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CAPÍTULO 11
“UM LUGAR AO SOL”
DE RICARDO NASCIMENTO
REVISADO EM
06/08/2012
PERSONAGENS DESTE CAPÍTULO
AFONSO
ALICE
ÁLVARO
ANDRÉA
CARLA
CARLOS
CLARICE
DIVA
EDUARDO
FERNANDA
GILSON
GILSINHO
GLADIS
ISABEL
JÚLIO
JURANDIR
LEINHA
LINDA
LÚCIA
MARCELO
MÁRCIA
MARIA LUIZA
MAURO
RAFAELA
REGINA
REGINALDO
RITINHA
RUTE
SILVIA
VERA
PARTICIPAÇÃO ESPECIAL DESTE CAPÍTULO:
Homem que aluga pedalinhos em Amsterdã, amigas de Ritinha (adolescentes
na faixa de 14, 15 anos), Garçom do bar onde Marcelo bebe.
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CENA 01. AMSTERDÃ. EXTERIOR. DIA.
Amanhecer. Inserir legenda “Amsterdã”. Long shot da
cidade. Belos takes de pontos turísticos. Os canais
típicos, Museu Rijksmuseum, Museu Vangh, Instituto Anne
Frank, Jardim das Tulipas. Trilha Sonora Cuide Bem do
Seu Amor – Paralamas do Sucesso. Clipe curto. Já cortou.
CENA 02. AMSTERDÃ. SUITE HOTEL. INTERIOR. DIA.
Mantém trilha sonora. Vemos um quarto, com decoração
típica, as janelas estão aberta, deixando a luz do sol
entrar. Vamos identificando Andréa deitada, começando a
despertar. A cam agora focaliza Álvaro, já de pé,
trajando um roupão, cabelos molhados, sentando aos pés
da cama, velando o sono da moça. Andréa desperta e vê a
cena e abre um sorriso.
ANDRÉA: - Já de pé, tão cedo?
ALVARO: - Cedo? Você que pensa. Quase onze da
manhã.
ANDRÉA: - Isso tudo? Que pecado! Perdemos uma
manhã inteira.
ALVARO: - (ri) Fica tranquila, meu amor, hoje
o nosso roteiro turístico só começa
depois do almoço. Temos ainda um
tempinho pra nos curtir aqui,
agarradinhos. Mas antes disso, vamos
comer? Pedi um café da manhã reforçado
pra gente.
ANDRÉA: - Nossa, que delícia, ta com uma cara
ótima.
ÁLVARO: - Um café típico holandês. Tem (pausa)
Pera, deixa eu ver se consigo
pronunciar... (não pronunia direito)
Appelgebak met slagroom e Stroopwafel,
ANDRÉA: - (ri) Ta bom, agora traduz pra mim.
Stroop, stroop... Esse biscoitinho ai
eu sei que é delicioso e a gente toma
com o café, lá no Brasil tem um lugar,
ali em Ipanema que serve um divino,
agora esse Appe.. Nem sei falar o
nome, eu não sei o que é.
ÁLVARO: - É uma torta de maçã com chantilly.
Você vai adorar.
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ANDRÉA: - Torta de maçã no café da manhã,
Álvaro? Já vi que vou voltar dessa
viagem uma bola.
ÁLVORO: - Só hoje pode, mas também tem Queijo
Gouda, Iogurte de Baunilha Orgânico e
Pão Integral, eles me asseguraram que
é de vilarejo aqui perto, fabricação
caseira. E mesmo se você engordar vai
continuar sendo a mulher mais linda do
Rio de Janeiro e de Amsterdã.
ANDRÉA: - Eu que não me cuide, com tanta
concorrência. Mas eu vou acabar mesmo
é ficando mal acostumada, com tantos
mimos. Quando voltar pro Rio eu vou
querer um marido assim, atencioso,
carinhoso, que me acorda com café na
cama com todo dia.
ALVARO: - Pode ficar mesmo. É só o começo. Eu
vou te encher de mimos, de paparicos.
ANDRÉA: - Sabia que eu sou a mulher mais feliz
desse planeta?
ALVARO: - Então a mulher mais feliz desse
planeta podia aproveitar essa
felicidade toda e ligar pro Brasil,
falar com a sua mãe, dizer que estamos
bem... Fazer as pazes.
ANDRÉA: - Nossa, você existe mesmo? Porque tem
horas que eu acho que não. Lindo,
inteligente, bom marido, profissional
competente e ainda se preocupa com a
sogra! O que eu poderia querer mais da
vida? Tirei a sorte grande.
CORTE CONTINUIDADE.
CENA 03. AP REGINA. INTERIOR. DIA.
Regina de pé, próxima a porta, impaciente, olha o
relógio.
REGINA: - (grita) Vamos Rute. Daqui a pouco
vamos pegar a xepa.
RUTE: - Calma dona Regina, fui trocar de
roupa, “passá” um batom, “botá” um
brinco nas “orelha”.
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REGINA: - Rute, você vai à feira e não a um
baile funk. Não precisa dessa produção
toda.
RUTE: - Precisa sim dona Regina. Vai que eu
encontro o amor da minha vida, tenho
que tá “bunitinha”.
REGINA: - Na feira? Só se for o vendedor de
banana ou então o peixeiro. O que pra
você ta muito bom, né? (estranha) Mas
você não tinha um namoradinho lá onde
você mora?
RUTE: - Tinha não, tenho! Mas e aquele
ditado que é melhor dois passarinhos
na mão do que um “vuanu”.
REGINA: - É ao contrário Rute.
RUTE: - É melhor dois “voanu” do que um na
mão?
REGINA: - Desisto. Deixa pra lá. Agora vamos,
daqui a pouco eu só encontro frutas
passadas no final da feira.
RUTE: - Mais barato dona Regina! Eu bem
achei que a senhora ia mais tarde pra
“dá” uma economizada e comprar na
xepa.
REGINA: - Não fala besteira e vamos que eu
ainda tenho reunião de condomínio
hoje. Pegou tudo? O carrinho, a lista
que eu fiz mais cedo.
RUTE: - Me esqueci da lista.
REGINA: - Vai Rute.
Regina olha feio para Rute que vai até a cozinha. Nessa
hora a porta se abre e Alice entra em casa.
REGINA: - Ué, já em casa essa hora?
ALICE: - Oi mãe, sai mais cedo da faculdade.
REGINA: - Milagre né, porque parece que você
se mudou pra aquela faculdade. Vive
enfiada lá dentro, fazendo o que eu
não sei.
ALICE: - Estudando, né mãe.
REGINA: - Estudando, estudando... Se ainda
fosse uma faculdade de gente. (desdém)
Letras! Me fala? Você vai viver do que
quando se formar? (ironiza) Vai dar
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aula? Já viu quanto ganha um professor
no Brasil? Ou vai me dizer que você
quer entrar pra Academia Brasileira de
Letras. Vai ser uma imortal?! Acorda
pra vida e sai desse País das
Maravilhas, Alice.
ALICE: - Eu faço o que eu gosto mãe. E eu não
to pensando em dinheiro agora/
REGINA: - E quando você vai pensar? Ce acha
que vai ter papaizinho e mamãezinha
pra sempre?
ALICE: - Eu sei mãe/
REGINA: - (forte, interrompe) Parece que não
sabe. Porque se ainda tivesse um pingo
de juízo e tino pros negócios dava
continuidade nas padarias do seu pai
ou então arrumava um casamentão, como
a sua irmã conseguiu, (desdém) mas eu
sei que pra você é mais difícil. A
Andréa é linda, exuberante, puxou a
mim. Agora você, parece que eu to
olhando pro Otávio. Então Alice, tem
que estudar mesmo. Mas alguma coisa
que dê dinheiro. Não letras. Vai
vender livro e viver de brisa e
poesia?
Alice, com os olhos marejados, escuta a tudo. Rute chega
a cena.
RUTE: - “Bora”, dona Regina.
Regina e Rute saem de cena. Timidamente, Alice enxuga os
olhos. O telefone toca.
ALICE: - (TEL) Alô.
CORTE CONTINUIDADE.
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CENA 02. AMSTERDÃ. HOTEL. ALTERNANCIA DOS CENÁRIOS.
ANDRÉA: - (TEL) Oi, Alice?
ALICE: - (TEL) Andréa? Oi minha irmã, como
está a viagem?
ANDRÉA: - (TEL) Tá tudo bem, to ótima. Cadê a
mamãe e o papai?
