ulbra-to.br · Web viewHá previsão de regra especial, no art. 20 da Lei Maria da Penha (Lei n ....
Transcript of ulbra-to.br · Web viewHá previsão de regra especial, no art. 20 da Lei Maria da Penha (Lei n ....
CLAUDIA FITTIPALDI ANDRADE DE SOUZA
A INDETERMINAÇÃO DO PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA COM ENFOQUE
NO PROJETO DE LEI N.º 7.741, DE 2017
Palmas -TO
2019
CLAUDIA FITTIPALDI ANDRADE DE SOUZA
A INDETERMINAÇÃO DO PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA COM ENFOQUE
NO PROJETO DE LEI N.º 7.741, DE 2017
Trabalho de Curso em Direito apresentado
como requisito parcial da disciplina de
Trabalho de Curso em Direito II (TCD II) do
Curso de Direito do Centro Universitário
Luterano de Palmas – CEULP/ULBRA.
Orientador(a): Prof: Carlos Victor Almeida
Cardoso Júnior
Palmas-TO
2019
CLAUDIA FITTIPALDI ANDRADE DE SOUZA
A INDETERMINAÇÃO DO PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA COM ENFOQUE
NO PROJETO DE LEI N.º 7.741, DE 2017
Trabalho de Curso em Direito apresentado
como requisito parcial da disciplina de
Trabalho de Curso em Direito II (TCD II) do
Curso de Direito do Centro Universitário
Luterano de Palmas – CEULP/ULBRA.
Orientador(a): Prof. Carlos Victor Cardoso
Almeida Júnior
Aprovado (a) em : ______/______/______
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________
Prof. Orientador Carlos Victor Cardoso Almeida Júnior
Centro Universitário Luterano de Palmas
__________________________________________________
Prof. Me. Thiago Perez Rodrigues da Silva
Centro Universitário Luterano de Palmas
__________________________________________________
Prof. Dr. Vinicius Pinheiro Marques
Centro Universitário Luterano de Palmas
Palmas-TO
2019
Dedico este trabalho aos meus pais, pelo amor
incondicional, pela paciência nos momentos
difíceis e pela força em todos os momentos.
Agradeço ao meu Orientador Professor Carlos
Victor, pela colaboração, dedicação e por todo
o conhecimento repassado, que possibilitou a
realização desse trabalho.
“Quando alguém compreende que é contrário à
sua dignidade de homem obedecer a leis
injustas, nenhuma tirania pode escraviza-lo”.
Mahatma Gandhi
RESUMO
Através de pesquisa teórica fundamentada em levantamento teórico conceitual,
buscou-se o presente trabalho tratar da questão referente à indeterminação do prazo da prisão
preventiva e seus impactos sociais e jurídicos. Levou-se em consideração, para a elaboração da
presente pesquisa, aspectos abordados pelo Projeto de Lei 7.741, de 2017, tendo em vista a
atual situação em que se encontra o sistema penitenciário brasileiro e a necessidade de maior
rigor na inserção anterior a sentença condenatória do indivíduo nesse sistema. Constatou-se na
lei processual penal, a existência de lacunas, a qual tem permitido prisões arbitrárias e
inconstitucionais, que corrobora para a superlotação enfrentada pelo sistema carcerário.
Palavras-chave: Prisão Preventiva – Sistema Penitenciário – Superlotação
LISTA DE EXPRESSÕES LATINAS OU ESTRANGEIRAS
Periculum in mora – Perigo da demora
Referendum – Relatório
Non bis in idem – Não duas vezes
Nemo tenetur se detegere e Nemo tenetur seipsum accusare – Ninguém é obrigado a acusar-se
In dubio pro reo ou favor rei – Em caso de dúvida, beneficiar o réu
Periculum in libertatis – Perigo na liberdade
Per relationem – Em um relatório
Rebus suc stantius – Enquanto as coisas estiverem assim
Ultima ratio – A razão final
In malan partem – Em prejuízo
Habeas Corpus – Remédio constitucional que garante a liberdade ambulatorial
More of the same – Mais graves
Mark system – Sistema de marcar
Fumus boni iuris – Fumaça do bom direito
Fumus comissi delicti – indícios suficientes de autoria e materialidade
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 10
1 HISTÓRIA E PRINCÍPIOS DAS PRISÕES CAUTELARES........................................12
1.1 SISTEMA PROCESSUAL PENAL BRASILEIRO..........................................................12
1.1.1. Evolução Histórica Da Prisão Preventiva ................................................................. 14
1.2 GARANTIAS GERAIS DO PROCESSO PENAL............................................................18
1.1.2. Princípios do Processo Penal .......................................................................................21
2 PRISÕES CAUTELARES.................................................................................................23
2.1 PRINCÍPIOS REGENTES DAS PRISÕES CAUTELARES............................................23
2.2 ESPÉCIES DE PRISÕES...................................................................................................24
2.3 PRISÃO PREVENTIVA....................................................................................................27
2.3.1. Pressupostos da Prisão Preventiva..............................................................................29
2.3.2.Hipóteses, Fundamentação e Finalidade Legitimadoras da Prisão
Preventiva................................................................................................................................31
3 OS REFLEXOS JURÍDICOS, SOCIAIS E CARCERÁRIOS DA
INDETERMINAÇÃO DO PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA ..................................33
3.1 A BANALIZAÇÃO DO INSTITUTO DA PRISÃO PREVENTIVA...............................33
3.2 OS MALEFÍCIOS NAS VIDAS DOS ENCARCERADOS PREVENTIVAMENTE ....37
3.2.1 A Banalização da Prisão Preventiva e a Superlotação dos Estabelecimentos
Prisionais .................................................................................................................................39
3.3 ASPECTOS DO PROJETO DE LEI N.º 7.741, DE 2017..................................................41
CONCLUSÃO ........................................................................................................................43
REFERÊNCIAS..................................................................................................................... 45
9
INTRODUÇÃO
O trabalho tem como base teórica a alteração no Código de Processo Penal,
conforme dispõe o seu art. 311 o no Projeto de lei n° 7.741 de 2017, do Deputado Vinicius
Carvalho. A alteração do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941, em face da
necessidade de revisão constante, a fim de não deixar lacunas e se adequar as mudanças e
evoluções da sociedade.
O sistema legal de persecução criminal e de aplicação das penas vigente no Brasil
não vem cumprindo sua finalidade. Nem mesmo tem atingido o objetivo elementar de atuar
contra o estímulo ao crime. É possível perceber isto diante da banalização do instituto da
prisão preventiva, e a indeterminação de seu prazo. O uso desregulado e discricionário desse
instrumento tem acarretado diversos problemas sociais, jurídicos e carcerários, não só no
Sistema Criminal, mas principalmente na vida dos presidiários.
É notório que tem havido uma antecipação do cumprimento de sentença, mas não só
isso, muitas vezes a prisão preventiva torna-se mais gravosa e onerosa para o preso do que se
este recebesse uma condenação ao final do processo.
Segundo parte dos doutrinadores, esse problema tem como fundamento a falta de
taxatividade no texto dos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal, devido a essa omissão,
tem-se uma inconstitucionalidade substancial, tais como o desvio na finalidade de tal medida,
visto que só estaria autorizada se fosse para garantir o bom andamento do processo e para que
o réu esteja presenta quando houver de cumprir sua pena.
Porém, pela falta de taxatividade conceitual que o legislador deixou na lei, o Poder
Judiciário tem feito uso discricionário e arbitrário deste instituto. Excesso de prazo, falta de
adequação, péssimas condições no cárcere, dentre outros, são problemas enfrentados pelos
presos provisórios, que atualmente representam 40% da população carcerária. Contudo, não
tem-se observado o caráter excepcional e cautelar da prisão preventiva, havendo uma
banalização na sua utilização.
A superlotação do sistema penitenciário brasileiro e suas condições precárias são
problemas antigos no nosso ordenamento, de forma que o acusado que adentra a esse sistema
mesmo quando inocente, muitas vezes acaba por se tornar de fato um delinquente. Logo, a
aplicação da prisão preventiva deve ser caso de extrema necessidade, e a única forma de se
garantir a instrução criminal, o que não tem acontecido.
O projeto de lei n° 7.741 de 2017, elabora pelo Deputado Vinicius Carvalho, objetiva
a determinação de um prazo da prisão preventiva, com fim de garantir a provisoriedade dessa
10
medida, haja vista, ser uma modalidade de prisão cautelar, usando como critério a
proporcionalidade e adequação, sustentáculos desse instituto, de acordo com o a pena prevista
no tipo penal.
Além de que, o projeto prevê uma revisão obrigatória pelo magistrado, depois de
decorrido determinado prazo da decretação da prisão, o mesmo juiz deverá reavaliar se ainda
persistem os motivos que ensejaram sua aplicação. Dessa forma, o autor do presente projeto
pretende não só determinar um prazo para prisão preventiva, como também tornar mais
rigorosos os requisitos para decretação e manutenção da mesma.
Contudo, diante de uma reforma no art. 311, §2° do Código de Processo Penal,
pretende-se uma maior observância aos princípios da excepcionalidade, provisoriedade e
adequação, norteadores das medidas cautelares, e inclusive, o princípio constitucional da
presunção de inocência, ou seja, garantir que prisão cautelar mantenha a sua cautelaridade.
Portanto, no primeiro capítulo do trabalho buscou-se abordar de maneira sucinta a
evolução histórica das medidas cautelares. Já no segundo capítulo, foi abordado os conceitos
das prisões cautelares previstas no Código de Processo Penal, e as diferenças entre elas.
Ademais, no último capítulo restou demonstrado os impactos sociais, jurídicos e
carcerários, decorrente de fatores tais como a indeterminação do prazo da prisão preventiva,
corroborando para necessidade da alteração na lei processual penal proposta pelo Projeto de
Lei n°7.741 de 2017, ao qual proceder-se-á a análise.
11
1. HISTÓRIA E PRINCÍPIOS DAS PRISÕES CAUTELARES
1.1 SISTEMA PROCESSUAL PENAL BRASILEIRO
O sistema processual penal brasileiro adota o denominado sistema processual misto,
que consiste em uma mistura do sistema acusatório e inquisitório, baseado no sistema francês,
onde o a fase inquisitiva ocorre no inquérito policial, e a fase acusatória depois que se inicia a
Ação Penal. Ocorre que não foi sempre assim.
Segundo Guilherme de Souza Nucci: Surgido após a Revolução Francesa, uniu as virtudes dos dois anteriores, caracterizando-se pela divisão do processo em duas grandes fases: a instrução preliminar, com os elementos do sistema inquisitivo, e a fase de julgamento, com predominância do sistema acusatório. Num primeiro estágio, há procedimento secreto, escrito e sem contraditório, enquanto no segundo, presentes se fazem a oralidade, a publicidade, o contraditório, a concentração dos atos processuais, a intervenção dos juízes populares e a livre apreciação de provas. (NUCCI, 2014, p. 70)
A atual conjuntura em que se encontra o sistema processual penal brasileiro deriva de
uma série de mudanças que ocorreram durante séculos, em que paulatinamente foi-se
modificando o sistema jurisdicional no âmbito criminal.
O sistema acusatório predominou até finais o início do século XIX, a partir daí tal
sistema começou a ganhar força na história do direito processual penal.
O modelo acusatório, diferentemente do inquisitivo, adota um modelo de tripé, em
que se divide claramente a figura do juiz, acusação e defesa, de forma a garantir a
imparcialidade do magistrado. Como decorrência disso tem-se a iniciativa probatória como
dever das partes, e ônus de provar os fatos imputados ser do acusado, haja vista nesse sistema
prevalecer o princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade.
Assim aduz Aury Lopes Júnior: Quando o sistema aplicado mantém o juiz afastado da iniciativa probatória (da busca de ofício da prova), fortalece-se a estrutura dialética e, acima de tudo, assegura-se a imparcialidade do julgador. O estudo dos sistemas processuais penais na atualidade tem que ser visto com o “olhar da complexidade” e não mais com o “olhar da Idade Média”. Significa dizer que a configuração do “sistema processual” deve atentar para a garantia da “imparcialidade do julgador”, a eficácia do contraditório e das demais regras do devido processo penal, tudo isso a luz da Constituição. (LOPES, 2015, p. 41)
Logo, dentro do sistema acusatório, as partes ganham direito ao contraditório e
ampla defesa, devendo para tanto o processo ser público, via de regra, para que haja uma
melhor fiscalização dos atos do Poder Judiciário, pois a condenação de um culpado ou
absolvição de um inocente trata-se de um interesse público.
