TCC - Leitura e Recepção Crítica de Tropa de Elite 2 - Talitha Barbosa
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABA
CENTRO DE COMUNICAO, TURISMO E ARTES
CURSO DE COMUNICAO SOCIAL
TALITHA DE MELO E SILVA BARBOSAHABILITAO: JORNALISMO
LEITURA E RECEPO CRTICA DE TROPA DE ELITE 2, DE JOS PADILHA
Joo Pessoa2012
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TALITHA DE MELO E SILVA BARBOSA
LEITURA E RECEPO CRTICA DE TROPA DE ELITE 2, DE JOS PADILHA
Trabalho apresentado Universidade Federal da Paraba,em cumprimento s exigncias para obteno do ttulode Bacharel em Comunicao Social, habilitao emJornalismo.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Antonio MousinhoMagalhes
Joo Pessoa2012
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TALITHA DE MELO E SILVA BARBOSA
LEITURA E RECEPO CRTICA DE TROPA DE ELITE 2, DE JOS PADILIHA
Trabalho de Concluso de Curso apresentado banca examinadora do Curso deComunicao, da Universidade Federal da Paraba, em cumprimento s exigncias paraobteno do ttulo de Bacharel em Comunicao Social, habilitao em Jornalismo.
Banca Examinadora:
______________________________________________Prof. Dr. Luiz Antonio Mousinho Magalhes - OrientadorUniversidade Federal da Paraba
______________________________________________Afonso Manoel da Silva Barbosa Co-orientadorUniversidade Federal da Paraba
_________________________________________________Prof. Dr. Marcel Vieira Barreto SilvaUniversidade Federal da Paraba
_________________________________________________Prof. Ms. Victor Eduardo Bijos Jardim Gomes BragaUniversidade Federal da Paraba
Mdia: __________
Aprovado em: ______ de ________________ de 2012
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Dedico este trabalho
,
minha filha, este meu outro corao que pulsa fora de mim.
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AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, essa esfera infinita, cujo centro est em toda parte, e a circunfernciaem parte alguma (Blaise Pascal).
Ao meu heri fora da fico, meu pai, Walker Robson de Assuno Barbosa e ao meu maiorexemplo de vida, minha me, Kthia Maria de Melo e Silva Barbosa. Por nunca deixarem deacreditar no meu potencial. Pelo apoio material e emocional. Pelo amor incondicional, apoioafetivo e pelo carinho com que exerceram a misso de educar, de formar no um profissional,mas uma pessoa. Por isso mesmo, principais responsveis por essa conquista.
minha irm, Twilla Barbosa em nome de quem agradeo a cada pessoa da minha famlia.As oraes, energias positivas que enviaram sempre que precisei. E por acreditarem na minha
superao. Maria Luiza Barbosa, minha filha, por perdoar todas as minhas falhas, por suapacincia diante das minhas ausncias, ora fsicas ora mentais. Pelos beijos e estmulos quevoc me trazia, pela fora reconfortante dos teus abraos.
A Luiz Antonio Mousinho Magalhes, para ns, Mousinho, pelo srio trabalho de orientao,pelas horas extras na internet, pelo direcionamento terico e incentivo que vem desde ainiciao cientfica. Tem sido nossa bssola a apontar o norte dessa jornada deamadurecimento acadmico.
A Afonso Manoel da Silva Barbosa, que generosamente aceitou o convite oficial para a co-orientao, muito tempo depois de j exerc-la informalmente. Por apresentar sempre novosdesafios, confiante da minha capacidade de ultrapass-los. Parceria imprescindvel para arealizao deste e qui dos prximos trabalhos.
Aos amigos do grupo de estudos Leitura e Recepo, especialmente Juliana Terra e DaniloLuna, que numa dessas tardes na Praa da Alegria, ao lado de Mousinho e Afonso, fizeram ashistrias de vida e a amizade tornarem-se mais importantes do que os laos acadmicos, e queindependente dos rumos que tomem nossas vidas, ho de ficar.
Ana Priscila, Louise Dornelas e Graham Tidey, de quem eu ouvi as mais sinceras verdadese que me fizeram acordar. Eu cansei seus ouvidos, despejei minhas lgrimas e mesmo assim
vocs estiveram sempre presentes, disponveis e solcitos. Pelas vezes que acreditaram emmim, mais do que eu mesma. Vocs enchem meus dias cinzentos de alegria e sem dvidacontriburam significativamente para a construo deste trabalho.
A Rafael vila Betencourt, que enriqueceu minha caminhada com seus comentrios eobjees. Que aparou meus preconceitos apresentando outras histrias, outros artigos, outraviso de mundo. Pelo dilogo constante, oferecendo escuta e contendo as minhas afobaes.Sua racionalidade acadmica agregou muito a esta pesquisa. E sua generosidade serviutambm como apoio moral.
Aos trocentos colegas de faculdade, das trocentas turmas que passei, sempre desblocada
me enturmando em novos grupos para dividir as atividades sagradas e profanas da academia.Rebbeca Ricarte, Maria Librio, Camila Bezerra, Suellen Barboza, Vitor Pessoa, Andr Lima,
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Gemma Lima e Allan Herbert. Sobretudo Anne Nascimento, minha afilhadinha e RafaelaGambarra, por nossos excessos de cumplicidade.
Aos professores da Universidade Federal de Roraima, onde iniciei minha jornada. Agradeo
nas pessoas de Vngela Morais e Maurcio Zouein a todos aqueles que de algum modocontriburam com a minha formao. E claro aos amigos que ainda fazem parte da minhahistria, representados aqui pelas amadinhas Siloany Neves, Marlia Grande e GrsikaBezerra, para no incorrer na injustia de esquecer algum.
Aos grandes professores que encontrei no aprendizado do ofcio jornalstico. Renata CmaraAvelino, que sorte eu tive de parar em suas mos e ser lapidada por voc. Ivo Almeida, Dida,Jussi Rodriges, Gabriela Guedes e Gabriela Parente, minha admirao por vocs crescente. rica Chianca e a Douglas Xavier, almas-irms, sintonia profissional e pessoal, pelosdesafios que me ensinam a superar com seus exemplos.
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"O cineasta no deve fazer s filme, ele deve se interrogar sobre a sociedade em que vive."(Jean-Jacques Beineix)
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BARBOSA, Talitha de Melo e Silva. Leitura e recepo crtica de Tropa de Elite 2, de JosPadilha. Monografia de Concluso do Curso de Comunicao Social da Universidade Federalda Paraba, habilitao em Jornalismo. Joo Pessoa, 2012.
RESUMO
O presente Trabalho de Concluso de Curso tem o intuito de analisar as crticascinematogrficas publicadas em dez sites e blogs distintos, sobre o longa-metragem de ficoTropa de elite 2, dirigido por Jos Padilha. Nosso objetivo observar os olhares construdos
pelos crticos sobre a importncia da personagem para a economia da obra, a representao daviolncia no filme e as relaes entre a fico e a sociedade. Neste vis, desenvolvemos a
pesquisa agregando as contribuies terico-metodolgicas do sistema de resposta social,caracterizado por Jos Luiz Braga (2006), com os mtodos e as tcnicas de anlise flmica
propostas por Manuela Penafria (2009) e Francis Vanoye e Anne Goliot-Lte (1994). Emseguida, buscamos confrontar as anlises das crticas com textos de autores diversos que
versam sobre essas mesmas questes e agregamos pesquisa. O trabalho, portanto, visaestabelecer uma ligao ainda maior do texto com o contexto social, fazendo uma anlise dosdispositivos sociais de crtica miditica, ou apenas respostas que a sociedade encontra paraintegarir com e sobre a sua mdia. Diante disso, pretendemos realizar um estudo com interesseesttico, mas principalmente comunicacional sobre um importante produto do cinemanacional que representa o filme brasileiro mais assistido at o presente momento.
Palavras-chave:Recepo; Crtica; Sistema de resposta social; Jos Padilha; Tropa de Elite.
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BARBOSA, Talitha de Melo e Silva. Reading and critique of Elite Squad 2, by JosPadilha. Course completion monograph of Social Communication major in Journalism,Universidade Federal da Paraba, Joo Pessoa, 2012.
ABSTRACT
This final project aims to analyze critiques published on ten different websites and blogsabout the feature film Tropa de Elite 2, directed by Jos Padilha. Our goal is to observecritics impressions on the importance of character to the economy of the piece, therepresentation of violence in the film and the relationship between fiction and society. Withthis aim, we developed a search combining the theoretical and methodological contributionsof the social response system, characterized by Jos Luiz Braga (2006), with the methods andtechniques of film analysis proposed by Manuela Penafria (2009) and Francis and AnneVanoye Goliot-Lete (1994). We we seek to confront the critical analysis of texts by variousauthors that deal with the above issues and added to the research. Therefore this written
project aims to establish a link even greater than text with social context, making an analysisof critical social media, or even answers that society finds to interact with or about media. Weintend to conduct a study of aesthetic interest, although mainly examining communication, onan important product of national cinema and most watched Brazilian film to date.
