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UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM GEOGRAFIA
PR-REITORIA DE PESQUISA E PS-GRADUAO
MESTRADO EM GEOGRAFIA
CAMPUS UNIVERSITRIO DE PORTO NACIONAL
MESSIAS VIEIRA BARBOSA
REFORMA AGRRIA NO TOCANTINS: UMA ANLISE DA LUTA
E CONQUISTA DA TERRA A PARTIR DO ASSENTAMENTO PAULO FREIRE I e II,
RIO DOS BOIS - TOCANTINS
PORTO NACIONAL/TO
2016
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MESSIAS VIEIRA BARBOSA
REFORMA AGRRIA NO TOCANTINS: UMA ANLISE DA LUTA
E CONQUISTA DA TERRA A PARTIR DO ASSENTAMENTO PAULO FREIRE I e
II, RIO DOS BOIS - TO
Dissertao de Mestrado apresentado ao Programa de Ps-
Graduao em Geografia da Universidade Federal do
Tocantins, como requisito parcial obteno do ttulo de
Mestre em Geografia, Universidade Federal do Tocantins.
Orientador: Prof. Dr. Elizeu Ribeiro Lira.
PORTO NACIONAL-TO
2016
2
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)
Biblioteca da Universidade Federal do Tocantins
Campus Universitrio de Porto Nacional
Bibliotecria: Janira Iolanda Lopes da Rosa CRB-10/420 TODOS OS DIREITOS RESERVADOS A reproduo total ou parcial, de qualquer forma ou
por qualquer meio deste documento autorizado desde que citada a fonte. A violao dos direitos
do autor (Lei n 9.610/98) crime estabelecido pelo artigo 184 do Cdigo Penal.
B238 Barbosa, Messias Vieira
Reforma agrria no Tocantins: uma anlise da luta e conquista
da terra a partir do assentamento Paulo Freire I e II, Rio dos Bois -
Tocantins. / Messias Vieira Barbosa. Porto Nacional, TO: UFT,
2016.
160 p.; il.
Orientador: Prof. Dr. Elizeu Ribeiro Lira.
Dissertao (Mestrado) Universidade Federal do Tocantins,
Programa de Ps-Graduao em Geografia.
1. Geografia. 2. Reforma agrria. 3. Tocantins. I. Ttulo.
CDD 333.31
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DEDICATRIA
A todos os camponeses do Estado Tocantins,
que de forma direta ou indireta contriburam
para realizao deste trabalho.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo a Universidade Federal do Tocantins e ao Curso de Geografia por proporcionar esta
oportunidade de estudo.
Agradeo a CAPES parceira do Programa de Ps-Graduao em Geografia da Universidade
Federal do Tocantins (PPGG/UFT), Mestrado acadmico pela bolsa DS, um recurso
indispensvel para desenvolvimento e concluso do curso.
Agradeo ao orientador prof. Dr. Elizeu Ribeiro Lira pelo apoio e incentivo quanto
superao dos desafios surgidos no decorrer dessa luta, acreditando na minha capacidade e ao
mesmo tempo apontando as minhas limitaes.
Agradeo ao NURBA- Ncleo de Estudos Urbanos e Agrrios da UFT pelo apoio e suporte
institucional.
Agradeo ao professor Ariovaldo Umbelino de Oliveira pela contribuio dada relacionada a
idealizao e implantao deste Programa de Ps-graduao em Geografia da UFT-Campus
de Porto Nacional e tambm pela disciplina Agricultura, Capitalismo, Revolues e Reforma
Agrria.
Agradeo ao Projeto Casadinho, trabalho desenvolvido pela Ps-graduao em Geografia da
UFT-Campus de Porto Nacional e do IESA da Universidade Federal de Gois, pelas
contribuies dadas pelos docentes no decorrer da disciplina.
Agradeo ao professor Roberto de Souza Santos e a professora Gleys Ially Ramos dos Santos
por ter aceitado fazer parte da banca examinadora e pelas contribuies dadas para
estruturao do trabalho.
Agradeo a todos os assentados do assentamento Paulo Freire I e II pelo apoio e contribuio
dado durante realizao deste trabalho.
Agradeo ao MST no Estado do Tocantins pelo apoio e suporte institucional.
Agradeo ao departamento de Meio Ambiente e de Desenvolvimentos dos Assentamentos do
INCRA, SR-26 pelas informaes e fornecimento de documentos importantes para
organizao do trabalho.
Agradeo ao companheiro Miguel Paulo Arajo que sempre esteve disposio para auxiliar
nos trabalhos de campo.
Agradeo os meus pais e meus irmos que me deram apoio, bem como os demais familiares
que admiram a minha dedicao e luta. Por fim, agradeo a minha esposa Eliete Saraiva Brito
Barbosa e as nossas filhas: Messiele Saraiva Barbosa e Emili Saraiva Barbosa pela fora,
compreenso e apoio nesta empreitada.
v
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EPGRAFE
A liberdade da terra no assunto de lavradores.
A liberdade da terra assunto de todos.
Quantos no se alimentam do fruto da terra.
Do que vive, sobrevive do salrio.
Do que impedido de ir escola.
Dos meninos e meninas de rua.
Das prostitutas. Dos ameaados pela clera.
Dos que amargam o desemprego.
Dos que recusam a morte do sonho.
A liberdade da terra e a Paz do campo tem um nome.
Hoje viemos cantar no corao a cidade
para que ela oua nossas canes
(Pedro Tierra).
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RESUMO
A pesquisa aborda como ttulo dessa Dissertao a reforma agrria no Tocantins: uma anlise
da luta e conquista da terra a partir do assentamento Paulo Freire I e II localizado no
municpio de Rio dos Bois-TO. Analisado aleatoriamente a partir de entrevista por meio de
questionrios semiestruturados e udio com sujeitos que vivenciaram o processo de formao
do assentamento. O assentamento fruto da luta das famlias do acampamento Paulo Freire
organizado pelo MST no Estado do Tocantins, montado s margens direita da Rodovia Belm
Braslia, BR-153 sentido Sul a Norte, entre a cidade de Rio dos Bois e Miranorte. A pesquisa
desenvolvida no assentamento Paulo Freire I e II baseia no referencial terico de autores que
trabalham com a quento agrria como Jos de Sousa Martins, Ariovaldo Umbelino de
Oliveira, Manoel Correia de Andrade e Caio Prado Junho entre outros. O texto debate alguns
fatores que contriburam para criao do assentamento. Dentre os quais destaco as aes,
ideolgicas e econmicas da agricultura capitalista, as aes sociais do Estado relacionado
politica de reforma agrria e as aes politicas organizativas dos movimentos sociais e
sindicais protagonizadas pelos camponeses na luta pela conquista e reconquista da terra. No
Tocantins essas aes e relaes se apresentam por meio dos grandes projetos que articulam
suas implantaes em pontos estratgicos de modo convergir e divergir com relaes
capitalista e no capitalista de produo, gerando assim inmeros conflitos no campo. Nesse
contexto, apresento a trajetria de luta dos camponeses do assentamento Paulo Freire I e II,
suas perspectivas e desafios. Esses camponeses, direta e indiretamente faz parte do histrico
processo de explorao e expropriao provocado pela agricultura capitalista. Entretanto estes
sujeitos tem se colocado em resistncia contra as formas de explorao imposta pelo
capitalismo e pelo Estado brasileiro. Uma estrutura politica e econmica que resiste e luta
contra mudanas que ameaam os seus interesses. Diante desse quadro poltico, econmico e
social, os camponeses sem terra percebem que alternativa a ser adotada se envolver e
participar de lutas contra essa estrutura opressora. Um processo que contribui para formao
da conscincia de classe, sentimento que desperta a partir do engajamento na luta vivenciando
situaes de conflitos e tenses nos diferentes territrios, espaos e momentos de lutas.
(Acampamentos, assentamentos e as manifestaes) surgem como forma de aproximao,
socializao, formao politica e integrao dos camponeses sem terra. Esta relao, de
acordo com o nvel de organizao e participao dos sujeitos no processo produtivo; das
aes do Estado, da conjuntura politica, econmica e social que possa garantir a reproduo
social da classe no territrio conquistado.
Palavras-chave: Estrutura fundiria, luta de classe, luta pela terra, camponeses e movimentos
sociais.
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8
ABSTRACT
The research addresses a work whose theme agrarian reform in Tocantins: an analysis of
struggle and conquest of the land from Paulo Freire I and II settlement in Rivers municipality
of Bois-TO, fruit of the struggle of camp families Paulo Freire the movement of the Landless
Rural Workers MST-mounted near the Highway Belem Brasilia BR-153 in Rio municipality
of Bois-tO, between the city of Rio dos Bois and Miranorte-tO. The research developed in the
settlement Paulo Freire I and II, it is based on a set of factors which eventually resulted in the
achievement of the peasants landless. Among the factors highlight the actions political,
ideological and economic of capitalist agriculture; social actions related state land reform
policy; and organizational policy actions of the movement spearheaded by the peasants in the
struggle for conquest and re-conquest of the land. In the state of Tocantins these actions and
relations are presented through the major projects that articulate their deployments at strategic
point in order to converge with capitalist relations and production of non-capitalist in the
field, thus generating numerous conflicts in the field. In this context, I present the history of
struggle of the settlement of peasants Paulo Freire I and II, its prospects and challenges. These
peasants who historically are victims of the capitalist system that exploits, expropriates and
excludes, demonstrated and demonstrate feeling resistance against the system under all when
they make social challenges, manifested through the struggles and against social and
economic policy structure that exploits, appropriates and expropriates the peasants. A
structure that resists and fights against any change that threatens their interests. Given this
political, social and economic framework, landless peasants realize that the alternative route is
the fight. Process that helps to develop the class consciousness, consciousness awakening
from conflicts caused by tensions and antagonism that demarcate the social identity of
individuals and groups. A process that starts with the struggles in different actions, areas and
territories (camps, settlements and demonstrations) emerge as an approximation, socialization,
training and political integration of landless peasants. It shows that the time of participation in
the struggles, the number of participants, the organicity levels of rooms and territories
contribute to the subject and the community have a critical view and political reality.