12
O sistema inquisitório prevaleceu durante muito tempo no ordenamento jurídico
brasileiro, isto porque, no transcurso do século XIII foi instituído no Brasil e no mundo o
Tribunal de Inquisição, para reprimir a heresia de quem fosse contrário às ideologias da Igreja
Católica.
Este foi um dos grandes exemplos de sistema inquisitivo, onde predominava o
princípio da culpabilidade, em que o que acusado já era presumidamente culpado, sem
distinguir o juiz da figura da acusação e da defesa, estando com ele o poder de produção de
provas.
Para Rosmar Rodrigues Alencar: No sistema inquisitivo (inquisitório), permeado que é pelo princípio inquisitivo, o que se vê é a mitigação dos direitos e garantias individuais, em favor de um pretenso interesse coletivo de ver o acusado punido. É justificada a pretensão punitiva estatal com lastro na necessidade de não serem outorgadas excessivas garantias fundamentais. (ALENCAR, 2018, p. 54)
Era nítido o defeito nesse sistema, tendo em vista que ficava prejudicada a
imparcialidade do magistrado, pois todo o poder estava concentrado na figura do julgador.
Nesse sentido, aduz Guilherme de Souza Nucci, que o sistema inquisitivo: É caracterizado pela concentração de poder nas mãos do julgador, que exerce, também, a função de acusador; a confissão do réu é considerada a rainha das provas; não há debates orais, predominando procedimentos exclusivamente escritos; os julgadores não estão sujeitos à recusa; o procedimento é sigiloso; há ausência de contraditório e a defesa é meramente decorativa. (NUCCI, 2014, p. 69)
O Código de Processo Penal em vigor, em sua origem adotara o sistema autoritário
de jurisdição, haja vista que o mesmo foi criado baseado na legislação processual penal
italiana, na década de 1930, onde predominava o regime fascista, logo, não poderia ser de
outra forma.
A exemplo disso tinha-se a insuficiência da sentença absolutória para restituição da
liberdade do réu, era necessária a decisão no segundo grau de jurisdição para que o
sentenciado fosse posto em liberdade, ao contrário do que é hoje. Além disso, dependendo de
qual fosse a pena prevista para o caso concreto, uma vez recebida a denúncia, a prisão
preventiva era automaticamente decretada.
Atualmente, a doutrina majoritária entende que o sistema processual penal brasileiro
adota o sistema misto. Tal sistema nasceu com o Código Napoleônico de 1808. A maior parte
da doutrina defende que no que concerne à parte pré-processual, o Brasil adota o sistema
inquisitório, tendo em vista que dentro da investigação não há possibilidade de contraditório e
13
ampla defesa. O direito de se defender e produzir provas se inicia a partir do momento que o
Juiz recebe a denúncia, no início da Ação Penal, onde o sistema passaria a ser o acusatório.
1.1.1 A Evolução Histórica da Prisão Preventiva
A prisão cautelar, sob um caráter de custódia, com critérios de excepcionalidade, que
preservasse o réu fisicamente até o julgamento e a execução, já existia no período
compreendido como Antiguidade. As penas aplicadas a pessoa do condenado de forma
acautelatória para garantir a execução da pena ou da dívida.
O sistema processual penal inquisitorial prevaleceu durante a Idade Média. Este
sistema dava poderes ao inquisidor para, tendo o acusado completamente subjulgado, obter
confissões forjadas através de tortura, como pressuposto ordinário da instrução.
Ensina Cezar Roberto Bittencourt: De toda a Idade Média, caracterizada por um sistema punitivo desumano e ineficaz, só poderia destacar-se a influência penitencial canônica, que deixou como sequela positiva o isolamento celular, o arrependimento e a correção do delinquente, assim como outras ideias voltadas à procura da reabilitação do recluso. (BITENCOURT, 2012, p. 35)
O caráter de excepcionalidade e cautelaridade da prisão preventiva só seria retomado
a partir de Século XVIII. Com este novo modelo, a prisão preventiva assume a função de
garantia da justiça, de impedir a fuga do acusado, de impedir que as provas possam ser
perdidas ou danificadas e a defesa da ordem pública. Neste mesmo período, com o
crescimento considerável da pobreza em grande parte da população e o consequente aumento
dos crimes de subsistência, a prisão assume a função de manutenção da ordem social em favor
da garantia do crescimento econômico da burguesia.
A corrente de pensamento iluminista, da segunda metade do século XVIII,
representada por Volteir, Montesquieu e Rousseau, determina novas mudanças relacionadas a
aplicação de penas até então de excessiva crueldade, contrapondo-se aos castigos corporais e
a pena capital.
Continua o mesmo doutrinador:Aos excessos imperantes na legislação penal, propondo que o fim do estabelecimento das penas não deve consistir em atormentar um ser sensível. A pena deve ser proporcional ao crime, devendo-se levar em consideração, quando imposta, as circunstâncias pessoais do delinquente, seu grau de malícia e, sobretudo, produzir a impressão de ser eficaz sobre o espírito dos homens, sendo, ao mesmo tempo, a menos cruel para o corpo do delinquente. (BITENCOURT, 2012, p. 52)
14
No Brasil colonial, a legislação vigente pautava-se no direito português que
determinava que qualquer prisão só seria feita mediante mandado expedido por juiz, exceto
em casos de flagrante delito ou na hipótese de crime apenado com morte natural ou civil. No
entanto, se a culpa não se configurasse dentro do prazo de 8 (oito) dias o réu deveria ser solto
imediatamente.
Independentemente dessas duas hipóteses, a prisão do réu só se daria depois de
pronunciado em uma das seguintes formas: a pronúncia ordinária, quando o réu deveria ser
liberto; a pronúncia especial, com a possibilidade do réu ser liberto mediante fiança, e a
pronúncia de réo capiendo, nos casos dos crimes mais graves onde a prisão deveria manter-se
até o julgamento de réu.
Após a proclamação da independência em 1822, a legislação brasileira passou a ser
aplicada segundo a Constituição de 1824 que determinava que ninguém poderia ser preso sem
culpa formada, quando em lugares próximos da residência do juiz, dentro de um prazo de 24
(vinte e quatro) horas contadas a partir da entrada da prisão. Nos casos das localidades
remotas, os prazos deveriam ser determinados pelo juiz, levando-se em consideração a
dificuldade do acesso, sendo que a notificação ao réu deveria constar o motivo da prisão, o
nome dos acusadores e, caso haja, das testemunhas.
Por sua vez, o Código de Processo de 1832, em seu artigo 175, dispunha que, além
da hipótese de flagrante delito:Poderão também ser presos sem culpa formada os que forem indiciados em crimes em que não tem lugar fiança; porém, nestes e em todos os mais casos, à exceção dos de flagrante delito, a prisão não pode ser executada senão por ordem escrita da autoridade legítima.
Na prática, a simples conjectura de que o acusado houvera cometido um crime “sem
direito a fiança”, já seria suficiente para justificar a prisão preventiva. Diante deste fato o
Deputado Saião Lobato, no ano de 1861, levantou a discussão através de projeto que visava
bem aquilatar a qualificação jurídica do fato imputável, com todas as razões justificadoras da
prisão:São conhecidos os abusos que resultam da atribuição que, pelo art. 175 do Código de Processo Criminal, têm as autoridades de proceder antes de culpa formada nos crimes inafiançáveis, porque geralmente entendem, para satisfazer alheias exigências, ou suas infundadas apreensões, que o indiciado criminoso cometera crime inafiançável e assim o conservam detido até que o processo informatório se conclua .
O Deputado José de Alencar também apresentou projeto em 1869, com o objetivo de
aumentar o rigor na aplicação da prisão preventiva, assim propondo:
15
Só é permitida a prisão preventiva por veemente presunção de crime inafiançável, quando essa presunção for estabelecida pela declaração de duas testemunhas que jurem de ciência própria, ou pelo auto de corpo de delito, e quando concorrerem as duas circunstâncias de ser o indiciado pessoa não abonada, sem residência permanente no lugar e de não haver decorrido o prazo de três anos de perpetração do crime. Poderá, todavia, a autoridade, quando se trate de crime muito grave, exigir do indiciado caução ou fiança, no caso de existir contra ele presunção veemente .
No entanto, apenas em 1871, a Lei n° 2.033 passou a exigir especiais contornos de
formalização e de prévia instrução para a decretação da prisão preventiva, autorizada nos
casos de crimes inafiançáveis, sem, contudo, haver na legislação quaisquer referências a
requisitos de cautelaridade (periculum in mora). Outras novidades importantes dessa reforma
legislativa foi a criação do Inquérito Policial, por meio do Decreto nº. 4.824/1871 (que regula-
mentou a Lei n° 2.033/1871) e a vedação da prisão preventiva, caso houvesse decorrido um
ano depois da data do crime.
Código Processual Penal de 1941 foi um marco na história da aplicação das prisões,
notadamente das prisões preventivas, que passaram a obrigatórias, e cabíveis para os autores
de crimes puníveis com pena máxima de reclusão igual ou superior a dez anos, baseadas
apenas em prova indiciária contra o acusado.
Conforme ensinamentos de Nereu José Giacomolli:Nesse cenário, Estado de Direito, Direitos fundamentais e Democracia, por exemplo, eram tidos como obras demoníacas, e seus defensores considerados inimigos do Estado e amigos da impunidade. O reflexo desse posicionamento foi e ainda é representado pela máxima de que os suspeitos, os investigados e os acusados devem ser combatidos a todo custo, ainda que tenham seus direitos colocados em segundo plano (GIACOMOLLI, 2015, p. 143).
Durante a segunda fase do Governo Vargas, os poderes da Polícia judiciária foram
ampliados, de outra forma os poderes instrutórios do juiz foram mitigados e o surgimento da
possibilidade de privação da liberdade atingir 180 dias sem qualquer controle judicial, que se
findava com a instrução preparatória, que ora era feita pelo juiz, ora pela polícia.
Por outro lado, se o Ministério Público, para levar a cabo as suas investigações, não
podia privar da liberdade física os suspeitos por um período superior a 50 dias e carecia para
esse efeito do referendum do Tribunal, a Polícia Judiciária ou a Polícia Internacional e de
Defesa do Estado tinham o poder de prenderem, durante 180 dias para averiguações, sem
necessidade de qualquer referendum ou controle judicial, prorrogáveis por mais dois períodos
sucessivos de quarenta e cindo dias cada, mediante autorização do ministro da Justiça ou do
ministro do Interior.
16
O Decreto Lei n° 36.387/1947, efetivamente alargou o âmbito de aplicação das
medidas de segurança, previstas na Constituição para a defesa da sociedade e reabilitação dos
delinquentes a todos os demais condenados por crimes contra a segurança exterior ou interior
do Estado.
As legislações pertinentes à prisão preventiva desta época estavam preocupadas em
conter os movimentos sociais e políticos contrários ao novo Governo, que se demonstrava
autoritarista. Essas ações representavam um ataque aos movimentos oposicionistas, e visavam
legalizar o que, na realidade, seria uma prática constante e ilegal, a detenção por tempo
indeterminado e sem pena, ou para além desta.
Somente 26 anos após, por força da Lei n° 5.349, de 3 de novembro de 1967, a
redação original dos artigos 312 e 313 foi alterada, extinguindo-se a hipótese de prisão
preventiva obrigatória:Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indícios suficientes da autoria.
Art. 313. A prisão preventiva poderá ser decretada: I – nos crimes inafiançáveis;
II – nos crimes afiançáveis, quando se apurar no processo que o indiciado é vadio ou quando, havendo dúvida sobre a sua identidade, não fornecer ou indicar elementos suficientes para esclarecê-la;III – nos crimes dolosos, embora afiançáveis, quando o réu tiver sido condenado por crime da mesma natureza, em sentença transitada em julgado.
