Trabalho Nbr 15165
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Universidade de So Paulo
Faculdade de Sade Pblica
A discricionariedade tcnica nos atos
administrativos sanitrios
ALEXANDRE NEMER ELIAS
Dissertao apresentada ao Programade Ps-Graduao em Sade Pblicapara obteno do ttulo de Mestre emSade Pblica
rea de Concentrao: Servios deSade Pblica
Orientador: Prof. Dr. Laurindo DiasMinhoto
So Paulo2008
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A discricionariedade tcnica nos atos
administrativos sanitrios
ALEXANDRE NEMER ELIAS
Dissertao apresentada ao Programade Ps-Graduao em Sade Pblica da
Faculdade de Sade Pblica daUniversidade de So Paulo paraobteno do ttulo de Mestre em SadePblica
rea de Concentrao: Servios deSade Pblica
Orientador: Prof. Dr. Laurindo Dias
Minhoto
So Paulo2008
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expressamente proibida a comercializao deste documento tanto na
sua forma impressa como eletrnica. Sua reproduo total ou parcial
permitida exclusivamente para fins acadmicos e cientficos, desde que
na reproduo figure a identificao do autor, ttulo, instituio e ano da
dissertao.
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Aos meus pais, Jorge Nemer Elias,
Lia Santa Terra Elias, e minha
esposa Sandra Regina M. Campos
Nemer Elias.
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AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador professor Laurindo Dias Minhoto, pela confiana e
pacincia durante o processo de orientao.
professora Sueli Gandolfi Dallari, pelo apoio depositado no trabalho
proposto.
A meus colegas da Nemer e Dacorso Advogados Associados e em especial
a meu scio, pelo apoio cotidiano.
Eliane Arajo e Adelaide do CEPEDISA e a todos aqueles que
participaram direta ou indiretamente da realizao deste importante sonho.
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RESUMO
Por meio de uma intensa explorao doutrinria, vem se discutindo as
mutaes do direito frente exploso tecnolgica no mundo e, em especial,
tecnificao das atividades de atuao do Estado. Diante dessa situao,
exploramos na doutrina internacional e nacional o conceito de um instituto
intimamente ligado tecnificao da atividade Estatal chamado de
discricionariedade tcnica. Com esta explorao, temos o intuito de
demonstrar que, alm de esta doutrina ser plenamente aplicvel no direito
ptrio, a situao de fato correspondente tecnificao pela aplicao ao
direito dos conhecimentos cientficos de engenharia, biologia, medicina,
sade pblica, entre outros, impulsionado pelas agncias reguladoras,
demanda o seu reconhecimento como forma de controle e proteo dos
direitos contra eventuais abusos e ilegalidades da Administrao Pblica e,
especialmente, da Administrao Pblica Sanitria. Por isso, iniciamos com
os conceitos da discricionariedade tcnica em suas duas modalidades e,
aps isto, buscamos, nas mais recentes doutrinas, os conceitos e limites
identificados para a atividade discricionria tcnico-administrativa, alm de
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exemplificar ao leitor, circunstncias em que tal discricionariedade se impe.
Paralelamente conceituao, demonstramos a correlao e a relevncia
do reconhecimento deste instituto para o direito sanitrio, buscando
exemplos existentes neste ramo jurdico para melhor ilustrar a pesquisa.
Aps conceituar e exemplificar, passamos, finalmente, a justificar a real
relevncia deste estudo levantando na doutrina os limites formais e materiais
deste instituto, como maneira de fornecer ferramentas para a proteo dos
direitos coletivos e individuais contra atos ilegais.
Descritores: Direito Administrativo Sanitrio Discricionariedade
Discricionariedade Tcnica Discricionariedade Tcnico-Administrativa
Ato Administrativo Sanitrio Ato Normativo Regulatrio Tecnificao do
Estado.
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ABSTRACT
By means of an intense doctrinaire exploration, people have discussed the
mutations of law before the technological explosion in the world and,
especially, to the technological development of the activities which the State
acts. Because of that situation, we have explored in the international and
national doctrine the concept of an institute connected to the technological
development of the State activity which is called technical discretionarity.
With this exploration, we wish to demonstrate that, not only is this doctrine
fully applicable in Paternal Law, actually the situation corresponding to the
technical development by means of the application to the right of the
scientific knowledge of engineering, biology, medicine, public health, among
others, impelled by Regulatory Authorities, demands its recognition as a way
to control and protect the rights against eventual abuses and illegalities of
Public Administration and, especially, of Health Administration. Therefore, we
began with the concepts of the technical discritionarity in its two modalities
and, after that, we searched, in more recent doctrines, the concepts and
identified limits for the technical-administrative discretionary activity, besides
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exemplifying the reader, circumstances in which such discritionarity is
imposed. Parallel to the conception, we demonstrated the correlation and the
relevance of the recognition of this institute for Health Law, looking for
existing examples in this juridical branch in order to better illustrate the
research. After classifying and exemplifying it, we finally started to justify the
real relevance of this study raising in the doctrine the formal and material
limits of this institute, as a way to supply tools for the protection of collective
and individual rights against illegal actions.
Keywords: Administrative Health Law Discretionarity - Technical
Discritionarity Technical - Administrative Discretionarity - Administrative
Health Act Normative Act of a Regulatory Authority Technical
Development of the State.
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NDICE
Pgina
I Introduo 12
II Conceito e as modalidades da discricionariedadetcnica 19
2.1 O conceito clssico da discricionariedade administrativa e a
sua incapacidade de prover solues diante da atividadetcnico-administrativa do Estado na atualidade.......................................
2.2 A discricionariedade tcnica, suas modalidades e diferenas......
2.3 H discricionariedade na realizao de aes tcnicas pelaAdministrao? O estgio atual da Administrao Pblica.............
2.4 O termo tcnica e a discricionariedade.......................................................
2.5 A discricionariedade tcnica e a atividade tcnico-interpretativa da administrao a discricionariedade
instrumental jurdico-tcnica...................................................................................
2.5.1 A discricionariedade instrumental e a teoria dosconceitos jurdicos indeterminados......................................................
2.5.2 A discricionariedade instrumental jurdico-tcnica....................
2.6 A discricionariedade tcnico-administrativa................................................
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III A discricionariedade tcnico-administrativa nossistemas jurdicos estrangeiros 59
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3.1 A discricionariedade tcnica nos pases adotantes do direitoanglo-saxo.........................................................................................................................
3.1.1 A discricionariedade tcnica no sistema jurdicoestadunidense......................................................................................................
3.1.2 A discricionariedade tcnica no sistema jurdico ingls........
3.2 A discricionariedade tcnica nos pases adotantes do direitoromanstico...........................................................................................................................
3.2.1 A discricionariedade tcnica no sistema jurdico italiano.....
3.2.1.1 Incio do debate do conceito da discricionariedade
tcnica.......................................................................................................
3.2.1.2 A posio da doutrina da segunda metade do sculoXX o crescimento da tecnificao e esta influnciana atividade do Estado......................................................................
3.2.1.3 O entendimento atual da doutrina italiana e atecnificao da administrao pblica. Adiscricionariedade tcnico-administrativa nascida dainterferncia da tcnica no direito administrativo................
3.2.2 A discricionariedade tcnica no sistema jurdicoportugus.................................................................................................................
3.2.3 A discricionariedade tcnica no sistema jurdicoargentino..................................................................................................................
3.2.4 A discricionariedade tcnica no sistema jurdicoespanhol...................................................................................................................
3.2.4.1 As teorias sobre a discricionariedade tcnico-administrativa da autora EVA DESDENTADO DAROCA.........
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IV A relevncia da discricionariedade tcnico-administrativa para o direito sanitrio brasileiro 107
4.1 A relevncia do reconhecimento da discricionariedade tcnico-administrativa no sistema jurdico sanitrio brasileiro.........................
4.1.1 A identidade da discricionariedade tcnico-administrativa........................................................................................................
4.1.2 O carter tcnico e interdisciplinar do direito sanitrio
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brasileiro como justificativa para o reconhecimento dadiscricionariedade tcnico-administrativa........................................
4.1.3 A importncia da discricionariedade tcnico-administrativa como instrumento do direito sanitrio..............
4.2 As hipteses em que surge a discricionariedade tcnico-administrativa no direito sanitrio........................................................................
4.2.1 A hiptese de discricionariedade tcnico-administrativano ato administrativo sanitrio em abstrato o estudo docaso da marcao de pequenos implantes parafusos......
4.2.2 A influncia da norma tcnica no caso da marcao dosparafusos biocompatveis............................................................................
4.2.3 A hiptese de discricionariedade tcnico-administrativano ato administrativo sanitrio em concreto o estudo docaso do cumprimento das Boas Prticas de Fabricao(BPF) de Medicamentos...............................................................................
4.3 Os limites formais e materiais na atuao discricionriatcnico-administrativa o papel e a importncia do controle doato...............................................................................................................................................
4.3.1 Os limites formais para a atuao discricionria tcnico-administrativa os elementos da discricionariedade.............
4.3.2 Os limites materiais..........................................................................................
4.3.2.1 O critrio da discricionariedade tcnico-administrativa a eficincia............................................................................................
4.3.2.2 O critrio da discricionariedade tcnico-administrativa a razoabilidade...................................................................................
4.3.2.3 A norma tcnica como critrio.......................................................
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V Concluses 151
Bibliografia 155
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SIGLAS UTILIZADAS
ABNT - Associao Brasileira de Normas Tcnicas
ANS - Agncia Nacional de Sade Suplementar
ANVISA - Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria
APA - Administrative Procedure Act
BPF - Boas Prticas de Fabricao
EPA - Environmental Protection Agency
EUA - Estados Unidos da Amrica
FDA - Food and Drug Administration
ISO - International Standards Organization
NBR - Norma Brasileira
PL - Projeto de Lei
RDC - Resoluo da Diretoria Colegiada
RN - Resoluo Normativa
SNVS - Sistema Nacional de Vigilncia Sanitria
SUS - Sistema nico de Sade
TV - Technische berwachungs Vereine
UE - Unio Europia
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CAPTULO I
INTRODUO
A discricionariedade, uma das mais instigantes matrias do direito
pblico, sempre desafiou e ainda desafia a doutrina e a jurisprudncia
quanto sua identificao e limites.
