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ndice
Prefcio dos editores belgas.............................................. 03
Prefcio do tradutor......................................................... 05
Mademoiselie Clairon e o fantasma (1) ............................. 17
O Esprito batedor de Bergzabern.................................... 23
Consideraes sobre o Esprito batedor de Bergzabern ........... 30
O Esprito batedor de Bergzabern (II) .............................. 31
O Esprito batedor de Bergzabern (III) ............................ 42
Palestras familiares de Alm-Tmulo................................ 46
Espritos impostores O falso padre Ambroise................. 54
O Esprito batedor de Dibbelsdorf................................... 59
Obsidiados e subjugados............................................ 63
O mal do medo.............................................................. 78
Teoria do mvel de nossas aes.................................... 80
Palestras familiares de Alm-Tmulo II............................ 83
Dificuldades com que deparam os mdiuns................... 85
Espritos barulhentos como dialogar com eles................ 94
Estudo sobre os mdiuns................................................ 98
Mdiuns interesseiros...................................................... 102
Processo para afastar os maus Espritos.......................... 104
Manifestaes fsicas espontneas................................... 116
Superstio..................................................................... 121
O Livro dos Mdiuns...................................................... 122
O Esprito batedor de Aube........................................... 124
Epidemia demonaca na Sabia...................................... 132
Estudos sobre os possessos de Morzine........................... 137
Estudos sobre os possessos de Morzine (II) ................... 149
Estudos sobre os possessos de Morzine (III) ................... 158
Estudos sobre os possessos de Morzine (IV) ................... 167
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Estudos sobre os possessos de Morzine (V) .................... 181
Um Caso de possesso..................................................... 192
Perodo de luta .............................................................. 197
Instrues dos Espritos................................................. 200
Os conflitos ................................................................... 202
Um caso de possesso .................................................... 208
Cartas de Alm-Tmulo ............................................. 216
Variedades. Cura de uma obsesso ................................ 220
Cura da jovem obsidiada de Marmande.......................... 220
Novos detalhes sobre os possessos de Morzine............... 234
Instrues dos Espritos ................................................ 242
Os Espritos na Espanha ................................................ 242
Curas de obsesses ......................................................... 253
Sesso anual comemorativa dos mortos. ...................... 257
Discurso de abertura pelo sr. Allan Kardec...................... 257
Prefcio dos editores belgas
Apresentando estas pginas escritas pelo mestre Allan Kardec,
nosso propsito tornar conhecidos certos fatos que a maioria dos
espritas, de modo geral, quase sempre desconhecem, uma vez
que as fontes de onde foram colhidos so muito raras.
Esses fatos curiosos, e, sobretudo instrutivos, serviram
singularmente para fazer a cincia esprita avanar na
compreenso do invisvel.
Alguns captulos parecem ter pouca relao com o ttulo do livro,
porm nem por isso deixam de conter instrues da mais alta
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importncia para o leitor que medita e deseja se aprofundar no
assunto.
Quanto ao problema da obsesso, verificar-se-, pelos fatos
relatados, que ela tanto pode atingir o profano quanto o esprita
propriamente dito, e este at com maior facilidade.
Essa doena moral existiu desde todos os tempos, mas o
Espiritismo bem compreendido e bem praticado pode dela preservar
a criatura e, se atingida, cur-la mais eficazmente do que qualquer
outra cincia ou doutrina, uma vez que ele revela a verdadeira
causa do mal, bem como a forma de nos livrarmos dele,
apresentando uma imensa variedade de particularidades, conforme
a cada caso.
Assim sendo, este livro interessa muito de perto aos espritas, uma
vez que, segundo as prprias palavras de Allan Kardec, a obsesso
um dos grandes tropeos com que esbarra o Espiritismo.
Verificar-se-, igualmente, a eficcia da prece e, sobretudo, da
prece coletiva para combater a obsesso, por exemplo, atravs de
algumas descries comovedoras que nos revelam o servio que
nos possvel prestar se nos dispusermos a nos instruir a respeito,
e, bem assim, o esforo que necessitamos fazer para nos
elevarmos na hierarquia dos Espritos a fim de aceitarmos, sem
susceptibilidade, a severidade das instrues morais dos Espritos
Superiores, pois que eles nunca se dispem a nos engrandecer ou
a nos embalar com iluses, ao invs de nos dizer a verdade.
Fechamos este livro com um discurso do mestre Allan Kardec, no
qual ele desenvolve o problema da comunho de pensamentos com
o seu estilo sempre magistral, j que ningum, por maior tenha sido
o seu trabalho, seu devotamente e seu talento, pode dar
cumprimento a uma tarefa mais magnificamente do que ele o fez,
auxiliado por uma pliade de Espritos que lhe colocaram nas mos
todos os assuntos dignos de ser enfocados na justa medida do
avano da cincia, para nos trazer as consoladoras verdades do
Espiritismo.
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Desejamos aqui prestar homenagem a nosso guia espiritual, Jean
Baptiste Quimaux, bem como a seus colaboradores, ao auxlio de
Espritos simpatizantes, familiares, protetores e superiores que,
desde 1885, atravs de seus conselhos, sua perseverana e suas
instrues reiteradas, sempre baseados nos Evangelhos e nas
obras de Allan Kardec, mantiveram a coeso deste grupo em clima
de harmonia moral e desinteresse material, para maior glria de
Deus e felicidade de toda a Humanidade.
A COMISSO
Prefcio do tradutor
O problema da obsesso problema de mente a mente ou de
mentes para com outras mentes. , pois, uma questo de atitudes
mutuamente assumidas. Para no repisarmos quanto vem sendo
dito e escrito neste ltimo sculo e isto de valiosa maneira!
gostaramos, alinhando estas consideraes despretensiosas, de
nos atermos ao problema da atitude propriamente dita, encarada
at os limites onde a Psicologia Social nos pode conduzir. Pois que
atitude problema de Psicologia Social, cincia que mantm laos
ntimos, vizinhana estreita com outras cincias, tais a Psicologia, a
Sociologia e a Etnologia e, como tal, tem de ser reconhecida em
sua originalidade, assim como a Fsica, a Mecnica ou a Qumica.
J se disse que o Espiritismo ser cincia ou no ser. Ora, ele
nunca recusou confronto com quaisquer outras cincias, pelo
contrrio abraa-as prazerosamente e segue com elas renovando-
se a cada dia. Mas aqui vale notar que a arquitetura geral traada,
as articulaes estabelecidas entre diferentes noes j adquiridas
sobre atitude, resultam, no o dissimulamos, de concepes
prprias. Assim, pois, esto sujeitas tanto crtica quanto
discusso, pois que, analisando o problema, os estudiosos
sistematicamente tm-se negado a explorar o rico filo da mente
desencarnada atuando sobre a mente encarnada, bem assim a
questo reencarnatria, dois poderosos fatores que de nenhuma
forma podem ser afastados cu ignorados ao exame das atitudes,
sobre elas lanando uma poderosa luz.
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J Paulo de Tarso escrevia: ... mas nada puro para os
contaminados e infiis... (Tito, 1: 15), ao que Emmanuel, em
FONTE VIVA, adita:
O homem enxerga sempre atravs da viso interior. Com as cores
que usa por dentro, julga os aspectos de fora. Pelo que sente,
examina os sentimentos alheios. Na conduta dos outros, supe
encontrar os meios e fins das aes que lhe so peculiares. Da o
imperativo de grande vigilncia para que a nossa conscincia no
se contamine pelo mal. Quando a sombra vagueia em nossa mente,
no vislumbramos seno sombras em toda a parte. Junto das
manifestaes do amor mais puro, imaginemos alucinaes carnais.
Se encontramos um companheiro trajado com louvvel aprumo,
pensamos em vaidade. Ante o amigo chamado carreira pblica,
imaginamos a tirania poltica. Se o vizinho sabe economizar com
perfeito aproveitamento da oportunidade, fixamo-lo com
desconfiana e costumamos tecer longas reflexes em torno de
apropriaes indbitas. Quando ouvimos um amigo na defesa justa,
usando a energia que lhe compete, relegamo-lo, de imediato,
categoria de intratvel.
Quando a treva se estende na intimidade de nossa vida,
deplorveis alteraes nos atingem os pensamentos. Virtudes,
nessas ocasies, jamais so vistas. Os males, contudo, sobram
sempre. Os mais largos gestos de bno recebem lastimveis
interpretaes. Guardemos cuidado toda vez que formos visitados
pela inveja, pelo cime, pela suspeita ou pela maledicncia. Casos
Intrincados existem nos quais o silncio o remdio bendito e
eficaz, porque, sem dvida, cada esprito observa o caminho ou o
caminheiro, segundo a viso clara ou escura de que dispe.
Em vista disto, prossigamos: Um esprito que assedia outro, com tal
ou qual Inteno, oferece ao exame, via de regra, deformao de
percepes ou de memria para isto que, em ltima anlise,
nos desperta a ateno o comentrio de Emmanuel. Todavia, quais
as causas que residem nessas deformaes? No livro que iremos
ler, Kardec rene casos de obsesses manifestadas no apenas
em indivduos mas tambm em grupos, tal o de Morrinhes. Trata-se,
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pois, de um comportamento social, isto , de uma delicada textura
tal as maneiras como seres humanos os espritos so seres
humanos! se ajustam ou no se ajustam ao meio social, neste
caso provocando toda a gama de desequilbrios que Kardec com
to grande felicidade cataloga ao vivo.
Mas, em particular, preciso que se focalize uma forma de
ajustamento: os desenvolvimentos das atitudes. A anlise das
atitudes apresentadas por Inteligncias desencarnadas ontem
preocupava Kardec to seriamente quanto hoje, em criaturas
encarnadas, a preocupao mais Importante dos psiclogos
sociais. Ora, no vai um passo entre as atitudes assumidas por
inteligncias encarnadas e as desencarnadas. Em ambos os casos
o fenmeno psicolgico se reveste de tremendo significado social e
foi precisamente por isto que Kardec nele to cuidadosamente se
deteve.
As atitudes afetam o comportamento e a personalidade. luz da
Psicologia Social tentaremos, embora com simplicidade, explicar
tanto quanto for possvel! como essas atitudes se formam, isto
, como so aprendidas, nesta ou noutras vidas, e como talvez
possam ser mudadas. Isto possivelmente poder nos auxiliar tanto
agora quanto aps a nossa desencarnao.
Mas o que uma atitude? uma maneira organizada e coerente
de pensar, sentir e reagir em relao a grupos, questes, outros
seres humanos, ou, mais especificamente, a acontecimentos
ocorridos em nosso meio circundante. Neste livro Kardec rene
exuberantes exemplos de tudo isto.
