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Capitulo I
BENEFÍCIOS DO RESFRIAMENTO EM GRÃOS DE SOJA
Destaques:
1) O resfriamento (15ºC) da massa de grãos
durante o armazenamento inibe a proliferação
de insetos.
2) O armazenamento na faixa de 11 a 18ºC
proporciona mínimas alterações na fração
proteica e lipídica dos grãos, durante pelo
menos um ano de estocagem, mesmo com
umidades de grãos acima da faixa ideal (13%)
para o armazenamento em ambiente natural.
3) O resfriamento dos grãos de soja durante o
armazenamento reduz a quebra técnica.
4) O resfriamento dos grãos (<20ºC) auxilia na
manutenção dos padrões aceitáveis de
classificação ao longo do armazenamento.
1. Introdução
A soja é a principal cultura oleaginosa cultivada em todo o mundo, sendo que o
Brasil e os Estados Unidos são os responsáveis por mais de 50% da produção mundial.
Os grãos de soja são considerados uma importante fonte de proteínas para populações de
países desenvolvidos e em desenvolvimento. A China é o principal importador de soja
brasileira, onde os grãos são utilizados como matéria-prima para diversos produtos
alimentares. Estima-se que cerca de 60% dos produtos industrializados em todo o mundo
possuem algum constituinte de soja em sua composição, como carne industrializada,
massas, maioneses, sopas e alimentos enlatados.
O óleo presente nos grãos de soja possui alto valor comercial e é utilizado tanto
no consumo de forma direta ou como matéria-prima para as indústrias agroenergéticas,
representando 90% da produção de óleo e 80% do biodiesel no Brasil. Já a parte proteica
desses grãos é amplamente utilizada na alimentação animal, sendo fonte de proteínas na
formulação de rações para alimentação do gado de corte ou leiteiro. A fração proteica
também é utilizada, principalmente na China, no Japão e em países vizinhos como
matéria-prima para a produção de soymilk e tofu, alimentos típicos dessa região.
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Nesse contexto, será abordado nesse capítulo a importância da redução da
temperatura de armazenamento dos grãos de soja para a manutenção de suas propriedades
tecnológicas e nutricionais.
2. Resultados de pesquisa em grãos de soja
Estudos realizados por Ziegler (2014) e Ziegler et al. (2016) durante o
armazenamento de grãos de soja em diferentes condições de umidade de grãos e
temperaturas de armazenamento, avaliando propriedades físico-químicas, tecnológicas e
nutricionais, assim como o controle de insetos serão abordados. Esses estudos foram
realizados simulando um sistema semi-hermético de armazenamento (aquele que permite
trocas de ar do ambiente interno com o ambiente externo de armazenamento).
O armazenamento de grãos de soja por 180 dias em diferentes condições de
umidade e temperatura também foi estudo por Alencar et al. (2009), os quais avaliaram
importantes parâmetros de qualidade de grãos de soja
Outro estudo também foi realizado por Yousif (2014) que avaliou os efeitos do
armazenamento de grãos de soja em diferentes condições de umidade e temperatura,
durante 12 meses, sobre parâmetros de cor e textura.
Os principais resultados desses estudos são abordados abaixo.
2.1. Controle de insetos
Na Tabela 1 são apresentados os resultados da detecção de insetos em grãos de
soja armazenados em diferentes condições de umidade e temperatura. Observa-se que no
início do armazenamento foram detectados insetos em todas as condições de
armazenamento estudadas, possivelmente oriundas da lavoura, em seguida realizou-se
um expurgo, para eliminar os insetos presentes. Após esse expurgo, nos grãos
armazenados em temperatura de refrigeração (15°C) não foram mais encontrados os
insetos, enquanto que no armazenamento na temperatura de 25°C os insetos voltaram a
aparecer já nos próximos 30 dias.
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Tabela 1. Detecção de insetos em grãos de soja armazenados em diferentes condições de umidade
e temperatura durante 12 meses.
