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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LETRAS
CMPUS DE TRS LAGOAS
Em tempo (quase) real
Anlise semitica do jornalismo na web
Thasa Bueno
TRS LAGOAS (MS)
2007
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LETRAS
CMPUS DE TRS LAGOAS
Em tempo (quase) real
Anlise semitica do jornalismo na web
Thasa Bueno
Projeto de Dissertao apresentado aoPrograma de Ps-graduao em Letras, rea deconcentrao Estudos Lingsticos, daUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul Campus de Trs Lagoas, nvel Mestrado, comorequisito parcial para a obteno de ttulo deMestre em Letras.
Orientadora:Prof. Dr. Ritade Cssia Pacheco
Limberti.
TRS LAGOAS (MS)
2007
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Ao meu pai, que me ensina todos os dias que nunca tarde.
minha me, por ter dedicado a mim, ainda hoje, o melhor do seu tempo.
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AGRADECIMENTOS:
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, por ter proporcionado todosos meus anos de estudo no Ensino Superior;
Ao Mestrado em Letras de Trs Lagoas, na figura do professor doutorJosBatista de Sales, e a todos os professores do programa, em particular MarleneDurigan, Vnia Maria Lescano Guerra, Claudete Cameschi de Souza e PauloSrgio Nolasco dos Santos, pela oportunidade que me ofereceram de darcontinuidade ao meu aperfeioamento profissional e pessoal;
minha orientadora, professora doutora Rita de Cssia Pacheco Limberti,pelo tempo precioso que me dedicou nesse caminho;
Ao programa de Mestrado em Estudos de Linguagem, da UFMS de CampoGrande, e os professores deste programa, pela oportunidade de estudar comoouvinte e depois como aluna especial as disciplinas de Introduo Semitica eSemitica Desenvolvimentos, que muito contriburam para meu aprendizado;
s coordenaes de curso da Faculdade Estcio de S e Uniderp, pela boavontade com que entenderam minhas ausncias;
Aos meus alunos, que aceitaram, com poucas reclamaes, repor aulas aossbados;
Ao curso de Jornalismo da Aems de Trs Lagoas, pela oportunidade delecionar durante minha estada na cidade e por ter aberto as portas de seualojamento para que ficasse ali durante o perodo do curso;
sociedade brasileira, que de maneira involuntria permitiu que eu pudesseter acesso escola pblica de qualidade e introduzir-me na pesquisa, apesar dacrise educacional do pas;
comunidade de Trs Lagoas, pela receptividade com que fui recebida;
Aos motoristas da Viao So Luiz, por conduzirem-me com segurana
pelos pouco mais de 300 quilmetros de estrada, madrugada a fora;
Aos colegas de curso, dos quais vou sentir muita saudade;
Aos novos amigos que fiz durante mestrado, alguns que levarei para o restoda vida;
Ao meu namorado Danilo, que sempre esteve comigo mesmo quando issosignificava comprometer nossos fins de semana;
Ao meu irmo, pela fora e provocaes;
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A todas as outras pessoas que me ajudaram em algum momento dessatrajetria; esse trabalho o resultado do apoio de todos vocs!
Por fim,Ao TEMPO, por permitir-me mais alguns bons momentos nessa viagem.
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Rico no o homem que coleciona e se pesa no amontoado de moedas, e nem aquele devasso
que se estende, mos e braos, em terras largas., rico s o homem que aprendeu, piedoso e
humilde, a conviver com o tempo.
Raduan Nassar, Lavoura Arcaica
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RESUMO
A proposta desta pesquisa estudar a produo do jornalismo on line nos
chamados sites de notcia dirios e discutir o conceito de notcia nestes veculos,
tendo como base metodolgica a semitica de linha francesa. A idia fazer uso
dessa ferramenta para observar algumas estratgias de construo de sentido
usadas por esses jornais virtuais para garantir o efeito de tempo real em suas
coberturas. Mostrar, por exemplo, os simulacros que criam com enunciados e
que, nesse formato de trabalhar a notcia, o jornalismo acaba contradizendo
algumas premissas, como no noticiar o que no se tem certeza, oferecer uma
contextualizao histrica e social daquilo que est sendo divulgado, ouvir todos
os envolvidos no acontecimento reportado entre outros pressupostos que o
acompanhavam at ento, em outros suportes.
O trabalho pretende analisar como se d o tratamento do texto jornalstico
quando a notcia transformada em mercadoria. No momento em que chegar na
frente do concorrente mais importante do que dar uma notcia com preciso. A
pesquisa analisa os aspectos do jornalismo na web tendo como base o estudo da
cobertura sobre as Rebelies provocadas pelo PCC (Primeiro Comando daCapital) nos dias 13, 14 e 15 de maio de 2006, no site Campo Grande News, o
mais antigo neste suporte em Mato Grosso do Sul e o nico 24 horas no ar. O
corpus inclui tambm, como recurso de exposio, o recorte de uma semana, a
primeira do ms de janeiro de 2007, que teve sua pgina inicial modificada no
primeiro dia daquele ano.
Palavras-chave: Jornalismo on-line, semitica francesa, comunicao.
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ABSTRACT
The proposal of this research is to study the production of the journalism on
line in the news daily sites and talk about the concept of the news in these
vehicles, having as a methodological base the Greimas semiotics. The idea is to
make the use of this tool to observe some used strategies of construction of
direction for these virtual periodicals to guarantee the effect of real time in its
coverings. To show, for example, the simulacro that creates and declares in its
format to work the news, the journalism contradicts some premises, such as
releasing what is not certain, offering a historical and social contextualization
which is being divulged, hearing all the involved in the event reported and others
presupposed in other supports.
The work intends to analyze how the treatment of the journalistic text is
transformed into merchandise. At the moment when arriving first than its
competitor is more important than publicizing the news with precision. The
research analyzes the aspects of the journalism in the websites having as a base
the study of the covering on the Rebellions provoked by the PCC (First Command
of the Capital) on 13th, 14th and 15th of May of 2006, at the site Campo GrandeNews, the oldest in this support in Mato Grosso do Sul and only one a.m. p.m. in
the air. The corpus also includes as an exposition resource, the clipping of one
week, the first one of the month of January of 2007, which had its initial page
modified in the first day of that year.
Key words: Journalism, semiotics, Greimas, communication.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Pgina inicial do CGNews 43
Figura 2: Pgina inicial do CGNews visualizada para impresso 46
Figura 3: Visualizao das Chamadas 59
Figura 4: Caixa de acesso das Chamadas em Movimento 60
Figura 5: Pgina inicial do Detran-MS 66
Figura 6: Nota sobre morte de Roberto Marinho no CGNews 70
Figura 7: Modelo que exemplifica apurao em parceria 75
Figura 8: Modelo que exemplifica fluxo das notas 79
Figura 9: Modelo de listagem no sistema de busca do site 96
Figura 10: Efeito de realismo garantido por matria com fotografia 105
Figura 11: Efeito de realismo comprometido por matria sem fotografia 105
Figura12: Nota em que o jornal critica publicao de boatos 122
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SUMRIO
INTRODUO 11
I OS PRECURSORES 171.1 Hjelmslev e outros 221.2 Semitica e Comunicao 261.3 Adeus aos mitos 33
II CONHECENDO O JORNAL: SUPORTE E SUASPISTAS SOBRE O ENUNCIADOR 362.1 Embalagem 372.2 Um jeito todo seu 412.3 Prazer em conhec-lo 47
III TEMPO: MOTOR DA REALIDADE 523.1 O tempo 523.2 Tempo agostiniano/Tempo semitico 553.3 A corrida da mdia: uma corrida social 633.4 - Um modo de construo da temporalidade 71
IV IV COBERTURA DAS REBELIES EM TEMPO REAL: ANLISE 814.1 Nvel Discursivo 854.2 Outras estratgias 924.3 Efeito de realidade 954.4 A imagem e o estigma da verossimilhana 1024.5 O Nvel Narrativo 1064.6 Veridico 1154.7 Nvel Fundamental ou Profundo 122
CONSIDERAES FINAIS 126
REFERNCIAS 132
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INTRODUO
A utopia est no horizonte...Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos.
Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos.Por mais que eu caminhe jamais a alcanarei.
Para que serve a utopia? Serve para isso: para caminhar.(Eduardo Galeano)
Uma pesquisa feita em nove pases do Globo e publicada na revista Veja1 no
dia 10 de maio de 2006 aponta que a imprensa desfruta, hoje, de mais credibilidade
que os governos. Com algumas excees, como o caso da Inglaterra, em que ostablides sensacionalistas so apontados como a grande causa da pouca
credibilidade da mdia, em geral a mdia entre os nove pases foi de 61% de
confiabilidade na imprensa contra 52% no governo. No Brasil os ndices ficaram em
45% para quem confia na mdia e 30% entre os que apontam o governo como mais
confivel. Alis, o papel social da imprensa e a sua confiabilidade entre o pblico j
assunto comum nas mais diferentes classes sociais. O Manual de Redao da
Folha de So Paulo (2001), no item Projeto Editorial, menciona que a viso do
pblico sobre a mdia mudou desde 1992, quando das coberturas sobre o
impeachmentdo presidente Fernando Collor de Melo. Deste perodo para c, diz o
manual, a imprensa garantiu prestgio e confiabilidade.
A evoluo do jornalismo brasileiro na dcada de 80 culminou noimpeachment do Presidente da Repblica em 1992, no qual a imprensateve papel determinante. Os telejornais ganharam desenvoltura informativa,firmou-se nos meios impressos o prestgio de um profissionalismo
independente, submetido apenas s foras de mercado. A democraciaadquiriu consistncia, conforme as instituies mostravam que podiamfuncionar. Os meios de comunicao passaram a refletir pressescrescentes de democratizao do poder pblico, expressas em timbremoralizador, tanto mais intensas quanto mais o Estado se mostrava incapazde atender expectativas mnimas da populao, represadas havia muito. (p.13)
1
A imprensa ganha do governo. Revista Veja. Edio 1955 ano 39 n 18. Data 10 de maio de2006, pg. 40. O estudo entrevistou os seguintes pases: Indonsia, ndia, Estados Unidos, Rssia,Inglaterra, Alemanha, Coria do Sul, Nigria e Brasil.
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certo que a imprensa tambm alvo de crticas, algumas mais, outras
menos generalistas, mas no se deve desconsiderar que com falhas ou no os
meios de comunicao ainda so o porta-voz e, muitas vezes, a nica opo de
acesso a certas informaes que a grande massa da populao tem ao seu alcance.