ALICE: - (TEL) Mamãe acabou de sair com a
Rute, e o papai já esta na padaria,
você sabe, ele madruga lá. Mas eu acho
que a mamãe ainda esta no corredor,
ela acabou de sair, não tem um
minutos, deixa eu tentar chamar.
ANDRÉA: - (TEL) Não, não precisa Alice! Eu
ligo outra hora. Vô aproveitar que eu
ainda tenho muita coisa pra conhecer.
ALICE: - (TEL) Tudo bem, eu digo que você
ligou, mas me conta da viagem, como é
Amsterdã? Você esta gostando?
ANDRÉA: - (TEL) (ríspida) É óbvio que eu estou
gostando é minha lua de mel. Mas outra
hora nos falamos. Um beijo Alice. (já
desligou)
ALICE: - (TEL) Um beijo.
CONTINUA CENA 03.
Regina entra em casa.
REGINA: - (a Rute) Eu sabia que você ia
esquecer alguma coisa.
Alice ainda com o telefone em mãos. Rute entrou direto.
ALICE: - A senhora ainda esta ai?! A Andréa
acabou de ligar.
REGINA: - (irrita-se) Minha filha ligou e
porque você não me chamou?
ALICE: - A senhora já tinha saído, eu pensei/
REGINA: - (irritada) Você não tem que pensar
nada, tinha que ter me chamado. Eu
morrendo de saudades da Andréa/
ALICE: - Desculpa mãe, eu tentei chamar, mas
ela disse que não precisava, ela vai
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ligar de novo. Mandou um beijo pra
todo mundo.
REGINA: - Ela esta bem?
ALICE: - Disse que esta ótima. Nem nos
falamos direito.
REGINA: - Espero que isso não seja ciúme.
ALICE: - Ciúme?
REGINA: - Ciúmes da Andréa.
ALICE: - Não mãe, eu só/
REGINA: - (interrompe, sem paciência) Alice,
me faz um favor. Cala a boca. Você
consegue a proeza de me irritar com
esse seu jeitinho de sonsa, songa
monga. Não nega as origens mesmo.
Puxou ao teu pai. Agora sai da minha
frente. (grita) Oh Rute, como é?
Rute entra em cena.
RUTE: - Pronto, dona Regina.
Regina sai. Rute olha o estado de Alice.
RUTE: - O Alice. Que foi? Que carinha
musumbuda é essa? Foi tua mãe, né? Ela
pegou pesado “dinovo” contigo?
ALICE: - (desfarça) Não foi nada, Rute.
RUTE: - E eu não te conheço, nem. E também
também conheço a dona Regina. Mas
“num” fica assim não. Deixa entrar no
ouvido e sair por outro. Agora deixa
eu ir antes que a tua mãe me frite pro
almoço.
Rute sai. Alice senta no sofá, encolhida, desprotegida,
se encolhe e chora comedidamente em silencio.
Já cortou.
CENA 04. AP MÁRCIA. INTERIOR. DIA.
Mesa posta para o café da manhã, Márcia sentada,
desanimada, toma seu café sozinha. Isabel sai de seu
quarto, aparentemente apressada, terminar de se arrumar
enquanto anda em cena.
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ISABEL: - Nossa, madrugou, hein! Eu marquei
com um fornecedor agora lá no ateliê,
já estou atrasadíssima. (para, repara
em Márcia). O que houve minha irmã?
Você não vai trabalhar hoje?
MÁRCIA: - O Afonso me demitiu.
ISABEL: - (pára, estarrecida) Com é que é? Não
acredito.
MÁRCIA: - Não foi bem uma demissão, na verdade
foi, mas com outras palavras. Ele me
propôs um afastamento temporário da
empresa por conta desses últimos
acontecimentos.
ISABEL: - E ai? E você?
MÁRCIA: - Aceitei é claro. Vou me recolher,
talvez um retiro, sair um pouco de
cena até a poeira baixar.
ISABEL: - É a melhor coisa que você faz. Sair
um pouco dessa loucura, do olho do
furacão, e quem sabe tirar de ume vez
por todas o Álvaro da sua cabeça.
MÁRCIA: - Eu to disposta a isso mesmo Bel. Eu
vou fazer uma viagem bem longa,
descansar, aproveitar pra me curtir,
ter um tempo só meu, sabe há quanto
tempo eu não penso exclusivamente em
mim?
ISABEL: - Pois é. Ultimamente você vivia em
função do Álvaro e do seu trabalho.
MÁRCIA: - Então, isso agora é passado. Tá
decidido, vou fazer uma cruzeiro,
talvez Ilhas Gregas, aproveitar
bastante e voltar renovada.
ISABEL: - Um cruzeiro é uma ótima ideia. Quem
sabe você não encontra um Deus Grego
ai pela sua viagem.
MÁRCIA: - Quem sabe. (risos)
ISABEL: - Agora deixa eu ir, que a Fernanda só
vai a tarde pro ateliê. E pelo menos
antes você viajar pra esse cruzeiro
fala comigo, já que você é louca.
MÁRCIA: - Pode deixar! Beijo!
Já cortou.
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CENA 05. ACADEMIA GINÁSTICA. INTERIOR. DIA
Movimentação de uma academia de ginástica (a mesma da
cena 23 – capítulo 8). Trilha sonora agitada. Academia
cheia. Vemos Luiza correndo na esteira, suada, muito
ritmo. Em segundo plano, Mauro se aproxima. Luiza
continua seu exercício. Quando vê Mauro, não será
simpática.
MAURO: - Mas o Rio de Janeiro é muito pequeno
mesmo ou tem alguém querendo que nós
dois sejamos ao menos amigos.
LUIZA: - (grossa) Nem um, nem outro.
MAURO: - Mas porque tanta certeza? É a
terceira ou quarta vez que nos
encontramos assim, por acaso?
LUIZA: - Não sei, não to contabilizando. Eu
costumo esquecer as coisas que não são
agradáveis que acontecem durante o meu
dia.
MAURO: - Ta bom, mas uma coisa você não pode
negar, é muito acaso pra um tão pouco
tempo.
LUIZA: - O que você esta querendo insinuar
com isso?
MAURO: - Eu não estou insinuando nada. São
fatos. Nos conhecemos por acaso
naquela loja, e por coincidência temos
o mesmo ciclo social, nos encontramos
no casamento do Álvaro e agora
malhamos na mesma academia.
LUIZA: - Não é coincidência, essa é a melhor
academia do Rio de Janeiro.
MAURO: - Tudo bem, a academia pode não ser,
mas e os outros fatos. Seu pai
trabalha na mesma empresa que eu. Será
que depois de disso tudo você não pode
me dar uma chance de uma conversa sem
essa hostilidade toda? Pode ser um
suco aqui na academia mesmo. Ta cheio
de gente, prometo que não vou te fazer
nenhum mau.
LUIZA: - Quem sabe um dia. Agora me deixa
malhar. Você não conhece aquele ditado
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que quando um não quer, dois não
brigam.
MAURO: - (ri) Conheço, mas algo me diz que
você quer.
LUIZA: - (irrita-se) Garoto, se enxerga. Não
enche e vê se me erra.
MAURO: - Ta ok, senhorita nervosinha. Mas só
mais uma coisa, o engraçado é que eu
não me lembro de já ter te visto
circulando por aqui. E eu não ia me
esquecer de alguém tão gostosinha
feito você.
LUIZA: - Vai ver que é porque eu não sou pro
teu bico. Agora dá o fora.
Mauro lança um olhar para Luiza e sai. Luiza aumenta o
ritmo da esteira e corre ainda mais rápido.
LUIZA: - (fala pra si) Idiota!
CENA 06. IPANEMA. ORLA. DIA
Uma bela manhã ensolarada. Fernanda e Silvia caminham no
calçadão, lado a lado.
FERNANDA: - (animada) Eu fiquei tão contente
quando você me ligou Silvia.
Precisávamos mesmo desse tempo juntas.
Eu estou tão em falta com você minha
cunhada. Mas também foi tanta coisa
acontecendo ao mesmo tempo.
SILVIA: - Que isso Fernanda. Eu sei que você
também esta com a cabeça cheia. Já
basta os seus problemas. E ainda vem
uma cunhada problemática te perturbar
com os meus.