Condição de
armazenamento
Período de armazenamento (meses)
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
12% / 15°C P A A A A A A A A A A A
12% / 25°C P P P P P P P P P P P P
16% / 15°C P A A A A A A A A A A A
16% / 25°C P P P P P P P P P P P P P= Presença, A= Ausência
Fonte: Ziegler et al. (2016).
Esses resultados demonstram a importância da utilização de temperaturas de
refrigeração no controle de insetos durante o armazenamento, isso acontece, porque, de
acordo com estudos de Dosland et al. (2006), os insetos precisam temperaturas mínimas
de 18,3ºC para apresentarem um mínimo de desenvolvimento. Temperaturas abaixo desse
patamar, inibem a locomoção e alimentação dos insetos, levando-os a morte, antes mesmo
de completar seu ciclo de vida, além de perderem sua capacidade reprodutiva.
2.2. Umidade dos grãos
Na Figura 1 são apresentados os resultados de umidade dos grãos de soja
armazenados durante 12 meses em diferentes condições de umidade e temperatura.
Observa-se que os grãos armazenados na temperatura de 32°C, independente da umidade
inicial dos grãos, apresentaram uma pequena redução da umidade após 12 meses de
armazenamento. Por outro lado, os grãos armazenados nas temperaturas de refrigeração,
não apresentaram redução da umidade dos grãos. Dessa forma, demonstra-se a
importância da utilização de temperaturas de refrigeração durante o armazenamento dos
grãos para manter a umidade dos mesmos.
A umidade mais usual no armazenamento de grãos de soja, gira em torno de 13%,
dessa forma, é importante que a umidade se mantenha nesses patamares, pois se houver
redução da umidade, automaticamente, haverá perda de peso dos grãos, o que representa,
perda econômica para o armazenista.
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Figura 1. Umidade (%) de grãos dos grãos de soja armazenados com quatro umidades iniciais, em quatro
temperaturas, durante doze meses. Onde: a) 9% de umidade, b) 12% de umidade, c) 15% de umidade e d)
18% de umidade.
Fonte: Ziegler (2014).
2.3. Peso de Mil Grãos
Na Figura 2 são apresentados os resultados do peso de mil grãos de soja
armazenados durante 12 meses em diferentes condições de umidade e temperatura. De
acordo com esses resultados, fica evidente a importância da utilização de temperaturas na
faixa de refrigeração (11 a 18°C) para manter o peso de mil grãos, principalmente quando
se utiliza umidades de grãos de 15 a 18%.
Na prática, o armazenamento com umidade de 18% praticamente não é
encontrado, no entanto, a umidade próxima a 15% pode ser facilmente encontrada em
armazéns e silos pelo Brasil e pelo mundo. Nos grãos armazenados com 15% de umidade
na temperatura de 32°C verifica-se uma redução de 3,9% após 12 meses, enquanto que
na mesma umidade de grãos, quando armazenados em temperatura de refrigeração (11 e
18°C), não houve redução significativa do peso de mil grãos. Para exemplificar o
tamanho da redução, esse resultado significa que a cada 100kg de grãos de soja
depositados no silo, após um ano armazenado a 32°C, vai ocorrer uma perda de peso de
3,9kg, que é a chamada quebra técnica ou perda quantitativa durante o armazenamento.
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Temperaturas de armazenamento acima da faixa de refrigeração provocam o
aumento da atividade respiratória dos grãos, dessa forma, quanto maior a atividade
respiratória, maior é o consumo das reservas energéticas (proteínas, lipídios e
carboidratos) para manter os processos respiratórios, consequentemente reduzindo o peso
desses grãos. Outras pesquisas realizadas por Ziegler et al. (2016), Pohndorf (2012) e
Alencar et al. (2009) demonstram a importância da utilização do resfriamento para
minimizar a quebra técnica durante o armazenamento de grãos de soja.
Figura 2. Peso (g) de mil grãos dos grãos de soja armazenados com quatro umidades iniciais, em quatro
temperaturas, durante doze meses. Onde: a) 9% de umidade, b) 12% de umidade, c) 15% de umidade e d)
18% de umidade.
Fonte: Ziegler (2014).