Os componentes essenciais da- atitude do os pensamentos, as
crenas os sentimentos ou emoes, e as tendncias para
reagir. Diz-se que uma atitude est formada quando esses
componentes se encontram de tal maneira inter-relacionados que
os sentimentos e tendncias reativas especficas ficam
coerentemente associadas com uma maneira particular de pensar
em certas pessoas ou acontecimentos. Desenvolvemos nossas
atitudes ao enfrentarmos e ajustarmo-nos ao meio social e uma
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vez desenvolvida, emprestam regularidade aos nossos modos de
reagir e de facilitar o ajustamento social.
Nas primeiras fases do desenvolvimento de uma atitude, seus
componentes no esto rigidamente sistematizados que no
possam ser modificados por novas experincias. Mais tarde, porm,
sua organizao malfica ou benfica, pode se tornar
inflexvel e estereotipada, especialmente nas pessoas em que
foram encorajadas, no decurso de grandes perodos de tempo,
reencarnaes por exemplo, a reagir segundo processos
padronizados ou aceitveis a determinados acontecimentos e
grupos.
Num como noutro caso os Evangelhos e o Espiritismo so capazes
de poderosamente auxiliar.
Se as atitudes de uma pessoa tornam-se inabalavelmente fixas,
ela estar ento pronta para classificar pessoas ou acontecimentos
em um dos seus padres emocionalmente elaborados de
pensamentos, de modo que fique incapacitada para examinar ou
reconhecer a individualidade dessas mesmas pessoas ou eventos,
tudo conforme Emanuel deixa explcito em sua mensagem. E dessa
maneira que as atitudes fixas ou estereotipadas reduzem a
riqueza potencial e constringem as reaes.
O estudo do processo obsessivo nos fornece ampla amostragem
desse fato. Ocorrncia importante a ser enfatizada, principalmente
no meio esprita, onde se tem por lema que o verdadeiro esprita
reconhece-se por sua reforma ntima, que no estamos
completamente cnscios da maioria das nossas atitudes nem da
extensa influncia que elas tm sobre o nosso comportamento
social. Mas, atravs da to citada vigilncia, numa anlise
detalhada, podemos localizar o funcionamento de certas atitudes
em ns mesmos. E no esqueamos de que j agora, ou amanh,
na qualidade de espritos, poderemos, conforme nossa atitude, ser
classificados como obsessores.
Atravs de relampejos introspectivos das atitudes que funcionam
em ns, tornamo-nos sensveis s atitudes de outras mentes,
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vestidas de carne ou no. Mas sucede que num ou noutro caso
nem sempre as pessoas revelam abertamente suas atitudes! De
fato elas aprendem, atravs de experincias com outros, a manter
algumas de suas atitudes escondidas dos conhecimentos casuais
ou mesmo dos amigos mais ntimos. Em virtude desse fato vamos
usar o termo tendncia de reao, em lugar de reao, apenas
para o terceiro componente das atitudes, a fim de indicar que
estas no se encontram necessariamente expressas no
comportamento ostensivo. E porque isso se d, o xito da interao
social redunda, frequentemente, no talento para inferir ou reduzir a
natureza dos pensamentos, sentimentos e tendncias reativas dos
outros, a partir de indcios muito sutis de comportamento. Na
realidade uma caracterstica comum do pensamento humano
fazer inferncias sobre as atitudes dos outros e regular nossas
prprias aes em conformidade. Com base em limitadas e
diminutas amostras do comportamento dos outros, poderemos
concluir se, digamos, tratamos com pessoa liberal, compreensiva,
destituda de preconceitos, e reagirmos, ento, de maneira que
considerarmos mais apropriada. Mas, embora todos ns faamos
dedues, as pessoas diferem na capacidade de faz-las
corretamente.
Os psiclogos sociais desenvolveram uma srie de tcnicas
sistemticas para inferir e medir atitudes. Como as atitudes no
podem ser diretamente medidas, as inferncias indiretas sobre elas
requerem uma comprovao cuidadosa para que sejam vlidas, isto
. Deve-se estabelecer que as medidas de atitudes realmente
medem aquilo que pretendem e no algum outro processo
psicolgico.
As atitudes desempenham uma funo essencial na determinao
de nosso comportamento; por exemplo, afetam nossos julgamentos
e percepes sobre os outros, como to bem expressa a
mensagem de Emmanuel. Ajudam a determinar os grupos com que
nos associamos, as profisses que finalmente escolhemos e at
mesmo a filosofia ou a religio sombra das quais vivemos.
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Em nossa definio de atitudes preciso destacar que elas
constituem organizados, coerentes, e habituais modos de sentir
e reagir, em relao a acontecimentos e pessoas em nosso prprio
meio-ambiente. Usamos esses adjetivos para indicar que as
atitudes so modos aprendidos de ajustamento, isto , hbitos
complexos. O desenvolvimento desses hbitos, portanto, deve
obedecer a princpios fixos de aprendizagem. Essa aprendizagem
por sua vez, ainda que os Evangelhos e a doutrina esprita sirvam
de seguro roteiro, depende de fatores da vontade pessoal. O
propsito seria ento apresentar trs princpios inter-relacionados
que ajudam a explicar como se aprendem as atitudes, a saber, os
princpios de: associao, transferncia e satisfao de
necessidades.
Em geral aprendemos sentimentos e tendncias reativas, dois dos
componentes das atitudes, atravs da associao e da
satisfao de necessidades, isto , aprendemos a temer, a evitar,
a guardar rancores para com pessoas ou coisas associadas com
acontecimentos desagradveis, a gostar e a nos aproximar das
associadas com acontecimentos agradveis. Evitando no primeiro
caso, e abordando no segundo, satisfazemos necessidades bsicas
de prazer e conforto. Por exemplo, nossas atitudes mais bsicas
so aprendidas ou despertadas na infncia, pela interao com os
nossos pais, nesta ou em vidas pregressas. Tipicamente uma
criana desenvolve fortes atitudes favorveis em relao aos pais,
visto que, ao cuidarem das necessidades e conforto dela, sua
presena se torna associada com o seu conforto e bem estar geral.
Nisto tambm se oculta o mecanismo da harmonizao dos
espritos, de que a Providncia Divina se serve, na sabedoria de
suas leis. Todavia com o tempo, desavisados, os pais ficam
associados tanto com os prazeres quanto com as punies. E as
atitudes da criana adquirem ento uma natureza complexa e
ambivalente.
De fato as atitudes aprendidas por associao e satisfao de
necessidades so, muitas vezes, categorizadas nas fases iniciais
de seu desenvolvimento, pela incapacidade do indivduo para
compreender porque ele se sente e reage assim. Essa
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incapacidade de compreenso torna-o especialmente atento aos
pensamentos e crenas dos demais e poder finalmente adot-los
como um meio para justificar seus prprios sentimentos e
tendncias reativas. Nosso propsito apresentar, neste ponto, o
princpio de transferncia, que ajuda a explicar como aprendemos
atitudes, especialmente os componentes pensa-mento-crena,
com outras pessoas.
Na realidade, aprendemos atitudes atravs de transferncia de um
modo essencialmente idntico quele em que aprendemos o
significado de conceitos: atravs da instruo. Por exemplo, uma
criana desenvolve imediatamente um significado para zebra
quando se lhe diz que um animal do feitio de um cavalo, com
listras de cima a baixo. Neste exemplo duas idias no
relacionadas na criana (cavalo e listras de cima a baixo), so
levadas, pela primeira vez, a uma nova combinao. De modo
semelhante aqueles que nos ensinam ou transmitem idias ou
emoes podem transferir atitudes mediante a sugesto de como
deveremos reorganizar e integrar algumas de nossas idias
bsicas. Quando existe uma estreita relao entre transmissor e
receptor, os sentimentos de tendncias reativas tambm podem ser
transferidos juntamente com os pensamentos e crenas. Por
exemplo, algum poderia transferir uma atitude completamente
favorvel descrevendo os pretos como criaturas de pele escura,
maltratados, trabalhadores no duro, amveis e agis. Ou
poderia transmitir uma atitude totalmente negativa, descrevendo-
os como dotados de pele escura, preguiosos, incertos, sujos
e indignos de confiana.
Todavia no incorporamos todas as atitudes dirigidas para o
nosso caminho; o fato de selecionarmos quais as atitudes que nos
interessam, indica no apenas que a satisfao de uma
necessidade se encontra presente quando as atitudes so
transferidas, mas igualmente que o mecanismo j pode ter sido
acionado em uma outra encarnao. Em criana prestamos ateno
e, usualmente, adotamos as atades de nossos pais, como parte
normal de nos tornarmos educados, fato este que no deve escapar
aos pais espritas, os maiores interessados e responsveis pela
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modificao moral daqueles que a Divina Providncia lhes deu
como tutelados. O fato ocorre porque ao sermos come nossos pais,
em todos os aspectos garantimos a afeio deles, ao mesmo tempo
que consolidamos nosso sentimento de pertencermos famlia. A
necessidade de afeto e de pertencer, numa criana, nem sempre
so satisfeitas na famlia, claro, e elas ento passam a exteriorizar
sua hostilidade no adotando as atitudes dos pais na transferncia
ou assumindo atitudes inversas.
Tambm adotamos atitudes de outras pessoas importantes fora
da famlia. medida que crescemos, vamos incorporando atitudes
que nos parecem apropriadas para pertencer a grupos que
reputamos importantes. Por vezes mudamos de atitude como
meio de abandonarmos um grupo e nos integrarmos em outro.
primeira vista a mudana de atitudes poder parecer uma
questo simples, e este o erro em qu costuma incidir a maioria
dos doutrinadores de sesses de desobsesso. Pensamos que,
uma vez que as atitudes so aprendidas, deveria ser bastante fcil
modificar a intensidade delas ou substituir uma atitude indesejvel
mediante a aprendizagem de outra. O fato complicado porm que
as .atitudes no so modificadas ou substitudas com a mesma
facilidade com que so aprendidas.
Como j vimos, as atitudes se desenvolvem, tornam-se aspecto
integrante da personalidade de um indivduo, influindo em todo o
seu estilo de comportamento. Mud-las no fcil e por isso raro
ouvirmos falar de mudanas radicais tais as sofridas por Maria de
Magdala ou Paulo de Tarso. As tentativas para modificar atitudes,
por mais bem planejadas que sejam, s conseguem, muitas vezes,
alterar o componente pensamento-crena, sem afetar sentimentos e
tendncias reativas, de modo que, com o tempo, a atitude poder
reverter ao seu estado anterior.