FERNANDA: - Não fala isso Silvia. Somos amigas,
não somos? Amigo é pra isso. E eu te
conheço, eu bem sei que tem algo mais
te afligindo além da historio do
julgamento do Marcelo. Aconteceu
alguma coisa?
SILVIA: - Aconteceu. Dessa vez é a Luiza.
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FERNANDA: - O que a Luiza aprontou dessa vez?
Eu já fiquei sabendo, ela terminou com
o Marcelo, mas não era pra você estar
aliviada? É um problema a menos.
SILVIA: - Eu não vou mentir pra você, fiquei
aliviada sim. O que eu não gostei foi
das coisas que a Luiza disse pro meu
filho.
FERNANDA: - Ah Silvia, se eu bem conheço a minha
filha, ela sabe ser bem malvada quando
ela quer. Ela me contou o que
aconteceu. Os dois brigaram.
SILVIA: - o Marcelo está arrasado.
FERNANDA: - E por incrível que pareça, a Luiza
também. Mas pra uma coisa essa briga
serviu. Eu pude ver que a Luiza gosta
do Marcelo de verdade, esse namoro dos
dois não é apenas uma afronta pra
família.
SILVIA: - Será mesmo Fernanda? Quem gosta não
diz as coisas que ela disse.
FERNANDA: - Olha Silvia, esse julgamento não
cabe a nós. Por amor, fazemos e
dizemos coisas inimagináveis. Eu sou
uma prova viva.
SILVIA: - Mas eu sou mãe, meu dever é cuidar
do Marcelo.
FERNANDA: - Silvia, o Marcelo já é um homem. Eu
sei que sempre vamos ter instinto
materno de proteção, mas esse é um
problema deles. Eles vão se resolver
sozinhos dessa vez.
SILVIA: - Você ta certa Fernanda. Mas eu não
consigo. Se eu pudesse, eu colocava o
meu filho numa redoma de vidro pra
protegê-lo do mundo. Foi essa a
criação que eu tive.
FERNANDA: - Quem sou eu pra julgar, errei muito
na criação da Luiza, mas você acha que
privando o Marcelo do mundo é a melhor
solução para os problemas?
SILVIA: - Óbvio que não, minha cunhada. Eu sou
um exemplo, uma mulher insegura,
fraca.
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FERNANDA: - Não diz isso Silvia. Todos nós temos
o nosso valor. E você tem o seu. Agora
se martirizar não vai resolver. Bola
pra frente minha cunhada.
Aumenta trilha sonora, continua diálogo em off enquanto
as duas caminham no orla. Fundir com a próxima cena.
CENA 07. ACADEMIA. EXTERIOR. DIA.
Vemos, em segundo plano, a fachada da academia a que nos
referimos na cena 5. Em primeiro plano, um carro
estaciona, Marcelo esta dirigindo. Ele esta com o
celular em mãos, já discou.
CORTE CONTINUIDADE.
CENA 08. ACADEMIA. INTERIOR. DIA.
Luiza já esta fazendo outro exercício, alongamento
talvez. Nesse ponto onde Luiza esta, vemos ao fundo a
cantina da academia. Quando Luiza se dá conta, esta
olhando para Mauro que retribui. Ela se irrita e vira.
Nesse momento seu celular, que esta próximo, toca, close
no visor “Marcelo Chamando”. Ela para por alguns
segundos e pensa, mas imediatamente volta a fazer o seu
exercício. A próxima fala será em off, veremos apenas
Luiza.
MARCELO: - (OFF) A gente pode conversar?
Luiza se assusta. Agora revela Marcelo.
LUIZA: - (surpresa) Marcelo, o que você esta
fazendo aqui?
MARCELO: - Você não ia me atender?
LUIZA: - Você veio atrás de mim?
MARCELO: - A gente precisa conversar.
LUIZA: - A gente não tem nada pra conversar.
MARCELO: - “Qualé” Luiza. Eu to vindo aqui,
passando por cima do meu orgulho mesmo
depois de tudo o que você me disse pra
tenta ficar numa boa com você.
LUIZA: - E o meu orgulho, Marcelo? Onde fica?
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MARCELO: - Deixa eu me explicar, aquilo que
você viu ontem lá na praia, não tem
nada a ver. Aquela garota me agarrou.
LUIZA: - (ri) Te agarrou? (irônica) E você
estava bêbado também? Porque agora
todas as suas desculpas são essas. Foi
culpa da bebida.
MARCELO: - Você sabe que eu sou amarradão na
sua. Se não/não estaria vindo aqui,
atrás de você.
LUIZA: - Mas eu to com ódio de você.
MARCELO: - Ta bom, eu errei. Desculpa! A
Manuela me agarrou, mas eu podia ter
me esquivado, me afastado. Errei! Ta
satisfeita. Me perdoa?!
Em todo momento, enquanto Luiza e Marcelo conversam,
vemos em segundo plano Mauro, de forma sutil, sem dar
ênfase na presença dele.
LUIZA: - (pausa) Não!
MARCELO: - Qualé Luiza.
LUIZA: - Sabe o que mais me irrita? Ter sido
com aquela garota. Aquela favelada
desclassificada. Se fosse com qualquer
outra eu ia pensar na possibilidade de
te perdoar. Agora me deixa terminar a
minha série.
MARCELO: - Não faz isso comigo. A gente precisa
conversar.
LUIZA: - Já conversamos o suficiente. Agora
me deixa.
MARCELO: - Eu não vou sair daqui até você falar
comigo direito.
LUIZA: - Se você não sai, saio eu!
Luiza levanta-se e vai em direção a Mauro. Marcelo fica
sem entender e vê a cena de longe.
LUIZA: - (a Mauro) Ainda tá de pé aquele suco
que você me convidou?
MAURO: - (abre um sorriso) Claro. Sente-se.
LUIZA: - Aqui não.
MAURO: - Aonde então?
LUIZA: - Qualquer outro lugar, menos aqui.
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Já cortou.
A cena abre no estacionamento da academia. Mauro em seu
carro, Luiza sentada no carona. Vemos em segundo plano
Marcelo chegando. Ele chama por Luiza.
MARCELO: - (grita) Luiza!
Marcelo esta ao lado do carro de Mauro.
MARCELO: - Peai Luiza. Quem é esse cara? Ce vai
pra onde? Não faz isso comigo. Vamos
conversar.
Antes de Marcelo terminar de falar, Luiza levantou os
vidros do carro. Tempo. Olha para Mauro.
LUIZA: - Ta esperando o que pra me tirar
daqui?
Mauro arranca com o carro. Inicia trilha sonora “Enjoy
The Silence – Depeche Mode (remix)” Close no olhar de
Marcelo, que irritadíssimo chuta ou dá um soco em algum
objeto, numa lata de lixo ou numa pilastra do
estacionamento.
Já cortou.
CENA 09. AP FERNANDA. QUARTO. INTERIOR. DIA.
Fernanda termina de se arrumar. Vai recolhendo sua bolsa
e algumas pastas. Esta preparada para sair. Vera entra
em cena.
VERA: - Será que alguém almoça nessa casa
hoje?
FERNANDA: - Sinceramente eu não sei Verinha. O
Bruno provavelmente não, eu vou comer
alguma coisa pelo Ateliê, tenho um dia
cheio. Agora tem as meninas.
VERA: - Eu pergunto pra saber se eu preparo
ou não alguma coisa/ (pausa, pensa)
Fernanda, o que eu faço? O Marcelo já
ligou umas trezentas vezes atrás da
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Luiza. Eu não sei mais que desculpar
dar.
FERNANDA: - Ué. Não dá desculpa nenhuma, fala a
verdade.
VERA: - Eu sei, mas eu fico morrendo de pena
do menino. Da última vez que ele ligou
tava com uma vozinha. Parecia que
tinha chorando. E cê sabe. Homem
quando chora por mulher é porque ta
apaixonado.
FERNANDA: - Ele ficou muito mau com essa
história. Mas a gente não pode fazer
nada. Ou melhor, podemos aconselhar, e
isso eu já fiz. Agora só o tempo.
Agora deixa eu ir.
Fernanda vai saindo.
VERA: - Ta, e pro jantar, o que eu preparo?
FERNANDA: - Ai Vera, prepara uma saladinha.
VERA: - Saladinha de novo?
FERNANDA: - Por que de novo?
VERA: - Porque vocês só comem isso. Deus me
livre, se eu viver comendo verde eu
morro de fome. Preciso de algo de
sustância.
FERNANDA: - E depois você quer emagrecer, me diz
como?
