UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
ANA CLÁUDIA DE SOUSA RODRIGUES
Produção De Sentidos E Processos Inferenciais: Um
Estudo Da Compreensão Leitora De Alunos Do 3º Ano
Do Ensino Fundamental I.
CAMPINAS
2017
ANA CLÁUDIA DE SOUSA RODRIGUES
“Produção De Sentidos E Processos Inferenciais: Um
Estudo Da Compreensão Leitora De Alunos Do 3º Ano
Do Ensino Fundamental I.
Tese de Doutorado apresentada ao
Programa de Pós- Graduação em
Educação da Faculdade de Educação da
Universidade Estadual de Campinas para
obtenção do título de Doutora em
Educação, na área de concentração de
Educação, conhecimento, Linguagem e
Arte.
Este exemplar corresponde à redação final da Tese defendida por Ana Cláudia de Sousa
Rodrigues e aprovada pela Comissão Julgadora
Orientador: Sérgio Antonio da Silva Leite
Campinas
2017
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): Não se aplica.
Ficha catalográfica Universidade
Estadual de Campinas Biblioteca da
Faculdade de Educação Rosemary
Passos - CRB 8/5751
Rodrigues, Ana Cláudia de Sousa, 1972-
R618p Produção de sentidos e processos inferenciais : um estudo da
compreensão leitora de alunos do 3ºAno do ensino fundamental / Ana Cláudia
de Sousa Rodrigues. – Campinas, SP : [s.n.], 2017.
Orientador: Sérgio Antonio da Silva Leite.
Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação.
1. Inferência. 2. Leitura - Compreensão. 3. Letramento literário. 4.
Interdisciplinaridade. I. Leite, Sérgio Antonio da Silva,1946-. II. Universidade
Estadual de Campinas. Faculdade de Educação. III. Título.
Informações para Biblioteca Digital
Título em outro idioma: The production of meanings and inferential processes : from the
reading of narrative texts for students of the 3rd cycle of the first year- elementary school
Palavras-chave em inglês:
Inferences-reading
Comprehension- literacy
Interdisciplinarity
Área de concentração: Educação, Conhecimento, Linguagem e Arte
Titulação: Doutora em Educação
Banca examinadora:
Sérgio Antonio da Silva Leite
Elvira Cristina Martins Tassoni
Rildo José Cosson Mota
Cláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto
Márcia de Souza Mendonça
Data de defesa: 23-02-2017
Programa de Pós-Graduação: Educação
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE
CAMPINAS FACULDADE/INSTITUTO
TESE DE DOUTORADO
Produção De Sentidos E Processos Inferenciais: Um
Estudo Da Compreensão Leitora De Alunos Do 3º
Ano Do Ensino Fundamental I.
Autor: Ana Cláudia de Sousa Rodrigues
COMISSÃO JULGADORA:
Prof. Dr. Sérgio Antônio da Silva Leite (Orientador)
Prof. Drª. Elvira Cristina Martins Tassoni
Prof. Dr. Rildo José Cosson Mota
Prof. Drª. Cláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto
Prof. Drª. Márcia Rodrigues de Souza Mendonça
A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.
2017
DEDICATÓRIA
Ao meu irmão, André Luís de Sousa Rodrigues (In
Memorian). Como a casa ficou vazia sem você! A sua
ausência dói na alma e ainda aperta o coração, mas é
preciso eguir adiante!
AGRADECIMENTOS
Do início à conclusão deste trabalho, foram várias as pessoas que participaram durante este
percurso ao meu lado. Foram tantos os momentos, que agora neste exercício de relembrar
esta minha trajetória, me remeto aos momentos vividos com pessoas que estiveram
presentes, as que já não estão mais e, as que permaneceram no decorrer da caminhada ,
também as que surgiram no final e acompanharam o processo.
Gostaria de agradecer ao meu orientador Prof. Drº Sérgio Antonio da Silva Leite, que
acolheu meu projeto e acreditou deste do início, em minhas ideias, apesar do meu percurso
profissional e de pesquisa ser tão distinto do assumido na área que este estudo dialoga.
À Márcia Celestin e à Margarete de Faria, sem as quais este estudo não teria dado frutos,
pois foi através de nossas conversas que surgiu a ideia da pesquisa e pela irmandade.
Aos meus amigos e companheiros do ALLE: Ana Elisa, Alessandra, Cinthia, Fernanda,
Oton, pela amizade, pelas conversas e acolhimento nos momentos difíceis.
A todos os funcionários da instituição pesquisada, sobretudo à diretora Sílvia, vice-diretora
Priscila, à orientadora pedagógica Angélica e todos os professores da escola.
Às amiga queridas que não estão mais na escola mas que fazem parte da minha história:
Vilma e Érika.
Aos meus queridos amigos que sempre estiverem a prontos para uma conversa e que
fizeram e fazem minha vida mais alegre: Patrícia, Sandra F, Sandra X., Fernanda, Lauro,
Maria Aparecida e Amana.
Ao grupo de estudos e pesquisa – AFETO, pela troca de conhecimentos e acolhimento.
À Fran que contribuiu significativamente para a finalização deste estudo, por sua
disponibilidade e conhecimento.
Aos queridos alunos sujeitos desta pesquisa, que vi entrar tão pequeninos na escola e hoje
finalizaram o ciclo II e seguiram para o Ensino Fundamental – anos finais.
Aos meus pais Antonia e Sebastião que sempre me incentivaram a buscar realizar meus
sonhos, pelo apoio e dedicação.
À Sônia pelo carinho e atenção de sempre.
Ao Renan e a Maíra sempre disponíveis, presentes em vários momentos
importantes. Ao membros da banca, pela leitura atenciosa e contribuição da
discussão desta pesquisa.
Para compreender um texto nós não apenas o lemos,
no sentido estrito da palavra: nós construímos um
significado para ele (...) Os leitores cuidam do texto.
Criam imagens e transformações verbais para
apresentar seu significado. E o que é mais
impressionante: eles geram significado à medida que
leem, construindo relações entre seu conhecimento, sua
memória da experiência, e as frases, parágrafos e
trechos escritos. (Merlin C. Wittrock, apud Manguel,
2004)
RESUMO
Este estudo tem como objetivo investigar a produção de sentidos e processos inferenciais, a
partir da leitura de textos narrativos, por alunos do 3º Ano do Ciclo I – Ensino Fundamental
I, em uma escola da Rede Municipal de Campinas. Foram selecionados três alunos do
último ano do ciclo de alfabetização e analisadas as inferências produzidas por eles - de
base textual, base contextual e sem base textual e contextual - segundo o modelo teórico
proposto por Marcuschi (2008). Buscou-se relacionar, as inferências produzidas pelos
mesmos com as conexões feitas no seu contexto social e escolar. Partiu-se do pressuposto
que ler é inferir, sendo que a compreensão leitora está diretamente relacionada com a
capacidade de produção de inferências, considerando a situação imediata em que ocorre a
leitura e a contextualização cognitiva atreladas à organização dos conhecimentos e
experiências pessoais. A coleta de dados baseou-se em sessões de leitura, em que foram
utilizados 3 textos distintos, todos lendas da cultura popular brasileira: texto 1- “Dança do
Arco-íris”; texto 2 - “A origem do Oiapoque”; texto 3 - “Romãozinho”. Cada sujeito
selecionado participou de duas sessões de leitura de cada um dos textos. A cada leitura, o
sujeito leu em voz alta, em seguida elaborou comentários orais sobre o texto, com ou sem
intervenção da pesquisadora. Foram realizadas18 sessões de leitura, todas viodeogravadas e
transcritas. A partir desse material, foram identificados e analisados os tipos de inferências
produzidas pelos sujeitos, sendo tais inferências cotejadas com as experiências vivenciadas
pelos alunos nos primeiros anos de escolarização do ensino fundamental, em que se
destacaram trabalhos com projetos interdisciplinares, como Sacola, Roda da Leitura e
Festival Literário.).Verificou-se, nas inferências produzidas pelos sujeitos pesquisados, que
o investimento, realizado pela professora, em práticas pedagógicas que prezam pela
formação literária dos alunos contribuiu com processo de compreensão leitora, além da
formação de leitores engajados e proficientes.
Palavras-chave: inferências, compreensão leitora, letramento literário, projetos
interdisciplinares
ABSTRACT
This study aims to investigate the production of meanings and inferential processes, from
the reading of narrative texts for students of the 3rd cycle of the first year - elementary
school, at a school in the Campinas Municipal School Net. Three students of last year
literacy cycle were selected and analyzed the implications produced by them – regarding to
textual basis, contextual basis and without textual and contextual basis - according to the
theoretical model proposed by Marcuschi (2008). This work tried to relate the inferences
produced by them with the connections made in their school and social context. The
standpoint was that reading is infer and that reading comprehension is directly related with
the inferences production capacity, considering the immediate situation in which there is
reading and cognitive contextualization linked to the organization of knowledge and
personal experiences. Data collection, based on reading sessions were used in three
different texts, all legends of Brazilian popular culture: Text 1 "Rainbow Dance"; Text 2 -
"The origin of Oiapoque"; Text 3 - "Romãozinho". Each student selected participated in
two sessions of reading each text. In every reading, the reader had prepared oral comments
on the text, with or without intervention of the researcher. Were realized eighteen reading
sessions, all of that taped and transcribed. From this material, types of inferences produced
by the students were identified and analyzed, such inferences collated with the experiences
of the students in the early years of schooling of elementary school, which stood out work
on interdisciplinary projects, such as Bag, Reading Reunion and Literary Festival. It was
found, in the inferences produced by the subjects surveyed, that the investment held by the
teacher in pedagogical practices that values the literary education of the students had
contributed to process of reading comprehension, besides the formation of readers engaged
and proficient.
Keywords: inferences-reading comprehension- literacy literary-interdisciplinary projects
LISTA DE QUADROS E TABELAS
QUADRO 1:Quadro Geral de Inferência ............................................................................ 37
QUADRO 2: Quadro de Operações ................................................................................... 38
QUADRO 3: Horizontes de Compreensão Textual ........................................................... 40
QUADRO 4: Quadro explicativo dos horizontes de compreensão textual ........................ 41
QUADRO 5: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 1ª Fase ................................................... 52
QUADRO 6: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 2ª Fase ................................................... 63
QUADRO 7: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 3ª Fase .................................................... 76
FIGURA 1: Indicadores de população, alfabetização e renda da área atendida pela escola
............................................................................................................................................. 99
FIGURA 2: Imagem de satélite........................................................................................ 101
TABELA 1: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Nível de Alfabetização ........ 103
TABELA 2: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Desenvolvimento das
Habilidades. ................................................................................................................................... 103
TABELA 3: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Rendimento nas Questões
Objetivas. ...................................................................................................................................... 104
TABELA 4: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 1. .............................................. 106
TABELA 5: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 2 ............................................... 107
TABELA 6: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 3. .............................................. 107
Sumário 1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................... 12
1.1. OBJETIVOS ...................................................................................................................................... 14 CAPÍTULO 1............................................................................................................................................... 17
1. LEITURA: CAMPO DE INVESTIGAÇÃO, CONCEPÇÕES, ROCESSOS INFERENCIAIS
E PRODUÇÕES DE SENTIDOS 1.1. Campo de investigação ............................................................................................................. 17
1.2. Concepções .............................................................................................................................. 23
1.3. Inferências: algumas considerações. ........................................................................................ 31
1.3.1. Processos Inferenciais e produções de sentidos. ....................................................................... 34 1.4. Formação do sujeito leitor: escolarização da leitura e compreensão textual ............................ 42
CAPÍTULO 2............................................................................................................................................... 48 2. CARACTERIZAÇÃO DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DE LEITURA E
EXPERIÊNCIAS LEITORAS 2.1. Projeto: “Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...” ............................................................. 51
2.2. Projeto “Na Trilha da Minha Vida ...” ....................................................................................... 67 2.1. Projeto: “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens” ................................................ 75 2.2. Sacola e Roda da Leitura .......................................................................................................... 91 2.3. FLISELLO – Festival Literário do Tosello .............................................................................. 93
CAPÍTULO 3............................................................................................................................................... 94 3. PERCURSO METODOLÓGICO ............................................................................................ 94 3.1. Base Teórica ............................................................................................................................. 94
3.2. Descrição do Bairro e da Escola ............................................................................................... 97
3.3. Descrição dos Sujeitos e procedimentos de coleta de dados .................................................. 104
3.4. A professora: concepção de ensino- aprendizagem ................................................................ 108
3.5. Categorias de Análise ............................................................................................................. 111
CAPÍTULO 4............................................................................................................................................. 112 4. PRODUÇÕES E ANÁLISE DE INFERÊNCIAS.................................................................. 112 4.1. Texto 1 - “A Dança do Arco-Íris” .......................................................................................... 113
4.1.1. Análise de dados sobre compreensão leitora e produção de inferências. ............................... 116 4.2. Texto 2 - “A Origem do Oiapoque” ....................................................................................... 130
4.2.1. Análise de dados sobre compreensão leitora e produção de inferências ................................ 132 4.3. Texto “Romãozinho” .............................................................................................................. 149
4.3.1. Análise de dados primários sobre compreensão leitora e produção de inferências. ............... 151 CAPÍTULO 5............................................................................................................................................. 168
5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ...................................................................................... 168 5.1. Processo de compreensão leitora ............................................................................................ 168
5.2. Aluno Pedro ............................................................................................................................ 168
5.3. Aluna Elisa .................................................................................................................................. 174
5.4. Aluno Luís. ............................................................................................................................. 178
5.5. As implicações das práticas pedagógicas de leitura nas produções inferenciais: leitura de
textos narrativos ............................................................................................................................... 180
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................................ 184 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................. 188 APÊNDICE ..............................................................................................................................................190 ANEXOS ................................................................................................................................................ 257
12
1. INTRODUÇÃO
A presente pesquisa surgiu em consequência das reflexões e questionamentos
oriundos da prática de orientação pedagógica. Atuo como orientadora pedagógica em uma
escola da Rede Municipal de Campinas desde 2009. Há quase 8 anos, sou corresponsável
pelo trabalho dos professores dos Ciclos I e II, os quais atendem aos alunos do 1º ao 5º ano.
Ao chegar nesta escola, busquei compreender todo o processo de ensino-
aprendizagem que ocorriam na interação entre professores e alunos. Isso significou estudos
e pesquisas sobre o funcionamento do Ensino Fundamental I e a dinâmica que caracteriza
esse segmento de ensino.
O primeiro ano que estive na unidade escolar foi para tomar ciência do
funcionamento da escola, reuniões de assessoramento, estudos e para ouvir os professores
sobre suas práticas, entre outros assuntos abordados em reuniões pedagógicas.
No início do ano letivo de 2010, na RPAI (reunião pedagogia de avaliação
institucional) que ocorreu durante três dias do mês de fevereiro na escola, estávamos
reunidos: professores, orientadoras pedagógicas, vice-diretores e diretora para elaborar o
planejamento anual. Nesta reunião, ficou definido entre os professores do Ciclo I e II que os
conteúdos de ciências, história e geografia seriam trabalhados, no decorrer do ano, através
de projetos. No 1º trimestre; seria abordado ciências, no 2º, história e no 3º geografia.
O desenvolvimento dos projetos oportunizou a relação mais próxima entre
orientadora pedagógica e professores, no caso específico, a aproximação maior ocorreu com
a professora Mariana1, que na época ministrava aulas no 2º ano do ciclo I. Além disso, foi
uma oportunidade de aproximação também com os alunos. Essa experiência de trabalhar
com projetos interdisciplinares, me fez refletir sobre a importância de se “enxergar” o outro
na relação educacional, nas palavras de Cortella (2006):
“Buscar ‘enxergar’ o outro não implica de forma alguma aceitá-lo como é;
não há prática educativa coerente se não houver inconformidade, dado que
a própria palavra ‘educação’ significa conduzir para um lugar diferente
daquele em que se está. No entanto, a incompreensão da gênese e
desdobramentos dos valores e conhecimentos daqueles com os quais
convivemos é um obstáculo brutal para uma relação pedagógica autônoma
e produtiva”. (p.50/51)
Foi muito importante poder estar com os alunos conhecer um pouco mais de sua
cultura, seus gostos, suas brincadeiras, enfim, conhecer melhor esse universo que muitas
vezes é desconsiderado pela cultura escolar..
1 Nome fictício da professora pesquisada
13
Embora o cargo de orientação pedagógica esteja diretamente atrelado aos
processos pedagógicos, muitas vezes, vivenciamos a maior parte do tempo na escola
resolvendo questões burocráticas. No entanto, como orientadora pedagógica, pude olhar de
uma forma mais efetiva para o desenvolvimento dos alunos.
Além dos projetos, passei a participar de várias outras atividades propostas pela
professora já citada, como a roda da leitura. Esta atividade é realizada em sala de aula, em
um momento específico da semana, quando os alunos socializam os livros lidos em casa
para a professora e demais colegas.
Com o passar do tempo, comecei a observar e concluir intuitivamente que
algumas práticas pedagógicas assumidas pela professora estavam contribuindo para a
formação de alunos mais questionadores, pois tinham uma relação mais afetiva com os
livros de literatura infantil e apresentavam características de leitores autônomos e
engajados, ainda no ciclo I do Ensino Fundamental.
Com o ingresso no doutorado, passei a observar, como pesquisadora, o
cotidiano do trabalho desenvolvido pela Professora Mariana e as posturas dos alunos diante
da leitura. Buscava ali, indícios de como nesse espaço escolar, através da mediação
pedagógica, a criança vai constituindo-se como leitora.
Trabalhar na mesma escola que escolhi para fazer esta pesquisa, contribuiu para
a minha constituição enquanto pesquisadora, pois, convivia, diariamente, com as crianças,
participava de suas rotinas e acompanhava a professora em diversas atividades na sala de
aula e fora dela.
Nessas relações interativas, a pesquisa foi delineando-se e a principal questão
que passou a nortear este trabalho foi: como crianças em fase de alfabetização tornam-se
leitoras proficientes ao final do 3º ano do Ciclo I? Para isso, buscou-se olhar para a
produção de inferências construídas por três sujeitos selecionados para esta pesquisa. Eram
alunos matriculados no final do ciclo I e que vivenciaram as mesmas práticas de leitura e
trabalho com projetos interdisciplinares desde o início da escolarização.
Para entender esse processo, foram feitas sessões de videofilmagens das
crianças selecionadas. O procedimento de leitura dos textos escolhidos e posteriores
comentários produzidos pelos alunos, que serão apresentados no decorrer do trabalho, dava-
se individualmente e em voz alta.
As sessões foram transcritas e utilizadas para obter dados sobre quais tipos de
inferências são produzidas pelas crianças em situações de leitura, considerando que ler é
14
produzir sentidos a partir de processos inferenciais (MARCUSCHI,1985; 2007; 2008;
2011). A partir da análise dos diversos tipos de inferências produzidas em comentários orais
sobre textos narrativos, foi possível obter respostas sobre a proficiência leitora das crianças
pesquisadas.
As práticas da professora desenvolvidas em sala de aula foram consideradas
relevantes pois priorizavam a leitura literária em diversas atividades de leituras, sejam elas
para fruição ou mesmo nos projetos desenvolvidos com vistas à aprendizagem de vários
conteúdos escolares. Os processos de interação entre professora e alunos para apropriação
da atividade leitora é analisada a partir da teoria histórica cultural desenvolvida por
Vygotsky (2003) na interface entre as inferências produzidas pelos alunos e o processo de
aquisição da leitura enquanto prática social e cultural.
Posto isso, destaco os objetivos a que se propõe responder este trabalho.
1.1. OBJETIVOS
O principal objetivo deste estudo é investigar a produção de sentidos e
processos inferenciais, a partir da leitura de textos narrativos, por alunos do 3º Ano do Ciclo
I – Ensino Fundamental I, em uma escola da Rede Municipal de Campinas. Analisar-se-á a
compreensão leitora de crianças do 3º ano do Ensino Fundamental com enfoque nos
processos inferenciais de base textual, contextual e sem base textual e contextual
(MARCUSCHI, 2008.).
O objetivo secundário é relacionar as inferências produzidas pelos sujeitos
pesquisados, a partir da leitura de textos literários, lendas de origem brasileira, com as
conexões feitas com processo de escolarização da leitura vivenciados no decorrer de três
anos no ciclo I. Ou seja, com as principais práticas pedagógicas de leitura literária
desenvolvidas pela educadora que acompanhou este grupo de alunos durante esses anos do
ensino fundamental.
O presente texto está organizado da seguinte forma:
Capítulo 1 – Leitura: campo de investigação, concepções, processos inferenciais
e produções de sentido. Buscou-se fazer um levantamento bibliográfico acerca das diversas
faces e interfaces da leitura enquanto objeto de pesquisa. O leque de pesquisas na área é
bem amplo e com distintas abordagens e autores – sobre Estado da Arte em leitura: Ferreira
(1999); Martins (2005), Penido (2010), sociológicas e históricas: Chartier (2001; 2009),
Darton (1992), Certeau (2004). Sobre a leitura: como prática social, aprendizagem e
15
desenvolvimento; compreensão de textos escritos; interdisciplinaridade, escola e leitura
literária; letramento e letramento literário; processos interativos e inferências; são
referências: Abreu (2001), Bakhtin, M.[Volochínov] (2012), Coscarelli (2003), Freire
(2006), Kleiman (1989; 2007;2008; 2012), Geraldi (2010), Silva (1985; 2004; 2005);
Marcuschi (1985; 2007; 2008; 2011), Lajolo(2002), Smolka (2009;2010), Soares ( 2010;
2011), Vóvio (2007), Zilberman ( 2004; 2009).
A proposta deste capítulo é discorrer sobre a leitura e suas interfaces. Procurou-
se fazer um histórico sucinto sobre o campo de investigação: leitura no Brasil; além disso,
como este objeto foi assumido pelas diversas áreas do conhecimento, considerando as
diversas concepções sobre ele.
Como esta pesquisa está atrelada ao processo de compreensão textual, à
interação autor, texto e leitor e à produção de inferências, recorreu-se também a uma
discussão preliminar sobre escolarização da leitura literária na escola.
Refletir sobre o campo de estudos, leitura significa pensar neste objeto de forma
ampla, com muitas possibilidades de abordagens. Neste caso, tratou-se de focar nas
perspectivas teóricas construídas por autores que versam sobre a leitura como produção de
sentidos, de inferências, de atividade e trabalho social.
Sendo assim, ancorou-se nas ideias defendidas por Kleiman; Marcuschi;
Bakhtin e Geraldi: autores elencados anteriormente. Foi explorada as abordagens teóricas
desenvolvidas por esses autores, com o intuito de dar visibilidade às concepções de leitura e
ampliar as possibilidades de reflexão e discussões neste campo de pesquisa.
Capítulo 2 – caracterização das práticas pedagógicas de leitura e experiências
leitoras. O principal objetivo deste capítulo é apresentar algumas das principais propostas
pedagógicas criadas, implementadas e aplicadas pela professora, sujeito desta pesquisa. A
mesma acompanhou a sala dos alunos pesquisados, durante os 3 anos do Ciclo I – Ensino
Fundamental.
Além disso, o intuito foi relacionar as principais experiências - em sala de aula,
nos projetos e atividades de leitura vivenciados pelos alunos pesquisados, com suas
produções de inferências, construídas a partir da leitura de textos narrativos, durante o
processo desta pesquisa.
As principais referencias utilizadas foram: Cosson (2011), Vygotsky (2003;
2012), Luria (2012), Smolka (2009) e Oliveira (2010). Além dos 3 cadernos de registros da
16
professora que contém as atividades das três fases do projeto interdisciplinar.
Capítulo 3: buscou-se apresentar e discutir o percurso metodológico, com
ênfase nas reflexões sobre pesquisa de cunho qualitativo embasadas nos pressupostos de
Bogdan e Biklen (1994).
Foram levantados indicadores com o intuito de caracterizar o bairro, com
ênfase em dados populacionais, de alfabetização e renda, retirados do IBGE, acrescidos dos
resultados da Provinha Brasil – avaliação sobre leitura e matemática do ano de 2013. Com o
objetivo de dar visibilidade a formação da professora, sua concepção de ensino e
aprendizagem, foi utilizada entrevista com a mesma.
Capítulo 4 – Produções e análise de inferências. Neste capítulo apresentam-se
os textos selecionados para a pesquisa de campo e na sequência, foram feitas análises sobre
as inferências produzidas pelos alunos em cada uma das sessões de leituras em que os
sujeitos pesquisados participaram.
No capítulo 5 - Discussão dos resultados. Pretendeu-se neste capítulo
evidenciar os processos de produção de sentidos e compreensão leitora, de cada um dos
alunos pesquisados à luz do aporte teórico sobre produção de inferências.
Por fim apresentou-se as considerações finais com algumas discussões
pertinentes aos resultados de pesquisa e a formação do leitor proficiente.
17
CAPÍTULO 1
1. LEITURA: CAMPO DE INVESTIGAÇÃO, CONCEPÇÕES,
PROCESSOS INFERENCIAIS E PRODUÇÕES DE
SENTIDOS
A leitura é também co-produção do texto, uma atividade orientada por
este, mas que lhe ultrapassa.... É preciso ultrapassar o já sabido e
reconhecido para construir uma compreensão do que se lê (do que se
ouve)” (GERALDI, 2010, p.103).
1.1. Campo de investigação.
Ao olhar para o ato de ler como objeto de investigação, constata-se que se está
diante de um objeto multifacetado e de difícil apreensão. Com o intuito de compreender
algumas de suas principais facetas, optou-se por traçar um histórico sucinto de sua origem,
enquanto objeto de pesquisa no Brasil. Para isso, recorreu-se ao contexto da produção de
pesquisa sobre leitura identificado por Ferreira2
(2002).
Segundo a autora, foi na década de 1960, mais precisamente em 1965, que
foram regulamentados os primeiros programas de pós-graduação (mestrado e doutorado)
no Brasil, e a temática leitura emerge pela primeira vez enquanto produção acadêmica
através da tese: Significado de alguns fatores psicológicos no rendimento em leitura, da
pesquisadora Maria José Aguirre, apresentada em concurso de livre-docência à cadeira de
Psicologia Educacional da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, em 1965. Esta
pesquisa, segundo Ferreira (1999), caracteriza-se como:
O primeiro esforço no delineamento da Leitura enquanto área específica
de reflexão e pesquisa, desvinculada da problemática maior do ensino de
Língua Portuguesa ou da área de Alfabetização. A pioneira e solitária
pesquisadora localizada em minha busca é Aguirre (1965), que, no
instituto de Psicologia da USP, apresenta sua tese de livre-docência
intitulada “Significado de alguns fatores psicológicos no rendimento em
leitura”. Trata-se de um trabalho preocupado em estudar o problema do
rendimento da leitura em alguns alunos de escola primária, tanto em
relação ao aspecto de deficiência quanto em relação aos rendimentos
médios e superiores de leitura. (FERRERIRA, 1999, p.43-44). .
2 Artigo: Contribuições para a escrita da história da produção acadêmica sobre Leitura, no Brasil –
1965 a 1979 – apresentado no GT sobre Alfabetização, Leitura e Escrita (2002). Informações
obtidas em https://www.fe.unicamp.br/alle/textos/NSAF-ContribuicoesEscrita.pdf.
18
É pertinente ressaltar que, a partir da segunda metade da década de 60 do século
XX, a leitura, enquanto objeto de investigação, está atrelada às discussões do campo da
Psicologia e, com enfoque, no rendimento dos alunos da escola primária; temática a qual
permanece atual. É fato também que a política pública de educação brasileira vem, desde a
última década do século XX, apoiando práticas de avaliações externas tendo assumido,
como principal objetivo, levantar indicadores sobre o sistema educacional brasileiro.
Exemplo notório é o da Provinha Brasil – instrumento de avaliação de leitura e
matemática, vinculado ao Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – Saeb,
implementada pelo MEC em 19903.
Neste sentido, é possível constatar que o levantamento dos índices de
rendimento baixos, médios e superiores de leitura demonstra uma preocupação em
mensurar e definir padrões do que sejam bons leitores, através de instrumentos criados por
várias instâncias de poder, sejam elas governamentais e legitimadas por pesquisas
científicas.
Tema recorrente na educação escolar, sobretudo nos primeiros anos do ensino
fundamental, fase em que a criança aprende a ler e a escrever. Nesse processo são
detectados os fracassos com relação à aquisição da leitura e da escrita. Com o intuito de
explicar os problemas na aprendizagem da leitura, muitos foram os culpabilizados: em
alguns casos, o método de ensino, em outros, o próprio aluno, o material didático, assim
como a cartilha, entre outros.
Com relação à leitura, enquanto campo de investigação, verificou-se que
Aguirre (1965) inaugura a pesquisa sobre este objeto de estudos, e o Instituto de Psicologia
da USP constitui-se como o lugar de origem de construção teórica. Contudo, nos anos
subsequentes, a “leitura ganha status, ampliando seu campo de atuação e incorporando os
estudos da Psicolinguística, Sociolinguística, Teoria da Literatura e Pedagogia, entre as
áreas mais consolidadas”. (FERREIRA, 1999, p.44).
Na sua tese de doutorado, Ferreira (1999) define que no 3º período de sua
pesquisa, que englobam os anos de 1991 a 1995, a maior parte das pesquisas sobre leitura
têm como lugares de produção as faculdades e institutos de Educação, Letras e Linguística,
e, caracterizam-se por uma diversidade de abordagens teóricas, metodológicas e interfaces
com outras áreas.
3 http://portal.inep.gov.br/web/provinha-brasil/historico.
19
O foco que mais emerge na maioria dos trabalhos pesquisados é sobre
compreensão/ desempenho em leitura, sendo a temática mais constante em todo o período
estudado. Acerca dessas pesquisas, Ferreira (1999) assevera:
Os resumos que interrogam, estudam, descrevem o processo de
compreensão e desempenho em leitura sob a perspectiva do leitor,
preocupando-se com a concepção que o indivíduo tem sobre a
compreensão, ou com a maneira pela qual a compreensão se dá, se
processa, ou, ainda na identificação das habilidades, competência, níveis
de leitura. (FERREIRA, 1999, p.79)
Desta forma, a maioria dos estudos posteriores ao de Aguirre (1965), embora oriundos
de outros lugares de produção, além dos programas de pós-graduação em Psicologia, têm como
temática predominante a compreensão/desempenho em leitura. São pesquisas de caráter
quantitativo, com ênfase em descrição de experimentos e eficácia de técnicas, assim nos assegura
Ferreira (1999):
No foco compreensão/desempenho em leitura, o que se vê de modo mais
geral e ao longo de todo período (80-95) é a predominância das pesquisas
experimentais, que descrevem e analisam experimentos verificando a
eficácia de técnicas sob condições controláveis e com introdução de uma
ou mais variáveis, cujo controle é feito através de testes ou questionários
aplicados aos sujeitos, distribuídos em vários momentos ou etapas: “pré-
teste, treino e pós- treino”; “grupo de controle e não controle”.
(FERREIRA, 1999, p.81).
A autora apresenta em sua tese todas as temáticas das pesquisas desenvolvidas
sobre leitura e suas interfaces, considerando o período pesquisado pela mesma. Além das já
abordadas, são elas: proposta didática e análise do ensino de leitura; leitores-preferências,
gostos, hábitos, histórias e representações: o caso do professor/ bibliotecário como leitor;
texto de leitura usado na escola; memória da leitura, do leitor e do livro; concepção de
leitura. Estas informações propiciam obter uma primeira noção sobre as pesquisas
desenvolvidas sobre leitura em cursos de pós-graduação, na segunda metade do século XX,
as quais garantem uma visibilidade da formação do campo desta temática no Brasil e seus
lugares de produção.
Dando continuidade às pesquisas sobre o “estado da arte” em leitura, iniciadas
por Ferreira (1999) e Martins (2005), Penido (2010), em sua pesquisa, avança no tempo
cronológico e traça um panorama das pesquisas sobre leitura no Brasil, entre os anos de
2000 a 2005. A autora, com o intuito de contribuir com a ampliação do campo de pesquisa,
busca, além de dar visibilidade às principais produções do período citado, verificar a
20
ampliação das produções dessa temática no período circunscrito.
Com relação à cronologia das produções, e em termos numéricos, Penido
(2010) verifica um total de 596 pesquisas entre os anos de 2001 a 2005, um número bem
significativo comparado à produção entre 1980 a 1995, que segundo Ferreira (1999) totaliza
189 pesquisas entre teses e dissertações. Dentre os resumos pesquisados por Penido (2010),
a maioria das pesquisas concentra-se nas áreas de Letras/Linguística e Educação,
considerando os aspectos de compreensibilidade a partir dos materiais estudados, do seu
ensino, das memórias de leitura, dos livros, dos leitores.
Os aspectos citados acima, foram muito bem levantados em sua pesquisa. Em
contrapartida, temáticas como: alfabetização, letramento e literatura não foram abordadas.
Nesse estudo, a autora concluiu que:
É interessante destacar que, ao realizarmos uma análise mais detalhada
nos resumos encontrados, notaremos que a maioria das teses e dissertações
analisadas trazem propostas que focam o trabalho dos professores com
leitura dentro das salas de aula, indicando que os educadores estão cada
vez mais se conscientizando acerca da importância e dos benefícios da
realização de atividades de leitura junto aos estudantes, e que muitas vezes
esses trabalhos são oriundos de relatos de sua própria prática dentro das
escolas brasileiras. (PENIDO, 2010, p.49).
Portanto, é possível afirmar que a maior parte das pesquisas no Brasil, no início
do século XXI, produzidas nos cursos de pós-graduação, tem como foco a leitura na sala de
aula; no entanto, não há dados que comprovem se essa é uma tendência atual nas pesquisas
– ainda que seja possível considerar que a leitura em sala de aula é uma temática muito
recorrente, sendo muitos os trabalhos que se preocupam em investigar esse campo e suas
interfaces.
O Grupo ALLE – Alfabetização, Leitura e Escrita – pertencente à Faculdade de
Educação da Unicamp, tem sido responsável por uma produção de trabalhos, entre
dissertações e teses, muito significativos, sobre a temática leitura e suas mais variadas
dimensões, tais como: o “Estado da Arte”, formação de leitores, biblioteca escolar,
construções das relações entre leitores e livros, ler por prazer, memórias de leituras, práticas
de leituras em diversos espaços, dentre outros temas (Ferreira, 1999; Marcelino, 2003;
Klébis, 2006; Sampaio, 2008; Aliaga, 2013; Carvalho, 2015, entre outros).
Por volta dos anos 90, como parte do ALLE, foi criado o grupo de estudos
denominado Grupo do Afeto, sob a coordenação de Leite (2006), reunindo pesquisas e
21
discussões teóricas e metodológicas sobre a questão da constituição do sujeito leitor. Entre
outras temáticas também pesquisadas pelo grupo, as que abordam a temática da formação
do leitor tendo em vistas os processos de mediação, envolvem os trabalhos Grotta, (2000),
Silva, (2005), Souza, (2005) e Higa, (2007 e 2015).
Neste sentido, ao se debruçar sobre a última década, é possível afirmar,
considerando algumas das pesquisas desenvolvidas no Grupo de Pesquisas ALLE e o
subgrupo deste, o Grupo do Afeto, ambos sediados na Faculdade de Educação da Unicamp,
que existe um crescente interesse pelas pesquisas que abordam a leitura como objeto de
investigação.
Em uma busca superficial , não foram encontrados indícios sobre o
desenvolvimento desta temática em termos de regiões brasileiras, como visto nas pesquisas
de Ferreira (1999) e Penido (2010) No entanto, o crescente interesse pela leitura deve-se,
entre outros fatores, ao fato de ser um assunto recorrente em várias instâncias da sociedade
e debatido de forma exaustiva em congressos nacionais, como o COLE, por exemplo,
criado nos anos finais da década de 70 por pesquisadores da leitura, com o intuito de
discutir uma suposta crise de leitura no país e suas possibilidades de mudança; no interior
deste nasce a ALB – Associação de Leitura do Brasil: ambos, congresso e associação,
surgiram com determinados objetivos e empreenderam várias transformações na leitura no
cenário nacional atual4.
Um outro fator que parece ser um indício explicativo sobre a permanência e
recrudescimento das discussões e pesquisas sobre leitura, seria a necessidade de pensar e
repensar os resultados obtidos nas avaliações internas e externas, que têm demonstrado
índices muito baixos com relação à compreensão leitora. Um instrumento que tem sido
referência sobre os níveis de aprendizagem de leitura dos adolescentes brasileiros é o PISA
cujo objetivo é produzir indicadores que contribuam para a discussão da qualidade da
educação nos países participantes, de modo a subsidiar políticas de melhoria do ensino
básico. A avaliação procura verificar se as escolas de cada país participante estão
preparando seus jovens para exercer o papel de cidadãos na sociedade contemporânea5.
A periodicidade das avaliações ocorrem de três em três anos. As avaliações
abrangem as áreas de leitura, matemática e ciências; em 2000 e 2009, o foco foi em leitura.
Segundo o relatório de 2009, o marco referencial do Pisa é o conceito de letramento, que,
segundo o documento, é a capacidade de um indivíduo entender, empregar e refletir sobre
4 Disponível em: http://alb.com.br/alb/apresentacao. Acesso em: 25 de junho de 2016. 5 Disponível em: http://portal.inep.gov.br/pisa/sobre-o-pisa. Acesso em: 25 de junho de 2016.
22
textos escritos, para alcançar objetivos, desenvolver conhecimentos e participar da
sociedade6.
Segundo o relatório do PISA de 2009, os alunos que apresentaram maior
desempenho em leitura são os que demonstraram ter desenvolvido o prazer pela
leitura; considerando esse indício, é feita uma recomendação para que práticas de leitura,
que visam ao prazer e a fruição, sejam incentivadas nas escolas.
O PISA possui sete níveis de proficiência em leitura. Embora tenha
demonstrado um avanço no níveis, entre 2000 e 2009, no ranking mundial, o Brasil
encontra-se com a maior porcentagem nos nível 1a (28,6 %) em comparação com a OCDE
(Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico) que apresenta uma
porcentagem bem menor nesse mesmo nível (13,1%). As características das atividades de
proficiência leitora são:
Atividades neste nível requerem que o leitor localize um ou mais blocos
de informações explícitas, para identificar o tema central da proposta de
um autor em um texto de natureza familiar ou realizar uma conexão
simples entre uma informação do texto e o conhecimento cotidiano. A
informação requerida é evidente no texto, com pouca informação
competindo com ela. O leitor é dirigido para considerar informações
relevantes no texto e na atividade. (PISA, 2012, p.28).
Nessa avaliação de leitura, de 2009, os estudantes que participaram da prova
apresentaram 0,1% nas atividades de nível seis. Segundo os critérios de avaliação em
leitura e letramento:
Atividades neste nível requerem que o leitor realize múltiplas inferências,
comparações e contrastes com precisão e detalhamento. Elas requerem
que se demonstre uma compreensão completa e detalhada de um ou mais
textos que podem envolver integração de informação entre eles.
Atividades que requerem que o leitor lide com ideias desconhecidas, na
presença de informações concorrentes, e gere categorias abstratas de
interpretação. As atividades de refletir e avaliar requerem que o leitor
delineie hipóteses ou que avalie de forma crítica um texto complexo ou um
tópico desconhecido, levando em consideração múltiplos critérios e
perspectivas, e aplicando interpretações sofisticadas para além do texto.
Uma condição presente para exercícios de Acessar e Recuperar neste nível
é a precisão de análise e atenção refinada para encontrar detalhes pouco
perceptíveis nos textos. (PISA, 2012, p.29).
6 Disponível em: http://download.inep.gov.br/acoes_internacionais/pisa/resultados/2009/brasil_relatorio_nacional_PISA_2009.p df. Acesso em: 30 de junho de 2016.
23
Ao tecer uma análise preliminar e superficial sobre as informações expostas, é
possível afirmar que o leitor adolescente brasileiro compreende o que está explícito no
texto, entende somente o que é familiar e faz conexões simples com o conhecimento
cotidiano. Desta forma, torna-se necessário identificar quais são os motivos que contribuem
para uma compreensão limitada acerca do texto e a pouca interação com o mesmo. Esta é
uma temática importante a ser investigada.
Outro ponto a ser retomado é sobre o foco sobre a compreensão leitora, ou
questões atreladas a ela, tais como: níveis de compreensão e rendimento em leitura. Essa
temática é recorrente nas pesquisas em leitura no Brasil, considerando a primeira pesquisa
de Aguirre (1965) e as discussões atuais. Para ampliar essa reflexão, é necessário articular
estas a temáticas como concepções de leitura, formação do sujeito leitor, escolarização da
leitura, sobretudo a literária, para se traçar um panorama sobre o que seria um leitor
competente. E que, segundo o relatório do PISA sobre a avaliação de 2009, é aquele capaz
de realizar múltiplas inferências.
1.2. Concepções
Diante dos aspectos elencados, torna-se importante refletir como os discursos
sobre este objeto – a leitura - foram constituindo-se no decorrer do tempo e ganhando
legitimidade. Vóvio (2007; 2010) define que os discursos sobre leitura estão entre a
unidade e a multiplicidade.
A leitura, compreendida como unidade, caracteriza-se por uma única concepção
autorizada e legítima do ato de ler, por acreditar que este ato possui um poder
transformador da sociedade; o enfoque se dá no tipo de material, em geral, dado a ler: a
valorização de obras literárias consideradas canônicas. Assim, o importante é apropriar-se
das grandes referências clássicas e considerar os outros tipos de textos: menores, pois é
preciso garantir o status de uma prática de difícil acesso, justificada pelo seu caráter
altamente intelectual. Além disso, o enfoque também recai sobre a frequência com que se
lê, a valorização do hábito, do consumo, do domínio das normas e as competências
necessárias para o que determina a compreensão correta do texto lido.
Esta concepção de leitura entende que há uma única interpretação textual, com
ênfase na homogeneização do sentido que o texto deve imprimir no leitor; “e a
pressuposição de uma relação direta entre o texto e uma recepção determinada mais pelo
objeto do que pelo leitor” (VÓVIO, 2007, P.67). Desta forma, a ideia da leitura como
24
unidade foi legitimada por uma série de pesquisas que visavam detectar os problemas
relacionados à aquisição da leitura, sobretudo no espaço escolar, com incentivo às
dicotomias entre bom/mau leitor, leitores competentes/ incompetentes, com incentivo à
criação e implementação de políticas de avaliação de competências leitoras, já abordado
anteriormente neste trabalho. Sobre essa questão, Vóvio (2007) assevera que:
Consoante com o enfoque centrado na unidade, também se encontram
pesquisas desenvolvidas nas décadas de 1960 e 1970 voltadas a
demonstrar que a escolarização, a aquisição da linguagem escrita e o
acesso à leitura seriam sinônimos de progresso social e, no âmbito
individual, seriam responsáveis pelo desenvolvimento cognitivo e pela
aquisição de habilidades e conhecimentos necessários para adequar-se as
sociedades modernas. (VÓVIO, 2007, p.67)
Com relação às implicações dessa concepção de leitura, constituiu-se um ideal
de leitor padronizado, o qual deve atingir certos padrões normativos legitimados e
divulgados por lugares institucionalizados, como a escola, entre outros, os quais visam
educar por meio de conhecimentos que competem à construção e à participação em uma
sociedade moderna. Neste sentido, a leitura, sob uma perspectiva homogeneizadora, elitista,
pautada por critérios que definem práticas de leitura melhores e piores, textos apropriados
ou não, que focam somente no texto e não no contexto, no qual o leitor está inserido,
permitem que os próprios educadores desavisados assumam que há categorias de leitores e
legitimem essa ideia como verdade, tornando-a tradição inconteste. É o que explicita Abreu
(2007):
Aquilo que os discursos convencionais sobre leitura ensinam – até mesmo
para os professores – é que há leitores de segunda categoria, assim como
há cidadãos de segunda categoria: aqueles que não falam a língua da
escola e não leem os livros que a escola gostaria que lessem. “Esquece-se”
de que a leitura não é uma prática neutra, que no contato de um leitor com
o texto (assim como de um autor com o texto) estão envolvidas questões
culturais, políticas, históricas e sociais, “Esquece-se” de que as diferentes
leituras revelam diferentes modos de inserção nas formas da cultura e são
condicionadas por eles. (ABREU, 2001, p.156).
O discurso da ausência de uma cultura letrada no Brasil está presente ao se
comparar a história da leitura no Brasil, com a história da leitura europeia. Abreu (2001)
aponta que, através dos relatos dos viajantes no Brasil Colônia, os quais denunciavam
precárias condições de vida intelectual e ausência de escolas nesse período, foi possível a
construção da ideia de ausência, da falta de uma cultura letrada, por escritores da época, ao
25
compararem a produção iconográfica europeia que apresentava as representações do que
seriam práticas de leitura legítimas, associando-as à ideia de conforto, intimidade do lar,
tranquilidade, prazer, em oposição aos “comentários pejorativos sobre a cultura letrada
local incorporaram-se ao senso comum, não requerendo mais qualquer tipo de
comprovação”. (ABREU, 2001p.141).
Desvelar o processo de leitura perpassada pelo discurso da unidade permite
compreender a construção e promoção de ideais que distinguem, definem e delimitam
práticas de leitura, materiais, modos e modelos de ler padronizados, considerados
referências, disseminados sobretudo pela escola. Sobre as referências europeias de como se
ler e as suas implicações na constituição de um discurso pedagógico no Brasil, Abreu
(2001) enfatiza:
“É em cenas semelhantes às europeias que se pensa, quando se discutem
as práticas de leitura a serem promovidas no Brasil contemporâneo. Uma
vez que elas parecem pouco frequentes – ou menos frequentes do que se
gostaria
– mantém-se o discurso da ausência da leitura, como parte central da ideia
de uma carência cultural brasileira. Esta premissa é particularmente
importante no discurso pedagógico que insiste no desinteresse dos alunos
pela leitura e nas dificuldades aí decorrentes.” (ABREU, 2001, p.148).
Em contrapartida a um enfoque da leitura apoiado no discurso da unidade, surge
o discurso sob o estatuto da diversidade, ancorado nos estudos e pesquisas
multiculturalistas, etnográficas, desenvolvidos pelas áreas da Antropologia, Ciências
Sociais e História Cultural. No entanto, cabe ressaltar que este paradigma, ao questionar o
ideal de unicidade do ato de ler, trouxe uma nova problemática, ao defender a pluralidade
pautada numa suposta neutralidade, por dar ênfase ao relativismo cultural. Neste sentido,
Vóvio (2007) alerta sobre os riscos ao se assumir uma concepção relativista com relação a
este ato tão complexo:
De um lado, a abordagem relativista tem como mérito o princípio ético e
metodológico do reconhecimento da diversidade, validação de diferentes
manifestações culturais e da contestação a padrões hegemônicos e da,
como já foi dito afirmação de vozes e discursos apagados ou
desconhecidos. O reconhecimento da diversidade acarreta ainda a
desnaturalização da perspectiva elitista, o que resulta fundamental para os
processos reivindicatórios que se originam no seio de grupos subalternos
ou em condição de desvantagem social. Por outro lado, se operada sob o
estatuto da neutralidade, atenua as desigualdades, obscurece o conjunto de
exigências em relação aos padrões de cultura escrita que colaboram para
exercício da cidadania em sociedades letradas. O processo de
26
neutralização da ordem simbólica e das hierarquias sociais reveste-se de
uma intenção democrática que tem como consequência a imobilidade.
(VÓVIO, 2007, p.76).
Tal posicionamento relativista pode incorrer na implantação de ações
compensatórias na área educacional, ao substituir um padrão de leitura e leitores por outro,
sem o devido questionamento das relações de poder e jogos simbólicos que as constituíram.
Não basta valorizar práticas de leitura consideradas inferiores, ou oriundas de matrizes de
culturas populares, como tentativa de subverter uma ordem de valorização cultural em uma
dada sociedade, em que imperam outros tipos de relações, sobretudo de poder.
Portanto, nem uma concepção ancorada em uma abordagem hegemônica sobre
os modos de ler, os materiais, o domínio da norma culta e competências para a
compreensão textual, e tampouco uma concepção plural do ato de ler, mas que assume o
relativismo cultural, como forma de resolução da questão da valorização das produções
escritas de outros grupos sem visibilidade social: ambas posições apresentam limites nas
definições sobre o ato de ler.
Quanto à dinâmica de compreensão textual, pautadas em uma visão da leitura
enquanto unidade, definidas por regras rígidas de linguagem, de compreensão única,
desconectada de um lugar e um contexto social e histórico, Chartier (2002) tece uma crítica
a respeito dessa visão limitada, e extremamente objetivista dessa relação, demonstrando o
quão fragmentada ela pode ser:
Aplicada à teoria da leitura, esta perspectiva leva a observar quão
insatisfatórias são as abordagens que consideram o acto de ler como uma
relação transparente entre o texto - apresentado como uma abstracão,
reduzido ao seu conteúdo semântico, como se existisse fora dos objectos
que o oferecem a decifração - e o leitor - também ele abstracto, como se
as práticas através das quais ele se apropria do texto não fossem histórica e
socialmente variáveis. Os textos não são depositados nos objectos,
manuscritos ou impressos, que o suportam como em receptáculos, e não se
inscrevem no leitor como o fariam em cera mole. (CHARTIER, 2002,
p.25)
Em contrapartida, é através de uma concepção de leitura que esteja vinculada às
articulações entre práticas políticas, sociais, discursivas que compõem o mundo social e
construídas historicamente, que se torna possível ampliar as possibilidades de compreensão
da complexidade do ato de ler; pois inserido em uma dinâmica de tempo, espaço,
representações sociais, caracteriza-se pela ênfase nos processos, nos jogos simbólicos, nas
relações interativas que definem a diversidade de compreensões resultantes da apropriação
27
entre o leitor e o material escrito. Sobre a questão da apropriação, Chartier (2002) discorre:
Pensar deste modo as apropriações culturais permite também que não se
considerem totalmente eficazes e radicalmente aculturante os textos ou as
palavras que pretendem moldar os pensamentos e as condutas. As práticas
que deles se apoderam são sempre criadoras de usos ou de representações
que não são de forma alguma redutíveis a vontade dos produtores de
discursos e de normas. O acto de leitura não pode de maneira nenhuma ser
anulado no próprio texto, nem os comportamentos vividos nas interdições
e nos preceitos que pretendem reguiá-los. (CHARTIER, 2002, p.136).
Portanto, entende-se o ato de ler como uma prática criadora, sendo que o
processo de compreensão ocorre na relação do sujeito com o objeto cultural escrito,
inserido em um determinado contexto social, histórico, político, econômico e cultural. Por
ser uma atividade criadora, tem um caráter subjetivo, de difícil apreensão Ao considerar que
tal ato é construído na interação entre o texto e seus leitores, Certeau (2004) defende que:
O texto só tem sentido graças a seus leitores; muda com eles; ordena-se
conforme códigos de percepção que lhe escapam. Torna-se texto somente
na relação à exterioridade do leitor, por um jogo de implicações e de
astúcias entre duas espécies de “expectativa” combinadas: a que organiza
um espaço legível (uma literalidade) e a que organiza uma démarche
necessária para a efetuação da obra (uma leitura). (CERTEAU, 2004, p.
266).
A compreensão de um texto, de um enunciado, é um ato linguístico complexo.
Ao olhar para o fenômeno da linguagem, Bakhtin/Volochínov (2012) elenca duas principais
orientações do pensamento filosófico-linguístico, as quais buscam explicar a linguagem
enquanto objeto de reflexão e estudo. No entanto, em sua descrição dessas duas orientações,
o autor descreve a incompletude de ambas. A primeira delas, denominada, subjetivismo
idealista:
A primeira tendência interessa-se pelo ato da fala da criação individual,
como fundamento da língua (no sentido de toda atividade de linguagem
sem exceção). O psiquismo individual constitui a fonte da língua. As leis
da criação linguística – sendo a língua uma evolução ininterrupta, uma
criação contínua – são as leis da psicologia individual, e são elas que
devem ser estudadas pelo linguista e pelo filósofo da linguagem. Esclarece
que o fenômeno linguístico significa reduzi-lo a um ato significativo (por
vezes mesmo racional) de criação individual.
(BAKHTIN/VOVLOCHÍNOV, 2012, p.74).
Analisar o fenômeno da linguagem sob a perspectiva do subjetivismo idealista é
28
assumir uma condição monológica dos atos da fala e dos processos de enunciação, ao dar
ênfase somente a um dos componentes presentes no ato da linguagem, ou seja, o receptor. É
considerar que a criação individual determina todo ato linguístico, desconsiderando os
contextos sociais e de produção da linguagem. Essa orientação assevera que o indivíduo
tem pleno poder de criar e recriar expressões linguísticas. Ao considerar o processo de
compreensão textual, à luz dessa orientação, o texto, enquanto enunciado, é visto como uma
representação do pensamento do autor que o produziu, e cabe ao leitor/ouvinte, através da
sua capacidade intelectual, do seu psiquismo individual, dar sentido ao enunciado com base
na suas capacidades psicológicas, um movimento do interior do indivíduo para seu exterior.
Portanto, não há interação: a atividade de linguagem fica restrita a um único
fator que compõe a linguagem, e o diálogo entre o eu, o outro e o meio enquanto
componente imprescindível na composição do discurso é desconsiderado, segundo a crítica
feita por Bakhtin/Volochínov (2012).
A segunda orientação sobre o pensamento filosófico-linguístico, é o objetivismo
abstrato: “é preciso procurar as raízes desta orientação no racionalismo dos séculos XVII
e XVIII. Tais raízes mergulham no solo fértil do cartesianismo”
(BAKHTIN/VOLOHÍNOV, 2012, p.85). Neste sentido, esta tendência tem como foco o
domínio do sistema linguístico sobre o sujeito. Bakhtin/ Volochínov (2012) explicita os
principais aspectos desta vertente ao comparar com a tendência anterior, já evidenciada
anteriormente:
Segundo esta tendência, o centro organizador de todos os fatos da língua, o
que faz dela o objeto de uma ciência bem-definida, situa-se, ao contrário,
no sistema linguístico, a saber o sistema das formas fonéticas, gramaticais
e lexicais da língua. Enquanto que, para a primeira orientação, a língua
constitui um fluxo ininterrupto dos atos de fala, onde nada permanece
estável, nada conserva sua identidade, para a segunda orientação a língua é
um arco-íris imóvel que domina este fluxo. Cada enunciação, cada ato de
criação individual é único e não reiterável, mas em cada enunciação
encontram-se elementos idênticos aos de outras enunciações no seio de
um determinado grupo de locutores. São justamente estes traços idênticos,
que são assim normativos para todas as enunciações – traços fonéticos,
gramaticais e lexicais - que garantem a unicidade de uma língua e sua
compreensão por todos os locutores de uma mesma comunidade.
(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.79).
A concepção de linguagem assumida pelo objetivismo abstrato entende a língua
composta por regras gramaticais, e o sistema linguístico definido por um conceito estático e
formalista, que não leva em consideração os sujeitos no momento da enunciação. Dessa
29
forma, há somente um aspecto do desenvolvimento da linguagem e da comunicação que é
considerado em detrimento do processo da relação entre os interlocutores e o contexto de
produção de enunciados.
Nesta perspectiva, o texto enquanto componente de uma atividade comunicativa
é considerado um produto acabado, composto por sentidos determinados e delimitados,
sendo o ato de compreensão a retirada desses sentidos e ou ideias encontrados no texto. Tal
perspectiva torna a compreensão textual fragmentada e reducionista, pois não prevê uma
prática de leitura que valorize os aspectos extralinguísticos; além disso, a relação entre
autor, texto e leitor é passiva.
Ao discutir o problema da linguagem enquanto objeto científico,
Bakhtin/Volochínov (2012) questiona as duas orientações, pelo caráter incompleto de
ambas, já que a primeira foca no indivíduo, como elemento primordial para o
desenvolvimento da linguagem, e a segunda, no sistema linguístico. Ao se considerar, no
ato de compreensão textual, somente o texto, como elemento principal, incorre-se no
erro de estabelecer uma relação passiva entre autor e leitor, através do texto.
Bakhtin/Volochínov (2012) define a compreensão nesta perspectiva:
A compreensão passiva caracteriza-se justamente por uma nítida
percepção do componente normativo do signo linguístico, isto é, pela
percepção do signo como objeto-sinal: correlativamente, o
reconhecimento predomina sobre a compreensão.
(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.102).
Ao se tomar o texto enunciado, como ato de fala impresso e de natureza social,
o processo de compreensão necessariamente adquire um caráter interativo e cooperativo,
pois o processo de significação ocorre dentro de um contexto. Neste sentido, retomemos as
palavras de Bakhtin/Volochínov (2012):
O livro, isto é, o ato da fala impresso, constitui igualmente um elemento
da comunicação verbal. Ele é objeto de discussões ativas sob a forma de
diálogo e, além disso, é feito para ser apreendido de maneira ativa, para
ser estudado a fundo, comentado e criticado no quadro do discurso
interior, sem contar as reações impressas, institucionalizadas, que se
encontram nas diferentes esferas da comunicação verbal (críticas,
resenhas, que exercem influência sobre os trabalhos posteriores, etc).
(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.127).
Cabe ressaltar que, embora tenha sido citado o exemplo do livro, como objeto a
ser compreendido como elemento da comunicação verbal, do diálogo entre dois polos da
30
comunicação, em uma perspectiva interativa, nesta pesquisa foram utilizados textos
narrativos populares e lendas do universo cultural brasileiro, sistematizados por
antropólogos, etnógrafos, folcloristas, dentre outros pesquisadores, e organizados por uma
autora, em formato de um livro. Portanto, os textos integram um livro, que não possui uma
única narrativa do início ao fim, mas várias narrativas com elementos e conteúdos diversos.
Estas questões serão tratadas com mais ênfase nos capítulos subsequentes.
Entende-se aqui o texto como o ato da fala impresso, elemento da comunicação
verbal, o qual deve ser apreendido de forma ativa, de maneira que o leitor aproprie-se dos
enunciados produzidos pelo autor e desenvolva um discurso interior e exterior, imbricado
com as situações extralinguísticas construídas a partir de seus conhecimentos históricos
sociais e as condições contextuais, no momento de leitura, capazes de gerar enunciados
através do diálogo com o texto lido, através da interação verbal.
O processo de compreensão surge da interação entre autor, leitor, a partir do
texto. A () posição do leitor nessa relação, considerando a perspectiva dialógica, é de
ouvinte ativo, seja de um texto falado, ou escrito, posição caracterizada por Bakhtin (2011)
como uma ativa posição responsiva:
... O ouvinte, ao perceber e compreender o significado (linguístico) do
discurso, ocupa simultaneamente em relação a ele uma ativa posição
responsiva: concorda ou discorda dele (total ou parcialmente) , completa-
o, aplica-o, prepara-se para usá-lo, etc; essa posição responsiva do ouvinte
se forma ao longo de todo o processo de audição e compreensão desde o
seu início, às vezes literalmente a partir da primeira palavra do falante.
(BAKHTIN, 2011, p.271).
Portanto, a compreensão ocorre na relação dialógica entre a palavra emitida
pelo autor, através do texto escrito. No caso desta pesquisa, que trata da compreensão de
textos narrativos, a compreensão ocorre em sua relação com as respostas ativas produzidas
pelo leitor, considerando seus conhecimentos sociocognitivos e o contexto em que se dá o
processo de leitura, relação em que “qualquer tipo genuíno de compreensão deve ser ativo,
deve conter já o germe de uma resposta” (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.136).
Ao analisar a compreensão leitora, das crianças no final do ciclo I – 3ºano, a
partir das suas inferências sobre textos lidos, procurou-se evidenciar as ressignificações dos
textos promovidas pelas crianças no processo de compreensão, a produção de réplicas
ativas – comentários, tecidos a partir de posturas ativas diante dos enunciados dos autores
das narrativas. Com relação a este conceito abrangente de compreensão, Bakhtin (2012)
assevera:
31
Compreender a enunciação de outrem significa orientar-se em relação a
ela, encontrar o seu lugar adequado no contexto correspondente. A cada
palavra da enunciação que estamos em processo de compreender,
fazemos corresponder uma série de palavras nossas, formando uma
réplica. Quanto mais numerosas e substanciais forem, mas profunda e real
é a nossa compreensão. (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.137).
Desta forma, a qualidade da compreensão textual está atrelada à capacidade de
dar respostas aos enunciados do texto lido, através das palavras produzidas pelo leitor, em
uma relação responsiva ativa, formulando réplicas: “A compreensão é uma forma de
diálogo; ela está para a enunciação assim como uma réplica está para a outra no diálogo”
(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.137).
Como contribuição aos conceitos bakhtinianos, sobre compreensão e
significação, Geraldi (2010) amplia as discussões sobre o ato de ler/compreender, produzir
significados, ao defender a ideia de que:
Ler não é apenas reconhecer o signo com suas significações do passado.
Ler é construir uma compreensão no presente com significações que,
entranhadas nas palavras, são dissolvidas pelo seu novo contexto – que
incluem também as contrapalavras do leitor – para permitir a emergência
de um sentido concreto, específico e único, produto da leitura que está
realizando. (GERALDI, 2010, p.103).
Neste sentido, ler e “compreender é opor a palavra do locutor uma contrapalavra”
(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.137). E o que os dados desta pesquisa demonstram
são a construção de contrapalavras, de réplicas ativas, de alunos, crianças na faixa etária
dos 8 a 9 anos, que têm muito a dizer sobre suas experiências leitoras, produzem atitudes
responsivas ao serem convidadas a ler textos sobre a cultura popular brasileira,
direcionados à crianças.
Para analisar os comentários elaborados pelos alunos do 3º ano do ciclo I, em
situação de leitura e produção de comentários sobre os textos, serão utilizadas as categorias
definidas por Marcuschi (1985; 2007; 2008; 2011), ênfase nos processos inferenciais de
leitura, de base sociocognitiva. Também será discutida, de forma sucinta, a noção de
inferência (COSCARELLI, 2003), considerando seus principais aspectos em consonância
com a compreensão leitora e alguns referenciais teóricos.
1.3. Inferências: algumas considerações.
Segundo Coscarelli (2003), “as inferências podem ser de muitos tipos, podem
32
ser feitas em diferentes momentos da leitura e são feitas levando-se em consideração
elementos do texto e do contexto, além de conhecimentos prévios do leitor”
(COSCARELLI, 2003, p.01). Além disso, a autora destaca que, no processo de produção de
inferências, devem ser considerados dois elementos importantes para que elas ocorram:
fontes de informação usadas na compreensão e a teoria dos esquemas.
Com relação aos elementos textuais, estes são imprescindíveis para o processo
de compreensão textual, pois ajudam o leitor estabelecer coerência e coesão de ideias, entre
partes do texto, considerando elementos formais da língua; no entanto, esses elementos não
são suficientes para a construção de sentidos a partir da leitura, pois para que ocorra a
compreensão efetiva na relação com o texto escrito, deve-se considerar a interlocução com
elementos extralinguísticos.