Um grupo de pesquisadores da Universidade de Yale conseguiu
esboar algumas das caractersticas da personalidade que
distinguem a pessoa altamente persuadvel. Poucas pessoas,
afirmam eles, reagem persuaso com flexibilidade discriminante,
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isto , no so demasiado susceptveis nem demasiados
resistentes. As poucas que possuem essa caracterstica esto
suficientemente interessadas em seu meio social para darem
ouvidos pelo menos a algumas idias dirigidas sua maneira de ver
as coisas, mas esto igualmente habilitadas a distinguir e pr de
lado o que para elas no oferece qualquer importncia. Todavia a
maioria das pessoas varia em torno desse ideal na direo dos
extremos. O indivduo crdulo caracteriza-se por uma acentuada
dependncia de outras pessoas e uma incapacidade notria para
apreciar de modo crtico as proposies alheias. Essa combinao
de caractersticas torna-o especialmente inclinado a adotar as
crenas dos outros ou quaisquer proposies apresentadas com
autoridade. No outro extremo situa-se o indivduo altamente
resistente persuaso, a quem falta, frequentemente, a capacidade
de compreender o material comunicado. habitualmente negativo
. Autoridade, rgido e obtuso em seu pensamento e
voluntariamente desatento a novas idias, de onde a necessidade,
per parte das Divinas Leis que nos regem, do imperativo da Dor
como derradeiro recurso de persuaso para o Bem.
Alguns psiclogos sociais dedicaram recentemente ateno ao
estudo do desejo humano de ter atitudes logicamente coerentes.
Esse novo interesse resultou das idias defendidas por Fritz Heider.
Da Universidade de Kansas, que se convenceu de que as pessoas
procuram relaes equilibradas ou harmoniosas, entre suas
atitudes e conduta ficando psicologicamente perturbadas
enquanto no se estabelecer um estado de equilbrio. Quando o
significado dessa idia tornou-se patente, algumas das mais
prometedoras teorias sobre a mudana de atitudes comearam a
aparecer. Primeiro Charles Osgood e Percy Tanembaum, da
Universidade de Illinois, demonstraram que as pessoas alteram
suas atitudes quando se tornam bvias algumas incoerncias
sobre as mesmas. evidente que uma pessoa muda suas prprias
atitudes para reduzir a Incoerncia entre elas e seu
comportamento. Desenvolvemos atitudes na medida em que
lidarmos com o nosso meio social e, uma vez desenvolvidas, elas
facilitam o nosso ajustamento, regularizando nossas reaes ante
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acontecimentos recorrentes. Quando as atitudes esto
rigidamente organizadas, entretanto, elas constringem a riqueza de
nossas experincias, pois nos inclinamos, com excessiva rapidez, a
atribuir categorias s pessoas e acontecimentos, dentro de padres
de pensamento superestruturados, e os nossos sentimentos e
reaes em face dos mesmos tornam-se rotineiros.
Grande parte do nosso comportamento social influenciado pelas
atitudes que sustentamos. Elas afetam nossos julgamentos e
percepes, nossa eficincia no estudo, nossas reaes com
relao aos outros e at nossa filosofia bsica de vida. Finalmente
as atitudes numerosas que desenvolvemos acabam por unirem-se
em padres caractersticos que ajudam a formar a base de nossa
personalidade.
Concebemos as atitudes como hbitos complexos e, como tal,
esperamos que seu desenvolvimento obedea a princpios de
aprendizagem, tal como sucede a muitos outros tipos de hbitos.
Parece que aprendemos dois dos componentes das atitudes os
nossos sentimentos e tendncias reativas atravs da
associao e da satisfao de necessidades, isto , como j foi
dito, aprendemos a temer e a evitar pessoas e acontecimentos
associados com ocorrncias desagradveis; a gostar e acercarmo-
nos daquilo que estiver associado com ocorrncias agradveis.
Tipicamente adquirimos nossos pensamentos e crenas (o
terceiro componente), atravs de pessoas importantes em nosso
mundo social que transferem seus pensamentos e crenas para
ns j prontos e por medida, se assim podemos dizer. Atravs, da
comunicao social, no s recebemos componentes de atitudes
por meio de transferncia, mas tambm transmitimos nossas
prprias crenas aos outros.
As tentativas de modificar ou substituir atitudes assentam nos
mesmos princpios de aprendizagem. Mas evidentemente muito
mais difcil mudar ou esquecer atitudes do que aprend-las.
Porque isso assim parece ser, estamos comeando a apreciar o
grande papel que a socializao inicial desempenha no
desenvolvimento de atitudes.
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Diversas estratgias para modificar atitudes esto sendo
investigadas e comparadas. Um novo e prometedor critrio destaca
o desejo normal das pessoas de serem logicamente coerentes em
seus pensamentos e sentimentos. Os investigadores descobriram
que quando um componente da atitude experimentalmente
modificado, os outros parecem sofrer um realinhamento coerente.
H mesmo indcios de que as pessoas mudaro suas prprias
atitudes at sem se darem conta disso, quando as incoerncias
lgicas, em suas crenas e sentimentos, so levados ateno
delas.
As atitudes desenvolvidas em casa, no seio da famlia, ou atravs
das primeiras experincias em grupos so particularmente
importantes na formao da estrutura de um complexo de atitudes
e resistem bastante modificao.
Os psiclogos sociais confessam que necessitam mais pesquisas
para explicar tanto a persistncia quanto alterabilidade de atitudes.
Embora no existam ainda respostas finais o Espiritismo
prescreve preces, vibraes e dilogos em sesses para isto
especialmente orientadas ou, entre os encarnados, o cuidadoso
aprendizado de sentimentos e tendncias reativas , podemos
prever que os estudos revelaro atitudes particularmente
renitentes mudana se: A) tiverem sido aprendidas no incio da
vida ou em uma sequncia de vidas pretritas; B) tiverem sido
aprendidas tanto por associao como por transferncias; C)
ajudarem a satisfazer necessidades; D) tiverem sido integradas na
personalidade e estilo de comportamento de um indivduo. Por tudo
isto Jesus prope to seriamente o orai e vigiai.
Os psiclogos sociais so guiados por essas regras gerais em suas
tentativas para modificar atitudes e elas devem ser levadas em
conta tambm pelos espritas. Sabem que se quiserem substituir
atitudes ou modificar sua intensidade, as novas idias e crenas a
serem aprendidas devem ser engenhosamente apresentadas,
usualmente na forma de comunicaes persuasivas. Se se quiser
alterar modos habituais de sentir e reagir lembremo-nos aqui da
afirmativa de Kardec, segundo a qual se reconhece o verdadeiro
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esprita por sua reforma ntima , devem ser preparados
enquadramentos sociais reais ou experimentalmente engendrados,
de tal maneira que os novos processos de reao possam ser
aprendidos. As tcnicas usadas em outras palavras devem facilitar
a aprendizagem.
Como seria de esperar, os componentes de novas atitudes so
aprendidos de acordo com os princpios de transferncia,
associao e satisfao de necessidades. Muitos psiclogos esto
empenhados em pesquisas para determinar critrios e pena que
no empreguem o rico veio que o Espiritismo lhes oferece, pois, tal
como ocorre nas sesses de desobsesso, as concluses das
pesquisas indicam que mais provvel que as novas atitudes
sejam transferidas por intermdio de contatos face a face ou em
discusses em grupos do que atravs de conferncias impessoais.
Mas a personalidade daqueles que fazem os contatos pessoais
fixam limites leia-se as obras de Andr Luiz e observe-se as
personalidades dos encarregados de semelhantes tarefas , a sua
eficcia como agentes de transferncia, uma vez que, como vimos,
as atitudes so mais facilmente transferidas quando o indivduo
que aprende atrado para um professor social e deseja ser
como ele. Por exemplo, verificou-se que quanto mais digna de
confiana e atraente uma pessoa, tanto mais haver possibilidade
de sua mensagem penetrar e influenciar as atitudes existentes.
Faz-se tambm largo uso do princpio da satisfao de
necessidades nas tentativas de alterar atitudes. Por exemplo, as
novas idias numa mensagem persuasiva podem ser apresentadas
com o endosso de lderes de grupos ou de pessoas de elevada
posio moral. Se os que recebem a mensagem forem levados a
compreender que o serem aceitas por si mesmas ou por outrem
depende de adotarem um conjunto diferente de atitudes as
mudanas podem concretizar-se.
A mudana de atitude poder tambm ocorrer se forem
propiciadas condies adequadas para aprender-se. Novos meios
de sentimentos e reao atravs da associao.
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Enquanto extensa pesquisa sobre os mtodos de apreciao de
comunicaes persuasivas ou de criao de contextos sociais para
aprendizagem de novas atitudes continua sendo feita, outros
grupos de investigadores esto concentrando a ateno sobre as
caractersticas de personalidades daqueles cujas atitudes se
pretenda mudar. Como vimos, as atitudes possuem razes slidas
no sistema motivacional da personalidade; quaisquer tentativas
para mudar atitudes sero limitadas enquanto no se souber
mais sobre as relaes entre atitudes e personalidade.
Contudo, para ns espritas, o estudo das obras de Andr Luiz, pela
psicografia de Francisco Cndido Xavier; j provoca um grande
avano na compreenso do problema. A obra do falecido Carl
Hovland e seus associados, em Yale, bem como a de Leon
Festinger, de Stanford, no devem ser postas de lado.
Afinal, conquanto encarnados hoje, nem por isso poderemos deixar
de ser, at inconscientemente, os obsessores de amanh. Por tal
motivo e pelo lema esprita de progredir sem cessar, tal a lei,
julgamos fazer sentido oferecer ao leitor do dia de hoje quanto a
Psicologia Social nos pode proporcionar meditao, no tocante
aos to pouco conhecidos mecanismos de nossas atitudes se
que, sinceramente, a elas nos damos o trabalho de prestar alguma
ateno.
Araraquara, outono de 1969.
Mademoiselle Clairon e o fantasma (1)
Esta histria fez muita sensao em seu tempo, pela posio da
herona e pelo grande nmero de pessoas que a testemunhou. A
despeito de sua singularidade, ela provavelmente teria sido
esquecida se mademoiselle Clairon no a tivesse consignado em
suas Memrias, de onde extramos o relato que se vai fazer. A
analogia que ela apresenta com alguns fatos que se passam em
nossos dias d-lhe um lugar natural nesta coletnea.
