UNIÃO DE FACTO O PROBLEMA DA PROVA DE COABITAÇÃO E A …
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Ana Joatildeo Salgado Costa
UNIAtildeO DE FACTO - O PROBLEMA DA PROVA DE
COABITACcedilAtildeO E A SUA EVENTUAL INSCRICcedilAtildeO
NO REGISTO CIVL
Dissertaccedilatildeo apresentada agrave Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra no acircmbito do 2ordm Ciclo de Estudos em Direito (conducente ao grau de Mestre) na Aacuterea
de Especializaccedilatildeo em Ciecircncias Juriacutedico-Forenses sob orientaccedilatildeo da Doutora Sandra Passinhas
Abril de 2021
2
Ana Joatildeo Salgado Costa
UNIAtildeO DE FACTO - O PROBLEMA DA PROVA DE COABITACcedilAtildeO E A SUA
EVENTUAL INSCRICcedilAtildeO NO REGISTO CIVIL
CONSENSUAL UNION - THE PROBLEM OF THE PROOF OF COHABITATION
AND ITS POSSIBLE ENTRY IN THE CIVIL REGISTER
Dissertaccedilatildeo apresentada agrave Faculdade de
Direito da Universidade de Coimbra no
acircmbito do 2ordm Ciclo de Estudos em Direito
(conducente ao grau de Mestre) na Aacuterea
de Especializaccedilatildeo em Ciecircncias Juriacutedico-
Forenses sob orientaccedilatildeo da Doutora
Sandra Passinhas
Coimbra
Abril 2021
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4
Agrave minha famiacutelia
Ao meu Di
Sempre
5
Teria passado a vida
atormentado e sozinho
se os sonhos me natildeo viessem
mostrar qual eacute o caminho
umas vezes satildeo de noite
outras em pleno de sol
com relacircmpagos saltados
ou vagar de caracol
quem os manda natildeo sei eu
se o nada que eacute tudo agrave vida
ou se eu os finjo a mim mesmo
para ser sem que decida
AGOSTINHO DA SILVA Sonho in Poemas
6
IacuteNDICE
RESUMO 7
ABSTRACT 8
SIGLAS E ABREVIATURAS 9
1 Introduccedilatildeo 11
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs 12
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa 16
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo 20
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos 27
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo 30
51 Consideraccedilotildees gerais 30
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo Europeia 37
521 Espanha 37
522 Franccedila 41
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo nordm6380169T8CBRC1S1 46
54 Soluccedilatildeo proposta 52
6 Conclusatildeo 57
BIBLIOGRAFIA 59
JURISPRUDEcircNCIA 65
7
RESUMO
A figura da uniatildeo facto eacute uma realidade crescente com cada vez mais importacircncia
na nossa sociedade atual tendo em conta o consideraacutevel nuacutemero de pessoas que opta por
viver desta forma Sendo que pode esse nuacutemero derivar natildeo soacute da liberdade associada a este
regime como tambeacutem do facto de poder ser uma circunstacircncia provisoacuteria e transitoacuteria Pode
ateacute tratar-se de uma circunstacircncia definitiva em virtude de por inuacutemeras razotildees os membros
da uniatildeo de facto natildeo quererem casar ora por natildeo terem condiccedilotildees financeiras para celebrar
um casamento ora por natildeo fazer parte da sua cultura formalizarem a sua relaccedilatildeo
Apesar da importacircncia da uniatildeo de facto e da sua relevacircncia na sociedade o seu
regime juriacutedico eacute parco apresentando lacunas relativamente agraves normas sobre o seu registo
regime de bens entre os membros a sua extinccedilatildeo e efeitos sucessoacuterios Estas e outras
mateacuterias deveriam ter uma regulamentaccedilatildeo mais completa para que se pudesse oferecer uma
maior proteccedilatildeo aos unidos de facto
Pretendemos essencialmente analisar por estar estritamente ligado ao facto de a
uniatildeo de facto natildeo ser objeto de registo civil ou administrativo o problema da prova da
existecircncia e do iniacutecio da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto e desta forma refletir sobre as vantagens
que provecircm do registo deste tipo de relaccedilotildees
PALAVRAS-CHAVE uniatildeo de facto prova da coabitaccedilatildeo registo civil
8
ABSTRACT
The figure of consensual union is an increasingly important reality in our society
today given the considerable amount of people who choose to live this way This number
can derive not only from the freedom associated with this regime but also from the fact that
it can be a temporary and transitory circumstance It may even be a definitive circumstance
because for a number of reasons the unmarried partners do not want to get married either
because they do not have the financial means to enter into a marriage or because it is not part
of their culture to formalise their relationship
Despite the importance of the non-marital partnership and its relevance in society
its legal system is scarce with gaps regarding the rules on its registration the system of
property between members its extinction and inheritance effects These and other matters
should be regulated more fully in order to offer greater protection to consensual union
The main aim is to analyse as it is strictly linked to the fact that consensual union
is not subject to civil or administrative registration the problem of proving the existence and
the beginning of this situation and thus reflect on the advantages that come from the
registration of this type of relationship
KEYWORDS non-marital partnership proof of cohabitation civil registry
9
SIGLAS E ABREVIATURAS
A- Autor
AA- Autores
Ac- Acoacuterdatildeo
Art ndash Artigo
Arts ndash Artigos
Ed - Ediccedilatildeo
In - Em
ob cit - Obra Citada
p ndash paacutegina
pp paacuteginas
ss - Seguintes
vg - verbi gratia
Vol ndash Volume
CCiv ndash Coacutedigo Civil
CEDH ndash Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem
CNP- Centro Nacional de Pensotildees
CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil
CReg Civ ndash Coacutedigo de Registo Civil
CRP ndash Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
DUDH ndash Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos
ISS ndash Instituto da Seguranccedila Social
10
LUF ndash Lei da Uniatildeo de Facto (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010
de 30 de Agosto)
PACS ndash Pacto civil de Solidariedade
STJ ndash Supremo Tribunal de Justiccedila
TCE - Tribunal Constitucional Espanhol
TEDH ndash Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
ed vol I Lisboa Livraria Petrony1999 p 31 DIOGO LEITE DE CAMPOS ldquo Liccedilotildees de Direito da Famiacuteliardquo 2ordf
Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
16
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
17
idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
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compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
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A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
20
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
21
assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
22
regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
23
com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
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5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
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feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
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legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
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4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
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e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
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da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
33
declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
34
dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
35
Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
36
Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
42
caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
43
casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
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heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
45
Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
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53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
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CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
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de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
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provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
51
a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
52
uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
59
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XAVIER M Rita Aranha da Gama Lobo ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de
Francisco Manuel Pereira Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para
Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
65
JURISPRUDEcircNCIA
Tribunal Constitucional
bull Acoacuterdatildeo nordm 3361986
bull Acoacuterdatildeo nordm 18881996
Supremo Tribunal de Justiccedila
bull Acoacuterdatildeo 9-07-2014 processo nordm 3076111TBLLEE1 S1
bull Acoacuterdatildeo 22-03-2018 processo nordm 6380169T8CBRC1 S1
Tribunal Central Administrativo Norte
bull Acoacuterdatildeo de 13-11-2020 processo nordm 00090151BECBR
Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra
bull Acoacuterdatildeo de 16-10-2012 processo nordm 50091TBALDC1
bull Acoacuterdatildeo de 08-03-2006 processo nordm 419705JTRC
Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa
bull Acoacuterdatildeo de 15-02-2007 processo nordm 62842006-8
bull Acoacuterdatildeo de 29-11-2012 processo nordm 444092TCFUNL1-A-8
bull Acoacuterdatildeo de 24-04-2019 processo nordm 12025160T8LRSL1-2
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
bull Acoacuterdatildeo JOHNSTON C IRLANDA de 18 de dezembro de 1986
bull Acoacuterdatildeo KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994
Tribunal Constitucional Espanhol
bull Sentenccedila nordm 1841990 de 15 de novembro Consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-T-1990-29360
bull Sentenccedila nordm 2221992 de 11 de dezembro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow2109
bull Sentenccedila nordm 661994 de 28 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalespt-BRResolucionShow2583
66
bull Sentenccedila nordm 391998 de 17 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalesesResolucionShow3541
bull Sentenccedila nordm 1161999 de 17 de junho Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow3858
Tribunal Constitucional Francecircs
bull Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil Constitutionnel de 29 de julho Consultaacutevel
em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm
2
Ana Joatildeo Salgado Costa
UNIAtildeO DE FACTO - O PROBLEMA DA PROVA DE COABITACcedilAtildeO E A SUA
EVENTUAL INSCRICcedilAtildeO NO REGISTO CIVIL
CONSENSUAL UNION - THE PROBLEM OF THE PROOF OF COHABITATION
AND ITS POSSIBLE ENTRY IN THE CIVIL REGISTER
Dissertaccedilatildeo apresentada agrave Faculdade de
Direito da Universidade de Coimbra no
acircmbito do 2ordm Ciclo de Estudos em Direito
(conducente ao grau de Mestre) na Aacuterea
de Especializaccedilatildeo em Ciecircncias Juriacutedico-
Forenses sob orientaccedilatildeo da Doutora
Sandra Passinhas
Coimbra
Abril 2021
3
4
Agrave minha famiacutelia
Ao meu Di
Sempre
5
Teria passado a vida
atormentado e sozinho
se os sonhos me natildeo viessem
mostrar qual eacute o caminho
umas vezes satildeo de noite
outras em pleno de sol
com relacircmpagos saltados
ou vagar de caracol
quem os manda natildeo sei eu
se o nada que eacute tudo agrave vida
ou se eu os finjo a mim mesmo
para ser sem que decida
AGOSTINHO DA SILVA Sonho in Poemas
6
IacuteNDICE
RESUMO 7
ABSTRACT 8
SIGLAS E ABREVIATURAS 9
1 Introduccedilatildeo 11
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs 12
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa 16
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo 20
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos 27
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo 30
51 Consideraccedilotildees gerais 30
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo Europeia 37
521 Espanha 37
522 Franccedila 41
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo nordm6380169T8CBRC1S1 46
54 Soluccedilatildeo proposta 52
6 Conclusatildeo 57
BIBLIOGRAFIA 59
JURISPRUDEcircNCIA 65
7
RESUMO
A figura da uniatildeo facto eacute uma realidade crescente com cada vez mais importacircncia
na nossa sociedade atual tendo em conta o consideraacutevel nuacutemero de pessoas que opta por
viver desta forma Sendo que pode esse nuacutemero derivar natildeo soacute da liberdade associada a este
regime como tambeacutem do facto de poder ser uma circunstacircncia provisoacuteria e transitoacuteria Pode
ateacute tratar-se de uma circunstacircncia definitiva em virtude de por inuacutemeras razotildees os membros
da uniatildeo de facto natildeo quererem casar ora por natildeo terem condiccedilotildees financeiras para celebrar
um casamento ora por natildeo fazer parte da sua cultura formalizarem a sua relaccedilatildeo
Apesar da importacircncia da uniatildeo de facto e da sua relevacircncia na sociedade o seu
regime juriacutedico eacute parco apresentando lacunas relativamente agraves normas sobre o seu registo
regime de bens entre os membros a sua extinccedilatildeo e efeitos sucessoacuterios Estas e outras
mateacuterias deveriam ter uma regulamentaccedilatildeo mais completa para que se pudesse oferecer uma
maior proteccedilatildeo aos unidos de facto
Pretendemos essencialmente analisar por estar estritamente ligado ao facto de a
uniatildeo de facto natildeo ser objeto de registo civil ou administrativo o problema da prova da
existecircncia e do iniacutecio da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto e desta forma refletir sobre as vantagens
que provecircm do registo deste tipo de relaccedilotildees
PALAVRAS-CHAVE uniatildeo de facto prova da coabitaccedilatildeo registo civil
8
ABSTRACT
The figure of consensual union is an increasingly important reality in our society
today given the considerable amount of people who choose to live this way This number
can derive not only from the freedom associated with this regime but also from the fact that
it can be a temporary and transitory circumstance It may even be a definitive circumstance
because for a number of reasons the unmarried partners do not want to get married either
because they do not have the financial means to enter into a marriage or because it is not part
of their culture to formalise their relationship
Despite the importance of the non-marital partnership and its relevance in society
its legal system is scarce with gaps regarding the rules on its registration the system of
property between members its extinction and inheritance effects These and other matters
should be regulated more fully in order to offer greater protection to consensual union
The main aim is to analyse as it is strictly linked to the fact that consensual union
is not subject to civil or administrative registration the problem of proving the existence and
the beginning of this situation and thus reflect on the advantages that come from the
registration of this type of relationship
KEYWORDS non-marital partnership proof of cohabitation civil registry
9
SIGLAS E ABREVIATURAS
A- Autor
AA- Autores
Ac- Acoacuterdatildeo
Art ndash Artigo
Arts ndash Artigos
Ed - Ediccedilatildeo
In - Em
ob cit - Obra Citada
p ndash paacutegina
pp paacuteginas
ss - Seguintes
vg - verbi gratia
Vol ndash Volume
CCiv ndash Coacutedigo Civil
CEDH ndash Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem
CNP- Centro Nacional de Pensotildees
CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil
CReg Civ ndash Coacutedigo de Registo Civil
CRP ndash Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
DUDH ndash Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos
ISS ndash Instituto da Seguranccedila Social
10
LUF ndash Lei da Uniatildeo de Facto (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010
de 30 de Agosto)
PACS ndash Pacto civil de Solidariedade
STJ ndash Supremo Tribunal de Justiccedila
TCE - Tribunal Constitucional Espanhol
TEDH ndash Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
ed vol I Lisboa Livraria Petrony1999 p 31 DIOGO LEITE DE CAMPOS ldquo Liccedilotildees de Direito da Famiacuteliardquo 2ordf
Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
16
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
17
idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
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compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
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A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
20
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
21
assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
22
regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
23
com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
24
5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
25
feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
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legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
27
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
28
e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
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da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
33
declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
34
dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
35
Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
36
Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
42
caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
43
casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
44
heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
45
Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
46
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
47
CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
48
de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
enDocument
50
provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
51
a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
52
uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
59
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65
JURISPRUDEcircNCIA
Tribunal Constitucional
bull Acoacuterdatildeo nordm 3361986
bull Acoacuterdatildeo nordm 18881996
Supremo Tribunal de Justiccedila
bull Acoacuterdatildeo 9-07-2014 processo nordm 3076111TBLLEE1 S1
bull Acoacuterdatildeo 22-03-2018 processo nordm 6380169T8CBRC1 S1
Tribunal Central Administrativo Norte
bull Acoacuterdatildeo de 13-11-2020 processo nordm 00090151BECBR
Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra
bull Acoacuterdatildeo de 16-10-2012 processo nordm 50091TBALDC1
bull Acoacuterdatildeo de 08-03-2006 processo nordm 419705JTRC
Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa
bull Acoacuterdatildeo de 15-02-2007 processo nordm 62842006-8
bull Acoacuterdatildeo de 29-11-2012 processo nordm 444092TCFUNL1-A-8
bull Acoacuterdatildeo de 24-04-2019 processo nordm 12025160T8LRSL1-2
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
bull Acoacuterdatildeo JOHNSTON C IRLANDA de 18 de dezembro de 1986
bull Acoacuterdatildeo KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994
Tribunal Constitucional Espanhol
bull Sentenccedila nordm 1841990 de 15 de novembro Consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-T-1990-29360
bull Sentenccedila nordm 2221992 de 11 de dezembro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow2109
bull Sentenccedila nordm 661994 de 28 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalespt-BRResolucionShow2583
66
bull Sentenccedila nordm 391998 de 17 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalesesResolucionShow3541
bull Sentenccedila nordm 1161999 de 17 de junho Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow3858
Tribunal Constitucional Francecircs
bull Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil Constitutionnel de 29 de julho Consultaacutevel
em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm
3
4
Agrave minha famiacutelia
Ao meu Di
Sempre
5
Teria passado a vida
atormentado e sozinho
se os sonhos me natildeo viessem
mostrar qual eacute o caminho
umas vezes satildeo de noite
outras em pleno de sol
com relacircmpagos saltados
ou vagar de caracol
quem os manda natildeo sei eu
se o nada que eacute tudo agrave vida
ou se eu os finjo a mim mesmo
para ser sem que decida
AGOSTINHO DA SILVA Sonho in Poemas
6
IacuteNDICE
RESUMO 7
ABSTRACT 8
SIGLAS E ABREVIATURAS 9
1 Introduccedilatildeo 11
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs 12
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa 16
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo 20
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos 27
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo 30
51 Consideraccedilotildees gerais 30
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo Europeia 37
521 Espanha 37
522 Franccedila 41
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo nordm6380169T8CBRC1S1 46
54 Soluccedilatildeo proposta 52
6 Conclusatildeo 57
BIBLIOGRAFIA 59
JURISPRUDEcircNCIA 65
7
RESUMO
A figura da uniatildeo facto eacute uma realidade crescente com cada vez mais importacircncia
na nossa sociedade atual tendo em conta o consideraacutevel nuacutemero de pessoas que opta por
viver desta forma Sendo que pode esse nuacutemero derivar natildeo soacute da liberdade associada a este
regime como tambeacutem do facto de poder ser uma circunstacircncia provisoacuteria e transitoacuteria Pode
ateacute tratar-se de uma circunstacircncia definitiva em virtude de por inuacutemeras razotildees os membros
da uniatildeo de facto natildeo quererem casar ora por natildeo terem condiccedilotildees financeiras para celebrar
um casamento ora por natildeo fazer parte da sua cultura formalizarem a sua relaccedilatildeo
Apesar da importacircncia da uniatildeo de facto e da sua relevacircncia na sociedade o seu
regime juriacutedico eacute parco apresentando lacunas relativamente agraves normas sobre o seu registo
regime de bens entre os membros a sua extinccedilatildeo e efeitos sucessoacuterios Estas e outras
mateacuterias deveriam ter uma regulamentaccedilatildeo mais completa para que se pudesse oferecer uma
maior proteccedilatildeo aos unidos de facto
Pretendemos essencialmente analisar por estar estritamente ligado ao facto de a
uniatildeo de facto natildeo ser objeto de registo civil ou administrativo o problema da prova da
existecircncia e do iniacutecio da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto e desta forma refletir sobre as vantagens
que provecircm do registo deste tipo de relaccedilotildees
PALAVRAS-CHAVE uniatildeo de facto prova da coabitaccedilatildeo registo civil
8
ABSTRACT
The figure of consensual union is an increasingly important reality in our society
today given the considerable amount of people who choose to live this way This number
can derive not only from the freedom associated with this regime but also from the fact that
it can be a temporary and transitory circumstance It may even be a definitive circumstance
because for a number of reasons the unmarried partners do not want to get married either
because they do not have the financial means to enter into a marriage or because it is not part
of their culture to formalise their relationship
Despite the importance of the non-marital partnership and its relevance in society
its legal system is scarce with gaps regarding the rules on its registration the system of
property between members its extinction and inheritance effects These and other matters
should be regulated more fully in order to offer greater protection to consensual union
The main aim is to analyse as it is strictly linked to the fact that consensual union
is not subject to civil or administrative registration the problem of proving the existence and
the beginning of this situation and thus reflect on the advantages that come from the
registration of this type of relationship
KEYWORDS non-marital partnership proof of cohabitation civil registry
9
SIGLAS E ABREVIATURAS
A- Autor
AA- Autores
Ac- Acoacuterdatildeo
Art ndash Artigo
Arts ndash Artigos
Ed - Ediccedilatildeo
In - Em
ob cit - Obra Citada
p ndash paacutegina
pp paacuteginas
ss - Seguintes
vg - verbi gratia
Vol ndash Volume
CCiv ndash Coacutedigo Civil
CEDH ndash Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem
CNP- Centro Nacional de Pensotildees
CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil
CReg Civ ndash Coacutedigo de Registo Civil
CRP ndash Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
DUDH ndash Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos
ISS ndash Instituto da Seguranccedila Social
10
LUF ndash Lei da Uniatildeo de Facto (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010
de 30 de Agosto)
PACS ndash Pacto civil de Solidariedade
STJ ndash Supremo Tribunal de Justiccedila
TCE - Tribunal Constitucional Espanhol
TEDH ndash Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
ed vol I Lisboa Livraria Petrony1999 p 31 DIOGO LEITE DE CAMPOS ldquo Liccedilotildees de Direito da Famiacuteliardquo 2ordf
Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
16
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
17
idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
18
compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
19
A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
20
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
21
assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
22
regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
23
com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
24
5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
25
feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
26
legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
27
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
28
e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
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da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
33
declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
34
dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
35
Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
36
Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
42
caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
43
casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
44
heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
45
Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
46
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
47
CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
48
de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
enDocument
50
provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
51
a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
52
uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
59
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65
JURISPRUDEcircNCIA
Tribunal Constitucional
bull Acoacuterdatildeo nordm 3361986
bull Acoacuterdatildeo nordm 18881996
Supremo Tribunal de Justiccedila
bull Acoacuterdatildeo 9-07-2014 processo nordm 3076111TBLLEE1 S1
bull Acoacuterdatildeo 22-03-2018 processo nordm 6380169T8CBRC1 S1
Tribunal Central Administrativo Norte
bull Acoacuterdatildeo de 13-11-2020 processo nordm 00090151BECBR
Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra
bull Acoacuterdatildeo de 16-10-2012 processo nordm 50091TBALDC1
bull Acoacuterdatildeo de 08-03-2006 processo nordm 419705JTRC
Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa
bull Acoacuterdatildeo de 15-02-2007 processo nordm 62842006-8
bull Acoacuterdatildeo de 29-11-2012 processo nordm 444092TCFUNL1-A-8
bull Acoacuterdatildeo de 24-04-2019 processo nordm 12025160T8LRSL1-2
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
bull Acoacuterdatildeo JOHNSTON C IRLANDA de 18 de dezembro de 1986
bull Acoacuterdatildeo KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994
Tribunal Constitucional Espanhol
bull Sentenccedila nordm 1841990 de 15 de novembro Consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-T-1990-29360
bull Sentenccedila nordm 2221992 de 11 de dezembro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow2109
bull Sentenccedila nordm 661994 de 28 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalespt-BRResolucionShow2583
66
bull Sentenccedila nordm 391998 de 17 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalesesResolucionShow3541
bull Sentenccedila nordm 1161999 de 17 de junho Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow3858
Tribunal Constitucional Francecircs
bull Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil Constitutionnel de 29 de julho Consultaacutevel
em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm
4
Agrave minha famiacutelia
Ao meu Di
Sempre
5
Teria passado a vida
atormentado e sozinho
se os sonhos me natildeo viessem
mostrar qual eacute o caminho
umas vezes satildeo de noite
outras em pleno de sol
com relacircmpagos saltados
ou vagar de caracol
quem os manda natildeo sei eu
se o nada que eacute tudo agrave vida
ou se eu os finjo a mim mesmo
para ser sem que decida
AGOSTINHO DA SILVA Sonho in Poemas
6
IacuteNDICE
