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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
Polyana Aparecida Valente
MULHERES CATÓLICAS EM AÇÃO: CARIDADE, SAÚDE E
DIVULGAÇÃO DE CIÊNCIAS EM BELO HORIZONTE (1897-1936)
Belo Horizonte
2016
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Polyana Aparecida Valente
MULHERES CATÓLICAS EM AÇÃO: CARIDADE, SAÚDE E
DIVULGAÇÃO DE CIÊNCIAS EM BELO HORIZONTE (1897-1936)
Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais como requisito para obtenção do título de Doutor em História.
Linha de Pesquisa: Ciência e Cultura na História.
Orientador: Profº. Drº. Bernardo Jefferson de Oliveira
Belo Horizonte
2016
0
112.109
V154m
2016
Valente, Polyana Aparecida
Mulheres Católicas em ação
[manuscrito] : filantropia, saúde e divulgação de
ciências em Belo Horizonte (1897-1936) /
Polyana Aparecida Valente. - 2016.
206 f. : il.
Orientador: Bernardo Jefferson de
Oliveira.
Tese (doutorado) - Universidade
Federal de Minas Gerais, Faculdade de Filosofia
e Ciências Humanas.
Inclui bibliografia
1.História – Teses. 2. Associações
religiosas - Teses. 3.Assistência social - Teses. 4.
Saúde - Teses. 5.Ciência – História - Teses. I.
Oliveira, Bernardo Jefferson de. II. Universidade
Federal de Minas Gerais. Faculdade de Filosofia
e Ciências Humanas. III. Título.
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Universidade Federal de Minas Gerais Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em História
Tese intitulada Mulheres Católicas em ação: caridade, educação, saúde e a divulgação de ciências em Belo Horizonte (1897-1936) de autoria de Polyana Aparecida Valente, aprovada pela banca examinadora constituída dos seguintes professores: __________________________________________________________________________ Prof. Dr. Bernardo Jefferson de Oliveira (UFMG) – Orientador
__________________________________________________________________________ Prof. Dr. Luiz Otávio Ferreira (COC - Fiocruz)
__________________________________________________________________________ Prof. Dra. Carla Simone Chamon (CEFET/MG)
__________________________________________________________________________ Prof. Dra. Rita de Cássia Marques (UFMG) __________________________________________________________________________ Prof. Dra. Anny Jackeline Torres Silveira (UFMG)
Suplentes: __________________________________________________________________________ Prof. Dr. Bráulio Silva Chaves (CEFET/MG) __________________________________________________________________________ Prof. Dra. Betânia Gonçalves Figueiredo (UFMG) __________________________________________________________________________
Prof. *** Nome do Coordenador(a) *** Coordenador(a) do Programa de Pós-Graduação em História – UFMG
Data de aprovação: Belo Horizonte, ____ de ____________ de 2016
Av. Antônio Carlos, 6627 - Belo Horizonte, MG - 31270-901 - Brasil - Tel.: (31) 3409-5112 - Fax: (31) 3409-5490
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À minha “Sol”, aos meus irmãos e sobrinhos,
com amor.
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AGRADECIMENTOS
Escrevi a tese em muitos e seguidos mergulhos na pesquisa e no texto. Foram
quatro anos e meio de muita dedicação e trabalho. A vida não dá tréguas e tive que
combinar todas as adversidades do caminho com o desenvolvimento da pesquisa.
Assim como na canção portuguesa, chego ao final do trabalho com a dor de
Frida Kahlo, a alegria de Greta Garbo e a graça de Madre Teresa. Quero agora “abraçar e
agradecer” toda a coletividade que contribuiu para sua concretização. “O que eu sou, sou
em par, não cheguei sozinha”.
Em primeiro lugar, agradeço minha avó materna, a incrível Dona Zélia, mulher
católica que abriu mão de sua própria vida para se dedicar à casa e à família. Sua escolha
de vida implicou em incentivar suas filhas e netas a serem mulheres independentes, fortes e
acima de tudo, livres. Sem a presença dela nada disso seria possível.
Agradeço ao meu pai pelo seu jeito doce. Por caminhar sempre de mãos dadas
comigo e com os meus sonhos.
À minha mãe, a mulher mais forte que conheço.
Aos meus maninhos Igor e Hugo, sou eternamente grata por me fazerem
compreender o sentido da palavra amor.
Aos meus sobrinhos, por me mostrarem a leveza da vida. Jamille, sorrisinho bom
da tia Poly. João Pedro, meu super herói preferido, meu Miguilim!
Aos meus familiares, tias, tios, primos e primas, agradeço pelo apoio. Em
especial, agradeço a Aline Valente, prima linda com quem, mesmo a longa distância, dividi
angústias e esperanças.
Agradeço aos muitos amigos, que por vezes reclamaram da minha ausência,
mas sempre me incentivaram e me encheram de carinho. Agradeço especialmente “aos
velhos amigos” da Turma do Sesi de 1998, Susu, Ju, Pablito, Mari e ao querido João, que
no final dessa travessia me estendeu a mão, me confortando as dores.
A Wellesandra Benfica, agradeço pelas experiências acadêmicas compartilhadas
e os mimos cotidianos manifestados em mensagens, olhares e abraços apertados.
A Romilda amiga de profissão, agradeço todo apoio e incentivo ao meu trabalho
e pelo caminhar apesar das distâncias geográficas.
Agradeço à amiga de última hora, Roberta Ferreira, sempre disposta a mostrar a
natureza, a arte e a música como elementos de cura e fontes de energia para a produção.
Fez-me ver a luz no fim do túnel.
A Danielle Coutinho, minha amiga, dona do sorriso mais lindo que já vi, agradeço
a primeira leitura do trabalho.
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Ao Gui, meu amigo queridão, sou grata pelo auxílio no tratamento das línguas
estrangeiras.
Às queridas amigas Bete e Dy, fontes inesgotáveis de bem querer.
Carinhosamente, agradeço a D. Madalena, que me recebeu em sua casa de
braços abertos, com generosidade e atenção. Nossas conversas valeram não apenas para
a construção da tese, mas por lições que levarei para a vida.
Agradeço ao meu querido orientador Bernardo Jefferson de Oliveira, que sempre
acreditou e confiou no meu trabalho.
Agradeço aos professores Rita de Cássia Marques e Luiz Otávio Ferreira, pelas
valiosas contribuições no exame de qualificação. As indicações de leituras e formas de
pensar o problema apontaram caminhos seguros a seguir.
Aos queridos professores do Programa de Pós-Graduação, em especial as
professoras Regina Horta Duarte, Ana Carolina Vimieiro, Anny Jackeline Torres Silveira e
Betânia Figueiredo.
Aos funcionários dos vários arquivos por onde passei e que de alguma maneira
contribuíram para a pesquisa: a Maria Júlia, do Centro de Memória da Escola de
Enfermagem da UFMG, sempre tão eficiente e solicita. A Marília, do Instituto de Educação,
responsável pelo arquivo da Escola Normal Modelo, que efetivamente viabilizou a pesquisa
no acervo. Sem a intervenção dela o acesso às fontes não seria possível. Aos funcionários
da Hemeroteca Histórica de Minas Gerais, sempre muito disponíveis. A Pollyana Teixeira e
Thiago Lemos, funcionários da Hemeroteca da PUC Minas, agradeço por dividirem o espaço
de trabalho comigo na consulta dos microfilmes dos periódicos católicos. Sou grata à
Rosangela, funcionária do Centro de Memória da Arquidiocese de Belo Horizonte, sempre
preocupada pelas longas horas de pesquisa no arquivo. À Carla e Miriam, do Memorial
Helena Antipoff, pela busca incansável das fontes de pesquisa e oferecimento de uma sala
tranquila de trabalho. Ao querido Mário, responsável pela biblioteca da Magistra da
Secretaria de Educação de Minas Gerais, que me ajudou a encontrar pistas da Maria Luiza
de Almeida Cunha e pelo ouvido atento sobre as ideias presentes na pesquisa. Às irmãs da
Creche Menino Jesus, agradeço pelo atendimento e por permitirem o acesso à
documentação histórica da instituição.
Agradeço aos colegas da turma do doutorado, especialmente a Deise
Rodrigues, com quem tive oportunidade de dividir trabalhos acadêmicos, a realização de
mini curso e a elaboração de um dossiê sobre História das Ciências.
Ao Bráulio Chaves, pela troca de ideias, apoio e carinho.
Aos colegas com quem compartilhei a edição da Revista Temporalidades, Rute
Torres, Bruno Vinicius de Morais, Mateus Rezende, Kellen Silva, Lucas e Virgílio Oliveira Jr.,
agradeço pela experiência enriquecedora.
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Agradeço à Capes pelo financiamento que viabilizou a realização da pesquisa.
Finalmente, agradeço à existência, que anuncia a primavera na minha vida!
Minha flor solar, girasSol, obrigada por irradiar alegria e luz pela nossa travessia. Te amo
pétala por pétala!
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RESUMO
O objetivo central deste trabalho foi analisar a atuação das mulheres leigas no associativismo católico, sobretudo na assistência à saúde e à educação na cidade de Belo Horizonte, entre os anos 1897 e 1936. O corte cronológico justifica-se pelo fato da construção de Belo Horizonte ser um marco no processo de modernização e urbanização de Minas Gerais. Nesse período houve a ampla organização de agremiações assistenciais, das quais destacamos as associações femininas católicas. Acreditamos que o associativismo feminino católico não era marcado apenas pela caridade cristã, mas por uma filantropia científica guiada por valores morais e científicos. Procuramos mostrar também que as agremiações possibilitaram às mulheres o acesso ao mundo público, bem como a formação de uma agenda ligada aos interesses femininos do período. Não foi nosso objetivo fazer um estudo de gênero, mas uma produção ligada à História das Mulheres, no sentindo de compreender as leigas católicas como atores sociais, que no caso em questão, elegeram a filantropia para atuar fora do espaço doméstico. Concluímos que o associativismo feminino católico em Belo Horizonte é fruto da combinação do reformismo católico, iniciado em meados do século XIX, com o projeto político-social das elites mineiras. Esse projeto social visava a proteção e o controle da infância e da família, primando pela formação de uma sociedade moderna, moralmente boa e saudável. Palavras-chave: Belo Horizonte. Associações Femininas Católicas. Filantropia. Educação. Saúde.
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ABSTRACT
The main objective of this work was to analyse the agency of lay women in catholic associations, mainly on health and education aid in Belo Horizonte city, between 1897 and 1936. This period was chosen because the establishment of Belo Horizonte represents the modernisation and urbanisation process in the state of Minas Gerais. There was a wide number of assistance groups during this period, from which we highlight the catholic women groups. We believe that catholic female associations were characterized not only by Christian charity, but also by a scientific philanthropy guided by moral and scientific values. Also, we sought to show that those groups granted women access to the public sphere, as well as the creation of an agenda linked to female interests at that time. It was not our objective to carry out a gender analysis. We aimed at producing a work linked to the history of women, in the sense of understanding catholic lay women as social actors that have chosen philanthropy to act beyond the domestic space. We conclude that catholic female associations in Belo Horizonte results from the combination between the mid-19th century catholic reformism and a socio-political project of the elites of Minas Gerais. This socio-political project aimed at protecting and controlling childhood and families, shaping a modern society which was morally good and healthy. Keywords: Belo Horizonte. Women in Catholic Associations. Philanthropy. Education. Health.
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 Figura 2
Mapa da cidade de Belo Horizonte Maria Luiza, Isabel Lacombe e Roberto de Almeida Cunha
66 130
Figura 3 Maria Luiza, marido e seus filhos 132
Figura 4 Maria Luiza, marido e seus filhos 133
Figura 5 A casa da família Almeida Cunha 134
Figura 6 Artigo sobre Ensino Religioso nas Escolas 139
Figura 7 Ficha Individual do aluno proposta por Maria Luiza de Almeida Cunha 142
Figura 8 Professoras participantes do I Congresso Educação Primária e o presidente do Estado, Antônio Carlos de Andrada
144
Figura 9 Meninas Órfãs Asiladas no Bom Pastor 159
Figura 10 Projeto da Fachada do Asilo Bom Pastor 168
Figura 11 Creche Menino Jesus 181
11
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 Cor de Cabelos 113
Gráfico 2 Qualidade dos Cabelos 114
Gráfico 3 Cor de Olhos 114
Gráfico 4 Cor da Pele 115
12
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Obras realizadas pela Comissão Obras Sociais e Operárias 79
Tabela 2 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1927 86
Tabela 3 Lista de donativos da Cruzada Santa Terezinha do Menino Jesus 89
Tabela 4 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1928 – Damas da Caridade Santa Efigênia
94
Tabela 5 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1928 – Damas da Caridade São José
94
Tabela 6 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1928 – Damas da Caridade Boa Viagem
94
Tabela 7 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1929 – Damas da Caridade Santa Efigênia
95
Tabela 8 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1929 – Damas da Caridade Lourdes
95
Tabela 9 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1930 – Damas da Caridade Boa Viagem
96
Tabela 10 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1930 – Damas da Caridade Santa Efigênia
96
Tabela 11 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1930 – Damas da Caridade Barro Preto
96
Tabela 12 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1931 – Damas da Caridade São José
97
Tabela 13 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1931 – Damas da Caridade Santa Efigênia
97
Tabela 14 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1931 – Damas da Caridade Boa Viagem
98
Tabela 15 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1931 – Damas da Caridade Floresta
98
Tabela 16 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1931 – Damas da Caridade São Sebastião
98
Tabela 17 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1931 – Damas da Caridade Lourdes
98
Tabela 18 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1931 – Damas da Caridade Santo Antônio
99
Tabela 19 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1932 – Damas da Caridade Santa Efigênia
99
Tabela 20 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1932 – Damas da Caridade São José
100
Tabela 21 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1932 – Damas da Caridade Floresta
100
Tabela 22 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1932 – Damas da Caridade São Sebastião
100
Tabela 23 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1932 – Damas da Caridade Lourdes
101
Tabela 24 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1932 – Damas da Caridade Carlos Prates
101
Tabela 25 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1932 – Damas da Caridade Boa Viagem
101
Tabela 26 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1933 102
13
– Damas da Caridade Lourdes
Tabela 27 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1933 – Damas da Caridade Boa Viagem
102
Tabela 28 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1933 – Damas da Caridade Carlos Prates
103
Tabela 29 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1933 – Damas da Caridade Santa Tereza e Santa Terezinha
103
Tabela 30 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1933 – Damas da Caridade São José
103
Tabela 31 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1933 – Damas da Caridade Floresta
103
Tabela 32 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1934 – Damas da Caridade São José
104
Tabela 33 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1934 – Damas da Caridade Boa Viagem
104
Tabela 34 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1934 – Damas da Caridade Santa Tereza
104
Tabela 35 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1934 – Damas da Caridade Santa Efigênia
104
Tabela 36 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1934 – Damas da Caridade Carlos Prates
104
Tabela 37 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1934 – Damas da Caridade Lourdes
105
Tabela 38 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1934 – Damas da Caridade Calafate
105
Tabela 39 Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no Ano de 1934 – Damas da Caridade Floresta
105
Tabela 40 Levantamento de verbas diversas realizadas pela Comissão Assistência e Caridade
106
Tabela 41 Subvenção Municipal 107
Tabela 42 Subvenções e Doações Recebidas 109
Tabela 43 Movimentação de Verbas Damas da Caridade 109
Tabela 44 Lista de artigos produzidos por Maria Luiza de Almeida Cunha 135
Tabela 45 Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo prefeito Flávio Fernandes dos Santos set./1923 (Ano 1922-1923)
160
Tabela 46 Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo prefeito Flávio Fernandes dos Santos set./1925 (Ano 1924-1925)
160
Tabela 47 Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo prefeito Cristiano Monteiro Machado. Outubro/1926 (Ano 1925-1926)
160
Tabela 48 Relatório do 1º Ano da Administração Municipal no quatriênio iniciado em 1926
161
Tabela 49 Mensagem apresentada ao Conselho deliberativo pelo prefeito Cristiano Monteiro Machado Outubro/1928
161
Tabela 50 Repasses Prefeitura (1940/1941) 161
Tabela 51 Doações destinadas ao Asilo Bom Pastor 163
Tabela 52 Donativos comércio em fazendas e gêneros para o Bom Pastor 164
Tabela 53 Benfeitores da Creche Menino Jesus 177
Tabela 54 Doações de materiais de construção e acabamento Creche Menino Jesus
178
Tabela 55 Doações de mobília Creche Menino Jesus 178
14
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ABE – Associação Brasileira de Educação
CC – Confederação Católica
CCF – Confederação Católica Feminina
FM – Filhas de Maria
GAS – Grupo de Ação Social
JC – Juventude Católica
JEC – Juventude Estudantil Católica
JOC – Juventude Operária Católica
JUC – Juventude Universitária Católica
MTIC – Ministério do Trabalho Indústria e Comércio
MESP – Ministério da Educação e da Saúde
OMEP – Organização Mundial para Educação Pré-Escolar
SMAI – Sociedade Mineira de Assistência à Infância
SSVP – Sociedade São Vicente de Paulo
UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais
UMC – União dos Moços Católicos
UP – União Popular
15
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 18
1 ASSOCIATIVISMO FEMININO CATÓLICO EM BELO HORIZONTE 23
1.1 Associativismo Feminino 24
1.2 Estudo sobre o Associativismo Feminino no Brasil 28
1.3 Associativismo em Belo Horizonte 31
1.3.1 Associativismo Católico em Belo Horizonte 35
1.4 As associações católicas femininas em Belo Horizonte 39
1.4.1 Filhas de Maria 39
1.4.2 Mães Cristãs 51
1.4.3 Damas da Caridade 60
2 CONFEDERAÇÃO CATÓLICA DE BELO HORIZONTE E O ASSISTENCIALISMO 62
2.1 A Confederação Católica: sessão feminina 64
2.2 Comissões de Trabalho da Confederação Católica Feminina 71
2.2.1 Comissão Escolas 74
2.2.2 Comissão Obras Sociais e Operárias 78
2.2.3 Comissão Assistência e Caridade 80
2.3 A comissão Assistência e Caridade, as Damas da Caridade e a Parceria com a
Sociedade São Vicente de Paulo
83
2.3.1 As atividades realizadas na 1ª fase da Comissão Assistência e Caridade 86
2.3.2 O fortalecimento da parceria entre a Comissão Assistência e Caridade e
a Sociedade São Vicente de Paulo
96
2.4 A arrecadação da Comissão Assistência e Caridade: parcerias entre o poder
público e a sociedade
105
3 PERFIL DAS MULHERES ATUANTES NO ASSOCIATIVISMO CATÓLICO EM
BELO HORIZONTE
111
3.1 Formação Escolar 120
3.1.1 Colégio Santa Maria 122
3.1.2 Escola Normal Modelo 124
3.1.3 Escola de Enfermagem Carlos Chagas (EECC) 126
3.2 Maria Luiza de Almeida Cunha: o paradoxo entre o conservadorismo católico e 126
16
suas práticas de vanguarda
3.2.1 A vida antes de Belo Horizonte 128
3.2.2 Maria Luiza e a vida em Belo Horizonte 131
3.2.3 Maria Luiza e sua vida profissional em Belo Horizonte 135
3.2.4 A militância católica de Maria Luiza de Almeida Cunha 146
4 O TRABALHO DAS ASSOCIADAS CATÓLICAS A FAVOR DA INFÂNCIA
DESVALIDA E DAS “MULHERES PERDIDAS”
149
4.1 O Asilo Bom Pastor 150
4.1.1 O Bom Pastor em Belo Horizonte e as negociações para a doação do
espaço do asilo
152
4.1.2 A inauguração do Bom Pastor 156
4.1.3 A participação das mulheres leigas na rotina e na manutenção do asilo
Bom Pastor
159
4.2 A Creche Menino Jesus 173
CONSIDERAÇÕES FINAIS 183
REFERÊNCIAS 186
ANEXO 1 – Perfil da Mulheres Associadas 200
17
18
INTRODUÇÃO
Na ocasião da seleção para o doutorado, o objetivo do projeto de pesquisa era
compreender as relações estabelecidas entre a religião católica e o discurso científico no
processo de divulgação e popularização das ciências, na cidade de Belo Horizonte, durante
as primeiras décadas do século XX, a partir da análise do periódico católico O Horizonte. O
jornal era órgão do Conselho de Imprensa da Diocese de Belo Horizonte e circulou na
capital mineira entre os anos 1923 e 1934.
Ao iniciar o trabalho de investigação no jornal, despertava atenção o grande
número de artigos e anúncios voltados para o público feminino (maternidade, puericultura,
voto, trabalho, educação e infância), a presença de colunas femininas e a existência de
artigos assinados por mulheres. Também havia muitas informações sobre associações
femininas católicas, sobretudo das Filhas de Maria, Mães Cristãs e Damas da Caridade,
reunidas na Confederação Católica Feminina.
A partir destas constatações, conjecturamos a possibilidade do jornal O
Horizonte ser destinado ao público feminino, mesmo que só houvesse nomes de homens na
lista de assinantes e o corpo editorial fosse exclusivamente masculino. Intrigados, fomos em
busca de outras fontes que pudessem confirmar ou não a hipótese.
No Centro de Memória da Arquidiocese de Belo Horizonte encontramos as Atas
da Confederação Católica Feminina. Pela leitura das atas, identificamos que tal periódico
procurava orientar as mulheres católicas sobre o seu papel na sociedade, sobretudo os
papéis de mães e esposas. As mulheres envolvidas ao associativismo católico eram as
responsáveis pelas vendas avulsas do jornal e por angariar novos assinantes. Além disso, a
criação da coluna feminina do jornal foi sugestão de uma militante católica, membro da
Confederação Católica Feminina.
Dessa investigação tornou-se nítido que o associativismo feminino católico
estava integrado ao projeto reformador da Igreja Católica, que convocava o laicato à
participação ativa em todos os âmbitos sociais. Da construção da capital até os anos de
1930, esse projeto católico, em certa medida, foi adotado pelas elites mineiras no
enfrentamento dos problemas sociais da cidade.
A descoberta das Atas da Confederação Católica Feminina nos conduziu a
outros documentos sobre o associativismo feminino católico e suas ações sociais, que não
deixavam outra opção senão repensar o tema da pesquisa e compreender como o
associativismo feminino católico se organizou em torno da filantropia. Qual o papel das
mulheres na Ação Católica? Quais as possíveis relações entre as corporações femininas
católicas e o movimento feminista brasileiro? Quais eram suas interlocuções? Como
19
funcionava a rede de assistência? Quem eram essas mulheres? Quais suas estratégias e
objetivos? Como a filantropia se conjugava com a moral científica? Como as associações
filantrópicas se posicionavam em relação às instituições científicas? Como as mulheres
ligadas ao associativismo católico repercutiam a educação científica em suas palestras
sanitárias? De que maneira combinavam ciência e moral religiosa?
Dessa maneira, a pesquisa passou a intitular-se Mulheres Católicas em ação:
caridade, educação, saúde e a divulgação de ciências em Belo Horizonte (1897-1936). No
novo formato, o objetivo central da pesquisa foi analisar a atuação das mulheres leigas no
associativismo católico, sobretudo na assistência à saúde e à educação. Não foi nosso
objetivo fazer um estudo de gênero, mas uma produção ligada à História das Mulheres, no
sentido de compreender as leigas católicas como atores sociais, que no caso em questão,
elegeram a filantropia para atuar fora do espaço doméstico.
O marco temporal recortado para análise vai de 1897, ano de inauguração da
cidade, a 1936. Embora a atuação das associações femininas católicas analisadas tenha
sido mais significativa nos anos iniciais do século XX, entendemos que a organização das
aasociações no início da construção da cidade são fundamentais para compreender o papel
do associativismo femino católico na cidade. Desse modo, o corte cronológico inicial
justifica-se pelo fato da construção de Belo Horizonte, como a nova capital mineira, ser um
marco no processo de modernização e urbanização de Minas Gerais. Em seu projeto
coexistia a ideologia do progresso, as influências europeias e as práticas e tradições
trazidas pelos novos habitantes de seus antigos lugares. A cidade era uma espécie de
“laboratório” para o processo de civilização, tendo como referência os padrões burgueses
europeus. O ideário cientificista intervia diretamente no espaço urbano, na forma como as
elites o organizavam e o faziam funcionar, gerando novas formas de comportamento,
também entre a população mais geral. Para alcançar esses objetivos, tal ideário fez crescer
pela cidade uma gama de associações que procuravam ordenar, educar, tornar saudável e
trabalhadora a população mais pobre.
Destacamos o associativismo católico, sobretudo o feminino, que em parcerias
com o poder público, com a iniciativa privada e com profissionais da saúde, desde a criação
da cidade, se mobilizaram pela assistência material e médica, a instrução escolar, a
formação técnica, bem como o lazer da população pobre, especialmente das crianças e das
mulheres. A organização desses grupos nesse formato perdurou até o ano de 1936. Em
ocasião do II Congresso Nacional Eucarístico, realizado em Belo Horizonte nesse mesmo
ano, houve uma nova configuração da atuação do associativismo feminino católico.
Acreditamos que tal mudança estava ligada às estratégias internas da Igreja Católica e com
o processo de consolidação do Estado Nacional, iniciado por Getúlio Vargas a partir de
1934, com a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e do Mistério da
20
Educação e Saúde Pública. Ambos ministérios marcam a expansão do poder do Estado e
sua responsabilidade sobre as questões sociais. Isso, em certa medida, não extinguiu a
filantropia católica, mas impôs novas demandas e formatos. Por isso, elegemos o ano de
1936 como nosso marco cronológico final.
No que diz respeito às fontes, inicialmente este trabalho se dedicou a seleção de
artigos do jornal O Horizonte, no período de 1923 a 1934, ligados ao universo feminino tais
como feminismo, maternidade, infância, assistência e higiene. O jornal O Horizonte,
periódico semanário que, ao longo de suas publicações, tornou-se bissemanário, fazia parte
da Imprensa Diocesana de Belo Horizonte criada em 1922 pelo bispo D. Cabral. Circulou
entre os anos de 1923 a 1924, quando foi substituído pelo jornal Diário. Seu corpo editorial
era composto por eclesiásticos e membros do laicato católico.
De acordo com seus idealizadores, o periódico tinha como princípios: defender a
constituição da família, defender a instrução, desenvolver o ensino profissional, cuidar da
assistência, promover a harmonia das relações entre patrões e operários, praticar o trabalho
na base do sindicalismo cristão e zelar pela boa moral.
A partir da seleção, catalogação e análise dos artigos e a clara associação do
jornal com as associações femininas católicas, partimos para pesquisa no acervo da
Arquidiocese de Belo Horizonte, onde encontramos as Atas da Confederação Feminina
Católica. Com a constatação de que a Confederação Feminina Católica era composta por
membros de variadas pastorais, procuramos uma documentação que fornecesse mais
pistas sobre quem eram as mulheres desse grupo e como atuavam.
Assim, ainda no arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte investigamos
documentos relativos à Ação Social Católica, Atas do II Congresso Eucarístico Nacional
realizado em 1936, Avisos e Mandamentos da Cúria Metropolitana de Belo Horizonte,
Movimento Pró-Creche, Pastoral da Criança, Pastoral de Saúde, Pastoral do Menor,
Pastoral Familiar, III Semana Social Brasileira, Serviços Sociais, Avisos e Mandamentos da
Cúria Metropolitana, II Congresso Eucarístico Nacional, Paróquias, Foranias e Regiões
Episcopais (álbuns, cartilhas, dossiês, folhetos, históricos, pesquisas, projetos e relatórios).
Seguindo as pistas fornecidas pelas Atas da Confederação Católica Feminina
visitamos o acervo do Centro de Memória da Escola de Enfermagem da Universidade
Federal de Minas Gerais, onde utilizamos as fichas de inscrição das aspirantes ao curso de
enfermagem e a Revista Enfermagem em Minas.
Com o intuito de verificar se atuação das mulheres católicas estava restrita aos
círculos católicos e qual a sua audiência, no acervo do Arquivo da Cidade de Belo
Horizonte, na Revista Bello Horizonte, destinada ao público feminino encontramos variadas
reportagens, artigos e fotografias que faziam referência a ação social católica feminina.
21
Na Hemeroteca Histórica de Minas Gerais, investigamos no Jornal Minas Gerais
informações sobre o Congresso Feminino ocorrido no ano de 1931 e o Congresso
Eucarístico Nacional realizado em 1936. Acessamos também a Revista do Ensino,
importante espaço para a escrita feminina em Minas Gerais.
Para pensar a relação das instituições filantrópicas com o poder público
buscamos no Arquivo Público Mineiro os documentos da Secretaria do Interior que indicam
os repasses de verbas e doações recebidas pelas instituições em que atuavam o grupo de
mulheres estudado.
Acessamos também o acervo da Escola Normal Modelo e da Escola de
Aperfeiçoamento que está sob a guarda do Instituto de Educação de Minas Gerais. Nesse
arquivo investigamos atas das reuniões do Grêmio Literário Pedagógico, Livros de Termo de
Posse, Fichas de Ponto e Correspondências.
Por fim, na Creche Menino Jesus, tivemos acesso ao livro de crianças
matriculadas e ao “Livro de Ouro” que conta a história oficial da instituição.
Para apresentar os resultados da pesquisa, a tese foi dividida em quatro
capítulos. No primeiro capítulo fazemos uma discussão teórica sobre o associativismo
feminino. Apresentamos três associações femininas católicas: As Filhas de Maria, Mães
Cristãs e Damas da Caridade. Ambas instituições eram frequentadas por mulheres da elite
mineira e agiram efetivamente no campo da filantropia. A apresentação dessas
agremiações, além de demonstrar a atuação dos grupos no campo da assistência, objetiva
sustentar nosso principal argumento, ou seja, de que o associativismo feminino católico não
era marcado apenas pela caridade cristã, mas por uma filantropia científica guiada por
valores morais e científicos. Procuramos mostrar também que as agremiações
possibilitaram o acesso ao mundo público, bem como a formação de uma agenda ligada aos
interesses femininos do período.
Com a finalidade de apresentar as atividades realizadas pelas mulheres
católicas, no segundo capítulo demonstramos a organização da Confederação Católica
Feminina. A associação agregava várias agremiações femininas católicas, com destaque
para as Filhas de Maria, Mães Cristãs e Damas da Caridade. A Confederação Católica
Feminina foi criada com o objetivo de centralizar e organizar a assistência católica em Belo
Horizonte. As atividades realizadas pela Confederação permitem conhecer o trânsito das
mulheres católicas pelas instituições filantrópicas, os trabalhos por elas desenvolvidos e as
redes de influências acionadas. Além disso, os eventos realizados por esse grupo de
mulheres produziam uma arrecadação superior às subvenções do poder público,
salientando a importância das mulheres católicas na manutenção dos projetos filantrópicos.
Nesse capítulo mostramos também a importância da Sociedade São Vicente de Paulo para
a dinâmica do associativismo feminino católico.
22
No terceiro capítulo apresentamos o perfil do laicato feminino atuante no
associativismo. Demonstramos que a ação coletiva das mulheres católicas se tornou viável
pelas experiências por elas compartilhadas. Essas experiências foram construídas no
cotidiano, nas redes de sociabilidades, na origem social, nos programas criados no interior
das associações e pela mobilidade espacial adquirida. Eram mulheres católicas, de refinada
educação e pertencentes às elites econômicas e políticas de Minas Gerais. Utilizamos a
trajetória da militante Maria Luiza de Almeida Cunha para demonstrar que a ação das
mulheres no associativismo católico foi movida pelo saber técnico e científico adquirido na
formação escolar, preferencialmente nos cursos normais e de enfermagem. Por isso, elas
atuaram basicamente na assistência à infância e às mulheres pobres.
Desse modo, no quarto e último capítulo destacamos o trabalho das associadas
católicas a favor das mulheres “perdidas” e da infância desvalida. Para isso, apresentamos
duas instituições erigidas com a participação efetiva das associadas católicas: o Asilo Bom
Pastor e a Creche Menino Jesus.
23
1 ASSOCIATIVISMO FEMININO CATÓLICO EM BELO HORIZONTE
O escopo deste capítulo é discutir sobre o associativismo feminino no Brasil,
particularmente as associações femininas católicas atuantes em Belo Horizonte entre os
anos 1920 e 1930. Foi nosso objetivo nos distanciarmos da historiografia que compreende o
associativismo feminino católico sob o prisma dos manuais, regimentos e códigos de
condutas que regulavam as associações.
Entendemos que havia uma nítida distância entre as rígidas determinações
desses manuais com a realidade vivenciada pelas mulheres. Pelos manuais das
associações católicas, as associadas eram conservadoras, piedosas e participavam da
filantropia apenas para promover a carreira de seus maridos. Desse modo, procuramos
diminuir a tutela dos homens nas agremiações e nos afastar da perspectiva que pensa o
associativismo feminino católico exclusivamente como um mecanismo de disciplinamento
social e normatização, sem levar em consideração a dinâmica das relações sociais.
Para a organização do capítulo, apresentamos uma discussão teórica sobre o
associativismo feminino. Além disso, mostramos como estava organizado o associativismo
católico em Belo Horizonte nas primeiras décadas do século XX. Enfatizamos as três
principais associações femininas de caráter ativo na cidade, que atuavam efetivamente
dentro do projeto de Ação Social da Igreja Católica nesse período. São elas: Filhas de Maria
(FM), Mães Cristãs e Damas da Caridade.
A escolha dessas agremiações justifica-se por, pelo menos, três razões. Primeiro
por terem sido criadas dentro do projeto de Ação Social Católica1, protagonizado por D.
Sebastião Leme e D. Cabral, do qual as mulheres foram peças fundamentais. Em seguida,
pelo destacado trabalho desempenhado por elas nos campos da assistência social,
marcadamente na assistência às mulheres pobres e operárias, crianças e mulheres
“desviadas”. Finalmente, por serem essas três associações a parcela mais representativa da
Confederação Católica Feminina (CCF), agremiação criada no ano de 1927, e que tinha
como meta centralizar e orientar a ação das associações leigas em Belo Horizonte. As
reuniões da CCF eram realizadas, exclusivamente, com a presença das mulheres que
ocupavam cargos de gestão nas associações que representavam. Tratava-se, portanto, de
1 O movimento reformista da Igreja Católica no Brasil, iniciado em 1891, também conhecido como Ação Social Católica, foi direcionado pela carta encíclica Rerum Novarum, redigida pelo papa Leão XIII. O movimento se organizou de forma mais efetiva a partir dos anos 1910. Em termos gerais, esse movimento representava uma reação da Igreja Católica frente às demandas postas pela modernidade, especialmente no que dizia respeito ao mundo do trabalho, ao alastramento de outras correntes religiosas e à intervenção do Estado no campo social. Além dos eclesiásticos, a Ação Social Católica contou com a participação do laicato católico e tinha como objetivo primeiro intervir na vida social, a partir dos elementos da modernidade.
24
um grupo bem específico de mulheres que compartilhavam experiências e comportamentos
sociais, pertencendo a uma parte seleta da elite mineira. Essas mulheres tiveram uma
trajetória escolar bem similar, frequentavam os mesmos espaços de divertimento, moravam
em bairros próximos etc.
1.1 Associativismo Feminino
As associações femininas aparecem como um meio privilegiado de estudo para
tornar as mulheres visíveis durante o período que estavam fora do sufrágio universal. Para
Cova, a iniciação das mulheres na vida associativa inscreve-se na história das
aprendizagens da democracia.2
Nas últimas décadas ampliou-se o campo de investigação sobre a História das
Mulheres. Salienta Bock3 que, nos anos 1980, nos Estados Unidos, Suíça, Itália, Suécia e
Dinamarca, algumas revistas de História dedicaram vários números à História das Mulheres.
Além do aumento quantitativo, a autora destaca o viés analítico desses trabalhos, que
procuram demonstrar a experiência das mulheres, independente da história dos homens. Há
nesses trabalhos uma clara tentativa de diminuir a presença dos homens, construindo as
tramas a partir das experiências femininas.
Bock e Cova4 afirmam que é interessante tentar apreender o que significa o
engajamento militante para estas mulheres, de modo a clarificar as relações entre o público
e o privado e a construção de uma identidade coletiva das mulheres atuantes no
associativismo.
Segundo Perrot, as mulheres ligadas às associações,
souberam apossar-se dos espaços que lhes eram deixados ou confiados, para desenvolver sua influência junto às portas do poder. Sair moralmente dos papéis designados e construir uma opinião, passando da sujeição à independência.
5
2 COVA, Anne. O associativismo das mulheres. Uma abordagem comparativa: França e Portugal
(1900-1918). In: SERRAO, José Vicente et al. (orgs.). Desenvolvimento Econômico e Mudança Social: Portugal nos últimos dois séculos. Lisboa: ICS Imprensa de Ciências Sociais, 2009. p. 333-348.
3 BOCK, Gisela. La história de lãs mujeres y La historia Del gênero. Aspectos de um debate
internacional. História Social 9 España, Universidad de Valencia. Instituto de História Social, 1991. 4
COVA, Anne. O associativismo das mulheres. Uma abordagem comparativa: França e Portugal
(1900-1918). In: SERRAO, José Vicente et al. (orgs.). Desenvolvimento Econômico e Mudança Social: Portugal nos últimos dois séculos. Lisboa: ICS Imprensa de Ciências Sociais, 2009. p. 333-348.
5 PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história. Bauru, São Paulo: EDUSC, 2005.
25
No plano cronológico, na Europa, a maior parte dos movimentos de mulheres
ganhou forma no final do século XIX e atingiu seu apogeu nas vésperas da Primeira Guerra
Mundial, período conhecido como a Belle Époque dos feminismos.6 De acordo com Evelyne
Diebolt7, a sociedade civil francesa, na virada do século XIX para o XX, organizou-se em
associações para remediar problemas como a pobreza e a miséria moral e intelectual.
Procuravam obter junto ao poder público e à sociedade civil, financiamentos para trabalhos
de assistência social. Como salienta a autora, as associações de caráter médico-social
surgem de instituições e poderes já consolidados, fortes e monolíticos, representadas, de
um lado, principalmente pelas Igrejas Católica e Protestante, e do outro lado, pelo Estado.
Para Bock e Cova8, o Estado tinha interesse por essas associações sobre vários
aspectos: a legislação, a fiscalização e a concessão de subsídios, o que lhe permitia exercer
certo controle sobre elas. Na parceria entre Estado e associações femininas, as mulheres
desempenhavam um papel fundamental na criação, organização e gestão dos serviços
sociais. Nas associações sanitárias, eram as mulheres, na maioria das vezes, que
assumiam a prestação de serviços junto aos assistidos. Faziam tratamentos domiciliares,
campanhas de prevenção contra doenças, organizavam colônias de férias e assumiam a
responsabilidade pelas atividades com crianças.9
Evelyne Diebolt mostra a dinâmica do crescimento das instituições médico-
sociais na França, oriundas do associativismo de mulheres depois da promulgação da Lei
1901, que estabelecia a liberdade associativa. Assim, tal lei definia “a associação como
sendo a convenção pela qual uma ou várias pessoas colocam em comum e de forma
contínua seus conhecimentos ou suas atividades com a única finalidade de dividir os
benefícios”.10
Segundo a autora, a maleabilidade e a simplicidade do texto fundador da lei
facilitaram sua utilização e as mulheres, não tendo nesse período direitos civis nem direito
ao voto, impedidas de aderir a um sindicato e com dificuldade de militar em um partido
6 COVA, Anne. O associativismo das mulheres. Uma abordagem comparativa: França e Portugal
(1900-1918). In: SERRAO, José Vicente et al. (orgs.). Desenvolvimento Econômico e Mudança Social: Portugal nos últimos dois séculos. Lisboa: ICS Imprensa de Ciências Sociais, 2009. p. 333-348.
7 DIEBOLT, Evelyne. História do Trabalho Social: nascimento e expansão do setor associativo
sanitário e social (França, 1901-2001). In: Estudos Feministas, Florianópolis, 13 (2): 256 maio-agosto, 2005.
8 COVA, Anne. O associativismo das mulheres. Uma abordagem comparativa: França e Portugal
(1900-1918). In: SERRAO, José Vicente et al. (orgs.). Desenvolvimento Econômico e Mudança Social: Portugal nos últimos dois séculos. Lisboa: ICS Imprensa de Ciências Sociais, 2009. p. 333-348.
9 DIEBOLT, Evelyne. Op. cit., nota 7.
10 DIEBOLT, Evelyne. Op. cit., nota 7. p. 305.
26
político, encontraram na referida lei uma brecha para exercer a cidadania política.11 Criaram
numerosas associações sanitárias e sociais, lutando contra a pobreza, a miséria moral e
intelectual, as epidemias e doenças.
Para Diebolt, ao criarem as associações ativistas e ao desenvolverem medidas
sociais, as mulheres exerceram um papel importante no surgimento do Estado de Bem Estar
Social. Na perspectiva da autora, as mulheres, através da ação associativa, permitiram a
aplicação da legislação social, sobretudo a proteção à maternidade, saúde pública,
segurança social, profissionalização do setor social, formação de empregos para mulheres e
educação. Por conseguinte, teceram importantes laços sociais entre a sociedade,
autoridades civis, estaduais e locais.
Nessa mesma direção, Michelle Perrot advoga que as mulheres, ao atuarem nas
associações, “edificaram um poder social muitas vezes conquistado e assumiram uma
missão moral da qual a filantropia foi a forma mais corrente”.12 Como mostra a autora, a
caridade, antigo dever das cristãs, conduziu historicamente as mulheres para fora de suas
casas para visitar os pobres, doentes e prisioneiros, traçando pelas cidades itinerários
permitidos e abençoados.
Desse modo “a filantropia constituiu para as mulheres uma experiência não
negligenciável que modificou sua percepção de mundo, seu sentido de si mesmas e, até
certo ponto, sua inserção pública”13. Foi na experiência filantrópica, através da gestão
privada do social, que as mulheres ganharam um lugar de importância, como uma extensão
das tarefas domésticas.14 No começo, a presença das mulheres na filantropia tratava apenas
de fazer caridade, no entanto, acabou tornando-se uma vasta empreitada de moralização e
higiene.
Outro ponto importante a se destacar sobre o associativismo feminino nesse
período é a sua internacionalização. De acordo com Cova, a ideia de criar uma organização
internacional de mulheres surgiu em Nova Iorque, no ano de 1848. O objetivo era abrir um
espaço para discussão de temas ligados à esfera social, civil e religiosa. Além disso, visava
estabelecer uma comunicação constante entre as associações de mulheres de todos os
países envolvidos e realizar encontros para deliberação de questões relativas ao bem
público e à segurança da família.
11
DIEBOLT, Evelyne. Op. cit., nota 7. 12
PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história. Bauru, São Paulo: EDUSC, 2005. p.
277. 13
Ibid., p 281 14
Ibid., p.280
27
Observa Cova15 que as duas primeiras comissões internacionais criadas foram a
Paz e Arbitragem e a Situação Legal da Mulher na Imprensa. Aos poucos surgiram outras
comissões que tinham como objetivos a obtenção do voto e os direitos civis das mulheres,
bem como a igualdade moral para ambos os sexos e a luta contra o tráfico de mulheres.
Outros temas defendidos eram a higiene e saúde pública, a proteção à infância, a educação,
a migração, o trabalho feminino, a literatura, belas artes, cinema e radiodifusão, a habitação
e a economia doméstica.
De acordo com Cova, havia uma preponderância de grupos filantrópicos nos
conselhos internacionais, especialmente os de filantropia religiosa. Isso pode ser explicado,
em certa medida, pelo argumento de Perrot, que destacava a Igreja como um caminho
aberto para as mulheres nesse período. Outro aspecto a se considerar é a conhecida
tradição dos trabalhos assistenciais desempenhados pela Igreja Católica. Além disso, havia
nesse momento o florescimento das ideias reformistas católicas, que tinham as mulheres
como importantes agentes na chamada Ação Social Católica. Embora a Igreja Católica
tivesse uma grande representatividade no campo da filantropia, havia também muitas
iniciativas da igreja protestante e do espiritismo.
Para Perrot, o intercâmbio entre as associações e os congressos organizados
por mulheres era importante para a formação política, uma vez que os congressos
configuravam-se em um sistema de comunicação eficaz e palco de representações,
permitindo que as delegadas fizessem seu aprendizado de tribuna nas relações com a
opinião pública e a imprensa dos assuntos internacionais.16 Segundo Cova, as dirigentes
dos conselhos eram figuras carismáticas, oriundas de ambientes privilegiados, às vezes
aristocráticos. A maioria recebeu educação religiosa, fato que remetia a importância e o
peso da religião na militância dessas mulheres. O acúmulo de vários cargos no seio dos
conselhos, bem como a subida de hierarquia, era prática recorrente nestes tipos de
associações. Perrot afirma que a dimensão local era o lugar onde as redes formais e
informais, criadas pelas líderes das associações, funcionavam mais eficazmente. As
relações pessoais existentes entre as mulheres associadas ajudam a explicar a formação de
redes de influência. Por sua vez, elas utilizavam essas redes como estratégia para ganhar
apoio político, associando as suas ações de modo estreito aos homens do poder.17
15
COVA, Anne. O associativismo das mulheres. Uma abordagem comparativa: França e Portugal
(1900-1918). In: SERRAO, José Vicente et al. (orgs.). Desenvolvimento Econômico e Mudança Social: Portugal nos últimos dois séculos. Lisboa: ICS Imprensa de Ciências Sociais, 2009. p. 313-332.
16 PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história. Bauru, São Paulo: EDUSC, 2005.
p. 302-303. 17
COVA, Anne. O associativismo das mulheres. Uma abordagem comparativa: França e Portugal
(1900-1918). In: SERRAO, José Vicente et al. (orgs.). Desenvolvimento Econômico e Mudança
28
As líderes das associações se relacionavam com numerosos empresários que
conheciam devido a vínculos familiares ou pela convergência de ideias quanto à ação social
a ser realizada. Elas faziam contato com empresas vizinhas de suas associações para a
concretização de seus projetos. Segundo Diebolt, a articulação das mulheres no trabalho de
persuasão junto às iniciativas privadas, ao Estado e aos médicos, era fundamental, pois
essas instâncias tendiam a negligenciar as condições de vida dos assistidos e a
necessidade de prevenção dos males que lhes acometiam.18
Nesse sentido, fica claro que o associativismo feminino, que começa a se
configurar no final do século XIX e perdura pelas primeiras décadas do século XX, permitia
uma ação pública das mulheres. O caminho preferencial dessa ação foi a filantropia
religiosa. No trabalho filantrópico as associadas criaram agendas ligadas à saúde pública, à
educação e à segurança pública. Cumpre ressaltar que as mulheres engajadas nessas
associações tinham uma boa formação escolar e eram mulheres de elite que usaram suas
influências para estabelecerem parcerias com a iniciativa privada e com o Estado.
1.2 Estudos sobre o Associativismo Feminino no Brasil
Para investigar o associativismo feminino no Brasil, fizemos um levantamento
bibliográfico dos trabalhos que abordam a temática nas plataformas: Scielo (Scientific
Eletronic Library Online), Portal Capes e Biblioteca de Teses e Dissertações. O objetivo era
mapear como a literatura brasileira analisa o papel da mulher nas associações femininas do
primeiro quartel do século XX, sobretudo nas associações católicas. Usamos como
palavras-chave os seguintes termos: associativismo feminino, associações femininas
católicas e associativismo católico.
A investigação serviu para demonstrar como ainda são raros os estudos sobre o
associativismo feminino católico no início do século XX. Há muitos trabalhos nesse período
que discutem as questões de gênero, salientando as lutas pelo sufragismo, moda e
imprensa. Há também muitos trabalhos que discutem as experiências femininas nas escolas
normais, sobretudo nas discussões ligadas à História da Educação no Brasil. Esses últimos
trabalhos ressaltam a formação religiosa das normalistas, reforçando as questões ligadas ao
Social: Portugal nos últimos dois séculos. Lisboa: ICS Imprensa de Ciências Sociais, 2009. p. 313-332.
18DIEBOLT, Evelyne. História do Trabalho Social: nascimento e expansão do setor associativo
sanitário e social (França, 1901-2001). In: Estudos Feministas, Florianópolis, 13 (2): 256 maio-agosto, 2005.
29
conservadorismo e ao papel que devia ser incorporado pelas mulheres: o de tornarem-se
boas esposas e mães.
Alguns trabalhos pensam a ação das mulheres nos campos da filantropia, saúde
e educação nas primeiras décadas do século XX. Entretanto, a maior parte dos estudos
ressalta os aspectos religiosos e dogmáticos desse tipo de ação ou fixam a análise sob o
ponto de vista do disciplinamento dos assistidos. Predominam as análises sobre instituições
e ações filantrópicas organizadas por homens de notoriedade política ou científica.
Encontramos muitos estudos sobre a associação católica Filhas de Maria,
entretanto, esses trabalhos centralizam o olhar sobre os aspectos piedosos da agremiação e
o discurso do recato e da moral previsto nos manuais das associadas. Eles partem do
pressuposto que as mulheres associadas às Filhas de Maria seguiram criteriosamente o que
estava prescrito nos manuais católicos, sendo mulheres piedosas, recatadas e fixadas nas
tarefas do lar e da maternidade.
Decerto, poucos trabalhos se debruçam sobre o associativismo feminino católico
na chave interpretativa de que as mulheres ligadas às associações católicas encontraram na
filantropia uma possibilidade de sair do universo de suas casas para aceder o espaço
público e assim construir uma vida para além do lar. Nesse movimento de sair19, as
associadas criaram uma agenda de reivindicações muito próxima à dos grupos feministas
do período. Nos arriscamos a afirmar, que eram sim, feministas. Estavam preocupadas com
problemas em evidência naquele momento, como a proteção à maternidade e à infância, e
buscavam a criação de uma legislação social e melhorias no acesso e na qualidade da
educação primária.
Para Maria Lúcia Mott, a historiografia brasileira reconhece a importância da
participação das mulheres de elite em entidades filantrópicas nos primeiros anos do século
XX como forma de acesso à esfera pública, mas dá pouca importância ao tema. Encara-o
de forma subalterna, ou apenas como uma atividade de promoção da carreira de seus
maridos20. Para a autora, na historiografia brasileira, a imagem da filantropia aparece como
obra masculina. As mulheres ocupam o lugar de coadjuvantes, apenas organizadoras de
festas para levantamento de fundos. É pouco conhecido o papel que elas desempenharam
19
PERROT, Michelle. Sair. In: DUBY, Georges; PERROT, Michelle (dirs.). História das Mulheres do
Ocidente. O século XX. Porto. Edições Afrontamento, 1991 v. 4 p. 502-539. 20
MOTT, Maria Lúcia. Maternalismo, políticas públicas e benemerência no Brasil (1930-1945).
Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudo de Gênero – Pagu/Unicamp n.16 p.199-234, 2001.
30
na criação, manutenção e elaboração dos programas de associações no campo
educacional, médico e social.21
As associações filantrópicas no Brasil foram criadas um pouco mais tarde, se
comparado aos países europeus e aos Estados Unidos. Mott propõe repensar o papel que
essas associações tiveram na transformação da consciência das mulheres e na organização
do movimento feminista brasileiro, por fornecer a circulação de ideias e de questionamentos
novos, o convívio com outras mulheres, a administração de problemas fora do grupo familiar
e o estabelecimento de redes de interesse.22 As associações femininas floresceram no
período de desenvolvimento industrial e urbano, quando as mulheres passam a ter acesso a
uma melhor escolaridade. É também nesse momento que começa a existir a divulgação
pela imprensa de uma participação maior das mulheres no espaço público, do avanço do
feminismo e das frequentes reivindicações das mulheres por maiores oportunidades.23
As mulheres fizeram da religião seu espaço de expressão e manifestação de
mobilidade. Mesmo que tenham sido alvo direto dos ensinamentos mais conservadores e
tivessem incorporado esse discurso, contribuindo para a reprodução de um modelo mais
tradicional de Igreja, ocuparam seu espaço na militância e estiveram particularmente
sensíveis às tendências de renovação.24 Num período em que os serviços de saúde pública
no Brasil eram precários, a ação feminina nas associações filantrópicas procurava atuar
sobre os flagelos sociais. Essas mulheres procuravam mudar os hábitos dos assistidos, agir
nas raízes de seus males e restaurar suas famílias.
Em se tratando da saúde pública e das leis trabalhistas no Brasil nesse período,
a burocracia era rudimentar, não havia um departamento ou ministério dedicado exclusivamente às questões trabalhistas. Os hospitais pertenciam à iniciativa privada ou religiosa e o papel do Estado no campo da saúde restringia-se basicamente ao combate das epidemias e à fiscalização do exercício profissional dos gêneros de consumo e dos remédios
.25
As entidades filantrópicas atuavam para compensar a precariedade dos serviços
sociais e da saúde pública. Isso torna as entidades filantrópicas do início do século XX
21
MOTT, Maria Lúcia. Gênero, medicina e filantropia: Maria Rennote e as mulheres na construção
da nação. Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudos de Gênero Pagu/Unicamp n.24 p.41-67, jan./jun. 2005.
22 Ibid.
23MOTT, Maria Lúcia. Maternalismo, políticas públicas e benemerência no Brasil (1930-1945).
Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudo de Gênero – Pagu/Unicamp n.16 p.199-234, 2001.
24PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história/Michelle Perrot. Bauru, São Paulo:
EDUSC, 2005. 25
MOTT, Maria Lúcia. Maternalismo, políticas públicas e benemerência no Brasil (1930-1945).
Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudo de Gênero – Pagu/Unicamp n.16 p.199-234, 2001.
31
diferentes das associações de caridade de meados do século XIX. Enquanto as primeiras
tinham sido organizadas e administradas por religiosos que visavam levar o conforto
material e espiritual imediato para os necessitados, sobretudo através de doações, tendo,
portanto, pouco contato com os assistidos, as associações filantrópicas do século XX eram
fundadas e dirigidas por mulheres provenientes de uma ou de várias denominações
religiosas. As sócias trabalhavam junto aos beneficiados e tinham por objetivos não só
ajudar com doações, mas também dar meios para que saíssem da situação de necessidade,
ou seja, preocupavam-se com a promoção social da população assistida.26
Por esse motivo, é nosso objetivo demonstrar que as associações femininas
católicas atuantes nas quatro primeiras décadas do século XX em Belo Horizonte, não eram
apenas instituições de caridade, mas sim instituições constituídas por um grupo de mulheres
instruídas e modernas, que criaram programas com atuação em diversos campos,
particularmente na saúde e na educação. Miravam-se especialmente nas crianças e nas
mulheres pobres operárias, bem como naquelas que cometiam práticas fora das normas
legais do período.
Procuramos dialogar com a abordagem analítica de Mott e explorar as fontes
documentais relativas às associações femininas, adotando a metodologia utilizada em seus
trabalhos, sobretudo na obra O gesto que salva: Perola Byington e a Cruzada Pró-Infância27.
Nessa obra as autoras fazem uma espécie de radiografia da vida e das obras criadas por
Perola Byington e as sócias do programa Pró-Infância. Inspirados nesse trabalho de Mott,
procuramos tecer a trama do associativismo católico em Belo Horizonte, focando em
algumas mulheres como protagonistas e mapeando os programas criados por elas.
1.3 Associativismo em Belo Horizonte
Em Belo Horizonte, nas primeiras décadas do século XX, devido à grande
variedade de grupos e nacionalidades que compunham sua população, as associações
voluntárias serviam como elo agregador do conjunto urbano. Floresciam as associações de
auxílio mútuo de comerciantes, clubes de senhoras, bandas, grupos teatrais e associações
profissionais bem organizadas e amplamente atuantes no ordenamento da sociedade
mineira.
26
MOTT, Maria Lúcia. Maternalismo, políticas públicas e benemerência no Brasil (1930-1945).
Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudo de Gênero – Pagu/Unicamp n.16 p.199-234, 2001. p.212.
27 MOTT, Maria Lucia, et al. O gesto que salva: Perola Byington e a Cruzada Pró-Infância. São Paulo Grifo Projetos Históricos e Editoriais, 2005
32
Como já foi amplamente discutido pela historiografia28, Belo Horizonte foi
planejada e construída dentro dos padrões de higiene e salubridade da época, para ser
símbolo da República. A construção da cidade foi revestida de ideais de modernidade e
civilização. Sua criação serviu para minar os conflitos entre as forças políticas regionais e,
consequentemente, promover a integração do estado, tornando-se novo centro econômico,
político e cultural.
Embora tivesse a ampla divulgação do discurso de cidade moderna – planejada
e construída seguindo os preceitos da urbanidade e da higiene – havia poucas instituições
destinadas a cuidar da saúde da população, prevalecendo assim, a caridade e a assistência
popular29. Além disso, a cidade era referenciada como a “cidade dos papudos e dos
cretinos” devido ao grande número de doenças endêmicas, como o bócio e a cretinice30.
Assim também, os problemas econômicos e a consequente diminuição no ritmo das obras
refletiram em dificuldades de estender os serviços básicos a toda área urbana e no aumento
da precariedade da vida dos pobres da cidade31. Mesmo contando com um Conselho de
Saúde Pública desde 1895, destinado a cuidar da higiene e salubridade, e ter uma Diretoria
de Higiene encarregada das inspeções sanitárias e do combate a epidemias, era difícil
manter os novos padrões de higiene e saneamento, o que exigia a instauração de novos
departamentos e instituições que auxiliassem nesses serviços.
Assim, segundo Souza, “não fugindo à tradição a cidade de Belo Horizonte
contou desde o início de sua fundação com a Santa Casa de Misericórdia”32. Ainda
28
JULIÃO, Letícia. Belo Horizonte: itinerários da cidade moderna (1891-1920). In: DUTRA, Eliana de Freitas; MELLO, Ciro Fávio Bandeira de. BH: Horizontes Históricos. Belo Horizonte: C/Arte, 1996; GOODWIN JÚNIOR, James. Novos produtos para novos tempos: anúncios em jornais diamantinenses, 1890-1914. XI Seminário sobre Economia Mineira. Diamantina: CEDEPLAR/UFMG, 2004; SOUZA, Marco Antônio de. A Economia da Caridade: estratégias assistenciais e filantrópicas em Belo Horizonte. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004; e outros.
29 TEIXEIRA, Virgínia Mascarenhas Nascimento. De práticos a enfermeiros: os caminhos da enfermagem em Belo Horizonte (1897-1933). Tese de Doutorado. Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, 2012.
30 O bócio é uma doença associada ao aumento da região do pescoço, da qual há registros desde a Antiguidade. Com a descrição da tireoide no século XVI, passou a significar o crescimento incomum dessa glândula e foi progressivamente associada a distúrbios como o hipertireoidismo e o hipotireoidismo. O bócio endêmico diz respeito à situação em que a doença atinge expressiva porcentagem da população numa determinada região. Portadores de bócio endêmico também são acometidos de grave retardo físico e mental, sendo por isso denominados cretinos. A doença era descrita, sobretudo, nas regiões montanhosas. De alta prevalência em Minas Gerais, desde o século XVIII, despertava a atenção de naturalistas, viajantes e médicos. Ao longo do tempo muitas teorias foram propostas para sua etiologia. KROPF, Simone Petraglia. Doença de Chagas, doença do Brasil: ciência, saúde e nação, 1909-1962. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009, p. 165.
31SILVEIRA, Anny Jackeline. Entre febres, papudos e brejais: a mudança da capital mineira sob a
ótica da higiene. In: CONDÉ, Mauro Lúcio Leitão (org.). Ciência e Cultura na História. Brasília, DF: CAPES, Belo Horizonte, MG: Argvmentvm 2006 p. 39-60.
32 Marco Antônio de Souza refere-se à tradição assistencialista da Santa Casa de Misericórdia no
Brasil desde o tempo de colônia, que segundo o autor ganhou importância especial quando “lhe foi atribuída pelo poder público, ainda no Império, a missão de orientar a população das cidades para
33
segundo o autor, pouco depois da inauguração da cidade, a necessidade de construir um
hospital em Belo Horizonte era uma meta urgente. Devido à urgência da construção de um
hospital que pudesse assistir a saúde da população belo-horizontina, especialmente dos
pobres, em 1899 iniciou-se a construção da Santa Casa de Misericórdia. De acordo com
Souza33, o hospital passou a funcionar em estado de precariedade de asseio, higiene e
equipamentos, passando os primeiros anos em situação de improviso. Problemas que só
foram solucionados anos depois, com as constantes doações e mutirões de caridade dos
cristãos. Assim, a Santa Casa tornou-se um importante centro controlador de doenças e
epidemias, além de abrigar importantes associações médicas, como a Associação Médica
Cirúrgica de Minas Gerais34, bem como a ligação com os órgãos de Diretoria de Higiene,
Laboratório Geral de Análises e o Desinfectório Geral.
Outras instituições de caráter médico-científico foram se estabelecendo ao longo
dos anos de 1900, como a instalação da Filial de Manguinhos, em 1907 (que em 1922, em
homenagem a seu fundador, passou a se chamar Fundação Ezequiel Dias). Importante
instituição de pesquisa, manteve estreitas relações com o Estado de Minas, ficando o
governo “autorizado de contratar o fornecimento de vacinas e soros de que necessitar a
Diretoria de Higiene bem como entrar em acordo com as filiais do mesmo instituto para
estudo bacteriológico de todas as moléstias epidêmicas ou endêmicas que grassarem no
território do Estado (...)”.35
Em 1910 foi construído, na área suburbana da cidade, o Hospital de Isolamento
para atendimento de moléstias contagiosas. No ano de 1911 foram criados o Posto de
Observação e a Enfermaria Veterinária do Ministério da Agricultura (mais conhecido por
Posto Veterinário) funcionando em seus primeiros anos nas dependências da Filial de
Manguinhos. Seu primeiro diretor foi Henrique Marques Lisboa, seguido por Octavio
Magalhães, que em 1922, após o falecimento de Ezequiel Dias, assumiu a direção do
Instituto. Neste mesmo ano foram fundadas a Faculdade de Medicina e o Laboratório de
Análises Clínicas do Estado.36 Em 1918, com o apoio do governo federal e da Fundação
evitar a propagação de epidemias, com a finalidade de tentar controlá-las, isso ocorrendo nas décadas de transição entre os séculos XIX e XX”. SOUZA, Marco Antônio. A economia da caridade: estratégias assistências e filantrópicas em Belo Horizonte. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004. p. 82. Dados retirados do Livro do Conselho Metropolitano da Sociedade São Vicente de Paulo. p.105-106.