2.4. Coloração dos grãos
A coloração dos grãos é um excelente indicativo visual das alterações que ocorrem
nos grãos em virtude das condições de armazenamento. Na Figura 3 é apresentado uma
imagem de grãos de soja armazenados em quatro umidades de grãos (9, 12, 15 e 18%) e
quatro temperaturas (11, 18, 25 e 32°C) de armazenamento, no início e após doze meses.
A imagem demonstra que quanto maior a temperatura de armazenamento,
associado ao aumento da umidade de grãos, maior é o escurecimento dos grãos. Esse
escurecimento dos grãos, associado a outros defeitos metabólicos e não metabólicos
podem causar a redução da tipificação desses grãos ou até serem desclassificados segundo
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a legislação brasileira para comercialização de soja, o que representa redução da
qualidade para utilização industrial e perda do valor econômico.
Figura 3. Coloração de grãos de soja armazenados com quatro umidades iniciais, em quatro temperaturas,
no início e após 12 meses.
Fonte: Ziegler (2014).
Além das alterações visuais da coloração dos grãos, verificadas na Figura 3,
alguns métodos instrumentais também são capazes de demonstrar essas alterações. Nas
Figuras 4, 5 e 6 são apresentados os resultados de pesquisa de um estudo realizado na
Austrália, por Yousif (2014), que demostram as alterações de cor dos grãos de soja
armazenados em diferentes condições de umidade (9, 11 e 13%) e temperatura (10, 20 e
30ºC). O valor L* (Figura 4) expressa a variação da cor do preto ao branco, ou seja, quanto
menor o valor L*, mais escuros estão os grãos, e quanto maior o valor L*, mais claros
estão os grãos. O valor a* (Figura 5) expressa a variação de cor do verde ao vermelho, ou
seja, quanto maior o valor a*, mais avermelhados estão os grãos, e quanto menor o valor
a* mais esverdeados estão os grãos. O valor b* (Figura 6) expressa a variação de cor do
azul ao amarelo, ou seja, quanto maior o valor b*, mais amarelos estão os grãos, e quanto
menor o valor b*, mais azulados estão os grãos.
De acordo com os resultados apresentados nas Figuras 4, 5 e 6 verifica-se que os
grãos de soja ficaram mais escuros, com tendência a coloração avermelhada e redução da
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coloração amarelada, de acordo com o aumento da temperatura de armazenamento. Essas
alterações são causadas pela ação de microrganismos (fungos), associado a uma série de
reações químicas e enzimáticas, as quais, são inibidas pela utilização de temperaturas de
resfriamento. Estudo realizado por Ziegler et al. (2014) também demonstra a importância
da utilização do resfriamento de grãos de soja para a manutenção da coloração dos grãos
ao longo do período de armazenamento.
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Figura 4. Valor L* de grãos de soja armazenados em diferentes condições de umidade (9, 11 e 13%) e
temperatura (10, 20 e 30°C) durante 12 meses. Onde: linha azul =10°C, linha vermelha = 20ºC e linha verde
= 30ºC.
Fonte: Yousif (2014).
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Figura 5. Valor a* de grãos de soja armazenados em diferentes condições de umidade (9, 11 e 13%) e
temperatura (10, 20 e 30°C) durante 12 meses. Onde: linha azul =10°C, linha vermelha = 20ºC e linha verde
= 30ºC.
Fonte: Yousif (2014).
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Figura 6. Valor b* de grãos de soja armazenados em diferentes condições de umidade (9, 11 e 13%) e
temperatura (10, 20 e 30°C) durante 12 meses. Onde: linha azul =10°C, linha vermelha = 20ºC e linha verde
= 30ºC.
Fonte: Yousif (2014).
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2.5. Conteúdo de proteínas e solubilidade proteica
Na Figura 7 são apresentados os resultados do conteúdo de proteínas de grãos de
soja armazenados em diferentes condições de umidade e temperatura durante 12 meses.