RESUMO 7
ABSTRACT 8
SIGLAS E ABREVIATURAS 9
1 Introduccedilatildeo 11
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs 12
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa 16
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo 20
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos 27
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo 30
51 Consideraccedilotildees gerais 30
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo Europeia 37
521 Espanha 37
522 Franccedila 41
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo nordm6380169T8CBRC1S1 46
54 Soluccedilatildeo proposta 52
6 Conclusatildeo 57
BIBLIOGRAFIA 59
JURISPRUDEcircNCIA 65
7
RESUMO
A figura da uniatildeo facto eacute uma realidade crescente com cada vez mais importacircncia
na nossa sociedade atual tendo em conta o consideraacutevel nuacutemero de pessoas que opta por
viver desta forma Sendo que pode esse nuacutemero derivar natildeo soacute da liberdade associada a este
regime como tambeacutem do facto de poder ser uma circunstacircncia provisoacuteria e transitoacuteria Pode
ateacute tratar-se de uma circunstacircncia definitiva em virtude de por inuacutemeras razotildees os membros
da uniatildeo de facto natildeo quererem casar ora por natildeo terem condiccedilotildees financeiras para celebrar
um casamento ora por natildeo fazer parte da sua cultura formalizarem a sua relaccedilatildeo
Apesar da importacircncia da uniatildeo de facto e da sua relevacircncia na sociedade o seu
regime juriacutedico eacute parco apresentando lacunas relativamente agraves normas sobre o seu registo
regime de bens entre os membros a sua extinccedilatildeo e efeitos sucessoacuterios Estas e outras
mateacuterias deveriam ter uma regulamentaccedilatildeo mais completa para que se pudesse oferecer uma
maior proteccedilatildeo aos unidos de facto
Pretendemos essencialmente analisar por estar estritamente ligado ao facto de a
uniatildeo de facto natildeo ser objeto de registo civil ou administrativo o problema da prova da
existecircncia e do iniacutecio da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto e desta forma refletir sobre as vantagens
que provecircm do registo deste tipo de relaccedilotildees
PALAVRAS-CHAVE uniatildeo de facto prova da coabitaccedilatildeo registo civil
8
ABSTRACT
The figure of consensual union is an increasingly important reality in our society
today given the considerable amount of people who choose to live this way This number
can derive not only from the freedom associated with this regime but also from the fact that
it can be a temporary and transitory circumstance It may even be a definitive circumstance
because for a number of reasons the unmarried partners do not want to get married either
because they do not have the financial means to enter into a marriage or because it is not part
of their culture to formalise their relationship
Despite the importance of the non-marital partnership and its relevance in society
its legal system is scarce with gaps regarding the rules on its registration the system of
property between members its extinction and inheritance effects These and other matters
should be regulated more fully in order to offer greater protection to consensual union
The main aim is to analyse as it is strictly linked to the fact that consensual union
is not subject to civil or administrative registration the problem of proving the existence and
the beginning of this situation and thus reflect on the advantages that come from the
registration of this type of relationship
KEYWORDS non-marital partnership proof of cohabitation civil registry
9
SIGLAS E ABREVIATURAS
A- Autor
AA- Autores
Ac- Acoacuterdatildeo
Art ndash Artigo
Arts ndash Artigos
Ed - Ediccedilatildeo
In - Em
ob cit - Obra Citada
p ndash paacutegina
pp paacuteginas
ss - Seguintes
vg - verbi gratia
Vol ndash Volume
CCiv ndash Coacutedigo Civil
CEDH ndash Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem
CNP- Centro Nacional de Pensotildees
CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil
CReg Civ ndash Coacutedigo de Registo Civil
CRP ndash Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
DUDH ndash Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos
ISS ndash Instituto da Seguranccedila Social
10
LUF ndash Lei da Uniatildeo de Facto (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010
de 30 de Agosto)
PACS ndash Pacto civil de Solidariedade
STJ ndash Supremo Tribunal de Justiccedila
TCE - Tribunal Constitucional Espanhol
TEDH ndash Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
ed vol I Lisboa Livraria Petrony1999 p 31 DIOGO LEITE DE CAMPOS ldquo Liccedilotildees de Direito da Famiacuteliardquo 2ordf
Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
16
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
17
idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
18
compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
19
A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
20
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
21
assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
22
regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
23
com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
24
5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
25
feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
26
legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
27
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
28
e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
29
da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
33
declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
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dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
35
Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
36
Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
42
caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
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casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
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heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
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Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
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53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
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CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
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de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
enDocument
50
provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
51
a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
52
uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
59
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65
JURISPRUDEcircNCIA
Tribunal Constitucional
bull Acoacuterdatildeo nordm 3361986
bull Acoacuterdatildeo nordm 18881996
Supremo Tribunal de Justiccedila
bull Acoacuterdatildeo 9-07-2014 processo nordm 3076111TBLLEE1 S1
bull Acoacuterdatildeo 22-03-2018 processo nordm 6380169T8CBRC1 S1
Tribunal Central Administrativo Norte
bull Acoacuterdatildeo de 13-11-2020 processo nordm 00090151BECBR
Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra
bull Acoacuterdatildeo de 16-10-2012 processo nordm 50091TBALDC1
bull Acoacuterdatildeo de 08-03-2006 processo nordm 419705JTRC
Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa
bull Acoacuterdatildeo de 15-02-2007 processo nordm 62842006-8
bull Acoacuterdatildeo de 29-11-2012 processo nordm 444092TCFUNL1-A-8
bull Acoacuterdatildeo de 24-04-2019 processo nordm 12025160T8LRSL1-2
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
bull Acoacuterdatildeo JOHNSTON C IRLANDA de 18 de dezembro de 1986
bull Acoacuterdatildeo KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994
Tribunal Constitucional Espanhol
bull Sentenccedila nordm 1841990 de 15 de novembro Consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-T-1990-29360
bull Sentenccedila nordm 2221992 de 11 de dezembro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow2109
bull Sentenccedila nordm 661994 de 28 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalespt-BRResolucionShow2583
66
bull Sentenccedila nordm 391998 de 17 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalesesResolucionShow3541
bull Sentenccedila nordm 1161999 de 17 de junho Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow3858
Tribunal Constitucional Francecircs
bull Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil Constitutionnel de 29 de julho Consultaacutevel
em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm
5
Teria passado a vida
atormentado e sozinho
se os sonhos me natildeo viessem
mostrar qual eacute o caminho
umas vezes satildeo de noite
outras em pleno de sol
com relacircmpagos saltados
ou vagar de caracol
quem os manda natildeo sei eu
se o nada que eacute tudo agrave vida
ou se eu os finjo a mim mesmo
para ser sem que decida
AGOSTINHO DA SILVA Sonho in Poemas
6
IacuteNDICE
RESUMO 7
ABSTRACT 8
SIGLAS E ABREVIATURAS 9
1 Introduccedilatildeo 11
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs 12
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa 16
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo 20
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos 27
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo 30
51 Consideraccedilotildees gerais 30
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo Europeia 37
521 Espanha 37
522 Franccedila 41
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo nordm6380169T8CBRC1S1 46
54 Soluccedilatildeo proposta 52
6 Conclusatildeo 57
BIBLIOGRAFIA 59
JURISPRUDEcircNCIA 65
7
RESUMO
A figura da uniatildeo facto eacute uma realidade crescente com cada vez mais importacircncia
na nossa sociedade atual tendo em conta o consideraacutevel nuacutemero de pessoas que opta por
viver desta forma Sendo que pode esse nuacutemero derivar natildeo soacute da liberdade associada a este
regime como tambeacutem do facto de poder ser uma circunstacircncia provisoacuteria e transitoacuteria Pode
ateacute tratar-se de uma circunstacircncia definitiva em virtude de por inuacutemeras razotildees os membros
da uniatildeo de facto natildeo quererem casar ora por natildeo terem condiccedilotildees financeiras para celebrar
um casamento ora por natildeo fazer parte da sua cultura formalizarem a sua relaccedilatildeo
Apesar da importacircncia da uniatildeo de facto e da sua relevacircncia na sociedade o seu
regime juriacutedico eacute parco apresentando lacunas relativamente agraves normas sobre o seu registo
regime de bens entre os membros a sua extinccedilatildeo e efeitos sucessoacuterios Estas e outras
mateacuterias deveriam ter uma regulamentaccedilatildeo mais completa para que se pudesse oferecer uma
maior proteccedilatildeo aos unidos de facto
Pretendemos essencialmente analisar por estar estritamente ligado ao facto de a
uniatildeo de facto natildeo ser objeto de registo civil ou administrativo o problema da prova da
existecircncia e do iniacutecio da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto e desta forma refletir sobre as vantagens
que provecircm do registo deste tipo de relaccedilotildees
PALAVRAS-CHAVE uniatildeo de facto prova da coabitaccedilatildeo registo civil
8
ABSTRACT
The figure of consensual union is an increasingly important reality in our society
today given the considerable amount of people who choose to live this way This number
can derive not only from the freedom associated with this regime but also from the fact that
it can be a temporary and transitory circumstance It may even be a definitive circumstance
because for a number of reasons the unmarried partners do not want to get married either
because they do not have the financial means to enter into a marriage or because it is not part
of their culture to formalise their relationship
Despite the importance of the non-marital partnership and its relevance in society
its legal system is scarce with gaps regarding the rules on its registration the system of
property between members its extinction and inheritance effects These and other matters
should be regulated more fully in order to offer greater protection to consensual union
The main aim is to analyse as it is strictly linked to the fact that consensual union
is not subject to civil or administrative registration the problem of proving the existence and
the beginning of this situation and thus reflect on the advantages that come from the
registration of this type of relationship
KEYWORDS non-marital partnership proof of cohabitation civil registry
9
SIGLAS E ABREVIATURAS
A- Autor
AA- Autores
Ac- Acoacuterdatildeo
Art ndash Artigo
Arts ndash Artigos
Ed - Ediccedilatildeo
In - Em
ob cit - Obra Citada
p ndash paacutegina
pp paacuteginas
ss - Seguintes
vg - verbi gratia
Vol ndash Volume
CCiv ndash Coacutedigo Civil
CEDH ndash Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem
CNP- Centro Nacional de Pensotildees
CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil
CReg Civ ndash Coacutedigo de Registo Civil
CRP ndash Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
DUDH ndash Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos
ISS ndash Instituto da Seguranccedila Social
10
LUF ndash Lei da Uniatildeo de Facto (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010
de 30 de Agosto)
PACS ndash Pacto civil de Solidariedade
STJ ndash Supremo Tribunal de Justiccedila
TCE - Tribunal Constitucional Espanhol
TEDH ndash Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
ed vol I Lisboa Livraria Petrony1999 p 31 DIOGO LEITE DE CAMPOS ldquo Liccedilotildees de Direito da Famiacuteliardquo 2ordf
Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
16
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
17
idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
18
compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
19
A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
20
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
21
assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
22
regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
23
com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
24
5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
25
feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
26
legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
27
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
28
e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
29
da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
33
declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
34
dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
35
Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
36
Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
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caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
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casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
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heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
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Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
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53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
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CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
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de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
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provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
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a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
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uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
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65
JURISPRUDEcircNCIA
Tribunal Constitucional
bull Acoacuterdatildeo nordm 3361986
bull Acoacuterdatildeo nordm 18881996
Supremo Tribunal de Justiccedila
bull Acoacuterdatildeo 9-07-2014 processo nordm 3076111TBLLEE1 S1
bull Acoacuterdatildeo 22-03-2018 processo nordm 6380169T8CBRC1 S1
Tribunal Central Administrativo Norte
bull Acoacuterdatildeo de 13-11-2020 processo nordm 00090151BECBR
Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra
bull Acoacuterdatildeo de 16-10-2012 processo nordm 50091TBALDC1
bull Acoacuterdatildeo de 08-03-2006 processo nordm 419705JTRC
Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa
bull Acoacuterdatildeo de 15-02-2007 processo nordm 62842006-8
bull Acoacuterdatildeo de 29-11-2012 processo nordm 444092TCFUNL1-A-8
bull Acoacuterdatildeo de 24-04-2019 processo nordm 12025160T8LRSL1-2
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
bull Acoacuterdatildeo JOHNSTON C IRLANDA de 18 de dezembro de 1986
bull Acoacuterdatildeo KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994
Tribunal Constitucional Espanhol
bull Sentenccedila nordm 1841990 de 15 de novembro Consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-T-1990-29360
bull Sentenccedila nordm 2221992 de 11 de dezembro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow2109
bull Sentenccedila nordm 661994 de 28 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalespt-BRResolucionShow2583
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bull Sentenccedila nordm 391998 de 17 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalesesResolucionShow3541
bull Sentenccedila nordm 1161999 de 17 de junho Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow3858
Tribunal Constitucional Francecircs
bull Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil Constitutionnel de 29 de julho Consultaacutevel
em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm
6
IacuteNDICE
RESUMO 7
ABSTRACT 8
SIGLAS E ABREVIATURAS 9
1 Introduccedilatildeo 11
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs 12
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa 16
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo 20
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos 27
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo 30
51 Consideraccedilotildees gerais 30
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo Europeia 37
521 Espanha 37
522 Franccedila 41
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo nordm6380169T8CBRC1S1 46
54 Soluccedilatildeo proposta 52
6 Conclusatildeo 57
BIBLIOGRAFIA 59
JURISPRUDEcircNCIA 65
7
RESUMO
A figura da uniatildeo facto eacute uma realidade crescente com cada vez mais importacircncia
na nossa sociedade atual tendo em conta o consideraacutevel nuacutemero de pessoas que opta por
viver desta forma Sendo que pode esse nuacutemero derivar natildeo soacute da liberdade associada a este
regime como tambeacutem do facto de poder ser uma circunstacircncia provisoacuteria e transitoacuteria Pode
ateacute tratar-se de uma circunstacircncia definitiva em virtude de por inuacutemeras razotildees os membros
da uniatildeo de facto natildeo quererem casar ora por natildeo terem condiccedilotildees financeiras para celebrar
um casamento ora por natildeo fazer parte da sua cultura formalizarem a sua relaccedilatildeo
Apesar da importacircncia da uniatildeo de facto e da sua relevacircncia na sociedade o seu
regime juriacutedico eacute parco apresentando lacunas relativamente agraves normas sobre o seu registo
regime de bens entre os membros a sua extinccedilatildeo e efeitos sucessoacuterios Estas e outras
mateacuterias deveriam ter uma regulamentaccedilatildeo mais completa para que se pudesse oferecer uma
maior proteccedilatildeo aos unidos de facto
Pretendemos essencialmente analisar por estar estritamente ligado ao facto de a
uniatildeo de facto natildeo ser objeto de registo civil ou administrativo o problema da prova da
existecircncia e do iniacutecio da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto e desta forma refletir sobre as vantagens
que provecircm do registo deste tipo de relaccedilotildees
PALAVRAS-CHAVE uniatildeo de facto prova da coabitaccedilatildeo registo civil
8
ABSTRACT
The figure of consensual union is an increasingly important reality in our society
today given the considerable amount of people who choose to live this way This number
can derive not only from the freedom associated with this regime but also from the fact that
it can be a temporary and transitory circumstance It may even be a definitive circumstance
because for a number of reasons the unmarried partners do not want to get married either
because they do not have the financial means to enter into a marriage or because it is not part
of their culture to formalise their relationship
Despite the importance of the non-marital partnership and its relevance in society
its legal system is scarce with gaps regarding the rules on its registration the system of
property between members its extinction and inheritance effects These and other matters
should be regulated more fully in order to offer greater protection to consensual union
The main aim is to analyse as it is strictly linked to the fact that consensual union
is not subject to civil or administrative registration the problem of proving the existence and
the beginning of this situation and thus reflect on the advantages that come from the
registration of this type of relationship
KEYWORDS non-marital partnership proof of cohabitation civil registry
9
SIGLAS E ABREVIATURAS
A- Autor
AA- Autores
Ac- Acoacuterdatildeo
Art ndash Artigo
Arts ndash Artigos
Ed - Ediccedilatildeo
In - Em
ob cit - Obra Citada
p ndash paacutegina
pp paacuteginas
ss - Seguintes
vg - verbi gratia
Vol ndash Volume
CCiv ndash Coacutedigo Civil
CEDH ndash Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem
CNP- Centro Nacional de Pensotildees
CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil
CReg Civ ndash Coacutedigo de Registo Civil
CRP ndash Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
DUDH ndash Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos
ISS ndash Instituto da Seguranccedila Social
10
LUF ndash Lei da Uniatildeo de Facto (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010
de 30 de Agosto)
PACS ndash Pacto civil de Solidariedade
STJ ndash Supremo Tribunal de Justiccedila
TCE - Tribunal Constitucional Espanhol
TEDH ndash Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
ed vol I Lisboa Livraria Petrony1999 p 31 DIOGO LEITE DE CAMPOS ldquo Liccedilotildees de Direito da Famiacuteliardquo 2ordf
Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
16
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
17
idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
18
compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
19
A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
20
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
21
assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
22
regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
23
com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
24
5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
25
feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
26
legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
27
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
28
e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
29
da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
33
declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
34
dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
35
Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
36
Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
42
caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
43
casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
44
heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
45
Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
46
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
47
CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
48
de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
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provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
51
a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
52
uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
59
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bull Acoacuterdatildeo nordm 18881996
Supremo Tribunal de Justiccedila
bull Acoacuterdatildeo 9-07-2014 processo nordm 3076111TBLLEE1 S1
bull Acoacuterdatildeo 22-03-2018 processo nordm 6380169T8CBRC1 S1
Tribunal Central Administrativo Norte
bull Acoacuterdatildeo de 13-11-2020 processo nordm 00090151BECBR
Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra
bull Acoacuterdatildeo de 16-10-2012 processo nordm 50091TBALDC1
bull Acoacuterdatildeo de 08-03-2006 processo nordm 419705JTRC
Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa
bull Acoacuterdatildeo de 15-02-2007 processo nordm 62842006-8
bull Acoacuterdatildeo de 29-11-2012 processo nordm 444092TCFUNL1-A-8
bull Acoacuterdatildeo de 24-04-2019 processo nordm 12025160T8LRSL1-2
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
bull Acoacuterdatildeo JOHNSTON C IRLANDA de 18 de dezembro de 1986
bull Acoacuterdatildeo KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994
Tribunal Constitucional Espanhol
bull Sentenccedila nordm 1841990 de 15 de novembro Consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-T-1990-29360
bull Sentenccedila nordm 2221992 de 11 de dezembro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow2109
bull Sentenccedila nordm 661994 de 28 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalespt-BRResolucionShow2583
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bull Sentenccedila nordm 391998 de 17 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalesesResolucionShow3541
bull Sentenccedila nordm 1161999 de 17 de junho Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow3858
Tribunal Constitucional Francecircs
bull Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil Constitutionnel de 29 de julho Consultaacutevel
em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm
7
RESUMO
A figura da uniatildeo facto eacute uma realidade crescente com cada vez mais importacircncia
na nossa sociedade atual tendo em conta o consideraacutevel nuacutemero de pessoas que opta por
viver desta forma Sendo que pode esse nuacutemero derivar natildeo soacute da liberdade associada a este
regime como tambeacutem do facto de poder ser uma circunstacircncia provisoacuteria e transitoacuteria Pode
ateacute tratar-se de uma circunstacircncia definitiva em virtude de por inuacutemeras razotildees os membros
da uniatildeo de facto natildeo quererem casar ora por natildeo terem condiccedilotildees financeiras para celebrar
um casamento ora por natildeo fazer parte da sua cultura formalizarem a sua relaccedilatildeo
Apesar da importacircncia da uniatildeo de facto e da sua relevacircncia na sociedade o seu
regime juriacutedico eacute parco apresentando lacunas relativamente agraves normas sobre o seu registo
regime de bens entre os membros a sua extinccedilatildeo e efeitos sucessoacuterios Estas e outras
mateacuterias deveriam ter uma regulamentaccedilatildeo mais completa para que se pudesse oferecer uma
maior proteccedilatildeo aos unidos de facto
Pretendemos essencialmente analisar por estar estritamente ligado ao facto de a
uniatildeo de facto natildeo ser objeto de registo civil ou administrativo o problema da prova da
existecircncia e do iniacutecio da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto e desta forma refletir sobre as vantagens
que provecircm do registo deste tipo de relaccedilotildees
PALAVRAS-CHAVE uniatildeo de facto prova da coabitaccedilatildeo registo civil
8
ABSTRACT
The figure of consensual union is an increasingly important reality in our society
today given the considerable amount of people who choose to live this way This number
can derive not only from the freedom associated with this regime but also from the fact that
it can be a temporary and transitory circumstance It may even be a definitive circumstance
because for a number of reasons the unmarried partners do not want to get married either
because they do not have the financial means to enter into a marriage or because it is not part
of their culture to formalise their relationship
Despite the importance of the non-marital partnership and its relevance in society
its legal system is scarce with gaps regarding the rules on its registration the system of
property between members its extinction and inheritance effects These and other matters
should be regulated more fully in order to offer greater protection to consensual union
The main aim is to analyse as it is strictly linked to the fact that consensual union
is not subject to civil or administrative registration the problem of proving the existence and
the beginning of this situation and thus reflect on the advantages that come from the
registration of this type of relationship
KEYWORDS non-marital partnership proof of cohabitation civil registry
9
SIGLAS E ABREVIATURAS
A- Autor
AA- Autores
Ac- Acoacuterdatildeo
Art ndash Artigo
Arts ndash Artigos
Ed - Ediccedilatildeo
In - Em
ob cit - Obra Citada
p ndash paacutegina
pp paacuteginas
ss - Seguintes
vg - verbi gratia
Vol ndash Volume
CCiv ndash Coacutedigo Civil
CEDH ndash Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem
CNP- Centro Nacional de Pensotildees
CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil
CReg Civ ndash Coacutedigo de Registo Civil
CRP ndash Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
DUDH ndash Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos
ISS ndash Instituto da Seguranccedila Social
10
LUF ndash Lei da Uniatildeo de Facto (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010
de 30 de Agosto)
PACS ndash Pacto civil de Solidariedade
STJ ndash Supremo Tribunal de Justiccedila
TCE - Tribunal Constitucional Espanhol
TEDH ndash Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
ed vol I Lisboa Livraria Petrony1999 p 31 DIOGO LEITE DE CAMPOS ldquo Liccedilotildees de Direito da Famiacuteliardquo 2ordf
Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
16
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
17
idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
18
compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
19
A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
20
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
21
assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
22
regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
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com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
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5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
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feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
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legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
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4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
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e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
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da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
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declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
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dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
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Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
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Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
42
caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
43
casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
44
heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
45
Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
46
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
47
CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
48
de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
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provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
51
a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
52
uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
59
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bull Acoacuterdatildeo nordm 18881996
Supremo Tribunal de Justiccedila
bull Acoacuterdatildeo 9-07-2014 processo nordm 3076111TBLLEE1 S1
bull Acoacuterdatildeo 22-03-2018 processo nordm 6380169T8CBRC1 S1
Tribunal Central Administrativo Norte
bull Acoacuterdatildeo de 13-11-2020 processo nordm 00090151BECBR
Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra
bull Acoacuterdatildeo de 16-10-2012 processo nordm 50091TBALDC1
bull Acoacuterdatildeo de 08-03-2006 processo nordm 419705JTRC
Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa
bull Acoacuterdatildeo de 15-02-2007 processo nordm 62842006-8
bull Acoacuterdatildeo de 29-11-2012 processo nordm 444092TCFUNL1-A-8
bull Acoacuterdatildeo de 24-04-2019 processo nordm 12025160T8LRSL1-2
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
bull Acoacuterdatildeo JOHNSTON C IRLANDA de 18 de dezembro de 1986
bull Acoacuterdatildeo KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994
Tribunal Constitucional Espanhol
bull Sentenccedila nordm 1841990 de 15 de novembro Consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-T-1990-29360
bull Sentenccedila nordm 2221992 de 11 de dezembro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow2109
bull Sentenccedila nordm 661994 de 28 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalespt-BRResolucionShow2583
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bull Sentenccedila nordm 391998 de 17 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalesesResolucionShow3541
bull Sentenccedila nordm 1161999 de 17 de junho Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow3858
Tribunal Constitucional Francecircs
bull Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil Constitutionnel de 29 de julho Consultaacutevel
em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm
8
ABSTRACT
The figure of consensual union is an increasingly important reality in our society
today given the considerable amount of people who choose to live this way This number
can derive not only from the freedom associated with this regime but also from the fact that
it can be a temporary and transitory circumstance It may even be a definitive circumstance
because for a number of reasons the unmarried partners do not want to get married either
because they do not have the financial means to enter into a marriage or because it is not part
of their culture to formalise their relationship
Despite the importance of the non-marital partnership and its relevance in society
its legal system is scarce with gaps regarding the rules on its registration the system of
property between members its extinction and inheritance effects These and other matters
should be regulated more fully in order to offer greater protection to consensual union
The main aim is to analyse as it is strictly linked to the fact that consensual union
is not subject to civil or administrative registration the problem of proving the existence and
the beginning of this situation and thus reflect on the advantages that come from the
registration of this type of relationship
KEYWORDS non-marital partnership proof of cohabitation civil registry
9
SIGLAS E ABREVIATURAS
A- Autor
AA- Autores
Ac- Acoacuterdatildeo
Art ndash Artigo
Arts ndash Artigos
Ed - Ediccedilatildeo
In - Em
ob cit - Obra Citada
p ndash paacutegina
pp paacuteginas
ss - Seguintes
vg - verbi gratia
Vol ndash Volume
CCiv ndash Coacutedigo Civil
CEDH ndash Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem
CNP- Centro Nacional de Pensotildees
CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil
CReg Civ ndash Coacutedigo de Registo Civil
CRP ndash Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
DUDH ndash Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos
ISS ndash Instituto da Seguranccedila Social
10
LUF ndash Lei da Uniatildeo de Facto (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010
de 30 de Agosto)
PACS ndash Pacto civil de Solidariedade
STJ ndash Supremo Tribunal de Justiccedila
TCE - Tribunal Constitucional Espanhol
TEDH ndash Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
ed vol I Lisboa Livraria Petrony1999 p 31 DIOGO LEITE DE CAMPOS ldquo Liccedilotildees de Direito da Famiacuteliardquo 2ordf
Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
16
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
17
idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
18
compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
19
A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
20
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
21
assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
22
regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
23
com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
24
5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
25
feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
26
legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
27
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
28
e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
29
da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
33
declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
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dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
35
Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
36
Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
42
caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
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casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
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heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
45
Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
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53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
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CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
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de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
enDocument
50
provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
51
a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
52
uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
59
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bull Acoacuterdatildeo nordm 3361986
bull Acoacuterdatildeo nordm 18881996
Supremo Tribunal de Justiccedila
bull Acoacuterdatildeo 9-07-2014 processo nordm 3076111TBLLEE1 S1
bull Acoacuterdatildeo 22-03-2018 processo nordm 6380169T8CBRC1 S1
Tribunal Central Administrativo Norte
bull Acoacuterdatildeo de 13-11-2020 processo nordm 00090151BECBR
Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra
bull Acoacuterdatildeo de 16-10-2012 processo nordm 50091TBALDC1
bull Acoacuterdatildeo de 08-03-2006 processo nordm 419705JTRC
Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa
bull Acoacuterdatildeo de 15-02-2007 processo nordm 62842006-8
bull Acoacuterdatildeo de 29-11-2012 processo nordm 444092TCFUNL1-A-8
bull Acoacuterdatildeo de 24-04-2019 processo nordm 12025160T8LRSL1-2
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
bull Acoacuterdatildeo JOHNSTON C IRLANDA de 18 de dezembro de 1986
bull Acoacuterdatildeo KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994
Tribunal Constitucional Espanhol
bull Sentenccedila nordm 1841990 de 15 de novembro Consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-T-1990-29360
bull Sentenccedila nordm 2221992 de 11 de dezembro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow2109
bull Sentenccedila nordm 661994 de 28 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalespt-BRResolucionShow2583
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bull Sentenccedila nordm 391998 de 17 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalesesResolucionShow3541
bull Sentenccedila nordm 1161999 de 17 de junho Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow3858
Tribunal Constitucional Francecircs
bull Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil Constitutionnel de 29 de julho Consultaacutevel
em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm
9
SIGLAS E ABREVIATURAS
A- Autor
AA- Autores
Ac- Acoacuterdatildeo
Art ndash Artigo
Arts ndash Artigos
Ed - Ediccedilatildeo
In - Em
ob cit - Obra Citada
p ndash paacutegina
pp paacuteginas
ss - Seguintes
vg - verbi gratia
Vol ndash Volume
CCiv ndash Coacutedigo Civil
CEDH ndash Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem
CNP- Centro Nacional de Pensotildees
CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil
CReg Civ ndash Coacutedigo de Registo Civil
CRP ndash Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
DUDH ndash Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos
ISS ndash Instituto da Seguranccedila Social
10
LUF ndash Lei da Uniatildeo de Facto (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010
de 30 de Agosto)
PACS ndash Pacto civil de Solidariedade
STJ ndash Supremo Tribunal de Justiccedila
TCE - Tribunal Constitucional Espanhol
TEDH ndash Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
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Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
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3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
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idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
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compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
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A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
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31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
21
assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
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regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
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com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
24
5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
25
feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
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legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
27
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
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e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
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da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
33
declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
34
dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
35
Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
36
Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
42
caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
43
casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
44
heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
45
Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
46
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
47
CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
48
de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
enDocument
50
provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
51
a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
52
uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
59
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64
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PINHEIRO Jorge Duarte ldquoO Direito da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed reimpressatildeo
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PITAtildeO Joseacute Antoacutenio de Franccedila ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei
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65
JURISPRUDEcircNCIA
Tribunal Constitucional
bull Acoacuterdatildeo nordm 3361986
bull Acoacuterdatildeo nordm 18881996
Supremo Tribunal de Justiccedila
bull Acoacuterdatildeo 9-07-2014 processo nordm 3076111TBLLEE1 S1
bull Acoacuterdatildeo 22-03-2018 processo nordm 6380169T8CBRC1 S1
Tribunal Central Administrativo Norte
bull Acoacuterdatildeo de 13-11-2020 processo nordm 00090151BECBR
Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra
bull Acoacuterdatildeo de 16-10-2012 processo nordm 50091TBALDC1
bull Acoacuterdatildeo de 08-03-2006 processo nordm 419705JTRC
Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa
bull Acoacuterdatildeo de 15-02-2007 processo nordm 62842006-8
bull Acoacuterdatildeo de 29-11-2012 processo nordm 444092TCFUNL1-A-8
bull Acoacuterdatildeo de 24-04-2019 processo nordm 12025160T8LRSL1-2
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
bull Acoacuterdatildeo JOHNSTON C IRLANDA de 18 de dezembro de 1986
bull Acoacuterdatildeo KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994
Tribunal Constitucional Espanhol
bull Sentenccedila nordm 1841990 de 15 de novembro Consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-T-1990-29360
bull Sentenccedila nordm 2221992 de 11 de dezembro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow2109
bull Sentenccedila nordm 661994 de 28 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalespt-BRResolucionShow2583
66
bull Sentenccedila nordm 391998 de 17 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalesesResolucionShow3541
bull Sentenccedila nordm 1161999 de 17 de junho Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow3858
Tribunal Constitucional Francecircs
bull Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil Constitutionnel de 29 de julho Consultaacutevel
em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm
10
LUF ndash Lei da Uniatildeo de Facto (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010
de 30 de Agosto)
PACS ndash Pacto civil de Solidariedade
STJ ndash Supremo Tribunal de Justiccedila
TCE - Tribunal Constitucional Espanhol
TEDH ndash Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
ed vol I Lisboa Livraria Petrony1999 p 31 DIOGO LEITE DE CAMPOS ldquo Liccedilotildees de Direito da Famiacuteliardquo 2ordf
Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
16
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
17
idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
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compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
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A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
20
31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
21
assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
22
regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
23
com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
24
5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
25
feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
26
legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
27
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
28
e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
29
da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
33
declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
34
dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
35
Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
36
Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
42
caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
43
casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
44
heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
45
Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
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53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
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CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
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de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
enDocument
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provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
51
a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
52
uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
59
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Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa
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bull Acoacuterdatildeo de 29-11-2012 processo nordm 444092TCFUNL1-A-8
bull Acoacuterdatildeo de 24-04-2019 processo nordm 12025160T8LRSL1-2
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
bull Acoacuterdatildeo JOHNSTON C IRLANDA de 18 de dezembro de 1986
bull Acoacuterdatildeo KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994
Tribunal Constitucional Espanhol
bull Sentenccedila nordm 1841990 de 15 de novembro Consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-T-1990-29360
bull Sentenccedila nordm 2221992 de 11 de dezembro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow2109
bull Sentenccedila nordm 661994 de 28 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalespt-BRResolucionShow2583
66
bull Sentenccedila nordm 391998 de 17 de fevereiro Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionalesesResolucionShow3541
bull Sentenccedila nordm 1161999 de 17 de junho Consultaacutevel em
httphjtribunalconstitucionaleses-ESResolucionShow3858
Tribunal Constitucional Francecircs
bull Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil Constitutionnel de 29 de julho Consultaacutevel
em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm
11
1 Introduccedilatildeo
O presente estudo visa abordar a questatildeo do problema da prova da coabitaccedilatildeo numa
situaccedilatildeo em que se pretende provar a existecircncia de uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto para que
esta produza os efeitos que os membros pretendam Assim cumpriraacute analisar o regime
juriacutedico da Uniatildeo de Facto comeccedilando pela sua evoluccedilatildeo no nosso ordenamento e sobre a
importacircncia da LUF (Lei nordm 72001 de 11 de Maio alterada pela Lei nordm 232010 de 30 de
Agosto)
Uma vez analisada a proteccedilatildeo oferecida agraves situaccedilotildees de Uniatildeo de Facto
nomeadamente a sua (natildeo) alusatildeo na CRP caberaacute comparaacute-la agrave concedida ao casamento e
observar de que forma a liberdade caracteriacutestica do regime da uniatildeo de facto poderaacute deixar
desprotegidas algumas situaccedilotildees carentes de proteccedilatildeo
De seguida feita uma reflexatildeo geral importaraacute compreender como se constitui a
uniatildeo de facto Passando os membros a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo e natildeo
sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo civil ou administrativo ao contraacuterio do que acontece
em alguns ordenamentos vizinhos que tambeacutem mereceratildeo a nossa anaacutelise torna-se mais
difiacutecil saber de forma exata quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os
dois anos necessaacuterios para que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm
da LUF
A questatildeo primordial eacute assim a prova da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto nomeadamente
a prova da coabitaccedilatildeo que se pode revelar sinuosa Perante este cenaacuterio torna-se relevante
analisar jurisprudecircncia nomeadamente o Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 proferido
no acircmbito do processo nordm 6380169T8CBRC1 S1 relativamente agrave prova da uniatildeo de facto
no campo juriacutedico-civil isto eacute atraveacutes do regime geral do oacutenus da prova previsto no artigo
342ordm do CCiv que atribui a quem pretende invocar um direito provar os factos que o
constituem
A final com a nossa anaacutelise e apreciaccedilatildeo dos entendimentos da jurisprudecircncia e da
doutrina nacional e europeia pretendemos demonstrar a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto no nosso ordenamento juriacutedico e procurar propostas de soluccedilotildees que possam facilitar
de alguma forma a comprovaccedilatildeo da existecircncia destas relaccedilotildees cessando as dificuldades que
essa comprovaccedilatildeo origina
12
2 A evoluccedilatildeo da Uniatildeo de Facto no ordenamento juriacutedico portuguecircs
Quando se fala de uniatildeo de facto tem forccedilosamente de se aludir agrave discussatildeo
doutrinal acerca da sua classificaccedilatildeo como relaccedilatildeo (para)familiar que surge em grande
parte pelo disposto no artigo 36ordm n ordm1 CRP1 Pela sua ambiguidade haacute quem pense que a
referecircncia agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia engloba a uniatildeo de facto2 sendo o seu reconhecimento
juriacutedico feito pela Constituiccedilatildeo Contudo este preceito natildeo eacute assim interpretado por todos
que entendem que este apenas postula o direito de constituir famiacutelia e estabelece as relaccedilotildees
de filiaccedilatildeo e que apesar da uniatildeo de facto natildeo ser uma relaccedilatildeo de famiacutelia no que respeita agrave
generalidade dos efeitos pode ser assim qualificada para efeitos fiscais de locaccedilatildeo de
seguranccedila social entre outros3 Neste seguimento muitos satildeo os AA que tecircm vindo a
expressar a sua opiniatildeo quanto a esta questatildeo havendo quem considere que a situaccedilatildeo de
facto anaacuteloga agrave dos cocircnjuges se deve considerar uma relaccedilatildeo familiar tanto quanto as
previstas no artigo 1576ordm do Coacutedigo Civil ou seja o casamento o parentesco a afinidade
e a adoccedilatildeo4 E ainda quem defenda que natildeo deve ser qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica de
famiacutelia5 ou que o seja apenas em relaccedilatildeo a certos efeitos considerando-a desta forma uma
relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar6
1 1 Todos tecircm o direito de constituir famiacutelia e de contrair casamento em condiccedilotildees de plena igualdade
Disposiccedilatildeo inspirada no art 16ordm DUDH e 12ordm CEDH Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa Anotada 4ordf ed revista vol I Coimbra Coimbra Editora 2007 p 559 2 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561 3 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo In AAVV Temas de Direito
da Famiacutelia Ciclo de Conferecircncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados Coimbra
Almedina 1996 p 8 FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista
de Legislaccedilatildeo e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 pp 82-83 4 Cfr CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL ldquoRelance Criacutetico sobre o Direito de Famiacutelia portuguecircsrdquo in Textos de
Direito da Famiacutelia para FRANCISCO PEREIRA COELHO Coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa
da Universidade de Coimbra 2016 pp109-110 CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL JOSEacute SILVA PEREIRA
ldquoDireito da Famiacutelia Toacutepicos para uma reflexatildeo criacuteticardquo Lisboa AAFDL 2008 p 46 no mesmo sentido
GERALDO DA CRUZ ALMEIDA ldquoDa uniatildeo de facto convivecircncia more uxorio em direito internacional privadordquo
Lisboa Pedro Ferreira Editor 1999 p 184 TELMA CARVALHO ldquoA uniatildeo de facto a sua eficaacutecia juriacutedicardquo in
Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da reforma de 1977 vol I Coimbra Coimbra
Editora 2004 pp 223-226 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova
Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge Miranda Vol VI Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 460 e MARIA MARGARIDA PEREIRArdquo Direito da
Famiacuteliardquo Lisboa AAFDL Editora 3ordf ed 2019 pp 641-644 com quem tendemos a concordar embora como
veremos infra tal natildeo significa uma igualdade de tratamento entre a uniatildeo de facto e o casamento 5 Cfr JOAtildeO CASTRO MENDES MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA ldquoDireito da Famiacuteliardquo AAFDL Lisboa 1995 p
14-15 NUNO DE SALTER CID ldquoA Comunhatildeo de Vida agrave Margem do Casamento entre o facto e o Direitordquo
Almedina Coimbra 2005 p 505 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com a
Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo 3ordf ed Almedina Coimbra 2011 p35 6 Em todas estas relaccedilotildees (as dispostas no art1576ordm CCiv) encontramos um viacutenculo constituiacutedo por direitos
e deveres juriacutedicos reciacuteprocos () As relaccedilotildees juriacutedicas familiares satildeo tendencialmente duradouras e eacute por
13
A designaccedilatildeo uniatildeo de facto foi utilizada pela primeira vez no nosso ordenamento
juriacutedico com a Reforma de 1977 do Coacutedigo Civil7 passando o artigo 2020ordm a prever o direito
de exigir alimentos da heranccedila do falecido por aquele que com ele vivesse haacute mais de dois
anos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges No entanto jaacute no Coacutedigo Civil de 1966 no
seu artigo 1860ordm se falava em comunhatildeo duradoura de vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges o que quer dizer que o fenoacutemeno da uniatildeo de facto enquanto facto social jaacute existia
antes dessa primeira referecircncia no Coacutedigo de 19778 A expressatildeo que remete para a vivecircncia
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges no artigo 2020ordm foi utilizada por vaacuterias leis avulsas
que foram conferindo agraves pessoas que vivessem nessa situaccedilatildeo outros direitos como o direito
agraves pensotildees de sobrevivecircncia o de beneficiar do regime de feacuterias feriados e faltas semelhante
aos dos cocircnjuges e ainda no que respeita ao regime juriacutedico do arrendamento para habitaccedilatildeo
foi reconhecido o direito agrave transmissatildeo do arrendamento agrave pessoa que tenha vivido em uniatildeo
de facto com o arrendataacuterio falecido desde que essa relaccedilatildeo se tenha mantido por mais de
cinco anos9
Todavia soacute com a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto eacute que passou a existir um
diploma legal que reunisse as medidas de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto que ateacute agrave data se
encontravam dispersas pelas vaacuterias leis avulsas10 o que resultou de certa forma numa
institucionalizaccedilatildeo11 da uniatildeo de facto Em 2001 foi revogada e substituiacuteda pela Lei nordm
isso que satildeo sujeitas a registo gerando um estado civil () tecircm tambeacutem como caracteriacutestica a tipicidade estatildeo
previstas na lei bem como os factos juriacutedicos que lhes datildeo origem o seu conteuacutedo tipico as causas da sua
