UNIVERSIDADE ANHANGUERA DE SÃO PAULO · UNIVERSIDADE ANHANGUERA DE SÃO PAULO PEDRO MATEUS...
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UNIVERSIDADE ANHANGUERA DE SÃO PAULO
PEDRO MATEUS
DERIVADAS DE FUNÇÕES REAIS DE UMA VARIÁVEL REAL E INTEGRAL DE
RIEMANN: CONSTRUÇÃO E APRENDIZAGEM DE CONCEITOS MEDIADAS
POR MÍDIAS E PRÁTICAS USUAIS
SÃO PAULO
2014
UNIVERSIDADE ANHANGUERA DE SÃO PAULO
CONSELHO DA PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
PEDRO MATEUS
DERIVADAS DE FUNÇÕES REAIS DE UMA VARIÁVEL REAL E INTEGRAL DE
RIEMANN: CONSTRUÇÃO E APRENDIZAGEM DE CONCEITOS MEDIADAS
POR MÍDIAS E PRÁTICAS USUAIS
Tese submetida à banca examinadora da
Universidade Anhanguera de São Paulo, como
exigência para defesa de Tese para obtenção do título
de Doutor em Educação Matemática, sob a
orientação da Professora Doutora Marlene Alves
Dias.
SÃO PAULO
2014
PEDRO MATEUS
DERIVADAS DE FUNÇÕES REAIS DE UMA VARIÁVEL REAL E INTEGRAL DE
RIEMANN: CONSTRUÇÃO E APRENDIZAGEM DE CONCEITOS MEDIADAS POR
MÍDIAS E PRÁTICAS USUAIS
TESE APRESENTADA À UNIVERSIDADE ANHANGUERA DE SÃO PAULO COMO
EXIGÊNCIA DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MATEMÁTICA
Presidente e Orientador
Nome: Marlene Alves Dias
Titulação: Doutora em Matemática – Universidade Dennis Diderot – Paris 7
Instituição: Universidade Anhanguera de São Paulo
Assinatura: _________________________________________________
2º Examinador
Nome: Saddo Ag Almouloud
Titulação: Doutor em Matemática e Aplicações– Universidade de Rennes I
Instituição: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUCSP
Assinatura: __________________________________________________
3º Examinador
Nome: José Luiz Magalhães de Freitas
Titulação: Doutor em Didática da Matemática– Universidade Montppellier 2
Instituição: Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
Assinatura: __________________________________________________
4º Examinador
Nome: Maria Helena Palma de Oliveira
Titulação: Doutora em Psicologia Aprendizagem e Desenvolvimento Humano – USP
Instituição: Universidade Anhanguera de São Paulo
Assinatura: _________________________________________________
5º Examinador
Nome: Ruy Pietropaolo
Titulação: Doutor em Educação Matemática - PUCSP
Instituição: Universidade Anhanguera de São Paulo
Assinatura: __________________________________________________
Biblioteca
Bibliotecário: _____________________________________________________
Assinatura: _______________________________________DATA___/___/___.
São Paulo, ___ de __________de ___.
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar gostaria de agradecer à minha orientadora, Professora Doutora
Marlene Alves Dias, pela sua paciência, humildade e abnegação no acompanhamento deste
trabalho, com seus brilhantes conhecimentos da área. Agradeço à Professora Doutora Tânia
Maria Mendonça Campos, Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação
Matemática da Universidade Anhanguera de São Paulo, que perante dificuldades de várias
ordens, não mediu esforços em aceitar que o estudo fosse realizado nessa Universidade.
Estou grato aos Professores Doutores Saddo Ag Almouloud, José Luiz Magalhães de
Freitas, Maria Helena Palma de Oliveira e Ruy Pietropaolo, pelas notáveis contribuições
apresentadas na fase de qualificação para o aprimoramento desse trabalho.
À CAPES, agência financiadora do Governo Brasileiro, vai meu profundo
agradecimento pela provisão da bolsa de estudos que tornou possível a produção desta pesquisa e
a minha permanência em São Paulo, participando das atividades acadêmicas do programa.
Agradeço aos Professores do Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da
Universidade Anhanguera de São Paulo, pela sua contribuição na realização, com sucessos, das
diversas atividades acadêmicas do curso.
Um agradecimento para os meus colegas do programa pelos seus prestimosos exemplos
de convívio saudável e colaboração em São Paulo. Em especial, aos colegas Rosivaldo Santos
pela sua pré-disposição em ajudar, em particular, na leitura de alguns capítulos do trabalho,
colocando algumas formulações do texto na perspectiva brasileira correta; Tarciso Leão pela sua
liderança na discussão do grupo na disciplina de Tópicos de Probabilidade e Estatística; e aos
demais, que direta ou indiretamente tiveram alguma contribuição no desenvolvimento da
pesquisa.
Meus agradecimentos se estendem aos funcionários da secretaria da Pós-Graduação:
Guilherme Galvão de Menezes, Anália de Oliveira e Débora Brito que sempre se mostraram
prontos para resolver qualquer situação burocrática.
À Profa. Antonia Cileide Pereira vai meu inestimável agradecimento pela sua abnegada
correção do texto final da tese.
Reitero, não obstante que, as entidades e as pessoas que tanto contribuíram para este
trabalho não são, de modo algum, responsáveis por quaisquer equívocos que outros venham a
descobrir, mas sim, da minha responsabilidade.
Meus profundos agradecimentos vão para os estudantes que, voluntariamente,
participaram da pesquisa dando as suas valiosas contribuições a partir de suas experiências
acadêmicas e de seus modos de pensar. Meus agradecimentos se estendem aos colegas docentes
do curso de Licenciatura em Ensino de Matemática da Universidade Pedagógica – Delegação da
Beira, que com muita à vontade colaboraram na realização do estudo, especialmente:
- À família Draisma: Professora Dra Frouke Draisma e Professor Doutor Jan Draisma
pelos seus digníssimos ensinamentos desde à LEMEP até a elaboração desta tese;
- Ao Professor Doutor Marcelino Caetano Luís, pelo encorajamento na prossecução do
estudo, pelas observações de correção ao teste diagnóstico e pela organização dos estudantes para
o grupo de discussão;
- Ao Professor Doutor Adelino Evaristo Murimo, pelas observações de correção do teste
diagnóstico; ao Me. Tureva E. C. Vurande, pelo provimento de equipamento para áudio
gravação; ao Dr. Adamo Devi Cuchedza, pela organização do grupo de discussão;
- Ao Dr. Jacinto Ordem, pela convivência salutar e troca de ideias em São Paulo.
Agradeço à Direção da Universidade Pedagógica pela autorização para a prossecução
com os estudos; à Direção da Universidade Pedagógica – Delegação da Beira pela autorização
para a prossecução com os estudos e pelo consentimento de realização do experimento didático
naquela instituição; ao Me. Vasco Tamele pelo reforço em meios de áudio gravação.
Meus agradecimentos se estendem à família Muchanga, em especial aos srs:
- Mateus Mapsuca Muchanga pelo reforço financeiro de viagem à São Paulo;
- Jorge Mapsuca Muchanga pelos encaminhamentos de diversos processos burocráticos
em Maputo; à minha esposa Rosa Mapsuca Muchanga vai meu muito obrigado pelo inestimável
esforço na resolução de questões pertinentes em relação à minha situação estudantil e pela
coragem de enfrentamentos às adversidades decorrentes da minha ausência; aos meus filhos pelo
consentimento da ausência do pai do convívio deles que tanto fez falta;
Por último, vai meu agradecimento aos meus irmãos pelo apoio moral prestado durante
esse tempo todo fora do seu aconchego.
RESUMO
A versatilidade dos conceitos de derivada de funções reais de uma variável real e de integral de
Riemann faz com que eles sejam parte integrante de muitos currículos do Ensino Médio em
alguns países, como Moçambique, e quase indispensáveis em muitos cursos da universidade e, ao
mesmo tempo, temas de dificuldades didático-pedagógicas e de aprendizagem nas instituições de
ensino. Foi na sequência dessas dificuldades que realizamos esta pesquisa procurando responder
à seguinte questão: Quão efetiva é uma mediação didática para a construção e aprendizagem de
conceitos de derivadas de funções reais de uma variável real e de integral de Riemann mediadas
por mídias e práticas usuais? Para responder a essa questão, o objetivo da pesquisa é estudar as
praxeologias didático-matemáticas existentes em alguns materiais de ensino, sobre a derivada de
funções reais de uma variável real e a integral de Riemann, de modo a inserir o Geogebra como
ferramenta de ajuda à reflexão e construção dos conceitos em jogo. Para tal, consideramos
necessário experimentar uma modalidade de ensino e de aprendizagem dos conceitos de derivada
e integral de Riemann de funções reais de uma variável real, incorporando no processo o software
Geogebra, articulado com as mídias e práticas usuais. O referencial teórico central é a Teoria
Antropológica do Didático - TAD de Chevallard, que nos ajudou na análise das relações
institucionais e pessoais das noções consideradas na pesquisa e a Teoria de instrumentação de
Rabardel, a qual usamos para refletir sobre as interações nas sessões experimentais.
Consideramos ainda como referenciais teóricos de apoio: as noções de quadro e mudanças de
quadros introduzidas por Douady, que nos ajudaram na interpretação das formulações das tarefas
nos materiais de ensino e nas sessões experimentais; a noção de níveis de conhecimento
esperados para o funcionamento dos estudantes, segundo definição de Robert, que nos respaldou
na análise das propostas dos materiais de ensino e das sessões experimentais. Foi um estudo de
natureza qualitativa na forma de estudo de caso, tendo recorrido a alguns elementos da
engenharia didática nos seus aspectos de análise institucional, análise cognitiva, concepção e
análise a priori das tarefas preparadas para a experimentação; experimentação; análise a
posteriori e validação interna. A análise das relações institucionais mostrou que: as organizações
didáticas e matemáticas construídas, respectivamente, no programa de ensino e no livro didático
moçambicanos do Ensino Médio, apresentam algumas imprecisões, ambiguidades e discrepâncias
e com incidência nas organizações didático-matemáticas pontuais; os livros usados no Ensino
Superior apresentam uma diversidade de perspectivas, com maior enfoque nas organizações
matemáticas locais. Essa diversidade, se articulada adequadamente, pode ser vantajosa na
realização dos processos de ensino e de aprendizagem. A pesquisa mostrou que a mediação
didática articulada com as mídias e práticas usuais permite uma discussão multiforme e a
construção de conhecimentos pelos estudantes dos conceitos de derivada de funções reais a
valores reais e de integral de Riemann. Tal mediação desencadeia e capitaliza o dinamismo dos
estudantes na sua relação pessoal com o objeto da ação finalizada, uma vez que individualiza a
interação professor-estudante na relação com o conteúdo visado. Constatamos também que as
discussões na sala não obedecem a uma ordem cronológica de etapas de intervenção pedagógica.
Palavras-chave: Mediação didática. Derivada de Funções. Engenharia Didática. Integral de
Riemann. Teoria Antropológica do Didático. Teoria de Instrumentação/instrumentalização.
Níveis de Conhecimentos. Quadro e Mudanças de Quadros.
RÉSUMÉ
La polyvalence des concepts de dérivée des fonctions réelles d'une variable réelle et intégrale de
Riemann, fait que ceux-ci sont partie intégrante de nombreux programmes d'études secondaires dans
certains pays, comme le Mozambique. Ils sont presque indispensable dans de nombreux cours
universitaires, de la même façon que les sujets de difficultés didactiques, pédagogiques, et
d'apprentissage dans les institutions éducatives. Suite à ces difficultés, nous avons effectué cette
recherche visant à répondre à la question suivante: Quelle est l'efficacité d'une médiation didactique,
pour la construction et l’apprentissage des concepts de dérivée des fonctions réelles d'une variable
réelle et intégrale de Riemann médiée par les médias et les pratiques habituelles? Pour répondre à
cette question, l'objectif de la recherche est d'étudier les praxeologies didactiques mathématiques
existants dans certaines matériaux d'enseignement sur la dérivée de fonctions réelles d'une variable
réelle et l'intégrale de Riemann, de façon à insérer le logiciel GeoGebra en tant qu’outil d'aide à la
réflexion et construction des concepts en jeu. Pour cela, nous considérons qu'il est nécessaire de faire
l'expérience d'un mode d'enseignement et d'apprentissage des concepts de dérivé et intégrale de
Riemann, des fonctions réelles d'une variable réelle, incorporant dans le processus le logiciel
Geogebra articulé avec les médias et les pratiques habituelles. Le cadre théorique central est la théorie
anthropologique du didactique - TAD Chevallard, qui nous a aidé dans l'analyse des relations
institutionnelles et personnelles des notions considérées, et la théorie de l'instrumentation de
Rabardel, que nous avons utilisé pour réfléchir sur les interactions dans sessions expérimentales.
Nous considérons aussi en tant que cadres théoriques de soutien, les notions de cadre et changement
de cadres introduites par Douady. Elles ont contribué à l'interprétation des formulations de tâches
dans les matériaux d’enseignement et dans les sessions expérimentales. La notion de niveaux de
connaissance attendu pour le fonctionnement des étudiants selon la définition de Robert, nous a aidés
à examiner les propositions des matériaux pédagogiques et des sessions expérimentales. Il s'agit d'une
étude qualitative sous la forme d'étude de cas, faisant appel à certains éléments de l’ingénierie
didactique sous ses aspects d'analyse institutionnelle, d'analyse cognitive, de conception et d’analyse
à priori des tâches elaborées pour l’expérimentation; l'expérimentation elle même; analyse à
posteriori et la validation interne. L'analyse des relations institutionnelles a montré que: les
organisations mathématiques et didactiques construites respectivement dans le programme
d'enseignement et le manuel du lycée de Mozambique, présentent des inexactitudes, des ambiguïtés et
des incohérences avec des incidences dans les organisations didactiques et mathématiques pontuelles.
Les livres à l'Université présentent une diversité de points de vue, mettant davantage l'accent sur les
organisations mathématiques locales. Si cette diversité est bien articulée, elle peut être avantageuse
pour le processus d'enseignement et d'apprentissage. La recherche a montré que la médiation
didactique articulée avec le médias et la pratique habituelle permet une discussion multiforme et la
construction des connaissances par les étudiants sur les concepts de dérivée des fonctions réelles à
valeurs réelles et intégrale de Riemann. Cette médiation déclenche et capitalise le dynamisme des
étudiants dans leur rapport personnel avec l'objet de l'action réalisées, puisqu’elle individualise
l’interaction enseignant-élève dans le rapport avec le contenu visé. Nous notons également que les
discussions dans la salle ne suivent pas un ordre chronologique des étapes d'intervention
pédagogiques.
Mots-clés: Médiation didactique. Dérivée de fonctions. Ingénierie didactique. Intégrale de Riemann.
Théorie Anthropologique du Didactique. Théorie de l’instrumentation / instrumentalisation. Niveaux
de connaissances. Cadre et changements de cadres.
ABSTRACT
The versatility of the concepts of derivative of real valued-functions of a real variable and the
Riemann integral makes them to be an integrant part of many curricula of secondary education in
some countries, such as Mozambique, and almost indispensable in many university courses and,
at the same time, issues of learning and of difficulties of didactic-pedagogical in educational
institutions. Following those difficulties we conducted this research to answer the following
question: How effective is a didactic mediation for building and learning concepts of derivative
of real valued-functions of a real variable and Riemann integral mediated by media and usual
practices? To answer that question, the goal is to study the existing mathematical and didactical
praxeologies in some teaching materials on the derivative of real valued-functions of a real
variable and the Riemann integral, in order to insert the Geogebra as aid tool for reflection and
construction of concepts in play. To this end, we consider it necessary to experience a teaching
and learning mode of the derivative concepts and Riemann integral of real valued-functions of a
real variable, incorporating in the process the Geogebra software, articulated with the usual
means and practices. The central theoretical framework is the Anthropological Theory of the
Didactic - TAD Chevallard, which helped us in the analysis of institutional and personal
relationships of the considered notions in the research and, the theory of instrumentation by
Rabardel, which we used to reflect on the interactions in the experimental sessions. Also we
consider as support theoretical framework: the notions of setting and changes of settings
introduced by Douady, which helped us in the interpretation of the formulations of the tasks in
the teaching materials and the experimental sessions; the notion of levels of expected knowledge
for the functioning of the students, as defined by Robert, which backed us in examining the
proposals of the teaching materials and the experimental sessions. It was a qualitative study in the
form of case study, having appealed to some elements of the didactic engineering in its aspects of
institutional analysis, cognitive analysis, design and a priori analysis of the prepared tasks for
experimentation; experimentation, a posteriori analysis and internal validation. The analysis of
the institutional relationships showed that: the didactical and mathematical organizations
constructed, respectively, in the educational program and the high school mozambican textbook,
present some inaccuracies, ambiguities and discrepancies and with incidence in the punctual
mathematical and didactical organizations; the books used in higher education present a diversity
of perspectives, with greater focus on local mathematical organizations. This diversity, if
adequately articulated, can be advantageous in achieving the processes of teaching and learning.
The research has shown that the articulated didactic mediation with the media and usual practices
allows a multiform discussion and the construction of knowledge by students to the concepts of
derivative of real valued-functions of real variable and Riemann integral. Such mediation triggers
and capitalizes the dynamism of the students in their personal relationship with the object of
finalized action, since it individualizes the teacher-student interaction with regard to the target
content. We also found that the discussions in the classroom do not follow a chronological order
of pedagogical intervention.
Keywords: Didactical mediation. Derivative of functions. Didactical Engineering. Riemann
integral. Anthropological Theory of the Didactic. Theory of Instrumentation/instrumentalization.
Levels of knowledge. Setting and Changes of Settings.
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – TIPOS DE PESQUISA E ÁREA DA MATEMÁTICA ......................................... 34
FIGURA 2 – TIPO DE TECNOLOGIA ....................................................................................... 34
FIGURA 3 – DISTRIBUIÇÃO DE PAÍSES ................................................................................ 35
FIGURA 4 – INDICADORES DE DIMENSÕES ........................................................................ 37
FIGURA 5– INTERAÇÃO APRENDIZ-COMPUTADOR EM PROGRAMAÇÃO .................. 44
FIGURA 6 – TRANSLAÇÃO E HOMOTETIA HORIZONTAIS: FUNÇÃO QUADRÁTICA 45
FIGURA 7 – SIGNIFICADOS DOS COEFICIENTES: FUNÇÃO QUADRÁTICA E
TRANSFORMAÇÃO REFLEXÃO ............................................................................................. 45
FIGURA 8 – OTIMIZAÇÃO COM O GEOGEBRA. ................................................................... 51
FIGURA 9 – SOMAS APROXIMADAS NO GEOGEBRA. ....................................................... 51
FIGURA 10 – SOMAS DE ÁREAS APROXIMADAS COM O MAPLE. ................................. 55
FIGURA 11 – ESQUEMA CONCEITUAL: ENSINO E APRENDIZAGEM DO CÁLCULO
VIA T1-NSPIRETM
. ....................................................................................................................... 58
FIGURA 12 – ELEMENTOS DA TEORIA ANTROPOLÓGICA DO DIDÁTICO ................... 91
FIGURA 13 – MODELO I.A.S: SITUAÇÕES DE ATIVIDADES MEDIADAS PELO
INSTRUMENTO ........................................................................................................................ 103
FIGURA 14 – MODELO DE NORMAN DE I.A.S. .................................................................. 108
FIGURA 15 – MODELO I.A.S. TRIPOLAR DE HOLLNAGEL .............................................. 109
FIGURA 16 – SUGESTÕES METODOLÓGICAS – CÁLCULO DIFERENCIAL ................ 147
FIGURA 17 – SUGESTÕES METODOLÓGICAS – PRIMITIVA DE UMA FUNÇÃO ........ 148
FIGURA 18 – RESUMO DE TIPOS DE TAREFAS NO LIVRO DO ALUNO ....................... 154
FIGURA 19 – AS NOÇÕES NUMÉRICA INTUITIVA E FORMAL DA DERIVADA .......... 155
FIGURA 20 – VARIAÇÃO DE UMA FUNÇÃO EM RELAÇÃO A VARIAÇÃO DE x ........ 157
FIGURA 21 – STEWART: RETA TANGENTE E SEU DECLIVE. INTRODUÇÃO ............. 162
FIGURA 22 – DERIVADA COMO VELOCIDADE: APLICAÇÃO ........................................ 165
FIGURA 23 – STEWART: DERIVADA DE UMA FUNÇÃO REAL A VALORES REAIS.
DEFINIÇÃO ................................................................................................................................ 166
FIGURA 24 – STEWART: DERIVADA COMO TAXA DE VARIAÇÃO .............................. 167
FIGURA 25 – ÁVILA (2005): INTRODUÇÃO DO CONCEITO DE DERIVADA ................ 169
FIGURA 26 – ÁVILA E A DEFINIÇÃO DA RETA TANGENTE .......................................... 170
FIGURA 27 – RETA TANGENTE COMO LIMITE DAS RETAS SECANTES ..................... 171
FIGURA 28 – SARRICO: INTRODUÇÃO DO CONCEITO DE DERIVADA ....................... 172
FIGURA 29 – DERIVADA DE CARATHÉODORY ................................................................ 173
FIGURA 30 – HOFFMANN & BRADLEY: INTRODUÇÃO AO CONCEITO DE
VARIAÇÕES .............................................................................................................................. 175
FIGURA 31 – RAZÃO INCREMENTAL POR HOFFMANN & BRADLEY .......................... 176
FIGURA 32 – DEFINIÇÃO DA DERIVADA: HOFFMANN & BRADLEY .......................... 177
FIGURA 33 – STEWART: INTUIÇÃO NUMÉRICA PARA LIMITE DA FUNÇÃO ............ 181
FIGURA 34 – STEWART: INTUIÇÃO NUMÉRICA PARA LIMITE DA RAZÃO
INCREMETAL ........................................................................................................................... 181
FIGURA 35 – GEOMETRIA DA REGRA DO PRODUTO ...................................................... 182
FIGURA 36 – STEWART: ÁREA DE UMA REGIÃO SOB A CURVA QUADRÁTICA ..... 185
FIGURA 37 – STEWART: ÁREA (II) DE UMA REGIÃO SOB A CURVA QUADRÁTICA 186
FIGURA 38 – O PROBLEMA DA DISTÂNCIA E A INTEGRAL DEFINIDA ...................... 188
FIGURA 39 – DISTÂNCIA PERCORRIDA COMO LIMITE DA SOMA DE ÁREAS .......... 189
FIGURA 40 – STEWART: DEFINIÇÃO FORMAL DA INTEGRAL DEFINIDA ................. 190
FIGURA 41 – ÁVILA: INTEGRAL DEFINIDA COMO LIMITE DE SOMAS DE ÁREAS .. 192
FIGURA 42 – ÁVALIA: A NORMA DA PARTIÇÃO E A INTEGRAL DEFINIDA ............. 193
FIGURA 43 – SARRICO: ÁREAS SOB UM GRÁFICO DE UMA FUNÇÃO f. ..................... 195
FIGURA 44 – SARRICO: DEFINIÇÃO FORMAL DA INTEGRAL DEFINIDA ................... 195
FIGURA 45 – HOFFMANN & BRADLEY: INTEGRAL DEFINIDA COMO VARIAÇÃO DA
FUNÇÃO f ................................................................................................................................... 198
FIGURA 46 – HOFFMANN & BRADLEY: INTEGRAL DEFINIDA COMO ÁREA SOB O
GRÁFICO DE f ........................................................................................................................... 200
FIGURA 47 – HOFFMANN & BRADLEY: INTEGRAL DEFINIDA COMO ÁREA ............ 200
FIGURA 48 – TAREFA 1 DO TESTE DIAGNÓSTICO ........................................................... 211
FIGURA 49 – ANÁLISE GRÁFICA DA DESCONTINUIDADE DA FUNÇÃO f(x)
=
01
0
xse
xsex
,
, ......................................................................................................................... 214
FIGURA 50 – ESQUEMA DE SINAIS DA 1ª DERIVADA ..................................................... 223
FIGURA 51 – GRÁFICO DA FUNÇÃO f( t) = t3 – 6t
2 + 9t DO TESTE DIAGNÓSTICO ...... 223
FIGURA 52 – GRÁFICOS DE f(t) = t3 – 6t
2 + 9t E DE SUA DERIVADA: TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 224
FIGURA 53 – TEOREMA DE CONFRONTO E SUA APLICAÇÃO ...................................... 229
FIGURA 54 – GRÁFICO DE f(x) =
00
012
xse
xsex
senx
,
, E SUA DERIVADA .................. 230
FIGURA 55 – RETA TANGENTE AO GRÁFICO DE f(x) =
00
012
xse
xsex
senx
,
, EM x = 0 231
FIGURA 56 – GRÁFICO (I) DA FUNÇÃO f(x) = 2sen(2x) + 3 ............................................... 233
FIGURA 57 – GRÁFICO (II) DE f(x) = 2sen(2x) + 3 E ÁREAS APROXIMADAS ................ 237
FIGURA 58 – GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E PARTIÇÕES DE I PARA n = 1, 2, 3 239
IGURA 59 – ÁREA SOB O GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E PARTIÇÃO PARA n = 2
..................................................................................................................................................... 239
FIGURA 60 – ÁREA SOB O GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E PARTIÇÃO PARA n = 4
..................................................................................................................................................... 240
FIGURA 61 – ÁREA SOB O GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E PARTIÇÃO PARA n = 8
..................................................................................................................................................... 240
FIGURA 62 – ÁREA (ii) SOB O GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E A PARTIÇÃO PARA
n = 2 ............................................................................................................................................. 242
FIGURA 63 – ÁREA (ii) SOB O GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E A PARTIÇÃO PARA
n = 4 ............................................................................................................................................. 242
FIGURA 64 – ÁREA (ii) SOB O GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E PARTIÇÃO PARA n
= 8 ................................................................................................................................................ 243
FIGURA 65 – ÁREAS APROXIMADAS DE f(x) = x2, COM I = [0, 1], E n = 1, 2, 4 ............. 247
FIGURA 66 – 1
0
2dxx NO GEOGEBRA ....................................................................................... 247
FIGURA 67 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 1a) DO TESTE DIAGNÓSTICO .. 253
FIGURA 68 – RESPOSTA (I) CONFORME À PERGUNTA 1b) DO TESTE DIAGNÓSTICO
..................................................................................................................................................... 253
FIGURA 69 – RESPOSTA (II) CONFORME À PERGUNTA 1b) DO TESTE DIAGNÓSTICO
..................................................................................................................................................... 254
FIGURA 70 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 1c) DO TESTE DIAGNÓSTICO .. 254
FIGURA 71 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 2a) DO TESTE DIAGNÓSTICO .. 255
FIGURA 72 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 2b) DO TESTE DIAGNÓSTICO . 256
FIGURA 73 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 2c) DO TESTE DIAGNÓSTICO .. 256
FIGURA 74 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 2d) DO TESTE DIAGNÓSTICO . 257
FIGURA 75 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 2e) DO TESTE DIAGNÓSTICO .. 257
FIGURA 76 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 3 DO TESTE DIAGNÓSTICO ..... 258
FIGURA 77 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 1a) DO
TESTE DIAGNÓSTICO ............................................................................................................. 260
FIGURA 78 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 1b) DO
TESTE DIAGNÓSTICO ............................................................................................................. 260
FIGURA 79 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 1c) DO
TESTE DIAGNÓSTICO ............................................................................................................. 261
FIGURA 80 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 2a) DO
TESTE DIAGNÓSTICO. ............................................................................................................ 262
FIGURA 81 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 2b) DO
TESTE DIAGNÓSTICO. ............................................................................................................ 263
FIGURA 82 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 2c) DO
TESTE DIAGNÓSTICO ............................................................................................................. 263
FIGURA 83 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 2e) DO
TESTE DIAGNÓSTICO. ............................................................................................................ 264
FIGURA 84 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 3 DO TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 265
FIGURA 85 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 4 DO TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 266
FIGURA 86 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 1a) DO TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 267
FIGURA 87 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 1b) DO TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 267
FIGURA 88 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 1c) DO TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 268
FIGURA 89 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 2a) DO TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 268
FIGURA 90 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 2b) DO TESTE
DIAGNÓSTICO. ......................................................................................................................... 269
FIGURA 91 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 2c) DO TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 269
FIGURA 92 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 2d) DO TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 269
FIGURA 93 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 2e) DO TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 270
FIGURA 94 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 3 DO TESTE DIAGNÓSTICO
..................................................................................................................................................... 271
FIGURA 95 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 4 DO TESTE DIAGNÓSTICO
..................................................................................................................................................... 271
FIGURA 96 – RESPOSTA EM BRANCO À PERGUNTA 2a) DO TESTE DIAGNÓSTICO 272
FIGURA 97 – TAREFA PARA 2ª SESSÃO: CONTINUIDADE, FUNÇÃO LIMITADA E
CONJUNTO-IMAGEM .............................................................................................................. 278
FIGURA 98 – DISCUSSÃO SOBRE FUNÇÃO CONTÍNUA NA SESSÃO 2 ........................ 278
FIGURA 99 – DISCUSSÃO SOBRE FUNÇÕES LIMITADAS, SESSÃO 2 ........................... 281
FIGURA 100 – RESPOSTA (ii) NÃO CONFORME À PERGUNTA 1a) DO TESTE
DIAGNÓSTICO .......................................................................................................................... 284
FIGURA 101 – ESTUDO DE DOMÍNIO, IMAGEM E CONTINUIDADE ............................. 285
FIGURA 102 – IMAGEM VISUAL (I) DE DOMÍNIO, CONJUNTO-IMAGEM E GRÁFICO
..................................................................................................................................................... 287
FIGURA 103 – IMAGEM VISUAL (II) DE DOMÍNIO, CONJUNTO-IMAGEM E GRÁFICO
..................................................................................................................................................... 287
FIGURA 104 – ESTUDO GRÁFICO (I) DOS ASPECTOS DE UMA FUNÇÃO DEFINIDA
POR PARTES ............................................................................................................................. 289
FIGURA 105 – ESTUDO GRÁFICO (II) DOS ASPECTOS DE UMA FUNÇÃO DEFINIDA
POR PARTES ............................................................................................................................. 290
FIGURA 106 – USO DE GEOGEBRA NO ESTUDO DE FUNÇÕES, SESSÃO 3 .................. 291
FIGURA 107 – ANÁLISE VISUAL: DOMÍNIO, IMAGEM E GRÁFICO DE UMA FUNÇÃO
..................................................................................................................................................... 294
FIGURA 108 – FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES, SESSÃO 3 .......................................... 297
FIGURA 109 – ANÁLISE GRÁFICA (ii): DOMÍNIO, IMAGEM E GRÁFICO DE UMA
FUNÇÃO ..................................................................................................................................... 298
FIGURA 110 – REVISITANDO A CONTINUIDADE DE UMA FUNÇÃO, SESSÃO 3 ....... 298
FIGURA 111 – CONTINUIDADE DE UMA FUNÇÃO: AS POSSIBILIDADES
ALGÉBRICAS E GRÁFICAS .................................................................................................... 299
FIGURA 112 – REVISITANDO CONTINUIDADE DE FUNÇÕES DEFINIDAS POR PARTES
..................................................................................................................................................... 301
FIGURA 113 – GRÁFICO (I) DE UMA FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES, SESSÃO 4 .. 302
FIGURA 114 – ESTADOS DE UMA FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES ........................... 303
FIGURA 115 – GRÁFICO (II) DE UMA FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES, SESSÃO 4 . 304
FIGURA 116 – DOMÍNIO, IMAGEM E GRÁFICO: FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES,
SESSÃO 4 ................................................................................................................................... 304
FIGURA 117 – ESTADOS DE UMA FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES, SESSÃO 4 ....... 306
FIGURA 118 – ERROS GRÁFICOS (I) DE FUNÇÕES DEFINIDAS POR PARTES, SESSÃO
4 ................................................................................................................................................... 308
FIGURA 119 – ERROS GRÁFICOS (II) DE FUNÇÕES DEFINIDAS POR PARTES, SESSÃO
4 ................................................................................................................................................... 309
FIGURA 120 – EQUÍVOCOS COM O CONCEITO DE LIMITE DE UMA FUNÇÃO NUM
PONTO, SESSÃO 4 .................................................................................................................... 310
FIGURA 121 – INTRODUÇÃO GRÁFICA: LIMITE DA RAZÃO INCREMENTAL, SESSÃO
5. .................................................................................................................................................. 311
FIGURA 122 – VISUALIZAÇÃO GRÁFICA (I) DA RAZÃO INCREMENTAL ................... 313
FIGURA 123 – VISUALIZAÇÃO GRÁFICA (II) DA RAZÃO INCREMENTAL. ................ 314
FIGURA 124 – VISUALIZAÇÃO GRÁFICA (III) DA RAZÃO INCREMENTAL. ............... 315
FIGURA 125 – A RAZÃO INCREMENTAL, VISUALIZAÇÃO GRÁFICA E NUMÉRICA 316
FIGURA 126 – DERIVADA DE UMA FUNÇÃO EM UM PONTO, SESSÃO 7 .................... 323
FIGURA 127 – RETAS TANGENTES: GRÁFICOS DE FUNÇÕES QUADRÁTICA E AFIM
..................................................................................................................................................... 324
FIGURA 128 – TAXAS DE VARIAÇÃO DE FUNÇÕES QUADRÁTICA E AFIM .............. 325
FIGURA 129 – RAZÃO INCREMENTAL DE UMA FUNÇÃO COM O GEOGEBRA .......... 326
FIGURA 130 – VERIFICAÇÃO GRÁFICA DO DECLIVE DE UMA RETA POR DOIS
PONTOS ...................................................................................................................................... 327
FIGURA 131 – CÁLCULO ALGÉBRICO DO LIMITE DA RAZÃO INCREMENTAL ........ 327
FIGURA 132 – O CÁLCULO DO LIMITE DA RAZÃO INCREMENTAL PELO GRUPO 2 328
FIGURA 133 – CÁLCULO DO LIMITE DA RAZÃO INCREMENTAL ............................... 329
FIGURA 134 – SIMPLIFICAÇÃO DA RAZÃO INCREMENTAL ......................................... 330
FIGURA 135 – CÁLCULO DA DERIVADA EM UM PONTO POR SUBSTITUIÇÃO NA
FUNÇÃO DERIVADA ............................................................................................................... 330
FIGURA 136 – CORREÇÃO DA SIMPLIFICAÇÃO DA RAZÃO INCREMENTAL ............ 331
FIGURA 137 – CORREÇÃO DO CÁLCULO DO LIMITE DA RAZÃO INCREMENTAL .. 331
FIGURA 138 – VISTA DA DERIVADA, SESSÃO 7. .............................................................. 332
FIGURA 139 – RETAS TANGENTES A UMA PARÁBOLA E A UMA FUNÇÃO AFIM ... 333
FIGURA 140 – TAXAS DE VARIAÇÃO DAS FUNÇÕES QUADRÁTICA E AFIM ........... 334
FIGURA 141 – DIFERENCIABILIDADE/NÃO DIFERENCIABILIDADE DE UMA FUNÇÃO
EM UM PONTO ......................................................................................................................... 335
FIGURA 142 – ANÁLISE GRÁFICA (I) DE DECLIVES PARA ESTUDAR A
DERIVABILIDADE DE FUNÇÕES EM UM PONTO ............................................................. 337
FIGURA 143 – GRÁFICO DA FUNÇÃO f(x) =
51751
5122
,,,
,,
xse
xsexx ........................................ 339
FIGURA 144 – ANÁLISE GRÁFICA (II) DE DECLIVES PARA ESTUDAR A
DERIVABILIDADE DE FUNÇÕES EM UM PONTO ............................................................. 339
FIGURA 145 – DIFERENCIABILIDADE/NÃO DIFERENCIABILIDADE DE UMA FUNÇÃO
EM UM PONTO ......................................................................................................................... 342
FIGURA 146 – EXISTÊNCIA OU NÃO DA DERIVADA DE UMA FUNÇÃO EM UM
PONTO ........................................................................................................................................ 344
FIGURA 147 – VERIFICAÇÃO ALGÉBRICA DA DERIVADA DE UMA FUNÇÃO EM UM
PONTO ........................................................................................................................................ 345
FIGURA 148 – FEEDBACK COMPUTACIONAL ERRADO DA NÃO EXISTÊNCIA DA
DERIVADA DE UMA FUNÇÃO EM UM PONTO ................................................................. 346
FIGURA 149 – TENTATIVAS ALGÉBRICAS PARA DETERMINAR A DERIVADA DE
UMA FUNÇÃO NUM PONTO DE DESCONTINUIDADE .................................................... 347
FIGURA 150 – FUNÇÕES CONTÍNUAS COM RECURSO À DERIVADA .......................... 348
FIGURA 151 – PROPRIEDADES DA DERIVADA PARA RESOLVER PROBLEMA
MATEMÁTICO (I) ..................................................................................................................... 349
FIGURA 152 – PROPRIEDADES DA DERIVADA PARA RESOLVER PROBLEMA
MATEMÁTICO (II) .................................................................................................................... 349
FIGURA 153 – INTRODUÇÃO DA FUNÇÃO DERIVADA ................................................... 350
FIGURA 154 – DESCRIÇÃO GRÁFICA DA FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO
CÚBICA (I) PELA TAXA DE VARIAÇÃO INSTANTÂNEA ................................................ 351
FIGURA 155 – DESCRIÇÃO GRÁFICA DA FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO
SENO PELA TAXA DE VARIAÇÃO INSTANTÂNEA .......................................................... 353
FIGURA 156 – DESCRIÇÃO GRÁFICA DA FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO
CÚBICA (II) PELA TAXA DE VARIAÇÃO INSTANTÂNEA ............................................... 354
FIGURA 157 – DESCRIÇÃO GRÁFICA DA FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO exp
PELA TAXA DE VARIAÇÃO INSTANTÂNEA ..................................................................... 354
FIGURA 158 – DESCRIÇÃO GRÁFICA DA FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO
RAIZ QUADRADA PELA TAXA DE VARIAÇÃO INSTANTÂNEA ................................... 355
FIGURA 159 – FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO CÚBICA (I) A PARTIR DA
ANÁLISE DA ANIMAÇÃO GRÁFICA .................................................................................... 356
FIGURA 160 – FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO CÚBICA (II) A PARTIR DA
ANÁLISE DA ANIMAÇÃO GRÁFICA .................................................................................... 358
FIGURA 161 – FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO SENO A PARTIR DA
ANIMAÇÃO GRÁFICA ............................................................................................................. 359
FIGURA 162 – FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO CÚBICA (II) A PARTIR DA
ANIMAÇÃO GRÁFICA ............................................................................................................. 360
FIGURA 163 –FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO exp A PARTIR DA ANIMAÇÃO
GRÁFICA .................................................................................................................................... 361
FIGURA 164 – FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO RAIZ QUADRADA A PARTIR
DA ANIMAÇÃO GRÁFICA ...................................................................................................... 361
FIGURA 165 – TEOREMA DO CONFRONTO NA DERIVAÇÃO E DERIVADA DE
FUNÇÃO POTÊNCIA ................................................................................................................ 363
FIGURA 166 – FUNÇÃO POTÊNCIA E SUA DERIVADA PARA UM EXPOENTE n
INTEIRO ..................................................................................................................................... 364
FIGURA 167 – FUNÇÃO POTÊNCIA E SUA DERIVADA PARA UM EXPOENTE 1/n COM
n INTEIRO .................................................................................................................................. 365
FIGURA 168 – GRÁFICO DA FUNÇÃO DERIVADA DA FUNÇÃO f(x) = x-1/3
. ................. 367
FIGURA 169 – RETROAÇÃO ERRADA DO SOFTWARE .................................................... 368
FIGURA 170 – DIRETÓRIOS DE PRINCIPAIS E FUNÇÕES MATEMÁTICAS NO
GEOGEBRA ................................................................................................................................ 369
FIGURA 171 – INSERÇÃO DE FUNÇÕES A PARTIR DA LISTA DE FUNÇÕES DO
GEOGEBRA ................................................................................................................................ 369
FIGURA 172 – GRÁFICOS DE FUNÇÕES LOGARÍTMICAS PRODUZIDAS PELOS
ESTUDANTES ........................................................................................................................... 370
FIGURA 173 – DISCUSSÃO SOBRE A DERIVAÇÃO DE UMA FUNÇÃO COMPOSTA .. 370
FIGURA 174 – DERIVAÇÃO DE UMA FUNÇÃO POTÊNCIA ............................................. 373
FIGURA 175 – DERIVAÇÃO DE UMA FUNÇÃO COMPOSTA PELO TEOREMA DO
CONFRONTO ............................................................................................................................. 374
FIGURA 176 – DERIVAÇÃO DE UMA FUNÇÃO COMPOSTA PELO TEOREMA DE
CONFRONTO: DISCUSSÃO .................................................................................................... 376
FIGURA 177 – GRÁFICOS DE FUNÇÕES FATORES E DA FUNÇÃO PRODUTO ............ 379
FIGURA 178 – OPINIÕES DOS ESTUDANTES SOBRE AS SESSÕES EXPERIMENTAIS 383
FIGURA 179 –SOMAS DE ÁREAS APROXIMADAS: INTRODUÇÃO ............................... 385
FIGURA 180 – EXEMPLO (I) DE RESPOSTAS PARA AS ÁREAS APROXIMADAS ........ 390
FIGURA 181 – EXEMPLO (II) DE RESPOSTAS PARA AS ÁREAS APROXIMADAS ...... 390
FIGURA 182 – EXEMPLO (III) DE RESPOSTAS PARA AS ÁREAS APROXIMADAS ..... 391
FIGURA 183 – INTRODUÇÃO À SOMAS DE RIEMANN COM RECURSO AO GEOGEBRA
..................................................................................................................................................... 392
FIGURA 184 – ÁREAS APROXIMADAS NO GEOGEBRA E ALGUMAS REFLEXÕES ... 394
FIGURA 185 – FORMALIZAÇÃO DA INTEGRAL DEFINIDA. ........................................... 397
FIGURA 186 – MODELO BIPOLAR DE MEDIAÇÃO COM INSTRUMENTOS ................. 415
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 – ATIVIDADE DA APRENDIZAGEM COM TI-NSPIRETM
................................. 58
QUADRO 2 – NÍVEIS DE CODETERMINAÇÃO PARA DERIVADA DE FUNÇÕES REAIS
A VALORES REAIS E INTEGRAL DE RIEMANN NO SISTEMA EDUCATIVO
MOÇAMBICANO ........................................................................................................................ 81
QUADRO 3 – NÍVEIS DE CODETERMINAÇÃO PARA DERIVADA DE FUNÇÕES REAIS
A VALORES REAIS E INTEGRAL DE RIEMANN NO SISTEMA EDUCATIVO
BRASILEIRO ................................................................................................................................ 81
QUADRO 4 – ANÁLISE DE ATIVIDADE BASEADA NO MODELO I.A.S ........................ 104
QUADRO 5 – TIPOS DE TAREFAS EM LIVROS USADOS NA UNIVERSIDADE ............ 204
QUADRO 6 – CATEGORIAS DE ANÁLISE A PRIORI: TAREFAS DO TESTE
DIAGNÓSTICO E DO EXPERIMENTO .................................................................................. 210
QUADRO 7 – PARTICIPAÇÃO DAS SESSÕES EXPERIMENTAIS .................................... 248
QUADRO 8 – RESPOSTAS DOS ESTUDANTES AO TESTE DIAGNÓSTICO ................... 250
QUADRO 9 – RESPOSTAS DOS ESTUDANTES AO TESTE FINAL .................................. 381
QUADRO 10 – QUADRO DE RESPOSTAS AOS TESTES DIAGNÓSTICO E FINAL ........ 382
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – HOFFMANN & BRADLEY: INTUIÇÃO NUMÉRICA PARA LIMITE DA
FUNÇÃO ..................................................................................................................................... 181
TABELA 2 – TABELA DE VALORES DA RAZÃO INCREMENTAL .................................. 315
LISTA DE ABREVIATURAS
1A – um estudante ou um aluno;
1AGi – um estudante ou um aluno do grupo i;
AAs – alguns estudantes ou alguns alunos;
Abe – tipo de tarefas com um enunciado aberto;
OAs – outro(s) estudante(s) ou outro(s) aluno(s);
As – estudante(s) ou aluno(s);
CAS – Computer Algebra System;
Disp – tipo de tarefas que necessita conhecimento disponível.
EDUCOM – COMputador na EDUcação;
EM – Ensino Médio;
ENADE – Exame Nacional de Desempenho de Estudantes;
ES – Ensino Superior;
Exp – tipo de tarefas com um enunciado explícito;
Fec – tipo de tarefas com um enunciado fechado;
Fis – tipo de tarefas com um contexto da disciplina de Física;
Gi – grupo i.
HCI – Interações Homem Computador;
I. A.S – Instrument—mediated Activity Situations. (Situações de Atividades mediadas pelo
Instrumento);
ij – técnica relativa a tarefas i, ocorrendo no livro j;
Imp – tipo de tarefas com um enunciado implícito;
IntraM – tipo de tarefas com um contexto intra-matemático;
L2 – livro 2;
L3 – livro 3;
L4 – livro 4;
L5 – livro 5;
L6 – livro 6;
Loc – tipo de tarefas locais;
MEC – Ministério da Educação e Cultura;
Mob – tipo de tarefas que necessita conhecimento mobilizável
NReq – tipo de tarefas sem indicação da mudança de quadro;
OMF – Objeto Material Fabricado;
P – pesquisador;
PE – Programa de Ensino;
Pon – tipo de tarefas pontuais;
PRONINFE – Programa Nacional de Informática na Educação;
Real – tipo de tarefas com um contexto da vida cotidiana;
Req – tipo de tarefas com o enunciado indicando mudança de quadro;
SAC – Sistema Algébrico Computacional;
T2 – tipo de tarefas sobre derivada e suas propriedades;
T3 – tipo de tarefas sobre primitivas e suas propriedades.
T4 – tipo de tarefas sobre a integral de Riemann.
TAD – Teoria Antropológica do Didático;
Tec – tipo de tarefas do nível técnico;
TIC – Tecnologia de Informação e Comunicação;
tij – tarefas i, ocorrendo no livro j;
Tij – tecnologia (discurso tecnológico) relativa ao tipo de tarefas Tij;
Tij – teoria relativa à tecnologia Tij;
Tij – tipo de tarefas i, ocorrendo no livro j;
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 26
2 PANORAMA DE PESQUISAS EXISTENTES SOBRE CÁLCULO E UTILIZAÇÃO DE
SOFTWARE NA EDUCAÇÃO ............................................................................................................... 33
2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................................................ 33
2.2 ANÁLISE DO METAESTUDO DE ARTIGUE ET AL. (2003) ......................................................... 33
2.3 ALGUMAS PESQUISAS DESENVOLVIDAS POR BRASILEIROS ............................................... 40
2.4 OUTRAS PESQUISAS QUE AUXILIAM NO DESENVOLVIMENTO DO NOSSO ESTUDO ...... 57
2.5 PESQUISAS SOBRE A TRANSIÇÃO DO ENSINO MÉDIO PARA O ENSINO SUPERIOR ......... 62
2.6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ........................................................................................................ 64
3 REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................................................................ 67
3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................................................ 67
3.2 TEORIA ANTROPOLÓGICA DO DIDÁTICO .................................................................................. 68
3.3 TEORIA DE INSTRUMENTAÇÃO/INSTRUMENTALIZAÇÃO SEGUNDO RABARDEL (2002,
1995) .......................................................................................................................................................... 92
3.4 REFERENCIAL TEÓRICO DE APOIO: NOÇÕES DE QUADRO E MUDANÇAS DE QUADROS
DE DOUADY (1984, 1986) E NÍVEIS DE CONHECIMENTOS, SEGUNDO ROBERT (1998) .......... 126
3.5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ...................................................................................................... 129
4 PROBLEMÁTICA, QUESTÃO, OBJETIVOS, JUSTIFICATIVA E MÉTODO DA PESQUISA
................................................................................................................................................................. 132
4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS .......................................................................................................... 132
4.2 PROBLEMÁTICA DA PESQUISA .................................................................................................. 133
4.3 QUESTÃO DE PESQUISA ............................................................................................................... 135
4.4 OBJETIVOS DA PESQUISA ............................................................................................................ 135
4.5 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................................... 137
4.6 MÉTODO DA PESQUISA ................................................................................................................ 137
5 ANÁLISE DAS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS VIA PROGRAMA DE ENSINO E LIVRO
DIDÁTICO MOÇAMBICANOS DO ENSINO MÉDIO. ................................................................... 147
5.1 ORGANIZAÇÃO DIDÁTICA SOBRE A DERIVADA DE FUNÇÕES REAIS A VALORES REAIS
E PRIMITIVAS NOS PROGRAMAS DE ENSINO MÉDIO DE MOÇAMBIQUE ............................... 147
5.1.1 Algumas considerações em relação a organização didática ....................................................... 148
5.2 ANÁLISE DAS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS VIA LIVRO DIDÁTICO DO ENSINO MÉDIO 151
5.2.1 Análise dos dados da tabela: resumo de tipos de tarefas encontrados no livro estudado ........ 154
6 ANÁLISE DAS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS VIA LIVROS DIDÁTICOS DO ENSINO
SUPERIOR ............................................................................................................................................. 161
6.1 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A PARTE 1 DA ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS
USADOS NAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR ................................................................... 178
6.2 AS REGULARIDADES E DIFERENÇAS ENTRE AS OBRAS ANALISADAS NA PARTE II .... 202
6.3 ANÁLISE DOS TIPOS DE TAREFAS PRIVILEGIADOS POR MEIO DA TABELA QUE AS
CLASSIFICA EM RELAÇÃO ÀS DIMENSÕES ESCOLHIDAS COMO ELEMENTOS
DIFERENCIADORES DAS ABORDAGENS PROPOSTAS ................................................................. 205
7 ESTUDO EXPERIMENTAL PARTE I: O SOFTWARE GEOGEBRA E ANÁLISE A PRIORI
DAS TAREFAS USADAS NO TESTE DIAGNÓSTICO E NA EXPERIMENTAÇÃO E ANÁLISE
A POSTERIORI DO TESTE DIAGNÓSTICO .................................................................................... 209
7.1 O SOFTWARE GEOGEBRA E ALGUMAS DE SUAS CARACTERÍSTICAS ................................ 209
7.2 ANÁLISE A PRIORI DAS TAREFAS USADAS NO TESTE DIAGNÓSTICO E NO
EXPERIMENTO ..................................................................................................................................... 210
7.2.1 Teste de verificação do nível atual dos participantes do grupo de discussão – teste diagnóstico
................................................................................................................................................................. 211
7.2.2 Parte II: Noções de base para a Integral de Riemann ................................................................ 232
7.3 ANÁLISE A POSTERIORI DO TESTE DIAGNÓSTICO ................................................................. 247
7.3.1 Parte I: Análise quantitativa das respostas sobre as noções de base da derivada de funções
reais a valores reais ................................................................................................................................ 247
7.3.2 Análise qualitativa das respostas ao teste diagnóstico ................................................................ 253
8 ESTUDO EXPERIMENTAL PARTE II: RESULTADOS E ANÁLISES DAS SESSÕES
EXPERIMENTAIS ................................................................................................................................ 276
8.1 SESSÃO 2: 15.04.2013 ...................................................................................................................... 277
8.2 SESSÃO 3: 20.04.2013 ...................................................................................................................... 284
8.3 SESSÃO 4: 26.04.2013 ...................................................................................................................... 300
8.4 SESSÃO 5: 04.05.2013 ...................................................................................................................... 311
8.5 SESSÃO 6: 11.05.2013 ...................................................................................................................... 322
8.6 SESSÃO 7: 18.05.2013 ...................................................................................................................... 322
8.7 SESSÃO 8: 25.05.2013 ...................................................................................................................... 335
8.8 SESSÃO 9: 01.06.2013 ...................................................................................................................... 350
8.9 SESSÃO 10: 08.06.2013 .................................................................................................................... 363
8.10 SESSÃO 11: 15.06.2013 .................................................................................................................. 380
8.11 SESSÃO 12: 19.06.2013 .................................................................................................................. 392
9 CONCLUSÃO ..................................................................................................................................... 404
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................... 424
ANEXOS ................................................................................................................................................. 431
26
1 INTRODUÇÃO
Comecei1 a trabalhar como professor de 5ª e 6ª classes, atual EP2 – Ensino Primário do
2º grau, 6ª e 7ª classes (no Brasil, corresponde às 6a e 7
a séries do Ensino Fundamental) em 1984,
após a conclusão de um curso inicial de professorado, na Escola de Formação e Educação de
Professores – EFEP, com a duração de dois anos, em Moçambique, donde sou natural.
Em 1998, tive a minha formação universitária na Universidade Pedagógica de
Moçambique Delegação da Beira, no curso de Licenciatura em Educação Matemática para o
Ensino Primário (LEMEP), quando fui convidado a trabalhar nessa universidade a partir de 1999,
permanecendo até então. Na Universidade, lecionei várias disciplinas, entre as quais: Teoria de
Números, Álgebra Linear, Geometria Analítica, Teoria de Grafos, Cálculo Diferencial e Integral,
Matemática Escolar, Didática de Matemática e Geometria Euclidiana.
A partir de 1998, participei de vários eventos acadêmicos internos, regionais e
internacionais sobre a educação matemática. Desse convívio, fui sendo sensibilizado para alguma
atenção aos aspectos de ensino e de aprendizagem dos estudantes que ocorrem na sala. Assim, fui
ganhando consciência para um estudo aprofundado desses aspectos. Um dos exemplos dessa
realidade ocorreu em 2004 no acompanhamento de nossos estudantes nas práticas pedagógicas
num Instituto Médio Industrial, em ensino de Cálculo Diferencial e Integral, em que, perante uma
prática tão formalista, não tínhamos ideias claras sobre o que dizer a esses formandos em termos
de sugestões de como conduzir a aula. Essas dificuldades levaram-me a decidir pelo mestrado em
Educação Matemática, em 2005, na Pontifícia Universidade Católica de São – PUCSP, o qual foi
concluído em fevereiro de 2007, com um trabalho intitulado “Cálculo Diferencial e Integral nos
livros didáticos: uma análise do ponto de vista da organização praxeológica”.
Retornando a Moçambique, em 2007, o ambiente da sala de Cálculo Diferencial e
Integral, desta vez na Universidade, foi sempre dando as suas retroações que causavam
indignação e preocupação. Ora eram turmas superlotadas de estudantes reprovados em anos
anteriores, ora eram dificuldades de acompanhamento das aulas, motivadas pela falta de algum
conhecimento básico, por parte deles, necessário para o efeito. Esse estado de coisas levantava
questões do tipo: o que está falhando nos processos de ensino e de aprendizagem do Cálculo
1 As informações iniciais são relatadas na 1ª pessoa gramatical, por serem situações vivenciadas por mim.
27
Diferencial e Integral? Que tal experimentar outra maneira de mediar esses processos, por
exemplo, articulando algumas formas de interagir com o software Geogebra, aproveitando as
suas possibilidades ostensivas? O que isso pode resultar?
Portanto, a reflexão sobre o que acontecia na sala e os questionamentos subsequentes
motivaram a realização deste estudo, intitulado “Derivadas de funções reais de uma variável real
e integral de Riemann: construção e aprendizagem de conceitos mediadas por mídias e práticas
usuais”. Sempre foi minha vontade pesquisar sobre os processos da sala de aula, especialmente
de ensino e de aprendizagem de conteúdos curriculares.
Na verdade, derivada de funções reais de variável real e integral de Riemann sempre
representou um problema nos processos de ensino e de aprendizagem no Ensino Médio e/ou no
Ensino Superior, não obstante a sua grande aplicação em importantes setores de atividade social,
industrial e econômica, bem como em muitas ciências e na própria Matemática.
Muitas pesquisas foram desenvolvidas na área e uma série de resultados e sugestões
pedagógicas foi publicada. Entretanto, mesmo com esses resultados disponíveis, o tema nunca
ficou esgotado, e, ao que parece, nunca vai ficar. Sempre há novos problemas que surgem. Por
um lado, está a diversidade de enfoques e aplicações das noções em causa, e por outro, a
complexidade dos próprios processos de ensino e de aprendizagem que torna difícil formular
princípios pedagógicos e um quadro de referências que norteiem e resolvam definitivamente esse
problema.
A revisão bibliográfica que apresentamos no capítulo 2 mostra uma diversidade de
problemas de ensino e de aprendizagem de Cálculo, tanto para os estudantes do Ensino Médio
como para os do Ensino Superior. Os estudos de Araújo (2002), Artigue (1991), Millán et al.
(2013), Sad (1998), Thurston (1995, 1994), Villarreal (1999), Vianna (1998), Leng (2011),
apenas para destacar uma pequena parte, contêm resultados que reportam a complexidade do
ensino e da aprendizagem do Cálculo, e em particular, da derivada de funções reais a valores
reais e da integral de Riemann.
Esses estudos, além de apresentar os problemas existentes e a sua natureza, destacam
também algumas propostas didáticas e pedagógicas que podem ser utilizadas, como por exemplo:
a ressignificação do conteúdo de aprendizagem, a utilização de recursos computacionais, a
individualização do ensino, a participação ativa dos estudantes na aula, a opção pelo ensino mais
28
cooperativo, o favorecimento de alguns pontos de vista potencialmente fortes e capazes de
induzir a compreensão, entre muitas sugestões didáticas e pedagógicas. Como vemos, cada uma
das sugestões nunca é geral, sempre há perguntas que se levantam do tipo: como realizar uma
prática pedagógica numa realidade diferente, no espaço e no tempo, daquela em que o resultado
foi produzido?
Por outro lado, a nossa experiência docente sempre se confrontou com problemas
idênticos aos levantados pelas pesquisas anteriormente citadas: falta de compreensão das noções
de base do Cálculo Diferencial e Integral, provavelmente decorrente das dificuldades de ensino,
reprovações em massa e até com alguns indícios de frustração de estudantes, comportamento
passivo de alguns deles que sempre esperam que o professor resolva todas as tarefas propostas na
sala de aula e mesmo para casa, sem se dar conta de que esse comportamento prejudica a sua
própria formação e não auxilia no desenvolvimento pessoal.
Para Chevallard (1997), estudar é uma atividade essencialmente de resolução de
problemas, para elaborar uma técnica que será ao mesmo tempo um meio de solucionar quase
automaticamente problemas desse tipo. Então, como alguém vai aprender, se espera que tudo seja
resolvido pelo professor?
Nessa conformidade, diante dos problemas pesquisados e de sugestões dadas por outros
autores, surgem questões do tipo: como implementar uma determinada prática na realidade
moçambicana e, em particular, na cidade da Beira? Por outro lado, as situações vividas na nossa
prática docente levantam questões do tipo: o que está falhando na relação institucional e pessoal
dos estudantes da Universidade Pedagógica de Moçambique2, Delegação da Beira – UP-Beira,
em relação à disciplina de Cálculo?
A partir dessas inquietações, emergiram alguns aspectos de ensino que consideramos
como não tendo sido suficientemente explorados nas pesquisas já desenvolvidas com o recurso
computacional3. Exemplo disso é o destaque das variáveis animação, cor e espessura nas
2 Universidade vocacionada para a formação de professores para o ensino secundário.
3 Doravante, em toda parte da pesquisa onde aparece a nossa opinião sobre as possibilidades/potencialidades do
recurso ao computador, ou sobre as estratégias didáticas com o computador, entenda-se que não consideramos
que o computador traz os resultados sozinho e o professor e os estudantes recebem-nos passivamente. O que
dizemos é que esses resultados são obtidos pela mediação do professor ou de uma outra pessoa (pode ser
estudante) que sabe utilizar essa ferramenta para pesquisar resultados. Por isso deixamos claro (no referencial
29
construções gráficas que podem sugerir a existência dos objetos em jogo, descrição gráfica
explícita da taxa de variação no estudo da derivada de uma função real a valores reais,
relacionamento explícito entre os conceitos de base da soma de Riemann e o modelo geométrico
da soma das áreas de retângulos aproximantes, entre outras questões que mais adiante
apresentamos. Das reflexões, construímos a problemática da pesquisa em torno das noções de
derivada de funções reais a valores reais e de integral de Riemann. Destas noções, estabelecemos
o nosso tema de pesquisa, já mencionado acima.
A problemática da pesquisa corresponde ao estudo das relações institucionais existentes
no Ensino Médio e no Superior sobre os conceitos de derivada de funções reais a valores reais e
de integral de Riemann para verificar as marcas das mesmas sobre as relações pessoais
desenvolvidas pelos estudantes para, na sequência, desenvolver uma intervenção didática,
mediada pelo computador articulado com as práticas usuais. O recurso computacional representa
uma nova ferramenta para auxiliar o trabalho dos estudantes, mas também é uma forma de
construir novos instrumentos ou esquemas que permitam percorrer os caminhos que conduzem à
conceituação e à formalização a partir da ação instrumentada.
Essas reflexões nos conduziram à seguinte questão: Quão efetiva é uma mediação
didática para a construção e aprendizagem de conceitos de derivadas de funções reais de uma
variável real e de integral de Riemann mediadas por mídias e práticas usuais?
Diante desse contexto, os objetivos gerais desta pesquisa são:
estudar as praxeologias didático-matemáticas existentes em alguns materiais
didáticos sobre a derivada de funções reais de uma variável real e a integral de
Riemann, de modo a inserir o Geogebra como ferramenta de ajuda à reflexão e
construção dos conceitos em jogo;
experimentar uma modalidade de ensino e de aprendizagem dos conceitos de
derivada e integral de Riemann de funções reais de uma variável real,
incorporando no processo o software Geogebra articulado com as mídias e
práticas vigentes.
teórico mais adiante) que concordamos com Rabardel (2002, 1995), quando destaca a posição antropocêntrica
do uso de instrumentos.
30
Os objetivos específicos, a justificativa e o método construído para o desenvolvimento
da pesquisa são apresentados no capítulo 4.
O referencial teórico da pesquisa, que nos auxiliou na formulação e delimitação da
problemática, é apresentado no capítulo 3. Esse referencial é composto das seguintes teorias:
1- Teoria Antropológica do Didático - TAD de Chevallard (1992, 1994, 1998, 1999,
2002, 2011) e Bosch e Chevallard (1999). Consideramos nesta teoria as noções de dinâmica
cognitiva, praxeologia, objetos ostensivos e não ostensivos na atividade matemática, ecologia e
hierarquia de níveis de codeterminação. Essas noções ajudaram-nos na análise do contexto
institucional e pessoal dos conceitos de derivadas de funções reais de uma variável real e de
integral de Riemann.
2- Teoria de instrumentação de Rabardel (2002, 1995). Essa teoria ancorou-nos na
reflexão sobre a relação que o pesquisador e os estudantes foram construindo na interação com as
tarefas e com o computador durante as discussões nas sessões experimentais. Para tal, utilizamos
mais especificamente as noções de artefato, instrumento, processos de instrumentação e de
instrumentalização, esquemas de utilização, mediação epistêmica, pragmática e heurística,
transparência operativa do artefato, entre outras noções que Rabardel introduz, relacionadas com
a utilização de instrumentos na atividade.
Como referencial teórico de apoio, temos:
1- Noções de quadro e mudanças de quadros de Douady (1984, 1986). Essas noções
propiciaram-nos interpretar algumas formulações das tarefas no contexto da construção do
conhecimento matemático, tanto as que foram sendo encontradas nos materiais de ensino, quanto
as que foram tendo lugar nas discussões das sessões experimentais.
2- As noções de níveis de conhecimento esperados, para o funcionamento dos
estudantes, segundo definição de Robert (1998). Essas noções auxiliaram-nos a analisar os níveis
de conhecimentos esperados dos estudantes, tanto os que apareciam nas propostas dos materiais
de ensino, quanto o que foi sendo verificado durante as discussões nas sessões experimentais.
Com base na problemática estabelecida e no referencial teórico construído, elaboramos o
quadro metodológico baseado justamente nos dois pressupostos anteriores e circunscritos em
31
alguns elementos da engenharia didática4 nos seus aspectos de análise institucional, caracterizada
no estudo do programa de ensino e do livro indicado para ser trabalhado com os estudantes da
décima segunda classe do Ensino Médio de Moçambique (terceiro ano do Ensino Médio no
Brasil); estudo de quatro livros didáticos, sendo dois de introdução ao Cálculo e dois de
introdução à Análise Matemática, usados na Universidade. Procedemos à análise dos
conhecimentos retrospectivos dos estudantes, que consideramos como elemento da proposta de
Análise cognitiva5 indicada na engenharia didática, que se traduziu na elaboração de um teste
diagnóstico baseado na análise institucional e no estudo dos resultados a partir das expectativas
em função dos processos de ensino e de aprendizagem desenvolvidos no Ensino Médio;
Concepção e Análise a priori das tarefas preparadas para a experimentação; Experimentação;
Análise a posteriori e Validação interna.
No capítulo 5, apresentamos a análise das relações institucionais moçambicanas por
meio do programa de ensino e de um livro didático indicado pelo Ministério da Educação de
Moçambique para a décima segunda classe do Ensino Médio.
No capítulo 6, destacamos a análise das relações institucionais via livros didáticos
usados em faculdades/universidades brasileiras e ou moçambicanas. Tais livros são os seguintes:
4 Engenharia Didática: Artigue (2010), ao apresentar a engenharia didática como metodologia de pesquisa,
explicita que ela se fundamenta nas realizações didáticas em classe, isto é, sobre a concepção, implementação,
observação e análise de sequências de ensino, cuja validação é essencialmente interna, fundamentada na
confrontação entre análise a priori e a posteriori. Ainda segundo a autora, trata-se de uma metodologia
estruturada em quatro fases: análises preliminares, concepção e análise a priori, experimentação, análise a
posteriori e avaliação, cujas características são precisamente identificadas.
As análises preliminares são realizadas em função dos objetivos da engenharia e compreendem as seguintes
análises : análise epistemológica, análise institucional, análise cognitiva, análise das restrições.
Para a concepção e análise a priori das engenharias didáticas, é preciso considerar a escolha das variáveis de
comando macro e microdidáticas que governam a construção das situações, tanto no nível das situações
matemáticas, quanto de sua organização didática. A análise a priori, concebida como análise do controle das
relações entre sentido e situações, ao mesmo tempo descritiva e preditiva, centrada sobre um funcionamento
adidático. Observamos aqui que o funcionamento adidático supõe uma situação onde o conhecimento do sujeito
se manifesta apenas por decisões, por ações regulares e eficazes e onde não é importante para a evolução das
interações com o meio que o ator possa ou não identificar, explicitar ou explicar o conhecimento necessário. Na
sequência, são realizadas a experimentação, a análise a posteriori e validação interna envolvendo principalmente
a relação entre as análises a priori e a posteriori. Artigue (2010) observa ainda que as distorções inevitáveis e
constatadas não são necessariamente consideradas para invalidar as hipóteses feitas.
5 Análise Cognitiva: Aqui a análise cognitiva corresponde à procura da compreensão dos aspectos cognitivos
associados à solução de tarefas relacionadas aos conhecimentos desenvolvidos no Ensino Médio. Notemos que a
nossa análise cognitiva não foi exaustiva, pois não analisamos outros aspectos sociais que interferem na
cognição dos estudantes visados.
32
Stewart (2011) e Ávila (2005) usados tanto no Brasil quanto em Moçambique; Hoffman e
Bradley (1995) usado no Brasil e, Sarrico (2005), usado em Moçabique.
No capítulo 7, apresentamos o estudo experimental parte I: Análise a priori das tarefas
usadas no teste diagnóstico e na experimentação e análise a posteriori do mesmo teste.
No capítulo 8, apresentamos o estudo experimental parte II: mediação didática, em que
destacamos os resultados e a análises das sessões experimentais.
No capítulo 9, temos a conclusão, ressaltando as respostas à questão de pesquisa e
mostrando que a análise das relações institucionais, via livros didáticos coloca em evidência a
existência de uma diversidade de materiais que podem ser utilizados por professores e estudantes,
em particular, por aqueles que se encontram no Ensino Superior. Observamos que esse material
pode auxiliar na construção de novas tarefas, em especial, aquelas em que se faz uso de um
software enquanto nova ferramenta de trabalho matemático. Os resultados da experimentação
construída para provocar reflexões mediadas pelo professor, pelos próprios estudantes e pelo
instrumento (software), mostram a viabilidade desse trabalho e colocam em evidência
dificuldades dos estudantes que ao serem discutidas pelo grupo permitem um melhor
desempenho no desenvolvimento das tarefas que envolvem as noções e conceitos em jogo.
33
2 PANORAMA DE PESQUISAS EXISTENTES SOBRE CÁLCULO E UTILIZAÇÃO DE
SOFTWARE NA EDUCAÇÃO
2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Neste capítulo, destacamos algumas pesquisas em Educação Matemática sobre ensino e
aprendizagem, em particular, aquelas que consideram a importância da aplicação de softwares
para o estudo dos conceitos de função, de derivada de uma função real de uma variável real e de
integral de Riemann.
Existem diversas pesquisas com enfoque no uso das tecnologias digitais na sala de aula
na disciplina de Matemática. Essa diversidade de trabalhos na área mostra, por um lado, um
reconhecimento da importância desses meios na vida das pessoas, em particular no ensino, e, por
outro, origina restrições na problematização de um estudo, levantando questões do tipo: quais
dessas pesquisas na área devem ser consideradas?
Nesse contexto, é preciso ter algum critério claro na escolha do trabalho a ser utilizado
no estudo. O trabalho feito pela equipe de Artigue et al. (2003) contém indicações importantes
sobre a qualidade das pesquisas nessa área e assim sugere algum critério de escolha. Pela sua
importância, apresentamos nos parágrafos que seguem as ideias principais desse trabalho que faz
uma revisão de pesquisas sobre o tema realizadas entre 1994 e 1998.
2.2 ANÁLISE DO METAESTUDO DE ARTIGUE ET AL. (2003)
O metaestudo feito por Artigue et al. (2003, pp 237-269), intitulado “Technology and
Mathematics Education: A Multidimensional Study of the Evolution of Research and
Innovation”, apresenta a categorização das pesquisas em Educação Matemática com o enfoque
nas tecnologias digitais.
Objetivando uma compreensão mais ampla da integração das TIC – Tecnologias de
Informação e Comunicação – no ensino, os autores fizeram o referido metaestudo, reunindo um
corpus de pesquisas e inovações publicadas nos anos de 1994 a 1998, período em que os autores
consideram ter sido particularmente rico no uso das tecnologias digitais na sala de aula e que tal
prática se tornou uma realidade.
34
Os materiais analisados foram obtidos de várias fontes internacionais, entre as quais o
buscador de dados da internet, com entrada “Computer Assisted Instruction”, quatro revistas
internacionais de Educação Matemática, sete revistas internacionais sobre a utilização de
computadores para a aprendizagem matemática, livros com capítulos sobre tecnologia e
Educação Matemática, revistas profissionais e de pesquisa, teses, pesquisas e relatórios oficiais.
Essa busca resultou um corpus de 662 trabalhos publicados. Esses trabalhos foram classificados,
na primeira fase, quantitativamente, resultando em indicadores gerais da sua natureza, resumidos
nas quatro tabelas apresentadas nas figuras 1 à 4 que seguem:
FIGURA 1 – TIPOS DE PESQUISA E ÁREA DA MATEMÁTICA Tabela 1: Tipo de análise Tabela 2: Campo da Matemática
Apresentação do produto
Experimentação, Inovação
Relatório de pesquisa
Reflexão geral
Não especificado
20%
20%
37%
15%
6%
Geometria
Cálculo (ou Álgebra em Cálculo)
Álgebra
Gráfico/Função
Aritmética
23%
14%
11%
10%
5%
*6 Outros campos
Não especificado
7%
30%
FONTE: Artigue et al. (2003, p. 240).
A tabela 1 da figura 1 mostra que a literatura sobre TIC inclui inovações em sala de aula,
puras especulações sobre o papel dessas ferramentas, bem como estudos de pesquisa. Fato
notável é que as publicações de pesquisa não foram a maioria, mas apenas a 37% dos trabalhos
encontrados.
Sobre a tabela 2 da figura 1, os autores comentam que poucos trabalhos se debruçam
sobre a Aritmética e Álgebra, provavelmente isso reflita a escassez de material escrito acerca do
nível Ensino Fundamental, o que não é o caso para a Geometria. Por outro lado, os autores
ressaltam que um número significativo de trabalhos não especifica o campo matemático,
focalizando de modo geral o suporte que a tecnologia dá à aprendizagem matemática.
FIGURA 2 – TIPO DE TECNOLOGIA
Tabela 3: Tipo de tecnologia
Calculadora
12%
Numérica e científica
Gráfica
Simbólica
2%
4%
6%
Software Computacional
50%
(Dinâmica) geometria
Outros micromundos
Planilhas
16%
8%
6%
6 O somatório das porcentagens resulta em 98%, provavelmente os autores tenham feito algumas aproximações.
35
Sistemas simbólicos e gráficos
21%
Outras tecnologias
21%
Tutoriais
Ambientes inteligentes
Internet
Multimídia
Hipermídia
2%
4%
2%
3%
3%
Não especificadas 17%
FONTE: Artigue et al. (2003, p. 241).
Na tabela 3 da figura 2, é destacado que embora calculadoras simples sejam
instrumentos de uso diário para muitos estudantes em todo mundo, os trabalhos analisados
tiveram maior enfoque em tecnologias “mais finas”, como softwares computacionais ou
calculadoras simbólicas.
FIGURA 3 – DISTRIBUIÇÃO DE PAÍSES
Tabela 4: Países
França
Estados Unidos
Reino Unido
Alemanha
Itália
Áustria
Israel
Austrália
29%
23%
11%
6%
3%
2%
2%
2%
Países com oito trabalhos ou menos (1%):
Finlândia, Japão, Países Baixos, Espanha, Suiça, Portugal, China, Brasil,
Canadá, Dinamarca, Noruega, Nova Guiné, Bélgica, Grécia, Irlanda,
Rússia, Suécia.
Não especificado: 12%
FONTE: Artigue et al.( 2003, p. 241).
Na tabela 4 da figura 3, é realçado o fato de haver uma grande variedade de países que
usam tecologias digitais no ensino. E é indicado ainda que a proeminência da França deve-se ao
fato de ter sido mais fácil obter publicações internas como teses de doutorado, revistas
profissionais de professores e relatórios de encontros, que os autores da pesquisa em referência
desejaram incluir no banco de dados em estudo, para além de dados provenientes das revistas
internacionais.
Após o tratamento quantitativo, foi feita uma análise qualitativa, com atenção voltada
para o que chamaram de “problématique of a publication”, o conjunto de problemas relacionados
ou questões que tais publicações discutem, visando obter uma ideia geral da diversidade das
abordagens feitas em tais materiais, e propiciando a construção de um esquema interpretativo
compreensível do uso das TIC no ensino.
Baseados nas publicações do subcorpus sobre CAS - Computer Algebra System –
(sistema algébrico computacional – SAC), decisão tomada por causa de sua relevância na
36
pesquisa e também no ensino e na aprendizagem da Matemática, os autores sumarizaram as
constatações em cinco tipos de “problemáticas” visadas, que apresentamos a seguir:
1- Descrições Técnicas (53%): estes trabalhos ressaltam as capacidades do CAS como
aspecto relevante para os propósitos educacionais, como as potencialidades na visualização,
modelagem e programação, o que torna seu uso benéfico para o estudante. Otimismo é a
característica comum destes trabalhos e poucos destacam a necessidade do treinamento dos
estudantes para evitar as ciladas.
2- Atividades de inovação na sala de aula (9%): estes trabalhos destacam o uso efetivo
do CAS na sala de aula. Incluem apresentação de projetos para experimentação e integração do
CAS (casos da França e Austrália). Enfatizam uma melhor conceituação em função das
potencialidades acima citadas e economia no tempo na execução de algoritmos. A tecnologia
também é oferecida como solução aos problemas de aprendizagem. Algumas vezes os autores
apresentam dados de sua experiência de ensino, mas geralmente sem uma discussão real dessas
experiências.
3- Suposições acerca de melhoramentos (12%): estes trabalhos são estudos orientados
mais para a pesquisa, com as hipóteses, experimentação e conclusões. As hipóteses provêm das
considerações gerais sobre o ensino e a aprendizagem da Matemática e sobre tecnologia, e muitas
vezes sustentadas por uma teoria cognitiva. Seus autores assumem que existe uma melhora na
compreensão e nas habilidades na resolução de problemas como resultado do uso das TIC pelos
estudantes. Um experimento é então criado para operacionalizar tais suposições. O autor
geralmente fornece uma comparação externa entre grupos experimental e de controle, visando
proporcionar evidências dessa eficiência, em vez de dados para uma discussão sobre a inovação.
4- Questionamentos acerca do uso de tecnologias (21%): em contraste com os
trabalhos acima, estes não pressupõem quaisquer vantagens desse uso. Eles apresentam
inovações, experimentações ou exemplos de uso não para si mesmos, mas como uma ferramenta
para abordar as questões. As questões gerais e teóricas têm considerado os limites e restrições do
CAS, as tarefas, os procedimentos e os tipos de compreensões propiciados pelas tecnologias,
entre outros.
37
5- Integração (5%): estes trabalhos investigam as condições ‘ecológicas’7 para o uso
das tecnologias, e, tal como nos trabalhos de questionamentos, estes são também centrados nas
questões do uso das TIC na sala de aula.
A classificação apresentada acima mostra uma variedade de abordagens no uso das TIC
no ensino e na aprendizagem de matemática. Os trabalhos que mostram mera abordagem técnica
das TIC aparecem em número que ultrapassa a metade. Para os autores, os trabalhos das
categorias 1 e 2 mostram insuficiência de dados e análise e, em função disso, suas conclusões
sobre o uso das TIC na sala de aula podem não representar a realidade. Assim, usando os
trabalhos das categorias 3, 4 e 5, que são trabalhos de pesquisa ou que propõem determinadas
hipóteses ou questões sobre o uso das TIC na sala de aula, os autores esboçaram algumas
perspectivas, que chamaram de “dimensões” para análise da integração da tecnologia nos
processos de ensino e de aprendizagem da Matemática, que, pela sua importância, as destacamos
na figura que segue.
FIGURA 4 – INDICADORES DE DIMENSÕES
Tabela 5: Indicadores de dimensões
Dimensão Indicadores
1. Abordagem geral da
integração das TIC
Tipo de hipótese (suposição de melhorias, questões, etc.)
Metodologia e processos de validação (comparações entre grupos
experimental e de controle, comparação da análise a priori e as
expectativas com um experimento, etc.)
2. A dimensão epistemológica
e semiótica
Influência das TIC
No conhecimento matemático e nas práticas
Nas representações usadas em atividade específica
3. Dimensão Cognitiva
Modelo cognitivo (construtivista, sociocultural, …), Conceitos usados
(esquemas, em rede etc)
O papel cognitivo das TIC (visualização, expressão, conexão etc.)
4. Dimensão Institucional Interação das TIC com as tarefas e técnicas na cultura da instituição
escolar
Papel das técnicas instrumentadas na conceptualização da matemática
7 Ecológica: Chevallard (2002, 2002a) define ecologia dos saberes como a vida dos mesmos nas instituições,
pois a forma como serão trabalhados nas diferentes instituições depende das adaptações às restrições que muitas
vezes estão associadas à economia desses saberes.
38
5. Dimensão Instrumental As possibilidades e restriçõess das ferramentas
Processos de instrumentação
6. Dimensão Situacional Influência das TIC sobre
A estrutura da situação
As estratégias de resolução dos estudantes
O contrato didático
7. Dimensão professoral Crenças do professor e representações da matemática e das TIC
Novas situações de ensino
Influência da pesquisa e dos programas de formação pré/em serviço
FONTE: Artigue et al. (2003, p. 245)8
Sobre a tabela 5 da figura 4, os autores elaboraram ainda comentários adicionais, que
resumimos a seguir:
Os trabalhos das dimensões 1 e 2 (Abordagem geral da integração das TIC às dimensões
epistemológica e semiótica):
refletem sobre as aplicações dos softwares e procuram seus benefícios na
aprendizagem da álgebra;
enfatizam as potencialidades das TIC para visualização, oferecendo múltiplas
representações e generalizações;
levam em consideração as modificações que as representações tecnológicas trazem
aos conceitos matemáticos;
são baseados em profunda experimentação das situações construídas a partir dessa
análise, mas sem uma explícita ligação com o ensino “ordinário” da Matemática.
Os trabalhos da dimensão 3 (Dimensão cognitiva):
destacam o papel desempenhado pela percepção nos processos cognitivos, que
certamente é uma especificidade forte da pesquisa sobre o uso das TIC.
testemunham a forte convergência de abordagens teóricas, com predomínio sobre
pontos de vista construtivistas, realçando a construção de significado pelos estudantes ao
estabelecer conexão entre as ações e as reflexões matemáticas.
mostram uma diversidade de abordagens cognitivas, que enriquecem as
elaborações conceituais no campo do uso das TIC. Convergem nas questões sensíveis, tais como
8 Tradução nossa.
39
a visualização, construção e contextualização do conhecimento, bem como sobre as abordagens
dialéticas subjacentes.
Os trabalhos da dimensão 4 (Dimensão institucional):
refletem a inserção da tecnologia nas instituições escolares: o desenvolvimento
das técnicas relacionadas ao uso das TIC, e sua articulação com as técnicas de lápis e papel,
juntamente com as análises das tarefas oferecidas aos estudantes em relação ao currículo
“ordinário”, convergindo na preocupação para a viabilidade das TIC no ensino e na
aprendizagem matemática.
iniciam com preocupações pragmáticas (como aspecto central), questionando
sobre o que as tecnologias podem trazer de benefício no ensino.
Os trabalhos da dimensão 5 (Dimensão instrumental):
não trazem explicitamente a análise instrumental9, mas o uso que os estudantes
fazem da tecnologia pode ser interpretado em termos da teoria da instrumentação.
Os trabalhos da dimensão 6 (Dimensão situacional):
discutem a influência das TIC nas situações da aprendizagem (com destaque às
pesquisas em Educação Matemática do ramo da Inteligência Artificial em Educação).
Assim, com base nas ideias apresentadas no estudo analisado acima, a nossa revisão
bibliográfica considerou, principalmente, trabalhos com as seguintes características:
i) Começam com alguma preocupação pragmática, questionando sobre o que as
tecnologias podem trazer de benefício nos processos de ensino e de aprendizagem, especialmente
do Cálculo Diferencial e Integral de funções de uma variável real a valores reais.
ii) Refletem a inserção da tecnologia nas instituições escolares: o desenvolvimento
das técnicas relacionadas ao uso das TIC, e sua articulação com as técnicas de lápis e papel,
juntamente com as análises das tarefas oferecidas aos estudantes em relação ao currículo
ordinário, convergindo na preocupação para a viabilidade das TIC no ensino e na aprendizagem
matemática, principalmente do Cálculo Diferencial e Integral;
9 Análise instrumental segundo Rabardel (2002, 1995).
40
iii) Destacam o papel desempenhado pela percepção nos processos cognitivos, que
certamente é uma especificidade forte da pesquisa sobre o uso das TIC, principalmente no ensino
e na aprendizagem do Cálculo Diferencial e Integral;
iv) Testemunham a forte convergência de abordagens teóricas, com predomínio sobre
pontos de vista construtivistas, realçando a construção de significado pelos estudantes ao
estabelecer conexão entre as ações e as reflexões matemáticas, principalmente no que se refere ao
Cálculo Diferencial e Integral;
v) Mostram uma diversidade de abordagens cognitivas, que enriquecem as
elaborações conceituais no campo do uso das TIC. Convergem nas questões sensíveis, tais como
a visualização, construção e contextualização do conhecimento, bem como sobre as abordagens
dialéticas subjacentes.
Com base nessas considerações, analisamos nas seções que seguem algumas pesquisas
realizadas por brasileiros que consideramos pertinentes para o nosso trabalho.
2.3 ALGUMAS PESQUISAS DESENVOLVIDAS POR BRASILEIROS
No Brasil, são feitas pesquisas sobre a problemática do uso do computador no ensino,
em particular na disciplina de Matemática. Iniciamos com o trabalho de Silva (1997) que, em sua
tese de doutorado intitulada “O computador na perspectiva do desenvolvimento profissional do
professor”, visou estabelecer um quadro de referência nos diferentes domínios da profissão
docente e discutir a introdução dos computadores na escola, de forma que professores e
estudantes possam beneficiar-se, procurou ainda identificar os reflexos do uso do computador na
prática profissional do professor por meio de uma reflexão histórica geral da introdução e
evolução do uso do computador na escola brasileira.
Segundo a autora, as discussões sobre a Informática Educativa – área de conhecimento
que procura tratar das questões relacionadas à inserção do computador na escola – no Brasil
ganharam força com o aperfeiçoamento dos computadores pessoais na década 1980 (FRANT,
1993 apud SILVA, 1997). A partir desse momento, surgiram várias iniciativas, muitas delas de
órgãos governamentais, no sentido de promover e apoiar a implementação do uso de
computadores na escola. Em 1981, foi realizado o I Seminário Nacional de Informática
Educativa, com o apoio do Governo Federal, no qual participaram educadores de diversos
41
estados. Dessa iniciativa, surgiram alguns projetos, dentre os quais se assinalam: EDUCOM,
FORMAR, PRONINFE e PROINFO.
O EDUCOM (COMputador na EDUcação) foi lançado em 1983 pelo Ministério da
Educação e Cultura e pela Secretaria Especial de Informática, com o objetivo de criar centros-
piloto de pesquisa sobre as diversas aplicações do computador em educação.
FORMAR tinha como objetivo a formação de recursos humanos para trabalhar com a
Informática Educativa e consistiu de cursos de especialização na área de informática na
educação. Em 1987, realizou-se o FORMAR 1 e, em 1989, o FORMAR 2.
PRONINFE – Programa Nacional de Informática na Educação – surge em 1989, por
iniciativa do Ministério da Educação e Cultura, dando continuidade ao desenvolvimento da
Informática Educativa, contribuindo com a criação de laboratórios e centros para a capacitação de
professores. Segundo a autora, as experiências acumuladas nos programas anteriores deram
origem ao programa mais recente de Informática Educativa, o PROINFO – Programa Nacional
de Informática na Educação, com a primeira etapa de execução planejada para o biênio 1997/98.
Para a autora, os resultados dessas iniciativas têm-se manifestado de diversas maneiras nas
escolas. Algumas preferem incluir no currículo uma disciplina de Informática, onde os estudantes
podem aprender os recursos de alguns softwares, bem como o acesso à internet; e outras, o uso do
computador está relacionado ao ensino das disciplinas do currículo, como Ciências, Matemática,
Português, História e assim por diante.
Como parte da pesquisa, a autora acompanhou (durante todo o ano de 1995) aulas de
cinco professores numa escola privada, de Ensino Fundamental, altamente motivada para
implementar o programa de Informática na Educação, com um laboratório de Informática onde
decorriam as aulas com recurso ao computador. No fim do programa de observação das aulas, os
professores envolvidos responderam a um questionário expressando seu sentimento em relação a
esta nova maneira de trabalhar. As entrevistas com os participantes complementaram as
informações obtidas por meio dos questionários e das observações das aulas.
Como resultados principais, a tese aponta que, com a presença do computador, a aula
ganha um novo cenário, refletindo-se na relação do professor com os estudantes e no papel
desempenhado pelos demais atores presentes. Os estudantes tiveram grande participação na aula,
42
começaram a obter melhores resultados, mesmo aqueles que no ambiente de lápis e papel
apresentavam desempenho fraco, especialmente na produção de textos.
A sala de aula (laboratório) apresenta uma nova organização do espaço físico; pois não
havia estudantes sentados em cadeiras individuais, dispostas em filas, mas sim, em duplas de
estudantes trabalhando nos computadores distribuídos ao redor da sala. O quadro negro cedeu
lugar ao quadro branco, onde o giz e o apagador foram substituídos pelo pincel e apagadores
específicos para esse tipo de quadro.
Nessa nova organização, a professora tinha de negociar com os estudantes como
estabelecer uma ordem. Um novo cenário afeta a forma como os estudantes e o professor se
relacionam e se comportam na sala. O professor se vê diante de situações novas (e os estudantes
também) em relação ao que estão usualmente acostumados a enfrentar, exigindo estratégias
diferentes.
O estudo mostrou que o elemento fundamental para lidar com a nova maneira de
trabalhar é a motivação interna do professor para aprender sempre, tanto individualmente como
em grupos de trabalho. A partir das condições de trabalho que a escola proporcionou e do
inquérito final feito às professoras participantes da pesquisa, foi verificada a hipótese levantada
na literatura de que o uso efetivo do computador como meio de ensino e de aprendizagem na sala
de aula depende de aspectos gerais que envolvem a profissão docente, tais como: o contexto
escolar, as características pessoais e a experiência profissional dos professores.
A tese que estamos analisando (SILVA, 1997) destaca um dado muito importante: a
necessidade de um trabalho em equipe para produzir resultados efetivos perante uma nova
realidade, a qual não dominamos e precisamos aprender uns com outros (entre professores) e com
os estudantes. Os estudantes têm experiências que interessam ao professor para a efetividade do
seu trabalho. O estudo mostra-se atual, apesar de ter sido realizado há 17 anos. Os professores
precisam mudar sua postura, aceitando de forma crítica as mudanças que o computador traz ao
contexto escolar, capitalizando as suas potencialidades e possibilidades, refletindo sobre os novos
desafios da organização do “milieu” 10
de aprendizagem do estudante.
10 Segundo Chevallard (2004), milieu: conjunto dos objetos para os quais a relação institucional é estável e não
problemática.
43
O que Silva (1997) diz da nova organização dos processos de ensino e de aprendizagem
na sala de aula proporcionada pelo computador é corroborado por outros pesquisadores, entre
eles, Valente (2005), Villarrel (1999), Farias (2007), Andricelli (2010), Melo (2002) e outros que
vamos destacando do que está sendo feito no Brasil no quadro da implementação das tecnologias
digitais no ensino e na aprendizagem da Matemática.
Valente (2005), no artigo “Informática na Educação”, define essa expressão como o uso
das Tecnologias da Informação e da Comunicação nos processos de ensino e de aprendizagem
escolares. Esse uso traduz o reconhecimento do poder do computador, tanto como meio de
ensino, quanto como meio de aquisição de conhecimentos pelo estudante.
Para o autor, no contexto do ensino tradicional, o computador é meio de transmissão de
conhecimentos ao estudante por via de softwares educacionais como tutoriais em que alguém,
com conhecimentos, introduz a informação no computador e o estudante exercita e pratica ou
joga com o fim de reter a informação transmitida. Esses softwares também podem avaliar o nível
de retenção de conhecimentos pelo estudante, colocando perguntas sobre a matéria praticada.
Porém, segundo o autor, estas práticas não são construtivistas – como alguns advogam ser – pois
a construção de conhecimentos não se faz como se estivesse a construir a parede de uma casa,
onde os tijolos são progressivamente colocados uns sobre os outros. O ensino nessas condições
não prepara as pessoas com posições críticas capazes de enfrentar as mudanças da sociedade
atual.
Contrária à prática tradicional, está o construcionismo de conhecimentos que impõe ao
estudante agir com o seu meio social que constitui a fonte de ideias e da informação que deve ser
descrita formalmente na linguagem de programação, passando essa informação para o
computador que deve processá-la. Em seguida, o estudante analisa e reflete sobre a resposta
produzida. Caso seja necessário, o estudante faz o refinamento da descrição anterior,
introduzindo-a no computador para processá-la de novo. Assim, o processo continua,
percorrendo, como o autor refere, o ciclo: descrição-execução-reflexão-depuração. A missão do
professor nessa abordagem é garantir que o estudante mantenha o ciclo em ação, intervindo
quando houver a ruptura do mesmo. Nessa intervenção, o professor explicita o problema em
resolução, conhece o estudante e como ele pensa, incentiva outros níveis de descrição, trabalha
44
diferentes níveis de reflexão, facilita a depuração das ideias e promove relações sociais boas que
permitem a colaboração. A figura abaixo ilustra tal ciclo, referido acima:
FIGURA 5– INTERAÇÃO APRENDIZ-COMPUTADOR EM PROGRAMAÇÃO
FONTE: Valente ( 2005, p. 4).
Observe-se que, provavelmente, para o uso efetivo do computador na aprendizagem,
especialmente na Matemática, não precisamos do domínio da linguagem de programação. Alguns
softwares dinâmicos, como Geogebra, Winplot, Cabri II, entre outros, permitem, com uma
sintaxe simples e ordinária, descrever os objetos matemáticos, seguido de uma execução perfeita
no computador. Portanto, no ciclo referido acima, a depuração, como processo de refinamento e
purificação da descrição devia (e deve) ser seguida de outras operações (ações) como a
interpretação, a ressignificação, a abstração e a generalização e, se necessário, a articulação com
outras maneiras de representação, por exemplo, representações por meio de elaborações a mão
com lápis e papel. Por isso, destacamos no nosso trabalho uma articulação do software Geogebra
com as mídias e práticas usuais de representação. Esta articulação é endossada em algumas teses,
como a de Borba (1993).
Borba (1993), na sua tese de doutorado, “Students’ understanding of transformations of
functions using multi-representational software”, visou conhecer como os estudantes
compreendiam as transformações funcionais de homotetia (vertical e horizontal), de translação
(vertical e horizontal) e de reflexão e formulou uma série de questões como norteadoras da
pesquisa:
45
a) Quais os métodos os estudantes usam para explorar as transformações de uma
função?
b) Quais são os papéis de uma visualização e das ações diretas sobre um gráfico na
compreensão dos estudantes das transformações de funções?
c) Qual o papel do software multirrepresentacional na ajuda aos estudantes para
construir a invariância das transformações das diferentes classes de funções? Como
a habilidade proporcionada pelo software, para coordenar as diferentes
representações, pode desempenhar um papel na promoção de uma compreensão das
transformações de funções?
d) Em que sentido o “contexto do computador” é apropriado para o estudo destas
transformações? Que tipos de problemas neste contexto são úteis para os estudantes
explorar as transformações? [...] (BORBA, 1993, p. 11, tradução nossa).11
Foi usado na pesquisa o software multirrepresentacional Function Prove.
Por meio de experimentos de ensino individualizados a dois estudantes do Ensino
Médio, foram realizadas atividades de transformações de funções: homotetias (verticais e
horizontais), translações (horizontais e verticais) e reflexões (horizontais e verticais),
essencialmente sobre as funções quadráticas, modulares e função escada, como se pode observar
nas figuras que seguem.
FIGURA 6 – TRANSLAÇÃO E HOMOTETIA
HORIZONTAIS: FUNÇÃO QUADRÁTICA FIGURA 7 – SIGNIFICADOS DOS COEFICIENTES:
FUNÇÃO QUADRÁTICA E TRANSFORMAÇÃO
REFLEXÃO
FONTE: Borba (1993, P. 98).
FONTE: Borba (1993, P. 251).
11 a) What methods do students use to explore the transformations of a function?
b) What are the roles of visualization and of direct action on a graph in students’ understanding of
transformations of functions?
c) What is the role of multi-representational software in helping students to construct the invariance of
transformations across the different classes of functions? How can the ability, provided by the software, to
coordinate different representations play a role in promoting an understanding of transformations of functions?
d) In what sense is the “computer context” appropriate for the study of these transformations? What kinds of
problems in this context are helpful for students to explore transformations? […]
46
Os resultados obtidos são pertinentes, podendo ajudar a refletir sobre o ensino e a
aprendizagem com recurso aos softwares computacionais. O autor realça que os experimentos de
ensino no ambiente computacional mostraram como a Matemática foi sendo gerada como
resultado das representações humanas da mesma no contexto considerado, como se pode observar
no texto que segue.
[…] Embora a geração de matemática não fosse o objetivo deste estudo, algumas
tendências de novas ideias matemáticas e terminologia matemática poderiam ter sido
demonstradas por estas experiências de ensino. Pode ser o caso no futuro, que o uso
novo e ainda não tradicional de linguagem, tais como folhas de borracha pegajosa, pinos
e fios torne-se mais comum para explicar transformações “algébricas” ou para dar
sentido a um isomorfismo entre as mudanças em coeficientes e transformações de
objetos no plano cartesiano. Essa nova linguagem parece ser necessária para descrever
ideias, tais como alongamento ou traduzir eixos, que são novos para a matemática
escolar (BORBA, 1993, p. 338, tradução nossa)12.
Portanto, é a descrição das ideias, por meio de um sistema de representações,
proporcionando uma interpretação do trabalho que está sendo realizado, que torna o computador
uma ferramenta útil na aprendizagem da Matemática. Para Borba (1993), o ambiente
computacional foi apropriado para o estudo proposto, uma vez que proporcionou o contexto
flexível para o estudo das transformações de funções. Segundo o autor, várias vezes os estudantes
assumiram o processo de busca da solução como sendo sua tarefa, controlaram a investigação e
tomaram-na como sua. Num determinado momento, o autor observa que cada mídia tem suas
vantagens e desvantagens. Para ele, a mídia de lápis e papel não devia ser vista como menos
importante. O ambiente computacional é rico e ajuda a resolver muitas questões relacionadas
com o ensino e a aprendizagem das transformações, mas também levanta outros problemas, entre
os quais as limitações das dimensões da tela.
A seguinte passagem do autor é considerada importante para nosso estudo, pois destaca,
entre outras coisas, o papel inovador do uso do computador na aula:
Como sugerido na última seção, o contexto de computador mostrou ser apropriado para
o estudo das transformações de funções uma vez que permitiu aos estudantes
12 […] Although the generation of mathematics was not the goal of this study, some trends toward new
mathematical ideas and mathematical terminology might have been shown by these teaching experiments. It
might be the case in the future that new and as yet not-traditional use of language such as sticky rubber sheets,
pins and thread becomes more common as one uses it to explain “algebraic” transformations or to give meaning
to an isomorphism between changes in coefficients and transformations of objects on the Cartesian plane. Such
new language seems to be necessary to describe ideas, such as stretching or translating axes, that are new for
school mathematics.
47
desenvolver estratégias originais em sua prática de resolução de problemas e gerou novo
desafio problemático para eles. Foi também apontado como existindo uma relação de
influência mútua entre os recursos e o conhecedor. Os recursos que estruturam o
conhecimento também são moldados pelo conhecedor, o que sugere um modelo de
cognição em que os recursos são vistos como parte da cognição. Além disso, o contexto
de computador como uma ferramenta teórica mostrou ser apropriado como uma
linguagem para descrever a prática dos estudantes. Neste estudo, eu também tentei
romper com a tradição de se concentrar apenas nas ações dos estudantes em um
software. Para além de considerar as ações dos estudantes, tentei entender como os
mesmos interpretavam o design do software. [ ...] Além disso, a discussão feita no
último capítulo e neste capítulo, referente a mudanças em matemática, aprendizagem
matemática, modelos de compreensão em contextos de computador, a relação de
influência mútua entre computadores e ideias matemáticas, os modelos para as
transformações de funções com base na visualização, etc., são pertinentes para os
professores e os estudantes que estão em uma sala de aula onde a tecnologia do
computador é disponível. [ ...] Eles me ensinaram como se pode pensar
matematicamente usando um software de computador, não apenas como algo que faz as
coisas mais rápido, mas como uma parte "real" de pensamento de alguém (BORBA,
1993, pp 347-353, tradução nossa)13.
Portanto, são cruciais os destaques das passagens acima para nós, que estamos
preocupados com as questões sobre como discutir a Matemática na sala de aula com o recurso ao
computador: o computador aparece assumindo várias funções no processo: como recurso
estruturante do ambiente da aprendizagem matemática, como ferramenta que propicia uma
linguagem para descrever as práticas dos estudantes, como ferramenta que possibilita aos
estudantes desenvolver estratégias originais na prática de resolução de problemas e gerador de
novos desafios problemáticos para os estudantes, e ainda como ferramenta que nos motiva a
formular questões do tipo: qual é a lógica que ele usa na produção das respostas, o que ele faz se
enquadra nas nossas práticas habituais de fazer? Quer dizer, é o questionamento, a descrição
apropriada das atividades e das práticas e a interpretação subsequente do que fazemos, a
13 As suggested in the last section, the computer context proved to be appropriate for the study of
transformations of functions since it allowed them to develop original strategies in their problem solving practice
and it generated new challenging problematic for them. It also has been pointed out how there is an inter-shaping
relationship between the resources and the knower. The resources that structure the knowledge are also shaped
by the knower, which suggests a model of cognition in which the resources are seen as part of cognition. Also,
the computer context as a theoretical tool proved to be appropriate as a language for describing students’
practice. In this study, I also tried to break away from the tradition of only focusing on students’ actions in a
software. In addition to accounting for students’ actions, I tried to understand how students interpreted the
design of the software. […] In addition, the discussion made in the last chapter and in this chapter, regarding
changes in mathematics, mathematics learning, models for understanding in computer contexts, the inter-shaping
relationship between computers and mathematical ideas, the models for transformations of functions based on
visualization, etc. is pertinent for teachers and students who are in a classroom where computer technology is
available. […] They taught me how one can think mathematically using a computer software not only as
something that makes things faster, but as a “real” part of one’s thinking.
48
codificação correta das ações humanas na interação com os objetos conceituais, que ressalta o
valor do computador na sala de aula de Matemática.
Na sequência, optamos pela breve descrição da tese de doutorado de Villarreal (1999),
intitulada “Pensamento Matemático de Estudantes Universitários de Cálculo e Tecnologias
Informáticas”, pois a autora recorre ao software derive 3.14, com o objetivo de “descrever e
compreender os processos de pensamento desenvolvidos por estudantes em um ambiente
computacional ao realizarem atividades matemáticas relacionadas com o tópico derivada de
funções f: A R R”. A autora discute a problemática do ensino e da aprendizagem da
derivada de funções reais a valores reais. Ela apresenta em seu estudo várias questões, entre elas
identificam-se as seguintes:
Que tipo de pensamento é favorecido neste ambiente e quais são as estratégias dos
estudantes? Que problemas e questões são levantados e como o computador é usado para resolvê-
los?
O computador é um suplemento ou um reorganizador nas atividades que os estudantes
resolvem ao aprender a Matemática? Que evidências podemos recolher para optar por um destes
termos? Pode haver uma complementaridade necessária entre ambos?
Como caracterizar a relação “ser humano-computador” nos processos de ensino e de
aprendizagem do conceito de derivada e suas possíveis aplicações ao trabalharmos em uma
perspectiva quase empírica e intuitiva baseada principalmente no processo de visualização?
Os dados do campo da pesquisa foram obtidos em três fases: estudo piloto, em forma de
entrevistas com o objetivo de verificar a viabilidade das questões para a fase 3 (experimentos de
ensino), observação em sala de aula (do professor orientador) das atividades matemáticas dos
estudantes e, por fim, a realização de experimentos de ensino.
Participaram do experimento três duplas de estudantes (alunas) do 1º ano do curso de
graduação em Biologia do Instituto de Biociência da UNESP – Campus de Rio Claro, que
voluntariamente propuseram-se a participar da pesquisa, cursando naquele momento a disciplina
de Matemática Aplicada, durante o primeiro semestre de 1997, em quatro sessões de uma hora e
meia de duração cada. O final de cada sessão era seguido de uma entrevista de avaliação do
trabalho realizado.
49
O encaminhamento das discussões nas sessões mostra uma série de contradições nas
concepções iniciais das estudantes sobre o conceito de derivada de uma função real de uma
variável real. Ora são confusões entre a “derivada” e a reta tangente, ora são confusões com a
própria reta tangente: se toca em um ponto do gráfico da função ou em vários ou ainda se ser
tangente é o mesmo que dizer cruzar o gráfico da função. Com o recurso às representações
gráficas de várias funções e suas derivadas, em pouco tempo, numa mesma atividade, e fazendo
comparações, as participantes da pesquisa foram gradualmente aprimorando sua compreensão a
respeito do conceito de derivada e suas aplicações.
Os resultados da pesquisa mostraram que o pensamento das estudantes no ambiente
computacional não segue o estilo dedutivista: os aspectos visuais e as respostas vindas do
computador influenciam seu estilo de fazer matemática. Conjecturas, refutações, (re)formulações
e validações surgem como elementos essenciais na realização das tarefas. As estudantes falam,
explicam, justificam o que fazem e assim o transcorrer da aula revela-se não linear, ou seja,
contrário à prática exposição – exemplos – exercícios. Muitas vezes, o que causava as conjecturas
eram as evidências visuais que os gráficos das funções mostravam: crescente, decrescente,
extremos. A partir daí, elas refletiam: como deve ser a derivada? Então, muitas tentativas são
feitas, gráfica e algebricamente. O computador mostrou ser uma ferramenta que estimula o
pensamento e auxilia a colocar questões e tentar respondê-las.
Como comentário, diríamos que o computador não só mostrou ser ferramenta que
estimula o pensamento, mas sim uma ferramenta que faz parte do pensamento matemático no
sentido de que ele produz e faz parte do processo de produção de respostas que se pretendem, tal
como destacamos na citação anterior a Borba: “as a ‘real’ part of one’s thinking”14
.
Considerou-se ainda a dissertação de Paranhos (2009), com o título “Geometria
Dinâmica e o Cálculo Diferencial e Integral”, pois nela são realçadas as potencialidades do
computador como ferramenta que realiza atividades complexas que se tornam quase impossíveis
no ambiente de lápis e papel.
Recorrendo aos softwares Geogebra e Winplot, a pesquisa destaca dois objetivos:
14 Como uma parte ‘real’ de pensamento de alguém.
50
Apresentar uma ferramenta extra que possibilite autonomia ao estudante e a
ampliação dos limites do que já se realiza.
Fazer um estudo sobre as ideias fundamentais do Cálculo Diferencial e Integral e
sua utilização na resolução de problemas que envolvam funções com uma e duas variáveis,
destinadas a estudantes de um curso de Cálculo.
No trabalho, são apresentados muitos exemplos de situações-problema e as análises
matemáticas de resolução das tarefas de derivadas de funções reais a uma ou duas variáveis reais
e a integral de Riemann ou integral dupla com recurso aos softwares Geogebra e Winplot. O
autor apresenta seis módulos de tarefas para o estudo do Cálculo Diferencial e Integral:
Módulo 1: Derivadas para funções com Uma variável;
Módulo 2: Otimização de funções com Uma variável;
Módulo 3: Construção de gráficos para funções com Duas Variáveis;
Módulo 4: Derivadas Parciais, Pontos Máximos, Mínimos e Sela;
Módulo 5: Integrais para com funções com Uma Variável;
Módulo 6: Integrais Duplas.
É um trabalho centrado na solução de tarefas com a utilização dos softwares
considerados, que mostra as possibilidades e facilidades que os mesmos (Geogebra e Winplot)
comportam no plotar os gráficos de funções e suas correspondentes expressões algébricas. O
autor complementa o que visualmente é apresentado com comentários sobre os aspectos notáveis
nessas representações, como, por exemplo, os pontos críticos (pontos extremos e pontos de
inflexão), intervalos de monotonia, convexidade, entre outros. Para além dessas interpretações,
para cada situação-problema, principalmente nos problemas de aplicação, o autor apresenta a
representação gráfica (ou figural) da situação, seguida de uma análise matemática, elaborando a
solução sem explicitar o desenvolvimento do trabalho matemático realizado, o que pode ter sido
feito por meio de um discurso oral. A seguir, apresentamos dois exemplos dessa interpretação.
51
FIGURA 8 – OTIMIZAÇÃO COM O GEOGEBRA. FIGURA 9 – SOMAS APROXIMADAS NO
GEOGEBRA.
Exemplo 1: Exemplo 2: Aproximação da integral por
somas superiores e inferiores de Darboux
Análise matemática do problema:
condição: perímetro
2x + 2y = 12
x + y = 6
y = 6 – x
função: área
f(x) = x(6 – x)
f(x) = -x2 + 6x
otimização
f’(x) = -2x + 6
-2x + 6 = 0
x = 3
FONTE: Paranhos (2009, p. 77)
FONTE: Paranhos (2009, p. 32)
Este trabalho tenta estabelecer uma ligação entre a ferramenta computacional e a
resolução com significado das atividades matemáticas, relacionando a visualização e a
interpretação discursiva escrita dos conceitos matemáticos visados; mas nos exemplos
apresentados não está explícita a interpretação discursiva escrita que certamente foi feita de
forma oral.
Neste momento, é importante destacar que é nessa direção que pretendemos encaminhar
a nossa pesquisa, embora o foco, para nós, seja verificar como os estudantes reagem com essa
prática e os argumentos que eles utilizam para explicar seu raciocínio. Além disso, observamos se
essa prática pode ajudar na construção do conhecimento dos estudantes sobre a derivação e a
integração definida de funções reais a uma variável real. Esperamos ainda que as definições e
propriedades dos objetos matemáticos visados surjam diretamente da reflexão sobre as
observações identificadas na execução das tarefas propostas. Ou seja, analisamos a partir do
trabalho dos estudantes, por meio da utilização do software Geogebra e da mídia lápis e papel,
52
qual o discurso tecnológico oral e escrito estabelecido, qual a formulação do problema diante da
situação proposta.
Consideramos importante ressaltar o trabalho de Farias (2007), que analisa o papel das
representações no ensino e na aprendizagem da matemática com o recurso ao computador. Na sua
dissertação de mestrado, intitulada “As representações matemáticas mediadas por softwares
educativos em uma perspectiva semiótica: uma contribuição para o conhecimento do futuro
professor de Matemática”, a autora coloca como objetivos:
Investigar e ressaltar as potencialidades didático-cognitivas das representações
matemáticas em uma perspectiva semiótica, mediadas por softwares educativos, no
contexto da Disciplina Cálculo Diferencial e Integral I; Investigar e evidenciar os limites
e as possibilidades didático-pedagógicas das representações matemáticas na formação
didático-pedagógica do futuro professor de matemática (FARIAS, 2007, p. 66).
Por meio da observação das aulas de Cálculo Diferencial e Integral, de entrevista com
professores e estudantes sobre o ensino e a aprendizagem do Cálculo e aplicação de atividades
exploratório-investigativas com os mesmos, discutindo os conceitos de continuidade e de
derivada de funções reais a uma variável real e de otimização, com recurso ao Winplot, o estudo
explorou a relevância das múltiplas representações proporcionadas pelo software, acompanhadas
das falas dos estudantes e registros escritos e interpretativos. Como resultados principais, o
trabalho mostra que:
O estudo do Cálculo Diferencial e Integral na Universidade é feito com muitos
problemas que resultam da falta de conexão entre as noções de base dessa disciplina com o que
os estudantes aprendem no Ensino Médio.
As representações matemáticas são essenciais para a compreensão e visualização
dos conceitos matemáticos. A associação das representações gráficas à visualização de conceitos
é um meio para compreender e perceber o que está sendo representado na forma algébrica ou em
lingua natural, quer seja no estudo de uma função ou na demonstração de um teorema.
As representações matemáticas, quando inter-relacionadas e mediadas por
softwares educativos, nesse caso o Winplot, promovem uma compreensão com significado
unificado e global dos conceitos matemáticos, além de esses constituírem-se em um meio de
comunicação entre a Matemática escolar e a Matemática universitária.
A pesquisa apresenta informações importantes para a compreensão do papel das
representações, em particular, o recurso ao computador no ensino e na aprendizagem do Cálculo
53
Diferencial e Integral de funções reais de uma variável real. Ressaltamos que a pesquisa conduz a
considerar a importância do recurso tecnológico, pois, segundo a autora, ao interagir com o
computador, os estudantes refletem e tomam consciência do que significa aquilo que aprendem.
Neste trabalho, notamos, por exemplo, que no início, todos os estudantes participantes
da pesquisa pensavam que a função
132
11)(
2
xsex
xsekxxf , colocada na primeira atividade,
era contínua, antes de refletir sobre o papel do parâmetro k, que poderia tomar valores para os
quais a função não seria contínua. Outros, até, nem sabiam o que queria dizer função contínua.
Por meio da visualização, compreenderam o conceito de continuidade e foram capazes de
determinar para quais valores do parametro k a função f era contínua.
Por meio da representação gráfica no computador e animação das construções, os
estudantes adquiriram informações importantes sobre os conceitos de derivadas de funções e de
otimização, o que tornaria essa discussão muito difícil, caso o ambiente fosse de lápis e papel.
Assim, consideramos que, com o Geogebra, dada sua dinamicidade aprimorada, a
descrição da derivada de funções reais a uma variável real, da emergência da função derivada e
da integral definida, pode dar mais significado e possibilitar a interpretação correta desses
conceitos, o que experimentamos no nosso estudo.
O que autores anteriormente referidos escreveram sobre a exploração do computador no
ensino é realçado por Marin (2009) na sua dissertação de mestrado, com o título “Professores de
Matemática que usam a tecnologia de informação e comunicação no ensino superior”. Ele
procura saber: “Como os professores usam a TIC na disciplina de Cálculo?”, por meio de
entrevistas via internet a professores de Cálculo previamente localizados.
Como resultado da pesquisa, os entrevistados afirmaram que o uso do computador na
sala de aula proporciona, para os estudantes e professores, possibilidades de investigar e analisar
questões específicas da Matemática, que somente com lápis e papel fica muito difícil ou mesmo
impossível abordar. Ainda segundo os entrevistados, esse modo de trabalhar amplia as
possibilidades de discutir as atividades por diferentes representações, tais como: tabelas, gráficos
e expressões algébricas de forma rápida e articulada; proporcionando uma organização das
situações pedagógicas com maior potencial para a aprendizagem.
