Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do
grau de Mestre em Gestão do Território, Área de especialização em Ambiente e
Recursos Naturais, realizada sobre a orientação científica do Professor Doutor José
Eduardo Ventura.
Declaro que esta Dissertação é o resultado da minha investigação pessoal e
independente. O seu conteúdo é original e todas as fontes consultadas estão
devidamente mencionadas no texto, nas notas e na bibliografia.
A candidata,
Lisboa, 12 de Outubro de 2012
Declaro que esta Dissertação se encontra em condições de ser apresentada a provas
públicas.
O Orientador,
Lisboa, 12 de Outubro de 2012
Para os meus pais.
Para os meus avós.
Para a minha família.
Para o Zeus e para a Nala.
Agradecimentos
Gostaria de agradecer em primeiro lugar ao Professor Doutor José Eduardo
Ventura por ter aceitado ser meu Orientador e me ter guiado por estes caminhos das
alterações climáticas onde inicialmente era uma mera curiosa. Desde as aulas de
Ambiente e Mudança Globais que me despertaram para a problemática das alterações
climáticas em Portugal, que desconhecia por completo até às conversas meramente
informais que aguçaram o meu interesse pela investigação na área do Ambiente.
Seguidamente à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (UNL), especialmente
ao departamento de Geografia e Planeamento Regional, que tão bem me receberam
me abriram os horizontes para uma área de conhecimento completamente novo.
Obrigado ao André Cunha pela ajuda fundamental que foi para a realização
desta dissertação e por se ter tornado o recurso primordial em qualquer dúvida.
Agradeço também a toda a minha família e amigos que de um modo ou outro
me moldaram naquilo que sou hoje.
Finalmente um grande obrigada aos meus pais por todo o apoio, compreensão
e incentivo à realização da dissertação em especial mas também de todo o percurso
académico.
AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS NUMA PERSPETIVA DE AMEAÇA À SEGURANÇA
NACIONAL
Mariana C. Santos
Resumo
As alterações climáticas, mais conhecidas como “aquecimento global”, são o
fenómeno que irá influenciar de forma determinante o século XXI. A forma como
afecta as necessidades mais elementares do ser humano (água e alimento) será um
desafio para a nossa capacidade de existir em sociedade, onde os Estados
desempenharão um papel fundamental. Para além dos desafios que as alterações
climáticas nos colocam, enquanto indivíduos entre indivíduos, representam também
ameaças para os componentes basilares do Estado e para os objetivos para os quais
ele foi criado. Destes destaca-se a segurança sendo que esta não se resume
simplesmente às ameaças militares externas, como é tradicionalmente considerada. As
novas áreas da segurança que surgiram nos últimos anos como a segurança alimentar,
a segurança energética, entre outros vêm, no fundo, reavivar conceitos que foram
determinantes para o nascimento, crescimento e queda de civilizações na antiguidade.
Em Portugal as principais vulnerabilidades (aumento de temperatura e diminuição da
precipitação) vêm agravar características do clima português e colocar maior pressão
sobre o sector primário, base de qualquer Estado.
Palavras-chave: Alterações Climáticas; Segurança Ambiental; Segurança Nacional;
Ameaças Ambientais em Portugal.
CLIMATE CHANGE AS A NATIONAL SECURITY THREAT
Mariana C. Santos
Abstract
Climate Change, commonly known as “global warming”, is the phenomenon that will
influence in the most significant way the 21st Century. The manner in which it affects
the most basic needs of the human being — namely drinking water and food — will be
a challenge for our capacity to exist as civilized societies, thus giving the State a
fundamental role due to its responsibility to protect its territorial integrity and
population. This means that “security” will increasingly become a concept that goes
beyond traditional conceptions of military might as the residues provoked by
environmental vulnerabilities overspill to basic concerns of the State. This is already
being acknowledged with the development of security concepts that, while being new
in the security lexicon, translate old threats that challenged and ultimately ended
preceding civilizations. In Portugal, its major environmental challenges—namely
temperature warming and diminishing rainfall—do nothing short of harming the
Portuguese climatic characteristics while putting pressure on the primary sector,
without which the State will become increasingly dependent on the outside to fulfill its
most basic needs.
Key-words: Climate Change; Environmental Security; National Security; Environmental
Threats in Portugal
Índice de figures
Figura 1………………………………………………………………………………………………………………………..2
Figura 2………………………………………………………………………………………………………………………..3
Figura 3…………………………………………………………………………………………………………………………………..12
Figura 4…………………………………………………………………………………………………………………………………..17
Figura 5…………………………………………………………………………………………………………………………………..25
Figura 6…………………………………………………………………………………………………………………………………..32
Figura 7…………………………………………………………………………………………………………………………………..35
Figura 8………………………………………………………………………………………………………………………………..…83
Figura 9………………………………………………………………………………………………………………………………..…84
Figura 10…………………………………………………………………………………………………………………………………87
Figura 11…………………………………………………………………………………………………………………………………88
Figura 12………………………………………………………………………………………………………………………………..91
Figura 13………………………………………………………………………………………………………………………………..93
Figura 14……………………………………………………………………………………………………………………………..…98
Figura 15……………………………………………………………………………………………………………………………..…99
Quadro 1……………………………………………………………………………………………………………………………….….8
Quadro 2……………………………………………………………………………………………………………………………..……9
Quadro 3………………………………………………………………………………………………………………………………..89
Índice
Agradecimentos
Resumo
Abstract
I - Introdução e Metodologia…………………………………………………………………………………….1
I.1 - Enquadramento metodológico, Pergunta de Partida e Hipóteses de Pesquisa………6
I.2 – Metodologia…………………………………………………………………………………………………………8
I-3 - Descrição dos Capítulos………………………………………………………………………………………21
Capítulo II - Alterações Climáticas e Aquecimento Global……………………………………..22
II.1 – O aquecimento global……………………………………………………………………………………….22
II.2 – As Alterações Climáticas do Passado…………………………………………………………………29
II.2.1 – Os Últimos 100 anos……………………………………………………………………………………….35
II.3 - Projeções para o século XXI………………………………………………………………………………..42
II.3.1 – Projeções para a Europa do século XXI……………………………………………………………49
II.3.2 – Projeções para o Portugal do século XXI…………………………………………………………52
II.4 – Impactos, Vulnerabilidade, Adaptação e Mitigação…………………………………………..55
II.4.1 – Impactos Económicos……………………………………………………………………………………..60
II.4.2 – Impactos Económicos na Europa…………………………………………………………………….65
Capítulo III – Segurança Nacional e Segurança Ambiental…………………….………………..67
III.1 – Segurança Nacional…………………………………………………………………………………………..67
III.2 – Segurança Ambiental………………………………………………………………………………………..75
Capítulo IV – Das vulnerabilidades às Ameaças: aplicação prática………………………….79
IV.1 – Aumento da temperatura média………………………………………………………………………81
IV.2 – Diminuição da precipitação média……………………………………………………………………86
Conclusão……………………………………………………………………………………………………………….94
Bibliografia…………………………………………………………………………………………………………102
1
I - Introdução e Metodologia
A evolução e desenvolvimento do ser humano encontra-se intimamente
relacionada com o clima que o rodeia. Se, em certos períodos da História, as condições
climáticas favoreceram o desenvolvimento de sociedades, noutros períodos menos
favoráveis originaram a escalada de conflitos e, inclusive, a queda de civilizações
(Fagan, 2007).
É neste sentido que surgiu uma preocupação crescente com as recentes
alterações climáticas, ainda que pouco significativas, mas com a probabilidade de um
agravamento com implicações dramáticas para o Planeta e as sociedades humanas
durante o século XXI.
As últimas décadas do século XX e os primeiros anos do século XXI têm-se
revelado anormalmente quentes. Desde o início dos registos da temperatura,
aproximadamente há 150 anos, que não se observavam anos com temperaturas
médias globais tão elevadas. De facto, os 13 anos mais quentes ocorreram todos nos
últimos 15 anos, entre 1997 e 2011. Com uma temperatura média do planeta de 14°C
(calculada na análise do período 1961-1990), a década entre 2002-2011 registou o
maior aumento observado na temperatura média global (0.46°C) o que equivale a
2001-2010 como sendo o período de 10 anos com a temperatura média mais elevada
alguma vez registada (Houghton, 2011)8.
Para o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (ou
Intergovernmental Painel for Climate Change – IPCC), corpo científico criado para
investigar e avaliar as alterações climáticas de forma a providenciar um conhecimento
claro sobre a matéria e suporte científico à criação de medidas políticas, é
«inequívoco» o facto de o sistema climático mundial estar a aquecer devido à
observação do aumento da temperatura média global da atmosfera e dos oceanos, do
degelo e do aumento médio global do nível dos oceanos (Pachuri e Reisinger, 2007).
Apesar de o aumento de temperatura ser superior nos continentes do que nos
oceanos, observações indicam que estes têm vindo a absorver 80% do calor
adicionado ao sistema climático, tendo o nível médio dos oceanos subido a uma média
8 Para mais sobre este assunto ver World Meteorological Organization (WMO) (2011), Provisional
Statement on the Status of the Global Climate, disponível em: http://www.wmo.int/pages/mediacentre/press_releases/gcs_2011_en.html
2
de 1.8mm por ano entre 1961-2003 e 3.1mm por ano quando analisado apenas o
período 1993-2003 (Pachuri e Reisinger, 2007). O aumento da temperatura nos
oceanos provoca a sua expansão térmica, ou seja uma menor densidade e
consequentemente um maior volume, o que tem contribuído para 57% do aumento do
nível dos oceanos, desde 1993. A diminuição dos glaciares e do gelo acumulado no
topo das montanhas contribui em cerca de 28%, sendo que o restante advém das
perdas de gelo nos pólos. De facto, desde 1978 que o Ártico tem vindo a perder cerca
de 2.7% da sua área, por década, uma vez que a temperatura na região tem vindo a
aumentar a um ritmo superior (dobro) à média global. Também os glaciares e zonas
cobertas com neve têm vindo a diminuir por todo o planeta (Pachuri e Reisinger,
2007).
O final do século XX e início do século XXI foi também palco de eventos
climáticos extremos mais frequentes e intensos, que, de acordo com o IPCC,
encontram-se diretamente relacionados com o aumento médio das temperaturas
(Figura 1). Estes fenómenos extremos, quando afetam as sociedades humanas, podem
acarretar um elevado grau de destruição com custos para as instituições existentes e,
por vezes com a perda de vidas humanas.
Figura 1 – Número de catástrofes naturais 1980-2011
Fonte: Munich RE (2012), Topics Geo: Natural Catastrophes
2011, Analyses, Assessments, Positions, disponível em:
http://www.munichre.com/publications/302-07225_en.pdf
Eventos Geofísicos:
Terramoto, Erupção
vulcânica;
Eventos Meteorológicos:
Tempestades tropicais,
tempestades de Inverno,
granizo, tornado, tempestade
local;
Eventos Hidrológicos:
Tempestade, cheias,
inundações repentinas,
deslizamento de terras;
Eventos Climatológicos:
Ondas de calor, ondas de frio,
incêndios, secas (tradução da
autora)
3
Na realidade, as companhias de seguros estão cada vez mais alertas para esta
situação. As despesas crescentes com catástrofes relacionadas com o clima têm vindo
a levar as companhias ao limite à medida que diminuem os lucros, podendo mesmo
levar à falência, e/ou vêm o seu rating cortado (Brown, 2006). As perdas globais
devido a catástrofes registaram o valor mais elevado em 2011, ao atingirem 380 mil
milhões de dólares. Também as perdas seguradas atingiram o recorde de 105 mil
milhões de dólares, no mesmo ano (Figura 2). Ainda de acordo com a Swiss Re estas
perdas podem facilmente chegar aos 19% do PIB de alguns países em 2030 e fazer
retroceder anos de desenvolvimento, se não forem realizados investimentos em
medidas de adaptação e mitigação9.
Figura 2 – Perdas globais e perdas seguradas 1980-2011 (mil milhões de dólares)
Fonte: Munich RE (2012), Topics Geo: Natural Catastrophes 2011, Analyses, Assessments, Positions,
disponível em: http://www.munichre.com/publications/302-07225_en.pdf
O furacão Andrew, em 1992, foi uma chamada de atenção para esta
possibilidade, quando os custos da destruição de bens segurados ultrapassaram a
fasquia dos 20 biliões de dólares. Nos anos seguintes, vários furacões atingiram a
região do Golfo do México com estragos cada vez mais avultados, tendo sido o Katrina,
que atingiu Nova Orleães em 2005, o mais destruidor. Apesar de considerado um
furacão de Categoria 5, enfraqueceu para Categoria 3 quando atingiu a costa,
provocando uma tempestade com ondas que atingiram os 5m de altura, que destruiu
9 Swiss RE (2010), Weathering climate change, disponível em:
http://www.swissre.com/rethinking/climate/Weathering_climate_change.html
Perdas globais
Perdas seguradas
---- Tendência: perdas
globais
__ Tendência: perdas
seguradas (tradução da
autora)
4
algumas barreiras de proteção, inundando 70%-80% da cidade. Mais de 1000 pessoas
morreram e os custos com bens segurados ascenderam aos 40 biliões de dólares, com
um total de perdas económicas estimado em mais de 100 biliões de dólares, ou seja,
aproximadamente 1% do PIB norte-americano. Foi também em 2005 que se bateram
os recordes nos EUA do maior número de furacões (13), do mais forte (Wilma) assim
como dos custos económicos e financeiros mais elevados na ordem dos 200 biliões de
dólares (Houghton, 2011).
As companhias que calculam os prémios dos seguros com base em dados
históricos passados, têm vindo a constatar, cada vez mais, que o passado já não é um
guia fiável para o futuro, investindo massivamente em estudos de projeções climáticas
(Brown, 2006).
Para além da região do Golfo do México, também a Europa tem vindo a ser
assolada por tempestades de vento ciclónicas cada vez mais destruidoras. Apesar de
serem comuns as baixas pressões no Atlântico Norte, onde se formam, a sua
capacidade de destruição tem vindo a aumentar, demonstrando a vulnerabilidade
destas regiões. As tempestades de vento na Europa atingem sobretudo a região
noroeste, ou seja a Irlanda e as Ilhas Britânicas, deslocando-se depois ao longo do Mar
Báltico e atingindo também a costa da Escandinávia. Noutras ocasiões, é também
frequente as tempestades passarem mais a sul e atingirem a França, os Países Baixos e
a Alemanha. As tempestades de vento têm vindo a ganhar relevância uma vez que
atualmente representam aproximadamente 80% de todas as perdas cobertas por
seguros na região noroeste da Europa e, em termos globais, as perdas apenas são
superadas pelas que se encontram relacionadas com a época de ciclones nos EUA. De
facto, estudos sugerem que, se as três maiores tempestades de vento ocorridas em
1999 – Anatol, Lothar e Martin – ocorressem actualmente, os custos relativamente aos
bens segurados rondariam os 10 biliões de euros (Munich Re, 2002; Swiss Re, 2000),
um valor que vai deixando de ser sustentável à medida que o período de retorno
diminui.
As alterações climáticas são, assim, um alerta para as sociedades actuais uma
vez que põem em causa a dimensão dos fenómenos climáticos extremos e o seu
período de retorno. Para além da perda de vidas humanas surge a questão da
5
sustentabilidade das sociedades economicamente desenvolvidas quando estes
fenómenos, altamente destrutivos, possuem um menor período de retorno.
Fenómenos extremos como os tornados ou as tempestades de vento são
frequentemente agravados por precipitação intensa, que pode originar cheias e/ou
inundações. Por outro lado são também mais frequentes inundações derivadas de
tempestades com precipitação intensa acompanhada de storm surge, bem como uma
maior instabilidade nos períodos de monção. Estas situações têm sido responsáveis
por cheias frequentes nas regiões que dependem fortemente desde ciclo para a
produção agrícola, como a Índia e o Bangladesh (Lynnas, 2008).
Outro fenómeno que tem vindo a ocorrer com mais frequência e também se
encontra directamente relacionado com o aumento generalizado das temperaturas
são as ondas de calor. Estas são particularmente danosas para a vida humana,
nomeadamente para os grupos populacionais de risco (García-Herrera et al., 2010).
O aumento da frequência de fenómenos climáticos bem como de todas as
alterações originárias do aquecimento global são assim uma preocupação que não
pode ser ignorada independentemente de nos referirmos a países desenvolvidos ou
em vias de desenvolvimento. Se por um lado os países menos desenvolvidos possuem
menor capacidade de adaptação, por outro lado os danos nos países desenvolvidos
são superiores (Pittock, 2007). É esta capacidade de gerar elevados impactos
económicos e conflitos provenientes de um agravar da escassez de recursos (muitos
que já se encontram extremamente explorados e à beira do ponto de rutura) que tem
sido advogada pela maioria dos especialistas nas alterações climáticas para rotular o
fenómeno como um problema de segurança ambiental (Myers, 1994; Brown, 2006).
Além disso a securitização da temática possibilita a implementação de medidas de
adaptação e de mitigação que exigem um elevado financiamento bem como uma
mudança na estrutura económica das sociedades (sobretudo na mitigação) e que por
isso provocam resistência na classe política e nos demais sectores económicos
afetados (Stern, 2007; Helm and Hepburn, 2011).
É nesta lógica que analisamos o caso português desde as projeções e impactos
esperados, passando pela problemática da securitização até às consequências diretas
para o país e a segurança nacional.
6
I.1 - Enquadramento metodológico, Pergunta de Partida e Hipóteses de
Pesquisa
A presente dissertação insere-se em dois campos de estudo distintos mas que
se integram perfeitamente e que fizeram parte da nossa formação. Desde logo a
Licenciatura em Ciência Política, no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas
(ISCSP) e, posteriormente, o Mestrado em Gestão do Território, na especialidade de
Ambiente e Recursos Naturais, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da
Universidade Nova de Lisboa.
Ainda que a paixão pelas questões ambientais esteja presente desde tenra
idade, o percurso académico acabou por desenvolver e aprofundar outra grande área
de interesse que é a Ciência Política. O desenvolvimento do presente projeto, na altura
ainda não concebido como tal, iniciou-se ainda nos primeiros anos de licenciatura,
mais especificamente com as disciplinas de Dinâmica das Civilizações e Geopolítica,
onde a importância dos recursos foi explanada claramente como objeto fundamental
no nascimento, desenvolvimento e queda das civilizações. O nosso grande interesse
pelo Ambiente levou-nos, sempre que possível, a manter-nos informados sobre
questões da área, nomeadamente e mais recentemente pelas alterações climáticas,
ainda que o conhecimento possuído apenas permitisse um vislumbre um tanto
simplista do problema do aquecimento global. Ainda assim, e quando no término da
licenciatura mas principalmente durante a frequência das aulas da disciplina de
Ambiente e Mudanças Globais, na parte letiva do mestrado, foi possível perceber a
real dimensão da problemática das alterações climáticas, surgiu-nos frequentemente a
questão, que acabou por se tornar a pergunta de partida: Se o clima vai mudar
radicalmente nos próximos 100 anos, afetando gravemente os recursos que dispomos, numa
sociedade cada vez mais consumista, como é que os líderes mundiais, especialmente dos
países desenvolvidos ainda não despertaram para a completa dimensão do problema, que
pode ser uma ameaça existencial à civilização ocidental como a conhecemos? Foi na
tentativa de dar resposta a esta questão que esta dissertação foi desenvolvida.
Devido à dimensão do problema e à diversidade de impactos que varia de
região para região, fazia todo o sentido centrarmo-nos em Portugal. Não só é a nossa
casa mas as alterações climáticas acabarão por afetar o dia-a-dia de todos nós e a
forma como nos relacionamos e estamos em sociedade. Além disso também o
7
Mediterrâneo será uma das regiões mais afetadas pelas alterações climáticas, o que
implica necessariamente uma mudança acentuada no clima português e,
consequentemente, nas mais diversas atividades económicas e sociais.
Além dos motivos apresentados, outro estímulo adicional à realização desta
dissertação de Mestrado foi a ausência de trabalhos portugueses sobre Portugal, nesta
área. Com efeito, as pesquisas efetuadas sobre segurança ambiental e conflitos daí
derivados não foram muito além de publicações do Professor Doutor Viriato
Soromenho Marques e do Professor Doutor Luís Veiga da Cunha, que não refletem
aquilo que se pretende retratar com a presente dissertação. Enquanto o Professor
Viriato Soromenho Marques realiza uma abordagem mais teórica-conceptual do termo
segurança ambiental, o Professor Luís Veiga da Cunha reflete sobre o surgimento de
conflitos, nomeadamente sobre a água que é a sua área de especialização, que em
Portugal se traduz nos conflitos resultantes da partilha das bacias hidrográficas luso-
espanholas. No entanto os problemas derivados das alterações climáticas em Portugal
vão muito além da partilha das bacias hidrográficas, podendo originar conflitos sociais
também internos, pelo que a perspetiva sobre as alterações climáticas é de que estas
são uma ameaça à segurança nacional.
Assim, da pergunta de partida ainda algo vaga, nascem duas hipóteses de
pesquisa, específicas a Portugal, sendo que a confirmação da segunda depende
necessariamente da confirmação da primeira hipótese:
H.1 – As alterações climáticas terão um impacto profundo no clima português
H.2 - Portugal securitizou as alterações climáticas.
A linha de raciocínio seguida ao longo da dissertação para confirmar/rejeitar as
hipóteses é descrita seguidamente.
8
I.2 - Metodologia
Na área das Relações Internacionais, os estudos de segurança podem centrar-
se em cinco níveis de análise diferentes, consoante a escala espacial da aplicação do
estudo (Buzan et al., 1998:5). O nível mais abrangente é o sistémico, seguido pelo
subsistémico, o das unidades políticas, o das subunidades e por fim o nível do
indivíduo (ver Quadro 1).
Quadro 1 - Níveis espaciais de análise nas Relações Internacionais
Níveis Espaciais Exemplos
Sistemas Internacionais Sistema Económico, Sistema Alimentar, Sistema Financeiro, entre outros. Cada um deles pode ser analisado saparadamente mas estão todos relacionados.
Subsistemas Internacionais Um bom exemplo é providenciado por regiões que possuem uma dinâmica social distinta. O critério pode ser geográfico (Europa) ou político (União Europeia).
Unidades Políticas Estados, Nações, Religiões organizadas, etc.
Subunidades Partidos Políticos, Grupos de Pressão, Grupos de Interesse, etc.
Fonte: Buzan et.al. (1998:36), adaptado pela autora
Quanto mais elevado o nível espacial no qual localizamos a nossa análise
tendencialmente maior será a sua abrangência mas menor será a sua profundidade no
que à captação de interações sociais diz respeito. Por exemplo, compreender as
prioridades e dinâmicas de segurança do Norte pouco ou nada nos diz sobre a
estratégia de Segurança Nacional de países específicos como Portugal ou a França.
O nível subsistémico surge precisamente para combater esta ineficácia
analítica, concentrando-se numa secção do sistema de modo a conseguir captar um
maior número de interações sociais entre unidades políticas. Este nível tende a
prender-se com interações que não saem duma determina delimitação regional
previamente definida, sejam elas económicas, ambientais e/ou políticas. Interações
entre Estados-membro da NATO ou da UE cabem nesta categoria.
O terceiro nível da análise prende-se com o exame das prioridades, princípios
e/ou comportamento de uma única unidade política, ou então com o estudo das suas
interações com um número restrito de outras unidades. Exemplificando, um estudo
9
geopolítico sobre as prioridades securitárias da Alemanha localizar-se-ia claramente
neste nível. Extrapolações consequentes sobre as relações da Alemanha com a Polónia
ou com a Rússia também. Aqui é importante notar que a unidade política tende
preferencialmente a ser o Estado, mas que também pode ser a Religião, a Nação ou
outros coletivos com vocação política (Lara, 2010). De outro modo seria impossível
analisar em Relações Internacionais e Ciência Política a dinâmica entre os curdos e a
Turquia, ou os muçulmanos de etnia uyghur de Xinjiang e a China 10.
Sendo certo que mesmo dentro do Estado ocorrem interações sociais com
capacidade para influenciar ou até mesmo determinar os comportamentos daquele na
esfera internacional, surgiu como ótica relevante para os estudos em Ciência Política e
em Relações Internacionais o nível analítico da subunidade, que se prende com
instâncias inferiores à unidade política mas cujas interações enformam as prioridades
desta. Exemplos de subunidades políticas dentro de um Estado com sistema político
democrático variam de modo considerável, podendo ir de burocracias governamentais
a partidos e grupos de pressão.
Para uma melhor contextualização do conceito da segurança ambiental é
necessário perceber a dinâmica e evolução do conceito de segurança e quais as
principais teorias por detrás
Definimos o conceito de segurança como a gestão estratégica de ameaças
existenciais para a unidade política por um ator securitário (ver Quadro 2).
Quadro 2 - Atores e Objetos referentes: a contribuição dos Estudos Construtivistas Radicais
para os Estudos de Segurança
Descrição
Atores Securitários Atores que tentam securitizar ameaças existenciais percetíveis, ou objetos referes, normalmente através do discurso político
Atores Funcionais Atores que, de uma forma positiva ou negativa, afetam a dinâmica do setor, influenciando decisões na área da segurança.
Objetos Referentes O objeto que é existencialmente ameaçado e que portanto necessita de ser securitizado.
Fonte: Buzan et.al. (1998:36), adaptada pela autora.
10
Para mais sobre este assunto, ver David J. Singer (1961), “The Level of Analysis Problem in International Relations”, in World Politics, vol. 14, n. 1, disponível em http://sitemaker.umich.edu/jdsinger/files/the_level_of_analysis_problem_in_international_politics.pdf
10
A dinâmica do conceito implica que este sofreu uma evolução nomeadamente
durante o século XX, em muito fruto do contexto histórico da época, do que é
segurança e do que é percecionado como ameaça.