Keywords: Reception, Criticism; social response system; Jos Padilha; Tropa de Elite.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Uniforme exibe o nome do militar (Rocha, vivido pelo ator Sandro Rocha) e seutipo (Jos Padilha, 2010) .......................................................................................................... 38
Figura 2 Clima de romance entre Nascimento e Rosana, aps o nascimento de Rafael (JosPadilha, 2010) ........................................................................................................................... 43
Figura 3 Brigas do casal (Jos Padilha, 2010) ....................................................................... 43
Figura 4 - Nascimento ovacionado por clientes de um restaurante, aps a ao em Bangu 1(
Jos Padilha, 2010) ................................................................................................................... 44
Figura 5 Um dos raros momentos entre pai e filho, no tatame da academia do BOPE.rigasdo casal (Jos Padilha, 2010) .................................................................................................... 45
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SUMRIO
INTRODUO ...................................................................................................................... 11
CAPTULO I DA RECEPO RESPOSTA SOCIAL ............................................... 14
1.1 Das conversas sobre filmes crtica cinematogrfica ................................................... 14
1.2 Sistema de Resposta Social .............................................................................................. 16
1.3 Estrutura e caractersticas da crtica .............................................................................. 21
CAPTULO II PERCUSO DA ANLISE ........................................................................ 24
2.1 Padilha e o filme evento ................................................................................................... 24
2.2 Mtodos de anlise da crtica ........................................................................................... 26
CAPTULO III ANLISE DO CORPUS.......................................................................... 29
3.1 Leitura e recepo crtica de Tropa de elite 2................................................................. 293.2 De capito coronel o arco dramtico de Nascimento .............................................. 36
3.3 O intelectualzinho de esquerda ....................................................................................... 48
3.4 Polcia, poltica e milcia a representao da violncia em Tropa de elite 2............. 49
3.5 Fico e sociedade ............................................................................................................. 56
CONCLUSO ......................................................................................................................... 59
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ................................................................................. 62
CRTICAS ............................................................................................................................... 64
ANEXO II Cpia do DVD de Tropa de elite 2 .................................................................... 65
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INTRODUO
A construo do presente trabalho se deu a partir do desejo de levar adiante o estudo
iniciado com a participao no Programa Institucional de Bolsa de Iniciao Cientfica (Pibic)
realizado no perodo de agosto de 2010 a julho de 2011. Nesta pesquisa trabalhamos com
anlise flmica de fico audiovisual nacional no grupo Fico e Comunicao: Leitura e
Recepo crtica de audiovisuais, onde sentimos a necessidade de contribuir tambm para o
crescente campo dos estudos da recepo cinematogrfica no Brasil. Ao mesmo tempo,
pensamos em, paralelamente ao estudo das crticas, realizar anlise flmica de aspectos do
longa-metragem Tropa de elite 2, de Jos Padilha.
Levamos em considerao o fato de ser a obra com maior bilheteria nacional at omomento, superando o antigo marco de Dona flor e seus dois maridos (1976), de Bruno
Barreto. Por isso mesmo, acreditamos que haveria uma fartura de crticas a seu respeito. Por
j terem se passado dois anos do lanamento da obra, optamos por limitar o corpus da
pesquisa a textos publicados em meio eletrnico. O recorte considerou ainda a imensa
disponibilidade de sites e blogs especializados em cinema, deste modo, selecionamos 10
crticas entre os veculos mais familiares aos integrantes do grupo de estudos.
Ao iniciar os estudos sobre a recepo cinematogrfica, percebemos de cara que ocenrio deste campo de pesquisa no Brasil ainda incipiente. Fernando Mascarello, realizou
um mapeamento, cujo recorte temporal abrangeu os anos de 1997 a 2005, no qual constatou
que praticamente inexistem pesquisas nesta rea nas universidades brasileiras. Entretanto, o
fato deste tipo de trabalho poder ser relevante para a academia o mesmo que fez dele um
caminho difcil de ser percorrido.
A princpio trazemos as contribuies da recepo crtica cinematogrfica, com
destaque para os trabalhos de Fernando Mascarelo (2004, 2006) e Regina Gomes ([s/d]). Emseguida aderimos tese de Jos Luiz Braga (2006) sobre os dispositivos de enfrentamento
miditico, segundo o qual a crtica cinematogrfica pertenceria ao terceiro sistema (ao lado da
produo e da recepo) chamado por ele de Sistema social de resposta. No anteciparemos
seus conceitos e aplicaes, pois eles sero demonstrados no primeiro captulo deste trabalho.
Visto isso, apresentamos as caractersticas do trao realizador de Jos Padilha.
Sabemos que o diretor despontou no cenrio cinematogrfico nacional em 2002 com o longa-
metragem documental nibus 174. Ele faz parte desta nova safra de talentos que tem dado
visibilidade ao cinema brasileiro. Com sua esttica realista, compreendida por ns a partir da
leitura de Grard Betton (1987), e preocupado com a temtica social, seus filmes no passam
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despercebidos pelo pblico. Alis, arriscamos dizer que eles se enrazam no cotidiano, seus
bordes viram gria e seus personagens passam a habitar o imaginrio popular. A partir do
fenmeno Tropa de elite, pretendemos explicar o conceito de filme-evento, e falar sobre as
condies de produo e distribuio que conferiram tal status ao longa. Neste mesmo
captulo, buscamos esclarecer as estratgias utilizadas para aplicar leitura do corpus. Como
no encontramos metodologias especficas para realizar a anlise das crticas, adaptamos os
mtodos de anlise flmica disponveis nas obras de Manuela Penafria (2002) e Vanoye e
Goliot-Lt (1994). Neste vis, Braga (2006) novamente instrumentalizou a anlise
fornecendo as caractersticas da estrutura bsica e varivel dos textos crtico-interpretativo,
conduzindo nosso olhar em torno das especificidades do gnero.
No terceiro e ltimo captulo, realizamos a anlise do corpus. Foram dez crticasselecionadas em sitese blogsdistintos. Alguns crticos so velhos conhecidos do mtiere do
pblico por seus espaos permanentes em grandes jornais como Folha de So Paulo e
Estadoso eles: Luiz Zanin, do Cinema, cultura e afinse Incio Arajo, de Cinema de boca
em boca. Entre os sites especializados, temos os textos de Fernando Verssimo, Tatiana
Monassa e Pablo Vilaa das revistas especializadas Cintica, Contracampo e Cinema em
cena, respectivamente. Entre os de amplo alcance do pblico, temos Rodrigo Carreiro, de
Cinereporter; Marcelo Forloni, do Omelete;Daniel Wajnberg, do Crticos; Thiago Siqueira,de Cinema com rapadurae Heitor Augusto, do Cineclick.
Para tornar vivel o trabalho de anlise destrinchamos, decompomos, separamos em
quadros temticos as partes do texto que tratavam daquele mote correspondente. Algumas
delas ficaram isoladas, pois no houve recorrncia em outros textos, como foi o caso dos
comentrios sobre a distribuio do filme presente em apenas um dos textos. Outros, no
entanto, como era de se esperar dada as caractersticas comuns do gnero, receberam
tratamento de forma unnime, como as referncias ao diretor e parte do elenco e o ato decontar o filme. S ento contrapomos as contribuies crticas com a fortuna terica
relacionada ao contexto social, tomando por apoio Michael Foucault (1999), Muniz Sodr
(2006), Cristina Costa (2002), Maria Rita Khel (2004), alm de textos da revista Carta Capital
que utilizamos apenas pontualmente, porm mesmo assim foram de grande valia.
Os elementos das crticas foram enquadrados em trs grandes temas: personagem,
violncia e fico e sociedade. A partir deles, investigamos as falas dos analistas relacionando
sempre que possvel com os autores lidos ou com a nossa prpria anlise do texto ou do
contexto flmico. Extramos o que julgamos de mais relevante para o debate em torno da
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resposta social do cinema de Jos Padilha, e mais especificamente do longa Tropa 2, sem
buscar pretender exaurir as possibilidades de anlise.
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CAPTULO I
1.1 Das conversas sobre filmes crtica cinematogrfica
Conversas sobre cinema ocorrem cotidianamente nos mais variados locais, situaes e
envolvem todos os tipos de pessoa. A ttulo de exemplo, quem j assistiu a um filme com uma
criana deve ter se surpreendido com questionamentos como: qual a sua cena preferida? O
que voc no gostou? Qual seu personagem favorito? Casos como este acontecem a todo o
momento. Quantas vezes nos envolvemos em dilogos com colegas de trabalho ou numa roda
de amigos para falar sobre algum filme que vimos? Pois bem, a prtica de conversar sobre
cinema e audiovisuais em geral mais comum do que supomos. Essas conversas (anlises)variam em profundidade, podem privilegiar alguns aspectos ou abranger toda a obra, seguem
critrios na maioria das vezes pessoais e no possuem outras pretenses se no a de trocar
experincias e oferecer a sua interpretao. Neste cenrio, corroboramos com Manuela
Penafria (2009) que a anlise aparenta ser uma atividade banal que pode ser praticada por
qualquer pessoa sem que o mesmo seja obrigado a seguir um determinado enfoque ou uma
determinada metodologia (p.1).
