“Escrever é traduzir. Mesmo quando
estivermos a utilizar a nossa própria língua.
Transportamos o que vemos e o que sentimos
para um código convencional de
signos, a escrita...”
“...e deixamos às circunstâncias e aos acasos
da comunicação a responsabilidade de
fazer chegar à inteligência do leitor,
não tanto a integridade da experiência que nos propusemos transmitir,...”
“...mas uma sombra, ao menos,
do que no fundo do nosso espírito sabemos bem
ser intraduzível,por exemplo...”
“...a emoção pura de um encontro,
o deslumbramento de uma descoberta,
esse instante fugaz de silêncio anterior à
palavra que vai ficar na memória como o rasto de um sonho que o tempo não apagará por completo.”
José Saramago
“Muito universo, muito espaço
sideral, mas o mundo é mesmo
uma aldeia.”
José Saramago
Estamos numa aldeia chamada Azinhaga,
no Alentejo português,
a região sul do país onde se produzem azeitonas, cortiça
e trigo.
E nesta pequena aldeia,
modestas plantações e criação de porcos
é o que há para ser feito.
Jerónimo e Josefa estão particularmente
felizes hoje, 16 de novembro de 1922,
pois é o dia que viu nascer o seu mais novo neto,
a quem o destino conferiu o nome de
José Saramago.
Livros e letras não fazem parte
da rotina deste casal de camponeses,
bem como de tantos outros vizinhos.
As poucas palavras faladas lhes servem
aos propósitos, e o seu mundo é o quintal
que em breves minutos percorremos.
Na primavera de 1924, os pais de Saramago,Maria da Piedade
e José de Sousa,abandonam o seio
do campo e se mudam para Lisboa,
onde ele conseguiuum novo trabalho como
policial do trânsito.
Em Lisboa, Maria da Piedade passa a cuidar dos
afazeres domésticos, e se dedica aos filhos,
Francisco, de quatro anos, e José Saramago, que
conta com dois anos de idade.
No mês de dezembro do mesmo ano em que se
mudam para Lisboa, o filho mais velho
do casal, Francisco,com apenas quatro
anos de idade, morre de
broncopneumonia.
Uma dor que Maria da Piedade
carregará pelo restante dos seus dias.
Saramago passa afrequentar a escola primária na capital, e já é fluente na
leitura, aos oito anos.
Sua mãe o envia nas férias para Azinhaga, para
o contato com o campo e com os avós maternos.
E nas temporadas que passa na aldeia dos avós, o pequeno José sente-se feliz como um pássaro livre.
O contato com a Natureza – a inocência, cheia de beleza e serenidade, das coisas puras.
Os peixes que, nadando velozes, mantêm-se, por vezes, imóveis contra a força da corrente...
Anos mais tarde, recordará Saramago algumas lembranças do avô Jerónimo:...
“Recordo daquelas noites mornas de Verão,
quando dormíamos debaixo da figueira
grande, ouço-o falar
da vida que teve, das histórias e lendas
da sua infância distante.”
“Adormecíamos tarde, bem enrolados nas mantas por
causa do fresco da madrugada...”
As lembranças da pequena aldeia
e o tempo passado na companhia dos avós
– as grandes referências morais e sentimentais
na sua vida – acompanharão
o pequeno José pelosanos e décadas
vindouros.
O tempo passa e transforma crianças em jovens adultos.
Por falta de recursos,
Saramago não chega a concluir
o secundário,trocando os estudos
acadêmicos pelo curso de serralharia
mecânica numa escola técnica de Lisboa.
Aos dezenove anos passa a trabalhar num
hospital, fazendo a manutenção do
maquinário.
Com o trabalho a consumir as horas do dia, cultiva a rotina de dedicar
a noite à leitura.
Todas as noites, depois de jantar,
vai a pé, apesar da longa distância, até a biblioteca
pública de Lisboa, onde permanece até
a hora de fechar,
lendo tudo o que pode.
São estas leituras as suas aulas, o seu professor,
o seu mestre...
“Como gostava de, um dia, começar a escrever,
afinal, ser um escritor! E ser escritor era para
o jovem José uma reflexão sobre a vida
e os seus absurdos...”
Sobre esta fase, recordará anos mais tarde:...