De acordo com os resultados, verifica-se redução de proteínas, após 12 meses, em todas
as condições de armazenamento, no entanto, em todas as umidades de grãos testadas,
quando foram utilizadas temperaturas de refrigeração (11 e 18°C), a redução de proteínas
foi menor quando comparado a temperaturas de 25 e 32°C. A redução de proteínas se
deve ao metabolismo dos grãos, que consome as proteínas, assim como os lipídios para
manter-se fisiologicamente ativo. A redução de proteínas auxilia na redução do peso de
mil grãos, conforme abordado anteriormente.
Figura 7. Proteínas (% em base seca) dos grãos de soja armazenados com quatro umidades iniciais, em
quatro temperaturas, durante doze meses. Onde: a) 9% de umidade, b) 12% de umidade, c) 15% de
umidade e d) 18% de umidade.
Fonte: Ziegler (2014).
Além da perda quantitativa de proteínas durante o armazenamento, a perda
qualitativa é ainda mais expressiva. Na Figura 8 são apresentados os resultados de
solubilidade proteica de grãos de soja armazenados em diferentes condições de umidade
e temperatura durante 12 meses. Observa-se que a utilização de temperaturas de
refrigeração (11 a 18 °C) durante o armazenamento mantêm o percentual de solubilidade
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proteica praticamente inalterada durante 12 meses de armazenamento, mesmo quando os
grãos foram armazenados com 18% de umidade. No entanto, quando os grãos foram
armazenados na temperatura de 32°C, houve redução da solubilidade proteica
independente da umidade de grãos, sendo que quanto maior a umidade dos grãos, maior
foi a redução da solubilidade dos grãos nessa temperatura de armazenamento.
A solubilidade proteica é um parâmetro de avaliação de qualidade muito
importante, pois em países asiáticos e, em menor proporcionalidade no Brasil, as
proteínas solúveis são importantes na elaboração de alimentos à base de soja como o tofú
(queijo de soja) e o soymilk (leite de soja). Esses alimentos são típicos de países como a
China e o Japão e amplamente consumidos por lá. Esses alimentos são elaborados a partir
da solubilização das proteínas de soja em água, dessa forma, quanto menor a solubilidade
proteica, menor é o rendimento desses produtos, o que representa maior custo de produção
desses alimentos e também redução da qualidade desses alimentos. Por esses fatores
citados anteriormente, é que alguns países adotam a solubilidade proteica como um
parâmetro adicional de avaliação da qualidade para a compra da soja brasileira.
Figura 8. Solubilidade proteica (%) dos grãos de soja armazenados com quatro umidades iniciais, em
quatro temperaturas, durante doze meses. Onde: a) 9% de umidade, b) 12% de umidade, c) 15% de umidade
e d) 18% de umidade.
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Fonte: Ziegler (2014).
Resultados semelhantes que demostram os benefícios do resfriamento dos grãos
de soja sobre o conteúdo de proteínas e a solubilidade proteica também podem ser
conferidos nos estudos realizados por Ziegler et al. (2016), Ziegler et al. (2018) e Liu et
al. (2008).
2.6. Firmeza do cotilédone dos grãos de soja
A firmeza do cotilédone é um parâmetro de qualidade bastante importante,
principalmente para os consumidores de países asiáticos, que consomem grãos de soja
cozidos na sua forma integral. Na Figura 9 são apresentados os resultados de firmeza do
cotilédone de grãos de soja armazenados em diferentes condições de umidade (9, 11 e
13%) e temperatura (10, 20 e 30ºC). Para cada umidade de grãos estudada, observa-se um
aumento da firmeza do cotilédone dos grãos de acordo com o aumento da temperatura de
armazenamento. Esse comportamento provavelmente se deva a lignificação
(complexação) das estruturas da parede celular associado a uma redução da absorção de
água, o que ocasiona o aumento da firmeza do cotilédone dos grãos após o cozimento, o
que é indesejado pelos consumidores.
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Figura 9. Firmeza de grãos de soja armazenados em diferentes condições de umidade (9, 11 e 13%) e
temperatura (10, 20 e 30°C) durante 12 meses. Onde: linha azul =10°C, linha vermelha = 20ºC e linha verde
= 30ºC.
Fonte: Yousif (2014).