No entanto, existem pessoas que assistem a filmes com a inteno de analis-los.Falando com Francis Vanoye e Anne Goliot-Lt, a anlise flmica no um fim em si.
uma prtica que procede de um pedido, o qual se situa num contexto (institucional). Esse
contexto, porm, varivel e disso resultam evidentemente demandas tambm eminentemente
variveis (1994, p. 9). Independente de onde surja a demanda, desde escolas at veculos de
comunicao, na maioria das vezes a anlise flmica resulta numa produo escrita (texto),
audiovisual ou mista (VANOYE; GOLIOT-LT 1994, p. 9). Segundo os autores, sempre
importante situar esse contexto da anlise e de determinar o seu produto final (idem, p.10).Como dissemos, tais anlises vo dar origem aos mais diversos tipos de discursos.
Manuela Penafria aponta que qualquer discurso sobre um determinado filme far algum tipo
de anlise. E o discurso mais visvel o da crtica de cinema, diariamente publicada em
jornais e revistas (2009, p. 1). Neste sentido, a pesquisadora alerta sobre a
imprescindibilidade de distinguir os textos analticos dos textos crticos, pois, enquanto a
anlise visa decompor para em seguida reconstruir o filme e assim poder interpretar, a crtica
tem a inteno de julgar a obra em relao sua finalidade (seja esttica, seja para promover o
debate sobre um tema, etc.) (PENAFRIA, 2009, p. 2).
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Por outro lado, nem sempre essas atividades vm dissociadas. normal que para
atribuir um juzo de valor, e Penafria (2009) explica isso, um crtico cinematogrfico se valha
da anlise flmica, mas, o contrrio nem sempre possvel, pois um texto valorativo por vezes
se afasta da anlise e peca por ser demasiadamente genrico a ponto de suas frases feitas
servirem a outras obras que no a apreciada (p. 2).
Neste vis, compreendendo as proximidades e tenses entre a anlise flmica e a
crtica cinematogrfica, pretendemos realizar no presente estudo uma leitura da leitura, ou
seja, analisaremos algumas crticas do filme Tropa de Elite 2 e, procuraremos fazer anlise
flmica de aspectos da obra abordados nas crticas para ento ampliar o debate social que o
filme suscita.
A pesquisa seguiu o caminho trilhado por Jos Luiz Braga (2006) que verticalizou osestudou sobre dispositivos de crtica miditica e props uma separao entre o que chama de
sistema de resposta social e a recepo. Por hora, basta esclarecer que o autor no demonstra
uma nsia classificatria dos textos, mas, d suporte para a identificao dos elementos
intrnsecos ao gnero e os aspectos que evidenciem escolhas pessoais dos crticos. Mais
adiante aprofundaremos essas questes.
Amparamos nossa pesquisa tambm nos j citados Vanoye e Goliot-Lt, falando
sobre a posio ideal a ser tomada pelo analista e Manuela Penafria (2009) que no apenastraa os limites entre a crtica e a anlise, mas principalmente, empresta uma metodologia
prpria que por vezes serviu como parmetro para as discusses com as crticas. Importa
destacar que a anlise do discurso ficcional utilizada na anlise do corpuscomo elemento
subsidirio, portanto no se trata de um estudo que pretenda um contraste entre a crtica
jornalstica publicada e uma proposta de anlise flmica nossa. Longe disso, seguindo os
passos de Braga (2006), o que pesa nesse trabalho perceber como a sociedade, mais
especificamente, um grupo de crticos jornalsticos de cinema, respondem a um produtomiditico especfico, neste caso Tropa de Elite 2.
Adicionamos ao debate o suporte terico dado pela narratologia, que tem em Grard
Genette um de seus expoentes. Com ele, investigamos se e como as crticas percebem a
influncia da narrao (Voz) e da focalizao (Modo) na economia da obra. Genette, em seu
Discurso da narrativa, mostra que o que importa nisto tudo o modo como a quantidade e a
qualidade da informao diegtica repassada para o leitor (espectador). A partir da
combinao entre quem fala (narrador) e quem v (focalizador) no filme, teremos maior ou
menor fornecimento de informaes sobre a narrativa. Para averiguar como o discurso crtico
enfoca a personagem de fico, trabalhamos com Antonio Candido, Paulo Emlio Sales
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Gomes e Anatol Rosenfeld, atravs da obraA personagem de fico, na qual se ocupam das
relaes entre a literatura e o leitor (a produo e a recepo) da personagem de fico alm
de trazer tona peculiaridades da personagem cinematogrfica.
Com relao s observaes sobre o fenmeno da violncia exposto pelo filme,
recorremos s contribuies de Michael Foucault (1999) e Muniz Sodr (2006). Fazendo uma
leitura sobre a histria da violncia nas prises, compilada na obra Vigiar e punir, Foucault
dedica um captulo s Disciplinas. A partir da sua tese traamos um paralelo com a formao
militar no Brasil, conforme representada no filme. Ao mesmo, tempo evocamos Sodr para
explicar a violncia visvel, mediada pelos meios de comunicao, bem como as relaes
esprias das milcias, a tecnoburocracia e o trfico de drogas.
Na anlise do corpus, discutiremos tambm as interfaces entre fico e sociedade.Apresentamos o conceito de fico para em seguida mostrar como a esttica cinematogrfica
explica determinadas escolhas do diretor que so abordadas nas crticas. Utilizamos nesse
trabalho de cotejamento do real com o ficcional as contribuies de Cristina Costa (2002) e
Gerrd Betton (1987).
Mas antes, necessrio compreender como se d a consolidao dos estudos de Jos
Luiz Braga (2006). Visto que, embora sua tese se d em campo de estudo j explorado em
vrios aspectos, o mesmo prope uma nomenclatura nova que rompe com o paradigma naqual a crtica cinematogrfica pertencia ao sistema de Recepo.
1.2 Sistema de Resposta Social
Por muito tempo tivemos nos estudos da comunicao uma bipartio dos processos
comunicacionais entre os sistemas de produo e de recepo. Ao tomarmos a afirmao de
Jos Luiz Braga e Regina Calazans de que a comunicao social vista como uma relaobipolar entre a mdia (quer dizer, as empresas e os produtores de programas) e os usurios
(2001, p. 23), concordamos que persevera na atualidade uma viso dualista do processo de
comunicao baseada na relao entre emissores e receptores. No estamos afirmando,
obviamente, que este o modelo de comunicao vigente, afinal as teorias da comunicao h
muito superaram esse paradigma. Como afirmam Braga e Calazans (2001): a partir dos anos
80, comea-se a perceber o usurio como possivelmente ativo. Redescobrem-se as inseres
culturais dos receptores, que utilizariam sua vivncia, sua identidade cultural, como
mediao para interpretar os produtos mediticos e resistir a inculcaes (p. 22-3). No
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entanto, totalmente aceitvel falarmos ainda hoje, tendo em vista a percepo do senso
comum, que persevera essa viso unidirecional.
Dentro do vasto campo da comunicao, as pesquisas em cinema seguiram este
mesmo caminho, porm, com atraso ainda maior em relao aos estudos da recepo nas
demais reas da comunicao como a televiso, por exemplo. Segundo o mapeamento quali-
quantitativo realizado por Fernando Mascarello (2006), com a abertura dos programas de
ps-graduao em comunicao a partir dos anos 1970, um franco crescimento
experimentado pela pesquisa em setores como a histria do cinema brasileiro, a anlise
flmica e a teoria do cinema (p. 2).
Para Regina Gomes ([s/d]) estas anlises retiram o texto - e a recepo por
consequncia - da histria, ou seja, removem o texto de seu contexto (p. 1143). Em seuartigo sobre as Teorias da recepo, histria e interpretao de filmes, a autora esclarece que
somente a partir dos anos 80 que as investigaes tomam um rumo que leva a abandonar a
dimenso de mero arquivo dos textos flmicos para abordar a via da reconstruo conectada a
da interpretao desses textos (p. 1143). A partir de ento, explica Mascarello (2004),
nesse perodo que os tericos do-se conta da insuficincia do formato textualista, e passa-se a
investigar o contexto de recepo e a instncia espectatorial que viria a culminar na adoo da
etnografia para o estudo das audincias (p.101-2). Num esforo de mapeamento dos estudosculturais e da recepo no campo da pesquisa cinematogrfica, o pesquisador mostra que esse
novo horizonte terico-metodolgico visa buscar a uma multiplicidade de construes
discursivas passveis de habitao pelos espectadores histricos (p. 101). Esse espectador,
historicamente situado, afirma Regina Gomes ([s/d]), molda e moldado pela experincia
cinematogrfica, num processo dialgico sem fim. O conhecimento e a interpretao do
processo cinematogrfico deve, sem dvida, levar em conta este dilogo que reconhece a
participao concreta e ativa do espectador de filmes (p. 1142).Entretanto, mesmo com a entrada em cena dos chamados estudos contextualistas da
espectatorialidade cinematogrfica, nota-se que no Brasil as pesquisas nesse campo tm
sido insignificantes, ou ainda, nas palavras de Mascarello: inexistentes. Para o autor, o que
ocorre uma absoluta marginalizao do interesse pela recepo cinematogrfica nos
estudos brasileiros de cinema (MASCARELLO, 2006, p.1).