54
Os professores apontaram os seguintes conteúdos como favoráveis ao uso das TIC:
Funções, coeficiente angular, reta tangente, limites, máximos e mínimos de funções, introdução
de Derivadas e Integrais e anotaram que essas discussões devem ser realizadas em paralelo com a
institucionalização teórica do conhecimento em jogo.
Segundo os entrevistados, o computador favorece a formulação e verificação de
conjecturas, pois possibilita produções visuais, mas não permite a elaboração de demonstrações.
Por outro lado, são apontados como obstáculos na implementação dos processos de
ensino e de aprendizagem via TIC:
A existência de muitos professores na situação de horistas (cerca de 44%, segundo
o estudo) estimulada pela precarização da função docente, que não deixa tempo suficiente para o
professor planejar bem as suas atividades;
Falta de meios tecnológicos em algumas instituições de Ensino Superior;
Falta de domínio da linguagem computacional pelos professores, posto que a
maioria deles não teve experiência com esse tipo de ensino durante a sua vida escolar.
O trabalho acima nos conduz a considerar que as atividades no computador devem fazer
parte da produção de demonstrações, quando as entendemos como discurso racional que justifica
ou explica um resultado; como parte da produção das definições e de indicadores das condições
de existência dos objetos matemáticos de que se fala e do que eles são. Portanto, essas atividades
fazem parte da produção do conhecimento matemático, o que parece ser contrário à afirmação de
que o computador não favorece as demonstrações. Esse tipo de análise também é feita em nossa
pesquisa, uma vez que identificamos o trabalho desenvolvido pelos estudantes não somente pela
utilização do software, mas também por meio das dicussões com seus pares e das produções
escritas.
Consideramos também a dissertação de Melo (2002), intitulada “Conceito de Integral:
uma proposta computacional para seu ensino e aprendizagem”, na qual o autor salienta, tal como
outras pesquisas referidas anteriormente, o papel do computador na prática de ensino e
aprendizagem da matemática. O objetivo desse estudo foi o de responder à questão da pesquisa,
“Os estudantes são capazes de construir o conceito da Integral, por meio de atividades que
levem em conta sua gênese, utilizando um software matemático?” Para responder a essa questão,
o autor implementou uma sequência de ensino em um ambiente computacional, com o foco sobre
55
Integral de Riemann como limite comum das somas inferior, média e superior de Darboux,
recorrendo ao software Maple.
Com um total de 30 participantes, organizados em duplas, em um ambiente
computacional, procura-se construir o conceito da integral de Riemann. No experimento de
ensino considerado, são analisadas as somas superiores, inferiores e médias e conclui-se que a
integral de Riemann é o valor comum dessa soma. As seguintes figuras mostram algumas fases
dessa construção:
FIGURA 10 – SOMAS DE ÁREAS APROXIMADAS COM O MAPLE.
Fig. 6a: Soma inferior de
Darboux.
(MELO, 2002, p. 90)
Fig. 6b: Soma superior de Darboux.
(MELO, 2002, p. 99)
Fig. 6c: Soma tomando os
pontos médios dos intervalinhos
da partição. (MELO, 2002, p.
107)
FONTE: Melo (2002, p. 107).
Dessas visualizações, os estudantes concluíram que, com o refinamento contínuo das
partições, existe um número para o qual cada aproximação tende. E esse número é o mesmo para
o qual tendem as três aproximações. E tal número é o limite infinito das somas parciais em cada
caso, e é chamado de Integral de Riemann, ou seja, os estudantes, por meio da reflexão conduzida
através do software, são capazes de conjecturar e chegar a uma noção intuitiva de limite no
infinito.
Nas análises dos resultados, é destacado que a utilização da mídia computacional
favoreceu o surgimento do processo de visualização, do aprofundamento do pensamento
matemático, das conjecturas, das refutações e das validações.
Esse trabalho dá uma boa contribuição para a reflexão sobre o que pretendemos fazer, já
que uma parte da nossa pesquisa é sobre a Integral de Riemann. Podemos colocar, como questão,
por exemplo: do que esta pesquisa não dá conta que ainda possa motivar a investigação?
56
Na verdade, há muita coisa por explorar sobre como discutir um determinado assunto,
neste caso, Integral de Riemann com recurso ao software computacional. Na pesquisa de Melo
(2002), foi usado o Maple e na nossa, pretendemos usar o Geogebra. Talvez seja por causa das
características do Maple, na discussão conduzida por Melo, as somas inferior e superior não são
tomadas simultaneamente como pode acontecer com o Geogebra. Tomar essas somas ao mesmo
tempo pode favorecer a visualização de que cada soma superior é uma cota superior de qualquer
soma inferior e cada soma inferior é uma cota inferior de qualquer soma superior. E por esta
razão, pode-se concluir que a sequência de somas inferiores tem supremo e a sequência de somas
superiores tem ínfimo. Estabelecer essas propriedades é importante, pois são as premissas da
existência do objeto matemático integral definida. Nesse caso, o software não só desempenha o
papel de visualização dos acontecimentos, mas também indica as condições de existência das
premissas. Julgamos que esse seja um dos méritos do recurso a um software numa aula de
Matemática: tornar possível indicar as condições de existência dos objetos matemáticos que se
pretende construir. Apenas visualizar, sem destacar as condições de existência do que se visualiza
nos parece não ser suficiente.
Observamos ainda que Melo (2002) elege algumas experiências que estão sendo
realizadas nas instituições de Ensino Superior brasileiras e americanas no que se refere ao uso de
softwares educacionais no ensino da Matemática. Entre as instituições brasileiras, refere:
Instituto de Ciências Matemáticas da USP/São Carlos;
Universidade de Campinas;
PUC-RS;
Universidade Federal de Viçosa.
A pesquisa de Melo (2002) foi desenvolvida em 2002, e hoje, a julgar pela dinâmica de
como as tecnologias informacionais estão se espalhando pelo mundo, é de admitir que sejam
casos raros encontrar uma universidade sem pelo menos um laboratório destinado à realização de
aulas de Matemática com recurso a algum software. Portanto, usar computador numa aula de
Matemática é uma necessidade ditada pelo contexto da nossa vida social, na qual a escola se
insere. Apesar do uso de computador ser uma exigência das diretrizes curriculares dos cursos
superiores, vale ressaltar que esse trabalho ainda é bastante rudimentar, uma vez que nem sempre
as instituições dispõem das condições técnicas e humanas necessárias para sua implementação.
57
Na sequência, apresentamos algumas pesquisas estrangeiras que mostram a importância
da nossa pesquisa, assim como sua originalidade.
2.4 OUTRAS PESQUISAS QUE AUXILIAM NO DESENVOLVIMENTO DO NOSSO
ESTUDO
A seguir, destacamos alguns trabalhos estrangeiros considerados na nossa pesquisa.
Leng (2011), no seu trabalho intitulado “Using an advanced praphing calculator in
teaching and learning of calculus”, usou calculadora gráfica avançada, TI-NspireTM
para estudar
como a tal tecnologia, TI-NspireTM
, poderia melhorar o ensino e aprendizagem do Cálculo.
Segundo a descrição do autor, TI-NspireTM
é uma calculadora gráfica munida de um
dispositivo para navegação, o que viabiliza conexão com a internet, quando se trabalha numa sala
com wireless, o que foi o caso nesta pesquisa, tornando possível o contato instantâneo e interação
ativa entre os estudantes e os professores.
O estudo usou como metodologia o Design Experiment, que envolveu a preparação, o
design, implementação, e análise retrospectiva de um experimento de ensino. Participaram da
pesquisa 35 estudantes do quarto ano de uma escola secundária em Cingapura. A cada estudante,
foram emprestados o TI-NspireTM
portátil e os acessórios para a transferência de dados e para a
conexão ao navegador do TI-NspireTM
. Visando à familiarização com o aparelho, foram
desenvolvidas catorze sessões de treino de cerca de 30 minutos cada uma antes do programa de
intervenção. O programa de intervenção teve a frequência de duas a três aulas semanais de uma
hora sobre conceitos de Cálculo, durante 15 semanas.
Os tópicos discutidos nesse programa foram: a diferenciação e os seus primeiros
princípios básicos, equações de reta tangente e normal, taxa de variação, pontos estacionários,
derivadas de funções trigonométricas, exponenciais e logarítmicas, integrações e integrais
indefinidas, integrais definidas, integração de funções trigonométricas, exponenciais e da função
homógrafax
xf1
)( e área de uma região.
O autor salienta que, no estudo, a TI-NspireTM
estava intimamente integrada aos
processos de ensino e de aprendizagem por meio de atividades específicas introdutórias
intrigantes para os estudantes, envolvendo a ferramenta, que ao mesmo tempo os encorajava a
58
explorar a questão na esperança de que isso conduzisse às generalizações. A TI-NspireTM
foi
também usada para enfatizar os aspectos complementares das representações gráfica, numérica e
algébrica e encorajar as diferentes abordagens na resolução de problemas.
O quadro seguinte apresenta uma parte das atividades cognitivas.
Baseando-se na literatura, o autor estabeleceu um esquema de interação na sala de aula,
que denominou esquema conceitual (A conceptual framework) para o ensino e aprendizagem do
Cálculo via T1-NspireTM
:
FIGURA 11 – ESQUEMA CONCEITUAL: ENSINO E APRENDIZAGEM DO CÁLCULO VIA T1-NSPIRETM.
Student
TI-NspireTM with
wireless network
in the classroom
Guided discovery and
inquiry-based design
learning tasks
FONTE: Leng (2011, p. 927).
No quadro que segue, apresentamos algumas atividades da aprendizagem que o autor
usou na sua pesquisa
QUADRO 1 – ATIVIDADE DA APRENDIZAGEM COM TI-NSPIRETM
xsenxdx
dcos)(
Note:
a) Use TI-Nspire para verificar o resultado acima
(dffTrigoA.tns). O gradiente da reta tangente a y = sen(x) em um
ponto dado dá o valor da derivada de y = sen(x) naquele ponto.
b) Use a reta tangente para traçar um gráfico aproximado da
derivada de y = sen(x). O declive da tangente é mostrado à direita
acima do ecran. Sua tarefa é mover a reta tangente arrastando o
ponto de tangência tal que seja posicionado diretamente acima de
cada um dos 13 pontos, começando do ponto mais à esquerda.
c) Inspecione o gráfico de dispersão resultante, que
representa o gráfico aproximado da derivada da função seno.
Escreva suas observações.
d) Use os gráficos e aplicação da Geometria na próxima
página para verificar a sua resposta.
FONTE: Leng (2011, p. 929, tradução nossa).15
15 a) Use TI-Nspire to verify the above result (diffTrgoA.tns). The gradient of the tangent line to y = sin(x) at a
given point gives the value of the derivative of y = sin(x) at that point.
b) Use the tangent line to trace an approximate graph of the derivative of y = sin(x). The slope of the tangent is
shown at the top right of the screen. Your goal is to move the tangent line by grabbing and dragging the point of
tangency such that it is positioned directly above each of the 13 points, beginning with the left most point.
59
Consideramos essa atividade apropriada para fazer emergir, naturalmente e com sentido,
o conceito da função derivada, que associa cada valor x do domínio de f ao coeficiente angular
da reta tangente ao gráfico de f no ponto x. É uma abordagem muito diferente das práticas
comuns que não esclarecem (ou melhor, não deixam claro) a relação existente entre a derivada de
uma função f em um ponto e a função derivada 'f .
A discussão das tarefas teve duas formas:
1. Com o foco na introdução aos conceitos matemáticos por meio da exploração via
TI-NspireTM
, os estudantes eram encorajados a examinar as tarefas propostas, manipulando os
parâmetros. Depois, eram solicitados a formular conjecturas, examiná-las e confirmá-las,
culminando no estabelecimento de uma fórmula, na generalização dos resultados ou no resumo
dos conceitos subjacentes às atividades. Uma folha de questões foi concebida para acompanhar
essas atividades, de modo a facilitar as descobertas guiadas.
2. Os estudantes recebiam tarefas para serem resolvidas com recurso a TI-NspireTM
visando reforçar sua compreensão das noções discutidas em sala de aula.
Como resultado, o autor considera que:
O uso apropriado das representações gráficas, numéricas e algébricas, dos conceitos de
Cálculo com o recurso a TI-NspireTM permitiu aos estudantes melhor visualizar os
conceitos e fazer generalizações acerca das propriedades matemáticas relevantes. Além
disso, os estudantes foram capazes de relacionar as múltiplas representações,
especialmente as algébricas e gráficas, para melhorar sua compreensão conceitual e as
habilidades na resolução de problemas (LENG, 2011, P. 925, tradução nossa).16
Como referimos acima, o estudo é muito pertinente, pois mostra uma abordagem
diferente para o Cálculo, numa perspectiva promissora, uma vez que realça elementos de
significado das questões discutidas, com um envolvimento ativo dos estudantes e com um
enfoque multirrepresentacional. É uma proposta que esboça um aproveitamento efetivo das
tecnologias digitais na aprendizagem de alguns conteúdos curriculares nas instituições de ensino.
c) Inspect the resulting scatter plot, which represents the approximate graph of the derivative of the sine
function. Write down your observations.
d) Use the Graphs and Geometry application on the next page to verify your answer.
16 It was found that the appropriate use of graphical, numerical and algebraic representations of calculus
concepts using TI-NspireTM enabled students to better visualize the concepts and make generalizations about
relevant mathematical properties. In addition, the students were able to link multiple representations, especially
algebraic and graphical representations, to improve their conceptual understanding and problem-solving skills.
60
Na nossa pesquisa, abordamos o conceito de derivada sob a mesma perspectiva
utilizando o software Geogebra, que nos permite ampliar as possibilidades de recurso às
representações.
Consideramos ainda o trabalho de Thurston (1995, 1994), que aponta ser o conceito de
derivada um dos temas da Matemática em que os estudantes apresentam muitas dificuldades.
Para ele, esse conceito pode ser pensado de múltiplas formas, como as indicadas na sequência.
1. Como infinitesimal: a derivada como uma relação de mudança infinitesimal do
valor da função à mudança infinitesimal da variável;
2. no sentido simbólico: a derivada como resultado de uma certa manipulação
simbólica. A derivada de xn é nx
n-1, a derivada de sen(x) é cos(x), a derivada de fg é f’gg’ etc.
3. no sentido lógico: a derivada como objeto definido sob certas condições lógicas.
f’(x) = d, se e somente se, para cada , existe um tal que se
0 < | xΔ | < então ε
dΔx
f(x)Δx)f(x
4. no sentido geométrico: a derivada como o declive da reta tangente ao gráfico de f
em um ponto P dado, se o gráfico tiver uma reta tangente nesse ponto;
5. taxa de variação: a derivada como taxa de variação instantânea de f(t) se t for o
tempo;
6. uma aproximação: a derivada como aproximação linear de uma função f, nas
proximidades do ponto A dado;
7. do ponto de vista microscópico: a derivada de uma função como o limite do que se
vê sob um microscópio ampliando cada vez mais (THURSTON, 1995, p. 10, tradução nossa).
Conforme Thurston (1995, 1994), estas são algumas entre muitas outras maneiras de
pensar sobre a derivada, o que o autor denomina diferentes pontos de vista para considerar esse
conceito. O autor não trata da introdução de software, mas seu trabalho nos auxilia na escolha dos
pontos de vista mais adequados para o estudo da derivada com o recurso computacional.
As diferentes maneiras de pensar sobre a derivada são também expostas por Artigue
(1991), no seu trabalho intitulado “Analysis”, no qual faz uma breve consideração histórica da
evolução dos conceitos de derivada de uma função real a valores reais e da integral definida,
seguida de uma análise da problemática do ensino e da aprendizagem desses conceitos.
61
Entre os trabalhos apresentados por Artigue (1991), destacamos o de Aldon (1995), que
utiliza como recurso o software DERIVE para desenvolver com seus estudantes o estudo de
alguns conceitos de Análise. O autor realça a importância do uso desse recurso de ensino e de
aprendizagem da Matemática, pois segundo ele, a utilização do DERIVE na classe de Matemática
permite:
apropriar-se de uma gama de heurísticas variadas, colocar em prática um melhor
controle, manter como guia para o problema posto.
modificar o ensino da análise reduzido ao treinamento das técnicas de cálculo para
o uso de conceitos (comparação, aproximação, …).
construir as microteorias matemáticas sobre os microcampos do saber.
Para Aldon (1995), o conhecimento retrospectivo do software enseja um melhor
aproveitamento das possibilidades e dos limites do mesmo; é preciso fazer uma apropriação da
ferramenta e ter um olhar crítico quanto à sua utilização. A conclusão do trabalho destaca
exatamente este último ponto, a necessidade do uso crítico da ferramenta computacional, em
particular, nas aulas de Matemática.
Na sequência, salientamos que, no sistema educativo moçambicano, os conceitos
fundamentais de Cálculo Elementar, que se estruturam em torno dos conceitos de número real,
função, limites de sequências numéricas e de funções, continuidade, derivada e integral de
funções reais a valores reais, são introduzidos no Ensino Médio e seu estudo continua no Ensino
Superior. Observamos aqui que o sistema de ensino moçambicano se aproxima do sistema de
ensino francês no que se refere à introdução dos conceitos de Cálculo, quando comparamos com
os estudos de Artigue (1991).
As pesquisas acima apresentadas serviram, tanto para justificar nossa escolha do
conteúdo matemático, quanto da utilização do software articulado com outras mídias no estudo
da mediação didática na construção do conhecimento associado aos conceitos de derivada de uma
função real a valores reais e integral de Riemann, como mostramos mais adiante.
Observamos ainda que algumas tarefas apresentadas nas pesquisas acima consideradas
foram por nós utilizadas, uma vez que trabalhávamos com um software que apresenta diferentes
possibilidades que permitem melhor visualização e interpretação dos resultados como, por
exemplo, a tarefa proposta por Melo (2002), que utilizou o mapple, cuja diferença de tratamento
62
para a tarefa proposta está na construção isolada dos gráficos para o estudo da integral de
Riemann. Lembramos que na descrição das pesquisas consideradas acima, já explicitamos seu
interesse para o nosso estudo, assim como a diferença entre elas e a nossa proposta.
Além disso, no final deste capítulo, fazemos algumas considerações sobre a importância
dessas pesquisas para o nosso estudo e alguns aspectos que julgamos peculiares a ele.
Como a nossa pesquisa tem como foco o estudo da derivada e da integral e sendo esses
conceitos introduzidos a partir do Ensino Médio para os estudantes de Moçambique, que foram
os sujeitos que participaram da pesquisa, consideramos importante analisar algumas pesquisas
sobre a transição entre o Ensino Médio e o Superior. Alguns estudos discorrem sobre como essa
transição é feita.
2.5 PESQUISAS SOBRE A TRANSIÇÃO DO ENSINO MÉDIO PARA O ENSINO
SUPERIOR
Consideramos aqui as pesquisas sobre a transição entre o Ensino Médio e o Ensino
Superior, apresentando apenas aquelas cuja perspectiva antropológica é central para o seu
desenvolvimento.
Iniciamos com a pesquisa de Azzolini (2012) que, na sua dissertação de mestrado,
propõe-se a compreender quais as relações institucionais que sobrevivem e se reconstroem
atualmente no ensino, quando se introduzem os conceitos de equação e função quadráticas e o
que pode ser considerado como conhecimento retrospectivo disponível no início do Ensino
Superior.
Embasada na Teoria Antropológica do Didático de Chevallard (1991, 1992, 1994; Bosch
e Chevallard (1999), nas noções de quadro e mudança de quadros conforme Douady (1984, 1986)
e nos níveis de conhecimento esperados dos estudantes, segundo definição de Robert (1997,
1998), a autora faz uma análise documental (Parâmetros Curriculares Nacionais dos Ensinos
Fundamental e Médio e de alguns livros didáticos recomendados pelo Ministério da Educação e
Cultura – MEC, e outros constantes da bibliografia básica das grades curriculares das instituições
escolares analisadas) para compreender as propostas institucionais de funcionamento dos
conceitos matemáticos de equação e função quadráticas e para identificar quais os conhecimentos
retrospectivos podem ser considerados como mobilizáveis ou disponíveis na transição entre o
63
Ensino Médio e o Superior. Nas conclusões, a autora registra que os documentos analisados
consideram o estudo da equação e da função quadráticas de forma articulada com os
conhecimentos retrospectivos adequados aos diferentes níveis de escolaridade, cabendo aos
cursos de formação inicial e continuada de professores auxiliá-los a compreenderem e serem
capazes de reconhecer e utilizar os conhecimentos retrospectivos de seus estudantes no momento
da introdução de novos conhecimentos.
Consideramos ainda a tese de doutorado de Andrade (2012), que busca compreender os
diferentes processos de estudo e ajuda ao estudo que sobrevivem/reconstroem-se atualmente nos
Ensinos Médio e Superior, de modo a auxiliar as escolhas dos professores e conduzir a um
processo satisfatório que permita que os estudantes sejam capazes de utilizar os conhecimentos
matemáticos desenvolvidos no Ensino Médio, quando esses são considerados como
conhecimentos retrospectivos disponíveis para a introdução de novos conhecimentos ou para
utilização como ferramenta nas outras ciências. Com o foco sobre o conceito de função
exponencial, nas considerações finais do capítulo sobre o estado da arte, a autora indica que os
trabalhos sobre transição não tratam especificamente do conceito de função exponencial e não
analisam as diferentes formas de tratamento desse conceito nas etapas escolares consideradas.
Assim, em relação aos estudos já realizados, uma das contribuições de seu trabalho para a
Educação Matemática é que ele tornou possível identificar que no início do Ensino Superior os
estudantes dispõem de conhecimentos sobre as funções numéricas, suas representações e
propriedades, em particular, sobre a função exponencial. Usando as definições de Robert (1997,
1998), sobre níveis de conhecimentos, a autora aponta que esses conhecimentos são apenas
mobilizáveis, exigindo uma revisita às funções já trabalhadas no Ensino Médio de forma
articulada com a disciplina de Cálculo Diferencial e Integral, o que pode contribuir para o
desenvolvimento de conhecimentos disponíveis e sua aplicação em Matemática e nas outras
ciências.
Uma outra pesquisa que consideramos importante na análise da problemática da
transição do Ensino Médio ao Superior, é a pesquisa da Bosch et al. (2004), intitulada
“Incompletitud de las Organizaciones Matemáticas Locales en las Instituciones Escolares”.
Baseando-se na Teoria Antropológica do Didático e por meio de dados empíricos obtidos dos
questionários submetidos aos estudantes do primeiro ano do Ensino Superior e da análise de
64
livros escolares, os autores constatam que as Organizações Matemáticas17
que vêm sendo
trabalhadas no Ensino Médio estão mais confinadas ao bloco prático-técnico, desenvolvidas em
torno de técnicas isoladas e sobre uma Organização Matemática Pontual. Contrariamente a essa
prática da escola secundária, a instituição de Ensino Superior, segundo os autores, desenvolve sua
atividade docente sobre o bloco tecnológico-teórico. Quer dizer, o ensino universitário centra-se
no ensino de teorias, sem ligação com as técnicas elaboradas no secundário. Uma das conclusões
dos autores é a de que uma das dificuldades em estudar Matemática na transição entre o Ensino
Médio e o Ensino Superior está associada principalmente a essa distinção entre as organizações
matemáticas dessas duas etapas escolares, refletindo-se em contradições e mudanças precipitadas
entre esses dois contratos didáticos.
Portanto, são muitos e vários problemas da fase de transição do Ensino Médio para o
Ensino Superior. As pesquisas analisadas tentam caracterizar a natureza desses problemas e como
devem ser encarados nas instituições de ensino.
2.6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
A análise dos trabalhos já realizados possibilitou-nos compreender a preocupação que
existe na área do nosso estudo: o recurso às tecnologias digitais no ensino e na aprendizagem dos
conteúdos curriculares, com enfoque no domínio da Matemática sobre funções, com particular
incidência no Cálculo Diferencial e Integral.
Tais pesquisas resumem as seguintes características:
Descrição das possibilidades e potencialidades do computador no tratamento do
conteúdo de ensino e de aprendizagem na sala de aula;
17 Organização Matemática é definida por Chevallard (1997) como uma praxeologia de natureza matemática,
composta por um ou vários tipos de tarefas matemáticas, para as quais são criadas técnicas, mais ou menos bem
adaptadas e justificadas por meio de tecnologias matemáticas mais ou menos sólidas que são desenvolvidas no
quadro de uma teoria matemática mais ou menos explícita.
65
Pesquisa de opinião sobre as possibilidades e potencialidades do computador no
tratamento do conteúdo de ensino e de aprendizagem na sala de aula;
Observação (de aulas em ambiente computacional) e pesquisa de opinião sobre as
possibilidades e potencialidades do computador na aula;
Pesquisa experimental num ambiente de interação com os estudantes, visando
perceber os raciocínios que eles fazem na resolução das tarefas matemáticas
preparadas pelo pesquisador, incluindo discussões para ultrapassar os possíveis
equívocos e questionamentos sobre os significados dos objetos matemáticos
visados;
Pesquisa experimental num ambiente de interação com os estudantes visando
destacar as possibilidades e as potencialidades do computador na modelagem de
problemas matemáticos com algumas comparações entre os diferentes resultados
produzidos;
Pesquisas sobre a transição entre os Ensinos Fundamental, Médio e Superior no
domínio matemático sobre funções e Cálculo Diferencial e Integral. O estudo
ensejou-nos compreender a problemática da transição entre os ensinos Médio e
Superior. Essa compreensão permite caracterizar melhor os problemas que
ocorrem no Ensino Superior, onde desenvolvemos a nossa pesquisa.
De modo geral, esses estudos, por um lado, colocam em evidência as possibilidades e
potencialidades dos recursos digitais no tratamento dos conteúdos curriculares e por outro,
apontam desafios que resultam no uso desses meios na prática escolar, especialmente na
formação do pessoal docente.
Há problemas específicos que surgem relacionados com questões do tipo: o que o
computador é capaz de potencializar e o que não é capaz de favorecer, tendo em conta a
complexidade do próprio sistema educativo, e ainda, num contexto específico não habituado a
essa prática, como é o caso de Moçambique? Como relacionar o uso do computador com as
práticas existentes nas instituições de ensino?
Questões desse tipo levaram-nos a identificar alguns aspectos que nas pesquisas
analisadas não são claramente discutidos mas que, no nosso entender, precisam de uma nova
investigação:
66
- a integração de algum software matemático no ensino e na aprendizagem de um
conteúdo curricular matemático nas instituições moçambicanas. Com efeito, na realidade
moçambicana, não temos nenhuma informação a respeito do uso de um software para estudar
algum conteúdo matemático na sala de aula;
- a articulação dos processos de animação, das variáveis cor e espessura das construções
e de padrões numéricos para os estudantes discernirem tendências dos processos matemáticos
conducentes aos conceitos de limite da razão incremental e de sequências de somas de retângulos
aproximantes, que são variáveis não consideradas explicitamente nos estudos apresentados
acima;
- a análise, representação e descrição gráfica explícita da taxa de variação por meio do
recurso slope (declive) existente no Geogebra, que não é considerada nas pesquisas acima
discutidas;
- a análise, representação e descrição explícita da função derivada, tomando como
ordenada do ponto móvel o slope (declive) da reta tangente ao gráfico da função dada nos seus
diversos pontos. Trata-se de uma experiência não utilizada nas pesquisas acima apresentadas;
- a análise e o relacionamento explícito entre os conceitos de supremo (ínfimo) de uma
função contínua limitada, definida num intervalo limitado e fechado com os conceitos de áreas de
retângulos aproximantes e a propriedade de sequências numéricas monótonas limitadas por meio
da visualização das propriedades de aproximações.
- o estudo articulado entre as propostas dos materiais didáticos, os níveis de
conhecimentos dos estudantes visados e a experimentação de uma mediação didática. Dos
estudos analisados não percebemos articulação dessas três partes.
Isso nos conduziu a determinar inicialmente as características do cenário da pesquisa,
em particular, para a utilização do Geogebra como ferramenta de apoio para a reflexão sobre as
noções matemáticas a serem desenvolvidas, o que nos levou a estabelecer um quadro teórico que
serve para fundamentar o trabalho realizado e justificar as respostas encontradas a partir do
método desenvolvido na pesquisa.
Na sequência, apresentamos o referencial teórico que também nos auxiliou a aprimorar
as questões acima expostas, que correspondem ao início da pesquisa.
67
3 REFERENCIAL TEÓRICO
[…] theory is the practitioner’s most powerful tool
in understanding and changing practice.
Paul Ernest (1994, p. viii).
3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Assumimos a frase acima de Paul Ernest como imperativa à pertinência do referencial
teórico.
Além disso, pensamos como Robert (1992), que esse referencial permite identificar de
forma mais clara os objetivos da pesquisa destacados no capítulo que segue e auxilia a interpretar
e justificar os dados encontrados. Para tal, consideramos as seguintes teorias:
- Teoria Antropológica do Didático – TAD de Chevallard (2014, 2011, 2002, 1999,
1998, 1994, 1992) e Bosch e Chevallard (1999). Consideramos nesta teoria as noções de
dinâmica cognitiva, praxeologia, objetos ostensivos e não ostensivos na atividade matemática,
ecologia e hierarquia de níveis de codeterminação. Com essas noções, essa teoria ajudou-nos na
análise de contextos institucional e pessoal dos conceitos de derivadas de funções reais de uma
variável real e de integral de Riemann.
- Teoria de instrumentação de Rabardel (2002, 1995). Esta teoria deu-nos suporte para
refletir sobre a relação que o pesquisador e os estudantes foram construindo na interação com as
tarefas e com o computador durante as discussões nas sessões experimentais.
Como referencial teórico de apoio, temos:
- Noções de quadro e mudanças de quadros de Douady (1984). Estas noções ajudaram-
nos a interpretar algumas formulações das tarefas no contexto da construção do conhecimento
matemático, tanto as que se verificaram nos materiais de ensino, tanto as que foram tendo lugar
nas discussões das sessões experimentais.
- As noções de níveis de conhecimento esperados para o funcionamento dos estudantes,
segundo definição de Robert (1998). Estas noções nos nortearam para analisar os níveis de
conhecimentos esperados dos estudantes, tanto no estudo das propostas dos materiais de ensino,
quanto ao que foi sendo verificado durante as discussões nas sessões experimentais.
68
Iniciamos com uma breve descrição dos elementos da Teoria Antropológica do Didático
utilizados na nossa pesquisa, com alguns exemplos referentes ao nosso contexto.
3.2 TEORIA ANTROPOLÓGICA DO DIDÁTICO
Nossa opção por esta teoria está associada à proposta da nossa pesquisa, na qual
consideramos as noções da TAD anunciadas acima como elementos de análise das relações
institucionais e consequentemente das marcas dessas sobre as relações pessoais desenvolvidas
pelos estudantes.
A Teoria Antropológica do Didático – TAD – situa a atividade matemática no conjunto
das atividades humanas regulamente desenvolvidas, descrevendo o conhecimento matemático em
termos de organizações praxeológicas ou praxeologias cujas noções básicas são as noções de
tipos de tarefas T, técnicas , tecnologias e teorias Θque permitem modelar as práticas sociais
em geral e a atividade matemática em particular (CHEVALLARD 1992, 1994, 1998, 1999, 2002,
2011, 2014) e (BOSCH e CHEVALLARD, 1999). Destacamos desta teoria, como referimos
acima, as noções de dinâmica cognitiva, ostensivos e não ostensivos na atividade matemática,
praxeologia, ecologia e hierarquia de níveis de codeterminação.
Na perspectiva antropológica, Chevallard (1998) supõe que as primeiras questões de
organização do estudo requerem um modelo mínimo de dinâmica cognitva, no qual são definidos
os conceitos básicos que determinam as atividades de ensino e da aprendizagem (escolar). Tais
conceitos básicos são os conceitos de objeto, de relação pessoal de um indivíduo x ao objeto o, de
pessoa e do conceito de instituição e de relação institucional com o objeto o. Nessas definições,
um objeto é algo que existe (material ou não) na vida de um indivíduo. Assim, um objeto pode
ser uma pessoa, o conceito de derivada de uma função, o símbolo de integração e, em particular,
qualquer obra O. Ressaltamos que Chevallard (1998) define obra como uma parte qualquer de um
complexo de organizações praxeológicas ou praxeologias, podendo ser também uma questão Q a
estudar.
Após definir sistema didático S(x; y; ♥) como uma realidade social que congrega três
entidades: um estudante x, um professor y e um desafio didático ♥, para generalizar e explicitar,
Chevallard (2011) indica por X a instância estudante que corresponde ao conjunto dos membros
69
x, a instância ajuda ao estudo indicada por Y, cujos membros são representados por y e o desafio
didático ♥ que é a obra, designada para ser estudada por X com a ajuda de Y. Como exemplo, o
autor considera o sistema didático escolar, no qual X é um conjunto de estudantes – uma classe,
Y, quase sempre um único professor de determinada matéria (matemática, física...), da qual surge
a obra ♥ a estudar e a aprender.
Chevallard (2011) considera ainda o sistema autodidático que, segundo ele, deve
funcionar no mesmo ambiente do sistema didático comum para garantir seu funcionamento.
Dessa forma, um sistema didático pode ser formado por uma instituição mandante, que
corresponde a um sistema didático principal, que é composto por sistemas didáticos auxiliares e
sistemas didáticos induzidos. Como exemplo de sistema didático principal, Chevallard (2011)
considera o funcionamento da classe e assim a organização de aulas de estudo após a classe ou as
ajudas individualizadas, correspondem aos sistemas didáticos auxiliares. Nessa perspectiva, a
intervenção na nossa pesquisa correspondeu a um sistema didático auxiliar com um conjunto X
de estudantes, um professor Y de Matemática que, ao mesmo tempo, é o pesquisador e uma obra
♥, que correspondeu aos conceitos de derivada de uma função real a valores reais e de integral de
Riemann. Observamos aqui que, nesse sistema didático auxiliar, havia também o software
Geogebra, que representava a instância de ajuda permitindo assim a existência de um sistema
autodidático, pois era necessário que os próprios estudantes refletissem sobre o trabalho
realizado.
Chevallard (2011) ressalta ainda que, por sua constituição, os sistemas didáticos são
frágeis, conduzindo à existência de uma instituição mandante em seu lugar. Essa instituição, em
geral, pode ser considerada como o nível escola na escala dos níveis de codeterminação que
explicitaremos mais adiante.
Assim, Chevallard (2011) observa que para analisar o didático18
presente em uma
determinada situação, o primeiro gesto de análise consiste em identificar os sistemas didáticos
18 O didático e a didática: Segundo Chevallard (2011), em uma situação social dada, existe o didático quando
alguma instância (pessoa ou instituição) propõe-se a fazer (ou faz) algo para que outra instância aprenda o que
ele deseja. Assim, quando uma instituição social contém o didático, Chevallard considera que a mesma faz uso
de uma situação didática. Por exemplo, ao trabalhar com os estudantes no desenvolvimento das sequências
didáticas dessa pesquisa, estamos desenvolvendo situações didáticas, pois o pesquisador deseja que os
estudantes aprendam as noções de derivada de uma função real a valores reais e integral de Riemann. Assim,
conforme Chevallard, a didática é a ciência do didático.
70
S(X ; Y ; ♥) presentes ou evocados na situação a analisar e para cada um deles se esforçar para
responder às questões (que dependem das informações disponíveis ou possíveis de se conjecturar
a respeito): qual é a instituição mandante de S(X ; Y ; ♥)? O que é X? O que é Y? O que é ♥? Que
fazem X e Y para que X aprenda ♥? O que X poderá ter aprendido no curto e no longo prazo, em
função do funcionamento de S(X ; Y ; ♥)? O que Y e alguns ambientes eventuais de S(X ; Y ; ♥)
puderam aprender, no curto e longo prazo, em função de S(X ; Y ; ♥)? Quais mudanças o
funcionamento de S(X ; Y ; ♥) foi capaz de fazer nas condições e restrições que governam o
funcionamento subsequente?
No nosso estudo, tomamos a Universidade Pedagógica de Moçambique, curso de
Licenciatura em Ensino de Matemática, como sendo a instituição mandante do S(X; Y; ♥), pois é
o local onde surgiram a motivação e o contexto no qual se procura responder às questões da
pesquisa. O X neste caso é a instância estudante que estuda Cálculo na Universidade Pedagógica,
curso de Licenciatura em Ensino de Matemática. Y é a instância professor de Cálculo na mesma
Universidade, que assume o papel de ajudante do estudo, fazendo com que X estude ♥, o desafio
didático.
A instância ♥ é o desafio didático, ou seja, a obra designada para ser estudada por X,
com a ajuda de Y. Este desafio didático, no que tange ao tema de nossa pesquisa, se estrutura nos
seguintes domínios, conforme o plano de estudos de 2009 da Universidade Pedagógica.
Derivada e diferencial;
Teoremas gerais do cálculo diferencial;
Estudo da variação das funções;
Curvas contínuas. (MOÇAMBIQUE, 2009, p. 80)
Este é o desafio didático em relação à derivada. Para a integral, o plano estabelece o
seguinte desafio didático:
Integral indefinido;
Integral definido à Riemann
Aplicações do integral definido. (MOÇAMBIQUE, 2009, p. 98).
No contexto moçambicano, especialmente na Universidade Pedagógica e no curso de
Licenciatura em Ensino de Matemática, os processos de ensino e de aprendizagem do Cálculo
acontecem de uma maneira tal, que o professor expõe o conteúdo que deve ser aprendido, isto é,
a obra designada para ser estudada e os estudantes resolvem as tarefas propostas pelo professor
71
na tentativa de assimilar o conteúdo apresentado e serem capazes de transferir o trabalho
realizado para outras tarefas do mesmo tipo.
No plano curricular do curso de Licenciatura em Ensino de Matemática em vigor na
Universidade Pedagógica, são afirmados os objetivos de ensino e de aprendizagem. Para o
Cálculo Diferencial, o plano curricular afirma que ao término da disciplina cursada do Cálculo
Infinitesimal, na qual se estuda a derivada de funções reais a valores, o estudante deve:
Interpretar o conceito de limite;
Usar propriedades, proposições e teoremas no cálculo de limites;
Definir a derivada de uma função como limite da razão incremental;
Calcular a derivada de uma função. Fazer o estudo de uma função com o auxílio de
derivadas;
Estimar valores de funções com o auxílio do diferencial. Determinar equações da
tangente, da normal e curvaturas;
Aplicar os conhecimentos sobre derivadas no cálculo de limites. (MOÇAMBIQUE,
2009, p. 87).
Para a integral, o plano curricular declara os seguintes objetivos do estudo:
No final do estudo da disciplina, os estudantes deverão ser capazes de:
Definir o Integral indefinido a partir do conceito de derivada;
Conhecer e dominar os métodos de integração de funções;
Aplicar os conhecimentos da integração no cálculo de áreas, volumes e na resolução
de problemas de Física;
Aplicar os critérios de convergência no estudo de séries e em problemas diversos.
(MOÇAMBIQUE, 2009, p. 87).
Algumas vezes, o que se declara sobre o que X poderá ter aprendido no curto e no longo
prazo não é realizado satisfatoriamente, pois até o final do semestre correspondente, período
estabelecido para o estudo da disciplina, muitos estudantes são reprovados na disciplina, tal como
indicamos no capítulo 4, quando referimos aos dois episódios que motivaram esta pesquisa.
E perante a constatação das dificuldades do funcionamento de S(X ;Y ; ♥), refletimos
sobre o que estava falhando nesse funcionamento e, na sequência dessa reflexão, decidimos
realizar esta pesquisa.
Continuando, consideramos as noções de relação pessoal e institucional a um objeto o
definidas por Chevallard (1992), a saber:
A relação pessoal de um indivíduo x ao objeto o, designado por R(x, o), é o conjunto de
todas as interações que x pode ter com o objeto o – como manipular, utilizar ou falar sobre o
objeto o; no nosso caso, o objeto o corresponde aos conceitos de derivada de uma função real a
valores reais e integral de Riemann.
72
Assim, dizemos que um indivíduo x age sobre o objeto o, ou seja, sabe ou conhece o
objeto o, quando esse objeto o existe para ele, isto é, se a relação R(x, o) , que significa dizer
que a relação pessoal de x com o objeto o não é vazia. Por exemplo, quando o estudante se refere
à derivada de uma função como coeficiente angular da reta tangente à curva num ponto dado, ele
já mantém uma relação pessoal com o objeto derivada, mesmo se esta não for a que será utilizada
na nova instituição.
Da mesma forma, Chevallard (1992) define relação institucional R(I, o) = RI(o) como
um sistema de todas as interações que uma instituição I pode ter com o. Por exemplo, o ensino de
Cálculo no Ensino Médio e no Ensino Superior corresponde a duas relações institucionais
existentes para os mesmos objetos de estudo. No nosso estudo, os cursos de Cálculo do Ensino
Médio e do Ensino Superior correspondem a duas relações institucionais a que os estudantes de
Moçambique se submetem, quando se propõem a seguir seus estudos em Ciências Exatas.
Vale esclarecer que Chevallard (1998) define instituição I como uma “totalidade” social,
podendo ter uma extensão variável. Por exemplo, uma turma, uma escola, uma sessão onde se
discutem assuntos sobre Cálculo, uma universidade etc. são instituições. Nessa acepção, instituir
é desenvolver, criar, construir (por exemplo, conhecimentos de uma pessoa).
Uma pergunta essencial que se pode colocar é: como se constitui e como se muda ou se
amplia o universo cognitivo U(x)19
de uma dada pessoa x para um determinado objeto o?
A propósito desse questionamento Chevallard (1998) explica que a relação pessoal de x
com o objeto o, R(x, o) muda (ou se cria, se não existir) pela entrada de x em alguma obra O, que
contém o objeto o, em certas instituições, onde x ocupa uma posição p que pode ser a posição de
estudante numa determina turma X, por exemplo, a de participante numa discussão sobre integral
definida, e assim por diante.
Além disso, ao definir que dado um objeto o, uma instituição I e uma posição p em I
chama-se relação institucional RI na posição p em relação ao objeto o, denotada por RI(p, o),
Chevallard (1998) pondera que, para x ser considerado um bom sujeito de I na posição p, é
preciso que R(x, o) RI(p, o), onde designa a conformidade ou a adequação da relação pessoal
de x com o objeto o à relação institucional em posição p. Ou seja, a relação pessoal de um
19 Universo Cognitivo U(x): é o conjunto de todas as relações pessoais não vazias do indivíduo x com o objeto o,
indica-se por U(x) = {(o, R(x, o)) / R(x,o) ≠ }.
73
indivíduo x está conforme com a relação de uma posição p em I. Do mesmo modo se aplica para I
a consideração de que, se existe uma posição p de I tal que RI(p, o) , dizemos que I conhece o
objeto o.
Para o autor, ao tornar-se sujeito de I em posição p, um indivíduo x, que já é uma pessoa
com certo universo cognitivo U(x), sujeita-se às relações institucionais RI(p, o), que vão
(re)modelando, (re)fazendo o seu relacionamento pessoal: se o objeto o existe para os sujeitos de
I em posição p, a relação pessoal de x à o, R(x, o) tende a “assemelhar-se” à relação institucional
RI(p, o).
De uma maneira geral, as nossas relações pessoais com os objetos o são assim o fruto da
história das nossas sujeições institucionais passadas e presentes. Reciprocamente, uma instituição
I, e as diferentes obras O que ela conhece, não podem existir sem os sujeitos. Estes são os atores
da instituição I, e portanto, das obras O que vivem em I, e a razão de sua existência.
A relação de conformidade dos sujeitos x na posição p em I se estabelece por meio de
práticas que envolvem tipos de tarefas, técnicas, tecnologias e teorias, ou seja, as organizações
praxeológicas ou praxeologias, tal como se descreve abaixo na caracterização dos aspectos
essenciais da Teoria Antropológica do Didático – TAD.
Uma organização praxeológica ou praxeologia é constituída de um bloco prático –
técnico (praxis) [tipo de tarefa/técnica], que corresponde a um saber fazer, e de um bloco
tecnológico – teórico (logos) [tecnologia/teoria] que corresponde a um saber.
A noção de tarefa supõe um objeto relativamente preciso, para o qual se dispõe de
alguma técnica com um entorno tecnológico-teórico mais ou menos explícito. Na maioria dos
casos, uma tarefa (e o tipo de tarefas associadas) se expressa por um verbo evocando uma ação, o
que é para fazer, por exemplo, calcular a derivada de uma função f no ponto x0 de seu domínio é
um tipo de tarefas para o qual se tem a técnica de limites de funções em um ponto x0, com um
entorno tecnológico-teórico sobre limites de funções e sua representação gráfica; integrar a
função f(x) = lnx entre x = 1 e x = 2 é uma tarefa que pode ser justificada com a tecnologia de
integração por partes e como teoria, pelo Teorema Fundamental do Cálculo.
Para Bosch e Chevallard (1999), as tarefas, tipos de tarefas, gêneros de tarefas não são
dados da natureza, são “artefatos”, “obras”, construções institucionais, cuja reconstrução em
74
determinada instituição, por exemplo, numa classe, é um problema completo, que é o objeto da
didática.
Uma técnica τ (do grego tekhnê, saber fazer) é uma maneira sistemática e explícita que
possibilita realizar as tarefas do tipo T. Uma técnica deve ser pelo menos compreensível, legível e
justificável para garantir o seu controle e a eficácia das tarefas que ela permite executar. Os tipos
de tarefas e as técnicas correspondentes formam, como indicamos acima, um bloco que se chama
de bloco prático-técnico e que se identifica com o que comumente se denomina um saber-fazer:
precisamente composto de um determinado tipo de tarefas T, e uma determinada maneira, , de
executar as tarefas deste tipo. Uma técnica pode ter êxito sobre uma parte P( ) das tarefas do
tipo T ao qual ela é relativa. Desse modo, falamos do alcance da técnica. Quer dizer, a técnica
tende a fracassar sobre T\P( ), de maneira que se pode dizer que “não se sabe, em geral, realizar
as tarefas do tipo T”.
A tecnologia , como também já referido acima, é um discurso racional – do grego,
logos – sobre a técnica – a tekhnê – cujo primeiro objetivo é justificar racionalmente a técnica,
assegurar que ela realiza as tarefas do tipo T, quer dizer, a técnica permite encontrar o resultado
pretendido.
De acordo com Chevallard (1999), importa assinalar que em qualquer instituição I,
qualquer que seja o tipo de tarefa T, a técnica relativa a T está sempre acompanhada de ao
menos um embrião, ou mais frequentemente dito, de um vestígio da tecnologia . Quer dizer, em
numerosos casos, alguns elementos tecnológicos estão integrados na técnica . No Cálculo
Diferencial e Integral ocorre, em alguns casos, que um mesmo discurso racional desempenhe uma
dupla função: função técnica e função tecnológica que é, respectivamente, de favorecer encontrar
o resultado pretendido (função técnica) e de justificar que é correto o resultado esperado (função
tecnológica). Por exemplo, na tarefa: Calcular a integral indefinida lnxdx ,é comum fazer
lnxdx = xlnx – x + c, porque a derivada (xlnx – x + c)’ = lnx
Temos aqui a função técnica e tecnológica duplamente desempenhada: obtenção do
resultado e a justificação de que é correto o resultado obtido. Mesmo que a parte de justificação
não tenha sido explicitamente apresentada, aqueles que entram em contato com ela, em geral,
sabem por que seu resultado está certo.
75
Para Chevallard (1999), o fato de que exista em I uma técnica canônica, em princípio a
única reconhecida e a única empregada, confere a essa técnica uma virtude “autotecnológica”:
quer dizer, atuar de acordo com a técnica dada não exige justificativa, porque é uma boa maneira
de atuar em I. Com efeito, segundo nossa prática, observamos que nas instituições onde se estuda
a derivada de funções reais de uma variável real e a integral de Riemann, as tecnologias do limite
da razão incremental e do limite de somas de Riemann assumem o carácter autotecnológico:
saber fazer dessas duas maneiras parece ser inquestionável, como sendo as boas maneiras de
fazer.
A segunda função da tecnologia é explicar, tornar inteligível, aclarar a técnica; expor por
que razão ela é correta.
Assim, consideramos que no estudo da derivada de uma função real a valores reais e da
integral de Riemann, as tecnologias do limite dos declives das retas secantes e do modelo de área
assumem o papel de explicação, tornam inteligíveis as definições da derivada de uma função em
um ponto e da integral de Riemann em um intervalo limitado, respectivamente.
Uma terceira função da tecnologia corresponde a um amplo emprego mais atual do
termo tecnologia, que é a função de produção de técnicas. Para o nosso tema em estudo, derivada
de funções reais de uma variável real e integral de Riemann, podemos citar ainda os modelos do
limite da razão incremental e da área de retângulos aproximantes, como sendo tecnologias
(discursos racionais) que desempenham, para além das funções de justificação e explicação, a
função de produção de técnicas, respectivamente, de derivação e de integração. Muitas técnicas
de derivação são produzidas por meio do limite da razão incremental e para a integração definida,
o limite de somas das áreas dos retângulos aproximantes é usado para construir as técnicas
correspondentes.
Referimos ainda que, de acordo com Chevallard (1999), o discurso tecnológico contém
afirmações mais ou menos explícitas, das quais se pode pedir a razão. Neste caso, passa-se então
a um nível superior de justificação-explicação-produção, ou seja, ao nível da teoria , que
retoma, em relação à tecnologia, o papel que esta última tem com respeito à técnica.
Para nosso tema da tese, derivada de funções reais a valores reais e integral de Riemann,
consideramos que existem muitos elementos teóricos que as justificam, dos quais destacamos os
seguintes:
76
O conceito de número real: o conceito de número real é a base do Cálculo
Diferencial e Integral. Segundo Ávila (2005, p. 174), a teoria dos números reais, sobretudo a
propriedade do supremo, ou algo equivalente, como a propriedade dos intervalos encaixantes
constitui a base para uma apresentação rigorosa dos conceitos e teoremas do Cálculo Diferencial.
Por sua vez, a propriedade do supremo é justificada pela definição do Corte de Dedekind, ou
simplesmente o Corte, cuja formulação, consoante Ávila (2005, p. 58), é a seguinte: “[...] Corte
de Dedekind, ou, simplesmente, corte, é todo par (E, D) de conjuntos não vazios de números
racionais, cuja união seja Q, e tais que todo elemento de E seja menor que todo elemento de D.”
(ÁVILA, 2005, p. 58).
Depois dessa definição, temos o teorema (de Dedekind), segundo o qual, “Todo corte de
números reais possui um número real como elemento de separação.” (ÁVILA, 2005, p. 61).
Esses dois resultados tecnológicos são usados para justificar a propriedade do supremo
citada acima, segundo a qual: “Um conjunto não vazio de números reais, limitado superiormente,
possui supremo.” (ÁVILA, 2005, p. 63).
E ainda torna necessário definir supremo, que conforme Ávila (2005):
Chama-se supremo de um conjunto C à menor de suas cotas superiores.
Chama-se supremo de um conjunto C ao número S que satisfaz as duas condições
seguintes: a) c < S para todo c C; b) dado qualquer número > 0, existe um elemento
c C à direita de S - , isto é, tal que S - < c. (ÁVILA, 2005, p. 63).
Teoria de funções: consideramos que o domínio do conceito de função e suas
propriedades seja importante para o estudo da derivada e da integral. Podemos até considerar que
tanto o estudo da derivada quanto o da integral fazem parte do estudo das propriedades de
funções.
Teoria de limites de sequências numéricas e de funções: a teoria de limite de
funções e de sequências numéricas é o instrumental teórico que justifica, explica e constrói os
conceitos de derivada e de integral de Riemann. Tanto a derivada, quanto a integral de Riemann
são limites especiais. A derivada é o limite de variações infinitesimais (razões de diferenças
infinitamente pequenas) e a integral de Riemann é o limite de sequência de somas (acumulação
de quantidades), ou seja, o supremo, caso a sequência de somas seja crescente ou o ínfimo, caso a
sequência de somas seja decrescente.
77
No quadro de limites de funções, segundo a definição lógica formal de limites dada por
Weierstrass (1815-1897), a derivada de f no ponto x = x0 é um número real, geralmente denotado
por f’(x0), de modo que para qualquer > 0, existe > 0, tal que
0 < |x - x0| < )(')()(
0
0
0 xfxx
xfxf
< (LABARRE, 2008, p. 117).
De modo similar, podemos definir a integral definida da seguinte maneira:
Seja f uma função real de variável real definida num intervalo I = [a, b]. Dizemos que f é
integrável no intervalo I (no sentido de Riemann) se somente se existe um número,
denotado por b
adxxf )( e chamado integral de f sobre I, tal que para qualquer > o,
existe uma partição P
( P geralmente depende de ) tal que
P P b
adxxffP )(),( < entendido que a desigualdade é verdadeira sempre
que um número arbitrário do conjunto dos números { ),( fP } é substituído pelo
número ),( fP . (LABARRE, 2008, p. 147).
Como indicamos acima, existe muita teoria envolvendo os conceitos de derivada de
funções reais a valores reais e da integral de Riemann, mas consideramos que as ideias que
acabamos de apresentar nos parágrafos anteriores são resultados teóricos importantes que
justificam, explicam e constroem os conceitos da derivada de funções reais a valores reais e da
integral de Riemann.
Como já indicado acima, consideramos ainda no estudo o conceito de ecologia dos
saberes que corresponde à pesquisa da vida deles nas instituições, pois esses dependem de
adaptações às restrições, que muitas vezes estão associadas à economia de saberes. Chevallard
(2002), ao definir a noção de ecologia, considera os conceitos de:
• habitat: como o lugar onde vivem os objetos matemáticos considerados. Por
exemplo, Mateus e Dias (2013) mostram que o conceito de função vive no quadro da álgebra no
Brasil e quadro analítico em Moçambique.
• nicho: correspondendo à função que esses objetos ocupam em cada um de seus
habitats. Por exemplo, os autores acima identificam que, no Brasil, o conceito de função é
utilizado como ferramenta para solução de problemas contextualizados, enquanto em
Moçambique, o conceito de função é considerado um objeto para a introdução de novas noções.
78
As noções de ferramenta e objeto aqui consideradas correspondem às definidas por Douady
(1984), de que trataremos mais adiante.
• milieu: conjunto dos objetos para os quais a relação institucional é estável e não
problemática. Por exemplo, para o estudo do conceito de derivada de uma função real a valores
reais e da integral de Riemann, considera-se que o conceito de função de uma variável real a
valores reais, sua representação gráfica e suas propriedades são os objetos que constituem o
“milieu”.
Ressaltamos ainda que Chevallard (1997) define organização matemática como uma
organização praxeológica de natureza matemática, sendo constituída de um ou vários tipos de
tarefas matemáticas, mais ou menos bem identificadas, que exigem a criação de técnicas
matemáticas mais ou menos bem adaptadas e mais ou menos justificadas por tecnologias
matemáticas mais ou menos sólidas, sendo as tecnologias desenvolvidas no quadro de uma teoria
matemática mais ou menos explícita.
Assim, para Chevallard (1997), cabe ao professor a concepção e organização de
dispositivos de estudo, assim como a gestão de seu ambiente, ou seja, uma das tarefas do
professor consiste em determinar, a partir das indicações fornecidas pelos programas oficiais, as
organizações matemáticas a serem estudadas, especificando, para cada uma delas, seu conteúdo
preciso, a base dos tipos de tarefas que elas contêm e o grau de desenvolvimento a dar aos
componentes técnicos, tecnológicos e teóricos. Por exemplo, no nosso estudo, os tipos de tarefas
assim como seus componentes técnicos, tecnológicos e teóricos foram desenvolvidos pelo
pesquisador, uma vez que são tarefas usuais, para as quais foi proposta uma discussão apoiada
pelo software Geogebra.
Chevallard (1997) define ainda organização didática como a reconstrução ou a
transposição da organização matemática na sala de aula. Para o autor, quaisquer que sejam os
caminhos seguidos, acontece necessariamente um momento em que tal ou tal gesto didático deve
ser cumprido, o que Chevallard (1997) denomina momentos didáticos ou momentos de estudo,
que, segundo o autor, são uma realidade orgânica antes de ser uma realidade cronológica. Esses
momentos se realizam quando necessário e podem acontecer diversas vezes.
Como Chevallard (1997) afirma que a tarefa do professor na organização didática é de
ajuda ao estudo e gestão do mesmo de forma que se coloque em prática determinadas técnicas,
79
nos parece importante a proposta de partir de tipos de tarefas usuais para propor uma reflexão
sobre o trabalho matemático a ser realizado.
Observando que os momentos didáticos ou momentos de estudo indicados por
Chevallard (1997) configuram-se como os gestos didáticos que devem ser cumpridos em
determinada organização didática, e, parece-nos importante reconhecê-los, pois, eles podem
ajudar-nos na reflexão e na interpretação das diferentes etapas do encaminhamento da mediação
didática preconizada no estudo. Esses podem ocorrer diversas vezes em uma mesma organização
didática. Chevallard (1997) distingue os seis momentos a seguir:
- O primeiro momento de estudo, ou seja, aquele do primeiro encontro com a
organização matemática estudada. Esse encontro se dá entre duas formas extremas, isto é, um
encontro cultural que corresponde à organização matemática que surge em certas práticas sociais.
O submomento cultural métrico, em que a organização matemática só existe sob a forma de uma
imagem com a qual o estudante só mantém relações fictícias, é seguido de um submomento
mimético, no qual, por meio da manipulação efetiva dos objetos da organização matemática, o
estudante deve imitar o praticante. Por exemplo, para os estudantes de Moçambique que
participaram da pesquisa, podemos considerar que para os conceitos adotados como objetos
matemáticos desta pesquisa, o primeiro momento de estudo corresponde à introdução desses
conceitos no Ensino Secundário.
- O momento de exploração do tipo de tarefa e de elaboração de uma técnica que
corresponde ao estudo e a realização de um problema de tipo dado, que acompanha sempre a
constituição de um embrião de técnica a partir do qual uma técnica mais desenvolvida poderá
eventualmente emergir. O estudo de um problema particular aparece não como um fim, mas
como um meio para que tal técnica de resolução se constitua. Assim, o estudo de uma questão
está vinculado a uma dialética fundamental, a saber, estudar problemas é um meio de criar e de
elaborar uma técnica, que será um meio de resolver quase automaticamente problemas deste tipo.
Por exemplo, na nossa pesquisa, esse momento ocorre de imediato com a nova proposta de
reflexão sobre as técnicas estudadas no Ensino Secundário por meio da utilização do software
Geogebra.
- O momento da elaboração tecnológico-teórica relativa a uma técnica corresponde a um
momento que tem relação estreita com os outros momentos. Assim, desde o primeiro encontro
80
com a organização matemática, existe uma relação com um ambiente tecnológico teórico
anteriormente elaborado, ou com germes de um ambiente a ser criado que se tornará mais claro
por meio de uma relação dialética com a emergência da técnica. O mesmo exemplo do momento
de exploração.
- O momento de trabalho da técnica que deve aperfeiçoar a técnica, tornando-a mais
eficaz e mais confiável, além de aumentar o domínio que dela temos. Esse momento de provar a
técnica aparece, em particular, em um ou vários corpus de tarefas adequadas, tanto
qualitativamente quanto quantitativamente. Como exemplo podemos considerar o
desenvolvimento das tarefas da intervenção.
- O momento da institucionalização, que é aquele em que o objeto de estudo é
especificado, o que corresponde exatamente à elaboração da organização matemática,
distinguindo principalmente, de um lado, os elementos que contribuíram para a sua construção,
não sendo todos integrados e por outro, os elementos que entram de maneira definitiva na
organização matemática visada. Por exemplo, na intervenção após as discussões de reflexão faz-
se uma conclusão a partir dos resultados encontrados.
- O momento da avaliação que se articula com o momento da institucionalização. No
caso da intervenção, corresponde ao teste inicial e final, em que o teste inicial avaliava os
resultados dos estudantes em relação ao primeiro momento e o teste final avaliava o resultado dos
mesmos estudantes após a intervenção.
As praxeologias são as componentes dos diferentes habitats e, segundo Chevallard
(2002), as condições e restrições que determinam o processo de difusão praxeológico são
exploradas e localizadas com a ajuda de uma escala que contém diferentes níveis de
codeterminação, uma vez que elas podem situar-se em determinado nível da escala, mas podem
exprimir-se em outro. Para a análise das condições e restrições do processo de difusão
praxeológico, Chevallard (2002, 2014) define os seguintes níveis de codeterminação:
Civilização Sociedade Escola Pedagogia Disciplina Domínios Setores
Temas Tópicos.
Esses níveis descrevem as relações recíprocas entre os níveis mais específicos e os mais
gerais do sistema didático S(X ; Y ; ♥). A representação acima coloca em evidência que os níveis
81
de codeterminação têm consequências nos dois sentidos, ou seja, se modificarmos as condições e
restrições de um determinado nível, teremos repercussões sobre os outros níveis.
Tomando o exemplo de nosso estudo, e começando com os níveis mais específicos,
apresentamos o quadro 2 abaixo, destacando as responsabilidades do estudante, professor,
noosfera e da sociedade nos diferentes níveis da escala e da organização matemática
correspondente. Nos exemplos, destacamos os níveis de escolaridade em que são considerados,
sendo EM – para Ensino Médio ou Secundário e ES – para o Ensino Superior.
QUADRO 2 – NÍVEIS DE CODETERMINAÇÃO PARA DERIVADA DE FUNÇÕES REAIS A VALORES
REAIS E INTEGRAL DE RIEMANN NO SISTEMA EDUCATIVO MOÇAMBICANO
Níveis de codeterminação Exemplo Responsabilidade
Tópico
- Limite da razão incremental (EM,
ES)
- Partição de um intervalo I: soma
inferior e soma superior (ES)
Professor
Estudante
Tema - Derivada de funções polinomiais
(EM, ES)
- Limite de somas de áreas de
retângulos aproximantes (ES)
Professor
Estudante
Setor - Derivada de uma função em um
ponto (EM, ES)
- Teorema fundamental do Cálculo
(ES)
Noosfera disciplinar
Professor
Domínio - Funções diferenciáveis (EM, ES)
- Propriedade de funções Riemann-
integráveis (ES)
Noosfera disciplinar
Professor
Disciplina - Cálculo diferencial em IR (EM, ES)
- Cálculo Integral em IR (ES)
Noosfera disciplinar
Pedagogia Número de aulas de cada tópico; (EM,
ES)
Período de realização de aulas (EM,
ES)
Noosfera disciplinar
Política
Escola Escola por competência (EM, ES) Política
Sociedade Derivada: Ensino Médio e Ensino
Superior
Integral de Riemann: Ensino Superior
Política
FONTE: O autor (2014).
QUADRO 3 – NÍVEIS DE CODETERMINAÇÃO PARA DERIVADA DE FUNÇÕES REAIS A VALORES
REAIS E INTEGRAL DE RIEMANN NO SISTEMA EDUCATIVO BRASILEIRO
Níveis de codeterminação Exemplo Responsabilidade
Tópico - Limite da razão incremental (ES)
- Partição de um intervalo I: soma
inferior e soma superior (ES)
Professor
Estudante
Tema - Derivada de funções polinomiais
(ES)
- Limite de somas de áreas de
retângulos aproximantes (ES)
Professor
Estudante
Setor - Derivada de uma função em um Noosfera disciplinar
82
ponto (ES)
- Teorema fundamental do Cálculo
(ES)
Professor
Domínio - Funções diferenciáveis (ES)
- Propriedade de funções Riemann-
integráveis (ES)
Noosfera disciplinar
Professor
Disciplina - Cálculo diferencial em IR (ES)
- Cálculo Integral em IR (ES)
Noosfera disciplinar
Pedagogia Número de aulas de cada tópico; (EM,
ES)
Período de realização de aulas (EM,
ES)
Noosfera disciplinar
Política
Escola Escola por competência (EM) Política
Sociedade Derivada: Ensino superior
Integral de Riemann: Ensino superior
Política
FONTE: O autor (2014).
Os exemplos dos quadros 2 e 3 mostram em que nível se situam o professor e o estudante
em relação aos outros níveis para o sistema de ensino moçambicano e brasileiro respectivamente.
Chevallard (2002) observa ainda que o problema de fazer funcionar organizações
didáticas concebidas segundo um determinado ponto de vista conduz a enfrentar restrições que
distorcem a estrutura e eliminam as funções, quando deixam de ser apenas um mundo no papel.
Assim, o autor explicita essas restrições associando as diferentes organizações
matemáticas à hierarquia dos níveis de codeterminação, mostrando que seu interesse é possibilitar
a triagem das restrições que dirigem o estudo escolar e a escolha daquelas que serão consideradas
de maneira a evitar um desequilíbrio muito flagrante.
Dessa forma, Chevallard (2002) parte da afirmação que as restrições apresentadas
anteriormente devem-se ao fato de que uma organização matemática faz-se sobre essas obras,
pois uma organização matemática pontual praticamente não é encontrada no desenvolvimento de
estudos reais, posto que essa abstração existe para o estudante que, em geral, é avaliado sobre
tipos de tarefas que, para ele, correspondem a um tópico completo quase independente dos
outros. Um exemplo da nossa prática corresponde aos estudantes que estudam apenas os tópicos
para uma determinada avaliação, não relacionam com os novos tópicos introduzidos na
sequência, apresentando dificuldades, quando essa articulação de conhecimentos é necessária.
No que se refere ao professor, existe uma unidade em torno de uma tecnologia que tem
status de tema de estudo e que agrupa em uma organização regional as organizações locais que
admitem uma mesma teoria e que é associada ao setor de estudo. No exemplo dos quadros 2 e 3
83
acima, é possível observar que as derivadas de funções polinomiais se inserem no setor das
derivadas de funções em um ponto.
Existem ainda níveis superiores de determinação de uma organização matemática, os
correspondentes a várias organizações regionais que conduzem a uma organização global que se
identifica com um domínio de estudo cujo conjunto é reunido em uma disciplina.
Considerando o nosso estudo, para o caso da derivada, uma organização matemática
pontual seria uma tarefa do cálculo de uma função derivada recorrendo à regra prática de
derivação fazendo uso da notação de Cauchy, que consiste em um gesto de escrever um apóstrofe
por cima do símbolo f. No caso da integral de Riemann, consideramos que uma organização
matemática pontual seria o cálculo do valor da integral de uma função f, Riemann-integrável,
aplicando a técnica de primitivação prática seguida da aplicação da parte II do Teorema
Fundamental do Cálculo, segundo a qual a integral definida de uma função f contínua num
intervalo I = [a, b] é dada por b
af(x)dx = F(b) – F(a), onde F é qualquer primitiva de f, ou seja,
uma função tal que F’ = f. Como dissemos, F é calculada pela regra prática de primitivação.
Para uma organização matemática local, temos um tipo de tarefas articuladas em
diversas técnicas e tecnologias. No caso da derivada de funções reais a valores reais, temos os
tipos de tarefas de construção e reconstrução de técnicas com recurso ao limite da razão
incremental e à articulação e ao relacionamento das definições dos teoremas fundamentais do
Cálculo. No que diz respeito à integral de Riemann, temos os tipos de tarefas envolvendo somas
de áreas de retângulos aproximantes e outros teoremas de caracterização de funções integráveis a
Riemann.
As organizações matemáticas locais agrupam-se em conteúdos cada vez mais amplos,
formando as organizações matemáticas regionais que se constituem em teoria de diferenciação e
teoria de integração, respectivamente. Por sua vez, as organizações matemáticas regionais
estruturam-se em organizações matemáticas globais que, neste caso, resultam num domínio da
Matemática que reúne o Cálculo Diferencial e integral, constituindo a disciplina de Cálculo.
Chevallard (2002) observa que, em geral, os professores intervêm apenas nos níveis
tópicos e temas, pois nas organizações didáticas escolares frequentes, eles têm poucas
possibilidades de atuar sobre os outros níveis. O autor recorre ao exemplo de iniciar uma aula
apresentando o programa de estudos da classe para o ano escolar, mostrando que assim o
84
professor poderia expor cada domínio que o compõe e completar no decorrer do ano com uma
apresentação dos setores de estudo que compõem cada domínio, situando temas e tópicos que
serão estudados na sequência. Por exemplo, no Brasil, essa atividade do professor é cobrada pelo
Ministério da Educação no que se refere ao Ensino Superior, pois espera-se que, ao participar do
ENADE - Exame Nacional de Desempenho de Estudantes, o estudante conheça o plano de ensino
das disciplinas que cursou e seja capaz de associá-lo aos tópicos, temas, setor e domínio da
própria disciplina e das disciplinas correlatas. Mas, existem casos em que o professor apresenta o
plano de ensino, mas não faz referência aos tópicos e temas, articulando-os quando do seu
desenvolvimento.
Chevallard (2002) ressalta ainda que, se o professor não localiza temas e tópicos nos
setores e domínios de estudo e segue o programa introduzindo-os um após o outro enfileirados,
irá provocar uma atomização do material de estudo que contrasta com a ambição original que é
ensinar Matemática. Nesse caso, observamos que em função do tempo de estudo de cada tópico
do plano, muitas vezes os professores, apesar de os localizarem em seus respectivos setores e
domínios, são conduzidos a trabalhá-los de forma enfileirada, sem articulá-los com outros
domínios.
Chevallard (2002) aponta que o principal déficit do professor que se refere apenas aos
níveis tópicos e temas está associado primeiramente às organizações matemáticas efetivamente
utilizadas em aula, o que conduz à ausência de motivação dos tipos de tarefas estudadas, pois as
tarefas que servem para motivar o trabalho matemático encontram-se nos níveis superiores (setor
e domínio) das organizações matemáticas visadas. Por exemplo, no nosso estudo, se o professor
desenvolve o conceito de derivada utilizando apenas o ponto de vista simbólico, conforme
definição de Thurston (1995, 1994), certamente o estudante terá dificuldades em relacionar o
conceito de derivada com a taxa de variação instantânea.
Para Chevallard (2002), encontrar tarefas que motivem o desenvolvimento de um
determinado conceito exige que tenhamos acesso aos níveis superiores de determinação
matemática. O exemplo da utilização de diferentes pontos de vista para a introdução do conceito
de derivada de uma função coloca em evidência essa necessidade, pois, para articular os
diferentes pontos de vista propostos por Thurston, é necessário que se conheçam outros domínios
e diferentes representações para o estudo do conceito de função.
85
Assim, segundo Chevallard (2002), encontramos neste caso um fenômeno ecológico
central, o da codeterminação das organizações matemáticas e didáticas, pois a ausência da relação
do tópico ou tema com os níveis superiores de setores e domínios, além da própria disciplina,
torna impossível pensar a relação de motivação entre os tipos de tarefas. Quer dizer, a
organização do estudo de um tópico ou tema conduz a considerar os níveis superiores da
hierarquia de codeterminação matemática.
Desse modo, se os professores ficam confinados ao nível tema, as diferentes esferas da
noosfera cuidam dos níveis superiores: setores, domínios, disciplinas e, dessa forma, a opção de
introduzir ou não determinados domínios da Matemática passa a ser controlada por instâncias de
capital científico e político, isto é, pela noosfera disciplinar e pela política.
À escala tópicos, temas, setores, domínios e disciplinas, acrescentam-se ainda os níveis
superiores sociedade e escola que, de acordo com Chevallard (2002), representam uma
construção histórica. Cada nível determina a ecologia das organizações matemáticas e didáticas
por meio dos pontos de apoio que oferecem e das restrições que impõem.
Por meio do exemplo com o qual estamos habituados em nossa prática cotidiana,
Chevallard (2002) explicita que um tópico, em geral, está incluído em um tempo curto de uma
aula; o autor mostra que isso contraria a existência de formas didáticas em que o trabalho da sala
de aula sobre esse tópico possa ser articulado sobre um tempo longo. Isso o leva a considerar que
em função desse nível de condições oferecidas e restrições impostas, no quadro do sistema
escolar existente, o estudo de um tópico de qualquer disciplina pertence ao que se denomina nível
pedagógico.
O nível pedagógico é aquele no qual termina a ação da noosfera disciplinar. As
restrições pedagógicas tomam a forma de um conjunto de meios de estudo impostos e alocados
em todo estudo escolar, com algumas exceções, que convém tratar com autoridade pedagógica.
Mas o esquema de níveis de codeterminação matemática não termina no nível
pedagógico, esse representa apenas a fronteira entre a noosfera, que é composta por especialistas
de Pedagogia que propõem a lei sem se preocupar com os decretos de aplicação, e onde reina o
que o autor denomina política. Como exemplo, o autor indica o que ele chama de fórmula
tradicional apresentada nos programas, segundo a qual “o professor tem toda liberdade na
organização de seu ensino, com a condição de que sejam observados os objetivos visados pelo
86
programa”, ou seja, o professor deve respeitar o conjunto de restrições pedagógicas, o que lhe
proporciona uma margem de manobra muito reduzida.
Depois do nível pedagógico, encontramos o nível escola, que é o nível de restrições e
pontos de apoio próprio da instituição escolar, pois em uma escola pode existir determinada
disciplina e não existir outra, da mesma maneira que na sociedade existem escolas de 6 a 16 anos
e também escolas para menores de 6 anos e ainda escolas para maiores de 16 anos.
Desse modo, a escola é definida como sendo instituição social dedicada ao estudo, onde
se suspende temporariamente o fluxo das atividades comuns da vida para estudar, isto é,
desconstruir e reconstruir as praxeologias da vida. Nessa perspectiva, Chevallard (2002)
considera que a escola determina uma ecologia e uma economia na difusão dos conhecimentos na
sociedade.
No nível sociedade, existe uma enorme quantidade de restrições e, como exemplo, o
autor apresenta o fato de que uma sociedade pode compreender a instrução dada em sua escola de
pontos de vista diferentes, que não são didaticamente equivalentes, isto é, que não criam as
mesmas condições na classe para um mesmo tópico de estudo. Chevallard (2012) introduz ainda
o nível humanidade e, ao considerar a diferença entre pedagogia de ensino e pedagogia de
investigação, por meio de um exemplo, o autor mostra que essas pedagogias conduzem a dois
paradigmas diferentes, a saber: o paradigma de visita às obras, no qual o estudante só tem acesso
a uma obra guiado por um cicerone por meio de uma disciplina, e o paradigma de
questionamento do mundo, no qual encontramos primeiro a obra, que constitui o desafio didático,
e devemos procurar, quando importa, a disciplina, o domínio etc., nos quais tem origem a obra a
estudar. Observamos aqui que nossa pesquisa está centrada sobre o paradigma de questionamento
do mundo, pois a partir de algumas tarefas específicas, os estudantes são conduzidos a procurar o
domínio etc. que dão origem a essas tarefas.
Os esquemas associados a esses paradigmas são os seguintes.
Paradigma de visita às obras:
Humanidade
Civilização
Sociedade
87
Paradigma da visita às obras
Escola
Pedagogia
Disciplina Domínio Setor tema tópico
Obra
Paradigma de questionamento ao mundo:
Humanidade
Civilização
Sociedade
Paradigma do questionamento do mundo
Escola
Pedagogia
Obra
Disciplina Domínio Setor Tema tópico
Voltando ao exemplo de instrução dada à escola pela sociedade, observamos que um
primeiro ponto de vista, que ainda é dominante, corresponde ao sistema de disciplinas reduzidas
em si mesmas como sendo totalidades e não considerando o que elas nos possibilitam em termos
de conhecimento e ação. A escola aparece como uma obrigação cultural mais ou menos formal,
em que algumas obras, cuja escolha é vivenciada por muitos como arbitrária e cuja visita se
impõe sem que seja conveniente permanecer por muito tempo. Como exemplo, podemos
considerar o caso de algumas universidades moçambicanas e brasileiras, em que, em geral as
disciplinas não conversam entre si, mesmo que no papel esse trabalho seja considerado.
Um segundo ponto de vista, em emergência a partir dos anos 90, diz respeito à tentativa
do ensino baseado em projetos oficiais e semioficiais, que consiste em ver a escola imersa na
88
sociedade civil por meio de uma rede de lugares de difusão e validação de competências variadas,
constantemente e localmente redefinidas, adquiridas e validadas sem referência nem reverência
aos saberes “oficiais”, visando à eficácia pragmática na vida profissional e no reconhecimento
das pessoas por meio de títulos que as classificam. Como exemplo, podemos considerar o caso do
currículo de São Paulo para os Ensinos Fundamental e Médio, que corresponde a um projeto
oficial, cuja problemática é que a escola prepare os estudantes para a vida profissional, sendo que
esse projeto segue as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais. No caso de
Moçambique, temos no currículo oficial um componente que se denomina “Currículo local”, que
visa integrar os aspectos regionais na implementação do currículo oficial nos anos iniciais da
escolaridade.
Para Chevallard (2002), com tal problemática, a escola pode tomar a forma de uma sala
de negócios onde, no lugar de longos discursos “teóricos”, administramos com toda energia um
“portfólio de competências” para responder às necessidades de diferentes mercados sobre os
quais o indivíduo deve perceber o próprio valor.
Chevallard (2002) apresenta ainda um terceiro ponto de vista, por ele apresentado na
escola de verão de 1999, segundo o qual a escola é considerada como um lugar aberto ao estudo
de toda questão umbilical possível de uma sociedade, de uma geração, de um meio social para
determinados meios, podendo motivar um saber que sem isso seria de ordem puramente
especulativa. Dessa forma, tal ponto de vista parece suscetível de suspender o tempo social sem
repudiá-lo para dar lugar a um tempo de estudo em que se constroem pacientemente as
praxeologias que, por princípio escolar, só serão utilizadas com certa diferença no mundo das
práticas extraescolares.
Outro exemplo que corresponde ao nível sociedade é que atualmente vivemos em nossa
sociedade, mesmo que de forma implícita, divisões rígidas que delimitam domínios de
legitimidade exclusivos. Assim, conforme Chevallard (2002), o "habitus" de não falar muito, até
mesmo de se recusar a pronunciar e guardar para si as verdades tem um longo passado na cultura
e nas ciências. Isso inspirou em parte a fragmentação sábia da produção dos conhecimentos, um
princípio reivindicado pela ideologia comum dos cientistas.
Dessa forma, na divisão existente no campo de estudo, permanece a ambiguidade
determinada pela história deste campo, pelas restrições impostas às vezes à revelia dos
89
pesquisadores, pela cultura e pela organização da sociedade. Esse obstáculo20
não é próprio à
didática da Matemática, não mais que a instrução pública, sendo isso que devemos enfrentar.
Observamos ainda que Chevallard (2007) retoma a escala de níveis de codeterminação,
na qual inclui o nível civilização e clarifica que as praxeologias determinam a ecologia do
processo de difusão praxeológico, pois sendo elas consideradas as componentes dos diferentes
“habitats”, isto é, elas determinam o lugar onde vivem os objetos matemáticos, serão elas que
irão situar as condições e restrições desse processo com a ajuda dos níveis de codeterminação.
Ainda conforme Chevallard (2007), essas condições e restrições podem situar-se em um nível e
exprimir-se em outro, o que permite isolar o que se passa em uma classe do conjunto do sistema
de ensino. Como exemplo, nos referimos aos quadros 2 e 3 acima apresentados.
Além disso, é importante considerar, consoante Chevallard (2002), que o conjunto de
condições e restrições que possibilitam o desenvolvimento matemático (ecologia de uma
praxeologia matemática), ou seja, as condições e restrições que permitem a produção e utilização
das tarefas nas instituições, depende dos objetos ostensivos (perceptíveis aos sentidos humanos e
passíveis de manipulação, tais como sons, grafismos e gestos) e dos objetos não ostensivos.
A dimensão ostensiva de uma praxeologia proporciona que um saber matemático e os
conhecimentos se materializem. Os objetos ostensivos – do latim ostendere, que significa
mostrar, apresentar com insistência, são os objetos que têm certa materialidade e que por isso
adquirem para uma pessoa uma materialidade perceptível. Como exemplos, Chevallard (1994)
apresenta
• Um objeto material (uma caneta, um compasso, o software etc.) é um ostensivo.
• Os gestos: ostensivos gestuais, por exemplo, quando se considera o ponto de vista
simbólico para a determinação da derivada de uma função, existe um gesto que pode ser
explicado oralmente;
• As palavras, e, mais genericamente, o discurso : ostensivos discursivos;
• Os esquemas, desenhos, grafismos: ostensivos gráficos;
20 Aqui a palavra obstáculo tem o sentido de ambiguidade determinada pela história no campo de estudo e as
restrições impostas pela cultura e pela organização da sociedade na realização do estudo. Ou seja, aquilo que
dificulta ou impede a realização de um movimento. Para Glaeser (1981 apud SCHUBRING, 2012, p. 25),
“obstáculos” consistem em “dificuldades” de compreender conceitos matemáticos.
90
• As escritas e formalismos: ostensivos escriturais, por exemplo, quando se
considera o ponto de vista lógico da definição de derivada de uma função em um ponto.
Os objetos não ostensivos são todos aqueles, como as ideias, as intuições ou os conceitos
que existem institucionalmente, mas que não podem ser vistos, percebidos ou mostrados por si
mesmos.
Os objetos não ostensivos só podem ser evocados por uma manipulação adequada de
determinados objetos ostensivos associados. Por exemplo, o objeto “derivada de uma função em
um ponto” é objeto não ostensivo que aprendemos a identificar e ativar por meio de certas
expressões, escritas e gráficos colocados em jogo nas práticas e situações específicas, mas
quando escrevemos ou dizemos para um estudante “calcular a derivada de uma função em um
ponto”, ele passa a ser um ostensivo. Observamos ainda que o desenvolvimento de uma dada
técnica se traduz pela manipulação de objetos ostensivos regulados pelos objetos não ostensivos,
ou seja, pelas noções, leis, princípios e regras que existem em forma de ideias.
Chevallard (1994) pontua que existe uma dialética necessária entre ostensivos e não
ostensivos, pois os ostensivos são manipulados por meio de regras, cuja distinção é feita pelos
não ostensivos, enquanto os não ostensivos são evocados por meio da manipulação dos
ostensivos. Chevallard (1994) conclui afirmando que a “compreensão” de um conceito
matemático depende da técnica em que esse conceito é utilizado e esta depende de todo o sistema
de objetos não ostensivos e ostensivos por ela ativados.
Assim retivemos algumas das ideias da Teoria Antropológica do Didático – TAD – na
perspectiva de nosso trabalho. Consideramos haver uma relação íntima entre as noções básicas da
praxeologia que compreendem às noções de tarefas, tipo de tarefas, técnicas, tecnologias e teorias
e as noções de objetos ostensivos e não ostensivos, quando pensamos nos processos de ensino e
de aprendizagem da Matemática. Tomamos como ponto de partida a formação de um sistema
didático S(X; Y; ♥) ou S(X; Y; Q), cujo objetivo é estudar um desafio didático ♥ ou uma questão
Q, que é composta por tipo de tarefas e técnicas que podem e devem ser resolvidas de alguma
forma.
Se consideramos um sistema didático S(X; Y; Q), a resposta ótima à questão Q
corresponde ao conhecimento visado. Para resolver Q, precisamos de uma maneira de resolver,
ou seja, de uma técnica ; e por sua vez, precisamos de estar seguros de que permite-nos
91
encontrar o resultado pretendido e, além disso, deve haver clareza no sentido de que usar é
uma boa maneira de fazer, ou seja, precisamos de uma tecnologia e de uma teoria Θ na nossa
maneira de fazer e representações computacionais, entre outros modos de representação, que em
outras palavras, diríamos que as nossas ações são desenvolvidas sobre os objetos ostensivos.
Podemos resumir a apresentação da TAD na seguinte figura encontrada na tese de
Andrade (2012):
FIGURA 12 – ELEMENTOS DA TEORIA ANTROPOLÓGICA DO DIDÁTICO
FONTE: Andrade (2012, p. 72)
O organograma acima mostra de forma suscinta como se operacionalizam as relações
institucionais e a maneira como elas intervêm nas relações pessoais. Assim, os ostensivos e não
ostensivos utilizados no desenvolvimento da pesquisa são os ingredientes que permitem
manipular e evocar as noções em jogo nas técnicas associadas aos tipos de tarefas propostas aos
estudantes, que são justificadas, explicadas e produzidas por meio das tecnologias e teorias que
correspondem ao bloco do saber. No caso das tecnologias das técnicas, ressaltamos o interesse
em utilizar o software Geogebra como instrumento de reflexão, que possibilita um estudo
92
racional por meio da articulação entre fórmulas e gráficos, cujos recursos visuais são dificeis de
se construir usando apenas lápis e papel ou quadro negro. As praxeologias utilizadas na pesquisa
correspondem às relações institucionais existentes para o ensino e a aprendizagem de Cálculo
Diferencial e Integral em Moçambique, determinadas por meio da análise de livros didáticos.
Essas praxeologias auxiliaram na construção do teste diagnóstico e da proposta de intervenção e
seu encaminhamento.
Na sequência, apresentamos uma breve descrição das principais noções da teoria da
instrumentação/instrumentalização de Rabardel (2002, 1995), que serviram de base nesta
pesquisa em função da possibilidade que elas aportam para a reflexão de professor e estudantes,
assim como para a identificação das dificuldades dos estudantes com a utilização do software
Geogebra.
3.3 TEORIA DE INSTRUMENTAÇÃO/INSTRUMENTALIZAÇÃO21
SEGUNDO
RABARDEL (2002, 1995)
Como referimos acima, optamos por estudar alguns aspectos da Teoria de
Instrumentação/Instrumentalização na perspectiva de Rabardel (2002, 1995), por considerá-la
importante para a análise da relação entre o pesquisador e os estudantes e na interação com as
tarefas e com o computador durante as discussões nas sessões de trabalho de experimentação.
Rabardel (2002, 1995) construiu suas reflexões teóricas sobre a Instrumentação e
Instrumentalização, baseando-se em vários autores que estudaram o tema e as áreas correlatas.
Em função desse ponto de partida, a teoria em si apresenta-se muito vasta e com vários enfoques.
Ela abrange várias áreas de conhecimento e de sistemas de produção material (entre elas
encontramos a Psicologia, Epistemologia genética, Sociologia, História, Didática, Ergonomia,
Design, Automação industrial, entre outras). Vamos examinar algumas partes que consideramos
importantes para análise e reflexão da relação do pesquisador e dos estudantes participantes das
sessões experimentais com as tarefas propostas intermediadas pelo computador.
Assim sendo, focalizamos nesta pesquisa as noções de artefato, instrumento, ferramenta,
esquemas de utilização, instrumentação e instrumentalização, no contexto de resolução de tarefas
21 Esses processos são definidos mais adiante
93
visando ao ensino e à aprendizagem da derivada de funções reais a valores reais e da integral de
Riemann com recurso ao software Geogebra, articulado com outras práticas habituais.
Segundo Rabardel (1995), as relações humanas com os sistemas técnicos estão
emergindo, pois os seres humanos são o centro e o lugar da tecnologia e o sistema técnico é
imaginado, concebido e criado levando em conta o usuário para o qual será uma ferramenta ou
um instrumento.
É nessa perspectiva que orientamos a abordagem instrumental desenvolvida pelo autor
neste trabalho, pois o computador é inserido nos processos de ensino e de aprendizagem da
derivada de funções reais a valores reais e da integral de Riemann com o objetivo de aproveitar
suas possibilidades ostensivas, que se caracterizam pelas representações gráficas e algébricas,
capitalizadas pela animação, para resolver questões visando à construção de conhecimentos dos
estudantes participantes das sessões experimentais da pesquisa.
Para tornar as discussões apropriadas aos participantes das sessões, as tarefas usadas nas
discussões foram as habituais, quando da introdução ao Cálculo Diferencial e Integral de funções
de uma variável, e, no decurso das mesmas, houve momentos de familiarização com alguns
comandos frequentemente usados na produção das expressões matemáticas e de animação.
Observamos que, no nosso trabalho, a opção pelo Geogebra está associada à
possibilidade de os usuários trabalharem por meio de uma abordagem antropocêntrica, que se
apoia sobre as suas competências e procura desenvolvê-las, pois almejamos desenvolver as
habilidades de enfrentamento do conteúdo da aprendizagem, tentando aprimorar as formas de
trabalho com esse conteúdo, visando à eficácia na análise e nas formas de comunicação na
interação com as tarefas.
Citando Lynn White, o autor aponta que uma técnica é uma maneira como alguém faz
alguma coisa. Segundo Sigaut (1991 apud RABARDEL, 2002) o “alguém é essencial” no
processo, porque ele indica a perspectiva correta de fazer. Uma técnica existe somente quando ela
é praticada, isto é, quando ela passa por alguém que, tendo aprendido ou a inventado, a faz
funcionar de forma eficaz. Não existe técnica sem eficiência e sem as habilidades humanas que
ela implica. Enfatizamos aqui que essa noção de técnica aproxima-se da noção de Chevallard.
Assim, para Rabardel (2002, 1995), as análises devem privilegiar as dimensões em que o
contato entre os homens e os objetos materiais, e, mais genericamente, o contato entre os homens
94
e os objetos fabricados (os artefatos, compreendendo aqui os simbólicos e os usos que lhes são
associados), seja direto. Essa dimensão de análise, para Rabardel (2002, 1995), é a da Psicologia,
mesmo que ela não seja exclusiva.
Nesse sentido, a abordagem instrumental situa-se na dimensão da análise dos fatos
técnicos como fatos psicológicos. Ela se inscreve como uma contribuição para a reflexão teórica
e ao exame empírico das relações homem e sistemas técnicos centrados sobre o homem,
visualizações do ponto de vista deste último, quando está engajado nas atividades e ações reais,
situadas nos seus contextos de trabalho, na formação ou na vida cotidiana.
Como exemplo disso, podemos considerar, na sequência, a reflexão sobre nossas
práticas costumeiras de ensino e de aprendizagem dos conceitos de derivada e integral de
Riemann de funções reais a valores reais, para os quais constatamos haver dificuldades de
aprendizagem por meio dessas práticas, o que nos conduziu a realizar esta pesquisa, incorporando
nela o componente tecnológico por meio do software Geogebra, com a intenção de tornar o
contexto de ensino e de aprendizagem dos conceitos acima mencionados mais efetivo,
capitalizando as potencialidades desse software e abrindo um novo espaço para a aplicação de
novas técnicas pelo sujeito.
De acordo com Rabardel (2002, 1995), atores sociais mobilizam saberes particulares que
dependem das relações que eles constroem com os objetos técnicos: suas intenções, seus usos,
seus fantasmas. Rabardel (2002, 1995) cita Hatchuel para considerar que a ideia de que um objeto
tem um determinado uso é uma simplificação excessiva, pois segundo esse pesquisador, um
objeto técnico tem usos que o nosso conhecimento nos permite pensar ou descobrir; temos de
reconhecer que um mesmo objeto pode ser compatível com vários tipos de saberes técnicos e
assim, com vários tipos de competências técnicas. Por exemplo, no nosso estudo, tínhamos de
reconhecer inicialmente que o software Geogebra possibilitava estudar os conceitos matemáticos
e, a partir desse reconhecimento, estudamos alguns de seus aspectos técnicos úteis para modelar a
derivada e integral de Riemann de funções reais de uma variável real.
Assim, na exploração de possíveis categorizações do saber, olhamos os objetos técnicos
de uma maneira que nos enseja reconstruir a natureza das relações que um ator vai ter com tais
objetos, a validade e a legitimidade de suas ações. Podemos tomar como exemplo da nossa
95
pesquisa a análise do desenvolvimento de determinada tarefa pelo estudante ou grupo de
estudantes em função da utilização que eles fazem do software.
Rabardel (2002, 1995) considera que a abordagem instrumental visa contribuir para a
elaboração de conceitos e teorias intermediárias, trata-se de partir do estudo das relações
instrumentais que os indivíduos mantêm, na ação, com os artefatos e de ter acesso a uma
compreensão profunda de uma das formas de relação com os objetos técnicos: a relação de uso,
de utilização. Para tal, Rabardel (2002, 1995) considera o ponto de vista de Bannon e Bodker
(1991) e de outros autores, que corresponde a ponderar sobre a constante transformação dos
artefatos existentes nas atividades pela própria atividade, o que leva a analisá-los como
mediadores do uso e não como coisas. Nesse aspecto, nos unimos a Rabardel, uma vez que o
software Geogebra é utilizado na pesquisa como um instrumento mediador do conhecimento em
jogo.
Ainda segundo o autor, uma aplicação informática deve, por exemplo, ser considerada
como um conjunto de ferramentas, cuja concepção cria novas condições de trabalho individual e
coletivo, pois a introdução do artefato não muda apenas os aspectos operacionais, mas todos os
outros aspectos da prática, isso conduz o autor a considerar que um objeto de pesquisa central
deve ser os processos de utilização de um artefato e não o próprio artefato. Aqui, observamos que
na pesquisa, estudamos como o uso do software Geogebra pode auxiliar na compreensão das
noções de derivada e de integral de Riemann de funções reais de uma variável real.
É a partir dessa perspectiva que Rabardel (2002, 1995) propõe a conceituação
psicológica dos artefatos enquanto instrumentos, realçando que se trata de uma conceituação para
a qual se visa torná-la pertinente, tanto para a ergonomia como para a didática, mas conservando
a articulação com as conceituações originárias dos domínios tecnológico, antropológico,
sociológico e filosófico.
Assim, Rabardel (2002, 1995) ressalta que a definição de instrumento é dada na essência
da relação que a constitui: o uso pelo indivíduo enquanto meio que ele associa à sua ação, ou
seja, os artefatos são considerados instrumentos materiais ou simbólicos. Como exemplo,
podemos citar o software Geogebra, assim como o conjunto de ostensivos que ele permite
manipular e de não ostensivos que ele torna possível evocar.
96
Após as considerações acima sobre as noções de técnicas, artefatos e instrumentos,
Rabardel (2002, 1995) articula algumas abordagens psicológicas das técnicas e dos artefatos.
Segundo ele, a consciência da necessidade de um ponto de vista instrumental sobre as técnicas,
no interior das mesmas, e sobre os artefatos não é um privilégio das novas tecnologias, pois já
encontramos em Vygotsky uma visão criadora sempre viva que considera o instrumento no
coração do desenvolvimento e do funcionamento do psiquismo.
Rabardel (2002, 1995) enfatiza ainda que as duas formas fundamentais do
comportamento cultural, para Vygotsky, são a utilização dos instrumentos e a linguagem humana,
o que coloca as atividades com instrumentos no coração da constituição e do funcionamento das
funções psíquicas superiores22
para o homem, quando se consideram as especificidades do
desenvolvimento cognitivo humano em interação com os artefatos.
Nesse sentido, conforme Vygotsky (1934 apud RABARDEL, 2002), a integração do
instrumento no processo de comportamento aciona toda uma série de novas funções associadas
ao uso e controle do instrumento; substituindo e tornando inútil toda uma série de processos
naturais, cujo trabalho é desenvolvido pelo instrumento, transformando o desenvolvimento e os
aspectos particulares de todos os processo psíquicos que entram na composição do que ele
denomina ação instrumental. O instrumento substitui algumas funções por outras, recria e
reconstitui toda a estrutura do comportamento, da mesma maneira que o instrumento técnico
reestrutura toda a constituição das operações de trabalho. Considerado no seu conjunto, os
processos constituem uma unidade complexa, estrutural e funcional orientada para a solução do
problema proposto. Eles são coordenados, e no coração da atividade, definidos pelos
instrumentos; formando um novo complexo: a ação instrumental. Assim, analogamente ao
22 O conceito de “desenvolvimento das funções psíquicas superiores” e o objeto de nosso estudo abarcam dois
grupos de fenômenos que à primeira vista parecem completamente heterogêneos mas que de fato são dois ramos
fundamentais, duas causas de desenvolvimento das formas superiores de conduta, que jamais se fundem entre si
ainda que estejam indissoluvelmente unidas. Trata-se, em primeiro lugar, de processos de domínio dos meios
externos de desenvolvimento cultural e de pensamento: a linguagem, a escrita, o cálculo, o desenho; e, em
segundo lugar, dos processos de desenvolvimento das funções psíquicas superiores especiais, não limitadas com
exatidão, que na psicologia tradicional se denominam atenção voluntária, memória lógica, formação de
conceitos etc. Tanto uns como outros, tomados em conjunto, formam o que qualificamos convencionalmente
como processos de desenvolvimento das formas superiores de conduta da criança (VYGOTSKY, 1995, p. 29,
apud MARTINS, 2011, p. 63-64).
97
trabalho, enquanto atividade apropriada para um determinado fim, o processo não pode ser
explicado de maneira satisfatória, limitando-se aos objetivos e aos problemas, a explicação
referindo-se ao emprego das ferramentas; o esclarecimento das formas superiores de
comportamento e a dos meios que favorecem ao homem administrar o processo de seu próprio
comportamento.
Ao se referir ao trabalho de Léontiev, Rabardel (2002, 1995) considera que um dos
pontos centrais corresponde à fixação das aquisições da espécie humana. Enquanto a evolução
das espécies animais se faz pela via biológica, a evolução humana se faz pela via da fixação dos
conhecimentos adquiridos pela espécie no seio dos fenômenos externos da cultura material e
intelectual.
É pela apropriação dessas aquisições que cada homem adquire as capacidades
verdadeiramente humanas. Mesmo que os instrumentos e ferramentas da vida cotidiana sejam
descobertos ativamente nas suas qualidades específicas, segundo Léontiev, o homem deve efetuar
uma atividade prática ou cognitiva a eles relacionada que responda de forma adequada à
atividade humana que eles incorporam, isto é, a apropriação deve reproduzir os traços da
atividade cristalizada (acumulada) no objeto.
Nossa revisão bibliográfica apresentada no capítulo 2 deixou algumas evidências da
preocupação que existe para alguns pesquisadores da Educação Matemática no sentido de
capitalizar os artefatos computacionais, especialmente os softwares matemáticos no ensino e na
aprendizagem da Matemática. E nosso estudo igualmente associa-se aos demais, incorporando o
componente computacional na medicação didática para a construção e a aprendizagem da
derivada de funções reais a valores reais e da integral de Riemann.
Rabardel (2002, 1995) alude ainda aos textos de Wallon (1935, 1941, 1942, 1951 apud
RABARDEL, 2002), observando que o autor interroga-se sobre as relações dos homens e das
técnicas, formulando hipóteses relativas aos seus possíveis efeitos sobre o desenvolvimento das
crianças e, mais genericamente, sobre a maneira como a cognição pode ser afetada, mesmo
transformada. Assim, Rabardel (2002, 1995) pontua que as noções de que nos servimos para
representar as coisas familiares são derivadas de um contato ancestral e longínquo com elas.
Por meio dos exemplos de Wallon, Rabardel (2002, 1995) levanta a problemática das
realidades virtuais contemporâneas relativas às categorias do conhecimento, sendo este situado
98
no sentido de que ele é fortemente associado, pelo sujeito, às situações nas quais ele o construiu e
o utilizou. Essas situações são ao mesmo tempo dependentes da história exclusiva do sujeito e
também da história da sociedade e da cultura na qual ele se inscreve. Rabardel (2002, 1995)
afirma ainda que o mesmo ocorre para os artefatos, as técnicas e os instrumentos enquanto
objetos psicologicamente significativos. Destacamos aqui a importância da introdução do
software Geogebra, pois se trata de um artefato que, por meio de sua utilização, torna-se um
instrumento, uma vez que o indivíduo associa o artefato ao esquema de uso do mesmo. Por
exemplo, quando o estudante decide estudar derivada de uma função utilizando o software
Geogebra.
Rabardel (2002, 1995) esclarece que é preciso desenvolver uma concepção generalizada
de instrumento, que permita considerar seu status e as atividades a que ele está associado em
todos os níveis do funcionamento cognitivo, compreendendo os níveis superiores. Os
instrumentos simbólicos são naturalmente considerados, mas, além disso, é o status do
instrumento na atividade de trabalho e da vida cotidiana associado às tecnologias contemporâneas
que torna essa atualização necessária.
Assim, para Rabardel (2002, 1995), o campo de estudo da formação, da evolução e da
transformação das atividades sensório-motrizes constitui um domínio em que a questão das
atividades com instrumentos é altamente relevante. Nesse momento, Rabardel (2002, 1995)
reporta-se à afirmação de Bullinger (1987), a saber: “é o instrumento que conduz a invenção,
nada inventamos enquanto trabalhamos apenas com nosso próprio corpo”, isto é, o corpo
constitui, para o sujeito, seu primeiro instrumento.
Dessa forma, consoante Rabardel (2002, 1995), Bullinger abre a possibilidade de uma
interrogação sobre o processo de instrumentação do corpo, mas também a perspectiva de uma
inserção dessas interrogações em uma problemática mais geral do status psicológico do
instrumento e das atividades com instrumentos.
Assim, Bullinger amplia os estudos de outros autores e as hipóteses de Vygotsky (1930)
para as quais, a criança é, no processo de desenvolvimento, equipada e reequipada com
instrumentos diversos; os níveis de desenvolvimento se diferenciam pelo nível e natureza do
instrumento e assim pelo grau de controle do próprio comportamento.
99
Como exemplo, podemos considerar a utilização do software Geogebra que dá
oportunidade a que o estudante desenvolva a tarefa proposta e ele mesmo controle os resultados
encontrados e questione sua pertinência, sentido e validade no contexto em que a tarefa é
resolvida e reflita sobre a sua resposta, comparando com a prática habitual.
Rabardel (2002, 1995) considera ainda a questão do significado e, por meio da discussão
de diversos trabalhos, sublinha que o significado está no coração do problema da renovação da
Psicologia, que visa descrever as interações do homem com os artefatos e, mais genericamente, a
apropriação das técnicas. Segundo Rabardel (2002, 1995), o discurso de Bruner nesse sentido não
é isolado, assim como o trabalho de Cole (1989) que apresenta uma visão de conjunto do
nascimento, morte e renascimento atual do interesse pela cultura dos artefatos.
Tem-se então que a psicologia cultural é fundamentada em duas grandes teses: as
habilidades humanas para a criação de artefatos e as habilidades correspondentes da transmissão
de conhecimentos assim acumulados para as gerações futuras.
Dessa forma, ao considerar a problemática da relação entre artefatos e técnicas na
Psicologia, Rabardel (2002, 1995) cita o manifesto de Kittle House, o qual indica que essas
relações devem ser exploradas segundo dois eixos, correspondendo a duas formas de atividades
humanas, a saber:
- as atividades de concepção: é necessário compreender os mecanismos e os processos
pelos quais se concebem os artefatos para fornecer as ajudas reais aos projetistas. Auxiliar a
atividade de concepção supõe que as ajudas propostas sejam coerentes com essa atividade,
possam nela se inserir, ao invés de dificultar ou ser um obstáculo.
Como exemplo, para o software Geogebra, parece-nos interessante colocar algumas
questões aos projetistas, caso surjam algumas discrepâncias entre a finalidade das atividades e as
representações e execuções que o software faz para facilitar sua utilização no estudo dos aspectos
da derivada e integral definida de funções reais a valores reais para os quais tais discrepâncias
surgem.
- as atividades de uso, de utilização: é necessário analisar e compreender o que são essas
atividades, do ponto de vista dos próprios usuários, suas modalidades e seus significados que se
inscrevem nas situações sociais e contextos para os quais é preciso respeitar a singularidade e a
complexidade.
100
Em nossa pesquisa, tentamos nos aproximar do que é destacado pelo autor nos
parágrafos anteriores, propondo tarefas usuais de introdução ao Cálculo Diferencial e Integral
Definida e propondo, a partir do que os estudantes conhecem, transitar para uma compreensão
com sentido de algumas ideias de base de derivada de funções reais a valores reais e da integral
de Riemann.
Rabardel (2002, 1995), ao se referir à ação, considera o trabalho de Bannon e Bodker
(1991) que apresenta um quadro teórico sobre atividade e uso real dos artefatos em situações de
trabalho, o que os conduz a considerar os computadores não como objetos, mas como
ferramentas e instrumentos. A partir dessa consideração, eles definem os pontos essenciais de tal
abordagem, quais sejam:
- os artefatos existem na atividade e são constantemente transformados pela atividade.
Por exemplo, a construção dos conceitos de Cálculo, em geral, e da derivada de funções
reais a valores reais e da integral de Riemann, em particular, está ligada à produção,
transformação e desenvolvimento (modernização) de artefatos. Entre eles, podemos considerar os
artefatos materiais e simbólicos. Para entendermos isso, basta lembrar alguns casos, como por
exemplo: o modelo figural de Oresme (1323-1382) para descrever o movimento uniforme com
algumas ideias embrionárias da integral definida (BOYER, 1949, p. 83); o método de exaustão
aplicado pelo Arquimedes, inscrevendo e circunscrevendo figuras em segmentos parabólicos para
determinar áreas destes (BOYER, 1949, p. 52); o método de regula de Cavalieri para determinar
áreas de figuras planas e volumes de sólidos (BARON, 1974, v. 2, p. 12-13); os métodos usados
por Wallis, Fermat, Torriceli, Barrow, segundo Baron (1974, v. 2); as construções figurais e
algébricas de Newton e Leibniz para deduzir as ideias centrais do Cálculo (BARON e BOS,
1974, v. 3), bem como as construções posteriores de muitos outros matemáticos, entre eles
Cauchy (BOS, 1974, v. 4) e Riemann, mostram como a preocupação de prover ao Cálculo uma
base firme foi aprimorando os artefatos usados. Boyer (1949) refere ainda que o simbolismo
literal introduzido na Matemática, principlalmente por Viète (1540-1603), foi crucial para o
rápido desenvolvimento da Geometria Analítica e do Cálculo nos séculos seguintes, pois
permitiram que os conceitos de variabilidade e de funcionalidade entrassem no pensamento
algébrico. E no nosso tempo, temos as ferramentas computacionais, as quais procuramos integrar
101
no estudo do Cálculo, e, especificamente na nossa pesquisa; buscamos incorporá-las no estudo da
derivada de funções reais a valores reais e da integral de Riemann.
- os artefatos não devem ser analisados como coisas, mas na maneira como eles
medeiam o uso. O estudo da mediação é essencial para as interações homem computador – HCI;
- os artefatos não são somente meios individuais, eles são portadores de partilha e
divisão do trabalho;
- eles têm um significado incorporado em uma prática social.
Rabardel (2002, 1995) ressalta ainda o trabalho de Kuutti (1992), que desenvolve um
ponto de vista instrumental a partir da teoria da atividade que aporta à HCI uma nova visão em
relação ao ponto de vista padrão das ciências cognitivas, a comunicação entre dois processadores
de informação. Não se trata mais de um usuário interagindo com um computador, mas de um
sujeito ativo utilizando uma aplicação como um instrumento para manipular os objetos de tal
forma que o resultado da manipulação seja, para ele, carregado de significados no contexto da
atividade. Como exemplo, podemos considerar o nosso estudo do conceito de derivada de uma
função real a valores reais e integral de Riemann no desenvolvimento de atividades para as quais
o computador é instrumento que auxilia o estudante a encontrar o significado visado.
Assim, Rabardel (2002, 1995) situa a abordagem instrumental numa perspectiva de tipo
“personnal view”, para a qual é preciso analisar a influência do objeto sobre a recomposição das
tarefas, o aparecimento de novas tarefas e o desaparecimento das antigas.
Por exemplo, quando decidimos incorporar o componente computacional na nossa
pesquisa, consideramos uma perspectiva diferente da usual, para a qual é necessário conjecturar
sobre os conceitos de derivada de funções reais a valores reais e de integral de Riemann,
colocando em evidência os aspectos visuais, de sentido e de significado implicados em tais
conceitos e articulando-os com as práticas vigentes.
A seguir, Rabardel (2002, 1995) desenvolve um quadro teórico para análise e
conceituação das atividades com instrumento, partindo de Haudricourt (1994) que pondera que
uma mesa, por exemplo, pode ser estudada do ponto de vista matemático como tendo uma
superfície, um volume; do ponto de vista da física, em que podemos estudar seu peso, sua
densidade, sua resistência à pressão e do ponto de vista das ciências humanas, em que podemos
estudar sua origem e função para os homens. Essa multiplicidade de apreciações possíveis
102
corresponde aos desafios de análises diferentes propostas por pesquisadores em Sociologia, em
Tecnologia, em Economia, etc.
Assim, a noção de artefato designa em Antropologia toda coisa tendo sido submetida a
uma transformação, mesmo mínima, de origem humana, sendo, portanto, compatível com um
ponto de vista antropocêntrico sem especificá-lo anteriormente. Ela apresenta a vantagem de não
restringir o significado às coisas materiais (do mundo físico), compreendendo também os
sistemas simbólicos que podem ser instrumentos.
Rabardel (2002, 1995) esclarece que utiliza o termo instrumento para designar o artefato
em situação, inscrito em um uso, em uma relação instrumental da ação do sujeito como meio
desta. O autor observa ainda que essa definição corresponde a uma abordagem minimal da noção
psicológica de instrumento que compreende um de seus usos.
Nessa perspectiva, Rabardel (2002, 1995) considera diferentes pontos de vista para a
noção de artefato, a saber:
- artefato como sistema técnico, o artefato é uma coisa a conhecer, um objeto de
conhecimento;
- artefato do ponto de vista de suas funções, isto é, do que acontece com os objetos, com
as coisas para cuja transformação ele contribui como subconjunto de um sistema mais amplo
como uma unidade de produção ou uma empresa. Esse subconjunto pode ser considerado um
sistema misto homem-máquina-produtor de transformações.
- artefato como meio de ação é o caso em que o artefato é considerado do ponto de vista
do sujeito, de sua atividade e de sua ação, isto é, numa perspectiva da lógica da atividade e da
utilização que é organizadora da abordagem da relação instrumental do homem ao artefato.
- artefato do ponto de vista das lógicas complementares: funcionamento, utilização e
processo.
Por exemplo, o software Geogebra pode ser visto a princípio como um sistema técnico
que deve ser estudado como tal, apresentação do software para os estudantes. Na sequência pode-
se utilizá-lo para produzir transformações, por exemplo, fazer a representação gráfica de uma
função, o que corresponde a um sistema misto homem-máquina, que será tratado finalmente
como um meio de ação, quando os estudantes o utilizam de forma autônoma para responder a
uma tarefa.
103
Na sequência, Rabardel (2002, 1995) considera os três polos levados em conta nas
situações de utilização de um istrumento:
- o sujeito (usuário, operador, trabalhador, agente...);
- o instrumento (ferramenta, máquina, sistema, utensílios, produto ...);
- o objeto para o qual a ajuda do instrumento é dirigida (material, real, objeto de
atividade, de trabalho, outro sujeito ...).
Conforme Rabardel (2002, 1995), o significado de cada um desses polos varia
sensivelmente de acordo com cada autor e o ponto de vista que subentende seu sistema de
interpretação. Contudo ele representa o princípio que consiste em situar o artefato em uma
posição ao mesmo tempo intermediária e mediadora entre o sujeito e o objeto, o que parece ser
uma opção de caráter geral.
Na nossa pesquisa, o sujeito são os estudantes que participam da pesquisa, o instrumento
é o software Geogebra e o objeto são as tarefas propostas aos estudantes sobre as noções de
derivadas de funções reais de uma variável real e integral de Riemann.
O resumo dessa tríade é representado no modelo seguinte (I.A.S. Instrument-mediated
Activity Situations, situações de atividades mediadas pelo instrumento):
FIGURA 13 – MODELO I.A.S: SITUAÇÕES DE ATIVIDADES MEDIADAS PELO INSTRUMENTO
FONTE: Rabardel (2002, p. 43)
A interpretação que o autor dá sobre esse modelo é que, além de interações diretas
sujeito-objeto (dS-O), muitas outras interações podem ser consideradas: interações entre o sujeito
e o instrumento (S-I), interações entre o instrumento e o objeto sobre o qual aquele permite a
alguém agir (I-O), e, finalmente, interações sujeito-objeto mediadas pelo instrumento (S-Om).
Além disso, todo o sistema é inserido num ambiente feito de todas as condições que o sujeito
104
pode levar em consideração na sua atividade finalizada. Cada um dos polos e cada uma das
interações são passíveis de uma interação com o ambiente assim definido.
Para o autor, o modelo I.A.S. é uma ferramenta para análise das tarefas e atividades. Um
exemplo por ele apresentado, de aplicação do modelo, tirado de Aucherie e Sacotte (1994 apud
RABARDEL, 2002, p. 43-44) é de um pintor que prepara as paredes e forro de um quarto,
usando uma máquina de remoção de papel da parede. No quadro 4, que segue, apresentamos a
articulação entre os elementos do modelo para uma tarefa sobre derivada de funções que compõe
o estudo experimental, essa figura foi construída por adaptação a partir do exemplo do autor.
QUADRO 4 – ANÁLISE DE ATIVIDADE BASEADA NO MODELO I.A.S
Considere a função f: IR IR dada por: f(x) = x3 – 6x2 + 9x + 1. Com recurso ao Geogebra:
Tarefa Atividade do estudante Instrumento Objeto
a) i) Esboce o gráfico de f. Introduz no input do Geogebra a
expressão f(x) = x^3 – 6x^2 + 9x + 1
e confirma;
ou, com régua e esquadro, constrói
no papel o gráfico de f. Ou ainda, no
quadro negro (branco), com régua e
esquadro, constrói o gráfico de f.
Mouse, teclado e tela
do computador;
ou lápis , papel,
esquadro e régua; ou
quadro negro
(branco), régua e
esquadro, giz
(pincel).
Representação gráfica da
função f.
ii) Determine o ponto
A = (3,16; f(3,16)) sobre o
gráfico de f.
Introduz no input do Geogebra a
expressão A = (3,16; f(3,16)) e
confirma;
ou, com régua e esquadro, constrói
no papel o ponto A. Ou ainda, no
quadro negro (branco), com régua e
esquadro, constrói o ponto A.