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2.7. Conteúdo de lipídios, acidez lipídica e estabilidade oxidativa
Na Figura 10 são apresentados os resultados do conteúdo de lipídios (óleo) de
grãos de soja armazenados em diferentes condições de umidade e temperatura durante 12
meses. Observa-se que houve redução do conteúdo de lipídios durante o período de
armazenamento em todas as condições estudadas, no entanto, quando o armazenamento
foi realizado com a utilização de temperaturas de refrigeração, a redução do conteúdo de
óleo foi menos expressiva, ao comparar com o armazenamento realizado nas temperaturas
de 25 e 32°C.
Ao analisarmos as reduções do conteúdo de lipídios em números, verifica-se uma
redução de 9,85% no armazenamento de grãos com 15% de umidade na temperatura de
11°C, enquanto que no armazenamento na temperatura de 32°C, na umidade de 15%, a
redução foi de 14,56%, o que representa 4,71% a menos de redução quando se utiliza o
resfriamento no armazenamento. Quando os grãos foram armazenados na umidade de
18%, essas diferenças são ainda mais significativas, com 12,06% de redução no
armazenamento a 11°C e 20,75% no armazenamento a 32°C, o que representa 8,69% a
menos de redução quando se utiliza o resfriamento no armazenamento por 12 meses.
A manutenção de maior concentração de lipídios nos grãos quando se utiliza a
refrigeração se deve a redução da taxa respiratória dos grãos, redução da atividade
enzimática e da proliferação de fungos, que podem estar presentes nos próprios grãos ou
são oriundos da microflora associada.
É importante destacar que quanto maior a redução do conteúdo de óleo dos grãos,
menor é obtenção de óleo desses grãos, o que representa aumento de custo de produção
de óleo para consumo humano ou para utilização na fabricação de biodiesel.
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Figura 10. Conteúdo de lipídios (%) dos grãos de soja armazenados com quatro umidades iniciais, em
quatro temperaturas, durante doze meses. Onde: a) 9% de umidade, b) 12% de umidade, c) 15% de umidade
e d) 18% de umidade.
Fonte: Ziegler (2014).
Além das perdas quantitativas de lipídios ao longo do armazenamento, as perdas
qualitativas também são de extrema importância, pois interferem diretamente no
rendimento de extração de óleo e na qualidade do produto final. Na Figura 11 são
apresentados os resultados de acidez lipídica do óleo obtido de grãos de soja armazenados
em diferentes condições de umidade e temperatura durante 12 meses.
Dentro de cada umidade de grãos estudada no armazenamento, fica evidente a
importância da redução da temperatura durante o armazenamento dos grãos para que não
ocorra expressivos aumentos da acidez do óleo obtido desses grãos. É importante destacar
que a refrigeração proporciona baixos índices de aumento da acidez, mesmo quando são
utilizadas elevadas umidades de grãos (15 e 18%).
O óleo de soja é constituído principalmente por triglicerídeos, os quais são
compostos por uma molécula de glicerol unido a três ácidos graxos. O aumento da acidez
ocorre pela quebra da ligação existente entre o glicerol e os ácidos graxos, produzindo
ácidos graxos livres. Essa quebra é realizada por enzimas (lipase) e as temperaturas de
refrigeração reduzem a atividade enzimática dessas enzimas, preservando os
triglicerídeos.
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Para a indústria de extração e refino de óleos, quanto menor o teor de ácidos
graxos livres (menor índice de acidez) maior é o rendimento de refino do óleo, por que
os ácidos graxos livres são removidos do óleo na etapa de neutralização para atender a
legislação vigente para comercialização de óleo, dessa forma, quanto menor a acidez do
óleo, maior é o ganho econômico no refino do óleo.
Figura 11. Acidez lipídica (mg NaOH.100g-1) dos grãos de soja armazenados com quatro umidades iniciais,
em quatro temperaturas, durante doze meses. Onde: a) 9% de umidade, b) 12% de umidade, c) 15% de
umidade e d) 18% de umidade.
Fonte: Ziegler (2014).