Fernanda já saiu de casa. Continua cena.
CENA 10. HALL ELEVADOR. ANDAR FERNANDA. .
Vera da porta do apartamento e Fernanda aguardando o
elevador.
VERA: - Me deixa assim. Pançuda mas feliz.
O elevador chega.
FERNANDA: - Tchau Verinha.
Fernanda entra no elevador. Encontra com Lucia.
FERNANDA: - Lúcia.
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LÚCIA: - Menina, mas que sintonia é essa?
FERNANDA: - Pois é. Ta indo pra onde?
LUCIA: - Vou ao mercado. Vou pra minha vida
de escrava branca, de rainha do lar.
Do jeito que o senhor meu marido
gosta.
FERNANDA: - (ri) E o senhor, seu marido?
LUCIA: - Gilson ta no trabalho.
FERNANDA: - Eu quero saber como estão vocês
dois.
O elevador chegou ao estacionamento. Fernanda e Lucia
saem em direção aos seus carros. Continuam conversando.
LUCIA: - Ai amiga, ce sabe que eu não posso
reclamar do meu marido. O Gilson
apesar desse jeito meio bronco dele,
ele é um amor, mas ultimamente ele
anda muito estranho. Eu nem posso
falar nada. Eu sei que ele anda com
uns problemas no trabalho.
FERNANDA: - Imaginei. Conheço vocês há anos. E o
Gilson que entrou lá em casa naquele
dia querendo a janta pronta e a mulher
de banho tomado não é o Gilson que
casou com a Lucia, minha melhor amiga.
LUCIA: - Pois é. O pior que essa má fase no
trabalho já esta afetando a nossa vida
conjugal mais intimamente, se é que
você me entende. (para, pensa) Ah,
quem eu to querendo enganar, você é
minha amiga, não tenho segredos pra
você, o Gilson negou fogo ontem. Isso
nunca aconteceu nesses anos todos de
casamento.
FERNANDA: - Lúcia, agora, mais do que nunca você
tem que ser paciente e apoiar o seu
marido.
LUCIA: - Eu sei Fernanda. Mas é difícil. Você
outro dia reclamando que o seu
casamento era só sexo e eu aqui agora,
reclamando da falta no meu.
FERNANDA: - Isso é passageiro, Lúcia. Daqui a
pouco esses problemas no trabalho
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passam e ele volta a ser o velho e bom
Gilson.
LUCIA: - Deus te ouça
FERNANDA: - Agora deixa eu ir. Tenho um dia
cheio no Ateliê.
LUCIA: - Vai lá, minha amiga. A gente esta
precisando marcar um dia pra gente
sair e botar o papo em dia. O clube da
“luluzinha”.
FERNANDA: - Ótima ideia. Convidamos a Sílvia pra
ir conosco. Ela também esta
precisando. Aliás, todas nós. Cada uma
com seu drama pessoal.
LUCIA: - É a vida, né Fernanda. Aliás, o que
seria da vida sem problemas. Uma
chatice.
FERNANDA: - É verdade. Beijo.
Corta.
CENA 11. RUAS CARIOCAS. DIA.
Mauro dirige o seu carro, Luiza esta a seu lado. Os dois
em silêncio. Luiza séria olha fixamente para frente.
Mauro hora outra desvia o olha da direção e olha a
menina, talvez as pernas (frisar).
MAURO: - Você não deu uma palavra desde
que saímos da academia. Que tal
começar agora dizendo quem era
aquele maluco que estava atrás de
você. Seu namorado?
LUIZA: - Não vem ao caso agora.
MAURO: - Ta bom, como você quiser.
Então, onde vamos tomar o nosso
suco?
LUIZA: - Não sei. Surpreenda-me!
MAURO: - Olha, to começando a gostar
dessa nossa conversa. Então eu
sugiro trocar o nosso suco por um
drink que só eu sei fazer. Vamos
no meu apart, lá nós podemos
ficar mais a vontade.
LUIZA: - Ce ta pensando que eu sou o
que, hein cara?
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MAURO: - Eu não to pensando nada. Eu
tenho certeza que você é uma
garota muito da gostosa.
LUIZA: - Chega. Para esse carro.
MAURO: - Calma garota. Ta abortado o
drink no meu apart. Vamos pra
onde você quiser. Escolhe ai o
lugar.
LUIZA: - Você não ouviu? (grita) Para
esse carro.
Luiza puxa o volante e faz com que O carro quase bata
num outro que vem ao lado, Mauro freia bruscamente,
canta pneus, mas consegue contornar a situação sem
bater.
MAURO: - (irritado) Você ficou louca?
LUIZA: - Eu mandei você parar o carro.
MAURO: - Sua idiota, você não esta em
condição de mandar em porra
nenhuma. Se eu bato o meu carro/
(para, pensa) Se alguma coisa
acontece, um risco sequer na
lataria, eu acabo com você.
Mauro ainda dirige o carro, sugiro algo no entorno do
Bairro da Glória, uma via onde tem fluxo intenso de
carros e quase nenhum movimento de pedestres. Mauro
encosta no acostamento.
MAURO: - (ordena, forte) Desce!
LUIZA: - Você vai me deixar aqui/ Você
não pode fazer isso/
MAURO: - Você não escutou? Eu mandei
descer! Agora!
Mauro abre a porta do lado do carona e praticamente
empurra Luiza do carro. (deixando claro, esta cena não
será uma agressão física). Luiza já fora do carro bate a
porta com toda força.
MAURO: - Maluca!
LUIZA: - Idiota!
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
19
A cam focaliza Luiza, andando, ainda com roupas de
ginásticas por aquele local, um tanto desnorteada, sem
saber para onde ir. Nesse momento passa um táxi, ela faz
sinal, mas ele não para. Já cortou.
CENA 12. AMSTERDÃ. EXTERIOR. DIA
Long shot de Amsterdã. Rua movimentada. Vemos Álvaro
guiando uma bicicleta e Andréa em sua garupa. Os dois
passam pelas pessoas, num dia ensolarado em Amsterdã.
Parecem se divertir muito. Andréa ri a todo o momento.
Trilha sonora “Cuide Bem do Seu Amor – Paralamas”.
Corte. Fede in.
A cena retorna com os dois, bicicleta já estacionada.
Diálogo iniciado. Mantém trilha sonora de fundo.
ÁLVARO: - Você sabe há quanto tempo eu não
ando de bicicleta? Mais de anos! Nem
sabia se ainda lembrava como fazia.
ANDRÉA: - (ri) Mas tem duas coisas na vida que
a gente aprende e nunca mais esquece.
Andar de bicicleta é uma delas.
ÁLVARO: - E eu posso saber qual é a outra?
ANDRÉA: - Claro, beijar na boca.
Andréa dá um beijo apaixonado em Álvaro.
ANDRÉA: - Se eu te confessar uma coisa, você
promete que não vai rir de mim?
Álvaro faz sinal que sim beijando os dedos indicadores
em forma de “X’.
ANDRÉA: - Até hoje eu não sei andar de
bicicleta.
ALVARO: - Não acredito. Sério? (segura o riso)
ANDRÉA: - Você prometeu que não ia rir. É
sério sim. Nunca gostei. Achava que
era brincadeira de menino. Eu gostava
da minha coleção de bonecas, eu tinha
um jogo de maquiagem...
ALVARO: - Patricinha desde cedo. (pausa) Mas
eu vou resolver isso agora. Beijar,
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
20
você já sabe muito bem, mas agora vai
aprender a andar de bicicleta.
ANDRÉA: - Não Álvaro, vão rir de mim. Se eu
cair?
ALVARO: - Você não vai cair. Eu to te
segurando. E depois nós vamos andar de
pedalinho e passear no Parque das
Tulipas.
Já cortou. Fede in. Aumenta trilha sonora.
A cena reinicia com Andréa em cima da bicicleta, e
Álvaro ao seu lado, segurando. Clipe com esse momento
até o final da musica.
CENA 13. LINDA’S COIFEUR. INTERIOR. DIA.
Salão não muito movimentado. Jurandir no balcão com
Clarice a seu lado. Leinha passa em primeiro plano. Os
dois logo comentam.
JURANDIR: - E essa amapô? O que deu nela? Parece
outra pessoa.
CLARICE: - Pois é. Desde que a Linda pagou
aquela geral pra ela, a Leinha ficou
na moral.
