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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
MARCO AURELIO PETROSKI
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO
NA MAMOPLASTIA
CURITIBA
2013
MARCO AURELIO PETROSKI
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO
NA MAMOPLASTIA
Monografia apresentada ao Curso de Direito da
Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial
para a obtenção do titulo de bacharel em direito.
Orientador: Professor Luis Sérgio Langowski
CURITIBA
2013
TERMO DE APROVAÇÃO
MARCO AURELIO PETROSKI
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO
NA MAMOPLASTIA
Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do titulo de Bacharel em
Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, de de 2013.
_____________________________________________
Curso de Direito
Universidade Tuiuti do Paraná
Orientador: Professor Luis Sérgio Langowski
Universidade Tuiuti do Paraná – Faculdade de Ciências Jurídicas
Professor
Universidade Tuiuti do Paraná – Faculdade de Ciências Jurídicas
Professor
Universidade Tuiuti do Paraná – Faculdade de Ciências Jurídicas
A Deus, o que seria de mim sem a fé que eu tenho nele.
Aos meus pais, João Airton Petroski e Olga Denega Petroski, minha esposa
Daniella Pastore, meus sogros Roberto Pastore e Lucila Penso Pastore, com
muito carinho e apoio, não mediram esforços para que eu chegasse até esta
etapa de minha vida.
Agradeço ao Professor Luiz Sérgio Langowski pela paciência na orientação
e incentivo que tornaram possível a conclusão desta monografia.
À Professora e Coordenadora do curso, pelo convívio, pelo apoio, pela
compreensão e pela amizade.
A todos os professores do curso, que foram tão importantes na minha vida
acadêmica e no desenvolvimento desta monografia.
Aos amigos, colegas e funcionários pelo incentivo e pelo apoio constantes.
RESUMO
A cirurgia plástica estética é um caminho mais fácil e eficaz na busca pela
beleza. Porém, nem sempre o resultado dessa intervenção cirúrgica é considerado
satisfatório, e, nesses casos, o paciente busca a reparação do dano sofrido através da
Responsabilidade Civil do Médico.
A Constituição Federal, no Título II, Capítulo I, artigo 5º, inciso V e X, ao
tratar dos direitos e garantias fundamentais assegura “o direito de resposta,
proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem” e
que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua
violação”.
A Responsabilidade Civil é a aplicação de medidas que obrigam alguém a
reparar um dano, moral ou patrimonial, causado a terceiros. Essa responsabilidade
pode ser contratual ou extracontratual, e ainda pode ser caracterizada como uma
obrigação de meio ou de resultado.
Logo, configura-se como objetivo principal da pesquisa analisar a
Responsabilidade Civil do Médico nas cirurgias plásticas de mamoplastia, se esta
configura obrigação de meio ou de resultado, e se o profissional pode ser
responsabilizado mesmo quando tiver se cercado de todas as cautelas exigidas,
aplicando as técnicas usuais e agido conforme os ditames da ética, prudência e pericia.
Palavras-chave: Mamoplastia. Obrigação de resultado. Responsabilidade civil.
Responsabilidade médica.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................07
2 RESPONSABILIDADE CIVIL ..........................................................................08
2.1 HISTÓRICO .......................................................................................................... 08
2.2 ASPECTOS GERAIS .............................................................................................09
2.3 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA ...........................................11
2.4 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL ................14
2.5 OBRIGAÇÃO DE MEIO E OBRIGAÇÃO DE RESULTADO ...........................15
3 EVOLUÇÃO DA LEGISLAÇÃO EM RELAÇÃO À RESPONSABILIDADE
CIVIL ..........................................................................................................................17
3.1 CÓDIGO CIVIL DE 1916 .....................................................................................17
3.2 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ...............................................................18
3.3 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR .......................................................19
3.4 CÓDIGO CIVIL DE 2002 ......................................................................................21
4 RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO .................................................23
4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE MÉDICA ....................23
4.2 RESPONSABILIDADE MÉDICA ........................................................................25
4.3 DIREITOS E DEVERES NA RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE .......................26
4.4 INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO ............................................................27
5 RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO PLÁSTICO NA
MAMOPLASTIA .......................................................................................................31
5.1 DANO MORAL E DANO ESTÉTICO .................................................................33
5.2 EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE.....................................................36
6 POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL ..................................................39
7 CONCLUSÃO ......................................................................................................44
REFERÊNCIAS .........................................................................................................45
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1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho aborda a responsabilidade civil do médico,
especificamente na área da cirurgia plástica de mamoplastia, uma especialidade que
cada vez mais os profissionais atuantes têm sofrido com as indenizações concedidas
pelo judiciário aos pacientes lesados.
O estudo é iniciado a partir de um levantamento histórico sobre a
responsabilidade civil e sobre a responsabilidade médica, analisando suas
características e evoluções dentro do direito brasileiro, de forma mais especifica no
campo da cirurgia plástica estética.
Serão analisados os direitos e deveres do paciente, bem como, as fontes e
parâmetros para avaliar a responsabilidade civil médica e o dever de indenizar.
Também serão abordados os aspectos da relação médico paciente como a configuração
da relação contratual e extracontratual, a obrigação assumida e sua caracterização
como uma obrigação de meio e de resultado, abrangendo também os pressupostos
geradores da obrigação de indenizar na responsabilidade objetiva e subjetiva e as
condições excludentes de responsabilidade.
Partindo do dever de indenizar, diferencia-se a obrigação nascida de uma
cirurgia plástica estética e de uma cirurgia plástica reparadora e analisamos as nuances
do dano moral e do dano estético decorrentes da responsabilidade civil médica do
cirurgião plástico.
Sendo assim, o trabalho, tem por objetivo discutir a responsabilidade civil
dos cirurgiões plásticos estéticos, com o viés de discutir sua caracterização como uma
obrigação de meio ou uma obrigação de resultado.
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2 RESPONSABILIDADE CIVIL
2.1 BREVE HISTÓRICO
A todo instante, na vida em sociedade, surge o problema da
responsabilidade civil, pois cada dano sofrido pelo homem, contra a sua pessoa ou ao
seu patrimônio, constitui um desequilíbrio de ordem moral ou patrimonial, tornando
imprescindível a criação de soluções que sanem tais lesões, pois é inadmissível que o
direito tolere que ofensas fiquem sem reparação.
Maria Helena Diniz (2008, p. 10-11) ensina que no inicio da civilização
humana, dominava a vingança coletiva, ou seja, havia uma reação conjunta do grupo
contra o agente de uma ofensa a um de seus componentes. Posteriormente, essa reação
tornou-se individual, ou seja, evoluiu para uma vingança privada, em que os homens
buscavam a justiça com suas próprias mãos, sob a égide da Lei de Talião, sintetizada
na fórmula “olho por olho, dente por dente”. Com a finalidade de coibir abusos, o
poder público intervinha apenas para declarar quando e como a vítima poderia ter o
direito de retaliação, produzindo na pessoa do lesante dano idêntico ao que
experimentou. Nesse momento histórico, a responsabilidade era objetiva, independente
de culpa, sendo caracterizada apenas como uma reação do lesado contra a causa
aparente do dano.
Após isso, surge o período da composição, diante da constatação de que
seria mais conveniente que o autor do dano o reparasse por meio da prestação da
poema (pagamento de certa quantia em dinheiro), a critério da autoridade publica, se o
delito fosse público, e, do lesado, caso sendo o delito privado.
Posteriormente, a Lex Aquilia de damno, surgiu esboçando a noção de culpa
como fundamento da responsabilidade, impondo que o patrimônio do lesante
suportasse o ônus da reparação, em razão do valor do dano, se procedido com culpa.
Segundo a autora:
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A Lex Aquilia de damno estabeleceu as bases da responsabilidade
extracontratual, criando uma forma pecuniária de indenização do prejuízo,
com base no estabelecimento de seu valor. Esta lei introduziu o damnum
iniuria datum, ou melhor, prejuízo causado a bem alheio, empobrecendo o
lesado, sem enriquecer o lesante (DINIZ, 2008, p. 11).
Porém, mais tarde, as sanções dessa lei foram também aplicadas aos danos
causados por omissão ou verificados sem o estrago físico e material da coisa.
Nessa época, o Estado então passou a intervir nos conflitos privados,
fixando o valor dos prejuízos, obrigando a vítima a aceitar a composição, que
permaneceu no direito romano com o caráter de pena privada e como reparação, visto
que não havia nítida distinção entra responsabilidade civil e penal, que somente
ocorreu na Idade Média, com a constituição da idéia de dolo e de culpa stricto sensu.
A teoria da responsabilidade civil viu no jurista francês Domat, um de seus
grandes formuladores.
Segundo José de Aguiar Dias:
Domat precisava seu pensamento ao estabelecer a categoria da culpa de que
pode provir o dano: a que acarreta, a um tempo, a responsabilidade penal do
agente, perante o Estado, e a responsabilidade civil, perante a vítima; a das
pessoas que descumprem as obrigações, culpa contratual; e a que não se liga
nem a crime nem a delito, mas se origina da negligência ou imprudência
(DIAS, 2006, p. 30).
O Código Civil francês adotou a ideia da responsabilidade civil fundada na
culpa em seu artigo 1.382, influenciando as legislações de quase todo o mundo,
inclusive no Brasil.
2.2 ASPECTOS GERAIS
A palavra responsabilidade tem vários sentidos, podendo assim, ter mais de
um significado. Rui Stoco (2011, p. 132) ensina que ela pode ser tanto, sinônima de
diligencia e de cuidado, como pode revelar a obrigação de todos pelos atos que
praticam no plano jurídico. A partir dai, diz que, “imputar a responsabilidade a alguém
é considerar-lhe responsável por alguma coisa, fazendo-o responder pela consequência
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de uma conduta contrária ao dever, sendo responsável aquele indivíduo que podia e
devia ter agido de outro modo”. Mas, ainda, pode trazer à ideia de uma relação
obrigacional, conforme observa o doutrinador, “revela, então, um dever, um
compromisso, uma sanção, uma imposição decorrente de algum ato ou fato”.
Maria Helena Diniz define a responsabilidade civil como:
[...] a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou
patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de
pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda
ou, ainda, de simples imposição legal. Definição esta que guarda em sua
estrutura, a ideia da culpa quando se cogita da existência de ilícito
(responsabilidade subjetiva), e a do risco, ou seja, da responsabilidade sem
culpa (responsabilidade sem culpa) (DINIZ, 2008, p. 34).