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Como se sabe, mademoiselle Clairon era to notvel por sua beleza
como por seu talento, quer como cantora, quer como trgica. Havia
inspirado a um jovem breto, o sr. De S..., uma dessas paixes que
frequentemente decidem de uma vida, quando no se tem
suficiente fora de carter para se triunfar sobre ela. Mademoiselle
Clairon a ela correspondeu apenas com a amizade. Entretanto a
assiduidade do sr. De S... tornou-se de tal modo importuna que ela
resolveu romper essas relaes em definitivo. A mgoa que ele
sentiu produziu-lhe uma longa enfermidade, de que veio a morrer.
Isto se passou em 1743. Mas demos a palavra a mademoiselle
Clairon: Dois anos e meio eram decorridos entre o nosso
conhecimento e a sua morte. Ele mandou pedir-lhe que concedesse
aos seus ltimos instantes a doura de me ver outra vez; meus
amigos me impediram de comparecer. Morreu tendo em torno de si
apenas os criados e uma velha dama, nica companhia que tinha
desde muito tempo. Ele residia sobre o Rempart, perto da
Chausse dAntin, que comeava a ser construda; eu, rua de
Bussy, perto da rua do Sena e da abadia Saint-Germain. Estava
com minha me e vrios amigos que vinham cear comigo...
Acabara de cantar belas canes pastorais, que haviam encantado
os meus amigos quando, ao soarem as onze horas, ouvimos um
grito agudssimo. Sua modulao sombria e sua durao
espantaram a todos; senti-me desfalecer e estive quase um quarto
de hora desacordada.
Todos os meus parentes, os amigos, os vizinhos, a prpria polcia
ouviram o mesmo grito, sempre mesma hora, partindo sempre de
sob minhas janelas e como que se viesse vagamente, do ar...
Raramente eu ceava na cidade; mas nesses dias nada se ouvia e,
muitas vezes, pedindo informes minha me ou aos meus, quando
eu entrava em meu quarto, ele partia do meio de ns. Uma vez o
presidente de B..., com quem eu havia jantado, quis me reconduzir
casa para certificar-se de que nada me tinha ocorrido em
caminho. Quando, minha porta, me dava as boas-noites, o grito
partiu de entre ns. Como toda Paris, ele sabia da histria:
entretanto foi posto na carruagem mais morto do que vivo.
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Outra vez pedi ao meu amigo Rosely que me acompanhasse rua
Saint-Honor para escolher tecidos. O nico assunto de nossa
conversa foi o meu fantasma,
como o chamavam. Este jovem, muito inteligente, no acreditava
em nada, mas tinha ficado impressionado cem a minha aventura;
aconselhava-me a evocar o fantasma, prometendo-me acreditar se
ele me respondesse. Fosse por fraqueza ou por audcia, fiz o que
ele me pedia: o grito se ouviu trs vezes, terrveis por seu estrepito
e pela rapidez. De volta foi necessrio o auxlio de todas as
pessoas de casa para sermos tirados da carruagem, onde
estvamos sem nos apercebermos um do outro. Depois desta cena
fiquei alguns meses sem nada ouvir. Julgava-me livre para sempre:
puro engano!
Todos os espetculos haviam sido transferidos para Versalhes,
para o casamento do Delfim. Tinham-me arranjado um quarto
avenida Saint-Cloud, que eu ocupava com madame Grandval. s
trs da manh eu lhe disse: Estamos no fim do mundo; seria muito
difcil que o grito nos viesse procurar aqui... Ele se fez ouvir!
Madame Gradval pensou que o inferno inteiro estava no quarto:
correu em camisola de alto a baixo da casa, onde ningum pde
pregar olhos durante a noite; foi ao menos a ltima vez que
ouvimos.
Sete ou oito dias depois, quando conversava com pessoas de
minhas relaes comuns, o relgio fez ouvir as batidas de onze
horas; foi seguido de um tiro de fuzil, dado numa de minhas janelas.
Todos ns ouvimos o tiro e vimos o fogo: mas a janela no sofrera
nenhum dano. Conclumos todos que visavam a minha vida, que
haviam errado o alvo e que era preciso, para o futuro, tomar
precaues. O sr. De Marville, ento alferes de polcia, mandou
visitar as casas fronteiras minha; a rua ficou cheia cie toda sorte
de espias possveis; mas, por mais cuidados que se tivesse
tomado, durante trs meses a fio este tiro foi visto e ouvido, sempre
mesma hora, na mesma vidraa, sem que, entretanto, jamais
algum tivesse podido ver de onde partia. O fato foi consignado nos
registros policiais.
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Acostumada ao meu fantasma, considerava-o um pobre diabo que
se divertia com brincadeiras sem se importar com a hora. Como
fazia calor abri a janela malsinada e com o intendente nos
debruamos no balco. Batem as onze horas, ouve-se o tiro e
ambos fomos atirados ao meio do quarto. Sentindo que nada nos
havia ocorrido, examinamo-nos para constatar que ambos
havamos recebido ele na face esquerda e eu na face direita a
mais terrvel bofetada que jamais poderia ser aplicada: e rimos
como dois loucos.
Dois dias depois, convidada por mademoiselle Dumesnil para uma
festa noite em sua casa, na barrierre Blanche, tomei um fiacre
s onze horas com minha aia. Havia um belo luar e ns fomos
conduzidas por bulevares que comearam a ser guarnecidos de
casas. Perguntou-me a aia: No foi aqui que morreu o sr. De S...?
Segundo as informaes que me deram, respondi-lhe eu, deve
ter sido aqui e apontei uma das duas casas em nossa frente. De
uma delas partiu o mesmo tiro de fuzil que me perseguia:
atravessou nossa carruagem; o cocheiro disparou a viatura, crente
de que era assaltado por ladres. Chegamos ao destino tendo
apenas nos refeito e de minha parte devo confessar que durante
muito tempo conservei uma impresso de terror. Mas esta faanha
foi a ltima com arma de fogo.
exploso sucedeu um bater de palmas, com certa medida e
repetio. Este rudo ao qual a bondade do pblico me havia
acostumado, passou-me despercebido durante algum tempo; mas
os meus amigos o notaram. Disseram-me: Ns temos espreitado;
s onze horas, quase a vossa porta, que a coisa se d; ouvimos
mas no vemos ningum; no pode deixar de ser a continuao
daquilo que a Sra. Tem experimentado. Como o rudo nada tinha
de terrvel, no lhe guardei a data da durao.
Tambm no prestei ateno aos sons melodiosos que depois se
ouviram: parecia uma voz celeste dando o mote de uma ria nobre
e tocante, prestes a ser cantada. Esta voz comeava no quarteiro
de Bussy e acabava em minha porta; e como acontecera antes com
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todos os outros sons, ouvia-se mas nada se via. Por fim tudo
cessou durante pouco mais de dois anos e meio.
Algum tempo depois mademoiselle Clairon teve, por intermdio da
senhora idosa que havia ficado como nica amiga dedicada do sr.
De S. . ., o seguinte relato de seus ltimos instantes:
Ele contava os minutos quando, s dez e meia, o lacaio lhe veio
dizer que, decididamente, a senhora no viria. Depois de um
momento de silncio tomou-me a mo num impulso desesperado,
que me apavorou, e disse: Que brbara!. .. nada ganhar com isto:
eu a perseguirei tanto depois de morto quanto a persegui em vidai. .
. Procurei acalm-lo; mas estava morto.
Na edio que temos vista esta histria precedida da seguinte
nota, sem assinatura:
Eis uma anedota singularssima, que provocou e provocar sem
dvida as mais diversas opinies. A gente ama o maravilhoso,
mesmo quando no acredita nele: mademoiselle Clairon parece
convencida da realidade dos fatos que descreve. Contentar-nos-
emos em fazer notar que ao tempo em que ela foi ou se sups
atormentada por seu fantasma, contava de vinte e dois a vinte e
cinco anos. Que a idade da imaginao e que esta faculdade nela
era continuamente exercitada e exaltada pelo gnero de vida que
levava, no teatro e fora dele. preciso ainda lembrar que ela disse,
no comeo de suas Memrias, que na infncia foi apenas entretida
com aventuras de aparies e de feiticeiros e que lhe contavam tais
histrias como verdicas.
S conhecemos o fato atravs do relato de mademoiselle Clairon.
Assim, s podemos julgar por induo. Ora, nosso raciocnio o
seguinte. Descrito pela mesma mademoiselle Clairon nos seus mais
minuciosos detalhes, o fato tem mais autenticidade do que se fora
relatado por terceiros. Acrescente-se que quando escreveu a carta
onde o mesmo vem descrito, ela tinha cerca de sessenta anos, e,
pois, havia passado a idade da credulidade, da qual fala o autor da
nota. Este autor no pe em dvida a boa f de mademoiselle
Clairon quanto a sua aventura: apenas admite tenha ela sido vtima
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de uma iluso. Que a tivesse sido uma vez, nada tem de
extraordinrio; mas que o tivesse sido durante dois anos e meio j
se nos afigura mais difcil; mais difcil ainda supor que tal iluso
tenha sido partilhada por tantas pessoas, testemunhas auriculares e
oculares dos fatos, inclusive a prpria polcia. Para ns, que
conhecemos o que se pode passar nas manifestaes espritas, a
aventura nada contm de surpreendente e a tomamos como
provvel. Nesta hiptese no vacilamos em admitir que o autor de
todos esses malefcios no seja outro seno a alma ou Esprito do
sr. S. .., principalmente se atentarmos para a coincidncia de suas
ltimas palavras com a durao dos fenmenos. Havia ele dito: Eu
a perseguirei tanto depois de morto quanto a persegui em vida.
Ora, suas relaes com mademoiselle Clairon haviam durado dois
anos e meio, ou seja tanto tempo quanto as manifestaes.
Ainda algumas palavras sobre a natureza desse Esprito. No era
mau; com razo que mademoiselle Clairon o classifica de um
pobre coitado; mas tambm no se pode dizer que fosse bom. A
paixo violenta sob a qual sucumbiu como homem, prova que nele
predominavam as idias terrenas. Os traos profundos dessa
paixo, que sobreviveu destruio do corpo, provam que, como
Esprito, ainda se achava sob a influncia da matria. Sua vingana
por mais inofensiva que fosse, denota sentimentos pouco elevados.
Se, pois, nos reportar-mos ao nosso quadro da classificao dos
Espritos, no ser difcil determinar-lhe a classe; a ausncia de
maldade real o afasta naturalmente da ltima ciasse a doe
Espritos impuros, mas evidentemente tinha muito das outras
classes da mesma ordem; nada nele poderia justificar uma posio
superior.