Dos Estudos Tradicionais de Segurança (ETS) a corrente do realismo foi talvez a
que mais influenciou o conceito (Walts, 1979; Mearsheimer, 2007). Para esta corrente
o Estado é o focus central, o ator por excelência do sistema internacional, onde o
Governo é percecionado como um agente (subunidade) e onde a temática única e
central na relação entre os Estados é a procura e a manutenção de poder de modo a
maximizarem a sua segurança e probabilidade de sobrevivência. No contexto da
Guerra Fria, o sistema internacional é percecionado como anárquico (ausência de uma
força supranacional no sistema internacional capaz de conter os agentes individuais -
Estados) onde a manutenção da paz e da segurança se deve a um equilíbrio de poderes
entre os EUA e a URSS.
Nesta lógica, as relações internacionais são tendencialmente anárquicas,
centrando-se numa luta constante pelo domínio do poder e dissociadas de qualquer
princípio ético e moral a ameaça existencial por excelência é a militar. Um segundo
conjunto de realistas (neorrealistas) desenvolveram-se mais para o final do século,
com um conceito menos restrito e onde integram novos pressupostos à corrente,
entre os quais o exercício do poder económico para além do militar como forma de
manutenção da segurança própria (Baldwin, 1997; Barnett, 2007; Mearsheimer, 2007).
Também no final do século XX surgiram um conjunto de teorias críticas ao
modelo realista (Booth, 1991; Booth, 1994; Booth, 1995; Buzan 1991). Os Estudos
Críticos encontram-se neste novo conjunto de teorias que procuram alargar o conceito
de segurança.
Esta corrente deriva maioritariamente das ideias desenvolvidas pela escola de
pensamento marxista que vêm o sistema internacional integrado no sistema capitalista
que tem como objetivo da acumulação de capital, nomeadamente no que diz respeito
às relações de dependência assimétrica (Wallerstein, 2004). Neste sentido o focus
encontra-se nas interações económicas e nos aspetos materialistas onde os governos
funcionam como agentes. As ameaças são militares mas sobretudo económicas, que se
traduziram no período do colonialismo, com a exportação de recursos brutos para as
metrópoles e importação de bens manufaturados e serviços mais caros, e durante o
11
neo-colonialismo (Lara, 2000; Lara, 2011) com as relações de dependência económica
que se perpetuaram quando as ex-colónias foram integradas no sistema capitalista
enquanto provedoras de matérias-primas baratas. Para a Escola Crítica, ambas as
formas de dependência se traduziam em enormes fragilidades organizacionais dos
Estados mais fracos, que deste modo ficavam presos num eterno ciclo de incapacidade
material e de soberania fragmentada que naturalmente se traduziria em debilidades
de Segurança (Ayoob, 1995).
Outro paradigma das Relações Internacionais para a análise de problemas de
segurança deriva dos Estudos Construtivistas (Buzan et al., 1998).
O construtivismo nas relações internacionais advoga que aspetos significantes
do sistema internacional são histórica e socialmente contingentes, ou seja, estes
aspetos, em qualquer que seja o nível de análise, existem porque os atores principais
insistem na sua perpetuação no tempo e no espaço que eles existem e não porque são
consequências inevitáveis da natureza humana ou características essenciais da política
mundial.
Neste sentido a anarquia é um conceito “construído socialmente” pelos
agentes do sistema internacional. Do mesmo modo, a segurança acaba também ela
por ser uma construção história por via da praxis social, pelo que de modo a não
comprometer a sua objetividade científica o analista em estudos de segurança procura
não identificar as ameaças, só as perceções dos atores securitários.
Finalmente o paradigma da Segurança Humana, surgido no pós-Guerra Fria,
define o conceito mais abrangente de segurança, devendo esta centrar-se no último
nível de análise espacial, o do individuo. Em 1994, o relatório do Desenvolvimento
Humano realizado pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (UNDP,
1994) alargou o conceito de segurança global, passando este a integrar sete áreas
diferentes (segurança económica, alimentar, de saúde, da comunidade, pessoal e
política) e ambiental. Ainda assim existe um intenso debate dentro da Segurança
Humana entre uma visão mais abrangente vs restrita do conceito (MacFarlane e
Khong, 2006; Human Security Unit, 2009; Owen, 2004; Owen, 2005), para além de
bastantes problemas do ponto de vista metodológico, entre os quais a constante
dispersão do tema central para temas não relacionados com Segurança per si (Cunha,
2012).
12
Figura 3. Enquadramento da dissertação
Figura da autora
Como mostra a Figura 1, a segurança ambiental como propomos estudá-la não
encaixa no sentido mais restrito da segurança, uma vez que este é estritamente militar
(Walt, 1991; Chipman, 1992), e também não a inserimos na segurança humana, que
devido ao seu grau de abrangência sectorial dificultaria a aferição da nossa hipótese
sem com isso acrescentar pertinência analítica ou rigor conceptual. Devido ao facto de
os grupos não serem estanques e todo este processo possuir uma dinâmica própria o
presente estudo utiliza características quer dos estudos críticos quer dos
construtivistas.
Ao nível da segurança internacional, o conceito de securitização, desenvolvido
pela Escola de Copenhaga, é aceite maioritariamente como conceito “conciliador”
entre os construtivistas e o realismo clássico. Ao invés de se focar somente nas
capacidade material dos atores, com particular destaque para o poderio militar, os
Estudos construtivistas defendem que o processo de securitização é um processo
dinâmico e faseado, durante um qual um ator securitário procura elevar por via
argumentativa ou pela força um determinado objeto de referência a problema de
segurança, que por isso deve ser defendido independentemente das normas que
regulam as relações dentro duma comunidade política.
Um dos exemplos mais claros deste processo foi a questão do 11 de Setembro,
que, em nome da segurança nacional e porque a questão do terrorismo foi altamente
Restrita Abrangente
Segurança
Humana
Estudos
Construtivistas
Estudos
Críticos
Realismo
Dissertação
SEGURANÇA
13
securitizada, tomaram-se medidas extraordinárias, tanto nos EUA como na Europa,
que para muitos violam (excessivamente) as liberdades individuais.
A nosso ver, a segurança ambiental é uma questão de segurança nacional, uma
vez que as catástrofes naturais têm suficiente potencial destrutivo ou pelo menos
interruptivo para ameaçar a capacidade organizacional do Estado e, até, em último
caso, a sua soberania na zona afetada (Myers, 1993), para além de pôr em causa a
subsistência ou até mesmo a existência da população atingida, sendo que a população
é um dos elementos estruturante do próprio Estado (Moreira, 1963; Moreira, 1993).
Contudo, a Segurança Ambiental não tem vindo a ser consensualmente
reconhecida como um problema de segurança nacional, tanto na política interna como
externa (Deudney, 1990).
A existência de constantes alertas por parte de organizações científicas
credibilizadas (IPCC, 2007) das graves consequências para a condição humana de
ameaças à segurança ambiental a curto/médio/longo prazo, não possui
correspondência pelas entidades governamentais (na maioria dos casos) na aplicação
de medidas de mitigação e/ou de adaptação.
A temática já entrou na agenda política de diversos países e de organizações
internacionais como a ONU ou o Banco Mundial, sendo que os grupos (Greenpeace
por exemplo) (Buzan et al., 1998) que alertam para este problema advogam a
securitização do tema pois só desta forma é possível que as questões ambientais
ultrapassarem o debate criativo mas que peca pela morosidade na implementação de
medidas concretas e que ocorre na sociedade (Barnett, 2001).
No entanto existem vários problemas que não têm permitido a securitização da
segurança ambiental. A securitização ocorre, na maioria das vezes, como reação a uma
catástrofe. Muitas vezes e tirando ameaças convencionais à segurança, a atuação dos
Estados é uma reação a um evento dramático (Buzan et al., 1998).
O mesmo tem vindo a suceder com outras ameaças não-convencionais, que
não envolvem uma tensão armada entre dois ou mais Estados, ou dentro de um único
Estado. Até ao 11 de Setembro o terrorismo era considerado um problema de
segurança distante e localizado, com características semelhantes às do crime
organizado. A atual dimensão internacional só foi alcançada depois da catástrofe.
14
Relativamente à segurança ambiental a mesma traduz-se num conjunto de
ameaças ambientais, distintas umas das outras e com manifestações diferentes
consoante a região geográfica, o que não só torna a agenda de segurança um pouco
dispersa como também, do ponto de vista metodológico, bastante complexa, porque o
ator securitário, para um determinado objeto de referência, pode ser uma fonte de
ameaça noutro. Tomemos como exemplo o caso do Japão: se o mesmo tem sido um
aliado no combate às alterações climáticas, com a assinatura do Protocolo de Quioto,
tem, por outro lado, sido um ator ativo no entrave à redução/eliminação da caça à
baleia (ainda que não ponha em causa o Estado e portanto seja um problema de
política, demonstra uma posição contraditória dentro dos problemas ambientais)
(Buzan and Weaver, 2003).
Outro problema que dificulta a securitização da segurança ambiental é a forma
como os problemas ambientais se formam e se manifestam, encontrando-se
associados à necessidade de uma catástrofe para que a temática seja securitizada.
Uma vez que alguns problemas ambientais vão-se formando lentamente (creeping
disaster) é difícil identificar quando começam e quando terminam, pelo que muitas
vezes só existe uma chamada de atenção para o problema quando já se atingiu o
ponto de não-retorno. A seca é por natureza um creeping disaster sendo difícil
monitorizar o progresso e quantificar os impactos11.
Desta forma definimos segurança ambiental como as ameaças existenciais que
provêm de catástrofes ambientais relacionadas com a (in)ação humana (Burton, 1993).
Sendo que aqui destacamos aquelas que põem em perigo a soberania do Estado, i.e., o
controlo administrativo dum território e duma população por um poder político
(Moreira, 1963).
Falamos de ameaças e não de vulnerabilidade devido sobretudo à
especificidade do primeiro conceito. Enquanto as ameaças, especificas à área da
Segurança, definem todos os fenómenos, internos ou externos, que põem em causa a
existência de uma determinada unidade política, a vulnerabilidade que se iniciou na
escola das catástrofes naturais e da segurança alimentar, segundo Adger (1999), é
11
Para mais informação sobre a seca enquanto um creeping disaster consultar: NASA, Drought: The creeping disaster, disponível em: http://earthobservatory.nasa.gov/Features/DroughtFacts/ e NOAA (2001), Drought: The creeping disaster, disponível em: http://www.noaanews.noaa.gov/stories/s600b.htm.
15
transversal a todas as sociedades, sendo uma característica civilizacional, podendo
estar mais ou menos agravada consoante um conjunto de variáveis. De facto «there is
now fundamental evidence that vulnerability is a fundamental characteristic of all
human systems and that an external stress such as an extreme weather event exposes
rather than causes vulnerability» (Matthew, 2010: 36)12.
Ainda que os dois conceitos não sejam estanques e portanto exista uma
dinâmica entre eles, a vulnerabilidade é estrutural, sendo que o que varia é o tipo de
ameaça a que cada se coletivo encontra sujeito e a sua capacidade de resposta. As
ameaças agrupam-se maioritariamente em dois grupos, sendo que o critério
diferenciador é a previsibilidade: podem ser progressivas (Ex. onda de calor de 2003)
ou espontâneas (Ex. sismo no Japão em 2011).
Por outro lado as ameaças são sempre influenciadas pela componente humana,
seja pela ação ou pela inação. Em relação à inação temos como exemplo o sismo que
afetou gravemente o Haiti em 2010. A catástrofe é uma ameaça espontânea, não
sendo causada pela ação humana, mas tornou-se um prolema de segurança porque o
Estado não foi capaz de garantir a sua segurança, enquanto entidade soberana, nem a
dos seus cidadãos (componente fundamental da existência do Estado) isto é, o sismo
colapsou a capacidade organizativa do Estado. Já relativamente à ação humana,
inserem-se nesta categoria todas as catástrofes ambientais causadas pela mesma. É
exemplo a China através da construção excessiva de barragens em solos sismicamente
instáveis (Watts, 2010).
A distinção acima apresentada é simplesmente para formar referências
analíticas porque esta não é estática. Um problema de segurança ambiental causado
pela ação humana depressa se pode agravar devido à inação humana. Do nosso ponto
de vista, as alterações climáticas são um exemplo deste tipo, uma vez que já possuem
uma dinâmica própria. Ainda assim, o mesmo não tem servido para intensificar o
processo de securitização. Como já vimos, devido à natureza do problema das
alterações climáticas estas acabam por ter como entravas à sua securitização quase
todos aqueles apontados para a segurança ambiental:
12
O conceito de vulnerabilidade encontra-se mais aprofundado no ponto 1.4 – Impactos, Vulnerabilidade, Adaptação e Mitigação desta dissertação.
16
A agenda de segurança é errática porque as manifestações das
alterações climáticas serão diferentes em todo o Mundo, não sendo
passível o consenso que se formou aquando das negociações para
acabar com as emissões de CFCs, que é frequentemente dado como
exemplo a seguir;
O aumento generalizado das temperaturas insere-se na definição de
um desastre do tipo progressivo (creeping), uma vez que não existe um
momento definidor a partir do qual as alterações climáticas deixam de
ser suportáveis pelas populações; quando o aumento generalizado das
temperaturas (e consequentemente todos os outros fenómenos
climáticos extremos) ultrapassarem este limite a capacidade de
mitigação encontrar-se-á muito limitada;
Finalmente a importância da securitização das alterações climáticas
prende-se com a dificuldade das mudanças que necessitam de ser
implementadas para inverter o processo; na nossa perceção as
abordagens sobre as mudanças para a diminuição das emissões de
dióxido de carbono são, económica e politicamente, muito simplistas
(Stern, 2007). A estrutura energética fóssil está enraizada nas
sociedades, sendo impossível realizar mudanças para linhas mais
sustentáveis, sem que isso acarrete consequências abruptas tanto
económicas como políticas (Fonseca, 2011).
De facto, a curto/médio prazo a maioria dos problemas ambientais afecta
apenas o estilo de vida das populações (condições socio-económicas), só se tornando
uma ameaça/problema de segurança quando afecta a integridade física dos indivíduos.
Quando a integridade física dos cidadãos se encontra estruturalmente em causa ou
quando o Estado não consegue securitizar determinadas vulnerabilidades de modo
permanente, passa a existir um problema de erosão da legitimidade política. Quando
os indivíduos deixam de reconhecer legitimidade política ao Estado transferem-na para
outros grupos, quer sejam legítimos ou ilegítimos, passando a existir um problema de
subversão indireta.
A subversão (direta) ocorre quando um grupo organizado tenta substituir de
forma violenta uma ordem política pré-existente. A subversão indireta ocorre quando
17
essa substituição é despoletada por uma catástrofe natural que destrói/colapsa a
capacidade administrativa do Estado no local afetado (Lara, 2011).
Como é observável na maioria das vezes uma catástrofe natural não degenera
necessariamente num fenómeno de subversão indireta. Tendo como exemplo
novamente o Japão, que sistematicamente é atingido por sismos, o Estado securitizou
este tipo de catástrofes na sociedade civil de forma bastante eficaz, tanto que a ordem
política se mantém intacta independentemente dos inúmeros sismos e respetivas
consequências que têm afetado a região (ver Figura 4).
Figura 4 – Ameaças que derivam da Segurança Ambiental
Figura da autora
Para que ocorra uma subversão é necessário um conjunto de condições, entre
as quais, que o Estado falhe em responder e em manter a segurança da integridade
territorial do Estado bem como da sua capacidade organizativa, isto é, da sua
soberania e do seu aparelho administrativo (Lara, 2012) e que exista um ator
securitário rival que obtenha, por coação ou consentimento, a fidelidade política da
população (Cunha, 2012).
Quando estas duas condições se reúnem nasce um problema de subversão
interna que pode variar espacialmente do nível local ao nível nacional, e
temporalmente do nível temporário ao permanente, no qual o grupo que subverte se
organiza, adquire ideologia própria e procura subverter todo o aparelho do Estado.
Segurança Ambiental
Estado
Subversão Indirecta
Indivíduo
Existência Biofísica
18
Assim, a dissertação centra-se ao nível de análise da unidade política em
Portugal, existindo ainda uma interação com o nível subsistémico pelo facto de o
Estado português se encontrar integrado numa região – União Europeia – com
características e particularidades específicas. Dizemos União Europeia e não Europa
porque a União Europeia é constituída por diversos membros e instituições com
carácter político (Patrício, 2007) que não correspondem na íntegra à região “Europa”
geograficamente definida.
Seguidamente, como a nossa análise se foca no Estado português,
consideramos o Governo de Portugal como ator securitário primordial devido às suas
funções representativas bem como ao seu papel na elaboração de estratégias.
Optámos por não fazer uma identificação de outros possíveis atores securitários —
como partidos ou grupos de pressão — precisamente porque a elaboração de uma
estratégia de securitização das alterações climáticas depende, em última análise,
exclusivamente do governo português enquanto representante de um Estado
soberano.
Por outro lado, dada a dimensão do problema das alterações climáticas e numa
tentativa de obter uma maior objetividade possível, centramo-nos especificamente
nas vulnerabilidades mais graves, que podem ameaçar a existência do Estado (por
exemplo, a perda de biodiversidade não ameaça a existência do Estado, mas o mesmo
já não acontece com a mudança dramática nos padrões de precipitação).
Especificamente no caso português referimo-nos ao aumento das temperaturas
(incluindo fenómenos extremos de calor) e à diminuição da precipitação.
Tendo em conta tudo o que acabou de ser explicado, e porque falamos
concretamente de uma dissertação de mestrado e não de doutoramento, infelizmente
não seria possível em tempo útil analisar todos pontos que poderiam interessar para
enriquecer a investigação, desde a identificação e análise de outras ameaças — como a
subida do nível dos oceanos — ou o impacto macroeconómico das mesmas. Contudo,
é possível estabelecer ligações entre eventos de seca extrema e, por exemplo, o seu
efeito no output agrícola.
Desde logo a dissertação assumiu um caráter maioritariamente teórico
procurando esclarecer e reafirmar a ligação entre alterações climáticas e segurança
ambiental. Para isso a pesquisa será realizada principalmente com recurso a fontes
19
abertas primárias (ex: dados oficiais do Banco Mundial) e secundárias (bibliografia e
webgrafia). Numa primeira parte, para as alterações climáticas, recorremos aos
relatórios do IPCC e ao projeto SIAM II para suportar cientificamente as projeções para
o século XXI, recorrendo também a bibliografia adicional sobre a temática.
Numa segunda parte, sobre a segurança nacional e ambiental recorremos a
diversa bibliografia sobre a área e a relatórios oficiais que suportam a importância da
segurança ambiental no geral. Para o caso português procedemos a uma reunião e
análise de indicadores relevantes da estrutura agrícola nacional, procurando
estabelecer ligações pertinentes entre alterações climáticas particularmente
acutilantes para Portugal e o output agrícola obtido pelo sector primário português
numa linha temporal que vai, no máximo, de 1980 a 2010, atentando aos principais
períodos de seca.
Acresce dizer que aqui não nos debruçámos sobre as importações de bens
alimentares — mecanismo sempre disponível para atenuar vulnerabilidades
alimentares conjunturais ou estruturais dos Estados — porque o propósito da tese
reside em demonstrar o impacto das alterações climáticas na segurança alimentar e na
segurança nacional portuguesa e não tanto no modo como o Governo tem vindo a
lidar com diminuições súbitas do output do sector primário — que aliás são raras.
A aferição da securitização das condições ambientais portuguesas será feita
através de uma análise de conteúdo da Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações
Climáticas (ENAAC) que visará ver se esta: identificou instituições e/ou organismos
responsáveis pelo desenvolvimento e aplicação da estratégia; apontou orçamentos,
metas e objetivos concretos; definiu linhas temporais e vulnerabilidades aos quais o
Estado está sujeito.
Finalmente e ainda que a dissertação seja maioritariamente teórica é
fundamental que seja percetível a aplicabilidade da componente teórica pelo que na
terceira parte recorremos a dois exemplos concretos que ocorreram em Portugal (a
onda de calor de 2003 e a seca de 2005) e que derivam das principais vulnerabilidades
que o país se encontra sujeito, que já foram referidas. Estes exemplos procuram
demonstrar como um fenómeno climático pode escalar para um problema de
segurança ambiental. Para além disso, todo o processo da dissertação irá ser
submetido à figura de um painel de especialistas (Moreira, 1994) ao qual
20
submeteremos perguntas específicas à respetiva área científica e cujas respostas
ajudarão a conferir a validade das hipóteses previamente mencionadas. Para mitigar o
perigo, sempre presente nesta forma metodológica, de ver a investigação guiada por
terceiros temperaremos as respostas destes com dados fácticos encontrados no
decurso da investigação bem como leituras pessoais sobre o problema em questão.
21
I-3 - Descrição dos Capítulos
Assim sendo, a dissertação acabou por assumir o seguinte formato:
Os capítulos “introdutórios”, onde se inclui os “Agradecimentos”, o “Resumo”, o
“Índice de figuras” e o “Índice”;
O Capítulo I onde se insere a “Introdução”, o “Enquadramento Metodológico”
que inclui a pergunta de partida e as hipóteses de pesquisa e a “Metodologia” que
assume especial relevância dada a necessidade de uma forte ancoragem científica por
parte da dissertação, numa área ainda pouco ou nada explorada em Portugal, que é o
potencial das vulnerabilidades se transformarem em ameaças ao Estado;
Seguidamente, no Capítulo II “Alterações Climáticas e o Aquecimento Global”
realiza-se uma síntese do conhecimento científico mais atual, existente sobre o
fenómeno do aquecimento global. O Capítulo encontra-se subdividido em vários
subcapítulos que abrangem a explicação do fenómeno (pontos II.1, II.2 e II.2.1), as
projeções para a Europa e Portugal (pontos II.3, II.3.1 e II.3.2) e os impactos que serão
sentidos (pontos II.4 e II.4.1);
No Capítulo III “Segurança Nacional e Segurança Ambiental” introduz-se o
conceito de segurança nacional (III.1) e a evolução do mesmo ao longo dos diferentes
contextos históricos, para se perceber o surgimento do conceito de segurança
ambiental (III.2), bem como as dificuldades inerentes à operacionalização do conceito;
No Capítulo IV, “Das Vulnerabilidades às Ameaças: aplicação prática” são
identificadas as duas principais vulnerabilidades às quais Portugal se encontra sujeito e
é demonstrado como estas podem escalar para ameaças, onde existe uma quebra num
dos três componentes (Território, Povo e Poder político) e dos três fins do Estado
(Segurança, Justiça e Bem-estar económico e social), sendo por isso uma ameaça ao
Estado enquanto entidade soberana. Devido à impossibilidade de testar estas
hipóteses, recorremos a exemplos do passado para demonstrar onde se estabelece a
linha que separa uma vulnerabilidade de uma ameaça;
Finalmente é apresentada a Conclusão, onde são também enumerados alguns
dos mecanismos de adaptação/mitigação às alterações climáticas vigentes em Portugal
bem como uma reflexão crítica sobre a aplicabilidade e eficácia dos mesmos.
22
Capítulo II - Alterações Climáticas e Aquecimento Global
II.1 – O aquecimento global
Apesar do termo “alterações climáticas” se encontrar amplamente difundido é
frequentemente utilizado como referência às recentes mudanças climáticas,
nomeadamente o aquecimento global. É, no entanto, preciso ter em conta que estas
foram frequentes ao longo de todo o período geológico da Terra. Representaram
períodos de transição entre as várias eras geológicas e determinaram toda a biologia
terrestre e oceânica existente. Para o IPCC, as alterações climáticas referem-se «to a
change in the state of the climate that can be identified (e.g. using statistical tests) by
changes in the mean and/or the variability of its properties, and that persists for an
extended period, typically decades or longer. It refers to any change in climate over
time, whether due to natural variability or as a result of human activity.» (Pachuri,
2007:30).
A temperatura no Planeta resulta por um equilíbrio entre a energia que entra
no sistema atmosfera – Terra e a que sai. A variação do sistema climático ocorre
quando existe um desequilíbrio devido a forças externas (forcings) naturais,
antropogénicas ou fruto de uma mudança na dinâmica interna do clima. Referimo-nos
a uma variação acentuada do clima, que se prolonga no tempo e pode ser mensurável,
como foi referido, e que difere da irregularidade natural do clima, fruto da dinâmica
interna do Planeta. Esta irregularidade natural inclui desde a simples mudança das
temperaturas de noite para as de dia, a fenómenos mais intensos como o El Niño, La
Niña, a NAO ou a Corrente do Atlântico Norte, que influenciam o clima de uma forma
periódica.
Os dois principais fatores externos naturais são as erupções vulcânicas e as
variações na radiação solar, sendo este último fundamental para providenciar a
energia que o sistema climático necessita. «There are three fundamental ways to
change the radiation balance of the Earth: 1) by changing the incoming solar radiation
(e.g., by changes in Earth’s orbit or in the Sun itself); 2) by changing the fraction of
solar radiation that is reflected (called ‘albedo’; e.g., by changes in cloud cover,
atmospheric particles or vegetation); and 3) by altering the longwave radiation from
23
Earth back towards space (e.g., by changing greenhouse gas concentrations).» (Le
Treut, 2007:96). Por outro lado, o clima responde através de uma série de mecanismos
de resposta – feedback mechanisms – que podem agravar ou não (positivos ou
negativos) a mudança em curso. A persistência destas forças externas provocam uma
mudança na temperatura que se irá manter até o Planeta recuperar, de uma forma
natural, o seu equilíbrio energético (North, 2006).
Por outro lado, esta variação pode ter como causa fatores antropogénicos,
nomeadamente as emissões de gases com efeito de estufa, o que, de acordo com os
cientistas, tem estado na base do recente aquecimento global. A actividade humana
pode influenciar as alterações climáticas através de uma mudança na composição da
atmosfera. Os gases libertados de atividades como a indústria, os transportes e a
agricultura, entre outros, bem como as mudanças no uso do solo devido à
desflorestação, irrigação ou produção de culturas que alteram o albedo da superfície e
induzem mudanças no sistema climático (Bierbaum, 2010). A queima de combustíveis
fósseis como carvão, petróleo e gás natural juntamente com a desflorestação
generalizada, tem vindo a aumentar significativamente a emissão de dióxido de
carbono (CO2) nos últimos 200 anos, com especial incidência nos últimos 50 anos.