A Lei 6.416, de 24 de maio de 1977, autorizou a prisão preventiva,
incondicionalmente, também nos crimes dolosos afiançáveis, exigindo, tão somente, que estes
fossem punidos com reclusão. Assim sendo, o artigo 313 do Código de Processo Penal
preconiza:Art. 313. Em qualquer das circunstâncias, previstas no artigo anterior, será admitida a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos:
I – punidos com reclusão;II – punidos com detenção, quando se apurar que o indiciado é vadio ou, havendo dúvida sobre a sua identidade, não fornecer ou não indicar elementos para esclarecê-la;III – se o réu tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 46 do Código Penal.
Na prática, independentemente do que apregoado pela doutrina, então influenciada
pela doutrina italiana, bastava para a sua decretação que o crime fosse inafiançável, ainda
mais porque não havia parâmetros de cautelaridade disciplinados, resumindo-se, a
17
necessidade da prisão, à “conveniência e ao prudente arbítrio” do juiz, que, desde sempre,
eram criticados.
Assim, deixava a prisão preventiva de, em um primeiro plano, fundar-se, para sua
decretação, nas meras presumidas decorrências do cometimento de um crime não-sujeito à
fiança (tradição de séculos do direito brasileiro), para compatibilizar-se com a doutrina que, já
antes do Código de Processo Penal (e que lhe influenciou significativamente), há tempos
centrava nos elementos de cautelaridade o fundamento do instituto, que deveriam restar
demonstrados caso a caso.
A Lei n° 7.492, de 16 de junho de 1986, dispôs sobre a decretação da prisão
preventiva para os crimes contra o sistema financeiro nacional, enquanto a Lei n°
11.340/2006, autorizou a prisão preventiva, independentemente de se tratar de crime apenado
com detenção, nas hipóteses que envolverem violência doméstica e familiar contra a mulher.
Vários são os países que adotaram medidas alternativas à prisão cautelar, medida que
tem se apresentado como uma tendência consubstanciada na doutrina e na legislação desses
países. A reforma do Código de Processo Penal brasileiro trouxe, em seu artigo 319, a
possibilidade de aplicação de medidas cautelares alternativas, a fim de que se preserve o
direito fundamental, a liberdade, como regra aplicável a todos, que são iguais perante a lei,
tendo sido acusados por um crime, ou não.
1.2 GARANTIAS GERAIS DO PROCESSO PENAL
Observado que o processo é garantia ativa e passiva, cabe referir o sistema
constitucional de garantias do próprio processo, sendo assim entendido como instrumento de
justiça e de efetivação de direitos.
Alguns dispositivos na Constituição são exclusivamente de garantias de direitos no
processo penal, mesmo que nem todas estejam previstas de maneira expressa no texto
Constitucional, mas existindo de forma implícita, permanecendo sob a égide da fórmula
genérica do § 2°: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em
que a República Federativa do Brasil seja parte”.
Se a perspectiva teórica do Código de Processo Penal apresentava-se nitidamente
com um caráter autoritário, prevalecendo sempre a preocupação com a segurança pública, a
Constituição da República de 1988 caminhou em direção diametralmente oposta, uma vez que
o Direito Penal constitui verdadeira política pública.
18
A exemplo disso, o princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade foi
expressamente inserido pela Carta Magna, que veio a corroborar, tratando de maneira mais
ampla entendimento já preconizado pelo Decreto n° 678/1992). Logo, para que que haja
reconhecimento da autoria delituosa é necessário o trânsito da sentença condenatória, de
forma que durante todo o processo, o agente é presumidamente inocente, cabendo à acusação
o ônus de provar sua culpa.
Nesse sentido, aduz Guilherme de Souza Nucci:As pessoas nascem inocentes, sendo esse o seu estado natural, razão pela qual, para quebrar tal regra, torna-se indispensável que o Estado-acusação evidencie, com provas suficientes, ao Estado-Juiz, a culpa do réu. (NUCCI, 2014, p. 34)
Ademais, a Constituição Federal de 1988 proíbe a criação de tribunais de exceção
(art. 5°, XXXVII). Os tribunais de exceção são via de regra instituídos em períodos
revolucionários, com a finalidade de julgar fatos políticos praticados anteriormente à
existência da norma.
De acordo com Aury Lopes Júnior:Todo poder tende a ser autoritário e precisa de limites, controle. Então, as garantias processuais constitucionais são verdadeiros escudos protetores contra o abuso do poder estatal. Como consequência, o fundamento da legitimidade da jurisdição e da independência do Poder Judiciário está no reconhecimento da sua função de garantidor dos direitos fundamentais inseridos ou resultantes da Constituição. Nesse contexto, a função do juiz é atuar como garantidor dos direitos do acusado no processo penal. (LOPES, 2015, p. 57)
A garantia constitucional referente ao processo penal na Carta Magna consiste na
vedação expressa em seu art. 5°, XXXVII, da criação de tribunais ou juízos de exceção, e
ainda define quais os órgãos do Poder Judiciário e a competência básica das justiças especial e
comum (arts. 92 e ss.), com observância ao princípio do juiz natural.
Assim leciona Vicente Filho:Ligado à proibição dos tribunais de exceção está o princípio do juiz natural (art. 5o, LIII): “Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”. Tal norma significa que as regras de determinação de competência devem ser instituídas previamente aos fatos e de maneira geral e abstrata de modo a impedir a interferência autoritária externa. O nascimento desta garantia, dar-se no momento da prática do delito, e não no início do processo. (FILHO, 2012, p.70)
O juiz natural, ademais, por força do princípio da isonomia, não deve ser destacado
para casos determinados, mas naturalmente ter a competência para todos os que ocorrerem
nas mesmas condições na circunscrição de sua atuação. O mesmo teor do art. 5o, XXXVII, da CF, pode ser encontrado no art. 14, I, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova Iorque, aprovado pelo Decreto Legislativo n. 226, de 12-12-1991, promulgado pelo Decreto n. 592, de 6-7-1992, e, igualmente, no art. 8o da Convenção Americana sobre Direitos Humanos –
19
Pacto de San José da Costa Rica, aprovada pelo Decreto Legislativo n. 27, de 25-9-1992, e promulgada pelo Decreto n. 678, de 6-12-1992.
É possível, porém, o deslocamento da competência, como ocorre nos casos de
procedimento do júri, por exemplo (Código de Processo Penal, arts. 427 e 428).
Outra garantia constitucional do processo penal é o do devido processo legal. O
processo, em primeiro lugar, é indispensável à aplicação de qualquer pena, logo o processo é
condição necessária para privação de um direito.
Segundo Nestor Távora: O devido processo legal é estabelecido em lei, devendo traduzir-se em sinônimo de garantia, entendendo assim aos ditames constitucionais. Com isto, consagra-se a necessidade do processo tipificado, sem a supressão e/ou desvirtuamento de atos essenciais. (TÁVORA, 2018, p. 87)
Art. 5°, LIV da Constituição Federal: “Ninguém será privado da liberdade ou de seus
bens sem o devido processo legal”.
O devido processo penal constitucional busca, atender à exigência de igualdade
efetiva entre os litigantes, atentando sempre, para a desigualdade material que normalmente
ocorre no curso de toda persecução penal, em que o Estado ocupa posição de proeminência.
Em segundo lugar, o devido processo legal significa o processo adequado, ou seja,
aquele que assegura às partes paridade no exercício do contraditório e ampla defesa.
Segundo Eugênio Pacielli: Processo justo a ser realizado sob instrução contraditória, perante o juiz natural da causa, e no qual seja exigida a participação efetiva da defesa técnica, como única forma de construção válida do convencimento judicial. E o convencimento deverá ser sempre motivado, como garantia do adequado exercício da função judicante e para que se possa impugná-lo com maior amplitude perante o órgão recursal. (PACELLI, 2017)
Além disso, o processo deve seguir os parâmetros estabelecidos na lei, como
decorrência disso, por exemplo, tem-se a proibição pela Constituição da admissibilidade de
provas obtidas por meios ilícitos, e ainda as provas que dela derivaram.
A partir da Lei n° 11.690/2008, que deu nova redação a diversos dispositivos do
Código de Processo Penal, a teoria dos frutos da árvore envenenada passa a integrar a ordem
processual penal brasileira de modo expresso. Dispõe o art. 157, §1° “São também
inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de
causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte
independente das primeiras”.
O inciso LX da Carta Magna assegura a publicidade dos atos processuais, admitido,
20
contudo, o sigilo quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem.
A publicidade assegura a fiscalização da sociedade dos atos praticados pelo Estado,
haja vista o processo penal ser de interesse público.
Nesse sentido aduz Vicente Filho: A garantia da publicidade é uma garantia das outras garantias e, inclusive, da reta aplicação da lei. Nada melhor que a fiscalização da opinião pública para que a atuação judicial seja feita corretamente. A publicidade acaba atuando como obstativa de eventual arbitrariedade judicial. (FILHO, 2012, p. 72)
Estabelece, pois, o art. 792 do Código de Processo Penal que as audiências, sessões e
atos processuais serão, em regra, públicos, podendo o juiz, todavia, determinar que se
realizem a portas fechadas, no caso de a publicidade poder acarretar escândalo, inconveniente
grave ou perigo de perturbação da ordem.
Finalmente, dentro das garantias gerais explícitas do art. 5°, a Constituição Federal
de 1988 consigna no inciso LXXIV a assistência jurídica gratuita aos que comprovarem
insuficiência de recursos. No processo penal tal garantia se consolida com a nomeação de
defensor dativo, nos casos em que a parte não tenha meios suficientes para arcar com sua
própria defesa.
1.1.1 Princípios do Processo Penal
A lei assegura uma série de limitações ao poder jurisdicional, de forma a garantir um
processo penal efetivo e legítimo, com observância aos direitos fundamentais, para evitar
arbitrariedades estatais. Com isso, muitos princípios processuais penais encontram respaldo
na própria Constituição da República.
O princípio da inércia da jurisdição indica que o Poder Judiciário somente poderá se
manifestar mediante provocação da parte interessada, vedada a atuação ex officio do juiz.
Logo, a jurisdição somente pode ser exercida quando houver o exercício da pretensão
acusatória.
Ademais, o princípio do non bis in idem pode ser tanto material quanto processual,
logo, ninguém poderá ser julgado ou processado pelo mesmo fato típico mais de uma vez, e
também não poderá responder mais de uma vez pelo mesmo crime.
Outro princípio norteador do processo penal é o da imparcialidade, o que garante às
partes uma decisão justa e desprovida de vícios. A imparcialidade é requisito de validade no
processo, tanto que a sua inobservância pode acarretar nulidade absoluta do procedimento.
Segundo Nestor Távora: Cabe notar que a imparcialidade deve ser indicativa de honestidade. É que o
21
magistrado leva consigo os valores de sua formação, que acabam por justificar entendimentos distintos em relação a uma pluralidade de situações fáticas, o que não significa, a princípio, que seja parcial. (TÁVORA, 2018, p. 73)
No sistema acusatório, adotado pelo Código de Processo Penal brasileiro, a ação
penal pública é promovida pelo Ministério Público, e a ação penal privada pelo ofendido, de
forma que pode o juiz manter-se equidistante da acusação e da defesa, garantindo uma decisão
imparcial.
O princípio do juiz natural, consiste no direito que cada cidadão tem de saber, de
antemão, a autoridade que irá processá-lo e qual o juiz ou tribunal que irá julgá-lo, caso
pratique uma conduta definida como crime no ordenamento jurídico-penal.
O princípio da indeclinabilidade da jurisdição, significa dizer que o juiz natural não
pode declinar de sua obrigação de julgar, ou delegar a outro o exercício da sua jurisdição.
O contraditório consiste no instrumento utilizado para garantir o exercício da ampla
defesa, logo, o contraditório trata-se do poder do acusado de contrariar a acusação. Para que o
exercício da defesa, porém, seja criterioso e amplo, é essencial a presença da chamada “defesa
técnica”, que deve ser efetivada por advogado.
