UMA INTERPRETAÇÃO DA COBERTURA JORNALÍSTICA SOBRE O ACIDENTE COM O CÉSIO137 EM GOIÂNIA
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ROUBADOS EM SEUS SONHOS
UMA INTERPRETAÇAO DA COBERTURA JORNALISTICA
SOBRE O ACIDENTE COM O CESIO-137 EM GOIANIA
POR ANA HOJTOWICZ
TRABALHO APRESENTADO PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE WESTRE,
NA FACULDADE DE COMUNICAÇAO DA UNIVERSIDADE DE BRASILIA.
BRASILIA, SETEMBRO DE 1990
Agradecimentos
Introdução
O que k o cksio-137
O fato
Procedimentos
MOMENTO I - IMAGENS 1.1 - Relatório da CNEN
1.2 - Monitoramento Ambienta1
I .3 - Os Empregados da CNEN
1.4 - FundaçXo Leide das Neves Ferreira
I .5 - Opiniaes
1.6 - Programas Nucleares Brasileiros
MOMENTO I1 - CONTAMINAÇAO 11.1 - Primeiro Contato
11.2 - Segundo Contato
11.3 - Simbolismo da Sorte
MOMENTO I11 - ESPELHOS 111.1 - Reflexos em Carey
111.2 - Reflexos em Feld
MOMENTO IV - ROUBADOS EM SEUS SONHOS Devair Alves Ferreira
Luisa Odete dos Santos
A Carta de Teresinha
Wagner Motta
Epf logo
Bibliografia
Anexo 1 - Focos Principais de Contaminaçao
Anexo 2 - Residências
Anexo 3 - Logradouros
Anexo 4 - Trajeto do cdsio
Anexo 5 - Noticias Selecionadas
Anexo 6
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
- Edson, Santana, Teresa, Juanita
Ivo Alves Ferreira
Lurdes das Neves Ferreira
Ernesto Fabiano
Dalva Fabiano
Odesson Alves Ferreira
Kardec Sebastiao dos Santos
AGRADECIMENTOS
Agradeço As vitimas do Césio, em Goiânia; A Profa. Alcida Ramos, Ph.D., que assumiu a orientação deste traba-
lho num momento particularmente difícil para mim; A jorna- lista Lisa França, que me hospedou em sua casa em Goiânia;
ao jornalista Paterson Pereira e aos funciondrios da As-
sessoria de Comunicação Social do extinto Ministério das
Minas e Energia; a John S. Petterson, Ph.D., pelo estimulo
A realização deste trabalho; e ao meu esposo Hemet4rio Fec
nandes Júnior que fez a datilografia final.
Como cristã e evangélica não poderia deixar de agra-
decer a Deus, pois sem Ele nada existiria.
Rrasilia, setembro de 1990.
APRESENTAÇÃO
Este trabalho pretende mostrar uma interpretação da
cobertura jornalistica sobre o acidente com o césio 137 em
Goiânia, Centro-Oeste, Brasil, ocorrido em setembro de
1987.
Ele estd baseado em informações coletadas das noti - tias de jornais e em entrevistas formais e informais com os
principais contaminados, resgatando a palavra desses que
passaram à História como as vitimas do acidente nuclear
mais sério do Ocidente.
Foram contactados: Devair Alves Ferreira, Wagner
Motta, Ivo Alves Ferreira e Dona Lourdes das Neves Ferreira
sua esposa; Santana e Edson Fabiano, Ernesto e Dalva Fabi-
ano, Kardec Sebastião dos Santos e Luisa Odete dos Santos,
Odeson Alves Ferreira, Teresinha Nunes Fabiano, Juanita
Santana Silva, Odete Alves Feijó, mulher de Geraldo Guilher - me da Silva, e Roberto Santos Alves.