A caracterização dos pressupostos da responsabilidade civil é bastante
difícil, pois há uma grande imprecisão doutrinária a esse respeito.
Dentre outros doutrinadores, José de Aguiar Dias (2006, p. 131) entende
que todos os casos de responsabilidade civil obedecem a quatro séries de exigências
comuns: a ação ou omissão voluntária do agente causador, o dano sofrido pela vítima,
a questão da culpa do agente e finalmente, a relação de causalidade entre o dano e ação
ou omissão do autor.
Porém, outra parte da doutrina, como Maria Helena Diniz (2008, p. 36-38),
entende serem apenas três os pressupostos, deixando a culpa de ser um pressuposto, e
sendo eles definidos como:
a) Existência de uma ação, comissiva ou omissiva, podendo ser um ato
ilícito ou licito, pois, como fundamento da responsabilidade, ao lado da culpa há
também o risco.
b) Ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado a vítima por ato
comissivo ou omissivo do agente ou de terceiro por quem o imputado responde, ou por
fato de animal ou coisa a ele vinculada. Não há como haver responsabilidade sem
dano, que deve ser certo, a um bem ou interesse jurídico, sendo necessária a prova real
e concreta da lesão.
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c) Nexo de causalidade entre o dano e a ação, ou, fato gerador da
responsabilidade, pois, ela não existe sem o vinculo entre a ação e o dano. Caso o
lesado experimente um dano, mas este não resultou da conduta do réu, o pedido de
indenização será improcedente.
2.3 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA
Como regra geral em nosso ordenamento jurídico , o dever de indenizar
pela pratica de atos ilícitos decorre de culpa. O código civil, em seu art. 186, ao
descrever o ato ilícito, descreve que este ocorre quando alguém, por ação ou omissão
voluntaria, negligencia ou imprudência, viola direito ou causa dano, ainda que
exclusivamente moral, a outrem, em face do que será responsabilizada pela reparação
dos prejuízos.
Maria Helena Diniz descreve que:
O ato ilícito é o praticado culposamente em desacordo com a norma jurídica,
destinada a proteger interesses alheios; é o que viola direito subjetivo
individual, causando prejuízo a outrem, criando o dever de reparar tal lesão.
Para que se configure o ilícito será imprescindível um dano oriundo da
atividade culposa. A pratica do ato ilícito, infringindo preceito normativo da
tutela de interesse privado, produzindo dano a um bem jurídico, lesando
direitos pessoais ou reais, dá origem ao ressarcimento do prejuízo. É de
ordem publica o principio que obriga o autor do ato ilícito a se
responsabilizar pelo prejuízo que causou, indenizando-o. os bens do
responsável pelo ato ilícito ficarão sujeitos à reparação do dano causado, e,
se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela
reparação, mediante seus bens, de tal maneira que ao titular da ação de
indenização caberá opção entre acionar apenas um ou todos ao mesmo
tempo (DINIZ, 2008, p. 40).
A culpa, em sentido amplo, pode ser definida como a violação de um dever
jurídico, imputável a alguém, em decorrência de uma ação, comissiva ou omissiva, que
compreende o dolo, e, a culpa em sentido estrito.
José de Aguiar Dias (2006, p. 133-134) distingue dolo e culpa, como o
primeiro sendo uma violação intencional da norma de conduta, e, a culpa, o fato pelo
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qual a pessoa capaz de ofender, operando sem malicia, mas com negligencia não
escusável, em relação ao direito alheio, comete infração prejudicial a outrem.
Desta forma, o dolo pode ser definido como a vontade consciente de violar
o direito, dirigida a consecução do fim ilícito, e a culpa abrange a imprudência –
precipitação ou o ato de proceder sem cautela -, imperícia – falta de aptidão ou
habilidade para praticar certo ato - e negligencia - inobservância das normas que nos
ordenam agir com atenção, capacidade, solicitude e discernimento.
Havendo culpa, a obrigação de reparar o dano é a mesma, haja dolo ou
culpa em sentido estrito.
Um dos elementos constitutivos da culpa, segundo Maria Helena Diniz
(2006, p. 45), é a imputabilidade, que é pertinente às condições pessoais daquele que
pratica o ato lesivo, de modo que consiste na possibilidade de atribuir um ato a
alguém, por proceder de uma vontade livre. Deste modo, são imputáveis a uma pessoa
todos os atos por ela praticados, livre e conscientemente. Para que seja caracterizada a
imputabilidade é essencial à capacidade de discernimento e de autodeterminação do
agente.
Porém, existem exceções à imputabilidade, dentre outras: o exercício
regular de um direito; a legítima defesa; e o estado de necessidade:
a) Exercício regular de um direito: não haverá imputabilidade, nos casos em
que houver lesão a direto alheio causado por um ato praticado no exercício regular de
um direito reconhecido, excluindo-se assim, qualquer responsabilidade pelo prejuízo,
por não ser conduta contrária ao direito.
b) Legítima defesa: o artigo 930, parágrafo único, do Código Civil1, afasta a
imputabilidade ao causador do dano se a agressão ocorreu em repulsa à agressão de
terceiro ofendido, exclui-se da responsabilidade civil o autor do ato lesivo praticado
em legitima defesa e terá direito a ação regressiva contra aquele em defesa de quem
1 Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do
dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado. Parágrafo único. A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se causou o dano (art. 188, inciso I).
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causou o dano. Desta forma, conforme o artigo 25 do Código Penal2, se o agente, com
o uso moderado de meios necessários repelir injusta agressão, atual ou iminente, a
direito seu ou de outrem, legitimo será o dano infligido, não acarretando qualquer
reparação por perdas e danos.
c) Estado de Necessidade: conforme artigo 188, II e parágrafo único, do
CC3, consiste na ofensa do direito alheio para remover perigo iminente, quando as
circunstâncias o tornarem absolutamente necessário e quando não exceder os limites
do indispensável para a remoção do perigo, dessa forma, exclui-se, em regra, a
responsabilidade.
Como vimos, a regra geral é que a responsabilidade civil seja subjetiva,
dependendo da caracterização de dolo ou culpa em sentido estrito. Porém, a corrente
objetivista desvinculou o dever de reparação do dano à ideia de culpa, baseando-o na
atividade licita ou no risco com o intuito de permitir ao lesado, diante da dificuldade
em se provar a culpa, a obtenção de meios para reparar os danos experimentados.
Ensina Maria Helena Diniz:
O agente deverá ressarcir o prejuízo causado, mesmo que isento de culpa,
porque sua responsabilidade é imposta por lei independente de culpa e
mesmo sem necessidade de apelo ou recurso de presunção. O dever
ressarcitorio, estabelecido por lei, ocorre sempre que se positivar a autoria de
um fato lesivo, sem necessidade de se indagar se contrariou ou não norma
predeterminada, ou melhor, se houve ou não um erro de conduta (DINIZ,
2008, p. 50).
A responsabilidade objetiva baseia-se num principio de equidade, pois,
quem lucra com uma situação deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela
resultantes. Essa responsabilidade tem como fundamento a atividade exercida pelo
agente, pelo perigo que pode causar dano a vida, a saúde ou a outros bens, criando
risco de dano a terceiros. O perigo deve resultar do exercício da atividade e não do
2 Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta
agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. 3 Art. 188. Não constituem atos ilícitos:
II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.
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comportamento do agente. Nesses casos, a vítima deve apenas provar o nexo causal,
não se admitindo qualquer desculpa subjetiva do imputado.
Portanto, a obrigação de indenizar é imposta por lei a certos indivíduos,
independente da pratica de qualquer ato ilícito, levando em conta dois critérios: que
determinadas atividades humanas criam um risco especial para outrem; e, que o
exercício de certos direitos deve implicar o dever de reparar o prejuízo que origina.
2.4 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL
A responsabilidade civil vem sendo dividida em sua fonte originaria em
contratual e extracontratual. Nas palavras de Rui Stoco (2011, p. 164), a doutrina
distinguiu a responsabilidade decorrente do contrato ou das relações contratuais da
responsabilidade decorrente do ato ilícito, ou seja, do mau relacionamento entre
pessoas e do descumprimento de um direito preexistente.
Em que pese o Código Civil tenha utilizado a culpa como fundamento de
ambas, deve-se haver o cuidado de distingui-las. A responsabilidade contratual pode
ser verificada no artigo 389, e a responsabilidade extracontratual no artigo 186:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 389. Não cumprida à obrigação, responde o devedor por perdas e danos,
mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, e honorários de advogado.
Não importa de qual situação tenha decorrido, o relevante é saber se o ato
danoso ocorreu em razão de uma obrigação preexistente ou não, pois quem provoca o
prejuízo deve indenizar.
Nas palavras de Sergio Cavalieri Filho 2009, p. 15-16), a responsabilidade
contratual tem sua origem em um negócio jurídico que se funda na autonomia da
vontade das partes, pressupondo que elas tenham capacidade de contratar, e que o
objeto deste contrato seja licito e atenda a forma prescrita em lei, conforme estabelece
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o artigo 104 do Código Civil, gerando a partir do contrato firmado uma coobrigação
mútua entre as partes:
Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
I - agente capaz;
II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III - forma prescrita ou não defesa em lei.
Desta forma, tendo sido firmado um contrato entre as partes, a
responsabilidade está baseada em um dever de resultado, uma vez que se o objeto
deste contrato não for cumprido será configurado como uma violação a uma obrigação
que implicará em responsabilidade civil para a parte que descumpri-lo. A
responsabilidade contratual se funda no descumprimento da obrigação contratada,
conforme disposto no artigo 389, já mencionado, e o dever de indenizar é apenas a
consequência desse inadimplemento.
Em outra via, a responsabilidade extracontratual, se caracteriza quando há
lesão a um direito sem que as partes disponham de qualquer relação jurídica prévia.
Esta responsabilidade não se funda na autonomia da vontade das partes, mas sim em
uma imposição de ordem social que independe de capacidade das partes. Devido à
inexistência de vínculo anteriormente instituído entre as partes em uma obrigação
contratual ou obrigacional, a vítima tem ônus de provar a culpa do agente, exceto se a
obrigação se pautar na teoria do risco.
2.5 OBRIGAÇÃO DE MEIO E DE RESULTADO
A teoria que faz a diferenciação entre as “obrigações de meio” ou de
“resultado” foi esboçada no Direito Romano, e desenvolvida pelas doutrinas italiana,
francesa e alemã.