Com relação ao processo de compreensão textual, Coscarelli (2003) aponta a
importância da teoria dos esquemas, a qual pressupõe que as vivências culturais, sociais e
os conhecimentos adquiridos estão registrados na memória de longo prazo do indivíduo, e
são representadas através de esquemas mentais, acionados em determinadas situações,
inclusive nas quais é necessária a produção de inferências ao ler um texto escrito. Sobre a
teoria dos esquemas, a autora afiança que:
A teoria dos esquemas versa sobre como o conhecimento é representado e
sobre como essa representação facilita o uso do conhecimento. De acordo
com ela, o conhecimento é organizado em unidades que trazem, além do
conhecimento em si, informações sobre como ele deverá ser usado. Essa
teoria trabalha com a ideia de significados prototípicos, ou seja, os
significados são guardados como situações típicas ou eventos que
exemplificam determinado conceito. Um esquema, portanto, é uma estrutura
de dados que representa os conceitos armazenados na memória e contém
uma rede de relações que se acredita existirem entre os constituintes de um
determinado conceito. Existem esquemas representando nosso conhecimento
sobre todos os conceitos: aqueles que subjazem aos objetos, situações,
eventos, sequências de eventos, ações e sequências de ações.
(COSCARELLI, 2003, p.20).
De uma forma genérica, “nossa compreensão está ligada a esquemas cognitivos
internalizados, mas não individuais e únicos” (MARCUSCHI, 2008, p.228). O ato de
compreender, no caso desta pesquisa textos escritos, está também associado aos
conhecimentos ativados no decorrer da leitura, que dizem respeito aos conceitos formados
pelas experiências dos indivíduos, as quais são de caráter sócio-histórico. Sendo assim,
“compreender não é extrair conteúdos de textos. Por isso mesmo, nem tudo é visto por
todos do mesmo modo e há divergências na compreensão de textos por parte de diferentes
33
leitores” (MARCUSCHI, 2008, p. 229).
O conceito de esquemas mentais contribui para que se possa ter uma noção mais
efetiva de como ocorrem os processos de compreensão, de significação e ressignificação,
no ato da leitura de textos escritos. E, sobretudo, as relações que ocorrem entre a ativação
dos esquemas mentais e a produção de inferências – categoria de análise assumida nesta
pesquisa. Sobre o contato com texto no momento da leitura e suas conexões com as
informações ativadas através da ativação dos esquemas mentais, Coscarelli (2003) declara
que:
Ao ler, o leitor provavelmente vai procurar guardar aquelas informações do
texto que são importantes para que seu objetivo de leitura se cumpra. As
demais informações ou serão esquecidas ou poderão ser recuperadas por
meio da capacidade do leitor de ativar os esquemas que trazem situações
prototípicas relacionadas com essas informações. O leitor não guarda todas
as informações de todos os textos que lê porque usa alguns critérios para
selecionar as informações que ele vai guardar.Um dos principais critérios é o
grau de importância da informação do texto para os objetivos de leitura.
Outro é a novidade da informação: se a informação é nova e interessa, deve
ser armazenada; haverá informações, por outro lado, que não serão
guardadas porque já o são. Parece paradoxal, mas muitas informações lidas
são conhecidas do leitor e, por isso, não serão armazenadas, mas ativadas,
pois já existiam. (COSCARELLI, 2003, p. 22).
A partir das considerações expostas, é possível reafirmar que é na relação
dialógica com o texto que ocorre a compreensão, e que a leitura e o processo de
compreensão devem ser reconhecidos como trabalho social, já que “compreender exige
habilidade, interação e trabalho”. (MARCUSCHI, 2008, p.230). Embora os processos
citados tenham caráter social e histórico, como já discorrido neste texto, há que se pontuar
que cada leitor na sua individualidade, enquanto sujeito sócio-histórico, produz significados
distintos a partir da interação com o texto, considerando os objetivos de leitura, a
capacidade do leitor de selecionar informações significativas e relacioná-las aos esquemas
mentais acionados no decorrer do ato da leitura.
Portanto, a produção de inferências é consequência da relação entre os
conceitos que fazem parte de um esquema, os quais interagem a partir de um determinado
contexto e de objetivos de leitura, que serão determinantes na quantidade e na
complexidade de inferências constituídas na leitura de um texto. Desta forma, a
compreensão leitora está diretamente associada a produções de inferências; no entanto, este
conceito é bem amplo e existe uma multiplicidade de definições e modos de operar
34
associados ao mesmo. Com relação ao conceito de inferência, Coscarelli (2003) adverte
que:
Embora a noção de inferência seja de extrema importância para os estudos
relacionados com a leitura, por ser parte integrante desse processo, e esteja
sempre presente em textos relacionados com a compreensão da linguagem,
esse conceito geralmente não é bem definido[...]Essa excessiva
abrangência do conceito de inferência é problemática para a caracterização
do fenômeno, pois reúne sob o mesmo título operações muito diversas,
trazendo assim dificuldades para o estudo dele. (COSCARELLI, 2003,
p.32).
Apesar de se estar diante de um conceito de análise complexo, optou-se nesta
pesquisa por utilizar as classificações propostas por Marcuschi (1985; 2007; 2008; 2011).
Para este autor, “a compreensão leitora é resultado do processo inferencial em um universo
cultural- cognitivo” (MARCUSCHI, 1985, p.03). Desta forma, os dados que serão
apresentados posteriormente são resultantes da leitura desenvolvida por crianças e as
inferências elaboradas a partir das relações com textos narrativos. Assim, foi possível
verificar as diversas relações que as mesmas estabeleceram com seu universo cultural-
cognitivo, com contexto de leitura, sinalizando as diversas formas de compreensão textual e
produção de sentidos através de comentários emitidos sobre as leituras. Neste sentido,
Marchuschi (2008) estabelece um diálogo entre leitura, inferências e produção de sentidos:
Sendo uma atividade de produção de sentidos colaborativa, a compreensão
não é um simples ato de identificação de informações, mas uma construção
de sentidos com base em atividades inferenciais. Para se compreender bem
um texto, tem-se que sair dele, pois o texto sempre monitora o seu leitor para
além de si próprio e esse é um aspecto notável quanto a produção de sentido.
(MARCUSCHI, 2008, p.233).
A seguir serão discorridas as relações entre leitura, processos inferenciais e
produção de sentidos, a partir das abordagens traçadas por Marcuschi (1985; 2007; 2008;
2011) em diálogo com as análise de leitura e compreensão leitora propostas por Kleiman
(1989; 2007; 2008; 2012) e na sua interface com a escolarização da leitura e suas
implicações.
1.3.1. Processos Inferenciais e produções de sentidos.
35
Ao analisar a compreensão leitora de crianças do 3º ano do Ensino Fundamental
com base nos processos inferenciais, Marcuschi (2008), torna-se imprescindível retomar os
principais modelos teóricos que definem os significados do que é compreender:
De maneira geral, hoje podemos distribuir os modelos teóricos que tratam
da compreensão em dois grandes paradigmas que podem ser por sua vez
desmembrados em muitos outros subconjuntos específicos. Esses dois
conjuntos poderiam ser agrupados em duas hipóteses: (A) Compreender é
identificar (metáfora de conduto). (B) Compreender é inferir (metáfora da
planta baixa). (MARCUSCHI, 2008, p.237).
Neste estudo, assume-se a seguinte afirmativa: compreender é inferir e, com o
intuito de desvendar esse processo complexo, cabe expor a definição defendida nesta
pesquisa do que é língua, sua interface com o processo de compreensão, sobretudo a
compreensão de textos escritos, com ênfase nos textos narrativos. Como Marcuschi (2008),
defende-se que a noção de língua deve ser tomada como atividade e a compreensão como
um processo de base sociointerativa. Neste sentido, torna-se necessário explorar esse
conceito, o qual está embasado nas teorias do paradigma do tipo (B), como foi citado
anteriormente. Para Marcuschi (2008):
Já no caso das teorias no paradigma de tipo (B), que postula a
compreensão como inferência, toda compreensão será sempre atingida
mediante processos em que atuam planos de atividades desenvolvidos em
vários níveis em especial com a participação decisiva do leitor ou ouvinte
numa ação colaborativa. Aqui poderíamos adotar a metáfora da
compreensão como construção. A língua é vista como uma atividade e não
como um instrumento; uma atividade sempre interativa, ou seja, o
processo de compreensão se dá como uma construção coletiva.
(MARCUSCHI, 2008, p.232).
Com a finalidade de entender a leitura como processo inferencial, reitera-se a
noção de língua adotada, a qual, além de uma atividade de caráter interativo, “não é sequer
uma estrutura; ela é estruturada simultaneamente em vários planos, tais como o fonológico,
o sintático, o semântico e o cognitivo, que se organizam no processo de enunciação”
(MARCUSCHI, 2008, p.240). Confirma-se, assim, a importância da noção de língua,
assumida nesta pesquisa, a qual também é cultural, histórica, social, heterogênea e situa-se
no âmbito das relações dialógicas. Sobre as relações entre língua e comunicação verbal,
Bakhtin (2012) nos aponta:
A língua vive e evolui historicamente na comunicação verbal concreta,
36
não no sistema linguístico abstrato das formas da língua nem no psiquismo
individual dos falantes.[...] É nessa mesma ordem que se desenvolve a
evolução real da língua : as relações sociais evoluem ( em função das
infra- estruturas), depois a comunicação e a interação verbais evoluem no
quadro das relações sociais, as formas dos atos da fala evoluem em
consequência da interação verbal, e o processo de evolução reflete-se,
enfim, na mudança das formas da língua.
(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV,2012, p.128-129).
Considerando o conceito de língua como dinâmico e sua evolução resultante das
transformações infraestruturais das sociedades, como bem sinaliza Bakhtin (2012), e as
relações dialéticas entre as transformações socioculturais e ideológicas decorrentes das
mudanças superestruturais, “a língua permite a pluralidade de significações e as pessoas
podem entender o que não foi pretendido pelo falante ou o autor do texto” (MARCUSCHI,
2008, p.241). Deste modo, o texto não é tomado como um produto acabado e estático, em
que as informações devem ser “retiradas” do seu conteúdo, como se estes fossem portadores
de informações objetivas a serem reconhecidas e elencadas pelos leitores.
Este modelo conceitual de texto tradicional preza pela codificação e
decodificação, como habilidades essenciais de compreensão, concepção muito difundida no
ensino escolar há mais de 50 anos e ainda prática recorrente por muitos professores em
várias de nossas escolas, além de presente em manuais de educação, como os livros
didáticos.
Partindo do pressuposto que compreender é inferir, discorre-se aqui sobre as
relações entre autor, texto e leitor, fundamentais para que se possam apontar indícios sobre
como a criança apropria-se do texto escrito, o qual foi produzido em um determinado
contexto, por um autor que se expressa através da linguagem escrita, emitindo suas ideias
por meio de signos socialmente construídos.
A partir desta perspectiva, retoma-se a ideia de que a compreensão textual está
necessariamente associada à produção de inferências e estas por sua vez apresentam
diversos tipos de processos, os quais extrapolam a dependência puramente das informações
textuais, atingindo outras dimensões, como bem coloca Marcuschi (1985):
Se inferir é extrair proposições novas a partir das relações estabelecidas
entre as proposições dadas no texto, o mais importante não são as relações
de natureza simplesmente lexicais feitas automaticamente, Trata-se muito
mais, de uma tentativa de extrair as intenções pretendidas pelo autor.
Neste caso as regras inferenciais mais produtivas não são as de caráter
lógico apenas e sim as associações semânticas, os raciocínios analógicos,
as leis conversacionais ou os princípios pragmáticos. Isto porque a
inferência é um processo dependente do texto, do contexto de enunciação
37
implícito, do contexto reconstruído local e temporalmente e dos
conhecimentos prévios do leitor (MARCUSCHI, L. A., 1985).
Como já foi abordado anteriormente, as inferências também são conceitos
utilizados como contribuição de análise para a compreensão leitora, sejam elas de caráter
“cotextual/ contextual e cognitiva regida por certas regras” (MARCUSCHI,2008, P.254.
São elas que indicam os níveis de compreensão leitora. Dentre várias possibilidades, foram
selecionados as categorias a seguir, que serão utilizadas nas análises dos dados de pesquisa.
Quadro 1: Quadro Geral de Inferências
Fonte: MARCUSCHI.2008, p. 254.
38
Quadro 2: Quadro de Operações
Tipo de operação
inferencial
Natureza da
inferência
Condições de realização
1. dedução Lógica Reunião de duas ou mais informações textuais que
funcionam como premissas para chegar a outra
informação logicamente. A conclusão será necessária se a
operação for válida. Operação pouco comum em
narrativas.
2. indução Lógica Tomada de várias informações textuais para chegar a uma
conclusão com valor de probabilidade de acordo com o
grau de verdade das premissas.
3. particularização Lexical
Semântica
Pragmática
Tomada de um elemento geral de base lexical ou fundado
em experiências e conhecimentos pessoais
individualizando ou contextualizando num conteúdo
particular com um lexema específico.
4. generalização Lexical
Pragmática
Saída de uma informação específica, por exemplo, um
lexema, para chegar à afirmação de outra mais geral.
5. sintetização Lexical
Semântica
Pragmática
Condensação de várias informações tomando por base
saliências lexicais sem que ocorra uma eliminação de
elementos essenciais.
6. parafraseamento Lexical
Semântica
Alteração lexical para dizer a mesma informação sem
alteração fundamental de conteúdo proposicional.
7. associação Lexical
Semântica
Pragmática
Afirmação de uma informação obtida através de saliências lexicais ou cognitivas por associação de ideias.
8. avaliação ilocutória
Lexical
Semântica
Pragmática
Atividade de explicitação dos atos ilocutórios com
expressões performativas que os representam. Funciona
como montagem de um quadro para explicitação de
intenções e avaliações mais globais.
9. reconstrução Cognitiva
Pragmática
experiencial
Reordenação ou reformulação de elementos textuais com
quadros total ou parcialmente novos. Diverge do
acréscimo na medida que insere algo novo situado no
velho. No caso das narrativas, opera como uma estratégia
de mudar o discurso direto em indireto e vice-versa.
10. eliminação Cognitiva
Experiência
Lexical
Exclusão pura e simples de informações ou dados
relevantes e indispensáveis, impedindo até mesmo a
compreensão dos dados que permanecem.
11. acréscimo Pragmática
experiencial
Introdução de elementos que não estão implícitos nem são
de base textual, sendo que muitas vezes podem levar até a
contradições e falseamentos.
12. falseamento Cognitiva
Experiencial Atividade de introduzir um elemento e afirmar uma
proposição falsa que não condiz com as informações
textuais ou não pode ser dali inferida.
Fonte: MARCUSCHI, 2008, p.255.
39
O quadro geral de inferências e o quadro de operações inferenciais, apresentados
acima, detalham alguns dos principais processos inferenciais, tais como as ações: tipo de
operação inferencial, natureza da inferência e condições de realização que podem nos dar
indícios das várias formas de compreensão, produzidas a partir da leitura de textos escritos.
Considerando que:
No caso de inferência, o produto pode variar grandemente de indivíduo para
indivíduo, uma vez que elas não ativam apenas as relações entre
conhecimentos lexicais. O universo em que tais inferências se situam é o
contexto cognitivo formado pelos pré-conhecimentos do indivíduo, pelas
crenças, as circunstâncias em que o texto é lido e os conhecimentos das leis
do discurso. (MARCUSCHI, 1985, p 06).
Portanto, ler é inferir, é produzir sentidos através de uma relação dialógica com o
texto, uma relação pautada por diversos aspectos, já sinalizados, considerando que sempre se
parte de um input textual e que existem extrapolações não autorizadas no processo de
compreensão de um textual. A questão que se coloca é como orientar os alunos que estão se
apropriando da leitura, já que a grande maioria das crianças aprende formalmente a ler nos
bancos escolares, sobretudo na maioria dos casos de alunos que estudam em escola pública, o
acesso à leitura ocorre necessariamente no espaço escolar. Para Marcuschi (1985), a
investigação sobre processos inferenciais tem relevância didática, pois:
Em primeiro lugar, fica clara a necessidade de uma noção de texto como
unidade linguística de natureza comunicativa. Isto dá ao texto um caráter
menos estático; retira-lhe a autonomia absoluta de algo pronto quanto ao
sentido; obriga o autor a adotar estratégias de colaboração mais eficazes e
definidas. Tudo isso impõe ao professor em sala de aula que trabalhe o texto
dentro de perspectivas menos estanques e desenvolva exercícios que
permitam a penetração no implícito e nas intenções subjacentes.
(MARCUSCHI, 1985, p. 14).
O autor defende a importância didática de se olhar para o texto de uma forma mais
ampla, como evento comunicativo e as produções de inferências como produtos da
compreensão textual. Desta forma, o professor poderá romper com uma visão tradicional de
conceito de texto escrito e sua utilização em sala de aula, sobretudo assumir e valorizar as
múltiplas faces dos sentidos produzidos pelos alunos, a partir dos processos de compreensão.
No entanto, o processo de compreensão textual pode ocorrer de diversas maneiras, pois cada
indivíduo irá apropriar-se do conteúdo a partir de seus conhecimentos, vivências, de uma forma
dialógica, por meio da interação verbal; há que se considerar que existem níveis de
compreensão que são caracterizados por horizontes. Marcuschi (2007) faz uma analogia com
40
orizonte
1.1.4. Compreensão leitora e escolarização
MARCUSCHI, 2007, p. 99 (Tudo desconfigurado...)
Horizonte Indevido
Horizonte Problemático
Horizonte Máximo
Horizonte Mínimo
“uma cebola” e os horizontes são comparados às “camadas da cebola” e reproduzidos no
formato de um diagrama. Para melhor entender o processo de compreensão textual, segue:
QUADRO 3 : Horizontes de Compreensão Textual
Falseamentos
Extrapolações
Cópia
Falta de
Horizonte
Paráfrases
Inferências Possíveis
41
QUADRO 4: Quadro explicativo dos horizontes de compreensão textual...
1. Falta de horizonte – uma leitura nesta perspectiva apenas repete ou copia
o que está dito no texto. Permanecer nesse nível de leitura é agir como
se o texto só tivesse informações objetivas inscritas de modo
transparente. A atividade do leitor se reduziria a uma mera atividade de
repetição. Repetir um texto nem sempre é garantia de que se
compreendeu efetivamente, pois sabemos que decorar um texto não
garante compreensão.
2. Horizonte mínimo – teremos o que aqui se chama de leitura parafrástica, ou
seja, uma espécie de repetição com outras palavras em que podemos deixar algo
de lado, selecionar o que dizer e escolher o léxico que nos interessa.
Certamente, vamos colocar alguns elementos novos, mas nossa interferência
será mínima, e a leitura fica ainda em uma atividade de identificação de
informações objetivas que podem ser ditas com outras palavras
3. Horizonte máximo – perspectiva que considera as atividades inferenciais no processo de compreensão, isto é, as atividades de geração de sentidos pela
reunião de várias informações do próprio texto, ou pela introdução de
informações e conhecimentos pessoais ou outros não contidos no texto. É uma
leitura que inclui as entrelinhas; não se limita à paráfrase, nem fica
reduzida à repetição.
4. Horizonte problemático – embora este horizonte não seja em
princípio descartável como inadequado, ele vai muito além das
informações do pró- prio texto e se situa no limite da
interpretabilidade. Trata-se do âmbito da
extrapolação. São leituras de caráter pessoal, em que há investimento de
conhecimentos pessoais muito grande. Na escola, essa esfera é tida como a da
“opinião pessoal” e ali se instala quase que um vale-tudo.
5. Horizonte indevido - é a área da leitura errada.
MARCUSCHI, 2007, P. 99
A partir da ideia de horizontes, é possível detectar e analisar as origens das
produções de inferências construídas na relação entre autor, texto e leitor. Como já discutido
anteriormente, o entendimento de todo esse processo contribui para que as práticas
pedagógicas do professor, em suas aulas de leitura ou mesmo no decorrer do trabalho
pedagógico de alfabetização e letramento, sejam desenvolvidas em uma perspectiva mais
crítica , pois a mediação em sala de aula em atividades que privilegiam a leitura, contribui
de forma significativa para que os alunos tenham mais criatividade, argumentação e um
olhar crítico, a partir das relações estabelecidas com os textos. Ainda sobre a relevância
didática do trabalho com as inferências, Marcuschi (1985) indica um segundo destaque para
a importância de pesquisas sobre essa temática:
42
Em segundo lugar, revela a necessidade de trabalhar o leitor (o aluno)
numa perspectiva crítica, desenvolvendo nele capacidade de raciocínio
para além da contextualização cognitiva estrita. Só assim surgirá o leitor
crítico capaz de processar o texto em qualquer circunstância, sem estar
investindo apenas sua subjetividade. Isto significa, pois, que num primeiro
momento deve ser ter o máximo respeito pelo leitor que se tem pela frente
e num segundo momento deve se partir para um trabalho efetivo e crítico
junto a este leitor para que ele se liberte pelo menos dos elementos
puramente idiossincráticos.
A seguir, serão discorridas as intrínsecas relações entre a utilização do texto na
sala de aula, a escolarização do texto literário, a compreensão leitora e a produção de
sentidos. O que possibilita uma reflexão sobre alguns indícios do desenvolvimento da
leitura na escola, reiterando as relações complexas entre o autor, texto e leitor, sobretudo no
espaço escolar.
1.4. Formação do sujeito leitor: escolarização da leitura e compreensão textual.
Considera-se que a aprendizagem da leitura é consequência do processo de
escolarização, em geral, ocorrida no ambiente escolar. Isto é o que Kleiman (2008)
denomina de “descontextualização de linguagem”, pois a relação estabelecida entre o leitor
e o autor é constituída pelo distanciamento.
Embora seja uma interação marcada pela distância – o autor e o leitor -, ela é
necessária para o desenvolvimento da aprendizagem, para o desenvolvimento da
criatividade e da imaginação, pois, historicamente, as atividades escolares são pautadas pela
utilização de textos de gêneros variados, com objetivos e conteúdos diversos.
A compreensão textual fica comprometida quando não há, por parte da
instituição escolar, formas adequadas de mediação entre autor, texto e leitor, as quais
possam garantir o processo de aquisição da leitura de forma efetiva e crítica. “Daí que uma
questão fundamental para o ensino seja como ensinar a criança a compreender o texto escrito”.
(KLEIMAN, 2008, p.7).
Desta forma, o ato de compreender textos escritos, no caso desta pesquisa,
caracteriza-se por processos múltiplos, envolvendo ações linguísticas, sociais e cognitivas,
como já exposto. Sendo o texto um evento comunicativo, os sentidos não estão no texto,
tampouco no leitor, eles são construídos na relação os interlocutores, em um contexto
específico.
43
Com relação aos aspectos cognitivos da leitura, é importe ressaltar que refletir
sobre o que se lê é uma das bases para a formação de um leitor proficiente, autônomo e crítico;
além disto, refletir sobre o saber construído neste processo é uma forma de desenvolver
atividade de metacognição, como propõe Kleiman (2008):
Refletir sobre o conhecimento e controlar os nossos processos cognitivos são
passos certos no caminho que leva à formação de um leitor que percebe
relações, e que forma relações com um contexto maior, que descobre e infere
informações e significados mediante estratégias cada vez mais flexíveis e
originais. (KLEIMAN, 2008, p.9-10).
A busca pela análise e entendimento de como se processa o ato de compreensão
textual caracteriza-se por uma tarefa difícil, haja vista que este processo é composto de várias
dimensões, como já ressaltado anteriormente, e apreendê-lo significa interpretar as redes de
relações concernentes a este ato. Para isto, Kleiman (2008) descreve as dimensões a serem
apreendidas na compreensão do processo textual, sendo que um deles abrange uma série de
fatores os quais o compõem: o conhecimento prévio.
A compreensão de um texto é um processo que se caracteriza pela utilização
de um conhecimento prévio: o leitor utiliza na leitura o que ele já sabe, o
conhecimento adquirido ao longo de sua vida. É mediante a interação de
diversos níveis de conhecimento, como o conhecimento linguístico, o textual,
o conhecimento de mundo, que o leitor consegue construir o sentido do texto
[...] Pode-se dizer com segurança que sem o engajamento do conhecimento
prévio do leitor não haverá compreensão. (KLEIMAN, 2008, p.13).
Portanto, considera-se a importância do conhecimento prévio para que sejam
analisadas as relações entre autor, texto e leitor. Reitera-se que o mesmo é composto pelos
conhecimentos linguísticos, conhecimento textual e conhecimento de mundo ou enciclopédico.
Com relação ao conhecimento linguístico: é aquele adquirido com a língua materna, que
acontece de forma espontânea, pois está atrelado à origem da criança, à língua falada pelo
grupo social, ao vocabulário utilizado e diz respeito à sua identidade sociocultural. Este
conhecimento também se relaciona às regras da utilização da língua apreendida na instituição
escolar.
Com relação ao conhecimento textual, este está relacionado à estrutura textual; são
marcas que definem a composição do texto e suas características, que são classificadas como
estrutura narrativa e estrutura expositiva. Sobre o primeiro tipo, este tem como caraterísticas a
ênfase na marcação temporal cronológica, na causalidade – evidências ou os porquês dos fatos,
as ações de causa e efeito, destaque aos agentes das ações – personagens; cenários onde são
44
apresentados os personagens; uma complicação inicial e o desenrolar da trama até a
resolução do problema.
Em contrapartida, na estrutura expositiva, a orientação temporal é irrelevante,
com enfoque temático nas ideias, que são organizadas de maneira lógica: “premissa e
conclusão, problema e solução, tese e evidência, causa e efeito, analogia, comparação,
definição e exemplo”. (KLEIMAN, 2008, p.18).
O conhecimento de mundo ou conhecimento enciclopédico é o terceiro fator
que compõe o conhecimento prévio; este está atrelado aos conhecimentos obtidos
formalmente, assim como informalmente, construídos na instituição escolar ou em outras
instituições como a família, a igreja, entre outros espaços de produção sociocultural.
Foram considerados alguns elementos para desvendar as relações complexas
que estão na dinâmica da compreensão de textos escritos. Buscou-se elencar alguns dos
principais elementos, tais como: concepções de língua e texto; relações entre autor, texto e
leitor; a leitura e a compreensão como processos cognitivos e interacionistas; análise das
estruturas textuais como marcas formais que definem os objetivos de leitura.
Estamos diante de um o objeto de pesquisa - compreensão leitora –
o qual possui muitas dimensões; sendo assim, tem-se como tarefa crucial entender as
relações entre essas dimensões e como estas se fazem presentes na formação do sujeito
leitor. Observar como este constitui-se um leitor engajado na escola, considerando as
práticas de uma professora específica e como essas impactam na produção de inferências de
crianças que estão em pleno processo de alfabetização e letramento.
Diferentemente da fala, na qual a apropriação ocorre de forma não planejada,
através do contato com outras pessoas da mesma cultura em que se está inserida, a leitura é
aprendida em espaços institucionalizados ou em espaços informais, sua aquisição deve ser
explicitamente organizada e socialmente dirigida. Segundo Bresson (2001), com relação à
escrita e à leitura:
Não podem ser um objeto espontâneo de aquisição: trata-se aí
necessariamente, de práticas sociais instituídas em que o simples contato
com os escritos e a observação das leituras, silenciosas ou não, não são
suficientes para transmitir. (BRESSON, 2001, p.26).
Ler para as crianças ou ler com as crianças são atividades fundamentais, pois é
45
ouvindo contos, fábulas, mitos, notícias, poemas, enquanto não sabem ler autonomamente,
que elas vão tendo acesso a tudo que a escrita representa. Isto porque o ato de ler não é
passivo: “É um ato que requer atenção, vigilância que mobiliza também a liberdade e a
imaginação do leitor. Falar do ato da leitura é indicar que não se lê ‘com os olhos’, mas
com os saberes, julgamentos, emoções e valores” (CHARTIER apud MORTATTI, 2011, p.
55).
A apreciação pela criança do conteúdo do objeto cultural livro, mediado pela
escola entre outras instâncias de socialização cultural, possibilita troca de experiências,
entre o aprendido e o vivido; é nesta relação que se configura o sentido estético, que só
emerge no encontro de alguém (sujeito) com alguém (outro sujeito) ou com algo (objeto)
(PINO, 2007).
Portanto, existe uma experiência individual de sensibilização, de subjetivação
do real simbólico, expressa através de signos pela apropriação da leitura de um texto
literário, por exemplo, entendido como uma produção humana: um texto ou um livro, uma
obra literária, que não possui um valor intrínseco e não um valor em si mesmo. A
significação é atribuída social, cultural e historicamente às coisas materiais ou imateriais,
definidas por grupos sociais em determinados espaços e tempos históricos, como ensina
Pino:
As significações só adquirem direito de “cidadania” ou de existência
cultural quando reconhecidos por algum tipo de coletividade ou grupo
cultural. Isso explica por si só duas coisas: que se o gosto é uma
experiência pessoal, subjetiva, só se torna cultural quando encontra um
ambiente social que o acolhe; segundo que os valores e as significações
culturais podem ser, e quase sempre o são, diferentes em diferentes épocas
e em diferentes grupos de uma mesma ou diferente época ou sociedade.
(PINO, 2007, p.115).
O sujeito leitor constitui-se através de suas referências - individuais e sociais;
históricas e existenciais - construindo novas significações e sentidos a partir de processos
entretecidos às vivências do universo da leitura e do ato de compreensão, o qual apresenta
“o caráter multifacetado, multidimensionado deste processo que envolve percepção,
processamento, memória, inferência e dedução”. (KLEIMAN, 1989, p. 7).
Este trabalho busca delimitar a leitura em um espaço específico: o escolar.
Neste sentido, acredita-se que o ensino da leitura, enquanto prática social e intelectual, e o
desenvolvimento do gosto e prazer pela mesma são funções da instituição escolar. A Escola
se constituiu historicamente como espaço legítimo e fundamental para o desenvolvimento e
46
formação do sujeito leitor, embora muitas destas práticas desenvolvidas neste espaço ainda
caracterizam-se por uma concepção de leitura reducionista, privilegiando apenas seu uso
instrumental, não que o ensino da técnica, da apropriação dos signos não seja
imprescindível para a constituição do leitor, mas ela não pode ser um fim em si mesma.
Segundo Kleiman (2012), a maioria das práticas escolares são nefastas e
afastam o sujeito do universo do texto, da leitura e da linguagem. A autora retoma as
memórias de leituras de uma grande maioria de pessoas que vivenciaram o processo de
escolarização:
Devemos lembrar que, para a maioria, a leitura não é aquela atividade no
aconchego do lar, no canto preferido, que nos permite isolar, sonhar,
esquecer, entrar em outros mundos, e que tem suas primeiras associações
nas estórias que a nossa mãe lia antes de dormir. Pelo contrário, para a
maioria, as primeiras lembranças dessa atividade são a cópia maçante, até
a mão doer, de palavras da família do da, “Dói o dedo do Didu”; a procura
cansativa, até os olhos arderem, das palavras com dígrafo que deverá ser
sublinhado naquele dia; a correria desesperada até o dono do bar que
comprar o jornal aos domingos, para a família achar as palavras com a
letra J. Letras, sílabas, dígrafos, encontros consonantais, encontros
vocálicos, ”dificuldades” imaginadas e reais substituem o aconchego e o
amor para essas crianças, entravando assim o caminho até o prazer.
(KLEIMAN, 2012, p.23).
As práticas relatadas por Kleiman (2012), apesar de estarem no universo das
memórias, do passado, não significam que não ocorram mais, tornando-se obsoletas; ao
contrário, pode-se afirmar que são atuais e recorrentes na maioria das escolas nos dias de
hoje. Desta forma, o trabalho desenvolvido pela professora participante da pesquisa busca
romper com práticas mecanicistas do ensino de leitura, sua proposta didática visa ao
investimento em atividades mais interessantes, representadas no uso de gêneros literários,
pois em suas aulas são utilizados diversos tipos de textos: contos, poesia, histórias em
quadrinhos, parlendas, fábulas, também textos informativos e cartas. Nesta pesquisa será
dada ênfase na leitura de lendas.
Sendo a escola o espaço legítimo da constituição de conhecimentos, saberes e
artes em “saberes escolares” que se apresentam nos currículos e programas de ensino,
torna-se inevitável a escolarização de livros de literatura e textos literários. Segundo Soares
(2011):
O que se pode criticar, o que se deve negar não é a escolarização da
literatura, mas a inadequada, a errônea, a imprópria escolarização da
literatura, que se traduz em sua deturpação, falsificação, distorção, como
47
resultado de uma pedagogização ou uma didatização mal compreendidas
que, ao transformar o literário em escolar, desfigura-o, desvirtua-o,
falseia-o. (SOARES, 2011, p.22)
Através dessa pesquisa, pode-se observar e analisar o trabalho pedagógico de
uma professora que desenvolve práticas pedagógicas através de projetos interdisciplinares:
história, ciências e geográfica - fazendo uso de textos literários que rompem com a
escolarização literária inadequada no ambiente escolar, a partir da valorização da função
social da leitura e escrita nos processos de alfabetização e letramento, da utilização de
textos de diferentes gêneros explorados e apropriados sem fragmentação, como acontecem
nos livros didáticos.
Esse posicionamento da professora está de acordo com Soares (2011), que
define como prática adequada de escolarização da literatura infantil “aquela que conduza
mais eficazmente às práticas de leitura que ocorrem no contexto social e às atitudes e
valores que correspondem ao ideal de leitor que se quer formar” (p.25).
A utilização dos textos e livros literários em sala de aula pela professora citada,
a utilização de práticas pedagógicas significativas com vistas à apropriação destes tipos de
texto por grupo de crianças, durante 3 anos de escolarização, contribuiu para que as mesmas
apresentassem vários processos inferenciais durante as leituras e compreensão de textos
escritos. São estes “processos inferenciais” (MARCUSCHI, 1985, p.15), produzidos por
crianças em situações de pesquisa, que fornecerá os indícios de como estes compreendem
um texto.
No capítulo 2, serão apresentadas as principais práticas pedagógicas: projetos
interdisciplinares, sacola da leitura e o FLISELLO, desenvolvidas pela mesma professora
nos 3 anos de escolarização das crianças pesquisadas, exceto o FLISELLO, evento cultural
e literário que foi apropriado por toda unidade escolar.
48
CAPÍTULO 2
2. CARACTERIZAÇÃO DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DE
LEITURA E EXPERIÊNCIAS LEITORAS
Como a leitura se esquematiza, se constitui, se desenvolve, tanto em nível
psicológico/individual quanto sócio/ideológico? Como a leitura – e,
portanto, a forma escrita de linguagem – marca o desenvolvimento
psíquico das crianças e seu processo de aprendizagem? (SMOLKA, 2010,
p.44/45).
Este capítulo tem como objetivo apresentar algumas das principais propostas
pedagógicas criadas, implementadas e aplicadas pela professora, sujeito desta pesquisa, que
acompanhou a sala dos alunos pesquisados, durante os 3 anos do Ciclo I – Ensino
Fundamental. Além disso, pretende-se relacionar as principais experiências - em sala de
aula, nos projetos e atividades de leitura vivenciados pelos alunos pesquisados, com suas
produções de inferências, construídas a partir da leitura de textos narrativos, durante o
processo desta pesquisa.
As atividades propostas pela professora foram registradas no planejamento
anual e foram sendo apropriadas pelos demais professores da escola, no decorrer dos anos,
tornando-se um dos projetos coletivos da unidade escolar.
As propostas pedagógicas, que serão expostas aqui, e que fazem parte do
projeto político pedagógico da escola, foram embasadas nas “Diretrizes Curriculares para o
Ciclo I e II, do Ensino Fundamental da Prefeitura de Campinas”. Os três primeiros anos de
escolarização são dedicados à alfabetização e ao letramento das crianças, segundo as
perspectivas teóricas de Kleiman (2009, 2008,2007,2005,1999,1995), Soares (2004) e Rojo
(2009).
Esse documento propõe um trabalho didático a partir de uma diversidade de
gêneros textuais e de múltiplas linguagens. No entanto, o como fazer, a definição das
escolhas pedagógicas dos professores, está atrelada à sua formação como leitor e às
concepções que possui sobre leitura, escolarização e formação da criança leitora. Sendo
assim, embora haja um referencial a ser seguido, são diversos os enunciados que estão
implícitos e ou explícitos no fazer pedagógico dos professores, concepções que se
materializam em suas práticas cotidianas de ensino de leitura.
A primeira proposta a ser apresentada e discutida é o projeto interdisciplinar
que envolve as disciplinas de história, ciências e geografia. Surgiu a partir das
49
discussões de planejamento na unidade escolar, em 2010, como estratégia para se
trabalharem os conteúdos citados, os quais não eram tão prestigiados como as disciplinas e
os conteúdos de Língua Portuguesa e Matemática. Neste sentido, a professora Mariana,
como já desenvolvia com suas turmas alguns projetos de letramento, tendo como parâmetro
a aprendizagem da leitura e escrita, considerando sua função social, encabeçou as
discussões sobre o projeto interdisciplinar e o sistematizou. No início, eram 3 projetos
distintos: “Qualidade de Vida”; “Minha escola, minha casa e meu bairro” e “Identidade e
Memória”. No entanto, cada um desses projetos foi avaliado e repensado a cada final de
ano letivo.
Em 2011, os projetos foram reescritos com o intuito de aprimorá-los e torná-los
efetivamente interdisciplinares, já que os mesmos mantinham divisões disciplinares:
história, ciências e geografia. A alteração teve início no 1º Ano do Ciclo I, sala em que
acompanhei o desenvolvimento pedagógico das crianças, como orientadora pedagógica da
escola, na qual foi feita esta pesquisa.
O projeto interdisciplinar atualizado foi organizado em um único projeto, com
início no 1º ano do Ciclo I, tendo sua finalização no 2º ano do Ciclo II (5º ano) – em um
encadeamento de conteúdos das áreas já citadas. Embora seja um projeto único, o mesmo
apresenta suas especificidades de objetivos gerais e específicos, por ano e ciclo, estando
divididos em temas gerais que abarcam todo assunto a ser tratado em cada ano.
Com relação ao Ciclo I, o Projeto está organizado em três temas: 1º Ano -
“Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...”; 2º Ano – “Na Trilha da Minha Vida” e 3º
Ano - “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens”.
Com relação aos conceitos de transversalidade e interdisciplinaridade, Kleiman
(1999) assevera que:
Transversalidade e interdisciplinaridade são conceitos inseparáveis, pois
alimentam-se, mutuamente. A interdisciplinaridade questiona a
fragmentação e a linearidade do conhecimento; a transversalidade
questiona a alienação e o individualismo no conhecimento. Ambas podem
ser postas em prática através do trabalho coletivo. (KLEIMAN, 1999, p.
22).
A opção pedagógica por um projeto de caráter interdisciplinar associa-se a um
posicionamento que concebe o ser humano como ser integrado, autônomo, o qual é sujeito
participante na construção do conhecimento. Abordar os conteúdos de forma interdisciplinar
não é somente romper com a fragmentação dos mesmos, mas sobretudo com uma formação
profissional histórica, marcada por “esta identidade social do professor, o sujeito que
50
sabe o saber produzido por outros, e que o transmite”. (GERALDI, 2010). É assumir uma
concepção de educação crítica e menos alienante, em que o conhecimento é constituído nas
relações entre professores e alunos, utilizado como instrumento de resistência e
transformação.
O projeto interdisciplinar exposto tem como um dos principais eixos a
utilização da leitura literária. Ao ser indagada pela pesquisadora sobre o(s) motivo(s) da
seleção de livros e textos de literatura infantil para compor o projeto interdisciplinar, a
professora Mariana relata que:
Os livros de literatura infantil foram inseridos nos projetos porque eles
abriam uma reflexão sobre os assuntos que seriam trabalhados, além disso
havia o propósito de incentivo à leitura. Com essa prática as crianças
começaram a ler mais e estabelecer relações entre um livro e outro, e entre
fatos ocorridos no cotidiano, na história da humanidade, de nosso país.
(relato da professora Mariana).
Como relatado pela professora, no projeto interdisciplinar desenvolvido no ciclo
I é utilizado o discurso literário, como estratégia para iniciar uma discussão sobre os
assuntos em questão, ou mesmo, através deles, ampliar a temática em diálogo com textos de
gêneros distintos, em uma dinâmica intertextual. Esta prática de inter-relações textuais
contribui para a construção de redes interdisciplinares, sendo que um dos objetivos é a
formação de leitores proficientes e críticos. Para Kleiman (1999):
O significado de um texto não se limita ao que apenas está nele; seu
significado resulta da intersecção com outros. Assim, a intertextualidade
refere-se às relações entre os diferentes textos que permitem que um texto
derive seus significados de outros. Os textos incorporam modelo,
vestígios, até estilos (no caso das paródias) de outros textos e de outros
gêneros. Diz-se que todo texto remete a outros textos no passado e aponta
para outros no futuro. (KLEIMAN, 1999, p.62).
Ao desenvolver um trabalho pedagógico com ênfase em uma rede de
conhecimentos que dialogam, acredita-se que mais significativa será a aprendizagem para o
educando, e a compreensão dos conceitos será mais efetiva. Ainda, sobre a
intertextualidade, Kleiman (1999) expõe:
A intertextualidade é um fenômeno cumulativo: quanto mais se lê, mais se
detectam vestígios de outros textos naquele que está lendo e mais fácil se
torna perceber as suas relações com outros objetos culturais e, portanto,
mais fácil é sua compreensão. (KLEIMAN, 1999, p.62).
O incentivo à prática da intertextualidade é uma das características do projeto
51
interdisciplinar implementado na unidade escolar pesquisada, pois pode se observar que há
um encadeamento dos conteúdos e conceitos das áreas de história, ciências e geografa, os
quais são desenvolvidos a partir da leitura e discussão de diversos textos: narrativos,
informativos, imagéticos entre outros, presentes nas etapas previstas para o
desenvolvimento do projeto.
Sobre o ensino de leitura em língua materna, são muitas as práticas ainda a
serem rompidas, muitas são consequência de concepções de educação conservadoras e
conteudistas que defendem, para a maioria da população, uma escola com um currículo
mínimo, que se limite ao ensino de leitura, cálculo e outras noções elementares. Há uma
urgência de mudanças de concepção que deve ser delegada à escola e a seus profissionais,
ou seja, que se repensem tais práticas de ensino de leitura alienantes e se implemente outra
concepção de formação do leitor, como sugere Geraldi (2010):
E entre formar ‘lectores’ e formar ‘lectores e auctores’, insinua-se na sala
de aula (perigosamente) uma outra concepção de leitura, não mais um ato
solitário, muito menos um ato de repetição do já dito. Mas um ato de
produção, que leva em conta “todos os conhecimentos anteriores da língua
e nossa experiência de vida”. Onde cada leitura é nova escrita de um texto.
(GERALDI, 2010, p. 112).
Neste sentido, apresenta-se o projeto interdisciplinar, o qual se acredita estar
embasado em uma concepção de ensino de língua materna que corresponda à formação de
um leitor e autor, produtor de inferências, a partir das leituras de textos de gêneros
diferentes e da promoção de discussões e comentários impulsionados pelos mesmos, no
decorrer do desenvolvimento do projeto e, concomitantemente, desta pesquisa.
A seguir, será feita uma análise comparativa entre o projeto em cada fase de
aplicação, com os registros diários produzidos pela professora sobre o desenvolvimento do
mesmo. Buscou-se fazer essa análise comparativa para que se possam obter dados
complementares sobre as experiências dos educandos ao participarem do projeto
interdisciplinar sobre leitura e sua possível relação com a produção de inferências – dados
obtidos neste trabalho de pesquisa.
Segue a descrição do projeto na fase desenvolvida no 1º ano do Ciclo I –
2.1. Projeto: “Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...”
52
QUADRO 5: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 1ª Fase
CURSO: 1ª ano ciclo I – Ensino Fundamental ANO:
2012
Campinas - SP
CIÊNCIAS/HISTÓRIA/GEOGRAFIA
Os conteúdos de Ciências, História e Geografia serão trabalhados por meio de projeto, durante o ano
letivo.
PROJETO: ESPELHO, ESPELHO MEU, DIGA QUEM SOU EU...
JUSTIFICATIVA: ao trabalhar a identidade, estaremos estudando o verdadeiro “eu”, um
autoconhecimento através do corpo, fases da vida, estrutura familiar, lugar que vive, vivências de
cada um, debatendo e refletindo as diferentes histórias apresentadas, podendo então, promover a
ampliação das relações afetivas, o respeito à diversidade e à inclusão.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
criar um espaço de reflexão sobre a própria identidade;
reconhecer-se parte integrante de uma família e de outros grupos sociais próximos;
compreender a diversidade de organizações familiares em suas diferenças e semelhanças;
conhecer e explorar diferentes fontes históricas;
comparar imagens para perceber as diferenças temporais;
conhecer a organização do lugar em que está inserido;
descrever e registrar percursos rotineiros;
observar imagens, mapas, dados sobre o espaço que ocupa;
observar, registrar e preservar a natureza manifesta em seus espaços de convívio;
conhecer o esquema corporal humano, nomear suas partes, perceber as diferentes
características físicas e os sentidos que usamos para perceber o mundo;
cuidar do próprio corpo desenvolvendo hábitos de higiene e alimentação saudável;
entender o conceito de ser vivo;
perceber e reconhecer as diferenças entre os seres vivos, a diversidade da vida;
utilizar procedimentos de pesquisa para apropriação de conhecimentos.
compartilhar informações, ouvir e respeitar ideias dos colegas;
executar tarefas em grupo;
realizar as atividades propostas com empenho, respeito aos outros e ao ambiente;
valorizar a vida em todas as suas formas de manifestação;
ter iniciativas em relação à preservação ambiental;
valorizar as histórias, a cultura, os saberes dos colegas;
olhar, observar, descrever, registrar e analisar o espaço em que vive (casa, escola, bairro);
representar o espaço em que vive;
valorizar o espaço e o tempo vivenciado;
realizar processos simples de reciclagem e a reutilização de materiais.
53
ETAPAS PREVISTAS:
Apresentar aos alunos a proposta do projeto e do produto final;
leitura (feita pela professora) do livro: “Bisa Bia, Bisa Bel” – Ana Maria Machado, realizada
em capítulos: capítulo 1- No fundo de uma caixinha (descoberta da foto da Bisa Bia); capítulo
2 – Pastel bochechuda (a foto da Bisa na escola); capítulo 3 – Tatuagem transparente (bisa Bia
estava no coração de Isabel); capítulo 4 – Conversa de antigamente (Isabel aprende coisas de
antigamente com bisa Bia); capítulo 5 – Meninas que assoviam (os conselhos de bisa Bia);
capítulo 6 – Um espirro e uma tragédia (desentendimento entre bisa Bia e Isabel); capítulo 7 –
A dona da voz misteriosa (a dona da voz misteriosa é bisa Bia); capítulo 8 – Trança de gente
(os alunos levam para a escola fotos das bisas);
a cada leitura de capítulo, uma reflexão e comentários das crianças;
discutir as fontes de memórias contidas na história de Bisa Bia;
trazer de casa fotografias e objetos que fazem lembrar pessoas ou acontecimentos da vida de
cada um;
discutir a frase: “Todos nós temos uma história” (relembrar a história de Isabel do livro Bisa
Bia, Bisa Bel e o que a fez lembrar ou entender a cultura de sua família);
leitura do conto: “Branca de Neve e os sete anões”;
filme: Branca de Neve e os sete anões;
discussão de como Branca de Neve foi uma filha desejada, e as dificuldades e conflitos
vividos com a madrasta;
pesquisa com os pais de como receberam a notícia de que teriam um filho, o período de
gestação e o momento do parto (onde nasceu, que dia, mês e ano), primeiros dias do bebê,
peso, altura, cuidados. Quando começou a andar, a falar, qual foi a primeira palavra;
pesquisar o nome: quem escolheu, por que escolheu, o seu significado;
olhando no espelho: como sou aspectos físicos, estudar as partes do corpo;
leitura de imagens sobre o corpo, livro: “Dos pés à cabeça” – Marie Houblon;
trabalhar os órgãos do sentido. Como sinto o mundo?
introduzir a questão da alimentação saudável, os alimentos de que gostamos e os que
precisamos comer;
leitura do livro: “Alimentos bons e certos” – Mário Gomboli
fazer uma salada de frutas e elaborar uma receita;
fazer uma salada de folhas;
o que fazer com as cascas das frutas e talos de verduras? Receitas;
discutir os hábitos de higiene com o próprio corpo e com os alimentos;
a partir da pergunta: somos todos iguais? – introduzir a história da África;
leitura do livro: “Menina bonita do laço de fita” – Ana Maria Machado;
filme Kiriku e a Feiticeira;
discutir as características da Menina do laço de fita e do Kiriku;
confeccionar a boneca Abayomi e contar a sua história;
observar e discutir a cultura na aldeia de Kiriku, a organização familiar e comparar com a
nossa;
socializar a organização familiar (cada aluno conta sobre sua família);
filme: Procurando Nemo;
discutir o filme enfocando a estrutura familiar;
vivência em família: o que gostamos de fazer, relação entre os membros da família;
profissão dos pais, importância de cada profissão;
construção da árvore genealógica;
temos animais de estimação? Quais? Conversar sobre os cuidados que devemos ter com os
animaizinhos e introduzir o estudo dos seres vivos;
54
minha família vive em um lugar. Qual?
leitura do livro: “Onde Estamos” – Ely Barbosa;
discussão e apreciação da leitura;
leitura dos livros: “Uma Casa para Viver” – Maria Luísa Aroeira e Miriam L. da M. Fontes e
“As casas de ontem e de hoje” – Carlos Reviejo, que discutem vários tipos de moradia
começando pelas cavernas;
filme: Up, altas aventuras;
refletindo as leituras feitas e o filme, cada um conta como é sua casa;
construção da maquete da casa;
onde fica minha casa (rua, bairro);
como é o bairro que moramos (infraestrutura);
nosso bairro é bem cuidado?;
e nossa escola, como é? (estrutura física, funcionários, alunos). O que está bom e o que não
está. Como melhorar?
introduzir a questão da preservação do meio ambiente;
refletir o que podemos fazer para contribuir com o meio ambiente (economia de água e
energia, reciclagem e reutilização do lixo;
construir brinquedos com lixo reciclado.
Cada etapa será discutida, sistematizada e iremos construindo o livro da vida.
PRODUTO FINAL: Livro da Vida
BIBLIOGRAFIA:
AROEIRA, M. L., MOTA, M. L. Uma casa para viver. Belo Horizonte: Dimensão, 2008.
BARBOSA, E. Onde estamos? São Paulo: Paulinas, 2006.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília:
MEC/SEF
CAMPINAS. Diretrizes Curriculares para os anos iniciais do Ensino Fundamental. Versão II/2011.
Coleção Ciranda, cirandinha. São Paulo: Paulus, 2010.
GOMBOLI, M. Alimentos bons e certos. São Paulo: Paulus, 2002.
HOUBLON, M. Dos pés à cabeça. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2005. MACHADO,
A. M. Bisa Bia, Bisa Bel. São Paulo: Moderna, 2007.
. Menina bonita do laço de fita. São Paulo: Ática, 2005.
MUNDURU, D. Kabá Darebu. São Paulo: Brinque-Book, 2002.
REVIEJO, C. As casas de ontem e de hoje. Curitiba: ed. Base, 2008.
55
O enunciado do projeto já remete a uma fala bastante conhecida não somente
pelas crianças, mas por adultos que tiveram contato com as narrativas infantis, como é o
caso da “Branca de Neve”, cuja fala da personagem/madrasta “Espelho, espelho meu, diga
quem sou eu...”, foi utilizada como mote para a primeira fase do projeto. A personagem da
história da Branca de Neve, conhecida por esses dizeres, ao estar diante de um espelho
mágico, obrigava-o a responder-lhe, positivamente, que sua beleza era incomparável a de
qualquer outra mulher que habitasse o reino.
Em contrapartida, os dizeres tão conhecidos na história da literatura infantil
foram apropriados e ressignificados em um contexto pedagógico, passando a ser associados
com a construção da identidade da crianças. Com a utilização do espelho como metáfora, e
através de atividades significativas de leitura, discussões, produções textuais, dinâmica de
grupo, troca de experiências, poderá ser possível responder: quem sou eu?
Com relação às etapas do projeto, este inicia-se com a apresentação do projeto
pela professora, e o produto final esperado. Na etapa seguinte, a proposta é fazer a leitura do
livro de literatura infantil: “Bisa Bia Bisa Bel” - obra vencedora de vários prêmios, escrita
pela renomada autora de livros infantis: Ana Maria Machado. A atividade está organizada
em: 1) leitura de cada capítulo do livro com as crianças, em voz alta, pela professora e 2)
reflexão sobre cada um dos capítulos associados aos objetivos e conteúdos a serem
trabalhados como planejado.
Além de seguir o planejamento, a professora possui um caderno de registros
sobre as atividades do projeto; este caderno cumpre a função de um diário sobre a
implementação das atividades planejadas. Utilizou-se este documento para dar visibilidade
às experiências vivenciadas pelos alunos da sala. Embora as atividades pedagógicas não
tenham sido restritas somente à leitura de textos, focou-se nos registros das práticas de
leitura propostas no projeto e vivenciadas em sala de aula.
No primeiro dia de registro, a professora fez a leitura do 1º capítulo do livro
“Bisa Bia Bisa Bel” (Ana Maria Machado), e relatou que:
“Após leitura, as crianças fizeram um reconto oral e discutimos a leitura
feita. Na discussão, recuperamos a questão dos guardados que temos em
casa, aquela caixa em que estão as lembranças do passado das famílias. As
crianças relataram coisas que ainda têm de quando eram bebês”. (Caderno
de Registro, Projeto Espelho, espelho meu, diga quem sou eu. Professora
Mariana, 2012).
56
A passagem evidenciada acima, demonstra que, ao ler o primeiro capítulo do
livro de Ana Maria Machado – “Bisa Bia Bisa Bel” – obra que discute sobre as histórias de
vida de pessoas de gerações distintas, a professora, através do input textual, faz
intervenções entre o que foi lido e coordena uma discussão sobre a história do livro,
associando com as vivências dos alunos. Nesta relação, é possível afirmar que a professora,
com esse tipo de prática, constrói possibilidades de diálogos entre o texto lido e as
experiências do “universo cultural- cognitivo” (MARCUSCHI, 1995) das crianças,
remetendo às memórias de uma infância não tão distante, mas repleta de significados.
Após a leitura do primeiro capítulo, os alunos participaram de uma “roda da
memória”, onde cada criança expôs para os demais colegas e para a professora um objeto
significativo, o qual representasse passagens significativas da vida de cada um deles. A
professora relata que foi bem interessante essa atividade.
Na mesma semana, a professora retomou a leitura do livro, segundo capítulo e,
após a leitura, as crianças fizeram o reconto oral, sendo discutidas questões referentes à
semelhança física das crianças com seus parentes. Foi proposta para a turma uma entrevista
para fazer com os pais, para colher informações referentes ao nascimento e primeiro ano de
vida de cada um dos alunos.
No dia seguinte, foi lido para as crianças o terceiro capítulo, segundo o relatório
da professora, que descreveu, no livro de registro, detalhes sobre o conteúdo deste capítulo
e expôs o que foi feito após a leitura do mesmo:
“Discutimos o trecho lido e combinamos de na próxima aula trazer fotos
das bisas e das avós. Socializamos as entrevistas que as crianças fizeram
com os pais sobre dados de seu nascimento e primeiro ano de vida”.
(Caderno de Registro, Projeto Espelho, espelho meu, diga quem sou eu.
Professora Mariana, 2012).
A professora relatou o seguinte, através do registro diário, correspondente à
semana do dia 05/03/2012 ao dia 09/02/2012:
“Li para as crianças do capítulo 4 até o 8 do livro Bisa Bia, Bisa Bel.
Discutimos todos os capítulos e as crianças fizeram ilustrações. Depois do
último capítulo fizemos o reconto oral do livro todo. Fiquei feliz das
crianças lembrarem de detalhes que eu havia esquecido, como foi o caso
dos objetos que Bisa Bia contou à bisneta que existiam na época dela,
como por exemplo: o urinol (penico)”. (Caderno de Registro, Projeto
Espelho, espelho meu, diga quem sou eu. Professora Mariana, 2012).
57
Cabe aqui retomar como a professora utiliza o livro de literatura infantil em sala
de aula. O que se pode observar é que a mesma leu o primeiro livro proposto no projeto, e
desenvolveu as práticas pedagógicas de leitura, além de outras associadas a ela, como se
verifica na sequência:
1) leitura feita pela professora em voz alta em sala de aula, para a turma toda;
2) reconto feito pelas crianças a cada capítulo lido;
3) organização de roda da memória em que, a partir da leitura do livro, as crianças
puderam levar para a escola “ objetos de memória” e relatar suas histórias de vida
para os colegas;
4) reconto oral do livro na íntegra;
5) ilustrações feitas pelas crianças sobre o livro lido.
Ainda no mês de março, a professora iniciou o segundo livro de literatura
infantil intitulado “Tem um avô no meu quintal”. Ela justificou, em seus registros, que era
um livro que não tinha sido inserido no planejamento, mas devido à temática estar
relacionada com as discussões sobre memória e história pessoal, foi incluído.
Aproveitamos a história para falar de tudo que aprendemos com nossos
avós. As crianças contaram que aprendem brincadeiras com os avós como:
corda, pipa, pião, esconde-esconde, além disso os avós são excelentes
contadores de histórias e que gostam de estar com os avós.
Esse livro contribuiu muito com nosso trabalho, pois permitiu refletir
sobra a importância de aprender com os mais velhos e saber respeitar a
cultura, o modo de viver de cada um. (Caderno de Registro, Projeto
Espelho, espelho meu, diga quem sou eu. Professora Mariana, 2012).
58
É pertinente ressaltar que, no caso do livro “Tem um avô no meu quintal”. O
que ficou bastante marcante, na leitura que fez com os alunos sobre este livro, foram as
possibilidades de relações que o mesmo permitiu, o resgate de brincadeiras antigas de rua
citadas pela professora e, além disso, a história também suscitou a discussão sobre a
importância de respeitar os mais velhos e o modo de viver de cada um. Na leitura deste
livro foi possível verificar as diversas relações entre a história e as vivências das crianças e
de suas famílias.
Como registrado no planejamento da professora, a história lida para os alunos
foi “A Branca de Neve e os Sete anões”. Fica evidente, no relato da professora, a
participação efetiva das crianças no processo de discussão sobre os textos lidos e a
produção de comentários. No caso desta história, é relatado o seguinte:
“Hoje li para as crianças o livro: “Branca de Neve e os Sete Anões”. Ao
terminarmos de ler as crianças comentaram que conheciam a história de
outro jeito. Então, expliquei que existem várias versões da história, e
fizemos um relato de como são as versões que conhecemos. Concluímos
que o que muda de uma versão para a outra são as tentativas de matar a
Branca de Neve utilizadas pela madrasta e como a Branca de Neve acorda
do sono profundo após morder a maçã”. (Caderno de Registro, Projeto
Espelho, espelho meu, diga quem sou eu. Professora Mariana, 2012).
Nesse trecho do registro da professora, nota-se uma atitude leitora por parte dos
alunos marcada pela intertextualidade, pois as crianças perceberam que existem versões
para uma mesma história. Isso foi possível devido ao conhecimento prévio que as mesmas
acionaram quando tiveram contato com uma das versões do conto “Branca de Neve e os
59
Sete Anões” lida pela professora, a qual abriu uma discussão sobre esse
questionamento das próprias crianças.
Comumente, subestimam-se as crianças na faixa etária, em que estão em
processo de alfabetização. É recorrente a preocupação excessiva em ensinar a ler e a
escrever de forma alfabética, no primeiro ano escolar. Muitos desses educadores sempre
questionam o trabalho desenvolvido na educação infantil, pois dizem que as crianças
chegam ao ensino fundamental sem conhecer minimamente as letras e os números. Essa
necessidade de alfabetizar as crianças - no sentido de que elas apropriem-se do código,
acaba por fragmentar o conhecimento e, sobretudo, implica em não ouvir o que a criança
tem a dizer.
Ao ler o conto da “Branca de Neve e os Sete anões para as crianças, a
professora percebeu que os mesmos já conheciam a história Além disso, identificaram
diferenças no conteúdo do conto. Ao considerar esses saberes das crianças, a professora
investiu em uma reflexão, permitida pela leitura de uma das versões, em comparação com
outras suscitadas pelos alunos. Essa mediação pedagógica rompeu com a visão de um
aluno tradicional que não sabe ler e escrever, convencionalmente, e por não ter as
ferramentas de comunicação, são considerados imaturos para possuírem conhecimentos
sobre leitura e, incapazes de fazer relações. Será que são mesmos? Ou os educadores ainda
não aprenderam a ter sensibilidade e voltar o olhar pedagógico para o aluno, escutar o que o
outro tem a dizer, mesmo que este seja criança e esteja em uma fase de desenvolvimento
sócio cognitivo inicial.
Ao se lançar luz sobre as práticas pedagógicas de leitura ocorridas na sala do 1º
Ano A, da EMEF. Prof. André Tosello, a partir dos registros da professora da sala, é
possível reiterar o quão importante e significativo para o aprendiz são os conteúdos e os
conhecimentos adquiridos na escola, quando abordados de maneira criativa, através da
reflexão e da interação verbal entre professores e alunos, valorizando os conhecimentos
prévios, as histórias de vida. Neste sentido, a opção pela literatura contribui para a mudança
de olhar sobre o educando, mais humanizada. É o que afirma Cosson (2011):
Na leitura e na escritura do texto literário encontramos o senso de nós
mesmos e da comunidade a que pertencemos. A literatura nos diz o que
somos e nos incentiva a desejar e a expressar o mundo por nós mesmos. E
isso se dá porque a literatura é uma experiência a ser realizada. É mais que
um conhecimento a ser reelaborado, ela é a incorporação do outro em mim
sem renúncia da minha própria identidade. No exercício da literatura,
podemos ser outros, podemos viver como outros, podemos romper os
60
limites do tempo e do espaço de nossa experiência e, ainda assim,
sermos nós mesmos. É por isso que interiorizamos com mais intensidade
as verdades dadas pela poesia e ficção. (COSSON, 2011, p. 17)
Foram muitas as atividades desenvolvidas a partir do projeto interdisciplinar,
como apresentado (planejamento anual), nessa dinâmica. Em um outro momento foram
usados livros de literatura. Um deles foi o livro de Ana Maria Machado “Menina Bonita do
Laço de Fita”, utilizado a partir de uma indagação, segundo a professora:
“Após falarmos um pouco sobre como manter uma vida saudável com boa
alimentação, exercícios físicos e higiene, começamos a pensar na seguinte
questão: Somos todos iguais? Para iniciarmos as discussões fizemos a
leitura do livro: “Menina Bonita do Laço de Fita” - Ana Maria Machado”.