Mouse, teclado e tela
do computador;
ou lápis, papel,
esquadro e régua; ou
quadro negro
(branco), régua e
esquadro, giz
(pincel).
O ponto
A = (3,16; f(3,16)) sobre
o gráfico de f.
iii) Com o seletor
determine a = [3,16009;
4]. Coloque no seletor a =
4 e determine o ponto B =
(a, f(a)) sobre o gráfico de
f.
Ativa o seletor na 9ª opção da
barra de ferramentas.
Clica sobre a zona gráfica do
Geogebra.
Introduz os valores dos extremos
do intervalo de animação nos lugares
correspondentes ao mínimo e ao
máximo; e o valor do incremento (o
passo de animação).
Confirma a ação clicando no
apply.
Introduz no input do Geogebra a
expressão B = (a, f(a));
ou com régua e esquadro constrói no
papel (no quadro) um ponto B A,
sobre o gráfico f. (1).
Mouse, teclado e tela
do computador;
ou lápis, papel,
esquadro e régua; ou
quadro negro
(branco), régua e
esquadro, giz
(pincel).
Seletor (slider): o
intervalo de animação;
O ponto B de
coordenadas (a, f(a)).
(1)
iv) Determine a reta Introduz no input do Geogebra a
105
secante AB:
y = 163
163
,
),()(
a
faf(x –
3,16) + f(3,16).
expressão
y = ((f(a) – f(3.16))/(a – 3.16))*(x –
3.16) + f(3.16) ou ativa reta (line) na
3ª opção da barra de ferramentas; em
seguida clica em sequência sobre os
pontos A e B;
ou com régua, traça a reta secante
pelos pontos A e B. (2).
Mouse, teclado e tela
do computador.
Lápis, papel, régua;
ou quadro negro
(branco), régua, giz
(pincel). (2)
Reta secante ao gráfico
de f pelos pontos A e B.
b) Movimentando o ponto
B em direção ao ponto A,
anote os diferentes valores
de 163
163
,
),()(
a
faf em
cada posição de B.
Ativa o seletor e com o rato ou seta
do teclado, movimenta o ponto
B aproximando à A;
ou aponta, fala, traça retas secantes
passando por A.
_________________(3)
Mouse, teclado, seta
e tela do
computador;
ou gestos, discurso
oral, lápis e papel ou
quadro e giz (pincel)
____________ (3)
Aproximação do ponto
B ao ponto A e seus
valores nas diferentes
posições;
Inferência (conjectura)
sobre o possível valor do
limite da razão
incremental. (3)
Complete:
163
163
163 ,
),()(lim,
a
faf
a =
….
Determinar o limite da razão
incremental dada no ponto x = 3,16
Técnica prática do
cálculo de limites de
funções em um
ponto
___________(4)
O limite da razão
incremental de f no
ponto x = 3,16.
c) O que é que este limite
significa para nós?
Pensar sobre os possíveis
significados do limite da razão
incremental de f.
Elaboração do significado para o
limite da razão incremental.
Raciocínio,
imaginação,
memória,
interpretações
___________(4)
Os diferentes pontos de
vista da derivada,
segundo Thurston
(1995).
FONTE: Adaptado de Rabardel (2002, p. 44).
Na figura acima, identificamos algumas etapas que consideramos críticas em termos de
finalidades do uso de instrumento, as condições e restrições existentes entre a ferramenta
computacional e as ferramentas usuais (papel e lápis e, quadro negro ou branco e giz ou pincel) e
seu impacto na aprendizagem.
Na questão a), tanto o uso do software, quanto o uso da mídia usual, tem como objetivo
produzir os ostensivos gráficos para construir a noção visada por meio da análise desse ostensivo
visual.
Com lápis e papel ou quadro e giz (pincel), temos interações diretas sujeito-objeto (dS-
O). Devemos entender que os objetos a serem construídos nessa interação são os ostensivos dos
conceitos, e não os próprios conceitos, que serão evocados mentalmente ou quando se
desenvolver a discussão. Esses ostensivos são produzidos no ambiente lápis e papel, pelo
estudante, construindo assim os eixos ortogonais, plotando uma rede de pontos, fazendo algumas
106
substituições na lei de formação da função com alguns valores do domínio e calculando as
imagens correspondentes, que vão lhe oportunizar perceber o padrão desses pontos e, em seguida,
uni-los por uma linha contínua.
Com o computador, temos interações sujeito-objeto mediadas pelo instrumento (S-Om),
pois o sujeito age sobre o teclado, o software reconhece esse comando e fornece a resposta na
tela. Com efeito, ao introduzirmos a lei de formação da função na entrada de comandos,
caracterizamos o lugar geométrico e a sua expressão analítica, que vão ser exibidos na tela,
vetorialmente23
ou em pixels (BALACHEFF, 1994, p. 2), tanto em forma de gráfico, quanto na
forma algébrica.
Notemos que as técnicas implicadas para o encaminhamento da tarefa, nas duas formas
de interação, são diferentes, como a própria figura e os parágrafos anteriores mostram.
Na fase que indicamos por (1), acontece que, com o computador, o ponto B é definido
parametricamente, para dar margem à sua mobilidade e da secante AB que esses dois pontos
definem. Com o recurso às mídias usuais, o ponto B precisa ter coordenadas fixas, se houver
necessidade de determinar a equação da secante. Caso contrário, o ponto B pode ser determinado
arbitrariamente.
Na fase (2), com o computador, podemos prover à reta secante AB com o triângulo
característico, triângulo declive e o correspondente valor do declive. Com a mídia usal, esses
elementos também podem ser determinados, mas é necessário um tempo maior para elaborar as
construções e os respectivos cálculos.
A etapa (3) fornece mais informações em termos de movimento de aproximação do
ponto B ao ponto A e a variação dos tamanhos e formas do triângulo característico e do triângulo
declive, apresentando ainda valor do declive em cada posição. Consideramos que essas
transformações podem propiciar a construção da imagem mental correta pelos estudantes dos
conceitos visados. Com a mídia usual, esta etapa é desenvolvida com o recurso aos ostensivos
gestuais (apontando o possível movimento do ponto B), discursivo (descrevendo o movimento de
23 Em computação gráfica, imagem vetorial é um tipo de imagem gerada a partir de descrições geométricas de
formas, diferente das imagens chamadas mapa de bits, que são geradas a partir de pontos minúsculos
diferenciados por suas cores (os pixels). Uma imagem vetorial normalmente é composta por curvas, elipses,
polígonos, textos, entre outros elementos, isto é, utilizam vetores matemáticos para sua descrição.
http://www.oficinadanet.com.br/artigo/design/o_que_e_desenho_vetorial.
107
B) e gráficos, desenhando algumas retas que presumem as diferentes posições da secante AB com
a aproximação de B ao ponto A. E torna-se cansativo (e geralmente não se faz) calcular o declive,
desenhar o triângulo característico e o triângulo declive para cada posição da secante traçada.
Pensamos que a gestão desses elementos é determinante para a construção correta do conceito de
derivada de uma função real de uma variável real.
Na etapa (4), o estudante não age diretamente sobre o instrumento, mas sim pensa sobre
o trabalho realizado com instrumentos, adaptando-o ao plano mental de execução, segundo
Argento (1995), rumo à abstração e à generalização. Avaliamos que nesta fase as inferências e
conjecturas têm mais sentido com o recurso ao software, pois em cada posição do ponto B, o
valor da razão incremental é exibido, o que pode sugerir o valor do limite dessa razão. Com a
mídia usual, é difícil produzir esses valores, pelo menos o tempo consumido pode ser
considerável, caso haja interesse de calcular o valor da razão incremental para cada reta traçada.
Em termos de produção de significado para a derivada, pensamos que o recurso ao software
Geogebra é mais vantajoso do que recorrer apenas às práticas e mídias usuais.
Voltando ao trabalho de Rabardel (2002, 1995), o autor observa que, na verdade, o
modelo I.A.S. não cobre todas as características de situações cujas atividades são mediadas por
instrumentos: há uma multiplicidade de instrumentos usados por um sujeito numa ação
complexa; os contextos de ação são de natureza muito variável e podem ser coletivos; as
finalizações específicas dos sujeitos [...] Porém o instrumento está presente e essa presença é
constitutiva da tríade e das interações múltiplas que dela resultam, formando assim um núcleo
comum, característico da classe de situações da atividade instrumentada. No entanto, como
constatamos, esse núcleo comum é suscetível de múltiplas interpretações.
Focalizando a máquina como tal, Rabardel (2002, 1995) reafirma que ela deve ajudar o
operador a executar uma tarefa, mas ele/ela deve empreender uma aprendizagem de modo a se
beneficiar dessa ajuda. Nessa ordem de ideias, a máquina tem de realizar duas funções: gerir o
diálogo com o operador e conduzir a tarefa (planificação). Assim, um modelo tripolar de relações
humano-máquina é proposto com o nome de “triplet operador-máquina-objeto”. Na sequência,
examinamos as conceituações de cada polo e suas respectivas interações:
108
o polo humano é menos constituído em termos do sujeito do que como
componente humano (tendo suas características e propriedades próprias) de um sistema mais
amplo que o ultrapassa e no qual ele se insere;
o polo artefato é considerado em termos de máquina, de sistema operando e
funcionando. Não é um ponto de vista instrumental que envolve o sistema enquanto meio de ação
do sujeito.
o polo objeto é considerado aquele que envolve a atividade do sistema homem-
máquina. O polo objeto é constituído do objeto da atividade comum dos componentes do sistema
mergulhados em um ambiente comum ao operador e à máquina. Duas concepções do real ao qual
é confrontado o sistema homem-máquina são distinguidas: um entendimento em termos de objeto
(refere-se ao objeto da atividade) e um outro em termos de ambiente (isto é, o contexto da
atividade).
Os polos acima correspondem ao modelo de organização da atividade com recurso a um
software computacional. Para tal, Rabardel (2002, 1995) faz menção ao trabalho de Norman
(1991), visando apresentar o que Norman denomina artefatos cognitivos baseados no modelo
triádico de atividade com situações de artefatos, cujos polos são o sujeito, o artefato e a tarefa.
FIGURA 14 – MODELO DE NORMAN DE I.A.S.
FONTE: Rabardel (2002, P. 49).
Segundo Rabardel (2002, 1995), Norman distingue dois pontos de vista possíveis destas
situações:
- ponto de vista sobre o sistema, considerando o conjunto sujeito-artefato como um
sistema, examinando o que este sistema pode fazer à luz da tarefa que é considerada como
imutável. Nessa perspectiva, o artefato é considerado como amplificador das capacidades
funcionais do sistema;
109
- ponto de vista “pessoal”, aquele do usuário segundo o qual são as transformações da
tarefa que serão examinadas. Estas transformações da tarefa trazem consigo novas exigências
cognitivas que necessitam da ativação de capacidades cognitivas muito diferentes daquelas
requeridas pela tarefa original.
Uma abordagem triádica de situações de atividade com artefatos é igualmente
desenvolvida no domínio do controle dos processos. Rabardel (2002, 1995) observa que
Hollnagel (1990) identificou para essa abordagem três polos, a saber: homem, computador e
processo, distinguindo ainda dois tipos de interações, conforme a figura que segue.
FIGURA 15 – MODELO I.A.S. TRIPOLAR DE HOLLNAGEL
FONTE: Rabardel (2002, P. 50).
- o computador fornece ao usuário as informações sobre o processo e ao mesmo tempo
“amplifica” algumas das funções cognitivas do usuário (discriminação, interpretação). Trata-se
de uma relação de tipo incorporação no sentido que o computador pode de uma determinada
maneira ser considerado como uma parte do operador (IHLDE, 1979 apud RABARDEL, 2002, p.
50);
- o computador é um interpretante das comunicações entre o operador e um programa de
aplicação (software). É um mediador sobre o qual o operador não tem controle. A relação
estabelecida nesta situação é hermenêutica (interpretativa). Hollnagel, segundo Rabardel (2002,
1995), faz uma ligação dessa distinção com a estabelecida por Reason (1988 apud RABARDEL,
2002, p. 50) entre ferramentas que corresponderiam à função de amplificação e às próteses que
estariam do lado da interpretação.
110
Rabardel (2002, 1995) indica o trabalho de Béguin (1994) que coloca em evidência
características importantes das interações entre a pessoa e os outros, intermediadas pelo
instrumento que tem uma função de mediação colaborativa para atingir os objetivos no interior
das atividades coletivas. Por exemplo, a utilização na pesquisa do Geogebra com os estudantes
distribuídos em duplas possibilita identificar o quarto polo, ainda que essa interação se tenha
realizado com apenas dois sujeitos. Lembramos que poderíamos trabalhar com grupos maiores.
Em relação aos estudos de Léontiev (1975, 1976), Rabardel reforça ainda a ideia de que
instrumentos devem ser considerados como portadores da primeira abstração verdadeira. Na
interação direta sujeito-objeto, as propriedades do objeto são somente reveladas nos limites das
sensações do sujeito, ao passo que no processo de interação mediado pelo instrumento, o
conhecimento ultrapassa esses limites.
Rabardel (2002, 1995) ressalta que Léontiev se une a Vygotsky que desenvolveu uma
concepção generalizada dos instrumentos centrados no sujeito. Para Vygotsky, os instrumentos
permitem, não somente a regulação e a transformação do meio externo, mas também a regulação,
pelo sujeito, de sua própria conduta e da conduta dos outros.
Por exemplo, a ideia de utilizar a mediação didática, articulada com o software
Geogebra deve-se ao fato de este último viabilizar uma modelagem algébrica e gráfica dos
problemas de introdução da derivada e da integral definida de funções reais de variável real,
acompanhada de animação que, no nosso entender, realça o significado e, dessa forma, regula a
conduta dos estudantes participantes das sessões experimentais para as questões de
aprendizagem.
De acordo com Rabardel (2002, 1995), o ponto de vista desenvolvido por Vygotsky
leva, de um lado, a distinguir dois tipos de instrumentos em função de como eles propiciam ao
sujeito agir (o mundo material, o próprio psiquismo ou o dos outros) e, por outro lado, a propor
uma unidade de análise das atividades instrumentadas: a ação instrumental. O instrumento é
assim duplamente pensado em referência ao sujeito. Mas Rabardel (2002, 1995) explicita que o
interesse da abordagem de Vygotsky não reside somente na associação das noções de instrumento
e ação instrumental. A abordagem de Vygotsky é mais fundamentalmente ligada à noção de
instrumento psicológico, pelo qual o sujeito controla e regula sua própria atividade.
111
A partir dos estudos de Cuny (1993), são destacadas as noções de instrumentos
semióticos. A esse respeito, Cuny (1993 apud RABARDEL, 2002, p. 60) define ferramentas
semióticas como sendo objetos, cuja função é fornecer informação e que se inscrevem num
sistema homem-tarefa, caracterizando toda situação de trabalho, participando das operações
determinadas no interior das quais suas funções são atualizadas. Eles são, como todo instrumento,
indissociáveis das técnicas e dos modos operatórios que permitem sua implementação.
Rabardel (2002, 1995) considera também a noção de ferramenta cognitiva, desenvolvida
por Rogalski e Samurcay. Rogalski (1993 apud RABARDEL, 2002, p. 60) define as
características da sua concepção de ferramentas cognitivas como sendo artefatos, objetos
externos ao sujeito, que resultam de um processo social de elaboração e que integram
conhecimento (estas ferramentas são cognitivas por natureza). Assim, artefatos, tais como tabelas
de dados digitais, ábacos, calculadoras, ferramentas de software, bem como os métodos de
resolução de problemas são ferramentas cognitivas.
Rogalski e Samurcay (1993 apud RABARDEL, 2002, p. 61) insistem sobre a natureza
das ferramentas cognitivas, que assumem parte da atividade cognitiva do usuário e assim
contribuem para ele realizar as tarefas. Para Rabardel (2002, 1995), ferramentas cognitivas
devem ser concebidas como instrumentos na posse do sujeito para resolver um problema. A
ferramenta cognitiva desempenha papel de um consultor, uma fonte de informação para o sujeito
que dirige o processo de resolução do problema. O papel do usuário é vigiar a cooperação
usuário-máquina como um todo e gerir o alcance dos recursos cognitivos à sua disposição.
A posição intermediária do instrumento faz dele o mediador das relações entre o sujeito
e o objeto. Ele constitui um mundo intermediário, cuja característica principal é ser adaptado
tanto ao sujeito, quanto ao objeto. Esta adaptação se dá em termos materiais, bem como em
termos de propriedades cognitivas e semióticas, segundo o tipo de atividade na qual o
instrumento é inserido ou é destinado a ser inserido. Assim, dois tipos de mediação são
identificados:
- uma mediação do objeto ao sujeito, descrita como uma mediação epistêmica, na qual
o instrumento é um meio possibilitando o conhecimento do objeto;
112
- uma mediação pragmática, do sujeito ao objeto, na qual o instrumento é um meio
para uma ação transformadora (em um sentido mais amplo, incluindo controle e regulação)
dirigida para o objeto;
Mas, quando essa mediação se inscreve em uma atividade real, as dimensões epistêmica
e pragmática da mediação estão em constante interação no interior da atividade.
Assim, um instrumento não é somente um mundo intermediário, ele é meio de ação e
mais amplamente de atividade, constituindo uma segunda dimensão característica do uso do
instrumento. As ações são evidentemente de naturezas diversas, a saber:
- transformação de um objeto material com uma ferramenta manual: instrumento
material;
- tomada de decisão cognitiva, por exemplo, numa situação de gestão de um ambiente
dinâmico: ferramenta cognitiva;
- gestão da própria atividade: instrumento psicológico;
- interação semiótica com um objeto semiótico ou com os outros: ferramenta
semiótica.
No interior da ação, o instrumento é um operante. Ele é operativo no sentido de que ele
oferece suporte a uma parte da tarefa: faz um trabalho. A natureza desse trabalho e o que a ele diz
respeito estão obviamente relacionados aos objetos da atividade e, como tal, são extremamente
variáveis. O instrumento é associado pelo sujeito à sua ação individual, dinamicamente integrado
nessa, mas é também conservado para ser reutilizado em situações futuras pertencentes à(s)
mesma(s) classe(s), sendo assim ocasição de recomposições duráveis da atividade que se
organizam em ações instrumentais. Por meio dessa conservação, o instrumento é um meio de
capitalização da experiência acumulada (cristalizada) e, nesse sentido, todo instrumento é
conhecimento.
Ainda mantendo-se em uma perspectiva psicológica, Rabardel (2002, 1995) define
instrumento como um todo, incorporando um artefato (ou uma parte dele) e um ou mais
esquemas.
Fazendo menção a Piaget (1936), o autor define esquema como sendo “o grupo
estruturado de características generalizáveis da ação que permite a mesma ação ser repetida ou
aplicada às novas situações. (RABARDEL, 2002, p. 65). Referindo-se a Piaget (1936a), o autor
113
diz que esquemas constituem meios para o sujeito assimilar as situações e os objetos com os
quais se confronta. Os esquemas são as estruturas que prolongam a organização biológica e
compartilham com esta última a capacidade assimiladora para incorporar uma realidade externa
no ciclo da organização do sujeito: tudo que satisfaz uma necessidade é passível de ser
assimilado.
Nesta nossa análise, damos particular atenção aos esquemas ligados à utilização de
artefatos, que o autor chama de esquemas de utilização. Estes esquemas dizem respeito a duas
dimensões da atividade:
- atividades relacionadas a tarefas secundárias, isto é, relacionadas à gestão das
características e propriedades específicas do artefato: por exemplo, manejar o teclado de um
computador pertence ao esquema de utilização na sua dimensão de atividades relacionadas a
tarefas secundárias. Essas atividades correspondem aos esquemas de uso.
- atividades relacionadas a tarefas primárias, ou tarefas principais, orientadas para o
objeto da atividade, e para a qual o artefato é um meio para a execução. Como exemplo, diríamos
que a adequação do processamento de dados no computador, via teclado, estaria neste nível do
esquema de utilização. Essas atividades estão associadas aos esquemas de ação instrumentada.
Assim, a partir dos critérios acima apresentados para distinguir os esquemas e sua
relação com a tarefa secundária ou principal, podemos considerar que o caráter do esquema de
uso ou do esquema da ação instrumentada não se refere a uma propriedade do próprio esquema,
mas a seus status na atividade finalizada do sujeito. Nessa perspectiva, um mesmo esquema pode,
segundo as situações, ter um status de esquema de uso (por exemplo a mudança da velocidade em
uma ultrapassagem) ou esquema da ação instrumentada (por exemplo, quando um iniciante está
aprendendo a fazer as mudanças de velocidade para uma ultrapassagem).
Além desses esquemas, Rabardel (2002, 1995) destaca que a análise dos esquemas
implicados pelas e nas atividades com instrumentos não pode ser limitada a um único sujeito,
pois as utilizações instrumentais situam-se sempre em um contexto de atividade coletiva. Um
mesmo artefato (ou uma mesma classe de artefatos) pode ser utilizado simultaneamente ou
conjuntamente por um coletivo de trabalho. É evidente que os sujeitos inseridos nessa atividade
coletiva usam os esquemas de utilização considerados acima, mas também é evidente que o
caráter coletivo da atividade faz apelo à constituição e à implementação de esquemas específicos.
114
Dessa forma, um terceiro nível de esquema deve ser considerado, o dos esquemas de
atividade coletiva instrumentada, que deve envolver, de um lado, as especificações dos tipos de
ação ou de atividade, dos tipos de resultados aceitáveis etc., quando o coletivo compartilha de um
mesmo instrumento ou trabalha com uma mesma classe de intrumentos. De outro lado, ele
precisa considerar a coordenação das ações individuais e a integração de seus resultados como
contribuição para as expectativas dos objetivos comuns.
Rabardel (2002, 1995) observa ainda que os esquemas de utilização têm uma dimensão
privada e uma dimensão social. A dimensão privada é própria de cada indivíduo e a dimensão
social está relacionada aos esquemas que se elaboram no processo em que o sujeito não está
isolado, assim, os outros usuários e os projetistas dos artefatos contribuem para a emergência dos
esquemas.
Vale acrescentar que os esquemas são objeto de transmissões, de transferências, mais ou
menos formalizadas, após as informações transmitidas de um usuário a outro, até as formações
estruturadas em torno dos sistemas técnicos complexos, passando pelos diversos tipos de ajudas
aos usuários (notas, instruções, assistências diversas incorporadas ou não nos próprios artefatos).
Esses esquemas são denominados esquemas sociais de utilização. Seu caráter social não se
confunde com o fato de que alguns deles são relativos às atividades coletivas instrumentadas.
Para Rabardel (2002, 1995), os esquemas sociais de utilização têm características
comuns de multifuncionalidade no sentido que eles cumprem:
- funções epistêmicas: orientadas para a compreensão das situações;
-funções pragmáticas: focalizadas na transformação da situação e obtenção de
resultados (resolução do problema);
- funções heurísticas: focalizadas na orientação e controle da atividade (pesquisa da
solução).
Eles constituem, como todo esquema, os quadros assimiladores das situações com as
quais o sujeito é confrontado. Eles permitem ao sujeito atribuir significados aos objetos em
função da orientação da atividade do sujeito e das tarefas e atribuir status, de um lado, em termos
de objetivos e subobjetivos, de estado, mudança de estado e transformação operáveis sobre os
objetos, por outro lado, em termos de meios, isto é, de instrumentos pertinentes para as ações
possíveis.
115
Sob esse prisma, os esquemas de utilização são organizadores da ação, da
implementação, do uso do artefato, levando em conta e apoiando-se sobre as propriedades do
artefato, sendo essas também organizadoras. Todavia, ressalta o autor, os esquemas de utilização
não podem ser aplicados diretamente. Eles devem ser adaptados à especificidade de cada situação
e implementados na forma de um procedimento adequado às particularidades da situação.
Rabardel (2002, 1995) enfatiza que a assimilação de novos objetos e novos artefatos aos
esquemas de utilização, ao mesmo tempo fontes de generalização, mas também de diferenciação
e acomodação, conduz ao enriquecimento e ao desenvolvimento da rede de significados do
sujeito, no interior da qual estão estreitamente ligados os artefatos, objetos e esquemas de
utilização.
Após apresentação das noções de esquemas, e principalmente, sobre esquemas de
utilização, são elaboradas ainda algumas definições sobre instrumento na perspectiva psicológica.
Segundo Rabardel (2002, 1995), o ponto essencial dessas definições é que o instrumento
não pode ser reduzido ao artefato, ao objeto técnico ou à máquina, seja qual for a terminologia
empregada. Para ele (autor), o instrumento é uma entidade mista, nascida tanto do sujeito quanto
do objeto: o instrumento é uma entidade composta de um componente artefatual (artefato, uma
parte dele ou um conjunto de artefatos) e um componente do esquema (um ou mais esquemas de
utilização, muitas vezes ligados à esquemas de ação mais gerais). Portanto, um instrumento é
formado por dois componentes:
- um artefato material ou simbólico produzido pelo sujeito ou por outros sujeitos. Na
verdade, não há instrumento sem artefato (RABARDEL, 2002, p. 86).
- um ou mais esquemas de utilização associados, resultante de uma construção própria
do sujeito, autônoma ou de uma apropriação de esquemas sociais de utilização já formados
exteriormente a ele.
À luz dessa definição, pontua o autor que instrumento não é somente o “objeto”
associado, e associável, pelo sujeito com sua ação para a execução de uma tarefa, ele é também o
esquema de utilização que irá proporcionar a inserção de um instrumento como um componente
funcional da ação do sujeito. Isto significa que a constituição da entidade instrumental é o
produto da atividade do sujeito. O instrumento não é somente parte do mundo externo do sujeito,
ou alguma coisa disponível a ser associada com uma ação (ou mesmo, necessariamente,
116
associado, como muitas vezes acontece em locais de trabalho). Ele é também a produção ou
construção do sujeito.
Assim, um instrumento enquanto totalidade, mas também em cada um de seus
componentes, é uma forma de capitalização de experiência ou conhecimento.
O sujeito institui alguns componentes de seu ambiente como instrumentos de acordo
com seu objetivo, isto é, como meio para sua ação. De igual modo, a posição instrumental do
artefato é relativa ao seu estatuto na ação. O artefato não é um instrumento, ele é instituído como
um instrumento pelo sujeito que lhe dá o estatuto de meio para alcançar os objetivos da sua ação.
Desse modo, um mesmo artefato pode ter estatutos instrumentais diferentes, segundo os sujeitos e
para um mesmo sujeito, de acordo com as situações e ainda em relação aos diferentes momentos
em que elas acontecem.
Rabardel (2002, 1995) analisa que os sujeitos, ao encontrarem em seu ambiente de ação
os elementos dos artefatos, que têm a propriedade necessária para serem associados aos esquemas
de utilização, formam o instrumento requerido para a ação em curso. O autor acrescenta que a
utilização do instrumento de forma não indicada pode ser considerada como indicadora da
atividade de atribuição aos artefatos, em função de suas propriedades aparentes e conhecidas, de
funções não antecipadas ou previstas pelos projetistas.
Conforme Rabaradel (1995), essa tendência pode ser traduzida como um processo da
gênese instrumental. Os sujeitos desenvolvem, em função dos objetos sobre os quais eles devem
agir, modos de uso diferenciados de um mesmo artefato, esquemas de utilização específicos, que
tendem a tornar esse artefato multifuncional e a constituir, a partir de um mesmo artefato, vários
instrumentos individualizados em função da especificidade dos objetos e tarefas. É, portanto, por
meio de uma diferenciação acomodativa do componente esquema do instrumento que se
desenvolveria uma multifuncionalidade do artefato.
No entando, no nosso estudo, observamos que é preciso estar consciente e atento para
não considerar o Geogebra um instrumento que possibilita tratar todos os pontos de vista
apresentados por Thurston (1995, 1994) para o conceito de derivada de uma função, mesmo se os
estudantes puderem utilizá-lo de diferentes modos.
A partir das análises feitas sobre as práticas de uso de instrumentos e, principalmente, do
estudo de pontos de vista de vários autores sobre a gênese instrumental, Rabardel (2002, 1995)
117
pondera que as catacreses, isto é, a utilização indevida de um instrumento, podem ser vistas
meramente como um caso específico de um fenômeno muito generalizado de: produção,
elaboração, instituição e transformação que o sujeito faz de seus instrumentos, incluindo quando
esses instrumentos são baseados em artefatos muito sofisticados como códigos.
Para o autor, a gênese instrumental é finalizada pelo sujeito. Dado que ela diz respeito a
dois polos da entidade instrumental – o artefato e os esquemas de utilização, ela comporta
também duas dimensões e duas orientações que são mutuamente distinguíveis e muitas vezes
relacionadas: instrumentalização, dirigida para o artefato, e, instrumentação, relativa ao sujeito
em si. Assim, a elaboração instrumental diz respeito, tanto a tarefas que o usuário se propõe a
resolver e à reorganização da sua atividade, quanto às transformações do sistema técnico.
A elaboração instrumental pelo usuário é assim dirigida, tanto para si mesmo (esta é a
dimensão da gênese instrumental chamada instrumentação), quanto para o artefato (a dimensão
de instrumentalização).
Os processos de instrumentação são relativos à emergência e à evolução dos esquemas
de utilização e da ação mediada pelo instrumento: sua constituição, seu funcionamento, sua
evolução por acomodação, combinação, coordenação, inclusão e assimilação recíproca, a
assimilação de novos artefatos aos esquemas constituídos já existentes.
Os processos de instrumentalização dizem respeito à emergência e evolução dos
componentes artefatos do instrumento: seleção, reagrupamento, produção e instituição de
funções, desvios e catacreses, atribuição de propriedades, transformação do artefato (estrutura,
funcionamento, etc.) que prolongam as criações e realizações dos artefatos cujos limites é difícil
determinar.
Os dois tipos de processos dizem respeito ao sujeito. A instrumentalização por atribuição
de uma função ao artefato resulta de sua atividade, assim como a acomodação de seus esquemas.
O que distingue esses processos é a orientação dessa atividade. No processo de instrumentação,
ela é dirigida para o próprio sujeito, enquanto no processo de instrumentalização, ela é orientada
para o componente artefato do instrumento. Os dois processos contribuem para a emergência e
evolução dos instrumentos, não obstante, dependendo das situações, um deles pode ser mais
desenvolvido, mais dominante do que o outro, ou mesmo o único implementado.
118
Assim, o processo de instrumentação compreende a descoberta progressiva pelo sujeito
das propriedades (intrínsecas) do artefato, acompanhada pela adaptação de seus esquemas, bem
como pelas mudanças na adaptação do instrumento resultante da associação do artefato com
novos esquemas.
Rabardel (2002, 1995) observa que a descoberta progressiva das propriedades
(intrínsecas) do artefato pelos sujeitos se acompanha da acomodação de seus esquemas, mas
também de mudanças de significado do instrumento resultante da associação do artefato a novos
esquemas.
Rabardel (2002, 1995) esclarece que na tradição piagetiana, os esquemas familiares são
considerados instrumentos. Assim, a gênese dos esquemas, a assimilação de novos artefatos aos
esquemas (dando um novo significado aos artefatos), a acomodação dos esquemas (contribuindo
para suas mudanças de significado), são constitutivas da segunda dimensão da gênese
instrumental: os processos de instrumentação.
Na sequência, Rabardel (2002, 1995) examina os aspectos representativos das gêneses
instrumentais. Ele afirma que os processos de instrumentação e de instrumentalização, pelos
quais se constituem as componentes esquema e artefato do instrumento, implicam, do lado do
sujeito, uma atividade representativa, cujo papel na estruturação, no controle e na regulação das
ações é essencial.
O autor inicia pelas representações mentais, considerando que nas atividades
instrumentadas, elas pertencem à categoria, mais geral, das representações para ação, que têm um
caráter funcional para a ação do sujeito, o que é designado por “imagem operativa”,
“representação funcional” ou modelos mentais.
Para as representações dos artefatos, Rabardel (2002, 1995) fornece exemplos das que
ele considera mais significativas, a saber: controlar um processo, compreender o funcionamento,
identificar uma falha, montar e desmontar um objeto técnico, utilizar um artefato como um meio
de ação.
Entre esses diferentes tipos de representação dos artefatos, mesmo que funcionais,
Rabardel (2002, 1995) destaca o aspecto de utilização de um artefato como um meio de ação,
pois o status do artefato representado em situação de atividade com instrumento é
fundamentalmente diferente, uma vez que ele participa dos instrumentos do sujeito, isto é, dos
119
meios de sua ação e não de seus objetos. Essa distinção heurística não é assim dividida nas
situações reais: em função dos momentos e das necessidades, um artefato pode mudar de status
para o sujeito; as mudanças que se assemelham para os especialistas da dialética ferramenta
objeto introduzida por Douady (1986) no domínio da Matemática.
Assim, o status instrumental do artefato implica que o sujeito disponha de
conhecimentos específicos, associados à sua função na ação. Rabardel (2002, 1995) cita Richard
(1983) para explicitar que a lógica de utilização não se superpõe à do funcionamento. Dessa
forma, os procedimentos, no caso da utilização de sistemas informáticos, não são deduzidos do
conhecimento das regras de funcionamento, mas habitualmente das modificações realizadas nos
procedimentos conhecidos para torná-los compatíveis com as regras de funcionamento e, mais
genericamente, com as restrições do dispositivo.
Rabardel (2002, 1995) reporta-se a Richard, que formulou a hipótese de que, quando um
sujeito aprende a utilizar um aparelho, seu primeiro objetivo é encontrar um procedimento para
atingir o resultado que lhe interessa. Somente quando é impossível ter sucesso sem compreender,
que ele se interessa por seu funcionamento. Ele observa ainda que o difícil para um iniciante é
saber quais são as ações realizáveis com os comandos do dispositivo e que são ao mesmo tempo
os objetivos, os subobjetivos possíveis em uma tarefa complexa.
Nossa expectativa é que uma situação idêntica reportada no parágrafo anterior pode
acontecer com os estudantes participantes das sessões experimentais, pois a experiência de
integração do instrumento computacional para estudar as questões de Cálculo é nova para eles,
bem como para o pesquisador.
Rabardel (2002, 1995) considera ainda os trabalhos de Mounoud (1970), que observou
que as crianças, quando escolhem ou concebem um instrumento para resolver um problema,
tendem a atribuir ao artefato as propriedades de sua própria ação, e é somente após certo tempo
que as propriedades do artefato e da ação do sujeito serão diferenciadas.
No nosso caso, é particularmente importante vivenciar como a integração do Geogebra
confere às práticas de ensino e de aprendizagem dos conceitos introdutórios de derivadas de
funções reais a valores e da integral de Riemann um rumo diferente daquele que é usualmente
seguido.
120
Na sequência, Rabardel (2002, 1995) apresenta algumas características das
representações para ação na situação de atividade com instrumento. Ele registra que um dos
pontos essenciais é que essas representações ou modelos mentais não dizem respeito apenas ao
artefato, mas ao conjunto de elementos característicos das situações de atividade instrumentada,
em partircular, os três polos da tríade (sujeito, instrumento, objeto), as interações entre eles, os
elementos do contexto pertinentes para a ação e a própria ação.
Outro ponto importante é que, pelo menos na fase inicial, os sujeitos tendem a atribuir
aos objetos sobre os quais eles agem e aos artefatos que são os meios de ação, suas próprias
características, propriedades etc. Por esse raciocínio, os movimentos dos artefatos são
interpretados em termos de sua própria motricidade, o objeto sobre o qual ele age com
instrumento é concebido nos mesmos termos que o objeto da atividade sem instrumento, ele
atribui suas ações aos instrumentos. Quando essa projeção acontece e é pertinente, ela se inscreve
em um processo de assimilação aos esquemas de ação e cognição do sujeito.
Como exemplo, Rabardel (2002, 1995) considera o caso da Matemática e sua
aprendizagem com recurso ao computador, citando Rogalski (1987 apud RABARDEL, 2002, p.
119) que põe em relevo, para o campo da aprendizagem dos saberes matemáticos e informáticos,
o papel do conhecimento já constituído, que funciona como precursor dos conhecimentos a serem
adquiridos. O conhecimento já em posse do estudante pode desempenhar um papel produtivo,
facilitando a aquisiçaõ do novo conhecimento, ou ao contrário, pode ser redutor quando o
estudante transpõe aspectos inadequados de seus conhecimentos anteriores.
Portanto, além das representações do artefato, são as representações da própria ação e do
objeto da atividade que irão evoluir.
Rabardel (2002, 1995) pontua que uma multiplicidade de fatores conduzem a situações
em que o uso de um artefato é específico para cada sujeito. O determinismo da atividade pelo uso
do artefato é ao mesmo tempo efetivo e relativo, o que conduz o autor a utilizar a noção de
atividade relativamente requerida, marcando a existência de modalidades de controle com caráter
ascendente (expresso pela ideia de “requerido”) e caráter descendente, próprio de cada sujeito
(que designa a ideia de relatividade). Assim, a atividade relativamente requerida é a tradução dos
compromissos estabelecidos pelo sujeito entre as restrições que lhe são impostas a partir de
múltiplas fontes: o artefato, a tarefa, o ambiente, suas próprias competências e capacidades etc.,
121
levando em conta sua finalização e seu engajamento na situação. Isso conduz a pensar a atividade
requerida como um conceito relativo, uma tensão entre dois polos: as restrições e fontes ligadas à
associação do artefato e, mais genericamente, do instrumento à ação e o próprio sujeito
psicológico, ator singular e intencional.
Rabardel (2002, 1995) considera ainda a questão da transparência de um artefato,
esclarecendo que essa transparência deve estar associada com às necessidades de informação dos
usuários, que são variáveis em função de seus objetivos, de suas competências, das estratégias
que eles utilizam para atingi-los etc. A transparência deve referir-se ao usuário e à sua atividade.
Isso conduz o autor a propor o conceito de transparência operativa para designar as propriedades
características dos instrumentos, pertinentes para a ação do usuário, perceptíveis para o mesmo.
Assim, a transparência operativa é um conceito relacional que exprime a variabilidade
das necessidades do sujeito de “informação” em função da variabilidade das situações de ação, de
seus estados e objetivos. Ela pode tomar diversas formas: inteligibilidade das transformações
entre ações de comando e efeitos, destaque das modalidades de funcionamento do próprio
instrumento, autoexplicação... A transparência operativa é função da distância que o instrumento
inscreve entre o sujeito e o real, objeto de sua ação, da complexidade dos esquemas operatórios e
representativos necessários para sua utilização, das condições de assimilação aos esquemas do
sujeito e da acomodação desses, que oferece ao artefato considerando suas características
externas e internas.
A transparência operativa pode ser analisada no âmbito de diferentes aspectos da
situação:
- a estrutura, o funcionamento e o comportamento da própria máquina: o que seria uma
transparência interna no sentido que o artefato daria a ver, mesmo explicaria seus aspectos
pertinentes para a ação;
- o objeto sobre o qual o operador age com a ajuda do artefato, suas características e suas
propriedades, tais como são consideradas pelo artefato e pertinentes em função da ação;
- as interações entre o artefato e o objeto: natureza, formas, conteúdos.
A transparência operativa pode ser analisada em referência às diferentes dimensões da
ação. Assim, ela pode ser relativa:
122
- à causalidade material, fenômeno próprio ao artefato. Ela refere-se a sua estrutura, seu
funcionamento, mesmo sua conduta (sistemas produzindo raciocínios), ou pelo menos o que é
pertinente para a ação do sujeito. Diagnosticar que a faca com a qual procuramos, em vão, cortar
um tomate não está suficientemente afiada constitui um exemplo de julgamento em termos de
causalidade material;
- à causalidade da ação instrumentada do sujeito orientada para o objeto. Ela pode, em
particular, estar associada à interação do artefato e do objeto em termos de mudanças de estado
desse último e das condições dessas mudanças. Diagnosticar que a faca não é a causa, mas que é
a maneira de utilizá-la que impede cortar o tomate, o que constitui um exemplo de julgamento em
termos de causalidade da ação instrumentada;
- às dimensões teleonômicas da ação. Dizem respeito, ao mesmo tempo, à ação do
sujeito afetada pelo artefato, mas também do artefato, desde que ele tenha um comportamento
que não é simplesmente o prolongamento ou cópia do comportamento do sujeito. O artefato
pode, por exemplo, ter seus próprios objetivos que ele fixa ou que são fixados do exterior pelo
construtor, um outro operador e algumas vezes pelo próprio sujeito;
- às dimensões axiológicas: elas concernem aos valores apresentados pelo artefato que
condicionam a atividade instrumentada do sujeito (valores e avaliações relativas aos objetivos do
sistema, à organização de sua ação, assim como a do sujeito...).
A transparência operativa é, por sua definição, relativa à ação e às finalidades dessa,
assim seus critérios variam em função das finalidades das ações. Em uma perspectiva formativa,
podemos, por exemplo, não desejar que a ação seja mais simples, mas ao contrário, constroem-se
restrições sobre essa ação, de forma que elas conduzam o sujeito a operar as construções
cognitivas que desejamos vê-lo elaborar.
A existência de uma diversidade de critérios da transparência operativa em função dos
domínios de aplicação está associada ao problema de utilizar uma abordagem instrumental em
diferentes campos (trabalho, formação, vida cotidiana), para os quais ela pode contribuir na
compreensão dos problemas encontrados pelos usuários na elaboração de soluções.
Rabardel (2002, 1995) avalia ainda que pouca atenção é dada às potencialidades
educativas dos processos de aprendizagem com utilização de instrumentos. Segundo o autor, o
uso de instrumentos é uma prática comum nos ensinos técnicos e profissionais, mas também em
123
disciplinas de ensino geral. Como exemplo, ele considera a utilização da régua, compasso,
esquadro para traçar e construir em Geometria, considerando ainda o Cabri-Géomètre como um
novo instrumento.
O autor ressalta que esses instrumentos são habitualmente considerados como simples
auxiliares, neutros, e que não intervêm enquanto tal sobre as conceituações dos estudantes. A
partir das questões: Mas, é certo? Qual é seu status cognitivo real? De que maneira eles
contribuem para a estruturação do pensamento geométrico e espacial dos estudantes, ou, ao
contrário, eles o dificultam?
Para responder a essas questões, o autor cita Ourahay (1991), que mostrou que a noção
de simetria ortogonal não se construiria, para os estudantes, nem da mesma maneira, nem com os
mesmos conteúdos segundo os instrumentos utilizados para fazer as construções gráficas
(esquadro, compasso, dobradura). Ele considera ainda o trabalho de Bautier (1993), que revelou
o impacto dos instrumentos sobre a conceituação das transformações geométricas.
A esse propósito, de acordo com Rabardel (2002, 1995), aparece uma via educativa que
se afigura promissora, a da concepção de instrumentos especificamente projetados para favorecer,
entre os usuários, em formação ou no trabalho, a construção e manipulação de conceituações e de
competências cuja aquisição constitui um objetivo.
Para o autor, instrumentos diferentes implicam concepções diferentes, não somente do
artefato, mas também e, sobretudo, do real associado e do objeto de ação, o que contradiz a
intuição comum, o instrumento não é neutro em relação ao real.
Finalmente, Rabardel (2002, 1995) salienta que não se trata somente de identificar as
contribuições da utilização instrumental dos artefatos, mas também, e pode ser preferencialmente,
das generalizações possíveis desses saberes em ação tanto no domínio profissional como para as
disciplinas mais “gerais”. Os saberes instrumentais são suscetíveis de ter um papel de precursor
para as construções formalizadas na sequência sobre uma base disciplinar e/ou estruturadas no
interior das ferramentas mais gerais da cognição. Construir novos instrumentos explicitamente
fundamentados sobre a propriedade acima permitirá percorrer os caminhos que conduzem da
ação à conceituação e à formalização, inscrevendo-se no movimento geral do desenvolvimento
cognitivo dos seres humanos.
124
Como parte final de apresentação da teoria de instrumentação segundo Rabardel (2002,
1995), destacamos algumas noções que consideramos importantes desse trabalho para a análise e
interpretação de alguns fenômenos e resultados da mediação didática desenvolvida na nossa
pesquisa.
Perspectiva antropocêntrica do uso de instrumentos. Essa perspectiva coloca o
homem no centro do processo do uso de instrumentos destacando que é ele que define
a finalidade desse uso, geralmente visando a eficácia na análise e nas formas de
comunicação na interação com as tarefas de seu interesse.
Noção de instrumento. A noção de instrumento está intimamente ligada à noção de
artefato – objeto material que tenha sofrido alguma transformação humana, ou objeto
simbólico – e à noção de esquema – modelo de atividade que permite o organismo
incorporar o meio, ou, como o autor diz, “o grupo estruturado de características
generalizáveis da ação que permite a mesma ação ser repetida ou aplicada às novas
situações”. Ainda sobre a noção de esquema, é destacada a noção de esquema de
utilização, que compreende:
- esquema de uso: que corresponde à gestão pelo usuário das características e
propriedades específicas do artefato;
- esquema da ação instrumentada: que corresponde ao controle que o usuário faz da
adequação do resultado fornecido pelo artefato.
Destacamos que a elaboração instrumental pelo usuário é assim dirigida, tanto para si
mesmo (esta é a dimensão da gênese instrumental chamada instrumentação), quanto para o
artefato (a dimensão de instrumentalização).
Os processos de instrumentação são relativos à emergência e à evolução dos
esquemas de utilização e da ação mediada pelo instrumento: sua constituição, seu
funcionamento, sua evolução por acomodação, combinação, coordenação, inclusão e
assimilação recíproca, a assimilação de novos artefatos aos esquemas constituídos já
existentes.
Os processos de instrumentalização dizem respeito à emergência e evolução dos
componentes artefatos do instrumento: seleção, reagrupamento, produção e
instituição de funções, desvios e catacreses, atribuição de propriedades,
125
transformação do artefato (estrutura, funcionamento, etc.) que prolongam as criações
e realizações dos artefatos cujos limites é difícil determinar.
Na ação instrumentada, é possível identificar alguns modos de mediação que o
instrumento permite estabelecer entre o sujeito da ação e o objeto da ação:
Mediação epistêmica que é uma mediação do objeto ao sujeito, na qual o
instrumento é um meio possibilitando o conhecimento do objeto;
uma mediação pragmática, do sujeito ao objeto, na qual o instrumento é um meio
para uma ação transformadora (em um sentido mais amplo, incluindo controle e
regulação) dirigida para o objeto.
O uso de instrumento como meio de ação, pode induzir diversas ações numa
determinada atividade:
transformação de um objeto material com uma ferramenta manual. Temos aqui
instrumento material;
tomada de decisão cognitiva, por exemplo, numa situação de gestão de um ambiente
dinâmico: ferramenta cognitiva;
gestão da própria atividade: instrumento psicológico;
interação semiótica com um objeto semiótico ou com os outros: ferramenta
semiótica.
No nosso estudo, consideramos fundamentalmente os aspectos cognitivos, psicológicos
e semióticos do uso de instrumentos em virtude de a nossa atenção estar voltada para ajudar os
estudantes na construção de seus conhecimentos sobre os conceitos de derivada e integral de
Riemann de funções reais a valores reais.
Consideramos ainda destacar uma outra noção importante no que tange ao uso de
instrumentos que Rabardel (2002, 1995) denomina de transparência operativa do artefato que
corresponde à gestão da própria atividade (instrumento psicológico) e ao mesmo tempo das
características e possibilidades (físicas) do artefato. A transparência operativa do artefato
compreende à gestão pelo usuário dos componentes esquema e artefato do instrumento e, citando
Vygotsky, Rabardel (2002, 1995) enaltece que as atividades com instrumentos estão no coração
da constituição e do funcionamento das funções psíquicas superiores para o homem. No nosso
126
entender essa constituição e esse funcionamento das funções psíquicas superiores compreendem a
construção de conhecimentos pelo sujeito da ação.
O estudo da teoria de instrumentação/instrumentalização favoreceu-nos compreender
que o essencial dela aponta para o papel da mediação (interface), via instrumento, da interação do
sujeito com seu mundo, no qual se encontra inserido: na resolução de problemas de interesse do
sujeito, e na compreensão, ou seja, na aquisição de conhecimentos em vários níveis sobre o
mesmo mundo. A esse respeito, consideramos essa teoria pertinente para nossa pesquisa que
procura explorar as potencialidades do instrumento computacional no ensino e na aprendizagem
da derivada de funções reais a valores reais e da integral de Riemann, por proporcionar a
conceituação e a formalização a partir da ação.
Na sequência, apresentamos uma breve descrição dos referenciais teóricos de apoio que
são utilizados para o estudo das relações instituicionais e pessoais dos estudantes.
3.4 REFERENCIAL TEÓRICO DE APOIO: NOÇÕES DE QUADRO E MUDANÇAS DE
QUADROS DE DOUADY (1984, 1986) E NÍVEIS DE CONHECIMENTOS, SEGUNDO
ROBERT (1998)
Como referimos anteriormente, outras noções teóricas que usamos no trabalho são as
noções de quadro e mudanças de quadros da Douady (1984, 1986).
As noções de quadro e mudanças de quadros surgem neste trabalho como auxiliares das
teorias de Chevallard e de Rabardel apresentadas acima.
Douady (1984, 1986), ao considerar a Matemática, ressalta que é preciso distinguir para
um conceito matemático, entre o caráter de “ferramenta” e o de “objeto”. Segundo a autora, uma
ferramenta corresponde ao funcionamento de um conceito matemático em diversos problemas
que ela possibilita resolver, mas esse caráter coloca em jogo as relações que ele tem com outros
conceitos implicados no mesmo problema. Assim, do ponto de vista da ferramenta, não podemos
falar de um conceito, mas de uma rede de conceitos gravitando eventualmente em torno de um
conceito principal ou campo conceitual, conforme definição de Vergnaud (1991).
Por objeto, a autora entende o conceito matemático, considerado como objeto cultural,
tendo seu lugar num edifício mais amplo que é o saber sábio num dado momento, reconhecido
socialmente.
127
Assim, para Douady, a palavra “quadro” é tomada no sentido usual, isto é, o que
circunscreve um conjunto de objetos de um saber, o que conduz a falarmos de quadro algébrico,
quadro numérico, quadro geométrico …, mas também podemos falar de quadro qualitativo,
quadro da realidade do estudante, quadro algorítmico, entre outros. Para a autora, um quadro é
constituído de objetos de uma área da Matemática, das relações entre os objetos, de suas
formulações eventualmente diferentes, e das imagens mentais associadas a essas ferramentas,
relações e a esses objetos. Essas imagens têm um papel essencial no funcionamento como
ferramenta, dos objetos do quadro, visto que dois quadros podem comportar os mesmos objetos e
serem diferentes pelas imagens mentais e também pela problemática envolvida.
Segundo a autora, as mudanças de quadro constituem um meio para obter formulações
diferentes de um problema sem necessariamente serem exatamente equivalentes, viabilizando um
novo acesso às dificuldades encontradas e pondo em marcha as ferramentas e técnicas que não
serviram na primeira formulação.
O objetivo é, para o pesquisador, formar convicções principalmente sobre as conjecturas
e abrir o caminho que leva a organizar os planos da demonstração. Um plano nem sempre é certo
à primeira vista. Muitas vezes são necessários contraexemplos, colocando em evidência as
obstruções, conduzindo o movimento das etapas ou rejeitando as conjecturas iniciais.
Enfim, as traduções de um quadro para outro conduzem muitas vezes a resultados não
conhecidos, a novas técnicas, à criação de objetos matemáticos novos, em suma, ao
enriquecimento do quadro original e dos quadros auxiliares de trabalho.
Douady (1984) esclarece ainda que, para o estudante, uma ferramenta pode ser implícita
ou explícita. Quando um estudante resolve ao menos parcialmente um problema, o observador
exterior pode reconhecer que as hipóteses matemáticas, justificando as decisões do estudante, são
satisfeitas, mesmo se ele não é capaz de formulá-las. Essas noções que o observador reconhece e
que o estudante faz funcionar implicitamente correspondem às ferramentas conceituais implícitas
ou ferramentas implícitas.
Ao contrário, se o estudante pode formular e justificar o emprego da ferramenta, diremos
que ele a utilizou de forma explícita.
Após apresentação resumida do trabalho de Douady (1984, 1986), pensamos ser
importante considerar os níveis de conhecimentos esperados para o funcionamento dos
128
estudantes, segundo Robert (1998), dado que contemplamos no nosso estudo a análise dos
materiais de ensino, seguida de um trabalho experimental com um grupo de estudantes. A autora
define três níveis de conhecimento esperados dos estudantes, observando que eles dependem do
nível de conceituação em que trabalhamos os diferentes objetos matemáticos.
Primeiramente, parece-nos importante registrar como Robert (1997) define níveis de
conceituação, ou seja, esses níveis correspondem às prateleiras em um campo conceitual de
conhecimentos matemáticos, caracterizado pelos objetos matemáticos apresentados de uma
determinada maneira, dos teoremas sobre esses objetos, dos métodos associados a esses teoremas
e dos problemas que os estudantes podem resolver com os teoremas do nível considerado,
utilizando esses métodos.
Após a definição de níveis de conceituação, apresentamos as definições dos níveis
técnico, mobilizável e disponível indicadas por Robert (1998).
Nível técnico – corresponde a funcionar de maneira isolada, local e concreta –
correspondendo mais às ferramentas (compreendendo também as definições). Exemplos deste
nível podem ser o cálculo de valores próprios (constantes); o cálculo do valor da função dado um
valor x.
Para o nosso trabalho, podemos considerar o cálculo do valor da derivada de uma função
f em um ponto x = x0 usando a regra prática de derivação que Thurston chama derivada no
sentido simbólico, como sendo um conhecimento no nível técnico. Para o caso da integração
definida, podemos considerar o cálculo do valor da integral definida de uma função f, contínua
num intervalo I = [a, b] com mais de um ponto aplicando o Teorema fundamental do Cálculo.
Nível mobilizável – é um nível mais amplo no qual existe um início de
justaposição de saberes de um determinado domínio, até mesmo uma organização, vários
métodos podem ser mobilizados, os caracteres ferramenta e objeto são considerados, mas o que
está em jogo na tarefa é explícito.
Se um saber é identificado, ele é dito mobilizável se é acessível, se o estudante o utiliza
corretamente. Por exemplo, em f(x) = 3x o estudante reconhece que 3 é valor próprio e utiliza
isso para calcular os valores específicos da função; se o estudante consegue esboçar o gráfico de
uma função f(x).
129
Em relação à nossa pesquisa, podemos considerar como estando no nível mobilizável a
justaposição de alguns teoremas fundamentais do Cálculo para o estudo de funções. No caso da
integração definida, podemos tomar como exemplo as técnicas de integração por partes e de
integração por substituição, em que para sua utilização é preciso relacionar a integral com a
derivada e controlar a validade do encaminhamento dos passos envolvidos.
Nível disponível – corresponde ao fato de saber resolver o que é proposto sem
indicações, de poder, por exemplo, dar contraexemplos, mudar de quadros, aplicar métodos não
previstos.
Sobre o nível disponível, podemos, com os domínios da nossa pesquisa, exemplificar a
resolução de problemas diversos de contexto da vida real e da própria Matemática, fazendo uso
da derivada e da integral de funções reais a valores reais, mas esses conceitos não são
explicitamente recomendados ou evocados nos enunciados dos problemas.
3.5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
É nosso sentimento que as quatro teorias apresentadas neste capítulo complementam-se
mutuamente em resposta a perguntas essenciais sobre a produção de conhecimentos por parte do
estudante.
Pensamos que algumas das perguntas essenciais sejam do tipo, como evolui, se
desenvolve ou se constrói o universo cognitivo de uma pessoa? Esta pergunta é muito importante
para um professor, cuja missão é oportunizar a construção de conhecimentos pelo estudante.
A Teoria Antropológica do Didático – TAD – responde a esse questionamento,
afirmando que a relação pessoal de x com o objeto o, R(x, o), muda (ou se cria, se não existir)
pela entrada de x em alguma obra O que contém o objeto o, em certas instituições, onde x ocupa
uma posição p (pode ser a posição de estudante numa determina turma X, a de participante numa
discussão sobre integral definida e assim por diante).
Uma outra pergunta que pode surgir é: o que os ingressantes na obra O devem fazer? Ou
seja, o que significa entrar numa obra O, na qual vive o objeto o, de modo que x mude seu
universo cognitivo? A TAD igualmente responde a esta questão, destacando que ingressantes nas
instituições visadas devem estudar as obras O, que são o repositório, ou seja, o habitat dos objetos
o que são motivo do conhecimento.
130
E ainda surge uma nova pergunta prática crucial do ponto de vista dos processos de
ensino e de aprendizagem: como estudar uma obra O de nosso interesse? No nosso entender, esta
questão encontra resposta em todas as teorias que aqui apresentamos, como vêm explicadas na
sequência.
A TAD contém a premissa de que é preciso resolver tarefas e tipos de tarefas que são
constituintes de O, colocando em marcha técnicas, tecnologias e teorias, sendo que as técnicas
permitem resolver as tarefas visadas, e as tecnologias e teorias justificam e explicam que tais
técnicas obtêm os resultados pretendidos e são boas maneiras de resolver com a mediação dos
ostensivos regulados pelos não ostensivos.
A teoria de instrumentação igualmente responde considerando que é preciso resolver
tarefas com a mediação de instrumentos (os ostensivos) que dependem do artefato e do esquema
de utilização em jogo.
As noções de quadro e mudanças de quadros propostas por Douady (1984) apontam para
a mesma direção: as tarefas aparecem formuladas em um determinado quadro ou área de
conhecimento matemático e as mudanças de quadros visam obter formulações alternativas
necessárias para a resolução de tarefas que são objeto do conhecimento.
As noções sobre níveis de conhecimentos propostas por Robert (1998) igualmente dão-
nos algumas indicações para a necessidade de ter em conta os conhecimentos retrospectivos dos
estudantes na situação em que se preconize alguma intervenção didática. Essa necessidade é
ressaltada também por Rogalski (1987 apud RABARDEL, 2002, p. 119): “[...] o conhecimento
já em posse do estudante pode desempenhar um papel produtivo na facilitação do novo
conhecimento. E por outro lado, pode ser redutor quando o estudante transpõe aspectos
inadequados do seu conhecimento anterior.”
Assim sendo, consideramos, por um lado, haver uma articulação das diferentes partes do
quadro teórico estabelecido, e, por outro lado, que esse quadro dá conta do nosso propósito da
pesquisa, do qual já fizemos menção no início do capítulo em virtude da explicação dada acima.
Consideramos ainda que o referencial teórico estabelecido está de acordo com o método
usado para esta pesquisa que compreende:
131
1- Análise documental visando compreender as bases que os documentos oficiais e
os livros didáticos criam no Ensino Médio para o estudante estudar o Cálculo Diferencial e
Integral no Ensino Superior.
2- Análise de uma série de livros didáticos do Ensino Superior para compreender a
diversidade dos pontos de vista que esses livros apresentam na discussão da derivada de funções
reais a valores e da integral de Riemann.
3- Pesquisa experimental para viver a complexidade do problema de ensino e de
aprendizagem do Cálculo, explorando diversas possibilidades de mediação didática com recurso
ao software Geogebra, articulado com as práticas costumeiras, com os estudantes do 1º ano do
curso de licenciatura em ensino de Matemática, na cidade da Beira, Moçambique.
Com estas últimas observações, concluímos o estudo das teorias que fundamentam
nosso trabalho. E, na sequência, apresentamos a problemática, a questão, os objetivos, a
justificativa e o método da pesquisa.
132
4 PROBLEMÁTICA, QUESTÃO, OBJETIVOS, JUSTIFICATIVA E MÉTODO DA
PESQUISA
4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Neste capítulo, apresentamos as circunstâncias que motivaram a realização deste
trabalho, sua finalidade e a maneira como o realizamos. Começamos com a exposição de alguns
elementos que motivaram a pesquisa.
Observamos que pesquisas em Educação Matemática têm destacado que o objetivo dos
processos de ensino e de aprendizagem de Matemática não consiste na memorização de regras. O
que se entende por aprendizagem em Matemática é a capacidade de transpor o conhecimento
adquirido a uma situação nova, de criar estratégias de ação para resolução de situações-problema,
como e quando exigidas (CORRÊA, 2008, p. 82). Portanto, a memorização e a operacionalização
de regras são apenas partes do objetivo. E nessa ordem de ideias, o ensino deve significar a
proposição de questões-problema aos estudantes de modo que, ao serem por eles resolvidas, vão
provocando neles as adaptações necessárias para o conhecimento visado.
A aula de Matemática precisa cultivar no estudante a atitude de questionamento sobre o
significado do que está sendo discutido na sala. Por outro lado, o professor de Matemática precisa
abrir um espaço para reflexão sobre o que está sendo feito na sala com o foco nas ideias centrais
do conteúdo.
Para Skemp (1991 apud CORRÊA, 2008, p. 82), o problema com o qual o ensino de
Matemática se confronta não é o do rigor, mas sim, do desenvolvimento do significado, da
existência dos objetos matemáticos. O significado se perde, quando o ensino consiste
simplesmente na transmissão da informação.
Dessa forma, consideramos que o computador pode auxiliar na análise sobre o que
verdadeiramente interessa discutir na aula, pois o estudante pode explorar, com mais rapidez e
sentido, diversos exemplos com diferentes representações e, daí, tentar buscar a apreensão do
conteúdo subjacente aos exemplos trabalhados. Essa é uma posição partilhada por alguns
pesquisadores em Educação Matemática, como os apresentados no capítulo anterior, dos quais
destacamos: Valente (2005), Vilarreal (1999), Artigue et al. (2003), Borba (1993), entre outros.
133
Ressaltamos que os objetos matemáticos de pesquisa deste trabalho são os conceitos de
derivada de funções reais de uma variável real e de integral de Riemann, pois, no contexto
moçambicano, nossa prática docente tem mostrado que há sérios problemas no ensino e na
aprendizagem desses conteúdos nas classes terminais do Ensino Médio e nos primeiros anos do
Ensino Superior..
Esses problemas caracterizam-se na apresentação descritiva dos temas pelo professor e
na assimilação passiva dos conteúdos pelo estudante; assimilação essa que se limita à
manipulação algébrica das expressões e geralmente sem compreender o significado subjacente ao
que está sendo feito, conforme alguns episódios específicos para os quais escolhemos os
exemplos a seguir, com o relato na 1ª pessoa gramatical, por serem situações vivenciadas por
mim.
Primeiro episódio: numa das aulas no 4º ano do curso de licenciatura em Ensino de
Física, em Moçambique, coloquei uma questão para que os estudantes dissessem alguma coisa do
que sabiam da Integral de Riemann. Em resposta, eles mostraram-se completamente alheios a
esse pedido, apesar de terem tratado desse tema no semestre precedente.
Segundo episódio: em 2009, lecionando aulas de Cálculo Diferencial e Integral para uma
turma de 40 estudantes do 1º ano do curso de licenciatura em ensino de Física, nas provas
comparecia cerca de 200 estudantes, que não seguiam o curso, reprovados dos anos anteriores,
que buscavam nova oportunidade para eliminar a disciplina. Perante essas dificuldades, fui
refletindo, formulando questões sobre o que teria falhado na experiência desses estudantes no que
dizia respeito ao ensino e à aprendizagem de Cálculo.
Dessa reflexão, fomos ganhando consciência de que era preciso estudar a situação para
compreendê-la e procurar algumas alternativas pedagógicas de abordá-la. Na sequência,
apresentamos a problemática da pesquisa que correponde a uma necessidade de mudança em
relação à prática usual.
4.2 PROBLEMÁTICA DA PESQUISA
De acordo com a nossa experiência, o ensino de Cálculo em Moçambique segue o
modelo tradicional: o professor apresenta o conteúdo de ensino, o estudante assiste às aulas e, em
seguida, resolve as tarefas propostas pelo professor na tentativa de assimilar o conteúdo
134
apresentado. A mesma situação acontece no Brasil, conforme afirmam as pesquisadoras Araújo
(2002), Sad (1998), Villarreal (1999), entre outros. E essa prática é considerada como um dos
problemas associados às dificuldades de aprendizagem apresentadas pelos estudantes.
A partir dos episódios destacados acima e de muitos outros com os quais nos deparamos
no dia a dia do processo de ensino de Matemática, surge o sentimento de que o estudante deve ser
coconstrutor de seus conhecimentos, segundo os resultados de algumas pesquisas apresentadas
anteriormente.
No caso do Cálculo, as ideias de base, como as relacionadas com os conceitos de função,
limites e continuidade de funções, derivadas de funções reais de uma variável real e de integral de
Riemann, devem ser consolidadas de modo que sejam utilizadas na resolução de situações
problemáticas, quando necessário.
Dessa forma, consideramos que um software matemático, no caso, o Geogebra, é um
recurso adequado na análise dos aspectos fundamentais da derivada de funções reais de uma
variável real e da integral de Riemann, em razão das potencialidades gráficas e algébricas que ele
possui e que podem funcionar como ferramenta auxiliar no desenvolvimento do conteúdo de
ensino, além das possibilidades de animação que podem possbilitar realçar o significado do
conteúdo da aprendizagem.
Essa afirmação vem corroborar a visão de Kidron & Zehavi (2002), que escrevem, no
seu texto intitulado “The role of animation in Teaching the Limit Concept”, que gerar gráficos de
forma dinâmica permite aos estudantes não somente visualizar o processo que ocorre, mas
também perceber o significado das definições.
Como nossa observação sobre o que os autores dizem consideramos que essas
possibilidades oferecidas pela animação no computador, depende da atividade proposta e do
modo de seu encaminhamento pelo mediador do processo.
Assim, a problemática da pesquisa corresponde ao estudo das relações institucionais
existentes no Ensino Médio e no Ensino Superior sobre os conceitos de derivada de funções reais
a valores reais e de integral de Riemann para verificar as marcas das mesmas sobre as relações
pessoais desenvolvidas pelos estudantes para, na sequência, desenvolver uma intervenção
didática, mediada pelo computador, articulado com as práticas usuais, o que representa uma nova
ferramenta para auxiliar o trabalho dos estudantes, mas também pode ser uma forma de construir
135
novos instrumentos ou esquemas que favoreçam o estudante a percorrer os caminhos que
conduzem à conceituação e à formalização a partir da ação instrumentada.
Na sequência, apresentamos a questão da pesquisa.
4.3 QUESTÃO DE PESQUISA
A partir dos problemas relatados nos parágrafos anteriores, no que tange às práticas
prevalecentes do ensino baseado na exposição descritiva do conteúdo na sala de aula pelo
professor, e da aprendizagem contemplativa desse mesmo conteúdo pelo estudante, no caso
específico da derivada de funções reais de uma variável real e da integral de Riemann, e na
procura de formas que possam estimular processos de reflexão na prática de ensino e de
aprendizagem dos tópicos acima apontados, na perspectiva da aprendizagem baseada no
significado e na compreensão, formulamos a seguinte questão de pesquisa:
Quão efetiva é uma mediação didática para a construção e aprendizagem de conceitos de
derivadas de funções reais de uma variável real e de integral de Riemann mediadas por mídias e
práticas usuais?
Na sequência, apresentamos os objetivos da pesquisa.
4.4 OBJETIVOS DA PESQUISA
Com a questão destacada acima, definimos os objetivos gerais da pesquisa:
1) estudar as praxeologias didático-matemáticas existentes em alguns materiais didáticos
sobre a derivada de funções reais de uma variável real e a integral de Riemann, de modo a inserir
o Geogebra como ferramenta de ajuda à reflexão e à construção dos conceitos em jogo.
2) experimentar uma modalidade de ensino e de aprendizagem dos conceitos de derivada
e integral de Riemann de funções reais de uma variável real, incorporando no processo o software
Geogebra, articulado com as mídias e práticas vigentes.
A partir desses objetivos gerais, consideramos os seguintes objetivos específicos:
1) analisar as relações institucionais moçambicanas para o estudo dos conceitos de
derivada de funções reais de uma variável real e de integral de Riemann a partir do programa de
ensino do nível médio e do livro didático indicado para os estudantes;
136
2) analisar as praxeologias didático-matemáticas existentes em alguns livros didáticos
usados nas instituições de Ensino Superior sobre a derivada de funções reais de uma variável real
e a integral de Riemann, para compreender as suas tendências e a articulação que fazem entre o
nível médio e o nível superior;
3) analisar as marcas das relações institucionais sobre as relações pessoais dos
estudantes moçambicanos do primeiro ano da Universidade Pedagógica de Moçambique, do
curso de Licenciatura em Ensino de Matemática na cidade da Beira, em função das relações
institucionais existentes;
4) construir e aplicar um experimento que possibilite analisar o funcionamento dos
estudantes em processos de ensino e de aprendizagem das noções de derivada e integral definida
de funções reais de uma variável real, quando se introduz uma nova ferramenta, no caso, o
Geogebra, articulada com as outras mídias e práticas usuais;
5) explorar as potencialidades gráficas e algébricas do Geogebra no ensino e na
aprendizagem de derivadas de funções reais de uma variável real e da integral de Riemann;
6) explorar as possibilidades de desenvolver habilidades e competências do estudante no
uso do computador para a aprendizagem dos conteúdos curriculares, em particular, sobre
derivadas de funções reais de uma variável real e integral de Riemann.
Deixamos expresso que alguns aspectos sobre os objetivos específicos ainda serão
mencionados mais adiante nas seções específicas.
Rabardel (2002, 1995) ressalta a necessidade do uso de instrumentos na interação com a
realidade. Para ele, o computador “amplifica” algumas das funções cognitivas do usuário no que
se refere à discriminação e à interpretação. Esclarecemos ainda que os conceitos tornam-se
materializáveis quando representados, pois é por meio de seus objetos ostensivos que eles podem
ser manipulados, segundo Chevallard (1994).
Portanto, percebemos que algo existe e é o caso quando estiver representado e depois
disso é que partimos para a exploração do que deve se tratar efetivamente. Nosso acesso aos
objetos matemáticos é sempre mediado por representações. E formas de representação devem
ajudar significativamente na compreensão do objeto de estudo, conforme esses autores.
A seguir apresentamos a justificativa da pesquisa.
137
4.5 JUSTIFICATIVA
Derivada de funções reais de uma variável real e integral de Riemann constitui algumas
das ideias fundamentais do Cálculo Diferencial e Integral, cujas noções básicas são de taxas de
variação de grandezas e acumulação de quantidades. As noções acima são usadas para vários
conceitos e definições em muitas disciplinas curriculares, como na Matemática, Química, Física,
Economia, Sociologia, entre outras disciplinas e aplicações.
A versatilidade dos conceitos de derivada e de integral definida faz com eles sejam
temas de ensino no nível médio em alguns países, como Moçambique, e quase indispensáveis em
muitos cursos de nível superior e, ao mesmo tempo, temas de dificuldades didático-pedagógica e
de aprendizagem nas instituições de ensino. Esse estado de coisas dá origem a muitas pesquisas
nesse domínio, procurando documentar a natureza e as causas dos problemas do ensino e da
aprendizagem desses conceitos e, por outro lado, buscando encontrar alternativas didático-
pedagógicas satisfatórias. Foi na sequência dos problemas vividos de ensino e de aprendizagem
nessa área que realizamos esta pesquisa, tal como esclarecemos acima.
Para responder às questões acima e atingir os objetivos propostos na pesquisa,
construímos o seguinte método que está fundamentado no referencial teórico já apresentado.
4.6 MÉTODO DA PESQUISA
Para Marconi e Lakatos (2005, p. 83),
[...] o método é o conjunto das atividades sistemáticas e racionais que, com maior
segurança e economia, permite alcançar o objetivo – conhecimentos válidos e
verdadeiros -, traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as
decisões do cientista (MARCONI & LAKATOS, 2005, p. 83).
Nessa perspectiva, consideramos o método como um procedimento operacional
(conceitual ou instrumental) utilizado na produção e tratamento dos dados para obter os
resultados pretendidos. Robert (1992) corrobora essa ideia, embora refira que nas Ciências
Sociais, método e metodologia signifiquem a mesma coisa. Para ela, o método (metodologia)
corresponde às maneiras de conduzir pesquisas, especialmente na sua parte experimental,
caraterizando-se pela unidade entre o problema que se coloca e os meios disponíveis para obter
os resultados.
138
O estudo teve duas etapas diferentes:
A primeira etapa foi a análise documental24
que consistiu no estudo das relações
institucionais, o qual, por sua vez, abrangeu duas fases: na primeira fase fez-se o estudo do
programa moçambicano do Ensino Médio e do livro didático correspondente, especialmente na
parte sobre a introdução da derivada e da primitiva de funções reais de uma variável real.
Essa análise teve como objetivo principal compreender o que institucionalmente é
sugerido a respeito do tema em estudo, pois, embasados em Chevallard (1998), as relações
pessoais dos estudantes com os objetos o em uma dada posição p são o fruto da história das suas
sujeições institucionais passadas e presentes.
A segunda fase consistiu na análise das relações institucionais existentes para o Ensino
Superior, por meio de quatro livros didáticos, três deles, em geral utilizados atualmente nas
instituições de Ensino Superior brasileiras: Stewart (2011), Ávila (2005) e Hoffmann & Bradley
(1999), e um livro de Sarrico (2005), autor português, usado na universidade em Moçambique.
Observamos que os livros referidos anteriormente de Ávila (2005) e o traduzido para o português
de Stewart (2011) também são utilizados na universidade em Moçambique. O terceiro livro
traduzido para o português, a obra de Hoffmann & Bradley (1999), que apresenta aplicações do
Cálculo nas outras ciências e algumas indicações para que se utilize um “software”, em particular
para o estudo de funções, derivada e integral, é um exemplo que vislumbra a integração das
novas tecnologias nos processos de ensino e de aprendizagem de Cálculo. Ressaltamos ainda que
as obras de Hoffmann & Bradley (1999) e Stewart (2011) são as que apresentam essa sugestão de
utilização de novas tecnologias como ferramentas para o desenvolvimento dos conceitos de
Cálculo Diferencial e Integral, assim como exemplos variados de aplicações nas outras ciências.
Lembramos que nosso trabalho de mestrado foi sobre Cálculo Diferencial e Integral em
livros didáticos, uma análise do ponto de vista da organização praxeológica. E, naquela análise,
percebemos que os livros didáticos têm aspectos importantes a considerar quando se perspectiva
um trabalho didático. Foi na sequência de dar continuidade ao trabalho iniciado naquela altura
24 Segundo Caulley (1981 apud LUDKE & ANDRÉ, 1986, p. 38), a análise documental busca identificar
informações factuais nos documentos a partir de questões ou hipóteses de interesse. E segundo Phillips (1974, p.
187 apud LUDKE & ANDRÉ, 1986, p. 38), são considerados documentos “quaisquer materiais escritos que
possam ser usados como fonte de informação sobre o comportamento humano”. Para Ludke e André (1986),
estes incluem leis e regulamentos, […], roteiros de programas de rádio e televisão até livros […].
139
que contemplamos nesta pesquisa a análise das relações institucionais por meio desses livros
didáticos com objetivos de:
- aprofundar a compreensão do desenvolvimento e das diferenças de perspectivas que
esses materiais dão aos conceitos de derivada de funções reais de uma variável real e da integral
de Riemann, muito particularmente com a inclusão no estudo de dois livros de Análise
Matemática e dois outros que enfatizam a ideia de utilizar um software como ferramenta do
trabalho matemático e propõem ainda atividades intra e extramatemáticas;
- criar base teórica para o encaminhamento da parte experimental da pesquisa, pois
temos a convicção de que o professor não pode basear seu ensino no quotidiano, mas sim, buscar
fundamentos científicos nas obras.
Após a análise das relações institucionais do conteúdo visado na pesquisa, passamos
para a segunda etapa, que foi a etapa de pesquisa experimental25
, para viver a complexidade do
problema de ensino e de aprendizagem do Cálculo com recurso ao software Geogebra, articulado
com outras mídias e práticas costumeiras. A estratégia usada no experimento foi a discussão entre
os estudantes aos pares, seguida do diálogo exploratório com o pesquisador, das questões
colocadas, geralmente com a sugestão de serem trabalhadas no computador caso isso fosse
possível e articulado com as possibilidades do lápis e papel. Em virtude desse procedimento
metodológico, tomamos como unidades de análise dos resultados os recortes de sequências de
diálogos, em cada sessão, captando as questões levantadas nas discussões, as produções e
comportamentos dos estudantes, fazendo uso das categorias de análise para tal construídas, a
partir do referencial teórico estabelecido e dos acontecimentos ocorridos no experimento.
No caso da derivada de funções reais a uma variável real e da integral de Riemann,
podemos formular questões do tipo: quais pontos de vista sobre a derivada podemos discutir com
25 Segundo o que consta do site www.ergonomia.ufpr.br/Tipos%20de%20Pesquisa.pdf, a pesquisa experimental
é o método de investigação que envolve a manipulação de tratamentos na tentativa de estabelecer relações de
causa-efeito nas variáveis investigadas. A variável independente é manipulada para julgar seu efeito sobre uma
variável dependente. A relação causa-efeito não pode ser estabelecida através de técnicas estatísticas, mas
somente pela aplicação de pensamento lógico para experimentos bem delineados. O processo lógico estabelece
que nenhuma outra explicação razoável pode existir para as mudanças na variável dependente, exceto a
manipulação da variável independente.
140
os estudantes, quando fazemos uso de um software computacional? Como as praxeologias do
tema visado são afetadas ou modificadas com a ferramenta computacional? Quais conhecimentos
retrospectivos os estudantes deveriam mobilizar e/ou deles dispor para tal discussão e quais
conhecimentos eles devem desenvolver e em que nível ao longo dessa discussão?
Nessa linha, o método da pesquisa foi pensado no sentido de se fazerem intervenções
didáticas recorrendo-se a alguns elementos da Engenharia Didática, conforme explica Artigue
(2010, 2009, 1988), nos seus aspectos de análise institucional, tal como indicamos nos parágrafos
anteriores, que compreendeu o estudo das relações institucionais via programa de ensino e livro
didático moçambicanos para o Ensino Médio e o estudo de quatro livros que fazem a introdução
ao Cálculo com funções reais a valores usados no Ensino Superior. Empregamos uma parte da
análise cognitiva, que se traduziu em um teste diagnóstico realizado com os estudantes
participantes da experimentação; e ainda, na sequência, fizemos: a Concepção e Análise a priori
das tarefas preparadas para a experimentação; a Experimentação (intervenções didáticas); Análise
a posteriori e Validação interna.
E, mediante essa perspectiva, formamos, norteados por Chevallard (2009), um sistema
didático S(X; Y; ), onde X foi o coletivo de estudo (estudantes convidados para as sessões) e Y,
o pesquisador, e outros materiais de ajudas ao estudo e , um desafio didático, que consistiu nas
questões propostas para a discussão. O objetivo da constituição deste sistema didático é estudar
, quer dizer, buscar uma resposta R que satisfaça certas restrições a priori. O trabalho que se
esperava de X sob a orientação e supervisão de Y pode ser descrito assim:
com o sentido de que X deve trabalhar sobre , com a mediação de Y, de modo a produzir a
resposta R, o conhecimento visado. Realçamos ainda que Y é o sistema de ajuda ao estudo, ou
seja, todo tipo de mediação visando uma ação de X sobre para produzir a resposta R.
Assim, o procedimento metodológico submeteu-se a essa estrutura do sistema didático,
nas diferentes fases de trabalho com os estudantes. Foi essa modalidade de trabalho que guiou e
produziu o conteúdo material da pesquisa na sua segunda etapa, etapa de trabalho experimental,
uma vez que nas tarefas propostas aos estudantes foi possível fazer intervir as escolhas que
correspondem às variáveis independentes que, por sua vez, devem provocar reações nos
estudantes, as quais poderão ser analisadas pelo pesquisador.
141
Para tal, a pesquisa desenvolveu-se com um grupo de estudantes do 1º ano do curso de
Licenciatura em Ensino de Matemática, de 13 de abril a 19 de junho, de 2013, na Universidade
Pedagógica de Moçambique, Delegação (Campus) da cidade da Beira.
A pesquisa transcorreu numa sala de Informática, com aproximadamente 40
computadores operacionais e os estudantes trabalhavam em duplas, com o propósito de
proporcionar um ambiente de mediação entre os estudantes, bem como entre o estudante e o
computador durante a resolução das tarefas propostas. O plano inicial preconizava trabalhar com
10 duplas, portanto, 20 estudantes. Participaram 21 estudantes nas duas primeiras sessões, mas a
partir da 3ª sessão, o número de participantes foi caindo gradualmente até restarem 8 estudantes,
ou seja, 4 duplas com as quais se trabalhou até ao final da 12ª sessão, que marcou o fim do
experimento. Observamos aqui que, entre os 8 estudantes, seis participaram de todas as sessões e
2 faltaram a três sessões, os outros faltaram a mais de três sessões, o que nos conduziu a retirá-los
no momento das análises comparativas entre os resultados do teste inicial e final, cujo objetivo
era verificar se a utilização do computador facilitou para que os estudantes encontrassem novas
maneiras de desenvolver as tarefas propostas.
Cada sessão tinha uma duração aproximada de 1 hora e 30 minutos. O horário
combinado era das 08h00 às 09h30min, do sábado. Mas, por dificuldades de comparecimento no
horário exato, geralmente as sessões começavam às 10h00. Os estudantes queixavam-se dos
problemas de transporte das suas casas para a Universidade lócus do estudo. A cidade da Beira é
uma entre quase todas as cidades moçambicanas com problemas de transporte. Presume-se que
tenha sido uma das grandes causas que levou muitos estudantes a desistirem das sessões.
Preparação e contatos preliminares que antecederam o experimento:
- Como preparação inicial, foram elaboradas tarefas sobre a derivada de funções reais de
uma variável real e a integral de Riemann e ainda sobre algumas noções de base do Cálculo
Diferencial e Integral, especialmente sobre as noções de continuidade e limitação. Consideramos
essa fase como sendo de concepção e análise a priori.
- Foi feito um pedido formal à direção da Universidade (anexo B) no sentido de
autorizar a realização naquela instituição da pesquisa experimental que nos propúnhamos fazer. O
pedido foi respondido favoravelmente.
142
- Inicialmente, a pesquisa estava concebida para envolver estudantes repetentes do 2º
ano do curso de Licenciatura em Ensino de Matemática. E durante duas semanas: de 25 de março
a 06 de abril foram encetados contatos com os estudantes visados no sentido de procurar
consensos para sua participação da pesquisa. Os contatos não produziram os resultados
desejados. Os motivos foram vários: desde a falta de interesse em participar da pesquisa, embora
tivesse sido esclarecido que a confidencialidade das identidades dos participantes seria
salvaguardada, a heterogeneidade do grupo dos repetentes: alguns eram repetentes apenas em
Cálculo Diferencial, outros apenas em Cálculo Integral, e ainda outros nas duas disciplinas. Isso
acontece por causa da separação em duas partes do currículo do Cálculo em vigor naquela
Universidade: o Cálculo Diferencial é lecionado na disciplina que se chama Cálculo
Infinitesimal, na qual se lecionam outros conteúdos, como as sequências numéricas, limites de
sequências numéricas e de funções e por fim a derivada de funções reais a valores reais. Esses
temas são tratados no primeiro semestre do 1º ano do curso: do início de fevereiro a meados de
julho. O Cálculo Integral em IR, como é denominado, é uma disciplina autônoma, lecionada no
2º semestre do 1º ano do curso. Como consequência desta situação, havia repetentes que
assistiam às aulas em dois turnos: de manhã, na turma do 1º ano na disciplina do Cálculo
Infinitesimal, e, à tarde, em outras turmas mais adiantadas, frequentando outras disciplinas, em
dois edifícios separados a uma distância de cerca de 8 km. Além dos repetentes nessas condições,
havia os que não participavam de nenhuma das disciplinas do semestre letivo, portanto, não
compareciam à Universidade, esperando fazer exame no final do semestre, como estudantes
externos. Portanto, tornava-se difícil trabalhar com estudantes repetentes num período pré-
estabelecido.
Fracassada a possibilidade de trabalhar com os repetentes, optamos por trabalhar com
estudantes do 1º ano, do mesmo curso, um grupo mais ou menos homogêneo, composto de novos
ingressos. E assim, contatamo-los no sentido de convidá-los a participar, voluntariamente, da
pesquisa. Houve concordância, e marcamos o dia 13 de abril como dia de início das discussões.
Como indicamos acima, foram realizadas no total 12 sessões:
Sessão 1: no dia 13/04/2013
Nessa sessão, foi administrado o teste diagnóstico, com a duração de duas horas, que
visou identificar os conhecimentos que os estudantes convidados a participar das discussões
143
tinham sobre as noções de base do Cálculo Diferencial e Integral, a saber: as noções de
continuidade e conjunto imagem, a propriedade de limitação, a interpretação da 1ª e 2ª derivadas
de uma função horária s, como velocidade e aceleração do movimento, respectivamente; a
interpretação da 1ª derivada como o declive da reta tangente ao gráfico de uma função horária s
em um dado instante t = t0, e a determinação da equação da reta tangente correspondente; o
esboço do gráfico com auxílio da 1ª e 2ª derivadas ou o reconhecimento do esboço do gráfico de
uma função s mediante o relacionamento com o esboço da sua derivada no mesmo sistema
cartesiano; o domínio de definição da derivada de uma função f em um dado ponto x = x0 e da
propriedade de continuidade de f no ponto x = x0, onde ela é diferenciável e a aplicação dessas
duas noções para estudar a diferenciabilidade de f em um ponto dado.
Sessão 2: 15/04/2013
A sessão 2 teve como objetivos: analisar e discutir algumas dificuldades encontradas
pelos estudantes convidados ao estudo experimental na resolução do teste diagnóstico. O foco
dessa discussão foi a continuidade e a limitação de funções. Introdução de algumas características
do Geogebra: zona gráfica, zona algébrica e a linha de entrada de comandos. O método usado
para a discussão foi a interação pesquisador-estudante. Não muito centrada no próprio software.
Sessão 3: 20/04/2013
A sessão 3 tinha os seguintes objetivos:
- introduzir aos estudantes o recurso computacional Geogebra, com o foco:
a) na produção de gráficos;
b) no desenho de âncoras de pontos coordenados no plano cartesiano, especialmente
pontos do gráfico da função. Pensávamos que saber colocar esses pontos era importante para o
estudo dos conceitos de domínio, imagem e gráfico da função, quando se faz uso do recurso
‘traço’ do Geogebra.
- revisar e analisar os conceitos de domínio, imagem e gráfico de funções com o recurso
do Geogebra.
- revisar e analisar funções definidas por partes com o recurso do Geogebra;
- revisar e analisar a continuidade e limites de funções com o recurso do software
Geogebra.
Sessão 4: 26/04/2013
144
A sessão 4 teve como objetivos:
- praticar e dominar o uso do software Geogebra para plotar gráficos de funções
elementares;
- analisar os conceitos de limite e continuidade de funções reais a valores reais com
recurso do software Geogebra. A análise desses conceitos é continuação do estudo deste tema,
pois sua introdução ocorreu na sessão 2, tendo continuado na sessão 3. Os diálogos
desenvolvidos na sessão 3 mostraram que os argumentos apresentados por alguns estudantes não
eram muito claros para justificar a existência do limite da função em um ponto e da sua
continuidade nesse ponto. Por isso, consideramos necessária a continuação do estudo dessas
questões.
Sessão 5: 04/05/2013
O objetivo da sessão 5 foi a introdução da noção do limite da razão incremental, dada
graficamente como declive da reta secante.
Sessão 6: 11/05/2013
Essa sessão foi a continuação da sessão 5, dado que não se concluiu a introdução da
noção de limite da razão incremental devido à morosidade no encaminhamento da discussão
decorrente da falta de domínio pelos estudantes no manejo dos recursos do software usado na
construção das expressões necessárias para o estudo do conteúdo visado.
Sessão 7: 18/05/2013
Nessa sessão, foi concluída a discussão da derivada de uma função em um ponto
destacando: verificação geométrica, e com sentido de taxa de variação e estabelecendo a seguinte
equivalência: declive da reta tangente taxa instantânea de variação limite da razão
incremental. As representações gráficas foram articuladas com análise algébrica da taxa de
variação.
Sessão 8: 25/05/2013
A sessão 8 teve como objetivos: destacar as funções que são não diferenciáveis em todos
os seus pontos do domínio, comparando com as funções diferenciáveis; realçar a propriedade de
continuidade das funções nos pontos onde elas têm derivadas laterais ou onde elas são
diferenciáveis.
Sessão 9: 01/06/2013
145
O objetivo central da sessão 9 foi a introdução da função derivada a partir de
considerações gráficas do esboço gráfico descrito pelo declive da reta tangente nos diferentes
pontos do gráfico de f.
Sessão 10: 08/06/2013
Nessa sessão, tinham sido definidos os objetivos de levar os estudantes a trabalhar as
técnicas de derivação de funções potências. Mas, no início da sessão, os estudantes apresentaram
questões de sua autoria, que foram as seguintes: como inserir funções logarítmicas na entrada de
comandos? Como derivar uma função composta no computador? Assim, a sessão centrou-se mais
na discussão dessas questões, continuando depois com algumas questões planejadas pelo
pesquisador.
Sessão 11: 15/06/2013.
A sessão 11 teve duas partes principais: parte 1: resolução do teste final sobre a derivada
de funções reais a valores reais. Essa parte teve a duração de 1 hora.
Parte 2, com a duração também de 1 hora, dedicou atenção à introdução de somas de
áreas de retângulos aproximantes, visando à discussão de somas e integral de Riemann,
destacando os conceitos de supremo e ínfimo de uma função f contínua num intervalo fechado
limitado I = [a, b].
Sessão 12: 19/06/2013.
A sessão 12 teve como objetivo principal concluir a discussão sobre a integral de
Riemann, com a definição formal do limite de sequências de somas de áreas de retângulos
aproximantes, articulando as análises gráficas e algébricas dessas somas.
A 12ª sessão marcou o fim da fase experimental da pesquisa.
Notemos que foram duas sessões que não ocorreram num sábado: sessão 2 e sessão 12.
Isso aconteceu a pedido dos estudantes em função da disponibilidade de tempo deles.
Todas as sessões foram gravadas em áudio e transcritas depois.
Após esta descrição de como, em termos metodológicos, a pesquisa foi realizada,
pensamos ser possível caracterizar como sendo uma pesquisa qualitativa, pois dá-nos indicações
de concordar com a classificação de Ludke e André (1986) a esse respeito:
tem o ambiente natural como sua fonte de dados e o pesquisador como seu principal
instrumento;
146
os dados coletados são predominamente descritivos;
a preocupação com o processo é muito maior do que com o produto;
o significado que as pessoas dão às coisas é foco de atenção especial pelo
pesquisador;
a análise dos dados tende a seguir um processo indutivo.
Ainda considerando a classificação dos mesmos autores (LUDKE & ANDRÉ, 1986),
para além de ser qualitativa, a pesquisa se apresenta na forma do estudo de caso.
O estudo de caso é o estudo de um caso, seja ele simples e específico, como o de uma
professora competente de uma escola pública, ou complexo e abstrato, como o das
classes de alfabetização […]. O interesse, portanto, incide naquilo que ele tem de único,
de particular, mesmo que posteriormente venham a ficar evidentes certas semelhanças
com outros casos ou situações (LUDKE & ANDRÉ, 1986, p. 17).
Portanto, consideramos que a pesquisa tem realmente algo de peculiar que autoriza
considerá-la como um caso, a saber: uma mediação didática sobre conceitos de Cálculo, com
recurso a um software dinâmico, num meio (país) para um curso específico, para o qual não há
registro de algo parecido ter sido feito, o que mostra sua originalidade.
No próximo capítulo, apresentamos a análise das relações institucionais via programa de
ensino e livro didático moçambicanos do Ensino Médio sobre a derivada de funções reais a
valores reais e primitivas.
147
5 ANÁLISE DAS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS VIA PROGRAMA DE ENSINO E
LIVRO DIDÁTICO MOÇAMBICANOS DO ENSINO MÉDIO.
A análise que fazemos apresenta-se em duas partes: na parte 5.1, fazemos o estudo da
organização didática via programa de ensino. Designamos esta parte de “organização didática”
por dizer respeito às orientações metodológicas para a reconstrução ou à transposição das
praxeologias matemáticas na sala de aula. Na parte 5.2, fazemos o estudo do livro didático
correspondente, essencialmente no que diz respeito à organização matemática e, quando julgamos
necessário, comparamos com o que o programa sugere.
5.1 ORGANIZAÇÃO DIDÁTICA SOBRE A DERIVADA DE FUNÇÕES REAIS A
VALORES REAIS E PRIMITIVAS NOS PROGRAMAS DE ENSINO MÉDIO DE
MOÇAMBIQUE
Sobre a derivada, o programa sugere o que deve ser feito:
FIGURA 16 – SUGESTÕES METODOLÓGICAS – CÁLCULO DIFERENCIAL
Funções deriváveis. Regras de derivação (demonstração da regra da soma e do produto; informação das restantes
regras). Derivadas de funções elementares (informação baseada em intuição numérica e gráfica). Segunda definição
do número e. Teorema da derivação da função composta – (informação). Segundas derivadas e concavidades
(informação baseada em intuição numérica).
Derivada da função composta: grau de dificuldades a não ultrapassar: f(ax), f(x +b), f(xk).
Em todos teoremas se deve analisar a necessidade das condições do enunciado através de contra-exemplos.
Deve ser adotada a definição: f é derivável quando a derivada existe (isto é, é um número real); limites infinitos não
existem, +(inf) e –(inf) não devem nunca ser considerados como números reais.
O número e é o único número real tal que (ex)’ = ex.
Dificuldades a não ultrapassar: f(x) = 2-x + 2x, f(x) = 12
12
x
xx, f(x) =
x
x
log1
Estudo de funções em casos simples.
O estudo de funções deve seguir o modelo que se encontra no Manual de apoio. Integração do estudo do Cálculo
Diferencial num contexto histórico. Os alunos poderão realizar trabalhos individuais ou em grupo de História do
Cálculo Diferencial referindo o trabalho de alguns matemáticos como Fermat, Newton, Leibniz, Berkeley,
Anastácio da Cunha, Bolzano, Cauchy, etc.
Os problemas de otimização devem ser escolhidos de uma forma a que um aluno trabalhe de uma forma tão
completa quanto possível a modelação. É uma boa oportunidade para discutir com os alunos o processo de
modelação matemática e sua importância no mundo atual.
Indicadores do desempenho
interpreta geometricamente o conceito de derivada.
aplica a definição para determinar a derivada de uma função num ponto dado.
aplica regras de derivação para determinar derivadas de funções;
aplica as derivadas para o estudo da variação da função, variação da inclinação da função e de resolução de
problemas práticos;
faz o estudo analítico de uma função tendo em referência questões como domínio, zeros, pontos de
descontinuidade, monotonia, máximos e mínimos e concavidades;
constrói gráficos de uma função aplicando limites e derivadas.
FONTE: Moçambique (2009, p. 29-30).
148
Sobre a primitivação, o programa sugere como procedimento metodológico:
FIGURA 17 – SUGESTÕES METODOLÓGICAS – PRIMITIVA DE UMA FUNÇÃO
A derivada e a integral são duas noções básicas do cálculo diferencial e integral. Do ponto de vista geométrico, a
derivada está ligada ao problema de traçar a tangente a uma curva enquanto que o integral está relacionado com o
problema de determinar a área de certas figuras planas, embora tenha outras interpretações.
Não se pretende que nesta unidade sejam explorados com profundidade todos aspectos do cálculo integral mas
que o aluno tenha uma ideia da importância assim como algumas propriedades do cálculo.
Por exemplo, o aluno deverá saber que a primitiva de uma função f é uma outra função F cuja derivada coincide
com f, isto é F’ = f e que podem existir várias primitivas para uma mesma função f.
Por exemplo, algumas primitivas para a função f(x) = x2 são
F(x) = 3
3
1x ou F(x) =
3
3
1x + 3 ou ainda F(x) =
3
3
1x + C pois as derivadas destas funções são iguais a f(x) = x2
Os alunos devem perceber que C é uma constante arbitrária e pode assumir qualquer valor numérico.
Também é importante que os alunos se debrucem de aspectos históricos sobre o conceito de integral, destacando
o trabalho realizado por Newton e Leibniz no século XVII assim como pelo matemático francês Cauchy (1789-
1857).
É preciso ter em conta que a definição da integral é de certa forma abstrata com pouco uso operacional daí que
seja importante a introdução de mecanismos que facilitem determinados cálculos. Esses mecanismos constituem
as propriedades das integrais.
A preocupação não deve ser a demonstração das propriedades mas a sua aplicação prática no cálculo integral.
Os alunos deverão identificar algumas aplicações do integral indefinido. Por exemplo problemas relacionados
com a taxa de crescimento da população em uma determinada cidade ou país. FONTE: Moçambique (2009, p. 31).
5.1.1 Algumas considerações em relação a organização didática
No documento, se enaltece a necessidade de articularem as resoluções analíticas e
gráficas das tarefas de estudo. E destaca-se ainda a necessidade de o cenário pedagógico estar
voltado para a resolução de problemas, ensino contextualizado, especialmente o contexto da vida
real. A convicção do programa é de que essa forma de trabalhar permite o desenvolvimento de
competências necessárias para o enfrentamento dos desafios da vida, mas não existe indicação de
como realizar esse trabalho centrado no desenvolvimento de competências.
Parece-nos conveniente citar aqui as cinco diferentes formas de pensar sobre a noção de
competência, segundo concepção de Vergnaud (1991 apud AZZOLINI, 2012, p. 62 ), a saber:
- uma competência está associada ao que o sujeito A pode fazer quando comparado com
o sujeito B;
- uma competência está associada à evolução do desempenho de A num determinado
tempo;
149
- uma competência está associada à possibilidade de A encontrar formas mais
apropriadas para tratar uma determinada situação que permitam obter um resultado mais rápido,
mais genérico e mais compatível;
- uma competência está associada à possibilidade de o sujeito A dispor de um
repertório de fontes alternativas;
- uma competência está associada à possibilidade de esse sujeito estar mais
instrumentalizado face a uma nova situação.
Esses diferentes modos de pensar a noção de competência são descritos por Vergnaud
(1991, apud AZZOLINI, 2012, p. 62) por meio das seguintes afirmações:
- A é mais competente que B se ele sabe fazer qualquer coisa que B não sabe fazer.
- A é mais competente no tempo t’ que no tempo t se ele sabe fazer em t’ o que não sabia
fazer em t.
- A é mais competente se ele encontra uma forma melhor, com critérios, para resolver
uma situação seja mais rápida, mais geral e/ou mais compatível.
- A é mais competente se ele dispõe de um repertório de fontes alternativas que lhe
possibilitem adaptar sua conduta aos diferentes casos que podem aparecer.
- A é mais competente se ele é o mais instrumentalizado diante de uma nova situação.
Observamos que as noções de competência apresentadas acima não indicam os temas e
tópicos a serem tratados como o documento oficial sugere, mas a forma como podemos
considerar o desenvolvimento dos estudantes. Nesse caso, parece-nos uma função da escola
despertar nos estudantes essas diferentes formas de competência que poderão auxiliá-los na
solução de tarefas escolares e da vida cotidiana sem uma prescrição que responda às necessidades
do mercado, mas que prepara o estudante para enfrentar diferentes situações em sua vida
acadêmica e profissional.
Ainda consideramos que o programa é muito prescritivo e com um foco relativamente
grande sobre as técnicas, para além de uma série de ambiguidades, como mostram algumas partes
das transcrições feitas das orientações metodológicas sobre Cálculo Diferencial e Primitivas:
Regras de derivação (demonstração da regra da soma e do produto; informação das
restantes regras). Derivadas de funções elementares (informação baseada em intuição
numérica e gráfica). Segunda definição do número e. Teorema da derivação da função
composta – (informação). Segundas derivadas e concavidades (informação baseada em
intuição numérica). Derivada da função composta: grau de dificuldades a não
ultrapassar: f(ax), f(x +b), f(xk). …
150
Em todos teoremas se deve analisar a necessidade das condições do enunciado através de
contraexemplos.
Deve ser adotada a definição: f é derivável quando a derivada existe (isto é, é um número
real); limites infinitos não existem, +(inf) e –(inf) não devem nunca ser considerados
como números reais.
O número e é o único número real tal que (ex)’ = ex.
Dificuldades a não ultrapassar: f(x) = 2-x + 2x, f(x) = 12
12
x
xx, f(x) =
x
x
log1”
(MOÇAMBIQUE, 2009, p. 29).
Portanto, prescreve-se no sentido de se fazerem algumas demonstrações, e, por outro
lado, dar uma informação sobre as técnicas que permitem manipular o conceito em jogo. Além
disso, não fica claro o que significa basear uma informação numa intuição numérica ou gráfica,
pois não é dado um exemplo que auxilie na compreensão do que é prescrito. Essa intuição é
desenvolvida por meio de um exemplo sobre limite e continuidade em Hoffmann & Bradley
(1999, p.46) e Stewart (2011, p. 74-84). Os mesmos autores apresentam exemplos de intuição
gráfica da derivada, como podemos verificar em Hoffmann & Bradley (1999, p. 68-73) e Stewart
(2011, p. 135). Este autor ainda apresenta uma situação de intuição figural para deduzir a regra de
derivação do produto (STEWART 2011, p. 168-169).
Dizer “grau de dificuldades a não ultrapassar: f(ax), f(x +b), f(xk)” não diz nada quanto
ao grau de dificuldades a evitar no tratamento da função composta. O grau de dificuldades de
uma função composta não depende essencialmente da natureza do argumento, mas sim, da
expressão que descreve como a imagem é produzida. Um argumento simples pode ter uma
expressão imagem muito complexa.
Afirmar que “limites infinitos não existem” é problemático matematicamente,
especialmente nesta fase em que os estudantes se encontram, pois eles já calcularam limites desse
tipo, embora não sejam números. Kaplan (1976, p. 346) compartilha com essa nossa posição e
destaca isso da seguinte maneira:
As definições de limite superior e limite inferior podem ser generalizadas para
sequências não-limitadas. Nesse caso, e - devem ser considerados como possíveis
“valores de limite”; assim sendo, é um valor de limite se, para todo número K, vale sn
> K para infinitos n; - é um valor de limite, se para todo K, sn < K para infinitos n. […]
(KAPLAN, 1976, p. 346) .
Dizer “O número e é o único número real tal que (ex)’ = e
x” não tem sentido no que se
refere ao conceito de derivada, pois a derivação não é definida sobre números, mas sim sobre
funções, ou sobre grandezas variáveis, na perspectiva do Cálculo do século XVII: Cálculo
151
fluxional de Newton (1642-1727) e Cálculo Diferencial de Leibniz (1646-1716), segundo Baron
e Bos (1974). Onde não há ideia de variação, o conceito de derivada só se circunscreve a um
contexto técnico, pontual e nada mais. Observamos aqui que Stewart (2011) desenvolve a ideia
de movimento como um contexto para introduzir o conceito de derivada com um modelo
explícito desse movimento.
“Dificuldades a não ultrapassar: f(x) = 2-x
+ 2x, f(x) =
12
12
x
xx, f(x) =
x
x
log1”
igualmente é difícil atribuir algum sentido a essa restrição. Uma pergunta que surge é: como um
professor vai selecionar atividades que satisfaçam essa restrição? Será que essas tarefas estão na
posição intermediária entre as difíceis e as fáceis? Portanto, o sentido dessa prescrição é muito
problemático. Talvez a prescrição pudesse fazer referência ao tipo de tarefas e não tarefas
específicas. Por exemplo, diria: dificuldades a não ultrapassar funções racionais, ou dificuldades
a não ultrapassar a funções iguais à soma de funções exponenciais e assim por diante.
Após essa apreciação sobre as orientações metodológicas, apresentamos, na sequência, a
análise das relações institucionais via livro didático do Ensino Médio.
5.2 ANÁLISE DAS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS VIA LIVRO DIDÁTICO DO ENSINO
MÉDIO
Restringimos o estudo aos temas sobre derivadas de funções reais de uma variável real e
primitivas, porque correspondem às questões diretamente relacionadas com nossa pesquisa.
Escolhemos um livro da 12ª classe (terceiro ano brasileiro do Ensino Médio), que é mais
recente e mais usado pelos professores e estudantes desse nível, segundo a opinião dos usuários,
para além de ser um livro elaborado de acordo com o “Novo currículo do ensino Secundário”, o
currículo do qual apresentamos acima uma parte do programa sobre a derivada e primitivas. Esse
livro é designado neste estudo como livro 2.
Livro 2: VUMA, José Pedro. Matemática 12. Pré-Universitário. Novo Currículo do
Ensino Secundário. Longman Moçambique, Lda, Maputo, 2010.
A análise é feita em torno dos seguintes aspectos ou dimensões, eleitos a partir do
referencial teórico estabelecido que se constitui da Teoria Antropológica do Didático de
Chevallard (1994, 1998, 1999, 2002 e BOSCH e CHEVALLARD 1999), das noções de quadro e
152
mudanças de quadros de Douady (1986), de níveis de conhecimentos de Robert (1998) e de
pontos de vista segundo Thurston (1995, 1994):
1. Dimensão pertinência: nessa perspectiva, queremos verificar quais são os tipos de
tarefas propostas e o que é que elas permitem construir: técnicas, tecnologias ou a articulação
entre ambas? Ou seja, as Organizações Matemático-Didáticas visadas são pontuais ou locais? O
ideal é que as tarefas apresentadas sejam pertinentes ao objetivo que se pretende alcançar. Se o
objetivo é fazer com que o estudante seja ator de seu conhecimento, então os tipos de tarefas
devem favorecer essa ação. Para Chevallard (1999), Bosch et al. (2004) e Bosch & Gascón
(2004), uma Organização Matemática é pontual se ela diz respeito a um único tipo de tarefas e
consistindo de apenas uma técnica como meio de resolvê-la. Por exemplo, no caso da derivação
de uma função, digamos, f(x) = xn, as pessoas simplesmente fazem f’(x) = (x
n)’ = nx
n-1. Essa
maneira de fazer diz respeito apenas a um tipo de tarefas. Neste caso, de funções potências.
Claro, existe um discurso tecnológico por volta dessa maneira de fazer, sendo um deles o de
limites de funções e de sequências numéricas.
Uma Organização Matemática é local se ela se articula em torno de várias técnicas e
tecnologias. Por exemplo, na função dada acima, primeiro consideramos um número a qualquer
de seu domínio. Pela definição da derivada de uma função f em a, temos:
f(a)’ = ax
afxf
ax
)()(lim =
)(
))(...(lim
ax
axxaxaaxx nnnn
ax
1221
=
= 123221
nnnnn
axaxaxaaxx ...lim = na
n-1.
Como a é qualquer elemento do domínio de f, temos f’(x) = nxn-1
. Pelo menos neste caso,
a expressão f’(x) = (xn)’ = nx
n-1 tem sentido, compreende-se sua origem.
2. Dimensão abertura do enunciado: o que o livro analisado privilegia: tarefas
abertas ou fechadas? Na perspectiva de Bosch et al. (2004), uma tarefa aberta é aquela para a
qual o estudante tem de decidir sobre quais são os dados e as incógnitas pertinentes que lhe
possibilitam elaborar a solução. Para Robert (1988), o interesse de uma situação aberta está
associado à aquisição de uma certa disponibilidade do conhecimento pelo estudante, pois tais
situações caracterizam o que resta a ser feito pelo estudante, tendo em conta seu percurso da
aprendizagem. Pensamos que se o estudante se envolve nesse tipo de atividades, efetivamente ele
153
constrói seus conhecimentos, pois estudar corresponde ao trabalho com questões problemáticas,
visando encontrar as respostas adequadas.
3. Dimensão quadro de funcionamento dos conceitos: As mudanças de quadros são
adequadas? Segundo Robert (1998), este deveria ser um dos eixos da análise, é interessante olhar
sistematicamente naqueles quadros que fazem funcionar os conceitos em cada tarefa estudada e
se as mudanças de quadros a fazer são adequadas ou não. Observamos aqui que a noção de
quadro a que a autora se refere é a introduzida por Douady (1984).
4. Existência de implícitos no enunciado: Qual é a tendência de deixar elementos
implícitos ou não nos enunciados? Para Robert (1998), esta dimensão diz respeito à
caracterização de alguma coisa que se admite existir, mas que não é evidente à primeira vista. As
tarefas de otimização constituem exemplos desse fato, admitem, sem enunciar que existe um
objeto mínimo ou máximo com o qual podemos trabalhar diretamente.
5. Dimensão variabilidade de tarefas e contextualização: as tarefas propostas são
diversificadas? Facilitam mudanças de quadros? Conforme Robert (1998), é importante que os
livros didáticos proponham formas de exercícios variados para facilitar as aprendizagens dos
estudantes, como por exemplo, os que exigem mudanças de quadros e aqueles que exigem
pesquisas para encontrar a resposta. É também importante, segundo Robert, acostumar os
estudantes a praticarem o percurso contextualização/descontextualização/recontextualização,
pois esta forma de trabalhar é suscetível de provocar uma boa dinâmica de construção dos
conhecimentos.
6. Dimensão níveis de conhecimentos: quais são os níveis de conhecimentos
esperados dos estudantes: técnico, mobilizável ou disponível?
Com estes eixos de análise estabelecidos, passamos para o estudo do livro visado.
A tabela a seguir resume o que encontramos no livro analisado, em termos de quantidade
de tipos de tarefas e suas outras características relacionadas a cada uma das dimensões acima
definidas.
Legenda da tabela:
Pon – tipo de tarefas pontuais, geralmente em torno de uma técnica;
Loc – tipo de tarefas locais, geralmente com certa articulação que ultrapassa uma
técnica;
154
Fec – tipo de tarefas com um enunciado fechado;
Abe – tipo de tarefas com um enunciado aberto;
Exp – tipo de tarefas com um enunciado explícito;
Imp – tipo de tarefas com um enunciado implícito;
Req – tipo de tarefas com o enunciado indicando mudança de quadro;
NReq – tipo de tarefas sem indicação da mudança de quadro;
IntraM – tipo de tarefas com um contexto intramatemático;
Real – tipo de tarefas com um contexto da vida cotidiana;
Fis – tipo de tarefas com um contexto da disciplina de Física;
Tec – tipo de tarefas do nível técnico;
Mob – tipo de tarefas que necessitam conhecimento mobilizável;
Disp – tipo de tarefas que requerem conhecimento disponível;
T2 – tipo de tarefas sobre derivada e suas propriedades;
T3 – tipo de tarefas sobre primitivas e suas propriedades.
FIGURA 18 – RESUMO DE TIPOS DE TAREFAS NO LIVRO DO ALUNO
Dimensão
Livro
Pertinência
do tipo de
tarefas
Abertura do
enunciado
Implicitude
do enunciado
Possibilidad
e de
mudança de
quadro
Contexto do
enunciado
Níveis de
conhecimento
requerido
Pon Loc Fec Abe Exp Imp Req NReq IntraM Real Fis Tec Mob Disp
Livro
2
T2 10 63 50 23 46 27 40 33 62 8 3 11 28 34
T3 14 0 14 0 14 0 0 14 14 0 0 14 0 0
FONTE: O autor (2014).
5.2.1 Análise dos dados da tabela: resumo de tipos de tarefas encontrados no livro estudado
No capítulo sobre derivada, observa-se uma tendência de propor tarefas que exigem
articulação entre diferentes técnicas; há mais exercícios com formulações abertas, requerendo
frequentes mudanças de quadros, e com mais questões desafiadoras aos conhecimentos
mobilizáveis e disponíveis dos estudantes, embora com o predomínio sobre contextos
intramatemáticos. O livro faz a introdução do conceito de derivada como limite da razão
incremental, com recurso a um problema de movimento, como podemos verificar no extrato da
figura 19 que segue.
155
FIGURA 19 – AS NOÇÕES NUMÉRICA INTUITIVA E FORMAL DA DERIVADA
6.1 Derivada
Vamos considerar que viajas num automóvel que circula na Avenida Eduardo Mondlane e, de repente,
descobre que o velocímetro não está a funcionar. Será possível saber a velocidade do carro num dado
momento baseado na indicação do conta-quilómetros?
Então, no instante = 10 h, o conta-quilómetros marca 9476 km e passados 30 minutos marca 9514 km.
Qual é a velocidade do automóvel?
Da física sabemos que vm = t
x
Δ
Δ Assim, vm =
h0,5
km9476km9514 =
h0,5
km3,8= 76 km/h
Se quisermos saber a velocidade instantânea do veículo no instante t = 10 h e 15 minutos, teríamos de
considerar intervalos de tempo tΔ mais curtos. Isto é, a diferença entre t0 e t1 deve ser tão pequena quanto
possível.
t0(h) ti(h) tΔ (h) x0(km) xi(km) xΔ Δt
Δx(km/h)
0,25 0,26 0,3 95 97 2 66,66
0,25 0,27 0,022 95 96,662 1,672 75,545
0,25 0,26 0,012 95 95,912 0,902 75,167
0,25 0,251 0,011 95 95,836 0,836 76
0,25 0,2501 0,01 95 95,76 0,76 76
0,25 0,25001 0,0001 95 95,075 0,0076 76
Observa que quando tΔ 0 então vm = t
x
Δ
Δ 76 km/h.
Isto é, a velocidade média aproxima-se cada vez mais a 76 km/h. Diz-se então que a velocidade
instantânea do corpo no instante t = 4
1h é 76 km/h.
A velocidade média no intervalo de tempo tΔ é a taxa de variação média (t.v.m.) da função f(t) nesse
inetrvalo de tempo. Isto é:
vm = t.v.m. = t
tfttf
Δ
Δ 00 )()( .