Para Rui Stoco (2011, p. 628), a distinção entre a obrigação de meio e de
resultado, esta em estabelecer a quem incumbe o ônus da prova em cada uma das
situações. A obrigação de meio caracteriza-se quando a própria prestação nada mais
exige do devedor do que pura e simplesmente o emprego de determinado meio sem
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olhar o resultado. Como exemplo, nos serviços profissionais do medico que se obriga a
usar de todos os meios indispensáveis para alcançar a cura do doente, porém sem
jamais assegurar o resultado de cura.
Esse tipo de obrigação aparece nos contratos de prestação de serviços do
cirurgião plástico, onde é a própria atividade do devedor que esta sendo objeto do
contrato. Sendo assim, esta atividade deve ser desempenhada da melhor maneira
possível, com a diligencia necessária para o melhor resultado, mesmo que este não seja
alcançado.
Já, na obrigação de resultado, o devedor se obriga a alcançar determinado
fim, sem o qual não terá cumprido sua obrigação. O devedor, nesses casos, deve
conseguir o resultado avençado, ou deve arcar com as consequências.
Ruy Rosado de Aguiar Junior distingue essas obrigações nos seguintes
termos:
A obrigação é de meios quando o profissional assume prestar um serviço ao
qual dedicará atenção, cuidado e diligencia exigidos pelas circunstancias de
acordo com o seu titulo, com os recursos de que dispõe e com o
desenvolvimento atual da ciência, sem se comprometer com a obtenção de
um certo resultado.
A obrigação será de resultado quando o devedor se comprometer a realizar
um certo fim, como, por exemplo, transportar uma carga de um lugar a
outro, ou consertar e por em funcionamento uma certa maquina.
Sendo a obrigação de resultado, basta ao lesado demonstrar, além da
existência do contrato, a não obtenção do objetivo prometido, pois isso basta
para caracterizar o descumprimento do contrato, independente de suas
razoes, cabendo ao devedor provar o caso furtuito ou de força maior, quando
se exonera da responsabilidade (AGUIAR JUNIOR, 1995, p. 33).
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3 EVOLUÇÃO DA LEGISLAÇÃO EM RELAÇÃO À RESPONSABILIDADE
CIVIL
3.1 CÓDIGO CIVIL DE 1916
No antigo Código Civil, a responsabilidade era fundada na prática de ato
ilícito. Uma cláusula geral identificava a culpa lato sensu. O artigo 159 do Código
definia que para surgir o dever de indenizar era necessário demonstrar a culpa.
O legislador preferiu adotar a noção do ato ilícito. Sua definição pode ser
articulada por meio dos artigos 159 e 160 do Código, assim descritos:
Art. 159. Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência, ou
imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem fica obrigado a
reparar o dano.
Art. 160. Não constituem atos ilícitos:
I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito
reconhecido;
II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, a fim de remover perigo
iminente;
Parágrafo único. Neste último caso, o ato será legítimo, somente quando as
circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os
limites do indispensável para a remoção do perigo.
Podemos constatar que, o texto da época rejeitou a distinção entre dolo e
culpa lato sensu, e omitiu-se no sentido de definir culpa. Desta forma, ficou apenas a
concepção de culpa genérica.
Segundo o entendimento de Jose de Aguiar Dias (2006, p. 35), observamos
que o Código Civil de 1916, houve uma tentativa de atualização quanto ao direito das
reparações com o projeto do Código das Obrigações no qual predominou o conceito de
culpa, porém a responsabilidade civil continuava sendo tratada tanto na parte geral
quanto na parte especial do Código, sem uma grande alteração em sua estrutura.
A legislação do Código Civil de 1916 era carente no campo do direito de
reparação e não conseguia atender as demandas que chegavam ao judiciário, desta
forma a jurisprudência em certas oportunidades se antecipou utilizando fórmulas
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próprias para a liquidação dos danos provocados por fatos ilícitos, tentando suprir as
situações que não eram contempladas pelo Código.
3.2 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Com a chegada da Constituição de 1988, o legislador reconstruiu a
dogmática jurídica incluindo princípios como o da à dignidade da pessoa humana, o
qual teve grande influência sobre o Direito Civil e efeitos no tocante da
responsabilidade.
Antes da Carta Magna, a reparação de dano moral era admitida pela
jurisprudência, mas, somente se não houvesse cumulação de danos morais e materiais.
Porém, a partir artigo do 5º, incisos V e X, a responsabilidade civil foi
tornando-se mais abrangente, vejamos:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
(...)
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenização por dano material, moral ou à imagem;
(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação;
Sem duvida alguma, conforme ensina Clayton Reis (2000, p. 192-193), o
texto constitucional exerceu grande influência nas decisões advindas dos tribunais,
tendo em vista que estas decisões eram desprovidas de uma disposição legal própria
que incluíssem a satisfação dos danos morais. Desta forma, a reparação de danos na
esfera civil passou a incluir os planos do patrimônio e da esfera da personalidade da
vítima, tema que foi posteriormente transformado na Súmula 37 do STJ:
Súmula 37 - STJ: São cumuláveis as indenizações por dano material e dano
moral oriundos do mesmo fato. (12/03/1992 - DJ 17.03.1992)
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A Constituição de 1988 favoreceu a tese da reparabilidade dos danos
morais, quando incluiu em seu texto matérias importantes como os direitos básicos da
personalidade e os instruiu como um de seus princípios fundamentais a dignidade da
pessoa humana, garantindo o direito à reparação dos danos sofridos, condição apoiada
com o advento de novas leis como o Código Civil de 2002.
3.3 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
A Carta Magna estabeleceu ainda, no inciso XXXII do artigo 5º4, o
compromisso do Estado em promover a defesa do consumidor. Sendo assim, foi
editado em 11.09.1990 o Código de Defesa do Consumidor, que sendo uma lei
específica, surge com a finalidade de eliminar as desigualdades criadas nas relações de
consumo, através de uma nova postura jurídica.
Segundo os ensinamentos de Sergio Cavalieri Filho (2009, p. 17), a
orientação legislativa do Código de Defesa do Consumidor provocou uma revolução
no conceito de responsabilidade civil, por meio de uma nova área chamada de
responsabilidade civil nas relações de consumo. Inovando ao se basear no fato do
consumidor não ter mais a necessidade de provar que o fornecedor agiu com culpa,
bastando apenas que os danos morais ou materiais sejam consequência de falha ou
defeito na prestação do serviço ou do produto, independentemente de existir ou não
imprudência, negligencia ou imperícia, conforme descrito em seu artigo 14, caput e
seus §§ 1º ao 3º que trata da responsabilidade objetiva:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da
existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores
por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
4 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;
20
§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o
consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias
relevantes, entre as quais:
I - o modo de seu fornecimento;
II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III - a época em que foi fornecido.
§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada
mediante a verificação de culpa.
Porém, verifica-se uma exceção no § 4º deste mesmo artigo, que trata da
responsabilidade pessoal dos profissionais liberais de forma subjetiva, pois exige a
verificação de culpa para que o agente seja responsabilizado.
A partir da responsabilidade objetiva, o Código de Defesa do Consumidor
possui duas vertentes de responsabilidade nas relações de consumo: uma decorrente de
vícios do produto ou serviço, e outra é a responsabilidade pelo fato referente aos danos
sofridos pelo consumidor.
Fazendo uma analise com relação à responsabilidade civil nas relações de
consumo, verifica-se que a relação médico-paciente é caracterizada como um contrato
de prestação de serviço, porém o profissional liberal é a única exceção ao sistema de
responsabilização objetiva no tocante aos acidentes de consumo, pois este profissional
tem sua responsabilização decorrente do fato de ter prestado um serviço ao
consumidor e a sua responsabilidade, portanto, será subjetiva.
Mais uma inovação trazida pelo Código é a inversão do ônus da prova,
regra prevista como geral no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do
Consumidor, que atribui ao juiz, a partir de critério próprio e se considerar necessário,
a possibilidade de inverter o ônus da prova, com a finalidade de facilitar a defesa do
consumidor, considerado a parte mais fraca, ou hipossuficiente, da relação:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do
ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for
21
verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras
ordinárias de experiências;
Contudo, é importante destacar que se o caso em questão versar sobre a
exceção disposta no artigo 14, § 4º, o consumidor, embora vítima do dano, terá a
necessidade de provar a existência dos elementos da responsabilidade subjetiva, ou
seja, a culpa, o dano decorrente de uma prestação de serviço defeituoso derivado de
atuação imprudente, negligente ou imperita do agente causador e, por fim, a existência
do nexo de causalidade.
Entretanto, Fernanda Schaefer (2006, p. 220) expõe que a responsabilidade
do profissional liberal tem por fundamento a responsabilidade subjetiva, tendo em
vista que a natureza jurídica da obrigação que é intuitu personae. Mas, ressalta-se nas
relações entre consumidores e fornecedores, mesmo sendo aplicadas de forma
subsidiária as regras do Direito Civil nos casos de responsabilidade subjetiva, nenhum
dispositivo do Código de Defesa do Consumidor afasta os direitos garantidos ao
consumidor, como é o caso da inversão do ônus da prova em benefício ao consumidor,
pois este instituto sempre dependerá da avaliação do juiz ao caso concreto.
3.4 CÓDIGO CIVIL DE 2002
No ano de 2002 passa a vigorar o Novo Código Civil, o qual traz uma nova
conceituação para a responsabilidade civil, conforme dispõe o artigo 186:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Ao compara-lo com o artigo 159 do Código Civil revogado, verifica-se que
a expressão “violar direito ou causar prejuízo” foi trocada por “violar direito e causar
dano”. Analisando esta alteração constatamos que no antigo código bastava que
ocorresse somente a violação ao direito para se optar pelo dano moral, ou seja a
simples ofensa à norma jurídica. O artigo no novo Código ao constar a expressão “e
22
causar dano”, “ainda que exclusivamente moral” e, em vez de figurar, como no art.
159, que fica o autor obrigado a repará-lo, em qualquer espécie, explicitamente
mencionou-se que ele comete ato ilícito.
A responsabilidade civil fundada na culpa tem como cláusula geral o texto
o artigo 927, caput do Código:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo.
No atual Código Civil a responsabilidade subjetiva se torna residual, tantas
são as hipóteses de responsabilidade que independem da culpa, condição que pode ser
atestada com a proliferação de diplomas de nível ordinário, tais como o Código de
Defesa do Consumidor, que faz da responsabilidade civil subjetiva a exceção.