Digna de nota a sucesso das vrias maneiras pelas quais
manifestava sua presena. No mesmo dia e no momento exato de
sua morte, fez-se ouvir pela primeira vez e em meio a uma ceia
despreocupada. Quando vivo, via mademoiselle Clairon por
pensamento, cercada por essa aurola com que a imaginao
envolve o objeto de uma paixo ardente; desde, porm, que a alma
se desembaraa de seu vu material, a iluso cede realidade. E l
est ele, ao seu lado, vendo-a cercada de amigos, tudo lhe
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excitando os cimes; seu canto e sua alegria parecem um insulto ao
seu desespero e este se traduz por um grito de raiva, que ele repete
diariamente, mesma hora, como se para a censurar por se haver
recusado a ir consolar seus ltimos instantes. Aos gritos se
sucedem os tiros de fuzil, inofensivos, certo, mas que nem por
isso denotam menos uma raiva impotente e o propsito de lhe
perturbar o repouso. Mais tarde seu desespero toma um carter
mais sereno; evoluindo para idias mais sadias, parece haver
tomado uma resoluo: resta-lhe a lembrana dos aplausos de que
ela foi objeto, e ele os repete. Mais tarde, enfim, diz-lhe adeus,
fazendo-a ouvir sons que dir-se-ia o eco dessa voz melodiosa que
em vida tanto o encantara.
(1) O ttulo original Le revenant de Mademoiselle Clairon, que
alteramos por uma questo de clareza. Mademoiselle Clairon
nasceu em 1723 e faleceu em 1803. Estreou numa
companhia italiana aos 13 anos e na Comdie Franaise em
1743. Retirou-se do teatro em 1765, aos 42 anos de idade.
O esprito batedor de Bergzabern
J tnhamos ouvido falar de certos fenmenos espritas que em
1852 haviam feito enorme celeuma na Baviera renana, nas
cercanias de Spire; sabamos at que havia sido publicada uma
brochura em alemo, com um relato autntico. Depois de longas e
infrutferas buscas, uma senhora nossa assinante da Alscia,
demonstrando grande interesse e perseverana, pelo que lhe
somos imensamente agradecidos, conseguiu um exemplar daquela
brochura e no-la ofereceu.
Damos aqui a sua traduo in extenso, esperando seja lida com
tanto maior interesse quanto mais uma vez vem provar que fatos
desse gnero so de todos os tempos e pases de vez que os de
que se trata ocorrem numa poca em que apenas se comeava a
falar em Espritos.
PROMlO
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H vrios meses um acontecimento singular constitui o assunto de
todas as conversas em nossa cidade e suas imediaes. Referimo-
nos ao Batedor, como chamado na casa do alfaiate Pierre
Snger.
At aqui abstivemo-nos de qualquer relato em nossa folha o
Jornal de Bergzabern das manifestaes que desde 1. de
janeiro de 1852 se produzem naquela casa. Como, porm, excitam
a ateno geral a tal ponto que as autoridades se sentiram no dever
de pedir ao Dr. Bentner uma explicao para o caso e o Dr.
Dupping, de Spire, chegou a ir ao local para observar os fatos, no
nos podemos por mais tempo furtar ao dever de dar-lhes
publicidade.
Sentir-nos-amos muito embaraados se os leitores esperassem de
ns um pronunciamento sobre a questo: deixamos essa tarefa
queles que, pela natureza de seus estudos e por sua posio,
esto mais aptos para a julgar, o que faro sem maiores
dificuldades, se conseguirem descobrir a causa daqueles efeitos.
Quanto a ns, limitamo-nos ao simples relato dos fatos,
principalmente daqueles que testemunhamos ou que ouvimos de
pessoas dignas de f: o leitor que forme a sua opinio.
Redator do Jornal de Bergzabern F. A. BLANCK
Maio de 1852.
A 1 de janeiro, deste ano, em Bergzabern, na casa de sua
residncia e no quarto vizinho sala de estar, onde habitualmente
se reunia a famlia de Snger, ouviu-se um como martelar, que
comeava por golpes surdos e como se viessem de longe, e que se
tornavam progressivamente mais fortes e marcados. Esses golpes
pareciam desferidos na parede, junto qual se achava o leito onde
dormia sua filha de doze anos de idade. Habitualmente o rudo era
ouvido entre nove e meia e dez e meia. A princpio, o casal no
ligou importncia; como, porm, essa singularidade se repetisse
todas as noites, pensaram que viesse da casa vizinha, onde talvez
um doente se distrasse tamborilando na parede. Logo, entretanto,
25
se convenceram de que no havia tal doente, nem ele poderia ser a
causa do rudo. Foi revolvido o cho do quarto, a parede foi
derrubada, mas tudo sem resultado. A cama foi mudada para o lado
oposto do quarto: ento coisa admirvel o rudo mudou de
lugar e era percebido assim que a mocinha adormecia.
Era claro que de algum modo a moa participava da manifestao
daquele rudo e, depois das inteis pesquisas da polcia, comeou-
se a pensar que o fato deveria ser atribudo a uma doena da
menina ou a uma particularidade de sua conformao. Entretanto
at agora nada veio confirmar tal suposio. ainda um enigma
para os mdicos.
Com a espera a coisa se desenvolveu: o rudo prolongou-se por
mais de uma hora e os golpes eram vibrados com mais fora. A
menina mudou de cama e de quarto, mas o batedor se manifestou
neste outro quarto, debaixo da cama, na cama e na parede. Os
golpes no eram idnticos: ora mais fortes, ora mais fracos e
isolados, ora, enfim, sucedendo-se rapidamente e seguindo o ritmo
das marchas militares e das danas.
A menina j ocupava por alguns dias o dito quarto quando comeou
a dizer palavras breves e incoerentes. Essas palavras se tornaram
mais distintas e inteligveis; parecia que a menina conversava com
outra pessoa sobre a qual tinha autoridade. Entre os fatos que se
produziam a cada dia, o autor destas linhas lembra um do qual foi
testemunha.
A menina achava-se na cama, deitada sobre o lado esquerdo.
Apenas adormeceu, os golpes comearam e assim principiou ela a
falar: Voc! Voc! Bata uma marcha! E o batedor marcou uma que
parecia muito com uma marcha bvara. ordem de Halte!, dada
pela menina, o batedor parou. Ento a menina ordenou: Bata trs,
seis, nove vezes. O batedor executou a ordem. A uma nova ordem
de bater 19 golpes, ouviram-se 20 batidas, ao que retorquiu a
menina adormecida: No est certo; foram 20 batidas. Logo foi
possvel contar 19 golpes. A seguir a menina pediu 30 pancadas e
as 30 foram ouvidas. ordem de 100 pancadas foi possvel contar
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at 40, to rpidos eram os golpes. Soado o ltimo a menina disse:
Muito bem; agora 110. Ento foi possvel contar at cerca de 50.
Ao ltimo golpe disse a adormecida: No est certo; deu apenas
106; e logo se fizeram ouvir as 4 pancadas que completavam
aquele nmero. Depois a menina pediu: Mil. Foram batidas
apenas 15. Ora, vamos! O batedor marcou ainda 5 golpes e
parou.
Ento os assistentes tiveram a ideia de dar ordens diretamente ao
batedor, o qual executou as recebidas. Parava quando recebia a
ordem de Halte! Silncio! Paz! Depois, por si mesmo e sem
comando, recomeava a bater. Um dos assistentes avisou, em voz
baixa, de um canto do quarto, que queria comandar apenas por
pensamento, para que fossem dadas 6 batidas. Ento o
experimentador postou-se junto ao leito e no disse uma s palavra:
foram ouvidas as 6 pancadas. Ainda por pensamento foram pedidas
4 e os 4 golpes foram ouvidos. A mesma experincia foi tentada por
outras pessoas, mas nem sempre deu bom resultado.
Em breve a menina espreguiou-se, afastou as cobertas e levantou-
se. Quando lhe perguntaram o que havia acontecido, respondeu
que tinha visto um homem grande e mal encarado, junto a seu leito
e que lhe apertava os joelhos. Acrescentou que sentia dor nos
joelhos quando o homem batia. A jovem adormeceu novamente e
as manifestaes prosseguiram at que o relgio do quarto bateu
11 horas. De repente o batedor parou, a menina entrou em sono
tranquilo, reconhecido pela regularidade da respirao e naquela
noite nada mais foi ouvido.
Observamos que o batedor obedecia ordem de marcar marchas
militares. Vrias pessoas afirmam que quando se lhe pedia uma
marcha russa, austraca ou francesa, ela era marcada com muita
exatido.
A 25 de fevereiro, estando adormecida, a menina disse: Agora
voc no quer mais bater; quer arranhar. Est bem! Quero ver
como voc o far. Com efeito no dia seguinte, 26, em vez dos
golpes ouvia-se um arranhar que parecia vir da cama e que se
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manifestou at hoje. As batidas se misturaram raspagem, ora
alternadas, ora simultaneamente, de tal modo que nas reas de
marcha ou de dana a raspagem marcava os tempos fortes e a
batida os tempos fracos. Conforme os pedidos, a hora do dia ou a
idade das pessoas eram indicadas por golpes secos ou pela
raspagem. Em relao idade das pessoas, s vezes h vi-a erros,
logo corrigidos na segunda ou terceira tentativa, desde que se
dissesse que o nmero tinha sido marcado errado. Algumas vezes
em lugar de dar a idade pedida, o batedor executava uma marcha.
Dia a dia a linguagem da menina, durante o sono, tornava-se mais
perfeita. Aquilo que a princpio no passava de simples palavras ou
de ordens rpidas ao batedor, transformou-se, com o tempo, numa
conversa, encadeada com os pais. Assim, um dia se entreteve com
a irm mais velha sobre assuntos religiosos, num tom de exortao
e de ensino, dizendo-lhe que devia ir missa, fazer as preces todos
os dias e mostrar submisso e obedincia aos pais. noite retomou
o mesmo assunto. Em seus ensinamentos nada havia de teologia,
mas apenas algumas daquelas noes que se aprendem na escola.
Antes dessas palestras ouviam-se durante uma hera, pelo menos,
pancadas e arranhes, no s durante o sono da jovenzinha, mas
at em estado de viglia. Vimo-la comer e beber enquanto as
batidas e raspagens eram ouvidas, do mesmo modo que, estando
acordada, tnhamos ouvido a transmisso de ordens ao. Batedor, as
quais foram todas executadas.