A enorme defasagem do debate terico cinematogrfico no pas, situado ainda
maciamente no paradigma textualista tpico dosfilm studiesdos anos 1970, impedea divulgao de uma cultura terico-metodolgica contextualista necessria,justamente, para a proposio de estudos do extratexto cinematogrfico, entre osquais se acham, evidentemente, os de recepo. (MASCARELLO, 2006, p.8).
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Duas causas geram esse quadro desolador da recepo cinematogrfica no Brasil,
segundo Mascarello (2006). A primeira delas uma desafeio local teorizao e o segundo
advm da desatualizao terica (p.9). Inevitavelmente, tais fatores geram como consequncia
a repetida excluso do espectador concreto do horizonte analtico, em termos tanto
quantitativos (hipertrofia da rea) como qualitativos (anlise imanente do texto flmico) (p.
9).
Regina Gomes ([s/d]), por sua vez, acredita que as teorias da recepo no campo
cinematogrfico, tem recebido nos dias que correm merecido destaque aps um longo perodo
de ostracismo (p. 1141). Conforme a autora possvel traar um paralelo com a recepo
literria, levando-se em conta que o papel de agente ativo delegado ao leitor seria, em cinema,
exercido pelo espectador com o objetivo de compensar ausncias e preencher lacunas do textoflmico (p. 1141).
Dentro deste cenrio, em fase de construo, realizamos o presente estudo visando
extrair das reflexes da crtica cinematogrfica especializada sua contribuio para o debate
tanto nos aspectos internos ao texto, em que pese a linguagem cinematogrfica, quanto na sua
capacidade de contextualizar a obra em relao a contemporaneidade. A opo por uma
pesquisa que privilegie essa via de mo dupla entre o texto e o contexto se d em consonncia
com a viso de Antonio Candido (2006) segundo a qual s assim possvel obter umainterpretao dialeticamente ntegra (p. 13).
Entretanto, era preciso encontrar em meio a essa escassez terica, um caminho seguro
onde pudssemos repousar nossas inquietaes e a partir da empreender a anlise do corpus
de pesquisa.
Estudando os dispositivos de crtica miditica, Jos Luiz Braga (2006) constatou a
existncia de um terceiro sistema que, ao lado da produo e da recepo, completa a
processualidade de midiatizao social geral, fazendo-a efetivamente funcionar comocomunicao (p. 22). A este sistema, Braga deu o nome de sistema de resposta social
(2006, p. 22). Deste modo, encontramos os subsdios necessrios para fundamentar nossa
pesquisa e desenvolver a leitura das crticas cinematogrficas de sitese blogsespecializados
sobre Tropa 2.
Importa esclarecer, antes e acima de tudo, que Braga (2006) no trouxe tona um
campo novo, totalmente inexplorado, tampouco no seria justo dizer que o autor se ocupa
apenas em nomear um campo vastamente conhecido pela academia. Longe disso, o autor
reconhece que h estudos sobre a circulao social, ou elementos dela, mas ainda so escassos
e no trazem essa noo de atuao social sobre a mdia de forma expressa (p. 33). Visto isso,
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passamos a explicar como essa contribuio de Jos Luiz Braga viabilizou no s a presente
pesquisa, mas tem servido de alicerce para muitos estudos que enfocam esse subsistema de
circulao social diferida e difusa dos produtos e processos da mdia.
Compreendemos com Braga (2006) que a sociedade age e produz no s com os
meios de comunicao, ao desenvolv-los e atribuir-lhes objetivos e processos, mas sobre os
seus produtos, redirecionando-os e atribuindo-lhes sentido social (p. 22). Deste modo, o
autor pondera que os produtos miditicos no so apenas recepcionados e consumidos pelos
usurios, mas que, portando informaes sobre esses materiais simblicos, a sociedade
conversa e interage com base nesse estmulo. essa movimentao social de sentidos, essas
conversaes posteriores, evidentemente trabalhadas, tensionadas, manipuladas e reinseridas
nos contextos mais diversos (p. 28) que do corpo ao sistema de resposta social. Para opesquisador, importa entendermos que o sistema de interao social sobre a mdia, que a
circulao de produtos miditicos na sociedade no se faz apenas como escolher e acolher
segundo critrios culturais anteriores, mas gera um trabalho social dinmico: respostas
(BRAGA, 2006, p. 29).
Essas respostas representam as formas que a sociedade encontra para interagir com e
sobre a sua mdia. Os meios de expressar essas respostas so chamados de dispositivos sociais
e agrega a crtica jornalstica, os cineclubes, revistas que falam da mdia, entre tantos outros.So aes interpretativas, contrapositivas, polemizadoras, seletivas, direcionadas para a
prpria sociedade, mas, dependendo da amplitude podem direta ou indiretamente retornar
mdia, um retorno que parte da sociedade e necessariamente, como j fora dito, diferido e
difuso (BRAGA, 2006, p. 40).
Embora o autor considere em seus estudos todos esses dispositivos sociais como
processos crticos numa viso abrangente, a ns interessa aquele caracterizado pelo esforo
analtico-interpretativo que ilumina o produto miditico em determinados ngulos de suaconstituio ou seja, a crtica acadmica e a crtica jornalstica (BRAGA, 2006, p. 47).
Mas, afirma o pesquisador, o erro de ambas consiste em no alimentar significativamente o
debate social sobre a mdia (BRAGA, 2006, p. 48). A acadmica se ocupa basicamente da
leitura de autores prediletos para depois aplic-las sobre as produes miditicas, no intuito de
confrontar algumas perspectivas. E a jornalstica, acrescida dos elementos de opinio pessoal,
coloca-os como verdades, como um discurso de autoridade que objetiva dar ao leitor um
servio de seleo pronto (BRAGA, 2006, p.48). Nessa perspectiva, nenhuma das duas
proporciona o mrito de ampliar os conhecimentos sobre os processos e produtos miditicos,
sendo, em sua maioria, limitadas.
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No soubemos ainda desenvolver (com suficiente abrangncia e penetrao)dispositivos sociais centrados em processos crtico-interpretativos capazes detensionar produtivamente os trabalhos de criao e produo, nem de eficazmenteestimular, cobrar, avaliar e selecionar bons produtos, nem ainda oferecer baseseficazes para interpretao direta do usurio (BRAGA, 2006, p. 60).
Entretanto, quando se trata de cinema, a situao um pouco diferente. Braga (2006)
esclarece que a crtica cinematogrfica (ao lado das criticas de literatura e de teatro) no se
fixa no debate do meio e seus processos de forma generalizada e abstrata como fazem as
crticas de rdio e televiso. Elas analisam, interpretam, comentam produtos especficos tendo
em vista o modo com so formulados, o objetivo que perseguem e suas incidncias sobre o
pblico (p. 61). Ao mesmo tempo, completa o autor, fornece bases, vocabulrios e critrios
para os usurios em seu esforo de seleo, interpretao e edio dos produtos com que sedefrontam (BRAGA, 2006, p. 61).
Para Braga (2006), um trabalho crtico de qualidade consegue oferecer tambm
critrios diferenciados para nortear interpretaes de senso comum, que possam ser feitas
pelos usurios no especializados, de modo que atenda seus prprios interesses e percepes
de mundo ampliando a competncia e autonomia interpretativa na hora de realizar suas
escolhas, e desenvolvendo a capacidade de relacionar com outros produtos, com questes do
mundo e de suas experincias sociais e pessoais (p. 65). Trata-se de instrumentalizar asociedade com um repertrio discursivo que permita a mesma compreender e refletir sobre a
mdia, decidir o que lhe interessa e o que desinteressa, operar selees.
A questo que a abrangncia da crtica no Brasil muito limitada. Poucos tm o
hbito de ler crticas de cinema, ainda mais porque so disponibilizadas, via de regra, em
revistas e sites especializados na stima arte. E mesmo as pessoas que buscam esse servio
o fazem com a inteno de se informar sobre determinado filme, diretor ou ator, mas
pouqussimos (pra no dizer nenhum) o fazem com o fim de conhecer como os espectadores
especializados tm utilizado os dispositivos crticos que temos para refletir sobre o cinema
como arte e como objeto de produo de sentido. Deste modo, concordamos com a
reivindicao de Braga (2006) de que a disponibilidade da crtica precisaria ser ampliada,
deveria ser acessvel, e no distante teria que circular entre os diversos ambientes e
patamares, de modo que ultrapasse as trocas entre coparticipantes de uma mesma tendncia
ou de um mesmo crculo de iniciados (p. 65). Neste sentido, necessrio que a crtica
alcance as pessoas para inseri-las no debate, na produo de resposta social consciente e
direcionada para os produtos miditicos.
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1.3 Estrutura e caractersticas da crtica
Ao estudar sistematicamente o gnero crtica cinematogrfica que, entre outros,
compe o conjunto dos dispositivos sociais sobre a mdia, Jos Luiz Braga percebeu que a
estrutura dos textos crticos composta de caractersticas bsicas e de elementos variveis.