“Guiado talvez pela beleza da persistência,
ainda que trêmula,de uma daquelas estrelas
que vira no céu na casa do avô Jerónimo
e da avó Josefa, decidiu ser todo uma só
vontade, todo um atrevimento e lançou-se no voo alto de escrever...”
Em 1944, aos 22 anos de idade, casa-se com a
pintora Ilda Reis,sendo que três anos mais tarde, em 1947, nasce
a filha, que recebe o nome Violante.
Neste ano também publica o seu primeiro
livro, ‘Terra do Pecado’.
José Saramago, Ilda Reis e a filha Violante, 1951
Pais e filhos – a convivência gera laços; no entanto, o amor, a admiração
e o carinho necessitam ser construídos.
Leva tempo, atenção e cuidado arar a terra que fecunda
afeição e ternura, respeito e carinho.
Leva tempo, atenção e cuidado arar a terra que fecunda
afeição e ternura, respeito e carinho.
José Saramago e Violanteàs margens
do rio Almonda
Azinhaga, 1951
“A expressão vocabular humana
não sabe ainda e provavelmente
não o saberá nunca,conhecer, reconhecer
e comunicartudo quanto é humanamente
experimentável e sensível.”
José Saramago
“A expressão vocabular humana
não sabe ainda e provavelmente
não o saberá nunca,conhecer, reconhecer
e comunicartudo quanto é humanamente
experimentável e sensível.”
José Saramago
José Saramago e Violante
Azinhaga, 1953
Embora tenha seu primeiro livro,
‘Terra do Pecado’, ignorado pela crítica,Saramago continua
a escrever, tendo diversos contos e
crônicas publicados em jornais e revistas.
A sua paixão pela literatura leva-o
a conseguir posições de certo destaque no meio editorial,
atuando comocolunista, revisor,
tradutor ecrítico literário.
Com aproximadamente quarenta anos de idade,
seu nome começa a ser conhecido no campo da literatura e cultura
em Portugal.
Saramago passa a ocupar diversas funções,
como coordenador do suplemento de cultura do jornal ‘Diário de Lisboa’,
e diretor-adjunto do ‘Diário de Notícias’.
Em 1970, Saramago
e Ilda Reis se divorciam.
E em 1975, ao deixar afunção de
editorialista do jornal onde
trabalha,resolve dedicar-se exclusivamente
à literatura.
Em 1980, aos 58 anos de idade,
Saramago publica o seu segundo
romance, chamado“Levantado
do Chão”.
Desta vez, a acolhida é
bem diferente; a obra é recebida com êxito, tanto
pela crítica, quanto pelo público,
em Portugal.
Aos sessenta e poucos anos de idade
Saramago dá início a uma tardia e
improvável carreira literária.
Os livros que se seguem nos anos seguintes são igualmente aclamados
pelo país afora.
Estamos em 1986, Saramago encontra-se com 63 anos de idade.
Separado, com a filha já adulta.
Realizou o sonho de escrever e ser lido.Com um sucesso
considerável em Portugal , parece um homem satisfeito
com a vida que lhe fora destinada.
“Aos 63 anos de idade, o que um homem pode
ainda esperar da vida?...”afirmaria numa
entrevista, “Não muito...”.
Mas o futuro ainda lhe reserva
algumas surpresas...
( fim da primeira parte desta apresentação )
1986 - Sevilha, Espanha. Uma jornalista espanhola, nos seus trinta
e poucos anos, passeia por uma livraria à procura de títulos interessantes.
Ao passar por uma estante que contém alguns livros separados para serem devolvidos à
editora, se depara com um título que chama sua atenção.
Mesmo sem ter ouvido falar do autor, ela resolve comprar o livro, sem poder imaginar
as consequências que tal decisão, aparentemente trivial, poderá ter.
Coincidências da vida, dirão alguns,enquanto outros atribuirão o ocorrido
ao destino, ao acaso, ao inevitável...
O livro se chama ‘Memorial do Convento’.
E a jovem jornalista que o acaba de adquirir, Pilar
del Río.
Blimunda, a protagonista de
‘Memorial do Convento’, ocupa um lugar
especial dentre todos os personagens femininos
criados por Saramago.
Pilar gosta tanto do livro que compra vários exemplares para presentear às melhores amigas,
comentando sua grande vontadede conhecer esse homem capaz de
tocar tanto a alma feminina
através de Blimunda.