JURANDIR: - Então tu sabe o que a patroinha
falou pra vacilona da Leinha?
CLARICE: - Sei de nada, Jura. Me deixa fora de
confusão. Já basta os meus problemas,
eu quero lá saber de Leinha.
JURANDIR: - Tu ta me escondendo alguma coisa
dona Clarice.
Linda esta atrás dos dois. Eles ainda não perceberam.
LINDA: - E esse papo de matar carambola, aqui
no meu salão?!
JURANDIR: - (surpreso) Patroinha.
LINDA: - Seu Jura, “vambora arrumá” aquele
estoque, que aquilo lá tá um “mafuá”.
JURA: - Mas Linda, eu organizei o estoque
semana passada, coloquei os xampus até
em ordem alfabética.
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
21
LINDA: - Mas eu to mandando tu ir agora,
DINOVO!
JURA: - (entende) Ta bom, to indo viu
patroinha. O que a patroinha não pede
chorando, que eu faço sorrindo.
Jurandir sai de cena.
LINDA: - Aff, que cabra puxa-saco. (pausa) E
tu mulé, que cara é essa?
CLARICE: - O Carlos, Linda.
LINDA: - Ah meu Deus, tu e esse “quiprocó”.
Que/que foi dessa vez?
CLARICE: - Ele confessou, disse com todas as
letras que ainda é apaixonado por essa
tal de Fernanda.
LINDA: - Então mulé, e tu ta esperando o que
pra largar esse cabra “di” mão e “si
chamegá” com outro par de calças.
CLARICE: - Eu não vou desistir do Carlos assim
tão fácil.
LINDA: - Assim tão fácil? Pelo que tu conta o
cabra só falta cuspir nas tuas fuças e
agora diz que ta enrabichado com outra
rapariga e tu ainda vai correr atrás
dele? Tu gosta de sofrer mesmo.
CLARICE: - Eu amo o Carlos, Linda. E eu sei que
ele me ama também.
LINDA: - Tu ta ficando “lélé” das ideias?
Oxi, que amor é esse?
CLARICE: - Ele não quer admitir. Mas no fundo,
no fundo, ele sabe que eu sou a “mulé”
da vida dele.
LINDA: - Oxi. Tu que sabe. Agora se assunte e
vá trabalhar.
Já cortou.
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
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CENA 14. OFICINA CARLOS. INTERIOR. DIA
Carlos, debaixo de um carro, consertando. Machuca-se.
CARLOS: - (consigo mesmo) Merda.
Inicia trilha sonora “Não Faz isso comigo – Bruno e
Marrone”. Carlos fica sério, compenetrando.
FLASH BACK.
CENA 36. CAPÍTULO 8.
FERNANDA: - Eu estou confusa. Eu amo o meu
marido, mas eu não sei se te esqueci.
Eu quero colocar as coisas no lugar na
minha cabeça. Não dá pra continuar
desse jeito.
NALDO: - (off) Carlos, Carlos, Carlos.
Carlos percebe a presença de Naldo.
NALDO: - Ei “homi” de Deus, to aqui lhe
chamando e você com essa cara de
paspalho.
CARLOS: - (irrita-se) O que tu quer Reginaldo?
NALDO: - Oxi, tu terminou esse carro? A gente
ficou de entregar ele hoje à tarde. Tu
sabe o que dono é aquele almofadinha
todo cheio de “gueri gueri”.
CARLOS: - Num to com cabeça.
NALDO: - E onde é que ta tua cabeça, “homi”?
Já tem um tempo que tu assim aluado
feito um bocó.
Já cortou. FADE IN.
A cena inicia com Carlos e Naldo no escritório da
oficina. Vemos pôsteres de mulheres peladas colados na
parede. Os dois tomam café num copo de requeijão.
Diálogo já iniciado.
NALDO: - Então ela voltou?
CARLOS: - Na verdade ela nunca foi embora. Ela
sempre esteve aqui (aponta para sua
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
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cabeça) Eu que sou um cabeça dura e
não tava querendo admitir.
NALDO: - Mas que história sem pé nem cabeça,
cabra. Se essa tal Fernanda ai ta
casada, e bem casada, tu acha que ela
vai ficar contigo?
CARLOS: - Eu tenho certeza Naldo. Ela gosta de
mim.
NALDO: - Então porque vocês não ficaram
juntos lá no passado?
CARLOS: - Porque eu fui um idiota. Achei que
ela tinha me traído. Entreguei ela de
bandeja. Mas eu quero recuperar esse
tempo perdido.
NALDO: - Olhe Carlos, eu fiquei aqui meio
pensativo, eu comigo mesmo. Se tu tem
tanta certeza que essa “mulé” vai
“butá” tudo pro alto pra ficar
contigo, o que tu ta esperando pra ir
atrás dela? (pausa) Oxi, “homi” é tudo
idiota mesmo e eu me incluo nisso.
Fica maluco por um rabo de saia. Eu
não consigo viver sem a minha
pretinha. E eu to vendo que tu anda
perturbado das ideias. Vai atrás
dessa rapariga antes que tu comece a
dar prejuízo monetário aqui na nossa
sociedade.
CARLOS: - Você ta certo. Eu já perdi tempo
demais. Vinte anos. Eu vou mesmo.
NALDO: - Vá, mas antes tome um banho e troque
de roupa. Não tem amor que resista a
um cabra sujo de graxa e cheirando a
bode velho.
Os dois riem. Já cortou.
CENA 15. AMSTERDÃ.
Estamos próximo ao local onde são alugados os
pedalinhos. Álvaro e Andréa chegam.
ÁLVARO: - Você me espera? Eu vou alugar um
pedalinho e já volto.
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
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Vemos em segundo plano, Julio e Carla. Os dois parecem
discutir. Álvaro vai até o local de atendimento e fala
com o responsável pelos pedalinhos.
ÁLVARO: - Hello, please, I would like to rent
a pedal boat.
HOMEM: - Excuse me. We have paddle boats
available for rent at this time.
ÁLVARO: - Really? I am Brazilian and I am on
my honeymoon. My wife and I'd love to
make this ride.
HOMEM: - Congratulations. Brazilian? I love
that place. The latter has been
rented.
O homem aponta para Júlio e Carla.
HOMEM: - The pedal that they have rented
space for four people. Do not know if
the alternative is more romantic, but
I think they will not go very far. You
can follow the ride without them.
ÁLVARO: - Thank you, sir. I'll try to talk to
them. Goodbye.
Álvaro se aproxima de Andréa.
ÁLVARO: - O último pedalinho foi alugado. Mas
ele me disse quem alugou. Foi aquele
casal ali. Eu vou tentar falar com
eles. Quem sabe eles não topam
dividir.
ANDRÉA: - Dividir pedalinho na lua de mel,
Álvaro? Vai que o casal também esta em
lua de mel.
ÁLVARO: - Bom, segundo o senhorzinho que
aluga, parece que eles não vão longe.
A gente vai com eles, depois seguimos
o nosso caminho.
ANDRÉA: - Vamos deixar esse passeio pra outro
dia, eu nem estava com vontade de
andar de pedalinho. E além do mais,
temos ainda mais alguns dias aqui em
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
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Amsterdã. A gente faz esse passeio
desses depois. Vamos Álvaro.
ÁLVARO: - Não custa nada tentar.
ANDRÉA: - Mas pela cara deles, eles não estão
nada amistosos.
Álvaro e Andréa se aproximam de Júlio e Carla que estão
se preparando para embarcar no pedalinho. Os dois estão
discutindo. Agora Julio e Carla em primeiro plano, ao
fundo Álvaro e Andréa.
CARLA: - (irritada) Eu não sei por que você
não me escuta. Eu falei pra irmos de
barco. Agora eu tenho que atravessar
esse canal pedalando. Vê se pode.
JULIO: - Você reclama de tudo.
CARLA: - De tudo não, só da sua teimosia, que
acaba virando burrice. Primeiro me faz
vir pra Amsterdã, esse lugar horroroso
que só tem gente drogada, e agora que
viver pra cima e pra baixo de
pedalinho. Qual é a próxima? Quando a
gente voltar pro Brasil você vai
querer andar de que? Bicicleta?
JULIO: - Primeiro. Você veio pra Amsterdã
comigo porque quis. Eu não forcei
ninguém a nada. Segundo, Amsterdã é
lindo, é uma cidade cultural, não tem
só drogado como você diz. E outra, não
vejo problema no pedalinho, acho
charmoso. E quanto a andar de
bicicleta no Brasil, você me deu uma
ótima ideia. Ecologicamente correta.