Segundo o autor, essas variaes ocorrem de acordo com o objeto temtico especfico (no
caso, os filmes criticados), com o estilo do autor e com as contingncias de produo e de
interlocuo que estejam associadas ao texto (2006, p. 209).
O primeiro fator, entre os invariveis, que influencia na construo do texto crtico a
entrada em cartaz, a participao em premiaes, festivais, o lanamento em DVD ou o
relanamento em verso remasterizada, enfim, a presena de algum aspecto que vincule aobra atualidade. , portanto, um gnero vinculado ao presente (BRAGA, 2009, p. 210).
Posteriormente, temos o critrio da imperatividade, segundo o qual aspectos
contextuais em relao ao filme obrigam os crticos a falarem sobre ele. Indicaes a grandes
premiaes (Oscar, Grammy, etc), e acmulo de prmios em festivais menores so bons
exemplos. Aqui, importa no o gosto pessoal, mas solicitaes externas do veculo, pelo
sucesso obtido, entre outras circunstncias relevantes na trajetria do filme (BRAGA, 2009, p.
211).O terceiro elemento essencial para que um texto crtico se torne inteligvel: estamos
falando de contar o filme. Nas palavras de Braga , necessrio e delicado, falar do que o
filme trata, pois, o leitor espera receber um mnimo de informaes que o permitam
compreender o universo diegtico1do filme. Por outro lado, no legtimo que o crtico
seja minucioso a ponto de antecipar o final ou tornar sua espectao dispensvel (BRAGA,
2006, p. 211). Essa caracterstica apresentou algumas variveis. Alguns crticos optam por
expor apenas o argumento bsico, outros preferem descrever o problema dramtico. Tambmforam encontrados resumos indiretos, falando dos personagens principais e relaes com os
demais, ou ainda a decomposio de uma ou mais cenas relevantes (idem,p. 211-2).
O autor aponta em seguida que, principalmente nos filmes de fico, ocorre a
caracterizao do personagem. Tal critrio mostra-se especialmente importante e por isso sua
recorrncia nas crticas. (O que nos remete ao que diz Anatol Rosenfeld, a personagem vive
1 Em seuDicionrio de teoria da narrativa, Carlos Reis e Ana Cristina Lopes (1988) estabelecem umaseparao dos conceitos de histria (diegese) e discurso. Para os autores a histria consiste no plano doscontedos narrados (o que se conta), enquanto que o discurso se refere ao plano da expresso desses mesmoscontedos, ou seja, como se conta (p. 29).
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o enredo e as ideias e os torna vivos) (ROSENFELD, 1998, p. 51). Essa caracterizao do
personagem vem quase sempre em articulao com informaes sobre os atores.
Insere-se ainda, entre as caractersticas bsicas da crtica, a contextualizao. Segundo
Braga, o filme um produto, que se elabora e, portanto, conta com criadores e participantes,
e circula ou pretende circular no mundo (2006, p. 212). Inclui-se aqui, as referncias ao
diretor e elenco principal, dependendo da importncia do diretor e/ou dos atores e atrizes
comum mencionar outras obras da qual fizeram parte. Cabe tambm neste critrio, falar sobre
os elementos de pr e ps-produo, trazer informaes sobre a equipe, em resumo,
acrescentar dados sobre a origem e produo do filme como um complemento para o leitor
(2006, p. 213). Em suma, diz o autor, reunir em um mesmo texto os problemas de
financiamento, os resultados de bilheteria, o trabalho dos atores, as sinuosidades da narrativae as reaes sentidas por um conhecedor, no bvio nem natural: uma deciso de
gnero (BRAGA, 2006, p. 217).
Por fim, temos que a crtica fornece, impreterivelmente, um juzo de valor. Pode-se
dizer que essa a essncia da crtica. A crtica constitui gnero jornalstico, que se enquadra
como opinativo, de modo que faz parte da apreciao, portanto, no uma pretenso de
verificabilidade objetiva (isto , de constatao no objeto de tais e tais caractersticas
apreciadas), mas sim a expresso de uma relaoentre objeto (o filme) e o sujeito (o crtico)(BRAGA, 2006, p. 214).
Em relao aos aspectos variveis, o autor coloca apenas a alterao em diferentes
graus de especializao, sofisticao e ngulos de acuidade dos textos crticos. Para Braga,
nas revistas especializadas privilegia-se o contar e a apreciao (em nosso corpus
aproximamos da noo de publicao especializada os sites da Cintica, Contracampo e
Cinema em cena). Na apreciao, diz o autor, os elementos estticos (em notao de esttica
maior) e as perspectivas sobre valores humanos e de sociedade ganham em profundidade econcentrao (BRAGA, 2006, p. 220). Destaca-se tambm as variaes entre os
interlocutores. Na anlise do autor, essas revistas lidam com leitores cujo conhecimento, a
sofisticao esttica e as reflexes de mundo so mais amplas em relao ao pblico de
veculos populares (que em nosso corpuspoderiam ser aproximadas, bem grosso modo, de
sites como Cineclick, Omelete, Crticos, Cinema com rapadura eCinereporter).
Outra varivel do gnero ao qual Braga (2006, p. 221) nomeia de profissional crtico
se d na transio da crtica jornalstica para a crtica acadmica. Nesse modelo, o critrio de
atualidade perde sua obrigatoriedade, ainda que por vezes a apreciao seja justificada pelo
ingresso do filme em cartaz. Tambm notvel que a narrao se faz muito mais para
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sustentar a anlise do que para informar ao leitor. E a apreciao d lugar interpretao,
numa perspectiva quase-objetiva (BRAGA, 2006, P. 221-2). Atrelamos a esta perspectiva
de anlise, as crticas dos blogs de Luiz Zanin e Incio Arajo.
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CAPTULO II
2.1 Padilha e o filme-evento
Em 2007, Jos Padilha estreia como diretor de fico ao lanar o primeiro longa-
metragem da franquia Tropa de Elite. Oriundo do documentrio, Padilha j era reconhecido e
premiado pelo longa documental nibus 1742(2002). O filme narra a histria do sequestro de
um nibus na zona sul do Rio de Janeiro protagonizado por Sandro Nascimento, que
sobreviveu chacina da Candelria (1993) e acabou assassinado por policiais aps o desfecho
mal conduzido do sequestro. A ideia inicial de Padilhaem Tropa de Elite misso dada
misso cumprida era realizar outro documentrio, desta vez pela perspectiva dos policiais,entretanto percebeu que seria praticamente impossvel encontrar personagens reais que
topassem o risco de falar sobre os problemas internos corporao. Visto isso, abraou a ideia
de fazer uma fico.
Ao ingressar no universo ficcional, Padilha traz os ingredientes que fizeram de Cidade
de Deus (Fernando Meirelles, 2003) um marco no cinema nacional: a trade favela, violncia
e excluso social. Entretanto, sozinhos, esses ingredientes no do conta da repercusso que o
filme adquiriu, afinal no havia nada de novo nisso. O lance inaugural do projeto veio nasubordinao da perspectiva narrativa a um oficial do Batalho de Operaes Especiais
(BOPE) da Polcia Militar.
Uma narrativa que referencia o cotidiano do trfico de drogas e da criminalidade emfavelas cariocas sob a tica da polcia constituiu um captulo inovador no quadroatual do cinema brasileiro. Em filmes como Cidade de Deus e Carandiru, aviolncia urbana apresentada ao espectador pelo morador da favela, o presidirio,o traficante ou seja, pelos indivduos-personagens que fazem parte daquelarealidade retratada (RUY, 2011, p. 104).
Com o vazamento do filme, no foi possvel mensurar o pblico total que assistiu
obra. Por outro lado, isso permitiu que Tropa de Elite, em pouco tempo, se transformasse em
um fenmeno de popularidade e abriu imenso espao gratuito, e impensvel para uma fico
nacional, na agenda jornalstica. E no fim das contas arrastou mais de dois milhes de
espectadores para as salas de exibio tornando-se o filme nacional mais assistido no cinema,
sem vinculao com a Globo Filmes, entre os anos de 2000 e 2009. Em 2008, se notabilizou
por ter conquistado o Urso de Ouro do Festival de Berlim.2Vencedor do Festival Sundanceem 2003,Mostra So Paulo em 2002 e Festival do Rionas categorias pblicoe crtica.
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Em 2010 estreia Tropa de Elite 2 o inimigo agora outro , e conquista a maior
bilheteria do cinema brasileiro at o momento, desbancando o at ento recordistaDona Flor
e seus dois maridos (1976), de Bruno Barreto. Algumas mudanas contriburam para que a
obra provocasse um verdadeiro terremoto no mercado. Em primeiro lugar, no h como
ignorar o esquema de segurana montado por Padilha, e coordenado por Srgio Barata
(inspetor de polcia) para evitar a pirataria. Em seguida a opo pela distribuio
independente, tirando de cena a figura das distribuidoras e introduzindo a de um grupo de
investidores, dentre os quais o prprio diretor e o ator Wagner Moura, que, juntos, assumiram
todos os riscos do processo. A iniciativa da Zazen, produtora de Padilha, segue o modelo
inaugurado por Carla Camurati com o filme Carlota Joaquina (1995). Porm,mesmo assim,
representa uma quebra de paradigma para o mercado cinematogrfico nacional que utiliza omodelo mundial organizado sobre o trip dos produtores, distribuidores e exibidores.
