa: o que selecionar do fatosocial.
Peirce Morris Estática Dinâmica
signo gramática
semióticasintaxe validade incidência
objeto lógica
crítica
semântica vigência existência
Inter
pretante
retórica
universal
pragmática eficácia aplicação
BibliografiaARAUJO, Clarice von Oertzen. Incidência Jurídica. Teoria eCrítica. São Paulo, Noeses, 2011.
BARRETO, Vicente de Paula (coord.) Dicionário de filosofiapolítica. Editora Unisinos, 2010.
CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral doDireito (O construtivismo Lógico-Semântico). 3ª edição. SãoPaulo, Noeses, 2013.
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentosjurídicos da incidência. 8ª edição. São Paulo, Saraiva, 2010.
CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e positivação. Vol. I.São Paulo, Noeses, 2011.
CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação noDireito Tributário. Entrevista concedida à Carta Forense.http://www.cartaforense.com.br/conteudo/entrevistas/derivacao-e-positivacao-no-direito-tributario/9501; acesso em 15.05.2013.
HEGENBERG, Leônidas. Dicionário de Lógica. São Paulo,EPU, 1995.
Top Related