Keywords: land structure, class struggle, the struggle for land, peasants and social
movements.
viii
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LISTA DE GRFICOS
Grfico 1- Migrao para o Estado do Tocantins ............................................................... 40
Grfica 2- Brasil- Estrutura Fundiria por regies - nmero de imveis rurais por ano
1998, 2003, 2010, 2011, 2012 e 2014 .................................................................................
46
Grficos 3- Evoluo estrutura fundiria por regies referente o nmero de imveis ....... 47
Grfico 4 - Estrutura fundiria brasileira por regies - reas dos imveis rurais em
hectares ................................................................................................................................
49
Grficos 5- Evoluo estrutura fundiria - Regio Norte hectares .................................... 50
Grficos 6- Brasil. Evoluo da estrutura fundiria por nmero de imveis e por reas
dos imveis rurais em hectares ...........................................................................................
52
Grficos 7- Evoluo da estrutura fundiria no Estado do Tocantins entre 1998 a 2014 ... 57
Grfico 8- Brasil. Nmero de assentamento rurais entre 1979 a 2014 ............................ 71
Grfico 9- Brasil. Nmero de famlias assentadas em assentamentos rurais entre os anos
de 1979 a 2014.....................................................................................................................
72
Grfico 10- Brasil. Assentamentos criados por regies entre 1979 a 2014 ........................ 73
Grfico 11- Brasil - Nmero de famlias assentadas por regies, entre 1979 a 2014 ......... 74
Grfico 12- Assentamentos implantados no Tocantins entre 1987 a 2015 ......................... 76
Grfico 13- Assentamentos criados no Estado do Tocantins entre 1987 a 2015................. 78
Grfico 14- Nmero de famlias assentadas no Estado do Tocantins entre 1987 a 2015 ... 79
Grfico 15 - Formas de obteno da terra para reforma agrria ......................................... 80
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LISTAS DE QUADROS
Quadro 1- Estrutura fundiria do Estado do Tocantins entre 1998 a 2014 ........................ 56
Quadro 2- Assentamentos implantados no Tocantins entre 1987 a 2015 .......................... 76
Quadro 3- Famlias assentadas no Tocantins entre 1987 a 2015 ........................................ 77
Quadro 4- INCRA, Formas de obteno de terra ............................................................... 79
Quadro 5- Assentamentos implantados no Tocantins entre 1987 a 2015 .......................... 83
Quadro 6- Formas de obteno de terra ............................................................................. 83
Quadro 7- Formas de obteno de terra ............................................................................. 84
Quadro 8- Assentamentos do Crdito Fundirio do Tocantins entre 2001 a 2016 ............ 85
Quadro 9- Assentamentos criados pelo Governo Federal no Tocantins ............................ 86
Quadro 10- Assentamentos de reforma agrria no Tocantins classificados por regies .... 88
Quadro 11- Assentamentos localizados na regio Norte do Tocantins .............................. 91
Quadro 12- Assentamentos localizados na regio Centro-Oeste do Tocantins .................. 93
Quadro 13- Assentamentos localizados na regio Leste e Nordeste do Tocantins ............ 94
Quadro 14- Assentamentos localizados na regio Sul do Estado do Tocantins ................. 96
Quadro 15- Distncias e rodovias de acesso ao assentamento ........................................... 106
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LISTA DE MAPAS
Mapa 1- Assentamentos de Reforma Agrria no Tocantins- Cartografia da Luta e
Conquista da Terra .............................................................................................................
89
Mapa 2- assentamentos localizados na regio Norte do Tocantins .................................... 90
Mapa 3- assentamentos localizados na regio Centro-Oeste do Tocantins........................ 92
Mapa 4- assentamentos localizados na regio Leste e Nordeste do Tocantins .................. 94
Mapa 5- assentamentos localizados na regio Sul do Tocantins ....................................... 95
Mapa 6- Localizao do assentamento Paulo Freire I e II ................................................. 105
12
LISTA DE FIGURAS
Figura 1- Casa sede da fazenda Sobra da Mata ............................................................ 119
Figura 2- Vista espacial da antiga casa sede da fazendo Sombra da Mata ........................ 130
Figura 3- Vista espacial de parte do rio dos Bois ............................................................... 130
Figura 4- primeira Escola do assentamento, agrovila Paulo Freire I ................................. 131
Figura 5- Escola atual (2015-2016) do assentamento, agrovila Paulo Freire I ................. 132
Figuras 6- Vista dos barraces de reunies do assentamento, agrovila Paulo Freire I ...... 133
Figuras 7- Vista dos barraces de reunies do assentamento, agrovila Paulo Freire I ...... 133
Figura 8- Vista do poo artesiano e da caixa dagua da agrovila, Paulo Freire I ............... 135
Figura 9- Antena/torre telefnica da agrovila, Paulo Freire I ............................................ 136
Figura 10- Habitao do assentamento, agrovilas, Paulo Freire I e II ............................... 137
Figura 11- Habitao abandonadas nas agrovilas, Paulo Freire I e II ................................ 138
Figura 12- Plantao de abacaxi no assentamento Paulo Freire I e II ............................... 142
Figura 13- Criao de gado no assentamento Paulo Freire I e II ...................................... 143
Figura 14- Criao de galinha no assentamento Paulo Freire I e II.................................. 144
Figura 15- Linha do Trem da Ferrovia Norte Sul ............................................................... 144
13
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Brasil. Estrutura fundiria 1998 e 2003 ............................................................. 42
Tabela 2- Brasil. Estrutura fundiria 2010 e 2011 ............................................................. 43
Tabela 3- Brasil. Estrutura fundiria 2012 e 2014 ............................................................. 44
Tabela 4- Brasil. Estrutura fundiria entre 1998 a 2003, por Classe de reas e por
nmero de imveis .............................................................................................................
53
Tabela 5- Brasil. Estrutura fundiria do pas entre 2010 a 2011, por Classe de reas e
por nmero de imveis .......................................................................................................
54
Tabela 6- Brasil. Estrutura fundiria do pas entre 2012 a 2014 por Classes de reas e
por nmero ..........................................................................................................................
55
Tabela 7- Brasil - Nmero de assentamentos e reassentamentos rurais 1979 a 2014
....................................................................................................................................
69
Tabela 8- Municpios que contribuio para formao do assentamento Paulo Freire I e
II .........................................................................................................................................
114
Tabela 9- Participao da luta nos acampamentos do MST-TO ........................................ 128
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
APP reas de Preservao Permanente
CNBB Confederao Nacional dos Bispos do Brasil
CPT Comisso Pastoral da Terra
DATALUTA - Banco de Dados da Luta pela Terra
DIEESE Departamento Intersindical de Estatstica e Estudos Socioeconmicos
FETAET Federao dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Tocantins
GETAT Grupo Executivo das Terras do Araguaia-Tocantins
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
INCRA Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria
MAB Movimento dos Atingidos Por Barragens
MATOPIBA Maranho, Tocantins, Par, Piau e Bahia
MDA Ministrio do Desenvolvimento Agrrio
MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
NERA Ncleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrria
ONG Organizaes no Governamental
PA Projeto de Assentamento
PIN Projeto de Integrao Nacional
PND Plano Nacional de Desenvolvimento
PND Plano Nacional de Desenvolvimento.
PLO AMAZNICO Programa de Polos Agropecurios e Agrominerais da Amaznia
PRONAF Programa Nacional de Fortalecimento da agricultura Familiar
PROTERRA Programa de Redistribuio de Terras e Agroindstria do N e do NE.
PSDB Partido Socialista Democrtico Brasileiro
PT Partido dos Trabalhadores
SEPLAN Secretaria de Planejamento e Meio Ambiente
SIPRA Sistema de Informaes de Terras e Projetos de Reforma Agrria
SNCR Sistema Nacional de Cadastro Rural
SR-26 Superintendncia Regional de nmero 26
STR Sindicato dos Trabalhadores Rurais
TDA Ttulo da Divida Agrria.
UFT Universidade Federal do Tocantins
15
SUMRIO
INTRODUO ................................................................................................................ 16
CAPITULO I
1. A QUESTO AGRRIA NO BRASIL ........................................................................ 24
1.1 Poltica de Estado.......................................................................................................... 24
1.2 Luta de classe no campo, uma abordagem necessria ................................................. 29
1.3 Agricultura camponesa verso agricultura familiar: diferenciando os conceitos........... 33
CAPITULO II
2. ESTRURA FUNDIRIA, LUTA PELA TERRA E REFORMA AGRRIA ............. 39
2.1 Tocantins, formao e estrutura fundiria .................................................................... 39
2.2 Estrutura fundiria brasileira por regies relacionadas ao nmero de imveis rurais
bem como as reas dos imveis por ano ............................................................................
45
2.3 Estrutura fundiria brasileira por classe de reas e nmero de imveis ....................... 53
2.4 Estrutura fundiria no Estado do Tocantins ................................................................. 56
2.5 Agricultura capitalista e expropriao camponesa no Tocantins ................................. 58
2.6 Lutas dos movimentos sociais no campo e a poltica de reforma agrria no Brasil .... 64
2.7 Geografia dos assentamentos de reforma agrria no Estado do Tocantins .................. 86
2.8 Uma anlise sob a espacializao da luta do MST na regio Central do Tocantins .... 100
CAPITULO III
3. ASSENTAMENTO PAULO FREIRE I e II: O PROCESSO DE LUTA PELA TERRA.......... 105
3.1 Localizao e caracterizao ....................................................................................... 105
3.2 Massificao e organizao do acampamento Paulo Freire margem da rodovia
Belm-Braslia 153 ...................................................................................................
109
3.3 Diviso parcelar e a propriedade da terra no assentamento Paulo Freire I e II ............ 121
3.4 Os espaos comunitrios e a produo camponesa no assentamento Paulo Freire I e
II casa sede e o crrego Rio dos Bois. .......................................................................