Algumas mudanas no mbito diegtico da obra mostraram-se igualmente significativos para
repercusso do filme. Falando com Karina Ruy, percebemos
uma sofisticao na trama, de Tropa 2. O filme continua centrado no personagem dopolicial Nascimento, que tambm segue na figura de narrador, mas a abordagem darelao entre o BOPE e o trfico de drogas se afasta do cenrio da favela. Comoindica o slogan O inimigo agora outro, a sequncia procura mostrar a origem das
milcias, apontando as ligaes existentes com o Estado (2011, p. 151).
A obra contabilizou mais de 14 milhes de espectadores. O fenmeno de popularidade
experimentado no primeiro filme foi potencializado, e mobilizou a mdia impressa, televisiva
e principalmente a internet. Revistas como a Veja, Isto, CartaCapital trouxeram os longas
como matria de capa. A repercusso fez dos filmes Tropa de Elitee Tropa de Elite2tpicos
representantes do que o mercado cinematogrfico denomina de filme-evento.
Os jornais e revistas no lhes dedicam apenas o espao convencional, na forma decrtica e reportagem sobre o lanamento. Abrem tambm espao para artigos queexplorem aspectos polmicos do filme, convidam os realizadores a escrever emdefesa da obra, s vezes com rplicas e trplicas. As emissoras de TV e rdio fazemo mesmo e, sua maneira, o incluem por algumas semanas na pauta. Portais denotcias, blogs e listas de discusso amplificam o debate na internet. Como resultadode tanto movimento, conversa-se sobre o filme em pontos de nibus e mesas debares. Fica no ar a sensao de que preciso ver, afinal, o dito cujo. Caso contrrio,voc est por fora3(RIZZO, 2010).
3RIZZO, Srgio. Stanley Kubrick e seus filmes-evento. Revista Cult. Ed 119. 2007. Resenha. Disponvel em: Acesso em: 22 desetembro de 2012.
http://revistacult.uol.com.br/home/2010/03/stanley-kubrick-e-seus-filmes-eventos/http://revistacult.uol.com.br/home/2010/03/stanley-kubrick-e-seus-filmes-eventos/ -
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Trata-se, portanto, de um formato de produo-distribuio-consumo incomum para o
cinema brasileiro. Numa ltima anlise, falando com Karian Ruy, acreditamos que o
surgimento de filmes com padro blockbuster adaptados claro, ao contexto brasileiro
representam o aspecto mais relevante da atividade cinematogrfica no pas nessa primeira
dcada do sculo 21 (2011, p. 139). A autora acrescenta que essa nova safra de diretores,
que estrearam e amadureceram no cinema no final da dcada de 90, muitos vindos da
publicidade, da televiso e (acrescentamos) do documentrio, trouxeram inovaes e
experimentaes tanto na esttica quanto na narrativa cinematogrfica aproximando
esteticamente os filmes televiso. E assim, os espectadores, acostumados ao produto
audiovisual brasileiro presente na televiso, ganham uma margem de conforto ao entrar em
uma sala de cinema para assistir a um filme nacional (idem).Por outro lado, consideramos que o interesse miditico e espectatorial pelo filme-
evento vincula-se tambm capacidade que o diretor ou a obra (filme-evento) tem de inserir-
se no debate social. E Jos Padilha, com seus trs primeiros longas, parece deixar claro a que
veio.
2.2 Mtodos de anlise da crtica
Depois dessa vasta exposio de elementos referentes produo, distribuio,
lanamento e recepo de Tropa de Elite 2, passamos a analisar como os dispositivos
miditicos de resposta social responderam ao fenmeno deste segundo representante da
franquia. Conscientes da impossibilidade de analisar todas as crticas publicadas sobre o
filme, escolhemos 10 textos de veculos diferentes, todos publicados em meio digital e
disponibilizados na internet atravs de sites ou blogsespecializados em cinema. O material
emprico que selecionamos para o estudo pode ser dividido de acordo com o pblico-alvo. O
primeiro grupo composto por revistas dirigidas a um pblico tambm especializado, figuram
aqui a Cintica,aContracampo e a Cinema em cena; Em seguida temos os sites de crtica e
notcias sobre cinema vinculado aos grandes veculos nacionais: Crticos, da Globo.com;
Cineclick, doR7.com; Omelete, do UOL; Os portais de contedo independente e voltados s
para a stima arte so: Cinereporter eCinema com rapadura. Por fim, os blogs ligados a dois
grandes jornais de circulao nacional: Cinema de boca em boca,do crtico Incio Arajo,
vinculado Folha de So Pauloe Cinema, cultura e afins, do crtico Luiz Zanin, do Estado.
Ao propormos uma anlise das crticas nos deparamos com um obstculo, pois no
localizamos metodologia pronta e especfica para analisar o texto crtico de audiovisuais.
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Mesmo Jos Luiz Braga que se ocupou dessa matria em sua tese sobre o sistema de resposta
social no fornece um percurso metodolgico que contemple todas as nuances da crtica.
Neste cenrio, suprimos a carncia de um modus operandi partindo da proposta bsica de
Manuela Penafria (2009) e, sobretudo agregando mtodos de abordagem da narratologia e
tambm da anlise, a partir de nossa experincia com autores como Genette ([s/d]), Betton
(1987), Reis e Lopes (1988), Martin (2006), Candido (1998 e 2006), Costa (2002) e Vanoye e
Goliot-Lt (1994).
Analisar um filme consiste, basicamente, na decomposio entre cenas ou outros
elementos que no so percebidos sem um olhar mais aguado pelo simples fato de ser visto
na totalidade da obra. Essa etapa de dilacerao de um filme em partes equivale a descrio
do mesmo. A partir da, busca-se reestabelecer os vnculos compreendendo como se d essaassociao para formar um todo significante, ou seja, trata-se de reconstruir o filme atravs da
interpretao. No entanto, o processo de reconstruo deve conduzir de volta ao filme, para
no incorrer no erro de criar outra obra (VANOYE; GOLIOT-LT, 19, p .15). Interessante
que as duas etapas no precisam seguir uma ordem pr-estabelecida no texto. Para os autores,
apela-se a uma quando a outra se esgotou e inversamente, num movimento de balano
incessante (VANOYE; GOLIOT-LT, 1994, p .16).
Visto isso, partimos para averiguar nas crticas que tipo de anlise foi priorizada. Emseu texto Anlise de Filmes - conceitos e metodologia(s),Manuela Penafria explica que h
dois caminhos possveis para analisar um filme: a) opta-se por uma anlise interna centrada
no filme em si, enquanto obra individual e possuidora de singularidades que apenas a si
dizem respeito (p. 7); ou b) prefere-se umaanalise externa aqui o analista considera o
filme como resultado de um conjunto de relaes e constrangimentos nos quais decorreu a sua
produo e realizao, como seja o seu contexto social, poltico, econmico, esttico e
tecnolgico (p. 7).A maioria das crticas mostraram-se muito mais preocupadas com os elementos
internos ao filme do que os externos, a exceo se deu basicamente nos textos de Zanin e
Arajo. possvel que o fato de estarem vinculados a jornais impressos estimulem esse olhar
mais voltado para o cotidiano. Por esta razo iremos aprofundar nossa anlise levando em
conta essa caracterstica textualista das crticas.
Uma anlise interna, explica Penafria, prescinde que sejam apresentadas suas
informaes bsicas (ttulo, ano, diretor, ficha tcnica, pas, sinopse, gnero); decompor o
filme cena a cena, conferindo dinmica narrativa; ponto de vista: visual/sonoro; narrativo
(quem conta a histria); e qual o sentido ideolgico da obra (PENAFRIA, 2009, p. 9). Alguns
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ltados.
pontos apresentados por Penafria no condizem com o nosso corpus. A ficha tcnica por
exemplo, no apresentada em nenhuma das crticas. Mas, diludo no texto, h informaes
sobre o diretor, gnero e sinopse. O que ningum se furtou a fazer foi decompor as cenas, no
todas, mas escolhendo as que consideram mais significativas. S para ilustrar Fernando
Verssimo, da Cintica,que utiliza a cena em que Nascimento encontra Matias na priso e
Pablo Vilaa, de Cinema em cena, sublinha a sequncia em que pai e filho lutam jiu-jitsu.O
ponto de vista visual apontado pela vasta maioria sem poupar elogios ao trabalho de Lula
Carvalho, diretor de fotografia, j o ponto de vista sonoro lembrado apenas pelo crtico de
Cinema em cena.Em relao s questes narrativas, todos os analistas tratam a narrao de
Nascimento como off, no por equvoco de interpretao mas porque na crtica
cinematogrfica, assim como no ambiente de produo convencionou-se o uso da narrao offe a da voz over4 como sinnimos. Entretanto, neste estudo convm diferenciamos os
conceitos utilizando o entendimento dos autores consu
medida em que os textos iam apresentando suas interpretaes da obra, fomos
intercalando nossa prpria leitura do trecho, e, em seguida, agregando as contribuies de
autores que tratam do tema ou da tcnica inerente ao filme.