Com tamanha responsabilidade, o jornalismo precisa todos os dias aprimorar suas
ferramentas de transmisso. Do ponto de vista tecnolgico isso tem sido feito. Um
bom exemplo so os sites de notcia, veculos dinmicos, que quebram fronteiras e
alcanam propores inimaginveis antes de sua descoberta.
No primeiro semestre de 2007, conforme pesquisa do Ibope/NetRatings2 o
Brasil mantinha 33 milhes de cidados ligados Internet, estando frente de
pases como Frana, Estados Unidos e Japo quando se tratava de tempo de
navegao por internauta, com um nmero de aproximadamente 22 horas mensais.
Fora isso, outro estudo do mesmo perdo3 mostrou que a audincia dos jornais on
line foi duas vezes maior que a audincia geral na Rede.
Ou seja, motivos para comemorar no faltam. No entanto, na mesma
proporo que supera fronteiras e destaca-se pela capacidade de oferecer com
grande rapidez assuntos variados e diferentes enfoques para uma parcela cada vez
maior de leitores, surge a dvida: qual o preo de chegar antes? Com a proposta de
trabalhar no tempo do acontecimento tempo real e preocupado em no ficar
atrasado com relao aos seus concorrentes, os veculos informativos da Internet
precisam cada dia mais de apurao instantnea. Nesta perspectiva esta
dissertao foi pensada com o intuito de entender justamente isso: como esses
veculos fazem para atender essa necessidade da apurao meterica, fazendo
convencer o leitor de que os fatos desenrolam-se no momento em que so narrados,
ignorando o processo de produo? E mais, esse modelo mostra-se eficaz para
garantir a credibilidade que a mdia conquistou at ento?A base desta discusso como uma mdia que tem como principal
preocupao noticiar primeiro e apresenta-se como um produto em tempo real
garante ao enunciatrio esse estado de constante atualizao, esconde o tempo
gasto na apurao dos fatos e cria uma impresso de que estes esto acontecendo
no momento da enunciao.
2 http://render.estadao.com.br/tecnologia/not_tec25260,0.htm3
http://render.estadao.com.br/tecnologia/not_tec25264,0.htm
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E esse conceito que este trabalho usa para discutir os efeitos de sentido do
Tempo como categoria enunciativa na mdia eletrnica, mais especificamente no site
noticioso Campo Grande News, um jornal tipicamente informativo, que em Mato
Grosso do Sul o nico que se prope a ser atualizado 24 horas por dia, com
notcias alteradas, mesmo no perodo da madrugada, em instantes de tempo que
no ultrapassam 20 minutos. A diferena de tempo entre uma nota e outra no
CGNews, no perodo das 6 horas s 19 horas, segue um padro de rapidez com
inseres quase instantneas com diferenas de 2 a 6 minutos; depois deste horrio
o espaamento fica maior, mesmo assim no ultrapassando os 20 minutos citados.
Ou seja, como outros modelos de jornalismo na web, este no pode negar sua
influncia, quase como refm, das questes temporais e serve de recorte para
discusses semelhantes em outros sites pelo mundo que faam uso dos mesmos
recursos.
Sabendo disso, este estudo quer mostrar que tipos de estratgias discursivas
a mdia usa para garantir o sentido de imediatismo proposto nesses veculos e
propor uma discusso sobre o conceito de notcia nesses suportes. Mostrar, por
exemplo, os simulacros que criam com enunciados e que, nesse formato de
trabalhar a notcia, o jornalismo acaba comprometendo algumas premissas j
solidificadas em outros suportes, mais antigos, como no noticiar o que no se tem
certeza, oferecer uma contextualizao histrica e social daquilo que est sendo
divulgado, ouvir todos os envolvidos no acontecimento reportado entre outros
pressupostos que o acompanhavam at ento, em outros suportes. Nesse sentido, e
adequado Semitica de linha francesa4, o projeto pretende identificar tipos de
estratgias de persuaso que a notcia no jornalismo on line usa para adequar-se ao
contrato fiducirio acertado com o leitor de ofertar uma cobertura movida,
aparentemente, por duas proposies contraditrias: informao em tempo real que exige agilidade e rapidez para conhecer, entender e divulgar assuntos
complexos e de diferentes reas ; e informao precisa que pressupe maior
tempo de apurao, contextualizao e interpretao crtica.
O trabalho pretende analisar como se d o tratamento do texto jornalstico
quando a notcia transformada em mercadoria. No momento em que chegar na
4
Este estudo ter como base metodolgica a Semitica Francesa, teorizada inicialmente por A. J.Greimas. A explanao sobre seus pressupostos e origens ser melhor esclarecida no Captulo 1desta dissertao.
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frente do concorrente mais importante do que dar uma notcia com preciso. Para
isso, essa pesquisa vai analisar os aspectos do jornalismo na web tendo como base
o estudo da cobertura sobre as Rebelies provocadas pelo PCC (Primeiro Comando
da Capital) nos dias 13, 14 e 15 de maio de 2006, no siteCampo Grande News. O
corpus inclui, tambm, como recurso de exposio, o recorte de uma semana, a
primeira do ms de janeiro de 2007, do site em questo. Este perodo foi escolhido
por trazer o modelo atual da pgina deste veculo na Internet, uma vez que sua
apresentao foi re-paginada e modificada no primeiro dia daquele ano.
Hipteses e objetivos
O trabalho de pesquisa parte das seguintes hipteses:
o tempo real uma construo discursiva que o jornalismo on line usa
para oferecer ao leitor a sensao de que a leitura dos acontecimentos so
concomitantes ao momento em que eles acontecem; o jornalismo on line cria um novo conceito de notcia e esta contraditria
prtica de apurao da imprensa at ento;
a notcia nos veculos on line no tem o objetivo de formar opinio, mas
apenas pautar assuntos;
o jornalismo on line criaria uma informao com poucos subsdios para
levar a reflexo crtica;
como no jornalismo on line os jornalistas precisam abastecer seu veculominuto a minuto tempo controlado nas redaes ento praticamente tudo
notcia.
o tempo, e no mais o interesse do leitor, seria a premissa que moveria e
guiaria a seleo de notcias no jornalismo on line;
Conhecendo as hipteses de trabalho, pode-se dizer que o objetivo geral
deste estudo analisar a influncia do tempo real na cobertura do jornalismo na
web, sendo que entre os objetivos especficos esto:
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fazer uma anlise da cobertura da rebelio provocada pelo PCC nos
presdios de Mato Grosso do Sul, nos dias 13, 14 e 15 de maio de 2006, feita pelo
siteCampo Grande News;
analisar a influncia do tempo nesta cobertura e mostrar os efeitos que
geram no conceito tradicional de jornalismo;
identificar os recursos discursivos que afianam efeito de tempo real s
notcias vinculadas nos veculos on line;
identificar os recursos de webdesign que confirmam efeito de agilidade
ao suporte;
contribuir para a divulgao da semitica como ferramenta de estudos
miditicos;
contribuir para as discusses sobre a influencia do tempo nas
coberturas on line em outros estudos de veculos com apresentao semelhante ao
site selecionado para esta dissertao.
saber se a cobertura em tempo real no compromete a qualidade do
produto divulgado e, com isso, colocando em risco a credibilidade que o jornalismo
moderno desfruta.
Toda a pesquisa tem como pressuposto terico a Semitica de Linha
Francesa e os conceitos da Teoria da Comunicao no que tange o Jornalismo.
Organizao do trabalho
Esta dissertao foi dividida em quatro captulos, alm da Introduo e das
Consideraes Finais. De uma maneira didtica, ela desenvolve-se da seguinte
maneira:
CAPTULO I: Neste captulo so apresentadas as bases da Semitica
Francesa e a evoluo da teoria ao longo dos anos. O texto tenta propor um dilogo
entre os pressupostos da Semitica e as Teorias da Comunicao e do Jornalismo,
buscando adapt-los ao estudo de uma mdia recente como os sites na Internet.
Nessa etapa da dissertao, tambm so semiotizados, ou seja, apresentados
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como a semitica os entende, alguns conceitos-chave do Jornalismo, como fato,
verdade e objetividade.
CAPTULO II: Aqui ser examinada a importncia do estudo do suporte
como produtor de sentido no estudo de objetos sincrticos, ou seja, aqueles que
renem mais de uma linguagem, como o caso do site estudado. Ainda, neste
segundo captulo, apresentado um breve histrico do jornalismo na web, bem
como do siteCGNews. Por fim, so descritos os recursos de webdesign que este
jornal usa para afianar seu conceito de veculo em tempo real.
CAPTULO III: No terceiro captulo o estudo traz uma apresentao de
como a Semitica entende o conceito de Tempo e suas estratgias discursivas. O
texto dialoga com as concepes de tempo psicolgico de Santo Agostinho, que
prope, entre outras coisas, que a passagem das horas uma construo mental; e
mostra, por meio das discusses da Teoria da Comunicao, como a mdia buscou,
com a evoluo social e tecnolgica, cada vez mais a rapidez na divulgao dos
fatos. Por fim, este captulo apresenta uma tentativa de teorizao sobre como o
discurso do jornalismo on line assegura o efeito de tempo real por meio de
estratgias do discurso e de distribuio das matrias na pgina.
CAPTULO IV: Esta parte da dissertao traz a aplicao do simulacro
metodolgico da Semitica Francesa, o Percurso Gerativo de Sentido, na anlise da
cobertura em tempo real da rebelio provocada pelo PCC nos presdios de Mato
Grosso do Sul. O estudo, que inclui a averiguao de 108 notas, inseridas nos trs
dias da ao, apresenta-se em camadas: Nvel Discursivo, Narrativo e Fundamental.
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CAPTULO I
OS PRECURSORES
Se eu vi mais longe, foi por estar de p sobre ombros de gigantes
(Isaac Newton)
A definio de Semitica no fcil. Antes de partir para a execuo de um
projeto nessa rea de conhecimento preciso saber que h pelo menos trs linhas
tericas que se preocupam com o Sentido e com a Significao: a Semitica Norte-
Americana, desenvolvida por Charles Sanders Pierce; a Semitica da Escola de
Trtu, conhecida tambm como Semitica Russa; e a Semitica Francesa, cujo pai
o lituano Algirdas Julien Greimas5.