Rui Stoco (2011, p. 114) destaca que o Código Civil de 2002 não trouxe
grandes inovações no tocante da responsabilidade civil. Vários preceitos foram
aproveitados do Código anterior, os quais receberam apenas alterações em sua
redação. A novidade ocorreu em relação à sistematização da matéria, que ganhou
autonomia e um título específico na parte especial, mas foi perdida a oportunidade de
incluir parâmetros importantes, como é o caso sobre a forma de liquidação do dano,
por exemplo.
23
4 RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO
4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE MÉDICA
Historicamente, a preocupação com a saúde sempre esteve presente na vida
do ser humano. Na antiguidade, não se concebia a atividade médica propriamente dita,
havendo apenas pessoas dedicadas ao curandeirismo, tendo por base não o
conhecimento científico, que se chega através dos estudos de determinados
fenômenos, mas sim o conhecimento empírico, consistindo a arte da cura na utilização
de poções geralmente extraídas de ervas, bem como em tratamentos com remédios
naturais testados nos próprios doentes. Porém, não se alcançando a cura desejada, a
culpa recaía sobre o "curandeiro", acompanhada da acusação de imperícia ou de
incapacidade.
Desta forma, podemos observar que, já havia sanções em decorrência de
culpa relativa ao insucesso ao responsável pela cura do doente.
Sendo assim, afirma Salvo Venosa que:
As preocupações com a saúde remontam à Antiguidade. Contudo, durante
muito tempo imperou o empirismo em torno da dor. Era o mago ou o
sacerdote que se encarregava dos doentes. Muito demorou na História para
que o médico assumisse definitivamente seu papel (VENOSA, 2006, p. 143).
O Código de Hamurabi foi o primeiro documento histórico que trata do
problema do erro médico. Seus artigos estabeleciam ao médico, que tivesse o máximo
de atenção no exercício de sua profissão, que zelasse pela máxima atenção e perícia no
exercício da profissão; caso não o fizesse, ocasionavam várias penas severas que
ensejavam até a amputação da mão do médico. Tais sanções eram impostas quando
ocorriam morte ou lesão ao paciente devido a sua imperícia ou má pratica. Caso o
paciente fosse mal curado, poderia o médico ressarci-lo com um escravo ou animal.
Posteriormente, em Roma, a responsabilidade civil recebeu princípios mais
genéricos que mais tarde passariam a ser cristalizados por legislações mais modernas,
24
surgindo à composição voluntária ao qual o agressor a critério da vítima, deveria
entregar certa soma em dinheiro ou algum objeto.
Ainda nesta época, a medicina ainda era praticada por curandeiros e
sacerdotes, ao qual acontecia na era primitiva da humanidade, sendo a atividade
imbuída de superstições e crendices que culminavam em uma duvidosa credibilidade.
Mas, com advento da mudança da República para o Império Romano, cursos
profissionalizantes foram organizados, alterando para o panorama então existente, com
médicos distribuídos em diversas áreas.
No Egito, os médicos eram elevados a maior posição social, gozando de
diversos privilégios, sendo, por muitas vezes confundidos com os próprios sacerdotes.
Os médicos no Egito possuíam um livro que continha todas as regras que
deveriam obedecer. Sendo assim, não sofreriam nenhuma punição caso lesionassem
um paciente, desde que seguissem o livro. Da mesma foram, caso eles viessem a curar
um paciente, mas suas condutas ou técnicas empregadas não condissessem com o
estabelecido no livro, seria ele punido. Ou seja, não recebiam punição alguma, desde
que seguissem a prática descrita no livro sagrado.
Na Grécia, no século V A.C., por meio do Corpus Hippocraticum de
construção filosófica aristotélica pode se observar pela primeira vez um verdadeiro
estudo no campo da medicina.
Deste modo, após um período de poucas mudanças, lentamente foi
firmando o princípio de que a culpa médica não se presume apenas pelo fato de não ter
ele obtido êxito no tratamento, mas deve ser analisada e individualizada com base na
conduta seguida pelo profissional. Assim, para os platônicos e aristotélicos, a
responsabilidade do médico deveria ser avaliada por um perito na matéria e por um
colegiado de médicos.
Finalmente, na França, onde a teoria da responsabilidade foi tratada de
forma mais aprofundada, a Academia de Medicina de Paris, no século XIX, proferiu
decisão no sentido de haver apenas responsabilidade moral dos profissionais médicos.
Tal decisão ensejou em uma imunidade muito ampla, pois para que se caracterizasse a
25
responsabilidade do médico era necessário que se provasse a ocorrência de uma falta
de cunho grave, sendo que, tal ônus de provar incumbia sempre ao paciente.
Todavia, com a revolução operada na Jurisprudência francesa de 1832 em
diante, passou-se a aceitar a tese da responsabilidade plena quando verificada a culpa
do médico, partindo do princípio de que não se pode privilegiar uma classe
profissional em detrimento de outras na consideração da responsabilidade pelos atos
cometidos no seu exercício. Assim, como é necessária a averiguação da culpa para
certas profissões, bem como para qualquer pessoa, também o deverá ser à atividade
médica. Atualmente, essa é a tese em vigor em França.
4.2 RESPONSABILIDADE MÉDICA
Maria Helena Diniz, explica que, embora nosso Código Civil tenha
regulado a responsabilidade médica no capitulo atinente aos atos ilícitos, essa
responsabilidade é contratual:
Realmente nítido é o caráter contratual do exercício da medicina, pois
apenas excepcionalmente terá natureza delitual, quando o medico cometer
um ilícito penal ou violar normas regulares da profissão. Assim, se o medico
operador for experiente e tiver usado os meios técnicos indicados, não se
explicando a origem da eventual sequela, não haverá obrigação por risco
profissional, pois os serviços médicos são, em regra, de meio e não de
resultado (DINIZ, 2008, p. 299).
Porém, há casos em que o medico responderá extracontratualmente, como
quando: fornecer atestado falso; consentir, podendo impedir, que pessoa não habilitada
exerça a medicina; permitir a circulação de obra por ele escrita com erros de revisão
relativos à dosagem de medicamentos, o que pode ocasionar acidentes ou mortes; não
ordenar a imediata remoção do ferido para um hospital, sabendo que não será possível
sua melhora nas condições em que o paciente está sendo tratado; operar sem estar
habilitado para tal; e lançar mão de tratamento cientificamente condenado causando
deformação no paciente.
26
Antônio Ferreira Couto Filho ensina que o profissional da área de saúde
responde por seus atos mediante a comprovação de sua culpa no suposto evento
danoso alegado, portanto, a responsabilidade do médico é subjetiva.
Porém, cada vez mais vem crescendo o entendimento que o médico pode
também ser responsabilizado objetivamente, pois, a teoria do risco, diferentemente da
teoria da culpa, cria a responsabilização independente de culpa, bastando que existam
o dano e o nexo de causalidade para que o agente seja compelido a indenizar.
Essa teoria anuncia que todo aquele que exerce uma atividade que possui
um risco, deve assumir esses riscos e reparar o dano que dela decorrente. Encontram-
se aí, todos os estabelecimentos de saúde, na condição de pessoas jurídicas prestadoras
de serviço.
A responsabilidade objetiva, igualmente a subjetiva, pressupõe uma
conduta ilícita, a existência de um dano e a relação de causalidade entre o evento
danoso e a conduta do agente, porém, a culpa é totalmente desnecessária. Ela, na
realidade, pode até existir, mas será irrelevante para a análise da obrigação de
indenizar. Existe muita controvérsia entre essas duas teorias, porém, ambas caminham
juntas em nosso ordenamento jurídico. A regra geral é a responsabilidade com culpa,
mas a responsabilidade objetiva é admitida em casos expressamente previstos em lei.
4.3 DIREITOS E DEVERES NA RELAÇÃO MÉDICO PACIENTE
O contrato médico contem os seguintes deveres:
1) Dever de conselho: o medico deve instruir o cliente, ou a pessoa que
cuida dele, a respeito das precauções essenciais requeridas pelo seu estado. Responde
pela infração do dever, aquele que deixa de aconselhar a hospitalização do enfermo,
quando evidente que não se poderia tratar devidamente nem ter uma assistência
adequada em seu domicilio. Ainda, comete infração aquele que não adverte sobre os
riscos das intervenções e tratamentos preconizados. Quanto mais perigosa a
intervenção, mais necessária é a advertência do profissional, que responderá na medida
em que calar ou atenuar os riscos do procedimento operatório ou do tratamento.
27
2) Dever de cuidado: o profissional deve cuidar do enfermo com zelo,
diligencia, utilizando todos os recursos da medicina. Desta forma, será
responsabilizado se não der assistência ao seu cliente ou se negligenciar visitas,
abandonando-o. Essa obrigação de atender a chamados ou de visitar o enfermo
pressupõe necessidade ditada pela doença ou acordo entra as partes a respeito. Ainda
com relação ao dever de cuidado, Maria Helena Diniz ensina que:
O medico tem ainda o dever de vigilância não só em relação aos pacientes
alienados, mas também, aos que, pelo seu estado mórbido, não estejam em
condição de se conduzir livremente, podendo até causar dano a si mesmo ou,
ainda, em relação aos que se tornaram inconscientes pelo efeito da anestesia
(DINIZ, 2008, p. 301).
3) Dever de abster-se de abuso ou desvio de poder: o médico não tem o
direito de tentar experiências medicas sobre o corpo humano, a não ser que seja
imprescindível para combater o mal que acarreta perigo a vida do paciente. Porem a
regra não pode ser entendida com rigor absoluto; não se pode obstruir a liberdade do
profissional que ouse tentar novos métodos científicos, pois o médico deve salvar,
mesmo que precise arriscar métodos novos.
4.4 INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO
Conforme ensina Fernanda Schaefer (2006, p. 207), o Código de Defesa do
Consumidor nos artigos 18 a 20 dispõe sobre a garantia do adimplemento da obrigação
contratada entre as partes, disciplinando a responsabilidade por vício do produto ou
serviço para os casos de inadimplemento da obrigação.
Como já mencionado em item anterior, para o médico cirurgião plástico, a
grande maioria da doutrina considera a responsabilidade médica como uma obrigação
de resultado.
Porém, é evidente que a melhora estética buscada tem uma análise de
eficiência de resultado, que é muito subjetiva. O médico pode ter agido de acordo com
28
o procedimento indicado para o paciente, atuado com perícia, prudência e diligência, e
ter alcançado um resultado satisfatório para o caso, o que não significa que tenha
atingido o fim desejado pelo paciente, pois a avaliação do resultado final é muito
particular para cada caso concreto.