33SOUZA, Marco Antônio. A economia da caridade: estratégias assistências e filantrópicas em Belo
Horizonte. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004. p. 82. Dados retirados do Livro do Conselho Metropolitano da Sociedade São Vicente de Paulo.
34 Sobre a Associação Médica Cirúrgica de Minas Gerais ver: <www.dichisoriasaude.coc.fio cruz.br>.
35 Lei nº 452 de 9 de outubro de 1906 – Minas Gerais 10 de outubro de 1906 apud CHAVES, Braúlio.
Os primeiros tempos. In: STARLING, Heloísa Maria Murgel; GERMANO, Lígia Beatriz de Paula; MARQUES, Rita de Cássia (org.). Fundação Ezequiel Dias: um século de promoção e proteção à saúde. Belo Horizonte: UFMG, 2007.
36 Ibid.
34
Rockefeller, foi criado o Serviço de Profilaxia Rural do Estado para o combate das endemias
uncinariose, paludismo, doença de chagas e lepra.37
Como demonstra Nascimento, foi apenas no início dos anos 1920 que outros
hospitais surgem na capital mineira, ampliando o campo de atendimento aos doentes na
cidade. Em 1920 foi inaugurado o Hospital São Geraldo, destinado às clínicas de
oftalmologia e otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina. Neste mesmo ano foram
iniciadas as obras para a construção do Hospital São Vicente de Paulo. Inaugurado em
1921, a instituição foi resultado dos esforços de pessoas da alta sociedade e dos médicos e
professores da Faculdade de Medicina.38
Destacamos ainda a atuação de importantes associações médicas, que além do
desenvolvimento de trabalhos científicos, ficaram a cargo da higiene e cuidados da saúde
da população que buscavam, mais que tratar e prevenir doenças, estabelecer novos valores
para a medicina. Para além dos cuidados com as doenças, havia também cuidado “com o
corpo, com a casa, nascimentos, casamentos, educação dos filhos e comportamento geral
na sociedade”.39
Desse modo, o período que abrange os anos da construção de Belo Horizonte
até 1930 foi de fundamental importância na organização espacial e social da nova capital.
Para Souza, essa fase, que ainda estava dentro dos projetos iniciais delineados pelas elites
que planejavam a cidade, é um momento crucial na formação da população e na criação de
grupos e identidades40. Nesse momento ocorre o preenchimento dos quadros burocráticos
administrativos e começam a surgir os problemas sociais. Uma incipiente industrialização se
inicia e, com ela, o aparecimento de uma nova classe: os operários. Acompanhados de
outros homens, mulheres e seus filhos, eles formaram um contingente populacional que, na
visão das elites, precisava ser educado dentro dos bons costumes, da ordem e da moral, e
disciplinado para o mundo do trabalho.41
A Igreja Católica mineira, sem dúvida, teve papel importante nas organizações
voluntárias. Essa atuação pode ser verificada no trabalho de Souza, que destaca a força da
37
Decreto 5 de 8 de junho de 1918 p. 1- 4 apud SILVEIRA, Anny Jackeline Torres. A influenza
espanhola e a caridade planejada: Belo Horizonte, 1918. Belo Horizonte: Argumentum, 2008. p.126.
38 TEIXEIRA, Virgínia Mascarenhas Nascimento. De práticos a enfermeiros: os caminhos da enfermagem em Belo Horizonte (1897-1933). Tese de Doutorado. Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, 2012.
39MARQUES, Rita de Cássia. Imagem social do médico de senhoras no século XX. Belo
Horizonte: Coopmed, 2005. 40
SOUZA, Marco Antônio de. As estratégias da pedagogia do assistencialismo em Belo
Horizonte, 1930-1990: Educação e Caridade. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, 2001.
41SOUZA, Marco Antônio de. A economia da caridade: estratégias assistências e filantrópicas em
Belo Horizonte. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004. p.24.
35
Igreja na economia da caridade42, seu controle sobre as famílias desfavorecidas e as
estratégias de aproximação e convencimento usadas pelos grupos de vicentinos em suas
visitas aos pobres.
Segundo Jonh Wirth43, as organizações voluntárias, juntamente com os meios de
comunicação, a educação e a Igreja, eram um dos principais órgãos socializadores em
Minas Gerais. Como mostra o autor, no censo do ano de 1920 havia cerca de 2.600
associações atuantes em Minas. Desse número, mais da metade era do tipo beneficente ou
religioso tradicional e funcionavam como sociedades de amparo médico e irmandades
laicas.
Em Belo Horizonte, nesse período, contabilizava-se 117 associações voluntárias
ativas. O grande número de associações voluntárias, sobretudo as de cunho filantrópico
associadas às limitações de instituições destinadas ao atendimento de saúde e higiene da
população pobre, revela a importância dos serviços de assistência no atendimento a essa
parcela da sociedade.
1.3.1 Associativismo católico em Belo Horizonte
A ação do laicato católico belo-horizontino pode ser dividida em dois momentos:
antes e depois da criação da arquidiocese. O primeiro momento caracteriza-se pela atuação
de instituições avulsas de caridade compostas pelo laicato44. Homens e mulheres da alta
sociedade que, fazendo uso da prática caritativa, cuidavam dos pobres e, ao mesmo tempo,
mostravam-se como denodados cidadãos perante a sociedade, afinal, ser caridoso nesse
contexto era atributo importante.45
As referências eclesiásticas dessa primeira fase eram os bispos das cidades de
Mariana e Diamantina, D. Silvério Gomes Pimenta e D. Joaquim Silvério de Souza,
42
Para o autor, Economia da Caridade é a rede de assistência à pobreza incrementada pelas elites
políticas e religiosas desde meados do século XIX. Um dos desdobramentos dessa rede foi o surgimento de novas estratégias assistenciais nas grandes cidades brasileiras no início do século XX, com ênfase em intensa ação pedagógica. Ver: SOUZA, Marco Antônio de. As estratégias da pedagogia do assistencialismo em Belo Horizonte, 1930-1990: Educação e Caridade. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, 2001. p. 2.
43WIRTH, John D. O fiel da balança: Minas Gerais na Federação Brasileira, 1889-1937. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1982. 44
Sobre as associações católicas atuantes em Belo Horizonte antes da criação da arquidiocese de
Belo Horizonte, ver MATOS, Henrique Cristiano José. Um estudo histórico sobre o catolicismo militante em Minas, entre 1922 e 1936. Belo Horizonte: O Lutador, 1990.
45Ver MARQUES, Rita de Cássia. A imagem social do médico de senhoras no século XIX. Belo
Horizonte: Coopmed, 2005.
36
respectivamente. Nessa fase, havia um claro alinhamento com o reformismo católico
internacional. Inclusive, nessa época, muitos grupos de estrangeiros, em especial da França
e Países Baixos, vieram para Minas Gerais trabalhar nessa causa.
Salienta Wirth que o movimento católico em Minas Gerais iniciado nesse período
formou um grupo efetivo de pressão. Possuía uma base ampla e multiorganizacional. Nas
palavras do autor,
por um lado, a Igreja patrocinou organizações voluntárias quando a sociedade estava tornando-se mais complexa. Por outro, o movimento atraía o conservadorismo mineiro num período de crescente transformação. O efeito mais sólido foi mediar a mudança com um conjunto de símbolos e organizações que ganharam ampla aceitação da elite
46.
Desse modo, antes da criação da Arquidiocese em Belo Horizonte, havia várias
associações beneficentes e de caridade espalhadas pela cidade, que, grosso modo,
visavam assistir às famílias pobres, combater a circulação de ideias socialistas e zelar pela
educação, saúde e bons costumes das famílias operárias, com a finalidade de manter a
cidade moderna e higienizada. Dessas associações, destacam-se a União Popular (UP), A
União dos Moços Católicos (UMC) e a Sociedade São Vicente de Paulo (SSVP). As
referidas associações eram organizadas por importantes intelectuais católicos, pertencentes
à Tradicional Família Mineira, educados em escolas católicas com ampla atuação política.
Tratava-se de um grupo homogêneo que conseguiu organizar força para conduzir os
processos de modernização da cidade.47
O centro de União Popular que lutava contra a neutralidade religiosa, organizou
nos anos de 1910 (Juiz de Fora), 1911, 1914 e 1918 (Belo Horizonte) Congressos Católicos,
cujo objetivo maior era o retorno do ensino religioso nas escolas públicas mineiras48. A meta
foi alcançada no ano de 1928, durante o Congresso Eucarístico. O presidente Antônio
Carlos de Oliveira Andrada proferiu uma mensagem autorizando o ensino facultativo do
catecismo nas escolas públicas dentro do horário escolar. A efetivação da autorização se
deu com a promulgação da Lei 1.092, em 12 de dezembro de 1929, pela Reforma Francisco
Campos.49
46
WIRTH, John D. O fiel da balança: Minas Gerais na Federação Brasileira, 1889-1937. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
47 VALENTE, Polyana Aparecida. Intelectuais Católicos, saúde e educação em Minas Gerais.
Dissertação de Mestrado em História das Ciências e da Saúde. Fundação Oswaldo Cruz/ Casa de Oswaldo Cruz, 2010.
48 No ano de 1906, João Pinheiro, o então presidente do estado, pôs fim ao ensino religioso nas
escolas públicas mineiras. 49
Sobre isso ver CASASSANTA, Ana Maria Peixoto. Educação e Estado Novo em Minas Gerais.
Bragança Paulista: Editora da Universidade São Francisco, 2003.
37
Para Marco Antônio de Souza, a Sociedade São Vicente de Paulo, em Minas
Gerais, mais do que em outros lugares do país, foi a precursora da Ação Social Católica,
uma das primeiras organizações de massa para o atendimento dos pobres em hospitais,
asilos, creches e vilas populares.50
Enquanto as associações SSVP e a União Popular tinham um caráter mais ativo,
a União dos Moços Católicos era uma agremiação de cunho mais piedoso. Fundada em
Belo Horizonte, em 21 de novembro de 1915, por um grupo de jovens católicos, em sua
maioria estudantes, a finalidade da associação era reunir os jovens católicos para orientá-
los nos princípios cristãos e sociais e encaminhá-los na doutrina católica, que deveriam
propagar e defender em qualquer ocasião. A orientação era “formar homens patriotas que
compreend[essem] com exatidão os seus deveres de católicos e de cidadãos brasileiros, de
acordo com as instruções da Santa Sé, do episcopado brasileiro e dos congressistas
internacionais da Juventude Católica”.51
Desde sua criação, a UMC52 manteve-se em franca expansão até a década de
1940. A entidade se estabeleceu em outros estados brasileiros e, por conta disso, foi
implantado um Conselho Superior em Belo Horizonte e foram instalados conselhos regionais
e estaduais. Em 1928, a UMC contava com 15.000 associados, 183 uniões locais, 12
conselhos estaduais e 18 conselhos regionais subordinados ao Conselho Superior de Belo
Horizonte.53 A UMC servia para consolidar a influência do catolicismo na formação dos
jovens, iniciada nas escolas secundárias. Era uma forma de garantir a sociabilidade e a
homogeneidade dos jovens aos programas católicos.
O segundo momento do associativismo em Belo Horizonte é demarcado pela
vinda de D. Antônio dos Santos Cabral à capital mineira, ocasião em que o referido bispo
fundou a Arquidiocese de Belo Horizonte (1922) e tomou a direção do laicato em ampla
conexão com as orientações de D. Leme, no Rio de Janeiro. Em torno de D. Cabral
formaram-se comissões de apoio, compostas especialmente por homens e mulheres da elite
política e econômica.
As mulheres eram compreendidas como figuras fundamentais nessa segunda
fase. Eram convocadas a agir efetivamente nas causas e movimentos religiosos, como é
possível observar na assertiva:
50
Ao longo do trabalho, a Sociedade São Vicente de Paulo será discutida de forma mais cuidadosa. 51
LIMA, Mário de. O bom combate: subsídios para história de 20 anos da ação social catholica em
Minas. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1929. p. 227. 52
Vale ressaltar que o grupo aqui selecionado não corresponde à União dos Moços Cristãos criada
em 1844 e composta por jovens protestantes. 53
LIMA, Mário de. Op. cit., nota 51.
38
Incontestavelmente a grande maioria das mulheres mineiras são católicas. Apesar disso as mulheres não desempenham o papel quando podem assumir em face dos problemas que preocupam nossos líderes católicos. Além dos exemplos de piedade, organização de festas religiosas, a instrução religiosa, a imprensa católica toda ação social católica. Mulheres não compreendem ainda que o católico deve impregnar toda sua vida além das capelas. Antigamente este fato atribuído a falta de cultura e educação científica da mulher mineira, eram boas mães de família conheciam os trabalhos domésticos e só. Hoje não, nossas patrícias dispõem de sólida cultura, podem perfeitamente versar as associações religiosas, auxiliar a imprensa católica, impulsionar o ensino religioso, tomar parte na Santa Cruzada do catolicismo social no Estado. Sejam piedosas, mas saiam também para fora da Igreja e dissemine as cá no exterior por todos os meandros dessa trama complicada, que é a nossa sociedade moderna
.54
O artigo foi publicado no jornal O Horizonte no ano de 1926. Trata-se da
convocação das mulheres para o trabalho social. É notório que a convocação é dirigida a
um grupo específico de mulheres, pertencente à elite mineira, dotadas de uma sólida
educação e de grande representatividade social. Deixa entrever que o trabalho
desempenhado por essas mulheres não se restringia a fazer caridade, mas auxiliar na
imprensa e na educação. Eram mulheres que dispunham de um saber técnico, e esse saber
guiava e qualificava a atuação dessas mulheres fora das associações.
De acordo com Joana Maria Pedro55, a influência das associações caritativas
femininas se irradiava através da família, motivo pelo qual a socialização religiosa se fazia,
principalmente, por meio feminino. O estímulo a essa socialização se dava, essencialmente,
através dos eventos familiares, com uma maior participação das mulheres nas atividades
beneficentes.
Ao abrir espaço para as mulheres em suas associações, a Igreja, sem abrir mão
de seus interesses, proporcionou a inclusão social feminina, dando a ela a oportunidade de
participar da vida social, ao incentivar suas ações. Para Perrot, a intensidade dos vínculos
entre mulheres e religião confere uma particular ressonância aos acontecimentos religiosos,
laços complexos de disciplina e de dever, de sociabilidade e direitos, de práticas e de
linguagens.56
54
O Horizonte 11/09/1926. 55
PEDRO, Joana Maria. Mulheres do Sul. In: DEL PRIORE, Mary (org.). História das Mulheres no
Brasil. São Paulo: Contexto, 2004. 56
PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história. Tradução Viviane Ribeiro. Bauru,
SP: EDUSC, 2005. p. 309.
39
1.4 As associações católicas femininas em Belo Horizonte
Dentre as variadas agremiações leigas existentes na capital mineira no período,
destacam-se na proposta da pesquisa: as Filhas de Maria (FM), Mães Cristãs e Damas da
Caridade.
1.4.1 Filhas de Maria
As Filhas de Maria é uma das três mais importantes confrarias femininas
vicentinas de caráter militante. Foi criada no ano de 1875, por iniciativa do projeto pastoral
das Filhas da Caridade, irmãs da Companhia São Vicente de Paulo no Brasil57. Minas
Gerais foi a primeira província a ser contemplada com a existência da associação. As Filhas
da Caridade contribuíram efetivamente no projeto de internalização do catolicismo
reformista.
Podiam participar das Filhas de Maria mulheres solteiras entre 16 e 40 anos. A
imagem de Maria era a fonte inspiradora da espiritualidade sacerdotal e do modelo cristão
de mulher.58 A associação tinha como finalidade educar suas associadas sob a
espiritualidade mariana para serem boas filhas, esposas e irmãs. Para identificação, as FM
usavam no pescoço um escapulário azul celeste com as inscrições: “Nossa Senhora da
Conceição” e “Maria foi concebida sem pecado”. Na cintura, usavam uma faixa azul.59
A associação FM era regida por um complexo postulado de regras e condutas, o
Manual da Pia União das Filhas de Maria. Das variadas regras sugeridas pelo manual
vicentino, chama atenção a importância atribuída aos hábitos e práticas de higiene, bem
como a prática da indulgência parcial cuja obrigação era praticar as virtudes cristãs,
principalmente a caridade, a pureza, a humildade e a obediência. Além de visitar enfermos,
encarcerados, dar esmolas aos pobres, dentre outros.60
De acordo com Ana Paula Magno Pinto, a SSVP era influenciada por
concepções higienistas, positivistas, o que resultou na criação de um modelo de assistência
57
ASONO, Sandra Nui. Associação das Filhas de Maria práticas religiosas e a construção de
corpos femininos castos em Diamantina/Minas Gerais. Revista em Tempo de Histórias, nº 7, 2003.
58 MUNIZ, Diva de Couto Gontijo. Um toque de gênero: história e educação em Minas Gerais (1935-
1892). Fundação de Empreendimentos Científico e Tecnológicos. Brasília, 2013. 59
AMARAL, Walter Valdevino do. Apostolado da boa imprensa: contribuições das Filhas de Maria
na imprensa católica (Pernambuco 1902-1922). Escritas Vol. 6 n. 1, 2014. p. 204-224. 60
Manual da Pia União das Filhas de Maria, p. 67.
40
baseado na ajuda com recursos materiais (roupas, alimentação e remédios) e também em
hábitos de higiene que contribuíssem para o controle de maus hábitos e doenças.61
Em Belo Horizonte, as Filhas de Maria se reuniam nas paróquias e nos colégios
Santa Maria e Sagrado Coração de Jesus. Ambos os colégios se destacam como referência
na educação belo-horizontina e eram destinados ao público feminino de elite. O colégio
Santa Maria foi criado em 1903, pela Ordem Dominicana Francesa. Inicialmente, instalou-se
no palacete Antônio Olinto, na Rua da Bahia, onde hoje é a basílica de Nossa Senhora de
Lourdes. No dia 22 de maio de 1909, ganhou sede definitiva na Rua Jacuí, no bairro
Floresta.
Já o Colégio Sagrado Coração de Jesus foi fundado no ano de 1911, pela
Congregação das Irmãs Missionárias Servas do Espírito Santo. Localizado na esquina da
Rua Professor Moraes com a Avenida Getúlio Vargas, funcionava como internato e recebia
basicamente filhas de fazendeiros do interior do estado. Nesses colégios, as mulheres
recebiam uma formação religiosa, moral e escolar com o objetivo de prepará-las para o bom
desempenho das atribuições femininas.62 Por outro lado, tinham uma educação sofisticada e
erudita.
No ano de 1923 as Filhas de Maria era um “grande exército de
aproximadamente 500 mulheres”. Esse número crescia com o passar dos anos e, em 1926,
formava um contingente de 1200 associadas.63 Sem dúvida, a FM era a agremiação com
maior número de sócias, o que permitia maior atuação do grupo e grande variedade de
atividades.
Para manter financeiramente os seus programas, as Filhas de Maria pediam
auxílios a benemerentes e mantinham obras de costura. Parte das peças produzidas era
doada aos pobres e outras peças eram vendidas. Elas também eram responsáveis por
fazerem visitas periódicas às fábricas de produção têxtil, auxiliando material e
espiritualmente as operárias e as crianças. Eram encarregadas também de organizar
encontros e palestras em instituições de assistência católica, principalmente nas creches
Menino Jesus e Santo Antônio, Asilo Bom Pastor, Vila dos Operários Tuberculosos, Santa
Casa e no Hospital São Vicente de Paulo.
Um grande espaço de atuação das Filhas de Maria na capital mineira foi a
Imprensa, sobretudo no jornal O Horizonte64, onde atuaram como leitoras, redatoras e
61
PINTO, Ana Paula Magno. Caridade organizada. O manual da Sociedade São Vicente de Paula
de Lisboa em 1885. Anais do Simpósio Nacional de História, 2015. 62
MUNIZ, Diva do Couto Gontijo. Um toque de gênero: história e educação em Minas Gerais
(1935-1892). Fundação de Empreendimentos Científico e Tecnológicos. Brasília, 2013. 63
O Horizonte 3/05/1926. 64
O Horizonte foi um jornal católico criado no ano de 1923 como órgão do Conselho da Arquidiocese
de Belo Horizonte.
41
divulgadoras do periódico. Trabalhavam para angariar novos assinantes e efetuavam
vendas avulsas65. A imprensa foi uma forte aliada no processo de recristianização da
sociedade. A Igreja Católica utilizava a imprensa como veículo de informação, motivação e
arregimentação dos leigos. A participação das Filhas de Maria na divulgação da doutrina
católica era uma característica do projeto romanizador. Assim como em Minas Gerais,
também em outros estados brasileiros as agremiadas eram responsáveis pela imprensa.66
Como observa Joana Maria Pedro, nas primeiras décadas do século XX os
jornais eram responsáveis pela divulgação de modelos de comportamento, sobretudo para
as mulheres. Funcionavam como meio de difusão de um projeto civilizador preocupado com
a definição dos papéis femininos.67 A experiência da escrita passa pela trajetória escolar das
FM, uma vez que era comum nos colégios secundários a produção de revistas internas,
folhetins de literatura e jornais informativos, produzidas pelas jovens estudantes.
Nas reuniões da Confederação Católica Feminina, D. Cabral era incansável ao
delegar às FM a tarefa de angariar novos assinantes para o jornal. Por outro lado, as
próprias confederadas entendiam as páginas d‟O Horizonte como espaço de debate para
assuntos femininos. O jornal dispunha de vários artigos destinados às mulheres e colunas
dirigidas por elas. Dentre as redatoras podemos citar Violetta, Annita de Santa Cecília, Maria
Luiza de Almeida Cunha e Maria Luiza FM. Na reunião do dia 21 de setembro de 1927,
Maria Luiza de Almeida Cunha propôs a sistematização da produção de textos no jornal e
criou uma seção feminina. Aproveitando-se desse espaço, a FM utilizou o periódico para
reforçar os valores e virtudes necessários às jovens católicas, bem como para fortalecer o
ideal de boa filha, mãe e esposa, além de fazer campanhas de toda sorte (moda, educação,
congressos, ligas, cruzadas pró-saúde, festas). Dessa forma mostravam às jovens suas
impressões sobre o mundo, que muitas vezes destoavam do conservadorismo católico.
Chama-nos atenção os artigos produzidos por Maria Luiza FM. Esta usava as
iniciais FM na assinatura de suas crônicas para identificar-se como Filha de Maria. Tal
característica era comum entre os membros da militância católica, que levavam os valores e
dogmas do catolicismo à frente de suas atividades, dentro e fora da Igreja. Desde as
primeiras edições d‟O Horizonte, Maria Luiza FM produzia artigos em colunas variadas do
65
A ação das Filhas de Maria na propagação de periódicos católicos foi uma prática recorrente no
reformismo católico. Também em Pernambuco, as jovens do Recife eram responsáveis por angariar assinantes para o jornal católico A Tribuna. Sobre isso ver: AMARAL, Walter Valdevino do. Que fizeram ellas? As Filhas de Maria e a boa imprensa no Recife 1902-1922. Dissertação de Mestrado. Universidade Católica de Pernambuco, 2010.
66 AMARAL, Walter Valdevino do. Que fizeram ellas? As Filhas de Maria e a boa imprensa no
Recife 1902-1922. Dissertação de Mestrado. Universidade Católica de Pernambuco, 2010. 67
PEDRO, Joana Maria. Mulheres do Sul. In: DEL PRIORE, Mary (org.). História das Mulheres no
Brasil. São Paulo: Contexto, 2004. p. 278-321.
42
jornal. Em 28 de outubro de 1923, a convite do gerente do jornal, Lauro Wanderley, ela
assumiu oficialmente a coluna “Sociaes”.
Os textos escritos por Maria Luiza FM ressaltam a capacidade dessas mulheres
de mostrar sua devoção à imagem de Maria (imagem no sentindo mais amplo) e a vivência
dos dogmas católicos, ao mesmo tempo em que lidavam com as questões pujantes no
mundo moderno. Deixa entrever que antes de tudo, eram mulheres modernas, cultas e
leitoras ávidas.
A devoção à Imaculada Conceição é ressaltada no artigo, Imacullada Conceição,
Fomos três boas amiguinhas dar um passeio a um ponto bem alto, de onde nos foi dado contemplarmos toda Belo Horizonte. Assim também assentada a minha mesinha, relanço os olhos de minha imaginação feminina, assim de fixar um assumpto para minha croniqueta de hoje: entretanto alguma cousa mais alta, mais alevantadora, esta a encadearme-me a fantasia irriqueta – é a Imaculada Conceição. Sinto-me porém, inteiramente feliz por ser obrigada a, bom grado meu, tratar hoje daquela que as gerações tem chamado bem aventurada. Aliaz eu quero destarte cumprir um duplo dever de muita gratidão, nesse dia solene, eu disse porém que minha gratidão a Maria é dupla. E verdade porquanto livremente eu me fiz Filha de Maria, a quem desde então, de modo especial considero minha mãe. É pois, mais um laço de gratidão que me prende a Ella. Bem sei que desta nossa relação que nos liga a nós, Filhas de Maria, provem naturalmente novos deveres, de que o nosso manual fala longamente. Entretanto eu temo que o pó do século tenha pousado em minha alma manchando-a (...). Mas minha doce e incomparável mãe, remetto todos os meus defeitos, todas as faltas de filha leviana e desatentada, para o pé do trono de vossa bondade. E si, mãe bondosa heis castigar-me, castigai-me, mas com a vossa misericórdia maternal
68.
A Imaculada Conceição de Maria é um dogma católico definido no século XIX,
que gira em torno da crença de que a Virgem Maria foi preservada do pecado original. As
FM estavam sobre o patrocínio da santa. A devoção à Imaculada Conceição se via
aumentada em Belo Horizonte, já que sua festa litúrgica é celebrada em 8 de dezembro, dia
do aniversário da cidade, sendo, portanto, a sua padroeira.
Fica claro na narrativa citada, o respeito, o desejo de se assemelhar à santa e
sua escolha por ser membro da associação. A autora mostra também certa indulgência e
reconhecimento de suas faltas. Podemos conjecturar que a afirmação, “temo que o pó do
século tenha manchado a minha alma”, refere-se às suas aspirações femininas mais
modernas, práticas que a distanciava do rigor e dogmatismo expresso no manual que devia
seguir.
Para Louro, através do símbolo mariano, apoiava-se a missão da maternidade e
manutenção da pureza feminina. Segundo a autora “esse ideal feminino implicava o recato e
68
O Horizonte 08/12/23
43
o pudor, a busca constante de uma perfeição moral, a aceitação de sacrifício, a ação
educadora dos filhos e filhas”69 e apontava para as mulheres a dicotomia entre Eva e Maria.
De acordo com Perrot70, a exaltação da diferença do feminino e sua aproximação
à figura da Virgem Maria resultaram, dentre outras coisas, na formação de uma consciência
de gênero e, com isso, um feminismo cristão, às vezes missionário e combativo, baseado na
promoção dos valores femininos como forma de salvação.
No artigo intitulado “Lições das Rosas”, Maria Luiza FM evidencia alguns
aspectos da rotina das FM,
Olavo Bilac sabia ouvir as estrelas. Quanto a mim, eu desejava ouvir as harmonias das orbes celestes, como as ouvia certo personagem creado por Shakespare. E que delícia não fora ouvir e comprehender tais harmonias”. Em compensação, terça-feira desta semana, foi me dado ouvir lição das rosas imaculadas que ornam encantadoramente o humilde jardim da casa que eu e mamãe moramos. Eu voltava do Colégio Santa Maria onde tenho a felicidade de comungar frequentemente. Foi uma manhã que se podia chamar perfeitamente formosa, temperatura amena, leve brisa agradabilíssima, e luz, muita luz matinal. Tive a impressão de que a natureza, entre os trymphos da luz, vestira suas melhores galas, para a festa da vida universal. Antes de entrar em casa, senti tanto desejo de visitar minhas queridas amigas – as lindas rosas imaculadas. Naquela manhã encontrei três que esplendiam e sorriam felizes. Animando-as com caricias, sorvi-lhes o perfume e sandei-as com as palavras de A. Herculano
71 dizendo,
É da campina da virgem. A pandibunda flor. Em seus eflúvios matina brisa. Bebe o primeiro amor. O Sol inunda as veigas. Calou-se o rouxinol. E a flor, ébria de glória à luz fervente. Desabrochou-a o sol.
Pareceu-me que ellas me sorriram outra vez, para me significarem sua fidalga gratidão. Mas não sei por que motivo ali me deixei ficar queda mais algum tempo, como enamorada das rosas. Foi um bem, porque entre elas e mim houve, pois uma hora de pensamentos que muito me aproveitaram o espírito, sim as rosas me fizeram linda preleção, que sinto não poder traduzir em minha pobre linguagem. Entretanto eu recomendava as minhas colegas, que de vez em quando fossem ouvir as lições que as rosas imaculladas costumavam dar. (...) Pela sua alvura ensinaram-me que a Filha de Maria há mister ser pura, apoiada na modéstia e amparada pela
69
LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: DEL PRIORI, Mary. (Org.). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997. p. 447.
70PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história. Bauru, São Paulo: Edusc, 2005.
PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. São Paulo: Contexto, 2007. 71
Alexandre Herculano de Carvalho (1810-1877), filósofo e romancista português. Familiarizado com
o meio social que cultivava ideias liberais, Herculano era católico e fundamentava suas ideias morais na religiosidade. Produziu vários ensaios reflexivos sobre a necessidade de reconstrução moral da sociedade portuguesa. Ver: BARROSO, Marco Antônio. Confluências e divergências na ética romântica de Alexandre Herculano e José de Alencar. Ibérica – Revista Interdisciplinar de Estudos Ibéricos e Ibero-Americanos Vol. VI, n. 17, Juiz de Fora, ago./nov., 2011. p.57-70.
44
humildade. Oh! Detestar sempre e evitar tudo aquilo que pode ainda de leve, melindrar a pureza, que é pela pureza de sentimentos e pela elevação de pensamentos que as criaturas racionais se approximam da pureza eterna de Deus. Ellas olhavam para o alto. E dest‟arte disseram-me que, pisando a terra, a Filha de Maria deve ter saudade da pátria viva do céo – a me dizer, não se conquista sinão pelos sofrimentos, muitos sofrimentos, simbolizados pelos espinhos que estão numerosos nas hastes que nos sustentam. Folhas verdes, guarnecem-nos e nos ornam: elas significam a esperança que ainda estimula para a prática do bem no meio das agruras da vida. Que seria do homem sem o conforto divino da esperança formosamente celestial? Enquanto eu ouvia enlevada lição, tornei a contemplar as gottas. – Ella nos vieram do céo, responderam-me solicitas. E acaso não precisam as Filhas de Maria da graça abundante da misericórdia divina? Pode alguém viver a vida cristã, sem esse socorro do alto? E a luz que nos envolve e nos aquece, sobre symbolizar aquella outra luz que deve guiar as moças por entre os recifes da vida, afim de evitarem naufrágios, significa também o amor que há de prender o coração humano ao coração de Deus. (...) Assim é, cumpre produza a Filha de Maria o odor celestial das boas obras, esse odor que se eleva para além. Por mim ainda ficaria em alli ouvir as queridas amigas, cuja lição tanto bem me fez, mas lembrei-me de uma minha colega que estava passando mal. Precisava ir visitá-la
72 (...)
Nesse trecho, entrevê-se a boa formação e conhecimento de literatura da jovem.
Observa-se também que a terça-feira foi o dia destinado por ela ao cumprimento da reflexão
semanal imposta pelo regimento das FM73. Evidencia ainda a relação entre as associadas
para além das reuniões, criando uma rede de amizade, a prática de visita aos doentes e o
exercício da caridade. O reforço das virtudes, doçura, piedade, humildade, devoção e
comunhão, confirmam a importância de tais valores para as associadas e o reforço das
práticas caritativas.
As mulheres deveriam contribuir politicamente com a nação e com o Estado a
partir do lugar e das competências que lhes eram próprias ou „naturais‟. Assim, o apelo aos
sentimentos naturais das mulheres, como a bondade, a solidariedade e a sensibilidade com
o sofrimento alheio, era o que as encorajava a dar um passo além dos cuidados domésticos
e familiares, envolvendo-se com o trabalho assistencial junto às populações pobres e aos
necessitados.74
Os grupos de encontro serviam de espaços de diálogos para que as moças
católicas discutissem sobre os assuntos de toda sorte. Eram desses encontros que eram
criados os programas de atuação da associação. Nesse sentido, as associações de
caridade, as agremiações literárias e as reuniões internas de jornais e revistas femininas
72
O Horizonte 06/10/1923 73
Manual da União Pia das Filhas de Maria/traduzido pelo Cônego Dr. Ananias Correa do Amaral.
Porto: Livraria Católica Portuense, 1926. 74
MARTINS, Ana Paula Vosne. Gênero e Assistência: considerações histórico, conceituais sobre
práticas assistenciais. In: Revista História, Ciências, Saúde, Manguinhos. Vol. 18. Suplemento 1. Rio de Janeiro. Dez., 2011.
45
eram lugares de encontro e discussão de pautas relacionadas ao bem comum e a
interesses próprios do sexo feminino..75
O artigo de Maria Luiza FM intitulado Voto Feminino, elucida a efervescência
desses encontros,
No domingo de carnaval após as bênçãos do Santíssimo reunimo-nos em nossa humilde casa várias amigas. Ora, dizem que onde há mais de uma mulher, costuma haver muito parlatório e muita discussão. Si esta é a regra social, devo confessar com franqueza que lhe não abrimos excepção alguma, naquela tarde. Nossa alegre e familiar reunião confirmou-a plenamente. É possível que, de permeio, houvesse alguma futilidade. Pois não falta quem nos atire a nós, mulheres, a pecha de fúteis. (...) Pois bem, em phrases quentes e patrióticas comentamos aquelle telegrama que a Rainha da Bélgica (tão conhecida e sympatizada em Belo Horizonte) passou dia 29 do mez próximo findo, ao presidente de S. Paulo a propósito do concerto realizado em Bruxellas, pela senhorita Lucia Branco da Silva. E tão entusiasmada ainda estou com o triumpho a artista brasileira, que não posso deixar de trasncrever aqui aquele despacho telegráfico. “Sinto-me feliz aos vos dirigir as minhas felicitações, na ocasião do concerto dado pela senhorita Branco da Silva, (...) o qual apreciei immensamente o talento da vossa compatriota. Sim! A mulher brasileira tem tido seus belos expoentes em todos os departamentos da cultura feminina. Claro está que feminista como sou, minha alma vibra intensamente quando uma brasileira, honra assim, gloriosamente, nosso sexo”
76(...).
O artigo segue com Maria Luiza FM contando que ela e as amigas trocaram ao
longo da tarde várias ideias e impressões, até que a “leader do feminismo” na reunião se
referiu também ao telegrama vindo de Londres, no qual anunciava ter feito um discurso a
favor do projeto de lei que dava direito de voto às mulheres maiores de 21 anos. Maria Luiza
afirma que todas as amigas presentes na reunião, exceto ela, entenderam que a mulher
brasileira devia alcançar o mesmo direito. Conta que seu posicionamento gerou uma
discussão acalorada. Foi censurada, sem a possibilidade de se justificar e aproveitou o
espaço do artigo para a réplica,
Não sou contrária ao direito do voto feminino. Antes abraço todas as idéias do Mosenhor Spalding, contidas no seu excelente trabalho. La haute éducation de La femme. E espero que mais cedo ou mais tarde, teremos todas o direito de votar. Entretanto, sou da opinião que, enquanto a democracia brasileira for o que vemos por ahi além, nenhuma mulher poderia, sem perder bastante dignidade, levar uma cédula a urna. Porque, inimiga intransigente da hypocrisia, não me conformo, nem jamais, me conformarei com essa revoltante zombaria que se faz actualmente, da vontade popular.
77
75
MOTT, Maria Lúcia. Maternalismo, políticas públicas e benemerência no Brasil (1930-1945).
Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudo de Gênero – Pagu/Unicamp n.16 p.199-234, 2001.
76 O Horizonte, 08/03/1924.
77 O Horizonte, 08/03/1924.
46
O artigo dá nuances da presença marcante das questões femininas (feministas),
na ordem do dia das jovens mineiras. Também evidencia como a questão do sufrágio
promovia grandes discussões, mostrando ainda a articulação das mulheres aos movimentos
feministas pelo mundo e a ciência sobre os acontecimentos internacionais.
Chama atenção o fato de que no texto, Maria Luiza se autointitula feminista,
apesar de toda reserva que o editorial tinha com o termo. Toda vez que utilizavam a palavra
feminismo no jornal, procuravam torná-la mais suave, “o bom feminismo”, “o verdadeiro
feminismo”, “feminismo católico”. Explica Cova que esse fato era comum nas associações
femininas do período, quando a expressão era mal conotada e desacreditada. As mulheres
receavam serem rejeitadas e queriam se distanciar de movimentos sufragistas mais
radicais. Tendiam sempre a transmitir um feminismo suave, não ligado às mulheres
masculinizadas.78 Maria Luiza, por sua vez, não temia essa associação.
Questionando alguns padrões impostos às mulheres, Maria Luiza FM, apresenta
a crônica, “A mulher e o footbal”:
É a epigrafe de um artigo publicado no Diário de Minas, de sábado passado. Li-o com a avidez de quem deseja observar quadros de uma exposição organizada por pintor de nomeada. Porque todos os assuntos que dizem respeito aos interesses femininos, me chama fascinadoramente atenção.
Quer isto dizer que não me resigno a o quietismo das mulheres que aceitam a teoria dos que afirmam ser nosso destino único o ménage. Ainda bem que homens do valor de um Spalding, Bispo cathólico norte-americano, já nos fazem justiça. Assim o illustre Antistite teve coragem de chamar em seu livro l‟Education Supérieure dês femmes, velho preconceito a crença absurda que a mulher é inferior ao homem no ponto de vista intelectual e physico. Não há vida nobre nem trabalho útil, não entre na esphera da vida da mulher, é uma afirmação que elle ilustra com ótimos argumentos. Claro está, porém, que nossa missão na terra nos criou uma esphera bem distinta. Entretanto essa esfera não é a escravização, inferioridade. Podemos fazer concorrências aos homens em muitos departamentos da actividade humana. Temos como elles o directo de viver e procurar nosso aperfeiçoamento. Nossa Victoria embora demorada há de ser uma realidade. Mas pra sermos iguaes aos homens devemos cultivar o desporto do football? (...) Enquanto, porém não me provarem que o football é uma manifestação de superioridade masculina, responderei negativamente aquella pergunta. Quereis as provas de minha these? O football é um desporto violento, ou melhor violentíssimo. É a impressão que tenho que todas as vezes que assisto a matches. É preciso acrescentar a observação do ilustre higienista Afrânio Peixoto, o qual falando do football, lembra que o desporto por causa dos inconvenientes por excesso, é proibido ou comedido em algumas universidade americanas. (...) Há vários exercícios corporais que podemos e devemos praticar. Muller aconselha a corrida que
78
COVA, Anne. O associativismo das mulheres. Uma abordagem comparativa: França e Portugal
(1900-1918). In: SERRÃO, José Vicente et al. (orgs.) Desenvolvimento Econômico e Mudança Social: Portugal nos últimos dois séculos. Lisboa: ICS Imprensa de Ciências Sociais. 2009, p. 333-348.
47
é o exercício que melhor fortalece e conserva a saúde. Tem sobre qualquer outra a vantagem de fortificar principalmente, não apenas um grupo de músculos, mas os pulmões e o coração, e de acelerar a digestão e a secreção cutânea. Longos passeios a pé fazem muito bem. Mas... como andar muito a pé si o calçado Luiz XV, que a moda nos impôs, no-lo impede? Lá se foi o espartilho, mas ficou-nos outra tortura. Quanto é para desejar, pois, que nós nos vamos, a pouco a pouco, libertando de certas dictaduras da moda. Antes de tudo sejamos racionaes não nos submetamos a essas copias servis das extravagâncias, que nos vem dos Estados Unidos, ora da França. Em Conclusão penso que o football não poderá ser o desporto da mulher
79.
A motivação do texto origina-se da leitura de um artigo publicado no jornal O
Diário de Minas, cujo autor comenta a (im)pertinência das mulheres praticarem o futebol.
Maria Luiza FM explicita sua atenção para todos os assuntos femininos, mostra-se atenta à
leitura de outros jornais e pontua questões importantes sobre os papéis sociais femininos.
Menciona sobre bons hábitos de higiene e saúde e critica a ditadura das modas parisienses
e americanas.
A jovem mostra indignação diante da postura de algumas mulheres que aceitam
o trabalho doméstico como única possibilidade. Para a autora, a mulher poderia concorrer
em pé de igualdade com os homens em muitos segmentos da vida pública. A opinião de
Maria Luiza FM contraria a orientação católica, na qual a mulher era educada para ser a
rainha do lar, sendo que o trabalho deveria ser exercido sem o afastamento da vida familiar
e dos deveres domésticos.80 No próprio jornal há uma série de artigos escritos por mulheres
que ressaltam a maternidade e o cuidado com o lar, papéis mais sublimes ao sexo feminino,
não sendo compatível com outras funções.
O espírito de sacrifício e doação era outro adjetivo caro às FM. Devido à ligação
com as irmãs vicentinas, elas viam a prática da caridade como exemplo a ser seguido. No
artigo, “Lembrança Pungente”, Maria Luiza relata a experiência de visitar uma família pobre,
juntamente com uma senhora de caridade. Assim ela narra,
Uma senhora de caridade, muito amiga minha pediu-me certa vez que a acompanhasse a uma visita que precisava fazer a uma família pobre, socorrida pela benemérita associação cristã. Lá fomos. A distância não era pequena. De caminho acretamos, entretanto de aproximar-mos de um casebre, e através da porta aberta vindo uma criança de uns sete anos, muito desfeita, pallida, coberta de andrajos. Detivemos o passo. Falamos a desventurada menina, que entre admirada e interrogativa nos disse que sua mãe estava dormindo desde cedo. Era meio dia suspeitando, porém tratar-se de uma doença, entramos e o que vimos? Oh! Um quadro desolador uma mulher cahida ao chão dormia profundamente, causado por
79
O Horizonte 15/08/23. 80
LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: DEL PRIORI, Mary (org.) História das
Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997.
48
embriaguez alcoólica. A cozinha muito pequena anunciava estrema pobreza, nem sinal de fogo no fogão. A caridosa ofereceu pão e queijo
81 (...)
Suas qualidades naturais e morais habilitavam as FM para a maternidade e as
tarefas domésticas, mas também se esperava, tanto do ponto de vista da religião quanto da
filosofia moral, que essas qualidades fossem estendidas para os outros, para aqueles que
sofriam e que precisavam de cuidados. As mulheres, particularmente as mães e as crianças,
recebiam maior atenção das benemerentes. As visitas domiciliares serviam para conhecer a
realidade dos assistidos e orientar uma ação mais eficiente. De acordo com Souza, a maior
parte das mulheres assistidas pelas caridosas eram mulheres solteiras ou viúvas, chefes de
família que não sabiam ler, nem escrever.82
Vê-se também o discurso de combate a todo o tipo de vício. Aos olhos das
classes médias a multidão urbana aparecia como desorganizada e selvagem. As teorias
bacteriológicas e de proliferação das doenças infecciosas reforçavam a suspeita do caráter
insalubre das promiscuidades de todo o tipo.83 A caridade e a assistência social, nesse
sentido, tinham o objetivo de educar e mudar o comportamento dos assistidos.84 O trecho
acima citado evidencia também a relação entre a mulher de elite e a mulher pobre, marcada
pela solidariedade e pela hierarquia.
Com a crescente participação feminina no trabalho benemerente e sua
associação com o lugar de gênero das mulheres formulado pela ideologia da domesticidade,
a filantropia passou a ser associada à feminilidade, até ser considerada uma atividade
feminina. Portanto, é a partir de uma política de gênero que excluiu as mulheres do mundo
público que se definiu a assistência como um trabalho feminino, que não atentaria contra a
moral e a virtude das mulheres.85
Segundo Martins86, muitas personagens femininas de romances se dedicavam à
filantropia e eram geralmente descritas como mulheres de elevada moral, sensíveis ao
sofrimento alheio, bondosas e solidárias. Eram exemplos de como as mulheres podiam e
até mesmo deviam se ocupar dos outros para encontrar, quiçá, a felicidade que não
81
O Horizonte 15/12/1923. 82
SOUZA, Marco Antônio. A economia da caridade: estratégias assistências e filantrópicas em Belo
Horizonte. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004. p. 82. Dados retirados do Livro do Conselho Metropolitano da Sociedade São Vicente de Paulo.
83PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história/Michelle Perrot; tradução Viviane
Ribeiro. Bauru, São Paulo: EDUSC, 2005. 84
SOUZA. As estratégias da pedagogia do assistencialismo em Belo Horizonte, 1930-1990:
educação e caridade. Tese de Doutorado. Universidade Federal de Minas Gerais, 2001. 85
MARTINS, Ana Paula Vosne. A feminilização da filantropia. Revista Gênero. Niterói. V.15 n.2,
2015. p.13-28. 86
MARTINS, Ana Paula Vosne. Gênero e Assistência: considerações histórico, conceituais
sobre práticas assistenciais. In: Revista História, Ciências, Saúde, Manguinhos. Vol 18. Suplemento 1. Rio de Janeiro. Dez., 2011.
49
encontravam em suas vidas afetivas. Tal construção feminina da assistência e dos cuidados
representava, igualmente, uma ampliação da maternidade para aquelas que não foram
mães porque permaneceram solteiras. Dessa forma, mesmo que as mulheres passassem a
exercer uma função cada vez mais pública por meio da filantropia, ela não era antitética à
ideologia da domesticidade, pois se fundamentava na ideia de complementaridade e de
extensão da maternidade e das qualidades então consideradas femininas para o mundo
exterior à casa e à família.87
No artigo, “Voto Edificante”, Maria Luiza ressalta a importância dos trabalhos
desempenhados pelas irmãs de caridade nos hospitais. Na ausência de um sistema de
saúde pública, o concurso da filantropia era fundamental para que as ideias defendidas pelo
discurso científico fossem colocadas em prática.88 Outro tema recorrente nos textos de
Maria Luiza FM era a questão das novas modas destinadas às mulheres, tema que ela
tratava com certo desdém. Ela conta que uma amiga havia lhe enviado o recorte de um
artigo publicado no Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro, intitulado “Elegâncias” e assinado
E.R,
Nesse artigo eu vejo, á tona a discussão, aliaz futilissima, a questão de andarem as mulheres com cabellos cortados. Mas devo confessar com franqueza que ahi se me depara uma face muito interessante dessa questão, ou antes uma conseqüência dessa moda ditadora, como infelizmente o são todas as modas femininas (...). Argumenta o articulista que as mulheres que cortam o cabelo curto ficarão calvas em breve tempo.
89
Ela segue o texto afirmando que considera isso uma bobagem, afirma ser essa
constatação um uso equivocado dos conhecimentos científicos e termina o texto afirmando
que “um homem que cultiva futilidades é um animal de cabelos curtos e de ideias mais
curtas ainda!”
Ainda sobre a moda dos cabelos “a la garçone” e modas femininas, em
29/03/1924, Maria Luiza FM recebeu dos editores do jornal a encomenda de uma nota que
comentasse a publicação de um artigo da seção Crônica Social, do jornal Diário de Minas. O
autor do artigo, nomeado como “Sr. X”, condenava veementemente as modas femininas
parisienses. O autor criticava os calçados, vestidos e os cortes de cabelo, apontava tais
modas como um atentado à saúde, à moral e ao bom senso das mulheres brasileiras.
87
MARTINS, Ana Paula Vosne. Gênero e Assistência: considerações histórico, conceituais
sobre práticas assistenciais. In: Revista História, Ciências, Saúde, Manguinhos. Vol 18. Suplemento 1. Rio de Janeiro. Dez., 2011.
88SOUZA. As estratégias da pedagogia do assistencialismo em Belo Horizonte, 1930-1990:
educação e caridade. Tese de Doutorado. Universidade Federal de Minas Gerais, 2001. 89
O Horizonte 4/05/24 - Cabelos aparados e Calvície
50
Maria Luiza FM, por sua vez, discorre que ao receber a encomenda e ao ler o
artigo do “Sr. X”, concordava em certa medida com as impressões do autor, mas confessa
que ao final da tarde, ao conversar com uma amiga, chegou à conclusão que a postura do
“Sr. X” era tão radical quanto as das mulheres que seguiam piamente as modas parisienses.
Assim, Maria Luiza FM, em protesto aos radicalismos da moda e do “Sr. X”, deu o seguinte
título ao seu artigo: “Não sejamos escravas”. No encerramento do texto mencionou que
“todas as mulheres devem ser radicaes, mandando cortar os cabellos à escovinha (...) Eu de
mim não mandarei resposta alguma ao “Sr. X”; mas si houver logar para a opinião de minha
querida amiga, Ella ahi está”.90
Segundo Mott, “escrava” era uma metáfora encontrada frequentemente em
meados do século XIX, escrita por mulheres para elucidar sua condição de “escrava”, na
grande batalha pelo fim da tirania a que eram submetidas pelos maridos, pais e irmãos. O
que mais uma vez reforça o argumento de que as mulheres ligadas ao associativismo
católico não utilizavam esse espaço apenas para a devoção e não eram dadas cegamente
ao discurso conservador presente nos regimentos católicos. Pelo contrário, usavam os
espaços a elas concedidos para colocar em prática suas ideias e valores.
Na edição comemorativa do primeiro ano de existência do periódico, Maria Luiza
FM dava a entender que seu lugar de fala era desconfortável, sugerindo inclusive que não
permaneceria no jornal por muito tempo. Em tom de despedida, publica o artigo “Sombra
Esbatida”:
Pois bem, o Horizonte é uma obra prima, que pinceis manejados por mãos que cultivam o bello, estam pintando todas as semanas. E aquele é uma obra artistica e bem acabada, dizem todos os entendidos. Era conveniente, pois, que aqui houvesse sombra, cujo o efeito fosse igual, a que tem os quadros celebres. Mas, sombra esbatida, quanto não me sinto feliz por poder prestar assim o meu apagado concurso a esta obra essencialmente patriótica. E si me fora licito nesse dia de festa, confessar um pesar, eu diria, com a sinceridade de uma Filha de Maria, que o sentimento que me ralla, é saber certamente que minha inteligência está aquém, muito aquém de minha grande boa vontade. Afirmo, todavia que me consolo com o pensamento de que O Horizonte deve sempre ter sombras esbatidas
91.
A participação de Maria Luiza FM na redação do jornal O Horizonte evidencia
que ela soube se apossar do espaço que lhe foi confiado e desenvolveu sua influência. Foi
capaz de sair moralmente dos papéis designados, construindo e divulgando suas opiniões,
passando muitas vezes da sujeição à independência92. Evidencia, sobretudo, que apesar
90
O Horizonte 29/03/1924 – Não sejamos escravas 91
O Horizonte 08/04/1924 – Sombra esbatida 92
PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história; tradução Viviane Ribeiro. Bauru,
São Paulo: EDUSC, 2005.
51
das rígidas determinações impostas às FM, ela era uma mulher moderna, bem-educada e
atenta aos diversos acontecimentos no mundo, além de denotar a preocupação com a
assistência social.
A coluna ficou sob a responsabilidade de Maria Luiza FM até o dia 11 de junho
de 1924, tendo ela produzido mais de 40 crônicas no periódico93. Nessa edição a autora se
despede, segundo ela, de seus poucos leitores, da seguinte maneira,
porque os meus reduzidos leitores, libertados do não leve jugo de umas crônicas desenxabidas, escritas por uma mulher que só tem o mérito de querer ser útil a causa social da boa imprensa, póderão respirar desafogados e, sobretudo terão o agradável prazer de ter páginas de graças e sempre instrutivas (...)
94
Ao final do artigo, mostra-se feliz por ser substituída por dois jovens talentosos e
que deixaria o país com a certeza de que contribuíra para um jornal de importante valor para
a nação.
Escolhemos os artigos produzidos por Maria Luiza FM para discutir a associação
das Filhas de Maria, por entender que o conteúdo dos seus textos evidencia a variedade de
assuntos que interessava o universo feminino naquele período. Embora fosse uma
frequentadora assídua da associação e utilizasse a militância católica em todos os âmbitos
de sua vida, Maria Luiza não se prendia aos padrões conservadores ditados pelos estatutos
das FM. Ao contrário disso, ela tinha uma postura de conciliação, enfrentamento e
negociação dos valores católicos mais conservadores com suas ideias, posições sobre o
mundo e sua maneira de compreender e viver a modernidade.
1.4.2 Mães Cristãs
A Associação das Mães Cristãs foi uma das variadas iniciativas da Igreja
Católica em influenciar a maternidade nos aspectos morais e higiênicos. Tinha como
93
A mulher e o football; Folhas que caíram; Manhãs de Chuva; Saudades e Esperanças; Heroísmo
de Mãe; Aurora e Ocaso; Gloria Mineira que Surge; Imacullada Conceição; Lições das Rosas; Lembrança Pungente; Piedade da Família; Papa e Noel; Exemplo Notável; Ano Novo; Sabedoria Antiga; Estão falando que ...; O Cruzeiro do Auto; Porque; Dois Poemas; Lourdes; Relíquia que Desaparece; Carnaval; Voto Feminino; Princesa Repudiada; Voto Edificante; Não Sejamos Escravas; Sombra Esbatida; Mulher Turca; Símbolo Elouquente; Cigarra Descuidosa; Noite de abril; Estrela da Manhã; Santa Virgem das Virgens; Mãe admirável; Mãe do Salvador; Causa da Nossa Alegria; Rosa Mística; Socorredora dos Aflitos; Rainha da Paz; Porta do Ceo; Cabelos Aparados e Calvice; Exploração e Caridade; e Boas Novas.
94 O Horizonte 08/04/1924 – Sombra esbatida
52
objetivos “realizar maravilhosas transformações na organização escolar em todos os
departamentos de ensino público e privado e instruir as senhoras católicas a serem fiéis
esposas aos seus maridos, a verdadeira rainha do lar.95
A fundação oficial da Associação das Mães Cristãs em Belo Horizonte ocorreu
em 13 de março de 1928, em um Retiro realizado no Colégio Sagrado Coração de Jesus,
com missa solene na capela do colégio. As reuniões das Mães Cristãs ocorriam no terceiro
domingo do mês, na Capela do Colégio Sagrado Coração de Jesus, após a missa.96 O
Estatuto da associação foi elaborado por Anna Cintra, Coleta Lanari e Maria Luiza de
Almeida Cunha, todas lideranças do associativismo católico.97
A associação era constituída por dois membros eclesiásticos - D. Cabral (diretor)
e Padre Affonso (vice-diretor) - e pelas leigas, D. Maria Coleta Lanari (presidente), Clarinda
Proença Costa Sigaud (vice-presidente), Ana Mesquita Assunção (tesoureira), D. Leonidia
Leite, D. Antonieta Souza Silva, D. Epaminondas Pires, D. Cecília de Freitas e Maria Luiza
de Almeida Cunha (conselheiras).98
As líderes da Associação Mães Cristãs desempenhavam atividades em
instituições filantrópicas dedicadas à infância e às mulheres pobres, como por exemplo as
creches Menino Jesus, Bom Pastor e Santa Casa de Misericórdia. Todas possuíam o curso
normal e a presidente da associação, Maria Coleta Lanari, além de normalista era
enfermeira do Curso Anexo da Cruz Vermelha da EECC. Como é possível observar, tinham
uma formação sólida nas áreas de educação, saúde, higiene e puericultura, estando
habilitadas a cumprir o papel de instruir as mães pobres e as crianças.
Já a vice-presidente, a senhora Clarinda, pertencia à família Sigaud, conhecida
por suas ações filantrópicas na cidade. Tudo indica que Clarinda era esposa do
ginecologista Eugênio Sigaud. Também da família, destaca-se Cléa Costa Sigaud, que
trabalhava na diretoria de Educação e Saúde, validando pedidos de ingresso no curso de
enfermagem da EECC. D. Alice Sigaud, mãe do ginecologista, havia negociado com ele a
concessão de cartões de encaminhamento para consultas gratuitas para enfermos carentes.
Em seu consultório, Eugênio Sigaud atendia senhoras grávidas para tratamento pré-natal e
fazia exames pré-nupciais para homens. Os anúncios de seus serviços no jornal O
Horizonte destacavam que os exames pré-nupciais eram fundamentais para garantir a
saúde da geração por vir, delineando os métodos da eugenia em sua prática médica.
Eugênio Sigaud procurava orientar sobre doenças venéreas, especialmente a sífilis, além de
95
VIEIRA, Dilermando Ramos. O processo de reforma e reorganização da igreja no Brasil (1984-
1926). Aparecida: São Paulo: Editora Santuário, 2007. 96
O Horizonte 28/11/1928. 97
O Horizonte 21/3/1928. 98
O Horizonte 21/03/1928.
53
orientar as mulheres sobre os conhecimentos de puericultura e tratamento para doenças
urinárias. Na sua clínica dispunha de laboratório de análises (urina, sangue, pus, escarros,
fezes e suco gástrico) e serviços de Raio-X. Ressaltava com frequência a presença de
profissionais qualificados e de enfermeiras. Essas últimas eram destacadas especialmente
no atendimento de mulheres.99
Da iniciativa caritativa da clínica Sigaud em atender gratuitamente os pobres,
realçamos o fato deste atendimento partir da recomendação da mãe do médico, senhora
engajada na militância católica. Isso reforça o argumento de Diebolt100 sobre a importância
das mulheres para organizar campanhas e convencer os médicos do trabalho caritativo, já
que muitas vezes eles se mostravam indiferentes aos problemas sociais.
Para D. Cabral, a Associação das Mães Cristãs procurava a santificação de uma
das maiores responsabilidades que tinha a mulher na formação da sociedade, a de ser mãe.
Accati101 afirma existir nesse período dois tipos de mães: a mãe política e a mãe cristã. A
mãe cristã representava a fertilidade, a maternidade e a natureza. Ela seria um instrumento
de Deus. Já a mãe política trazia para o plano terreno sua superioridade espiritual e
contribuía para a Igreja Católica, materializando o poder divino sobre o soberano.
Entendemos a criação da Associação das Mães Cristãs na capital mineira como
uma parceria entre a Igreja e o Estado. D. Cabral, através dessa associação, buscava
incentivar as mulheres católicas a ocuparem o quadro da Associação das Mães de Família,
a agremiação instituída pelo Presidente do Estado, Mello Vianna, na Reforma Educacional
de 1925. Acreditamos que a estratégia era criar um contingente atuante de mães católicas
nas escolas primárias de Minas Gerais. Essa intenção é notória, pois desde 1923, antes
mesmo da criação da Associação das Mães de Família, D. Cabral redigia cartas pastorais
convocando as mães católicas a atuarem em forma de associações nas escolas. Até pelo
menos os anos 1930, a maior preocupação da Igreja Católica era manter o controle sobre o
ensino primário, incutir nas crianças os valores morais, mas também atributos ligados à
higiene, alimentação, civilidade e orientação para o trabalho.
D. Cabral, interessado em constituir um grupo de mães católicas atuantes nas
escolas primárias mineiras, direcionava várias cartas pastorais, convocando e orientando a
ação das mulheres associadas às Mães Cristãs,
99
O Horizonte 25/5/1927 e 3/09/1927. 100
DIEBOLT, Evelyne. História do Trabalho Social: nascimento e expansão do setor associativo sanitário e social (França, 1901-2001). In: Estudos Feministas, Florianópolis, 13 (2): 256 maio-agosto, 2005.
101 ACCATI, Luisa. Hiza omnipotentes y madres peligosas. El modelo católico y mediterraneo. In
MORANT, Isabel (dir.). História de lasmujeres em Espana y América Latina Tomo II. Madri: Editora Catédra, 2005.
54
Uma obra que merece benévola e acurada atenção do nosso clero pela sua natureza transcendência e intuitos práticos, é a Associação das Mães Cristãs ensina que a criança é herdeira do céu, onde nada poluído pode entrar e irmã dos anjos que contemplam a face de Deus, e um ser de tal sorte sagrado, que não se lhe poderá causar dano sem ficar incurso nas mais sensíveis maldições. São Mateus, Cap. X, 24 – Cap. XVII, 10 v. 16. E por Deus que a família possui as crianças (Geneses, Cap. IV, 1). Configurada à semelhança carnal de seus pais a criança deve receber em sua alma impressão da fé, das virtudes, das esperanças e o sêlo da divina graça (...). È pois, incumbência inalienável da família zelar pela educação dos filhos e orientá-los do (???) em que possam assumir a direção de seus próprios e augustos destinos
102
D. Cabral segue a carta, afirmando que “esta delicada e sublime missão” deve
ser exercida na escola de forma complementar. A escola seria a continuação do lar e os
professores não poderiam desvirtuar, nem trair as tradições da família católica mineira. O
arcebispo parabenizava a ação do presidente do estado, Mello Vianna e entendia que a
medida de convocar as mães mineiras para que tutelassem e inspecionassem a escola
pública garantia que não fossem profanadas as consciências na sua sagrada missão
educativa.
Apesar da presença do catolicismo nas escolas públicas de Belo Horizonte, dada
a preferência católica dos mineiros e o fato da maior parte das normalistas terem sido
formadas em escolas secundárias católicas, o ensino religioso acontecia na escola de
maneira extraoficial e havia um crescimento das escolas protestantes. Temendo esse
crescimento, D. Cabral apostava na ação das mães católicas nas escolas públicas e
privadas para a manutenção dos valores católicos e da família cristã. Além da manutenção
dos valores católicos, ele acreditava que a presença das mães nas escolas era um meio de
propagar “argumentos religiosos e higienistas que responsabilizavam a mulher pela
manutenção de uma família saudável, no sentido mais amplo do termo”.103
Vale ressaltar que, na ocasião da Reforma Mello Vianna (1925), houve um forte
diálogo entre o Estado e a Igreja Católica, sobretudo no campo da educação e da saúde.