Além da acidez lipídica, a estabilidade oxidativa (ranço) do óleo, medida pela
formação de compostos que conferem alteração de sabor e odor do óleo também é
importante. Na Figura 12 são apresentados os resultados de produtos secundários de
oxidação lipídica (K270) dos grãos de soja armazenados com quatro umidades iniciais, em
quatro temperaturas, durante doze meses. Observa-se que a utilização de temperaturas de
refrigeração durante o armazenamento dos grãos proporciona menor produção de ranço
oxidativo do óleo, medido através do coeficiente de extinção especifica a 270nm.
Os compostos que conferem as características de ranço em óleos são os aldeídos,
álcoois e cetonas. Essas reações de oxidação, que em sua fase final produzem os
compostos citados, é influenciada pela temperatura de armazenamento dos grãos,
22
conforme demostrado na Figura 12, pois quanto menor a temperatura, menor é a
velocidade dessas reações que podem ocorrer por via enzimática ou química.
Para a indústria de extração e refino de óleo, é desejável a menor concentração de
produtos de oxidação lipídica possível, pois esses compostos devem ser removidos na
etapa de desodorização do óleo, tendo em vista que quanto maior a concentração desses
compostos, maior é o custo operacional.
Também é importante destacar que quando as reações oxidativas atingem
elevados índices, ocorrem algumas alterações no perfil de ácidos graxos do óleo,
reduzindo o teor de ácidos graxos poli-insaturados e aumentando o teor de ácidos graxos
monoinsaturados e saturados, o que não é desejável, pois os ácidos graxos saturados são
mais prejudiciais à saúde dos consumidores quando comparado aos ácidos graxos poli-
insaturados.
Figura 12. Produtos secundários de oxidação lipídica (K270) dos grãos de soja armazenados com quatro
umidades iniciais, em quatro temperaturas, durante doze meses. Onde: a) 9% de umidade, b) 12% de
umidade, c) 15% de umidade e d) 18% de umidade.
Fonte: Ziegler (2014).
Resultados semelhantes que demonstram os benefícios do resfriamento dos grãos
de soja sobre o conteúdo de óleo, acidez lipídica e a estabilidade oxidativa também podem
23
ser observados em estudos realizado por Ziegler et al. (2016), Ponhdorf (2012), Coradi et
al. (2015) e Moraes et al. (2011).
2.8. pH dos grãos
O pH dos grãos mede o potencial Hidrogeniônico e não deve ser confundido com
o PH que mede o Peso Hectolitro. Na Figura 13 são apresentados os resultados do pH dos
grãos de soja armazenados com quatro umidades iniciais, em quatro temperaturas,
durante 12 meses. Observa-se que quanto maior a temperatura de armazenamento dos
grãos, ao longo do período de armazenamento, maior foi a redução do pH dos grãos, por
outro lado, a utilização de temperaturas de refrigeração, na faixa de 11 a 18°C, foram as
que apresentaram as menores reduções do pH dos grãos, após 12 meses de
armazenamento.
O pH dos grãos é uma análise que auxilia na avaliação da qualidade dos grãos,
pois quanto menor o pH dos grãos, maior foi a formação de compostos ácidos durante o
armazenamento, conforme verificado pelo aumento da acidez lipídica. Além disso, uma
maior redução do pH dos grãos, indica uma maior desestruturação celular dos grãos, o
que facilita a lixiviação de íons de hidrogênio, os quais são detectados pela análise de pH.
A desestruturação celular no interior do grão, é causada principalmente por ação
enzimática e, quanto maior a desestruturação celular, maior é o desencadeamento de
outras reações químicas e enzimáticas que acarretam na redução da qualidade dos grãos
ao longo do armazenamento, dessa forma, fica evidenciado a importância da redução da
temperatura para a manutenção da qualidade dos grãos ao longo do período de
armazenamento.
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Figura 13. pH dos grãos de soja armazenados com quatro umidades iniciais, em quatro temperaturas,
durante doze meses. Onde: a) 9% de umidade, b) 12% de umidade, c) 15% de umidade e d) 18% de
umidade.