«Every year these emissions currently add to the carbon already present in the
atmosphere a further 8000 million tonnes, much of which is likely to remain there for a
period of 100 years or more.» (Houghton, 2011:13).
O dióxido de carbono, o metano e o vapor de água existem naturalmente na
atmosfera, absorvendo a radiação proveniente do Sol e sobretudo a que é refletida
pela superfície da Terra. Sendo bons absorventes de radiação, aquecem a atmosfera
como uma estufa – daí a denominação “efeito de estufa” – aproximadamente 33°C
mais quente do que se não existissem estes gases e nuvens, mantendo o Planeta a
uma temperatura estável e criando a possibilidade de existência de vida na Terra
(Anderson, 2010). O crescente aumento de emissões de gases com efeito de estufa
(greenhouse gases - GHG) como o dióxido de carbono, o metano, mas também o óxido
de nitroso, entre outros, tem vindo a aumentar a capacidade da atmosfera de absorver
radiação, amplificando o efeito de estufa natural já existente (enhanced greenhouse
effect) e, consequentemente, aumentando as temperaturas globais. De facto, de
acordo com o IPCC «Most of the observed increase in global average temperatures
24
since the mid-20th century is very likely due to the observed increase in anthropogenic
GHG concentrations. This is an advance since the TAR’s [Third Assessment Report, ou
seja terceiro relatório do IPCC] conclusion that “most of the observed warming over
the last 50 years is likely to have been due to the increase in GHG concentrations”.»
(Pachuri, 2007:10).
Do conjunto de gases com efeito de estufa abrangidos pelo protocolo de
Quioto que obriga os Estados a reduzir a sua emissão fazem parte: o dióxido de
carbono (CO2), o metano (CH4), o óxido de nitroso (N2O), os hidrofluorcarbonetos
(HFCs), os perfluorcarbonetos (PFCs) e o hexafluoreto de enxofre (SF6) (Houghton,
2011, Pittock, 2007).
O dióxido de carbono é de longe o mais importante gás emitido devido às
atividades humanas, tendo contribuído em cerca de 77% para o efeito de estufa de
origem antropogénica (IPCC, 2007). Como já foi referido existe naturalmente no
Planeta e é fundamental para o seu funcionamento através do ciclo do carbono: o CO2
é emitido para a atmosfera por nós, seres humanos, mas também pelos animais, no
simples ato de respirar ou pela decomposição de material orgânico; por outro lado é
absorvido pelos oceanos e também pelas plantas, que no processo da fotossíntese o
decompõem em oxigénio e carbono, libertando o oxigénio e produzindo compostos
orgânicos, num ciclo constante (Denman, 2007, Houghton, 2011)13. No entanto, desde
a Revolução Industrial que o ser humano tem vindo a destabilizar este mecanismo
natural, aumentando as emissões de CO2 devido sobretudo à queima de combustíveis
fósseis. Se por um lado existe um acréscimo no input de dióxido de carbono na
atmosfera, este não é acompanhado por um output do sistema. Trocas rápidas (entre
menos de um ano e algumas décadas) de CO2 apenas podem ocorrer entre a
atmosfera e a biosfera (plantas, animais e solo) ou as águas superficiais dos oceanos.
Relativamente às trocas com a biosfera o processo encontra-se bastante limitado dada
a atual pressão do ser humano sobre os sistemas naturais. Mesmo que se invertesse
esta situação, seriam necessárias áreas florestais enormes para conseguir colmatar o
atual volume de emissões, encontrando-se estas sempre dependentes da qualidade
dos solos, para fazer crescer estes organismos, e à probabilidade de rapidamente
13
Para mais informação sobre o ciclo do carbono consultar o Capítulo 7, do Volume I do relatório do IPCC (2007) disponível em: http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg1/ar4-wg1-chapter7.pdf
25
serem destruídas devido a incêndios florestais, retornando o CO2 novamente à
atmosfera. Também a superfície do oceano absorve dióxido de carbono com rapidez.
No entanto o input de CO2 altera a sua composição química, tornando as águas
oceânicas superficiais mais ácidas e apenas processos com a duração de escalas de
tempo geológicas (milhares de anos) possibilitam que estas águas, carregadas de
dióxido de carbono, se envolvam com águas mais profundas. Este é depositado no
fundo dos oceanos onde a sua deposição em sedimentos constitui o único processo de
remoção natural e permanente do dióxido de carbono (Pittock, 2007).
Durante milhares de anos até meados do século XVIII, ao início da Revolução
Industrial, as variações naturais do dióxido de carbono na atmosfera situavam-se
dentro de um espectro de variação de 20 ppm (partes por milhão) de um valor médio
de 280 ppm (Brown, 2006). Desde este período que os valores têm vindo a aumentar
gradualmente, sendo este aumento mais acentuado a partir da segunda metade do
século XX. No presente os valores situam-se nos 391.80 ppm (2011)14 (ver Figura 5),
um aumento de 39% que é um valor inexistente nos últimos 800 000 anos da Terra,
quando esta, segundo indícios revelados por análises a núcleos de gelo, anéis de
árvores e medições geológicas, teria um clima bastante diferente do atual (Bierbaum,
2010).
Figura 5 – Concentração de CO2 na atmosfera no Observatório Mauna Loa (Hawai)
Fonte: U.S. Department of Commerce, National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA)
disponível em: http://www.esrl.noaa.gov/gmd/ccgg/trends/co2_data_mlo.html
14
U.S. Department of Commerce, National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) disponível em: http://www.esrl.noaa.gov/gmd/ccgg/trends/co2_data_mlo.html (consultado em Dezembro de 2011)
26
Um clima tropical pode parecer uma visão apetecível para o ser humano
comum mas o excesso de calor em determinadas regiões até então temperadas, bem
como a inexistência de gelo nos polos e a consequente diminuição do albedo e subida
acentuada do nível dos oceanos, seria um cenário catastrófico num Planeta já
densamente povoado, com concentração de população nas faixas litorais e escassez de
recursos (Brown, 2011).
A duração do dióxido de carbono é outra característica do mesmo. Apesar de
não existir um consenso em relação à duração do CO2 na atmosfera, a maioria dos
estudos aponta para uma durabilidade na ordem dos 100 anos (Houghton, 2010). A
dificuldade de calcular este período encontra-se relacionada com a complexidade de
trocas do dióxido de carbono entre os vários sistemas (atmosfera, biosfera, oceanos).
A absorção de CO2 pela biosfera não varia relativamente à quantidade deste presente
na atmosfera (excluindo o reduzido efeito da fertilização do CO2). Como já foi referido,
o aumento apenas poderia ocorrer com um crescimento das áreas florestais. Por outro
lado, estas trocas influenciam a composição química dos oceanos que ao tornarem-se
mais ácidos (devido ao aumento da concentração de dióxido de carbono) vão
perdendo a capacidade de absorção de CO2 uma vez que se vão saturando. Os
investigadores calculam que entre 15% a 40% de CO2 irá manter-se na atmosfera
durante os próximos milhares de anos até que haja uma renovação das águas
superficiais saturadas, criando outra vez a capacidade para absorção de dióxido de
carbono. Assim, calcula-se que mesmo que existisse uma cessação total das emissões
de CO2 amanhã, os seus efeitos prolongar-se-iam durante os próximos 10 000 anos,
até o dióxido de carbono atingir a concentração presente no período pré-Revolução
Industrial (Archer, 2009).
O metano é também um gás com efeito de estufa, existente no meio natural
que tem observado um aumento significativo por via das emissões devido a fatores
antropogénicos. Como o dióxido de carbono calcula-se que o Planeta esteja preparado
para “lidar” com um certo volume de emissões geradas por fontes naturais, como os
terrenos pantanosos, as térmitas através do seu processo digestivo, os oceanos, rios e
estuários, os hidratos de metano presentes em zonas subaquáticas profundas ou em
zonas de sedimentação, no permafrost, as emissões produzidas por vulcões, fogos
27
florestais, solos (em zonas tropicais quando desflorestadas) e animais selvagens
(Anderson, 2010).
No entanto, estas emissões têm vindo a aumentar, coincidindo com o
crescimento populacional gerado pela Revolução Industrial tal como aconteceu com o
CO2. Este fenómeno deve-se sobretudo ao crescimento do consumo de gás natural, de
que o metano é o principal componente, bem como o aumento das áreas pantanosas
destinadas à cultura do arroz, onde a decomposição anaeróbica de material orgânico
gera elevadas emissões de metano. Outras fontes de origem antropogénica resultam
da criação de gado, decomposição de material depositado em aterros ou lixeiras,
exploração de minas de carvão subterrâneas ou de superfície e emissões de metano
proveniente de estações de tratamento de águas residuais (Anderson, 2010).
Apesar de diminuta, quando comparada com o dióxido de carbono, a produção
de metano e a sua concentração na atmosfera (1,775 ppm em 2005 quando
comparadas com 380 ppm de dióxido de carbono), representa atualmente cerca de
14% do efeito de estufa devido ao facto deste gás ser 20 vezes mais eficaz que o CO2
na absorção de radiação. Por outro lado o metano dura cerca de 12 anos, ao fim dos
quais é destruído na atmosfera através de processos químicos. No entanto, este é um
dos gases que merece a atenção do IPCC e da Comunidade Internacional uma vez que,
apesar dos valores de metano na atmosfera serem os mais elevados dos últimos 650
000 anos, o ritmo das emissões tem vindo a decrescer desde os anos 80, sendo
praticamente nulo em 2005. A incerteza quanto ao futuro das emissões leva a que
sejam projetados cenários que abrangem desde a duplicação das emissões como um
decréscimo de 25% das mesmas (Houghton, 2011).
Existem ainda outros gases com efeito de estufa que, apesar da sua quantidade
diminuta encontram-se referenciados uma vez que a maioria tem vindo a aumentar ao
mesmo tempo que apresentam uma elevada durabilidade na atmosfera e eficácia em
termos de efeito de estufa. O óxido de nitroso é o mais importante destes gases
“menores” contribuindo em cerca de 7% para o atual efeito de estufa. A sua
concentração é de apenas 0.3 ppm na atmosfera mas tem vindo a aumentar o que se
torna uma preocupação visto que a sua duração na atmosfera é de 120 anos,
aproximadamente. O aumento das emissões deve-se sobretudo aos ecossistemas
naturais e à agricultura, nomeadamente associado ao uso crescente de fertilizantes
28
mas também à indústria química e à queima de biomassa (Anderson, 2010). Ao grupo
dos halocarbons compreendem os clorofluorcarbonetos (CFCs),
hidroclorofluorcarbonetos (HCFCs) e hidrofluorcarbonetos (HFCs). Relativamente aos
CFCs, a descoberta da depleção da camada de ozono e o consequente alerta da
Comunidade Internacional veio a culminar na assinatura do Protocolo de Montreal em
1987, que determinou o fim da produção de CFCs em 2006. No entanto estes são
também gases com efeito de estufa com um efeito 5000 a 10000 vezes superior ao do
dióxido de carbono e uma durabilidade superior a 100 anos, irão causar impactos no
aquecimento global durante este século, ainda que a sua quantidade na atmosfera seja
diminuta (Houghton, 2011). Por serem também gases com efeito de estufa, os HCFCs
foram acrescentados ao Protocolo de Montreal através da emenda aprovada em
Copenhaga, em 1992, onde foi determinada a cessação da sua produção em 203015. Os
HFCs não foram abrangidos visto não contribuírem para a depleção da camada de
ozono. Foram no entanto abrangidos pelo Protocolo de Quioto (1997) dada a
probabilidade de acrescerem ao problema do aquecimento global ainda que a sua
duração esteja na casa das dezenas de anos ao invés de centenas. A preocupação foi
ainda estendida aos perfluorcarbonetos (PFCs) e ao hexafluoreto (SF6) de enxofre,
gases derivados da produção industrial que dada a sua elevada durabilidade (mais de
1000 anos) podem vir a contribuir para o aquecimento global, ainda que não num
futuro próximo (Houghton, 2011).
15
United Nations Environment Program , Ozone Secretariat, disponível em:http://ozone.unep.org/Ratification_status/copenhagen_amendment.shtml
29
II.2 – As Alterações Climáticas do Passado
A capacidade que a paleoclimatologia nos oferece de “olhar para trás” no
tempo e perceber como o clima se comportou mediante a influência de uma
multiplicidade de fatores naturais é uma ferramenta fundamental para antecipar,
ainda que com algum grau de incerteza, os tempos que advêm.
Os registos diretos da medição da temperatura são relativamente recentes
remontando aos últimos 150 anos, que permitem uma caracterização mais
pormenorizada e específica para vários locais diferenciados. Estes registos
compreendem a medição da temperatura através de termómetros (ainda que pouco
rigorosos) aos quais se juntam relatos de eventos climáticos escritos na primeira
pessoa.
Mais para trás no tempo, a informação existente é mais parca, não nos
permitindo ter um relato específico de determinado incidente. Assim a caracterização
é feita em largos períodos temporais, utilizando várias fontes como os núcleos de gelo,
nomeadamente do Antártico e da Gronelândia, anéis de árvores, formações
sedimentares, entre outros.
Através da informação paleoclimática recolhida é possível reconstruir cenários
climáticos que demonstram as consequências no ambiente geradas por excessivas
quantidades de dióxido de carbono na atmosfera. De facto, apesar destes fenómenos
de aquecimento no passado possuírem uma origem natural começam a ser observados
pelos investigadores como analogias quase perfeitas do futuro que nos espera, caso as
emissões de CO2 continuem a aumentar de forma descontrolada.
Um destes episódios que começa agora a ser compreendido é o Máximo
Térmico do Paleocénico-Eocénico (Paleocene-Eocene Thermal Maximum - PETM). Este
súbito aquecimento ocorreu na transição do Paleoceno para o Eoceno, durante a Era
Terciária, há aproximadamente 56 milhões de anos ou seja 10 milhões de anos depois
da extinção dos dinossauros no Cretáceo (Jardine, 2011). É, no entanto, importante
perceber que o clima tinha vindo a aquecer desde o Cretácico, proliferando uma
grande diversidade de plantas e animais num planeta mais quente e tropical que o
atual. As regiões polares e a latitudes mais elevadas encontravam-se maioritariamente
livres de gelo, podendo as temperaturas do ar alcançar os 25°C e do oceano Ártico
23°C. «Alligators, which today are found in the warm tropics and subtropics, occuredd
30
well within the Arctic Circle during the early Eocene.» (Jardine, 2011:2). Apesar de não
existir ainda uma explicação concreta para a origem deste aquecimento, todas as
hipóteses parecem apontar para uma libertação massiva de hidratos de metano (a
oxidação do metano origina CO2), contribuindo fortemente para um aumento do efeito
de estufa natural. Enquanto uma das hipóteses aponta para um desmoronamento
submarino de enormes proporções que destabilizou os compostos sedimentares no
fundo dos oceanos, libertando grandes quantidades de hidratos de metano, outra
hipótese, também bastante reiterada ultimamente, aponta para um conjunto de
vulcões submarinos na região da Gronelândia que, ao entrarem em erupção,
libertaram gases e basalto durante um vasto período de tempo. Este conjunto de
erupções submarinas destabilizou grandes quantidades de hidratos de metano que se
encontravam sob uma grande pressão. Calcula-se que aproximadamente 2000
gigatoneladas de carbono tenham sido libertadas para a atmosfera e oceanos durante
este período. As temperaturas nas regiões continentais aumentaram cerca de 5°C nas
latitudes mais elevadas e 3°C nas latitudes mais baixas. Do mesmo modo também nos
oceanos a temperatura das águas superficiais subiram 6°C em latitudes elevadas e 4°C
em latitudes baixas enquanto as águas profundas tiveram um aumento de 8°C nas
latitudes mais elevadas e 6°C nas latitudes mais baixas, perto do Equador (Jardine,
2011). Estas mudanças foram dramáticas para os ecossistemas existentes, originando
impactos regionais diversificados, como períodos de seca mais acentuados e expansão
dos desertos em certas regiões e aumento da precipitação noutras. No entanto, é
preciso lembrar que apesar de ser considerada uma mudança climática abrupta,
geologicamente falando, esta ocorreu durante um período entre 1000 a 10000 anos,
ou seja, um ritmo dez vezes mais lento que o aquecimento atual, possibilitando a
adaptação e a migração de algumas espécies. Do mesmo modo, também a
recuperação do clima depois do PETM demorou cerca de 100 000 anos, até que parte
do CO2 voltasse a ser novamente absorvido pela biosfera e oceanos, um presságio do
que o futuro nos pode reservar se libertarmos excessivas quantidades de dióxido de
carbono (Jardine, 2011).
Mais recentemente o período a meio do Plioceno, há aproximadamente 3
milhões de anos atrás, tem mostrado evidências das alterações passíveis de acontecer
no futuro próximo. «The mid-Pliocene is the last time in geological history when our
31
planet’s climate was significantly warmer, for a prolonged period, than it is today.»
Haywood e Williams, 2005:138). Durante aproximadamente 300 000 anos (3.3 a 3
milhões de anos atrás) a temperatura média global encontrava-se 2°C a 3°C acima dos
valores pré-industriais; o CO2 entre 360 e 400 ppm e os oceanos 25m acima do nível
atual, um período quente que promoveu o desenvolvimento dos hominídeos (Lynnas,
2008)16. Análises de fósseis de microrganismos presentes nos sedimentos demonstram
um aumento de temperatura significativo na região dos polos (3°C a 5°C) e menos
acentuado nas regiões dos trópicos (1°C a 3°C). Uma vez que tanto os continentes
como as bacias dos oceanos já se encontravam na sua presente configuração
geográfica, incluindo o movimento da corrente do Golfo17, apenas uma subida dos
gases com efeito de estufa na atmosfera produziria um aumento generalizado das
temperaturas (Haywood e Williams, 2005). De acordo com os modelos climáticos esta
mudança de comportamento do clima a nível regional vem demonstrar o efeito de um
dos vários feedbacks positivos existentes: ao derreter grandes áreas do Ártico e da
Gronelândia, regiões que antes atuavam como espelhos gigantes refletores de
radiação solar, passaram a absorver a radiação, amplificando o aquecimento já
existente no Ártico (Haywood e Williams, 2005).
Ambos os períodos quentes que referimos são anteriores ao Quaternário (era
atual) tendo ocorrido há alguns milhões de anos atrás. Como é natural à medida que
recuamos mais no tempo, a informação torna-se cada vez mais escassa, o que só
demonstra uma necessidade crescente de investigação no passado para percebermos
o futuro. Atualmente existem modelos computorizados altamente complexos que são
capazes que recriar o clima existente durante esses períodos com bastante realismo,
sendo ótimos indicadores para perceber como o clima se pode comportar quando
algumas componentes deste se alteram.
Durante o Pleistocénico (Quaternário), a Terra arrefeceu e entrou num ciclo de
períodos glaciares intercalados por períodos mais quentes (interglaciares), resultado
16
Um dos primeiros fosseis de hominídeos, “Lucy”, foi descoberto em África tendo sido datado com 3 milhões de anos aproximadamente (Lynnas, 2008:108). 17
PETM – continentes tinham começado a separar-se e o Atlântico era bastante estreito, com uma largura semelhante à do Mediterrâneo atual. Meio do Plioceno – continentes no mesmo local que a atualidade; tinha acabado de se formar a ponte que liga a América do norte à América do sul cortando a ligação entre os oceanos pacífico e atlântico tornando este último mais salino (Haywood e Williams, 2005).
32
de um dos fatores externos que pode influenciar o clima: a variação nos parâmetros da
órbita da Terra à volta do Sol (Jansen, 2007). As amostras recolhidas nos núcleos de
gelo demonstram uma alternância entre glacial-interglacial nos últimos 740 000 anos
devido à redução/aumento de insolação, sendo que os últimos 430 000 anos
encontrarem-se melhor documentados. Sabe-se hoje que se registaram períodos
glaciares de grande amplitude, com uma duração média de 100 000 anos, enquanto o
período interglacial durava entre 10 000 a 30 000 anos (no período até aos 430 000
anos) (Figura 6).
Figura 6 – Concentração de CO2 presente no núcleo de gelo de Vostok, Antártica
Fonte: Barnola et al., Historical Carbon Dioxide Record from the Vostok Ice Core, Carbon Dioxide
Information Analysis Center (CDIAC) disponível em: http://cdiac.ornl.gov/trends/co2/vostok.html
As alterações de ciclos resultaram numa variação bastante acentuada das
temperaturas. Durante os períodos glaciares, as temperaturas médias globais
encontrar-se-iam 3°C (trópicos) a 5°C (latitudes mais elevadas) abaixo das atuais,
agravadas mais 1°C a 2°C devido a poeiras na atmosfera e mudanças na vegetação,
com a camada de gelo do Ártico a atingir grande parte do Reino Unido e norte da
Alemanha. Por outro lado, durante os períodos interglaciares, nomeadamente na
última interglaciação, aproximadamente há 125 000 anos, o aumento de temperatura
era 2°C a 5°C superior à atual, no hemisfério Norte, o que implicou um recuo na
camada de gelo da Antárctica (Jansen, 2007) e um aumento no nível dos oceanos entre
4m a 6m. A relação do dióxido de carbono, nas constantes variações entre 180 e
33
300ppm, com os períodos de glaciação e interglaciação não tem uma resposta
concreta. Apesar de se saber que a concentração de CO2 na atmosfera variava
consoante o ciclo, estas alterações só se manifestavam várias centenas de anos depois
de o período se iniciar. O maior grupo de hipóteses aponta para o oceano como
origem nas alterações da concentração de CO2, através de trocas dinâmicas constantes
entre «ocean circulation, marine biological activity, ocean-sediment interactions,
seawater carbonate chemistry and air-sea exchange. Most explanations propose
changes in oceanic processes as the cause for low glacial CO2 concentrations. The
ocean is by far the largest of the relatively fast-exchanging (<1 kyr) carbon reservoirs,
and terrestrial changes cannot explain the low glacial values because terrestrial
storage was also low at the Last Glacial Maximum» (Jansen, 2007:449). Qualquer que
tenha sido o impacto dos oceanos na composição da atmosfera, sabe-se que este
apenas veio amplificar as alterações geradas pela variação da órbita terrestre, visto
que esta por si só, também não teria capacidade de provocar as alterações observadas.
Provavelmente a variação da concentração de CO2 não é a causa da variação do clima
mas uma consequência.
A transição para o Holoceno acontece pouco depois do final da última grande
glaciação, há cerca de 10 000 anos. Ao contrário da instabilidade climática gerada
durante o Pleistocénico, o atual período interglacial estável, pouco usual, promoveu o
desenvolvimento da civilização humana, nomeadamente através da agricultura,
prática impossível ou quase impossível na era anterior, devido ao clima frio e seco em
quase todas as regiões (Richerson et al., 2001). O Holoceno, que dura até ao presente,
é caracterizado por uma estabilidade nas temperaturas, apesar de existir uma variação
natural do clima que se traduz em pequenas alterações regionais.
Destacam-se apenas dois períodos onde existiu uma mudança mais acentuada:
o Período Quente Medieval durante o século XI e XIV e a Pequena Idade do Gelo
associada ao período entre os séculos XV e XIX. «There has been much debate about
the extent of these particular periods that only affected part of the northern
hemisphere and are therefore more prominent in local records, for instance those from
central England.» (Houghton, 2011:81). Devido à falta de registos fiáveis sabe-se
apenas de relatos de aumento das temperaturas e da precipitação que se prolongam
por um período dentro dos séculos referidos para o Período Quente Medieval.
34
Informação paleoclimática recolhida inicialmente revelava que este tinha sido o
período mais quente nos últimos 2000 anos, com um aumento de temperatura entre
1°C e 2°C. No entanto informação recente veio revelar que na realidade a temperatura
média era de 0.3°C inferior à atual, ou seja, o que foi um período anormalmente
quente face às temperaturas médias da época, é, quando comparado com as
temperaturas atuais, um período mais frio, o que só vem atestar o aumento de
temperatura atual face a alguns séculos atrás (Bradley et al., 2003). Por outro lado a
Pequena Idade do Gelo traduziu-se numa diminuição da temperatura média de 0.6°C
durante o período referido. Ainda que não exista consenso relativamente às datas de
início e término, este período observou invernos mais frios, expansão dos glaciares e
de fenómenos sociais dramáticos como fomes um pouco por toda a Europa (Mann,
2002). A falta de consenso afecta também a discussão sobre a origem destas
alterações apesar de a maioria apontar para o vulcanismo particularmente activo
durante a Pequena Idade do Gelo bem como mudanças na intensidade da radiação
solar (Houghton, 2011). Às forças externas ou internas que destabilizam o sistema
climático, este responde de forma a estabilizar novamente o clima, funcionando quase
como uma balança que se equilibra a ela própria.
35
II.2.1 – Os Últimos 100 anos
Comparativamente às variações do clima que temos vindo a enunciar ao longo
dos vários períodos históricos, os últimos dois séculos, principalmente os últimos 100
anos são os melhores documentados do ponto de vista climatológico. Com o início das
medições das temperaturas em 1880 é possível estabelecer uma evolução do clima
nos últimos 130 anos, tendo como temperatura média global a média das
temperaturas compreendidas no período 1901-2000. Ainda que estas medições
inicialmente utilizassem meios mais arcaicos para a recolha de informação, os modelos
de projecção de climas actuais vieram confirmar a veracidade dos dados recolhidos.
De acordo com o IPCC «the total temperature increase from 1850 – 1899 to
2001 – 2005 is 0.76°C [0.57°C to 0.95°C]» (IPCC, 2007a:5), um aumento de temperatura
que não se regista pelo menos nos últimos 1300 anos. No entanto esta evolução não
foi uniforme, sendo comum dividir esta evolução em três períodos principais: 1880-
1940 – aquecimento; 1940-1970 – arrefecimento/estagnação; 1970 – 2010 –
aquecimento (Figura 7).
Figura 7 – Anomalias da temperatura global anual
Fonte: NOAA, National Climate Data Center, disponível em http://www.ncdc.noaa.gov/cmb-
faq/anomalies.php
O final do século XIX e inícios do século XX é marcado por um aumento ligeiro
mas gradual da temperatura média global (no rescaldo da Pequena Idade do Gelo),
com acentuadas variações regionais. Este aumento acentuou-se particularmente entre
36
1910 e 1940. Em apenas 30 anos a temperatura média global aumentou
aproximadamente 0.5°C (Hansen et al., 2001).