Seu estudo, que se intensificou durante o sculo XX, ensejou, a partir
do incio daquele sculo, a identificao de outra modalidade de
discricionariedade que parte da doutrina passou a denominar
discricionariedade tcnica.
Termo que vem criando grande polmica no direito est muito longe,
como est tambm a prpria discricionariedade administrativa clssica1, de
constituir unanimidade e consenso, principalmente quanto sua efetiva
existncia e diferenciao relativa ao prprio instituto da discricionariedade
administrativa clssica, sendo tratado, at mesmo, como questo obscura,
1- Segundo a lio de MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, a discricionariedade administrativa a faculdade que a lei confere Administrao para apreciar o caso concreto, segundocritrios de oportunidade e convenincia, e escolher uma dentre duas ou mais
solues, todas vlidas perante o direito. (Discricionariedade administrativa naConstituio de 1988.2. ed., So Paulo: Atlas, 2001, p. 67).
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dada a sua variedade de conceitos2.
Tal instituto, concebido na obra de EDMUND BERNAZIK3, baseou-se nas
apreciaes (chamadas por ele de ein technisches Ermessen) em que a
Administrao Pblica age como um tcnico (administrativo) do interesse
pblico, no abrindo a possibilidade de controle judicial para esses atos4.
Assim, por este conceito pretendia-se englobar todos os atos administrativos
que, apesar de eventualmente no serem discricionrios, por sua alta
complexidade tcnica administrativa do dia-a-dia da Administrao Pblica,
deveriam ser retirados do controle jurisdicional5.
Aps isto, o conceito deste instituto foi debatido e desenvolvido
principalmente na Itlia e na Espanha, onde se encontra a maioria das bases
doutrinrias para a discusso do tema. Porm, apesar da intensa discusso
sobre o instituto da discricionariedade tcnica e apesar de passado mais de
um sculo de discusso, no existe, ainda, consenso na doutrina quanto
sua existncia.
No entanto, houve sem dvida alguma uma ampliao tanto da
atividade estatal quanto da regulao estatal que, em vrios casos, se
utilizam das normas e conhecimentos tcnicos que se tornaram por sua vez
fontes das decises administrativas sanitrias, principalmente nos casos das
2- SOUSA, Antnio Francisco de. A discricionariedade administrativa: origem e evoluohistrica no sistema continental europeu. Estado actual dos reconhecimentoscientficos. Consideraes para o estreitamento e a clarificao do conceito dediscricionariedade administrativa.Lisboa: Danbio, 1987, p. 307.
3- Rechtsprechung und materielle Rechtskraft, de 1886 apud QUEIR, Afonso Rodrigues.O poder discricionrio da administrao.2. ed., Coimbra: Coimbra Editora, 1948, p.123.
4- QUEIR. O poder discricionrio..., p. 122.5- SOUSA. A discricionariedade..., p. 307-308.
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agncias reguladoras, o que imprime ao direito, a necessidade de
reestruturar formas de controles especficos para a sua atividade.
Por isso, tratamos neste trabalho de demonstrar as duas vertentes
doutrinrias que estudam este assunto na doutrina estrangeira, comparando
as razes da doutrina que no aceita a tese de que a tcnica capaz de
alterar a discricionariedade administrativa ao ponto de criar uma nova
modalidade de discricionariedade chamada de discricionariedade tcnico-
administrativa6, com a doutrina que acredita nesta nova modalidade de
discricionariedade7apontando, ainda, suas peculiaridades.
Assim, independente da falta de consenso quanto sua existncia,
verificamos que cada vez mais ela objeto de estudo na doutrina
estrangeira, principalmente na atualidade e com a intensificao da atividade
de regulao do Estado moderno nas reas de alta complexidade
tecnolgica.
Aliada esta atividade estatal ao surgimento de decises e atos dos
rgos da administrao sanitria brasileira: Resolues da Diretoria
Colegiada (RDC) da ANVISA ou as Resolues Normativas (RN) da ANS,
alm de normas ISO, ABNT, entre outras, teve inicio aqui uma crescente
6- Un secondo fattore strettamente connexxo allespansione dei poteri discrezionali statuil convincimento che mopti compiti di carattere regolamentare dovessero essereaffrontati alla stregua di questioni di natura tecnica o scientifica e, quindi, dovesseroessere risolti da autorit specializzate. Tuttavia, non vi una netta linea didemarcazione tra le questioni che possono essere risolte aplicando abilit tecniche equelle che, invece, richiedono decisioni che comportano scelte politiche e di valore.(GALLIGAN, Denis J. La discrezionalit amministrativa. Trad. de Marco Mazzoni eVincenzo Varano. Milo: Giuffr, 1999, p. 85).
7- PELAGATTI, Giuseppe. Valutazione techiche dellamministrazione pubblica e sindicato
giudiziario. Un analisi critici dei recenti sviluppi della dottrina iuspubblicista. RevistaTrimestale di Diritto Pubblico.Nmero VI, Milano: Giuffr, 1992, p. 159.
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discusso sobre a existncia da discricionariedade tcnica no Brasil e, da,
comeou-se a verificar a possibilidade do seu controle social e judicial.
Apesar de tudo isso, no houve no Brasil, muitos estudos dedicados a
este instituto8, embora estejam contidos nas obras que abordam temas
como agncias reguladoras e discricionariedade administrativa.
Em toda a coleta e anlise da doutrina nacional, encontramos uma
obra, resultante de uma dissertao de mestrado9, que trata exclusivamente
da discricionariedade tcnica, concluindo pela sua inexistncia e, assim,
dando mais nfase s questes relativas discricionariedade administrativa
clssica e a seu controle.
Por esta razo e pela importncia que vem sendo dada matria na
Europa, trazemos discusso a evoluo doutrinria e jurisprudencial sobre
este tema, identificando, tambm no Brasil, o que a doutrina tem discutido
sobre a discricionariedade tcnica.
A justificativa desta abordagem est na necessidade de adequarmos
a doutrina e as decises administrativas e judiciais situao de fato quanto
atividade do Estado que mudou significativamente aps a metade do
sculo XX.
E, com o surgimento das leis e normas que disciplinaram a atividade
8- Como bem ressalta SRGIO GUERRA,...entre ns, o tema da discricionariedade tcnicano foi objeto de um amplo aprofundamento doutrinrio (Controle judicial dos atosregulatrios. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2005, p. 200).
9- FARIAS, Daniela Cordeiro de. Discricionariedade e apreciaes tcnicas da
administrao pblica. Dissertao (Mestrado em Direito do Estado). 2005. 203 p.Faculdade de Direito, PUC/SP, So Paulo.
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de vigilncia sanitria a partir da dcada de 7010, a disciplina
discricionariedade tcnica ganhou mais fora com a tecnificao11 das
atividades do Estado na busca de regulao de setores de alto
conhecimento cientfico e na sua prpria atividade estatal, especificamente,
para nosso caso, as reas de sade.
E, como explica MIGUEL SNCHEZ MORN:
...la doctrina jurdico-pblica necesita actualizar peridicamente su bagaje
de ideas y conceptos, so pena de quedar desconectada del devenir social y,en consecuencia, ver reducida la capacidad explicativa (de fenmenosnuevos que no encajan en los moldes preestablecidos), ordenadora y deresolucin de conflictos que le es propia12.
Sensibilizados com esta idia, dedicamos esta obra coleta e estudo
da doutrina nacional e internacional como base para o entendimento da
discricionariedade tcnica, seus novos critrios de eleio e sua definio
como ponto inicial para a discusso do tema.
Iniciaremos, no Captulo II, a identificao do conceito da
discricionariedade administrativa clssica, a discricionariedade tcnica e sua
subdiviso conforme entendimento baseado na mais recente doutrina
espanhola em discricionariedade instrumental tcnico-jurdica (atividade
10- BRASIL. Lei n. 6.360, de 23 de setembro de 1976. Dispe sobre a vigilncia sanitria aque ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacuticos e correlatos,cosmticos, saneantes e outros produtos, e d outras providncias. Dirio Oficial daUnio, Braslia, DF, 24 de setembro de 1976. BRASIL. Lei n. 5.991, de 17 dedezembro de 1973. Dispe sobre o controle sanitrio do comrcio de drogas,medicamentos, insumos farmacuticos e correlatos, e d outras providncias. DirioOficial da Unio, Braslia, DF, 19 de dezembro de 1973, entre outras.
11- Tal conceito empregado pela doutrina para identificar a incluso das atividadesprofissionais de alta complexidade tcnico-cientficas extrajurdicas na atividade doEstado.
12
- Discricionalidad administrativa y control judicial. 2. Reimpresso, Madrid: Tecnos,1995, p. 94-95.
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interpretativa) e discricionariedade tcnico-administrativa(atividade volitiva),
com a finalidade de colocar o leitor, desde j, em contato com a discusso
do tema e com o entendimento da linha conceitual deste instituto.
Tais conceitos sero colocados dentro da perspectiva do direito
brasileiro, sem nos afastarmos da essncia trazida principalmente pela
doutrina espanhola e italiana que mais se desenvolveram neste campo.
A partir da, comearemos a justificativa deste conceito com a coleta
da doutrina internacional sobre o tema.
Esta coleta, realizada no Captulo III, ser dividida entre os pases
adotantes do direito anglo-saxo common law e o direito romanstico.
A subdiviso realizada tem como justificativa a diferena de
abordagem entre os conceitos e a evoluo encontrada em cada um desses
sistemas jurdicos para melhor esclarecer o leitor.
Aps a demonstrao das doutrinas hoje existentes no direito
aliengena, passaremos a analisar o direito brasileiro em comparao com
toda a doutrina demonstrada nos captulos anteriores, mostrando a
relevncia do tema para nosso direito sanitrio, identificando casos prticos
de discricionariedade tcnico-administrativa, objeto do nosso estudo,
aplicada na atividade da ANVISA na regulao de produtos para a sade.