extinccedilatildeo () natildeo se pode considerar como familiar uma relaccedilatildeo que natildeo esteja prevista como tal na lei Cfr
RITA LOBO XAVIER ldquolaquoEstatuto Privadoraquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo in RJLB Ano 2 2016 pp1511-
1513 No mesmo sentido Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoCurso de Direito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Coimbra Coimbra Editora 2015 p 34 65-67 JORGE DUARTE PINHEIRO ldquoO Direito
da Famiacutelia Contemporacircneordquo 6ordf ed Lisboa AAFDL 2018 p 43 ANTUNES VARELA ldquoDireito da Famiacuteliardquo 5ordf
ed vol I Lisboa Livraria Petrony1999 p 31 DIOGO LEITE DE CAMPOS ldquo Liccedilotildees de Direito da Famiacuteliardquo 2ordf
Ed Almedina Coimbra 1997 p21 MARTA COSTA ldquoConvivecircncia more uxorio na perspetiva de
harmonizaccedilatildeo do Direito da Famiacutelia Europeu uniotildees homossexuaisrdquo 1ordf ed Coimbra Coimbra Editora 2011
p 108 e SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo in Actualidad Juriacutedica Iberoamericana Nordm 11
pp 110-147 Agosto de 2019 p115 7 Mais concretamente com a alteraccedilatildeo feita pelo Decreto-Lei nordm 49677 de 25 de novembro 8 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p57 9 Para mais desenvolvimentos cfr HELENA MOTA ldquoO problema normativo da famiacutelia ndash Breve reflexatildeo a
propoacutesito das medidas de proteccedilatildeo agrave uniatildeo de facto adotadas pela lei n ordm13599 de 28 de Agostordquo in Estudos
em Comemoraccedilatildeo dos 5 anos da FDUP 2001 p548-553 10 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniatildeo de Facto no Direito Portuguecircs A propoacutesito da Lei nordm 13599 de 2808rdquo
Coimbra Almedina 2000 p36 No mesmo sentido RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da
Uniatildeo De Factordquo in RJLB ano 2 2016 p 1499 11 Expressatildeo utilizada por FRANCISCO PEREIRA COELHO para definir a existecircncia de regulaccedilatildeo proacutepria da uniatildeo
de facto Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68
14
72001 de 110512 atual LUF que aleacutem de regular situaccedilotildees de uniatildeo de facto entre pessoas
de sexo diferente daacute relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto entre pessoas do mesmo sexo
Apesar de natildeo ter representado uma transformaccedilatildeo significativa do conjunto de direitos e
deveres juridicamente conferidos agrave uniatildeo de facto limitando-se em boa parte a reconhecer
direitos conferidos por leis que jaacute existiam acresce algumas disposiccedilotildees inovadoras13 Sendo
claramente as mais relevantes o facto de permitir agraves pessoas de sexo diferente que vivessem
em uniatildeo de facto a adoccedilatildeo conjunta de menores nos mesmos termos que os cocircnjuges
previstos no artigo 1979ordm n ordm1 do CCiv14 e o alargamento das medidas de proteccedilatildeo por ela
concedidas agraves pessoas do mesmo sexo que viviam em uniatildeo de facto15
Posteriormente com a alteraccedilatildeo feita pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto visou-
se essencialmente aumentar os efeitos que se produzem apoacutes a morte de um dos membros
da uniatildeo de facto ou apoacutes a sua rutura16 Tendo em vista dessa forma a proteccedilatildeo social do
membro sobrevivo que fique em situaccedilatildeo difiacutecil no que concerne agrave conservaccedilatildeo da sua
12 Alterada pela Lei 232010 de 3008 13 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p68 14 Art7ordm da LUF Nos termos do atual regime de adoccedilatildeo constante do livro IV tiacutetulo IV do Coacutedigo Civil eacute
reconhecido a todas as pessoas que vivam em uniatildeo de facto nos termos da presente lei o direito de adoccedilatildeo
em condiccedilotildees anaacutelogas agraves previstas no artigo 1979ordm do Coacutedigo Civil sem prejuiacutezo das disposiccedilotildees legais
respeitantes agrave adoccedilatildeo por pessoas natildeo casadas 15 A lei 72001 de 1105 resulta da discussatildeo de alguns projetos de lei elaborados por partidos poliacuteticos A
propoacutesito da vigecircncia da lei nordm 13599 que continuava a natildeo proteger juridicamente as relaccedilotildees dos unidos de
facto do mesmo sexo o partido ldquoOs Verdesrdquo apresentou o projeto de lei nordm 6VIII (consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6374) que pretendia
alterar o nordm1 do art 1ordm da lei em vigor eliminando a referecircncia a pessoas de sexo diferente passando os casais
de orientaccedilatildeo homossexual a ter acesso aos benefiacutecios previstos na LUF com exceccedilatildeo da possibilidade de
adoccedilatildeo que ficaria reservada aos casais heterossexuais Apresentando o projeto de lei nordm 45VIII (consultaacutevel
em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308) surge o Bloco
de Esquerda tencionando a modificaccedilatildeo do mesmo preceito para que se reconhecessem as uniotildees
homossexuais e ainda que se afastasse da lei o prazo miacutenimo de duraccedilatildeo de convivecircncia se estas situaccedilotildees
fossem registadas passando o art 1ordm n ordm1 a ter a seguinte redaccedilatildeo a presente lei regula a situaccedilatildeo juriacutedica
das pessoas que vivem em uniatildeo de facto O PCP por sua vez apresentou o nordm 145VIII tendo como objetivo
a revogaccedilatildeo da lei que vigorava substituindo-a por uma legislaccedilatildeo que fosse aplicaacutevel a quem vivesse em
uniatildeo de facto haacute mais de dois anos independentemente do sexo corroborava a proteccedilatildeo da casa de morada
comum garantindo a preferecircncia do outro para efeitos de venda ou arrendamento em caso de morte de um dos
membros e pretendia que o acesso a prestaccedilotildees por morte fosse mais flexiacutevel contudo o regime da adoccedilatildeo
continuava reservado aos casais heterossexuais O PS apresentou o projeto de lei nordm 105VIII (consultaacutevel
em httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6195) que
apesar de natildeo se referir especificamente a uniotildees de facto visava que a proteccedilatildeo concedida pela lei nordm13599
se estendesse a um novo regime denominado de economia comum distinguindo-o do regime aplicaacutevel agraves
uniotildees de facto pela absoluta irrelevacircncia da orientaccedilatildeo sexual das pessoas a quem se confere proteccedilatildeo legal
pretendendo assim a tutela de duas pessoas que vivessem em economia comum haacute mais de dois anos Para
mais desenvolvimentos cfr MARTA COSTA ob cit pp 346-348 16 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p70
15
habitaccedilatildeo e aos meios de subsistecircncia miacutenimos17 Haacute quem considere que apesar das
alteraccedilotildees o regime da uniatildeo de facto portuguecircs em comparaccedilatildeo com muitos sistemas
juriacutedicos eacute modesto e continua a ser o que menos efeitos atribui agrave uniatildeo de facto18 Uma vez
que continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente
dirigida a cenaacuterios de crise em que as debilidades dos membros se concretizem com mais
intensidade19 Contudo essa moderaccedilatildeo eacute uma escolha sendo intenccedilatildeo do legislador natildeo
atribuir efeitos imperativos por entender que pode haver quem natildeo queira uma regulaccedilatildeo tatildeo
abrangente de determinadas situaccedilotildees deixando que os proacuteprios membros se possam
organizar privadamente20 O que leva a que no regime da uniatildeo de facto natildeo haja regulaccedilatildeo
juriacutedica relativamente ao seu registo agraves invalidades que podem existir na sua constituiccedilatildeo e
ainda no que respeita ao regime de bens agrave administraccedilatildeo do patrimoacutenio agraves ilegitimidades
de disposiccedilatildeo agrave proibiccedilatildeo de contratos ou regulaccedilatildeo de participaccedilatildeo em sociedades nem no
que toca aos efeitos sucessoacuterios e agrave extinccedilatildeo da situaccedilatildeo de uniatildeo de facto21
Ainda que natildeo defina o conceito de uniatildeo de facto a LUF no seu artigo 1ordm nordm 2
identifica o seu objeto como a situaccedilatildeo juriacutedica de duas pessoas que independentemente do
sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute mais de dois anos Dito isto pode
depreender-se que eacute necessaacuterio que duas pessoas vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges haacute mais de dois anos e ainda que segundo o previsto no artigo 2ordm da LUF entre
os membros da uniatildeo natildeo se verifique nenhum dos impedimentos aiacute mencionados No que
concerne agrave constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e ao desenvolvimento dos impedimentos agrave mesma
abordaremos a questatildeo mais adiante
17Art 5ordm e 6ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ldquoNotas sobre a lei nordm 232010 de 30 de agosto (Alteraccedilatildeo
agrave lei das uniotildees de facto)rdquo in Lex Familiae Coimbra Editora 2012 p 146 A lei nova encara mais nitidamente
a necessidade de proteccedilatildeo do membro sobrevivo da uniatildeo de facto e daacute-lhe prioridade relativamente aos filhos
() considera que a proteccedilatildeo da casa de morada eacute o nuacutecleo irredutiacutevel da proteccedilatildeo conferida ao membro
sobrevivo da uniatildeo de facto e portanto garante a proteccedilatildeo mesmo contra a vontade do falecido 18 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob
cit p 69 19 Cfr RUTE TEIXEIRA PEDRO ldquoBreves reflexotildees sobre a proteccedilatildeo do unido de facto quanto agrave casa de morada
de famiacutelia propriedade do companheiro falecidordquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para FRANCISCO
PEREIRA COELHO coord GUILHERME DE OLIVEIRA Coimbra Imprensa da Universidade de Coimbra 2016
p310 20 De realccedilar que em 2001 o nuacutemero registado de pessoas a viver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges foi
de 381 mil indiviacuteduos e em 2011 quase que duplicou perfazendo o total de 730 mil indiviacuteduos Dados
consultaacuteveis em
httppordataptPortugalPopulaC3A7C3A3o+residente+segundo+os+Censos+em+uniC3B5es+
de+facto-2649-222898 21 Para aleacutem do disposto no art 8ordm da LUF Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 70
16
3 A uniatildeo de facto e a Constituiccedilatildeo da Reacutepublica Portuguesa
Ainda na linha de pensamento do ponto anterior no que respeita ao artigo 36ordm n ordm1
da CRP importa dizer que esta norma determina que todos tecircm o direito de constituir famiacutelia
e de contrair casamento em condiccedilotildees de igualdade22 ou seja pode considerar-se que este
artigo consagra essencialmente dois direitos o de constituir famiacutelia e o de casar23 Nesta
senda importa tambeacutem debruccedilarmo-nos sobre a proteccedilatildeo que a Constituiccedilatildeo oferece agrave uniatildeo
de facto
Jaacute referimos que certos AA como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA24
defendem que o que parece decorrer do nordm1 do artigo 36ordm CRP eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo
admite a reduccedilatildeo do conceito de famiacutelia agrave uniatildeo conjugal baseada no casamento havendo
outras formas de constituiccedilatildeo de famiacutelia aleacutem do casamento como a uniatildeo de facto isto eacute
ao distinguir a famiacutelia do casamento o legislador pretendeu demonstrar que se tratam de
realidades diversas e que o direito a constituir famiacutelia natildeo estaacute vedado a quem natildeo pretenda
contrair casamento25 Segundo esta corrente doutrinaacuteria haacute uma abertura constitucional - se
natildeo mesmo uma obrigaccedilatildeo - para conferir relevo agraves uniotildees familiares de facto tendo em
consideraccedilatildeo que o conceito constitucional natildeo abrange apenas a famiacutelia
matrimonializada26 Apesar de afirmarem o reconhecimento da uniatildeo de facto como relaccedilatildeo
juriacutedica familiar postulam que tal natildeo implica que haja um tratamento legal totalmente
22 A sua interpretaccedilatildeo deve ser feita como se o n ordm1 do art36ordm prescrevesse que laquotodos tecircm o direito de
constituir famiacutelia em condiccedilotildees que natildeo violem o princiacutepio da igualdade definido no artigo 13ordmraquo Tendo em
conta que ao espiacuterito desta norma constitucional natildeo repugna efetivamente aceitar as limitaccedilotildees resultantes
da legislaccedilatildeo vigente quer em mateacuteria de impedimentos matrimoniais() Cfr ANTUNES VARELA ldquoDireito da
Famiacuteliardquo 5ordf ed vol I Lisboa Livraria Petrony 1999 p 158 23 Em sentido diverso Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo
JORGE MIRANDA (coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 372 que entende que os dois direitos
reduzem-se a um soacute E ainda Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoCasamento e Famiacutelia no direito portuguecircsrdquo
obcit p 8 que entende que ao contraacuterio do que acontece no artigo 16ordm DUDH o legislador portuguecircs optou
por colocar o direito a constituir famiacutelia agrave frente do direito de contrair casamento na disposiccedilatildeo do n ordm1 do art
36ordm natildeo se sabe bem porquecirc 24Cfr J GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p561 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo
Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo in Estudos em Homenagem ao Prof Doutor Jorge
Miranda Vol VI Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Coimbra Editora 2012 p 453 HENRICH
EWALD HOumlRSTER ldquoInconstitucionalidade da Tributaccedilatildeo Conjunta dos Cocircnjugesrdquo in Revista de Direito e
Economia da Universidade de Coimbra Ano III nordm 2 Julho ndash Dezembro 1977 p 506 25 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 453 CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoA jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e as
Novas Formas de Famiacutelia ndash The European Court of Human Rights and The New Concept of Familyrdquo in Revista
Juriacutedica da Universidade Portucalense nordm15 Universidade Portucalense Porto 2012 p 36 Neste sentido
vide Acoacuterdatildeo Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 15-02-2007 proferido no acircmbito do processo nordm 62842006-
8 26 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 561
17
idecircntico entre as famiacutelias natildeo matrimonializadas e as famiacutelias baseadas no casamento desde
que as distinccedilotildees feitas natildeo sejam arbitraacuterias irrazoaacuteveis ou desproporcionadas e tenham
em conta todos os direitos e interesses em jogo27
De outra parte FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem
que a 1ordf parte do n ordm1 do artigo 36ordm CRP ao estabelecer que todos tecircm direito de constituir
famiacutelia esse diz respeito essencialmente agraves relaccedilotildees de filiaccedilatildeo pois o direito de constituir
famiacutelia eacute antes de mais o direito a procriar e ainda o direito a estabelecer as
correspondentes relaccedilotildees de paternidade e maternidade28 Relativamente agrave 2ordf parte do
mesmo artigo alertam para o facto de natildeo se poder reconduzir a uniatildeo de facto a uma
dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento uma vez que a dimensatildeo
negativa desse direito eacute o de natildeo casar2930
Embora entendam que este artigo natildeo oferece proteccedilatildeo constitucional agrave uniatildeo de
facto isso natildeo quer dizer que esta fique desprotegida constitucionalmente Para estes AA o
princiacutepio de proteccedilatildeo da uniatildeo de facto decorre do direito ao desenvolvimento da
personalidade previsto no nordm1 do artigo 26ordm CRP considerando-o como o direito do
indiviacuteduo a afirmar livremente a sua identidade31 como sujeito autoacutenomo dotado de
autodeterminaccedilatildeo decisoacuteria32 sem estar vinculado a modelos externamente impostos e
conferindo-lhe o direito a viver a sua vida do modo que escolher podendo dizer-se que
estabelecer uma uniatildeo de facto eacute uma manifestaccedilatildeo desse direito33
A proteccedilatildeo conferida pelo direito ao desenvolvimento da personalidade natildeo exige
que o legislador conceda agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos que oferece ao casamento
equiparando o que natildeo eacute igual visto que os membros da uniatildeo de facto natildeo assumem um
27 Como por exemplo os direitos dos filhos Idem 28 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 60 29 Idem 30 Mais amplo do que viver em uniatildeo de facto pois pode ainda significar ficar em solidatildeo relacionar-se
esporadicamente ou pontualmente ou ateacute viver em promiscuidade Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e
Personalidaderdquo Almedina Coimbra 2017 p 237 No mesmo sentido Cfr NUNO SALTER CID ldquoSobre o
Direito de natildeo Contrair Casamentordquo in Famiacutelia Consciecircncia Secularismo e Religiatildeo 1ordf Ediccedilatildeo Coimbra
Editora 2010 p 28 O direito de natildeo contrair casamento o tal direito fundamental que a Constituiccedilatildeo
implicitamente confere e protege como dimensatildeo ou vertente negativa do direito de contrair casamento eacute na
verdade e apenas o direito de se negar a contrair casamento o direito natildeo ser forccedilado a casar-se um direito
que natildeo exerce apenas quem opta por viver em uniatildeo de facto mas tambeacutem quem opta por manter-se solteiro
divorciado ou viuacutevo (de Direito ou de facto) 31 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237 32 Cfr JJ GOMES CANOTILHOVITAL MOREIRA ob cit p 463 33 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo ob cit p 237
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compromisso de vida por natildeo quererem ou natildeo o poderem fazer Equiparar o que eacute diferente
nesta medida poderia ser julgado inconstitucional pois iria impor agraves pessoas que vivem em
uniatildeo de facto os mesmos deveres e conceder os mesmos direitos que impotildee e concede agraves
que satildeo casadas violando o direito a natildeo casar sendo-lhes forccedilado um estatuto que em
princiacutepio rejeitaram por vontade proacutepria
Conveacutem ainda referir que no que toca ao princiacutepio da proteccedilatildeo da famiacutelia previsto
no artigo 67ordm CRP este natildeo impotildee ao legislador ordinaacuterio a atribuiccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis
agrave uniatildeo de facto mas tambeacutem natildeo proiacutebe que sejam concedidos agrave mesma os efeitos que
considere adequados e justificados34 FRANCISCO PEREIRA COELHO considera ainda que este
princiacutepio constitucional natildeo visa apenas a famiacutelia conjugal35 ao contraacuterio de CASTRO
MENDES que explica que soacute faz sentido valer neste contexto a famiacutelia fundada no
casamento natildeo devendo a lei passar um laquocheque em brancoraquo a quaisquer formas de
sociedade familiar36 Por sua vez SANDRA PASSINHAS defende que apesar da uniatildeo de facto
natildeo ser uma forma de contrair casamento e natildeo caber no acircmbito de proteccedilatildeo do artigo 36ordm
da CRP isso natildeo inibe que o casal nascido da uniatildeo de facto juridicamente protegida
tambeacutem seja considerado famiacutelia para efeitos da proteccedilatildeo institucional conferida pelo
artigo 67ordm CRP37 pois entende que seria inaceitaacutevel que no acircmbito normativo do artigo 67ordm
CRP natildeo coubessem as relaccedilotildees parafamiliares como a uniatildeo de facto38 Nesta ordem de
ideias eacute possiacutevel aferir que a constituiccedilatildeo natildeo permite penalizar a uniatildeo de facto ou equiparaacute-
la ao casamento39
34 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoAnotaccedilatildeo ao Ac do STJ de 2 de abril de 1987rdquo in Revista de Legislaccedilatildeo
e Jurisprudecircncia nordm 3782 ano 122 Coimbra 1990 p84 35 Idem Entendendo que o princiacutepio constitucional visa abranger a famiacutelia natural e ainda a adotiva 36 Cfr JOAtildeO DE CASTRO MENDES ldquoFamiacutelia e casamentordquo in Estudos sobre a Constituiccedilatildeo JORGE MIRANDA
(coord) vol I Lisboa Livraria Petrony 1977 p 373 37 Referindo em abono da posiccedilatildeo que defende o modo como o legislador na LUF em cumprimento do
disposto no art 67ordm nordm2 da CRP conformou a posiccedilatildeo dos unidos de facto no sentido de lhes conceder
proteccedilatildeo da casa de morada de famiacutelia de os beneficiar com o regime juriacutedico aplicaacutevel a pessoas casadas
em mateacuteria de feacuterias feriados faltas licenccedilas e de preferecircncia na colocaccedilatildeo dos trabalhadores da
Administraccedilatildeo Puacuteblica com a aplicaccedilatildeo do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
concedendo-lhes proteccedilatildeo socia na eventualidade de morte do beneficiaacuterio por aplicaccedilatildeo do regime geral ou
de regimes especais de seguranccedila social bem como prestaccedilotildees por morte resultante de acidente de trabalho
ou doenccedila profissional a pensatildeo do preccedilo de sangue e por serviccedilos excecionais e relevantes prestados ao paiacutes
ou a inclusatildeo do unido de facto no elenco dos titulares do direito agrave indemnizaccedilatildeo por danos natildeo patrimoniais
por morte da viacutetima no nordm3 do art 496ordm SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p240 38 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoPropriedade e Personalidaderdquo obcit p 231 39 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p64
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A propoacutesito dos diplomas internacionais cabe referir que a Declaraccedilatildeo Universal
dos Direitos do Homem40 inclui dois princiacutepios relativos agrave famiacutelia Primeiramente no seu
artigo 12ordm onde estabelece o direito ao respeito pela vida familiar seguido do artigo 16ordm que
abrange no seu nordm 1 o direito de casar e de constituir famiacutelia e no seu nordm 3 reconhece a
famiacutelia como elemento natural e fundamental da sociedade tendo direito agrave proteccedilatildeo desta e
do Estado Tambeacutem a Convenccedilatildeo Europeia dos Direitos do Homem41 conteacutem dois
princiacutepios dedicados agrave famiacutelia o direito ao respeito pela vida privada e familiar previsto no
seu artigo 8ordm e por sua vez o direito a casar e a constituir famiacutelia estando este disposto no
artigo seu 12ordm Nestes diplomas o legislador internacional tal como o legislador nacional
natildeo assegura uma definiccedilatildeo de famiacutelia ou casamento levando a que se concretizem e sejam
interpretados de forma diversa consoante o substrato social de quem o faz42 Pois como
defende CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS43 eacute inegaacutevel as transformaccedilotildees que o conceito de famiacutelia
tradicional tem sofrido dando origem a novas formas de famiacutelia como as de facto as
monoparentais as recombinadas e as homossexuais Nesta senda note-se que o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) apesar de ter em conta a tutela do casamento e
encorajar a famiacutelia tradicional44 tem vindo a considerar que o artigo 8ordm CEDH natildeo se refere
apenas agrave famiacutelia constituiacuteda com base no casamento como acontece no artigo 12ordm CEDH
podendo conceder tutela a outros laccedilos familiares como as uniotildees de facto45
40 Proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em Paris a 10 de dezembro de 1948 41 Assinada a 4 de novembro de 1950 em Roma tendo entrado em vigor em 1953 A adesatildeo de Portugal deu-
se apenas em 1978 42 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 458 43 Idem 44 Neste sentido e para mais desenvolvimentos Cfr SUSANA ALMEIDA ldquoO Respeito pela Vida (Privada e)
Familiar na Jurisprudecircncia do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem A tutela das Novas Formasrdquo
Coimbra Editora 2008 p 165 45 Article 8 (art 8) applies to the family life of the illegitimate family as well as to that of the legitimate
family Ac JOHNSTON C IRLANDA 18 de dezembro de 1986 p19 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5750822
The Court recalls that the notion of the family in this provision is not confined solely to marriage-based
relationships and may encompass other de facto family ties where the parties are living together outside of
marriage Ac KEEGAN C IRLANDA de 26 de maio de 1994 p13 consultaacutevel em
httpshudocechrcoeinteng22itemid22[22001-5788122]
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31 A uniatildeo de facto e o casamento ndash liberdade mas e proteccedilatildeo
Como jaacute haviacuteamos referido tanto a proteccedilatildeo conferida pelo direito ao
desenvolvimento da personalidade quanto a que se entenda que eacute dada pelo artigo 36ordm CRP
natildeo exige que o legislador atribua agrave uniatildeo de facto efeitos semelhantes aos do casamento
equiparando os dois institutos Esta diferenccedila de tratamento de situaccedilotildees distintas natildeo viola
o princiacutepio da igualdade previsto no artigo 13ordm CRP visto que esta norma apenas proiacutebe as
discriminaccedilotildees arbitraacuterias ou sem fundamento46 Tratam-se de situaccedilotildees materialmente
diferentes enquanto no casamento se assume um compromisso de vida em comum
sujeitando-se a um viacutenculo juriacutedico47 um contrato entre duas pessoas que pretendem
constituir famiacutelia mediante uma plena comunhatildeo de vida na uniatildeo de facto os membros natildeo
querem ou natildeo podem assumir esse compromisso48
Antes de nos dedicarmos ao estudo do contraste que o regime da uniatildeo de facto e o
casamento apresentam em concreto conveacutem relembrar a noccedilatildeo de casamento no nosso
ordenamento juriacutedico Assim segundo o artigo 1577ordm CCiv o casamento constitui um
contrato4950 um compromisso juriacutedico assumido por duas pessoas que se vinculam entre si
mediante uma plena comunhatildeo de vida Ainda que o Coacutedigo Civil natildeo defina explicitamente
o que significa plena comunhatildeo de vida eacute possiacutevel aferir-se pelos preceitos subsequentes
que esta deve ser guiada pelos deveres de respeito fidelidade coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e
46 Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional nordm 33686 p 3807 Neste artigo reconhece-se o direito agrave diferenccedila desde
que esta natildeo ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade Acoacuterdatildeo Tribunal Constitucional
nordm 11881996 O princiacutepio da igualdade (artigo 13ordm da Constituiccedilatildeo) impotildee se decirc tratamento igual ao que for
essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for Natildeo proiacutebe as distinccedilotildees de tratamento se
materialmente fundadas proiacutebe isso sim a discriminaccedilatildeo as diferenciaccedilotildees arbitraacuterias ou irrazoaacuteveis
carecidas de fundamento racional No mesmo sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Coimbra de
08-03-2006 proferido no acircmbito do processo nordm 419705JTRC 47 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDa Inclusatildeo Constitucional da Uniatildeo de Facto Nova Relaccedilatildeo Familiarrdquo
obcit p 460 48 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p63 49Apesar da sua contratualidade ser afirmada na sua definiccedilatildeo legal esta eacute contestada Haacute quem qualifique o
casamento como um mero acordo outros como instituiccedilatildeo ou ainda como um puro ato administrativo vendo
a declaraccedilatildeo do funcionaacuterio do registo civil como o elemento constitutivo do casamento e o consentimento
das partes como um simples pressuposto dessa declaraccedilatildeo Cfr mais desenvolvidamente FRANCISCO PEREIRA
COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 232- 235 e ainda TELMA CARVALHO ob cit p 230 50 Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs in
AAVV Comemoraccedilotildees dos 35 anos do Coacutedigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977 vol I Coimbra
Editora Coimbra 2004 pp 178-179
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assistecircncia (artigo 1672ordm CCiv) aleacutem disso deve ser exclusiva (artigo 1601ordm CCiv) e tendo
em vista a perpetuidade (artigo 1773ordm CCiv)
A solenidade de formalizaccedilatildeo de vontades necessaacuteria no casamento (artigo 1615ordm
CCiv) em contraposiccedilatildeo agrave falta de forma de celebraccedilatildeo uniatildeo de facto tem sido a principal
diferenccedila apontada pela doutrina entre estas duas formas de vida Dado que no casamento
haacute a expressatildeo de duas vontades atraveacutes de uma declaraccedilatildeo expressa perante uma entidade
puacuteblica que abrange todo o conteuacutedo do casamento Os nubentes ao declararem que aceitam
casar estatildeo simultaneamente a aceitar os efeitos legais do casamento tal como prevecirc o
regime obrigatoacuterio do artigo 1618ordm nordm 1 CCiv Aceitam todos os deveres reciacuteprocos e
tambeacutem os efeitos patrimoniais onde vatildeo tendo uma autonomia privada ainda que limitada
atraveacutes das convenccedilotildees antenupciais51 Isto eacute na uniatildeo de facto haacute uma intencionalidade52
de viver em comunhatildeo plena de vida com outra pessoa no casamento aleacutem da
intencionalidade da plena comunhatildeo de vida haacute a intenccedilatildeo de celebrar o casamento com
tudo o que o seu regime legal acarreta