Ela procura outros livros de Saramago, e diante da revelação
e fascinação sentida após cada leitura, resolve entrar em
contato com o autor.
Pilar recordará mais tarde: “Senti que tinha a obrigação moral de
dizer a José Saramago o que tinha experimentado. Um autor só acaba a
sua obra quando o livro é lido eentendido.
E eu queria dizer-lhe:
completou-se o ciclo, li-o e entendi.”
Uma bela tarde, toca o telefone na
casa de Saramago.
Pilar se identifica, dizendo ser uma leitora e admiradora.
Conversam sobre os livros de Saramago,
sobre a literatura, sobre a vida...
E ao fim da conversa, combinam de se encontrar numa
cafeteria em Lisboa, para uma entrevista
que Pilar propõe realizar para o jornal
em que trabalha.
Por ocasião do encontro, aproveitam para passear pela cidade de Lisboa, e
falam de quase tudo.
Depois, ela retorna para Sevilha.
“Com uma estranha paz.”
No dia seguinte, Saramago retribui a visita de Pilar a Lisboa, enviando-lhe uma carta,
acompanhada de rosas.
Caminhos que se entrecruzam, vidas prestes a se mudar para sempre...
Coincidências da vida, dirão alguns.O destino, o acaso, o inevitável,
afirmarão outros...
Há quem afirme que as histórias de amor, todas elas, desde o início dos tempos,
se parecem, se repetem.
O que muda são os nomes, os detalhes, os corações...
As idas e vindas entre Sevilha e Lisboa, onde Pilar e Saramago residem, respectivamente,
passam a se tornar cada vez mais frequentes.
Os 28 anos de vida que separam Pilar, com 34 anos, e Saramago, 63, se tornam um
mero detalhe diante do amor que sentem.
Em outubro de 1988 celebram o casamento.
Ao lado de Pilar, Saramago inicia o que chama de sua ‘segunda vida’.
Saramago observa que aos 63 anos, “quando já não se espera nada”, encontrou “o que faltava para
passar a ter tudo” – Pilar.
Ela, espanhola: sonhadora, lutadora, vive a batalha de mudar o mundo; Ele, português: melancólico, sereno...
Uma combinação perfeita.
Os livros que Saramago passa a escrever
desde então são todos dedicados
a ela.
“A Pilar, os dias todos”
“A Pilar, até ao último
instante...”
“A Pilar, minha casa”
Com a mudança para Lisboa, Pilar abandona a carreira jornalística
que exercia na televisão espanhola.
É a primeira leitora dos textos de Saramago, e a tradutora das obras
do marido para o espanhol.
Em 1991, Saramago publica o livro “O Evangelho segundo
Jesus Cristo”, onde conta a história
de Jesus de forma moderna, sob um
olhar narrativo que humaniza Cristo.
Em 1992, a Secretaria de Cultura de Portugal veta a inscrição do livro
na disputa do Prêmio Literário Europeu,
por considerá-lo “ofensivo para o catolicismo
do povo português.”
Em reação a tal veto, que considera censório,
Saramago se muda de Portugal,
passando a fixar residência na ilha de Lanzarote,
Ilhas Canárias.
E é em seu escritório em Lanzarote que Saramago escreve um de seus romances mais
conhecidos – “Ensaio sobre a Cegueira”.
Escrito em 1995, próximo à virada do milênio, o romance aborda uma epidemia de cegueira
repentina que acomete a inteira população de uma cidade.
A cegueira como uma alegoria para o estado de crise por que passa a atual sociedade,
onde, frequentemente, os limites entre civilização e barbárie são rompidos.
A cegueira como uma alegoria para o estado de crise por que passa a atual sociedade,
...
A cegueira descrita no livro é uma
“cegueira branca”, pastosa, como se alguém tivesse mergulhado de
olhos abertos num “mar de leite”.
“Trevas brancas” a anuviar o olhar
daqueles que, tendo olhos, não conseguem (ou se recusam a)
enxergar.
Uma cegueira por vezes associada ao avanço irrefreado do consumismo e
do materialismo,que faz com que
os homens percam a consciência de si, se deformem, se massifiquem e
se barbarizem.
Uma cegueira que promove a ruptura com a nossa própria
essência – a compaixão,
o cuidado, a solidariedade...