129
3.5 Projeto capitalistas e sua influencia negativa no assentamento Paulo Freire I e II ..... 144
CONSIDERAES ........................................................................................................... 147
REFERNCIAS BIBLIOGRAFICAS ............................................................................... 150
APNDICE ........................................................................................................................ 154
NEXO ................................................................................................................................. 157
16
INTRODUO
Este trabalho de Dissertao de Mestrado tem como objeto de pesquisa o
assentamento Paulo Freire I e II, um assentamento de Reforma Agrria, localizado no
municpio de Rio dos Bois-TO. Esse assentamento teve sua formao a partir da luta dos
camponeses do movimento sem terra no Estado Tocantins, que residiam no acampamento
Paulo Freire, montado a margem direita da Rodovia Belm Braslia BR-153, sentido Sul a
Norte, municpio de Rio dos Bois-TO, entre a cidade de Rio dos Bois e Miranorte-TO,
prximo ao antigo posto de gasolina Tupi, posto que na espoca (2001e 2002) j se encontrava
desativado. Uma etapa inicial do processo da luta em busca da conquista da terra,
estabelecendo assim um enfrentamento contra o latifndio e o Estado brasileiro.
O objetivo do estudo analisar que o processo que contribuiu para a formao do
assentamento Paulo Freire I e II resultado de uma luta poltica, econmica e social
incansvel, historicamente travada pelos camponeses ao longo do tempo com intuito de
conquistar e reconquistar a terra, numa disputa que envolve alm dos camponeses os
latifundirios e o Estado brasileiro que se posicionar contra os camponeses. O qual o Estado
brasileiro contribuiu para implantar medidas que resultaram na apropriao do territrio
atravs de concesses de sesmarias, ao poltica de distribuio terras por parte do Estado e
tambm explorao da fora de trabalho1. Um modelo proveniente de experincias
desenvolvidas pelos europeus a partir do sculo XVI em diversas localidades do continente
americano e africano. Essas aes constituram como um dos elementos para o surgimento da
questo agrria no Brasil. ANDRADE (1988).
Tudo isso financiado pelo capitalismo que veio carregado de influncias ideolgicas
permeadas pelo jogo poltico e econmico de interesses ditando e expandindo-se suas aes
em diversas localidades da terra onde era possvel explorar visando assim implantao uma
poltica de dominao territorial e econmica sobre os povos, colnias recm-invadidas e
naes apropriadas. Dessa forma o capitalismo desenvolvia-se suas atividades e quando
encontrava obstculo que poderia colocar em risco suas aes, adotavam-se medidas de
proteo, como forma de garantir sua reproduo. Neste sentido a libertao dos escravos
em 1888 entendida por pesquisadores da questo agrria como Ariovaldo Umbelino de
Oliveira e Jos de Sousa Martins como elemento para garantir a conservao e reproduo do
capitalismo.
1 Escravizao dos povos indgenas e a utilizao de escravos exportados da frica.
17
Para Karl Marx, (apud Catani, 1989), uma das regras do capitalismo se baseia na
existncia de trs elementos bsicos que so: propriedade privada dos meios de produo,
diviso social do trabalhado e a troca. No caso brasileiro, parte desses elementos ainda
faltava para se consolidar. Portanto, com vistas expanso do mercado consumidor, era
necessrio forar o Estado e os latifundirios (senhores feudais) a se adequarem s regras
impostas pelo capitalismo. Entretanto, mesmo oferecendo certo nvel de resistncias, ainda
pontuais e tardiamente, do ponto de vista do capitalismo, foram obrigados a cederem.
Diante desta situao o Estado brasileiro, apoiado em bases extremamente
conservadoras, criou-se meios para que os exploradores, contrrio s mudanas impostas pelo
capitalismo, no fossem prejudicados, contrariando em partes, os propsitos do capitalismo.
Entretanto o Estado brasileiro, pressionado pelo capitalismo adotou medidas que culminaram
na criao da Lei de terras de N. 601, em setembro de 1850 e posteriormente a Lei urea, em
13 de maio de 1888 libertao dos escravos. No geral, essas leis contriburam para
inviabilizar todas as possibilidades dos camponeses terem acesso terra por meios legais e ao
mesmo tempo participarem do processo de explorao menos agressivo. Diante dessa
situao, os conflitos resultados da luta pela terra, se tornaram inevitveis. Luta essa que at
hoje, incio do sculo XXI, permanecem com altos ndices de violncia e injustia social no
campo (BARBOSA, 2009 p, 14).
Para Martins (1981), os camponeses brasileiros, entre os sculos XVI e XXI,
protagonizaram diversas lutas como, por exemplo: Zumbi dos Palmares, Guerra de Canudos e
Guerra do Contestado, como fatos que apesar de terem sido relevantes para nossa histria,
grande parte da sociedade brasileira ainda desconhece. Para o autor, esta classe social, foi
nica classe social no Brasil, que conseguiu impor severas derrotas s foras oficiais
(militares-exrcito brasileiro) e que o desconhecimento sob as informaes e registros dessas
lutas por grande parte da sociedade brasileira, se constitui como elemento poltico e
ideolgico adotado pelo o Estado contra os camponeses. Neste sentido, os proprietrios de
terra-latifundirios sempre utilizou-se e utiliza-se, as estruturas do Estado para inviabilizar
algo que possa beneficiar a classe social inimiga/adversaria, nos aspectos que contraria os
seus interesses. Uma atitude e posicionamento que geralmente conhecido no campo das
categorias das lutas polticas, sociais e econmicas relacionadas s reivindicaes e
conquistas de benefcios, como luta de classe.
A anlise de estudos relacionados s questes econmicas e sociais, realizada por
Karl Marx e Friedrich Engels afirma que: a histria de todas as sociedades at agora tem sido
18
a histria da luta de classe, (MARX 1818 a 1883 p, 8 2008), entendida tambm como motor
que move a sociedade. Embora nessa poca estes autores tenham manifestado opinio mais
sob as lutas ocorridas entre proletrio e burgus, se percebe que esta mesma relao se
encontra tambm no campo brasileiro desde sculo XIX at os dias atuais, marcadas por
histricas lutas enrgicas entre proprietrios de terra-latifundirios e camponeses motivado
principalmente, pela a implantao e expanso da agricultura capitalista, provocando assim
explorao e expropriao dos camponeses do campo.
No Brasil, o processo de desenvolvimento da agricultura capitalista, no foi
homogenia em todas as regies do pas. Em algumas regies como Centro-Oeste e Norte esse
processo demorou um pouco mais. Na regio Centro-Oeste, comeou a partir das dcadas de
1960 a 1980 com a minerao a pecuria e a monocultura de gros. J na regio Norte, esse
processo iniciou a partir de 1930 com extrao da borracha, explorao agropecuria,
extrao minerao, extrao de madeira, construo de barragens para instalao de usinas
hidreltricas, instalao de redes de cabos para conduo de energia eltrica e a monocultura
de gros. Um processo de explorao desenvolvido em etapas, conforme a necessidade do
mercado de consumo externo (exportao) fator que orienta o desenvolvimento da atividade
produtiva exigida. Tudo isso determinado por uma lgica baseada na explorao, apropriao
e expropriao dos povos que vivem no/do campo. Um processo de explorao onde est
implcita e explcita a luta de classe manifestada pelos conflitos e representada pela questo
agrria.
Nesse sentido, se apresenta a questo agrria na regio Norte do pas, onde destaco o
Estado do Tocantins, um territrio que desde a dcada de 1970 do sculo XX, o campo
atravessando um intenso processo de explorao e extino dos recursos naturais, de
explorao e expropriao dos camponeses, provocado principalmente pelo avano da
fronteira agrcola que procura de todas as formas avanarem, sobre tudo e todos,
transformando o ambiente natural e social numa paisagem sem vida. Um fenmeno que
inicialmente passa-se uma falsa impresso de crescimento, desenvolvimento econmico dos
territrios (municpios e regio), um reflexo que ludibria autoridades polticas,
governamentais, empresa privada instituies de ensino e a sociedade civil. (BARBOSA,
2013).
No Tocantins, a exemplo do que acorreu e ocorre em outros Estados do pas, os
fatores provocados pela agricultura capitalista tm se constitudo um entrave para o avano da
reforma agrria. Esse modelo de agricultura, historicamente sempre se posicionou contra os
19
camponeses. As lutas e perspectiva de conquistas dos camponeses tm sofrido inmeras
frustraes, pois o Estado brasileiro, sob controle da agricultura capitalista sempre contribuiu
para limitar e inviabilizar polticas que possa beneficiar agricultura camponesa. Entretanto,
faz-se necessrio que os camponeses continuem lutando, num processo do qual, a cada
possibilidade de conquistas que se constroem, poucas so as que se materializa na prtica.
Fatores que inicialmente apresenta-se um cenrio de boas perspectivas. Porm, na grande
maioria das lutas, h um sentimento de esperana que no decorrer do processo de lutas so
frustradas. Os proprietrios de terra-latifundirios recorrem aos seus aliados estratgicos2
que sempre esto prontos, ocupando posio de destaque nas diversas esferas do poder
(executivo, judicirio, legislativo e instituies/rgos pblico de segurana) os quais, criam
meios para garantir os interesses dos latifundirios. Numa ao que, alm de inviabilizar a
luta e conquista da terra, criminalizando assim os movimentos sociais do campo e os sujeitos
camponeses.
Os camponeses, organizados pelos movimentos sociais de massa, pelos os
movimentos sindicais, pelos os movimentos de pastorais sociais (Igreja), pelos os
movimentos de organizao poltica social articulada por famlias ou por pessoas juntos aos
rgos oficiais e instituio econmica que recorre ao programa (crdito fundirio),
envolvendo famlias ou pessoas residentes no campo e na cidade com objetivo conquistar e
reconquistar um pedao de terra. So grupos e pessoas que lutam por direitos,
independentemente se tem ou no conscincia poltica de classe social. Entretanto, os
camponeses que no esto organizados em movimentos sociais de massa, em movimentos
sindicais e em movimentos de pastorais sociais, costumam encontrar mais dificuldades no
momento de articular meios de luta e conquista da terra.