Fazer anlise de um texto, em Semitica, saber que, embora com
pressupostos bem consolidados, principalmente no que tange o Discurso, ,
tambm, fazer uso de uma teoria em construo. No que seja uma doutrina omissa,
cheia de lacunas; mas, antes, um conjunto de princpios recentes, e no estanques,
que permite ao pesquisador a adequao de seu arcabouo terico de acordo comsuas necessidades particulares. Enfim, a Semitica uma teoria que atende a todos
os tipos de textos, verbais ou no verbais, entre outras razes por essa
caracterstica de flexibilidade. Se pensarmos numa linguagem multimdia, por
exemplo uma linguagem recente, particularmente se comparada com a
consolidao do que chamamos hoje de Semitica Greimasiana ela pode ser
perfeitamente aplicada, ainda que a teoria no tenha sido pensada para um tipo de
linguagem como esta, com particularidades especficas do suporte que a agrega: aInternet.
Sendo assim, torna-se uma boa opo de anlise dos textos do Jornalismo on
line, no apenas por se apresentar como uma ferramenta abrangente, mas,
principalmente, pelo seu entendimento de texto, que inclui uma anlise da parte
externa, que est voltada para o dialogo com outros textos; e outra interna, que
privilegia o estudo dos mecanismos intradiscursivos. At ento, desde os gregos, os
5 Este estudo tem como base a teoria Semitica de linha francesa, portanto, todas as vezes que otermo for usado, ser referente aos seus pressupostos.
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tericos do texto se preocupavam muito mais com o vnculo que o discurso mantinha
com a cultura e a sociedade que permitia sua produo do que com os mecanismos
que levavam sua construo. A Semitica hoje no descarta a primeira
preocupao, mas agrega, com muito mais interesse, a segunda. Costuma-se dizer
que em Semitica importante sabero que o texto dize como faz para dizer o que
diz.
A Semitica tem, portanto, o texto, e no a palavra ou a frase, como seuobjeto e procura explicar os sentidos do texto, isto , o que o texto diz, e,tambm, ou sobretudo, os mecanismos e procedimentos que constroem osseus sentidos (BARROS, 2005, p.187).
Se partirmos da publicao, em 1966, do livro Semntica estrutural, de A. J.
Greimas, como o nascimento oficial da teoria, a Semitica completaria, hoje, 40
anos. Obviamente o embrio desta epistemologia bem anterior e remete aos
estudos de Ferdinand de Saussure, Louis Hjelmslev, Vladimir Propp, Roman
Jakobson e Claude Lvi-Strauss. No entanto, a partir daquela obra que se chega
ao que Fiorin chamou de discurso fundador da lingstica moderna. Uma das
grandes influncias de Greimas foi, sem dvida, Saussure, que na busca dacientificidade dos estudos da lngua permitiu, mais tarde, a postulao dos
fundamentos da teoria greimasiana. claro que desde os postulados de Saussure
muita coisa mudou e foi questionada, mas no entendimento de seu projeto
lingstico que possvel compreender melhor a ferramenta atual e ampliar sua
aplicao.
Saussure, a quem so atribudos os alicerces da Lingstica Moderna, tinha
como objeto de estudo a lngua e por suas dicotomias propiciou o aparecimento do
que hoje chamamos de Estruturalismo, que por muito tempo foi a base da
Semiologia6 conceito anterior ao de Semitica . A principal obra do autor, o Curso
de lingstica geral, foi editada em 1916, trs anos aps sua morte, a partir das
anotaes de trs alunos que freqentavam suas aulas. A verso brasileira s foi
6 De acordo com Fiorin (1999, p. 03) a Semitica demarca-se da Semiologia e, por isso, assumeoutro nome, porque, ao incorporar o conceito saussuriano de valor, torna-se uma teoria dasignificao, que tem por escopo descrever a produo e a compreenso do sentido, e no uma
teoria do signo. Enquanto a Semiologia buscava descrever sistemas de signo, como, por exemplo, osistema de signos da herldica (Mounin, 1970, p. 103-115), a Semitica visa a compreender osistema de diferenas responsveis pela produo de sentido de um texto.
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publicada em 1970. As propostas de Saussure podem ser resumidas em quatro
dicotomias, ou seja, pares de conceitos que garantem definio a partir da relao
com o outro. Poder-se-ia pensar que os estudos de Saussure no tm uma relao
direta com os trabalhos do discurso, uma vez que seu objeto de estudo era a lngua;
no entanto, o princpio-base de sua anlise, o fato de que o sentido s se d na
medida que se relaciona com outro, ou seja, por RELAO, tambm o alicerce
onde se apiam os conceitos-chave da teoria de Greimas.
E o que seria esse conceito de relaes to importante na busca do sentido?
Saussure usou a metfora do jogo de xadrez para explicitar seu argumento.
Conforme ele, num tabuleiro de xadrez a substituio da pea representada pelo
Cavalo no agrega valor pelo material de que feito, mas pela posio que ocupa
em relao s demais peas, seja o Rei, o Bispo, a Torre etc. Ou seja, a substituio
de um cavalo de madeira por outro de plstico, ou mesmo por um pedao de pedra,
no alteraria seu valor no jogo, porque sua importncia est na sua representao
dentro da partida e por sua posio no tabuleiro.
Se substituo umas peas de madeira por outras de marfim, a troca indiferente para o sistema, mas se diminuo ou aumento o nmero de peas,essa troca afeta profundamente a gramtica do jogo (SAUSSURE, 1972, p.43)
O exemplo, como bem lembra Hernandes (2004), j bastante desgastado entre
os estudiosos do discurso, retomado aqui porque, ainda que extremamente
esclarecedor nos exames de objetos miditicos, praticamente desconhecido entre
os estudantes de Comunicao. No entanto, sua metfora aparece neste trabalho
como a base do estudo de uma mdia na rede. No se podem pensar seus
elementos, ou como Saussure chamava termos-objetos, isolados. O sentido da
mdia on line, o que ela diz e o ethos que cria de si mesma est no conjunto das
relaes entre os termos que a completam. Como explica Lopes (1997, p. 35):
Elemento nenhum, numa mensagem, existe sozinho; e elemento nenhum pode ser
definido por sua natureza ou (ou que d no mesmo) isoladamente, mas sempre e s
por referncia a outro elemento qualquer da mesma formao.
As relaes de Saussure tratavam das dicotomias Lngua x Fala uma social
e outra individual -, Sincronia x Diacronia, Significante x Significado e Paradigma x
Sintagma. Ainda que o primeiro postulado tenha permitido, depois, outras
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formulaes como a diviso Esquema/Uso, de Hjelmslev; e Cdigo/Mensagem, de
Jakobson, para o estudo do Jornalismo on line as trs ltimas duplas saussurianas
evidenciam uma influncia maior nos estudos semiticos.
A dicotomia Sincronia x Diacronia, por exemplo, garantiu ao pesquisador a
possibilidade de um recorte do objeto de pesquisa que lhe afiana cientificidade,
porque o isola, ou seja, congela as mutaes dentro de um perodo determinado.
Pensemos no jornalismo da web, por exemplo. A Internet um suporte recente. O
primeiro jornal brasileiro a arriscar-se efetivamente no mundo ciberntico foi o Jornal
do Brasil, em 1995. Em estado embrionrio, a mdia da Rede Mundial ainda divide
opinies de pesquisadores da rea quanto definio de uma linguagem prpria,
uma vez que no explorou todas as ferramentas disponveis no hipertexto, ou seja,
mantm um estado de mudana constante, j que suas bases no foram
aliceradas; fora isso, faz parte da prpria caracterstica do suporte a agilidade e a
mobilidade. Um estudo diacrnico, neste caso, correria o risco de se perder, uma
vez que o suporte poderia ser alterado durante o estudo, particularmente porque a
velocidade o grande mote dos ditos jornais em tempo real. No sincronismo
possvel estudar, mesmo uma mdia que prima por uma apurao meterica, como o
jornal on line, e garantir um resultado com o rigor da cincia porque no vai se ater
s transformaes atravs dos tempos, mas ao mesmo tempo, num determinado
instante. As palavras Sincronia e Diacronia vm do grego e significam syn,
juntamente; e dia atravs. Como chrnos quer dizer tempo, os termos
adaptados ao idioma do a noo clara de um estudo que se altera junto com a
cronologia temporal; e outro que isola uma poro do todo.
A segunda dicotomia, Significante x Significado, provavelmente a mais
importante contribuio de Saussure Semitica atual, pois a partir dela que se
tem a definio de Signo, que depois ser revista por Hjelmslev, e empregada nosconceito de Greimas como um conjunto que agrega um Plano de Contedo e um
Plano de Expresso. De maneira modesta pode-se dizer que signos so formas que
permitem assimilar o mundo e apreender a realidade. Signos no so os nomes das
coisas, mas os conceitos que temos e criamos para compreender o mundo por sua
categorizao, ainda que esses conceitos sejam arbitrarios. Saussure vai precisar
bem esse fato, quando diz que o signo lingstico no une um nome a uma coisa,
mas um conceito a uma imagem acstica (FIORIN, 2005a, p. 58).
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A partir desse entendimento, Saussure criou os termos SIGNIFICANTE (face
material) e SIGNIFICADO (conceito). Conforme o autor, a relao entre os dois
termos arbitrria e alcanada por meio das convenes culturais e histricas. Ao
postular hoje que a linguagem no deve ser entendida apenas como um signo
verbal, necessrio ampliar o conceito de significante para o veculo do
significado. Essa dilatao necessria para analisar um jornal na Internet, que
embora faa uso do verbal, dispe de uma linguagem prpria, que lhe concede e
muda o sentido. So os chamados textos sincrticos, que em Semitica vo
representar suportes que unem vrias linguagens. Para a anlise de um texto assim,
resumir o significante a uma imagem acstica no basta. No jornal on line temos a
Semitica Sincrtica porque, de uma maneira bem resumida, podemos dizer que
este recurso miditico usa linguagens variadas para montar seu contedo, como
linguagem infogrfica, fotogrfica, tipogrfica, multimdia etc. Ou seja, no apenas
o que est escrito na matria que explica o que o jornal diz, mas a soma da
distribuio de todas as unidades, uma em relao outra, que vai permitir o seu
entendimento.
A ltima dicotomia vai tratar das diferenas entre Paradigma e Sintagma. Na
relao sintagmtica h uma ordenao linear dos significantes, o que resulta num
entendimento geral e global do seu significado; j na relao paradigmtica, a
combinao dividia em partes, com um entendimento isolado e independente. No
caso do jornalismo, pensemos na anlise global da pgina como uma relao
sintagmtica; j a relao paradigmtica seria a anlise e classificao particular de
cada um dos componentes. Ou seja, no eixo sintagmtico da pgina do jornal est
uma seqncia de fotos + texto + infogrficos, etc. J os tipos de fotos, os gneros
dos textos e os modelos de infogrficos estariam no eixo paradigmtico.