(Caderno de Registro, Projeto Espelho, espelho meu, diga quem sou eu.
Professora Mariana, 2012).
Novamente, apareceu em seus registros a utilização dos livros de literatura
infantil, para o início de uma conversa, de uma discussão sempre atrelada a uma temática
importante, e também para responder aos conteúdos curriculares. Mas não somente para tal:
sobretudo, percebe-se o objetivo de fazer a criança pensar, refletir sobre a construção do
conhecimento. Após ler o livro para e com os alunos, foi exibido o filme “Kiriku e a
Feiticeira” - filme que aborda a história de uma criança que vive em uma aldeia na África.
A professora solicitou que os alunos fizessem uma lista das características dos personagens
principais e, em seguida:
“Questionei as crianças sobre o que diferia nas duas histórias. Relataram
que, além do lugar em que viviam, o Kiriku conhecia sua história porque
perguntou para a mãe, foi atrás do avô e a menina não sabia, pois quando o
coelho questionava porque ela era tão “pretinha” sempre inventava uma
história. As crianças disseram que é importante a gente conhecer a própria
história”. (Caderno de Registro, Projeto Espelho, espelho meu, diga quem
sou eu. Professora Mariana, 2012).
61
Além de incentivar a discussão e a comparação sobre as características dos
personagens do livro e do filme, essa atividade propiciou às crianças chegar à conclusão de
que é importante conhecer a própria história. Isso desencadeou conversas sobre os gostos,
os desejos e as escolhas de cada sujeito da turma, possibilitando a compreensão das
diferenças e a valorização do outro. Foram introduzidas as reflexões sobre a história do
Nemo - filme e, da boneca Abayomi, para finalizar as questões sobre as diferenças pessoais,
familiares e culturais.
Um outro livro foi introduzido para dar continuidade às discussões sobre
organização familiar: “A melhor família do mundo”, de Susana Lopez, o qual aborda a
temática da adoção da personagem principal. Pelo que foi registrado pela professora, a
leitura deste livro foi profícua, para que os alunos se sentissem no lugar do outro, nessa
história específica, da criança abandonada, “enxergando” a importância de uma família que
cuida do outro sem, necessariamente, ter laços familiares consanguíneos.
62
Após uma série de atividades intensas sobre a formação das famílias de cada
criança e reflexões sobre os diversos tipos de organização familiar, foram produzidos
esquemas sobre a árvore genealógica de cada sujeito da sala; inclusive, foi abordada a
importância do animal de estimação ser tratado com carinho e sua posição como um ente da
família. Na sequência do trabalho pedagógico, as reflexões se ampliaram a partir de
conversas sobre o lugar onde se vive. Para subsidiar as discussões, a professora leu para e
com as crianças os livros “Onde Estamos”, de Ely Barbosa e “Uma Casa para Viver”, de
Maria Luísa Aroeira e Míriam L. da M. Fontes.
Esta prática propiciou comparações entre os conteúdos dos dois livros: um livro
mais voltados para o entendimento da ocupação do espaço e suas relações entre casa, rua,
bairro, cidade e assim sucessivamente; e o outro sobre a história das moradias no decorrer
da história. Segundo a professora, a leitura dos livros, sobretudo do “Uma casa para viver!
fez com que:
“As crianças tiveram curiosidade a respeito do surgimento do dinheiro,
então falamos sobre como viviam os homens da caverna, depois os
nômades que procuravam comida e que depois começaram a plantar,
então expliquei o mercado de troca e que com o crescimento populacional
tiveram que usar moedas de trocas (que ainda não era dinheiro como
temos hoje), mas as coisas foram caminhando até que chegasse como
somos hoje.” (Caderno de Registro, Projeto Espelho, espelho meu, diga
quem sou eu. Professora Mariana, 2012).
Além dos livros citados, foram utilizados outros que estão no projeto, além de
alguns que foram inseridos no decorrer do mesmo. Entretanto, o objetivo não foi dar conta
de todas as especificidades das práticas pedagógicas desenvolvidas no projeto
interdisciplinar. Selecionaram-se algumas passagens, as quais dão visibilidade à utilização
63
de textos literários no processo de aquisição de alfabetização e letramento pelos alunos
desta sala, com ênfase no que Cosson (2011) chama de letramento literário - um conceito
que rompe com as apropriações tradicionais de textos literários na escola. Para este autor:
Nesse caso é fundamental que se coloque como centro das práticas
literárias na escola a leitura efetiva dos textos, e não as informações das
disciplinas que ajudam a constituir essas leituras, tais como a crítica, a
teoria ou a história literária. Essa leitura também não pode ser feita de
forma assistemática em nome de um prazer absoluto de ler. Ao contrário,
é fundamental que seja organizada segundo os objetivos da formação do
aluno, compreendendo que a literatura tem um papel a cumprir no âmbito
escolar. (COSSON, 2011, p.23).
Em geral, os livros de literatura são utilizados nas séries iniciais como um
artefato cultural lúdico, para momentos de recreação, lazer e para trabalhar com os alunos
as escritas de algumas palavras que contribuem para a alfabetização. Além disso, os
professores costumam selecionar livros com pouco texto, pois acreditam, como sinalizado
anteriormente, que os alunos ainda não têm maturidade cognitiva para apropriarem-se de
histórias mais complexas, textos mais densos. Por outro lado, os professores não
conhecem as obras literárias, não pesquisam títulos e não investem seu tempo nessas
leituras.
Sendo assim, a literatura não é explorada da forma como deveria. O que se traz
nesta pesquisa é a possibilidade de um investimento, por parte de uma educadora, em
práticas pedagógicas de leitura literária, as quais são caracterizadas por letramento
literário.
A seguir é apresentada, na íntegra, a segunda fase do projeto interdisciplinar, e
retomados os registros feitos pela professora sobre o desenvolvimento do mesmo no 2º ano
do Ciclo II. Algumas práticas pedagógicas do ensino de leitura são recorrentes; entre
outras que serão relatadas, apresentam-se novas possibilidades de se trabalhar com a
leitura literária na escola.
QUADRO 6: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 2ª Fase
CURSO: 2ª ano ciclo I ANO: 2013
Campinas- SP
CIÊNCIAS/HISTÓRIA/GEOGRAFIA
Os conteúdos de Ciências, História e Geografia serão trabalhados por meio de projeto, durante o
ano letivo.
64
PROJETO: “NA TRILHA DA MINHA VIDA...”
JUSTIFICATIVA: o Projeto “Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...”, realizado no ano
letivo de 2012, tem a finalidade de trabalhar a origem de cada família, história do sobrenome, as
raízes culturais/sociais/étnicas de cada aluno, bem como as relações entre os seres vivos nesse
percurso, observando, pesquisando, investigando os lugares (espaços percorridos, vividos)
através de várias fontes de informações: documentos, relatos, objetos, imagens, estabelecendo
relações entre o presente e o passado, pensando no futuro
OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE HISTÓRIA:
Reconhecer-se como sujeitos que fazem história em seus grupos de convívio.
Contextualizar sua história pessoal e familiar no âmbito das relações sociais da escola.
Analisar documentos históricos e fontes de informação, tais como documentos escritos,
relatos orais, objetos pessoais, imagens e reconhecer algumas de suas funções.
Identificar permanência e transformações sociais, econômicas e culturais nas vivências
cotidianas das famílias e da escola, estabelecendo relações entre o presente e o passado.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE GEOGRAFIA:
Conhecer a diversidade de moradias e discutir aspectos humanos e sociais envolvidos.
Explorar percursos rotineiros e identificar o próprio endereço e o da escola, fazendo uso
de representações cartográficas.
Conhecer e reconhecer os espaços escolares e suas funções.
Analisar, relacionar e comparar informações sobre o espaço geográfico que ocupam.
Valorizar e respeitar o ambiente escolar e seus recursos humanos e preservá-lo como
espaço coletivo.
Reconhecer e valorizar os diferentes papéis sociais desempenhados por si e pelas pessoas
da família, da escola, da comunidade e de outros meios em que estejam inseridos.
Identificar e discutir a estrutura do trânsito e as sinalizações existentes no entorno da
escola e sua relação com a mobilidade.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE CIÊNCIAS:
Relacionar as fases da vida com as transformações do corpo humano e os diferentes
comportamentos a elas associados.
Compreender que o alimento é fonte de energia para o desenvolvimento físico.
Compreender as relações entre os seres vivos e os espaços em que vivem.
Identificar as características (físicas, alimentares, reprodutivas, locomoção) de diferentes
grupos de animais.
Relacionar os períodos do dia e da noite no planeta aos hábitos diurnos e noturnos dos
seres vivos.
ETAPAS:
Apresentar aos alunos a proposta do projeto e do produto final.
Retomar “o projeto: Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...”.
O meio em que vivemos: chuva de ideias (o que é meio ambiente?), o que temos no
65
meio ambiente (seres vivos, seres não vivos, recursos naturais).
Livro: Onde Estamos?
Planeta Terra – observação e estudo do Globo Terrestre (localizar nosso país).
O que temos no planeta Terra? Seres vivos (quais?), recursos naturais (quais?).
Classificação dos seres vivos (reino dos animais, reino das plantas, reino dos
fungos, reino protista, reino monera e vírus).
Estudo do reino animal (como são os grupos: características, habitat, alimentação,
reprodução).
Homem – animal racional – características do ser humano, suas relações no meio
ambiente, transformações ocorridas durante as fases da vida.
Recursos naturais necessários à vida (solo, ar, água).
Ciclo da água.
Preservação dos recursos naturais.
Alimentação – fonte de energia para o desenvolvimento físico.
Livro: “Energia do Alimento” – valor nutricional dos alimentos.
Cuidados com a saúde – higiene, vacinação, atividades físicas.
Relações que o homem estabelece com os outros seres.
Produção de um livro contando a história de vida de um ser vivo (características,
reprodução, alimentação, habitat, relações com o meio ambiente).
Socialização das pesquisas, apresentação do livro para os colegas.
Voltando ao globo terrestre, localizar o Brasil.
Pesquisar o mapa do Brasil e localizar o Estado de São Paulo.
Estudo do mapa de São Paulo e localizar nossa cidade – Campinas.
Estudo do mapa de Campinas, localizar o bairro em que mora e onde está localizada
a escola.
Localizar a rua em que cada um mora.
Como é o trânsito em nossa cidade, no nosso bairro e em nossa rua.
A cada estudo do lugar que ocupamos iremos construindo as páginas do livro
sanfonado: “Onde Estamos? Meus lugares...”
Chegar até a casa e descrever a família.
Livro: “A árvore da família”.
Pesquisa do sobrenome da família – origem/significado.
Pesquisa do brasão da família.
Socialização dos dados obtidos nas pesquisas com os colegas.
História da formação do povo brasileiro.
Livro: “Tem Tupi na oca e em quase tudo que se toca”.
Livro: “Meu Tataravô era Africano”.
Entrevista coletiva com a Orientadora Pedagógica Ana Cláudia (professora de História).
Trabalho em pequenos grupos sobre a formação do povo brasileiro, tendo como
fontes de pesquisa a entrevista com a Ana Cláudia, textos oferecidos pela professora
e o livro “Meu Tataravô era Africano”.
Confecção de cartazes para a socialização das pesquisas.
Livro: “A colcha de retalhos”.
Roda de imagens e objetos que trazem as raízes culturais e as memórias de cada família.
Livro: “Felpo Filva”.
Quem sou? Autobiografia.
Livros: 1- “Carta errante, avó atrapalhada, menina aniversariante”, 2- “Tem uma
história nas cartas da Marisa”, 3- “De carta em carta”.
Recebendo uma carta – cada aluno receberá uma carta escrita pela professora.
Meios de comunicação.
Escrita de uma carta contando aos pais as descobertas, as trilhas que estamos
percorrendo no projeto.
66
Ida ao Correio postar as cartas.
Pesquisa com os pais sobre fatos marcantes na vida da criança e da família.
Confecção de uma almofada com a autobiografia.
Socialização da autobiografia.
Construção do jogo de trilha com os fatos marcantes da vida de cada um.
Passeio de Maria Fumaça (túnel do tempo).
PRODUTO FINAL:
Jogo de trilha – “Na trilha da minha vida”.
AVALIAÇÃO:
Entendendo a avaliação como um instrumento para o planejamento e encaminhamento do
trabalho docente, para que os alunos possam concluir os objetivos propostos, ela será
processual. Inicia-se com a diagnóstica e segue com o acompanhamento dos alunos em todas as
etapas, observando, registrando o processo de ensino-aprendizagem (dificuldades, avanços,
caminho percorrido). Todo o processo será documentado em caderno de registro (observações
da professora e autoavaliação dos alunos), atividades realizadas pelos alunos.
BIBLIOGRAFIA
ADELSIN. Cuidar bem do ambiente. São Paulo: Peirópolis, 2009.
BARBOSA, E. Onde estamos? São Paulo: Paulinas, 2006.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília:
MEC/SEF.
CAMPINAS. Diretrizes Curriculares da Educação Básica para o Ensino Fundamental – Anos
Iniciais: Um processo Contínuo de Reflexão e Ação: Prefeitura Municipal de Campinas,
Secretaria Municipal de Educação, Departamento Pedagógico/organização e coordenação:
Heliton Leite de Godoy, 2012.
FURNARI, E. Felpo Filva. São Paulo: Moderna, 2006. MACHADO,
A. M. De carta em carta. São Paulo: Moderna, 2002.
MARTINS, G., TELLES, T. S. Meu Tataravô era Africano. São Paulo: DCL, 2008.
MELLETT, P., ROSSITER, J. Energia do Alimento. São Paulo: Scipione, 1994.
PINSKY, M. Carta errante, avó atrapalhada, menina aniversariante. São Paulo: FTD, 1999.
SANTOS, W. M. Tem Tupi na oca e em quase tudo o que se toca. Belo Horizonte: Autêntica, 2011.
SILVA, C. C., SILVA N. R. A colcha de retalhos. São Paulo: Editora do Brasil, 1995.
STAHEL, M. Tem uma história nas cartas da Marisa. São Paulo: Clube do Livro, 1986.
ZAKZUK, M. A árvore da família. São Paulo: Panda Books, 2007
67
2.2. Projeto “Na Trilha da Minha Vida ...”
Ao iniciar a segunda fase do projeto interdisciplinar, a professora retomou os
caminhos percorridos pelas crianças na primeira fase deste, relembrando com eles o que
aprenderam, através de uma conversa informal e foi introduzindo novas temáticas, dando
continuidade ao desenvolvido no ano anterior. Houve uma ampliação das discussões sobre
os espaços ocupados pelas crianças, passando pela casa, bairro, cidade. Foram introduzidas
atividades sobre ambiente natural e ambiente modificado, para isso a professora recorreu
ao livro “Esta casa é minha!”, de Ana Maria Machado.
Segundo os registros da professora, a leitura do livro possibilitou a discussão
sobre ambientes naturais e ambientes modificados e, após as discussões, foi utilizado o
livro didático de ciências para a construção dos conceitos científicos e a leitura de
imagens. Isto possibilitou que as crianças ampliassem a dimensão do micro e do macro, e
as possibilidades de vida nesses ambientes. Foi retomada com os alunos a temática sobre o
ambiente em que vivemos.
Para subsidiar as reflexões sobre ambiente em que vivemos, a professora releu
para as crianças o livro “Onde Estamos?”, de Ely Barbosa, para focar no vários lugares em
que se pode estar ao mesmo tempo. Segundo a professora:
“Após a leitura, discutimos os ambientes em que vivemos, as
crianças acharam fantástica a viagem do quarto ao universo e do
universo para o quarto, perceberam que ocupamos vários
ambientes” (Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida,
Professora Mariana, 2013).
68
Aqui aparece uma prática que é a releitura de um mesmo livro de literatura com
objetivos pedagógicos distintos. Segundo os relatos da professora em seu caderno de
registros, foi possível verificar que, no segundo ano, ela buscou trabalhar com textos mais
teóricos para conceituar todo o conhecimento que os alunos vinham construindo através das
discussões promovidas pela leitura dos livros de literatura, na interface com suas vivências,
desde o primeiro ano escolar. Cabe ressaltar a importância do papel de mediação da
professora na aquisição dos conhecimentos conceituais, ou sistematizados. Para Vigotsky
(2012), a criança aprende muito antes de entrar na escola. Segundo o autor:
Tomemos como o ponto de partida o fato de que a aprendizagem da
criança começa muito antes da aprendizagem escolar. A aprendizagem
escolar nunca parte do zero. Toda a aprendizagem da criança na escola
tem uma pré-história. Por exemplo, a criança começa a estudar aritmética,
mas já muito antes de ir à escola adquiriu determinada experiência
referente à () quantidade, encontrou já várias operações de divisão e
adição, complexas e simples; portanto a criança teve uma pré-escola de
aritmética, e o psicólogo que ignora esse fato é um cego. (VIGOTSKY,
2012, p.109).
A afirmação de Vigotsky (2012), sobre a ignorância do psicólogo por não ver
que a criança aprende antes mesmo de entrar na escola, é um preceito que serve para o
professor que não enxerga e não valoriza as experiências prévias da criança, as quais o
autor denomina de idade pré-escolar.
Ao analisar o desencadeamento do projeto interdisciplinar proposto pela
professora Mariana, é possível afirmar que a mesma não somente valorizou, no primeiro
ano de escolarização das crianças, os conhecimentos prévios adquiridos por elas na idade
pré-escolar, assim como valeu-se dos livros de literatura para dialogar com esses
conhecimentos e, a partir disso, ampliar seu repertório.
Estar atenta a essas questões e, sobretudo à escolarização, e ir desenvolvendo
estratégias que permitam as crianças a apropriarem-se dos conceitos abstratos, é um os
papéis da escola. Sobre o processo de aprendizagem pré-escolar e a escolar. Vigotisky
(2012) considera:
Pela sua importância, este processo de aprendizagem, que se produz antes
que a criança entre na escola, difere de modo essencial do domínio de
noções que se adquirem durante o ensino escolar. Todavia, quando a
criança, com suas perguntas, consegue apoderar-se dos nomes dos objetos
que as rodeiam, já está inserida numa etapa específica de aprendizagem.
Aprendizagem e desenvolvimento não entram em contato pela primeira
vez na idade escolar, portanto, mas estão ligados entre si desde os
primeiros dias de vida da criança. (VIGOTISKY, 2012, p. 110).
69
Dito isto, faz-se necessário reiterar a importância da mediação da professora
para a aquisição dos conceitos científicos desenvolvidos pela escolarização e, sobretudo,
criar estratégias de intervenção que valorizem o desenvolvimento intelectual da criança.
Para o autor, “o aprendizado escolar produz algo fundamentalmente novo no
desenvolvimento da criança” (VIGOTSKY, 2010). Com o objetivo de compreender este
processo, o autor faz uso de um novo conceito: a zona de desenvolvimento proximal, que
estabelece que “o aprendizado deve ser combinado de alguma maneira com o nível de
desenvolvimento da criança”. (VIGOTSKY, 2010, p.95).
As relações reais entre o processo de desenvolvimento e a capacidade de
aprendizado da criança são marcadas por dois níveis de desenvolvimento: a) nível de
desenvolvimento real - é o indicativo do que a criança pode fazer por ela mesma, ou seja,
este nível diz respeito ao “nível de desenvolvimento das funções mentais da criança que se
estabeleceram como resultado de certos ciclos de desenvolvimentos já
completados”(VIGOTSKY,2010, p.95,96); b) nível de desenvolvimento proximal – estão
relacionadas “àquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de
maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentemente em estado
embrionário” (VIGOTSKY, 2010, p.98).
Em suma, entre o nível de desenvolvimento real, que se refere às etapas do
desenvolvimento já alcançadas, e o nível de desenvolvimento potencial, aquelas que
deverão ser atingidas, entre uma e outra, existe a zona de desenvolvimento proximal,
espaço em que deve ocorrer a atuação do professor, o qual deve ter como objetivo intervir
para que a criança alcance uma nova fase de desenvolvimento intelectual.
Portanto, a tarefa do professor é fundamental para que seus alunos, no processo
de ensino-aprendizagem, consigam atingir os propostos educativos. No caso específico da
criança que está na fase de apropriação de sistemas simbólicos, como a leitura e a escrita,
cabe ao professor, enquanto sujeito mediador desse processo, criar estratégias de
aprendizagem, atividades de diversos níveis de conhecimento que deem conta de contribuir
para o crescimento intelectual dos seus alunos.
No decorrer da segunda etapa do projeto, a professora utilizou um outro livro de
literatura para dar continuidade à discussão sobre os espaços ocupados, e fez relações com
as crianças sobre os lugares estudados, tais como quarto, casa, escola, bairro, cidade,
ampliando para planeta terra, lua, sol, estrelas, ou seja, a composição da nossa galáxia. O
livro utilizado é “Estrelas e Planetas”, de Pierre Winters.
70
Na sequência, foi montado um roteiro de discussão sobre a leitura do livro e
feito um registro coletivo sobre as respostas obtidas nas discussões coletivas. Em seguida,
os próprios alunos montaram, cada um, um livro próprio sobre os espaços estudados. A
ênfase dos estudos desta vez foi sobre a organização política do Brasil, com seus estados,
culminando na cidade de Campinas, suas regiões e a composição de seu bairros, com
discussão sobre pertencimento. Até chegar na organização do bairro onde moram as
crianças, com uma profícua reflexão sobre transportes, sinais de trânsito e orientações para
os pedestres.
Após essas discussões, o foco do trabalho pedagógico voltou-se para a
composição familiar; para isto, a professora, retomou as reflexões ocorridas no primeiro
ano, através do livro “A Árvore da Família”, de Maísa Zakzuk. Foi levantada com os alunos
a história dos sobrenomes das crianças e desenvolvidos os conceitos: gerações e imigração.
71
Este livro foi lido em partes e, no decorrer da leitura, a professora solicitou que
os alunos fizessem pesquisas a partir das questões: Por que me chamo assim? História do
sobrenome. Concomitante à leitura do livro, foi feita a socialização das pesquisas dos
alunos. Em seguida, a professora elaborou uma lista com os sobrenomes das crianças.
Os estudos sobre a origem dos sobrenomes propiciaram a discussão sobre como
o Brasil foi formado, quem foram os povos que chegaram nestas terras. As conversas entre
professora e alunos renderam tanto que ultrapassou os séculos, até chegar nos primeiros
habitantes que vivam no Brasil, antes da chegada dos portugueses. Para compreender um
pouco da história dos povos indígenas, a professora leu com os alunos o livro “Tem Tupi na
Oca, e em quase tudo que se toca”, de Walter Moreira Santos. Sobre essa experiência, a
professora relatou:
“Após a leitura, fizemos uma reflexão sobre a vida dos índios, retomamos
a nossa visita à aldeia em Cabreúva, em 2012, a leitura do “Diário de
Caxi”. As crianças falaram sobre a vida do índio antes e depois da chegada
dos portugueses ao Brasil (retrataram essa passagem através de desenhos).
Estudamos palavras de nosso vocabulário que têm origem indígena”.
(Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida, Professora
Mariana, 2013).
É pertinente ressaltar que, após a leitura do livro, no momento da reflexão sobre
o que foi lido, foram associadas às experiência de um estudo do meio, em que as crianças
tiveram contato com o modo de vida dos Guaranis. Isso permitindo que as mesmas
fizessem relações entre os modos de vida antes e depois da chegada dos portugueses ao
Brasil. A leitura possibilitou uma discussão mais complexa, em que aparecem conceitos de
mudanças e permanências, imprescindíveis para a compreensão de muitos conteúdos
históricos.
72
Na sequência do projeto, foi lido pela professora o livro de literatura “Meu
Tataravô era Africano”, de Georgina Martins e Teresa Silva Telles. Sobre a leitura deste
livro a professora faz a seguinte observação:
“A cada capítulo do livro fomos discutindo a vinda dos africanos para o
Brasil como escravos, toda a vivência que tiveram (trabalho escravo,
castigos, péssimas condições de vida, vendidos como mercadoria, as
fugas, os quilombos, as leis, ...). As crianças ficaram espantadas com
todas as situações e elaboraram questões para a Orientadora Pedagógica
” (Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida, Professora
Mariana, 2013).
Através da história contida no livro citado, as crianças emocionaram-se com a
difícil vida dos africanos no Brasil, sentiram-se na condição do outro, o sofrimento, a
saudade da terra natal. Esses sentimentos foram despertados a partir da leitura de textos
narrativos, onde os personagens se tornam mais próximos do leitor. Acredita-se que um
livro didático, com uma linguagem mais abstrata e conceitual, na maioria das vezes, não
suscita tais sentimentos, pois a preocupação é com uma linguagem mais científica. Aqui
fica claro como a utilização de textos dessa natureza atinge a sensibilidade da criança.
Como relatou a professora, os alunos elaboraram questões para uma entrevista
marcada com a orientadora pedagógica da escola, que também é professora de história, para
sanar algumas dúvidas da história dos escravos africanos no Brasil. Para fechar a
discussão sobre a formação do povo brasileiro, as crianças, em grupo, produziram telas e
um texto coletivo, representando as cenas dos capítulos iniciais da história do Brasil.
73
Depois das discussões sobre a formação do povo brasileiro, a professora
retornou à questão sobre a origem de cada família, agora com novas informações através
das leituras, pesquisas, tais como a origem do sobrenome e a árvore genealógica de cada
criança. Foram retomadas com as crianças as discussões sobre a história da família, com
ênfase na, na saudade, nos objetos que representam o tempo histórico. Foi lido pela
professora o livro “Colcha de Retalhos”, de Conceil Corrêa da silva e Nye Ribeiro Silva.
De acordo com a professora:
As crianças trouxeram objetos e fotos que retratam as memórias das
famílias. Discutimos um pouco o que é memória, o que é saudade. As
crianças disseram que saudades podemos sentir de uma pessoa que está
longe, de um lugar que já fomos, de coisas que já passaram. Disseram
também que memória pode estar em objetos, em fotos em livros, em
cartas...”(Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida,
Professora Mariana, 2013).
Após a leitura do livro, foi feita uma roda de memória, em que cada criança
levou, para socializar com o grupo, alguns objetos referentes à história da sua família: fotos
dos pais, avós, tios etc; roupa dos pais quando pequenos, calçados, quadros, registros de
nascimento, cartas, entre outros objetos representativos da história das crianças, os quais
remetem à memória histórica.
A partir dessas reflexões, foi introduzido o estudo sobre gêneros textuais,
assunto surgido em decorrência dos conhecimentos que as crianças já tinham sobre a
estrutura de uma autobiografia e da carta. A professora leu com as crianças o livro “Felpo
Filva”, de Eva Furnari. Segundo a professora:
74
“Com essa leitura, conversamos sobre vários gêneros textuais: autobiografia,
carta, cartão postal, bula, manual de instrução, poesia, fábula, conto... As
crianças escreveram a primeira versão autobiografia. Estudamos a estrutura
de uma carta. As crianças fizeram a leitura da primeira versão da
autobiografia para a sala.” (Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha
Vida, Professora Mariana, 2013).
Na sequência do trabalho, foram selecionados pela professora dois livros
de literatura que abordam como um dos assuntos a carta. Os livros são “Tem uma História
nas Cartas da Marisa”, de Mônica Stahel e “Carta Errante, Avó Atrapalhada”, de Mirna
Pinsky.Com relação a esses livros, foram feitos:
“Leitura e comentários, trabalhamos a cultura da menina, da avó e as
lembranças da avó (retrospectiva da sua própria vida)”. (Caderno de
Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida, Professora Mariana, 2013).
É importante ressaltar que, após as leituras dos livros de literatura, é recorrente
que a professora solicite o reconto da história e que produzam comentários sobre os livros
lidos.
75
Para enriquecer as discussões sobre o gênero carta, atrelados a outros assuntos
discutidos no decorrer do projeto interdisciplinar, a professora propôs para os alunos a
leitura do livro “De Carta em Carta”, de Ana Maria Machado. Segundo os registros da
professora:
“Uma leitura emocionante, que encanta e traz a importância da
alfabetização e de se comunicar através da carta. Estudamos a estrutura de
uma carta, como escrevê-la e suas funções”. (Caderno de Registro, Projeto
Na Trilha da Minha Vida, Professora Mariana, 2013).
Além da leitura dos livros citados, a professora preparou uma atividade interessante.
Segue o registro:
76
“Durante o mês de outubro, as atividades do projeto foram: a professora
escreveu uma carta para cada aluno dizendo da alegria de tê-los como
alunos e do desenvolvimento que tiveram durante o ano. As cartas foram
postadas no correio no dia 14 de outubro. As crianças escreveram cartas
para um familiar contando sobre as atividades que veem realizando no
projeto de história. As cartas foram levadas ao correio pelos próprios
alunos.” (Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida,
Professora Mariana, 2013).
Na sequência da leitura dos livros que remetem à temática carta e suas
interfaces, como relatado no registro, a professora escreveu uma carta para cada aluno,
expondo sobre o processo de aprendizagem que cada um vivenciou naquele ano. Esta
prática foi muito significativa, pois os alunos sentiram-se motivados por terem recebido
nas suas casas, uma carta da professora. Uma experiência que promove o aprendizado de
conhecimentos conceituais através de uma relação de afeto com o objeto cultural.
A segunda fase do projeto foi finalizada no final do ano com uma exposição e apresentação
cultural dos alunos da sala.
2.1. Projeto: “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens”
QUADRO 7: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 3ª Fase.
CURSO: 1ª ano ciclo I – Ensino Fundamental
ANO: 2014
Campinas - SP
CIÊNCIAS/HISTÓRIA/GEOGRAFIA
Os conteúdos de Ciências, História e Geografia serão trabalhados por meio de projeto, durante o ano
letivo.
Projeto: “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens”
Justificativa: dando continuidade ao projeto, “Na trilha da minha vida”, realizado no ano letivo de
2013, o presente projeto tem a finalidade de convidar as crianças a comemorarem e celebrarem o
tempo. O tempo passado, o tempo presente, para desvendar a própria história.
O projeto justifica-se por trabalhar as heranças culturais trazidas das diferentes regiões do Brasil pelos
pais e avós dos alunos, estudando os diferentes espaços, tipos de moradias, meios de transportes,
vegetação, cuidados com o meio ambiente, alimentação, saúde, características físicas e culturais das
pessoas de cada região.
Objetivos de Ciências:
77
Compreender que o corpo humano é constituído de ossos, músculos e articulações que
permitem movimentos variados para interagir com o ambiente;
Reconhecer hábitos alimentares e de higiene, fundamentais para a saúde e para uma vida
saudável, relacionando-os às condições sociais, que são ou não asseguradas à sua
comunidade;
Compreender a importância da preservação de todas as espécies para o equilíbrio ambiental;
Identificar as características dos vegetais e os seus diferentes grupos;
Compreender os movimentos do Planeta Terra (translação e rotação), relacionando-os às
estações do ano e suas interferências no ambiente e no ciclo vital dos seres vivos.
Objetivos de Geografia
Identificar e avaliar as ações humanas em diferentes espaços, tempos e suas transformações;
Utilizar recursos visuais (desenho, foto, mapa, plantas e outros) como instrumentos de
análise dos diferentes espaços;
Apropriar-se, gradativamente, dos conceitos dos pontos cardeais, como referência;
Identificar e descrever as diferenças e semelhanças entre o modo de vida no campo e na
cidade, as formas de produção em diferentes espaços, reconhecendo suas inter-relações;
Analisar e comparar a natureza expressa no espaço vivido em relação às suas
manifestações presentes em outros ambientes;
Conhecer e valorizar diferentes atividades econômicas, suas especificidades e relações
entre elas e com a natureza;
Analisar e discutir a estrutura do trânsito e as sinalizações existentes no bairro e sua
relação com a modalidade;
Conhecer os diferentes meios de transportes utilizados nas regiões brasileiras.
Objetivos de História
Reconhecer-se como sujeito que faz história em seu grupo de convívio e nas relações
com outros grupos sociais, desenvolvendo uma postura de cidadania;
Reconhecer permanências, semelhanças e transformações sociais, econômicas e culturais
no cotidiano das famílias, escola e seu entorno;
Analisar documentos históricos e fontes de informação, tais como documentos escritos,
relatos orais, objetos pessoais e imagens, relacionando-os com acontecimentos no tempo
em seus grupos de convívio;
Identificar permanências e transformações sociais, econômicas e culturais do entorno da
escola (bairro, distrito), estabelecendo relações entre o presente e o passado.
Conhecer a cultura das regiões brasileiras e reconhecer sua influência no cotidiano
familiar e da comunidade.
Conteúdo de Ciências
Corpo humano – relação ossos, músculos e articulações nos movimentos;
Formas de locomoção, restrição de movimentos;
Alimentação saudável;
Saúde corporal e bucal;
Preservação ambiental e das espécies;
Morfologia vegetal;
Diferenciação de tipos de plantas;
Regularidade dos movimentos da Terra: translação e rotação;
Passagem dos dias e noites;
Estações do ano;
Horário de verão.
78
Conteúdos de Geografia:
O bairro da escola: localização, infraestrutura;
Os bairros formam a cidade: o centro e a periferia como áreas de uma cidade;
Localização (bairro, cidade, estado, país);
Divisão das regiões brasileiras;
Mapas: leitura e análise de títulos, legenda, fonte – partindo da moradia, bairro, cidade,
estado, país, continente, mundo;
Pontos cardeais como instrumento de orientação espacial;
Zona rural: características, transformações, dificuldades, desenvolvimento e qualidade de
vida;
Zona urbana: características, transformações, dificuldades, desenvolvimento e qualidade
de vida;
Atitudes de cuidado e preservação do meio em que se vive;
As relações entre trabalho, profissões e renda (no tempo e no espaço);
O movimento no trânsito – pedestres, motoristas, passageiros;
Melhoria qualitativa da mobilidade: sinalização de trânsito horizontal e vertical, direção
defensiva.
Conteúdos de História
Como aprendemos na interação com os outros;
Reconhecimento e análise de documentos históricos e fontes de informações da vida
pessoal, familiar e da escola e seu entorno;
História pessoal, familiar, da escola e seu entorno;
Aspectos históricos do presente e passado nas famílias, escola, bairro e seu entorno;
História dos antepassados com ênfase nos locais de nascimento;
Aspectos culturais, econômicos e sociais das regiões brasileiras;
Direitos e deveres das crianças.
Etapas:
Retomada dos projetos “Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...” (2012) e “Na trilha
da minha vida” (2013);
Pesquisa com os pais para descobrir de que região, estado e cidade do Brasil vieram os
bisavós, avós e pais;
Montar, na sala de aula, o mapa do Brasil dividido em regiões e cada aluno irá marcar a
região de origem da família;
Livro “Histórias da Nossa Gente”, de Sandra Lane;
Estudo das regiões brasileiras (localização dos Estados que compõe cada uma delas);
Explorando a vegetação/recursos naturais da Região Norte: texto – A história do guaraná;
Pesquisa de plantas, árvores da Região Norte;
Livro “Seringueira”, de Regina Casé e Estevão Ciavatta;
Estudo da estrutura dessa vegetação;
Explorando a vegetação/recursos naturais da Região Nordeste: Texto – O sapo encantado;
Pesquisa sobre plantas/árvores da Região Nordeste;
Estudo dessa vegetação;
Explorando a vegetação/recursos naturais da Região Centro-oeste: texto – Na roda do
jatobá;
Pesquisa sobre plantas/árvores da Região Centro-Oeste;
Estudo dessa vegetação;
Explorando a vegetação/recursos naturais da Região Sudoeste: Texto – Os sabiás;
Pesquisa sobre plantas/árvores da Região Sudeste;
Estudo dessa vegetação;
79
Explorando a vegetação/recursos naturais da Região Sul: Texto – A lenda do mate;
Pesquisa de plantas/árvores da Região Sul;
Estudo dessa vegetação;
Relacionar todos os tipos de vegetação estudados com as condições ambientais e
climáticas, trabalhando os movimentos da Terra (translação e rotação), as estações do ano
e a questão do horário de verão;
Alimentação saudável – a importância dos vegetais na alimentação e na medicina;
Relacionar a boa qualidade de vida (higiene, alimentação, exercícios físicos, lazer) ao
desenvolvimento do corpo humano, principalmente com os ossos, os músculos, as
articulações, a saúde corporal e bucal;
Preparar uma exposição com a vegetação típica de cada região, algumas plantas
medicinais e a importância da vegetação para a boa qualidade de vida dos seres vivos;
Fazer uma horta com garrafas pet;
Ensaio da música “Herdeiros do Futuro”, de Toquinho (refletir sobre a preservação
ambiental e das espécies);
Encerramento do 1º trimestre;
Refletir sobre os aspectos estudados no ano de 2013 referentes ao bairro, à escola, ao
nosso lugar no espaço, para iniciarmos o estudo das regiões do Brasil, pensando no
espaço que ocupam;
Livro “A Paisagem”, de Maria Luiza Favret;
Livro “As Histórias e os Lugares”, de Elias José;
Livro “Ópera Brasil de Embolada”, de Rodrigo Bittencourt (leitura, reflexão, discussão
sobre as paisagens e problemas do Brasil);
Retornar a Região Norte para estudo do espaço: Texto: A lenda da bacaba – observação e
estudo do mapa, Estados/Capitais, bandeiras, algumas características geográficas da
região;
Retornar a Região Nordeste: Texto – A princesa de Jericoacoara – observação e estudo do
mapa, Estados/Capitais, bandeiras, algumas características geográficas da região;
Retornar a Região Centro-Oeste: texto – O Sol e a Lua – observação e estudo do mapa,
Estados/Capitais, bandeiras, algumas características geográficas da região;
Retornar a Região Sudeste: Texto – A mochila de ouro – observação e estudo do mapa,
Estados/Capitais, bandeiras, algumas características geográficas da região;
Retornar a Região Sul: Texto – São Sepé – observação e estudo do mapa,
Estados/Capitais, bandeiras, algumas características geográficas da região;
Observar as transformações ocorridas nos ambientes pela ação humana;
Identificar as diferenças dos espaços urbanos e rurais e as condições de vida, verificar as
profissões predominantes em cada região;
Identificar os meios de transportes utilizados nas regiões, os impactos ambientais,
sinalizações e leis de trânsito;
Representar por meio de maquetes os principais espaços de cada região do Brasil;
Ensaios de um musical para apresentação para os pais: “Notícias do Brasil”, de Milton Nascimento;
Encerramento do 2º trimestre;
Livro “Falando Banto”, de Eneida D. Gaspar (leitura e discussão da influência do
vocabulário Banto em nossa língua);
Retornar a Região Norte: Texto – A história do manganês – Aspectos históricos e
culturais da região (festas, hábitos, culinária, artesanato, dialeto, um pouco da história de
cada estado;
Retornar a Região Nordeste: Texto – O governador do sertão, livro: “Lampião e Maria Bonita - o rei e a rainha do cangaço” – Liliana Iacocca – aspectos históricos e culturais da região (festas, hábitos, culinária, artesanato, um pouco da história de cada estado;
Livros “O Tabuleiro da Baiana”, de Sônia Rosa; “Capoeira”, de Sônia Rosa; “Maracatu”,
de Sônia Rosa;
80
Literatura de Cordel;
Livro “O Herói de Damião – em a descoberta da capoeira”, de Iza Lotito;
Retornar a Região Centro-Oeste: Texto – Romãozinho – aspectos históricos e culturais da
região (festas, hábitos, culinária, artesanato, um pouco da história de cada estado;
Retornar a Região Sudeste: Texto – Chico Rei – aspectos históricos e culturais da região (festas,
hábitos, culinária, artesanato, um pouco da história de cada estado;
Livros “Jongo”, de Sônia Rosa; “Feijoada”, de Sônia Rosa;
Retornar a Região Sul: Texto – Um castelo no céu – aspectos históricos e culturais da região
(festas, hábitos, culinária, artesanato, um pouco da história de cada estado;
Estabelecer relações entre a cultura de cada região e as influências dela em nossa vida, o que
herdamos e usamos no nosso dia-a-dia;
Identificar as influências culturais das regiões brasileiras trazidas por imigrantes para nossa
escola e nosso bairro;
Pesquisar o modo de vida das crianças de cada região brasileira e analisar se os direitos e
deveres a elas atribuídos estão sendo garantidos;
Selecionar aspectos de cada região para um desfile cultural;
Confeccionar fantasias para o desfile;
Confeccionar telas para cenário do desfile com características marcantes de cada região;
Apresentação do desfile ao som de músicas que caracterizam cada região do Brasil.
Produtos Finais:
1º Trimestre – exposição da pesquisa sobre vegetais típicos de cada região do país, vegetais
utilizados na medicina, horta em garrafas pet e apresentação musical “Herdeiros do Futuro”,
de Toquinho;
2º Trimestre - maquetes dos principais espaços de cada região do Brasil e apresentação do
musical “Notícias do Brasil”, de Milton Nascimento;
3º Trimestre – desfile cultural das regiões brasileiras.
AVALIAÇÃO:
Entendendo a avaliação como um instrumento para o planejamento e encaminhamento do trabalho
docente, para que os alunos possam concluir os objetivos propostos, ela será processual. Inicia-se com
a diagnóstica e segue com o acompanhamento dos alunos em todas as etapas, observando, registrando
o processo de ensino-aprendizagem (dificuldades, avanços, caminho percorrido). Todo o processo
será documentado em caderno de registro (observações da professora e autoavaliação dos alunos),
atividades realizadas pelos alunos e uma avaliação integrada ao final de cada trimestre.
BIBLIOGRAFIA
BALL, Johnny. Pense em um número – uma viagem fascinante ao mundo dos números
BITTENCOURT, Rodrigo. Ópera Brasil de embolada. RJ: Pallas, 2010
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília:
MEC/SEF.
BUENO, Renata. Poemas Problemas. São Paulo: Editora do Brasil, 2011.
CAMPINAS. Diretrizes Curriculares da Educação Básica para o Ensino Fundamental – Anos Iniciais:
Um processo Contínuo de Reflexão e Ação: Prefeitura Municipal de Campinas, Secretaria Municipal
de Educação, Departamento Pedagógico/organização e coordenação: Heliton Leite de Godoy, 2012.
CAMPINAS. Quadro de Suporte Pedagógico das Diretrizes Curriculares do Ensino Fundamental:
subsídios à prática educativa. Prefeitura Municipal de Campinas, Secretaria Municipal de Educação,
Departamento Pedagógico, Assessoria de Currículo e Pesquisa Educacional, Organização: Heliton
Leite de Godoy, 2013.
CARVALHO, M. Problemas? Mas que problemas?! Estratégias de resolução de problemas
81
Ao iniciar a terceira fase do projeto interdisciplinar, foi feita uma retrospectiva
com os alunos sobre o desenvolvimento das duas fases anteriores. A professora relatou
que as crianças lembraram prontamente, com riqueza de detalhes, os momentos vividos
nos dois anos do seu processo de escolarização. Em seguida, foi exposto para sala que o
projeto será uma sequência de tudo que já foi estudado e que será feito um passeio pelo
Brasil para descobrir que “muito que somos e temos são heranças das regiões brasileiras.”
(Prof. Mariana).
Para iniciar o projeto, os alunos fizeram uma pesquisa sobre o lugar de origem
dos pais e outras pessoas da família. Após desenvolvidas as pesquisas, foi proposto para os
alunos estudarem as influências da cultura dos outros estados na vida cotidiana de cada
um. A professora produziu um mapa de papel e colocou na parede da sala, cada aluno com
um bonequinho, também de papel afixou no mapa, a região de origem da família.
O livro “Histórias da Nossa Gente”, de Sandra Lane, foi apresentado para as
crianças e feita a leitura do prefácio escrita pelo cantor e compositor Rubinho do Vale. Em
seguida, a professora leu a apresentação do livro para as crianças e mostrou uma imagem.
matemáticos em sala de aula. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005.
CASÉ, Regina e CIAVATTA, Estevão. Seringueira. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2011.
FAVRET, Maria Luiza. A Paisagem. São Paulo: FTD, 2008.
FURNARI, Eva. Os Problemas da Família Gorgonzola. São Paulo: Global, 2004.
IACOCCA, Liliana. Lampião e Maria Bonita – o Rei e a Rainha do Cangaço. São Paulo: Ática, 2005.
JOSÉ, Elias. As Histórias e os Lugares. São Paulo: Paulus, 2005.
LANE, Sandra. Histórias da Nossa Gente. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2010.
LOTITO, IZA. O Herói de Damião – em a Descoberta da Capoeira. São Paulo: Girafinha, 2006.
ROSA, Sonia. Capoeira. RJ: Pallas, 2009.
O Tabuleiro da Baiana. RJ: Pallas, 2009.
Feijoada. RJ: Pallas, 2009.
Jongo. RJ: Pallas, 2009.
SALERNO, Silvana. Viagem pelo Brasil em 52 histórias. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2006.
TEIXEIRA, M. R. Matemática em mil e uma histórias – quem inventou o dinheiro? São Paulo: FTD, 2010.
82
Segundo seu registro:
“Perguntei para as crianças o que a imagem retratava. Prontamente
responderam que a imagem mostrava a chegada dos portugueses ao Brasil.
Fiz a leitura do capítulo 1: História da Nossa Gente’. Durante a leitura, as
crianças foram se lembrando de vários aspectos estudados no ano passado
(história dos índios, chegada dos portugueses, resistência dos índios,
confronto de culturas). As crianças fizeram comentários lembrando como
e em que condições os africanos chegaram ao Brasil. Terminamos a leitura
desse capítulo e construímos um comentário coletivamente.” (Caderno de
Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens,
Professora Mariana, 2014).
Com a leitura do livro citado, a professora retomou as discussões sobre a
história do Brasil, ao estudar a formação do povo brasileiro. Nesta fase do projeto, a ênfase
das discussões recaiu sobre a chegada dos portugueses, a implantação da escravidão no
Brasil - período colonial. O livro traz informações sobre alguns personagens importantes da
nossa história, como Chico Rei e Zumbi dos Palmares. Segue a continuidade do relato da
professora:
Com as histórias relatadas no livro “Histórias da Nossa Gente”, as crianças
puderam perceber o quanto o nosso país é rico em diversidade cultural, a
partir de agora embarcaremos em uma viagem às cinco regiões do Brasil.
Vamos? Boa Viagem? (Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando pelo
Brasil, desvendando minhas origens, Professora Mariana, 2014).
Ao retomar as práticas de leitura desenvolvidas no 1º e no 2º anos, é possível
inferir que a apropriação deste livro caracteriza-se por novos elementos, tais como: leitura
do prefácio e discussão do mesmo; leitura da apresentação do livro; leitura de imagens com
o intuito de promover a discussão de conceitos aprendidos no 2º ano; contato com
83
personagens reais da história do Brasil, narrados em forma de biografia. Ao comparar o uso
dos livros de literatura nas fases anteriores do projeto e na terceira fase, verifica-se uma
complexidade no uso desses materiais e as várias possibilidades de diálogo, sejam com
conceitos científicos, o apelo às experiências prévias do leitor, o uso de imagens como
forma de incentivar a retomada dos conhecimentos adquiridos e o incentivo a desvendar
conhecimentos novos.
Este livro também foi utilizado para o ensino de conhecimentos conceituais da
área de ciências, sobre vegetações nativas das 5 regiões do Brasil, temática que possibilitou
que os alunos acionassem os conhecimentos já adquiridos sobre a organização do Brasil em
regiões e suas especificidades históricas, culturais e ambientais.
A seguir, o livro trabalhado com os alunos foi “Viagem pelo Brasil em 52
histórias”, uma coletânea de narrativas do universo popular brasileiro, organizado pela
autora Silvana Salerno.
O primeiro texto lido com as crianças foi: “A história do Guaraná”, o qual diz
respeito à vegetação da região norte do Brasil. Segundo a professora:
“Lemos o texto em uma leitura compartilhada, depois discutimos as
seguintes questões: Que tipo de texto temos? Em que local acontece a
história? Quais são os personagens? O que entenderam da história? As
crianças souberam identificar que se trata de uma lenda e a compararam
com a lenda da mandioca. Falamos um pouco sobre a cultura indígena e
sobre a utilidade do guaraná.” (Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando
pelo Brasil, desvendando minhas origens, Professora Mariana, 2014).
A leitura do texto sobre a história do guaraná foi realizada de forma
compartilhada, ou seja, cada criança leu um trecho em voz alta e em seguida a professora
84
fez uma nova leitura do mesmo. Esta prática de leitura compartilhada apareceu pela
primeira vez nos registros da professora, possivelmente por as crianças já estarem
alfabetizadas; estas são convidadas a fazer uma leitura em sala, onde cada uma delas lê um
fragmento do texto. A pesquisadora esteve na sala em alguns momentos em que a
professora estava desenvolvendo a leitura compartilhada com seus alunos, sendo possível
observar que todos participavam, independente da fluência leitora, todas as crianças
respeitavam e contribuíam ajudando os alunos que demonstrava uma maior dificuldade
com a leitura.
Outro aspecto importante a ser ressaltado é que, após a leitura, a professora
propôs uma reflexão, através da formulação de algumas questões, que não têm o intuito de
mensurar o que se sabe através de respostas corretas ou erradas. Estas são elaboradas para
direcionar a reflexão e adquirir conhecimentos novos a partir dos já obtidos; são questões
com objetivos distintos, e as respostas são indícios para que a professora possa avaliar o
desenvolvimento dos alunos. Cabe ressaltar o registro que ela fez ao identificar os alunos
que conseguiram identificar o que é uma lenda e comparar com outra lenda já lida.
Após trabalhar com o texto narrativo lenda, a professora introduziu o gênero
informativo para ampliar os conhecimentos sobre vegetação do norte do Brasil e, em
seguida, leu com as crianças o livro “Seringueira”, de Regina Casé e Estevão Ciavatta.
Sobre a leitura deste livro, a professora registrou que:
“Durante a leitura, fomos parando para comentários e explicações, levei
para as crianças um pedaço de caule de uma seringueira, a semente e uma
pedaço da borracha[...] levei também fotografias de um seringal e da
extração de látex. Em seguida fizemos uma sistematização”. (Caderno de
Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens,
Professora Mariana, 2014).
85
A professora finalizou as discussões sobre a vegetação do nordeste com o
depoimento de um aluno da sala, cuja a família é do Pará, e este pôde relatar suas
experiências vivenciadas naquele estado da região norte.
Sobre a vegetação da Região nordeste, a professora leu para os alunos o
texto “Sapo Encantado”, também retirado o livro de Silvana Salerno. Segundo relato da
mesma:
“Fizemos a leitura do texto e as crianças, após reconto, identificaram
aspectos da vegetação contida no texto. Depois estudamos os aspectos da
vegetação nordestina, sempre com a ajuda de um mapa para que as
crianças percebessem na região a predominância de cada espécie.”
(Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando
minhas origens, Professora Mariana, 2014).
Após a leitura do texto, pode-se inferir, a partir do registro da professora, que os
alunos já sabiam quais as informações deveriam explorar, ou seja, os mesmos identificaram
os aspectos da vegetação nordestina, contidas na narrativa. Ao que indicam os indícios,
recuperaram essa informação de maneira autônoma. Após a leitura do texto narrativo, os
alunos registraram informações científicas sobre a vegetação nordestina.
Para o estudos das demais Regiões do Brasil e sua vegetação e meio ambiente
natural, foram utilizados outros textos do livro já citado “Viagem pelo Brasil em 52
histórias”; os textos selecionados foram “Na Roda do Jatobá” – Região Centro-Oeste, “Os
Sabiás” – Região sudeste e “A Lenda do Mate” – Região Sul. Os procedimentos didáticos
foram os mesmos: leitura compartilhada, leitura feita pela professora, comentários dos
textos lidos, complementação feita pela professora com outros textos de gêneros
informativos e científicos.
Após os estudos das cinco regiões do Brasil, com ênfase nas vegetação, tipos de
alimentos, animais, o assunto abordado passou a ser a organização do espaço brasileiro.
Para apresentar os conteúdos de geografia, a professora faz a seguinte explanação:
“A geografia estuda o espaço que ocupamos, os lugares que existem no
planeta Terra. Paisagem, em geografia, é tudo que podemos ver em um
lugar: as casas, as ruas, os rios, as pontes, as plantações, as matas, as
montanhas, o mar. Nem sempre as paisagens nos revelam coisas boas,
muitas vezes observamos poluição, destruição. Continuaremos nosso
passeio pelo Brasil, estudando um pouco das paisagens de cada região.”
(Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando
minhas origens, Professora Mariana, 2014).
A professora convidou novamente os alunos a uma viagem pelo Brasil, desta
86
vez com uma olhar para aspectos relacionados à sua geografia. Essa “viagem” tem um
ponto de partida e de chegada, seguindo um mesmo itinerário proposto ao se estudar o meio
ambiente brasileiro, ou seja, começando os estudos pela Região Norte, com a leitura do
texto “A lenda da bacaba” . Além da descrição das paisagens dessa região, foi trabalhada
com os alunos a organização política do território e a divisão em Estados.
Para a reflexão sobre a Região Nordeste, o texto selecionado foi “A Princesa de
Jericoacoara” e, posteriormente, estudados os Estados que compõem essa região. Com
relação à Região Centro-Oeste, foi lido o texto “O Sol e a Lua”, sobre as experiências
leitoras das crianças sobre este texto. A professora relata:
“Fizemos uma leitura compartilhada, depois as crianças fizeram o reconto
e comentários. As crianças explicaram que se tratava de uma lenda
(quando não tinham como explicar alguns fenômenos e situações os índios
e povos mais antigos usavam as lendas).
Como estamos iniciando o estudo geográfico da Região Centro- Oeste, fiz
a seguinte pergunta: O que o texto nos traz da Região Centro-Oeste? As
crianças responderam que aparecia: lugar de caça/ floresta/pantanal;
reserva indígena; rio Xingu e Estado do Mato Grosso. Após o estudo do
texto, fomos para o mapa do Brasil localizar a Região Centro-Oeste,
observamos os estados e países vizinhos.” (Caderno de Registro 1, Projeto
“Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens, Professora Mariana,
2014).
É importante ressaltar que, nesta passagem do registro, as crianças já
demonstram, a partir de seus comentários, conhecer algumas características de uma lenda.
Conhecimentos muito significativos, pois contribuíram para que compreendessem a função
social do texto lido. Um outro aspecto relevante no registro da professora diz respeito aos
elementos que as crianças reconhecem no texto e relacionam os mesmos às características
geográficas referentes à Região Centro-Oeste.
O texto selecionado para a introdução dos estudos sobre a Região sudeste foi
“A Mochila de Ouro”. Sobre o registro de leitura:
“Fizemos uma leitura compartilhada do texto (cada criança leu um
pedaço). Depois pedi para que comentassem. As crianças relataram
questões relacionadas ao egoísmo, avareza, a ser bom ou mau. Falaram
sobre a terra boa para plantar. Questionei as crianças quanto à ocupação da
Região Sudeste, disseram que existe mais zona urbana que rural e que
muitas pessoas saem, principalmente da Região Nordeste, para vir
trabalhar principalmente em São Paulo. Discutimos um pouco essa
questão, pois muitas vezes essas pessoas passam por muitas dificuldades
tendo que morar em favelas.” (Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando
pelo Brasil, desvendando minhas origens, Professora Mariana, 2014).
87
Novamente verifica-se a prática da leitura compartilhada e comentários sobre o
texto lido pelos alunos. Nesta leitura nota-se que a discussão sobre o espaço geográfico é
ampliado ao se produzirem inferências relacionadas a questões sociais decorrentes de
ocupação desordenada do espaço e geração de pobreza. Em seguida a essas discussões,
foram introduzidos conceitos sobre divisão política da região sudeste e a formação dos
estados.
Para finalizar o estudo sobre as Regiões brasileiras, à luz dos conceitos
geográficos, foi feita uma leitura compartilhada e discussão da lenda “São Sepé”, a qual
aborda a Região Sul do país. Foram identificados pelos alunos os estados pertencentes a
essa Região e mais características peculiares de cada um deles. Ao final do segundo
trimestre, os diversos trabalhos produzidos foram apresentados em uma exposição,
concomitante a uma mostra de danças sobre a temática estudada.
A fase seguinte da “viagem pelo Brasil” foi recuperada pela professora através
de uma série de experiências vivenciadas pelas crianças desde o 1º ano o Ciclo I. Segue o
relato da professora:
“Voltamos um pouco ao Projeto ‘Na Trilha da Minha Vida’, quando
estudamos nossas origens, voltamos à história do Brasil desde o
descobrimento. Vimos que quando os portugueses chegaram, encontraram
os índios e que depois foram chegando outros povos dentre eles os
africanos. Expliquei que nosso vocabulário tem muita influência indígena
e africana. Fizemos a leitura do livro ‘Falando Banto’, de Eneida D.
Gaspar.” (Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil,
desvendando minhas origens, Professora Mariana, 2014).
Com a leitura do livro citado, foram trabalhadas palavras e expressões de
origem indígena e africana que fazem parte da nossa cultura, as quais são usadas no dia a
88
dia. Para iniciar as reflexões sobre os conteúdos de história, a professora fez uma
retrospectiva do que foi estudado nas duas primeiras fases do projeto interdisciplinar,
conversou com os alunos sobre a origem de suas famílias, a importância dos objetos como
símbolos de memória, a composição étnica do povo brasileiro. Além do livro de literatura, a
professora propôs o estudo da letra da música “E outros quinhentos virão” – Palavra
Cantada, com o objetivo de retomar as origens da história do Brasil.
Na sequência, a proposta foi retomar a “Viagem pelo Brasil” a partir de uma
perspectiva cultural e histórica. Para isso foi lido o texto “A História do Manganês” (do
mesmo livro da Silvana Salerno). A partir da leitura, foram desenvolvidas pesquisas sobre
as especificidades culturais de cada estado que compõe a Região Norte e apresentadas para
os alunos músicas regionais: Cantiga de Penas; Rodaciranda; Ubirajara.
A professora solicitou para os alunos pesquisas sobre a Região nordeste do
Brasil. Após a socialização das mesmas e o trabalho com texto informativo, ela leu com os
alunos o livro “Lampião e Maria Bonita: o Rei e a Rainha do Cangaço”, de Liliana
Iacoccca. Sobre a leitura deste livro, a professora relata:
“Um texto bastante longo e denso. Após a leitura, as crianças teceram
alguns comentários. Partimos para a segunda leitura que foi compartilhada
do texto: ‘O Governado do Sertão’. Na discussão, as crianças
relacionaram as vivências de Lampião (de querer justiça social) com os
nossos dias. Falaram também sobre preconceito. Construímos um texto
coletivo contando um pouco sobre a vida de Lampião”. (Caderno de
Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens,
Professora Mariana, 2014).
Aqui, mais uma vez, a professora utilizou dois textos sobre a mesma temática
para subsidiar as discussões dos alunos, ou seja, a importância do recurso da
intertextualidade como incentivo à produção de inferências, comentários sobre os textos
lidos pelos alunos.
89
Para dar continuidade à “Viagem” pela Região nordeste, além de outros
aspectos da cultura nordestina, que é muito diversa e rica, foram enfatizados pela
professora a culinária e a capoeira. Para esta reflexão, foram utilizados os livros “ O Herói
de Damião: em a descoberta da Capoeira”, de Iza Lotito; “ Capoeira” ,de Sonia Rosa e “ O
Tabuleiro da Baiana”, de Sônia Rosa.
Sobre a Região nordeste, foram desenvolvidos muitos trabalhos pedagógicos,
desde produções de textos coletivos até estudo do gênero cordel e produção de livrinhos
pelos alunos sobre este gênero. Em seguida, a professora introduziu o texto “Romãozinho”
como início dos estudos da Região Centro-Oeste, texto também retirado do livro: “Viagem
pelo Brasil e 52 histórias”. Para ampliar os estudos sobre a história e cultura desta Região,
foi utilizada a música “Quero-quero” (Matogrosso do Sul) – Palavra Cantada e textos
informativos. Para trabalhar a Região sudeste, o texto selecionado foi “Chico Rei”, de
90
Silvana Salerno. Sobre a leitura deste texto, a professora relata:
“Lemos o texto e discutimos. As crianças falaram sobre a escravidão,
lembraram-se de trabalhos feitos no ano passado, comentaram sobre a
chegada dos africanos no Brasil em navios negreiros, a venda de escravos.
Falamos um pouco sobre o Aleijadinho e suas obras.” (Caderno de
Registro 2, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens,
Professora Mariana, 2014).
Este relato sucinto demonstra algumas das relações que os alunos estabeleceram
sobre o conteúdo aprendido nos anos anteriores com o atual e como, a partir dos livros e
textos lidos, a intervenção da professora através de suas práticas pedagógicas contribuíram
para a produção de inferências com base em um “universo Cultural- cognitivo”
(MARCUSCHI, 1985).
O texto escolhido para representar a Região sul foi “Um Castelo no Céu”, de
Silvana Salerno. Sobre a leitura deste texto, aparece no registro da professora uma prática, a
qual não se tem registro em momentos de leitura anteriores a este. Segue:
“As crianças leram o texto em pequenos grupos, discutiram e depois
fizemos a socialização com a turma toda. Durante o trabalho, percebi que
os grupos se organizaram muito bem para fazer a leitura e as discussões.
Na socialização, os grupos fizeram o reconto do texto e colocaram suas
opiniões...” (Caderno de Registro 2, Projeto “Viajando pelo Brasil,
desvendando minhas origens, Professora Mariana, 2014).
Desta forma, é possível afirmar que esta última prática pedagógica de leitura,
descrita no registro da professora Mariana, é caracterizada por uma total autonomia dos
alunos na relação com o texto. A professora demonstra orgulho diante da confiança que os
alunos apresentam ao participarem de uma atividade de leitura proposta por ela. O projeto
foi finalizado com outras atividades elencadas no planejamento anual. Os registros feitos
pela educadora fornecem pistas sobre como é o seu trabalho e como as crianças vão se
apropriando dos textos literários conduzidos a partir de uma abordagem interdisciplinar dos
conteúdos de história, ciências e geografia.
Pode-se inferir que as práticas pedagógicas, apresentadas e discutidas,
demonstram a preocupação da educadora em atuar na zona de desenvolvimento proximal de
seus alunos, pois, pelas suas práticas, pode-se afirmar que o ensino ministrado por ela prevê
o que a crianças aprenderam – zona de desenvolvimento real, a etapa superada de
91
aquisição de conhecimento e, o que ela tem possibilidade de apreender – zona de
desenvolvimento potencial. Sobre os processos de aprendizagem e desenvolvimento na
criança, Vigotsky (2012) considera que:
[...] a característica essencial da aprendizagem é que engendra a área de
desenvolvimento potencial, ou seja, que faz nascer, estimula e ativa na
criança um grupo de processos internos de desenvolvimento no âmbito das
inter- relações com outros, que, na continuação, são absorvidos pelo curso
interior de desenvolvimento e se convertem em aquisições internas da
criança. [...] Por isso, a aprendizagem é um momento intrinsicamente
necessário e universal para que se desenvolvam na criança essas
características humanas não –naturais, mas formadas historicamente.