Como forma de deixar clara a sua diferena com o instituto da
discricionariedade administrativa, sintetizando e sem a pretenso de esgotar
o tema, abordaremos algumas consideraes sobre os limites deste instituto
quanto aos elementos da discricionariedade tcnico-administrativa, quanto
aos seus critrios de eleio das alternativas e sob a influncia eventual da
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norma tcnica, como critrio.
Por ser extensa a matria de discusso neste ltimo captulo, faremos
uma sntese superficial com a explanao de pontos especficos e
essenciais para a constituio e aclaramento do instituto, deixando para
outro momento a complementao subsidiria dos limites da
discricionariedade tcnico-administrativa, bem como a explanao de seus
critrios.
Ressaltamos que por no haver unanimidade em toda a doutrina, seja
nacional ou internacional, o enfrentamento deste tema no assunto fcil de
desenvolver.
Porm, alm de necessria, a urgncia nesta discusso se faz pelas
circunstncias de fatos ligados atividade do Estado e interferncia deste
na sociedade, j existente e proliferados em nosso pas.
Neste sentido, esperamos que este trabalho abra a discusso sobre
este instituto, e que tambm, o presente debate seja absorvido pela
atividade estatal, principalmente na busca de delimitar a atividade
desenfreada de regulao, realizada sob o manto e em nome da
complexidade tcnica sem controles jurdicos efetivos.
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CAPTULO II
CONCEITO E AS MODALIDADES DA DISCRICIONARIEDADE
TCNICA
SUMRIO: 2.1 O conceito clssico da discricionariedadeadministrativa e a sua incapacidade de prover soluesdiante da atividade tcnico-administrativa do Estado naatualidade 2.2 A discricionariedade tcnica, suasmodalidades e diferenas 2.3 H discricionariedade na
realizao de aes tcnicas pela Administrao? Oestgio atual da Administrao Pblica 2.4 O termotcnica e a discricionariedade. 2.5 A discricionariedadetcnica e a atividade tcnico-interpretativa daadministrao a discricionariedade instrumental jurdico-tcnica 2.5.1 A discricionariedade instrumental e a teoriados conceitos jurdicos indeterminados 2.5.2 Adiscricionariedade instrumental jurdico-tcnica 2.6 Adiscricionariedade tcnico-administrativa
2.1 O conceito clssico da discricionariedade administrativa e asua incapacidade de prover solues diante da atividade
tcnico-administrativa do estado na atualidade
A discricionariedade administrativa conceitua-se classicamente como
a faculdade que a lei confere Administrao Pblica de escolher entre
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duas ou mais alternativas vlidas perante o direito, a que mais se aproxima
do interesse pblico segundo os critrios de oportunidade e convenincia13.
No entanto, quando estamos diante de certos conhecimentos tcnicos
sanitrios extrajurdicos, tais critrios de oportunidade e convenincia
estabelecidos pela doutrina clssica do direito administrativo no so
capazes de resolver o caso em concreto, como j observou a recente
doutrina administrativista14.
Assim, os critrios de soluo e os elementos do ato administrativo se
alteram nestes casos para que o Estado possa atender ao interesse pblico
da melhor forma, buscando a soluo mais justa quando enfrentados os
casos em que o administrador se depara com a alta complexidade tcnica
extrajurdica.
Esta soluo tem como base conhecimentos complexos e
especializados, prprios das cincias extrajurdicas e tem como
caracterstica, ainda, a interdisciplinaridade cientfica.
Neste sentido, j advertia AFONSO RODRIGUES QUEIR:
O conceito de poder discricionrio..., resume-se nisto: trata-se de umafaculdade de escolher uma entre vrias significaes contidas num conceitonormativo prtico, relativo s condies-de-fato do agir administrativo escolha feita sempre dentro dos limites da lei.(...)Ora bem: o conceito de fim do ato, na nossa concepo, no forosamente um conceito de valor: pode ser um conceito de valor; comoquando a atividade competente age para reprimir atos contrrios moral e decncia pblica (art. 351. do Cdigo Administrativo) mas pode
13- DI PIETRO. Discricionariedade administrativa..., p. 67.14- DAROCA, Eva Desdentado. Discrecionalidad administrativa y planeamiento urbanstico
construccin terica y anlisis jurisprudencial. 2. ed., Editorial Aranzadi: Elcano,1999, p. 133-134.
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tambm ser um conceito teortico, porque derivado das cincias do ser ouartes correspondentes: como quando a autoridade pode praticar certos atosde polcia sanitriaquere dizer, com o fim higinico-sanitrio15.
Os conceitos derivados das cincias que, no caso, so extrajurdicas
e ligadas atividade estatal sanitria, no comportam a prtica do ato diante
da liberdade conferida pela norma, como vem verificando a doutrina
administrativista, dentro dos limites estabelecidos pelos critrios da doutrina
clssica de discricionariedade.
Este problema da alterao de critrios nos casos de
discricionariedade baseada em critrios tcnicos tambm j foi levantado por
THEMSTOCLES BRANDO CAVALCANTI, que advertiu quanto apreciao de
critrios tcnicos:
Quem pode determinar o sentido? O tcnico? O perito? O prprio juiz?
O controle judicial do ato discricionrio delicado, no s pela naturezaespecfica da funo judicial, fundada em pressupostos estranhos, emgrande parte, atividade administrativa, mas tambm porque o critrio deapreciao muitas vzes diferente16.
Por isto, a doutrina nacional e estrangeira vem buscando vrias
formas de se adequar o conceito clssico de discricionariedade atividade
estatal que hoje totalmente diversa daquela que existia quando do
estabelecimento do conceito clssico.
E mais. O conceito clssico no tem a capacidade de resolver as
questes sanitrias enfrentadas atualmente pelo Estado, mesmo porque
15- A teoria do desvio de poder em Direito Administrativo. Revista de DireitoAdministrativo. Rio de Janeiro, n. 06, 1968, pp. 77-78.
16
- Do poder discricionrio. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, vol. 101,jul.-set. 1970, p. 11.
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atualmente a lei no tem delimitada a atuao estatal e sim tem fixados os
standards de atuao, ou seja, existe uma limitao mais genrica,
relegando a soluo do caso concreto aplicao de conceitos da tcnica
ou da cincia sanitria onde muitas vezes tais solues so encontradas nas
normas tcnicas.
Por isto, este trabalho buscou encontrar na evoluo doutrinria e na
posio mais recente da doutrina da discricionariedade, instrumento capaz
de responder e de solucionar tais casos concretos encontrados hoje pelo
Estado na sua atividade sanitria e na atividade de regulao,
correspondente chamada discricionariedade tcnica.
2.2 A discricionariedade tcnica, suas modalidades e
diferenas
Antes de adentrarmos na explanao conceitual da discricionariedade
tcnica com base na doutrina existente, preciso tecer algumas
consideraes quanto aos termos utilizados por esta mesma doutrina que
subdividiu a denominada discricionariedade tcnica em duas modalidades:
a discricionariedade instrumental jurdico-tcnica e a discricionariedade
tcnico-administrativa, sendo esta ltima o objeto de estudo de nossa
monografia.
Assim, a doutrina espanhola, com fundamento na doutrina italiana,
identificou duas subespcies da discricionariedade tcnica como forma de
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distinguir aquela que tem como base a atividade meramente interpretativa do
administrador discricionariedade instrumental jurdico-tcnica -, daquela
em que h liberdade de escolha discricionariedade tcnico-administrativa.
Aps a atividade interpretativa do agente administrativo sanitrio, em
que ele interpretar os termos tcnicos extrajurdicos, necessrios para a
aplicao do direito e do interesse pblico j definido pela norma, seguir ele
para a aplicao direta deste direito, concluindo pela inexistncia de
liberdade conferida pela tcnica, ou, em havendo esta liberdade, ter este
que percorrer o caminho da eleio at culminar na concreo do ato
administrativo sanitrio com a finalidade exigida pela norma.
Neste estudo centraremos nossa pesquisa na chamada
discricionariedade tcnico-administrativa.
Porm, apenas neste captulo discorreremos sobre a sua modalidade
interpretativa - discricionariedade instrumental tcnico-jurdica, para dar ao
leitor noo mais ampla sobre o assunto, e que ser de grande importncia
para a identificao dos institutos, mas sem aprofundamento do tema.
2.3 H discricionariedade na realizao de aes tcnicas pela
Administrao? O estgio atual da Administrao Pblica
A crescente tecnificao e remisses a conceitos, regras e aes que
se desenvolvem por meio de conhecimentos especializados no direito,
uma preocupao dos juristas da atualidade.
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Neste sentido, explica DAROCAque:
Como consecuencia de ello, las reglas y criterios tcnicos inciden de formacada vez ms relevantes y penetrante sobre la actividad de laAdministracin, hasta el punto que se ha afirmado que la tcnica sobre laactuacin administrativa es una de las tendencias que caracterizan laactividad del poder pblico en la poca contempornea.17
Razo pela qual, estando a tecnificao permeando a atividade
administrativa do Estado, esta influncia atinge tambm o poder
discricionrio.
E para DAROCA, a discricionariedade no mudou. O que mudou foram
os critrios de juzos e valorao necessrios para a eleio da soluo mais
adequada quando se est diante das chamadas apreciaes tcnicas, o
que alterou o instituto da discricionariedade, admitindo o surgimento de uma
nova espcie18
: a discricionariedade tcnica.
Alm disso, desta mudana criou-se uma preocupao quanto
interferncia das aes tcnicas da Administrao que atingem os
particulares, afetando-os neste novo conceito de atividade discricionria.
Porm, a doutrina, ao tratar da discricionariedade tcnica, deparava-
se com o questionamento consistente na existncia de liberdade nas
escolhas de alternativas tcnicas. Hoje este entendimento foi ultrapassado
admitindo a existncia da pluralidade de opes mesmo quando esto
presentes as questes tcnicas, fazendo com que a discricionariedade
tcnica seja analisada como instituto do direito administrativo.
17- Discrecionalidad, p. 133.18- Discrecionalidad, p. 133-134.