Superadas essas etapas, verificamos que os dez textos apresentavam as caractersticas
bsicas apontadas por Braga (2006) e explicadas no captulo anterior: atualidade,imperatividade (solicitaes externas do veculo, pelo sucesso obtido, por exemplo:
premiaes ou indicaes), resumo do filme, contextualizao (em relao ao diretor, elenco,
equipe tcnica) e apresentao do juzo de valor. O privilgio dado a determinado elemento
em detrimento de outros variou entre as crticas. Acrescentamos aqui a recorrncia nas crticas
de um retorno, em maior ou menor profundidade, ao primeiro filme da franquia. Isso seja para
situar o leitor da evoluo da narrativa, para relembrar a repercusso crtica ou ainda para
tratar aspectos especficos como o desempenho de determinado ator e o arco dramtico do seupersonagem, e nesse ponto Wagner Moura foi quase unanimemente recordado.
4 Grosso modo, chamamos de voz over ao som no diegtico, ou seja, fala do personagem que no
corresponde fala ou ao dilogo de uma ao que se desenrola naquele momento (diegtico vem de diegese,histria, o que contado) (MOUSINHO, 2012, p. 82). In: MOUSINHO, Luiz Antonio . A sombra que memove - ensaios sobre fico e produo de sentido (cinema, literatura, tv). Joo Pessoa: Editora Universitriada UFPB - EDUFPB/ IDEIA, 2012. v. 01. 180p.
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CAPTULO III ANLISE DO CORPUS
Superadas as etapas de fundamentao terico-metodolgica e explicitado o caminho
que traamos para a realizao deste estudo, daremos incio anlise das crticas que versam
sobre o filme Tropa de elite 2, disponveis em dez sites e blogsespecializados em cinema.
Para compor o corpusselecionamos as crticas dos portais da revista Cintica;Contracampo;
Crticos;Cinereporter;Cinema com Rapadura; Omelete;Cinema em cena; Cineclick; alm
dos blogs Cinema de boca em boca e Cinema, cultura e afins. Observaremos que tipos de
anlise os crticos optaram por realizar, o tipo de abordagem, se as crticas apresentam os
requisitos bsicos do gnero, quais caractersticas variveis so recorrentes nos textos, como
interpretam os elementos narrativos, estticos e de linguagem cinematogrfica, bem como, arelao que estabelecem entre texto e contexto.
3.1 Leitura e recepo crtica de Tropa de elite 2
Tropa de elite 2, segundo filme da franquia homnima, estreou em outubro de 2010
com uma misso: ampliar o debate sobre a segurana pblica no Rio de Janeiro, introduzido
pelos premiados nibus 174e Tropa de Elite, todos dirigidos por Jos Padilha. O filme bateurecorde de pblico, com mais de 11 milhes de espectadores no cinema, graas no s ao
sucesso do primeiro longa-metragem, que gerou muita expectativa em torno deste, mas
tambm ao forte aparato de segurana utilizado para evitar que a obra vazasse antes da estreia
como ocorreu com o primeiro. Para fazer isso dar certo, Padilha quebrou alguns paradigmas,
assumiu e realizou de forma independente, s com o apoio da Globo Filmes, toda a
distribuio da obra eliminando quaisquer intermedirios. Tal inovao inspira a
disseminao de um novo modelo de produo e distribuio no pas. Alm disso, o diretor,
ao lado do produtor, Marcos Prado, comeou sua trajetria como documentarista. Ambos
trouxeram dessa experincia o interesse em fazer uma fico que pretende alcanar o mximo
realismo possvel. Tanto que espectadores desavisados chegaram a pensar que se tratava de
uma histria verdica. De fato, algumas situaes foram baseadas em fatos reais, mas isso,
obviamente, no torna o filme um documentrio.
Deixemos de lado os espectadores normais para adentrarmos no universo daqueles
que assistem ao filme com outra inteno, no apenas a de entretenimento, pois seu desejo
(consciente) , antes de mais nada, compreendero filme ou fragmento escolhido a fim de
estar em condies de elaborar um discurso a esse respeito (VANOYE; GOLIOT-LT,
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1994, p. 18). O xito da empreitada analtica fruto ainda do distanciamento forado do
especialista a fim de tornar possvel uma apreciao ativa e racional do filme. Trata-se, para
falar com Vanoye e Goliot-Lt, de um exerccio de resistncia onde tudo acontece, como se
a relao entre o analista e o filme devesse ser necessariamente uma relao de fora, de luta
(1994, p.19).
Nesse vis, cabe enquadrarmos os espectadores especialistas de acordo com o contexto
e o produto final resultante da anlise. Jos Luiz Braga (2006) promove em sua tese a diviso
da produo crtica entre a acadmica e a jornalstica. A acadmica, via de regra, uma leitura
dos nossos autores favoritos que em seguida aplicada sobre a mdia. Sua nfase mais em
aumentar o conhecimento sobre os processos e produtos do que confrontar perspectivas
(p.48). Braga (2006) manifesta que os objetivos da crtica acadmica dos filmes se debruammais sobre as chaves interpretativas. E explica que pretenso da anlise acadmica certo
grau de objetividade ou pelo menos de sistemtica analtica voltada para o rigor
interpretativo que, se no assegura iseno, pelo menos suspende ou pe entre parnteses os
nveis mais subjetivos do gosto (2006, p.214).
A jornalstica, por sua vez, tende a ser mais impressionstica. Ou seja, esses
comentrios no pretendem realizar a verificao objetiva do filme, mas sim a expresso de
uma relao entre objeto (o filme) e o sujeito (crtico) (BRAGA, 2006, p. 214). Nesse tipode comentrio da mdia os juzos valorativos so dados principalmente pelo gosto do analista.
Visto isso, pretendemos compreender atravs da crtica jornalstica cinematogrfica, com suas
impresses e manifestaes de gosto, as respostas produzidas sobre o filme Tropa de elite
2, independentemente de compartilharmos idnticas reaes (idem, p. 214).
No Captulo II pontuamos os requisitos bsicos e as variveis do gnero crtica
cinematogrfica, alm de outros caminhos possveis para a anlise. Nesta etapa emprica,
pretendemos expor como essas questes orientam e estruturam os textos. O primeiro elementoque identificamos em praticamente todos os textos foi a atualidade das crticas. O filme foi
lanado no dia 08 de outubro de 2010. Das dez crticas selecionadas, seis foram escritas na
semana de estreia, duas no mesmo ms, outra no ms seguinte e apenas uma, do site
Cinereporter5, data de cinco meses aps a estreia nacional.
Em seguida, vimos que foram unnimes quanto a aprovao do filme. Por vezes, essa
adeso se deu de forma comedida e custamos a perceber que se tratava de um elogio, noutras
5Rodrigo Carreiro Doutor em Comunicao (UFPE). Ele criou e mantm o site Cinereporter cuja atualizaodepende das brechas no trabalho como professor com vnculo de dedicao exclusiva do curso de Cinema daUFPE.
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vezes ocorreu com uso desmedido de adjetivos ressaltando as qualidades da obra. Fernando
Verssimo, escrevendo para Cintica, um dos que no poupou loas ao filme: dizer que a
continuao de Tropa de Elite um dos maiores fenmenos que o cinema brasileiro j
produziu em sua histria no um exagero. Daniel Wajnberg, no site Crticos, limitou-se a
afirmar que em Tropa de elite 2, Nascimento mais diverte e eletriza do que incomoda. No
Cinereporter, Rodrigo Carreiro, aponta problemas para s ento tecer seus comentrios a
favor da obra Em que pese esses problemas menores, Tropa de elite 2 possui mritos
inegveis.
A maioria das crticas converge para uma interpretao interna da obra, ou seja, aquele
tipo de anlise que centra-se no filme em si enquanto obra individual e possuidora de
singularidades que apenas a si dizem respeito (PENAFRIA, 2009, p.7). Vejamos algunsexemplos: no site Omelete, Marcelo Forlani fala do filme que d sequncia trajetria de
enorme sucesso de um personagem que no vive para meios tons, que faz de tudo para
cumprir sua misso e, se precisar, at bota na conta do papa. Em Contracampo, Tatiana
Monassa aponta que Nascimento deixa de ser um homem de ao para ser um homem de
discurso. Verssimo, para a revista Cintica, acrescenta que com Tropa 2, como se toda
uma janela de oportunidades de fices se fechasse para abrir espao a um novo conceito. H
uma srie de outras passagens que atestam a opo pela anlise interna. Esta escolha se d porduas razes que nos parecem bvias. A primeira , falando com Braga, determinada pela
linguagem do prprio gnero que no pode abster-se de trazer a narrao, os elementos
cinematogrficos, a direo, os atores e atrizes, personagens, financiamento e negcios,
distribuio e vendagem, sucesso ou insucesso, tudo isso pertence ao filme (2006, p. 217).