Pgina do jornal -------------------------------------------------------------sintagma
Fotos textos infogrficos Paradgma
Enfim, parte as crticas a Saussure, principalmente pelo desprezo s
questes do homem e pela defesa idia de que o sentido s pode estar no texto edentro dele, a Semitica deixa evidente sua influncia aos seus estudos. No entanto,
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ainda que no negue sua origem estrutural, hoje desatou as amarras e busca, na
Relao (legado de Saussure) com outros textos dentro da histria a construo do
sentido, uma mescla do lingstico e do extralingstico, este alcanada no dilogo
com outros textos.
1.1 Hjelmslev e outros
Depois de Saussure, Hjelmslev certamente foi o terico que mais contribuiu
para o desenvolvimento da Semitica Geral. Muito criticado nos dias de hoje por sua
postura extremamente formalista, que desconsiderava as questes sociais e
histricas na produo do sentido nos textos, o lingista de dinamarqus permitiu,
com suas formulaes, a base dos estudos semiticos modernos. Fiorin (2005d)
lembra que os que hoje criticam as postulaes de Hjelmslev, provavelmente
desconhecem a importncia desse pesquisador.
Os que fazem essas crticas no levam em conta a dimenso histrica doprojeto hjelmsleviano. Afinal, uma teoria criada num ambiente culturaldeterminado, num dado universo de discursos, em que campos e espaosdiscursivos ganham significados. No se pode ler Hjelmslev, sem levar emconta as teorias com que ele dialoga, pois no se pode analisar um projetocientfico fora do espao discursivo em que se constitui (FIORIN, 2005d, p.01).
Foi em 1943, com seus Prolegmenos a uma teoria da linguagem que ele
exps os princpios bsicos de sua doutrina. De tudo que teorizou, alguns pontos
foram cruciais para os postulados posteriores de Greimas como, por exemplo, o
ponto de vista imanentista de anlise, ou seja, a busca de estruturas imutveis e
repetitivas. At aquele momento, tericos humanistas negavam as generalizaes
nos estudos dos fenmenos humanos, tidos por eles como singulares e, portanto,impossveis de serem interpretados, mas apenas descritos. A partir dessa
representao, Hjelmslev prope o conceito de Sistema, ou seja, qualquer sucesso
de estados um sistema e, portanto, pode ser analisado e descrito por meio de suas
relaes imutveis, num universo limitado de repeties. No que ignorasse as
mutaes, mas o que ele buscava eram as invariantes que se manifestam em
situaes variadas. Greimas partiu deste princpio quando formulou o Nvel Narrativo
de seu simulacro metodolgico, o Percurso Gerativo de Sentido. Greimas
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estabelece uma generalizao arbitrria, mas adequada: uma narrativa uma
transformao (FIORIN, 2005d, p. 05).
Esta noo pertinente ainda hoje. No estudo de uma mdia regional7, por
exemplo, como a proposta deste trabalho, a investigao dos elementos
imanentes pode ampliar as proposies para estudos de objetos semelhantes em
mbito global. As repeties encontradas na avaliao de uma cobertura on line em
um site de Mato Grosso do Sul podem ser as mesmas, em outros casos, em uma
outra cobertura do mesmo site, em um veculo nacional, qui mundial. A
generalizao, quando no ignora tambm as particularidades de cada objeto,
permite um entendimento mais aprofundado do sentido que aquele texto agrega.
Inclusive no Nvel Narrativo que esto as bases mais consolidadas da
Semitica standard. nesta etapa da anlise que os pressupostos se apresentam
mais delimitados, j que na sua formulao os semioticistas exploraram com mais
nfase as questes narrativas, para mais tarde orientar os estudos para o Discurso e
hoje tambm para a expresso. Sabe-se que para construir o sentido de um texto, a
Semitica percorre um caminho alm deste nvel. O Percurso Gerativo de Sentido
composto por camadas que partem das estruturas mais elementares (nvel
Fundamental) para as mais concretas (nvel Discursivo). Em trs etapas
(Fundamental, Narrativo e Discursivo), o sentido do texto no Plano de Contedo vai
sendo revelado. Mas preciso atentar para o fato que ningum escreve um texto
pensando nestas etapas, nem mesmo Greimas props esse estudo com esta
finalidade. Por isso costuma-se dizer que o Percurso um simulacro metodolgico.
Atualmente a Semitica passou a se preocupar tambm com as significaes alm
do Percurso, ou seja, com o Plano de Expresso, composto, por exemplo, pelo
suporte que agrega determinados textos. No caso do jornalismo on line, com a
significao enunciada pela pgina que abriga o jornal na Internet. Essa discusso,ainda que recente, j tinha alguns preceitos formulados por Hjelmslev, quando de
sua postulao sobre o Contedo, Forma e Substncia da Expresso.
Outra contribuio importante dos preceitos deste estudioso trata do mtodo
classificado de Emprico e Dedutivo. Quando pergunta o objeto que determina e
7Entende-se aqui o conceito de Mdia Regional como aquela cuja produo prpria da regio. No
caso, o site CGNews pode ser uma mdia regional, embora na internet seu contedo no encontre
fronteiras geogrficas, por ser uma produo local, apurada e focada nos assuntos de Mato Grossodo Sul. O prprio slogan do veculo prope uma mdia assim quando defende A notcia da terra a umclique de voc.
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afeta a teoria ou a teoria que afeta e determina o objeto? (HJELMSLEV,1975,
p.15) faz uma crtica s teorias deterministas e prope um caminho analtico em que
os fundamentos do estudo se tornem adaptveis a objetos diversos. Esse o
conceito em que se encontra um dos sustentculos da Semitica greimasiana, que
se deixa construir a cada novo texto, ou seja, como o prprio dinamarqus explica
em seus prolegmenos, , sem dvida, o objeto que determina a teoria. Some-se a
isso o conceito de que a teoria da linguagem tem de ser preditiva: A predio diz
respeito ao sistema (ou lngua), a partir do qual se estruturam todos os textos, sejam
eles realizados ou teoricamente possveis, de uma lngua, de todas as lnguas que
existem, que existiram ou que existiro (HJELMSLEV, 1975, p.19-20), ou seja,
abriga todos os tipos de textos j conhecidos ou que sero formulados. Basta
pensar que inicialmente voltada para a anlise de narrativas, a Semitica francesa
hoje, por meio do seu entendimento de texto, possibilita a observao crtica de
qualquer tipo de objeto, inclusive de imagens. No fosse assim, no seria aplicvel
s coeres de um suporte na web, j que no foi criada para isto, ou para o
cinema, entre outros modelos.
Se se fosse descrever minuciosamente cada conceito Hjelmslev adotado pela
Semitica , poder-se-ia estender esse estudo por muitas outras pginas. Para
resumir sua importncia, resta dizer que com a ampliao do conceito de
Significado para Plano de Contedo, e Significante para Plano de Expresso
alargou o leque de objetos a serem estudados e permitiu, hoje, com eficincia, a
anlise de um texto sincrtico. Ele tambm criou outras formulaes, a de Forma
(conceitos possveis para identificar-se de que maneira especfica se trata uma
unidade de sentido) e Substncia (nmero amplo de conceitos dados Forma
so as possibilidades de Forma). Conceitos estes que a Semitica adaptou ao
estudar a Forma do Contedo, como o texto diz o que diz; e o conjunto de relaesque permitem a produo do sentido. E como ele defendia, se ao estudar-se a
forma tem-se presente tambm a substncia, ou seja, o sentido j formado, a
Semitica estuda tambm o que o texto diz. Enfim, o grande legado da Glossemtica
(nome dado por Hjelmslev a sua sistematizao terica) foi a ampliao do conceito
de Signo. Se at Saussure o signo era uma forma de apreender o mundo; em
Hjelmslev passa a ser, antes, uma operao de semiotizao. Hjelmslev no falou
de Enunciao, que depois foi incorporada pela Semitica , quando passou a auto-intitular-se uma Teoria do Discurso.
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Outros nomes tambm merecem ser lembrados ao pensar-se na formulao
dos conceitos dessa teoria. Como j foi dito antes, uma das postulaes mais
importantes diz respeito busca das estruturas repetidas. Neste campo quem
tambm deixou legado efetivo para o desenvolvimento dos estudos semiticos foi
Vladimir Propp, que ao estudar os Contos Maravilhosos russos identificou o que
permanecia idntico em cada uma das partes, ou seja, relaes de igualdade, e no
mais de diferena. As categorizaes de Propp, denominadas Funes, permitiram
a postulao, posterior, das fases de manipulao e aquisio de competncia no
Percurso Gerativo de Sentido.
Fora isso, no sentido mais elementar do texto, denominado Nvel
Fundamental pela Semitica, que est a contribuio mais evidente de Claude Lvi-
Strauss. Ao destacar os subsdios tericos do estudioso s investigaes
Semiticas, Baccega (1998) lembra que tais postulaes guardam uma relao
estreita com o Crculo de Praga, difundido por Roman Jakobson, depois da Segunda
Guerra Mundial, quando migrou para os Estados Unidos da Amrica.
L ele conviveu com Claude Lvi-Strauss, que se destacou comoantroplogo estrutural, em cuja obra encontramos a concepo de quemitos aparentemente diferentes so, na verdade, variaes de um certo
nmero de temas bsicos. E essa anlise percorre o caminho das reduessucessivas at s estruturas essenciais (BACCEGA, 1998, p. 76).
Conforme a autora, foi a divulgao do pensamento do Crculo de Praga, nos
Estados Unidos, que avizinhou o termo Estruturalismo do termo Semitica . Ainda
que a autora admita que isso possa configurar uma aproximao em demasia, a
Semitica ainda hoje se utiliza do mtodo estruturalista, que tem como sustentculo
as oposies de Saussure, principalmente nas duas primeiras etapas do seu
Percurso (Nvel Fundamental e Nvel Narrativo). Mas h diferenas marcantes,
principalmente nos postulados modernos. Enquanto Saussure privilegiava a lngua
como estrutura, a Semitica uma teoria dos modos de significar e, ainda que no
trabalhe com o autor de carne e osso, j que entende que a realidade em si
inapreensvel, hoje se mostra uma teoria muito mais dinmica, agregando a
apreenso dos simulacros de realidade por meio do contexto semitico dilogo
que um texto faz com outros textos , alm de ter assumido conceitos como o de
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Dialogismo (noo de que o discurso no se constri por si s, mas em vista de
outro) de Mikhail Bakhtin.