No caso da uniatildeo de facto essa intencionalidade natildeo eacute declarada de forma solene ou
formal eacute um acordo iacutentimo realizado entre os membros da situaccedilatildeo de facto que natildeo eacute
reconhecido por nenhum ente estadual53 Por outro lado a realizaccedilatildeo do casamento aleacutem de
implicar todo um processo preliminar que tem por fim um despacho final que no caso de ser
favoraacutevel pressupotildee a celebraccedilatildeo do casamento no prazo de seis meses subsequentes a essa
autorizaccedilatildeo tem forma puacuteblica e a sua celebraccedilatildeo acarreta o seu registo (artigo 1ordm al d)
CRegCiv) Este registo eacute obrigatoacuterio e comporta uma elevada importacircncia visto que soacute com
o reconhecimento do casamento pelo Conservador do Registo Civil (artigo 1615ordm CCiv) eacute
possiacutevel fazer a prova do estado civil das pessoas Eacute a uacutenica prova legalmente admitida do
casamento sendo que enquanto este natildeo for registado natildeo pode ser invocado54 Devido agrave
uniatildeo de facto natildeo implicar uma alteraccedilatildeo no estado civil dos membros por natildeo estar sujeita
a registo torna a falta de publicidade no que concerne agrave elaboraccedilatildeo deste estudo a grande
diferenccedila entre este regime juriacutedico e o do casamento e o que tem maior repercussatildeo no
51 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 229 52 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 230 53 Cfr TELMA CARVALHO ob cit p 237 54 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 337
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regime protecional dos unidos de facto jaacute que o que natildeo pode ser provado em princiacutepio
natildeo pode ser protegido
Aleacutem da dificuldade da prova da uniatildeo de facto quer diante o Estado quer em face
a terceiros a falta do seu registo impede o controlo da sua existecircncia e do cumprimento dos
seus requisitos por parte do Estado Abordaremos a questatildeo da dificuldade da prova
resultante da falta de publicidade da uniatildeo de facto mais aprofundadamente na parte a ela
dedicada
Ateacute aqui apresentamos diferenccedilas de caraacuteter puramente formal nomeadamente no
que respeita agrave natureza contratual do casamento agrave solenidade da celebraccedilatildeo do mesmo e
ainda quanto agrave sua publicidade em contrapartida com o que acontece com a uniatildeo de facto
tendo umas mais importacircncia objetiva que outras Cabe agora analisar as diferenccedilas que tecircm
sido apontadas aos efeitos juriacutedicos praacuteticos Nomeadamente a necessidade de decurso de
prazo de dois anos para que a lei atribua agrave uniatildeo de facto efeitos juriacutedicos uma vez que no
nordm 2 do artigo 1ordm da LUF estaacute previsto que a uniatildeo de facto eacute a situaccedilatildeo juriacutedica de duas
pessoas que independentemente do sexo vivam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges haacute
mais de dois anos Haacute entatildeo uma exigecircncia do decurso de dois anos55 dessa convivecircncia para
que a situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges seja considerada uniatildeo de facto Ao passo que o
casamento se considera constituiacutedo com a declaraccedilatildeo de vontade de cada nubente e celebrado
perante uma entidade competente natildeo necessitando da decorrecircncia de nenhum prazo para
que se considere constituiacutedo
Eacute de notar alguma diferenccedila ainda no que se refere agrave cessaccedilatildeo do casamento e agrave
dissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto O artigo 1773ordm CCiv determina que o divoacutercio pode ser por
muacutetuo consentimento ou sem consentimento de um dos cocircnjuges - desde que se verifiquem
algum dos fundamentos de rutura previstos no artigo 1781ordm CCiv - ou seja natildeo basta o
simples afastamento dos cocircnjuges para que o casamento cesse haacute um viacutenculo formal que
tem de ser dissolvido A uniatildeo de facto dissolve-se quando cessar o facto da uniatildeo56 isto eacute
55 Noutras regulamentaccedilotildees especiacuteficas esse prazo pode variar () por exemplo no caso da transmissatildeo de
arrendamento por morte do unido o prazo de um ano basta na Lei da Nacionalidade jaacute eacute exigida a duraccedilatildeo de
trecircs anos para que um estrangeiro possa declarar querer adquirir a nacionalidade portuguesa com fundamento
na uniatildeo de facto SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo ob cit p113 56 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo in AAVV Textos de Direito da Famiacutelia para Pereira Coelho GUILHERME OLIVEIRA (coord)
Imprensa da Universidade de Coimbra 2016 p 91
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com a rutura da efetiva comunhatildeo de vida que acontece com a verificaccedilatildeo de alguma das
situaccedilotildees mencionadas no nordm 1 do artigo 8ordm da LUF
Veja-se entre noacutes a uniatildeo de facto eacute objeto de atribuiccedilatildeo de alguns efeitos juriacutedicos
poreacutem no que respeita ao domiacutenio das relaccedilotildees patrimoniais e agrave regulamentaccedilatildeo das
consequecircncias da sua dissoluccedilatildeo natildeo haacute nenhuma norma reguladora Isto eacute natildeo existe
regulamentaccedilatildeo quanto ao regime de bens e natildeo sendo em princiacutepio de aplicar
analogicamente o regime juriacutedico do casamento57 os membros da uniatildeo de facto sentem a
necessidade de criarem eles proacuteprios um estatuto juriacutedico que regule determinados
problemas que possam surgir da sua comunhatildeo de vida com base no princiacutepio da autonomia
da vontade58 Em alguns ordenamentos juriacutedicos59 a soluccedilatildeo para esta questatildeo eacute o contrato
de coabitaccedilatildeo60 visto como a hipoacutetese de conferir aos membros da uniatildeo de facto a
possibilidade de regularem as suas relaccedilotildees patrimoniais com base no princiacutepio da
autonomia patrimonial61 Apesar de no nosso ordenamento juriacutedico natildeo haver tipificaccedilatildeo
legal do contrato de coabitaccedilatildeo - como a uniatildeo de contratos em que os membros da uniatildeo
de facto reuacutenem vaacuterias espeacutecies contratuais em vista da organizaccedilatildeo convencional das suas
relaccedilotildees patrimoniais durante a vida da relaccedilatildeo e apoacutes a extinccedilatildeo desta62- natildeo haacute
legalmente nada a opor a esses contratos desde que estes se limitem a regular os efeitos
patrimoniais sem abrangerem os efeitos pessoais63 Houve por parte do PCP com o artigo
57 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p83 58 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo in Cadernos de Direito Privado nordm 11 julhoSetembro 2005 p72 59 Como nos Estados Unidos na Holanda e no Canadaacute e ainda na Espanha e Franccedila onde satildeo normalmente
celebrados apesar de levantarem algumas duacutevidas Neste sentido vide Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de
Lisboa de 29-11-2012 proferido no acircmbito do processo nordm 444092TCFUNL1-A-8 JEAN CARBONNIER
ldquoDroit Civil (T2 ndash La famille lrsquoenfant le couple)rsquorsquo 21ordm ed PUF Paris 2002 p681 EDUARDO ESTRADA
ALONSO ldquoLas uniones extramatrimoniales en el Derecho Civil Espantildeolrdquo 2ordm ed Civitas Madrid 1991 pp
139-152 o A prevecirc a possibilidade de utilizar a autonomia da vontade dos membros como fonte de regulaccedilatildeo
das uniotildees de facto apesar de este tipo de convenios natildeo serem frequentes em Espanha devido a possibilidade
dos tribunais os poderem declarar nulos por ilicitude de causa o A admite a sua validade desde que tratem
apenas de aspetos patrimoniais 60 Pode ser designado de diversas formas tais como contrato de convivecircncia contratos de uniatildeo de facto
convenccedilotildees entre conviventes pactos concubinaacuterios Cfr MARTA COSTA ob cit p156 GERALDO ALMEIDA
ob cit p202 RENATO NETO ldquoContrato de Coabitaccedilatildeo na Uniatildeo de Facto Confronto entre o Direito Brasileiro
e Portuguecircsrdquo Livraria Almedina Coimbra 2006 pp 69-70 61 Cfr MARTA COSTA ob cit p157 62 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 84 63 Cfr JOSEacute JOAtildeO GONCcedilALVES DE PROENCcedilA ldquoDireito da Famiacuteliardquo Lisboa Universidade Lusiacuteada Editora 2003
p 34
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5ordm do projeto de lei nordm 384VII a proposta de uma convenccedilatildeo de uniatildeo de facto64 que
pretendia afastar nesta mateacuteria a incerteza e inseguranccedila juriacutedicas resultantes da LUF natildeo
tendo todavia prosseguido
Por uacuteltimo eacute de ressalvar a diferenccedila notoacuteria que haacute entre os efeitos sucessoacuterios do
casamento e da uniatildeo de facto O estatuto sucessoacuterio do cocircnjuge sobrevivo tem um elevado
grau de proteccedilatildeo comparativamente com a proteccedilatildeo oferecida ao unido sobrevivo uma vez
que o cocircnjuge aleacutem de ser herdeiro legiacutetimo eacute tambeacutem herdeiro legitimaacuterio65 enquanto o
unido sobrevivo natildeo eacute considerado sequer herdeiro do falecido limitando-se a lei a conceder
o direito de exigir alimentos da heranccedila do mesmo (artigo 2020ordm CCiv) Constata-se uma
enorme discrepacircncia de tratamento entre o cocircnjuge sobrevivo e o unido de facto sobrevivo
devendo a posiccedilatildeo deste uacuteltimo ser objeto de atenccedilatildeo pelo legislador nem que seja para
integrar a sucessatildeo legitima numa posiccedilatildeo inferior agrave do cocircnjuge descendentes e
ascendentes66 Tendo isto em conta eacute possiacutevel afirmar-se que atualmente muitos casais
optam pelo instituto do casamento ao inveacutes do instituto da uniatildeo de facto pela proteccedilatildeo que
este concede ao sobrevivo em caso de morte podendo o casamento ser visto de certa forma
como um (quase) contrato sucessoacuterio67 Na praacutetica muitos casais com esta informaccedilatildeo
apesar de natildeo acharem necessaacuterio celebrar casamento no acircmbito social ou cultural optam
por fazecirc-lo devido agrave elevada discrepacircncia existente entre ambos os institutos
FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO68 defende que diante do presente quadro
regulativo natildeo pode por um lado ser recusada liminarmente a possibilidade de aplicaccedilatildeo agrave
uniatildeo de facto das normas pertencentes ao regime do casamento desde que se tratem de
efeitos indiretos ou legais do casamento e de efeitos fundados na simples existecircncia de uma
comunhatildeo de vida Por outro lado levando em conta o atual quadro legislativo natildeo pode ser
64 Prevendo a possibilidade dos membros da uniatildeo de facto celebrarem uma convenccedilatildeo que visava estabelecer
o seu regime de bens a responsabilidade por diacutevidas e o seu regime de administraccedilatildeo de bens Consultaacutevel em
httpswwwpcpptarlegis-7projleipjl384html 65 Isto eacute nos termos do 2132ordm CCiv eacute chamado agrave sucessatildeo mesmo que o falecido natildeo tenha deixado testamento
vaacutelido consta tambeacutem do art 2157ordm CCiv tendo direito a uma porccedilatildeo de bens (a legiacutetima) que o falecido natildeo
pode dispor no seu testamento Cfr OLIVEIRA ASCENSAtildeO ldquoDireito civil Sucessotildeesrdquo Coimbra Editora 5ordf Ed
2000 pp 333 e 353 66 Para mais desenvolvimentos FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da
uniatildeo de facto breves observaccedilotildeesrdquo ob cit pp104-105 67 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p103 68 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit pp 83-101
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feita uma geneacuterica aplicaccedilatildeo analoacutegica do regime do casamento O A aleacutem de salvaguardar
que essa aplicaccedilatildeo soacute poderia abranger os referidos efeitos indiretos ou legais do casamento
alega que antes dessa aplicaccedilatildeo teriam de se apurar caso a caso os interesses em causa e a
ratio da norma eventualmente aplicaacutevel e soacute assim se poderia fundar uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica Aleacutem do mais alerta para o quadro limitado de efeitos que a nossa lei fixou para
a uniatildeo de facto previsto na LUF o que pode refletir o intuito de impedir uma aplicaccedilatildeo
analoacutegica das normas do casamento de forma irrestrita O A declara que tendo em
consideraccedilatildeo os uacuteltimos desenvolvimentos legislativos na regulaccedilatildeo da uniatildeo de facto e no
casamento69 a diferenccedila que assenta no facto de natildeo haver uma vontade de vinculaccedilatildeo no
plano juriacutedico e da comunhatildeo de vida dos membros da uniatildeo de facto natildeo implicar o
cumprimento de deveres conjugais ficou bastante atenuada Natildeo soacute porque se tem vindo a
assistir a uma desregulaccedilatildeo do casamento em termos imperativos mas tambeacutem pelo Coacutedigo
Civil se limitar a fixar os deveres pessoais dos cocircnjuges e os modos de execuccedilatildeo dos mesmos
natildeo obedecerem a um padratildeo uacutenico Crecirc que se tem vindo a assistir a um progressivo
afrouxamento dos deveres conjugais por estarem esvaziados das normais caracteriacutesticas de
um dever juriacutedico tanto no plano das consequecircncias indemnizatoacuterias como nas resolutoacuterias
Levando-o a concluir que esbatida a base da diferenccedila principal entre os dois institutos
deixou de haver fundamento para a recusa de uma aplicaccedilatildeo analoacutegica agrave uniatildeo de facto de
muitas normas do casamento que estabelecem efeitos indiretos ou laterais de diversa ordem
deixando o casamento de ser necessaacuterio no plano social afetivo cultural ou econoacutemico e
que este soacute subsiste em maior nuacutemero do que a uniatildeo de facto por se tratar de um haacutebito
adquirido pela sociedade e por haver em certos meios uma pressatildeo social e religiosa nesse
sentido70
Por seu turno CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS no acircmbito dos efeitos patrimoniais da
uniatildeo de facto defende que a aplicaccedilatildeo analoacutegica de uma norma pressupotildee a existecircncia de
uma lacuna No entanto entende que natildeo se pode falar em lacuna quando natildeo existe uma
regulamentaccedilatildeo juriacutedica numa dada mateacuteria visto que essa inexistecircncia de regulamentaccedilatildeo
pode ter sido intencional por parte do legislador Podendo tambeacutem ser pretensatildeo do proacuteprio
69 Com as alteraccedilotildees agrave Lei nordm 72001 introduzidas pela Lei nordm 232010 de 30 de agosto no que respeita agrave uniatildeo
de facto e relativamente ao casamento em consequecircncia da profunda reforma operada pela Lei nordm 612008 de
31 de Outubro 70 Cfr FRANCISCO BRITO PEREIRA COELHO ldquoOs factos no casamento e o direito da uniatildeo de facto breves
observaccedilotildeesrdquo ob cit p 102
26
legislador que o seu preenchimento fique a cargo da doutrina e da jurisprudecircncia71 No
entanto julga que a sua integraccedilatildeo deveraacute ser feita por recurso agraves regras gerais e natildeo por
aplicaccedilatildeo do regime do casamento para o qual o legislador natildeo remeteu intencionalmente
A soluccedilatildeo a nosso ver passaria por natildeo se estender agrave uniatildeo de facto os efeitos do
casamento evitando uma intromissatildeo injustificada na escolha que as partes fizeram de natildeo
contraiacuterem casamento No entanto seria importante reforccedilar o regime legal atual natildeo
olvidando os que apesar de optarem por natildeo seguir a via do casamento pretendem uma
proteccedilatildeo mais firme e os que pretendem apenas a coabitaccedilatildeo sem consequecircncias juriacutedicas
Enveredando-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto com
um regime proacuteprio que natildeo se confunda com o do casamento possibilitando aos que
pretendam uma uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo a um
regime legal ou natildeo
71 Cfr CRISTINA M ARAUacuteJO DIAS ldquoDissoluccedilatildeo da uniatildeo de facto ndash Anotaccedilatildeo ao Acoacuterdatildeo do TRG de 2992004
Proc 128904rdquo ob cit pp 74-75
27
4 Constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo de Uniatildeo de Facto e os seus efeitos
A uniatildeo de facto constitui-se quando dois sujeitos do mesmo sexo ou de sexo
diferente que tecircm uma relaccedilatildeo passam a viver em comunhatildeo de leito mesa e habitaccedilatildeo
Passando os membros a viver nessas condiccedilotildees e natildeo sendo essa situaccedilatildeo objeto de registo
civil72 ou administrativo ao contraacuterio do que acontece em alguns ordenamentos vizinhos
que mereceratildeo a nossa anaacutelise mais adiante torna-se mais difiacutecil saber de forma exata
quando se iniciou para que seja possiacutevel a partir daiacute contar os dois anos necessaacuterios para
que a situaccedilatildeo de facto produza os efeitos previstos no artigo 3ordm da LUF
Efeitos estes que soacute se produziratildeo se cumulativamente com requisito temporal de
decurso de dois anos natildeo existir nenhum impedimento dirimente ao casamento dos membros
da uniatildeo de facto Eacute a soluccedilatildeo prevista no artigo 2ordm da LUF que reproduz nas suas aliacuteneas
o disposto no artigo 1601ordm e 1602ordm CCiv obstando agrave constituiccedilatildeo de uma uniatildeo de facto
juridicamente protegida impedimentos relacionados com a idade dos companheiros a
existecircncia de uma demecircncia notoacuteria mesmo com intervalos luacutecidos e situaccedilatildeo de
acompanhamento de maior se assim estabelecer a sentenccedila que a haja decretado salvo se
posteriores ao iniacutecio da uniatildeo a ocorrecircncia de casamento anterior natildeo dissolvido exceto se
tiver sido decretada a separaccedilatildeo de pessoas e bens o parentesco na linha reta ou no 2ordm grau
da linha colateral ou afinidade na linha reta e a condenaccedilatildeo anterior de uma das pessoas
como autor ou cuacutemplice por homiciacutedio doloso ainda que natildeo consumado contra o cocircnjuge
do outro Os factos expostos estorvam apenas a produccedilatildeo de efeitos favoraacuteveis da uniatildeo de
facto ou seja a atribuiccedilatildeo de direitos ou benefiacutecios natildeo deveraacute ser intenccedilatildeo do legislador
que a uniatildeo de facto mesmo que afetada por algum dos impedimentos seja considerada
irrelevante juridicamente quando estatildeo em causa interesses legiacutetimos de terceiros ou quando
surjam consequecircncias como a presunccedilatildeo de paternidade relativamente ao homem7374
Em relaccedilatildeo aos efeitos pessoais por natildeo assumirem nenhum compromisso natildeo
estatildeo os membros da uniatildeo de facto vinculados aos deveres conjugais que os artigos 1671ordm
72 Uma vez que natildeo estaacute mencionada no acircmbito do art 1ordm do Coacutedigo do Registo Civil norma que consagra as
situaccedilotildees em que o registo civil eacute obrigatoacuterio no nosso ordenamento juriacutedico 73 Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 141 74 O elenco dos impedimentos agrave produccedilatildeo dos efeitos favoraacuteveis agrave uniatildeo de facto que constam no artigo 2ordm da
LUF foi corrigido e adaptado para evitar uma excessiva ligaccedilatildeo agraves soluccedilotildees postuladas no artigo 1601ordm CCiv
Sobre as correccedilotildees mais detalhadamente cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit pp 141-142
28
e 1672ordm CCiv impotildeem aos cocircnjuges75 Contudo a relaccedilatildeo pessoal que assumem permite-
lhes adotar um filho nos mesmos termos que os cocircnjuges por forccedila do artigo 7ordm da LUF
desde que a relaccedilatildeo dure haacute mais de quatro anos e ambos tiverem mais de 25 anos
independentemente do seu sexo Releva tambeacutem para efeitos de aquisiccedilatildeo de nacionalidade
desde que o estrangeiro que viva em uniatildeo de facto com nacional portuguecircs haacute mais de trecircs
anos e tenha reconhecimento judicial da situaccedilatildeo de facto declare que quer adquirir
nacionalidade portuguesa (artigo 3ordm nordm 3 Lei da Nacionalidade - Lei nordm 3781 de 03 de
Outubro) No que respeita aos filhos nascidos das uniotildees de facto nas accedilotildees de investigaccedilatildeo
de paternidade presume-se a paternidade quando tenha havido comunhatildeo duradoura de vida
entre a matildee e o pretenso pai no periacuteodo legal de concepccedilatildeo por forccedila do artigo 1871ordm CCiv
Quanto ao exerciacutecio das responsabilidades parentais no caso de comunhatildeo duradoura de
vida em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges ou concubinato duradouro o artigo 1911ordm nordm
1 CCiv determina a aplicaccedilatildeo do previsto nos artigos 1901ordm e 1904ordm CCiv que corresponde
ao regime que vigora quando os progenitores satildeo casados Jaacute no caso de dissociaccedilatildeo familiar
o mesmo artigo remete para aplicaccedilatildeo do disposto nos artigos 1905ordm a 1908ordm CCiv normas
atinentes ao divoacutercio separaccedilatildeo de pessoas e bens ou declaraccedilatildeo de nulidade ou anulaccedilatildeo do
casamento Como se pode ver os filhos nascidos de uniatildeo de facto tal como quaisquer outros
nascidos fora do casamento estatildeo equiparados aos nascidos dentro do mesmo por forccedila do
disposto no nordm 4 do artigo 36ordm da CRP76
Como jaacute haviacuteamos referido a uniatildeo de facto natildeo permite a aplicaccedilatildeo de um regime
de bens nem das regras que disciplinam as relaccedilotildees patrimoniais dos cocircnjuges como a
administraccedilatildeo de bens e regime de responsabilidade por diacutevidas sendo de aplicar entre os
unidos o regime geral das relaccedilotildees obrigacionais e reais77 De acordo com as regras do direito
comum cada um dos membros da uniatildeo de facto pode vender bens moacuteveis ou imoacuteveis dar
ou tomar de arrendamento um imoacutevel ou contrair diacutevidas podem entre eles celebrar
contratos de compra e venda de locaccedilatildeo de depoacutesito de comodato de muacutetuo entre outros
pois o artigo 1714ordm CCiv que impede a celebraccedilatildeo de certos contratos entre os cocircnjuges natildeo
eacute aplicaacutevel agraves relaccedilotildees de uniatildeo de facto Acrescem a estes os que expusemos anteriormente
relativamente a esta mateacuteria aquando da distinccedilatildeo entre o regime do casamento e o regime
75 Natildeo estabelecem relaccedilotildees de afinidade com os parentes do outro natildeo podem adotar o apelido um do outro
possibilidade que eacute concedida aos cocircnjuges por virtude do artigo 1677ordm CCiv 76 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 81 77 Cfr SANDRA PASSINHAS ldquoUniatildeo de Facto em Portugalrdquo obcit p 120
29
da uniatildeo de facto no ponto 31 e ainda sucintamente importa referir como efeito
patrimonial da uniatildeo de facto a extensatildeo a esta do artigo 1691ordm al b) CCiv que prevecirc a
responsabilidade dos cocircnjuges pelas diacutevidas contraiacutedas por qualquer dos cocircnjuges antes ou
depois da celebraccedilatildeo do casamento para ocorrer aos encargos normais da vida familiar
equiparando nesta mateacuteria o conceito de uniatildeo de facto como a comunhatildeo de leito mesa e
habitaccedilatildeo aos casamentos e protegendo a confianccedila de terceiros que com eles contratem e
confiem nessa aparecircncia de vida matrimonial78 A niacutevel patrimonial a uniatildeo de facto atribui
ao unido sobrevivo por forccedila do artigo 2020ordm nordm 1 o direito de exigir alimentos da heranccedila
do falecido poreacutem esse direito caduca se natildeo for exercido nos dois anos posteriores agrave data
da morte do autor da sucessatildeo (nordm 2) e se o alimentado casar iniciar uma relaccedilatildeo de uniatildeo
de facto ou se tornar indigno do benefiacutecio pelo seu comportamento moral por forccedila do nordm 3
do artigo 2020ordm e do artigo 2019ordm CCiv Resta em uacuteltimo lugar dizer que em mateacuteria fiscal
nomeadamente no que respeita ao imposto sobre o rendimento o artigo 3ordm al d) da LUF
torna aplicaacutevel aos membros da uniatildeo de facto o regime atribuiacutedo aos sujeitos passivos natildeo
separados de pessoas e bens nessa mateacuteria
78 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 34
30
5 O problema da prova da coabitaccedilatildeo
51 Consideraccedilotildees gerais
Expostos os efeitos a que a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto daacute origem urge abordar
a problemaacutetica que a este estudo interessa o problema da prova da relaccedilatildeo de uniatildeo de facto
nomeadamente a prova da coabitaccedilatildeo Apesar de natildeo existir como vimos uma exigecircncia de
forma para a constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto e prevalecer entre noacutes um modelo faacutectico79-
bastando que se verifiquem os requisitos factuais para que a convivecircncia seja protegida - eacute
exigido aos seus membros que provem a sua convivecircncia se pretenderem beneficiar de
determinados direitos
Ora a opccedilatildeo do legislador tem sido contraacuteria agrave formalizaccedilatildeo da uniatildeo de facto o
que natildeo facilita a demonstraccedilatildeo dos factos exigidos pela lei para aferir a sua relevacircncia
juriacutedica Portanto a dificuldade dessa prova adveacutem natildeo soacute desta relaccedilatildeo natildeo estar sujeita a
nenhum tipo de solenidade ou publicidade na sua constituiccedilatildeo por natildeo implicar a sujeiccedilatildeo
ao registo civil ou administrativo80 mas tambeacutem por natildeo haver em regra uma prova preacute-
constituiacuteda81 diferentemente do que sucede com o casamento estando nas matildeos dos
cocircnjuges a possibilidade de requerer a qualquer momento uma certidatildeo de casamento
A respeito da prova da uniatildeo de facto no acircmbito juriacutedico-civil recorde-se o regime
geral do oacutenus da prova previsto no artigo 342ordm CCiv que atribui a quem pretende invocar
um direito provar os factos que o constituem Isto eacute se um dos membros da uniatildeo de facto
pretender beneficiar da proteccedilatildeo juriacutedica conferida agrave uniatildeo de facto precisaraacute de demonstrar
a realidade dos factos que invoca para preenchimento dos pressupostos estabelecidos Nesta
mateacuteria tambeacutem satildeo aplicaacuteveis as normas gerais do oacutenus da prova a terceiro que pretenda
fundar um direito na uniatildeo de facto recaindo sobre ele o oacutenus de provar os factos que
consubstanciam o direito que alega Porquanto se vecirc que a prova de que se vive numa
79 Cfr ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoA convivecircncia laquomore uxorioraquo um olhar sobre o regime portuguecircs francecircs
e alematildeordquo in Direito Constitucional e o seu papel na construccedilatildeo do cenaacuterio juriacutedico global dir IRENE
PORTELA IPCA 1ordf Ed 2016 p 121 A uniatildeo de facto eacute uma realidade de convivecircncia continuada sem
qualquer forma exigida Natildeo existe a sujeiccedilatildeo a registo da uniatildeo de facto Ou seja a uniatildeo de facto no nosso
sistema natildeo se constitui consolida-se com o tempo ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUNIAtildeO de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo Gestlegal 1ordm ed 2019 p 158 80 O que natildeo permite saber com certeza a data a partir da qual se comeccedilam a contar os dois anos necessaacuterios agrave
produccedilatildeo de efeitos 81 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72
31
situaccedilatildeo anaacuteloga agrave dos cocircnjuges pode revelar-se sinuosa e por isso eacute relevante desenvolver
essa mateacuteria no presente estudo
Nesta senda o artigo 2ordm-A nordm 1 da LUF prevecirc que a prova da uniatildeo de facto se faz
por qualquer meio legalmente admissiacutevel salvo se disposiccedilatildeo legal ou regulamentar exija
prova documental especiacutefica A prova seraacute maioritariamente testemunhal contudo natildeo se
deve excluir a possibilidade de prova documental ao realizar uma interpretaccedilatildeo extensiva
do termo vida previsto no artigo 34ordm nordm 1 do Decreto-Lei nordm 13599 de 22 de Abril que
regula a forma como atestados de residecircncia vida e situaccedilatildeo econoacutemica dos cidadatildeos
devem ser passados pelas Juntas de Freguesia82 Ou ainda como sugerem FRANCcedilA PITAtildeO e
MARTA COSTA mobilizar accedilatildeo judicial de simples apreciaccedilatildeo (ou de mera declaraccedilatildeo)
positiva83 com a qual os membros pretenderiam apenas obter a declaraccedilatildeo da existecircncia de
um facto que assentava na comunhatildeo de cama mesa e habitaccedilatildeo por mais de dois anos84
Contudo esta soluccedilatildeo poderia comportar o risco de ser usada por um dos membros agrave revelia
do outro com vista ao aproveitamento dos efeitos favoraacuteveis da uniatildeo mesmo que esta jaacute
esteja extinta Eacute precisamente por esta razatildeo que NUNO COSTA MAURIacuteCIO85
rejeita o recurso
a esta accedilatildeo pelos unidos Crecirc que natildeo eacute a soluccedilatildeo para a dificuldade da prova da uniatildeo de
facto devido aos problema que podiam advir da falta de controlo judicial da extinccedilatildeo da
uniatildeo de facto que consistiriam na possibilidade de um ou ambos os unidos continuarem a
usufruir de efeitos favoraacuteveis de uma situaccedilatildeo que jaacute se extinguiu