Conforme nos ensina Eugênio Pacelli: É um dos princípios mais caros ao processo penal, constituindo verdadeiro requisito de validade do processo, na medida em que a sua não observância é passível até de nulidade absoluta, quando em prejuízo do acusado. [...] O contraditório, portanto, junto ao princípio da ampla defesa, institui-se como a pedra fundamental de todo o processo e, particularmente, do processo penal. E assim é porque, como cláusula de garantia instituída para a proteção do cidadão diante do aparato persecutório penal, encontra-se solidamente encastelado no interesse público da realização de um processo, justo e equitativo, como único caminho para a imposição da sanção de natureza penal. (PACELLI, 2017, p.37)
Outro princípio constitucional de fundamental importância no processo penal é o que
a doutrina denomina “direito de não se auto acusar”, o “direito ao silêncio”, ou, em latim,
nemo tenetur se detegere, também formulado como nemo tenetur seipsum accusare. De
acordo com o art. 5°, inciso LXIII, da Constituição Federal de 1988: O preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado.
Entende-se desse princípio, que o acusado tem o direito de permanecer em silêncio,
ser informado desse direito, e que esse silêncio não seja interpretado em seu prejuízo. Tal
princípio é decorrente da vedação à autoincriminação prevista no art. 5°, LXII. A vedação à
autoincriminação é também princípio norteador do processo penal, e tem como vertentes o
direito ao silêncio, a inexigibilidade de dizer a verdade, não ser compelido a praticar
comportamento ativo e nem submeter-se a procedimento probatório invasivo.
22
Renato Brasileiro de Lima preleciona que: São as intervenções corporais que pressupõem penetração no organismo humano, por instrumentos ou substâncias, em cavidades naturais ou não, implicando na utilização (ou extração) de alguma parte dele ou na invasão física do corpo humano, tais como os exames de sangue, o exame ginecológico, a identificação dentária, a endoscopia (usada para localização de droga no corpo humano) e o exame do reto; (LIMA, 2014, p.84)
Entende-se o princípio da não autoincriminação como decorrência ou complemento
da presunção de não culpabilidade (art. 5°, LVII) ou da presunção de inocência. Tal princípio
no que tange a regra probatória consiste no “in dubio pro reo” ou “favor rei”, que determina
que no caso de dúvida no julgamento, o magistrado deverá escolher a opção que mais
beneficie o réu, além de que, caberá ao acusador provar a culpa do acusado. Já na regra de
tratamento, o princípio da presunção de inocência prevê que o indiciado deve ser tratado
como presumidamente inocente no decorrer do processo.
E por fim, o princípio do duplo grau de jurisdição, que não tem previsão na
Constituição Federal, mas foi estabelecido através da Convenção Americana de Direitos
Humanos. Tal princípio busca o reexame da causa por órgão jurisdicional superior. Contudo,
não é possível dissecar em sua totalidade os princípios processuais penais, visto sua falta de
taxatividade.
23
2. PRISÕES CAUTELARES
2.1 PRINCÍPIOS REGENTES DAS PRISÕES CAUTELARES
O sistema processual penal brasileiro não adota um modelo de ação cautelar
autônoma, logo, a tutela jurisdicional cautelar é exercida através de medidas cautelares
prevista no ordenamento jurídico.
Tais medidas podem ser utilizadas tanto no momento da investigação preliminar,
quanto na fase de conhecimento ou execução criminal. Essas medidas podem ser de caráter
patrimonial ou pessoal, como ocorre no caso das prisões temporária e preventiva, porém deve-
se respeitar as limitações impostas pelo Código de Processo Penal para sua justa aplicação.
Nesse sentido, aduz Aury Lopes Júnior: A sistemática do Código de Processo Penal não contempla a existência de “ação cautelar”, até porque, no processo penal, inexiste um processo cautelar. Daí por que não concordamos com essa categorização (de ação cautelar penal) dada por alguma doutrina. (LOPES, 2015, p. 591)
O primeiro critério a ser observado é da provisoriedade, tendo em vista a natureza
temporária das prisões cautelares. Logo, deixando de existir a situação fática que ensejou a
aplicação da medida, a mesma deverá ser revogada pelo juiz.
O desprezo pela provisoriedade, segundo Aury Lopes Jr., “conduz a uma prisão
ilegal, não apenas pela falta de fundamento que a legitime, mas também por indevida
apropriação do tempo imputado” (2011, p. 17). Porém, é nesse princípio que surge a
problemática da indeterminação do prazo da prisão preventiva, podendo durar enquanto o juiz
entender que há o periculum in libertatis. O PL 4208/2001 já tentou fixar um prazo máximo
de 180 dias, mas o mesmo foi vetado.
Outro princípio das medidas cautelares é o da excepcionalidade, esse se aplica
exclusivamente à prisão preventiva. Contudo, esse instituto só deve ser utilizado em último
caso, quando nenhum outro for possível para garantia do processo.
O art. 282 do Código de Processo Penal estabelece: As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I – necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II–adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.
A regra estampada no inciso II, trata do princípio da adequação, que surge para
24
nortear a conduta do juiz.
Portanto, a adequação e proporcionalidade são princípios que servem como
sustentáculo das prisões preventivas. É equivocada a interpretação por vezes emprestada ao inciso II no sentido de que a “gravidade do crime” justifica a aplicação automática da prisão preventiva. Isso porque, em tal hipótese, desconsidera-se a existência de outras medidas cautelares menos invasivas e com aplicação prioritária à prisão, e também porque se presume a existência da cautelaridade com fulcro em elementos distintos daqueles previstos no inciso I. (MARTINI, 2012, p.112).
Por isso, a decretação da prisão cautelar deve observar o risco ao processo,
independentemente da natureza do delito cometido pelo acusado, além de que, deve ser
observado o caráter excepcional de tal medida.
2.2 ESPÉCIES DE PRISÕES
Prisão consiste no cerceamento da liberdade do indivíduo, ou seja, no
encarceramento. Essa restrição pode dar-se como resposta do Estado para um delito cometido,
no caso da prisão como pena, ou como forma de garantia processual como ocorre nas prisões
provisórias, nesse caso, são prisões sem pena, ou seja, sem finalidade de punir e ressocializar.
Logo, as prisões se dividem em duas grandes espécies, prisão-pena ou prisão penal
e prisão sem pena ou prisão processual.
Nesse sentido, aduz Fernando Capez: Prisão-pena ou prisão penal: é aquela imposta em virtude de sentença condenatória transitada em julgado, ou seja, trata-se da privação da liberdade determinada com a finalidade de executar decisão judicial, após o devido processo legal, na qual se determinou o cumprimento da privativa de liberdade. (CAPEZ, 2015, p. 307)
Ainda nesse sentido, o mesmo autor descreve: Prisão sem pena ou prisão processual: trata-se de prisão de natureza puramente processual, imposta com finalidade cautelar, destinada a assegura o bom desempenho da investigação criminal, do processo penal ou da futura execução da pena, ou ainda a impedir que, solto, o sujeito continue praticando delitos. (CAPEZ, 2015, p. 307)
O Código de Processo Penal prevê em seu art. 302 a prisão em flagrante, que
consiste na prisão no momento do acontecimento do delito ou logo após. Tem natureza
cautelar e administrativa, logo, sua decretação só poderá durar no máximo 72 horas, tendo
nesse prazo o delegado de polícia 24 horas para lavrar o auto de prisão em flagrante, e o juiz
48 horas para ou relaxar a prisão, no caso da prisão ser ilegal, ou converter em prisão
preventiva, conforme previsto nos arts. 306 e 310 do Código de Processo Penal.
25
Segundo Victor Eduardo Rios Gonçalves: Em princípio, a palavra “flagrante” indica que o autor do delito foi visto praticando o ato executório da infração penal e, por isso, acabou preso por quem o flagrou e levado até a autoridade policial (GONÇALVES, 2015, p. 372)
A prisão em flagrante pode ainda ser subdivida em flagrante próprio, quando o
delinquente é surpreendido no momento do cometimento da infração; em flagrante impróprio,
nessa modalidade o agente sofre a perseguição e é detido logo após em situação que faça
presumir ser o autor do fato, logo, no flagrante impróprio é necessário o elemento da
perseguição e da presunção de autoria.
O flagrante pode ainda ser presumido, que consiste naquele em que o autor é
encontrado logo depois do fato, com instrumentos ou ferramentas que presumam que seja ele
o autor do fato. Nesse caso não existe o elemento da perseguição.
Segundo Fernando Capez: Não é necessário que haja perseguição, bastando que a pessoa seja encontrada logo depois da prática do ilícito em situação suspeita. Essa espécie de flagrante usa a expressão “logo depois”, ao invés de “logo após” (somente empregada no flagrante impróprio). Embora ambas as expressões tenham o mesmo significado, a doutrina tem entendido que o “logo depois”, do flagrante presumido, comporta um lapso temporal maior que o “logo após”, do flagrante impróprio. (CAPEZ, 2015, p. 321)
Logo, o flagrante próprio, impróprio e presumido são modalidades elencadas no
Código de Processo Penal, tendo ainda o chamado flagrante facultativo, que é aquele que
autoriza alguém do povo a efetuar ou não a prisão em flagrante, tratando-se, portanto, de uma
faculdade legal.
A prisão temporária, segunda modalidade de prisão cautelar, ou seja, pré-processual,
consiste na restrição de liberdade do acusado que preencher os requisitos elencados na lei
n°7.960/1989, sendo esse um rol taxativo.
Nos termos do art. 1°, da Lei n° 7.960/1989, caberá prisão temporária:I – Quando for imprescindível para as investigações durante o inquérito policial, ou seja, quando houver indícios de que, sem a prisão, as diligências serão malsucedidas. II – Quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade III – Quando houver indícios de autoria ou de participação em um dos seguintes crimes: homicídio doloso, sequestro ou cárcere privado, roubo, extorsão ou extorsão mediante sequestro, estupro, epidemia ou envenenamento de água ou alimento, quadrilha, genocídio, tráfico de entorpecentes ou crime contra ao sistema financeiro.
O prazo de duração para a prisão temporária via de regra é de 5 (cinco) dias, podendo
ser prorrogada de maneira justificada por igual período, e nos casos de crimes hediondos esse
prazo é de 30 dias podendo ser prorrogado por mais 30 (trinta) dias, de acordo com a Lei n°
8.072/1990, devendo o réu ser posto imediatamente em liberdade após expirado o prazo, sob
26
pena de a autoridade coatora responder por crime de abuso de autoridade conforme previsto
no art. 4°, i, da Lei n° 4.898/65)
Segundo Alexandre Cebrian Araújo Reis: Do mandado de prisão constará o prazo de duração da prisão temporária, que, uma vez expirado, implicará a imediata libertação do indiciado, salvo se já tiver sido decretada sua prisão preventiva. É muito comum que, ao término das investigações e próximo ao fim do prazo da prisão temporária, a autoridade policial ou o Ministério Público requeiram a decretação da prisão preventiva, de modo que o indiciado não chega a ser solto, pois isso poderia dificultar sua recaptura. (REIS, 2015, p. 409).
É estritamente vedada que essa prorrogação do prazo seja automática, logo, sendo
observado que os motivos para decretação da prisão temporária subsistem, o magistrado
deverá prorroga-la de forma fundamentada.
A prisão temporária não pode ser decretada de ofício pelo juiz, precisa-se para tanto
que a autoridade policial no curso do inquérito policial represente pela sua decretação, ou
membro do Ministério Público requeira, por se tratar de prisão pré-processual, ou seja, antes
do curso da ação penal.
Assim aduz Rosmar Rodrigues Alencar: A lei não comtemplou a vítima como legitimada a requerer a temporária. Na fase de inquérito por crime de iniciativa privada, caberá ao delegado representar pela medida. A lei também não tratou do assistente de acusação, haja vista que, de acordo com suas atribuições, ele não poderá requerer decretação de nenhuma modalidade prisional. (ALENCAR, 2018, p. 961)
Nesse sentido também, a prisão preventiva não poderá ser decretada de ofício pelo
juiz na fase de investigação, haja vista que a ação penal ainda não foi iniciada. A prisão
preventiva é a prisão cautelar mais ampla, não há um rol taxativo para seu cabimento, estando
sua fundamentação baseada em termos amplos e desprovidos de taxatividade conceitual,
como “garantia de ordem pública”.