Meu interesse na pesquisa deriva de um fato pessoal,
existencial, que me levou a indagar por que aquelas pessoas
se sentiram tão atraídas pelo brilho do césio 137, da mesma
forma como queria saber de mim mesma aonde me levaria o lu-
minoso brilho de uma estrela azul do céu. Queria também
que, de alguma forma, pudesse transformar este trabalho num
grande espelho, onde os meus colegas jornalistas e os estu-
dantes de comunicação pudessem meditar sobre o que é que
andamos fazendo de nossa profissão.
Para tanto, precisava saber das próprias vitimas o
que teriam a dizer sobre o acidente, em alguns aspectos que
foram escolhidos entre as inúmeras noticias publicadas na
época do acidente, ou seja, setembro/outubro de 87, e pas-
sados sete meses, em abril/maio de 88. Esses aspectos po-
dem ser resumidos em dez itens: 1) o fato como aconteceu;
2 ) a questão nuclear no Brasil; 3) as expectativas de vida
antes e depois do acidente, ou os sonhos que foram rouba-
dos; 4 ) o lixo atômico humano e material; 5 ) as responsa-
bilidades; 6) a discriminação; 7 ) as lições; 8 ) a atra-
ção pelo césio; 9) cobaias de experiências científicas; e
10) a cobertura da imprensa.
O trabalho, em sua totalidade, estd dividido em qua-
tro momentos principais. O primeiro -- IMAGENS -- mostra
como o acidente foi visto por autoridades, instituições e
cientistas. O segundo -- CONTAMINAÇÃO -- conta como as no- tícias na época do acidente e sete meses depois agiram so-
bre a minha imaginação. O primeiro contato no auge da cober
tura e o segundo quando foi iniciado o projeto deste trabg
lho. Falo da série de imagens que me fizeram indagar se o
cksio-137 teria sido a representação simbólica da sorte pa-
ra os contaminados.
A seguir, no MOMENTO I11 -- ESPELHOS -- são buscados reflexos para a fundamentação teórica e encontrados em Ja-
mes Carey e Steven Feld. No MOMENTO IV -- ROUBADOS EM SEUS SONHOS -- 6 feito o relato do trabalho de campo em Goiânia,
focalizando as entrevistas de três de um total de treze en-
trevistados, e incluindo uma carta de uma das vítimas cedi-
da pela mesma para fins deste trabalho.
As entrevistas focalizadas são as de Devair Alves
Ferreira, Luisa Odete Santos Alves e Wagner Motta. Há ainda
a carta que Teresinha Nunes Fabiano enviou a um amigo jorng
lista. A escolha dessas três entrevistas e da carta também
6 explicada nesse mesmo MOMENTO, quando a série de imagens
iniciais 4 desfeita e refeita, junto com as vítimas do cé-
sio, que se vêem refletidas nas notícias de jornal.
Então v6m as conclusões, resultado de todos os OU-
tros momentos, onde também se encontram os conceitos, esta-
belecidos comparativamente com a antropologia, de notícia,
comunicação e momento jornalístico.
Nos anexos poderão ser encontradas as demais entre-
vistas feitas com as vitimas do cksio, e que não constam do
corpo do trabalho. Embora de grande interesse, essas entre-
vistas, se transcritas no corpo do trabalho, acabariam por
sobrecarregar demais o texto e diluiriam a mensagem que a
tese quer transmitir.
INTRODUÇHO
O QUE E O CESIO-137l
O césio, primeiro elemento a ocupar a tabela periódi - ca, foi descoberto em 1860 pelos cientistas Robert Bunsen e
Gustav Kirchoff. Ao ser aquecido, o elemento coletado por
eles, e até então desconhecido, emitia raios de cor azul c%
leste. Daí o seu nome caesius, que em latim quer dizer
"céu azul".
O césio, nessa versão natural, levou o número de i-
dentidade atômica 133. E um metal muito mole, que a 280 C
fica liquido, como o mercúrio, e é setenta vezes mais fácil
de se achar que a prata, sendo utilizado na propulsão iôni-
ca de naves espaciais ou elementos supersensfveis à luz pa-
ra câmara de TV.