Nesse período, Lúcio dos Santos, grande nome da militância católica em Minas Gerais,
ocupava o cargo de diretor da Instrução Pública.104
A criação da Associação das Mães de Família foi mencionada nos artigos 82 e
94 da Reforma Educacional Mello Vianna (1925). Segundo Borges, ao convocar a
participação ativa das mães na educação mineira, o governo tinha como objetivos a
102
Resoluções em 29/05/1923 p. 36. Arquidiocese de Belo Horizonte. 103
LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: História das Mulheres no Brasil. Mary Del
Priori (org.) Carla Bassanezi (coord.). 2 Ed. São Paulo Contexto, 1997.p. 452 104
VALENTE, Polyana Aparecida. Intelectuais Católicos, saúde e educação em Minas Gerais.
Dissertação de Mestrado em História das Ciências e da Saúde. Fundação Oswaldo Cruz/ Casa de Oswaldo Cruz, 2010.
55
correção dos defeitos dos filhos, a possibilidade de manter a professora informada dos
avanços e retrocessos da aprendizagem dos alunos e contribuir para a educação moral dos
mesmos. Pretendia-se, também, que as mães mais abastadas e instruídas auxiliassem as
mães que não tiveram oportunidade de estudar, estabelecendo dessa maneira a
cooperação e harmonia social.105
A Reforma Mello Vianna e a ênfase dada à participação das mães na escola
passam pelo pressuposto de que o ambiente escolar era um instrumento de reforma social.
O discurso maternalista, sobretudo ao que se refere à higiene e à alimentação, identifica a
mulher como a responsável por garantir a ordem no lar. A mulher devia zelar para que a
família incorporasse cada vez mais referências escolares para gerir o mundo doméstico e a
educação dos filhos. A máxima era: não basta amar seus filhos, uma boa mãe deve
conhecer e compreender as necessidades infantis.106
Em artigo publicado na Revista do Ensino, em 08/03/1925, Alceu Novaes explica
que as Associações das Mães de Família geravam, na Europa e nos Estados Unidos,
iniciativas “extraordinárias”107 para a solução dos problemas da educação física, moral e
intelectual, sendo, portanto, um modelo a ser seguido.108 Além da cooperação entre
professoras e mães, o autor aponta outra função da Associação das Mães de Família: a de
reunir as mães pobres e ricas para discutirem sobre as questões palpitantes do ensino e da
educação para que as mães cultas esclarecessem aquelas que não tinham estudo, tornando
as associações um “esteio da sociedade e da ordem”.109 Atrás do desejo de convivência
desses dois grupos de mulheres (ricas e pobres), o objetivo era transformar os hábitos das
mulheres pobres e, consequentemente, restaurar suas famílias deterioradas, combatendo o
alcoolismo dos maridos e a vadiagem das crianças..110
Em relatório ao Congresso Mineiro, Mello Vianna afirma que as Mães de Família
forneciam sopa e leite aos pobres, ajudavam na seleção de filmes a serem exibidos nas
escolas e, em reuniões mensais, discutiam com as diretoras questões relativas à educação
de seus filhos.111
105
BORGES, Vera Lúcia Abrão. A ideologia do caráter nacional da educação em Minas Gerais
(1925-1929). Tese de doutorado em Educação. Campinas: Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas, 1993.
106 PEIXOTO, Ana Maria Casasanta. A luta dos católicos pela escola. Minas Gerais, ano 1930.
Educação em Revista. Belo Horizonte. nº.17 jun.1993. p. 56-63. 107
Dentre essas iniciativas estavam o fornecimento de lanche nas escolas, a organização de clubes literários e de saúde, aulas de reforço para alunos com dificuldade de aprendizagem e o estabelecimento de parcerias com as professoras.
108 NOVAES. Associação das Mães. Revista do Ensino, 8/03/1925, p. 30-32.
109 NOVAES. Associação das Mães. Revista do Ensino, 8/03/1925, p. 31.
110 PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história. Bauru, São Paulo: Edusc, 2005.
111 VIANNA, Fernando de Mello. Mensagem do Presidente ao Congresso Mineiro, 1926.
56
Em artigo publicado no jornal O Horizonte, D. Cabral convoca as mães e ressalta
a medida do presidente do estado,
Às mães de família mineira. Mães de famílias cristãs células da sociedade doméstica e nacional fiadora da estabilidade da sociedade. Sobre a atitude de Mello Vianna em dirigir-se as mães de família mineira e tê-las como solução dos problemas é a instrução e a educação da infância. São elas as formadoras do caráter do cidadão. Missão social, nacional das mães – formar e consolidar a pátria formando hoje a luz das construtoras idéias de amanhã. O manacial mais puro das energias cívicas e das virtudes morais brota da educação do lar, pela palavra maternal. Essa educação que começa no lar deve ser continuada na escola. Duas coisas se conclue importância do ensino religioso na escola, mães devem valorizar e velar pela formação dos seus filhos. Que as mulheres ouçam o presidente
112
As mulheres eram encaradas como meio de reconquista da paz social.
Defendiam a idéia de que a educação moral era o remédio para todos os males da
sociedade moderna, por isso deviam as mulheres voltar-se para a educação da infância,
concedendo apoio moral e material. No campo material deviam organizar festas para manter
caixas escolares em prol das crianças pobres.
A Reforma Mello Vianna centrava-se na educação primária, cuja função
primordial era inserir a criança na sociedade, inculcando-lhe regras e valores tidos como
necessários e naturais.113 A preocupação estava em desenvolver, na primeira infância,
aptidões físicas e mentais da criança, mediante métodos pedagógicos aprovados e
adotados pelo Conselho de Instrução Pública. A escola pretendia dar continuidade à
educação iniciada na família e pelas mães, por isso era forte o desejo de firmar parcerias e
cooperação entre as famílias e as instituições de ensino.
Havia preferência pela contratação de normalistas que fossem solteiras ou
viúvas e sem filhos, sob o argumento de que a mulher, naturalmente, por dádiva divina,
tinha mais talento para o magistério. Ela compreendia melhor as necessidades das crianças
e, sendo solteira e sem filhos, podia se entregar à profissão e continuar a educação iniciada
no lar.
Nesse período, foi construída na capital a Escola Maternal Mello Vianna,
localizada no Barro Preto, conhecido na época como bairro de operários. Para dar início à
sua construção, foi organizada uma cerimônia que contou com a participação de várias
autoridades políticas. Também estavam presentes alguns professores da rede pública, Lucio
dos Santos, D. Cabral e o médico Dr. Gentil Sales. Gentil Sales era dedicado à puericultura,
112
O Horizonte 04/04/1925. 113
SOUZA, Rita de Cássia de. Sujeitos da educação e práticas disciplinares: uma leitura da
disciplina escolar a partir da Revista do ensino e das Reformas Educacionais Mineiras (1925-1930). Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Educação. Belo Horizonte, 2001.
57
e por várias vezes seu livro, Iniciação Materna,114 foi divulgado e recomendado às mães
cristãs nas páginas do jornal O Horizonte. Segundo os editores do periódico, o livro
ensinava, em linguagem clara e acessível, como a mãe podia evitar e auxiliar o médico a
combater doenças na infância. O livro estava organizado da seguinte maneira:
Dividido em três partes: 1ª profilaxia de doenças do aparelho digestivo, ensinando que as mães devem alimentar corretamente os filhos. 2ª Transformar as mães em boas enfermeiras, primeiros recursos quando ficam doentes. 3ª Destinado aos Paes e ao médico da família para anotarem fatos psicológicos e práticos mais importantes que ocorre na vida da criança.
115
A presença do Dr. Gentil Salles ilustra o processo de institucionalização da
pediatria no Brasil. O caminho da institucionalização contava com instituições, associações
e veículos de divulgação do saber médico, voltados, sobretudo, para o cuidado das
crianças.116
Na ocasião da inauguração da escola maternal, Mello Vianna insistiu para que D.
Cabral fosse o primeiro a assinar a ata de inauguração da construção. Esse ato simbólico
evidencia a importância da Igreja Católica no ensino em Minas Gerais, apesar do caráter
laico da educação. Durante a cerimônia, a esposa de Mello Vianna foi convidada a brindar
em homenagem à mulher operária. A presença da esposa do presidente do estado
elucidava os laços de solidariedade da mulher da elite para com as operárias.117
Na Reforma Francisco Campos, a Associação das Mães de Família foi
regulamentada pelos artigos 208-210 do decreto 7.970, de 1927, e estabeleciam que a
associação era destinada a cooperar com as autoridades escolares, no sentido de levantar a
moral e saúde dos alunos, bem como promover a matrícula e a frequência escolar. As mães
associadas deviam tomar parte das reuniões quinzenais do Auditorium118, reunir-se
mensalmente e realizar visitas frequentes nas escolas.119
114
O livro foi publicado pela imprensa diocesana e recebeu espaço na seção de higiene na Exposição
Internacional do Centenário, realizada no Rio de Janeiro. O Horizonte 18/02/1925. 115
O Horizonte 18/02/1925. 116
Sobre isso ver os trabalhos: PEREIRA, Júnia Sales. História, Ciência e Infância: narrativas
profissionais no processo de singularização da pediatria como especialidade. Brasilia, DF: Capes, Belo Horizonte: Argvmentvm, 2008. FREIRE, Maria Martha de Luna. Mulheres, mães e médicos: discurso maternalista no Brasil. FERREIRA, Luiz Otávio e SANGLARD, Gisele. Médicos e filantropos a institucionalização do ensino de pediatria e da assistência à infância no Rio de Janeiro da Primeira República. Varia História, v. 26 n.44 p. 437-459, 2010.
117 O Horizonte 09/09/25.
118 As horas do Auditorium eram destinadas aos cantos corais, à audição musical e à exposição de assuntos que interessassem à escola, sejam eles relativos ao programa de estudos, sejam concernentes a alguma obra escolar ou social. Nesses momentos também aconteciam palestras dadas pelo médico ou dentista escolar sobre temas de higiene, além de conferências, se possíveis acompanhadas de demonstrações práticas, sobre a indústria, a produção agrícola e o comércio locais. Nessas conferências havia a exposição, por pessoa preferencialmente do comércio local,
58
A preocupação dos católicos na formação de boas mães é visualizada no grande
número de artigos presentes n‟O Horizonte com esse objetivo. Os artigos publicados por
Jota Emme, intitulados “Educação no Lar”, tratavam de instruir as mães na educação dos
filhos e versavam sobre os conselhos morais e higiênicos. Outra chave de ação estava na
instrução formal. Os católicos eram incansáveis no desejo de criar escolas de puericultura
cristã e questionavam o fato de existirem variadas escolas de formação profissional
feminina, e nenhuma destinada exclusivamente à formação de mães,
hoje fundam-se escolas femininas para tudo serviço doméstico, para enfermeiras, empregadas no comércio, para mestras, para ensaiar boas maneiras, para modistas, até para aprender a dançar e a bem aparecer. Ninguém se lembra, porém, de fundar uma escola que prepare a mulher para seu papel mais importante, para sua missão mais sublime, para ser boa mãe, que não somente saiba crear, mas que ainda saiba educar, isto é formar o caráter de seus filhos, encaminha-los para o bem e para a virtude. Desejo escola de puericultura cristã.
120.
No ano de 1931, foi inaugurado um departamento no Colégio Santa Maria,
intitulado Escola Social Feminina. O novo departamento oferecia três cursos, a saber –
Curso Doméstico, destinado a ensinar a arte culinária, economia domésticas, costura e corte
prático de chapéus, bordados, higiene, psicologia, noções de agricultura e jardinagem;
Curso Comercial, com práticas de datilografia, stenografia, contabilidade, português, francês
e italiano; e Curso Literário e Artístico, destinado ao estudo de literaturas antigas e
modernas, história da arte, pintura, desenho e artes decorativas. A notícia sobre a abertura
da escola foi seguida por variadas notas no jornal O Horizonte, que ressaltavam a felicidade
pela criação da escola, pois,
a Escola Doméstica ensinará coisas que não se aprende em casa, nem nas escolas normais que é expressão máxima da instrução feminina, a preparação para serem boas donas de casa e mães de família. Ministrar todos os conhecimentos necessários para o desempenho de sua missão no lar para o esposo, filhos e para a sociedade. Não queremos a mulher ignorante, queremos que seja instruída para ser companheira intelectual do marido. Revolta-nos ver a mulher se masculinizando, ridicularizando (...). Aprender a higiene para conservar o domínio de si mesmo deante das moléstias, dos acidentes, tomar as medidas de urgência e facilitar o trabalho do médico executando inteligentemente as suas prescrições (...)”.
121
sobre o plano de obras públicas que estivesse sendo executado. Minas Gerais, Regulamento do Programa Obrigatório da Escola Primária 24/12/1937. Decreto n. 8.094. p. 8.
119 MINAS GERAIS, Regulamento do Programa Obrigatório da Escola Primária 24/12/1937. Decreto
n. 8.094. p. 1-33. 120
O Horizonte 19/12/1925 - Escola de Mães. 121
O Horizonte 31/01/1931 e 04/02/1931 - Escola Social Feminina.
59
Tal iniciativa reforça o desejo católico de formar um tipo ideal de mulher cristã
que desenvolvesse com aptidão suas funções de mãe e esposa, dotadas de saberes
morais, puericultura e tudo o que dizia respeito à economia doméstica.
Sabe-se que a associação das Mães Cristãs foi atuante no espaço da escola,
estabelecendo vias de troca entre o ambiente familiar e o espaço escolar. Conseguiram
difundir aulas de catecismo e aumentar o número de alunos matriculados e frequentes nas
escolas primárias. A ação da associação se viu aumentada pelos trabalhos desenvolvidos
na Confederação Católica Feminina, que atuava em comissões morais, regulando a censura
de filmes, modas e bailes.
Anne Cova observa que a maternidade guarda um papel particular na história
dos feminismos. Os da primeira metade do século XX, ditos da primeira onda, que surgiram
em numerosos países, serviam-se da maternidade como trunfo para penetrar na esfera
pública, reivindicando direitos para as mães e mulheres em geral, tornando-se conhecido
pela expressão “feminismo maternalista”.
Na mesma direção, Perrot considera que o ativismo feminino maternalista
permitiu a muitas mulheres cruzar a fronteira e atuar no mundo público. Para a autora, a
maternidade é o grande caso das mulheres. A figura da mãe e suas práticas (saúde,
puericultura, educação na infância), a colocavam como um pilar da sociedade e da força dos
Estados, tornando-se um fato social, no qual devia-se investir políticas destinadas aos
cuidados das mães e de seus filhos.122
Para Koven e Michel123 o maternalismo atuava em dois níveis: enaltecia as
virtudes privadas da domesticidade e legitimava as relações das mulheres com a vida
pública e com a política, o Estado, a comunidade e o mundo do trabalho e do mercado. Na
perspectiva de Mott, o maternalismo defendia a preponderância do sexo feminino devido à
natureza específica para a maternidade, na defesa e desempenho de atividades
relacionadas ao bem-estar das mulheres e das crianças.124
É praticamente unânime a interpretação de que a maternidade representava a
função mais importante da mulher e que ela precisava ser educada para exercer seu papel.
Partia-se do pressuposto de que as mulheres não estavam preparadas para desempenhar
as suas funções essenciais de esposa e mãe, precisando ser instruídas.125
122
PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. Tradução Ângela M. S. Côrrea. São Paulo,
Contexto, 2007.p. 271 123
KOVEN, Seth; MICHEL, Sonya. Womanly Duties: maternalist politics and the origins of welfare
states. American Historical Review. V. 95, 1990. P. 1076-1108. 124
MOTT, Maria Lúcia. Maternalismo, políticas públicas e benemerência no Brasil (1930-1945).
Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudo de Gênero – Pagu/Unicamp n.16 p.199-234, 2001.
125 FREIRE, Maria Martha de Luna. Mulheres, mães e médicos: discurso maternalista no Brasil.
Rio de Janeiro: Editora FGV, 2008.
60
Dessa maneira, a maternidade não era uma função individual, mas uma função
social. Ela era entendida como um papel primordial das mulheres que, em sua maioria,
viam-na como um valor positivo. Havia a crença de que pela maternidade elas obteriam
reconhecimentos sociais e direitos. Assim, as mulheres defendiam o argumento de que a
maternidade lhes atribuía qualidades específicas e naturais para o desempenho de
determinadas atividades, sobretudo daquelas destinadas ao bem-estar das mães e das
crianças.126
Para que as mulheres desempenhassem adequadamente sua função materna
era necessário que as autoridades fossem mais atuantes, intervindo nas relações entre
capital e trabalho, para proteger as mães trabalhadoras e suas crianças. Dentre as medidas
propostas para minimizar o conflito entre trabalho e maternidade, a oferta de creches e
escolas maternais apresentava-se como solução razoável para compensar a ausência da
mãe.127
Outra medida importante era a instrução das mulheres à maternidade. Havia
nesse período uma série de instituições comprometidas com a formação de “boas mães”,
escolas de economia doméstica, curso de puericultura e higiene e escolas sociais femininas.
A Igreja Católica se mostrava atenta à questão da maternidade e procurava incutir nas mães
da classe média e das operárias o dever moral de ensinar os valores da religião aos seus
filhos, transmitir bons costumes e educá-los higienicamente.
1.4.3 Damas da Caridade
A Associação das Damas da Caridade era uma instituição de assistência social
voltada ao auxílio de indivíduos pobres, doentes e inválidos, de caráter caritativo. Seu corpo
social era composto por mulheres da alta sociedade belo-horizontina. Como elemento de
identificação, as damas utilizavam um pequeno crucifixo pendente com uma fita preta.
A associação pertencia à Sociedade São Vicente de Paulo. Logo que surgiu a
capital, destacava-se como a mais importante instituição na prestação de assistência às
famílias pobres. Ficou marcada pela presença exclusiva de católicos, alguns dos quais eram
lideranças de destaque no meio político, empresarial e comercial mineiro. Camila Jansen de
Mello de Santana salienta que a estrutura organizacional das Associações das Senhoras da
126
MOTT, Maria Lúcia. Maternalismo, políticas públicas e benemerência no Brasil (1930-1945).
Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudo de Gênero – Pagu/Unicamp n.16, 2001. p.199-234.
127 FREIRE, Maria Martha de Luna. Mulheres, mães e médicos: discurso maternalista no Brasil.
Rio de Janeiro: Editora FGV, 2008.
61
Caridade era pautada por uma rigorosa hierarquia. As damas que ocupavam cargos mais
elevados tinham status no interior da instituição. As chamadas damas ativas eram as
senhoras que podiam atuar na visitação dos indivíduos auxiliados, decidindo quem poderia
continuar usufruindo do benefício.128 Entendemos que a visitação feita pelas Damas da
Caridade servia para conhecer as necessidades dos assistidos. Segundo Diebolt, era
comum as associações femininas fazerem pesquisas e estudarem as condições de vida das
populações, o que permitia, em médio prazo, ações de educação sanitária, educação
familiar, organização de atividades culturais, prevenção de doenças e a distribuição de
vales-alimentação.129
As Damas da Caridade eram importantes na arrecadação de recursos para a
SSVP, pois eram responsáveis pela organização de campanhas de donativos e ofereciam
festas, operetas e concertos beneficentes, algumas inclusive faziam doações em dinheiro e
de objetos de valor.130 Elas organizavam bailes de caridade para levantamento de fundos
das caixas escolares e para a manutenção de hospitais; atuavam na saúde de forma
intensa; operavam uma sindicância nas casas dos assistidos; encaminhavam doentes para
hospitais e dispensários; e identificavam e isolavam os doentes. Além da saúde, tinham uma
atuação bem diversa, desenvolvendo trabalhos de evangelização e de “causas morais”. 131
Os primeiros grupos de Damas de Caridade de Belo Horizonte se formaram nas
paróquias da Boa Viagem e São José. Eram as mais antigas e com grande poder de
atuação. Com a criação da Confederação Católica Feminina houve um considerável
aumento de grupos de Damas nas diferentes paróquias belo-horizontinas, ampliando
consequentemente a abrangência do trabalho filantrópico na cidade.
Como observa Souza, a SSVP em Minas mostra-se desorganizada na
apresentação dos relatórios e estatísticas. Os relatórios de atividades das Damas da
Caridade, por vezes eram publicados no jornal O Horizonte, mas não havia uma
periodicidade. O trabalho realizado por elas pode ser mais bem visualizado nas atas da
CCF. Por esse motivo trataremos com mais detalhes a ação das Damas da Caridade no
próximo capítulo, quando apresentamos a atuação dessa agremiação nos trabalhos de
assistência e caridade desenvolvidas pela CCF em parceria com a SSVP.
128
SANTANA, Camila Jansen de Mello de. A caridade a si ou ao outro? As práticas católicas
como auto-salvação. Revista Aulas. Dossiê Religião n.4 abril/junho, 2007. 129
DIEBOLT, Evelyne. História do Trabalho Social: nascimento e expansão do setor associativo
sanitário e social (França, 1901-2001). In: Estudos Feministas, Florianópolis, 13 (2): 256 maio-agosto, 2005.
130 SOUZA, Marco Antônio de. A economia da caridade: estratégias assistências e filantrópicas em
Belo Horizonte. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004. 131
O Horizonte 21/09/1927.
62
2 CONFEDERAÇÃO CATÓLICA DE BELO HORIZONTE E O
ASSISTENCIALISMO
O objetivo desse capítulo é apresentar as atividades realizadas pela
Confederação Católica Feminina (CCF). A agremiação destaca-se por agrupar as três
principais associações de militância católica na capital. Sua criação foi uma estratégia da
arquidiocese para melhorar organização da Ação Social Católica. Na sua origem, tratava-se
de uma associação mista, mas rapidamente foi subdivida em seções masculina e feminina.
As mulheres associadas à CCF pertenciam exclusivamente à elite mineira. Além disso, as
atividades por elas realizadas na CCF revelam o trânsito das mulheres católicas pelas
instituições filantrópicas, as redes acionadas por elas no associativismo e as diferentes
formas de atuação das mulheres na filantropia.
A Confederação Católica de Belo Horizonte foi organizada por D. Cabral, em
abril de 1927. O arcebispo transplantou para a capital mineira o modelo institucional do Rio
de Janeiro132. Segundo D. Cabral, havia em Belo Horizonte magníficos elementos da ação
católica no campo social, muitos desses elementos se achavam aproveitados nas
numerosas associações de piedade e de caridade que funcionavam na cidade, porém
muitos outros se perdiam por falta de orientação e iniciativa. Faltava, de acordo com D.
Cabral, um núcleo coordenador que chamasse à ação esses elementos.
Para o arcebispo, a variedade de associações leigas na capital gerava um
desperdício de esforços, descontinuidade de ação e isolamento de cada movimento em seu
âmbito particular, com considerável prejuízo de todos e de cada um. A Confederação
Católica (CC) desenvolveria o papel centralizador e coordenador dos grupos da chamada
“Ação Católica”. De acordo com Cova133, esse tipo de associação que federa outros grupos
mostrava-se como uma tentativa de tornar mais eficaz, estruturada e estável a atuação das
associações.
132
D. Leme, em 1918, fundou na Arquidiocese de Olinda a Confederação Católica Pernambucana,
que serviu de experiência para a obra de unificação. Logo em seguida assumiu o bispado. Em 1922 ele criou a Confederação Católica do Rio de Janeiro, órgão coordenador e disciplinador do apostolado leigo. Nas instruções, D. Leme define sua finalidade: unir, formar e coordenar para ação os elementos católicos em geral, e de modo particular, organizar e intensificar o devotamento ativo a todas as obras católicas de piedade, caridade e sociais. In: MATOS, Henrique Cristiano José. Um estudo histórico sobre o catolicismo militante em Minas Gerais entre 1922 e 1936. Belo Horizonte: O Lutador, 1990. p. 200.
133 COVA, Anne. O associativismo das mulheres. Uma abordagem comparativa: França e Portugal
(1900-1918). In: SERRAO, José Vicente. et al. (Orgs.). Desenvolvimento Econômico e Mudança Social: Portugal nos últimos dois séculos. Lisboa: ICS Imprensa de Ciências Sociais. p. 333-348, 2009.
63
Para dirigir os trabalhos das comissões e compor os órgãos permanentes da
CC, foram nomeados oito homens e nove mulheres134. Além dos leigos, D. Cabral nomeou
para cada comissão um sacerdote diretor, um presidente e vários membros. Era comum a
presença de eclesiásticos nas associações leigas, pois havia uma amistosa convivência e
fortes laços de amizades entre esses dois grupos.
D. Cabral recomendava que, para a realização dos trabalhos da CC, era
necessário o exercício da sindicância, elaboração de inquéritos e estudos prévios. O
objetivo era criar projetos que atendessem as demandas mais urgentes da sociedade belo-
horizontina. Como mostra Diebolt, essa prática era comum nas associações femininas do
período, uma vez que, para desempenhar suas funções, as mulheres faziam estudos das
condições de vida dos assistidos e de suas necessidades, organizando em médio prazo
suas ações de educação sanitária, educação familiar e cultural.135
Como citado anteriormente, inicialmente a Confederação Católica funcionou em
caráter misto, ocorrendo mais tarde a separação em seções masculinas e femininas. A
conferência de abertura da associação foi solenemente realizada por D. Cabral e Olinto
Orsini136, um intelectual de militância católica, formado em Farmácia pela Escola de
Farmácia de Ouro Preto (1911) e em Medicina pela Faculdade de Medicina de Minas Gerais
(1917). Sua presença na conferência de abertura da CC é significativa e revela como os
serviços de higiene, saúde e sanitarismo estavam conectados às associações católicas de
assistência. Evidencia, sobretudo, o processo de legitimação da ciência e da saúde. Mostra
ainda um alinhamento do trabalho de assistência da CC em agência com o poder público e
a iniciativa privada.
134
O Horizonte 13/04/1927 135
DIEBOLT, Evelyne. História do Trabalho Social: nascimento e expansão do setor associativo
sanitário e social (França, 1901-2001). In: Estudos Feministas, Florianópolis, 13 (2): 256 maio-agosto, 2005.
136 Olinto Orsini de Castro fez o curso de Humanidade no Colégio do Caraça. Diplomou-se pela
EFOP e pela Faculdade de Medicina de Minas (1911 e 1917). Em 1915 fundou a União dos Moços Católicos. Enquanto acadêmico, foi encarregado do laboratório de dermatologia da Faculdade de Minas, cujo corpo docente passou a integrar, em 1910, como assistente de clínica sifilográfica e dermatologia. Em 1927 tornou-se livre docente e, em 1949, quando se federalizou à Universidade de Minas Gerais, assumiu a cadeira da disciplina. Atuou como médico do Serviço de Profilaxia da Lepra, Sífilis e Doenças Venéreas do Serviço de Saneamento Rural, entre 1922 e 1930. No ano de 1931 trabalhou no Serviço Dermatológico e Antivenéreo da Força Pública do Estado. Atuou também no serviço de sifiligrafia, dermatologia e venerologia do departamento estadual de saúde de Minas Gerais. Entre 1935 e 1937, na Assembleia, fez parte das comissões de saúde, educação e cultura. Foi vice-presidente da Sociedade Mineira de Leprologia e participou de vários congressos científicos fora do país. In: Dicionário Biográfico de Minas Gerais Período Republicano 1889/1991.
64
2.1 A Confederação Católica: sessão feminina
A primeira reunião exclusivamente feminina da Confederação Católica ocorreu
no dia primeiro de junho de 1927. As reuniões aconteciam no salão da Cúria Metropolitana
de Belo Horizonte e eram acompanhadas pelo arcebispo D. Cabral. Na sua ausência,
assumiam o comando das reuniões os eclesiásticos Vicente Soares, Monsenhor João
Rodrigues de Oliveira, Álvaro Negromonte, Leão de Medeiros Leite, Cornélio Pinto Fonseca,
Frei Mário, Monsenhor Arthur de Oliveira, José Medeiros Leite, Vicente Borges, Walter
Perriais, José Caitsou, Frei Zacarias, José Taitson, Pedro Passo, Francisco Prada e José
Augusto Bastos.
Apesar da presença dos eclesiásticos nas reuniões, pela leitura das atas
observa-se que as mulheres eram responsáveis por conduzir as discussões, propor os
planos de trabalho e organizar as intervenções do grupo. Eram as associadas que
levantavam fundos, geriam as verbas arrecadadas e criavam campanhas de ação, havendo,
portanto, autonomia feminina nas decisões da CCF.
O quadro burocrático da agremiação era composto pela senhorita Marieta Viotti
(secretária), D. Maria de Vasconcellos (diretora) e a senhorita Jacyntha Neves (presidente).
Esse quadro manteve-se do ano de 1927 a 1934137. Essa é uma das características
marcantes das lideranças nas associações católicas femininas desse período, ou seja,
mantinham por longa data seus cargos. Embora ocorressem eleições periódicas, via de
regra as líderes eram reeleitas. Outra característica importante era o fato de acumularem
cargos de liderança em outras associações.
Marieta Viotti pertencia a uma família de farmacêuticos com ampla atuação na
política e na filantropia em Minas Gerais. A senhorita Jacyntha Neves era uma figura notável
no campo da assistência à saúde. Seu nome era recorrentemente mencionado nas fichas de
inscrição da EECC, principal mecanismo da seleção das candidatas ao curso de
enfermagem, e provavelmente ela era uma agenciadora de moças para a Escola de
Enfermagem. Nas fichas, além dos dados relativos à identificação (nome, idade, endereço e
a pessoa responsável), encontramos informações sobre a instrução, ocupação anterior,
exposição de intenções e referências pessoais das candidatas.138
137
Há indícios de que a CCF, em 1935, foi remodelada dentro do movimento de Ação Católica, que
nesse período passou a ser dividida pelos programas JOC e JUC. Sobre isso ver MATOS, Henrique Cristiano José. Um estudo histórico sobre catolicismo militante, entre 1922 e 1936. Belo Horizonte: O Lutador, 1990
138 SANTOS, Geralda Fortina dos. Escola de Enfermagem Carlos Chagas (1933-1950): a Deus
pela humanidade para o Brasil. Tese de Doutorado. Faculdade de Educação. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2006.
65
Sabe-se que na virada do século XIX até os anos 1920, a enfermagem estava
nas mãos de religiosas e de práticas que exerciam tal atividade baseadas no conhecimento
empírico. Acreditamos que, antes da criação dos cursos de enfermagem em Minas Gerais,
as mulheres ligadas à filantropia, especialmente as normalistas que possuíam algum
conhecimento nessa área, trabalhavam nos hospitais com as religiosas e, por isso, com o
tempo, tornaram-se referência no campo da enfermagem.
Virginia Teixeira salienta que no período anterior à institucionalização da
enfermagem, as pessoas que trabalhavam nos hospitais possuíam alguma qualificação. A
autora mostra também que até os primeiros anos das escolas de enfermagem em Belo
Horizonte, os pré-requisitos para ser enfermeira eram ser uma pessoa dedicada, de
confiança, honesta, além de gostar e saber trabalhar com as irmãs de caridade.139
Destacamos que a presidente da CCF, Jacyntha, também trabalhava com
advogados e homens vinculados à Secretaria de Segurança Pública na censura de filmes e
nas discussões ligadas à preservação da moralidade católica. A parceria e diálogos das
associadas com a Segurança Pública evidenciam a importância dos sistemas de caridade
para as mudanças de hábitos sociais. O objetivo era oferecer benefícios para que o
necessitado pudesse sobreviver. Aquele ou aquela que não aceitasse o socorro seria
considerado vadio e combatido pela autoridade da segurança pública.140
Cumpre ressaltar também que, nesse período, a Diretoria de Saúde Pública
estava subordinada à Secretaria de Segurança e Assistência Pública, incumbida dos
seguintes assuntos: educação sanitária, organização estatística, estudo epidemiológico,
profilaxia geral das doenças, polícia sanitária das edificações, fiscalização sanitária da
produção, inspeção dos imigrantes, profilaxia das intoxicações por drogas entorpecentes,
organização do centro de estudos (lepra, malária e doença de Chagas), inspeção das
estâncias ou hidrominerais e higiene infantil.141
Além do quadro de gestoras, as comissões eram formadas por mulheres líderes
de outras pastorais, destacando-se a participação das associadas às Filhas de Maria, às
Mães Cristãs e às Damas da Caridade, sendo que a maior parte delas pertencia às
paróquias São José, Boa Viagem, Lourdes, Santa Efigênia, Santa Tereza, Lagoinha,
Barroca, Floresta, Calafate e Barro Preto. Localizadas na região central da cidade.
139
TEIXEIRA, Virgínia Mascarenhas Nascimento. De práticos à enfermeiros: os caminhos da
enfermagem em Belo Horizonte – 1897-1933. Tese apresentada ao Programa de Pós Graduação em História. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2012.
140 PINTO, Jefferson de Almeida. Uma esmola pelo amor de Deus: caridade, filantropia e controle
social. (Juiz de Fora, 1870-1930) OPSIS (UFG), v.8 p.275-298, 2008. 141
CHAVES, Braúlio Silva. Instituições de saúde e a ideia de modernidade em Minas Gerais na
primeira metade do século XX. In: MARQUES, Rita de Cássia; SILVEIRA, Anny Jackeline Torres; FIGUEIREDO, Betânia Gonçalves. (Orgs.). História da Saúde em Minas Gerais: instituições e patrimônio arquitetônico (1808- 1958). Barueri, SP: Minha Editora, 2011. p. 51.
66
Figura 1 Mapa dos Bairros da Cidade de Belo Horizonte
Fonte: www.editoradobrasil.com.br (2013). Créditos: Alessandr Passos da Costa
Importante lembrar que os bairros Santa Efigênia, Lagoinha, Calafate e Barro
Preto, que ocupavam as franjas entre as zonas urbanas e suburbanas da cidade de Belo
Horizonte, eram praticamente ignorados pelos serviços básicos de Saúde Pública, o que
gerava uma situação de precariedade entre os pobres que viviam na região142. Tornando
mais importante a atuação das associações assistencialistas, conforme demonstram Luiz
142
SILVEIRA, Anny Jackeline Torres. A influenza espanhola e a cidade planejada. Belo Horizonte.
MG: Argvmentum, FAPEMIG: Capes, 2008.
67
Otávio Ferreira e Gisele Sanglard, “as associações científicas e filantrópicas eram também
motivadas pela ausência de políticas públicas que visassem corrigir os “maus hábitos”
típicos da cultura das famílias, sobretudo das famílias que ocupavam vasto setor das
classes trabalhadoras urbanas”.143
As reuniões da CCF ocorriam uma vez por mês, sendo a sessão aberta pelo
Presidente da Confederação, D. Cabral, ou por seus substitutos. Em regra, D. Cabral
iniciava as sessões chamando a atenção para a assiduidade nas reuniões e compromisso
com as atividades da confederação. Cada comissão, em ordem, apresentava o relatório de
atividades e definia novas ações. Após as apresentações dos trabalhos, a reunião era
encerrada com uma pequena conferência sobre assuntos que se mostravam oportunos no
momento, tais como divórcio, moda144, educação, saúde, entre outros. Quando não havia
conferência, uma associada tomava a palavra e proferia mensagens encarecendo o papel
das mulheres na Ação Social Católica.
Sobre os fundamentos e princípios que deviam obedecer a Seção Feminina,
exortava D. Cabral:
- Será de bom aviso que a comissão entre em relações com as instituições congêneres da Europa e América.
- Buscar nos boletins e revistas, nos relatórios de suas assembleias e congressos, notícias e ideias que podem ser úteis. Para darmos exemplo no Congresso Internacional das Ligas Católicas Femininas, realizado em Luxemburgo, foram firmados alguns princípios que julgamos acertado frisar sobre o movimento social católico feminino.
- Se opor a todas as formas de interconfessionalismo e participação nas organizações neutras. Em casos de parecer necessário ou oportuna qualquer colaboração individual ou coletiva, antes de mais nada serão consultados os bispos.
145
Como é possível observar, propunha-se o intercâmbio com associações
congêneres e fica claro no texto que o arcebispo via com reservas o diálogo com
associações femininas ditas neutras, no entanto, vigiavam de perto a ação e ideias das
variadas associações desse tipo. Tal fato permite inferir que a CCF, ao atentar-se para
associações femininas congêneres de outros estados e países, intercambiava ideias que,
inclusive, guiavam a criação de sua agenda.
A proximidade de agenda das associações femininas católicas e de outros
grupos feministas pode ser verificada nas teses discutidas no I Congresso Feminino Mineiro.
143
FERREIRA, Luiz Otávio; SANGLARD, Gisele. Médicos e filantropos a institucionalização do
ensino de pediatria e da assistência à infância no Rio de Janeiro da Primeira República. In: Varia História v.26, n.44, p. 437-459, 2010.
144 Ressaltamos que o tema da moda era discutido pelo viés da moralidade. Esse grupo de mulheres
julgava a moda, em si, uma grande futilidade. 145
O Horizonte 23/04/1927.
68
O Congresso aconteceu em junho de 1931 e foi organizado por Elvira Komel146. Foi um
movimento feminino laico e fez intensa divulgação nos jornais de grande circulação em
Minas. O jornal Minas Gerais, por exemplo, publicou 12 artigos sobre o congresso147. Além
das conferencistas mineiras, mulheres de outros estados (Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul
e Espírito Santo) participaram do encontro. Desse grupo de mulheres destacamos Natércia
Silveira.148
As conferências do Congresso ocorreram no Teatro Municipal de Belo Horizonte.
Todas as noites, após as discussões, acontecia um chá dançante no Automóvel Club, com a
presença das congressistas e de grande parte da elite belo-horizontina. O jornal O Horizonte
fez a cobertura completa do evento e no geral dispensaram elogiosos comentários ao
conteúdo das teses discutidas pelas congressistas, exceto ao que dizia sobre as classes
mistas no campo educacional. D. Cabral, inclusive, celebrou a missa de abertura do evento
na igreja São José.
A normalista Diva Magalhães, pertencente à comissão de Imprensa da CCF,
participou do evento, apresentando uma tese sobre a coeducação e a formação de classes
mistas nas escolas públicas, e apontando “os perigos” dessa proposta pedagógica. Outra
católica militante a participar do evento foi à senhorita Laura Jacobina Lacombe, vice-
diretora do tradicional colégio católico Jacobina, do Rio de Janeiro, irmã de criação de Maria
Luiza de Almeida Cunha, figura notável do laicato em Belo Horizonte149.
O grupo de feministas discutiu as seguintes teses:
1ª Seção Formação Moral 1 – É possível educação moral sem fundamento religioso?
146
Elvira Komel nasceu em Barão de Cocais, em 24/06/1906. Advogada, feminista, sufragista,
formou-se em Direito, no Rio de Janeiro. Voltou para Minas e abriu uma banca de advocacia, sendo a primeira mulher a exercer a profissão no fórum de Belo Horizonte. Engajou-se nos movimentos urbanos que, na década de 1920, reagiram à oligarquia agrária, reivindicando maior representação social. Foi considerada a primeira eleitora mineira. Em 1930, com Getúlio Vargas no poder, Elvira aderiu ao movimento revolucionário. Publicou nos jornais de Belo Horizonte um manifesto dirigido às mulheres mineiras, convocando-as a apoiar o movimento revolucionário e comunicando a criação do Batalhão Feminino João Pessoa, como base de apoio à capital mineira. Costuravam fardas e bandagens para os soldados. Aos 26 anos, em 1932, quando se preparava para disputar uma vaga no Senado, Elvira adoeceu, falecendo no dia 27/05/1932. In: Novo dicionário bibliográfico de Minas Gerais. 300 anos de História p. 239.
147 Minas Gerais, 24/05/1931, 27/5/1931, 5/6/1931, 20/06/1931, 21/06/1931, 22 e 23/61931,
24/06/1931, 27/6/1931, 25/6/1931, 26/06/1931, 28/06/31 e 29 e 30/6/1931. 148
Natércia Silveira, sufragista e advogada. Nasceu no Rio Grande do Sul, mas viveu maior parte da
sua vida no Rio de Janeiro. Participou ativamente da luta pelo voto feminino, ao lado de Bertha Lutz. Por divergências políticas ocorreu uma ruptura na parceria entre as duas. Natércia criou, em 1931, a Aliança Nacional de Mulheres. Ver sua biografia completa em: SCHUMAHER; BRASIL. Dicionário Mulheres do Brasil: de 1500 até a atualidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2010.
149 O Colégio Jacobina era conhecido pela sua formação católica e suas práticas educativas
modernas. Laura Jacobina era filha de Isabel Jacobina Lacombe, fundadora do colégio, e teve forte participação na criação da Associação Brasileira de Educação.
69
2 – Não será um absurdo moral a coeducação? Se não, em que limites? 3 – É o luxo um mal? Como combatê-lo? 4 – Como educar as filhas, no lar ou nos internatos? 5 – É o alevantamento moral das sociedades função da educação dada à mulher? 6 – Exercerá a mulher ação moralisadora da política, como intervir nesta? 2ª Seção Instrução 1 – Como poderá a mulher influir na organização e desenvolvimento do ensino 1º, 2º e superior? 2 – Satisfazem os actuaes processos de preparação da professora primária – considerada esta como formadora de caráter? 3 – Será uma necessidade de ordem geral, o aperfeiçoamento da altura scientífica feminina? Como accudir a essa necessidade, si afirmativa a resposta? 4 – Constitue uma necessidade social a cultura, cívico doméstica? Em que moldes organizá-la? 5 – Como organizar a cultura profissional da mulher? Deve a mulher competir com o homem em todas as profissões? Exame da questão sobre o ponto de vista brasileiro. 6 – Em que bases organizar a cultura física da mulher? 3ª Seção Legislação Social 1 – Como se conceituam os direitos econômicos da mulher? 2 – Quaes para o trabalho feminino, as garantias indispensáveis? 3 – Como garantir a egualdade de remuneração entre o homem e a mulher, como operários? 4ª Seção Proteção as mães e a infância 1 – Como assegurar aos lares a assistência moral às mães? Há no Brasil diminuição da influência das mães nos lares? Quaes as coisas disto e os males? Como corrigi-los? 2 – Como organizar e manter as maternidades e hospitais de crianças, as creches e os asilos? 3 – Como organizar e manter estabelecimentos para menores delinquentes e abandonados? Deve-se dar preferentemente a mulher a direção de taes estabelecimentos? Como e onde preparar a mulher para tal mister? 5ª Seção Situação da Mulher na Ordem Política e jurídica 1 – Voto feminino condição para seu exercício. 2 – Equiparação da mulher ao homem perante as leis civis, comerciais, penaes e estatutos de funcionários. 6ª Seção Campanhas Sociais e Humanitária 1 – Participação da mulher no combate ao alcoolismo, lepra e a tuberculose 2 – Proteção aos animais 3 – Cooperação da mulher na pacificação e confraternização universal.
150
É possível notar que há uma proximidade da agenda do movimento feminista
com os trabalhos da CCF. Como veremos a seguir, as comissões da CCF estavam
preocupadas com a questão religiosa, mas sobretudo, com a questão do ensino, com a
infância, a maternidade, a assistência aos desvalidos, as campanhas sociais humanitárias e
com a cooperação entre as mulheres abastadas e as mulheres operárias.
Observa Martha de Luna Freire151 que a partir da metade do século XIX e nas
primeiras décadas do século XX houve uma priorização do binômio mãe e filho como objeto
150
Minas Gerais, 22 e 23/06/1931. p. 10 e 11. 151
FREIRE, Maria Martha de Luna Freire. Maternalismo e proteção materno-infantil: fenômeno mundial de caráter singular. Cadernos de História da Ciência Instituto Butantan. Vol. VII (2) jul/dez, 2011. P.55-70.
70
de preocupação do Ocidente. Salienta a autora que essa preocupação pode ser justificada
por questões demográficas, sanitárias ou patrióticas e ressultou no surgimento de diferentes
propostas de legislação e ações de proteções a mães e filhos. Desse contexto temos o
chamado movimento maternalista que demarcava a ascendência do papel de mãe para
todas as mulheres. O maternalismo, portanto foi um fenômeno mundial, mas marcado por
especificidades locais.
Desse modo o tema da maternidade tinha centralidade nos primeiros
movimentos feministas. O tema era permeado de ambigüidades, mas de qualquer modo a
maternidade era ponto importante na agenda de todos os movimentos ocidentais na virada
do século XIX para o século XX.
O ponto de discordância das agremiações femininas católicas dos grupos laicos
estava centrado exclusivamente na questão do ensino religioso e na proposta de
coeducação dos sexos. Os católicos eram expressamente contra a escola laica e a
formação de salas mistas na educação primária. Acreditava-se que a religião era “o meio
mais poderoso da educação porque é a força da disciplina, a luz da instrução, a base da
eficácia dos cuidados físicos necessários ao desenvolvimento e a conservação do corpo
humano”.152 Para os católicos, não era possível uma educação moral e dos costumes sem o
ensino religioso. Acreditavam sobremaneira que a coeducação era uma má interpretação da
psicologia, que desconsiderava as diferenças biológicas e o desenvolvimento das meninas e
dos meninos.
No último dia do evento as congressistas visitaram a Santa Casa, o Hospital São
Vicente de Paulo e o Orfanato Santo Antônio. Na ocasião, fizeram doações às instituições
visitadas, todas elas erigidas pelo laicato católico em parceria com o poder público. As
mulheres católicas tinham grande participação no cotidiano dessas instituições. Certamente,
mesmo que não tenham participado em grande número do I Congresso Feminino Mineiro,
as associadas católicas, seja nos bailes dançantes ou no acompanhamento das visitas,
trocavam ideias e dialogavam sobre todos os assuntos com as mulheres engajadas no
Congresso. O grande caso do feminismo nesse período, seja ele católico ou não, era a
questão da maternidade e a assistência à infância e às mulheres.
Sempre atenta aos bons exemplos e práticas de Ação Social no Brasil e em
outros países, a CCF de Belo Horizonte intercambiava com outras associações católicas
femininas. As confederadas viajaram para participar de congressos dentro e fora do país e
receberam lideranças de outras associações católicas femininas, como por exemplo Stela
152
MATOS, Henrique Cristiano José. Um estudo histórico sobre o catolicismo militante em
Minas, entre 1922 e 1936. Belo Horizonte: O Lutador, 1990.
71
Faoro, Eva Paci e Hempetine.153 Durante suas reuniões faziam leituras de jornais católicos
de outras localidades tais como El Pueblo (Argentina), Nova Era (Bahia), entre outros.
Desse modo, a Confederação Católica não era somente uma associação de
caráter religioso, mas, sobretudo, um grupo composto de mulheres bem educadas,
pertencentes à classe média e à elite urbana de Belo Horizonte que se apropriou desse
espaço para criar uma ampla agenda de atuação na educação, saúde e seguridade social.
2.2 Comissões de trabalho da Confederação Católica Feminina
A CCF era dividida em nove comissões: Fé e Moral, Piedade e Culto,
Assistência e Caridade, Santificação da Família, Escolas, Imprensa, Vocação Sacerdotal,
Obras Sociais e Operárias e Descanso e Dias Festivos. D. Cabral recomendava atenção
especial às comissões destinadas à imprensa e ao operariado. Chama atenção na
apresentação dos trabalhos o fato das comissões não se mostrarem um grupo fechado em
si mesmo. Articulavam-se entre si e com o mundo fora da agremiação.
Das nove comissões atuantes na CCF, destacamos três: Escolas, Obras Sociais
e Operárias e, sobretudo, a Assistência e Caridade. Analisaremos com mais profundidade
as atividades realizadas por essas comissões, fazendo apenas um apresentação geral das
demais.
A comissão Fé e Moral (propagação, defesa e preservação), era presidida por
Marocas Franco, que inclusive tinha uma relação bem próxima ao delegado de Segurança
Pública, responsável pelos bons costumes. Não por acaso, Marocas trabalhava
assiduamente no Asilo Bom Pastor, destinado a receber mulheres que agiam “fora das
153
Stela Faoro foi importante liderança do associativismo católico no Rio de Janeiro, sobretudo no
serviço social. Representou a Igreja Católica Brasileira no Congresso da União Internacional das Ligas Femininas Católicas, na cidade de Lucerna, na Suíça, em 1932. Stela teve intensa atuação no Ministério da Educação e da Saúde. Ver: MESQUIDA, Peri. A educação na restauração Leminista da Igreja: a missão de Tristão de Athayde e Stella de Faoro no Ministério da Educação e Saúde Pública: 1934-1945. Revista Dialogo Educacional, Curitiba, v. 9, n.27, p. 279-295, maio/ago. 2009.
Eva Paci era condessa, pianista e literata italiana. Atuante nas associações católicas, passou por várias cidades brasileiras realizando palestras e recitais com sua filha. Na vinda à Belo Horizonte participou de reuniões da Confederação Católica Feminina e fez doações para os trabalhos assistenciais da agremiação. Ver: BRUM, Rosemary Fritsch. Caderno de Pesquisa: notícias de imigrantes italianos em Porto Alegre, entre 1911 e 1937. São Luis: EDUFMA, 2009. p.425.
Christine Hempetine, por sua vez, foi presidente mundial da Juventude Feminina Católica e em 1932 esteve no Rio de Janeiro, a convite de Dom Leme, dando aulas para as Filhas de Maria. A Confederação Feminina Católica de Belo Horizonte recebeu o convite de Stela Faoro para participação na referida conferência e algumas associadas foram selecionadas para participarem do evento. Hempetine incentivou a criação do Grupo de Ação Social (GAS) no Brasil. Ver: GUBIN Eliane (Org.). Dictionnaire des femmes belges: XIX et XX siécles. Bruxelas: Ed. Racine, 2006.
72
normas legais”, sendo um espaço de reabilitação de mulheres “perdidas”. Há indícios de que
grande parte das mulheres retidas pela Delegacia de Costumes foi encaminhada a esse
asilo. O encaminhamento se dava pela intermediação entre as associadas e o delegado. Tal
instituição será analisada mais detalhadamente no capítulo 4 deste trabalho.
A comissão Fé e Moral tinha como cerne intensificar a instrução religiosa da
infância, mocidade e operariado. As mulheres membros do grupo deviam se preocupar com
os passos da propaganda protestante e espírita.
D. Cabral sugeria como metas de trabalho154:
Publicação e diffusão de bons escritos e boas leituras, folhas avulsas.
A formação de uma ronda que vigie e procure neutralizar as pregações públicas dos protestantes
Formação de doutrinadores que como os protestantes, percorram as ruas, as casas, os campos, os cárceres, os hospitais
Organizar grupos de atalaias que descubram e denunciem as manobras contra a fé
Dirigir apello aos pais chamando atenção para a finalidade sectária de colégios católicos e protestantes.
Invocar a solicitude dos colégios catholicos na intensificação e aperfeiçoamento da cultura religiosa de seus alunos.
Deviam atuar também no controle do que os católicos chamavam de “fontes
capitais da imoralidade”: leituras, teatros, cinemas, modas e bailes. As mães cristãs eram o
grande contingente da comissão. Procuravam preservar, principalmente as crianças, dos
“perigos dos cinemas e revistas ilustradas”.
A comissão Piedade e Culto tinha como diretor o padre Vicente Soares. O grupo
era destinado a convocar as mulheres a viverem os ritos eucarísticos, participarem das
missas, oração de terços, ladainhas e adorações. Deviam divulgar horários de missa,
funções religiosas e endereços das igrejas, além de organizar retiros espirituais e a
entronização da Imagem do Sagrado Coração nos lares.
A devoção do Coração de Jesus foi o símbolo mais expressivo do catolicismo
romanizado, e as práticas relacionadas com essa devoção distinguiam essa nova maneira
de ser cristão, através da fidelidade da Santa Sé. Na devoção ao Coração de Jesus era
enfatizada a responsabilidade pessoal de cada cristão no desígnio salvífico de Deus, ao
mesmo tempo em que se ressaltava a necessidade de reparar, com as obras espirituais, os
pecados cometidos pelos hereges e maus cristãos. A devoção foi amplamente difundida
através de imagens, orações e cânticos.155
154
O Horizonte 23/4/1927. 155
AZZI, Riolando. História da Igreja no Brasil: ensaio de interpretação a partir do povo: tomo II:
terceira época: 1930-1964. Petrópolis: Vozes, 2008.
73
A comissão Santificação da Família era destinada à preservação ou saneamento
da família. Havia uma comissão central ligada às paróquias. Tal comissão de santificação da
família estava sob a direção de um sacerdote delegado da arquidiocese. Todas as
paróquias se faziam representar por uma senhora indicada pelo vigário. O vigário dividia
grupos de casas, que eram então repartidos, sendo duas senhoras responsáveis por cada
grupo. As senhoras passavam de casa em casa divulgando os benefícios da comissão e
registrando a situação civil, sacramentos recebidos e educação cristã. Trabalhavam para
regularizar os matrimônios “irregulares”, inscreviam as crianças em cursos de catecismo e
realizavam batismo e outros sacramentos.
Compreendemos as três comissões, Fé e Moral, Piedade e Culto e Santificação
da Família, como parte do projeto de modernização da elite mineira, baseada na
moralização dos costumes. Além disso, era uma estratégia da Igreja Católica de cooptar as
pessoas que não estavam submetidas ao discurso religioso católico.
A principal preocupação da comissão Imprensa, por sua vez, era a manutenção
do jornal O Horizonte e a campanha para torná-lo diário, o que ocorreu no ano de 1935,
quando inclusive passou a se chamar Diário Católico, popularmente conhecido como Diário.
As Filhas de Maria eram as principais responsáveis pela função de efetuar vendas avulsas
do jornal e angariar novas assinaturas. Tinham espaço também, como vimos, para escrever
nas colunas femininas do periódico.
A Comissão Vocação Sacerdotal era presidida por Clélia Miranda e tinha como
objetivo a formação do clero diocesano. Preocupava-se em aumentar o corpo eclesiástico
da igreja católica belo-horizontina.
Sob a responsabilidade das Ligas Católicas de São José e pela Pia União das
Filhas de Maria da Boa Viagem, o comitê Descanso Festivo cuidava das festividades
realizadas nas paróquias. Era responsável também pela criação de um postulado de moral e
de higiene. Intentavam instruir o povo acerca da obrigação de descanso nos domingos e
dias santos, além de zelar e urgir perante as fábricas, casas comerciais, empresas
construtoras, associações operárias, patrões, operários e instituições diversas. Exigiam que
os poderes públicos criassem leis sobre esse tema e trabalhavam para o seu cumprimento.
Ao longo dos anos, algumas comissões sofreram alterações: no ano de 1930, o
Monsenhor Álvaro Negromonte assumiu a presidência da comissão Sociais e Operárias. Em
1931, a comissão Fé e Moral passou a ser composta pela pastoral da Doutrina Cristã. A
comissão Piedade e Culto e Santificação de Famílias ficou sob a responsabilidade do
Apostolado da Oração.
Ainda no ano de 1931, as Filhas de Maria assumiram o comando da seção
Obras Sociais e Operárias, com a obrigação de visitar as fábricas e assistir as mulheres
operárias. As Mães Cristãs substituíram as comissões de Imprensa e Dia Festivo,
74
trabalhando por difundir a boa leitura e pela prosperidade da imprensa diocesana.156 A
alteração mais significativa foi a oficialização da parceria entre as Damas da Caridade e a
Sociedade São Vicente de Paulo na realização de todas as obras de assistência popular.
Houve nesse período uma expansão dos grupos de Damas da Caridade pelas diferentes
paróquias da capital e consequentemente do trabalho desenvolvido por elas.
Vale a pena salientar que, nos anos de 1930 e 1931, os intelectuais católicos,
bem como seus projetos, tiveram ampla presença no governo varguista. A Igreja se
destacou como importante força social no processo de consolidação do novo regime
republicano. Tal conjuntura permitiu a realização de muitos projetos católicos, especialmente
no campo social, na saúde e na educação.
2.2.1 Comissão Escolas
Presidida por Maria Cintra, a comissão Escolas era responsável pela criação e
organização de aulas de catecismos nas paróquias, escolas e colégios. Trabalhavam para
introduzir nas escolas públicas a instrução religiosa, criar escolas católicas e prover fundos
de benfeitores e doações.
A questão educacional ocupava um lugar importante nas ambições das
associações femininas e tinha basicamente duas finalidades: formar profissionais com boa
cultural geral e capacidade técnica e oferecer possibilidades de trabalho para o pessoal
diplomado.157
Nos primeiros anos de existência da CCF, a comissão Escolas preocupava-se
basicamente com o estabelecimento das aulas de catecismo nas escolas públicas de Belo
Horizonte. Maria Luiza de Almeida Cunha e Emilia Crurau eram as responsáveis por
negociar as autorizações com os diretores escolares. Quando recebiam a autorização,
encaminhavam catequistas para as escolas. As aulas de catecismo eram ministradas pelas
mulheres que compunham a comissão, sendo elas instruídas a ministrar as aulas dentro das
novas práticas pedagógicas, influenciadas pelos métodos escolanovistas. As catequistas
deviam seguir o programa de ensino elaborado por Branca Vasconcelos, que era professora
de Música na Escola Normal Modelo e diretora do colégio Barão de Macaúbas. O programa
tinha o objetivo de tornar as aulas de ensino religioso mais atraentes às crianças.
156
Ata da Confederação Católica Feminina, 25/05/1931. 157
DIEBOLT, Evelyne. História do Trabalho Social: nascimento e expansão do setor associativo
sanitário e social (França, 1901-2001). In: Estudos Feministas, Florianópolis, 13 (2): 256 maio-agosto, 2005.
75
Cumpre ressaltar que, diferente do que propõe parte da historiografia da História
da Educação, os educadores católicos preocupavam-se em tornar o ensino religioso mais
prazeroso para os alunos e apropriavam-se das práticas pedagógicas propostas pelo
movimento da Escola Nova158. A Revista do Ensino159 e o jornal O Horizonte eram os
principais veículos de popularização de como deveria ser o ensino religioso nas escolas.
Em artigo publicado no O Horizonte, intitulado “O Ensino Religioso”, Maria Luiza
de Almeida Cunha mostra-se preocupada com a metodologia utilizada nas aulas de ensino
religioso. Afirma que o catecismo era ensinado por mulheres caridosas e inteligentes, mas
que não sabiam ensinar de acordo com a escola ativa. Maria Luiza propunha como solução
a organização de livros à luz da metodologia hodierna para instruir as catequistas. Sugeria
ainda, para amenizar as aulas de catecismo, a utilização de filmes, quadros, objetos e
excursões. Além disso, pedia às catequistas que abandonassem os caderninhos de religião,
pois entendia que a metodologia não era alheia ao ensino da prática cristã.160
Nessa empreitada, conseguiram retomar as aulas de catecismos em vários
jardins de infância e colégios, dos quais destacamos Escola Anexa à Escola Normal Modelo;
o Jardim de Infância Delfim Moreira; Jardim João Pinheiro; Jardim de Infância e o curso
158
Surgiu no Brasil, em meados dos anos 1920, com o objetivo de colocar o país em sintonia com os
desenvolvimentos teóricos e práticos desenvolvidos nos Estados Unidos e na Europa. Na constituição de um discurso renovador da escola brasileira, a Escola Nova produziu enunciados que, desenhando alterações no modelo escolar, desqualificavam aspectos da forma e a cultura em voga nas escolas, aglutinadas em torno do termo “tradicional”. Era pela diferença quanto às práticas e saberes escolares anteriores que se construía a representação do “novo” nessa formação discursiva. Já no fim do século XIX, muitas das mudanças afirmadas como novidades pelo “escolanovismo” nos anos 20, povoavam o imaginário da escola e eram reproduzidas, como prescrição, nos textos dos relatórios de inspetores e nos preceitos legais: a centralidade da criança nas relações de aprendizagem, o respeito às normas higiênicas na disciplinarização do corpo do aluno e de seus gestos, a cientificidade da escolarização de saberes e fazeres sociais e a exaltação do ato de observar e de intuir na construção do conhecimento do aluno.. Na década de 20, entretanto, essas preocupações voltaram a ser enunciadas como “novas” questões. A ruptura entre uma e outra formação discursiva não vinha associada a uma alteração dos enunciados, mas de seus significados. A escola renovada pretendia a incorporação de toda a população infantil. Serviria de base à disseminação de valores e normas sociais, em sintonia com os apelos da nova sociedade moderna, constituída a partir dos preceitos do trabalho produtivo e eficiente, da velocidade das transformações, da interiorização das normas de comportamentos otimizados em termos de tempo, e movimento de valorização da perspectiva da psicologia experimental na compreensão científica do humano, tomado na dimensão individual. VIDAL, Diana Gonçalves. Escola nova e processo educativo p.497- 498. In: LOPES, Eliane Marta Teixeira, FARIA FILHO, Luciano Mendes de, VEIGA, Cynthia Greive. 500 anos de Educação no Brasil. 3ª ed., Belo Horizonte: Autêntica, 2003. p. 497-518.
159 A Revista do Ensino, órgão oficial da Diretoria de Instrução Pública em Belo Horizonte foi criada
em 1925, através da Reforma Mello Vianna. Na época era leitura obrigatória dos professores e demais funcionários da rede pública de ensino de Minas Gerais. De acordo com o editorial, servia para disseminar uma nova concepção de educação e ensino e, ao mesmo tempo, para contribuir com a sistematização de determinados valores, normas e atitudes ditados pela república. Teve apoio decisivo da Igreja Católica. Na ocasião, Lúcio dos Santos era diretor da Instrução Pública e foi grande incentivador da publicação da Revista. Ver: BORGES, Vera Lúcia Abrão. Modernização, Democracia e Caráter Nacional da Educação em Minas Gerais pela análise da Revista do Ensino 1925/1929. Educação e Filosofia v.16 – nº31. jan./jun. 2012.
160 O Horizonte 25/2/1928.
76
Fundamental do colégio Bueno Brandão; Escola de Aprendizes Artífices, dentre outros.
Além disso, fundaram dois Jardins Eucarísticos: um no bairro Sagrada Família e outro no
centro da cidade. Percebe-se uma clara intenção de assistir e instruir a infância dentro dos
valores morais católicos, atentos à pedagogia da época.