Para ter a velocidade instantânea, é necessário considerar os intervalos tΔ cada vez menores, ou seja,
fazer com que a diferença t1 – t0 seja muito pequena ( tΔ 0):
vinst = Δt
)0(tΔt)0(tlim
0Δt
ff
A velocidade instantânea do corpo no instante t designa-se derivada e representa-se por f’(t).
Definição da derivada
Seja f uma função de domínio Df e x0 um ponto de seu domínio. Chama-se derivada de f no ponto de
abscissa x0, ao limite (se existe) do quociente de seu acréscimo yΔ pelo acréscimo xΔ da variável
independente quando xΔ tende para zero. Isto é:
156
Δx
)0(xΔx)0(x
0Δxlim(x)'
Δx)0f(xΔy
)0f(x)1f(xΔy
Δx0x1xΔx0x1x
Δx
Δy
0Δxlim(x)f'
fff
xΔ – é o acréscimo ou incremento da variável independente;
yΔ – é o acréscimo ou incremento da função;
Δx
Δy- é a razão incremental;
f’(x) – exprime a forma como função varia no instante x0. FONTE: Vuma (2010, p. 136-137).
Esta citação mostra as ideias iniciais de introdução à derivada de uma função real a
valores reais pelo livro 2, colocando em evidência que o autor segue a proposta institucional
indicada pelo Programa de Ensino (PE) do Ministério da Educação e Cultura.
Do ponto de vista do nosso estudo, essa introdução tem muitas questões obscuras, que
possivelmente podem constituir dificuldades para aquisição de um conceito correto de derivada.
Pensamos que a situação de movimento criada não é adequada, neste caso, porque não deixa
claro qual o modelo matemático que descreve o movimento do automóvel. Na falta desse
modelo, não se sabe se o movimento é paulatino ou não. Pode acontecer que a equação do
movimento não seja diferenciável. Portanto, pensamos não ser correto começar discutindo
velocidade instantânea antes de apresentar a equação do movimento. A tabela de valores
apresentada também não deixa claro como as variações dos tempos e dos espaços ocorrem. Não
há nenhum padrão de variação. Isso pode criar alguma dificuldade na compreensão do que se
pretende atingir como objetivo, que é a aquisição do conceito de derivada como limite da razão
incremental. Além da situação criada, que consideramos equivocada, há muitas outras
imprecisões no texto, como as que aparecem nas relações seguintes:
157
Δx
)0(xΔx)0(x
0Δxlim(x)'
Δx)0(xΔy
)0(x)1(xΔy
Δx0x1xΔx0x1x
Δx
Δy
0Δxlim(x)'
fff
f
ff
f
f’(x) – exprime a forma como a função varia no instante x0.
Não está certo escrever yΔ = f(x0+ xΔ ) yΔ = f(x1) – f(x0). Pois de x1 – x0 = x, ou
seja, x1 = x0 + xΔ , e neste caso, f(x0 + xΔ ) = f(x1). Então, de yΔ = f(x1) – f(x0) e yΔ = f(x0+ xΔ )
= f(x1), obtemos f(x1) = f(x1) – f(x0) o que implica que essa igualdade é verdadeira só para f(x0) =
0. Então yΔ f(x0+ xΔ ), se f(x0) 0. Parece-nos importante observar que a intuição gráfica
poderia ser uma ferramenta importante, não só para compreender o que se pretendia com a
formulação acima, mas também para identificar o erro apresentado. Além disso, o autor teria
seguido as orientações do PE.
O autor apresenta o gráfico da figura 20 que segue, mas este gráfico não serve como
elemento intuitivo para justificar os caminhos da demonstração da derivada como limite da razão
incremental.
FIGURA 20 – VARIAÇÃO DE UMA FUNÇÃO EM RELAÇÃO A VARIAÇÃO DE x
FONTE: Vuma (2010, p. 138).
Portanto, o autor poderia muito bem usar o gráfico para mostrar a relação yΔ = f(x1) –
f(x0) que é diferente de yΔ = f(x0+ xΔ ). Mas o desenho que apresenta não permite tirar
informações claras para justificar os passos da demonstração da fórmula de derivação.
158
Na expressão f’(x) = x
xfxxf
x Δ
Δ 00
0Δ
)()(lim
, há erro em referência ao ponto onde a
função está sendo diferenciada. O lado esquerdo da igualdade indica que se está diferenciando a
função f para qualquer ponto x de seu domínio, enquanto o lado direito indica que a função f está
sendo diferenciada no ponto x = x0. O mesmo erro ocorre quando se escreve “f’(x) – exprime a
forma como a função varia no instante x0”. Na verdade f’(x) não exprime apenas como a função f
varia em x = x0, mas sim como ela varia em todos pontos do seu domínio onde é possível estudar
essa variação instantânea.
O livro explora os pontos de vista da derivada como limite do quociente de Newton,
como declive da reta tangente ao gráfico de f em um ponto a dado e como velocidade instantânea
do movimento, o que corresponde aos pontos de vista 1, 4 e 5, segundo Thurston (1995, 1994).
Pensamos que também poder-se-ia explorar o ponto de vista da derivada como taxa instantânea
de variação da função em geral, uma vez que no problema dado, menciona-se a taxa de variação
média (t.v.m.) como sendo igual à velocidade média. Como fizemos referência acima, pensamos
que faltam nesta discussão as representações gráficas dos conceitos visados.
Após a formalização da introdução do conceito de derivada como limite do quociente de
Newton, são discutidos outros conceitos associados a derivadas de funções e algumas de suas
aplicações, tais como: derivadas laterais, condições de derivabilidade de uma função f em um
dado ponto a, o conceito de função derivada, regras de derivação, estudo completo de funções
reais de uma variável real com recurso às ideias de derivada, e por fim, as aplicações práticas dos
conceitos de derivada de uma função f na resolução de problemas intramatemáticos e práticos
verbais, ou seja, do contexto da vida quotidiana.
Quando o livro começa a discussão sobre primitivas, a estratégia muda para uma
tendência predominantemente formalista: os tipos de tarefas propostos são todos pontuais,
dizendo respeito a técnicas muito específicas e isoladas, formulações fechadas, explícitas,
nenhuma sugestão para formulações diferentes das algébricas, todas as tarefas são formuladas no
contexto matemático e exigindo apenas o conhecimento técnico.
Para nós, este capítulo não cumpre plenamente os objetivos do programa, pois este
afirma numa das suas passagens que “os alunos devem identificar algumas aplicações da integral
indefinida. Por exemplo, problemas relacionados com a taxa de crescimento da população em
159
uma determinada cidade ou país”. Mas o livro não traz nenhuma tarefa prática verbal ou de
algum contexto diferente do intramatemático.
Notamos, por outro lado, que o autor não distingue o termo “primitiva” com o termo
“integral”. Os dois termos são usados com o mesmo sentido de antiderivada. Ao menos que o
livro fizesse menção à integral indefinida. Primitiva é uma função, ou melhor dito, primitiva de
uma função f é uma função F, tal que F’ = f. Assim sendo, primitiva de uma função f é uma
classe de funções, cujas leis de formação diferem uma da outra pela constante. Isto é,
f(x)dxF(x) representa uma classe de funções dada por F(x) = G(x) + C, sendo C um número
real qualquer.
Integral nem sempre representa uma classe de funções. Por exemplo, x
a
f(x)dxF(x)
representa uma única função que se define assim F(x) = G(x) – G(a). Às vezes resulta em um
número, quando os extremos são valores constantes. Por exemplo, b
a
f(x)dx é um número real
dado por F(b) – F(a), ou seja, b
a
f(x)dx = F(b) – F(a). Portanto, parece-nos importante distinguir
explicitamente primitiva e integral, quando se trata da apresentação didática da integração nos
materiais de ensino para evitar criar conceitos equivocados nos estudantes que aprendem este
tema.
Desse modo, na parte sobre primitivas, segundo a tabela, muitas tarefas propostas dão
indicação do uso de técnicas pontuais, carecendo de uma articulação apropriada com outras
técnicas. Há mais tarefas com formulações fechadas, explícitas, geralmente desenvolvidas sobre
um único quadro e em contextos intramatemáticos. Para Robert (1998), este tipo de tarefas é
necessário, mas temos de estar cientes que só visam, muito principalmente, ao desenvolvimento
da técnica, o saber-fazer e não o saber, ou seja, o conteúdo de referência das tarefas, isto é, o
significado. Pensamos que procedendo assim, a compreensão é de certa forma comprometida.
Na perspectiva de Chevallard (1999) e Bosch et al. (2004), procedendo desse modo,
estamos perante questões de ensino apresentadas no sentido fraco do termo, quer dizer, questões
que só visam ao desenvolvimento de técnicas. Para esses autores, embora se reconheça a
160
necessidade do domínio de técnicas, as questões de ensino devem ser colocadas no sentido forte,
que implicam a construção das maneiras de fazer, que exigem a (re)construção de técnicas e de
tecnologias, justificações e explicações sobre o que se faz.
Para Chevallard (1998), estudar significa trabalhar com uma determinada questão até
produzir uma resposta satisfatória. E para isso acontecer, achamos ser necessário equilibrar as
tarefas entre as que visam a rotinização e prática de técnicas e as que visam justificações,
explicações e construção de técnicas, ou seja, tarefas problemáticas no sentido forte. Portanto, a
partir do que vemos na tabela, temos a percepção de que o livro 2 não articula adequadamente
algumas pretensões do programa que destaca a resolução de problemas e a exploração de
situações vividas no dia a dia como fio condutor da aprendizagem matemática na sala.
No livro, notamos que mudanças de quadros são raras e mesmo quando ocorrem não são
explicitadas, o que pode criar dificuldades para os estudantes que não dominam os diferentes
quadros em jogo, ou seja, os quadros algébrico, numérico, geométrico e analítico.
Na sequência, apresentamos a análise das relações institucionais via livros didáticos
utilizados na universidade no Brasil e/ou em Moçambique. No início do capítulo que segue
explicamos como essa análise é estruturada. Nas partes que indicamos por 1 e 2 a análise incide
sobre as praxeologias propostas nos materiais estudados. Na parte 3 a análise retoma as
dimensões usadas no estudo do programa e livro do aluno moçambicanos do ensino médio.
161
6 ANÁLISE DAS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS VIA LIVROS DIDÁTICOS DO
ENSINO SUPERIOR
A análise que fazemos nesta parte do estudo centra-se ainda nos conceitos de derivada
de funções reais de uma variável real e de Integral de Riemann, o foco de nossa pesquisa.
No prosseguimento da análise, consideramos ainda as dimensões em termos de eixos
categoriais já estabelecidos na seção anterior.
Assim sendo, o trabalho de estudo nesta seção consiste, principalmente, de dois tipos de
tarefas: descrever e analisar a Organização Matemática (OM) construída nos livros didáticos
escolhidos para esse fim.
Na parte 1: analisamos como o conceito de derivada é introduzido;
Na parte 2: analisamos como o conceito de integral de Riemann é introduzido;
Na parte 3: apresentamos uma tabela-resumo em termos de dimensões dos diferentes
tipos de tarefas encontradas nos livros analisados. Essa tabela é idêntica à que foi apresentada no
capítulo anterior.
Apresentamos abaixo os livros, que, em geral, são indicados na bibliografia básica dos
cursos de Matemática das faculdades/universidades brasileiras e que, pela nossa experiência, são
usados pelos professores da Disciplina de Cálculo Elementar, quando consideramos o caso de
Moçambique, em particular o livro 5. Como identificamos o anterior por Livro 2, os que usamos
nesta seção receberam os números 3, 4, 5 e 6, respectivamente. Assim temos:
Livro 3: James Stewart: Cálculo Volume 1. 6ª edição, CENGAGE Learning, São Paulo,
2011;
Livro 4: Geraldo Ávila. Análise Matemática para Licenciatura. 2ª Edição revista e
ampliada, Editora Blucher, São Paulo, 2005.
Livro 5: Carlos Sarrico. Análise Matemática. Leituras e exercícios. 6ª edição, Gradiva,
Lisboa, 2005.
Livro 6: Laurence Hoffmann & Gerald L. Bradley. Cálculo. Um curso moderno e suas
aplicações, sexta edição, JC Editora, Rio de Janeiro, 1999.
Os livros 3 e 6 são de autores norte-americanos traduzidos no Brasil. O livro 4 é de autor
brasileiro. O livro 5 é de autor português.
162
Como dissemos acima, tais livros foram escolhidos para o estudo pela sua importância
prática: os livros 3, 4 e 5 são usados no ensino e na aprendizagem de Cálculo elementar em
Moçambique; no caso do Brasil, com a exceção do livro 5, do qual não temos informação a
respeito de seu uso, os restantes são de alguma forma usados, principalmente os livros 3 e 4 que
aparecem como referências básicas nos cursos de licenciatura em Matemática.
Assim começamos a descrição e análise da Organização Matemática dos livros
escolhidos.
Parte 1: Tema1: Derivada de funções reais de uma variável real.
Inicialmente, chamamos a atenção para certa notação que introduzimos, abstraída do
referencial teórico principal, a TAD (CHEVALLARD, 1999).
Tij – tipo de tarefas i, ocorrendo no livro j, para i = 1, 2, 3, … e j = 3, 4, 5, 6.
tij – tarefas i, ocorrendo no livro j, para i = 1, 2, 3, … e j = 3, 4, 5, 6.
ij – técnica relativa a tarefas i, ocorrendo no livro j, para i = 1, 2, 3, … e j = 3, 4, 5, 6.
Tij – tecnologia (discurso tecnológico) relativa ao tipo de tarefas Tij. Neste caso, pode
ocorrer também ij
, o que quer dizer: tecnologia relativa à técnica ij .
Tij – teoria relativa à tecnologia Tij. Igualmente pode ocorrer ij
Θ , o que quer
dizer: teoria relativa à técnica ij .
Tarefa 1 (T1) : Caracterizar e determinar a derivada de uma função f em um ponto P de seu
domínio.
Notemos que este tipo de tarefas vai ser analisado para os quatro livros antes de passar
para o tipo de tarefas seguinte. Pensamos que isso facilita compreender as diferenças e
semelhanças nas estratégias usadas pelos autores dos materiais considerados.
O livro de Stewart (L3) começa com um discurso tecnológico descritivo e a definição da
derivada é introduzida por meio dos ostensivos da língua natural e gráfico, como se vê no
exemplo que segue:
T13: Discurso sobre a construção da definição da reta tangente e seu declive.
FIGURA 21 – STEWART: RETA TANGENTE E SEU DECLIVE. INTRODUÇÃO
DERIVADAS E TAXAS DE VARIAÇÃO
O problema de encontrar a reta tangente a uma curva e o problema de encontrar a velocidade de um objeto
163
envolvem determinar o mesmo tipo de limite, como vimos na seção 2.1. Este tipo especial de limite é
chamado derivada e veremos que ele pode ser interpretado como uma taxa de variação tanto nas ciências
quanto na engenharia.
TANGENTES
Se uma curva C tiver uma equação y = f(x) e quisermos encontrar a tangente a C em um ponto P(a, f(a)),
consideramos um ponto próximo Q(x, f(x)) onde x a e calculamos a inclinação da reta secante PQ:
PQm = ax
afxf
)()(
Então fazemos Q aproximar-se de P ao longo da curva C ao obrigar
x tender a a. Se PQm tender a um número m, então definimos a
tangente t como a reta que passa por P e tem inclinação m. (Isso
implica dizer que a reta tangente é a posição limite da reta secante
PQ quando Q tende a P. Veja a figura 1).
Figura 1
1 Definição A reta tangente a uma curva y = f(x) em um
ponto P(a, f(a)) é a reta por P que tem a inclinação
m = ax
f(a)f(x)
axlim
desde que este limite exista
[…] Algumas vezes nos referimos à inclinação da reta tangente como a inclinação da curva no ponto. A
ideia por detrás disso é que, se dermos um zoom (suficiente) em direção ao ponto, a curva passará quase
uma reta. A figura 2 ilustra esse procedimento para curva y = x2 do exemplo 1. Quanto maior for o zoom,
mais indistinguível da reta tangente será da parábola.
Figura 2.
FONTE: Stewart (2011, p. 130-131).
É importante notar que o livro introduz os conceitos de inclinação de reta tangente e
velocidade instantânea antes do início do estudo específico sobre a derivada. De fato, os
problemas da tangente e da velocidade são os contextos que o livro usa para introduzir o capítulo
2: Limites e Derivadas. Quer dizer, as derivadas são abordadas neste livro como parte do estudo
de limites.
Após esta descrição introdutória, o livro revisita o conceito de velocidade instantânea
v(a) no instante t = a como limite das velocidades médias, apresentando a definição
164
h
afhafav
h
)()(lim)(
0
depois de ter considerado h = x – a e x = a + h, e, feitas as substituições apropriadas
em ax
afxf
ax
)()(lim
Notemos ainda que cada uma das caracterizações ou definição da derivada, geralmente é
intermediada com um ou mais exemplos que mostram como a técnica construída funciona. Por
exemplo, após a definição da fórmula da velocidade instantânea como limite de velocidades
médias, no livro é apresentada a solução do seguinte problema: “Exemplo 3 Suponha que a bola
foi abandonada do posto de observação da torre, 450 m acima do solo. (a) Qual a velocidade da
bola após 5 segundos; (b) Com qual velocidade a bola chega ao solo?” (STEWART, 2011, p.
132).
Temos neste problema as seguintes tarefas:
t13: Determinar a velocidade da bola após 5 segundos de lançamento;
t23: Determinar a velocidade com a qual a bola chega ao solo.
Para essas tarefas, é proposta a seguinte técnica:
13: definição do limite da razão incremental de uma função f em um determinado ponto
P de abscissa a. A pergunta pontual neste caso é: qual f? Ou seja, qual é a equação do
movimento? Aqui temos de encontrar uma tecnologia que justifique a existência da equação
apropriada deste movimento. Na página 75 do mesmo livro, aparece uma nota referindo-se a
Galileu:
Por meio de experimentos feitos séculos atrás, Galileu descobriu que a distância
percorrida por qualquer objeto em queda livre é proporcional ao quadrado do tempo em
que ele esteve caindo (esse modelo para queda livre despreza a resistência do ar). Se a
distância percorrida após t segundos for chamada s(t) e medida em metros, então a Lei
de Galileu pode ser expressa pela equação s(t) = 4,9t2 (STEWART, 2011, p. 75).
Este resultado tecnológico pode ser usado para construir a razão incremental desejada e
implementar a técnica 13 indicada acima.
23: aqui temos alguns conhecimentos que são supostos disponíveis e que devem ser
utilizados para resolver a tarefa proposta:
165
- interpretar que a bola atinge o solo após ter percorrido 450 m, dado que foi lançada a
essa altura. Aqui interpretamos assim: seja t1 o tempo que a bola atinge o solo, então temos 4,9t12
= 450 m.
- resolver a equação quadrática incompleta em ordem a t1, usando técnicas de resolução
de equações desse tipo;
- usar a equação linear da velocidade determinada na tarefa a) para calcular o instante
em que a bola atinge o solo, usando técnicas de resolução de equações lineares.
Assim o livro resolve o problema dado:
FIGURA 22 – DERIVADA COMO VELOCIDADE: APLICAÇÃO
Precisaremos de encontrar a velocidade tanto quando t = 5 quanto quando a bola atinge o solo, de modo que é
eficiente começar encontrando a velocidade em um instante geral t = a. Usando a equação de movimento s =f(t) =
4,9t2, temos
h
f(a)h)f(alimv(a)
0h
=
h
4,9ah)4,9(alim
22
0h
=
h
4,9a)h 2ah4,9(alim
222
0h
=
= h
)h 4,9(2ahlim
2
0h
= h)4,9(2alim
0h
= 9,8a
A velocidade após 5 s é de v(5) = (9,8)(5) = 49 m/s.
Uma vez que o posto de observação está 450 m acima do solo, a bola vai atingir o chão em t1, quando s(t1) = 450,
isto é,
4,9t12 = 450
Isso fornece
21t =
94
450
, e t1 =
94
450
,= 9,6 s
A velocidade com que a bola atinge o chão é, portanto,
v(t1) = 9,8t1 = 9,894
450
, 94 m/s
FONTE: Stewart (2011, pp. 132).
Após a apresentação dos declives de uma reta tangente ao gráfico de f em um ponto
dado P, a equação e representação gráfica da reta tangente em P, sua comparação com o aspecto
retilíneo do gráfico de f em P por meio de um zoom cada vez maior da região de tangência, o
autor introduz formalmente o conceito de derivada de uma função f a valores reais, por meio do
seguinte discurso tecnológico :
T13: Definição da derivada de uma função em um ponto como limite da razão
incremental.
166
FIGURA 23 – STEWART: DERIVADA DE UMA FUNÇÃO REAL A VALORES REAIS. DEFINIÇÃO
DERIVADAS
Vimos que o mesmo tipo de limite aparece ao encontrar a inclinação de uma reta tangente (equação 2) ou a
velocidade de um objeto (equação 3). De fato, os limites do tipo
h
afhaf
h
)()(lim
0
surgem sempre que calculamos uma taxa de variação em uma das ciências ou engenharia, tais como a taxa de
uma reação química ou o custo marginal em economia. Uma vez que esse tipo de limite ocorre amplamente, ele
recebe nome e notação especiais (sublinhado nosso).
4 Definição A derivada de uma função f em um número a, denotada porf’(a) é
f’(a) = h
afhaf
h
)()(lim
0
se o limite existir.
Se escrevermos x = a + h, então h = x – a e h tende a 0 se e somente se x tende a a. Consequentemente, uma
maneira equivalente de enunciar a definição da derivada, como vimos na determinação das retas tangentes, é
f’(a) = ax
afxf
ax
)()(lim
FONTE: Stewart (2011, p. 132-133).
Em relação ao nome “derivada” e à notação por meio do apóstrofo, estas são devidas a
Cauchy, segundo Bos (1985, p. 48-49) e o autor não faz menção da relação entre a notação e o
nome “derivada” com as aplicações deste conceito. Portanto, não é claro por que Stewart entende
associar a nomenclatura e a notação com as aplicações. Sabemos que existem outras notações
diferentes da notação sugerida por Cauchy. São casos de notações de Leibniz e de Newton que
ainda hoje se utilizam. Aliás, o próprio Stewart sugere na página 143 outras notações para a
derivada:
f’ (x) = y’ = dx
dy =
dx
df= )(xf
dx
d = Df(x) = Dxf(x) =
x
y
x Δ
Δ
0Δ lim
E ainda outras notações alternativas: axdx
dy
ou axdx
dy
Após a definição da derivada como a dada na figura 23, seguida de alguns exemplos de
aplicação, trabalhando a técnica recém-construída, o livro expande o conceito de derivada para o
ponto de vista de taxa de variação:
T13: Definição da derivada de uma função em um ponto como taxa instantânea de
variação.
167
FIGURA 24 – STEWART: DERIVADA COMO TAXA DE VARIAÇÃO
TAXAS DE VARIAÇÃO
Figura 8
taxa média de variação = mPQ
taxa instantânea de variação = a
inclinação da tangente em P
Suponha que y seja uma quantidade que depende de outra
quantidade x. Assim, y é uma função de x e escrevemos y =f(x). Se
x variar de x1 para x2, então a variação de x (também chamada de
incremento de x) é
x = x2 – x1 e a variação correspondente de y é
y =f(x2) –f(x1)
O quociente de diferenças
12
12
Δ
Δ
xx
xfxf
x
y
)()(
é denominado taxa média de variação de y em relação a x no
intervalo [x1, x2] e pode ser interpretado como a inclinação da reta
secante PQ na figura 8.
Por analogia com a velocidade, consideramos a taxa média de variação em intervalos cada vez menores fazendo
x2 tender a x1 e, portanto, fazendo x tender a 0. O limite destas taxas médias de variação é chamado taxa
(instantânea) de variação de y em relação a x em x = x1, que é interpretada como a inclinação da tangente à
curva y =f(x) em (x1,f(x1)).
6 Taxa instantânea de variação = 12
12
0Δ 12Δ
Δ
xx
xfxf
x
y
xxx
)()(limlim
Reconhecemos este limite como a derivada f’(x1).
Sabemos que uma das interpretações da derivadaf’(a) é a inclinação da reta tangente à curva y = f(x) quando x =
a. Agora temos uma segunda interpretação
Figura 9
A derivada f’(a) é a taxa instantânea de variação de y = f(x) em
relação a x quando x = a.
FONTE: Stewart (2011, p. 134)
Depois dessas definições, o livro destaca as conexões entre elas, ou seja, mesmo sem
utilizar o termo, o autor mostra que são pontos de vista diferentes para a definição de derivada.
No caso, podemos considerar os pontos de vista geométrico, taxa de variação, simbólico segundo
Thurston (1995, 1994).
A conexão com a primeira interpretação é que se esboçarmos a curva y = f(x), então a
taxa instantânea de variação será a inclinação da tangente a essa curva no ponto onde x =
a. Isso significa que quando a derivada for grande (e portanto a curva será íngreme no
ponto P na figura 9), os valores de y mudarão rapidamente. Quando a derivada for
pequena, a curva será relativamente achatada, e os valores de y mudarão lentamente. Em
particular, se s =f(t) for a função posição de uma partícula que se move ao longo de uma
reta, então f’(a) será a taxa de variação do deslocamento s em relação ao tempo t. Em
168
outras palavras, f’(a) é a velocidade da partícula no instante t = a (STEWART, 2011, p.
134).
Além das interpretações da derivada como taxa de variação para um deslocamento em
função do tempo, e coeficiente angular da reta tangente, o livro apresenta outras interpretações
possíveis relacionadas às outras ciências: o custo marginal, considerado como taxa de variação do
custo de produção em relação ao número de itens produzidos; a taxa de variação do débito em
relação ao tempo; a potência, considerada como taxa de variação do trabalho com relação ao
tempo; taxa de variação da concentração de um reagente em relação ao tempo; taxa de variação
da população de uma colônia de bactérias em relação ao tempo; densidade linear definida como
taxa de variação da massa em relação ao comprimento, observando que todas essas interpretações
estão associadas ao olhar para derivada de uma função como taxa de variação. Finalmente, o livro
sintetiza que as taxas de variação ocorrem em todas as ciências, ou seja, essas taxas podem ser
vistas de diferentes formas em função das aplicações a que nos referimos. Para melhor
exemplificá-las, o autor escreve:
UMA ÚNICA IDEIA, MUITAS INTERPRETAÇÕES
A velocidade, a densidade, a corrente, a potência e o gradiente da temperatura na física;
a taxa de reação e a compressibilidade na química; a taxa de crescimento e o gradiente
da velocidade do sangue na biologia; o custo e o lucro marginal na economia; a taxa do
fluxo do calor na geologia; a taxa do desenvolvimento do desempenho na psicologia; a
taxa de divulgação de um boato na sociologia – todos esses são casos especiais de um
único conceito matemático, a derivada. (STEWART, 2011, p. 213).
O livro faz um desenvolvimento amplo do tema derivadas. Cerca de 50% das 642
páginas do livro são dedicadas ao estudo de tópicos relacionados com a derivada, associados a
setores e domínios em que esse conceito é aplicado. É interessante ver que o livro apresenta a
generalidade da ideia de taxa de variação, analisando vários contextos com algum significado
prático relacionado com o conceito. Trata-se assim de uma obra que pode auxiliar os estudantes
de Matemática a compreenderem o funcionamento interdisciplinar do conceito de derivada e, ao
mesmo tempo, a obra pode ser utilizada nos diferentes cursos em que se introduzem os conceitos
de cálculo diferencial e integral.
Passamos a seguir para a apresentação das análises do livro 4, de Geraldo Ávila;
iniciamos pela forma como o autor introduz o conceito de derivada.
Na introdução do capítulo 7, sobre o Cálculo Diferencial, Ávila (2005) inicia com uma
advertência ao leitor sobre as características de seu livro.
169
No presente capítulo fazemos uma apresentação rigorosa dos conceitos e teoremas
fundamentais do Cálculo Diferencial, uma tarefa que não costuma ser feita nos cursos
introdutórios de Cálculo; isso por duas razões: por um lado o professor não dispõe de
uma teoria dos números reais, sobretudo a propriedade do supremo, ou algo equivalente,
como a propriedade dos intervalos encaixados. E sem isso fica impossível demonstrar
rigorosamente os referidos teoremas. Em segundo lugar, o objetivo primordial de um
curso de Cálculo é desenvolver logo os métodos e técnicas da disciplina, não só para
prover os pré-requisitos de outras disciplinas, mas também para familiarizar o aluno com
funções mais sofisticadas e várias de suas propriedades, o que muito facilita o estudo da
análise. Portanto, no presente capítulo cuidaremos de estabelecer, de forma rigorosa, os
resultados básicos do Cálculo Diferencial, e não os métodos e técnicas, que são objeto de
um curso preliminar de Cálculo. Por isso mesmo é muito conveniente que o leitor, ao
estudar este capítulo, faça ao mesmo tempo, um reestudo dos referidos métodos e
técnicas da derivada (ÁVILA, 2005, p. 174).
Após esta advertência, o autor introduz formalmente o conceito de derivada como limite
de uma razão incremental:
T14: Derivada como limite da razão incremental.
FIGURA 25 – ÁVILA (2005): INTRODUÇÃO DO CONCEITO DE DERIVADA
7.1 A derivada e a diferencial
Diz-se que uma funçãof, definida num intervalo aberto I, é derivável em x0 I se existe e é finito o limite da
razão incremental
0
0
xx
)f(xf(x)
com x x0. Esse limite é, por definição, a derivada da funçãof no ponto x0. Para indicar esse limite usam-se as
notações
f’(x0), (Df)(x0) e )(xdx
df
0
esta última sendo o quociente de diferenciais, como explicaremos logo adiante. Em mecânica, onde
frequentemente se consideram funções do tempo t, como s(t), x(t) etc., é comum a notação de derivada com a
letra encimada por um ponto, como
(t)s , s , (t)x , x , etc.
Pondo x = x0 + h, podemos escrever a derivada das seguintes maneiras:
f’(x0) =
0
0
0xx xx
)f(xf(x)lim
=
h
)f(xh)f(xlim 00
0h
.
Essa é a derivada no sentido ordinário, o ponto x0 sendo interior ao domínio da função. As noções de derivadas
laterais, à direita e à esquerda são introduzidas de maneira análoga. […]
É fácil ver também que uma funçãof é diferenciável em x0, no sentido ordinário, se e somente se suas derivadas
laterais nesse ponto existem e são iguais. FONTE: Ávila (2005, pp. 174-175).
A introdução do conceito de derivada é mesmo formal, como o autor adverte no início
do capítulo. Na definição podemos identificar os pontos de vista infinitesimal e taxa de variação,
segundo Thurston (1995, 1994). O autor não usa exemplos de contextos diferentes da Matemática
para introduzir o conceito. Mesmo a interpretação geométrica de aproximação das secantes à
posição tangente ao gráfico de f em um ponto P é evitada. Aqui, nos parece que seria importante
170
que o autor utilizasse o recurso do ponto de vista geométrico, pois daria algum sentido para o tal
número obtido que recebe o nome de derivada. Além disso, é preciso lembrar que, no Brasil, o
estudo das funções no Ensino Médio se faz por meio do quadro algébrico e suas propriedades
são, geralmente, visualizadas por meio do ostensivo gráfico.
Consideramos, por outro lado, que seja interessante a observação que o autor faz ao
considerar a igualdade das derivadas laterais como critério para verificação da derivabilidade de
uma função f em um ponto, pois estende o critério usado na verificação do limite de uma função
em um ponto. Pensamos que até esta fase, o estudante ainda não domina muito bem a definição
lógica formal do limite de uma função em um ponto que pode ser usada para justificar a
derivabilidade de uma função em um ponto. Assim, o critério de limites laterais, neste caso, de
derivadas laterais, é uma alternativa ao alcance do estudante.
Ávila (2005) usa o conceito de derivada de uma função f em um ponto P para construir o
conceito de reta tangente, uma estratégia contrária à que vimos no livro de Stewart (2011)
analisado anteriormente, bem como em muitos outros livros de Cálculo (segundo nossa
experiência). O autor faz essa discussão da seguinte maneira:
FIGURA 26 – ÁVILA E A DEFINIÇÃO DA RETA TANGENTE
Voltemos à razão incremental (7.1) que representa o declive da reta secante PQ, onde P = (x0,f(x0)) e Q = (x, f(x))
como ilustra a Fig. 7.1. Quando x x0, o ponto Q se aproxima do ponto P e f’(x0) é o valor do limite do declive da
reta secante. Isto sugere a definição de reta tangente à curva y = f(x) no ponto P como aquela que passa por esse
ponto e tem declive f’(x0). Sua equação em coordenadas (x, Y) é dada por
Y –f(x0) = f’(x0)(x – x0), ou seja Y =f(x0) + f’(x0)(x- x0).
É interessante examinar a natureza do contato dessa reta com a curva y =
f(x). Para isso, observamos que a diferença de ordenadas da curva e da
reta, correspondentes à mesma abscissa x, isto é f(x) – Y, tende a zero com
x x0. Mas não é só isso; tende a zero o quociente dessa diferença por x –
x0, isto é
η)(xf'xx
)f(xf(x)
xx
Yf(x)0
0
0
0
(7.2)
que tende a zero com x x0. Vemos assim que a diferença de ordenadas f(x) – Y, ou distância entre a curva e a reta
tangente ao longo de uma paralela ao eixo Oy (fig. 7.2), tende a zero “mais depressa” que x – x0.
171
Em vista disso dizemos que o contato da curva com a reta tangente no ponto P considerado é de ordem superior à
primeira. […].
Outro modo de definir a reta tangente consiste em definir essa reta como sendo, dentre as retas do feixe pelo ponto
P, aquela que tem com a curva um contato de ordem superior à primeira. Sendo a função derivável, vamos mostrar
que essa condição de fato determina a reta tangente univocamente como sendo aquela da equação (7.2). De fato, o
referido feixe de retas é dado por
Y =f(x0) + m(x – x0),
onde m é um parâmetro variável (Fig. 7.3). A condição de que essa reta tenha com a curva contato de ordem
superior à primeira,
mxx
)f(xf(x)
xx
Yf(x)
0
0
0
0
implica m = f’(x0). FONTE: Ávila (2005, pp. 176-177).
Portanto, nessa discussão, o autor tenta definir reta tangente, rigorosamente. Não usa o
conceito de reta tangente para definir a derivada. Pensamos que essa abordagem seja
particularmente importante, porque assim caracteriza uma única reta tangente. Como vimos no
capítulo 2 no estudo da Villarreal (1999), os estudantes fazem confusão sobre o que é uma reta
tangente. Essa confusão também é reportada nos estudos de Artigue (1991). Para a autora, o
estudante pode conceber a tangente a uma curva num ponto A, como sendo:
1. uma reta que passa por A, mas sem atravessar a curva na vizinhança de A (ponto de
vista usado principalmente por Appollonius para determinar as tangentes às cônicas, sem apelo a
uma abordagem diferencial);
2. uma reta tendo uma dupla interseção com a curva em pontos vizinhos (um ponto de
vista presente nos trabalhos de Euler e Cramer, que mais tarde se sistematizou no contexto da
geometria algébrica);
3. uma reta passando por dois pontos infinitamente próximos de A sobre a curva (o
ponto de vista de Fermat, Leibniz, [...]) ou a reta para a qual a curva se torna quando se amplia a
curva numa vizinhança de A;
4. o limite das secantes (AM) quando o ponto M se desloca para A ao longo da curva,
como na figura abaixo (ponto de vista de D’Alembert, por exemplo, mais próximo da abordagem
tradicional no ensino);
FIGURA 27 – RETA TANGENTE COMO LIMITE DAS RETAS SECANTES
FONTE: Artigue (1991, p. 175).
172
5. a melhor aproximação linear ou a única aproximação linear de primeira ordem à curva
numa vizinhança de A (conduzindo à ideia mais sofisticada da transformação linear tangente);
6. a reta passando por A cujo declive é dado pela derivada em A da função associada
com a curva (onde a derivada é suposta existir).
A partir destas questões que se levantam em torno da percepção da reta tangente pelos
estudantes, talvez a solução seja seguir o modelo de Ávila (2005). Após a introdução da derivada
como o declive da reta tangente ao gráfico de f em um ponto dado, tal como muitos livros fazem,
acentuar depois que essa reta tangente é única, usando a descrição de Ávila.
Depois dessa referência ao livro de Ávila (2005), passamos à análise do livro 5, de
Sarrico (2005). A introdução apresentada neste livro é semelhante à usada por Ávila, iniciando
com uma apresentação formal, antecedida de uma referência histórica a Fermat, onde ele procura
maximizar a área de A(x) = x(x – a) de um retângulo de comprimentos x e x – a.
O livro faz a introdução da seguinte forma:
T15: Definição da derivada como limite da razão incremental.
FIGURA 28 – SARRICO: INTRODUÇÃO DO CONCEITO DE DERIVADA
3.1 Derivada de uma função num ponto. Funções diferenciáveis
Deve-se a Cauchy a formulação clássica da noção de derivada por volta de 1823 nos seguintes termos:
Seja I um intervalo de IR com mais de um ponto. Diz-se que f: I IR é diferenciável ou tem derivada no ponto a
I quando existir e for finito o limite
ax
f(a)f(x)lim
ax
À função ax
f(a)f(x)
definida em I\{a} chama-se razão incremental de f no ponto a e ao valor do limite chama-se
derivada de f em a e representa-se por f’(a), Df(a) ou (a)dx
df. Assim,
f’(a) = ax
f(a)f(x)
axlim
ou fazendo a mudança de variável x = a + h
f’(a) = h
f(a)h)f(alim
0h
[…]
É claro que uma função diferenciável num ponto interior a I tem derivadas direita e esquerda nesse ponto e
estas são iguais. […].
Interpretação geométrica
173
Consideremos sobre o gráfico de f o ponto P = (a, f(a)), o
ponto genérico Q = (x, f(x)) e a reta PQ secante ao gráfico de
f. O declive desta secante é a razão incremental
ax
f(a)f(x)
e, portanto, f’(a+) =ax
f(a)f(x)lim
ax
não é mais do que o número para que tende o declive da secante PQ, quando o
ponto Q se aproxima do ponto P. Assim, f’(a+) é o declive da semirreta tangente Pt ao gráfico de f do lado direito
do ponto a. É claro se a função for diferenciável em a, tudo se passa analogamente para o lado esquerdo e a
derivada em a, isto é, o número f’(a) é o declive da tangente geométrica ao gráfico de f no ponto (a, f(a)). Assim,
afirmar que uma função f é diferenciável em a, significa geometricamente que o gráfico de f tem tangente no
ponto (a, f(a)) e o valor da derivada é o declive desta tangente. FONTE: Sarrico (2005, pp. 112-14).
Depois dessa interpretação geométrica, o livro analisa a interpretação física da derivada,
discutindo o problema da velocidade instantânea como limite da razão incremental entre as
variações dos espaços percorridos s(t) – s(t0) e as variações dos lapsos t – t0 dos tempos passados
em percorrê-los. Finalizada essa discussão, o livro apresenta um outro ferramental tecnológico
para a derivada, o que ele chama de “derivada de Carathéodory.”
T15: Definição da derivada de Carathéodory.
FIGURA 29 – DERIVADA DE CARATHÉODORY
Como na definição clássica, seja I um intervalo de IR com mais de um ponto. Diz-se que f : I IR é
diferenciável ou tem derivada no ponto a I, quando existir uma função : I IR contínua no ponto a tal que
f(x) – f(a) = (x)(x – a) 3.1.5
para qualquer x I.
É claro que se f é diferenciável neste sentido, a função (x) = ax
f(a)f(x)
definida para x a verifica
(x)ax
lim
= (a)
por ser contínua em a e, assim,
f’(a) = (a)
existe. Mais ainda, a derivada de f em a é o número (a), na formulação de Carathéodory.
Reciprocamente, se f tem derivada em a no sentido clássico, a função (x) = ax
f(a)f(x)
, sempre definida para x
a, tem limite em a e é prolongável por continuidade a este ponto verificando-se trivialmente a equação 3.1.5
Uma consequência imediata desta formulação é que, se f é diferenciável no ponto a então f é contínua em a. A
recíproca não é válida. […]
Se f : I IR for definida num conjunto X que não é necessariamente um intervalo, o carácter local da noção de
derivada permite definir f’(a) desde que existe > 0 tal que ]a - , a + [ x seja um intervalo com mais de um
ponto. Com efeito, pondo I = ]a - , a + [ X, f’(a) será por definição a derivada da restrição de f a I no ponto
a, caso exista. FONTE: Sarrico (2005, pp. 112-14).
174
Na verdade, essa definição, embora ligeiramente diferente da definição de Cauchy, é
equivalente à definição clássica apresentada acima que aparece em muitos livros de Cálculo. Para
o autor, este conceito simplifica consideravelmente certas demonstrações dos teoremas clássicos
do cálculo diferencial.
Uma aplicação da formulação de Carathéodory é mostrada na seguinte tarefa.
t15: Seja f : IR IR definida por f(x) = xn onde n IN. Determinar a derivada de f no
ponto x = a.
Para essa tarefa, são consideradas as seguintes técnicas, sendo as duas primeiras
conhecimentos retrospectivos disponíveis:
15: interpretar a questão colocada para a necessidade da construção do binômio xn – a
n.
25: factoração do binômio:
xn – a
n = (x
n-1 + ax
n-2 + a
2x
n-3 + … + a
n-2x + a
n-1)(x – a)
35: aplicação da definição de Carathéodory à função f: uma vez que o polinômio (x) =
xn-1
+ axn-2
+ a2x
n-3 + … + a
n-2x + a
n-1 é uma função contínua em a, então f é diferenciável em a.
Assim, a derivada de f em a é
f’(a) = a) = an-1
+ an-1
+ an-1
+ … an-1
+ an-1
= nan-1
Obtemos o mesmo resultado quando aplicamos a definição clássica da derivada como
limite da razão incremental:
t15: determinar a derivada de f(x) = xn como limite da razão incremental:
Assim, a técnica a ser utilizada corresponde a:
45: aplicação do limite da razão incremental:
f’(a) =ax
axlim
ax
f(a)f(x)lim
nn
axax
=
= a)(x
a))(xaxa...xaax(xlim
1n2n3n22n1n
ax
=
= ax
lim
xn-1
+ axn-2
+ a2x
n-3 + … + a
n-2x + a
n-1 = na
n-1.
É interessante observar que a definição de Carathéodory já dispensa a formulação do
teorema sobre a continuidade de uma função f em um ponto P, se ela é diferenciável nesse ponto,
pois uma das condições da formulação é o fato de a função ser contínua em P. Na verdade, a
evocação do teorema de continuidade parece ser supérflua no conhecimento da derivada, pois é
175
um teorema já implicado na definição deste conceito. Para se poder definir a derivada de uma
função f como limite da razão incremental em a, é necessário que f seja contínua em a, pois se
não for o caso, tal limite não existe como número determinado.
Após estas observações, passamos para a análise do livro 6, de Hoffmann & Bradley
(1999). A estrutura deste livro é parecida com a do livro 3, de Stewart (2011), já analisado acima,
não obstante este último seja mais rico em exemplos, situações e com uma visão estratégica
muito mais exploratória e abrangente na exposição do conteúdo. A esse respeito, como
registramos anteriormente, o livro 3 discute a derivada de uma função f dentro de um capítulo
denominado limites e derivadas. E tal capítulo começa exatamente com os principais problemas
que conduzem à definição da derivada: problemas da tangente e problemas da velocidade.
Consideramos ainda que o livro de Stewart (2011) propõe um desenvolvimento do conceito de
derivada de uma função que pode ser considerado exaustivo.
O livro de Hoffmann & Bradley (1999) é um pouco mais prescritivo e com algumas
receitas incluídas sobre alguns temas, embora sugerindo muitos problemas práticos verbais que
requerem interpretação e equacionamento. Há que se referir ainda que esse livro não usa os
termos “definição”, “teoremas”, algo que nos parece peculiar para um livro de Cálculo que
precisa identificar os resultados importantes obtidos. Assim, apresentamos alguns aspectos de
como o livro caracteriza e determina a derivada de uma função f em um ponto.
T16: Taxa de variação média.
FIGURA 30 – HOFFMANN & BRADLEY: INTRODUÇÃO AO CONCEITO DE VARIAÇÕES
A inclinação de uma tangente
A meta é resolver o seguinte problema geral: dado um ponto (x, f(x)) no gráfico de uma função f, encontre a
inclinação da reta que é tangente ao gráfico neste ponto. […].
A estratégia é aproximar a tangente por outras retas cujas
inclinações possam ser calculadas diretamente. Em
particular, considere as retas unindo o dado ponto (x, f(x))
a pontos vizinhos no gráfico de f. Essas retas mostradas na
figura 2.4b são chamadas secantes, e são boas
aproximações da tangente, desde que o ponto vizinho
esteja próximo do ponto dado. […]
Para calcular a inclinação de uma secante, primeiro denote
as coordenadas do ponto vizinho como indicado na Fig.
2.5. Em particular faça x simbolizar a variação na
coordenada x entre o ponto dado (x, f(x)) e o ponto
vizinho.
176
Fig. 2.4 (b)
Fig. 2.5
A coordenada x do ponto vizinho é x + x, e, como o ponto se situa no gráfico de f, sua coordenada y é f(x + x).
Como a variação da coordenada y é y = f(x + x) – f(x), segue-se que
Inclinação da secante = Δx
Δy =
x-Δxx
f(x)-Δx)f(x
=
Δx
f(x)-Δx)f(x.
Lembre-se de que este quociente não é a inclinação da tangente, mas somente uma aproximação dela. Se x é
pequeno, contudo, o ponto vizinho (x +x, f(x + x)) está próximo ao ponto dado (x, f(x)), e a aproximação é boa.
De fato, a inclinação da tangente real é o valor a que este quociente tende quando x se aproxima de zero. FONTE: Hoffmann & Bradley (1999, pp 69-71).
Após essa descrição, o livro passa para uma análise com recurso ao limite. Como vemos,
o livro apresenta muitos detalhes por meio da língua natural, recorrendo ao mesmo tempo ao
ostensivo gráfico. Didaticamente, isso pode ser bom, tentando transmitir o sentido e o significado
do objeto que se pretende construir.
Para mostrar como a fórmula recém-apresentada funciona, o livro propõe algumas
tarefas resolvidas como a apresentada na sequência:
t16: Encontre a inclinação da reta que é tangente ao gráfico da função f(x) = x2, no
ponto (2, 4).
Para essa tarefa, é proposta a seguinte técnica:
16: formar a razão incremental, depois de considerar um ponto vizinho:
FIGURA 31 – RAZÃO INCREMENTAL POR HOFFMANN & BRADLEY
Fig. 2.6
O esboço de f mostrando o ponto dado (2, 4) e uma secante relacionada está
mostrada na Fig. 2.6. Como a coordenada x do ponto dado é 2, segue que a
coordenada x do ponto vizinho é 2 + x e que a coordenada y deste ponto é (2 +
x)2. Assim,
Inclinação da secante = Δx
4Δx)(22
quando x se aproxima de zero. Antes de
fazer isso, você deve reescrever o quociente numa forma mais simples (percebe o
que aconteceria se fizéssemos x tornar zero no numerador e no denominador do
jeito que está?).
Para simplificar o quociente expanda o termo (2 + x)2, reescreva o numerador e então divida o numerador e o
denominador por x, como se segue:
Inclinação da secante = Δx
4Δx)(22
177
= Δx
4Δxx442 Δ
= Δx
Δxx42
Δ
= Δx
Δx)Δx(4
= 4 + x
Agora você pode fazer x se aproximar de zero. Como a inclinação 4 + x da secante se aproxima de 4 quando
x se aproxima de zero, segue-se que no ponto (2, 4) a inclinação da tangente deve ser 4.
FONTE: Hoffmann & Bradley (1999, pp 71-72).
Após esta discussão por meio do ponto de vista geométrico, mesmo se os autores não
utilizam essa nomenclatura, é considerada a definição formal da derivada de uma função por
meio do ponto de vista taxa de variação. É interessante observar no exemplo da definição teórica
que segue a forma como os autores articulam o discurso tecnológico desenvolvido anteriormente
com a definição teórica que justifica esse discurso. Um ponto negativo dessa apresentação é o
fato de o passo 2 aplicar-se apenas para funções polinomiais.
T16: discurso tecnológico para a construção do conceito de derivada.
FIGURA 32 – DEFINIÇÃO DA DERIVADA: HOFFMANN & BRADLEY
A derivada
No exemplo 1.3, você começou com uma função f e deduziu uma função relacionada que expressa a inclinação de
sua tangente em termos da coordenada x do ponto de tangência. Esta função deduzida é conhecida como a
derivada de f, e é frequentemente denominada pelo símbolo f’, o que é lido “f linha”. No exemplo 1.3, você
descobriu que a derivada de x2 é 2x; isto é, você descobriu que, se f(x) = x2, então f’(x) = 2x.
Interpretação geométrica da Derivada
A derivada f’(x) expressa a inclinação da tangente à curva y = f(x) em função da coordenada x do
ponto de tangência.
Como calcular a derivada de f(x)
Passo 1. Forme o quociente da diferença seguinte (inclinação de uma secante).
Δx
f(x)-Δx)f(x
Passo 2: Simplifique o quociente da diferença algebricamente.
Passo 3: Faça x se aproximar de zero no quociente da diferença simplificado.
O fato que o quociente da diferença Δx
f(x)-Δx)f(xse aproxima da derivada f’(x) à medida que x se aproxima
de zero pode ser expresso na notação de limite (veja capítulo 1, seção 5) como
f‘(x) = Δx
f(x)-Δx)f(xlim
0Δx
FONTE: Hoffmann & Bradley (1999, pp 72-73).
178
Assim, os autores concluem a introdução formal do conceito de derivada de uma função
f. Notemos que a introdução se faz sobre o conceito de função derivada interpretada como a
inclinação da reta tangente ao gráfico de f em um ponto de seu domínio de abscissa x, qualquer,
ficando como particular o caso da derivada em um ponto específico dado.
Em seguida, depois da discussão sobre as técnicas de derivação, são introduzidas as
interpretações da derivada como taxa de variação e são destacadas as situações de velocidade,
taxa de variação percentual, dada pela fórmula: taxa de variação percentual =
y
dy/dx100
f(x)
(x)f'100 , acompanhadas com exercícios de aplicação.
Este livro chamou-nos uma atenção particular nos seus detalhes, quando emprega a
linguagem natural de “pontos vizinhos”. Na verdade, no contexto funcional, a construção do
conceito de reta tangente à uma curva dada num determinado ponto tem sentido, quando
consideramos um ponto vizinho que se aproxima a um ponto fixo até que os dois pontos sejam
coincidentes. Assim, temos uma reta tangente.
6.1 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A PARTE 1 DA ANÁLISE DOS LIVROS
DIDÁTICOS USADOS NAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR
O estudo dos livros escolhidos nesta parte revela os pontos de vista privilegiados sobre a
derivada de uma função real a valores reais, com o destaque para os seguintes:
1 – A derivada como limite da razão incremental, tanto para a derivação numérica (em
que a derivada resulta num número), quanto para a derivação funcional (em que a derivada é uma
função) é proeminente. Quer dizer, o não ostensivo “limite da razão incremental”, materializado
no ostensivo h
f(x)h)f(xlim
0h
assume, no estudo da derivada, o carácter autotecnológico, no
sentido de que esta maneira de proceder é uma boa e inquestionável maneira de definir
institucionalmente este conceito.
2 – O não ostensivo “reta tangente”, que se traduz no ostensivo gráfico tanto da função
em estudo quanto da reta tangente, igualmente assume o caráter autotecnológico, mas neste caso,
adquirindo principalmente a função instrumental. Em primeiro lugar, para justificar
racionalmente a técnica do limite da razão incremental, para mostrar que o limite da razão
179
incremental permite calcular a derivada de uma função f em um ponto x de seu domínio. Em
segundo lugar, o conceito de reta tangente é usado para explicar a técnica, justificando-a,
expondo que ela é correta, ou seja esse conceito corresponde à tecnologia da técnica.
3 – O não ostensivo “velocidade” igualmente aparece como objeto de referência para a
construção do conceito de derivada. Este conceito, em combinação com os outros dois conceitos
anteriores, conduz, em termos de aplicações, ao conceito geral de derivada como taxa de variação
instantânea de grandezas. Aqui encontramos um leque bem grande de situações e fenômenos
modeláveis pelo conceito de derivada como taxa de variação, sempre materializada pelo
ostensivo h
f(x)h)f(xlim
0h
.
4 – O não ostensivo “linearização local”, ou melhor, “retilinearização local” aparece
também como objeto de referência para a construção do conceito de derivada, mas neste caso,
como uma ideia de reforço para justificar e dar siginificado ao conceito de reta tangente usado. A
base dessa ideia é de que fazendo um zoom suficientemente grande na região de tangência então
vê-se que o gráfico da função nessa região se parece, em termos de retilinearidade, com a reta
tangente. Donde se conclui que o estado de inclinação da tangente é aproximadamente igual ao
estado de inclinação da função e, por consequência, igual à taxa de variação de f no tal ponto.
Essa ideia só aparece no livro de Stewart, de todos os livros analisados, o que mostra a
versatilidade deste manual. Importa salientar que a efetivação de um zoom para estudar o caráter
gráfico local de uma função só é possível com o advento das tecnologias digitais. Quer dizer, esta
é uma das vantagens que os artefatos tecnológicos nos proporcionam no ensino, fazer algo que
em condições normais não somos capazes de fazer ou de fazer melhor.
No que diz respeito aos elementos teóricos requeridos para justificar a tecnologia do
limite da razão incremental, referimos que, tal como Ávila (2005, p. 174) faz saber, a base se
encontra na teoria de números reais, sobretudo a propriedade do supremo ou a propriedade dos
intervalos encaixados, que são alguns dos elementos teóricos que definem os números reais.
Sendo a derivada numérica um número real, ela se rege pelas propriedades dos números reais.
Não obstante este arcabouço teórico mais amplo que justifica nosso objeto de estudo, podemos
mencionar alguns resultados teóricos específicos que o justificam.
T1j – teoria relativa à tecnologia T1j: derivada como limite da razão incremental.
180
Na teoria de limites de funções, temos os seguintes elementos que justificam a derivada:
1) Definição lógico-formal do limite de funções, formulada nos seguintes termos:
Dada uma função f com domínio D, seja a um ponto de acumulação de D (que pode ou
não pertencer a D). Diz-se que um número L é o limite de f(x) com x tendendo a a se, dado
qualquer > 0, existe > 0 tal que
x D, 0 < |x – a| < |f(x) – L| <
que se indica por
Llimax
Esta definição aparece nos seguintes livros: Ávila (2005, p. 142), Stewart (2011, p. 98) e
Sarrico (2006, p. 95).
O livro de Hoffmann & Bradley (1999) não considera esta definição, limitando-se
apenas a fazer uma consideração de natureza intuitiva sobre o limite, o que consideramos como
sendo uma falta de conteúdo importante e necessário para a justificação e explicação de alguns
objetos matemáticos, entre os quais o limite de funções, e, por extensão, a derivada.
Tanto o livro de Hoffmann & Bradley (1999) como o de Stewart (2011) apresentam
formas intuitivas para a introdução do conceito de limite e derivada de uma função, o que pode
servir de elemento para este estudo, tanto para os estudantes de Moçambique do Ensino Médio,
quanto para os primeiros anos do Ensino Superior dos estudantes brasileiros, quando são
introduzidos os conceitos básicos de Cálculo, como também para estudantes de outros cursos, nos
quais o conceito de derivada é chamado a funcionar como ferramenta explícita para o
desenvolvimento de aplicações relacionadas a outros conceitos. Para melhor compreender a
afirmação acima, consideramos exemplos sobre as noções intuitivas de limite, de derivada e de
derivada do produto de duas funções, como é possível observar nas figuras que seguem.
Stewart analisa o limite da função f(x) = x2 – x + 2, no ponto x = 2, fazendo uso à
intuição numérica:
181
FIGURA 33 – STEWART: INTUIÇÃO NUMÉRICA PARA LIMITE DA FUNÇÃO
X f(x) X f(x)
1,0 2,000000 3,0 8,000000
1,5 2,750000 2,5 5,750000
1,8 3,440000 2,2 4,640000
1,9 3,710000 2,1 4,310000
1,95 3,852500 2,05 4,152500
1,99 3,970100 2,01 4,030100
1,995 3,985025 2,005 4,015025
1,999 3,997001 2,001 4,003001
FONTE: Stewart (2011, p. 78).
Destas observações intuitivas, o autor conclui que: 2)x(xlim 2
2x
= 4
O mesmo procedimento numérico intuitivo é usado pelos autores Hoffmann & Bradley
para estudar o limite da função f(x) = 1x
2xx 2
, no ponto x = 1.
TABELA 1 – HOFFMANN & BRADLEY: INTUIÇÃO NUMÉRICA PARA LIMITE DA FUNÇÃO
FONTE: Hoffmann & Bradley (1999, p. 46).
Destas observações numéricas, os autores concluem que: f(x)lim1x
= 3.
Stewart estende o procedimento intuitivo para estudar a derivada de algumas funções em
um ponto e a regra de derivação do produto, como se vê nos exemplos a seguir:
Exemplo 1: estudo da derivada da função exponencial f(x) = ax, no ponto x = 0, tomando
2 e 3 para os valores de a:
FIGURA 34 – STEWART: INTUIÇÃO NUMÉRICA PARA LIMITE DA RAZÃO INCREMETAL
h 2h
- 1
h
3h - 1
h
0,1 0,7177 1,1612
0,01 0,6956 1,1047
0,001 0,6934 1,0992
0,0001 0,6932 1,0987
FONTE: Stewart (2011, p. 164).
A partir dessas observações numéricas, o autor estima os valores da derivada,
respectivamente, de f(x) = 2x e f(x) = 3
x, no ponto x0 = 0, obtendo:
para a = 2, f’(0) = h
12lim
h
0h
0,69
182
para a = 3 f’(0) = h
13lim
h
0h
1,10
Exemplo 2: Para a regra da derivada do produto, Stewart apresenta um modelo
geométrico intuitivo, que ele chama de “Geometria da Regra do Produto”, como se vê a seguir.
Antes de entrar nos detalhes da regra, o autor destaca o erro que pode ocorrer da analogia dessa
regra com as regras da soma e da diferença:
REGRA DO PRODUTO
Por analogia das Regras da Soma e da Diferença, alguém poderia tentar conjecturar,
como Leibniz o fez três séculos atrás, que a derivada de um produto é o produto da
derivada. Contudo, podemos ver que esta conjectura está errada examinando um
exemplo particular. Seja f(x) = x e g(x) = x2. Então a Regra da Potência fornece f’(x) = 1
e g’(x) = 2x. Mas (fg)(x) = x3, assim (fg)’(x) = 3x2. Dessa forma, (fg)’ f’g’. A fórmula
correta foi descoberta por Leibniz (logo depois de tentar a fórmula falsa) e é chamada
Regra do Produto. Antes de enunciar a Regra do Produto, vamos ver como poderíamos
descobri-la (STEWART, 2011, p. 168).
Na sequência dessa observação, o autor apresenta a regra do produto:
FIGURA 35 – GEOMETRIA DA REGRA DO PRODUTO
v uv uv
v Uv vu
U u
Figura 1
Geometria da Regra do Produto
No caso onde u = f(x) e v = g(x) são positivas, podemos interpretar o
produto uv como uma área de um retângulo (veja a Figura 1). Se x
variar uma quantidade x, temos que as variações correspondentes
em u e v são
u = f(x + x) – f(x) v = g(x +x) – g(x)
e um novo valor do produto, (u + u)(v + v), pode ser interpretado
como a área do retângulo maior da Figura 1 (desde que u e v sejam
positivos).
A variação da área do retângulo é
1 (uv) = (u + u)(v + v) – uv =
= uv + vu + uv
= soma das três áreas sombreadas
Se dividirmos por x, obtemos
Δx
Δvu
Δx
Δ(uv) +
Δx
Δuv +
Δx
ΔvΔu
Se fizermos x 0, obtemos a derivada de uv:
(uv)dx
d
Δx
Δ(uv)
0Δxlim
Δx
ΔvΔu
Δx
Δuv
Δx
Δvu
0Δxlim
= Δx
Δvlimu
0Δx+
Δx
Δuim
0Δxlv
+
Δx
ΔvimΔulim
0Δx0Δxl =
dx
dv0u
dx
dvv
dx
du
2 (uv)dx
d= u
dx
dvv
dx
du
[...] Assim demonstramos a equação 2, conhecida como a Regra do Produto, para todas funções diferenciáveis de u
e v.
FONTE: Stewart (2011, p. 168-169).
183
Após trabalhar de forma intuitiva e considerar os diferentes pontos de vista quando se
introduz o conceito de derivada, nos parece que os estudantes estão preparados para a justificativa
da derivabilidade de uma função f em um ponto a por meio do ponto de vista lógico formal:
Seja I um intervalo de IR com mais de um ponto. Diz-se que f : I IR é diferenciável ou
tem derivada f’(a) no ponto a I, se para qualquer > 0, existe um > 0, tal que
|x – a| < ε (a)'fax
f(a)f(x)
Com este resultado, podemos justificar que a derivada de f no ponto a existe e é única,
bastando para isso articular com a justificativa da definição lógica formal de limite de uma
função.
2) A definição intuitiva do limite de uma função em um ponto, que se formula da seguinte
forma:
Seja I um intervalo de IR com mais de um ponto. E seja f: I IR. Dizemos que o limite
de f(x), quando x tende a a, é igual a L, e escrevemos
Lf(x)limax
se podermos tornar os valores de f(x) arbitrariamente próximos de L (tão próximos de L
quanto quisermos), tomando x suficientemente próximo de a (por ambos lados de a), mas não
igual a a.
Um instrumental teórico complementar a este é a formulação, segundo a qual, f tem
limite no ponto a se os seus limites laterais existem (são números reais) e são iguais. Como vimos
no estudo dos livros escolhidos, esta formulação é evocada no caso da derivada como critério de
verificação da sua existência: “É fácil ver que uma função f é derivável em x0, no sentido
ordinário, se e somente se suas derivadas laterais nesse ponto existem e são iguais”, Ávila
(2006, p. 175).
3) A definição da continuidade de uma função f em um ponto a de seu domínio. Este
resultado teórico constitui a condição necessária para se falar da existência da derivada de uma
função f em um ponto a, embora não seja suficiente.
4) A teoria de funções igualmente faz parte do instrumental teórico que justifica a razão
incremental, em especial as chamadas funções de classe Cn, com n = 1, 2, 3, …, que são funções
contínuas e com derivadas contínuas até à ordem n, inclusive.
184
Pensamos que até este ponto da nossa análise sobre o conceito de derivada apresentado
nos livros escolhidos, tenham ficado ideias importantes em termos de ecologia das tarefas e
técnicas, isto é, as condições e restrições que possibilitam sua produção e utilização nas
instituições. Aqui observamos mais uma vez que os quatro livros analisados são adequados a
diferentes abordagens, que dependem das necessidades dos estudantes em função das maneiras
como eles devem utilizar os conhecimentos adquiridos sobre derivada.
Esses conhecimentos podem viver em lugares diferentes (habitat), por exemplo, nos
cursos de Matemática e de Informática, tendo assim funções diferenciadas nesses habitats. Os
objetos que os compõem devem proporcionar um millieu, para o qual a relação institucional seja
estável e não problemática.
Assim, para os estudantes dos cursos de Matemática e Licenciatura em Matemática, nos
parece fundamental que possam trabalhar de forma integrada, considerando tanto os
conhecimentos teóricos desenvolvidos em Sarrico (2005) e Ávila (2005), como os conhecimentos
mais técnicos associados a possíveis aplicações, como os desenvolvidos em Stewart (2011) e
Hoffmann & Bradley (1999). Já para os estudantes dos cursos de Informática, os livros de
Stewart (2011) e Hoffmann & Bradley (1999) parecem mais adaptados, pois correspondem a uma
economia de saberes e possibilidades de uma utilização mais associada à prática.
É importante observar aqui que esses livros didáticos constituem algumas das obras
estudadas em determinadas instituições brasileiras e moçambicanas, o que mostra a existência de
uma diversidade de relações institucionais, que terminam sendo ainda maiores, pois não
analisamos todos os livros que são indicados nos planos de ensino das instuituições.
Consideramos apenas aqueles que são atualmente os mais utilizados.
Prosseguimos nossa análise apresentando agora os resultados encontrados na parte 2:
Integral de Riemann.
Parte 2: Tema 2: Integral de Riemann para funções reais a valores reais
Tipos de Tarefa 2 (T2) : Caracterizar e determinar a Integral de Riemann para funções reais a
valores reais
Análise do livro de Stewart (2011).
185
Stewart inicia a discussão da integral definida, analisando dois problemas: o problema
da área e o problema da distância.
No problema da área, são dados vários exemplos, fixando depois no de área sob o
gráfico de uma função f, contínua, definida no intervalo I fechado de extremos a e b: I = [a, b]
IR. O intervalo é seccionado sucessivamente em 2n partições regulares P0< i<n = {x0, x1, x2, …,
xn}, com i = 0, 1, 2, 3, …, n tal que a = x0 < x1 < x2 < … < xn = b, que por sua vez dá origem a
uma série de retângulos inscritos e circunscritos na região sob o gráfico em análise, com
extremos a e b. Na sequência, apresentamos um extrato que permite observar como o livro faz
esse estudo para o caso da função f(x) = x2, com I = [0, 1].
T23: discurso tecnológico utilizado por Stewart (2011) para introduzir integral definida.
FIGURA 36 – STEWART: ÁREA DE UMA REGIÃO SOB A CURVA QUADRÁTICA
Figura 6 mostra o que acontece quando dividimos a região S em oito faixas com a mesma largura.
Figura 6: Aproximando S por 8 retângulos
Calculando a soma das áreas dos retângulos menores (L8) e a soma das áreas dos retângulos maiores (R8),
obtemos estimativas inferior e superior melhores para A:
0,2734375 < A < 0,3984375
Assim, uma resposta possível para a questão é dizer que a verdadeira área de S está em algum lugar entre
0,2734375 e 0,3984375.
N Ln Rn
10 0,2850000 0,3850000
20 0,3087500 0,3587500
30 0,3168519 0,3501852
50 0,3234000 0,3434000
100 0,3283500 0,3383500
1000 0,3328335 0,3338335
Podemos obter melhores estimativas aumentando o
número de faixas. A tabela na lateral mostra os
resultados de cálculos similares (com um computador)
usando n retângulos cujas alturas são encontradas com
as extremidades esquerda (Ln) ou com as extremidades
direitas (Rn). Em particular, vemos que usando 50
faixas, a área está entre 0,3234 e 0,3434.
Com 1.000 faixas, conseguimos estreitar a desigualdade ainda mais: A está entre 0,3328335 e 0,3330335.
Uma boa estimativa é obtida fazendo-se a média aritmética desses números: A 0,3333335.
Dos valores na tabela parece que Rn aproxima-se de 1
3 à medida que aumentamos n. Vamos confirmar isso no
próximo exemplo. FONTE: Stewart (2011, pp 336-337).
O autor sugere resolver a seguinte tarefa, usada como exemplo:
186
t23: Para a região S do exemplo 1, mostre que a soma das áreas dos retângulos
aproximantes superiores tende a 1
3 , isto é,
3
1Rlim n
n
A técnica (23) relativa a esta tarefa compreende algumas outras técnicas, que
correspondem a conhecimentos disponíveis, pois são necessárias algumas fases de interpretação:
Primeiro: interpretar que cada retângulo tem uma largura 1
n , e as alturas são os valores
da função f(x) = x2 nos pontos
1
n ,
2
n ,
3
n , …,
n
n , isto é, as alturas são
2
n
1
,
2
n
2
,
2
n
3
, …,
2
n
n
.
Uma visualização, como a que apresentamos a seguir, pode ser usada:
FIGURA 37 – STEWART: ÁREA (II) DE UMA REGIÃO SOB A CURVA QUADRÁTICA
FONTE: Stewart (2011, p. 337).
Segundo: Após a interpretação, podemos somar as áreas, envolvendo algumas técnicas
de factoração
Rn =
222
n
3
n
1
n
2
n
1
n
1
n
1
+ … +
2
n
n
n
1
= )n...32(1
n
1
n
1 2222
2 =
= )n...32(1n
1 2222
3
Terceiro: usar a fórmula para a soma dos quadrados dos n primeiros inteiros positivos:
6
1)1)(2nn(nn...321 2222
187
Quarto: Substituir a fórmula da soma dos quadrados dos n primeiros inteiros na
expressão para Rn:
Rn = 23 6n
1)1)(2n(n
6
1)1)(2nn(n
n
1
Quinto: Passar a expressão de área ao limite, aplicando as técnicas de limites de
sequências:
n
12n
n
1n
6
1lim
6n
1)1)(2n(nlimRlim
n2nn
n =
3
121
6
1
n
12
n
11
6
1limn
Assim, mostramos que a área exata da região sob o gráfico de f(x) = x2 no intervalo [0,
1], por retângulos aproximantes superiores é 3
1. Do mesmo modo, mostra-se o valor
1
3 por
retângulos aproximantes inferiores, bastando para isso usar os valores da função f(x) = x2 nos
pontos (i – 1) de cada intervalo [xi-1, xi] para as alturas dos retângulos, com i = 1, 2, 3, .., n. Essa
estratégia resulta nos números
2
n
0
2
n
1
,
2
n
2
,
2
n
3
, …,
2
n
1-n
que levam ao resultado
Rn = 23 6n
1)1)(2n(n
6
1)1)(2nn(n
n
1
=
n
12
n
11
6
1
Que aplicando o limite se obtém:
n
12
n
11
6
1limRlimn
nn
= 3
121
6
1
No livro, é definida a área sob o gráfico de uma função f, contínua, em um intervalo I,
como o limite da soma das áreas dos retângulos aproximantes.
Num outro desenvolvimento, o autor considera os pontos médios dos retângulos
aproximantes e determina a área da região abaixo da curva. Terminada a discussão sobre este
último caso, o autor passa à demonstração por meio de um problema da distância.
T23: discurso tecnológico utilizado por Stewart (2011) para introduzir integral definida,
usando o problema de distância.
188
FIGURA 38 – O PROBLEMA DA DISTÂNCIA E A INTEGRAL DEFINIDA
O PROBLEMA DA DISTÂNCIA
Vamos considerar agora o problema da distância: achar a distância percorrida por um objeto durante um certo
período de tempo sendo conhecida a velocidade do objeto em todos os instantes. (Em um certo sentido, é o
problema inverso do problema da velocidade discutido na Seção 2.1.) Se a velocidade permanece constante, então
o problema da distância é de fácil solução através da fórmula
distância = velocidade tempo
Mas se a velocidade variar, não é tão fácil determinar a distância percorrida. Vamos investigar o problema no
exemplo a seguir.
Exemplo 4 Suponha que queiramos estimar a distância percorrida por um carro durante um intervalo de tempo de
30 segundos. A cada 5 segundos, registramos a leitura do velocímetro na tabela seguinte;
Tempo (segundos) 0 5 10 15 20 25 30
Velocidade (km/h) 27 34 38 46 51 50 45
Para ter o tempo e a velocidade em unidades consistentes, vamos converter a velocidade para metros por segundo
(1 km/h = 1000/3 600 m/s):
Tempo (segundos) 0 5 10 15 20 25 30
Velocidade (m/s) 7,5 9,4 10,6 12,8 14,2 13,9 12,5
FONTE: Stewart (2011, p. 342).
Nas análises subsequentes do problema, o autor considera que em cada intervalo de
tempo de 5 segundos, a velocidade não varia muito e usa essa informação para estimar a distância
percorrida até ao 30º minuto:
Primiero: usar a velocidade inicial para cada trecho feito:
(7,5 5) + (9,4 5) + (10,6 5) + (12,8 5) + (14,2 5) + (13,9 5) = 342 m.
Segundo: usar a velocidade no fim de cada intervalo de tempo em vez de no começo
como a velocidade constante, se obtém:
(9,4 5) + (10,6 5) + (12,8 5) + (14,2 5) + (13,9 5) + (12,5 5) = 367 m.
O autor destaca que estimativas mais precisas podem ser feitas, tomando as leituras de
velocidade em intervalos de tempo cada vez mais curtos e, socorrendo-se da representação
gráfica do movimento, explora a similaridade desta situação com a situação anterior de área:
T23: discurso tecnológico utilizado por Stewart (2011) para introduzir integral definida,
articulando o problema da distância com o conceito de área sob o gráfico da função velocidade.
189
FIGURA 39 – DISTÂNCIA PERCORRIDA COMO LIMITE DA SOMA DE ÁREAS
Talvez os cálculos no exemplo 4 o façam lembrar das somas usadas
anteriormente para estimar as áreas. A similaridade tem explicação quando
esboçamos um gráfico da função velocidade do carro na Figura 16 e façamos
os retângulos cujas alturas são as velocidades iniciais para cada intervalo de
tempo. A área do primeiro retângulo é 7,5 5 = 37,5, que é também a nossa
estimativa para a distância percorrida nos primeiros cinco segundos. De fato,
a área de cada retângulo pode ser interpretada como uma distância, pois a
altura representa a velocidade,
a largura é o tempo. A soma das áreas dos retângulos na Figura 16 é L6 = 342, que é a nossa estimativa inicial
para a distância total percorrida.
Em geral, suponha que o objeto se move com a velocidade v = f(t), em que a < t < b e f(t) > 0 (logo, o objeto
move-se sempre no sentido positivo). Vamos registrar as velocidades nos instantes t0 (= a), t1, t2, .., tn (=b), de
forma que a velocidade seja aproximadamente constante em cada subintervalo. Se esses tempos forem igualmente
espaçados, então entre duas leituras consecutivas temos o período de tempo t = b - a
n . Durante o primeiro
intervalo de tempo a velocidade é aproximadamente f(t0) e, portanto, a distância percorrida é de aproximadamente
f(t0)t. Analogamente, durante o segundo intervalo de tempo é de cerca de f(t1)t e a distância total percorrida
durante o intervalo de tempo [a, b] é de aproximadamente
f(t0)t + f(t1)t + … + f(tn-1)t =
n
1it)1if(t Δ
Se usarmos as velocidades nas extremidades direitas em vez de nas extremidades esquerdas, nossa estimativa
para a distância total ficará:
f(t1)t + f(t2)t + … + f(tn)t =
n
1it)if(t Δ
Quanto maior a frequência com que medimos a velocidade, mais precisa nossa estimativa; logo, parece plausível
que a distância exata d percorrida seja o limite de tal expressão:
d =
n
1ix)1if(t
nlim Δ =
n
1ix)if(t
nlim Δ
FONTE: Stewart (2011, p. 342).
O autor acrescenta que, como esta última equação tem a mesma forma que as expressões
anteriores para área, segue que a distância percorrida é igual à área sob o gráfico da função
velocidade. Além disso, segundo o autor, este mesmo limite ocorre em uma grande variedade de
situações, como no processo de encontrar comprimento de curvas, volumes de sólidos, centros de
massas, forças cuja causa é a pressão de água e trabalho, como também outras quantidades,
mesmo quando f não é necessariamente uma função positiva. Depois desta discussão, é
apresentada a definição da integral definida:
T23: discurso tecnológico: definição da integral definida segundo Stewart (2011).
190
FIGURA 40 – STEWART: DEFINIÇÃO FORMAL DA INTEGRAL DEFINIDA
A INTEGRAL DEFINIDA
[...]
2 DEFINIÇÃO DE INTEGRAL DEFINIDA Se f é uma função contínua
definida em a < x < b, dividimos o intervalo [a, b] em n subintervalos de
comprimento iguais x = b - a
n. Sejam x0 (=a), x1, x2, …, xn (= b) as extremidades
desses subintervalos, escolhemos os pontos amostrais
1x ,
2x , …,
nx nesses
subintervalos, de forma que
ix esteja no i-ésimo subintervalo [xi-1, xi ]. Então a
integral definida de f de a a b é
xΔ)n *
if(xlimf(x)dx1i
b
an
desde que este limite exista. Se ele existir, dizemos que f é integrável em [a, b].
O significado exato do limite que define a integral é o seguinte:
Para todo número > 0 existe um inteiro N tal que
b
a
n
i
xi
xfdxxf
1
Δ)()( < para todo inteiro n > N e
toda escolha de x
i em [xi-1, xi].
Obs 1 O símbolo foi introduzido por Leibniz e é denominado sinal de integral. Ele é um S alongado e foi
escolhido porque uma integral é um limite de somas. Na notação ba f(x)dx , f(x) é chamado integrando, a e b são
ditos limites de integração, a é o limite inferior, b o limite superior, e o símbolo dx indica simplesmente que a
variável independente é x; ba f(x)dx é todo um símbolo. O processo de calcular uma integral é conhecido como
integração.
Obs 2 A integral definida ba f(x)dx é um número, não depende de x. De fato, em vez de x podemos usar qualquer
outra letra sem mudar o valor da integral:
ba f(x)dx =
ba f(t)dt =
ba f(r)dr
Obs 3 A soma
n
1ix)
if(x Δ que ocorre na definição 2 é chamada soma de Riemann, em homenagem ao
matemático Bernhard Riemann (1826-1866). Assim, a definição 2 diz que a integral definida de uma função
integrável pode ser aproximada com qualquer grau de precisão desejado por uma soma de Riemann. FONTE: Stewart (2011, pp. 345-346).
Portanto, é esse discurso tecnológico-teórico que Stewart (2011) usa para introduzir a
Integral de Riemann. Consideramos a introdução muito significativa em termos de qualidade das
tarefas propostas e a maneira de fazer que reputamos clara e objetiva para a construção do
conceito visado. Os conceitos de área, em particular do retângulo, e de distância são conceitos
com os quais os estudantes já deviam ter alguma relação pessoal, algum conhecimento disponível
a partir do qual o conceito de Integral de Riemann como limite de uma soma deve ser construído.
A articulação que o livro faz entre os dois problemas: problema de área e de distância, esta
última terminando, por outro lado, no conceito anterior de área, quando se analisa a área abaixo
191
do gráfico de uma função de velocidade, abre-se espaço para uma reflexão muito mais profunda
sobre esse conceito de área.
Nesse sentido, é legítimo formular uma pergunta aqui: o que é essa área? Muitas
respostas são possíveis: área calculada como uma medida de superfície, pode significar uma
distância percorrida em um intervalo de tempo (quando calculamos a área por baixo de uma
função velocidade), um volume de um sólido (quando calculamos a área por baixo de uma função
de área), um trabalho realizado por uma força variável (quando calculamos a área por baixo de
uma função força), e para muitas outras situações como a saída de sangue do coração, a variação
da concentração do produto de uma reação química, a massa de uma barra, o crescimento
populacional durante um período de tempo, custo de produção etc. Enfim, uma grande variedade
de fenômenos sociais e da natureza pode ser modelada por um conceito único, denominado
Integral de Riemann, materializável pelo conceito de área abaixo da curva do gráfico da função
considerada. Portanto, é interessante a ligação que o autor faz entre as duas situações criadas,
pois permite extrapolar e refletir melhor sobre a natureza e o alcance do conceito em jogo. Além
disso, coloca-se em evidência que essa medida de área representa apenas um número pelo qual
determinamos o resultado do fenômeno que estamos estudando e não o conceito de área
propriamente dito.
Consideramos interessante quando o autor enaltece o valor do computador no tratamento
das situações de aprendizagem. Numa das fases da construção das estimativas da área abaixo da
curva representada pelo gráfico, foi usado um computador para determinar estimativas melhores,
apresentadas numa tabela. Esses resultados constituem um ponto de partida muito bom para
conjecturar sobre o que deve ser a coisa que estamos procurando. Às vezes torna-se difícil,
quando não impossível, produzir aproximações melhores na ausência de meios computacionais.
Após estas observações sobre as possibilidades que Stewart (2011) sugere para
introduzir o conceito de Integral de Riemann, passamos para o livro 4, de Ávila (2005).
Análise do livro de Ávila (2005)
O autor inicia, como no capítulo sobre a derivada, chamando a atenção sobre a
perspectiva de rigor do livro:
O objetivo do presente capítulo é mostrar como definir rigorosamente a integral como
limite de somas de Riemann, e demonstrar que toda função contínua é integrável
(Teorema 8.8 adiante). Esta é uma tarefa que dificilmente pode ser feita nos cursos de
Cálculo, por exigir o conceito mais delicado da continuidade uniforme e o teorema de
192
Heine (Teorema 8.7 adiante), enquanto que há muito que se fazer naqueles cursos para
desenvolver os métodos e técnicas do Cálculo Integral (ÁVILA 2005, p. 191).
Depois de indicar ao leitor a existência da necessidade de uma revisão de seus estudos
anteriores sobre integral, principalmente em seus aspectos práticos, o autor passa por uma
caracterização histórica da integral, destacando o desenvolvimento da simbologia, sobretudo nos
trabalhos de François Viéte, René Descartes, Pierre de Fermat, e outros métodos do passado que,
com motivação geométrica, conduziram ao surgimento do conceito. Após essa caracterização
histórica do tema, o autor introduz o conceito com o seguinte discurso tecnológico:
T24: discurso tecnológico: definição da integral definida segundo Ávila (2005).
FIGURA 41 – ÁVILA: INTEGRAL DEFINIDA COMO LIMITE DE SOMAS DE ÁREAS
O procedimento que usaremos aqui não é muito diferente. Consideremos o problema de definir a área da figura
delimitada pelo gráfico de uma função positiva f, pelo eixo dos x e por duas retas x = a e x = b. Começamos
considerando a soma das áreas de uma série de retângulos como os ilustrados na Fig. 8.1, obtidos da seguinte
maneira: dividimos o intervalo [a, b] em n subintervalos iguais, de comprimento x =n
ab . Sejam x0 = a
< x1 < x2 < … < xn = b os pontos dessa divisão, a qual é chamada partição do intervalo [a, b]. Em cada um dos
subintervalos da partição, escolhemos pontos quaisquer (usaremos a letra grega , que se lê “esi”): 1 no primeiro
desses subintervalos, 2 no segundo, 3 no terceiro, etc. Estes últimos pontos podem ser escolhidos
arbitrariamente, podendo mesmo ser um dos extremos do subintervalo, como ilustra a própria Fig. 8.1. Dessa
maneira, formamos n retângulos, todos com base x e alturas dadas por
f(1), f(2), f(3), …, f(n).
[…] A soma das áreas dos retângulos, representada pelo número Sn, dado por
Sn = f(1)x + f(2)x + … + f(n)x,
pode ser escrita, abreviadamente, com a notação do somatório:
Sn = Δxn
1i)if(ξ
Vamos imaginar uma sequência infinita dessas somas, correspondentes a diferentes partições.
S1, S2, S3, …, Sn, …
A própria Fig. 8.3 sugere que esses valores Sn se aproximam de um valor limite, à medida que n cresce acima de
193
qualquer número dado.
E a mesma figura sugere que esse valor limite é o que devemos tomar como sendo a área da figura delimitada
pelo gráfico de f, pelo eixo dos x e pelas retas x = a e x = b. O limite assim obtido é chamado de integral de f no
intervalo [a, b], a qual é indicada com o símbolo
b
a f(x)dx
Portanto, por definição,
x)n
if(ξimf(x)dx1i
b
a nl Δ
Observe que, para definir a integral, o limite que aí aparece deve existir independentemente da escolha dos pontos
1, 2, …, n nos subintervalos de divisão de [a, b]. FONTE: Ávila (2005, pp. 192-195).
O autor acrescenta que as somas Sn da definição dada são chamadas somas de Riemann,
e a integral, integral de Riemann, porque foi o matemático alemão Bernhard Riemann quem
primeiro construiu, em meados do século XIX, uma teoria adequada da integral, como aqui
definida.
Num dado momento, adiciona ainda que na definição dada, a função f pode assumir
valores positivos, negativos ou nulos, e nem é preciso que a partição seja regular, bastando
apenas que o maior dos comprimentos dos subintervalos tenda a zero. E, segundo o autor, esse
comprimento maior é a norma da particação P.
T24: discurso tecnológico: definição da integral definida por Ávila (2005), tomando os
pontos amostrais i arbitrários dos intervalos da partição P.
FIGURA 42 – ÁVALIA: A NORMA DA PARTIÇÃO E A INTEGRAL DEFINIDA
Esse comprimento maior é chamado a norma da partição P = {x0 = a, x1, x2, …, xn = p}, sendo x0 = a < x1 < x2 <
… < xn = b.
Tomamos arbitrariamente os pontos 1 em [x0, x1], 2 em [x1, x2], …, n em [xn-1, xn]. Denotamos por
x1 = x1 – x0, x2 = x2 – x1, …, xn = xn – xn-1,
os comprimentos dos subintervalos, formamos a soma
Sn = f(1)x1 + f(2)x2 + … + f(n)xn = ix)n
f(ξ1i
i Δ
194
Por definição, a integral de f no intervalo [a, b] é o limite da soma Sn, com n , sob o pressuposto de que a
norma da partição correspondente a Sn tende a zero; e que o limite de Sn realmente exista. Escrevemos, então,
ix)n
if(ξimf(x)dx1i
b
a nl Δ
FONTE: Ávila (2005, p. 195).
O autor esclarece em seguida que esta definição de integral é puramente numérica, não
dependendo do conceito de área, que apenas aparece nela como elemento motivador.
O autor acrescenta que na posse da definição da integral, inverte-se o problema,
definindo-se a área da figura delimitada pelo gráfico de f > 0, pelo eixo dos x e pelas retas x = a e
x = b como a integral dessa função no intervalo [a, b], podendo tomar valor negativo, caso f seja
negativa numa parte do intervalo [a, b].
Esse é o discurso tecnológico teórico que o autor apresenta para construir o conceito da
integral definida de uma função contínua a valores reais em um intervalo I. A construção do autor
é colocada numa perspectiva da análise matemática, o que exige mais rigor, visando à descrição
do próprio objeto de estudo, sem preocupação de contextos extramatemáticos, que de certo modo
podem prover algum conteúdo de referência aos objetos construídos.
Consideramos a construção como sendo muito bem feita na perspectiva matemática,
embora outros contextos como de distância teriam ajudado a elucidar melhor o que é exposto.
Contudo pensamos que essa elucidação pode ficar a cargo dos estudantes, revisitando o que já
foi desenvolvido em Cálculo Diferencial e Integral. O objetivo da construção é meramente de
prover o conteúdo teórico sobre a integral definida, não sobre as técnicas, tal como o próprio
autor deixa claro em algumas partes do seu livro.
Depois desse breve panorama da introdução de integral de Riemann por Ávila (2005),
observando que se trata de um livro de análise matemática que visa a um tratamento teórico dos
conceitos nele desenvolvidos, passamos para a apresentação da análise do livro 5, de Sarrico
(2005).
Sarrico (2005) inicia a apresentação do conceito de integral de Riemann da seguinte
forma:
T25: discurso tecnológico de aproximação por retângulos aproximantes para definir a
integral definida.
195
FIGURA 43 – SARRICO: ÁREAS SOB UM GRÁFICO DE UMA FUNÇÃO f.
Integração
O integral de uma função f > 0 num intervalo [a, b] de IR pode interpretar-se intuitivamente como sendo a área da
parte do plano Oxy limitada pelo gráfico de f, o eixo Ox e as rectas verticais x = a e x = b.
Para determinar esta área com certa aproximação podemos usar áreas de retângulos, como se indica em qualquer
das figuras.
No primeiro caso a área virá aproximada por defeito e no segundo caso por excesso. Quanto maior for o número
de retângulos maior será a exactidão do cálculo.
A área exacta será o limite para que tende a soma das áreas dos retângulos quando o seu número aumenta
indefinidamente, tendendo para zero o comprimento das bases. Passamos a formular rigorosamente estas ideias. FONTE: Sarrico (2005, pp. 167-168)
Assim o autor formula, em termos gerais, a natureza do objeto de estudo e a perspectiva
que quer tomar e continua:
T25: Teoria: definição da integral definida como supremo (ínfimo) de sequências
infinitas limitadas.
FIGURA 44 – SARRICO: DEFINIÇÃO FORMAL DA INTEGRAL DEFINIDA
Integrais de Darboux e Riemann. Definição e existência
Seja [a, b] um intervalo de IR que contenha mais do que um ponto. Chamamos partição de [a, b] a qualquer
conjunto de pontos {x0, x1, …, xn} com a = x0 < x1 < … < xn = b.
Seja f uma função real limitada e definida em [a, b]. Para cada partição P de [a, b] pomos
mi = f(x)]x,[xx
inf
i1i
Mi = f(x)]x,[xx
sup
i1i
com i = 1, 2, 3, …, n
Chamamos soma inferior de Darboux da função f relativa à partição P ao número
s(f, P) =
n
1i
1iii )x(xm
Do mesmo modo chamamos soma superior de Darboux da função f relativa à partição P ao número
S(f, P) =
n
1i
1iii )x(xM
Note-se que estes números são as somas das áreas dos retângulos que referimos no início.
Chama-se integral inferior de Darboux de f em [a, b] ao número
P)s(f,supfP
b
a
sendo o supremo relativo a todas as partições P de [a, b]. Analogamente, para o integral superior de Darboux
196
b
a P
P).S(f,inff
É fácil ver que, para uma função f limitada em [a, b], os integrais inferior e superior de Darboux existem sempre.
Com efeito, se f é limitada em [a, b], existem dois números m e M tais que m < f(x) < M em [a, b] e, portanto,
s(f, P) = n
1i)1ixi(xim >
n
1i
1ii )xm(x =
= m(xn – x0) = m(b – a).
Analogamente se prova que S(f, P) < M(b – a), e podemos escrever
m(b – a) < s(f, P) < S(f, P) < M(b –a)
Isto prova que os números s(f, P) e S(f, P) formam um conjunto limitado; pelo princípio de supremo e do ínfimo,
existem portanto os integrais inferior e superior de Darboux da função f em [a, b].
Por exemplo, para a função de Dirichlet definida por
f(x) =
Qxse
Qxse
0
1
tem-se no intervalo [1, 3]
s(f, P) =
n
1i
1ii )x(x0 = 0
S(f, P) =
n
1i
1ii )x(x1 = xn – x0 = 3 – 1 = 2
Independentemente da partição P de [1, 3]. Assim, neste caso
P)s(f,supfP
3
1 = 0
P)S(f,inffP
3
1 = 2,
e os integrais inferior e superior de Darboux não coincidem.
Quando os integrais superior e inferior de Darboux em [a, b] coincidem, a função f diz-se integrável à Riemann
ou integrável-R em [a, b], e representa-se por
b
af ou (x)dxf
b
a
Geometricamente, define a área exacta que referimos na introdução. A segunda notação, muito corrente, é por
vezes necessária para distinguir casos como este:
b
a
2 t)dx(x e b
a
2 t)dt(x
No primeiro caso, a função a integrar é um polinômio do segundo grau em x e o resultado depende de t. No
segundo caso, a função a integrar é um polinômio do primeiro grau em t e o resultado depende de x. FONTE: Sarrico (2005, p. 168-170).
Assim, é introduzido o conceito de Integral de Riemann na perspectiva de Sarrico
(2005). É uma perspectiva muito mais abstrata do que as outras duas anteriores apresentadas por
Stewart e Ávila, em virtude do recurso a Darboux para definir a integral. Sarrico não usa sequer o
conceito de limite de sequências de somas, e refere-se à área apenas como sendo o significado
geométrico que o objeto ora construído tem.
197
Com efeito, a definição de Darboux vale-se diretamente de uma das definições centrais
da análise matemática, que é o princípio do supremo, segundo o qual, um conjunto não vazio de
números reais, limitado superiormente, tem supremo. Para mostrar este resultado, o autor recorre
ainda a um outro princípio matemático conceitualmente, em nossa opinião muito forte, que é o
teorema de cortes de Dedekind, segundo o qual, um corte de números reais possui um número
real como elemento de separação.
Consideramos que, para o nível introdutório do conceito de integral definida, o livro em
tela precisa de uma reinterpretação no sentido de adequar-se ao nível do conhecimento disponível
dos estudantes provenientes do Ensino Médio que ainda confiam em seus hábitos de calcular e
obter um resultado numérico.
Nesse livro, assim como no de Ávila, não se calcula, apenas se interpreta, se explica e se
caracteriza o que é o objeto matemático que se deseja introduzir. Talvez aqui esteja o limiar
turbulento entre o Cálculo do Ensino Médio (ou introdutório) e o Cálculo estudado no Ensino
Superior.
Assim, a análise desses materiais mostra-se importante e necessária para compreender
essas diferenças de perspectivas e oportunizar uma reflexão para a configuração dos processos de
ensino e de aprendizagem que visem à compreensão. Trata-se aqui de considerar os diferentes
olhares para a transição entre o Ensino Médio e o Ensino Superior, como mostra Gueudet (2008).
Quando se fazem perguntas sobre de que tipo são as tarefas, técnicas, tecnologias e
teorias, que o livro de Sarrico (2005) apresenta, algumas respostas não são claras. Sobre os tipos
de tarefas, podemos dizer que são eles de descrição, caracterização, justificação e explicação do
objeto integral definida, ou seja, muito mais sobre as suas propriedades intrínsecas. Não
encontramos técnicas explícitas como as de limite de uma sequência de somas de retângulos
aproximantes que aparecem nos livros anteriores. Pensamos que a falta dessas técnicas explícitas
pode dificultar a utilização dessa parte do livro, para um estudante não muito familiarizado com o
tema, quando ele pretender mostrar a igualdade entre o máximo e o mínimo de sequências de
somas de retângulos aproximantes, respectivamente crescente e decrescente, da qual definimos a
integral de Riemann.
Assim, segundo Gueudet (2008, 2007), esse olhar centrado na instituição propicia
compreender a Matemática praticada no Ensino Superior e colocar em evidência as diferenças
198
entre os tipos de tarefas, as técnicas, as tecnologias e as teorias que se desejam trabalhar com os
estudantes, mostrando as necessidades de novos modos de pensar, de uma organização dos
conhecimentos e de novas linguagens e novos meios de comunicação.
Dessa forma, é preciso optar pelo material mais adequado aos diferentes grupos de
estudantes, se quisermos que eles aprendam e possam refletir de maneira consciente sobre os
novos conceitos que são introduzidos no Ensino Superior, em particular, nas disciplinas de
Cálculo Diferencial e Integral e em Análise Matemática.
Com estas últimas observações, pareceu-nos importante considerar o livro 6, que
corresponde à obra de Hoffmann & Bradley (1999), a qual faz uma abordagem diferente das
anteriores e que pode servir para determinados grupos de estudantes, em particular, aqueles para
os quais a disciplina de Cálculo é introduzida como ferramenta para resolver problemas de outras
ciências e para os estudantes que desejam revisitar os conceitos de derivada e integral de
Riemann ao iniciar a disciplina de Análise Matemática.
Hoffmann & Bradley (1999) introduzem a integração definida de uma maneira que
consideramos muito simples, baseada na antidiferenciação:
T26: discurso tecnológico utilizado por Hoffmann & Bradley (1999) para introduzir
integral definida.
FIGURA 45 – HOFFMANN & BRADLEY: INTEGRAL DEFINIDA COMO VARIAÇÃO DA FUNÇÃO f
ÁREA E A INTEGRAL DEFINIDA
Suponha que você conheça a taxa f(x) = dx
dF na qual uma certa grandeza F está variando e deseje encontrar a
quantidade pela qual a grandeza F variará entre x = a e x = b. Você poderá primeiro encontrar F por
antidiferenciação, e então calcular a diferença
Variação em F entre = F(b) – F(a)
x = a e x = b
O resultado numérico deste cálculo é chamado integral definida da função f e é denotado pelo símbolo
b
af(x)dx .
A integral definida
A integral definida de f, de a até b, é a diferença
b
af(x)dx = F(b) – F(a)
onde F é uma antiderivada de f. Isto é, a integral definida é a variação da antiderivada entre x = a e x = b.
O símbolo b
af(x)dx é lido “a integral (definida) de f de a até b”. Os números a e b são denominados limites de
integração. Nos cálculos que envolvem as integrais definidas, é frequentemente conveniente usar o símbolo b
a)F(x para a diferença F(b) – F(a).
FONTE: Hoffmann & Bradley (1999, pp. 272-273).
199
Após esta introdução, os autores apresentam alguns exemplos da aplicação da tecnologia
recém-“construída”.
Destacamos a tarefa representada pelo exemplo 3.1
“Exemplo 3.1 Um estudo indica que, daqui a x meses, a população de uma cidade estará
crescendo a uma taxa de 2 + 6 x pessoas por mês. Em quanto a população crescerá durante os
próximos 4 meses?”, Hoffmann & Bradley (1999, p. 273).
t26: Determinar o número de pessoas num período de 4 meses dada a taxa de variação
instantânea de 2 + 6 x.
Encontramos a seguinte técnica:
26: primitivação da função dx
dP = 2 + 6 x, usando as técnicas de primitivação de uma
soma, do produto por um escalar e de uma função potência:
Segundo o livro (p. 273), resolvemos:
“P(4) – P(0) = 4
0
4
0
3/2 C)4x(2x)dxx6(2 =
= [2(4) + 4(4)3/2
+ C] – [2(0) + 4(0)3/2
+ C]
= (40 + C) – (0 + C) = 40 pessoas”.
Afigura-nos que aqui temos um outro extremo desses materiais em análise. Enquanto
Sarrico mostrou-se muito abstrato, com um discurso introdutório baseado no princípio do
supremo, num quadro analítico, visando ao rigor, Hoffmann & Bradley tomam uma perspectiva
muito prática, informando o que deve ser feito e como deve ser feito, utilizando apenas o discurso
construtivo da técnica, sem utilizar um discurso teórico que justifique a tecnológia empregada.
O resultado tecnológico b
af(x)dx = F(b) – F(a) é muito importante na teoria da
integração definida, só que apresentado da maneira como os autores aqui citados o fazem, pode
gerar dificuldades de compreensão para os estudantes que vão para um curso de Análise
Matemática, pois a demonstração do resultado não é feita no livro.
É importante destacar que se trata da variação da primitiva entre esses dois pontos x = a
e x = b, mas observamos que é igualmente importante esclarecer que se trata de uma variação
total da grandeza nesse intervalo. Ou seja, uma explicação adicional, digamos, a demonstração do
200
resultado b
af(x)dx = F(b) – F(a) deveria ser fornecida para esclarecer e justificar a técnica, a fim
de mostrar quais as razões que tornam correto fazer dessa maneira.
Após a introdução e a apresentação de algumas tarefas resolvidas, os autores articulam o
conceito de integral definida com o da área abaixo do gráfico da função e delimitada pelo eixo
dos x e pelas retas verticais x = a e x = b. Mais uma vez, eles fazem um discurso tecnológico que
justifica considerar a integral definida como a área sob a curva.
T26: discurso tecnológico utilizado por Hoffmann & Bradley (1999).
FIGURA 46 – HOFFMANN & BRADLEY: INTEGRAL DEFINIDA COMO ÁREA SOB O GRÁFICO DE f
Fig. 5.5 A área sob a curva y =
f(x) entre x = a e x = b
Se f(x) é contínua e f(x) > 0 em um intervalo a < x < b, então faz sentido
falar sobre a área “sob a curva y = f(x), entre x = a e x = b” (veja Fig. 5.5).
Isto acarreta uma surpreendente conexão entre essa área e a integral
definida, que pode ser resumida como se segue:
Área sob uma curva
Suponhamos que f(x) seja contínua e f(x) > 0 no
intervalo a < x < b. Então a região R sob a curva
y = f(x) entre x = a e x = b tem uma área
Área de R = b
af(x)dx
FONTE: Hoffmann & Bradley (1999, p. 275)
Após alguns exemplos, os autores justificam por que a fórmula da integral para a área
funciona:
T26: discurso tecnológico-teórico utilizado por Hoffmann & Bradley (1999) para
justificar a relação entre a integral definida e área.
FIGURA 47 – HOFFMANN & BRADLEY: INTEGRAL DEFINIDA COMO ÁREA
Por que a Fórmula da Integral para a Área Funciona
Para ver por que a fórmula da integral funciona no cálculo da área, suponha que f(x) seja contínua e não-negativa
no intervalo a < x < b. Para qualquer valor de x neste intervalo, faça A(x) representar a área da região sob o
gráfico de f entre a e x como mostrado na Fig. 5.8. Note que A(x) é um função de x no intervalo a < x < b.
Fig. 5.8 A área A(x)
Sua meta é mostrar que A(b) = b
adxxf )( . O passo crucial é estabelecer
que a derivada A’(x) da função da área é igual a f(x). Para fazer isto
considere o quociente da diferença
Δx
A(x)Δx)A(x
A expressão A(x + x) – A(x) no numerador é exatamente a área sob a
curva entre x e x + x. Se x for pequeno, a área é aproximadamente a
mesma do retângulo cuja altura é f(x) e cuja base é x, como indicado na
Fig. 5.9. Isto é,
201
Fig. 5.9
A(x + x) – A(x) f(x)x
Ou equivalentemente
Δx
A(x)Δx)A(x = f(x)
Quando x tende a zero, o erro da aproximação tende também a
zero, e daí segue-se que:
0Δxlim Δx
A(x)Δx)A(x = f(x)
Mas pela definição da derivada
0Δxlim Δx
A(x)Δx)A(x = A’(x)
Assim A’(x) = f(x)
e também b
af(x)dx =
b
a(x)dxA' = A(b) – A(a)
Mas A(a) é a área sob a curva entre x = a e x = a, que obviamente é zero. Logo b
af(x)dx = A(b) e a fórmula da
área está provada. FONTE: Hoffmann & Bradley (1999, pp. 276-277).
Com a demonstração apresentada na figura 48, fica estabelecido que a área sob uma
curva de uma função contínua em um intervalo I pode ser obtida por meio da integral definida.
Nesse caso, a integral definida é usada como ferramenta para calcular medidas das áreas sob
curvas, não como um modelo que justifica a técnica de integração.
Por outro lado, parece-nos haver um pouco de imprecisão no discurso demonstrativo
usado, especialmente no que se refere à coordenação de algumas partes entre o ostensivo gráfico,
o discurso explicativo em língua natural e os correspondentes ostensivos algébricos. Ora
vejamos:
Primeiro: admite-se que existe uma área sob a curva y = f(x), designada por A(x), que
também é uma função de x, no intervalo a < x < b, tal como se vê na Fig 5.8 acima. E afirma-se
que a meta é mostrar que A(b) = b
af(x)dx . Pensamos que esta meta pode trazer alguma
dificuldade na compreensão de seu conteúdo, porque a definição dada acima diz que o número
b
af(x)dx depende dos dois extremos a e b, não apenas do extremo superior como vem na
igualdade A(b) = b
af(x)dx , a não ser que o valor de A(a) seja identicamente nulo.
Segundo: Afirma-se que o passo crucial é estabelecer que a derivada A’(x) da função da
área é igual a f(x). No nosso entender, esse passo leva à conclusão de que o integrando é a
202
derivada da função b
af(x)dx , ou seja, que a primitivação e a derivação são operações inversas
uma da outra, não que b
af(x)dx seja uma função de área representada por um número.
Terceiro: num dado momento, se escreve: b
af(x)dx =
b
a(x)dxA' = A(b) – A(a).
Mas A(a) é a área sob a curva entre x = a e x = a, que obviamente é zero. Logo
b
af(x)dx = A(b), e a fórmula da área está provada.
Pensamos que a conclusão de que A(a) = 0 porque A(a) é a área sob a curva entre x = a
e x = a não seja muito convincente, porque do mesmo modo, alguém pode pensar que A(b) = 0 e
justificar que A(b) é a área sob a curva entre x = b e x = b. Além disso, como dissemos antes já
foi definido que b
af(x)dx = F(b) – F(a), e não fica claro que para definir uma função de área
temos que tomar F(a) = 0.
6.2 AS REGULARIDADES E DIFERENÇAS ENTRE AS OBRAS ANALISADAS NA PARTE
II
Do estudo feito, temos a percepção de que as diferentes perspectivas na apresentação e
discussão do tema sobre a integral definida são notáveis, como apontamos na discussão a seguir.
O livro de Ávila (2005) tem uma perspectiva para uma apresentação formal do tema,
embora considere o modelo visual de área, articulado com o conceito de limite de uma soma,
como ferramenta para a construção do conceito de integral definida. É importante lembrar que se
trata de uma obra de Análise Matemática, o que justifica sua diferença em relação às outras
obras, em que é pertinente uma abordagem mais teórica.
Assim como o livro de Ávila, o livro de Sarrico (2005) tem uma perspectiva muito mais
formal, ainda que num exemplo inicial considere uma visão geral sobre área, essa visão também
se justifica por se tratar de um livro de Análise Matemática. Esse modelo não é usado para a
construção do conceito de integral definida. O que o livro faz é uma construção formal, teórica,
baseada no modelo de Darboux, que toma o conceito de supremo (ínfimo) como pilar da
construção do conceito da integral definida, o que não é feito por nenhum dos outros autores.
Apesar de o autor considerar que, quando “os integrais superior e inferior de Darboux em [a, b]
203
coincidem, a função f diz-se integrável à Riemann ou integrável-R em [a, b], ao valor comum
desses integrais chama-se integral de Riemann de f em [a, b]”, parece-nos que seja uma
referência implícita a Riemann, uma referência decorativa, pois toda construção faz-se sobre
Darboux.
O livro de Stewart (2011) é muito versátil, digamos, com uma integração multiforme de
perspectivas: aborda o modelo de área, considera outros modelos, como de distância, integrando-
os em seguida no modelo de área, articula esses modelos com o conceito de limite de uma
sequência de somas de áreas e generaliza para um panorama mais abstrato, mas conserva sua
origem enquanto obra de Cálculo Diferencial e Integral.
O livro de Hoffmann & Bradley (1999) consideramo-lo ser mais prático, com um
enfoque sobre o bloco prático técnico, com pequenos empreendimentos tecnológicos teóricos no
sentido da sua construção, recorrendo apenas ao teorema da variação total para a definição da
integral definida. A tecnologia do limite da sequência de somas é totalmente evitada. O modelo
de área é tratado de forma superficial como conceito que se pode construir com a integração
definida.
A seguir apresentamos, muito resumidamente, o discurso teórico que consideramos
importante para justificar a técnica e, ao mesmo tempo, a tecnologia da integração definida.
T2j – teoria relativa à tecnologia T2j: definição da integral de Riemann.
O modelo de área articulado com o extensivo do limite de uma sequência de somas de
áreas aparece como uma autotecnologia da integral definida. Institucionalmente, o conceito de
área parece-nos ser uma boa maneira de introduzir a integral definida, embora em alguns casos
isso não seja proeminente, como no livro 6. Assim sendo, destacamos os recursos teóricos que
justificam este modelo:
1) O teorema do supremo. Este teorema afirma que todo conjunto não vazio de
números reais limitado superiormente (inferiormente) tem supremo (ínfimo). Então, segundo esse
teorema, dada uma sequência monótona e limitada de somas de áreas, ela tem supremo (ínfimo).
É esse supremo (ínfimo) que se define como a integral definida. Vimos que o livro de Sarrico usa
este teorema diretamente na definição da integral definida. Observamos que esse teorema, em
geral, é tratado na Análise Matemática, o que muitas vezes será objeto de estudo apenas para os
estudantes dos cursos de Matemática e Licenciatura em Matemática.
204
2) A definição de números reais, que pode ser construída por meio do conceito de
corte de Dedeckind, de intervalos encaixados ou da sequência de Cauchy. Trata-se também de
um tema que, em geral, é desenvolvido completamente nos cursos de Matemática e Licenciatura
em Matemática.
3) A teoria sobre sequências e limites de sequências, que obviamente se apoia nos
dois princípios anteriores. Particularmente destacamos alguns teoremas com implicação no
resultado:
a) O teorema pelo qual toda sequência monótona e limitada é convergente;
b) O teorema de Weierstrass, segundo o qual, uma sequência limitada possui uma
subsequência convergente.
4) Propriedade de funções contínuas e o Teorema Fundamental de Cálculo.
Com esses comentários, pensamos que ficam evidentes as diferenças de introdução e
discussão do conceito de integral definida nos materiais analisados. Assim, passamos para a parte
3: resumo tabular dos diferentes tipos de tarefas propostas nos materiais analisados, sobre a
derivada de funções reais de uma variável real e a integral de Riemann. Lembramos que na tabela
usamos as categorias em termos de dimensões apresentadas na seção 5.1.
A legenda da tabela é a mesma que apresentamos na seção 5.1, apenas com algumas
modificações sobre os tipos de tarefas:
A linha T3 do tipo de tarefas sobre primitivas foi substituída pela linha T4: tipo de tarefas
sobre a integral de Riemann.
QUADRO 5 – TIPOS DE TAREFAS EM LIVROS USADOS NA UNIVERSIDADE
Dimensão
Livro
Pertinência:
tipo de
tarefas
Abertura
do
enunciado
Implicitude
do
enunciado
Possibilidade
de mudança
de quadro
Contexto do
enunciado
Níveis de conhecimento
requerido
Pon Loc Fec Abe Exp Imp Req NReq IntraM Real Fis Tec Mob Disp
Livro
3
T2 667 1027 1004 843 1024 823 354 183 1517 168 162 662 122 1063
T 4 674 1180 859 842 859 842 1593 1517 1393 160 148 304 318 1079
Livro
4
T 2 0 21 0 21 0 21 2 19 21 0 0 0 0 21
T 4 0 18 0 18 0 18 0 18 18 0 0 0 0 18
Livro
5
T 2 0 31 0 31 0 31 0 31 30 1 0 0 12 19
T 4 0 39 0 39 0 39 0 39 39 0 0 0 0 39
Livro
6
T 2 330 432 316 496 316 496 113 685 426 338 27 132 153 435
T 4 206 279 216 219 216 219 42 407 215 232 9 117 158 252
FONTE: O autor (2014).
A seguir apresentamos a análise dos resultados desta tabela.
205
6.3 ANÁLISE DOS TIPOS DE TAREFAS PRIVILEGIADOS POR MEIO DA TABELA QUE
AS CLASSIFICA EM RELAÇÃO ÀS DIMENSÕES ESCOLHIDAS COMO ELEMENTOS
DIFERENCIADORES DAS ABORDAGENS PROPOSTAS
O livro de Stewart (2011) apresenta uma grande variedade de exercícios: entre tarefas
pontuais (que dizem respeito a um único tipo de tarefas e consistindo de uma única técnica) a
tarefas articuladas em várias técnicas e tecnologias; entre tarefas fechadas e abertas; entre tarefas
apresentadas em um quadro matemático a tarefas que sugerem mudanças de quadro ou
simplesmente uma mudança dos ostensivos, ou seja, passagem de ostensivos algébricos para os
ostensivos gráficos e com algumas explicitações para o uso de um recurso computacional. No
livro, encontramos tarefas formuladas em vários contextos, entre os quais, os contextos:
intramatemático, real e da física, o que conduz a uma grande diversidade de níveis de
conhecimento matemático, precisamente, os níveis técnico, mobilizável e disponível, com a
preponderância para este último.
O livro, como já o referimos, faz uma grande articulação entre os blocos prático/técnico,
visando a construções de técnicas, e o bloco tecnológico/teórico, visando à construção de um
quadro de referências (justificações, explicações e teorias) sobre a derivada e a integral de
Riemann de funções reais de uma variável real.
No nosso entender, o autor articula adequadamente os desenvolvimentos no quadro
algébrico por meio de tarefas de modelagem, em que os conceitos da derivada e da integral de
Riemann são usados como ferramentas para encontrar respostas às questões-problema colocadas.
E, ao mesmo tempo, no quadro da análise, discute com detalhes as definições formais, as
formulações e demonstrações dos teoremas fundamentais do Cálculo, e as propriedades das
funções reais de uma variável real.
Com características idênticas ao livro de Stewart, em termos do tipo de tarefas
propostas, está o livro de Hoffmann e Bradley (1999), que igualmente apresenta uma grande
diversidade de tarefas e em vários contextos, principalmente para o contexto da vida real, em que
são sugeridas 540 tarefas desse tipo. Dos livros estudados, este livro é único com um número de
tarefas de contexto da vida real muito elevado. Trata-se de uma obra que, mesmo não
apresentando as definições teóricas de Ávila e Sarrico, o que é compreensível por se tratar de um
livro de Cálculo e não de Análise, tem uma grande diversidade de tarefas que exigem o nível
206
disponível não somente em relação aos conceitos de Cálculo, mas muitas vezes em função das
aplicações a que as tarefas se referem.
Hoffmann e Bradley (1999) focalizam mais o bloco prático/técnico, com poucas tarefas
sobre o bloco tecnológico/teórico, mas ainda com a ênfase no nível de conhecimento disponível.
Por incidir mais sobre os problemas de contexto, o livro funciona mais no quadro algébrico que
propicia a modelagem desses problemas e os conceitos de derivada e da integral de Riemann
aparecem como ferramentas para resolver esses problemas. Não obstante esse foco que o livro
privilegia, existem indícios de algumas construções tecnológico-teóricas dos conceitos da
derivada e da integral de Riemann de funções reais de uma variável real.
Consideramos importante referir que estes dois livros (STEWART, 2011 e
HOFFMANN e BRADLEY, 1999) sugerem explicitamente o uso de meios computacionais
(computador ou calculadoras gráficas) para a realização de algumas tarefas propostas. São obras
que tentam implementar as novas tecnologias nos processos de ensino e de aprendizagem de
Cálculo Diferencial e Integral, uma iniciativa à qual nos subscrevemos plenamente.