Além disso, a prisão preventiva pode ser decretada em qualquer fase processual, ou
até mesmo antes do processo. Não há, portanto, uma determinação legal para o prazo de sua
duração, ficando o Judiciário com ampla discricionariedade para sua aplicação.
2.3 PRISÃO PREVENTIVA
Trata-se de uma medida cautelar de constrição à liberdade do indiciado ou réu, por
razões de necessidade, respeitados os requisitos estabelecidos em lei. A prisão preventiva
revela a sua cautelaridade na tutela da persecução penal, objetivando impedir eventuais
condutas praticadas pelo alegado autor e/ou por terceiros que possam colocar em risco a
efetividade do processo.
27
A prisão preventiva, por trazer como consequência a privação da liberdade antes do
trânsito em julgado, somente se justifica enquanto, e na medida, em que puder realizar a
proteção da persecução penal, em todo o seu iter procedimental e quando se mostrar a única
maneira de satisfazer tal necessidade. A preventiva é medida de exceção, devendo ser interpretada restritivamente, para compatibilizá-la com o princípio da presunção de inocência (art. 5°, inciso LVII da CF), afinal, o estigma do encarceramento cautelar é por demais deletério à figura do infrator. (ALENCAR, 2018, p. 947)
Consoante a Súmula n° 9 do STJ, a prisão provisória não ofende o princípio
constitucional do estado de inocência (Constituição Federal de 1988, art. 5°, LVII). Além de
que, em razão da sua gravidade, e como decorrência do sistema de garantias individuais
constitucionais, somente se decretará a prisão preventiva “por ordem escrita e fundamentada
da autoridade judiciária competente”, conforme se observa com todas as letras no art. 5°, LXI,
da Carta de 1988, mas não basta a fundamentação judicial da autoridade competente. Como se
trata de medida restritiva de direitos, a sua decretação deve estar expressamente prevista em
lei, não podendo o juiz afastar-se do princípio da legalidade, nem mesmo se entender
presentes circunstâncias e/ou situações que coloquem em risco a efetividade do processo e da
jurisdição penal.
Por ser permitida a prisão preventiva desde o início da persecução penal (fase de
investigação) até após a prolação da sentença (art. 387 e art. 492, I, d, Código de Processo
Penal), as hipóteses de decretação de prisão preventiva contemplam praticamente todas as
circunstâncias e/ou situações da realidade, em que o legislador vislumbra a possibilidade de
risco ao processo.
Conforme ensina Vicente Filho: A segurança da aplicação da pena significa a necessidade da prisão para que,posteriormente, possa ser eficaz a punição, porque a impunidade ofende a ordem pública. Contudo, não pode ser decretada a preventiva para assegurar a execução da pena de multa. (FILHO, 2012 p. 337)
A prisão preventiva submete-se à cláusula da impressão, podendo ser revogada
quando não mais presente os motivos que a ensejaram, bem como renovada quando
sobrevierem razões que a justifiquem (art. 316 do Código de Processo Penal), a revogação da
prisão preventiva não implica a concessão da liberdade provisória. Conforme dispõe o art. 311
do Código de Processo Penal, ela pode ser decretada em qualquer fase da investigação policial
ou do processo penal, em razão de requerimento do Ministério Público, do querelante ou do
assistente, ou mediante representação da autoridade policial. O juiz pode decretá-la de ofício
desde que no curso da ação penal. Inexiste em lei um prazo determinado para sua duração.
28
Preleciona Ivan Marques que: Seja no curso da investigação policial, ou em investigação direta feita pelorepresentante do Ministério Público, não cabe prisão preventiva decretada de ofíciopelo magistrado (com exceção ao art. 20 da Lei Maria da Penha – Lei n. 11.340/2006, para as hipóteses de crime envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher), mas caberá a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial. (MARQUES, 2012, p. 126)
Torna-se muito importante respeitar a razoabilidade de sua duração, não podendo
transpor os limites do bom senso e da necessidade efetiva para a instrução do feito. A prisão
preventiva tem a finalidade de assegurar o bom andamento da instrução criminal, não
podendo esta, se prolongar indefinidamente, por culpa do juiz ou por atos procrastinatórios do
órgão acusatório. Se assim acontecer, configura constrangimento ilegal.
Por outro lado, dentro da razoabilidade, havendo necessidade, não se deve estimular
um prazo fixo para o término da instrução. Deve-se, portanto, seguir o princípio geral da
razoabilidade, hoje adotado pela maioria dos tribunais brasileiros, vale dizer sem prazo fixo
para o término da instrução. Na realidade, os prazos estabelecidos para a conclusão dos atos
de instrução são impróprios, vale dizer, não há sanção alguma se forem descumpridos, porém,
isso não significa que ultrapassá-los sem motivo razoável possa manter o acusado preso
indefinidamente.
Conclui Renato Brasileiro de Lima:A prisão cautelar deve estar obrigatoriamente comprometida com a instrumentalização do processo criminal. Trata-se de medida de natureza excepcional, que não pode ser utilizada como cumprimento antecipado de pena, na medida em que o juízo que se faz, para sua decretação, não é de culpabilidade, mas sim de periculosidade. (LIMA, 2014 p. 815)
Em outros termos, deve-se terminar, em nível ideal, a instrução nos prazos fixados
em lei. Porém, havendo fundamento para que tal não se dê, admite-se a prorrogação e,
existindo prisão cautelar adota-se o princípio da razoabilidade. Além disso, deve-se respeitar a
proporcionalidade, critério correlato, para que o tempo de segregação provisória não se torne
o indevido cumprimento antecipado da pena.
A previsão de decretação da prisão preventiva como ato de ofício do magistrado, sem
que qualquer interessado o provoque, é mais uma mostra de que o juiz, no processo penal
brasileiro, afasta-se de sua posição de absoluta imparcialidade, invadindo seara alheia, que é
do órgão acusatório, podendo decretar medida cautelar de segregação sem que qualquer das
partes, envolvidas no processo tenha solicitado.
29
A decretação da prisão permite ao indiciado ou réu a impetração de habeas corpus. A
negativa em decretá-la quando requerida pelo Ministério Público ou pelo querelante autoriza
o ingresso de recurso em sentido estrito (art. 581, V, CPP). Quando requerida pelo assistente
em caso de indeferimento, não há recurso cabível se houver representação da autoridade
policial, negada a preventiva, nada há a fazer, exceto se o Ministério Público concordou com
o pleito, e, portanto, passou a uma posição de interessado.
2.3.1 Pressupostos Da Prisão Preventiva
Nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva poderá ser
decretada para garantir a ordem pública, a ordem econômica, ou para garantir o resultado do
processo, quando houver prova de existência do crime e indício suficiente de autoria.
A prova da existência do crime é a certeza de que ocorreu uma infração penal, não se
podendo determinar o recolhimento cautelar de uma pessoa, presumidamente inocente,
quando há séria dúvida quanto a própria existência de evento típico. O indício suficiente de
autoria é suspeita fundada de que o indiciado ou o réu é o autor da infração penal. Não é
exigida prova plena da culpa, pois isso é inviável antes do julgamento de mérito.
A garantia da ordem pública é a hipótese de interpretação mais ampla e flexível na
avaliação da necessidade da prisão preventiva. Entende-se pela expressão a indispensabilidade
de se manter a ordem na sociedade, que, como regra, é abalada pela prática de um delito. Se
este for grave de particular repercussão com reflexos negativos e traumáticos na vida de
muitos, propiciando àqueles que tomam conhecimento da sua realização, um forte sentimento
de impunidade e de insegurança, cabe ao judiciário determinar o recolhimento do agente.
Ensina Vicente Filho que: A garantia da ordem pública tem sentido amplo. Significa a necessidade de se preservar bem jurídico essencial à convivência social, como, por exemplo, a proteção social contra réu perigoso que poderá voltar a delinquir, a proteção das testemunhas ameaçadas pelo acusado ou a proteção da vítima. (FILHO, 2012 p. 336)
Outro fator responsável pela repercussão social que a prática de um crime adquire é a
periculosidade, probabilidade de tornar a cometer delitos (caso típico de periculum in mora)
demonstrada pelo indiciado ou réu e apurada pela análise de seus antecedentes e pela maneira
de execução do crime. “A repercussão do crime ou clamor social, não são justificativas legais
para a prisão preventiva” (STF, RT, 549/517). Assim, é indiscutível que pode ser decretada a
prisão preventiva daquele que ostenta, por exemplo, péssimos antecedentes, associando a isso
a crueldade particular com que executou o crime.
30
Assim, um delito grave, normalmente são todos os que envolvem violência ou grave
ameaça à pessoa, associado à repercussão causada em sociedade, gerando intranquilidade,
além de se estar diante de pessoa reincidente ou com péssimos antecedentes, provoca um
quadro legitimador da prisão preventiva.
A conveniência da instrução criminal é o motivo resultante da garantia de existência
do devido processo legal, no seu aspecto procedimental. A conveniência de todo processo é
que instrução criminal seja realizada de maneira escorreita, equilibrada e imparcial, na busca
da verdade real, interesse maior não somente da acusação, mas, sobretudo, do réu. Diante
disso, abalos provocados pela atuação do acusado, visando à perturbação do desenvolvimento
da instrução criminal que compreende a colheita de provas de um modo geral, é motivo a
ensejar a prisão preventiva.
Conforme aduz Renato Brasileiro de Lima: Apesar do legislador usar a expressão “conveniência da instrução criminal”, a medida cautelar não pode se decretada com base em mera conveniência. Sua decretação está condicionada, sim, à necessidade ou indispensabilidade da medida a fim de possibilitar o bom andamento da instrução criminal. (LIMA, 2013, p. 915)
A garantia de aplicação da lei penal significa assegurar a finalidade útil do processo
penal, que é proporcionar ao Estado o exercício do seu direito de punir, aplicando a sanção
devida a quem é considerado autor de infração penal. Não tem sentido o ajuizamento da ação
penal, respeitando-se o devido processo legal para a aplicação da lei penal em caso concreto,
se o réu age contra esse propósito, tendo, nitidamente, a intenção de frustrar o respeito ao
ordenamento jurídico. Não bastasse já ter ele cometido o delito, que abala a sociedade, volta-
se agora, contra o processo, tendo por finalidade evitar que o direito de punir se consolide.
Ademais, para decretação da prisão preventiva é imprescindível que haja o fumus
boni iuris, fumus comissi delicti e o periculum in libertatis. Os primeiros consistem na
demonstração da materialidade dos fatos e indícios suficientes de autoria. Já o segundo,
consiste na demonstração da ineficácia ou impossibilidade da aplicação da lei penal no caso
de réu permanecer em liberdade, razão pela qual o Código de Processo Penal prevê a
decretação da mesma para garantia da ordem pública, ordem econômica, conveniência da
instrução criminal ou garantia da aplicação da lei penal.
Todavia, as medidas cautelares diversas da prisão, são, via de regra, preferíveis. Com
isso, o art. 282 do Código de Processo Penal, prevê expressamente a possibilidade de
substituição da prisão preventiva por outras medidas cautelares, sempre que for cabível e
suficiente.
31
2.3.2 Hipóteses Legitimadoras, Fundamentação, Revogação e Finalidade da Prisão
Preventiva
No tocante as hipóteses de decretação da prisão preventiva, o art. 313 do Código de
Processo penal, traz um rol taxativo de cabimento:
O art. 313 do Código de Processo Penal especifica, em um rol taxativo de cabimento,
que a prisão preventiva será admissível nos casos de crimes dolosos, punidos com pena
privativa de liberdade máxima superior a 4 anos (inciso I), nesse caso, o critério usado é a
quantidade de pena cominada, e não mais se a pena é de reclusão ou detenção; se o acusado
tiver sido condenado por outro delito doloso, em sentença transitada em julgado, mesmo que a
pena máxima cominada seja igual ou inferior a 4 anos, ressalvado o prazo depurador do art.
64, I, do Código Penal (inciso II); bem como se o crime envolver violência doméstica e
familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência para
garantir a execução das medidas protetivas de urgência (inciso III).