O período de arrefecimento que se seguiu, entre 1940 e 1970, é ainda pouco
compreendido pelos investigadores. A descida rápida mas ligeira das temperaturas
(0.2°C aproximadamente) entre 1940 e 1950 foi seguida de um período de
estabilização até 1970. Pensa-se que na origem desta anomalia estejam as elevadas
emissões de aerossóis que atingiram o pico durante este período e que anulam o
efeito dos gases com efeito de estufa (Hansen et al., 2001). Também a erupção do
Monte Agung na Indonésia em 1963, lançou grandes quantidades de partículas
refletoras da radiação para a atmosfera o que interferiu com a quantidade de radiação
absorvida pelo planeta (Hegerl, 2007). Outra possibilidade avançada foi um
enviesamento nas medições da temperatura dos oceanos visto que os dados revelam
um declínio apenas nos valores sobre os oceanos. Em terra as temperaturas
estabilizaram (Forest e Reynolds, 2008; Thompson et al., 2008).
No entanto, desde 1970 que as temperaturas têm vindo a aumentar a um ritmo
bastante mais acelerado que no início do século XX. «The rate of warming over the last
50 years is almost double that over the last 100 years» (Trenberth, 2007:237),
acompanhando o aumento nas emissões de dióxido de carbono, que se intensificaram
a partir da segunda metade do século XX. Calcula-se que o ritmo do aquecimento por
década aumentou de 0.07°C, nos últimos 100 anos, para 0.13°C, nos últimos 50 anos
(Trenberth, 2007). De facto, os 13 anos mais quentes, desde que existem registos,
ocorreram todos nos últimos 15 anos (1997-2011), sendo 2005 o ano mais quente
alguma vez registado, apesar de recentes notícias apontarem 2010 como o ano mais
quente de sempre18. Apesar do aumento de temperatura ser global, o ritmo do
aquecimento em terra é sensivelmente o dobro daquele observado nos oceanos
(desde 1979 que as temperaturas têm vindo a aumentar, por década, a um ritmo de
0.27°C nos continentes e 0.13°C nos oceanos) (Trenberth, 2007). Também o aumento
das temperaturas é mais acentuado nas latitudes mais elevadas, a norte, afetando
18
Ver Nicolau Ferreira (2012), “Atualização do registo mundial de temperaturas revela que 2010 foi o ano mais quente”, Público, disponível em http://ecosfera.publico.pt/noticia.aspx?id=1538584 (consultado em 23/05/2012).
37
diversos sistemas biológicos e climáticos que, pela sua vulnerabilidade às alterações,
são uma importante fonte de alerta e informação (IPCC, 2007b).
O Ártico é um desses sistemas onde a temperatura aumentou
aproximadamente 3°C desde 1980 (Lemke, 2007). Os glaciares/coberturas de gelo são
altamente sensíveis às mudanças climáticas sendo uma variável fundamental nos
programas de monitorização do clima. Tornam-se tão ou mais importantes dado que
representam ¾ de toda a água potável existente no planeta, suportando sistemas de
agricultura, industriais, uso doméstico e sendo também uma importante componente
do turismo e da produção hidroelétrica (UNEP, 2009). O pico da cobertura de gelo
ocorreu há aproximadamente 21 000 anos, aquando da última idade do gelo (Last
Glacial Maximum), quando 1/3 da superfície terrestre encontrava-se coberta por gelo.
Desde então a criosfera global retrocedeu de uma forma geral, sendo pontuada por
alguns re-avanços intermitentes. O avanço máximo dos glaciares, no Holoceno,
ocorreu durante a Pequena Idade do Gelo. Seguidamente observou-se um retrocesso
significativo entre 1920 e 1940, uma estabilização/aumento entre 1940 e 1970 e
novamente um forte retrocesso a partir dos anos 70 (UNEP, 2009). Apesar de as
variações nos glaciares dependerem fortemente do clima/geografia do terreno bem
como das dimensões dos próprios glaciares (pequenos glaciares são bastante mais
susceptíveis a pequenas variações no clima do que os glaciares de maiores dimensões)
existe uma tendência global para a diminuição dos mesmos. De facto, só na última
década os glaciares perderam, em média, o equivalente a 60cm de água por ano e
desde 1980 até ao presente registou-se um declínio na espessura dos mesmos (mass
balance) de aproximadamente 12.5 metros19. Também a área coberta de neve durante
o final da Primavera (Março-Abril) no hemisfério Norte tem vindo a diminuir
significativamente a partir de meados dos anos 80, levando plantas de várias espécies
a brotar mais cedo, o que aumenta o período de desenvolvimento das mesmas20. Estas
alterações são assim coincidentes com as recentes alterações climáticas observadas,
derivadas da acumulação de gases com efeito de estufa na atmosfera. A estabilização
do retrocesso dos glaciares e inclusive ligeiro aumento nos anos 70 coincide com uma
19
Ver NOAA (2011), Climate Change: Glacier Mass Balance, disponível em:
http://www.climatewatch.noaa.gov/article/2011/climate-change-glacier-mass-balance 20
Ver NOAA (2011), Climate Change: Spring Snow Cover, disponível em: http://www.climatewatch.noaa.gov/article/2011/climate-change-spring-snow-cover
38
diminuição na radiação solar incidente, juntamente com um aumento da poluição.
«Recent studies have shown that the atmosphere cleared up again in the mid 1980s,
probably as a result of the implementation of industrial filters and the breakdown of
industry in the former Soviet Union, which increased the amount of incoming solar
radiation and, as such, of glacier melting.» (UNEP, 2009:14).
O degelo afeta, não só comunidades inteiras que vivem na região Ártica e
dependem da especificidade daquele clima para sobreviverem mas, mais grave ainda,
as regiões costeiras um pouco por todo o mundo devido à subida do nível dos oceanos.
Desde a última grande glaciação (há 21 000 anos) que o nível dos oceanos aumentou
continuamente cerca de 120m, até estabilizar entre 2000 e 3000 anos atrás. Existem
indícios que demonstram que o nível médio dos oceanos aumentou a partir de meados
do século XIX e observações que demonstram que se intensificou ao longo do século
XX, especialmente na última década. O ritmo calculado para o todo o século XX é de
1.7mm por ano e no período de 1961-2003 de 1.8 mm por ano. No entanto, as
previsões não se afirmam promissoras uma vez que as medições realizadas no período
1993-2003 apontam para valores de 3mm por ano, com tendência para aumentar nas
décadas seguintes (Bindoff, 2007). É importante também, referir que uma parte
significativa da subida do nível dos oceanos deriva da expansão térmica dos mesmos
(quando a água aquece expande-se). Os oceanos têm vindo a aquecer, a
profundidades cada vez mais elevadas, alterando a composição química destes e
pondo em causa diversos sistemas bastantes sensíveis a pequenas alterações e que
estão na base da cadeia alimentar. No entanto, persistem incertezas quanto ao valor
do contributo para a média global da diminuição da criosfera um pouco por todo o
Mundo e da expansão térmica dos oceanos (Bindoff, 2007). Para além de pôr em causa
comunidades inteiras que dependem de cursos de água com origem em glaciares, a
situação é ainda mais grave quando se sabe que a fusão do gelo da Gronelândia
provocará uma subida de mais de sete metros do nível do mar (Lemke, 2007)21. O facto
de o aumento da temperatura registada no Ártico ser o dobro do aumento da
temperatura média global (2°C) até ao presente (AMAP, 2011; Trenberth, 2007), de
estudos recentes demonstrarem que o gelo é bastante mais sensível à variação
21
Esta situação não se aplica na Antárctica uma vez que dada a geografia daquela região não se prevê um degelo bastante acentuado como no Ártico, nos próximos séculos.
39
térmica do que inicialmente se pensava e que o ritmo das alterações é bastante mais
acelerado do que os investigadores do IPCC previram em 2007 (Rahmstorf, 2010),
apontam para situações graves nas regiões costeiras um pouco por todo o Mundo
ainda antes do final do século XXI.
Também as alterações observadas na precipitação reforçam a ideia da
mudança climática à escala global. Mais do que um aumento da precipitação, regista-
se uma alteração nos padrões de precipitação bem como um acentuar da
variabilidade. De uma forma geral, a precipitação aumentou nas regiões do hemisfério
Norte, nas latitudes médias e elevadas, nomeadamente nas regiões centro/norte dos
EUA, Canadá, norte da Europa e centro/norte da Rússia. Ao invés, a diminuição da
precipitação ocorreu sensivelmente nas regiões dos trópicos, principalmente a partir
de 1976/1977 (Trenberth, 2007). Esta faixa inclui regiões como o México, o
Mediterrâneo, algumas zonas do sul da Ásia e, nomeadamente, as regiões do Sahel. A
bacia do Amazonas é a excepção uma vez que tem vindo a ficar mais húmida, o que
demonstra a vulnerabilidade dos padrões de precipitação relativamente ao
relevo/topografia do terreno e às massas de ar, sendo difícil estabelecer um padrão
uniforme. Mais claro é o aumento dos fenómenos de precipitação intensa. «It is likely
that there have been increases in the number of heavy precipitation events (…) within
many land regions, even in those where there has been a reduction in total
precipitation amount, consistent with a warming climate and observed significant
increasing amounts of water vapour in the atmosphere» (Trenberth, 2007:238).
O aquecimento da temperatura durante o século XX diverge das restantes
variações climáticas observadas. Os principais forcings do clima durante os últimos
2000 anos foram as variações na radiação solar, o vulcanismo e a emissão de aerossóis
e gases com efeito de estufa devido à atividade humana. «Greenhouse gases and
tropospheric aerosols varied little from A.D. 1 to around 1850. Volcanic eruptions and
solar fluctuations were likely the most strongly varying external forcings during this
period, but it is currently estimated that the temperature variations caused by these
forcings were much less pronounced than the warming due to greenhouse gas forcing
40
since the mid-19th century.»22 . De facto os modelos de projecção do clima necessitam
da variável do aumento dos gases com efeito de estufa de origem antropogénica para
poderem simular a evolução do clima durante o século XX. Também o IPCC sublinha
que forcings naturais podem ter tido alguma influência no aquecimento do Planeta no
início do século XX mas que o mesmo não se revela na segunda metade desse século.
«Numerous experiments have been conducted using climate models to determine the
likely causes of the 20th-century climate change. These experiments indicate that
models cannot reproduce the rapid warming observed in recent decades when they
only take into account variations in solar output and volcanic activity. However (…)
models are able to simulate the observed 20th-century changes in temperature when
they include all of the most important external factors, including human influences
from sources such as greenhouse gases and natural external factors. (…) The human
influence on climate very likely dominates over all other causes of change in global
average surface temperature during the past half century»23.
A interferência do ser humano no ambiente, mais especificamente, no clima é,
na realidade, a história da sua evolução, ainda que de uma forma inconsciente grande
parte do tempo. Desde os primórdios que fenómenos como a utilização do fogo,
desflorestação, agricultura interferiram com o meio, não existindo durante séculos
uma manifestação concreta por parte do clima devido à reduzida dimensão das
populações humanas. No desenrolar da Revolução Industrial, a utilização intensiva de
combustíveis fósseis (inicialmente mais o carvão e só depois o petróleo) bem como a
explosão demográfica que se seguiu, vieram colocar a pressão do ser humano sobre o
Ambiente a níveis completamente diferentes. Como já foi referido, atualmente, os
combustíveis fósseis são utilizados em especial para gerar energia para alimentar a
indústria e os transportes, emitindo sobretudo dióxido de carbono, aquando da sua
combustão, que se tem vindo a acumular na atmosfera dada a longa duração deste
gás. Por outro lado, também o ritmo das emissões tem vindo a aumentar (IPCC,
2007b).
22
Board on Atmospheric Sciences and Climate (2006), Surface Temperature Reconstructions for the last 2,000 years, p.98, livro on-line disponível no site de The National Academies Press, Washington, D.C. http://books.nap.edu/openbook.php?record_id=11676&page=98 23
Board on Atmospheric Sciences and Climate (2006), Surface Temperature Reconstructions for the last 2,000 years, p.99, livro on-line disponível no site de The National Academies Press, Washington, D.C. http://books.nap.edu/openbook.php?record_id=11676&page=98
41
Como é possível concluir da análise dos dados sobre a concentração de CO2
presente nos núcleos de gelo da Antárctica, nos últimos 400 000 anos a concentração
de dióxido de carbono na atmosfera oscilou consoante os períodos glaciares ou
interglaciários, nunca ultrapassando as 300ppm (Barnola et al., 1998)24. Mais
especificamente, os últimos 1000 anos foram pautados por uma estabilidade à volta
dos 280 ppm, com uma pequena quebra entre 1600 e 1750 (pequena idade do gelo), à
qual se seguiu um aumento consecutivo. Face aos valores de 1750 (Revolução
Industrial), de 280ppm, a concentração de CO2 na atmosfera aumentou
aproximadamente 40% até ao presente, tendo havido um agravamento do volume das
emissões na segunda metade do século XX.25. Como já foi referido, os valores actuais
encontram-se muito próximos dos 400ppm26, um valor que nunca se verificou durante
os últimos 650 000 anos (IPCC, 2007a).
24
Barnola et al., Historical Carbon Dioxide Record from the Vostok Ice Core, Carbon Dioxide Information Analysis Center (CDIAC) disponível em: http://cdiac.ornl.gov/trends/co2/vostok.html 25
Neftel et al., Historical Carbon Dioxide Record from the Siple Station Ice Core, Carbon Dioxide Information Analysis Center (CDIAC) dísponivel em: http://cdiac.ornl.gov/trends/co2/siple.html Etheridge et al., Historical CO2 Records from the Law Dome DE08, DE08-2, and DSS Ice Cores, Carbon Dioxide Information Analysis Center (CDIAC), disponível em: http://cdiac.ornl.gov/trends/co2/lawdome.html 26
Valores actualizados mensamente pelo NOAA, disponíveis em http://www.esrl.noaa.gov/gmd/ccgg/ trends/
42
II.3 - Projeções para o século XXI
As alterações climáticas observadas durante o século XX e inícios do século XXI,
bem como a crescente pressão sobre os sistemas naturais devido ao contínuo
desenvolvimento civilizacional, tornam fundamental modelizar os cenários do clima
para o século XXI.
A complexidade do sistema climático, na relação entre os constituintes da
atmosfera com os oceanos e o albedo terrestre, apenas permite aos modelos
climáticos, também eles bastante complexos, antever o comportamento do clima num
futuro distante. Apesar de existir sempre um certo grau de incerteza nas projeções
realizadas, os modelos mais complexos são considerados bastante credíveis, uma vez
que têm por base princípios da física estabelecidos na comunidade científica. Na
realidade os modelos climáticos são «mathematical representations of the climate
system, expressed as computer codes and run on powerful computers.» (Randall,
2007:600) sendo extensivamente comparados com observações, sempre que possível,
e avaliados de forma a corresponderem à realidade. Outro fator de confiança advém
do fato de estes serem também utilizados para reproduzir climas e mudanças
climáticas do passado com sucesso.
Por sua vez, o aumento do conhecimento e compreensão do funcionamento de
alguns sistemas, por parte dos cientistas, desde os primeiros relatórios do IPCC, tem
possibilitado o aperfeiçoamento dos modelos. Ainda assim existem variáveis climáticas
onde os níveis de confiança são mais elevados (temperatura) e menos elevados
(precipitação). De facto as variáveis com maior incerteza encontram-se relacionadas
com as nuvens e a resposta destas às alterações climáticas, com o gelo do mar por
implicar um melhor conhecimento da relação entre a atmosfera e os oceanos e
finalmente com os padrões de precipitação por implicarem um conhecimento mais
específico da região, sendo de assinalar que cenários a uma escala maior são bastante
difíceis de realizar quando os modelos são projetados para funcionar à escala global
(mais pequena) (Randall, 2007). Para mudanças climáticas regionais mais específicas
são muitas vezes utilizados modelos menos complexos e portanto mais adequados a
cada tipo de realidade que têm servido de base a múltiplos estudos sobre as alterações
climáticas (Houghton, 2011). Outro fator de incerteza encontra-se relacionado com a
43
duração das projeções: quanto mais alargada no tempo for, maior o seu grau de
incerteza.
Apesar destas limitações os modelos climáticos são considerados bastante
credíveis e robustos, tendo produzido resultados já comprovados ao longo dos anos.
No entanto o principal fator de incerteza advém do volume das emissões de CO2, que
se encontram diretamente relacionadas com diversos fatores que envolvem o
comportamento humano. Devido ao fato de não ser possivel prever a evolução da
sociedade global «what is being done is to explore likely future climates which arise
from a range of assumptions regarding human activities» (Houghton, 2011:138).
No ano 2000, o IPCC publicou um relatório especial sobre as emissões de gases
com efeito de estufa, para o século seguinte (SRES – Special Report on Emission
Scenarios), produzindo um total de 40 cenários futuros possíveis, agrupados em quatro
famílias principais – A1, A2, B1 e B2. Os cenários têm por base variáveis sobre o
crescimento populacional, o desenvolvimento social e económico, as principais fontes
de energia e desenvolvimento tecnológico:
«A família de cenários A1 descreve um futuro de rápido crescimento económico
mundial, reduzido crescimento populacional e rápida introdução de novas e
mais eficientes tecnologias. Os grandes temas subjacentes são a convergência
entre regiões, desenvolvimento das capacidades e aumento de interações
sociais e culturais, com uma substancial redução nas diferenças do rendimento
per capita ao nível regional. A família de cenários A1 desenvolve-se em quatro
grupos que descrevem direções alternativas para a mudança tecnológica e
sistema energético;
A família de cenários A2 descreve um Mundo bastante heterógeno. O principal
tema subjacente é a independência e a preservação das identidades locais. Os
padrões de fertilidade nas regiões convergem lentamente, o que resulta num
elevado crescimento populacional. O desenvolvimento económico é, numa
primeira fase, focado nas regiões sendo que o crescimento económico per
capita e as mudanças tecnológicas são mais fragmentadas e lentas do que
noutras famílias de cenários;
A família de cenários B1 descreve um Mundo convergente com o mesmo
reduzido crescimento populacional presente na família A1l, mas com mudanças
44
rápidas nas estruturas económicas para uma economia de serviços e
informação, com uma redução na intensidade material e introdução de
tecnologias limpas e de uso eficiente dos recursos. O enfase centra-se em
soluções globais para a sustentabilidade económica, social e ambiental,
incluindo melhorias na equidade mas sem iniciativas ambientais adicionais;
A família de cenários B2 descreve um Mundo em que o enfase centra-se nas
soluções locais para uma sustentabilidade económica, social e ambiental. É um
Mundo com um crescimento populacional moderado, com níveis intermédios de
desenvolvimento económico e uma mais lenta e diversa evolução tecnológica
que nas família B1 e A1. Ao mesmo tempo o cenário é orientado para a
proteção ambiental e equidade social ao nível local e regional.»27
As projeções dos modelos climáticos para os cenários referidos apontam para um
aumento generalizado nas emissões de gases com efeito de estufa até ao final do
século. Para o dióxido de carbono, estima-se que a concentração possa oscilar entre as
550 e 1000ppm (abrangendo os vários cenários) (Houghton, 2011). Apenas as
partículas derivadas do óxido de nitroso apresentam uma redução a partir da segunda
metade do século XXI, devido ao aumento de políticas de proteção para os seres
humanos e o ambiente, da poluição atmosférica e da “chuva ácida”. É ainda
importante referir que se tivermos em conta que a margem de erro relativamente ao
resultado final dos cenários projetados pode variar entre -10% e +30%, depressa
chegamos à conclusão que, havendo uma alteração das condições, é
(consideravelmente) mais provável que o resultado final tenha sido subvalorizado do
que sobrevalorizado (Houghton, 2011).
Com base nos cenários projetados sobre as emissões de dióxido de carbono,
existe clara confiança de que o aumento de temperatura e as consequentes alterações
climáticas serão mais acentuadas do que as observadas durante o século XX (IPCC,
2007a). Relativamente à temperatura média global espera-se um aumento mínimo de
1.8°C (para o cenário com as emissões mais reduzidas) e um aumento máximo de 4.0°C
27
IPCC, “Emissions Scenerios”, disponível em: http://www.ipcc.ch/ipccreports/sres/ emission/index.php?idp=91#4.2.1. (Consultado em 23/03/2012, traduzido para português pela autora). Os quatro grupos são: A1C, A1G, A1T (predominantly non-fossil fuel) e A1B (balanced). Posteriormente os grupos A1C e A1G foram combinados num grupo de utilização intensiva de energias fósseis (fossil intensive), A1FI. Para mais informação sobre os diversos cenários criados sobre as projeções de dióxido de carbono, consultar o relatório SRES (Special Report on Emission Scenarios) no site do IPCC.
45
(para o cenário com as emissões mais elevadas), que ocorrerá a um ritmo de 0.2°C por
década, pelo menos durante as próximas duas décadas seguintes (IPCC, 2007a).
Quando acrescentadas as incertezas, o aumento da temperatura poderá variar entre
1.1°C e 6.4°C.
O aumento de temperatura projetado poderá vir a ser agravado pelos
mecanismos de resposta (feedbacks mechanisms) das variáveis que interagem com o
clima. Apesar de existirem feedbacks negativos, como é o caso do efeito de fertilização
na vegetação, devido ao aumento da fotossíntese provocado pelo aumento de CO2 na
atmosfera, parece ser bastante provável que os feedbacks positivos irão anular e
inclusive ultrapassar em larga escala os primeiros (Scheffer et al., 2006). Existem
diversos feedbacks positivos:
Aumento da atividade bacterial na biologia terrestre, devido ao
aumento da temperatura, que realiza a decomposição de material
orgânico, libertando maiores quantidades de CO2 (Cox et al., 2000);
À medida que os oceanos aquecem observa-se uma diminuição dos
nutrientes provenientes das correntes frias, que causa uma diminuição
do plâncton existente e consequente diminuição da absorção do CO2
por parte deste. Esta situação leva a um aumento da concentração de
CO2 na atmosfera à medida que os oceanos aquecerem (Woods e
Barkmann, 1993);
Sendo o vapor de água um dos mais potentes gases com efeito de
estufa na atmosfera e que, na generalidade aumenta com temperaturas
mais elevadas, os estudos apontam para um efeito positivo sobre as
alterações climáticas, sendo este capaz de duplicar o aumento de
temperatura média global que ocorreria caso o vapor de água se
mantivesse fixo (Houghton, 2011);
O retrocesso do gelo por todo o mundo, que reflete até 70% da radiação
que lhe incide, aumenta a absorção da mesma, tanto em terra como nos
oceanos, agravando o aquecimento (Houghton, 2011).
A forma como certas variáveis irão reagir e qual a sua contribuição para o
aumento de temperatura (além do projetado inicialmente) é ainda alvo de relativa
incerteza, mas os modelos mais atuais apontam para uma subavaliação inicial da
46
contribuição destes mecanismos (Denman, 2007). De facto «there is unanimous
agreement among the coupled climate carbon cycle models driven by emission
scenarios run so far that future climate change would reduce the efficiency of the Earth
system (land and ocean) to absorb anthropogenic CO2. As a result, an increasingly large
fraction of anthropogenic CO2 would stay airborne in the atmosphere under a warmer
climate» (Meehl, 2007:4), agravando assim o aquecimento projetado e as alterações
climáticas em curso. Os modelos que incluem as incertezas derivadas dos feedbacks
dos gases com efeitos de estufa demonstram um aumento dos limites superiores do
espectro do possível aumento de temperatura (do limite máximo previsto pelo IPCC de
5.8°C sobe para 7.7°C) e uma maior probabilidade para mais 2°C a 3°C de aumento
adicionais (devido apenas aos feedbacks) (Matthews e Keith, 2007).
Para além do aumento da temperatura média estão projetadas diversas
alterações no sistema climático. Relativamente à temperatura é bastante provável que
ocorra um aumento mais acelerado das temperaturas diurnas mínimas do que das
máximas, diminuindo a amplitude térmica diária. Dias mais quentes aumentam o risco
de secas e ondas de calor, mais intensas, mais frequentes e mais duradouras, como a
experienciada na Europa, durante o Verão de 2003 (Meehl, 2007). Encontra-se
também associada uma diminuição dos episódios frios, nomeadamente de dias frios
(noites onde a temperatura desce abaixo dos 0°C), em quase todas as regiões de
latitudes médias e elevadas, bem como uma diminuição da frequência de períodos
continuados de frio extremo (alguns dias a mais de uma semana) (Meehl, 2007).
Com a diminuição das condições para a queda de neve, espera-se um
retrocesso global da criosfera (tanto em extensão como em espessura): montes e
montanhas podem perder totalmente os seus glaciares durante o próximo século
(como já ocorreu no Kilimanjaro). É também esperado um retrocesso do gelo no Ártico
que, de acordo com estudos mais recentes, poderá ficar totalmente sem gelo durante
o Verão já daqui a trinta anos, suplantando as previsões do IPCC que previam que este
fenómeno ocorresse no final do século XXI (Wang e Overland, 2009).
O aumento da frequência, da intensidade e da duração de fenómenos
climáticos extremos não se aplica apenas a secas e ondas de calor. Ao mesmo tempo
que se prevê um aumento da evaporação e da concentração de vapor de água na
atmosfera devido ao clima mais quente, torna-se mais expectável uma mudança
47
significativa nos padrões de precipitação do que um aumento real na precipitação
média global. De uma forma geral, regiões tropicais (que usufruem de um regime de
monção) e a latitudes mais elevadas podem esperar um aumento da precipitação,
associado a uma maior frequência de eventos de precipitação intensa, devido a uma
intensificação geral do ciclo hidrológico global resultante do aquecimento. Por outro
lado, as regiões subtropicais irão observar um declínio na precipitação média (até
20%), apesar de também observarem um aumento na frequência e intensidade dos
eventos de precipitação extrema, o que implica períodos mais longos entre os
episódios de precipitação (Meehl, 2007).