Consciente dos seus direitos e conhecendo a realidade fundiria do pas, os
movimentos de luta pela terra, que h sculos travam intensas batalhas pela reforma agrria,
esto sempre lutando. Entretanto, os latifundirios e o Estado brasileiro, quando se sentem
ameaados ou pressionados, procuram de alguma maneira, reprimir de forma enrgica as
aes dos movimentos sociais. No entanto, grande parte dos movimentos sociais de luta pela
terra, entende que de acordo a correlao de foras e a conjuntura poltica, econmica e social
do momento, podem ocorrer derrotas e conquistas.
Baseado nestes fatores e aspectos, os movimentos sociais de luta pela terra no
campo, tm conseguido algumas conquistas e benefcios. Estas conquistas e benficos que
2 Chefe do poder executivo, poder legislativo, poder judicirio e instituies/rgos pblicos de segurana.
20
pode ser entendida como concesso por parte do Estado brasileiro e tambm como conquistas
dos camponeses. Para os movimentos sociais, embora o Estado classifique-o como concesso,
os movimentos sociais consideram como conquistas, pois se trata de alo que s foi possvel
ter acesso, atravs de lutas e lutas histricas.
Nesse contexto, se deu o processo de luta dos camponeses do Movimento Sem Terra
-MST do assentamento Paulo Freire I e II do municpio de Rio dos Bois-Tocantins, uma luta
que resultou na conquista do assentamento, um territrio entes controlado pelo latifndio que
a partir do ms de novembro do ano de 2002, passou a pertencer aos camponeses. Ressalta-se
ainda que o processo de luta dos referidos camponeses foi alm da luta pela posse da terra,
eles lutaram e lutam contra explorao imposta pelo sistema capitalista que consequentemente
contribui na perda de valores e de saberes camponeses. Dessa maneira, eles viram na luta no
s a possibilidade de retorno a terra, mais a conquista da liberdade, do resgate da sua
identidade, do cultivo de seus saberes e principalmente da reproduo social da classe e do
modo de vida.
Contudo, a luta dos camponeses do assentamento Paulo Freire I e II no foi apenas
pelo acesso terra, que se materializou na criao do assentamento e no desenvolvimento das
atividades produtivas, mas tambm pela luta contnua em busca de recursos que garanta sua
vivencia junto terra conquistada. Dessa forma, os camponeses esto buscando alternativas
atravs da organicidade na base com vistas autossubsistncia produtiva e econmica das
famlias. Assim, procuram discutir, planejar e elaborarem meios de resistncia contra
possveis formas de subordinao e explorao imposta pelo sistema capitalista.
Desse modo, os camponeses do assentamento Paulo Freire I e II, veem na
organizao poltica, na econmica e no aspecto social formas de manter sua permanncia no
campo. Para isso, desenvolvem-se aes voltadas para implantaes de infraestrutura
(construo estradas, abastecimento dgua e energia eltrica), atividades produtivas
(plantaes de cultura diversas, criao de animais e aves) bem como servios pblicos
(educao e a sade) essenciais para comunidade. Essas aes se materializam nas lutas
coletivas juntas aos rgos oficiais do Estado. Uma forma de lutas reivindicativas que
abrangem aspectos socioambientais e territoriais no assentamento. Lutas que procuram ir
alm de reivindicaes sindicais.
Nesta pesquisa abordo o assentamento Paulo Freire I e II que se encontra no
municpio de Rio dos Bois-Tocantins. O assentamento foi implantado numa rea de 4.622
hectares, conforme informao do INCRA, SR-26, e do Movimento Sem Terra. O processo de
21
assentamento das famlias na terra iniciou-se a partir do ms de novembro de 2002. Nessa
poca, foram assentadas 152 famlias em parcelas que variavam entre doze e vinte hectares
para cada, alm das reas destinadas para conservao e preservao ambiental que soma
mais de 35% da rea total do assentamento.
O trabalho faz uma abordagem a parti de um recorte temporal, espacial envolvendo
as lutas e conquistas dos movimentos sociais, dos movimentos sindicais, do movimento de
pastorais sociais e de movimento de associao diversa de luta pela terra no campo, bem
como a organizao regional dos territrios camponeses no Estado do Tocantins
compreendendo os anos de 2000 a 2015. Em relao o assentamento Paulo Freire I e II a
anlise est dividida em duas etapas a primeira refere-se ao ano 2000, perodo em que as
famlias camponesas residiram no acampamento margem da rodovia Belm Braslia, a
segunda etapa se refere ao ano de 2001, perodo em que as famlias camponesas
permaneceram acampadas na terra e na terceira etapa se refere ao no de 2002 a 2015 perodo
de ocupao das parcelas e desenvolvimento das atividades produtivas.
A Dissertao est organizada em trs captulos. No primeiro captulo abordo
aspectos polticos, econmicos e sociais relacionados reforma agrria em nosso pas, com
destaque para as polticas de reforma agrria desenvolvidas no Tocantins, bem como as aes
motivadas por influencias de natureza exgeno, implantando assim, sob a tica do
capitalismo, as bases de sua produo e reproduo no campo.
A regio do Norte pas, por ser uma regio cujo processo de explorao da
agricultura capitalista no campo iniciou-se a partir da metade sculo XX, encontrou um
grande nmero de camponeses que j havia vivenciado os reflexos desse processo de
explorao e expropriao na regio Nordeste entre o sculo XVIII e metade do sculo XX e
atualmente, incio do sculo XXI, esse processo infelizmente ainda continua.
No segundo captulo abordo aspectos polticos, econmicos e sociais da questo
agrria. Um problema que historicamente sempre fez parte das lutas camponesas no Brasil,
que teve seu incio na luta dos povos quilombolas durante a escravido, a revolta do
Contestado, a guerra de Canudos, nas lutas das ligas camponesas na dcada de 1950, nas
manifestaes dos Cangaceiros no Nordeste, no movimento de Trombas e Formoso do
Araguaia, bem como as lutas dos movimentos sociais, sindical, pastorais sociais e
movimentos associativos diversos que a partir da dcada de 1970 vem lutando contra a
explorao e expropriao dos camponeses.
22
Neste sentido h necessidade de ressaltar que vrios fatores contriburam para
intensificar a luta pela terra nos estados da regio Norte. Nesse contexto, consequentemente
envolve a poro Norte do Estado de Gois, atual Estado do Tocantins, territrio que
motivando pela implantao de grandes projetos na regio central do pas onde se destaca
primeiro a construo de Braslia-Capital Federal, golpe militar de 1964, segundo a
construo da rodovia Belm Braslia BR -153, terceiro incio da construo da rodovia
Transamaznica, BR-230, e quarto a implantao de projetos como: PIN-Projeto de
Integrao Nacional, quinto o PNDs-Plano Nacional de Desenvolvimento, sexto o
PROTERRA-Programa de Redistribuio de Terras e de Estmulo Agroindstria do Norte e
do Nordeste, stimo o PLOAMAZNICO-Programa de Plos Agropecurios e
Agrominerais da Amaznia se constituram como elementos que impulsionaram a ocupao
da Amaznia pelo grande capital, principalmente a agricultura capitalista responsvel pela
explorao e expropriao dos camponeses na regio (LIRA, 2011).
Essa contextualizao se faz necessria porque as lutas dos camponeses do
assentamento Paulo Freire I e II esto vinculadas ao processo de explorao provocado pela
agricultura capitalista no campo. Esses camponeses expropriados pelo o processo de
modernizao agrcola que transformaram um conjunto de relaes sociais existente no
campo. Assim os camponeses atingidos por essa modernizao eram arrendatrios, meeiros,
assalariados no campo, assalariados na cidade e posseiros que moravam em sua grande
maioria em diversos estados da regio Centro-Oeste, Norte e Nordeste do pas.
Os camponeses, desterritorializado e constrangido, so obrigados a migrarem para as
cidades aonde vo se tornaram proletariados ou partirem para a luta, em busca da terra
novamente. Para os que optam pela terra necessrio ingressar na luta dos movimentos sem
terra e fazerem enfrentamento direto com o Estado e com os latifundirios, alternativa adotada
por muitos camponeses que se encontram nesta situao, dentre eles, os camponeses do
assentamento Paulo Freire I e II.
No terceiro captulo fao uma abordagem sobre a trajetria da luta dos assentados do
assentamento Paulo Freire I e II demonstrando a importncia da organizao do movimento
durante o processo de luta no acampamento, bem como os desdobramentos, posteriormente
no assentamento. Essa luta, no foi apenas uma luta pela terra, mas tambm na terra num
enfrentamento contra foras adversas (subordinao, explorao e alienao influencias que
podem descaracterizar a organicidade do assentamento), lutas por benefcios sociais e por
meios que facilite o desenvolvimento dos sistemas produtivos.
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A luta para conquistar e permanecer na terra fez com que os camponeses buscassem
alternativas para garantirem seu modo de vida. Dentre as alternativas utilizadas, encontram-se
as formas de organizao social de natureza poltica informal (grupos de famlias) e poltica
formal (associaes) ambas, na medida do possvel procuram desenvolver trabalhos
comunitrios.
Essas atividades no possuem uma norma especfica, mas se baseiam nas relaes
sociais e na solidariedade que envolve as famlias e a comunidade, qualidades motivadas e
vivenciadas durante o engajamento no processo de luta pela terra no perodo em que residia
no acampamento. Logo, no so atividades estranhas ao modo de vida camponesa. Pelo
contrrio so baseadas justamente nos modos de vida dos camponeses, onde a diviso social
do trabalho no vivenciada.
importante mencionar que as aes comunitrias no ocorrem apenas no aspecto
econmico, mas tambm no aspecto poltica. Atravs da organicidade que reflete na
realizao de atividades associativas, educativas, comemorativas, de lazer e religiosa, aonde
os assentados do assentamento Paulo Freire I e II vm procurando implementar um conjunto
de benefcios para a comunidade. Esses benefcios no so apenas materiais e imediatos, mas
se constituem como uma forma de resistncia contra a subordinao e explorao dos
camponeses imposta pelo Estado e o capital. Assim, a pesquisa no assentamento Paulo Freire
I e II, possibilita analisar como se deu a luta dos camponeses e como se encontra a situao
deles atualmente. Tenta-se observar tambm as estratgias de resistncia utilizadas pelos
camponeses diante da expanso do capitalismo no campo.