A militância para a realização do catecismo nas escolas públicas perdurou de
maneira mais intensa até o ano de 1928, quando o presidente Antônio Carlos de Andrada
permitiu oficialmente o ensino religioso facultativo dentro do horário de aula. Após essa
conquista a comissão criou uma nova agenda, que passava basicamente pela organização
de cursos de aperfeiçoamento do ensino religioso para as professoras, manutenção de
caixas escolares, luta contra a coeducação dos sexos e discussões sobre o ensino de
higiene sexual nas escolas.
As caixas escolares eram associações beneméritas que visavam conceder
auxílios às crianças desvalidas. Distribuíam prêmios, merendas, calçados, roupas, objetos
de uso pessoal, serviços de higiene e medicamentos. As professoras organizavam as listas
dos alunos pobres que deveriam ser assistidos. As verbas das caixas escolares eram
oriundas das mensalidades dos sócios e sócias, de contribuições de donativos, produtos de
subscrições, de quermesses, teatros e festas, e produto de multas e de taxas especiais
criadas em seu favor pelo estado e município. A forma mais corriqueira de arrecadação
eram os bailes de caridade, que inclusive tinham ampla divulgação pela imprensa.161
Semestralmente as mulheres responsáveis pelas caixas escolares eram
obrigadas a remeter os balancetes à Diretoria de Instrução para fins estatísticos. Não
encontramos nenhum balancete, entretanto, apenas o fato de terem a obrigação de
organizar esses documentos e submetê-los ao diretor de instrução evidencia a articulação
das mulheres com as instâncias públicas e a necessidade de organização e planejamento
de seus trabalhos.
O Padre Álvaro Negromonte comandava a ação da comissão na luta contra a
coeducação dos sexos e o ensino de higiene sexual. Negromonte formou-se e ordenou-se
em Olinda, em 1924. Nesse mesmo ano, por problemas de saúde, mudou-se para Belo
Horizonte. Devido à estreita relação da sua trajetória com a Educação,162 logo que chegou à
capital mineira integrou-se à atividade catequética e educacional.
No que diz respeito à questão do ensino catequético na escola, Negromonte
defendia o argumento de que o catecismo era, no cenário educacional brasileiro, um
161
MINAS GERAIS. Regulamento do Ensino Primário, 21 de agosto de 1924. Decreto n. 6.655. C. 162
ORLANDO, Evelyn de Almeida. Por uma civilização cristã: a coleção monsenhor Álvaro
Negromonte e a pedagogia do catecismo (1937-1965). Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2008.
77
importante recurso utilizado pela igreja para cumprir sua dupla missão de formar o homem
para seu próprio bem e para o bem estar social.163
Como mostra a historiografia sobre o tema, no ano de 1931, diante da
possibilidade real de traçar um plano nacional de educação, os educadores brasileiros se
mobilizaram para ter suas ideias educacionais contempladas. Devido às divergências sobre
o ensino religioso, coeducação e higiene sexual nas escolas, houve a divisão dos
educadores em dois grupos: de um lado os católicos e, de outro, os pioneiros. Tal
polarização não estava relacionada às práticas pedagógicas escolanovistas, uma vez que
ambos valiam-se dos preceitos da Escola Nova.
Negromonte e os católicos de maneira geral eram contrários à formação de
classes mistas nas escolas por pelo menos dois aspectos. Primeiro, porque acreditavam
que a educação feminina devia manter a família e a pátria dentro dos cânones desejáveis
para o desenvolvimento do país. A mulher era a principal responsável pelo seu corpo e de
seus filhos. Cabia aos homens serem provedores da família e guardiões da mulher.164
Assim, era necessária uma formação escolar diferenciada para os sexos masculino e
feminino. Nesse sentido, é válido ressaltar que os católicos não eram os únicos que viam
com resistência o sistema de classes mistas. Muitos higienistas demarcavam diferenças dos
papéis femininos e masculinos na constituição familiar. A mulher era responsabilizada pela
sua higiene, de sua família e de sua casa, devendo ser educada para esse fim. Além disso,
a Igreja católica tinha um sistema de internato destinado às filhas das elites. Era uma
proposta educativa que não atentava contra as ideias tradicionais e representava uma
segurança para as famílias que desejavam que as filhas estudassem em bons colégios e
tivessem uma boa instrução religiosa.
Sobre a higiene sexual, os católicos defendiam que os pais tinham o dever de
falar para os filhos sobre a sexualidade, de forma inteligente e discreta. Acreditavam que a
criança tinha que ser mantida afastada o maior tempo possível do conhecimento sobre a
vida sexual. Os pais só deviam orientar os filhos sobre o assunto quando a criança
mostrasse curiosidade sobre tais questões. Orientavam que os pais deviam responder às
perguntas com naturalidade, mas sem explicações minuciosas sobre a concepção.
Alertavam que a adolescência era a fase mais perigosa de todas as idades. Nessa fase, a
163
SOUZA, Valéria Carmelita de. A Cruzada Católica uma busca pela formação de esposas e
mães cristãs em Sergipe na primeira metade do século XX. São Cristóvão/NPGED. Dissertação de mestrado, 2005.
164 ORLANDO, Evelyn de Almeida. Por uma civilização cristã: a coleção monsenhor Álvaro
Negromonte e a pedagogia do catecismo (1937-1965). Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2008.
78
explicação das questões sexuais devia ser dividida por gênero, os pais orientavam os filhos
e as mães as filhas. Na infância, a responsabilidade recaía apenas sobre as mães.165
Na perspectiva católica, a escola deveria desenvolver um trabalho complementar
junto às famílias. Desse modo, Álvaro Negromonte trabalhava junto às associadas
orientando-as sobre essas temáticas. As agremiadas, por sua vez, compartilhavam esses
saberes com as mulheres assistidas pela confederação e com as professoras primárias. Na
concepção do eclesiástico, as professoras deveriam estar bem orientadas sobre o melhor
modo de iniciar o assunto de higiene sexual na escola, e neste sentido, ser católica era um
atributo importante.
2.2.2 Comissão Obras Sociais e Operárias
O principal objetivo da comissão Obras Sociais e Operárias era a visitação às
mulheres operárias, oferecimento de cursos, bem como todo tipo de assistência às
operárias e aos seus filhos. As Filhas de Maria era a agremiação responsável pelos
trabalhos da comissão que, no ano de 1931, passou a ser presidida por Álvaro Negromonte.
Para visitação às fábricas eram formadas pequenas comissões. No primeiro
momento as visitas eram destinadas ao estudo das condições em que se encontravam as
operárias. Elaboravam questionários sobre a organização familiar, modos de vida e religião
professada. Posteriormente as comissões, cientes das necessidades, prestavam assistência
material, moral, médica, instrução escolar, formação técnica e lazer.
As principais fábricas visitadas pelas associações femininas para assistir as
operárias foram: Marçola, Cemil, Balas Lalka, Sabonetes Haya, Balas Suissa, Malhas
Clesius, Camisaria São Jorge, Toalhas Minas Fabril, Fábrica Ypiranga de Portugal, Casa
Nova, Casas Olga e Azul, Fábrica Progresso e Oficina de Costura Madame Branca.
As fábricas visitadas eram em sua maioria do ramo têxtil. Conforme mostra Alda
Britto da Motta166, a presença feminina no universo do trabalho se deu de forma complexa,
existindo certos limites para as aspirações femininas. Eram inúmeros os empecilhos ao
acesso a determinadas profissões. As ofertas disponíveis, em geral, estavam próximas do
que se considerava uma extensão das atribuições das mulheres: professora, enfermeira,
datilógrafa, taquígrafa, secretária, telefonista, operária das indústrias têxteis, de confecção e
produtos alimentícios. Em Belo Horizonte não foi diferente, e o setor industrial, sobretudo os
165
Ibid. 166
MATOS, Maria Izilda e BORELLI, Andrea. Espaço Feminino no mercado produtivo. In: PINSK,
Carla Bassanezi e PEDRO, Joana Maria (Org.). Nova História das Mulheres. São Paulo: Contexto, 2012.
79
setores de fiação, tecelagem, vestuário e alimentos, foram os que mais arregimentaram a
mão de obra feminina.
Uma das preocupações latentes da comissão era a criação de agremiações e
estatutos que protegessem as operárias, sobretudo as crianças. As associadas mostravam-
se preocupadas com os tipos de atividades desempenhados por estas últimas nas fábricas,
procurando negociar com os patrões que os serviços mais leves fossem destinados a elas.
Além disso, criavam escolas para as crianças operárias. Um exemplo dessas iniciativas era
a realização de aulas para os pequenos jornaleiros, no salão dos vicentinos e na
Confederação Católica do Trabalho.
A comissão ocupou-se da criação de pensionatos para as moças pobres
realizarem suas refeições. Criaram várias escolas pastorais destinadas a ensinar as
primeiras letras e o ensino religioso às operárias. Ministravam, ainda, vários cursos, a
destacar o de arte culinária, de empregada doméstica e de costura. A comissão também
disponibilizava visitas médicas e aviamento de receitas às operárias. Faziam visitas aos
Hospitais de Inválidos, Asilo Bom Pastor, Instituto Raul Soares, Instituto Bioterápico, Santa
Casa, Orfanato Santo Antônio, Hospital São Vicente de Paulo e Creche Menino Jesus.
Nessas visitas, as Filhas de Maria ministravam palestras de cunho moral e noções de
higiene, além de prestarem serviços de assistência e doações.
As atividades desenvolvidas pela comissão Operárias eram bem próximas às da
Assistência e Caridade, no entanto, sua principal preocupação era a formação das mulheres
e crianças para o trabalho, criando medidas de proteção trabalhista. A tabela 1 mostra
algumas obras criadas com esse objetivo.
TABELA 1 – Obras realizadas pela comissão Obras Sociais e Operárias
OBRA ANO Curso de Arte Culinária – direção das Irmãs da Terra 1928 Agremiação Católica do Trabalho 1928 Escola Pastoral Santo Affonso 1928 Pensão e Restaurante para Normalistas – direção Irmãs Salesianas 1929 Pia União dos Operários para socorro espiritual e assistência médica no caso de doenças
1930
Escolas para pequenos jornaleiros – salão dos vicentinos e no salão da confederação católica do trabalho
1930
Curso de primeiras letras e religião para empregadas na Escola Normal Modelo 1931 Oficina Madame Branca Monteiro 1931 Salão de Costura para crianças pobres do Carlos Prates 1931 Cursos para operárias no Colégio Sacre Couer Marie 1931 Espaços de recreação, teatros e festivais para operários 1932 Instalação da Escola Santa Zita no Grupo Escolar D. Pedro II 1932
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos das Atas da Confederação Católica Feminina (1927-1934).
80
Como podemos visualizar na tabela acima, além da criação de espaços de
instrução e formação profissionais das operárias assistidas, estava previsto no programa da
comissão a organização de salas de recreação para as operárias e seus filhos, como o
espaço criado na paróquia São Geraldo. A organização de teatros, cinemas e festivais
revela o objetivo de destinar aos assistidos uma educação estética ligada à educação dos
sentidos. Os católicos acreditavam que essa era uma parte fundamental na formação
integral do ser humano, sendo a arte, neste processo, responsável por valorizar e trabalhar
a criatividade.
Como podemos observar, o programa da comissão operária intentava atingir um
modelo de mulher operária, passando pelos seguintes atributos: ser católica, ter alguma
instrução intelectual, ter noções de higiene e cuidado com a casa (saber como se prepara
um alimento, se lava, passa, conserta roupas), além de saber escolher um bom marido, que
fosse educado, honesto e trabalhador.
Além disso, segundo Louro167, havia a expectativa de que as mulheres das
camadas populares fossem diligentes, honestas, ordeiras, asseadas. A elas caberia
controlar seus maridos e formar seus filhos para serem trabalhadores e trabalhadoras.
Desse modo, em linhas gerais a Comissão Obras Sociais e Operárias procurava a melhoria
das condições morais e materiais das mulheres operárias e procuravam instruí-las sobre
higiene e educação moral.
2.2.3 Comissão Assistência e Caridade
Sob a direção do Dr. Furtado de Menezes168 e a presidência de Alexandrina
Santa Cecília, a comissão Assistência e Caridade tinha como tarefas a criação e direção de
obras de caridade. Joaquim Furtado de Menezes teve uma ampla atuação no campo da
assistência em Minas Gerais, fundando e dirigindo a Sociedade de São Vicente de Paulo
em Minas Gerais. Destacam-se no seu trabalho de assistência aos pobres a criação da
Assistência aos Mendigos e da Cidade de Ozanan.169
167
LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: DEL PRIORI, Mary. (Org.). História das Mulheres no Brasil. 2 Ed. São Paulo: Contexto, 1997.
168 Joaquim Furtado de Menezes, engenheiro de minas e civil. Farmacêutico e professor da Escola
de Minas de Ouro Preto. Foi diretor de Indústria do Estado, Secretário de Agricultura, prefeito da cidade de Águas Formosas e deputado federal. Atuou como membro do Conselho de Imprensa de Belo Horizonte, colaborou para os jornais católicos O discípulo, O Regenerador, Adoremos, O Horizonte e Diário. Ajudou na fundação da corporação dos médicos católicos e dos engenheiros católicos.
169 Sobre as obras protagonizadas por ele ver: SOUZA, Marco Antônio de. As estratégias da
pedagogia do assistencialismo em Belo Horizonte, 1930-1990: Educação e Caridade. Tese de
81
Alexandrina de Santa Cecília, por sua vez, era normalista e trabalhou como
professora da Escola Normal Modelo, nas cadeiras Costura e Trabalhos de Agulha (1907),
Trabalhos Manuais (1910), e Trabalhos Manuais e Economia Doméstica (1916). A
dedicação às disciplinas foi importante para seu trabalho na assistência, haja visto que
grande parte dos projetos destinados às mulheres e jovens tinha como mote a formação em
trabalhos manuais, especialmente corte, costura e economia doméstica. Alexandrina
também lecionou como professora substituta a disciplina de Ginástica e participou da
comissão de professores que redigiu o primeiro regimento interno da Escola Normal Modelo.
Na ocasião, viajou para o Rio de Janeiro para comparar o currículo da Escola Normal
Modelo de Belo Horizonte com a Escola Normal da capital federal. Além disso, ela foi
presidente do pensionato Nossa Senhora Auxiliadora e benfeitora da Creche Menino Jesus.
Sobre a inspiração de Gustavo Capanema e em parceria com outras associadas, fundou em
Belo Horizonte, no ano de 1932, a Sociedade Mineira de Assistência à Infância (SMAI).
Embora tenha atuado de forma significativa no ensino secundário em Belo
Horizonte, até a segunda década do século XX, Alexandrina de Santa Cecília, que pertencia
à família do médico Santa Cecília, desempenhou trabalhos importantes no campo da
assistência social, deixando a carreira docente em segundo plano. Ao lado de Furtado de
Menezes, presidiu a comissão Assistência e Caridade, na qual era responsável por
administrar as verbas arrecadadas, organizar campanhas e pedir subsídios junto ao poder
público, especialmente nas esferas municipais e federais.
De acordo com D. Cabral, a Conferência Vicentina e os centros de Senhoras da
Caridade não davam conta de tantas necessidades, sendo urgente a criação de novos
espaços de assistência. A comissão, então, tinha o compromisso de ampliar a atuação
assistencialista da SSVP. Dessa forma, estabeleceu-se como objetivos desse grupo:
- Incrementar a vida dos vicentinos e senhoras de caridade nas associações já existentes, recrutando novos combatentes, estimulando a seção perseverança nos moldes de São Vicente de Paula. - Multiplicar, o mais que seja possível, o número dessas associações em todas as paróquias e recantos da arquidiocese. - Organizar um dispensário, agência para ser o canal de esmolas que se pedem porta a porta (mendicância publica). - Conselhos de higiene e moral, instrução religiosa, facilitação de trabalhos. - Seguir modelo Alemanha e França que fazem matrícula dos pobres. - Educação para a caridade. - Assistência espiritual, recebimento de sacramentos aos doentes e pobres. - Assistência religiosa nos hospitais, asilos, prisões e outros institutos. - Assistência religiosa, moral e material as crianças de rua. - Assistência religiosa, moral nos albergues noturnos e públicos.
Doutorado. Programa de Pós-Graduação de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, 2001; e SOUZA, Marco Antônio. A economia da caridade: estratégias assistências e filantrópicas em Belo Horizonte. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004.
82
- Assistência religiosa, moral nas pensões e hotéis.170
O programa da comissão era bem similar às aspirações da assistência vicentina.
Baseado numa ampla assistência aos pobres e doentes, preconizavam os hábitos
higiênicos, educação moral e a criação de instituições asilar, hospitalar e educacional.
Destacavam ainda a necessidade de criação de institutos de Senhoras de Caridade em
todas as paróquias da cidade e um curso de enfermeiras católicas. O objetivo era formar
enfermeiras profissionais católicas que certamente seriam preferidas entre as famílias e
atuariam nas instituições em que desenvolviam o trabalho caritativo.
A meta de formar enfermeiras profissionais católicas foi, em parte, alcançada em
1933, com a criação da Escola de Enfermagem Carlos Chagas. A Escola começou a
funcionar no dia 19 de junho desse mesmo ano, no Hospital São Vicente de Paulo, num
contrato estabelecido entre os diretores da Faculdade de Medicina e Saúde Pública. A data
é bem representativa para o calendário católico, por ser o dia consagrado a São Vicente de
Paulo.171 Salienta Geralda Fortina dos Santos que o ideal era formar uma profissional
“moderna” para atuar na nova organização sanitária, não apenas comprometida com
comportamentos altruístas e abnegados, mas com sólida formação técnica.172
É relevante destacar que a parceria entre a comissão Assistência e Caridade e a
Sociedade São Vicente de Paulo foi fortalecida no ano de 1931, quando Furtado de
Menezes e Alexandrina Santa Cecília transformaram a comissão efetivamente numa
extensão dos trabalhos sociais desenvolvidos pela SSVP. Houve nesse período um nítido
aumento do número de Senhoras da Caridade, bem como das instituições para atender os
pobres, crianças e mulheres viúvas, abandonadas ou “desviadas”.
A prioridade de atendimento desse grupo de pessoas era difundida desde o I
Congresso Católico Mineiro, organizado pelo Centro da União Popular, no ano de 1910. No
evento foi determinado que as obras de caridade a serem fundadas em Minas Gerais
deveriam considerar três classes em particular: os enfermos, a infância desvalida e as
infelizes arrependidas.173 Era exatamente nesses três grupos da sociedade que a comissão
Assistência e Caridade buscou atuar de forma efetiva.
A comissão Assistência e Caridade foi sem dúvida o segmento que mais
desempenhou ações dentro da CCF. Dentre as principais atividades da comissão estavam
170
O Horizonte 13/04/1927 171
TEIXEIRA, Virgínia Mascarenhas Nascimento. O quotidiano da Escola de Enfermagem Carlos
Chagas: entre Luz e Sombra. Dissertação de Mestrado Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2002
172 SANTOS, Geralda Fortina dos. Escola de Enfermagem Carlos Chagas (1933-1950): a Deus –
Pela Humanidade, Para o Brasil. Tese de Doutorado Programa de Pós-Graduação em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2006.
173 Boletim do Centro da União Popular.
83
as organizações de festividades (Natal, Páscoa, etc.), a distribuição de roupas e gêneros
alimentícios aos pobres, a visita aos presos, aos meninos de rua e aos doentes nos
hospitais, o encaminhamento de internações, as visitas domiciliares a doentes, os
atendimentos médicos, a doação de medicamentos, etc. Essa era a comissão que tinha o
maior número de integrantes. Para além da apresentação de trabalho nas reuniões da CCF,
a comissão reunia-se periodicamente no salão dos vicentinos, visando melhor direção e
controle das tarefas.
2.3 A comissão Assistência e Caridade, as Damas da Caridade e a
parceria com a Sociedade São Vicente de Paulo
A Sociedade São Vicente de Paulo instaurou-se em Belo Horizonte no ano de
1897, com a criação do Conselho Vicentino da Boa Viagem. Em 1901, foi criado o Conselho
São José.174 Esses conselhos eram responsáveis pelas conferências criadas nas demais
paróquias. Do ponto de vista administrativo, os conselhos eram corpos executivos e de
direção destinados a manter a união e a disciplina no corpo ativo formado pelas
conferências. O Conselho Geral era, verdadeiramente, o centro da instituição, sendo que
todas as conferências e suas obras estavam sujeitas a ele, cabendo-lhe decidir sobre a
agregação de novas conferências. Além disso, o Conselho Geral tinha autonomia para
instituir e criar os regulamentos.175 Procuravam organizar a assistência tornando-a eficiente,
com uma racionalidade clara: organizar a família e preparar o homem para o trabalho.
De acordo com Pinto, a SSVP, em consórcio com as elites locais e o Estado,
procurava meios de enfrentar os problemas da pobreza no período em que a economia se
encontrava em transição. Os membros da SSVP, pertencentes à elite católica, estavam
interessados na normatização da vida pública e procuravam reconduzir o pobre ao mundo
do trabalho, mantendo a organização social.176
As Damas da Caridade estavam submetidas aos Conselhos Particulares da
SSVP e foram instituídas nos anos 1920. Como dito anteriormente, as primeiras
associações se deram nas paróquias da Boa Viagem e São José. Paulatinamente, outras
associações foram sendo criadas. Até o ano de 1931, havia Damas da Caridade nas
174
TORRES, João Camilo de Oliveira. Igreja de Deus em Belo Horizonte. Belo Horizonte, 1972. 175
SOUZA, Marco Antônio de. Op. cit., nota 33. 176
PINTO, Ana Paula Magno. Assistência, Saúde e Sociedade na Zona da Mata Mineira (1895-
1939): a Sociedade São Vicente de Paulo. Anais do XVI Encontro Regional de História Anpuh-Rio: saberes e práticas científicas. Rio de Janeiro, 2014.
84
paróquias de Lourdes, Santa Efigênia, Lagoinha, Barro Preto e Floresta. Depois foram
criadas associações nas paróquias Santo Antônio, São Sebastião, Santa Tereza e Santa
Terezinha. O aumento do número de Damas da Caridade ampliou de forma significativa as
atividades desenvolvidas por elas.
Seguindo o modelo austero dos vicentinos, a estrutura organizacional das
Damas de Caridade tinha uma hierarquia constituída. Tal estrutura, como foi dito no capítulo
anterior, garantia às Damas que ocupavam os cargos mais elevados um status no interior da
instituição e frente às demais senhoras da camada social que faziam parte. As senhoras que
podiam atuar na visitação dos indivíduos auxiliados, decidindo quem poderia continuar a
usufruir do benefício, eram chamadas Damas Ativas.177
O grande objetivo da assistência vicentina era a integridade das famílias, mantê-
las afastadas dos perigos da miséria e impedir a saída dos filhos para as ruas, caindo na
promiscuidade e vagabundagem. Assim, a visita à família pobre tinha como objetivo,
velar pela união e perfeita harmonia entre os membros, velar pela saúde, velar pelos que trabalham, obter visitas médicas e medicamentos, obter emprego para os desocupados, obter instrução para as crianças, fornecer roupa, calçados, livros e finalmente ensinar regras de higiene.
178
Antes da primeira visita, os vicentinos faziam a sindicância, cuja finalidade era
selecionar as famílias que passariam a ser adotadas. Em seguida, a comissão fazia o
primeiro contato para levar vale-compras para alimentação. As famílias eram classificadas
em cinco grupos e auxiliadas com vales nos seguintes valores, 5$000, 7$000, 9$000,
12$000 e 15$000. O valor do vale estava relacionado ao número de pessoas que compunha
a família, assim como à possibilidade dos membros familiares de trabalhar (ou a sua
completa impossibilidade).179 Havia uma meta de que as famílias assistidas fossem visitadas
pelo menos uma vez por semana.
Em um relatório da assistência vicentina na capital, publicado no O Horizonte,
em janeiro de 1927, observa-se que das 204 famílias socorridas, 80 tinham homens por
chefes e 124 eram chefiadas por mulheres. Dos chefes masculinos, 19 eram solteiros, 48
casados e 13 viúvos. Já as famílias chefiadas por mulheres, 15 eram solteiras, 11
separadas dos maridos e 98 viúvas180. Como podemos ver, mais de 60% das famílias
177
SANTANA, Camila Jansen de Mello de. A caridade a si ou ao outro? As práticas católicas
como auto-salvação. Revista Aulas. Dossiê Religião n. 4 abril-jun., 2007. 178
Boletim Brasileiro, 1901 p. 299-300 apud SOUZA, Marco Antônio de. A Economia da caridade:
estratégias assistenciais e filantrópicas em Belo Horizonte. Belo Horizonte: Newton Paiva, 2004. p. 60.
179 O
Horizonte 19/01/1927 – Assistência aos mendigos-algarismos elouquentes.
180 Ibid.
85
assistidas tinham as mulheres como chefes. Esse dado nos permite pensar que, embora no
discurso houvesse a idealização de uma família nuclear tradicional, as famílias assistidas
fugiam a esse padrão e tinham as mulheres como líderes. Observa-se também que esse
universo de mulheres não tinha maridos, justificando o reforço da formação profissional, a
fim de que elas pudessem sobreviver sem a presença masculina.
Além da assistência à família existiam outras formas de atuação da SSVP, as
chamadas “obras especiais”. As obras especiais em Belo Horizonte, de acordo com Marco
Antônio de Souza, eram divididas nas seguintes modalidades:
- Obra Dispensa Econômica: organização destinada a comprar mercadorias a serem distribuídas aos pobres. Cuidava também do controle sobre os vales distribuídos para a compra de gêneros alimentícios; - Obra Enfermaria: mantida pelas conferências locais apropriadas para o atendimento de mendigos que ficavam sob os cuidados dos confrades. Atuavam especialmente na área de saúde. Encaminhavam doentes para hospitais e dispensários, visitando-os em seus domicílios ou enfermarias. - Obra Albergues: a intenção era abrigar os pobres evitando a desagregação da família. - Obra Casinhas de Morada: envolvida na construção de moradias para abrigar as famílias adotadas. Em alguns casos, alugavam por preços módicos, os prédios recebidos de donativos. - Obra Rouparia: consistia em distribuir roupas aos pobres, o que podia ser feito de duas maneiras: através da compra de tecido que era transformado em roupas pelas damas de caridade ou através de campanhas de doação. - Obra Patrocínio: destinada a oferecer auxílio aos alunos pobres nas escolas públicas. Doavam livros, cadernos e uniformes. - Obra Hospitais: visitas realizadas semanalmente aos hospitais. Os confrades, após obterem a permissão da administração do hospital, levavam aos doentes animação e conforto, além de recados à família dos doentes. - Obra Vigilância Moral: atuavam na reabilitação de uniões ilícitas. - Obra Prisões: realizavam visitas nas prisões e procuravam reabilitar os presos através do apelo religioso. - Obra Visita Sagrada: realizavam doações de livros religiosos, roupas e prestavam pequenos serviços.
181
Seguindo a categorização das obras especiais apresentadas por Souza, os
dados contidos nas atas das reuniões da CCF foram organizados em tabelas. A análise foi
feita por ano, com o objetivo de observar no tempo como as associadas organizaram as
reivindicações, programas e prioridades da comissão.
A comissão foi dividida em duas fases, a primeira de 1927 a 1930, e a segunda
de 1931 a 1934. A primeira fase caracteriza-se por atividades mais pontuais e menos
diversificadas. Dessa fase destacamos a organização da Cruzada Santa Terezinha do
Menino Jesus, em favor dos filhos de tísicos e morféticos e o auxílio na construção da Vila
181
SOUZA, Marco Antônio de. A economia da caridade: estratégias assistências e filantrópicas
em Belo Horizonte. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004.
86
dos Proletários Tuberculosos. Já a segunda fase apresenta-se mais dinâmica na realização
de atividades, sendo também marcada pela criação de variados institutos de assistência.
2.3.1 As atividades realizadas na primeira fase da Comissão Assistência e Caridade
Como podemos observar na Tabela 2, em 1927 as atividades da comissão
voltaram-se essencialmente para dispensa econômica, rouparia e vigilância. Nesse período
havia apenas três grupos de Damas, as de São José, Boa Viagem e Lagoinha. Pelo
conteúdo das atas vê-se que nesse ano a comissão estava em processo de organização de
ações, muitas ideias e projetos, mas poucas ações concretas.
TABELA 2 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1927
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos das Atas da Confederação Católica Feminina (1927-1934).
Bráulio Chaves destaca que no ano de 1927 ocorreu a reformulação da estrutura
da Diretoria de Saúde Pública de Minas Gerais. Na ocasião, a parceria entre os municípios
tornou-se mais explícita, com ênfase na profilaxia e no ensino. Houve uma descentralização
dos serviços a partir da criação dos centros de saúde, nos municípios que fariam a ligação
direta com a população pelos atendimentos, na inspeção, na epidemiologia, na educação e
na propaganda sanitária. Esta última tinha papel vital na profilaxia das doenças e no
conjunto das mudanças de práticas culturais. Era pormenorizada a profilaxia de uma série
de doenças transmissíveis, como peste, tifo, difteria, cólera, tuberculose, malária, varíola,
verminoses, doença de Chagas, bouba, doenças venéreas, filariose e lepra.182
Salienta Chaves que o tratamento da lepra foi um assunto à parte na
reformulação dos serviços sanitários. A questão dos leprosários tinha estreita relação com a
imagem social que se construiu em torno da doença. As construções distantes, baseadas
em uma concepção de isolamento dos doentes, foram acompanhadas de uma série de
182
CHAVES, Braúlio Silva. Instituições de saúde e a ideia de modernidade em Minas Gerais na
primeira metade do século XX. In: MARQUES, Rita de Cássia; TORRES, Anny Jackeline; FIGUEIREDO, Betânia Gonçalves (Orgs.). História da Saúde em Minas Gerais: instituições e patrimônio arquitetônico (1808- 1958). Barueri: Minha Editora, 2011. p.52.
Dispensa Econômica Rouparia Vigilância Moral
Atendimento de 320 pobres. (1:082$300)
Damas da Caridade de São José e Boa Viagem com distribuição de roupas e gêneros aos pobres
Levantamento de Verba Damas de Caridade da Lagoinha para Casamento de operárias. (100$000)
87
medidas de caráter profilático, com vistas a conter a enfermidade.183 Dessa maneira,
observa-se a preocupação dos trabalhos da comissão Assistência e Caridade no controle
mais cuidadoso a doenças infectocontagiosas como sífilis, lepra e tuberculose. Por iniciativa
do Conselho Central Metropolitano da SSVP da capital, reuniu-se, em fevereiro de 1927, no
prédio vicentino, um grupo de senhoras para promover, em todo estado, um movimento para
obter recursos e organizar um instituto cujo fim seria recolher os filhos de ambos os sexos
de morféticos, subtraindo o perigo de contágio e ao mesmo tempo evitando que servissem
de veículos de propagação do terrível mal a todos os meios infantis184. Nessa reunião
preparatória ficou resolvida a organização benemérita intitulada Santa Terezinha. Dessa
reunião formou-se uma comissão central sob a presidência de Alice Sigaud. A senhora Alice
ficou responsável pela criação de comissões locais nas cidades e vilas do estado.
Em matéria publicada no jornal O Horizonte, Furtado de Menezes comentava a
iniciativa das Senhoras da Caridade na organização da Cruzada e defendia o isolamento
como a única possibilidade de conter a doença. Assim argumentava em seu artigo,
(...) antigamente suponha-se que a lepra era hereditária e acreditava-se na inutilidade do isolamento dos filhos dos leprosos, tão certo estava o povo e até os médicos de que mais dia menos dia, a lepra surgiria no pobre condenado. Hoje ninguém mais crê na hereditariedade do mal de São Lázaro. A preocupação final hoje de todos que combatem a lepra e a profilaxia.
185
É interessante notar no texto de Furtado de Menezes o seu conhecimento sobre
a etiologia da doença e o entendimento da lepra como uma doença infectocontagiosa.
Ângela Porto explica que a lepra foi uma das primeiras doenças infectocontagiosas a ser
investigada pela microbiologia do final do século XIX e início do XX, no entanto, o bacilo da
lepra não se reproduzia in vitro, não atendendo aos postulados de Kock. Essa
especificidade desencadeou as mais complexas discussões científicas sobre o contágio e
profilaxia da doença. Por isso, de acordo com a autora, durante o I Congresso Internacional
sobre Lepra (1897), ficou determinado que a única forma de conter o avanço da doença era
o isolamento e a vigilância dos doentes.186 Em Minas Gerais, desde 1918, o isolamento de
leprosos era obrigatório, regulamentado pelo decreto 1.510 de junho desse ano.
183
CHAVES, Braúlio Silva. Instituições de saúde e a ideia de modernidade em Minas Gerais na
primeira metade do século XX. In: MARQUES, Rita de Cássia; TORRES, Anny Jackeline; FIGUEIREDO, Betânia Gonçalves (Orgs.). História da Saúde em Minas Gerais: instituições e patrimônio arquitetônico (1808- 1958). Barueri: Minha Editora, 2011. p. 55-56.
184 O Horizonte 13/04/1927
185 O Horizonte 30/03/1927 - Filhos de Leprosos, Furtado de Menezes.
186 PORTO, Angela. A vida inteira que podia ter sido e que não foi: trajetória de um poeta tísico.
Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do IMS/UERJ. Rio de Janeiro, 1997.
88
Guiadas por essa determinação, por todo ano de 1927 as Senhoras da Caridade
estiveram mobilizadas, discutindo questões e realizando eventos para arrecadação de
verbas para a criação de preventórios para filhos de morféticos. Entretanto, foi no ano
seguinte que organizaram uma agenda mais sistemática para concretização desses
projetos.
Pela ata da CCF, observa-se que no ano de 1928 D. Cabral sugeriu a
Alexandrina de Santa Cecília que convocasse as senhoras da comissão Assistência e
Caridade para que retomassem a organização da Cruzada Santa Terezinha, em favor dos
Leprosos187. As Damas da Caridade organizaram a Cruzada sobre o patrocínio de Julieta
Guimarães de Andrada, esposa do então presidente Antônio Carlos de Andrada.
A Cruzada apresentava-se para o editorial do jornal O Horizonte como,
Uma inicitativa opportuna, pois a sorte dos leprosos e dos seus descentes, sem um asylo que os abrigasse, estava a reclamar o amparo das almas piedosas que condoídas do seu imenso infortúnio, procurassem resolver o angustiante problema de forma a atender as suas necessidades e ao mesmo tempo aos interesses da defesa social, comprometida com a liberdade que tinha até agora de perambolar pelas nossas ruas. Obra de assistência e ao mesmo tempo de defesa contra o contagio terrível, abrangendo os próprios descendentes de leprosos pelo seu isolamento dos focos de infecção, a tarefa humanitária meritória a que se abalançaram as dignas senhoras é das reclamam a solidariedade de todos os corações bem formados. (...) A cruzada encetada, portanto, pelas senhoras horizontinas, em prol dos filhos dos leprosos, é pela sua oportunidade e pelo fim humanitário que visa, merecedora não só do apoio official, como de todos os que sabem compreender o alcance dessa benemérita obra de assistência e defesa social
188.
O texto enfatiza a necessidade colaborativa dos órgãos oficiais e da sociedade
para o êxito da campanha encabeçada pelas senhoras. Vê-se ainda que o trabalho
desenvolvido pelas Damas não era apenas caritativo, mas também de defesa social. Mais
tarde as Damas da Caridade unificaram a Cruzada em favor dos filhos de leprosos e
tuberculosos, nomeando-a como Cruzada Santa Terezinha do Menino Jesus189. Nessa nova
fase, a prioridade da Cruzada era a construção de uma instituição para recolhimento e
isolamento de crianças, filhos de pais morféticos e tísicos.
Para arrecadação de fundos, as Damas fizeram circular uma lista de donativos
pelo comércio, indústrias, colégios, por homens e mulheres da alta sociedade, como pode
ser visualizado a seguir na tabela 3.
187
Ata da Confederação Católica Feminina 25/4/1928 188
O Horizonte 13/04/27 189
A devoção a Santa Terezinha do Menino Jesus é confirmada na biblioteca de algumas dessas
mulheres. Encontramos o livro que conta a história da santa na biblioteca particular de Helena Antipoff e no acervo da Escola Normal Modelo.
89
TABELA 3 - Lista de Donativos da Cruzada Santa Terezinha do Menino Jesus (1928)
DOADOR VALOR Companhia Lotérica de Minas Gerais 200$00 Banco Comércio e Indústria 200$00 D. Leonidia Leite 100$00 Colégio Santa Maria 100$00 D. Maria de Magalhães 100$00 D. Altina Lobo 100$00 D. Olga de Magalhães Ferreira 100$00 D. Maria Holanda de Lima 100$00 Banco Pelotense 100$00 Ribeiro Haas e Cia. Ltda 100$00 Cel. Armando Martins Vieira 100$00 D. Alice Cortês Sigaud 100$00 Antônio Falci e Cia 100$00 Cel. Sebastião Augusto de Lima 50$000 Casa Crystal 50$000 Um católico 50$000 Sr. João José da Cunha 20$000 Cizimbra 20$000 Grande Hotel 20$000 D. Cecilia Aguiar Cunha 20$000 Sr. Antônio R. Soares 20$000 D. Gabriella B. H. Ferreira 20$000 Sr. Theodulo Leão 20$000 Sr. Antenor Freitas 20$000 Juventino de Cia 20$000 Andrade Correa e Cia 20$000 Gontijo Fonseca e Cia 20$000 Silva Souza e Cia 20$000 Sr. V. Purri 20$000 Cervejaria Polar 20$000 Almeida Cunha 20$000 D. Amanda Machado 26$000 Sr. Gontijo 20$000 Uma devota de Santa Terezinha 10$000 Cardoso e Cia 10$000 Sr. Homero Viana de Paula 10$000 2 Devotas de Santa Terezinha 10$000 São José Viana 10$000 Alfaiataria Brito 5$000 Anônimo 5$000 D. Maria Veiga 5$000 D. Elvira Sales 5$000 Total 586$000
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos do O Horizonte – 13/04/1927
Pela lista, vemos a participação dos diversos setores da sociedade, inclusive das
mulheres ligadas ao ativismo católico e das organizadoras da Cruzada. Além da
arrecadação dessa natureza, durante três meses, as Damas da Caridade instalaram em
lugares estratégicos da cidade uma Pipa da Cruzada Santa Terezinha do Menino Jesus,
para depósitos espontâneos. O Bar do Ponto foi um dos lugares escolhidos pelas Damas,
90
no qual a Pipa permaneceu por um longo período. Tal local estava situado na Rua da Bahia,
considerada por Carlos Drummond de Andrade como o cérebro de Belo Horizonte, onde se
encenava os debates sobre literatura, artes, ciências, desporto, regimes políticos e
alimentares, bailes, finanças, o temporal e o espiritual.190 O bar foi fundado em 1907 e
estava localizado em frente à estação dos bondes. Não era apenas o café mais famoso da
cidade, era um ponto de referência na vida da capital, ponto de negócios, encontros,
conversas e notícias.191
Claro está que a escolha dos lugares percorridos pela Pipa não era aleatória. As
Damas da Caridade procuravam os ambientes mais movimentados da cidade e
frequentados pela alta sociedade, com o objetivo de ter uma arrecadação significativa. A
abertura solene da Pipa ocorreu na sede da Sociedade São Vicente de Paulo. Na ocasião
foram arrecadados 490$000, e o valor foi depositado no banco. Era uma prática comum das
Damas da Caridade depositar os valores arrecadados em contas movimentadas por elas,
como forma de aplicação e planejamento dos gastos.
Não há indicação explícita nas fontes de como o dinheiro arrecadado foi gasto e
se de fato houve a construção do asilo para o isolamento dos filhos dos tuberculosos e
leprosos. Entretanto, a hipótese é de que grande parte da construção do preventório São
Tarcísio tenha ocorrido com a verba arrecadada pela Cruzada. Sua construção teve início
no ano de 1930 e ele foi inaugurado em 12 de outubro de 1934, com apoio da Sociedade de
Assistência aos Lázaros de Defesa Contra a Lepra192, e sob os cuidados de uma ordem
religiosa. O edifício principal tinha capacidade para abrigar 200 crianças. Era localizado na
Praça Lagoa do Campo Verde, no município de Mário Campos, próximo à colônia Santa
Isabel. Dentro do preventório as crianças tinham acesso ao ensino primário, mantido pelo
Estado. Os meninos trabalhavam na plantação de produtos agrícolas e na olaria. As
meninas produziam artigos artesanais, que eram vendidos em benefício da instituição. Há
poucos trabalhos sobre o preventório, mas tudo indica que sua inauguração foi acelerada
pela política varguista de combate à lepra, encabeçada pelo então Ministro da Educação e
da Saúde, Gustavo Capanema, em parceria com os grupos locais, dos quais destacamos as
ordens religiosas católicas e as mulheres envolvidas na filantropia.
Outro resultado da Cruzada foi a criação de uma Assistência aos Tuberculosos
Proletários, bem como a criação de uma Vila para trabalhadores tuberculosos. Em matéria
190
BOMENY, Helena. Guardiães da razão: modernistas mineiros. Rio de Janeiro: Editora
UFRJ/Tempo Brasileiro, 1994. 191
CHACHAM, Vera. A memória urbana entre o panorama e as ruínas – a rua da Bahia e o Bar do
Ponto na Belo Horizonte dos anos 30 e 40. In: DUTRA, Eliana de Freitas (org.) BH. Horizontes Históricos. Belo Horizonte: C/Arte, 1996. p. 183-238.
192 A Sociedade Mineira de Proteção as Lázaros e Defesa contra a Lepra a cargo de Berenice
Martins.
91
publicada no jornal O Horizonte, Maria Luiza de Almeida Cunha conta que, depois da
realização da Cruzada, ela, juntamente com as demais confederadas, chegou à conclusão
que,
o espírito de caridade e de altruísmo da sociedade belorizontina tem se preocupado nestes últimos tempos de um problema que constituía a muito uma das questões sociais mais salientes da capital. Clima de sanatório, cidade moderna, recursos abundantes peculiares a um centro de estudos médicos, Belo Horizonte atraiu desde sua fundação as vistas dos que buscam energias para resistência terrível a peste branca.
193
De fato, como salienta Rita de Cássia Marques, a tuberculose, que foi um dos
principais flagelos dos fins do século XIX e início do XX, não tinha cura medicamentosa e a
transferência dos tísicos para cidades como Belo Horizonte tornou-se corriqueira. De acordo
com a autora, “o clima seco e frio deu à capital o título de cidade sanatório atribuído às
localidades que abrigavam grande número de tuberculosos. ”194
Considerando o grande número de pessoas que chegavam à cidade em busca
do bom clima e do ar ameno da montanha, a Diretoria de Higiene entendeu que a
construção de sanatórios seria a melhor opção para controlar a doença e a população
doente na capital, evitando assim que os belo-horizontinos fossem contaminados por
forasteiros. Os primeiros empreendimentos construídos eram particulares. À diretoria de
Saúde Pública coube a fixação de regras e a fiscalização dos espaços que alojavam os
doentes na cidade195. Havia, portanto, uma carência de tratamento para a população pobre.
Assim, após longas discussões, as mulheres envolvidas na Cruzada julgavam
que, além do cuidado e isolamento dos filhos dos tuberculosos, era urgente a criação de
serviços mais relevantes para conter a doença, como por exemplo a criação de uma
Associação de Assistência ao Proletário Tuberculoso. Esse grupo de mulheres, encorajadas
por Maria Luiza de Almeida Cunha, decidiu levar a ideia ao conhecimento do professor
Henrique Marques Lisboa. Segundo a própria Maria Luiza, o médico mostrou-se interessado
na proposta e convocou uma reunião no salão do Club de Esporte Higiênicos de Belo
Horizonte, criado pelo médico. A reunião foi presidida por Henrique Marques Lisboa, pelo dr.
Mello Vianna e pelo presidente do Estado. Da reunião ficou resolvida,
193
O Horizonte 14/7/1928 194
MARQUES, Rita de Cássia. A Caridade Criando Hospitais em Minas Gerais (Brasil) –
Séculos XVIII-XX. Dynamis, 2011 31(1): 107-129. 195
MARQUES, Rita de Cássia; GONÇALVES, Huener Silva. Construir, tratar e curar: a tuberculose
na “suíça mineira” do século XX. In: MARQUES, Rita de Cássia; TORRES, Anny Jackeline; FIGUEIREDO, Betânia Gonçalves (Orgs.). História da Saúde em Minas Gerais: instituições e patrimônio arquitetônico (1808- 1958). Barueri: Minha Editora, 2011. p. 82.
92
a construção de pequenas casas capazes de alojar dois doentes cada uma. As casas dos doentes isoladas umas das outras ou juntas em pequenos grupos, constituirão villas dirigidas por um conselho de administração, que nomeará diretor médico, secretário, chefes de clínica, ecônomo e farmacêuticos. Em cada casa haverá uma pequena oficina adequada ao estado de saúde do internado que nele resida. De momento lembra à comissão organizadora a instalação de criação de bichos de seda, apiário, serviço de horta, pomar ou criações de galinhas, pássaros e pneus
196.
Maria Luiza de Almeida Cunha segue o artigo ressaltando os ganhos da criação
desse espaço,
O que há de elogiável na fundação é a preocupação de elevar a moral de tais doentes sempre fortemente deprimidos quando se inteiram da moléstia que os aflige. A reeducação para o trabalho, de doentes crônicos, mas curáveis ou capazes de reassumir atividade física que as mantenha é ainda um outro escopo elevado da assistência. Em cada Villa haverá centros de diversão, restaurante, salas de reunião e leitura, salas de industrias adequadas e instalações hospitalares para moléstias intercurrentes ou doentes graves. Os estatutos publicados não cogitam do socorro espiritual o qual, no entanto pode ser facilmente corrigido a proposição de cada vila que instale sendo facílimo que umas das casas seja transformada em capela. Para os doentes crônicos e para os proletários, faltos do socorro ilusório da riqueza é justamente que o consolo da religião, mas eleva o sossego espiritual, a resignação, o bem estar moral, em suma, fazem metade da cura dos tuberculosos curáveis e suprimem certamente boa percentagem da provação dos incuráveis moribundos. A nobre e benemérita instituição ai está. Resta que secundemos o esforço a estas almas de eleição que se lembram do sofrimento alheio. A SSVP é uma instituição feita para servir de arrimo quiçá amparo as obras dessa natureza. Em contato com o pobre e o miserável é a gloriosa sociedade que compete encaminhar os doentes pregar-lhes a resignação e secundar os esforços de Saúde Pública na educação do doente contaminante ensinando o pobre a submeter-se aos cuidados da higiene ao menos no espírito de caridade se não cuida, mas curar-se. É mister amparemos a novel fundação e roguemos a Deus em pró de seus beneméritos fundadores
197.
O artigo publicado por Maria Luiza de Almeida Cunha indica alguns aspectos
importantes sobre a filantropia praticada em Belo Horizonte. O primeiro deles é a limitação
da ação pública no combate à tuberculose, demonstrando a importância da filantropia no
tratamento e controle da doença. Vê-se também a colaboração entre os beneméritos e a
comunidade médica, dentre a ação de beneficência, sobressai a SSVP. Faz-se notar
também a preocupação com a formação para o trabalho, a presença dos preceitos médicos,
científicos e sanitários como orientadores dos espaços. A educação estética e o lazer
também estavam presentes no cotidiano do asilamento, mesmo que na prática não tenha se
efetivado como planejado.
196
O Horizonte 14/7/1928 197
O Horizonte, 14/7/1928 - Almeida Cunha
93
Um último aspecto extremamente relevante é o fato da criação da Vila dos
Proletários Tuberculosos partir da iniciativa de um grupo de mulheres. Isso mostra que a
participação das mulheres na filantropia não necessariamente estava associada ao objetivo
de promover a carreira de seus maridos. Ou que a prática da filantropia e a construção de
instituições filantrópicas não era marcada exclusivamente pela ação masculina. A relação de
gênero a que essas mulheres estavam submetidas está implícita. Elas agiam dentro do que
era permitido para uma mulher no período, reconheciam seu lugar na sociedade e
procuravam acionar as pessoas “certas” para concretizar a realização de seus projetos. Por
isso, muitas vezes seus nomes não aparecem na realização dos projetos.
Depois de ler inúmeras vezes os artigos de Almeida Cunha, conclui-se que
realmente eram escritos por Maria Luiza de Almeida Cunha, devido ao estilo de escrita e
pela sua história pessoal, de ter um irmão tuberculoso que veio tratar-se em Belo Horizonte.
Finalmente, na leitura de outros textos, Henrique Marques Lisboa revela sua proximidade
com Maria Luiza de Almeida Cunha e o fato de que, através dela, se engajou no campo da
educação, particularmente no ensino de ciências naturais. Henrique Marques Lisboa teve
grande proximidade com um grupo de professoras da Escola de Aperfeiçoamento. A convite
desse grupo elaborou o plano do ensino de ciências naturais do ensino primário em Minas.
Quando se aposentou, passou a trabalhar na Escola Rural na Cidade de Ibirité, em um
projeto chamado “Granjinhas Reunidas Marques Lisboa” junto a um grupo de professoras.198
A Vila dos Convalescentes foi construída ainda no ano de 1928. Foi a primeira
instituição dedicada ao tratamento de tuberculosos pobres. O local escolhido para a
construção foi o Morro das Pedras, situado na zona oeste de Belo Horizonte. O critério
utilizado para escolha do local era a necessidade de um clima ameno, sendo que o Morro
das Pedras estava num dos pontos mais altos da cidade.199A administração da Vila dos
Convalescentes estava a cargo da Associação dos Proletários Leprosos e sob a direção do
médico Henrique Marques Lisboa e do barbeiro vicentino José César dos Santos.
Inicialmente o sanatório tinha 3 barracões, 12 pacientes e manteve-se nas primeiras
décadas do século XX com auxílios oriundos da iniciativa privada e com subvenção das
prefeituras do interior do estado, da Diretoria de Saúde Pública e da Prefeitura de Belo
Horizonte200.
No ano de 1932, o atendimento e a assistência aos doentes da Vila dos
Operários Tuberculosos ficou a cargo das Damas da Boa Viagem. De acordo com Rita de
198
Granjinhas – ISER – Fazenda do Rosário. Minas Gerais. Imprensa Oficial. Belo Horizonte, 1969. 199
MARQUES, Rita de Cássia; GONÇALVES, Huener Silva. Construir, tratar e curar: a tuberculose
na “suíça mineira” do século XX. In: MARQUES, Rita de Cássia; TORRES, Anny Jackeline; FIGUEIREDO, Betânia Gonçalves (Orgs.). História da Saúde em Minas Gerais: instituições e patrimônio arquitetônico (1808- 1958). Barueri: Minha Editora, 2011.
200 Ibid.
94
Cássia Marques e Huener Silva Gonçalves, com a morte do vicentino José César dos
Santos, em 1940, a instituição enfrentou uma crise financeira e quase fechou. No ano de
1948, o sanatório passou a ser administrado pela Congregação das Pequenas Missionárias
de Maria Imaculada, oriundas de São José dos Campos. No ano seguinte, o Sanatório
recebeu novo nome, Sanatório Marques Lisboa e, sob a direção das irmãs, foi inaugurado
um pavilhão feminino.201
Além de todo engajamento na Cruzada Santa Terezinha do Menino Jesus, no
ano de 1928 observa-se maior variedade de atividades da comissão.
TABELA 4 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1928 – Damas da Caridade Santa Efigênia
Rouparia Hospitais Vigilância Moral
Distribuição de roupas e cobertores aos pobres
Diversas visitas a enfermos
Compra de uma imagem de Nossa Senhora das Dores para realização de casamentos
Distribuição de roupas e cobertores aos pobres na Capela do Hospital Militar
Visita aos doentes da Santa Casa
Fonte: Elaborada pela autora, com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1928) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 5 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1928 – Damas da
Caridade São José
Dispensa Econômica
Rouparia Prisões Festas
Distribuição de gêneros alimentícios
Distribuição roupas aos pobres
Comunhão para presos da cadeia local
Festa do Padroeiro São Vicente de Paula.
Fonte: Elaborada pela autora, com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1928) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 6 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1928 – Damas da
Caridade da Boa Viagem
Patrocínio
Enterro de dois pobres socorridos residentes na Villa Santa Isabel. Fonte: Elaborada pela autora, com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1928) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
Como podemos ver nas tabelas acima, no ano de 1928 destaca-se a distribuição
de gêneros alimentícios e o aumento considerável dos atendimentos de enfermos e o
encaminhamento de doentes aos hospitais. Nesse ano as Damas da Caridade de Santa
Efigênia mostram-se bem eficientes. Por estarem localizadas na região hospitalar,
desenvolviam muitas visitas a doentes nos hospitais, sobretudo na Santa Casa e no Hospital
Militar.
201
MARQUES, Rita de Cássia; GONÇALVES, Huener Silva. Construir, tratar e curar: a tuberculose
na “suíça mineira” do século XX. In: MARQUES, Rita de Cássia; TORRES, Anny Jackeline; FIGUEIREDO, Betânia Gonçalves (Orgs.). História da Saúde em Minas Gerais: instituições e patrimônio arquitetônico (1808- 1958). Barueri: Minha Editora, 2011. p. 98-99.
95
Como mostram as tabelas 7 e 8, em 1929 as Damas da Caridade mantiveram a
variedade dos trabalhos, apesar de observarmos uma diminuição de sua quantidade.
Acreditamos que essa redução está relacionada com a crise econômica mundial.
TABELA 7 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1929 – Damas da Caridade de Santa Efigênia
Dispensa Econômica
Patrocínio Hospitais Família Festas
Distribuição de roupas aos pobres.
Ofereceram verba ao aluno pobre do Seminário 100$000
Visita a enfermos
Socorreram 18 famílias pobres.
Festa da Caridade realiza com doações do Sr. La Torre dono da Farmácia Santa Efigênia. Distribuição de gêneros alimentícios a 22 famílias.
Distribuição esmolas em gêneros durante o Natal.
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1929) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 8 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1929 – Damas da Caridade de Lourdes
Dispensa Econômica
Forneceram gêneros e remédios a 59 pobres.
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1929) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
Os trabalhos basicamente restrigiram-se a distribuição de roupas e gêneros
alimentícios. Vemos que nesse ano apenas as Damas de Lourdes e Santa Efigênia
apresentaram relatórios de atividades. Os trabalhos da agremiação de Santa Efigênia muito
se explica pela presença de quartéis militares na região.
Além disso, no ano de 1929, as Damas da Caridade de Santa Efigênia fundaram
um gabinete dentário com atendimento gratuito para a população pobre. Os serviços eram
prestados por dentistas católicos. Esse mesmo grupo de Damas estabeleceu uma parceria
com a Pharmacia Santa Efigênia. A farmácia fornecia medicamentos gratuitamente a
doentes pobres. Para conseguir o medicamento sem pagar, a receita médica devia seguir
anexa a uma carta de apresentação elaborada por uma Dama de Caridade e ter a
assinatura do pároco local. A carta das Damas como condição de validade para troca das
receitas mostra a representatividade local dessas mulheres.
No ano de 1930, marcadamente iniciou-se as atividades de sindicância, como é
possível visualizar nas tabelas 9, 10 e 11.
96
TABELA 9 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1930 – Damas da Caridade da Boa Viagem
Dispensa Econômica
Patrocínio Hospitais Festividades Família
Distribuição de socorros materiais aos pobres
Realizaram lanches e primeira Comunhão no Jardim Eucarístico
Visita à Villa Isabel
Organizaram Festividade Santa Isabel da Hungria
Socorreram 28 famílias com 38 membros: 400$000 na compra de gêneros alimentícios.
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1930) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 10 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1930 – Damas da Caridade de Santa Efigênia
Dispensa Econômica
Família Festas
Ofereceu em parceria com a Farmácia Santa Efigênia remédios aos pobres além de medicamentos e cigarros aos soldados
Sra. La Torre, proprietária da farmácia Santa Efigênia, fez doação de alimentos a 22 famílias
Participação no Centenário da Transladação das relíquias de São Vicente de Paulo realizado em Paris
Doação de gêneros e roupas a 424 pessoas.
Forneceram vales a 175 famílias pobres
Duas Damas da Caridade trabalharam no Posto de Socorro às famílias de militares.
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1930) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 11 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1930 – Damas da
Caridade do Barro Preto
Prisões
Visita e comunhão de 16 detentos
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1930) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
Nesse ano as Damas da Caridade passaram a fazer visitas periódicas às
famílias. A partir das visitas, organizavam a distribuição de gêneros alimentícios pelo
sistema de vales-alimentação. Nesse período, devido à Revolução de 1930 e à participação
dos militares no esforço de guerra, as Damas dedicaram-se especialmente à assistência às
famílias dos militares.
2.3.2 O fortalecimento da parceria entre a Comissão Assistência e Caridade e a Sociedade São Vicente de Paulo
A partir de 1931 houve o fortalecimento da parceria entre as Damas da
Caridade, atuantes na Comissão Caridade, e a Assistência Sociedade São Vicente de
Paulo. Como resultado, vê-se uma sofisticação das atividades e um vertiginoso aumento do
número de assistidos. Nessa fase ocorreu um total alinhamento e uma ação efetiva para
97
fomentar a criação de Damas da Caridade nas paróquias onde não existia a agremiação.
Desde então, os trabalhos desenvolvidos pelas Damas passaram a ser apresentados nas
reuniões da associação separadamente, sendo que cada paróquia tinha um tempo de
explanação. Parecia ocorrer uma disputa interna entre as Damas de Caridade das diferentes
paróquias. Os dados das tabelas 12 a 18 referentes às atividades desenvolvidas no ano de
1931, não deixam dúvidas que as mudanças propostas por Alexandrina Santa Cecília, em
parceria com Furtado de Menezes, aumentaram o número de Damas, bem como a
quantidade e variedade de serviços desempenhados por elas.
TABELA 12 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1931– Damas da Caridade de São José
Dispensa Econômica
Enfermaria
Damas de São José distribuíram 697 vales aos pobres na importância de 410$00 e despesas com gêneros e farmácias de 344$00
São José: Fornecimento de Leite e Remédios aos doentes.
Despesas com doentes socorridos 436$500.
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1931) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte. TABELA 13 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1931– Damas da Caridade de Santa Efigênia
Dispensa Econômica
Enfermaria Rouparia Patrocínio Festas Família
Distribuição de vales de gêneros e 9 kg de pães, agasalhos e pães de Santo Antônio
Aviamento de 16 receitas médicas e 4 visitas médicas
Doação de 24 cobertores aos pobres
Amparou-se 2 menores
Festividade de Páscoa para 186 pobres.
27 famílias amparadas. 216$000 em gêneros, 35$000 em dinheiro.
Visitaram 22 enfermos
Enterro de uma idosa, preparação de enxoval e casamento de uma jovem.
Internação de uma jovem de 15 anos preste a perde-se e 3 órfãos foram entregues ao Orfanato Santo Antônio.
Enxoval de um recém-nascido
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1931) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
98
TABELA 14 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1931 – Damas da Caridade da Boa Viagem
Dispensa Econômica
Enfermaria Patrocínio
Visita aos pobres 40. Distribui gêneros no valor de 150$000
Visita aos pobres 60, doentes em tratamento 1
237$000, uma viúva com três filhos pequenos.
Socorro de 20 pessoas da Vila Santa Isabel
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1931) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 15 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1931– Damas da Caridade da Floresta
Dispensa Econômica
Enfermaria Rouparia Patrocínio Casinhas De
Morada
Família Festas
56 visitas aos pobres.
Visita a 63 enfermos
Distribuição de 40 peças de roupas aos pobres da casa de São Vicente na Vila Concórdia.
Caiação e limpeza das casas
Organizaram um regulamento para os moradores das Casas de São Vicente.
Socorro 14 famílias com 35 pessoas
Entronização Sagrado Coração na Casa de Vicentinos
Socorro de 16 viúvas com um total de 30 pessoas 40$000
Visita a pobres doentes 114
Sindicância na casa dos pobres Villa São Vicente de Paula
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1931) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 16 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1931– Damas da Caridade de São Sebastião
Dispensa Econômica
Distribuição de remédios
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1931) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 17 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1931– Damas da Caridade de Lourdes
Dispensa Econômica
Rouparia Festas
Pobres socorridos 8 despesa 50$000
Distribuição de roupas Festa de Santa Isabel
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1931) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
99
TABELA 18 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1931– Damas da Caridade de Santo Antônio
Enfermaria
Visitaram 22 enfermos
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1931) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
Surge nesse período as Damas da Caridade da paróquia São Sebastião, ao
mesmo tempo em que as Damas da Floresta e as Damas de Lourdes mostram-se ainda
mais atuantes. Destaca-se a distribuição de medicamentos e o aparecimento da obra casas
de morada. Vale lembrar que todos os terrenos eram obtidos através de doação. As Damas
da Caridade negociavam com os políticos a doação de terrenos para as obras assistenciais.
No último capítulo da tese, apresento a criação da creche Menino Jesus. O terreno para a
construção dessa creche foi fruto do engajamento das mulheres com os políticos e a
sociedade. Observa-se a manutenção da regularidade dos trabalhos de sindicância, a
família e o início das atividades de visitas, atendimentos médicos e aviamento de receitas
médicas.
Em 1932 há a criação das Damas da paróquia do bairro Carlos Prates. Destaque
para a criação de duas importantes instituições: a Creche Menino Jesus, na Vila Concórdia,
em colaboração com as Irmãs da SSVP, e a Casa Hospital Lar Santa Isabel, ambas criadas
pelas Damas da Boa Viagem.
TABELA 19 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1932 –Damas da Caridade Santa Efigênia
Dispensa Econômica
Enfermaria Hospitais Família
Distribuição de gêneros para mais de 1:100$000
Internação de 1 criança no orfanato
2 tratamentos na Santa Casa
Distribuição de gêneros no valor de 249$000 a 22 famílias
Distribuição de 14 garrafas de leite.
19 receitas aviadas, 14 consultas médicas, 238 visitas a enfermos.
Internação de duas enfermas na Santa Casa.
6 sindicâncias
Despesa com farmácia 47$000
Encaminhou 2 pobres aos vicentinos.