“Penso que estamos cegos,
José Saramago
Cegos que vêem, Cegos que, vendo,
não vêem.”
“Se podes olhar,
vê. Se podes
ver, repara”.
(epígrafe do livro “Ensaio sobre a
Cegueira”)
“Somos a memória que temos
e a responsabilidade que assumimos.
Sem memória não existimos,
sem responsabilidade talvez não mereçamos
existir.”José Saramago
1995 – Saramago recebe o Prêmio Camões, o mais importante da
literatura da língua portuguesa.
1998 – Recebe o Prêmio Nobel de
Literatura, tornando-se o
primeiro autor da língua portuguesa a
receber a homenagem.
1998 – Recebe o Prêmio Nobel de
Literatura, tornando-se o
primeiro autor da língua portuguesa a
receber a homenagem.
Saramago, aos 76 anos de idade, recebe o Prêmio Nobel
das mãos do rei da Suécia.Estocolmo, 1998
Ao receber o prêmio, Saramago inicia seu discurso com uma homenagem ao avô, o camponês Jerónimo
Melrinho, o que também pode ser visto como uma crítica à pompa das instituições literárias:...
“O homem mais sábio que conheci em toda minha vida não sabia
ler nem escrever...”
E passa a discorrer sobre memórias de sua infância, suas fontes de inspiração e formação, e sobre alguns
de seus principais livros e personagens.
Com a conquista do prêmio Nobel, inicia-se uma nova fase na vida de Saramago e Pilar.
Com a conquista do prêmio Nobel, inicia-se uma nova fase na vida de Saramago e Pilar.
O público leitor de Saramago multiplica-se.Os livros são traduzidos em 42 línguas, publicados em 53 países, e vendem milhões de
exemplares mundo afora.
Com a conquista do prêmio Nobel, inicia-se uma nova fase na vida de Saramago e Pilar.
O público leitor de Saramago multiplica-se.Os livros são traduzidos em 42 línguas, publicados em 53 países, e vendem milhões de
exemplares mundo afora.
Plateias numerosas, por vezes superiores a mil pessoas, ouvem avidamente suas palavras.
“Acho que na sociedade actual nos falta filosofia...”
“Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que,
sem idéias, não vamos a parte nenhuma.”
“Falamos muito ao longo destes últimos anos dos direitos humanos; simplesmente deixamos de falar
de uma coisa muito simples,...”
“...que são os deveres humanos, que são sempre deveres em relação aos outros, sobretudo.
E é essa indiferença em relação ao outro, essa espécie de desprezo do outro,...”
“...que eu me pergunto se tem algum sentido numa situação ou no quadro de existência
de uma espécie que se diz racional.”
“...que eu me pergunto se tem algum sentido numa situação ou no quadro de existência
de uma espécie que se diz racional.”
“O egoísmo pessoal, o comodismo, a falta de generosidade, as pequenas cobardias do quotidiano,
tudo isto contribui para essa perniciosa
forma decegueira mental...”
“...que consiste em estar no mundo e não ver o mundo
ou só ver dele o que, em cada momento, for susceptível de servir os
nossos interesses.”
“Temos que acreditar nalguma coisa e, sobretudo, temos de ter um sentimento de responsabilidade
colectiva, segundo o qual cada um de nós será
responsável por todos os outros.”
“A prioridade absoluta tem de ser o ser humano.
Acima dessa não reconheço nenhuma outra
prioridade.”José Saramago
E fazendo uso do espaço, da atenção e
notoriedade conferidos pelo prêmio Nobel,
Saramago denuncia as injustiças sociais, e
defende com coração e alma as causas que
abraça:...
Os cuidados com a infância;A educação de qualidade;
Os direitos dos povos nativos da América Latina;
O combate à violência doméstica;
A luta pelo fim dos maus-tratos contra animais;A questão dos refugiados;
O sofrimento do povo palestino;dentre tantas outras.
Aos oitenta anos de idade, guarda o vigor juvenil
de se revoltar contra toda injustiça, e
não permite que se morra nele o desejo de
mudar o mundo.
O engajamento sempre em prol do humanismo.