(VIGOTSKY, 2012, p. 115).
Para Vigotsky (2012, p.13), é preciso “reexaminar todo processo das disciplinas
formais, do papel e da importância de cada matéria no posterior desenvolvimento
psicointelectual geral da criança”, Ao considerar essa afirmação, reitera-se a importância de
um trabalho pedagógico alicerçado na valorização dos conhecimentos prévios das crianças,
no seu caráter interdisciplinar e no compromisso da formação em um sujeito que produz
conhecimentos. A seguir, será exposta uma prática pedagógica desenvolvida pela
professora Mariana.
2.2. Sacola e Roda da Leitura
A Roda de leitura não é algo inovador enquanto prática pedagógica. É uma
atividade presente no cotidiano escolar, principalmente na educação infantil e no ensino
fundamental, sobretudo nos anos iniciais. Contudo, não se pode afirmar que existam
procedimentos, manuais que são seguidos por todas as escolas, como uma espécie de
protocolo de como proceder na Roda de Leitura.
Dessa forma, os professores que desenvolvem essa prática em sala de aula
fazem com diversos objetivos, considerando as especificidades de sua turma de alunos:
faixa etária; desenvolvimento cognitivo e afetivo; valores culturais, sociais e ideológicos.
A professora Mariana já desenvolve esta prática pedagógica há alguns anos.
Com o objetivo de desenvolver o prazer pelos textos literários envolvendo, inclusive
a família, agregou a sua sistematização a maleta da leitura, na sua sala do 1º ano, do ensino
fundamental, desde 2012.
São duas maletas que foram confeccionadas pela professora, cada uma delas
92
contendo dez livros e um caderno de anotações. A cada semana, duas crianças levam a
maleta e registram da forma que preferir a leitura que julgaram mais interessante; a família
também registra como foram os momentos de leitura. Os registros são socializados com a
turma. Além desses registros escritos, os alunos socializam com os colegas na Roda de
Leitura, os livros que mais gostaram, podendo ser os que estavam na maleta ou os que
foram retirados da biblioteca, outra opção para obter livros de literatura.
Toda semana há um momento específico para a Roda da Leitura; os alunos
acomodam-se em círculo, da maneira mais confortável e a professora vai chamando cada
uma das crianças, seguindo a organização do círculo/roda, e faz perguntas sobre o livro que
a criança leu: Qual o autor(a) desse livro? Você já leu outra história parecida com essa?
Qual a parte que você mais gostou desse livro? Além das perguntas, a professora pede à
criança: “conta pra gente um pouquinho da história”.
Todas as crianças envolvem-se na atividade, ouvindo o colega relatar sobre a
história do livro lido e também participando na sua vez de fazer o relato. Essa prática
demonstra a importância de ler para as crianças, ou ler com as crianças. Com relação ao
fazer cotidiano da sala de aula, o que se pretende com a prática Roda da Leitura é o
incentivo à criação, à imaginação e ao prazer pelo texto literário, considerando os
conhecimentos vivenciados pelos alunos e os adquiridos no momento do contar e ouvir
histórias, com a mediação significativa da professora. Dessa forma, a visão de um ser uno,
em que o cognitivo e o afetivo se interpenetram, deve permear todo processo que envolve
ensino e aprendizagem.
Com relação à afetividade, Wallon e Vygotsky demonstram que as
manifestações emocionais ganham complexidade atuando no universo simbólico, ou seja,
assumem o caráter social da afetividade quando argumentam que a relação afetividade –
inteligência é fundamental para o processo de desenvolvimento humano. Sendo assim, as
interações ocorridas são marcadas pela afetividade, o pensamento tem origem na
motivação, que inclui inclinações, necessidades, interesses, impulsos, afeto e emoção.
Como complementa Leite (2006): “o acesso ao mundo simbólico se dá por meio das
manifestações afetivas que permeiam as mediações que se estabelecem entre o sujeito e o
outro” (p. 24).
O que se almeja com determinadas práticas é a constituição de um leitor
autônomo, que compreenda as diversas funções da leitura em nossa sociedade, e possa
utilizá-la para seu crescimento, enquanto indivíduo e sujeito histórico. No entanto, anterior
a essa visão política, o que se espera é que a criança, nos primeiros anos de escolarização,
93
possa desfrutar do prazer, da fantasia, da imaginação que a leitura é capaz de produzir, e
que essa educação dos sentidos seja incentivada e desenvolvida pela escola, em outros
espaços de sociabilidade, ressignificando as práticas de leitura – literária, capazes de
formar seres humanos mais éticos e conscientes de suas ações.
2.3. FLISELLO – Festival Literário do Tosello.
O Festival Literário do Tosello é um evento implementado na escola, em 2013,
com o objetivo de propiciar aos alunos um encontro com a literatura, a arte, a história, as
memórias que envolvem nosso cotidiano. O Festival ocorre durante dois dias consecutivos,
no mês de outubro, em comemoração ao dia das crianças. No primeiro, dia ocorrem as
oficinas em que a criança tem a oportunidade de ler, criar, imaginar, conhecer, aprender e
interagir com as obras, os colegas, os artistas, em atividades lúdicas. No segundo, os alunos
apreciam uma peça de teatro, uma apresentação musical. É um evento que reúne toda a
escola em momentos de prazer e encantamento, propiciados pela leitura e outras expressões
artísticas.
Em 2013, a autora homenageada foi Ana Maria Machado, os alunos tiveram a
oportunidade de conhecer melhor a biografia dessa autora e sua produção literária, através
das oficinas em que todos da escola participaram. No ano seguinte, em 2014, foi a vez de
Vinícius de Moraes ser homenageado e os alunos apropriarem –se de suas produções para
as crianças. Em 2015, tiveram o prazer de entrar em contato com o universo das obras de
Eva Furnari, autora já conhecida das crianças através do trabalho desenvolvido em sala de
aula pelas professoras. O FLISELLO é uma oportunidade única de acesso a um evento de
literatura, que as crianças da escola não têm contato, pois tradicionalmente a data em
comemoração ao dia das crianças sempre foi nesta escola e em muitas outras, como um dia
de entretenimento, regado a brincadeiras e lances diferentes.
Neste capítulo, procurou-se expor de forma sucinta o trabalho desenvolvido por
uma professora comprometida com a educação de qualidade e, com novas estratégias de se
ensinar o ler e o escrever nos primeiros anos do ensino fundamental. Seu trabalho foi
apropriado pela escola, transformando-se em um projeto coletivo de educação. No próximo
capítulo, será discorrido o percurso metodológico percorrido para o desenvolvimento desta
pesquisa.
94
CAPÍTULO 3
3. PERCURSO METODOLÓGICO
O objetivo dos investigadores qualitativos é o de melhor compreender o
comportamento e experiência humanos. Tentam compreender o processo
mediante o qual as pessoas constroem significados e descrever em que
consistem estes mesmos significados. Recorrem à observação empírica
por considerarem que é em função de instâncias concretas do
comportamento humano que se pode reflectir com maior clareza e
profundidade sobre a condição humana. (BOGDAN e BIKLEN,1994,
p.70).
3.1. Base Teórica
Para responder as questões da pesquisa e os objetivos relacionados à mesma,
buscou-se lançar luz nos processos de compreensão leitora de crianças matriculadas no 3º
ano do ciclo I - Ensino Fundamental I as quais participaram, durante os 3 primeiros anos de
escolarização, deste ciclo de Alfabetização. Além disso, foram evidenciadas as práticas
pedagógicas de leitura desenvolvidas pela educadora, que permaneceu durante esse ciclo de
formação atuando junto aos alunos. Desta forma, espera-se identificar como essas práticas
refletem nas inferências produzidas por crianças em situações de leitura.
O objeto de estudo desta pesquisa envolve a compreensão leitora de crianças em
fase de alfabetização/letramento, as quais tiveram a oportunidade de participar de projetos
interdisciplinares desenvolvidos nas disciplinas de ciências, história e geografia, entre
outras práticas de leitura literária, com ênfase na formação do sujeito leitor.
Para esta investigação optou-se pela abordagem qualitativa, pelo fato desta
metodologia valorizar a produção de dados de forma descritiva, sobre pessoas, lugares em
diversos contextos. Neste sentido, “as questões a investigar não se estabelecem mediante a
operacionalização de variáveis, sendo, outrossim, formuladas com o objetivo de investigar
os fenômenos em toda a sua complexidade e em contexto natural” (BOGDAN e
BIKLEN,1994, p.16).
Com relação ao contexto deste estudo, foi definido o espaço escolar, lugar onde
se estabelecem as diversas relações, não somente de ensino-aprendizagem, mas de
interações sociais diversas. A opção pela instituição escolar pode ser significativa para o
pesquisador, na medida em que existia a possibilidade de participar como observador das
vivências do cotidiano escolar. No entanto, cabe-lhe ter clareza do seu lugar neste contexto,
para que seja garantida a naturalidade das ações e atitudes dos sujeitos pesquisados, diante
95
da sua presença. Segundo Bogdan e Biklen (1994):
Como os investigadores qualitativos estão interessados no modo como as
pessoas normalmente se comportam e pensam em seus ambientes naturais,
tentam agir de modo a que as atividades que ocorrem na sua presença não
difiram significativamente daquilo que se passa na sua ausência.
BOGDAN e BIKLEN, 1994, p. 68).
A instituição escolar onde a pesquisa foi realizada é a mesma em que a
pesquisadora ocupa o cargo de orientadora pedagógica; sendo assim, a relação que se
estabelece entre a pesquisadora e os sujeitos pesquisados no decorrer da investigação, pode
se tornar complexa e confusa, pois ambos os papéis ocupados pela mesma pessoa, podem
gerar dificuldades de compreensão pelos sujeitos pesquisados e, também, contribuir para
que a pesquisadora, em algumas situações, possa ter ações incoerentes com seu papel
desempenhado em uma ou outra função. Sobre esses aspectos, Bogdan e Biklen (1994),
asseveram que:
Conduzir uma investigação com pessoas que conhece pode ser confuso e
embaraçoso. O treino de um investigador, mais do que a aprendizagem de
Cv 7Yompetências e procedimentos específicos, consiste na análise de [
impressões acerca de si próprio e da sua relação com os outros. Implica
que se sinta no papel de “investigador “. Se os objetos do seu estudo são
pessoas que conhece, a transferência da sua personalidade própria para a
de investigador faz-se de forma ambígua. (BOGDAN e BIKLEN, 1994 p.
87).
Como orientadora pedagógica, participo das atividades profissionais
concernentes ao cargo, tanto as que tangem às questões pedagógicas do ciclo I e II, como as
relacionadas às exigências burocráticas. Exceto às segundas-feiras, o restante da semana,
nos períodos da manhã e tarde, a orientadora está presente na escola, resolvendo várias
questões, frutos das demandas do cargo. As crianças não entendem muito bem o que é ser
orientadora pedagógica, havendo sempre a necessidade de explicar qual a função deste
cargo na escola. É interessante como são curiosos, sempre questionando o que uma
orientadora faz na escola. Percebe-se que as crianças têm a necessidade de compreender a
função de cada um dos funcionários na unidade educacional.
Procuro estar sempre presente nos espaços ocupados pelos professores e alunos,
nos horários de aulas e em outros momentos do dia, tais como: refeitório, quadra de
esportes, biblioteca e sala de informática. Sempre vou às salas de aula para conversar com
professores e alunos sobre algum assunto e, muitas vezes, por solicitação de alguns
professores, conversando com alunos que necessitam de orientação.
96
No início da pesquisa, como ainda não tinha definido se faria a pesquisa com
todos os alunos da sala ou se definiria um grupo de alunos específico, passei a estar
presente semanalmente na sala de aula, sempre nas atividades de leitura que a professora
havia planejado: rodas da leitura, leituras de textos literários do projeto interdisciplinar,
entre outras atividades que envolvessem a participação das crianças em situações de leitura.
Desta forma, com a turma pesquisada, houve um processo de aproximação mais
efetivo, pelo fato de a pesquisadora estar em contato direto com as crianças, ou seja, por
conta da presença praticamente diária na sala de aula dessa turma. Isso gerou um
estreitamento nas relações entre ambos, contribuindo para que, nos momentos de pesquisa
de campo, os sujeitos pesquisados agissem de forma espontânea. Embora os dados tenham
sido coletados em 2014, essa turma foi acompanhada pela pesquisadora em vários
momentos, desde de 2012. Com a filmadora em mãos, passou-se a filmar quase que
semanalmente as rodas de leitura ocorridas na sala da professora Mariana; em um segundo
momento, foram filmadas as aulas de leitura, mais sistematizadas, cujo objetivo era
apreender as práticas pedagógicas desenvolvidas pela professora e os debates promovidos a
partir dessas leituras.
A partir do momento que os objetivos de pesquisas foram melhor delineados,
foi possível elaborar um “plano de investigação” (BOGDAN e BIKLEN,1994, p.83) e
definir quais dados deveriam ser produzidos na pesquisa; isso ocorreu de forma mais
sistemática em 2014
Após várias observações das aulas da professora, dos debates promovidos a
partir da leitura de textos literários pelas crianças, dos recontos feitos pelas mesmas nas
rodas da leitura, a questão principal da pesquisa ficou assim definida: Quais as inferências
produzidas pelas crianças do 3º ano do ensino fundamental I a partir da leitura de textos
narrativos (lendas brasileiras)? Um segunda questão surgiu a partir da principal, ou seja:
Quais as relações entre as inferências produzidas pelos alunos e os suas experiências
vividas, considerando seu universo cultural cognitivo (MARCUSCHI, 1985) e as práticas
pedagógicas de leitura vivenciados na escola?
Para responder a principal questão, houve a necessidade de especificar como os
dados seriam produzidos, ou seja, em que contexto imediato, e quais textos seriam
utilizados para a produção de inferências; além disso, quantas e quais crianças seriam
selecionadas para esta pesquisa de campo. Ao que tudo indicava, a investigação, além da
abordagem qualitativa, definiu-se como um estudo de caso centrado no procedimento de
observação, em um local específico dentro da instituição: um grupo específico de
97
pessoas a serem observadas em relação a uma atividade específica, no caso leitura de
textos escritos e produção de comentários orais- videogravados e posteriormente transcritos.
A opção pela instituição educacional, a qual a pesquisadora trabalha, pode ser
um entrave para o desenvolvimento da investigação, como já foi exposto e, ao selecionar
uma espaço e um grupo específico dentro da instituição para uma investigação, significa
também envolver-se em uma situação de risco, como alertam Bogdan e Biklen (1994):
A escolha de um determinado foco, seja ele um local na escola, um grupo
particular, ou qualquer outro aspecto, é sempre um acto artificial, uma vez
que implica a fragmentação do todo onde ele está integrado. O
investigador quantitativo tenta ter em consideração a relação desta parte
com o todo, mas, pela necessidade de controlar a investigação, delimita a
matéria de estudo. Apesar de o investigador tentar escolher uma peça que
constitua, por si só, uma unidade, esta separação conduz sempre a alguma
distorção. (A parte escolhida é considerada pelos próprios participantes
como distinta e, pelo observador, como tendo identidade própria.
(BOGDAN e BIKLEN, 1994, p. 91).
Essas questões permearam todo o período de coleta de dados, a professora da
sala explicou para as crianças sobre a pesquisa e que seria feita uma seleção de alunos. Em
conversa com a professora, procuramos escolher os alunos que se situassem em níveis de
desenvolvimento diferentes, mas que demonstrassem uma relação mais próxima com os
textos escritos. Isso não foi difícil, pois todos os alunos da sala já sabiam ler e teciam
comentários em vários espaços e nas várias atividades promovidas pela professora. A seguir
serão apresentadas as principais informações sobre a escola, espaço onde foi desenvolvida a
pesquisa e a seleção dos alunos.
3.2. Descrição do Bairro e da Escola
A pesquisa de campo ocorreu em uma Escola Municipal de Campinas,
denominada EMEF – Escola Municipal de Ensino Fundamental unidade educacional
localizada na Vila Aeroporto, Região do Ouro Verde, pertencente à Região Sudoeste da
cidade de Campinas. O bairro onde está localizada fica muito próximo da Rodovia dos
Bandeirantes, sendo sua população composta sobretudo de migrantes oriundos de diversas
regiões do país, os quais se fixaram, na sua grande maioria, em Campinas, pelo seu
potencial de empregabilidade. A cidade transformou-se, na segunda metade do século XX,
em um polo de desenvolvimento industrial e tecnológico de referência do Estado de São
Paulo. Sobre a migração e trabalho pode-se destacar que:
98
Desde a década de 1990, assiste-se na região de Campinas a uma
intensificação dos fluxos populacionais intra-regionais, reforçando a
percepção de que vivemos uma era de proliferação dos
deslocamentos, já que a instabilidade do emprego e as oscilações na
renda põem em marcha permanente toda uma população em busca de
trabalho e moradia possíveis. (PESSOA, 2004. p.185).
Estas questões de caráter social, econômico e cultural têm refletido na dinâmica
das matrículas e da frequência escolar, pois o processo de itinerância da população escolar é
uma realidade vivenciada pela instituição de ensino: muitos alunos matriculados no início
do ano não permanecem na escola, havendo um grande número de pedidos de transferência
de matrículas para escolas de outras regiões do município, para outras cidades do estado e
para outros estados; em contrapartida, a demanda por matrículas na escola extrapola as
vagas oferecidas.
Acredita-se que essa mobilidade urbana seja decorrente das dificuldades
causadas pela instabilidade de trabalho e também por conta de configurações familiares.
Além disso, é recorrente o retorno das famílias que vieram de regiões distantes e decidem
retornar para o seu lugar de origem. Os deslocamentos contínuos das famílias dos
estudantes acaba por comprometer sua vida escolar, já que os mesmos não criam um
vínculo com a professora da sala e o processo de aprendizagem fica fragmentado.
A seguir, serão descritas algumas das principais características da região onde a
escola está localizada, a partir de dados obtidos do censo demográfico de 2010.
99
Figura 1: Indicadores de população, alfabetização e renda da área atendida pela
escola.
Considerando os dados do censo demográfico de 2010 (Fonte IBGE), foi
possível fazer algumas análises a partir dos números. Sobre o primeiro mapa - população
100
total - há cerca de 17.730 habitantes, nos setores representados no mapa - Vila Aeroporto e
adjacências, ou seja, o bairro no qual está localizada a EMEF e seu entorno tem uma alta
concentração de habitantes.
No segundo mapa - sobre o rendimento mensal por domicílio, pode-se concluir
que cerca de 16,9% dos domicílios dessa região (Vila Aeroporto e adjacências) possuem
renda média mensal de até 1/2 salário mínimo/pessoa. Esse é o valor médio mas a variação
de cores no mapa demonstra que existem diferenças dentro do próprio bairro. Os setores do
bairro e imediações, com as duas cores mais escuras, correspondem às comunidades mais
carentes (ocupações, favelas, etc) onde as pessoas possuem renda média mensal mais baixa.
Os dados acima podem ser contrastados com a média do mapa 3 que indica que
cerca de 2,20% apenas dos domicílios da Vila Aeroporto e adjacências possuem renda
média mensal de 10 ou mais salários mínimos por pessoa. Onde isso é demonstrado no
mapa (cor mais escura) existem condomínios fechados cuja renda média/mês é mais
elevada que a maior parte do bairro em que eles estão inseridos.
Em síntese, a EMEF está inserida em uma região populosa da cidade (mapa 1),
onde cerca de 16,9% dos domicílios/residências possuem renda média mensal de igual ou
menos de 1/2 salário mínimo por pessoa; apenas 2,20% dos domicílios possuem renda
média mensal igual ou acima de 10 salários mínimos por pessoa. Por ser uma escola situada
na periferia da cidade, a maior parte dos alunos matriculados são oriundos das
ocupações/comunidades existentes no bairro e imediações, cuja renda média mensal da
residência é igual ou inferior a 1/2 salário por pessoa, com um grau de escolaridade da
população também baixo (ver mapa de escolaridade).
Segue uma imagem de satélite, para uma maior visibilidade, sobre o bairro e
adjacências onde está inserida a EMEF.
101
Figura 2: Imagem de satélite
A escola está organizada em três períodos: manhã, tarde e noite. No período da
manhã, funciona o Ciclo I: 1º A e B; 2º A e B; 3ºA e B - totalizando 6 salas deste segmento
de ensino; e o Ciclo II: 4º A e B; 5ºA e B – 4 salas. No período da tarde, a unidade escolar
atende alunos do Ciclo III (6ºs e 7ºs anos) e o Ciclo IV (8ºs e 9ºs anos). A EJA (1º, 2º, 3º e
4º termos) funciona à noite. A equipe gestora da escola é formada por um diretor, dois vice-
diretores e dois orientadores pedagógicos.
Esta unidade escolar está localizada em uma área de risco, pois foi construída
sobre um córrego, desde a sua fundação, em 1982. É um prédio que já passou por diversas
reformas, no entanto, alguns problemas infraestruturais são recorrentes e permanecem sem
solução. Já ocorreram várias solicitações ao poder público para a mudança de prédio. Em
2011, houve um alagamento decorrente de uma forte chuva e o prédio ficou interditado por
uma semana, voltando a funcionar depois de algumas reparações.
Apesar da precariedade do edifício e do descaso do poder público em resolver
tal situação, a equipe de profissionais desta escola municipal tem buscado garantir uma
educação de qualidade para as crianças, jovens e adultos matriculados, através de uma série
de ações e projetos interdisciplinares, alguns deles já foram abordados no capítulo 2
pesquisa, pois estão diretamente vinculados às práticas desenvolvidas pela professora
Mariana, educadora que acompanhou os alunos durantes os 3 anos do ciclo I.
Além disso, a EMEF, há três anos, oferece aos seus professores Grupos de
102
Formação (GF), certificados pela prefeitura da cidade. No ano de 2014, a professora
Mariana ministrou um GF sobre “Projetos Pedagógicos na Escola Ciclada”, com a
participação de professores de diversas áreas e segmentos. No ano seguinte, foram dois GFs
ministrados pela mesma profissional: “Projetos Pedagógicos na Escola Ciclada – módulo II
e “Reflexões sobre a Alfabetização”. Estes cursos têm contribuído para a formação de
professores em exercício e também para mudanças de práticas pedagógicas.
Em 2013, funcionava nesta unidade escolar apenas um 2º ano do Ciclo I, sala
composta pelos alunos pesquisados. Naquele ano, foi aplicada a Provinha Brasil 7- na
avaliação sobre leitura, a sala ficou no nível 5:
Neste nível, os alunos demonstram ter alcançado o domínio do sistema de
escrita e a compreensão do princípio alfabético, apresentando um
excelente desempenho, tendo em vista as habilidades que definem o aluno
como alfabetizado e considerando as que são desejáveis para o fim do
segundo ano de escolarização. Assim, os alunos que atingiram este nível já
avançaram expressivamente no processo de alfabetização e letramento
inicial. Para além das habilidades dos outros quatro níveis, demonstram,
por exemplo: • compreender textos de diferentes gêneros e de
complexidade diversa, identificando o assunto principal e localizando
informações não evidentes, além de fazerem inferências. (INEP,
PROVINHA BRASIL, 2013).
O resultado obtido pelos alunos do 2º ano da EMEF, em 2013, na Provinha
Brasil, foi o melhor da cidade de Campinas em comparação com outras escolas municipais.
Este resultado teve uma grande repercussão no bairro, pois a mídia veiculou o nome da
escola e serviu como propaganda política do atual governo. Para a equipe gestora e para a
professora, o resultado positivo foi consequência da adoção de práticas pedagógicas que
priorizam o incentivo à leitura literária, ao desenvolvimento dos projetos interdisciplinares
e à forma de mediação assumida pela professora, a qual entende que os conteúdos
apropriados pelos alunos devam ser significativos para a sua formação escolar e humana.
7 http://provinhabrasil.inep.gov.br/
103
TABELA 1: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Nível de Alfabetização
TABELA 2: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Desenvolvimento das
Habilidades.
104
TABELA 3: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Rendimento nas
Questões Objetivas.
Os dados apresentados acima demonstram que 93% da turma de alunos do 2º
ano A, do ciclo II - ensino fundamental I, da EMEF pesquisada, demonstram ter alcançado o
domínio do sistema de escrita e a compreensão do princípio alfabético. Deste número, 70%
das crianças sabem inferir informação sobre o que leu (H10). Portanto, os dos dados obtidos
nesta avaliação externa instigaram a investigação sobre a compreensão leitora de algumas
das crianças selecionadas para a pesquisa, contribuindo para a necessidade de olhar para o
processo de formação destes leitores, através das produções de inferências e das relações
dialógicas entre autor, texto e leitor – novos sentidos são construídos a partir dessa
interação.
3.3. Descrição dos Sujeitos e procedimentos de coleta de dados
Foram selecionadas 3 crianças, sendo dois meninos e uma meninas, garantindo
que as crianças tivessem níveis diferenciados de relação com textos literários. Desta forma,
foram realizadas sessões de videofilmagens das 3 crianças, procedimento utilizado para
obter dados sobre quais tipos de inferências são produzidas pelas crianças em situações de
leitura, considerando que ler é produzir sentidos a partir de processos inferenciais
(MARCUSCHI, 2008).
105
Os participantes desta pesquisa são alunos que estavam matriculados em 2014, no 3º
Ano A do Ciclo I, na EMEF. Os 3 alunos foram matriculados no 1º Ano da referida
escola e permaneceram juntos durante os 3 anos, que é a duração do Ciclo I nas Escolas de
Ensino Fundamental da Rede Municipal de Campinas8; foram alunos da professora
pesquisada durante todo este período de alfabetização e letramento, identificados pelos
nomes fictícios: Pedro, Elisa e Luís.
Os sujeitos selecionados também participaram de forma efetiva dos projetos
desenvolvidos pela professora: “A sacola da Leitura”, Projetos Interdisciplinares “Espelho,
Espelho meu, diga quem sou eu ..., “Na Trilha da Minha Vida” e “Viajando pelo Brasil,
desvendando minhas origens”. Além dos projetos citados acima, os alunos participaram, em
sala de aula, dos momentos de leitura e discussão de diversos textos, sobretudo dos
narrativos.
Buscou-se valorizar o desenvolvimento cognitivo e as experiências escolares e
extraescolares de cada criança participante da pesquisa, pois acredita-se que a diversidade
contribuiu para a riqueza dos dados e da pesquisa.
As vídeofilmagens ocorreram no segundo semestre de 2014. Foram escolhidos
5 textos, dos quais utilizaram-se os dados de 3: “A Dança do Arco-íris”; “A Origem do
Oaipoque” e “Romãozinho” (O primeiro texto foi selecionado de uma revista de grande
circulação nacional; desenvolvida para professores, contém dicas de atividades para
elaboração de aulas com diversas temáticas. Os outros textos foram retirados do livro
“Viagem pelo Brasil em 52 histórias” - Silvana Salerno (2009)9, volume que reúne lendas e
contos populares tradicionais de nosso país. Esse livro faz parte da bibliografia utilizada
pela professora da sala nos projetos interdisciplinares.
Não foi definido previamente um lugar específico onde ocorreriam as sessões
de leitura; dependendo da disponibilidade dos espaços nos dias marcados pela
pesquisadora, o lugares mais utilizados foram: a sala da orientação pedagógica, sala de
aulas, sala de informática e sala das professoras de educação especial.
Optou-se por realizar duas sessões de leitura de cada texto. Em cada uma delas,
os alunos puderam recontar a história lida e tecer comentários, de forma espontânea e
também direcionada, a partir de algumas questões levantadas pela pesquisadora em
decorrência de conversas estabelecidas com os alunos durante o desenvolvimento de seus
8 Diretrizes Curriculares da Educação Básica para o Ensino Fundamental – Anos Iniciais: Um processo Contínuo
de Reflexão e Ação: Prefeitura Municipal de Campinas, Secretaria Municipal de Educação, Departamento
Pedagógico / organização e coordenação: Heliton Leite de Godoy. – Campinas, SP, 2012 9 http://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=403
106
comentários sobre os textos lidos. Tal procedimento será melhor explicitado no capítulo
quatro destinado à análise e categorização das inferências produzidas pelos alunos.
Neste sentido, a opção por duas sessões de leitura para cada texto deve-se ao
pressuposto de que há uma ampliação das inferências sobre os textos lidos, já que nas
primeiras leituras, aparece mais a prática em recontar a história e fazer comentários. Além
disso, entre a primeira leitura e a segunda, teve um tempo decorrido em torno de 1 mês a
algumas semanas. Isso contribuiu para que os alunos tivessem novas experiências que,
direta ou indiretamente, impactaram sua segunda leitura e, consequentemente, a produção
de novas inferências.
Portanto, na segunda leitura, houve uma preocupação (da maioria dos alunos)
em interagir com os textos, através de dúvidas (perguntas direcionadas à pesquisadora) e
problematizações de algumas passagens de cada texto lido.
A sigla PL – primeira leitura, refere-se ao material utilizado na primeira leitura
efetuada pela criança em cada texto lido e sobre as inferências orais produzidas pelas
mesmas; e a SL, refere-se à segunda leitura desenvolvida e, consequentemente, às
elaborações de inferências obtidas nesse processo.
Os textos selecionados são do gênero lenda e narrativa popular, com temáticas
do universo da cultura brasileira. Privilegiaram-se narrativas das cinco regiões brasileiras,
tendo- se como critério de escolha a proximidade da temática desenvolvida pela professora
da sala no Projeto: “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens”10,
TABELA 4: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 1
TEXTO: “A DANÇA DO ARCO-ÍRIS”
1ª Leitura
Pedro - Junho de 2014
Elisa - Julho de 2014
Luís – Julho de 2014
10 Justificativa: dando continuidade ao projeto: “Na trilha da minha vida”, realizado no ano letivo de 2013, o
presente projeto tem a finalidade de convidar as crianças a comemorarem e celebrarem o tempo. O tempo
passado, o tempo presente, para desvendar a própria história.
O projeto justifica-se por trabalhar as heranças culturais trazidas das diferentes regiões do Brasil pelos pais e avós dos alunos, estudando os diferentes espaços, tipos de moradias, meios de transportes, vegetação,
cuidados com o meio ambiente, alimentação, saúde, características físicas e culturais das pessoas de cada
região. (Planejamento desenvolvido pela professora pesquisada).
107
2ª Leitura
Pedro- Julho de 2014
Elisa – Julho de 2014
Luís – Julho de 2014
TABELA 5: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 2.
TEXTO: “A ORIGEM DO OIAPOQUE”
1ª Leitura
Pedro - 13 de Agosto de 2014
Elisa - 14 de Agosto de 2014
Luís - 15 de Agosto de 2014
2ª Leitura
Pedro- 02 de Setembro de 2014
Elisa - 24 de Setembro de 2014
Luís - 25 de Setembro de 2014
TABELA 6: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 3
TEXTO: “Romãozinho”
1ª Leitura
Pedro - 05 de Novembro de 2014
Elisa - 18 de Novembro de 2014
Luís – 05 de Novembro de 2014
2ª Leitura
Pedro - 18 de Novembro de 2014
Elisa - 27 de Novembro de 2014
Luís - 18 de Novembro de 2014
Após o período de coleta de dados, chegou o momento de voltar o olhar para a
análise dos dados, iniciando-se com as transcrições e, na sequência, debruçando-se
minuciosamente sobre o material produzido. Abandonar o campo pode ser uma tarefa
difícil, acompanhada de um sentimento de rompimento com as relações estabelecidas no
período de coleta. Como bem sinalizam Bogdan e Biklen (1994), “esse sentimento continua
de tal modo que, ao partir, sente que está a perder algo importante - dados novos que o
conduzirão as novas descobertas”. No final da coleta de dados, a dificuldade em abandoná-
lo se tornou tão evidente que sair do ambiente pesquisado, romper com as crianças e olhar
para o material produzido foi uma tarefa hercúlea.
108
Os dados foram coletados através de 18 sessões de leitura videofilmadas e,
posteriormente, transcritas, com objetivo de obter dados sobre as inferências de base
textual, contextual e sem base textual e contextual (MARCUSCHI, 2008), produzidas pelos
3 alunos do 3º ano do ensino fundamental, a partir da leitura de textos narrativos. Desta
forma, foi possível levantar indícios sobre o processo de compreensão leitora das crianças
pesquisadas e associar à práticas de escolarização da leitura desenvolvidas pela professora
que acompanhou os alunos durante todos o ciclo I.
Defende-se que uma boa compreensão leitora é resultado das inferências
produzidas pelos sujeitos pesquisados e que um trabalho pedagógico comprometido, que
tenha como ênfase práticas de leitura de textos literários, entre outras atividades de leitura,
são processos que contribuem para a formação do leitor proficiente.
Portanto, embora o trabalho pedagógico não seja o foco desta pesquisa, o
mesmo contribuiu para analisar e cotejar as produções de inferências elaboradas pelos
sujeitos pesquisados, em sessões de leitura – coleta de dados - com as práticas pedagógicas
de leitura, a quais visam o acesso e uso de textos narrativos em diversos projetos e em
momentos de leitura em sala de aula, discutindo como a interface desses processos
comtemplam a formação de leitores engajados e proficientes. Assim, os sujeitos são
criadores de sentidos no decorrer do processo de leitura, produzindo diversos níveis de
inferências que definirão a construção da compreensão textual.
Defende-se aqui que o trabalho pedagógico desenvolvido pela professora,
comprometida com a qualidade do ensino da leitura, foi imprescindível para que os sujeitos
em processos de alfabetização e letramento se constituíssem em leitores autônomos,
engajados e proficientes.
Foram utilizados, nesta pesquisa, os cadernos de registros sobre o
desenvolvimento dos projetos interdisciplinares, implementados pela professora, além do
planejamento de cada ano trabalhado. Tais materiais constituem-se fontes documentais que
contribuíram para a compreensão do desenvolvimento de escolarização, sobretudo, literária
dos alunos pesquisados. Além disso, optou-se por apresentar algumas características
pessoais e profissionais da professora Mariana, com intuito de relacionar sua concepção de
educação à sua prática pedagógica.
3.4. A professora: concepção de ensino- aprendizagem.
A professora pesquisada - Mariana - trabalha no ensino fundamental desde
109
2003. Antes desse período, teve experiência como monitora na educação infantil. Deixar a
educação infantil e assumir uma sala de ensino fundamental I gerou para essa profissional
uma série de questionamentos, entre eles:
Assumi uma segunda série, sendo que foi um choque sair da Educação
Infantil e ir para o Fundamental, pois na Infantil a fantasia e a realidade
caminham juntas, dando ênfase ao lúdico e entrei em uma sala de aula
com alunos sentados um atrás do outro, com um espaço muito menor, em
que a preocupação é o conteúdo. Nesse momento pensei como é para a
criança iniciar o Ensino Fundamental, pois a mudança é muito brusca,
enquanto aluna não tinha pensado nessa situação. Mas hoje, penso na
criança que sai de um ambiente muito espaçoso, onde circulam, brincam,
convivem em pequenos grupos, além do coletivo e entra em outro com
espaço totalmente reduzido, não tem nada adaptado à sua altura.
(MARIANA, 2005, p. 25).
Ao relatar sobre seu percurso profissional no “Memorial de formação: do ver ao
olhar, reflexões sobre minha formação”, produzido como exigência para a conclusão do
curso de pedagogia Programa Especial de Formação de Professores em Exercício,
promovido pela Unicamp, a professora já demonstra um olhar de reflexão sobre a
organização do ensino fundamental e questiona a mudança abrupta que ocorre no
atendimento da criança na educação fundamental. Esse olhar sensível da professora já é um
indício que esta profissional tem uma preocupação com o desenvolvimento da criança, com
seu bem-estar e com seu desenvolvimento integral.
Em uma outra passagem do mesmo memorial (MARIANA, 2005), a professora
questiona sobre os conteúdos ministrados na educação fundamental e sinaliza sobre a
importância da interdisciplinaridade como a melhor forma de se trabalharem os conteúdos
escolares. Segundo seu relato:
Vivenciando uma realidade de ensino em que o conhecimento acontecia
de forma compartimentalizada, ou seja, como se na cabeça tivéssemos
gavetas que se abrissem uma para cada disciplina, ficando difícil dominar
a totalidade do conhecimento global sobre a realidade, a
interdisciplinaridade surge como um caminho possível para amenizar
essa situação. Mas não significa que teremos um currículo não-
disciplinar e sim uma integração, articulação entre disciplinas.
(MARIANA, 2005, p.26).
Desta forma, esta profissional defende a adoção dos temas transversais como
opção às práticas pedagógicas, as quais visam à formação dos educandos baseadas somente
em conteúdos científicos, transmitidos de forma descontextualizada. Sobre essa temática, a
professora relata:
110
Nesse sentido, ao discutirmos os Temas Transversais como eixos,
refletimos um trabalho na escola além dos conhecimentos científicos e
culturais tradicionais, para incorporar também a cultura popular
aproximando os saberes da realidade dos alunos aos conhecimentos
científicos e de outras realidades culturais. (MARIANA, 2005, P.26).
O relato da professora Mariana já demonstrava, há 10 anos atrás, uma
preocupação em buscar alternativas para desenvolver uma educação com vistas à
valorização do conhecimento prévio das crianças, as experiências vivenciadas em outros
espaços de sociabilidade, a preocupação com a organização do ensino fundamental, visando
à educação do corpo, ao controle disciplinar representado pelas salas de aulas com suas
fileiras e regidas pelo controle do tempo e espaço.
Em depoimento produzido pela professora, durante esta pesquisa, sobre suas
práticas pedagógicas e, sobretudo, sobre as atividades relacionadas à alfabetização e ao
projeto interdisciplinar desenvolvido pelos ciclos I e II, ela relata que:
Junto ao trabalho com projetos acontecia o processo de alfabetização, os
textos, os livros de literatura infantil que conduziam o projeto eram
também instrumentos de alfabetização. Tudo foi acontecendo ao mesmo
tempo em um processo dinâmico, os alunos se alfabetizavam e aprendiam
os conteúdos das demais disciplinas. (Entrevista concedida à
pesquisadora, 2015).
No trecho citado acima, fica clara a importância dos livros de literatura infantil
utilizados no projeto e a contribuição deste gênero no processo de alfabetização das
crianças. Em muitas situações, os conteúdos de ciências, história e geografia e conceitos de
diversas áreas de conhecimento são abordados a partir do universo da literatura. Durante a
entrevista concedida pela professora, ela relata a importância da prática da sacola da leitura,
iniciada com os alunos desde 2012 e que, neste ano, em 2015, foi ampliada para todo Ciclo
I e II.
Sobre a prática da sacola da leitura, a professora Mariana, analisa:
Outro trabalho que realizamos é a sacola da leitura, toda semana as
crianças levam livros e gibis para casa, para que possam junto com a
família fazer a leitura, depois na sala temos a roda da leitura, as crianças
contam sobre os livros que leram e relacionam com outros que leram
anteriormente. Nesse momento há uma troca entre as crianças, pois uma
questiona a outra, fazem inferências, auxiliam na lembrança do nome de
personagens, de momentos marcantes dos livros, contam sobre os autores
e criam um suspense com o intuito de deixar o colega com vontade de ler.
(Entrevista concedida à pesquisadora, 2015)
111
Sobre a prática da sacola da leitura, a professora afirma que é uma atividade que
tem contribuído de forma significativa para a formação dos sujeitos leitores. Ela descreve a
média de livros lidos pelas crianças, durante os 3 anos que acompanhou a mesma turma, do
primeiro ao terceiro anos (2012, 2013 e 2014). Segundo a professora Mariana:
Essa atividade vem contribuindo muito com a alfabetização e com a
formação de leitores. As crianças leem em média 80 livros no primeiro
ano, 100 livros no segundo ano e 100 no terceiro. Durante as aulas
trabalhamos com vários gêneros textuais, sempre depois da leitura as
crianças tecem comentários, acontece uma discussão desses textos,
relacionando com acontecimentos vividos, leituras feitas anteriormente e
estudos que estão fazendo no projeto. (Entrevista concedida à
pesquisadora, 2015).
Os relatos da professora contribuíram para dar visibilidade às práticas
docentes desenvolvidas por ela, o que pensa sobre a educação, a sua concepção de ensino e
aprendizagem, a forma como compreende a escolarização das crianças, além da formação
do sujeito leitor. Sobre esse tipo de material, Bogdan e Biklen (1994) relatam:
A qualidade deste tipo de material varia. Alguns dos materiais fornecem
apenas detalhes factuais tais como datas em que ocorreram reuniões.
Outros servem como fontes de férteis descrições de como as pessoas que
produziram os materiais pensam acerca do seu mundo. (BOGDAN E
BIKLEN, 1994, p.176).
Dar visibilidade aos discursos contidos nos relatos pessoais e registros de
atividades profissionais contribuiu para a ampliação do olhar do pesquisador, lançando luz
sobre os processos investigados. Esses dados complementares “são provas detalhadas de
como as situações sociais são vistas pelos seus atores e quais os significados que vários
fatores têm para os participantes” (ANGEL apud BOGDAN e BIKLEN, 1994, p.177), que,
no caso, estejam ligados direta ou indiretamente à pesquisa.
3.5. Categorias de Análise
Após a coleta de dados, o material obtido nas sessões de leitura foi transcrito e
organizado em categorias, segundo o quadro geral de inferências, definido por Marcuschi
(2008, p.254,255). As principais categorias de análise e o quadro de operações - tipo de
operação inferencial, natureza da inferência e condições de realização - foram apresentados
no capítulo 1 e serão utilizados nas análises dos dados, no capítulo 4.
112
CAPÍTULO 4
4. PRODUÇÕES E ANÁLISE DE INFERÊNCIAS
O leitor é produtor de jardins que miniaturizam e congregam o mundo. os
leitores são viajantes; circulam nas terras alheias, nômades caçando por
conta própria através dos campos que não escreveram, arrebatando os
bens do Egito para usufruí-los. (CERTEAU, 1990, p.269,270).
Neste capítulo, apresentam-se os textos selecionados para a pesquisa de campo.
O primeiro texto é: “A dança do arco-íris” – foi reproduzido na íntegra e enumerado em
cada linha para melhor cotejar as inferências produzidas pelo aluno com as passagens do
texto original. Em seguida, foram feitas pela pesquisadora possíveis análises sobre as
inferências produzidas pelos alunos. Esta disposição de apresentação do texto,
acompanhada de uma análise preliminar teve como referência a pesquisa de mestrado sobre
“O Papel do Processo Inferencial na Compreensão de Textos Escritos”. (MACHADO,
2005).
Os dados obtidos nas duas sessões de leitura deste texto foram organizados em
primeira e segunda leituras. Em cada uma das sessões foi feito o exercício de categorizar as
inferências produzidas pelos alunos pesquisados - Pedro, Elisa e Luís11 - considerando os
quadros produzidos por Marcuschi (2008), detalhados no capítulo 1, com ênfase nas
inferências de base textual, de base contextual e sem base textual e contextual
(MARCUSCHI, 2008, p.254).
Para a produção de dados desta pesquisa, foram selecionados pela pesquisadora
outros dois textos: “A Origem do Oiapoque” e “Romãozinho”, ambos trabalhados em sala
de aula pela professora Mariana, no 3ºano da turma de alunos, à qual pertencem as 3
crianças participantes deste estudo. Desta forma, foi possível observar, além das produções
de inferências, os sentidos construídos pelos alunos nas interações com os textos, assim
como os processos de compreensão leitora, ao estabelecer comparações entre os
comentários das leituras elaboradas pelas 3 crianças, da primeira à última leitura dos textos
narrativos, apropriados pelos mesmos em situações de leitura. Nos dados obtidos,
evidenciaram-se alguns indícios sobre a compreensão leitora dos sujeitos pesquisados e as
relações com os processos de escolarização, letramento literário e os conhecimentos
prévios adquiridos pelas crianças, em vários espaços de sociabilidade.
11 Nomes fictícios dos sujeitos pesquisados
113
4.1. Texto 1 - “A Dança do Arco-Íris”
1 A DANÇA DO ARCO-IRIS
2 Há muito e muito tempo, vivia sobre uma planície de nuvens uma tribo muito feliz.
3 Como não havia solo para plantar, só um emaranhado de fios branquinhos e fofos como
4 algodão-doce, as pessoas se alimentavam da carne de aves abatidas com flechas, que faziam
5 amarrando em feixe uma porção dos fios que formavam o chão. De vez em quando, o chão dava
6 umas sacudidelas, a planície inteira corcoveava e diminuía de tamanho, como se alguém
7 abocanhasse parte dela.
8 Certa vez, tentando alvejar uma ave, um caçador errou a pontaria e a flecha se cravou no chão.
9 Ao arrancá-la, ele viu que se abrira uma fenda, através da qual pôde ver que lá embaixo havia
10 outro mundo.
11 Espantado, o caçador tampou o buraco e foi embora. Não contou sua descoberta a ninguém.
12 Na manhã seguinte, voltou ao local da passagem, trançou uma longa corda com os fios do chão
13 e desceu até o outro mundo. Foi parar no meio de uma aldeia onde uma linda índia lhe deu as
14 boas-vindas, tão surpresa em vê-lo descer do céu quanto ele de encontrar criatura tão bela e
15 amável. Conversaram longo tempo e o caçador soube que a região onde ele vivia era
16 conhecida por ela e seu povo como "o mundo das nuvens", formado pelas águas que
17 evaporavam dos rios, lagos e oceanos da terra. As águas caíam de volta como uma cortina
18 líquida, que eles chamavam de chuva. "Vai ver, é por isso que o chão lá de cima treme e
19 encolhe", ele pensou. Ao fim da tarde, o caçador despediu-se da moça, agarrou-se à corda e
20 subiu de volta para casa. Dali em diante, todos os dias ele escapava para encontrar-se com a
21 jovem.
22 Ela descreveu para ele os animais ferozes que havia lá embaixo. Ele disse a ela que lá no alto
23 as coisas materiais não tinham valor nenhum.
24 Um dia, a jovem deu ao caçador um cristal que havia achado perto de uma cachoeira. E pediu
25 para visitar o mundo dele. O rapaz a ajudou a subir pela corda. Mal tinham chegado lá nas
26 alturas, descobriram que haviam sido seguidos pelos parentes dela, curiosos para ver como se
27 vivia tão perto do céu.
28 Foram todos recebidos com uma grande festa, que selou a amizade entre as duas nações. A
29 partir de então, começou um grande sobe-e-desce entre céu e terra. A corda não resistiu a tanto
30 trânsito e se partiu. Uma larga escada foi então construída e o movimento se tornou ainda mais
31 intenso. O povo lá de baixo, indo a toda a hora divertir-se nas nuvens, deixou de lavrar a terra
32 e de cuidar do gado. Os habitantes lá de cima pararam de caçar pássaros e começaram a se
33 apegar às coisas que as pessoas de baixo lhes levavam de presente ou que eles mesmos desciam
34 para buscar.
35 Vendo a desarmonia instalar-se entre sua gente, o caçador destruiu a escada e fechou a
36 passagem entre os dois mundos. Aos poucos, as coisas foram voltando ao normal, tanto na
37 terra como nas nuvens. Mas a jovem índia, que ficara lá em cima com seu amado, tinha
38 saudade de sua família e de seu mundo Sem poder vê-los, começou a ficar cada vez mais triste.
39 Aborrecido, o caçador fazia tudo para alegrá-la. Só não concordava em reabrir a comunicação
40 entre os dois mundos: o sobe-e-desce recomeçaria e a sobrevivência de todos estaria
41 ameaçada.
42 Certa tarde, o caçador brincava com o cristal que ganhara da mulher. As nuvens começaram a
43 sacudir sob seus pés, sinal de que lá embaixo estava chovendo. De repente, um raio de sol
44 passou pelo cristal e se abriu num maravilhoso arco-íris que ligava o céu e a terra. Trocando o
45 cristal de uma mão para outra, o rapaz viu que o arco-íris mudava de lugar.
46 - Iuupii! - gritou ele. - Descobri a solução para meus problemas!
47 Daquele dia em diante, quando aparecia o sol depois da chuva, sua jovem mulher escorregava
48 pelo arco-íris abaixo e ia matar a saudade de sua gente. Se alguém lá de baixo se metia a
49 querer visitar o mundo das nuvens, o caçador mudava a posição do cristal e o arco-íris saltava
50 para outro lado. Até hoje, ele só permite a subida de sua amada. Que sempre volta, feliz, para
51 seus braços.
52 Lenda Indígena recontada por João Anzanello Carrascoza
114
Figura 1: Capa da Revista Nova Escola, Figura 2: “A Dança do Arco-Íris”. Retirada da Revista Nova Escola:
Vol.
1 –contos para Crianças
e Adolescentes Contos para crianças e adolescentes, vol. 1. Ilus trador Alarcão.
O texto selecionado para a pesquisa é do gênero narrativo, uma lenda indígena.
A opção por ele justifica-se pelo conteúdo trabalhado pela professora desde o primeiro ano:
a questão indígena é um assunto que perpassa todo o ciclo I, sendo que as crianças
geralmente têm muito interesse nas histórias indígenas, abordadas pela literatura infantil. O
título do texto é “A Dança do “Arco-Íris”, e foi retirado da revista Nova Escola, edição
especial: “Contos para Crianças e Adolescentes” é uma coletânea de textos para serem
trabalhados pelos professores; a revista traz um guia com sugestões com atividades
pedagógicas.
A narrativa “Dança do Arco-Íris” faz parte do repertório de conhecimentos da
tradição de alguma etnia dentre as inúmeras que existiram no interior do território
brasileiro, embora não haja referência sobre a qual delas trata o texto; somente aspectos
gerais aparecem, como a cultura da caça, pesca e elementos da natureza. As lendas
caracterizam-se por componentes fantásticos, mágicos e passagens cheias de magias; no
entanto, as histórias são marcadas por indícios dos modos de viver de determinado povo e
sua cultura.
No tópico inicial (linhas 02 - 07), ocorre a delimitação genérica do tempo e
espaço, sem precisão dos mesmos; a trama acontece num tempo remoto, em uma planície
nas nuvens. São citadas as formas de alim entação da tribo, a qual era feliz. Já nas linhas
08 até a 11, é narrado o acontecimento gerador de uma situação de conflito, a descoberta de
um outro mundo e o primeiro impacto da descoberta que fez o caçador guardar segredo
115
sobre o ocorrido.
Entre as linhas 12 e 21, o caçador retorna ao local da descoberta do “outro
mundo”, momento de encontro com uma linda índia que se encarrega de mostrar seu
mundo ao visitante. A linda índia demonstra conhecer o “mundo das nuvens” de onde o
caçador é originário e ainda relata todo o processo de formação das chuvas. Por fim, ocorre
o retorno do personagem ao seu mundo, mas a relação dos dois é selada com o retorno
diário do personagem ao mundo da linda índia.
Na passagem das linhas 22 e 23, a linda índia relata sobre os animais selvagens
existentes na terra e ele diz que no mundo das nuvens os bens materiais não são
valorizados. Nessas duas linhas, são evidenciados os valores distintos entre as duas
civilizações, sobretudo, no que tange aos bens materiais.
Nos trechos a seguir (linhas 24 - 27), é apresentada a curiosidade da linda índia
em conhecer o mundo do caçador, ele a leva para conhecer seu mundo, no entanto, toda a
família dela embarca nessa jornada sem ser convidada, pois seguiram o casal por
curiosidade. Neste trecho, podemos inferir que os parentes não tiveram um bom
comportamento ao seguir o caçador e a linda índia, dado que não haviam sido convidados
para conhecer o mundo do personagem.
Contudo, nas linhas 28 até 34, embora os parentes da linda índia não tivessem
sido convidados para conhecer o “mundo das nuvens”, eles foram recepcionados com uma
grande festa, selando a amizade entre as duas nações; no entanto, essa amizade durou pouco
em consequência do excesso de visitas do grupo de pessoas da terra a corda arrebentou.
Nas passagens entre as linhas 35 e 41, verifica-se que, apesar da desarmonia
estabelecida no “mundo das nuvens”, foi construída uma escada para que as visitas
continuassem, mesmo com os problemas, pois esses aumentaram com a circulação de
pessoas; por isso, o caçador resolveu destruir a escada e o contato entre os dois mundos foi
rompido. Embora a rotina do “mundo das nuvens” tivesse voltado ao normal, foi instalado
um conflito entre o personagem e sua linda índia. Com a ação do caçador, foi rompido o
contato entre ela e seus parentes, causando-lhe uma enorme tristeza.
Nas linhas 42 até 46, ao brincar com o cristal que ganhara de sua amada, o
caçador descobre uma maneira de resolver o conflito: devido à chuva que caía na terra, o
brilho do sol atravessou uma das frestas abertas no meio das nuvens, possibilitando a
entrada de raios de sol que, ao atingir o cristal, produziu um arco-íris, o qual serviu de
ponte entre um mundo e o outro. O caçador ficou imensamente feliz, pois descobrira a
chave para seus problemas.
116
No tópico final (linhas 47-51), há a resolução do problema causado pelo
rompimento do contato entre os dois mundos e a consequente tristeza da índia, motivada
pela saudade dos seus parentes, que permaneceram na terra. O caçador passa a usar o cristal
para criar um arco-íris, o qual se tornou uma passagem para o mundo de sua amada. Porém,
essa passagem é controlada por ele, permitindo apenas que a linda índia transitasse entre
os dois mundos e mais ninguém, minimizando a saudade dela e evitando que os problemas
recomeçassem.
Pode-se inferir a simbologia do arco-íris nessa história, que está relacionado
como uma passagem entre dois mundos, e também a importância da figura masculina no
controle dessa comunicação.
As leituras foram feitas em voz alta, em um espaço no ambiente escolar,
definido pela pesquisadora, considerando a disponibilidade de acesso no dia definido
para as videofilmagens: sala de informática, sala de orientação pedagógica, sala de
educação especial e sala de aula.
4.1.1. Análise de dados sobre compreensão leitora e produção de inferências.
Serão analisados os dados obtidos a partir dos comentários das leituras
desenvolvidas pela criança, considerando os processos inferenciais de base textual, base
contextual e sem base textual e contextual. Busca-se evidenciar os processos de
compreensão leitora produzidos pelo aluno em dois momentos de leitura.
Texto 1/ Pedro - PL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:
a) De base textual:
Após feita a primeira leitura, o aluno Pedro-PL reconta a história e em
seguida tece comentários sobre a mesma:
Pedro - P (linha 07): Eu gostei do texto...
Pedro - PL (linhas 09-10): Aí, um dia ele foi acertar a flecha num pássaro, mas só que
ele errou e caiu no chão, aí ele foi tirar a flecha de lá, abriu um buraco, aí ele botou ...
aí ele fechou e saiu, não contou pra ninguém.
Pedro - PL (linhas 10-12): Aí no outro dia ele voltou, abriu, desceu lá embaixo e
Texto 1: A Dança do Arco-Íris. Data: junho/ julho de 2014
Sujeito pesquisado: Pedro Primeira leitura: PL
117
conheceu ... conheceu a moça. Aí eles ficaram conversando, aí ele saiu e quando ele
voltou, ela falou eram uns animais terríveis que tinham lá embaixo, e ele falou ...
falou... é... cada uma falando coisas de cima e de baixo.
Análise:
Nos comentários de base textual produzidos pelo aluno Pedro em sua primeira
leitura (PL), pode-se perceber que este busca fazer um diálogo com o texto lido,
posicionando- se diante do mesmo, sempre com a mediação da pesquisadora, através de
algum tipo de pergunta inicial: 1) O que você quer falar sobre o texto? 2) Muito bem, e aí?
E aí, o que você achou? Diante destes questionamentos, o aluno Pedro inicia seus
comentários embasados em juízos de valor: gostou ou não gostou da história, geralmente
com justificativa.
Na sequência, descreve o que entendeu e faz suas considerações, contudo não
há uma busca pela simples reprodução, pois em vários momentos ele tem uma postura
interativa com o texto, sem suprimir a estrutura textual, que não é recuperada de forma
linear, mas que apresenta um horizonte mínimo, “leitura parafrástica” (MARCUSCHI,
2011). O horizonte mínimo é caracterizado por uma leitura em que são repetidas algumas
partes do texto, com outras palavras, em que se pode deixar algo de lado e evidenciar outras
passagens.
Em alguns momentos, pode-se observar que o aluno associa o mesmo
acontecimento que dá origem ao enredo, ou seja, a abertura, um buraco/fenda nas nuvens,
que possibilitou o conhecimento de outro mundo, a Terra, pelo personagem-caçador.
Aparecem, em seus comentários, a sequência dos acontecimentos evidenciados no texto, o
encontro entre o caçador e a linda índia.
Após o aluno Pedro ter feito o reconto e a retomada da história através do uso de
paráfrases, a pesquisadora faz perguntas mais direcionadas, com objetivo de verificar se o
aluno faz alguma relação desse texto com outros estudados. Verifica-se que as inferências
de base contextual, na maioria dos casos, aparecem nos comentários dos alunos mediante a
intervenção da pesquisadora, propondo questões mais elaboradas e direcionadas.
Pesquisadora/ aluno Pedro - PL (linhas 27-28): Você já leu algum outro texto que fala sobre
essa questão indígena? Texto que fale sobre índio? Já leu alguma outra coisa?
Pesquisadora/ Aluno Pedro - PL (linhas 34-35): Ah, entendi, você percebeu alguma
diferença ou semelhança entre esse texto e outros que você leu sobre a civilização
indígena? O povo indígena?
118
Essas questões permitem a produção de comentários e inferências de base
contextual. É importante ressaltar que se entende o conceito de contexto, aquele formulado
por Marcuchi (2007, 2008), exposto no capítulo 1.
De base contextual:
Aluno Pedro- PL (linhas 29-31): Ah, eu também já li a lenda do guaraná, que fala que
nasceu um índio, aí uma cobra picou ele, aí ele morreu, aí no lugar que ele foi enterrado,
nasceu uma planta que tinha olhos iguais os dele, que era o guaraná. A da mandioca
também e da... qual foi aquela lá que a gente fez dos índios? (ele se pergunta em voz
alta) .
Aluno Pedro- Pl (linhas 36-38): Esse texto aqui é diferente dos outros que eu li porque os
outros só falavam da plantação, de mulheres grávidas, de caçadores. Esse daqui fala que
o caçador encontrou outro mundo. Que na aldeia dele eles não tinham comida, comiam
aves, que a aldeia era cheia de nuvens.
Análise:
As respostas elaboradas pelo aluno Pedro estão relacionadas ao quadro geral
de inferências, proposto por Marcuschi (2008), em um nível do processo de compreensão
em que ocorrem extrapolações autorizadas, permeadas pelos processos cognitivos e
sociointerativos desenvolvidos e vivenciados pelo aluno em várias situações cotidianas
escolares e extraescolares. A partir dos conceitos definidos por Marcuschi (1985, 2007,
2008), podemos analisar as respostas dadas pelo aluno ao responder as perguntas da
pesquisadora como inferências de base contextual pragmáticas (experienciais) e
cognitivas (analógicas).
É pertinente ressaltar que o aluno extrapola as marcas textuais, ou seja, tem
uma atitude leitora marcada pela intertextualidade, explica as características deste texto
lido, associando outros textos do mesmo gênero, estudados na sala de aula, isso ocorre
mediante a pergunta da pesquisadora se o aluno percebeu alguma diferença entre o texto
lido (a dança do arco- íris) e outros estudados em sala de aula que falam sobre histórias
indígenas. Considerando esse questionamento, Pedro expõe as relações entre o texto lido
no momento da pesquisa com a lenda da mandioca e do guaraná.
As associações ocorrem através da comparação dos diversos elementos que
compõe o texto lido com os citados pela criança, sejam elas com o intuito de elencar
características em comum e outras que se diferenciam.
119
Esse movimento de interface com outros textos do mesmo gênero – lenda -
demonstra já uma atitude de leitor proficiente, sendo o aluno pesquisado, com faixa etária
entre 08 e 09 anos, ainda em no processo de alfabetização, final do Ciclo I do Ensino
Fundamental, mas que demonstra um nível de compreensão leitora que rompe com o
mero decodificar de textos: a leitura é entendida nesse processo através de uma relação
dinâmica entre o leitor, o texto e o contexto.
b) Sem base textual e contextual:
Foi possível observar, nas inferências feitas pelo aluno, que não houve
falseamentos, ou seja, como descrito no quadro de operações: “atividade de introduzir um
elemento e afirmar uma proposição falsa que não condiz com as informações textuais ou
não pode ser dali inferida” (MARCUSCHI, 2008).
Texto 1/ Pedro – SL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:
a) De base contextual:
Após feita pelo aluno a segunda leitura do texto “A dança do arco-íris”,
a pesquisadora inicia uma conversa com o sujeito pesquisado, fazendo a
seguinte pergunta:
Pesquisadora (linha 02): E aí? Você pensou em mais alguma coisa, além
daquelas que você havia pensado antes?
O conteúdo da pergunta foi pensado e elaborado com o objetivo de retomar a
leitura feita no primeiro encontro, para que o aluno pudesse elaborar reflexões
relacionando-as com a produção de inferências, a partir da segunda leitura. Segue a resposta
produzida pelo aluno:
Aluno Pedro- SL (linhas 03-07): Pensei, além de eu ter falado aquilo, é que minha família
também não gosta muito de festa, movimento, essas coisas.
Texto 1: A Dança do Arco-Íris.
Data: julho/agosto de 2014.
Sujeito pesquisado: Pedro
Segunda leitura:.SL
120
E também não gostam que gente que vão muito lá em casa, tipo na copa, todo jogo do
Brasil, tava indo um monte de gente lá pra casa ver, aí meu pai fazia churrasco, mas eles
não gostavam muito do movimento.
Considerando a resposta do aluno, a pesquisadora faz a seguinte pergunta logo
em seguida:
Pesquisadora (linha 08): Ah! E o que isso tem a ver com o texto?
Prontamente o aluno responde:
Aluno Pedro- SL (linhas 09-12): Ah, por causa que além de um ficar indo pro outro lado,
invés de eles tarem gostando, num tava gostando. Eles tavam indo tanto, tanto, chega a
corda quebrou e construíram uma escada. Mas depois ele deu uma solução, pra ... quem
quisesse subir, subia e descia, pra namorada dele poderia ir.