Em cirurgias estéticas é relativamente comum que o resultado desejado não
seja conseguido já na primeira intervenção cirúrgica, necessitando muitas vezes de
uma segunda ou até terceira intervenção, conhecida como “retoque” da cirurgia, que é
uma ação do médico para adimplir a obrigação contratada.
Não basta apenas a insatisfação do paciente com o resultado final da
cirurgia para que se configure a obrigação de indenizar do médico, é necessário que
existam condições específicas que comprovem que o médico realmente não adimpliu a
sua obrigação com o paciente.
Miguel Kfouri Neto (2002, p. 32) instrui que, na responsabilidade
contratual a culpa é presumida quando se verifica o inadimplemento da obrigação do
devedor, e para os casos de responsabilidade extracontratual, a culpa precisa ser
demonstrada por aquele que a alega. Quando há uma obrigação contratual na relação
médico-paciente e o resultado contratado não foi alcançado, entende-se que houve
inadimplemento da obrigação assumida. Se esta obrigação contratual era uma
obrigação de resultado à culpa será presumida, a qual só pode ser excluída se o médico
provar que existiram condições excludentes de culpa, como o caso fortuito ou de força
maior, a culpa exclusiva da vítima e ainda fato de terceiro, não imputável ao médico.
Mas se a obrigação era de meio, o paciente deverá provar que o médico teve culpa no
inadimplemento, que agiu com negligência, imprudência ou imperícia, e neste caso, o
ônus da prova será do paciente e não do médico.
As situações de inadimplemento da obrigação contratual médica podem ser
configuradas principalmente nos eventos danosos decorrentes de três situações
específicas: culpa médica; erro médico; e erro de diagnóstico.
Nos caos de culpa médica, ela pode ser definida como a inexecução de um
dever que o agente podia conhecer, observar e evitar. É um erro de conduta que não
29
seria cometido por uma pessoa avisada, em iguais circunstâncias, de acordo com Caio
Mario Pereira (1999, p. 67).
A partir da definição de culpa, é possível definir a culpa médica, utilizando
citação de Miguel Kfouri Neto:
A culpabilidade somente pode ser presumida na hipótese de ocorrência de
erro grosseiro, de negligência ou de imperícia, devidamente demonstrados.
Se os profissionais se utilizam de sua vasta experiência e dos meios técnicos
indicados, com os habituais cuidados pré e pós-operatórios, somente uma
prova irretorquível poderá levar à indenização pleiteada. Não tendo sido
demonstrado o nexo causal entre a cirurgia danoso, correta esteve à sentença
dando pelo improvimento da ação (KFOURI NETO, 2002, p. 80).
Seguindo ainda o pensamento do mesmo autor, a culpa médica pode ser
separada em duas vertentes, a primeira seria a culpa ordinária que decorre do fato de
um médico executar um procedimento clínico ou cirúrgico ser ter condições físicas
para tal ato, como por exemplo, um cirurgião plástico que efetua uma cirurgia em
estado de embriaguez. A segunda modalidade é a culpa profissional que se caracteriza
quando um médico comete um erro de diagnóstico. Qualquer uma destas modalidades
de culpa, se provadas, geram a responsabilidade do médico, mas para ser indenizado é
necessário que, o paciente prove o nexo de causalidade que gerou o dano sofrido,
configurando assim o inadimplemento da obrigação.
Com relação ao erro médico, é aquele que deriva de ação ou omissão
culposa ou dolosa do médico. É possível definir como erro médico, em linguagem
simples, a falha profissional imputada a aquele que exerce a medicina.
Ocorre o erro culposo naqueles caos em que o médico não deseja e nem
prevê o resultado, ele produz o dano decorrente de situações em que agiu com
imprudência, imperícia ou negligência. Já, o erro doloso acontece quando o médico
age de forma consciente e aceita o risco de produzir certo resultado.
Contudo, assevera Miguel Kfouri Neto (2002, p. 88) que, para analisar o
inadimplemento da obrigação decorrente de erro médico é importante avaliar
documentos e provas, primeiramente deve-se verificar quanto ao médico à
30
regularidade do seu diploma, se este foi emitido por faculdade reconhecida, e ainda se
sua inscrição no CRM é válida e correta.
Seguidamente, segundo o mesmo autor, devem ser analisados os dados do
paciente, verificar seu prontuário e toda a evolução do tratamento, analisando se o
quadro clínico evoluiu corretamente comparado a partir de livros e trabalhos
científicos com a descrição das técnicas questionadas, a fim de se comparar o
desempenho dos acusados, no desenvolvimento do ato questionado – antes, durante e
depois da intervenção.
Ainda, para constatar o erro médico também deverá será verificado se a
técnica utilizada pelo médico foi semelhante à preconizada nos compêndios, não
houve transgressão de normas técnicas; se for diferente, e o mau resultado decorreu
desta técnica, houve transgressão.
Por fim, quanto ao erro de diagnóstico, este consiste em incorretamente
identificar a moléstia que acomete o paciente, fato que gera consequências muito
graves, pois o diagnóstico é a emissão de um juízo acerca da condição de saúde do
paciente, do qual depende a escolha do tratamento apropriado, e uma vez escolhido o
tratamento inadequado a enfermidade do paciente, gerará efeito danoso.
Quanto ao erro de diagnóstico é importante destacar que a princípio ele é
escusável, por exemplo, em casos que dependa de exames interpretativos, a menos que
o erro cometido seja grosseiro, se trate de um erro que qualquer médico prudente não
cometeria.
O paciente que vier a sofrer danos ocasionados por culpa médica, por erro
médico ou erro de diagnóstico, tem o direito no prazo de até três anos procurar um
advogado ou a defensoria pública e ingressar com um processo na área cível
requerendo indenização do médico responsável.
31
5 RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO EM CIRURGIAS PLÁSTICAS
DE MAMOPLASTIA
A insatisfação com o próprio corpo é muito comum, quase todos tem o
desejo de melhorar alguma coisa em seu corpo. Uma pesquisa inédita feita pelo Ibope5
Inteligência Mercado de Cirurgia Plástica no Brasil em todo o país estima que, em
2010, foram realizadas mais de 640 mil cirurgias plásticas no Brasil, 82%, em
mulheres, dessas, mais de 156 mil foram de implantes de silicone, e 91% delas de
implantes mamários.
Dentre os implantes de mama, 91% foram de cirurgias estéticas e apenas
9% de cirurgias reparadoras.
O Brasil ocupa o segundo lugar no ranking mundial de cirurgias plásticas.
A cirurgia plástica estética é um ramo da medicina em franco desenvolvimento hoje
em dia. Aqueles que buscam esse tipo de operação têm por finalidade melhorar sua
aparência externa, ou seja, tem por objetivo o seu embelezamento. Segundo Tereza
Ancoma Lopez (2004, p. 118-119), “essas intervenções foram muito combatidas no
passado e, hoje, apesar de aceitas, a responsabilidade dos danos produzidos por elas é
vista com maior rigor que nas operações necessárias a saúde ou a vida do doente”.
Esse maior rigor vem se destacando apenas com relação à cirurgia
meramente estética, pois a cirurgia plástica reparadora é considerada tão necessária e
imprescindível quanto qualquer outra intervenção cirúrgica, pois tem a mesma
finalidade terapêutica que as demais.
É bastante polemica a definição da natureza jurídica da cirurgia estética.
Ruy Rosado de Aguiar Junior (1995, p. 35) esclarece que, na França a orientação
doutrinaria e jurisprudência é de que, a obrigação a qual está submetido o cirurgião
plástico não é diferente daquela dos demais cirurgiões, pois corre os mesmos riscos e
5 IBOPE INTELIGENCIA, Mercado de Cirurgia Plástica no Brasil. Disponível em: http://www.ibope.com.br/pt-
br/noticias/Documents/apresentacao_cirurgia_plastica.pdf. Acesso em: 10 set. 2013.
32
depende da mesma álea. Sendo assim, seria como a dos médicos em geral, uma
obrigação de meios.
No Brasil, grande parte da doutrina e, principalmente, da jurisprudência
defende a tese de que se trata de uma obrigação de resultado. Como exemplo, Miguel
Kfouri Neto, leciona que a cirurgia plástica com fins estéticos atribui ao médico que a
realiza uma obrigação resultado, pelos riscos a que se submete o paciente e pela
garantia de um resultado certo e determinado. Nas palavras do autor:
[...] a cirurgia de caráter estritamente estético é aquela na qual o paciente
visa a tornar seu nariz, por exemplo – que de modo algum destoa da
harmonia de suas feições -, ainda mais formoso, considerando, por vezes, um
modelo ideal de beleza estética. Neste caso, onde se expõe o paciente a
riscos de certa gravidade, o médico se obriga a um resultado determinado e
se submete à presunção de culpa correspondente e ao ônus da prova para
eximir-se da responsabilidade pelo dano eventualmente decorrente da
intervenção (a jurisprudência alienígena registra caso de cirurgião que, no
propósito de corrigir a linha do nariz, terminou por amputar parte do órgão)
(KFOURI NETO, 2002, p. 175).
Ainda, com o mesmo posicionamento, Caio Mário da Silva Pereira forma as
seguintes considerações sobre a cirurgia estética:
a) o cirurgião, como médico, está sujeito a deveres gerais, que são o dever de
aconselhar, apontando os riscos da intervenção (tratamento e cirurgia), tendo
em conta as condições pessoais do paciente (idade, estado de saúde,
anomalias etc.); dever de assistir o paciente antes, durante e depois da
cirurgia; e dever de abster-se de abusos ou desvios de poder;
b) a cirurgia estética gera obrigação de resultado e não de meio. O paciente
do cirurgião estético não é um doente que procura tratamento e o médico não
se engaja na sua cara. O médico está empenhado em atingir o resultado
pretendido e, se não há como consegui-lo, não deve efetuar o ato cirúrgico
(PEREIRA, 1999, p. 157).
A mamoplastia, que é o nome dado à cirurgia plástica feita nas mamas
humanas, podendo ser de aumento, quando se acrescenta materiais como o silicone, ou
de redução, quando o médico retira parte do tecido mamário para reduzir seu volume.
A finalidade desse tipo de procedimento é exatamente o de se obter o resultado de um
corpo mais belo.
33
Desta forma, fica claro que a cirurgia em questão, tem como natureza
jurídica uma obrigação de resultado.