“Estou convencido de que é preciso continuar
a dizer não, mesmo que se trate de uma voz pregando
no deserto.”José Saramago
“Estou convencido de que é preciso continuar
a dizer não, mesmo que se trate de uma voz pregando
no deserto.”José Saramago
Em 2007, aos 85 anos, Saramago é agraciado como prêmio “Amigo das Crianças”, concedido pela
fundação ‘Save the Children’.
Segundo a fundação, o prêmio é um reconhecimento ao grande empenho na procura de “um mundo melhor
em que todas as crianças tenham esperança e oportunidades”,...
...salientando, ainda, o “compromisso ativo pela paz” e o “apoio continuado às campanhas e projectos
relacionados com a infância e com os mais desfavorecidos”.
Dentre os livros de Saramago encontra-se um dedicado ao público infantil
– “A Maior Flor do Mundo”.
Foto tirada em novembro de 2005.
Pilar é uma companhia constante nosintermináveis compromissos e viagens.
Igualmente defensora de inúmeras causas humanitárias, atua como confidente, conselheira, tradutora e é quem organiza a agenda do marido.
Estão sempre juntos – em Lisboa e Lanzarote ou pelo mundo – e de mãos dadas.
Estão sempre juntos – em Lisboa e Lanzarote ou pelo mundo – e de mãos dadas.
Um amor e uma admiração singulares – a aura envolvente que raros casais emitem...
“Pilar, se eu tivesse morrido aos 63 anos, antes de te conhecer, morreria muito mais velho do que serei
quando chegar a minha hora.” José Saramago
“Pilar, se eu tivesse morrido aos 63 anos, antes de te conhecer, morreria muito mais velho do que serei
quando chegar a minha hora.” José Saramago
Em meio às constantes viagens, é na residência em Lanzarote, com vista para o mar, que
Saramago recompõe as energias e se restabelece.
E mesmo com a agenda corrida, ele reserva tempo para escrever ao menos duas páginas diárias – que totalizará
um livro ao fim de um ano, conforme observa.
Por diversas vezes, Saramago e Pilar
visitam o Brasil, onde cultivam
muitas amizades.
Jorge Amado, Chico Buarque, Leonardo Boff,
Sebastião Salgado, Lygia Fagundes Telles Paulo Freire, Betinho,
Frei Betto, entre tantos outros.
A calorosa acolhida dos intelectuais brasileiros também se reflete na relação de Saramago com
o seu público leitor no país.
Certa vez, diante da cativa platéia e da efusão de beijos e abraços que se seguiram, exclama:...
Certa vez, diante da cativa platéia e da efusão de beijos e abraços que se seguiram, exclama:...
“Esta gente quer me matar
de amor!”
Saramago também manifesta um carinho especial pelos jovens e adolescentes.
Frequentemente aceita convites para visitar escolas, proferir palestras e participar de debates.
“Nem a juventude sabe o que pode, nem a velhice pode o que sabe.”
José Saramago
Saramago, rodeado pela família – foto tirada em 1993, na varanda da casa de Lanzarote.
A filha, Violante, e o genro, Danilo;
os netos, Ana e Tiago.
Pilar e Juan Jose – filho do primeiro casamento,
(que segura o cãozinho Camões).
Ao mesmo tempo em que
cultiva a conhecida
seriedade, Saramago também nutre uma notória leveza e um bom-humor constante.
Certa vez, declara gostar da seção de
quadrinhos dos jornais.
“Confesso que gosto muito do
Calvin e do Hobbes, do Snoopy,
do Garfield,...”
“...daquela Mafalda sábia e subversiva, de quem continuo a ser
discípulo fiel.”
José Saramago
mas cabe nela muito mais
do que somos capazes de viver.”
“A vida é breve,
José Saramago
“Fugir da morte pode tornar-se num modo de fugir da vida.”
“O homem é o único animal
capaz de chorar.
É diante do mar que o riso e a
lágrima assumem uma importância
absoluta.”
E de sorrir.
“Dir-se-á que mais profundamente a
assumiriam diante do universo,
mas esse, digo eu, está demasiado longe, fora do alcance duma compreensão
comum.”
“O mar é o universo
perto de nós.”José Saramago
Em 2007, Saramago é hospitalizado durante longos meses, devido a uma grave doença respiratória.
Tão logo se recupera, conclui o livro “A Viagem do Elefante”,...
...e faz questão de viajar para o Brasil, aos 85 anos de idade, para o lançamento mundial da obra.