Poderaacute entatildeo fazer-se a prova documental atraveacutes de uma declaraccedilatildeo emitida pela
Junta de Freguesia competente sendo que esse documento deve ser acompanhado da
declaraccedilatildeo de ambos os membros conviventes que sob compromisso de honra afirmam que
vivem em uniatildeo de facto haacute mais de dois anos e da coacutepia das suas certidotildees de nascimento
Poreacutem a veracidade deste documento pode por vezes ser posta em causa e natildeo fazer prova
plena por natildeo se tratar normalmente de facto atestado com base nas perceccedilotildees da entidade
82 Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p74 83 Cfr MARTA COSTA ob cit p387 FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia Comum de acordo com
a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit p78 84 Tendo os requerentes de tal accedilatildeo de provar natildeo soacute a sua natildeo coabitaccedilatildeo nos termos e condiccedilotildees previstos na
lei bem como a inexistecircncia de qualquer um dos impedimentos previstos no art 2ordm da LUF sob pena de a
decisatildeo judicial natildeo poder produzir nenhum efeito uacutetil Cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoUniotildees de Facto e Economia
Comum de acordo com a Lei nordm 232010 de 30 de agostordquo obcit pp 78-79 85 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo Um repensar da problemaacutetica juriacutedica das uniotildees
de facto e das relaccedilotildees patrimoniais entre unidos de facto Tese de Mestrado em Ciecircncias Juriacutedico-Civiliacutesticas
Faculdade De Direito Da Universidade De Coimbra Outubro 2000 p 76
32
documentadora86 Efetivamente o documento soacute prova que os interessados fizeram perante
o funcionaacuterio a afirmaccedilatildeo de que conviviam em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges desde
determinada data todavia natildeo quer dizer que natildeo se possa pocircr em causa a veracidade dessa
afirmaccedilatildeo87 Qualquer interessado pode demonstrar que o facto natildeo eacute verdadeiro por alegar
que a uniatildeo de facto natildeo existiu ou natildeo teve lugar durante o periacuteodo mencionado pelos
declarantes88 Ou seja o disposto no artigo 2ordm-A n ordm1 da LUF traduz-se apenas na
possibilidade que os unidos tecircm de apresentar documentos para demonstrarem os
pressupostos que permitem atribuir relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto pois essa norma natildeo
confere qualquer valor probatoacuterio a tais documentos Posto isto o documento emitido pela
Junta de Freguesia natildeo eacute suficiente para demonstrar a existecircncia da uniatildeo de facto porquanto
a LUF natildeo exige apenas a alegaccedilatildeo de que duas pessoas vivem juntas haacute mais de dois anos
ou que natildeo se verifique nenhum dos impedimentos agrave constituiccedilatildeo da relaccedilatildeo eacute essencial
ainda que provem a sua coabitaccedilatildeo89
O nordm 5 do artigo 2ordm-A adverte tambeacutem para as sanccedilotildees penais que as falsas
declaraccedilotildees poderatildeo causar Como prova documental eacute um meio de prova fraacutegil e suscetiacutevel
de fraude esta norma funciona como advertecircncia que visa promover a conformidade entre
as declaraccedilotildees que os sujeitos fazem e a realidade que por eles eacute vivida esperando que a
ameaccedila da aplicaccedilatildeo de uma sanccedilatildeo penal iniba a alegaccedilatildeo de falsas declaraccedilotildees Tendo em
conta que o interesse da demonstraccedilatildeo dos requisitos que permitem atribuir relevacircncia
juriacutedica agrave situaccedilatildeo de facto eacute com o objetivo de se produzirem factos favoraacuteveis aos
86 Art 371ordm nordm 1 CCiv Cfr FRANCISCO PEREIRA COELHO GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 72 87 Vide neste sentido o Acoacuterdatildeo do TCA Norte de 13-11-2020 proferido no acircmbito do processo nordm
00090151BECBR Natildeo oferece qualquer controveacutersia quer em sede doutrinal quer jurisprudencial que natildeo
sendo arguida a falsidade do documento autecircntico este faz prova plena dos factos praticados pela entidade
documentadora de sorte que tudo o que o documento referir como tendo sido praticado por essa entidade
tudo o que segundo o documento seja obra do seu Autor e bem assim tudo o que tenha sido percecionado
pelo mesmo tem de ser aceite como exato Assim as declaraccedilotildees que constam no documento como tendo sido
feitas perante a entidade documentadora ou seja o declarado perante a uacuteltima e que essa entidade ouviu
atraveacutes dos seus sentidos em consonacircncia com a parte final do nordm 1 do art 371ordm do CC beneficiam da prova
plena inerente agrave forccedila probatoacuteria conferida pelo oficial puacuteblico Deste modo se o presidente de junta consigna
no texto do atestado que a requerente e as referidas testemunhas declararam que ldquo(a) mesmo(a) residia haacute
mais de dois anos com o falecido A seu companheiro(a) ateacute agrave data de oacutebito (hellip)rdquo tem-se como plenamente
provado que essa declaraccedilatildeo foi efetivamente feita perante o presidente de junta de freguesia Mas tatildeo soacute Eacute
que daiacute natildeo decorre que a forccedila probatoacuteria desse atestado respeite a tudo o que nele se conteacutem A verdade
dos factos a que se reportam as declaraccedilotildees emitidas e que constam desse documento autecircntico- no caso o
atestado emitido pelo presidente de junta de freguesia- ficam sujeitas agrave livre apreciaccedilatildeo do julgador 88 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 529 89 Isto eacute que vivem em ldquouniatildeo de factordquo Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo
De Factordquo obcit p1518 E ainda sobre a importacircncia da coabitaccedilatildeo cfr FRANCcedilA PITAtildeO ldquoOs novos
casamentos ou a crise do casamento tradicional no direito portuguecircs ob cit p66
33
declarantes estaraacute sempre em causa a credibilidade de tais declaraccedilotildees que estaratildeo sujeitas
ao confronto com as demais provas e ao princiacutepio da livre apreciaccedilatildeo da prova90 acabando
por serem mais crediacuteveis as declaraccedilotildees feitas em detrimento dos declarantes91 A norma em
causa pretende apenas facilitar a demonstraccedilatildeo dos factos que satildeo considerados como
pressupostos da atribuiccedilatildeo de relevacircncia juriacutedica agrave uniatildeo de facto uma vez que a lei natildeo
adotou ainda um registo oficial desta relaccedilatildeo Cremos que a intenccedilatildeo do legislador foi libertar
os membros da uniatildeo de facto de terem de obter declaraccedilatildeo judicial para certificar a sua
convivecircncia respeitando a liberdade inerente a quem opta por este tipo de relaccedilatildeo Todavia
este eacute um tema controvertido e vem sido debatido na doutrina a possibilidade de registo da
uniatildeo de facto como forma de conferir publicidade a estas relaccedilotildees findar os problemas
relativos agrave sua prova e de colmatar esta que pode ser considerada uma das lacunas presentes
no regime juriacutedico portuguecircs da uniatildeo de facto Haacute quem entenda que uma vez que a uniatildeo
de facto se trata na maioria das vezes de uma opccedilatildeo de vida de acordo com a autonomia da
vontade de quem por ela optou o legislador deve respeitar essa escolha e intervir apenas se
necessaacuterio legislando somente em alguns aspetos pontuais92 Devendo quanto ao resto
abster-se e confiar na capacidade de autorregulamentaccedilatildeo dos membros da uniatildeo de facto
Neste seguimento o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n ordm45VIII93
que visava alterar a Lei nordm 13599 de 28 de Agosto Atraveacutes deste projeto apresentou
soluccedilotildees no que diz respeito agrave prova e ao registo da uniatildeo de facto94 sugerindo que o artigo
2ordm-A passasse a tratar da forma como a uniatildeo de facto eacute constituiacuteda que seria atraveacutes de
registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou apoacutes
90 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira Coelho e
Legislaccedilatildeo Atualrdquo em Textos de Direito da Famiacutelia para Francisco Pereira Coelho Coimbra Imprensa da
Universidade de Coimbra 2016 p 684 91 Cfr RITA LOBO XAVIER ldquoEstatuto Privadordquo dos membros da Uniatildeo De Factordquo obcit p1519 92 Cfr HEINRICH HOumlRSTER ldquoDireito da Famiacutelia e Poliacutetica Socialrdquo Publicaccedilotildees Universidade Catoacutelica Porto
2001 pp71-72 Segundo este A o legislador adotando uma postura prudente deve apenas legislar quando
estejam em causa interesses de terceiros ou seja da comunidade ou quando haja a necessidade de proteger os
filhos Nestas situaccedilotildees defende que o legislador pode e deve intervir e que quando se trate de legislar em
mateacuteria de uniatildeo de facto espera que seja feito com cuidado e ponderaccedilatildeo 93 Consultaacutevel em
httpswwwparlamentoptActividadeParlamentarPaginasDetalheIniciativaaspxBID=6308 94 No seu art 2ordm previam o aditamento do artigo 2ordmA e 2ordm B art 2ordm-A1 A uniatildeo de facto eacute constituiacuteda a)
Por registo na junta de freguesia da aacuterea de residecircncia das pessoas em uniatildeo de facto ou b) Apoacutes dois anos
em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo 2 As uniotildees de facto constituiacutedas por registo
conforme a aliacutenea a) do nordm 1 do presente artigo estatildeo imediatamente reguladas pela presente lei Art 2ordm-B
A uniatildeo de facto constituiacuteda por registo eacute dissolvida por vontade de pelo menos um dos seus constituintes
expressa junto aos serviccedilos de registo da junta de freguesia da aacuterea da residecircncia
34
dois anos em plena comunhatildeo de vida sem necessidade de registo passando as uniotildees de
facto constituiacutedas por registo a estar imediatamente reguladas pela LUF sem necessidade
do decurso do prazo de dois anos Este projeto previa tambeacutem no artigo 2ordm-B o registo da
dissoluccedilatildeo junto dos serviccedilos da junta de freguesia atraveacutes da declaraccedilatildeo de pelo menos um
dos unidos O Projeto de Lei n ordm45VIII do BE95 cumpriu os requisitos constitucionais e
regimentais necessaacuterios para ser apreciado pelo plenaacuterio da Assembleia da Reacutepublica
Contudo apoacutes a adoccedilatildeo por parte da Comissatildeo de Assuntos Constitucionais Direitos
Liberdades e Garantias de um texto de substituiccedilatildeo relativo aos projetos nordm 6VII de
iniciativa do partido Os Verdes ao nordm 45VIII do BE e ao nordm 115VII do PCP e apoacutes a
aprovaccedilatildeo com votos favoraacuteveis do PS do PCP e do BE e votos contra do PSD do CDS-
PP e da Deputada Maria do Rosaacuterio Carneiro (PS) relativamente a cada artigo do texto de
substituiccedilatildeo os representantes na Comissatildeo dos Grupos Parlamentares do PCP e do BE bem
como a Srordf Deputada Isabel Castro (Os Verdes) declararam retirar as respetivas iniciativas
legislativas em benefiacutecio do texto de substituiccedilatildeo adotado entrando em vigor a Lei nordm
72001 de 11 de Maio que adotou medidas de proteccedilatildeo das uniotildees de facto Vigorando com
as subsequentes alteraccedilotildees ateacute aos dias de hoje
Conveacutem frisar que a questatildeo do registo da uniatildeo de facto pode ser encarada como
incompatiacutevel com a proacutepria natureza informal da uniatildeo de facto Desde logo NUNO COSTA
MAURIacuteCIO defende que subjacente agrave necessidade do registo reside sempre uma ideia de
certeza juriacutedica a qual transportada para o acircmbito da uniatildeo de facto vai implicar que a sua
prova nunca possa ser feita atraveacutes de uma declaraccedilatildeo unilateral da parte interessada tendo
de passar por uma acreditaccedilatildeo um crivo de publicidade que traraacute consigo e proporcionaraacute a
terceiros a certeza juriacutedica de que aquelas duas pessoas vivem em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges96 Poreacutem acredita que apesar das vantagens da certeza e seguranccedila juriacutedicas
inerentes ao instituto do registo as desvantagens se afloram maiores Em virtude de no que
respeita aos elementos constitutivos da uniatildeo de facto onde o essencial eacute estar-se perante
uma convivecircncia estaacutevel e duradoura semelhante agrave dos cocircnjuges natildeo deve bastar o facto de
duas pessoas se dirigirem a uma conservatoacuteria de registo ou a outra entidade puacuteblica e
declararem viver em uniatildeo de facto sem se apurar a autenticidade dessas declaraccedilotildees
95 Bem como os projetos de lei nordm 6VIII da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes o nordm 105VIII da
iniciativa do Partido Socialista e o nordm 115VIII da iniciativa do Partido Comunista Portuguecircs 96 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p 81
35
Acrescenta ainda que ao fazerem depender a eficaacutecia juriacutedica da uniatildeo de facto da sua
inscriccedilatildeo no registo tornando ineficazes as uniotildees que natildeo estivessem inscritas estariam a
forccedilar os unidos que optaram por esta forma de convivecircncia exatamente para dispensar
qualquer formalidade a inscrever a sua relaccedilatildeo O que se traduziria numa adulteraccedilatildeo da
intencionalidade e natureza da uniatildeo de facto Ou mesmo que se configurasse um registo
livre e voluntaacuterio quem preferisse a natildeo inscriccedilatildeo natildeo teria acesso a um regime legal de
proteccedilatildeo da uniatildeo de facto ficando agrave margem da lei o que geraria uma nova discriminaccedilatildeo
Nota por uacuteltimo que a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto se iria traduzir na prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos dois sujeitos e assim sendo poderia
estar-se perante um novo tipo de casamento ainda que se trate de um casamento de segundo
grau97 Tal consideraccedilatildeo iria contra o espiacuterito de liberdade e natildeo formalismo que preside agrave
uniatildeo de facto98 Depreendendo que devido agraves desvantagens inerentes ao registo a
dificuldade da prova da uniatildeo de facto seria mais facilmente superada se se permitisse aos
unidos de facto ao abrigo do princiacutepio da livre disponibilidade convencionar as
regulamentaccedilatildeo das suas relaccedilotildees99
De outra banda MARTA COSTA considera que se fosse instituiacutedo o registo
obrigatoacuterio para que os conviventes pudessem beneficiar da tutela legislativa prevista as
dificuldades que advecircm da prova da uniatildeo de facto ficariam diminuiacutedas e sairiam
privilegiadas a seguranccedila juriacutedica e a liberdade dos conviventes que poderiam decidir se
pretendiam ser legislativamente tutelados ou se optariam por uma relaccedilatildeo meramente
factual Realccedila ainda que a instituiccedilatildeo do registo transformaria a uniatildeo de facto em relaccedilatildeo
de direito num instituto juriacutedico formal ainda que a sua tutela fosse diminuta100 Durante a
sua anaacutelise aproveita para refutar algumas das desvantagens que NUNO COSTA MAURIacuteCIO
aponta agrave inscriccedilatildeo da uniatildeo de facto no registo Primeiramente em relaccedilatildeo agrave dificuldade de
apurar a veracidade das declaraccedilotildees dos unidos a A crecirc que depende da opccedilatildeo legislativa
97 Atentando-se agrave diferenccedila de grau no que diz respeito ao nuacutemero de efeitos juriacutedicos que cada um produz
Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p82 98 Eacute na procura do momento da conciliaccedilatildeo entre a autoridade e liberdade e entre o puacuteblico e o privado que
residem os fundamentos das intervenccedilotildees legislativas no acircmbito das relaccedilotildees juriacutedico-familiares que devem
repousar ou fundamentos de poliacutetica legislativa relativos agrave atribuiccedilatildeo de efeitos de direito agrave uniatildeo de facto
(hellip) e estaacute na base das intervenccedilotildees legislativas feitas em alguns paiacuteses e nas exigecircncias feitas pela doutrina
noutros com vista agrave definiccedilatildeo de um estatuto juriacutedico da uniatildeo de facto Cfr GERALDO DA CRUZ ALMEIDA
ob cit pp 185-193 99 Cfr NUNO COSTA MAURIacuteCIO ldquoO pecado mora ao ladordquo ob cit p83 100 Cfr MARTA COSTA ob cit p 394
36
Isto eacute se com a obrigatoriedade do registo o legislador decidir que a tutela da relaccedilatildeo fique
dependente da duraccedilatildeo da mesma esta duraccedilatildeo pode contar-se apoacutes o registo ou exigir-se o
decurso da mesma para que os conviventes possam inscrever a relaccedilatildeo no registo mantendo-
se a dificuldade de determinar o seu iniacutecio Se por outro lado a tutela da convivecircncia natildeo
ficar dependente da sua duraccedilatildeo natildeo teraacute de haver uma convivecircncia preacutevia podendo duas
pessoas que queiram conviver dirigirem-se a uma entidade competente e registar a
convivecircncia que podia jaacute existir ou iniciar-se nesse momento101 Relativamente ao facto de
os unidos que optaram pela uniatildeo de facto para se eximirem de qualquer formalidade se
verem obrigados a proceder ao registo da sua relaccedilatildeo para evitar que a sua uniatildeo seja
inexistente a A discorda afirmando que os unidos natildeo se veriam forccedilados a proceder ao
registo podendo preferir manter uma verdadeira uniatildeo de facto agrave qual continuariam a ser
atribuiacutedos ainda que poucos alguns direitos e deveres102 face agrave nossa ordem juriacutedica
defendendo que a obrigatoriedade do registo ao lado do instituto do casamento e da relaccedilatildeo
puramente de facto serviria melhor os interesses de uma sociedade pluralista103 A A
diverge ainda da ideia imputada pelo A de representar uma discriminaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos
conviventes que optem pela natildeo inscriccedilatildeo por natildeo beneficiarem do regime de proteccedilatildeo da
uniatildeo de facto No seu entendimento eacute antes o reflexo do respeito pela escolha dos unidos
de manterem a sua uniatildeo verdadeiramente factual Remata a sua apreciaccedilatildeo afirmando que
o que vai contra o espiacuterito de liberdade que preside agrave uniatildeo de facto natildeo eacute a prestaccedilatildeo de
consentimento a uma relaccedilatildeo de facto por parte dos unidos mas antes a aplicaccedilatildeo automaacutetica
de um regime juriacutedico aos conviventes ainda que pouco densificado aditando que a
instituiccedilatildeo do registo obrigatoacuterio proporcionaria vaacuterias possibilidades que dependeriam da
real vontade dos interessados
101 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 102 Cfr MARTA COSTA ob cit p 397 103 Cfr MARTA COSTA ob cit p 398
37
52 Comparaccedilatildeo com o regime de outros ordenamentos juriacutedicos na Uniatildeo
Europeia
De forma a completar o raciociacutenio ateacute aqui apresentado cumpre agora uma sucinta
anaacutelise do regime juriacutedico da uniatildeo de facto em vigor em alguns ordenamentos juriacutedicos
europeus bem como outras figuras que advieram da jurisdicionalizaccedilatildeo da convivecircncia more
uxorio104 Assim importa primeiramente discorrer umas breves notas sobre o regime geral
previsto em cada um dos ordenamentos particularmente no que respeita agrave constituiccedilatildeo da
uniatildeo de facto aos seus efeitos e o seu regime de prova para que possamos posteriormente
expor as nossas conclusotildees e possiacutevel proposta de soluccedilatildeo
521 Espanha
Jaacute em 1986 EDUARDO ESTRADA ALONSO refletia sobre o conceito juriacutedico da uniatildeo
de facto em Espanha definindo o conceito de unioacuten extramatrimonial como uma
convivecircncia diaacuteria que eacute desenvolvida habitualmente pelos casamentos de forma estaacutevel e
duradoura sugerindo que o prazo miacutenimo deveria ser de cinco anos para que pudessem ser
consideradas pelo Direito Admite que essa convivecircncia natildeo seja necessariamente no sentido
da coabitaccedilatildeo mas no sentido de que haja pelo menos uma vontade de estar juntos a fim de
evitar que as separaccedilotildees temporaacuterias e involuntaacuterias ndash por motivos profissionais ndash impeccedilam
a produccedilatildeo dos efeitos juriacutedicos pretendidos por essas uniotildees Entende que eacute uma uniatildeo que
dispensa qualquer formalidade para ser constituiacuteda e que implica o cumprimento espontacircneo
sem obrigaccedilatildeo juriacutedica dos deveres conjugais por parte dos membros devendo ser uma
relaccedilatildeo monogacircmica onde haacute a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais sem exigecircncia que
procriem105
Apesar de em Espanha natildeo se encontrar definido o conceito juriacutedico de famiacutelia nem
se as uniotildees de facto se enquadram nesse conceito o Tribunal Constitucional Espanhol tem
vindo a pronunciar-se sobre essa sua inclusatildeo ou natildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola106 Em 1990 na sentenccedila nordm 1841990 de 15 de Novembro107 o TCE defendeu
104 Expressatildeo usada para caracterizar uma convivecircncia semelhante agrave do marido e mulher ou seja segundo os
costumes matrimoniais 105 Cfr EDUARDO ESTRADA ALONSO ob cit pp 52-73 106 1 Los poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica de la familia Constituiccedilatildeo
Espanhola consultaacutevel em
httpswwwtribunalconstitucionalesestribunalnormativaNormativaCEportuguC3A9spdf 107 Sobre a importacircncia desta sentenccedila cfr JUAN FORNEacuteS ldquoMatrimonio y uniones de hechordquo Ius Canonicum
XL n ordm80 2000 p 404
38
que este tipo de convivecircncia natildeo encontrava previsatildeo no artigo 391 da Constituiccedilatildeo
Espanhola sugerindo que este artigo estava reservado agrave proteccedilatildeo da famiacutelia num ambiente
marital e pela existecircncia de filhos natildeo obstante as parejas de hecho poderem ser protegidas
constitucionalmente atraveacutes da mobilizaccedilatildeo do artigo 101 que postula o direito ao
desenvolvimento da personalidade108 Contrariamente o magistrado GIMENO SENDRA do
TCE sustentou num voto particular nessa sentenccedila a diferenciaccedilatildeo entre a famiacutelia e o
casamento afirmando que a constituiccedilatildeo espanhola previa duas situaccedilotildees distintas o artigo
391 consagrava a proteccedilatildeo da famiacutelia e o artigo 321109 previa a defesa do matrimoacutenio assim
protegendo o artigo 391 no solo a la famiacutelia como institucioacuten juriacutedica sino tambieacuten la
familia como realidad natural por lo que junto a la familia matrimonial tambieacuten han de
merecer proteccioacuten constitucional las denominadas uniones conyugales de hecho110 Em
1992 nesta mesma linha de pensamento na sentenccedila nordm 22292 de 11 de Dezembro o TCE
salientou que o artigo 39 da Constituiccedilatildeo Espanhola protege natildeo soacute a famiacutelia matrimonial
mas tambeacutem a natildeo matrimonial e assim as relaccedilotildees de convivecircncia constituiriam relaccedilotildees
familiares independentemente de terem filhos ou natildeo cabendo no acircmbito de incidecircncia
desse artigo Posteriormente em 28 de Fevereiro de 1994 na sentenccedila nordm 6694 o mesmo
tribunal voltou ao entendimento sufragado em 1990 defendendo a natildeo equivalecircncia entre
casamento e uniatildeo de facto para efeitos do artigo 39 Por fim este entendimento foi reiterado
na sentenccedila nordm 3998 de 17 de Fevereiro de 1998 e a 17 de Junho de 1999 com a sentenccedila
nordm 11699111 foi aceite a posiccedilatildeo defendida pela magistrado GIMENO SENDRA Assim
determinou o Tribunal Constitucional Espanhol que o artigo 391 natildeo identifica que a famiacutelia
que visa proteger eacute a que tem origem no casamento existindo outras modalidades de vida
familiar a par do casamento que refletem una sociedad plural Aleacutem da jurisprudecircncia
tambeacutem a doutrina tem divergido sobre a amplitude de aplicaccedilatildeo deste preceito
constitucional Atualmente o entendimento maioritaacuterio parece estar mais favoraacutevel agrave
inclusatildeo da convivecircncia more uxorio no artigo 391112
108 Tal como recorde-se eacute defendido em Portugal por alguns autores 109 1 El hombre y la mujer tienen derecho a contraer matrimonio con plena igualdad juriacutedica 110 Cfr MARTA COSTA ob cit p 111 111 Cfr JUAN FORNES ob cit p403 112 Cfr JOSEacute RAMOacuteN DE VERDA Y BEAMONTE ldquoLa Ley 52012 de 15 de octubre de uniones de hecho
formalizadas de la Comunidad Valencianardquo Rev boliv de derecho nordm 19 enero 2015 p 772 El precepto
habla de ldquofamiliardquo y no de ldquofamilia legiacutetimardquo (o ldquomatrimonialrdquo) por lo que la proteccioacuten que el precepto
otorga a la familia no debe identificarse necesariamente con la que tiene origen en el matrimonio el cual se
39
Ora diferentemente do que sucede em Portugal o legislador espanhol natildeo se
ocupou de regular de forma uniforme o regime da uniatildeo de facto113 Ao inveacutes as
comunidades autoacutenomas espanholas no acircmbito das suas competecircncia legislativas114
adotaram ainda que de forma distinta regras proacuteprias que regulam este tipo de convivecircncia
natildeo matrimonial Desde logo a maioria qualifica a convivecircncia more uxorio como relaccedilatildeo
familiar Pode ler-se na Ley Foral 62000 de 3 de julio da Comunidade Foral de Navarra
ora revogada115 no seu artigo 2 que ningueacutem pode ser discriminado em razatildeo do grupo
familiar de que faz parte quer seja proveniente de filiaccedilatildeo casamento ou uniatildeo de duas
pessoas que convivam em relaccedilatildeo afetiva semelhante independentemente da sua orientaccedilatildeo
sexual Esta disposiccedilatildeo foi reproduzida por leis de outras Comunidades como as Astuacuterias
Extremadura e Andaluzia116 Contrariamente outras comunidades como as Ilhas Baleares
natildeo as qualificam dessa forma No artigo 3 da Ley 182001 de 19 de diciembre prevecirc-se
que a formaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo gere relaccedilatildeo de parentesco entre cada um de seus
membros e os familiares do outro Contudo na exposiccedilatildeo de motivos da dita lei eacute chamado
agrave colaccedilatildeo o artigo 391 da constituiccedilatildeo espanhola em nome da proteccedilatildeo social econoacutemica e
juriacutedica da famiacutelia indicando que essa norma natildeo visa proteger apenas um modelo de
famiacutelia sendo necessaacuterio fazer uma interpretaccedilatildeo ampliada desse conceito de acordo com a
realidade social A exposiccedilatildeo de motivos estabelece ainda que o artigo 32 ao prever o direito
de contrair matrimoacutenio tambeacutem prevecirc o direito a natildeo o fazer o que natildeo prejudica o direito
de todos os homens e mulheres de constituir por meio de uma uniatildeo efetiva e estaacutevel uma
comunhatildeo de vida que com ou sem filhos implique a constituiccedilatildeo de uma famiacutelia
regula en un precepto especiacutefico (art 32 CE) y en capiacutetulo diverso No mesmo sentido LUIS PEacuteREZ
FERNAacuteNDEZ ldquoLas Uniones Extramatrimoniales En Espantildea iquestEs Necesaria Su Regulacioacutenrdquo in Revista Juriacutedica
de Astuacuterias nordm 40 2017 p162 En nuestros diacuteas tanto matrimonio como la unioacuten extramatrimonial pueden
constituir una familia y estaacuten amparados por la misma proteccioacuten social econoacutemica y juriacutedica del artiacuteculo
391 de la Constitucioacuten espantildeola cuyo tenor literal establece laquoLos poderes puacuteblicos aseguran la proteccioacuten
social econoacutemica y juriacutedica de la familiaraquo 113 Ou concubinato parejas de hecho parejas cohabitantes uniones de hecho uniones libres convivencias
no matrimoniales matrimonios laquosin papelesraquo convivencias prenupciales () CfrGERARDO MEIL
LANDWERLIN ldquoLas uniones de hecho en Espantildeardquo Madrid Centro de Investigaciones Socioloacutegicas 2003 p
26 114 Cfr MARTA COSTA ob cit p 349 115 Lei original consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2000-16373 modificada e
atualizada pela Ley Foral 212019 de 4 de abril consultaacutevel em httpswwwboeeselies-
nclf2019040421 116 Respetivamente Ley 42002 de 23 de mayo de Parejas Estables Ley 52003 de 20 de marzo de parejas
de hecho de la Comunidad Autoacutenoma de Extremadura Ley 52002 de 16 de diciembre de Parejas de Hecho
40
Ademais assiste-se a uma coexistecircncia entre uniones extramatrimoniales
formalizadas e as puramente faacutecticas117 o que se reflete nos meios probatoacuterios No
ordenamento juriacutedico espanhol satildeo aceitaacuteveis todos os meios de prova que sejam admitidos
nos termos gerais do direito A exigecircncia da aparecircncia externa da convivecircncia entre unidos
de facto tem estreita relaccedilatildeo com a prova da mesma mostrando-se a jurisprudecircncia flexiacutevel
ao considerar suficientes para esse efeito as declaraccedilotildees dos conviventes ou seja a prova
testemunhal sem que documentos de caraacuteter administrativo a possam pocircr em causa As
disposiccedilotildees do acircmbito estatal natildeo precisam os requisitos pessoais nem as formas de
constituiccedilatildeo da uniatildeo de facto118 Jaacute no que toca ao direito regional prevalece a diversidade
havendo leis que admitem todos os meios de prova e outras que sendo mais restritivas
requerem o registo obrigatoacuterio Um exemplo de lei que admite qualquer meio de prova
admissiacutevel no direito eacute a Ley 42002 de 23 de mayo do principado das Astuacuterias119 A