Fonte: Ziegler (2014).
2.9. Classificação de grãos de soja
O estudo realizado por Alencar et al. (2009) avaliou a classificação de grãos de
soja armazenados por 6 meses, nas umidades de 11,2, 12,8 e 14,8%, nas temperaturas de
20, 30 e 40°C. Na Tabela 2, estão apresentados os percentuais médios dos grãos de soja
ardidos e avariados, os quais foram obtidos a partir dos laudos de classificação emitidos
pelo Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA. Observa-se que com 90 dias de
armazenamento, os grãos armazenados com 14,8% de umidade na temperatura de 40°C
já apresentaram percentual de grãos avariados acima do limite de referência básica (8%).
Com 135 e 180 dias de armazenamento, os grãos armazenados com 12,8 e 14,8% na
temperatura de 40°C, apresentaram percentual de grãos avariados acima do limite de
referência básica (8%). Por outro lado, os grãos armazenados na temperatura de 20°C,
independente da umidade dos grãos estudada, foram os que apresentaram os menores
percentuais de grãos avariados e permanecendo abaixo do limite de referência básica
(8%), até os 180 dias de armazenamento.
Segundo a atual legislação brasileira para classificação de soja (IN MAPA N°
11/2007), consideram-se grãos avariados os grãos ou pedaços de grãos que se apresentam
25
queimados, ardidos, mofados, fermentados, germinados, danificados, imaturos e chochos,
sendo que os ardidos são os grãos ou pedaços de grãos que se apresentam visivelmente
fermentados em sua totalidade e com coloração marrom escura acentuada, afetando o
cotilédone.
Dessa forma, levando em consideração os resultados obtidos por Alencar et al.
(2009) e de acordo com o que estabelece a legislação brasileira para comercialização de
soja, fica evidente a importância da redução da temperatura durante o armazenamento dos
grãos, para manter os padrões básicos de classificação, o que não acarreta em redução do
valor econômico, caso esses grãos não atendessem os limites exigidos pela legislação.
Tabela 2. Valores médios percentuais de grãos avariados de soja armazenados nas temperaturas de 20, 30
e 40 °C e teores de água de 11,2, 12,8 e 14,8% b.u. durante 180 dias
Fonte: Alencar et al. (2009).
Resultados semelhantes que demonstram os benefícios do resfriamento sobre a
classificação de grãos de soja também podem ser verificados na pesquisa realizada por
Martes et al. (2016).
3. REFERÊNCIAS
ALENCAR, E. R.; FARONI, L. R. D.; FILHO, A. F.L.; PETERNELLI, L. A.; COSTA,
A. R. Qualidade dos grãos de soja armazenados em diferentes condições. Revista
Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v.13, n.5, p.606–613, 2009.
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37, de 27 de julho de 2007, anexo – Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade da
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BRASIL. Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento. Portaria n° 262, de 23
de novembro de 1983.
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CORADI, P. C.; MILANE, L.V.; CAMILO, L. J.; PRADO, R. L. F.; FERNANDES, T.
C. Qualidade de grãos de soja armazenados em baixas temperaturas. Brazilian
Journal of Biosystems Engineering, v.9, n.3, p.197-208, 2015.
LIU, C.; WANG, X.; MA, H.; ZHANG, Z.; GAO, W.; XIAO, L. Functional properties
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MARTES, S.; ELY, A.; HAEBERLIN, L.; JAQUES, L. B. A.; PARAGINSKI, R. T.
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beneficios/soja/qualidade%20de%20gros%20de%20soja_cotripa.pdf. Acesso em:
20/10/2017.
POHNDORF, R. S. Efeitos da umidade e do resfriamento no armazenamento sobre
a qualidade de grãos e do óleo de soja para fins comestíveis e de produção de
biodiesel. Dissertação de mestrado. 85f. Programa de Pós-Graduação em Ciência e
Tecnologia de Alimentos. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas/RS, 2012.
ZIEGLER, V. Efeitos da umidade e da temperatura de armazenamento sobre
parâmetros de avaliação da qualidade dos grãos, do óleo e de compostos bioativos
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