Ao final dos comentários, o aluno é indagado pela pesquisadora se ele quer falar
mais algum aspecto do texto. A reposta é a seguinte:
Aluno Pedro - SL (linhas 26-29): Ah, eu também queria falar de outras lendas de frutas tipo
a do guaraná... foi um menino que nasceu aí depois a cobra matou ele, aí... aí, onde ele foi
enterrado nasceu...não onde foi colocado os olhos dele, nasceu uma frutinha chamada
guaraná, porque tinha o formato dos olhos dele.
Na sequência a pesquisadora faz uma nova intervenção e o aluno responde:
Pesquisadora (linha 30): E o que tem a ver uma lenda com a outra?
Aluno Pedro - SL (linhas 31-32): É por causa que as lendas, além de ser uma coisa assim
que as pessoas inventam, algumas são verdadeira outras inventadas, outras ainda não se a
sabem.
Análise:
As inferências produzidas pelo aluno Pedro, segunda leitura do texto “A Dança
do Arco-íris”, são, em sua maioria, de caráter textual e contextual, pois o aluno atem-se em
elementos presentes no texto e outros que dialogam com o mesmo, a partir de pistas textuais
há o movimento de retomada de experiências vividas em situações cotidianas em sua casa e
provenientes do espaço escolar.
O sujeito pesquisado já sabia, a partir da pergunta da pesquisadora, que deveria
apresentar outros elementos, além daqueles expostos na primeira leitura. Embora direcionada,
a questão elaborada pela pesquisadora possibilitou várias associações de base textual e
contextual, abrindo um leque de possibilidades de construção de sentidos.
121
O aluno optou por fazer associações pragmáticas e experienciais. Ele selecionou
uma passagem do texto original (linhas 35-41), na qual o personagem (índio-caçador)
demonstra estar descontente com o “sobe e desce” das pessoas dos dois mundos (das nuvens
e da terra). Ancorado nessa base textual, o aluno foi capaz de mobilizar uma série de saberes
vivenciados, relacionando-os com conteúdo lido e comparando o fato do personagem não ter
gostado do movimento de pessoas em seu mundo, caracterizada pela “desarmonia entre sua
gente”, com um acontecimento vivenciado em sua casa durante os jogos da copa do mundo.
O aluno relata que muitas pessoas frequentavam esse ambiente para festejar, seu pai fazia
churrasco; no entanto, seus familiares não gostavam muito de festa.
Nas passagens entre as linhas 26 até 29, os comentários produzidos pelo aluno
em sua segunda leitura retomam a mesma relação feita após a primeira leitura, ou seja, a
associação do texto “A dança do arco-íris” com a lenda do guaraná. Na primeira leitura, o
aluno relata a lenda do guaraná, pois responde a pergunta da pesquisadora, se ele conhecia
ou tinha estudado uma outra história sobre os índios; no entanto, o aluno traz novamente em
pauta o reconto da lenda do guaraná sem a intervenção direta da pesquisadora. É importante
ressaltar o papel mediador da pesquisadora, no momento da pesquisa, na relação da criança
com o texto. A presença da pesquisadora não é imparcial, a sua atuação interfere na
produção de inferência do aluno pesquisado, é algo que tem que ser considerado pois os
questionamentos elaborados implicam necessariamente na construção dos diversos tipos de
inferências.
Pode-se considerar que o aluno, em seu processo de compreensão do texto lido,
percebe que compreender não é só ler, recontar e entender o conteúdo da história, mas é
também fazer relações entre histórias do mesmo gênero, neste caso específico, lendas
indígenas, comparações entre personagens. Há ainda um movimento da criança em levantar
as características de uma lenda, na tentativa de conceituá-la. Todo esse movimento feito
pelo aluno demonstra uma busca pela coerência, princípio que, segundo Kleiman (2008,
p.29), “rege a atividade de leitura e outras atividades humanas”.
É importante ressaltar que, na segunda leitura do texto, não aprecem
produções de inferências somente de base textual e também sem base textual e
contextual. As principais inferências são de base contextual.
122
Texto 1/ Elisa - PL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:
a) De base textual:
Pesquisadora (linha 01): e aí? (após o término da leitura)
Aluna Elisa - PL (linhas 03- 14): Eu achei muito legal porque fala de um índio, de uma
índia que... se... que o índio tava tentando pegar o pássaro, aí ele atirou a flecha no
lugar errado e abriu uma passagem para outro mundo. Aí, ele desceu lá escondido, aí
ele viu uma... uma índia que ele se apaixonou, os dois se casaram, aí eles namoraram,
mas aí a índia subiu pra lá e toda vez tinha festa, aí ficava um sobe e desce pra i e voltar
pros dois mundos. Aí, o índio não concordou com isso, então ele fechou, ele tapou o
buraco, aí depois começou chover de depois abriu o sol, que ele tava com o cristal, é que
ele ganhou da mulher. Aí as nuvens começaram a sacudir que fez chover, aí o cristal, é
... abriu um arco-íris que fazia... que se mudasse de posição o arco- íris ia pra outro
lugar. Aí ele só permitia que a mulher descia lá pra visitar a família dela, mas quando as
pessoas de lá de baixo queriam subir, não deixava, porque... ele não concorda com a
ideia, mas aí depois ficou assim, ele virava o cristal e o arco-íris virava pra outro lado.
Análise:
A aluna Elisa, em sua primeira leitura, após ler o texto em voz alta e
questionada
pela pesquisadora, inicia o reconto da história prontamente, com o enfoque nos
acontecimentos vivenciados pelos dois personagens principais, o índio e a índia. Segundo
o quadro de inferências de base textual (MARCHSCHI, 2008,P.255), a aluna apresenta
um processo dedutivo de natureza lógica ao reproduzir o texto lido: reunindo duas ou
mais informações textuais que serviram de premissas para se chegar a uma conclusão
válida, ou seja, a confusão entre o entra e sai da família da índia que vivia no “mundo
de baixo”, ao visitar de forma continua o “mundo das nuvens”, o que contribuiu para
que o índio resolvesse fechar a passagem e controlar a mesma através do cristal que
abriria um arco-íris para a descida da índia para visitar sua família, quando fosse
permitido por ele.
Texto 1: A Dança do Arco-Íris. Data: julho de 2014
Sujeito pesquisado: Elisa Primeira leitura: PL
123
A aluna Elisa produz um tipo de operação inferencial marcada pela sintetização
das ideias, onde várias informações são tomadas a partir do input textual, consideradas as
principais ações dos personagens em uma sequência narrativa coerente com o desfecho da
história. Embora tenha sido suprimida partes da narrativa, não houve alteração na sua
compreensão, ocorrendo a chamada leitura parafrástica, “a leitura fica ainda numa atividade
de identificação de informações objetivas que podem ser ditas com outras palavras”
(MARCUSCHI, 2008, p. 259). As inferências demonstram que a leitura da aluna encontra-
se no “horizonte mínimo”, ela recupera as principais informações explícitas dos textos,
seleciona o léxico, no entanto, consegue compreender a sequência da narrativa, rompendo
com a mera atividade de repetição - “Falta de horizonte”.
b) De base contextual:
Após o reconto, a pesquisadora faz uma pergunta, considerando algumas
informações que aparecem nos comentários da aluna:
Pesquisadora (linhas 15-16): Por que que ele não concordava com a ideia? Por que ele
não concordava com a subida dos parentes dela?
Aluna Elisa – PL (linhas 17-18): Por que ele num. ficava feliz, então ele não deixou ,
mas a mulher mesmo assim queria visitar os parentes dela.
Em seguida, a pesquisadora faz uma pergunta mais genérica:
Pesquisadora (linha19): Muito bem! Mais alguma coisa? O que mais te chamou a
atenção no texto?
Aluna Elisa - PL (linhas 20-22): É que... a mulher queria que os parentes dela subiam, só
que o homem não deixava, porque ele não gostava, porque ficava um sobe e desce, fazia
festa todo dia e eu acho que ele não gostava.
Aluna Elisa – PL (linha 24): É e ficava... e o povo dele descia lá e ficava pegando coisa.
Eu acho que também ...
Pesquisadora (linha 25): E o que você acha que ele não gostava?
Aluna Elisa – PL (linha 26): Ah ..., humm... porque ele é mais quieto. Ele não
gosta muito de fazer bagunça.
Análise:
A aluna Elisa atinge, com relação aos horizontes de compreensão textual,
a fase do “horizonte máximo”, o qual a leitora produz inferências possíveis e rompe com
124
a leitura meramente parafrástica: são inseridos novos elementos a partir dos
conhecimentos prévios da aluna, suas crenças e valores, atitude valorativa, quando a
mesma, afirma que o homem não deixou que a família da mulher a visitasse
constantemente. Observa-se que ela se refere de forma generalizada ao padrão de
comportamento que se deve ter um homem e uma mulher e não um caso pontual
relacionada aos personagens: índio e índia em um determinado contexto. Apoiando-se
nas passagens do texto (linhas 35 e 36) em que o personagem destrói a escada que dá a
passagem entre os dois mundos, a aluna conclui que ele não gostava de bagunça, era mais
quieto que a mulher, portanto destruindo a passagem, o índio não deixou que o trânsito
entre os dois mundos continuassem ocorrendo, em uma atitude arbitrária caracterizando o
poder de decisão assumido pelo homem em detrimento da vontade da mulher.
Um outro tipo de operação inferencial que se verifica nos comentários da
aluna é de associação pragmática, ou seja, Elisa conclui que o índio fechou a passagem
entre os dois mundos, por ser quieto e não gostar de bagunça. Em nenhum momento
aparece essa afirmação no texto: o que ocorre é uma “afirmação de uma informação
obtida através de saliências lexicais ou cognitivas por associação de ideias”.
(MARCUSCHI, 2008, p.255).
Na primeira leitura do texto “a dança do arco-íris”, a aluna apresenta
algumas inferências de base textual e contextual, no entanto, sua leitura caracteriza-se por
comentários baseadas nas informações textuais, feitas através da prática de reconto da
narrativa lida.
Texto 1/ Elisa - SL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:
a) De base textual e contextual:
Pesquisadora (linhas 1-2): Nós vamos fazer agora a segunda leitura do texto: A dança do
Arco- Íris com a aluna Elisa.
Pesquisadora (linha 3): E aí? O que que você achou?
Aluna Elisa – SL (linhas 4-14): Achei legal, porque o homem tava tentando atirar a
flecha no pássaro pra ele levar pra eles comer, só que aí ele errou a mira e foi cair lá no
Texto 1 : A Dança do Arco-Íris.
Data: julho de 2014
Sujeito pesquisado: Elisa
Segunda leitura: SL
125
chão, aí começou abrir uma venda que lá embaixo tinha outro mundo, aí um dia ele foi
lá e encontrou uma mulher que ele se apaixonou e namorou ela. Aí depois é, quando ela
ia subir pra visitar ele, os parentes dela queria subir junto, só que aí o homem não
gostava muito, porque ele achava que era muito chato, ele não ficava mais feliz quando
era só ele e o povo dele.
E o pessoal lá de baixo queria visitar o mundo das nuvens né que eles chamavam. Mas aí
um dia ele tava brincando com o cristal, que a mulher deu pra ele, aí começou chover
depois veio um raio de sol lá de baixo, aí abriu um outro buraco que...e aí a mulher dele
ficava com
saudade, aí ele deixava só a amada dele descer. Aí se alguém lá debaixo queria subir ele
virava o cristal e o arco-íris pulava pra outro lugar.
Aluna Elisa – SL (linhas 28-30): Que a mulher gostava de festa e o homem não, e o
pessoal lá de baixo queria visitar ela e ficava brincando lá no mudo das nuvens, ele não
gostava , ele não se sentia mais casa.
Análise:
Após a segunda leitura em voz alta do texto “A dança do arco-íris”, a
pesquisadora pergunta para a aluna o que achou do mesmo. A reposta é que achou legal e,
na sequência, inicia o reconto da história; mas desta vez, ao recontar a lenda, ela vai
acrescentando sua opinião, constrói inferências pragmáticas avaliativas, o que fica
explícito através nas passagens: “ele achava que era muito chato”; “ele não ficava
mais feliz”; “e o pessoal lá de baixo queria visitar ela e ficava brincando lá no mudo das
nuvens”; “ele não gostava , ele não se sentia mais casa”. Contudo, são avaliações
baseadas nos acontecimentos permitidos pelo texto, fazendo com que o leitor atinja,
dentro dos horizontes de compreensão textual, inferências possíveis.
Nos seus comentários não ocorrem muitas extrapolações de base contextual.
Foi possível fazer esta afirmação, pois assim como o aluno Pedro foi questionado pela
pesquisadora sobre o conhecimento que o mesmo tinha sobre lendas, a aluna também foi
indagada sobre tal questão e as respostas foram bem diferentes. No caso da aluna, ela
respondeu que não. Seguem as passagens este assunto:
Pesquisadora (linha 43): Você conhece outra história parecida com essa?
Aluna Elisa- SL (linha 44): Não.
Pesquisadora (linhas 45-46): Que fala de outros povos, povos indígenas? Você não se
lembra de nada que você já tenha lido antes disso?
Aluna Elisa – SL (linha 47): Não.
126
Texto 1/ Luís - PL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:
a) De base textual e contextual:
Após fazer a primeira leitura, em voz alta do o texto, a pesquisadora indaga o
aluno sobre o que achou do texto:
Pesquisadora (linha 1): E aí? O que você achou Luís?
Aluno Luís –PL (linha 2): Legal.
Pesquisadora (linha 3): Legal? Achou legal mesmo?
Em seguida, o aluno busca uma informação pontual no texto e faz relações com sua
vivência:
Aluno Luís – PL (linhas 4-7): Aqui quando falou (o aluno tenta buscar no texto o trecho que
ele quer expor), que tipo pegava o vapor da água, aí eu me lembrei de um negócio que a gente
estudou sobre como é que fazia chover, que o sol aquecia a água, aí fazia nuvens, aí tipo
quanto mais grande a nuvem mais chovia, aí caia a chuva e começava tudo de novo.
Seguindo o mesmo procedimento, o aluno seleciona outra passagem do texto
para fazer um diálogo com o mesmo:
Aluno Luís – PL (linhas 9-11): E quando falou do arco-íris aqui, falou que ele pegava o cristal
e movia para o arco- íris trocar de lugar . Então, eu também me lembrei bolha de sabão,
quando eu brincava com bolha de sabão, sempre eu via as cores tipo arco-íris, mais ou menos,
só que embaçado.
Após as inferências de base contextual, a pesquisadora faz uma intervenção e o
aluno elabora inferência de base textual, como se segue:
Pesquisadora (linha 13): Hum, que interessante! Muito bom! E que mais você tem assim, pra falar
da história?
Aluno Luís – PL: (linhas 14-19): Achei legal né, porque ele, o caçador errou o tiro, que ele
ia pegar uma ave, errou o tiro, aí abriu tipo uma passagem que levava pro mundo de baixo
Texto 1: A Dança do Arco-Íris. Data: julho de 2014.
Sujeito pesquisado: Luís. Primeira leitura: PL.
127
onde ele encontrou é. uma menina que tipo ele foi se apaixonando. Aí, não sei quem aí
fechou a passagem, aí eles tipo nunca se encontraram mais.
Aluno Luís – PL (linhas 23-25): Aí o caçador brincava com o cristal, aí lá embaixo começou
a chover, aí veio o trovão. Que... o cristal que fez o arco-íris. Aí o caçador ficou mexendo o
cristal, que eu já falei, para o arco-íris mudar de lugar, aí tipo eles se encontraram. Eu acho.
A partir do que o aluno foi comentando, a pesquisadora intervém:
Pesquisadora (linha 27): E porque você achou interessante isso?
Aluno Luís – PL (linhas 28-30): Sei lá, porque os dois se apaixonaram, um ficava em cima e
outro embaixo, aí tipo não dava pra eles se encontrarem. Aí isto daqui, eu acho, que mistura
romance, meio romance com aventura.
Análise:
Ao explicar porque achou o texto legal, o aluno Luís busca informações
pontuais no texto, ele associa a informação sobre o lugar onde o índio vivia: “o mundo das
nuvens”, com a formação das nuvens e da chuva, ou seja, a partir do input textual, Luís
constrói inferências de base contextual pragmática experiencial, desenvolvidas através da
sua vivência escolar, pois ele afirma: “aí eu me lembrei de um negócio que a gente estudou
sobre como é que fazia chover...”. É possível considerar que o aluno elabora um tipo de
inferência marcada pela reconstrução, que pode ser de natureza cognitiva, semântica e
experiencial, pois é realizada pela “reordenação ou reformulação de elementos textuais
com quadros total ou parcialmente novos”. (MARCUSCHI, 2008, p.55). Esta afirmação foi
constituída mediante as informações que o aluno Luís acrescenta ao texto, são
conhecimentos aprendidos em sala de aula que dizem respeito aos conteúdos da disciplina
de ciências – vapor de água e produção das chuvas, são associados ao a palavra arco-íris,
ampliando o significado proposto no texto.
Em seguida, o aluno demonstra o mesmo procedimento: utiliza o termo arco-íris
que está no contexto textual e, utilizando essa palavra para elaborar uma outra inferência
contextual pragmática experiencial, associa o arco-íris com a bolha de sabão que produz as
cores do arco-íris. Uma associação relacionada às suas experiências de vida.
Quando a pesquisadora indaga Luís sobre o que mais ele tem para falar sobre a
história, o aluno produz inferências textuais, através de uma leitura parafrástica, ele reconta
trechos da narrativa: novamente com a intervenção da pesquisadora, ele dá continuidade ao
reconto.
128
Com relação à compreensão textual, este aluno demonstrou um entendimento
do texto em que se apresentam mais inferências com base contextual do que textual.
Partindo dessa avaliação, é possível afirmar que ele estabelece um diálogo mais profícuo
com o texto do que a aluna Elisa. Pode-se concluir que, em termos de horizontes de
compreensão textual, Luís entra em um nível de horizonte denominado por Marcuschi
(2008) de problemático, por conta das extrapolações: “são leituras de caráter pessoal, onde
o investimento de conhecimentos pessoais é muito grande”. (MARCUSCHI, 2008, p. 259).
Nos comentário finais, o aluno Luís faz uma leitura do texto com o intuito de
explicar que gênero de texto ele está lendo e chega à conclusão que: “Aí isto daqui, eu acho,
que mistura romance, meio romance com aventura”. Não se sabe o que levou o aluno a
fazer essa análise sobre o texto, no entanto, têm-se indícios: este aluno participou do projeto
interdisciplinar que permeou todo o ciclo I, participou da sacola da leitura, dos
festivais literários, sendo provável que essas experiências tenham contribuído de forma
significativa para que o mesmo pudesse fazer constatações baseadas em suas experiências
prévias, sobre as características de um gênero textual.
Texto 1/ Luís- SL: A Dança do Arco-Íris, produção de
inferências:
a) De base contextual
Na segunda leitura do texto 1, o aluno Luís não faz o reconto do mesmo,
tampouco elabora inferências contextuais a partir do diálogo com a narrativa. O que ele
produz, com ou sem intervenção da pesquisadora, são questões: a todo momento ele
questiona os elementos textuais e também questiona as perguntas da pesquisadora. Para
dar inteligibilidade aos comentários elaborados pelo aluno, buscou-se fazer recortes dos
assuntos tratados, para análise mais efetiva, pois ele inicia seus comentários a partir de
uma informação textual, por exemplo: sobre por que o texto tem o título de “A dança do
arco-íris”; no entanto, retoma esse assunto depois de discorrer sobre outros assuntos
abordados no texto. Seguem os comentários:
Texto 1: A Dança do Arco-Íris. Data: julho de 2014
Sujeito pesquisado: Luís Primeira leitura: SL
129
Pesquisadora (linha 1): E aí? O que que você quer contar a respeito desse texto?
Aluno Luís - SL (linha 2): É ... que eu não entendi uma coisa, por que o nome desse texto
é a dança do arco-íris?
Pesquisadora (linha 3): Por que que você acha?
Aluno Luís – SL (linhas 4 - 6): Não sei, o arco-íris não dança.
Não, o nome do texto é a dança do arco-íris se o arco-íris nem dança. (rindo, ironizando a
situação).
Aluno Luís – SL (linhas 7-8): A não ser que tipo, sei lá, dançaram ou festejaram por que
descobriu o negócio do arco-íris, descobriu sobre o arco-íris?
Pesquisadora (linha 29): Ele tava brincando com cristal na mão, e aí?
Aluno Luís – SL (Linha 30): O raio de sol bateu no cristal que saiu o arco-íris. Aí ele
descobriu o arco-íris.
Pesquisadora (linha 31): E esse arco-íris se tornou o que?
Aluno Luís – SL (linha 32): Outra passagem, uma passagem nova.
Pesquisadora (linha 33): Uma passagem nova! E o que ele fazia com o cristal?
Aluno Luís – SL (34): Movimentava pra poder descer lá embaixo ou subir de lá de baixo.
Pesquisadora (linha 35): Quem? Subir e descer de lá de cima e lá debaixo?
Aluno Luís – SL (linha 36): A mulher.
Pesquisadora (linhas 37-38):E ele movimentava o cristal, e esse movimento significa o que?
O que significa esse movimento pra lá e pra cá?
Aluno Luís – SL (linha 39): Sei lá.
Pesquisadora (linha 40): Pode ser comparado a que? Lembra do título?
Aluno Luís – SL (linha 41- 43): A dança do arco-íris. Ah entendi agora, porque ele
movimentava (gesto com a mão), como se o arco-íris tivesse dançando.
Agora descobriu tudo.
Análise:
O aluno faz a leitura em voz alta e, em seguida, a pesquisadora faz uma
pergunta aberta, deixando o aluno livre para contar o que quiser sobre o texto. Na
sequência, Luís se apoia no referencial arco-íris e diz que não entendeu a relação deste com
o texto, em uma atitude de questionamento sobre a relação do referente semântico com o
enunciado. Quando indagado pela pesquisadora sobre qual a sua opinião a respeito, o aluno
automaticamente diz que o arco-íris não dança, como pode o texto chamar a dança do arco-
íris? Isso significa que a leitura feita está associada à compreensão literal da palavra arco-
130
íris e sua função. É pertinente afirmar que sua posição de questionamento é muito
importante para a construção da compreensão textual, pois está levantando dúvidas e
hipótese para, posteriormente, responder a sua dúvida, o que caracteriza uma operação
metalinguística, imprescindível para a formação de um leitor. Esse leitor não faz uma leitura
no nível parafrástico (SL): de forma intuitiva, compreende a narrativa como um evento
comunicativo e interacional.
Em diálogo entre texto, leitor, pesquisadora, o aluno chega à conclusão, a partir
de elementos textuais e extratextuais, que o título da lenda está relacionado com o
movimento que o personagem faz com o cristal, formando um arco-íris que serve de
passagem de um mundo ao outro para que a índia possa se mover entre os dois lugares.
Quando chega a essa conclusão, Luís se expressa com a frase: “agora descobri tudo”, uma
expressão que representa seu entendimento sobre o texto relacionando o enunciado com o
conteúdo, a partir de suas próprias reflexões.
A seguir, será apresentado o próximo texto utilizado na pesquisa. Os
procedimentos para verificar a compreensão leitora dos alunos a partir da produção
de inferências foram os mesmos: leitura oral e comentários, em dois momentos distintos
sobre o mesmo texto.
4.2. Texto 2 - “A Origem do Oiapoque”
1 A ORIGEM DO "OIAPOQUE"
2 Muitos anos atrás, a fome atingiu uma aldeia indígena. Havia pouca caça e quase nenhum
3 peixe, e a seca acabara com a plantação de mandioca. O mesmo tinha acontecido com muitas
4 árvores frutíferas, que não deram frutos. Enfraquecidas, as crianças ficavam doentes, e os 5 bebês e os velhos estavam morrendo. Por causa disso, a índia Tarumã, que estava grávida, 6 decidiu sair de lá para salvar o seu bebê. Ela tinha certeza de que sua criança morreria de
7 fome, pois, fraca como estava, provavelmente não teria leite para amamentá-la. E partiu em
8 busca de um lugar melhor para criar seu filho. Alguns dias se passaram. Sozinha na mata, 9 Tarumã já não tinha esperança. Começou então a chorar, com saudade de tudo o que deixara 10 para trás. Em desespero, pediu a Tupã para transformá-la numa cobra, de modo que pudesse 11 transpor a floresta e encontrar um lugar adequado para seu povo construir outra aldeia. 12 Admirado com a coragem da moça, o deus atendeu seu pedido. Durante meses, aquela grande 13 cobra vagou em busca de um local em que houvesse comida e água. Carregando o bebê, seu
14 peso era tanto que por onde passava ela deixava sulcos profundos no chão. Finalmente, 15 Tarumã encontrou um vale cortado por um riacho, com muitas árvores frutíferas e caça nas 16 redondezas. A índia-cobra ficou super feliz! Fez todo o trajeto de volta para avisar seu povo
17 que havia encontrado água e comida: agora, todos estavam salvos. Mas ela estava tão 18 empolgada que se esqueceu de pedir a Tupã para desfazer o encantamento. Quando estava 19 chegando à aldeia, o bebê nasceu. Tarumã teve sua filhinha bem na entrada do povoado. 20 Quando as pessoas viram que uma criança tinha nascido de uma cobra, acharam que fosse
21 algum tipo de bruxaria e mataram o bebê. Tarumã ficou louca de dor, mas não atacou sua 22 gente. Expressou sua tristeza com um choro tão prolongado que as lágrimas preencheram os 23 sulcos que seu corpo havia cavado na mata, transformando-os num grande rio. Com a perda do
131
24 bebê, Tarumã não quis mais ser gente. Para esconder-se do mundo, mergulhou no rio de suas
25 lágrimas e adormeceu no seu leito. Na aldeia, os índios contam que as águas do rio ficam 26 revoltas nas noites de lua cheia, e quando Tarumã suspira pela falta da filha. Quando ela 27 chora, o volume de água aumenta tanto que o rio transborda e forma-se um grande alagado até 28 as ilhas próximas. Foi assim que esse rio ganhou o nome de Oiapoque.
29 (Inspirada em "A lenda do rio Oiapoque" )
Figura 3: Livro: Viagem pelo Brasil em 52 Histórias. Ilustração de Cárcamo.
Este segundo texto, utilizado para leitura e produção de inferências pelos
sujeitos pesquisados, possui características semelhantes ao primeiro (A Dança do Arco-
Íris): é uma lenda indígena, possui caráter metafórico, embora o texto apresente elementos
reais, por exemplo, a existência do rio Oiapoque.
A lenda discorre sobre a origem de um rio que fica na região Norte do Brasil. A
narrativa tem início com uma problemática sem um tempo definido, “há muitos anos atrás”.
Nas linhas 2 a 4, é apresentado o problema, ou seja, a fome arrasou a aldeia devido à
escassez de alimentos.
Diante da situação em que está a aldeia, assolada pela fome e a consequente
mortandade da população local, entre as linhas 4 e 7, aparece a personagem principal: a
índia Tarumã, que está grávida, se vê fraca e com medo de o seu bebê morrer de fome, pois
mal alimentada não terá condições de produzir leite para amamentá-lo, por isso, abandona a
aldeia para buscar alimento. O feminino, representado pela índia Tarumã, coloca em
132
evidência a importância da figura feminina, capaz de ir em busca de soluções para sanar os
problemas vividos por ela e sua comunidade.
A passagem seguinte (linhas 7-12) é marcada por quatro momentos
importantes: a partida da aldeia; o desespero da índia por não encontrar nenhuma
possibilidade para a
resolução do problema da fome; o pedido ao deus Tupã para transformá-la em cobra; a
aceitação do pedido por Tupã, já que a índia demonstrou muita coragem.
Entre as linhas 12 e 16, verificam-se os primeiros indícios que podemos
relacionar ao título do texto, ou seja, Tarumã, transformada em cobra e pesada por conta
da gravidez de sua filha, por onde passava, abria sulcos na terra. Qual a importância
desses sulcos? Qual a relação deles com a origem do rio? São questões que serão
respondidas à medida que a história vai chegando ao seu desfecho, à resolução do
problema inicial da personagem.
O destino trágico para a índia Tarumã ocorre entre as linhas 16 e 21, quando a
índia-cobra retorna para a tribo para dar a notícia da descoberta de um novo lugar para
viver, no qual havia árvores frutíferas e caça; num lapso de esquecimento, a índia não
pede a tupã para voltar à forma humana, sendo assim, a filha da índia-cobra nasce na
entrada da aldeia. A população fica horrorizada com esse acontecimento, considerando
algo inaceitável e decide matar a criança.
Nas linhas 21 até 25, são apresentados a dor e o sofrimento vivenciados pela
personagem em função da morte de sua filha; diante deste fato, a índia não quis mais ser
gente e suas lágrimas de dor preencheram os sulcos abertos anteriormente nas terras por
onde passou, quando estava à procura de alimentos para si e todos da aldeia, e
“mergulhou no rio de suas lágrimas”, portanto, é um rio composto pelas lágrimas de dor
da índia-cobra. Essa é a representação lendária da formação do rio Oiapoque.
Entre as linhas 25 e 28, ocorre a associação da história da índia Tarumã com
a origem do nome do rio Oiapoque.
4.2.1. Análise de dados sobre compreensão leitora e produção de inferências
Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: Agosto de 2014.
Sujeito pesquisado: Pedro Primeira leitura: Pedro – PL
133
Texto 2/ Pedro – PL: A origem do Oiapoque, produção de inferências:
a) De base textual:
Como no primeiro texto, o aluno fez a leitura de forma tranquila e segura; após
a finalização da mesma, a pesquisadora repete o procedimento, perguntando:
Pesquisadora (linha 01): E aí?
Pedro - PL (linhas 02-5): “Eu achei meio triste essa história, por causa que a aldeia deles
não tinha muita comida e nem água, então ela decidiu sair de lá, aí pra procurar outro
lugar, aí ela pediu pro...pro...Tupã (o aluno procura o nome do personagem no texto) pra
transformar ela em cobra, Aí como ele viu que ela tinha tanta coragem assim, aí ele fez o
pedido dela...”
Pedro – PL (linhas 6-12): “aí ela achou uma ilha com água e comida, aí ela foi falar pra
aldeia dela, só que ela tinha esquecido de falar pro Tupã tirar o feitiço dela, aí quando ela
chegou lá, o bebê nasceu. Aí todos viram que, então apareceram todos aí viram que um
bebê nasceu de ... de uma cobra, aí eles acharam que era bruxaria, aí eles mataram o bebê,
aí ela começou a chorar, aí o choro dela fez um rio, aí ela entrou dentro do rio e
adormeceu no leito, aí depois quando ela chora o volume de água é tanta, o rio transborda
e vira um alagado até as ilhas próximas, aí por isso que o rio ganhou o nome de
Oiapoque”.
Análise:
A leitura de um texto não ocorre de forma linear, pois não acontece nesse ato
um processo exato, detalhado e sequencial, por isso, a compreensão textual é dificilmente
apreendida, já que os sentidos construídos resultam a partir da interação comunicativa entre
leitor e autor, com base no texto, sem sua repetição literal.
Um dos aspectos cognitivos imprescindíveis para a compreensão textual é a
memória, conceito que segundo Marcuschi “não é um repositário caótico de coisas e sim
um instrumento estruturado e estruturante, com grande dinamismo e capaz de se
reorganizar a todo momento” (MARCUSCHI, 1985).
Considerando essas premissas, pode-se observar que, a partir do input textual,
após a primeira leitura do segundo texto, o aluno Pedro retoma toda a história, organizando
suas ideias de forma que possa recriá-la, seguindo as pistas do texto narrativo É importante
ressaltar que em poucas linhas ele abarca os principais acontecimentos da história.
No primeiro texto (A dança do arco-íris), o aluno não reconta com essa
propriedade, com essa habilidade de seguir uma sequência dos acontecimentos; pode-se
134
afirmar que ele desenvolveu uma leitura mais proficiente, mais complexa. Isso,
provavelmente, deve-se às experiências leitoras ocorridas na escola com os projetos
interdisciplinares e maleta
da leitura, práticas pedagógicas que incentivam de forma significativa a constituição de um
leitor autônomo, capaz de refletir sobre o que lê e produzir inferências de diversas origens.
a) De base contextual:
Foram selecionados alguns fragmentos da primeira leitura feita pelo aluno
Pedro, nos quais o mesmo constrói uma hipótese sobre a intenção de a índia ter deixado o
bebê na aldeia, pois além de preservar a vida do bebê, o aluno infere que ela (índia) queria
que seu filho “vivesse mais” e não foi isso o que ocorreu, pois a criança foi morta.
Pedro – PL (linhas 14-18): “Ah, é eu achei legal porque ela queria deixar o filho dela ...
ela queria que o filho dela vivesse mais do que ela, mas só que depois ele morreu mais
primeiro.
Pesquisadora: “Humm, e o que que você acha disso?”
Pedro – PL (linhas 17-18): “É, apesar dela ter esquecido, também eles podiam achar que
ela roubou, que a cobra roubou o filho de alguém, da aldeia”.
Ao finalizar o comentário sobre sua percepção da história, a pesquisadora
utiliza a mesma estratégia para verificar as relações que o aluno pode fazer desse texto com
outros:
Pesquisadora (linhas 20-21): E você quer comentar mais alguma coisa? Essa história é
parecida com alguma outra que você tenha lido?
Aluno Pedro - PL (linhas 22-23): Essa história é parecida com uma que a professora já leu
pra gente, que era a lenda de alguma coisa que eu esqueci, que falava quando o homem
tava indo pra floresta....
Aluno Pedro – PL (linhas 43-46): Ah, o outro que eu li era, ele... o homem foi esperto, ele fez
....ele criou as filhas com um material aí elas tiveram vida na manhã seguinte , mas só que
essa daqui, eu achei triste por causa que era a coisa que ela mais queria era ter um filho,
mas só que o filho dela morreu.
Após a intervenção da pesquisadora, o aluno faz o reconto da lenda que foi
135
trabalhada pela professora, tecendo comparações entre os dois textos.
Análise:
Os aspectos dos comentários do aluno evidenciam processos inferenciais com
base nos seus conhecimentos de mundo, adquiridos em várias instâncias de sua vida.
O aluno
reproduz a ideia de que a ordem natural das coisas é que os mais velhos morram primeiro
que os mais novos. Essa ideia não está explícita no texto lido, ele inferiu a partir do que
Marcuschi (1985) denomina de universo cultural-cognitivo: o aluno insere dados que
contribuem para o processo de compreensão textual. Pode-se afirmar que esse tipo de
inferência é de natureza lexical e pragmática, já que o aluno, apesar da pouca idade,
demonstra a construção de ideias sobre a morte e sua representação, para as pessoas que
vivenciam esse acontecimento. Além disso, se sensibiliza com a morte do bebê que foi
uma tragédia na vida da personagem.
Nas passagens desta primeira leitura (linhas 23 e 24), ao ser indagado sobre
se ele conhecia outro texto parecido com o lido, o aluno relata uma lenda que a
professora contou, diferente daquela citada por ele nos comentários sobre o texto “A
dança do arco-íris”.
A criança diz que não lembra o nome da lenda contada pela professora, no
entanto, reconta essa lenda buscando recuperar toda a sequência da narrativa. Ao
comparar o texto 2 com essa lenda, ele chama a atenção para o final das filhas do
personagem principal, as quais ficam vivas, algo que não ocorre no final do texto 2, pois
a filha da índia-cobra é morta.
A comparação no último exemplo expõe elementos de morte e vida, uma
história com final triste e a outra com um final feliz. Pode-se afirmar que a comparação
intertextual é observada com mais complexidade nos comentários do texto 2.
Não foi observado algum tipo de inferência sem base textual e ou contextual.
Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: Agosto de 2014.
Sujeito pesquisado: Pedro Segunda leitura: SL.
136
Texto 2/ Pedro – SL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:
a) De base textual e contextual:
Nessa segunda leitura do texto 2, a pesquisadora inicia a conversa
questionando se o aluno lembra a história e ele reponde afirmativamente; após ler o texto
na íntegra, o aluno reconta a história, no entanto, traz outros elementos que não foram
expostos na primeira leitura:
Pesquisadora (linha 01): Já faz um tempo, né, que você leu? Não sei se você
lembra da história.
Aluno Pedro – SL (linha 02): lembrar, até que lembro.
Pesquisadora (linha 04): E aí? (após feita a leitura).
Aluno Pedro- SL (linha 5): Legal.
Pesquisadora (linha 06): Por quê?
Aluno Pedro - SL (linhas 08-14): Porque, lá que eu já tinha falado antes, que ela não tinha
comida, então a Tarumã quis ver se tinha mais alguma ilha que tivesse água e comida. Aí
ela foi, ela pediu pro Tupã pra ela se transformar em cobra, ele transformou ela, aí ela
passou meses andando...aí até que ela encontrou a ilha e também, antes eu não tinha
percebido que foram por causa dos fulgos... dos sulcos dela, porque o rio se tornou, porque
ela ia andando e a terra ia... ia abrindo. Aí quando ela começou a chorar, aí a choradeira
dela foi toda pra aquele lado. Aí se tornou um rio.
Aluno Pedro - SL (linhas 15-16): Ah, uma única coisa que eu não entendi, foi, é como eles
tiveram a ideia de dar o nome de Oiapoque pro rio.
Pesquisadora (linha 25): Qual foi a pergunta que você fez mesmo?
Aluno Pedro – Sl (linha 26): Porque esse rio ganhou o nome de Oiapoque?
Pesquisadora (linha 27): Por que que você acha?
Aluno Pedro - SL(linha 28): Humm, será que foi pelo nome da aldeia, ou por causa... ah,
não sei porque.
Pesquisadora (linha 29): Tem esses textinhos aqui do lado, será que eles podem nos ajudar?
Aluno Pedro – SL (linhas 44-46): Ah, eu... eu também quase cheguei pertinho da resposta
...eu ia falar que era o nome de uma aldeia, aí você pediu pra mim lê isso daqui ... mas eu
tava pensando em falar que era o nome de uma aldeia.
Análise:
Ao recontar a história, são produzidas inferências de base textual, pois o
aluno
Pedro, nas passagens entre as linhas 08 e 14, busca, ao ativar a memória, retomar toda a
137
sequência do texto; no entanto, os trechos enfatizados na segunda leitura são diferentes dos
da primeira. Nesta, o aluno enfatiza a passagem em que a criança é morta pela aldeia, por
ela ter nascido de uma cobra, embora ele relate os acontecimentos ocorridos em
consequência desse ato e atrele os mesmos à origem do rio; naquela, o aluno apresenta um
olhar mais de indagação, ele se fixa em uma palavra: “fulgos.... sulcos” . Ele afirma que
foi por causa dos sulcos que ela criou e sua “choradera” que o rio formado.
Depois de ter recontado a história, quem faz a pergunta para a pesquisadora é o
aluno, indagando-a “Porque esse rio ganhou o nome de Oiapoque?” (linha 26). Ao retornar
a questão para o aluno, ele responde com um pouco de insegurança, por conta da aldeia. Ele
já sabia a resposta, mas queria uma confirmação que ocorreu após um diálogo entre a
pesquisadora e o sujeito pesquisado.
A pesquisadora não responde de imediato, sugere que o aluno leia os textos
informativos complementares e, quando ele verifica que estava certo, que o nome dado
ao rio foi por causa do nome da aldeia “Oiampi” e depois “Oiapoque”, sentiu-se
satisfeito. Desta forma, Pedro ao formular uma questão sobre a origem do título do texto
e seu enredo, busca apoiar-se em suas memórias de leituras anteriores que abordavam
elementos da cultura indígena, seguindo as pistas semânticas do texto: a escrita e o som
da palavra Oiapoque, para confirmar sua hipótese sobre a origem indígena do nome do
rio, com a sugestão da pesquisadora utiliza-se de outros textos informativos para
confirmar sua ideia.
Na segunda leitura do texto 2 - A origem do Oiapoque - a relação
estabelecida entre o sujeito e o texto lido é de diálogo e questionamentos elaborados a
partir do seu próprio entendimento do conteúdo textual. Nesta segunda leitura, torna-se
complexa a categorização das inferências produzidas, pois todas originam-se do input
textual, o aluno não faz extrapolações contextuais, o único momento em que isso ocorre é
quando ele vai buscar em sua memória, em seu conhecimento prévio, a associação entre a
lenda que é de origem indígena e o nome do rio.
Acredita-se que essa relação só foi possível pelos conhecimentos adquiridos
anteriormente, através de leituras de lendas indígenas propostas pela professora no
projeto interdisciplinar e em livros selecionados pelo aluno na sacola da leitura. Com
isso, foi possível a formulação da hipótese de que o nome do texto e do rio estão
associados ao nome da aldeia, pois todos os personagens da lenda são de origem
indígena.
138
Essa estratégia é de origem metacognitiva, pois envolve uma reflexão sobre o
conhecimento, e “controlar nossos processos cognitivos são passos certos no caminho que
leva à formação de um leitor que percebe relações, e que forma relações com um
contexto maior, que descobre e infere informações e significados mediante estratégias
cada vez mais flexíveis e originais”. (KLEIMAN, 2008, p.10).
Texto 2/ Elisa – PL: A origem do Oiapoque, produção de inferências:
a) De base textual:
Após a leitura em voz alta, a pesquisadora questiona a aluna, a qual responde
prontamente:
Pesquisadora (linha 1): E aí? Você gostou da história? Não gostou? O que você achou?
Aluna Elisa – PL (linha 2): Eu gostei.
Pesquisadora (linha 3): Hum, e o que você pode me contar?
Em seguida, a aluna busca retomar a sequência da narrativa; em alguns
momentos, ela recorre ao texto, nos trechos em que não lembra a história de memória,
buscando uma palavra ou expressão. No entanto, no seu reconto, verifica-se uma
reconstrução da história com riqueza de detalhes:
Aluna Elisa –PL (linhas 04-17): Eu gostei porque eles viviam em uma aldeia, onde a fome
tinha atingido eles e havia pouca caça e quase nenhum peixe, e a seca acabara com as
plantações de mandioca, com as árvores frutíferas, aí a mulher tava grávida ... uma mulher
chamada (a aluna procura o nome no texto) Tarumã, ela estava grávida, ela decidiu sair
para achar um lugar onde tinha comida, é... água pra aldeia dela, aí ela pediu pro Tupã,
que queria ser uma cobra pra procurar né, aí quando ela, ela avisou e toda vez que ela
passava lá deixava uma rastro né, aí ela chamou o povo dela, ela tinha achado uma aldeia
... não uma aldeia, um lugar. Aí eles construíram as casas, tinha água, tinha comida, aí ela
foi lá e chamou, aí quando eles tavam indo, aí o bebê tinha nascido, aí a Tarumã teve a
filhinha dela bem na entrada do povoado né. Aí quando as pessoas viram que a criança
Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: 14 de agosto de 2014.
Sujeito pesquisado: Elisa. Primeira leitura: PL
139
tinha nascido de uma cobra, acharam que fosse algum tipo de bruxaria mataram o bebê, aí
a Tarumã ficou louca de dor, mas não atacou sua gente expressou a tristeza dela com um
choro tão prolongado que as lágrimas preencheram os sulcos que seu corpo havia cavado
na mata, aí formou tipo um rio, porque ela era grande.
Análise:
Elisa apresenta operações inferenciais apoiando-se no input textual. O tipo de
inferência mais comum que esta apresenta, no primeiro momento da leitura com a
intervenção da pesquisadora, é o parafraseamento, de natureza lexical e semântica em que
ocorre a “alteração lexical para dizer a mesma informação sem alteração fundamental de
conteúdos proposicional”. (MARCUSCHI, 2008, p.255). Embora sua leitura seja
parafrástica, é importante ressaltar que a reorganização do texto lido não é caracterizada por
uma reprodução linear da narrativa; é perceptível que a aluna apropriou-se de modelos
estruturais de reconto de textos, onde pode-se afirmar que esquemas mentais são acessados,
estes “concebidos como estruturas flexíveis em dinâmicas, que estão em constante
reestruturação, de acordo com as informações que vão sendo processadas no decorrer das
várias atividades cognitivas que as pessoas realizam”. (MACHADO, 2006, p.289).
Desta forma, acredita-se que Elisa, em três anos em que permaneceu na escola,
pôde vivenciar cotidianamente atividades de leituras, já exemplificados no capítulo 2,
assim
como práticas de leituras que foram ampliadas para outros espaços, as quais contribuíram
para que a aluna ao final do 3º ano do ciclo I já seja capaz de construir de forma
sistematizada a sequência de um texto narrativo, de forma autônoma, utilizando de seu
próprio universo semântico.
b) De base contextual:
Em seguida ao reconto produzido pela aluna Elis, em sua primeira leitura do 2º
texto, a pesquisadora faz uma nova intervenção, com o objetivo de incentivar a aluna a
travar um diálogo mais efetivo com o texto:
Pesquisadora (linhas 26-29): Então você me contou toda a história né?! Então, eu quero
saber assim também, que parte você mais gostou? Se você conhece alguma outra história
que tenha a ver com essa, o que você pensou sobre ... quando tava lendo essa história, se
você lembrou de alguma outra.
140
A partir desse questionamento, entre outras intervenções da pesquisadora, a
aluna procura interagir com o texto, elaborando suas respostas, produzindo inferências de
base contextual:
Aluna Elisa – PL (linha 30): Ah... eu gostei mais da parte que ela tava chegando na aldeia e
o bebê nasceu.
Pesquisadora (linha 31): Hum, por que?
Aluna Elisa – PL (linhas 32-33): Porque aí é...teve a filhinha bem na entrada do povoado,
quando as pessoas viram que era uma criança nascida de uma cobra, aí elas mataram o
bebê. Pesquisadora (linha 34): E você gostou disso? Que mataram o bebê?
Aluna Elisa – PL (linhas 35-36): Não, que eu achei legal que uma criança nasce de uma
cobra, uma criança normal.
Pesquisadora (linha 37): Ah, o que você achou de legal nisso.
Aluna Elisa – PL (linha 38): Porque eu nunca tinha visto uma criancinha nascer de uma
cobra né!
Aluna Elisa – PL (linhas 43-44): Eu também achei legal a parte que ela quis se transformar
em cobra só pra achar um lugar pro povo dela ficar.
Pesquisadora (linha 45): Hum, porque que você acha legal
isso? Aluna Elisa – PL (linha46): Porque ela tava ajudando
a família. Pesquisadora (linha 47): E você acha importante
isso?
Aluna Elisa – PL (linha 48): A aluna faz sinal que sim com a cabeça.
Pesquisadora (linha 49): Por que?
Aluna Elisa – PL (linha 50- 51): Ah, porque é a sua família, se tem que cuida dela,
agora eu tenho dois irmãozinhos, eu cuido deles.
Análise:
As inferências contextuais elaboradas por Elisa foram feitas em um contexto
de diálogo entre o texto, com a contribuição da pesquisadora, por meio de perguntas
direcionadas. A aluna fixou-se em duas passagens da narrativa: a primeira sobre o fato de
a criança filha da personagem ter nascido de uma cobra: para aluna esse fato é
improvável, pois a mesma relata que nunca vira um acontecimento desse antes, para ela
uma criança normal não nasce de uma cobra. Este tipo de inferência demonstra que a
141
aluna, fez uma associação com suas vivências pessoais e o conhecimento prévio sobre
nascimentos de bebês, ela não faz uma alusão a esse acontecimento ser possível pelo fato
de a história tratar-se de uma lenda: a inferência feita por ela fica em um nível pragmático
e experienciais.
A segunda passagem da narrativa considerada por Elisa refere-se ao ato de
cuidar. O que chama a atenção da menina é a preocupação da personagem, transformada
em cobra, se preocupar com a sua aldeia: essa atitude valorativa fez a aluna produzir um
tipo de operação inferencial por associação lexical, semântica e pragmática, em que
ocorre a “afirmação de uma informação obtida através de saliências lexicais ou
cognitivas por associação de ideias”. (MARCUSCHI, 2008, p.255). Neste caso, a aluna
apoiou-se na pista textual sobre o ato de cuidar, presente no decorrer da história e,
associou essa expressão ao que ela entendia por cuidar, exemplificando com uma ação
do seu cotidiano que remete ao cuidado que sua família teve com ela e agora que cresceu
um pouco, ela que é responsável por cuidar o irmãozinho mais novo.
Texto 2/ Elisa – SL: A origem do Oiapoque, produção de inferências:
a) Base textual:
A segunda leitura do texto 2 ocorreu depois de quarenta dias de efetuada a
primeira leitura. A pesquisadora orienta a aluna sobre como deverá ser feita a leitura:
primeiro em voz alta e, em seguida, comentários sobre o texto; além disso, a pesquisadora
pergunta se Elisa lembra de ter lido a história e pede para comentar sobre algo que não tinha
dito na primeira leitura. A aluna diz que lembra que já leu esse texto. Após a leitura a
pesquisadora indaga:
Pesquisadora (linha 01): Então?
Com a intervenção de uma palavra, a aluna já inicia o reconto da narrativa,
demonstrando que Elisa se apropriou de um modelo de prática de leitura escolarizada, o reconto e,
Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: 24 de setembro de
2014.
Sujeito pesquisado: Elisa. Segunda leitura: SL.
142
responde a indagação com a expressão: eu gostei justificando o porquê e desenvolve a construção
da narrativa através de uma leitura parafrástica,
Aluna Elisa – SL (linha 1): Ah, eu gostei, porque fala de uma mulher que morava em uma
aldeia que, muitos anos atrás né, a fome atingiu a aldeia dessa mulher né. Aí, ela tava
grávida né, e ela não ia consegui é...amamentar a filhinha dela que ela tava grávida né.
Entre as linhas 2 a 29, Elisa reconstrói toda a narrativa, com autonomia; no
entanto, em boa parte desse processo, a aluna lança o olhar para o texto, utilizando-o com
apoio, apresenta pouca autonomia para a prática do reconto do texto.
b) De Base contextual
Após o reconto, a pesquisadora pergunta:
Pesquisadora (linha 30): Humm, muito bom! E o que mais você tem pra dizer dessa história?
Como na primeira leitura, a aluna repete que acha estranho um bebê nascer de uma cobra:
Aluna Elisa SL (linha 32): Que... muito estranho né, um bebê nascê de uma cobra.
A partir de ssa afirmação, ocorre um diálogo entre pesquisadora e aluna,
apresentado a seguir:
Pesquisadora (linha 32): Isso é possível?
Aluna Elisa – SL (linha 33): Não, acho que
não. Pesquisadora (linha 34): E porque aqui é
possível? Aluna Elisa – SL (linha 35): Porque
é uma lenda.
Pesquisadora (linha 36): Humm, em uma lenda é possível acontecer isso?
Aluna Elisa – SL (linha 37):
Raram! Pesquisadora (linha 38):
Por que?
Aluna Elisa – SL (linha 39): Porque não é real.
Pesquisadora (linha 40): Mas nada que tá aqui é
real?
Aluna Elisa – SL (linha 41): Acho que só as aldeias né, que existe índio , né.
Pesquisadora (linha 42): Humm, muito bem!
Aluna Elisa – SL (linha 43): Mas as outras coisas, acho que não.
Pesquisadora (linha 47): Entendi. E essa história te fez lembrar de alguma outra que você já
143
tinha visto?
Aluna Elisa – SL (linha 48): Não.
Pesquisadora (linha 49): Estudado em sala de
aula? Aluna Elisa – SL (linha 50): Não.
Pesquisadora (linha 51): Humm, nunca viu uma parecida com
essa? Aluna Elisa – SL (linha 52): Balança a cabeça que não.
Pesquisadora (linha 53): Entendi.
Pesquisadora (linha 54-55): Que seja uma lenda, por exemplo, que não fala da Tarumã, fala
de outras coisas, você lembra?
Aluna Elisa – SL (linhas 56-57): Nós já trabalhamos a lenda do guaraná, a da mandioca e
mais outras aí que eu não lembro.
Pesquisadora (linha 58): E o que elas têm em comum com
essa? Aluna Elisa – SL (linha 59): Nada.
Aluna Elisa – SL (linha 60): Mas eu só sei que nós trabalhou várias
lendas. Pesquisadora (linha 61): Então não tem nada em comum?
Aluna Elisa – SL (linhas 61-67): A do guaraná é que o menino foi picado pela cobra que era
o jurupai, o espírito do mal né, aí ele morreu. Aí o tupã .... eu acho que é o Mesmo Deus, o
tupã... é ... ele falou que era pra ...é... quando é, pra quando é, teve várias trovoadas né, mas
aí, o povo quando viu é que o indiozinho morreu né, que é o (?) e a mãe dele queria tanto
um filhinho, aí depois o tupã falou que era pra plantar os olhos do menino que ia nascê uma
planta milagrosa, que era o guaraná.
Pesquisadora (linha 68): Então você identificou né? Que é o Mesmo
Deus. Aluna Elisa – SL (linha 69): Balança a cabeça positivamente.
Pesquisadora (linha 70): Então você encontrou uma semelhança.
Aluna Elisa – SL (linha 71): Risos.
Análise:
Foi descrito, praticamente, todo o diálogo travado entre a pesquisadora e a aluna
Elisa, para que se compreenda o processo de produção de inferências de origem
contextual.
Como na primeira leitura, o que chama a atenção de Elisa é o fato de o bebê nascer de uma
cobra, pois, segundo ela, isso é estranho; na primeira leitura não havia muito o
desenvolvimento dessa ideia, no entanto, através do diálogo com a pesquisadora, a aluna
chega à conclusão que, por ser uma lenda, isso não é real, ou seja , ela consegue avaliar que
somente a possibilidade de uma cobra ter um bebê humano é em uma lenda, ainda verifica
que embora aconteçam situações fantasiosas em uma lenda, é possível também aparecerem
144
objetos e lugares que existem. Como é o caso citado por ela, que existem índios e aldeias.
Elisa, a partir de uma relação dialógica com o texto e com a pesquisadora, consegue
identificar de forma pragmática uma das características do gênero lenda, trabalhada em
sala de aula, como a própria aluna expõe. Desta forma, torna-se possível afirmar que a
aluna, na relação com o texto, elabora inferências de base contextual pragmática
experiencial; cognitivas analógicas, ao se posicionar como leitora, atingindo um
horizonte máximo de compreensão textual, por meio de inferências possíveis. A
compreensão ocorre pela reunião de várias informações do próprio texto, tais como:
elementos naturais e míticos; personagens recorrentes em outras lendas; um enredo que
explica a origem de algo, seja um rio, uma planta, etc. São marcas textuais, as quais
permitiram que a aluna fizesse associações intertextuais e as relacionasse com outros
tipos de informações, sejam elas de conhecimentos pessoais entre outros que não estão no
texto, mas que contribuem na geração de sentidos e compreensão leitora.
Dando continuidade ao diálogo, a pesquisadora pergunta se a aluna estudou
algum outro texto que se parece com o lido; Elisa diz que não reiteradamente, no entanto,
quando conta para a pesquisadora sobre uma lenda estudada em sala de aula, ela verifica
que o nome Tupã, ou melhor, o Deus Tupã, aparece em ambas as histórias e percebe, com
a ajuda da pesquisadora, uma semelhança entre os dois textos , produzindo inferência de
base contextual, associativa pragmática conversacionais, em que, através de uma
informação obtida no texto, há uma associação de ideias.
Texto 2/ Luís – PL: A origem do Oiapoque, produção de inferências:
a) Base Textual:
Após feita a leitura em voz alta, ocorre o seguinte diálogo entre a pesquisadora
e o aluno Luís:
Pesquisadora (linha 2): E aí? O que você achou? O que que você me conta (após a leitura).
Aluno Luís – PL (linha 3): Legal.
Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: 15 de agosto de 2014.
Sujeito pesquisado: Luís. Primeira leitura: PL.
145
Pesquisadora (linha 4): É!
Aluno Luís – PL (linha 5): Porque essa história... posso reler tipo isso... reler só que não
ler, conta!
Pesquisadora (linha 6): Sim.
A partir da resposta afirmativa da pesquisadora, Luís inicia o reconto da
história: Aluno Luís – PL (linhas 07- 15) Que, muitos anos atrás, uma aldeia ficou com
muita fome, aí as crianças que ficou doente, os bebês e os velhos tavam morrendo... só que
a Tarumã, eu acho que é Tarumã mesmo, tava grávida, aí ela fugiu pro seu bebê não
morrer, aí com fome e sede, ela pediu, acho que foi pra Deus, sei lá quem aí, transformar
ela em cobra, aí não sei quando aí, ela virou cobra mesmo, aí, finalmente, uns meses, ela
achou a aldeia e ficou toda alegre. Aí os índios que viram o bebê, tipo filho da cobra, aí
acharam que era bruxaria e matou o bebê, aí a cobra ficou triste, mas mesmo assim não
quis matar os índios, aí o resto eu já esqueci... não sei que aconteceu aí que eu já esqueci.
Ah, ela foi pro mar, aí de tanto ela chorar, o mar tipo aumentou.
A pesquisadora indaga o aluno Luís:
Pesquisadora (linha 16): o mar?
O aluno segue com o reconto:
Aluno Luís – PL (linhas 17-19): Deixa eu ver se é o mar (procurou informação no texto),
foi no rio né .... “o rio transborda forma-se uma grande alagado”(trecho lido pelo aluno).
Aí por isso que agora o rio é chamado... tem um nome, ganhou um nome de Oiapoque.
Após o reconto:
Pesquisadora (linha 20): Muito bem!
Aluno Luís – PL (linha 21): Por isso que é a origem do Oiapoque.
Análise:
A pesquisadora faz uma intervenção inicial após a primeira leitura do texto 2:
sobre a opinião do aluno com relação ao texto lido, ele diz que achou legal. Ao ser
solicitado para contar o que achou interessante no texto, Luís pergunta se, ao invés de reler,
ele pode contar. Muito importante essa fala do aluno: possibilita constatar que o mesmo
prefere contar ao reler a história. O que essa postura diante do texto revela? É uma
146
indagação muito pertinente que deve ser investigada, pois o contar mobiliza muito mais
elementos psicolinguísticos do que a atividade de ler, reproduzindo literalmente as palavras
contidas no texto.
O reconto do texto é construído através de uma leitura parafrástica, sendo que
um elemento que caracteriza a leitura deste aluno é a reflexão permanente no decorrer do
processo de reelaboração textual. Luís apresenta uma autonomia durante o reconto, mas
demonstra algumas dúvidas com relação a nomes, significados, marcadores temporais, o
que não impede que o mesmo compreenda a história; as estratégias metalinguísticas que
Luís faz uso contribuem para a sua compreensão textual, demonstrando assim uma
flexibilidade na leitura, característica de um leitor proficiente, pois “ele não tem apenas um
procedimento para chegar aonde ele quer, ele tem vários possíveis, se um não der certo,
outros serão ensaiados”. (KLEIMANM, 2012, p.76).
b) Base contextual
Finalizado o reconto e questionado novamente pela pesquisadora se o aluno tem
mais alguma coisa para contar, Luís:
Aluno Luís – PL (linhas 23-24): Posso ler esses pedacinhos aqui ó, que tem? (o aluno se refere aos
textos informativos que estão nas quatro pontas das páginas).
Pesquisadora (linha25): Pode.
Aluno Luís – PL (linhas 26-27): Estranho ... agora não tô entendendo, se aqui tarumã é a cobra né,
e aqui a tarumã é uma árvore ou cidade ou fruta, agora já não tô entendendo não. Confundiu tudo
agora.
Pesquisadora (linha 28): Ah, você acha que confundiu tudo?
Aluno Luís – PL (linhas 29-32): É porque aqui tá falando que tarumã é uma cobra...na verdade é
uma índia cobra né, e aqui , depois que eu li esse pedacinho, piquititico, eu vi que tarumã uma ....
“tupi quer dizer fruta que dá em cacho, o côco é uma das outras frutas também chamadas de
tarumã e a árvore é chamada também de tarumã”( trecho lido do texto informativo).
Pesquisadora (linhas 33-34): Então, porque será que é diferente? Em um texto a tarumã é uma coisa
e no outro texto a tarumã é outra? Por que você acha?
Aluno Luís – PL (linha 35): Ah, eu não sei!
Pesquisadora (linha 36): Imagina! O que que você pode pensar?
Aluno Luís – PL (linhas 37-38): Eu acho que tarumã ficou tão famosa assim, que deu o nome
também de árvore e frutas.
Pesquisadora (linha 39): Porque ela ficou famosa, ah entendi.
147
Aluno Luís – PL (linha 40): Tipo isso, ficou tão conhecida assim.
Pesquisadora (linhas 41 - 43): E esse texto, é um tipo de que texto, esse aqui que você leu
grande, que fala da índia tarumã? Que tipo de texto?
Aluno Luís – PL (linha 44): Lenda.
Análise:
O suporte apresentado pela pesquisadora para o aluno, onde o texto foi
veiculado, faz parte de um livro sobre a história do Brasil; nas duas páginas em que se
encontra o texto, existem alguns textos informativos complementares, como exposto na
página 29 deste trabalho. Na sequência do reconto, o aluno Luís, talvez com objetivo de
obter mais informações sobre o texto narrativo, pede para ler os “pedacinhos” dos textos
informativos que se encontram nas laterais das páginas.
A leitura do texto complementar gera no aluno muitas dúvidas, sobretudo
quanto ao significado da palavra Tarumã: Luís diz não estar entendendo nada, no
entanto, busca fazer associações mentais e contextuais sobre o que significa Tarumã,
considerando as informações dos textos lidos, em que o referente Tarumã tem diversos
significados. Na dúvida gerada pelos significados distintos nos textos, Luís busca uma
saída para seu questionamento, concluindo que Tarumã ficou famosa (a índia cobra) e
que, diante disso, seu nome foi dado para árvores de frutas. Dessa forma, ao acessar
informações vivenciadas sobre lendas e ter aprendido sobre alguns elementos que
caracterizam uma lenda, Luís produz inferências de base contextual pragmáticas
conversacionais, experienciais e cognitivas analógicas.
Texto 2/ Luís – SL: A origem do Oiapoque, produção de inferências:
a) De base textual e contextual:
Optou-se, neste item, por apresentar dados da segunda leitura do texto 2, feita
pelo aluno Luís que estejam relacionadas a duas origens de inferências textuais e
contextuais, pois Luís intercala com suas opiniões, à medida que vai reconstruindo o
reconto do texto. Ele não faz o reconto e em seguida elabora inferências contextuais. Há
Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: 25 de setembro de
2014.