Nas regiões tropicais, o aumento da energia proveniente do oceano com
temperaturas superficiais mais elevadas, irá resultar, nas regiões com condições
favoráveis à sua ocorrência, num aumento na frequência e na intensidade de ciclones
tropicais e, consequentemente, da velocidade máxima do vento que atingem (IPCC,
2007a).
Relativamente às projeções para a subida do nível dos oceanos, o IPCC estima
que estas possam variar entre 18 e 59 centímetros no final do século XXI (IPCC, 2007a).
O maior contributo para esta subida (mais de 50%) será a expansão térmica dos
oceanos que continuará a ocorrer durante este século. As restantes contribuições
provêm, de uma forma geral, do degelo global (Gronelândia e restantes glaciares à
escala global; já a Antártica não contribui para estes valores uma vez que não se prevê
o degelo desta, pelo menos durante este século) (Meehl, 2007).
A temática sobre a subida do nível dos oceanos no futuro tem suscitado a
atenção de diversos cientistas que têm vindo a discordar das projeções do IPCC
(Rahmstorf et al., 2007; Hansen, 2007; Christoffersen e Hambrey, 2006). Desde o
último relatório de 2007, vários estudos têm sido lançados a argumentar que a posição
do IPCC é demasiado “segura” e que uma subida de vários metros pode ocorrer até ao
final do século. Em causa encontra-se o fato de o IPCC não levar em conta os feedbacks
do ciclo do carbono e os efeitos plenos das mudanças do fluxo do gelo (IPCC, 2007a).
«There is enough information now, in my opinion, to make it a near certainty that IPCC
business-as-usual climate forcing scenarios would lead to a disastrous multi-meter sea
level rise on the century time scale» (Hansen, 2007:6). Especificamente, James Hansen
argumenta que se o degelo duplicar a cada década (devido principalmente ao ritmo do
48
aumento das temperaturas no Ártico, superior à média global em 3°C a 6°C a mais em
2080), existe uma possibilidade séria de que o nível dos oceanos aumente um total de
5 metros até 2100, sendo que o gelo da Gronelândia desaparecerá totalmente dentro
de 140 anos (7 metros) (Hansen, 2007; Lynnas, 2008).
De fato, apesar de se projetar um aumento global das temperaturas, existirão
variações regionais que dependem das características físicas das regiões e da sua
interação com o sistema climático. Neste ponto, convém lembrar que as alterações
climáticas possuem um grande impacto ao nível regional, mesmo com uma variação
mínima ao nível global.
Assim, podemos concluir que um dos principais padrões a observar será um
aumento da temperatura superior nas regiões terrestres face à temperatura média
global prevista, devido à diminuição significativa da água disponível para evaporação e
consequente "arrefecimento” do clima, como acontece nos oceanos (onde o aumento
da temperatura se encontra abaixo da média global). Do mesmo modo, as regiões
costeiras (de uma forma geral) irão aquecer menos que as do interior. Outro factor
que influenciará fortemente a distribuição do clima é a latitude: «the amount of
projected warming generally increases from the tropics to the poles in the Northern
Hemisphere. Precipitation is more complex, but also has some latitude dependent
features. At latitudes adjacent to the polar regions, precipitation is projected to
increase, while decreases are projected in many regions adjacent to the tropics.»
(Christensen, 2007:865).
49
II.3.1 – Projeções para a Europa do século XXI
Na Europa, as projeções para as mudanças climáticas irão seguir, de uma forma
geral, os padrões descritos previamente, acentuando as diferenças climáticas entre o
Norte e o Sul.
Relativamente à temperatura, os modelos projetados para o cenário A1B
apontam para um aumento no final do século XXI de 2.3°C a 5.3°C no modelo de
projeção regional para o norte da Europa (NEU) e 2.2°C a 5.1°C no modelo de projeção
regional para o sul da Europa (SEM). É também expectável que o aumento seja
superior no Norte da Europa durante o Inverno e na região do Mediterrâneo durante o
Verão (Christensen, 2007). Apesar da desaceleração da corrente de circulação
termohalina do Atlântico Norte prevista em 25%, no cenário A1B, durante o próximo
século (num espectro de 0% aos 50%), é projetado que o aumento da temperatura
será bastante superior, devido a um domínio dos efeitos do contínuo aumento dos
gases com efeito de estufa sobre as alterações na circulação oceânica (IPCC, 2007a).
Também a precipitação espelha o agravamento da divisão entre norte e sul.
Com base nos mesmos modelos será de esperar um aumento da precipitação na
região norte de 0 a 16% e uma diminuição no sul entre -4% a -27% (Christensen, 2007):
«the decrease in precipitation together with enhanced evaporation in spring and early
summer is very likely to lead to reduced summer soil moisture in the Mediterranean
region and parts of central Europe» (Christensen, 2007:876). De facto, a diminuição da
humidade no solo é o principal motivo para um aumento da variabilidade da
temperatura, nomeadamente a diferença entre as regiões costeiras e interiores
durante o Verão.
Às alterações na precipitação encontra-se diretamente associado o agravar dos
fenómenos extremos. O aumento generalizado de temperatura e da sua variabilidade,
juntamente com uma diminuição da precipitação e consequente diminuição de
humidade no solo implica um aumento na frequência, na intensidade e na duração das
ondas de calor (Christensen, 2007). Por oposição «in northern Europe and in central
Europe in winter, where time mean precipitation is simulated to increase, high
extremes of precipitation are very likely to increase in magnitude and frequency»
(Christensen, 2007:877). Especialmente na frequência, sendo previsto que os cindo
dias de maior precipitação, que ocorrem atualmente na Escandinávia, uma vez em oito
50
a dezoito anos, passem a ocorrer de cinco em cinco anos no final do século. Do mesmo
modo também os fenómenos extremos de precipitação intensa na região do
Mediterrâneo revelam uma tendência para aumentar (devido ao aumento da
concentração de vapor de água na atmosfera relativo ao clima mais quente) ao mesmo
tempo que diminuem o número de dias de precipitação (Christensen, 2007). A
variação do aumento da frequência de dias chuvosos (no Inverno) na Europa central é
similar às mudanças nos fenómenos extremos de precipitação de curta duração
durante o Verão. Assim, apesar de se projetar uma diminuição da precipitação média,
aumento da temperatura e maior probabilidade de secas e ondas de calor para esta
época do ano, o tempo quente será pautado por um aumento dos fenómenos de
precipitação extrema de curta duração. O aumento da frequência da precipitação,
mais do que a intensidade, no norte da Europa, contrasta com o decréscimo dos dias
de precipitação no centro e sul da Europa e um aumento da duração dos períodos de
seca (Christensen, 2007).
A confiança nos modelos que projetam alterações nos padrões de vento ainda
permanece relativamente baixa. Ainda assim existe um maior número de estudos que
aponta para uma aumento da velocidade média e máxima do vento no norte da
Europa relativamente àqueles que apontam para um decréscimo. Estas variações
tendem a ser sazonais e encontram-se relacionadas com uma mudança nas pressões
atmosféricas, nomeadamente uma deslocação para Norte, o que implica um aumento
da atividade a norte e diminuição a sul, inclusive dos ciclones no Mediterrâneo
(Christensen, 2007).
Finalmente espera-se uma redução geral da criosfera por toda a Europa. No
seguimento do aumento das temperaturas e consequente redução da neve e do gelo
observado no século passado, espera-se um agravamento destes fenómenos durante o
próximo século. É bastante provável que se observe uma redução no período de queda
de neve entre um a três meses. Também a redução da espessura da neve e gelo irá
agravar-se, com uma diminuição prevista entre os 50% e 100%, ainda que esta varie
conforme a altitude e latitude: as regiões mais elevadas (acima dos 2000m ou no norte
da Escandinávia e norte-ocidental da Rússia) tendem a ser menos sensíveis às
alterações climáticas. O mar Báltico é outra região particularmente sensível onde se
51
espera uma redução da sua cobertura de gelo entre os 60% e 70% no final do século
(Christensen, 2007).
52
II.3.2 – Projeções para o Portugal do século XXI
Portugal segue a tendência das mudanças na região do Mediterrâneo já
descritas, ainda que exista uma grande variação ao nível nacional. É importante referir
que o continente situa-se na «zona de transição entre o anticiclone subtropical
(anticiclone dos Açores) e a zona das depressões subpolares, sendo o clima fortemente
influenciado pela proximidade ao oceano Atlântico» (Santos e Miranda, 2006:49). No
entanto, apesar das regiões mais interiores distarem apenas cerca de 220km da linha
costeira, algumas apresentam características climáticas do tipo continental. «Outro
dos fatores determinantes do clima é a orografia da região, com áreas significativas
das zonas Norte e Centro a ultrapassarem os 1000m de altitude» (Santos e Miranda,
2006:49). Estes fatores propiciam uma grande variação tanto ao nível da temperatura
como da precipitação: enquanto a região Noroeste (Minho) apresenta uma
precipitação média em alguns locais superior a 3000mm, uma das mais elevadas da
Europa, no interior do Alentejo a precipitação não ultrapassa, em média, os 500mm,
tornando o continente vulnerável a ambos os extremos climatológicos – cheias e secas
(Santos e Miranda, 2006).
A evolução do clima em Portugal continental e nas Regiões Autónomas dos
Açores e da Madeira, durante o século XX, encontram-se de acordo com a tendência
mundial observada: um período de aquecimento até 1945, seguido de um período de
estagnação/ligeiro arrefecimento até 1975 e novamente aumento de temperatura,
que se tem agravado nos últimos 20 anos. Os dados meteorológicos recolhidos
demonstram que enquanto o primeiro período de aquecimento foi pautado por um
aumento acentuado da temperatura média máxima, no período após 1975 o aumento
da temperatura média mínima foi superior ao aumento da temperatura média
máxima, estabelecendo uma tendência de diminuição da amplitude térmica que se
manteve até à atualidade. Ainda assim «desde a década de 1970, a temperatura média
subiu em todas as regiões de Portugal, a uma taxa de cerca de 0.5ºC/década, mais do
dobro da taxa de aquecimento observada para a temperatura média mundial» (Santos
e Miranda, 2006:47).
Relativamente à precipitação, observou-se uma tendência para a redução da
mesma nos últimos 20 anos, particularmente durante a Primavera, no mês de Março.
Esta redução é parcialmente compensada por ganhos nos meses de Inverno, o que
53
pode indiciar uma mudança climática patente em cenários do aquecimento global que
apontam para uma redução do período de Inverno e uma antecipação da Primavera
(Santos e Miranda, 2006). A precipitação em Portugal e a Oeste da Península Ibérica
são fortemente influenciadas pela Oscilação do Atlântico Norte (NAO), um índice
climático que caracteriza a circulação atmosférica numa vasta área do hemisfério
Norte. As observações têm demonstrado que a NAO correlaciona-se negativamente
com a precipitação nestas regiões, nomeadamente durante o Inverno e Primavera,
pelo que um aumento neste índice, como se tem verificado nos últimos 20 anos,
implica uma diminuição da precipitação em Portugal (Santos e Miranda, 2006)28.
Como foi referido, as tendências climáticas aqui descritas e observadas no
último século, nomeadamente nos últimos vinte anos, tenderão a agravar-se durante o
século XXI, acarretando graves consequências para o país e para a sua população. As
projeções climáticas realizadas para Portugal no final do século XXI com base nos
cenários de emissões de CO2 presentes no relatório SRES (Special Report on Emission
Scenarios), calculam que a anomalia do aumento de temperatura deverá oscilar entre
+2°C e +8.6°C (abrangendo todos os cenários), sendo superior à estimativa global. Do
mesmo modo, a diminuição da precipitação tenderá a agravar-se quanto maior for o
aumento de temperatura. Os cenários mais pessimistas (família A – A2 e A1FI) que
projetam um maior aumento do dióxido de carbono estimam que a oscilação de
temperatura no Verão ocorrerá entre +4.5°C e +11.5°C, com uma diminuição da
precipitação até 60%. Durante o Inverno a temperatura também irá aumentar (+1.5°C
a 4°C), no entanto as previsões para a precipitação, ainda que sendo as mais incertas (-
25% a +20%), calculam, na sua maioria, um aumento da mesma, principalmente na
região Norte, que não será suficiente para colmatar as perdas nas restantes estações
do ano (Santos e Miranda, 2006). De facto tanto o Outono como a Primavera apontam
para um encurtar do período chuvoso com diminuições de precipitação até 55% e 40%
respetivamente, ao mesmo tempo que se prevê um aumento da temperatura entre
+2°C a +7°C para o Outono e +1°C a +5.5°C para a Primavera. Também os cenários da
família B (B1 e B2), ainda que sendo menos pessimistas, corroboram as tendências já
apresentadas. O aumento de temperatura situa-se entre +2°C e +7°C, também
28
Para mais informações sobre a caracterização do clima português e a sua evolução no último século, consultar projetos SIAM e SIAM II
54
superior ao aumento projetado a nível global, sendo que se estima uma redução da
precipitação generalizada (até -25%), em todas as estações do ano, menos no Inverno
na região Norte (+20%) (Santos e Miranda, 2006).
Também nas regiões autónomas da Madeira e dos Açores espera-se um
aumento da temperatura (entre +1°C e +2°C), bastante menos acentuado que no
continente devido sobretudo à sua dimensão e localização. Já as anomalias previstas
na precipitação divergem devido à latitude onde se localizam as regiões. Enquanto nos
Açores prevê-se um aumento de 10% da precipitação no Inverno e uma diminuição até
20% na precipitação de Verão, o oposto acontece na Madeira: -20% no Inverno e +40%
no Verão (Santos e Miranda, 2006).
55
II.4 – Impactos, Vulnerabilidade, Adaptação e Mitigação
A importância das alterações em curso decorre do facto de estas influenciarem
de uma forma maioritariamente negativa as fontes mais elementares de subsistência
do ser humano, principalmente a agricultura, as pescas e os recursos hídricos. A
complexidade do sistema climático e da sua interação com os oceanos e as regiões
terrestres implica que todos os organismos vivos e a maioria dos recursos necessários
à sua sobrevivência sejam afetados. O aumento da frequência das ondas de calor,
períodos de seca e/ou cheias nos últimos 10 anos, não provocaram só perdas humanas
e materiais mas também de colheitas, sendo que a evolução destas situações no futuro
tenderá a agravar-se.
No contexto das alterações climáticas, «an impact describes a specific change in
a system caused by its exposure to climate change. Impacts may be judged to be either
harmful or beneficial» (Schneider, 2007), sendo que é expectável que no curto e no
longo prazo, a maioria das alterações previstas tenham um impacto negativo (como já
foi referido no ponto 1.3 e 1.3.1). No entanto o grau do impacto varia consoante uma
série de variáveis desde a localização, o grau de vulnerabilidade existente, capacidade
de adaptação, tecnologia, recursos financeiros, etc, sendo a projeção para o século XXI
uma tarefa bastante complexa. Assim sendo a avaliação dos impactos é algo
contingente e dinâmico, que evolui consoante as alterações em algumas das variáveis
e que necessita de avaliação permanente de forma a calcular a situação presente
(Fussel e Klein, 2005)29.
Para além da complexidade da combinação das variáveis, um dos principais
obstáculos à avaliação dos impactos é necessariamente o grau de incerteza a que se
encontram sujeitos, sendo uma característica inerente ao conceito de risco, que
combina a magnitude dos impactos e a probabilidade da sua ocorrência. Estudos
recentes demonstram também que as projeções iniciais quanto aos custos inerentes
aos impactos são bastante mais incertas do que se previa inicialmente. Se com o
agravar das alterações climáticas, consequentes impactos e custo económicos, outras
variáveis como a adaptação e a mitigação irão alterar-se necessariamente (Schneider,
2007).
29
http://www.pik-potsdam.de/research/transdisciplinary-concepts-and-methods/projects/project-archive/favaia/pubs/fuessel_klein_2005.pdf
56
A incerteza não advém apenas da (in)capacidade de prever as alterações
durante o século XXI. Os impactos projetados podem também variar bastante devido à
via de desenvolvimento assumido. «For example, there may be large differences in
regional population, income and technological development under alternative
scenarios, which are often a strong determinant of the level of vulnerability to climate
change» (IPCC, 2007c:20) (o número de indivíduos afetados no cenário A2 é
significativamente superior ainda que no volume das emissões não exista uma grande
variação). Neste sentido a vulnerabilidade assume-se como «the degree to which a
system is susceptible to, and unable to cope with, adverse effects of climate change,
including climate variability and extremes. Vulnerability is a function of the character,
magnitude, and rate of climate change and variation to which a system is exposed, its
sensitivity, and its adaptive capacity» (Schneider, 2007:782) .
Apesar de intimamente relacionados a avaliação de impactos difere da
avaliação da vulnerabilidade devido sobretudo à abrangência dos conceitos. Enquanto
inicialmente a avaliação era realizada muito com base nos impactos biofísicos, numa
escola que derivava da avaliação dos riscos de catástrofes naturais e da avaliação da
segurança alimentar, logo muito mais restritiva e específica, a evolução dos conceitos
e termos passou a considerar a avaliação das vulnerabilidades bastante mais adequada
às questões das alterações climáticas. A sua avaliação é bastante mais interdisciplinar e
abrangente compreendendo variáveis como a via de desenvolvimento, a exposição
física, a distribuição de recursos, stresses ambientais anteriores e instituições sociais e
políticas, sendo que a preocupação se concentra mais ao nível local, nas políticas de
adaptação no curto prazo30. De uma forma geral a vulnerabilidade depende, em parte,
de um conjunto de fatores físicos naturais (vulnerabilidade biofísica) como o ritmo e a
severidade das alterações climáticas e de um importante conjunto de variáveis sociais
(vulnerabilidade social)31 como fatores económicos, políticos, de governança entre
outros, que determinam quem é afetado, o que acaba por elevar o nível de incerteza
30
Para mais informações sobre a evolução dos conceitos de avaliação de impactos e de avaliação de vulnerabilidades consultar FÜSSEL, H.M. e KLEIN, R.J.T (2005), Climate Change Vulnerability Assessments: An Evolution of Conceptual Thinking, Climate Change, 1-29, disponível em http://www.pik-potsdam.de/research/transdisciplinary-concepts-and-methods/projects/project-archive/favaia/pubs/fuessel_klein_2005.pdf 31
Para mais informações sobre vulnerabilidade biofísica e social consultar BROOKS, Nick (2003), Vulnerability, risk and adaptation: A conceptual Framework, Tyndall Centre for Climate Change Research disponível em http://tyndall.ac.uk/sites/default/files/wp38.pdf
57
face a uma avaliação específica dos impactos (Leary, 2006). Ainda assim a avaliação da
vulnerabilidade oferece a capacidade para formular uma moldura de políticas que se
focam em aspetos sociais como a redução da pobreza, diversificação de meios de
subsistência, proteção de recursos de propriedade comum e fortalecimento da ação
coletiva, que para além de fortalecerem os meios de subsistência perante as condições
atuais, reduzem a vulnerabilidade às alterações climáticas do futuro (Carter et al.,
2007).
A abrangência de variáveis que combinam para a determinação do grau de
vulnerabilidade implica que esta varie fortemente de região para região e inclusive
dentro das próprias comunidades. Até mesmo vulnerabilidades semelhantes
necessitarão de programas de adaptação diferentes que estejam de acordo as
estruturas políticas e sociais.
As regiões mais pobres e marginalizadas, nomeadamente em países em vias de
desenvolvimento, que têm como base modos de vida fortemente dependentes dos
recursos primários de subsistência, historicamente sempre se encontraram mais em
risco e atualmente são particularmente as que se encontram mais vulneráveis a
impactos das alterações climáticas (Adger et al., 2007). « A climate shock or stress has
the potential to do the most damage in a context in which natural systems are being
severely stressed and degraded by overuse and in which social, economic or
governance systems are in or near a state of failure and so not capable of effective
responses» (Leary, 2006:27). Consequências como a fome e o colapso dos sistemas de
subsistência podem agravar e aumentar a pobreza e a perda de vidas humanas através
da dispersão de doenças contagiosas.
Ainda assim, apesar de a vulnerabilidade ser superior nos países em
desenvolvimento, é preciso não esquecer que também os países desenvolvidos
enfrentam sérios desafios devido às alterações climáticas. Em primeiro lugar a maioria
destes países encontra-se localizado na região (hemisfério Norte) onde se irá observar
o maior aumento da temperatura bem como as maiores reduções na precipitação
(OECD, 2006). Seguidamente são estes Estados que possuem as maiores densidades
populacionais e de população urbana em zonas costeiras de risco, sendo que as
principais capitais, que albergam milhões de habitantes, são costeiras ou localizam-se
na foz dos rios. Muitas destas cidades foram ganhando terra aos rios/mar sendo
58
bastante vulneráveis a tempestades já possuindo proteções contra estas. Sendo países
desenvolvidos outro desafio que também terão de enfrentar será o provável aumento
do volume de imigrantes/refugiados, que para além dos fatores base de migração que
leva todos os anos milhares de indivíduos a tentarem entrar nos países mais
desenvolvidos, acrescenta-se a depleção dos seus sistemas de subsistência devido às
alterações climáticas (Castles, 2010). De facto, o stress ambiental ao qual muitos
sistemas ambientais já se encontram sujeitos é comum em ambos os conjuntos de
países e é uma séria ameaça à existência das comunidades como as conhecemos. Se
por um lado, muitos destes sistemas já se encontram à beira da rutura, já com
impactos negativos nas populações que dependem deles, por outro lado, as alterações
climáticas tenderão a exacerbar a pressão negativa do ser humano sobre estes
recursos, podendo mesmo lança-los para um ponto de inflexão (UNEP, 2007). Esta
situação também aumenta a complexidade na avaliação de impactos uma vez que
torna-se mais difícil definir onde começam os efeitos das alterações climáticas.
A principal diferença entre países desenvolvidos e em desenvolvimento traduz-
se sobretudo na tecnologia disponível e na capacidade financeira para a aplicar em
medidas de adaptação e mitigação, que são fatores fundamentais da capacidade de
adaptação das sociedades. De facto, «efficient cooling systems, improved seeds,
desalination technologies, and other engineering solutions represent some of the
options that can lead to improved outcomes and increased coping under conditions of
climate change. In public health, for example, there have been successful applications
of seasonal forecasting and other technologies to adapt health provisions to
anticipated extreme events» (Adger et al., 2007:727). Tanto as tecnologias como as
inovações (desenvolvimento de novas tecnologias ou adaptação de métodos
desatualizados) são desenvolvidas através de investigação no sector público e privado
sendo um aspeto chave da capacidade de adaptação das sociedades. No entanto, na
maioria das vezes apenas são desenvolvidas como resposta a um tipo específico de
impacto, como o aumento das temperaturas ou a diminuição na precipitação.
Ainda assim, a tecnologia potencia a capacidade de adaptação das sociedades,
ou seja, «the ability or potential of a system to respond successfully to climate
variability and change, and includes adjustments in both behavior and in resources and
technologies» (Adger et al., 2007:727). Tem sido demonstrado que a capacidade de
59
adaptação é fundamental para que as estratégias de medidas de adaptação tenham o
alcance e eficácia pretendidas na diminuição da magnitude das alterações climáticas,
através, sobretudo do aproveitamento das vantagens das oportunidades ou benefícios
criados por este fenómeno, como, por exemplo, o aumento da época agrícola e o
aumento potencial do turismo. Assim a capacidade de adaptação dos sistemas
humanos refere-se ao potencial do sistema de reduzir a sua vulnerabilidade social, que
é determinado por fatores como a pobreza, desigualdade, marginalização, direitos
alimentares, acesso a seguro e qualidade de habitação. A vulnerabilidade biofísica
apenas pode ser alterada através da mitigação, de forma a interferir com o clima,
sendo que ambos os conjuntos acabam por estar complexamente interligados (Brooks,
2003; Brooks et al., 2005).
Os estudos desenvolvidos sobre a capacidade de adaptação demonstram a
existência de dois tipos de indicadores: mais genéricos, como a educação, o
rendimento e a saúde e mais específicos, relativos a um impacto concreto como secas
e inundações, relacionado com uma instituição, conhecimento e tecnologia. De facto,
sendo a capacidade de adaptação inerente ao processo de adaptação, a aplicação
desta varia fortemente tanto no tempo como na escala: a aplicação de um programa
estratégico de adaptação ao nível nacional terá como requisito variáveis
necessariamente diferentes (e/ou mais abrangentes) do que um programa de
adaptação local, específico a um fenómeno climático extremo (Brooks, 2003; Brooks et
al., 2005). Voltaremos à adaptação mais à frente.
60
II.4.1 – Impactos Económicos
Atualmente é quase certo a existência de um consenso científico em torno do
fenómeno das alterações climáticas, com origem antropogénica, bem como das
medidas necessárias para adaptar as populações às mudanças climáticas e
consequentemente reduzir a vulnerabilidade bem como a necessidade de mitigação
destes efeitos, ou seja, uma redução gradual nas emissões de CO2 com o objetivo de
não agravar as alterações a longo prazo. No entanto, o principal fator determinante da
aplicação destas medidas é o financeiro, o qual justifica a falta de acordo entre os
vários países ao nível nacional e internacional.
Neste sentido é importante tentar calcular os reais custos monetários dos
impactos das alterações climáticas e se compensa o largo investimento em medidas de
adaptação e mitigação. Vários estudos têm analisado esta temática, no entanto o
Relatório Stern, encomendado pelo ministério das finanças britânico em 2006 continua
a ser o mais significativo por ser o maior e o mais discutido sobre a matéria. A inovação
no relatório Stern (2007) deveu-se à inclusão de elementos que até então não tinham
sido incluídos devido ao grau de incerteza e de dificuldade de cálculo que os
caracterizava particularmente, as medidas de adaptação (e o seu custo), o dano
proveniente de fenómenos extremos e os impactos não económicos (Houghton, 2011).
De facto calcula-se que estes estudos tenham subavaliado os reais custos dos impactos
económicos uma vez que excluíam os impactos mais incertos mas potencialmente os
mais prejudiciais.