Internação de uma cega no Instituto Benjamim Constant, no Rio de Janeiro.
Socorreu 26 pobres despesa de 305$000.
21 doentes socorridos
Recolheu à Santa casa dois pobres
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1932) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
100
TABELA 20 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1932 –Damas da Caridade São José
Dispensa Econômica
Rouparia Festas Família
Auxílios no valor de 2:574$400
Distribuição de 3 peças de roupa
Festa da SSVP distribuíram aos socorridos a quantia de 10$000
Socorro de 9 famílias
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1932) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 21 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1932 –Damas da Caridade Floresta
Dispensa Econômic
a
Enfermaria Rouparia Hospitais Vigilância Moral
Família Patrocínio
Gêneros distribuídos no valor de 370$000
Visitas e consultas médicas: 8, doentes socorridos: 6
Doação de peças de roupas, sapatos,
4 recolhimento ao hospital
Obteve emprego no comércio para duas moças que frequentavam casas de jogos.
107 visitas domiciliar
1 enterro
Socorro de 16 famílias com 30 pessoas
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1932) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 22 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1932 –Damas da
Caridade São Sebastião Dispensa
Econômica Enfermaria Rouparia Hospitais Família Festas
Distribuição de gêneros no valor de 48$000.
Aviamento de 2 receitas
Distribuição de peças de roupa
Visita aos Tuberculosos do Morro das Pedras.
Socorro de 5 famílias e 10 visitas
Criação do espaço de recreação na Paróquia São Geraldo para realização de teatros e festivais para operárias.
Distribuição de cobertores, colchas, cortes de vestidos
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1932) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
101
TABELA 23 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1932 –Damas da Caridade de Lourdes
Dispensa Econômica
Enfermaria Rouparia Hospitais
Distribuição de gêneros alimentícios
Diversos doentes receberam em seus domicílios auxílios material e espiritual.
Confecção de roupas de cama.
Socorro de enfermos em domicilio e na Santa Casa.
Distribuição vestuários a 150 pobres.
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1932) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 24 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1932 –Damas da
Caridade Carlos Prates
Dispensa Econômica
Enfermaria Hospitais
Visitas domiciliar distribuição de cartões de gêneros alimentícios
no valor de 300$000
Aviamento de 3 receitas. 1 doente internada na Santa Casa
Socorro de 1 mulher doente pobre
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1932) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 25 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1932 –Damas da
Caridade da Boa Viagem
Dispensa Econômica
Enfermaria Rouparia Hospitais Festas
Distribuição de 1:240$000 de vales
Socorro de 38 pessoas na Vila dos Tuberculosos
Distribuição de roupas e calçados
33 recolhidos ao hospital
Festa de Inauguração da Creche Menino Jesus na Vila Concórdia, crianças ficaram aos cuidados das Irmãs de São Vicente de Paula.
Internação de 1 menor no Instituto João Pinheiro
A vila dos convalescentes da Associação das Damas de Caridade, a casa/hospital foi nomeada Lar Santa Isabel.
27 consultas
20 receitas
130 visitas a doentes pobres
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1932) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
Como mostra as tabelas 19 a 25, no ano de 1932 temos a participação ativa das
Damas de Caridade de diferentes paróquias. Observa-se a variedade de trabalhos, um
aumento significativo dos valores arrecadados destinados as obras de dispensa econômica.
Vê-se aumentado também o atendimento médico e o aviamento de receitas, bem como o
número de recolhidos aos hospitais.
102
Nesse mesmo ano houve a fundação da Sociedade Mineira de Assistência à
Infância Gota de Leite e Creche, com apoio de Olegário Maciel e Gustavo Capanema,
situada na Rua Padre Marinho, entre a Avenida Araguaia e a Rua Piauí, no bairro Santa
Efigênia. A finalidade da sociedade era amparar, proteger e fornecer leite e alimentação
apropriada às crianças pobres doentes, cujas famílias lutavam com dificuldade para tratar os
filhos enfermos. Nesse ano ocorreu também a inauguração de um Recreatório na Paróquia
São Geraldo, para realização de teatros e festivais, a Criação da Creche Menino Jesus e a
construção da Vila dos Convalescentes e do Lar Santa Isabel.
No ano de 1933, como é possível visualizar nas tabelas 26 a 31, a maior parte
das obras de casa de morada foram desempenhadas pelas Damas de Lourdes.
TABELA 26 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1933 – Damas da
Caridade Lourdes
Dispensa Econômica
Enfermaria Casinha De Morada
Família
Distribuição semanal de vales de 12$000 e 90$000
Socorros a doentes
Aquisição de terreno para construir pequenos cômodos para seus socorridos.
Amparo de uma família da Sociedade São Vicente de Paulo. Socorros no valor de 100$000.
Pagamento aluguel de uma casa habitada por uma família muito necessitada.
Doação de um terreno do Sr. Silvério Silva para construção de casas para pobres.
Construção de abrigos para pobres inválidos. Posse do terreno
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1933) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 27 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1933 – Damas da
Caridade Boa Viagem
Dispensa Econômica
Enfermaria Hospitais
Distribuição de Vales no valor de 644$000
Consultas médicas e receitas 6, doentes socorridos
Visita à Vila Santa Isabel e Vila dos Proletários Tuberculosos – doentes recebem o tratamento do dr. Paulo de Souza Lima
Distribuição de 40 vales mantimentos no valor de 90$000
Na Vila Santa Isabel foram socorridos 19 pobres, na Vila Operários Tuberculosos 11. Tratados pelo Dr. Paulo de Souza Lima.
79 kg de pão Internação de uma jovem na Santa Casa e de uma criança idiota e paralítica no Hospital São Vicente
Recebeu 2 pobres doentes da Vila Santa Isabel e 2 tuberculosos da Vila dos operários onde existem 14 doentes.
65 recolhidos ao hospital
43 consultas médicas e receitas aviadas na Santa Casa
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1933) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
103
TABELA 28 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1933 – Damas da
Caridade Carlos Prates
Dispensa Econômica
Enfermaria
Cartões semanais no valor de 12$000. Fornecimento de leite a doentes e socorro de duas senhoras idosas.
Socorro a 5 necessitados e distribui quinzenalmente 1 cartão no valor de 4$000
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1933) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 29 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1933 – Damas da
Caridade Santa Tereza e Santa Terezinha
Dispensa Econômica
Enfermaria Patrocínio Família
2 pobres socorridos
Visitas médicas e receitas aviadas
2 enterros
Distribuição de Garrafas de leite
15 vales no valor de 150$000
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1933) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 30 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1933 – Damas da
Caridade São José
Dispensa Econômica
Casinha de Morada
Família
Distribuição de 95 vales no valor de 190$000.
Construção de um quarto para um
tuberculoso
Recebeu do Açougue Mineiro 60 Kg de carne que foram distribuídos a mais de 40 famílias
Distribuição de 153 vales na importância de 306$000
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1933) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 31 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1933 – Damas da
Caridade Floresta
Enfermaria Hospitais Família
Vários doentes foram socorridos, outros se acham em tratamento
Visita aos pavilhões da Santa Casa e distribuição de esmolas
Socorro de 50 famílias
1 visita médica, visitas de zeladoras 170, 8 doentes socorridos
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1933) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
104
Nesse ano destaca-se o aumento da arrecadação das Damas de Santa Tereza e
Santa Terezinha. Aumentam também a quantidade da distribuição de gêneros alimentícios e
os serviços das obras de enfermaria e hospitais.
No ano de 1934, por outro lado, vemos a diminuição das atividades da comissão.
TABELA 32 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1934 –
Damas da Caridade São José
Enfermaria Rouparia
Distribuição de 150 vales Ganhou e distribuiu 50 colchões e colchas
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1934) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 33 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1934 –
Damas da Caridade Boa Viagem
Enfermaria Hospitais Patrocínio Festas
Vales no valor de 240$000.
Visita à Vila dos Tuberculosos
Pagamento dos impostos das casas na Vila Isabel. Foi feito consertos nas casas da Vila no valor de 1:448$700.
Festa de Santa Isabel, distribuição de roupas e gêneros
Mantêm 17 socorridas na Vila Santa Isabel, e 1 no Presta auxílio aos proletários tuberculosos. Visita de 4 socorridas na Santa Casa e 1 na Casa dos Velhos.
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1934) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 34 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1934 –
Damas da Caridade Santa Tereza
Enfermaria
Distribuição de remédios e mantimentos
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1934) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 35 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1934 –
Damas da Caridade Santa Efigênia
Enfermaria
30 visitas a pobres doentes
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1934) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 36 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1934 –
Damas da Caridade Carlos Prates
Casinha de Morada
Compra de um lote. Saldo em caixa 882$000
Aquisição de casas para socorridos
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1934) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
105
TABELA 37 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1934 –
Damas da Caridade Lourdes
Casinha de Morada
Construção de casa na Colônia Affonso Pena
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1934) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 38 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1934 –
Damas da Caridade Calafate
Hospitais Rouparia
Internação de 2 doentes na Santa Casa 21 peças de roupas e gêneros de primeira necessidade
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1934) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
TABELA 39 – Obras realizadas pela Comissão Assistência e Caridade no ano de 1934 –
Damas da Caridade Floresta
Vigilância Moral Família
Visita à Creche Menino Jesus. Despesas de 313$000
Socorro de 11 famílias
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos da Ata da Confederação Católica Feminina (1934) – Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte.
Um dos motivos da diminuição das atividades em 1934 foi o início da
reformulação do Programa da Ação Católica e a consequente reorganização das
associações femininas católicas. O novo programa entrou em vigor em 1935. Destaca-se
nesse período a formação dos grupos ligados às juventudes – Juventude Católica (JC),
Juventude Estudantil Católica (JEC), Juventude Universitária Católica (JUC) e Juventude
Operária Católica (JOC).
Não obstante, nesse momento, no primeiro governo varguista, temos o processo
de consolidação do Estado Nacional. Esse processo foi marcado pelo aumento de políticas
sociais. A assistência e a saúde ganham importância e o Estado passa a se encarregar de
uma série de atividades destinadas a prestar serviço à saúde da população pobre. Em se
tratando de assistência à saúde, temos a criação de dois ministérios: Ministério do Trabalho,
Indústria e Comércio (MTIC) e o Ministério da Educação e Saúde (MESP).202
2.4 A arrecadação da Comissão Assistência e Caridade: parcerias entre o poder público e a sociedade
Como dito anteriormente, entre os anos 1927 e 1930, embora a comissão
Assistência e Caridade auxiliasse os trabalhos da SSVP, ela atuava com certa
202
FONSECA, Cristina Maria O. Saúde no governo Vargas (1930-1945): dualidade institucional de um bem público. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2007.
106
independência em relação à sua congênere. Nesse período, como é possível visualizar na
tabela 40, as associadas basicamente levantavam verbas através de festividades, doações
de empresas e de particulares. Conseguiam também fundos através do uso de subsídios
municipais e federais.
TABELA 40 – Levantamento de verbas diversas realizadas pela comissão Assistência e Caridade
ANO DOADOR DOAÇÃO 1927 Levantamento de verbas Damas da Caridade da Lagoinha para
casamento de operárias 100$000
Damas da Caridade de Santa Efigênia também organizaram uma festividade natalina
1:082$300
1928 Sociedade do Banco Commercio e Indústria
2:000$000
Companhia Industrial de Belo Horizonte 500$00 1930 Casal Mascarenhas
Quantia em dinheiro e donativos de fardas de tecido de algodão para o gabinete dentário
Farmácia
Medicamentos e cigarros para soldados
Verbas municipais e federais 4:500$000
Delegacia Fiscal 6:000$000 1931 Farmácia 344$000
Senhor residente na Serra destinado à Vila Isabel em comemoração à data de falecimento da sua esposa
100$000
Verbas municipais e federais
4:500$000
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos das Atas da Confederação Católica Feminina (1927-1934).
Nesse período não havia a separação bem definida dos trabalhos realizados
pelas Damas da Caridade das diferentes paróquias. Verifica-se que as doações e redes
eram tímidas, se comparadas aos anos seguintes. A maior parte da arrecadação era
concedida pelos poderes públicos, municipais e federais. Deve se levar em consideração
que o valor arrecadado em festas era um valor alto, se comparado à subvenção recebida do
poder municipal.
Por outro lado, a tabela mostra como eram variadas as possibilidades de
arrecadação de donativos. Salienta Souza que as formas mais comuns eram: caixas de
coletas, doações por graças alcançadas e mensalidades de sócios. Também por
107
comemoração de aniversário, parte de heranças, pedido de pessoas no leito de morte, ou
doações para manter a virtude cristã da caridade.203
A subvenção municipal concedida às instituições de caridade era registrada nos
relatórios dos prefeitos da cidade de Belo Horizonte. Na tabela abaixo é possível visualizar
os repasses.
TABELA 41 – Subvenção Municipal
ANO INSTITUIÇÕES VALOR Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo Prefeito Flávio Fernandes dos Santos. Setembro/1923 (Ano 1922-1923)
Associação das Damas de Caridade
3:000$000
Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo Prefeito Flávio Fernandes dos Santos. Setembro/1923 (Ano 1922-1923)
Associação das Damas de Caridade
3:000$000
Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo Prefeito Flávio Fernandes dos Santos. Setembro/1925 (Ano 1924-1925)
Associação das Damas de Caridade São José e da Boa Viagem, em partes iguaes
5:000$000
Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo Prefeito Christiano Monteiro Machado. Outubro/1926 (Ano 1925-1926)
Associação das Damas de Caridade São José
2:500$000
Associação das Damas de Caridade da Boa Viagem
2:500$000
Relatório do Primeiro Ano da Administração Municipal no quatriênio iniciado em 1926
Associação das Damas de Caridade
5:000$000
Mensagem apresentada ao Conselho Deliberativo pelo prefeito Christiano Monteiro Machado. Outubro/1928
Associação das Damas de Caridade de São José
2:500$000
Associação das Damas de Caridade de Boa Viagem
1:250$000
Fonte: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte.
Os dados indicam que entre os anos de 1922 e 1928, os repasses variavam
entre 1:250$000 e 3:000$000 e apenas as Damas da Caridade das paróquias São José e
Boa Viagem recebiam o auxílio. Isso se deve ao fato das duas paróquias terem as
conferências vicentinas mais antigas de Belo Horizonte e estarem localizadas nos lugares
mais nobres e centrais da cidade. O grupo de Damas da Caridade dessas paróquias era
composto por mulheres da alta sociedade mineira, com grande influência social e política, o
que possivelmente facilitava as negociações com o poder público.
Para conseguir a subvenção federal, a presidente da comissão, Alexandrina de
Santa Cecília, acionava a subvenção social oferecida pelo governo federal. A subvenção
social era,
203
SOUZA, Marco Antônio de. A economia da caridade: estratégias assistências e filantrópicas em
Belo Horizonte. Belo Horizonte: Editora Newton Paiva, 2004.
108
o auxílio financeiro às entidades sociais, que sai da esfera pessoal do governante e passa a esfera social. Constituiu-se numa ajuda de caráter supletivo, que no início só podia ser aplicada em despesas de manutenção de serviços e posteriormente como auxílio extraordinário, passando a subsidiar atividades de natureza especial ou temporária, como construção, aquisição de equipamentos. As subvenções, como tal, iniciam-se com a criação da caixa de subvenções em 1931, que estabelece à sua distribuição certa racionalidade, registro das entidades subvencionadas e fiscalização in loco pelo Ministério da Justiça. De início sua fonte de recursos era à contribuição da caridade, a mesma ajuda do governante. A partir de 1935, vai contar com créditos orçamentários adicionais.
204
Afirma Maria Luiza Mestriner que, em 1930, Getúlio Vargas atribuiu diretamente
os auxílios às organizações sociais, segundo seus critérios e preferências, utilizando-se da
contribuição da caridade cobrada na alfândega sobre a importação de bebidas alcoólicas.
Em 1931, Vargas criou o decreto-lei nº20351, utilizando o Ministério da Justiça como
instituição mediadora dos subsídios aos programas de assistência. O Ministro da Justiça
nesse período, Ernani Agrícola, era mineiro e conhecia bem a realidade sanitária de Minas
Gerais, pois nos anos 1920 atuou como inspetor dos Centros de Saúde de Belo Horizonte e
percorreu a Estrada de Ferro Vitória-Minas para elaboração do plano de saneamento na
Zona Rio Doce, o que tornava mais possível a conquista da subvenção.205
Na tabela a seguir temos as subvenções federais e municipais recebidas pelas
Damas da Caridade de 1930 a 1934.
TABELA 42 – Subvenções e Doações Recebidas
ANO DOADOR DOAÇÃO 1930 Verbas municipais e federais 4:500$000
Subvenção Delegacia Fiscal 6:000$000
1931 Damas São José recebem doação em dinheiro de uma Farmácia
344$000
Subvenção Federal e Municipal 4.500$000 Esmolas recebidas Damas Santa Efigênia 236$000 Doação de um senhor residente na Serra destinado à Vila Santa Isabel em comemoração à data de falecimento de sua esposa.
100$000
1932 Damas da catedral receberam do governo federal 20 sacas de café
1933 Doação em dinheiro para o Horizonte 40$000
Subvenção Federal
100$000
1934 Subvenção Federal e Municipal das Damas da Boa Viagem 2:500$00 Doação Fundação Balbina Araújo 1:500$000 Subvenção Federal das Damas da Floresta 150$000
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos das Atas da Confederação Católica Feminina (1927-1934).
204
MESTRINER, Maria Luiza. O Estado entre a filantropia e assistência social. 4ª Edição. São
Paulo: Cortez, 2001. p. 58. 205
ABREU, Jean Luiz Neves. Ciência e território em Minas Gerais (1895-1930) In: ESPINDOLA,
Haruf Salmen; ABREU, Jean Luiz Neves (Orgs.). Território, Sociedade e Modernização: abordagens interdisciplinares. Governador Valadares: Ed. Univale, 2010.
109
Na tabela 43 temos um balanço das movimentações de verbas levantadas pelas
Damas da Caridade.
TABELA 43 - Movimentação de Verbas: Damas da Caridade
ANO DAMAS VALOR 1929 Santa Efigênia 100$000
1930 Boa Viagem 400$000
1931 Santa Efigênia 251$000
São José 1:929$000
Catedral 387$000
Floresta 40$000
Lourdes 237$000
Total 2:844$000
1932
Santa Efigênia 1:396$000
São José 2:584$000
Catedral 1:440$000
Carlos Prates 51$000
Floresta 556$000
São Sebastião 48$000
Total 6:075$000
1933 Floresta 1:551$000
São José 8:241$000
Lourdes 190$000
Carlos Prates 16$000
Boa Viagem 585$000
Santa Tereza 265$000
Total 10:848$000
1934 São Sebastião 312$500
Floresta 1:654$500
Boa Viagem 1:688$700
Santa Tereza 778$000
São José 664$300
Carlos Prates 882$000
Lourdes 225$000
Total 6:205$000
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos das Atas da Confederação Católica Feminina (1927-1934)
110
Vê-se o alto valor movimentado pelas mulheres, maior que a verba dos órgãos
públicos, o que comprova o protagonismo das associadas no trabalho de assistência social
e na criação de uma complexa rede de convênios e interlocuções. Revela, sobretudo, que
as associações femininas católicas, em particular a CCF, não eram um simples espaço de
devoção e religiosidade, mas um espaço de vivência da modernidade. Os trabalhos
desenvolvidos pelas mulheres associadas eram movidos, não apenas pelo apelo cristão,
mas pelo discurso científico.
111
3 PERFIL DAS MULHERES ATUANTES NO ASSOCIATIVISMO CATÓLICO
EM BELO HORIZONTE
Até aqui foi nosso objetivo apresentar como se organizou o associativismo
feminino em Belo Horizonte, tendo como foco a Confederação Católica Feminina. Vimos que
ele é resultado do movimento de renovação da Igreja Católica e da ação da elite na
organização dos serviços de assistência social. A mulher de elite foi sem dúvida um
elemento fundamental nesse processo, aproveitando-se das brechas criadas para agir
efetivamente no espaço público e criando uma agenda de assistência à infância e às
mulheres operárias.
Nesse capítulo sugerimos que a ação coletiva dessas mulheres tornou-se
possível devido às experiências compartilhadas por elas. Essas experiências perpassam o
cotidiano, a formação, as redes de sociabilidade, a origem social, os programas das
associações, as reivindicações, a mobilidade espacial e os trabalhos desenvolvidos por elas.
Foi uma tarefa árdua recolher informações sobre o grupo de mulheres em
questão, já que, muitas vezes, seus nomes não aparecem nos documentos de forma direta,
por serem identificadas pelos nomes de seus maridos, geralmente figuras públicas e
notáveis. Também porque a historiografia mais tradicional sobre a filantropia qualificou o
trabalho filantrópico como uma atividade masculina. Além disso, pelo simples fato de serem
católicas, suas trajetórias foram esquecidas ou negligenciadas sob o rótulo de serem
conservadoras ou retrógradas.
Diante das dificuldades, partimos do pressuposto de que as mulheres que
desenvolveram algum tipo de trabalho filantrópico e atuaram nas associações femininas
católicas, sobretudo as que ocuparam os cargos de gestão, tiveram sólida instrução escolar.
As carreiras de normalistas e enfermeiras eram mais comuns para as mulheres no período
investigado. Portanto, adotamos a estratégia de procurar informações sobre essas mulheres
não apenas nos documentos das associações que participavam, mas também nos arquivos
da Escola Normal Modelo e da Escola de Enfermagem Carlos Chagas. Foi exatamente
nessas instituições que obtivemos mais dados sobre as associadas.
Nos arquivos da Escola Normal Modelo foram consultadas as Correspondências
Expedidas e Recebidas pelos diretores escolares, Atas das Congregações Especiais, Livros
de Admissão de Alunas, Livros de Termo de Posse de Professores e Funcionários, Fichas
de Ponto e documentos do Grêmio Literário Pedagógico. Já nos arquivos da Escola de
Enfermagem Carlos Chagas, a consulta voltou-se para o Contrato de Professores,
Matrículas, o jornal Cinco Pras Dez, órgão de divulgação do Grêmio Literário “9:55”, da
112
EECC, que circulou quinzenalmente entre os de 1935 e 1940, e a revista A Enfermagem em
Minas, produzida de 1936 até 1938, dedicada a temas técnicos, religiosos e relatos das
experiências vivenciadas no internato.206
As informações recolhidas nesses arquivos foram de extrema importância para
desvelar um pouco do universo das mulheres católicas que se envolveram no trabalho
filantrópico, usando-o como um caminho possível para acessar e agir no espaço público.
Constatou-se que as mulheres envolvidas no associativismo feminino católico eram
modernas, sofisticadas e atentas ao mundo que as cercavam, distanciando daquela imagem
estritamente piedosa e conservadora a que comumente são associadas. Utilizaram-se dos
saberes adquiridos em sua formação escolar, suas redes de sociabilidade e suas condições
socioeconômicas para atuarem no campo da educação e da saúde na capital mineira.
Partimos da hipótese de que o associativismo feminino católico representava
uma forma de ação coletiva de mulheres que compartilhavam experiências, o que de certa
maneira possibilitou a ampla atuação no campo da assistência. Obviamente, não
desconsideramos as motivações e características pessoais das mulheres envolvidas. O
catolicismo era um ponto de partida dessa ação, não o único. Elas desenvolviam trabalhos
filantrópicos não apenas por caridade, mas, sobretudo, porque tinham uma qualificação. Os
temas de educação e saúde passaram pela formação dessas mulheres, guiando suas
ações. Isso posto, buscamos nesse capítulo mostrar quais são as experiências
compartilhadas por essas mulheres. É nosso objetivo mostrá-las como atores sociais,
evidenciando sua origem social, a que famílias pertenciam, trajetória escolar, espaços de
sociabilidade e os valores por elas compartilhados. Tomamos como base para a construção
do perfil das associadas católicas as mulheres que pertenciam à Confederação Católica
Feminina, pois, como dito no capítulo anterior, essa associação era composta por um grupo
específico de mulheres pertencentes à elite, que atuaram basicamente no campo da
assistência à educação e à saúde. Procuramos assim demonstrar que elementos uniam e
direcionavam a ação dessas mulheres.
Para isso, elaboramos um quadro com informações sobre 125 mulheres
associadas à CCF207 que atuavam ativamente como lideranças de alguma associação
católica, das quais destacamos a trajetória de Maria Luiza de Almeida Cunha. O grande
número de mulheres envolvidas no associativismo evidencia que Maria Luiza não era uma
exceção à regra ou uma figura heroica. Sua trajetória demonstra os poderes femininos
206
Sobre isso ver TEIXEIRA, Virginia Mascarenhas Nascimento. O quotidiano da Escola de
Enfermagem Carlos Chagas: entre luz e sombra. Dissertação de Mestrado. Escola de Enfermagem. Universidade Federal de Minas Gerais, 2002.
207 O número de mulheres atuantes no associativismo é infinitamente maior, no entanto foram
selecionados os nomes encontrados que continham informações.
113
vivenciadas por várias mulheres contemporâneas a ela, que extrapolaram o espaço
doméstico e atuaram efetivamente no espaço público.
Apesar de não conseguirmos informações detalhadas sobre todas as mulheres
selecionadas, apenas a quantidade numérica mostra a dimensão da rede, sua extensão e
sua capacidade de mobilização. Além disso, mostra que através das associações de
caridade as mulheres da elite mineira puderam responder aos problemas sociais unindo
preceitos cristãos aos seus interesses, valores e formação.
As mulheres se dividiam em pelo menos duas gerações, os das senhoras
nascidas a partir das três últimas décadas do século XIX e das senhorinhas nascidas nas
primeiras décadas do século XX. Tomando o estudo antropológico realizado por Júlia
Viotti208 no departamento de Psicologia da Escola de Aperfeiçoamento, no ano de 1933,
sobre o perfil das normalistas da Escola Normal Modelo e da Escola de Aperfeiçoamento,
vemos que havia mulheres de 19 a 46 anos nesse universo, sendo registrada a maior
frequência de mulheres com idades entre 22 e 23 anos. Desse grupo, poucas eram
casadas, sendo 88% delas solteiras.
Como podemos visualizar nos gráficos abaixo quanto à raça, possuíam maior
ascendência branca e alguma mestiçagem entre brancos e negros. A maior parte delas
possuía cabelos castanhos e lisos, olhos castanhos e cor de pele morena, seguidos pelos
tons de pele morena clara e branca.
GRÁFICO 1 – Cor de Cabelos
Fonte: VIOTTI, Julia. Antropologia das Moças Mineira (1933). Acervo do Memorial Helena Antipoff da Fundação Helena Antipoff/Ibirité.
208
VIOTTI, Júlia. Antropologia das Moças Mineiras, Imprensa Oficial. Belo Horizonte,1933.
114
GRÁFICO 2 – Qualidade dos Cabelos
Fonte: VIOTTI, Julia. Antropologia das Moças Mineira (1933). Acervo do Memorial Helena Antipoff da Fundação Helena Antipoff/Ibirité.
GRÁFICO 3 – Cor de olhos
Fonte: VIOTTI, Julia. Antropologia das Moças Mineira (1933). Acervo do Memorial Helena Antipoff da Fundação Helena Antipoff/Ibirité.
115
GRÁFICO 4 – Cor da pele
Fonte: VIOTTI, Julia. Antropologia das Moças Mineira (1933). Acervo do Memorial Helena Antipoff da Fundação Helena Antipoff/Ibirité.
Pelo estudo de Viotti, a maior diversão das moças mineiras estava na prática de
esporte, na audição musical, no empreendimento de viagens, passeios pelo campo e
danças. Tinham declarada preferência pela vida no espaço urbano.209 Embora a pesquisa
realizada pela autora tenha sido restrita às mulheres normalistas, pode ser tomada como
uma amostragem das mulheres ligadas ao associativismo católico. Assim, podemos inferir
que havia no associativismo um maior número de moças solteiras, o que permitia tempo
para se dedicar aos trabalhos da assistência. As mulheres casadas, por sua vez, dispunham
de uma organização familiar (empregadas domésticas, babás e professores particulares
para seus filhos), o que lhes permitia dedicar à vida profissional, da casa e ainda se envolver
na filantropia. Outro ponto a destacar era o gosto pela prática de esporte, viagens e a
vivência no espaço urbano, assim como as possibilidades que esse espaço oferecia.
Como é possível visualizar no Anexo 1210, todas as mulheres participavam de
mais de uma associação católica. Comumente, as mais jovens pertenciam às Filhas de
Maria e as senhoras participavam das Mães Cristãs, Damas da Caridade, Apostolado da
Oração, dentre outras. A maior parte delas pertencia às paróquias de Lourdes e Boa
Viagem. É interessante observar que as associadas moravam e pertenciam às paróquias
das regiões mais nobres da cidade, enquanto seus projetos de assistência e instituições
asilares eram erigidos em regiões mais distantes do centro. O que reforça nosso argumento
209
O livro apresenta um estudo antropométrico ainda mais sofisticado do que os dados apresentados
aqui. Apresenta dados sobre alimentação, tamanho das narinas, espessura dos lábios, condições gerais de saúde, períodos menstruais e medidas do corpo em geral.
210 Ver Anexo 1 na página 200.
116
de que o trabalho filantrópico desenvolvido por elas pretendia a ordenação social e o
distanciamento dos hábitos das classes desfavorecidas.
As associadas tinham participação ativa nos grupos católicos e geralmente
ocupavam cargos de gestão. Em suas trajetórias no associativismo, poucas participavam
exclusivamente de associações devocionais. O maior contingente atuava em associações
ativas ligadas basicamente à assistência no campo da educação e da saúde, o que lhe
garantia grande circularidade na cidade e atividades no espaço público. Seguindo as
características das entidades filantrópicas do início do século XX, as associadas
trabalhavam junto aos beneficiados e tinham por objetivo não apenas ajudar com doações,
mas também dar meios para que estes saíssem da situação de necessidade.211 Por isso,
todos os projetos desenvolvidos por elas envolviam trabalhos de formação escolar e
profissional para os assistidos.
Como podemos ver, essas mulheres trabalhavam na benfeitora de instituições
que ajudaram a construir, com destaque para o Asilo Bom Pastor, Creche Menino Jesus,
Vila dos Operários Tuberculosos, Orfanato Santo Antônio e Vila Santa Izabel. Elas estavam
envolvidas em vários projetos de escolas e jardins paroquiais. Todas essas instituições
visavam assistir os necessitados, especialmente as mulheres, crianças, operários e doentes.
Por consequência, esses órgãos criaram noções de legislação social, pois reivindicavam no
interior das associações proteção trabalhista aos operários doentes, como é o caso da Vila
dos Operários Tuberculosos. Formaram uma lógica de proteção às mães e à infância ao
criar instituições como a creche Menino Jesus, Bom Pastor e Orfanato Santo Antônio.
Tratam-se também de ações de cunho humanitário, baseado em campanhas de combate à
tuberculose, sífilis e lepra.
Além do trabalho dentro das instituições, as mulheres se colocavam à frente da
organização de eventos culturais e congressos ligados à educação primária. É notável a
preocupação desse grupo com a infância, a formação das crianças e cuidados com as
mulheres operárias. Como salienta Mott, ao participarem da organização de instituições de
ensino e saúde, as mulheres deixavam sua marca nos serviços prestados à população e
também contribuíam para o desenvolvimento do conhecimento científico.212
Esse grupo de mulheres assumiu como responsabilidade o papel de “mães da
pátria”. Sentiam-se responsáveis pelo melhoramento da nação e cuidavam da infância,
enquanto mães, professoras e enfermeiras. As leituras feitas por elas revelam essa
211
MOTT, Maria Lúcia. Maternalismo, políticas públicas e benemerência no Brasil (1930-1945).
Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudo de Gênero – Pagu/Unicamp n.16 p.199-234, 2001. p.212.
212 MOTT, Maria Lúcia. Gênero, medicina e filantropia: Maria Rennote e as mulheres na construção
da nação. Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudos de Gênero Pagu/Unicamp n.24 p.41-67, jan./jun. 2005.
117
preocupação com a infância e o futuro da nação brasileira. No acervo da EECC nos
deparamos com títulos como: a Cartilha das Mães (1930), Dr. Martinho da Rocha Jr.; Como
criar meu filhinho (palestras com o doutor) (1940), 2ª Edição, Prof. Martagão Gesteira;
Noivos e Esposos – problemas do Matrinômio (1948), 2ª Edição, Padre Àlvaro Negromonte;
Do berço à escola (1941), Mauricea Filho; Moral nas suas relações com a medicina e a
higiene, 4 tomos, Doutor Georges Surbled; Breviário das Mães e das Enfermidades (noções
de hygiene natal e infantil) (1930), W. Burke & A. Mayer.
Na biblioteca particular de Helena Antipoff213, que conviveu de perto com esse
grupo de mulheres, encontramos vários livros de biotipologia, desenvolvimento infantil e
sobre a escola primária. Podemos destacar títulos como A escola e a formação da
mentalidade popular do Brasil, de autoria de dr. Estevão Pinto e organizado por Lourenço
Filho, Guide pratique d’ assistance, annuaires du musée social guides et documents, por
Henri Aubrun, Assistência a Infância, de Gustavo Lessa, Assistência a menores, de Saul de
Gusmão, Imprensa Nacional do Rio de Janeiro de 1942, Anales de Instruccion Primária do
Uruguai, 1944, La vie affective et morale de l´enfant, Madeleine L. Rambert Delachaux e
Niestlé S., Paris. Tais leituras elucidam a prioridade do tema da infância, puericultura,
educação, família, higiene e moral na ação das associadas católicas.
As associadas residiam em sua maioria nos bairros nobres de Belo Horizonte,
especialmente no bairro de Lourdes. Destacamos aqui as famílias, Frazen de Lima, Borges
da Costa, Santa Cecília, Brochado, Brandão, Pires e Alburquerque, Carneiro de Rezende,
Proença, Sales, Viotti e Pádua214. Observa-se também que seus pais, maridos e irmãos
eram atuantes na educação e saúde em Minas Gerais - médicos, dentistas, farmacêuticos,
advogados, engenheiros, industriais, grandes comerciantes, funcionários públicos, ourives e
educadores. As associadas utilizavam desses meios para alcançar suas reivindicações.
Sobre as condições socioeconômicas é preciso dizer que faziam parte da elite política
mineira, havendo uma ampla convivência familiar no interior das associações católicas:
eram primas, mães e filhas, tias e sobrinhas.
A proximidade das famílias não era apenas geográfica, pois existia um forte laço
de amizade entre elas. Ofereciam inúmeros jantares, faziam passeios coletivos no Parque
Municipal e na Praça da Liberdade. Naquela época os encontros nos parques possibilitavam
213
Helena Antipoff não era católica, mas se aproximou do grupo, sobretudo a partir do momento que enfrentou resistência da Igreja Católica às suas pesquisas sobre o interesse infantil. Helena Antipoff reconhecia a forte influência da Igreja na educação em Minas Gerais e a necessidade de diálogo para realização de seus projetos. Assim estabeleceu vínculos e parcerias com os grupos e intelectuais católicos. Sobre isso ver: OLIVEIRA, Bernado Jefferson, VALENTE, Polyana Aparecida. Helena Antipoff and Álvaro Negromonte: a debate about the role of the catholic church in education in Brazil. In: The Global Education Space and Academic Migrants: The legacy of the Russian-Brazilian psychologist Helena Antipoff (1892-1974) in Science, education and human rights (Latin America, Europe and Russia). , p. 174-181, Moscou: em cirílico, 2012.
214 MARTINS, Beatriz Borges. A vida é essa. Belo Horizonte: B.B. Martins, 2000.
118
uma relativa privacidade da elite, pois, como mostra Letícia Julião, não se tem notícia de
muitos eventos com participação popular nesses locais. Segundo a autora, havia uma sutil
barreira que protegia a elite de imprevistos e contatos indesejáveis na rua.215
Destaca Whirt que, além da convivência em parques, saraus e jantares, a vida
de clube transformou-se no centro da recreação em família da elite de Belo Horizonte216. Os
clubes proliferaram nas primeiras décadas da capital, sendo agremiações literárias,
artísticas, culturais, carnavalescas, recreativas e cívicas. Nesses locais, os frequentadores
eram selecionados e o convívio era partilhado entre pares.
Conforme Julião, as famílias de elite belo-horizontina foram seduzidas pela rua.
Reconheciam a necessidade de aderir aos passeios e divertimentos públicos. Rapazes
elegantes e gentilíssimas senhoras circulavam pelas ruas e frequentavam os teatros,
saraus, festas beneficentes e cinemas da cidade. Organizavam nos clubes festividades de
carnaval e faziam piqueniques. Desde criança, essa elite brincava pelas ruas e quintais,
participando dos eventos religiosos, como coroações e outros.217
Para as mulheres, as associações de caridade, as agremiações literárias e as
reuniões internas de jornais e revistas femininas também se configuravam em lugares de
encontro e discussão das questões que diziam respeito ao bem comum e aos interesses do
sexo feminino218. Nesse universo plural e efervescente, as meninas desde pequenas liam
clássicos da literatura, almanaques e revistas francesas. Falavam várias línguas e viajavam
com frequência. Além disso, participavam fortemente na imprensa belo-horizontina, com a
produção de artigos em jornais de grande circulação e revistas de educação. Havia nesse
período muitas revistas e folhetins locais destinados ao público feminino.
Assim, estimuladas por uma intensa vida cultural nas instituições em que
atuavam ou em outros espaços pelas cidades, como teatros e cinemas, essas mulheres
organizavam eventos como peças de teatros e orquestras sinfônicas. Tais eventos tinham o
objetivo de proporcionar entretenimento de qualidade e também levantar fundos para a
filantropia. Como aponta Cynthia Greive, as variadas formas de expressão artísticas (canto,
música, literatura e teatro) guardavam uma dimensão pedagógica formativa de educação
215
JULIÃO, Letícia. Belo Horizonte: itinerários da cidade moderna (1891-1920) In: DUTRA, Eliana de
Freitas; MELLO, Ciro Fávio Bandeira de. BH: horizontes históricos. p. 49-118. Belo Horizonte: C/Arte, 1996.
216 WIRTH, John D. O fiel da balança: Minas Gerais na Federação Brasileira, 1889-1937. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1982. p.134. 217
JULIÃO, Letícia. Belo Horizonte: itinerários da cidade moderna (1891-1920) In: DUTRA, Eliana de
Freitas; MELLO, Ciro Fávio Bandeira de. BH: horizontes históricos. Belo Horizonte: C/Arte, 1996 218
MOTT, Maria Lúcia. Maternalismo, políticas públicas e benemerência no Brasil (1930-1945).
Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudo de Gênero – Pagu/Unicamp n.16 p.199-234, 2001.
119
dos sentidos. Através dessas manifestações, as agremiações comungavam padrões
higiênicos, produção de civilidade, harmonia, ordem, beleza e de consciência pública.219
Todos esses espaços eram ambientes seletivos e serviam de aproximação das
famílias, permitindo o estreitamento dos vínculos de sociabilidade. Desse modo, era muito
comum uma grande intimidade entre os indivíduos. Mas claro está que as mulheres e moças
eram vigiadas em suas andanças pela cidade. Assim, além dos circuitos de eventos
familiares e casas de amigas, podemos afirmar que a escola e a igreja foram os espaços por
excelência da sociabilidade das mulheres mineiras. Convém lembrar que a convivência na
Igreja ia além dos ritos católicos, se estendendo à organização de eventos, quermesses,
festividades, reuniões e outras atividades.
Todas as associadas tiveram uma sólida formação escolar, entretanto, não se
tem muitas informações sobre as instituições em que cursaram o ensino primário, mas
certamente o fizeram em escolas católicas ou nas escolas públicas de grande renome e
qualidade, das quais se destaca o grupo Escolar Barão do Rio Branco.220
No ensino secundário, parte das associadas estudou em colégios confessionais
católicos, destacando-se os colégios Santa Maria e Sagrado Coração de Jesus, nas
modalidades de internato ou externato. Outras cursaram o ensino secundário na Escola
Normal Modelo. Um grupo significativo atuou como professora nas escolas em que se
formou. Desse modo, o grande contingente de mulheres do associativismo católico era de
normalista, talvez todas elas. Observamos que essa mulheres não eram apenas donas de
casa, sendo que quase todas tinham uma carreira profissional e, dentre elas, um número
significativo dedicava-se exclusivamente à sua profissão..221
Mais tarde, algumas normalistas se formaram em enfermagem na EECC,
algumas delas, como é o caso de Clotilde Machado, atuavam, quando normalistas, no
serviço de enfermagem na Inspetoria Médica Escolar. O que denota a presença das
questões relativas à higiene, saúde e puericultura na formação das mesmas. Nas escolas
públicas de Belo Horizonte havia o Serviço de Inspetoria e Higiene Escolar, através do qual
todo aluno da escola primária era examinado pelo médico e enfermeira escolar. É possível
conjecturar que, antes da criação das escolas de enfermagem em Minas, eram as
normalistas que assumiam esse papel. Por isso, muitas delas, mais tarde, optaram pela
carreira de enfermeira.
219
VEIGA, Cynthia Greive. Educação Estética para o povo. In: LOPES, Eliana Marta Teixeira, FARIA
FILHO, Luciano Mendes, VEIGA, Cynthia Greive (orgs.). 500 anos de Educação. 2ª Edição. Belo Horizonte: Autêntica, 2000 p. 399-422.
220 O grupo escolar Barão do Rio Branco, foi criado em 1906, frequentado preferencialmente pelos
filhos da elite mineira. 221
VIOTTI, Júlia. Antropologia da Moça Mineira. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1933. p. 33.
120
Assim, certamente as escolas secundárias foram espaços fundamentais para a
formação do laicato católico feminino, haja visto o maciço controle da Igreja Católica sobre o
ensino secundário em Minas Gerais. No ano de 1920, havia apenas duas escolas normais
oficiais e cinquenta escolas normais equiparadas sob o controle das congregações
católicas, sobretudo de origem francesa. Essas escolas formavam mulheres com base nos
valores cristãos, e elas, por sua vez, tornaram-se importantes instrumentos da Igreja
Católica na vida pública. Mesmo as escolas oficiais do Estado estavam impregnadas dos
símbolos do catolicismo, com professores pertencentes à militância católica e os santos e
crucifixos espalhados pelos ambientes escolares, sendo o catolicismo a crença religiosa da
maioria da população mineira. Por isso, advogamos que a Igreja católica teve um importante
papel na formação do espírito moderno das mulheres mineiras.
Além disso, dentro desses espaços escolares, as mulheres compartilhavam
valores, se organizavam em grêmios, associações, festas que de alguma maneira lhe
renderam amizades, mas, sobretudo, uma capacidade administrativa, de organização de
metas e formação de agendas pautadas nos interesses femininos.
3.1 Formação escolar
Como dito anteriormente, o ensino secundário foi por excelência o espaço de
formação desse grupo de mulheres. Portanto, se faz necessário conhecer como se
apresentavam as escolas secundárias nas quais elas se formaram. Por ser difícil tratar
detidamente as variadas escolas secundárias no período, tomamos como amostra o Colégio
Santa Maria, a Escola Normal Modelo e a Escola de Enfermagem Carlos Chagas.
Interessante observar o intercâmbio que existia entre as alunas dessas instituições. Em
várias reportagens de jornais que circulavam no período encontramos registros de eventos
que envolviam as discentes das diferentes escolas, podemos citar os desfiles de 7 de
setembro, campeonatos de vôlei e apresentações conjuntas nos eventos religiosos
realizados na cidade. Esses intercâmbios permitiam a aproximação das moças e o
estabelecimento de vínculos.
Como salienta Louro, as ocupações de enfermagem e magistério tomaram
emprestadas as características femininas de cuidado, sensibilidade, amor e vigilância.
Essas carreiras estavam carregadas da dupla marca do modelo religioso e da metáfora
materna: dedicação, disponibilidades, humildade, submissão, abnegação e sacrifício.222
222
LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: DEL PRIORI, Mary. (Org.). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997. p. 452.
121
Ainda de acordo com Louro,
a fragilidade feminina, constituída pelo discurso religioso, médico, jurídico e educacional é também constituinte de sua proteção e tutela. A professora era “produzida”, então, em meio a aparentes paradoxos, já que ela devia ser ao mesmo tempo, dirigida e dirigente, profissional e mãe espiritual, disciplinada e disciplinadora.
223
Esse paradoxo e esse conflito na formação das mulheres são apresentados por
Virginia Mascarenhas224 e Georgina Fortina225 ao estudar o cotidiano das alunas da EECC.
As autoras destacaram que o dia a dia no interior da escola dava-se como um espaço
dinâmico, criativo, educativo e de socialização. Foram vários os significados compartilhados,
valores, crenças e sensibilidades. As relações eram estabelecidas entre a harmonia e a
resistência. Na perspectiva das autoras, apesar da rigidez dentro da EECC, as alunas de
enfermagem driblavam as regras, seja pela rebeldia individual, seja pela defesa de seus
interesses, via representantes de turma e através dos grêmios estudantis. Virginia
Mascarenhas, em sua dissertação de mestrado, salienta ainda o espaço da EECC como um
ambiente de vivência da diferença, do lúdico e da transgressão. Espaço de vivências
marcado por comemorações e solenidades religiosas. Ao lado da rotina pesada de estudos
e vigilância católica, as alunas tinham espaços para dançar, tocar, brincar e dialogar.
Um traço comum dessas três escolas era a arquitetura marcada pela
monumentalidade. Fachadas planejadas e organizadas pelo discurso da higiene, salas
amplas, bem arejadas, janelas grandes para circulação de ar e entrada dos raios solares.
Escolas dotadas de espaços externos para prática de esportes, educação física e realização
de momentos cívicos. De acordo com Louro, a própria arquitetura escolar constitui-se num
programa que fala aos sujeitos sobre como agir. Acabava por instituir em sua materialidade
um sistema de valores, como ordem, disciplina e vigilância.
Ainda segundo Louro, o espaço interno das escolas normais tinha uma
organização plena de significados. Os corredores e salas, a capela, os crucifixos, as
bandeiras e retratos de autoridades, os quadros de formatura ou busto das personalidades
ilustres afirmavam ou ocultavam saberes, apontando valores e exemplos, sugerindo
comportamentos. Assim, as escolas secundárias destinadas às mulheres eram marcadas
por uma série de rituais, símbolos, doutrinas e normas.
223
Ibid., p. 454. 224
TEIXEIRA, Virginia Mascarenhas Nascimento. O quotidiano da Escola de Enfermagem Carlos
Chagas: entre luz e sombra. Dissertação de Mestrado. Escola de Enfermagem. Universidade Federal de Minas Gerais, 2002.
225 SANTOS, Geralda Fortina dos. Escola de Enfermagem Carlos Chagas (1933-1950): a Deus
pela humanidade para o Brasil. Tese de Doutorado. Faculdade de Educação. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2006.
122
3.1.1 Colégio Santa Maria
O Colégio Santa Maria, foi a primeira escola secundária de Belo Horizonte,
criada em 1903, destinada ao público feminino. Sua criação foi fruto da articulação do
ministro das relações exteriores do governo Afonso Pena com as Irmãs Dominicanas de
Sévres, na França. O objetivo do colégio era atender a demanda das elites mineiras e evitar
que as meninas de elite tivessem que se deslocar para outras localidades para estudar.
Inicialmente a escola instalou-se no palacete do Dr. Antônio Olinto, próximo à basílica de
Lourdes. Posteriormente foi transferida para o palacete do Conde de Santa Marinha,
próximo à Estação Ferroviária Central. Finalmente, em 1909, estabeleceu-se em sede
própria na Rua Jacuí, no bairro Floresta.
Beatriz Borges Martins relata o trajeto que as normalistas faziam de bonde pelo
Floresta à caminho do colégio Santa Maria,
O bonde do Santa Maria era um sucesso na cidade. Saía da Floresta cedo, pela manhã, com uma irmã e uma empregada. (...) Hilda e eu o esperávamos na esquina da rua da Bahia com a Timbiras, onde entravam também Dulce, Célia e Nícia Baptista Ferreira, que moravam na Av. João Pinheiro. D. Ciduca tinha tanto cuidado com suas filhas, que mandava uma empregada levar-lhes as pastas para que não ficassem com as mãos grossas. (...) Por onde passava, o “bonde do Santa Maria” era esperado por vários rapazes e, por isso, as “fiscais” tinham trabalho: a irmã ia em pé, no primeiro banco, e a empregada, a Zezé. Também em pé, no último. Alguns desses rapazes, que já dirigiam, acompanhavam-no de carro e, quando chegávamos ao Colégio, as meninas maiores sempre tomavam “pitos”, pois eram consideradas as causadoras dos escândalos.”
226
O relato de Beatriz Borges Martins deixa entrever que o trajeto de bonde que
levava as normalistas à escola era, por si só, um grande evento. Por mais que houvesse a
vigília das irmãs no vagão, as moças se divertiam e flertavam com os rapazes. Ainda nas
palavras de Beatriz, o bonde não era apenas um meio de transporte, mas uma forma de
“matar o tempo, apreciar o mundo ao redor e descobrir os territórios”.
A descrição de Martins evidencia que as futuras normalistas tinham a vida bem
controlada por olhares alheios, entretanto, aproveitavam-se das pequenas liberdades
alcançadas no cotidiano. O trajeto no bonde permitia acesso à cidade e tornava-se ambiente
de encontros e diálogos entre as alunas.
Os uniformes das normalistas eram confeccionados com o objetivo de ensinar as
moças um modo adequado de se portar. Eram uniformes sóbrios, avessos à moda,
escondiam os corpos das jovens, tornando-os praticamente assexuados, para combinarem
226
MARTINS, Beatriz Borges. A vida é essa. Belo Horizonte: B.B. Martins, 2000. p. 74.
123
com a exigência de uma postura discreta e digna227. Sobre os trajes que compunham o
uniforme do colégio Santa Maria, descreve Martins,
Os uniformes, todos feitos no próprio colégio, eram uns “marinheiros” bem bonitos: saia pregueada de sarja azul-marinho, blusa de mangas compridas de fustão branco, gola marinheiro do mesmo fustão, com uma âncora azul-marinho bordada em cada ponta. Na frente da blusa, havia um peitinho reto com as letras SM bordadas, também em azul-marinho. Usávamos nas idas e vindas de bonde, um gorro azul-marinho de marinheiro, com o nome do colégio – SANTA MARIA – gravado, em dourado, numa fita de gorgorão. Vivíamos cheias de penduricalhos, chamados de “cruzes” – de comportamento, de aplicação e outros. (...)Ainda, para o desespero de todas as alunas, havia uma avental de tricoline preta, de pala curta e camisolão pregueado, com um babado no lugar das mangas, que usávamos sobre o uniforme durante as aulas. No verão era um inferno usá-lo por cima de todas aquelas roupas, e na verdade, em qualquer época, não adiantava quase nada, pois o que mais sujava, no caso, eram os punhos e as mangas das blusas, que ficavam fora do avental. Finalmente, as meninas eram obrigadas a fazer uma trança grossa, atrás da cabeça, amarrada com uma fita preta.
228
Desse modo, o uniforme escolar tinha o objetivo de proteger o corpo feminino,
evidenciando o desejo de recato, elegância e pudor. O uniforme expressava tanto uma
predisposição das alunas a pensar, sentir e agir de acordo com o ethos cristão católico,
como um engendramento de formas de resistência e luta.229 No entanto observamos que,
por mais que as alunas se vissem obrigadas a utilizá-lo, não se sentiam confortáveis com
ele.
As alunas tinham uma rotina intensa de estudos. A maioria dos professores era
de homens leigos e algumas professoras religiosas. Tinham aulas de desenho, pintura,
costura, línguas, educação física, puericultura, religião, higiene, história e geografia.
Tratava-se de uma educação bem refinada e diversificada. No Colégio Santa Maria, assim
como outras escolas dirigidas por congregações religiosas femininas, as irmãs eram
dotadas de bondade e caridade, atraíam a simpatia das elites, o que garantia com facilidade
gabinetes de coleção, materiais e equipamentos para seus laboratórios. Captavam para seu
corpo docente juízes de direito, juízes municipais, advogados e médicos230. O convívio com
os professores dava-se dentro e fora das escolas.
Havia no interior das instituições escolares normais católicas uma preocupação
sobre a formação das jovens para aquilo que acreditavam ser a maior missão da mulher, ou
227
LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: DEL PRIORI, Mary. (Org.). História das
Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997. p. 452. 228
MARTINS, Beatriz Borges. A vida é essa. Belo Horizonte: B.B. Martins, 2000. p. 73. 229
CHARTIER, Roger. Diferenças entre sexos e dominação simbólica (nota crítica). Cadernos
Pagu, Campinas, São Paulo, n. 4 p. 37-47, 1995. 230
O Horizonte, 28/3/1928 - Affonso dos Santos.
124
seja, ser mãe. Este objetivo estava presente no currículo escolar sobre noções de
puericultura cristã. Por outro lado, essas escolas compreendiam também a necessidade de
formar mulheres para o trabalho. Não por acaso, no ano de 1931 foi inaugurado no colégio
Santa Maria um novo departamento, intitulado Escola Social Feminina, oferecendo três
cursos, a saber: Curso Doméstico, destinado a ensinar a arte culinária, economia doméstica,
costura e corte prático de chapéus, bordados, higiene, psicologia, noções de agricultura e
jardinagem; Curso Comercial, com práticas de datilografia, stenografia, contabilidade,
português, francês e italiano; e o Curso Literário e Artístico, destinado ao estudo de
literaturas antigas e modernas, história da arte, pintura, desenho e artes decorativas.231
Desse modo, a Criação da Escola Social Feminina evidencia o desejo de formar
boas donas de casas e boas mães, mas, sobretudo, formar mulheres bem instruídas e com
domínio sobre os conhecimentos de higiene. Ao que tudo indica, os conteúdos presentes
nos currículos foram os norteadores dos projetos sociais desenvolvidos pelas associadas
católicas. Outro ponto a se considerar é que, embora houvesse o discurso da maternidade
como missão mais importante da mulher, na prática, a existência de três cursos distintos na
Escola Social Feminina indica que nem todas as mulheres eram mães de família, sendo que
algumas dividiam essa missão com outras tarefas. Desse modo, a escola devia preparar e
formar mulheres para variadas funções dentro da sociedade.
No próprio espaço da escola, as alunas participavam das associações católicas.
As reuniões das Filhas de Maria, por exemplo, aconteciam no colégio. Muitas alunas,
inclusive, faziam parte da agremiação. Essas práticas estavam associadas à intenção de
expandir a ideia de caridade nas jovens.232 No bojo das discussões sobre a caridade, as
alunas entravam em contato com os problemas sociais, começavam a pensar alternativas
para amenizar tais problemas e se engajavam na ação social católica como um ambiente de
formação de elite e valores religiosos.
3.1.2 Escola Normal Modelo
A Escola Normal de Belo Horizonte nasceu da Reforma Educacional João
Pinheiro, no ano de 1906. A Escola foi idealizada para atender as moças da alta sociedade.
Inicialmente funcionava na rua Timbiras, no bairro Funcionários. Em 1909 foi transferida
para a Rua Pernambuco, sua sede definitiva.
231
O Horizonte, 31/01/ 1931 e 04/02/1931 . 232
LAGE, Ana Cristina Pereira. Conexões Vicentinas: Educação Confessional Feminina no século
XIX. In: JINZENJI, Monica Yumi; MORENO, Andrea (orgs). História da Educação: sujeitos da educação: intelectuais, professores, crianças e família. Vol. 1 Jundiaí: Paco Editorial, 2014.
125
As alunas eram distinguidas pelos uniformes de saias em cor azul e blusas
brancas, sapatos pretos e meias brancas. Conta Santos que, “era um verdadeiro desfile das
meninas de azul e branco que inspirou até uma música bem conhecida naquele tempo:
“vestia de azul e branco, trazendo um sorriso franco num rostinho encantador, etc”, de
autoria do então famoso jornalista David Nasser, da revista O Cruzeiro, para se referir às
normalistas.233
A escola contava com professores renomados e era respeitada e reconhecida no
meio estudantil. A primeira turma estabeleceu-se em 15 de janeiro de 1907, sob a direção
de Artur Joviano (Português), Aurélio Pires (Francês), Francisco de Magalhães Gomes
(Ciências Físicas e Química), Egídio Soares (Matemática), Branca de Carvalho Vasconcelos
(Música), Cecília de Santa Cecília234 (Trabalhos Manuais) e Cipriano de Carvalho (História e
Geografia). Cumpre ressaltar que, apesar de ser uma escola pública não confessional, a
maior parte do corpo docente era atuante na militância católica.
Em 1928, com a Reforma Educacional Francisco Campos, o curso normal foi
dividido em três etapas: o curso de Adaptação, com duração de dois anos; o curso
Preparatório, de três anos; e o curso de Aplicação, de dois anos. Nesse último, estudavam
psicologia, história da educação, biologia e higiene, estabelecendo então a prática
profissional.
Conta Santos que as aulas de Puericultura eram ministradas por um médico
pediatra. A aula final acontecia na Maternidade Hilda Brandão. Uma das atividades
desenvolvidas na aula prática era dar banho nos recém-nascidos. Nessa aula, as alunas
eram auxiliadas pelas enfermeiras do hospital.235
As normalistas da Escola Normal Modelo também tinham aulas de música, com
um programa elaborado pela professora Branca Vasconcellos, importante membro da
militância católica e atuante na CCF pela comissão Escolas. Dentro da Escola Normal havia
um museu de história natural onde eram ministradas as aulas de ciências. As salas de
geografia constituíam-se em “salas/museus”, com materiais como globos terrestres e
projeções. Não só os conteúdos, mas também a forma como eram ministradas as aulas
proporcionava um repertório bem variado de experiências às alunas. Além disso, a Escola
Normal Modelo contava com vários grêmios literários e estudantis, que de alguma forma
dotava as alunas de uma capacidade de gerência e trabalhos em coletividade.
233
SANTOS, Edelweiss de Paiva. Instituto de Educação de Minas Gerais: pequena biografia de
uma grande história. Belo Horizonte: Mazza Edições Ltda., 2011. 234
Tudo indica que Cecília de Santa Cecília era mãe de Alexandrina de Santa Cecília, que, inclusive,
posteriormente, assume a cadeira de Trabalhos Manuais. 235
SANTOS, Edelweiss de Paiva. Instituto de Educação de Minas Gerais: pequena biografia de
uma grande história. Belo Horizonte: Mazza Edições Ltda., 2011.
126
3.1.3 Escola de Enfermagem Carlos Chagas (EECC)
O internato se localizava nas proximidades da Rua de Chumbo, 601, no bairro
da Serra. Além do espaço, localizado na Rua Estevão Pinto, a Casa Amarela na época era
sede e gerência do internato da EECC. A instalação da escola na modalidade externato
tinha sede administrativa em salas do Hospital São Vicente de Paulo, cedidas pelo diretor da
Faculdade de Medicina, Professor Alfredo Balena, e pelas irmãs vicentinas.
Na concepção da diretora da EECC, o objetivo era formar enfermeiras e
despertar um espírito de serviço, uma cultura intelectual geral e um arsenal técnico
específico da enfermagem. Prepará-las para os desafios e sacrifícios que a profissão exigia.
Uma profissão a serviço de Deus, da Pátria e da Humanidade.236 A enfermeira foi
considerada, por parte da intelectualidade médica, um dos principais agentes que iria
desempenhar, perante a população, o papel de guardiã devotada e educadora sanitária,
ensinando como formar, criar e educar para a pátria e para Deus, homens sadios e íntegros
de corpo e alma. A enfermeira era a representação da mulher como educadora e
saneadora.
Nos periódicos237 que circulavam no interior da escola é possível identificar as
prioridades da formação das futuras enfermeiras, sem dúvida a infância e a maternidade era
o grande caso. Nos vários números da revista A enfermagem em Minas, encontramos
artigos de médicos e intelectuais católicos discutindo sobre alimentação infantil, visitações
nos lactários de Belo Horizonte e as relações entre a enfermagem e a educação. Além
disso, era muito recorrente assuntos ligados à educação física, saúde pública e cuidados
com a lepra, sobretudo na infância.
3.2 Maria Luiza de Almeida Cunha: o paradoxo entre o conservadorismo católico e suas práticas de vanguarda
Maria Luiza de Almeida Cunha é uma figura presente na pesquisa desde o
mestrado. Seus textos e o pouco que conhecemos sobre a sua trajetória indicavam que era
uma mulher importante para a educação em Minas Gerais e, sobretudo, uma mulher
moderna, sofisticada e de intensa vida pública. Entretanto, as informações sobre ela eram
236
SANTOS, Geralda Fortina dos. Escola de Enfermagem Carlos Chagas (1933-1950): a Deus
pela humanidade para o Brasil. Tese de Doutorado. Faculdade de Educação. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2006. p. 159.
237 Revista A Enfermagem em Minas Gerais e jornal Cinco p’ras dez.
127
esparsas e pouco exploradas pela literatura sobre o tema, sendo ela comumente rotulada
como educadora católica e conservadora, avessa ao movimento da Escola Nova.
No presente trabalho, esbarramos novamente na figura de Maria Luiza de
Almeida Cunha. No começo a deixamos de lado, devido à miopia causada por esse transitar
no tempo, um pouco por aceitar o que a literatura diz sobre ela, e muito por exigir desse
personagem uma modernidade do tempo presente e não a modernidade na qual ela estava
inserida. Quando nos demos conta desses equívocos, nos lançamos ao desafio de ir ao
encontro de Maria Luiza de Almeida Cunha no tempo e no espaço em que viveu. Para isso
tivemos que negligenciar muitas informações já estabelecidas sobre ela e buscar pistas que
permitissem outra construção de sua imagem.
Vasculhamos os jornais e revistas que circulavam no período, materiais
produzidos pelo associativismo católico, até finalmente chegar à sua família. Através do
Projeto de Memória e História Oral238 sobre educadores mineiros, disponível no acervo da
Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais, encontramos a entrevista da filha de
Maria Luiza de Almeida Cunha, que inclusive recebeu o mesmo nome da mãe e, assim
como ela, atuou como educadora.