Sujeito pesquisado: Luís Segunda leitura: SL
148
uma interlocução entre a busca pela reprodução do texto e uma postura de diálogo com o
mesmo, como é apresentado a seguir:
Pesquisadora (linha 1): Muito bem, e aí? (após a leitura )
Aluno Luís – SL (linhas 02 - 12) É, eu gostei porque fala de uma mulher, a Tarumã, acho que é o
nome, que ... a aldeia dela que tava tudo... ela ficou doente, morrendo, ela quis fugir pra salvar seu
filho, não tinha comida e nem água, ela pediu para tupã transformar ela em cobra. Aí , ela achou
.... esqueci o lugar, que tinha água e comida e frutas. Aí, quando ela foi chamar o povo, ela
esqueceu de falar pra tupã desfazer o pedido, aí o bebê tinha nascido quando ela chegou perto do
povo, aí todo mundo pensou que era bruxaria, porque uma criança nascer de uma cobra. Até que
isso não é comum né? (risos). Aí, mataram o bebê, aí a cobra Tarumã chorou, não sei, formou um
riacho, um rio, aí quanto mais ela chorava, mais aumentava, até que, e foi assim que esse rio
ganhou o nome de Oiapoque, agora entendi porque o nome é a origem do Oiapoque.
Pesquisadora (linha 13): Ah, você entendeu então? Por quê?
Aluno Luís – SL (linha 14): E agora? Não sei.
Pesquisadora (linha 15): Você falou que entendeu...
Aluno Luís – SL (linhas 16 -17): É a origem do Oiapoque porque aqui fala, que por conta das
lágrimas da cobra, fez um rio né que ganhou o nome Oiapoque.
Pesquisadora (linha 18): Muito bem.
Análise:
Após a intervenção da pesquisadora, o aluno responde que gostou da história
e inicia o reconto, de forma mais autônoma em comparação com a primeira leitura deste
mesmo texto. Passou mais de um mês entre uma leitura e outra nesse ínterim, o aluno pode
ter refletido mais sobre o texto, ter lido outros e experimentado outros momentos de leitura
em sala de aula. A aparente autonomia não gerou certezas absolutas com relação ao
conteúdo textual. O aluno faz uma leitura parafrástica, articulada com reflexões e lapsos de
memória em que ele mesmo se questiona, sobre suas análises e certezas e assim vai
produzindo inferências de base contextual pragmática e avaliativa: avalia a todo momento
suas atitudes diante das informações textuais e compara com conhecimentos prévios sobre a
relação entre o enunciado com a história de Tarumã e a origem do rio Oiapoque. O aluno
demonstra estratégias metacognitivas ao verbalizar suas reflexões, dúvidas e busca de
respostas às suas próprias dúvidas a partir do input textual.
149
4.3. Texto “Romãozinho”
150
Figura 4: Livro: Viagem pelo Brasil em 52 Histórias. Ilustração de Cárcamo.
Este terceiro texto utilizado na pesquisa possui as mesmas características dos
anteriores. Contudo, ao ser escolhido, foi considerada uma história popular que já havia
sido lida e discutida pela professora em sala de aula, a qual fazia parte da bibliografia
adotada por ela no projeto desenvolvido no terceiro ano do ciclo I. Esta estratégia foi criada
por se acreditar que, ao ler um texto já conhecido, em determinado contexto de mediação
escolar, os alunos seriam capazes de construir diversas relações e ampliar a produção de
inferências de base contextual.
O texto inicia com a apresentação de Romãozinho (linhas 1-3), suas
características de personalidade e a comparação com as personalidades de seus pais, que
eram bem diferentes da sua.
Entre as linhas 4 e11, ocorre a primeira ação do personagem, que encadeará as
demais, ou seja, o menino inventa uma história para o pai. Não é uma história simples,
comum, com intuito de entretenimento, sem maiores consequências na vida das pessoas
envolvidas na ação, mas uma história com conteúdos de traição, maldade, de “quebra” de
confiança do pai sobre a honestidade e fidelidade da mãe, com possibilidade de
consequências trágicas.
151
Após ouvir a história contada por Romãozinho, sobre a traição da mãe, o pai
decidiu “tomar” satisfação com a mulher sobre o ocorrido, entre os trechos 12 e 16; não
acreditando na versão da mulher, o homem se vinga da traição “enterrando uma faca no
peito da mulher” – atitude decorrente do desespero ou talvez pela necessidade cultural de
“lavar a honra”.
Nas passagens seguintes (linhas 17-19), a mãe, antes de morrer, joga uma
“praga” no filho como forma de se vingar pelo ocorrido. A mãe deseja que o filho nunca
morra, que viva para sempre, que nunca descanse dessa vida e jamais tenha sossego. Na
linha 20, o pai morre de desgosto por ter matado a mulher.
Na linha 21, o texto expõe a falta de compaixão e sensibilidade de
Romãozinho diante da tragédia ocorrida na sua família em consequência de suas atitudes.
Nas passagens entre as linhas 25 e 28, são relatadas todas as maldades cometidas por
Romãozinho, depois de passado algum tempo, não se sabe ao certo quanto; no entanto,
pode-se inferir que esses acontecimentos são mais contemporâneos. Ainda é evidenciado
o medo que as pessoas sentem ao serem vítimas de tal criatura.
Entre as linhas 29 e 32, ocorre a finalização da história: há o relato de mais
uma maldade de Romãozinho, sendo também descrito que ele foi visto se transformando
em um fogo azul, na região da Chapada dos Veadeiros, e afirma que sua sina será vagar
eternamente pelo mundo fazendo maldade com as pessoas.
4.3.1. Análise de dados primários sobre compreensão leitora e
produção de inferências.
Texto 3/ 1ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:
A escolha do terceiro texto para pesquisa seguiu os mesmos critérios dos dois
anteriores. Contudo, foi acrescentado mais um objetivo durante a obtenção de dados
sobre as produções de processos inferenciais e compreensão leitora, pois este texto era
conhecido pelos alunos pesquisados: ele fora utilizado em sala de aula pela professora
como subsídio para o desenvolvimento do projeto interdisciplinar “Viajando pelo Brasil,
desvendando minhas origens”.
Texto 3: Romãozinho. Data: Novembro de 2014. Sujeito
pesquisado: Pedro. Primeira leitura: PL.
152
Considerando esta informação, a pesquisadora elaborou questões que
pudessem verificar se nas falas dos alunos apareceriam relações entre o texto lido no
momento da pesquisa e as leituras conduzidas pela professora em sala de aula.
a) De base textual:
Após a leitura efetuada pelo aluno, a pesquisadora usa a mesma estratégia de
pesquisa apresentada anteriormente, ou seja, uma pergunta bem genérica.
Pesquisadora (linha 01): Muito bem, e aí?
Aluno Pedro – PL (linhas 02-08): Fala que ele, o Romãozinho, era malcriado e era preguiçoso,
os pais dele eram boas pessoas, aí um dia a mãe pediu pra ele levar o almoço do pai, mas aí
quando tava no caminho, ele comeu toda galinha, aí ele levou pro pai, aí ele enganou o pai
falando que a mãe dele e outro homem tinham comido a galinha e botado os ossos na cesta pra
ele trazer, aí o homem ficou furioso e matou a mulher. Aí, antes da mulher, da mulher dele
morrer, ela amaldiçoou ele, aí até hoje ele ainda fica vagando pelas ruas, maltratando os
bichos, dando nó no rabo dos cavalos e dando medo nas pessoas.
Análise:
Ao responder à questão proposta pela pesquisadora, o aluno não emite sua
opinião
sobre o texto, como fez nos anteriores. Ele inicia o reconto dizendo “fala que” (o texto):
isso demonstra que o aluno, objetivamente, opta pelo recurso do reconto; na primeira
leitura de cada texto, essa prática é recorrente.
As inferências de base textual aparecem nos comentários, no decorrer do
procedimento de retomada da sequência do texto, com ênfase nos personagens, ação e
desenlace da trama. Considerando os elementos textuais mencionados, a natureza das
inferências produzidas são: lógica, lexical e semântica (parafraseamento), por apresentar a
partir das marcas textuais, uma sequência de acontecimentos que busca reproduzir o enredo,
atenta-se para uma lógica do desenvolvimento da história, sem suprimir momentos
importantes da narrativa.
Há a preocupação do aluno em reproduzir a história na íntegra, utilizando suas
próprias palavras. Percebe-se que, ao recontar essa lenda, o aluno demonstra bem mais
segurança do que apresentou ao recontar o primeiro texto desta pesquisa. Talvez por já
conhecê-lo, por já ter se apropriado com mais autonomia do processo de reconto e
comentários sobre o que foi lido.
153
b) De base contextual:
Ao término do reconto, a pesquisadora introduz uma questão direcionada, com
o objetivo de verificar se o aluno faz relações com os conhecimentos adquiridos no projeto
desenvolvido pela professora. Segue o trecho do diálogo:
Pesquisadora (linha 09): E, você já conhecia essa história?
Aluno Pedro – PL (linha 10): Já, na sala a gente já tinha lido essa história.
Pesquisadora (linha 11): Hum, a professora deu esse texto pra vocês já? Ela deu esse texto pra
explicar o que?
Aluno Pedro - PL (linha 12 - 13): É, ela deu pra explicar... é a gente começou a fazer o centro-
oeste, aí a gente começou com a história de Goiás.
Pesquisadora (linha 14): Hum, vocês estudaram o centro-oeste por quê? Faz parte do que?
Aluno Pedro – PL (linhas 15-16): Faz parte do projeto que a gente tá fazendo ... é ... é, só não
lembro o nome (fica pensativo).
Pesquisadora (linha 17): O que vocês estudam nesse projeto?
Aluno Pedro – PL (linhas 18-19): A gente tá estudando todas as regiões, a gente estudou o
norte, agora a gente tá no finalzinho do nordeste e tá começando o centro-oeste.
Pesquisadora (linha 20): Hum, que interessante.
Aluno Pedro – PL (linha 21): Aí, depois a gente vai pro sul.
Análise:
Partindo do input textual, a pesquisadora indaga ao aluno se já conhecia a
história,
o qual responde afirmativamente à questão, diz que a professora já leu esse texto em sala de
aula; isso sugere que o aluno acionou operações sociocognitivas, com base no seu
conhecimento prévio de leitor/ouvinte, contido em sua memória.
Em seguida, a pesquisadora questiona o aluno Pedro se a “professora deu o
texto para explicar o quê?”, visando detectar se o aluno, através do estudo de textos
literários, mais especificamente um conto popular brasileiro (Romãozinho), estabeleceria
conexões com os conteúdos desenvolvidos no Projeto interdisciplinar (ciências, geografia e
história), já citado anteriormente.
O aluno Pedro associa esse texto ao projeto, dizendo que eles (alunos da sala)
começaram a fazer o centro-oeste e a história de Goiás. Ainda explica que, no projeto,
estudam as regiões, elenca as já estudadas e as que faltam estudar.
Pode-se afirmar que, a partir da leitura do texto e com as perguntas direcionadas
pela pesquisadora, o aluno produz inferências de base contextual pragmáticas experienciais
154
e cognitivas, esquemáticas e analógicas. (MARCUSCHI, 2008), no momento em que os
aluno, a partir da materialidade do texto, associa seu conhecimento sobre regiões
geográficas brasileirasc retiradas da história aos conteúdos do projeto interdisciplinar.
Demonstrando suas experiências adquiridas em estudos anteriores, as quais são acessadas
na releitura do texto Romãozinho durante a pesquisa.
É importante ressaltar como é significativo para o aluno a prática de projetos
desenvolvido pela professora desde o primeiro ano de sua turma; isso aprece mais
efetivamente na segunda leitura do texto Romãozinho.
A seguir, será analisado o segundo grupo de inferências contextuais obtidas após
o término do diálogo já exposto. A pesquisadora questiona o aluno:
Pesquisadora (linha 32): E você queria falar mais alguma coisa a respeito dessa?
Aluno Pedro – PL (linhas 33-34): Ah, quando a professora leu pra gente, eu faço a mesma
pergunta: por que ele era tão malcriado se os pais dele eram tão bonzinhos?
Pesquisadora (linha 35): Você ficou com essa dúvida? Por que será hein? O texto explica
isso?
Aluno Pedro - PL (linha 36): Não muito.
Pesquisadora (linhas 37): Não né? E o que você acha? Que explicação você pensa pra isso?
Aluno Pedro - PL (linhas 38-39): Vai ver os pais dele criaram ele bem e depois ele, que
quando foi crescendo foi se tornando malcriado.
Pesquisadora (linha 40): Por que você acha que isso pode acontecer?
Aluno Pedro – PL (linhas 41-42): Por que já várias famílias, elas criaram o filho educado,
aí depois eles vão crescendo e ficando malcriados.
Pesquisadora (linha 43): E porque você acha que isso pode acontecer?
Aluno Pedro – PL (linhas 44-45): É, porque ... às vezes... é, por causa de um amigo, de
alguma coisa que deixou ele nervoso.
Pesquisadora (linha 46): Hum, você acha que pode ser isso então?
Aluno Pedro – PL (linha 47): A companhia né, de algum amigo.
Análise:
Novamente, o aluno dialoga com texto, busca respostas para dúvidas surgidas
na
interação dialógica entre leitor e texto. A questão apresentada pelo sujeito pesquisado é
universal, pode-se caracterizar como um questionamento de dilema humano, ou seja, ele
quer saber por que uma pessoa, ou criança (Romãozinho), era tão malcriada se os pais eram
tão bonzinhos.
155
O nível de compreensão do aluno extrapola os aspectos de pura decodificação
textual e de produção de inferências de base apenas textual, com ênfase na preocupação de
seguir somente uma sequência da narrativa. O aluno sensibiliza-se com o acontecimento
trágico: o pai mata a mãe em consequência de uma mentira inventada pelo filho (a traição
da mãe com outro homem) e, a partir disso, elabora questionamentos para entender o fato.
A pesquisadora, ao devolver a pergunta para o aluno, obtém como resposta que
várias famílias educam bem seus filhos. Na concepção do aluno, várias crianças vivem em
um ambiente familiar bom, no entanto, mesmo assim, quando crescem, ficam malcriadas e
o motivo disso seriam as companhias. Provavelmente, essa afirmação está atrelada
ao seu universo cultural cognitivo, às crenças vivenciadas pelo aluno, seja no ambiente
familiar, nas orientações religiosas divulgadas em espaços para esse fim e na própria
vivência escolar.
Texto 3/ 2ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:
a) De base contextual:
Ao término da leitura em voz alta, a pesquisadora, como de praxe, inicia o
diálogo com um breve “...e aí?”. Ao invés do reconto, o aluno faz uma série de
associações a partir do texto lido com histórias de assombração brasileiras; ele cita vários
personagens do universo da cultura popular: são feitas algumas relações com o saci-
pererê e o aluno diz, com convicção, que as histórias lidas por ele aconteceram na
Chapada dos Veadeiros, onde se passa a história de Romãozinho.
Verifica-se que o aluno Pedro, em sua segunda leitura do texto 3, a partir da
história, busca fazer todas as relações possíveis com outras leituras de textos literários,
também de outros gêneros e faz um percurso de ir e vir ao retomar o texto base. São
muitas informações inferenciais que ele traz de origem intertextual e contextual. Para
análise, optou-se em retomar um trecho em que o aluno, ao voltar o olhar para o texto,
constrói uma rede de relações entre a narrativa Romãozinho e, algumas atividades de
leitura desenvolvidas em sala de aula, a partir da prática de projetos interdisciplinares.
Texto 3: Romãzinho. Data: Novembro de 2014. Sujeito
pesquisado: Pedro. Segunda leitura: SL.
156
Já foram expostas, em momentos anteriores, essas relações produzidas pelo
aluno no processo de compreensão de textos e produção de inferências; no entanto, os
trechos a seguir apresentam um detalhamento de significados das diversas leituras feitas
pelo sujeito pesquisado e sua capacidade de tecer relações, ao ponto de criar links de
diversos contextos, sem correr o risco de produzir inferências falseadoras.
Seguem os diálogos entre pesquisadora e aluno:
Aluno Pedro – SL (linha 27): Esse texto aqui é do centro-oeste, não é?
Pesquisadora (linha 28): É do centro-oeste. Aluno
1B (linha 29): Então é do centro-oeste.
Pesquisadora (30): Como você sabe que esse texto é do centro-oeste?
Aluno Pedro –SL (linhas 31-33): É porque a gente já tinha lido na sala e a gente tava fazendo é ... o
projeto “Viajando pelo Brasil desvendando nossas origens”, aí a gente foi do norte pro nordeste, aí
a gente estudou o centro oeste, aí a gente estudou o sudeste e agora a gente tá no sul.
Pesquisadora (linha 34): Em todas essas regiões vocês leram algum texto?
Aluno Pedro – SL (linha35): Sempre alguma lenda ... tem de pessoas ... de como surgiu a mandioca,
o guaraná.
Pesquisadora (linha 36): E essas lendas ajudaram vocês a compreenderem a região?
Aluno Pedro – SL (linha 37): Sim, e a compreender também os negros ...
Pesquisadora (linha 38): E o que mais?
Aluno Pedro –SL (linhas 39-40): Os negros eram bem maltratados pelos portugueses .... eles davam
comida no chão pra eles.
Pesquisadora (linhas 41-42): Ah, entendi. Estudando as regiões do Brasil vocês foram vendo como
era o dia a dia da época da escravidão, né?
Pesquisadora (linha 43): É importante saber dessas coisas né? Da nossa história né?
Aluno Pedro - SL (linhas 44- 46): A gente estudou a história do Chico Rei, que falava de um homem
que era escravo, aí sua família também foi, aí ele foi separado da família só ficou seu filho, aí eles
começaram a libertar os escravos colocando pó de ouro no cabelo.
Pesquisadora (linha 47): E como que eles libertavam com esse pó de ouro?
Aluno Pedro –SL (linhas 48-49): Eles iam economizando, aí eles falavam com o ... com o moço pra
ele... aí eles davam pó de ouro ... aí eles libertavam ....
Pesquisadora (linha 50): E compravam a liberdade. E você sabe o que eles compravam, como era o
nome?
Pesquisadora (linha 51): Carta?
Aluno Pedro – SL (linhas 52-53): De... a professora, a gente escreveu um texto, aí ela falou o nome,
mas acabei esquecendo.
157
Pesquisadora (linha 54): Carta de alforria.
Aluno Pedro - SL (linha 55): É isso daí.
Pesquisadora (linha 56): Pra ficar livre, né?
Pesquisadora (linha 57): Isso mesmo, muito bem!
Análise:
Durante a produção de comentários, após o aluno expor todo seu conhecimento
sobre histórias de assombração, ao voltar ao texto, ele faz uma pergunta para a
pesquisadora, praticamente uma afirmativa, “se o texto é do centro-oeste”. A reposta dada
pela pesquisadora confirma sua dúvida e retorna a questão para o aluno: como você sabe
que esse texto é do centro-oeste?
A partir desse questionamento, o aluno explica que, através do projeto
“Viajando pelo Brasil, desvendando nossas origens”, eles (fala em nome da turma)
estudaram sobre todas as regiões e aprenderam várias lendas, como ele mesmo diz, sobre
as pessoas, o guaraná, a mandioca. Cabe ressaltar que, através dos estudos de textos de
caráter literário, o aluno teve a oportunidade de conhecer vários aspectos das regiões
estudadas: cultura, geografia e história.
Além do que foi exposto, chama a atenção as relações feitas pelo aluno a
partir da leitura do texto 3, como o tratamento dado aos negros pelos portugueses na
época da escravidão no Brasil, e relata, de forma sucinta, mas com muita propriedade, a
história de um personagem real da história do Brasil.
A questão que se coloca é: o que permitiu que o aluno fizesse tantas relações?
Pode-se afirmar que o universo cultural-cognitivo deste aluno é consequência das práticas
de leitura, sobretudo literária, adquirido em várias situações de aprendizagem promovidas
pela professora e que ultrapassaram os muros da escola, ficando internalizada e gerando
no aluno o hábito e o gosto por ler, contribuindo para formação de um sujeito na faixa
etária entre 08 e 09 anos, o qual lê e compreende de forma crítica e proficiente.
Existe um discurso muito proliferado pelos professores alfabetizadores: as
crianças moradoras de regiões periféricas e estudantes em escolas públicas não
conseguem ler e escrever, pois têm muitos problemas familiares e psicológicos que
atrapalham seu desenvolvimento. Muitos desses professores subestimam essas crianças e
optam, na maioria das vezes, pelo uso de metodologias de ensino de leitura e escrita
focadas na decodificação e memorização de textos, desconsiderando a importância da
158
imaginação e criatividade como componentes essenciais ao desenvolvimento intelectual,
social e cultural de seus alunos.
O que foi descrito nestes dados analisados, sobre a leitura de uma criança do
3º ano do ensino fundamental, ciclo I, refuta esse discurso produzido e reproduzido
durante anos pelos profissionais da educação do ensino fundamental I.
Texto 3/ 1ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:
a) De base textual e contextual:
Optou-se por apresentar as inferências de base textual e contextual, produzidas
pela aluna Elisa – primeira leitura do texto Romãozinho, em um mesmo item, pois a aluna,
após a leitura em voz alta, faz um reconto argumentativo; portanto, não se pode fazer uma
análise descolada entre inferências de base textual e contextual, já que a mesma, no decorrer
da reprodução textual, vai tecendo comentários, em constante diálogo com o texto.
A seguir, o diálogo entre a pesquisadora e a aluna Elisa sobre a primeira leitura
do texto 3:
Pesquisadora (linha 01): E aí?
Elisa – PL (linha 02): Eu gostei, né!
Pesquisadora (linha 03:) Por que que você gostou?
Elisa – PL (linhas 04 - 16): Sim e não né? Porque o Romãzinho era malcriado e preguiçoso, ele
fazia só coisa ruim, né. E, quando a mãe dele pediu pra levar comida lá pro pai dele... o pai dele
que tava lá trabalhando na roça.... é, ele atendeu com má vontade .... no caminho ele abriu a cesta e
comeu tudo e foi lá e levou pro pai dele,né! e ele inventou uma brincadeira que a mãe dele
almoçava galinha com homem que vai lá na casa dele quando o pai tá trabalhando, né! e falou que
quando eles acabaram de comer colocaram tudo os ossos na cesta pra ele levar né. Aí o homem
tava trabalhando na terra havia horas... aí ele tava louco de ciúmes e raiva né.... ele foi lá pra casa
dele correndo né , ele pegou a faca e enterrou no peito da mulher , a mãe dele acabou morrendo por
causa de uma brincadeira que ele fez e aí ela amaldiçoou ele né. Enquanto o mundo existir ele vai
ficar vivo ainda, aí é o homem depois logo morreu né, porque ele ficou doente de desgosto né. O
menininho nem se abalou, o Romãozinho, porque ele não era bonzinho, senão ele ia ficar triste. Aí,
Texto 3: Romãozinho.
Data: 18 de Novembro de 2014. Sujeito pesquisado: Elisa.
Primeira leitura: PL.
159
conta na história que ele ganhou o mundo, né.
Aluna Elisa – PL (linhas 20-21): Aí é, quando a mãe dele morreu e amaldiçoou ele, é como se o
tempo tivesse parando na vida dele né, porque maldição de mãe pega (risos).
Pesquisadora (linha 27): E o que você acho dessa “brincadeira” aí, que ele fez com o pai
dele?
Aluna Elisa – PL (linha 28): Muito feio.
Pesquisadora (linha 29): Será que isso é brincadeira, mesmo? O que você acha que é?
Aluna Elisa – PL (linhas 30-31): Que não ama a mãe, que não ama o pai, acha que é uma
brincadeira legal, mas na verdade não é. Destruiu a própria família dele.
Pesquisadora (linhas 34-35): E você queria falar mais alguma coisa Elisa, a respeito do texto, assim,
que você lembra? Você já conhecia esse texto?
Aluna Elisa – PL (linha 36): Sim, nós já leu lá na sala.
Pesquisadora (linha 37): Ah!
Aluna Elisa – PL (linhas 38-39): E quando eu cheguei em casa eu fui ler lá pra minha mãe e pra
minha madrinha, que tava lá, né! Aí, elas falaram também do texto.
Pesquisadora (linha 40): Você leu esse texto pra sua mãe e sua madrinha?
Pesquisadora (linha 41): Ah! E porque você leu esse texto pra elas?
Aluna Elisa – PL (linha 42): Porque eu gosto de ler ...
Análise:
A partir da intervenção da pesquisadora (linha 1), Elisa inicia o reconto
dizendo que gostou do texto, no entanto quando indagada pela pesquisadora (linha 3), a
aluna diz que gostou e não gostou e, passa a tecer comentários sobre o mesmo, recuperando
a sequência da narrativa através de uma leitura parafrástica, em interface com elementos
argumentativos. Entre as linhas 04 a 16, no processo de compreensão do texto, Elisa busca
seguir uma linearidade de acontecimentos e introduz inferências de base contextual
pragmática avaliativa quando diz que o personagem não era “bonzinho”, pois não se abalou
e nem ficou triste com o desencadeamento de suas ações. Para a aluna, o tipo de ação
produzida pelo personagem, segundo o que ela entende de boas e más ações, fazia dele um
menino ruim.
Elisa diz, em várias partes do seu comentário, que o personagem fizera uma
brincadeira com o pai e a mãe e, quando questionada pela pesquisadora (linha 27) sobre se
o que o personagem tinha feito era realmente uma brincadeira, a aluna esclarece que
Romãozinho achava que era apenas uma brincadeira, mas na verdade não era, pois destruiu
sua família. Nessa passagem, a aluna faz um tipo de operação inferencial por associações de
informações obtidas através de saliências lexicais e cognitivas com outras ideias, a partir de
160
suas experiências pessoais.
Elisa relata para a pesquisadora que já havia lido esse texto na escola, na sala
de aula, e diz que, quando chegou na sua casa, leu para sua mãe e madrinha, enfatizando
que elas também comentaram sobre a história. É interessante que esse dado demonstra
que a aluna apropriou-se de uma prática de leitura escolar - leitura e comentário, exposta
no capítulo 2, e reproduziu no ambiente familiar, e ainda
diz que fez isso por gostar de ler.
Texto 3/ 2ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:
b) De base textual e contextual:
Após onze dias da primeira leitura do texto 3, a aluna Elisa foi convidada para
fazer uma nova leitura. Após a leitura em voz alta, a pesquisadora faz uma pergunta
direcionada, já que a aluna havia explorado muito bem o texto. Para que a abordagem do
texto não fosse repetitiva para aluna e para garantir a possibilidade de dados novos, a
pesquisadora inicia o diálogo com a seguinte pergunta:
Pesquisadora (linha 2-3): Você lembrou de alguma coisa, pensou em alguma coisa a mais
que você não falou na última leitura?
Aluna Elisa – SL (linha 4): Hum, mais ou menos.
Pesquisadora (linha 5): Pensou? O que que você pensou?
Aluna Elisa – SL (linhas 6-8): É, eu gostei mais ou menos porque essa história fala que
morreu a mãe e o pai né e, ele nem se abalou. Quando morre alguém da família todo
mundo se abala que fica até semanas sem ri.
Após o diálogo sobre o desenvolvimento da narrativa, a pesquisadora questiona
novamente sobre a leitura feita em sala de aula:
Pesquisadora (linha 17): Hum, você leu com a professora na sala de aula esse texto?
Aluna Elisa – SL (linha 18): Li.
Pesquisadora (linha 19): Ah, e como foi quando vocês leram?
Texto 3: Romãozinho.
Data: 27 de novembro de 2014. Sujeito pesquisado: Elisa
Segunda leitura: SL.
161
Aluna Elisa – SL (linhas 20-21): Nós fizemos uma leitura junto com a professora, depois
nós pegou nosso caderno e escreveu algumas coisas.
Pesquisadora (linha 22): Humm e vocês leram esse texto dentro... que trabalho vocês
estavam fazendo?
Aluna Elisa – SL (linha 23): É, as regiões.
Pesquisadora (linha 24): Ah, e de que região é esse texto aí? Falou aí o nome, né!
Aluna Elisa – SL (linha 25): Goiás.
Com intuito de dar continuidade ao diálogo, a pesquisadora questiona:
Pesquisadora (linha 31): Você já leu bastante ele, né? Já conhece bem a história, né?
Aluna Elisa – SL (linha 32 - 34): Ah e também quando eu cheguei em casa é... eu fiz a
mesma coisa que nós fizemos lá na sala com minha mãe e minha madrinha. Eu li o texto
pra elas e elas comentaram também.
Análise:
Entre as linhas 2-8, a partir do questionamento da pesquisadora, sobre quais
outros elementos a aluna tinha pensado sobre o texto que não disse na primeira leitura,
Elisa repete suas impressões sobre um acontecimento pontual da narrativa, ou seja, a
morte do pai e da mãe do Romãozinho e sua completa falta de sentimento diante de fato
tão triste. Elisa produz inferências de base contextual de natureza pragmática e cognitiva,
pois elabora, a partir de uma situação textual, avaliações pessoais experienciais, no caso
específico o que a morte pode causar nas pessoas que perderam um ente querido: todos
da família ficam abalados sem rir por semanas. A aluna produz inferência comparativa
com a situação de Romãozinho, que foi incapaz de se abalar com a morte dos pais.
Entre as linhas 17-25, a pesquisadora faz uma intervenção que induz a aluna
Elisa a refletir sobre o texto lido no contexto da pesquisa e estabelecer relações com o
momento de leitura feito em sala de aula e as possíveis relações que podem ser
estabelecidas entre os dois momentos. As questões feitas pela pesquisadora fizeram com
que aluna refletisse sobre uma outros contextos, o de sala de aula e não o imediato da
pesquisa, considerando que o contexto não é tão somente a situação imediata, mas
sobretudo que compreensão “exige uma contextualização cognitiva dependente da
própria organização dos conhecimentos e experiências pessoais” (MARCUSCHI, 2004,
p.46). Desta forma, Elisa acionou os conhecimentos obtidos em sala de aula através da
sua memória e produziu inferências de base contextual associativa, quando diz que o
162
texto está relacionada com a Região de Goiás: essa afirmação foi possível pois a
professora apresentou esse texto na sala de aula para trabalhar o projeto interdisciplinar
que aborda as regiões do Brasil.
Na ultima passagem selecionada dos comentários da segunda leitura do texto
3 produzidos pela aluna Elisa, ao ser indagada pela pesquisadora com uma pergunta
retórica (linha 31), a aluna prontamente expõe, novamente, como na primeira leitura, a
experiência de ter lido em casa o texto 3 para a mãe e a madrinha e reitera que ambas
comentaram sobre o texto que ela leu. Essa prática de leitura e comentários dos alunos
foi desenvolvida pela professora da turma, que trabalhou com as crianças durante os três
anos do ensino fundamental através de projetos interdisciplinares entre outras atividades
de incentivo à leitura literária.
Texto 3/ 1ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:
a) De base textual.
Ao final da leitura em voz alta e da pergunta da pesquisadora, Luís diz que o texto 3 é legal e,
ao ser indagado o porquê, o aluno inicia o reconto. Segue
Pesquisadora (linha 1): E aí?
Aluno Luís – PL (linha 2): Achei legal.
Pesquisadora (linha 3) É? Por quê?
Aluno Luís – PL (linhas 4-10): Porque fala de um menino, que mentiu pro pai falando que a
mãe dele, uma mulher, né! Comeu galinha com um homem, aí o pai ficou com ciúmes e raiva
e matou a mulher, antes dela morrer, ela jogou uma maldi...amaldiçoou o filho, que
enquanto ele viver, ele nunca vai morrer. Só vai morrer quando for o fim do mundo. Aí, ele
... aí, o pai morreu doente, por conta que matou a mulher dele, e o filho ficou, meio que um
menino ruim, que ficou assombrando todo mundo, fazendo coisa ruim mesmo.
E, sei lá... acabou.
Texto 3: Romãozinho.
Data: 5 de Novembro de 2014.
Sujeito pesquisado: Luís
Primeira Leitura: SL.
163
Análise:
O aluno Luís em sua primeira leitura do texto 3, após ler o texto em voz alta, faz
o reconto da narrativa, de uma forma autônoma e com segurança; é possível afirmar que o
aluno não encontrou nenhuma dificuldade em fazer o relato da história, procurou seguir a
sequência da narrativa dentro de um horizonte de compreensão textual mínimo
(MARCUSCHI, 2008, p. 258), com elaboração de paráfrases. A partir do input textual, Luís
expôs o conteúdo da narrativa de uma forma sintética, mas com início, meio e fim
b) De base contextual.
Quando questionado, novamente, pela pesquisadora sobre por que achou a
história legal, o aluno Luís tece algumas considerações sobre a história.
Pesquisadora (linha 11): E você achou legal, por quê?
Aluno Luís – PL (linhas 12- 14): Ah, e também essa história é um pouco parecida, essa
parte aqui é um pouco parecida com, a parte lá do saci-pererê. E aqui fala que o saci-
pererê, que no São Francisco no centro-oeste, no rio São Francisco entre dois... é o famoso
Romãozinho.
Pesquisadora (linhas 15 e 16): E como você sabe que ali (apontando para o texto
complementar) estava falando sobre o saci, neste textinho aí?
Aluno Luís – PL (linha 17): É que aqui em ciminha tá estado de Goiás?
Pesquisadora (linha18): Mas como você sabia que aí tava escrito sobre o saci de Goiás?
Aluno Luís – PL (linha 19): É que a professora tinha lido antes.
Pesquisadora (linha 20): Ah, então você já conhecia essa história? Quando que ela leu essa
história pra vocês?
Aluno Luís – PL (linha 21): O dia? Isso eu não lembro.
Pesquisadora (linha 22): Assim, em que momento, o que vocês estavam fazendo na sala de
aula. Aluno Luís – PL (linhas 23-24): Todo mundo leu, cada um leu uma parte, a
professora escolhia alguém aí lia mais ou menos até (indica uma parte do texto). Aí era
outro e até assim .... outro.
Em outras passagens, o aluno detalha o trabalho com o projeto interdisciplinar:
Pesquisadora (linhas 48-49): Tá, e quando ela usou esse texto na sala, você me disse que
todo mundo leu uma parte?
Aluno Luís – PL (linhas 50-51): Aí depois que todo mundo acabou, ela leu tudo de novo pra
ficar melhor. Tem uns que leem baixo, outros alto, alguns rápido ....
Pesquisadora (linha 52): Sei, e esse texto, fala de algum lugar?
164
Aluno Luís (linhas 53- 54): De Goiás. É aqui fala de Goiás (apontando para o texto). E
aqui no cantinho fala do centro-oeste e o São Francisco e só.
Pesquisadora (linha 55): Tem alguma coisa a ver com que vocês estão estudando ou não?
Esse texto?
Aluno Luís – PL (linha 56): Não, agora não... eu acho.
Pesquisadora (linha 57): O que vocês estudaram?
Aluno Luís – PL (linha 58): O que nós estamos estudando?
Aluno Luís – PL (linha 59): É... as regiões. Centro-oeste.... que eu sei nós tamo no ....
nordeste.
Análise:
Ao ser indagado pela pesquisadora sobre o porquê de ter achado o texto legal, o
aluno Luís tem uma atitude leitora comparativa, faz inferências por associação de ideias de
natureza lexical, semântica e pragmática, ao dizer que a história do Romãozinho é um
pouco parecida com a do saci-pererê e, ainda, busca localizar a região onde acontece a
narrativa: cita Goiás e o Rio São Francisco. Questionado pela pesquisadora sobre como ele
sabe dessas informações, o aluno diz que “a professora tinha lido antes”. Acredita-se que
essas associações feitas pelo aluno devem-se ao fato de o mesmo já ter lido em sala de aula
com a professora e os colegas sobre a história do Romãozinho, e os demais textos
complementares foram explorados pela professora quando trabalhou com os alunos o
projeto interdisciplinar.
Na linha 22, a pesquisadora pergunta em que momento da aula foi lido o
texto. O aluno responde como foi lido e não o momento e enfatiza mais uma prática de
leitura em sala de aula de textos literários, como o aluno explicita nas linhas 23 e 24.
Nas linhas 50 e 51, o aluno novamente expõe como aconteceu a prática de
leitura em sala de aula: é interessante ressaltar que o aluno diz que todos leram e depois a
professora “leu tudo de novo para ficar melhor”. Para o aluno, a intervenção da
professora, através de sua leitura, contribuiu para que o texto ficasse melhor, ou seja,
pode-se definir a expressão ficar melhor como uma forma do incentivo da professora para
que os alunos compreendessem de forma mais efetiva a história.
Novamente, questionado pela pesquisadora se o texto fala de algum lugar,
Luís responde que é de Goiás, e cita a região centro- oeste e o Rio São Francisco,
demonstrando que produziu inferências de associações de ideias e de relações
intertextuais, pois ao usar os textos complementares o aluno pode acionar mais
165
informações para interagir com o texto narrativo principal.
Texto 3/ 2ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:
c) De base textual e Contextual.
Na sequência da leitura do texto 3, a partir da intervenção mínima da
pesquisadora, o aluno inicia uma série de associações emergidas do diálogo entre
pesquisadora, aluno e texto.
Pesquisadora (linha 1): E aí?
Aluno Luís –SL (linhas 2-6): Eu pensei que... tem uma parte aqui que fala que ele
assombra aqueles que vão passando pela estrada, aí isto daqui me lembrou muito uma
lenda que nóis lemos lá na sala que é de uma mulher que também fica assombrando, que
ela fica pedindo carona, aí quando chega numa curva , é fala que foi lá que ela morreu,
aí todo mundo...
Pesquisadora (linha 7): E você sabe o nome dessa lenda?
Aluno Luís – SL (linha 8): Não. Também aparece no gibi que eu li, de
terror. Pesquisadora (linha 9): Ah, essas histórias de assombração?
Aluno Luís (linha 10): Aí tinha aparecido uma menina que também morreu, só que foi no
penhasco.
Discussão sobre as características de Romãozinho:
Pesquisadora (linha 28): E você acha que o Romãozinho é só arteiro e brincalhão?
Aluno Luís – SL (linha 29): Hum!
Pesquisadora (linha 30): Ou não? Tem mais alguma coisa aí da personalidade dele?
Aluno Luís – SL (linha 31): Talvez lá no fundo, bem lá no fundo mesmo ele fosse um pouco
bonzinho.
Pesquisadora (linhas 32-33): Será? O que que ele fez? Você lembra o que que ele
fez? O que que ele fez?
Aluno Luís - SL (linhas 34-36): Ele mentiu pro pai falando que a mãe dele tava comendo a
Texto 3: Romãozinho.
Data: 18 de novembro de 2014. Sujeito pesquisado: Luís
Segunda Leitura: SL .
166
galinha com homem que ia lá e o Romãozinho levou os ossos pro pai. Aí o pai ficou furioso
e com ciúmes e matou a mulher. Aí ela jogou uma maldição no filho.
Pesquisadora (linha 37): E qual era a maldição?
Aluno Luís – SL (linhas 38-41): Que ele, tipo assim, ia viver até o fim do mundo, não ia
morrer nunca. Só queria saber se ele não ia morrer nunca e se acontecesse um acidente que
ele fosse atropelado, o que ia acontecer? Ou ele ia ressuscitar ou ia abrir um escudo nele,
pra parar sei lá, o carro.
Aluno Luís – SL (linhas 47-48): Eu acho também, será que ele já sabia que o Romãozinho
era arteiro? Eu acho que a mulher podia ter falado, que podia ser uma brincadeira dele.
Pesquisadora (linha 49): Ah muito bem!
Aluno Luís – SL (linha 50): A parte lá que ela recusou ter comido com ele.
Pesquisadora (linha 51): Rurum poderia evitar a tragédia, né?
Aluno Luís – SL (linha 52): Rurum
Aluno Luís – SL (linha 53): Assim o Romãozinho não ia ficar assim, vivo pra sempre.
Pesquisadora (linha 54): E nem a mãe dele teria morrido, né?
Aluno Luís – SL (linha 55): Rurum.
Alunos Luís – SL (linhas 56-58): E o pai também, eu só não sei porque ele morreu de
doença. Não sei se ele morreu doente por causa que ele se arrependeu de ter matado ou se
ele ficou doente assim normal, pegou uma doença sei lá.
Pesquisadora (linha 59): Entendi, mais física, né?
Pesquisadora (linha 60- 61): Tá ótimo então! Mais alguma coisa Luís? Não mais?
Análise:
Os comentários sobre a segunda leitura do texto 3 foram ricas devido à
criatividade e ao interesse do aluno em interagir com o texto; foram produzidas muitas
inferências de base contextual, partindo do input textual. Buscou-se dar visibilidade às
principais inferências produzidas pelo aluno Luís em sua segunda-leitura.
Assim que o aluno termina a leitura em voz alta, a pesquisadora inicia o diálogo
com um simples: e aí? Em seguida a esta intervenção, o aluno expõe sobre uma das
características do texto, dizendo que conhece outras histórias de assombração e conta para
pesquisadora trechos de duas delas. Pode-se afirmar que o aluno elabora inferências do tipo
de operação denominada de acréscimo, de caráter pragmático e experiencial, ou seja,
caracteriza-se pela introdução de elementos que não estão implícitos nem são de base
textual, podendo muitas vezes levar a contradições e falseamentos. (MARCUSCHI, 2008,
p.255).
167
Entre as linhas 28-41, o aluno, com a mediação da pesquisadora, discorre sobre
suas impressões sobre as características psicológicas de Romãozinho e, volta a tratar do
assunto sobre a maldição que a mãe do personagem jogou sobre o menino. Nas passagens
entre as linhas 38-41, Luís faz uma reflexão interessante sobre o texto, ele não está
convencido que o personagem ia viver para sempre, como isso poderia acontecer, caso ele
sofresse um acidente? É essa questão que permeia suas reflexões! Para ele, o menino
Romãozinho podia morrer por acidente, talvez ser atropelado. Neste sentido, Luís produz
inferências considerando as possibilidades de mudar o desfecho da história, por meio de
elementos novos, associações de novas ideias à história, pautadas em situações do seu
universo cultural cognitivo.
Nas linhas 47 e 48, Luís faz uma reflexão muito pertinente, ou seja, será que o
pai de Romãozinho não sabia que ele era arteiro? Segundo suas inferências baseadas em
uma suposição extratextual, essa informação poderia ter evitado a morte dos pais. Neste
sentido, o que o aluno em uma postura metalinguística está questionando, nas entrelinhas é:
como o pai não conhecia o filho? Não sabia que o mesmo era arteiro? E a mãe também?
Essas considerações que acionam elementos fora da dinâmica textual, contribuem para a
ampliação do olhar sobre o texto, aberto às várias possibilidades de interação e produção de
sentidos, sem esquecer que se pode incorrer no erro dos falseamentos.
168
CAPÍTULO 5
5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Modelo de desvelamento do mundo, a leitura encontra na literatura
eventualmente seu recipiente imprescindível. Preservar essas relações é
dar sentido a elas. E, se a escola não pode absorvê-las por inteiro,
igualmente não pode ser o lugar onde estas se rompem em definitivo, sob
pena de arriscar sua missão e prejudicar, irremediavelmente, o ser humano
a quem diz servir. (ZILBERMAN, 2009, p.34)
5.1. Processo de compreensão leitora
Neste capítulo, procurou-se evidenciar os processos de produção de sentidos e
compreensão leitora, de cada um dos alunos pesquisados. No capítulo 4, foi feita a
apresentação dos dados obtidos nas 18 sessões de leitura: os mesmos foram analisados
considerando as inferências de base textual, base contextual e sem base textual e contextual
(MARCUSCHI, 2008, p.255), produzidas pelos 3 alunos (Pedro, Elisa e Luís). No entanto,
com o intuito de possibilitar uma melhor visibilidade aos processos vivenciados pelas
crianças, são apresentadas, neste capítulo, as características da compreensão leitora das
crianças, tendo em vista as especificidades presentes nas inferências produzidas em cada
leitura, lançando o olhar sobre suas marcas mais recorrentes entre outros elementos
importantes para a análise da compreensão leitora.
Além das análises das produções das inferências desenvolvidas pelos alunos nas
sessões de leitura, buscou-se cotejar os dados da pesquisa com as experiências vivenciadas
por essas crianças: práticas de leitura literária promovidas em sala de aula além das
atividades envolvendo família e comunidade escolar, construídas no decorrer dos 3 anos de
escolarização do ciclo I do ensino fundamental.
5.2. Aluno Pedro
Em todas as sessões de leitura, o aluno leu a lenda e fez o reconto de forma
espontânea, sempre na primeira sessão de cada texto lido, demonstrando a apropriação de
uma prática de leitura escolarizada. Através de movimentos do corpo, foi possível perceber
a busca para recuperar os fatos, as ações dos personagens, em uma atividade intensiva de
169
memória. Isso fica evidente no decorrer do reconto, pois mesmo sem ter sido solicitado que
a história fosse recontada, o sujeito opta por esse procedimento.
Ao se dirigir o olhar para esse processo – fica visível a natureza constitutiva das
aulas anteriores da professora nas rodas de leitura do momento da pesquisa (2014), pois, já
desde a primeira lenda, o aluno Pedro, tanto na primeira quanto na segunda atividade de
leitura de a “Dança do arco-íris” faz referência à lenda do guaraná aprendida e apreendida
nos anos anteriores (2012 / 2013).
O que se pode perceber é uma total autonomia do aluno em sua relação com o
texto lido, sendo essa segurança e autonomia imprescindíveis para que haja a compreensão
leitora e que foi alcançada, paulatinamente, nas relações estabelecidas com o que foi
aprendido em sala de aula nas atividades de leitura promovidas pela professora. Na primeira
leitura do texto 1 - “Dança do arco-íris” - Pedro apresenta mais inferências de base textual
comparada à sua segunda leitura, na qual, além das inferências textuais, apresentou também
as de origens contextuais.
Com relação às inferências de base textual, o aluno busca preservar a sequência
narrativa do texto; em contrapartida, não há uma preocupação em reproduzir a linguagem,
as palavras exatas utilizadas pelo autor. A criança recupera o texto a partir de uma “leitura
parafrástica” (MARCUSCHI, 2008), com ênfase em passagens que fazem mais sentido para
ela. Não é seguido um script, sendo selecionadas passagens significativas pelo sujeito leitor.
Nas inferências de base contextual, na primeira leitura do texto 1, as mesmas
ocorrem a partir das indagações feitas pela pesquisadora, cujo objetivo é verificar nos
comentários produzidos pelo aluno, relações desse texto com outros já estudados. O aluno
lembra-se de duas lendas estudadas em sala de aula - a lenda do guaraná e a da mandioca-
buscando recontar as duas de forma sucinta.
Além disso, o sujeito pesquisado tece comparações entre as lendas que ele já
havia lido em atividades de leitura na sala de aula, e outras informações contidas na lenda
“Dança do arco-íris”, com as inferências feitas pelo aluno são de base textual e contextual.
Pode-se verificar um tipo de operação inferencial associativa, sendo a natureza da
inferência lexical, semântica e pragmática. Ela é produzida pela “afirmação de uma
informação obtida através de saliências lexicais ou cognitivas por associações de ideias”
(MARCUSCHI, 2008). Portanto, o aluno pautou-se em informações obtidas no texto,
associando-as à sua vivência, sobretudo a escolar, o que lhe possibilitou uma
compreensão mais ampliada, mais informações linguísticas e extralinguísticas, e o
170
capacitou a fazer comparações intertextuais.
A segunda leitura do texto - “Dança do arco-íris” - foi realizada um mês após a
primeira; os procedimentos de pesquisa foram os mesmos em ambas. O aluno fez a leitura
em voz alta e, ao terminar, a pesquisadora perguntou-lhe se havia pensado em mais alguma
coisa (sobre o texto), além daquelas já ditas na primeira leitura. O objetivo dessa questão
foi tentar obter outras informações, além daquelas exploradas pelo aluno na primeira leitura
do texto.
Ao ser indagado, a partir do texto lido, o aluno apresenta inferências de origem
contextuais. Ele amplia o horizonte de compreensão textual ao relatar uma experiência
vivida em sua casa, com sua família, durante os jogos da copa do mundo de 2014; apoiando-
se em uma passagem do texto, em que o personagem demonstra descontentamento com o
trânsito de pessoas em seu mundo, o aluno faz associações autorizadas entre o “mundo do
personagem” e o “seu mundo”.
Ao conceituar os diferentes tipos de horizontes de compreensão textual,
Marcuschi (2008) define esse tipo de nível de compreensão, apresentada pelo aluno, de
horizonte máximo:
Essa é a perspectiva que considera as atividades inferenciais no processo
de compreensão, isto é, as atividades de geração de sentidos pela reunião
de informações do próprio texto, ou pela introdução de informações e
conhecimentos pessoais ou outros não contidos no texto. É uma leitura do
que vai nas entrelinhas; não se limita à paráfrase nem fica reduzida () à
repetição. Esse horizonte representado pelas inferências constitui o
horizonte máximo da produção de sentidos. (MARCUSCHI,2008, p. 259).
Ao comparar a primeira leitura com a segunda, pode-se afirmar que houve uma
ampliação no processo de compreensão leitora, pois o aluno considerou novos elementos
de seu “universo cultural cognitivo” (MARCUSCHI, 1985) no diálogo com as informações
textuais. Essa extrapolação ocorreu somente na segunda leitura do texto 1.
Pode-se perceber que, na primeira leitura, o aluno fez movimentos de entender
a dinâmica do texto, fazendo reconto e uso da leitura parafrástica (horizonte mínimo),
enquanto que na segunda as relações são de caráter cotextual e contextual.
Na segunda leitura do texto 1, verifica-se que o aluno amplia as associações que
faz entre o texto e outras lendas. Na primeira leitura, o aluno relaciona esta lenda com
outras lidas em diversos momentos na escola, tecendo comparações, enquanto que, na
segunda leitura, ele retoma o movimento comparativo entre o texto 1, a lenda do guaraná e,
171
ao buscar conceitos do que é lenda, partindo do seu conhecimento a respeito deste gênero,
extrapola essa relação.
Em agosto de 2014, foi feita a primeira leitura do texto 2, “A Origem do
Oiapoque”. Após o término da leitura, Pedro inicia o comentário posicionando-se diante do
texto: diz que achou a história triste e justifica sua afirmação através de elementos que
possam comprová-la.
O que ocorre não é um mero reconto da narrativa, mas um processo de
compreensão que visa recuperar os principais elementos da história, considerando a análise
da mesma. Neste caso, é possível considerar que houve avanços na leitura do aluno, em
comparação com as duas leituras do texto 1, feitas anteriormente; pois agrega, às suas
impressões sobre o texto, a prática do reconto para recuperar a história. Ocorre, assim, uma
interação comunicativa entre autor, texto e leitor mais efetiva.
Ainda no decorrer dos comentários da primeira leitura do texto 2, o aluno
associa os acontecimentos da história ao título do texto, ou seja, ele identifica os indícios
textuais necessários que expliquem o nome da lenda - “A Origem do Oiapoque”.
Com relação aos comentários de base contextual, observados na primeira leitura
deste texto, o aluno retoma a ideia de morte do bebê: afirma que a mãe queria que a criança
vivesse mais do que ela. Ao evidenciar essa passagem, esse enunciado; o sujeito dialoga
com questões históricas e culturais sobre o processo humano de vida e morte.
A nossa sociedade avançou em termos de conhecimento médico, de tratamento
de várias doenças, sendo que não vemos como natural a morte do recém-nascido antes da
mãe, exceto em situações de descaso de atendimento em hospitais públicos ou alguma
fatalidade. Entende-se como natural que a criança se desenvolva plenamente sob os
cuidados da mãe. Portanto, quando o aluno enfatiza a morte precoce da filha da personagem
índia, analisa como sendo um problema, uma grande tragédia para a mãe.
Pode-se concluir que o aluno aprendeu, seja no ambiente familiar e ou em
outros espaços de socialização, que a morte de um recém-nascido não deve ser algo natural,
demonstrando valores culturais e sociais interiorizados. Neste sentido, a compreensão do
aluno extrapolou as informações lexicais ao buscar elementos em seu contexto histórico –
cultural.
Ao considerar esse movimento de busca de produção de sentidos pelo aluno,
reitera-se, a partir dos dados desta pesquisa, que o ato de compreender não é uma ação
apenas linguística ou cognitiva. “É muito mais uma forma de inserção no mundo e um modo
de agir sobre o mundo na relação com o outro dentro de uma cultura e uma sociedade”
172
(MARCUSCHI, 2007, p.89).
Ainda sobre a primeira leitura do texto 2, mais uma vez o aluno cita uma lenda
lida pela professora em sala de aula. Mesmo não se lembrando do título da lenda, ele busca
retomar toda a sequência da história e tece comparações intertextuais sobre o desenrolar das
narrativas, ou seja, sobre a lenda ouvida em sala de aula, ele infere com base em
informações lógicas que tem um final feliz, enquanto que o texto 2 – “A Origem do
Oiapoque” - tem um final triste.
A segunda leitura do texto 2 foi feita em 02 de setembro de 2014. Após a leitura
em voz alta, o aluno é questionado pela pesquisadora se ele se lembra da primeira leitura
efetuada. A criança responde de forma afirmativa à questão, diz que o texto é legal e busca
justificar seu comentário. Com esse questionamento, a pesquisadora teve como objetivo
verificar que tipos de relações o aluno faria ao comparar a leitura do mesmo texto em
momentos distintos.
Ele retoma trechos da narrativa e seleciona a passagem em que o choro da
personagem (Tarumã) preenche os sulcos que ela mesma tinha aberto com seu peso
(grávida), formando um rio. O aluno diz que não entendeu porque o rio levou o nome de
Oiapoque. Percebendo que a pesquisadora não irá responder a sua questão, o aluno
apresenta indícios que o levam a associar o nome Oiapoque com o nome de uma tribo. Para
justificar sua afirmação, o aluno faz uso de seu conhecimento prévio sobre lendas indígenas
e também da palavra Oiapoque, a qual sonoramente remete ao léxico da língua indígena.
Isto sugere que “compreender é, essencialmente, uma atividade de relacionar
conhecimentos, experiências e ações em um movimento interativo e negociado”
(MARCUSCHI, 2007, p. 95). É esse movimento relacional que se pode observar nas
inferências produzidas pelo aluno Pedro: percebe-se uma série de aspectos inter-
relacionados que são responsáveis pela construção da compreensão leitora proficiente.
Com os dados de leitura dos textos 1 e 2, expostos até aqui, pode-se afirmar que
o aluno demonstrou, a partir das inferências produzidas de origem textual e contextual ,
uma ampliação no diálogo com os dois textos apresentados; verificou-se, em vários
momentos, a prática do reconto, leitura parafraseada – ênfase no horizonte mínimo de
leitura, e, com o desenvolvimento das sessões de leitura , foi possível observar o
engajamento do aluno através de produções de inferências com base em seu “universo
cultural – cognitivo” (MARCUSCHI, 1985, p.3), possibilitando a ampliação de sua
compreensão para um “horizonte máximo de leitura” ( MARCUSCHI, 2008, p. 259).
Nas inferências produzidas pelo aluno, foi possível encontrar elementos das
173
práticas de leitura vivenciadas na escola, como a leitura de lendas brasileiras, entre outros
gêneros narrativos e, também, o acesso, manuseio e exploração dos livros de literatura
infantil pela criança, com mediação da professora, pais e/ou responsáveis, de forma
sistematizada - como a sacola da leitura e as atividades atreladas aos projetos
interdisciplinares.
O 3º texto explorado na pesquisa – “O Romãozinho” - foi utilizado em duas
sessões de leitura, em novembro de 2014. Desta vez, o texto escolhido já tinha sido lido
pela professora em sala de aula durante o desenvolvimento do projeto “Viajando pelo
Brasil, desvendando minhas origens”. Ao considerar esse aspecto, as questões de pesquisa
elaboradas tiveram como objetivo verificar possíveis relações entre as inferências
produzidas nas duas sessões de leitura deste texto com a leitura vivenciada pelo aluno em
outro espaço e lugar (sala de aula).
Na primeira sessão de leitura, após ler o texto em voz alta, a pesquisadora elogia
sua leitura e diz genericamente: “e aí?” O aluno prontamente faz o movimento de reconto
da história, buscando dar conta de toda a sequência da narrativa. Ele não faz comentários
com juízos de valor, busca utilizar elementos coesivos como “fala que...”, “mas aí...” para
garantir a coerência textual e garantir um entendimento do enredo, considerando o início da
trama, seu desenrolar e o desfecho da história.
Em seguida, a pesquisadora questiona se o aluno já conhece essa história. A
partir dessa pergunta, ele expõe uma série de comentários explicativos – inferências
culturais, cognitivas, com o objetivo de relacionar a lenda com as atividades desenvolvidas
no projeto. Pedro relata para a pesquisadora que ficou com uma dúvida quando esse texto
foi lido em sala de aula: como Romãozinho podia ser tão malcriado, se os seus pais eram
tão bonzinhos? O aluno reflete e chega a uma justificativa, a partir do seu entendimento de
mundo.
Na segunda leitura feita pelo aluno, no mesmo mês, mas com um intervalo de
duas semanas, as inferências produzidas são em sua maioria de origem contextual e são
caracterizadas por uma relação de diálogo com o projeto desenvolvido pela professora, já
citado anteriormente. O que chama a atenção é a utilização de conceitos históricos já
formados como escravidão e a citação de história de vida, como a do Chico Rei, citada pelo
aluno para contar sobre o projeto.
Isso demonstra que a compreensão leitora está ancorada em um processo
complexo de produção de sentidos, composto pelos conhecimentos prévios, vivências
sociais, diálogo com o autor e seu texto. Sendo assim, pode-se afirmar que a leitura e a
174
compreensão são consideradas um trabalho social, como define Marcuschi (2008):
A interpretação dos enunciados é sempre fruto de um trabalho e não uma
simples extração de informações objetivas. Como o trabalho é conjunto e
não unilateral, pois compreender é uma atividade colaborativa que se dá
na interação entre autor-texto-leitor ou falante-texto-ouvinte, podem
ocorrer desencontros. A compreensão é também um exercício de
convivência sociocultural. (p.231).
Quando o aluno Pedro faz associações entre o texto lido e as informações
obtidas em sua vivência escolar, ele estabelece conexões entre conteúdos estudados com as
produções de inferências nas sessões de leitura. É possível afirmar que essas relações
estabelecidas são consequências de uma intensa atividade interativa entre agentes culturais
e objeto de conhecimento.
Pode-se afirmar que os dados de leitura do aluno Pedro apresentam produções
de inferências de origem textuais bem estruturadas e contextuais, que primam pela intensa
relação com o universo cultural cognitivo do aluno, considerando principalmente sua
experiência escolar durante os 3 anos do ciclo I.
5.3. Aluna Elisa.
A aluna Elisa apresenta, em sua primeira leitura do texo1 – “A Dança do Arco-
íris”
- uma atitude de segurança e de síntese. Sua leitura é fluida e bem objetiva, caracterizada
por produções de inferências basicamente de origem textuais. As produções de inferências
de base contextual, surgem somente com as intervenções da pesquisadora, ao aplicar
questões abertas, as quais foram elaboradas com o intuito de não interferir no conteúdo das
respostas da aluna.
Os resultados do diálogo entre a pesquisadora e Elisa, sobre o texto, promovem
a elaboração, pela aluna, de inferências de base contextual, com enfoque pragmático ao
evidenciar as ações e valores atribuídas ao índio: era quieto e não gostava de bagunça.
Na segunda leitura do texto 1, ao ser questionada pela pesquisadora sobre o que
achou do texto, a aluna diz que considera o texto legal e faz o reconto; contudo, diferente da
primeira leitura, a aluna reconstrói todo o texto lido atribuindo inferências pragmáticas
avaliativas. Elisa, assim como o aluno Pedro, demonstra conhecimento sobre as
características do gênero lenda. No entanto, não explora muito os conhecimentos que possui
sobre outras lendas indígenas, ainda que seja sabido que a aluna estudou, durante os dois
175
primeiros anos do ciclo I, textos narrativos do gênero lenda. Somente se restringe a poucas
informações sobre o gênero abordado.
A leitura da aluna é marcada por adjetivos aplicados ao personagem principal –
o índio - construídos a partir das informações textuais. Elisa tem uma postura mais direta ao
dialogar com o texto, valoriza os elementos explícitos. É o que se pode concluir ao analisar
as duas leituras feitas sobre o texto 1.
A primeira sessão de leitura do texto 2 - “A Origem do Oiapoque” - ocorreu no
dia 14 de agosto de 2014. No processo de leitura e compreensão desse texto, a aluna, após a
leitura em voz alta, fez o reconto utilizando paráfrases, buscou evidenciar os principais
elementos da narrativa ao considerar a contextualização do problema, a resolução e o
desfecho.
A aluna, ao ler o texto, produz inferências apoiadas na estrutura textual; no
entanto, com a intervenção da pesquisadora, Elisa produz inferências de base contextual ao
questionar a passagem em que a personagem do texto – uma índia transformada em cobra -
“dá a luz” a uma criança. Ao ativar seus conhecimentos prévios sobre o assunto, a aluna diz
que não é normal tal fato ocorrer.
Outra passagem do texto, que é evidenciada pela aluna, versa sobre a atitude de
preocupação com a aldeia e ao cuidado com seu povo, demonstrado pela personagem índia
– cobra. É através de saliências lexicais que a aluna apresenta inferências contextuais
baseada em valores e experiências pessoais.
A segunda leitura do texto 2 ocorreu em 24 de setembro de 2014, após 40 dias
da primeira sessão de leitura. Os procedimentos foram os mesmos: leitura em voz alta e
reconto. Desta vez, a pesquisadora orienta a aluna Elisa a comentar sobre mais algum
assunto que não tenha dito na primeira leitura, ou algo de que tenha se lembrado que não
falou naquele momento e que poderia comentar. Essa estratégia foi utilizada para que aluna
pudesse refletir mais sobre o texto lido, já que a mesma apresenta uma relação bem direta e
objetiva com o mesmo.
Na segunda leitura do texto 2, novamente a aluna lê com fluidez; no entanto, ao
fazer o reconto, permanece apoiada na estrutura narrativa. Somente com a intervenção da
pesquisadora, a aluna dialoga com o texto. Diz que é muito estranho um bebê nascer de
uma cobra. Esta observação é feita novamente em sua segunda leitura. “Podemos afirmar,
sem exageros, que a qualidade da mediação vivenciada pelo aluno, em muitos casos,
determina toda a história futura da relação entre ele e os diversos conteúdos estudados”.
(LEITE, 2006, p.38)
176
A aluna só elaborou inferências de origem contextual, com a intervenção da
pesquisadora. É perceptível que aluna entendeu o que leu; contudo, Elisa ficou na
expectativa dos questionamentos da pesquisadora e, conforme o diálogo sobre o texto foi
ocorrendo, a aluna foi fazendo conexões.
Em síntese, na segunda leitura do texto 2, Elisa conclui que: uma criança nascer
de uma cobra só é possível através de uma lenda, pois não é uma história real; na lenda,
também aparecem elementos reais, como índios; faz associação com o nome Tupã – Deus,
que aparece também na lenda do guaraná estudada em sala; percebe que o texto lido tem
relação com outras lendas já conhecidas por ela, tais como - mandioca e guaraná. As
principais inferências contextuais produzidas pela aluna (-expostas no capítulo 4) foram
geradas a partir de suas experiências pessoais e cognitivas.