De acordo com o Relatório Stern (2007), tendo como ponto de partida um
cenário de aquecimento de 2°C a 3°C até ao fim do século (ou cenário BAU – business-
as-usual), «o custo das alterações climáticas poderia ser equivalente a uma perda
permanente da ordem de 0 a 3% da produção mundial global em comparação com o
que poderia ter sido alcançado num mundo sem alterações climáticas» (Stern, 2007:9).
Os países em desenvolvimento sofrerão quebras mais acentuadas. Com um
aquecimento entre os 5°C e 6°C calcula-se uma perda média de 5 a 10% do PIB global,
com os países em desenvolvimento a sofrerem custos mais significativos, além dos
10% do PIB. A questão da maior vulnerabilidade e maiores impactos nos países em
desenvolvimento é de facto bastante realçada no relatório. Não só estes países
possuem um menor grau de capacidade de adaptação devido ao atraso no
61
desenvolvimento, como a agricultura sendo o sector mais vulnerável às alterações
climáticas, possui um peso significativo nas economias destes países e no modo de
sobrevivência dos seus habitantes. Além disso, muitas destas regiões já são, em média,
mais quentes que as mais desenvolvidas, sofrendo também de uma elevada
variabilidade na pluviosidade. Como a maioria possui graves problemas de acesso a
água potável, o aumento das temperaturas nestas regiões trará grandes custos e
poucos ou nenhuns benefícios, ao contrário do que acontece nas regiões
desenvolvidas do norte da Europa (Escandinávia, Rússia) e da América (Canadá), onde
um aumento entre 2°C e 3°C se traduz numa diminuição das mortes pelo frio e num
aumento da produção agrícola (a partir dos 3°C também se observa uma quebra na
produção) (Stern, 2007).
O cenário BAU implica uma redução média do consumo per capita global de 5%
agora e para sempre. No entanto, os custos agravam-se quando temos em conta três
fatores:
Primeiro, a inclusão dos ditos custos “não comerciais”, relacionados
com o ambiente e a saúde humana, aumentariam os impactos de 5% a
11%, ainda que existam aqui questões éticas difíceis de avaliar
monetariamente;
Seguidamente, algumas provas científicas mais recentes, admitem que o
sistema climático é mais sensível do que inicialmente se pensou e que
os feedbacks do sistema podem amplificar ainda mais o aumento de
temperatura já projetado. Assim os impactos no consumo global iriam
agravar-se de 11% para 14%, se já tivermos em conta os impactos não
comerciais;
Finalmente, com um aumento de temperatura entre os 5°C e os 6°C e
tendo em conta os impactos mais severos nas zonas mais
desfavorecidas do globo, a média dos custos dos impactos ao nível
global aumentaria mais um quarto, traduzindo-se numa redução no
consumo per capita na ordem dos 20% (Stern, 2007).
«Em resumo, as análises (...) sugerem que as alterações climáticas do cenário BAU
reduzirão (…) o consumo per capita entre 5 e 20%. Tendo em conta o aumento das
provas científicas de riscos maiores, a prevenção das possibilidades de catástrofes, e
62
uma abordagem mais ampla às consequências do que aquelas implícitas em medidas
de redução da produção, é provável que a estimativa apropriada se encontre na parte
superior deste leque» (Stern, 2007:11).
É ainda importante lembrar que certos impactos possuem um valor intrínseco e
que não podem ser avaliados monetariamente. É o caso da perda de espécies e
biodiversidade, de vidas humanas bem como de tumultos sociais e conflitos, associado
à queda de regimes, devido a pressões sociais. Estas podem ter origem por exemplo no
aumento do número de refugiados, derivado não só mas sobretudo do aumento do
nível médio dos oceanos e a pressões nos mercados financeiros globais, como o
aumento do preço dos bens essenciais e instabilidade no sector das seguradoras (com
custos mais elevados e mais voláteis) devido ao aumento da frequência e intensidade
de fenómenos climáticos extremos (Houghton, 2011; Stern, 2007, Halsnæs et al.,
2007).
Como forma de evitar uma escalada da temperatura e das consequências mais
graves que daí podem advir, o relatório propõem uma articulação da mitigação e da
adaptação, tanto ao nível nacional como internacional, a começar no imediato. Ainda
assim, o ênfase é posto na mitigação ou «an anthropogenic intervention to reduce the
sources or enhance the sinks of greenhouse gases» (Klein et al., 2007:750), como forma
de estabilizar as emissões de dióxido de carbono no futuro próximo, uma vez que só
isso evitará danos mais graves. A mitigação diverge da adaptação uma vez que,
enquanto a primeira reduz todos os impactos, sejam eles positivos ou negativos, a
adaptação é mais seletiva, podendo optar por aproveitar as vantagens dos benefícios
e/ou reduzir os impactos negativos (Goklany, 2005). Divergem também na escala em
que são projetadas: enquanto a mitigação é aplicada ao nível regional/local mas possui
benefícios globais, necessitando para isso do empenho e convergência de uma série de
emissores de gases com efeito de estufa, para que ocorra uma mudança significativa
no sistema climático; a adaptação é aplicada ao nível do impacto específico que
ocorre, na melhor das hipóteses, a uma escala regional, sendo que a eficácia das
medidas varia consoante o contexto social, económico e político onde se aplica (Klein
et al., 2007). Ainda que seja difícil calcular monetariamente os benefícios da adaptação
(o que impede a comparação entre os vários métodos), o facto de produzir efeitos
imediatamente e rentabilizá-los ao longo do tempo (à medida que as alterações
63
climáticas se intensificam), como a redução da vulnerabilidade das populações, tem
levado (recentemente) a uma maior motivação perante as ações de adaptação. De
facto, durante bastante tempo, o focus das comunidades internacionais esteve
centrado no combate às emissões de gases com efeito de estufa. Apenas quando a
comunidade internacional percebeu que certas alterações já se encontravam em curso
e portanto eram inevitáveis, o focus passou a centrar-se (excessivamente) na
adaptação em prol da mitigação (Dang, 2003). Também contribuiu para esta situação
uma defesa mais exacerbada da adaptação por parte dos atores privados, comunidade
civil, entre outros, que viram diretamente os seus interesses afetados. Pelo contrário,
devido à longa duração dos gases com efeito de estufa na atmosfera, os benefícios
produzidos pela mitigação são gerais e apenas terão efeito dentro de muitas décadas
Só muito recentemente investigadores têm apontado para uma sinergia entre a
adaptação e mitigação, adaptando-as à região a aplicar, como forma de alcançar um
desenvolvimento sustentável (Dang, 2003).
De uma forma geral, ambas as áreas se encontram intimamente relacionadas
com o desenvolvimento sustentável, a mitigação no longo termo e a adaptação no
curto termo. Além disso, a adaptação pode ser reativa (na resposta às alterações
climáticas) e/ou proactiva enquanto a mitigação apenas pode ser proactiva no sentido
de prevenir um maior agravamento das alterações climáticas nos próximos séculos
sendo que o sucesso e eficácia da sua implementação dependem de um conjunto de
fatores socioeconómicos, entre os quais os padrões de crescimento económico,
tecnologia, população, governança e politicas ambientais (Dang, 2003). No entanto,
ainda que possam complementar-se na procura de um desenvolvimento sustentável,
como já foi referido, também podem ocorrer conflitos entre as duas áreas
especificamente na opção de políticas nacionais. Por exemplo «installing air
conditioning systems in buildings is an adaptation option, but energy requirements can
increase GHG emissions, and thus climate change» (Halsnæs et al., 2007:142).
O Relatório Stern aponta para uma articulação entre a adaptação e a mitigação
ainda que ainda que as prioridades devam ser centradas na mitigação, uma vez que
apenas esta possibilita o combate claro às alterações climáticas e ao aumento da
temperatura a níveis onde não haja possibilidade sequer de adaptação. Assim, para
estabilizar as emissões de gases com efeito de estufa entre os 500 e 550 ppm os custos
64
serão aproximadamente 1% do PIB global anualmente até 2050, com um leque entre -
2% e +5%, que refletem as incertezas na evolução de certas variáveis como a inovação
tecnológica, a eficácia e rapidez da aplicação de medidas a nível global. Esta situação
equivale a uma redução das emissões entre 60% e 80% dos níveis de 1990 até 2050,
partindo do princípio que a emissões estabilizariam nos próximos 10 a 20 anos, a partir
do qual baixariam entre 1% e 3% ao ano. A partir de 2050 as incertezas aumentam
devido em grande parte à reação do sistema climático, sendo que a margem de erro
das projeções dos impactos varia entre -4% e +15%. Além disso os custos não incluem
a despesa com a adaptação que até 2050 pode chegar a 0.5% do PIB global e que
tenderá a agravar-se consoante as alterações se intensifiquem (Stern, 2007).
Ainda assim, se parece existir uma grande probabilidade de os custos com
adaptação e mitigação ultrapassarem o 1% do PIB global anual, o investimento
compensará, em larga medida, os prejuízos à civilização proveniente das alterações
climáticas durante os próximos séculos. De facto, quanto mais rápido for a atuação,
maior a probabilidade de se evitar mudanças climáticas extremas, onde os impactos
são imprevisíveis.
65
II.4.2 – Impactos Económicos na Europa
Os impactos económicos para a Europa serão bastante avultados, exercendo
uma maior pressão sobre o projeto europeu, à medida que aumenta o “gap” entre o
norte e o sul. Com um aumento de temperatura média entre 2.5°C e 5.5°C (cenário A2)
e 1°C a 4°C (cenário B2), o aumento será superior no Sul, como já foi referido
anteriormente, podendo haver aumentos de temperatura em partes de França e na
Península Ibérica, no Verão, que ultrapassem os 6°C (Alcamo et al., 2007:547). A
combinação de temperaturas mais elevadas e uma redução significativa da
precipitação média de Verão implicará também um reforço na ocorrência de ondas de
calor e secas no Mediterrâneo, que tenderão a iniciar-se mais cedo no ano e a
prolongar-se durante mais tempo (Beniston et al., 2007). Aumentos desta magnitude
associados a períodos mais frequentes e prolongados de calor intenso implicam
diretamente uma quebra na produção agrícola e um aumento no risco de incêndios
florestais para esta região (Olesen, 2002; Pausas, 2004; Maracchi, 2005; Pereira, 2005;
Pausas, 2012). A quebra da produção agrícola no Sul da Europa deve-se sobretudo ao
aumento da frequência de fenómenos climáticos extremos (longos períodos de calor
intenso, episódios de precipitação intensa), que contribuem para um aumento da
variabilidade da produção, sendo que, especificamente, no Sul da Europa observa-se
uma redução na produção agrícola média, ao mesmo tempo que aumenta a
necessidade de água por parte das culturas (Olesen, 2002; Giannokopoulos et al.,
2005; Audsley et al., 2006). O calor excessivo encontra-se também associado a um
aumento dos problemas de saúde (ex. da onda de calor europeia de 2003 que implicou
um excesso de 35 000 mortes), juntamente com uma maior procura de água, tanto
pela população como pela agricultura, no período em que ela é mais escassa.
De facto, a quebra da precipitação no Sul é mais um fator a acentuar aí os
impactos económicos. Com uma quebra na precipitação entre 30-45% em toda a bacia
do Mediterrâneo, podendo alcançar os 70% em algumas regiões, durante o Verão, a
capacidade de abastecimento das populações e das atividades agrícolas e inclusive
industriais ficará bastante mais limitada, agravando uma crescente disputa pelos
recursos. Uma menor disponibilidade hídrica das barragens implica uma menor
qualidade da água e uma diminuição na produção de eletricidade durante o Verão
precisamente no período onde de prevê um aumento do consumo de energia. Ao
66
contrário da diminuição da precipitação anual, os fenómenos de precipitação intensa
têm tendência a aumentar, incrementando a probabilidade de inundações e cheias nas
regiões de planície, junto aos cursos de água, sendo que a maioria destas regiões
encontra-se densamente urbanizada (Alcamo et al., 2007).
Outra das principais vulnerabilidades que afecta a Europa é a subida do nível do
oceano e um aumento dos impactos nas regiões costeiras. Apesar da subida do nível
dos oceanos, a pressão humana sobre as zonas costeiras continua a aumentar, sendo
estas regiões densamente povoadas e urbanizadas. De facto, não só as principais
capitais europeias são cidades costeiras, como também é nestas regiões que se
desenrola uma intensa atividade económica através dos principais portos comerciais
ao nível mundial. As projeções apontam que até 1.6 milhões de europeus venham a
ser afetados todos os anos nas regiões costeiras devido, sobretudo, à subida do nível
dos oceanos (Alcamo et al., 2007).
Finalmente, as alterações climáticas poderão também afetar outras atividades
económicas como o turismo e a área das seguradoras. Relativamente ao turismo é
esperado uma diminuição dos turistas no Sul da Europa, à medida que estes rumam
mais para norte, para regiões com temperaturas mais amenas e onde o calor não seja
tão intenso. É também esperado instabilidade no sector das seguradoras e um
agravamento das apólices devido ao aumento na frequência e intensidade de
fenómenos extremos (Alcamo et al., 2007).
67
Capítulo III – Segurança Nacional e Segurança Ambiental
III.1 – Segurança Nacional
O conceito de segurança ambiental deriva necessariamente da compreensão da
segurança, particularmente do conceito de segurança nacional, desenvolvido pela
disciplina das Relações Internacionais. Nesta lógica é por aqui que necessitamos de
começar.
A segurança é um conceito universal ainda que vago e pouco claro, apesar de
se encontrar na base da teoria política contemporânea. De acordo com o Shorter
Oxford Dictionary, segurança é: «1. the conditions of being protected from or not
exposed danger; safety. 2. freedom from doubt. Now chiefly, well founded confidence,
certainty. 3. freedom from care, anxiety or apprehension; a feeling of safety.» (Barnett,
2001; 23). Neste sentido o conceito de segurança encontra-se historicamente
relacionado com a proteção e a capacidade (da pessoa) de se sentir segura
relativamente a alguma contingência, sendo, portanto, algo intuitivamente desejável.
O risco é uma característica estrutural no conceito de segurança que possibilita
a caracterização da última de duas formas. Primeiro a segurança pode ser específica a
um risco particular. Esse risco responde à pergunta “o quê?” (what) na segurança. O “o
quê?” refere-se ao fenómeno que é securitizado, por exemplo, uma cheia.
Seguidamente, de forma a identificar os sujeitos afetados surge a pergunta “a quem?”
(who), que, de acordo com o nosso exemplo, seria toda a população, ainda que
existam regiões onde o risco de cheia é mais elevado e, portanto, onde as populações
se encontram mais ameaçadas (Barnett, 2001). Ainda que estas duas questões sejam o
mínimo para identificar um problema de segurança, existem outras questões que
ajudam a delimitar e a possuir um conhecimento mais profundo sobre o fenómeno.
Essas outras questões são: security for which values?, how much security?, by what
means?, at what cost?, in what time period? (Baldwin, 1997).
Por outro lado, a avaliação do risco e da vulnerabilidade é sempre uma questão
subjetiva e sujeita aos valores do especialista. «There is no purely objective basis upon
which to assess the probability of food shortages, military aggression, a nuclear reactor
accident, or rape. We can say, on the basis of evidence, that such events might in a
68
general sense be more or less likely, and we can consider with some accuracy the
impact of such an event, but we cannot objectively quantify the risk per se.» (Barnett,
2001:25). Neste sentido, e porque não existe uma realidade concreta para o risco e
para a segurança, os indivíduos podem sentir-se seguros apesar de o risco ser elevado
e da mesma forma sentir-se inseguros quando o risco é baixo, o que justifica a
ambiguidade e a contestação do conceito apesar de a praxis permanecer igual (Buzan,
1991).
É ainda importante referir que quando um problema é rotulado como uma
questão de segurança — isto é, um interesse vital— este torna-se de imediato uma
prioridade do Estado que a ela aloca a sua capacidade de resposta, mesmo que
atropelando no processo liberdades e direitos individuais. A situação deixa de ser
solucionada pelas instituições convencionais e passa a requerer medidas
extraordinárias. «In the same way that the US is now engaged in a “war on drugs”,
suggesting a response of a kind equivalent to war, labeling a particular challenge a
security issue scripts that challenge as a threat to sovereignty, consequently excusing
the state from the normal checks on its behavior. This is a critically important aspect of
the use of security; it raises the stakes of certain problems and justifies drastic a
potentially unaccountable action.» (Barnnet, 2001:25). Para mais informação sobre
como um problema se transforma num problema de segurança consultar a
Metodologia.
As origens da segurança nacional, se olharmos para o modelo histórico
ocidental, remontam ao período medieval estendendo-se ao período renascentista. A
estruturação mais evidente do Estado moderno inicia-se a partir da finalidade da
segurança, garantido pelo sistema feudal medieval.
Teoricamente o processo seria iniciado através de um contrato informal,
segundo o qual era garantida a segurança aos constituintes da comunidade política
pela elite governante em troca do produto do trabalho e ajuda na guerra (Lara, 2007).
Com a proliferação destes reinos e principados por toda a Europa, durante o
Renascimento, e consequentes períodos de expansionismo e retração, o conceito de
segurança nacional começou a focar-se fortemente na defesa da integridade
territorial. Foi também durante este período que um dos primeiros textos realistas foi
redigido por Maquiavel, O Príncipe, que acaba por colocar um cunho teórico a uma
69
contingência que só pela praxis histórica da época se foi formando: a da
monopolização militar do conceito de segurança.
A assinatura do Tratado de Vestefália em 1648 definiu os Estados como
entidades soberanas com capacidade militar e delimitados territorialmente por
fronteiras formais que teriam que ser protegidas a todo o custo, tornando-se a
segurança militarizada um princípio constitutivo do moderno Estado-Nação e
ganhando aqui uma legitimidade política para além de uma formulação teórica.
As origens dos estudos modernos de segurança remontam ao período entre as
duas grandes guerras. Depois do fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) a ênfase
dos estudos centrou-se na exportação de modelos democráticos, na arbitragem das
tensões que surgissem, na autodeterminação nacional, no desarmamento e na
segurança coletiva, de forma a promover a paz e a segurança internacional, focando-se
também nas convenções, tratados e organizações internacionais para além de na força
militar. Os estudos de segurança foram-se tornando cada vez mais complexos ao
ganharem uma componente jurídica e atentarem aos princípios ocidentais que se
foram disseminando, pelo que esta é uma diferença fundamental relativamente aos
ensaios e estudos sobre a segurança até 1940, sobretudo preocupados com a força
militar e o equilíbrio de poderes (Baldwin, 1996).
Mas o debate não cessaria aqui. O período do pós-Segunda Guerra Mundial,
principalmente durante o período da Guerra Fria é apelidado por muitos como a Era
Dourada dos estudos de segurança “realistas”. O ressurgimento do realismo, que
centra a segurança na autonomia do Estado-Nação e enfatiza o poder militar como
base do poder político na sociedade internacional, encontra-se muito associado ao
falhanço do paradigma mais liberal do período entre as duas guerras durante o qual foi
dada prioridade à cooperação e à democratização para que se evitasse outro grande
conflito (Idem).
O antagonismo crescente entre os EUA e a URSS ajuda também a explicar
porque é que os estudos de segurança passaram a ser dominados por considerações
relativamente ao uso da força e ao armamento nuclear, para além de se debruçarem
sobre temas habituais como o controlo de armas e a limitação da guerra, ainda que
intelectuais que definiram os estudos de segurança nos termos da força militar (Idem;
Ullman,1983) tenham notado uma tendência, durante este período, para enfatizar
70
exageradamente os aspetos militares da segurança nacional. Ainda assim a corrente
dominante, constatando a anarquia do sistema internacional, colocava como o
objetivo primordial dos Estados o da própria sobrevivência, que seria melhor
assegurada através da maximização do poder militar.
«Interest in security studies did not revive immediately after de Vietnam War;
rather the lessened cold war tensions associated with détente allowed other issues,
such as economic interdependence, Third World poverty, and environmental issues, to
increase in salience. And the Arab oil embargo served as a sharp reminder that threats
to the American way of life emanated from nonmilitary sources, as well as from
military ones» (Baldwin, 1997:4). Apesar do surgimento de novas perspetivas sobre a
segurança nacional a componente militar continuou a dominar o panorama dos
estudos de segurança ao longo do século XX.
Deste modo existem diversas definições para o conceito de segurança nacional,
que vão desde uma perspetiva mais restrita a uma mais abrangente. As perspetivas
mais restritas, que dominaram o panorama durante a Guerra Fria, focam-se
essencialmente nas ameaças militares externas, excluindo ameaças ambientais e
outras vulnerabilidades não-militares, definindo portanto segurança nacional como
«the absence of a military threat or with the protection from external overthrow or
attack» (Haftendorn, 1991:4). De facto alguns intelectuais (Walt, 1991; Mearsheimer,
2007) continuam a argumentar que, independentemente do fim da Guerra Fria, os
problemas de segurança mantém-se sobretudo relacionados com a capacidade militar
dos Estados, não sendo por isso necessário reformular o conceito tradicional de
segurança nacional (Baldwin, 1996).
Por outro lado existem cada vez mais intelectuais que argumentam a
necessidade de alargar o conceito (Booth, 1991; Buzan, 1991), no sentido de abranger
ameaças internas e externas de carácter militar e não-militar, provenientes por isso de
vulnerabilidades não tradicionais. Para estes autores, definir a segurança nacional
apenas em termos militares é errado por projetar uma falsa imagem da realidade que
leva os Estados a ignorar outras ameaças, por vezes mais perigosas.
Nesta conceptualização alargada a definição de segurança mais reconhecida é
talvez a de Ullman (1983:133): «a threat to national security is an action or a sequence
of events that (1) threatens drastically and over a relatively brief span of time to
71
degrade the quality of life for the inhabitants of a state, or (2) threatens significantly to
narrow the range of policy choices available to the government of a state or to private,
nongovernmental entities (persons, groups, corporations) within the state». Enquanto
a primeira parte da definição se refere a um conjunto de distúrbios desde guerras
externas, rebeliões internas, bloqueios e boicotes, a desastres “naturais” devastadores
como epidemias dizimadoras, cheias catastróficas ou massivas e persistentes secas, o
segundo ponto remete para ameaças aos valores exportados (neste caso pelos EUA) e
que podem indiretamente afetar o Estado (por exemplo, se vários Estados se fecharem
economicamente aos EUA isso pode significar uma ameaça à economia americana e,
consequentemente, à segurança nacional).
No entanto, há quem considere que o alargamento excessivo do conceito
dificulta a sua operacionalização. É o caso de Levy (1995:40), que tenta chegar a um
meio-termo: «A threat to national security is a situation in which some of the nation’s
most important values are drastically degraded by external action». Ainda assim o
conceito reflete bastante, talvez demasiado, a perspetiva norte-americana de que a
ameaça é sempre externa e consciente. Se tivermos em conta a perspetiva de Ullman
(1983) é fácil perceber que existem uma serie de ameaças, nomeadamente catástrofes
naturais, que não são causadas por nenhum agente nem tão pouco são premeditadas.
A tentativa de abranger o conceito de segurança nacional para incluir outras
formas de ameaça, especificamente a ambiental, é de facto um problema complexo
que acarreta uma série de dificuldades. Para além da dificuldade de operacionalização
do conceito como já foi referido, a tentativa de obtenção de um conceito de segurança
nacional mais abrangente e maioritariamente aceite é sempre condicionada pela
perspetiva do investigador/analista.
Sendo que a grande maioria dos estudos sobre segurança que vingaram na
Escola das Relações Internacionais são produzidos por norte-americanos, estes acabam
por refletir o que os seus autores consideram como ameaça aos EUA. É por isso que
erradamente se foi formando uma perspetiva segundo a qual a escassez de recursos é
sobretudo uma ameaça para os países em desenvolvimento, não sendo um problema
de segurança para os EUA e portanto não sendo considerado um problema de
segurança para os países desenvolvidos. A única vulnerabilidade equacionada como
72
problema de segurança é a escassez crescente de petróleo — muito devido à
experiencia sofrida durante o embargo dos anos 70 (Levy, 1995).
No entanto a questão da escassez de recursos é um problema bastante
premente uma vez que pode levar a uma escalada de conflitos. No curto prazo e numa
primeira instância afetará os países com economias em desenvolvimento que tendem
a depender de commodities para formar modelos económicos de exportação que
estimulem a industrialização interna e a modernização da economia.
Homer-Dixon (1999), relembrando-nos que os recursos económicos são
escassos e finitos, diz-nos claramente que a sua sobre-exploração na prática acaba por
exercer uma marginalização ecológica para aquelas comunidades que não podem e/ou
não conseguem aceder-lhes. Isto por sua vez afetará crescentemente a vitalidade do
sistema económico internacional, aumentando ainda mais as fileiras dos
marginalizados.
Isto tem efeitos sobre a segurança, já que «environmental scarcities also
strengthen group identities based on ethnic, class or religious affiliations, a process
called social segmentation; strengthened identities intensify competition among
groups, reducing social trust and useful intergroup interaction» (Idem:178). Além disso,
em alguns países pobres, a escassez de recursos aumenta as vulnerabilidades internas
e externas Estado, estimulando o comportamento predatório da elite à medida que
diminuem as receitas provenientes da atividade económica, pondo em causa quer a
capacidade administrativa da comunidade política — que deixa de ter receita fiscal
para controlar efetivamente todo o seu território — quer a sua capacidade militar.
Por sua vez este processo agrava as diferenças sociais de riqueza e poder entre
os grupos ao mesmo tempo que enfraquece a capacidade administrativa e a
legitimidade do Estado (esta situação é ainda mais grave quando ocorre em regiões
onde o Estado já possui um controlo deficitário do território).
O enfraquecimento do Estado altera a balança social de poder a favor de
grupos subversivos (cujas identidades foram muitas vezes reforçadas pela
segmentação social) e aumenta as oportunidades para uma ação coletiva destes
grupos contra o Estado (Lara, 2012).
É ainda importante referir que o processo de escalada de um conflito é
bastante complexo e que ao fator ambiental encontram-se associados todo um
73
conjunto características, específicas de um determinado momento que confluem para
uma situação de conflito: «It is true that environmental scarcity produces its effects
within extremely complex ecological-political systems. Furthermore, environmental
scarcity is not sufficient, by itself, to cause violence; when it does contribute to violence,
research shows, it always interacts with other political, economic, and social factors.