Segundo Fernando Capez: A Lei. 11.340/2006, Lei Maria da Penha, já previa a prisão preventiva nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. O código de Processo Penal, em sua nova redação, ampliou o cabimento para as hipóteses de vítima criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência. (CAPEZ, 2016, p. 339)
Pode-se, ainda, decretar a preventiva quando houver dúvida quanto à identidade civil
da pessoa suspeita ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la. Nessa
hipótese, o preso deve ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se
outra causa justificar a manutenção da prisão cautelar (art. 313, parágrafo único do Código de
Processo Penal).
Há previsão de regra especial, no art. 20 da Lei Maria da Penha (Lei n°.
11.340/2006), permitindo a decretação da prisão preventiva de ofício pelo juiz, “em qualquer
fase do inquérito policial ou da instrução criminal”, quando for caso de violência doméstica e
familiar contra a mulher.
Exige a Constituição Federal de 1988 que toda decisão judicial seja fundamentada
(art. 93, IX), razão porque, para decretação da prisão preventiva é indispensável que o
magistrado apresente as suas razões para privar alguém de sua liberdade, de forma a permitir
que a defesa possa constituir argumentos contrários em uma eventual impugnação. É o
previsto igualmente no art. 315 do Código de Processo Penal. Essa fundamentação pode ser
concisa, sem implicar nulidade por constrangimento ilegal.
32
A fundamentação do magistrado concentrando-se no parecer do Ministério Público,
pode ser admitida em certos casos, trata-se de fundamentação per relationem. Se o referido
parecer do membro do Ministério Público estiver bem estruturado, apontando e esgotando
toda a análise das provas, que estão a demonstrar a necessidade da prisão preventiva, nada
impede que o juiz o acolha integralmente. Nesse sentido, o STJ já entendeu não haver
nenhuma ilegalidade. Idêntica posição foi adotada pelo STF:A adoção do parecer do Ministério Público como razão de decidir pelo julgador, por si só, não caracteriza ausência de motivação, desde que as razões adotadas sejam formalmente idôneas ao julgamento da causa. (STF, HC 94.164/RS, 1° Turma, Rel. Min. Menezes Direito, DJ 22.08.2008.)
Porém, havendo coautoria ou participação deve o magistrado analisar,
individualmente, os requisitos para a decretação da prisão preventiva.
Dispõe o art. 316 do Código de Processo Penal que o juiz poderá revogar a prisão
preventiva se no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como
de novo decretá-la se sobrevierem razões que a justifiquem. Logo, a revogação da prisão
preventiva é norteada pela cláusula da rebus suc stantius, “enquanto as coisas estiverem
assim”.
Assim aduz Fernando Capez: Isto implica dizer que a decisão judicial que decretar a prisão preventiva ou outra medida cautelar diversa da prisão deverá ser reflexo da situação existente no momento em que proferida, persistindo o comando a ela inserido, enquanto esse mesmo contexto fático se mantiver. Se o reverso ocorrer e desfizer-se o cenário que justificou a determinação das providências emergenciais, caberá ao Poder Judiciário ordenar a respectiva revogação, reestabelecendo a situação anterior. (AVENA, 2015, p. 1052)
A prisão preventiva serve para garantia da investigação criminal e apuração da
verdade real dos fatos, protegendo os meios de prova. A garantia real se difere da processual,
pois nesta o que importa é o que foi levado aos auto pela parte, e não o que de fato aconteceu. No âmbito processual penal, a tutela jurisdicional cautelar é exercida através de uma série de medidas cautelares, para instrumentalizar quando necessário, o exercício da jurisdição. Afinal, em sede processual penal, é extremamente comum a ocorrência de situações em que essas providências urgentes se tornam imperiosas, seja para assegurar a corretar apuração do fato delituoso, a futura execução da pena. (LIMA, 2014, p.773)
Logo, a prisão preventiva não serve apenas como garantia processual de apuração da
verdade real, mas também para prevenir que o acusado esteja presente ao receber a
condenação permitindo a execução da pena imposta.
33
3. OS REFLEXOS JURÍDICOS, SOCIAIS E CARCERÁRIOS DA
INDETERMINAÇÃO DO PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA
3.1 A BANALIZAÇÃO DO INSTITUTO DA PRISÃO PREVENTIVA
Toda medida cautelar tem por finalidade assegurar a proteção dos resultados do
processo. Todavia, a aplicação de medidas cautelares de restrição de liberdade pode vir a
acarretar uma restrição de direitos e interesses do acusado, em maior ou menor grau.
Portanto, é necessário que haja um maior controle e ponderação para que seja decretada.
O problema das medidas cautelares, é que se não decretada corre-se o risco da
impunidade, mas se for decretada, tem-se o risco da injustiça. Porém, as medida cautelares
são, ou pelo menos deveriam ser, de cunho excepcional, principalmente as que têm a função
de restringir a liberdade do acusado, ou seja, a prisão deve ser no nosso ordenamento penal a
ultima ratio, tendo em vista que se põe em cheque um direito fundamental inerente ao
indivíduo.
Assim leciona Binder:O poder penal é um poder violento, e como consequência disto existe o princípio de ultima ratio, que é próprio de um Estado de Direito em uma sociedade democrática, que indica o dever do Estado de utilizar o poder penal o menos possível. (online)
Ocorre que no Brasil tem havido um uso crescente das prisões cautelares, isso tem
ocorrido dessa forma pois a sociedade vem sofrendo inseguranças devido ao aumento da
criminalidade desenfreado, e também de um sistema processual lento, em que na maioria das
vezes demora-se anos para se chegar a uma sentença, o que gera uma sensação de
impunibilidade, o que não poderia ocorrer, tendo em vista sua natureza instrumental.
Segundo Renato Brasileiro: Tendo em conta a função cautelar que lhe é inerente – atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal – a prisão cautelar também não pode ser decretada para dar satisfação à sociedade, à opinião pública ou à mídia. (LIMA, 2014, p. 816)
A maioria das decretações têm sido desnecessárias, observando apenas a legalidade
dos requisitos para sua aplicação, de forma que sua natureza cautelar prevista no art. 312 do
Código de Processo Penal tem ficado de lado. Além de que, antes de sua decretação, deve ser
analisado se outra medida diversa da prisão pode ser aplicada para aquele caso, sem que haja
tanto prejuízo tanto para o preso, quanto para o sistema judiciário e penitenciário.
Sobre esse tema, preconiza Victor Eduardo Rios Gonçaves: A prisão preventiva é, evidentemente, medida excepcional – embora tenha se tornado comum em razão da escalada da criminalidade violenta em nosso país. Em
34
face dessa excepcionalidade, o instituto rege-se ainda pelos princípios da taxatividade, adequação e proporcionalidade, não e sujeitando a regime de aplicação automática. Não pode a lei determinar hipóteses compulsórias de decretação da prisão preventiva que, assim sempre pressupõe a análise do fato concreto pelo juiz a fim de verificar a necessidade desta forma de prisão. (GONÇALVES, 2015, p. 392)
Essa discricionariedade do Poder Judiciário nas decretações das prisões preventivas
tem tido respaldo dado pelo legislador que dispôs no art. 312 do Código de Processo Penal
que a prisão preventiva poderia ser decretada para garantia da ordem pública ou econômica,
transformando o instituto em um instrumento de segurança pública, e perdendo sua natureza
cautelar.
Nesse sentido, preconiza André Nicolitt: Usar a prisão preventiva para garantir é antecipar os efeitos da pena, o que é inconstitucional. O mesmo se pode dizer em relação à ordem econômica, pois toda prisão cujo objetivo transcenda a ordem processual padece de inconstitucionalidade. (NICOLITT, 2014, p.751)
Além disso, existem outras formas de se garantir a ordem econômica, diferente da
prisão e provavelmente até mais eficaz, como por exemplo o sequestro de bens. Desta forma,
para André Nicolitt “os únicos fundamentos, constitucionalmente válidos, para a prisão
previstos no art. 312 do CPP são: o risco à instrução processual e o risco à aplicação da lei
penal.” (2014, p.752).
Trata-se, portanto, de uma inconstitucionalidade substancial, tendo em vista que a
prisão preventiva deveria servir para garantir o resultado útil do processo, e não como
antecipação da pena, de forma que quando o legislador não traz uma definição concreta de
“garantia de ordem pública” deixa margem para o Poder Judiciário dispor da maneira como
quiser, permitindo uma interpretação extensiva in malan partem da lei penal, vedado no
ordenamento jurídico.
Nesse sentido, afirma Aury Lopes Júnior que: É inconstitucional atribuir à prisão cautelar a função de controlar o alarma social, e, por mais respeitáveis que sejam os sentimentos de vingança, nem a prisão preventiva pode servir como pena antecipada e fins de prevenção, nem o Estado, enquanto reserva ética, pode assumir esse papel vingativo. (LOPES, 2015, p. 650)
Além disso, as prisões preventivas para garantia da ordem pública tornaram-se
instrumento de satisfação do clamor público. Contudo, o Poder Judiciário, tem utilizado as
medidas restritivas de liberdade como forma de dar a sociedade uma sensação de punibilidade
e segurança jurídica, mesmo que por determinado período de tempo.
Como leciona Rogério Cruz:
Se é difícil oferecer à uma população uma resposta rápida para os desvios criminais,
35
de modo que se tenha uma mínima sensação de segurança e de credibilidade nas instituições, a mensagem que grassa é: prendam-se cautelarmente os suspeitos, ainda que por alguns dias. [...] em decorrência da qual se corre o risco de que, com mais tipos de punições e mais graves (more of the same) se produza, ao invés de redução de crimes, maior violência social. (CRUZ, 2017, p. 19)
Outro problema a se encarado é a indeterminação temporal das prisões preventivas,
assumindo, portanto, caráter de antecipação de cumprimento de pena, o que viola diretamente
o princípio da presunção de inocência.
Contudo, tendo em vista indeterminação do prazo para prisão preventiva, precisa ser
feita uma análise do caso concreto para averiguar se tem havido excesso no prazo, e com isso
a violação de direito fundamental.
Segundo Renato Brasileiro Lima: Tem-se considerado que o excesso de prazo na formação da culpa é medida de todo excepcional e somente estará caracterizado nas seguintes hipóteses: mora processual decorrente de diligências suscitadas exclusivamente pela atuação da acusação, mora processual decorrendo de inércia do Poder Judiciário, em afronta ao direito à razoável duração do processo e mora processual incompatível com o princípio da razoabilidade evidenciando-se um excesso abusivo, desarrazoado, desproporcional. (LIMA, 2013, p. 933)
Logo, o excesso na constrição da liberdade do preso provisória derivado de
negligência da acusação ou falha do Poder Judiciário, pode caracterizar constrangimento
ilegal.
Nesse sentido, também já se manifestou o Min. Celso de Mello: O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário, não derivando, portanto, de qualquer fato procrastinatório causalmente atribuível ao réu, traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas (CF, 5°, LXXVIII) e com todas as garantias reconhecidos pelo ordenamento constitucional, inclusive a de não sofrer o arbítrio da coerção estatal representado pela privação da liberdade por tempo irrazoável ou superior àquele estabelecido em lei.
Isso porque, quando ficar evidenciado que o atraso no processo decorreu de desídia
do acusado, não há que se falar em constrangimento ilegal, conforme súmula n° 64 do STJ,
afinal, ninguém pode se beneficiar da sua própria torpeza.
A partir do momento em que uma prisão preventiva torna-se ilegal, deve ser imediatamente
relaxada. Contudo, não adiantaria uma prisão ilegal ser relaxada se o Juiz poderia decretá-la
novamente. Logo, para que o Magistrado possa decretar novamente a prisão preventiva,
devem haver razões novas, ou seja, que tenham sido após a soltura do réu.
Nesse sentido, aduz o doutrinador Renato Brasileiro de Lima:
36
Deveras, se a prisão preventiva por excesso de prazo no encerramento do processo, seria expediente arbitrário e desleal restabelecer a detenção por meio de novo mandado de prisão preventiva. (LIMA, 2014, p.937)
Ademais, o art. 311 do Código de Processo Penal, autoriza o Juiz a decretar a prisão
preventiva de ofício, desde que no curso da Ação Penal. Tal dispositivo viola diretamente o
princípio da inércia de jurisdição, visto que mesmo que a prisão preventiva não seja uma ação
autônoma, possui natureza de ação cautelar, logo, deve o juiz ser provocado.