Logo no início da entrevista, a filha fala rapidamente da importância da mãe para
a educação em Minas Gerais e pontua algumas questões sobre a trajetória dela. O que mais
nos intrigou foi o fato de Maria Luiza Almeida Cunha ter sido criada pelas irmãs Jacobina
Lacombe, uma família tradicional do Rio de Janeiro, proprietária de um colégio católico
importante no período, o Colégio Jacobina.
De modo geral, a entrevista serviu para tornar maior nosso interesse e confirmar
as suspeitas de que Maria Luiza de Almeida Cunha havia sido uma mulher importante na
sociedade belo-horizontina nas primeiras décadas do século XX, e que essa importância ia
muito além da militância católica. Depois disso, outra filha de Maria Luiza foi localizada,
dona Madalena, que gentilmente nos recebeu em sua casa, conversou conosco e nos cedeu
materiais fundamentais para a escrita desse trabalho. Destacamos o empréstimo do livro O
presente das coisas passadas, que é uma coletânea de textos produzidos pelos familiares,
que conta a história da família Almeida Cunha.
Claro está que é possível visualizar a figura de uma mulher católica, sim, mas
acima de tudo uma mulher de apurada educação, dinâmica e moderna e importante membro
da Ação Social Católica em Belo Horizonte, sobretudo no campo da educação. Maria Luiza
acreditava que a escola formaria um novo homem, moderno, saudável, honesto e
trabalhador. Para ela, essa formação só teria êxito em conexão com o ensino religioso.
238
Projeto de História Oral “Depoimentos orais sobre a educação em Minas Gerais: ampliando a
memória oficial”. Faz parte do acervo do Centro de Referência do Professor, órgão da Secretaria e Educação de Minas Gerais.
128
3.2.1 A vida antes de Belo Horizonte
Maria Luiza de Almeida Cunha nasceu em 19 de agosto de 1895, na cidade de
Barra Mansa, no Rio de Janeiro. Filha de Maria Campos de Aguiar Neves (Marieta) e do
comerciante José da Rocha Neves. Teve dois irmãos, Luiz e Cecília. O pai de Maria Luiza
era comerciante, uma espécie de caixeiro viajante, e em uma de suas viagens não voltou
para casa, sendo dado como morto pela família. Por esse motivo, se vendo obrigada a
trabalhar para cuidar dos filhos, Marieta, mãe de Maria Luiza, foi morar na casa dos pais.
Depois de um tempo (não foi possível precisar a data), seus avós maternos
foram morar na cidade do Rio de Janeiro. Na ocasião, tornaram-se vizinhos da família
Jacobina Lacombe. Na época, as irmãs Isabel e Chiquinha Jacobina decidiram criar uma
escola para educar suas filhas. Isabel tinha uma filha na idade de Maria Luiza e pediu aos
seus avós que a deixassem estudar no colégio. Maria Luiza tinha entre 6 e 7 anos. Tendo
sido autorizada, ela e mais 5 meninas foram as primeiras alunas do colégio.
A escola estava localizada na Rua Almirante Tamandaré, no bairro do Flamengo,
uma rua grande e larga, que abrigava poucos moradores, de modo que todos se conheciam.
Com o tempo a escola cresceu e passou a atender os filhos dos moradores dos arredores e
rapidamente tornou-se um importante colégio no cenário educacional carioca, quiçá
brasileiro, frequentado por um público diverso, oriundo de vários lugares da cidade do Rio e
de grande aceitação pela elite.
No projeto do colégio estava presente a busca de despertar nas alunas o amor e
a caridade, a sinceridade, a pureza, o ato de ser mãe e educadora, propondo uma educação
renovadora, mas embasada nos preceitos católicos.239 As idealizadoras da instituição, as
irmãs Isabel e Chiquinha, procuraram aplicar no colégio a experiência educacional
vivenciada por elas. Isabel estudou no Colégio Progresso, fundado no Rio de Janeiro em
1887, por uma professora americana e protestante. O colégio era destinado ao público
feminino e foi uma das primeiras instituições a utilizar as concepções educacionais
americanas no Brasil. Chiquinha, por sua vez, teve uma orientação educacional francesa.
Essa preocupação com a educação foi herdada de seu pai, D. Antônio Jacobina.
Em uma carta enviada a Isabel Jacobina, no ano de 1889, D. Antônio manifesta sua
compreensão sobre o que considerava uma condição adequada para mulher,
Se conheces o que não podes fazer, deves compreender como é triste a condição da mulher a quem Deus deu inteligência igual a do homem, mas,
239
ALVES, Luciana Pazzito. O curso Jacobina: uma experiência de modernização em uma
instituição católica (anos 1920 e 1930). Faculdade de Educação. Universidade Federal Fluminense, Niterói, 1997.
129
que um sistema acanhado de educação esteve a ponto de não conhecer seus próprios interesses aguardando o marido, podendo firmar-lhe o passo e discernir o verdadeiro caminho. Vês, pous que a mulher se ocupando de futilidades perde sua importância como membro da sociedade, para só forma-se um objeto de divertimento para ricos e (?) para os remediados se a mulher pudesse ser o braço direito do marido, assegurava-o seu futuro e o da sua família. Mas isso é inútil pregar: a moda e a falta de senso têm mais valor.
240
Como podemos ver, as filhas Lacombe foram educadas para não serem
mulheres fúteis e submissas ao marido. Ao contrário, foram incentivadas a crescerem
intelectualmente, formarem uma boa família e atuarem na sociedade. Certamente criaram a
escola para que suas filhas tivessem uma educação dentro desses moldes. Podemos
ressaltar isso como uma novidade, pois no período a educação feminina baseava-se quase
exclusivamente na formação de boas mães, esposas e donas de casa.
Conta Maria Amélia, que na casa dos Lacombe, Maria Luiza conviveu com três
diferentes gerações de mulheres. Era um meio bastante culto e lá se organizavam saraus
literários sofisticados. Além das mulheres, a casa era habitada por homens ligados à política
e à literatura. O “tio Américo”, por exemplo, foi diretor da Casa Ruy Barbosa e membro da
Academia Brasileira de Letras241. É nesse ambiente que Maria Luiza de Almeida Cunha se
formou. Inclusive, supomos que o entendimento do papel da mulher para ela, sua formação
católica e o espírito caridoso são frutos da educação recebida no colégio e da convivência
com a família Jacobina Lacombe.
240
LACOMBE 1962 apud. PRAZERES, Talitha dos. As minhas meninas: um estudo sobre os
discursos se Laura Jacobina Lacombe dirigido à alunas. Artigo Apresentando nos Anais do Congresso da Sociedade Brasileira de História da Educação. p. 65.
241 ALMEIDA CUNHA, Maria Amélia. O presente das coisas passadas. Coletânea de Textos:
Família Almeida Cunha. Belo Horizonte, 2015. p. 05.
130
FIGURA 2– Maria Luiza de Almeida Cunha, Isabel Lacombe e Roberto de Almeida Cunha (s/d).
Fonte: Arquivo Pessoal da Família Almeida Cunha
Pouco tempo depois, os avós de Maria Luiza decidem voltar para Barra Mansa.
Isabel Lacombe Jacobina pediu à família que deixasse Maria Luiza sobre os cuidados dela.
Segundo relatos da família, Isabel julgava Maria Luiza uma menina muito talentosa e seria
um desperdício de seu talento se ela voltasse para o interior. Assim, Maria Luiza ficou no
Rio de Janeiro e foi criada como uma filha por Isabel. Ela fez todo o curso de Humanidades
no Colégio Jacobina, durante o qual teve aulas com professores renomados como João
Kopke, José Oiticica e Alberto Nepomuceno. Após se formar, atuou como professora e se
preparava para ser diretora do colégio. No entanto, Maria Luiza não chegou a assumir a
direção da escola. Seu irmão, Luiz, estava com tuberculose e, em decorrência do problema
de saúde do irmão, Maria Luiza, aos 21 anos, juntamente com sua avó Marieta, mudou-se
para Belo Horizonte, para que Luiz tivesse condições mais adequadas de tratamento.242
242
Como vimos no capítulo anterior, Belo Horizonte recebia muitas pessoas acometidas por doenças
pulmonares, atraídas pelo clima de montanhas favorável ao tratamento.
131
3.2.2 Maria Luiza e a vida em Belo Horizonte
Com a vinda de Maria Luiza para Belo Horizonte, quem assumiu a direção da
escola foi Laura Jacobina Lacombe, irmã de criação da Maria Luiza. Laura atuou como vice-
diretora do colégio e assumiu a direção entre os anos 1935 a 1980. Laura Jacobina
participou ativamente de encontros e assembleias voltados para educação. Foi membro da
Associação Brasileira de Educação (ABE)243 e da Organização Mundial para Educação Pré-
Escolar (OMEP), onde foi presidente entre 1955 e 1980. Fez viagens pela Europa e Estados
Unidos, interagindo com os conteúdos da Escola Nova. Escreveu vários livros com os
temas: música, religião e educação.
Na vinda a Belo Horizonte, Maria Luiza foi recomendada por Isabel Lacombe a
procurar as famílias Monteiro e Borges da Costa. Famílias com as quais estabeleceu uma
sólida amizade. Inclusive, ela ficou instalada por um tempo na casa dos Borges da Costa. O
lastro de amizade durou por toda vida e gerou laços de compadrios entre as famílias. O
médico Eduardo Borges da Costa indicou que Luiz se tratasse com o médico Roberto de
Almeida Cunha, com quem Maria Luiza se casou algum tempo depois.
Roberto de Almeida Cunha era oriundo de uma família tradicional de São João
Del Rey. Formou-se na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, por volta de 1912 e
trabalhou com Oswaldo Cruz no Instituto Manguinhos na campanha contra a febre amarela.
O médico decidiu fazer carreira em Belo Horizonte em virtude de sua saúde, alguns falam
em gripe espanhola, outros em tuberculose. O primeiro trabalho de Roberto de Almeida
Cunha na capital mineira foi no Posto Veterinário da cidade, onde atuou ao lado do dr.
Henrique Marques Lisboa. Foi catedrático de microbiologia na Faculdade de Medicina de
Belo Horizonte e na Escola de Odontologia e Farmácia. Na Faculdade de Medicina e
Farmácia, além de professor, foi diretor por duas vezes consecutivas. Fundou, em
sociedade com o professor Carlos Chagas, o primeiro laboratório de análises clínicas de
Belo Horizonte, Laboratório Veritas. O laboratório foi anunciado em todas as edições do
jornal O Horizonte. No laboratório eram realizadas análises de urina, fezes, suco gástrico,
sangue e cefalorraquidiano. O laboratório realizava também exames bacteriológicos,
histopatológicos e aplicação de vacinas.
Além disso, Roberto de Almeida Cunha teve importante papel na militância
católica. Era vicentino e aos domingos de manhã visitava doentes e fazia doação de
alimentos. Como mostra Marques, ser caridoso e católico eram atributos importante para os
243
Na primeira Conferência Nacional de Educação organizada pela ABE, Laura Jacobina Lacombe
apresentou as seguintes teses: Comunicação sobre o Bureau International D‟Education e a Educação e a Paz.
132
médicos mineiros nas primeiras décadas do século XX, pois contribuía para estabelecer a
confiança entre médicos e pacientes. Roberto de Almeida Cunha também atuou como
membro do corpo editorial dos jornais católicos, O Horizonte e O Diário.
O casamento de Roberto e Maria Luiza ocorreu no ano de 1919, no Rio de
Janeiro, na velha Igreja de Nossa Senhora da Lampadosa. A cerimônia foi celebrada pelo
capelão Monsenhor José Antônio Gonçalves Rezende. A festa de casamento aconteceu na
Confeitaria Colombo, com cerca de 200 convidados. O enxoval e a festa de casamento
foram organizados por Isabel Lacombe.
O casal Almeida Cunha teve 13 filhos, sendo 4 homens e 9 mulheres. Pelo
número de filhos vemos que Maria Luiza seguia os preceitos da vida cristã e não evitava a
gravidez, formando uma grande e tradicional família católica. No livro de memórias
elaborado pela família, os filhos contam que Maria Luiza tinha uma rotina intensa. Ficava
muito tempo fora de casa, envolvida com o trabalho e, mesmo assim, “todo ano voltava com
cheirinho de bebê da maternidade Hilda Brandão”. O marido e a filha mais velha ajudavam a
cuidar das crianças. Diferentemente das mulheres da época, Maria Luiza não sabia costurar
nem bordar.
FIGURA 3 – Maria Luiza com o marido e seus filhos (s/d)
Fonte: Arquivo Pessoal da Família Almeida Cunha.
133
FIGURA 4 – Maria Luiza com o marido e seus filhos (s/d)
Fonte: Arquivo Pessoal da Família Almeida Cunha.
Maria Luiza preocupava-se em refinar o repertório cultural dos filhos com
atividades variadas, como aulas de francês e inglês. Preparavam momentos recitativos,
canções e teatro em casa. Além de saraus de literatura organizados pela professora e
poetisa Carmem de Mello, criavam clubes, jornais e gibis. Os filhos também eram
incentivados a participar da ação católica.244
A família morou em dois endereços diferentes na cidade. Primeiro na Rua
Maranhão e depois, no ano de 1928, a família mudou para a casa da Avenida Bias Fortes
(naquele tempo, Cristovam Colombo). A segunda casa foi construída aos poucos e ficou
conhecida pelo intenso fluxo de pessoas que passavam por lá e por ter uma capela (um
oratório privado), autorizada pelo padre Eugenio Pacelli (Pio XII), onde se celebravam
missas quase todos os dias.
Vejamos a descrição da casa “Bias Forte” por José Carlos, filho de Maria Luiza,
Realizada parte por parte, montada peça por peça, como um objeto de carinho para guardar na lembrança! O acesso pelo endereço das Bias Fortes começava com uma escada que virava para a esquerda com ângulo reto: os dois lances de cinco degraus. Uma passarela, logo mais três degraus e um pequeno descanso no banco encostado no muro coberto de hera, com a pintura dos carregadores de uma liteira, para que os nobres
244
ALMEIDA CUNHA, O presente das coisas passadas. Coletânea de Textos: Família Almeida
Cunha. Belo Horizonte, 2015 p.22
134
visitantes não se fatigassem. Mais dois degraus à esquerda, continua a subida por uma rampa suave, que terminava subindo com mais degraus. Outra base para repouso, esta com uma gravura portuguesa, também pintada em azulejos azuis, como as outras. Para não perder o impulso, ainda seis degraus, a escolha: um lance curvo para a esquerda e outro igual, em curva para a direita. Depois desta subida toda, chegava-se ao adro com piso de tijolos, na frente da bonita mansão, mais quatro degraus amplos e o prêmio da varanda de entrada: porta com duas partes, pintada de azul, que se abria, para o hall de recepção. Duas gravuras nas paredes, também pintadas sobre azuleijos uma com a figura de um vendedor ambulante com seu cavalo carregando mercadorias e, de outro, a fachada de uma casa, da qual se dizia ser a mais antiga de São João de Rey.(...) A casa era muito grande. Com mais de trinta cômodos, tinha sido construída por partes, na medida em que a família crescia. Depois do último acréscimo, ficou com dois mil metros de área coberta e trinta e tantos cômodos. (...) Lá pelos idos de 1943 a casa foi preparada para receber os hospedes que viriam para a celebração das bodas de pratas, que aconteceu em 1944. Naquele ano começou a construção do anexo a que chamamos de “Austrália”, apelido inventado por Maria Eugenia, porque ficava “do outro lado do mundo”. O anexo tinha um quarto de banho completo, dois pequenos quartos e um grande no extremo de um corredor comprido. (...) O anexo foi feito sobre os quartos dos empregados e da lavanderia, que ficavam no fundo da horta, separando o galinheiro da parte em que ficavam os canteiros.
245
FIGURA 5 – A casa da família Almeida Cunha (s/d)
Fonte: Arquivo Pessoal da Família Almeida Cunha.
Pela descrição de José Carlos, observa-se que era uma casa grande, marcada
pela tradição e elementos religiosos. Era também uma casa de encontros, trocas e de muita
circularidade. Além dos parentes, a casa recebeu vários hóspedes ilustres, tais como Pio
XII, Dom Hélder Câmara, D. Leme e D. Cabral. Este último, inclusive, ceava com a família
245
Ibid., p. 34
135
todo dia 26 de dezembro. Conta Madalena que durante o 2º Congresso Catequético
Nacional, realizado em Belo Horizonte, a casa ficou completamente movimentada, vários
lanches e jantares foram realizados no local, que serviu como um importante ponto de
encontro do Congresso.
Maria Luiza de Almeida Cunha tornou-se uma mulher conhecida e estimada na
cidade e tinha um enorme ciclo de amizade. Ela tinha ao seu redor uma rede de pessoas
influentes no meio político, social, educacional e religioso e ela soube acionar essa rede
para desenvolver seus projetos.
3.2.3 Maria Luiza e sua vida profissional em Belo Horizonte
Maria Luiza de Almeida Cunha atuou amplamente no campo da educação em
Belo Horizonte. Em 1927, em ocasião da Reforma Educacional Francisco Campos, foi
indicada para trabalhar na Inspetoria de Educação. Tudo leva a crer que a Inspeção Pública
foi o primeiro trabalho oficial de Maria Luiza na capital mineira. No entanto, desde a sua
chegada à cidade, ficou aproximadamente oito anos trabalhando em casa e dedicando-se à
militância católica nas associações leigas. Nesse período produziu muitos artigos para a
imprensa local, especialmente no jornal O Horizonte e na Revista do Ensino, conforme
demonstra tabela abaixo.
TABELA 44 – Lista de artigos produzidos por Maria Luiza de Almeida Cunha
1 PERIÓDICO TÍTULO DO ARTIGO MÊS/ANO 2 Revista do Ensino Impressões sobre o método de ensinar 01/1926 3 Revista do Ensino O trabalho inteligente do mestre 02/1926 4 Revista do Ensino Os exercícios de observação 03/1926 5 Revista do Ensino Como avaliar 04/1926 6 Revista do Ensino Os exercícios da memória 06/1926 7 Revista do Ensino Educação da vontade 07-08/1926 8 Revista do Ensino Disciplina Escolar 10/1926 9 Revista do Ensino As tendências atuais do ensino primário 12/1926
10 Revista do Ensino Primeiros Frutos (análise sobre os efeitos da Reforma Francisco Campos)
01/1929
11 Revista do Ensino Testes/ Que testar? 08/1930 12 Revista do Ensino O problema da Inspeção e a educação nova 07-08-09/1931 13 Revista do Ensino Comentário geral sobre os relatórios referentes a
homogeneização das classes escolares 04-05-06/1932
14 Revista do Ensino Test Prime (teste de inteligência, elaborado em coautoria com Helena Antipoff)
07-08-09/1932
15 Revista do Ensino A vida de Jesus e o ensino de catecismo 15/10/1932 16 Revista do Ensino A vida de Jesus e o ensino de catecismo
(continuação) 01/11/1932
17 Revista do Ensino A vida de Jesus e o ensino de catecismo (conclusão)
15/11/1932
18 Revista do Ensino O conceito cristão de educação (tradução da Femme)
15/09/1933
136
19 Revista do Ensino Caderno de preparo de lições 09/1935 20 Revista do Ensino A influência da religião na educação da creança e
Programa do Ensino de Religião no ensino primário 12/1935
21 Revista A enfermagem em
Minas
As mães Ano I – n° III Nov./Dez.1937
22 Revista A enfermagem em
Minas
O casamento Ano I – n° IV Jan./Fev. 1938
23 O Horizonte A Reforma do Ensino Primário 5/11/1927 24 O Horizonte Congresso de Educação da Academia Brasileira de
Educação 3/12/1927
25 O Horizonte Pela educação integral 28/12/1927 26 O Horizonte A unidade nacional pela cultura moral. A educação
religiosa como meio de nacionalizar a infância 28/01/1928
27 O Horizonte O ensino religioso 25/2/1928 28 O Horizonte Sobre o ensino religioso no Brasil 23/5/1928 29 O Horizonte Pela educação nacional 18/07/1928
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos de revistas e jornais que circularam no período de estudo.
Pela Reforma Francisco Campos, o serviço de Inspetoria Geral da Instrução
Pública era dividido em Inspetoria Técnica, Educação Física e Assistência Médica e
Odontológica. Os assistentes técnicos da inspetoria deveriam ser escolhidos, de
preferência, entre os membros do magistério público pelas notas de merecimento
registradas na Secretaria do Interior, acompanhado da obrigatoriedade do diploma da
Escola de Aperfeiçoamento. Enquanto não houvesse pessoas diplomadas pela escola, os
assistentes eram nomeados via concurso ou indicação. Os inspetores técnicos tinham uma
lista imensa de atribuições e desempenhavam um papel importante na modernização do
ensino primário em Minas Gerais. Dentre as atribuições estavam:
- visitar as escolas públicas e particulares, concedendo instruções para melhor desenvolvimento dos programas; - inspecionar classes e proceder crítica a aula assistida, sugerindo modificações aos métodos, processos e orientações do ensino, visando torná-lo mais eficiente; - organizar conferências; - produzir dados de estatística escolar; - elaborar testes; - produzir relatórios periódicos e remetê-los à Inspetoria Geral. - estudar e ensaiar os estudos clássicos com as temáticas Escola Livre, Escola Ativa, Métodos de Decroly, Dalton, Plane e outros.
246
O serviço de inspeção era importante para a concretização das metas da
Reforma Educacional proposta por Francisco Campos. Quem assumia o cargo devia gozar
de ampla experiência e de grande representatividade no meio educacional mineiro. Além
disso, assumir a função de inspetora naquele momento era algo muito representativo para
246
Minas Gerais 20/10/1927 - Regulamento do Ensino Primário em Minas Gerais p. 5.
137
uma mulher, pois geralmente eram os homens que dirigiam e faziam a inspeção escolar. Às
mulheres cabia o espaço da sala de aula.247
Como Inspetora do Ensino, Maria Luiza foi indicada a trabalhar com Helena
Antipoff no laboratório de Psicologia da Escola de Aperfeiçoamento. Das razões da
indicação podemos citar o fato de Maria Luiza possuir fluência em língua francesa, atuando
como intérprete e tradutora de Helena Antipoff, a experiência e o conhecimento que possuía
no campo da pedagogia moderna e a experiência adquirida nos longos anos que lecionou
no Colégio Jacobina e nas leituras empreendidas por ela.
Helena Antipoff era psicóloga e educadora e estava na vanguarda de um grupo
de pioneiros educacionais de Genebra. No final dos anos 1920 recebeu a proposta de
contrato de trabalho, pelo então presidente Antônio Carlos de Andrada, para lecionar na
Escola de Aperfeiçoamento, em Belo Horizonte. A Escola de Aperfeiçoamento estava no
bojo das transformações educacionais propostas na Reforma Educacional Francisco
Campos, redigida no ano de 1927248. O objetivo da Escola de Aperfeiçoamento era formar
uma elite pedagógica e cientificamente preparada nos termos mais modernos do
conhecimento educacional do período. Os profissionais ali formados eram colocados nos
postos chaves da estrutura do ensino primário mineiro.249
Juntas, Helena Antipoff e Maria Luiza, no ano de 1932, criaram o modelo de
teste de inteligência conhecido como test prime. O teste procurava levantar informações
sobre ideais e interesses, desenvolvimento mental das crianças mineiras e a organização
das escolas locais. Para Maria Luiza, os testes permitiam aferir a inteligência global, as
aptidões físicas e psicológicas das crianças e, por consequência, orientava a organização
das classes e o controle de promoções.250
O resultado do teste, inclusive, gerou uma controvérsia entre os católicos que
ficou conhecida como “a desavença entre Helena Antipoff e o padre Álvaro Negromonte”. O
teste afirmava que a disciplina de ensino religioso era o conteúdo com maior índice de
rejeição entre as crianças. Diante do resultado, Negromonte publicou, no jornal O Horizonte,
um artigo intitulado, “Em torno de inquérito escolar”.251 No artigo, Negromonte analisou com
minúcias os dados do teste e tentou demonstrar que o desinteresse das crianças não estava
no ensino religioso em si, mas na forma como ele era ministrado pelas catequistas.
247
LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: DEL PRIORI, Mary. (Org.). História das
Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997. p. 452. 248
Helena Antipoff – 85 anos de Brasil: Memórias (com) partilhadas. Belo Horizonte, 2014. 249
PRATES, Maria Helena de Oliveira. Escola de Aperfeiçoamento: teoria e prática na formação de
professores. In: Lições de Minas: 70 anos de Secretaria de Educação. Belo Horizonte: Secretaria de Educação de Minas Gerais, 2000. p. 68.
250 ALMEIDA CUNHA, Maria Luiza. Tests. Revista do Ensino 08/1930.
251 O Horizonte, 15/10/1930.
138
Argumentava também que Helena Antipoff desconsiderava outras questões do teste que
revelavam a importância da fé católica na vida das crianças mineiras.
Sabe-se que depois desse episódio Helena Antipoff e o padre trabalharam juntos
por um longo período. Negromonte trabalhou arduamente na formação de catequistas
atuantes no ensino primário público e foi vice-presidente da Sociedade Pestallozi252,
instituição criada por Antipoff, no ano de 1935, destinada a acolher crianças excepcionais. O
episódio entre Helena Antipoff e Negromonte torna visível a grande representação da Igreja
Católica na educação mineira e as negociações estabelecidas entre os educadores e o
catolicismo.
Em função do resultado do teste, nos meses seguintes à sua publicação, Maria
Luiza de Almeida Cunha organizou uma série com três artigos sobre o ensino religioso nas
escolas. Os artigos foram publicados na Revista do Ensino. No primeiro artigo da série, a
autora argumenta que, ao permitir o ensino religioso em suas escolas, o governo mineiro
criou novas responsabilidades para os catequistas. Exigia por todos os meios a
homogeneização do ensino em obediência estrita à psicologia infantil. O cumprimento de tal
responsabilidade representava um grande desafio, uma vez que existiam naquele período
mais de 400 classes e um reduzido número de catequistas. Por isso era necessário oferecer
aos professores um meio eficaz de transmitir aos alunos o ensino de catecismo sem quebra
de homogeneidade pedagógica, que era essencial à boa compreensão. Maria Luiza
afirmava ser necessário que os catequistas e professoras adotassem as exigências da
Escola Nova às noções básicas do catecismo. Nesse sentido, seus artigos pretendiam
auxiliar os catequistas nessa tarefa.253
Maria Luiza escolheu como centro dos seus artigos “A vida de Jesus e o
catecismo” para enunciar os dogmas e os preceitos da moral cristã. Os artigos foram
divididos em lições. Para cada lição havia um tema, uma narrativa evangélica e a
apresentação de um dogma. Entre as lições tinham várias ilustrações, que objetivavam
atrair o interesse das crianças, uma técnica muito utilizada pela Escola Nova.
252
A Sociedade Pestallozzi colaborava também com o Abrigo de menores e com outras instituições voltadas para os problemas das crianças desvalidas.
253 Revista do Ensino 15/10/1932.
139
FIGURA 6 – Artigo sobre Ensino Religioso nas Escolas
Fonte: Revista do Ensino 15/11/1932. Acervo da Hemeroteca Histórica de Minas Gerais.
Ainda sobre a temática do ensino religioso nas escolas primárias, no ano de
1933, Maria Luiza publicou a tradução de um livro francês sobre o sentido cristão da
educação. Mais tarde, em 1935, elaborou o Programa de Ensino Religioso oficial utilizado
nas escolas primárias mineiras.
Na virada do século XIX e nas primeiras décadas do XX, a modernidade estava
mergulhada nos projetos de urbanização e industrialização, na escola, na cidade e também
na Igreja. Eram vários os agentes e instituições sociais que disputavam a condução da
modernidade. No Brasil, de maneira geral, em Minas, de modo particular, a Igreja Católica
assumiu um papel importante na formação do espírito moderno. A influência da Igreja
Católica na constituição social e cultural da elite mineira é visivelmente percebida na sua
formação e nos valores que serviam de base para os projetos conservadores. Viver a
modernidade não significava abrir mão do conservadorismo, afinal, era ele que garantia sua
coesão e marcava sua desenvoltura em conduzir as mudanças sem perder a ordem.
Assim, Maria Luiza de Almeida Cunha acreditava que a moral católica era a
chave para o melhoramento moral do homem e, consequentemente, para sua ação no
mundo. Para ela, a formação do homem moderno estava em ser moralmente bom, educado,
higiênico, saudável e trabalhador, por isso dedicou a sua obra à causa do ensino religioso.
140
Antes mesmo de trabalhar na Inspetoria do Ensino Primário e se dedicar à escrita sobre o
ensino religioso na educação primária, Maria Luiza escrevia artigos para a Revista do
Ensino. Seu primeiro artigo na revista foi publicado em janeiro de 1926, intitulado
“Impressões sobre o método de ensinar”254. Na apresentação da autora o editorial ressaltava
os trabalhos desenvolvidos por Maria Luiza no campo da educação e seu amplo gabinete de
estudos.
No ano de 1926, foram oito artigos publicados na Revista do Ensino.
Preocupada com as práticas pedagógicas do seu tempo, os artigos de Maria Luiza tratavam
especialmente do ensino primário, privilegiando os temas: finalidades da escola moderna,
impressões sobre os métodos de ensino, orientações didáticas e pedagógicas, vontade e
disciplina do aluno, o gosto pela leitura, a experimentação, a pediatria e a psicologia. No
interior dessas temáticas estavam as preocupações com higiene, maternidade e infância.
Nos seus textos, Maria Luiza se mostrava muito atenta às novidades pedagógicas no
mundo, fazendo várias citações de trabalhos produzidos na Europa e nos Estados Unidos
naquele período.
Vemos que a partir do século XVIII e mais intensamente no século XIX, muitos
pensadores, tais como Rosseau, Pestalozzi e Montessori, chamavam a atenção para as
especificidades e necessidades da infância, denunciando práticas e métodos educativos
inadequados para a compreensão das crianças e para seu desenvolvimento físico, moral e
intelectual. Esses autores desenhavam uma nova imagem da criança, semelhante à
semente de uma árvore, promessa de futuro quando bem orientada e conduzida.255
Todas essas temáticas estavam em consonância com a importância do Ensino
Primário naquele momento e com os preceitos da Reforma Educacional Francisco Campos.
A educação primária procurava adaptar a criança à vida em sociedade dentro de uma lógica
moral e intelectual. Para isso, era necessário que as professoras fossem capazes de
inculcar essas aspirações sob a forma de hábitos, costumes, regras de vida e disciplina da
inteligência e da vontade. Nesse momento, a infância era vista como uma fase de
preparação para a vida adulta.256
Como Inspetora Técnica, no ano de 1929 Maria Luiza fez um balanço dos efeitos
da Reforma Francisco Campos nas escolas mineiras, apontando o que havia alcançado até
aquele momento e o que ainda precisava alcançar. Na avaliação de Maria Luiza, era preciso
que as professoras se atentassem cada vez mais para as tendências da alma infantil para
melhor educá-los. Exigia da professora um olhar cuidadoso para o desenvolvimento das
254
Revista do Ensino. Jan/1926. p. 19-21. 255
MARTINS, Ana Paula Vosne. “Vamos cuidar do seu filho”: os médicos puericultores e a
pedagogia materna no século XX. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro. V.15, n. 1 jan.-mar. 2008. p. 135-154.
256 MINAS GERAIS, Regulamento da Secretaria do Interior, 20 de outubro de 1927. Decreto n. 7.970.
141
crianças. A professora do ensino primário, depois das mães, tinha a mais alta
responsabilidade da formação do caráter e da mentalidade das crianças257. Para Maria
Luiza, a professora devia observar especialmente os alunos atrasados e as possíveis
causas desse atraso - saúde, caráter, defeitos constitucionais, surdez, miopia, e agir sobre
eles. A acuidade visual e auditiva dos alunos era levada em consideração na organização e
posicionamento dos alunos nas salas de aula, além de serem providenciadas compras de
livros com letras e tamanhos variados, bem como de carteiras especializadas.
Maria Luiza sugeria ao professorado a aproximação de textos e conhecimentos
produzidos pela pediatria e convocava a associação das Mães de Família a participar da
escola, na preparação das gerações vindouras. Ela também foi conselheira e responsável
pela criação do estatuto das Mães Cristãs. O objetivo era reverter o quadro dos problemas
sociais através da escola, em pareceria com as mães.
A figura materna era vista como a maior responsável pelas desordens infantis, já
que muitas vezes as mães desconheciam os princípios preconizados pela puericultura.258
De acordo com Nancy Leys Stepan, no início do século XX a palavra puericultura tornou-se
comum nos círculos médicos franceses e latino-americanos em função das altas taxas de
mortalidade maternal e infantil. Preocupava-se com o crescimento inadequado da população
e era marcada por uma visão pró-família essencialmente conservadora.259
O artigo “Caderno de Lições” chama atenção, pois é uma análise de Maria Luiza
sobre os usos dos cadernos de plano de aula elaborados pelas professoras do ensino
primário. Pelo regulamento da Reforma Francisco Campo, o Caderno de Lições deveria ser
preenchido diariamente e apresentado aos diretores escolares e assistentes técnicos dos
grupos, sendo lançado nos diários o preparo das lições260. No artigo, Maria Luiza propõe a
criação de uma ficha individual para cada aluno e uma ficha coletiva. Nessas fichas
constariam o desenvolvimento intelectual, a instrução e a formação moral da criança. A
escola mostrava-se como o ambiente para o indivíduo se adaptar à vida. O professor
primário deveria ficar atento a isso.
Para Maria Luiza, a criança educada nas escolas públicas deveria ser seguida
em seu desenvolvimento corporal e em sua saúde. A professora deveria estar sempre
atenta às modificações no estado de saúde das crianças. Para isso, era necessário fazer
uma inspeção diária dos alunos, observando o asseio e procurando surpreender alguns
257
ALMEIDA CUNHA, Maria Luiza. Impressões sobre o método de ensinar. Revista do Ensino
01/1926. 258
MOTT, Maria Lúcia. Maternalismo, políticas públicas e benemerência no Brasil (1930-1945).
Cadernos Pagu, Campinas-SP, Núcleo de Estudo de Gênero – Pagu/Unicamp n.16 p.199-234, 2001.
259 STEPAN, Nancy Leys, A Hora da Eugenia: raça, gênero e nação na América Latina. Rio de
Janeiro: Editora Fiocruz, 2005. p.86. 260
O Horizonte 31/03/1928 – A Reforma do Ensino/Affonso dos Santos.
142
sinais externos de doença. Além disso, os professores deveriam tomar parte nas reuniões
com as famílias dos alunos e participar de palestras instrutivas destinadas à divulgação de
regras de higiene.
FIGURA 7 – Ficha Individual do aluno proposta por Maria Luiza de Almeida Cunha
Fonte: Revista do Ensino 09/1935. Acervo da Hemeroteca Histórica de Minas Gerais.
A ficha proposta por Maria Luiza de Almeida Cunha é uma versão simplificada
da ficha individual utilizada pela Inspeção Médica Escolar, que fazia uma avaliação médica
semestral. Além das observações acima, a ficha individual proposta por Maria Luiza
continha também: identificação do aluno, do grupo escolar e da professora responsável por
ele; tipo de classe; e idade. O objetivo era obter um controle cotidiano da saúde do aluno e
do seu comportamento moral. A professora devia fazer o papel do médico, examinando
diariamente os alunos, verificando o seu estado de saúde. Além disso, deveria também
participar da organização de palestras instrutivas destinadas à divulgação de regras de
higiene. Com isso, procurava-se formar um tipo específico de criança dentro do padrão
estabelecido pelo discurso médico e científico.
Outro traço interessante presente na escrita de Maria Luiza era o espírito
nacionalista e patriótico exacerbado. Não raro encontramos em seus textos as expressões,
“meu coração de brasileira”, “pela grandeza futura de nossa terra”. É interessante ressaltar
que nas revistas educacionais a autora assinava seu nome completo e geralmente colocava
o seu sobrenome em caixa alta - Maria Luiza de ALMEIDA CUNHA. Entretanto, nos artigos
publicados no jornal O Horizonte, ela assinava apenas o sobrenome, também em caixa alta
- ALMEIDA CUNHA. Durante a pesquisa ocorreram dúvidas em relação à autoria de seus
textos. A dúvida só se desfez pela leitura incansável dos artigos, que permitiu-nos conhecer
143
seu estilo de escrita e os temas que se dedicava a escrever. Esse fato desvela a
interiorização, pelas mulheres, de normas enunciadas pelos discursos masculinos261. Por
mais que o jornal O Horizonte abrisse espaço para a escrita feminina, Maria Luiza
reconhecia o periódico como território masculino, basta ver que em toda existência do jornal
as mulheres não compuseram o corpo editorial, embora produzissem artigos e trabalhassem
pela sua divulgação.
Além de atuar na Escola de Aperfeiçoamento, Maria Luiza lecionou, nos anos de
1936 e 1937, as disciplinas de Ação Social e Princípios de Família na EECC; trabalhou na
Inspetoria Técnica dessa mesma escola; foi professora na Escola Normal Modelo; e mais
tarde foi professora do Instituto de Educação no curso de Administração e Aperfeiçoamento
Escolar, onde ministrou as disciplinas de Filosofia, História da Educação e Pedagogia, por
40 anos. Paralelamente, ingressou no ensino superior.
Ainda na Educação Primária, Maria Luiza de Almeida Cunha participou da
organização de vários congressos e associações educacionais. No ano de 1926, por
exemplo, foi uma das organizadoras do I Congresso Mineiro de Instrução Pública. Ao ser
autorizada a Reforma do Ensino em Minas, Francisco Campos, o então Secretário do
Interior, convocou o professorado mineiro para a realização de um Congresso para que
pudesse auscultar os interesses, opiniões e necessidade da educação mineira. O Secretário
do Interior confiou a organização das teses e das comissões a professores de sua
confiança, dentre eles Maria Luiza. Ela participou da Comissão Organização Geral do
Ensino, apresentou uma tese sobre “Questões de Pedagogia” e foi a redatora das
conclusões da comissão. Os resultados das teses debatidas no congresso foram levados
em consideração por Francisco Campos na elaboração da Reforma Educacional.
261
CHARTIER, Roger. Diferenças entre sexos e dominação simbólica (nota crítica). Cadernos
Pagu, Campinas, São Paulo, n. 4, 1995. p. 37-47.
144
FIGURA 8 – Professoras participantes do I Congresso de Educação Primária e o presidente do Estado, Antônio Carlos de Andrada
Fonte: Revista do Ensino, outubro de 1926. Acervo da Hemeroteca Histórica de Minas Gerais.
Em 1927, Maria Luiza integrou a comissão que enviou teses de interesses dos
educadores católicos para serem discutidas no congresso realizado pela Academia
Brasileira de Educação. Na ocasião, Roberto de Almeida Cunha, juntamente com Henrique
Marques Lisboa, foram os representantes da delegação mineira e apresentaram
respectivamente as teses, “A unidade nacional pela cultura moral: a educação religiosa
como melhor meio de nacionalizar a infância” e “O ensino das Ciências Naturais”.
No ano de 1931, Maria Luiza integrou a Associação dos Professores Primários
de Minas Gerais. A associação batalhava pela representação da formação docente e por
processos de lutas e conquistas dos professores. Em 1941, a Associação criou uma revista
de orientação técnica e pedagógica intitulada Educando, na qual Maria Luiza de Almeida
Cunha publicou diversos artigos.
Em 1948, Maria Luiza participou de uma comissão de trabalho, presidida por D.
Cabral. A comissão empreendeu a criação da Sociedade Mineira de Cultura, instituição que
tornou-se mantenedora de várias iniciativas educacionais e culturais em Minas Gerais, como
a criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santa Maria, hoje a Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais. Devido às suas atribuições como Inspetora de
Ensino e seu carisma, Maria Luiza circulou bastante pelas escolas do estado de Minas e até
145
mesmo fora do país, tornando-se uma figura importante para o cenário educacional mineiro.
Além disso, ela articulou a criação de dois grandes colégios católicos em Minas, os colégios
São Paulo e Loyola.
O colégio São Paulo era dirigido pela congregação das Irmãs Angélicas de São
Paulo. A congregação foi fundada por Santo Antônio Maria Zacarias, na cidade de Milão, na
Itália e aprovada pelo papa Paulo III, no ano de 1535. Era uma congregação atuante na
evangelização, sendo imposta a clausura pelo Concílio de Trento. A vida ativa da
congregação foi reestabelecida em 1919, e desde então retomou as atividades de
evangelização pelo mundo. A vinda das Irmãs Angélicas à Belo Horizonte está ligada a pelo
menos três fatores. O primeiro deles foi o convite recebido pela madre superiora geral, por
parte do Dr. Caio Nelson Serra, educador do Colégio São Paulo, na sede do Rio de Janeiro;
o segundo motivo foi o sucesso das três escolas instaladas no Brasil; e, por fim, o
direcionamento de Maria Luiza de Almeida Cunha, que não apenas hospedou as madres da
Congregação em sua casa, como também as auxiliou nos primeiros passos da
concretização do projeto junto às autoridades políticas. A primeira sede do colégio foi
estabelecida na Avenida João Pinheiro, esquina com Bernardo Guimarães. Em março de
1939 o Colégio foi construído no bairro Cidade Jardim, em terreno cedido por Jucelino
Kubitschek, prefeito da cidade naquele tempo. Era intenção de JK formar nessa região um
polo educacional. Na mesma época, vários terrenos foram doados para faculdades de
odontologia, farmácia e química.
Da mesma maneira, Maria Luiza recebeu os padres jesuítas Loyolas, César
Dainese e Paulo Naccae, e com eles articulou a construção do colégio Loyola. Os jesuítas
vieram a Belo Horizonte a convite de D. Cabral. No ano de 1943, o colégio sediou-se na Rua
Gonçalves Dias, em casa cedida pelo senhor Francisco de Freitas Lobato. Em 1949, foi
transferido definitivamente para a Avenida do Contorno, na Cidade Jardim.
Em 1954, Maria Luiza pleiteou e obteve uma bolsa de estudos de História e
Filosofia da Educação, na Universidade de Pádua, na Itália, onde passou um ano. Na
ocasião, seu marido foi com ela, também a trabalho, porém ficaram em cidades distintas.
Na década de 1960, Maria Luiza foi professora de Filosofia da Educação na
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Participou da Reforma Universitária dessa
instituição e juntamente com os professores Alda Lodi, Alaíde Lisboa de Oliveira, Carlos dos
Anjos Duarte de Andrada e Magda Soares, fundou o primeiro departamento de Pedagogia e
Didática dessa Universidade. Aos 70 anos de idade foi aposentada compulsoriamente e
para ocupar o tempo, matriculou-se num curso de exegese na UFMG.
Como podemos ver, Maria Luiza teve uma grande atuação no campo da
educação em Minas Gerais. Sua principal preocupação era a formação integral da criança,
baseada no desenvolvimento intelectual. Preocupava-se com a saúde e a educação moral.
146
A educação moral para ela passava necessariamente pelos valores católicos. Era uma
mulher culta e muito conhecida pela cidade. Tinha um variado ciclo de amizade no campo
da educação e da saúde e aproveitou-se dessa rede para a realização dos seus projetos
dentro do associativismo católico feminino.
3.2.4 A militância católica de Maria Luiza de Almeida Cunha
Sem sombra de dúvidas um dos valores mais cultivados por Maria Luiza de
Almeida Cunha foi viver e pregar o catolicismo. Ela viveu segundo os preceitos da ação
católica que defendem que “o catolicismo veio trazer ao mundo a paz, a ordem, a disciplina,
a liberdade e o progresso”. Acreditavam os militantes que deviam agir como católicos, não
só em prol da religião, mas também em prol da pátria e da sociedade futura. Por isso foram
tão atuantes no ensino, política e na sociedade de maneira geral.
Além dos artigos produzidos no campo educacional, Maria Luiza escreveu e
coordenou a coluna feminina do jornal O Horizonte. Foi uma das responsáveis pela criação
das Mães Cristãs e redigiu o primeiro estatuto da corporação. Em 1930 se empenhou na
educação dos filhos de leprosos, no Preventório São Tarcísio.
Fundou, em 18 de março de 1932, a Sociedade Mineira de Assistência à
Infância, tendo como diretora Alexandrina Santa Cecília, como vice-presidente Fany Gianetti
de Morares, tesoureira Marina Amaral Brandão e secretária Dulce da Silva.262 As reuniões
ocorriam no Hospital da Criança, anexo à Santa Casa. Há poucas informações disponíveis
sobre essa associação. Algumas fontes indicam que as idealizadoras foram incentivadas por
Gustavo Capanema, que dois anos depois assumiu o Ministério da Educação e da Saúde e
durante toda sua gestão dialogou com os interesses educacionais católicos e contou com a
colaboração das mulheres.
É importante ressaltar que já nos anos de 1910, havia por parte da assistência
católica, especialmente dos vicentinos, o objetivo de criar uma instituição destinada à
assistência da infância. No ano de 1919 inaugurou-se O Instituto de Proteção à Infância, por
incentivo do médico Moncorvo Filho e pela mobilização dos setores católicos pela infância
desvalida. Em 1921, o espaço tornou-se o Hospital São Vicente de Paulo. O Instituto de
Proteção à Infância de Belo Horizonte foi inspirado na instituição criada pelo médico
262
Ata da Confederação Católica Feminina 29/03/32.
147
Moncorvo Filho, no Rio de Janeiro263. Era objetivo do seu idealizador criar uma rede de
assistência à infância no Brasil.
No ano de 1933, Maria Luiza fundou, em sua própria casa, a Obra dos
Tabernáculos, destinada a cuidar das igrejas pobres. A obra empregava moças pobres que
produziam objetos (terços, cálices, altares portáteis, alfaias, etc.) para as celebrações
eucarísticas. Em 1936, a Obra dos Tabernáculos organizou a infraestrutura das missas
campais do II Congresso Eucarístico Nacional. Mesmo grávida, Maria Luiza, liderou uma
série de trabalhos para a realização do Congresso.
O evento ocorreu entre os dias 03 e 08 de setembro de 1936, na Semana da
Pátria. Tinha como tema central “A defesa da família, pela consagração do casamento e
renovação social e política”. Pela cobertura da imprensa, denota-se que o Congresso teve
ampla participação de toda sociedade belo-horizontina, das instituições escolares e dos
grupos de caridade (Filhas de Maria, Damas da Caridade e União dos Moços Católicos),
revelando um aspecto altamente festivo. Além da cobertura da imprensa, o evento foi
transmitido pela primeira rádio pública mineira, Rádio Inconfidência, inaugurada durante o
Congresso.
Pela representatividade do II Congresso Eucarístico, concordamos que ele
estava no bojo das comemorações religiosas realizadas no início dos anos 1930, junto à
entronização de Nossa Senhora Aparecida como Padroeira do Brasil e a inauguração do
Cristo Redentor. Não se tratava, portanto, de uma comemoração típica do catolicismo
popular, mas sim uma festa religiosa e cívica, onde estava presente toda hierarquia da
Igreja Católica e autoridades políticas. A maior parte dos eventos ocorreu na Praça Raul
Soares. Toda a infraestrutura foi montada pelo governo do estado, enquanto a Igreja
Católica dedicou-se à preparação religiosa do evento.
A abertura solene contou com a explanação de Alceu Amoroso Lima sobre o
Estado Moderno e questões que versavam sobre a unidade da nação e a colaboração dos
católicos para a reconstrução política e moral do país. Os dias de apresentação foram
separados por temáticas: família cristã, estudantes e militares. Nesses dias foram discutidas
várias sessões, das quais destacamos a Eucaristia, a Ação Católica, o Espírito de
Obediência e Caridade; Senhoras, Eucaristia e Ação Católica na Defesa das Famílias;
Senhorinhas Eucaristia, Ação Católica da Juventude Feminina e sua vida no lar; Operárias,
Eucaristia e Ação Católica, a preservação e aperfeiçoamento moral e social da mulher
operária. De acordo com as sessões supracitadas, vemos que havia uma nítida
preocupação com as mulheres, especialmente as mulheres operárias. Um dos resultados do
263
FREIRE, Maria Martha de Luna Freire, LEONY, Vinícius da Silva. A caridade científica: Moncorvo Filho e o Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro (1899-1930). História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 18, supl. 1, dez 2011, p. 199-225.
148
Congresso foi a reorganização da Ação Social Católica, tendo como meta a formação de
Ligas Femininas. Nessa nova reformulação, Maria Luiza assumiu a presidência da Liga
Feminina da Ação Católica da Sessão Senhoras.
Maria Luiza tornou-se a primeira Ministra da Eucaristia da arquidiocese de Belo
Horizonte, ocupação que tinha muito gosto. A nomeação foi investida por D. João de
Resende Costa, grande amigo da família, que inclusive celebrou o casamento de Maria
Luiza. Conhecida como uma mulher sem vaidade, depois de sua nomeação passou a pintar
as unhas para tocar a hóstia sagrada. Como ministra da Eucaristia distribuía a comunhão
aos doentes da paróquia de Lourdes e nos hospitais. Usava uma roupa branca, com uma
capa de mesma cor por cima, sendo chamada pela criançada como “Super vó”. Essa
nomeação é muita representativa, uma vez que este é o cargo máximo que um leigo pode
alcançar na hierarquia católica.
A trajetória de Maria Luiza de Almeida Cunha serve para elucidar a atuação da
mulher católica na assistência à saúde e à educação em Minas Gerais. Apesar de não ser
mineira, também teve uma forte formação católica e logo se aproximou da militância
religiosa em Minas Gerais, estabelecendo conexões e projetos. Foi educada por uma família
de elite e entendia o catolicismo como a chave para o melhoramento moral do indivíduo e
consequentemente da sociedade brasileira.
Apesar de toda tradição católica e o reforço ao espaço doméstico como o
espaço por excelência da mulher católica casada, Maria Luiza teve uma vida profissional
ativa na educação em Minas, bem como no associativismo católico. Ela discutiu temas que
estavam na agenda do feminismo naquele momento, tais como maternidade, infância,
higiene, puericultura, proteção às mulheres pobres e operárias, entre outros. Há quem
possa dizer que sua ação foi facilitada pela representatividade do marido na sociedade belo-
horizontina, mas essa tese é facilmente rebatida se pensarmos que, se não fosse a doença
do irmão, ela teria se tornado diretora do importante colégio Jacobina e trilhado sua carreira
profissional e militante no Rio de Janeiro.
A militância católica lhe proporcionou grande trânsito pela cidade e suas
instituições, bem como fora dela. Seus trabalhos, sejam no campo da educação ou da
filantropia, evidenciam que a atuação das mulheres católicas nos projetos de ordenação das
famílias, do cuidado da saúde e educação dos mais pobres, não estava apenas no discurso
ou na promoção da carreira de seus maridos, mas sim na ação efetiva das suas convicções.
Sem dúvida a formação escolar foi fundamental na orientação do ativismo de Maria Luiza,
bem como das demais mulheres ligadas ao ativismo católico.
149
4 O TRABALHO DAS ASSOCIADAS CATÓLICAS A FAVOR DA INFÂNCIA
DESVALIDA E DAS “MULHERES PERDIDAS”
Vimos que dentre os projetos realizados pela militância católica feminina o
público preferencial era a infância desvalida e as mulheres pobres. Assim, nesse capítulo
apresentamos a articulação prática de duas instituições criadas por iniciativa do
associativismo de mulheres católicas: o Asilo Bom Pastor, destinado às meninas órfãs e
mulheres “desviadas”, e a Creche Menino Jesus, que atendia crianças órfãs ou filhos de
operárias. A criação e manutenção das duas instituições deixa transparecer as negociações
do associativismo feminino católico com os membros da hierarquia católica, políticos das
esferas municipal, estadual e federal e também com os profissionais da saúde (médicos,
dentistas e farmacêuticos).
Apesar das duas instituições ainda existirem, há poucas informações sobre elas.
Observamos que hoje, ambas funcionam em esquema bem distinto do período estudado, o
que só faz evidenciar que as instituições se prestam a atender as demandas da sociedade
em que estão inseridas, transformando-se com ela.
Entramos em contato com o Asilo Bom Pastor, sem muito sucesso. Hoje a
instituição está alocada numa casa, ao lado do prédio onde funcionava o asilo. Atualmente
esse prédio abriga uma das unidades do colégio Santa Maria. Segundo uma funcionária da
instituição, toda a documentação mais antiga do asilo foi encaminhada para a sede central,
em São Paulo, e não se tem notícia da conservação do material. Na Creche Menino Jesus
foi possível colher informações no livro de memória produzido pela própria instituição,
intitulado Livro de Ouro. Tivemos acesso também às fichas individuais e ao livro de registros
das crianças assistidas. Hoje a instituição atende crianças de 02 a 18 anos em situação de
risco social ou pessoal.
Assim, pelas limitações de fontes e trabalhos acadêmicos sobre as referidas
instituições, buscamos informações em jornais e revistas que circularam no período em que
foram construídas. Pelos registros na imprensa observamos que eram instituições
reconhecidas na cidade, que realizavam eventos com ampla participação da sociedade. As
idealizadoras e benfeitoras solicitavam doações para a manutenção dos serviços prestados
e integravam a rede de instituições filantrópicas católicas.
Ao demonstrar a criação e funcionamento dessas instituições é nosso intento
chamar a atenção para alguns aspectos: o protagonismo das mulheres na criação e
manutenção desses espaços; as articulações estabelecidas entre a iniciativa privada e os
150
órgãos públicos na manutenção dos projetos sociais da cidade; a importância e a presença
dos discursos médico, científico e jurídico na organização das referidas instituições, bem
como na difusão de hábitos de higiene; e o surgimento de uma nova sociabilidade imposta
pela crescente urbanização e industrialização da sociedade belo-horizontina.
4.1 O Asilo Bom Pastor
A partir de 1891 intensifica-se a vinda de religiosas estrangeiras para o Brasil,
predominantemente francesas e italianas. Entre os anos de 1872 e 1920, cinquenta e oito
congregações europeias se estabeleceram no Brasil. Outras dezenove foram fundadas
nesse período. Tais congregações eram atuantes no trabalho educativo em colégios, no
cuidado com os doentes, crianças e velhos, em orfanatos e asilos.264
Conforme Nunes, no fim do século XIX, as freiras já se encarregavam de
inúmeras tarefas necessárias à sociedade, sobretudo no campo da educação, da saúde e
da assistência social. No Brasil, no período imperial, duas Congregações Femininas iniciam
suas atividades: as Filhas da Caridade (1849), ligadas à Sociedade São Vicente de Paulo e
as Irmãs de São José de Chambéry (1858).
Seguindo essa tendência, a Congregação Nossa Senhora da Caridade do Bom
Pastor foi fundada pela Madre Maria Eufrasia Pelletier, na cidade de Angers, na França, no
ano de 1829, com o intuito de cuidar de mulheres jovens, desamparadas socialmente. As
irmãs ligadas à congregação deviam fazer voto de pobreza e prometiam dedicação à
reeducação e reabilitação das desafortunadas através da moral cristã.265 Nas palavras da
fundadora, o fim principal da congregação era a caridade, “essa caridade deve levar-nos a
caminhar nas pisadas do Bom Pastor, indo à procura das pobres ovelhas que se afastam do
redil de Jesus Cristo”.266
A imagem do Bom Pastor remete à parábola que associa a figura do pastor que
esquece de si para recolocar suas ovelhas no “bom caminho”, observando suas
necessidades, zelando pela sua salvação e recuperação. Nesse caso, o Bom Pastor eram
as irmãs ligadas à congregação que trabalhavam em parceria com as mulheres leigas e os
264
NUNES, Maria José Rosado. Freiras no Brasil. In: DEL PRIORI, Mary (org.) e BASSANEZI, Carla
(coord.). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997. p. 443-481. 265
BATISTA, Bruna Soares Angotti. Entre as leis da ciência, do Estado e de Deus: o surgimento
dos presídios femininos no Brasil. Dissertação de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade de São Paulo, 2011.
266 CASTRO, Jerônimo Pedreira de. Santa Maria Eufrásia Pelletier: fundadora da Congregação de Nossa Senora da Caridade do Bom Pastor D‟Angers/adaptação em vernáculo da edição italiana pelo Pe.Jerônimo Pedreira de Castro. Petropólis: Vozes, 1940.
151
poderes locais onde se estabeleciam. A figura da ovelha perdida recaía sobre as mulheres
pobres que cometiam atos contra a conduta dita adequada às mulheres. Geralmente eram
jovens envolvidas com a prostituição, alcoolismo, jogos e outras atividades consideradas
perigosas e desviantes. Pelo regulamento da Congregação Bom Pastor era preciso zelar
pelo restabelecimento da integridade do corpo e da alma, assim, além do ensino
catequético, a instituição primava pela boa alimentação, saúde, higiene, educação
elementar e o ensino de um ofício. O objetivo era regenerar o comportamento das mulheres
asiladas para que retornassem à sociedade prontas para o trabalho.
A primeira Casa Bom Pastor na América Latina foi erigida no Chile, em 1857. A
partir dos anos 1920 a Congregação espalhou-se rapidamente por todo continente
americano. Além do Chile, havia casas no Brasil, Paraguai, Uruguai e Argentina. A rápida
dispersão dessa congregação pelos países latino-americanos está intimamente associada à
determinação em realizar a regeneração social como o caminho que leva ao progresso e à
modernização. Fonseca aponta que o sucesso da multiplicação das Casas Bom Pastor
estava ligado ao papel desempenhado pelas irmãs, que seduziam governantes, religiosos e
a população em geral, uma vez que elas atentavam para aquelas pessoas das quais
ninguém queria cuidar, mas que cada vez mais apareciam como um incômodo nas
cidades.267
Desse modo, o Bom Pastor tinha uma missão educativa de melhorar o
comportamento das mulheres. Era o objetivo da instituição que as mulheres pobres se
tornassem boas donas de casa, atuando como a cientista do lar (na cozinha, na higiene
infantil e na limpeza da casa), e que também tivessem uma profissão para viver do seu
trabalho, além de serem moralmente educadas.
Como salienta Stepan, nos países latinos “na segunda década do século XX, a
atroz pobreza e a deplorável saúde dos pobres haviam se cristalizado na consciência
pública como uma questão nacional – a questão social.”268 A questão moral era considerada
perigosa porta de entrada do mundo da criminalidade para meninas pobres e órfãs, sendo
sempre associada aos maus costumes, tais como o jogo e o ócio, que se mostravam como
ameaça que dava origem à desordem social.269
No Brasil, o primeiro Asilo Bom Pastor foi fundado no Rio de Janeiro, sendo que
em seguida foram criadas unidades na Bahia (1892), São Paulo (1897) e Juiz de Fora
267
FONSECA, Sérgio C. A interiorização da assistência à infância durante a Primeira República:
de São Paulo a Ribeirão Preto. Educação em Revista. Belo Horizonte. v.28 n.01 mar. 2012. p. 79-108.
268 STEPAN, Nancy Leys. A hora da eugenia: raça, gênero e nação na América Latina. Rio de
Janeiro: Editora Friocuz, 2005. 269
SOUZA, Marco Antônio de. As estratégias da pedagogia do assistencialismo em Belo
Horizonte, 1930-1990: educação e caridade. Tese de doutorado, Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2001.
152
(1902). Na década de 1920, foram inauguradas filiais nas cidades de Belo Horizonte, Recife,
Pelotas, Petrópolis e em algumas cidades do estado do Ceará270.
Assim, o contexto de criação do Bom Pastor no Brasil está dentro da formação
de um conjunto de instituições fechadas, tais como seminários, asilos e orfanatos, com
ênfase no recolhimento, na disciplina, no encaminhamento social e na educação e ensino de
algum ofício. O foco estava em cuidar da infância desvalida e das mulheres “perdidas”. De
acordo com Marcílio, a ideologia que fundamentava instituições desse tipo incluía a
instrução elementar, formação moral e capacitação profissional. Procuravam atingir a
questão da infância em várias frentes: combate à mortalidade infantil, cuidados com o corpo,
estudos, campanhas de combate às doenças infantis, educação das mães, e a introdução à
puericultura e pediatria como novas áreas do conhecimento.271 Esses estabelecimentos
eram motivados por correntes humanitárias ou religiosas, ligadas aos poderes públicos, ao
mesmo tempo que supriam sua ausência em resposta à pobreza e ao abandono da
infância272.
4.1.1 O Bom Pastor em Belo Horizonte e as negociações para a doação do espaço do asilo
A propriedade onde se estabeleceu o Asilo Bom Pastor em Belo Horizonte foi
doada por Mariana Carolina Pinto Coelho, filha do arquiteto e coronel Júlio Pinto Coelho,
que participou da execução do projeto de construção da capital mineira. A propriedade
estava localizada no bairro Floresta e dispunha de três casas: uma chácara chamada Casa
Velha, situada na Rua Jacuí, uma casa de esquina, entre a Rua Jacuí e Pouso Alegre, e um
casarão no encontro das ruas Pouso Alegre e Januária.
Pedro Nava, que era primo de Mariana, hospedou-se no casarão da família
antes de ser admitido no internato do Colégio Pedro II. Em suas memórias ele descreve o
casarão,
Nunca tinha visto nada mais limpo e geométrico que a residência do tio Júlio. Nem uma poeira sequer mancha, sujeira, nódoa, pedaço de papel no chão, fio de linha caído. Tudo reluzia limpeza. Tudo brilhava esfregado.
270
CAMPOS, Margarida de Morais. A Congregação do Bom Pastor na Província Sul do Brasil –
pinceladas históricas. São Paulo: [s.n], 1981. 271
MARCÍLIO, Maria Luiza. História Social da Criança Abandonada. 2ªEd. São Paulo: Hucitec,
2006. 272
FONSECA, Sérgio C. A interiorização da assistência à infância durante a Primeira República:
de São Paulo a Ribeirão Preto. In: Educação em Revista v.28 n.1. Belo Horizonte, 2012. p. 79-108.
153
Cada coisa no seu lugar. Sentei a medo numa beira de cadeira estofada e senti a prisão do silêncio que se adensava, chegando perto do ponto cróscopico.