No decorrer da pesquisa, estava entre 08 e 09 anos de idade e todas as
experiências vivenciadas com relação à leitura, sobretudo a literária, contribuiu para que a
aluna, nessa faixa etária, já apresentasse características de uma leitora proficiente.
A primeira sessão de leitura do texto 3 - “Romãozinho” - ocorreu no dia 18 de
novembro de 2014. Após terminar a leitura em voz alta, Elisa faz um reconto marcado por
produções de inferências textuais e contextuais. Diferentemente das quatro sessões de
leitura anteriores, nesta a aluna faz o reconto de forma argumentativa, emitindo opiniões
sobre o texto lido.
É interessante evidenciar alguns aspectos da primeira leitura de Elisa sobre o
texto
3. Primeiro ela diz que gostou do texto. Contudo, logo após a intervenção da pesquisadora,
ela diz que gostou e não gostou e justifica com atitudes tomadas do personagem para definir
as ações erradas, as quais, segundo ela, fazia com que o personagem não fosse “bonzinho” e
define, através de inferências contextuais (capítulo 4), o que são boas e más ações.
Uma outra passagem, sobre a compreensão leitora de Elisa, versa sobre o
significado da palavra brincadeira. A aluna diz para a pesquisadora que os pais do menino
morreram em decorrência de uma brincadeira do menino. Indagada sobre se a atitude de
Romãozinho foi realmente uma brincadeira, Elisa diz que talvez para o menino tenha sido,
pois ele não amava a mãe e o pai, “destruiu a família” (linhas 30-31, PL do texto 3).
As conclusões da aula sobre o texto são marcadas por inferências contextuais
baseadas em seu “universo cultural cognitivo” (MARCUSCHI, 1985), todas explicitadas no
capítulo 4.
Um outro aspecto muito importante, que aparece na primeira leitura – texto 3 de
177
Elisa, é o relato que ela apresenta sobre a reprodução de uma prática de leitura desenvolvida
em sala de aula, em sua casa. Segundo a aluna, já conhecia este texto e, quando chegou à
sua casa depois de ter lido com a professora em sala de aula, leu para a mãe e a madrinha
que também fizeram comentários sobre o texto; a justificativa de Elisa para a pesquisadora
sobre sua atitude é que gosta de ler.
A segunda sessão de leitura do texto 3 ocorreu no dia 27 de novembro de 2014,
nove dias após a primeira. Na sequência da leitura em voz alta, novamente a intervenção da
pesquisadora é no intuito de abrir possibilidades de ampliar a compreensão da aluna por
meio de produções de novas inferências sobre a leitura. O questionamento é se a aluna
lembrou-se de alguma coisa, se pensou algo que não tenha falado na leitura anterior (linhas
2-3, SL, texto3).
Elisa segue praticamente o mesmo script da primeira leitura deste texto: diz que
gostou mais ou menos e produz inferências baseadas em suas experiências e valores
adquiridos nas relações sociais. A aluna reitera sobre o comportamento adequado que deve
se ter quando morre alguém da família: “Quando morre alguém da família todo mundo se
abala que fica até semanas sem ri” (linhas 7-8, SL, texto3).
Portanto, a morte dos pais do Romãozinho, em decorrência de sua
“brincadeira”, foi ressignificada pela aluna, através das interações com o texto, entre outros
elementos linguísticos, extralinguísticos e contextuais, responsáveis pela geração de novos
sentidos, que caracterizam sua compreensão leitora.
Em uma nova intervenção da pesquisadora sobre a leitura do texto 3, sobre a
utilização do mesmo em sala de aula, Elisa diz que já conhecia a história e que os alunos
fizeram uma leitura junto com a professora sobre este texto na sala (ela diz nós). Além
disso, a aluna explicita que essa história é referente às regiões do Brasil que estão estudando
e que na história fala sobre Goiás (projeto interdisciplinar). Por fim, a aluna conta
novamente que, ao chegar em casa, leu a mesma história para a mãe e a madrinha e na
sequência as mesmas comentaram sobre a história.
E suma, a aluna Elisa, matriculada no 3º ano do ensino fundamental do ciclo I,
compreende a função social da leitura e escrita, lê de maneira articulada palavras frases e
textos de diversos gêneros, e ainda reconhece os principais aspectos de um texto narrativo.
Compreende o gênero lenda, faz associações entre algumas das principais lendas indígenas
conhecidas e suas origens geográficas e identifica características da cultura brasileira nas
mesmas.
178
Produziu, nas seis sessões de leitura dos três textos lidos nesta investigação,
uma série de inferências de origens textuais e contextuais, como já explicitado
anteriormente. Elisa vivenciou, de forma espontânea, uma prática de leitura aprendida na
escola com pessoas da sua família, indicando que essas ações pedagógicas foram muito
significativas e interiorizadas pela criança, contribuindo para a sua aprendizagem e
desenvolvimento intelectual e social.
5.4. Aluno Luís.
A primeira leitura do texto 1 - “A dança do arco-íris” - feita pelo aluno Luís,
ocorreu em julho de 2014 (não foi registrado o dia exato). Após a leitura em voz alta, a
pesquisadora questiona o que o aluno achou do texto e ele diz que achou legal; questionado
novamente pela pesquisadora se achou legal mesmo, Luís utiliza a expressão “aqui quando
falou...” e procura no texto o trecho que fala sobre o vapor d´agua, associando a um
conteúdo de ciências que estudou em sala de aula sobre como ocorre a produção de chuva.
Em seguida, o aluno seleciona a palavra arco-íris e associa às vivências pessoais sobre fazer
bolhas de sabão quando pequeno e o aparecimento das cores do arco-íris.
Com esses dados foi possível avaliar que o aluno Luís fez inferências
contextuais de natureza cognitiva, semântica e experiencial (MARCUSCHI, 2008, p.255),
como explanado no capítulo 4. A compreensão leitora de Luís caracteriza-se por
extrapolações de cunho pessoal, atingindo o que Marcuschi (2008) denomina de horizonte
problemático
Por ser do âmbito da extrapolação, este horizonte de compreensão textual pode
recair na esfera da pura e simples opinião pessoal sem dar a devida importância para as
informações textuais. No caso do aluno Luís, as inferências produzidas estão relacionadas
ao seu universo de experiências pessoais: espaço escolar e brincadeiras infantis.
Ainda na primeira leitura do texto 1, Luís, após essas associações citadas,
retomou a história através da prática do reconto e elaborou inferências de origem textual,
através de uma leitura marcada por paráfrases. Este aluno finalizou a primeira leitura do
texto com a conclusão de que o texto lido “mistura romance com aventura”. Esta afirmação
permite constatar que o aluno acessou seus conhecimentos prévios sobre gênero textual ao
concluir que e a história possui tais características.
A segunda leitura do texto 1 ocorreu no mesmo mês que a primeira, em julho de
2014; como não foi identificado precisamente o dia, não se sabe o tempo percorrido entre a
179
primeira e a segunda leitura deste texto.
Após a leitura em voz alta, novamente, a pesquisadora sugeriu ao aluno contar o
quisesse sobre o texto. Luís apoiou-se no referencial arco-íris: questionou sobre a relação
entre ele e o título da história e argumentou que, como o texto tem o nome “dança do arco-
íris”, se o arco-íris não dança. Com o apoio da pesquisadora, em um diálogo entre ambos e
o texto, o aluno conclui as relações entre o enunciado e o conteúdo do texto.
A primeira sessão de leitura do texto 2 - “A Origem do Oiapoque” - ocorreu em
15 de agosto de 2014. Após a leitura em voz alta, o aluno diz que achou a história legal e
pede: “posso reler tipo isso? reler só que não ler, conta!” (linha 5, PL, texto 2). O reconto
efetuado sobre o texto 2 por este aluno caracteriza-se por uma dinâmica de leitura
parafrástica, com questionamentos sobre passagens do mesmo e um intenso diálogo
consigo, em uma tentativa de reconstruir situações e contextos da história. Outra
característica demonstrada na leitura do texto 2, efetuada por Luís, é a intertextualidade
(capítulo 4).
A segunda leitura do texto 2 ocorreu em 25 de setembro de 2014, 40 dias após a
primeira sessão de leitura deste texto. Nesta sessão, Luís reconstrói a história através de
produções de inferências de origens textuais e contextuais, em um diálogo constante com o
texto, apresenta estratégias metacognitivas, demonstra autonomia e segurança diante do
texto,
associa o título do texto com o desfecho da história, ou seja: o choro da personagem índia-
cobra a origem do rio Oiapoque. Faz essas associações através de suas reflexões.
O terceiro texto escolhido para a sessão de leitura foi “Romãozinho”. Como foi
exposto anteriormente, é um texto que foi lido e discutido em sala de aula, pois está
associado ao planejamento do projeto interdisciplinar. Na primeira sessão de leitura deste
texto, Luís faz o reconto de forma sintética, utilizando paráfrases, considerando as
principais ações da narrativa. Além das inferências textuais, o aluno apresenta inferências
de origem contextuais: associação do personagem “Romãozinho” com “Saci-Pererê”,
localiza geograficamente a história - explicitadas no capítulo 4.
Além disso, em seu comentário, o aluno Luís expõe uma prática de leitura de
textos literários desenvolvida pela professora da sala a qual, segundo ele, contribuiu para a
melhor compreensão textual: “leu tudo de novo para ficar melhor” (professora).
A segunda sessão de leitura do texto 3 ocorreu em novembro de 2014. Após a
leitura em voz alta e o questionamento da pesquisadora- e aí? – Luís, novamente, inicia um
180
diálogo com o texto: Contudo desta vez, o aluno associa esta história com histórias de
assombração e relata uma história lida por ele, com alguns detalhes, também cita que leu
uma história de terror em um gibi, demonstrando que é um aluno que lê com frequência e é
capaz de discutir o que leu.
Uma outra caraterística da segunda leitura do texto 3, feita por Luís, é a análise
do comportamento do personagem Romãozinho, a discussão de suas características
pessoais e areflexão sobre as ações dele e suas consequências para si e para os outros
personagens da narrativa.
Em síntese , Luís é um aluno que apresenta diversas posturas diante da
interação com os 3 textos lidos, as quais caracterizam sua compreensão leitora: faz reconto
em diversos momentos, utilizando paráfrases; seleciona palavras significativas e, a partir
delas, faz relações com situações vivenciadas, tanto na escola, assim como em outros
momentos e espaços da sua vida; cria situações de reflexão a partir de palavras e expressões
que aparecem nos textos e nos títulos dos mesmos; ênfase na intertextualidade; relaciona
histórias do mesmo gênero, demonstra muita criatividade e criticidade ao produzir
inferências sobre os textos lidos.
5.5. As implicações das práticas pedagógicas de leitura nas produções inferenciais:
leitura de textos narrativos.
Cada um dos alunos pesquisados apresenta peculiaridades em relação aos
processos de compreensão de textos narrativos, em função do seu desenvolvimento
cognitivo, sociocultural e aprendizagem (VIGOTSKY, 2007). Contudo, há alguns pontos
convergentes, quando analisados os principais aspectos da compreensão leitora dos 3 alunos
desta pesquisa.
A partir da indicação dos dados de leitura, associados às práticas pedagógicas
com ênfase na formação do sujeito leitor, desenvolvidas pela professora, seja nos projetos
e/ou atividades em sala de aula, é possível afirmar que, nesses três anos de escolarização, a
qualidade das atividades de leitura promovidas pela educadora contribuiu de forma
significativa para que os alunos desenvolvessem uma relação de diálogo com textos
narrativos, através de uma postura crítica de questionamentos. Embora em níveis diferentes,
essa característica é encontrada na compreensão leitora dos 3 alunos.
Neste sentido, considera-se que os projetos interdisciplinares com ênfase na
181
leitura de textos literários, como a Maleta e, posteriormente, a Sacola da Leitura, as práticas
de promoção da leitura literária – leitura diária e a criação do festival literário (FLISELLO),
foram ações planejadas com o objetivo de desenvolver a criatividade e a constituição do
leitor engajado e proficiente.
Sobre a Maleta / Sacola da Leitura, trata-se de uma prática pedagógica - como
já foi dito anteriormente - implementada desde o primeiro ano do ciclo I pela professora da
sala, foi organizada com os objetivos a seguir: ampliar o acesso aos livros de diferentes
gêneros textuais que compõem o universo da literatura infantil; envolver a família na
vivência da leitura; apreciar (individual e coletivamente) durante a leitura valores estéticos,
afetivos e éticos; desenvolver a linguagem oral, por meio do reconto do livro lido; exercitar
a escuta, respeitar o momento da fala dos colegas.
Uma outra prática muito importante desenvolvida pela professora é a leitura
diária de livros de literatura infantil, na qual ela seleciona livros que podem estar ou não
atrelados aos projetos e faz a leitura por capítulos ou partes. As crianças esperam ansiosas
para saber o que irá acontecer no dia seguinte, quando a história será retomada, sendo que
essa atitude instiga a curiosidade das crianças. No decorrer da leitura diária, a professora
estabelece sempre com os alunos um diálogo sobre o livro, deixa livre para que os alunos
façam comentários diversos sobre o texto lido.
Outra prática citada nesta pesquisa de incentivo à leitura é o festival literário,
que ocorre em outubro, em comemoração ao dia das crianças. Foi idealizado com o
objetivo de criar mais um espaço de promoção à leitura e práticas culturais atrelada à
literatura, como explanado no capítulo 2.
A leitura é entendida como uma atividade social e a compreensão como um
processo de trabalho social, marcada fundamentalmente pelas interações, as quais também
devem ocorrer em sala de aula entre professor-aluno, entre aluno-aluno e entre aluno -
objeto de conhecimento em uma relação dialógica
Em muitos casos, o espaço escolar é o único lugar onde as crianças, que moram
em regiões afastadas do centro da cidade, têm a oportunidade de ter acesso a livros de
literatura e poder vivenciar todas as possibilidades de entretenimento, reflexão, criatividade
e fantasia promovidos pelo universo da leitura literária. Isso só é possível quando os
professores entendem a dimensão e as possibilidades da ampliação do universo das crianças
pelo viés dessa arte.
Defende-se que todo esse processo de compreensão leitora, internalizada pelos
alunos pesquisados, é determinado, em grande medida, pelas práticas pedagógicas de leitura
182
e pelos projetos desenvolvidos de forma interdisciplinar pela educadora, a qual permaneceu
os três anos de escolarização das crianças e utilizou a literatura de uma forma mais ampla,
ao contrário da utilização puramente instrumental desse bem cultural, pela maioria das
escolas.
Neste sentido, além da compreensão leitora ser marcadamente relacionada ao
trabalho social, à leitura enquanto atividade; está atrelada à prática social, à função social
da leitura. Com relação ao conceito da atividade de leitura e sobre as pesquisas
contemporâneas sobre esse tema, recorre-se à Kleiman (2004):
A concepção hoje predominante nos estudos de leitura é a da leitura como
prática social que, na Linguística Aplicada, é subsidiada teoricamente
pelos estudos do letramento. Nessa perspectiva, os usos da leitura estão
ligados à situação; são determinados pelas histórias dos participantes,
pelas características da instituição em que se encontram, pelo grau de
formalidade ou informalidade da situação, pelo objetivo da atividade de
leitura, diferindo segundo o grupo social. Tudo isso realça a diferença e a
multiplicidade dos discursos que envolvem e constituem os sujeitos e que
determinam esses diferentes modos de ler. (p.14)
A partir da análise dos dados da compreensão leitora dos alunos pesquisados, é
possível concluir que estes apresentam características de leitores proficientes e engajados
no final do ciclo I. Essa proficiência leitora, característica dos sujeitos pesquisados, deve-se,
sobretudo, às suas experiências leitoras, as quais já foram elencadas anteriormente. São
práticas de leitura literária desenvolvidas para garantir a formação do sujeito leitor crítico,
criativo e capaz de produzir inferências de diversas origens ao estabelecer o diálogo com o
texto.
Além do compromisso com a educação e a criatividade observada nas práticas
pedagógicas de incentivo à leitura, um outro aspecto imprescindível para a formação do
aluno leitor é a maneira afetiva com que a profissional conduz a mediação entre o aluno e o
objeto cultural a ser apropriado.
Sobre a importância da qualidade da mediação conduzida pelos agentes
culturais - nesse caso, a professora – pode-se afirmar que a afetividade é um fator
determinante para a aprendizagem dos alunos. “A afetividade está envolvida em todas as
principais decisões de ensino assumidas pelo professor, constituindo como fator fundante das
relações que se estabelecem entre os alunos e os conteúdos escolares”. (LEITE, 2006, p.38)
Cabe aqui ressaltar que afetividade não está restrita ao contato físico ou à
utilização de uma linguagem mais carinhosa. A dimensão afetiva, como ficou demonstrado
183
nos resultados obtidos nas pesquisas efetuadas no início deste século (Leite, 2006),
“envolviam todo o processo de planejamento e desenvolvimento das práticas pedagógicas,
mesmo nas situações em que o professor não se encontra fisicamente presente no ambiente”
(p.08). Para o grupo do Afeto (subgrupo do ALLE
no capítulo 1 é descrito todo o processo de constituição tanto do ALLE quanto
do AFETO e a relação existente entre eles) coordenado pelo referido autor, a afetividade é
estudada a partir dos impactos promovidos pela mediação pedagógica, na relação que se
estabelece entre o aluno e os conteúdos ou práticas desenvolvidas em sala de aula.
Neste sentido, ao discorrer sobre a importância da afetividade nas mediações
efetuadas por professores em sala de aula na aquisição do conhecimento cultural, Leite e
Tassoni (2007) demonstram como as condições implementadas pelos professores em seus
fazeres pedagógicos são valiosos para a aprendizagem significativa do aluno. Essas
condições, além de promover o conhecimento significativo, são fundamentais para que o
aluno aprenda a gostar do que estuda; sobretudo que tenha gosto pela leitura literária, um
gênero capaz de seduzir a criança, pelo seu universo criativo, fantasioso e tão caro ao
desenvolvimento humano. O conhecimento adquirido pelos alunos nas relações interativas
com outros textos,
neste caso, e com outros textos do gênero lenda, foram apropriados pelos alunos a partir de
práticas de incentivo à leitura literária, as quais ocorreram no espaço escolar, mas rompem
com práticas de leitura escolarizadas, entendidas como tradicionais e fragmentadas,
fazendo o uso do texto como um pretexto para trabalhar questões formais da língua.
Os dados nos mostram uma outra relação da escolarização da literatura literária,
que produz outros sentidos e saberes. Esse saber, considerado escolar, está relacionado
aos usos da leitura que podem ser dados entre outros elementos “pelas características da
instituição em que se encontram” (KLEIMAN, 2004).
Assim, concluímos que a criança, ao final do Ciclo de Alfabetização, cujas
práticas sociais estejam totalmente imbricadas em práticas cotidianas de leitura e não
somente na decodificação de palavras e frases, seja capaz de demonstrar compreensão
leitora marcada por uma complexidade de relações estabelecidas entre autor, texto e leitor.
Fundamentando-se em uma concepção de alfabetização na perspectiva do
letramento literário Cosson (2011), a opção por um trabalho pedagógico pautado em tais
premissas, faz toda a diferença para a formação de crianças e jovens além de leitores
proficientes, questionadores de realidade, política, econômica, cultural e social em que
vivem.
184
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As produções literárias, de todos os tipos e todos os níveis, satisfazem
necessidades básicas do ser humano, sobretudo através dessa
incorporação, que enriquece a nossa percepção e a nossa visão do
mundo... A literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na
medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a
sociedade, o semelhante. (CÂNDIDO, 1988, p.179,180).
Este estudo surgiu da necessidade de promover uma reflexão sobre a formação
do leitor e como ocorre o processo da compreensão leitora, sobretudo no espaço escolar,
nos primeiros anos de alfabetização, pois essa é uma fase crucial do desenvolvimento
intelectual, social, cultural e emocional da criança e início da aprendizagem sistematizada.
“Conduzida por sua capacidade de imaginação e pela inventividade de sua linguagem, a
criança é capaz de criar sínteses, funções ou prolongamentos dos elementos extraídos de
uma ou mais histórias. (SILVA, 2010, p.77).
Portanto há que se “descobrir as relações entre o processo de desenvolvimento e
a capacidade de aprendizagem” (VIGOTSKY, 2010, p.95). Neste sentido, o (a) professor
(a), ao trabalhar com conhecimentos escolares em suas diversas áreas, deve considerar o
nível de desenvolvimento real da criança, para garantir que ocorra efetivamente a
aprendizagem, sobretudo, na fase em que as crianças iniciam a estruturação dos
conhecimentos da leitura e escrita. Ainda que a aprendizagem ocorra em diversos espaços e
inúmeras situações de interação, é na escola que ocorre sua regularização.
Comumente, considera-se que o aprendizado está, necessariamente, relacionado
ao desenvolvimento mental dos seres humanos. Para Vigostsky (2010):
Aprendizado não é desenvolvimento; entretanto, o aprendizado
adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em
movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma,
seriam impossíveis de acontecer. Assim, o aprendizado é um aspecto
necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções
psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas.
(VIGOTSKY, 2010, p. 103).
Nesta pesquisa, buscou-se lançar luz à formação da criança leitora, nos 3
primeiros anos de escolarização, analisando como elas produzem sentidos e inferências a
partir da leitura de textos literários. Sendo assim, este estudo procurou ouvir o que as
crianças tinham a dizer sobre os textos disponibilizados para a leitura no decorrer da
pesquisa.
185
Busca-se desenvolver o gosto pela leitura por meio de temas veiculados nos
meios de comunicação, campanhas educacionais promovidas por diversas instâncias
governamentais, com discursos sobre as possibilidades de acesso ao mundo da imaginação
e ao desenvolvimento da criatividade. No entanto, apesar do discurso sobre a importância
da formação do hábito da leitura e o investimento em um país de leitores, várias questões
permanecem para serem discutidas e aprofundadas.
Como já exposto neste estudo, são várias pesquisas que buscam retratar a leitura
em suas diversas abordagens Por exemplo: como esses leitores estão sendo formados?
Quais os tipos de práticas de leitura estão sendo implementadas nas escolas de ensino
fundamental I? Aumentar o número de aquisições de livros literários garantem a formação
de um leitor engajado? Qual o papel do professor nesse processo? Quais diretrizes
pedagógicas são facilitadoras? Segundo Silva e Zilberman (2004):
Pois, se ler e escrever convivem juntos desde os primeiros anos da escola,
nem sempre explicita sua relação com o que os motiva e possibilita: o
texto escrito, independentemente da sua natureza, tipo, linguagem
empregada, produtor ou destinatário. (...)Por consequência, a passagem à
condição de leitor, nem sempre acontece de maneira natural..(SILVA E
ZILBERMAN, 2004, p.13)
Neste sentido, olhar para o leitor que é formado no espaço escolar não é tarefa
fácil, pois implica olhar para as práticas de leitura escolarizadas tradicionais que,
historicamente, visam, única e exclusivamente, perpetuar a leitura como mero instrumento
gramatical e o texto como pretexto para aprender conteúdos diversos.
Desta forma, o que se pretendeu com esta pesquisa foi dar voz ao leitor que
finaliza o primeiro percurso escolar, a fase de alfabetização e, abordando sua compreensão
leitora, através das produções de inferências construídas a partir de textos literários. Sobre
estudos desta natureza, Silva (2010) assevera:
Somente agora o sujeito-criança parece ganhar um espaço maior de
análise e discussão, transformando-se, por isso mesmo, em objeto de
preocupação e de pesquisa em vários pontos do país. Ainda assim, e
considerando a grande quantidade e variedade de crianças deste país,
dentro ou fora das escolas, são poucos – muito poucos- os estudos que
tratam, por exemplo, de questões relacionadas com a estética da recepção,
com a compreensão e a fruição de textos diversos, com o consumo de
informações transmitidas por diferentes veículos de comunicação, com a
experiência literária construída pelas crianças ao longo de sua trajetória
acadêmica. (SILVA, 2010, p.68).
186
Portanto, esta pesquisa buscou contribuir para ampliação dos estudos referentes
à compreensão leitora de crianças matriculadas no final do ciclo I, segundo as diretrizes
curriculares, produzidos pela Secretaria Municipal de Campinas.
Para a análise das inferências produzidas pelos 3 alunos sujeitos desta pesquisa,
foram utilizadas as categorias elaboradas por Marcuschi (1985; 2007; 2008; 2011), para
caracterizar o processo da compreensão leitora. Foi possível, através da análise dos dados
de pesquisa à luz do referencial teórico exposto, dar visibilidade às estratégias pelas quais
os sujeitos constroem a compreensão de textos narrativos.
As inferências produzidas pelos sujeitos desta pesquisa foram organizadas
basicamente em duas principais bases: de base textual e de base textual e contextual
(MARCUSCHI, 2008, p.255). Sendo utilizado 3 textos narrativos do gênero lenda,
selecionados da cultura popular brasileira.
A partir da primeira organização de inferenciais foi possível ampliar as análises
considerando o quadro proposto pelo autor: tipo de operação inferencial, natureza da
inferência e condições de realização. Além disso, foi possível definir os horizontes de
compreensão textual: falta de horizonte; horizonte mínimo, horizonte máximo; horizonte
problemático e horizonte indevido.
O uso dessas categorias de análise foi possível por estarem baseadas na
concepção de que ler é inferir (MARCUSCHI, 2008 p. 237), sendo esse processo também
praticado por crianças e não somente por leitores com mais escolaridade e experiência
leitora: os resultados sugerem que a criança tem muito a dizer sobre o seu processo de
compreensão leitora.
Embora os 3 alunos selecionados tenham iniciado o processo de alfabetização
somente dois anos e meio antes deste estudo, foi possível constatar, através das inferências
produzidas, o quão significativas foram as práticas pedagógicas de leitura empreendidas
pela professora da sala, a qual permaneceu durante 3 anos com a mesma turma.
Constatou-se neste estudo como é importante para o desenvolvimento
intelectual, emocional e social da criança, a utilização da linguagem literária. Conforme
Silva (2010):
Enquanto experiência de linguagem e, ao mesmo tempo, de revelação,
descoberta e aprofundamento de referenciais de realidade, a leitura de
literatura infantil influi significativamente no processo de
desenvolvimento da criança. Além da usufruição do texto literário, que é,
em si mesmo, um processo criativo, a aventura do ler vai permitir à
criança um refinamento de sua razão (inteligência) pelas reflexões feitas
187
acerca do possível e do impossível, acerca dos problemas de seu tempo e
de seu contexto. (p.77)
Portanto, os dados demonstraram que práticas pedagógicas que incentivam a
leitura, sobretudo de textos literários, abordando conteúdos de forma interdisciplinar que
valorizam o diálogo entre os diversos conhecimentos humanos, sem hierarquizá-los, podem
fazer a diferença na escolarização das crianças. Principalmente daquelas que somente têm a
escola como único espaço de aprendizagem, de acesso aos objetos culturais, à discussão
sobre valores e a realidade que se vive.
Em suma, para que os anos que as crianças vivem na escola sejam repletos de
experiências e situações significativas para as mesmas. Neste sentido Silva (2010) alerta
para o risco:
Na ausência de integração e de comunicação real entre os professores, em
benefício dos alunos- leitores, continuaremos a falar aos ventos sobre a
importância da convivência com leitura, sem poder e sem saber como
concretizar, na prática, ações pedagógicas consequentes. E o leitor que se
dane no círculo da inconstância, da mesmice e da barafunda escolar!
(SILVA, 2010, p.76).
Neste sentido, para que realmente ocorram práticas pedagógicas significativas
de leitura e ênfase em um letramento literário, é necessário o comprometimento dos
professores através de um planejamento pedagógico que, efetivamente, tenha como objetivo
a formação de leitores proficientes, engajados e críticos.
188
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABREU, Márcia. Diferença e Desigualdade: Preconceitos em Leitura In: MARINHO,
M. (Org.). Ler e navegar: espaços e percursos da leitura. Campinas, SP: Mercado das
Letras: Associação de Leitura do Brasil (ALB), 2001.
ARAÚJO, Maria Jaqueline de Grammont Machado de. Práticas de leitura na escola e nas
famílias em meios populares. Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG.
ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. São Paulo: Pioneira, 2001.
BAKHTIN, M. [VOLOCHÍNOV]. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo:
Hucitec, 2012
BARREYRO, Juan Pablo; MOLINARI, Carlos M; YOMHA, Jazmín C e DUARTE,
Dionisio Aníbal. Generación de inferencias emocionales durante la lectura de textos
narrativos. Anu. investig. [online]. 2008, vol.15, pp. 0-0. ISSN 1851-1686.
BANKS, Lucy L. Aspectos Argumentativos e Polifônicos da Linguagem da Criança em
Idade Pré-escolar. Campinas,1996.
BERMAN, Marshall. Tudo o que é sólido desmancha no ar: a
aventura da modernidade.São Paulo: Companhia das Letras, 1986.
BOGDAN, Robert & BIKLEN, Sari. Investigação qualitativa em educação:
uma introdução à teoria e aos métodos. Portugal: Porto Editora, 1994.
BRESSON, François.A leitura e suas dificuldades. In: CHARTIER, Roger (org.) Práticas
de leitura.São Paulo: Estação Liberdade, 2001.
CAVALLO, E CHARTIER.R. História da Leitura no Mundo Ocidental, vol. 2. Editora
Ática, São Paulo, 1999.
CLARK, K. e HOLQUIST, M. O Marxismo e a Filosofia da Linguagem. In: CLARK, K.
e HOLQUIST, M. Mikhail Bakhtin. Trad. J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva, 1998.
CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano: 1. artes de fazer. Petrópolis, RJ: Vozes,
1994.
CHARTIER, R. (1998). A aventura do livro: Do leitor ao navegador. SP: EDUNESP.
(texto original publicado por Les Editions Textuel em 1997).
. Do livro à leitura. In: CHARTIER, Roger (Org.). Práticas de leitura.
São Paulo: Estação Liberdade, 2001.
. O mundo como representação. Estudos Avançados, São Paulo, v.
5, n. 11, jan. /abr.1991. p. 173-91.
COLOMER, Teresa; CAMPS, Anna. Ensinar a ler, ensinar a compreender. Porto Alegre:
Artmed, 2002. (Edição original, 1991).
189
CORTELLA, MÁRIO SÉRGIO. A escola e o conhecimento: fundamentos
epistemológicos e políticos. São Paulo: Cortez, Instituto Paulo Freire, 2006.
COSSON, Rildo. Letramento Literário: Teoria E Prática. São Paulo: Editora Contexto,
2011. COSCARELLI, C. V. Inferência: Afinal o que é isso? Belo Horizonte: maio de
2003.
CRUVINEL. Fabiana R. A Leitura como prática cultural e o processo de escolarização:
As vozes das crianças. Tese de doutorado. UNESP: Marília, 2010.
FARIA. Mariana, Memorial de Conclusão de Curso apresentado como um dos pré-
requisitos para conclusão da Licenciatura em Pedagogia- Programa Especial de
Formação para Professores em Exercício (Proesf) da Faculdade de Educação da
Universidade Estadual de Campinas, 2005.
FERREIRA, Norma S. A. Pesquisa em leitura: Um estudo dos resumos de dissertações
de mestrado e teses de doutorado defendidas no Brasil, de 1980 a 1995. Tese de
doutorado, Faculdade de Educação da Unicamp. Campinas, 1999.
, Norma S. A Contribuições para a escrita da história da
produção acadêmica sobre leitura, no Brasil -1965 a 1979. Revista de Educação Pública,
v. 16, p. 29- 42, 2007
GERALDI, J. W. (Org.) (1997[1984]). O texto na sala de aula. 3. ed. São Paulo: Ática.
GERALDI, V. A Leitura e suas Múltiplas Faces. In: A Aula como Acontecimento. São
Carlos: Pedro & João Editores, 2010.
GROTTA, Ellen C. Baptistella. Processo de formação do leitor: relato e análise de
quatro histórias de vida. Campinas, 2000. Dissertação (Mestrado em Educação).
Faculdade de Educação, Universidade Estadual Paulista.
HÉBRARD, JEAN. “O objetivo da escola é a cultura, não a vida mesma”. In: Presença
Pedagógica. Belo Horizonte: Dimensão, v. 06, n.33, maio/junho 2000.
HIGA, Sue Ellen. A Constituição do Sujeito Leitor: Duas Histórias de Mediação.
Trabalho de Conclusão de Curso. Unicamp: Campinas, 2007.
KLEIMAN, Angela. Leitura: ensino e pesquisa. Campinas, SP: Pontes, 1989.
KLEIMAN, Angela B.; MORAES, S. E. Leitura e interdisciplinaridade: tecendo redes
nos projetos da escola. Campinas, SP: Mercado de Letras, 1999.
. Angela. Abordagens da leitura. SCRIPTA, Belo Horizonte, v. 7, n. 14, p. 13-
22, 1º sem. 2004b. Disponível em:
http://www.ich.pucminas.br/cespuc/Revistas_Scripta/Scripta14/Conteudo/N14_Parte01_art
01. pdf.
. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. 2. ed. Campinas, SP: Pontes, 2008.
190
. Oficina de Leitura: teoria e prática. 14ª. ed. Campinas, SP: Pontes, 2012.
LAJOLO, Marisa. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. São Paulo: Ática,
1997 LEITE, A. S. Afetividade e Práticas Pedagógicas. São Paulo: Casa do Psicólogo,
2006.
LEITE, Sérgio Antônio da Silva (org.). Alfabetização e Letramento: Contribuições para
as práticas pedagógicas. Campinas, SP: Komedi & Arte Escrita, 2008.
Sérgio Antônio da Silva; COLELLO, Sílvia M. Gasparian; ARANTES,
Valéria Amorim (org). Alfabetização e letramento: pontos e contrapontos. São Paulo:
Summus, 2010.
MACHADO, Marco Antônio Rosa. O papel do processo inferencial na compreensão de
textos escritos. 2005. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de Campinas,
Campinas, 2005
MACHADO, Veruska R., Compreensão leitora no PISA e práticas escolares de leitura.
Brasília: Líber Livros, Faculdade de Educação: UNB, 2012.
MARCHESANO, Lauren Souza do Nascimento. Como crianças de 4 a 6 anosconstroem
sentidos lendo livros de literatura: como a lua foi ao cinema? Orientadora: Profª Drª
Cecilia
M. A. Goulart – RJ; UFF, 26/03/2010. Dissertação (Mestrado em Educação).
MARCUSCHI, L. A. (1985). Leitura como processo inferencial num universo cultural
cognitivo. Leitura, Teoria e Prática, 4, 1-14.
. Leitura e compreensão de texto falado e escrito como ato individual
de uma prática social. In: ZILBERMANN, R.; SILVA, E. T. (Org.). Leitura: Perspectivas
interdisciplinares. São Paulo: Ática, 2004.
. Compreensão textual como trabalho criativo. Unesp, 2007. Disponível
em: tstream/123456789/40358/3/01d17t07.pdf>. Acesso em: setembro de 2014.
. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo:
Parábola, 2008.
MARTINS, Renata Pereira. Estudos Introdutórios sobre leitura no Brasil -1996 a 2000.
Campinas, 2005. Trabalho de Conclusão de Curso – Universidade Estadual de Campinas.
MORTATTI, M. R. L. Alfabetização no Brasil: uma história de sua história. São Paulo:
Cultura Acadêmica, 2011.
191
OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo
sócio
– histórico. São Paulo, SP: Scipione, 1997.
PAULINO, Graça. Algumas especificidades da leitura literária. In: Leituras literárias:
discursos transitivos. PAIVA, Aparecida et al. Belo Horizonte: Ceale, Autêntica Editora,
2005, p. 55-68.
PENIDO, Thais Nogueira. Um estudo da leitura como temática nos resumos das teses de
doutorado e das dissertações de mestrado no Brasil (2000- 2005). Campinas, SP: [s.n.],
2010.
PESSOA, Ângelo Emílio da Silva (org.). Conhecer Campinas numa perspectiva
histórica. Campinas: Secretaria Municipal de Educação, 2004.
PINO, Angel. As marcas do humano: às origens da constituição cultural da criança na
perspectiva de Lev S. Vigotski. São Paulo, SP: Cortez, 2005.
PINO, A. (2007) Educação estética do sentimento e processo civilizador: um ensaio sobre
estética e semiótica. In Andréa Zanella, Fabíola Costa Katia Maheirie, Silvia da Ros, orgas.
Educação estética e constituição do sujeito: reflexões em curso. Florianópolis,
NUP/UFSC.
POSSENTI, Sírio. Sobre a Leitura: o que diz a análise do discurso? In.: MARINHO, M.
(Org.). Ler e navegar: espaços e percursos da leitura. Campinas, SP: Mercado das
Letras: Associação de Leitura do Brasil (ALB), 2001.
RENNÓ.Sandra D. da S. Produção de Inferências e Avaliação de compreensão leitora.
Dissertação de Mestrado.PUCSP: São Paulo, 2008.
ROJO, Roxane. Letramento e capacidades de leitura para a cidadania. Texto de
divulgação científica elaborado para o Programa Ensino Médio em Rede, Rede do
Saber/Fundação Vanzolini/SEE-SP e para o Programa Ler e Escrever – Desafio de Todos,
CENPEC/SME-SP. SP: SEE-SP e SME-SP, 2004.
SANTOS. Márcia R. M. O Estudo das Inferências na Compreensão do Texto Escrito.
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa/ Departamento de Línguítica Geral e
Românica. Lisboa, 2008. (Dissertação de mestrado).
SILVA, Ezequiel Theodoro da. Elementos de Pedagogia da Leitura. São Paulo: Martins
Fontes, 1998.
. Ezequiel T. Partilha e conflito de interpretações: um caminho
para o desenvolvimento da linguagem do leitor infantil. In:.Leitura e desenvolvimento
da linguagem. São Paulo: ALB – Associação de Leitura do Brasil, 2010
SILVA, Lílian M. Memórias de Leitura: A Constituição do leitor escolar. Dissertação
de Mestrado. Unicamp: Campinas, 2005.
192
SILVA, V. Regina Silva da. Um estudo com crianças de 3ª série do ensino fundamental
sobre compreensão de histórias infantis, procedimentos de leitura e nível de
satisfação: uma interface psicolinguística e literatura. Tese de doutorado. PUCRS: Porto
Alegre, 2009.
SMOLKA, Ana Luiza B. et al. A atividade da leitura e o desenvolvimento das crianças:
considerações sobre a constituição de sujeitos-leitores. In:.Leitura e desenvolvimento da
linguagem. São Paulo: ALB – Associação de Leitura do Brasil, 2010
SOARES, M. A escolarização da literatura infantil e juvenil. In: M. EVANGELISTA, A. A.
M.; Brandão, H. M. B.; Machado, M. Z. V. (orgs.). (2011) A escolarização da leitura
literária: o jogo do livro infantil e juvenil. Belo Horizonte: Autêntica / CEALE.
TASSONI. Elvira C. M. A dinâmica interativa na sala de aula: as manifestações
afetivas no processo de escolarização. Tese (doutorado) – Universidade Estadual de
Campinas, Faculdade de Educação. Campinas, SP.[s.n.], 2008.
TEIXEIRA, Maria Julieta. A Compreensão Leitora em Textos Narrativos: Diversificar
Estratégias. Trabalho de Projecto apresentado para cumprimento de requisitos necessários
à obtenção do grau de Mestre em Ciências da Educação. Porto: 2011.
VIGOTSKI. O desenvolvimento psicológico na infância. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
. Imaginação e criação na infância: ensaio psicológico: livro para
professores. Apresentação e comentários de A. L. Smolka. São Paulo: Editora Ática, 2009.
. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
. LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem,
desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone; Edusp, 2012.
VÓVIO. Cláudia L. Entre discursos: sentidos, práticas e identidades leitoras de
alfabetizadores de jovens e adultos - Campinas, SP : 2007.
ZILBERMAN, Regina; SILVA, Ezequiel Theodoro da. Pedagogia da leitura: movimento
e história. In: ZILBERMAN, Regina; SILVA, Ezequiel Theodoro da. et. al. (orgs). Leitura:
perspectivas interdisciplinares. São Paulo: Ática, 1998.
. A Escola e a leitura da literatura. In: ZILBERMAN, Regina e
RÖSING, Tania M.K. (org.). Escola e Leitura: Velha crise, novas alternativas. São Paulo:
Global,2009.
193
APÊNDICE
SESSÃO DE OBSERVAÇÃO - 1ª Leitura - PL
ATIVIDADE: leitura do texto – Dança do Arco-Íris
DATA: junho/julho 2014
Nº DE ALUNOS: 3 alunos
SÍNTESE DA ATIVIDADE: 3 alunos foram convidados à participarem da pesquisa, todos já estiveram presentes em outros momentos, em
outras sessões de observação, de certa forma, já estão acostumados com a dinâmica das filmagens, sendo que na maioria das vezes eles estivessem
acompanhados pela professora e alguns colegas de sala. Essa atividade foi feita em momentos distintos e individualmente, estando presente em
cada sessão o (a) alun(o) a e a pesquisadora. A atividade está organizada em dois momentos: 1º) leitura em voz alta efetuada pelo aluno e 2º)
análise livre sobre o texto lido e intervenções da pesquisadora através de perguntas genéricas e direcionadas.
OBJETIVO: analisar a proficiência leitora de um aluno do 3ºano do ensino fundamental, considerando o processo de compreensão textual, com
base nos níveis das inferenciais: a) de base textual, b) de base contextual e c) sem base textual ( Marcuschi, 2008).
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por um aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de
uma Escola Municipal de Campinas. ( Pedro ) – Junho de 2014
01
02
03
04
05
06
Pesq
Pespq
Pesq
Pesq
Pesq
Depois de já acomodado na sala de informática e o texto já entregue a pesquisador dá o seguinte comando: vamos
começar: O aluno prontamente iniciou a leitura em voz alta, leu com tranquilidade , no entanto , em alguns momentos
teve dificuldade para pronunciar uma ou outra palavra.
Utilizou o dedo para ajudar no processo de leitura. O aluno leu o texto no decorrer de 7 minutos ( 51 linhas).
E aí (Pedro) ? O que você quer falar sobre o texto?
194
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq.
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Eu gostei do texto, porque eles ficavam... eles não tinha comida , eles ficavam caçando as aves e fazendo cordas com as
penas deles .
Aí , um dia ele foi acertar a flecha num pássaro, mas só que ele errou e caiu no chão, aí ele foi tirar a flecha de lá , abriu
um buraco, aí ele botou ... aí ele fechou e saiu , não contou pra ninguém . Aí no outro dia ele voltou, abriu desceu lá
embaixo e conheceu ... conheceu a moça. Aí eles ficaram conversando, aí ele saiu e quando ele voltou ela falou eram uns
animais terríveis que tinham lá embaixo, e ele falou ... falou... é... cada uma falando coisas de cima e de baixo.
Aí depois os de baixo queriam subir , os de cima queria descer, aí ele veno ( pergunta da pesquisadora, quem que é
ele?), o caçador... o caçador quando ele viu seu povo ... não comia mais aves, eles pegavam presentes que os debaixo
davam pra eles... aí ele ficou... aí ele fechou ... e ninguém nunca mais foi pra baixo ou pra cima . Aí eles voltaram a
comer aves , tudo voltou ao normal.
Aí quando ele tava brincando com o cristal , aí ele viu que ... ele viu que o arco-íris ficava mudando de lugar. Aí ele
teve uma ideia , sempre que ela queira descer pra ver os familiares dela, aí ele colocava o arco-íris de um lado, quando
os de cima queriam desce pra baixo, ele colocava de outro. Aí eles ficaram legal , do mesmo jeito que ele não tava
gostando do jeito com a aldeia dele , ele encontrou um jeito deles ficarem juntos.
O que mais, assim , que você achou dessa história?
Ah eu não gostei da parte que ele não gostou que eles descessem e subissem .
Por que?
Por causa que também era só uma aldeia que ficava lá embaixo, eles também tinham que conhecer outras pessoas, né?
Pra conhecer outras coisas , outros animais.
Então você acha que é interessante que eles se relacionassem? O aluno balança a cabeça afirmativamente.
195
30
31
32
33
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
Pesq
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq.
Pedro
Pesq.
Pesq.
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Você já leu algum outro texto que fala sobre essa questão indígena? Texto que fale sobre índio? Já leu alguma outra
coisa?
Ah, eu também já li a lenda do guaraná , que fala que nasceu um índio, aí uma cobra picou ele , aí ele morreu , aí no
lugar que ele foi enterrado, nasceu uma planta que tinha olhos iguais os dele, que era o guaraná. A da mandioca
também e da... qual foi aquela lá que a gente fez dos índios ? ( ele se pergunta em voz alta) .
Que vocês fizeram pesquisa? Sobre os índios? Ah , sobre o que dos índios? Os modos de vida? É, as
culturas ... as plantações.
Ah , entendi, você percebeu alguma diferença ou semelhança entre esse texto e outros que você leu sobre a civilização
indígena? O povo indígena?
Esse texto aqui é diferente dos outros que eu li porque os outros só falavam da plantação, de mulheres grávidas, de
caçadores . Esse daqui fala que o caçador encontrou outro mundo. Que na aldeia dele eles não tinham comida, comiam
aves, que a aldeia era cheia de nuvens .
Essa aldeia ficava em outro lugar né? Que lugar ela ficava, essa aldeia?
A de cima ou de baixo?
A de cima.
Ficava bem pertinho das nuvens. Aí os caçadores iam caçar.
Você quer colocar mais alguma coisa?
Não.
Não. Então tá bom ! Obrigada tá bom.
De nada .
196
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por um
aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. (Pedro).
Julho de 2014 – Segunda-leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
Pesq
Pesq
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Vamos começar...
E aí? Você pensou em mais alguma coisa, além daquelas que você tinha pensado
antes?
Pensei , além de eu ter falado aquilo, é que minha família também não gosta muito de
festa, movimento, essas coisas.
E também não gostam que gente que vão muito lá em casa, tipo na copa , todo jogo do
Brasil, tava indo um monte de gente lá pra casa ver , aí meu pai fazia churrasco, mas
eles não gostavam muito do movimento.
Ah! E o que tem a ver isso com o texto?
Ah, por causa que além de um ficar indo pro outro lado, invés de eles tarem gostando,
num tava gostando. Eles tavam indo tanto, tanto , chega a corda quebrou e construíram
uma escada. Mas depois ele deu uma solução, pra ... quem quisesse subir
, subia e descia, pra namorada dele poderia ir. E que solução que
foi essa?
Ah , foi uma solução pra uma coisa que ... as duas nações poderiam ser ameaçadas por
causa que eles iam tanto de uma lado pro outro... chega que eles não cuidavam
7 min. E 15 segundos de leitura
197
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pesq
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
mais das coisas, não cuidavam mais do gado, da plantação. Aí aos poucos as coisas
iam ficando... iam morrendo né! Aí , então, invés das duas tribos serem extintas ele
fechou o portão, quer dizer “o coisa”.
A passagem né ? O que mais que chamou atenção nesse texto, assim?
Ah, eu gostei por causa que além deles terem muitas plantações, eu também vi que
quando lá em cima tá sol, lá embaixo tá chovendo, e quando tá chovendo em cima lá
embaixo tá sol, aí então ele pode ver isso pelo... cristal.
Humm, entendi! Muito interessante! E daí... mais alguma coisa? Pedro balança a
cabeça negativamente.
Tem certeza?
Ah , eu também queria falar de outras lendas de frutas tipo a do guaraná... foi um
menino que nasceu aí depois a cobra matou ele, aí... aí , onde ele foi enterrado
nasceu...não onde foi colocado os olhos dele, nasceu uma frutinha chamada guaraná,
porque tinha o formato dos olhos dele.
E o que tem a ver uma lenda com a outra?
É por causa que as lendas, além de ser uma coisa assim que as pessoas inventam ,
algumas são verdadeira outras inventadas , outras ainda não se sabem.
Ah, entendi! São histórias fantasiosas? Mas que dizem respeito um pouco sobre a
realidade de um povo.
É
198
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pesq
Pesq
Ah, tá! E porque você acha que chama arco-íris, a dança do arco-íris , o texto?
É por causa que eles ficavam fazendo uma dança, ia pra baixo , outros ia pra cima.
Ah, o arco-íris por causa da namorada dele, que pra ela descê e subi.
E ele fez o que ? Pra ela descer e subir?
Ele ficou movendo o cristal , daí o arco-íris ia pra uma lado e pro outro.
Ah, ficava movendo pra lá e pra cá! E através do arco-íris ela ... o que que ela fazia?
Ela poderia... tipo descê pra ver os parentes dela e depois subi.
Muito bem! Mais alguma coisa? Faz com a cabeça que não.
Muito obrigada, de novo!
199
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por
uma aluna do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. (Elisa).
Julho de 2014 – Primeira-leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
Pesq
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Pesq
Pode começar a leitura Elisa .
Após o término da leitura a p. pergunta: e aí?
Eu achei muito legal porque fala de um índio , de uma índia que... se.... que o índio tava
tentando pegar o pássaro , aí ele atirou a flecha no lugar errado e abriu uma passagem
para outro mundo . Aí , ele desceu lá escondido, aí ele viu uma... uma índia que ele se
apaixonou, os dois se casaram, aí eles namoraram, mas aí a índia subiu pra lá e toda vez
tinha festa, aí ficava um sobe e desce pra i e voltar pros dois mundos . Aí , o índio não
concordou com isso, então ele fechou, ele tapou o buraco, aí depois começou chover de
depois abriu o sol, que ele tava com o cristal, é que ele ganhou da mulher. Aí as nuvens
começaram a sacudir que fez chover, aí o cristal, é ... abriu um arco-íris que fazia... que
se mudasse de posição o arco- íris ia pra outro lugar. Aí ele só permitia que a mulher
descia lá pra visitar a família dela, mas quando as pessoas de lá de baixo queriam subir,
não deixava, porque... ele não concorda com a ideia, mas aí depois ficou assim , ele
virava o cristal e o arco-íris virava pra outro lado.
Por que que ele não concordava com a ideia? Por que ele não concordava com a
subida dos parentes dela?
1º momento/ leitura individual e voz alta: A
sessão foi gravada na sala de informática da
escola. A leitura da aluna foi fluente , e
demorou em torno de 5min. 45 seg. para
fazer a leitura de 52 linhas. “Tropeçou” em
algumas palavras que provavelmente
desconhecia, mas isso não foi empecilho
para que ficasse insegura ou parasse a
leitura, prosseguia de forma bem segura, a
cada “tropeço”. Leu com entonação,
preocupando-se com o todo do texto e não
somente com as palavras.
200
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
Elisa
Elisa
Pesq
Pesq
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Por que ele num... ficava feliz, então ele não deixou , mas a mulher mesmo assim
queria visitar os parentes dela.
Muito bem ! Mais alguma coisa? O que mais te chamou a atenção no texto?
É que... a mulher queria que os parentes dela subiam, só que o homem não deixava ,
porque ele não gostava, porque ficava um sobe e desce, fazia festa todo dia e eu acho
que ele não gostava.
Ele não gostava?
É e ficava... e o povo dele descia lá e ficava pegando coisa. Eu acho que também ... E
o que você acha que ele não gostava?
Ah ... , humm... porque ele é mais quieto. Ele não gosta muito de fazer bagunça. Ah
entendi. Muito bem! Mais alguma coisa?
Não
Então tá bom , muito obrigada!
201
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por
uma aluna do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas.
(Elisa ). Julho de 2014 – Segunda Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
Pesq
Pesq
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Nós vamos fazer agora a segunda leitura do texto : A dança do Arco-Íris com a aluna
Elisa .
E aí? O que que você achou?
Achei legal, porque o homem tava tentando atirar a flecha no pássaro pra ele levar pra
eles comer, só que aí ele errou a mira e foi cair lá no chão, aí começou abrir uma
venda que lá embaixo tinha outro mundo, aí um dia ele foi lá e encontrou uma mulher
que ele se apaixonou e namorou ela. Aí depois é, quando ela ia subir pra visitar ele , os
parentes dela queria subir junto, só que aí o homem não gostava muito, porque ele
achava que era muito chato, ele não ficava mais feliz quando era só ele e o povo dele. E
o pessoal lá de baixo queria visitar o mundo das nuvens né , que eles chamavam. Mas
aí um dia ele tava brincando com o cristal, que a mulher deu pra ele, aí começou
chover depois veio um raio de sol lá de baixo, aí abriu um outro buraco que....e aí a
mulher dele ficava com saudade, aí ele deixava só a amada dele descer. Aí se alguém lá
debaixo queria subir ele virava o cristal e o arco-íris pulava pra outro lugar.
Ele só permitia a passagem da mulher dele.
E essa passagem era feita por onde?
A aluna leu a história em 5 min, 20 seg.
202
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
É ... pelo buraco!
Pelo buraco?
É.
E como ela chegava lá?
Ela descia escorregando.
Por onde?
Pelo arco-íris.
Ah, e porque que você acha que chama a dança do arco-íris, o texto?
Porque eles ficavam dançando e depois disso aparecia um arco-íris?
Que mais? Não tem problema se você não lembrar tá! Mas assim, o que mais que
chamou atenção nesse texto?
Que a mulher gostava de festa e o homem não, e o pessoal lá de baixo queria visitar ela
e ficava brincando lá no mudo das nuvens, ele não gostava , ele não se sentia mais casa.
Humm, ele não se sentia mais em casa , né? É.
Ele foi obrigado a tomar uma atitude! Que atitude foi essa?
Ele teve que tapar o buraco, e só permitia a subida da mulher dele.
Ela ficou com ele lá , né?
É.
203
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Mas ela morria do que?
De saudade dos parentes dela.
E ele arrumou um jeito então.
É.
E qual foi esse jeito? Que você já me contou né?
É.
Você conhece outra história parecida com essa?
Não.
Que fala de outros povos, povos indígenas? Você não se lembra de nada que você já
tenha lido antes disso?
Não.
Então tá bom , quer falar mais alguma coisa?
Não.
Então tá bom.
204
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por um
aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís).
Julho de 2014 – Primeira Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
E aí? O que você achou 4A? Legal.
Legal? Achou legal mesmo?
Aqui quando falou ( o aluno tenta buscar no texto o trecho que ele quer expor),que
tipo pegava o vapor da água, aí eu me lembrei de um negócio que a gente estudou sobre
como é que fazia chover , que o sol aquecia a água , aí fazia nuvens , aí tipo quanto
mais grande a nuvem mais chovia , aí caia a chuva e começava tudo de novo.
Interessante!
E quando falou do arco-íris aqui , falou que ele pegava o cristal e movia para o arco-
íris trocar de lugar . Então , eu também me lembrei bolha de sabão, quando eu brincava
com bolha de sabão , sempre eu via as cores tipo arco-íris, mais ou menos , só que
embaçado .
Hum, que interessante! Muito bom! E que mais você tem , assim, pra falar da história?
Ah sei lá, achei legal!
Da própria história aí ?
Achei legal né, porque ele, o caçador errou o tiro, que ele ia pegar uma ave, errou o
205
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
tiro, aí abriu tipo uma passagem que levava pro mundo de baixo onde ele encontrou é...
uma menina que tipo ele foi se apaixonando. Aí , não sei quem aí fechou a passagem ,
aí eles tipo nunca se encontraram mais.
Quem que fechou a passagem? Aí eu não me lembro.
Ah tá!
Aí o caçador brincava com o cristal, aí lá embaixo começou a chover, aí veio o trovão
Que... o cristal que fez o arco-íris. Aí o caçador ficou mexendo o cristal, que eu já
falei, para o arco-íris mudar de lugar, aí tipo eles se encontraram. Eu acho.
Aqui também tá falando que ( o aluno leu o nome do autor e dados sobre o texto). E
porque você achou interessante isso?
Sei lá, porque os dois se apaixonaram, um ficava em cima e outro embaixo , aí tipo não
dava pra eles se encontrarem. Aí isto daqui , eu acho , que mistura romance , meio
romance com aventura.
206
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por um
aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís).
Julho de 2014 – Segunda Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
E aí? O que que você quer contar a respeito desse texto?
É ... que eu não entendi uma coisa , por que o nome desse texto é a dança do arco-íris?
Por que que você acha?
Não sei, o arco-íris não dança.
Não, o nome do texto é a dança do arco-íris se o arco-íris nem dança. ( rindo,
ironizando a situação)
A não ser que tipo, sei lá, dançaram ou festejaram por que descobriu o negócio do arco-
íris, descobriu sobre o arco-íris?
Interessante sua pergunta, o que que tem a ver , por que se chama a dança do arco-íris?
Então, eu também não entendi nada.
E também , quando falou que ele “coisou” a linha, eu fiquei imaginando se a linha
ficou torta pra eles subir meio que em pé, ou se ficou reta pra poder escalar. Essa parte
eu não tava entendendo.
Aí eu tive que só usar a imaginação.
Aí quando falou que subia e descia e o fio não aguentou, eu acho que a mulher já tava
lá em cima quando o fio arrebentou, aí colocou a escada pra eles poder descer e subir.
Fez a leitura em 12 min.e 27 seg.
Embora o aluno tenha problemas de fono ,
troca o r pelo l, de proficiência na leitura de
palavras e frases, troca muitas vezes uma
palavra por outra semelhante quanto a
grafia. Sua leitura é atenta e com foco.
Comparado aos outros alunos ele demorou
mais tempo para finalizar a leitura do texto,
no entanto, ele se manteve concentrado o
tempo todo, fez uma leitura tranquila e
principalmente é um aluno que procura fazer
várias relações do texto lido com situações
vividas, com outros textos e é bem
questionador.
207
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Até que o caçador quis .... ele quebrou a escada e fechou a passagem e fechou a
passagem.
Por que você acha ?
Não sei, pra eles não se encontrarem mais.
E por que que ele não queria que eles se encontrassem mais?
Você tá fazendo muita pergunta difícil.
Se fechou a passagem foi por algum motivo?
Eu acho que foi pra ele ficar com ela, com a mulher dos sonhos dele.
Humm, muito bem!
Aí, mas a mulher ficava triste porque não tava mais vendo a família. E o caçador fazia
de tudo pra ela ficar feliz , menos abrir a passagem. Aí na tarde ele brincava com o
cristal e o chão tava tremendo, isso significa que lá embaixo havia chuva.
Ele tava brincando com cristal na mão, e aí?
O raio de sol bateu no cristal que saiu o arco-íris. Aí ele descobriu o arco-íris.
E esse arco-íris se tornou o que?
Outra passagem, uma passagem nova.
Uma passagem nova! E o que ele fazia com o cristal?
Movimentava pra poder descer lá embaixo ou subir de lá de baixo.
Quem? Subir e descer de lá de cima e lá debaixo?
A mulher.
208
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
57
58
59
60
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
E ele movimentava o cristal , e esse movimento significa o que? O que significa esse
movimento pra lá e pra cá?
Sei lá.
Pode ser comparado a que? Lembra do título?
A dança do arco-íris. Ah entendi agora, porque ele movimentava ( gesto com a mão) ,
como se o arco-íris tivesse dançando.
Agora descobriu tudo.
Só que eu queria saber , como é que se fica em cima das nuvens e não cai?
Então, por que será ?
Porque quando cê olha assim na nuvem, parece que ela é tipo , sei lá , meio que
transparente , mais ou menos.
Por que neste texto é possível não cair?
Por que é uma história? Por que é uma lenda?
Isso, e o que tem a ver uma lenda....
Lenda não é verdade.
É o que?
Lenda é um conto, tipo isso. Conto inventado pra poder explicar. Aqui foi inventada
essa lenda pra poder explicar o arco-íris , como é que foi feito o arco-íris.
Depois eles descobriram que é por causa da chuva e do sol e não por causa do
cristal...
209
61
62
63
64
65
66
67
68
69
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Quem descobriu?
Isso eu não sei.
Só que aqui , esse tipo de lenda é só pra explicar e também tem lenda urbana pra
deixar a gente com medo.
Existe esses dois tipos de lenda que eu sei. Lenda urbana e lenda inventada.
Mais alguma coisa Luís?
Não.
Obrigada!
210
SESSÃO DE OBSERVAÇÃO - Primeira Leitura ATIVIDADE: leitura do texto – A Origem do
Oiapoque DATA: Agosto de 2014
Nº DE ALUNOS: 3 alunos
SÍNTESE DA ATIVIDADE: 3 alunos foram convidados à participarem da pesquisa, todos já estiveram presentes em outros momentos, em
outras sessões de observação, de certa forma, já estão acostumados com a dinâmica das filmagens, sendo que na maioria das vezes eles estivessem
acompanhados pela professora e alguns colegas de sala. Essa atividade foi feita em momentos distintos e individualmente, estando presente em
cada sessão o (a) aluno ( a ) e a pesquisadora. A atividade está organizada em dois momentos: 1º) leitura em voz alta efetuada pelo aluno e 2º)
análise livre sobre o texto lido e intervenções da pesquisadora através de perguntas genéricas e direcionadas.
OBJETIVO: analisar a qualidade de leitura de um aluno do 3ºano do ensino fundamental, considerando o processo de compreensão textual, com
base nos níveis das inferenciais: a) de base textual, b) de base contextual e c) sem base textual ( Marcuschi, 2008).
Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitas oralmente por um
aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas.
( Pedro).
Agosto de 2014 – Primeira Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
E aí?
Eu achei meio triste essa história, por causa que a aldeia deles não tinha muita comida
e nem água, então ela decidiu sair de lá, aí pra procurar outro lugar, aí ela pediu
pro...pro...Tupã ( o aluno procura o nome do personagem no texto) pra transformar ela
A pesquisadora explicita o dia, mês e ano
que será feita a leitura e o título do texto que
será lido pelo aluno.
Em alguns momentos o aluno utiliza o
211
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pesq
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
em cobra, Aí como ele viu que ela tinha tanta coragem assim, aí ele fez o pedido dela,
aí ela achou um ilha com água e comida, aí ela foi falar pra aldeia dela, só que ela tinha
esquecido de falar pro Tupã tirar o feitiço dela, aí quando ela chegou lá , o bebê
nasceu. Aí todos viram que, então apareceram todos aí viram que um bebê nasceu de
... de uma cobra, aí eles acharam que era bruxaria, aí eles mataram o bebê, aí ela
começou a chorar , aí o choro dela fez um rio, aí ela entrou dentro do rio e adormeceu
no leito, aí depois quando ela chora o volume de água é tanta, o rio transborda e vira
um alagado até as ilhas próximas, aí por isso que o rio ganhou o nome de Oiapoque.
Humm, muito bem ! E o que mais você tem pra falar?
Ah, e eu achei legal porque ela queria deixar o filho dela ... ela queria que o filho dela
vivesse mais do que ela, mas só que depois ele morreu mais primeiro.
Humm, e o que que você acha disso?
É, apesar dela ter esquecido, também eles podiam achar que ela roubou , que a cobra
roubou o filho de alguém , da aldeia.