Os livros de Ávila (2005) e de Sarrico (2005) propõem poucas tarefas e todas elas num
contexto formal e intramatemático. São tarefas que pedem justificações e explicações e outras
que representam demonstrações de propriedades e teoremas. Todo discurso é desenvolvido no
quadro da análise matemática e quase todas as tarefas propostas requerem o nível de
conhecimento disponível.
A característica desses dois livros era de se esperar, pois são obras destinadas à
disciplina de Análise Matemática. Assim, elas concentram sua discussão no bloco
tecnológico/teórico, com pouca atenção voltada para o bloco prático/técnico, que se supõe tenha
sido desenvolvido anteriormente em um curso de Cálculo Diferencial e Integral, como Ávila
(2005) escreve isso muito explicitamente.
Como últimas palavras dessa parte do estudo, assumimos ter valido a pena essa análise,
pois a diversidade de perspectivas que observamos pode chamar-nos a atenção sobre o que se
pode aproveitar de cada um desses materiais num momento de preparação e execução de uma
ação didática na sala de aula sobre o Cálculo Diferencial e Integral. Temos a percepção de que a
organização do ensino e da aprendizagem, levando em conta essa multiplicidade de perpesctivas,
207
pode enriquecer esses processos, desde que sejam consideradas as condições iniciais dos
estudantes com os quais se deseja trabalhar.
Apresentada a análise dos livros escolhidos, temos a percepção de que nosso interesse
em desenvolver a mediação didática dos conceitos de derivada de funções reais a valores reais e
de integral de Riemann com o recurso ao Geogebra articulado com as práticas vigentes é
pertinente, pois, no nosso entender, essa estratégia didática complementa o que os livros sugerem
e, possivelmente, com uma efetividade maior no relacionamento com o conteúdo da
aprendizagem, pois alguns aspectos foram identificados acima como importantes, mas
dependentes desse tipo de recurso para que possam ser realizados.
O contexto de movimento é preponderante na introdução do conceito de derivada de
funções reais a valores reais. Três dos quatro livros analisados fazem a menção a esse contexto. O
recurso tecnológico “limite da razão incremental” é dominante na apresentação desse conceito
pelos livros analisados.
No que diz respeito à integração à Riemann, consideramos haver uma real necessidade
de articulação das diferentes perspectivas que os livros fazem, especialmente quando os
processos de ensino e de aprendizagem são dirigidos aos estudantes dos cursos de licenciatura em
ensino de Matemática ou aos estudantes dos cursos de licenciatura em Matemática que precisam
de fundamentos consistentes entre a teoria e as aplicações dos conceitos visados, que precisam de
um ensino e de uma aprendizagem baseados no sentido e na compreensão dos significados dos
objetos matemáticos em jogo. Recordamos que as denominações usadas em Moçambique de
“licenciatura em ensino de Matemática” e “licenciatura em Matemática” correspondem ao que no
Brasil se chamam “licenciatura em Matemática” e “bacharelato em Matemática”,
respectivamente.
Como já destacado acima, os livros de Stewart (2011) e de Hoffmann e Bradley (1995),
por se tratarem de livros de Cálculo não deixam explícito que a integrabilidade à Riemann é
fundamentada no fato de a função f, analisada no intervalo limitado e fechado I, ser cotada em I.
Esse fato implica que as sequências de somas construídas a partir de partições Pi de I, sejam
também cotadas. E a integral definida de f em I, é uma dessas cotas. Como a nossa mediação
didática, segundo nossa opção, precisava de um fundamento teórico da noção de supremo
(ínfimo) articulado com o teorema de convergência da função monótona e limitada num
208
intervalo, para falar da integral de Riemann, fomos buscar esse fundamento nos livros de análise
Matemática de Ávila (2005) e de Sarrico (2005). Por isso, para nós é legítimo afirmar que a
análise dos livros escolhidos foi importante para desenvolver o estudo na parte da mediação
didática. Por um lado, capacitou-nos a compreender os aspectos técnicos, tecnológicos e teóricos
sobre o tema de nossa pesquisa para conduzir a experimentação. Devíamos estar certos na
escolha dos caminhos a seguir na discussão tanto sobre a derivada quanto sobre a integral de
Riemann. Por exemplo, Artigue (1991) diz que na França a opção, pelo menos na altura em que
foi apresentado o estudo, era usar os pontos de vista de linearização local e microscópico para
introduzir a derivada de uma função a valores reais. Dos livros analisados só Stewart (2011)
discute esse método como uma possibilidade de tratar a noção de derivada de uma função em um
ponto. Uma grande parte dos livros de Cálculo usa o modelo de razão incremental como
ferramenta tecnológica para introduzir essa noção. Os livros analisados mostrou essa tendência e,
principalmente, num contexto da Física. A prática vigente em Moçambique segue esse modelo.
Por isso, optamos por seguir o que os livros analisados mostraram quando preparamos a
intervenção didática.
Por outro lado, a análise feita ajudou-nos a refletir para a construção das tarefas usadas
no teste diagnóstico e na experimentação. Algumas tarefas foram retiradas desses livros, com
algumas alterações para atingirem o objetivo visado. E é nosso sentimento de que seria difícil
conduzir a experimentação sem que antes fizéssemos esse estudo inicial.
Na sequência, apresentamos algumas características do Geogebra26
, as análises a priori
das tarefas usadas no teste diagnóstico e no experimento, a análise a posteriori do teste
diagnóstico, a experimentação e a análise a posteriori de sequências de ensino e de
aprendizagem.
26 Com alguns detalhes no anexo A.
209
7 ESTUDO EXPERIMENTAL PARTE I: O SOFTWARE GEOGEBRA E ANÁLISE A
PRIORI DAS TAREFAS USADAS NO TESTE DIAGNÓSTICO E NA
EXPERIMENTAÇÃO E ANÁLISE A POSTERIORI DO TESTE DIAGNÓSTICO
7.1 O SOFTWARE GEOGEBRA E ALGUMAS DE SUAS CARACTERÍSTICAS
O Geogebra é um software de Matemática Dinâmica gratuito e multiplataforma para
todos os níveis de ensino, que combina geometria, álgebra, tabelas, gráficos, estatística e cálculo
em um único sistema. Além de suas potencialidades, o fato de ser gratuito também foi importante
de alguma forma para optar por este software. Segundo a enciclopédia WIKIPEDIA (acesso:
10/02/2013), o Geogebra foi criado por Markus Hohenwarter para ser utilizado em ambiente de
sala de aula. O projeto foi iniciado em 2001, na Universität Salzburg, e tem prosseguido em
desenvolvimento na Florida Atlantic University.
Características do Geogebra:
O programa possibilita realizar construções geométricas com a utilização de pontos,
retas, segmentos de reta, polígonos etc., assim como permite inserir funções e alterar todos esses
objetos dinamicamente após a construção estar finalizada. Equações e coordenadas também
podem ser diretamente inseridas. Portanto, o Geogebra é capaz de lidar com variáveis para
números, pontos, vetores, derivar e integrar funções e ainda oferecer comandos para se encontrar
raízes e pontos extremos de uma função. Com isto, o programa reúne as ferramentas tradicionais
de Geometria com outras mais adequadas à Álgebra e ao Cálculo. Isto tem a
vantagem didática de representar, ao mesmo tempo e em um único ambiente visual, as
características geométricas e algébricas de um mesmo objeto, ou seja, sua interface dispõe de
uma janela de Álgebra e outra de Geometria, cada objeto geométrico criado possui uma
correspondência algébrica, ou seja, existe uma interatividade entre a zona algébrica e zona
gráfica, de modo que tudo que é construído na zona gráfica o software mostra a expressão
algébrica que representa tal objeto construído, isto é, a passagem do ostensivo algébrico para o
ostensivo gráfico e, vice-versa, é feita pelo software. Importa referir ainda que, como já anotado,
o software Geogebra tem também a parte de estatística.
Para Grécio e Bittar (2011), o Geogebra, por ser também um programa de Geometria
Dinâmica, facilita a investigação dos alunos, que podem movimentar os objetos e acompanhar as
210
variações ocorridas, fazer conjecturas e testá-las, além de relacionar os conteúdos algébricos e
geométricos, afirmações com as quais concordamos plenamente.
A manipulação desse software estimula docentes e discentes a tentar usá-lo em suas
práticas, porque quando é feito qualquer tipo de manipulação simultaneamente, ocorre a alteração
da figura sem alterar sua estrutura de construção, entre outras vantagens práticas.
Pensando nas potencialidades algébricas e gráficas do Geogebra e nas suas
possibilidades de animação, idealizamos o experimento de ensino com recurso a esse software
computacional. No anexo A, destacamos alguns detalhes desse recurso.
Na sequência, apresentamos a análise a priori das tarefas utilizadas no teste diagnóstico
e no experimento, cuidadosamente escolhidas por possibilitarem a utilização do software,
articulado com outras mídias, como elemento mediador da solução e de reflexão sobre os
resultados encontrados.
7.2 ANÁLISE A PRIORI DAS TAREFAS USADAS NO TESTE DIAGNÓSTICO E NO
EXPERIMENTO
Entre as tarefas apresentadas na análise a priori, algumas serviram tanto para o teste
diagnóstico, quanto para a experimentação. Nesta última, às vezes, foi necessário reorganizar e
introduzir novas tarefas para alimentar a discussão e para responder às expectativas e dificuldades
dos estudantes.
Lembramos que o teste diagnóstico tinha como objetivo identificar os conhecimentos
que os estudantes convidados a participar das discussões tinham sobre as noções de base do
Cálculo Diferencial e Integral, especialmente sobre as noções de continuidade, da propriedade de
limitação, de conjunto imagem, das regras práticas de derivação, da interpretação da derivada
como declive da reta tangente ao gráfico de uma função em um ponto e do uso da derivada no
estudo de funções rais a valores reais.
Consideramos, no quadro 6, categorias usadas na análise a priori:
QUADRO 6 – CATEGORIAS DE ANÁLISE A PRIORI: TAREFAS DO TESTE DIAGNÓSTICO E DO
EXPERIMENTO
1. As praxeologias didático-matemáticas subjacentes às tarefas propostas;
2. As escolhas pertinentes (modificações que afetam a hierarquia das estratégias de
211
solução);
3. Quadro da área da Matemática em que são formuladas e desenvolvidas as soluções
das tarefas propostas;
4. Níveis de conhecimentos exigidos ao estudante para responder às tarefas propostas.
FONTE: O autor (2014).
7.2.1 Teste de verificação do nível atual dos participantes do grupo de discussão – teste
diagnóstico
Parte I: Conceitos envolvidos:
A: Limites e continuidade de funções;
B: Imagem de uma função e funções limitadas;
C: Derivada de funções reais a valores reais: pontos de vistas da derivada como taxa de
variação (velocidade do movimento), como declive da reta tangente ao gráfico de f
(ponto de vista geométrico) e derivada como um procedimento simbólico. Estes são
alguns dos pontos de vista da derivada propostos por Thurston (1994, 1995);
D: Teorema de Fermat.
E. Propriedade de continuidade local da função f diferenciável em um ponto P.
Objetivo geral do teste: verificar o domínio desses conceitos pelos participantes do
experimento para determinar algumas estratégias a adotar na condução do mesmo.
A seguir apresentamos as tarefas propostas e destacamos que elas foram baseadas
principalmente nos livros de Stewart (2011, vol. 1) e de Sarrico (2005).
Tarefa 1: 1. Considere o gráfico de uma função f definida no intervalo I = [-2, 4].
FIGURA 48 – TAREFA 1 DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
212
a) A função f é contínua em [-2, 4]? Justifique.
b) A função f é limitada? Por quê?
c) Indique o conjunto imagem de f, Im(f). Justifique
Objetivos da tarefa: verificar o domínio, por parte dos participantes das sessões, das
propriedades de continuidade e limitação de funções reais a valores reais, que correspondem às
condições necessárias para definir a derivada e a integral de Riemann respectivamente. Também
pretendíamos verificar o domínio do conceito de imagem de uma função real a uma variável real.
Fizemos as seguintes escolhas para encaminhar as tarefas:
Ostensivo gráfico da função: pensamos ser mais rico e com sentido, para os
estudantes que acabam de sair do Ensino Médio, identificar, falar ou descrever a
continuidade, a propriedade de limitação ou o conjunto-imagem de uma função a
partir de sua representação gráfica. Consideramos ser abstrato, para um estudante
desse nível, elaborar, a partir da lei de formação da função, explicações do que se
pede. Observamos ainda que o gráfico é dado sobre um quadriculado, o que pode
auxiliar os estudantes na determinação de certos pontos necessários para a resposta.
Perguntas intermediárias que estimulam a reflexão para a resposta.
Caso seja usado o recurso computacional, podem ser consideradas as escolhas:
Software do computador que vai permitir a produção de respostas;
Cor das construções gráficas que pode proporcionar a discriminação dos diferentes
elementos contruídos;
Espessura das curvas produzidas que, igualmente como a cor, vai permitir
discriminar os elementos produzidos. Essa discriminação pode ajudar na decisão sobre a resposta
a dar.
Respostas esperadas:
Em a) espera-se que, com base na teoria de continuidade de funções e, trazendo à
lembrança essa teoria, o estudante note que f não é contínua no intervalo [-2, 4], uma vez que
existe um ponto x = 0, no domínio de f para o qual o limite de f não existe, pois usando a técnica
de limites laterais, no ponto considerado, temos: 0f(x)lim0x
e 1
f(x)lim0x
, e, esse resultado,
segundo a definição (teoria) da continuidade, implica que f não é contínua em x = 0. E, por
conseguinte, f não é contínua no domínio considerado. A resposta pode ser obtida também
213
usando a imagem visual do gráfico da função: vemos no desenho que em x = 0 o gráfico de f tem
um salto e esse salto significa a descontinuidade de f naquele ponto. Notemos que este raciocínio
tem sentido para o domínio dado. Se o domínio fosse, por exemplo, [-1, 0] ]0, 4], teríamos o
mesmo gráfico, mas a função seria contínua, pois satisfaz a definição lógico-formal da noção de
limite de uma função em um ponto. Alguns materiais de ensino não observam bem essa sutileza
da noção de continuidade. Vianna (1998) corrobora essa observação na sua tese de doutorado.
Portanto, usando tal definição formal de continuidade, para a função dada, diríamos o
seguinte:
A função dada não é contínua no intervalo dado, porque, segundo a definição, f seria
contínua se satisfizesse a seguinte implicação: > 0, > 0 tal que x Df, |x – x0| <
|f(x) – f(x0)| < . Mas isso não ocorre para essa função. Tomando x0 = 0, dado um > 0, nem
sempre é possível encontrar o > 0, tal que |x – 0| < |f(x) – f(0)| < . Ou ainda: dada a bola
aberta B’ = B(f(0), ), de centro f(0) e raio > 0, não é possível obter uma bola aberta B =
B(0, ), de centro 0 e raio , tal que f(B) B’. Como indicamos acima, este recurso tecnológico
corresponde ao ponto de vista lógico-formal, e, portanto, não se espera que possa ser
desenvolvido por estudantes do 1º ano do curso de Licenciatura em Ensino de Matemática, que
acabam de sair da escola secundária, onde não se define continuidade dessa forma, que será
introduzida nessa nova etapa. Trata-se aqui do primeiro momento de estudo, segundo Chevallard
(1997), o que, conforme Gueudet (2008), pode ser considerado um olhar sobre o modo de pensar,
que corresponde a um novo filtro para compreender as dificuldades dos estudantes, portanto não
sendo o indicado para essa fase do estudo proposto.
Uma outra técnica para responder à questão seria dizer: f não é contínua em [-2, 4],
porque, se percorrermos o gráfico de f, teremos um salto em x = 0. Quer dizer, o percurso no
gráfico de f não se faz numa única linha ou curva. O gráfico de f tem mais que um componente,
ou seja, o ostensivo gestual que permite resolver a questão mostra essa não conexividade do
gráfico. Este raciocínio, embora inadequado, é frequentemente usado como forma intuitiva de
justificar a continuidade, sem precisar evocar a natureza do domínio de f. Geralmente há
confusão entre a continuidade e a conexidade. A continuidade é um conceito logicamente
definido e não apela à conexidade. Como vimos acima, se o domínio de f fosse [-2, 0] ]0, 4], a
214
função seria contínua, pois para cada > 0 seria possível encontrar um > 0, tal que para a [-
2, 0] ]0, 4], |x – a| < |f(x) – f(a)| < .
Recorrendo ao software Geogebra, a
continuidade pode ser analisada da seguinte forma:
colocar as âncoras dos pontos do gráfico e
movimentá-los ao longo do gráfico. Nesse
movimento, pode-se ver que quando as abscissas
tendem para zero, pela esquerda, as imagens tendem
para 0; e pela direita, as imagens tendem para 1.
FIGURA 49 – ANÁLISE GRÁFICA DA
DESCONTINUIDADE DA FUNÇÃO
f(x) =
01
0
xse
xsex
,
,
FONTE: O autor (2014).
Com o recurso computacional, a técnica usada para dar resposta à questão colocada
muda. O estudante usa a observação visual, que corresponde a um ostensivo gestual, captando a
tendência dos movimentos das imagens da função. Com essa técnica, o estudante faz uma
validação e um controle experimental da sua resposta. Portanto, com o recurso computacional, as
praxeologias didático-matemáticas envolvidas na tarefa mudam substancialmente: muda a técnica
empregue para obter a resposta, ao invés de usar o ostensivo escritural para produzir a resposta,
usa-se observação da tendência do movimento dos pontos nas proximidades do ponto crítico;
muda a tecnologia que justifica a técnica: ao invés de usar um argumento dos limites laterais que
são produzidos algebricamente, usa-se o argumento do tipo, porque estamos vendo. As
praxelogias que mudam são: o tipo de tarefa, técnica e tecnologia.
Observamos ainda que as técnicas utilizadas, as formulações e reformulações do
problema são desenvolvidas no quadro da análise matemática, uma vez que são sistematicamente
usados os ostensivos e não ostensivos de limites e de vizinhanças. Quanto à conceituação, a tarefa
está situada no nível de conhecimentos disponíveis, pois não sugere nenhuma estratégia a ser
usada, cabendo ao estudante decidir como encontrar a resposta requerida.
Na parte b), pretendemos que o estudante, evocando a teoria sobre limitação de funções,
identifique que f é limitada, porque as suas imagens estão num intervalo limitado. Tomando por
exemplo k = 3, temos |f(x)| < k, para todo x [-2, 4]. Esta técnica exige o conhecimento da
definição da propriedade de limitação de uma função. O ensino moçambicano parece não dar
muita atenção a essa noção tão importante da análise, especialmente quando fazemos a
215
introdução das noções de integral de Riemann. Muitas vezes, confunde-se a propriedade de “ser
limitada” com a de “ter um limite”. Às vezes, o estudante guia-se, por falta de compreensão da
definição de limitação, pelo domínio de f e responde dizendo que f é limitada, porque o domínio
de f, [-2, 4] é limitado. O que não está correto. Neste caso, o ostensivo discursivo utilizado para
responder à questão colocada não é guiado pelo não ostensivo correspondente, acarretando erros
de raciocínio. Consideramos ainda que a tarefa é situada no quadro da análise matemática e no
nível de conhecimentos disponíveis, o que implica um custo técnico adicional na resolução.
Na parte c), temos o objetivo de verificar se o estudante explicita ou não a imagem de f.
Isto é, Im(f) = [0, 2] = {y IR: y = f(x), x [-2, 4]}. Portanto, a técnica usada para executar a
tarefa é essencialmente a definição do conjunto-imagem da função. Na falta dessa definição, não
há como responder corretamente à questão. O estudante deve saber que as imagens são lidas no
eixo vertical, isto é, a imagem de f é o conjunto das ordenadas dos pontos do gráfico de f, ou seja:
se G = {(x, f(x)): x [-2, 4]}, então Im(f) = {f(x) IR: x [-2, 4]}. Sabendo dessa definição, o
ostensivo gráfico dado pode sugerir onde encontrar as imagens da função. A experiência tem
mostrado que tem sido difícil para os estudantes lerem corretamente essa informação no eixo
vertical. Por outro lado, o ensino vigente não tem sido muito explícito nesse aspecto. O software
computacional Geogebra pode proporcionar uma oportunidade para discriminar visualmente o
domínio, o gráfico e o conjunto imagem de f, bastando para isso criar um parâmetro móvel a
(controle deslizante) e determinar os pontos do domínio por A = (a, 0), os do gráfico de f por B =
(a, f(a)) e os do conjunto imagem de f por C = (0, f(a)). Feito isso, ativamos o recurso rastro
(trace) do Geogebra para os pontos A, B e C. Em seguida, ativamos animação de a. Assim vão
sendo traçados, dinamicamente, os rastros de A, de B e de C. Com esse procedimento,
discriminamos, experimentalmente, no plano cartesiano, os lugares do domínio, do gráfico e do
conjunto imagem de f respectivamente. Essa validação experimental pode ajudar a criar uma
imagem mental correta de cada um dos objetos matemáticos visados.
A seguir, passamos para a análise da tarefa 2.
Tarefa 2: A equação de movimento de uma partícula é s(t) = t3 – 6t
2 + 9t, em que s(t) é
dado em metros e t em segundos. Encontre:
a) A velocidade e a aceleração como funções de t.
b) A equação da reta tangente ao gráfico de s no instante t = 5s.
216
c) A aceleração depois de 2s.
d) A aceleração quando a velocidade for 0.
e) O esboço do gráfico de s.
Esta tarefa foi adaptada do livro de Stewart (2011, v.1, pp. 205-206).
A tarefa tem como objetivos verificar a capacidade dos participantes na interpretação da
derivada como velocidade (e aceleração, no caso da segunda derivada), da derivada como declive
da reta tangente e no uso das técnicas práticas de derivação. Também se explora o uso da
derivada para esboçar o gráfico de uma função. Nessa exploração, pretendemos perceber como os
participantes articulam alguns significados para responder à questão:
Aplicação das técnicas de derivação de uma soma de polinômios e de uma função
potência;
O significado do gráfico como um conjunto G(f) = {(x, f(x)): x Df} de pontos no
plano cartesiano;
O significado do comportamento da 1ª derivada de s;
- Se, em um intervalo I IR, tivermos s’(t) > 0, então s é crescente nesse intervalo e
vice-versa.
- Se, em um intervalo I IR, tivermos s’(t) < 0, então s é decrescente nesse intervalo e
vice-versa.
Significado de um número crítico c de uma função f: usando a definição: um
número c do domínio de f é um número crítico se f’(c) = 0 ou f’(c) não existe.
Se f é derivável em c e c é um extremo local de f, então c é um ponto crítico. Note-se que
o recíproco não vale, pois nem todo ponto crítico, em que f é derivável, é um extremo local. Pode
ser um ponto de inflexão.
Fizemos as seguintes escolhas para encaminhar a tarefa colocada:
Formulação da tarefa em língua natural (ostensivo discursivo), evocando um
contexto da Física. Consideramos o contexto do movimento como apropriado nesta
tarefa porque corresponde ao tipo de contexto que a maior parte de livros de introdução
ao Cálculo usa para começar o estudo de variações de funções reais a valores reais,
como o caso de derivadas de funções reais a valores reais. Dos livros analisados,
217
observamos essa tendência no livro escolar moçambicano (VUMA, 2010), no de Stewart
(2011, v. 1), no de Hoffmann & Bradley (1999) e no livro de Sarrico (2005).
Lei do movimento dada por uma sentença polinomial;
Discriminação dos diferentes itens da tarefa em alíneas;
Caso haja necessidade do uso do computador, o software Geogebra é uma escolhar a
considerar. Essas escolhas são importantes porque permitem que a pessoa que é
solicitada a resolver tome sua decisão para encaminhar a solução.
Respostas esperadas:
Na parte a), esperamos que o estudante use a técnica prática da derivação, interpretando
a velocidade como derivada da equação do movimento e aceleração como derivada da equação
da velocidade, ou seja, segunda derivada da equação do movimento. As técnicas para essa
interpretação devem ser os conhecimentos cristalizados em relação a essas noções. Assim, o
estudante pode fazer o seguinte, usando as técnicas práticas de derivação de uma soma e de
funções potências, recorrendo à notação de apóstrofo, sugerida por Cauchy (1789-1857) no
século XIX:
v(t) = s’(t) = (t3 – 6t
2 + 9t)’ = 3t
2 – 12t + 9
a(t) = v’(t) = s’’(t) = (3t2 – 12t + 9)’ = 6t – 12.
O estudante pode também usar a definição de derivada como limite da razão incremental
para qualquer t, e h = t – t0, ainda sugerida por Cauchy, na mesma época:
v(t) = h
s(t)h)s(tlim
0h
=
h
9t)6t(th)9(th)6(th)(tlim
2323
0h
=
= h
9t6tt9h9t)h2th6(th3thh3ttlim
23223223
0h
= h
9t6tt9h9t6h12th6th3thh3ttlim
23223223
0h
= h
9h6h12thh3thh3tlim
2322
0h
=
= 0h
lim
(3t2 + 3th + h
2 – 12t – 6h + 9) = 3t
2 – 12t + 9.
Do mesmo modo para aceleração:
218
a(t) = h
(t)s'h)(ts'lim
0h
=
h
9)12t(3t9h)12(th)3(tlim
22
0h
=
= h
912t3t912h12th6th3tlim
222
0h
=
h
12hh6thlim
2
0h
=
= 0h
lim
(6t + h – 12) = 6t – 12
Essa técnica é pouco provável ocorrer, pois a experiência mostra que, logo que se
introduzem as técnicas práticas do cálculo de derivadas, estas assumem o caráter autotecnológico,
tornando-se quase inquestionáveis na resolução de problemas sobre a derivada. A definição é
praticamente ignorada, pelo menos no contexto moçambicano. Notemos que o encaminhamento
de cada uma das técnicas utilizadas na resolução depende do conhecimento disponível dos
estudantes, pois na formulação do problema não é indicado como ele deve ser resolvido. Cabe ao
estudante encontrar a maneira de fazer. E observamos, por outro lado, que todas as formulações
são feitas no quadro da análise matemática.
Com o software Geogebra, a questão pode ser resolvida introduzindo na linha de
comandos a lei de formação da função: f(x) = x3 – 6x
2 + 9x. Em segundo lugar, introduzir na
mesma entrada a expressão f’(x) ou derivada[f]. Assim obtemos na tela o resultado f’(x) = 3x2 –
12x + 9 e o gráfico correspondente. Esses resultados são apresentados como uma caixa preta, de
modo que o software não dá nenhuma indicação de como tais comandos operam. Como
indicamos acima, aqui fazemos interações sujeito-objeto mediadas pelo instrumento (S-Om).
Cabe ao estudante assumir que os objetos assim produzidos correspondem aos resultados
desejados, fazendo comparações, inferências e buscando na memória o que ele sabe acerca das
representações das noções em discussão.
No nosso entender, a resolução anterior mostra uma vantagem relativa do software
Geogebra em relação aos procedimentos usuais, pois aparecem sempre duas representações da
função: o ostensivo algébrico e o ostensivo gráfico. E a sintaxe é quase idêntica à que usamos em
contextos habituais, e ainda com possibilidades de apresentar o ostensivo tabular.
A aceleração pode ser calculada do mesmo modo.
Na parte b), esperamos que o estudante saiba interpretar que:
1) Uma das equações de uma reta é dada por y = ax + b, onde
a = f’(x0). Desse modo a = s’(t0 = 5) = 3 52 – 12 5 + 9 = 75 – 60 + 9 = 24.
219
No ponto t0 de tangência, temos que s(t0) = y0, ou seja:
s(5) = 53 – 6 5
2 + 9 5 = 125 – 150 + 45 = 20. Logo temos 20 = 24 5 + b b = -100
y = 24t – 100.
Portanto, os conhecimentos sobre o que é uma reta tangente ao gráfico de uma função f
num dado ponto P, da equação reduzida de uma reta r, da relação entre a declividade da reta em
causa e o valor da derivada de f em P, são os elementos técnico-tecnológicos que o estudante
deve ter para desenvolver a solução.
2) Podemos também usar a fórmula y – f(x0) = f’(x0)(x – x0) y = f’(x0)(x – x0) +
f(x0), o que resulta em y = 24t – 100.
3) Com o recurso computacional, temos as seguintes possibilidades de obter a
resposta:
Possibilidade 1: tendo na mente a equação y = f’(x0)(x – x0) + f(x0), introduzimos na
linha de comandos a expressão f(x) = x3 – 6x
2 + 9x. Em seguida, introduzimos a expressão f’(5) e
obtemos 24. Esse é o valor f’(x0) na equação dada. Na sequência, introduzimos a expressão f(5), e
obtemos 20. Este é o valor de f(x0) na equação dada. Por fim, introduzimos a expressão y = 24(x –
5) + 20, e obtemos y = 24x – 100.
Possibilidade 2: tendo na mente a equação y = ax + b, e calculados os valores de f’(x0) e
f(x0) como na possibilidade 1, calculamos o valor de b, introduzindo na linha de comandos a
expressão: b = f(x0) – a * x0 = 20 – 24 * 5 = -100. No fim, introduzimos a equação: y = 24x –
100.
Notemos que cada comando implementado para produzir um determinado resultado é
guiado pelo resultado teórico y = f’(x0)(x – x0) + f(x0) ou y = ax + b. O software intervém nessas
situações como qualquer outra ferramenta usual, apenas com a vantagem de que os cálculos são
feitos muito rapidamente.
Possibilidade 3: introduzimos a expressão f(x) = x3 – 6x
2 + 9x. Na sequência,
introduzimos a expressão y = f’(5)(x – 5) + f(5) e, obtemos y = (3 52 – 12 5 + 9)(x – 5) + (5
3 –
6 52 + 9 5). Esta expressão não é muito elegante, mas corresponde às duas anteriores. Para
escrever na forma reduzida, é preciso calcular os valores das expressões numéricas (3 52 – 12 5
+ 9) e (53 – 6 5
2 + 9 5) no próprio Geogebra, numa calculadora ou a mão, usando lápis e papel.
Esta possibilidade não traz vantagem relativa às outras mídias.
220
Possibilidade 4: pode-se traçar a reta tangente ao gráfico de f no ponto x0 = 5,
introduzindo na linha de comandos a expressão tangente[(5, f(5)), f]. Esse modus operandi é
muito abstrato e não deixa nenhuma informação acerca dos elementos dessa reta, senão a
propriedade de ser tangente. Com esta possibilidade, o conceito de declive de uma reta não fica
transparente e, dessa forma, esse conceito não pode ser usado para a construção da técnica de
derivação.
Possibilidade 5: esta é uma variante da possibilidade 4, em que construído o gráfico de f,
introduzimos o ponto P sobre o gráfico de f com coordenadas 5 e f(5), fazendo: (5, f(5)).
Construído este ponto sobre o gráfico de f, ativamos a opção tangente na barra de ferramentas e
clicamos sucessivamente sobre o gráfico de f e sobre o ponto P. Com esse procedimento, é
traçada uma reta tangente ao gráfico de f passando pelo ponto P. Esta possibilidade, como a
anterior, não deixa claros os elementos constitutivos da tangente.
As duas últimas possibilidades de construir a reta tangente ao gráfico de uma função f
são radicalmente peculiares ao software Geogebra e, embora sendo procedimentos precisos, são
comparadas a um procedimento manual impreciso em que, dada uma curva c, no papel ou no
quadro negro ou branco, alguém toma uma régua e traça uma reta encostando-a supostamente à
curva c num ponto P, muitas vezes sem certeza se a reta traçada é tangente, secante ou uma reta
sem ponto em comum com a curva c.
Consideramos importante referir que com o recurso computacional, as praxeologias
envolvidas na questão mudam. As interações com os objetos finalizados são indiretas, as
respostas são fornecidas pelo computador e a tarefa principal do estudante é analisar e interpretar
o que é fornecido.
Destacamos que a solução da questão é desenvolvida no quadro da análise matemática e
demanda o conhecimento disponível do estudante, pois é da sua responsabilidade determinar
como encaminhar a resolução.
A questão c) tem como objetivo identificar como o estudante usa a lei de formação da
função para calcular uma imagem específica, dado um elemento do domínio. As técnicas para
resolver essa questão são os conhecimentos disponíveis do estudante da equação da aceleração,
calculada em a), como derivada da velocidade e as técnicas de substituição em tal equação para
determinar imagens. O estudante deve interpretar que “depois de 2 segundos” significa t0 = 2s.
221
Assim, temos a(2) = 6 2 – 12 = 0. Em termos físicos, isso significa que a velocidade não varia
nesse ponto. A questão está colocada no quadro de álgebra, pois a solução é obtida pela
manipulação formal da equação da aceleração, usando as operações de substituição da variável
pelo valor dado, multiplicação e adição (subtração) numéricas.
Com o recurso computacional, a solução não é muito diferente da solução anterior, pois
obtida a equação da aceleração, como indicado na a), introduzimos na linha de comandos a
expressão v’(t), com t = 2, e obtemos, v’(2) = 0.
Na parte d) temos o objetivo de verificar a capacidade do estudante de articular o
teorema de Fermat com um contexto da resolução do problema de movimento. As tecnologias
que guiarão a solução do problema devem ser os conhecimentos disponíveis sobre o teorema de
Fermat e sobre a resolução algébrica de equações do segundo grau, além de outros raciocínios de
interpretação da questão. Assim sendo, o estudante deve concluir que “A aceleração quando a
velocidade for 0”, implica primeiramente calcular o tempo para o qual a velocidade tem esse
valor. E usando esse tempo, calcular a aceleração: então v(t) = 0 3t2 – 12t + 9 = 0 3(t
2 – 4t
+ 3) = 0 t = 1 e t = 3. Note que o estudante pode valer-se também da fórmula de Bhaskara e
determinar os zeros da função derivada.
Portanto, a velocidade é igual a zero nos instantes t = 1 e t = 3. Usando estes tempos,
temos:
No instante t = 1, obtemos a(1) = 6 1 – 12 = -6. Uma aceleração negativa, em termos
físicos isso significa que o movimento está sendo retardado, está havendo uma diminuição da
velocidade.
No instante t = 3, temos a(3) = 6 3 – 12 = 18 – 12 = 6. Uma aceleração positiva. Em
termos físicos, teríamos que o movimento está sendo acelerado, ou seja, está havendo um
aumento da velocidade.
É possível surgirem dificuldades nessa questão, principalmente no relacionamento entre
o estado da velocidade e aceleração, pois existe aqui uma sutileza da necessidade do cálculo dos
tempos. Notemos que a solução é desenvolvida no quadro da álgebra e demanda o conhecimento
disponível do estudante.
Com o recurso computacional, procedemos da seguinte maneira para resolver a questão:
como ponto de partida, temos de estar certos de que pretendemos calcular os tempos para os
222
quais a velocidade é nula. Por outro lado, precisamos ter na mente o teorema de Fermat, segundo
o qual, “Se f é uma função derivável num ponto x = c, onde ela assume valor máximo ou mínimo,
então f’(c) = 0”, (ÁVILA, 2005, p. 182). Dispondo desses conhecimentos, temos duas
possibilidades para atacar o problema:
Possibilidade 1: plotada a equação do movimento no computador, procedemos ao
cálculo dos extremos de f, introduzindo o comando: extremos[f], e obtemos A = (1, 4) e B = (3,
0). As abscissas desses pontos são os tempos procurados, quer dizer t1 = 1 e t2 = 3. A partir desses
tempos, calculamos a aceleração requerida, introduzindo sucessivamente, na linha de comandos,
as expressões a(1) e a(2) e obtendo, respectivamente, a(1) = -6 e a(3) = 6.
Possibilidade 2: plotada a equação do movimento no computador, determinamos a
função derivada, introduzindo o comando f’(t) ou derivada[f] e obtemos f’(t) = 3x2 – 12x + 9.
Em seguida, introduzimos o comando raízes [função, ponto-inicial, ponto-final]. Este comando
chama-nos a atenção sobre o intervalo do domínio onde devemos procurar as raízes da função
dada. Com a ajuda do gráfico e com a informação disponível de que as raízes de uma função são
as abscissas da interseção do gráfico de f com o eixo dos x, podemos especificar a nossa busca,
colocando raízes[f’, 0, 5] e obtendo C = (1, 0) e D = (3, 0). E, como antes, escolhemos as
abscissas desses pontos como os tempos procurados: t1 = 1 e t2 = 3. E, na sequência,
determinamos os valores correspondentes da aceleração. Uma restrição que observamos na
pesquisa de zeros da função por meio do software é que ele não consegue pesquisar tais zeros em
todo o conjunto IR, digamos, o comando raízes[função, menos infinito, mais infinito] não é
reconhecido. A mesma situação ocorre com valores numéricos na ordem de milhares. Mas com o
intervalo na ordem de centenas, ou menos, o software faz a busca das raízes corretamente.
Na parte e), temos como objetivo investigar como os estudantes usam o teste da 1ª
derivada ou a combinação da 1ª e a 2ª derivadas para estudar a monotonia da função f. Esperamos
que, a partir do conhecimento disponível, o estudante possa relacionar as informações nas alíneas
anteriores da seguinte forma:
Se num dado intervalo I, s’(t) > 0, então s é crescente nesse intervalo e vice-versa.
Se num dado intervalo I, s’(t) < 0, então s é decrescente nesse intervalo e vice-
versa.
223
Se em I, s’(t) = 0, então s é constante em I, ou, se f não é constante, então s’(t) = 0
implica que t é abscissa de um ponto crítico (máximo, mínimo ou ponto de inflexão).
Se nas proximidades de t, tal que s’(t) = 0, temos à esquerda de t, s’(t) > 0 e à
direita de t, s’(t) < 0, então t é um ponto do máximo local. E ocorrendo o contrário, então t é um
ponto do mínimo local. Se nas proximidades de t, tal que s’(t) = 0, s’(t) não muda de monotonia,
então t não é ponto do extremo. É um ponto de inflexão.
A análise desse último ponto pode ser feita com o auxílio da segunda derivada,
raciocinando da seguinte maneira: se s’(t) = 0 e s’’(t) < 0, então t é um ponto de máximo local. Se
s’(t) = 0 e s’’(t) > 0, então t é um ponto de mínimo local. Se s’(t) = 0 e s’’(t) = 0, então t é um
ponto de inflexão. Observamos que nessa última parte da articulação entre a 1ª e 2ª derivadas,
não é necessário que s’(t) = 0 para que a condição s’’(t) = 0 implique t ser ponto de inflexão.
Com essas informações, elaboramos o que se chama esquema de sinais:
FIGURA 50 – ESQUEMA DE SINAIS DA 1ª DERIVADA
FONTE: O autor (2014).
Dadas essas informações, o esboço do gráfico ficaria:
FIGURA 51 – GRÁFICO DA FUNÇÃO f( t) = t3 – 6t2 + 9t DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Observamos ainda que por se tratar de uma função polinomial, ela não tem assíntotas.
Assim sendo, não é preciso fazer uma análise sobre esses elementos para esboçar o gráfico.
No teste diagnóstico, a alínea e) tinha uma alternativa que consistia em identificar a
representação gráfica correta. Ao propor esta alternativa, pensávamos que avaliar a capacidade de
reconhecimento do gráfico da função e do respectivo gráfico da derivada dessa função fosse
224
importante, pois esse reconhecimento indica que o estudante dispõe de conhecimentos que o
capacita a identificar a relação entre a derivada e a função dada.
FIGURA 52 – GRÁFICOS DE f(t) = t3 – 6t2 + 9t E DE SUA DERIVADA: TESTE DIAGNÓSTICO
Em qual das figuras dadas abaixo, o gráfico da função s está desenhado corretamente, tendo em conta o
desenho do gráfico da sua função derivada s’? Justifique a sua resposta.
Fig. 1
Fig. 2
Fig. 3
Fig. 4
FONTE: O autor (2014).
A resposta esperada nesta alternativa é a seguinte: primeiro observamos as figuras e
concluímos que em cada uma delas o gráfico de f está desenhado da mesma maneira. Portanto, o
erro deve estar no desenho do gráfico da função derivada. Estudando a derivada, concluímos que
os seus zeros são t1 = 1 e t2 = 3. Com esta informação, percebemos que o desenho correto deve
ser da figura 2 ou da figura 3. Um outro dado importante é que a derivada tem a ordenada na
origem igual 9. Em razão dessa informação, excluímos a figura 2 das respostas corretas. Assim,
nossa atenção fica focada na figura 3, a qual apresenta, porém, uma restrição sobre a ordenada
na origem, porque não mostra seu valor. Assim, passamos a estudar algebricamente as
coordenadas do vértice: tV = 2
tt 21 = 2
31= 2.
e sV = 4a
Δ =
4a
4acb2 =
34
934(-12)2
=
12
108144 =
12
36 = - 3
A partir dos dois valores obtidos, concluímos que a figura corretamente desenhada é a Fig. 3.
O Geogebra, pode ajudar na construção visualização da tarefa dada na parte e) fazendo o
seguinte: introdução da expressão analítica f(x) = x3 – 6x
2 + 9x na entrada de comandos e
confirmar. Fazendo isso, obtemos a representação gráfica da função. Na alternativa da tarefa de
identificar a figura corretamente desenhada contendo o gráfico da função f e o de sua derivada,
225
num sistema cartesiano ortogonal, a resposta esperada consiste em desenhar o gráfico de f e da
sua derivada para depois comparar a monotonia de f e o sinal de f’. Essa comparação é o meio
cognitivo importante para formular a resposta da pergunta.
Consideramos que cada uma das técnicas e tecnologias usadas para responder a questão
proposta tem as suas virtudes e restrições pedagógicas.
Por meio das técnicas e das tecnologias com recurso à mídia vigente, o estudante
desenvolve um procedimento passo a passo e com a sua interação direta, embora usando lápis27
sobre o papel, na gestão e produção de meios visuais (ostensivos algébricos e gráficos) na
elaboração da resposta. Essa interação direta pode ajudar o estudante a refletir melhor sobre a
natureza do conceito visado.
Com a tecnologia computacional, a gestão de produção de meios visuais é feita pelo
computador, mediante uma descrição do objeto pretendido, por meio de ações do estudante sobre
o teclado. Aqui o estudante igualmente tem de refletir, primeiramente, sobre como descrever. Em
segundo lugar, o estudante tem a possibilidade de fazer uma validação visual e experimental do
resultado obtido.
Portanto, com a mídia usual, o estudante desenvolve a solução tendo na mente a
preocupação de como construir e por quê. Geralmente a satisfação da preocupação de como e por
quê é resolvida primeiro, por meio de um discurso teórico, e muitas vezes avançado pelo
professor: teorema de Fermat, teorema da positividade (negatividade) da função derivada f’, num
intervalo onde f é crescente (decrescente). Enquanto com a mídia computacional, a preocupação
do estudante é sobre o que significa o que se construiu. Qual a relação entre os extremos de f
(visíveis) no gráfico e os elementos da derivada de f? O que implica o crescimento
(decrescimento) de f para a derivada de f? No nosso entender, com a mídia computacional, os
elementos teóricos necessários para resolver a questão colocada são construídos
experimentalmente pelo estudante. Embora com a mídia usual essa estratégia possa ser
desenvolvida, na prática não acontece assim, talvez por inércia da própria prática didática
tradicional. A seguir, passamos para a tarefa 3.
27 Podemos pensar no lápis como prolongamento da ação dos dedos sobre o papel.
226
Tarefa 3: Seja
2
22
xsebmx
xsexxf )(
Encontre os valores de m e b que tornem f derivável em todo seu campo de definição.
Essa tarefa foi inspirada numa das tarefas usadas pela Millán et al. (2013) no seu estudo
que procura identificar as dificuldades dos estudantes mexicanos do curso de Matemática
Aplicada na resolução de problemas envolvendo derivadas. Nesse estudo, é reportado que
nenhum dos participantes da pesquisa conseguiu executar corretamente uma tarefa desse tipo. A
nossa réplica com uma tarefa idêntica pode dar indicações sobre como, em uma outra realidade,
no caso moçambicano, os estudantes reagem a esse tipo de tarefas e, assim, verificar se as
dificuldades em relação à tarefa estão associadas à própria tarefa ou a uma relação institucional
que a torna uma situação de referência para os estudantes que se submetem a essa relação. A
seguir, depois da indicação do objetivo da tarefa, destacamos alguns aspectos matemáticos e
didáticos da mesma.
Para a tarefa, o objetivo foi verificar como o estudante usa a definição da função
derivada, se ele entende as restrições impostas pela definição de que se uma função f é derivável
em um intervalo I, então ela é contínua nesse intervalo. A tarefa impõe a disponibilidade do
conhecimento de articulação entre o conceito de continuidade e o conceito de derivada de uma
função em um ponto.
Fizemos as seguintes escolhas para apresentação da tarefa:
Lei de formação da função dada por duas sentenças polinomiais;
Existência de dois parâmetros desconhecidos cujos valores devem ser calculados;
Formulação do pedido em língua natural.
Resposta esperada:
A técnica para resolver a questão deve ser o conhecimento disponível do estudante. Ele
deve saber que o problema da derivabilidade de f só pode acontecer em x = 2, pois à esquerda de
2 temos uma função quadrática e ela é sempre diferenciável. À direita de 2 temos uma função
afim, ela é sempre diferenciável. Então, para que f seja diferenciável em x = 2, devemos ter x2 =
mx + b, e (x2)’ = (mx + b)’, ou seja 2x = m. Ou seja, 2 2 = m, isto é: m = 4. Então, de x
2 = mx +
b, obtemos 22 = 4 2 + b b = -4
Assim, obtemos m = 4 e b = -4.
227
Um erro de raciocínio que pode ocorrer na resolução dessa tarefa é continuar a resolver
o problema no quadro algébrico em que está formulado: supor que as duas expressões x2 e mx +
b sejam identicamente iguais e usar isso para calcular os coeficientes pretendidos. Ou seja,
admitir que, se x2 = mx + b, então m = 0 e b = 0, o que nos permite dizer que no contexto em que
o problema se insere, essa solução está errada. Portanto, a necessidade de mudanças do quadro
algébrico para o quadro analítico e deste para o algébrico é pertinente nesse problema.
O recurso computacional não é muito útil nessa tarefa, embora possa ser possível
encontrar os valores pretendidos pela escolha dos números convenientes num processo de
experimentação com alguns valores dos parâmetros m e b.
Na sequência, passamos para a tarefa 4.
Tarefa 4: Considere a função definida por
00
012
xse
xsex
senx
xf )(
Encontre a função derivada de f e seu valor (da função derivada) no ponto x = 0.
Esta tarefa foi inspirada na pesquisa de Hitt (2011, p. 723), intitulada “Construction of
mathematical knowledge using graphic calculators (CAS) in the mathematics classroom” com
estudantes canadenses em formação para serem professores do Ensino Médio.
A discussão apresentada no trabalho mostra que não houve consenso entre os formandos
se a função dada era derivável ou não no ponto x = 0. Consideramos que isso ocorreu por falta de
compreensão clara do resultado teórico expresso no teorema do confronto, segundo o qual, se
uma função f tem limites laterais iguais num ponto x0 de seu domínio, então ela tem limite nesse
ponto.
Com essa tarefa, pretendíamos verificar se os estudantes conseguem tratar as duas
sentenças separadamente, para x 0 e para x = 0 e se eles consideram f nestas condições dadas
como diferenciável em x = 0. Desse modo, podemos verificar se os estudantes dispõem de
conhecimentos associados ao teorema do confronto.
Trata-se de uma tarefa enunciada no quadro da análise matemática, pois o que se pede é
a determinação da função derivada da função dada e a determinação de seu valor no ponto x=0.
Fizemos as seguintes escolhas para encaminhar a tarefa:
228
Lei de formação da função dada por ostensivo algébrico em duas sentenças,
sendo uma numérica e a outra um produto de um monômio quadrático e a função seno
de argumento 1/x.
Formulação do pedido em língua natural;
Software Geogebra versus papel/lápis
Como indicamos nas questões anteriores, caso seja usado o recurso computacional; o
software do computador, cor das construções gráficas e a espessura das curvas produzidas são
alguns elementos que podem ser considerados na produção da resposta.
Respostas esperadas:
Se os estudantes trabalham apenas no ambiente lápis e papel, a resposta esperada pode
ser encaminhada da seguinte maneira: primeiro interpretar que se existe algum problema de
derivabilidade da função f dada, esse problema deve estar em x = 0, pois tanto à esquerda quanto
à direita de 0, temos o produto de uma função quadrática e uma função seno sempre definidas em
todos os seus pontos. Cada uma dessas funções é sempre diferenciável e o produto de funções
diferenciáveis é diferenciável. No ponto x = 0, temos a função constante (nula), sempre
diferenciável.
Assim, temos, para x 0, f’(x) =
'
2
x
1senx
=
x
12xsen –
x
1cos .
Usando diretamente as regras práticas de derivação do produto e da função composta.
Para x = 0, podemos usar a definição: f’(0) = 0x
f(0)f(x)lim
0x
=
x
0x
1senx
lim
2
0x
=
x
1xsenlim
0x= 0.
O estudante que não tem conhecimento disponível sobre o teorema do confronto vai ter
dificuldades para determinar
x
1xsenlim
0x. Por causa das regras práticas do cálculo do limite,
229
alguns estudantes podem ser levados a raciocinar erroneamente, fazendo
x
1xsenlim
0x=
0
1sen 0 = 0, sem dar-se conta de que a fração
0
1não tem sentido.
Portanto, o passo importante para encaminhar a solução é reconhecer que a função
definida por sen (1/x) é limitada, pois existe um número M > 0 tal, que |sem(1/x)| < M e, desse
modo, aplicar o teorema do confronto, como podemos verificar na demonstração apresentada na
figura 53:
Segundo Guidorizzi (2008), temos a seguinte formulação do teorema do confronto e
exemplos de sua aplicação:
FIGURA 53 – TEOREMA DE CONFRONTO E SUA APLICAÇÃO
Teorema (de confronto). Sejam f, g, h três funções e suponhamos que exista r > 0 tal que
f(x) < g(x) < h(x)
para 0 |x – p| < r. Nestas condições, se
h(x)px
limLf(x)px
lim
então Lg(x)px
lim
[…]
Exemplo 2: Sejam f e g duas funções com mesmo domínio A tais que 0f(x)px
lim
e |g(x)| < M para todo x
em A, onde M > 0 é um número real fixo. Prove que 0f(x)g(x)px
lim
Solução
|f(x)g(x)| = |f(x)||g(x)| < M|f(x)|
para todo x em A. Daí, para todo x em A
-M|f(x)| < f(x)g(x) < M|f(x)|
De 0f(x)px
lim
segue que 0|f(x)|Mpx
lim
e 0|f(x)|Mpx
lim
. Pelo teorema de confronto
0f(x)g(x)px
lim
[…]
Exemplo 3. Calcule g(x)xxlim
2
0onde
Qxse1-
Qxse1g(x)
Solução
2x
xlim
0= 0; como g(x)
xlim
0não existe (verifique) não podemos aplicar a propriedade relativa a limite de um
produto de funções. Entretanto, como g é limitada, (|g(x)| < 1 para todo x) e
2
xxlim
0= 0, pelo exemplo anterior
FONTE: Guidorizzi (2008, p 90-92).
230
Por conseguinte, para resolver bem esta tarefa é preciso que o estudante disponha de
conhecimentos sobre as proposições apresentadas por Guidorizzi (2008) nos exemplos 2 e 3
anteriores dados na figura 53.
O estudante deve dispor do conhecimento que o conceito de limite não evoca que a
função esteja definida no ponto considerado e ponderar sobre a propriedade do limite do produto
no qual um dos fatores é uma função limitada. Assim, para cumprir a tarefa proposta, espera-se
que os estudantes disponham de conhecimentos relacionados ao conceito de limite de uma
função, suas operações e propriedades.
Assim temos: f’(x) =
0xse0
0xsex
1cos
x
12xsen
Se os estudantes trabalham no ambiente computacional, a resposta esperada pode ser
encaminhada da seguinte maneira:
Inserimos a função f na entrada de comandos: f(x) = If[x != 0,(x^2) * sin(1/x),0],
obtemos o ostensivo algébrico na janela algébrica e seu correspondente gráfico na janela gráfica.
Aqui o estudante, ao utilizar o artefato Geogebra, pode observar a existência do ostensivo
algébrico e do ostensivo gráfico por meio das representações que aparecem na tela do
computador. Tal como indicamos nas tarefas anteriores, as interações do estudante com o objeto
finalizado são mediadas pelo instrumento.
Em seguida, derivamos a função, introduzindo a sintaxe normal: f’(x) e obtemos o
resultado, como se vê na figura 54 em cor azul. Esse resultado não nos fornece uma ideia clara da
derivabilidade de f no ponto x = 0, pois analiticamente temos a derivada do ramo para x 0.
FIGURA 54 – GRÁFICO DE f(x) =
00
012
xse
xsex
senx
,
, E SUA DERIVADA
FONTE: O autor (2014).
231
Por outro lado, o comportamento gráfico de f’ nas proximidades de x = 0 não permite
compreender se ela é prolongável ao ponto zero.
Para que o sujeito possa certificar-se desse fato, ele pode desenhar uma reta tangente ao
gráfico de f nas proximidades de zero e seu declive e, em seguida, observar se no ponto x = 0 a
reta tangente e seu declive existem ou não, como verificamos na figura 55:
FIGURA 55 – RETA TANGENTE AO GRÁFICO DE f(x) =
00
012
xse
xsex
senx
,
, EM x = 0
FONTE: O autor (2014).
Na figura 55, vemos que existe uma reta tangente ao gráfico de f no ponto x = 0 e o
declive dessa reta é igual a zero. Caso não existissem esses elementos, o computador daria a
mensagem undefined. Assim sendo, podemos fazer uma comparação entre o discurso tecnológico
baseado no teorema do confronto, desenvolvido no quadro da análise matemática e o discurso
tecnológico desenvolvido no quadro da Geometria, por meio do recurso computacional, em
termos do custo cognitivo implicado, complexidade, validade e efetividade da solução.
Com o teorema do confronto, o resultado f’(0) = 0 é produzido inferencialmente,
raciocinando da seguinte maneira: como f’(0) = 0 f’(0
+) = 0, então f’(0) = 0. A validade do
resultado é assegurada teoricamente. Na ausência desse resultado teórico, não há como resolver.
Com a mídia computacional, o resultado f’(0) = 0 é obtido construtivamente e validado
experimental e visualmente, raciocinando-se da seguinte maneira: f’(0) = 0 porque f’(0) = m e m
= 0! Vemos isso na figura construída. Além disso, vemos que há uma reta tangente, em cor azul,
ao gráfico de f no ponto x = 0. Num ponto onde a função f não é diferenciável, nunca haveria
reta tangente.
232
Este último argumento é corroborado com Ávila (2005, p. 177) que afirma o seguinte:
“Diz-se que a função f é diferenciável em x = x0 se existe uma reta do feixe (de retas)28
que tenha
com a curva y = f(x) contato de ordem superior à primeira no ponto P = (x0, f(x0))”.
Portanto, cada discurso desenvolvido tem a sua virtude em termos de provimento de
meios ostensivos e não ostensivos para a construção do conhecimento visado. Contudo, a nossa
percepção é de haver uma relativa vantagem da mediação didática com o recurso computacional
Geogebra, pois com ele conseguimos estabelecer a coordenação visual entre o declive e a
representação da reta tangente, o que nos permite dizer se a função dada é diferenciável ou não
no ponto x = 0. Aqui a validade do resultado é assegurada tanto teórica, quanto
experimentalmente. Por causa disso, consideramos essa maneira de fazer como sendo a mais
efetiva do que a sua contraparte baseada no raciocínio inferencial.
A seguir, apresentamos a análise a priori da parte II da experimentação sobre as noções
de base para a integral definida.
7.2.2 Parte II: Noções de base para a Integral de Riemann
Os conceitos visados são os seguintes:
A: Partição P de um intervalo I de números reais.
B: Máximo e mínimo de uma função f contínua em um intervalo I.
C: Soma inferior e soma superior de f relativamente à partição P.
D: Supremo (ínfimo) de uma sequência monótona limitada de somas.
E: Refinamento de uma partição P.
Objetivo geral das tarefas propostas: verificar o domínio desses conceitos pelos
participantes da discussão para determinar algumas estratégias a adotar nas sessões.
As tarefas foram baseadas nos livros de Stewart (2011), Ávila (2005) e Sarrico (2005).
Começamos por observar o que é uma partição P de um intervalo I de números.
Uma partição P do intervalo [a, b] é um subconjunto finito de pontos P = {t0, t1, t2, …,
tn} tal que a P e b P. A notação será sempre usada de modo que a = t0 < t1 < t2 < t3 < … < tn-1
28 A expressão entre parênteses é nosso acréscimo.
233
< tn = b. O intervalo [ti-1, ti], de comprimento ti – ti-1, é chamado de i-ésimo intervalo da partição
P.
Tarefa 1: Mostre que
n
1i
1ii ab)t(t
A tarefa tem como objetivo obter uma ideia inicial da relação entre a forma reduzida e a
forma expandida de somas de intervalos da partição.
Consideramos como escolha pertinente da tarefa a apresentação da soma de n intervalos
de uma partição P na forma de somatório.
Resposta esperada:
n
1i
1ii )t(t (t1 – t0) + (t2 – t1) + (t3 – t2) + … + (tn-1 – tn-2) + (tn – tn-1) =
= -t0 + (t1 – t1) + (t2 – t2) + … + (tn-2 – tn-2) + (tn-1 – tn-1) + tn = tn – t0 = b – a.
A tarefa está colocada no nível disponível de conhecimentos, pois a reformulação para
elaborar a solução é da responsabilidade do estudante e é desenvolvida no quadro da álgebra. A
técnica usada para encontrar a resposta é o desenvolvimento ordenado do somatório dos termos
indexados da sequência, seguido de aplicação das propriedades algébricas de comutatividade e
associatividade e das operações algébricas de subtração e adição.
Quanto ao recurso à mídia computacional, do nosso lado não temos informação
suficiente para desenvolver a resposta requerida que envolva operações com polinômios. Na
sequência, apresentamos a tarefa 2.
Tarefa 2: Um gráfico de uma função f: [-2, 2] IR está dado abaixo.
FIGURA 56 – GRÁFICO (I) DA FUNÇÃO f(x) = 2sen(2x) + 3
FONTE: O autor (2014).
a) Determine:
m = inf(f). Justifique
234
M = sup(f). Justifique
b) Considere a partição P de I, P = {-2, 2
,
4
, 0,
4
,
2
, 2}.
Usamos as notações mi = inf{f(x); ti-1 < x < ti}, Mi = sup{f(x); ti-1 < x < ti} e i =
Mi - mi para indicar, respectivamente, o ínfimo, o supremo e a oscilação de f no i-ésimo intervalo
de P. Quando f é contínua, mi e Mi são valores efetivamente assumidos por f em [ti-1, ti]. Em
particular, neste caso, existem xi, yi [ti-1, ti] tais que i = |f(yi) – f(xi)|.
Ainda, temos que:
A soma inferior de f relativamente à partição P é o número s(f, P) =
n
1i
1iii )t(tm . A soma
superior de f relativamente à partição P é o número S(f, P) =
n
1i
1iii )t(tM .
No caso da figura acima, calcule:
s(f, P)
S(f, P)
S(f, P) – s(f, P) =
n
1i1iii )t(tω
Destaque na figura, usando cores diferentes, cada uma das somas: s(f, P), S(f, P) e
n
1i
1iii )t(tω .
A tarefa tem como objetivo verificar se os participantes dominam os conceitos básicos
usados na definição da integral de Riemann. Precisamente, se dominam os conceitos de cota
inferior (e ínfimo) e de cota superior (e supremo). Ainda para verificar se dada uma partição P, os
estudantes são capazes de determinar uma soma superior e uma soma inferior relativamente ao
gráfico de uma função f, no caso considerado, trigonométrica, num intervalo I limitado e fechado.
Fizemos as seguintes escolhas para encaminhar a tarefa:
Ostensivo gráfico da função e sua lei de formação;
Gráfico da função desenhado num quadriculado; ou desenhado na tela do
computador, ou anida, pode ser denhado no papel com lápis.
235
Localização de todos os pontos da partição, com a exceção dos extremos, sobre
as linhas do quadriculado;
Localização dos máximos e mínimos requeridos para cada intervalo i, com a
exceção dos pontos extremos da partição, nas intersecções das linhas do quadriculado;
Pedido de uso de cores diferentes para destacar retângulos aproximantes por
falta, retângulos aproximantes por excesso e a oscilação;
Respostas esperadas:
Para a questão a), baseando-se no ostensivo gráfico e no resultado teórico da definição
de ínfimo e de supremo e na técnica de substituição na lei de formação da função para determinar
imagens, obtemos:
m = inf(f) =
4
f = 1
O número 1 é ínfimo de f porque vemos na figura que todo número real r < 1 é uma cota
inferior de Imf , pois temos que r < f(x) para todo x [-2, 2], e 1 é a maior das cotas inferiores,
ou seja, inf(f). Como 1 faz parte das imagens de f, então 1 é mesmo um mínimo.
Por outro lado, temos M = sup(f) =
4
f = 5. Pois, como no caso anterior, Imf é
limitado superiormente e da figura vemos que f(x) < 5. Portanto, cada número s > 5 é uma cota
superior de f, e 5 é a menor das cotas superiores de f. Como antes, dado que 5 faz parte das
imagens de f, então 5 é mesmo um máximo de f no intervalo considerado.
A solução também pode ser encaminhada usando as técnicas do Cálculo Diferencial,
trabalhando com a lei de formação da função. Considerando os não ostensivos ínfimo e supremo,
então raciocinamos que eles devem ser extremos absolutos. Com este ponto de partida, evocamos
o resultado teórico expresso no conceito de pontos críticos: neles a derivada é nula ou não existe.
Coordenando esse raciocínio, articulado com a percepção visual dada pela figura, concluímos que
nesses extremos a derivada é nula, pois se situam no interior do domínio I da função f, no qual ela
é diferenciável. Dessas constatações, aplicamos a derivação para resolver o problema:
f(x) = 2sen(2x) + 3. Então, f’(x) = 4cos(2x). f’(x) = 0 4cos(2x) = 0, isto é 2x = 2
π+
kcom k inteiro. Ou seja, x = 2
kπ
4
π . Para o intervalo dado, temos apenas k = 0. Nesse caso,
236
temos dois valores no conjunto solução da equação 4cos(2x) = 0: S =
4
π,
4
π. Com o recurso
da segunda derivada, analisamos a natureza dos extremos: f’’(x) = -8sen(2x). Para x = 4
π,
temos
4
π'f' =
4
π-28sen- = 8 > 0. Então x =
4
πé um ponto de mínimo local.
4
π'f' =
4
π28sen- = 8 < 0. Então x =
4
πé um ponto de máximo local.
Desses resultados obtemos m = inf(f) =
4
f = 1; M = sup(f) =
4
f = 5.
Notemos que ostensivo gráfico permite obter a resposta com a ajuda da visualização.
Sem esse recurso, poderíamos identificar os extremos absolutos, comparando os diferentes
valores da função nos pontos extremos. Por exemplo, x = -2 é um extremo local. E f(-2) =
2sen[2(-2)] + 3 = 2sen(-4) + 3 4,51. Este valor não é máximo absoluto nem mínimo absoluto.
Para x = 2, temos f(2) = 2sen(4) + 3 1,49. Igualmente o valor obtido não é máximo absoluto
nem é mínimo absoluto.
Observemos também que, tanto a formulação da tarefa, quanto o encaminhamento da
solução são feitos no quadro da análise matemática.
O recurso computacional pode ser usado para ajudar a resolver esta tarefa, bastando para
isso inserir a função com o comando f(x) = if[x >= -2 && x >= 2, 2sin(2x)], e em seguida pedir
extremos[função, ponto-inicial, ponto-final], cuja especificação pode ser extremos[f,-3,3], em
que [-3, 3] é o intervalo do domínio em que procuramos os extremos. Feito isso, obtemos o
resultado A = (-0,79; 1) e B = (0,79; 5). Nesses pares, escolhemos as ordenadas como sendo os
valores do ínfimo e do supremo respectivamente. Ao que parece, o computador usa a lógica da
técnica do Cálculo Diferencial para determinar os extremos, pois o comando dado só consegue
detectar apenas extremos em que a função é diferenciável. Outros extremos, como (-2, f(-2)) e (2,
f(2)), não são detectados.
Para a questão b), primeiro pintamos, usando cores diferentes, os retângulos que
correspondem à soma superior (com uma cor) e os retângulos que correspondem à soma inferior
237
(com outra cor). E, usando as técnicas do desenvolvimento do somatório e da substituição na lei
de formação da função, que devem ser do conhecimento disponível para o estudante, calculamos
as somas inferior e superior das áreas dos retângulos aproximantes. Os extensivos figural e
numérico, apresentados pelo gráfico num quadriculado e pela partição P num conjunto de
valores, respectivamente, desempenham um papel preponderante para o encaminhamento das
técnicas para encontrar o resultado pretendido. Na figura 57 e nos cálculos que seguem,
mostramos como é desenvolvida a solução
FIGURA 57 – GRÁFICO (II) DE f(x) = 2sen(2x) + 3 E ÁREAS APROXIMADAS
A partir da figura, temos:
s(f, P) =
6
1
1
i
iii ttm )( =
2
f (
2
+2) +
4
f (
4
+
2
)+
4
f (0 +
4
) + ))(( 04
0
f +
)(422
f + )(
222
f (2sen(-) + 3) 0,4292 + 2
(2sen(2
) + 3)
4
+ (2sen(0) + 3 + 2sen() + 3)
4
+
(2sen(4) + 3) 0,4292 = = (3 0,4292) + (2 4
) + (6
4
) +
(1,4864 0,4292) 8,2087
FONTE: O autor (2014).
É importante observar que a partição usada nesta tarefa não é regular. Além disso, os
estudantes devem dispor de conhecimentos que relacionam monotonicidade e ínfimo e supremo,
ou seja, num intervalo onde f é decrescente, o ínfimo (mi) de f corresponde à extremidade direita
do intervalo, e o supremo (Mi) corresponde à extremidade esquerda do intervalo. Quando f
cresce, acontece o contrário.
O resultado anterior pode ser também obtido pela técnica de leitura no gráfico de alguns
valores necessários para os cálculos:
s(f, P) =
6
1
1
i
iii ttm )( =
= 3 (2
+2) + 1
4
+ 1
4
+ 3
4
+ 3
4
+ f(2) (2
2
) 8,2087
Para soma superior, temos:
238
S(f, P) =
6
1i
1iii )t(tM e, lendo alguns dados no gráfico da figura X, prosseguimos
com os cálculos:
S(f, P) =
6
1i
1iii )t(tM = f(-2) (2
+2) + 2 f(
2
)
4
+ 2 f(
4
)
4
+ f(
2
) (2 -
2
) = (2sen(-4) + 3) (
2
+2) + 2 3
4
+ 2 5
4
+ 3 (2 -
2
) 15,7912
A oscilação S(f, P) – s(f, P) =
n
1i
)t(tω 1iii pode ser determinada da seguinte forma:
S(f, P) – s(f, P) =
6
1i
1iii )t(tω =
2
222
ff + 2
2442
ff + 2
0
40
4
ff +
222
2
ff = [2sen(-
4) + 3) – 3] 0,4292 + 2 2 4
+ 2 2
4
+ [3 – (2sen(4) + 3)] 0,4292 = 1,5136 0,4292 + 2
+ 0,6496 = 7,5830.
Podemos obter o mesmo resultado fazendo simplesmente: S(f, P) – s(f, P) 15,7912 –
8,2087 = 7,5825.
Observamos aqui a importância de uma calculadora para facilitar os cálculos acima
apresentados.
Com o Geogebra, os cálculos seriam simples se a partição do intervalo I fosse regular.
Como ela é irregular, precisamos de uma reflexão sobre como a tarefa pode ser trabalhada. Até o
momento, não temos indicações de como, nessas condições, a solução pode ser desenvolvida.
Temos aqui uma restrição imposta pela tarefa que torna o software um instrumento não
apropriado para encaminhar a solução. Essa situação, faz-nos concordar com Chevallard (1999)
quando ele diz que uma técnica pode ter êxito sobre uma parte P() de tarefas do tipo T ao qual
ela é relativa e, tende a fracassar sobre P\P(). E, ainda, podemos considerar essa situação na
visão de Rabardel (2002, 1995) segundo a qual a gênese da ação instrumentada precisa estar de
acordo com o tipo de tarefas a serem resolvidas. Para o autor, a utilização de instrumentos em
circunstâncias inapropriadas, geralmente não produz os resultados pretendidos e é uma das causas
239
de acidentes de trabalho. Portanto, é preciso tomar em consideração o tipo de tarefas que
pretendemos resolver com o instrumento no momento de delineamento e de realização dos
processos de ensino e de aprendizagem
Na sequência, apresentamos a tarefa 3.
Tarefa 3: Considere o gráfico de f: [0, 1] IR, dada por f(x) = x2.
FIGURA 58 – GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E PARTIÇÕES DE I PARA n = 1, 2, 3
Considere as partições Pi de [0, 1].
P1 = {0, 2
1 , 1},
P2 = {0, 4
1 , 4
2 , 4
3 ,1},
P3 = {0, 8
1 , 8
2 , 8
3 ,8
4 , 8
5 , 8
6 , 8
7 , 1},
Vemos que P1 P2 P3. E assim o processo pode continuar. Quando
isso acontece dizemos que a partição Pi refina a partição Pi-1. No nosso
exemplo, P2 refina P1, P3 refina P1 e P2. FONTE: O autor (2014).
Como na tarefa anterior, calcule os números s(f, Pi), S(f, Pi) e i, e ilustre esses cálculos
fazendo um desenho ao lado, de preferência usando cores diferentes para cada número:
Apresente o resultado com pelo menos 5 algarismos decimais.
a) Usando a partição P1.
IGURA 59 – ÁREA SOB O GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E PARTIÇÃO PARA n = 2
s(f, P1)
S(f, P1)
S(f, P1) – s(f, P1) =
n
i
iii tt1
1)(
FONTE: O autor (2014).
240
Usando a partição P2:
FIGURA 60 – ÁREA SOB O GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E PARTIÇÃO PARA n = 4
s(f, P2)
S(f, P2)
S(f, P2) – s(f, P2) =
n
i
iii tt1
1)(
FONTE: O autor (2014).
Usando a partição P3:
FIGURA 61 – ÁREA SOB O GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E PARTIÇÃO PARA n = 8
s(f, P3)
S(f, P3)
=S(f, P3) – s(f, P3) =
n
i
iii tt1
1)(
FONTE: O autor (2014).
b) Escreva sua conclusão, o que acontece, nesse caso com a soma inferior, soma
superior e com a oscilação quando se refina a partição P.
c) A sequência si de somas inferiores de f relativamente à partição P, quando se
refina P, é monótona, crescente e limitada. Portanto, tem supremo, ou seja: P
sup s(f, P) relativa a
todas partições do intervalo [a, b] existe. Do mesmo modo P
inf S(f, P) existe.
Calcule:
P
sup s(f, P)
P)S(f,P
inf
de f.
241
d) Determina a área exata da região sob o gráfico de f.
Com esta tarefa, temos os objetivos de analisar:
1 - Se os estudantes participantes das sessões conseguem obter soma inferior e soma
superior para cada uma das partições dadas em relação à função f em consideração.
2 – Se os estudantes conseguem observar ou não que quando se refina a partição P, a
soma inferior aumenta e a soma superior diminui, e a oscilação também diminui.
3 – Se os estudantes conseguem interpretar que o supremo P
sup s(f, P) existe e deve ser
determinado pelo processo de limite da sequência das somas parciais s(f, P). E do mesmo modo
para P)S(f,infP
.
4 – Se os estudantes também conseguem ver que quando P
sup s(f, P) = P)S(f,infP
, então
= 0.
5 – Se os estudantes conseguem interpretar que a área exata da região sob o gráfico de f
corresponde ao limite comum das somas parciais inferior e superior relativa a f no intervalo I.
Na questão 3a), destacamos as mesmas escolhas da tarefa 2, com a exceção de que
nesta, os extremos da partição situam-se nas intersecções das linhas do quadriculado, a partição é
regular e a função é polinomial e estritamente crescente.
Nas questões a) e b), as escolhas pertinentes são as respectivas perguntas, formuladas
em língua natural, pois são elas que vão causar o envolvimento dos estudantes nas tarefas
colocadas.
Na questão c), as escolhas para encaminhar a tarefa são as expressões P
sup s(f, P),
P)S(f,infP
e que vão desencadear uma sequência de reformulações, no quadro da análise
matemática, a partir de conhecimentos disponíveis, até chegar ao resultado pretendido.
As respostas esperadas são as seguintes:
Na questão a), esperamos que os estudantes façam o seguinte, pintando com cores
diferentes a soma superior e a soma inferior: para P1 = {0, 2
1, 1} e calculando os valores
requeridos.
242
FIGURA 62 – ÁREA (ii) SOB O GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0, 1] E A PARTIÇÃO PARA n = 2
s(f, P1) = )(0f 2
1+
2
1f
2
1 = 0 +
4
1
2
1 =
8
1= 0,125
S(f, P1) =
2
1f
2
1 + 1f
2
1 =
8
1 +
2
1 = 0,625
S(f, P1) – s(f, P1) =
2
1
1
i
iii tt )( = (
2
1f - )(0f )
2
1 + ( 1f -
2
1f )
2
1 =
8
1 +
8
3 =
2
1 = 0.5
FONTE: O autor (2014).
Os estudantes precisam ter o conhecimento disponível sobre as técnicas do cálculo da
área de um retângulo, da substituição com valores concretos na lei de formação da função e das
operações de potenciação, multiplicação, adição e subtração de números reais. O ostensivo
figural, dado pelo gráfico da função desenhado num quadriculado e com eixos numerados, serve
como elemento de controle e validação visual do que está sendo desenvolvido numericamente.
Para P2 = {0, 4
1,
4
2,
4
3,1}
FIGURA 63 – ÁREA (ii) SOB O GRÁFICO DE f(x)
= x2 EM I = [0, 1] E A PARTIÇÃO PARA n = 4
FONTE: O autor (2014).
s(f, P2) = ( )(0f +
4
1f +
4
2f +
4
3f )
4
1=
(0 + 16
1+
16
4+
16
9)
4
1=
16
14
4
1 =
64
14= 0,21875
S(f, P2) = (
4
1f +
4
2f +
4
3f +
4
4f )
4
1 =
(16
1+
16
4+
16
9 +
16
16)
4
1=
16
30
4
1 =
64
30 =
0,46875
S(f, P2) – s(f, P2) =
4
1
1
i
iii tt )( = [(
4
1f - )(0f ) + (
4
2f -
4
1f ) + (
4
3f -
4
2f ) + (
4
4f -
4
3f )]
4
1 = (
4
4f - )(0f )
4
1 = (1 – 0)
4
1 =
4
1 = 0,25000
Em relação a essa questão, valem as mesmas análises que fizemos em relação à questão
para a partição P1, apenas com a observação de que partição P2 refina a P1, e, como consequência,
as aproximações das áreas calculadas por falta e por defeito são melhores do que as anteriores.
Essa tendência é observada comparando as duas figuras e os números obtidos.
243
Para P3 = {0, 8
1,
8
2,
8
3,8
4,
8
5,
8
6,
8
7, 1}:
FIGURA 64 – ÁREA (ii) SOB O
GRÁFICO DE f(x) = x2 EM I = [0,
1] E PARTIÇÃO PARA n = 8
FONTE: O autor (2014).
s(f, P3) = ( )(0f +
8
1f +
8
2f +
8
3f +
8
4f +
8
5f +
8
6f +
8
7f )
8
1= (0 +
64
1+
64
4+
64
9 +
64
16+
64
25+
64
36 +
64
49)
8
1=
64
140
8
1 =
512
140= 0,2734375
S(f, P3) = (
8
1f +
8
2f +
8
3f +
8
4f +
8
5f +
8
6f +
8
7f +
8
8f )
8
1= (
64
1+
64
4+
64
9 +
64
16+
64
25+
64
36 +
64
49 +
64
64)
8
1=
64
204
8
1 =
512
204= 0,3984375
S(f, P2) – s(f, P2) =
8
1
1
i
iii tt )( = 0,3984375 - 0,2734375 = 0,125
Para a partição P3, valem as mesmas análises que fizemos em relação às partições
anteriores, realçando contudo que os ostensivos figurais e numéricos desempenham o papel de
validação e controle visual na percepção da tendência das aproximações que estão sendo feitas.
Observamos ainda que a tarefa está sendo desenvolvida no quadro da análise matemática e os
aspectos cor e quadriculado desempenham papel importante na discriminação das aproximações
por falta e por excesso.
Nesta tarefa, podemos usar o recurso computacional para elaborar a resposta pretendida
em virtude de termos aqui partições regulares do intervalo I. Havendo essa possibilidade,
procedemos da seguinte maneira para produzir a resposta:
- inserimos a função dada com o comando f(x) = if(x >= 0 && x <= 1, x^2).
- inserimos os extremos do intervalo I em consideração: a = 0 e b = 1.
- inserimos o parâmetro c por meio do slider (controle deslizante), de 0 até um certo
valor natural d, digamos, d = 20, com o incremento de 1.
- inserimos o parâmetro n que vai indicar o número de retângulps da partição Pn, com n
= 2d. Notemos o seguinte: para d = 0, temos n = 1, isto é P1 = {1}; para d = 1, temos n = 2, então
244
P2 = {2
0,
2
1,
2
2}; para d = 2, temos n = 2
2 = 4, então P3 = {
4
0,
4
1,
4
2,
4
3,
4
4}. E, assim, por
diante.
- inserimos o comando Somainferior[Função, valor-inicial, valor-final, número-de-
retângulos]. No nosso caso, inserimos: somainferior(f, a, b, n). Para cada valor de n vamos ter
esse número de retângulos aproximantes por falta. Para termos retângulos aproximantes por
excesso, usamos o comando somasuperior(f, a, b, n). Com esses dois comandos, para cada valor
de n vamos ter o mesmo número de retângulos por falta e o mesmo número de retângulos por
excesso no mesmo intervalo I. Os valores das aproximações vão aparecendo para cada iteração
dada. Se quisermos que o software produza também a oscilação da função no intervalo dado,
inserimos o comando = somasuperior(f, a, b, n) somainferior(f, a, b, n). E, assim, vamos
obtendo esses valores para certo n. Notemos também que, com o recurso computacional, as
questões colocadas para os diferentes valores de n são tratadas numa mesma figura e
interativamente, o que dispensa a necessidade de apresentar para cada valor de n uma tarefa
diferente.
Recordamos que nessa maneira de resolver a questão, fazemos uma interação sujeito-
objeto mediada pela ferramenta software e ela nos dá o resultado global, tanto gráfico, quanto
numérico, como caixa preta, sem indicações de como os cálculos e resultados parciais são obtidos
no interior da máquina. Essa é uma restrição incontornável nessa situação de transposição
informática nos processos de ensino e de aprendizagem, segundo Balacheff (1994).
Na questão b), esperamos que, a partir da percepção do padrão de variações das
aproximações feitas na parte a), o estudante seja capaz de concluir que, quando se refina a
partição P, a soma inferior não diminui (ou seja, aumenta), a soma superior não aumenta (ou seja,
diminui) e a oscilação também diminui. A técnica principal de que o estudante dispõe para
responder à questão da tarefa é o pensar sobre o que observa da situação colocada.
Na questão c), temos como objetivo levar o estudante a generalizar o que ele observa,
abstraindo as características principais do padrão observado. O estudante deve conjecturar que o
refinamento da partição P sugere um processo de limite no infinito, quando n cresce
arbitrariamente. E dessa presunção, ele deve trazer à sua mente alguns resultados teóricos sobre
sequências numéricas. Os principais desses resultados são os seguintes:
245
- o conhecimento de sequências monótonas;
- o conhecimento de sequências limitadas;
- o conhecimento do teorema que diz que uma sequência monótona e limitada é
convergente;
- o conhecimento da técnica de substituição na lei de formação de uma função com
alguns valores específicos;
- o conhecimento de como expandir um somatório dado na forma reduzida;
- o conhecimento da fórmula da soma dos n primeiros quadrados de números naturais;
- o conhecimento da noção de limites de sequências.
Com esses conhecimentos teóricos disponíveis, o estudante busca a solução da seguinte
maneira:
P
sup s(f, P) = ))((lim 1
1
1
ii
n
i
in
tttf =
n
in nn
if
1
11lim =
n
in nn
i
1
211
lim =
n
in n
i1
3
2 11lim =
3
22222 113210
nn
n
)(...lim =
3
1
6
121
n
nnn
n
))((lim =
26
121
n
nn
n
))((lim
=
2
2
6
132
n
nn
nlim =
6
2=
3
1= 0,33333…
)Pf,S(infP
= ))((lim 1
1
ii
n
i
in
tttf =
n
in nn
if
1
1lim =
n
in nn
i
1
21
lim =
n
in n
i1
3
2 1lim =
3
2222 1321
nn
n
...lim =
3
1
6
121
n
nnn
n
))((lim =
26
121
n
nn
n
))((lim
=
2
2
6
132
n
nn
nlim =
6
2=
3
1= 0,33333…
Com estes dois resultados, temos que tanto o P
sup s(f, P), quanto o )Pf,S(infP
tendem
para 3
1 = 0,33333…
Daqui concluímos que 0.
246
Na questão d), o estudante deve concluir que a área exata pretendida sob o gráfico de f é
precisamente P
sup s(f, P) = P)S(f,infP
= ))((lim 1
1
1
ii
n
i
in
tttf = ))((lim 1
1
ii
n
i
in
tttf = 3
1=
0,33333…
A partir desse resultado, definimos a integral de Riemann como sendo o limite comum
das somas superiores e das somas inferiores.
Com o Geogebra, executamos a mesma tarefa da seguinte maneira: introduzimos os
seguintes dados na entrada de comandos:
A função f, contínua, definida no intervalo I = [0, 1] IR, f : I IR, f(x) = x2
As extremidades do intervalo I, a = 0, b = 1 e o número de retângulos n, sendo n = 2k,
onde k é o número de ordem do passo (incremento), a partir de k = 0.
O controle deslizante (seletor) k = [0, m], com m inteiro, passo 1. Note que embora k
seja indicado como intervalo, na realidade, a forma correta de indicar k deveria ser k = {0, 1, …,
m} pois com o passo 1, significa que os valores de k serão sempre inteiros. Mesmo não sendo
inteiros, com a indicação do valor de um passo significa que k sempre será um conjunto discreto
finito de passos.
Lowersum (somainferior): lowersum[f, a, b, n] que significa: soma das áreas dos n
retângulos aproximantes inscritos na região sob o gráfico de f no intervalo I com extremos a e b.
Notemos que o Geogebra omite alguns detalhes da construção dessa soma, pois não apresenta as
medidas da base e da altura de cada retângulo aproximante, que conhecemos como sendo xΔ =
n
ab e f(xi-1) (ou f(xi), respectivamente, onde i-1 é o valor da extremidade inferior de cada
intervalo [xi-1, xi] da partição P do intervalo I, e i, a extremidade superior. Notemos ainda que,
pela definição de xΔ , teremos neste modelo de somas inferiores (respectivamente superiores)
partições sempre regulares. Uppwersum (somasuperior): uppersum[f, a, b, n] que significa: soma
das áreas dos n retângulos aproximantes circunscritos na região sob o gráfico de f no intervalo I
com extremos a e b. Com este procedimento técnico cumprido, o Geogebra fornece as seguintes
respostas para somas inferiores e somas superiores, ambas representadas em cada figura. As cores
podem ser introduzidas para diferenciar esses retângulos aproximantes:
247
FIGURA 65 – ÁREAS APROXIMADAS DE f(x) = x2, COM I = [0, 1], E n = 1, 2, 4
Partição Pi n = 1
P = {1}
n = 2
P = {0, 2
1, 1}
n = 4
P = {0, 4
1,
4
2 ,
4
3,
4
4}
Somas
FONTE: O autor (2014).
Assim, o processo pode continuar, determinando somas aproximadas tanto por falta,
quanto por excesso.
Para determinar a área total da região
sob o gráfico de f no intervalo I, introduzimos,
na entrada de comandos, o seguinte: integral[f,
a, b] e obtemos o resultado 0,33333.
Observemos que o computador apresenta esse
valor por aproximação com 5 algarismos
decimais e corretos, como se vê na figura ao
lado. Na opção roundig ou arredondamento,
podemos aumentar o número de casas decimais
corretas.
FIGURA 66 – 1
0
2dxx NO GEOGEBRA
FONTE: O autor (2014).
Após a descrição da análise a priori das tarefas que serviram de base para a elaboração
do teste diagnóstico e para a experimentação, apresentamos a análise a posteriori do teste
diagnóstico.
7.3 ANÁLISE A POSTERIORI DO TESTE DIAGNÓSTICO
7.3.1 Parte I: Análise quantitativa das respostas sobre as noções de base da derivada de
funções reais a valores reais
A seguir, apresentamos as categorias usadas na análise das respostas dadas ao teste
diagnóstico, as respostas e as respectivas análises. O teste diagnóstico foi dado em duas fases. Na
248
fase 1, foi administrada a parte sobre a derivada, com o pressuposto de que os estudantes já
tivessem alguma informação sobre o assunto a partir do Ensino Médio. Na fase 2, administrou-se
a parte sobre a integral de Riemann e os conceitos subjacentes de somas de áreas de retângulos
aproximantes, de supremo e ínfimo de uma função limitada num intervalo fechado e limitado.
Sem perda de generalidade, e por conveniência em termos de espaço, apresentamos nesta
pesquisa os resultados referentes à fase 1 do teste diagnóstico.
O quadro 7 contém o registro de participações das sessões experimentais. Os nomes que
nele constam são fictícios e, alguns deles, são referidos na discussão dos resultados do teste
diagnóstico, bem como nas intervenções das sessões experimentais. Os nomes em negrito são de
estudantes que tiveram ao máximo três ausências das sessões, os quais consideramos como tendo
tido uma participação aceitável e, por conseguinte, foram convidados a participar do teste final.
QUADRO 7 – PARTICIPAÇÃO DAS SESSÕES EXPERIMENTAIS
Nr
Mês e data
Nome e
participação
Abril Maio Junho
13 15 20 26 04 11 18 25 01 08 15 19
1 Agnécio
2 Américo
3 Bauco
4 Befone
5 Beulane
6 Cadeado
7 Davi
8 Davis
9 Gerson
10 Goabe
11 Gogo
12 Jeshua
13 Micas
14 Michael *
15 Nicolau `
16 Nito
17 Salazar
18 Samson
18 Santos
20 Semo
21 Vinagre
* Chegou no fim da sessão.
FONTE: O autor (2014).
Assim, as categorias de análise das respostas são as seguintes, baseadas, por um lado, na
Teoria Antropológica do Didática (CHEVALLARD, 2014, 2012, 1999), nas noçoões de quadro e
249
mudanças de quadros segundo Douady (1986, 1984) e nas noções de níveis de conhecimentos
segundo Robert (1998, 1997) e, por outro lado, nos resultados da análise da relações
institucionais via materiais didáticos.
Categoria A: aqui temos uma relação de conformidade ou a adequação da relação
pessoal x com o objeto o à relação institucional em posição p. Ou seja, R(x, o) Ri(p, o).
Significando ainda que, segundo Chevallard (1998), R(x, o) , isto é, x conhece o objeto o.
Portanto, o estudante mostra ter um conhecimento disponível (ROBERT, 1998, 1997), usa e
articula adequadamente os ostensivos e não ostensivos pertinentes para a tarefa proposta e no
quadro matemático apropriado.
Categoria B: aqui a resposta mostra uma relação pessoal de x com o objeto o não
totalmente conforme à relação institucional em posição p. Ou podemos dizer simplesmente que a
resposta dada é razoável (com algum sentido para a questão colocada), mas não totalmente certa,
x não conhece plenamente o objeto o. O estudante mostra ter algum conhecimento disponível,
mas não articula adequadamente os ostensivos e não ostensivos apropriados para a tarefa
proposta, e, às vezes, faz encaminhamentos inadequados ou incompletos da solução.
Categoria C: esta categoria significa que a relação pessoal de x com o objeto o não é
conforme à relação institucional em posição p. Ou seja, R(x, o) = , isto é, x não conhece o.
Existe uma desadequação entre o discurso técnico-tecnológico desencadeado e o conteúdo da
tarefa proposta. Os ostensivos produzidos não são guiados pelos não ostensivos subjacentes à
tarefa.
Categoria D: Sem resposta (o estudante deixou a tarefa em branco).
Mencionamos por outro lado que a redação do teste na forma submetida aos estudantes
obedeceu à versão não brasileira da língua portuguesa com vista a adequá-la ao público-alvo.
Indicamos ainda que, com relação a funções, existe uma falta de menção explícita do domínio em
algumas perguntas. Embora no nosso entender, esse fato não tenha comprometido a compreensão
por parte dos respondentes, qual era o domínio das funções apresentadas, a formulação ficaria
mais completa com essa explicitação.
Achamos necessário mencionar que o teste foi respondido no ambiente usual, com papel
e caneta, sem recurso a meios computacionais.
Assim, temos o seguinte quadro de respostas ao teste diagnóstico.
250
QUADRO 8 – RESPOSTAS DOS ESTUDANTES AO TESTE DIAGNÓSTICO
Tarefas colocadas Tipos de respostas
A B C D
Tarefa 1: Considere o gráfico de uma função f definida no intervalo I = [-2, 4].
a) A função f é contínua em [-2, 4]?
Justifique a sua resposta.
b) A função f é limitada? Por quê?
c) Indique o conjunto imagem de f, Im(f).
Justifique a sua resposta.
Tarefa 2: A equação de movimento de uma partícula é s(t) = t3 – 6t2 + 9t, em que s(t) é
dado em metros e t em segundos.
a) Encontre a velocidade e a aceleração do movimento como funções de t.
b) Escreva a equação da recta tangente ao gráfico da função s passados 5 segundos (no
instante t = 5s).
c) Calcule a aceleração do movimento depois de 2s (t = 2s).
d) Qual era aceleração do movimento quando a velocidade era 0 (v(t) = 0m/s)?
e) Em qual das figuras dadas abaixo, o gráfico da função s está desenhado correctamente,
tendo em conta o desenho do gráfico da sua função derivada s’? Justifique a sua resposta.
Fig. 1
Fig. 2
Fig. 3
Fig. 4
Se nenhuma das figuras acima apresenta o desenho
correcto entre o gráfico de
s(t) = t3 – 6t2 + 9t e da sua derivada s’, então desenhe
correctamente o gráfico da função s tendo em conta os
valores da sua função derivada s’, no espaço abaixo (ao
lado).
Tarefa 3: Seja f uma função definida por
2
22
xsebmx
xsexxf )(
Encontre os valores de m e b que tornem f derivável em toda parte.
Tarefa 4: Considere a função f definida por
00
012
xse
xsex
senxxf )(
Encontre a função derivada de f e seu valor (da função derivada) no ponto x = 0.
1a) 4 9 7 1
1b) 1 14 4 2
1c) 1 4 14 2
2a) 6 3 9 3
2b) 2 6 6 7
2c) 6 1 10 4
2d) 1 0 13 7
2e) 3 9 6 3
3 1 5 10 5
4 0 9 5 7
FONTE: O autor (2014).
Entre os 21 estudantes que participaram da pesquisa para a tarefa 1, foi possível
identificar que: 1 estudante (5%) deixou em branco a parte dessa tarefa que corresponde a
identificar se a função é contínua e justificar; 7 estudantes (33%), apesar de tentarem responder à
questão da tarefa, deram uma resposta não conforme; 9 estudantes (43%) apresentaram uma
251
resposta não totalmente conforme e apenas 4 (19%) estudantes ofereceram uma resposta
conforme. Para a parte b, que corresponde a verificar se a função é limitada, observamos que 14
estudantes (67%) deram uma resposta não totalmente conforme e apenas 1 estudante (5%)
apresentou uma resposta conforme; 4 estudantes (19%) apresentaram respostas não conformes e
2 (10%) deixaram a tarefa em branco. Assim, entre as respostas das partes a e b, observamos que
existe uma uniformidade. Já para a parte c), em que se pedia para identificar o conjunto imagem,
é interessante notar que a quantidade de respostas não conformes e em branco aumenta, sendo
que 14 estudantes (67%) responderam de forma não conforme e 2 estudantes (10%) deixaram a
tarefa em branco e apenas 5 (24%) estudantes deram uma resposta não totalmente conforme, e
apenas 1 (5%) apresentou uma resposta conforme.
Na parte 2a) da tarefa, em que se pedia para calcular a velocidade e a aceleração do
movimento, 6 estudantes (29%) deram resposta conforme; 3 estudantes (14%) deram respostas
não totalmente conformes; 9 estudantes (43%) deram respostas não conformes e 3 estudantes
(14%) deixaram a pergunta em branco. Na parte 2b), cujo comando era determinar a equação da
reta tangente ao gráfico da função s no ponto t = 5s, apenas 2 estudantes (10%) deram respostas
conformes; 6 estudantes (29%) deram respostas não totalmente conformes; 6 estudantes (29%)
deram respostas não conformes e 7 estudantes (33%) deixaram a pergunta em branco. Na parte
2c) em que se pedia para calcular a aceleração do movimento no instante t = 2s, temos que 6
estudantes (29%) deram respostas conformes; 1 estudante (5%) deu resposta não totalmente
conforme; 14 estudantes (67%) deram respostas não conformes, dos quais 10 estudantes (48%)
apresentaram respostas não conformes e 4 estudantes (19%) deixaram em branco. Na parte 2d),
em que se deveria determinar a aceleração do movimento no instante em que a velocidade se
anula, apenas 1 estudante (5%) deu resposta conforme, nenhum estudante deu resposta não
totalmente conforme e os restantes 20 estudantes (95%) construíram respostas não conformes,
entre os quais, 13 (62%) deixaram alguma coisa escrita, embora não conforme e 7 (33%)
deixaram a questão em branco. Esta parte parece ter sido a mais difícil de todas as partes da
pergunta 2.
O padrão de respostas para a pergunta parece indicar alguma tendência decrescente do
desempenho dos estudantes quanto ao número de respostas não totalmente conformes, como
252
vemos na sequência: 9 estudantes (43%) na parte 2a) 8 estudantes (39%) na parte 2b) 7
estudantes (34%) na parte 2c) 1 estudante (5%) na parte 2d).
Na parte 2e), que direcionava relacionar o gráfico da função de entrada com o da sua
derivada, temos que 3 estudantes (14%) deram respostas conformes; 9 estudantes (43%) deram
respostas não totalmente conformes; 6 estudantes (29%) deram respostas não conformes e 3
estudantes (14%) deixaram a pergunta em branco.
Na tarefa 3, em que era preciso usar a propriedade da continuidade e da
diferenciabilidade de uma função em um ponto para responder, observamos que 1 estudante (5%)
deu resposta conforme; 5 estudantes (24%) deram respostas não totalmente conformes e 15
estudantes (72%) deram respostas não conformes, sendo que 10 (48%) escreveram algum coisa e
5 (24%) deixaram em branco.
Na tarefa 4, em que era preciso usar o teorema do confronto para julgar a derivada da
função no ponto crítico e obedecer às condições da definição da função definida por partes,
nenhum estudante deu resposta conforme; 9 estudantes (43%) formularam respostas não
totalmente conformes; 5 estudantes (24%) escreveram respostas não conformes e 7 estudantes
(33%) deixaram a pergunta em branco.
De modo geral, o padrão de respostas dos estudantes parece sugerir que a interpretação
da derivada para resolver problemas do contexto (partes 2a) – 2d)), o uso da propriedade da
derivada para resolver problemas intramatemáticos (tarefas 3 e 4) e o conceito de imagem de uma
função sejam os conceitos com maiores dificuldades para os estudantes, o que atribuimos à falta
de compreensão do significado do conceito de derivada nos seus conceitos de base e nos seus
diferentes pontos de vista, segundo Thurston (1995, 1994). Não obstante, a situação criada do
movimento é a mais usada na introdução a esse conceito, mas ao que parece, seu conhecimento
ainda não está na forma disponível, consoante Robert (1997), para ser usado como situação de
referência, quando necessário.
Em relação à tarefa 3, inspirada no estudo da Millán et al. (2013), segundo o qual
nenhum dos estudantes mexicanos submetidos à tarefa conseguiu dar uma resposta plausível,
temos a referir que, no nosso contexto, houve estudantes que conseguiram dar algumas respostas
plausíveis, embora em número reduzido. Podemos supor que essa diferença relativa possa ser
253
creditada a práticas e expectativas institucionais diferentes, quando consideramos os níveis de
codeterminação à luz do ensinamento de Chevallard (2002, 2012).
A seguir, apresentamos algumas análises qualitativas mais específicas para as respostas
que temos na tabela. Como mencionado acima, os nomes dos estudantes que aparecem como
respondentes ao teste são nomes fictícios para salvaguardar a sua privacidade.
7.3.2 Análise qualitativa das respostas ao teste diagnóstico
Categoria A: Resposta conforme
As respostas conformes, tal como já indicado, são aquelas que indicam ser o
conhecimento, as técnicas, as tecnologias e teorias que se esperava serem aquelas mobilizadas
pelo estudante de forma apropriada. O discurso técnico-tecnológico mostra uma coerência das
ideias, isto é, a relação pessoal do estudante com o objeto matemático visado é conforme à
relação institucional indicada na análise a priori.
Exemplo de respostas classificadas na categoria A:
Na pergunta 1a), destacamos a resposta de Befone:
FIGURA 67 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 1a) DO TESTE DIAGNÓSTICO
1a) A função f é contínua em [-2, 4]?
Justifique a sua resposta
FONTE: O autor (2014).
Nessa resposta, o estudante localiza um ponto de descontinuidade que é condição
necessária e suficiente para que uma função f deixe de ser contínua. O estudante tem disponível o
conhecimento sobre a continuidade e articula adequadamente o discurso técnico-tecnológico para
responder de acordo com o que foi previsto na análise a priori.
Na pergunta 1b), destacamos ainda a resposta de Bofene, o único que respondeu
corretamente a essa questão:
FIGURA 68 – RESPOSTA (I) CONFORME À PERGUNTA 1b) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
254
O estudante mostra corretamente que as imagens estão num intervalo limitado, embora
não verbalize explicitamente que o intervalo das imagens é limitado, a resposta é conforme. O
estudante tem conhecimento disponível do que é imagem de uma função, consegue usar
adequadamente o ostensivo gráfico, onde mostra que as imagens pertencem ao eixo das
ordenadas e foi usada a representação adequada de intervalos para caracterizar o conjunto
imagem, no quadro da análise matemática, como previsto. Contudo, observamos na resposta a
confusão entre o conceito de conjunto imagem e de contradoínio. Mais adiante apresentamos
algumas observações sobre as possíveis origens dessa confusão.
Uma outra resposta que consideramos conforme nessa tarefa faz referência ao intervalo
onde está desenhado o gráfico:
FIGURA 69 – RESPOSTA (II) CONFORME À PERGUNTA 1b) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Achamos ser igualmente conforme esta resposta “o gráfico somente termina … no
intervalo limitado”, embora em termos de língua portuguesa, tenha havido dificuldades de
formulação. Contudo, é verdadeiro que para uma função limitada, seu gráfico está dentro de um
intervalo limitado. Seria mais claro se o estudante mostrasse o intervalo em referência. Mas
consideramos que essa ausência de explicitação pode ser decorrente do modo como a pergunta
foi elaborada, pois ela deixa uma margem para uma ambiguidade em virtude de ter sido
formulada de forma genérica e não pede para o estudante exibir o intervalo de referência.
Para a pergunta 1c), nesta categoria de respostas, consideramos a resposta do estudante
Semo:
FIGURA 70 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 1c) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
255
Não é correto igualar a notação de função a um conjunto, neste caso, intervalo. Ele
poderia ter indicado que f(x) pertence ao intervalo [0, 2]. Além disso, o estudante não usa a
prática habitual de notar o intervalo na ordem crescente, em que o menor número entre os valores
dos extremos do intervalo fica no extremo inferior, e o maior, no extremo superior. Ao que nos
parece, o estudante leu no ostensivo gráfico, de cima para baixo, e anotou a sua resposta nessa
ordem, o que consideramos ser correto, pois caracteriza o conjunto-imagem da função dada.
Notamos também as dificuldades de formulação da justificativa. O estudante menciona valores da
reta 0y sem restrição, o que não é verdade, e contrasta com a notação de intervalo que ele usa.
Perante esse contraste, presumimos que a incompletude da justificativa deva-se ao uso
inadequado da língua portuguesa, não à falta do conhecimento matemático. Assim sendo, apesar
de apresentar dificuldades associadas aos ostensivos gráficos da função, conjuntos, intervalos e
elementos de conjuntos, parece que o estudante dispõe do método de determinação do conjunto-
imagem a partir da visualização gráfica, isto é, determinar o intervalo que corresponde aos
valores f(x) para x pertencente ao intervalo [-2, 4].
As dificuldades apresentadas pelo estudante mostram a importância do trabalho com os
ostensivos dos conceitos, o que parece faltar para esse aprendiz. Aqui podemos pensar em um
trabalho que considere a conversão dos diferentes registros de representação (DUVAL, 2011)
para cada uma dessas noções e as mudanças de quadros e de pontos de vista que se mostrarem
necessárias para evitar esse tipo de confusão entre os diferentes conceitos e suas representações,
observando ainda que com o Geogebra, os diferentes aspectos visuais da função podem ser
realçados.
Na pergunta 2a), destacamos a resposta do Micas:
FIGURA 71 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 2a) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Nesse caso, Micas compreendeu bem o problema e consegue mobilizar seu
conhecimento disponível para dar uma resposta apropriada, usando a técnica prática de derivação
que Thurston (1994, 1995) nomeia como ponto de vista simbólico da derivada. A designação que
256
Micas usa para velocidade e aceleração são apropriadas e consonantes com o que é sugerido pela
literatura da Física e da Matemática.
Na pergunta 2b), destacamos a resposta do Nicolau:
FIGURA 72 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 2b) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Muito explicitamente, o estudante determina a equação da reta tangente, articulando
adequadamente os ostensivos algébricos, no quadro da análise matemática, aplicando o ponto de
vista simbólico da derivada da função horária do movimento. O estudante tem disponíveis os
conhecimentos da técnica de substituição na lei de formação da função para determinar imagens
concretas, do ponto de vista geométrico da derivada de uma função e do recurso teórico da
equação de uma reta tangente ao gráfico de uma função f em um ponto P = (x0, f(x0)).
Identificamos esses conhecimentos quando o estudante, após determinar a função derivada s’(t) =
3t2 – 12t + 9, substitui t por 5, obtendo s’(5) = 24; usa o valor de s’(5) como coeficiente angular
reta tangente ao gráfico de s no ponto x = 5 e, em seguida, determina a equação da reta pedida,
passando pelo cálculo de f(x0). A resposta está perfeitamente de acordo com uma das nossas
expetactivas apresentadas na análise a priori.
Na pergunta 2c), apresentamos a resposta do estudante Nito:
FIGURA 73 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 2c) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Uma vez determinada a fórmula da aceleração, o estudante determina explicitamente o
valor dela no ponto t = 2. Com a lei da aceleração calculada na tarefa a), não fica difícil
determinar seu valor em t = 2, bastando para isso ter o conhecimento mobilizável sobre a técnica
257
de substituição com valores concretos na lei de formação da função, neste caso, a função
aceleração, e o conhecimento das operações de multiplicação e subtração de números reais.
Na pergunta 2d), destacamos a resposta de Befone:
FIGURA 74 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 2d) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
O estudante interpreta corretamente o problema. Ele percebeu que o tempo estava
implicado na questão, instante em que a velocidade se anula e usa esse tempo para determinar os
valores da aceleração. A questão era complexa, muito capciosa na interpretação, mas o estudante
encaminha adequadamente a resolução no quadro algébrico e mostra que sua relação pessoal com
as questões implicadas no problema é conforme. Fazendo menção a Chevallard (1998), diríamos
que R(x, o) .
Na pergunta 2e), destacamos a resposta do estudante Nicolau:
FIGURA 75 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 2e) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
258
Considerando o ostensivo gráfico da função dada e da sua derivada, o estudante articula
adequadamente com as técnicas algébricas qual deve ser a figura correta, determinando os zeros e
as coordenadas do vértice da função derivada. Os conhecimentos algébricos do estudante são
disponíveis, pois ele é capaz de aplicá-los corretamente, sem que seja pedido explicitamente. Os
elementos calculados funcionam como elementos de controle e validação da resposta. O
estudante percebe essa necessidade como critério de decisão, como destacamos na análise a
priori. Outra técnica que alguns estudantes usaram corretamente é a verificação da ordenada na
origem. Dado que a derivada tem ordenada na origem igual a 9, então, concluíram que a figura
correta não pode ser a figura 2. Claro, essa técnica funciona com a determinação dos zeros da
derivada. Notemos, por outro lado, que nenhum dos estudantes que responderam corretamente
usou os valores e o sinal da derivada e a monotonia da função dada para determinar a resposta,
excetuando-se apenas um que aparece nas respostas da categoria B, o que para nós é um
indicador (e alerta-nos) que esse discurso tecnológico-teórico possa ser difícil no estudo de
funções. E, como esclarecemos na análise a priori, talvez as interações com o recurso
computacional possam prover uma percepção duradoura desse conteúdo.
Na tarefa 3, apresentamos a resposta do estudante Micas, o único que utilizou um
raciocínio coerente para responder esta questão:
Tarefa 3: Seja f(x) =
2
22
xbmx
xx
,
,
Encontre os valores de m e b que tornem f derivável em toda parte.
FIGURA 76 – RESPOSTA CONFORME À PERGUNTA 3 DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Micas interpretou corretamente a questão dada, raciocinando que se existe algum
problema de derivabilidade da função dada, esse problema deve estar no ponto x = 2, pois à
esquerda dele a função é quadrática e ela é sempre derivável. À direita de x = 2, a função é afim,
e uma função afim é sempre derivável e articula adequadamente essa análise, com recurso às
259
técnicas de análise e de álgebra para chegar ao resultado. Nesse sentido, para que a função seja
derivável naquele ponto, as derivadas laterais devem ser iguais, e o estudante mobiliza esse
conhecimento disponível para determinar m. O estudante ainda interpreta que a função deve ser
contínua naquele ponto, em que uma das premissas desse fato é a igualdade dos limites laterais
nesse mesmo ponto, o que leva à determinação do b. Desse modo, podemos dizer que a relação
pessoal do estudante é mesmo conforme à relação institucional existente em posição p, isto é R(x,
o) Ri(p, o).
Na pergunta 4, em que se pede para encontrar a derivada da função
f(x) =
00
012
xse
xsex
senx
,
,
e seu valor no ponto x = 0,
não houve uma resposta que se enquadrasse nesta categoria, portanto, uma resposta conforme.
Era preciso ter um conhecimento disponível para interpretar a questão de modo um pouco
parecido com o modo de interpretar a questão na tarefa anterior. Primeiro, considerar que, se há
algum problema de derivabilidade da função dada, esse problema deve estar no ponto x = 0, pois
tanto à esquerda quanto à direita do zero, temos a mesma função e diferenciável. Então, para x
0, diferenciamos a função, usando as técnicas de diferenciação do produto e da função composta.
Para x = 0, averiguamos as possibilidades de diferenciabilidade: usando o conhecimento de
limites laterais e do valor da função no ponto considerado, concluímos que ela é contínua.
Empregando o conhecimento de derivadas laterais nesse ponto, concluímos que ela é
diferenciável. Contudo, não podemos usar a técnica de derivação do produto, pois essa técnica
não nos leva ao resultado pretendido para o caso em análise. Então, como segundo passo,
determinamos a derivada em x = 0 usando a técnica do confronto, tomando a derivada como
limite da razão incremental. Consideramos que o raciocínio implicado na questão é complexo,
como acabamos de mostrar. Presumimos que tenha sido esse o motivo que dificultou produzir
respostas pertinentes por parte dos participantes do teste. Observamos ainda que o teorema do
confronto é institucionalmente contemplado no programado do Ensino Médio, mas não se pode
garantir que é trabalhado nessa etapa escolar, fato que também pode justificar as dificuldades dos
estudantes.
260
Na sequência, passamos à discussão das respostas classificadas na categoria B.
Categoria B: Resposta não totalmente conforme
Como indicamos acima, as respostas não totalmente conformes são aquelas em que os
recursos técnico-tecnológicos teóricos mobilizados para encaminhar a resolução da questão não
são geridos adequadamente em algumas fases do percurso. Pode ocorrer uma tradução pertinente
da tarefa, porém encontrar um desvio pelo caminho ou ocorrer uma tradução inadequada, embora
com um encaminhamento técnico-tecnológico correto. Quer dizer, neste tipo de resposta há
indícios de compreensão do problema colocado, mas existe uma etapa de resolução que não é
corretamente implementada. A relação entre o estudante e a questão a ser resolvida não é
totalmente conforme.
A seguir, apresentamos exemplos desse tipo de respostas para as diferentes tarefas do
teste.
Na pergunta 1a), exemplificamos com a resposta do estudante Nicolau:
FIGURA 77 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 1a) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
O estudante percebe, pelo ostensivo gráfico, que a função não é contínua no intervalo
dado e parece identificar algum ponto problemático do domínio que a torna não contínua. Mas
não explicita qual seja o ponto problemático. Não podemos dizer que R(x, o) pois, apesar de
o estudante ter identificado a existência de um ponto problemático que torna a função não
contínua, ele fracassa por não explicitar qual é esse ponto, isto é, sua análise é incompleta.
Na pergunta 1b), nesta categoria de respostas, não totalmente conforme, destacamos a
resposta do estudante Vinagre:
FIGURA 78 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 1b) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Essa resposta, em princípio, deveria ser considerada conforme: “estar dentro de um
intervalo fechado”. No entanto, a julgar pelo padrão da maioria de respostas dadas a essa
pergunta e das suas respectivas justificativas, classificamo-la na categoria de respostas não
261
totalmente conformes, pois deveria haver explicitação do intervalo fechado em alusão. Neste
texto, acima, classificamos uma resposta similar a essa na categoria de respostas conformes.
Naquela resposta, o autor diz que é o gráfico da função que está dentro de um intervalo limitado.
Nesta, a ambiguidade é maior, pois o autor não indica o que está dentro de um intervalo fechado
e qual é esse intervalo fechado. Muitas respostas fazem menção ao intervalo do domínio: “f é
limitada porque está definida num intervalo fechado [-2, 4]”. Isso não é completamente certo.
Uma função pode estar definida num intervalo fechado, mas não ser limitada. Por exemplo,
podemos definir a função f(x) = x
1no intervalo [-2, 4], mas ela não é limitada. E, ainda, podemos
considerar um intervalo fechado toda reta. Portanto, o discurso tecnológico que o estudante usa
para justificar a sua resposta não é completo.
Na pergunta 1c), fazemos menção à resposta do estudante Michael:
FIGURA 79 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 1c) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Como indicamos na caracterização desse tipo de respostas, há indícios de ter havido
compreensão do problema exposto, mas existe uma etapa de resolução da questão não
corretamente implementada. Nessa resposta, o estudante revela ter compreendido onde ler o
conjunto-imagem da função, aliás, ele próprio usa uma interpretação alternativa do conjunto-
imagem da função, quando diz: “falar de imagem é exatamente falar de contradomínio da
função”, o que está correto, quando se considera a relação institucional moçambicana, uma vez
que não há uma distinção explícita entre contradomínio e conjunto-imagem. Não se sabe
claramente a origem dessa denominação que nos parece confusa. Talvez a falta de destaque nos
materiais de ensino da diferença de significados entre os termos “contradomínio” e “conjunto-
imagem” pode estar na origem dessa situação. Ou ainda o nível de generalidade em que a
definição de função é apresentada pode estar na origem dessa prática, como as seguintes
passagens do livro de Sarrico mostram:
262
“6.1 Definição. Uma função f : D Y é uma lei que associa elementos de um conjunto
D, chamado o domínio da função, a elementos de um outro conjunto Y, chamado o
contradomínio da função (ÁVILA, 2005, p. 135)”.
Portanto, quem lê a definição dada nesse nível de geralidade, sem exemplos, certamente
será levado a considerar contradomínio como sendo o conjunto imagem. Contudo, Ávila
esclarece depois da apresentação da definição, os elementos constituintes do conjunto Y:
Em geral, o contradimínio é um conjunto fixo, o mesmo para toda uma classe de funções
sob consideração, não acontencendo necessariamente que todo elemento de Y provenha
de algum elemento do domínio pela ação da função que esteja sendo considerada. Já
com o domínio a situação é diferente, pois cada função tem seu domínio próprio, e a
função age sobre todos os elementos de seu domínio (ÁVILA, 2005, p. 135).
Consideramos, por outro lado que, talvez, a formulação da questão não tenha sido muito
explícita para alguns estudantes. Provavelmente alguns estudantes não entendam bem o termo
imagem da função, pois o habitual em Moçambique é falar de contradomínio da função ao invés
da imagem.
Na pergunta 2a), damos como exemplo a resposta ainda do estudante Michael:
FIGURA 80 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 2a) DO TESTE DIAGNÓSTICO.
FONTE: O autor (2014).
Michael compreende o problema a que é solicitado a resolver. Ele mostra um
conhecimento disponível da derivada como taxa de variação do movimento e do ponto de vista
simbólico da mesma noção, contudo procura a todo custo determinar um resultado concreto à
operação, introduzindo passos adicionais, mas incoerentes entre os ostensivos algébricos e os não
ostensivos que deveriam guiar esses passos, desviando o sentido correto da resposta. Não está
claro como o estudante raciocina pois, obtida a solução S’(t) = 3t2 – 12t + 9, ele ainda pretende
determinar a derivada de f no ponto x = 0 com recurso ao limite da razão incremental e, como não
bastasse, essa razão é erradamente apresentada. Provavelmente o questionamento do tipo
263
“Encontre a velocidade e a aceleração do movimento como funções de t” pode ter dado a
entender que se precisava de um valor concreto.