...e faz questão de viajar para o Brasil, aos 85 anos de idade, para o lançamento mundial da obra.
A escolha do Brasil para o lançamento mundial é um
presente ao carinho e amizade dos brasileiros.
16 de novembro, 2008, aniversário de 86 anos.
A notória lucidez e a acuidade da sua reflexão filosófica
permanecem inabaláveis,
contrastando cada dia mais com a
saúde física debilitada.
“A vida é como uma vela que vai
ardendo,quando chega ao fim
lança uma chama mais forte antes de
se extinguir.”
“Creio que estou no período da
última chama...”,
afirma Saramago diante das crescentes limitações impostas pela saúde frágil .
Janeiro de 2010 – Haiti é sacudido por um forte tremor, que deixa
milhares de mortos, feridos e desabrigados.
Saramago, aos 87 anos de idade, já não tem a força nem a saúde
para empreender viagem, de modo a levar a sua solidariedade
àqueles que sofrem.
Apesar da distância, desde ailha de Lanzarote, encontra
um meio de contribuir, e de lançar o seu incansável apelo
para a humanidade.
Ele convence sua editora a publicar uma edição especial do livro
“Jangada de Pedra”, que terá a renda revertida integralmente
em prol do povo haitiano.
Mais que um gesto de ajuda, um sopro de alento, nestes
dias de fria indiferença,nestes tempos tão desprovidos
de compaixão social e caridade.
– Uma ‘Jangada de Pedra’a caminho do Haiti –
“Porque todos temos uma obrigação.”
José Saramago
Abril de 2010, a saúde física de Saramago a tal ponto está debilitada que o seu médico
lhe impõe repouso absoluto.
O repouso absoluto, observa o médico, abrange também a escrita, ou seja, Saramago deverá parar de escrever.
Diante da renúncia derradeira à escritaque acaba de ser imposta ao esposo,
Pilar sente que a recuperação será um milagre.
“...enganadora é sim a luz do dia,
faz da vida uma sombra apenas recortada,só a noite é lúcida,
porém o sono a vence,...”
“...talvez para nosso sossego e descanso,
paz à alma dos vivos.”
(em ‘O Ano da Morte de Ricardo Reis’)
José Saramago
Mês de maio, 2010
Durante as últimas semanas, Saramago quase não fala, mas ri, e segue rindo.
Embora participe dos jantares e cafés da manhã que Pilar carinhosamente lhe prepara,...
...parece nutrir outras fomes e outras necessidades, anseios que a este mundo já não mais pertencem.
Ele está aqui e não está, mas sorri.
Ele está aqui e não está, mas sorri.
“...o espírito não vai a lado nenhum sem
as pernas do corpo,
José Saramago(em ‘Todos os Nomes’)
e o corpo não seria capaz de mover-se se lhe faltassem as asas
do espírito.”
No dia 18 de junho, depois de uma noite
serena e tranquila,
Saramago falece na sua residência em Lanzarote, acompanhado de Pilar e
de sua família, “despedindo-se de forma
serena e plácida.”
Em se havendo outros mundos,
e havendo lá também oprimidos e necessitados,
estes ganharam uma voz a defendê-los e
quem se importe com eles...
estes ganharam uma voz a defendê-los e
quem se importe com eles...
E em se havendo outros mundos ainda,
talvez lá tenham se reencontrado o pequeno José
e os avós tão amados, Josefa e Jerónimo.
“Dentro de nós há uma coisa que
não tem nome,essa coisa é
o que somos.” José Saramago
Segundo o amigo e teólogo Leonardo Boff,
Saramago cultivava “a espiritualidade como sentimento do mistério
do mundo,,
da profundidade humana
e do amor aos oprimidos.”
Leonardo Boff descreve a tarde que ele e a esposa,
Márcia, passaram na companhia
de Saramago e Pilar como “um festim de
espiritualidade”.
“Ganhamos um amigo e a fé me diz que
ele agora mergulhou naquele Mistério de amor
que sempre buscou.”Leonardo Boff
“Quando me for deste mundo, partirão duas pessoas.
José Saramago
Sairei, de mão dada, com essa criança que fui”.
Formatação: [email protected]
Tema musical:Primeira Parte: ‘Illumination’, White StonesSegunda Parte: ‘Moment musical n.3’, Schubert
Obrigado, Saramago.
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