Ou seja, se seus estudos anteriores, tpicos do estruturalismo da dcada de 60
do sculo passado, evidenciavam uma preocupao centrada nas relaes mtuas
e internas do objeto de anlise, hoje no nega sua base, mas vai alm. A teoria
postula saber sobre o processo de significao, inclusive agregando conceitos
exteriores. O prprio Fiorin (1995) explica que a distino que os estudiosos faziam
entre uma anlise interna em que se preocupavam com a construo de sentido
no texto e externa em que viam um texto como objeto histrico , est
ultrapassada.
Essa terminologia muito ruim, porque deixa entrever que aquelas s seocupam do aspecto lingstico, enquanto estas s tm olhos para o extra-lingustico. Na verdade, cada uma ressalta um aspecto da constituio dosentido e, portanto, so ambas teorias lingsticas. As primeiras acentuamos mecanismos intradiscursivos e as segundas, os interdiscursivos. Valeressaltar que estamos falando em predominncia de interesses por umdado aspecto e no em exclusividade (FIORIN, 1995, p. 02).
1.2 Semitica e Comunicao
Infelizmente, como aponta Hernandes (2005), h ainda muitos pesquisadores,
particularmente na rea de Comunicao, que desconhecem a evoluo que a teoria
sofreu nas ltimas dcadas e ainda a vinculam aos conceitos estruturalistas de sua
formulao.
Em um quadro sobre as escolas tericas da comunicao, Ciro Marcondes
Filho, por exemplo, em sua obra O espelho e a mscara (2002), colocaGreimas em Semiologia clssica, cuja filiao filosfica e epistemolgica o estruturalismo, e o aponta como estudioso do signo e dos sinais.Hjelmslev, grande inspirador de Greimas, aparece na escola de semiologiacontempornea (HERNANDES, 2005, p.17).
Equvocos como esses podem afastar estudos semiticos de objetos
miditicos, j que a difuso confusa e equivocada de seus conceitos nas Escolas de
Comunicao, por exemplo, geram desinteresse na escolha do aparato terico
metodolgico, que assim se mostraria insuficiente para sanar certas dvidas, quando
no ineficaz para a pesquisa. Alm disso, tipos de confuso assim configuram uma
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grande perda para o aprimoramento das pesquisas no campo da Comunicao e,
particularmente do Jornalismo, j que este no dispe de uma ferramenta aplicada e
sistematizada como a Semitica em seu arcabouo terico. H bem pouco tempo,
tericos dessa rea tm buscado desenvolver o que chamam de Teoria do
Jornalismo, tentando desvincular, ou destacar as particularidades do meio, das
Teorias da Comunicao, que apesar da importncia e dos subsdios mais
alicerados, no se mostraram capazes de resolver todas as questes ligadas
produo de sentido dos produtos jornalsticos, muito mais atreladas inteno de
desvendar os modos de produo que os produtos em si. Em um dos livros mais
recentes sobre o assunto, Teoria do jornalismo identidades brasileiras (2006), Jos
Marques de Melo narra as mudanas do jornalismo contemporneo, focando as
diferenas nacionais, e prope uma reflexo sobre o fazer jornalstico. Mas a
sistematizao de uma Teoria do Jornalismo, que inclusive busque a criao de uma
cadeira nas universidades, ao lado da Teoria da Comunicao - pr-requisito em
qualquer escola da rea no Pas no apresenta uma ferramenta didtico-
pedaggica de anlise diferente do que j foi feito at hoje, sempre em comunho
com outras reas do conhecimento, como estudos miditicos ligados sociologia,
antropologia, histria e at lingstica.
Um dos mtodos mais aceitos ainda hoje para exame neste campo do
conhecimento o chamado estudo em Comunicao Comparada8, que funciona
como uma dissecao e anlise crtico-comparativa entre jornais nacionais e
internacionais e entre mdias distintas. Nesse modelo, o estudo se divide em Anlise
Morfolgica, que averigua ttulos, ilustraes e textos a partir do espao que
ocupam; de Contedo, diferenas entre a estrutura das notcias em veculos
particulares; e sobre a Origem das Notcias e suas Fontes. A Comunicao
Comparada uma ferramenta importante para os estudos jornalsticos, mas noseria suficientemente eficaz para um estudo focado na produo de sentido e no na
descrio das diferenas. No se trata, aqui, de uma crtica gratuita aos trabalhos
comparados, que muito contribuem para os avanos nos estudos sobre o papel dos
meios de comunicao de massa, principalmente quando das mudanas scio-
polticas, mas de mostrar que talvez uma outra ferramenta, muitas vezes ignorada
8Conforme Melo (2006), os estudos comparados comearam na Amrica Latina, por volta da dcada
de 50 e 60, por iniciativa de Jacques Kayser, ex-editor do Instituto Francs de Imprensa. Seusesforos estiveram orientados para a formao de um acervo metodolgico capaz de propiciar acriao de uma cincia da imprensa(p.211).
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por comuniclogos, pode ser to ou mais eficiente para desvendar o que um jornal
pretende evidenciar e que tipo de sentido ele quer produzir no leitor.
Em sua tese de doutorado, Hernandes (2005) divide os trabalhos jornalsticos
em cinco grupos: obras Tcnicas (manuais que ensinam a prtica); Histrias de
Bastidores (depoimentos de jornalistas experientes sobre o dia-a-dia das Redaes);
Segmentadoras (analisam parte do noticirio, como estudos de Ttulos ou de
Editoriais deste ou daquele veculo); Generalizantes (anlises crticas, de carter
filosfico ou sociolgico, muitas vezes relacionadas s questes de poder), e, por
fim, as obras Integradoras, nas quais estaria sua anlise Semitica dos Jornais, que
analisam o jornalismo e suas conseqncias com base no exame de suas
manifestaes concretas.
As teorias da comunicao ou os diversos estudos sobre jornalismo, pelomenos at onde pudemos localizar, no produziram ferramentas paradesvendar a produo de sentido dos jornais, palavra que utilizaremosneste trabalho para qualquer forma de noticirio: impresso, de rdio, de TV,via Internet. foroso reconhecer que, sozinhas, obras generalizantes,tcnicas, histrias de bastidores, segmentadoras no do conta dasnecessidades do estudo das manifestaes cotidianas do jornalismo vrios nmeros de uma revista semanal que destacaram determinadoassunto, um telejornal ou um programa de radiojornalismo e seus efeitosno pblico. (HERNANDES, 2005, p. 11-12).
Nessa concepo, a crescente mutao dos fenmenos de comunicao, com
o aparecimento de novos suportes, novas mdias e outras linguagens concedem
Semitica um status diferenciado, justamente por sua capacidade de abrigar em seu
aparato terico metodolgico diferentes tipos de objetos e torn-la adaptvel. Alm
disso, a Semitica Francesa adequada para os estudos miditicos porque no
entende a comunicao como uma mera transferncia de saberes, mas credita umainterao a quem comunica e a quem recebe a mensagem e, mais, defende a idia
de intencionalidade do sujeito que produz o ato de comunicao.
Por essa razo preciso delimitar neste estudo, tambm, que modelo de
comunicao pretende-se usar, j que o termo bastante amplo e h diversas
correntes, seja nas cincias humanas, biolgicas ou exatas, que discutem o assunto
nas mais diversas perspectivas. O prprio conceito de Comunicao catalogado nos
dicionrios polissmico. Entre as explicaes encontradas esto a de compartilharsignos; estabelecer relaes com alguma coisa ou algum; transmitir e receber
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mensagens por meio de mtodos e/ou processos convencionados, entre outros.
Existem, evidentemente, vrias possibilidades de estudar a comunicao.
H outro modelo, contudo, de ver essa relao que no valoriza a troca pura e
simples, mas pensa esse processo como algo que produz sentido. Passa de uma
transferncia de saber, para uma transformao de conceitos. Na Semitica, a
recepo da mensagem no se resume a um saber, a uma simples codificao de
dados, mas a uma ao que tem o intuito de levar a outra. Na Teoria da Informao,
por exemplo, desde os primeiros estudos, e mesmo depois com a reviso dos
conceitos feita por Roman Jakobson, pensava-se a comunicao como um modelo
linear e mecanicista, a idia de um emissor uma mensagem e um receptor.
Neste trabalho, entende-se a comunicao na tica da Semitica Francesa, como
um sistema interacional. Nessa mudana, pressupem-se tanto a codificao
quanto a decodificao de conhecimentos, ou seja, para essa linha terica
comunicar antes persuadir, ou pelo menos, tentar persuadir. E, nesse
entendimento do ato de comunicar, a Semitica d um passo adiante, porque
oferece uma forma crtica de ver a produo dos meios de comunicao de massa.
No que veja a relao com o leitor como se este fosse uma marionete, uma caixa
vazia, mas que toda a forma de comunicar, seja individual ou com grande alcance,
sempre uma tentativa de convencimento. Essa avaliao no isolada das Teorias
da Comunicao e pode perfeitamente manter um dilogo com esta. Se pensarmos
em McLuhan, e nos seus postulados sobre a relao que o homem mantm com os
meios, vemos que seu conceito de construo de sentido pode dialogar com a
concepo Semitica, ainda que no tenha sido pensada no mbito do discurso.
[...] toda a forma de transporte no apenas conduz, mas traduz e transformao transmissor, o receptor e a mensagem. O uso de qualquer meio ou
extenso do homem altera as estruturas de interdependncia entre oshomens, assim como altera os raios entre os nossos sentidos(McLUHAN,1964, p. 108).
Assim a comunicao no se resume apenas a uma mensagem que sai da
fonte e atinge um receptor, que compartilha os mesmos cdigos, mas de um
processo dinmico de significao, uma semiose. Transferindo esse conceito para o
objeto de estudo dessa dissertao, possvel dizer que a mensagem de um jornal
na web, o tipo de comunicao que adota, no de maneira alguma inocente, maspressupe a criao de um simulacro de enunciador (jornal) que tenta, por
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manipulao e personificao do veculo, criar um vnculo com o leitor-internauta. Ou
seja, no cabe ao jornal apenas informar, mas orientar para uma determinada
interpretao, formatar uma certa posio poltica, ideolgica do seu
leitor/consumidor. Enfim, nesse entendimento de comunicao, a intencionalidade
do emissor, que no Nvel Discursivo do Percurso greimasiano recebe o nome de
Enunciador, parte importante na formao do sentido, em outras palavras, numa
pesquisa Semitica no a troca o ponto principal a ser estudado, mas aquilo que
ela tem de mais particular: a gerao e circulao de sentido.