A pesquisa de campo realizada a partir de 2015 abordou alm de anlises materiais
trabalhou com diversas entrevistas envolvendo os camponeses(as), representante de rgos
oficiais e lideranas de movimentos sociais, trabalho fundamental para aquisio de
informaes empricas.
Assim, espera-se que as consideraes tratadas na presente pesquisa possam
contribuir para ampliar o leque de informaes sobre a reforma agrria no Tocantins, sobre o
assentamento Paulo Freire I e II e ao mesmo tempo, subsidiar atividades desenvolvidas em
prol do assentamento.
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CAPTULO I
1. QUESTO AGRRIA NO BRASIL
1.1 Poltica de Estado
No Brasil a questo agrria problema que surgiu a partir de 1.500, e com a chegada
dos portugueses. Nessa poca tem incio a apropriao das terras e a explorao dos recursos
naturais atravs da extrao do pau Brasil, do ouro, do cultivo da Cana-de-acar e da
agricultura de subsistncia. Atividades desenvolvidas por meio da mo-de-obra escrava
proveniente da cultura indgena e da cultura Africana.
Aps a chegada dos portugueses, houve uma convivncia relativamente pacfica
entre os europeus e indgenas. Os nativos trabalhavam para o colonizador na extrao do pau
Brasil, na indicao dos locais onde se encontravam os minrios, bem como ajudava na
extrao dos mesmos, e em troca recebia objetos (canivete, pente para os cabelos, espelhos e
tecidos) de pouco valor. Mais ainda sem serem forados a essa atividade.
Quando os indgenas perceberam que a tentativa do colonizador era escraviz-los,
apossar de suas terras e destruir sua principal fonte de sobrevivncia. Nesse momento, os
indgenas comearam a reagir, iniciando assim, os primeiros conflitos pela a posse da terra no
Brasil, como afirma Brando, (2003).
Aps a invaso, inicia-se o processo de concentrao de terras, em 1534, quando o
rei de Portugal divide o Brasil em capitanias hereditrias distribuindo-as a amigos de
Portugal. A ao distributiva foi o inicio da concentrao de terra por particulares
atravs da compra legal e ilegal; da grilagem e da posse pela violncia para-militar,
ou das negociaes diretas com os poderes pblicos. Consequentemente o resultado
dessas aes se caracterizou pelo massacre de milhes de nativos, de negros e de
pequenos trabalhadores rurais e seus familiares, desencadeando manifestaes de
descontentamento e mobilizaes de indgenas de e de trabalhadores rurais em
vrias partes do Brasil (BRANDO, 2003, p. 23).
Observando estes aspectos, percebe-se que os portugueses no se apropriaram
somente dos recursos naturais, mas tambm da cultura dos povos que aqui residiam. Para
OLIVEIRA, (1997), antes dos portugueses chegarem ao Brasil, j encontrou em pleno
desenvolvimento um modelo de produo comunitria entre a populao indgena, um
modelo de produo tambm chamado de comunismo primitivo, uma forma de produo,
reproduo e relao baseada numa estrutura familiar e comunitria, que naturalmente
25
contribuiu de forma direta e indiretamente para a cultura e a origem do campons brasileiro,
que segundo Tavares dos Santos se dava da seguinte forma:
A reproduo da fora de trabalho familiar efetiva-se pela procriao e
complementao atravs do processo de socializao das crianas. Considerando o
ncleo familiar em um ncleo produtivo. Dessa forma, as crianas so encenadas
como personagens da diviso social do trabalho no interior da unidade produtiva do
campons. (OLIVEIRA, 1997, p. 60).
Basicamente, no Brasil, o campons surgiu, reproduziu e se reproduz a partir das
relaes sociocultural e socioeconmica entre senhores de engenho, trabalhadores livres,
escravos e indgenas que; atravs da agricultura de subsistncia, produzido para o consumo da
colnia e para o consumo prprio da comunidade e da famlia, estabelecia uma progressiva e
contraditria relao de resistncia-persistncia de modo a beneficiar os invasores.
Dessa forma, a poltica da diviso territorial brasileira implantou uma estrutura de
concentrao de terra e tambm de poder. Neste sentido, observamos que o problema que
afeta o campons est associado ao modelo de organizao fundiria criada exclusivamente
para expropri-lo. Segundo Oliveira (1997), no Brasil a distribuio de terras sempre foi
desigual, primeiro foram s capitnias hereditrias e seus donatrios, segundo as sesmarias e
terceiro a Lei de terras, n. 601, criada em setembro de 1850. Lei esta que foi definida 1842,
pelo o conselho3 de Estado da poca, onde entre outras normas, estabeleceu que: o direito de
possuir terra, s seria possvel por meio da compra e venda. Fato que beneficiou direto e
indiretamente os latifundirios, pois estes detinham o poder econmico e poltico. De acordo
com o exposto, observamos que oito (8) anos antes da criao da referida Lei de terras, os
governantes criaram mecanismos para proteger os latifundirios, situao que teoricamente
permaneceu at o dia 30 de novembro de 1964, quando foi aprovado o Estatuto da Terra, Lei
n 4.504.
Segundo o autor, estas leis serviram de instrumento para legalizar de fato a
expropriao do campons, ou seja, eliminar todas as possibilidades do campons continuar
no campo. Esse modelo de organizao fundiria refletiu e reflete diretamente no seio da
sociedade camponesa, criando assim um estado de insegurana, onde o campons brasileiro,
at hoje, continua tentando entrar na terra. Pois a ideologia capitalista que visa o lucro acima
de tudo, atua no campo em trs formas: primeira, modernizao da agricultura no campo;
segundo, a implantao de novas culturas e terceiro, a invaso do espao para reserva de
mercado. Atitude que causa a segregao social da classe camponesa e indgena.
3 Em julho de 1842, o Governo Imperial solicitou Seo dos Negcios do Imprio do Conselho de Estado que formulasse modificaes e critrios para obteno de terras no Brasil.
26
Um tipo de segregao que, acredita-se contribuiu para surgimento dos principais
problemas existente na Cidade e no Campo (favelas, desemprego, violncia, xodo rural e
conflitos agrrios) fatores, que se concretizou com a abolio da escravatura-Lei urea, a 13
de maio de 18884. Momento em que os escravos ficaram libertos, porm sem oferecer
nenhuma alternativa de trabalho, pois a Lei de terra, n 601 de 18505 inviabilizava as
possibilidades de ter acesso a uma gleba de terra. Para aqueles que no tinham recursos
financeiros, sejam eles indgenas, escravos ou trabalhadores livres o jeito foi engrossar a
fileira dos segregados, situao que infelizmente, at hoje permanece. Portanto, pode-se dizer
que tanto a Lei de Terras como a Lei urea, so consideradas como Leis que legalizaram a
criao dos Sem terras e dos Sem tetos em nosso Pas. A concentrao de terras vem da poca
colonial. A luta dos povos indgenas contra os invasores portugueses na poca da colonizao
est relacionada questo agrria, o que configura, portanto, em lutas camponesas. Segundo
Guimares, (2005, p.18), pode-se afirmar que a ocupao do continente americano se deu
atravs das correntes migratrias provenientes da frica e da sia, atravessando o estreito do
Alasca, tambm conhecido como estreito de Bering.
A conquista, a dominao e a apropriao da nova terra atravs das invases, das
intensas lutas e consequentemente o extermnio de muitos povos que aqui residiam, foram
extremamente violentas, aos poucos, esta forma de dominao resultou numa prtica contnua
que ao longo dos tempos vem cada vez mais se diversificando e aperfeioando.
No Brasil, o processo de conquista, de dominao e de apropriao se baseou na
colonizao e subcolonizao atravs da concesso de sesmarias6, relacionada monocultura
(cana-de-acar) e utilizao de trabalho escravo. Vale ressaltar que esta prtica que at hoje
incio do sculo XXI, vem sendo praticada pelos latifundirios brasileiros em diferentes
atividades e localidades do pas, dos quais se identifica polticos influentes no cenrio
Regional e Nacional dentre eles se destaca o Senador tocantinense Joo Ribeiro legislatura
(2003 a 2010), flagrado em operaes realizadas pelos os fiscais do Tribunal Regional do
Trabalho e pelos agentes da Polcia Federal.
Durante o processo de ocupao territorial, realizado por meio da implantao de
aes polticas com vistas garantia do domnio territorial, adotando medida de segurana
contra possveis invases empreendidas por outras naes que pretendiam, tambm, esta terra
4 Lei que Instituiu a Libertao dos Escravos, assinada pela Princesa Isabel, 13 de maio de 1888.
5 Lei que regulamentou as regras para aquisio de terra no Brasil entre 1850 at 1964.
6 Grandes extenses de terras que eram doadas ou apropriadas pelas pessoas ligadas ao poder poltico e
econmico.
27
ocupar, do que pela a implantao de um modelo de desenvolvimento coerente com a
realidade encontrada. Com receio de que isso ocorresse, os integrantes da coroa portuguesa
planejaram diversas aes estratgicas, como afirma Guimares:
Os portugueses que aqui chegaram e invadiram nosso territrio, em 1500, o fizeram
financiados pelo nascente capitalismo comercial europeu, e se apoderaram do
territrio por sua supremacia econmica e militar, impondo as leis e vontades
polticas da monarquia portuguesa. No processo da invaso, como a Histria
registra, adotaram duas tticas de dominao: cooptao e represso. E assim,
conseguiram dominar todo o territrio e submeter os povos que aqui viviam ao seu
modo de produo, s suas leis e sua cultura, (GUIMARES, 2005, p. 19).
De acordo com Guimares, (2005) estas aes perpassaram por vrios momentos que
veio desde 1500 (per) a 1988 (Constituio Federal). Um processo que apesar de lento, alguns
autores consideram importante porque legitima a luta pela terra no Brasil, conforme determina
o Artigo 2. do Estatuto da Terra, onde fala: assegurado a todos a oportunidade de acesso
propriedade da terra, condicionada pela sua funo social, na forma prevista nesta lei.
