Um Tratamento Postural para a Dislexia? · PDF filetocante aos exames psicológicos, o...

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  • Texto de apoio ao curso de Especializao Atividade Fsica Adaptada e Sade

    Prof. Dr. Luzimar Teixeira

    Um Tratamento Postural para a Dislexia?

    Alexandre Frey Pinto de Almeida, MD., PhD.

    RESUMO

    A dislexia uma dificuldade especfica de aprendizagem da leitura que requer

    nomeadamente para seu completo diagnstico a passagem dum teste de leitura e dum teste

    de inteligncia no quadro de um exame mdico e psicolgico atento que comprove

    objectivamente as dificuldades de leitura e exclua como causa atrasos de desenvolvimento

    doutra natureza, dfices sensoriais, doenas neurolgicas e psiquitricas ou problemas

    maiores de escolaridade. Sem prejuzo disto, a dislexia acompanha-se muitas vezes de

    disortografia e de numerosos soft-signs neurolgicos, e Pinto de Almeida (1993) deu a

    conhecer uma associao igualmente frequente com o Sndrome de Deficincia Postural,

    parecendo confirmar-se que o tratamento deste S. D. P. associado por meio de

    reprogramao postural e lentes prismticas de baixa potncia surte efeitos muito

    apreciveis sobre os prprios desempenhos de leitura. Graciete Serrano e Orlando Alves da

    Silva (1998) revelaram ter obtido resultados muito sobreponveis num grande nmero de

    crianas disortogrficas, possivelmente dislxicas, defendendo esta abordagem como

    tratamento de eleio para a maior parte dos casos e atribuindo as melhorias correco de

    disfunes proprioceptivas ocasionadas por vcios de posio, disfunes estas que

    terminariam por gerar bloqueios cognitivos susceptveis de comprometer a leitura. Critica-se

    este ponto de vista contrapondo-se-lhe uma concepo da dislexia e do prprio S.D.P.

    enquanto sndromes de dislateralidade , ambos assentes numa disarmonia geral das

    funes hemisfricas que no somente o tratamento proposto como tambm outras

    intervenes bem sucedidas e que o potenciam poderiam ajudar a resolver.

    I. INTRODUO: DISLEXIA E S. D. P.

    A dislexia uma perturbao especfica de aprendizagem da leitura cuja deteco se faz j

    em idade escolar, quando o nvel de leitura no progride de forma ajustada ao nvel

    acadmico geral e ao restante desenvolvimento do indivduo. O seu diagnstico requer um

    exame mdico e psicolgico atento anamnese escolar, pessoal e familiar, ao estado

    mental e a eventuais sinais neurolgicos, se possvel com avaliao do Q.I. e aplicao dum

    teste de leitura. Somente este ltimo ser capaz de objectivar as dificuldades

  • experimentadas, permitindo confront-las com os desempenhos prprios daquela faixa

    etria e normas de leitura daquele ano de escolaridade. No existe em Portugal nenhum

    teste de nvel de leitura convenientemente aferido, nem mesmo o de Pinto de Almeida

    (1993) - o que no impede em absoluto um diagnstico de rigor lanando mo dos materiais

    existentes, uma vez que bastar comprovar que o dislxico tem, por poucos que sejam,

    alguns resultados em parmetros leximtricos francamente aqum do esperado, com um

    desfasamento de dois anos ou mais relativamente aos restantes resultados escolares, e j o

    teremos identificado como mau leitor (Pinto de Almeida, 2002).

    Resta depois excluir dfice intelectual, baixa acuidade sensorial, doena neurolgica,

    perturbaes psiquitricas importantes ou mesmo absentismo ou defeitos do sistema de

    ensino como causa dos dfices observados, e teremos desta forma mostrado tratar-se com

    efeito de dificuldade de aprendizagem especfica, e no consecutiva a causas de outra

    natureza (dislexia evolutiva especfica, dizia Critchley, 1975). Isto no impede que as

    dificuldades especficas de leitura se acompanhem muito frequentemente, como natural,

    de dificuldades na escrita (dislexia-disortografia), e que encontremos at, por via de regra,

    pequenos sinais de imaturidade neurolgica associados: maior frequncia de canhotismo e

    ambidextria, lateralidades cruzadas, ausncia de ouvido director e/ou de olho fixador e

    outros soft-signs que levam Pinto de Almeida (2003) a considerar como base

    fisiopatolgica essencial para a dislexia uma disarmonia no funcionamento conjunto de

    ambos os hemisfrios cerebrais.