Neste quadro mais amplo, a comunicao entre sujeitos ocorre medianteobjetos de valor (os discursos e textos-mensagens) que circulam entre elese que os constituem como sujeitos. preciso, assim, rever as noes e asdenominaes de emissor e de receptor da comunicao, pois, nessa
perspectiva, os sujeitos da comunicao no podem mais ser pensadoscomo casas ou caixas vazias de emisso e de recepo de mensagens. Ossujeitos devem ser considerados, em primeiro lugar, como sujeitoscompetentes, ou seja, o destinador e o destinatrio (termos menosrestritivos e, portanto, mais adequados do que o emissor e o receptor) tmde ter certas qualidades que permitem que eles se comuniquem (BARROS,2005, p. 48).
As qualidades a que Diana Barros se refere so de duas naturezas: modais e
semnticas. No primeiro caso referem-se aos atributos da ao o querer, o dever,
o saber e o poder e, no campo semntico, aos conceitos de valores que vo
determinar essa relao comunicativa.
Nessa tica, a atuao do jornal pode ser vista tambm de maneira dialgica.
Em um determinado momento, o jornal exerce a funo de narrar o fato, oferecendo
ao enunciatrio-internauta, no caso da Internet, a possibilidade de ter acesso ao
saber e; num segundo momento, ele cria um sistema de valores. A ordem dessas
aes pode ser invertida e inclusive acontecer ao mesmo tempo. Assim sendo, de
acordo com os preceitos de Greimas, a comunicao no pode ser entendida de
uma maneira inofensiva: comunicar-se acima de tudo um ato de manipulao de
um destinador, que espera do destinatrio no apenas a codificao da mensagem,
mas que, por ela, leve o outro a fazer. No caso do Jornalismo, o enunciador
(veculo) espera criar no enunciatrio (leitor) um interesse um querer saberou um
dever saber que resultaria num vnculo. Para o webjornalismo, esse vnculo pode
ser medido pelo nmero de visitas na pgina. uma relao manipulao: o
discurso do jornal faz o enunciatrio pensar que precisa saber.
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Para persuadir e para interpretar preciso comparar os conhecimentos,valores, crenas, da competncia semntica dos sujeitos, com aqueles queesto em jogo na comunicao. Da a afirmao de que os sujeitos dacomunicao no podem ser considerados como casas vazias e sim como
casas cheias de projetos, aspiraes, emoes, conhecimentos, crenas,que vo determinar os modos de persuadir e as formas de interpretar(BARROS, 2005, p. 49).
Alm das competncias modais e da partilha de valores, para a Semitica, a
comunicao pressupe, tambm, o estabelecimento de um contrato, ou seja,
acordos intersubjetivos com expectativas mtuas entre os envolvidos no ato de
comunicao. No jornalismo on line o acordo mais evidente o da rapidez. Noticiar
antes a principal qualidade de um veculo em rede. Vale pensar, por exemplo, nos
slogans divulgados por essas mdias. O mais espetacular deles provavelmente seja
do Portal Ig, com notcia no ltimo segundo. Em Campo Grande, o site
CampoGrandeNews tambm explora seu carter de agilidade com a campanha A
notcia da terra a um clique de voc. Conhecer esses contratos importante para a
Semitica, assim como desmistificar outros deles.
O Jornalismo uma prtica que tem seu alicerce apesar das discusses
contemporneas sobre o assunto no serem um consenso no discurso da
verdade e da objetividade/imparcialidade. Estes princpios, que, apesar de
independentes, esto interligados, evidenciam uma relao estreita com os valores
ticos da prtica jornalstica de esclarecer a sociedade e do ao jornal um poder
particular em nome do direito de saber do cidado. Apesar de muito criticadas,
essas formulaes sobrevivem, seja nos discursos dos veculos de comunicao,
seja nos trabalhos acadmicos. Ao tratar desse assunto, Moretzshon (2002)
escreveu:
Essa noo de verdade permitiu a formulao de alguns princpiosfundamentais da atividade da imprensa: a teoria da responsabilidade social,baseada na idia de que o pblico tem o direito de saber, remetendo classificao idealista de quarto poder portanto, acima das contradiesda sociedade, sem interesses a defender, capaz de falar em nome de todos,e as noes de imparcialidade e objetividade da decorrentes (p.56).
A teoria da Responsabilidade Social americana e data da dcada de 40. Seu
documento mais conhecido o relatrioA free and responsible press, que, entre as
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orientaes, sugere que a imprensa faa um relato verdadeiro e completo no
contexto em que est inserido. Em seu estudo, inclusive, Moretzshon, aponta uma
reflexo de James Carey, de 1986, sobre o assunto, que ainda hoje parece
pertinente. Segundo ele, entre as perguntas clssicas do fazer jornalstico quem,
que, quando, onde, como e porque as duas ltimas j agregam em si uma
carga de subjetividade, j que comportam uma vasta margem de incerteza.
Fora a questo da verdade, a objetividade e a imparcialidade tambm
configuram um grande problema no resolvido, apesar da existncia, hoje, de
grupos de pesquisadores que colocam esses conceitos como mitos, entre eles
Clovis Rossi que defende que a objetividade impossvel.
[...] entre o fato e a verso h uma mediao de um jornalista que carregaconsigo toda uma formao cultural, todo um backgraund pessoal,eventualmente opinies firmes a respeito do que est testemunhando, oque leva a ver o fato de maneira distinta de outro companheiro, comformao backgraunde opinies diversas (ROSSI, 1980, p. 7-13).
Os manuais de jornalismo, como o do Jornal O Estado de S.Paulo, ainda
orientam para que se faam textos imparciais e objetivos e que o jornalista no
exponha opinies, mas fatos, para que o leitor tire deles as prprias concluses
(1997, p.77). OManual de redao da Folha de So Paulo chega a admitir que no
existe objetividade em jornalismo no entanto, [...] isso no exime, porm, da
obrigao de ser o mais objetivo possvel (2002, p.45). Marques de Melo diz que
essa distino entre o que opinativo e o que objetivo no jornalismo remete
prpria formao dos jornais na era da Revoluo Burguesa.
Na Frana, emergiu um jornalismo opinativo apaixonado, vibrante,impetuoso predominando o fluxo da interpretao da realidade. NaInglaterra, firmou-se um jornalismo objetivo racional, contido, comedido imperando o relato dos acontecimentos, isolado do comentrio (MELO,2006, p. 37).
a partir do conceito ingls que o jornalismo americano, e depois o nacional,
vai cunhar o ideal de que os fatos falam por si mesmos e so, portanto,
inquestionveis, garantindo ao jornal a neutralidade e imparcialidade que buscavam.
Ainda, conforme o autor, depois dessa gnese o conceito foi reformulado pelo
jornalismo norte-americano, que modelo tambm para o jornalismo brasileiro,
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como um valor indissocivel da prtica jornalstica, como uma maneira de preservar
a imprensa da deteriorao da dita imprensa popular a partir das ltimas duas
dcadas do sculo 19.
A cruzada contra o sensacionalismo e pela objetividade tomou dimensocoletiva, disseminando-se por toda a sociedade norte-americana. Osleitores de jornais, influenciados pelas organizaes cvicas, passaram acobrar uma atitude diferente das empresas que os editavam (MELO, 2006,p.43).
Ou seja, a partir desse contexto, a objetividade jornalstica passa a ser
acolhida pelos manuais, deixando de lado tanto as questes filosficas e ticas, para
se converter num modelo padro de estilo. E nesse momento se aproxima dosconceitos da Semitica , que entende esses recursos como uma construo
discursiva.
1.3 Adeus aos mitos
Esses esclarecimentos so importantes porque vo nortear toda a anlise
deste trabalho e outras que possam surgir com objetos miditicos. Primeiramente,
depois de apresentados os pressupostos da Teoria do Jornalismo, necessrio
esclarecer que discutir sobre a verdade, para a Semitica, pr em debate um
efeito do discurso, e no uma assimilao filosfica. Para esta teoria, o conceito de
verdade entendido como uma construo discursiva que existe no texto e que
tambm pode ser complementada enquanto efeitos configurados em dilogos com
outros textos. Para um melhor esclarecimento sobre o que seria essa verdade
jornalstica, vale o dilogo com os Regimes de Verdade de Michel Foucault. Para
ele, a verdade como algo alcanvel e coletivo no existe, uma vez que cada
sociedade se organiza para fazer valer discursos que entende e aceita como
verdadeiros. Para Foucault, o que importa no a descoberta daquilo que
verdadeiro, mas, como explica Revel (2005, p.87) ao analisar a obra do escritor
francs, das regras segundo as quais aquilo que um sujeito diz a respeito de um
certo objeto decorre da questo do verdadeiro e do falso. Deslocando esse conceito
para o jornalismo, as verdades se tornam trechos de verdade por vrias razes, s
para citar algumas:
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a) configuram um recorte do acontecimento, entendido aqui como o conjunto
de ocorrncias da vida cotidiana;
b) representam uma escolha do jornalista, que vai enxergar e selecionar os
fatos nmero limitado de acontecimentos que o jornal entende como
prioritrios - e de acordo com sua prpria formao pessoal e profissional;
c) esto submetidas linha editorial do veculo a que sero publicadas;
d) esto submetidas linguagem do suporte que a veicula;
e) esto submetidas s coeres do discurso da editoria especfica a que
pertencem, etc.
Enfim, como os Regimes de Verdade, as notcias jornalsticas so verses da
realidade que se fazem funcionar como verdadeiras, e so aceitas como tal, de
acordo com o contexto em que esto inseridas. Ou como diz Serva (2002, p.61)
compreender o mundo pelo modelo da imprensa no significa compreend-lo de
fato, mas apenas isso, compreender o mundo pelo modelo da imprensa, um fim em
si.
Outra mstica do discurso jornalstico que deve ser semiotizada neste
trabalho, antes de dar incio anlise do objeto propriamente dito, com relao
imparcialidade e objetividade. Tambm para a Semitica, a neutralidade
impossvel de ser alcanada em termos concretos e pode ser configurada por meio
de efeitos de sentido da enunciao. O recorte, a escolha das palavras, o gancho
(enfoque que cada jornal d matria publicada) configuram uma escolha. A
Semitica sistematizou9, inclusive, recursos sintticos e lexicais que permitem
identificar e alcanar o dito estilo objetivo, com as debreagens temporais,
actanciais e espaciais. Os sistemas enuncivos, que permitem a construo do texto
no tempo do ento, na figura do ele e no tempo do l, concedem ao texto umasensao de distanciamento, de neutralidade e objetividade de que o jornalismo
contemporneo faz uso para manter o aval de credibilidade. Da mesma forma, os
componentes do sistema enuciativo agora, eu, aqui tambm integram a
montagem do discurso, ainda que com efeito distinto. No cabe ao analista dizer que
um texto construdo de uma maneira ou de outra mais ou menos parcial, mas que
9Para saber mais ver BARROS, Diana. Teoria semitica do texto. So Paulo: tica, 2005, p. 53-67.