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Mesmo assim, a discusso ainda est longe de chegar a um
consenso. H parte da doutrina que no admite a criao de uma nova
modalidade de discricionariedade e, assim, para no restringir a aceitao
de sua tese, adverte DAROCA que, para no se aprofundar no debate do
termo discricionariedade tcnica, condenado pela doutrina italiana, utiliza
ela a expresso apreciao tcnica, fazendo referncia a toda a atividade
de respostas a problemas prticos mediante a utilizao de critrios tcnicos
que, adverte, no se reduz cincia aplicada, e sim a todos os
conhecimentos cientficos e tcnicos.
So estas as apreciaes heternomas19.
E assim conclui que:
En las apreciaciones tcnicas los criterios o reglas tcnicas no sonsusceptibles de una aplicacin y utilizacin mecnicas, sino que exigen que
el operador tcnico ejercite su discernimiento, es decir, que realice ciertaselecciones conforme a criterios que no vienen determinados ni por elordenamiento jurdico ni por la tcnica.20
A utilizao do termo apreciaes tcnicas no afasta o
reconhecimento da discricionariedade tcnica nas teses levantadas por
DAROCA. Mas para evitar confuso, j que parte da doutrina no aceita este
reconhecimento, deixamos bem claro que ele expresso em sua obra bem
como na de muitos autores que se aprofundaram no tema.
Com este reconhecimento, passaremos a analisar as duas
modalidades de discricionariedade tcnica identificadas pela doutrina
19- Discrecionalidad, p. 136-137.20- Discrecionalidad, p. 138-139.
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espanhola e italiana, diante das atividades de regulao e atuao tcnicas
da Administrao Pblica, dentro dos conceitos de discricionariedade forte
(poltica) e fraca (jurdica)21, passamos a descrever.
2.4 O termo tcnica e a discricionariedade
A doutrina que vem estudando a discricionariedade tcnica tem boas
razes para defender a continuidade do termo tcnica quando se fala na
possibilidade de eleio com base na liberdade e em conhecimentos de alta
complexidade tecnolgica ou cientfica extrajurdica22.
O direito assim segue uma alterao imposta pelo prprio homem, ouseja, a evoluo tecnolgica e a sua interferncia nas atividades estatais23.
Conforme j identificaram a doutrina nacional e internacional, a atual
atividade da Administrao Pblica na produo dos seus atos
administrativos regulatrios (de poder de polcia), de fomento ou de
prestao de servios pblicos, impe, muitas vezes, conhecimento tcnico
21- DWORKIN criou um sistema de identificao do grau de liberdade na atividadediscricionria quantificando este ele como forte e fraca, sendo a fraca de menoramplitude e a forte de maior amplitude, ou seja, onde se tem mais liberdade de ao(Levando os direitos a srio. Traduo e notas Nelson Boeira. So Paulo: MartinsFontes, 2002, p. 51-54).
22- Discrecionalidad, p. 134.23- PELAGATTI. Valutazione techiche..., p. 159.
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extrajurdico para as diversas situaes encontradas na busca das solues
para o exerccio destas atividades perante cada caso concreto24.
As normas e conhecimentos tcnicos extrajurdicos esto hoje
presentes tambm nas normas legais, nas administrativas em abstrato, alm
dos atos administrativos em concreto, principalmente naqueles emanados
pelas agncias reguladoras em matria de sade: ANVISA e ANS25, que
tm, at por exigncia legal26, atribuio tcnica27.
Atualmente faz necessrio que o conhecimento tcnico-extrajurdico
de certos agentes administrativos seja utilizado na interpretao e aplicao
dos conhecimentos tcnicos existentes, tanto para a criao de normas,
necessrios na definio das regras sanitrias prprias de regulao,
24- A produo de regras tcnicas acerca do desempenho de atividades econmicasrelevantes passa titularidade de rgos tcnicos. As agncias so entidades
hierarquicamente no subordinadas ao poder Legislativo, dotadas de competncia paradisciplinar os meios tcnicos adequados realizao dos fins impostos(legislativamente) aos sujeitos que desempenham atividades integrantes de certosegmento econmico. (JUSTEN FILHO. Maral. O direito das agncias reguladorasindependentes.So Paulo: Dialtica, 2002, p. 364).
25- Tal finalidade tcnica faz MARAL JUSTEN FILHO afirmar que as agncias: ...recebemcompetncias de diversas ordens para fiscalizar a formulao de decises polticas,verificar o cumprimento dos deveres institucionais por parte das autoridades pblicas,promover a implementao de valores fundamentais consagrados constitucionalmente,concentrar conhecimento tcnico e a produo dele derivadas e assim por diante. (Odireito das agncias..., p. 358.)
26 - Artigo 5. - O Presidente ou o Diretor-Geral ou o Diretor-Presidente (CD I) e os demais
membros do Conselho Diretor ou da Diretoria (CD II) sero brasileiros, de reputaoilibada, formao universitria e elevado conceito no campo de especialidade doscargos para os quais sero nomeados, devendo ser escolhidos pelo Presidente daRepblica e por ele nomeados, aps aprovao pelo Senado Federal, nos termos daalnea f do inciso III do art. 52 da Constituio Federal. (grifo nosso) (BRASIL. Lei n.9.986, de 18 de julho de 2000. Dispe sobre a gesto de recursos humanos dasAgncias Reguladoras e d outras providncias. Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF,19 de julho de 2000).
27- Aduz ALEXANDRE SANTOS DE ARAGOque: O carter tcnico da atuao das agnciasreguladoras se revela atravs dos requisitos de formao tcnica que a lei impe aosseus dirigentes e, principalmente, pelo fato dos seus atos e normas demandaremconhecimento tcnico e cientfico especializado para que possam ser emanados,
aplicados e fiscalizados.(Agncias reguladoras. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004,p. 323)
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quanto na concreo dos atos administrativos discricionrios, definindo as
regras para a atividadesanitria de fomento ou prestao de servios.
Negar a existncia da tcnica (extrajurdica) e da sua influncia na
discricionariedade como conhecemos, vem em desencontro a uma atual
situao de fato e de direito hoje encontrada no direito ptrio.
Por isso, com todo respeito queles que defendem posio contrria,
baseada na doutrina de ALESSI28, o qual afirmou que los dos trminos
discrecionalidad y tcnica son esencialmente inconciliables, no podemos
mais imaginar que no houve uma readaptao do direito situao de fato
baseada na evoluo tecnolgica, lembrando sempre que a base da
negativa desta doutrina anterior dcada de 1970, situao diversa da
que encontramos hoje no direito, principalmente diante da interferncia da
tcnica no direito administrativo sanitrio.
Conclumos estar mais acertada a doutrina de DAROCA, neste caso.
Vejamos por que.
DAROCA, iniciando num extenso estudo da parte filosfica para o apoio
da sua teoria, passando pelas teses de KELSEN, HART, MACCORMICK e
DWORKIN29, fazendo uma anlise do conceito da discricionariedade
administrativa, define como sendo esta uma espcie do gnero
supraconcepto de discrecionalidad, que para ela uma definio de um
mnimo denominador comum entre todas as espcies de
discricionariedades.
28- Instituciones de derecho administrativo.Vol. I, Barcelona: Bosch, 1970, p. 199.29- Discrecionalidad, p. 35-52.
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Tais espcies de discricionariedade, apesar de terem caractersticas
particulares que as diferenciam entre si, na essncia, remetem a uma viso
unitria de um fenmeno complexo e heterogneo, dentro do qual a
discricionariedade administrativa, por exemplo, no mais do que uma
parte30.
Portanto, neste supraconceito estaria um fator comum a todas as
modalidades de discricionariedade consistente em um determinado modo de
operar, de atuar, de realizar algo. Por fora deste entendimento, o ato
demandaria a adoo de decises dentro de uma margem de apreciao
desejada pelo ordenamento mediante a realizao de uma eleio entre
diferentes alternativas sobre a base de determinados critrios31.
Assim:
Se trata, pues, de la adopcin de decisiones de forma desvinculada delordenamiento jurdico, realizando una eleccin entre diferentes alternativas,utilizando para ello criterios valorativos extrajurdicos. La discrecionalidad esun . Con el supraconcepto de discrecionalidad no se esthaciendo, pues, referencia ms que a una determinada forma de operar; nose describe la actividad que realiza el sujeto ms que desde una perspectivapuramente formal. Desde esta perspectiva formal, todas las manifestacionesde fenmenos discrecionales son esencialmente iguales; su nica diferenciaes de grado.32
A partir desse entendimento, passa DAROCA33
a dividir a
discricionariedade com base no instituto da separao de poderes e nos
limites das atividades a eles conferidos pelo sistema jurdico:
30- Discrecionalidad, p. 70.31- Discrecionalidad, p. 70-71.32- Discrecionalidad, p. 71.33- Discrecionalidad, p. 71-81.
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discricionariedade poltica Poder Legislativo discricionariedade
fortssima;
discricionariedade jurdica Poder Judicirio discricionariedade
fraca;
discricionariedade administrativa Poder Executivo
discricionariedade forte ou fraca, dependente da outorga de liberdade
do ordenamento jurdico.
No primeiro caso (discricionariedade poltica), afirma DAROCAque, de
todas as formas de discricionariedade analisadas:
la ms amplia es, por tanto, la caracterstica del legislador (que Bell llama) en la medida en que implica la creacin de normasjurdicas generales y la eleccin para ello de los fines y medios pertinentesdentro de un amplio marco de opciones polticas, con las nicas limitacionesque se establezcan en la Constituicin. Es decir, el legislador goza de unamplio margen de discrecionalidad para el establecimiento de opcionespolticas, para lo cual se halla plenamente legitimado por su carcterrepresentativo. De ah, que se haya calificado esta discrecionalidad de y de .34
J no segundo caso (discricionariedade jurdica), os Tribunais operam
na soluo de casos que exijam critrios extrajurdicos de moralidade
poltica, de justia ou econmicos, onde devem eleger, entre um espao de
liberdade bem restrito conferido pela lei, uma soluo proporcionada pelo
ordenamento jurdico.
34- Discrecionalidad.. ., p. 76.