    Na verdade, mesmo quando se trata de semiologia clnica oriunda de outras esferas, tais

    como os dfices de processamento fonolgico ou as dificuldades de organizao verbal do

    pensamento que muitos dislxicos tendem a apresentar, raro que isso no possa ser

    imputado a disfuno hemisfrica. Os estudos anatmicos vm ao encontro deste ponto de

    vista: Galaburda & Geschwind (1980), nomeadamente, evidenciaram na populao geral a

    existncia de assimetrias entre os hemisfrios cerebrais que so muito frequentes nas reas

    da linguagem, sendo exemplo disto o que se passa ao nvel do planum temporale , que

    tende a ser mais volumoso esquerda do que direita em crebros normais mas no no

    crebro dislxico, o qual exibe pelo contrrio muito sistematicamente uma quase simetria

    entre os dois hemisfrios no tocante a esta rea. Ao nvel da maior comissura entre os dois

    lados do crebro, por outro lado, tm-se encontrado com certa frequncia estreitamentos do

    corpo caloso em dislxicos (cf. tb. Hynd & Semrud-Clikeman, 1989), e dum modo geral

    parece haver nesta populao um tempo de transmisso inter-hemisfrica bastante

    aumentado durante a leitura (Davidson et al., 1990). Michel Habib (2000), entre outros, d-

    nos conta igualmente de numerosos achados microscpicos relativos a uma desorganizao

    da citoarquitectura e mesmo ectopias corticais nas reas da linguagem em crebros

  • dislxicos, consecutivamente a desordens da migrao neuronal, sendo frequente que tais

    alteraes assumam maior relevo no hemisfrio dominante.

    Em termos funcionais, ser tambm de mencionar uma marcada assimetria da actividade

    dos dois hemisfrios cerebrais durante a leitura, sugerida por diferentes dados

    electrofisiolgicos (cf. Bakker et al., 1987) e neuroimagiolgicos funcionais (cf. Wise et al.,

    1991, para a tomografia de emisso de positres). Relativamente s funes sensitivas, e

    alm do perfil audiolgico que Tomatis (1972) ps em evidncia para a dislexia (um ouvido

    direito / hemisfrio esquerdo menos discriminativo, conforme as provas de audio dictica

    parecem efectivamente confirmar para estmulos verbais), a electronistagmografia permite

    observar inclusive, relativamente funo vestibular dos dislxicos, uma frequente

    preponderncia direccional de um dos lados (Levinson, 1990), e o prprio Pinto de Almeida

    (1993) chamou a ateno, por meio de estudos campimtricos nos seus pacientes, para

    uma grande variabilidade mas tambm frequentes assimetrias na sensibilidade perifrica

    aos incrementos de luz em ambos os olhos. O parmetro lateralidade da bateria

    psicomotora de Vtor da Fonseca (1992) era tambm dos mais afectados neste estudo

    dados estes que no seu conjunto parecem de facto sustentar a viso da dislexia como

    sndrome de dislateralidade (Pinto de Almeida, 2003).

    Mais do que isso, Pinto de Almeida (1993) notou num conjunto de dislxicos a existncia de

    sinais e sintomas que configuravam um Sndrome de Deficincia Postural primeiro descrito

    por Martins da Cunha (1979; 1987). Os critrios diagnsticos para o S. D. P. incluem: 1)

    sintomas cardinais dor (especialmente raquialgias); perturbaes do equilbrio; alteraes

    da percepo visual (astenopia, diplopia, metamorfopsias); perturbaes da somatognose,

    frequentemente com propriocepo alterada (para os sintomas no-cardinais, ver Martins da

    Cunha, 1987) ; 2) uma semiologia fsica caracterstica, podendo incluir: assimetria facial;

    adopo de uma direco preferencial do olhar com insuficincia da convergncia tnica

    ocular; adopo de uma atitude postural cifoescolitica estereotipada assimtrica, com

    rotao axial e apoio privilegiado sobre um p; pontos lgicos caractersticos semiologia

    esta que foi confirmada em diversos servios do Hospital Universitrio aonde se levou a

    cabo este estudo com dislxicos que associadamente apresentavam um S.D.P.

    Assim notada esta associao, o autor colocou a hiptese de se tratar de entidades

    nosolgicas relacionadas entre si do ponto de vista fisiopatolgico: tratar-se-ia, em suma, de

    dois sndromes de dislateralidade, exprimindo ambos, embora de maneira diferente, uma

    mesma disarmonia geral das funes hemisfricas (cf. Pinto de Almeida, 2003). O autor

    levou a cabo consequentemente um estudo exploratrio destinado a verificar uma eventual

    eficcia sobre a prpria capacidade de leitura do tratamento j previsto e experimentado

  • para o S.D.P. associado (cf. Martins da Cunha, 1988) por reprogramao postural e

    correco com lentes prismticas de baixa potncia (Pinto de Almeida, 1993). Por meio da

    reprogramao postural, o indivduo passa a ter conscincia dos seus erros inconscientes

    de posicionamento e aprende a corrigi-los; o recurso a lentes prismticas permite coadjuvar

    este processo, surtindo mudanas no grau de tenso e por conseguinte tambm na

    propriocepo ao nvel dos msculos extrnsecos do globo ocular, e corrigindo

    nomeadamente uma insuficincia da convergncia tantas vezes associada (cf. Martins da

    Cunha e Alves da Silva, 1986; Gagey, 1993), ou talvez at compensando de certo modo as

    alteraes dos campos visuais j citadas (cf. tb. Martins da Cunha, 1983). Estas poderiam

    ter uma primordial importncia, j que interferem grandemente no feedback exercido pelas

    entradas de informao do sistema postural, na regulao do equilbrio (desde o momento

    em que a prpria cab