Segundo Portela e Fernandes, (1998) este avano que houve em 1964 (estatuto da terra) est
relacionado diretamente com as histricas aes de represses e massacres contra os
camponeses no Brasil. Sobre este aspecto afirmao a seguir:
Com o advento do regime militar em 1964 essas organizaes populares foram
intensamente reprimidas, e muitos lideres camponeses foram presos torturados ou
exilados. Como consequncia, a luta pela reforma declinou, embora a situao no
campo continuasse sendo alvo de intensos protestos, dessa vez internacional.
Equipes de estudiosos da ONU (Organizao das Naes Unidas) visitaram o Pas
no perodo e constataram que era necessrio melhorar a situao dos camponeses e
realizar a reformas urgentes no campo. Essa atitude pode ser bem resumida por uma
frase de John F. Kennedy, presidente dos EUA (1960-1963): Aqueles que
impossibilitam a reforma pacifica tornam a mudana violenta inevitvel. Ou seja,
suas palavras querem dizer que prefervel fazer uma mudana vinda de cima para
baixo, de forma controlada, a conservar uma situao to explosiva que originar
revolues vinda de baixo para cima populares e espontneas, que iriam contra os
interesses capitalistas. (PORTELA e FERNANDES, 1998, p. 12).
A Constituio de 1988, ainda vigente atualmente, estabelece como norma e
princpio o atendimento funo social da propriedade, conforme preconiza o:
Art. 5 - Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade
do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos
seguintes dos incisos: XXII - garantido o direito de propriedade; XXIII - a
propriedade atender a sua funo social.
A funo social da propriedade restringe-se ao direito de propriedade e
estabelece-se como um direito social e um dever individual do proprietrio. No que
diz respeito aos indgenas, a Constituio de 1988, chamada de Constituio Cidad,
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refere, em seu artigo 20 que: Que as terras tradicionalmente ocupadas pelos indgenas so
bens da Unio.
J o artigo 184 da Constituio Federal diz: Art. 184 afirma que Compete Unio
desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrria, o imvel rural que no esteja
cumprindo sua funo social, mediante prvia e justa indenizao a ttulos da dvida agrria.
Latifndios, com baixo emprego e pouca ou nenhuma produo, no cumprem sua funo
social.
O Novo Cdigo Civil Brasileiro: Lei n 10.406, que entrou em vigor no dia 11 de
janeiro de 2003, a inovao do Cdigo Civil vigente est no 1 do art. 1.228, o qual
enfatiza as finalidades econmicas e sociais do direito de propriedade:
Art. 1.228. O proprietrio tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o
direito de reav-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
1 O direito de propriedade deve ser exercido em consonncia com as suas
finalidades econmicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade
com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilbrio
ecolgico e o patrimnio histrico e artstico, bem como evitada a poluio do ar e
das guas.
Mesmo diante dessas vantagens apontadas nas leis, reforma agrria a qual tanto
almejamos tem se tornado algo difcil de ser realizada, nesse aspecto convm destacar a
afirmao de Schilling (2005).
A Constituio Brasileira, no que se refere ao direito de propriedade,
eminentemente conservadora. O 16, do art. 141, que reza: garantido o direito de
propriedade, salvo o caso de desapropriao por necessidade ou utilidade pblica, ou
por interesse social, mediante e justa indenizao em dinheiro constitui-se num
obstculo intransponvel a qualquer reforma agrria efetiva.
A soma de recursos necessrios indenizao das terras utilizveis numa reforma
agrria, procedida em ritmo adequado s necessidades de nossas populaes rurais,
considerando pagamento vista e pelo o justo valor ultrapassar em muito a
capacidade de investimento no s do governo, como de todo povo brasileiro.
(PAULO R. SCHILLING, 2005, p. 239).
Relacionado a estes aspectos, Caio Prado Junior, (1979) observa que as leis que rege
sob a reforma agrria que foi editada, por se s, para inviabiliza a reforma agrria por que essa
forma de direcionamento da questo agrria para o mercado - compra e venda de terra, coloca
o prprio estado numa situao delicada, pois no dispe de recursos financeiros para
implementar uma poltica dessa dimenso. Neste sentido o autor tem razo, ou seja, essa lei j
foi pensada para no d certo.
A nica coisa que existe na matria a obrigao, prevista no mesmo dispositivo
constitucional citado, o da justa e previa indenizao em dinheiro. Essa
indenizao prvia praticamente irrealizvel no caso da reforma agrria. No
29
somente haveria recursos financeiros lquidos suficientes para a massa de
desapropriaes exigidas pela reforma, como tambm ainda que existissem, o
impacto produzido pelo brusco e avultado afluxo de poder aquisitivo para as mos
de uma categoria social relativamente insignificante que seriam os proprietrios
desapropriados, provocaria desequilbrios e desajustadamente financeiros
insuportveis para a economia nacional. (JUNIOR, 1979, p.115).
O autor entende que se condicionar a poltica de reforma agrria a essa lei, como
est, se torna realmente difcil. Portanto, diante do exposto, tudo indica que o caminho para
realizarmos a reforma agrria seria o da revoluo, porque luz das leis vigente as coisas se
tornam mais difceis. Essas leis so contraditria e extremamente conservadoras de modo a
beneficiar a classe latifundiria capitalista. Neste caso o mais coerente deveria instituir
mudanas nas leis e assim avanar no processo de reforma agrria. Como afirma Baran apud
Schilling (2005, p. 254). Onde formas tradicionais de pensamento e trabalho impedem a
introduo de novos mtodos, meios de produo, apenas uma reorganizao geral da
sociedade e uma mobilizao total de todas as suas potencialidades criadoras, podem tirar a
economia do ponto morto em que se encontra.
1.2 - Luta de classe no campo, uma abordagem necessria
A concepo ideolgica expressada de forma subjetiva e objetiva no seio da
sociedade materializa-se em aes de interesses diversos gerando assim inmeras
contradies, das quais se destacam a ocupao territorial, a implantao de sistema poltico,
econmico e social em escala nacional, continental e mundial conforme a forma de
explorao utilizada. A economia, a poltica e a comunicao so elementos que o sistema
poltico, econmico (capitalismo) impe contra as classes trabalhadoras, as que so realmente
produtora de bens e servios indispensveis sociedade e a economia. Neste sentido os
latifundirios capitalistas e os capitalistas que atuam em diversos ramos de produo seja na
cidade ou no campo vm se apropriando das terras e dos recursos naturais com vistas
expanso e a atuao, constituindo-se, cada vez mais, num sistema que tem obrigado a
sociedade viver e conviver com frequentes momentos e perodos (cclicos) de crises de ordem
poltica-administrativa e crises de ordem poltico-econmica, fenmenos que ocasiona
conflitos e guerras em diversas partes no mundo.
As contradies existentes num sistema poltico, econmico e social num dado
momento, perodo e localidade pode ser entendida como elementos, indicadores de que a
situao precisa ser modificada ou transformada. Entretanto, para o sistema capitalista, as
30
contradies e suas consequncias so tidas como oxignio que alimenta a capacidade de sua
recuperao e reproduo. Por isso, o capitalismo utiliza diversas formas atuao: apropriao
privada dos meios de produo, explorao desordenada dos recursos naturais, incentivo a
urbanizao, mecanizao da produo-industrializao, consumo intenso, xodo rural,
apropriao e explorao do trabalho.
Esse conjunto de aes serviram para consolidar o capitalismo e ao mesmo tempo
contribuir para alimentar o ciclo continuo que garanti a capacidade de sua existncia e que se
manteve e mantem s custas da explorao das classes sociais subalterna (povos e sociedades
menos favorecidas) sobretudo as recm libertadas do colonialismo e da escravido. As
classes sociais subalternas pelo processo de explorao se manifestam exigindo/propondo
mudanas estruturais na forma como atua o sistema poltico, econmico e social bem como a
organizao social da sociedade o qual afirma (TOMPSON, 2012) que:
A classe acontece quando alguns homens, como resultado de experincias comuns
(herdadas ou partilhadas), sentem e articulam a identidade de seus interesses entre si,
e contra outros homens cujos interesses diferem (geralmente se opem) dos seus. A
experincia de classe determinada, em grande medida, pelas relaes de produo
em que os homens nasceram ou entraram involuntariamente. A conscincia de
classe a forma como essas experincias so tratadas em termos culturais:
encarnadas em tradies, sistemas de valores, ideias e formas institucionais
(THOMPSON, Apud, BADAR 2012: p. 84-85).
As consequncias mais graves da explorao capitalista, reproduzida e difundido na
maioria dos pases europeus e tambm da Amrica, continuam aparecendo nos tempos atuais,
camuflado sob formas complexas e aparentemente aceitveis, uma prtica que na realidade
oculta as formas de exploraes que ameaa decompor as bases da sociedade em diversos
fatores e aspectos. Dessa forma, o indivduo consciente dos seus direitos reconhece que o
caminho a ser tomado a organizao e a luta contra a burguesia (classe social) que controla
o sistema poltico e econmico impondo diversas formas de explorao e dominao.
No plano terico, valorizar o indivduo significa valorizar todos os indivduos. J no
plano prtico a igualdade bsica do ser implica uma distribuio equitativa do ter entre os
indivduos e grupos como forma de tentar equilibrar a situao. Caso contrrio o ter de uns
significar o no-ter de outros, assim a apropriao por parte de alguns dos bens, recursos e
benefcios que seriam ou so de todos, resultar da expropriao dos outros, (MARX, apud
ALMEIDA, 1987-88).