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Neste sentido, afirma DAROCAque:
...los tribunales operan discrecionalmente aunque su discrecionalidad seanormalmente de escasas dimensiones en la medida en que exige ms juicioque voluntad, se encuentra guiada por los materiales jurdicos existentes ycualquier decisin que se adopte ha de estar justificada mediante unargumento jurdico, aunque para ello sea precisa una integracin valorativadel ordenamiento jurdico. La discrecionalidad propia de los tribunales sera,as, una o que aparece en la concreciny aplicacin del ordenamiento jurdico al caso concreto.35
Entre esta modalidade de discricionariedade e a primeira aqui
demonstrada, existe uma intermediaria, denominada por DAROCA, como
sendo discricionariedade administrativa36.
Nela, afirma a doutrina que pode haver tanto uma maior como uma
menor liberdade de atuao, podendo-se, assim, dizer que h uma
discricionariedade administrativa forte e fraca.
No caso da fraca, a administrao pode ter seu campo de liberdadeto reduzido que se assemelhar muito discricionariedade jurdica37.
J na discricionariedade administrativa forte, a liberdade maior, mas
nada comparvel discricionariedade poltica, que bastante ampla.
Dentro deste entendimento podemos realizar uma nova diviso das
liberdades discricionrias, agora fundada nas imperfeies da norma ou na
real finalidade de a norma atribuir a liberdade ao operador. A primeira, define
35- Discrecionalidad..., p. 77.36- Discrecionalidad.. ., p. 77.37- Discrecionalidad.. ., p. 81-82.
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DAROCA como discricionariedade instrumental, ou fraca, e a segunda,
discricionariedade forte38:
Es importante tener presente la distincin entre aquellos casos en los que elordenamiento jurdico pretende realmente atribuir a un sujetodiscrecionalidad con la finalidad de que sea titular de un poder de decisinconsistente en la eleccin entre diferentes alternativas vlidas y aquellosotros supuestos en los que la posibilidad de elegir o decidir dentro de unmargen de maniobra surge como consecuencia de indeterminaciones,vaguedades u otro tipo de imperfecciones de la regulacin jurdica.39
E, conclui:
El tratamiento de ambos tipos de discrecionalidad no puede ser equivalente:el hecho de que el ordenamiento jurdico quiera o no que un determinadorgano tenga un poder de decisin es un factor que ha de jugar un papelrelevante a la hora de determinar tanto la actitud de otros rganos quepudieran interferir en esa decisin como la actitud del mismo rgano queacta discrecionalmente.40
Teramos, assim, duas modalidades partidas do denominado
supraconceito de discricionariedade: uma discricionariedade instrumental, ou
fraca, voltada a elementos adjetivos do instituto e uma discricionariedade
forte, voltada ao elemento de deciso de caracterstica volitiva, ou seja,
parte substantiva do instituto.
Para ela, a discricionariedade jurdica ser sempre instrumental por setratar de uma atividade com liberdade reduzida41.
38- Discrecionalidad.. ., p. 81.39- Ibidem idem.40- Ibidem idem.41- Los tribunales cuentan con un margen de maniobra para la bsqueda de la solucin
ms adecuada al caso difcil, es decir, con una discrecionalidad instrumental, pero nocon una discrecionalidad fuerte.(Ibidem idem)
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No entanto, nos casos em que h discricionariedade poltica ou, em
alguns casos em que h a discricionariedade administrativa, existe uma
atribuio intencional pelo ordenamento jurdico de um poder de deciso de
natureza eletiva42. Portanto:
Tanto la discrecionalidad poltica del legislador como la discrecionalidadadministrativa tienen en comn que ambas implican que el sistema jurdicoha reconocido al legislador o a la Administracin un poder de decisin, quese traduce en un poder de elegir, sobre la base de una valoracin poltica,entre diferentes alternativas, todas igualmente vlidas dentro del marco del
Derecho.43
A partir desta construo terica, conceitua EVA DESDENTADO DAROCA
a discricionariedade administrativa forte como:
...un poder de decisin atribuido por el ordenamiento jurdico a laAdministracin que se traduce en un poder de eleccin entre diferentesalternativas dentro del marco del ordenamiento jurdico, de tal forma que la
Administracin viene legitimada para la adopcin y desarrollo de unadeterminada poltica de actuacin.44
Nestes termos, inexiste, em parte, a apreciao do Poder Judicirio
sobre a deciso tomada pela Administrao.
Por ser uma discricionariedade provisional, j a discricionariedade
instrumental perfeitamente suscetvel reviso judicial at mesmo pela
falta de liberdade conferida nesta atividade discricionria45.
Ser luz destas definies, alm das modificaes e mutaes do
direito administrativo, que iremos abordar a matria demonstrando os
42- Discrecionalidad.. ., p. 82.43- Ibidem idem.44- Discrecionalidad...,p. 83.45- Ibidem idem.
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aspectos jurdicos da influncia ftica da tcnica extrajurdica na atividade da
Administrao Pblica, especificamente no campo da atividade discricionria
do Estado.
2.5 A discricionariedade tcnica e a atividade tcnico-
interpretativa da administrao a discricionariedade
instrumental jurdico-tcnica
Segundo DAROCA46, a discricionariedade instrumental jurdico-
tcnica a margem que a Administrao tem em eleger, mediante
apreciaes tcnicas interpretativas com a integrao de conceitos
jurdicos indeterminados, uma resposta mais adequada ao caso, jque, estes termos tcnicos extrajurdicos, levam conseqente
dificuldade de identificar de maneira certa uma nica resposta
verdadeira para o caso concreto.
Este conceito desenvolvido pela doutrina nasceu, segundo ela, da
teoria geral dos conceitos jurdicos indeterminados47, denominao
46- Discrecionalidad...,p. 139-140.47- Nos casos de aplicao da norma tcnica ou suas bases para a interpretao de tais
termos tcnicos afirma JOS ESTEVE PARDOque: ...como es propio de la frmula de losconceptos jurdicos indeterminados, su concrecin puede variar en cada caso ymomento. De esta forma no se opera una remisin a una solucin tcnica concreta, auna norma tcnica singular, sino al orden tcnico en su conjunto, con su componentedinmico, de progresso. El operador jurdico y el juez en su caso tendrn una margende valoracin sobre cul sea, en ese momento del desarrollo cientfico y tecnolgico, la
solucin adecuada. (Tcnica, riesgo y Derecho: tratamiento del riesgo tecnolgico en elDerecho ambiental. Barcelona: Ariel Derecho, 1999, p. 176).
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empregada para designar vocbulos ou expresses que no tm um sentido
preciso, objetivo ou determinado, e que so encontrados com grande
freqncia nas normas jurdicas dos vrios ramos do direito48.
2.5.1 A discricionariedade instrumental e a teoria dos conceitosjurdicos indeterminados
Vimos que nos termos da construo doutrinria de DAROCA, a
discricionariedade administrativa pode tanto ser instrumentalou fraca quanto
forte.
Na primeira modalidade, ela sempre existir quando da necessidade
de interpretao de termos qualificados como conceitos jurdicos
indeterminados49.
Assim:
cuando la actuacin viene condicionada por conceptos jurdicosindeterminados, la autoridad competente debe, al igual que cuando laconducta no viene condicionada en modo alguno, establecer determinadoscriterios de actuacin, aunque el marco que tenga para hacerlo sea ms
reducido. Tanto en el primer caso como en el segundo la autoridad .50
48- DI PIETRO. Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade administrativa..., p. 97.49- Discrecionalidad, p. 124.50- Discrecionalidad, p. 123-124.
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Podemos entender, portanto, que para DAROCAh discricionariedade
instrumental na definio dos conceitos jurdicos indeterminados
encontrados nas normas jurdicas.
Porm, a discricionariedade ali encontrada no a mesma da
administrativa clssica, e sim uma modalidade fraca, voltada aos meios de
interpretao e procedimento que tendem ao fim do interesse pblico ditado
pela norma legal.
Neste sentido:
...en los conceptos jurdicos indeterminados no hay una nica solucincorrecta, sino un margen de discrecionalidad instrumental, lo que nosignifica que la Administracin tenga una discrecionalidad fuerte para suaplicacin que excluya el control judicial pleno porque precisamente es a lostribunales a los que el sistema confiere la funcin de interpretar el Derecho yde resolver los casos litigiosos conforme al mismo.51
No entanto, deve-se frisar que essa discricionariedade deve ser
exercida dentro de critrios de poltica-jurdica-administrativa com o
estabelecimento de determinados objetivos para a sua deciso com a
adequada relao de meios e fins52.
2.5.2 A discricionariedade instrumental jurdico-tcnica
51- Discrecionalidad, p. 126.52- Discrecionalidad, p. 133.
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Iniciando sua explicao, afirma DAROCA que em alguns casos, a
Administrao Pblica se depara com conceitos que necessitam de
conhecimentos tcnicos extrajurdicos para sua aplicao ao caso concreto.
Quando a norma faz referncia a edifcio em runa etc. estaria ela
determinando Administrao que busque dentro desses conhecimentos
tcnicos, a forma mais adequada de aplic-los.
Assim, en la utilizacin y aplicacin de conocimientos tcnicos el
tcnico acta, por tanto, ejerciendo una cierta discrecionalidad, una
discrecionalidad instrumental53.
E, estabelecendo a valorao dos fatores e critrios tcnicos
cientficos extrajurdicos, o Estado concluiria que, continuando o exemplo
dado, uma casa est em runa, mediante a obteno de parecer tcnico
qualificado, especialmente proporcionado pelos conhecimentos
especializados e tcnicos de um agente administrativo, de forma automtica
e nica54.
Portanto, como la norma no ha atribuido a la Administracin la
posibilidad de elegir con carcter concluyente conforme a su juicio y
voluntad, sino que la eleccin es necesaria como consecuencia de la propia
naturaleza de las normas tcnicas55, estaramos neste caso, diante da
modalidade de discricionariedade fraca ou instrumental.
53- Discrecionalidad, p. 139.54- Discrecionalidad, p. 140.55- Discrecionalidad, p. 140-141.
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Esta atividade , segundo DAROCA, plenamente sindicvel pelo Poder
Judicirio, com a ajuda da prova tcnica, dado ser ela fundada em uma
discricionariedade instrumental56de atividade meramente interpretativa que
pode ser substituda pelo Poder Judicirio.