Environmental scarcity’s casual role can never be separated from these contextual
factors, which are often unique to the society in question» (Homer-Dixon, 1999:178).
Dados os motivos evidenciados, o aumento de conflitos irá afetar, no curto
prazo, países em desenvolvimento. Relativamente aos países desenvolvidos é difícil
equacionar qualquer tipo de projeção por a sua capacidade económica e integração no
comércio internacional lhes terem providenciado mecanismos de ajuste aos resíduos
económicos provocados pela competição crescente por recursos.
Dito isto, o que podemos contabilizar é que as alterações climáticas projetadas
nunca antes foram experienciadas por humanos, sendo que as previsões mais atuais
apontam para alterações mais graves do que aquelas inicialmente supostas. Neste
sentido, e devido às necessidades económicas e societais dos países desenvolvidos
(mais consumistas), é de calcular que terão maior dificuldade em adaptarem-se no
longo-prazo, pelo que é necessário não subestimar o impacto das alterações devido a
uma suposta capacidade económica superior. Os conflitos com origem na escassez dos
recursos (que no caso português bem pode ser a água ou mesmo os cereais, se o preço
destes continuar a aumentar no sistema alimentar internacional como32) irão
avolumar-se e tanto podem ocorrer em países em desenvolvimento como em países
desenvolvidos, o que implica a elevação de vulnerabilidades ambientais específicas
para cada Estado para um problema de segurança nacional (Ullman, 1983).
Também Mathews (1989) e Myers (1994) evidenciaram os perigos para a
humanidade de conflitos provenientes da escassez de recursos associado ao
crescimento exponencial da humanidade nas décadas seguintes. Para Mathews
(1989:166) o carater transnacional dos problemas ambientais cria um novo problema à
soberania dos Estados, obrigando a uma redefinição do conceito de segurança, devido
às ineficiências das instituições à época (logo após o fim da guerra fria) para lidar com
32
FAO (2012), “FAO Price Index”, disponível em http://www.fao.org/worldfoodsituation/wfs-home/foodpricesindex/en/
74
os novos desafios, já que estes não só passam a ser transnacionais como os problemas
externos acarretam consequências no domínio da política interna, pelo que a divisão
clara entre as duas fica desfocada uma vez que «environmental decline occasionally
leads directly to conflict, especially when scarce water resources must be shared.
Generally, however, its impact on nations' security is felt in the downward pull on
economic performance and, therefore, on political stability. The underlying cause of
turmoil is often ignored; instead governments address the poverty and instability that
are its results»33.
O mesmo diz Myers (1994) que, para além de identificar vários problemas
ambientais — como a escassez alimentar, a depleção de reservas de pescado, escassez
de água, mudanças climáticas e desflorestação — como causas que contribuirão para o
aumento de conflitos no futuro, foca-se principalmente em explorar os trade-offs
financeiros entre os problemas ambientais e a segurança nacional. Para o autor se
parte da despesa financeira realizada no sector militar fosse ao invés canalizada para a
mitigação dos problemas ambientais identificados, muitos destes problemas já teriam
sido eliminados ou quase eliminados, argumentando assim que os recursos financeiros
aplicados no ambiente providenciam mais segurança do que aqueles aplicados no
sector militar.
No entanto é de perspetivar que não só este tipo de argumento é pouco eficaz
como até falacioso. Quando se projeta um aumento dos conflitos, inclusive da
possibilidade de refugiados ou de guerras, é necessária a intervenção militar, pelo que
esta particular combinação de questões (conflito e desmilitarização) é, do ponto de
vista analítico, incongruente e faz mais por mobilizar as instituições de segurança
nacional do que ameaça-las com um tipo de paz proveniente do ambiente (Barnett,
2001).
33
Para mais sobre este assunto, vide Jessica T. Mathews (1989), “Redifining Security” in Foreign Affairs, Council of Foreign Relations, disponível em http://www.polisci.ufl.edu/usfpinstitute/2010/ documents/readings/matthews1989.pdf
75
III.2 – Segurança Ambiental
O conceito de segurança ambiental, desde o seu surgimento em meados dos
anos 70, tem vindo a desenvolver-se, tendo sido reconhecido em meados os anos 80
através de um capítulo no relatório Brundtland, elaborado pela Comissão Mundial
sobre Ambiente e Desenvolvimento (1987), que nos diz que «the environmental
problems of the poor will affect the rich as well in the not too distant future,
transmitted through political instability and turmoil»34 .
Ao longo dos anos 90 o conceito cresceu em importância e uma série de novos
estudos e avaliações científicas foram realizados. No entanto, eventos como a guerra
do Kuwait e o 11 de Setembro, no início dos aos 90 e no início do século XXI
respetivamente, retiraram os assuntos sobre a temática ambiental da agenda política
(principalmente nos EUA) durante alguns anos; as definições militares de segurança
ganharam proeminência uma vez mais (Myers, 2002; Dalby, 2012).
Apesar destes fenómenos, as preocupações com o ambiente não se
desvaneceram. Antes pelo contrário. Os indícios frequentes de alterações nas
temperaturas, degelo das calotes geladas e glaciares, mudanças nos padrões de
migração de diversas espécies, e o despoletar antecipado da Primavera em muitas
regiões do hemisfério Norte tornaram-se esmagadores e reavivaram de uma forma
mais premente as preocupações ambientais. Para Dalby (2012:29), «the security
implications of increased storms and the possible disruptions of major parts of modern
societies were unavoidable in the aftermath of Hurricane Katrina and the flooding of
New Orleans».
Em Abril de 2007 o Conselho de Segurança das Nações Unidas debateu a
questão das alterações climáticas admitindo finalmente o advento de graves
perturbações nas sociedades. Juntamente com filmes, documentários, relatórios
técnicos e uma mudança, ainda que relutante, na retórica da administração Bush e do
Governo Federal conservador do Canadá — que admitiram que o problema
necessitava de ser encarado — sugerem que as mudanças climáticas já não eram
passíveis de serem negadas. O ano de 2007 seria também aquele em que Al Gore e o
IPCC receberiam o prémio Nobel da Paz; o primeiro pelo tão premiado documentário,
34
Sobre este tema, ver UN (1987), “Report of the World Commission on Environment and Development: Our Common Future”, disponível em http://www.un-documents.net/wced-ocf.htm.
76
“Uma Verdade Inconveniente”, que alerta para o crescente efeito de estufa,
proveniente das quantidades excessivas de dióxido de carbono libertadas e as
consequências para as gerações futuras e o IPCC pelo trabalho na divulgação científica
sobre as alterações climáticas, que se traduziram em quatro relatórios, o último dos
quais apresentado em 2007, cujos resultados atestam, de forma inequívoca, para a
influência dos fatores antropocêntricos na mudança do clima (Idem).
Os problemas sobre os quais se ocupa a segurança ambiental não são novos. De
facto, apesar de o primeiro conflito registado ter ocorrido há 4500 anos entre duas
cidades-Estado na antiga Mesopotâmia, o conceito de segurança ambiental tem
apenas algumas décadas, encontrando-se associado sobretudo, ao crescimento
explosivo da população a partir de meados do século XX.
O problema da água potável tem servido de exemplo-chave na segurança
ambiental: desde 1950 o fornecimento de água fresca por pessoa diminuiu cerca de
60% ao mesmo tempo que a população aumentou 150%; o consumo de água cresceu
em 180% prevendo-se um aumento adicional nas próximas duas décadas de 40%; no
mesmo período de tempo ocorreram mais de 450 disputas hostis relacionadas com a
água e em 37 dessas ocasiões os países rivais recorreram a fogo armado, rebentaram
uma barragem ou levaram a cabo outros tipos de ação violenta (Myers, 2002).
Atualmente pelo menos 261 dos maiores cursos de água do Mundo são
partilhados, sendo que 176 circulam entre dois países, 48 entre três países e 37 entre
quatro ou mais países. Enquanto as bacias hidrográficas destes mesmos cursos de água
representam mais de 45% da superfície terrestre e 60% do fornecimento de água
potável, ao mesmo tempo abastecem 40% da população mundial com água para uso
doméstico, agrícola, produção de energia, entre outros. Por outro lado três mil milhões
de pessoas (dois quintos da população dispersa em 80 países) sofrem de sérias
dificuldades no abastecimento de água e dois terços da água retirada de reservatórios
subterrâneos é utilizada para a produção de alimentos (Myers, 2002).
Estes números traduzem-se em situações concretas: o corte/desvio das
principais fontes de abastecimento de Israel e do Egipto, o rio Jordão e o Nilo, é uma
ameaça de tal maneira premente para as populações e para a legitimidade política dos
envolvidos que é suficiente para uma declaração de guerra entre os dois países. São
também conhecidos os conflitos existentes entre a Turquia, a Síria e o Iraque pelos rios
77
Tigre e Eufrates; entre a Índia e o Paquistão pelo Indus; entre a Índia, o Bangladesh e o
Nepal pelo Ganges; o Brasil e a Argentina pelo Rio de La Plata e entre as nações que
partilham a bacia do rio Mekong (Myers, 2002).
Apesar do sector da água ser o mais associado a conflitos ambientais existem
outras questões com impactos alargados que também podem despoletar uma
escalada de violência, nomeadamente a desertificação. De facto, «by virtue of its
capacity to trigger famines, internal displacements and international migration,
desertification often serves as a recipe for political instability (Algeria, Chad), for
tensions between neighboring countries (Zimbabwe, Botswana), and even for armed
conflict. It is surely not coincidental that in the Sahel zone of Africa, not a single
government survived the droughts of the 1970s and 1980s, several fell twice over, and
few are moving toward still further collapse» (Idem:3).
Os exemplos descritos rementem-nos para a análise realizada por Homer-Dixon
(1999) sendo que:
1.º Nem todos os problemas ambientais se traduzem em conflitos, tal como
nem todos os conflitos derivam de problemas ambientais;
2.º Raramente os problemas ambientais podem ser descritos como os únicos
fatores que originam um conflito.
Outros fatores como políticas económicas deficientes, estruturas políticas
inflexíveis, regimes oligárquicos, governos opressivos, entre outros igualmente
adversos, na maioria das vezes, agravam problemas ambientais já existentes ao
mesmo tempo que estes fatores são também exacerbados pelos problemas
ambientais, num ciclo vicioso.
Assim, de acordo com tudo o que foi enunciado, a segurança ambiental pode
ser definida como «the relationship to established security of those environmental
factors – water, soil, vegetation, climate, and whatever others are prime components
of a nation’s environmental foundations – that ultimately underpin all our
socioeconomic activities and hence our political stability. Conversely, when these
environmental resources are degraded or otherwise depleted, so our security declines
too» (Idem:5).
78
Apesar da evolução do conceito até à atualidade com um aumento no número
e na qualidade das análises realizadas, a segurança ambiental continua a ser deficiente
na capacidade de previsão, o que de certo modo é um entrave ao estabelecimento do
conceito enquanto parte integrante da segurança nacional. De igual maneira é
fundamental que, dada a complexidade do sistema ambiental, muitos destes
problemas necessitem de ser equacionados do ponto de vista coletivo, sendo que, por
exemplo, nenhum Estado é capaz de combater as alterações climáticas por si só.
Ainda assim a área da segurança ambiental evoluiu bastante, ao ponto de ser
frequentemente referida por Estados como os EUA, o Reino Unido, a Noruega, a Índia
a Austrália, e organizações internacionais como a ONU e até mesmo a NATO.
Infelizmente ainda não foi oficial e formalmente adotada por nenhuma dos Estados
identificados.
79
Capítulo IV – Das vulnerabilidades às Ameaças: aplicação
prática
Não sendo possível testar a forma como algumas vulnerabilidades na região
Portugal, possam evoluir para ameaças, afetando a segurança do Estado português,
decidimos recorrer a exemplos do passado como forma de demonstrar a aplicabilidade
da teoria e de qual o limite entre uma vulnerabilidade grave e uma ameaça à
segurança nacional.
Uma ameaça à segurança define-se como uma ameaça existencial (Buzan,
1998), neste caso ao Estado, sendo por isso necessário definir aquilo que o constitui e
a razão da sua existência. O Estado, de acordo com a doutrina clássica da Ciência
Política, «é toda a população de nacionais fixa num território, onde existe uma
autoridade soberana que tem a missão de assegurar a satisfação das necessidades
coletivas, gerais e abstratas, de justiça, segurança e bem-estar material e espiritual»
(Lara, 2007:272). Neste sentido a entidade Estado é formado por três componentes
fundamentais, a saber:
a) «O povo, entendido como uma coletividade organizada, quase
personalizada, distinta, por valores, cultura e outras características
próprias, das demais coletividades semelhantes;
b) O território, entendido como o espaço geográfico específico, sobre o
qual a referida população organiza imediatamente a sua vida social;
c) O poder político que no caso e plenitude assume a expressão de
Soberania, referida como o poder – conjunto de meios capazes de coagir
a um determinado comportamento – que não tem igual na ordem
interna nem superior na ordem externa dessa relação população
território, e que se justifica pela necessidade de um respetiva
organização interna» (Lara, 2007: 272-273).
Sendo um conjunto de matérias e desempenhos que dão fundamento e razão à
própria existência do Estado, os fins do Estado ou as funções do Estado dividem-se em
três grupos: a Segurança, a Justiça e o Bem-estar económico e social. Para a Segurança,
já amplamente debatida no capítulo anterior, por considerarmos que apresenta um
bom complemento entre as ameaças externas e internas, não sendo excessivamente
80
focada nas ameaças externas utilizaremos a definição de Lara (2007) que «diz respeito
à defesa externa do Estado e à garantia da ordem a nível interno, abrangendo as
pessoas singulares e coletivas que o constituam, ou que no seu âmbito atuem e ainda
aos valores estabelecidos» (Lara, 2007:343). A Justiça é entendida como «condição
indispensável para garantir a paz social, baseada em “relações de mútuo respeito e
equidade” segundo a doutrina do professor Marcello Caetano, e o Bem-estar material e
espiritual em referência às necessidades coletivas resultantes da Cultura e da
Economia.» (Lara, 2007:343)
Decidimos pegar em duas vulnerabilidades-chave, demonstrando as
consequências que podem gerar se as mesmas vulnerabilidades se agravarem. Por
uma questão de tempo e de dimensão do trabalho, a seleção das vulnerabilidades foi
realizada com base nas alterações mais dramáticas projetadas para Portugal, seja pela
maior probabilidade de ocorrência como pelo facto de serem as que afetam mais
diretamente a vida humana, a estabilidade social e, que consequentemente, se podem
transformar numa ameaça.
À luz das alterações climáticas projetadas para a região do Mediterrâneo, mais
especificamente para Portugal, identificamos duas vulnerabilidades-chave:
1. Aumento da temperatura média, associado a um aumento tanto no
número de dias como na frequência dos períodos de calor intenso
(ondas de calor) e secas;
2. Diminuição da precipitação média anual, com especial incidência na
Primavera e no Verão;
81
IV.1 - Aumento da temperatura média
O aumento da temperatura média projetada para Portugal é um dos fatores
mais importantes porque, para além de ser o fator mais evidente e imediato, influi
sobre uma diversidade do número de variáveis, desde aumento dos problemas para a
saúde humana, quebra na produção agrícola, maior evaporação dos reservatórios de
água e consequente quebra na produção elétrica proveniente de barragens e na água
disponível para rega. Estas situações são tanto ou mais danosas quanto maior for o
aumento de temperatura, que pode ser experienciado através da ocorrência de ondas
de calor, fenómeno extremo que, de acordo com a Organização Meteorologia Mundial
(OMM) corresponde a um período de, pelo menos, seis dias consecutivos em que a
temperatura máxima diária é 5°C superior ao valor médio das temperaturas máximas
do período de referência, e que têm vindo a aumentar em frequência e magnitude e
que se projeta que continuem a intensificar-se durante o século XXI (IPCC, 2007;
Cunha, 2012).
Em 1995 uma onda de calor atingiu a região da cidade de Chicago, nos EUA,
provocando aproximadamente 700 mortos. Já em 2002, outra onda de calor atingiu a
Índia, provocando cerca de 1000 mortos (Brown, 2006). No entanto, a situação mais
grave ocorreu no Verão de 2003, em plena Europa: estima-se que tenha provocado
aproximadamente 40 000 mortos, apesar de os valores oscilarem entre os 25 000 e 70
000, sendo inclusive considerada a pior catástrofe natural a atingir a Europa nos
últimos 50 anos (D’lppoliti, 2010; Lynnas, 2008).
A combinação de fraca precipitação no Inverno e Primavera antecedentes e
consequente fraca humidade nos solos, anomalias no anticiclone dos Açores e
temperaturas dos oceanos invulgarmente elevadas geraram as condições ideias para
que esse Verão fosse particularmente seco e quente, atingindo o auge nas primeiras
duas semanas de Agosto. As temperaturas foram 5°C superiores à temperatura média
esperada, tendo sido registados recordes absolutos em Portugal (47,4°C na Amareleja),
Reino Unido (38,5°C em Kent) e Escócia (32,9° em Greycrook)35. O fenómeno teve o
seu impacto mais grave em França onde tanto os serviços de saúde como as
infraestruturas não se encontravam preparados para a ocorrência de uma catástrofe
35
Disponível no Instituto de Metereologia de Portugal em http://www.meteo.pt/pt/oclima/extremos/
82
deste tipo (García-Herrera, 2010). O Ministério de Saúde Francês divulgou como
números oficiais 14,802 óbitos resultantes da onda de calor mas muitos mais
ocorreram nos Estados vizinhos que também acabaram por ser afetados. Em Portugal,
de acordo com um estudo realizado pela Direcção-Geral de Saúde e o Instituto
Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, estima-se que tenham ocorrido um excesso de
1953 óbitos (Calado, 2004).
Ainda que tenha ocorrido um excesso de quase dois mil óbitos no espaço de
uma semana não consideramos esse fato uma ameaça existencial ao Estado. Os
períodos mais quentes, tal como os períodos mais frios, são caracterizados
precisamente por um aumento do número de óbitos, nos grupos etários mais
vulneráveis.
No entanto a onda de calor de 2003 gerou consequências mais graves para o
Estado, enquanto entidade política soberana. O aumento das temperaturas provocou
também uma quebra na produção agrícola europeia, com particular incidência em
França e nos países do Sul da Europa (Portugal, Espanha e Itália), devido sobretudo ao
stress nas plantas provocado pelo calor extremo, que impede a polinização e o
desenvolvimento das mesmas. A quebra de produção foi particularmente sentida na
produção de cereais (mais de vinte e três milhões de toneladas) apesar de ter afetado
todo o sector agropecuário (produção de leguminosas, frutos, vinho, carne de vaca,
porco e aves). No conjunto, os prejuízos derivados do sector primário a que se somam
os resultantes dos incêndios, rondaram os 13 biliões de euros aproximadamente
(Lynnas, 2008).
A quebra na produção agrícola foi igualmente sentida em Portugal com especial
incidência na cultura de trigo cuja produção em 2003 sofreu uma redução de 55,8%
face ao ano de 2002. Também a cultura do arroz sofreu uma quebra de 10%. O
decréscimo na produção de cereais apenas de 10,4% foi compensado por exceções
como foi um aumento na produção de vinho (ao contrário do que ocorreu no resto da
Europa) e de centeio. As áreas de produção de frutos, vegetais, carne bovina, suína e
avícola também sofreram quebras (COPA-COGECA, 2003).
O mesmo período verificou os incêndios mais graves que ocorreram em
Portugal (Figura 8). «High temperatures and greater dry spell durations increase
vegetation flammability, and during the 2003 heatwave a record-breaking incidence of
83
spatially extensive wildfires was observed in European countries with roughly 650,000
ha of forest burned across the continent. Fire extent (area burned), although not fire
incidence, was exceptional in Europe in 2003» (Parry et al., 2007:846). Em Portugal a
área ardida totalizou 471813,1 hectares, ou aproximadamente 5% da área florestal
sendo o valor mais elevado alguma vez registado. Quase 46 mil hectares ardidos eram
área agrícola36 o que não só contribuiu para que o impacto económico dos incêndios
excedesse um mil milhões de euros, como também para agravar as falhas na produção
agrícola (Bono, 2004; IPCC, 2007; Lynnas, 2008)37.
Figura 8 – Área Florestal total ardida (1980-2010)
Fonte: figura da autora com base nos dados sobre os incêndios florestais disponíveis no site do Instituto
da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF)
http://www.icnf.pt/florestas/dudf/estatisticas/estatistica-sgif
36
Dados estatísticos sobre os incêndios florestais disponível no site do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) http://www.icnf.pt/florestas/dudf/estatisticas/estatistica-sgif 37
Para mais informações sobre o surgimento, evolução e impactos da onda de calor de 2003 consultar PARRY et al. (eds.) (2007), Cross-chapter case studies in Climate Change 2007: Impacts, Adaptation and Vulnerability. Contribution of Working Group II to the Fourth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change disponível em http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg2/ar4-wg2-xccc.pdf e GARCÍA-HERRERA, R. et al. (2010), “A Review of the European Summer Heat Wave of 2003”, Critical Reviews in Environmental Science and Technology disponível em http://www.iac.ethz.ch/people/fischeer/docs/garcia_2010.pdf
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Neste sentido podemos admitir que o episódio produziu uma ameaça
existencial significativa, que não foi sentida devido aos preços baixos dos cereais nos
mercados internacionais em 2003. Atualmente os preços encontram-se quase três
vezes superiores ao registado no ano da onda de calor, pelo que é possível projetar
que o impacto na população da quebra da produção agrícola, sobretudo num período
de crise grave, seria bastante mais acentuado (Figura 9).38
Figura 9 – FAO food price index
Fonte: FAO Food Price Index disponível em http://www.fao.org/worldfoodsituation/wfs-
home/foodpricesindex/en/
Para além dos óbitos que ocorreram (devido diretamente ao calor excessivo ou
durante os incêndios), a quebra na produção agrícola torna-se uma ameaça existencial
quando o país não produz o mínimo necessário para satisfazer o mercado interno e
necessita de recorrer aos mercados internacionais, colocando a entidade numa grave
situação de dependência face o exterior. Assim, o Estado não consegue cumprir um
dos seus fins, o bem-estar do povo, que é também um dos componentes fundamentais
38
FAO Food Price Index disponível em http://www.fao.org/worldfoodsituation/wfs-home/foodpricesindex/en/
85
do mesmo. Na antiguidade várias civilizações prosperaram e caíram consoante a
existência de alimento suficiente ou não, pelo que na civilização moderna, ainda que
existam mecanismos que atenuam o efeito da falta de alimentos, o problema persiste.
No caso português, a integração no espaço europeu e todos os mecanismos existentes
possibilitam uma maior integração de Portugal nos mercados, pelo que a falta de
alimentos não é tão sentida. No entanto, em países menos desenvolvidos ou fora
destes sistemas de suporte, a falta de alimentos é bastante mais notória, com efeitos
mais rápidos e graves. Por exemplo a escalada de instabilidade originada pelo aumento
do preço dos alimentos nos mercados internacionais e falta de produção interna,
propiciou a revolução que ocorreu em 2011 no Egipto (Cunha, 2012). Também o chefe
de Estado de São Tomé e Príncipe veio apelar ao cultivo de todos os terrenos passíveis
de serem cultivados para evitar uma crise alimentar no ano que vem39.
39
Notícia “São Tomé e Príncipe: Governo prevê agravamento da situação alimentar no próximo ano”, Expresso, disponível em http://expresso.sapo.pt/sao-tome-e-principe-governo-preve-agravamento-da-situacao-alimentar-no-proximo-ano=f755143 (consultado em 22/09/2012)
86
IV.2 – Diminuição da precipitação média anual
A diminuição da precipitação média anual projetada de -25% a -50%,
especialmente incidente nos meses da Primavera e do Verão, não só intensifica como
é intensificada pelo aumento da temperatura. Esta tendência, que já vem sendo
sentida ao longo dos últimos 20 anos, potencia períodos de seca, com períodos de
retorno mais reduzidos, sendo que as mais graves e incidentes ocorreram nos últimos
dez anos (Santos e Miranda, 2006)40.
Como seca entendemos que são «situações de escassez de água com longa
duração, que abrangem áreas extensas e com repercussões negativas significativas nas
atividades socioeconómicas e nos ecossistemas, podendo-se definir como situações
excecionais em que as disponibilidades hídricas são insuficientes para satisfazer as
necessidades de água de determinada região» (Santos, 1998:3). A seca é também um
fenómeno com contornos mal definidos, que se desenvolve lentamente no tempo e
que se traduz essencialmente numa acumulação de efeitos, sendo por isso passível de
só ser identificada (na maioria das vezes) após já estar instalada e através de uma
reavaliação retrospetiva (Santos, 1998). Em regra podemos definir a seca em quatro
grandes grupos: seca meteorológica (verifica-se quando a precipitação encontra-se
bastante abaixo dos valores normais esperados), seca hidrológica (quando os caudais
dos rios e os níveis dos aquíferos encontram-se abaixo do normal), seca agrícola
(quando a quantidade de água armazenada no solo é insuficiente para suprimir a
necessidade de desenvolvimento das plantas) e finalmente seca económica (verifica-se
quando o deficit de água provoca a falta de bens ou serviços, como a água para
consumo urbano-industrial, energia elétrica, alimentos, entre outros) (Cunha, 2012).
Tomamos como exemplo a seca de 2005 e de 2012.
A seca de 2005, que ocorreu no período de Novembro de 2004 a Fevereiro de
2006 «fez jus ao sentido mais abrangente das definições de seca para os climas
semidesérticos e mediterrânicos no que se relaciona com a da sua natureza inter
anual» (Rodrigues et al., 2006:2). A semelhança existente entre a pluviometria dos
primeiros quatro meses do ano hidrológico de 2005/2006 e do ano de 2003/2004
40
Secas em Portugal disponíveis no site do Instituto de Meteorologia http://www.meteo.pt/pt/areaeducativa/otempo.eoclima/seca.meteo/index.html?page=seca.pt.xml
87
indica que a sua proximidade ao ano seco, faz com que esses três anos hidrológicos
compreendam um período inter anual de seca (Figura 10).