Na pergunta 2b), exemplificamos, nesta categoria, com a resposta do estudante Micas:
FIGURA 81 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 2b) DO TESTE DIAGNÓSTICO.
FONTE: O autor (2014).
Micas mostra o conhecimento disponível do ponto de vista geométrico da derivada de
uma função em um ponto dado, da técnica de substituição na lei de formação da função para
determinar alguns valores e da equação reduzida de uma reta. Ele mobiliza esses conhecimentos
para determinar o declive de f no ponto t = 5 e, a partir da equação da reta na forma reduzida,
com o declive já calculado, fica a tarefa de calcular o valor de b. O estudante pensa que o valor
de b é igual ao valor da função no ponto considerado, o que não é correto. É de se crer que o
estudante faz confusão entre a ordenada na origem da equação da reta (o valor de b) e o valor da
função no ponto de tangência. Ele interpreta mal o passo b = f(t0) + (-f’(t0) t0). O cálculo errado
do b leva à equação errada da reta tangente. Entretanto, como dissemos, existe uma parte
plausível do encaminhamento da resposta pelo estudante, é o caso de algumas interpretações
corretas indicadas acima. O estudante poderia ainda utilizar o ponto de tangência para substituir
as coordendas respectivas na equação da reta, na forma reduzida (y = ax + b), para determinar o
b, isto é: b = y – ax = 20 – 24 5 = 20 – 120 = -100.
Na pergunta 2c), apresentamos a resposta do estudante Michael:
FIGURA 82 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 2c) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
O estudante tem disponível o conhecimento do ponto de vista simbólico da derivada, já
que o emprega para determinar a 1ª e a 2ª derivadas da equação do movimento. Contudo, faz
264
fatorações inadequadas e erradamente, e interpreta o resultado dessas fatorações como
significando a aceleração pretendida, quando, na verdade, a aceleração é a 2ª derivada já
determinada. Melhor explicando, por um lado, há indícios de interpretação correta da questão que
se pretende resolver e, por outro, há desarticulação entre os ostensivos algébricos produzidos e os
não ostensivos correspendentes que deveriam nortear o encaminhamento da solução.
Na pergunta 2d) não houve resposta que se pode enquadrar nessa categoria de respostas,
ou seja, respostas que indicam ter havido indícios de compreensão do problema colocado. Com
exceção de uma resposta certa do estudante Befone, o resto de respostas é não conforme.
Reconhecemos que a questão não era fácil em termos de interpretação, porque o que estava em
causa não era a aceleração em si. Era preciso interpretar o problema em termos de tempo, instante
em que a velocidade se anula. Calculada a incógnita tempo é que se podia pensar na aceleração
nesse tempo. Para responder corretamente à questão, era preciso ter um conhecimento disponível
no uso da derivada de funções e, em seguida, mudar do quadro da análise para o quadro da
álgebra e resolver a equação do segundo grau para obter os zeros da função velocidade e usar
esses valores para determinar os valores de aceleração nesses pontos.
Na questão 2e) apresentamos, como exemplo, a resposta do estudante Befone:
FIGURA 83 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 2e) DO TESTE DIAGNÓSTICO.
FONTE: O autor (2014).
265
O estudante tem conhecimento disponível do estudo de funções com recurso à 1ª
derivada, e mobiliza esse conhecimento para responder à questão, no entanto a resposta dele fica
no nível das não totalmente conformes, pois sua análise não é completa. O que ele faz é aplicável
também à figura 2. Não está claro como é que ele escolhe a figura 3 e não a figura 2 ou ambas.
Portanto, ele deveria aprofundar um pouco mais a análise no sentido de diferenciar a situação da
figura 3 com a da figura 2. Isso poderia ser feito olhando para a ordenada na origem da função
derivada, o que alguns fizeram, ou estudando as coordenadas do vértice da função derivada.
Embora pareça não ter influenciado a natureza da resposta dos estudantes, a formulação
correta da questão haveria de ser: “Qual gráfico da derivada está desenhado corretamente?”
Dessa forma seria mais correto, pois em todos os casos apresentados, a função f está desenhada
da mesma maneira.
Como exemplo, nessa categoria, à questão 3, apresentamos a resposta do estudante
Goaba:
FIGURA 84 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 3 DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Goaba consegue identificar o problema que pode comprometer a derivabilidade da
função, o ponto x = 2. Goaba também tem conhecimento mobilizável de que, para a função ser
derivável, é necessário que satisfaça algumas condições, entre elas, a igualdade dos limites
laterais, no ponto considerado, umas das condições necessárias para a continuidade. Contudo o
estudante não usa a condição da igualdade das derivadas laterais para que a função seja derivável
em um ponto. Essa análise o levaria ao cálculo do m. É possível que essa atitude tenha como
origem o fato de que essa condição da igualdade de derivadas laterais para justificar a
derivabilidade de uma função em um ponto tenha pouca referência na prática de ensino do
conceito de derivada em Moçambique. Aliás, muitos livros de Cálculo não se detêm nesse
pormenor, embora importante, para tratar da derivada de uma função em um ponto.
Para a pergunta 4, nessa categoria de respostas não totalmente conformes, apresentamos
a resposta do estudante Agnêcio.
266
Tarefa 4: Considere a função f(x) =
00
012
xse
xsex
senx
,
,
Encontre a função derivada de f e seu valor (da função derivada) no ponto x = 0.
Agnêcio respondeu da seguinte maneira:
FIGURA 85 – RESPOSTA NÃO TOTALMENTE CONFORME À PERGUNTA 4 DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Existe na resposta o procedimento mobilizável correto do cálculo da derivada de um
produto e de uma função composta, todavia há dificuldades de notação. O estudante usa a
notação do limite juntamente com a notação de apóstrofe para a derivada de uma função e ao que
se vê na resolução, a notação de limite aparece simplesmente como decorativa, pois não se nota
seu efeito no desenvolvimento efetuado para encontrar a função derivada. Transparece apenas o
ponto de vista simbólico da derivada de um produto e de uma função composta. Determinada a
função derivada, o estudante usa a técnica de substituição para encontrar o valor da derivada no
ponto x = 0. Essa maneira de fazer dá indicações de que o estudante não entende a falta de
sentido de uma divisão por zero. Consideramos que esse modus operandi (de substituição) tenha
como origem a prática de substituição na determinação de limites de funções que funcionam
perfeitamente para funções geralmente polinomiais, mas quando se estende a outras funções, o
procedimento fica sem sentido. Por outro lado, entendemos que o estudante não interpretou bem
a condição imposta para o zero, pois estava explícito que o ramo x2
xsen
1da sentença tinha
sentido para x 0. Portanto, só numa dificuldade de interpretação da condição estabelecida é que
se pode substituir o denominador da fração x
1por zero. Mais uma vez, podemos considerar não
ter havido uma articulação entre os ostensivos algébricos desenvolvidos com os não ostensivos
correspondentes.
267
Categoria C: Respostas não conformes (incoerentes, não pertinentes).
As respostas não conformes são respostas incoerentes, que mostram discrepâncias entre
o que se apresenta como questão por responder e o discurso técnico-tecnológico desencadeado,
ou seja, os ostensivos mobilizados não são guiados pelos não ostensivos da questão posta. A
relação do estudante com a questão por resolver é vazia, ou como se diz em situações comuns, ele
não sabe resolver a questão apresentada. O estudante não tem conhecimento disponível,
mobilizável ou mesmo técnico para resolver a questão proposta.
A seguir, são exemplos de respostas não conformes, ou seja, não pertinentes, às questões
colocadas no teste.
Na pergunta 1a) apresentamos a resposta do estudante Gogo:
FIGURA 86 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 1a) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
A resposta dada mostra não haver coerência entre o que se pergunta e o que se responde.
A pergunta não faz menção à IR. Portanto, falar de IR não tem muito sentido nessa resposta. Por
outro lado, a resposta aponta que a função é contínua no intervalo dado, o que não é verdade. Não
é verdade que o gráfico não apresenta interrupção ao longo do seu curso, pois de -2 a 0, a função
é monótona, estritamente decrescente, e de 0 a 4,a função é constante, tendo havido um salto em
x = 0. Ao que parece, o estudante não conseguiu aproveitar o ostensivo gráfico para tirar dele a
resposta requerida. A resposta: “não apresenta interrupção ao longo do seu curso” pode
significar três coisas: o estudante não conhece o que é o gráfico de uma função, porque o da
função dada tem interrupção, ou o estudante toma o domínio da função para julgar a continuidade
dela, o que é um raciocínio incorreto, ou ainda o estudante toma o conjunto-imagem para julgar a
continuidade, conduta igualmente incorreta.
Na pergunta 1b), apresentamos a resposta do estudante Bauco:
FIGURA 87 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 1b) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
268
Esta resposta mostra que a relação entre o conteúdo matemático de análise e o estudante
respondente é mesmo vazia. O estudante utiliza qualquer conhecimento associado a limite,
mesmo que incorreto, para justificar sua resposta, ou seja, segue o exemplo da idade do capitão.
No caso, o estudante utiliza uma representação sem sentido.
Na pergunta 1c), apresentamos como exemplo nesse tipo de respostas, não conformes, a
resposta do estudante Vinagre:
FIGURA 88 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 1c) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Igualmente, essa resposta mostra dificuldades de compreensão sobre que é um conjunto-
imagem. Há uma discrepância entre o que se pergunta e o que se responde. Por exemplo, na
passagem: “quando`f´ tende a menos infinito f = 2”, há uma contradição: a imagem a tender ao
infinito, pois f significa imagem, e ao mesmo tempo assumir um valor de 2.
Como exemplo de respostas não conformes na pergunta 2a), apresentamos a resposta do
estudante Michael:
FIGURA 89 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 2a) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Nessa resposta, há uma discrepância entre o que se pede que seja encontrado e o
discurso técnico-tecnológico usado. O estudante procura determinar os zeros da função horária do
movimento, mas esses zeros não têm significado para o cálculo da velocidade. O estudante não
dispõe de conhecimentos que lhe permitam transitar do quadro da álgebra em que se encontra
formulada a tarefa para o quadro da análise matemática que possibilita encontrar a resposta da
questão proposta. Além disso, o estudante emprega a fórmula do movimento uniforme para
calcular a velocidade, uma indicação de que ele não compreende que uma equação horária como
269
a que foi dada no problema não pode corresponder a um movimento uniforme, onde a velocidade
é constante.
Na pergunta 2b), como exemplo desse tipo de respostas, apresentamos a resposta do
estudante Gogo:
FIGURA 90 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 2b) DO TESTE DIAGNÓSTICO.
FONTE: O autor (2014).
Embora o estudante apresente alguns aspectos da equação que pretende determinar,
quando escreve S – S1 = m(t – t1), mostra não compreender como obter os dados pretendidos. Ele
utiliza os dados sem uma articulação clara e correta entre eles.
Na pergunta 2c), apresentamos a resposta do estudante Vinagre:
FIGURA 91 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 2c) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
A resposta dada não é relevante para a questão colocada, pois a velocidade do
movimento, representada por uma equação quadrática, não tem aceleração constante. Portanto, é
problemático considerar aceleração constante numa situação do problema que estamos
resolvendo. O estudante não dispõe do conhecimento indispensável à resolução do problema
proposto.
Na pergunta 2d), apresentamos a resposta do estudante Davi, como exemplo:
FIGURA 92 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 2d) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
270
O estudante não estabelece corretamente a relação entre a questão colocada e a estratégia
de solução usada. Não está claro se o estudante confunde a velocidade com o tempo ou se
considera que a velocidade igual a zero implica tempo igual a zero. Há uma discrepância entre o
que se pede e a resolução feita da questão.
Na pergunta 2e), apresentamos ainda a resposta do estudante Davi, como exemplo de
respostas não conformes:
FIGURA 93 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 2e) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
O estudante faz um julgamento incompleto do problema. A derivada não poderia ser
analisada apenas com relação aos seus zeros, pois na figura 3, ao lado, claramente se vê que a
derivada também tem os mesmos zeros e com a parábola virada para cima. Não está claro como o
estudante não vê a necessidade de usar outros argumentos para certificar a sua resposta, uma vez
que existem duas situações parecidas. Da maneira como o problema é apresentado, é insuficiente
apresentar argumentos como os dados por ele.
271
Na pergunta 3, apresentamos a resposta do estudante Semo, como exemplo de respostas
desse tipo:
FIGURA 94 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 3 DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
Nessa resposta, a relação entre o que o estudante apresenta como resposta e o conteúdo
matemático visado é totalmente vazia. Não há indícios de que o estudante tenha algum
conhecimento para resolver o problema dado. O estudante exibe uma desarticulação entre os
ostensivos produzidos e os não ostensivos implicados no problema que deveriam guiar a solução.
Na pergunta 4, destacamos a resposta de Gerson como exemplo nessa categoria de
respostas:
FIGURA 95 – RESPOSTA NÃO CONFORME À PERGUNTA 4 DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
A resposta apresentada mostra uma incoerência no encaminhamento da resolução. Uma
sucessão de passos de manipulações algébricas sem relação com as ideias matemáticas que
subjazem à tarefa e, portanto, R(x, o) = . Com estas considerações, passamos para a categoria
D:
Categoria D: sem resposta (o estudante deixou em branco).
272
A categoria sem respostas refere-se a respostas que não foram dadas às questões
formuladas. Como se tem dito, o estudante deixou a questão em branco. Em alguns casos, os
estudantes explicitamente disseram não ter estudado o conteúdo visado. Esclarecendo esse fato,
então uma resposta inexistente pode significar uma relação vazia do estudante com o conteúdo da
questão colocada.
Os que explicitamente indicaram as razões do porquê de não responder, deram
justificação do tipo: “não estudei a matéria …”, como a explicação de Davis:
FIGURA 96 – RESPOSTA EM BRANCO À PERGUNTA 2a) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
O caso de Davis é idêntico ao de alguns estudantes que ingressam no Ensino Superior
em cursos de Licenciatura em Ensino de Matemática, sem que tenham tido no nível médio a
Matemática necessária para dar conta do conteúdo visto no primeiro ano de graduação em
Matemática. Isso significa que há pessoas que entram em cursos universitários para os quais não
estão qualificadas.
Algo interessante é o fato de que todos os que explicitamente declararam não ter
estudado um determinado tema relacionado com as tarefas constantes no teste, parece não terem
se sentido motivados para participar das sessões experimentais, o que indica a necessidade de um
trabalho de nivelamento mais específico com esses estudantes. Isso nos conduz a considerar que
seria interessante propor uma turma com estudantes que reconhecem não terem trabalhado
anteriormente com os conceitos de Cálculo, de maneira que eles possam sentir-se menos
constrangidos em relação ao grupo.
Diante disso, uma informação com que se fica, quando se olha a tabela dos resultados e
do percurso que fizemos na análise dos mesmos, é a de uma grande variabilidade de respostas,
das respostas conformes às respostas inexistentes, com uma certa predominância das respostas
não conformes e inexistentes. Nas categorias de respostas conformes e não totalmente conformes,
273
predominam as respostas não totalmente conformes, isto é, respostas com algum descaminho do
percurso correto da resolução.
O panorama da situação dá indicação (como a seguir destacamos) de haver problemas
reais de compreensão por parte dos estudantes em função das respostas dadas às tarefas do teste
diagnóstico:
- poucas respostas conformes ou não totalmente conformes quando comparadas com as
respostas não conformes e as deixadas em branco. Associado a esse tipo de respostas, as
justificações correspondentes não são claras. Essas duas informações levam-nos a considerar que
a maior parte dos estudantes participantes do teste não conhece integralmente o que é
preconizado pelo programa de ensino, se interpretarmos a situação na perspectiva de Chevallard
(1992) segundo a qual se R(x, o) = , então x não conhece o. O x aqui é o estudante participante
ao teste diagnóstico e o é o conteúdo de uma determinada questão do teste diagnóstico. Assim,
segundo Chevallard (1998), não podemos dizer que R(x, o) RI(p, o), ou seja, não podemos dizer
que a relação pessoal de x está conforme às expectativas institucionais para um estudante do 1º
ano da Universidade Pedagógica (posição p na fórmula dada) que veio de um ensino médio em
que se estuda o. Portanto, o que dizemos nesta passagem é a principal informação que tiramos
dos resultados do teste diagnóstico. Contudo podemos ainda realçar alguns detalhes:
- muitas imprecisões (erros) técnicas, tecnológicas e teóricas na resolução das tarefas
propostas e, sobre essas imprecisões podemos destacar as noções para as quais existem
dificuldades e a sua natureza. Nas porcentagens apresentadas abaixo na estratificação das
respostas que mostram dificuldades de responder às tarefas colocadas, agrupamos as categorias
não totalmente conformes, não conformes e sem resposta.
Na tarefa 1:
Noção de continuidade: os argumentos usados pelos estudantes não estão de acordo
com as definições estabelecidas institucionalmente, 81% dos que responderam o teste
estão nessa situação;
Noção de limitação: para além de haver estudantes que não têm informações sobre
essa noção, outros confundem a expressão “limitada” com o significado de possuir
limite. E, ainda outros, associam a limitação da função com a limitação do domínio
da mesma; 95% dos que responderam o teste estão nessa situação;
274
Noção de conjunto-imagem: 95% dos estudantes que responderam o teste estão com
dificuldades sobre essa noção;
Na tarefa 2:
O ponto de vista da derivada como taxa de variação (inclusive da derivada como
velocidade): 71% dos que resolveram o teste não cosnseguem produzir uma resposta
conforme;
O ponto de vista geométrico da derivada (derivada como declive da reta tangente ao
gráfico em um ponto): 90% dos que responderam o teste têm dificuldades de produzir
uma resposta boa;
Aplicação da derivada para resolver os problemas de movimento (questões 2c e 2d):
em média 83% dos que responderam o teste têm dificuldades;
Aplicação da derivada no estudo de funções: 86% dos que responderam o teste têm
dificuldades.
Tarefa 3:
Dificuldades de compreensão da continuidade de funções para a função derivada:
95% do que responderam o tste estão nessa situação.
Tarefa 4:
Dificuldades de compreensão e aplicação do teorema de confronto para a função
derivada: 100% dos que responderam estão nessa situação.
- alguns estudantes deixaram as tarefas sem respostas o que pode traduzir a falta de
estratégia para as resolver, aliás alguns deles disseram que não sabiam resolver
porque não estudaram o conteúdo visado no ensino médio por onde passaram.
Perante essa realidade, consideramos que houvesse razões suficientes que justificassem
nossa experimentação didática mediada com mídias e práticas usuais para ver como esses
estudantes reagiriam a esse novo ambiente para a construção e aprendizagem de conceitos de
derivada e integral de Riemann de funções reais a valores reais.
Esse panorama de resultados sugeriu-nos também que a discussão seguisse certa ordem,
que foi a seguinte: os conceitos de domínio, conjunto imagem, gráfico de uma função, limitação,
continuidade, limite de funções, limite da razão incremental, função derivada, função cotada e,
por fim, integração definida.
275
Finalmente, observamos que as relações pessoais dos estudantes são bastante
heterogêneas, pois dependem das relações institucionais já desenvolvidas no ensino secundário
que, para alguns estudantes, mostraram-se inexistentes. Essa constatação justifica a pertinência
do desenvolvimento do trabalho experimental para avaliar se uma estratégia diferente, que
considere a utilização do Geogebra articulada com as práticas usuais, pode promover ou não uma
aprendizagem baseada na compreensão e na construção de conhecimentos dos estudantes sobre
os conceitos de derivada de funções reais de uma variável real e de integral de Riemann. Na
sequência, apresentamos a descrição e análise das sessões experimentais, a partir de recortes de
algumas sequências de diálogos que consideramos como unidades de análise.
276
8 ESTUDO EXPERIMENTAL PARTE II: RESULTADOS E ANÁLISES DAS SESSÕES
EXPERIMENTAIS
Como indicamos na seção 4.4, esta parte da pesquisa tem como objetivo experimentar
uma modalidade de ensino e de aprendizagem dos conceitos de derivada e integral de Riemann
de funções reais de uma variável real, com recurso ao software Geogebra, articulado com as
mídias e práticas vigentes, por termos constatado que, restringindo-se às práticas usuais, o ensino
e a aprendizagem desses conceitos passam por uma fase complicada e com resultados
insatisfatórios e preocupantes, como mostram os resultados do teste diagnóstico apresentado
anteriormente.
Na sequência, descrevemos o trabalho realizado em cada sessão, indicando os aspectos
que consideramos essenciais, particularmente os objetivos, as tarefas propostas, a análise a priori
de algumas delas, para as quais tal análise não foi feita na parte I por terem surgido
especificamente na parte II, recortes de sequências de diálogos que constituem as unidades de
análise a posteriori e validação interna. As categorias construídas para essa análise são as
seguintes, baseadas no referencial teórico construído e na análise das relações instucionais feita.
Categoria E: dinâmica cognitiva. Conceitos básicos que determinaram as atividades de
ensino e de aprendizagem e a relação pessoal dos estudantes (conformidade e ou
inconformidade) frente às relações institucionais vigentes.
Categoria F: praxeologias didático-matemáticas desenvolvidas e a postura matemática
dos estudantes: os discursos técnico, tecnológico e teórico desenvolvidos na interação
pesquisador/estudantes e sua conformidade com as relações institucionais existentes.
Categoria G: ostensivos e não ostensivos usados pelos estudantes na relação com o
conteúdo visado.
Categoria H: ecologia das tarefas e dos conhecimentos dos estudantes.
Categoria I: os estudantes e os processos de instrumentação e de instrumentalização.
Categoria J: instrumentos e tipos de mediação didática.
Categoria K: artefato e instrumento e a conduta matemática dos estudantes: a
reconstrução dos esquemas matemáticos dos estudantes mediante o uso de instrumentos.
Categoria L: instrumentos e as praxeologias matemáticas desenvolvidas.
277
Categoria M: quadro de funcionamento dos conceitos e a conduta matemática dos
estudantes: qualidade das reformulações e o resultado obtido.
Categoria N: níveis de conhecimentos dos estudantes no processo de resolução das
tarefas propostas: formulações matemáticas produzidas e os métodos de solução usados.
Apresentadas as categorias que julgamos vão nos ajudar a indagar e a compreender os
acontecimentos no experimento, passamos ao decurso do mesmo, percorrendo as sessões
realizadas.
Observamos que a sessão 1 do dia 13/04/2013 corresponde à aplicação do teste
diagnóstico. Assim seguimos com a apresentação da sessão 2.
8.1 SESSÃO 2: 15.04.2013
A sessão 2 teve como objetivos analisar e discutir algumas dificuldades encontradas
pelos estudantes convidados ao estudo experimental na resolução do teste diagnóstico.
Participaram dela 21 estudantes, ou seja, todos os que fizeram parte do teste diagnóstico.
O foco dessa discussão foi sobre os conceitos de continuidade e funções limitadas.
Iniciou-se introduzindo algumas características do Geogebra: zona gráfica, zona algébrica e a
linha de entrada de comandos.
Na discussão, usamos a interação pesquisador-estudante, estudante-estudante, na qual
tanto o pesquisador como os estudantes mediaram a discussão, conforme preconiza Rabardel
(2002, 1995), ao se referir aos estudos de Vygotsky, segundo os quais, o trabalho com
instrumentos não somente possibilita a regulação e a transformação do meio externo, mas
também a regulação pelo sujeito de sua própria conduta e da conduta dos outros. Nessa primeira
sessão, o trabalho com o software foi apenas a introdução de suas características feita pelo
pesquisador.
A discussão realizou-se por meio da exploração do que os estudantes dispunham em
termos de conhecimentos relacionados aos conceitos de continuidade e de função limitada. A
partir de seus pontos de vista, foram discutidos e institucionalizados (formalizados) esses
conceitos.
278
Para essa primeira sessão, iniciamos a discussão com a tarefa apresentada na figura 97,
proposta no teste diagnóstico, portanto, uma tarefa para a qual já havíamos identificado algumas
das dificuldades que poderiam emergir durante a discussão:
FIGURA 97 – TAREFA PARA 2ª SESSÃO: CONTINUIDADE, FUNÇÃO LIMITADA E CONJUNTO-IMAGEM
1. Considere o gráfico de uma função f definida no intervalo I = [-2, 4].
a) A função f é contínua em [-2, 4]? Justifique.
b) A função f é limitada? Por quê?
c) Indique o conjunto imagem de f, Im(f). Justifique
FONTE: O autor (2014).
A análise a priori da tarefa já foi apresentada no corpo do teste diagnóstico.
Legenda usada na transcrição dessa sessão e nas transcrições das sessões subsequentes:
P – pesquisador;
As – estudante(s) ou aluno(s);
AAs – alguns estudantes ou alguns alunos;
1A – um estudante ou um aluno;
OAs – outro(s) estudante(s) ou outro(s) aluno(s);
1AGi – um estudante ou um aluno do grupo i, com i = 1, 2, 3, 4. Essa denominação não
é frequente nas primeiras sessões, pois, com a desistência de alguns participantes iniciais, os
grupos tiveram de ser reorganizados.
A seguir são apresentadas algumas partes do desenvolvimento da sessão 2, destacando
em negrito os sujeitos intervenientes e, às vezes, as afirmações consideradas interessantes.
Recorte 1 de uma sequência de diálogos.
FIGURA 98 – DISCUSSÃO SOBRE FUNÇÃO CONTÍNUA NA SESSÃO 2 P – Como disse, vamos trabalhar aqui (no laboratório de informática). Nas nossas aulas vamos usar frequentemente
o Geogebra, versão 4.2, parece que aqui tem versão 3.2. Vamos falar com os homens da informática para colocar a
versão 4.2. Algumas coisas vocês já as conhecem e outras coisas com certeza podem ser novas … como disse, as
nossas discussões vão centralizar-se sobre a derivada de funções e a integral de Riemann … esses são os nossos
assuntos: derivada e integral de Riemann. Suponho que algumas pessoas têm conhecimento da derivada de funções
ou da integral de Riemann. Então nessa sequência, quais são os conceitos de base, e por isso nós resolvemos aquele
teste … para você estudar a derivada, ou a integral de Riemann, você precisa de alguns conceitos de base … tal
279
como nós vimos, são conceitos de funções … como vocês sabem, a derivada é definida de certa forma sobre
funções, propriedades de funções, são conceitos de base, por isso mesmo na 1ª questão vinha a função f, é ou não é
contínua? E vocês responderam … sobre continuidade de funções. Eu não sei se vocês estudaram na matemática
escolar … já estudaram ou não a continuidade de funções?
[...]
AAs – Estudamos na 12ª. (Última série do Ensino Médio – terceiro ano do Ensino Médio no Brasil).
P – Ok. Estudaram na 12ª.
AAs – Precisamos de rever.
[...]
P - […] A pergunta que se coloca aqui, é, aquela função é contínua ou não?
As – Silêncio.
P – Há definições que se usam para falar da continuidade: as definições principais. Há muitas outras definições
com certeza, mas as definições que nós usamos quando estamos a começar, são duas … Quem pode falar sobre a
continuidade?
As – Silêncio.
1AG2 – podemos falar da continuidade da função quando o limite da função é igual ao limite da...
1AG4 – Quando o limite à direita é igual ao limite à esquerda.
1AG3 – Quando os limites laterais são iguais, é contínua, ela é definida nesse ponto.
P – Bem, essas são as definições que vocês estão a dar. ... A pergunta é se aquela função é contínua ou não e vocês
estão a falar de pontos … vocês estão a dizer que aquela função é contínua quando os limites laterais são iguais ao
valor da função naquele ponto. Onde?
Silêncio
1A – Uma função é contínua quando ela é definida em todos os seus pontos.
P – Ok. Eu vou dar um exemplo: (Escreve: f(x) =
05
02
xse
xsex
,
, , para produzir um salto. (Note-se que esta
função não foi planificada para esta aula, espontaneamente o pesquisador apresentou achando que podia ser usada
para discutir a contuidade.)
P – É uma definição que eu estou a introduzir. Em todos os seus pontos. Qual seria o gráfico desta função?
1A vai completar o esboço do gráfico:
P – Este é o gráfico daquela função. Do que foram dizendo,
quando seria contínua?
1 A – Se os limites laterais fossem iguais.
P – Então vamos determinar os limites laterais. Mas temos que
dizer onde.
As – No ponto zero.
P – À esquerda do zero, qual o limite?
Todos os As – Zero.
P – Alguém pode justificar por que zero?
Silêncio prolongado.
1A – Quando estamos a aproximar para zero, o gráfico tende para zero.
P – Este zero aqui (do limite) tem a ver com as imagens. Quando estamos a aproximar para zero no domínio, as
imagens aproximam-se do zero. Então, os limites laterais são iguais. Podemos concluir que a função é contínua?
No ponto zero, os limites laterais são iguais, estamos a ver, não é?
1A – Não é contínua. […]
1 A – Uma função é contínua quando em qualquer ponto de seu domínio os limites laterais são iguais e igual a f da
função.
1AG4 – Esta função que nós temos, se f(0) fosse zero, seria contínua.
P – Seria sim. Por exemplo, se fosse assim f(x) = x2 e estudar a continuidade da função no ponto x = 0, o que nós
íamos dizer?
As – O limite existe e é igual ao valor da função naquele ponto.
1 A – É assim que se estuda, a continuidade de uma função é um ponto.
280
P – Então a continuidade de uma função, toda ela, é falada quando eu a vejo em todos os seus pontos. Então uma
função é contínua, toda ela, quando for o quê?
1 A – Quando ela é definida em todos pontos do seu domínio.
1 A – É contínua quando o limite é igual ao valor da imagem. […]
1 A – Uma função é contínua se o valor é igual ao limite.
OA – Uma função é contínua num ponto se o limite é igual ao valor da função naquele ponto.
P – Vamos ver a função que apareceu no
questionário: (o pesquisador plota a função usando
data show):
P – Esta função é contínua?
1A – Não é contínua porque os limites laterais não
são iguais no ponto x = 0.
P – Quando eu venho da esquerda, o limite é...?
As – É zero.
P – Quando venho da direita, o limite é...?
Muitos estudantes – É zero.
1 A – É um.
P – Quando venho da direita, o limite é um. Então a
função não é contínua em x = 0 ... O valor da imagem
da função deve ser igual ao valor do limite naquele
ponto. […]
FONTE: O autor (2014).
Análise do recorte 1 de sequências de diálogos:
A sequência acima de diálogos mostra que a relação pessoal dos estudantes sobre a
noção de continuidade não é conforme à relação institucional vigente. Nenhum critério dos que
destacamos na análise a priori é tomado em consideração pelos estudantes, quando caracterizam
a continuidade de uma função em um ponto ou em todo seu domínio. O discurso tecnológico-
teórico desenvolvido pelos estudantes não se baseia em conceitos ou noções, mas sim, em
percepções vagas, como mostram as seguintes passagens extraídas do recorte acima:
“1AG2 – Podemos falar da continuidade da função, quando o limite da função é igual
ao limite da …”.
“1AG4 – Quando o limite à direita é igual ao limite à esquerda.”
“1AG3 – Quando os limites laterais são iguais, é contínua, ela é definida nesse ponto.”
A afirmação: “Uma função é contínua quando em qualquer ponto de seu domínio os
limites laterais são iguais e igual a f da função” carece de explicitação. No caso, seria preciso
individualizar os pontos. O estudante parece não entender bem que o termo “lateral” implica uma
posição relativa. Deve ser lateral a alguma coisa. Da maneira como está formulada, dá a entender
que em todos pontos, a função deve ter o mesmo limite e esse limite será igual ao valor da função
para que ela seja contínua.
281
Da mesma forma, para responder que uma função é contínua, encontramos “Quando ela
é definida em todos pontos do seu domínio”, o que expressa uma dificuldade do próprio conceito
de função.
Perante essas dificuldades, a discussão desenvolvida em torno da função
f(x) =
05
02
xse
xsex
,
,
parece-nos ter proporcionado aos estudantes a oportunidade para refletir melhor sobre o conceito
em jogo, pois a partir dela, surgiram argumentos tecnológico-teóricos adequados em relação ao
conceito visado. As afirmações de alguns estudantes mostram essa mudança do ponto de vista.
“O limite existe e é igual ao valor da função naquele ponto.” e “Uma função é contínua num
ponto se o limite é igual ao valor da função naquele ponto.”
Para nós, as afirmações desse tipo, veiculando o conteúdo da definição do objeto
requerido segundo as expectativas institucionais, constituem um indicador do início de
apropriação de um conhecimento sobre o conteúdo visado pelo estudante que antes não possuía.
Uma pergunta que nos parece importante, mas que não foi colocada no momento
oportuno, é saber a razão de boa parte dos estudantes ter respondido que o limite lateral direito da
última função era 0, quando x tendia a zero.
Vianna (1988, p. 22), na sua tese de doutorado, identifica casos em que a literatura de
Cálculo reforça raciocínios equivocados. Segundo a autora, o livro de Courant & John de 1965,
página 37, apresenta um exemplo de descontinuidade usando a função f(x) = x
1, no ponto x = 0.
Para ela, o exemplo é claramente contraditório com a definição de continuidade, uma vez que a
função dada não está definida em x = 0, o que pode levar o estudante a construir um conceito
inadequado de descontinuidade.
As passagens que seguem dão algumas indicações de como os estudantes pensam a
respeito do conceito de uma função limitada, uma forma de pensamento já identificada no teste
diagnóstico.
FIGURA 99 – DISCUSSÃO SOBRE FUNÇÕES LIMITADAS, SESSÃO 2 […]
P – Temos alínea b. A pergunta é se a função é limitada. E por quê.
AAs – A função é limitada porque está definida no intervalo [-2, 4].
282
OAs – É limitada porque tem um limite.
P – Uma série de respostas. É limitada porque está definida num intervalo limitado. É limitada porque tem um limite.
Vamos ver isso bem. A definição da função limitada fala sobre domínio limitado? Fala da existência do limite?
Silêncio.
P – A definição de uma função limitada não apela ao domínio, nem apela à existência do limite. Bem, dizemos que
uma função f é limitada se suas imagens estão dentro de um intervalo limitado. Não se pergunta se seu domínio é
limitado, mas sim, se seu conjunto-imagem é limitado. Nem se fala da existência do limite dessa função. Portanto,
formalmente dizemos que uma função f é limitada se existe um número real k>0 tal que |f(x)| < k para todo x do
domínio de f. Então vejamos as imagens da nossa função. Qual é o conjunto-imagem?
Silêncio
P – Ou o contradomínio, como geralmente se tem referido? Qual é o contradomínio (em Moçambique contradomínio
algumas vezes se identifica com o conjunto imagem).
Silêncio
P – Na verdade, quando falamos de uma função é porque há imagens. Onde estão as imagens da nossa função? Estão
a ver ou não?
As – Estamos.
P – Onde estão as imagens da função?
AAs – As imagens começam no zero e terminam no dois.
P – Começam de zero e terminam no 2. Ok. Então qual o conjunto das imagens?
1 A – Os números de zero a 2.
P – Então, como podemos escrever isso?
1 A escreve no quadro: “y = [0, 2]”.
P – Ou podemos escrever “Imf = [0, 2]” para dizer imagens da função f. Ou ainda podemos escrever “Imf = {yIR :
0 < y < 2}”. Então f é limitada ou não?
AA – É limitada. É limitada.
P – É limitada. Por quê?
AAs – Porque é limitada. (dificuldades de produção de justificação coerente).
P – É limitada por que é limitada?
1 A – É limitada porque as imagens estão num intervalo limitado.
FONTE: O autor (2014).
Análise do 2º extrato da sessão 2:
O extrato acima mostra o julgamento que os estudantes fazem sobre a propriedade de
limitação de uma função: é limitada porque está definida num intervalo limitado; é limitada
porque tem limite. O julgamento é feito sobre um discurso tecnológico errado, concordando com
o que apontamos na análise a priori sobre os possíveis equívocos do raciocínio, em geral baseado
nas características do domínio e na palavra ambígua de “limite”.
Talvez o fato de o conceito de “função limitada” demandar na Matemática uma
definição rigorosa possa ser a causa do resvalar do conteúdo desse conceito para interpretações
ambíguas, pois o custo cognitivo implicado é maior e exige uma abstração mais delicada.
Pensamos que teria sido interessante se se questionasse aos estudantes qual era o limite
que definia essa limitação. Talvez ficaria mais claro o sentido da expressão “é limitada porque
tem limite”. Da maneira como foi expresso, não se sabe se ter limite está sendo usado no sentido
de ser convergente, ou no sentido de estar entre dois valores conhecidos. Não obstante essas
283
dificuldades específicas de questionamento, temos a percepção de que a sequência de
intervenções entre o pesquisador e os estudantes tentou trazer ao conhecimento dos estudantes o
significado da expressão “função limitada”, ou seja, os elementos de referência da noção visada.
O questionamento focalizou a noção de conjunto-imagem de uma função e apelou para uma
reflexão sobre esse fato na função dada. Na sequência dessa reflexão, algumas ideias dos
estudantes foram despontando, identificando corretamente, no ostensivo gráfico, o conjunto-
imagem da função em estudo, tendo-o representado por meio do código associado à noção de
intervalo [0, 2], que pode ser representado pelo ostensivo lógico ou pelos ostensivos topológicos
que, se considerarmos a teoria dos registros de representação de Duval (2011), correspondem aos
registros de representação - lógico e topológico - respectivamente. Como já observamos na
análise a priori, a noção de intervalo sobre IR merece um estudo mais específico quando se
consideram suas representações.
Pese embora o fato de que o desenvolvimento dos questionamentos tenha levado certo
tempo para avançar, consideramos válido esse processo, pois questões de continuidade, imagens
e função limitada nos parecem cruciais para o prosseguimento das sessões seguintes, e elas
constituem aspectos de base para falar da derivada e da integral de Riemann. E, por outro lado, os
estudantes mostraram não dominar esses conceitos e uma discussão em que eles falam do que
pensam e depois o pesquisador intervém para o encaminhamento apropriado, fazendo ver as
razões de ser ou não dos seus pontos de vista, é uma estratégia adequada, promotora da reflexão,
como é possível observar nas afirmações seguintes: “As imagens começam no zero e terminam
no dois”, “É limitada porque as imagens estão num intervalo limitado”. Essas afirmações
mostram uma mudança nos pontos de vista dos estudantes, pois no teste diagnóstico e nas
primeiras fases da discussão, eles não tinham uma ideia clara sobre esse tema. A partir da
discussão desenvolvida, eles começam a produzir justificações consistentes. No nosso entender, o
ambiente criado na sessão constituiu uma verdadeira ecologia do conhecimento matemático dos
estudantes, no sentido de que permitiu a emergência de raciocínios corretos sobre as noções de
continuidade e de limitação de funções reais a valores reais.
Ainda reforçamos que a discussão tentou ir ao encontro das sugestões de respostas
apresentadas na análise a priori, ainda que no desenvolvimento da sessão essas respostas tenham
sido produzidas numa situação de diálogo entre o pesquisador e os estudantes, não
284
necessariamente sob a iniciativa dos mesmos. Em alguns casos, foi necessária uma intervenção
do pesquisador, como podemos observar em algumas passagens: “P – Na verdade, quando
falamos de uma função é porque há imagens. Onde estão as imagens da nossa função? Estão a
ver ou não?”, “P – Ou podemos escrever “Imf = [0, 2]” para dizer imagens da função f. Ou
ainda podemos escrever “Imf = {yIR : 0 < y < 2}”. Então f é limitada ou não?”
Assim, a discussão empreendida na sessão 2 deixou-nos com algumas questões para
reflexão e reformulação das estratégias para as sessões seguintes, principalmente no que se refere
à explicitação dos conceitos de domínio, conjunto imagem e gráfico de uma função, aproveitando
as possibilidades de representação do software computacional, no nosso caso, o Geogebra, por
meio dos recursos cor, espessura e animação para destacar esses elementos.
A seguir apresentamos a sessão 3.
8.2 SESSÃO 3: 20.04.2013
A sessão 3 tinha os seguintes objetivos:
- introduzir aos estudantes o recurso computacional Geogebra: com o foco
a) na produção de gráficos;
b) no desenho de âncoras de pontos coordenados no plano cartesiano; especialmente
pontos do gráfico da função. Pensávamos que saber colocar esses pontos (do domínio, do gráfico
e da imagem) era importante para o estudo dos conceitos de domínio, imagem e de gráfico que
consideramos como elementos essenciais de uma função;
- revisar e analisar os conceitos de domínio, imagem e gráfico de funções com o recurso
ao ostensivo gráfico produzido no Geogebra. Esta revisão foi uma necessidade didática ditada,
principalmente, pela resposta do estudante Gogo no teste diagnótisco, que foi a seguinte:
FIGURA 100 – RESPOSTA (ii) NÃO CONFORME À PERGUNTA 1a) DO TESTE DIAGNÓSTICO
FONTE: O autor (2014).
E a nossa análise dessa resposta foi de que dizer: “não apresenta interrupção ao longo
do seu curso” podia significar três coisas: o estudante não conhece o que é o gráfico de uma
285
função, porque o gráfico da função em consideração tem interrupção, ou o estudante considera o
domínio da função para julgar a continuidade dela, o que é um raciocínio incorreto ou ainda o
estudante utiliza o conjunto-imagem para julgar a continuidade, o que é igualmente incorreto.
Dessa preocupação, julgamos oportuno e necessário discutir a distinção entre domínio, gráfico e
imagem, com o recurso ao software Geogebra, aproveitando as suas possibilidades de
representação.
- revisar e analisar funções definidas por partes com o recurso ao Geogebra. Essa
revisão foi, por um lado, ditada pelas dificuldades que os estudantes mostraram na resolução das
questões 1, 3 e 4 do teste diagnóstico, que são de funções definidas por partes, em que eles não
conseguem discriminar as diferentes sentenças da função e, por outro lado, consideramos que
estudar a continuidade e limites de funções tem mais sentido, quando as suas leis de formação
têm mais que uma sentença ou seu gráfico tem mais que um componente porque, no nosso
entender, essa representação veicula a aparência de existir problemas de continuidade ou
problemas de existência de limite nos pontos de ligação das sentenças que precisam ser
averiguados. Pensamos não ser motivador estudar a continuidade ou limite de funções em um
ponto, cuja lei de formação é de apenas uma sentença ou o gráfico é de apenas um componente.
Pois, ainda segundo nossa percepção, o pedido de estudar a continuidade ou a existência de limite
de uma função com uma sentença em um ponto de seu domínio parece ser artificial, não é
motivada por alguma situação de representação.
- revisar e analisar a continuidade e limites de funções com o recurso ao software
Geogebra. Esta revisão tem imperativo de reforçar a compreensão desses conceitos pelos
estudantes, pois eles funcionam como ferramentas essenciais na discussão de derivada e integral
de Riemann de funções reais a valores reais.
Participaram da sessão 9 estudantes.
As tarefas propostas foram as seguintes:
FIGURA 101 – ESTUDO DE DOMÍNIO, IMAGEM E CONTINUIDADE
Tarefa 1: Considere a função definida por f(x) = x2 – 2x + 1
Roteiro da construção: com recurso ao Geogebra:
1 – desenhe o gráfico de f;
2 – desenhe um ponto A no eixo das abscissas nas proximidades do ponto 2;
3 – com a opção reta perpendicular na 4ª janela da barra de ferramentas, desenhe uma reta perpendicular ao eixo
x, passando pelo ponto A;
4 – com a opção ponto de interseção na 2ª janela da barra de ferramentas, determine o ponto B, de interseção
entre a reta perpendicular ao eixo x passando por A e o gráfico de f;
286
5 - com a opção reta perpendicular na 4ª janela da barra de ferramentas, desenhe uma reta perpendicular ao eixo y,
passando pelo ponto B;
6 – com a opção ponto de interseção na 2ª janela da barra de ferramentas, determine o ponto C de interseção entre
o eixo y e a reta perpendicular ao eixo y passando pelo ponto B;
7 – com um clique em cima de cada um dos pontos A, B e C, ative o rastro de cada um desses pontos.
8 – diga o que cada um desses pontos descreve:
Tarefa 2: Considere a função definida por
10212
20
0103
2
asea
asea
ase
af )(
Responda às seguintes perguntas, recorrendo, se necessário, ao recurso computacional.
a) Como a função está definida?
b) Qual é o domínio de f?
c) Qual é a imagem de f?
d) A função f é contínua? Por quê? FONTE: O autor (2014).
Análise a priori das tarefas propostas
As escolhas pertinentes para encaminhar as tarefas são as seguintes:
Formulação das tarefas pela lei de formação;
Perguntas intermediárias discriminadas em itens;
Software Geogebra;
Opções de cor e espessura do Geogebra;
Animação das imagens;
Organização dos estudantes em grupos de 2 componentes.
Respostas esperadas:
Na tarefa 1, as respostas que esperávamos são as seguintes.
O gráfico poderia ser desenhado digitando na entrada de comandos do Geogebra a
expressão algébrica: f(x) = x^3 - 2x + 1
Feito isso, teríamos o gráfico da função cuja lei de formação é f(x) = x3 – 2x + 1
desenhado na zona gráfica. Os pontos A, B e C são plotados segundo o roteiro dado no
enunciado, com o acompanhamento passo a passo do pesquisador.
287
FIGURA 102 – IMAGEM VISUAL (I) DE DOMÍNIO, CONJUNTO-IMAGEM E GRÁFICO
FONTE: O autor (2014).
A construção final deve resultar na seguinte figura:
FIGURA 103 – IMAGEM VISUAL (II) DE DOMÍNIO, CONJUNTO-IMAGEM E GRÁFICO
FONTE: O autor (2014).
Pelo ostensivo figural, e observando o traço que cada ponto vai descrever no plano
cartesiano, os estudantes devem compreender que o ponto A descreve o domínio da função (em
azul), o ponto C descreve a imagem da função (em vermelho) e o ponto B descreve o gráfico da
função (em preto). Consideramos ser importante clarificar isso, pois, para alguém dominar a
continuidade e a propriedade da função limitada, ele precisa compreender os conceitos de
domínio, imagem e de gráfico de uma função. Pensamos que o Geogebra permite ao estudante
entender esses fatos por meio de observação do movimento e da imagem visual que cada ponto
vai descrevendo no sistema cartesiano ortogonal. Por meio da observação, o estudante tem a
possibilidade de discriminar, comparar e diferenciar cada lugar geométrico descrito e, daí, poder
identificá-los distintamente um do outro, quando necessário.
288
Nessa tarefa, evidenciamos claramente a mudança das praxeologias, especialmente no
aspecto técnico-tecnológico. Enquanto, com a mídia usual, a construção do domínio, do gráfico e
da imagem da função é feita em etapas desconexas: escolha de ponto no domínio determinar a
imagem desse ponto levantar uma perpendicular no ponto escolhio do domínio fazer
perpendicular ao eixo do contradomínio pelo ponto da imagem obtida determinar a interseção
das perpendiculares; repetir o processo várias vezes até que apareça uma rede de pontos no plano
cartesiano que dê a ideia da estrutura da curva do gráfico … essa estratégia é demorada,
imprecisa e requer o domínio do discurso teórico o que muitas vezes fracassa, segundo nossa
prática. Com o recurso computacional, esses elementos são descritos visualmente e em
simultâneo e o vínculo entre eles é percebido, também visualmente, por meio de âncoras. A tarefa
é desenvolvida no quadro da geometria e, no nosso entender, as escolhas cor, espessura e
animação desempenham um fator diferenciador positivo na caracterização dos objetos
matemáticos em estudo, pois é nítido, ou os estudantes podem ser chamados a verem isso, onde
cada objeto se situa no plano cartesiano. Com a mediação do professor, os estudantes podem ser
levados a produzir respostas baseadas na apreensão visual (por meio de ostensivos visuais) do
conteúdo da definição. No nosso entender, fica mais claro, partindo dessa visualização, escrever
Domf = {xIR}, Imf = {yIR} e Grf = {(x, y)IR2: y = f(x)}. Nessa mediação, o estudante
deve apreender que, tanto o domínio quanto o conjunto-imagem são conjuntos de números reais,
mas satisfazendo condições diferentes, ou seja, são lugares geométricos diferentes. A articulação
entre o quadro numérico (números reais) e o quadro geométrico (lugar geométrico) é necessária
para o estudante compreender o que é o domínio, o que é a imagem e o que é o gráfico.
Na tarefa 2, as respostas esperadas são as seguintes:
a) O estudande precisa mobilizar o conhecimento sobre o que é um intervalo e sobre o
que é a lei de formação. Com a mobilização desses conhecimentos, a resposta a produzir deve ser
a seguinte: a função está definida por partes pois há três ramos da função com expressões
algébricas bem distintas. Da esquerda para a direita, temos que na 1ª expressão, no intervalo [-10,
0), a função é constante; na 2ª expressão, no intervalo [0, 2), a função toma a forma quadrática;
na 3ª expressão, no intervalo [2, 10], a função é afim.
O ostensivo gráfico pode ser usado para mostrar as particularidades geométricas dessas
diferenças de comportamento da função e possibilita distinguir os ostensivos topológicos
289
relacionados ao domínio e à imagem das partes da função e o ostensivo gráfico dessas mesmas
partes, como vemos a seguir.
FIGURA 104 – ESTUDO GRÁFICO (I) DOS ASPECTOS DE UMA FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES
FONTE: O autor (2014).
Na tarefa b), a resposta esperada é a seguinte: o domínio de f, segundo a definição é:
Domf = {x IR: -10 < x < 10}, o que corresponde ao ostensivo lógico do intervalo que
representa o domínio da função.
Esse domínio pode ser visualizado graficamente pelo traço do ponto Domf sobre o eixo
das abscissas, de -10 a 10. Outros elementos, Imf e Gráficof, podem ser visualizados na figura
abaixo. Como já mencionado, as variáveis cor, espessura e animação nesse ostensivo gráfico
desempenham um papel importante na produção da resposta.
Na tarefa c), temos que a imagem de f, Imf, é o conjunto dos números reais entre 0 e 19,
inclusive, ou seja:
Imf = {y IR: 0 < y < 19}, ou seja, após identificar o ostensivo topológico por meio do
gráfico, o estudante utiliza o ostensivo lógico para produzir a resposta esperada.
Graficamente, a imagem de f é traçada em vermelho na figura que segue e indicada por
Imf.
290
FIGURA 105 – ESTUDO GRÁFICO (II) DOS ASPECTOS DE UMA FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES
FONTE: O autor (2014).
Na tarefa d), a resposta seria que a função f não é contínua pois no ponto x = 0, os
limites laterais de f não são iguais: temos 0a
lim f(a) = 3 e 0a
lim f(a) = 0.
Uma análise similar pode ser feita em relação ao ponto x = 2, onde vemos 2a
lim f(a) = 4
e 2a
lim f(a) = 3.
Outra resposta seria recorrer ao gráfico de f. Dado que o domínio de f é um intervalo, e o
gráfico de f tem três componentes disjuntos, então f não é contínua.
Uma resposta informal seria dizer que f não é contínua, porque o gráfico de f não pode
ser percorrido numa única linha sem fazer um salto.
Observação: consideramos que um dos aspectos delicados do uso da tecnologia numa
intervenção didática seja a observância rigorosa de procedimentos técnicos algorítmicos. Para um
principiante no processo, esse ritual pode tornar-se um pouco enfadonho. Mas não há como
esquivar-se dele se a intenção for usar o recurso tenológico para o estudo do conteúdo visado, que
é o nosso caso neste trabalho. Portanto, pode parecer que haja muita diretiva em termos do que
deve ser feito, mas não há como escapar disso, quando o grupo a que se dirige a ação didática
instrumentada não conhece como fazer funcionar a máquina para produzir resultados. A diretiva
faz parte das condições e restrições impostas pelo uso de instrumento.
É válido esclarecer, embora já o tenhamos feito anteriormente, que é preciso ter presente
que, para as duas formas de interação: recurso às práticas usuais ou por meio de um software
computacional, alguns componentes das praxeologias implicadas na questão (tipo de tarefas,
técnica, tecnologia e teoria) mudam. Como vemos nas respostas acima, com as práticas usuais, as
técnicas e tecnologias desenvolvidas são interações diretas e no quadro da análise matemática,
291
tendo como base as definições; com o recurso computacional, as técnicas e tecnologias
desenvolvidas são interações não diretas, pois são baseadas em instruções inseridas na máquina
via teclado ou outros dispositivos de interface, geralmente, acompanhadas com uma mudança de
quadro, operada no interior da máquina: do quadro da análise para o quadro da geometria e, desse
último, a resposta é trazida pelo juízo que compreende a comparação, a discriminação, o controle
e a validação visual e experimental. Observamos ainda que as respostas exigem ainda um
domínio dos ostensivos lógico e topológico que, em geral, não são trabalhados com estas
especificidades pelo ensino, o que pode conduzir a dificuldades de interpretação dos conjuntos
domínio e imagem.
A tarefa 2 foi proposta pelo pesquisador em forma de applet, para não gastar muito
tempo na sua elaboração, tendo em conta que era a primeira aula do uso do Geogebra pelos
estudantes nesse tipo de tarefas.
A seguir, apresentamos recorte de uma sequência de diálogos da sessão.
FIGURA 106 – USO DE GEOGEBRA NO ESTUDO DE FUNÇÕES, SESSÃO 3
Os estudantes trabalham na função f(x) = x3 – 2x + 1, com a entrada direta de comandos na janela de comandos,
segundo a orientação do pesquisador: f(x) = x^3 – 2x + 1. E aparece o gráfico:
Algumas dicas que o pesquisador considerou:
- através do comando mover, mover o gráfico para um bom view (boa visualização) conforme o desejo do
resolvedor;
- visualizar ou esconder o quadriculado da zona gráfica, por meio de um click na zona gráfica com o botão direito
do rato;
P – Para eu movimentar o plano cartesiano, eu clico primeiro aqui (na última janela da barra de ferramentas), e
com o rato (mouse), pressionado o lado esquerdo, assim eu movimento o plano cartesiano. Está certo? Em vez de
estar assim colocada a janela algébrica, então eu posso movimentar a janela gráfica para um lugar conveniente.
(Repete a mesma instrução). Se este ícone não aparece (o ícone mover), então por baixo da janela, há uma
setinha, então é clicar na setinha e lá vemos o ícone (mover) e clicamos nele. Depois de ativar a janelinha,
movimentamos, como antes, colocando o gráfico na posição onde se quer. … Outra dica, para eu colocar a grelha,
eu clico com o botão do lado direito, e vejo onde está a grelha, eu clico nela, com o lado esquerdo então aparece a
grelha. Para esconder (a grelha), faço a mesma operação, clico com o lado direito, então aqui, onde está grid,
acho que em português é grelha mesmo, então clico ali com o lado esquerdo.
292
As – É quadriculado.
P – Ok, quadriculado, clique ali, então escondo ou coloco a grelha. […]
Depois começa a discussão sobre como colocar as âncoras dos pontos e isso é feito passo a passo com a
orientação do pesquisador por meio do data show mostrando no quadro, e algumas vezes, em contato
individualizado ao nível dos grupos:
P – Vamos escolher um ponto no eixo das abscissas (nas proximidades do ponto x = 2, para ser visível na janela
gráfica). Talvez esconder a grelha, clicar com o lado direito e com o lado esquerdo, clicar sobre a grelha,
esconder a grelha, …, já? …
[…]
Uma longa discussão para se determinar o ponto de intersecção. Depois de ser obtido o ponto de interseção, é
traçada a reta perpendicular ao eixo das ordenadas passando pelo ponto B e obtida a seguinte figura (figura 107a).
O pesquisador recomenda esconder as retas, ficando apenas os
pontos A, B e C. Em seguida, recomenda traçar segmentos AB
e BC, com o estilo tracejado, como se vê na figura 107b.
Uma longa discussão para isso ser feito. Os passos para isso
foram os seguintes:
Segmento (3ª janela da barra de ferramentas) ponto A
ponto B (clicando em cada um dos pontos). Assim se obtém
AB; ponto B ponto C. Assim se obtém BC. Um clic direito
sobre AB propriedades estilo tracejado. Ok. Do
mesmo modo para o segmento BC.
Figura 107a
Figura 107b
O pesquisador recomenda traçar as âncoras do ponto B; pintando B com cor azul e C com cor vermelha. Os
passos para isso:
click com botão direito do rato sobre o ponto A traço. O mesmo para outros pontos.
Para pôr a cor: click com botão direito do rato sobre o ponto B propriedades cor (seleciona-se vermelha).
Os mesmos passos para o ponto C, selecionando a cor azul.
Feito isso o pesquisador sugere:
P – Vamos mover o ponto A (com a seta do teclado). (Obtém-se sucessivamente diferentes pontos, descritos
pelo ponto A, diferentes imagens descritas pelo ponto C e diferentes pontos do gráfico, descritos pelo ponto B).
Feito o movimento obtém-se a seguinte figura 107c.
P – Onde está o domínio aqui (na figura)?
1A – No eixo das abscissas (sem especificar).
P – E onde está a imagem?
1A – A imagem está no ponto de intersecção.
P – Neste desenho, o que é que mostra a imagem? Quando eu
movimento o ponto A, vejo a imagem, onde está imagem?
1AG1 – Nos pontos C.
P – O ponto C está a mostrar cada imagem do ponto do domínio. Então
Figura 107c
293
o ponto B descreve o quê?
Silêncio.
P – Quem pode nos dizer o que o ponto B descreve? […]
P – Quando eu movimento o ponto A, muitas coisas aqui (na figura) se movimentam, vocês estão a ver isso ou
não? (Nos seus desenhos assim como no desenho do data show).
Os estudantes fazem experiências, movimentando o ponto A. Mas alguns ainda não concluíram a etapa de colocar
as âncoras/tracejar as âncoras do ponto B. O pesquisador ajuda esses estudantes a concluirem as suas construções,
dando algumas explicações:
P - É só ver este ponto A, está a percorrer o domínio da função, onde está a imagem? (Para o grupo 4,
especificamente): Vocês estão a ver as imagens ou não?
G4 – É o ponto C.
[…]
Uma longa discussão de idas e voltas, pois alguns estudantes estão ainda atrás, faltando um e outro detalhe
técnico. O pesquisador tem de gerir toda essa complexidade para ver se todos avançam.
P – É mesmo difícil.
Depois de concerto nos grupos, o pesquisador prossegue:
P – Como estava a dizer, o ponto A descreve o quê?
As – O domínio da função.
P – O ponto C descreve o quê?
As – A imagem da função.
P – E o ponto B descreve o quê?
As – O gráfico da função.
P – Há que ficar claro aqui: há pessoas que pensam que as imagens são estes pontos (descritos pelo ponto B).
Não. Estes pontos são a combinação entre a abscissa e ordenada. … É preciso ver isso neste desenho. Temos o
domínio descrito pelo ponto A, as imagens descritas pelo ponto C, e o gráfico descrito pelo ponto B. O gráfico é
combinação entre os elementos do domínio e os elementos da imagem.
1A - Vemos isso nas coordenadas do ponto B. […] FONTE: O autor (2014).
Análise da discussão da tarefa 1 da sessão.
Nessa sessão, e possivelmente nas outras sessões subsequentes, viveu-se a complexa
tarefa de transformação do artefato em instrumento. Por um lado, está o pesquisador, que já
assume que o computador é um instrumento para a efetivação dos processos de ensino e de
aprendizagem de um conteúdo matemático, neste caso, dos conceitos de função, domínio,
imagem, gráfico de uma função, continuidade e limite de funções. Por outro lado, estão os
estudantes que, a princípio, veem o computador como um artefato para assimilar os conteúdos.
Então, como fazer com que este dispositivo artifatual se transforme num “artefato cognitivo”,
como Rabardel (1995) refere, visando à aquisição de conhecimentos a respeito do conteúdo
visado? Nesse processo de transformação, percebemos avanços e contradições. Consideramos
que as contradições têm como origem, por um lado, as exigências específicas da máquina, como
interagir com ela, como comunicar a ela instruções que permitem observar o resultado
pretendido, dado que nesse processo estamos operando uma interação sujeito-objeto, mediada
pelo instrumento. Por outro lado, há uma outra forma, inerente à máquina, de exibição do
294
resultado, ou seja, um outro tipo de ostensivo que torna o conteúdo visado materializável.
Observemos exemplos nas passagens seguintes:
FIGURA 107 – ANÁLISE VISUAL: DOMÍNIO, IMAGEM E GRÁFICO DE UMA FUNÇÃO
P – Onde está o domínio aqui (na figura)?
1A – No eixo das abscissas (sem especificar).
P – E onde está a imagem?
1A – A imagem está no ponto de intersecção.
P – Neste desenho, o que é que mostra a imagem? Quando eu movimento
o ponto A, vejo a imagem, onde está imagem?
1AG1 – Nos pontos C.
P – O ponto C está a mostrar cada imagem do ponto do domínio. Então o
ponto B descreve o quê?
Silêncio.
P – Quem pode nos dizer o que o ponto B descreve? […]
FONTE: O autor (2014).
A resposta “No eixo das abscissas” parece mostrar o conhecimento de localização do
domínio de f, embora ela pudesse ser um pouco mais específica, dizendo que o domínio é de
tanto até tanto. A continuação do diálogo mostra que o domínio foi explicitado mais tarde na
tarefa 2.
Quando o estudante diz “A imagem está no ponto de interseção”, tem a sua razão pois
no tal ponto existe o valor da imagem, dado que o gráfico, nesse caso, é um conjunto de pares de
pontos onde uma das coordenadas é o valor da imagem. Uma resposta desse tipo é equivalente a
dizer que o domínio está no ponto de intersecção. Portanto, no seu aspecto essencial, a resposta
não satisfaz a pergunta “onde está a imagem?”. Uma boa parte de materiais de ensino existente
apresenta a imagem de uma forma descritiva: Imf = {y IR: …}. Embora a descrição faça
menção a y, parece não ficar claro, para alguns estudantes, tal como o autor da resposta acima,
que tal y deve ser elemento do eixo real vertical não como a ordenada do par ordenado do gráfico.
Consideramos que a ferramenta computacional proporciona visualizar bem o y como elemento da
imagem, tal como a figura 107 mostra. Embora no ambiente usual possamos indicar que, como
elemento da imagem, o y fica no eixo das ordenadas, assumimos que a dinamicidade por meio do
computador deixa a ideia desse fato mais clara. Cada um dos elementos descritos (domínio de f,
gráfico de f, e imagem de f), como já mencionado na análise a priori, é um lugar geométrico
distinto do outro. Consideramos essa possibilidade de descrição como sendo a facilitação da
máquina no processo cognitivo, ou seja, no processo de aquisição de conhecimentos por meio da
percepção (visual), atenção, memória, imaginação, do raciocínio, juízo e do pensamento e
295
linguagem. As seguintes passagens do diálogo revelam o que pensamos ser a sustentação da
nossa percepção:
P – Como estava a dizer, o ponto A descreve o quê?
As – O domínio da função.
P – O ponto C descreve o quê?
As – A imagem da função.
P – E o ponto B descreve o quê?
As – O gráfico da função.
Em termos de dinâmica cognitiva (CHEVALLARD, 1998) e ecologia (CHEVALLARD,
1999) de conhecimentos, consideramos que essas afirmações dos estudantes mostram uma
mudança de sua postura matemática em relação às tarefas de identificação dos 3 elementos a que
nos propusemos a discutir: domínio, imagem e gráfico de uma função. Quer dizer, tais objetos
passam a existir no seu repertório de conhecimentos que antes se mostravam inexistentes ou não
claramente existentes. Assim sendo, podemos dizer que a ferramenta computacional, por meio de
suas possibilidades gráficas e de animação, propiciou a reconstrução dos esquemas matemáticos
dos estudantes que antes se mostravam não conformes às relações institucionais vigentes. Na
visão de Rogalski e Samurcay (1993 apud RABARDEL, 2002), podemos afirmar que o software
funcionou como uma ferramenta cognitiva, provendo informação ao sujeito que dirige a
resolução do problema colocado e propiciando-lhe a gestão do alcance dos recursos cognitivos
em elaboração.
Ressaltamos, como fizemos menção na análise a priori, que com o recurso
computacional, alguns elementos praxeológicos (principalmente no aspecto técnico tecnológico)
e o quadro de funcionamento dos conceitos mudam. Ao invés de produção de respostas por meio
de descrições algébricas fundamentadas nas definições, no quadro da análise, o que geralmente é
problemático por demandar um custo cognitivo elevado, com o software produzimos as mesmas
respostas no quadro da geometria, a partir de observações (visuais) de tendências e padrões.
Em relação à discussão acima, não obstante essa explicitação (visual), consideramos que
ela deveria ter sido articulada com a descrição por meio de ostensivos algébricos para adequar-se
à prática usual em que tarefas do tipo são frequentemente resolvidas.
A seguir, passamos para a análise da tarefa 2
296
Esta tarefa consistiu na análise de um applet (aplicativo) previamente feito pelo
pesquisador por causa da sua relativa complexidade sintática. Pensou-se que assim poder-se-ia
poupar o tempo, indo diretamente para a discussão dos aspectos matemáticos, ao invés de
começar com os aspectos de programação. Como o applet foi feito no Geogebra versão 4.2, não
podia abrir na versão 3.2, existente nos computadores do laboratório. Esse fato foi percebido
nessa aula. Assim, o pesquisador sugeriu analisar usando o data show conectado ao laptop com a
versão compatível.
A tarefa teve como principal objetivo destacar a continuidade e não continuidade da
função e ainda os aspectos de domínio, imagem e gráfico; e recapitulando também os conceitos
de limites, com auxílio de um software computacional.
A programação da função no Geogebra foi a seguinte:
f(a) = if[-10 <= a < 0, 3, if[0 <= a < 2, a^2, if[2 <= a <= 10, 2a – 1]]].
10212
20
0103
2
asea
asea
ase
af )(
Notemos que em virtude de termos precisado utilizar o controle deslizante (slider ou
seletor) para produzir as animações de modo a estudar as tendências, o domínio foi parametrizado
por a, pois o software não reconhece a letra x como parâmetro. Consideramos esta restrição como
sendo não pertinente para os propósitos didáticos, na medida em que pode reforçar as práticas
tradicionais que frequentemente tomam a letra x como a variável eleita para denotar os elementos
do domínio ou usá-la nas expressões algébricas. Esse fato pode distorcer o desenvolvimento da
visão matemática dos estudantes.
Destacamos a seguir algumas passagens da discussão da tarefa em que notamos
igualmente como os estudantes tentam adequar a sua maneira de perceber os aspectos de
conteúdo visado à nova realidade criada com o recurso ao Geogebra. O que para Rabardel (2002,
1995) seria o processo de instrumentação, que é relativo à emergência e evolução dos esquemas
de utilização e da ação mediada pelo instrumento: sua constituição, seu funcionamento, sua
evolução por acomodação, combinação, coordenação, inclusão e assimilação recíproca, a
assimilação de novos artefatos aos esquemas constituídos já existentes.
297
FIGURA 108 – FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES, SESSÃO 3
P – Temos aqui a função f. Como ela está definida?
AAs – Por partes (não bem claro).
P – É falar bem. Como está definida a função f?
As – Por partes.
P – Em cada intervalo, a função está definida de certa forma. Esta é
uma função definida?
As – Por partes.
1A – Temos f de a igual a 3, se a está entre menos 10 e zero; é igual
a a2 se a está entre zero e dois, e é igual a 2a – 1, se a está entre 2 e
dez.
P - Em cada trecho do domínio, a imagem está definida de uma
certa maneira específica. … Então, eu vou chamar alguém para
mexer na seta que aponta para a esquerda, (a seta do teclado),
simplesmente isso.
FONTE: O autor (2014).
Como a tarefa já fosse programada, a discussão centrou-se imediatamente na análise de
seus aspectos matemáticos, isto é, sobre o conhecimento visado. Consideramos essa possibilidade
como uma das potencialidades pedagógicas de um software: ao invés de passar por um momento
de produção do desenho do gráfico, em que saber fazer isso constitui igualmente uma habilidade
importante numa situação de aprendizagem, é possível ir diretamente às questões de conteúdo
visado. Observamos aqui que, para os estudantes que participaram da pesquisa, o
desenvolvimento de uma tarefa matemática utilizando o Geogebra corresponde ao primeiro
momento, ou momento do primeiro encontro, segundo Chevallard (1997), o que exigiu uma
abordagem diferenciada em relação à utilização do software, pois a ênfase foi dada aos momentos
de exploração, elaboração tecnológico-teórica e trabalho com a técnica. Quer dizer, com estes
meios, alocamos mais tempo na discussão do conteúdo matemático. Apesar dessa facilidade
criada pelo artefato, observamos algumas contradições e dificuldades de percepção do conteúdo
matemático, à medida que os estudantes lutam para adaptar-se às novas possibilidades de
aprender e integrá-las à sua vida escolar:
298
FIGURA 109 – ANÁLISE GRÁFICA (ii): DOMÍNIO, IMAGEM E GRÁFICO DE UMA FUNÇÃO
P – Ok. Eu vou colocar algumas perguntas: […]. Talvez, vou fazer
uma outra pergunta ao Gogo: você consegue identificar ali o domínio
da função? … ali no quadro?
Gogo – O domínio são todos estes pontos de A.
P – Quais pontos de A?
Gogo – O domínio é zero. […]
P – Quem pode dizer onde está o domínio da função ali. Gogo tem
problemas de ver o domínio da função aqui.
Alguns estudantes levantam o braço.
P – Ok, vai dizer onde está o domínio da função (dirigindo-se ao
Micas).
Micas – O domínio vai de menos dez até dez.
P – Aponta onde está o domínio exatamente, não só dizer que o
domínio vai de menos dez até dez.
Micas – O domínio é o intervalo fechado de menos dez até dez. (O
Micas aponta esse intervalo no eixo das abscissas).
FONTE: O autor (2014).
O Gogo mostra uma contradição e ambiguidade. Primeiro, parece conhecer o domínio
da função f, quando diz “O domínio são todos estes pontos de A”. Contudo parece não ser
consistente quando não consegue especificar os pontos de A, e perante a necessidade de
especificar, ele muda de opinião dizendo que “o domínio é zero”. Algumas perguntas ao Gogo
ainda poderiam ser feitas: O domínio é zero por quê? Onde está esse domínio zero?
Provavelmente, ele estivesse a referir-se a pontos do plano tais y = 0. Mas, mesmo assim, essa
caracterização precisava de uma explicitação, pois não são todos os pontos da forma y = 0 que
constituem o domínio da função, como muito bem o Micas esclareceu. Esta situação reforça o
que dissemos acima na análise da tarefa 1, explicitação (visual) deve ser articulada com outras
descrições, como, por meio de ostensivos algébricos, gestuais, discursivos para, por um lado,
adequar-se à prática usual em que tarefas desse tipo são frequentemente resolvidas e, por outro
lado, para o pesquisador perceber a qualidade de compreensão do estudante do material discutido.
As contradições e esforços para tentar organizar o conhecimento mediante a análise do
resultado dado pelo software são também observados nas seguintes pessagens:
FIGURA 110 – REVISITANDO A CONTINUIDADE DE UMA FUNÇÃO, SESSÃO 3
P – Aquela função é contínua?
Silêncio.
É recordada a definição de continuidade, tratada no ensino secundário e é escrita no quadro:
“f é contínua no ponto a Domf se e somente se as seguintes condições são satisfeitas: se o limite de f(x) quando
x tende para a existe e é igual a f( a).”
P – Ok. Essa é a condição para que a função f seja contínua em um ponto a. Quer dizer, o limite de f no ponto a
existe.
As – Os limites laterais são iguais.
299
O pesquisador escreve:
axax
limf(x)lim f(x)
P – […] Então esta função que nós temos aqui (a função dada) satisfaz isso?
1A – Aqui estamos a falar em um ponto, não é?
P – A pergunta que está sendo colocada aqui é a seguinte: esta função que nós temos satisfaz isso (a definição
escrita no quadro) em todos os seus pontos? FONTE: O autor (2014).
Algumas questões de reflexão podem ser propostas em relação às passagens anteriores:
por que não é claramente respondida a pergunta feita no sentido de saber se a função dada é
contínua ou não?
Consideramos que isso reflete a contradição entre o que os estudantes sabiam da
continuidade e o que realmente precisa ser reconstruído nesse diálogo. Ao que parece, a pergunta
não estava sendo bem entendida por alguns estudantes, pois quando se recordou a definição de
continuidade, tratada no nível médio, é que eles começaram a ter uma ideia do que se tratava. A
pergunta “Aqui estamos a falar em um ponto, não é?” consubstancia essa nossa interpretação. A
reação dos estudantes dá-nos a entender que eles tiveram pouca experiência ou mesmo nenhuma
experiência de análise da continuidade da função com o auxílio da visualização gráfica. Após
essa combinação entre o conhecimento da definição algébrica da continuidade e a representação
gráfica da função, reforçada com animação dos aspectos em análise (aproximação visível aos
pontos “críticos”) e o realce dos distintos elementos envolvidos (domínio, imagem, gráfico)
proporcionados pelo software, parece-nos que a compreensão dos estudantes foi melhorando
gradualmente, e passaram a dar respostas explícitas e corretas para o conteúdo visado, como
vemos no seguinte diálogo:
FIGURA 111 – CONTINUIDADE DE UMA FUNÇÃO: AS POSSIBILIDADES ALGÉBRICAS E GRÁFICAS
P – Aqui no 2 é onde há problemas. À direita do 2, qual é a expressão da função?
AAs – A expressão é esta, 2a – 1, à esquerda do 2, a expressão é esta aqui, a2. À esquerda do 2, a expressão é
quadrática, o gráfico é uma parábola.
P – Então, como podemos escrever o limite de f de a, quando a tende para 2, à direita?
Michael, escreve: 1)-(2alim2a
= 3.
As – Vale três. […]
P – Qual a expressão que eu tenho que usar aqui, quando quero determinar o limite de f de a, quando a tende para
2, pela esquerda?
AAs – Quadrática.
AAs – O limite é quatro.
P – Controle a imagem (ao Samson, aqui este estudante está analisando no gráfico o aspecto de continuidade em
x = 2. O salto que nele ocorre quando ao passar da direita para esquerda e da esquerda para direita): Então, da
direita para 2, o limite é três; da esquerda para 2, o limite é 4. Então, aqui no a = 2, a função pode ser contínua?
As – Não pode. FONTE: O autor (2014).
300
Aqui, parece-nos haver realmente uma análise articulada entre as representações através
do software e as práticas institucionais vigentes, baseadas no encaminhamento algébrico e
analítico das soluções. Pareceu-nos também que a complexidade da expressão proposta tenha tido
um efeito positivo na reflexão sobre alguns pontos específicos do domínio, que requeriam
atenção especial.
É importante mencionar Douady (1986, 1984) nessa tarefa, pois segundo ela, mudanças
de quadros constituem um meio para obter formulações diferentes de um problema, permitindo
um novo acesso às dificuldades encontradas e possibilitando pôr em marcha as ferramentas e
técnicas que não serviram na primeira formulação. No extrato acima, vemos que a mudança de
quadros operada, do quadro da Geometria propociada pelo software Geogebra para o quadro da
análise matemática com recursos aos ostensivos algébricos, propiciou aos estudantes ultrapassar
as barreiras que tinham com apenas os ostensivos visuais para apreender a noção de limites
laterais em um ponto. Esses fatos reforçam a nossa posição quanto à necessidade de articulação
entre os meios disponíveis no trabalho didático na sala de aula.
Avaliamos que os pontos expostos na análise da sessão sejam essenciais, embora haja
muito mais questões sobre as quais refletir. Assim sendo, passamos para a análise da sessão 4.
8.3 SESSÃO 4: 26.04.2013
A sessão 4 tinha como objetivos:
- praticar e dominar o uso do software Geogebra para plotar gráficos de funções
elementares;
- analisar os conceitos de limite e continuidade de funções reais a valores reais com
recurso ao software Geogebra. A análise desses conceitos é continuação do estudo deste tema,
pois sua introdução ocorreu na sessão 2, tendo continuado na sessão 3. Os diálogos
desenvolvidos nas sessões 2 e 3 desvelaram que os argumentos apresentados por alguns
estudantes não são muito claros para justificar a existência do limite da função em um ponto e da
sua continuidade nesse ponto. Por exemplo, na sessão 2, na sequência da análise do gráfico da
função f(x) =
4x0se1,
0x2sex,
301
alguns estudantes afirmaram que o limite da função quando x tendia para 0 pela direita era zero e
na altura, não percebemos muito bem por que eles estavam dizendo isso. A revisita descrita na
sequência visa perceber melhor esse raciocínio.
Participaram da sessão 9 estudantes.
As tarefas propostas foram as seguintes, ainda com o foco sobre funções definidas por
partes, por considerarmos que elas apresentam aspectos interessantes que motivam falar de limite
ou de continuidade. Consideramos não ser muito motivador estudar essas questões usando
funções que pela sua expressão analítica ou pelo seu gráfico são percebidas como contínuas.
FIGURA 112 – REVISITANDO CONTINUIDADE DE FUNÇÕES DEFINIDAS POR PARTES
Tarefa 1: Estudar a continuidade da função f definida por f(x) =
11
12
ase
asea
,
,
Tarefa 2: Estudar a continuidade da função f definida por f(x) =
132
12
xsex
xsekx
,
,
Determinar o valor de k para o qual a função f é contínua.
Esta tarefa foi tirada da dissertação da Farias (2007), na qual a autora investiga e ressalta as potencialidades
didático-cognitivas das representações matemáticas em uma perspectiva semiótica. Consideramos esta tarefa ser
importante para o que estamos a estudar, pois para responder corretamente a tarefa, exige-se uma especificação
do ponto problemático, articulando a definição expressa algebricamente com a visualização gráfica.
Tarefa 3: Estudar a continuidade da função f definida por f(x) =
25
25012
053
xse
xexsex
xse
FONTE: O autor (2014).
A seguir, apresentamos a análises a priori das tarefas da sessão.
As escolhas consideradas na sessão foram as mesmas consideradas na sessão anterior:
Formulação das tarefas pela lei de formação;
Perguntas intermediárias discriminadas;
Software Geogebra;
Opções de cor e espessura do Geogebra;
Animação das imagens;
Organização dos estudantes em duplas.
Na tarefa 1, as respostas esperadas devem ser as seguintes:
302
1) Plotar gráfico de f pelo comando: f(x) = if[a < 1, 2a, 1]. Usamos a letra a no
domínio, porque precisamos usar o seletor do Geogebra para analisar graficamente o
comportamento do gráfico de f nos seus diferentes pontos.
2) Pela definição algébrica de f e pelo
gráfico, vemos que ela é uma função definida por
partes. De menos infinito até 1, as imagens estão
duplicando; de 1 até mais infinito, as imagens são
constantes e iguais a 1.
FIGURA 113 – GRÁFICO (I) DE UMA
FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES,
SESSÃO 4
FONTE: O autor (2014).
3) A função dada não é contínua, pois tem um ponto de descontinuidade em x = 1.
Vemos isso no gráfico de f, e, analiticamente, obtemos o mesmo resultado: )(lim xfa 1
= 2 e
)(lim xfa 1
= 1. A função tem um salto em x = 1.
Como nas tarefas anteriores, temos aqui a articulação entre as técnicas baseadas no
ostensivo gráfico, onde as respostas são fundamentalmente produzidas a partir da visualização e
do raciocínio sobre os padrões e comportamentos percebidos da figura, e nos ostensivos
algébricos guiados pelos resultados técnicos, tecnológicos e teóricos, essencialmente constituídos
pelas definições. Nas duas formas de fazer, percebemos a necessidade de mudanças de quadros,
que quase sempre ocorrem quando articulamos as práticas usuais e o recurso computacional.
Outras maneiras de responder esta tarefa já foram descritas na análise a priori da tarefa 1, que
aparece no teste diagnóstico, bem como na sessão 2, que incluem o uso de definições rigorosas
no quadro da análise matemática. Mas, como a tarefa surge com o propósito de discutir as
dificuldades específicas de julgamento dos estudantes sobre as noções de continuidade e de
limites de uma função em um ponto, surgidas das discussões anteriores, preferimos não entrar em
detalhes sobre aquelas formas (rebuscadas) de fazer.
Na tarefa 2, as respostas esperadas devem ser as seguintes:
1) Plotamos o gráfico de f introduzindo na entrada de comandos do Geogebra o
seguinte:
f(x) = if[x <= 1, k x^2, 2x – 3].
303
O k deve ser introduzido como controle deslizante do Geogebra (ou seletor, slider). Com
o k inserido desta forma na função f, é possível obter diferentes estados do gráfico de f, na sua
parte parabólica:
FIGURA 114 – ESTADOS DE UMA FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES
FONTE: O autor (2014).
2) A função é definida por partes. De menos infinito até 1, temos uma parábola; de 1 até
mais infinito, temos uma reta.
3) O problema da continuidade de f só pode ocorrer em x = 1, pois à esquerda de 1 f é
quadrática e uma função quadrática é sempre contínua. À direita de 1 f é afim e uma função afim
é sempre contínua. A continuidade ou não de f em x = 1 depende do valor de k, que modifica o
estado da parábola. Por isso, a pergunta: para quais valores de k a função é contínua? O gráfico
dá impressão que para k = -1, f é contínua, mas essa impressão precisa ser certificada com a
definição:
)(lim xfa 1
= )(lim xfa 1
)(lim 2
1kx
a = )(lim 32
1
x
a
)(lim 2
1kx
a = k
k = - 1 )(lim 32
1
x
a = -1
Consideramos nesta tarefa a necessidade de articulação entre o raciocínio baseado nos
ostensivos gráficos, desenvolvido a partir da percepção visual, e o raciocínio baseado na
definição de continuidade de uma função em um ponto. O ostensivo gráfico serve para levantar a
conjectura, uma percepção de que algo existe e deve ser o caso, mas com evidências incompletas.
A técnica baseada na análise matemática, com recurso às noções de limites de uma função em um
ponto, completa as evidências sobre a existência do caso. A articulação entre os dois discursos
tecnológicos desenvolvidos nesta tarefa parece-nos ser imprescindível. O recurso computacional
304
por si só é insuficiente por prover apenas uma percepção visual e a característica da tarefa exige
perceber pormenores muito locais. A prática tradicional também é insuficiente, porque vai direto
ao resultado e não faz perceber os efeitos do parâmetro k para a função dada.
Na tarefa 3, as respostas esperadas devem ser as seguintes:
1) Plotamos o gráfico de f, introduzindo o seguinte na entrada de comandos:
f(x) = If[-5 <= x < 0, 3, if[0 <= x && x != 2 && x<= 5, 2x - 1, if[x == 2, 5]]]
Talvez, uma das desvantagens da visualização
nesta tarefa seja o fato de não serem visíveis
graficamente os pontos P = (2, f( 2)) e Q = (2, 3), onde
o ponto P seria um ponto cheio, em virtude de ser um
ponto do gráfico de f e o ponto Q seria um ponto com
buraco no meio. Esta é uma das restrições inerentes ao
software, a qual devemos levar em conta quando
concebemos, realizamos e analisamos uma sequência
didática numa sala de aula. Para Balacheff (1994), a
utilização de um software computacional em processos
de ensino e de aprendizagem ocorre com algumas
FIGURA 115 – GRÁFICO (II) DE UMA
FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES,
SESSÃO 4
FONTE: O autor (2014).
transformações adaptativas que tornam o saber a ensinar em um saber ensinável.
Tanto algébrica, quanto graficamente, percebe-se que a função está definida por ramos.
2) A função dada não é contínua, porque ela apresenta pontos que não satisfazem a
definição da continuidade. A justificação pode-se basear tanto no ponto x = 0, quanto no ponto x
= 2. No ponto x = 0, temos: )(lim xfa 0
= 3 e )(lim xfa 0
= -1. Logo f não é contínua, porque não
tem limite em x = 0.
Se consideramos o ponto x = 2, temos )(lim xfa 2
= 3 e )(lim xfa 2
= 3. Quer dizer, o
limite de f(x) quando x 2 existe e é igual a 3. Mas f(2) = 5. Logo, a função não é contínua em x
= 2, porque o limite de f no ponto x = 2 não é igual ao valor da função no mesmo ponto. E por
conseguinte, ela não é contínua.
A seguir, apresentamos o recorte de algumas sequências de diálogos da sessão.
FIGURA 116 – DOMÍNIO, IMAGEM E GRÁFICO: FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES, SESSÃO 4
P – Então este é o gráfico da nossa função definida por partes. Infelizmente o software não dá indicações do
305
ponto incluído no gráfico daquele que não é, em x = 1. E aqui uma pergunta interessante. Temos lá o gráfico. O
que acontece quando os valores de x tendem a 1? […] Vocês devem mostrar os valores do ponto B. De novo
clicamos em propriedades e mostramos os valores dos objetos. Valores da abscissa e valores da ordenada. Vamos
para o ponto A, e mostramos os valores. Estão lá os valores da abscissa e da ordenada. Quando movimento o
ponto A, eu vou ativar o slider. O que está a acontecer, movimentando o ponto A, a vir da direita? O que acontece
com a função quando aproximo abscissa a um? Quem pode falar?
1A – A imagem está a aproximar.
P – Está a aproximar para onde?
OA – A imagem aqui à direita é constante, igual a 1.
P – Estamos a ver que a imagem é constante. Indo a 1, vindo
da direita, a imagem mantém-se constante. Mas quando eu
vou a 1, vindo da esquerda, nas proximidades de 1.
1A – A imagem chega a ser 2, um ponto oitenta e quatro.
P – Eu aproximo, mas provavelmente não chego até lá. Mas
aqui a ideia é: quando vou para 1 […] A pergunta é qual é o
limite: qual é o limite desta função no ponto 1?
Micas – Quando vou da direita?
P – Qual é o limite da função quando eu vou para um, digamos no ponto um?
Micas – O limite da função não existe porque os limites laterais não são iguais. Quando eu vou a 1, pela direita, a
função tem um valor, assume o valor um. Da esquerda, aproxima a um outro valor. A função não tem limite em x
= 1.
OAs – Os limites laterais não são iguais. Por isso a função não tem limite ali. (em x = 1). FONTE: O autor (2014).
Análise em relação a esta parte da discussão
Até essa altura, os estudantes mostram mudança de atitude: ao invés de se concentrarem
na escrita, nos procedimentos sintáticos, há mais concentração na exploração dos aspectos
matemáticos visuais. Pouco a pouco eles se libertam da complexidade sintática e engajam-se
mais no conteúdo matemático, articulando os resultados fornecidos pelo software e sua
compreensão desse resultado. Ao que parece, há um resultado positivo rumo à compreensão. Os
discursos técnicos, tecnológicos e teóricos evidenciam um crescimento qualitativo para a
conformidade das relações institucionais vigentes para o conteúdo visado. O ostensivo visual
desempenha, nessa tarefa, o papel de instrumento cognitivo, promovendo a construção do
conhecimento matemático do estudante. Notemos que, de fato, o raciocínio matemático é
desenvolvido em torno desse meio visual. E, por outro lado, percebe-se uma relação implícita
entre a exploração visual e a aplicação mental da noção de aproximação que subjaz ao
instrumental formal das noções de limites:
1A – A imagem está a aproximar.
OA – A imagem aqui à direita é constante, igual a 1”,.
1A – A imagem chega a ser 2, um ponto oitenta e quatro.”
306
Micas – O limite da função não existe, porque os limites laterais não são iguais.
Quando eu vou a 1, pela direita, a função tem um valor, assume o valor um. Da
esquerda, aproxima a um outro valor. A função não tem limite em x = 1.
Uma nota positiva de realce nessas verbalizações dos estudantes é a referência ao termo
“imagem”. O limite é um valor para o qual as imagens tendem. Na verdade, em muitas
formulações sobre limites, mesmo ao nível de relações institucionais, nunca fica explícita essa
percepção. Assim sendo, destacamos a pertinência da mediação didática com o o recurso
computacional na provisão do conteúdo de referência na questão discutida, o que, no nosso
entender, significa uma oportunidade de construção de conhecimentos dos estudantes. O recurso
computacional aqui assume o valor de ferramenta semiótica (CUNY, 1993 apud RABARDEL
2002, 1995), cuja função é fornecer informação acerca do objeto visado. Contudo, observamos
que os argumentos produzidos a partir das percepções visuais deveriam ter sido associados às
formulações algébricas correspondentes como uma forma de ligar com o que é usualmente feito.
A seguir analisamos o recorte de sequências de diálogos sobre a tarefa 2.
FIGURA 117 – ESTADOS DE UMA FUNÇÃO DEFINIDA POR PARTES, SESSÃO 4
P – Neste caso, a condição se coloca de uma só vez: f(x) = if[x<=1,
kx^2, 2x – 3].
[…] O pesquisador explica a alguns estudantes o sentido da função:
“num lado é uma parábola, se x for menor que 1, se x for maior ou
igual a 1, aparece uma reta, como vemos na figura”.
P – Ok. Alguns têm a parábola com a concavidade virada para baixo.
Outros têm a concavidade virada para cima. Por quê? Por quê está
acontecer isso?
AAs – É o valor do k. Para k negativo, temos a concavidade virada para baixo, e para k positivo, temos a
concavidade virada para cima.
P – Sim. Como dissemos, k varia de -5 até 5. Para k negativo, a concavidade vira para baixo. Para k positivo, a
concavidade vira para cima. …
P – Então vamos movimentar o k. É vir aqui na seta ( e ) para movimentar o k. Eu movimento o k.
Os estudantes obtêm diferentes resultados:
P – […] Então, esta função que nós temos aqui é contínua?
AAs – Não é contínua no ponto x = 1.
P – Não é contínua no ponto x = 1. Será isso para todo valor de k? Por exemplo, para k = 0,2 ela é contínua?
As – Não.
1A – Porque estamos a ver que para k = 0,2, os limites laterais
são diferentes.
Na verdade. para k = 0,2 o gráfico aparece como se vê na
figura ao lado:
P – […]
P – Será que posso perceber isso movimentando o k? Talvez
haja um valor de k para o qual a função é contínua. Podemos
ver, por exemplo k = 5, é contínua?
As – Não.
AAs – Para k igual a menos 1. (Notam isso a partir de experimentação).
307
OAs – Para k igual a menos um, a função é contínua.
P – Não sei. Vocês devem justificar que para k = -1 a função é contínua.
As – Sim, para k igual a menos um, a função é contínua.
P – Seja como for, vocês devem justificar que para k = -1, a função é contínua.
Um estudante escreve: “Para k = -1, temos -x2 = 2x – 3
-x2 – 2x + 3 = 0
(x + 3)(x – 1) = 0
x = -3 x = 1
P – Analise bem essa solução. Está a responder a continuidade? Nós estamos a procurar os valores de k para os
quais a função é contínua. Essa é justificação? Quando a função seria contínua?
AAs – Se os limites laterais forem iguais.
P – Se os limites laterais forem iguais. Não é suficiente falar assim.
Eu falo de limites laterais em um ponto.
AAs – Se os limites laterais à esquerda de 1, e à direita de 1 forem
iguais.
P – Talvez usar essa condição também porque a vista pode
enganar.
Alguns estudantes escrevem:
“k = -1 e temos: )3(2xlimkxlim1x
2
1x
k = -1
E clamam que é o mesmo que se vê na figura. FONTE: O autor (2014).
Algumas análises sobre a tarefa 2
A tarefa em si mostrou ser muito importante na análise das condições para as quais uma
função f é contínua. A tarefa motiva a reflexão sobre o que acontece e qual deve ser o foco de
atenção do estudante: continuidade da função e o ponto específico da atenção. Como indicamos
na análise a priori, uma discussão efetiva da tarefa exige uma articulação entre reflexões no
quadro da geometria (percepção visual do comportamento), e reflexões no quadro da análise
matemática com recurso ao ferramental algébrico, sustentadas pelas definições de limites. O
software mostrou a potencialidade que tem para captar atenção dos estudantes para esse foco
matemático da discussão. Os estudantes relacionam - e de boa maneira - a continuidade com as
ideias de limites de uma função num ponto. A definição do limite pontual da função e a sua
representação gráfica, facultada pelo software, são articuladas adequadamente, pois antes mesmo
da verificação algébrica, alguns estudantes conseguem expressar sua conjectura de que para k = -
1, a função é contínua. Visualmente, para este valor de k, os dois pedaços do gráfico se unem
formando um todo. Embora a conexidade não seja o critério para verificar o limite, neste caso,
essa estratégia funcionou bem como conjectura inicial e tendo em conta que o domínio é todo IR.
Por outro lado, embora tenha havido uma resposta em termos do valor de k, julgamos que a
discussão teria sido completa se ainda se observasse que para k = -1, a função dada não só
308
satisfazia a igualdade dos limites laterais, mas também a igualdade das imagens dos dois ramos
de f para esse valor de k.
Não obstante, verificamos que no Geogebra 4.2 o comportamento da função nas
proximidades de x = 1 foi explorado adequadamente, mas, na versão 3.2 e versão 4.4, ocorrem
erros de representação da função que podem induzir a conclusões equivocadas.
Na versão 3.2, notamos os seguintes erros de representação gráfica da função nas
proximidades de x = 1:
132
1
)(
2
xsex
xsekx
xf
FIGURA 118 – ERROS GRÁFICOS (I) DE FUNÇÕES DEFINIDAS POR PARTES, SESSÃO 4
Para k = [-5, -3]
Para k = [3, 5]
FONTE: O autor (2014).
O segmento vertical que aparece ligando o extremo direito da parte parabólica com o
extremo esquerdo da parte retilínea do gráfico, nos dois casos, é conceitualmente errado. Esta
linha vertical não é parte do gráfico da função f dada, pois teoricamente o gráfico de uma função
real de uma variável real não pode ter um pedaço paralelo ao eixo das ordenadas. Por outro lado,
aparecendo uma situação desse tipo, onde o gráfico apresenta uma linha contínua, pode dar
impressão de que a função dada seja contínua para esses valores de k, o que não está certo.
Na versão 4.4, observamos os seguintes problemas de representação:
309
FIGURA 119 – ERROS GRÁFICOS (II) DE FUNÇÕES DEFINIDAS POR PARTES, SESSÃO 4
Para k = 0,5
Para k = 0,6
Para k = 0,7
FONTE: O autor (2014).
Nessas figuras, vemos que para os valores -0,5 e -0,7 de k, parece que a função dada é
contínua, o que não é verdade, pois pelos cálculos analíticos, temos que a continuidade só ocorre
para k = -1.
Estes são alguns dos problemas inerentes ao software, para os quais devemos prestar
atenção na concepção, realização e análise de sequências de ensino e de aprendizagem, quando
tencionamos incorporar o recurso computacional nesses processos. Temos de estar atentos às
possibilidades e ao mesmo tempo nas perversidades que um software pode proporcionar no
ensino e na aprendizagem de um conteúdo matemático. Essa nossa posição é corroborada com
Balacheff (1994), segundo a qual, as interfaces com recursos computacionais exigem a gestão dos
problemas relativos ao comportamento dos objetos além das restrições dcorrentes dos modelos
matemáticos subjacentes.
Não obstante à evolução positiva na percepção dos conceitos de continuidade e limite de
funções que notamos nos parágrafos anteriores por parte dos estudantes envolvidos nas
discussões, houve ainda certos julgamentos inadequados e, por outro lado, com informações
preciosas para o pesquisador sobre o que realmente um estudante pode estar pensando quando
ouve expressões do tipo “qual o limite de f de x, quando x tende para a”. As passagens seguintes,
relativas à tarefa 3, elucidam esses julgamentos.
310
FIGURA 120 – EQUÍVOCOS COM O CONCEITO DE LIMITE DE UMA FUNÇÃO NUM PONTO, SESSÃO 4
Em princípio, os estudantes identificam que são os pontos para x = 0 e x = 2 onde a função é dscontínua.
P – Quero estudar a continuidade aqui (x = 2), o limite de f de x quando vou para 2 da direita. Quando vou para
zero, a vir da direita, qual é o limite?
Semo – É zero.
1A – O limite não é para onde vai esta coisa que anda não (a referir-se ao seletor). O limite é para onde vai a
imagem da função.
P - Quando eu escrevo )(lim xfx 2
, o limite de f de x quando x tende para 2, pela direita, estou a falar da imagem.
A imagem tende para onde? Não esta coisa (seletor) que anda não. Com certeza o limite de x, quando x tende para
2, vai ser 2. Porque vou para 2. Mas a imagem vai para 2x – 1 (pela direita), para onde vai a imagem. Este é o
sentido desta expressão ( )(lim xfx 2
). Este elemento do domínio vai para 2. Então a imagem vai para onde? Este é
o limite da expressão, da função, função significa imagem. Para onde a imagem aproxima, quando x aproxima de
2? Já está dito que x aproxima-se de 2. A imagem aproxima a que valor? Por exemplo, quando eu aproximo a 2
pela direita?
1A – A imagem aproxima-se de 3. […]
Nito – O limite em x = 2 deve ser 5, porque a imagem de 2 é 5. FONTE: O autor (2014).
Nesse extrato da discussão, Semo considera o limite de uma função num ponto ao valor
para o qual a variável independente tende, não o valor para o qual a imagem da função tende. Por
outro lado, Nito considera o limite da função num ponto x = x0 ao valor imagem f(x0). O
raciocínio dele é de que, uma vez que a variável objeto tende para x0, então a imagem deve tender
para a imagem de x0. Nito considera que o limite deve ser uma imagem, o que mostra uma
aprendizagem inadequada desse conceito, pois sua existência num ponto não apela à existência
da imagem nesse ponto. Essas duas formas inadequadas de raciocinar sobre o limite de uma
função em um ponto podem ser atribuídas à história das sujeições institucionais pelas quais esses
estudantes passaram, pois no estudo que fizemos sobre o panorama de pesquisas existentes sobre
o Cálculo e utilização de software na educação, não encontramos reportados esses tipos de
raciocínios. Perante esta realidade, consideramos que o recurso a um software computacional,
311
como o Geogebra, pode constituir uma oportunidade para o estudante identificar o conteúdo de
referência e reconstruir adequadamente seu conhecimento.
Na verdade, esses raciocínios foram detectados mediante um processo de
experimentação e visualização do comportamento das representações, reforçadas pelas
animações, produzidas num ambiente computacional. Sem esses meios, provavelmente não
constataríamos essas condutas.
Quando um estudante diz: “1A – O limite não é para onde vai esta coisa que anda não
(a referir-se ao seletor). O limite é para onde vai a imagem da função.”, ele mostra como a
interação com o instrumento pode influenciar a mudança de conduta dos sujeitos, um fato
realçado por Vygotsky (apud RABARDEL 2002, 1995), segundo o qual os instrumentos
permitem, não somente a regulação e a transformação do meio externo, mas também a regulação,
pelo sujeito, de sua própria conduta e a conduta dos outros.
Após essa sessão, consideramos que já tinham sido criadas as condições para a
introdução do conceito de derivada de funções reais a valores reais como limite da razão
incremental, segundo a tendência dos materiais de ensino analisados e as praxeologias
institucionais existentes em Moçambique para a introdução desse assunto aos estudantes. E a
nossa inovação aqui foi a incorporação do componente computacional, articulando com as tais
práticas usuais. Assim sendo, apresentamos a sessão 5.
8.4 SESSÃO 5: 04.05.2013
O objetivo da sessão 5 foi introduzir o conceito de limite da razão incremental, dada
graficamente como declive da reta secante e articulada com o procedimento algébrico.
Participaram da sessão 8 estudantes.
O texto preparado de tarefas para a discussão foi o que segue, distribuído aos estudantes:
FIGURA 121 – INTRODUÇÃO GRÁFICA: LIMITE DA RAZÃO INCREMENTAL, SESSÃO 5.
Tarefa 5: Considera a função f: IR IR dada por: f(x) = x3 – 6x2 + 9x + 1
a) Com recurso ao Geogebra
i) esboce o gráfico de f
ii) determine um ponto A = (3,16; f( 3,16)) sobre o gráfico de f .
iii) com o seletor, determine a = [3,16009; 4]. Coloque no seletor a = 4 e determine o ponto B = (a, f( a))
sobre o gráfico de f .
312
iv) Determine a reta secante AB: y = 163
163
,
),()(
a
faf(x – 3,16) + f(3,16).
b) Movimentando o ponto B em direção ao ponto A, anote os diferentes valores de 163
163
,
),()(
a
faf em
cada posição de B.
Posição de B
Valor de m
Complete: 163
163
163 ,
),()(lim,
a
faf
a = ….
c) O que esse limite significa para nós? FONTE: O autor (2014).
A tarefa foi dada num applet, previamente construído pelo pesquisador, para evitar
dificuldades decorrentes de sua programação nas diferentes fases que poderiam consumir mais
tempo e prejudicar a discussão dos aspectos matemáticos visados. O mais importante nessa tarefa
era analisar o significado e o sentido dos conceitos de declive da reta secante e de declive da reta
tangente, este último dado como limite da razão incremental.
Análise a priori da tarefa proposta para a sessão
Começamos por considerar as seguintes escolhas para encaminhar a tarefa:
Formulação da tarefa pela lei de formação;
Perguntas intermediárias discriminadas em itens;
Disponibilidade de tabela para o preenchimento com os diferentes valores das
posições do ponto B (móvel) e dos valores do declive nessas posições;
Software Geogebra;
Ferramenta declive do Geogebra;
Opções de cor e espessura do Geogebra;
Animação das imagens;
Organização dos estudantes em duplas.
As respostas esperadas são as seguintes:
Na alínea a), devem ser observadas as instruções dadas na tarefa com o recurso ao
Geogebra para plotar o gráfico da função dada, como se vê abaixo:
313
FIGURA 122 – VISUALIZAÇÃO GRÁFICA (I) DA RAZÃO INCREMENTAL
FONTE: O autor (2014).
A construção dos elementos que vemos na figura procede como indicamos a seguir.
Plotar o gráfico f com recurso f(x) = x^3 – 6x^2 + 9x + 1.
Determinar o ponto fixo A sobre o gráfico de f na entrada de comandos: A = (3.16,
f( 3.16)).
Introduzir o seletor a = [3.16009, 4].
Note que o extremo inferior do intervalo a é 3.16009, para que o ponto móvel B não
coincida com o ponto A, pois caso isso ocorra, a reta AB desaparece.
Determinar o ponto móvel B sobre o gráfico de f na entrada de comandos: B = (a,
f( a)).
Determinar a reta secante AB, com a opção reta do Geogebra, passando pelos
pontos A e B.
Determinar: uma reta perpendicular ao eixo x passando por B, com a entrada no
input x = a; uma reta perpendicular ao eixo y passando por A, com a entrada no input y = f( 3.16);
o ponto C, de intersecção das duas perpendiculares anteriores.
Desenhar o triângulo ABC característico (azul no desenho), tal que tg = AC
BC =
declive da reta secante AB.
Determinar as âncoras dos pontos A, B e C para dar relevância às variações: aΔ =
a – 3,16 e Δ f(a) = f(a) – f(3,16).
314
Determinar o triângulo declive (castanho no desenho). Este triângulo define a taxa
de variação, ou seja, a variação da função f(x) para a variação de uma unidade na variável x. O
valor m da medida do cateto oposto ao ângulo do triângulo declive é igual AC
BC = tg do
triângulo característico. Notemos que na prática usual com a mídia lápis, papel, quadro, giz (ou
lousa e pincel), o triângulo azul (no desenho) é normalmente apresentado na introdução do estudo
da razão incremental e do limite da razão incremental. O aparecimento do triângulo castanho
(triângulo declive) é favorecido pelo recurso computacional.
A equação da reta secante AB, é dada por: y = 163
163
,
),()(
a
faf(x – 3,16) + f(3,16)
Na parte b), deve ser movimentado o ponto B em direção ao ponto A e anotar os
diferentes valores da razão, observando o valor da fração AC
BC, o valor de m e comparando estes
valores, como o que se vê nas figuras que seguem:
FIGURA 123 – VISUALIZAÇÃO GRÁFICA (II) DA RAZÃO INCREMENTAL.
FONTE: O autor (2014).
315
FIGURA 124 – VISUALIZAÇÃO GRÁFICA (III) DA RAZÃO INCREMENTAL.
FONTE: O autor (2014).
A tabela seguinte é preenchida para diferentes valores da posição do ponto B e dos
declives da reta secante AB correspondentes a essas posições, apresentados como valores da
fração AC
BCou como valores de m.
TABELA 2 – TABELA DE VALORES DA RAZÃO INCREMENTAL
Posição de B 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Razão incremental = AC
BC
4,6656
4,1596
3,6737
3,2076
2,7616
2,3356
1,9296
1,5436
1,1776
1,0371
Valor de m 4,6656 4,1596 3,6737 3,2076 2,7616 2,3356 1,9296 1,5436 1,1776 1,0371
FONTE: O autor (2014).
Na parte c) deve ser calculado algebricamente o limite da razão incremental:
163
163
163 ,
),()(lim,
a
faf
a =
163
1163916361631962323
163 ,
),,,(lim,
a
aaa
a =
=
163
16391636163962323
163 ,
,,,lim,
a
aaa
a=
=
163
16391636163 2233
163 ,
.)).(().(lim,
a
aaa
a
= 163
16391631636163163163 22
163 ,
),(),)(,()).(,)(,(lim,
a
aaaaaa
a=
=163
91636163163163 22
163 ,
)]),().(,)[(,(lim,
a
aaaa
a =
316
= 025608422
163,,lim
,
aa
a = 1,0368
Com este valor obtido, concluímos: o que observamos graficamente é o mesmo valor
que obtemos algebricamente. E esse valor pode receber vários nomes, mas com o nome genérico
de derivada da função f no ponto x = 3,16.
Realçamos que o foco de modelar a tarefa colocada com o recurso computacional nos
itens a) e b) é proposital, pois corresponde ao nosso objetivo da segunda parte do nosso estudo:
experimentar, no contexto moçambicano, uma nova modalidade de ensinar Cálculo, articulando
as práticas usuais com o recurso computacional. Na verdade, as instruções dadas de como os
estudantes deveriam modelar a tarefa correspondem a uma mudança das praxeologias implicadas
no processo. Ao invés de discursos oral e gestual, acompanhados, eventualmente com alguns
traçados imprecisos das secantes, que culminam com o estabelecimento da fórmula f’(a) =
ax
afxf
ax
)()(lim , a técnica adotada dá primazia à precisão, à percepção visual das tendências,
controle e validação experimental, culminando na questão c) com a verificação formal. Este é um
dos modos de se trabalhar com a informática na educação, tal como é explicado por Valente
(2005), Balacheff (1994), Leng (2011), entre outros.
Como já anunciado acima, a tarefa foi dada num applet, previamente construído pelo
pesquisador, para evitar constrangimentos originados pela programação da atividade nas suas
diferentes fases que poderiam consumir tempo. O mais importante nessa atividade era a análise
do sentido da tarefa, ou seja, o conhecimento implicado.
Recorte de algumas sequências de diálogos da sessão:
FIGURA 125 – A RAZÃO INCREMENTAL, VISUALIZAÇÃO GRÁFICA E NUMÉRICA
P – Nessa atividade, vamos fazer como fizemos na sessão anterior, vamos analisar a tarefa já construída. […] A
atividade é muito importante para o que vamos começar a falar. Claro, tudo o que estamos a falar é importante,
mas esta é particularmente importante, porque já está a introduzir a noção importante que vamos discutir: a
derivada de funções. Então, o que é que nós estamos a ver nesta atividade? […] Eu já produzi a atividade. Então,
a nossa tarefa é: (Lê o roteiro da tarefa) “Com recurso ao Geogebra esboce o gráfico de f. O gráfico de f é esse
que já está esboçado. Determine um ponto A, aquele ponto que já está lá. O ponto A está no gráfico, com abscissa
3,16 e ordenada f de 3,16. Então, um ponto que se define assim está no gráfico. Então, há uma outra instrução, as
casas decimais da abscissa deveriam ser 3,16009, até 4 casas decimais. Coloque o seletor em a = 4. O seletor deve
estar no 4. Determine o ponto B. O ponto B é (a, f(a)). Determina-se o ponto B sobre o gráfico de f. Determine a
reta secante AB. Estão a ver a reta secante AB?
As – Sim.
P – Ok. A reta que passa por A e passa por B.
1A – Corta o eixo dos x no ponto B?
P – Mas aqui estamos a falar da reta que corta o gráfico em dois pontos: aquela reta é secante. (Mostra o desenho
317
através do data show). E ali está a equação da reta secante. Não sei se vocês estão a ver. (Na janela algébrica,
bem como no texto em word, já distribuído). A equação da reta secante. Estão a ver a equação?
As – Sim.
P – É assim como se determina a equação da reta secante ou não? Reta secante não, mas a equação de uma reta
que passa por dois pontos?
Silêncio.
P – É assim ou não? (apontando) y = 163
163
,
),()(
a
faf(x – 3,16) + f(3,16))?
Silêncio.
1A – Não estamos a entender.
P – Não estão a entender. Eu vou abrir aqui uma janela nova para poder
explicar o que eu quero que seja dito. (Abre uma nova janela no
Geogebra).
P – Então, está assim: (com a janela aberta), eu vou desenhar uma curva
que vocês têm.
O pesquisador desenha o gráfico da função f(x) = x3 – 6x2 + 9x + 1, fig.
5a ao lado.
P – Há uma reta que corta este gráfico, neste ponto (ponto A). A abscissa
deste ponto pode ser x1 e a ordenada do ponto é f(x1). Não é? E aqui
também (no ponto B) cuja abscissa é x2 e ordenada é f(x2). (Juntamente
com os estudantes fala). E a reta que passa pelos pontos (1 e 2) é secante,
(Fig. 5b ao lado).
Fig
. 5a
P – E sua equação como se determina? A equação desta
reta, como se determina?
Nicolau – A razão incremental.
P – A razão incremental. Então como se determina essa
razão incremental?
Silêncio
P – É uma reta em que eu conheço este ponto (ponto A) e
conheço ali (ponto B). Então para determinar a equação
desta reta aqui, o que é que eu faço?
Micas – Determinar o declive.
P – Então determinar só o declive daquela reta secante
(fala a um estudante).
Silêncio
P – Só o declive!
Vinagre escreve no quadro: “a =
12
12
xx
xfxf
)()(”
Fig. 5b
P – Então, nessa nossa equação ali (da reta dada na questão em discussão), existe declive a ou não há?
Silêncio
P – Existe o declive ou não?
Silêncio
P – Nesta expressão que nós temos (escreve a expressão y = 163
163
,
),()(
a
faf(x – 3,16) + f(3,16) na lousa) vocês
estão a ver algum declive?
Silêncio
P – Nesta questão, onde determinamos a reta secante: y = … ra-ra-ra … aquela expressão longa, vocês
identificam algum declive naquela expressão longa, ou não?
Silêncio
P – Nesta expressão longa, existe algum declive, ou não?
Nicolau – Existe.
P – Existe. Onde está?
318
Nicolau diz: “f de a menos f de três ponto dezasseis, sobre a menos três ponto dezasseis”.
P – Este é o declive? (Aponta na expressão).
As – Sim.
P – É o declive desta reta secante. Então este é o declive. Daquela reta secante. Só que foi escrito de outra forma.
Então, para eu escrever a equação da reta secante, como é que vai ser? Já tenho o declive, da secante. Então,
como vou escrever a equação da reta? Outra pessoa? Alguém pode escrever a equação da reta secante neste caso?
1A – Não é só substituir os valores de x e de y?
P – Mas como se escreve? Alguém pode escrever?
Um estudante escreve: “y – y0 = f’(x0)(x – x0)”.
P – Sim. Nesta nossa equação (y = 163
163
,
),()(
a
faf(x – 3,16) + f(3,16)), existe alguma coisa desse tipo? (Do que
o estudante acaba de escrever).
AAs – Sim existe (mas não muito claro).
P – É falar bem, se existe ou não existe.
As – Existe.
Um estudante vai ao quadro e escreve:
A discussão prossegue:
P – De fato, é a mesma expressão. Escrita de outra maneira. Aqui
(y = f’(x0)(x – x0) + y0) escrita na forma algébrica, mais compacta.
Aqui (y = 163
163
,
),()(
a
faf(x – 3,16) + f(3,16)), está escrita na
forma funcional. Ok. Uma vez tendo esta equação da reta secante,
vamos ativar o seletor. Só ativar e movimentar pouco a pouco. Por
exemplo, dou um passo, (dá um passo para esquerda, a partir de a
= 4, com o passo, incremento de 0,001). Então, em vez de a reta
secante passar pelo ponto B, com aquelas coordenadas, agora
passa por um ponto numa outra posição. A reta secante corta o
gráfico numa outra posição. Este valor aqui (A) permanece no
mesmo lugar. Este ponto B está a aproximar-se do ponto A… E
para cada posição do ponto B, anotem os valores do declive.
Podemos acabar isso na próxima discussão. Onde é que nós
verificamos o valor do declive? Então, aqui nós temos um
triângulo retângulo: (aponta o triângulo retângulo com a
hipotenusa AB).
Fig. 5c
P – Então, esta razão aqui (163
163
,
),()(
a
faf) é o quê?
AAs – É o cateto oposto sobre o cateto adjacente.
Declive
x – x0
319
P – Cateto oposto sobre cateto adjacente. Este valor aqui
(razão incremental) significa o estado de inclinação da
reta, o declive. Ou tangente deste ângulo aqui (aponta o
ângulo A, no triângulo dado). À medida que o ponto B se
aproxima deste ponto aqui (A), o ângulo aqui muda (o
ângulo A). Por isso, o declive também muda. Ok. Ativem
este vermelhinho aqui (o m que indica o declive, na
janela algébrica, como se vê na fig. 5d).