Comunidade de Andaluzia prevecirc a possibilidade da declaraccedilatildeo de vontade de constituir uma
pareja de hecho mediante el otorgamiento de escritura puacuteblica o por cualquier otro medio
de prueba admisible en Derecho120 Jaacute comunidades como Extremadura121 Ilhas Baleares122
Cantaacutebria123 e Paiacutes Vasco124 exigem a inscriccedilatildeo das uniotildees de facto no registo para a sua
constituiccedilatildeo e por conseguinte como forma de provar a relaccedilatildeo Na comunidade de
Aragatildeo125 prevecirc-se a inscriccedilatildeo da relaccedilatildeo no registo administrativo podendo provar-se a
existecircncia da relaccedilatildeo se natildeo houver escritura puacuteblica por qualquer meio de prova admitido
no direito
117 Cfr NATALIA ALVAREZ LATA ldquoLas Parejas De Hecho Perspectiva Jurisprudencialrdquo Derecho Privado y
Constitucioacuten nordm 12 enero- diciembre 1998 p 15 118 Para mais desenvolvimentos no acircmbito de normas estatais cfr MARTA COSTA ob cit p 388 119 Art 3 n ordm3 La existencia de pareja estable o el transcurso del antildeo de convivencia podraacuten acreditarse
atraveacutes de cualquier medio de prueba admitido en Derecho
Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-13017 120 Art 5 nordm 3 Consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2003-771 121 Art 4 da Ley 52003 de 20 de marzo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2003-9450 122 Art1 nordm2 da Ley 182001 de 19 de diciembre consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2002-917ampa=aamporden=conterefpost 123 Art 5 da Ley 12005 de 16 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-2005-
9402 124 Art 3 e 4 da Ley 22003 de 7 de mayo consultaacutevel em httpswwwboeesbuscardocphpid=BOE-A-
2011-18545 125 Ley 61999 de 26 de marzo derrogada pelo Decreto Legislativo 12011 de 22 de marzo consultaacutevel em
httpswwwboeesbuscardocphpid=BOA-d-2011-90007
41
Apoacutes a anaacutelise das soluccedilotildees que as comunidades autoacutenomas apresentam eacute de notar
a diversidade de caminhos que sugerem e que satildeo desconhecidos ao direito portuguecircs pelo
menos para jaacute
522 Franccedila
Tal como sucede em Espanha o ordenamento juriacutedico francecircs natildeo contempla uma
definiccedilatildeo de famiacutelia nem em termos constitucionais nem no Code Civil ou Code de la
Familie Tradicionalmente a doutrina tem vindo a definir famiacutelia como o grupo de pessoas
que estatildeo ligados por laccedilos fundados essencialmente pelo casamento e parentesco126 As
relaccedilotildees de concubinage natildeo cabem em princiacutepio neste conceito127 Poreacutem atualmente a
natureza familiar dos laccedilos criados pelo PACS tem sido questionada e ao receber resposta
afirmativa por parte da jurisprudecircncia eacute possiacutevel perceber-se que estaacute em curso uma
modificaccedilatildeo no que respeita agrave noccedilatildeo de famiacutelia apresentando-se cada vez menos riacutegida128
No Tiacutetulo XII no Code Civil encontramos as duas figuras que ocuparatildeo agora a
nossa anaacutelise o pacte civil de solidariteacute e le concubinage129 Em primeiro lugar o artigo
515-2 define o PACS como o contrato celebrado por duas pessoas singulares maiores de
idade do mesmo sexo ou de sexo diferente para organizarem a sua vida em comum Le
concubinage eacute definido pelo artigo 515-8 como uma uniatildeo de facto caracterizada por uma
vida comum de estabilidade e continuidade entre duas pessoas de sexo diferente ou igual
que vivem como um casal130 Importa frisar que esta relaccedilatildeo deve dispor alguns elementos
constitutivos que a possam qualificar como tal131 Entre os elementos suscetiacuteveis de
126 Por sua vez o Institut National De La Stastistique et des Etudes Economiques define que une famille est la
partie dun meacutenage comprenant au moins deux personnes et constitueacutee soit dun couple vivant au sein du
meacutenage avec le cas eacutecheacuteant son ou ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage soit dun adulte avec son ou
ses enfant(s) appartenant au mecircme meacutenage (famille monoparentale)
Pour quune personne soit enfant dune famille elle doit ecirctre ceacutelibataire et ne pas avoir de conjoint ou denfant
faisant partie du mecircme meacutenage Consultaacutevel em httpswwwinseefrfrmetadonneesdefinitionc1465 127 Cfr ALAIN BENABENT lsquorsquoDroit de la famillersquorsquo LGDJ 4ordm ed 2018 p15 128 Idem 129Consultaacutevel
emhttpswwwlegifrancegouvfrcodessection_lcLEGITEXT000006070721LEGISCTA000006118360
LEGISCTA000006118360 130 O que implica certas consequecircncias legais para os indiviacuteduos que escolheram esta forma de conjugalidade
em oposiccedilatildeo ao casamento Enquanto o casal surgido do casamento estaacute sujeito a um conjunto de regras que
formam um estatuto natildeo existe um estatuto de coabitaccedilatildeo mesmo que a coabitaccedilatildeo seja marcada pela adesatildeo
contiacutenua agraves regras aplicaacuteveis aos cocircnjuges JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ldquoDroit de la famillerdquo Paris
Dalloz 2001 XXXVII p 373 131 Cfr GERARD GOLDSTEIN lsquorsquoLa cohabitation hors mariage en droit international priveacutersquorsquo in Recueil des Cours
ndash Collected Courses Of The Hague Academy Of Internation Law Tomo 320 Martinus Nijhoff Publishers
2006 p 95
42
caracterizar como concubinage haacute alguns que consoante o caso satildeo particularmente
necessaacuterios em detrimento de outros Le concubinage natildeo se baseia apenas em relaccedilotildees
estaacuteveis e contiacutenuas que envolvem uma comunhatildeo de vida com coabitaccedilatildeo Aleacutem de haver
uma comunhatildeo de casa eacute ainda necessaacuterio que haja uma comunhatildeo de leito ou seja que
exista a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais tal como no nosso ordenamento juriacutedico Aleacutem do
mais eacute importante que seja puacuteblica isto eacute conhecida por terceiros132
Quanto ao regime legal do concubinage este eacute inexistente Os efeitos do casamento
natildeo satildeo aplicaacuteveis agrave relaccedilatildeo de uniatildeo de facto no ordenamento juriacutedico francecircs A situaccedilatildeo
vivenciada pelos conviventes difere da dos cocircnjuges tanto do ponto de vista patrimonial
como do ponto de vista extrapatrimonial nomeadamente no que respeita aos direitos e
deveres conjugais previstos nos artigos 212ordm a 226ordm Code Civil133 Estes natildeo satildeo extensiacuteveis
aos membros da uniatildeo de facto pois a sua comunhatildeo de vida assenta num facto e nunca num
dever Independentemente da duraccedilatildeo da relaccedilatildeo os membros da uniatildeo de facto permanecem
juridicamente estranhos um ao outro natildeo gerando qualquer estado civil nem a possibilidade
de adotarem o nome do outro A situaccedilatildeo de facto estaacute no acircmbito pessoal isenta de qualquer
tipo de regulamento especiacutefico sendo regulada essencialmente pelo direito comum
Possibilitando que a sua rutura seja mais simples podendo qualquer dos membros pocircr fim agrave
relaccedilatildeo a todo o momento134 No tocante a efeitos patrimoniais natildeo existem efeitos diretos
ligados agrave uniatildeo de facto e natildeo haacute norma semelhante ao artigo 220ordm Code Civil135
relativamente ao regime do concubinage responsabilizando solidariamente os membros
pelas diacutevidas do outro No acircmbito fiscal os unidos declaram os seus rendimentos
separadamente sendo considerados individualmente Ao contraacuterio do casamento natildeo haacute o
dever de assistecircncia entre os conviventes e a existir eacute inteiramente voluntaacuterio Como foi
dito sem ser o regime primaacuterio natildeo existe um regime entre os conviventes como existe no
132 Atualmente natildeo eacute necessaacuteria a diferenccedila de sexos para que se possa qualificar a relaccedilatildeo como concubinage
sendo considerado da mesma forma quer se trate de pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente art 515-8
do Code Civil Para mais desenvolvimentos quanto aos elementos caracterizadores cfr JACQUELINE
RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 375 133 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ldquoDroit de la famillerdquo
ParisSirey DL 2009 XII p89 134 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 391 135 1ordf parte Chacun des eacutepoux a pouvoir pour passer seul les contrats qui ont pour objet lentretien du meacutenage
ou leacuteducation des enfants toute dette ainsi contracteacutee par lun oblige lautre solidairement Cfr JEAN
CARBONNIER ob cit p 671
43
casamento Surgindo assim a tentativa de desenvolver na Franccedila inspirada por outros
ordenamentos os contratos de coabitaccedilatildeo que devem reger apenas aspetos patrimoniais
Contudo surgiram duacutevidas sobre a validade deste tipo de contratos no acircmbito do
direito francecircs Consideradas individualmente as claacuteusulas relativamente a aspetos
patrimoniais poderiam ser consideradas vaacutelidas todavia analisando a sua dinacircmica em
conjunto poderia tornar o contrato iliacutecito por dar forccedila obrigatoacuteria a uma espeacutecie de
casamento privado violando o monopoacutelio do Estado em mateacuteria de casamento136 A
permissatildeo de existecircncia destes contratos eacute excecional visto que a partir de 1999 os membros
da uniatildeo de facto puderam convencionar a sua relaccedilatildeo como entendiam atraveacutes do Pacto
Civil de Solidariedade
A prova do concubinage pode ser feita pelos membros ou por terceiros
Contrariamente ao que acontece no casamento em que os cocircnjuges podem facilmente provar
o seu estado civil atraveacutes da sua certidatildeo de casamento lavrada oficialmente pelo funcionaacuterio
do registo civil os conviventes natildeo dispotildeem de nenhuma prova preacute-constituiacuteda No entanto
por se tratar de um facto juriacutedico pode ser provado por qualquer meio de prova admissiacutevel
pelo direito nos termos gerais designadamente atraveacutes de certificados documentos
declaraccedilotildees de honra e ainda com o recurso agrave prova testemunhal137 A sua prova natildeo gera
em princiacutepio grande dificuldade para os membros dado que os organismos que exigem a
prova dessa convivecircncia impotildeem requisitos razoaacuteveis Caso diferente eacute a prova da
convivecircncia por terceiros que podem ver essa possibilidade limitada pelo direito agrave vida
privada do convivente por forccedila dos artigos 9 do Code Civil138 e 8ordm da CEDH139
O pacte civil de solidariteacute conhecido como PACS foi criado a 15 de novembro de
1999 pela lei nordm 99-944 contudo o atual conteuacutedo e estrutura do PACS natildeo eacute o que foi
inicialmente previsto pela referida lei devido agrave grande reforma que sofreu em 2006140 A
criaccedilatildeo deste instituto deveu-se essencialmente agrave necessidade dos casais do mesmo sexo
obterem reconhecimento puacuteblico da sua relaccedilatildeo visto que em 1999 soacute os casais
136 Cfr JEAN CARBONNIER ob cit p681 137 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 389 MARTA COSTA ob cit p 390 BRIGITTE HESS-
FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p 91 JEAN CARBONNIER ob cit
p775 138 Art 9 do Code Civil 1ordf parte Chacun a droit au respect de sa vie priveacutee 139 Cfr JACQUELINE RUBELLIN-DEVICHI ob cit p 387 MARTA COSTA ob cit p 390 140 Cfr ALBANA METAJ - STOJANOVA ldquoFrench Civil Partnership Contract (Pacs)rdquo South East European
University Vol 14 n ordm1 2019 p 136
44
heterossexuais poderiam optar pelo casamento ou pelo concubinage restando aos casais
homossexuais a uacuteltima alternativa141 Aleacutem disto o PACS veio igualmente satisfazer as
necessidades dos casais heterossexuais que pretendiam regular contratualmente a sua
relaccedilatildeo mas sem formalismo na sua constituiccedilatildeo permitindo-lhes organizar a sua vida
conjunta ndash podendo tratar-se por vezes de um ldquoensaiordquo para um futuro casamento ndash e em
caso de dissoluccedilatildeo evitar os procedimentos inerentes ao divoacutercio que podem ser longos e
dispendiosos142
Este instituto natildeo deve ser confundido nem com o casamento nem com o
concubinage143 O PACS tem bastante adesatildeo144 precisamente por se diferenciar do
casamento em alguns aspetos embora apresentem vaacuterias semelhanccedilas contratualmente o
primeiro natildeo se coaduna com a regulaccedilatildeo da vida familiar e dos filhos apenas a vida do
casal
141 Apenas a 17 de maio de 2013 com a lei 2013-404 foi garantida a possibilidade do casamento entre pessoas
do mesmo sexo 142 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HELENE HESS ob cit p78 143 Neste sentido sobre as diferenccedilas entre cada um destes trecircs regimes em concreto sobre a diferenccedila de
tratamento para atribuiccedilatildeo de pensatildeo de sobrevivecircncia vide Decisatildeo nordm 2011-155 QPC do Conseil
Constitutionnel de 29-07-2011 5 Consideacuterant en premier lieu que le concubinage est deacutefini par le seul
article 515-8 du code civil comme laquo une union de fait caracteacuteriseacutee par une vie commune preacutesentant un
caractegravere de stabiliteacute et de continuiteacute entre deux personnes de sexe diffeacuterent ou de mecircme sexe qui vivent en
couple raquo quagrave la diffeacuterence des eacutepoux les concubins ne sont leacutegalement tenus agrave aucune solidariteacute financiegravere
agrave leacutegard des tiers ni agrave aucune obligation reacuteciproque 6 Consideacuterant en deuxiegraveme lieu quen vertu de larticle
515-4 du code civil les partenaires lieacutes par un pacte civil de solidariteacute laquo sengagent agrave une vie commune ainsi
quagrave une aide mateacuterielle et une assistance reacuteciproques raquo que laquo si les partenaires nen disposent autrement
laide mateacuterielle est proportionnelle agrave leurs faculteacutes respectives raquo quen outre ils sont laquo tenus solidairement
agrave leacutegard des tiers des dettes contracteacutees par lun deux pour les besoins de la vie courante raquo quainsi
contrairement aux personnes vivant en concubinage les partenaires sont assujettis agrave des obligations
financiegraveres reacuteciproques et agrave leacutegard des tiers que toutefois les dispositions du code civil ne confegraverent aucune
compensation pour perte de revenus en cas de cessation du pacte civil de solidariteacute au profit de lun des
partenaires ni aucune vocation successorale au survivant en cas de deacutecegraves dun partenaire 7Consideacuterant en
troisiegraveme lieu que le reacutegime du mariage a pour objet non seulement dorganiser les obligations personnelles
mateacuterielles et patrimoniales des eacutepoux pendant la dureacutee de leur union mais eacutegalement dassurer la protection
de la famille que ce reacutegime assure aussi une protection en cas de dissolution du mariage 8 Consideacuterant
par suite que le leacutegislateur a dans lexercice de la compeacutetence que lui reconnaicirct larticle 34 de la Constitution
deacutefini trois reacutegimes de vie de couple qui soumettent les personnes agrave des droits et obligations diffeacuterents que la
diffeacuterence de traitement quant au beacuteneacutefice de la pension de reacuteversion entre les couples marieacutes et ceux qui
vivent en concubinage ou sont unis par un pacte civil de solidariteacute ne meacuteconnaicirct pas le principe deacutegaliteacute
Consultaacutevel em httpswwwconseil-constitutionnelfrdecision20112011155QPChtm 144 Para anaacutelise de alguns dados estatiacutesticos relativamente agrave evoluccedilatildeo do nuacutemero de PACS registados entre
2000 e 2007 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit
p78 Consultar httpswwwinseefrfrstatistiques2381498 para anaacutelise do nuacutemero de casamentos e PACS
em relaccedilotildees heterossexuais entre 1990 e 2019 sendo de realccedilar que em 2018 o nuacutemero de casamentos e de
PACS foi muito semelhante verificando-se uma diferenccedila de 28 mil casamentos em relaccedilatildeo aos PACS
Relativamente agraves relaccedilotildees homossexuais a diferenccedila eacute ainda menor sendo os dados quase equivalentes
45
Deve ainda obedecer a vaacuterias regras para a sua formaccedilatildeo Soacute pode ser celebrado
entre pessoas maiores de idade que natildeo sejam parentes em linha reta ou colateral ateacute ao
terceiro grau e que natildeo estejam casadas ou tenham celebrado PACS com outra pessoa145 A
sua celebraccedilatildeo deve cumprir as regras do direito comum contratual e natildeo deve ser contraacuterio
agrave ordem puacuteblica A forma sob a qual o acordo deve ser redigido eacute livre porque o artigo 515-
3 do Code Civil natildeo especifica a sua forma e os parceiros podem redigir eles proacuteprios ou
optar que a redaccedilatildeo seja feita por um notaacuterio Por conseguinte os parceiros satildeo livres de
escolher a forma do PACS podendo o acordo ser um ato autecircntico ou um ato privado
Terminada a redaccedilatildeo do acordo os parceiros devem fazer uma declaraccedilatildeo conjunta do
acordo devendo o notaacuterio do registo civil registar o pacto depois de verificar as condiccedilotildees
necessaacuterias para a conclusatildeo do acordo e mandar executar as formalidades de publicaccedilatildeo
previstas no artigo 515-3 Code Civil permitindo que seja oponiacutevel a terceiros Apoacutes a sua
vaacutelida formaccedilatildeo o PACS estaacute em condiccedilotildees de produzir efeitos na vida dos parceiros no
acircmbito pessoal146 e patrimonial regidos pelas disposiccedilotildees dos artigos 515-4 a 515-5-3 do
Code Civil147 Por uacuteltimo a dissoluccedilatildeo do PACS eacute muito mais simples do que a dissoluccedilatildeo
de casamento uma vez que existem apenas quatro situaccedilotildees cada uma das quais com um
procedimento para a dissoluccedilatildeo do mesmo tais como a rutura unilateral a rutura de comum
acordo por casamento dos membros ou de um deles e a morte de um dos membros Os
procedimentos que devem seguir cada uma destas circunstacircncias estatildeo previstos no artigo
515-7 do Code Civil
Sem embargo de todas as condiccedilotildees de forma que o PACS estaacute sujeito haacute algumas
incoerecircncias quanto ao seu regime de prova por terceiros148 Depois do registo do acordo eacute
entregue aos pactuantes um atestado de inscriccedilatildeo em que constam os seus nomes data e
lugar de nascimento e a data do registo do pacto natildeo sendo conservadas pelo notaacuterio as
convenccedilotildees que satildeo exibidas para serem assinadas e para ser verificadas as condiccedilotildees de
validade do acordo Porquanto se um terceiro quiser ter acesso ao conteuacutedo de um PACS
apenas poderaacute fazecirc-lo se pedir aos proacuteprios pactuantes salvaguardando assim o direito agrave
reserva da vida privada dos parceiros
145 Sob pena de nulidade art 515-2 Code Civil 146 Assentam essencialmente no compromisso de viverem em comunhatildeo de vida e de fornecerem ajuda e
assistecircncia muacutetua 147 Cfr BRIGITTE HESS-FALLONANNE-MARIE SIMON com colaboraccedilatildeo de HEacuteLEgraveNE HESS ob cit p 85 148 Cfr MARTA COSTA ob cit p 390
46
53 O Acoacuterdatildeo do STJ de 22 de Marccedilo de 2018 processo
nordm6380169T8CBRC1 S1
Decidimos analisar este Acoacuterdatildeo por entendermos que representa de forma clara os
problemas que a prova da coabitaccedilatildeo causa Demonstrando que natildeo eacute uma questatildeo unacircnime
na jurisprudecircncia pois eacute objeto de decisotildees diacutespares natildeo deixando de ser bem
fundamentadas Em causa estaacute uma accedilatildeo em processo comum que tem como Autor o
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees e como Reacute
quem alega ter mantido uma relaccedilatildeo de uniatildeo de facto com o beneficiaacuterio dessa pensatildeo ateacute
agrave data da morte deste Antes de mais urge atentar brevemente aos factos dados como
provados relevantes para a presente anaacutelise
A Reacute encetou um relacionamento amoroso com o falecido em 1991 passando a ter
relaccedilotildees sexuais e a fazer as refeiccedilotildees com o de cujos na casa onde este vivia Em 1996 a
Reacute passou a pernoitar na casa do de cujos de onde se ausentava nos fins de semana em que
a filha do beneficiaacuterio o visitava duas vezes por mecircs ou quando existia uma discussatildeo entre
o casal Manteve o arrendamento da sua casa para onde ia quando uma destas circunstacircncias
ocorriam suportando os encargos inerentes a esta manutenccedilatildeo Os sujeitos dividiam entre si
as despesas do supermercado e a Reacute acompanhava o beneficiaacuterio agraves consultas e agraves urgecircncias
do hospital sempre que necessaacuterio Na sequecircncia da morte do beneficiaacuterio a 14 de julho de
2015 a Reacute requereu a atribuiccedilatildeo das pensotildees devidas pela morte do mesmo invocando a sua
qualidade de unida de facto por ter vivido com o de cujos em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos
cocircnjuges desde 17 de Agosto de 1991 ateacute agrave sua morte Como prova da qualidade de unida
de facto apresentou atestado emitido pela Junta de Freguesia que certificava que esta residia
em comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com o beneficiaacuterio desde 1991 ateacute agrave data da sua morte
documentos exigidos pelo artigo 2ordm-A nordm 4 da LUF Contudo a filha do de cujos informou
o CNP de que a alegaccedilatildeo da Reacute natildeo era verdadeira pois esta sempre residiu em habitaccedilatildeo
distinta do beneficiaacuterio
Note-se que a demonstraccedilatildeo dos factos pressupostos para a relevacircncia juriacutedica da
uniatildeo de facto foi facilitada relativamente ao acesso agraves prestaccedilotildees do Estado no caso de
morte devido agrave possibilidade que eacute dada aos pretensos beneficiaacuterios de determinados
direitos (nomeadamente interessados que pretendam beneficiar dos efeitos previstos na lei
em face dos herdeiros do falecido artigo 2020ordm CCiv do senhorio artigo 1105ordm e 1106ordm
47
CCiv das entidades responsaacuteveis pelo pagamento das prestaccedilotildees por morte artigo 6ordm nordm 2
da LUF) No que respeita ao acesso agraves prestaccedilotildees sociais em caso de morte o artigo 6ordm nordm2
da LUF prevecirc a possibilidade da entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees
previstas nas aliacuteneas e) f) g) do artigo 3ordm caso entenda que existem fundadas duacutevidas sobre
a existecircncia da uniatildeo de facto poder solicitar meios de prova complementares149 e se na
sequecircncia dessas diligecircncias subsistirem duacutevidas a entidade deve promover a competente
accedilatildeo judicial com vista agrave sua comprovaccedilatildeo Foi o que sucedeu no caso em apreccedilo tendo a
entidade responsaacutevel pelo pagamento das prestaccedilotildees sociais por morte - tratando-se do
Instituto da Seguranccedila Social nomeadamente o Centro Nacional de Pensotildees no caso que
estamos a analisar- proposto a competente accedilatildeo judicial150
No seguimento da interposiccedilatildeo desta accedilatildeo pelo ISS a Reacute respondeu afirmando que
durante 24 anos viveu em comunhatildeo de mesa cama e casa com o de cujos e alegou que natildeo
se desfez da sua casa por uma questatildeo de precauccedilatildeo O Tribunal da 1ordf instacircncia julgou a accedilatildeo
parcialmente procedente e julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em situaccedilatildeo de uniatildeo de facto
entre a Reacute e o beneficiaacuterio A Reacute recorreu para o Tribunal da Relaccedilatildeo que a 2 de novembro
149 Designadamente declaraccedilatildeo emitida pela Autoridade Tributaacuteria e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos
e do Notariado I P onde se ateste que agrave data da morte os membros da uniatildeo de facto tinham domiciacutelio fiscal
comum haacute mais de dois anos ndash art 6ordm nordm 2 da LUF 150 No entender de RITA XAVIER ldquoA Uniatildeo de Facto e a Lei Civil no Ensino de Francisco Manuel Pereira
Coelho e Legislaccedilatildeo Atualrdquo ob cit p 685 deveraacute tratar-se de uma accedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo negativa
(prevista no art 10ordm nordm 3 al a) CPC) que visa declarar que determinada pessoa natildeo beneficia ou natildeo tem um
certo direito E embora o oacutenus de propositura da accedilatildeo recaia sobre a entidade responsaacutevel pelo pagamento das
prestaccedilotildees sociais compete ao membro sobrevivo da uniatildeo de facto a prova dos factos constitutivos do seu
direito Vide Art 343ordm n ordm1 CCiv 1 Nas accedilotildees de simples apreciaccedilatildeo ou declaraccedilatildeo negativa compete ao
reacuteu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga E ainda a este propoacutesito vide Acoacuterdatildeo Tribunal
da Relaccedilatildeo de Coimbra de 16102012 proferido no acircmbito do processo nordm 50091TBALDC1 A accedilatildeo
declarativa de simples apreciaccedilatildeo negativa - ou seja uma accedilatildeo pela qual se procura ldquohellip obter unicamente a
declaraccedilatildeo da hellip inexistecircncia de um direito ou de um factordquo (artigo 4ordm nordm 2 al a) do CPC) - destina-se desde
logo a definir uma situaccedilatildeo juriacutedica tornada incerta - o demandante pretende reagir contra uma situaccedilatildeo de
incerteza que o impede de auferir todas as vantagens normalmente proporcionadas pela relaccedilatildeo juriacutedica
material que lhe causa um dano patrimonial ou moral apreciaacutevel (hellip) A causa de pedir nas accedilotildees de simples
apreciaccedilatildeo negativa consubstancia-se na inexistecircncia do direito e nos factos materiais pretensamente
cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza Em sentido inverso mais recentemente
vide o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24-04-2019 proferido no acircmbito do processo
12025160T8LRSL1-2 (hellip) trata-se de uma acccedilatildeo proposta pelo ISS a pedir que o requerente comprove no
processo a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica que se arroga O ISS natildeo nega que a uniatildeo de facto tenha existido
diz que tem duacutevidas sobre a sua existecircncia e por isso pede que o requerente seja chamado a comprovar a
existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica em causa Assim trata-se de uma acccedilatildeo de simples apreciaccedilatildeo positiva sui
generis em que a lei atribui ao reacuteu que se arrogou o direito em causa o oacutenus da prova dos factos constitutivos
dele embora natildeo negado pelo Autor O ISS natildeo deve no desenho da lei intentar a acccedilatildeo declarativa para se
declarar a inexistecircncia de uma situaccedilatildeo juriacutedica (o que o ISS natildeo alega nem nega pois que apenas tem
duacutevidas) mas sim para que o reacuteu comprove a existecircncia da situaccedilatildeo juriacutedica a que se arroga Se o reacuteu
conseguir provar os factos necessaacuterios a situaccedilatildeo juriacutedica eacute declarada existente caso contraacuterio natildeo o eacute
48
de 2017 revogou a sentenccedila recorrida e declarou improcedente a accedilatildeo do CNP reconhecendo
a convivecircncia de 24 anos como uma situaccedilatildeo uniatildeo de facto
Por sua vez o ISS interpocircs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiccedila
Nas suas alegaccedilotildees demonstrou a discordacircncia com a decisatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo por
entender que a tese do Tribunal de1ordf Instacircncia que defendia que o relacionamento da Reacute e
do de cujos natildeo revestia as caracteriacutesticas que o tornavam anaacutelogo ao dos cocircnjuges seria a
correta Defendem que apesar da Reacute e o de cujos terem mantido relaccedilotildees sexuais e esta
pernoitasse quase sempre na casa do mesmo ela mantinha a sua casa onde dormia
pontualmente e onde guardava os seus pertences o que indicava que natildeo sentia a morada
comum como sua Ademais embora fizessem refeiccedilotildees em comum natildeo havia comunhatildeo
patrimonial jaacute que as compras eram custeadas de forma alternada por um ou por outro e era
feita uma separaccedilatildeo bem definida das despesas inerentes a cada uma das casas
Na 2ordf Instacircncia o Tribunal da Relaccedilatildeo entendeu que natildeo era imprescindiacutevel que a
relaccedilatildeo de uniatildeo de facto natildeo fosse interrompida pela saiacuteda de um dos membros da morada
em comum quando ocorram desentendimentos ou discussotildees dado que esta circunstacircncia
tambeacutem se verifica no casamento podendo levar agrave interrupccedilatildeo esporaacutedica da comunhatildeo que
eacute proacutepria desse instituto e natildeo eacute por isso que se pode dizer que a comunhatildeo de habitaccedilatildeo fica
descaracterizada151 Na sua tese o tribunal referido defende tambeacutem que o facto de a Reacute ter
mantido a sua casa por querer manter a propriedade daquele imoacutevel por motivos que soacute a ela
dizem respeito - o que leva a que seja da sua responsabilidade suportar os encargos que dela
advenham - natildeo seria suficiente para colocar em causa a residecircncia em comum com o
falecido Para enfatizar a tese de que a morada comum dos sujeitos seria o imoacutevel em que
os dois viviam o tribunal realccedila o facto do Autor ter citado a Reacute nessa morada para a accedilatildeo
em causa O tribunal considera que a comunhatildeo de mesa leito e habitaccedilatildeo eacute o que define a