Na noite de sbado, 6 de maro, vrias pessoas se reuniram em
casa dos Snger, pois estando desperta a menina, havia predito
durante o dia a seus pais que o batedor apareceria s nove horas
da noite. Ao bater esta hora, quatro golpes to violentos foram
desferidos na parede que os assistentes se assustaram. Logo e
pela primeira vez, as batidas foram dadas na madeira da cama e
exteriormente; o leito foi abalado completamente. Esses golpes se
manifestaram de todos os lados da cama, ora num, ora noutro
lugar. Pancadas e arranhes alternavam na cama. A uma ordem da
menina e das pessoas presentes ora os golpes se ouviam no
interior da cama ora externamente. De repente o leito levantou-se
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em sentidos diferentes, enquanto os golpes eram desferidos com
fora. Mais de cinco pessoas em vo tentaram repor o leito
levantado; e quando desistiram da tentativa ele ainda se balanou
por alguns instantes, depois do que tomou a sua posio natural.
Este fato j havia ocorrido uma vez, antes desta manifestao
pblica.
Todas as noites a menina fazia uma espcie de discurso, de que
falaremos de modo sucinto.
Antes de mais nada preciso notar que a menina, assim que
baixava a cabea, estava adormecida e comeavam os golpes e as
arranhaduras. Com as batidas ela gemia, agitava as pernas e
parecia sentir-se mal. J o mesmo no acontecia com as
raspagens. Chegado o momento de falar, a menina deitava-se em
decbito dorsal, o rosto tornava-se plido, assim como as mos e
os braos. Acenava com a mo direita e dizia: Vamos! Venha para
perto de minha cama e junte as mos. Vou lhe faiar do Salvador do
mundo. Ento cessavam batidas e arranhaduras e todos os
assistentes ouviam com respeitosa ateno o discurso da
adormecida.
Falava com vagar e de modo muito inteligvel em puro alemo, o
que surpreendia tanto mais quanto se sabia que a menina era
menos adiantada que seus colegas de colgio, o que certamente
era devido a uma doena dos olhos, que lhe dificultava o estudo.
Suas palavras decorriam sobre a vida e as aes de Jesus desde
os doze anos, sua presena no templo entre os escribas, seus
benefcios Humanidade e os seus milagres. Depois entretinha-se
em descrever os seus sofrimentos e censurava duramente os
judeus por terem crucificado a Jesus, apesar de sua imensa
bondade e de suas bnos. Terminando, a menina dirigia a Deus
uma fervorosa prece, pedindo que lhe concedesse a graa de
suportar com resignao os sofrimentos que lhe tinha enviado, pois
que a havia escolhido para entrar em comunicao com o Esprito.
Pedia a Deus para no morrer ainda, pois era criana e no queria
descer no negro tmulo. Terminadas as suas prdicas, recitava com
uma voz solene o Pater noster, depois do que dizia: Agora voc
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pode vir. Imediatamente recomeavam as batidas e arranhaduras.
Ainda falou duas vezes ao Esprito e, a cada uma delas, parava o
batedor. Dizia ainda algumas palavras e acrescentava: Agora voc
pode ir, em nome de Deus. E despertava.
Durante essas palestras os olhos da menina ficavam bem fechados;
mas os lbios se mexiam. As pessoas mais prximas do leito
podiam observar-lhe os movimentos. A voz era pura e harmoniosa.
Despertando, perguntavam-lhe o que tinha visto e o que se havia
passado. Ela respondia: O homem que vem me ver. Onde est
ele? Perto de minha cama, com as outras pessoas? Viu as
outras pessoas? Vi todos os que estavam perto da cama.
fcil compreender que tais manifestaes encontrassem muitos
incrdulos; chegou-se mesmo a pensar que toda essa histria era
pura mistificao. Mas o pai era incapaz de palhaadas, sobretudo
de uma palhaada que exigia toda a habilidade de um
prestidigitador profissional. Ele goza da reputao de um homem
decente e honesto.
Para responder e fazer cessar a suspeita, a menina foi levada para
uma casa estranha. Apenas l chegando, ouviram-se as batidas e
arranhaduras. Alm disso, alguns dias antes ela tinha ido com a
me a uma pequena aldeia chamada Capeie, a cerca de meia lgua
de distncia, casa da viva Klein. Sentiu-se fatigada; deitaram-na
num canap e imediatamente o mesmo fenmeno se produziu.
Vrias testemunhas o podem afirmar. Posto tivesse um aspecto
saudvel a menina devia ser afetada por uma doena que, se no
ficasse provada peias manifestaes acima relatadas, ao menos
pelos movimentos involuntrios dos msculos e dos sobressaltos
nervosos.
Para terminar, faremos notar que h algumas semanas a menina foi
levada ao Dr. Bectner, com quem ficou, a fim de que esse sbio
pudesse estudar mais de perto os fenmenos em apreo. Desde
ento cessou todo o barulho em casa da famlia Snger, passando
a se produzir na do Dr. Bectner.
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So estes, com toda a sua autenticidade, os fatos passados.
Entregamo-los ao pblico sem emitir opinio. Possam os homens
da arte dar-lhes em breve uma explicao satisfatria.
BLANCK
Consideraes sobre o Esprito batedor de Bergzabern
A explicao solicitada pelo narrador que acabamos de citar, fcil
de ser dada: h uma nica, e s a doutrina esprita pode fornec-la.
Esses fenmenos nada tm de extraordinrio para as pessoas
familiarizadas com aqueles a que nos habituaram os Espritos.
Sabe-se o papel que certas criaturas emprestam imaginao.
Sem dvida se a menina apenas tivesse tido vises, os partidrios
da alucinao teriam em mos um bom jogo. Mas aqui havia efeitos
materiais de natureza inequvoca e que tiveram um grande nmero
de testemunhas. Era preciso admitir que todos estivessem
alucinados a ponto de pensarem ouvir aquilo que no ouviam e
verem se mover peas de mobilirios imveis. Ora, nisso estaria um
fenmeno ainda mais extraordinrio.
Aos incrdulos resta apenas um recurso: o de negar. mais fcil e
dispensa o raciocnio.
Examinando as coisas do ponto de vista esprita torna-se evidente
que o Esprito que se manifestou era inferior ao da menina, pois lhe
obedecia; subordinava-se at aos assistentes, pois estes lhe davam
ordens. Se no soubssemos pela doutrina que os chamados
Espritos batedores esto no incio da escala, aquilo que se passou
ser-lhes-ia uma prova. Realmente no se conceberia que um
Esprito elevado, assim como os nossos sbios e nossos filsofos,
viesse se divertir em bater marchas e valsas e, numa palavra,
representar o papel de jogral ou submeter-se aos caprichos dos
seres humanos. Apresenta-se com as feies de criatura mal-
encarada, circunstncia que apenas corrobora esta opinio. Em
geral a moral se reflete no envoltrio. Est, pois, demonstrado para
ns que o batedor de Bergzabern um Esprito inferior, da classe
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dos Espritos levianos, manifestou-se como antes outros o fizeram e
ainda o fazem em nossos dias.
Mas, com que propsito veio ele? A notcia no diz que tenha sido
chamado. Hoje que estamos mais experimentados nestas coisas,
no deixaramos entrar um visitante to estranho sem que ele
informasse quais os seus propsitos. Apenas podemos fazer uma
conjectura. verdade que nada fez ele que revelasse maldade ou
m inteno; a menina no sofreu nenhum distrbio fsico ou moral:
s os homens poderiam ter chocado a sua moral, ferindo-lhe a
imaginao com os contos ridculos. E uma sorte que no o
tenham feito. Esse Esprito, por muito inferior que fosse, no era
mau nem malvolo; era apenas um desses Espritos to numerosos
de que, por vezes a mau grado nosso, estamos rodeados. Ele pode
agir naquelas circunstncias por efeito de um mero capricho, como
poderia t-lo feito por instigao de Espritos elevados, com o fito de
despertar a ateno dos homens e os convencer da realidade de
um poder superior, fora do mundo corpreo.
Quanto menina, certo que era um desses mdiuns de influncia
fsica, dotados, mau grado seu, de tal faculdade e que esto para
os outros mdiuns assim como os sonmbulos naturais esto para
os sonmbulos magnticos. Essa faculdade dirigida com prudncia
por um homem experimentado nesta nova cincia, poderia ter
produzido coisas ainda mais extraordinrias e de natureza a lanar
nova luz sobre esses fenmenos maravilhosos, que no so
compreendidos ainda.
O Esprito batedor de Bergzabern II
Extramos as passagens que se seguem de uma nova brochura
alem, publicada em 1853 pelo sr. Blanck, redator do jornal de
Bergzabern, sobre o Esprito batedor de que falamos em nosso
nmero de maio. Os fenmenos extraordinrios a relatados, cuja
autenticidade no poderia ser posta em dvida, provam que, no
particular, nada temos a invejar America. Observe-se no relato o
cuidado minucioso com que os fatos foram registrados. Fora
32
desejvel que em casos semelhantes houvesse sempre a mesma
prudncia. Sabe-se hoje que os fenmenos desse gnero no
resultam de um estado patolgico: antes denotam naqueles em que
se manifestam uma excessiva sensibilidade, sempre fcil de ser
superexcitada, nas pessoas em que se manifestam. O estado
patolgico no a causa eficiente; pode entretanto, ser-lhe
consecutivo. Em casos anlogos a mania de experimentao mais
de uma vez tem causado acidentes graves, que teriam sido
evitados se se houvesse deixado a natureza agir por si mesma. Em
o Livro dos Mdiuns encontram-se os conselhos necessrios para
tais casos.
Acompanhamos o relatrio do sr. Blanck.
Os leitores de nossa primeira brochura intitulada Os Espritos
batedores viram que as manifestaes de Philippine Snger tm
um carter enigmtico e extraordinrio. Relatamos esses fatos
maravilhosos desde o seu comeo at o momento em que a menina
foi levada ao mdico real do canto. Vamos examinar agora o que
se passou desde ento.
Quando a menina deixou a casa do Dr. Bectner e regressou ao lar,
as batidas e arranhaduras recomearam na casa dos Snger. At
aquele instante e mesmo depois da sua cura completa, as
manifestaes foram mais marcadas e mudariam de natureza (*).
Neste ms de novembro de 1852 o Esprito comeou a assoviar; a
seguir ouvia-se um rudo comparvel ao de uma roda de carrinho
de mo, que girasse sobre o eixo seco e enferrujado; mas de tudo
isto o que incontestavelmente era mais extraordinrio era a
derrubada de mveis no quarto de Philippine, desordem essa que
durou quinze dias.
Parece-me necessrio fazer uma ligeira descrio do lugar.