Conforme preceitua ainda, devem ser observadas algumas
peculiaridades neste modelo de discricionariedade que difere da
discricionariedade administrativa clssica que conhecemos:
a) No se pode falar que h, na discricionariedade instrumental jurdico-
tcnica, a busca do interesse pblico. Em todos os casos em que existe
discricionariedade instrumental jurdico-tcnica, no h um poder
conferido Administrao para a atividade de juzo de valor em busca do
interesse pblico. Esse interesse pblico j ficou fixado pelo
ordenamento jurdico, seja qual for o resultado da discricionariedade
instrumental.
b) No existe valorao que justifique ser esta discricionariedade uma
discricionariedade forte. As apreciaes tcnicas necessrias para a
aplicao de um conceito jurdico indeterminado que remete a um critrio
tcnico no so mais do que operaes jurdicas consistente na
56- Assim ensina DAROCA que: el que la determinacin de la concurrencia de lascualidades previstas en la norma no sea fcil, no siquiera mediante la utilizacin decriterios y conocimientos tcnicos, no permite concluir que la Administracin tiene unadiscrecionalidad fuerte, pues el ordenamiento ha pretendido regular su actividad y queen el desarrollo de su actividad se someta a las pautas establecida sin la norma, cuya
interpretacin y aplicacin final no le corresponde a ella, sino a otros rganos (losrganos judiciales)(Ibidem idem).
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aplicao de uma norma57. Por isso se deve denominar de
discricionariedade instrumental jurdico-tcnica.
c) No se pode, tambm, afirmar que tem a Administrao poder conferido
pela norma como inteno de possibilitar o poder de valorao que
afastaria o controle jurisdicional. Em sendo uma operao jurdica,
absolutamente possvel ser sindicvel pelo Judicirio.
d) Por ltimo, a valorao tcnica realizada pela Administrao pode ser
perfeitamente confrontada com uma prova tcnica judiciria.
Conclui DAROCA, portanto, que nas hipteses de integrao de
conceitos jurdicos indeterminados de carter tcnico estamos diante da
discricionariedade instrumental jurdico-tcnica58.
Voltando conceituao e qualificao desta atividade de
interpretao como sendo uma atividade discricionria, o entendimento de
DAROCA diverge, em parte, do significado atribudo pela doutrina dos
conceitos jurdicos indeterminadosque entende que estes tm apenas uma
nica soluo justa59.
No entanto, DAROCAensina que, como parte da doutrina baseada no
conceito de discricionariedade aceita a circunstncia de que h certa
discricionariedade nos conceitos jurdicos indeterminados face relativa
multiplicidade efetiva de opes finais da Administrao frente a esta forma
57- Discrecionalidad, p. 142.58- Discrecionalidad, p. 143.59
- GARCIA DE ENTERRA, Eduardo e TOMS-RAMN Fernndez. Curso de derechoadministrativo. Vol. I, 12. ed., Madri: Civitas Ediciones, 2005, p. 467.
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de indeterminao, o emprego do termo discricionariedade neste caso
plenamente admissvel60.
A corrente que entende uma nica soluo para os casos em que h
conceitos jurdicos indeterminados tem o apoio de SAINZ MORENO61, que
explica:
...la tesis segn la cual la utilizacin de tales conceptos por una norma nosignifica, por si sola, la atribucin de la facultad de elegir discrecionalmenteentre varias soluciones aquella que en cada caso se considera
conveniente e oportuna; esta tesis, por el contrario, mantiene que lainterpretacin y aplicacin de todo concepto jurdico, cualquiera que sea elgrado de su indeterminacin, no admite, si la norma no dispone otra cosa,ms que una sola solucin correcta y que, por tanto, la correccin de ladecisin que se tome puede ser controlada judicialmente sin que tal controlimplique una mera substitucin de criterios, sino el resultado de la bsquedade la solucin justa. As, pues, la teora de los conceptos jurdicosindeterminados reduce la discrecionalidad administrativa eliminando laarbitrariedad mediante el sometimiento a control judicial de todo aquello quedebe ser juzgado en trminos de legalidad o de justicia.
Isto porque, diferentemente do que entende EVA DESDENTADO
DAROCA, SAINZ MORENO afirma que os conceitos jurdicos indeterminados
resultam apenas numa soluo correta justamente pela simples inexistncia
de critrios de opo da atividade interpretativa. Assim sendo, esta no
poderia resultar em duas ou mais escolhas.
Este entendimento tambm confirmado por COSTA62
:
60- Hemos llegado a la siguiente conclusin general: en los conceptos jurdicosindeterminados no hay una nica solucin correcta, sino un margen de discrecionalidadinstrumental, lo que no significa que la Administracin tenga una discrecionalidad fuertepara su aplicacin que excluya el control judicial pleno porque precisamente es a lostribunales a los que el sistema confiere la funcin de interpretar el Derecho y deresolver los casos litigiosos conforme al mismo.(Discrecionalidad,p. 126)
61- Conceptos jurdicos, interpretacin y discrecionalidad administrativa. Editora Civitas:Madri, 1976, p. 192.
62
- Conceitos jurdicos indeterminados e discricionariedade administrativa. Revista daProcuradoria Geral do Estado de So Paulo, So Paulo, v. 29, p. 93, jun. 1988.
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A distino mais simples e didtica entre conceitos jurdicos indeterminadose discricionariedade , a nosso ver, a formulada por Sainz Moreno: existediscricionariedade quando a autoridade administrativa pode escolher entre
vrias decises, de modo que, na vontade do legislador, qualquer delas juridicamente admissvel e tem o mesmo valor: existe um conceito jurdicoindeterminado, por sua vez, quando s uma deciso juridicamenteadmissvel.
Com isto, criou-se uma forma de diferenciao entre os chamados
conceitos jurdicos indeterminados e a denominada discricionariedade
administrativa clssica que se funda no ponto principal da inexistncia, no
entendimento da doutrina, de verdadeira liberdade na aplicao do direito ao
caso concreto63.
Porm, no obstante esta diferenciao, a doutrina foi mais longe e
comeou a analisar no s a multiplicidade ou no das opes, mas
tambm, o exerccio de aplicao da norma ao caso concreto. Com isto,
firmou DAROCA64
o entendimento de ser esta modalidade verdadeira
discricionariedade, que qualifica como instrumental:
La distincin entre los conceptos jurdicos indeterminados y ladiscrecionalidad administrativa no puede basarse, por tanto, como hapropugnado la teora de los conceptos jurdicos indeterminados, en la ideade que la aplicacin de stos requiere una operacin de mero juicio odescubrimiento de la nica solucin justa que proporciona el ordenamientojurdico, mientras que la discrecionalidad administrativa supondra unaoperacin de volicin que consiste en la eleccin entre una pluralidad dealternativas igualmente posibles. El anlisis del problema a la luz de laTeora General del Derecho impide aceptar este criterio de distincin ypermite, por el contrario, poner de manifiesto que tambin en la aplicacinde los conceptos jurdicos indeterminados aparecen diferentesinterpretaciones posibles entre las que es preciso elegir conforme a criteriosque estn fuera del mundo jurdico.
63- DAROCA. Discrecionalidad,p. 116.64- Discrecionalidad, p. 124.
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Entendemos a corrente defendida por DAROCA a mais adequada, j
que a liberdade da atividade interpretativa que d verdadeiro significado ao
conceito jurdico indeterminado, independente da pluralidade ou no das
opes de resultados finais.
A atividade interpretativa faz com que haja uma diferena concreta
entre o que podemos denominar discricionariedade administrativa clssica e
o conceito jurdico indeterminado, sendo que, no primeiro, a lei no precisou
exaustivamente todo ocaminhoa ser percorrido pelo administrador no seu
dever de satisfazer o interesse pblico por ela indicado65. No segundo, a
preciso existe, mas de forma fraca e, por isso, qualifica-se a
discricionariedade em instrumental.
No direito administrativo brasileiro, apesar de parte de a doutrina
entender que os conceitos jurdicos indeterminadosno surgem da atividade
discricionria da Administrao Pblica, reputamos ser mais acertada a
posio de BANDEIRA DE MELLO:
Deveras, a apreenso do significado dos conceitos imprecisos, semdvida, um ato de inteleco e ao Judicirio assiste pratic-lo parainterpretar a lei. As decises de mrito so, induvidosamente, atos volitivos,decididos segundo critrios de convenincia e oportunidade, que traduzemopo por um dentre dois ou mais comportamentos comportados pela
norma a ser aplicada. Da no se segue entretanto que s nesta segundahiptese esteja a Administrao a exercer atividade discricionria.Com efeito, a circunstncia de que um ato de inteleco e um ato de voliosejam realidades logicamente distintas como, deveras, o so no implicaque necessariamente tenham, em face do Direito, ressonncias diversas.(...)
65- COSTA. Conceitos jurdicos indeterminados..., p. 90-91.
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Vale dizer, tais operaes mentais, intelectivas ou volitivas, repercutemindiferentemente para a composio dos mesmos efeitos jurdicos queintegram o que se entende por discricionariedade.66
Sendo assim, reconhecida na doutrina ser a aplicao de conceitos
jurdicos indeterminados atividade discricionria e ultrapassada a questo
relativa posio doutrinria sobre a teoria dos conceitos jurdicos
indeterminados e a sua localizao dentro da discricionariedade
administrativa, restou pacificado que a atividade resultante da aplicao
deste instituto cognitivo-interpretativa, como esclarecem GARCA DE
ENTERRA E FERNNDEZ67:
Esto es lo esencial del concepto jurdico indeterminado: la indeterminacindel enunciado no se traduce en una indeterminacin de las aplicaciones delmismo, las cuales slo permiten una en cadacaso, a la que se llega mediante una actividad de cognicin, objetivable portanto, y no de volicin.
Neste diapaso, levando em considerao as afirmaes de EVA
DESDENTADO DAROCA, quando a tcnica est presente na forma de conceitos
jurdicos indeterminados, a atividade de aplicao da norma ao caso
concreto resultar no exerccio do dever-poder discricionrio instrumental
jurdico-tcnica68.