273
A descrição de Nava revela a aspiração da classe média urbana, que pensava
os cuidados e higiene da casa como um prolongamento dos valores da modernidade.274
A proximidade da casa destinada ao asilo com o colégio Santa Maria facilitava a
presença e intervenção das Filhas de Maria no cotidiano do Bom Pastor, seja no cuidado
das meninas ou instruindo as mulheres asiladas. O livro sobre a história da Congregação no
Brasil afirma que Marianinha (como era conhecida), estudou no Colégio Santa Maria e com
o tempo tornou-se membro e presidente das Filhas de Maria da capital. Assim, à primeira
vista e pelos documentos oficiais emitidos pela Congregação Nossa Senhora da Caridade
do Bom Pastor, Marianinha enquadrava-se dentro das características das mulheres ligadas
ao associativismo católico, tendo estudado em um importante colégio de formação católica,
sendo solteira, membro atuante das Filhas de Maria e posteriormente tendo ingressado na
vida religiosa.
No entanto, ao lermos a obras Balão Cativo e Galo das Pedras, de Pedro Nava,
observamos que Marianinha nasceu em Petrópolis, na casa de amigos do seu pai e lá se
criou até os 8 anos. Segundo Nava, o pai de Marianinha “era insuportável, a mulher não o
aturou e cedo raspou-se para São Paulo, onde morreu”. Com a ida da mãe para São Paulo,
Marianinha ficou sob os cuidados de sua tia paterna, Joana Carolina Pinto. D. Joana abriu,
em Juiz de Fora, uma escola para meninas, em esquema de internato, para educar a
sobrinha.275 Em fins do século XIX, no início da construção da capital mineira, Marianinha,
juntamente com seu pai e sua tia, mudou-se para Belo Horizonte e instalou-se no
“castelinho” do bairro Floresta. Ao longo dos anos, vários parentes moraram com a família
de Marianinha.
O primeiro ponto a se observar é que a família de Mariana estava distante do
padrão da família nuclear tradicional prescrito pela Igreja Católica. Viveu parte de sua
infância com desconhecidos e sua mãe não se submeteu à tirania do pai, abandonando a
família. Além disso, há indícios de que ela era ateísta, como pai, e só tardiamente
engrossou as fileiras do associativismo católico. Sobre isso relata Nava,
273
NAVA, Pedro. Balão Cativo, poemas Carlos Drummond de Andrade, José Geraldo Nogueira Moutinho. Apresentação de André Botelho, crônica Paulo Mendes Campos. São Paulo. Companhia da Letras, 2012. p.118.
274 NOVAIS, Fernando A. (coord.). História da vida privada no Brasil: da Belle Epoque a Era do
Rádio. Vol. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p. 367 – 421. 275
NAVA, Pedro. Balão Cativo, poemas Carlos Drummond de Andrade, José Geraldo Nogueira
Moutinho. Apresentação de André Botelho, crônica Paulo Mendes Campos. São Paulo: Companhia da Letras, 2012. p. 122-124.
154
Mariana Carolina (Marianinha) que professava como o pai, um ateísmo desenfreado e proclama-se anticlerical convicta, aos poucos fora fraquejando indo a missa vez que outra, depois todos os domingos. Começara a receber visitas de Filhas de Maria da Floresta, das Dominicanas do Santa Maria, da Mrs. Dobsn irlandesa e agregada ao Colégio dessas irmãs e finalmente a Anita Monteiro Machado dobrara-lhes as últimas resistências e fizera-a Filha de Maria aí por volta de 1918 e 1919. Começara a partir de então, vida cada vez mais devota, a princípio com missas diárias, depois com comunhões diárias. Abandonara completamente suas atividades culinárias suas virtuosidades musicais e agora não saía mais das irmandades, e era assídua em visitas às Dominicanas, às irmãs da Santa Casa, às do Sagrado Coração, às do Orfanato de Santo Antônio. E punha na beateria o mesmo entusiasmo que pusera outrora na negação de Deus.
276
Apesar de sua formação secundária no colégio Santa Maria, Marianinha pregava
o ateísmo e apenas depois dos 30 anos de idade passou a atuar nas associações católicas
e nas instituições de caráter filantrópico. Sua trajetória é uma amostra de como as mulheres
daquele tempo utilizaram-se do associativismo católico, não apenas por devoção ou
caridade, mas também como uma possibilidade real de alcançar seus objetivos. Nesse caso
em específico, Marianinha era uma mulher sem crença religiosa, uma “solteirona” dedicada
aos cuidados domésticos e da tia, tendo como única distração a música e a culinária. Ao
ingressar no associativismo, Marianinha mudou seus hábitos, abandonou o espaço da casa,
os cuidados domésticos e passou a transitar pela cidade, nos circuitos das instituições
filantrópicas. Como podemos ver no excerto acima, Marianinha atuou junto às irmãs da
Santa Casa, do Sagrado Coração de Jesus e do Orfanato Santo Antônio.
Conta Campos que desde o ano de 1919, mais ou menos o mesmo período em
que Marianinha se converteu ao catolicismo, representantes da Ordem da Nossa Senhora
da Caridade do Bom Pastor articulavam a possibilidade da construção de uma instituição
congênere em Belo Horizonte. Ciente desse interesse, Mariana, que dispunha da herança
de seu pai, propôs a doação de sua propriedade e fortuna em troca do direito de ser
admitida pela ordem Bom Pastor. Como tinha 37 anos e o limite de idade para entrar em
qualquer ordem religiosa era de 35 anos, seu pedido foi avaliado pela Madre Superiora, na
França, sendo aceito logo em seguida.
Outra condição imposta por Marianinha na negociação com a Congregação Bom
Pastor foi a de que sua tia, de 65 anos, tivesse o direito de ser assistida pelo asilo até a sua
morte. Imposição que em certa medida foi atendida, dona Joana morou na chácara velha
até seu falecimento, mas queixava-se do mau tratamento que recebia das religiosas e a
insatisfação de ter que conviver e dividir as refeições com as asiladas e ter sua mesada
276
NAVA, Pedro. Galo das Trevas: poesias de Gastão de Castro Neto e Olavo Drumond – São
Paulo: Atelie e Editorial, 2003. p.349.
155
cortada277. Em 1930, com o falecimento de D. Joana, a casa em que vivia foi transformada
numa nova ala do asilo, chamada Preservação.
Como parte do acordo, Marianinha entrou no noviciado do Rio de Janeiro em
setembro de 1921. Em 13 de março de 1922 recebeu o hábito religioso sob o nome de Irmã
Maria do Santo Tabernáculo. Conta Nava que antes de entrar no noviciado, Marianinha
viajou secretamente para a Bahia sem se despedir de ninguém, deixando apenas uma carta
à sua prima Diva. Na carta ela anunciava estar desiludida de tudo e dizia que passaria o
resto de sua vida em penitência pelos pecados dos seus – que era a cruz que tomava sobre
seus ombros.278 Há registros que Marianinha, depois de tornar-se noviça, foi definitivamente
para Bahia e em 1926 fundou um jardim de infância que atendia crianças da elite Baiana.279
Conta Nava, sobre Marianinha,
Minha prima tinha o nome da avó, Mariana Pinto Coelho, não usava o Cunha. Tinha nos traços a mesma pureza antiga e escultórica da cara de seu pai, que Ella reproduzia linha por linha. E os dentes admiráveis. E os olhos de um verde hortelã. E a pele dum moreno de jambo. Seria uma mulher bonita se não fosse o corpo desastrado. Era alta, espadaúda e, apesar de gorda, tinha pouco busto. De nádegas, neres. O chamado tipo búfalo. Pior, pior, porque tinha um jeitão másculo, que durante muito tempo me deixou induzido ao erro. Foi caso de conversa que bispei entre tia Berta e tia Iaia. A primeira estranhava que a Marianinha era rica e bonita, não tivesse achado casamento. A segunda baixou a voz, perguntou a outra, como é que a prima podia casar? Com aquele defeito que tinha....Impossível uai! Gente que defeito? Ai veio o cochicho que não pude escutar e mal revi a Marianinha em Belo Horizonte, com seu ar dedicado, sua energia, os ombros marciais e a cara sisuda, tendo ao mesmo tempo de bela mulher e belo homem, tirei minhas conclusões. Era aquilo. Era aquele negócio da figura que eu vira passar a socapa, de mão em mão, entre os colegas do Lucindo Filho. A prima era hemafrodita. Assim considerei (...)
280
Diante da narrativa das características físicas e dos dilemas que circundavam a
figura de Marianinha, podemos questionar também se a escolha pela Ordem do Bom Pastor
não se deu pelo fato dela sentir-se uma “ovelha desgarrada”, por não enquadrar-se no
padrão de feminilidade imposto às mulheres nesse período.
277
NAVA, Pedro. Balão Cativo, poemas Carlos Drummond de Andrade, José Geraldo Nogueira
Moutinho. Apresentação de André Botelho, crônica Paulo Mendes Campos. São Paulo: Companhia da Letras, 2012. p.117
278 NAVA, Pedro. Galo das Trevas: poesias de Gastão de Castro Neto e Olavo Drumond – São
Paulo: Atelie e Editorial, 2003. p.326. 279
CAMPOS, Margarida de Moraes. A congregação do Bom Pastor na Província Sul do Brasil –
pinceladas históricas. São Paulo [s.n], 1981. 280 NAVA, Pedro. Galo das Trevas: poesias de Gastão de Castro Neto e Olavo Drumond – São
Paulo: Atelie e Editorial, 2003. p.117
156
Como salienta Soihet281, a medicina social assegurava como características
femininas, por razões biológicas, a fragilidade, o recato, o predomínio das faculdades
afetivas sobre as intelectuais e a subordinação da sexualidade à vocação maternal. As
características atribuídas às mulheres eram suficientes para justificar que se exigisse delas
uma atitude de submissão e um comportamento que não maculasse sua honra282.
Marianinha, por sua vez, não atendia a tais atributos.
Marianinha era uma mulher culta, da elite e limitada ao espaço do lar. É possível
inferir que ao entrar no associativismo católico ela ampliou suas redes e conseguiu, através
da negociação com a Congregação Bom Pastor, dar novos rumos para sua vida. O que
reforça nosso argumento de que as associações católicas foram utilizadas pelas mulheres
não necessariamente para professar sua fé, mas, sobretudo, para acessar a vida pública.
4.1.2 A inauguração do Bom Pastor
O Asilo Bom Pastor foi inaugurado na capital no dia 14 de setembro de 1923,
durante a festividade de Exaltação da Santa Cruz. As duas casas foram divididas em sala
de comunidade, refeitório, pátios, dormitórios (com camas brancas, todas de ferro), salas de
trabalhos e uma capela.283 Quando da sua inauguração o asilo estava sob a direção de
Soror M. das Victorias Breves, que contava com o auxílio de cinco beneméritas religiosas
francesas, além do capelão francês Pe. Luiz Brousté, que veio ao Brasil em demanda de
repouso à saúde.
Na ocasião da inauguração do asilo estavam presentes autoridades civis,
representantes da imprensa e “distintas famílias do escol social” do município. O arcebispo
D. Cabral conduziu a solenidade felicitando-se com a realização de uma antiga aspiração, a
inauguração de uma instituição da natureza do Bom Pastor, preocupada com a assistência e
proteção da infância. Dom Cabral discorreu sobre os fins da instituição, realçou o valor da
referida obra que “vae buscar a mulher nos abismos de abjeção em que despenha
arrancando-a às ignomínias dos lupanares para transfigurá-la nos mistérios da penitência
pelo amor, restituindo-lhe a formosura da alma reconquistada pelo arrependimento”.284
281
SOIHET, Rachel. Mulheres pobres e violência no Brasil urbano. In: DEL PRIORE, Mary (Org.).
História das Mulheres no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Contexto, 2000. p. 362-400. 282
Ibid., p. 362-400. 283
Revista Bello Horizonte nº 17. Janeiro de 1934 c. 15x – 014 – Arquivo da Cidade de Belo
Horizonte. 284
O Horizonte, 15/09/23.
157
Em seguida, o bispo fez a leitura do Evangelho sobre a parábola que revela o
perdão de Jesus a Maria Madalena. A parábola remete à figura de Madalena, a pecadora
arrependida, considerada a prostituta mais conhecida da humanidade, que teve seu
comportamento analisado, julgado e condenado por toda sociedade, menos por Jesus, que
a aceitou, tornando-a sua discípula e propagadora da fé cristã285. Diante dessa figura, a
igreja procurava reconduzir as mulheres pecadoras ao caminho da integridade. Madalena
era considerada uma espécie de anti-modelo da mulher mãe, esposa e boa dona de casa.
Madalena era o meio do caminho entre Eva e Maria. Conforme Rago, eram contrapostas no
discurso burguês duas figuras femininas polarizadas: de um lado a imagem de Maria, a mãe
dessexualizada e purificada, do outro lado a mulher sensual e pecadora, associada à figura
do mal e de Eva.286 O desejo era aproximar as mulheres assistidas à figura de Maria,
passando da condição de danosa à condição de santa.287
Segundo Rago, a mulher pobre que se prostituía era associada à imagem da
criança ou do selvagem que necessitava dos cuidados do Estado e das classes dominantes
na condução de sua vida. Era vista como pessoa desorientada que precisava de socorro
dos especialistas para reencontrar o bom caminho e reintegra-se na sociedade288. Embora
houvesse no interior das instituições asilares a clara intenção de enquadrar as mulheres
assistidas no padrão moralmente aceito, na prática as mulheres asiladas recebiam de
maneiras distintas as ações normatizadoras.
Nesse sentido, os católicos viam a obra Bom Pastor como,
um fim eminentemente social e cristão humanitário desenvolvido pelos governos, famílias e sociedade. Mas difundidas nas sociedades latino-americanas. Preocupação que se melhore a saúde moral da sociedade pela regeneração das infelizes que foram arrastadas ao abismo da degradação, e pela preservação de queda a que estão facilmente expostas tantas órfãs
289.
A instituição teria a função de modular o comportamento das mulheres dentro da
moral e tradição católicas, funcionando como elemento essencial para o desenvolvimento do
processo de civilização proposto pela modernidade. Encarava a prostituição como um
285
LELOUP, Jean-Yves. O romance de Maria Madalena: uma mulher incomparável. Campinas:
Verus, 2004. 286
RAGO, Margareth. Os prazeres da noite: prostituição e códigos da sexualidade feminina em São
Paulo (1890-1930). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. 287
SOUZA, Sidnara Anunciação Santana. As órfãs e desvalidas do Asilo Filhas de Ana: regras de
conduta e feminilidade em Cachoeira (1891-1905). Dissertação de Mestrado em História. Universidade Estadual de Feira de Santana, 2009. p. 32 e 33.
288 RAGO, Margareth. Do Cabaré ao Lar: a utopia da cidade disciplinar. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1985. 289
O Horizonte, 12/06/26
158
flagelo social, causador de doenças venéreas, que procurava-se combater. De acordo com
seus idealizadores, o principal fim do estabelecimento era “promover por meio de
recolhimento e indispensável assistência moral e material, a regeneração de mulheres
transviadas, estando também no seu programa, implicitamente, a preservação de menores
desamparadas”290, a difusão da higiene social e a regeneração das pobres vítimas da
maldade humana.291
O Asilo Bom Pastor recebia meninas entre 8 e 10 anos e também a guarda de
mulheres prisioneiras, que por ventura o Estado lhe confiasse. Na ocasião da inauguração o
asilo assistia 77 meninas/mulheres nas duas sessões. Com a ajuda de outras mulheres, a
Sra. Luiz Alves (esposa do ministro da justiça), junto aos drs. Magalhães Castro e Clodovil
Pinto Coelho e ao Sr. João Machado, em 28 de novembro de 1924, conseguiu abrir uma
Secção de Preservação que permitia a entrada de crianças a partir dos seis anos de idade.
O espaço era divido em duas seções: Proteção e Regeneração. As mulheres
destinadas à ala de Regeneração recebiam outro nome ao entrarem no Asilo, como marca
do surgimento de uma nova mulher. Segundo a madre superiora da instituição, as atividades
nas duas seções eram assim divididas,
na primeira seção fazemos compreender às crianças órfãs ou àquelas cujos pais não tenham idoneidade moral para educá-las, deixando-as ao desamparo. Na segunda, cuidamos das moças de menor idade desamparadas, ou cuja conduta mereçam o nosso carinho e conselho. Empenhamos todos os esforços na formação ou na regeneração do caráter dessas moças, encaminhando-as física, moral e praticamente para a vida em sociedade. (...) Só regressam quando solicitadas por parentes ou interessados de reconhecida idoneidade. Algumas são encarregadas de cuidar das crianças menores.
292
As aulas eram ministradas pelas irmãs de caridade e por professoras leigas,
garantindo a instrução primária. As internas se ocupavam com tarefas que melhor condiziam
com suas inclinações e aptidões. Elas pintavam, costuravam e bordavam, sendo os
trabalhos produzidos pelas internas vendidos em benefício do asilo.
As normalistas que cuidavam da educação primária eram filiadas às associações
católicas e eram preocupadas em destinar às internas a educação moral, bem como
trabalhos de cozinha, casa e higiene infantil. Um traço importante das instituições
filantrópicas destinadas às mulheres era a formação para o trabalho. Acreditavam que no
caso das mulheres pobres, além do ensino para se tornarem boas donas de casa era
preciso prepará-las para uma profissão que permitisse que vivessem de forma digna com o
290
O Horizonte, 18/06/24. 291
O Horizonte, 13/08/24. 292
Revista Bello Horizonte n. 17 janeiro de 1934 c. 15x – 014. Arquivo da cidade de Belo Horizonte.
159
fruto do seu trabalho. O bordado e a costura eram portas de salvação para a manutenção
das que fossem solteiras e um complemento da renda para as casadas.293
FIGURA 9 - Meninas Órfãs Asiladas no Bom Pastor
Fonte: Revista Bello Horizonte 17/01/1934 – Acervo do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte.
4.1.3 A participação das mulheres leigas na rotina e na manutenção do asilo Bom Pastor
As mulheres leigas ligadas ao associativismo católico eram atuantes na
manutenção e organização do Asilo Bom Pastor. Além de trabalharem como professoras de
instrução primária, elas faziam aviamento de receitas, visitas periódicas às assistidas e
angariavam fundos através de eventos sociais. Elas também concediam aulas de catecismo
às internas e as levavam a participar dos eventos religiosos pela cidade, especialmente as
festividades de Natal e Páscoa. Nessas ocasiões, as internas faziam apresentações
artísticas e seguiam procissões.
A instituição mantinha-se com doações advindas do governo, iniciativa privada e
homens da alta sociedade. Vê-se nos relatórios dos prefeitos da cidade de Belo Horizonte
uma periodicidade dos repasses de verbas realizados para o Asilo Bom Pastor, mas a maior
arrecadação da instituição estava no trabalho das filantropas, na organização de eventos e
293
GONZAGA, Aprígio de Almeida. Finalidade do Trabalho Manual para as Mulheres, Revista do
Ensino, 14/07/1925. p. 117.
160
na venda dos artigos produzidos pelas asiladas. Vejamos os repasses realizados pela
prefeitura.
TABELA 45 - Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo Prefeito Flávio Fernandes dos Santos. Setembro/1923 (Ano 1922-1923)
Santa Casa de Misericórdia 16:000$000
Asylo Affonso Penna, Maternidade de Belo Horizonte, Orphanato Santo Antônio, Associação Assistência à Pobreza, Associação das Damas de Caridade, Associação Escolar São José para manutenção das escolas primárias a seu cargo.
3:000$000 para cada uma
Hospital de São Vicente e Asilo Bom Pastor 4:000$000
Faculdade de Medicina, para manutenção do Hospital São Geraldo
1:500$000
Associação Protectora da Infância, Liga Contra a Tuberculose, Associação dos Empregados do Comércio para manutenção de uma escola nocturna e escola operária
1:000$000
Obras públicas 902:15$000
Fonte: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Relatórios de Prefeitos – Auxílios p.50.
TABELA 46 - Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo Prefeito Flávio Fernandes dos Santos. Setembro/1925 (Ano 1924-1925)
Santa Casa de Misericórdia 20:000$000
Asylo Affonso Penna 5:000$000
Maternidade Hilda Brandão 4:000$000
Orfanato Santo Antônio 6:000$000
Associação das Damas de Caridade São José e da Boa Viagem, em partes iguaes
5:000$000
As escolas parochiais de São José e da Lagoinha, em partes iguaes
3:000$000
Asylo Bom Pastor 3:000$000
Faculdade de Medicina, para o Hospital São Geraldo 2:000$000
Associação dos Empregados do Commercio para a Manutenção de uma escola nocturna
4:000$000
Escola Operária Donato de Fonseca 3:000$000
Obras públicas 1.127:726$000
Fonte: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Relatórios de Prefeitos – Auxílios p.53.
TABELA 47 - Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo Prefeito Christiano Monteiro Machado. Outubro/1926 (Ano 1925-1926)
Santa Casa de Misericórdia 24:000$000
Asylo Affonso Penna 6:000$000
Maternidade Hilda Brandão 6:000$000
Orfanato Santo Antônio 6:000$000
Associação das Damas de Caridade São José 2:500$000
Associação das Damas de Caridade da Boa Viagem 2:500$000
Escola parochial de São José 2:500$000
Escola parochial da Lagoinha 2:500$000
Hospital São Vicente de Paula 4:000$000
Asylo Bom Pastor 4:000$000
Faculdade de Medicina, para o Hospital São Geraldo 3:000$000
Associação dos Empregados do Commercio para a Manutenção escola nocturna
4:000$000
Escola Operária Donato de Fonseca 4:000$000
Obras públicas 1.580:522$000
Fonte: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Relatórios de Prefeitos – Auxílios p.14.
161
TABELA 48 - Relatório do Primeiro Ano da Administração Municipal no quatriênio iniciado em 1926
Santa Casa de Misericórdia 24:000$000
Asylo Affonso Penna 6:000$000
Maternidade Hilda Brandão 6:000$000
Orfanato Santo Antônio 4:000$000
Associação das Damas de Caridade 5:000$000
Escola parochial de São José e outras 7:000$000
Hospital São Vicente de Paula 4:000$000
Asylo Bom Pastor 4:000$000
Faculdade de Medicina, para o Hospital São Geraldo 3:000$000
Associação dos Empregados do Commercio para a Manutenção escola nocturna
4:000$000
Escola Operária Donato de Fonseca 4:000$000
Obras públicas 1.400:???$000
Fonte: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Relatórios de Prefeitos – Auxílios p.196.
TABELA 49 - Mensagem apresentada ao Conselho Deliberativo pelo prefeito Christiano Monteiro Machado. Outubro/1928
Santa Casa de Misericórdia 30:000$000
Asylo Affonso Penna 8:000$000
Maternidade Hilda Brandão 8:000$000
Orfanato Santo Antônio 10:000$000
Associação das Damas de Caridade de São José 2:500$000
Associação das Damas de Caridade de Boa Viagem 1:250$000
Escola parochial de São José 1:250$000
Escola parochial da Lagoinha 1:250$000
Escola parochial São Geraldo 2:500$000
Hospital São Vicente de Paula 5:000$000
Asylo Bom Pastor 4:000$000
Associação dos Empregados do Commercio 2:000$000
Escola Operária Donato de Fonseca 4:000$000
Obra Assistencial de Mendigos 12:000$000
Obras públicas 7.568:288$766
Fonte: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Relatórios de Prefeitos – Auxílios p.196.
TABELA 50 – Repasses Prefeitura (1940 – 1941)
Segurança Pública e Assistência Social 31:0594$600 Educação Pública 89:046$000 Saúde Pública 239:615$600 Serviços Industriais 26:643$600 Serviços de Utilidade Pública 1.994:119$500
Fonte: Relatório apresentado ao governo de Benedito Valadares Ribeiro pelo Prefeito Otacílio Negrão. (1935-1936). Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Relatórios de Prefeitos – Auxílios p. 23-25.
Como podemos observar o valor do auxílio municipal destinado ao Bom Pastor
variava entre 3:000$000 e 4:000$000, dentro da média de repasses para instituições da
mesma natureza, tais como o Orfanato Santo Antônio e o Hospital São Vicente de Paulo. É
possível verificar também que das instituições subvencionadas, o maior repasse era
destinado à Santa Casa de Misericórdia, que se destacava como um dos mais importantes
espaços de assistência aos pobres e no combate a epidemias da cidade.
162
Outro ponto a ser realçado é o fato de todas essas instituições serem destinadas
à assistência do pobre operário, às crianças órfãs e mulheres desvalidas. Eram instituições
preocupadas com o cuidado com a saúde, mas também com a instrução e formação
profissional do público assistido.
Pode-se verificar também que os auxílios destinados à assistência eram
infinitamente menores àqueles destinados às obras públicas, por isso a necessidade da
colaboração da iniciativa privada e do trabalho benemérito nessa instância. Esse dado
demarca a ineficiência do Estado para cuidar dos aspectos sociais, sobretudo da saúde, e a
importância da filantropia nesse setor. As tabelas revelam também a predominância da
Igreja Católica no campo assistencial em Belo Horizonte, uma vez que quase todas as
instituições subvencionadas pela prefeitura eram católicas.
Cabe ressaltar que nos anos 1929-1930, 1930-1931, 1935-1936 e 1937 não
consta nos relatórios dos prefeitos o quadro detalhado de auxílios destinados às instituições
filantrópicas. Há menções sobre doações de terras e concessão e autorização de espaços
dessa natureza, das quais chamamos a atenção para a construção da Cidade de Ozanan,
colônia de pobres com o objetivo de retirá-los da área urbana central294; a doação do terreno
da Vila Concórdia, para a construção da Creche Menino Jesus295; e a construção de novas
alas na Santa Casa de Misericórdia.
Os dados sobre as doações de terreno por parte da prefeitura podem ser
cruzados com a ação da Comissão de Assistência e Caridade apresentada no capítulo
anterior. Observamos que nos anos 1930 houve um aumento da construção de instituições
filantrópicas e das obras de casa de morada destinadas às doações de terrenos e moradias
aos pobres, o que, em certa medida, justifica a diminuição dos repasses em dinheiro às
instituições filantrópicas nesse período.
Outros aspectos importantes revelados pelas tabelas de auxílios são as relações
existentes entre essas instituições. Conjuntamente, as instituições formavam um campo
assistencial e, por sua vez, compartilhavam uma lógica assistencialista baseada na moral
católica, no suprimento material e na formação educacional e profissional. Tal rede permitia
às mulheres vinculadas ao associativismo católico transitarem por todas as instituições. As
mulheres tinham papéis importantes, a se destacar, o levantamento e gerência de verbas, a
instrução escolar e material, além da articulação com diversos intelectuais ligados ao
universo da educação e da saúde. Nesse campo assistencial existia uma hierarquia a ser
respeitada e um comando que as interligava. A Sociedade São Vicente de Paulo detinha
294
O projeto foi aprovado pelo prefeito Otácilio Negrão de Lima e doou um terreno na Vila Renascença ao Conselho Metropolitano da Sociedade São Vicente de Paula de Belo Horizonte
295 Relatório apresentado ao governo de Benedito Valadares Ribeiro pelo Prefeito Otacílio Negrão.
(1935-1936). Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Relatórios de Prefeitos – Auxílios p. 23-25.
163
grande importância dentro dessa hierarquia. Funcionava como instituição catalisadora e
organizadora das ações filantrópicas. Conectadas a esse campo assistencial estavam as
esfera públicas e privadas, o discurso médico científico e, claro, as mulheres católicas.
Além dos repasses oficiais da prefeitura de Belo Horizonte, o Bom Pastor
recebia doações de particulares e da iniciativa privada. Como salienta Viscardi, as
instituições filantrópicas mantinham contato com os gestores públicos e cobravam a
participação pública mais efetiva. Já a doação da iniciativa privada e de membros da elite
servia como um mecanismo de reforço da cultura dominante. Ao fazerem grandes doações
os membros dessa elite conseguiam que seus nomes fossem alçados às condições de
cidadãos beneméritos ilustres.296
A tabela a seguir demonstra essa combinação de doações.
TABELA 51 – Doações destinadas ao Asilo Bom Pastor297
LISTA DE DOADORES QUANTIA Antônio Carlos Ribeiro de Andrada 200$000 Secretários do Estado, Prefeito da Capital e Diretor do Dep. de Eletrecidade 250$000 Senado e Camara 300$000 Loteria Mineira 100$000 Empresa Gomes Nogueira 248$000 Tribunal da Relação, Forúm Federal e 12 outras 151$000 Padre Salustiano 100$000 Lista dos Advogados a cargo dos drs. Júlio de Carvalho e Mozart Menicom 530$000 Lista dos Engenheiros a Cargo do dr. Benedito José dos Santos 450$000 Grupo Barão de Rio Branco 164$000 Grupo Affonso Penna 80$600 Sr. Oscar Netto 200$000 Sr. Antenor de Freitas 200$000 Banco Commercio e Industria 1:000$000 Banco HypotecárioAgricola 1:000$000 Banco Pelotense 500$000 Commercio 726$200 Lista a cargo do dr. Ernesto Von Sperling 400$000 Grupo Barão de Macaubas 62$000 Total 5:651$800
Fonte: Horizonte 27/08/1927.
Era comum as instituições filantrópicas receberem verbas advindas de loterias,
comerciantes, bancos e políticos. As doações demonstradas na tabela acima são resultado
de uma semana de arrecadação organizada pelas mulheres da Associação Protetora do
Asilo Bom Pastor. Pelo valor total da arrecadação observamos que a quantia alcançada na
“Semana Bom Pastor” é quase o dobro do valor recebido anualmente da prefeitura de Belo
Horizonte. Esse é um dado bem relevante sobre a importância da mobilização das mulheres
na manutenção das obras do asilo.
296
VISCARDI, Claudia Maria Ribeiro. Mutualismo e filantropia. In: Locus: Revista de História. Juiz
de Fora, v. 10 n. 1, p. 95-113 jan./jun., 2004. 297
Arrecadação referente à Semana Bom Pastor, organizada pela Associação Protetora do Asilo.
164
Na tabela 52 visualizamos os donativos concedidos pelos comerciantes da
cidade. As doações eram utilizadas para o consumo do asilo ou como premiação de sorteios
nos eventos realizados para angariar verbas para a instituição. Vale ressaltar que as casas
comerciais que mantinham certa regularidade na doação de artigos tinham um grande
contingente de mulheres operárias e recebiam visitas periódicas das associações católicas,
ou eram empresas instaladas no entorno da instituição.
TABELA 52 - Donativos do comércio em fazendas, gêneros para o Bom Pastor298
Confeitaria estrela 1 litro de licor de ouro Casa Oscar Marques 2 pares de sapato Guedes e Cia 1 peça de algodão Casa Abras 1 peça de morim Casa Confiança 1 vidro filosina Trianon 2 latas de conservas Baleira Suissa 3 kilos de balas Casa Aristides Alfaiataria Guanabara 5 pares de meia Alfaiataria Guanabara 1 sabonete Sr. Sebastião A. Lima 3 colchas Padaria Martini 10 kg de macarrão Sr. Carlos Coelho 30 kg de farinha de mandioca, 1 peça de algodão,
1 caixa de charutos, e retalhos de fazendas entregues sem os nomes dos doadores.
Fonte: Horizonte 27/08/1927.
Os dados das tabelas mostram a importância da filantropia católica nos trabalhos
assistenciais, demonstrando a variedade de sujeitos e organizações que contribuíram para
edificar o sistema de assistência. A atuação do poder público, municipal ou estadual,
restringia-se à subvenção. Além das doações do poder público e da iniciativa privada, o
Asilo contava com uma Associação Protetora do Asilo Bom Pastor, que organizava festivais,
quermesses e palestras para arrecadação de verba. A viúva de Raul Soares, a senhora
Aracy Sperling Soares de Moura, era uma das diretoras da associação299, que também
recebia subvenções do governo federal.
Era comum nesse período a relação entre a assistência social e o primeiro-
damismo. As mulheres de elite e esposas de políticos assumiram uma postura mediadora
entre o poder público e as organizações filantrópicas, estimulando o voluntariado
feminino.300 Um caso notório em Belo Horizonte foi a atuação de Hilda Brandão, esposa do
presidente do estado, Júlio Bueno Brandão, que dirigiu campanhas de recolhimento de
298
Arrecadação referente à Semana Bom Pastor, organizada pela Associação Protetora do Asilo. 299
Minas Gerais, 04/12/1929. 300
MESTRINER, Maria Luiza. O Estado entre a filantropia e a assistência social. São Paulo:
Cortez, 2011.
165
fundos com apoio das Damas de Caridade para criação da primeira maternidade
belorizontina.301
Os festivais em benefício do asilo, comumente aconteciam no Cinema Floresta e
no Teatro Municipal da capital. A programação era organizada por grupos benfeitores, pelas
senhoras e senhoritas católicas, com patrocínio de empresas do ramo alimentício e têxtil,
destacando-se as empresas Gomes Nogueira, a Fábrica de Sabonetes Haya, a Fábrica Bala
Nova Suissa, as Malhas Clecius, a Camisaria São José, a Fábrica de Toalhas Minas Fabril,
Cemil, Marçola, dentre outras. Mais uma vez chamamos atenção para o fato de que a
iniciativa privada que colaborava para manutenção do asilo era notadamente as empresas
que empregavam mulheres operárias.
As jovens benfeitoras encenavam peças teatrais tendo como principal inspiração
textos de renomadas escritoras brasileiras, especialmente os trabalhos de Amélia de
Rezende Martins. As peças teatrais eram dirigidas pelas Damas da Caridade e outras
jovens, membros das diversas associações católicas femininas. Amélia Rezende Martins,
nascida em Campinas, era filha do Comendador e Barão Geraldo Ribeiro de Souza
Rezende, e foi casada com o médico João de Assis Lopes Martins. Mãe de muitos filhos,
destacava-se na época como grande nome na arte musical e na escrita. Começou sua
carreira como escritora produzindo livros didáticos302 para educação de seus filhos, cujos
títulos foram adotados pela Instrução Pública do Rio de Janeiro. Viajou por alguns países da
América afirmando a importância da obra educativa salesiana e publicou vários artigos em
jornais sobre os temas divórcio, benemerência e temas ligados à mulher. Era uma mulher
ativa no trabalho caritativo e utilizava esse trabalho como uma forma de ativismo político.
Amélia tinha planos de desenvolver uma rede nacional de organização e assistência
social.303
Em 1925, a convite de Lúcio dos Santos, importante liderança católica e, na
época, diretor da Instrução Pública de Minas Gerais, Amélia Rezende Martins esteve em
Belo Horizonte para realizar conferências pedagógicas sobre o ensino primário. Na ocasião,
auxiliou na organização de projetos de utilização do cinema na escola. O objetivo era
oferecer divertimento e, ao mesmo tempo, lições que julgavam moralmente sadias, com a
301
MARQUES, Rita de Cássia. A imagem social do médico de senhoras no século XIX. Belo
Horizonte: Coopmed, 2005. 302
Geografia Elementar, 24 pontos de História do Brasil, Meu Brasil 40 pontos, Compêndio de
História do Brasil, Pontos de Geografia Universal, Meu Livreto de Missa, O livro de José Maria, Quadros Sinóticos Sincrônicos de História Universal, Quadro Sinótico e Sincrônico de História do Brasil, Quadro Sinótico e Sincrônico da História da Música. BITTENCOURT, Adalzira. Dicionário bio-bibliográfico de mulheres ilustres, notáveis e intelectuais do Brasil. Rio de Janeiro: Pongelti, 1969. p. 244-245.
303 Ibid.
166
apresentação de modelos de mulheres admiráveis, bem como a indicação de livros infantis,
peças teatrais e poesia.
Dos variados eventos organizados pelas benfeitoras do Asilo Bom Pastor,
destacamos:
Em outubro de 1924 em parceria com a Empresa Gomes Nogueira. As associadas organizaram um festival no Cinema Floresta. Na programação constava Cena de Três Atos da escritora Amélia Rodrigues - A Borboleta e as abelhas (personagens: Sophia, Maria C. Miranda, Terezinha e sua filha, G. Pimenta, Gracinda e sua filha, Dinorah Faria, D. Otília, Delmira Teixeira, Aurora filha de Otília S. Coelho Aleixo, Claudia Luiza Machado A Coelho e Flora Pimenta.
304
Em dezembro de 1924, no cinema Floresta as benfeitoras organizaram a apresentação da peça de teatro “Drama Santa Dorotéia” sob a organização de D. Beralda Nunes
305.
Em janeiro de 1925, as senhoritas Annita e Lindinha de Melo organizaram a apresentação de trágico cômico lírico, também no Cinema Floresta.
306
Em junho de 1928 realizaram no Teatro Municipal um festival artísticos e conferências infantis, sob a organização de Lourdes Lima Liberal. Fazia parte da apresentação os números: Apresentação de Elza Soares no piano; Bailado de sombrinhas por um grupo de meninas (provavelmente asiladas); a Conferência o Jeca Tatu pela senhoria Ruth Garcia de Paiva; Luzie: cantado pelo menino Eddie Rolleaux; Às vistas: cançonela pela menina Iracema Xavier; Recitativo italiano pelo menino José Carlos Ferrari de Lima e Ayayaya cantado por Eddie Rolleaux.
307
Outra figura recorrente era D. Beralda Nunes de Faria – D. Lalá, que dirigia
diversas peças teatrais. O jornal O Horizonte ressaltava a sua capacidade de “antepor os
seus deveres de esposa e mãe, formando um lar feliz e cristão” e ainda ser capaz de
promover distrações lícitas, como o famoso drama Santa Doroteia. Mulheres como Beralda
e Amélia Rezende eram referenciadas como modelos femininos a serem seguidos, uma vez
que, apesar de serem mulheres com uma profícua carreira profissional, eram católicas,
casadas e tinham muitos filhos.
A figura do Jeca Tatu era recorrente nas apresentações.308 Segundo Nisia
Trindade Lima e Gilberto Hochman309, a trajetória do Jeca Tatu, criado por Monteiro Lobato,
sintetiza o que o autor acreditava serem os males do Brasil e elucida de alguma maneira o
debate intelectual que envolveu diferentes autores preocupados com o tema dos contrastes
sociais existentes no país. Afirmam os autores que Monteiro Lobato escreveu, entre os anos
304
O Horizonte, 6/8/1924. 305
O Horizonte 13/08/1924. 306
O Horizonte 10/12/1926. 307
O Horizonte 30/06/1928. 308
O Horizonte, 30/06/28. 309
HOCHMAN, Gilberto e LIMA, Nisia Trindade. Pouca saúde, muita saúva, os males do Brasil
são... Discurso médico sanitário e interpretação do país. In: Ciência e Saúde Coletiva 5(2), 2000. p. 313-332.
167
1916 e 1920, o Problema Vital, que reúne uma série de artigos sobre o tema do
saneamento, divulgados no jornal O Estado de São Paulo, dentre os quais destacam o texto
“A ressureição do Jeca Tatu”.
Segundo Lima e Hochman o artigo é narrado,
na forma de uma parábola dirigida às crianças. Ao passar a acreditar na ciência médica e a seguir suas prescrições, o personagem transforma-se. Livre da opilação e como consequência do estado de permanente desânimo torna-se produtivo, em pouco tempo, um próspero fazendeiro, competindo com seu vizinho italiano e rapidamente ultrapassando-o.
310
Hochman e Lima mostram que ao término da história há um ensinamento moral.
Jeca Tatu havia se tornado não somente um homem afortunado, mas também um educador
sanitário que transmitia a seus empregados os conhecimentos aprendidos.
Podemos inferir que os eventos organizados pelas filantropas estavam inseridos
num contexto de efervescência ideológica e de campanhas cívicas. Muitos atores se
destacavam simultaneamente como educadores e sanitaristas, que pretendiam, através dos
novos conceitos científicos, normatizar e disciplinar as sociedades urbanas para a vida
moderna.
Ressaltamos a atuação das mulheres na gerência dos eventos, na organização
das festas, palestras e na administração dos valores angariados. Tal atuação põe em xeque
o argumento de Susan Besse311 de que a ação social da mulher estava prevista dentro de
valores conservadores pré-estabelecidos, que restringia os efeitos potenciais e as
oportunidades das mulheres na sociedade. Ao contrário disso, as associadas católicas, por
meio das associações, criavam agendas de reivindicações e defesa de seus interesses, que
passavam basicamente pela proteção da infância e das mulheres operárias.
Em março de 1925, a Associação Protetora do Asilo Bom Pastor iniciou uma
campanha cujo objetivo era levantar fundos para a construção de um novo edifício, no Barro
Preto, em terreno doado pela prefeitura de Belo Horizonte. No dia 19 de março desse ano,
ocorreu uma solenidade de lançamento da pedra fundamental do novo prédio. Acredita-se
que a escolha pelo Barro Preto dava-se em função da maciça presença de operárias no
bairro. Estavam presentes no evento D. Cabral, Flávio dos Santos (prefeito), Lúcio dos
Santos (diretor da Instrução Pública), irmãs da Congregação Bom Pastor, as crianças e as
religiosas do Orfanato Santo Antônio e muitas famílias da elite belo-horizontina, animados
310
HOCHMAN, Gilberto e LIMA, Nisia Trindade. Pouca saúde, muita saúva, os males do Brasil
são... Discurso médico sanitário e interpretação do país. In: Ciência e Saúde Coletiva 5(2), 2000. p. 322.
311 BESSE, Susan K. Modernizando a desigualdade – reestruturação da ideologia de gênero no
Brasil 1914-1940. São Paulo: Edusp, 1999.
168
pela banda da Polícia Militar.312 Apesar da realização do evento, a construção definitiva do
Asilo deu-se mais tarde, no ano de 1934, em outra localidade.
Em 1930 a Me. Maria das Vitórias B. de Souza Breves deixou a casa Bom
Pastor de Belo Horizonte e foi substituída pela Me. Maria do Coração Agonizante de Jesus
Batista de Oliveira, que concluiu as negociações referentes à doação do terreno pela
prefeitura. Pela negociação, o terreno Alto do Cercado (Calafate) foi destinado à instalação
da obra definitiva do asilo, localizado no bairro Nova Suíça, onde hoje funciona o Colégio
Santa Maria.
O projeto do prédio foi elaborado pelo arquiteto Luiz Olivieri, datado de 03 de
julho de 1931, aprovado pela prefeitura em 01 de outubro desse mesmo ano. 313 Segundo
Rita Lages Rodrigues, o arquiteto era italiano, da cidade de Florença, e chegou a Belo
Horizonte no ano de 1895 para compor a comissão construtiva da capital. Há ainda hoje
vários vestígios de sua presença nas obras arquitetônicas da cidade. Tinha como elemento
forte a preocupação com a estética de jardins, iluminação, ventilação e arejamento dos
ambientes. Pelo novo projeto previa que o asilo pudesse abrigar até 300 asiladas e era
dividido em três alas distintas: ala das madalenas, penitentes e preservadas.314
FIGURA 10 - Projeto da Fachada do Asilo Bom Pastor315
Fonte: Acervo do Arquivo da Cidade de Belo Horizonte.
312
O Horizonte, 21/03/25. 313
Acervo da Secretaria Municipal Adjunta da Regulação Urbana (SMARU), projetos arquitetônicos
do século XIX ao XXI. 9 Pranchas. O projeto é de autoria de Luiz Olivieri, com o título Asilo Bom Pastor a ser construído em Belo Horizonte, foi aprovado pela prefeitura em 01 de outubro de 1931. Notação do documento; APCBH//AJ.1902-000272.
314 O Horizonte, 24/10/1931.
315 A imagem foi retirada de uma rede social do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Pela
descrição da imagem, é possível ver na prancha original as três alas do Asilo: Madalenas, Penitentes e Preservados.
169
Como já mencionado, a cerimônia da benção e do estabelecimento da primeira
pedra do Asilo Bom Pastor se deu no ano de 1931. Presidida por D. Cabral, teve como
paraninfos o presidente Olegário Maciel, dr. Gustavo Capanema (Secretário do Interior), dr.
Amaro Lannari (Secretaria de Finanças), dr. Ribeiro Junqueira (Secretário da Agricultura),
dr. Noraldino de Lima (Secretário da Educação e Saúde Pública), dr. Luiz Pena, dr. Ernani
Agrícola (diretor de Saúde Pública), dr. Mario Casasanta (Diretor de Imprensa), dr. Carlos
Campos, dr. Álvaro Batista (Chefe de Polícia), tenente coronel Francisco de Campos
Brandão, tenente coronel Elpidio Amaral, tenente coronel João Evangelista, coronel José
Gabriel Marques, major Octavio Diniz, tenente coronel Quintiliano Valadares, Sr. José Dias
Bicalho, Sr. Felicio Rocho, dr. Paulo Alvim e senhora, Dr. Edgard Franzen de Lima e
senhora, Dr. Olinto Orsini e senhora, dr. Aprigio Ribeiro de Oliveira (Presidente do Tribunal
de Justiça de Minas Gerais), dr. Fernando Penna (prefeito) e senhora, coronel Arthur Vianna
e senhora, desembargador Nisio Batista de Oliveira e senhora, dr. Borges da Costa e
senhora, Dr. Pedro Magalhães e senhora, coronel Faustino Assumpção e senhora, coronel
Virgilio Machado, Dr. Hugo Werneck e senhora, Dr. Cristiano Guimarães e senhora,
desembargador Souza e Lima e senhora, Dr. Araujo Penna, D. Colleta Lanari, D. Leopoldina
Leite, D. Alice Sigaud e D. Marocas Franco.
Entrevê-se a participação de figuras importantes da elite belo-horizontina,
atuantes no campo da educação, saúde e segurança pública. A maior parte deles estava
acompanhada de suas esposas, que eram por sua vez as leigas atuantes nos projetos
assistenciais da Igreja Católica, não apenas no Bom Pastor. Dentre elas destacamos Colleta
Lanari, Leopoldina Leite, Alice Sigaud e Marocas Franco.
Chama a atenção o fato de grande parte desses homens pertencer à militância
católica e estar engajada no projeto de modernização da cidade de Belo Horizonte. A
presença de nomes importantes do Serviço de Segurança e Assistência Pública da cidade e
do Estado denota o forte elo das instituições filantrópicas com esse tipo de serviço e reforça
o argumento de que havia uma clara preocupação de corrigir e controlar as mulheres
abrigadas pelo asilo. Como aponta Rago, formou-se nesse período um complexo sistema
judiciário utilizado pelo sistema vigente como um recurso a fim de disciplinar, controlar e
estabelecer normas para as mulheres dos segmentos populares.316
Das diversas autoridades ligadas à segurança pública, destacamos Edgar
Franzen de Lima, irmão de Mário Franzen de Lima.317 Edgar possuía estreita relação com as
316
RAGO, Margareth. Do Cabaré ao Lar: a utopia da cidade disciplinar. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1985. 317
Mário Franzen de Lima foi escritor, professor de Filosofia e Direito da Faculdade de Minas Gerais,
diretor do Arquivo Público Mineiro e da Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais. Atuou como secretário da presidência do estado nos governos de Mello Viana e Antônio Carlos de Andrada. Foi um dos fundadores da Academia Mineira de Letras e liderou o movimento em prol do retorno
170
associadas da Confederação Católica Feminina e trabalhava em parceria com a Comissão
Fé e Moral em campanhas chamadas por eles de “campanha pelo saneamento moral”, em
prol da censura de filmes e representações teatrais.318
No ano de 1929, Edgar Franzen de Lima assumiu a Delegacia de Costumes e
Jogos da capital. Conforme Lucas Carvalho Soares de Aguiar Pereira319, a Delegacia de
Costumes teve funções variadas, mas estava ligada, sobretudo, a movimentos e campanhas
morais, além da perseguição às manifestações religiosas africanas e espíritas, caça aos
banqueiros do jogo do bicho e intervenção na prática do meretrício.
A aspiração de criar em Belo Horizonte uma delegacia de Costume e Jogos era
antiga. No ano de 1914, o então delegado Affonso dos Santos320, denodado militante
católico, em parecer apresentado ao Secretariado do Interior, afirmava que o século XIX
havia inaugurado uma maneira de atuação da política de costumes. De acordo com ele, as
prostitutas eram inscritas em um registro exclusivo, sequestradas da sociedade e
enclausuradas em casas autorizadas. Nessas casas eram submetidas a visitas sanitárias
periódicas, idealizando a extinção de moléstias derivantes da prostituição.
Como demonstra Lucas, para Affonso dos Santos, a melhor maneira de lidar
com a questão seria,
Reprimir tanto possível a onda invasora da corrupção protegendo as menores abandonadas, colocando-as em asilos e orfanatos ou em casas de família, procurando-lhes serviços, exercendo muita vigilância sobre as meretrizes, evitando escândalo na vida pública, cuidando seriamente impedir que as pensões e casas de prostitutas ofendam os bons costumes que escandalizam a sociedade.
321
No ano de 1927, o então presidente do estado, Antônio Carlos de Andrada,
propõe a organização do sistema penitenciário em Minas Gerais, antes marcado pela
promiscuidade, falta de higiene e de função educativa. O jurista e professor Mendes
Pimentel foi nomeado o primeiro presidente do novo Conselho Judiciário. Estava em seus
planos a criação de um sistema penitenciário mais humano e que permitisse a correção
do ensino religioso ao currículo das escolas mineiras, movimento nomeado por ele como o Bom Combate.
318 Ata Confederação Católica Feminina 29/02/28.
319 PEREIRA, Lucas Carvalho Soares de Aguiar. Sociabilidade e Moralização dos Costumes: os
guardas civis e a experiência do policiamento do meretrício em Belo Horizonte. (1928-1934). História e Perspectiva, Uberlândia (49): 41-68 jul./dez.,2013.
320 Affonso dos Santos, além do cargo de delegado de polícia, atuava como professor e jornalista.
Trabalhou na reforma do ensino elaborada por Francisco Campos no estado de Minas Gerais. 321
RCP 1014b p.65 apud PEREIRA, Lucas Carvalho Soares de Aguiar. No intuito de produzir
influência educativa: delegacia de costumes e práticas do meretrício em Belo Horizonte (décadas de 1920 e 1930). Dissertação de Mestrado. Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, 2012. p.31.
171
mais efetiva dos desajustados sociais. Nessa empreitada, Pimentel contou com o auxílio de
Alexandre Drumond, Estevão Pinto e Magalhães Drumond.
No novo modelo penitenciário, o Asilo Bom Pastor teve papel importante, pois a
presença de mulheres nas cadeias locais representava um transtorno para as autoridades,
uma vez que os presos brigavam entre si por causa das mulheres. Ao serem direcionadas
para o Bom Pastor, além de ficarem longe do olhar masculino, elas tinham a possibilidade
de se reabilitarem. Desse modo, eram encaminhadas ao Bom Pastor mulheres que haviam
sido defloradas, meretrizes, alcoólatras e outros crimes. Como mostra Pereira, as colunas
policiais publicadas nos jornais indicam um gradual crescimento das prisões de meretrizes
por questões de ordem moral, entre os anos de 1928 e 1929. Pode-se atribuir esse
aumento, à reforma penitenciária iniciada nesse período.
Pela estreita relação do serviço de Segurança Pública com as associações
femininas católicas e pelo regulamento do Bom Pastor, podemos conjecturar que se não
todas, parte das mulheres detidas pela delegacia de Costumes e Jogos era asilada na
instituição. Corrobora também os argumentos defendidos por Marina Costa e Silva e Lucas
Pereira de que a polícia belo-horizontina se construiu como um dos aparelhos de disciplina
mobilizado pelo Estado e pela elite de uma maneira geral, em busca da conformação dos
comportamentos e sensibilidades.322
Outro ponto importante é a presença de Olinto Orsini de Castro, médico e
professor da faculdade de medicina em clínica sifiligráfica e dermatológica, que ocupou
importantes cargos no Serviço de Profilaxia da Lepra, Sífilis e Doenças Venéreas do Serviço
de Saneamento Rural323. Como demonstra Carrara, a sífilis, assim como outras doenças
venéreas, era considerada, na virada do século XIX até os anos 1940, como um elemento
da degeneração brasileira, devendo, portanto, haver uma intervenção educativa e
sanitária.324 Através dessas intervenções intentava-se tornar essas mulheres sadias e aptas
ao trabalho.325
322
SILVA, Marina Guedes Costa e. A moral e os bons costumes: a experiência da cidade nas
narrativas policiais. (Belo Horizonte, 1897 – 1926). Dissertação de Mestrado em Educação. Belo Horizonte. Faculdade de Educação Universidade Federal de Minas Gerais, 2009 e PEREIRA, Lucas Carvalho Soares de Aguiar. No intuito de produzir influência educativa: delegacia de costumes e práticas de meretrício em Belo Horizonte (décadas de 1920 e 1930). Dissertação de Mestrado. Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, 2012.
323 Foi um dos fundadores da União dos Moços Católicos de Belo Horizonte, participou ativamente
dos Congressos de Médicos Católicos. Em 1946 assumiu a Secretaria da Educação e da Saúde em Minas. Dirigiu o serviço de Sifiligrafia do Departamento Estadual de Saúde. Foi vice-presidente da Sociedade Mineira de Leprologia.
324 CARRARA, Sérgio. Tributo à Vênus a luta contra a Sífilis no Brasil, da passagem do século
aos anos 1940. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 1996. 325
STEPAN, Nancy Leys, A Hora da Eugenia: raça, gênero e nação na América Latina. Rio de
Janeiro: Editora Fiocruz, 2005. p. 52.
172
A prostituição era classificada como um vício que corrompia o corpo social, e por
isso era motivo de estudo médico. Procurava-se criar técnicas de saber e estratégias de
poder destinadas a enclausurar e domesticar as práticas sexuais. Tratava-se de uma luta
contra o “perigo venéreo” em defesa da saúde da população e da preservação da
espécie.326
Chama atenção também a presença do médico Hugo Werneck, que como
demonstrou Marques, foi importante figura no processo de institucionalização e
especialização dos “médicos de senhoras”, em Belo Horizonte. Em seu trabalho, a autora
revela a importância do discurso católico para o acesso ao corpo da mulher.327
A inauguração definitiva do espaço se deu em 23 de abril de 1934, quando o
prédio oferecia condições para receber o contingente do Bom Pastor. Na ocasião eram 133
alunas internas, entre as jovens da Reeducação e as crianças da Preservação. Em 1955 foi
suprimida a Seção da Preservação. Em 1957 vendeu-se parte do terreno e nos antigos
apartamentos ocupados pela Preservação instalou-se uma escola externa, com professoras
pagas pelo governo. A frequência média era de 115 alunas, crianças pobres da vizinhança.
Em 28 de dezembro de 1969, por iniciativa da Irmã Maria Teresa Moreira
Machado, inaugurou-se no Instituto Bom Pastor a obra social Margarida Maria Batista
Oliveira, com gabinete médico, gabinete dentário, curso de educação alimentar, arte
culinária, trabalhos manuais, bordados, formação moral, formação religiosa, formação
educacional, orientação às mães solteiras e alfabetização de adultos. Mais tarde o asilo
transformou-se no Instituto Bom Pastor e na escola Maria Eufrasia, dirigida pela
Congregação Católica, sem vínculos com o poder público, associada à Arquidiocese de Belo
Horizonte e mantida pela Congregação Bom Pastor.
Como podemos verificar, o trabalho caritativo desenvolvido pelo asilo Bom
Pastor, particularmente entre os anos 1920 e 1940, estava intimamente integrado ao projeto
de modernização e ordenação social de Belo Horizonte. Com o crescimento da cidade, a
urbanização, a industrialização e a ampliação das possibilidades culturais da capital, temia-
se pela moral e saúde das mulheres pobres. A instituição, nesse sentido, procurava
recuperar as mulheres perdidas e reintegrá-las à ordem social. Entrevê-se também um
trabalho de cooperação entre o poder público, a iniciativa privada e a Igreja Católica na
condução e manutenção do projeto de reordenação social. Revela sobretudo a importância
do associativismo feminino católico para sua manutenção. Observa-se também que os
326
RAGO, Margareth. Do Cabaré ao Lar: a utopia da cidade disciplinar. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1985. 327
MARQUES, Rita de Cássia. A imagem social do médico de senhoras no século XIX. Belo
Horizonte: Coopmed, 2005.
173
discursos médico e jurídico se faziam presentes e eram os elementos chaves no processo
de modernização e moralização dos costumes.
4.2 Creche Menino Jesus
A Creche Menino Jesus foi uma obra idealizada pelas Mães Cristãs. Durante a
realização de um retiro espiritual no colégio Sagrado Coração de Jesus, as associadas
manifestaram o desejo de fundar uma casa para recolhimento de crianças pobres que
viviam nas ruas. Após o retiro, a senhora Sylvia Guatimosin, em nome do grupo, procurou a
Irmã Superiora do Hospital São Vicente para apresentar o projeto.
Dessa conversa, Sylvia conseguiu, junto às irmãs da Congregação das Filhas da
Caridade de São Vicente de Paulo, um espaço dentro do Hospital São Vicente para a
realização de aulas de catecismo. Ana Cristina Pereira Lage ressalta a mobilidade, poder de
ação, percepções da cultura organizacional e das conexões criadas pelas Filhas de
Caridade São Vicente de Paulo no século XIX e nas primeiras décadas do XX.
A Congregação das Filhas da Caridade foi fundada na França, no ano de 1633,
por Vicente de Paulo e Luisa de Marillac. A instalação da Congregação no Brasil ocorreu
entre 1843 e 1874, num movimento expansionista das Filhas da Caridade pelo mundo.
Segundo Lage, a congregação estava intimamente associada à questão da expansão da
caridade e do reformismo católico. As Filhas da Caridade eram responsáveis por diversas
atividades, como cuidado com os doentes nos hospitais, assistência em asilos e a criação
da infância abandonada e órfã. Além disso, concediam auxílio em maternidades, prisões e
tinham ampla preocupação com a prática escolar.328
Segundo Arruda, as Filhas da Caridade empreenderam esforços em diversas
frentes. Elas se aproximavam das senhoras que ocupavam lugares de status, seja por
possuir um aporte de recursos financeiros ou pelo potencial de contato com os agentes do
Estado. Assim, convocavam essas senhoras a participarem na área de beneficência, como
uma possibilidade de planejar obras sociais de maior envergadura.329
No local cedido pela congregação, as Mães Cristãs realizavam aos domingos
aulas recreativas de catecismo. No entanto, objetivavam um espaço maior para a realização
das atividades, por isso pediram ao Secretário do Interior, Francisco Campos, que cedesse
328
LAGE, Ana Cristina Pereira. Conexões Vicentinas: Educação Confessional Feminina no século
XIX. In: JINZENJI, Monica Yumi; MORENO, Andrea (orgs). História da Educação: sujeitos da educação: intelectuais, professores, crianças e família. Vol. 1 Jundiaí: Paco Editorial, 2014.
329 ARRUDA, Maria Aparecida. Formar almas, plasmar corações, dirigir vontades: o projeto educacional das Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo (1898-1905). Tese de Doutorado. Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2011.
174
uma casa da Secretaria para a realização do catecismo. Não tendo o local disponível,
Francisco Campos orientou que procurassem o prefeito, o Dr. Alcides Lins. Na ocasião, o
prefeito havia doado um terreno destinado à criação de uma Vila Operária, no bairro
Concórdia, na região nordeste da capital.
A Vila Concórdia é considerada a primeira Vila Operária de Belo Horizonte,
aprovada por volta do ano 1928 e criada para abrigar os operários das fábricas da região e
pessoas despejadas do bairro Barroca. A Vila era assim caracterizada,
Cada lote da vila, que era vendido aos operários a preço de custo, tinha em torno de 600m² e as habitações construídas eram modestas, nem havia muros separando as casas. Todos viviam próximos e isso contribuiu para que os trabalhadores se ajudassem mutuamente. Como não havia sistema de esgoto nem água potável ou encanada, os moradores tinham que buscá-la nos chafarizes e cisternas espalhados pela região. As ruas também eram precárias, pois não tinham calçamento e, quando chovia, tudo se transformava em pura lama! Era por isso que quem morava na região era apelidado de “pé vermelho”
330.
A adoção dessas medidas de remoção dos proletários e pobres para a periferia
dos centros da cidade é uma conhecida estratégia do urbanismo higienista. Nessas regiões
eram criadas instituições de assistência à educação e à saúde na tentativa de amenizar os
efeitos colaterais das remoções.331 A falta de infraestrutura do bairro, os problemas de
salubridade e o fato de ser uma vila operária, tornavam o espaço interessante para a ação
da filantropia. Desse modo, o projeto apresentado pelas Mães Cristãs era ideal para a Vila.
A criação de uma creche permitiria que os filhos das mulheres trabalhadoras não ficassem
sozinhos pelas ruas enquanto suas mães trabalhavam. Além disso, a criação de creches
nas vilas operárias era uma maneira de minimizar o conflito entre o trabalho e a
maternidade. As creches procuravam compensar a ausência da mãe pobre trabalhadora e
por consequência protegiam as crianças dos “perigos das ruas”.332
O prefeito atendeu prontamente a solicitação das Mães Cristãs e reservou parte
do terreno da Vila Concórdia para a associação. As despesas de cartório do terreno foram
pagas pelas famílias Cardoso, Anibal Gontijo e Arcângelo Maleta. De posse do terreno as
senhoras D. Sylvia Guatomosin e D. Amaryllis Rabelo reuniram-se com Furtado de Menezes
para a formação de uma comissão e concessão de empréstimo junto à SSVP, para iniciar a
construção da Creche.
330
ARREGUY, Cintia Aparecida Chagas, RIBEIRO, Raphael Rajão. História dos bairros prefeitura
de Belo Horizonte: Regional Nordeste. Belo Horizonte: APCBH; ACAP-BH, 2008. p.21. 331
FONSECA, Sérgio C. A interiorização da assistência à infância durante a Primeira República:
de São Paulo à Ribeirão Preto. Educação em Revista. Belo Horizonte v. 28 n. 01, mar. 2012. p. 79-108.
332 FREIRE, Maria Martha de Luna. Mulheres, mães e médicos: discurso maternalista no Brasil. Rio
de Janeiro: Editora FGV, 2008.