O quarto tem cerca de 18 ps de comprimento por 8 de largura e a
ele se chega pela sala comum. A porta de comunicao entre as
duas peas abre-se direita. O leito da menina estava colocado
direita; ao meio havia um armrio e no canto esquerda a mesa de
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trabalho de Snger, na qual h duas cavidades circulares, cobertas
por duas tampas.
Na tarde em que comeou o rebolio a senhora Snger e sua filha
mais velha, Francisque, estavam sentadas na primeira pea, junto a
uma mesa e se ocupavam em descascar vagens. De repente caiu a
seus ps um pequeno fuso, atirado do quarto de dormir. Ficaram
muito assustadas, tanto mais quanto sabiam que se no encontrava
no quarto ningum alm de Philippine, ento mergulhada em sono
profundo. Alm disso o fuso fora lanado do lado esquerdo, posto
se achasse na prateleira do pequeno armrio, colocado direita. Se
tivesse sido atirado do leito, teria sido interceptado pela porta. Era,
pois, evidente que a menina nada tinha com o caso. Enquanto a
famlia Snger externava a sua surpresa com o acontecimento, algo
caiu da mesa no soalho: era um retalho de pano que antes estava
mergulhado numa bacia com gua. Ao lado do fuso jazia tambm
uma cabea de cachimbo, cujo canudo tinha ficado sobre a mesa.
O que tornava a coisa ainda mais incompreensvel era que a porta
do armrio onde estava o fuso, antes de ser atirado, achava-se
fechada, que a gua da bacia no tinha sido agitada e nem uma s
gota tinha cado sobre a mesa. De repente a menina, sempre
adormecida, grita da cama: Pai! Saia! Ele atira! Saiam ele vos
atirar tambm! Obedeceram ordem e assim que passaram
primeira pea a cabea do cachimbo foi atirada com muita fora,
mas no se quebrou. Uma rgua que Philippine usava na escola
seguiu o mesmo caminho. O pai, a me e a filha mais velha
olhavam-se com espanto e, como procurassem o partido a tomar,
um grande cepilho de Snger e um grande pedao de madeira
foram atirados da bancada numa outra pea. Sobre a mesa de
trabalho as tampas estavam em seus lugares; entretanto, os objetos
cobertos por elas tambm tinham sido em parte atirados ao longe.
Nessa mesma noite os travesseiros foram lanados sobre um
armrio e a colcha atirada sobre a porta.
Num outro dia tinham posto aos ps da menina, debaixo das
cobertas, um ferro de engomar de cerca de seis libras. Logo foi
atirado na outra sala; o cabo havia sido tirado e foi encontrado
sobre uma poltrona, no quarto de dormir.
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Testemunhamos que as cadeiras colocadas a trs ps da cama
foram derrubadas, as janelas foram abertas, quando antes estavam
bem fechadas e isto assim que viramos as costas para entrar na
sala. De outra feita duas cadeiras foram levadas para cima da
cama, sem desarranjar as cobertas. A 7 de outubro tinha sido
fechada a janela, diante da qual fora estendido um lenol. Assim
que deixamos o quarto, foram dados golpes repetidos e com tanta
violncia que tudo ficou desarranjado e as pessoas que passavam
na rua fugiam espavoridas. Correram para o quarto: a janela estava
aberta, o pano atirado sobre o pequeno armrio ao lado, as
cobertas da cama e o travesseiro no cho, as cadeiras de pernas
para o ar e a menina no leito, abrigada apenas pela camisa.
Durante catorze dias a senhora Snger no fez outra coisa seno
refazer a cama.
Uma vez havia ficado uma harmnica sobre uma cadeira. Ouviram-
se sons. Entrando precipitadamente no quarto, encontraram, como
sempre, a menina tranquila em seu leito; o instrumento estava
sobre a cadeira mas j no tocava. Uma noite, ao sair do quarto da
filha, Snger recebeu nas costas, de arremesso, a almofada de uma
cadeira. De outras vezes eram um par de chinelos velhos, sapatos
que estavam debaixo da cama, ou tamancos que lhe iam ao
encontro. Muitas vezes sopravam a vela acesa, sobre a mesa de
trabalho. As pancadas e arranhaduras alternavam com essa
demonstrao do mobilirio. A cama parecia movimentada por mo
invisvel. ordem de: Balance a cama ou Nine a criana, a cama
ia e vinha, num e noutro sentido, com rudo; ordem de Alto! ela
parava. Ns, que vimos, podemos afirmar que quatro homens se
sentaram na cama e nela foram suspensos, mas no conseguiram
paralisar o movimento: eram levantados com o mvel. Ao fim de
catorze dias cessou o rebolio dos mveis e as manifestaes
foram substitudas por outras.
Na noite de 26 de outubro achavam-se no quarto, entre outras
pessoas, os srs. Luiz Sonee, bacharel em direito, o capito Simon,
ambos de Wissenburg, bem como o sr. Sievert, de Bergzabern.
Nesse momento Philippine Snger encontrava-se mergulhada em
sono magntico. O sr. Sievert apresentou-lhe um papel contendo
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cabelos, para ver o que faria com eles. Ela abriu o embrulho,
entretanto sem descobrir os cabelos, aplicou-os sobre as plpebras
fechadas, afastou-os como que para os examinar a distncia e
disse: Eu bem queria saber o que est neste embrulho. . . So
cabelos de uma senhora que no conheo. . . Se ela quiser vir, que
venha. . . No a posso convidar, pois no a conheo. No
respondeu s perguntas dirigidas pelo sr. Sievert; mas, tendo
colocado o papel no cncavo da mo, o estendia e revirava, mas o
papel ficava suspenso. Depois o colocou na ponta do indicador e,
durante muito tempo, fez a mo descrever um semicrculo, dizendo:
No caia. E o papel ficava na ponta do dedo. Depois ordem de
Agora caia! ele se destacou,, sem que ela tivesse feito o menor
movimento para lhe determinar a queda. Sbito, voltando-se para a
parede disse: Agora quero pregar-te parede. E a esta aplicou o
papel, que se lhe fixou durante 5 a 6 minutos, depois do que o
retirou. Um exame minucioso do papel e da parede no permitiu
descobrir nenhuma causa da aderncia. Parece-nos um dever
advertir que o quarto estava perfeitamente iluminado, o que permitia
que nos dssemos conta de todas essas particularidades com
exatido.
Na noite seguinte deram-lhe outros objetos: chaves, moedas,
cigarreiras, relgios, anis de ouro e de prata. E todos, sem
exceo, ficavam suspensos sua mo. Notou-se que a prata
aderia mais facilmente que as outras substncias, pois houve
dificuldade em retirar-lhe as moedas e tal operao causou-lhe dor.
Um dos mais curiosos fatos nesse gnero foi o seguinte: sbado, 11
de novembro, um oficial presente deu-lhe sua espada com o
talabarde, tudo pesando 4 libras; constatou-se que tudo ficou
suspenso ao dedo da mdium, balanando-se durante muito tempo.
O que no menos singular que todos esses objetos, fosse qual
fosse a matria, tambm ficavam suspensos. Tai propriedade
magntica comunicava-se, por simples contato das mos, s
pessoas susceptveis da transmisso do fluido. Disto tivemos vrios
exemplos.
Um cavalheiro, o capito Zentner, ento servindo na guarnio de
Bergzabern, testemunhou esses fenmenos e teve a ideia de
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colocar uma bssola perto da menina, para observar as variaes.
Na primeira tentativa a agulha fez um desvio de 15., mas nas
outras ficou imvel, posto a menina sustivesse a caixa numa das
mos, acariciando-a com a outra. Esta experincia provou que tais
fenmenos no se poderiam explicar pela ao do fluido mineral,
mesmo porque a atrao magntica no se exerce indiferentemente
sobre todos os corpos.
Habitualmente, quando a pequena sonmbula se dispunha a
comear a sesso, chamava para o quarto todas as pessoas
presentes. Dizia apenas: Venham! Venham! ou ento Dem,
deem! Muitas vezes s se tranquilizava quando todos, sem
exceo, estavam junto ao seu leito. Ento pedia com solicitude e
impacincia um objeto qualquer e, assim que lho entregavam, este
se ligava aos seus dedos. Frequentes vezes acontecia que dez,
doze e mais pessoas estavam presentes e cada uma lhe
apresentava vrios objetos. Durante a sesso no admitia que lhe
tomassem nenhum deles. Parecia preferir os relgios: abria-os com
muita habilidade, examinava o movimento, fechava-os e os
colocava prximo, para examinar outra coisa. Por fim devolvia a
cada um o que lhe havia sido entregue; examinava os objetos com
os olhos fechados e jamais lhe confundia o dono. Se algum
estendesse a mo para receber o que lhe no pertencia, ela o
repelia. Como explicar essa distribuio mltipla e sem erros a to
grande nmero de pessoas? Em vo tentar-se-ia fazer o mesmo
com os olhos abertos. Terminada a sesso e retiradas as pessoas,
recomeavam as pancadas e arranhaduras, momentaneamente
interrompidas.
Acrescente-se que a menina no queria que ningum ficasse aos
ps da cama, junto ao armrio, onde o espao entre os mveis era
apenas de cerca de um p. Se algum a se metesse, afastava-o
por meio de gestos. E se teimassem ela demonstrava uma grande
inquietao e com gestos imperiosos mandava que sasse do lugar.
Uma vez advertiu os assistentes a que jamais ocupassem aquele
lugar proibido, porque, dizia, no queria que sobreviesse uma
desgraa a algum. Este aviso foi to positivo que ningum o
esqueceu da por diante.
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Depois de algum tempo s batidas e arranhaduras juntou-se um
zumbido comparvel ao som produzido por uma corda grossa de
contrabaixo; uma espcie de assovio se misturava a esse zumbido.
Se algum pedisse uma marcha ou uma dana, logo era atendido o
seu desejo: o msico invisvel mostrava-se muito complacente. Por
meio das arranhaduras chamava nominalmente as pessoas da casa
ou os estranhos presentes. Todos compreendiam facilmente a
quem era dirigido o apelo. A esse chamado, a pessoa designada
respondia sim, para dar a entender que sabia tratar-se de si
mesma. Ento era executada em sua homenagem um trecho de
msica, que por vezes ocasionava cenas cmicas. Se outro que
no a pessoa indicada respondesse sim, o raspador fazia
compreender por um no, expresso a seu modo, que nada lhe
tinha a dizer naquele momento.
Estes fatos se produziam pela primeira vez na noite de 10 de
novembro, e continuaram at o presente.
Eis como procedia o esprito batedor para designar as pessoas.