Instrumental, porque, como afirmamos, a discrio aqui usada
como processo interpretativo e cognitivo sem grande liberdade de
66- Discricionariedade e controle jurisdicional. 2. ed., 6. tir., So Paulo: Malheiros, 2003,p. 24-25.
67- Curso de derecho, p. 465.68
- Los problemas del control judicial de la discrecionalidad tcnica (un estudio crtico de lajurisprudencia).Madri: Civitas, 1997, p. 61-62
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atuao discricionria (fraca), diferente de um poder prprio de
deciso atribudo pela lei Administrao69, e diverge quanto falta
de interferncia da vontade dos aplicadores do conceito70e, por isto,
considerada uma discricionariedade fraca71.
Tal tarefa consiste na apreciao tcnica, denominao j
conhecida pela doutrina brasileira, estudada em artigo doutrinrio
escrito por CSAR AUGUSTO GUIMARES PEREIRA72 e, em dissertao de
mestrado de DANIELA CORDEIRO DE FARIAS73. Ressaltamos ainda que as
hipteses de fato estudadas por esses dois autores no analisaram as
questes relativas ao exerccio de opes tcnicas e, com isto, a
concluso de ambos os trabalhos deixa de incorporar que entendemos
ser discricionariedade tcnico-administrativa, sendo restritas apenas
s hipteses que definimos como discricionariedade instrumental
jurdico-tcnica.
Isto porque a grande discusso jurdica sobre a apreciao
tcnica nasceu logo aps a criao das agncias reguladoras na
busca da doutrina de respostas aos problemas relativos aos termos
69- DAROCA.Discrecionalidad,p. 140.70- COSTA.Conceitos jurdicos indeterminados..., p. 94.71- DAROCA.Discrecionalidad,p. 81-84.72- Discricionariedade e apreciaes tcnicas da Administrao. Revista de Direito
Administrativo. Rio de Janeiro, n. 231: p. 217-267. jan./mar. 2003.73 - Discricionariedade e apreciaes tcnicas da administrao pblica. Dissertao
(Mestrado em Direito do Estado). 2005. 203 p. Faculdade de Direito, PUC/SP, SoPaulo.
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tcnicos encontrados nas resolues normativas das agncias,
problema este apenas resolvido mediante a utilizao dos critrios
tcnicos e de conhecimento especializado74.
Nesses casos, abordados pela doutrina, no h deciso entre
escolhas e sim, pura interpretao.
E, por ser atividade interpretativa com a aplicao de conceitos
jurdicos e extrajurdicos, podemos conceitu-la como atividade
interpretativa jurdico-tcnica. Jurdico-tcnica por fora da forma de
discricionariedade (mesmo que fraca) ali realizada75 que acrescentada
apreciao tcnica interpretativa. Neste caso, os elementos do Direito e da
cincia tcnica extrajurdica especfica devero ser conjugados para a
atividade jurdico-cognitiva e isto nos traz mais uma razo para diferenciar
esta modalidade a teoria dos conceitos jurdicos indeterminados.
Somando essas qualidades diferenciadoras dentro da teoria geral dos
conceitos jurdicos indeterminados, podemos concluir que, alm de essa
modalidade poder ser conceituada como uma atividade discricionria que
DWORKIN chama de discricionariedade em sentido fraco76, ela tambm
possui elementos prprios distintivos e relativamente autnomos da regra
geral.
74- Discrecionalidad, p. 137.75- DAROCA.Discrecionalidad,p. 71.76- Segundo DWORKIN, discricionariedade em sentido fraco ocorre quando o contexto no
por si s esclarecedor, quando os pressupostos de nosso publico no incluem essefragmento de informao. (Levando os direitos..., p. 52)
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Os conceitos tcnico-jurdicos nem sempre so indeterminados. O
grau de indeterminao depender sempre da necessria interpretao. O
mero auxlio de um perito ao juiz, no caso de lide judicial, no exclusivo
para a verificao da determinao ou indeterminao do termo. Na
verdade, a indeterminao sempre ser verificada dentro da capacidade de
cognio do homem comum.
Portanto, nos casos em que o termo tcnico-jurdico tiver bem claro,
com base no conhecimento cientfico-tcnico do homem mdio, estaremos
diante do conceito jurdico determinado, enquanto que, aquele que depender
de uma interpretao tcnico-cientfica mais profunda, ser um conceito
jurdico indeterminado.
Conclumos, assim, que a discricionariedade instrumental jurdico-
tcnica a atividade tcnico-interpretativa que a AdministraoPblica desenvolve quando da aplicao de suas normas ou
conhecimentos tcnicos extrajurdicos ao caso concreto e que
resultam, necessariamente, numa alternativa efetiva, correta,
razovel e proporcional que, por fora do processo de
interpretao, ter resultados que podero ser plenamentesindicveis pelo Poder Judicirio.
2.6 A discricionariedade tcnico-administrativa
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Os conhecimentos e normas tcnicas podero, tambm, ser usados
em certas situaes em que a Administrao Pblica chamada para
eleger, dentre duas ou mais alternativas, a deciso mais razovel e eficiente
ao caso concreto, decises estas eventualmente orientadas por normas
tcnicas77.
Para isto, os conhecimentos e normas tcnicas so imprescindveis
hoje na atividade administrativa78 de escolha e deciso, bastando a
existncia desta remisso expressa pela norma, tcnica extrajurdica, para
que essa modalidade de discricionariedade ocorra79.
Assim, da mesma forma que sem a norma jurdica a Administrao
Pblica no poderia atuar nos casos em que h discricionariedade tcnico-
administrativa, sem o conhecimento tcnico-cientfico ou a norma tcnica, a
soluo para o caso seria inalcanvel.
A discricionariedade aparece aqui ento com um elemento
imprescindvel e responsvel pela tarefa cognitiva e volitiva da administrao
na aplicao das normas: os conhecimentos tcnicos extrajurdicos.
Os conhecimentos tcnicos definem a escolha que, sem ele, no seria
acertada e no alcanaria o fim objetivado pelo direito.
77- HAWKINS, Keith org. The uses of discretion. Claredon Press: Oxford, 1991, p. 99.78- Como afirma GIORGIO PELAGATTI, ...difatti, la progressiva accentuazione dellimportanza
delle regole tecniche nellagire di tali poteri connessa strettamente allo sviluppo dellefuncioni che connotano sprecificamente la forma dello Stato. (Valutazioni tecniche..., p.159)
79- Discrecionalidad..., p. 143-144.
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J quanto s normas tcnicas, estas j so entendidas pelo direito
brasileiro como normas de aplicao obrigatrias e vinculativas a certas
atividades tcnico-administrativas80.
As normas e os conhecimentos tcnico-cientficos unem-se, nestes
termos, ao conhecimento jurdico e, com esta operao interdisciplinar, o
direito aplicado ao caso concreto em relao s questes tcnicas
sanitrias81.
No se trata, portanto, de exclusiva apreciao tcnica interpretativa.
claro que para o objetivo da atividade discricionria tcnico-
administrativa, a Administrao, no raras vezes, ter de executar
inicialmente, uma apreciao instrumental tcnico-jurdica. Por isso,
afirma DESDENTADO DAROCA82que:
...la discrecionalidad tcnico-administrativa se caracteriza por la existencia,en primer lugar, de un momento de discrecionalidad instrumental en larealizacin de apreciaciones tcnicas y, en segundo lugar, de un momentode verdadera discrecionalidad o discrecionalidad fuerte.
Porm, alm disso, as normas e conhecimentos tcnicos,
nesses casos e por fornecer elementos de deciso e mltiplas
80- Artigo 39 (...) Inciso VIII vedado ao fornecedor de produtos ou servios, dentreoutras prticas abusivas:colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou servioem desacordo com as normas expedidas pelos rgos oficiais competentes ou, senormas especficas no existirem, pela Associao Brasileira de Normas Tcnicas ououtra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalizao eQualidade Industrial (Conmetro). (BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1980.Cdigo de Defesa do Consumidor. Dispe sobre a proteo do consumidor e d outrasprovidncias.Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF, 12 de setembro de 1980).
81- VASCONCELOS, Fernando Donato. Normalidade: entre a norma jurdica e a normatcnica. Trabalho & Doutrina, So Paulo, v. 15, dez. 1997, p. 39.
82- Discrecionalidad, p. 145-146.
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escolhas, pem-se na qualidade de fonte fundamental para a atividade
discricionria (forte) do Estado83. Temos assim, diante da
interdisciplinaridade, a conjugao de normas e conhecimentos
tcnicos e jurdicos como fonte da discricionariedade tcnico-
administrativa84.
Entender de outra forma seria navegar por um campo perigoso
da inexistncia de regras de criao e aplicao do direito pelas
normas e conhecimentos tcnicos85, presentes no direito sanitrio.
Isto porque a atividade discricionria tcnico-administrativa hoje
aceita pela doutrina brasileira qualificada como apreciao tcnica,
no sendo reconhecida como parte da atividade volitiva86, e sem o
reconhecimento tambm de que a interferncia da norma tcnica no
direito alcana outra dimenso, ultrapassando o campo da
interpretao ou mera apreciao, impondo um controle social e
jurisdicional mais rigoroso e inexistente ainda hoje, j que ela acaba
por limitar os resultados nascidos da atividade discricionria tcnico-
administrativa.
83- Em favor da aplicao das normas tcnicas no direito: PELAGATTI. Valutazionetecniche..., p. 159; SESIN, Domingo Juan. Administracin pblica, actividad reglada,discrecional y tcnica. 2. ed., Buenos Aires: Depalma, 2004, p. 201; MOREIRA NETO,Diogo de Figueiredo. Mutaes do direito pblico. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p.394-395; entre outros.
84- AMARAL. Diogo Freitas do. Curso de direito administrativo.Vol. 2. Lisboa: Almedina,2004, p. 115-116.
85- Ibidem idem.86- PEREIRA, Discricionariedade..., p. 265.