De acordo com André Nicolitt: A segunda crítica que o dispositivo exige diz respeito à decretação da prisão de ofício pelo juiz. O modelo acusatório do processo penal estruturado pela Constituição de 1988 exige do juiz uma postura de inércia e equidistância no processo penal, sem as quais não é possível sua imparcialidade e a efetiva tutela das garantias fundamentais em jogo no processo penal. A prisão preventiva como medida cautelar representa o exercício de uma espécie de ação cautelar, embora não tenha autonomia no processo penal. Sendo assim, é impensável que o juiz possa exercer ação no curso do processo, ou seja, prestar tutela jurisdicional cautelar, sem provocação. (NICOLITT, 2014, p. 750)
Diante disto, nota-se que a prisão preventiva tem se distanciado do seu caráter
cautelar para ser utilizada como verdadeira antecipação da pena, o que viola diretamente os
princípios da presunção de inocência e devido processo legal, tendo em vista que, a função da
prisão preventiva não é de punir e ressocializar, mas de garantir a instrumentalidade do
processo, outrossim, a crença nas instituições jurídicas não podem depender exclusivamente
do encarceramento das pessoas, principalmente quando o cárcere gera mais malefícios para
preso, do que benefícios.
3.2 OS MALEFÍCIOS NAS VIDAS DOS ENCARCERADOS PREVENTIVAMENTE
O Código Penal brasileiro, adotou o sistema penitenciário denominado de
progressivo, que consiste em estimular o preso à reintegração do convívio social. Esse sistema
foi mentalizado na cidade de Ilha de Norfolk na Austrália, pelo capitão Alexandre
Maconochie em 1840. A ideia era implementar um sistema penitenciário em que a duração da
pena fosse medida pelo desempenho laboral do preso, corroborado com uma boa conduta
carcerária.
Conforme Alessandro Baratta:Esse sistema consistia em medra duração da pena através de uma soma do trabalho e da boa conduta imposta ao condenado, de forma que, à medida que o condenado satisfazia essas condições, ele computava um certo número de marcar (mark system), de tal forma que a quantidade de marcas que o condenado necessitava obter antes de sua liberação deveria ser proporcional à gravidade do delito por ele praticado. (BARATTA, 2016, p. 64)
37
O aplicador da lei penal, deve se preocupar com os malefícios gerados pelo ambiente
carcerário principalmente ao preso provisório. Estes, em muitas situações piores até mesmo
dos que já possuem uma sentença condenatória, tendo em vista que os preso definitivos sabem
que terão sua liberdade ao fim da pena determinada, enquanto o preso provisório não sabe ao
certo quanto tempo permanecerá sem liberdade e se for condenado quanto tempo ainda restará
para ser cumprido.
Segundo Benigno Núñez Novo: O sistema penitenciário, tal como ele existe na sociedade capitalista, principalmente aqui no Brasil, é extremamente cruel, não só porque confina fisicamente o homem, sem que esse homem possa compreender o problema da liberdade, senão em relação à sua locomoção física, mas ele destrói a subjetividade do homem, no sentido de não lhe oferecer nenhuma possibilidade de racionalização da situação em que se encontra. (online)
Além disso, o preso provisório não é assistido pelos mesmos direitos concedidos
àqueles já se encontram em período de execução da pena, ou seja, não há qualquer
investimento do Estado em relação aos presos preventivos, de forma que em determinados
casos a prisão provisória torna-se mais onerosa do que se de fato recebesse uma sentença.
Assim ensina Rogério Cruz: Quando se trata de prisão cautelar, há ainda outros malefícios a serem considerados. Primeiramente, dada a instabilidade do período da estada carcerária, não há interesse em qualquer investimento pedagógico sobre a pessoa do preso, que permanece aguardando ou a revogação de sua prisão, ou a confirmação de sua pena, para que, aí sim, possa saber por quanto tempo ainda restará preso. (CRUZ, 2017, p. 29)
Outro problema enfrentado no ordenamento jurídico brasileiro é a crise carcerária em
que se encontra, o que tem gerado o cumprimento de uma função contrária à da prisão. Nos
últimos quatorze anos o Ministério da Justiça junto ao Departamento Penitenciário Nacional,
registraram um aumento na população carcerária de 267,32%.
Conclui Dráuzio Varella: É fato que a prisão – “lugar povoado de maldade”– despersonaliza e dissocializa o indivíduo, que se isola do mundo externo, passando a conviver em outro grupo social, formado por pessoas portadoras de rancor, de ódio, de angústia, de melancolia, e tanto outros sentimentos presente em quem se vê privado de sua liberdade. (VARELLA, 1999, p. 13)
Logo, a crise no sistema penitenciário impossibilita a reabilitação do preso ao
convívio social, tendo em vista as repercussões negativas na sua condição física e psíquico,
pelas condições às quais ficam sujeitos durante o encarceramento, de forma que os tornam
incompatíveis com a vida em sociedade.
Os principais impactos que a prisão traz para a vida do preso e para a sociedade são:
38
desfazimento do berço familiar, contribuição para o crescimento do número de criminosos,
acarreta aumento desnecessário nas despesas públicas, agrava ou ruína a saúde do preso.
Ensina Alexandre Moraes que:A complexidade e a profundidade do problema tornam essenciais sugestões que envolvam uma política criminal racional para a modernidade, de modo que, diante invevitabilidade do momento se delimite um “direito penal do inimigo” com regras claras e bem fixadas evitando a contaminação de todo o sistema.” (MORAES, 2011, p. 318)
Estudos comprovam que o regime carcerário no Brasil provoca sérias violações
físicas e psíquicas nos presos. A ressocialização do encarcerada tornou-se algo quase que
utópico na realidade em que se encontram as penitenciárias brasileiras. O sistema
penitenciário tem tornado os presos incompatíveis para vida em sociedade.
A “subcultura” ao qual são inseridos, o novo tipo de comunidade informal ao qual se
deparam ao entrarem nos estabelecimentos prisionais fazem com que o reeducando adquira
uma nova personalidade, para que seja aceito dentro desse novo sistema. Logo, nota-se o
encarceramento sob um aspecto negativo do processo de ressocialização do réu.
Segundo Alessandro Baratta: Este é examinado sob um duplo ponto de vista: antes de tudo, o da “desculturação”, ou seja, a desadapatação às condições necessárias para vida em liberdade (diminuição da força de vontade, perda do sendo de autorresponsabilidade do ponto de vista econômico e social), a redução do sendo de realidade do mundo externo e a formação de uma imagem ilusória deste, o distanciamento progressivo dos valores e dos modelos de comportamento próprios da sociedade externa. (BARATTA, 2016, p.184)
Em face disso, o processo de reinserção do condenado tem sido reconduzido para
dois novos processos, tais quais a educação para ser criminoso e a educação para ser bom
preso, seguindo os moldes legais estabelecidos.
O primeiro decorre da organização do sistema informal criado pelos próprios encarcerados.
Eles criam seus próprios modelos os quais devem ser seguidos, determinando uma hierarquia
entre os presos dentro do estabelecimento penitenciário, que é comandado por uma minoria
dos condenados.
Já a educação para ser bom preso, consiste em respeitar as regras formais da
instituição, como também na aceitação das regras criadas dentro do próprio sistema informal
criado pelos encarcerados, em troca de benefícios, privilégios, e muitas vezes até, por
proteção.
Seguindo ainda o mesmo autor: Em geral, pode-se dizer que a adaptação a estas normas tende a interiorizar modelos exteriores de comportamento, que servem ao ordenado desenvolvimento da vida da
39
instituição. Esta se torna o verdadeiro objetivo da instituição, enquanto a função propriamente educativa é amplamente excluída do processo de interiorização das normas, também no sentido de que a participação em atividades compreendidas diretamente nesta função ocorre com a motivação estranha a ela, e de que é favorecida a formação de atitudes de passivo conformismo e de oportunismo. (BARATTA, 2016, p. 185)
Logo, diante desta realidade fática o preso passa por um processo de “aculturação”,
tornando-se inadequado para o convívio social fora da penitenciária, por haver uma mudança
nos valores e modelos que devem ser seguidos, para que sobreviva ao regime carcerário, e até
mesmo pela natureza do cárcere, pois o indivíduo fica excluído da sociedade, dificultando sua
reinserção.
3.2.2 A Banalização da Prisão Preventiva e a Superlotação dos Estabelecimentos
Prisionais
Os estabelecimentos prisionais não têm cumprido sua função primordial que seria de
ressocializar o preso, isto é notório pelos índices de reincidência de seus egressos. A crise
carcerária tem como uma das suas principais razões a superlotação dos estabelecimentos
prisionais, que inviabiliza um tratamento descente conforme os ditames da Lei de Execução
Penal.
A superlotação das penitenciárias vem sendo corroborado pela banalização do
instituto da prisão preventiva. Dados do CNJ mostram que em 2016 o sistema carcerário
abriga 660 mil presos, tendo capacidade para comportar apenas 401 mil. Desses presos, 243
mil são provisórios, ou seja, que ainda não receberam uma condenação, o que corresponde a
40% da população carcerária.
Segundo a Raul Jungmann, o Brasil “caminha para se tornar refém do sistema
penitenciário”. Isto porque, a população carcerária do Brasil cresce 8,3% ao ano, de forma
que até o ano de 2018 a população carcerária caminhava para um total de 700 mil presos,
tendo no entanto, vagas apenas pouco mais de 400 mil vagas nos estabelecimentos penais.
As péssimas condições as quais são submetidos têm chamado a atenção de entidades
engajadas na defesa dos Direitos Humanos. Espaço físico inadequado, tortura, maus tratos,
rebeliões e atentados frequentes nas prisões, são alguns dos problemas enfrentados dentro das
penitenciárias, devido à superlotação.
Segundo Carlos Alberto Marchi Queiroz: Atualmente, a não ser, talvez, pena destinação dos espaços físicos, os estabelecimentos prisionais brasileiros não passam de autênticos depósitos de criminosos condenados pela Justiça Pública. (QUEIROZ, online)
40
A expectativa de vida dentro do cárcere é mais baixa do que a do homem médio, isso
se dá pela facilidade das doenças se proliferarem dentro desse ambiente. O conselheiro
Rogério Nascimento em audiência pública na Comissão Especial de Sistema Penitenciário da
Câmara dos Deputados afirmou: “O sistema carcerário brasileiro é doente e mata.”
Contudo, é imprudente colocar um indivíduo que sequer recebeu uma condenação
dentro de um sistema penitenciário tóxico, sem ter observado a excepcionalidade, diante desta
realidade fática. O sistema prisional brasileiro enfrenta um grande transtorno que, dentre outros fatores, também é reflexo da banalização do uso da prisão preventiva. A má decretação da medida, consiste na utilização indiscriminada e inadequada desta, devido à inobservância da presença dos seus requisitos necessários. (online)
Ademais, o Brasil é o país que possui a quarta maior população carcerária do mundo,
sendo 40% desses presos provisórios. Sendo estes colocados nos mesmos estabelecimentos
precários e falidos dos que já receberam sua sentença. Além de ter sua liberdade cerceada, o
preso preventivo tem seu direito à integridade física e psíquica violados, não terem direitos
garantidos pela Lei de Execução Penal por não estarem em fase de execução de pena e
principalmente, não tem previsão de quando saem devido à ausência de previsão legal para o
término da prisão preventiva.
3.3 ASPECTOS DO PROJETO DE LEI N.º 7.741, DE 2017
A necessidade de se determinar um prazo para decretação da prisão preventiva não é
recente. Nesse sentido, os tribunais, por muito tempo, passaram a entender que a duração da
prisão preventiva deveria ser de 81 (oitenta e um) dias, sob pena de do excesso no prazo
caracterizar constrangimento ilegal.