Sergio Cavalieri Filho faz uma esclarecedora abordagem sobre o tema:
E como se justifica essa obrigação de resultado do médico em face da
responsabilidade subjetiva estabelecida no Código do Consumidor para os
profissionais liberais? A indagação só cria embaraço para aqueles que
entendem que a obrigação de resultado gera sempre responsabilidade
objetiva. Entendo, todavia, que a obrigação de resultado em alguns casos
apenas inverte o ônus da prova quanto à culpa; a responsabilidade continua
sendo subjetiva, mas com culpa presumida. O Código do Consumidor não
criou para os profissionais liberais nenhum regime especial, privilegiado,
limitando-se a afirmar que a apuração de sua responsabilidade continuaria a
ser feita de acordo com o sistema tradicional, baseado na culpa. Logo,
continuam a ser-lhes aplicáveis às regras de responsabilidade subjetiva com
culpa provada nos casos em que assumem obrigação de meio; e as regras de
responsabilidade subjetiva com culpa presumida nos casos em que assumem
obrigação de resultado (CAVALIERI FILHO, 2009, p. 381).
Utilizando o entendimento citado que a responsabilidade médica deve
sempre ser subjetiva, alterando apenas a inversão do ônus da prova quando a obrigação
for de resultado, devido à culpa ser presumida. O ideal é que nos casos de cirurgia
plástica estética, como é o caso da mamoplastia, o médico cumpra seu dever de
informação de forma mais completa, se comparado à outra intervenção cirúrgica
qualquer. Ele deverá fornecer informações especificas, avaliando criteriosamente os
riscos e as vantagens que o procedimento pode trazer ao paciente. Pois se houver
incerteza quanto ao resultado final, o ideal é que o cirurgião desaconselhe o
procedimento, conforme ensina Miguel Kfouri Neto, para evitar que um resultado
indesejado aconteça ou que a cirurgia resulte em danos morais ou estéticos ao
paciente.
5.1 DANO MORAL E DANO ESTÉTICO
O dano moral, conforme explica Maria Helena Diniz, é a lesão de interesses
não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada por ato lesivo. Segundo a
autora:
34
O direito a integridade corporal, que é um direito da personalidade, pode
sofrer um prejuízo patrimonial, caso em que a lesão ao interesse patrimonial
será representada pelas despesas (dano emergente) com o tratamento da
vítima e pela sua incapacidade para o trabalho (lucro cessante), e um
prejuízo extrapatrimonial, hipótese em que terá uma lesão ao interesse à
incolumidade física que esse direito pressupõe e que sofreu, p. ex., um
menos cabo em razão de um dano estético que pode provocar complexos
provenientes das deformações (DINIZ, 2008, p. 89-90).
Desta forma, o dano moral tem natureza extrapatrimonial e decorre de uma
lesão nos direitos da personalidade do indivíduo que provocam diversos tipos de
sofrimento humano, os quais podem ser traduzidos na dor, na angústia, em turbações
de ânimo, em reações desagradáveis, desconfortáveis ou constrangedoras que
constituem um evento de natureza danosa produzida na esfera do lesado. Podemos
afirmar então, que o dano moral ocorre na esfera da subjetividade, no plano íntimo da
personalidade humana, pois é a dor resultante da violação de um bem juridicamente
tutelado, sem repercussão patrimonial.
Teresa Ancona Lopez ensina que o dano moral pode ser divido em duas
espécies: o dano moral objetivo que é aquele que atinge a dimensão social e moral do
indivíduo abalando sua imagem na sociedade; e o dano moral subjetivo que se
relaciona com o mal sofrido pelo indivíduo, que lhe traz sofrimento psíquico.
De acordo com os ensinamentos de Clayton Reis, a vítima do dano moral
sofre um prejuízo que é de impossível reparação, pois o conceito de reparação só se
aplica a bens materiais e não sendo, deste modo, possível avaliar com precisão e
equivalência a perda sofrida, pois os bens atingidos neste caso são abstratos e não
podendo ser avaliados pecuniariamente. Desta forma, por causa da impossibilidade da
reparação, converte-se a sanção em indenização pecuniária.
Com relação ao dano estético, Rui Stoco (2011, p. 1864) explica que
significa uma lesão à beleza física, ou seja, um dano à harmonia das formas externas
de alguém. Ao apreciar um prejuízo estético deve-se ter em mente a modificação
sofrida pela pessoa em relação ao que ela era.
Teresa Ancona Lopez especifica o dano estético com relação ao direito
civil, expondo que seu primeiro elemento é qualquer modificação:
35
Aqui não se trata apenas das horripilantes feridas, dos impressionantes olhos
vazados, da falte de uma orelha, da amputação de um membro, das cicatrizes
monstruosas ou mesmo do aleijão propriamente dito. Para a responsabilidade
civil basta a pessoa ter sofrido uma “transformação”, não tendo mais aquela
aparência que tinha, ou seja, um desequilíbrio entre o passado e o presente,
uma modificação para pior (LOPEZ, 2004, p. 18).
O segundo elemento, definido pela autora, é a permanência ou, no mínimo,
o efeito danoso prolongado. O dano estético deve apresentar certa definitividade, pois,
se possível ser reparado, resolve-se apenas como dano material. Porém, se for
permanente, então terá produzido uma modificação sensível na pessoa, com relação a
sua aparência anterior, e então deve ser resolvido com dano material e moral.
A indenização pecuniária advinda da dor moral e estética experimentadas
tem o viés de compensar o dano da vítima, como forma de minorar seu sofrimento. Já,
para o agente causador, a indenização serve como forma de punição e desestímulo para
a prática de novos atos ilícitos.
Segundo Clayton Reis (2000, p. 70), o arbitramento dos valores
indenizatórios referentes aos danos estéticos e morais é uma tarefa muito árdua, tendo
em vista que, o dano reside na subjetividade e como a legislação não estabelece
critérios objetivos para a fixação do valor, torna-se ainda mais difícil chegar a um
valor que repare o dano de forma correspondente.
Desta forma, é necessário prudência do judiciário, utilizando-se muitas
vezes da criatividade da doutrina e da jurisprudência, para a instituição de parâmetros
e critérios que resultem em um valor, ensina Humberto Theodoro Junior (2001, p. 30):
“conforme a gravidade do dano e a fortuna do responsável, a critério do poder
judiciário, como justa reparação do prejuízo sofrido, e não como fonte de
enriquecimento ilícito para quem a recebe”.
Antes da Constituição de 1988, embora fosse admitida a indenização de
dano moral, a jurisprudência predominante negava a cumulatividade com o dano
material, ao pretexto de que havendo o ressarcimento de todos os efeitos patrimoniais
nocivos do ato ilícito já estaria, a vítima, suficientemente reparada.
36
Hoje, o Superior Tribunal de Justiça firmou, entretanto, que é possível a
acumulação de pagamento de indenizações de dano moral e dano estético, ainda que
decorrentes do mesmo fato, desde que seja possível a identificação de forma separada
para cada dano, conforme prescreve a Súmula 387:
Súmula 387 - STJ: É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e
dano moral. (Rel. Min. Fernando Gonçalves - 26/8/2009).
O texto da Súmula que concede esta cumulação de indenização de danos
decorre do entendimento que os danos morais, estéticos e materiais têm dimensões
diversas. O dano estético provoca grande repercussão social, devido à agressão do
aspecto externo do indivíduo, ocasionado por uma alteração na aparência deste
indivíduo para pior, enfim o dano estético tem caráter objetivo, por isto não deve ser
considerado como parte do dano moral e do dano material. O dano moral é subjetivo,
provoca alterações e sofrimentos de natureza íntima no indivíduo. E quanto ao dano
material, este se caracteriza por uma lesão causada no patrimônio de outrem. E devido
à natureza diversa dos danos apresentados é que se justifica que cada dano possa ser
indenizado de forma individual.
Com relação aos danos causados pelo cirurgião plástico, especialmente na
mamoplatia, verificamos que em certos casos, podem ocorrer varios tipos de dano,
pois, uma cirurgia mal realizada pode causar um dano que enseja muitas outras
cirurgias para ser reparado, caracterizando o dano material, além que causar grave
dano estético, já que terá alterado para pior a aparência do lesado, além de lhe causar
grande angustia, descontentamento, sofrimento psíquico, etc. em decorrência do não
atingimento do resultado pretendido com a cirurgia.
5.2 EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE
Existem algumas situações que excluem a responsabilidade civil do agente,
e, uma vez estando presentes, impossibilitam a relação de causalidade entre a conduta
do agente e o dano. São elas:
37
a) Fato exclusivo da vítima: a conduta da vítima como fato gerador do dano
elimina a causalidade. Antônio Ferreira Couto Filho assim explica:
É, pois, a atitude originada pela vítima (no caso do nosso estudo, pelo
paciente) que efetivamente contribuiu para o evento danoso e que, por
conseguinte, isenta de responsabilidade o aparente causador do dano: em
seara do ora estudado, o médico ou o estabelecimento de saúde (COUTO
FILHO, 2001, p. 31).
Desta forma, se, por exemplo, o médico utiliza todas as técnicas necessárias
com relação à cirurgia , age com prudência e diligência e prescreve todos os cuidados
pós-operatórios que o paciente deve seguir, mas no período de recuperação o paciente
deixa de seguir as orientações médica, ou tem qualquer conduta que ocasione o dano, o
médico não poderá ser responsabilizado.
Segundo Caio Mario Pereira (1999, p. 298), uma questão relevante quanto à
culpa da vítima, é quando se verifica que há culpa concorrente entre a vítima e o
médico, quando ambos concorrem igualmente em grau de culpa para a produção do
resultado danoso. Nesta hipótese, não se extingue o nexo causal, mas atenua a culpa do
médico e se reduz o valor da indenização.
b) Caso fortuito ou força maior: entende-se por caso fortuito aquele que é
imprevisível, por isso, inevitável, já, o caso de força maior é aquele que até pode ser
previsto, porém, é igualmente inevitável.
O caso fortuito e a força maior se caracterizam pela presença de dois
requisitos: o objetivo, que se configura na inevitabilidade do evento; e o subjetivo, que
é a ausência de culpa na produção do acontecimento.
c) Fato de terceiro: o dano ocorre por culpa de qualquer outra pessoa, além
da vítima e do agente.