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a escolha de um outro pode levar a um processo sensorial de maior ou menor
aproximao.
Por fim, esses e outros conceitos servem de exemplo para discutir, no
decorrer do trabalho, outros paradigmas da mdia do ponto de vista semitico. No
entanto, os exemplos apresentados j mostram, de antemo, que a comunicao,
como j postulavam os semioticistas10, no ingnua; e mais, a verdade e a
parcialidade do discurso jornalstico so, antes, um efeito. Mas antes de concluir
esta discusso, que incluiu a apresentao dos pressupostos da teoria e a
demonstrao de alguns de seus conceitos aplicados ao texto, poder-se-ia
questionar sobre a apresentao da terminologia Semitica, j que esta se mostra
muitas vezes como um entrave para os iniciantes na rea. Para no tornar o trabalho
cansativo, no caberia aqui fazer uma explanao isolada dos termos. Os conceitos
ficam mais claros medida que vo sendo explorados na anlise e esta a
proposta neste trabalho: o uso da metalinguagem explicitada para leigos, como
pressupe tambm a prtica jornalstica. Por fim, vale concluir que a escolha da
Semitica para a anlise do objeto miditico no poderia ser mais eficiente. Esta
teoria tem encarado o desafio de estudar o Jornalismo com preciso, ainda que
este objeto, desde sua origem, no se mostre pronto, mas mutvel a cada alterao
tecnolgica. Assim, esse estudo pretende contribuir para se alcanar o entendimento
mais profundo das persuases dos discursos miditicos sobre o funcionamento dos
meios de comunicao cujos paradigmas parecem ser guiados muito mais pela
questo temporal que pela apurao precisa, e suas conseqncias sociais e
ideolgicas.
10
Entenda-se a generalizao semioticistas como um conceito amplo que inclui desde Greimas atos pesquisadores atuais como Jos Luiz Fiorin, Diana Barros, Norma Discini e outros que estocitados nas referncias desta dissertao.
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CAPTULO II
CONHECENDO O JORNAL: SUPORTE E SUAS PISTAS SOBRE O
ENUNCIADOR
O que Deus tem feito?
(Alexandre Graham Bell)
Em 10 de maro de 1876 Alexandre Graham Bell faz sua primeira experincia
importante com o que seria o telefone atual. Com um instrumento rudimentar
consegue uma ligao em seu prprio escritrio para seu assistente Thomas
Watson. Depois dessa experincia o experimento ainda seria aperfeioado at usarcabos subterrneos e transmitir mensagens. Conforme conta Pinho (2003), naquela
poca o telgrafo de Morse j existia, mas tinha uma finalidade estritamente
comercial, por causa do alto custo11. Em 1879, cada mensagem entre os Estados
Unidos e a Inglaterra custava US$ 100, caindo para no mximo 25 centavos de dlar
por palavra em 1970 (2003, p. 14).
O rdio foi o primeiro meio de comunicao eletrnica que no necessitava de
uma ligao fsica era transmitido por ondas eletromagnticas. A transmisso viardio comercial foi inaugurada em 2 de novembro de 1920, nos Estados Unidos. No
Brasil o marco da rdiofuso poderia ser colocado como a fundao, em 1923, da
Rdio Sociedade do RJ. Primeiramente voltado para as elites, com msica erudita,
literatura e cincia, o rdio foi, paulatinamente, adaptando-se at tornar-se uma
referncia na comunicao de massa. O aparecimento da TV vai modificar
profundamente a natureza do rdio, de qualquer maneira foi a tecnologia deste que
permitiu o surgimento da televiso, que no Brasil aportou em 1950, com a TV Tupi,uma emissora de Assis Chateubriand.
J o princpio de conexo em rede tem cunho militar e comea na Guerra
Fria. De l para c, uma grande evoluo tecnolgica foi sendo aperfeioada at o
aparecimento da Internet rede mundial. Mohedaui (2002) menciona que a
experimentao para o que se entende como mdia on line comeou no Estados
11PINHO (2003) conta que a primeira experincia na telegrafia internacional data de
1858, mas problemas tcnicos s permitiram o sucesso na transmissotransatlntica em 1866.
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Unidos, na dcada de 80, com o aparecimento de produes jornalsticas
embrionrias, os futuros jornais digitais. Apenas para situar o leitor da pouca idade
desta mdia no Brasil, vale lembrar que a Internetcomercial s iniciou no pas em
1995, quando apareceram verses on line de jornais impressos, agncias de
notcias, portais e sites noticiosos. A primeira iniciativa foi do grupo O Estado de S.
Paulo que, no mesmo ano, colocou sua agncia de notcias Agncia Estado no
ar na rede mundial. Ao JB (Jornal do Brasil) fica o mrito de ser o primeiro veculo
nacional a fazer uma cobertura completa no espao virtual, conforme conta
Mohedaui.
O primeiro jornal brasileiro a fazer uma cobertura completa no espao virtual
foi o Jornal do Brasil (www.jb.com.br) em 28 de maio de 1995. Logo emseguida vrios outros jornais registraram-se na Web, como O Estado de S.Paulo (www.estadao.com.br), a Folha de So Paulo (www.folha.com.br), oGlobo, o Estado de Minas (www.estadodeminas.com.br) o Zero Hora(www.zerohora.com.br), o Dirio de Pernambuco (www.dpnet.com.br) e oDirio do Nordeste (www.uol/diariodonordeste.com.br) (MOHEDAUI, 2002,p.24).
2.1 Embalagem
Mdia relativamente nova, com pouco mais de dez anos, o jornalismo na
Internetainda no explorou todas as possibilidades de textualizao que o suporte
deste texto sincrtico que agrega diferentes linguagens permite12. Assim, a
referncia primeira do jornalismo on line continua alicerada nas orientaes do
jornalismo impresso, ainda que o novo domnio permita outras investidas, alm do
texto escrito, fotografia e grfico, como por exemplo, vdeo, udio, ilustraes
animadas, links de acesso a outras matrias que tenham informaes
complementares ou indiquem caminhos fora do espao virtual a que o contedo
(aqui cabe melhor esse termo por agregar outros recursos alm do escrito)
apresentado.
12 Um site que usa muitos recursos multimdia pressupe um enunciatrio que dispe de umaconexo em banda larga, ou seja, com condies de navegao rpida, ainda que a pgina estejapesada. Como em geral os sites jornalsticos, e particularmente o Campo Grande News, tentamatingir o maior nmero de internautas, j que tratam de assuntos variados, uma pgina assim poderiaafastar um enunciatrio que, embora guiado pela agilidade, fizesse uso de uma Internetde conexo
com modem ultrapassado. Um site pesado, que demora mais tempo para carregar sua pgina, seriasancionado como lento. Isso explica, em partes, porque no possvel usar em demasia opes maisarrojadas de design grfico.
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Essa migrao de linguagem muito comum quando do aparecimento de
uma mdia. Aconteceu, por exemplo, com a TV, que antes de definir um estilo
especfico adotou a linguagem do veculo que lhe parecia mais prximo, no caso, o
Rdio. A discusso pertinente aqui porque, antes de partir para a anlise,
preciso conhecer o suporte, que Maingueneau (2005) chama de mdium. Segundo
defende, esse conjunto que d materialidade ao discurso no um mero acessrio,
mas agrega e concede sentido ao enunciado, ainda que por muito tempo tenha sido
desprezado pelos analistas do discurso. Hoje, estamos cada vez mais conscientes
de que o mdium no um simples meio de transmisso do discurso, mas que ele
imprime um certo aspecto a seus contedos e comanda os usos que dele podemos
fazer (MAINGUENEAU, 2005, p. 71)
Se as discusses sobre o sentido que o suporte agrega tiveram pouca
ateno dos estudiosos do discurso, cabe lembrar que o suporte um problema
fundamental da escrita desde o aparecimento dos primeiros alfabetos. Quintero
(1994) conta, por exemplo, que este elemento capaz de receber e conservar a
inscrio de um texto, aqui visto no sentido semitico, foi sendo aperfeioado
paulatinamente das tbuas de barro sumrias, ou de madeira e marfim, at o
aparecimento, ainda na Antiguidade e parte da Era Medieval, do uso do Papiro,
descoberta dos egpcios.
A casca do tronco era fendida e do caule obtinha-se o lber, uma pelculainterior com tiras finssimas. Sobre uma tbua umedecida com gua turvado Nilo colocavam-se umas na posio horizontal e outras na vertical. (...) agua turva do rio era suficiente para colar os filamentos, mas apesar dissotambm lhe era aplicada uma camada de cola. A operao terminava com oesmagamento com um mao e a secagem ao sol (QUINTERO, 1994, p.16).
Alm do papiro, outros suportes tambm conviveram neste perodo, como as
lminas de chumbo e estanho. O autor conta que s com no Sculo 1 antes de
Cristo, depois de ter escrito sobre a seda, os chineses inventaram o papel, que se foi
expandindo at chegar Europa e popularizar-se. Embora hoje a impresso seja
muito diferente e os suportes para o texto bem variados, a inveno de Gutemberg 13
13 Gutemberg publicou a primeira Bblia da histria, com 42 linhas, em 1456. Muitos autores datam ahistria da imprensa com o aparecimento das gazetas edies semanais dirias lanadas umsculo depois. Quintero (1994), depois de um amplo estudo sobre a histria da imprensa no mundo
defende que, apesar de no apresentarem as mesmas caractersticas dos noticirios que marcam ahistrias da imprensa, o embrio deste modelo de comunicao de massa estaria nos calendrios-almanaques, de 1448, tambm originrios da oficina de Gutemberg.
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continua atual e sem dvida a mais revolucionaria descoberta desde do
aparecimento da escrita. O prelo de caracteres mveis permitiu a produo em larga
escala e a popularizao da informao. Depois desta inovao o mundo substituiu,
aos poucos, o texto manuscrito pelo impresso, que ganhou periodicidade. Depois
disso o informativo substitudo pelo jornal de papel e assim por diante. A
descoberta to importante para a imprensa, entre outras razes, porque impresso
e jornalismo no se dissociam. E mesmo com o advento das mdias eletrnicas,
quando se pensa em jornal logo se imagina uma publicao com as caractersticas
do impresso.
A idia do modelo tradicional de jornal escrito foi to disseminada que, como
foi lembrado acima, at pouco tempo quem estudava o sentido de um texto deixava
pouca ou nenhuma ateno ao suporte e ao modo de difuso. Maingueneau (2005)
defende que apenas recentemente, com o advento do computador e da linguagem
ciberntica, que pesquisadores ocuparam-se do estudo da manifestao material
dos enunciados como forma complementar de produo do sentido.