Já o césio 137 é um isótopo artificial criado pelo
homem, não existente na natureza. E um subproduto das rea- ções de fissão nuclear nos reatores, resultado da quebra de
átomos maiores. E para voltar ao seu estado natural de cé- sio 133 que o césio 137 emite radiações extremamente perigo
sas para a vida, pois atingem as células humanas, desorgani
zando a molécula do dcido desoxirribonucléico, o DNA, que é
o responsdvel pelo armazenamento do código genético. As cé - lulas ficam sem orientação e começam a se multiplicar desoy
denadamente causando o câncer.
E como o césio tem uma atividade química igual do
potdssio, que é normalmente ingerido pelo ser humano nos a-
limentos e na dgua, o organismo, enganado pela semelhança,
fixa o cksio nos tecidos, contaminando e destruindo as célu - las.
1 - Fonte: Revista Isto E, 14 de outubro de 1987, pdg.20.
A r e v i s t a I s t o E, de 16 de setembro de 1987 publ ica-
va uma e n t r e v i s t a com Rex Nazareth Alves, sob o t i t u l o "Ca-
so de Soberan ia" , e tendo como s u b t í t u l o "Pa i do programa
nuc lea r não quer p r o i b i ç ã o da bomba". A reportagem de Pau-
l o Vasconcel los i n i c i a v a - s e ass im:
"O f í s i c o c a r i o c a Rex Nazareth Alves, 49 anos, se que r t e v e tempo para comemorar o maior f e i t o n u - c l e a r b r a s i l e i r o : o domfnio completo da tecnolo- g i a de enr iquecimento de u rân io , que colocou O
B r a s i l no e s t r i t o c lube dos p a í s e s com capacidade de produz i r a bomba atômica, anunciado na semana passada p e l o p r e s i d e n t e José Sarney. P r e s i d e n t e há c inco anos da Comissão Nacional de Energia Nu- c l e a r (CNEN) o coordenador do programa s e c r e t o que em o i t o anos consumiu o e q u i v a l e n t e a 20 b i - l h õ e s de cruzados e mobil izou quase q u a t r o m i l t é c n i c o s e c i e n t i s t a s , 18 un ivers idades e 150 i n - d ú s t r i a s , Rex Nazareth passou o s Últimos d i a s f a - zendo a s malas. Viaja n e s t e domingo pa ra Viena, Á u s t r i a , pa ra mais uma r eun ião anual de Energia Atômica da O N U , onde v a i defender a pos ição b r a s i l e i r a a f avo r da autonomia nac iona l no desenvo lv i mento da t e c n o l o g i a nuc l ea r " (pág. 7 2 ) .
Enquanto o p r e s i d e n t e da CNEN f a z i a a s malas no Rio,
na p a c a t a c a p i t a l do e s t a d o de Goiás -- Goiânia -- a 200
km de B r a s i l i a , Roberto Santos Alves, 2 1 anos, conhecido c 2
mo Betão, e Wagner Mota P e r e i r a , 19 anos, já padeciam dos e f e i t o s da contaminação r a d i o a t i v a , com vômitos, d i a r r é i a ,
manchas p e l o corpo todo e queda de cabe los , após terem r e t i
rado d e um p réd io em r u f n a s , e n t r e a s avenidas Paranaíba e
Tocan t in s , um c i l i n d r o de meta l , que tentaram a b r i r a mar-
r e t a d a s no ba r r aco da rua 57, onde Betão morava com sua mãe
Eunice. Era uma bomba de césio-137 u t i l i z a d a em medicina
nuc l ea r , que hav ia s i d o abandonada pe lo I n s t i t u t o Goiano de
R a d i o t e r a p i a , sem que o órgão f i s c a l i z a d o r d e s s e t i p o de a-
p a r e l h o , a CNEN, t i v e s s e tomado conhecimento.
De acordo com a s poucas e luc idações dadas p e l o s jor-