Para a caracterização do fato de terceiro exige-se a presença de alguns
pressupostos, como ensina José de Aguiar Dias:
O fato de terceiro precisa, antes de mais nada, ser caracterizado. Isto se faz
mediante a exigência destes pressupostos: a) causalidade: escusado dizer
que, se não é causa do dano, nenhuma influencia pode o fato de terceiro
38
exercer no problema da responsabilidade; b) inimputabilidade: com efeito, se
o fato danoso pode ser imputado ao devedor, fica fora de questão apurar em
que medida terá influído, no resultado, o fato de terceiro, porque não foi este,
mas aquele, o produtor do dano; c) qualidade: terceiro é qualquer pessoa
além da vítima e do responsável. Ressalvam-se as pessoas por quem o agente
responde, tanto no regime delitual (filhos, tutelados, prepostos, aprendizes,
etc.) como no campo contratual (encarregados da execução do contrato em
geral), porque essas não são terceiros, no sentido de estranhos a relação a
relação que aqui os interessa [...]; d) identidade: o fato de terceiro há de ser
atribuído a alguém, o que não quer dizer que se imponha, necessariamente, a
sua identificação [...]; e) iliceidade: se o fato de terceiro é causa exclusiva do
dano, não há que indagar se é ou não ilícito, para considerar-se como causa
de isenção [...] (DIAS, 2006, p. 927-928)
Diante de todo o exposto, resta claro que, se o paciente sofrer dano, mesmo
que a situação seja enquadrada como responsabilidade objetiva em que a culpa é
presumida, caberá ao médico provar que não gerou o dano. Ele poderá defender-se por
meio das causas excludentes de responsabilidade que rompem o nexo causal.
39
6 POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL
Como vimos, grande parte da doutrina e da jurisprudência entende que a
cirurgia plástica com finalidade estética, tem por natureza jurídica uma obrigação de
resultado, pensamento adotado por vários autores como Miguel Kfouri Neto, José
Aguiar Dias e Sergio Cavalieri Filho, os quais adotam o entendimento que uma pessoa
sadia se submete a uma intervenção cirúrgica almejando melhorar sua aparência ou
corrigir algo que entende como imperfeição, o médico assume o compromisso de
proporcionar ao paciente o resultado desejado.
Portanto, passamos agora a exposição de decisões de diversos tribunais de
nosso País nesse sentido:
DANOS MATERIAIS E MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL.
HOSPITAL. MÉDICO. CIRURGIA ESTÉTICA. OBRIGAÇÃO DE
RESULTADO. CONSENTIMENTO INFORMADO. VALOR DA
CONDENAÇÃO. 1 - HOSPITAL, COMO FORNECEDOR DE SERVIÇOS
MÉDICOS, RESPONDE, OBJETIVAMENTE, POR ERRO MÉDICO
OCORRIDO DURANTE CIRURGIA REALIZADA EM SUAS
DEPENDÊNCIAS, SOBRETUDO SE PRESTOU P ARTE DOS
SERVIÇOS. E O MÉDICO, RESPONSÁVEL PELA CIRURGIA,
RESPONDE MEDIANTE DEMONSTRAÇÃO DE CULPA. 2 - É DE
RESULTADO A OBRIGAÇÃO EM CONTRATO PARA REALIZAR
CIRURGIA ESTÉTICA. SEGUE QUE, SE O RESULTADO PODE
SER MELHORADO, A CIRURGIA NÃO ATINGIU O GRAU DE
SATISFAÇÃO ESPERADO. SE NÃO ATINGIU, A OBRIGAÇÃO
NÃO FOI ADIMPLIDA A CONTENTO. 3 - DOCUMENTO VAGO E
IMPRECISO, QUE NÃO INFORMA O PACIENTE QUANTO AOS
RISCOS DA CIRURGIA A SER REALIZADA, NÃO SUPRE A
EXIGÊNCIA DE EFETIVO CONSENTIMENTO INFORMADO. 4 - SÃO
INDENIZÁVEIS DANOS MATERIAIS, CONSISTENTES NAS
DESPESAS MÉDICO-HOSPITALARES DECORRENTES DA
CIRURGIA E DOS CUIDADOS EXIGIDOS NO PÓS-OPERATÓRIO,
ESPECIALMENTE DIANTE DA NECESSIDADE DE CIRURGIA
REPARADORA. 5 - O VALOR DE INDENIZAÇÃO POR DANO
MORAL DEVE SER FIXADO PRUDENTE E MODERADAMENTE,
LEVANDO EM CONTA CRITÉRIOS DE PROPORCIONALIDADE E
RAZOABILIDADE E ATENDENDO ÀS CONDIÇÕES DO OFENSOR,
DO OFENDIDO E DO BEM JURÍDICO LESADO. 6 - APELAÇÕES DOS
RÉUS PROVIDAS EM P ARTE. APELAÇÃO DA AUTORA NÃO
PROVIDA.
(TJ-DF - APL: 34696920068070003 DF 0003469-69.2006.807.0003,
Relator: JAIR SOARES, Data de Julgamento: 17/11/2010, 6ª Turma Cível,
Data de Publicação: 25/11/2010, DJ-e Pág. 297)
40
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ERRO MÉDICO.
CIRURGIA PLÁSTICA (MAMOPLASTIA). CONDENAÇÃO DO
HOSPITAL E DO PROFISSIONAL MÉDICO. RECURSO DO
HOSPITAL: AGRAVO RETIDO CONHECIDO. DENUNCIAÇÃO DA
LIDE. NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DO ART. 70 DO CPC O
NÃO ACOLHIMENTO É MEDIDA QUE SE IMPÕE.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA ENTIDADE HOSPITAL QUE
NÃO É AUTOMÁTICA. MÉDICO QUE NÃO FAZ PARTE DE SEU
CORPO CLÍNICO. AUSÊNCIA DE FALHA DOS EQUIPAMENTOS OU
SERVIÇOS OFERECIDOS PELO ESTABELECIMENTO.
PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. LEGITIMIDADE PASSIVA
ACOLHIDA. APELAÇÃO DO MÉDICO: NULIDADE DA SENTENÇA
POR AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO SOBRE PONTOS
RELEVANTES. IMPUGNAÇÃO E PEDIDO DE
DESENTRANHAMENTO DE FOTOGRAFIAS. A AUSÊNCIA DE
NEGATIVOS FOI SUPRIDA E A JUNTADA EXTEMPORÂNEA DOS
ORIGINAIS NÃO CAUSOU PREJUÍZO À AMPLA DEFESA OU AO
CONTRADITÓRIO. CÓPIAS COM A EXORDIAL E ORIGINAIS DO
CONHECIMENTO DO APELANTE, EIS QUE ACOMPANHAVAM
PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO JUNTO AO ÓRGÃO DE
CLASSE. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. INEQUÍVOCA
RELAÇÃO DE CONSUMO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA.
POSSIBILIDADE DE SUA APLICAÇÃO EM SEGUNDO GRAU DE
JURISDIÇÃO. MÉDICO QUE NÃO ESCLARECE À PACIENTE O FATO
DE NÃO POSSUIR TÍTULO DE CIRURGIÃO PLÁSTICO. DEVER DE
INFORMAÇÃO NÃO CUMPRIDO. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO
DO CIRURGIÃO PLÁSTICO DE CIRURGIA ESTÉTICA.
ELEMENTOS PARA CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE
PRESENTES. LAUDO PERICIAL QUE DEMONSTRA QUE OS
RESULTADO OBTIDOS COM A CIRURGIA NÃO ESTÃO
ADEQUADOS ÀS TÉCNICAS DE MAMOPLASTIA REDUTORA.
QUANTUM INDENIZATÓRIO RAZOÁVEL E PROPORCIONAL AOS
DANOS ESTÉTICOS E MORAIS EXPERIMENTADOS PELAS
APELADAS. REPARAÇÃO DEVIDA. RECURSOS CONHECIDOS.
PROVIDO O INTERPOSTO PELO HOSPITAL E DESPROVIDO O DO
PROFISSIONAL MÉDICO. - A denunciação à lide não é admitida em
qualquer situação em que possa haver posterior direito de regresso do
vencido, pelo contrário, somente em caso de garantia, sob pena de ofensa ao
princípio da celebridade processual. - O hospital somente deverá ser
responsabilizado solidariamente com o médico nas seguintes hipóteses: a)
erro praticado por médico preposto do hospital; b) erro praticado por médico
autônomo, decorrendo o dano da prática do médico, acrescida de alguma
falha dos equipamentos ou de serviços oferecidos pelo nosocômio; c) erro do
médico que, embora não sendo preposto, estava de serviço no hospital e
prestou o atendimento quando procurado diretamente pelo paciente naquele
local, presumindo-se, nesta hipótese, que estava credenciado para prestar o
aludido serviço. - "Sendo a inversão do ônus da prova uma regra de
julgamento, plenamente possível seja decretada em 2º grau de jurisdição, não
implicando esse momento da inversão em cerceamento de defesa para
nenhuma das partes, ainda mais ao se atentar para as peculiaridades do caso
concreto, em que se faz necessária a inversão do ônus da prova diante da
patente hipossuficiência técnica da consumidora que não possui nem mesmo
a documentação referente ao contrato de seguro. Agravo regimental
41
improvido (STJ, AgRg nos EDcl no Ag 977795/PR, Min. Sidnei Beneti,
julgado em 23/9/2008)". - "Sendo a obrigação de resultado, basta ao
lesado demonstrar, além da existência do contrato, a não obtenção do
objetivo prometido, pois isso basta para caracterizar o descumprimento
do contrato, independente das suas razões, cabendo ao devedor provar o
caso fortuito ou força maior, quando se exonerará da responsabilidade".
(Ministro Ruy Rosado de Aguiar Júnior, Responsabilidade civil do médico.
Revista dos Tribunais, São Paulo, vol. 84, n. 718, p. 33-53, ago. 1995, p. 35).
(TJ-SC - AC: 139896 SC 2009.013989-6, Relator: Cinthia Beatriz da Silva
Bittencourt Schaefer, Data de Julgamento: 09/02/2012, Sexta Câmara de
Direito Civil, Data de Publicação: Apelação Cível n. , de São João Batista)
RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. MAMOPLASTIA
REDUTORA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO MÉDICO DE
RESULTADO. ATO ILÍCITO. IMPERÍCIA. I - A CIRURGIA PLÁSTICA
CONSTITUI PRESTAÇÃO DE SERVIÇO MÉDICO DE RESULTADO. II
- ESTÁ CARACTERIZADA A IMPERÍCIA MÉDICA NA
MAMOPLASTIA REDUTORA, PORQUE OS SEIOS NÃO FICARAM
NO TAMANHO CONTRATADO; ALÉM DO QUE A CIRURGIA
RESULTOU EM CICATRIZES EXAGERADAS E MAL-
POSICIONADAS, EM MAMILOS TORTOS E EM ARÉOLAS
ASSIMÉTRICAS. III - A VALORAÇÃO DA COMPENSAÇÃO MORAL
DEVE OBSERVAR O PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE, A
GRAVIDADE, A REPERCUSSÃO DO DANO, BEM COMO A
INTENSIDADE E OS EFEITOS DA LESÃO. A FINALIDADE
COMPENSATÓRIA, POR SUA VEZ, DEVE TER CARÁTER
DIDÁTICO-PEDAGÓGICO, EVITADO O VALOR EXCESSIVO OU
ÍNFIMO, OBJETIVANDO, SEMPRE, O DESESTÍMULO À CONDUTA
LESIVA. IV - APELAÇÃO PROVIDA.