Foi, sobretudo, com a chegada dos mdiuns audiovisuais e odesenvolvimento da informtica que tomamos conscincia desse papelcrucial do mdium. Eles revolucionaram efetivamente a natureza dos textose seu modo de consumo. Seu surgimento provocou uma ruptura com acivilizao do livro, que trazia em si toda uma concepo do sentido(MAINGUENEAU, 2005, p. 72).
Inclusive, por muito tempo, o estudo do Plano de Expresso (forma de
manifestao, produto de uma linguagem ou mais linguagens, como quadrinhos,
cinema e outros) no interessou teoria, que s iniciou a busca deste sentido
quando esta embalagem, digamos assim, passou no apenas a abrigar o
contedo, mas contribuir para sua semantizao.
Neste prisma, hoje unnime que no se pode analisar separadamente as
diferentes manifestaes de produo de um discurso sem comprometer seu sentido
global. S com uma concepo assim possvel chegar a um entendimento mais
aprofundado de um jornal digital, que na sua prpria formao manifesta-se nas
mais diferentes linguagens. O jornal on line, para a Semitica de Linha Francesa,
pode ser entendido como um texto porque, conforme esta linha terica, este visto
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como um todo de sentido que conjuga uma dualidade, sendo ao mesmo tempo
objeto de significao e de comunicao, ou seja, para a teoria desenvolvida por A.
J. Greimas, sabero que o texto dize como faz para dizer o que dizsignifica envolver
uma analise interna e outra externa deste objeto. [...] a semitica trata, assim, de
examinar os procedimentos da organizao textual e, ao mesmo tempo, os
mecanismos enunciativos de produo e recepo do texto (BARROS, 2005a, p.8).
E a Semitica vai alm, no restringe o texto materialidade verbal ou
expresso oral, mas amplia o conceito para qualquer objeto de significao. Assim,
um texto pode ser tanto uma poesia, quanto uma conversa entre crianas, uma
imagem na parede, um encontro no supermercado e at mesmo um aroma. Partindo
desse conceito, o site Campo Grande News configura um texto que rene
linguagens distintas:
verbal: manifestada tipograficamente com matrias, ttulos e
chamadas e que neste site apresenta pouca variao;
fotogrfica: representada pelas fotografias, tambm com pouca
mobilidade, em geral pequenas e em pouca quantidade. Vale notar que
s as matrias de Capa fazem uso deste recurso na apresentao;
grfica: com grficos explicativos, tambm raramente usados, em
geral apenas em matrias previamente apuradas, as denominadas
especiais, que so inseridas nos fins de semana;
diagramtica: Com caixas coloridas para destacar e orientar a
navegao. O material publicitrio geralmente se apresenta nessas
caixas;
hipermiditica: Com links de acesso entre uma matria e outra ou
entre uma editoria e outra; material em fluxo, como apresentao das
capas em slides, chamadas que correm uma atrs da outra, caixas que
acompanham o movimento da barra de rolagem e animaes
publicitrias. H ainda, a TV News, que traz entrevistas semanais que
podem ser acompanhadas em vdeo.
Objetos como esses, que concentram mais de uma linguagem, so
identificados como Sincrticos. Discini (2005, p.29) classifica como texto sincrtico
aquele que pelo menos [...] juntar em si dois meios diferentes de expresso, ou
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seja, pode ser uma tira publicada em jornal, uma publicidade, um panfleto entre
outros. Nesta perspectiva, no possvel entender, com eficincia, um texto sem
levar em conta suas caractersticas enunciativas de Contedo e Expresso, alm da
relao entre elas. Barros (2005a) lembra que estudos recentes mostram no estudo
de textos sincrticos, a Expresso conjuga significado e portanto no pode ser
desprezada. [...] em muitos textos, o plano de expresso faz mais que apenas
expressar o contedo, ele cria novas relaes com o contedo, (BARROS, 2005a,
p. 210).
Enfim, chegar ao entendimento profundo de uma mensagem significa
conhecer seu enunciado desde os conceitos mais elementares at os mais
complexos, ou seja, fazer um percurso em camadas: em um momento as camadas
referentes ao Plano de Contedo e, em outro, s do Plano de Expresso, no
necessariamente nesta ordem.
2.2 Um jeito todo seu
O Campo Grande News pioneiro neste modelo de divulgao de notcia em
Campo Grande, sendo um jornal exclusivamente on line. Entrou na Rede Mundial
em 1999 e um nico em Mato Grosso do Sul que permanece 24 horas em
atualizao na rede. Esse site oferece acesso ilimitado a todo o contedo disponvel,
sem custo algum para o leitor. Para a anlise deste projeto, sobre a cobertura das
rebelies nos presdios de MS, importante antes conhecer como se apresenta
esse veculo e de que recursos de textualizao ele dispe. No ser aprofundada
aqui a estrutura da empresa, nem discutidas as condies de trabalho. A meta
fazer uma breve apresentao do Plano de Expresso e, quando necessrio, sua
comunicao com o Discurso.
Alm dos recursos de linguagem, que foram descritos no tpico anterior,outras disposies plsticas da pgina do CGNews podem revelar algumas pistas
do enunciador. Para comear vlido perceber que se trata de uma homepage
praticamente estvel do ponto de vista da disposio dos contedos, seja na
manchete, nas chamadas, nos links de acesso para as editorias, que aqui recebem
no nome de Canais, ou, ainda, nos demais produtos, como colunas e sites parceiros;
ou seja, o leitor que navega pela pgina do site sabe, todos os dias, onde encontrar
os assuntos que busca. H uma determinao espacial que permite conhecer osacessos da maioria do contedo por meio de conveno. Se a distribuio espacial
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do contedo da primeira pgina, que funciona como a capa de um jornal, onde o
enunciatrio evidencia seus valores, o jornal busca recursos visuais para dar o efeito
de movimento e fluxo.
O meio mais evidente a disposio temporal das notas, acompanhadas do
horrio da insero. Como as matrias so inseridas em intervalos muito curtos de
tempo, em geral com diferenas de dois a trs minutos, a sensao de que o jornal
no esttico. Cada portal, ao enunciar o tempo todo sobre um conjunto de fatos,
consegue o efeito de sentido de representao do prprio pulsar da vida cotidiana e
de insero do internauta nesse movimento incessante (HERNANDES, 2005, p.
276).
Quase sem recursos hipermiditicos at dezembro de 2006, com o novo
layout, que entrou no ar em janeiro de 2007, o CGNews passa a explorar com
bastante nfase o movimento na sua pgina principal. Ainda assim, o site no usa
muitos recursos de apresentao. Inclusive usa menos efeitos que um jornal de
papel, o qual permite, por exemplo, aumentar ou diminuir o tamanho da fonte, usar
cores e tipos diferentes de ttulos dependendo da pgina , e montar
apresentaes com recortes fotogrficos. No CGNews esses recursos no so
usados.
Diariamente o jornal dispe de cinco capas simultneas que se modificam
como um slide de Power Point, sempre no centro da pgina. As capas, ainda que se
substituam umas as outras nessa seqncia, mantm a conveno primeira entre o
jornal e o leitor de ocupar sempre a mesma posio espacial e sem grandes
mudanas de apresentao. Assim, a capa vir sempre com um ttulo em duas
linhas, logo acima da fotografia, a nica da pgina principal, sendo que estas
manchetes dispem da possibilidade de usar uma nova fotografia na pgina interna.
H ainda as Chamadas, algumas ficam em movimento no alto da pgina,acima da manchete. So em mdia quatro ou cinco chamadas em movimento, como
que correndo uma atrs da outra. H tambm a opo de chamada fixas, num total
de seis, ao lado direito da manchete. Elas vm sempre acompanhadas do nome da
Editoria a que esto vinculadas e como a capa e as outras chamadas no trazem a
insero do horrio que foram publicadas. Logo abaixo da capa h uma caixa
retangular usada para informe publicitrio e funciona como uma separao entre a
manchete e as chamadas das demais notas, que so inseridas uma abaixo da outra,sendo que a ltima inserida sempre ocupa o primeiro espao abaixo da publicidade,
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mostrando ao internauta qual a mais nova informao que ele pode conhecer. Do
lado esquerdo da manchete esto os Canais, com as editorias, colunas e outros
links de que o jornal dispe.
Exemplo:
Figura 1 parte da pgina inicial do CGNews exibida sem usar a barra de rolagem/ acessoem 03 de maro de 2007 s 10h26 min.
Nesta pgina de abertura, em que no preciso usar a barra de rolagem,
esto as informaes entendidas pelo enunciatrio que quer compartilhar esse
valor com o leitor como as mais importantes. Tanto assim que o internauta,
nesse caso, no precisa de esforo nenhum para procur-las. Ao abrir o site elas
ficam expostas. Hernandes (2005) atenta para o que chama de categoria Exposto x
Escondido, que no teria no jornal impresso, mas que no on line evidencia a
predileo editorial do jornal. A manchete tem um lugar fixo e seguida de outras
chamadas, mveis ou fixas, que so apresentadas nesta parte visvel do jornal. Sem
usar a barra de rolagem possvel conhecer praticamente metade do que pode ser
encontrado na pgina inteira. A pgina de abertura tambm modelo, com poucas
diferenas, para as pginas de acesso s editorias (Canais). Cada Canal tem uma
manchete, que pode ser diria ou semanal, mas sem o recurso do movimento, e
repete os simulacros. Essa padronizao, inclusive, uma das orientaes tambmdo jornal impresso. Na parte inferior da barra de rolagem esto as primeiras notas do
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dia, os links para sites de outras cidades do interior, que so os parceiros do jornal, o
espao de servio, com classificados, o expediente do veculo, e tambm uma
enquete semanal, na maioria das vezes sobre um assunto poltico.
Na padronizao grfica, a primeira pgina a que detm os maiores recursospersuasivos para a posterior leitura de todo o jornal. Para tal, necessrio queessa padronizao grfica seja personalizada, para que o leitor a identifiqueimediatamente. Ela representa a prpria imagem do jornal (SILVA, 1985, p. 50).
Em anlise do Portal Uol, Hernandes (2005) adaptou leis de diagramao do
jornalismo impresso que poderiam ser usadas no estudo do jornal na web. Ele
props algumas leis que seriam partilhadas entre os dois veculos e apontou alguns
semi-simbolismos entre o contedo publicado e a imagem que este pretende mostrarao seu enunciatrio por meio dos recursos de apresentao.
Pietroforte