P – Estão a fazer ou não?
As – Estamos.
P – Por exemplo, quando eu digo show, aparece um outro
triângulo.
O pesquisador monitora se todos grupos têm o resultado
pretendido ou não.
Fig. 5d
P – Este triângulo que apareceu agora é um triângulo semelhante ao primeiro, porque os dois triângulos têm os
lados diretamente proporcionais. Então, este que apareceu agora mostra o declive da reta pelos pontos A e B. É
um triângulo declive. O Geogebra mostra este valor (a medida do cateto vertical) como declive. Então, como é
que eu produzo o declive? Bem aqui, a vantagem deste triângulo (que apareceu depois) é que aqui (a medida do
cateto horizontal) mede um. E a altura do triângulo é exatamente o declive. É a variação da altura para cada
variação de uma unidade do cateto horizontal.
As – Cateto da base.
P – É esta interpretação que a gente dá. Este valor do declive mostra a variação da altura, ordenada para cada
variação de uma unidade no eixo x. Aqui no ponto inicial, meu desenho, a igual a quanto? O declive é igual a …
quando dou um passo, adquire um outro valor. Experimentem e anotem os vossos valores ai (na folha distribuída
aos estudantes).
Alguns resultados obtidos pelos estudantes:
Grupo 4:
Grupo 2:
A aula terminou com a apresentação dos resultados pelos grupos 4 e 2.
Esta aula foi muito curta (1 hora de duração), o pesquisador tinha de ir atender a uma reunião com a direção do
curso de Matemática da Delegação. FONTE: O autor (2014).
Análise do extrato da sessão:
320
O extrato apresentado nas páginas anteriores destaca 3 etapas, ao que nos parece,
importantes na interação entre o pesquisador, o estudante e o desafio didático (CHEVALLARD,
2009).
Na primeira etapa, o pesquisador apresenta a tarefa que deve ser resolvida e tenta
certificar se os estudantes têm algum relacionamento pessoal com a tarefa colocada. Um dos
estudantes responde que eles não entendem o questionamento.
Consideramos que essa estapa é particularmente interessante, quando se procura
articular o conhecimento retrospectivo do estudante com a nova informação que deve ser o objeto
de aprendizagem. Para Rogalski (1987 apud RABARDEL 2002, p. 119), o conhecimento já em
posse do estudante funciona como precursor dos conhecimentos a serem adquiridos.
Segunda etapa: o pesquisador sem saber por que os estudantes não estavam entendendo,
procura clarificar o conteúdo da tarefa, plotando o mesmo gráfico da função e a reta secante pelos
pontos A e B, que chamou de pontos 1 e 2. Achamos que teria sido interessante se fosse indagado
sobre o que é que não estavam entendendo. Qual era o problema? Embora mais tarde tenha-se
percebido que o problema estava na notação empregada para a equação da secante que se
apresentava ligeiramente diferente do que é habitual, usando as letras x1 e x2 para as abscissas dos
pontos de intersecção da secante com o gráfico da função f.
Prosseguindo, o pesquisador volta ao questionamento sobre como determinar a equação
da reta secante ao gráfico da função. Era importante para o resto da discussão saber determinar a
equação da reta secante, pois seria dessa equação que se deduziria o conceito de derivada.
Quando o pesquisador introduziu a notação x1 e x2 para as abscissas dos pontos de
intersecção da secante com o gráfico de f, os estudantes prontamente reconheceram que para
determinar a equação da reta secante, era preciso calcular seu declive e um estudante foi calcular
a = 12
12
xx
)f(x)f(x
.
Esse comportamento dos estudantes parece-nos sugerir que eles ainda não dominam
completamente a estrutura da equação de uma reta passando por dois pontos, pois afigura-nos que
eles ainda se guiam estritamente pelas letras usadas para a designação dos pontos. Na visão de
Robert (1997, 1998), diríamos que os estudantes ainda não têm o conhecimento disponível da
equação de uma reta passando por dois pontos, uma vez que não foram capazes de reconhecer
321
imediatamente que a equação y = 3.16a
f(3,16)f(a)
(x – 3,16) + f(3,16) era de uma reta secante ao
gráfico de f pelos pontos x1 = 3,16 e x2 = a.
Apesar de ter havido uma sequência de momentos de silêncio sobre o questionamento
feito se as equações y – y0 = f’(x0)(x – x0) e y = 3.16a
f(3,16)f(a)
(x – 3,16) + f(3,16) eram do
mesmo tipo ou não, os estudantes acabaram reconhecendo a similaridade entre elas.
Uma observação oportuna nesta situação é que os hábitos institucionais tradicionais de
destacar as letras x e y na escrita de equações de retas parece criar alguma dificuldade nos
estudantes em perceber as mesmas equações quando se usam letras diferentes. Como já
indicamos anteriormente, mesmo o software Geogebra reforça essa visão, quando não reconhece
as duas letras (x e y) como parâmetros, mas sim como variáveis.
A terceira etapa foi caracterizada pela análise do declive da reta secante ao gráfico da
função f(x) = x3 – 6x
2 + 9x + 1 nas diferentes posições do ponto móvel B, ao longo do gráfico,
para o ponto fixo A, também do gráfico, com o recurso ao software Geogebra. Nesse movimento,
os estudantes viam as posições do ponto B, o estado de inclinação da reta secante em cada
posição de B, o valor do declive designado por m no desenho e o valor da fração 3,16a
f(3,16)f(a)
.
Os valores de m foram registrados numa tabela. Dois grupos mostraram as suas tabelas. A
discussão dessas tabelas e o valor do limite 3,16a
f(3,16)f(a)lim
3,16a
ficaram para o encontro seguinte.
Essa tarefa introduz o ponto essencial da parte II da nossa proposta do trabalho
experimental, o estudo da derivada de funções com recurso ao software Geogebra.
Ao preencher a tabela com diferentes valores do declive da secante, os estudantes
trabalham diretamente sobre a razão incremental, via software, e parece-nos ser mais efetivo esse
modo de trabalhar do que simplesmente evocar a razão incremental num procedimento algébrico
e imaginar um possível movimento do ponto B ao longo do gráfico, aproximando-se do ponto A.
No nosso entender, esse contato com os diferentes valores do declive da secante, observando o
movimento de aproximação do ponto B ao ponto A e as diferentes posições da reta secante ao
gráfico de f aproximando-se do ponto de tangência, pode propiciar o aprimoramento das
capacidades de discriminação, comparação, relacionamento e de interpretação da situação em
322
estudo. E, segundo Léontiev (1975, 1976 apud RABARDEL, 1995), instrumentos devem ser
considerados como portadores da primeira abstração verdadeira, pois na interação direta sujeito-
objeto, as propriedades do objeto são somente reveladas nos limites das sensações do sujeito,
enquanto no processo de interação mediado pelo instrumento, o conhecimento ultrapassa esses
limites. No nosso entender, que também é corroborado por Rabardel (2002, 1995), são as
representações da própria ação e do objeto da atividade que irão evoluir. Para Balacheff (1994),
em Matemática, a visualização é utilizada de forma natural para as representações gráficas de
funções, mas também para exibir os raciocínios na forma de grafos de inferência. Essa
observação é particularmente importante no nosso caso, pois é nossa convicção de que o
desenvolvimento do pensamento, do raciocínio, a construção das ideias, deve ter como pontos de
referências o material empírico perceptivo, veiculando o sentido e o significado do que se quer
conhecer.
A seguir, apresentamos brevemente a sessão 6 que foi curta e que corresponde apenas a
revisões das dúvidas da sessão 5.
8.5 SESSÃO 6: 11.05.2013
Essa sessão foi muito improdutiva do ponto de vista da participação dos estudantes
convidados, mas que deveria ser muito importante do ponto de vista da realização dos objetivos
da pesquisa, pois seria nesta sessão que se institucionalizaria o conceito de derivada de funções
reais a valores reais, dando continuidade à discussão anterior. Estiveram presentes apenas três dos
estudantes convidados. A sessão teve uma duração de cerca de 48 minutos e não se discutiu com
profundidade o conteúdo para tal preparado, foi apenas realizada uma revisão das dificuldades
específicas dos três estudantes presentes. Assim sendo apresentamos, na sequência, a sessão 7.
8.6 SESSÃO 7: 18.05.2013
Participaram da sessão 9 estudantes.
Iniciamos a sessão com a tarefa 5, ainda não concluída, introduzida na sessão 5: estudo
da razão incremental da função f(x) = x3 – 6x
2 + 9x + 1.
323
A estratégia adotada foi de elaborar, em conjunto com os estudantes, alguns passos de
programação da tarefa, ao invés de usar um applet, como foi feito na fase introdutória. A ideia foi
de levar os estudantes a sentirem essa fase de elaboração desses passos e também a habituá-los a
usar o roteiro apresentado.
Outra tarefa discutida na sessão tinha como objetivo debater, com recurso às
visualizações gráficas, que a derivada de uma função afim é constante, uma vez que sua reta
tangente em cada um de seus pontos está sobre a própria reta que representa essa função, o que
contrasta com a situação da função quadrática, cuja derivada não é constante em todos os seus
pontos.
As tarefas propostas foram as seguintes:
FIGURA 126 – DERIVADA DE UMA FUNÇÃO EM UM PONTO, SESSÃO 7
Tarefa 1: Considere a função f: IR IR dada por: f(x) = x3 – 6x2 + 9x + 1
a) Com recurso ao Geogebra.
i) esboce o gráfico de f.
ii) determine um ponto A = (3,16; f( 3,16)) sobre o gráfico de f.
iii) com o seletor, determine a = [3,16009; 4]. Coloque no seletor a = 4 e determine o ponto B = (a, f( a)) sobre o
gráfico de f.
iv) Determine a reta secante AB: y = 163
163
,
),()(
a
faf(x – 3,16) + f(3,16)
b) Movimentando o ponto B em direção ao ponto A, anote os diferentes valores de 163
163
,
),()(
a
faf em cada
posição de B.
Posição de B
Valor de m
Complete: 163
163
163 ,
),()(lim,
a
faf
a = ….
c) Explique o que esse limite significa para nós.
Tarefa 2: Considere as funções f(x) = x2 e g(x) = x.
Com recurso ao Geogebra, plotar os gráficos de f e de g.
Com o seletor, determine a = [-5, 5]. com o passo p = 0,1. Determine os pontos A = (a, 0), B = (a, f( a)) e C = (a,
g(a)). Com recurso à reta tangente, determine as retas tangentes aos gráficos de f e de g, respetivamente em B e C.
Na opção declive do Geogebra, realce (desenhe) os declives das retas tangentes aos gráficos de f e de g,
respetivamente em B e C. Ative o seletor e movimente-o lentamente. (Para boa visibilidade, oculte as respectivas
retas tangentes, ficando apenas com os declives). O que acontece com as taxas de variação de f e de g em cada
ponto x = a?
Anote as suas constatações. FONTE: O autor (2014).
Análise a priori das tarefas propostas:
Aqui apresentamos apenas a análise a priori da tarefa 2, pois a da tarefa 1 já foi
apresentada na sessão 5.
324
Nesta tarefa, consideramos as seguintes escolhas para encaminhar a tarefa, algumas das
quais já indicadas na tarefa anterior:
Formulação da tarefa pela lei de formação da função;
Software Geogebra;
Ferramenta declive do Geogebra;
Opções de cor e espessura do Geogebra;
Animação das imagens;
Perguntas intermediárias;
Organização dos estudantes em grupos de 2 componentes.
As respostas esperadas são as seguintes:
Seguindo o roteiro da tarefa, é preciso plotar os gráficos das funções f(x) = x2 e g(x) = x,
e as respectivas retas tangentes nos pontos B e C. Aqui devemos constatar que a tangente ao
gráfico de g está sobre o gráfico de g, essa constatação é efetivada pela opção cor ou espessura
do Geogebra. De outro modo, não há como constatar visualmente esse fato. Daí uma vantagem
relativa do uso de Geogebra nesta tarefa.
FIGURA 127 – RETAS TANGENTES: GRÁFICOS DE FUNÇÕES QUADRÁTICA E AFIM
FONTE: O autor (2014).
Em seguida, devemos realçar os declives das retas tangentes nos pontos B e C, e
movimentá-los para esquerda ou para direita. Considerando que o declive de uma reta tangente ao
gráfico de f em um ponto é a taxa instantânea de variação da função f no ponto dado, então
podemos constatar, nas figuras a seguir, que para a função linear g, a taxa é constante e para a
função f ela não é constante. E, mais uma vez, realçamos as pontecialidades do software
Geogebra, ao prover os ostensivos visuais e a possibilidade de mudança do quadro de análise
matemática para o quadro da geometria sobre os quais se desenvolve o raciocínio no julgamento
da tarefa.
325
Torna-nos importante esclarecer, como sempre demos conta nas tarefas anteriores, que
com o recurso computacional, alguns elementos praxeológicos da tarefa mudam de alguma
forma, especialmente no que se refere ao discurso técnico-tecnológico usado para produzir as
respostas. Por outro lado, deixamos claro que o foco sobre o software em algumas fases da
discussão é propositado, pois corresponde ao nosso interesse de ver como uma abordagem
diferente das possibilidades tradicionais pode constituir um valor agregado ao ensino e à
aprendizagem de algumas noções de Cálculo.
FIGURA 128 – TAXAS DE VARIAÇÃO DE FUNÇÕES QUADRÁTICA E AFIM
FONTE: O autor (2014).
Na sequência, apresentamos alguns recortes de sequências de diálogos desenvolvidos na
sessão.
Depois de uma sequência de perguntas e respostas entre o pesquisador e os estudantes,
são feitas algumas construções da tarefa 1, sendo uma delas a que se vê a seguir na figura 129.
Nota-se, nesta fase, um grande entusiasmo dos estudantes que acompanham muito
adequadamente os aspectos matemáticos e as estratégias de construção com o computador.
Na perspectiva de Rabardel (2002, 1995), diríamos que eles estão se apropriando do
esquema de utilização do software Geogebra para modelar e estudar algumas questões
matemáticas de interesse. Significa que, segundo o mesmo autor, está havendo uma adaptação
pelos estudantes do aspecto artefatual da ferramenta computacional em ferramenta cognitiva,
propiciando uma mediação epistêmica, na qual o instrumento é um meio que permite a
construção do conhecimento do objeto e, ao mesmo tempo, uma mediação pragmática, na qual o
instrumento é um meio para uma ação transformadora (no aspecto praxeológico, para o caso em
apreço) incluindo o controle e regulação dirigida ao objeto.
326
FIGURA 129 – RAZÃO INCREMENTAL DE UMA FUNÇÃO COM O GEOGEBRA
P – O numerador está f (a) menos f(3.16). Vejam bem o triângulo.
Se vocês já fizeram as âncoras, é muito bem visível isso neste
triângulo. Esta razão incremental que estamos a falar, onde está?
Os estudantes analisam os seus desenhos.
Micas –Segmento DE.
Vinagre – Professor, essa leitura é feita a partir do declive?
P – Estamos a ler neste triângulo aqui. Claro, o declive é esta razão
aqui (163
163
,
),()(
a
faf). Claro, podemos pôr declive é igual a … mas
o que queremos saber são estes valores aqui f( a) – f( 3.16) e a –
3,16), onde estão? Aqui no triângulo. Mas parece que ele estava
para falar alguma coisa (aponta um elemento do 4º grupo).
Michael – Não disse nada.
P – Não disse nada? Ok.
Micas – Não será BE sobre AE?
P – Está a perguntar se não será? (Risos).
Micas – BE sobre AE.
P – BE sobre AE. É esta fração que de fato ele está a dizer. BE sobre AE. Este cateto (BE) sobre este cateto
(AE), neste triângulo retângulo que nós temos aqui.
Micas – Cateto oposto sobre o cateto adjacente, a tangente.
P – Precisamente. É tangente deste ângulo aqui (ângulo A do triângulo dado na figura). Esta razão incremental de
fato está aqui no triângulo. Claro, é o valor desta razão. É possível ver qual essa razão. Podemos ver isso (na
expressão razao incremental = (f(a) – f( 3.16))/(a – 3.16).
As – É quatro ponto sessenta e sete.
P – É isso. A razão entre cateto oposto (oposto ao ângulo A) e este cateto adjacente (ao ângulo A). Estamos a
falar da tangente trigonométrica deste ângulo aqui. Que indica a inclinação desta reta secante. É mais ou menos
isso o que está lá escrito (na fração 163
163
,
),()(
a
faf). É esta razão. Vocês todos têm esta razão incremental?
As – Sim. 4,67.
P – Ok. Já têm a razão incremental que é a razão entre este cateto (cateto oposto ao ângulo A) e este cateto
(adjacente ao ângulo A). Que é o declive também. FONTE: O autor (2014).
Consideramos o extrato acima como tendo explorado, em relação ao conceito de razão
incremental, os pontos de vista geométrico, numérico e algébrico e essa articulação de sentidos e
significados do mesmo objeto é propiciada e capitalizada pelas possibilidades do software
Geogebra. E ainda consideramos que essa articulação é bastante lógica, como observamos nas
passagens a seguir:
327
FIGURA 130 – VERIFICAÇÃO GRÁFICA DO DECLIVE DE UMA RETA POR DOIS PONTOS
P – E o Geogebra, mostra de fato este valor, a razão incremental. Então
para a gente mostrar (no desenho), vamos para a opção, não sei onde é
isso, … (procura a opção declive, slope nas janelas da barra de
ferramentas). Nesta janela aqui (na 8ª janela), há esta opção aqui (opção
slope). Que significa slope, slope significa declive. Então vamos para
lá, para o slope, e clicamos slope, quer dizer, ativamos, e clicamos em
cima daquela reta (a secante).
As – Slope.
P – Slope e clicar em cima da reta. Aparece um outro triângulo, …
aparece outro triângulo, não é?
As – Sim.
1A – Slope, em português? (Alguns estudantes têm versão portuguesa do Geogebra).
P – Declive. Então clicar sobre a reta. Quanto aparece ali?
As – Quatro ponto sessenta e sete.
P – É o declive da reta. É o que nós determinamos como razão incremental.
As – Razão incremental. FONTE: O autor (2014).
A verificação geométrica com o triângulo declive torna mais significativas as
interpretações possíveis do objeto em discussão, que são:
Declive taxa de variação média versus taxa de variação instantânea razão
incremental coeficiente angular da reta tangente.
A relação entre a fração AE
BE, que pode significar taxa de variação média e seu valor
numérico expresso por m, pode proporcionar a oportunidade para compreender o sentido
numérico daquela fração e ainda é posível tirar algumas lições do porquê se chama taxa de
variação. Neste caso, o software Geogebra favorece uma exploração multidimensional do
conceito, ou seja, a dimensão ostensiva de uma praxeologia, conforme Chevallard (2002),
possibilita que um saber matemático e os conhecimentos se materializem, viabilizando tal
exploração.
Assim, no extrato a seguir, o pesquisador tenta direcionar a discussão no sentido de os
estudantes confrontarem o resultado do limite da razão incremental obtido graficamente com o
resultado que se pode obter algebricamente, articulando com os conhecimentos disponíveis
(ROBERT, 1998, 1997) dos estudantes, em consonância às práticas institucionais vigentes em
Moçambique.
FIGURA 131 – CÁLCULO ALGÉBRICO DO LIMITE DA RAZÃO INCREMENTAL
P – Claro, corresponde à razão incremental. Então vamos continuar. Já deram alguns passos até ao fim?
AAs – Sim... já tratamos.
G1 – Declive vai até um ponto zero.
G2 – Zero quatro.
328
P – Até um ponto zero quatro. Ok. Quer dizer, é o fim e não pode continuar mais. …Como é que ficou a reta que
era secante ao gráfico de f passando pelos pontos A e B?
As – Ficou uma reta tangente.
P – Então, vamos determinar agora, vocês dois a dois, aquele limite (163
163
163 ,
),()(lim,
a
faf
a… o limite da razão
incremental (é distribuído A4 para os estudantes calcularem manualmente o limite da razão incremental).
Os estudantes trabalham ao nível dos grupos fazendo cálculo no papel. Depois de um tempo de cerca de 30
minutos, começa a discussão pública no quadro.
O G2 vai apresentar sua solução.
P – Bem, ali vemos qual foi o limite quando estávamos a apresentar graficamente.
G1 – Um vírgula zero quatro.
P – Um vírgula zero quatro então vamos ver se aquele limite vai lá. Vamos determinar aquele limite.
Agora é a história de limites mesmo.
Alguns estudantes mostram dificuldades como interpretar 163
163
163 ,
),()(lim,
a
faf
a, partindo de que função? O
pesquisador fala para todos os estudantes
P – Claro! É preciso vocês pensarem em nossa função que é: f(x) = x3 - 6x2 + 9x + 1.
As – Já está claro.
P – É preciso interpretar bem isso. FONTE: O autor (2014).
Depois de os estudantes trabalharem em duplas, é aberta a discussão para toda a turma.
O grupo 2 (Nicolau e Vinagre) apresenta na lousa sua solução:
FIGURA 132 – O CÁLCULO DO LIMITE DA RAZÃO INCREMENTAL PELO GRUPO 2
FONTE: O autor (2014).
Notemos que foi o grupo que decidiu fazer as aproximações (3,16)3 = 31,554496 para
31,55; 6 (3,16)2 = 59,9136 para 59,9 sem nenhuma justificação plausível. Parece que o grupo
tenta evitar a complexidade de trabalhar com os algarismos decimais nos cálculos seguintes, mas
sem prever outras consequências para o encaminhamento do procedimento.
329
Quando chega ao último passo da resolução, o grupo diz: “Chegado aqui, há
problemas.”
P – Há problemas? Qual é o problema? (No meio de risos). Talvez vocês esclarecerem
o problema.
G2 – O problema de simplificar a expressão. Simplificar, uma vez que a – 3 e aqui a –
3,16 não se simplifica.
Notemos que foi iniciativa do grupo aproximar os valores decimais na expressão do
numerador para números inteiros. O pensamento do grupo de simplificar é reforçado por algumas
práticas institucionais. Vimos na análise do livro 6 de Hoffmann & Bradley (1999) que esse
procedimento é explicitamente apresentado e sugerido como uma das maneiras de observar o
cálculo da derivada:
Como calcular a derivada de f(x)
Passo 1. Forme o quociente da diferença seguinte (inclinação de uma secante).
Δx
f(x)-Δx)f(x
Passo 2: Simplifique o quociente da diferença algebricamente.
Passo 3: Faça xΔ se aproximar de zero no quociente da diferença simplificado.
(HOFFMANN e BRADLEY, 1999, p. 73).
Mas o grupo pensa em simplificar depois de tantas outras aproximações nos cálculos
prévios, sem ideia da sua influência no passo da fatoração para a simplificação.
Nos passos seguintes, o grupo julga que pode continuar com os arredondamentos, como
vemos a seguir:
FIGURA 133 – CÁLCULO DO LIMITE DA RAZÃO INCREMENTAL
P – Entendo onde está o problema. Há uma sugestão, colegas do grupo? Ele tem uma preocupação de simplificar.
Vinagre (membro do grupo 2) – Arredondar, talvez recorrer ao arredondamento, não é?
P – Arredondar para?
Vinagre – Talvez podemos fazer um arredondamento. (Vinagre pensa em arredondar 3,16 no denominador para
3).
P – Ok. Proceder arredondamento.
Nicolau (membro do grupo 2) que está na lousa, arredonda 3,16 para 3, e prossegue com a sua resolução:
FONTE: O autor (2014).
330
Essa resolução mostra um equívoco conceitual sobre a derivada de uma função em um
ponto, pois tratando-se de taxa de variação instantânea, ela tem um caráter local, depende do
comportamento da função nas proximidades do ponto em análise, a não ser que a função seja
afim. Portanto, acreditamos que, se não tivesse havido um resultado obtido de outra forma, neste
caso, por meio de um software matemático, o resultado 0,5 seria aceito como correto, pois foi
obtido segundo procedimentos algébricos corretos. Ou seja, o resultado obtido por meio do
Geogebra serviu como controle da conduta dos estudantes em relação ao problema que estava
sendo resolvido, como vemos nas afirmações que eles fazem nas passagens a seguir.
FIGURA 134 – SIMPLIFICAÇÃO DA RAZÃO INCREMENTAL
P – Comparamos com aquele limite que obtivemos graficamente. O que observamos?
As – Coisas diferentes.
P – São coisas diferentes. Ok. Vamos analisar bem. Se a nossa preocupação foi de simplificar, onde se deveria ter
começado a pensar sobre a simplificação? Talvez aguardarmos os outros, vocês já acabaram? (grupo 3).
Micas – Com a ideia de derivada sai.
P – Vamos ver se há outras ideias. Talvez você (Nicolau, na lousa) vai esclarecer mais um pouco, vamos
aguardar o grupo 3 para acabar. Que ainda está a trabalhar. Depois de acabar, vão-nos dizer que acabamos.
Nicolau – Tenho uma forma de simplificar.
P – Onde deveria ter começado a simplificar? Mas vamos aguardar o grupo 3 para acabar.
FONTE: O autor (2014).
Com as passagens acima, os estudantes notam a contradição da resposta obtida pelo
Nicolau como já mostrado.
A partir do resultado errado 0,5, inicia-se uma discussão para perceber onde está o erro.
Na sequência dessa discussão, um estudante do grupo 1 afirma: “Com a ideia de derivada sai.”
Micas, autor da afirmação apresenta o resultado seguinte:
FIGURA 135 – CÁLCULO DA DERIVADA EM UM PONTO POR SUBSTITUIÇÃO NA FUNÇÃO DERIVADA
FONTE: O autor (2014).
Ao que parece, perante uma dificuldade de encaminhamento da técnica de determinação
do limite da razão incremental, o estudante simplesmente abandona tal procedimento e aplica a
técnica prática para calcular a derivada da função dada, embora aparente uma aplicação do limite
331
sobre a expressão simplificada da razão incremental. Ainda podemos pensar que o estudante
tenha usado a regra de L’hospital, derivar o numerador e o denominador, e continuar.
Por outro lado, as afirmações do Micas dão a entender que ele considera a técnica
prática de derivação recorrendo à notação de apóstrofe de Cauchy ou a outro procedimento
equivalente, como sendo a única operação de derivação, pois afirma várias vezes que “derivando
sai” o resultado.
Ainda na sequência em que se procura o entendimento sobre a necessidade de
simplificação, a discussão prossegue e o pesquisador - percebendo que os estudantes não
conseguiam descobrir o passo que comprometeu a simplificação -, sugere como deveria ter sido o
desenvolvimento:
FIGURA 136 – CORREÇÃO DA SIMPLIFICAÇÃO DA RAZÃO INCREMENTAL
P – O que comprometeu a simplificação?
Vinagre – 3,16.
P – 3, 16. Por que aqui em cima não há 3,16?
Silêncio
P – Está três, em vez 3,16, por quê?
Michael (G3) – Usaram a regra da soma e produto.
P – Usaram regras da soma e do produto e produziram números que não têm 3,16. Por que desapareceu?
Silêncio
P – O que deve ter provocado o desaparecimento de 3,16 aqui em cima?
Micas – Aquele polinômio ali devia ter cortado 1, só.
Aqui o estudante fala do numerador de 163
14428959553119263
163 ,
),,,(lim,
a
aaa
a
P – De fato, esse desenvolvimento ali comprometeu a simplificação. Deveriam ter mantido a estrutura das
potências para depois fatorizar e simplificar.
FONTE: O autor (2014).
Consideramos que essa sugestão do pesquisador aparece no momento oportuno, pois foi
dada depois de muita reflexão por parte dos estudantes sobre como fazer e assim nos parece que
eles aproveitam a dica para o encaminhamento da solução, como acontece na sequência.
Prosseguindo com a resolução, um estudante foi à lousa e fez:
FIGURA 137 – CORREÇÃO DO CÁLCULO DO LIMITE DA RAZÃO INCREMENTAL
Nicolau – Aquele é um caso notável.
P – Casos notáveis.
As – Sim.
Micas (G1) vai ao quadrado para continuar com a resolução.
P- Bem agora podemos avançar muito rapidadmente.
O estudante escreve: 163
16399216362631633
163 ,
,)),((),(lim,
a
aaa
a
P – Como desenvolver este cubo (diferença de cubos). É um caso notável. Quanto é?
São obtidos os seguintes desenvolvimentos:
332
163
163921632621631632163
163 ,
),()),((),,)(,(lim,
a
aaaaa
a
Os outros cálculos são feitos na máquina e obtém-se 1,037.
O estudante do quadro aproxima os valores para 1,037 e depois para 1,04.
P – Se você colocar arredondamento no computador (rounding), colocando 4 casas decimais, arredondamentos
nas opções, 4 casas decimais, quanto dá?
AAs mostram dificuldades para o comando opções.
P – Opções, rounding, colocar 4 casas decimais, quanto encontram?
AAs – 1,0368.
P – Quer dizer aqui (aproximação para casas decimais fica 7 o 3º algarismo decimal. […]
P – Quer dizer, aquele nosso limite da razão incremental é de fato aquela inclinação, o limite das inclinações da
retas secantes. Quer dizer, o limite dos declives das retas secantes. Quer dizer, os declives das secantes vão
tendendo para um certo valor, então chega numa certa altura que a reta fica tangente. E o declive nesse caso fica
o limite dos declives das retas secantes. O limite dos declives, aquele último valor, é o que nós chamamos
derivada da função:
FONTE: O autor (2014).
Depois dessas interações, são sistematizados na lousa os pontos de vista de derivada que
emergiram da discussão, a saber:
FIGURA 138 – VISTA DA DERIVADA, SESSÃO 7.
1. Derivada como limite da razão incremental.
2. Derivada como limite dos declives das retas secantes, ou seja, a derivada como declive da reta tangente ao
gráfico da função num ponto.
3. No contexto do movimento, a derivada é a velocidade, conhecida a equação horária do movimento.
4. Derivada como taxa de variação.
5. Derivada como a expressão dada por f’(x).
P – Só isso? FONTE: O autor (2014).
A discussão da tarefa apresentada acima transcorreu de acordo com a nossa proposta,
quando preparamos a integração do recurso computacional na mediação didática para a
introdução do conceito de derivada de uma função real a valores reais, articulando as diferentes
333
possibilidades que o software possui para analisar o conceito e, ao mesmo tempo, com as práticas
usuais. Para nós, o ambiente organizado se constituíu uma verdadeira ecologia dos
conhecimentos matemáticos dos estudantes, um conjunto de condições e restrições que
possibilitou a emergência de conhecimentos sobre o conceito de derivada de funções reais a
valores reais. Os ostensivos visuais (dados pelo gráfico e movimentos das construções), no
quadro da geometria, e os desenvolvimentos escriturais subsequentes, no quadro da análise foram
articulados adequadamente, pois os estudantes desempenharam um papel proeminente na
discussão, externando seus pontos de vista. Podemos elencar algumas dimensões que sobressaem
no uso do instrumento computacional nesta tarefa, segundo Rabardel (2002, 1995):
- tomada de decisão cognitiva, que consiste na gestão de um ambiente dinâmico:
exploração das propriedades do objeto cognitivo (que se quer conhecer). Nesse caso, dizemos que
o software funcionou como ferramenta cognitiva;
- gestão da própria atividade, que podemos considerar como o âmbito lógico de seu
desenvolvimento, ou seja, a transparência operativa do artefato que é a função de distância que o
instrumento increve entre o sujeito e o real, o objeto de sua ação, da complexidade dos esquemas
operatórios e representativos necessários para sua utilização, das condições de assimilação aos
esquemas do sujeito e da acomodação desses.
A experiência mostrou que o encaminhamento da discussão não é linear, requer
paciência e persistência, principalmente do coordenador da discussão para manter a dinâmica e a
lógica do diálogo.
A seguir, pontuamos ainda alguns momentos da discussão da tarefa 2, em que são
igualmente considerados aspectos essenciais do nosso objetivo da pesquisa. Depois das
construções do gráfico e de algumas de suas retas tangentes, segundo o roteiro constante do
enunciado, segue a discussão dos aspectos matemáticos da tarefa:
FIGURA 139 – RETAS TANGENTES A UMA PARÁBOLA E A UMA FUNÇÃO AFIM P – Onde está a reta tangente ao gráfico de g no ponto C?
G2 e G3 - …
P – Tentem aumentar a espessura da reta tangente para ver melhor. … reta tangente ao
gráfico de g passando por este ponto (C), onde está?
Depois de aumentar a espessura e cor, as tangentes são bem visíveis.
G2 – É a própria reta.
P – Bem, é escrever as vossas conclusões. … Eh, talvez a gente tenha de terminar com
esta atividade, vamos continuar no próximo sábado.
G2 (Exclama), professor!!!
P – Sim?
Fig. 1a
334
G2 – A reta tangente da função g está a confundir-se com a própria reta (no meio de
risos).
P – Essas são as vossas constatações que devem escrever aqui (na folha fornecida).
G1 – Está sobreposta ao gráfico de g.
Fig. 1b
FONTE: O autor (2014).
No extrato acima, vemos como os fatores cor e espessura aprimoraram o julgamento dos
estudantes sobre qual deve ser a reta tangente ao gráfico de uma função afim. Antes de destacar
as tangentes pela cor e espessura, alguns não sabiam o que dizer se havia ou não reta tangente ao
gráfico de g no ponto C. Aqui, concordamos com Hollnagel (1990 apud RABARDEL, 2002,
1995), no sentido de que o computador fornece ao usuário as informações sobre o processo e, ao
mesmo tempo, “amplifica” algumas das funções cognitivas do usuário (discriminação,
interpretação). No contexto sem computador, fica quase impossível visualizar uma tangente ao
gráfico de uma função afim. Esse fato é constatado na tese da Villarreal (1999), em que as
estudantes envolvidas no estudo da derivada, com o recurso ao software derive 3.14, encontraram
muitas dificuldades para perceber que a reta tangente ao gráfico de uma função afim num
determinado ponto é coincidente com o gráfico. No nosso caso, da maneira como os estudantes
reagem à situação, podemos considerar que o ambiente criado proporcionou a construção de seus
conhecimentos no que tange às propriedades da reta tangente ao gráfico da função afim, porque
depois de um tempo de procura, onde a reta tangente se encontrava, acabam descobrindo que ela
estava sobre o gráfico da função, e o estado emocional com que exterioriza seu pensamento
revela que realmente foi uma descoberta.
Ainda para evidenciar a natureza da variação das funções f e g, foi desenvolvido o
seguinte diálogo:
FIGURA 140 – TAXAS DE VARIAÇÃO DAS FUNÇÕES QUADRÁTICA E AFIM
P – O que estão a ver ao declive do gráfico de g no ponto C e ao gráfico de f no
ponto B?
G3 – Este muda (declive de f) e este mantém-se constante (declive de g).
P ao G3 – São observações importantes, podem pôr ali (escrever como
constatações). Não é? Anotem as vossas conclusões.
G1 – O declive da reta tangente ao gráfico de g, para cada centímetro, é
constante. Enquanto o declive de f, para cada centímetro, vai mudar.
O pesquisador discute com G3 como analisar a tarefa. Este grupo mostra-se um
pouco atrasado, para além de ter chegado tarde, pouco dinâmico. […]
FONTE: O autor (2014).
335
A discussão da tarefa prossegue até a conclusão de que os valores m e m1 são ao mesmo
tempo taxas de variação da função correspondente, onde se nota que a taxa de variação de f é
variável e a de g é constante. Com o triângulo declive plotado, e mostrando seu valor nas
diferentes posições de tangência, o instrumento mostrou-se muito efetivo neste caso, pois a
representação sugere a definição desse objeto matemático: variação da ordenada para cada
variação de uma unidade na variável x. Esse conteúdo é captado visualmente e pode ser
formalizado numa regra. A representação é muito precisa e, para Balacheff (1994),
A interface é o lugar que é muitas vezes designado como a reificação de conhecimentos:
visualização e manipulação direta de entidades abstratas, dando vista os
comportamentos compatíveis com as suas propriedades; os fenômenos “oferecidos” à
percepção, dando, assim, uma referência específica aos conceitos em jogo.
(BALACHEFF, 1994, p. 4).
No nosso entender, nesta tarefa, o software desempenhou o papel de ferramenta
cognitiva por excelência.
Assim, concluímos a análise da sessão 7, a qual consideramos como tendo sido muito
proveitosa no que concerne à realização dos objetivos do experimento. A seguir passamos à
discussão da sessão 8.
8.7 SESSÃO 8: 25.05.2013
Participaram da sessão 7 estudantes.
Nessa sessão, discutimos essencialmente funções definidas por partes, com o objetivo de
levar os estudantes a compreenderem as condições de diferenciabilidade e não diferenciabilidade
de funções em um ponto.
As tarefas preparadas para esta sessão foram as seguintes:
FIGURA 141 – DIFERENCIABILIDADE/NÃO DIFERENCIABILIDADE DE UMA FUNÇÃO EM UM PONTO
Tarefa 3: Considere as funções definidas por: f(x) = x2 + 1 e g(x) = |x| + 3
Com recurso ao Geogebra, plotar os gráficos de f e g.
Com o seletor determine a = [-3, 3], com o passo p = 0,1. Determine os pontos A = (a, 0), B = (a, f( a)) e C = (a,
g(a)). Com recurso à reta tangente, determine as retas tangentes aos gráficos de f e de g, respetivamente em B e C.
Na opção declive do Geogebra, realce (desenhe) os declives das retas tangentes aos gráficos de f e de g,
respetivamente em B e C. Ative o seletor e movimente-o lentamente. (Para boa visibilidade, oculte as respectivas
retas tangentes, ficando apenas com os declives).
O que acontece com as taxas de variação de f e de g em cada ponto x = a?
Anote as suas constatações, justificando alguns resultados importantes, se houver.
Analiticamente justifique o resultado anterior para a = 0, para as duas funções.
Relacione a continuidade de f e de g em a = 0 com as suas derivadas laterais nesse ponto.
336
Tarefa 4:
a) Considere a função dada por: f(x) =
51751
5122
,,,
,,
xse
xsexx
i) Determine as derivadas laterais de f no ponto x = 1,5.
ii) Estude a continuidade de f no ponto x = 1,5.
iii) Comparando as respostas da tarefa 3 anterior, com as respostas desta tarefa, como caracterizaria funções
contínuas (não contínuas) fazendo uso do conceito de derivada de uma função em um ponto x de seu domínio?
b) Considere a função f definida por: f(x) =
0
03
xsebax
xsexx
,
,
Determine os valores de a e b de modo que a função seja derivável em toda parte.
Justifique todo seu raciocínio (como faz e por que faz dessa forma). FONTE: O autor (2014).
Análise a priori das tarefas propostas para a sessão:
Para a tarefa, destacamos as seguintes escolhas para encaminhar a tarefa:
Formulação da tarefa pela lei de formação;
Software Geogebra;
Ferramenta declive do Geogebra;
Opções de cor e espessura do Geogebra;
Animação das imagens;
Perguntas intermediárias;
Organização dos estudantes em duplas.
As respostas esperadas:
Na tarefa 1, as respostas esperadas são as seguintes:
Plotar os gráficos de f(x) = x2 + 1 e g(x) = |x| + 3, como vemos na figura 142, as retas
tangentes e os respectivos declives; em seguida mover as retas tangentes e observar suas
diferentes posições e declives (direções):
337
FIGURA 142 – ANÁLISE GRÁFICA (I) DE DECLIVES PARA ESTUDAR A DERIVABILIDADE DE
FUNÇÕES EM UM PONTO
FONTE: O autor (2014).
Com essa análise gráfica, chegamos à conclusão de que no ponto x = 0, f’(0) = 0, pois
temos m1 = 0 e g’(0) não existe, uma vez que tanto a reta tangente como seu declive m
desaparecem nesse ponto. Para a função g, ainda podemos justificar que sua derivada no ponto x
= 0 não existe porque, à direita de 0 ela tem derivada sempre igual a 1 e à esquerda tem derivada
igual a -1. Então no ponto x = 0 ela não tem reta tangente, porque as derivadas laterais nesse são
diferentes.
Analiticamente, podemos responder da seguinte maneira:
Para função f temos: 0x
f(0)f(x)lim
0x
= x
11xlim
2
0x
= x
xlim
2
0x = xlim
0x = 0
0x
f(0)f(x)lim
0x
= x
11xlim
2
0x
= x
xlim
2
0x = xlim
0x = 0
Como as derivadas laterais de f no ponto x = 0 são iguais, então a função f é derivável no
ponto x = 0.
0x
f(0)f(x)lim
0x
=
x
11xlim
2
0x
=
x
xlim
2
0x = xlim
0x= 0
Para a função g, temos:
Primeiro podemos começar por desembaraçar o módulo, fazendo o seguinte:
338
g(x) = |x| + 3 =
0xse3,x
0xse3,x. Esse passo exige o conhecimento disponível
dos estudantes sobre a definição do módulo de um número real. A partir dessa transformação,
obtemos:
0x
g(0)g(x)lim
0x
= x
3-3x-lim
0x
= x
x-lim
0x = 1lim
0x
= -1
0x
g(0)g(x)lim
0x
= x
33xlim
0x
= x
xlim
0x = 1lim
0x = 1
Como as derivadas laterais de g no ponto x = 0 são diferentes, então a função g não é
derivável nele. Essa definição usa, de fato, a condição necessária de existência de limite de uma
função em um ponto: a igualdade de limites laterais nesse ponto. E, sendo a derivada em um
ponto, o limite da função “razão incremental” nesse ponto, então ela obedece às condições de
definição do limite da função num ponto. Quando comparamos os dois recursos tecnológicos,
mais uma vez notamos maior efetividade no modelo geométrico, com o recurso ao software, pois
a não existência é percebida visualmente pela ausência do valor de m (declive) e da respectiva
reta tangente no ponto considerado. No quadro da análise matemática, com o recurso ao
ostensivo escritural algébrico, a não existência é inferida da definição que mencionamos acima.
No processo experimental, essas duas formas de fazer podem ser articuladas no
momento da discussão, em que a forma analítica pode funcionar como parte de validação do
procedimento geométrico, embora este último seja internamente consistente, pois a validação
nele é efetiva experimentalmente.
Para a tarefa 4a), temos as seguintes respostas esperadas:
Plotando o gráfico da função dada, temos o resultado a seguir. Notemos nesse resultado
que, como o ponto não tem dimensões, o ponto (1,5; 1,75) não é destacado geometricamente na
figura 143a, nem a descontinuidade que geralmente é marcada por ponto vazio no gráfico do
ramo –x2 + 2x na abscissa de 1,5 é representada. Como já o mencionamos anteriormente, essas
restrições são peculiares à transparência operativa do artefato, são inerentes às especificidades
operativas do software, das quais não temos o controle, tal como esclarece Balacheff (1994) que,
no contexto da aprendizagem, a interface não está sob controle teórico do usuário.
339
Para visualizar esses aspectos (como vemos na figura 143b abaixo) é preciso plotá-los
num outro procedimento.
FIGURA 143 – GRÁFICO DA FUNÇÃO f(x) =
51751
5122
,,,
,,
xse
xsexx
Fig. 144ª
Fig. 144b
FONTE: O autor (2014).
Então, quanto à diferenciabilidade da função dada, uma primeira resposta é de que ela
não pode ser diferenciável em x = 1,5, porque ela não é contínua nesse ponto, visualmente vemos
isso.
Com o gráfico desenhado, podemos analisar a derivada, com recurso ao movimento da
reta tangente e seu declive sobre o gráfico da função.
FIGURA 144 – ANÁLISE GRÁFICA (II) DE DECLIVES PARA ESTUDAR A DERIVABILIDADE DE
FUNÇÕES EM UM PONTO
FONTE: O autor (2014).
Essa tarefa não pode ser completamente analisada com o auxílio de Geogebra, pois
como vemos, para muitas versões desse software, até a versão 4.2, que também foi usada no
experimento, não é possível dar uma informação correta da derivada de f no ponto x = 1,5, ponto
de descontinuidade da função. Como podemos observar na figura acima, no ponto (1,5; 1,75) é
desenhada uma reta (em cor verde) com o declive m = 0, sem nenhuma lógica para isso, violando
340
o teorema de continuidade de uma função diferenciável em um ponto, segundo o qual uma
função f é diferenciável em um ponto P de seu domínio se ela é contínua nesse ponto. Esses
problemas, como já o dissemos mais de uma vez, são inerentes à estrutura e aos objetivos do
próprio software. Reforçamos nossos argumentos fazendo referência a Balacheff (1994, p. 4), no
que ele diz a respeito desse tipo de problemas:
2.1.2 A representação dos dados
A escolha de representações envolve uma estruturação de dados que determina restrições
de processamento. Consideremos um exemplo em Álgebra: a expressão 5x + 3x(x – 5)
pode ser considerada como uma estrutura de lista ou uma estrutura de árvore associada à
hierarquia de operações. PIXIE (Sleemann 1982) e APLUSIX (Nicaud 1989)
mantiveram, respectivamente, a primeira e a segunda estrutura. Desse fato, no PIXIE, o
utilizador pode exprimir a transformação (errada do ponto de vista da álgebra usual): 5x
+ 3x(x – 5) 8x(x – 5). No entanto, essa transformação não é admissível no APLUSIX,
pois 5x + 3x não é uma sub-árvore da expressão inicial. Esta diferença deve ser
entendida à luz dos diferentes objetivos de cada um desses programas: APLUSIX visa à
aprendizagem de estratégia de resolução de problemas e isenta ao usuário o nível muito
elementar de cálculo. E no entanto, PIXIE dispõe de recursos para as manipulações
elementares para a resolução de equações de primeiro grau (BALACHEFF, 1994, p. 4).
Desse modo, como já o destacamos algures acima, questões de natureza representacional
das situações, especialmente com o recurso aos softwares computacionais, devem ser analisadas
com atenção nas fases de concepção, realização e análise de sequências didáticas, colocando em
evidência as possibilidades e as perversidades desses recursos para os casos específicos.
Assim, procedendo à análise algébrica da tarefa proposta, temos o seguinte:
1,5x
f(1,5)f(x)lim
1,5x
= 1,5x
1.752xx-lim
2
1,5x
= 0
1= -
Portanto o limite lateral esquerdo da razão incremental não é um número. Com esta
informação, não precisamos calcular o limite lateral direito, pois sabemos que, para que uma
função seja diferenciável em um ponto, os seus limites laterais devem ser, em princípio, números
reais, o que não acontece com a função em estudo. Assim, concluímos que f não é diferenciável
em x = 1,5, pois as derivadas laterais de f nesse ponto não existem.
Na parte iii) da tarefa, fazendo uso do conceito derivada de uma função em um ponto x
de seu domínio, podemos dizer que:
- f é contínua em x = x0 se as derivadas laterais de f existem, isto é, são números reais.
- f não é contínua em x = x0 se as derivadas laterais não existem.
341
Essa forma de estudar a continuidade de uma função em um ponto visa munir os
estudantes com mais elementos teóricos para tratar do mesmo conteúdo, alargando desse modo
seu ponto de vista sobre o tema.
Na parte b) da tarefa 4, como já mencionamos na tarefa 3 do teste diagnóstico, não é útil
usar o recurso computacional para executá-la. A tarefa apela ao conhecimento disponível do
estudante de interpretação do sentido de derivabilidade de uma função em um ponto. Então
recorrendo a essa interpretação, deve-se reconhecer que o problema da continuidade da função
dada ocorre quando x = 0, pois à esquerda bem como à direita de zero, temos funções
diferenciáveis, respectivamente cúbica e afim. Assim sendo, para que a função seja derivável em
x = 0, é necessário e suficiente que:
f’(0) = f’(0
+) ou seja:
0x
f(0)f(x)lim
0x
= 0x
f(0)f(x)lim
0x
x
xxlim
3
0x
= x
b-baxlim
0x
1xlim 2
0x
= alim
0x a = -1
Também podemos aplicar diretamente a regra prática de derivação:
(x3 – x)’ = (ax + b)’ 3x
2 – 1 = a. Para x = 0 temos a = -1.
Calculado o valor de a, interpretamos que se f é diferenciável em x = 0, então ela é
contínua nesse ponto, pois uma condição necessária de continuidade de uma função em um ponto
é que os limites laterais sejam iguais. Assim sendo, temos:
b)(axlimx)(xlim0x
3
0x
0 = b
Desse modo, para que a função f seja derivável em todos os pontos de seu domínio,
devemos ter a = -1 e b = 0.
Após a apresentação das respostas esperadas para as tarefas dessa sessão, passamos à
análise de algumas passagens da discussão que consideramos importantes em relação aos nossos
propósitos da pesquisa.
Recortes de algumas sequências de diálogos desenvolvidos na sessão:
Para a primeira tarefa da sessão, extraímos as seguintes intervenções, que ocorrem
depois de os estudantes terem resolvido outras tarefas de plotar gráficos de algumas funções
como parte de familiarização com o software.
342
FIGURA 145 – DIFERENCIABILIDADE/NÃO DIFERENCIABILIDADE DE UMA FUNÇÃO EM UM PONTO
Depois de plotar os gráficos de f e g, as suas retas tangentes (na
posição A1) e os respectivos declives, continua o diálogo:
P – Vamos movimentar o seletor, é esse pedido, não é?
As – Sim.
Um estudante é convidado para o computador ligado ao data show,
para movimentar o seletor, da direita para esquerda, partindo de A1.
O estudante faz diversos movimentos, obtendo diferentes resultados.
P – Há lugares onde podemos parar. Por exemplo em x = 0, parou. O
que é que estão a ver?
Micas (G1) – Declive é igual a zero.
Nicolau (G2) – Para qual função?
[…]
P– Devem comparar as duas funções em x = 0.
Micas – Os dois declives têm o mesmo valor que é zero.
Os outros estudantes protestam da afirmação do Micas.
P - … Aonde?
As – Em zero.
P – Bem, aqui há duas funções: há quem diz que para as duas funções os declives são iguais.
Micas – Que é zero (Muito explicitamente).
P – Mas há quem diz que não existe declive. Não existe declive onde?
G4 – No ponto x = 0, para ambas funções.
FONTE: O autor (2014).
As intervenções dos estudantes mostram que eles estão atentos à resolução da tarefa.
Quando Micas diz que o declive das funções no ponto x = 0 é zero, outros estudantes protestam,
manifestando a não concordância com ele. E Nicolau pede que Micas seja mais específico,
indicando a função para a qual o declive é zero. Por sua vez, Micas diz que isso ocorre para
ambas as funções. Esta explicitação do Micas leva todos os outros intervenientes a questionar
como é que Micas está se relacionando com a tarefa colocada?
Temos nesta situação, segundo Rabardel (2002, 1995), uma realidade em que uma
aplicação informática cria novas condições de trabalho individual e coletivo, pois o artefato não
muda apenas os aspectos operacionais, mas todos os outros aspectos da prática. Com o recurso
computacional e na maneira como foi organizada a discussão, o artefato não é somente meio
individual, ele é portador de partilha e divisão do trabalho. No nosso exemplo, os outros
estudantes estão preocupados com a resposta do Micas: o que ele está fazendo? Como ele está
resolvendo, o que torna a resposta dele diferente da nossa?
Perante esses questionamentos, os grupos são levados a considerar a transparência
operativa do artefato, de acordo com Rabardel (2002, 1995), nas suas dimensões de causalidade
material e causalidade da ação instrumentada, para julgar se é o problema do artefato ou o
esquema de uso que o Micas está utilizando que origina a discrepância dos resultados.
343
Na verdade, quando se verificam os desenhos produzidos por Micas, nota-se que f’(0) =
0 e g’(0) = 0. Quer dizer, a distorção obtida pelo Micas da resolução do problema foi devida à
transparência operativa do artefato na dimensão de causalidade material. Ou seja, é o instrumento
que está funcionando mal. A controvérsia desencadeou a necessidade de verificar algebricamente,
como veremos mais adiante.
Além dos questionamentos levantados pela resposta do Micas, houve outros raciocínios
que mereceram esclarecimentos. Na sequência da discussão da resposta do Micas, o grupo 4
produziu sua resposta afirmando que no ponto x = 0, a derivada não existia para ambas as
funções. Esta resposta de novo provocou uma curiosidade nos demais participantes, inclusive, no
pesquisador: não existe, por quê?
O diálogo seguinte ressalta essa compreensão por parte da maioria dos estudantes de que
para x = 0, as derivadas de f e de g não existem:
P – Mas há quem diz que não existe declive. Não existe declive onde?
G4 – No ponto x = 0, para ambas funções.
P – Para ambas as funções?
G4 – Sim.
P – Ok. É isso?
Micas – Sim.
OAs – É isso mesmo.
Aqui lembramos que, segundo a análise a priori
f’(0) = 0x
2 )(xdx
d = 0 g’(0) = 0x3 |x|
dx
d não existe.
Com exceção do computador do Micas que dava para ambas funções a derivada nula, os
outros estudantes têm o resultado como o apresentado na análise a priori.
Interpretamos que o raciocínio de considerar zero como significando “não existe”
decorre do raciocínio empregado em muitas línguas maternas locais moçambicanas. Zero
significa ausência de alguma coisa. Aliás, parece que é assim para quase todos os sistemas orais
de numeração ou mesmo para os sistemas escritos não posicionais como o romano.
Com esses modos de pensar, a discussão atingiu seu clímax (ponto mais alto de tensão
“dramática”) que tornava necessário ultrapassar, como vemos nas passagens seguintes:
344
FIGURA 146 – EXISTÊNCIA OU NÃO DA DERIVADA DE UMA FUNÇÃO EM UM PONTO
P – O declive para nós é m, não é?
As – Sim.
P – O declive para nós é m, aqui. (Segundo as ilustrações).
1A – Há 1 m.
P – Volta para este lado (orienta o estudante que maneja o data show para voltar para o extremo direito do
intervalo em análise, para o ponto x = 2,6). A inclinação da reta tangente aqui (x = 2,6), é:
As – Um para g e 5,2 para f.
P – Continua. Controlem os declives. No ponto x = 0, os declives?
As – Para função f(x) = x2 + 1 é zero.
P – É zero, está aqui (aponta m = 0, como se vê na figura), não é?
As – Sim.
P – Aqui (na função g(x) = |x| + 3)?
As – Não existe.
P – Na verdade, onde está?
Semo (G4) – Evaporou. (Notemos que os grupos 4 e 3, em geral, têm poucas intervenções nas discussões).
Risos
P – Então isso é o que vocês deveriam ter escrito ali. (Nas suas respostas). Para esta função aqui (f(x) = x2 + 1),
em x = 0, o declive é
As – Zero.
P – Para esta função aqui (g(x) = |x| + 3) em x = 0, o declive é...
As – Não existe.
P – Se não existe declive, como podemos falar da derivada da função naquele ponto?
As – A derivada não existe.
P – Não existe porque a derivada, segundo o que nós dissemos (nas discussões anteriores), é o declive da reta
tangente … aqui (para a função f(x) = x2 + 1) o declive é...
As – Zero. Temos uma tangente horizontal.
FONTE: O autor (2014).
Do extrato apresentado acima, consideramos que o procedimento comparativo entre uma
função que possui derivada e outra que não possui num ponto crítico foi importante, porque por
um lado permitiu evidenciar os raciocínios inadequados dos estudantes, e, por outro,
proporcionou justificar o sentido e significado dos conceitos polêmicos de “zero” e de “não
existência”.
A julgar pelo convencimento de como os estudantes emitiam suas opiniões de que zero
era a mesma coisa que não existência, temos a impressão de que teríamos dificuldades de levá-los
a acreditar que os dois conceitos são diferentes se não tivéssemos recorrido à evidência visual da
reta tangente e do declive m que continuavam existindo para f e que desapareciam para a função
g, respectivamente no ponto x = 0. Perante essa realidade, reconhecemos o valor da mediação
didática com o recurso computacional para efetivar a concretização da existência ou não dos
objetos matemáticos com os quais trabalhamos, embora haja circunstâncias em que o recurso
torna perversa a retroação recebida, o que demanda a reinterpretação dessa resposta.
345
Analiticamente, a tarefa foi discutida da seguinte maneira, como podemos observar no
extrato do grupo 1:
FIGURA 147 – VERIFICAÇÃO ALGÉBRICA DA DERIVADA DE UMA FUNÇÃO EM UM PONTO
FONTE: O autor (2014).
Aqui entendemos que o grupo refere-se à derivada que não existe, não a qualquer limite.
Esse fato foi expresso na lousa.
Assim, consideramos que essa articulação entre a análise gráfica e a análise algébrica
tenha justificado o significado da existência ou não da derivada de uma função em um ponto.
A tarefa 4a) que segue a que acabamos de analisar visava igualmente destacar a situação
da derivada num ponto crítico ou número crítico29
de uma função f. As passagens seguintes dão
algumas indicações de como a tarefa foi discutida.
Depois de plotar o gráfico, juntamente com os estudantes, o pesquisador sugere
determinar a derivada no ponto x = 1,5. Alguns estudantes começam a resolver analiticamente,
outros graficamente.
A resposta gráfica não foi muito convincente para estudar a derivada da função no ponto
x = 1,5. O software continuou a dar informação errada para a derivada nesse ponto: alguns
computadores davam a resposta f’(1.5) = 0 e outros davam f’(1,5) = -1. Não sabemos se este
problema é devido à instalação do software nos computadores, pois era a mesma versão 3.2 do
Geogebra que estava sendo usada. Nesta tarefa, quanto em algumas anteriores que tivemos
ocasião de referir, observamos que, segundo Richard (1980 apud RABARDEL, 2002, 1995), a
lógica de funcionamento diferiu profundamente da lógica de utilização. Embora esses resultados
possam ser atribuídos ao fenômeno de transposição informática, como Balacheff (1994) os refere,
29 Ponto crítico ou número crítico de uma função f é um número c no domínio de f onde f’(c) = 0 ou f’(c) não
existe. (STEWART 2011, p. 256).
346
deve haver algum outro problema lógico-matemático associado ao software que pode estar
causando o mau funcionamento, imprevisto na estrutura do programa.
FIGURA 148 – FEEDBACK COMPUTACIONAL ERRADO DA NÃO EXISTÊNCIA DA DERIVADA DE UMA
FUNÇÃO EM UM PONTO
Resposta gráfica 1
Resposta gráfica 2
FONTE: O autor (2014).
Quando notamos essa disparidade da resposta, que nos parece ser um problema do
software que está tomando informação inútil, procuramos saber da equipe do Geogebra, por meio
do fórum de discussão da internet, por qual motivo a derivada da função
f(x) =
1,5xse,1,75
1,5xse2x,2x no ponto x = 1,5 dava 0 ou -1, ao invés de aparecer
indefinido como ocorre em outras situações deste tipo. Não tivemos uma resposta satisfatória,
pois o que nos foi enviado foi a resposta gráfica 2 apresentada acima. Esse feedback sugere que o
problema inerente ao software é o que ocorre com a resposta 2. O problema 1 deve ter ocorrido
em razão da insuficiência lógico-matemática do software, como já nos referimos a isso em
parágrafos anteriores. Em termos da TAD (CHEVALLARD, 1999), podemos falar do alcance da
técnica, em que se observa que uma técnica pode ter êxito sobre uma parte P( ) das tarefas do
tipo T, no qual ela é relativa e fracassar sobre P\P( ), de maneira que se pode dizer que “não se
sabe, em geral, realizar as tarefas do tipo T”.
Em virtude de termos recebido a resposta inadequada do fórum de discussão, tornamos a
informar que a resposta dada não nos parecia adequada, pois violava o teorema de continuidade
de funções diferenciáveis em um ponto. Essa preocupação não nos foi satisfeita até ao momento,
restando assim uma questão para estudo.
347
Essa falta de reconhecimento do problema por parte dos responsáveis pelo projeto pode
estar associada ao modo de funcionar dos conceptores, que não levam em conta todos os
conhecimentos de que é preciso dispor e mobilizar quando da interpretação dos resultados.
O resultado acima parece ainda ratificar a hipótese de Richard (1980 apud RABARDEL,
2002, 1995), segundo a qual, a lógica de utilização do instrumento não se superpõe à lógica de
funcionamento e que, por conta disso, os procedimentos, no caso da utilização de sistemas
informáticos, não são deduzidos do conhecimento das regras de funcionamento, mas
habitualmente das modificações realizadas nos procedimentos conhecidos para torná-los
compatíveis com as regras de funcionamento e, mais genericamente, com as restrições do
dispositivo. E os projetistas de um software parecem funcionar segundo essa hipótese ao
produzirem uma resposta inadequada no contexto da lógica de utilização.
Com essa situação, temos a percepção de que a base lógica ou matemática do Geogebra
ainda tem muitos aspectos a serem reavaliados.
Depois de se verificar o problema de funcionamento do Geogebra, foi sugerida uma
análise algébrica, o que mostra a importância das diferentes formas de representação e de suas
possibilidades de interpretação para esse tipo de tarefa.
Exemplo de resposta algébrica:
FIGURA 149 – TENTATIVAS ALGÉBRICAS PARA DETERMINAR A DERIVADA DE UMA FUNÇÃO NUM
PONTO DE DESCONTINUIDADE
FONTE: O autor (2014).
Notemos nessa resposta que o grupo 3 tenta usar a técnica de fatoração para simplificar,
mas não consegue e opta por procurar os zeros do numerador da razão incremental, usando a
fórmula resolvente (Bhaskara), e obtendo o binômio discriminante menor que zero, então o grupo
conclui que o numerador não tem zeros e, por consequência, não se pode fatorar; a fração da
348
razão incremental não pode ser simplificada. E assim não há derivada. Este é um argumento
válido por se tratar de uma função polinomial, como mencionamos anteriormente, tornando-se
problemático quando a função envolvida não é polinomial.
Da resposta analítica, concluiu-se que a função não tinha derivada no ponto x = 1.5,
como vemos a partir de alguns diálogos:
FIGURA 150 – FUNÇÕES CONTÍNUAS COM RECURSO À DERIVADA
[…]
Estudante do quadro – Teremos zero aqui em baixo e teremos um valor em cima sobre zero.
1A – Logo, não existe o limite da razão incremental.
P – Não há limite, digamos assim, da razão incremental. Não o limite da função, não. O limite da razão
incremental. Estão a perceber? Nós não estamos a falar do limite desta função aqui (em x = 1,5). Não.
[…]
P – Bem, por enquanto, podemos concluir que o limite da razão incremental não existe. E, como vemos, a função
não é contínua no ponto x = 1,5. E sabemos do teorema que diz que se uma função é derivável num ponto é
porque ela é contínua nesse ponto. Então f não é contínua naquele ponto. Então ela não é derivável no ponto.
Micas – Podemos concluir que a derivada da função no ponto x = 1,5 não existe.
Este último caso é comparado com o caso g(x) = |x| + 3, no ponto x = 0, tentando perceber os casos onde a função
não é derivável.
P – Como caracterizar funções contínuas usando a noção de derivada?
1A – Quando as derivadas laterais forem iguais.
P – E os outros?
1A - Se as derivadas laterais são iguais e não haver um ponto de descontinuidade.
P – Mais? Outros.
Silêncio
P – Nós queremos caracterizar uma função contínua.
O estudante da resposta anterior – Eu estava a responder a questão, “quando é que uma função é contínua”. Não
usei a noção de derivada.
P – Vamos usar a noção de derivada. FONTE: O autor (2014).
A discussão acima põe em evidência alguns resultados teóricos úteis sobre a derivada
entre os quais ressaltamos:
(i) o teorema de continuidade, segundo o qual uma função derivável num ponto é
contínua nesse ponto;
(ii) a propriedade segundo a qual, se as derivadas laterais de uma função f num ponto
a existem, então f é contínua nesse ponto;
(iii) a propriedade segundo a qual, se as derivadas laterais de uma função f num ponto
a existem e são iguais, então f é derivável nesse ponto.
Pela sua natureza, como referido acima, a tarefa 4b) foi resolvida algebricamente.
Temos a seguir o exemplo de respostas:
349
FIGURA 151 – PROPRIEDADES DA DERIVADA PARA RESOLVER PROBLEMA MATEMÁTICO (I)
Grupo 2:
FONTE: O autor (2014).
Nessa resolução, embora os valores encontrados para a e b sejam corretos, o b foi obtido
por meio de uma derivação incorreta, após uma derivação correta para determinar a, o que Robert
(1982) em sua tese considera como um efeito do tipo “o fim justifica os meios”. A igualdade 3x2
– 1 = -1 + b está errada, pois decorre da derivada (x3)’ – x’ = (ax + b)’, e, como sabemos, a
derivada de uma constante é zero.
FIGURA 152 – PROPRIEDADES DA DERIVADA PARA RESOLVER PROBLEMA MATEMÁTICO (II)
Grupo 4:
FONTE: O autor (2014).
Ambas as respostas aplicam corretamente o teorema de continuidade de uma função em
um ponto em que ela é diferenciável, embora com alguns detalhes técnicos errados ou omitidos.
O acréscimo que o grupo 4 faz na sua resposta dizendo “a função deve ser derivável também no
ponto x = 0” não é plausível, pois no enunciado estava claro que se deveriam calcular os valores
de a e b, para os quais a função dada fosse derivável em toda parte, e essa formulação inclui o
valor x = 0.
Com essas observações, concluímos a análise da sessão 8 e passamos para a sessão 9.
350
8.8 SESSÃO 9: 01.06.2013
Participaram da sessão 9 estudantes.
O tema central da sessão foi a função derivada, com objetivos de levar os estudantes a
determinar a função derivada da intuição gráfica, a partir de padrões de pontos descritos pelos
pontos de taxas de variação instantânea de f, à generalização algébrica.
A tarefa usada na sessão, com as suas distintas partes, foi a seguinte:
FIGURA 153 – INTRODUÇÃO DA FUNÇÃO DERIVADA
Tarefa 5: Considere a função f: IR IR dada por: f(x) = x3 – 6x2 + 9x + 1
a) Com recurso ao Geogebra:
i) Esboce o gráfico de f;
ii) Escolha o seletor a = [-5, 5], e determine um ponto A = (a, f(a)) sobre o gráfico de f;
iii) Desenhe uma reta tangente ao gráfico de f no ponto A e realce seu declive m.
iv) Desenhe um ponto B = (a, m), onde m é o coeficiente angular da reta tangente. Ative o rastro do ponto B,
mova o seletor e fique atento ao que acontece:
b) Que curva o ponto B descreve?
c) Podemos determinar a expressão analítica dessa curva? Sim ou não ?
Se sim, determine tal expressão analítica.
Se não, justifique sua resposta.
d) Chamemos a curva descrita pelo ponto B, gráfico da função g. Alguma relação entre a função g e o
ponto B? Qual?
e) Como podemos relacionar m com a função g?
f) Faça o mesmo para as funções que se seguem e escreva sempre os seus comentários:
(i) f(x) = sen(x)
(ii) g(x) = x3 + 3
(iii) h(x) = ex
(iv) j(x) = x FONTE: O autor (2014).
Análise a priori da tarefa
Para a tarefa, destacamos as seguintes escolhas para seu encaminhamento:
Formulação da tarefa pela lei de formação;
Software Geogebra;
Ferramenta declive do Geogebra;
Opções de cor e espessura do Geogebra;
Animação das imagens;
Perguntas intermediárias;
Organização dos estudantes em duplas.
As respostas esperadas da tarefa proposta são as seguintes:
Na parte a), espera-se que o estudante:
351
- plote o gráfico da função f(x) = x3 -6x
2 + 9x + 1, com o recurso ao software Geogebra.
Em seguida, com recurso ao seletor do Geogebra a = [-5, 5];
- determine o ponto A = (a, f( a)) sobre o gráfico de f;
- desenhe a reta tangente ao gráfico de f no ponto A e realce o declive m da reta tangente;
- desenhe um ponto B = (a, m) e ative o rastro de B;
- movimente o ponto B, observe e analise o padrão de pontos descrito por B.
A construção proposta deve parecer-se como a que segue:
FIGURA 154 – DESCRIÇÃO GRÁFICA DA FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO CÚBICA (I) PELA
TAXA DE VARIAÇÃO INSTANTÂNEA
FONTE: O autor (2014).
Nossa estratégia é de potencializar a mediação didática com o recurso computacional
para, a partir do padrão de pontos no plano cartesiano que o ponto B descreve, deduzir a equação
da função derivada. É uma mudança proposital do discurso técnico-tecnológico da análise da
tarefa, tendo presente nossa intenção de experimentar, para ver o que vai resultar, em termos de
subsídios na aprendizagem com sentido e significado do conceito de derivada. Por isso evitamos
a estratégia usual de simplesmente derivar para obter a função derivada.
Na parte b) da tarefa, a resposta deve ser de que a curva descrita pelo ponto B é uma
parábola. Essa resposta é baseada no que sabemos da natureza da imagem geométrica da função
quadrática. Portanto, o ostensivo visual é o elemento de controle e validação da resposta, a partir
do conhecimento disponível do modelo geométrico de uma função quadrática.
Na parte c), a resposta deve ser: sim, podemos conhecer a expressão analítica dessa
curva e podemos determiná-la da seguinte maneira:
Usando a fórmula f(x) = a(x – x1)(x – x2), obtemos:
9 = a(0 – 1)(0 – 3) isto é a = 3. Logo f(x) = 3(x – 1)(x – 3) = 3x2 – 12x + 9.
352
Notemos que os valores de x1, x2 e da ordenada na origem foram lidos a partir do
gráfico. Portanto, para essa técnica funcionar, é necessário ter o quadriculado do plano cartesiano
e a função permitir a leitura de “bons” valores nesse plano. É interessante notar que a tecnologia
utilizada é radicalmente diferente daquela que é usual. Ao invés de usar o quadro da análise
matemática recorrendo ao resultado tecnológico x
xfxxf
x Δ
Δ
0Δ
)()(lim
, trabalhamos no quadro
da álgebra, a partir do conhecimento disponível nesse quadro sobre as propriedades de funções
quadráticas, articulado com as leituras adequadas no quadro geométrico.
Usando o ponto B = (1,1; -0,59): dado que o ponto B é que descreve o gráfico,
então podemos usá-lo para determinar a equação correspondente:
Como antes, a partir de y = a(x – x1)(x – x2), obtemos:
-0,57 = a(1,1 – 1)(1,1 – 3) -0,57 = a(0,1)(-1,9) a = 0,19
0,57= 3
Logo, temos y = 3x2 – 12x + 9
Usando as fórmulas do vértice: xV = 2a
b e yV =
4a
Δ , temos:
xV = 2
xx 21 = 2
31= 2 (ou lido diretamente do gráfico).
yV = -3 (lido diretamente do gráfico)
Então: b = -4a e -3 = 4a
4acb2 -3 =
4a
4ac(-4a)2 = -4a + c; pelo gráfico temos
c = 9, assim obtemos -3 = -4a + 9 ou seja, a = 3, e assim temos a equação y = 3x2 – 12x + 9.
Provavelmente haja outras formas analíticas para determinar a equação da curva dada.
Ou ainda se tivermos percebido que a curva descrita pelas taxas de variação é a derivada
da função dada, podemos então calcular diretamente a equação: f’(x) = 3x2 – 12x + 9.
Na parte d), esperamos a seguinte resposta: sim, existe alguma relação entre a função g e
o ponto B. A relação é de que eles têm o mesmo domínio e a ordenada de B é uma função de g.
Na parte e), esperamos como resposta a indicação de que m é uma função de x pela
aplicação g. Ou seja g(x) = m. Como g(x) = 3x2 – 12x + 9, obtemos
m = 3x2 – 12x + 9.
353
Nesse resultado, interessa notar que, sendo m o declive da reta tangente ao gráfico de f
em um ponto P, então a equação m = 3x2 – 12x + 9 descreve todos os declives das tangentes ao
gráfico f em cada um de seus pontos e, portanto, m é a função derivada de f.
A parte f) está subdividida em outras partes (i) – (iv). Assim sendo:
Na parte (i), temos as seguintes tarefas:
(i) Seguindo os passos i) – iv) da parte a), obtemos o seguinte resultado:
FIGURA 155 – DESCRIÇÃO GRÁFICA DA FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO SENO PELA TAXA
DE VARIAÇÃO INSTANTÂNEA
FONTE: O autor (2014).
Na parte b) de f) (i), sobre a natureza da curva descrita pelo ponto B, a resposta deve ser
de que se trata de uma cossenoide, a partir do conhecimento disponível que temos de gráficos de
funções trigonométricas.
Na parte c) de f) (i), a resposta deve ser afirmativa e indicamos que tal expressão é y =
cos(x) ou na notação funcional: g(x) = cos(x).
Para quem tem conhecimento da derivação da função seno, pode-se obter a mesma
resposta fazendo: f’(x) = (sen(x))’ = cos(x).
A resposta da parte d) de f) (i) é a mesma dada em d).
Na parte e) de f) (i), temos que m é uma função de x pela aplicação g. Ou seja g(x) = m.
Como g(x) = cos(x), obtemos m = cos(x).
Na parte (ii) da tarefa, temos as seguintes respostas esperadas:
(ii) Seguindo os passos i) – iv) da parte a), obtemos o seguinte resultado:
354
FIGURA 156 – DESCRIÇÃO GRÁFICA DA FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO CÚBICA (II) PELA
TAXA DE VARIAÇÃO INSTANTÂNEA
FONTE: O autor (2014).
Na parte b) de f) (ii), sobre a natureza da curva descrita pelo ponto B, a resposta deve ser
que se trata de uma parábola, a partir do conhecimento que temos de gráficos de funções
quadráticas.
Na parte c) de f) (ii), a resposta deve ser afirmativa e indicamos tal expressão: o ponto B
tem coordenadas (0,9; 2,43) e a função dada tem zero duplo x = 0, lendo esse valor a partir do
gráfico, e obtemos: y = a(x – x1)(x – x2)
ou seja, 2,43 = a(0,9 – 0)(0,9 - 0) 2,43 = 0,81a a = 0,81
2,43= 3 y = 3x
2.
As informações sobre as coordenadas do vértice não nos ajudam neste problema, porque
os dois elementos coincidem com o valor zero.
Para quem tem conhecimento da derivação da função potência, pode obter a mesma
resposta fazendo: y’ = (x3)’ = 3x
2.
A resposta da parte d) de f) (ii) é a mesma dada em d).
Na parte e) de f) (ii), temos que m é uma função de x pela aplicação g. Ou seja g(x) = m.
Como g(x) = 3x2, obtemos m = 3x
2.
Na parte (iii) da tarefa, temos as seguintes respostas esperadas:
(iii) Seguindo os passos i) – iv) da parte a), obtemos o seguinte resultado:
FIGURA 157 – DESCRIÇÃO GRÁFICA DA FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO exp PELA TAXA DE
VARIAÇÃO INSTANTÂNEA
FONTE: O autor (2014).
355
Na parte b) de f) (iii), sobre a natureza da curva descrita pelo ponto B, a resposta deve
ser de que se trata de um curva coincidente com o gráfico de h, a partir do que observamos na
figura.
Na parte c) de f) (iii), a resposta deve ser afirmativa e indicamos tal expressão: dado que
o gráfico de g(x) coincide com o gráfico de h(x) = ex, concluímos que as duas funções têm a
mesma expressão analítica, isto é: g(x) = h(x) = ex.
Para quem tem conhecimento da derivação da função exp, pode obter a mesma resposta
fazendo: h’(x) = (ex)’ = e
x.
A resposta da parte d) de f) (iii) é a mesma dada em d).
Na parte e) de f) (iii), temos que m é uma função de x pela aplicação g. Ou seja g(x) = m.
Como g(x) = ex, obtemos m = e
x.
Na parte (iv) da tarefa, são esperadas as seguintes respostas:
(iv) Seguindo os passos i) – iv) da parte a), obtemos o seguinte resultado:
FIGURA 158 – DESCRIÇÃO GRÁFICA DA FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO RAIZ QUADRADA
PELA TAXA DE VARIAÇÃO INSTANTÂNEA
FONTE: O autor (2014).
Na parte b) de f) (iv), sobre a natureza da curva descrita pelo ponto B, a resposta deve
ser de que se trata de uma curva da qual não se conhece o nome, a partir do que observamos na
figura.
Na parte c) de f) (iv), a resposta deve ser afirmativa. Pode-se obter tal expressão por
aproximação com recurso ao método de pequenos quadrados. Mas este método não é simples e
dispensa sua apresentação neste texto.
356
Quem tem conhecimento da derivação da função raiz quadrada pode obter a mesma
resposta fazendo: j’(x) = 'x = x2
1
A resposta da parte d) de f) (iv) é a mesma dada em d).
Na parte e) de f) (iv), temos que m é uma função de x pela aplicação g. Ou seja g(x) = m.
Como g(x) = x2
1, obtemos m =
x2
1.
No meio de muita discussão no nível dos grupos, que se mostrava muito animada e
produtiva, são destacadas algumas passagens.
FIGURA 159 – FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO CÚBICA (I) A PARTIR DA ANÁLISE DA
ANIMAÇÃO GRÁFICA
Michael – O ponto B vai descrever uma parábola que é a derivada
desta função aqui (a função cúbica dada). E vai sair uma equação
quadrática.
[…]
P – Por que neste ponto (extremo) o declive é zero? Você consegue
responder (ao Vinagre)?
Vinagre - …
AAs – Nos outros pontos, o declive não é zero. Nos outros o declive
é zero. O que significa isso?
Micas – Este é um máximo (m = 0, em x = 1). […]
P – Vamos começar a discutir, talvez estarmos atentos o que a pessoa
do quadro vai falar.
Micas (no quadro) – Na atividade 5, está-se a pedir desenhar o
gráfico da função f (x) = x3 – 6x2 + 9x + 1. (O estudante lê as
instruções da tarefa). O ponto B mostra a variação do declive neste
gráfico (sem precisar muito bem qual). Mas nós sabemos que o
declive representa a derivada da função no ponto dado. E pergunta-se
qual a curva descrita pelo ponto B. Bem, esta curva é uma parábola.
E pergunta-se se podemos determinar a expressão analítica desta curva. Eu disse sim. Porque esta curva representa
o declive desta função f, que é a derivada de f. Então para determinar a derivada desta função temos: f(x) = x3 – 6x2
+ 9x + 1. Então nós queremos o declive, a expressão desta parábola, nós sabemos que é o declive da reta tangente,
ou a velocidade se estamos a falar do movimento, então temos f derivada: a derivada disto aqui (x3) é 3x2, de (6x2) é
dois vezes seis, dá doze x, -12x, mais nove (derivada de 9x). A derivada de 1 é zero. Esta é a expressão da nossa
função: f’(x) =3x2 – 12x + 9. (O estudante continua lendo d) e diz) – Esta parábola aqui é descrita pelo ponto B.
Quando animamos o slider, o ponto B vai descrever a parábola. Então o gráfico de g é descrito pelo ponto B. É o
que está a acontecer. O estudante lê e) e continua – g representa a função m. Que é o declive da reta tangente desta
função aqui. Esta é a relação que existe. Esta função g aqui está a representar o declive m. É o que está a acontecer.
O estudante escreve no quadro a equação obtida:
Micas - Estas foram as minhas ideias em relação a este ponto f); é mais fácil começar a relacionar entre os gráficos
e o que o ponto B vai descrever, que se obtém a partir de m.
FONTE: O autor (2014).
357
O estudante resume muito bem as constatações feitas pelos diferentes grupos, e quase
correspondendo às expectativas apresentadas na análise a priori. Consideramos ter havido uma
articulação efetiva entre as representações gráfico-algébricas, potencializadas pelas animações e o
conteúdo visado. O ostensivo gráfico, descrito pelo ponto B, é efetivamente o representante do
conhecimento matemático requerido. Interessa reconhecer aqui a habilidade com que os
estudantes lidam com a ferramenta computacional, que funciona, neste caso, de acordo com a
nossa percepção, como ferramenta cognitiva, pois os estudantes falam apropriadamente do
conteúdo matemático visado a partir dela. Destacamos na tarefa o valor do processo de
instrumentação, reportando-nos a Rabardel (2002, 1995), no qual percebemos a emergência e a
evolução dos esquemas de utilização e da ação mediada pelo instrumento: sua constituição, seu
funcionamento, sua evolução por acomodação, combinação, coordenação, inclusão e assimilação
recíproca, a assimilação de novos artefatos aos esquemas constituídos já existentes. Por outras
palavras a conduta matemática dos estudantes é modelada pelos instrumentos. Interessa-nos
aprofundar um pouco a análise da pertinência desse modelo, que podemos chamar de modelo
geométrico algébrico, pelo fato de articular os ostensivos visuais no quadro da geometria, e os
ostensivos escriturais no quadro da álgebra.
- o teorema de Fermat é estabelecido visualmente e isso é percebido pelos estudantes,
como a sequência acima de diálogos mostra;
- o teorema da monotonia, que articula o comportamento da função dada e o sinal da sua
derivada, é visualmente percebido: onde a função f cresce, a sua derivada é positiva; onde f
decresce, a sua derivada é negativa; no extremo de f, a sua derivada é nula; o ponto de inflexão de
f é um extremo da derivada.
- a propriedade segundo a qual o domínio da função derivada da função f é um
subconjunto do domínio da função f é visualmente percebida na figura.
- o modelo geométrico algébrico apresentado acima pode ser precursor das noções de
campos de direções e do método de Euler, que são algumas das técnicas usadas para determinar
soluções numéricas e para esboçar o gráfico da solução de algumas equações diferenciais com o
problema de valor inicial. A prática tem mostrado que os estudantes têm tido bastantes
dificuldades para empregar essas duas técnicas na resolução de equações diferenciais desse tipo.
358
- o modelo geométrico algébrico acima é um precursor da noção de linearização local,
uma propriedade importante de uma função diferenciável, pois visualmente é percebido que, nas
proximidades do ponto de tangência, a altura do triângulo declive é muito pequena, e, por
conseguinte, o gráfico da função f no ponto considerado apresenta o aspecto retilíneo parecido
com o da reta tangente nesse ponto.
Continuando com a análise das sequências de diálogos da figura cima, observamos que
Micas compreende a técnica prática de derivação e usa esse conhecimento para determinar a
expressão analítica da função derivada. Alguns outros estudantes não se valeram dessa técnica,
mas chegaram ao mesmo resultado, como vemos na resolução do Vinagre:
FIGURA 160 – FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO CÚBICA (II) A PARTIR DA ANÁLISE DA
ANIMAÇÃO GRÁFICA
Vinagre (G2) – No nosso caso, nós não derivamos. Tiramos os dados (da figura), utilizamos a fórmula (do
trinômio quadrático), mas saiu a mesma expressão.
P – Fala um pouco alto, quero ouvir bem o que você está a dizer. Talvez você possa ir ao quadro para mostrar as
vossas ideias.
O estudante vai ao quadro e escreve: “y = a(x –x1)(x – x2)” e diz: “x1 = 1; e x2 = 3, lido diretamente do gráfico.
Então vamos ter y = a(x – x1)(x –x2)”.
x1 temos 1, vezes x menos x2 que é 3. A resolução do estudante:
Michael – O colega aí colocou zero vírgula nove (referindo ao par p(0, 9)).
Vinagre – São coordenadas.
Michael – Ali colocou nove igual a zero menos um, zero menos três.
Vinagre – O zero representa o valor de x aqui (abscissa na origem), o nove representa o valor da ordenada.
Michael – Pode mandar subir um pouco o gráfico para a gente ver bem.
Vinagre – Subir um pouco?
Michael – Subir o gráfico para ver as coordenadas.
Vinagre – Sim. Aquele ponto é o ponto da ordenada na origem.
P – Ok.
Vinagre – Vamos ter aqui (aponta os zeros, x = 1, e x = 3): vamos ter aqui 3 (valor de 3), x menos 1, vezes x
menos três. (Obtendo y = 3(x – 1)(x -3) = 3(x2 – 4x + 3).
E finaliza obtendo: y = 3x2 – 12x + 9.
OAs – De fato é a mesma coisa.
FONTE: O autor (2014).
Avaliamos que a exploração foi efetiva e a articulação entre as várias formas de
representação possibilitou uma abordagem multidimensional, com o foco no significado do
conceito da função derivada que era objetivo da sessão.
A tarefa de análise da derivada da função f(x) = sen(x) foi igualmente bem interpretada a
partir da solução gráfica para a solução algébrica, tal como o extrato seguinte mostra:
359
FIGURA 161 – FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO SENO A PARTIR DA ANIMAÇÃO GRÁFICA
[…] P – Então vamos começar a discutir juntos. O
grupo do Gogo (G3)?
Os estudantes têm o gráfico como o que se vê na
figura ao lado.
Gogo – O ponto B descreve o gráfico da função
cosseno, que é a derivada da função seno.
(observando do que estava acontecendo).
P - Ok. Primeiro viram que a derivada da função
seno deve ser cosseno. Depois partiram para a
demonstração.
Michael – Sim.
P – É preciso que este m seja a ordenada do ponto B. Quer dizer, o ponto B descreve os declives desta função aqui
(seno). Que é a derivada. De fato é esta aqui (que acaba sendo traçado pelo ponto B) é uma função derivada desta
aqui (seno). Podemos até escrever que a derivada de seno de x é igual a cosseno de x.
O estudante mostra usando o limite:
h
xfhxf
h
)()(lim
0 =
h
xsenhxsen
h
)()(lim
0=
h
xsenxsenhsenx
h
)()cos(coshlim
0=
= h
xsenxsenhsenx
h
)()cos(lim
1
0=
h
xsenxsenhsenx
h
)()cos(lim
0=
h
xsenh
h
)cos(lim
0= cosx.
Michael – Esta é a demonstração.
OAs – Aquela ali é a demonstração da derivada.
P – Então está demonstrado que a derivada de seno de x é cosseno de x.
Michael – Já foi provado que a derivada do seno de x é igual ao cosseno de x.
P – Já foi provado.
Michael – Sim.
P – Ok. Mas a ideia surgiu da observação do que estava acontecendo. Ok. Primeiro viram que a derivada da
função seno deve ser cosseno. Depois partiram para a demonstração.
FONTE: O autor (2014).
Do diálogo acima percebemos que a representação gráfica foi bem explorada e alguns
estudantes pareciam não se conformar com a resposta obtida graficamente e exigiram uma
demonstração algébrica. Para eles, esse procedimento é que satisfaria o critério de aceitação da
validade matemática.
A seguir apresentamos algumas indicações de como a tarefa de estudar a derivada da
função g(x) = x3 + 3 foi discutida pelos estudantes.
360
FIGURA 162 – FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO CÚBICA (II) A PARTIR DA ANIMAÇÃO
GRÁFICA
P – Qual o grupo que vai agora?
O grupo 2 se voluntaria. Apresenta a função g(x) = x3 + 3 e seu
gráfico.
Vinagre (G2) – Aqui vamos ter uma parábola. Que é a derivada da
função cúbica. Então, a sua expressão analítica será a derivada de g
de x. Temos g de x igual a: (Escreve: g‘(x) = 3x2.
Michael – Se usarmos as coordenadas, vamos ter aquela expressão
analítica? Nem as coordenadas nós temos.
Vinagre – Sim, x1 = 0 e x2 = 0.
Michael – Se é verdade que a partir das coordenadas podemos
chegar àquela expressão analítica?
Vinagre escreve: y = a(x – x1)(x – x2)
y = a(x – 0)(x – 0)
y = ax2
Michael – Aquela expressão não é agradável.
P – Não é agradável por causa da obtenção do a? […]
P – De fato estas observações são corretas: x1 e x2 estão lá; as coordenadas do vértice estão lá. Isso não nos vai
permitir calcular o a. Talvez devamos encontrar um outro ponto que pode ser usado. Qual outro par que pode ser
usado?
Vinagre – As coordenadas, pode ser difícil de descobrir.
Nicolau (colega do grupo de Vinagre) – Pode usar x = 1 e y = 3, usar as coordenadas do ponto B. Temos duas
fórmulas, da 10ª classe. Tem aquela de x1 e x2. Mas tem aquela que diz f(x) = x2 – Sx + P. Se aquela fórmula não
satisfaz (a de x1 e x2), pelos vistos, aqui podemos ter outro ponto. Temos o ponto p, que tem coordenadas 1 e 3.
Como eu disse, usar esta fórmula de coordenadas vai ter que pensar muitas coisas. Mas pode obter o resultado.
Temos y = 3 e x = 1, o a = 3 e P = 0. Então já temos o a. Podemos voltar para f(x) = 3x2. Que é a mesma equação.
P – Não sei se estamos satisfeitos.
FONTE: O autor (2014).
Ao que nos parece, a discussão está sendo bastante clara, lógica e objetiva no sentido de
interpretar o resultado obtido graficamente por meio de uma expressão algébrica. Michael tem
sua razão quando diz que a expressão y = ax2 não é agradável, no sentido de que não ajuda muito
para determinar o valor de a, dado que tanto as coordenadas na origem quanto os zeros da função
coincidem com um único valor zero. Por outro lado, Nicolau esclarece muito bem quando sugere
observar outras coordenadas do ponto B. Aqui Nicolau está chamando atenção aos demais no
sentido de ver a situação colocada na sua plenitude, não só concentrar-se nos interceptos. Na
verdade, há vários pontos que podem ser usados na tarefa para produzir a expressão analítica. A
ideia mais importante na situação criada é o ponto B, cujas coordenadas são (x, m), que são ao
mesmo tempo coordenadas da função derivada.
A exploração da derivada da função h(x) = ex foi igualmente explícita e objetiva, no
sentido de levar os estudantes a perceberem que a derivada dela é igual à própria função, como
vemos nas passagens seguintes:
361
FIGURA 163 –FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO exp A PARTIR DA ANIMAÇÃO GRÁFICA
As – O ponto B está no ponto A.
P – Estão juntos.
[…]
P – Qual é o grupo que pode comentar? Samson
(G3), qual é comentário que você tem em relação a
esta tarefa?
Silêncio …
P – Tem algum comentário?
Samson – Sim temos. O ponto B descreve a mesma
função. A expressão analítica é a mesma da função
exponencial. A derivada da função é a própria
função.
P – Claro que esta é uma das formas de a gente ver
isso. Estamos a ver que a derivada coincide com a
própria função. … É interessante o vosso
comentário. Não sei se há um grupo que quer
comentar mais.
Samson escreve h’(x) = ex = h(x).
Samson – Em poucas palavras é isso.
FONTE: O autor (2014).
Como referimos acima, a situação foi muito explícita no objetivo pretendido. É claro que
podia ter seguido uma demonstração algébrica, segundo o ponto de vista manifestado pelos
estudantes nas tarefas anteriores. Talvez por ter sido muito explícita ou por reconhecer que sua
demonstração não seria simples, não houve reclamações quanto a poder ser feita.
No extrato a seguir, resumimos como a tarefa de estudar a derivada da função j(x) =
x foi realizada:
FIGURA 164 – FUNÇÃO DERIVADA DE UMA FUNÇÃO RAIZ QUADRADA A PARTIR DA ANIMAÇÃO
GRÁFICA
P – Ok. Talvez possamos ir para a última tarefa. Aqui
podemos redefinir o seletor porque o nosso seletor era
de menos cinco até cinco. Mas esta nossa função tem
algumas propriedades.
As – Sim, temos que pôr de zero até cinco.
Samson – De zero até mais infinito.
P – Bem, aqui podemos dizer, até 10 para dizer até
mais infinito. Este é o problema da tecnologia, não
mostra claramente até onde, quando se diz até mais
infinito.
Gogo – Este caso é mesmo especial. (Risos).
P – É especial mesmo. Quem pode comentar?
Micas (G1) – É um pouco difícil dizermos como estávamos a fazer antes. Por isso mesmo recorrer à derivada.
Quanto ao ponto B é mesma coisa, sabemos que ele vai descrever o gráfico da derivada, o declive da reta tangente
em cada ponto do gráfico de f (em vez de j) do gráfico inicial, que é a raiz de x. Vamos determinar a derivada
desta função (j).
O estudante escreve: j(x) = x e j’(x) = x
1
2
1
362
Micas – Esta é a expressão analítica da função que está sendo descrita pelo ponto B.
P – Há algum comentário?
Silêncio
P – Há algum comentário?
Silêncio
P – De fato, aquele ponto B descreve os declives. Os tais declives descrevem uma função. Temos uma função que
nos dá os declives. Isso é algo que podemos dizer em relação a estas tarefas. Na verdade trabalhamos muito hoje.
Apesar de termos chegado tarde, mas trabalhamos bastante hoje. Muita coisa foi feita. Foi diferente daqueles
primeiros dias em que, por causa da dificuldade do uso do próprio computador, levava muito tempo para realizar
uma atividade. Muito obrigado pela vossa participação.
FONTE: O autor (2014).
A discussão dessa tarefa marcou o fim da sessão 9. Foi uma sessão muito interessante
em termos de participação dos estudantes. Por outro lado, consideramos ter sido satisfatória a
estratégia desenhada para construir o conceito de função derivada a partir da função dada,
considerando os conhecimentos disponíveis dos estudantes e de todas as ações articuladas por
meio de intuições gráficas e algébricas, seguidas de justificações analíticas, pois possibilitou agir
diretamente sobre o conceito visado e as justificações foram coerentes. Quer dizer, segundo
Artigue (1995), foi-nos possível centrar a abordagem sobre o objeto do saber (função derivada) e
sobre os processos de adaptação dos estudantes.
A sessão mostrou uma grande evolução por parte dos estudantes no uso do computador
para estudar a Matemática. Parece-nos que as aprendizagens iniciais para o uso do recurso
computacional tenham valido a pena e assim associamo-nos à observação de Rabardel (2002,
1995), segundo a qual, para tirar proveito do artefato, o usuário precisa aprender os modos de
utilização. Consideramos ser de suma importância a referência de Rabardel (2002, 1995) a
Vygotsky (1931), no sentido de que as atividades com instrumentos estão no coração da
constituição e do funcionamento das funções psíquicas superiores para o homem, pois no nosso
entender, podemos formular as questões: compreender esta realidade permite refletir sobre o que
realmente se faz quando se usa um instrumento numa atividade? Para a nossa sessão
experimental, essa pergunta pode ser feita no sentido de perceber o que significou o uso do
computador na discussão. Em nossa percepção, a discussão constituíu um verdadeiro momento
de debate científico, articulando o conhecimento disponível dos estudantes com o conhecimento
visado, por via da simulação computacional de tarefas que exigiam a aplicação desses
conhecimentos.
Apresentada a análise da sessão 9, passamos para a sessão 10.
363
8.9 SESSÃO 10: 08.06.2013
Participaram da sessão 7 estudantes.
A sessão tinha os seguintes objetivos:
Levar os estudantes a:
- determinar a derivada de uma função f que exige a aplicação do teorema do confronto;
- reconhecer e praticar as técnicas de derivação direta (com recurso à técnica do
apóstrofe) no computador;
- comparar os resultados de derivação obtidos pelo computador e os obtidos pela
aplicação da forma prática manual.
As tarefas preparadas para a sessão foram as seguintes:
FIGURA 165 – TEOREMA DO CONFRONTO NA DERIVAÇÃO E DERIVADA DE FUNÇÃO POTÊNCIA
Tarefa 6: Função derivada.
Considere a função f definida por: f(x) =
00
012
xse
xsex
senx
,
,
Estude a derivabilidade de f no ponto x = 0. Justifique a sua resposta
Tarefa 7: Estudo da derivada da função f dada por f(x) = xn, g(x) = x(1/n), h(x) = x(p/n) com n e p inteiros.
i) Com recurso ao Geogebra, determine n. com seletor, e tome n = [-5, 5], passo 1. Na janela de comandos
digite f(x) = xn. Digite em seguida f’(x). Para boa visibilidade, modifique os tamanhos dos gráficos de f e de f’ e
diferencie as cores. Movimente n. Analise o que acontece, registrando as suas conclusões sobre a função derivada
para uma dada função f, com um n dado.
ii) Comprove seus resultados anteriores analiticamente.
iii) Como na tarefa anterior, tome f(x) = x(1/n).
iv) Como na tarefa anterior, tome f(x) = x(p/n), para P um número dado. FONTE: O autor (2014).
Análise a priori das tarefas da sessão.
A análise da tarefa 6 já foi feita anteriormente, uma vez que fez parte do teste
diagnóstico. Assim sendo, passamos para a tarefa 7.
As escolhas feitas para encaminhar esta tarefa são as seguintes:
Formulação da tarefa pela lei de formação da função;
Software Geogebra;
Ferramenta declive do Geogebra;
Opções de cor e espessura do Geogebra;
364
Animação das imagens;
Perguntas intermediárias;
Organização dos estudantes em duplas.
A seguir, apresentamos as respostas esperadas para esta tarefa:
Na parte i), seguindo o roteiro do enunciado, esperamos obter os seguintes resultados:
FIGURA 166 – FUNÇÃO POTÊNCIA E SUA DERIVADA PARA UM EXPOENTE n INTEIRO
n = -5 N = -4
[…] o mesmo padrão para n = -3, n = -2
n = -1 n = 0
n = 1 N = 2
[…] o mesmo padrão para n = 3, n = 4, n = 5, …
FONTE: O autor (2014).
365
Os resultados mostram que dada uma função f(x) = xn, para um n inteiro, a derivada de f
é dada por f’(x) = nxn-1
e o software mostra isso explicitamente.
Na parte ii), comprovamos os resultados analiticamente:
Sem perda de generalidade, tomamos n > 1. E ainda tomemos um ponto a qualquer para
o qual queremos diferenciar a função f(x) = xn. Formamos o limite da razão incremental:
ax
f(a)f(x)lim
ax
=
ax
a-xlim
nn
ax =
ax
a)-)(xaxa...ax(xlim
1-n2-n2-n1-n
ax
=
axlim
(xn-1
+ axn-2
+ … +
an-2
x + an-1
) = nan-1
Como tomamos qualquer a do domínio de f, temos que f’(x) = nxn-1
. Assim a nossa conjectura
obtida das intuições gráficas e algébricas está confirmada. Usando a derivada de Carathéodory,
obtemos o mesmo resultado:
Tomamos o binômio xn – a
n e passamos a fatorá-lo:
xn – a
n = (x
n-1 + ax
n-2 + a
2x
n-3 + … + a
n-2x + a
n-1)(x – a)
A função (x) = xn-1
+ axn-2
+ a2x
n-3 + … + a
n-2x + a
n-1 é contínua em toda parte, porque se
trata de um polinômio.
Então f’(a) = (a) = an-1
+ aan-2
+ a2a
n-3 + … + a
n-2x + a
n-1 = na
n-1.
Ou seja f’(x) = (x) = xn-1
+ xn-1
+ xn-1
+ … + xn-1
+ xn-1
= nxn-1
.
Na parte iii), seguindo o roteiro do enunciado, esperamos obter os seguintes resultados:
FIGURA 167 – FUNÇÃO POTÊNCIA E SUA DERIVADA PARA UM EXPOENTE 1/n COM n INTEIRO
n = -5, temos N = -4
n = -3 n = -2
366
n = -1 n = 0
n = 1 n = 2
n = 3 n = 4
FONTE: O autor (2014).
O padrão continua.
367
Dos resultados obtidos acima, vemos que, para uma função potência f(x) = xr, com r =
n
1 e n inteiro, o computador mantém a mesma lógica usada no caso da função potência f(x) = x
n,
n inteiro, isto é: se f(x) = xr, então f’(x) = rx
r-1. Se por exemplo f(x) = x
1/3 então temos: f’(x) =
1(1/3)x3
1 = 1(1/3)xx3
1 = 3x
x3
. Equivale dizer que o computador usa a mesma lógica de cálculos que
nós usamos quando calculamos com lápis e papel.
Com essas observações, dispensamos a repetição da comprovação analítica da validade
da técnica de derivação usada para r real qualquer. Igualmente, dispensamos a apresentação da
parte iv) da tarefa, pois o caso apresentado acima para r = n
1é idêntico ao pedido da tarefa iv).
Por outro lado, notamos que o computador produz resultados gráficos incompletos para
as derivadas das funções potências f(x) = x1/(-5)
e f(x) = x1/(-3)
, visto que, para cada um desses
casos, aparece apenas o ramo direito do gráfico, a partir do zero, como se vê na figura acima. Na
verdade, se a derivada de f(x) = x1/(-5)
é f’(x) =5x-
x-5
esta função não está definida apenas para x =
0. Então o gráfico deveria ser como o que vemos a seguir:
FIGURA 168 – GRÁFICO DA FUNÇÃO DERIVADA DA FUNÇÃO f(x) = x-1/3.
FONTE: O autor (2014).
Assim, estamos mais uma vez diante de um dos casos em que o software traz uma
informação não pertinente para a resolução da tarefa proposta, o que pode distorcer o conteúdo de
aprendizagem pelo estudante, quando não se presta a devida atenção.
Para a função inexistente, definida por f(x) =
0
1
x , o software
produz o gráfico ao lado e a expressão da derivada, o que
mostra uma certa perversidade matemática neste caso. Estas
368
situações que ocorrem em certas circunstâncias chamam-nos
atenção para o aspecto antropocêntrico do uso do instrumento,
segundo Rabardel (2002, 1995). Ele não é uma panaceia
(remédio para todos os males) matemática. Seu
funcionamento sujeita-se a restrições internas para as quais o
usuário não tem controle, como explica Balacheff (1994).
FIGURA 169 – RETROAÇÃO
ERRADA DO SOFTWARE
FONTE: O autor (2014)
Na sequência, apresentamos passagens da discussão, que consideramos interessantes, as
quais alimentaram nossas análises sobre essas tarefas.
Antes de começar a discussão das tarefas preparadas para a sessão, os estudantes
propõem outras tarefas, de sua autoria, para as quais consideravam que deveria haver um
esclarecimento:
Pergunta 1 (do Micas, G1): Como inserir na entrada de comandos uma função
logarítmica de qualquer base?
Pergunta 2 (do Gogo, G3): Como derivar uma função composta?
Pergunta 3 (do Semo, G4): Como se deriva uma função no computador? (Notemos que
o Semo é um dos estudantes que tiveram ausências às sessões - ele faltou a três sessões -, trata-se
de um estudante que apresentou dificuldades no teste diagnóstico que reaparecem no teste final,
mas é importante observar que ele é o líder da turma convidada para participar desse
experimento. Sua forma de participação pode ter influenciado outros estudantes, mas não somos
capazes de responder a essa questão.)
Para outros participantes regulares, a pergunta 3 já não tinha razão de ser, pois já se
tinha discutido a respeito quase exaustivamente nas sessões anteriores.
Para responder à pergunta 1, o pesquisador sugere procurar na lista de funções que o
Geogebra possui. O pesquisador não sabe exatamente onde procurar essa lista, mas sugere
procurar: ir para a seta que se encontra no lado da entrada de comandos:
Clicando na seta, aparece o diretório de alguns objetos matemáticos, entre eles o
subdiretório para funções matemáticas e indo para este último, aparece uma lista de funções.
369
FIGURA 170 – DIRETÓRIOS DE PRINCIPAIS E FUNÇÕES MATEMÁTICAS NO GEOGEBRA
FONTE: Geogebra.
Apresentada esta lista de funções, o pesquisador refere que qualquer função de interesse
pode ser selecionada, bastando para isso clicar sobre a função desejada e em seguida clicar no
“paste”, nesse caso a função visada passa para a janela de comandos; no nosso caso, a função
logarítmica:
FIGURA 171 – INSERÇÃO DE FUNÇÕES A PARTIR DA LISTA DE FUNÇÕES DO GEOGEBRA
FONTE: Geogebra.
Ao finalizar, o pesquisador escreveu: f(x) = log(base, x).
370
Nessa entrada, uma base qualquer pode ser introduzida no lugar de b. Assim os
estudantes experimentam diferentes funções de sua escolha. Alguns resultados obtidos foram os
seguintes:
FIGURA 172 – GRÁFICOS DE FUNÇÕES LOGARÍTMICAS PRODUZIDAS PELOS ESTUDANTES
FONTE: O autor (2014).
Não houve outras análises detalhadas em relação a este caso, senão apresentando as
opções para plotar funções logarítmicas e outras.
Em relação à pergunta 2: “Como derivar uma função composta?”, o pesquisador
apresentou na lousa duas funções: f(x) = x2 g(x) = ln(x).
Algumas passagens de diálogo sobre esta tarefa: derivar uma função composta.
FIGURA 173 – DISCUSSÃO SOBRE A DERIVAÇÃO DE UMA FUNÇÃO COMPOSTA
O pesquisador pede ao estudante que fez a pergunta para fazer a composição gof.
O Gogo (o estudante que fez a pergunta de como derivar a função composta) vai à lousa e faz a composição:
(gof)(x) = g(x2) = ln(x2)
P – Temos aí duas funções, uma função quadrática e uma função logarítmica. Então a composição foi feita assim.
Alguém tem comentários em relação a essa resolução? Se a composição foi bem feita ou não, é essa pergunta que
está sendo feita.
Micas vai ao quadro para apresentar alguns detalhes da resolução e diz: “Eu fiz assim, temos aqui a função g, que
é ln de x. Então aqui na composição tomamos x2 como argumento, então em vez de termos ln de x, ficamos com
ln de x ao quadrado. É isso o que ele fez.
P – Aqui significa que temos uma outra função que resulta da composição, podemos designar essa função de
outra forma. Para eu poder derivar uma função, a função tem de ter um nome. Aquele nome composto, não sei
como a gente pode introduzir aqui na lista de comandos, porque … talvez possamos introduzir assim como está,
para ver o que vai acontecer: introduzir cada uma das funções, e depois a função composta e derivar. Para ver o
que vai acontecer.
Micas tem a seguinte solução:
A versão 3.2 do Geogebra, disponível no
laboratório da informática dá o resultado:
gof’(x) = 2x
x2
O estudante vai ao quadro e escreve: gof’(x) = 2x
x2
Como o computador fez.
P – Há uma possibilidade de escrever de outra
forma?
371
O estudante simplifica ficando: gof’(x) = 2
x
P – Bem, a pergunta do Gogo está respondida. Como derivar uma função composta. O que estamos a fazer é a
derivada de funções compostas. De fato podemos fazer a derivada de funções compostas, desde que as funções
sejam conhecidas, que funções são, não é? Agora, uma questão, esta é a única forma de compor?
Silêncio
P – Ali o Gogo escreveu gof, de outra forma, como seria a composição, fora a do Micas, como seria a outra
composição?
Vinagre vai ao quadro e escreve: fog(x) = 2)ln(x .
P – Aquela é a composição que o Vinagre sugere. Não sei se os outros sugerem a mesma composição. É a mesma
coisa?
Dois estudantes que acabam de chegar, atrasados, perguntam como encontrar o resultado da derivada de (gof)(x)
= g(x2) = ln(x2), dado por gof’(x) = 2x
x2 = x
2. O pesquisador sugere alguém mostrar no quadro:
[…] P - E vimos que a derivada gof(x) = ln(x2) é uma função homográfica. Não é? De fato é isso. Quem pode
mostrar isso, segundo aquilo que nós temos feito?
Micas vai ao quadro, tentando mostrar, mas com algumas dificuldades:
O Micas faz: ')ln( 2x = 2x 'ln 2x = 2x
x2
P – Entende-se o que está lá escrito?
Silêncio
P – Ok. Talvez outra pergunta seria: aquela forma como ele fez é a forma como normalmente temos feito na sala?
Silêncio
P – O computador deu aquela resposta: dois x sobre x ao quadro. Normalmente aquela forma (composta) como
Gogo demonstrou, como iria ser feita?
Micas escreve: “lnx2 2xe (tenta usar a fórmula da função inversa):
lnx2 =
'2
1
xe= 2x
2
1xe
. Em seguida o estudante apaga o membro direito e reescreve:
'2
1
xe=
2
12
1
xx
Micas fica travado, não avança mais.
Gogo vai ao quadro e escreve: 'ln 2x =
2
2
x
x'
, falando: “a derivada disto aqui, 2xln , é igual a derivada disto
que está aqui dentro (x2) sobre isso que está dentro”.
Gogo conclui: 'ln 2x =
2
2
x
x'
= 2
2
x
x
P – É assim como vocês aprenderam?
As – Sim.
Gogo – Quando apareceu aquele resultado no computador, comecei a pensar, como estudamos na 12ª classe. É
isso.
P – Esta igualdade como é ? (Questiona a igualdade lnx2 =
'2
1
xe= 2x
2
1xe
), como é? O que estão a verificar
realmente?
O autor apaga a resolução questionada.
P – É preciso escrever bem.
[…]
372
P – Mas como você escreve logo aquela expressão fracionária? ( 'ln 2x =
2
2
x
x'
). O que estão a aplicar
realmente?
Michael – Sim, temos logaritmo de x na base a, (escreve y = xalog ). Então a derivada é igual a x derivada,
sobre x vezes logaritmo natural da base. (Escrevendo y’ = ( xalog )’ = x'
xln(a) ). Então aqui na expressão y =
lnx2, 'ln 2x = (x2)'
x2ln(a) , só que a nossa base é e, então, 'ln 2x =
(x2)'
x2ln(e) , logaritmo natural de e na base e é um,
temos: 'ln 2x = 2x
x2 1 =
2x
x2 = 2
x .
Fazendo composição oposta de gof, ou seja a composição fog, obtém-
se o resultado: fog(x) = f( g(x)) = f( ln(x)) = (lnx)2.
E derivando fica, como se vê na figura, em vermelho.
O computador exibe uma notação não clara para composta:
- não reconhece a notação (fog)(x) = (ln(x))2, mas sim fog(x) =
(ln(x))2.
- no resultado apresenta fog(x) = ln(x)2, ao invez de (ln(x))2.
Michael dá a mesma resposta no quadro: ((fog)(x))’ = ((lnx)2)’ = 2lnx
x , verbalizando o seguinte: “Derivada
de uma função composta é a derivada da função externa, mantendo o argumento, vezes a derivada da
função interna”. Para o estudante, a função externa é a quadrática, o que implica a descida do expoente,
mantendo o argumento, mantendo neste caso lnx, vezes a derivada da função interna, a interna é a função
lnx, que derivando resulta em 1/x.
FONTE: O autor (2014).
A figura acima mostra como as três perguntas formuladas pelos estudantes foram
respondidas na perspectiva da nossa pesquisa. As perguntas foram colocadas e desencadearam
outras perguntas, suscitando os conhecimentos disponíveis dos estudantes e articulando-os com a
mídia computacional. Alguns estudantes não tinham esses conhecimentos disponíveis suficientes
para justificar a técnica usada para explicar a derivada de uma função logarítmica composta, mas
outros tinham esse conhecimento e o partilharam na sala.
Essa estratégia corresponde ao que preconizamos na pesquisa: articular a ferramenta
computacional com as práticas de lápis e papel (ou giz e lousa) para construir o conhecimento
matemático num ambiente de colaboração, por isso organizamos os estudantes em duplas.
Consideramos que quando os estudantes apresentam perguntas do tipo: como inserir
uma função tal no computador? Como derivar uma função no computador? Como derivar uma
função composta no computador?, eles reconhecem e assumem que o computador é um
instrumento com o qual se pode aprender a Matemática. Os estudantes assumem o protagonismo
na sua aprendizagem, colocando o computador como elemento de mediação epistêmica,
pragmática, heurística e hermenêutica, quando interpretamos o processo na perspectiva de
373
Rabardel (2002, 1995). Na mesma visão, Bosch e Chevallard (1999) apontam que são os
ostensivos que materializam a interação com o objeto matemático, guiados pelos não ostensivos
correspondentes. Na sequência de diálogos acima, percebemos essa materialização pelas
intervenções dos estudantes, evocando princípios matemáticos que existem em forma de ideias
para encaminhar as técnicas, explicações e justificações.
Assim, essa manifestação dos estudantes quase responde efetivamente a uma parte de
nossos objetivos da pesquisa no que concerne a experimentar uma modalidade de ensino e de
aprendizagem dos conceitos de derivada de funções reais de uma variável real, incorporando no
processo o software Geogebra, articulado com as mídias e práticas usuais.
Na sequência, apresentamos algumas passagens que ilustram como a discussão
prosseguiu com as tarefas que haviam sido propostas para a sessão, pois no início consideramos
importante esclarecer as questões levantadas pelos estudantes como discutido acima.
FIGURA 174 – DERIVAÇÃO DE UMA FUNÇÃO POTÊNCIA
P – Bem vamos continuar com a nossa ficha, bem, parece que o Gogo sabia colocando esta questão da derivada
da função composta, porque é exatamente isso que vamos fazer hoje. Então fazendo normalmente, nos grupos,
depois vamos discutir, como fazemos sempre. […]
Micas – Derivamos normalmente, se for num ponto escreve o ponto, se é qualquer ponto, escreve derivada de f
de x, aqui onde está o sinal de interrogação, tem um sinal que usamos. (O apóstrofo. Micas explica isso ao seu
colega que mostra dificuldade da sintaxe de como derivar).
P – Sim, como ele está a explicar, aqui na entrada de comandos introduzimos a função f, que queremos derivar e
apóstrofo e o ponto onde queremos derivar. Fazemos isso como escrevemos normalmente a mão.
P – (ao grupo 2): Por exemplo, para n = -1, que função obtemos?
Nicolau – Exponencial.
P – Exponencial? Na exponencial a variável fica em cima, é o expoente.
OAs – Homógrafa.
Uma grande discussão animada ao nível dos grupos, analisando vários aspectos: de visualização (cor e espessura
das linhas), escala, o que dá para fazer …
P – Para cada n, há uma função, seu gráfico e a sua derivada. É esta relação que vocês devem analisar. Por
exemplo, para n = -4, é aquela função 1 sobre x elevado a quatro. Esta é a função original. (f(x) = 1
x4, e esta (f’(x)
= - 4
x5) é a sua derivada. Por exemplo para n = 0; a função mãe (informalmente é usado o termo função mãe para
referir-se a uma primitiva de uma função dada). Onde está a sua derivada?