(TJ-DF - APL: 158216120038070004 DF 0015821-61.2003.807.0004,
Relator: VERA ANDRIGHI, Data de Julgamento: 12/08/2009, 1ª Turma
Cível, Data de Publicação: 24/08/2009, DJ-e Pág. 49)
Recurso de Apelação. Responsabilidade Civil. Cirurgia plástica
reparadora e estética de mamoplastia redutora insatisfatória. Preliminar.
Cerceamento de defesa. Rejeitada. Danos moral e estético configurados.
Obrigação de indenizar. Sentença Mantida. I - O juiz é o destinatário das
provas, cabendo a ele aferir e aquilatar sobre a necessidade ou não de sua
produção. Inteligência do art. 130 do Código de Processo Civil. O apelante
não trouxe aos autos argumentos suficientes para demonstrar a
imprescindibilidade da realização da audiência de instrução e julgamento,
ônus que lhe impunha e do qual não se desincumbiu, a teor do que estabelece
o art. 130, inciso I do CPC. II - Ao realizar uma cirurgia plástica de
caráter reparador e estético, o médico assume uma obrigação de
resultado, ensejando sua responsabilização quando se verificar que,
após a sua realização, a paciente ficou com aparência pior de que
quando procurou o auxílio especializado. III - Indiscutível a ocorrência
dos danos imateriais pretendidos pela paciente lesada em razão do insucesso
da cirurgia. IV - A fixação do quantum indenizatório deve sopesar critérios
objetivos como a condição econômica das partes, a gravidade do dano, o
grau de culpa, atendendo, especialmente, para o caráter punitivo-pedagógico
42
inerente a indenização em tais casos, sem acarretar o enriquecimento ilícito
da vítima. Recurso conhecido e improvido. Decisão unânime.
(TJ-SE - AC: 2010211775 SE , Relator: DESA. GENI SILVEIRA
SCHUSTER, Data de Julgamento: 23/11/2010, 1ª.CÂMARA CÍVEL).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS E
ESTÉTICOS. PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. INOVAÇÃO
RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA ESTABILIZAÇÃO
OBJETIVA DA LIDE. APLICAÇÃO DO ARTIGO 264, PARÁGRAFO
ÚNICO, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. LEGITIMIDADE
PASSIVA DO NOSOCÔMIO CONFIGURADA. RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA ENTRE O HOSPITAL E O MÉDICO QUE PRESTOU OS
SERVIÇOS. REALIZAÇÃO DE CIRURGIA PLÁSTICA ESTÉTICA
(MAMOPLASTIA). SEQUELAS FÍSICAS DEIXADAS NO CORPO
DA AUTORA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OBRIGAÇÃO
DE RESULTADO. EXEGESE DO ARTIGO 14 DO CÓDIGO
CONSUMERISTA. NÃO COMPROVAÇÃO DAS CAUSAS
EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL. DEVER DE
INDENIZAR CARACTERIZADO. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA POR
DANO ESTÉTICO JÁ INSERIDA NO VALOR ARBITRADO POR
DANOS MORAIS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. RECURSO CONHECIDO
E PARCIALMENTE PROVIDO. I ¿ Após o saneamento do processo, não é
permitida, em nenhuma hipótese, a alteração do pedido ou da causa de pedir
da demanda, consoante o disposto no art. 264, parágrafo único, do Código de
Processo Civil. Desse modo, em consonância com o princípio da
estabilização objetiva da lide, afigura-se descabido o pedido de antecipação
de tutela, feito pela autora no âmbito recursal, para a retirada de seu nome
dos cadastros de proteção ao crédito, se no momento em que apresentou a
inicial, narra causa de pedir e pedido diverso. II ¿ Considera-se responsável
solidário o hospital pelos atos praticados por médico, não pertencente ao seu
corpo clínico, que realiza procedimentos cirúrgicos dentro de suas
dependências, mormente quando aquele recebe pagamento pela realização de
tal procedimento. Dessa forma, caracterizada está à legitimidade do Hospital
para figurar no polo passivo da presente demanda. III ¿ Em regra, os
contratos de prestação de serviços médicos originam obrigações de meio
e não de resultado, sendo uma das exceções a esta regra os casos de
cirurgia plástica, na exata medida em que ela tem por escopo, entre
outros, o embelezamento estético do paciente, razão pela qual é
considerada obrigação de resultado. Nessa linha, deixando a intervenção
cirúrgica dessa natureza de atingir o escopo desejado e previamente
definido pelo profissional da saúde com o seu paciente, responde os réus
(prestadores de serviço), objetivamente, pelos danos causados à vítima
(consumidor), salvo demonstrada de maneira cabal alguma causa de
exclusão de culpa (inexistência de falha ou defeito na prestação dos
serviços hospitalares contratados pelo paciente, ocorrência de culpa
exclusiva do consumidor, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior), hipóteses não verificadas no caso em exame. IV ¿ Havendo provas
suficientes acerca dos danos suportados pela autora, e, diante da ausência de
exclusão do nexo de causalidade formado entre o dano e o serviço prestado
ou de excludente de culpabilidade, fica configurada a responsabilidade civil
43
dos réus e, consequentemente, o dever de compensar pelos danos morais
experimentados. V ¿ Considerando a natureza compensatória do montante
pecuniário em sede de danos morais (compreendidos também os danos
estéticos), a importância estabelecida em decisão judicial há de estar em
sintonia com o ilícito praticado, a extensão do dano sofrido pela vítima com
todos os seus consectários, a capacidade financeira do ofendido e do ofensor,
servindo como medida punitiva, pedagógica e inibidora. Serve de
abalizamento para a quantificação da importância devida a título de
danos morais, entre outros elementos, a dor física, o sofrimento e a
angústia experimentadas pela vítima, além dos danos estéticos, no caso,
representados pelas sequelas deixadas nos seios da vítima, somando-se
ainda a necessidade de submeter-se a outra (ou outras) intervenção
cirúrgica plástica reparadora, com todas as dores e aflições
naturalmente decorrentes. VI ¿ Para a configuração do dano estético, é
necessária a comprovação de que a lesão efetivamente tenha alterado a
aparência física da vítima, capaz de causar-lhe insatisfação ou
constrangimento. Destarte, a autora logrou êxito em demonstrar a ocorrência
de prejuízo físico hábil e suficiente a amparar o pedido de reparação por
danos estéticos, uma vez que ficarão evidentes as cicatrizes em sua pelé,
diante do ato cirúrgico. VII ¿ Necessitando a autora submeter-se à cirurgia
plástica reparadora da cicatriz deixada nos seus seios, como decorrência das
complicações encetadas pelo malsinado procedimento realizado pelos réus,
mister se faz a condenação destes ao custeio das respectivas despesas, sob
pena de descumprimento de ordem judicial, com a incidência de multa e
configuração da prática de ato atentatório ao exercício da jurisdição (art. 14,
V e parágrafo. único do CPC). VIII ¿ Tratando-se de responsabilidade civil
contratual, pela ocorrência de ilícito civil gerador de danos morais, a
correção monetária tem o seu termo inicial a partir do arbitramento do valor
da recuperação pecuniária (Súmula 362 do STJ). Por sua vez, os juros legais
moratórios fluirão a partir da citação. IX ¿ Em sentenças dotadas de eficácia
condenatória preponderante, devem os honorários advocatícios ser fixados
entre 10% e 20% sobre o valor da condenação, atendidos, para tanto, o grau
de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e
importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo para o
seu serviço (art. 20, § 3.º, do Código de Processo Civil).
(TJ-SC - AC: 476389 SC 2007.047638-9, Relator: Joel Figueira Júnior, Data
de Julgamento: 19/08/2010, Primeira Câmara de Direito Civil, Data de
Publicação: Apelação Cível n. , de Lages)
(Grifos meus)
É importante considerar que, embora seja considerada uma obrigação de
resultado, a jurisprudência em muitos casos avalia não só o resultado final, mas
também a conduta do médico e riscos possíveis e ou prováveis no caso concreto.
44
7 CONCLUSÃO
Atualmente, na busca da satisfação com sua imagem exterior, por conta dos
padrões de beleza impostos pela mídia e a busca de autoestima, revela-se um
significativo aumento de cirurgias estéticas. Esse tipo de procedimento cirúrgico, com
fins meramente estéticos, é reconhecido pela doutrina e jurisprudência obrigação de
resultado, pois neles o cirurgião assume o compromisso pelo efeito embelezador. São
hipóteses em a prestação de serviço tem um fim definido e caso não alcançado o
resultado esperado, ocorre o inadimplemento da obrigação.
Porém, as decisões judiciais, atentas à responsabilidade civil dos médicos,
afirmam que não obstante a obrigação de resultado inerente à cirurgia plástica
embelezadora, fatores externos e alheios à atuação médica têm efeito excludente de
sua responsabilidade, ao passo que rompem o necessário nexo de causalidade entre o
dano ao paciente e a prestação do serviço profissional.
Procedimentos cirúrgicos estéticos, quando com finalidade exclusivamente
embelezadora, como a mamoplastia podem, eventualmente, resultar em problemas de
saúde e intercorrências no processo de cicatrização, acarretando lesões formadas pelos
tecidos responsáveis, nos locais em que ocorreram os cortes para a operação, dentre
outras.
Nas hipóteses de insucesso, parcial ou total, da cirurgia estética,
reconhecida como obrigação de resultado, haverá presunção de culpa do médico que a
realizou e seu dever de indenizar surge da falha técnica, da negligência, imperícia e
imprudência e não da mera existência do dano.
Em razão da presunção de culpa, o ônus de provar que atuou com
observância de todos os procedimentos e técnicas cabíveis e disponíveis na realização
da cirurgia estética, que cumpriu com os deveres do médico, e que os danos afirmados
pelo paciente e de que inexiste o nexo de causalidade entre o dano estético e a conduta
médica, é do profissional médico.
45
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KFOURI NETO, Miguel. Culpa Médica e Ônus da Prova: presunções, perda de uma
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46
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