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Neste sentido, relata o professor TRCIO SAMPAIO FERRAZ JUNIOR ao
descrever a situao originria das agncias reguladoras estadunidenses
que:
...a idia de especializao em reas de atuao demarcadas, nas quais oconhecimento tcnico exige uma formao especial, fez com que aindependncia de grande parte delas [agncias] tornou-se corolrio do altograu de discricionariedade tcnica de seus atos regulamentares que,destarte, se supunham politicamente neutros, se comparados com aatividade legislativa do Congresso87.
Compartilhando do mesmo entendimento, explica DIOGO DE
FIGUEIREDO MOREIRA NETO:
Com efeito, no Direito Pblico, as normas reguladoras surgem comoespcies normativas muito distintas das normas legais tradicionais.Desde logo assim o porque as normas legais resultam de opes polticas
abstratas, definitrias de interesse pblico especfico, que dever prevalecerem cada tipo de relao administrativa considerada, de modo a que possamser aplicadas direta e concretamente pelo mtodo de subsuno.(...)Diferentemente, as normas reguladoras resultam de opes administrativas,tambm abstratas, formuladas, porm, com um maior nvel de densidadetcnica, como resultado da ponderao de vrios interesses concorrentesem certas relaes interprivadas crticas deslegalizadas, de modo a que, emsua aplicao direta e concreta, promovam o mximo de equilbrio social eeconmico nessas relaes crticas88.
Assim, inegvel que hoje estamos diante da interferncia cada vez
mais atuante das normas e conhecimentos tcnicos, especialmente no
campo do direito sanitrio, direito de grande atividade regulatria que
87- Agncias reguladoras: legalidade e constitucionalidade, Revista Tributria e deFinanas Pblicas.So Paulo, v. 8, n. 35, nov./dez. 2000, p. 144.
88- Mutaes..., p. 394-395.
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culminou na reviso do conceito da discricionariedade administrativa
clssica.
At as ltimas dcadas, o direito sanitrio nunca sofreu tanta
influncia externa ao direito como vem sendo praticado atualmente.
Isto porque em vrios casos as normas e conhecimentos tcnicos
tornam-se muitas vezes fonte desse direito nas decises administrativas
sanitrias da ANVISA e da ANS, o que imprime ao direito, a necessidade de
reestruturar formas de controles especficos para a sua atividade.
Por isso, nos Estados Unidos, o controle dos atos normativos das
agncias, rgos da administrao pblica daquele pas, teve grande
importncia na reestruturao regulatria na dcada de 1970.
L, o controle das normas tcnicas e tcnico-administrativas regido
tanto pelo Poder Legislativo quanto pelo Poder Judicirio.
Explica ORLANDO CELSO DA SILVA NETO89, que o Poder Legislativo nos
Estados Unidos exerce tanto um controle formal, criando legislao que
restrinja ou revogue o ato normativo da agncia, quanto o informal com o
veto, exercido por fora da disciplina do Administrative Procedural Act, dos
atos das agncias reguladoras90.
89- SILVA NETO, Orlando Celso da. Noes gerais sobre o controle das agnciasregulatrias no direito Norte-Americano. inDI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direitoregulatrio: temas polmicos. 2. ed., rev. e ampl., Belo Horizonte: Frum, 2004, p.404-416.
90- No campo do direito sanitrio, exemplifica ORLANDO CELSO DA SILVA NETOque, a Food
and Drug Administrationfoi impedida pelo Legislativo de banir a sacarina quando esteera o nico adoante artificial do mercado (Ibidem idem).
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Quanto ao controle judicial, podemos citar alguns mecanismos que
permitem ao Judicirio daquele pas realizar o controle dos atos editados
pelas agncias.
Dentre eles, nos casos dos atos administrativos em concreto:
substancial evidence test91 consistente no controle da razoabilidade
com base nas informaes de fato do procedimento contencioso das
agncias (Administrative Procedure Act (APA), United States Code,
Title 5, Chapter 5 Administrative Procedure, 706, (2));
controle judicial do abuso ou arbitrariedade na emanao de atos
administrativos discricionrios pelas agncias92
o controle judicial quando o ato exarado v contra outro ato da
prpria agncia, ainda que respeite os atos normativos
vigentes (United States v. Nixon, 418 U.S. 683 (1974));
o no adote em seus atos precedentes da prpria agncia e no
d razes para esta no adoo (Atchison, Y & S.F. Ry v.
Wichita Board of Trade, 412 U.S. 800 (1973));
o no aplique os princpios de direito (United States v. Stauffer
Chemical Co., 464 U.S. 165 (1984)); e,
o abuse da imposio de sanes ao setor regulado (Jacob
Siegel Co. v. FTC, 327 U.S. 608 (1946)).
J nos casos dos atos administrativos normativos93:
91- SILVA NETO. Noes gerais... in DI PIETRO.Direito regulatrio..., p. 413.92- Ibidem idem.93- Ibidem, p. 415.
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hard look94e hard look review controle democrtico e, no segundo,
judicial, sobre os aspectos das polticas pblicas afetadas pela norma
dentro dos standards legais (Automotive Parts & Accessories
Association v. Boyd, 407, F. 2ns 330 (D.C. Circuit, 1968));
incerteza cientifica controle judicial para as regulamentaes
tcnicas mesmo quando caso de incerteza cientfica. (Ethyl Corp. v.
EPA, 541 F 2nd Circuit (D.C. Circuit, 1976));
reexame das provas;
controle por omisso da agnciacontrole judicial vlido tanto quando
h inrcia da agncia na prtica de um ato, como no caso de demora
no registro de medicamento, ou quando ela tem o dever de baixar o
ato normativo (Telecommunications Research & Action Center v.
FCC, 750 F. 2d 70 (D.C. Circuit, 1984)).Tudo isto demonstra claramente a necessria e importante evoluo
para o reconhecimento da discricionariedade tcnico-administrativa pelo
direito sanitrio que possui, hoje, a influncia evidente dos conhecimentos e
normas tcnicas extrajurdicas.
Ao verificar esta situao, iniciou-se, nos Estados Unidos, elaborao
de regras para a interao do direito aos atos de contedo tcnico e
cientfico, como veremos no prximo captulo com mais detalhes.
E esta atividade discricionria, sendo um poder atribudo pelo direito
Administrao Pblica, faz com que estes conhecimentos sejam utilizados,
no mais s para interpretar os termos legais, como ocorre nos casos da
94- ARAGO, p. 440.
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discricionariedade instrumental jurdico-tcnica, mas tambm para buscar a
configurao das alternativas e, concretizando a eleio, dentre duas ou
mais alternativas razoveis e eficientes, como afirma DESDENTADO DAROCA95.
Difere, assim, a discricionariedade instrumental jurdico-tcnica da
discricionariedade tcnico-administrativa quanto ao alcance da influncia da
tcnica, como conhecimento, ou da norma tcnica na deciso por escolha
discricionria do Estado.
Portanto, se o conhecimento tcnico ou a norma tcnica atingem
apenas a interpretao, estaremos diante do primeiro caso
discricionariedade instrumental tcnico-jurdica.
Enquanto, nos casos em que o conhecimento tcnico ou a norma
tcnica atingem tambm ou exclusivamente a escolha da alternativa,
estamos perante a discricionariedade tcnico-administrativa.
Podemos dizer, assim, que ao invs de defender a delegao
normativa nestes casos, que inexiste enquanto agncias reguladoras, a
discricionariedade tcnico-administrativa abre um espao para a delegao
discricionria tcnico, emergida da necessidade de lidar com a
complexidade tcnico-cientfica extrajurdica, social e econmica, com a
produo de atos administrativos apropriados com o emprego de meios
corretos, razoveis e eficientes96.
95- Discrecionalidad, p. 143.96- FERRAZ JNIOR, p. 151-154.
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Neste sentido assevera TRCIO SAMPAIO FERRAZ JNIOR, ao explicar
os limites impostos pelo critrio da eficincia, exigida pelo direito s
Agncias Reguladoras:
A delegao instrumental tem a ver com os casos de em que preponderamas funes programticas e de resguardo. Trata-se de situaes em que,por razes de complexidade setorial e de correspondente exigncia deespecializao tcnica, a lei que atribui a delegao autoriza decises demrito, responsabilizando-se o rgo competente pela alocao de finstecnicamente apropriados e pelo encontro do meio correto. Estaresponsabilidade avaliada pela eficincia da medida97. (grifo nosso)
Porm, contrariando este entendimento, nasceu uma corrente no
Brasil que defende a tese da inexistncia da discricionariedade tcnica, mas
de uma discricionariedade administrativa com apreciao tcnica, fundada
na inexistncia de peculiaridades ou diferenas entre esta e aquela
discricionariedade98.
No entanto, verifica-se que esta doutrina deixa de analisar os casos
em que realmente h escolha do Estado, entre duas ou mais alternativas,
aquela que seja mais razovel99 e eficiente para o caso concreto, ou que
defina o caminho para a escolha atravs de atos administrativos normativos
tcnicos como veremos adiante100.
97- Ibidem,p. 155-156.98- PEREIRA, Discricionariedade... , p. 265.99- Em favor do critrio da razoabilidade, apesar de subsistir para este autor os critrios de
oportunidade e convenincia na atividade discricionria das Agncias Reguladoras, alio de um captulo inteiro da obra de SRGIO VARELLA BRUNA: ...a razoabilidade olimite ltimo para o exerccio de quaisquer poderes discricionrios. (Agnciasreguladoras: poder normativo; consulta pblica; reviso judicial. So Paulo: RT, 2003,p. 142)
100- Captulo IV, itens 4.2.1 a 4.2.3.
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Independente desta discusso, o surgimento do debate da
discricionariedade tcnico-administrativa est provocando significativas
alteraes no procedimento normativo da agncia, como forma de
implementar as regras democrticas e os instrumentos de controles sociais
j estabelecidos nos Estados Unidos. No Brasil, estas alteraes esto
representadas no Projeto de Lei n. 3.337/04, que dispe sobre a gesto, a
organizao e o controle social das Agncias Reguladoras, em trmite pela
Cmara dos Deputados101.
Este projeto, importando alguns institutos prprios do Administrative
Procedural Act estadunidense, determina e vincula a produo de atos
normativos s consultas pblicas, dando oportunidade sociedade
organizada, especialmente por meio das associaes, de participar da
discusso de tais atos e, dentre outras garantia