Esse prazo de 81 (oitenta e um) dias foi fixado pelo Tribunal de Justiça de Minas
Gerais, onde levou-se em consideração a soma dos prazos da persecução penal, desde o início
do inquérito policial até a sentença definitiva.
Contudo, posteriormente esse entendimento passou a prever que tal prazo deveria ser
observado apenas até o fim da instrução criminal. Com isso, o STJ (Superior Tribunal de
Justiça) editou a Súmula n° 52: “Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de
constrangimento por excesso de prazo).
Porém, após o Código de Processo Penal passar por uma reforma em 2008, o
entendimento do prazo de 81 (oitenta e um) ficou defasado, pois não se estabeleceu regras
claras quanto a duração da prisão cautelar. Portanto, não há atualmente no ordenamento
41
jurídico previsão legal para a duração do prazo do instituo da prisão preventiva.
Nesse sentido, aduz Renato Brasileiro de Lima: Impera, no processo penal comum brasileiro, absoluta indeterminação acerca do prazo de duração da prisão preventiva, que passa a assumir contornos de verdadeira pena antecipada. Isso porque, ao contrário da prisão temporária, que possui prazo fixado, o Código de Processo Penal não prevê prazo determinado para duração da prisão preventiva. Assim, a prisão preventiva, cuja natureza cautelar deveria revelar a característica da provisoriedade, acaba por assumir caráter de verdadeira prisão definitiva. (LIMA, 2013, p. 926)
O Projeto de Lei n° 7.741 de 2017, foi criado com a finalidade de acrescentar ao art.
311 do Código de Processo Penal um prazo e reexame necessário para a prisão preventiva.
Tal projeto dispõe que:
O CONGRESSO NACIONAL decreta: Art 1º O artigo 311, do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941,passa a vigorar acrescido dos seguintes parágrafos:“Art. 311, § 1º. O prazo da prisão preventiva não poderá ultrapassar a120 (cento e vinte) dias quando o réu estiver preso, prorrogáveis ematé igual período, por decisão fundamentada, devidamente motivadapela complexidade da causa ou por fato procrastinatório atribuível aoréu.§ 2º. Qualquer que seja o seu fundamento legal, a prisãopreventiva que exceder a 60 (sessenta) dias será obrigatoriamentereexaminada pelo juiz ou tribunal competente, para avaliar sepersistem, ou não, os motivos determinantes da sua aplicação,podendo substituí-la, se for o caso, por outra medida cautelar”. (NR)Art 2º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.
O Sr. Vinicius de Carvalho, autor do projeto de lei que visa modificar o art. 311 do
Código de Processo Penal, dispõe em sua justificação a necessidade de se estabelecer um
prazo para prisão preventiva e seu reexame periódico necessário tendo como base a
superlotação do sistema carcerário do Brasil.
Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional, 250 (duzentos e cinquenta)
mil encarcerados são provisórios, o que representa 40% da população carcerária.
O autor critica a falta de taxatividade conceitual da lei, ao dispor sobre as hipóteses
de cabimento da prisão preventiva, visto que o legislador não trouxe definições claras para
decretação desta. Logo, a discricionariedade do Poder Judiciário para decretação da prisão
preventiva, corroborada pela falta de taxatividade conceitual trazida pela lei, somada às
péssimas condições dos estabelecimentos prisionais, tornam tal medida em verdadeira
antecipação de pena, e isto é motivo suficiente para determinação do prazo da prisão.
Aduz Sr. Vinicius de Carvalho: O uso banalizado e discricionário da prisão preventiva pode acabar porgerar situações onde o indiciado permaneça exposto a situações abusivassubvertendo os fins que legitimam a utilização do instituto para verdadeiro meio de
42
antecipação executória da sanção penal.
Ainda nesse sentido: Registre-se que a tutela cautelar processual penal objetiva a prevençãode dano ou prejuízo da demora da prestação jurisdicional tendo papel fundamental para o alcance de uma eficácia prática da sentença final, entretanto, observa-se que o uso desmedido deste instituto acaba por gerar segregações preventivas que se revelam como interferências invasivas e desproporcionais na esfera dos direitos fundamentais do acusado.
Além da determinação do prazo, o autor defende também a necessidade de um
reexame periódico necessário, logo, para a manutenção da prisão preventiva, o magistrado
teria que fazer uma análise do caso concreto a cada período de tempo que o réu passou
encarcerado, para averiguar se ainda existe a necessidade de mantê-lo preso.
43
CONCLUSÃO
O que se denota do estudo do Projeto de Lei n° 7.741 de 2017 é a real necessidade de
uma determinação para o prazo da prisão preventiva, e um reexame periódico obrigatório. Isto
porque, tem-se havido uma interpretação extensiva in malan partem na utilização dessa
medida cautelar.
A falta na taxatividade conceitual trazida pelo legislador, tem ocasionado uma
inconstitucionalidade no instituto da prisão preventiva. Ocorre que, como previsto no texto
legal, a prisão preventiva poderia ser decretada para garantir a ordem pública e a ordem
econômica. Ora, o desvio de finalidade está expresso, visto que por tratar-se de medida
cautela, só deveria ser aplicada para garantir a instrução processual.
Diante disto, o Poder Judiciário tem-se utilizado deste instituto como forma de
satisfação do clamor público, e ainda colocando-o como única forma eficaz de obter uma
correta aplicação da lei penal, o que não poderia ocorrer, pois o Direito Penal não tem como
única ferramenta para desestimular a prática criminosa o encarceramento discricionário do
acusado.
Todavia, considerando que a população carcerária no Brasil, está submetida à
condições subumanas, a decretação de uma prisão, mesmo que cautelar, sem que tenha se
observado o binômio adequação e proporcionalidade, fere diretamente os direitos
fundamentais protegidos pela Constituição Federal de 1988.
Além disso, a prisão preventiva não poderia ser decretada ofício, conforme prevê o
art. 311 do Código de Processo Penal, visto que viola o princípio da inércia jurisdicional, pois
apesar do sistema processual penal brasileiro não prever como ação autônoma, as medidas
cautelares possuem esta natureza, devendo portanto, haver provocação da acusação para que a
mesma pudesse ser decretada.
Por isso, o Projeto Lei n° 7.741 de 2017, propõe alteração no art. 311 do Código de
Processo Penal, com o intuito de trazer a cautelaridade, essência das medidas cautelares, para
o instituto da prisão preventiva.
O reexame periódico trazido pelo projeto de lei, vem como instrumento de garantia
do não excesso de prazo, visto que, levaria o magistrado a fazer uma reanálise do caso
concreto, para averiguar se ainda existe a necessidade de manter o réu dentro do cárcere. Isto
deve ocorrer, pois atualmente o excesso de prazo das prisões preventivas, têm gerado a
execução antecipada da pena, o que viola princípio constitucional da presunção de inocência.
44
As medidas cautelares não podem servir como instrumento de antecipação de pena.
Ademais, a inserção precoce do acusado no sistema penitenciário pode gerar um efeito
contrário, haja vista que o sistema penitenciário brasileiro não tem atingido sua finalidade que
é a de ressocializar. Logo, a inserção de um indivíduo ainda inocente no cárcere, pode vir a
torná-lo de fato um delinquente.
Contudo, tendo em vista que atualmente a população carcerária é composta de 40%
de presos provisórios, a determinação do prazo da prisão preventiva assim como seu reexame
periódico necessário, seria uma das formas de se desafogar a superlotação nos
estabelecimentos prisionais.
Considerando a liberdade como bem jurídico maior, não pode a lei penal como
ultima ratio anuir sua restrição arbitrária e se fundamento, agravada pelas condições
subumanas de um sistema carcerário falido. Logo, para que a utilização de uma prisão
preventiva substancialmente constitucional, é mister a determinação de um prazo, com intuito
de manter a essência cautelar de tal medida.
45
REFERÊNCIAS
AVENA, Norberto. Processo Penal: esquematizado. 7 ed. São Paulo: Método, 2015.
BARATTA, Alessandro: Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal. 6 ed. Rio de
Janeiro: Revan, 2016.
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das Penas. Tradução: Ed. Martin Claret Ltda. Ano 2000.
Título original: Dei Delitti e Delle Pene (1764). Pág. 101.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: causas e alternativas. 4. ed.
São Paulo. Saraiva. 2012, p. 52.
BRASIL. Decreto- Lei n°3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Diário
Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 13 de outubro de 1941. Disponível
em< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm >. Acesso em 01 de
março de 2019.
BRITO, Alexis. FABRETTI, Humberto. LIMA, Marco. Processo Penal Brasileiro. Única
edição. São Paulo: Atlas, 2012
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
CRUZ, Rogerio Schietti Machado. Prisão Cautelar - Dramas, Princípios e Alternativas -
Com a Lei 12.403/11. 2 ed. São Paulo: Lumen Juris, 2011.
CRUZ, Rogerio. Prisão Cautelar: Dramas, Princípios e Alternativas. 3 ed. Salvador:
Juspodivm, 2017.
DE OLIVEIRA, Eugênio. Curso de Processo Penal. 11 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2009.
DE OLIVEIRA, Eugênio. Curso de Processo Penal. 11 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2009.
FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
GIACOMOLLI, Nereu José. Algumas marcas inquisitoriais do Código de Processo Penal
brasileiro e a resistência às reformas. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, São
Paulo.
ISHIDA, Válter. Prática Jurídica Penal. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2011.
LIMA, Renato. Manual de Processo Penal. 2 ed. Salvador: Juspodivim, 2014.
LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
MARQUES, Ivan. MARTINI, João Henrique. Processo Penal III. Procedimento e prisão.
São Paulo: Saraiva, 2012.
46
MESSA, Ana Flávia. Prisão e Liberdade. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
MORAES, Alexandre: Direito Penal do Inimigo: A Terceira Velocidade do Direito Penal. 2
ed. Curitiba: Juruá, 2011.
NICOLITT, André. Manual de Processo Penal. 5ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
LIMA, Renato. Curso de Processo Penal. Niterói: Impetus, 2013
NUCCI, Guilherme. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 11 ed. São Paulo:
Forense, 2014.
NUCCI, Guilherme. MOURA, Maria Thereza. Revistas do Tribunais 100 anos. Doutrinas
Essenciais Processo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 21 ed. São Paulo: Atla, 2017.
PIMENTEL, Irene. O Tribunal Plenário, instrumento de justiça política do Estado Novo.
Disponível em: http://jugular.blogs.sapo.pt/1728394.html. (acesso em 01 de março de 2019)
SANTOS, Marcos. O Novo Processo Penal Cautelar. Única edição. Salvador: Juspodvim,
2011.
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional positivo. Ed. 25ª. São Paulo:
Malheiros, 2005.
ULISSES, Wagner. Levantamento dos Presos Provisórios do País e Plano de Ação dos
Tribunais. Disponível em < http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/84371-levantamento-dos-
presos-provisorios-do-pais-e-plano-de-acao-dos-tribunais > Acesso em 01 de março de 2019.
VARELLA, Drauzio. Carceireiros. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
<https://delegado.grancursosonline.com.br/prisao-cautelar-nova-lei-migracao/ >(acesso em 24
de março de 2019)
<https://amandayamauthi.jusbrasil.com.br/artigos/202222661/a-banalizacao-da-prisao-
preventiva >(acesso em: 24 de março de 2019)
<http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/85245-o-sistema-carcerario-e-doente-e-mata-diz-rogerio-
nascimento-do-cnj >(acesso em: 27 de março de 2019)
<http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/84618-crise-dos-presidios-no-norte-cnj-esta-atento
>(acesso em: 27 de março de 2019)
<https://vbserpa.jusbrasil.com.br/artigos/499906195/as-prisoes-preventivas-e-a-superlotacao-
carceraria>(acesso em: 27 de março de 2019)
<https://g1.globo.com/politica/noticia/2018/07/20/brasil-caminha-para-se-tornar-refem-do-
sistema-prisional-diz-jungmann.ghtml> (acesso em: 23 de maio de 2019)
<https://especiais.g1.globo.com/monitor-da-violencia/2018/raio-x-do-sistema-prisional/>
(acesso em: 23 de maio de 2019)
47
<https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/10325/A-realidade-do-sistema-prisional-
brasileiro> (acesso em: 23 de maio de 2019)