CARLA: - Acho que você fala essas coisas pra
me irritar. E quando a gente volta pro
Brasil? Você disse um mês e já estamos
aqui há quase um ano.
JULIO: - Trabalho Carla, eu não to aqui
brincando. Eu to trabalhando. Você
sabe o que é isso?
CARLA: - Fotografia é trabalho, Júlio?
JULIO: - Pra mim é!
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
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CARLA: - Pois pra mim não é. Trabalho pra mim
dá dinheiro, não essa mereça que você
ganha que mal dá pra gente viver/
Álvaro e Andréa se aproximam e Carla para de falar e
olha para os dois, não faz questão em ser simpática.
Álvaro e Andréa sorriem, não ouviram o diálogo do casal.
Julio retribui o sorriso.
ÁLVARO: - Hello Can I speak with you for a
minute?
JULIO: - Yes you can.
ÁLVARO: - My wife and I are on honeymoon and
would love to tour with a paddle, but
I think that you rented the last.
JULIO: - This was the last? But how can I
help you?
ÁLVARO: - If it was not very uncomfortable, we
would like to divide the pedal. I pay
the rent.
Julio olha para Carla que não se mostra simpática todo o
momento, deixando Álvaro e Andréa desconcertados.
JULIO: - For me, no problems. I will consult
my wife. You know how women are.
ALVARO: - Ok.
Julio se afasta de Álvaro e Andréa para falar com Carla.
CARLA: - Agora você vai alugar pedalinho?
Podíamos ter pegado um maior e
fazíamos uma lotação. Vamos favelizar
Amsterdã.
JULIO: - Larga de ser do contra, Carla. Eles
estão em lua de mel. Além do mais, nem
vamos pra tão longe. Quando chegarmos
no nosso destino, eles ficam com o
pedalinho. Eles só querem um passeio.
CARLA: - Passeio? E se for esse povo
moderninho e drogado daqui? Ainda bem
que a minha filha não veio pra ter
essa má influencia.
Num canto mais afastado, em segundo plano.
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ANDRÉA: - Eu acho que ela não gostou nada da
ideia. Viu a cara dela, que mulher
nojenta.
ÁLVARO: - Ele me pareceu muito solicito, mas
ela...
Julio e Carla se aproximam,
JULIO: - Man, I'm sorry.
ÁLVARO: - Ok no problems. I do not want to
cause problems with his wife
Julio se vira e fala baixo com Carla. Andréa faz o mesmo
com Álvaro.
JULIO: - Carla, qual o problema?
ANDRÉA: - Eu disse Álvaro, que eles não iam
topar a ideia.
Julio escuta Andréa.
JULIO: - Do you speak Portuguese?
ÁLVARO: - We are Brazilians.
JULIO: - Really? Me too. (ri) Quer dizer, nós
também.
ALVARO: - Brasileiros? Que ótimo. Não vão me
dizer que também em lua de mel?
JULIO: - Pra falar a verdade nós nem tivemos
isso.
CARLA: - (repreende) Julio!
JULIO: - É verdade. Pra que mentir pros
nossos mais novos amigos brasileiros.
ÁLVARO: - (estende a mão) Prazer, Álvaro. Essa
é minha esposa Andréa.
JULIO: - (retribui o comprimento) Júlio. E
esta é a Carla.
ANDRÉA: - Tudo bom?
Carla cumprimenta Andréa. Close alternado de Álvaro,
Julio, Andréa e Carla. Todos muito simpáticos e
sorrindo, com exceção de Carla. Fecha no aperto de mão
de Carla e Andréa. Já cortou para a próxima cena.
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
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CENA 16. ATELIÊ. INTEIOR. DIA.
Fernanda sentada em sua mesa, em meio alguns papéis. Ora
outra ela digita algo no computador. Silvia também esta
em cena, digitando algo. Isabel já entrou carregando
alguns papéis.
ISABEL: - Acabou de chegar um email da Martins
Brandão com o novo cronograma daquela
obra da Barra.
FERNANDA: - Que bom. Isabel confirma com eles a
minha reunião com o Dr. Afonso.
ISABEL: - Ta confirmada. Eu vi hoje pela
manhã.
FERNANDA: - O que seria desse Ateliê sem você,
hein Isabel?
ISABEL: - Que isso.
SILVIA: - (empolga-se) Gente tem uma nota
sobre a exposição na coluna do Ancelmo
Góis.
FERNANDA: - Eu nem li o jornal ainda.
ISABEL: - Sério, Silvia? Que chique.
SILVIA: - Que responsabilidade.
ISABEL: - É tão bom ver vocês duas de volta ao
Ateliê, com força total, de bateria
recarregada.
FERNANDA: - Não podemos nos deixar abater pelos
problemas da vida.
SILVIA: - É como diz aquele ditado: Ter
problemas na vida é inevitável, agora
ser derrubados por eles é opcional.
ISABEL: - Olha falou bonito.
Sobre trilha sonora. “Belo Estranho Dia de Amanhã –
Roberta Sá”. As três continuam conversando e rindo.
Já cortou.
CENA 17. AMSTERDÃ. EXTERIOR. DIA.
Andréa, Álvaro, Carla e Júlio já no pedalinho. Os
quatros conversam empolgados. Diálogo já iniciado.
Trilha sonora “Bom Dia Rio – Bossa CucaNova”.
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JULIO: - Quando a gente passa tanto tempo
fora do Brasil, a gente fica meio que
órfão da nossa pátria. Órfão de
brasilidade, sabe? Tava com medo de
desaprender a falar português.
ÁLVARO: - Eu não me imagino morando fora do
Brasil.
ANDRÉA: - E aqui em Amsterdã, Deus me livre.
CARLA: - Até que enfim alguém sensato. Já
gostei de você Andréa.
ÁLVARO: - Quem escuta, parece que você não
esta gostando da nossa lua de mel.
ANDRÉA: - Não é isso, meu amor. Amsterdã é
linda e olha que nem conhecemos metade
da cidade. Mas é um lugar pra se tirar
férias, vir “an passant” como dizem os
franceses, aproveitar tudo de bom que
a cidade tem e voltar pro Brasil.
CARLA: - Esta ouvindo isso Julio? (a Andréa)
Essa era a nossa discussão um pouco
antes de vocês chegarem. Eu estou
louca para voltar ao Brasil. Ainda
mais que a minha filha voltou agora a
pouco, pra passar uns dias com o pai.
To morrendo de saudades.
ANDRÉA: - Você tem uma filha?
CARLA: - Tenho sim. Seis anos. Espera, eu
tenho uma foto dela aqui na carteira.
Carla pega em sua bolsa uma foto e mostra para Andréa e
Álvaro. Na foto estão Júlio, Carla e Estelinha
(produzir).
ANDRÉA: - Nossa, ela é linda Carla, uma graça.
Parece uma boneca.
JULIO: - A Estelinha é linda e um amor de
menina. Vocês precisam conhecer.
ÁLVARO: - Linda mesmo.
ANDRÉA: - Eu não vejo a hora de estar com o
nosso no colo, né meu amor?
ÁLVARO: - Tudo em seu tempo, Andréa.
ANDRÉA: - Eu quero voltar de lua de mel
grávida. São os nossos planos.
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
30
Álvaro não vai gosta quando Andréa disser “são os nossos
planos” Muda o semblante, mas algo sutil, ninguém em
cena percebe.
ANDRÉA: - Eu não sei como você conseguiu se
afastar dessa coisinha fofa.
CARLA: - Ela foi passar uns dias com o pai.
Andréa faz uma cara de surpresa. Clima chato. Carla
percebe.
CARLA: - A Estelinha não é filha do Júlio.
JÚLIO: - Mas é como se fosse. Filha do
coração.
ANDRÉA: - Eu vejo como seus olhos brilham
quando fala dela. Senti um carinho
todo especial.
CARLA: - Apesar de todos os contras da
maternidade, ser mãe é uma delícia.
JÚLIO: - Que contras Carla? Eu não consigo
ver nenhum!
CARLA: - Claro, porque não é você que carrega
uma barriga enorme durante nove meses,
não é você que vê seu corpo sendo
deformado, não é você que sente as
dores insuportáveis do parto.
ANDRÉA: - Eu ainda não tinha pensado nisso.