151 Veja-se a tiacutetulo de exemplo mutatis mutandis o Acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo de Lisboa de 24042019
no acircmbito do processo 12025160T8LRSL1-2 que jaacute se teve a oportunidade de mencionar Para que se possa
dizer que cessou a uniatildeo de facto natildeo basta constatar a existecircncia de uma separaccedilatildeo de facto Tem que se
provar tambeacutem que existe da parte de pelo menos um dos unidos de facto o propoacutesito de natildeo a restabelecer
E por isso embora o facto de os unidos de facto deixarem de dormir na mesma casa comerem agrave mesma mesa
e viver debaixo do mesmo tecto aponte para a falta de comunhatildeo de vida tal natildeo basta para se poder concluir
pela cessaccedilatildeo da uniatildeo de facto devendo fazer-se ainda a prova do elemento subjectivo da vontade de pelo
menos um deles romper com a uniatildeo de facto (de forma directa ou atraveacutes de um conjunto suficientemente
significativo de circunstacircncias objectivas que apontem nesse sentido isto eacute que o permitam afirmar com base
numa presunccedilatildeo natural ou judicial) Indo ainda mais longe na decisatildeo ao referir que se considera que a
sentenccedila teve razatildeo em considerar irrelevante o periacuteodo de separaccedilatildeo de 3 meses entre a reacute e o beneficiaacuterio
(hellip)
49
convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges exigida pelo artigo 1ordm nordm 2 da LUF E que encontrando-
se demonstrado que a Reacute encetou desde 1991 ateacute ao falecimento do beneficiaacuterio um
relacionamento onde mantinham relaccedilotildees sexuais faziam refeiccedilotildees conjuntas com amigos e
familiares na morada comum pagavam alternadamente as despesas com alimentaccedilatildeo e
ainda havia o acompanhamento do falecido pela Reacute a consultas meacutedicas e atendimento nas
urgecircncias mostram-se suficientemente comprovados os requisitos da declaraccedilatildeo de uniatildeo
de facto que se tem por estabelecida durante o todo esse lapso temporal
Estamos aqui perante duas decisotildees distintas e cada uma delas fundamenta a sua
decisatildeo com argumentos vaacutelidos e plausiacuteveis o que reflete uma vez mais a dificuldade
imanente a esta questatildeo Estaacute em causa uma relaccedilatildeo de convivecircncia e auxiacutelio de 24 anos que
devido aos requisitos que se exige que sejam comprovados ou por questotildees que natildeo se
colocariam se do instituto do casamento se tratasse se vecirc posta em causa a atribuiccedilatildeo de uma
pensatildeo de sobrevivecircncia por natildeo se conseguir provar a qualidade de unida de facto pela Reacute
A situaccedilatildeo sub judice eacute cada vez mais frequente nos tempos que correm Vaacuterios sujeitos que
pelo facto de serem divorciados ou viuacutevos refazem a sua vida ao lado de outra pessoa sem
assumir o compromisso do casamento Por natildeo quererem ou por natildeo lhes convir como eacute o
exemplo dos viuacutevos que recebam pensatildeo de sobrevivecircncia e se voltarem a casar perdem o
direito a esse benefiacutecio Ou ateacute por questotildees de praticidade por natildeo quererem estar sujeitos
a um regime que impotildee diversas consequecircncias como eacute o instituto do casamento Eacute neste
tipo de situaccedilotildees que se deve pensar quando se pretende equiparar a uniatildeo de facto ao
instituto do casamento Haacute efetivamente quem natildeo queira ser abrangido por uma
regulamentaccedilatildeo tatildeo ampla e o que para uns podem ser consideradas desvantagens no que
respeita ao regime mais liberal da uniatildeo de facto para outros podem ser as vantagens que
pesam na escolha deste regime como modo de vida em conjunto
Resta finalmente aludir agrave efetiva decisatildeo do STJ Tendo por base o Acoacuterdatildeo do
STJ de 9-07-2014152 que refere que se deve pensar na vivecircncia de dois cocircnjuges em situaccedilatildeo
de normalidade ou vulgaridade inseridos na cultura a que pertencemos e eacute aiacute que se haacute-de
encontrar o preenchimento do conceito de laquocondiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjugesraquo decide
que o quadro factual que estaacute em causa na situaccedilatildeo em anaacutelise natildeo eacute suficiente para dar como
152 Processo nordm 3076111TBLLEE1 S1 Consultaacutevel em
httpwwwdgsiptjstjnsf954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa8140b2f2587cb42fbd180257d16005402d4Op
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50
provada a existecircncia entre a Reacute e o de cujos de uma convivecircncia em economia comum
Considerando que essa convivecircncia se caracteriza pela situaccedilatildeo de pessoas que vivam em
comunhatildeo de mesa e habitaccedilatildeo com base num lar em sentido familiar moral e social e com
base numa economia domeacutestica em comum e pelo facto de a Reacute pernoitar na casa do falecido
mas manter sempre a sua casa onde conservou os seus pertences e objetos demonstrava que
esta natildeo sentia a casa do beneficiaacuterio como sua E ainda que a Reacute natildeo provou como lhe
competia por forccedila do artigo 342ordm nordm 1 do CCiv que faziam toda a vida de casal na casa do
de cujos e que manteve a sua casa arrendada para acautelar a possibilidade da filha do
beneficiaacuterio quisesse voltar a viver na casa do mesmo Aleacutem disso a Reacute natildeo conseguiu
provar que o beneficiaacuterio pernoitava na sua casa e que a esta tambeacutem servia para os amigos
ficarem a dormir O STJ conclui que natildeo obstante partilhassem refeiccedilotildees na casa do de
cujos natildeo se via que existisse uma economia domeacutestica em comum Caracteriacutestica que estaacute
intrinsecamente ligada ao modo de vida dos cocircnjuges existindo nesta situaccedilatildeo economias
separadas por serem custeadas alternadamente as despesas de supermercado e por cada um
se responsabilizar pelos gastos de cada casa Desta feita concluiu que natildeo se verificava a
vivecircncia em economia comum necessaacuteria para que se considerasse a situaccedilatildeo como uma
uniatildeo de facto como invocou a Reacute revogando o acoacuterdatildeo do Tribunal da Relaccedilatildeo e mantendo
a sentenccedila proferida pelo Tribunal de 1ordf Instacircncia que julgou natildeo reconhecida a vivecircncia em
situaccedilatildeo de uniatildeo de facto entre a Reacute e o beneficiaacuterio falecido agrave data da sua morte
Para terminar importa dizer que tendemos a concordar com a decisatildeo do Tribunal
da Relaccedilatildeo Note-se que estatildeo em causa 24 anos de convivecircncia em comum e auxiacutelio muacutetuo
que implicava a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais de refeiccedilotildees conjuntas de suporte a niacutevel
de acompanhamento meacutedico e natildeo menos importante a companhia inerente agrave convivecircncia
que em idades mais avanccediladas pode ser um fator relevante para manterem entre si um
relacionamento Natildeo se devendo esquecer conforme mencionam os factos comprovados
que a filha do de cujos em 1996 foi trabalhar e viver para outra cidade ficando longe do pai
e visitando-o apenas duas vezes por mecircs ao fim-de-semana Tal significava que o auxiacutelio
que o de cujos necessitava nomeadamente nos acompanhamentos a consultas meacutedicas e
mesmo agraves urgecircncias se assim fosse necessaacuterio era dado pela Reacute Gerando menos
preocupaccedilotildees e encargos agrave filha do beneficiaacuterio falecido conseguindo manter a sua
normalidade e rotina se uma destas circunstacircncias ocorressem pois sabia que o seu pai estava
51
a ser apoiado pela Reacute que despendia do seu tempo para lhe fornecer cuidados e auxiacutelio
sempre que necessaacuterio
Ora eacute necessaacuterio refletir que a convivecircncia e coabitaccedilatildeo de duas pessoas em
situaccedilotildees destas pode ir para aleacutem da vivecircncia em economia comum Pode verificar-se no
caso em apreccedilo o cumprimento dos deveres de coabitaccedilatildeo cooperaccedilatildeo e assistecircncia inerentes
aos deveres conjugais previstos no artigo 1672ordm CCiv Poreacutem apesar de natildeo se verificar
uma verdadeira vivecircncia em economia comum que o STJ considera como caracteriacutestica do
modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges por haver uma separaccedilatildeo bem definida das despesas
alimentares bem como dos encargos resultantes das casas de cada um verificam-se outras
caracteriacutesticas presentes no modo de vida proacuteprio dos cocircnjuges que tambeacutem relevam e natildeo
devem ser desconsideradas Devemos ter em conta que pode ter sido opccedilatildeo dos sujeitos viver
com economias separadas o que natildeo invalida que a sua situaccedilatildeo seja qualificada como uniatildeo
de facto em virtude de natildeo haver nenhuma norma na LUF que imponha qualquer tipo de
obrigaccedilatildeo aos unidos no que respeita a fazerem economias conjuntas
No que concerne agrave manutenccedilatildeo por parte da Reacute de outra casa e de laacute pernoitar
pontualmente cremos que natildeo eacute suficiente para pocircr em causa a verificaccedilatildeo da qualificaccedilatildeo
da relaccedilatildeo como uniatildeo de facto A ocorrecircncia da interrupccedilatildeo momentacircnea da coabitaccedilatildeo natildeo
eacute razatildeo para que natildeo se possa considerar a relaccedilatildeo convivencial entre duas pessoas como tal
Entre os cocircnjuges tambeacutem podem ocorrer situaccedilotildees que interrompam a sua coabitaccedilatildeo e
indo mais longe devemos recordar as situaccedilotildees em que cocircnjuges por motivos profissionais
veem a sua convivecircncia interrompida eg durante a semana e soacute estatildeo juntos ao fim-de-
semana devido agrave deslocaccedilatildeo de um deles para outra cidade153 Natildeo sendo mesmo assim
posta a sua convivecircncia em causa por forccedila do artigo 1673ordm CCiv que prevecirc esta
possibilidade Acontecendo o mesmo com membros da uniatildeo de facto deveraacute colocar-se a
sua convivecircncia em crise Seraacute a uniatildeo de facto uma simples comunhatildeo de casa Ou por
outro lado uma comunhatildeo de vida Com tudo o que isso implique para os sujeitos que
formam a relaccedilatildeo que se devem reger por criteacuterios subjetivos nessa mateacuteria
De forma a enfatizar o facto de existirem cada vez mais formas de organizaccedilatildeo
familiar e de se notar uma modernizaccedilatildeo constante nesta mateacuteria vale a pena referirmos que
existe tambeacutem uma forma de organizaccedilatildeo da vida em comum a par da uniatildeo de facto e a
153 Cfr neste sentido MARIA MARGARIDA PEREIRA ob cit p 650
52
uniatildeo conjugal que se designa de uniatildeo sem comunhatildeo154 Esta uniatildeo acontece quando as
partes decidem residir em locais distintos sem abdicarem de outros elementos que formam
um casal como a manutenccedilatildeo de relaccedilotildees sexuais a fidelidade e a entreajuda Pretendem
levar uma vida a dois no entanto natildeo querem residir no mesmo local Eacute uma forma de
organizaccedilatildeo da vida em comum que natildeo eacute mencionada pelo legislador que natildeo conjeturou
um caminho que estivesse entre o tudo e o nada155 uma vez que regula o casamento a uniatildeo
de facto o divoacutercio e a separaccedilatildeo O facto de natildeo haver comunhatildeo de habitaccedilatildeo neste tipo
de relaccedilotildees natildeo permite que se fale na hipoacutetese de ser considerada uniatildeo de facto Todavia
o que estaacute aqui em causa natildeo eacute a interrupccedilatildeo esporaacutedica ou pontual da coabitaccedilatildeo como
acontece no caso que temos vindo a analisar Mas antes a existecircncia de duas residecircncias
distintas natildeo havendo uma coabitaccedilatildeo entre o casal por escolha dos proacuteprios preferindo
uma organizaccedilatildeo da sua vida em comum de forma separada no que respeita agrave coabitaccedilatildeo
mantendo todos os outros elementos que relevam para a sua consideraccedilatildeo como um casal
Tudo isto para dizer que estamos perante uma eacutepoca onde o pluralismo jusfamiliar eacute uma
realidade e que talvez seja necessaacuteria uma atualizaccedilatildeo legislativa que acompanhe os tempos
que vivemos no tocante a estas mateacuterias156157
54 Soluccedilatildeo proposta
Aqui chegados e depois de analisar as soluccedilotildees que vigoram noutros ordenamentos
juriacutedicos eacute importante aventar a soluccedilatildeo que cremos que melhor resolveraacute os problemas que
o atual regime juriacutedico da uniatildeo facto levanta
Jaacute haviacuteamos proposto supra a densificaccedilatildeo do atual regime legal da uniatildeo de facto
com objetivo de assegurar uma maior proteccedilatildeo dos membros natildeo obstante o respeito da
vontade das partes de se submeter ou natildeo a tais consequecircncias juriacutedicas visto que natildeo se
trataria portanto de um regime imperativo automaticamente aplicaacutevel a quem opte por
conviver em condiccedilotildees anaacutelogas agraves dos cocircnjuges
154 LAT (Living Apart Together) Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 155 Cfr JORGE DUARTE PINHEIRO ob cit p 558 156 Idem 157 JORGE DUARTE PINHEIRO termina o ponto dedicado a esta mateacuteria questionando o que impede a receccedilatildeo
legal no nosso ordenamento de uma uniatildeo sem comunhatildeo de habitaccedilatildeo que beneficie de um estatuto proacuteprio
e que pudesse incluir a possibilidade da figura ser constituiacuteda por cocircnjuges suspendendo de forma consensual
o dever de coabitaccedilatildeo que agrave luz dos arts 1618ordm 1672ordm 1699ordm n ordm1 al b) CCiv eacute proibido atualmente
53
Cabe agora desenvolver esta proposta Apesar de haver quem encare a uniatildeo de
facto com uma visatildeo mais liberal e consequentemente entenda que esta natildeo deve gerar
muitos efeitos juriacutedicos por forma a respeitar-se a liberdade de escolha de cada um
acreditamos que o Direito natildeo deve ignorar as situaccedilotildees que merecem tutela juriacutedica E
apesar de haver uma regulamentaccedilatildeo juriacutedica da uniatildeo de facto no nosso ordenamento a
proteccedilatildeo por ela oferecida eacute meramente assistencial158 funcionando essencialmente em
situaccedilotildees de crise159
Natildeo se deve olvidar que a uniatildeo de facto na nossa ordem juriacutedica eacute um verdadeiro
ato juriacutedico e os seus efeitos natildeo dependem da vontade dos membros pois produzem-se ex
logo160 A soluccedilatildeo vigente concede certos efeitos aos membros da uniatildeo de facto apoacutes a
convivecircncia por dois anos sem que estes declarem expressamente a sua pretensatildeo A sua
uacutenica declaraccedilatildeo eacute a vontade de viver em plena comunhatildeo de vida Deveraacute daiacute aferir-se a
vontade de assumir efeitos juriacutedicos Acreditamos que a soluccedilatildeo atual apesar de ter como
objetivo o respeito pela autonomia privada e a vontade das partes natildeo o faz Estabelece
efeitos juriacutedicos a situaccedilotildees de facto que natildeo tem como controlar por natildeo haver nenhum tipo
de registo
Enquanto esta for a natureza da uniatildeo de facto e natildeo houver um ato constitutivo por
parte de uma autoridade puacuteblica ou outra formalidade a situaccedilatildeo de facto natildeo pode suscitar
um regime juriacutedico muito denso mas somente algumas medidas de proteccedilatildeo Dificilmente
se poderaacute ir mais longe no que concerne agrave atribuiccedilatildeo de efeitos juriacutedicos sem uma autecircntica
formalizaccedilatildeo das vontades das partes de intencionar um regime mais firme
Deste modo concomitantemente com a consolidaccedilatildeo do seu regime proacuteprio
julgamos ainda ser importante sujeitar estas relaccedilotildees a registo161
158 () o direito portuguecircs continua a ser daqueles que atribui menos efeitos juriacutedicos agrave uniatildeo de facto Apenas
se consagram soluccedilotildees do tipo ldquoassistencialrdquo que um Estado moderno tem de adotar qualquer que seja a
opccedilatildeo de vida escolhida pelos cidadatildeos Cfr GUILHERME DE OLIVEIRA ob cit p 153 159 () continua a acolher-se neste domiacutenio uma proteccedilatildeo fragmentaacuteria e especialmente dirigida a cenaacuterios
de crise em que as debilidades dos seus membros se concretizam ou manifestam com mais intensidade Cfr
RUTE TEIXEIRA PEDRO ob cit p 310 160 Cfr MARTA COSTA ob cit p 151 161 Cfr JOAtildeO PARRACHO COELHO considera que sendo a uniatildeo de facto um ato livre a opccedilatildeo pelo registo
determinaria que aqueles que unidos numa relaccedilatildeo para-matrimonial desejem beneficiar de direitos e deveres
juriacutedico - sociais paralelos aos atribuiacutedos agrave famiacutelia claacutessicaformallegal podem alcanccedilar um estatuto especiacutefico
mediante a inscriccedilatildeo da sua uniatildeo de facto em algum registo puacuteblico a criar para o efeito ldquoA Famiacutelia
perspectiva evolutiva do conceito tradicionalrdquo in Revista do Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico
nordm 54 3ordm trimestre1993 p 116
54
Inspiramos esta soluccedilatildeo no ordenamento juriacutedico francecircs por julgarmos oferecer
uma regulaccedilatildeo juriacutedica ampla dos tipos de convivecircncia fora do casamento distinguindo o
concubinage do pacte civil de solidariteacute Podendo optar-se pelo concubinato natildeo se
submetendo a quaisquer consequecircncias juriacutedicas ou pelo PACS a que subjaz um regime
proacuteprio e efeitos juriacutedicos que garantem a sua proteccedilatildeo Desta forma e socorrendo-nos em
parte da sugestatildeo ora mencionada do partido Bloco de Esquerda aquando da apresentaccedilatildeo
do Projeto de Lei nordm45VIII prevendo um registo das uniotildees nas juntas de freguesia da aacuterea
de residecircncia das pessoas que vivem em uniatildeo de facto ou a sua constituiccedilatildeo apoacutes dois anos
de convivecircncia sem necessidade de registo acreditamos que o Registo Civil das uniotildees de
facto seraacute a soluccedilatildeo mais acertada para proporcionar a certeza e seguranccedila juriacutedicas que se
pretende alcanccedilar com a inscriccedilatildeo no mesmo162
Antecipando desde jaacute as criacuteticas que poderatildeo surgir a esta soluccedilatildeo tais como a
possibilidade de recurso ao casamento para precaver todas as situaccedilotildees supramencionadas e
ainda o excessivo formalismo que daqui poderaacute advir natildeo devendo o direito proteger uma
situaccedilatildeo que as partes natildeo quiseram que fosse protegida desrespeitando-se a sua vontade
cumpre tecer algumas consideraccedilotildees Primeiramente o casamento trata de uma realidade
como jaacute tivemos a oportunidade de analisar com natureza muito distinta da uniatildeo de facto
Os casais tecircm o direito de escolher o tratamento juriacutedico que datildeo agrave sua convivecircncia pessoal
podendo simplesmente querer viver em uniatildeo de facto e natildeo se submeterem ao regime do
casamento Denote-se para este efeito que viver agrave margem do casamento natildeo significa
querer viver agrave margem do Direito Nesta senda e em segundo lugar parece-nos que a ideia
Napoleoacutenica de que se os concubinos natildeo se interessam pela lei a lei tambeacutem natildeo se
interessa por eles jaacute estaacute ultrapassada A formalidade do registo apenas garantiraacute a liberdade
de escolha das partes assegurando que aqueles que optam por ele satildeo os que pretendem
submeter-se aos efeitos juriacutedicos previstos legalmente Natildeo se tratando de um regime
automaacutetico aplicaacutevel pelo simples decurso do tempo que os sujeita a um regime que natildeo
162 Concordamos portanto com a posiccedilatildeo propugnada por ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto a
pertinecircncia de registo a problemaacutetica da separaccedilatildeo de pessoas e bens e a contagem do prazo de convivecircnciardquo
in Casamento e Uniatildeo de facto questotildees de jurisdiccedilatildeo civil Coleccedilatildeo Formaccedilatildeo Contiacutenua CEJ Novembro
2020 p71 segundo a qual as uniotildees devem ser dignas de Registo Civil pois os registos municipais natildeo
serviratildeo o propoacutesito por natildeo contribuiacuterem para a certeza e seguranccedila juriacutedicas uma vez que natildeo existe uma
base de dados nacional podendo-se potenciar muacuteltiplos registos
55
mostraram pretender163 A soluccedilatildeo que propomos funda-se no respeito pela vontade das
partes e no princiacutepio da liberdade contratual aleacutem de ser a mais compatiacutevel com a certeza e
seguranccedila juriacutedicas Bastando-lhes a verificaccedilatildeo dos requisitos necessaacuterios agrave constituiccedilatildeo no
momento da sua inscriccedilatildeo no registo Relativamente agrave exigecircncia do decurso de um
determinado periacuteodo para que a convivecircncia seja registada defendemos que a resposta deve
passar por natildeo ser exigida uma convivecircncia preacutevia Permitindo que duas pessoas que
queiram conviver nestes moldes se dirigiram a uma entidade competente e registem a sua
convivecircncia que pode jaacute existir ou iniciar-se nesse momento164
No fundo com a soluccedilatildeo que propugnamos pretendemos a coexistecircncia de trecircs vias
de conjugalidade O casamento que continuaria a ser regulado de igual forma as uniotildees
registadas em que as partes inscrevem a sua relaccedilatildeo no registo para que desta decorram
efeitos juriacutedicos mas que natildeo se confundem com os do casamento e por uacuteltimo as uniotildees
meramente de facto desprovidas de efeitos juriacutedicos Contudo em relaccedilatildeo a estas
acreditamos que algumas situaccedilotildees devem ser protegidas como a de um dos membros querer
viver livre de efeitos juriacutedicos e o outro apenas tolerar a situaccedilatildeo apesar da sua vontade natildeo
ser exatamente essa Eacute entatildeo necessaacuterio acautelar situaccedilotildees como esta em que no caso de
morte de algum deles o membro sobrevivo fosse aquele que pretendia uma maior
intervenccedilatildeo juriacutedica na sua convivecircncia Aqui deveraacute atribuir-se a este uacuteltimo uma proteccedilatildeo
miacutenima desde que a requeira Salvaguardando desta forma a liberdade e autonomia privada
de cada um sem que nada se lhes imponha a natildeo ser que o solicitem Isto quer dizer que soacute
seratildeo uniotildees meramente de facto aquelas em que a falta de reconhecimento de efeitos
juriacutedicos decorre de uma exteriorizaccedilatildeo das partes Por outras palavras essa categorizaccedilatildeo
resulta de uma falta de manifestaccedilatildeo das partes nesse sentido evitando as situaccedilotildees em que
a sua ineacutercia ndash justificada por natildeo pretenderem a ingerecircncia do Direito ndash resulte no confronto
com um regime legal que natildeo manifestaram querer
163 Neste sentido cabe referir a jaacute mencionada Ley 22003 7 de mayo reguladora de las parejas de hecho do
Paiacutes Vasco que na sua exposiccedilatildeo de motivos adverte para o facto do registo ser uma forma de evitar que os
membros que natildeo desejam que as suas uniotildees sejam acolhidas legalmente sejam reguladas contra a sua vontade
() el Registro de Parejas de Hecho que crea la propia ley registro que tiene una especial importancia al
tener la inscripcioacuten el caraacutecter de constitutiva lo que se hace precisamente para evitar que aquellas parejas
que no deseen en modo alguno acogerse a la ley se vean sometidas contra su voluntad a un reacutegimen de
derechos y obligaciones como el aquiacute recogido 164 Cfr MARTA COSTA ob cit p 396 No mesmo sentido ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus
Casamento ndash Questotildees pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 178
56
Realccedilamos ainda que o registo das uniotildees de facto aleacutem de salvaguardar a certeza
e seguranccedila juriacutedicas permitiria agraves partes invocar a qualquer altura atraveacutes de um meio
idoacuteneo e fidedigno a sua convivecircncia facilitando a prova destas relaccedilotildees e dirimindo as
dificuldades que dessa prova advecircm165 Cremos ser esta a principal e grande vantagem da
soluccedilatildeo que propomos e a que realmente interessa no presente estudo O atual regime de
prova eacute falho pois as declaraccedilotildees referidas no nordm 2 do artigo 2ordmA da LUF emitidas pela
junta de freguesia nunca seratildeo suficientes para garantir a proteccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de facto
por natildeo servirem como prova plena aleacutem de natildeo ser possiacutevel atestar a inexistecircncia de
impedimentos por esta via
Em suma como benefiacutecios advindos do registo consideramos natildeo soacute o que toca agrave
sociedade em geral a quem seria transmitida maior certeza e seguranccedila relativamente agrave
existecircncia daquelas relaccedilotildees mas tambeacutem a publicidade que eacute conferida agraves mesmas
desonerando os conviventes de um regime de prova tatildeo sinuosa da sua relaccedilatildeo para
beneficiarem de certos direitos
165 Atraveacutes do registo os membros da uniatildeo registada estariam cientes da repercussatildeo legal da sua uniatildeo
(entre eles e face a terceiros) ROSSANA MARTINGO CRUZ ldquoUniatildeo de facto versus Casamento ndash Questotildees
pessoais e patrimoniaisrdquo ob cit p 180
57
6 Conclusatildeo
A convivecircncia anaacuteloga agrave dos cocircnjuges sem o viacutenculo formal inerente ao casamento
natildeo eacute uma realidade recente A forma como o Direito encara esta figura eacute que foi mudando
ao longo do tempo de acordo com a evoluccedilatildeo das circunstacircncias sociais e histoacutericas Parece-
nos que hoje talvez se imponha uma atualizaccedilatildeo do tratamento legal oferecido agrave uniatildeo de
facto
Desde logo a sua natureza juriacutedica motiva algumas divergecircncias Como vimos
alguns AA entendem que a situaccedilatildeo de facto se deve considerar uma relaccedilatildeo juriacutedica familiar
como as previstas no artigo 1576ordm CCiv por forccedila da sua inclusatildeo no artigo 36ordm n ordm1 CRP
referente agrave constituiccedilatildeo de famiacutelia Por outro lado os AA que defendem que a proteccedilatildeo
constitucional da uniatildeo de facto adveacutem do direito ao desenvolvimento da personalidade
previsto no artigo 26ordm CRP advogam tambeacutem que a convivecircncia more uxorio natildeo deve ser
qualificada como relaccedilatildeo juriacutedica familiar mas sim uma relaccedilatildeo juriacutedica parafamiliar Neste
contexto tendemos a acompanhar a linha de pensamento dos primeiros AA isto por
entendermos que as relaccedilotildees de uniatildeo de facto merecem uma proteccedilatildeo mais abrangente da
que eacute dada pelo artigo 26ordm CRP visto tratar-se de uma proteccedilatildeo geneacuterica que natildeo se coaduna
com a importacircncia social que a uniatildeo de facto vem tendo Jaacute a proteccedilatildeo conferida pelo artigo
36ordm nordm 1 CRP eacute de facto mais consentacircnea com a proteccedilatildeo que este tipo de relaccedilotildees merece
e cremos que essa teraacute sido a intenccedilatildeo do proacuteprio legislador constitucional Eacute de realccedilar por
uacuteltimo que considerar a uniatildeo de facto protegida constitucionalmente pelo artigo 36ordm nordm 1
CRP natildeo quer dizer que o seu regime legal deva ser igual ao regime do casamento
Como tambeacutem jaacute referimos o proacuteprio regime legal da uniatildeo de facto previsto na
Lei nordm 72001 de 1105 alterada pela lei 232010 de 3008 eacute considerado parco e omisso
em relaccedilatildeo a algumas questotildees relevantes para a proteccedilatildeo dos membros dessa relaccedilatildeo Natildeo
obstante a natildeo equiparaccedilatildeo dos regimes legais do casamento e da uniatildeo de facto tal natildeo
significa que natildeo seja necessaacuterio um reforccedilo do atual regime legal da uniatildeo de facto
Devendo optar-se por um caminho que consolide os efeitos juriacutedicos da uniatildeo de facto
possibilitando um regime proacuteprio enrobustecido aos que apesar de natildeo escolherem a via do
casamento pretendam uma proteccedilatildeo mais firme e por outro lado dar aos que pretendam uma
uniatildeo sem consequecircncias juriacutedicas a liberdade de escolha de sujeiccedilatildeo ou natildeo a um regime
legal
58
Paralelamente de forma a diferenciar estas duas situaccedilotildees julgamos ainda ser
importante a sujeiccedilatildeo destas relaccedilotildees a um eventual registo civil que traraacute consigo a certeza
e seguranccedila juriacutedicas relativamente agrave existecircncia destas relaccedilotildees perante a sociedade e ainda
a consequente publicidade advinda dessa inscriccedilatildeo que desoneraraacute os membros de um
regime de prova tatildeo sinuoso Salvaguardando desta forma aqueles que pretendem uma
coabitaccedilatildeo com a miacutenima ingerecircncia juriacutedica Em suma ambicionamos a coexistecircncia de
trecircs vias de conjugalidade sendo elas o casamento as uniotildees registadas e por fim as uniotildees
meramente de facto
Damos como certo que esta eacute uma mudanccedila que natildeo deveraacute ser imediata Aquilo que
propomos eacute na verdade uma soluccedilatildeo que deveraacute isso sim dar azo a uma discussatildeo contiacutenua
que possa contribuir para um aperfeiccediloamento e atualizaccedilatildeo deste regime
59
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