175
A primeira comissão foi composta pelas senhoras: Gil Guatomosim, Dr. David
Rabelo, Dr. Antônio Guimarães, Necésio Tavares, Dr. Ismael Libâneo, Dr. Pires de
Albuquerque, Carlos Neves e as senhoritas Alice Silva, Sinhá Cardoso, Nair Ferreira e
Margarida Schmidt Monteiro de Castro. Como é possível notar, as senhoras casadas eram
identificadas pelos nomes de seus maridos que, por sua vez, eram homens de notoriedade
na cidade.
Com o empréstimo concedido por Furtado de Menezes e com arrecadação
adquirida pela ação das senhoras responsáveis pela comissão, a construção da creche foi
iniciada com a quantia de 9 contos e duzentos e cinquenta mil réis.
A Creche foi inaugurada em 19 de julho de 1932, sob a direção da Congregação
das Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo. Na inauguração foi realizada uma missa
solene pelo padre José Medeiros, representante do bispo Monsenhor Arthur de Oliveira.
Participaram da cerimônia as senhoras e senhorinhas pertencentes às organizações
católicas, várias famílias da alta sociedade de Belo Horizonte e os confrades da Sociedade
São Vicente de Paulo.333
As crianças assistidas pela Creche eram levadas pelas mães trabalhadoras ou
pelos próprios pais separados de suas esposas ou viúvos. Eram encaminhadas também por
parentes, benfeitores, confrades vicentinos, sacerdotes, filhas da caridade, pelo serviço
social de vigilância de menores, pelo serviço social da Legião Brasileira de Assistência, pela
Associação Mineira de Proteção à Infância, por autoridades como prefeito, ministro,
diretores da Secretaria de Educação, serviço social, juizado de menores, secretário de
saúde e assistência, serviço social médico, organização das voluntárias e pela Fundação do
Bem Estar do Menor. As variadas possibilidades de encaminhamento das crianças
assistidas pela creche evidenciam como eram variados os atores sociais e as instituições
preocupadas com a assistência das crianças: eram beneméritos, ordens religiosas,
membros das elites, intelectuais e profissionais da saúde e da educação.
No início do seu funcionamento, havia na Creche um berçário, mas devido à
proliferação de doenças dentro da instituição, principalmente o sarampo, e as limitações de
funcionários (uma cozinheira, uma lavadeira e algumas jovens aspirantes que ajudavam as
freiras) o berçário foi fechado. No lugar, montou-se uma clínica de olhos. Por esse motivo a
333
Assinaram a ata de inauguração: Margarida Schmitd Monteiro de Castro, Padre José Medeiros de
Leite, Monsenhor Arthur de Oliveira, Joaquim Furtado de Menezes, Alexandrina de Santa Cecília, Alice Alves da Silva, Miguel Abras, Patrício dos Santos e Nicolau Abras, Maria de Nazaré, Anna Santa Cecília, Joaquim Vieira Braga, Faustino Assumpção, José de Araújo Valle, Pedro Ferreira de Sá, João Lino do Nascimento, Pio Porto de Menezes, Nair Ferreira, Julio Teixeira, Hilda Passos, Helena Lodi, Georgina Magalhães, Cecília Lopes Paixão, Alice Neves, Noemia Pamplona de Carvalho, Maria Joana Moreira, Olinda Pessoa Oliveira, Antonieta S. Godinho, Marcelo Abranches Viotti, Antônio de Moura Lima, Zilda Assumpção, Emilia Moreira, Georgina Ottoni Chagas, Maria da Consolação Dias, Iracema Nogueira Braga.
176
creche passou a acolher crianças de ambos os sexos, de 1 a 13 anos. As alas eram
separadas por sexo e faixa etária. No ano de 1941, a Creche passou a receber crianças em
regime de internato.
Logo de sua inauguração a creche contava com 55 crianças, todas de viúvas
assistidas pela Sociedade São Vicente de Paulo. Ao sair da creche as crianças eram
entregues às mães ou encaminhadas para outras instituições, tais como: Colégio das Filhas
da Caridade, em Diamantina; Educandários dos Sagrados Coração de Jesus e Maria, em
Barbacena; Escola de Menores São Vicente de Paulo, em Borda do Campo, município de
Antônio Carlos; Orfanato do Colégio Providência de Mariana; Orfanato Santo Antônio; Casa
de Meninos da Cidade Industrial; Instituto Setelagoano; Escola professor Arthur Bernardes;
Escola Caio Martins; Lar D. Orione; Abrigo do Juizado de Menores; Lar dos Meninos, em
Divinópolis; Casa do Lar Homem de Nazaré, em Belo Horizonte. Como podemos verificar,
era uma grande rede de assistência com ramificações por todo o Estado. Tratava-se
efetivamente de uma assistência institucionalizada com ênfase no recolhimento, na
disciplina, no encaminhamento social e no ensino de ofícios, muitas vezes subalternos.334
Ao entrar na creche cada criança tinha uma ficha com seus dados, a saber –
nome e sobrenome, data e lugar de nascimento, nacionalidade, proveniente de, data de
entrada e saída, nome e endereço do responsável pela criança, informações sobre a família,
nome da criança, data e lugar de batismo, data e lugar da 1ª comunhão, certificado de
estudos, outros exames, aptidões, motivos da saída, meio social da família, saúde, caráter,
trabalho da criança. Pelas fichas observa-se que a maioria dos assistidos eram crianças
negras e pardas.
As crianças acolhidas recebiam alimentação, assistência médica e dentária,
remédios, roupas, instrução primária, apresentação de trabalhos domésticos, educação
moral e religiosa. A rotina da creche obedecia aos preceitos do Manual de Procedimentos
da Congregação das Filhas da Caridade. Nele estavam presentes os cuidados com os
hábitos de higiene. As irmãs com sua equipe supervisionavam diariamente a limpeza das
mãos e do rosto, cuidado com sapatos, limpeza das roupas e cuidados com os cabelos. No
caso das meninas, além de ensinar o asseio pessoal, eram instruídas quanto à limpeza
doméstica.335
As irmãs, juntamente com as auxiliares leigas, controlavam o número de
crianças por sala de aula. Os dormitórios deviam ser suficientes para atender de forma
334
FONSECA, Sérgio C. A interiorização da assistência à infância durante a Primeira República:
de São Paulo a Ribeirão Preto. Educação em Revista. Belo Horizonte. v.28 n.01 mar. 2012. p. 79-108.
335 LAGE, Ana Cristina Pereira. Conexões Vicentinas: Educação Confessional Feminina no século
XIX. In: JINZENJI, Monica Yumi; MORENO, Andrea (orgs). História da Educação: sujeitos da educação: intelectuais, professores, crianças e família. Vol. 1 Jundiaí: Paco Editorial, 2014.
177
confortável o número de assistidos para que o ambiente se mantivesse arejado e com
alguma distância entre as camas. Sempre havia uma Irmã de Caridade para velar pelo sono
das crianças.336 Os trabalhos manuais eram obrigatórios para todos, variando o tempo que
teriam para prática.
Após a inauguração da creche, as senhoras católicas continuaram levantando
fundos para a manutenção da instituição e sua construção definitiva. As formas de
arrecadação se davam através de carnês de sócios, contribuição das mães de crianças
protegidas e doações de benfeitores. Vejamos a seguir a lista dos principais doadores da
Creche.
TABELA 53 - Benfeitores da Creche Menino Jesus
Benfeitores Doação
Benjamim Guimarães 50:000$000
Saúde Pública por intermédio da Sociedade São Vicente de Paulo 20:000$000
Odete Valladares 12:225$000
Prefeito Otacílio Negrão de Lima 10:000$000
Produto da venda de uma tipografia por intermédio de David Rabelo 4:000$000
Um amigo da creche 3:000$000
Dr. Amaro Lanari 2:000$000
Produto de umas barraquinhas 2:000$000
Dr. Gil Guatimosin 1:500$000
Sr. José Pio L. Cardoso e sra. 1:100$000
Donativos por ocasião da benção da pedra fundamental 1:100$000
Um donativo anônimo por intermédio da senhorita Jaci Vasconcellos 1:000$000
D. Maria Colleta Lanari 500$000
D. Luiza C. Guimarães 500$000
Dr. David Rabello 500$000
Dr. Marques Lisboa 500$000
Dr. Dorinato de O. Lima 500$000
Sr. Hipólito Rocha 500$000
Vários anônimos 500$000
Sr. Paul Dardot 400$000
Sr. Joaquim Rolla 300$000
Lista confiada à viúva H. Tam 230$000
Dr. J. J. Monteiro Andrade e sra. 200$000
Alfredo Porto 200$000
Sr. Paulino Gontijo 200$000
Paulo Alvim 200$000
Cel. Silvério Silva 200$000
Cel. Sebastião Augusto de Lima 200$000
Sra. Ildeu Augusto de Lima 200$000
Sra. Julio Guimarães 100$000
Sra. Alfredo Santiago 100$000
Dr. Estevão Pinto 100$000
Dr. Julio Soares 100$000
Srs. Curi, Irmão e Cia. 100$000
Srs. José Assis Silva Brasil 100$000
Cel. Anibal Gontijo e sra. 100$000
336
LAGE, Ana Cristina Pereira. Conexões Vicentinas: Educação Confessional Feminina no século
XIX. In: JINZENJI, Monica Yumi; MORENO, Andrea (orgs). História da Educação: sujeitos da educação: intelectuais, professores, crianças e família. Vol. 1 Jundiaí: Paco Editorial, 2014.
178
Cel. Juventino Dias 100$000
Dr. Alarico Barroso 100$000
Cel. José Antônio Assunção 50$000
Cel. Caetano de Vasconcelos 50$000
Dr. Célio de Castro 50$000
Dr. Antônio Castilho 50$000
Dr. Demerval Pimenta 50$000
Dr. Lucas Machado 50$000
Dr. Alfredo Balena 50$000
Sr. João Gualberto da Costa 50$000
Sr. Ovídio Nogueira 50$000
Sr. Theotônio caldeira 50$000
Sr. José Sabino Ferreira 50$000
Sra. Borges da Costa 50$000
Sra. Emiliana de Werna 50$000
D. Alice Silva 50$000
D. M. Umbelina de Carvalho Pinto 50$000
Sr. Libaneo 50$000
Senhorita Heloísa Aleixo 50$000
Fonte: Livro de Ouro Creche Menino Jesus: Histórico da Creche Menino Jesus da comunidade de caridade Sociedade São Vicente de Paulo: sua origem e evolução. 19/7/1932 a 19/07/1941 - Manuscrito
TABELA 54 - Doação de materiais de construção e acabamento
D. Fany Gianetti de Moraes 200 telhas Dr. Octávio Penna 25 metros de pedra Dr. Jarbas Vidal Gomes 10 carroças de pedras Sr. José de Almeida Vieira 25 metros de pedra Dr. Antônio Guimarães 10 portas, 15 janelas e 3
lavatórios Srs. A. Santiago e Cia Areia, cal e cascalho no valor de
500$000 Dr. A Alvim 100 k de cal Cerâmica Ipanema 1.000 tijolos Sr. Dolabela Portela 200$000 em Madeira
Fonte: Livro de Ouro Creche Menino Jesus: Histórico da Creche Menino Jesus da comunidade de caridade Sociedade São Vicente de Paulo: sua origem e evolução. 19/7/1932 a 19/07/1941 - Manuscrito
TABELA 55 - Doações de Mobília
Cel. Benjamim Ferreira Guimarães 1 refrigerador e 1 fogão para cosinha dietética 1 fogão a lenha para a cosinha geral
D. Cota Miranda Para instalação do inicio 1:000$000
Sr. León Boutin 14:000$000 Dr. Waldemar Luz Para camas 500$000 Dr. Alvimar Carneiro de Rezende 4 mezas e 8 bancos Sr. Hypolito Rocha 12 berços de ferro
Produto de uma tômbola 675$000 para mezas de cabeceira
Casa Macife 1 fogão de carvão D. Alferina Marçola 4 cadeiras D. Luiza Guimarães 1 mesa
Fonte: Livro de Ouro Creche Menino Jesus: Histórico da Creche Menino Jesus da comunidade de caridade Sociedade São Vicente de Paulo: sua origem e evolução. 19/7/1932 a 19/07/1941 – Manuscrito
179
Nota-se que as doações não eram apenas em dinheiro, mas em materiais para a
construção e mobiliário. Observa-se também que os doadores fazem parte da elite belo-
horizontina e que atuam como beneméritos em outras instituições filantrópicas. Destaca-se
o grande número de mulheres, militares, médicos e homens ligados ao setor industrial. A
família Guatimosim, por exemplo, era formada por importantes engenheiros fundadores da
Companhia Siderúrgica Mineira, que mais tarde tornou-se a conhecida siderúrgica Belgo
Mineira. Outro grande benemérito da Creche Menino Jesus foi Benjamin Ferreira
Guimarães, pioneiro da indústria têxtil mineira, além de fundador do Banco de Minas Gerais
S/A. Benjamin Guimarães foi benemérito também no Hospital da Baleia. Ressaltamos
também o benfeitor Demerval Pimenta, importante engenheiro e fundador da Usiminas.
A presença dos beneméritos ligados ao setor industrial está intimamente ligada
ao assistencialismo dos Círculos Operários Católicos337, conhecido como circulismo,
destinado à defesa de colaboração de classes e recristianização do operariado. Esse tipo de
atividade procurava prestar uma assistência (moral, espiritual, intelectual, física e
profissional), por meio de escolas, clínicas, hospitais, caixas de mutualidade e
departamentos recreativos.338
Chama atenção a rapidez com que as mulheres conseguiam levantar verbas
para o avanço das obras. No livro de ouro vê-se que no primeiro semestre do ano de
inauguração da creche, elas contavam com a quantia de 1:566$700, no segundo semestre,
alcançaram o valor de 7:640$100 e em 1939, tinham a vultuosa quantia de 64:081$600.
Em 24 de maio de 1934 foi realizada a solenidade para benção da pedra
fundamental da creche definitiva. Estavam presentes representantes do Presidente do
Estado, chefes de polícia e juiz de menores. No dia da inauguração receberam a doação do
Cel. Benjamin Guimarães, no valor de 20:000$000, que ajudou no término da obra. Em 1935
houve uma nova retomada das obras com a doação de Otacílio Negrão de Lima, no valor de
10:000$000. A obra foi concluída em 1935, quando a instituição passou a contar com
serviço de ambulatório e foi encerrada a construção da capela. O Ambulatório pertencia à
Corporação dos Médicos Católicos, organização criada em 1930 e vinculada ao Conselho
Metropolitano da Sociedade São Vicente de Paulo.
A Corporação dos Médicos Católicos de Belo Horizonte é fruto do movimento
leigo que surgiu no contexto do reformismo católico e atuou na implantação de hospitais na
337
Sobre isso ver: DUTRA, Eliana Regina F. Alternativas do comportamento operário: Belo Horizonte, Juiz de Fora (1917-1930). Belo Horizonte. Dissertação de Mestrado em Ciência Política. Universidade do Estado de Minas Gerais, 1981.
338 MARQUES, Rita de Cássia. Da Romanização à Terceira Via: a igreja no Brasil de 1889-1945.
Dissertação de Mestrado. Faculdade de Ciências Humanas. Universidade Federal de Minas Gerais, 1995.
180
cidade e na assistência à população pobre339. A Corporação dedicava-se também às
discussões de temas médicos e religiosos. Era composta por importante grupo de médicos,
a saber: Dr. Hilton Rocha, Dr. Antônio Ximenes, Dr. João Batista Rezende Alves, Dr. José
Maria Carneiro, Dr. Afonso Lustosa, Dr. Arlindo Polizzi e Dr. Francisco de Souza e Lima.
Quando da sua criação, a Corporação funcionava num galpão localizado na Rua Itamaracá,
535, na Vila Concórdia. Assistia basicamente crianças e mulheres viúvas. Em 1936 foi
construído nesse mesmo espaço o Hospital São Francisco de Assis.
Segundo Rita de Cássia Marques, o hospital São Francisco de Assis ficou sob a
direção das Irmãs Carmelitas da Divina Providência e inicialmente comportava 80 leitos.
Manteve serviço de policlínica, laboratório de raio-X, farmácia, maternidade e lactário. Um
ano depois de criado, em 1937, sua policlínica atendeu 10.089 doentes em dietética e
14.627 crianças, que receberam 59.080 mamadeiras.340
Para a assistência médica das crianças dentro da Corporação dos Médicos
Católicos criou-se a Sociedade Médica da Creche Menino Jesus. A sociedade foi instituída
em 31 de março de 1935, não sendo composta exclusivamente por médicos, mas também
por farmacêuticos, estudantes e dentistas que trabalhavam na Creche. As reuniões ocorriam
no último domingo do mês, às 9 horas. As reuniões eram abertas a todos os profissionais da
instituição.
Havia na construção da creche a preocupação com a salubridade dos espaços.
Investiu-se em vacinação, salas amplas, janelas grandes para circulação do ar. Os
dormitórios também deveriam ser suficientes para atender o número de internos, já que era
essencial que estivessem arejados e fossem espaçosos.341 Cada ala da creche
homenageava os beneméritos que faziam doações vultosas. A ala de refeitórios e banheiros
das crianças, por exemplo, era chamada Benjamin Guimarães, um dos maiores benfeitores
da Creche Menino Jesus.
Além das Mães Cristãs, as Filhas de Maria tiveram presença marcante no
cotidiano da Creche. Faziam reuniões duas vezes no mês com palestras, debates e círculos
de estudo. Os assuntos mais recorrentes eram religião e higiene.
No ano de 1938 a Creche Menino Jesus recebeu nova denominação,
Educandário Menino Jesus, com a finalidade de amparar crianças de ambos os sexos,
principalmente filhos de empregadas. Nesse período houve novas repartições da creche,
criou-se o jardim de infância, curso primário, ofícios e aulas noturnas.
339
MARQUES, Rita de Cássia. A caridade criando hospitais em Minas Gerais – séculos XVIII-
XX. Dynamis, 2011. p.107-129. 340
Ibid., p. 127 341
LAGE, Ana Cristina Pereira. Conexões Vicentinas: Educação Confessional Feminina no século
XIX. In: JINZENJI, Monica Yumi; MORENO, Andrea (orgs). História da Educação: sujeitos da educação: intelectuais, professores, crianças e família. Vol. 1 Jundiaí: Paco Editorial, 2014.
181
Em setembro de 1939, o jornal Folha de Minas organizou uma campanha em
favor da Creche. O jornal foi fundado no ano de 1934, pela Sociedade Anônima Folha de
Minas. Afonso Arinos de Melo e Franco foi o primeiro diretor do diário. O periódico teve Luiz
de Bessa e Newton Prates como seus principais redatores. O conteúdo do jornal era bem
diverso. Destacamos a presença de vários eventos realizados pelo jornal destinados à
infância, tais como campeonatos esportivos. Além disso, há registros da criação de um
Suplemento Folha de Minas, destinado ao público infantil.342
FIGURA 11 – Creche Menino Jesus
Fonte: Revista Bello Horizonte n. setembro de 1939 c. 15x – 035. Arquivo da cidade de Belo Horizonte.
No ano de 1941 a Creche abrigava aproximadamente 300 crianças. Em 19 de
julho de 1944, formou-se no interior da Creche a Associação Luisas de Marillac. A
associação era composta pela Irmã Célia Brandão Lobato (presidente), Elza Vianna e
Vidiquinha Salles (procuradoras) e Edith Alvim Torres (secretária). Tratava-se de uma
associação com participação de mulheres leigas e religiosas. Tinha por finalidade cuidar de
idosos. A preocupação com mulheres idosas também estava presente no associativismo
feminino católico, particularmente das Damas da Caridade da Boa Viagem. No ano de 1935
inauguram a Associação Santa Zita, destinada à assistência (moral, médica, religiosa e
material) de empregadas domésticas. A associação atuava como uma agenciadora de
342
CASTRO, Maria Céres. Estudo Crítico e nota biográfica. In: LINHARES, Joaquim Nabuco. Itinerário da Imprensa de Belo Horizonte: 1895-1954. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro/Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1995.
182
empregos. Mais tarde, nos anos 1950, a associação criou uma casa para moradia de
idosas.343
Em 25 de janeiro de 1945 foi realizada a benção da pedra fundamental do novo
pavilhão da Creche. O evento contou com a presença do arcebispo metropolitano, do então
presidente Getúlio Vargas, do governador, Dr. Benedito Valadares Ribeiro, do prefeito JK,
da irmã superiora da Creche, além de vários sacerdotes e pessoas convidadas. No ano de
1954, parte do espaço físico da creche foi cedida para criação da Escola Estadual Benjamim
Guimarães. Em 1961 houve a averbação para alteração do nome para Educandário Creche
Menino Jesus.
As instituições Creche Menino Jesus e Asilo Bom Pastor revelam a importância
da filantropia católica nos serviços de assistência aos pobres, especialmente às crianças e
mulheres. Revela, sobretudo, o papel das mulheres leigas católicas na criação e
manutenção dessas instituições.
343
CASTRO, Vanja. Envelhecimento e Institucionalização: as experiências na Fundação de Obras
Sociais da Paróquia da Boa Viagem em Belo Horizonte. Dissertação de Mestrado Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, 2008.
183
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao final desse trabalho podemos concluir que o associativismo feminino católico
em Belo Horizonte é fruto da combinação do reformismo católico, iniciado em meados do
século XIX, com o projeto político-social das elites mineiras. Esse projeto social, liderado
pela intelectualidade católica, visava a proteção e o controle sobre a infância e a família e
primava pela formação de uma sociedade moderna, moralmente boa e saudável.
As mulheres tiveram papel importante nesse projeto. Para regular sua atuação,
criou-se uma série de associações, constituídas por rígidos manuais e regras e destinadas a
forjar um tipo ideal de mulher. No entanto, não necessariamente as mulheres se
apropriaram do modelo imposto. Ao contrário, utilizaram os espaços das associações como
uma possibilidade real de acessar a esfera pública, sendo o caminho mais comum a
filantropia. Através dos trabalhos filantrópicos as mulheres leigas católicas criaram uma
agenda de proteção aos doentes, pobres e, particularmente, às crianças desvalida e às
mulheres “perdidas”.
O trabalho desempenhado pelas associadas não se restringia à caridade cristã.
Suas ações eram guiadas pela formação técnica que possuíam. Tratava-se de um grupo de
mulheres com boas condições socioeconômicas, com formação escolar secundária,
preferencialmente normalistas e enfermeiras. Tal formação qualificava suas ações de
assistência no campo da educação e da saúde, preconizando a divulgação de hábitos
higiênicos, educação moral e a criação de instituições asilar, hospitalar e educacional.
No trabalho filantrópico, além da oferta de bens materiais aos assistidos, as
agremiadas realizavam atendimentos domiciliares e promoviam campanhas preventivas,
sobretudo campanhas contra a tuberculose, sífilis e lepra. Elas também fundaram diversas
instituições e realizaram eventos para angariar fundos, entre outras tarefas. Assim, podemos
observar que as agremiadas cuidaram da criação, da organização e da gestão dos serviços
sociais em Belo Horizonte.
Nessa empreitada, essas mulheres teceram importantes laços sociais com
autoridades civis, estaduais, federais e com o poder local de um modo geral. Estabeleceram
parcerias com o discurso médico-científico, especialmente com os médicos e farmacêuticos.
A partir do estabelecimento desses laços sociais, elas criaram uma eficiente rede de
assistência, bem organizada hierarquicamente. No topo da hierarquia estava a Sociedade
São Vicente de Paulo. A SSVP era o centro ordenador do trabalho de assistência. O diálogo
da agremiação da SSVP com as mulheres se deu via associações femininas católicas, com
destaque para a Confederação Católica Feminina, que reunia as mais importantes
agremiações caritativas femininas: As Filhas de Maria, Damas da Caridade e Mães Cristãs.
184
As Filhas de Maria era uma agremiação composta de mulheres solteiras que
agia basicamente no campo da educação de crianças e operárias. Realizava aulas de
catecismos, instrução primárias, palestras de higiene e educação moral. As Damas da
Caridade atuavam mais eficazmente na área de assistência à saúde. Estavam presentes
nos hospitais, aviavam receitas médicas, faziam encaminhamentos para consultas médicas
e odontológicas e uma variada assistência aos doentes. Já as Mães Cristãs atuaram
basicamente no cuidado da infância nas escolas e creches e na orientação de mães pobres
sobre temas ligados à maternidade e à puericultura.
Diante da precariedade do serviço de saúde pública, a ação feminina nas
organizações católicas procurava atuar sobre os flagelos sociais, mudando os hábitos dos
assistidos e visando restaurar suas famílias. Vale ressaltar que as famílias assistidas eram
basicamente chefiadas por mulheres viúvas ou abandonadas por seus maridos. Devido à
necessidade de trabalho dessas mulheres para seu auto-sustento e o de seus filhos, as
associadas primavam pela criação de creches e escolas paroquiais que protegessem as
crianças do perigo da rua e que, ao mesmo tempo, permitissem que elas tivessem uma
formação moral e para o trabalho.
Ao fazermos o levantamento das diferentes formas de arrecadação de doações
para o assistencialismo em Belo Horizonte, observamos que o valor arrecado pelas
associações femininas católicas é infinitamente maior do que as subvenções
governamentais. Além disso, é expressivo o número de instituições criadas e geridas por
essas mulheres. Esses dados nos permitem afirmar que a atuação das mulheres católicas
não era subalterna, ligada apenas à organização de quermesses ou à promoção da carreira
de seus maridos. Ao contrário, a ação das agremiadas foi fundamental para a manutenção
da assistência social em Belo Horizonte. Foram elas as responsáveis por uma agenda social
na cidade.
A pesquisa nos permitiu constatar também a combinação da ação do
associativismo feminino católico com a elite econômica, industrial e política. Destacamos o
ano de 1927 como fundamental para entender essas parecerias, pois nesse ano, no
governo de Antônio Carlos de Andrada, tivemos a Reformulação dos Serviços de Higiene e
Saúde Pública, a Reforma do Ensino Francisco Campos e a Reforma do Sistema
Penitenciário em Minas Gerais. Essas três instâncias políticas dialogavam intimamente com
a filantropia feminina católica, que também no ano de 1927 se reorganizou, com a formação
da Confederação Católica Feminina. Como vimos, a CCF reunia as associações católicas
mais ativas da cidade e tinha como objetivo centralizar e coordenar as ações filantrópicas.
O diálogo das associadas católicas com as autoridades civis, políticos e
empresários foi facilitado pelo lugar privilegiado que as agremiadas ocupavam na sociedade
belo-horizontina. Por conta desse lugar social privilegiado, elas alcançaram meios de
185
realizar projetos no campo da filantropia. Em contrapartida, o trabalho filantrópico permitiu
às associadas católicas grande mobilidade pelos espaços públicos. Nessa brecha, essas
mulheres agiram na nova organização social imposta pelo processo de modernização da
cidade, que passava pela ordenação da população pobre através da formação higiênica,
moral e educacional.
Ou seja, a agenda das agremiações femininas católicas estava integrada a
agenda mais ampliada da elite mineira. Os projetos ligados à ordenação social das elites
mineiras era propagados por intermédio das ações femininas nos seus traballhos de
natureza filantrópica.
186
187
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Jornal “Horizonte”
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Fontes consultadas no Arquivo da Arquidiocese de Belo Horizonte
- Atas de Reunião da Confederação Feminina Católica (1921/1935)
- Livros de Tombo
Data Título Pág.
16/06/1922 Congregações Religiosas: Irmãs Franciscanas da pequena família do sagrado coração de Jesus confiadas o Orfanato Santo Antônio. Irmãs Dominicanas o Colégio Santa Maria Filhas de Jesus o Colégio Imaculada Conceição
19
7/3/1923 Circular as Filhas de Maria, da diocese de Belo Horizonte. D. Cabral dirige as filhas de Maria circular sobre as “funestas conseqüências dos perniciosos divertimentos do carnaval”
20
29/5/1923 Resoluções: Conferências episcopais em Juiz de Fora de 19 a 25/4/23 para resolver os seguintes problemas: Ensino Religioso, Vocações e Seminários, Defesa dos Costumes, Cultos Religiosos, Associações, Imprensa Católica, Matrimônio, Arquivos e Livros Paroquiais, Política, Instrução, Serviço Militar e Hygiene e Profilaxia
23
s/d Carta Pastoral de D. Cabral – A Igreja e o Ensino às Mães Cristãs
-
s/d Conselhos Regionais da Associação de Educação e Ensino – Trabalho das Filhas de Maria
43
- II Congresso Eucarístico Nacional
Data Título Pág.
05/09/1936 Ata da 2ª Sessão de Estudos da Mocidade Feminina (Estudos da Juventude Feminina: Presença de d. Leme palestra sobre a situação do mundo católico, caso espanhol, abertura e convocação para assistência)
3
197
06/09/1936 Ata da 3ª Sessão de Estudos da Mocidade Feminina (Estudos da Juventude Feminina: D. Elza Pereira das Neves – These “A Eucaristia Ação Católica da Juventude Feminina e sua vida no Lar.
4
1936 Registro de Congressistas -
29/08/1936 Registro de Grupos de Congressistas: colégios, grupos escolares e associações católicas
-
- Avisos e Mandamentos da Cúria Metropolitana de Belo Horizonte
Data Título Pág.
1934-1936 Livro nº 1: 1934-1936 (aviso nº1 ao nº174) -
1936-1941 Livro nº 2: 1936-1941 (aviso nº 175 ao nº 291) -
Fontes consultadas no Arquivo Público Mineiro
- Inauguração Asylo Bom Pastor – presença de D. Cabral, no bairro Floresta em dois
prédios adaptados para esse fim.
- Instituto de Proteção e Assistência Infantil no Hospital São Vicente de Paula -
Notação TG – 202-004 – 1914/ Tipografia Magalhães
- Secretaria do Interior HGO-006913 e HGO-009130
Fontes consultadas no Centro de Memória Medicina da UFMG
- Atas de Reunião da Sociedade Médica Da Creche Menino Jesus, 1935 - Panorama Histórico do Hospital Madre Teresa (Hospital da Vila dos Operários Tuberculosos - Arquivo Henrique Marques Lisboa - Revista a Enfermagem em Minas
Fontes consultadas no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte
Título Data Pág. Referência
No lar dos que não têm lar. Asilo Bom Pastor
17/01/34 3, 4 Revista Bello Horizonte nº17 c.15x-014
Curso Gratuito; Economia do Lar. Companhia Força e Luz
05/09/33 3 Revista Bello Horizonte nº05 c.15x-014
Leiteiria Cinedia: doação Orfanato Santo Antônio
Out./1936 27 Revista Bello Horizonte nº 72 c.15x-020
198
II Congresso Eucarístico: D. Cabral, D. Leme e as filhas do Sr. Benedito Valadares.
Out./1936 35 Revista Bello Horizonte nº 72 c.15x-020
Partido Feminista de Minas Gerais
Ago./1937 36 Revista Bello Horizonte nº 83 c.15x-026
Pio XI: a maior figura do século
Fev./1939 21 Revista Bello Horizonte nº 101 c.15x-030
Colégio Santa Maria: discurso oradora da turma
Jul./1939 77,78 Revista Bello Horizonte nº 106 c.15x-034
Creche Menino Jesus Set./1939 67 Revista Bello Horizonte nº 107 c.15x-035
Festa da Infância, Normalista, Escola de Aperfeiçoamento
Jan./1940 Revista Bello Horizonte nº 111 c.15x-036
Natal Solidário D. Clelia Araujo esposa do Sr. José Oswaldo de Araújo e Berenice Magalhães Pinto – Meninos no Orphanato Santo Antônio, Hospital São Geraldo, Creche Menino Jesus, Hospital São Francisco e São Vicente
Jan./1940 Revista Bello Horizonte nº 111 c.15x-036
2ª Semana Odontológica Mineira – Atendimento Infantil
Abr./1940 65,66 Revista Bello Horizonte nº 114 c.15x-037
Visita a BH: Caravana de Acadêmicos da Faculdade Nacional de Odontologia da Universidade do Brasil – Homenagem prestada pela Chimica Bayer
Ago./1940 53 Revista Bello Horizonte nº 119 c.15x-042
Sobre as Instalações do Hospital São Lucas: D. Cabral, Benedito Valadares, os médicos Dr. José Maria Alkim diretor da Penitenciária de Neves e provedor da Santa Casa, Dr. Júlio Soares diretor do São Lucas e J. Castilho Jr. Diretor da Saúde Pública
Nov./1940 41 Revista Bello Horizonte nº 122 c.15x-044
Novas enfermeiras pela Escola Carlos Chagas e voluntárias socorristas da Liga Brasileira de Assistência de Minas
Jan./1943 44 Revista Bello Horizonte nº 148 c.15x-045
Relatórios dos Prefeitos da Cidade de Belo Horizonte
1922/1941
199
Fontes consultadas na Hemeroteca Histórica de Minas Gerais
Jornal “Minas Gerais”
Revista do Ensino
200
Anexo 1 Perfil das Mulheres Associadas
NOME ASS. FORMAÇÃO FAMÍLIA/SOCIABILIDADE OUTRAS INFORMAÇÕES
Adelaide Augusta de Paiva/Paula Brandão
CCF Casada com Martiniano de Paula Brandão. Irmã do vice-almirante Francisco Augusto de Paiva Brandão. Filha de Francisca de Paula Sanches e Francisco de Paiva Bueno. Irmã do Júlio Bueno Brandão. Linhagens Sanches Bueno e Brandão da Silva. Bandeirante Anhanguera.
Diretoria Obras sociais e da caridade de Lourdes.
Alexandrina Santa Cecília
CCF Professora da Escola Normal Modelo, na cadeira Trabalhos Manuais e Costura. Assumiu durante um tempo a cadeira de Ginástica.
Fundou a Sociedade Mineira de Assistência à Infância, da qual era presidente, em 1932. As reuniões aconteciam no Hospital da Criança, anexo à Santa Casa de Misericórdia. Em 1934. Lecionava as disciplinas: Costura e Trabalhos de Agulha (1907), Costura e Trabalhos Manuais (1910), Trabalhos Manuais e Economia Doméstica (1916). Foi a redatora do primeiro regimento interno da Escola. Em 1916 fez uma viagem ao Rio de Janeiro para comparar o programa de sua cadeira de Escola Normal de Belo Horizonte com a da Escola Normal do Rio de Janeiro. Presidente da Comissão Assistência e Caridade da CFC. Quem toma posse e recolhia as contribuições das associações. Presidente do Pensionato Nossa Senhora Auxiliadora. Benfeitora Creche Menino Jesus. Trabalhava com dr. Furtado de Menezes na Comissão Assistência e Caridade. Fundadora da Sociedade São Vicente de Paula em Minas Gerais. Presidente da Associação das Senhoras da Caridade.
Alice Sigaud
Mães Cristãs
Mãe do Médico Sigaud Asylo Bom Pastor. Presidente da Cruzada
201
Santa Terezinha do Menino Jesus.
Aline Marques
CCF Doação Fundação Balbina Araújo.
Alzira Malard Pires
CCF De Belo Horizonte. Esposa de Antônio Augusto Malard.
Secretária da Comissão Descanso festivo. Diretoria Obras sociais e da caridade de Lourdes.
Ana Mesquita Assunção
Mães Cristãs
Tesoureira Mães Cristãs/Sagrado Coração de Jesus. Responsável pelo culto da Saudade da Santa Casa de Misericórdia.
Angelina Catão
CCF Amiga de Constância Guimarães, filha de Bernardo Guimarães e irmã de Alphonsus Guimarães, poeta mineiro. Viúva. Provavelmente foi casada com Francisco Catão. Estudou na Escola de Farmácia de Ouro Preto. Formou-se também em Faculdade de Medicina, atuou como médica no Hospital Nossa Senhora das Dores. Lecionou na Faculdade de Direito da UFMG, ensinando Higiene Pública e Medicina Legal. Faleceu em 07/09/1926.
Comissão Descanso Festivo. Presidente da Seção Feminina do apostolado da oração do Sagrado Coração de Jesus, na paróquia Nossa Senhora das Dores
Anitta Santa Cecília
CCF FM
Professora Comissão Assistência e Caridade. Escrevia na Coluna Feminina do Horizonte, temas ligados à educação e à catequese. Traduções dos Trabalhos do Sistema Montessori. Em seus textos, ressalta a preocupação com a assistência moral das mulheres operárias.
Anita Assumpção
CCF Professora Comissão Escolas
Anna Silva
CCF Santificação e Família
Antonieta Souza Silva
Mães Cristãs
Conselheira Mães Cristãs/Sagrado Coração de Jesus
Aracy Sperling Soares de Moura
Viúva de Raul Soares Uma das diretoras da Associação Protetora do Asylo Bom Pastor
202
Augusta C. Chagas
CCF Parentesco Carlos Chagas Comissão Caridade e assistência popular. Senhora da Caridade da Boa Viagem. Curso de Catecismo “Nossa Senhora do Carmo” na Olaria Perto da Vila Mendonça.
Aurea Tavares Santos
CCF Diretoria Obras sociais e da caridade de Lourdes
Aureliza Teixeira
CCF Professora Comissão Escolas
Benvinda Coelho
CCF Presidente da Associação de Santa Efigênia
Beralda Nunes de Faria
Asylo Bom Pastor
Berenice Catão de Magalhães Pinto
Casada com José de Magalhães Pinto, governador de Minas, advogado, banqueiro. Ver relação dela com Dr. Francisco Catão, médico da santa Casa e professor de Física do Colégio Nossa Senhora das Dores.
Organizava o Natal Solidário – Meninos no Orphanato Santo Antônio, Hospital São Geraldo, Creche Menino Jesus, Hospital São Francisco e São Vicente. Juntamente com D. Clelia Araujo, esposa do Sr. José Oswaldo de Araújo
Branca Thereza de Carvalho Vasconcelos
CCF Professora de Música na Escola Normal Modelo
Oferecia curso para catequistas. Professora da cadeira de Música. Participou da comissão que elaborou o 1º Regimento da Escola Normal Modelo. Escrevia na Revista do Ensino. Vice-Presidente da Comissão Escolas CCF. I Congresso do Ensino Primário. Comissão Canto.
Carmem Leal
CCF Professora da Escola Normal Modelo no Curso Adaptação – Trabalhos Manuais e Modelagens
Imprensa – Boa Viagem Escrevia na Revista do Ensino
Carolina Tavares
CCF Santificação da Família
Cecília Affonso Alvarenga
Professora Diretora do Grupo Escolar Thomas Brandão da Paróquia de Lourdes (1932)
Casada com Henrique Bernardino de Alvarenga. De Uberaba, iniciou o curso de Odontologia e depois transferido para Escola de Odontologia de Belo Horizonte. Teve 7 filhas.
Escrevia Horizonte: mulher e política
203
Membro da Seção Técnica do Conselho Superior da Instrução
Cecília de Freitas
Mães Cristãs
Ver relação com João Batista Freitas Alves. Formado em Farmácia, em Ouro Preto (1894). Formou-se em Medicina no Rio de Janeiro, em (1910). Participou da fundação do Orfanato Santo Antônio e do Instituto de Assistência e Proteção à Infância de Belo Horizonte. Criou o Hospital São Vicente. Provavelmente era filha dele.
Conselheira Mães Cristãs/Sagrado Coração de Jesus
Célia Miranda Ribeiro
FM Cliente amiga do Dr. Borges da Costa. Morava no bairro de Lourdes.
Presidente das Filhas de Maria do Colégio Santa Maria. Realização de Festival de arte no Teatro Municipal de Belo Horizonte para construção do Seminário do Coração Eucarístico. Orquestra Symphonica, Comédia. Participação de várias senhorinhas. Presidente da Comissão da Obra das Vocações.
Clarinda Proença Costa Sigaud
Mães Cristãs
Ver ligação com Cléa C. Sigaud que assinava doc. Da Secretaria da Educação e Saúde Pública (1936). Em pedido de inscrição Escola de Enfermagem Carlos Chagas. Ver ligação também com o médico ginicologista Dr. Eugenio Sigaud, que tinha um grande consultório em Belo Horizonte. Ressaltava-se no Horizonte seu espírito de caridade.
Vice Presidente das Mães Cristãs/Sagrado Coração de Jesus Trabalhou nas comissões para receber o bispo D. Cabral. Arrecadação de Fundos.
Clelia Continentino de Araújo
Esposa do dr. José Oswaldo de Araújo (professor da Faculdade de Letras de Minas Gerais, empresário). Foi prefeito de Belo Horizonte entre 1938/1940. Clélia de Campos Continentino (1894-1988), natural de Oliveira, MG, filha do desembargador João Pereira da Silva Continentino e de Amanda de Campos Continentino.
Natal Solidário – Meninos no Orphanato Santo Antônio, Hospital São Geraldo, Creche Menino Jesus, Hospital São Francisco se São Vicente
Clelia CCF Presidente das Vocações
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Miranda Sacerdotais
Clotilde Machado Barbosa
CCF Enfermeira Filha de José Machado Barboza e D. Maria Carolina Machado Barbosa. Nasceu em junho de 1907.
Damas da Caridade (Boa Viagem). Aula catecismo Diploma Secundário Izabela Hendrix Inscrição na Escola de Enfermagem Carlos Chagas (1933). Na ocasião, tinha 26 anos. Solteira. De Curvello. Trabalhou como enfermeira da Inspetoria Médica Escolar por 7 anos. Referências: Dr. José Castilho Jr., médico escolar e diretor de Saúde Pública, e Dr. Horacio Andrade. Senhora da Caridade Boa Viagem Fazia parte da Mesa Administrativa da Irmandade Santa Efigênia da Polícia Militar de Minas Gerais.
Conceição Magalhães
CCF Professora do Grupo Escolar Henrique Diniz e na Escola Isolada da Serra Sandoval Azevedo.
Comissão Escolas
D. Elisa Evangelina Miranda Lima
CCF Professora
Casada com Manuel Correa Ribeiro. Sua filha, Gercyna Elisa Ribeiro, era farmacêutica diplomada pela Escola de Farmácia e Odontologia de Alfenas. Filha do Dr. Oscar Negrão de Lima
Vice provedora da Irmandade de Santa Efigênia dos Militares. Presidente das Damas da Caridade de Santa Efigênia – realizava casamentos eclesiásticos. Substituiu Alexandrina de Santa Cecília por dois meses na presidência da Comissão Assistência e Caridade.
D. Elza Pereira das Neves
Professora de Álgebra. Escola Profissional Nilo Peçanha (RJ)
Participação no Congresso Eucarístico Nacional – Tese “A Eucaristia Ação Católica da Juventude Feminina e sua vida no lar.
D. Epaminondas Pires
Mães Cristãs
Conselheira. Mães Cristãs/Sagrado Coração de Jesus.
D. Maria de Vasconcelos
CCF Presidente da Comissão Fé e Moral da CFC. Diretora da CFC.
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D. Maria Margarida Pires
CCF Professora Utilizada como referência na ficha de inscrição de Maria Cyrino Rodrigues na Escola de Enfermagem. Morava na Rua Claudio Manoel (1934). Substituía a secretária da CFC. Ministrava aula de catecismo na Vila Santa Isabel para adultos Fundou no Jardim em sua casa um Jardim Eucarístico com apoio da Comissão Piedade e Culto. Senhora da Caridade da Boa Viagem. Curso de Catecismo “nossa Senhora do Carmo”, na Olaria Perto da Vila Mendonça.
Diva Andrade de Magalhães Gomes
CCF Normalista Professora da classe infantil da Escola anexa à Escola Normal Modelo
Filha de Carlos Thomas de Magalhães Gomes e Guiomar Andrade de Magalhães Gomes. Ouro Preto. O pai era médico botânico, político e professor. Diplomado na Faculdade do Rio de Janeiro. Ver ligação com engenheiro Américo Magalhães Gomes – projeto cidade Ozanam Ver sobre Fernando Magalhães Gomes.
Imprensa Conselheira do Pensionato Nossa Senhora Auxiliadora e Centro das ex-alunas salesianas. Apresentou teses sobre a coeducação no I Congresso Feminino Mineiro.
Dulce Alvim da Silva
CCF Fundou a Sociedade Mineira de Assistência à Infância (secretária)
Elisa Brandão
CCF Fazia parte da Mesa Administrativa da Irmandade Santa Efigênia da Polícia Militar de Minas Gerais.
Elvira Brandão
CCF Professora Comissão Escolas. Escrevia na Revista do Ensino. No I Congresso de Educação Primária atuou como membro da comissão Questões de Pedagogia e Programas.
Emilia Crurau
CCF Professora Comissão Escolas. Curso de catecismo.
Ermelinda Sacramento
CCF Santificação e Família.
Esther Pires
CCF FM
Presidente da Juventude Feminina de BH. Presidente da Pia União das Filhas de Maria da Boa
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Viagem.
Euridice Paula e Silva
Instalação da Liga Eleitoral do Barro Preto.
Fanny Gianetti de Moraes
CCF Ver Ligação com Américo Rene Gianetti
Fundou Sociedade Mineira de Assistência à Infância (vice-presidente). Benfeitora da Creche Menino Jesus.
Felícia Pereira da Silva
CCF Presidente da Comissão Santificação da Família
Felícia (Raso) Pereira
CCF Esposa do dentista e professor Antônio Pereira da Silva
Presidente da Comissão Santificação e Família. Comissão Assistência e Caridade. Presidente das Damas da Caridade Boa Viagem.
Felinda Tavares
CCF Normalista Comissão Escolas da CFC – escrevia os folhetos e comunicações sobre o ensino religioso.
Francisca da Conceição Miranda Costa
CCF Professora Comissão Assistência e Caridade. Senhora da Caridade da Boa Viagem. Curso de Catecismo “nossa Senhora do Carmo”, na Olaria Perto da Vila Mendonça. Damas da Caridade (Boa Viagem). Aula catecismo.
Gabriela Varella
CCF Professora Comissão escolas.
Georgina Ottoni Chagas
CCF Ecônoma (administradora). Internato das Enfermeiras Escola Carlos Chagas.
Benfeitora Creche Menino Jesus.
Georgina Pires Malard
CCF FM
Normalista. Escola Normal Modelo de BH – contemporânea de Hilda Brandão. Ingressou em 1916
Parentesco com Alzira Pires Malard (provavelmente filha).
Comissão Imprensa da Boa Viagem. Presidente da Pia União das Filhas de Maria da Boa Viagem.
Graziella Coutinho
CCF Comissão Assistência e Caridade. Secretaria das Damas de Caridade da Boa Viagem, São José, Santa Efigênia, e Lourdes.
Guiomar de Sá Fontes
CCF Normalista
Guiomar CCF Santificação e Família.
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Santos Utilizada como referência na ficha de inscrição de Maria Cyrino Rodrigues na Escola de Enfermagem. Morava na rua Rio Grande do Norte.
Henriqueta B.
CCF Normalista Comissão Escolas
Hilda de Paula Ricardo
CCF Normalista. Escola Normal de BH. Contemporânea de Georgina Pires. Ingressou em 1916.
Conferir ligação com Julio Bueno Brandão – político, magistrado e jornalista. Seu pai era comerciante e coronel da Guarda Nacional.
Comissão Assistência e Caridade. Criou serviço de Assistência à Criança Desamparada (1914). Criação da Maternidade Hilda Brandão. Secretaria das Damas de Caridade da Boa Viagem, São José, Santa Efigênia, e Lourdes. Secretária suplente da CCF
Jachyntha Neves
CCF Alguma relação com Cândido Naves, advogado. Presidente da Associação Social Arquidiocesana.
Vice Presidente da Comissão Fé e Moral na CFC. Utilizada como referência na inscrição de Conceição de Castro Santos. Na Escola de Enfermagem Carlos Chagas. Morava na rua Gonçalves Dias (1935). Negociava com advogados “ilustres” (Sete Camâra, Orozimbo Nonato, Mozart Meniconi, Cândido Naves, Mário de Lima e Magalhães Drumond) e com o Secretário de Segurança Pública, a censura de alguns filmes. Trabalhava com o delegado Edgar Frazen de Lima.
Jandyra Gonçalves
Escrevia no Horizonte
Júlia Maria de Viotti
CCF Professora da Escola de Aperfeiçoamento
Família Tradicional de Baependi, no sul de Minas. Ligação nos ramos da medicina e farmácia. Ver ligação com dr.Polycarpo Magalhães Viotti, que foi membro do Conselho Superior de Instrução. Ver Ligação com Armando Viotti de Magalhães, que foi Procurador Geral do Estado.
Secretária da CFC (senhorita). Escrevia na Revista do Ensino – Escola Moderna e Trabalhos Manuais. Escreveu o livro Antropologia das moças mineiras (1932).
LaviniaViotti
Pianista Ver ligação com dr. Polycarpo Magalhães Viotti, que foi membro do Conselho Superior de Instrução.
Pianista que, atuante na Comissão Obra das Vocações, realizou recitais para benefício de tal
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Ver Ligação com Armando Viotti de Magalhães, que foi Procurador Geral do Estado.
comissão.
Leonidia Leite
CCF Mães Cristã
Comissão Descanso Festivo. Presidente da Seção Feminina do apostolado da oração do Sagrado Coração de Jesus, na paróquia Nossa Senhora das Dores. Tem uma rua no bairro Floresta em sua homenagem. Conselheira. Mães Cristãs/Sagrado Coração de Jesus. Presidente da Comissão Piedade e Culto.
Leopoldina Leite
Asylo Bom Pastor
Lourdes Liberal de Lima
Trabalhava na organização dos Festivais, em benefício do Bom Pastor.
Luiza de Santa Cecília
CCF Normalista Imprensa. Montaram pensionato para moças pobres – Secretaria do Pensionato Nossa Senhora Auxiliadora e Centro das ex-alunas salesianas.
Lydia Camietti (senhorinha)
CCF Comissão Descanso Festivo. Vice Presidente da Doutrina Cristã na paróquia Nossa Senhora das Dores.
Maria Gabriela Tavares
CCF Normalista Comissão Escola
Maria Amélia dos Santos Torres
CCF Professora das Classes Anexas à Escola Normal Modelo – ligada ao curso Aplicação.
Casada com o ourives Vicente Pereira de Guimarães Torres. Família de Diamantina. Família tradicional ligada à Mineração.
Maria Amélia Rezende
Professora Escrevia no jornal Horizonte e na Revista do Ensino. Seus textos eram muito lidos pelas associadas. Realizava muitas conferências.
Maria Angelina Vasconcelos
CCF Imprensa. Secretaria do Pensionato Nossa Senhora Auxiliadora e Centro das ex-alunas
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salesianas.
Maria Barreto
CCF Comissão Descanso Festivo. Presidente da Doutrina Cristã, na paróquia Nossa Senhora das Dores.
Maria Cardoso
Comissão Santificação e Família.
Maria Candida
CCF Comissão Escolas.
Maria Christina Braut
CCF Comissão Piedade e Culto. Trabalhou com dr. Araujo Penna para fundação de uma conferência vicentina e Santa Efigênia.
Maria Cintra
CCF Presidente da Comissão Escolas da CFC.
Maria ColletaLanari
Mãe Cristãs
Enfermeira Normalista
Inscrição no Curso Anexo de Cruz Vermelha, da Escola de Enfermagem Carlos Chagas (1937). Natural de Belo Horizonte (1920). Asylo Bom Pastor. Benfeitora da Creche Menino Jesus. Presidente da Associação das Mães Cristãs do Colégio Sagrado Coração de Jesus. Participou da comissão dos Estatutos das Mães Cristãs.
Maria das Dôres Araújo
CCF Comissão Santificação e Família.
Maria das Mercês de Souza e Lima
CCF FM
Professora do Grupo Escolar Barão do Rio Branco e aluna da Escola de Aperfeiçoamento
Parentesco com Dr. Paulo de Souza e Lima
Comissão Escolas. Conselheira das FM do Colégio Santa Maria.
Maria das Mêrces Dutra
CCF Comissão Descanso Festivo. Vice Presidente da Doutrina Cristã na paróquia Nossa Senhora das Dores.
Maria de Lourdes Ribeiro Oliveira
Presidente da Juventude Feminina (moças).
Maria de Lourdes Vianna
CCF
Maria Comissão Assistência e
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Flávia de Azeredo Coutinho
Caridade. Secretaria das Damas de Caridade da Boa Viagem, São José, Santa Efigênia e Lourdes.
Maria Geraldina Monteiro
CCF Comissão Assistência e Caridade. Secretaria das Damas de Caridade da Boa Viagem, São José, Santa Efigênia, e Lourdes.
Maria Gomes Vianna
CCF Família de Santa Bárbara. Pai Antônio Gomes Vianna e mãe Anna do Carmo.
Membro da Comissão Santificação da Família na CFC.
Maria Gontijo
CCF Professora Comissão Escolas.
Maria Jardim
CCF Professora Comissão Escolas.
Maria Lana
CCF Professora Comissão Escolas.
Maria José Andrada
CCF Professora Comissão Escolas.
Maria José Amador
CCF Trabalhou como preparadora e zeladora dos laboratórios da Escola Normal Modelo. Depois assumiu a cadeira de Biologia e Higiene, do Curso de Aplicação.
Imprensa – Lourdes.
Maria José Borges da Costa
CCF Esposa do médico Borges da Costa. Filha do coronel Augusto Halfeld e da Sra. D. Maria José Halfeld. Borges da Costa era diretor da faculdade de medicina e do Instituto Radium da capital. Nasceu em Juiz de Fora, em 18/02/1884. Sua família materna era descendente de alemães. Forte laço de amizade com Maria Luiza de Almeida Cunha
Maria José Santos Cintra
CCF FM
Presidente das Damas da Caridade Boa Viagem. Comissão Caridade e Assistência. Conselheira da FM do Colégio Santa Maria.
Maria Luiza de
CCF Mãe
Professora Psicóloga
Maria Luiza de Almeida Cunha, casada com Roberto
Na década de 1960. Maria Luiza foi professora de
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Almeida Cunha
Cristã
de Almeida Cunha, médico formado pelo Instituto Manguinhos, e que se mudou para Belo Horizonte para clinicar, com a possibilidade de tratamento da tuberculose. Foi importante militante católico.
Filosofia da Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Participou da Reforma Universitária dessa instituição e, juntamente com as professoras Alda Lodi, Alaíde Lisboa de Oliveira, Carlos dos Anjos Duarte de Andrada e Magda Soares, fundou o primeiro departamento de Pedagogia e Didática Universidade. Preocupada com as práticas pedagógicas do seu tempo, os artigos de Maria Luiza na Revista do Ensino tratavam especialmente do ensino primário, privilegiando os temas: finalidades da escola moderna; impressões sobre os métodos de ensino; orientações didáticas e pedagógicas aos professores, com o intuito de despertar a vontade e a disciplina do aluno, o gosto pela leitura e pela experimentação; e a psicologia. Além dessas questões, foi encarregada de elaborar o Programa de Ensino Religioso dentro das tendências pedagógicas da época. Responsável pela coluna Feminina do jornal Horizonte. Conselheira das Mães Cristãs/Sagrado Coração de Jesus. Inspetoria Técnica da Escola de Enfermagem Carlos Chagas. Presidente da Liga Feminina da Ação Católica (senhoras). Publicou artigos na revista A enfermagem em Minas. Ministrou nos anos de 1936/1937 a disciplina Ação Social; na EECC. Responsável pela elaboração dos estatutos da Associação das Mães Cristãs. Presidente da Liga
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Feminina de Ação Católica destinada a senhoras.
Maria P. Oliveira
CCF Professora Contribuinte do Hospital São Vicente de Paula.
Maria Pena Magalhães
CCF Imprensa. Conselheira do Pensionato Nossa Senhora Auxiliadora e Centro das ex-alunas salesianas..
Maria Ruas Santos
CCF Conselheira do Pensionato Nossa Senhora Auxiliadora e Centro das ex-alunas salesianas.
Maria Seminário Oliveira
CCF Professora Comissão Escolas.
Marieta Brochado
CCF Professora do Grupo Escolar Barão do Rio Branco e aluna da Escola de Aperfeiçoamento. Diretora do Grupo Escolar Barão de Macaúbas.
Relação com Sinfrônio Brochado. Escola com seu nome em Belo Horizonte. Família Brochado tinha grande relação de amizade com os Borges da Costa. Em um dos seus terrenos foi construído o colégio Imaculada Conceição. Trabalhavam na paróquia de Lourdes.
Assistência e Caridade e Vocações Sacerdotais. Presidente das Damas da Caridade de Lourdes. No I Congresso Primário atuou nas comissões: Desenho e Trabalhos Manuais, Organização Geral do Ensino, Higiene Escolar e Educação Física.
Marieta Viotti
CCF Ver ligação com dr. Polycarpo Magalhães Viotti, que foi membro do Conselho Superior de Instrução. Ver Ligação com Armando Viotti de Magalhães, que foi Procurador Geral do Estado.
Secretária da Confederação, responsável pelas Atas.
Marietta Teixeira de Salles
CCF Enfermeira EECC
Casada com Manoel Teixeira de Salles. Filhos: José Bento Teixeira de Salles (jornalista importante), João Cláudio Teixeira de Salles (construção da Usiminas, relações internacionais). Natural de Santa Luzia.
Trabalhou como enfermeira no Laboratório de Pesquisa de Belo Horizonte. Atuava na Legião Brasileira da Boa Vontade.
Marina Amaral Brandão
CCF Fundou Sociedade Mineira de Assistência à Infância (tesoureira).
D. Maria da Conceição conhecida Marocas Franco
CCF Irmã de José Augusto Juquinha Franco de Almeida. Filha de Francisco Franco de Almeida, Chico Franco. Natural de Juiz de Fora.
Asylo Bom Pastor. Presidente da Comissão Fé e Moral e Vocações Sacerdotais da CFC. Dialogava com o delegado Edgar Frazen de Lima.
Nieta Vasconcelos
CCF Imprensa. Vice-Presidente do Pensionato Nossa Senhora Auxiliadora e Centro das ex-alunas salesianas.
Noemi CCF Professora Parentesco com Joaquim Comissão Escolas
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Porto Menezes
Furtado de Menezes (engenheiro, farmacêutico, político, professor e jornalista). Sua esposa, Zaira Porto de Menezes, era presidente da Sociedade São Vicente de Paula.
Nolasquina de Moura
CCF Professora Comissão escolas.
Odila Dias de Oliveira
CCF Presidente da Associação Damas da Caridade de Lourdes.
Ophelia Paiva
CCF Professora escola na Pampulha
Membro das Damas da Caridade Floresta.
Ruth Garcia de Paiva
Trabalhava na organização dos festivais em benefício do Bom Pastor.
Senhora Borges da Costa
Esposa do médico Borges da Costa, formado na faculdade de medicina do Rio de Janeiro. Trabalhava na clínica cirúrgica da Santa Casa de Belo Horizonte. Participou da Fundação da Faculdade de Medicina de Minas Gerais. Membro da Associação Médico-Cirúrgica de Minas Gerais. Reitor da Universidade Federal de Minas Gerais. Contribuiu para a instauração do Instituto Radium.
Asylo Bom Pastor. Moça ilustre de Minas Gerais.
Senhora Cel. Artur Vianna
Asylo Bom Pastor.
Senhora Desembarg. Souza e Lima
Asylo Bom Pastor.
Senhora Dr. Cristiano Guimarães
Asylo Bom Pastor.
Senhora Dr. Paulo Alvim
Asylo Bom Pastor.
Senhora Edgar Franzen de Lima
Esposa de Edgar Frazen de Lima, irmão de Mário de Lima, importante militante católico, especialmente no campo da educação. Edgar foi delegado da Delegacia de Costume e Jogos.
Asylo Bom Pastor. Esteve presente nas comissões para receber o bispo D. Cabral. Trabalhou para arrecadar fundos para o evento.
Ester Franzen de Lima
Normalista e Inspectora de alunas na Escola Normal
Esposa do dr. Bernardino de Lima.
Associação das Mães de Família do grupo escolar Bernardo Monteiro.
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Modelo
Senhora Faustino Assumpção
Asylo Bom Pastor.
Senhora Fernando Penna
Asylo Bom Pastor.
Senhora Hugo Werneck
Esposa do Médico Hugo Werneck, primeiro médico ginecologista de Belo Horizonte. Membro da comissão do Bispado de Belo Horizonte. Primeiro Presidente do Banco da Lavoura de Minas Gerais. Participou da criação da Faculdade de Minas Gerais, do Hospital Maternidade Hilda Brandão e do Sanatório Hugo Werneck. Destacou-se na assistência e caridade por serviços prestados aos pobres
Asylo Bom Pastor.
Elza Marques
Trabalhava na organização dos festivais em benefício do Bom Pastor.
Sr. D. Alayde Andrade
CCF Realização do Festival de Arte no Teatro Municipal de Belo Horizonte para construção do Seminário do Coração Eucarístico. Orquestra Symphonica, Comédia. Participação de várias senhorinhas. Tesoureira e Presidente da Comissão da Obra das Vocações
Sra. Dr. Benedito dos Santos
CCF Festejo de aniversário da Seção Feminina.
Sra. Luiz Alves
Esposa do professor da Faculdade de Direito de Belo Horizonte. Cargos políticos importantes. Ministro da Justiça e Membro da Comissão de Bispado de Belo Horizonte.
Com ajuda de outras senhoras e dos drs. Magalhães Castro, Clodovil Pinto Coelho e João Machado, em 1924, conseguiram abrir uma Seção de Preservação para a entrada de crianças de 6 anos.
Sta Maria C. Miranda e sua filha Terezinha
Trabalhava na organização dos festivais em benefício do Bom Pastor
Sta. Dinorah Faria
Possível marido: Othon Leão Bezerra de Mello.
Sta. G. Trabalhava na organização
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Pimenta Gracinda
dos festivais em benefício do Bom Pastor.
Sylvia Guarany
CCF Imprensa – Lourdes. Fazia parte da alta sociedade. Data de aniversário anunciada na grande imprensa belo-horizontina.
Úrsula Aleixo
CCF Professora Irmã de Pedro Aleixo, advogado, professor e político. Família tradicional de Mariana/Ouro Preto. Pedro Aleixo foi Presidente da Associação de Assistência ao Pequeno Jornaleiro, criada em parceria com Helena Antipoff.
Comissão Escolas. Associações da Floresta.
Zelinda Tavares
CCF Normalista Comissão Escolas.
Fonte: Elaborada pela autora com dados extraídos de fontes diversas.