Muito bem.
E você quer comentar mais alguma coisa? Essa história é parecida com alguma outra
que você tenha lido?
Essa história é parecida com uma que a professora já leu pra gente , que era a lenda de
alguma coisa que eu esqueci, que falava quando o homem tava indo pra floresta, aí
apareceu uma onça , aí ele falou que não era pra matar ele, aí eles fizeram uma troca ,
dedo para acompanhar o texto, estratégia
muito usada em processos de leitura. O
aluno finalizou a leitura em
aproximadamente 4:00.
Durante o processo de recontagem do
história o aluno busca algumas informações
no texto, percebe-se que ele busca
informações pontuais sem a opção de
recorrer a leitura na íntegra.
212
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pesq
Pesq
Pedro
Pedro
a vida dele pelas filhas dele, aí ele foi esperto, ele não queria dar as duas filhas dele pra
ela , aí ele fez duas filhas , aí quando amanheceu elas tinham vida , aí elas foram pra
casa da onça , mas só que tinha dois lugares: a casa do lobo e a casa da onça. Aí cada
uma pegou um caminho, uma foi pra casa do lobo e a outra pra casa da onça. Aí
quando a irmã dela chegou na casa da onça, aí ela falou pra onça que a irmã dela tinha
ido pra casa do lobo, aí depois ... é , eu esqueci o que aconteceu, aí no final a onça fica
com as filhas e ele fica com as filhas dele.
A onça fica com as filhas ? Que ele criou.
Ah, você falou que ele fica com as filhas dele?
Não é a onça que fica ?
Não...ele fica com as filhas dele mesmo, aí a onça fica com as filhas que ele criou.
Humm.
Ele fez de um material assim, esqueci o nome, mas tá lá no meu caderno, na sala.
Hum, que você registrou.
É, que a gente leu na sala.
Ah , tá !E você tem estudado mais textos parecido
com esse?
Você contou esse pra mim, né?
O que você acha desses tipos de textos?
Ah , o outro que eu li era, ele... o homem foi esperto, ele fez ....ele criou as filhas com
um material aí elas tiveram vida na manhã seguinte , mas só que essa daqui, eu achei
213
52
53
54
55
56
57
58
59
60
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
triste por causa que era a coisa que ela mais queria era ter um filho, mas só que o filho
dela morreu.
Essa é mais triste por isso né ?!? E você quer falar mais alguma coisa ?
Não
Então tá bom , tá ótimo.
Obrigada Pedro .
De nada.
214
Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitos oralmente por um
aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Pedro).
Setembro de 2014 – Segunda Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
Pesq
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Já faz um tempo né, que você leu? Não sei se você lembra da história.
Lembrar , até que lembro.
Então, vamos à leitura.
E aí?
É legal.
Por que?
De novo... é legal.
Porque, lá que eu já tinha falado antes, que ela não tinha comida, então a Tarumã quis
ver se tinha mais alguma ilha que tivesse água e comida. Aí ela foi , ela pediu pro Tupã
pra ela se transformar em cobra, ele transformou ela, aí ela passou meses andando...aí
até que ela encontrou a ilha e também, antes eu não tinha percebido que foram por
causa dos fulgos... dos sulcos dela, porque o rio se tornou, porque ela ia andando e a
terra ia... ia abrindo. Aí quando ela começou a chorar , aí a choradeira dela foi toda pra
aquele lado. Aí se tornou um rio.
Ah, uma única coisa que eu não entendi, foi, é como eles tiveram a ideia de dar o
nome de Oiapoque pro rio.
A 2ª leitura do texto foi feita no dia 02 de
setembro. Antes de inciar a leitura a
pesquisadora retoma a 1ª leitura desse
texto.
A leitura foi feita em 4min.
215
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Humm, não sei. Isso, você tem que tentar descobrir.
Ah, isso eu sei que você sabe, mas se tá vendo que é pra mim descobri. É...
Você já ouviu falar desse rio, Oiapoque?
Não.
Você não estudou no projeto de geografia?
Estudei mais ou menos, ah estudei...um pouco desse rio.
Chegou a ver?
Não, vê eu não vi , mas estudar mais ou menos ele eu estudei.
Qual foi a pergunta que você fez mesmo?
Porque esse rio ganhou o nome de Oiapoque?
Por que que você acha?
Humm, será que foi pelo nome da aldeia, ou por causa... ah , não sei porque.
Tem esses textinhos aqui do lado, será que eles podem nos ajudar?
Deixa eu ver .
E aí , depois que você leu esses textos, que complementam a leitura ? você conseguiu
responder sua pergunta?
Consegui.
Então?
É antes de eu falar .... eu.... eu ia falar que era porque... porque era o nome de uma
aldeia .
Linha 28: diante da dúvida o aluno , busca
alguns trechos do texto, fala em voz alta O
Tarumã, Oiapoque, Oiampi... e responde
fazendo relação com o nome da aldeia.
Linha 30: prontamente o aluno inicia a
leitura dos textos complementares sobre a
região norte do Brasil . Na passagem que
fala da nação Oiampi , o aluno para de ler e
diz : Ah , agora eu entendi!.
216
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
57
58
59
60
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
E é isso ?
É ( todo sorridente porque acertou ). É a casa de Oiampi.
Então , o nome do rio?
É Oiampi.
Se origina por causa....
De Oiampi. ( ele ficou radiante, muito feliz)
Mais alguma coisa?
Ah, eu... eu também quase cheguei pertinho da resposta ...eu ia falar que era o nome de
uma aldeia, aí você pediu pra mim lê isso daqui ... mas eu tava pensando em falar que
era o nome de uma aldeia.
Então tá vendo, que bom né! Você acertou!
É.
E assim, pelo que você já estudou do projeto de geografia, pelos outros textos que
você já leu parecidos com esse, o que você pode contar?
Ah, e também lá na prova, pediu pra falar de uma lenda , aí eu tentei falar de algumas
lendas, aí eu lembrei da origem do Oiapoque.
Ah, você lembrou desse texto que você já tinha lido.
Mas só que invés dela te o bebê ... quando ela chegou na porta , ela tava procurando o
bebê dela.... porque até tinha esquecido um pouco do texto.
Hum, entendi.
217
61
62
63
64
65
66
67
68
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
E aqui também, é verdade isso daqui que a lua tem 2,5 vezes maior que a do sol. Além
dela ser mais próxima da terra , o sol também ... quando a terra tá longe do sol, ela é
fria , quando ela tá muito perto, ela é muito quente e quando a terra tem a posição
certa , nem muito quente , nem muito frio.
Então tá! Mais alguma coisa, Pedro ?
Não.
Muito obrigada!
218
Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitas oralmente por
uma aluna do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas.
( Elisa).
14 de agosto de 2014 – Primeira Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
E aí? Você gostou da história? Não gostou? O que você achou? Eu gostei.
Hum, e o que você pode me contar?
Eu gostei porque eles viviam em uma aldeia, onde a fome tinha atingido eles e havia
pouca caça e quase nenhum peixe, e a seca acabara com as plantações de mandioca,
com as árvores frutíferas, aí a mulher tava grávida ... uma mulher chamada ( a aluna
procura o nome no texto) Tarumã, ela estava grávida, ela decidiu sair para achar um
lugar onde tinha comida, é... água pra aldeia dela, aí ela pediu pro Tupã, que queria ser
uma cobra pra procurar né, aí quando ela, ela avisou e toda vez que ela passava lá
deixava uma rastro né, aí ela chamou o povo dela, ela tinha achado uma aldeia ... não
uma aldeia, um lugar . Aí eles construíram as casas , tinha água, tinha comida, aí ela foi
lá e chamou, aí quando eles tavam indo, aí o bebê tinha nascido, aí a Tarumã teve a
filhinha dela bem na entrada do povoado né.
Aí quando as pessoas viram que a criança tinha nascido de uma cobra, acharam que
fosse algum tipo de bruxaria mataram o bebê, aí a Tarumã ficou louca de dor , mas não
atacou sua gente expressou
A pesquisadora faz uma introdução dizendo
a data da gravação e que é a primeira leitura
desse texto.
A aluna lê o texto em 3:43. Após a leitura a
aluna a faz silêncio, olha para o texto depois
para a pesquisadora, que faz uma pergunta
para que a aluna inicie sua fala.
Na linha 5, a aluna utiliza a palavra acabara,
ela recorreu ao texto que estava disponível,
pois não foi retirado o mesmo após feita a
leitura.
É perceptível que a aluna em alguns
momentos recorre ao texto para recontar a
história, no entanto ela faz isso com muita
facilidade, parece que já sabe onde está o
219
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Pesq
Pesq
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
a tristeza dela com um choro tão prolongado que as lágrimas preencheram os sulcos
que seu corpo havia cavado na mata, aí formou tipo um rio, porque ela era grande.
Isso.
Aí quando perdeu o bebê , ela não quis mais ser gente, ela também tinha esquecido de
falar pro tupã que queria ser gente de novo, aí pra ela se esconder do mundo, ela
mergulhou no rio de suas lágrimas e adormeceu no seu leito. Aí , na aldeia, os índios
contam que as águas do rio ficam revoltas nas noites de lua cheia e quando a Tarumã
suspira pela falta da filha, e quando ela chora o volume de água aumenta tanto que o rio
transborda e forma um grande alagado, até as ilhas mais próximas, foi assim que o rio
ganhou o nome de Oiapoque.
Então você me contou toda a história né?! Então, eu quero saber assim também, que
parte você mais gostou? Se você conhece alguma outra história que tenha a ver com
essa, o que você pensou sobre ... quando tava lendo essa história, se você lembrou de
alguma outra.
Ah... eu gostei mais da parte que ela tava chegando na aldeia e o bebê nasceu.
Hum, por que?
Porque aí é...teve a filhinha bem na entrada do povoado, quando as pessoas viram que
era uma criança nascida de uma cobra, aí elas mataram o bebê.
E você gostou disso? Que mataram o bebê?
Não, que eu achei legal que uma criança nasce de uma cobra, uma criança normal
trecho que pretende buscar para ajudá-la no
reconto.
220
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
57
58
59
60
61
62
63
64
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Pesq
Pesq
Pesq
Elisa
nascer de uma cobra.
Ah, o que você achou de legal nisso.
Porque eu nunca tinha visto uma criancinha nascer de uma cobra né!
Ah, então você achou interessante. Mais alguma coisa?
Ah , eu não me lembro de nenhuma.
É?
É.
Eu também achei legal a parte que ela quis se transformar em cobra só pra achar um
lugar pro povo dela ficar.
Hum, porque que você acha legal isso?
Porque ela tava ajudando a família.
E você acha importante isso?
A aluna faz sinal que sim com a cabeça.
Por que?
Ah , porque é a sua família, se tem que cuida dela, agora eu tenho dois irmãozinhos, eu
cuido deles.
Humm, isso mesmo.
Você acha isso importante então?
Faz com a cabeça que sim. Então ela teve uma boa ação?
Teve.
221
65
66
67
68
69
70
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
E mesmo ela tendo uma boa ação ela sofre né, depois.
Rurum
Mais alguma coisa Elisa?
Não
Então tá bom , por hoje é só.
222
Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitos oralmente por
uma aluna do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas.
(Elisa ). Segunda-leitura
24 de setembro de 2014
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
P
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Então?
Ah, eu gostei, porque fala de uma mulher que morava em uma aldeia que, muitos anos
atrás né, a fome atingiu a aldeia dessa mulher né. Aí, ela tava grávida né, e ela não ia
consegui é...amamentar a filhinha dela que ela tava grávida né.
Aí depois, ela falou que ia procurar um lugar pra eles morarem que tinha árvores
frutíferas...é... água, caça, peixe, porque todos estavam doentes né, os bebês , os velhos
estavam quase morrendo né.
Aí, depois é ... depois é... de alguns dias... é... ela tava sozinha na mata né, aí Tarumã já
não tinha mais esperança, que ela não tinha achado, já tinha passado alguns dias, aí ela
começou a chorar com saudade de tudo que ela deixou pra trás né, em desespero ela
pediu pro tupã transformá-la numa cobra, de modo que ela pudesse é... ficou em volta
da floresta pra ver se tinha algum lugar onde eles podiam né... é.... aí a... pra encontrar
um lugar adequado para o povo dela construir outra aldeia né, que lá já não tinha mais
tanta coisa, aí ele ficou tão admirado com a coragem da moça que deus atendeu ao
pedido dela, né.
223
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Aí, durante meses né, aquela grande cobra vagou em busca de um local que houvesse
comida e água né, carregando o bebê , seu peso era tanto que por onde ela passava, ela
deixava os sulcos profundos no chão, né.
Aí depois, quando finalmente ela encontrou um vale cortado por um riacho com muitas
árvores frutíferas e caça nas redondezas, então a índia-cobra ficou muito feliz, que ela
não tinha .. é... é , não era mais uma índia né, e falou que era uma índia-cobra, aí depois
quando ela foi avisar o povo dela né, que eles já tavam indo pra lá.... é.... ela tinha se
esquecido de pedir pra ser gente de novo né, a criança nasceu né, aí as pessoas viram
que o bebê tinha nascido de uma cobra, acharam que era uma bruxaria né, aí elas foram
e mataram o bebê . É que.... aí a Tarumã ficou tão triste que as lágrimas dela é.... fez os
sulcos é se encherem de água né.
Aí , ela depois é, não queria mais ser gente porque ela mergulhou lá no rio onde ela fez
aí... noites de lua cheia é, ela chorava tanto que a água até fazia alagamentos, né. Aí
depois é ... foi assim que o rio ganhou o nome de Oiapoque.
Humm, muito bom ! E o que mais você tem pra dizer dessa história ? Que...
muito estranho né , um bebê nascê de uma cobra.
Isso é possível ?
Não, acho que não.
E porque aqui é possível?
Porque é uma lenda.
224
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
57
58
59
60
61
62
63
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Pesq
Pesq
Humm, em uma lenda é possível acontecer isso?
Raram !
Por que?
Porque não é real.
Mas nada que tá aqui é real?
Acho que só as aldeias né, que existe índio , né.
Humm, muito bem !
Mas as outras coisas, acho que não.
Muito bem, e porque chama a origem do Oiapoque?
Porque a mulher mergulhou no rio e ficou lá por muitos anos, aí o rio foi até... ele
ficou conhecido como o nome de Oiapoque né.
Entendi.
E essa história te fez lembrar de alguma outra que você já tinha visto?
Não.
Estudado em sala de aula?
Não.
Humm, nunca viu uma parecida com essa? Balança a cabeça
que não.
Entendi.
Que seja uma lenda , por exemplo, que não fala da Tarumã , fala de outras coisas, você
lembra?
225
64
65
66
67
68
69
70
71
72
73
74
75
76
77
78
79
80
81
82
83
84
85
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
3B
3B
3B
3B
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Nós já trabalhamos a lenda do guaraná, a da mandioca e mais outras aí que eu não
lembro.
E o que elas têm em comum com essa?
Nada.
Mas eu só sei que nós trabalhou várias lendas.
Então não tem nada em comum?
A do guaraná é que o menino foi picado pela cobra que era o jurupai, o espírito do mal
né, aí ele morreu. Aí o tupã .... eu acho que é o mesmo deus, o tupã... é ... ele falou que
era pra ... é... quando é, pra quando é, teve várias trovoadas né , mas aí , o povo quando
viu é que o indiozinho morreu né, que é o (?) e a mãe dele queria tanto um filhinho, aí
depois o tupã falou que era pra plantar os olhos do menino que ia nascê uma planta
milagrosa , que era o guaraná.
Então você identificou né ? Que é o mesmo deus.
Balança a cabeça positivamente.
Então você encontrou uma semelhança.
Risos.
Mais alguma coisa 3B?
Não.
Então tá bom, muito obrigada.
226
Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitas oralmente por um
aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís).
15 de agosto de 2014 – Primeira Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Pode começar.
E aí? O que você achou ? O que que você me conta ( após a leitura).
Legal.
É !
Porque essa história... posso reler tipo isso... reler só que não ler, conta!
Sim.
Que, muitos anos atrás, uma aldeia ficou com muita fome, aí as crianças que ficou
doente, os bebês e os velhos tavam morrendo... só que a Tarumã, eu acho que é Tarumã
mesmo, tava grávida, aí ela fugiu pro seu bebê não morrer, aí com fome e sede, ela
pediu, acho que foi pra Deus, sei lá quem aí, transformar ela em cobra, aí não sei
quando aí, ela virou cobra mesmo, aí finalmente , uns meses, ela achou a aldeia e ficou
toda alegre. Aí os índios que viram o bebê, tipo filho da cobra, aí acharam que era
bruxaria e matou o bebê, aí a cobra ficou triste, mas mesmo assim não quis matar os
índios, aí o resto eu já esqueci... não sei que aconteceu aí que eu já esqueci. Ah, ela foi
pro mar, aí de tanto ela chorar, o mar tipo aumentou.
O mar?
A gravação foi iniciada com algumas
informações relatadas pela pesquisadora,
como dia, mês, ano e 1ª leitura do texto. Em
seguida foi pedido para que o aluno iniciasse
a leitura.
A leitura foi feita em em 7:35.
227
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
Deixa eu ver se é o mar ( procurou informação no texto), foi no rio né .... “o rio
transborda forma-se uma grande alagado”( trecho lido pelo aluno).
Aí por isso que agora o rio é chamado... tem um nome, ganhou um nome de Oiapoque.
Muito bem !
Por isso que é a origem do Oiapoque.
Sim , e o que mais que você pode contar pra gente ?
Posso ler esses pedacinhos aqui ó, que tem ? ( o aluno se refere aos textos informativos
que estão nas quatro pontas das páginas) .
Pode.
Estranho... agora não tô entendendo, se aqui tarumã é a cobra né, e aqui a tarumã é uma
árvore ou cidade ou fruta , agora já não tô entendendo não. Confundiu tudo agora. Ah ,
você acha que confundiu tudo?
É porque aqui tá falando que tarumã é uma cobra.... na verdade é uma índia cobra né, e
aqui , depois que eu li esse pedacinho, piquititico, eu vi que tarumã uma .... “tupi quer
dizer fruta que dá em cacho, o côco é uma das outras frutas também chamadas de
tarumã e a árvore é chamada também de tarumã”( trecho lido do texto informativo).
Então, porque será que é diferente? Em um texto a tarumã é uma coisa e no outro texto
a tarumã é outra? Por que você acha?
Ah, eu não sei !
Imagina! O que que você pode pensar?
Linha 23: após ler as informações sobre a
culinária do norte, especificamente os pratos
feitos à base de mandioca e e a origem da
tarumã, que é uma árvore, que produz uma
espécie de côco, o aluno indaga faz algumas
indagações importantes nas págs. 26 e 27.
228
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
57
58
59
60
61
62
63
64
65
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Pesq
Luís
Eu acho que tarumã ficou tão famosa assim, que deu o nome também de árvore e
frutas.
Porque ela ficou famosa, ah entendi.
Tipo isso, ficou tão conhecida assim.
E esse texto, é um tipo de que texto, esse aqui que você leu grande, que fala da índia
tarumã ?
Que tipo de texto?
Lenda.
E, esse outro que fala que a tarumã é uma árvore?
Eu acho que é um texto mesmo.
Existe diferença entre um e outro?
Que um é maior e o outro é menor?
Isso. E a forma de contar , né?
É aqui conta uma lenda e aqui conta sobre tarumã , não tarumã que tá na lenda, tarumã
que é uma árvore, tarumã da árvore , da fruta.
E qual a relação entre essas duas tarumãs?
O nome.
O nome, muito bem !
Você acha que é só o nome?
Eu acho que é só o nome .
229
66
67
68
69
70
71
72
73
74
75
76
77
78
79
80
81
82
83
84
85
Pesq
Pesq
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
É pra gente pensar , não estamos aqui falando certo ou errado. A gente tá tentando
entender , né? Você acha que é só o nome, então tá bom .
E o que mais você gostaria de falar?
Têm esses três pedaços, ainda, que sobrou. ( o aluno se refere aos outros textos
informativos).
Então pode ler.
Então aqui tá falando um pouco. (o aluno para a leitura quando descobre uma
informação sobre a origem do nome Oiapoque, no texto informativo).
Tá falando o que?
Que Oiapoque que é aquele rio, é a casa do oiampi. É , acertei agora.
“O rio Oiapoque faz a fronteira entre o Brasil e a Guiana Francesa , percorrendo todo o
norte do Amapá” ( trecho lido pelo aluno) . Agora só falta esse “pedação” ( referência
ao texto).
Se você não quiser ler , não tem problema .
Não, eu vou ler mesmo.
Muito bem 4A, após término da leitura.
Então, agora que falou o negócio da lua.... aí eu me lembrei de um filme, meu malvado
favorito, que ele rouba a lua, aí tipo a água fica bem , mas bem baixa mesmo. Aí fique
imaginando a lua se a lua tem a ver com a água, sem alguma coisa a ver com a água.
Se a lua fez a água existir , tipo isso.
Linha 60: Quando penso que ele está
cansado e não quer falar mais nada, ele
ainda se propõe a ler dois textos curtos que
complementam a lenda com informações
sobre a região norte. A atitude dele é muito
espontânea , ler não é algo cansativo e que
tem um caráter escolar e obrigatório. Esse
aluno demonstra curiosidade e interesse a
partir da leitura do texto e tem a prática de
fazer pergumtas, pra sua interlocutora, pra
si mesmo e utiliza o texto para ampliar
informações.
230
86
88
89
90
91
92
93
94
Pesq
Pesq
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Então nós vamos combinar assim , semana que vem vc. Fará a segunda leitura do texto
e essas dúvidas que você teve com relação a tarumã árvore , a tarumã índia, a relação
entre lua e água , você vai pensando pra gente tentar responder semana que vem.
Outra coisa , essa cobra aqui ( referência ao desenho ) quero saber se significa alguma
coisa , porque a cabeça dela é azul.
Então outra coisa pra você refletir. Combinado?
Humm
Então até a próxima semana.
231
Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitos oralmente por
um aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís).
25 de Setembro de 2014 – Segunda Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Muito bem, e aí? ( após a leitura )
É, eu gostei porque fala de uma mulher, a Tarumã , acho que é o nome, que ... a aldeia
dela que tava tudo... ela ficou doente, morrendo, ela quis fugir pra salvar seu filho, não
tinha comida e nem água, ela pediu para tupã transformar ela em cobra.
Aí , ela achou .... esqueci o lugar, que tinha água e comida e frutas.
Aí, quando ela foi chamar o povo, ela esqueceu de falar pra tupã desfazer o pedido, aí
o bebê tinha nascido quando ela chegou perto do povo, aí todo mundo pensou que era
bruxaria, porque uma criança nascer de uma cobra. Até que isso não é comum né?
(risos).
Aí, mataram o bebê , aí a cobra Tarumã chorou, não sei, formou um riacho, um rio, aí
quanto mais ela chorava, mais aumentava, até que , e foi assim que esse rio ganhou o
nome de Oiapoque, agora entendi porque o nome é a origem do Oiapoque.
Ah, você entendeu então? Por que?
E agora? Não sei.
Você falou que entendeu...
É a origem do Oiapoque porque aqui fala, que por conta das lágrimas da cobra, fez um
Leitura foi feita em aproximadamente 5:50.
232
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
Luís
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
rio né que ganhou o nome Oiapoque.
Muito bem .
Só que eu não sei porque o nome tinha que ser , principalmente Oiapoque.
Isso que eu queria saber.
Hum, porque será ?
Mais alguma coisa ?
Não que eu sei, não que eu me lembro.
Lê um trechinho ali do lado ó, essa parte.
Ah tá, então , assim , o rio é a casa do Oiampi.
Entendeu? Muito bem.
Mais ou menos, tudo mais ou menos.
Quer falar mais alguma coisa ?
Não.
Linha 24 - Percebendo que o aluno ficou
com dúvida ao ser indagado sobre o
significado do nome Oiapoque, a
pesquisadora pediu para que o aluno lesse
um texto informativo, que está em um dos
cantos da página e explica a origem do
nome Oiapoque. No decorrer da leitura o
aluno , fala baixinho , entendi.
233
SESSÃO DE OBSERVAÇÃO - 1ª Leitura
ATIVIDADE: leitura do texto – Romãozinho
DATA: Novembro de 2014
Nº DE ALUNOS: 3 alunos
SÍNTESE DA ATIVIDADE: 3 alunos foram convidados à participarem da pesquisa, todos já estiveram presentes em outros momentos, em
outras sessões de observação, de certa forma, já estão acostumados com a dinâmica das filmagens, sendo que na maioria das vezes eles
estivessem acompanhados pela professora e alguns colegas de sala. Essa atividade foi feita em momentos distintos e individualmente, estando
presente em cada sessão o (a) alun(o) a e a pesquisadora. A atividade está organizada em dois momentos: 1º) leitura em voz alta efetuada pelo
aluno e 2º) análise livre sobre o texto lido e intervenções da pesquisadora através de perguntas genéricas e direcionadas.
OBJETIVO: analisar a qualidade de leitura de um aluno do 3ºano do ensino fundamental, considerando o processo de compreensão textual,
com base nos níveis das inferenciais: a) de base textual, b) de base contextual e c) sem base textual e contextual ( Marcuschi, 2008).
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãzinho, feitos oralmente por um aluno do 3º
Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Pedro).
Novembro de 2014 – Primeira Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
6
Pesq
Pedro
Pedo
Pedro
Pedro
Pedro
Muito bem , e aí?
Fala que ele, o Romãzinho era malcriado e era preguiçoso, os pais dele eram boas
pessoas, aí um dia a mãe pediu pra ele levar o almoço do pai , mas aí quando tava no
caminho, ele comeu toda galinha, aí ele levou pro pai, aí ele enganou o pai falando
que a mãe dele e outro homem tinham comido a galinha e botado os ossos na cesta
pra ele trazer, aí o homem ficou furioso e matou a mulher. Aí, antes da mulher, da
234
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
mulher dele morrer, ela amaldiçoou ele, aí até hoje ele ainda fica vagando pelas ruas,
maltratando os bichos, dando nó no rabo dos cavalos e dando medo nas pessoas.
E, você já conhecia essa história?
Já, na sala a gente já tinha lido essa história.
Hum, a professora deu esse texto pra vocês já ? Ela deu esse texto pra explicar o que?
É, ela deu pra explicar... é a gente começou a fazer o centro-oeste, a í a gente
começou com a história de Goiás.
Hum, vocês estudaram o centro-oeste porque? Faz parte do que?
Faz parte do projeto que a gente tá fazendo ... é ... é, só não lembro o nome ( fica
pensativo) .
O que vocês estudam nesse projeto?
A gente tá estudando todas as regiões, a gente estudou o norte, agora a gente tá no
finalzinho do nordeste e tá começando o centro-oeste.
Hum, que interessante.
Aí , depois a gente vai pro sul.
E vocês lêem bastante texto nesse projeto?
Hãm ! ( sinaliza com a cabeça que sim).
E quais os textos que vocês leram?
A gente leu da lenda da mandioca, do guaraná, é ... a do Romãozinho ...
Pode citar só o que você lembra, o que você não lembrar não tem problema.
235
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Ah, têm várias outras , só que eu não lembro.
Ah, tá ! E vocês estudam elas, quando vocês estão estudando a região?
É.
Ah, entendi! Então essas vocês já leram?
Sim.
E você queria falar mais alguma coisa a respeito dessa ?
Ah, quando a professora leu pra gente , eu faço a mesma pergunta : por que ele era
tão malcriado se os pais dele eram tão bonzinhos?
Você ficou com essa dúvida? Por que será hein? O texto explica isso ?
Não muito.
Não né? E o que você acha ? Que explicação você pensa pra isso?
Vai ver os pais dele criaram ele bem e depois ele, que quando foi crescendo foi se
tornando malcriado.
Por que você acha que isso pode acontecer?
Por que já várias famílias , elas criaram o filho educado, aí depois eles vão crescendo
e ficando malcriados .
E porque você acha que isso pode acontecer?
É , porque ... às vezes... é , por causa de um amigo, de alguma coisa que deixou ele
nervoso.
Hum, você acha que pode ser isso então?
236
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
57
58
59
60
61
62
63
64
65
66
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
A companhia né, de algum amigo.
Mais alguma coisa 1A, que você queira falar, queira colocar?
Eu também não entendi uma coisa ... então porque fala que ele ainda era menino ... se
ele se transformava num fogo azul?
Por que será que ele se transformava num fogo azul ?
Vai ver foi a maldade dele.
E você acha realmente que uma pessoa pode se transformar num fogo ?
Ah, vai saber né ? Acontecem várias coisas aqui no nosso mundo.
Ah, entendi!
Aqui, esse fogo azul era do bem?
Não.
Eu não sei explicar porque ele se transformou num fogo azul. O texto explica? Não
também né?
Não.
E o que você imagina?
Vai ver ele se transformava por causa da raiva.... do.... ficar nervoso.... querer
maltratar as coisas .
Mais alguma coisa?
Não.
Então, muitíssimo obrigada.
237
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãzinho, feitos oralmente por um aluno do 3º
Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Pedro ).
Novembro de 2014 – Segunda Leitura
Comentários
01
02
03
04
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Muito bem! E aí?
Essa Chapada dos Veadeiros, eu li um livro que também era de assombração, aí eu
não lembro se era de lobisomem ou era do corpo seco que parece que passou por ali.
Aí falava ... as histórias de assombração falavam do lobisomem, do saci-perê, do
curiango e do corpo seco.
Hum, é de história de assombração do Brasil? De personagens da história do Brasil ?
É.
É... a do saci-pererê falava que o saci era malvado e fazia .... maltratava as coisas , ele
ficava aprontando que nem o Romãzinho. Aí o corpo seco fala que se você bate no
pai você se transforma em um corpo seco, tipo um... uma ... é um tipo de zumbi, aí do
lobisomem fala de ... o livro fala de pessoas de ter certeza de ter visto essas coisas .
Nossa, que interessante né? E esse livro você leu... é daqui da escola?
É, na sacola da leitura.
Ah, que você levou pra casa pra lê?
O nome é histórias de assombração, tem 3 autores , foram os 3 que têm certeza que
viram essas coisas.
Leitura feita em 3:00.
238
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Ah , e você lembra o nome dos autores ou não ?
Não lembro não , acho que um dos autores chama Ricardo Rocha.
Ah, você escreveu no seu caderninho de registro? A história?
Acenou a cabeça que sim.
Ah, que legal!
Aí no final aparece a foto dos 3 e aparece os lugares onde aconteceram aquelas ... as
coisas, aí eu vi Chapada dos Veadeiros.
Lá também fala da Chapada dos Veadeiros, e onde fica a Chapada dos Veadeiros?
É... daí eu já não sei.
Será que aí no texto não fala?
Esse texto aqui é da centro-oeste não é ?
É do centro-oeste.
Então é do centro-oeste.
Como você sabe que esse texto é do centro-oeste?
É porque a gente já tinha lido na sala e a gente tava fazendo é ... o projeto “Viajando
pelo Brasil desvendando nossas origens”, aí a gente foi do norte pro nordeste, aí a
gente estudou o centro oeste , aí a gente estudou o sudeste e agora a gente tá no sul.
Em todas essas regiões vocês leram algum texto?
Sempre alguma lenda ... tem de pessoas ... de como surgiu a mandioca, o guaraná.
E essas lendas ajudaram vocês a compreenderem a região?
239
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pesq
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Sim, e a compreender também os negros ...
E o que mais?
Os negros eram bem maltratados pelos portugueses .... eles davam comida no chão
pra eles.
Ah, entendi. Estudando as regiões do Brasil vocês foram vendo como era o dia-a-dia
da época da escravidão, né?
É importante saber dessas coisas né? Da nossa história né?
A gente estudou a história do Chico Rei, que falava de um homem que era escravo, aí
sua família também foi, aí ele foi separado da família só ficou seu filho , aí eles
começaram a libertar os escravos colocando pó de ouro no cabelo.
E como que eles libertavam com esse pó de ouro?
Eles iam economizando, aí eles falavam com o ... com o moço pra ele... aí eles davam
pó de ouro ... aí eles libertavam ....
E compravam, a liberdade. E você sabe o que eles compravam, como era o nome?
Carta ....
De... a professora, a gente escreveu um texto, aí ela falou o nome , mas acabei
esquecendo.
Carta de alforria.
É isso daí.
Pra ficar livre , né ?
240
57
58
59
60
61
62
63
64
65
66
67
68
69
70
71
72
73
74
75
76
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pedro
Isso mesmo, muito bem!
Aí ontem a gente fez avaliação, aí apareceu pra colocar a história de Chico Rei .
Ah por isso que tá viva a história do Chico Rei na cabeça né ?!
É.
Ah que legal ! Muito bem!
Mais alguma coisa?
Ah, e também a roca é bem famosa no centro-oeste.
Ah é, porque?
Ela é uma forma de fazer roupas. Acho que foi no primeiro ano ou no segundo que a
gente fez um livro , era tipo uma canção, aí a velhinha fiando na roca, aí veio a
mosca, aí veio a aranha, aí foi indo.
E você sabe o nome desse texto?
Eu não lembro mais não, porque faz muito tempo que a gente estudou ele.
É a velha a fiar.
É isso daí.
É um livro não é ?
É, a gente leu e depois a gente fez o nosso próprio livro , copiando dele.
Ah, que legal!
Aí a gente fez uma apresentação da velha a fiar, aí cada um era uma coisa , aí no
final era a morte.
241
77
78
79
80
81
82
83
84
85
86
87
88
89
90
Pesq
Pedro
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Pedro
Pesq
Ah , entendi. Mais alguma coisa 1B?
É, e também no saci tem ... a professora falou que o saci tem vários nomes em cada
região, e aqui tem o saci de Goiás.
E o saci de Goiás é o ...
Nessa região o saci é o Romãzinho.
Ah, muito bem, isso mesmo. Excelente.
Cada região faz uma história diferente do saci .
Muito bem, ótimo! Mais alguma coisa ?
Deixa eu ver ... começou a ler o texto complementar
Essa é a característica da Chapada , né?
Aí também tem a culinária... e aqui fala da roca.
Ótimo, perfeito, mais alguma coisa?
Acena a cabeça que não.
Muito obrigada.
242
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãzinho, feitos oralmente por uma aluno da
3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Elisa ).
18 de novembro de 2014 – Primeira Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
E aí?
Eu gostei, né!
Por que que você gostou?
Sim e não né? Porque o Romãzinho era malcriado e preguiçoso, ele fazia só coisa
ruim né. E, quando a mãe dele pediu pra levar comida lá pro pai dele... o pai dele que
tava lá trabalhando na roça.... é, ele atendeu com má vontade .... no caminho ele abriu
a cesta e comeu tudo e foi lá e levou pro pai dele né, e ele inventou uma brincadeira
que a mãe dele almoçava galinha com homem que vai lá na casa dele quando o pai tá
trabalhando né, e falou que quando eles acabaram de comer colocaram tudo os ossos
na cesta pra ele levar né. Aí o homem tava trabalhando na terra havia horas... aí ele
tava louco de ciúmes e raiva né.... ele foi lá pra casa dele correndo né , ele pegou a
faca e enterrou no peito da mulher , a mãe dele acabou morrendo por causa de uma
brincadeira que ele fez e aí ela amaldiçoou ele né. Enquanto o mundo existir ele vai
ficar vivo ainda, aí é o homem depois logo morreu né, porque ele ficou doente de
desgosto né. O menininho nem se abalou, o Romãozinho, porque ele não era
bonzinho, senão ele ia ficar triste. Aí, conta na história que ele ganhou o mundo, né.
Leitura feita em 2:12
243
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Pesq
Elisa
E o que é ganhar o mundo aí na história?
Não sei.
É ?
Aí é, quando a mãe dele morreu e amaldiçoou ele, é como se o tempo tivesse parando
na vida dele né, porque maldição de mãe pega ( risos) .
É né , verdade (risos).
Aí, é, ele fica vagando pela estrada espalhando medo né. Aí um dia a pessoas viram
ele transformando num fogo azulado, né. O destino dele é vagar pelo mundo enquanto
o mundo existir .
Então é isso aí que é ganhar o mundo né? Ficar vagando pelo mundo.
E o que você acho dessa “brincadeira” aí, que ele fez com o pai dele?
Muito feio.
Será que isso é brincadeira, mesmo? O que você acha que é?
Que não ama a mãe, que não ama o pai, acha que é uma brincadeira legal, mas na
verdade não é. Destruiu a própria família dele.
É verdade, isso foi horrível né?
Rurum.
E você queria falar mais alguma coisa Elisa, a respeito do texto, assim, que você
lembra? Você já conhecia esse texto?
Sim , nós já leu lá na sala.
244
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
Pesq
Elisa
Elisa
Pesq
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Pesq
Elisa
Pesq
Ah!
E quando eu cheguei em casa eu fui ler lá pra minha mãe e pra minha madrinha, que
tava lá né. Aí, ela falaram também do texto.
Você leu esse texto pra sua mãe e sua madrinha?
Ah, e porque você leu esse texto pra elas?
Porque eu gosto de ler ...
E você achou interessante e quis contar pra elas?
Acenou a cabeça que sim.
Ah e o que elas disseram?
Ah, que .... não lembro , que já faz um tempinho né! Mas falou mais perto da história.
Entendi.
E você queria falar mais alguma coisa?
Não.
Então, muito obrigada!
245
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãozinho, feitos oralmente por uma aluna do
3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Elisa ).
27 de novembro de 2014 – Segunda Leitura
Comentários
01
02
03
04
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
Pesq
Pesq
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Muito bem! Leu rapidíssimo hein!
Você lembrou de alguma coisa, pensou em alguma coisa a mais que você não falou na
última leitura ?
Hum , mais ou menos.
Pensou? O que que você pensou ?
É , eu gostei mais ou menos porque essa história fala que morreu a mãe e o pai né e ,
ele nem se abalou. Quando morre alguém da família todo mundo se abala que fica até
semanas sem ri.
Ele não, ele saiu de casa ganhou o mundo e a mãe amaldiçoou ele , como se isso fosse
que .. parou o tempo quando ele era menino, quando sua mãe morreu né .
Rumrum
E ele deve ter se transformado num fogo azulado deve ser que ele era tão mau tão
mau que... eu acho triste também é ... maltratava os bichinhos né, arrancava as plantas
... ficava fazendo um monte de coisa ruim.
É né? Isso é bem ruim!
Por onde ele passa , ele espalha o medo ... um medo que ninguém sabe explicar.
246
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Hum, você leu com a professora na sala de aula esse texto?
Li
Ah , e como foi quando vocês leram?
Nós fizemos uma leitura junto com a professora, depois nós pegou nosso caderno e
escreveu algumas coisas.
Humm e vocês leram esse texto dentro... que trabalho vocês estavam fazendo?
É, as regiões.
Ah , e de que região é esse texto aí? Falou aí o nome né .
Goiás.
Que região que é Goiás?
Fica pensativa e diz que não lembra. Não lembra ?
Faz com a cabeça que não.
Mas alguma coisa que você queira falar sobre o texto?
Humm, não.
Você já leu bastante ele, né? Já conhece bem a história né?
Ah e tamém quando eu cheguei em casa é... eu fiz a mesma coisa que nós fizemo lá
na sala com minha mãe e minha madrinha. Eu li o texto pra elas e elas comentaram
também.
Ah! E o que elas comentaram?
Que é muito feio fazer as coisas que ele fazia, que ele se transformava em fogo
247
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Pesq
Elisa
Elisa
Pesq
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Elisa
azulado
Ah!
Comentou sobre o texto.
Esse texto ... que tipo de texto é esse daí?
Ele é um texto de jornal ? Que texto ele é ?
É uma lenda.
Porque ninguém se transforma num fogo azulado.
Ah , entendi.
Mas a lenda é importante?
É... mais ou menos.
Por que mais ou menos?
Um pouco sim um pouco não.
E o que que é um pouco sim ?
É que aqui tá falando é que ele fazia essas coisas e tem crianças que faz a mesma
coisa .. e não porque não pode fazer ... explica que eles faz essas coisas que feio né
... então.
Entendi. E quando as pessoas que lêem ... ajuda as pessoas ...
A parar de fazer .
E porque não é bom?
Que quando o pai dele e a mãe dele morreu né ... não se abalou, saiu de casa ganhou o
248
57
58
59
60
61
62
63
64
Elisa
Elisa
Pesq
Elisa
Pesq
Pesq
Elis
Pesq
mundo .... é, ele fazia coisas más , ele tirava os animais do rebanho né, disanimava
os viajantes que tavam viajano, e falava que era pra um lugar , se perdiam.
É! Isso é muito ruim né? Por que será que é muito ruim?
Num tá certo né !
É isso mesmo.
Mais alguma coisa, que você ainda queira falar sobre o texto?
Hum, não.
Não? Então tá bom.
249
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãozinho, feitos oralmente por um aluno do
3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís).
5 de Novembro de 2014 – Primeira Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Luís
Pesq
Pesq
E aí?
Achei legal.
É? Por que?
Porque fala de um menino, que mentiu pro pai falando que a mãe dele, uma mulher
né. Comeu galinha com um homem, aí o pai ficou com ciúmes e raiva e matou a
mulher, antes dela morrer , ela jogou uma maldi...amaldiçoou o filho, que enquanto ele
viver , ele nunca vai morrer . Só vai morrer quando for o fim do mundo. Aí , ele ... aí,
o pai morreu doente , por conta que matou a mulher dele , e o filho ficou, meio que um
menino ruim, que ficou assombrando todo mundo , fazendo coisa ruim mesmo.
E, sei lá... acabou.
E você achou legal por que?
Ah , e também essa história é um pouco parecida, essa parte aqui é um pouco parecida
com, a parte lá do saci-pererê. E aqui fala que o saci-pererê, que no São Francisco no
centro-oeste, no rio São Francisco entre dois... é o famoso Romãozinho.
E como você sabe que ali ( apontando para o texto complementar) estava falando sobre
o saci , neste textinho aí?
Leitura feita em 5:40.
Linha 14: o aluno mostra outro texto da
página, um texto informativo sobre o saci-
pererê. E vai lendo com o dedinho em
250
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
Luís
É que aqui em ciminha tá estado de Goiás. ?
Mas como você sabia que aí tava escrito sobre o saci de Goiás?
É que a professora tinha lido antes .
Ah, então você já conhecia essa história? Quando que ela leu essa história pra vocês?
O dia? Isso eu não lembro.
Assim, em que momento, o que vocês estavam fazendo na sala de aula.
Todo mundo leu , cada um leu uma parte , a professora escolhia alguém aí lia mais ou
menos até ( indica uma parte do texto). Aí era outro e até assim .... outro.
E por que vocês estudaram esse texto em sala de aula ?
Eu não lembro.
Não? Tem certeza?
Por que ela levou esse texto?
Então, eu não lembro!
Nem imagina?
Não.
Esse texto fala ... você já contou a história, né? Fala do Romãzinho e o que mais que
ele fala?
De um menino mentiroso, de ciúmes, raiva né. E da roca.
O que mais?
Da.... Veadeiros, alguma coisa assim.
silêncio.
251
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Ah, o que é Chapada do Veadeiro?
Não sei .
O que você acha que é? Chapada dos Veadeiros que fala aí.
Sapateria tipo isso?
Chapada dos Veadeiros, o que você imagina que seja?
Tipo sapateria assim, onde eles vendem sapato?
Será? Chapada , não está falando de sapateria.
Chapada dos Veadeiros (fica pensativo).
Não? Então tá!
E a professora usou esse texto na sala?
Rurum.
Tá, e quando ela usou esse texto na sala , você me disse que todo mundo leu uma parte
?
Aí depois que todo mundo acabou , ela leu tudo de novo pra ficar melhor. Tem uns que
leem baixo, outros alto, alguns rápido ....
Sei, e esse texto, fala de algum lugar?
De Goiás. É aqui fala de Goiás ( apontando para o texto). E aqui no cantinho fala do
centro-oeste e o São Francisco e só.
Tem alguma coisa a ver com que vocês estão estudando ou não? Esse texto?
Não, agora não... eu acho.
252
57
58
59
60
61
62
63
64
65
66
67
68
69
70
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
O que vocês estudaram?
O que nós estamos estudando?
É... as regiões. Centro-oeste.... que eu sei nós tamo no .... nordeste.
E vocês já estão algum tempo estudando?
Começamos no norte , e depois vamos até o sul.
E o que mais que você tem pra dizer do texto?
Do texto? Porque ele se transformou num fogo azul.
E o que você acha disso?
Não sei.
É possível alguém se transformar num fogo azul?
Azul ? Sei lá....
Então tá bom, mais alguma coisa?
Não.
Então tá bom, obrigada!
253
Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãzinho, feitos oralmente por um aluno do 3º
Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís ).
18 de Novembro de 2014 – Segunda Leitura
Comentários
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
Pesq
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Muito Bem!
E aí?
Eu pensei que... tem uma parte aqui que fala que ele assombra aqueles que vão
passando pela estrada, aí isto daqui me lembrou muito uma lenda que nóis lemos lá na
sala que é de uma mulher que também fica assombrando, que ela fica pedindo carona,
aí quando chega numa curva , é fala que foi lá que ela morreu, aí todo mundo...
E você sabe o nome dessa lenda ?
Não. Também aparece no gibi que eu li, de terror.
Ah , essas histórias de assombração ?
Aí tinha aparecido uma menina que também morreu, só que foi no penhasco.
Ah , entendi! E o que mais que você pode observar aí no texto?
A roca, eu sei que a roca é uma coisa que serve pra fazer a linha, ou é o que eles
usavam meio que pra costurar e, a Chapada dos Veadeiros.
O que que tem a Chapada dos Veadeiros?
Eu esqueci o que que é.
Esqueceu o que que é a Chapada dos Veadeiros?
A pesquisadora relembra que esse texto já
foi lido em mais de um momento e a
mesma orienta o aluno na leitura: você vai
ler e tentar trazer coisas que você não tenha
lembrado, que você não tenha pensado na
primeira leitura, pode ser?
254
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Pesq
Luís
Luís
Luís
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Pesq
Luís
Luís
Luís
Hum, você não lembra? E o que que chamou a atenção na Chapada dos Veadeiros? O
que que você lembrou dela?
É a Chapada né ... a palavra Chapada.
É a palavra Chapada que te chamou atenção?
É , eu queria saber o que é Chapada.
Hum, no Brasil tem vários lugares em que tem chapadas, como se fossem montanhas ,
com cachoeiras... como a Diamantina na Bahia e Veadeiros na região centro-oeste.
E também essa história que parece.... um pouco conta a história do saci, porque os dois
moleques que são bagunceiro, arteiro também percebi que essa história foi contada em
Goiás.
Foi contada em Goiás? Isso. Ah do Romãozinho né?
E você acha que o Romãozinho é só arteiro e brincalhão?
Hum!
Ou não ? Tem mais alguma coisa aí da personalidade dele?
Talvez lá no fundo , bem lá no fundo mesmo ele fosse um pouco bonzinho.
Será ? O que que ele fez? Você lembra o que que ele fez ?
O que que ele fez?
Ele mentiu pro pai falando que a mãe dele tava comendo a galinha com homem que ia
lá e o Romãozinho levou os ossos pro pai. Aí o pai ficou furioso e com ciúmes e
matou a mulher. Aí ela jogou uma maldição no filho .
255
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
Pesq
Luís
Luís
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Pesq
Luís
Luís
Pesq
Luís
Luís
E qual era a maldição?
Que ele , tipo assim , ia viver até o fim do mundo, não ia morrer nunca.
Só queria saber se ele não ia morrer nunca e se acontecesse um acidente que ele fosse
atropelado, o que ia acontecer ? Ou ele ia ressuscitar ou ia abrir um escudo nele, pra
parar sei lá, o carro.
Você acha que essas coisas são brincadeiras?
Sei lá, talvez ele só queria deixar o pai bravo mesmo.
Ih mas deixou muito bravo né?
Bravo até demais, tão bravo que matou a mãe.
É complicado né?!
Eu acho também, será que ele já sabia que o Romãozinho era arteiro? Eu acho que a
mulher podia ter falado, que podia ser uma brincadeira dele.
Ah muito bem!
A parte lá que ela recusou ter comido com ele.
Rurum poderia evitar a tragédia né?
Rurum
Assim o Romãozinho não ia ficar assim, vivo pra sempre.
E nem a mãe dele teria morrido né?
Rurum.
E o pai também, eu só não sei porque ele morreu de doença, Não sei se ele morreu
256
57
58
59
60
61
62
63
Luís
Luís
Pesq
Pesq
Pesq
Luís
Pesq
doente por causa que ele se arrependeu de ter matado ou se ele ficou doente assim
normal, pegou uma doença sei lá.
Entendi, mais física né ?
Tá ótimo então! Mais alguma coisa Luís?
Não mais?
Faz com cabeça que não.
Então tá bom!
COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNICAMP -
CAMPUS CAMPINS
257
Anexos
COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNICAMP -
CAMPUS CAMPINS
258
Anexos
PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP
DADOS DO PROJETO DE PESQUISA
Título da Pesquisa: A Constituição do leitor proficiente : o papel da mediação pedagógica
Pesquisador: Ana Cláudia de Sousa Rodrigues
Área
Temá
tica:
Versã
o: 2
CAAE: 41368814.0.0000.5404
Instituição Proponente: Faculdade de Educação
Patrocinador Principal: Financiamento Próprio
DADOS DO PARECER
Número do Parecer: 999.692
Data da Relatoria: 26/03/2015
Apresentação do Projeto:
Resumo: Esta pesquisa busca compreender como os alunos de uma Escola Pública Municipal da
cidade de Campinas, Ensino Fundamental, na faixa etária entre os 8 e 9 anos de idade,
matriculados no 3º ano do Ensino Fundamental, final do Ciclo I , definido como Ciclo de
alfabetização e Letramento, constituem-se como leitores proficientes, considerando a mediação
pedagógica e as produções de inferências orais construídas por cinco crianças .
Os alunos serão submetidos a sessões de leitura, onde, no primeiro momento, farão a leitura de
um texto narrativo em voz alta; em seguida, produzirão comentários com base na leitura feita, de
forma espontânea e mediante perguntas elaboradas pela pesquisadora. Os comentários serão
analisados à luz dos conceitos de inferências desenvolvidos por Marcuschi (2008) e cotejados
com as seguintes práticas pedagógicas de leitura desenvolvidas pela professora: Maleta da
Leitura; Roda da leitura; Projetos Interdisciplinares (Ciências, Geografia e História) e
FISELLO ( Festival Literário), sendo os 3 primeiros trabalhados desenvolvidos desde o
primeiro ano do Ciclo I. As práticas da professora priorizam a leitura literária como gênero para o
aprendizado de vários conteúdos escolares. Os processos de interação entre professora e alunos
para apropriação da atividade leitora serão analisados a partir da teoria histórica cultural
desenvolvida por Vigotski (2003).
Desenho:
Endereço: Rua Tessália Vieira de Camargo, 126
Bairro:
UF: SP
Barão Geraldo
Município: CAMPINAS
CEP: 13.083-887
Telefone: (19)3521-8936 Fax: (19)3521-7187 E-mail: [email protected]
Página 1 de 07
COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNICAMP -
CAMPUS CAMPINS
259
Endereço: Rua Tessália Vieira de Camargo, 126
Bairro: Barão Geraldo CEP: 13.083-887
UF: SP Município: CAMPINAS
Telefone: (19)3521-8936 Fax: (19)3521-7187 E-mail: [email protected]
Esta pesquisa situa-se no campo das ciências humanas, mais especificamente na área da
Educação. Visa compreender como alunos , em uma sala de aula do 3º. Ano do Ensino
Fundamental, apropriam-se da atividade de leitura, defendida aqui como prática social e
subsidiada teoricamente pelos estudos do letramento, propostos por Kleiman (2004). Busca
compreender como esses alunos constroem a compreensão leitora a partir de
práticas educativas promotoras da leitura no ambiente
escolar. Método
A pesquisa privilegia a abordagem qualitativa (Bogdan & Biklen,1994), em que o pesquisador se
posiciona como observador dos processos que deseja analisar. No caso , são dois momentos da
pesquisa: primeiro as sessões de observação – individuais, onde a pesquisadora, em um outro
ambiente da escola que não seja a sala de aula, pede para a criança ler um texto narrativo em
voz alta; em seguida, a mesma discorre sobre o texto lido fazendo suas considerações de forma
espontânea, com a intervenção da pesquisadora. O dados obtidos a partir dessas observações
serão analisados à luz dos processos inferenciais desenvolvidos por Marcuschi (1985; 2008). Em
um segundo momento, a pesquisadora participará das aulas, observando as atividades de
leitura, com o objetivo de apreender o processo de ensino-aprendizagem, com ênfase na
interação aluno-professor. Esses processos serão videofilmados e analisados segundo a
teoria histórico cultural de Vigotski (1984; 1998). Para compor a pesquisa, ainda serão
produzidas entrevistas com a
professora da sala para a compreensão dos vários projetos de leitura, desenvolvidos por ela.
Objetivo da Pesquisa:
Objetivo Primário:
Analisar o desenvolvimento do processo de compreensão leitora de crianças do 3º ano do Ensino
fundamental, com base nos processos inferenciais de base textual, contextual e sem base textual e
contextual, propostos por Marcuschi ( 2008) e nas práticas pedagógicas desenvolvidas pela
professora que visam à formação do leitor proficiente e autônomo .
Objetivo Secundário:
Buscar apreender o processo de ensino aprendizagem com ênfase na atividade de leitura com
base nas relações estabelecidas em sala de aula na interação entre professora e alunos, ao utilizar
a linguagem do texto escrito como instrumento simbólico para a constituição do leitor proficiente.
Avaliação dos Riscos e Benefícios:
Riscos:
Essa pesquisa não oferece riscos previsíveis para o participante.
Página 2 de 07
COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNICAMP -
CAMPUS CAMPINS
260
Benefícios:
Não haverá benefício direto. Entretanto, ao participar deste estudo vocês estarão contribuindo para
ampliar o conhecimento científico sobre a como as práticas pedagógicas de leitura em sala de
aula contribuem para a formação do leitor proficiente e crítico.
Comentários e Considerações sobre a Pesquisa:
Pesquisa relevante, que contribuirá para ampliar o conhecimento sobre práticas pedagógicas
desenvolvidas para a formação do leitor proficiente O projeto está bem descrito, metodologia
adequada. Projeto pertinente do ponto de vista científico.
A metodologia está adequada aos objetivos.
O Currículo do pesquisador responsável e dos demais pesquisadores são apropriados para a
realização da pesquisa.
Considerações sobre os Termos de apresentação obrigatória:
Foram apresentados o projeto original, o formulário gerado pela Plataforma Brasil, Folha de Rosto
devidamente assinada. O cronograma foi adequado e foi anexado a autorização da escola para
coleta de dados. O TCLE foi alterado solicitando autorização para gravação das aulas dos
alunos.
Recomendações:
-Recomendações de colocar um espaço para rubrica no final de cada página.
Conclusões ou Pendências e Lista de Inadequações:
Pendências emitidas no parecer CEP número 969.384 de 24/02/2015
1-)Adequar o TCLE segundo a estrutura básica apresentada na página do comitê de Ética da
UNICAMP http://www.prp.unicamp.br/files/3_estrutura_basica_tcle-_versao_marco_2014.docx
Resposta:O TCLE foi adequado segundo a estrutura básica, mas falta o local para rubrica no
final de cada página.
Análise:Pendência parcialmente atendida
2-)Riscos e
benefícios:
Riscos e
desconfortos
:
Não diga que não há riscos. “Diga que não há riscos previsíveis”.
“ Não há projeto sem risco”,toda pesquisa com seres humanos envolve risco com graus variados. O
Endereço: Rua Tessália Vieira de Camargo, 126
Bairro:
UF: SP
Barão Geraldo
Município: CAMPINAS
CEP: 13.083-887
Telefone: (19)3521-8936 Fax: (19)3521-7187 E-mail: [email protected]
Página 3 de 07
COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNICAMP -
CAMPUS CAMPINS
261
dano eventual pode ser imediato ou tardio, comprometendo o indivíduo ou a coletividade. A
tipificação do risco nas diferentes metodologias de pesquisa será definida em norma própria, pelo
Conselho Nacional de Saúde. Possíveis desconfortos e riscos decorrentes da participação na
pesquisa devem ser informados (tempo despendido na coleta, possíveis desconfortos). Sempre
detalhar como será a coleta.
Resposta:"Essa pesquisa não oferece riscos previsíveis para o participante, você ou sua família,
mas poderá haver algum desconforto pelo tempo dedicado ao estudo".
Análise:Pendência atendida.
3-) Benefícios: Lembramos que a única maneira de amenizar o fato do participante não ter
benefícios diretos com o estudo é informar direta e adequadamente isto a ele, para que possa
decidir livremente se participará ou não. Os benefícios sociais estão bem descritos, mas deverão
ser resumidos.
Resposta:Também não haverá benefício direto para vocês. Entretanto, ao participar deste estudo
vocês estarão contribuindo para ampliar o conhecimento científico sobre a como as práticas
pedagógicas de leitura em sala de aula contribuem para a formação do leitor proficiente e crítico".
Análise:Pendência atendida.
4-)Acrescentar o item Responsabilidade do Pesquisador:
"Asseguro ter cumprido as exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e complementares na
elaboração do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma via deste documento ao participante. Informo
que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi apresentado. Comprometo-me a
utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa exclusivamente para as finalidades previstas
neste documento ou conforme o consentimento dado pelo participante." No final, colocar a data e
assinatura do pesquisador responsável.
Resposta:Foi inserida a
informação.
Análise:Pendência
atendida.
5-) Conforme Resolução CNS nº 466 de 2012, itens IV.3.g e h, devem estar explícitos no TCLE os
direitos a indenização e assistência integral frente a dano decorrente da pesquisa, mesmo que
Endereço: Rua Tessália Vieira de Camargo, 126
Bairro:
UF: SP
Barão Geraldo
Município: CAMPINAS
CEP: 13.083-887
Telefone: (19)3521-8936 Fax: (19)3521-7187 E-mail: [email protected]
Página 4 de 07
COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNICAMP -
CAMPUS CAMPINS
262
estes sejam eventuais e não possam ser previstos, e o ressarcimento de qualquer gasto que o
participante tenha com a pesquisa. Dessa forma, solicita-se que tais informações sejam
adicionadas ao TCLE. Resposta:"Não haverá ressarcimento de despesas, pois as observações e
entrevistas serão realizadas no dia e na escola em que o professor e o aluno desempenham
suas funções. A participação nesse estudo é totalmente voluntária e não acarretará em custos
extras em seu orçamento".
Análise:Pendência atendida.
6-)Além das formas de contato com o CEP, solicita-se que sejam inclusos no TCLE uma breve
descrição do que é o CEP, qual sua função no estudo e seu horário de funcionamento (Resolução
CNS nº. 466 de 2012,IV.5.d).
Resposta:"Se desejar obter mais informações a respeito dos aspectos éticos da pesquisa,
registrar uma denúncia ou reclamações sobre sua participação no estudo, você pode entrar em
contato com a secretaria do Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp: Rua: Tessália Vieira de
Camargo, 126; CEP 13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19) 3521-7187;
e-mail: [email protected]".
Análise:Pendência atendida.
7-)O pesquisador necessita anexar a autorização da escola para coleta de dados e o TCLE para os
alunos, pois as aulas serão gravadas e são sujeitos vulneráveis.No caso de inclusão de menores
de idade como sujeitos da pesquisa, é fundamental a assinatura do TCLE pelos
REPRESENTANTES LEGAIS e não por vizinhos, cuidadores, etc.
Resposta:Foi anexada a carta de autorização para coleta de dados e o TCLE contempla a
assinatura do responsável legal.
Análise:Pendência atendida.
Conclusão: Projeto aprovado com recomendações de colocar um espaço para rubrica no final de
cada página.
Situação do Parecer:
Aprovado
Endereço: Rua Tessália Vieira de Camargo, 126
Bairro:
UF: SP
Barão Geraldo
Município: CAMPINAS
CEP: 13.083-887
Telefone: (19)3521-8936 Fax: (19)3521-7187 E-mail: [email protected]
Página 5 de 07
COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNICAMP -
CAMPUS CAMPINS
263
Necessita Apreciação da CONEP:
Não
Considerações Finais a critério do CEP:
- O sujeito de pesquisa deve receber uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido,
na íntegra, por ele assinado.
- O sujeito da pesquisa tem a liberdade de recusar-se a participar ou de retirar seu
consentimento em qualquer fase da pesquisa, sem penalização alguma e sem prejuízo ao
seu cuidado.
- O pesquisador deve desenvolver a pesquisa conforme delineada no protocolo aprovado. Se o
pesquisador considerar a descontinuação do estudo, esta deve ser justificada e somente ser
realizada após análise das razões da descontinuidade pelo CEP que o aprovou. O pesquisador
deve aguardar o parecer do CEP quanto à descontinuação, exceto quando perceber risco ou
dano não previsto ao sujeito participante ou quando constatar a superioridade de uma estratégia
diagnóstica ou terapêutica oferecida a um dos grupos da pesquisa, isto é, somente em caso de
necessidade de ação imediata com intuito de proteger os participantes.
- O CEP deve ser informado de todos os efeitos adversos ou fatos relevantes que alterem o curso
normal do estudo. É papel do pesquisador assegurar medidas imediatas adequadas frente a
evento adverso grave ocorrido (mesmo que tenha sido em outro centro) e enviar notificação ao
CEP e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA – junto com seu posicionamento.
- Eventuais modificações ou emendas ao protocolo devem ser apresentadas ao CEP de forma
clara e sucinta, identificando a parte do protocolo a ser modificada e suas justificativas. Em caso
de projetos do Grupo I ou II apresentados anteriormente à ANVISA, o pesquisador ou patrocinador
deve enviá-las também à mesma, junto com o parecer aprovatório do CEP, para serem juntadas
ao protocolo inicial.
- Relatórios parciais e final devem ser apresentados ao CEP, inicialmente seis meses após a data
deste parecer de aprovação e ao término do estudo.
Endereço: Rua Tessália Vieira de Camargo, 126
Bairro:
UF: SP
Barão Geraldo
Município: CAMPINAS
CEP: 13.083-887
Telefone: (19)3521-8936 Fax: (19)3521-7187 E-mail: [email protected]
Página 6 de 07
COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNICAMP -
CAMPUS CAMPINS
264
CAMPINAS, 26 de Março de 2015
Assinado por:
Renata Maria dos Santos
Celeghini (Coordenador)
Endereço: Rua Tessália Vieira de Camargo, 126
Bairro:
UF: SP
Barão Geraldo
Município: CAMPINAS
CEP: 13.083-887
Telefone: (19)3521-8936 Fax: (19)3521-7187 E-mail: [email protected]
Página 7 de 07
Top Related