Figura 10 - Variação da pluviometria ponderada no território continental desde o
Outono de 2003
Fonte: RODRIGUES, Rui, Cláudia Brandão, Ana Rita Lopes e Miguel Nunes (2006), Caracterização do
Período de Quatro Meses do início do ano hidrológico de 2005/2006 e seu Enquadramento na severidade
da Seca decorrente do ano hidrológico de 2004/2005, Instituto da Água — Direção de Serviços de
Recursos Hídricos, Lisboa, disponível em
http://snirh.inag.pt/snirh/download/relatorios/SECA2006_Jan.pdf
Depois de o ano hidrológico de 2003/2004 ter estado ligeiramente abaixo da
média, a excessiva precipitação em Outubro de 2004 fez crer que o Inverno de
2004/2005 iria compensar os efeitos ligeiros a moderados de seca que haviam sido
sentidos. No entanto, os meses seguintes de Novembro a Setembro, a precipitação
esteve quase a 75% abaixo do que seria esperado para cada mês (Figura 11, Tabela 3).
88
Figura 11 – Evolução da seca
Fonte: Mapas disponíveis no site do Instituto da Água (INAG) disponíveis em
http://snirh.inag.pt/snirh/_dadossintese/precipitacao/mapas_resumo/entrada.php?periodo=2000%2F2
011&mes=-1&ano=2004&tp_mapa=mensal
89
Tabela 3 – Distribuição da precipitação
Meses Registada (mm) Média (mm)
Outubro 159.4 92.5
Novembro 19.9 118
Dezembro 43.8 129.8
Janeiro 7 126.8
Fevereiro 18.7 112.2
Março 52.6 93.5
Abril 32.8 74.7
Maio 32 68.5
Junho 5.6 32.7
Julho 8.3 10.3
Agosto 3.4 11.6
Setembro 14 41.8
Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados fornecidos pelo INAG disponíveis em
http://snirh.inag.pt/snirh/_dadossintese/precipitacao/mapas_resumo/entrada.php?periodo=2000%2F2
011&mes=-1&ano=2004&tp_mapa=mensal
A diminuição da precipitação originou um conjunto de efeitos sendo que o
sector mais afetado foi a agricultura. Verificaram-se quebras generalizadas e bastante
acentuadas na produção agrícola nomeadamente a cerealífera que sofreu uma
redução de mais de 30%, face ao ano anterior, com excepção apenas para o trigo mole
(Quadro 3).
Quadro 3 - Terra Arável, Terra Agrícola, Produção de Cereais e Índice de Produção
Pecuária em Portugal, 1990-2010
Terra Arável (% da Área
Territorial Total)
Terra Agrícola (% da Área
Territorial Total)
Produção de Cereais (kg
por hectare)
Índice de Produção Pecuária (2004-
2006=100)
1990 25.6 43.3 1877.7 84.89
1991¹ 25.2 42.8 2160.5 87.51
1992¹ 24.9 42.4 1779.0 89.74
1993¹ 24.5 43.3 2033.4 91.6
1994¹ 24.0 43.2 2398.7 90.4
1995¹ 23.5 42.9 1993.8 92.52
1996 21.9 40.8 2498.2 93.68
1997 20.6 39.1 2220.8 96.31
1998¹ 20.8 41.2 3135.3 99.3
1999¹ 18,7 42.2 2829.3 101.0
90
2000 17.8 41.9 2780.7 101.4
2001 17.4 41.5 2632.3 99.7
2002 17.6 42.0 2905.7 101.7
2003 16.8 41.7 2629.2 97.1
2004 16.8 41.7 2945.5 99.8
2005¹ 13.8 41.6 2027.4 102.1
2006 13.8 41.2 3122.6 98.1
2007 12.3 40.2 3463.3 100.9
2008 12.8 40.8 3597.8 107.3
2009 12.3 40.3 3473.2 105.9
2010 — — 3462.9 107.8 Quadro da autora, a partir de dados do Banco Mundial disponíveis em http://data.worldbank.org/country/portugal. Notas elaboradas a partir de constatações do Instituto de Meteorologia de Portugal, disponíveis na íntegra em http://www.meteo.pt/pt/area educativa/otempo.eoclima/seca.meteo. Nota:¹A constatação de secas (de gravidade espacial variável) no território português tem vindo a aumentar desde a década de 90, sendo que na década de 80 apenas uma afetou o território nacional entre 1980 e 1981. Acresce dizer que é difícil distinguir aquelas que derivam do sistema climático mediterrâneo das que decorrem diretamente das alterações climáticas. Contudo, secas como a de 2005 e respetivos efeitos na produção de cereais por hectare tenderão a repetir-se mais vezes de acordo com o IPCC. A colocação do Índice de Produção Pecuária é exclusivamente por uma questão de transparência metodológica, para uma melhor constatação da situação do setor primário.
A quebra na produção de arroz rondou os 50% no Alentejo e no Algarve não se
chegou a realizar a cultura. Os prados, as pastagens e as culturas forrageiras também
foram fortemente afetadas pela escassez hídrica: em Junho os pastos já se
encontravam na sua maioria esgotados o que obrigou à compra extra de alimento para
a manutenção dos animais. A escassez de água em pequenas lagoas, poços e furos
obrigou ao transporte frequente de água em tanques para os animais. Houve também
quebra na produção de girassol (89%), grão-de-bico (64%), feijão (29%) e melão (15%)
e uma redução na área de produção de tomate de 8%. Relativamente à batata, a de
regadio sofreu uma quebra média de 17% enquanto a de sequeiro rondou os 40%
(Comissão para a seca 2005) (Figura 12).
Relativamente às fruteiras observou-se uma diminuição na produção da maçã
(17%), da pera (28%) e do figo (36%), com excepção para a laranja que aumentou em
7%. No entanto é preciso salientar que «nas zonas em que se verificou falta de água
para rega, a produção registou decréscimos acentuados. Os prejuízos sofridos
decorreram essencialmente da desvalorização dos frutos, devida aos pequenos calibres
que apresentavam e à sua deficiente qualidade, o que obrigou ao seu escoamento para
a indústria de transformação» (Comissão para a seca 2005:28).
91
Figura 12 – Variação da produção em relação ao ano anterior (data de referência 31
de Dezembro de 2005)
Fonte: Comissão para a seca 2005, Relatório de Balanço, disponível em
http://www.inag.pt/inag2004/port/divulga/actualidades/seca/relatorioBalanco.pdf
A quebra na produção agrícola foi acompanhada por um aumento da tensão
entre agricultores e populações à medida que as reservas hídricas iam diminuindo. Por
exemplo em Fevereiro ficou decidido que a água da albufeira do Arade seria destinada
ao consumo doméstico e não à exploração de citrinos. Do mesmo modo também a
albufeira do Roxo, que abastece Beja e Aljustrel, foi alvo de restrições para a atividade
agrícola41. Este fenómeno obrigou ao aumento do abastecimento de populações
através dos bombeiros: no período entre 1 de Janeiro e final de Setembro de 2005
foram registados 18452 abastecimentos, uma média de 60 por dia que aumentou para
uma centena durante o Verão (Comissão para a seca 2005).
A escassez de pluviosidade implicou também que a vegetação ficasse seca mais
cedo no ano, o que acabou por contribuir para uma elevada época de incêndios. É de
41
Notícia de Roberto Dores (2005), Falta de água pode afetar um milhão de portugueses, Diário de Notícias, disponível em http://www.dn.pt/inicio/interior.aspx?content_id=609622 (consultada a 24/09/2012)
92
referir que da totalidade de área ardida ronda os 347 mil hectares, sendo que 7642,5
mil hectares compõem a área agrícola ardida42.
De acordo com o relatório produzido sobre a seca pela Comissão para a seca
2005, os impactos que geraram mais custos financeiros devem-se à necessidade da
importação de combustíveis fósseis para a produção de energia necessária para
compensar a quebra na produção de eletricidade nas barragens devido à diminuta
disponibilidade hídrica. O custo foi de 133.5 milhões de euros, com a possibilidade de
terem atingido os 182 milhões de euros43. Seguem-se os prejuízos de 39 milhões de
euros provenientes da agricultura, suportados na totalidade pelo Ministério da
Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas. Estes encargos traduzem-se: nas
bonificações dos juros das linhas de crédito (7 milhões de euros), em cereais de
intervenção (5 milhões de euros), ajuda aos produtores de pecuária em regime
extensivo (15 milhões de euros) e isenção de pagamento à segurança social (12
milhões de euros). Os impactos sentiram-se também nas atividades empresariais
ligadas dependentes de recursos primários, sobretudo no caso da indústria da pasta de
papel, onde a perda de crescimento do eucaliptal equivale a 25% do crescimento
potencial ao ano, ou seja, 30 milhões de euros. Foram também gastos 23.210 milhões
de euros com os municípios, sobretudo para garantir a quantidade e a qualidade de
abastecimento de água às populações. Finalmente os custos do combate aos incêndios
florestais (8.760 milhões de euros), os prejuízos na indústria dos adubos (2.250
milhões de euros), campanhas de informação e sensibilização para a poupança de água
(697.864 euros) e extração de biomassa (285.800 euros) contribuíram para um
prejuízo total da seca de 286 205 800 euros (Comissão para a seca 2005).
Assim, passados apenas dois anos da onda de calor de 2003, Portugal sofre uma
quebra acentuada na produção agrícola interna. Ainda que o calor tenha sido mais
intenso durante as duas semanas do início de Agosto que compõem o período da onda
de calor de 2003, a agricultura, e o país no geral ressentiu-se mais devido à falta de
precipitação de 2005, pelo que se põe uma nova ameaça ao Estado: até quando o
Estado será capaz de suportar estes prejuízos, atendendo ao facto de serem mais
42
Dados estatísticos sobre os incêndios florestais disponível no site do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) http://www.icnf.pt/florestas/dudf/estatisticas/estatistica-sgif 43
O relatório de balanço foi produzido antes do final da seca
93
frequentes (apesar de nos encontrarmos apenas na primeira década do século XXI) e
cada vez mais onerosos?
A seca de 2005 foi apontada como a mais grave nos últimos 60 anos (Comissão
para a seca 2005) e quase se repetiu em 2012, menos de dez anos de retorno. De
facto, o volume de precipitação disponível aponta para uma seca grave, quase tão
grave como a de 2005. Ainda que não seja possível fazer uma análise completa, o
último relatório de acompanhamento da seca, produzido em Abril de 2012 registou, tal
como em 2005, uma quebra na produção agrícola acentuada, a partir do qual se
calculou um atenuar/ligeira melhoria da seca devido a alguma precipitação ocorrida no
mês de Abril44(Figura 13).
Figura 13 – Percentagem do território afetado pela seca meteorológica
Fonte: Acompanhamento e Avaliação dos Impactos da seca de 2012, 5º Relatório, disponível em
http://www.portugal.gov.pt/media/608161/20120528_relat_rio_seca.pdf
44
Dados da precipitação disponíveis no site do Instituto da Água (INAG) http://snirh.inag.pt/snirh/_dadossintese/precipitacao/mapas_resumo/entrada.php?periodo=2000%2F2011&mes=-1&ano=2011&tp_mapa=mensal
94
Conclusão
Com base no que foi desenvolvido ao longo desta dissertação podemos concluir
que o problema das alterações climáticas é grave e que os acontecimentos extremos
que ocorreram durante a primeira década do século XXI fazem temer o pior nos
próximos 25 a 50 anos. De facto o conhecimento científico produzido sobre as
alterações climáticas nos últimos vinte anos é abundante o que se traduz numa solidez
do seu reconhecimento (salvo raras exceções) e que é necessário tomar medidas para
mitigar e adaptar às mudanças climáticas. Especificamente em Portugal, localizando-se
no Mediterrâneo, uma das regiões mais afetadas, espera-se um aumento da
temperatura média entre 2ºC e 8,6ºC, que no Verão se agrava entre 4,5ºC e 11,5ºC,
com uma diminuição da precipitação que pode chegar até aos 60% (nos cenários mais
pessimistas), o que justifica a confirmação da primeira hipótese:
H.1 – As alterações climáticas terão um impacto profundo no clima português.
Mais grave do que isso, as alterações climáticas têm efeitos sobre a segurança
alimentar em Portugal. Como é possível observar no quadro X em 2005 registou-se
uma quebra na produção de cereais de aproximadamente 1/3 face ao ano de 2004, ou
seja, fez recuar a produção uma década. Também houve uma depressão no output de
cereais em 2003, mesmo que não tenha sido tão significativa.
Apesar de tudo, mesmo tendo em conta a variabilidade da produção de cereais,
é possível estabelecer uma tendência positiva de aumento gradual da produção de
cereais por hectare ao longo dos vinte anos em análise. No entanto é também verdade
que, de acordo com as projeções do IPCC e do projeto SIAM II, estes fenómenos
extremos de calor e de seca vão ser mais frequentes na região do Mediterrâneo e em
Portugal. Assim, é de assinalar que ainda que a produção de cereais tenha recuperado
no ano seguinte, o mesmo não se verificou na percentagem de terra arável, onde a
quebra de três pontos percentuais agravou a tendência de decréscimo da mesma. A
ocorrência destas depressões súbitas na produção de cereais tenderá a exigir mais da
capacidade de resposta do Estado à medida que se tornarem mais frequentes e
intensas, podendo, no limite, gerar um ponto de rutura onde o Estado não consegue
dar resposta às necessidades alimentares da população, até porque o sector primário
português, para além de estar sujeito a uma diminuição constante de terra arável, é
95
altamente ineficiente45, já que empregava 10,9% da população ativa em 2010 e
representava apenas 2,4% do PIB no mesmo ano segundo dados oficiais do Banco
Mundial.
É possível ficar com uma noção dos impactos concretos no abastecimento de
água às populações e na produção alimentar à luz dos dois fenómenos extremos
analisados. Além disso, os anos de 2003 e 2005 registaram também os valores mais
elevados de área ardida com consequentes recordes na perda de vidas humanas em
incêndios e de bens materiais.
No entanto, prevalece uma falta de sensibilidade para com as implicações
políticas e económicas da aplicação dessas medidas (Stern, 2007). Sem pôr em causa
que essas mesmas medidas são necessárias, a aplicação encontra-se muito
dependente do funcionamento da democracia e da lógica da luta pelo poder,
contribuindo para estas dificuldades a desinformação que ainda persiste por parte da
opinião pública.
Por outro lado a segurança ambiental, no panorama internacional, ainda não
foi securitizada apesar de atualmente já ser referida várias vezes como um problema
de ameaça à segurança nacional, devido em parte pela persistência de alguns
paradigmas do conceito tradicional de segurança e pela despesa adicional que acresce
ao Estado (Buzan et al., 1998).
Além disso o conceito de segurança ambiental é também muito perspetivado
numa ameaça à segurança do ser humano (individualmente considerado), derivado do
facto de ter surgido para a temática da segurança juntamente com uma panóplia de
outras vulnerabilidades ao indivíduo como a pobreza, questões de equidade social,
democracia, entre outras. No entanto, a nosso ver, a segurança ambiental é primordial
a todos estes tipos de ameaças porque não é possível tornar os sujeitos menos
vulneráveis aos efeitos colaterais provocados pelas alterações climáticas (aumento da
desigualdade, persistência da desigualdade, da falta de equidade, entre outros) sem
estratégias concretas de mitigação e/ou adaptação, sendo que como vimos Portugal
não se encontra no leque de países beneficiado pelas mudanças no sistema climático.
45
Para mais considerações sobre o sector primário português visto por um dos seus principais parceiros comerciais, ver Agriculture and Agri-Food Canada (2012), “Agri-Food Past, Present and Future Report:Portugal”, disponível em http://www.ats-sea.agr.gc.ca/eur/4076-eng.htm (consultado em 11/10/2012).
96
Entretanto, a insegurança dos indivíduos tenderá a repercutir-se no
funcionamento do Estado. Sem existência da segurança ambiental não é possível
garantir a segurança do Estado. Os frequentes desastres naturais são prova da
constante limitação do Estado, enquanto entidade soberana e possuidor de uma
estrutura organizativa interna, e que, no caso português das alterações climáticas, se
traduz numa mudança das variáveis fundamentais para a produção de bens primários
(água potável e alimento).
Há por isso um risco elevado de se verem postos em causa quer o controlo
administrativo e permanente do território — que se vê, mesmo que
momentaneamente, interrompido em caso de catástrofe — quer a sobrevivência física
das populações afetadas. E se é verdade que quer a população quer o território são
elementos estruturais de qualquer Estado, lembramos também que entre os seus fins
encontramos precisamente a responsabilidade de manter quer a integridade do
primeiro, quer o bem-estar do segundo.
Em Portugal, depois dos episódios de 2003 e 2005, os relatórios preliminares da
seca de 2012 apontam para prejuízos semelhantes àqueles observados nos dois
fenómenos extremos anteriores, sendo que o procedimento habitual do Estado
persiste, ou seja, o Estado português continua a assumir os prejuízos das catástrofes a
posteriori.
Os pareceres divulgados através de relatórios — nomeadamente os referentes
à seca de 2005 — apenas apelam para um conjunto de medidas de articulação da
resposta a estes eventos extremos, não sendo vinculativos. O entendimento oficial do
fenómeno da seca, enquanto problema sério com tendência a agravar-se com as
alterações climáticas apenas chegou em 2010 com a aprovação da Estratégia Nacional
de Adaptação às Alterações Climáticas (ENAAC). De facto em Portugal, deu-se
prioridade à mitigação em prol da adaptação, uma vez que o Programa Nacional para
as Alterações Climáticas (PNAC), que apenas diz respeito à redução da emissão de
gases com efeito de estufa, foi aprovada inicialmente em Conselho de Ministros em
Julho de 2004 (foi acrescentada uma resolução em 2006), enquanto a ENAAC apenas
foi aprovada em Abril de 2010.
Ora, não pondo em causa a necessidade de mitigação das emissões pelo seu
contributo para as alterações climáticas e para cumprimento das metas estabelecidas
97
pela UE e pelo protocolo de Quioto, é algo evidente que o contributo de Portugal para
o conjunto de emissões globais é muito diminuto comparativamente com os impactos
que irá sofrer. Sendo assim seria imperioso pensar antes de mais numa adaptação às
alterações climáticas que implicaria alterações profundas em vários sectores,
principalmente na estrutura agrícola nacional de modo a compensar os efeitos
potencialmente depressivos sobre a produção de cereais, sendo útil lembrar que
Portugal já importa 75% dos cereais que consome46.
De facto, para além de a adaptação ter sido relegada para segundo plano, a
ENAAC não contribuiu para que fosse criada uma verdadeira estratégia de adaptação
para Portugal, face às alterações climáticas, ou seja, não securitizou a temática em
Portugal, o que nos permite rejeitar a segunda hipótese: H.2 - Portugal securitizou as
alterações climáticas.
Como foi explicitado na Metodologia, para analisar se a ENAAC cumpriu ou não
o seu objetivo de securitização das alterações climáticas em Portugal, seguiu-se três
etapas:
1. Identificar instituições e/ou organismos responsáveis pelo
desenvolvimento e aplicação da Estratégia;
2. Apontar orçamentos, metas e objetivos concretos;
3. Definir linhas temporais e vulnerabilidades aos quais o Estado
encontra-se sujeito.
Em linha com o ponto 1, encontrámos toda uma moldura de
instituições/organismos envolvidos no processo (ver Figura X). A Estratégia fica a cargo
de um Grupo de Coordenação que dirige os trabalhos dos Grupos Setoriais. O Grupo
de Coordenação é composto pelos coordenadores dos grupos sectoriais, por um
representante do Ministério dos Negócios Estrangeiros, um representante de cada
Região Autónoma e um representante da Associação Nacional de Municípios
Portugueses. Por sua vez os Grupos Setoriais criados em cada área têm como objetivo
identificar as vulnerabilidades e as necessárias medidas de adaptação.
46
Notícia do jornal Expresso, consultada a 5 de Outubro de 2012, disponível em http://expresso.sapo.pt/preco-do-pao-pode-aumentar=f672094
98
Figura 14 – Organograma para o desenvolvimento e aplicação da Estratégia
Fonte: Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas, disponível em: http://www.anmp.pt/files/dpeas/2010/pactoautarcas/p02/ENAAC.pdf
Em Setembro de 2010, a Ministra do Ambiente e do Ordenamento do
Território, através de despacho ministerial, designa os nove coordenadores dos nove
grupos sectoriais mais oito elementos para o Grupo de Coordenação47. Da pesquisa
efetuada, além do site oficial da ENAAC48, a investigação chega a um beco sem saída,
uma vez que a partir daqui mais nenhum dado relevante é publicitado nem tão pouco
tornado público, dando a sensação que ou o governo ou as instituições responsáveis
perderam interesse em prosseguir o processo de efetiva securitização.
Também não foi encontrado nenhum relatório intercalar das atividades dos
grupos setoriais, bem como nenhum relatório final dos mesmos grupos. De facto, de
acordo com a mesma Estratégia no mês vinte e um (depois da aprovação da ENAAC)
deveriam ser apresentados os relatórios dos grupos sectoriais, no mês vinte e quatro o
relatório de progresso e de implementação juntamente com uma proposta para novos
trabalhos de implementação (ver Figura X). Nenhum dos relatórios nem a proposta se
47
Despacho ministerial consultado a 13 de Setembro de 2012, disponível em: http://dre.pt/pdf2sdip/2010/09/189000000/4848648486.pdf 48
Site oficial da ENAAC: http://adaptacao.clima.pt/home
99
encontram disponíveis, sendo que a autora tem altas dúvidas que tenham chegado
sequer a ser elaborados.
Figura 15 – Cronograma geral
Fonte: Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas, disponível em: http://www.anmp.pt/files/dpeas/2010/pactoautarcas/p02/ENAAC.pdf
Além da falta de cumprimento das únicas metas determinadas, a inexistência
de um orçamento é a nosso ver uma das falhas substanciais na Estratégia, por a nossa
experiência na área da Ciência Política nos dizer que sem verba não há verbo. No
ponto que diz respeito ao financiamento da estratégia apenas é determinado que os
grupos setoriais deverão identificar “linhas de financiamento”. Ora, não só a
adaptação e/ou a mitigação exigem financiamento para serem implementadas, como
o próprio Ministério das Finanças não foi incluído na ENAAC, sendo um dos grandes
vazios institucionais do planeamento, ainda para mais num contexto no qual este
Ministério voltou a assumir uma enorme preponderância no delineamento das ações
governamentais desde a tomada de posse do ministro Victor Gaspar.
A Estratégia falha igualmente na determinação de objetivos concretos. De
acordo com a própria estes centram-se em quatro pontos essenciais, com especial
ênfase para o segundo:
1.º Informação e conhecimento;
2.º Redução da vulnerabilidade e aumento da capacidade de resposta;
3.º Participar, sensibilizar e divulgar;
4.º Cooperar a nível internacional.
100
No entanto, a própria Estratégia em si não só não identifica as vulnerabilidades
específicas como não determina qualquer medida para as combater. Essa função
ficaria a cargo dos grupos sectoriais. Assim não só não aponta quaisquer orçamentos e
objetivos concretos como as únicas metas e/ou linhas temporais que deveriam ser
cumpridas seriam os prazos de entrega dos dois relatórios e da proposta, que aliás não
foram cumpridos.
Os resultados da nossa investigação acabam por ser corroborados pelos dois
pareceres realizados pelo Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente
(grupo GEOTA) e pelo Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento
Sustentável (CNADS) enquanto a Estratégia esteve sujeita a consulta pública (que
ocorreu até 4 de Setembro de 2009). Para além das diversas críticas direcionadas às
áreas dos grupos sectoriais e à clara falta de «linhas orçamentais específicas (…), não
sendo possível avaliar, de todo, qual a sua viabilidade» (GEOTA, 2009:3), o grupo
GEOTA conclui que «se demonstra aqui a falta de coragem para assumir medidas
eficazes, mas contrárias à política corrente» (GEOTA, 2009:4). Do mesmo modo,
também o parecer realizado pelo CNADS identifica algumas dúvidas e preocupações
relativas à metodologia uma vez que «uma estratégia implica um plano de ação para
atingir objetivos determinados, estabelecendo opções, alternativas e prioridades. Esta
porém não é a metodologia seguida na ENAAC» (CNADS, 2009:3). Além disto,
considera uma falha a não inclusão de Ministérios de «especial relevância» como os
«Ministérios das Finanças, da Educação e da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior»
bem como a falta de financiamento para a Estratégia (CNADS, 2009), indo também
aqui ao encontro das nossas conclusões.
Se o tema fosse securitizado um conjunto de medidas de adaptação concretas
teria uma aplicação imediata, mesmo que em prejuízo das atividades económicas (e
não só) de alguns indivíduos no curto-médio prazo.
Quanto à determinação dos resultados da ENAAC no médio-longo prazo seria
necessário dar continuidade à pesquisa iniciada por nós com esta dissertação de
mestrado através de uma tese de doutoramento. Além de abranger áreas bastante
diversas, o período de vigência da ENAAC (sensivelmente dois anos) é curto para se
101
traduzir em mudanças e produzir resultados concretos, caso esta fosse analisada neste
preciso momento.
No entanto, a perceção que passa com base nos relatórios preliminares da seca
de 2012 é a de que se evoluiu muito pouco desde os anos de 2003/2005, situação para
a qual deve ter contribuído a crise atual, que originou uma deterioração da capacidade
económica para a aplicação na prevenção bem como ter provocado uma deslocação
de prioridades por parte da elite governante. De facto, o atual clima económico e
financeiro ganha proeminência um pouco por todo o Mundo mas principalmente em
Portugal, relegando para um plano muito inferior a problemática das alterações
climáticas.
Além do mais, a falta de securitização do tema determina, especialmente num
momento em que os recursos financeiros são bastante escassos e que é necessário
efetuar cortes de despesa pública, que uma das áreas mais afetadas seja o Ambiente,
uma vez que não é considerado uma necessidade primária para o Estado… na nossa
opinião, por enquanto.
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