Neste contexto observa-se que, com a chegada dos portugueses ao Brasil, em 1500,
tem incio o processo de apropriao e explorao dos recursos naturais, um processo de
apropriao que no era somente dos recursos naturais (minerais e vegetais) mas tambm da
31
terra e da cultura dos povos que aqui residiam. Para (OLIVEIRA, 1997), antes dos
portugueses chegarem ao Brasil, j encontrou em pleno desenvolvimento um modelo de
produo comunitria entre a populao indgena, um modelo de produo tambm chamado
de comunismo primitivo, uma forma de produo, reproduo e relao social baseada numa
estrutura familiar e comunitria, que naturalmente contribuiu de forma direta e indiretamente
para a cultura e para produo e reproduo social do campons brasileiro, conforme afirma:
A reproduo da fora de trabalho familiar efetiva-se pela procriao e
complementao atravs do processo de socializao das crianas. Considerando o
ncleo familiar em um ncleo produtivo. Dessa forma, as crianas so encenadas
como personagens da diviso social do trabalho no interior da unidade produtiva do
campons, (SANTOS apud, OLIVEIRA, 1997: 60).
Basicamente, no Brasil, o campons se reproduziu a partir da relao sociocultural e
socioeconmica entre senhores de engenho, trabalhadores livres, escravos e indgenas que;
atravs da agricultura de subsistncia, produzido para o consumo da colnia e para o consumo
prprio da comunidade, estabelecia uma progressiva e contraditria relao de resistncia de
modo a beneficiar os invasores exploradores.
Dessa forma, a poltica da diviso territorial brasileira imps uma estrutura de
concentrao de terra e tambm de poder. Neste sentido, observa-se que o problema que afeta
o campo est associado ao um modelo de organizao fundiria totalmente expropriativa. De
acordo com (OLIVEIRA, 1997), no Brasil a distribuio de terras sempre foi desigual,
primeiro foram s capitnias hereditrias e seus donatrios, segundo as sesmarias e terceiro a
Lei de terras, n. 601, criada em setembro de 1850. Lei definida ainda em 1842, pelo o
conselho de estado da poca, onde entre outras normas, estabelecia que: o direito de possuir
terra, s seria possvel mediante compra e venda. Fato que beneficiou direto e indiretamente
os latifundirios, pois estes detinham o poder econmico e poltico. De acordo com o exposto,
observamos que oito (8) anos antes da criao da referida Lei de terras, j havia criado
mecanismos para proteger os latifundirios, situao esta, que em tese, permaneceu at 1964,
com aprovao do Estatuto da Terra, Lei n. 4.504.
Para OLIVEIRA (1997)7, afirma que estas leis serviram de instrumento para legalizar
de fato a expropriao do campons, e ao mesmo tempo, contribuir para surgimento dos sem
terra, que se concretizou de fato, com a abolio da escravatura-Lei urea, a 13 de maio de
1888. Teoricamente os escravos ficaram libertos, porm sem alternativa que lhes
7 Ariovaldo Umbelino de Oliveira, um pesquisador que situa-se na terceira Corrente de Pensamento dos Estudos
Agrrios, da qual discorda da ideia de que no Brasil existiu feudalismo. Para ele, o campons continua se
reproduzindo dentro das relaes contraditria do capitalismo e que no vai desaparecer.
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garantissem direitos em ter acesso aos meios de produo e trabalho, pois a Lei de terra, n.
601 de 1850 inviabilizou a possibilidade de acesso a terra. Em geral, pode-se afirmar que
tanto a Lei de terras como a Lei urea, considerada como instrumentos que legalizaram a
criao dos sem terra no Brasil, ou seja, dificultou todas as possibilidades do campons ter
acesso a terra.
Para GUIMARES8, (1981 p, 35). No geral, essas medidas, no deixam de serem
estratgias do capitalismo para penetrao e estruturao de suas bases na agricultura,
portanto no campo, onde o capitalismo ao penetrar na agricultura procura logo dominar a
terra, monopolizar a terra, monocultura l, ou seja, obter o domnio absoluto dos meios de
produo na agricultura, principalmente da terra. No entanto, a ao do capitalismo convergiu
com a essncia principal do modelo de organizao fundiria existente na Europa
monoplio colonial feudal, baseado nos grandes latifndios.
O desenvolvimento desse modelo poltico, econmico e social reflete diretamente no
seio da classe camponesa, criando assim um estado de insegurana, de lutas e de conflitos,
onde o campons brasileiro, at hoje, continua tentando entrar na terra MARTINS (1981).
Pois o sistema econmico e poltico ordenado por organismos internacionais e nacionais,
determinado pelo o capitalismo que desenvolve uma prtica de acumulao dos recursos
gerados meios de produo que ao longo dos sculos at os tempos atuais continuam
provocando segregao e expropriao. Entretanto, os camponeses indignados com mazelas
produzidas pelo o modelo de agricultura capitalista desenvolvido no campo, obrigando assim,
diversas categorias de trabalhadores a se manifestam, exigindo de forma direta e
indiretamente mudanas na estrutura fundiria em determinada localidade, regio e pas. Os
sujeitos que esto em luta por mudanas so:
Posseiros em luta pela terra de trabalho. So as naes indgenas demandando a
demarcao de seus territrios. So os membros dos trabalhadores rurais sem terra
acampados. So os bias-frias em greve por melhores salrios e condies de
trabalho. a colonizao assumida pelo o governo como vlvula de escape para
acalmar tenso. Em fim a Reforma Agrria na Nova Repblica propondo paz na
terra em p de guerra (OLIVEIRA, 1986: 52).
Diante desta situao, o Estado costuma se posicionar agindo da seguinte forma: no
primeiro momento defende os latifundirios e quando v que a situao extremamente
delicada no ponto vista poltico e social sob a tica da opinio pblica de modo que no tem
como ocultar elementos que possa favorecer seus interesses. Porm, neste caso, se utiliza de
8 Alberto Passos Guimares, pesquisador que situa-se na primeira Corrente de Pensamento dos Estudos Agrrios,
corrente da qual reconhece que no Brasil existiu Feudalismo o que a exemplo do que acorreu com o Feudalismo
o Campons tambm vai desaparecer.
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mecanismo ligado ao poder judicirio para agilizar ao protelar aes que possa beneficiar os
capitalistas latifundirios. O Segundo momento ocorre quando o Estado percebe que a
correlao de foras por parte dos trabalhadores est forte. Nesta situao, ele entende que
obrigado a d uma resposta, atendendo, pelo menos em partes, as reivindicaes dos
camponeses.
1.3- Agricultura camponesa verso agricultura familiar: diferenciando os conceitos
A agricultura tem um significado histrico envolvendo a produo, a relao social e
em fim, as formas de relao com a natureza. Ao longo do tempo a atividade agrcola tem
incorporado influencias econmicas, influncias polticas e influncias ideolgicas que
consequentemente motiva interesses diversos. Basicamente a forma de lidar com os processos
produtivos, com os meios de produo se constituiu como sujeito e ator do/no de um processo
o campons o sujeito prprio de uma classe que detm no s controle dos meios de
produo, mas as formas de produzir como afirma ENGELS (1894).
Por pequeno campons entendemos aqui o proprietrio ou rendeiro nomeadamente,
o primeiro de um bocadinho de terra, no maior do que aquele que, em regra, ele
pode cultivar com a sua prpria famlia, e no mais pequeno do que aquele que
sustenta a famlia. Este pequeno campons, tal como o pequeno arteso, tambm
um operrio que se diferencia do proletrio moderno por estar ainda na posse do seu
meio de trabalho; [], portanto, uma sobrevivncia de um modo de produo
passado. Diferencia-se triplamente do seu antepassado, do campons servo, adscrito
ou muito excepcionalmente tambm livre, ms obrigado a renda e a corveia.
(ENGELS, 1894).
O resgate do conceito de campons e consequentemente o conceito de agricultura
camponesa uma forma legtima de associar o sujeito sua atividade, dando-lhe uma
identidade de classe social que motiva estabelecer uma organizao poltica em defesa de seus
interesses a partir de suas bases. Neste sentido o Movimento Sem Terra com auxlio de
pensadores vem procurando reconstruir/construir no Brasil um sentido histrico e real de
identidade de classe, de luta de classe, de disputa e conflito. Na realidade o Estado brasileiro
j tinha conhecimento das lutas e resistncias dos camponeses em diversas localidades da
Europa e, temendo que o mesmo acontecesse aqui no Brasil, tratou de criar meios e formas
para dificultar e at impedir conforme afirma Jos de Sousa Martins abaixo:
O campons europeu est relacionado realidade da idade mdia, apresentando
caractersticas de um forte enraizamento territorial e resistncia contra o capitalismo.
J a formao do campesinato brasileiro guarda as suas especificidades. Aqui, o
campesinato criado no seio de uma sociedade situada na periferia do capitalismo e
margem do latifndio escravista. At ento, o campons recebia denominaes
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locais prprias conforme a sua histria e sua regio de origem como: caipira em So
Paulo, Minas Gerais e Gois; caiarano litoral paulista; colono ou caboclo no sul -
dependendo de sua origem, se imigrante ou no (MARTINS, 1981).
Essas denominaes acima apresentadas nos mostram que, esta uma ao que,
historicamente o Brasil fez e faz o possvel para modificar, camuflar e esconder, seja de forma
oficial ou popular-conservadora. Em relao ao aspecto oficial, se materializa quando
denomina e conceitua, agricultores familiares. Uma atitude e posicionamento adotado por
parte do Estado brasileiro como uma ao cujo objetivo dificultar a articulao e
organizao dos camponeses, ou seja, so formas e mecanismos que se criou e se cria para
no resolver problemas do/no campo relacionados aos camponeses.
O uso corrente da expresso agricultura camponesa por amplas parcelas das prprias
famlias camponesas no processo de construo da sua identidade social, pelos
movimentos e organizaes populares no campo, por organismos governamentais,
pela intelectualidade acadmica e por parcela dos meios de comunicao de massa
tem sido crescente nas ltimas dcadas. Isso decorre, por um lado, da aceitao da
concepo, no Brasil contemporneo, de que a agricultura camponesa expresso de
um modo de se fazer agricultura distinto do modo de produo capitalista
dominante, e, nesse sentido, o campesinato se apresenta na formao social
brasileira com uma especificidade, uma lgica que lhe prpria na maneira de
produzir e de viver, uma lgica distinta e contrria dominante. (CARVALHO;
COSTA, p. 30-31, 2012).