CARLA: - Pois pense, meu bem. Coloque numa
balança e veja os prós e contas.
ALVARO: - As damas agora vão confabular sobre
a maternidade. Mas você dizia que é
fotografo?
JULIO: - Sim, eu sempre trabalhei como
freela. Mas aceitei uma proposta para
uma exposição sobre a Holanda.
ALVARO: - Que interessante. Eu acho fotografia
fascinante.
JULIO: - É um vicio. Eu não sei o que eu
faria se não fosse fotografo. E você
Álvaro?
ÁLVARO: - Bom, eu tenho uma profissão mais
convencional, eu sou engenheiro. Mas
tem horas que eu gostaria de fugir
dessas amarras burocráticas, como
formalidade, rotina...
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
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CARLA: - Álvaro, pelo amor de Deus não
incentiva o Júlio. Porque era só o que
ele precisava de alguém pra bater
palma para as maluquices dele.
ÁLVARO: - Maluquice. Não vejo maluquice. Tai,
se eu não fosse engenheiro, eu
gostaria de ser fotografo.
JULIO: - Boa.
ANDRÉA: - Eu nem sei, por eu não sou nada. Eu
me formei em psicologia, mas nunca
cheguei a exercer. Acho que nem eu me
entendo de vez em quando.
CARLA: - Hoje em dia em sinto muito falta de
não ter seguido em frente. Eu fazia
medicina, mas acabei abandonando o
curso, dei prioridade a vida pessoal.
E agora eu estou aqui em Amsterdã,
dividindo um pedalinho com vocês, indo
acompanhar o meu marido num
compromisso profissional.
ANDRÉA: - Que coragem.
CARLA: - Coragem não. Necessidade.
Sobre trilha sonora. Continua diálogo.
CENA 18. ATELIÊ. INTERIOR. DIA
Fernanda e Silvia trabalham compenetradas, cada uma em
sua mesa.
SLVIA: - Ei Fernanda, não estamos esquecendo
nada?
FERNANDA: - Ai meu Deus, o que Silvia? Perdemos
algum prazo?
SILVIA: - (ri) Com esse ritmo, vamos entregar
todos os projetos com antecedência.
Nós nos esquecemos de almoçar, já viu
que horas são?!
FERNANDA: - Nossa, nem reparei.
SILVIA: - Eu também não. Mas meu estômago me
avisou e começou a reclamar.
FERNANDA: - Vamos comer alguma coisa por aqui
mesmo. Eu quero deixar tudo
encaminhado, tenho umas pendências
nesses dias que eu fiquei fora e ainda
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
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tem a ida pra Petrópolis na semana que
vem, aniversário da dona Diva.
SILVIA: - Eu to contando os dias. Por mim nós
dávamos férias e passava uma temporada
na chácara.
FERNANDA: - Com a sua exposição ai nas cabeças.
Nem pensar. Depois da exposição a
gente tira férias coletivas. Afinal
estamos precisando.
Isabel bate na porta. Já entrou.
ISABEL: - Meninas, temos visita.
Diva já entrou em cena.
DIVA: - Se Maomé não vai à montanha, a
montanha vem a Maomé.
FERNANDA: - (surpresa) Mamãe!
SILVIA: - Dona Diva que surpresa maravilhosa.
DIVA: - Nem tão maravilhosa assim, eu vim
puxar a orelha vocês, incluindo aquele
irresponsável do meu neto. Cadê o
Marcelo?
Já cortou.
CENA 19. BAR. INTERIOR. DIA
Marcelo sentado num bar, sugiro algo na Lapa, rua do
Lavradio(ou a critério do diretor). Nesse horário o bar
esta vazio, sem muitos clientes, dois ou três, no
máximo. Marcelo esta com o semblante melancólico. Seu
copo esta cheio, sob sua mesa uma garrafa de whisky.
Numa talagada só ele bebe todo o conteúdo de seu copo.
Tempo. Pegou o celular e discou.
CORTE CONTINUIDADE.
CENA 20. CASA RAFAELA. INTERIOR. DIA
Sala vazia. A porta se abre, Rafaela entra em cena com
várias bolsas de compras.
RAFAELA: - (grita) Gladis.
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Em segundo plano vemos Eduardo descendo as escadas e
Gladis correndo para atender Rafaela.
GLADIS: - Me chamou dona Rafaela?
RAFAELA: - Não querida, eu costumo falar o seu
nome em voz alta pra não esquecer.
(irrita-se) Claro que eu chamei
estafermo. Estou exausta. Pra você que
deve pensar que eu tenho uma vida boa,
muito pelo contrário. Encarei uma
tarde inteira no shopping fazendo
compras e com o calor um insuportável
que está fazendo nessa cidadezinha. Só
o trajeto de sair do carro e entrar em
casa, já estou suando bicas. Me trás
um suco bem gelado, ou melhor, um suco
não, me trás uma taça de champagne.
Mas antes leva essas bolsas.
GLADIS: - Levo pro seu quarto dona Rafaela?
RAFAELA: - (irônica) Não, leva pro seu. Esses
são seus presentinhos de Natal
adiantado. Viu como eu sou uma ótima
patroa. (irrita-se) Claro que é pro
meu quarto. O que aconteceu Gládis?
Você perdeu o seu último neurônio
sobrevivente ai nesse vale dos
desesperados que é essa sua cabecinha
oca? Vai desaparece da minha frente.
Eduardo esta em segundo plano ouvindo a tudo. Gladis sai
com as bolsas.
RAFAELA: - O que foi? Vai me recriminar por
maltratar a criadagem?
EDUARDO: - Eu se fosse a Gladis já teria te
processado por assédio moral.
RAFAELA: - Mas não é, né meu bem. Então/
EDUARDO: - (interrompe) Então você aproveita o
seus últimos dias com essa mordomia
toda. Porque isso vai acabar. Isso
tudo vai mudar. Eu não engoli aquela
historinha pra boi dormir que você
contou pro meu pai. Eu sei que tem
algo de muito sujo nessa história
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
34
toda. Eu vou descobrir e acabar com o
seu reinado.
RAFAELA: - Esta para nascer alguém que acabe
com o meu reinado.
O celular de Eduardo toca. Ele atende. Rafaela em
segundo plano ouve a tudo.
EDU: - (cel) Oi Marcelo.
Alternância de cenários.
MARCELO: - (cel) Oi Edu. Você ta podendo falar?
EDU: - (cel) To sim irmão. Aconteceu alguma
coisa?
MARCELO: - (cel) Aconteceu sim cara. To
precisando conversar. To na maior
fossa. Você ta de bobeira?
EDU: - (cel) To sim. Onde você ta?
MARCELO: - (cel) Eu to aqui na lapa.
EDU: - (cel) Eu to indo pra ai, pra gente
bater um papo. Fica tranquilo irmão,
to chegando.
Já desligou.
EDU: - E você fica de olho aberto. Porque
eu to de olho em você.
Eduardo dá as costas e sai de cena.
RAFAELA: - Ai, ai Edu. Mal sabe, que quem esta
correndo risco é você.
Rapidamente a cam focaliza Gladis, em segundo plano, que
faz cara de espanto ao ouvir Rafaela. Já cortou.
CENA 21. ATELIE. INTERIOR. DIA
Fernanda, Diva, Silvia e Isabel conversam.
DIVA: - Esse menino esta merecendo umas boas
palmadas.
SILVIA: - Ai minha sogra. Mas a senhora é a
maior responsável por boa parte das
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
35
mal criações do Marcelo. Não se
esqueça, foi o primeiro neto, tinha
todas as vontades prontamente
atendidas.
DIVA: - Mas vó é pra estragar mesmo. E agora
pra puxar a orelha.
FERNANDA: - Mas a senhora não me disse a que
devemos o prazer dessa visita ilustre?
DIVA: - Dona Sheila. Ela inventou de comprar
umas coisas aqui no Rio. Aproveitei e
vim visitar esses ingratos que
esquecem essa pobre velha naquela
chácara.
FERNANDA: - Como minha mãe é dramática.
Estávamos juntas ontem mesmo.
DIVA: - Você. Mas tem os outros ingratos. O
Heitor e o Julio, esses filhos que
esquecem que tem mãe. Minha norinha
predileta, a Silvia. E meus netinhos,
esses ai nem conta. Daqui a pouco, se
passar por eles na rua, nem reconheço
mais.
SILVIA: - Então vamos aproveitar pra almoçar
todas juntas. A senhora come conosco,
não é Dona Diva?