Havia muitas noites que se tinha notado, ao fazer um pedido para
que fizesse tal ou qual coisa, que ele respondia por uma
arranhadura prolongada. Assim que o golpe era dado o batedor
comeava a executar aquilo que se desejava; ao contrrio, quando
arranhava, no era satisfeito o pedido. Ento um mdico teve a
ideia de tomar o primeiro rudo por um sim e o segundo por um
no; desde ento tal interpretao foi sempre confirmada. Notou-
se tambm que por uma srie de arranhes mais ou menos fortes o
Esprito exigia certas coisas das pessoas presentes. fora de
ateno e observando a maneira por que se produzia o rudo, pode
compreender-se a inteno do batedor. Assim, por exemplo, o velho
Snger contou que certa manh, ainda pela madrugada, ouvira
rudos modulados de certa maneira. Posto lhes no tivesse ligado
de incio nenhum significado, notou que no cessavam enquanto se
achasse na cama, pelo que entendeu o sentido: Levanta-se!
Assim, pouco a pouco familiarizou-se com essa linguagem e com
certos sinais de reconhecimento de determinadas pessoas.
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Chegou o aniversrio do dia em que o Esprito batedor se havia
manifestado pela primeira vez: muitas mudanas se operaram no
estado de Philippine Snger. Continuavam as pancadas, as
arranhaduras e o zunido, mas a todas essas manifestaes juntou-
se um grito especial, que ora parecia o de um ganso, ora o de um
papagaio ou de qualquer outra ave grande; ao mesmo tempo ouvia-
se uma espcie de picada na parede, semelhante ao rudo
produzido pelas bicadas de um pssaro. Nesse perodo Philippine
Snger falava muito durante o sono e sobretudo parecia
preocupada com um certo animal, semelhante a um papagaio, o
qual ficava ao p do leito, gritando e dando bicadas na parede.
Quando desejvamos ouvir o papagaio, este soltava gritos agudos.
Vrias perguntas foram feitas, tendo como resposta gritos do
mesmo gnero; algumas pessoas pediram que dissesse
Kakatos, e foi ouvida distintamente a palavra Kakatos, como
se pronunciada pela prpria ave. Passaremos em silncio sobre
fatos menos interessantes, limitando-nos a relatar aquilo que mais
importante, no que diz respeito s modificaes sobrevindas ao
estado fsico da menina.
Algum tempo antes do Natal as manifestaes se renovaram com
mais energia: os golpes e as arranhaduras tornaram-se mais
violentos e duravam mais tempo. Mais agitada que de costume,
muitas vezes Philippine pedia para no dormir em sua cama, mas
na dos pais; rolava no seu leito, clamando: No posso mais ficar
aqui; vou arrebentar; eles vo encerrar-me na parede; socorro! E a
calma s se restabelecia quando a transportavam para outra cama.
Apenas a se encontrava, ouviam-se no alto pancadas muito fortes,
como se viessem do celeiro e como se um carpinteiro martelasse o
vigamento. Por vezes eram mesmo to fortes que abalavam a casa,
as janelas eram sacudidas e as pessoas presentes sentiam o solo
tremer sob os ps; outras vezes pancadas semelhantes eram dadas
na parede, perto da cama. As perguntas eram, como de hbito,
respondidas pelas pancadas, sempre alternadas com as
arranhaduras.
Os fatos que se seguem, no menos curiosos, reproduziram-se
inmeras vezes.
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Quando havia cessado o rudo e a menina repousava
tranquilamente em sua caminha, com frequncia a vamos
prosternar-se, juntar as mos, de olhos fechados virar a cabea
para todos os lados, como se algo extraordinrio tivesse atrado sua
ateno. Um amvel sorriso ento se espalhava em sua face; dir-
se-ia que se dirigisse a algum: estendia as mos e pelo gesto
depreendia-se que apertava as mos de amigos e conhecidos.
Tambm se via, depois de cenas que tais, recair na sua atitude
splice, juntar novamente as mos, curvar a cabea at tocar as
cobertas, depois endireitar-se e derramar lgrimas. Ento suspirava
e parecia orar com grande fervor. Nestes momentos seu rosto se
transformava: ficava plida e adquiria a expresso de uma mulher
de 24 a 25 anos. Por vezes tal estado durava cerca de meia hora,
durante a qual s dizia ah! Ah! Pancadas, arranhaduras, zumbidos
e gritos cessavam at que ela despertasse. Ento o batedor
novamente se fazia ouvir, procurando executar rias alegres, a fim
de dissipar a penosa impresso deixada na assistncia. Ao
despertar a menina achava-se muito abatida; apenas podia levantar
os braos e os objetos que lhe eram apresentados no ficavam
mais suspensos em seus dedos.
Curiosos de saber o que experimentava, interrogaram-na vrias
vezes. Somente depois de reiterados pedidos foi que se decidiu a
contar que tinha visto conduzir e crucificar o Cristo no Glgota; que
a dor das santas mulheres prosternadas ao p da cruz e a
crucificao lhe haviam produzido uma impresso indescritvel.
Tambm tinha visto uma poro de mulheres e de virgens vestidas
de preto e mocinhas com longos vestidos brancos percorrendo
como em procisso as ruas de bonita cidade e, por fim, viu-se
transportada a uma vasta igreja onde assistiu a um servio fnebre.
Em pouco tempo o estado de Philippine Snger mudou a ponto de
causar apreenso quanto sua sade porque, estando desperta,
divagava e sonhava em voz alta. No reconhecia os pais nem a
irm, nem qualquer outra pessoa. A esse estado veio juntar-se uma
completa surdez, que persistiu durante quinze dias.
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No podemos silenciar sobre o que se passou nesse lapso de
tempo.
A surdez manifestou-se de meio dia s trs horas e ela mesma
declarou que ficaria surda por algum tempo e que cairia doente. O
que h de singular que por vezes recobrava a audio durante
cerca de meia hora, com o que se mostrava contente. Ela prpria
predizia o momento em que ensurdeceria e em que recuperaria a
audio. Uma vez entre outras, anunciou que noite, s oito e
meia, ouviria claramente durante uma meia hora. Com efeito,
hora predita voltou a ouvir, o que durou at s nove horas.
Durante a surdez os traos se lhe alteravam: o rosto tomava uma
expresso de estupidez, que perdia assim que voltava ao estado
normal. Outras vezes no lhe produzia impresso: ficava sentada,
olhando os presentes fixamente e sem os reconhecer. Ningum
podia fazer-se compreender seno por sinais, aos quais em geral
no respondia, limitando-se a fitar os olhos na pessoa que lhe
dirigia a palavra. Uma vez agarrou pelo brao a um dos presentes e
lhe perguntou, enquanto o empurrava: Quem s tu? Nessa
situao ficava por vezes mais de hora e meia imobilizada na cama.
Seus olhos meio abertos paravam num ponto qualquer; de vez em
quando giravam direita e esquerda, depois voltavam ao mesmo
ponto. Toda a sensibilidade parecia ento embotada: o pulso
apenas batia e, quando se colocava uma luz diante de seus olhos,
no fazia nenhum movimento: dir-se-ia morta.
Aconteceu uma tarde, durante a surdez, que estando deitada, pediu
uma lousa e um lpis. Ento escreveu: s onze horas direi alguma
coisa; mas exijo que fiquem tranquilos e silenciosos. Depois
dessas palavras acrescentou cinco sinais semelhantes escrita
ratina, mas que nenhum dos presentes pde decifrar. Foi escrito na
lousa que ningum compreendia aqueles sinais. Em resposta ela
acrescentou: No que no possais ler! E, mais embaixo: No
alemo: uma lngua estranha. Em seguida, virando a ardsia,
escreveu do outro lado: Francisque (sua irm), sentar-se-
mesa e escrever o que eu ditar. Acompanhou as palavras por
cinco sinais semelhantes aos primeiros e entregou a ardsia.
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Notando que os sinais no eram ainda compreendidos, pediu
novamente a lousa e acrescentou: So ordens particulares.
Um pouco antes das onze horas, disse: Ficai tranquilos. Que todos
se sentem e prestem ateno! e, ao soarem as onze, caiu no leito
e entrou em sono magntico ordinrio. Alguns instantes depois
comeou a falar; e isto durou, ininterruptamente, cerca de meia
hora. Entre outras coisas declarou que durante o ano em curso
produzir-se-iam fatos que ningum poderia compreender e que
seriam infrutferas todas as tentativas feitas para os explicar.
Durante a surdez da jovem Snger renovaram-se algumas vezes o
rebolio dos mveis, o inexplicvel abrir das janelas, o apagar das
luze sobre a mesa de trabalho. Aconteceu uma noite que dois
bons que estavam pendurados num cabide do quarto de dormir
foram atirados sobre a mesa do outro quarto e entornaram um copo
de leite, espalhando-o pelo cho. As pancadas desferidas na cama
eram to violentas que esta se deslocou de seu lugar: outras vezes,
at, a cama se desmontava ruidosamente, sem que, entretanto, se
tivessem ouvido as pancadas.
Como ainda houvessem criaturas incrdulas ou que atribuam
essas originalidades a uma brincadeira da menina que, em sua
opinio, batia e arranhava com os ps ou com as mos, apesar de
que os fatos tivessem sido verificados por mais de cem
testemunhas e se tivesse constatado que a menina tinha os braos
estendidos sobre as cobertas, enquanto se produziam os rudos, o
capito Zentner imaginou um meio de as convencer. Mandou vir da
caserna dois cobertores muito grossos, os quais foram postos um
sobre o outro, e ambos envolveram o colcho e os lenis da cama;
os cobertores eram muito felpudos de modo que era impossvel
neles produzir o menor rudo por simples atrito. Vestindo uma
simples camisa e uma camisola de dormir, Philippine foi posta
debaixo das cobertas e, apenas agasalhada, os golpes e
arranhaduras se produziram como dantes, ora na madeira da cama,
ora no armrio vizinho, segundo a vontade que se manifestasse.
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Acontece muitas vezes que quando algum cantarola ou assovia
uma ria qualquer, o batedor a acompanha e os sons que se
percebe como que vm de dois, trs ou quatro instrumentos: ouve-
se, ao mesmo tempo, arranhar, bater, assoviar e murmurar,
conforme o ritmo da ria cantada. Muitas vezes, tambm, o batedor
pede a um dos assistentes que cante uma cano. Designa-o pelo
processo j nosso conhecido e quando a pessoa compreendeu que
a si mesma que o Esprito se dirige, por sua vez aquela lhe
pergunta se quer que cante esta ou aquela cano. A resposta
dada por
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