Podemos observar que partes dos problemas relacionados aos camponeses provem
de anlises abordadas por autores como, como Engels (1981) e Kautsky (1986), em suas
teorias, de acordo com a realidade vivenciada na poca sobre o avano da agricultura
capitalista que apontaram de forma teoricamente fundamentada desapropriao do
campesinato pela agricultura capitalista provocado pelos vnculos de mercado, pelas as
grandes empresas e pela as instituies nacionais que desestruturavam as bases sociais da
existncia camponesa, (ABRAMOVAY, 2007, p. 139).
Para ABRAMOVAY (2007), parte da existncia dos camponeses s poder resistir
metamorfoseando-se de agricultura camponesa para agricultura familiar um termo que surgiu
por convenincia ideolgica para se contrapor e fragmentar, por meio de aes poltica e
sociais do Estado brasileiro, seja no aspecto do modo de vida, seja no aspecto da luta de
classe, os camponeses. Uma classe social que, baseado em seu aspecto histrico e conceitual,
est assentado num conjunto amplo de relaes polticas, econmicas e sociais que envolvem
todas as atividades existentes no campo brasileiro, sobretudo as relaes no capitalistas de
produo que abarca alm da agricultura tambm a cultura conforme afirma (NEVES, 2012).
Nessa perspectiva, o termo deve ser entendido pelos critrios que distinguem o
produtor por seus respectivos direitos, nas condies asseguradas pela legislao
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especfica (decreto n 1.946, de 28 de junho de 1996, lei n 11.326, de 24 de julho de
2006, especialmente artigo 3, e demais instrumentos que vo adequando os
desdobramentos alcanados e incorporados): agricultor familiar o que pratica
atividades no meio rural, mas se torna sujeito de direitos se detiver, a qualquer ttulo,
rea inferior a quatro mdulos fiscais; deve apoiar-se predominantemente em mo
de obra da prpria famlia e na gesto imediata das atividades econmicas do
estabelecimento, atividades essas que devem assegurar o maior volume de
rendimentos do grupo domstico. (NEVES, 2012, p.37).
Na realidade, essa concepo foi gestada pelo sistema capitalista que, como afirma
Octvio IANNI (1974), a Amrica Latina sempre houve um compromisso entre o Estado
brasileiro e o sistema econmico, principalmente no setor agrcola, onde essa relao se
constituiu e continua cada vez mais se reproduzindo. Isso se tornou mais evidente com a
criao de rgos governamentais e de incentivos para facilitar a alocao de recursos
pblicos como mencionado acima.
Para (NEVES p. 39, 2012), o conceito de agricultura familiar, em termos gerais ou
abstratos obteve reconhecimento acadmico, poltico e jurdico, consensualmente definido
como: modelo de organizao da produo agropecuria onde predominam a interao entre
gesto e trabalho, a direo do processo produtivo pelos proprietrios e o trabalho familiar,
podendo ser complementado tambm pelo trabalho assalariado. Neste sentido, academia
acaba contribuindo para construo e afirmao ideolgica de polticas econmicas e sociais
que consequentemente favorece a explorao e expropriao dos camponeses pela agricultura
capitalista, que facilmente consegue-se estruturar e desenvolve-se em larga escala.
Neste contexto, o que se quer aqui no so as relaes sociais imediatas entre estes
dois sujeitos de campos sociais distintos. Mas, busca-se a possibilidade de construir
reflexes tericas e metodolgicas sobre uma experincia social da classe
trabalhadora (THOMPSON, 1981), a partir do encontro e suas mediaes entre
movimento social popular e instituio universitria de ensino, pesquisa, e at
extenso a perna atrofiada deste trip, que supostamente seria o elo de ligao da
universidade com as questes das classes sociais subalternizadas (THOMPSON,
Apud, BADAR 2012).
Em termos prticos a compreenso do conceito Agricultura Familiar foi um meio
que o Estado brasileiro encontrou para dividir/fragmentar/separar poltico e
institucionalmente, por meio de Lei, as diversas formas de articulao e organizao dos
modos de produo, da classe e das categorias de trabalhadores existentes no campo, todas
conhecida historicamente como camponeses, a qual forma tambm a classe-camponesa
conforme descreve:
A conquista de tais definies e respectivos direitos importante para a diminuio
de certo insulamento poltico e cultural. E para o enfrentamento da atribuda e
imposta precariedade material dos camponeses, dos pequenos produtores, dos
arrendatrios, dos parceiros, dos colonos, dos meeiros, dos assentados rurais, dos
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trabalhadores sem-terra designaes mais aproximativas da diversidade de
situaes socioeconmicas assim abarcadas. (NEVES p.37, 2012).
Para Martins (1987) as mltiplas denominaes atribudas aos camponeses
relacionadas s atividades e o modo de vida desenvolvido pelos sujeitos que vivem no campo
brasileiro, sempre foi uma ao que ocorreu com frequncia por parte do Estado brasileiro que
de forma direta e indiretamente contribuiu para criar, propagar e popularizar termos
considerado pejorativo e entendido tambm como preconceito. Termos que na realidade
serviram para dificultar a compreenso do sujeito campons sob a sua identidade de classe
social, o que consequentemente pode causar diviso interna entre os camponeses, fato que
inviabiliza a capacidade de articulao e organizao dos mesmos quanto aos seus direitos.
Portanto, os latifundirios e o Estado, entendendo que o termo campons refere-se
a uma conceito-classe social, que carrega consigo um histrico de luta e resistncia bastante
conhecida na Europa entre os sculos XVI e XIX, resolveram adotar a ttica de criar e apoiar
denominaes que desvirtuassem o verdadeiro sentido e a importncia desse termo. Pois
temiam que os camponeses brasileiros tivessem conscincia de classe social prximo ou
semelhante s dos camponeses europeus.
Neste sentido, o Estado em pleno governo neoliberalismo (1990 a 1996), pressionado
pelo a agricultura capitalista que pretendia expandir cada vez mais o processo de explorao,
apropriao e expropriao dos camponeses de suas terras, cumpriu seu papel, criando a lei n
11.326/2006, lei que conceitua agricultura familiar cujo objetivo integrar os modos e os
meios de produo dos camponeses agricultura capitalista e ao mesmo tempo enfraquecer e
desestruturar as lutas sociais no campo. Isso quer dizer que, sendo agricultura familiar,
envolve-se num conjunto de relaes entre o Estado, agricultura capitalista e o capital, de tal
maneira que dificulta formas de ao e relaes comunitrias de modo que inviabiliza a
capacidade de lutas sociais por interesses comuns, h tambm um forte incentivo na
competio com nfase para os interesses individuais.
Entretanto, h um conjunto de autores que no concordam com a leitura que defende
o desaparecimento ou metamorfose do campons, dentre eles destaco CHAIANOV (1981),
MARTINS (1981), OLIVEIRA (1986), NEVES (2012) e CARVALHO (2005). Em sua
identificao, CARVALHO (2005) afirma que no campesinato brasileiro se apresenta trs
tipos de paradigmas que tratam do futuro da propriedade camponesa: o paradigma do fim do
campesinato, o paradigma do fim do fim do campesinato e o paradigma da metamorfose do
campesinato.
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O paradigma do fim do campesinato classifica o campesinato como resqucio em
vias de extino, j foi tratado neste ensaio quando se falou da questo agrria na Europa.
Segundo Carvalho (2005) este paradigma possui duas leituras, uma se baseia na diferenciao
gerada pela renda capitalizada da terra que destri o campesinato, transformando pequena
parte em capitalistas e grande parte em assalariados. E a outra leitura acredita simplesmente
na inviabilidade da agricultura camponesa perante a supremacia da agricultura capitalista.
O paradigma do fim do fim do campesinato apontado por Carvalho (2005) entende
que a destruio deste pela sua diferenciao no determina o seu fim. Concorda que o capital
ao se apropriar da riqueza produzida pelo trabalho da agricultura familiar camponesa, por
meio da renda capitalizada pela explorao da terra que gera diferenciao nas relaes
sociais do campesinato como afirma.
Igualmente, fato que ao capital interessa a continuao desse processo para
o seu prprio desenvolvimento. Em diferentes condies, a apropriao da
renda capitalizada da terra mais interessante ao capital do que o
assalariamento. Por essa razo, os proprietrios de terra e capitalistas
oferecem suas terras em arrendamento aos camponeses ou oferecem
condies para a produo nas propriedades camponesas. (CARVALHO,
2005, p. 24).
O autor aponta, ainda, quais seriam as trs formas de recriao do campesinato: o
arrendamento, a compra da terra e a ocupao da terra. E assim se desenvolve num constante
processo de territorializao e de desterritorializao da agricultura camponesa, ou de
destruio e recriao do campesinato (CARVALHO, 2005, p. 24).
O paradigma da metamorfose do campesinato. Este paradigma apontado por
CARVALHO (2005) o da metamorfose do campesinato em agricultura familiar, defendido
por ABRAMOVAY (2007), LAMARCHE (1993) entre outros. Surgiu na ltima dcada do
sculo XX.
Essa lgica dualista processual, pois o campons para ser moderno precisa
se metamorfosear em agricultor familiar. [...] Esse processo de
transformao do sujeito campons em sujeito agricultor familiar sugere
tambm uma mudana ideolgica. O campons metamorfoseado em
agricultor familiar perde a sua histria de resistncia e se torna um sujeito
conformado com o processo de diferenciao que passa a ser um processo
natural do capitalismo. (CARVALHO, 2005, p. 25).
Neste sentido as diferentes concepes tericas de compreenso do desenvolvimento
do capitalismo no campo podem ser divididas em dois paradigmas: o paradigma do
capitalismo agrrio e o paradigma da questo agrria.
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O paradigma do capitalismo agrrio trata-se de um pensamento consensual, que
defende a expanso do capitalismo de maneira nica e homognea, uma ideia articulada por
um grupo de tericos ligados RIMISP - Centro Latinoamericano para el Desarrollo Rural
vinculado ao Banco Mundial (2005), entende que o futuro do campesinato est na