Nicolau – Está aqui (aponta o gráfico de f(x) = x0).
P – Vamos mudar de cor para mostrar bem. Vamos ver onde a
função derivada está.
O estudante muda de cor da derivada. E nota que o gráfico da
derivada está sobre o eixo das abscissas.
P – De fato o gráfico da derivada não está aqui (sobre o gráfico de f(x) = x0). De fato esta função aqui (f(x) = x0) é
uma função constante, para n = 0 f é uma função constante, igual a 1. E a derivada de uma função constante,
como é?
AAs – Zero.
P - É isso que está a acontecer.
374
[…]
Uma grande discussão entre os grupos 1 e 2 sobre o porquê de a derivada em x = 0 não existir.
Um estudante do grupo 2 (Nicolau) esclarece que a derivada não existe, porque a função f(x) = 0-1, por exemplo é
f(x) = 0-1 = 1
0 e esta fração não se calcula.
O pesquisador comenta que não se trata da derivada que não existe mas sim da própria função que não existe. FONTE: O autor (2014).
Observamos que a figura acima apresenta uma pequena parte da discussão sobre as
funções potências para os diferentes valores do expoente. A justificação algébrica da técnica f(x)
= xr f’(x) = rx
r-1 não foi desenvolvida na sessão para se ganhar algum tempo, mas no final foi
recomendado que ela fosse feita em casa.
Tal como aconteceu nas sessões anteriores, verificamos nesta também um verdadeiro
debate científico, e a ferramenta computacional desempenhou seu papel crucial como instância de
ajuda ao estudo e ponto de referência para argumentos justificativos. Por exemplo, para a
derivada da função potência x0, alguns estudantes, como Nicolau, não viam onde estava o seu
gráfico. Face a essa dificuldade, a cor e a espessura foram elementos importantes para
compreender que o gráfico da derivada estava sobre o eixo das abscissas. Essa observação
legitimou o conhecimento disponível dos estudantes de que a derivada de uma função constante é
zero. Nessa tarefa os ostensivos visuais cor e espessura, permitiram a descoberta do objeto
matemático que estava sendo procurado. Na formulação de Saussure (2006), diríamos que os
ostensivos gráficos com as propriedades de cor e espessura deram-nos o testemunho da existência
do objeto procurado.
A seguir, apresentamos partes da discussão da última tarefa da sessão:
As respostas que emergiram dos grupos:
FIGURA 175 – DERIVAÇÃO DE UMA FUNÇÃO COMPOSTA PELO TEOREMA DO CONFRONTO
Grupo 2:
Grupo 1
375
Grupo 4
FONTE: O autor (2014).
Os resultados acima sinalizam que os dois primeiros grupos não discriminam bem as
condições de definição da função dada por ramos e, por isso, todas as justificativas ficam erradas.
Por outro lado, notamos nas respostas dos grupos referidos o efeito da técnica de substituição
aplicada no cálculo de limites, conduzindo o estudante a interpretar o limite da função em um
ponto como sendo seu valor nesse ponto, o que não é correto, conforme a própria definição do
conceito de limite. O grupo 4 refletiu bem e dá uma resposta conceitualmente bem justificada
baseada no teorema do confronto. Pela nossa experiência, muitos estudantes do Ensino Médio e
mesmo do Ensino Superior não estão habituados a elaborar respostas desse tipo, baseadas em
conceitos. O que eles normalmente produzem são respostas respaldadas em técnicas, fato
compreensível, uma vez que os estudantes apresentam uma sequência de manipulação de
376
ostensivos sem evocar os não ostensivos que lhes são associados, no caso, mesmo o grupo 4, ao
utilizar o teorema do confronto, não explicita qual é o não ostensivo em jogo. Trata-se de uma
maneira de trabalhar com a Matemática que não é característica da própria Matemática, mas do
ensino de Matemática em alguns países, em particular, em Moçambique e no Brasil, como Ávila
(2005) deixa claro quando destaca que os objetivos do primeiro curso de Cálculo ficam mais
válidos para o provimento de técnicas e não para a discussão teórico-tecnológica dessas técnicas.
Embora esse ponto de vista seja pertinente na perspectiva do autor, consideramos que uma
técnica não deveria aparecer do nada, mas sim alicerçada em algum discurso tecnológico-teórico
que a torne exequível e transparente. Essa nossa observação é também sustentada por Chevallard
(1999) e Bosch et al. (2004) de modo que, segundo eles, uma técnica deve ser compreensível,
legível e justificável para proporcionar o seu controle e garantir a eficácia das tarefas que ela
permite realizar. Ainda de acordo com os mesmos autores, em qualquer instituição I, qualquer
que seja o tipo de tarefas T, a técnica relativa a T está sempre acompanhada de ao menos um
embrião, ou mais frequentemente dito, de um vestígio da tecnologia . Portanto, como já
indicado, não é interessante que se apliquem técnicas de substituição, como os estudantes acima
fizeram, sem explicação por que o fazem.
Perante as dificuldades como as mostradas pelos grupos 2 e 1, consideramos usar a
ferramenta computacional para tentar discutir os equívocos, e as figuras seguintes resumem a
discussão que na prática foi muito longa.
FIGURA 176 – DERIVAÇÃO DE UMA FUNÇÃO COMPOSTA PELO TEOREMA DE CONFRONTO:
DISCUSSÃO
1A – Na 1ª tarefa usamos o seletor. A mesma ideia pode ser usada aqui. Sim pode ser usada.
P – Pode ser usada, é uma possibilidade. Então vamos usar. Para poder usar o seletor, devo ter um ponto no qual
devo traçar a reta tangente e determinar o declive da reta tangente naquele ponto.
Os estudantes juntamente com o pesquisador fazem o seguinte desenho:
377
P – Temos lá o gráfico de f, a reta tangente no ponto A, e o declive
da reta tangente no ponto A. Ou também, como vimos, chamamos
de taxa de variação, não é? É a variação da ordenada para a
variação de uma unidade na abscissa. O que acontece
movimentando o ponto A?
As – Declive altera.
P – Estamos nas proximidades de zero, qual é a inclinação da reta
tangente aqui? (Veja que a tradução de Stewart usa mais o termo
inclinação da reta tangente). AAs – Zero.
1A – Não existe.
P – Hã?
AAs – Ali está zero.
P – Bem, é mudar a cor da reta tangente para ver bem. (O pesquisador sugere a um estudante que não destacou bem
no seu desenho). Mude a cor da reta tangente para vermelho (Cor foi uma variável muito importante para distinguir
as coisas). Talvez aumentar um pouco o tamanho da reta tangente.
P – Este é o a, (aponta o a a indicar zero, a = 0), qual é o declive da reta tangente?
As – Zero. A reta tangente está sobre o eixo das abscissas.
P – Quer dizer, nas proximidades de zero existe a reta tangente, e mesmo no zero. E mesmo no zero, então o que há
a dizer?
Nicolau – É derivável no ponto zero. A derivada é zero. Mas calcular analiticamente, vai sair?
Um estudante ainda não está convencido de que a derivada no ponto x = 0 é zero.
[…]
Uma longa discussão, com alguns erros de raciocínio dos estudantes, decorrentes ema alguns casos por
substituições inadequadas como as do tipo: 02 sen(1
0)”
Gogo vai ao quadro e escreve: 0
0
10
12
0
x
senx
senx
xlim
P – É interessante. Esta definição de fato é mesmo difícil, estou a ver.
[…]
P – Talvez tentarmos fazer assim: (O pesquisador escreve: f’(x) = 0
0
0
x
fxf
x
)()(lim ).
O Gogo diz: “Está aqui”, apontando a expressão dele (0
0
10
12
0
x
senx
senx
xlim ).
P – Não é aquela expressão que estou a escrever. Vamos ver se é aquela.
À medida que escreve, o pesquisador fala juntamente com os estudantes, do que escreve:
0
0
0
x
fxf
x
)()(lim =
0
12
0
x
xsenx
xlim
P – f de zero?
Gogo aponta a expressão dele e diz: está aqui (02 sen(1
0)).
P – Não. f de zero é zero. Segundo a nossa definição.
Todos concordam – yaaaaaaa.
A expressão do limite fica: 0
0
0
x
fxf
x
)()(lim =
0
012
0
x
xsenx
xlim
O Gogo pergunta apontando a exepressão dele: “Aquela aí não sai zero, 02 sen(1
0)”?
378
P – Aqui, da maneira como você escreveu, zero ao quadrado, seno de um sobre zero. Isto aqui (1
0) não está definido.
Um sobre zero não existe como número. Por isso esta coisa aqui, 02 sen(1
0) não podia ser feita.
Gogo continua desenvolvendo a expressão iniciada pelo pesquisador:
0
012
0
x
xsenx
xlim =
x
xsenx
x
12
0lim =
x
xsenx
1
0lim
O estudante fica travado nesta fase, não consegue prosseguir.
P – Este x tende para onde?
As – Para zero.
P – Esta expressão aqui (sen(1
x)) tende para onde?
AAs – Tende para infinito.
P – Como? Como vai tender para infinito?
O pesquisador plota o gráfico de sen(1
x).
P – O que é que estão a ver?
Silêncio
P – Então estamos a ver que esta expressão aqui sen(1
x), por
volta de zero, oscila entre menos um e um. Enquanto este
pedaço (x) tende para zero, este pedaço sen(1
x) oscila entre
menos um e um.
Quer dizer o valor daqui sen(1
x) está entre menos um e um. E multiplicado por zero, quanto vai dar?
As – Zero.
P – Este é o problema de substituições. Quando falamos de limite, não estamos a dizer que x é igual a zero.
Estamos sim nas proximidades de zero. Por exemplo, esta substituição (02 sen(1
0)), que ele estava a fazer, estava a
dar erros porque ele está a dizer, x tem de ser zero, não, nas proximidades de zero. … Como eu disse, esta função
aqui sen(1
x) nas proximidades do zero varia entre menos um e um, claro aqui entre menos um e um há outros
valores, inclusive o zero. Então, todo valor que está entre menos um e um, multiplicado por zero, dá zero. FONTE: O autor (2014).
Apontamos, na figura acima, parte do decurso da sessão, na qual vemos a real
complicação de estudar a derivada da função f(x) =
00
012
xse
xsex
senx
,
,
no ponto x = 0 e as
reais dificuldades que surgem e que estão intimamente relacionadas com a definição do conceito
de limite que se generaliza para a técnica de substituição. Não se sabe ao certo como essa técnica
é construída no meio estudantil, porque institucionalmente não é destacada. Todas as definições
de limites de uma função em um ponto apontam que o número a para o qual determinamos o
379
limite de f não precisa estar no domínio de f. Mediante essa observação, por que os estudantes
desenvolvem a técnica de substituição? Para o momento, não temos resposta a essa indagação,
talvez outras pesquisas possam respondê-la.
Consideramos, por outro lado, que a mediação com o recurso computacional
proporcionou uma imagem muito significativa para levar os estudantes a terem algum crédito do
resultado obtido, pois no ponto x = 0, tivemos o declive da reta tangente ao gráfico de f igual a
zero e a reta tangente e seu declive estavam visíveis. Outra representação gráfica que se revelou
útil na discussão foi a da função f(x) = sen(1/x), já que, por meio da imagem visual, dissipou-se o
equívoco de grande parte dos estudantes, pensando que quando x tendesse a zero, f(x) tendia ao
mais infinito. Além disso, com a imagem gráfica presente, foi possível argumentar que o produto
de um número entre -1 e 1, por 0 era igual a zero. Reconhecemos contudo que esta última
imagem teria sido mais efetiva se se plotasse junto todo produto x.sen(1/x), como indicamos na
figura a seguir:
FIGURA 177 – GRÁFICOS DE FUNÇÕES FATORES E DA FUNÇÃO PRODUTO
FONTE: O autor (2014).
Talvez com esta visualização, ficaria mais evidente que
x
1xsenlim
0x = 0 e assim
poderíamos concluir que f’(0) = 0.
Consideramos que a discussão tenha sido efetiva, pois oportunizou aos estudantes agir
sobre o conteúdo em causa e, dessa ação, foram sendo constatadas as suas relações pessoais com
o objeto matemático visado, algumas das quais não conformes às relações institucionais vigentes.
Nesses casos, buscou-se ultrapassar os equívocos, o que julgamos ter surtido efeitos, pois os
argumentos trazidos foram logicamente construídos e os estudantes mostram ter conquistado um
discurso apropriado ao que estava sendo discutido. Na visão de Korner (1985), diríamos que
houve efetivamente uma fase de construção de conhecimentos. Explica o autor que construir um
conceito é proporcionar-lhe um objeto a priori. Antes de terminar a análise da sessão, parece-nos
380
pertinente destacar o efeito positivo da ferramenta computacional na conduta matemática dos
estudantes. As afirmações deles que aparecem na figura acima são exemplos disso.
Com estas observações, finalizamos a análise da sessão 10 e passamos para a sessão 11.
8.10 SESSÃO 11: 15.06.2013
Participaram da sessão 8 estudantes.
A sessão teve duas partes principais: parte 1: resolução do teste final sobre a derivada de
funções reais a valores reais. Essa parte teve a duração de 1 hora.
Parte 2, com a duração também de 1 hora, dedicou atenção à introdução de somas de
áreas de retângulos aproximantes, visando à discussão de somas e integral de Riemann, tendo
destacado os conceitos de supremo e ínfimo de uma função f contínua num intervalo fechado
limitado I = [a, b], o de partição do intervalo I e o da soma de áreas de retângulos aproximantes
por falta e por excesso.
Como indicado no capítulo 3, a realização do teste final corresponde ao momento da
avaliação, consoante Chevallard (1997), com o objetivo de perceber o progresso dos estudantes
após a experimentação, por um lado e, por outro, ajudar a refletir sobre a eficácia da experiência.
Na sequência, apresentamos o teste, os resultados e sua análise, lembrando que a parte
de conteúdo matemático foi a mesma usada para o teste diagnóstico do nível de entrada dos
participantes das sessões experimentais, tendo-se acrescentado questões de pesquisa de opinião
em poder dos estudantes sujeitos do estudo.
Desse modo, dispensamos a apresentação de análise a priori das tarefas usadas no teste
final. Indicamos, não obstante, que as partes d) e e) da tarefa 2, de aplicação da derivada para o
estudo do movimento (estudo de funções) não foram explicitamente trabalhadas nas sessões
experimentais, como pudemos constatar na descrição das sessões realizadas.
Os quadros seguintes resumem os resultados obtidos no teste:
381
QUADRO 9 – RESPOSTAS DOS ESTUDANTES AO TESTE FINAL
Tarefas colocadas Tipos de respostas A B C D
Tarefa 1: Considere o gráfico de uma função f definida no intervalo I = [-2, 4].
a) A função f é contínua em [-2, 4]?
Justifique a sua resposta.
b) A função f é limitada? Por quê?
c) Indique o conjunto imagem de f,
Im(f). Justifique a sua resposta
3
3
2
0
5
1
2
0
6
0
2
0
Tarefa 2: A equação de movimento de uma partícula é s(t) = t3 – 6t2 + 9t, em que s(t)
é dado em metros e t em segundos.
a) Encontre a velocidade e a aceleração do movimento como funções de t.
b) Escreva a equação da recta tangente ao gráfico da função s passados 5 segundos (no
instante t = 5s).
c) Calcule a aceleração do movimento depois de 2s (t = 2s).
d) Qual era a aceleração do movimento quando a velocidade era 0 (v(t) = 0m/s)?
6
0
2
0
4
2 2
0
6 0
2 0
1
2
5
0
e) Em qual das figuras dadas abaixo, o gráfico da função s está desenhado
correctamente, tendo em conta o desenho do gráfico da sua função derivada s’?
Justifique a sua resposta.
Fig. 1
Fig. 2
Fig. 3
Fig. 4
Caso não haja um gráfico desenhado correctamente, esboce o gráfico de s
3
3
0
2
Tarefa 3: Seja
2
22
xsebmx
xsexxf )(
Encontre os valores de m e b que tornem f derivável em toda parte.
2
3
2
1
Tarefa 4: Considere a função
00
012
xse
xsex
senxxf )(
Encontre a função derivada de f e seu valor (da função derivada) no ponto x = 0.
3
3
2
0
FONTE: O autor (2014).
Análise do resultado do teste final.
382
Um dado notável na figura acima é a falta de progresso substancial de dois estudantes
que tiveram três faltas nas sessões experimentais.
Com o resultado da figura acima, apresentamos abaixo um quadro numérico
comparativo entre o desempenho dos oito estudantes no teste diagnóstico e no teste final com a
intenção de dar um panorama geral entre o ponto de partida e o de chegada, não no sentido de
validação estatística do resultado, pois nosso trabalho foi de natureza qualitativa. Nas sessões já
apresentadas, tentamos mostrar o que realmente o experimento tentou identificar e, no nosso
método, não preconizamos o método estatístico. Essa comparação foi feita apenas com oito
estudantes que participaram dos dois testes e que faltaram no máximo a três sessões (25% das 12
sessões da pesquisa), como indicado no quadro 7, sobre o registro da participação dos estudantes
às sessões experimentais. Nesse teste, restringimos a participação porque consideramos que
outros elementos poderiam influenciar as respostas e não tínhamos meios de identificá-los.
Observamos ainda que houve a necessidade de retomar as tarefas do teste diagnóstico e separar
os oito estudantes que participaram de forma mais ativa da pesquisa para efetuar a comparação
aqui proposta.
QUADRO 10 – QUADRO DE RESPOSTAS AOS TESTES DIAGNÓSTICO E FINAL
Tipo de
resposta
Tarefa
A B C D
Teste
1
Teste
2
Teste 1 Teste
2
Teste 1 Teste 2 Teste 1 Teste
2
1ª) 0 3/8
37,5
5/8
62,5
3/8
37,5
2/8
25
2/8
25
1/8
12,5
0
1b) 0 5/8
62,5
5/8
62,5
1/8
12.5
2/8
25
2/8
25
1/8
12,5
0
1c) 1/8
12,5
6/8
75
2/8
25
0 4/8
50
2/8
25
1/8
12,5
0
2ª) 2/8
25
6/8
75
1/8
12.5
0 4/8
50
2/8
25
1/8
12,5
0
2b) 1/8
12,5
4/8
50
4/8
50
2/8
25
2/8
25
2/8
25
1/8
12,5
0
2c) 2/8
25
6/8
75
0
0 5/8
62,5
2/8
25
1/8
12,5
0
2d) 0
1/8
12,5
0 2/8
25
7/8
87,5
5/8
62,5
1/8
12,5
0
2e) 1/8
12,5
3/8
37,5
4/8
50
3/8
37,5
1/8
25
0 2/8
25
2/8
25
3 1/8
12,5
2/8
25
3/8
37,5
3/8
37,5
3/8
37,5
2/8
25
1/8
12,5
1/8
12,5
4 0 3/8
37,5
5/8
50
3/8
37,5
2/8
25
2/8
25
2/8
25
0
FONTE: O autor (2014).
383
A parte amarela do quadro acima indica as tarefas não explicitamente trabalhadas nas
sessões experimentais.
Com as mudanças apresentadas nas tarefas de intervenção, que exigiam a utilização do
“software”, foi possível verificar que os estudantes que ativamente participaram da sessão
melhoraram suas performances, quando da resolução da tarefa aplicada após a intervenção, ou
seja, eles ampliam suas relações pessoais ao objeto derivada de uma função real a valores reais e
em geral, das noções de base do Cálculo, como os conceitos de limite de funções, continuidade,
propriedade de funções limitadas e o conceito de conjunto-imagem. Com exceção das duas linhas
amarelas, onde a intervenção não foi explícita, notamos que, na globalidade, houve evolução no
desempenho dos estudantes participantes das sessões. Todos os estudantes que tiveram boa
participação das sessões, com menos de três faltas, conseguem dar respostas razoáveis às tarefas
apresentadas. Desse resultado, podemos considerar que o experimento teve o efeito positivo na
aprendizagem dos estudantes. A estratégia adotada de articular o software computacional com as
práticas usuais funcionou adequadamente. Mais adiante, desenvolvemos as considerações sobre a
intervenção.
A figura a seguir contém as impressões com que os oito estudantes participantes das
sessões ficaram:
FIGURA 178 – OPINIÕES DOS ESTUDANTES SOBRE AS SESSÕES EXPERIMENTAIS
Tarefa 5: Escreva os seus comentários sobre as discussões feitas no grupo.
a) O que você aprendeu
destas discussões?
b) O que você mais
gostou das discussões
feitas? Por quê?
c) Do que você não
gostou das discussões
feitas? Por quê?
d) Escreva suas sugestões
para melhoria das possíveis
próximas discussões.
Uso do Geogebra para
estudar limites
Demonstração do
domínio e
contradomínio.
Nenhuma coisa,
porque aprendi muita
coisa.
Trabalhar individualmente
para se familiarizar com o
programa.
Uso do Geogebra para
estudar a Matemática:
limites, continuidade;
derivada; e uso da derivada
para estudar a continuidade
Mais tempo ao aluno
para discutir com o
colega; melhoria na
compreensão do
Cálculo Infinitesimal
Desaparecimento de
colegas.
Mais trabalho; ir às escolas
dar palestras.
Uso do Geogebra Usar o Geogebra no
estudo da Matemática
Nenhuma coisa,
porque tudo foi útil.
Produzir certificados para
motivar os que não querem.
Uso do Geogebra para
interpretar limites,
continuidade e limitação
Interpretação de limites;
melhoria na
compreensão.
Nenhuma coisa. Aumentar mais um
encontro. Um dia não chega.
Evitar sessões longas.
Trabalhar funções a partir
do computador; estudo de
continuidade e derivada
Liberdade de expressão
e respeito da opinião de
cada estudante.
Gerência do tempo. Rigor no horário.
Uso do Geogebra para
estudar limites,
Estudo da derivada e da
continuidade
Uso do seletor
porque é a primeira
Esclarecer melhor o uso do
seletor.
384
continuidade e derivada
num ponto
vez.
Que nos extremos a
derivada é nula.
Derivadas; uso de
diferentes maneiras
para determinar a
expressão da derivada.
Nos primeiros dias
por falta do domínio
do programa.
Pontualidade; saber gerir o
tempo; trabalhar
individualmente para dar
mais tempo no
aperfeiçoamento do uso do
programa.
Relacionar com os colegas,
usar o computador,
animação, definição do
limite em um ponto
Estudo de limites com o
computador permitindo
uma maneira diferente
de ver.
Por ser poucos dias
por semana.
Continuar com as
discussões, no mínimo duas
vezes por semana.
FONTE: O autor (2014).
De um modo geral, os estudantes manifestam terem aprendido a usar o computador para
estudar algum tema da Matemática; terem aprendido uma outra maneira de estudar a Matemática
que favorece discussão e troca de experiências entre eles. Indicam ainda que a gestão do tempo
das sessões não foi adequada. Em relação à duração das sessões, eles podem ter razão, porque as
aulas têm a duração de uma hora e as sessões em média duravam 1h30min, o que pode ter sido
algo pesado para eles - não habituados a esse horário. Outros lamentam as dificuldades de
pontualidade por parte deles, falta às sessões ou não comparecimento a elas pelos demais colegas.
As sugestões acenam com a necessidade de se melhorar a gestão do tempo, cabendo ao professor
mediador: proporcionar acesso individualizado ao computador para ter mais tempo de prática
com o software, aumentar o número de sessões por semana, esclarecer melhor alguns aspectos
técnicos no uso do computador, produzir certificados para motivar a participação e trabalhar
mais, ir às escolas dar palestras sobre o uso do instrumento aqui analisado.
Avaliamos as opiniões como muito positivas em termos do que foi feito e sobre o que
deve ser melhorado na implementação das discussões desse tipo. Consideramos a sugestão de
irmos às escolas para dar palestras sobre o uso do recurso computacional nos processos de ensino
e de aprendizagem da Matemática como sendo pertinente e, em parte, vem ao encontro dos
objetivos da nossa pesquisa, que visam avaliar a efetividade do uso do computador na sala de
aula de Cálculo.
Com estas observações, encerramos a apresentação da parte I da sessão 11, e passamos
apresentando a parte II: introdução ao estudo da integral de Riemann.
Essa introdução teve o objetivo de levar os estudantes ao reencontro com os conceitos
iniciais de soma de Riemann, por meio de construção de partições de um intervalo, de retângulos
aproximantes, de somas aproximadas por excesso e por falta de áreas desses retângulos, com
385
recurso à prática de cálculo de áreas de retângulos (base altura), articulado com as ideias de
supremo e ínfimo de uma função contínua num intervalo fechado e limitado.
Como indicamos anteriormente, a integral definida não é parte do conteúdo do Ensino
Médio geral em Moçambique (como a análise dos programas de ensino mostrou), com exceção
do curso técnico profissional, que estuda este tema no nível médio.
Assim sendo, consideramos que, para os estudantes resolverem algumas tarefas iniciais
relacionadas ao tema, eles precisariam ter uma informação básica sobre esse conteúdo. Foi assim
que decidimos começar com a introdução de alguma informação inicial sobre a partição de um
intervalo e a soma de áreas de retângulos aproximantes. As questões discutidas nesta parte já têm
sua análise a priori na secção 7.2 Análise a priori das tarefas usadas no experimento.
Assim, passamos apresentando algumas passagens da introdução desse tópico.
FIGURA 179 –SOMAS DE ÁREAS APROXIMADAS: INTRODUÇÃO
P – Vamos começar a ver outra coisa. Eu vou começar apresentando algumas coisas, vocês vão continuar.
[…]
P – Temos uma função f definida num intervalo I = [a, b]. Obtemos no intervalo um conjunto de pontos. Estes
pontos definem a partição do intervalo I. (Distribui a ficha):
Tarefas introdutórias apresentadas:
Tarefa 1:
Uma partição do intervalo [a, b] é um subconjunto
finito de pontos P = {t0, t1, t2, …, tn} tal que a P e b
P. A notação usada será sempre de modo que a = t0 < t1
< t2 < t3 < … < tn-1 < tn = b. O intervalo [ti-1, ti], de
comprimento ti – ti-1, é chamado de i-ésimo intervalo da
partição P.
Tarefa 2:
Um gráfico de uma função f: [-2, 2] IR, está dado ao
lado.
a) Determine m = inf(f). Justifique
M = sup(f). Justifique
b) Considere a partição P de I,
P = {-2, 2
,
4
, 0,
4
,
2
, 2}. Usamos as notações
mi = inf{f(x); ti-1 < x < ti}, Mi = sup{f(x); ti-1 < x < ti}
e i = Mi - mi para indicar o ínfimo, supremo e
oscilação de f no i-ésimo intervalo de P,
respectivamente.
Quando f é contínua, mi e Mi são valores efetivamente assumidos por f em [ti-1, ti]. Em particular, neste
caso, existem xi, yi [ti-1, ti] tais que i = |f(yi) – f(xi)|.
Ainda temos que:
A soma inferior de f relativamente à partição P é o número s(f, P) =
n
1i
1iii )( ttm .
386
A soma superior de f relativamente à partição P é o número S(f, P) =
n
1i
1iii )( ttM .
No caso da figura acima calcule:
s(f, P)
S(f, P)
S(f, P) – s(f, P) =
n
1i
1iii )( ttω
Destaque na figura, usando cores diferentes, cada uma das somas: s(f, P), S(f, P) e
n
1i
1iii )( ttω .
O pesquisador prossegue:
P – Aqui tenho um intervalo de menos dois até dois: (fala da tarefa 2). O que acontece? Vejam a partição que eu
fiz.
Apresenta: Considere a partição P de I, P = {-2, 2
,
4
, 0,
4
,
2
, 2}
P - O intervalo foi divido em seis partes. Claro, temos ponto inicial e ponto final. O intervalo foi particionado
desta maneira. Claro que vamos relacionar com aquela função ali:
f(x) = 2sen(2x) + 3, com I = [-2, 2].
P – Esta função definida no intervalo menos dois até dois é uma função limitada. Limitada por quê?
As – Porque as imagens estão naquele intervalo limitado.
P – Porque as imagens estão naquele intervalo limitado. O intervalo no qual as imagens estão não é só limitado, é
fechado também. Então como as imagens estão num intervalo limitado e fechado, e a função é contínua, então ela
tem um máximo e um mínimo naquele intervalo. (Teorema de Weierstrass).
Em relação ao gráfico da função, o pesquisador convida um estudante:
P – Gogo, vai lá apontar o máximo e o mínimo daquela função, naquele intervalo.
O Gogo aponta (/4; 5) como o mínimo e (-/4; 1) como o máximo.
P – É isso?
AAs – É ao contrário.
P – O maior valor que a função assume é este aqui (aponta (/4; 5)) e o menor valor que ela assume é este aqui
(aponta (-/4; 1)). Ou seja, este mínimo é a maior cota de todas cotas inferiores. E este (o máximo) é a menor cota
de todas cotas superiores. Então por que nós precisamos desta ideia de limitação? Por exemplo, se eu tenho a
partição do intervalo I, que é esta aqui P = {-2, 2
,
4
, 0,
4
,
2
, 2}. Então se faço a partição do intervalo I,
tenho intervalinhos. Por exemplo, este intervalinho aqui ([-2, -/2]). Como a função é contínua, neste intervalinho
ela tem um máximo e um mínimo. Estou a falar deste pedaço aqui, de extremos (-2, f( -2)) e (-/2, f( -/2)).
Alguém pode vir apontar, um máximo e um mínimo de cada intervalinho?
Um estudante vai ao quadro e aponta, corretamente, um mínimo e um máximo de cada intervalinho.
P – Ok. Então em cada intervalinho há um máximo e um mínimo. Então a nossa tarefa é calcular a área por baixo
deste gráfico aqui.
O pesquisador pinta a área por baixo do gráfico, como a figura 2a abaixo.
P – Como calcular?
Silêncio.
P – Para calcular esta área começa-se com as
aproximações (faz o desenho da figura 2b ao
lado). Uma área que está acima da área que nós
queremos calcular, e uma área que está abaixo
da área que nós queremos calcular. Então a
partir da figura, vemos que há dois tipos de
somas que podemos fazer
387
P – Soma inferior, em que fazemos a aproximação da área requerida, por defeito; e soma superior, em que
fazemos as aproximações da área requerida por excesso. […]
P – Então, soma inferior, como estamos a somar as áreas dos retângulos, como calculamos cada área?
As – Comprimento vezes largura.
P – Comprimento vezes largura, ou também podemos dizer base vezes altura. Aqui quanto é? (A base do 1º
retângulo, à esquerda).
Silêncio.
P – Menos pi meios, menos menos dois, para calcular o comprimento deste pedaço aqui [-2, -/2]. Para
multiplicar com esta altura aqui f(-/2) (aponta no desenho). Eu sei que aqui é o mínimo (-/2, f( -/2)). (Extremo
inferior do gráfico no intervalinho considerado). Como calculo este mínimo? É f de menos pi meios. Então
continuo: … então a situação continua: (Analisa da mesma maneira para todos retângulos inferiores). Neste
intervalinho aqui (1º à direita do zero), o mínimo está aqui (à esquerda do intervalinho dado, contrariamente ao
que acontecia antes, pois nesse caso o mínimo estava à direita do intervalinho em virtude de a função ser
decrescente nesse intervalo). Continuo: aqui (segundo intervalinho) onde está o mínimo? Como calculo a área
inferior tenho que pegar o mínimo, não é? Sim, calculo a área aproximada por falta. Usando calculadora aparece
este resultado aqui (o pesquisador exibe o resultado que já traz feito):
s(f, P) =
6
1
1
i
iii ttm )( =
2
f (
2
+2) +
4
f (
4
+
2
) +
+
2
f (0 +
4
) + ))(( 0
40
f + )(
422
f + )(
222
f = (usando calculadora) (2sen(-) + 3)
0,4292 + 2 (2sen(2
) + 3)
4
+ (2sen(0) + 3 + 2sen() + 3)
4
+ (2sen(4) + 3) 0,4292 = (3 0,4292) + (2
4
) + (6
4
) + (1,4864 0,4292) 8,2087.
P – Agora, soma superior: temos ainda a mesma partição. Quero calcular a área por excesso. Então vou pegar o
mesmo pedaço, não é (largura do 1º retângulo à esquerda)? Por excesso quero dizer que vai estar acima do que
pretendemos. Como vou calcular esta altura?
As – f de menos dois.
P – f de menos dois. Não vou pegar o último extremo. Naquela altura estava a calcular o mínimo. Agora preciso
de usar o máximo da função naquele intervalinho. Então eu continuo assim, … assim estou a calcular a área por
baixo do gráfico, aproximada por excesso. Então a soma superior, por aproximação, dá mais ou menos este valor
aqui (mostra o valor já calculado).
S(f, P) =
6
1
1
i
iii ttM )( = f(-2) (2
+2) + 2 f(
2
)
4
+ 2 f(
4
)
4
+ f(
2
) (2
2
) =
= (2sen(-4) + 3) (2
+2) + 2 3
4
+ 2 5
4
+ 3 (2
2
) =
15,7912
O pesquisador comenta que nos cálculos feitos alguns dados poderiam ser lidos diretamente da figura dada.
P – Podemos calcular a oscilação também, que é a diferença entre soma superior e soma inferior.
É apresentado o cálculo da oscilação:
S(f, P) – s(f, P) =
6
1i
1iii )( ttω =
2
2
π
2
πf2f + 2
2
π
4
π
4
πf
2
πf + 2
0
40
4
ff +
222
2
ff = [2sen(-4) + 3) – 3] 0,4292 + 2 2
4
+ 2 2
4
+ [3
– (2sen(4) + 3)] 0,4292 = 1,5136 0,4292 + 2 + 0,6496 = 7,5830.
P - Podemos obter o mesmo resultado fazendo simplesmente:
S(f, P) – s(f, P) 15,7912 – 8,2087 = 7,5825.
388
P – Notem bem, (analisa o primeiro retângulo à esquerda). Esta é a área por excesso, e esta é a área por falta
(aponta cada uma das áreas referidas). Há uma diferença entre estas duas áreas. Esta diferença chamamos de
oscilação da função neste intervalo aqui [-2, 2] … Cada pedaço destas tem área por excesso, área por falta e
oscilação. (O pesquisador mostra os valores calculados na 1ª partição). As páginas 6, 7 e 8 são simples (referem-
se às páginas da ficha com questões para os estudantes. Continuação da ficha de tarefas apresentada acima).
Então vocês vão responder isso.
A ficha com questões é a seguinte:
Parte II
Nome ______________________________________, Beira ___/___/2013
1. Considere o gráfico de f: [0, 1] IR, dada por f(x) = x2.
Considere as partições Pi de [0, 1].
P1 = {0, 2
1, 1}, P2 = {0,
4
1,
4
2,
4
3,1}, P3 = {0,
8
1,
8
2,
8
3,
8
4,
8
5,
8
6,
8
7, 1},
Vemos que P1 P2 P3. E assim o processo pode continuar. Quando isso acontece dizemos que a partição Pi
refina a partição Pi-1. No nosso exemplo, P2 refina P1, P3 refina P1 e P2.
Como no exemplo anterior, calcule os números s(f, Pi), S(f, Pi) e , e ilustre esses cálculos fazendo um
desenho ao lado, de preferência usando cores diferentes para cado número:
Usando a partição P1, P1 = {0, 2
1, 1}
s(f, P1)
S(f, P1)
S(f, P1) – s(f, P1) =
2
1i
1iii )( ttω
Usando a partição P2: P2 = P2 = {0, 4
1,
4
2,
4
3,1}
s(f, P2)
S(f, P2)
S(f, P2) – s(f, P2) =
4
1i
1iii )( ttω
Usando a partição P3:
P3 = {0, 8
1,
8
2,
8
3,
8
4,
8
5,
8
6,
8
7, 1}
s(f, P3)
S(f, P3)
= S(f, P3) – s(f, P3) =
8
1i
1iii )( ttω
a) Escreva sua conclusão, o que acontece neste caso com a soma inferior, soma superior e com a oscilação
389
quando se refina a partição P.
b) A sequência si de somas inferiores de f relativamente à partição P, quando se refina P, é monótona,
crescente e limitada. Portanto tem supremo, ou seja: Psup s(f, P) existe para todas as partições do intervalo
[a, b]. Do mesmo modo Pinf S(f, P) existe.
Calcule: P
sup s(f, P) ),(inf PfSP
c) Determine a área exata da região sob o gráfico de f.
P - É isso que eu estava a esclarecer. Por exemplo, soma inferior, como é? Cada um pega e calcula. A não ser
que não tenham percebido o que eu esclareci.
FONTE: O autor (2014).
Algumas observações sobre a introdução de partição de um intervalo e de somas de
áreas de retângulos aproximantes.
Na introdução, tentamos manter as ideias matemáticas importantes para este tópico que
são os conceitos de supremo e de ínfimo da função contínua f em cada intervalo Ii = [xi – xi-1] e
de área de retângulo, para dar sentido e significado ao procedimento de cálculo e ao valor obtido.
Consideramos que, ao destacar os conceitos de supremo e ínfimo da função f em cada intervalo,
estaríamos relacionando o procedimento de cálculo com as propriedades da função; os retângulos
envolvidos não são retângulos quaisquer, mas sim retângulos que estão intimamente relacionados
com a função.
Feita a introdução, seguida de algumas explicações adicionais das dúvidas que surgiram
para alguns estudantes, estes trabalharam individualmente na ficha apresentada acima com as
tarefas do mesmo tipo.
Algo interessente nesta introdução é que os estudantes falam explicitamente da
propriedade de funções limitadas já aprendida nas sessões anteriores e dominam também o
conceito de continuidade de uma função em um ponto ou em um intervalo. Essas são algumas das
noções fundamentais para introduzir a integral definida.
Algumas respostas dos estudantes são apresentadas a seguir:
390
FIGURA 180 – EXEMPLO (I) DE RESPOSTAS PARA AS ÁREAS APROXIMADAS
FONTE: O autor (2014).
Na resposta acima, o estudante entendeu a estratégia usada, mas cometeu alguns erros na
adição de frações30
. Ao que parece, deve ser um engano, pois em cálculos similares resolveu
corretamente.
FIGURA 181 – EXEMPLO (II) DE RESPOSTAS PARA AS ÁREAS APROXIMADAS
FONTE: O autor (2014).
30 Trata-se de um conhecimento suposto disponível e que não foi considerado na análise a priori, mas isso
parece mostrar uma dificuldade recorrente em Moçambique e no Brasil, apesar das diversas pesquisas existentes.
391
O estudante da resposta acima consegue perceber a necessidade de colocar o valor
comum em evidência, uma estratégia importante que conduz a uma forma geral de calcular somas
dessa natureza, ou seja, para a generalização. Contudo ele comete alguns erros, pois no nível de
aproximação em que trabalha, n = 8, não se alcança a igualdade das duas somas. A igualdade só é
alcançável quando se obtém o máximo da sequência das somas inferiores e o mínimo das somas
superiores. E esses valores são alcançados como limites no infinito. O estudante não entende
ainda esse fato, daí que preconizamos abordá-lo com o recurso computacional.
FIGURA 182 – EXEMPLO (III) DE RESPOSTAS PARA AS ÁREAS APROXIMADAS
FONTE: O autor (2014).
Consideramos que as respostas dos estudantes dão alguma indicação de que eles
percebem o procedimento básico que conduz à definição de somas de Riemann e, por
consequência, da integral correspondente, uma vez que elas são as esperadas, segundo o que
apresentamos na análise a priori, embora tenha sido o primeiro momento, na perspectiva de
Chevallard (1997), do encontro dos estudantes com a organização matemática estudada.
Observamos que o processo de refinamento das partições do intervalo I, facultado pelo material
especialmente preparado para o efeito, corresponde à ideia-chave da integral de Riemann,
segundo Labarre (2008). O estudante deve perceber esse precesso.
A análise de partições, de retângulos aproximantes e a soma de suas áreas
correspondentes marcaram o fim da sessão 11, reservando para a sessão 12 a continuação da
análise das mesmas somas com o recurso ao software Geogebra. Assim sendo passamos
apresentando a sessão 12.
392
8.11 SESSÃO 12: 19.06.2013
Participaram da sessão 8 estudantes.
A sessão tinha os seguintes objetivos:
Levar os estudantes a:
- estabelecer os conceitos iniciais de somas e integral de Riemann mediante a construção
e observação de padrões de sequências de somas de áreas de retângulos aproximantes no
computador;
- determinar o valor da integral definida com recurso ao computador;
- comparar os resultados obtidos pelo computador e os obtidos pela aplicação do limite
da sequência de somas das áreas dos retângulos aproximantes para uma função quadrática num
intervalo I.
As tarefas preparadas para a sessão são apresentadas abaixo, e as escolhas que
consideramos pertinentes para encaminhar a tarefa já foram destacadas na seção 7.2.2 Parte II:
Noções de base para a Integral de Riemann.
Antes do início das discussões, o pesquisador escreve o seguinte roteiro na lousa para os
estudantes usarem na produção e análise da tarefa em estudo:
Função: f(x) = If[0 <= x <= 1, x^2];
Extremidades do intervalo: a = 0 b = 1;
Seletor: k = [0, 32], passo 1;
Número de retângulos n = 2^k;
Base do retângulo xΔ = (b – a)/n;
Soma inferior (si) = lowersum(f, a, b, n);
Soma superior(Ss) = uppersum(f, a, b, n).
Depois deste roteiro, o pesquisador distribui a seguinte ficha com as tarefas para os
estudantes trabalharem, como sempre, em duplas.
FIGURA 183 – INTRODUÇÃO À SOMAS DE RIEMANN COM RECURSO AO GEOGEBRA
Grupo: 19/06/2013
Tarefa 1: Consideremos a função f: IR IR, definida por f(x) = x2. Consideremos o intervalo I = [0, 1] do
domínio de f. Com recurso ao Geogebra, vamos aproximar a área por baixo do gráfico de f na região do
intervalo I, por falta e por excesso. À medida que construímos essas áreas vamos preenchendo a tabela.
Legenda da tabela:
393
n – número de subdivisões (subintervalos)
xΔ = n
ab =
n
1 - comprimento de cada subintervalo [xi-1, xi] em I
Si =
n
i
ixxf
1
1Δ )( - soma inferior (soma das áreas dos retângulos “inscritos” ao gráfico de f em I).
Ss =
n
i
ixxf
1
Δ )( - soma superior (soma das áreas dos retângulos “circunscritos” ao gráfico de f em I).
i = Ss - Si - oscilação da função no intervalo I.
Como exemplo, preenchemos para n = 1 e n = 2, …, n = 32. Continue a preencher a tabela para outros valores
de n.
n = 1
n = 2
n = 32
n 1 2 32
xΔ = n
1
1
0,5
0,0313
Si =
n
i
ixxf
1
1Δ )(
0
0,125
0,3179
Ss =
n
i
ixxf
1
Δ )(
1
0,625
0,3491
i = Ss – Si 1 0,5 0,0312
Reflexões
a) Analise o que acontece quanto à monotonia para cada um dos seguintes elementos:
n ________________________________________________________________________________
xΔ _______________________________________________________________________________
Si ________________________________________________________________________________
Ss________________________________________________________________________________
b) As respostas da a) estão relacionadas. Tente encontrar o significado dessas respostas quando
comparadas com o número e os tamanhos dos retângulos envolvidos nas diferentes iterações.
c) Qual deve ser a área exata da região em análise? Por quê?
d) O que deve significar tal área exata para esta situação?
e) Supondo que não temos o Geogebra, elabore uma forma algébrica que nos permita determinar o
mesmo resultado.
Tarefa 2: Considere a função f : IR IR, definida por f(x) =
Qxse
Qxse
0
1
394
chamada função de Dirichlet.
a) Usando Geogebra, elabore o gráfico de f. Justifique sua resposta.
b) Considere o intervalo I do domínio de f: I = [1, 5]. Como na atividade 1, determine a área sob o gráfico
de f na região do intervalo I. Redija sua conclusão a respeito da caraterística desta atividade quando comparada
com a atividade 1. FONTE: O autor (2014).
Assim passamos a apresentar algumas passagens do decurso da sessão.
Recorte de algumas sequências de diálogos ocorridos na sessão.
FIGURA 184 – ÁREAS APROXIMADAS NO GEOGEBRA E ALGUMAS REFLEXÕES
P – Agora é para preencherem isto. Depois vamos tirar as conclusões. Por exemplo, é só ver todos os elementos
que estão lá. Temos soma inferior, soma superior. Temos delta, temos n. Temos a oscilação. Bem, vou deixar
neste lado aqui (o pesquisador refere-se ao roteiro que deixa num canto da lousa) para estar tudo claro. Temos
aqui (refere-se à figura para n = 1), significa que a região (sob o gráfico) está dividida em uma parte só. Como a
gente estava a dizer, para eu determinar a soma superior, como a nossa partição é sobre este intervalo ([0, 1]),
significa que, se eu quero a soma inferior, eu pego o extremo inferior.
AAs – Temos um (largura do retângulo) vezes f de zero. Então vai dar esta área, esta linha aqui (um estudante
aponta a linha [0, 1]). Um estudante faz: s(f, P1) = 1 f( 0) = 1 0 = 0.
P – De fato, é aquela soma inferior que está lá. E a soma superior?
As – Vai ser um, vezes f de um.
P – Não é?
As – Sim. (Escrevem S1(f, P1) = 1 f( 1) = 1 1 = 1).
P – Então vai ser essa área (escreve como os estudantes S(f, P1) = 1 f( 1) = 1 1 = 1). Então é assim como vão
preencher esta folha aqui. A primeira parte já está preenchida, como exemplo. Para n igual a 1, o delta qual é?
As – 1.
P – O delta é o comprimento desta divisão (n
abxΔ
). Então temos lá s1, na primeira coluna está preenchido.
Vocês vão continuar, para n igual a 2, qual o delta, qual si, soma inferior, qual é a soma superior, qual é a
oscilação.
1AG1 – A oscilação.
P – A oscilação é a diferença entre Ss e Si, …
Os estudantes trabalham nos respectivos grupos.
[…]
G2 – Delta já é constante. … só muda o n, …
Nessa fase os estudantes têm os resultados
numéricos e o gráfico correspondente, como se vê
na figura ao lado.
[…]
P – […] O tamanho dos retângulos o que
acontece? E como consequência como é que é Si e
Ss? Como é a soma inferior? Soma superior nessas
condições? Tem consequências. Tem algumas
consequências. Então quais são as consequências?
Então vocês devem falar sobre n, devem falar
sobre delta, devem falar sobre soma inferior,
devem falar sobre soma superior. […]
P – Qual será a área exata desta parte aqui por baixo do gráfico (de f(x) = x2), no intervalo I = [0, 1]). Vocês já
estão a ver, não é? Cada um deve tentar mostrar qual deve ser a área exata.
Até a este momento os estudantes têm a tabela preenchida como a seguinte, acompanhada com a imagem gráfica
correspondente:
395
[…]
P – Quem tem uma ideia qual deve ser a área exata dessa parte? (Sob o gráfico). Cada um vai tentar escrever o
que pensa. Alínea c) não é? A partir do que vocês estão a ver, a tendência do que acontece para a soma superior,
para soma inferior. Qual será a área exata? Daquela região?
O mesmo estudante da pergunta anterior, Nicolau (G2) – Qual é a área exata?
P – Qual é a área exata, é o que eu estou a perguntar, o que vocês estão a ver a partir do que vocês preencheram
aqui (na tabela). […] Como é que é Si, e Ss neste caso? Não tem nenhuma ideia qual deve ser a área exata, ou há
um grupo que tem uma ideia sobre qual deve ser a área exata?
Micas (G1) – Eu tenho.
O Micas tem as seguintes respostas para a), b) e c):
396
Micas – Para mim (explica as respostas dele), a área exata será a parte da soma inferior.
P – Sim.
Micas – Porque cada vez mais que aumentamos o valor de n, estamos a ver que a soma superior diminui que é a
parte total neste caso. E chega num instante em que a parte superior já não existe. E a parte inferior totalmente
completa o gráfico.
P – Ok. Então, qual é o número que indica a área? A área exata é igual a quê?
Micas – Será igual a zero vírgula três mil, trezentos e trinta e três (0,3333).
P – A área exata será igual a?
Micas – Zero vírgula três mil trezentos e trinta e três.
P – Bem, esta é a resposta do Micas, não sei outros grupos o que dizem?
Silêncio
P – Outros grupos o que dizem?
Silêncio
P – Nicolau e Vinagre (G2) o que vocês dizem segundo o que vocês observaram?
G2 – Ainda estamos a analisar.
P – Ainda estão a analisar? Ok, analisem.
G4 – Ainda estamos a analisar.
P – Ok. Ok. […]
P – Gogo e Samson, qual deve ser a área exata segundo as vossas observações? Segundo as vossas observações,
qual deve ser a área exata? FONTE: O autor (2014).
Consideramos que a estratégia usada para estudar o procedimento de construção de
aproximações de somas por excesso e por falta com recurso ao computador tenha sido efetiva,
pois é conseguido um resultado aproximado muito bom para a área exata. As imagens visuais
gráficas, numéricas e algébricas mostram efetivamente o que se pretende construir: as ideias de
397
aproximação (o refinamento da partição) e suas implicações na qualidade da aproximação. Temos
a percepção de que o computador auxiliou bastante na caracterização do objeto matemático
visado ao prover informações visuais gráficas e numéricas das aproximações. Podemos formular
nossa percepção na perspectiva de Rabardel (2002, 1995), destacando que o recurso
computacional ampliou as possibilidades de representação da própria ação dos estudantes e do
objeto de atividade. Para se perceber bem essa nossa afirmação, é só imaginar como seria
possível obter 32.768 retângulos num intervalo de 0 a 1, com cerca de 0,00003 cm de largura. O
resultado gráfico é efetivamente sugestivo de que a área sob o gráfico da função dada deve ser a
indicada, a saber 0,3333. Portanto, de acordo com Rogalski e Samurcay (1993 apud
RABARDEL, 2002, 1995), a ferramenta computacional desempenhou, nessa fase de atividade,
um verdadeiro papel de ferramenta cognitiva, pois a interação estudante-máquina propiciou que o
usuário vigiasse o processo de cooperação com a ferramenta como um todo e gerisse o alcance
dos recursos cognitivos à sua disposição. Neste caso, consideramos como recurso cognitivo à
disposição do estudante a retroação (feedback) que a máquina vai dando à medida que o
estudante age sobre ela.
Por outro lado, notamos algumas influências perturbadoras da aprendizagem correta,
decorrentes da informação provida pelo computador no que se refere à sua capacidade limitada
de apresentar as casas decimais corretas do resultado e à sobreposição das somas inferior e
superior que conduziu o estudante Micas, como vemos na sua intervenção, em que ele concluía
que a área superior aproximante estava desaparecendo. O estudante parece ter confundido a área
superior com a oscilação, pois esta é que realmente desaparecia no processo de aproximação da
soma superior com a inferior.
Na globalidade, consideramos que a estratégia foi efetiva no sentido de que
proporcionou uma construção com algum significado de elementos (somas aproximadas)
conducentes à definição formal da integral definida.
As passagens que se seguem mostram o diálogo que conduziu à formalização da integral
de Riemann.
FIGURA 185 – FORMALIZAÇÃO DA INTEGRAL DEFINIDA.
P – Então qual é a conclusão para a soma inferior quando o n aumenta?
Vinagre – A soma inferior aumenta também.
P – Soma inferior aumenta também.
Nicolau – Numa ordem crescente.
398
P – Numa ordem?
Nicolau – Crescente.
P – Então uma primeira observação é que a soma inferior é crescente. Ou melhor, a soma inferior forma uma
sucessão crescente de somas. Vou escrever assim: “As somas inferiores formam uma sucessão numérica
crescente”. (Escreve no quadro). Ok. O que acontece com as somas superiores?
Silêncio.
P – Começamos daqui, (n = 1), Gogo, qual é a soma superior quando n é igual a 1?
Gogo – É um.
P – Então eu vou aumentar para n igual a 2, qual é a soma superior?
Gogo – Zero vírgula seiscentos e vinte e cinco.
P – Aumento para quatro, como é que é agora?
As – Zero vírgula quatro seiscentos e oitenta e sete (parece que Gogo falou baixo).
P – Quando aumento para oito, qual é a soma superior?
Vinagre – Zero vírgula três mil novecentos e oitenta e quatro.
P – Aumento para 16?
As – Zero vírgula, três mil seiscentos e cinquenta e dois.
P – Então qual o comportamento das somas superiores?
As – Decrescem.
P – Quer dizer, as somas superiores formam uma sucessão decrescente. Vamos pôr aqui (no quadro. O
pesquisador escreve: “As somas superiores formam uma sucessão decrescente”). Ok. Vamos observar o detalhe.
Qual o valor mínimo que a soma inferior assume?
As – Zero.
P – Quer dizer, esta sucessão de somas inferiores tem um mínimo que é zero. Então vamos escrever aqui (no
quadro. O pesquisador escreve: “A sucessão de somas inferiores tem um mínimo que é zero”). … Por outro lado,
cada soma superior está sempre em cima de cada soma inferior (visível na tabela que os estudantes preencheram e
o pesquisador escreve isso no quadro). Cada soma superior é sempre maior que cada soma inferior.
Nito – É isso.
P – A sequência de somas inferiores tem um mínimo que é zero e, por outro lado, tem um limite por cima porque
não ultrapassa a soma superior. Significa que a soma inferior é limitada por cima pelas somas superiores.
AAs – A soma inferior é limitada.
P – A soma inferior é limitada sim. Vamos escrever aqui (no quadro. O pesquisador escreve: “A sequência de
somas inferiores é limitada”). É limitada por baixo e é limitada por cima. E é monótona.
Nicolau – É monótona crescente.
P – Segundo Nicolau, é monótona crescente. Então há um teorema que diz o seguinte: “Uma sucessão que é
monótona e limitada é convergente”. Não sei se vocês conhecem este teorema. Conhecem ou não?
Micas – Conhecemos um teorema que diz uma sucessão convergente é limitada.
P – Sim esse teorema existe. Uma sucessão convergente é limitada sim. É um outro teorema. É um teorema que
fala sobre uma sucessão convergente. Mas também uma sucessão que é monótona e limitada é convergente. Tem
um certo limite. Então sendo que estamos analisar a sucessão de somas de áreas, então esse limite vai significar o
quê?
AAs – Área exata.
P – Área exata. Esse limite para nós vai significar evidentemente a área exata. Então a área exata deve ser o limite
para o qual tendem as somas inferiores quando o número n aumenta indefinidamente. Então podemos escrever
isso: “A área exata deve ser o limite da sucessão de somas inferiores”. Vamos pôr Si aqui (na expressão interna da
soma), quando n tende para infinito. (O pesquisador escreve: n
lim si.)
P – Como eu obtenho uma soma inferior? Vejam que para s2, temos a soma, de i igual a 1 até 2, não é?
As – sim.
P – […] A base do retângulo é delta x. Delta x é isto aqui (aponta o comprimento de zero até ½ do segmento [0,
1]). Vezes f de quê? Como eu pego o extremo inferior do intervalinho i, então terei i menos um. Então tenho f de
x i menos um.
O pesquisador escreve: Área exata =
n)Δxf(xlim
1i1i
n. A discussão prossegue: […]
P – Talvez passar para n igual a 4, para se perceber o que se está a fazer. (O pesquisador fala o que corresponde a
399
cada divisão, apresentando um desenho):
Apontando sucessivamente a cada um dos pontos:
P – Aqui é um quarto, aqui é dois quartos, aqui é três quartos,
aqui é quatro quartos. Aqui por exemplo (ponto ¾) significa i
igual a 3. Para o extremo inferior teremos 3 – 1, três menos um,
exatamente este extremo aqui (extremo inferior do segmento [2/4,
3/4]). No outro intervalinho teremos 4 – 1, é este extremo aqui
(inferior de [3/4, 4/4]). Para calcular a área deste retângulo (4º
retângulo da soma inferior), terei de multiplicar por f de 3/4. Por
isso dizemos que este xi-1 que está lá é desta forma, i menos um
vezes delta x.
(Escreve xi-1 = (i – 1) xΔ ). Então vou substituir:
Área exata =
n
1in
Δx1)(iΔxflim
O pesquisador continua com o desenvolvimento:
Área exata =
n
i
xixfn
1
Δ1Δ )(lim =
n
i nif
nn 1
11
1)(lim =
n
i ni
nn 1
21
11
)(lim =
=
n
i ni
nn 1
212
11
)(lim =
n
iii
nn 112
23
1)(lim =
=
n
i
n
ii
n
ii
nn 1 11
12
23
1lim
P – Pois o somatório de uma soma é igual à soma de somatórios.
E prossegue com o desenvolvimento:
= 3
1
P – Então esta é a área exata.
Micas – É aquilo que nós tínhamos de zero vírgula três, três, três, três …
P – É isso zero vírgula três, três, três, etc.
Semo (G4) – Mas podemos calcular diretamente usando Geogebra?
P – Sim, podemos calcular diretamente usando o Geogebra. É isso, introduzir a função, chamar o comando
integral e escrever lá f de x, de zero a um, escrever os extremos zero e um.
Os estudantes calculam e obtêm o resultado de 0,3333.
P – Aqui estamos a dizer a área exata é igual a
400
Escreve: Área exata =
n
1i
1in
)Δxf(xlim
P – Então esta soma aqui, para nós é a integral, a gente escreve assim: “integral de zero até um, da função f de x.
Ou seja, integral de x ao quadro, dx.
Escreve ficando:
Área exata =
n
1i
1in
)Δxf(xlim = 1
0f(x)dx =
1
0dx
2x
P – Aquele dx entra na notação. Então aqui no Geogebra posso introduzir simplesmente f e os extremos. É por
isso que aparece este valor aqui (0,3333). Isso continua. O computador cortou aqui (outras casas decimais) por
causa da aproximação que eu introduzi aqui. Bem, está é a área exata. FONTE: O autor (2014).
Com a discussão apresentada na figura acima, foi formalizada a integral de Riemann
segundo os recursos disponíveis: o conhecimento dos estudantes, construído a partir das tarefas
anteriores, propriedade das sequências monótonas limitadas, as fórmulas de soma de quadrados
dos n primeiros inteiros e de soma dos n primeiros inteiros. Consideramos que esses recursos
foram explorados adequadamente, pois todos os argumentos matemáticos usados para chegar à
generalização foram sendo buscados das tabelas e das representações figurais em posse dos
estudantes. Consideramos que a articulação entre os resultados (tabelas e figuras) obtidos por
meio do computador e da análise teórica foi consistente, pois segundo Rabardel (2002, 1995), os
estudantes mostram ter-se adaptado às funções epistêmicas, pragmáticas e heurísticas do
instrumento, no sentido de este ter proporcionado a compreensão da tarefa, sua transformação
para a obtenção do resultado, orientação e controle das ações sobre a mesma.
A esse conjunto de processos, podemos interpretar como significando uma
aprendizagem, ou seja, a construção de conhecimentos pelos estudantes quando a mesma é
considerada, na perspectiva de Chevallard (1998), como sendo um trabalho com uma
determinada questão até produzir uma resposta satisfatória. A mesma posição é sustentada por
Robert (1992), ao destacar que a aprendizagem corresponde a pôr em funcionamento as noções
visadas nos exercícios ou nos problemas. Essa conduta constatamos nos estudantes, tanto no uso
do computador, na articulação entre o resultado obtido pelo computador e o preenchimento da
tabela, quanto nas intervenções que eles fazem sobre os resultados obtidos. Essas ações
correspondem às nossas expetactivas na análise a priori.
É nosso sentimento que a estratégia definida para o experimento foi interpretada
integralmente até esta última sessão: articular o recurso computacional com as práticas usuais na
introdução da derivada de funções reais a valores reais e da integral de Riemann.
401
Essa sessão aconteceu na última semana de aulas na Universidade e os estudantes
preparavam-se para uma prova de Cálculo Infinitesimal que ocorreria no sábado (22/06/2013).
Assim sendo, tínhamos de terminar o programa de experimentação com o fim da sessão 12. Para
nós, era interessante mais uma sessão para os estudantes praticarem o Cálculo de integrais
definidas com recurso ao Geogebra, embora tenham feito isso ainda nessa sessão terminal; uma
discussão sobre as funções não Riemann integráveis como tínhamos incluído na ficha entregue
aos estudantes o estudo da não integrabilidade à Riemann da função de Dirichlet. Não obstante a
falta de discussão desse último caso, consideramos que o plano estabelecido para o experimento
foi cumprido na sua grande parte, como tentamos mostrar por meio das análises das diferentes
sessões.
Pensamos ainda em aplicar um teste final sobre esta última parte do experimento, mas
como não tivemos mais tempo, decidimos aplicá-lo mais tarde, por intermédio de nossos colegas
de serviço na Universidade, o que veio a ser feito no dia 31/10/2013. Todavia, sem perda de
generalidade da validade do conteúdo do experimento, não incluímos neste trabalho os resultados
do teste da parte sobre a integral definida e seus conceitos de base.
Com estas observações, finalizamos a análise da sessão 12, que marca o fim do
programa de experimentação. A seguir, apresentamos algumas considerações sobre o trabalho
realizado nas onze sessões.
Algumas considerações sobre a intervenção
Como indicamos acima, a digressão pelas sessões mostra o que foi esse experimento
que, para nós, foi uma boa experiência, permitiu-nos viver a complexidade dos processos de
ensino e de aprendizagem da derivada de funções reais a valores reais e da integral de Riemann
com a incorporação da ferramenta computacional, articulada com as práticas usuais.
O experimento foi interessante do ponto de vista da compreensão das possibilidades
oferecidas pelo software Geogebra no estudo dos conceitos introdutórios da derivada de funções
reais a valores reais e da integral de Riemann e para avaliar como os estudantes podem reagir
com a presença desse instrumento na sua tarefa de aprender. Nessa conformidade, observamos
que a mediação didática com o software possibilitou aos participantes das sessões realçar as
questões de conteúdo matemático e de uma forma direta, o que no nosso entender é muito
402
importante, porque conduz a formular conjecturas muito específicas do ponto de vista de sentido
e de significado dos objetos de estudo.
Percebemos esse fato quando observamos, por exemplo, nas sessões 5-10, em que os
conceitos de derivada de uma função em um ponto e da função derivada emergem naturalmente
por meio de modelos geométricos articulados com as interpretações algébricas. Na sessão 7, por
exemplo, quando se obteve graficamente o resultado de 1,037 como declive da reta tangente ao
gráfico da função definida por f(x) = x3 – 6x
2 + 9x + 1 no ponto x = 3,16, houve necessidade de
uma verificação algébrica e o resultado foi o mesmo. Consideramos que trabalhar desse modo
consolida a compreensão dos estudantes em relação ao tema em estudo e capitaliza o espírito
heurístico na atividade matemática que, como defende Rabardel (2002, 1995), focaliza na
pesquisa de soluções. Para Chevallard (1999) e Bosch et al. (2004), esse modo de proceder
corresponde ao ensino e à aprendizagem no sentido forte do termo, pois implica a construção das
maneiras de fazer, que exigem a (re)construção de técnicas e de tecnologias, justificações e
explicações sobre o que se faz.
Assim, entendemos que observar a existência de um objeto matemático por meio de uma
de suas representações seja uma motivação para estudar com profundidade tal objeto. Na
verdade, como indicamos no capítulo 4, reportando-nos a Corrêa (2008), o problema com o qual
o ensino de Matemática se confronta não é o do rigor, mas sim, do desenvolvimento do
significado, da existência dos objetos matemáticos. No nosso entender, a mediação com o
computador pode ajudar esse relacionamento com as suas possibilidades de representação. Na
sessão 12, por outro lado, notamos que, por meio de uma mediação com o auxílio do computador,
a aquisição das ideias básicas da integral de Riemann surge quase naturalmente. Aqui, com o
termo naturalmente, queremos dizer que as mudanças que ocorrem no objeto de atividade
provocadas pelas ações dos estudantes envolvidos na interação com esse objeto, via computador,
são logicamente materializáveis, uma vez que essas ações originam mudanças provocadas e
observáveis que adquirem algum sentido e significado para os estudantes. As ideias de somas de
Riemann, os procedimentos matemáticos que conduzem a essas somas, como são: as definições
de supremo e ínfimo, as técnicas de cálculo de áreas de retângulos aproximantes e a modelagem
das aproximações são vividas e manipuladas pelos estudantes e, por causa disso, eles podem
formar uma representação correta e assim compreender bem a generalização subsequente.
403
As sessões mostraram também que há partes do conteúdo do Cálculo Diferencial e
Integral em que certas versões do Geogebra não respondem eficientemente aos procedimentos
requeridos. Esse fato chama-nos a atenção, como já o mencionamos, para certo cuidado na
preparação e mediação pedagógica, quando perspectivamos a incorporação da ferramenta
computacional nos processos de ensino e de aprendizagem de alguns conteúdos da Matemática.
Essas constatações colocam em evidência, se nos referirmos a Rabardel (2002, 1995), o
caráter antropocêntrico do uso de instrumentos que se apoia sobre as competências existentes dos
usuários e procura desenvolvê-las para resolver um problema proposto.
Por fim, destacamos que a articulação entre as possibilidades de um software, como o
Geogebra, e as diferentes estratégias de representação e interpretação do objeto matemático
visado torna os processos de ensino e de aprendizagem dinâmicos, com sentido e significado,
sendo algo que produz o resultado pretendido, em particular, quando se trabalha de forma
multidimensional.
Com essas últimas considerações sobre as sessões experimentais, passamos a apresentar
as conclusões do estudo.
404
9 CONCLUSÃO
Apresentamos neste capítulo as conclusões da pesquisa, buscando trazer as conquistas
alcançadas com nosso trabalho, as limitações, as reconsiderações e a relação entre os fatos
verificados, a teoria e o método utilizados para o seu desenvolvimento.
Estruturamos a apresentação em três etapas:
Etapa 1: sobre a análise das relações institucionais;
Etapa 2: sobre o estudo experimental, parte I: análise das relações pessoais dos
estudantes, mediante as respostas ao teste diagnóstico;
Etapa 3: sobre o estudo experimental, parte II: resultados e análises das sessões
experimentais.
A análise das relações institucionais via programa de ensino e livro didático
moçambicanos do Ensino Médio mostra que o saber a ensinar sobre a derivada de funções reais
de uma variável real e primitivas, construído nesses materiais, reflete alguma debilidade de
natureza tecnológica teórica, caracterizada pelas formulações inadequadas e imprecisas
conceitualmente; sugestões metodológicas inconsistentes quando confrontadas com a teoria
matemática existente sobre o Cálculo Diferencial e Integral.
Como indicamos na parte 5.1.1 do nosso texto, o programa avalia a complexidade de
uma lei de formação de uma função real a valores reais com base no seu argumento. Para o
programa, uma das dificuldades a evitar é usar um argumento composto, por exemplo: y = f(x +
a), y = g(bx) entre outros que são apresentados. Para nós essa sugestão não é correta quando não
há explicação adicional da natureza da dificuldade que esse argumento acarreta. O coeficiente a
no argumento da função f significa translação horizontal do gráfico da função y = f(x) em a
unidades para esquerda se a > 0 e em a unidades para direita se a < 0. O coeficiente b no
argumento da função g significa compressão horizontal do gráfico da função y = g(x) pelo fator
b, se |b| > 1 e expansão horizontal do gráfico da função y = g(x) se 0 < |b| < 1. Mais detalhes
sobre essas transformações podem ser obtidos do livro de Stewart (2011, p. 28-29, v. 1). Para o
caso do coeficiente b, observamos que, caso ele seja negativo, cada uma das transformações que
ele provoca é acompanhada de uma reflexão no eixo y = 0, se a função g é ímpar.
Observamos por outro lado que, no sistema educativo moçambicano, o ensino e a
aprendizagem sobre os efeitos dos coeficientes no argumento da lei de formação da função sobre
405
o gráfico da função e sobre a própria lei de formação da função, começam no ensino secundário
(no Brasil, anos finais do ensino fundamental) e continuam no ensino médio. Portanto, pensamos
que não é com a introdução do conceito da derivada ou da primitiva de uma função real a valores
reais que coeficientes no argumento podem constituir um problema de ensino ou de
aprendizagem desses conceitos. Pelo contrário, consideramos que a sugestão para evitar
expressões do tipo y = f(x + a) e y = g(bx) pode constituir um fator perturbador para a tomada de
uma decisão didática pertinente para o professor porque não há razões para essas restrições.
O programa ainda chama atenção de que o limite infinito de uma função em um ponto
como significando a não existência do limite dessa função no ponto em questão o que, no nosso
entender, não é correto matemática e didaticamente porque ele existe, chamado “infinito” e
representado pelo símbolo . Na matemática há um símbolo que designa a não existência de um
objeto matemático dado, que é o símbolo . Portanto, o limite infinito existe só que não é um
número, como já o mencionamos em referência quando referimos a Kaplan (1976, p. 346). No
nosso entender, o programa parece trazer uma confusão desnecessária entre o significado do
termo existir e não ser número. Se, por exemplo, tivermos )(lim xfax
= - e )(lim xfax
= + é um
dos casos em que diremos que o limite de f (x) quando x tende para a não existe. Mas se tivermos
)(lim xfax
= + e )(lim xfax
= + diremos que o limite existe e é +.
Numa das passagens, como tivemos ocasião de observar na seção 5.1, o programa diz
que o número e é o único número tal (ex)’ = e
x. E não deixa claro o contexto em que isso é válido
porque não menciona o conceito de função. No nosso entender, sem mencionar a noção de
função, pode acontecer que um estudante generalize a situação de forma inapropriada, fazendo o
seguinte, por exemplo: (e2)’ = e
2. O que não é correto.
Por isso, a nossa conclusão nessa parte do estudo é de que na organização didático-
matemática apresentada no programa de ensino, existem orientações de procedimentos com
imprecisões conceituais que podem conduzir o professor a tomar uma decisão didática
equivocada.
A situação de imprecisões, ambiguidades e equívocos conceituais é também observada
no livro do aluno correspondente:
406
- o modelo matemático que conduz à definição da derivada de uma função em um ponto
não é claro. Não é apresentado e não se sabe se esse modelo é uma função diferenciável ou não;
- confusão na caracterização da variação da função na tarefa introdutória à noção de
derivada de uma função em um ponto, em que aparecem as relações y = f(x1) – f(x0) e y = f(x0
+ x);
- imprecisão na apresentação do ostensivo gráfico que poderia ajudar na formulação da
definição do limite da razão incremental;
- especificação inadequada do ponto de derivação da função, como se apresenta na
expressão: f’(x) = x
xfxxf
x Δ
Δ 00
0Δ
)()(lim
. Nessa expressão o lado esquerdo mostra que estamos
derivando a função em todo x onde essa derivação é possível, o lado direito mostra que a função f
está sendo derivada no ponto x = x0.
Em função dessas incoerências praxelógicas, a nossa conclusão é de que os dois
materiais em referência não articulam adequadamente os blocos técnico-tecnológico e
tecnológico-teórico, o que nos leva a admitir que a organização matemática proposta nesses
materiais tende mais ao caráter de uma organização praxeológica pontual, segundo Chevallard
(1999), Bosch et al. (2004) e Bosch e Gascón (2004), o que significa demandar uma
reinterpretação, caso haja necessidade de sua utilização em alguma instituição de ensino,
deixando assim a cargo dos professores o amalgamento dessas praxeologias pontuais, o que, em
termos de níveis de codeterminação, corresponde à necessidade de o professor desenvolver um
trabalho que vá além dos níveis: temas e tópicos, pois ele deverá encarregar-se pelos níveis: setor
e domínios indicando, elementos de articulação intra e extramatemáticos.
Ainda admitimos que as partes do programa de ensino sobre a derivada e as primitivas, e
os capítulos correspondentes do livro do aluno, não cumprem plenamente os objetivos declarados
nesse mesmo programa que advogam o desenvolvimento de competências na resolução de
problemas da vida como sendo a prioridade do ensino da Matemática nas instituições escolares.
Portanto, a análise do contexto institucional moçambicano, via programa de ensino e
livro didático correspondente desvela esta realidade.
O estudo das relações institucionais, via livros didáticos usados no Ensino Superior,
destaca três tendências fundamentais:
407
Tendência 1: com o foco sobre as técnicas, articuladas com as aplicações em problemas
de contextos intramatemáticos, da vida real e da física, com uma demanda do conhecimento
disponível dos estudantes. Percebemos esta tendência no livro de Hoffmann e Bradley (1999). O
carácter ferramenta dos conceitos discutidos nesse livro é proeminente, e como já referenciado,
com poucos empreendimentos teóricos. No que diz respeito ao conceito da derivada, o livro
discute os pontos de vista geométrico, de taxa de variação (inclusive a velocidade), e ponto de
vista simbólico. Sobre a integral definida, o livro introduz a noção com uma definição, baseada
no conceito de antiderivada e no teorema de variação total, da seguinte forma, como tivemos
ocasião de ver no capítulo 6: “A integral definida de f, de a até b, é a diferença
b
aaFbFdxxf )()()( , onde F é uma antiderivada de f. Isto é, a integral definida é a variação
da antiderivada entre x = a e x = b” (HOFFMANN & BRADLEY, 1999, P. 273). Portanto, este
início de apresentação da noção de integral definida corrobora ao que dissemos sobre a
perspectiva de caráter ferramenta que esses autores consideram na apresentação dos conceitos
visados.
Tendência 2: com o foco na articulação entre o bloco técnico-tecnológico e o bloco
tecnológico-teórico, com uma visão ampla de contextos e multiplicidade de aplicações.
Observamos essa tendência no livro de Stewart (2011). Com efeito, na introdução da noção de
derivada, o autor destaca diversos pontos de vista: ponto de vista geométrico, ponto vista de
velocidade, de taxa de variação, de linearização local, microscópico e ponto de vista simbólico.
No que diz respeito ao conceito de integral definida, o autor começa com uma análise
pormenorizada do modelo de área, passando para o problema de movimento (distância
percorrida), e integrando este último, ao modelo anterior de área, terminando com a definição da
integral definida como o limite da sequência de somas de áreas de retângulos aproximantes. Após
a definição, o autor destaca o modelo lógico formal da integral definida, que, segundo ele: “O
significado exato do limite que define a integral é o seguinte: Para todo > 0, existe um número
inteiro N tal que
b
a
n
i
i xxfdxxf1
Δ)()( * para todo n > N e toda escolha de
ix ”. A
apresentação do autor é mesmo multifacética, articulando, adequadamente os aspectos
ferramenta e objeto dos conceitos visados.
408
Esses dois livros, Stewart (2011) e Hoffmann & Bradley (1999), integram
adequadamente os ostensivos da língua natural, algébricos e gráficos. E, ainda, sugerem
explicitamente, e com uma série de tarefas, a utilização de um software computacional.
Tendência 3: com o foco sobre o bloco tecnológico-teórico, em um contexto
intramatemático, com alto grau de abstração, e demandando o conhecimento disponível dos
estudantes sobre as técnicas do Cálculo Diferencial. Essa tendência é observada nos livros de
Ávila (2005) e de Sarrico (2005), por coincidência, editados no mesmo ano.
Com efeito, na introdução da noção de derivada, Ávila (2005) considera os pontos de
vista Geométrico, de taxa de variação, simbólico e lógico formal. Na introdução à integração à
Riemann, o autor começa com o modelo de área e depois faz uma ligação com a definição lógico-
formal.
No livro de Sarrico (2005), a introdução à noção de derivada considera os pontos de
vista geométrico, de taxa de variação (incluindo a noção de velocidade), simbólico e, destacando
em seguida, a formulação de Carathéodory da derivada. No que diz respeito ao conceito de
integração definida, Sarrico introduz destacando o modelo de área (implicitamente), passando
para a definição lógico formal fazendo uso das noções de somas de Darboux e de supremo e
ínfimo.
Os livros de Ávila (2005) e Sarrico (2005) destacam o carácter objeto dos conceitos
visados. Quer dizer, a elaboração é feita no sentido de discutir as definições adicionais e as
propriedades dos próprios objetos introduzidos, especialmente sobre as suas propriedades,
apresentadas em formas de teoremas, fortalecendo assim, seu estatuto conceitual, agregando mais
características e qualidades possíveis para a generalidade.
Vale observar que os livros de tendências 1 e 2 são livros de Cálculo, e os de tendência 3
são de Análise Matemática. Estes últimos privilegiam os ostensivos algébricos e não sugerem a
utilização de algum software computacional.
É verificado, nessa análise, o que Ávila (2005) registrou em seu livro que, para usá-lo
convenientemente, o estudante precisa rever as técnicas aprendidas no livro de Cálculo. Isso quer
dizer que o Cálculo é a porta de entrada da Análise Matemática.
A observação acima de Ávila (2005) é de extrema importância para o estudante, pois
enriquece sua relação pessoal com o conteúdo em jogo, e para o professor, pode implicar a
409
melhora da qualidade de tarefas para os seus estudantes e corresponde a uma indicação que pode
auxiliar o professor no tratamento dos níveis setor e domínio.
Observamos aqui que, em função da nossa opção por introduzir o software Geogebra
como elemento de reflexão, foi necessária maior atenção ao preparar as tarefas para a
experimentação, uma vez que, além de possibilitarem a utilização do software era preciso que
conduzissem os estudantes ao estudo comparado entre os ostensivos algébricos e gráficos.
A conclusão principal da análise de livros usados no Ensino Superior é de que eles
apresentam uma diversidade de perspectivas, acentuam sua apresentação na organização
matemática local, e que vale a pena articulá-los adequadamente nos processos de ensino e de
aprendizagem dos conceitos visados.
Com efeito, na preparação das tarefas para a experimentação didática, consideramos
seriamente essa articulação, discernindo as perspectivas teóricas, tecnológicas e técnicas dos
materiais analisados. No caso da derivada tínhamos que destacar os pontos de vista geométrico,
de velocidade, de taxa de variação, e simbólico, que são os mais destacados nos materiais
analisados. Por constrangimentos de tempo, não destacamos explicitamente os pontos de vista
lógico formal, de linearização local e microscópico da derivada.
Sobre a integral de Riemann, aqui de fato tínhamos que fazer a articulação das diferentes
perspectivas observadas nos livros estudados. Quando olhamos para os livros de Cálculo,
especialmente no de Stewart (2011), tivemos a percepção de que havia um bom desenvolvimento
do modelo de área. Contudo, percebemos que estavam omissos nesses materiais os aspectos
conceituais que permitiam desenvolver a estratégia do cálculo das áreas dos retângulos
aproximantes, que são os conceitos de continuidade da função dada no intervalo considerado e de
supremo (ínfimo). Observamos, por outro lado, a aplicação desses conceitos nos livros de análise
de Ávila (2005) e de Sarrico (2005), mas sem explicitação (como no livro de Stewart (2011)) em
referência às áreas dos retângulos aproximantes. Então, na preparação das tarefas para a
mediação didática e durante a mediação, fizemos uma ligação explícita entre a estratégia
observada nos livros de Cálculo e a observada nos livros de análise. Quer dizer, a existência das
áreas dos retângulos aproximantes tinha que ser explicada com base nos conceitos de
continuidade, limitação e de supremo (ínfimo) e a existência do limite da sequência de somas
dessas áreas tinha que ser explicada com base nos conceitos de limitação, de monotonia e de
410
convergência, expressos no seguinte teorema, observado nos livros de análise: “Toda sucessão
monótona limitada é convergente” (ÁVILA, 2005, p. 85, SARRICO, 2005, p. 35). Essa
integração permitiu-nos discutir, com algum fundamento teórico, mas preservando a intuição, o
que queríamos discutir.
Comparando as praxeologias didático-matemáticas definidas para o Ensino Médio e as
definidas para o Ensino Superior, constatamos que a articulação entre as duas propostas não é
conforme, pois, como tivemos ocasião de ver, o saber a ensinar definido para o Ensino Médio é
de natureza pontual, ao passo que no Ensino Superior, tal saber é de natureza local, ou seja, o
primeiro refere-se apenas aos níveis temas e tópicos, enquanto o segundo já leva em conta os
níveis setor e domínio, exigindo assim que o professor esteja mais bem preparado para poder
articular os conhecimentos matemáticos em relação à própria matemática, às outras ciências e à
possibilidade de utilização das novas tecnologias.
Assim sendo, dos livros analisados, julgamos que o livro de Stewart (2011), pela sua
característica versátil, pode ser usado para estabelecer a ponte de ligação entre o Ensino Médio e
o Ensino Superior. A ligação pode ser feita considerando a utilização desse livro a partir do
Ensino Médio e continuar no Ensino Superior, para nesse nível, articulá-lo com outros pontos de
vista da Análise.
As conclusões que acabamos de apresentar dizem respeito à viabilização do primeiro
objetivo geral da nossa pesquisa, que preconiza estudar as praxeologias didático-matemáticas
existentes em alguns materiais didáticos sobre a derivada de funções reais de uma variável real e
a integral de Riemann, de modo a inserir o Geogebra como ferramenta de ajuda à reflexão e à
construção dos conceitos em jogo. As mesmas conclusões apresentadas acima verificam também
a concretização dos seguintes objetivos específicos:
- analisar as relações institucionais moçambicanas para o estudo dos conceitos de
derivada de funções reais de uma variável real e de integral de Riemann a partir do programa de
ensino do nível médio e do livro didático indicado para os estudantes;
- analisar as praxeologias didático-matemáticas existentes em alguns livros didáticos
usados nas instituições de Ensino Superior sobre a derivada de funções reais de uma variável
real e a integral de Riemann para compreender as suas tendências e a articulação que fazem
entre o nível médio e o nível superior.
411
Feita a apresentação das conclusões sobre a análise das relações institucionais via
materiais didáticos, passamos a expor as conclusões sobre o estudo experimental, parte I.
O estudo experimental, parte I, corresponde à análise das relações pessoais dos
estudantes, via respostas que deram ao teste diagnóstico. Dos resultados obtidos e das análises
avançadas no capítulo 7, concluímos que tais relações pessoais não são efetivamente conformes
às relações institucionais esperadas do tema em questão, porque há poucas respostas que se
classificam nas categorias de respostas conformes e não totalmente conformes. Das 10 perguntas
do teste, 7 estão nessa situação.
As dificuldades de responder são caracterizadas pelas imprecisões (erros) técnicas,
tecnológicas e teóricas sobre alguns conceitos de base do Cálculo Diferencial e Integral que
fizeram parte do teste, que foram os conceitos de continuidade, de limitação e de conjunto-
imagem; sobre os pontos de vista da derivada como taxa de variação, como coeficiente angular da
reta tangente em um ponto (ponto de vista geométrico), ponto de vista simbólico da derivada;
sobre a aplicação da derivada na resolução de problemas de movimento e no estudo de funções;
sobre a condição necessária de continuidade de funções para a existência da função derivada e
sobre a aplicação do teorema de confronto para o cálculo de derivada de uma função em um
ponto.
Esse desempenho está diretamente relacionado com a história das sujeições
institucionais pelas quais esses estudantes passaram, se interpretarmos o resultado na perspectiva
de Chevallard (1998). Ou seja, as marcas das relações institucionais desenvolvidas no Ensino
Médio estão refletidas no desempenho acadêmico dos estudantes. As causas dessas marcas, de
acordo com este estudo, são as seguintes:
- incoerência das praxeologias didático-matemáticas construídas para o Ensino Médio,
nos níveis sociedade, disciplina, domínio e setor, quando consideramos a escala de níveis de
codeterminação de Chevallard (1997, 2014). Como já o referimos, esta conclusão procede da
análise do programa de ensino do nível médio e do livro didático correspondente.
- falta de provisão de alguns momentos de estudo, conforme Chevallard (1997). Esta
conclusão decorre das respostas ao teste diagnóstico em que alguns estudantes afirmaram não
terem conseguido responder às perguntas do teste, em virtude de não terem estudado a matéria
visada no nível médio da sua formação. Portanto, há pessoas, como já mencionamos no capítulo
412
7, que entram em cursos do nível superior sem que tenham tido contato, no Ensino Médio, com o
conteúdo necessário para estudar Matemática no Ensino Superior.
Nessa conformidade, a partir do discurso conclusivo sobre o estudo experimental, parte
I, é verificado o cumprimento do objetivo específico “analisar as marcas das relações
institucionais sobre as relações pessoais dos estudantes moçambicanos do primeiro ano da
Universidade Pedagógica de Moçambique, do curso de Licenciatura em Ensino de Matemática
na cidade da Beira, em função das relações institucionais existentes.” Essas marcas, por não
serem, em geral, conformes às relações institucionais do Cálculo, sugeriram-nos contemplar, na
mediação didática desenvolvida, discussões sobre os conceitos de domínio, conjunto-imagem,
gráfico de uma função, limites, continuidade e a propriedade de limitação.
Na sequência, apresentamos as conclusões sobre o estudo experimental, parte II:
resultados e análise das sessões experimentais.
Uma primeira conclusão que temos sobre a parte experimental II é de que, para
aproveitar as potencialidades do recurso computacional, o estudante precisa aprender como o
recurso funciona. Essa aprendizagem é possível. Nosso experimento mostra isso, pois todos os 8
estudantes que chegaram ao fim do programa experimental afirmaram no primeiro dia que nunca
tinham usado o computador para estudar algum conteúdo matemático. Portanto, para esse grupo,
a mediação didática articulada com o recurso computacional para estudar Matemática foi o
primeiro momento ocorrido nas sessões experimentais. Contudo, o conteúdo da derivada de
funções reais a valores reais não foi o primeiro momento para eles, posto que já haviam estudado
essa matéria no Ensino Médio.
As primeiras sessões foram um verdeiro desafio para o pesquisador para encaminhar as
discussões, pois era preciso assegurar aos estudantes participantes um conhecimento técnico
mínimo no uso do software Geogebra, principalmente das ferramentas que seriam
frequentemente usadas nas sessões: digitação das expressões na entrada de comandos, sintaxe
empregada, definir intervalos de animação no controle deslizante, movimento da janela gráfica,
traçado de reta tangente, do declive, entre outras técnicas básicas. A consequência disso é que as
primeiras sessões foram bastante lentas e, algumas vezes, requerendo recapitulações de temas já
discutidos.
413
A partir da 5ª sessão, os estudantes começaram a ganhar liberdade técnica no uso dos
comandos essenciais para modelar no computador as questões matemáticas de interesse. Apesar
de ter sido um pouco frustrante essa fase, estávamos consciente dela. De acordo com Rabardel
(2002, 1995), nas circunstâncias em que preconizamos o uso de instrumentos para intervir sobre
uma certa realidade, temos de considerar uma fase de aprendizagem de modo que os usuários
tirem proveito desses instrumentos. Em geral não é possível usar um instrumento sem antes
aprender o seu manejo.
No experimento, percebemos ainda que, numa situação de aula em que um software
matemático, como o Geogebra, é integrado na mediação do processo didático, a conduta do
professor é diferente daquela que ele assume no contexto do ensino tradicional vigente. O
professor precisa estar muito atento ao que os estudantes fazem e como fazem; se estão
avançando ou não e como avançam. O papel do professor muda, pois passa a ser mediador da
situação e cabe aos estudantes trabalharem para apresentar questões que exigem uma atenção
especial tanto em relação ao próprio conteúdo como em relação à utilização adequada do
software. Comungamos com o pensamento de Artigue (1995), que indica a importância de evitar
comportamentos de pesca na pesquisa de soluções. Além disso, tanto o professor como os
estudantes precisam observar se as retroações que a máquina fornece são pertinentes ou não,
ficarem atentos para a necessidade de comparar, interpretar e justificar o resultado, o que se torna
um processo quase permanente. Nesse sentido, no ambiente de aula com as mídias e práticas
usuais, tal como preconizamos no nosso estudo, a interação estudante-professor é efetivamente
individualizada e voltada para o conteúdo. A preocupação com a qualidade e, ao mesmo tempo,
com a quantidade do trabalho realizado é efetivamente notável.
Observamos que o diálogo quase permanente que caracterizou as sessões permitiu que
alguns raciocínios profundos equivocados e, de certo modo sutis, em torno das ideias de base do
Cálculo Diferencial e Integral, fossem evidenciados. Como exemplo desse fato, podemos citar as
afirmações de um estudante presente na sessão, de que o limite de uma função f(x) quando x
tende para a é a porque x vai para a. E ainda outra afirmação ocorrida na mesma sessão, segundo
a qual, o limite de uma função f(x) quando x tende para a é f(a). Uma vez trazidos à superfície
esses raciocínios inadequados, o ambiente de mediação com as mídias escolhidas deu visibilidade
aos elementos constitutivos da situação e possibilitou ultrapassar os equívocos. Como vimos nas
414
sessões 1 a 4, antes de aprofundar as discussões, os estudantes baseavam seus argumentos em
raciocínios vagos e equivocados de continuidade, limitação e de conjunto-imagem. Após a
discussão, eles começaram a produzir afirmações baseadas em conceitos. As explicações do tipo
“não é contínua porque os limites laterais no ponto P não são iguais” é limitada, porque as
imagens estão dentro de um intervalo limitado; o conjunto-imagem começa no ponto zero e
termina no 2, para nós, e embasados na Douady (1986, 1984), essas justificativas dos estudantes
são indicadoras da sua aquisição de conhecimentos na forma de ferramenta (no caso de falar de
limites laterais num ponto para concluir sobre a continuidade), e na forma de objeto (no caso de
apontar o conjunto-imagem, o intervalo de zero a dois).
No nosso entender, a explicitação descritiva (representacional) de conteúdo de ensino e
de aprendizagem pode favorecer a construção do conhecimento adequado, baseado no sentido,
significado e na compreensão. No nosso experimento, a mediação com as mídias e praticais
usuais favoreceu a construção dos conhecimentos conceituais de continuidade, limitação e de
conjunto imagem. No caso da continuidade, essa construção foi efetiva com articulação da
ferramenta computacional com a definição do limite de uma função em um ponto. Observamos
que casos críticos como esse, que exigem estudar o comportamento de uma função localmente,
geralmente exigem a articulação de mais de uma ferramenta. Só com ostensivos algébricos, o
conhecimento pode ficar no nível procedimental, em alguns casos sem compreensão, observamos
explicitamente esse fato nas vária sessões e, como exemplo, destacamos os procedimentos
incorretos de substituição das variáveis pelos valores concretos nas técnicas de cálculo do limite
da razão incremental; só com ostensivos visuais, o conhecimento pode ficar no nível de intuição,
um sentimento de aparência de certeza, mas que pode não o ser.
O experimento colocou em evidência a construção de conceitos pelos estudantes. No
caso da derivada de uma função em um ponto, foi efetivada por meio do processo visual de
aproximação dos declives da reta secante à posição tangente. No caso da função derivada, a
construção foi efetivada pelo declive da reta tangente. Para a integral de Riemann, a construção
foi concretizada pelo recurso soma (inferior ou superior). Nesses três casos de construção, a
variável “animação” desempenhou papel fundamental na produção de padrões visuais de
tendências (gráficos e numéricos) que conduziam ao levantamento de conjecturas a respeito da
existência do objeto em jogo. Nesse caso, o software assumiu o papel de ferramenta cognitiva,
415
segundo Rabardel (2002, 1995), no sentido de que fez o usuário desenvolver as adaptações
necessárias aos objetos de conhecimento, adaptações essas que são o conhecimento pretendido.
Podemos realçar a medição didática usada nessa interação, com o fim de reter os
aspectos essenciais do processo, no seguinte modelo bipolar simplificado, por nós imaginado, a
partir das noções de mediação epistêmica e mediação pragmática (RABARDEL 2002, 1995).
As setas na figura indicam o elemento para o qual
recai a finalidade da mediação.
Nossa interpretação desse modelo, meramente
metodológica para compreender a interação com o
computador, é a seguinte:
FIGURA 186 – MODELO
BIPOLAR DE MEDIAÇÃO
COM INSTRUMENTOS
FONTE: O autor (2014)
(1) O sujeito representado no modelo é aquele sujeito X, da instância estudante, quando
aludimos ao sistema didático (X; Y; ). O objeto finalizado é a instância , o
desafio didático. No nosso caso X é o grupo de estudantes participantes das sessões,
Y é o pesquisador e, às vezes, um outro sistema de ajuda ao estudo podendo ser
mesmo um estudante que ajuda aos outros estudantes, e é o conjunto de questões
preparadas para as sessões. No contexto de uso do computador, tanto a mediação
epistêmica, quanto a mediação pragmática, em geral, são desencadeadas por algum
sujeito, pode ser X ou Y.
(2) Dado que a mediação epistêmica é uma mediação do objeto ao sujeito (X),
consoante a definição do autor, então ela deve corresponder a retroações que a
interface emite para o sujeito (segundo nossa interpretação), provocando nele
imagens visuais ou acústicas31
que vão desencadear no centro de associação
(cérebro) do sujeito processo mental de adaptação, resultante dos processos de
assimilação e acomodação, que refere à construção dos esquemas. […] estruturas
mentais, ou cognitivas, pelas quais os indivíduos intelectualmente se adaptam e
organizam o meio (ARGENTO, 1995). Assim o objeto mediado pelo software fica
31 Saussure (2006, p. 19-21 & p. 79-93)
416
conhecido pelo sujeito. Observamos esses fatos nas diferentes ocasiões da mediação
que desenvolvemos em que as informações providas pelas mídias determinavam a
conduta dos estudantes expressando o conhecimento ou não do objeto em discussão.
No último caso era preciso reavaliar a natureza da dificuldade e reencaminhar a
discussão. Isso aconteceu nas discussões sobre as noções de domínio, conjunto-
imagem, gráfico de uma função, propriedade de limitação; sobre as noções de
derivada de uma função em um ponto, de função derivada bem como sobre as
noções de sequências de somas de áreas de retângulos aproximantes e seu limite.
(3) Dado que a mediação pragmática ocorre no sentido do sujeito ao objeto; à luz da
definição do autor, então ela deve corresponder a um processo procedimental, de
acesso ao objeto, cuja existência, em princípio, deve ser do conhecimento do
sujeito. Com a finalidade de comparação, usaríamos uma situação em que alguém
precisa atravessar um rio e sabe o que vai fazer na outra margem do rio. Então,
como procedimento para alcançar a outra margem do rio, usa uma mediação
pragmática, recorrendo a um barco ou a uma ponte. No experimento realizado, o
pesquisador sugeria instruções técnicas de busca dos objetos matemáticos
requeridos oralmente, por escrito e por outras vias possíveis.
Como indicamos acima, a discriminação que fizemos dessas mediações é, do ponto de
vista metodológico, uma ajuda para melhor compreender o que são essas mediações, o que
realmente acontece, ou seja, como é construído o conhecimento matemático nessas interações,
pois, conforme Rabardel (2002, 1995), as dimensões epistêmica e pragmática da mediação estão
em constante interação no interior da atividade.
Interessa pontuar que, de acordo com o que apresentamos acima, a dimensão epistêmica
é colocada na perspectiva do estudante, e, a pragmática, na do professor.
Outra conclusão que interessa deixar expressa é a de que a mediação didática articulada
com o recurso computacional, oportuniza mudanças notáveis nas praxeologias didático-
matemáticas: tipo de tarefas, técnicas, tecnologias, teorias e as maneiras de torná-los ensináveis
nas instituições escolares. Embora essa percepção possa ser obtida em todas as sessões
experimentais, ela é mais transparente nas sessões 5, 7, 8, 9, 10, 12. Essas são sessões em que os
estudantes já dominam minimamente a utilização do recurso computacional. Na sessão 9, por
417
exemplo, a construção do conceito de função derivada baseou-se no modelo geométrico
algébrico, fazendo articulação dos quadros geométrico e algébrico, prescindindo, completamente,
dos modelos clássicos e autotecnológicos do limite da razão incremental e do ponto de vista
simbólico da derivada. Essa estratégia foi possível graças à mediação com o recurso
computacional que propiciou produzir resultados geométricos sobre os quais se desenvolveu a
discussão e se tirou conclusões importantes sobre a noção da função derivada. Essa é uma
estratégia didática (mediação didática) que só é prática, para o estudo proposto, com o recurso
computacional, pois esse possibilita a construção do modelo geométrico algébrico. Ainda como
exemplo, na sessão 12, a noção de integral de Riemann foi efetivamente construída com a
mediação com o recurso computacional, tendo destacado as noções centrais do conceito da
integral definida, que são as noções de refinamento da partição e de aproximação numérica. E
acrescentamos enfatizando que, para os estudantes participantes da sessão de introdução à
integral de Riemann, foi o primeiro momento de estudo sobre o tema, já que esse conteúdo não é
estudado no Ensino Médio. No entanto, seu desempenho foi bom, pelo menos em relação ao tipo
de intervenções e argumentos usados para justificar as suas ideias, como podemos ver nas notas
escritas produzidas sobre o decurso da sessão 12 em que a noção de integral definida é construída
pelos estudantes por meio de suas ações sobre a mídia computacional e o registro sistemático dos
resultados obtidos.
Após essa digressão pelos acontecimentos nas sessões, retornamos, à questão da
pesquisa, e, mais adiante, aos objetivos da mesma, especialmente àqueles formulados sobre a
parte experimental.
Questão de pesquisa:
Quão efetiva é uma mediação didática para a construção e aprendizagem de conceitos
de derivadas de funções reais de uma variável real e de integral de Riemann mediadas por
mídias e práticas usuais?
Como resposta destacamos que a efetividade da mediação didática mencionada na
questão está na possibilidade que tal mediação oferece para a construção do conhecimento
matemático do estudante, como tivemos ocasião de ver ao percorrer a pesquisa. Realçamos, nesse
sentido que, além de auxiliar na construção de conhecimentos do estudante, a mediação
desenvolvida também permite a descoberta de alguns objetos matemáticos. Testemunhamos esse
418
fato nas sessões 7, 8, 9, 10 e 12, principalmente, em que os estudantes descobrem,
respetctivamente, o que é a derivada de uma função em um ponto, articulando o modelo
geométrico e os valores numéricos obtidos do declive da reta secante em suas diferentes
posições; o que significa a existência ou não da derivada de uma função é um ponto pela
comparação geométrica e numérica da razão incremental de uma função diferenciável em um
ponto e de uma função não diferenciável no ponto da mesma abscissa; o que é uma função
derivada pela sua construção à partir do gráfico descrito pelos declives da reta tangente ao gráfico
de uma função diferenciável; e, o que é uma área por baixo de uma curva usando as
aproximações das somas das áreas dos retângulos por baixo e por cima do gráfico de uma função
contínua em um intervalo fechado e limitado. No nosso entender, essa pesquisa traz alguns
resultados que consideramos como algo a mais em relação a outras pesquisas analisadas, que
assim passamos a destacar:
Implementação de uma mediação didática para a construção e aprendizagem de
conceitos de derivada de funções reais a valores reais numa realidade
moçambicana a qual não tem registro de algo parecido ter sido feito;
Emergência de alguns raciocínios equivocados dos estudantes sobre a noção de
limite de uma função em um ponto. No estudo surgiram raciocínios do tipo
axfax
)(lim porque x tende para a e )()(lim afxfax
porque x tende para a;
Esses raciocínios não foram reportados nas pesquisas anteriores que estudamos.
A utilização do recurso slope do Geogebra para a construção das noções de limite
da razão incremental e da função derivada. Para nós esse resultado foi importante
por algumas razões:
- permitiu comparar, com os estudantes, o resultado obtido graficamente e o
resultado algébrico. Essa comparação funcionou como elemento de controle da
conduta matemática dos estudantes. A diferença dos dois resultados fez com que
os estudantes refletissem sobre o que estava sendo mal encaminhando
algebricamente, e, assim adequar a sua relação pessoal à relação institucional
vigente sobre a derivada de uma função real a valores reais em um ponto. Esse fato
é explícito nas várias sessões, mas principalmente na sessão 7, em que a
comparação entre o valor da razão incremental obtido pela mídia computacional e
419
o obtido pelo procedimento algébrico (no quadro branco) levou à recapitulação das
estratégias que estavam sendo usadas.
- permitiu propor uma maneira diferente de encaminhar a introdução da noção de
função derivada. Para nós é importante procurar formas alternativas quando as
vigentes se mostram não producentes, ou pouco producentes. O mérito dessa nova
maneira de introduzir a função derivada, segundo nossa percepção, está no
propiciar o reconhecimento que os estudantes fazem dos diferentes pontos de vista
sobre a função derivada, como vemos na figura 159: ponto de vista geométrico
(derivada como declive da reta tangente ao gráfico de uma função f), ponto de
vista de taxa de variação (derivada como velocidade), derivada como função que
representa os declives, e o ponto de vista simbólico da derivada. Como indicamos
acima e descrito na sessão 9, o valor da taxa de variação da função f no ponto A,
está representado no triângulo declive. E com uma análise e reflexão apropriadas
sobre esta figura podem emergir outros pontos de vista da derivada, por exemplo:
o ponto de vista da derivada como taxa de variação e o ponto de vista da derivada
como linearização local da função f dada.
Mais uma vez reiteramos que, não dizemos que todos esses pontos de vista são
originados pelo computador. Mas sim, pelos processos de análise e de
interpretação, de procurar significados nesse resultado apresentado pelo
computador.
- no nosso contexto esse resultado foi interessante por ter permitido interpretar
para os vários pontos de vista sobre a função derivada, aqueles que são
matematicamente corretos. Provavelmente o que estamos dizendo pode não ter
sentido num outro ambiente e com uma outra dinâmica.
A articulação explícita entre os procedimentos de cálculo de áreas de retângulos
aproximantes com os recursos teóricos de continuidade e de supremo (ínfimo).
Das pesquisas analisadas e dos livros estudados, essa ligação não é clara, como o
mencionamos anteriormente. Para nós essa articulação é necessária, pois explica
por que é que é possível calcular a área de um retângulo por baixo ou por cima do
gráfico de uma função dada, segundo o modelo geralmente usado. Se a teoria de
420
continuidade e de supremo (ínfimo) não é evocada, nosso sentimento é de que o
procedimento de cálculo e os resultados obtidos são construídos sobre uma base
matemática incompleta que a qualquer momento pode desmoronar, porque, por
exemplo, pode-se perceber mais tarde que nem toda função integral é Riemann
integrável. O que dissemos sobre os procedimentos de cálculo de áreas dos
retângulos aproximantes, aplica-se também em relação ao limite de uma sequência
de somas dessas áreas. As pesquisas analisadas e os livros de Cálculo estudados
não explicam por que é que um limite desse tipo existe, porque não usam o
teorema de convergência de sequências monótonas limitadas, como já
esclarecemos acima. No nosso entender, embasados em Chevallard (1999, 2012,
2014), um ensino sem um recurso teórico é um ensino fraco, que pode ser um
fracasso mais tarde (BOSCH et al. 2004).
Um outro resultado importante da pesquisa é o identificar explicitamente partes do
conteúdo matemático em que o software Geogebra fornece resultados errados.
Não observamos esse destaque nos estudos anteriores que analisamos.
Embora o tenhamos deixado expresso em algumas partes do nosso texto,
consideramos reiterar que a articulação das diferentes perspectivas técnicas,
tecnológicas e teóricas para o encaminhamento de uma sequência didática,
mostrou ser, no nosso caso, uma estratégia correta, como ainda afirmamos nos
parágrafos a seguir.
A análise do contexto institucional possibilitou perceber as expectativas institucionais
por meio das praxeologias didático-matemáticas propostas. Essa análise também tornou possíveis
a concepção, a implementação e a análise de sequências didáticas implementadas. Os
conhecimentos retrospectivos mobilizáveis e disponíveis dos estudantes favoreceram-nos a
determinar as estratégias para o encaminhamento das discussões e alimentaram esse
encaminhamento.
Como já mencionado, voltamos aos objetivos da pesquisa formulados sobre a parte
experimental.
Objetivo geral:
421
- experimentar uma modalidade de ensino e de aprendizagem dos conceitos de derivada
e integral de Riemann de funções reais de uma variável real, incorporando no processo o
software Geogebra, articulado com as mídias e práticas vigentes.
Objetivos específicos:
- construir e aplicar um experimento que possibilite analisar o funcionamento dos
estudantes em processos de ensino e de aprendizagem das noções de derivada e integral definida
de funções reais de uma variável real, quando se introduz uma nova ferramenta, no caso, o
Geogebra, articulada com as outras mídias e práticas usuais;
- explorar as potencialidades gráficas e algébricas do Geogebra no ensino e na
aprendizagem de derivadas de funções reais de uma variável real e da integral de Riemann;
- explorar as possibilidades de desenvolver habilidades e competências do estudante no
uso do computador para a aprendizagem dos conteúdos curriculares, em particular, sobre
derivadas de funções reais de uma variável real e integral de Riemann.
Em relação a esses objetivos temos a dizer que:
- a parte experimental do estudo corresponde a efetivação de um experimento de uma
modalidade diferente de ensino e de aprendizagem dos conceitos visados, com a incorporação do
software Geogebra, articulado com as práticas usuais. A mediação didática implementada, gerou
processos e ações intelectuais dos estudantes, quais foram: a reflexão, a comparação, o
levantamento de conjecturas, o questionamento, a argumentação (e refutação) das respostas
obtidas; o desenvolvimento de estratégias de validação experimental e interpretação em busca de
sentido e significado das respostas. Em resumo, diríamos que a experimentação oportunizou um
ambiente de construção e aprendizagem dos conceitos visados pelos estudantes, bem como para o
pesquisador que perante diversas dificuldades didático-matemáticas procurou coordenar as
discussões até a última sessão.
- o desenvolvimento do experimento estava intimamente articulado com a exploração
das potencialidades gráficas e algébricas do Geogebra no ensino e na aprendizagem dos
conceitos em jogo. Essa exploração das potencialidades da mídia computacional estava sempre
articulada com as mídias e práticas usuais. Como indicamos acima, o processo foi tal que uma
ação ou um resultado obtido pelo recurso computacional passava pela reinterpretação e
ressignificação no contexto das práticas vigentes e, em alguns casos, no sentido contrário.
422
- o desenvolvimento do experimento, nas condições em que foi desenhado, preconizando
à participação ativa dos estudantes nas discussões, passava pelo desenvolvimento das habilidades
dos participantes no uso do computador na aprendizagem dos conteúdos curriculares. Realçamos
que essa exploração foi muito interessante, pois, como já mencionado, os 8 estudantes que foram
consequentes no experimento não tinham antes usado o computador para estudar Matemática.
Mas até ao fim do experimento, já sabiam analisar alguns aspectos matemáticos usando o
computador, especialmente no estudo das propriedades de funções, da derivada e integral
definida de funções reais a valores reais.
Uma volta ao referencial teórico e ao método usados na pesquisa, consideramos que eles
tenham sido articulados adequadamente nas diferentes partes do encaminhamento do trabalho.
A teoria usada permitiu-nos:
- uma orientação aos objetivos da pesquisa, restringindo-a aos fatos praxeológicos
observados nos materiais didáticos, na análise a priori das tarefas propostas para o estudo
experimental, na análise a posteriori das respostas dos estudantes ao teste diagnóstico e das
discussões realizadas na experimentação;
- uma definição dos principais aspectos da pesquisa, que foram: o estudo das
praxeologias via materiais didáticos, análise das relações pessoais via respostas ao teste
diagnóstico e por meio da mediação didática com as mídias e práticas usuais;
- uma interpretação e explicação dos fatos que fomos observando no decurso do estudo.
O método usado na pesquisa permitiu-nos articular as diferentes fases da pesquisa:
Análise das relações institucionais via materiais didáticos do ensino médio
moçambicano para compreender o fundamento e a natureza das praxeologias propostas nesses
materiais sobre o tema em estudo; análise das relações institucionais via livros didáticos usados
no Ensino Superior para perceber as suas expectativas praxeológicas e, desses resultados,
fundamentar as tarefas e as estratégias para o encaminhamento da experimentação;
experimentação para viver a complexidade da mediação didática com as mídias e práticas usuais;
e, em seguida, análise dos resultados obtidos. Consideramos ser oportuno ainda mencionar que
esse caminhamento metodológico da pesquisa mostra uma diferença entre o que é que ela foi e as
outras pesquisas analisadas no capítulo 2.
Para finalizar, consideramos deixar expresso o seguinte:
423
O software Geogebra tem as suas limitações e, por isso, o professor precisa acautelar-se,
caso tenha intenção de usar esse recurso em alguma intervenção didática. As limitações maiores,
do que observamos no nosso estudo, ocorrem na análise do comportamento de funções nos
pontos críticos, especialmente na aplicação dos conceitos de limites para estudar tal
comportamento.
Como perspectivas futuras da pesquisa, consideramos que:
- as tarefas discutidas na parte experimental do estudo podem ser replicadas nas
instituições brasileiras que abordam esses conteúdos para ver como os estudantes podem reagir
nesse novo contexto;
- a mediação didática com as mídias e práticas usuais, como desenvolvida nesse estudo,
pode ser experimentada num outro contexto e com um outro foco matemático, tal como o fez um
de nossos estudantes participantes das sessões que, depois de alguns meses do fim da experiência,
modelou, adequadamente, no Geogebra, a definição lógico formal de continuidade proposta por
Weierstrass, tonando-a mais compreensível com os aspectos de visualização gráfica e animação
que, na essência, essa definição é complexa e difícil para alguns estudantes dos cursos de
licenciatura em ensino de Matemática e para alguns professores de Matemática nas universidades
moçambicanas.
- embora tenhamos conseguido justificar que o desempenho insatisfatório dos estudantes
no teste diagnóstico tenha sido devido à falta de provisão do conteúdo necessário e à
inefetividade das praxeologias didático-matemáticas definidas para o Ensino Médio nos níveis
sociedade, escola, domínio e setor, na escala de codeterminação, estamos cientes de que outra
explicação do fenômeno que não procede do nosso estudo pode ser possível. Por exemplo, “os
hábitos de aprendizagem dos estudantes visados”, “as condições de vida dos estudantes”, entre
outros fatores, podem ter seu efeito no desempenho acadêmico do estudante e que a busca de
respostas para esses casos ainda precisa de uma nova pesquisa.
424
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431
ANEXOS
ANEXO A: Alguns recursos do software Geogebra
432
Recursos de cada uma das opções da barra de ferramentas:
1ª opção 2ª opção 3ª opção 4ª Opção
5ª opção 6ª opção 7ªopção
433
8ª opção 9ª opção 10 ªopção
11ª opção 12ª opção
434
ANEXO B: Autorização da universidade onde se fez o trabalho experimental
435
ANEXO C: Parecer da comissão de ética da UNIAN
436
ANEXO D: Termo de consentimento
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Título da Pesquisa: “DERIVADAS DE FUNÇÕES REAIS DE UMA VARIÁVEL REAL E
INTEGRAL DE RIEMANN: UMA ANÁLISE ARTICULADA COM RECURSO AO
SOFTWARE GEOGEBRA”
Pesquisadora: PEDRO MATEUS
Orientadora: Marlene Alves Dias
O sra (sr.)____________________________________________ está sendo convidada
(o) a participar desta pesquisa que tem como objetivo motivar a necessidade de operar mudanças
no paradigma de ensino e aprendizagem do cálculo: do ensino instrucionista para o ensino que
motive a reflexão, onde o computador é ferramenta de co-construção de conhecimentos do aluno.
Ao participar deste estudo a sra (sr) permitirá que o pesquisador realize seu trabalho. A
sra (sr.) tem liberdade de se recusar a participar e ainda se recusar a continuar participando em
qualquer fase da pesquisa, sem qualquer prejuízo para a sra (sr.). Sempre que quiser poderá pedir
mais informações sobre a pesquisa através do telefone do pesquisador do projeto e, se necessário
através do telefone do Comitê de Ética em Pesquisa.
Riscos e desconforto: a participação nesta pesquisa não traz complicações legais. Os
procedimentos adotados nesta pesquisa obedecem aos Critérios da Ética em Pesquisa com Seres
Humanos conforme Resolução no. 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Nenhum dos
procedimentos usados oferece riscos à sua dignidade.
Confidencialidade: todas as informações coletadas neste estudo são estritamente
confidenciais. Somente o pesquisador e a orientadora terão conhecimento dos dados.
Benefícios: ao participar desta pesquisa a sra (sr.) não terá nenhum benefício direto.
Entretanto, esperamos que esta pesquisa traga informações importantes sobre os conhecimentos
associados às práticas institucionais existentes para o caso de Moçambique e as possibilidades
reais de inserção de ferramentas computacionais nessas práticas no estudo da derivada de funções
reais de uma variável e real e da integral de Riemann, de forma que o conhecimento que será
construído a partir desta pesquisa possa servir de apoio para motivar a necessidade de operar
mudanças nas práticas moçambicanas de ensino e aprendizagem do cálculo: do ensino
437
instrucionista para o ensino que motive a reflexão, onde o computador é elemento de co-
construção de conhecimentos do aluno. Este estudo será publicado em congressos e revistas
nacionais e internacionais e, além disso, o pesquisador se compromete a divulgar os resultados
obtidos aos participantes da pesquisa.
Pagamento: a sra (sr.) não terá nenhum tipo de despesa para participar desta pesquisa,
bem como nada será pago por sua participação.
Após estes esclarecimentos, solicitamos o seu consentimento de forma livre para
participar desta pesquisa. Portanto preencha, por favor, os itens que se seguem: Confiro que
recebi cópia deste termo de consentimento, e autorizo a execução do trabalho de pesquisa e a
divulgação dos dados obtidos neste estudo.
Obs: Não assine esse termo se ainda tiver dúvida a respeito.
Tendo em vista os itens acima apresentados, eu, de forma livre e esclarecida, manifesto
meu consentimento em participar da pesquisa
_________________________________
Nome e Assinatura do Participante da Pesquisa
____ ______
Pedro Mateus
__________________________________
Marlene Alves Dias