DIVA: - Minha filha, veja lá se isso é hora
de uma senhora idosa almoçar? Eu já
comi. Tenho horário. Mas eu faço
companhia. (para, pensa,repreende) Mas
vocês não almoçaram agora? Que
absurdo.
FERNANDA: - Trabalho mamãe.
DIVA: - Saúde em primeiro lugar, minha
filha.
SILVIA: - Deixa-me ir, se não/não comemos
hoje. Pra você é aquela saladinha de
sempre Fernanda?
FERNANDA: - Por favor, Silvia.
DIVA: - E ainda vai comer salada?
FERNANDA: - Silvia vai antes que minha mãe me
coloque de castigo.
Já cortou.
UM LUGAR AO SOL CAPÍTULO 11 PÁG.:
36
CENA 22. AP LUCIA. INTERIOR. DIA.
Ritinha com duas ou três amigas no computador. Gilsinho
sentado assistindo televisão.
RITA: - Vocês tem que ver esse clip novo.
Maneirismo.
Rita aumenta o som do computador. Gilson entra em casa e
bate a porta agressivamente. Gilsinho vê o pai e faz
festa, vai correndo e pula em seu colo. Gilson não gosta
da cena.
GILSON: - Que isso? Abaixa essa porra.
RITA: - Oi pai. Já abaixo. Só to mostrando o
clipe novo pras meninas.
GILSON: - (irrita) Eu disse agora.
RITA: - Mas pai...
GILSON: - Mas nada. E vocês, não tem casa não?
RITA: - (envergonhada) Pai.
GILSON: - “Bora”, quero essas garotas fora. Eu
quero descansar, quero sossego na
minha casa.
RITA: - Desculpa meninas.
As meninas saem. Rita fica envergonhadíssima.
GILSINHO: - Pai. Eu vi um jogo um novo na TV,
você compra pra mim?
Gilson irritado.
GILSON: - Moleque eu não vou comprar porra
nenhuma, agora não me enche.
Lucia entra em cena, veio da cozinha, de avental.
LUCIA: - Que maneira é essa de falar, Gilson?
RITA: - Ele chegou azedo do trabalho hoje.
GILSON: - (irritado) E você, cala a sua boca
garota, antes que sobre pra você.
LUCIA: - Gilson, que isso? Não estou te
reconhecendo.
GILSON: - Vocês não me dão uma trégua. Cheio
de problema no trabalho e vocês
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enchendo o meu saco. Eu chego em casa
querendo ter um sossego.
LUCIA: - Ritinha faz um favor pra mim. Leva o
seu irmão pra tomar um sorvete La em
baixo. Eu vou conversar com o seu pai.
RITA: - Pode deixar. Qualquer coisa é melhor
do que ficar nessa casa com esse
grosso.
GILSON: - Veja lá como sua fala sua atrevida.
Você esta merecendo uma pisa.
LUCIA: - (forte) Vai Rita.
Rita olha com ódio para o pai e sai.
GILSON: - Você quer me desautorizar na frente
dos meus filhos, ficou louca?
LUCIA: - Você viu como você tratou os filhos,
ficou louco?
GILSON: - Fiquei louco sim, mas é louco que
sustenta essa família, é o louco que
bota dinheiro nessa casa, portanto,
sou eu que mando nessa porra
Lúcia olha indignada para Gilson. Closes alternados.
CORTE CONTINUIDADE.
CENA 23. BAR. INTERIOR. DIA.
CONTINUAÇÃO CENA 19.
Eduardo chega ao bar. Olha para os lados, logo vê
Marcelo debruçado sobre a mesa, completamente bêbado.
EDUARDO: - Marcelo o que você fez?
Um garçom se aproxima.
GARÇOM: - Você é amigo dele?
EDUARDO: - Sou sim, aconteceu alguma coisa?
GARÇOM: - Eu já ia chamar a polícia, ele bebeu
e não tem dinheiro pra pagar a conta.
Só esperamos porque ele disse que um
amigo estava vindo.
EDUARDO: - Tudo bem, quando eu lhe devo?
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Já cortou. FADE IN.
CENA 24. RUAS CARIOCAS. EXTERIOR. DIA.
Eduardo carrega Marcelo, que mal consegue parar de pé.
EDUARDO: - Vamos cara, eu vou te levar pra
casa. Você não ta em condições de sair
assim.
Já cortou.
CONTINUAÇÃO CENA 22.
Ponto onde paramos. Lucia continua olhando para Gilson.
LUCIA: - Eu não estou escutando isso. Eu vou
fingir que não estou escutando essas
grosserias. Eu não trabalho porque
você sempre foi contra. Me proibiu.
Como é mesmo que você fala? (muda voz,
ironiza) Mulher minha tem que ficar em
casa. (irrita-se) Então não me venha
agora jogar na cara as coisas que você
faz pela nossa família, você é o
homem, você é provedor. Não faz mais
que a sua obrigação. (pausa, respira,
humaniza-se) Eu sei que você anda com
problemas, mas não vem descontar em
cima da gente. Ou melhor, não desconta
em cima da Ritinha, nem do Gilsinho
que não tem nada a ver com essa
história. Desconta só em mim. Eu sou
adulta, eu vou entender. Eles não.
Eles são crianças. E pra passar a
odiar o pai, é um pulo.
Gilson entristece. Já cortou.
CENA 25. CASA RAFAELA. INTERIOR. DIA.
A cena abre com um close na mão de Rafaela entregando um
drink para Afonso.
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AFONSO: - O que aconteceu? Minha mulherzinha
carinhosa comigo, fazendo um drink pra
eu relaxar depois do trabalho. Como é
aquele ditado, quando a esmola é
demais, o santo desconfia.
RAFAELA: - Francamente Afonso, não me venha com
esses seus datados populares de quinta
categoria. O que é? Não posso fazer um
agrado pro meu maridinho?
Rafaela afrouxa a gravata de Afonso, é carinhosa,
sensual.
AFONSO: - Claro que pode, não estou
reclamando. Muito pelo contrário, eu
estou adorando a sua mudança assim tão
repentina.
RAFAELA: - Não é mudança, é só você fazer por
merecer. Observar mais ao redor. Por
falar em observar, já parou pra
observar melhor o filho?
AFONSO: - Ah, logo vi. Você com essa cisma com
o pobre coitado do Edu. Ele é careta
Rafaela. Eu ponho a minha mão no fogo
pelo garoto. Duvido que ele esteja
envolvido com drogas.
Antes que Afonso termine de falar, Eduardo entra em
cena, acompanhado por Marcelo que mau consegue parar de
pé, ele tromba em algum móvel e derruba alguma coisa.
Afonso levanta-se e vê a cena. Closes alternados de
Afonso, Eduardo e Rafaela. Clima tenso. Rafaela pelas
costas de Afonso tentar esconder um sorriso irônico.
Corte Continuidade.
CENA 26. ATELIE FERNANDA. INTERIOR. DIA.
Fernanda e Diva conversam.
DIVA: - E o Bruno, meu bem?
FERNANDA: - Estamos bem.
DIVA: - E quando você vai contar toda a
verdade?
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FERNANDA: - Mãe, o Bruno sabe que não é o pai da
Luiza.
DIVA: - Ele sim, mas ela não. Aliás, nem o
verdadeiro pai da menina sabe. Eles
têm o direito.
FERNANDA: - Mãe, eu não posso abrir o jogo
agora. Eu prometi ao Bruno.
DIVA: - O que você não pode fazer é
manipular a vida das pessoas assim
porque o Bruno quer.
FERNANDA: - Não é porque o Bruno quer. É o mais
correto a ser fazer. A Luiza adora o
Bruno, além do mais, eu não posso
jogar essa verdade na cabeça do
Carlos. Será que ele quer uma filha,
vinte anos depois do que a gente
viveu?
DIVA: - A questão não é querer. Ele tem e
ponto.
Nesse momento ouve-se um barulho vindo da recepção. A
porta se abre, revela Carlos. Isabel entra logo em
seguida.
FERNANDA: - (surpresa) Carlos!
ISABEL: - Desculpa Fernanda, ele entrou sem
ser anunciado. Eu tentei conte-lo.
CARLOS: - Desculpa o mau jeito Fernanda, mas
eu preciso falar com você.
Clima tenso. Close alternado de Carlos, Fernanda e Diva.
Já cortou.
FIM DO CAPÍTULO