A segunda uma forte herana dos estruturalistas da dcada de 60/70, cuja anlise flmica
perseguia o objetivo de decompor um filme dando conta da estrutura do mesmo
(PENAFRIA, 2009, p. 5).Se tratando de crtica de cinema dificilmente encontraremos nos textos apenas uma
escolha metodolgica, o comum agregar mais de um tipo de anlise. Uma delas permite que
o especialista tambm leve em considerao o trao realizador do diretor e sua filmografia, a
fim de compreender certos procedimentos encontrados no filme (PENAFRIA, 2009, p. 7).
Podemos perceber que esses elementos extratextuais agregam informaes do contexto e
juntos, texto e contexto permitem uma viso dialeticamente ntegra, em que tanto o velho
ponto de vista que explicava pelos fatores externos, quanto o outro, norteado pela convico
de que a estrutura virtualmente independente, se combinam como momentos necessrios do
processo interpretativo (CANDIDO, 2006, p. 13-4).
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As referncias ao diretor aparecem em todos os textos, comparando ou acrescentando
ao debate suas obras anteriores, como possvel ver no texto de Wajnberg, publicada no site
Crticos. Segundo o analista, os filmes de Padilha, [...] propem ao pblico um a relao de
mo-dupla: procuram suscitar uma tomada de conscincia a partir de um registro das relaes
promscuas entre policiais e bandidos, e, ao mesmo tempo, provocar alienao atravs da
filiao gramtica do thriller. Naanlise dos crticos sobre o diretortem sido comum criar
rtulos, a maioria volta a falar em Tropa de elite: misso dada misso cumprida, para
relembrar a enxurrada de taxaes pela qual Padilha passou. Como diria Forlani (Omelete),
Fascista, aproveitador, maniquesta... todos os termos j devem ter sido utilizados para
descrever Nascimento, Padilha e o filme. Luiz Zanin, para Cinema, Cultura e afins, trouxe
tambm a repercusso internacional do primeiro Tropa. O crtico aponta que a prestigiadarevista Cahiers Du Cinma chamou de execrvel, indigno de comentrio mais extenso e
ainda que estava entre as mais equivocadas premiaes de Berlim (referenciando o Urso de
Ouro que a obra recebeu no Festival de Berlim em 2007). J a norte-americana Variety,
conhecida como a bblia do cinema de entretenimento, destacou que na potica encravada no
longa aproxima-se do fascismo (ZANIN, 2010).
No entanto, poucas perduraram aps a espectao do segundo filme, e mesmo as que
voltaram crista da discusso, se preocuparam mais em mostrar como o diretor absorveu oscomentrios. Provavelmente porque Padilha, no s incorporou muitas dessas crticas como
buscou antecipar no prprio filme respostas para possveis condenaes.
Ao preparar o lanamento do segundo filme, o cineasta batia numa tecla sistemtica.De acordo com ele, haveria no Brasil duas posies dominantes, e insuficientes, arespeito da segurana pblica: A esquerda acha que tudo depende da soluo dadesigualdade social: a direita entende que o caminho o aumento da represso;nenhuma das duas d conta da questo da segurana. Tropa de Elite 2 viria exploraruma espcime de terceira via entre as duas vises de mundo. Querendo mostrar
porque as coisas acontecem desse jeito, Padilha opta pelo caminho do meio, o dasuposta sabedoria. Ao faz-lo, realiza o contrrio do que em geral fazem os cineastasbrasileiros. Estes, ao receber alguma opinio desfavorvel, colocam-se na defensivae procuram desqualificar o interlocutor. Padilha pode no gostar de crticas, mas asassimila e, a partir delas enriquece a sua leitura do real. (ZANIN, 2010)
Nada mais natural segundo Heitor Augusto, do site Cineclick. Tropa 2, diz ele, um
filme que d porrada em tanta gente e est aberto a receber porrada de todos os lados. No site
Cinema em cena, Pablo Villaa traz ainda referncias fotografia, montagem e trilha sonora,
alm de ilustrar o trabalho de direo.
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Mais uma vez comprovando seu imenso talento para conduzir sequncias de ao,Jos Padilha mantm a narrativa sempre fluida e confere imensa energia e umatenso palpvel aos confrontos fsicos e verbais entre os personagens, sendoauxiliado na tarefa pela fotografia do timo Lula Carvalho, que traz realismo eurgncia narrativa, e pelo excepcional montador Daniel Rezende, que aqui tambm
assume a direo de segunda unidade do longa. Da mesma maneira, o designde sommais uma vez merece destaque ao evocar toda a intensidade dos combates armados,ao passo que a trilha instrumental de Pedro Bromfman ajuda a estabelecer aatmosfera tensa sem recair em clichs (VILLAA, 2010).
De forma direta s Tatiana Monassa, da Contracampo, alegou que na nsia de afastar
o carismtico personagem da pecha de fascista, Padilha passa verdadeiramente a flertar com o
fascismo, afinal o senso de retido de Nascimento permanece invariavelmente ligado sua
mentalidade militarista. O posicionamento da analista estimula uma reflexo para alm das
crticas. A nosso ver, Nascimento uma reproduo do soldado moderno, disciplinado por umprocesso de formao que manipula os corpos e modela e treina e os torna hbeis
(FOUCAULT, 1999, p. 117). Um soldado fabricado a partir da automatizao das prxis
utilizadas no processo de formao dos oficiais do Bope, com mtodos que lhe so anteriores
e posteriores na medida em que reproduzido tambm aos que vo ingressando na
corporao. Ele aprendeu a manusear as armas, obedecer aos comandos, e
de uma massa uniforme, de um corpo inapto, fez-se a mquina de que se precisa;corrigiram-se aos poucos as posturas; lentamente uma coao calculada percorrecada parte do corpo, se assenhoreia dele, dobra o conjunto, torna-o perpetuamentedisponvel, e se prolonga, em silncio, no automatismo dos hbitos; (FOUCAULT,1999, p. 117).
O prprio personagem revela este fato ao comentar em voz overa atitude disciplinada
de Matias na operao de Bangu I: Matias aproveitou a chance que teve, matou o vagabundo
pra proteger o refm, fez o que aprendeu no Bope. Foucault analisa que as disciplinas, so
mtodos que permitem o controle minucioso das operaes do corpo, que realizam a sujeio
constante de suas foras e lhes impem uma relao de docilidade-utilidade (1999, p. 118).
Algumas questes foram preteridas pelos crticos, sabemos que o prprio gnero
permite essa liberdade e at deixa margem para a personalizao dos critrios, entretanto,
curioso encontrar em apenas um texto referencias ao indito sistema de distribuio proposto
por Padilha. Alm se ser um elemento contextual que diz respeito ao filme, representa a
ruptura de um paradigma indito no cinema nacional. Em entrevista ao site Omelete, Padilha
explicou como funciona o esquema da independncia na distribuio.
Faz de conta que um filme faz dinheiro no Brasil, mas lanado na Argentina, noPeru e perde o Brasil paga as perdas dos outros mercados. Sem essas coisas, o
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filme fica mais rentvel. Ento eu acho que, de fato, com Tropa de elite 2, inaugura-se uma via alternativa para o cinema brasileiro, que pode tornar o cinema brasileirode fato mais rentvel, um sistema em que a distribuidora no cobra taxa dedistribuio, no retm o dinheiro por seis meses, que o prazo de pagamento, e quea distribuio remunerada por uma prestao de servio. Essa a ideia. E em que
artistas, Wagner includo, investem seu salrio no filme. Se o filme der dinheiro, agente ganha. Se no fizer, no ganha (FORLANI, 2010b).
Fernando Verssimo, na Cintica,foi o nico analista a abordar o assunto dizendo que
ao arriscar um programa de lanamento comercial mais radical que o de muitos blockbusters
norte-americanos, Tropa 2 parece fazer do risco e da audcia elementos centrais de uma
estratgia a se perseguir.
Outro ponto comum aos textos foi a retomada do primeiro filme para situar a obra em
relao ao seu lugar no circuito, tal fato tem sido bastante recorrente nas crticas sobrefranquias. Em 2009, as anlises do longa de Daniel Filho, Se eu fosse voc 2, tambm se
empenharam em relacionar as duasobras. Luiz Zanin, de Cinema, cultura e afins,se ocupa
demoradamente em cotejar as obras. Ele comea falando do senhor deslocamento da viso
de mundo de Jos Padilha, que sambou na cara dos direitos humanos no primeiro longa para
em seguida se alinhar a essa corrente personificada na figura do Diogo Fraga (Irandhir
Santos).Separamos outros trechos de crticas que trazem essa mesma comparao, vejamos:
O peso do sucesso estrondoso e controverso do primeiro filme, identificadomajoritariamente figura de seu protagonista absoluto, guia da narrativa e m-conscincia da sociedade, certamente originou uma srie de precaues - e no faloaqui da "segurana" do material contra pirataria. Como narrador, o CapitoNascimento era em Tropa de Elitea incarnao do heri ruim, do personagemperverso que serve como ponto de inflexo de uma histria que o ultrapassa,complexa demais, e para a qual a postura de relato inadequada, pois h umimperativo de posicionamento (sic.) (MONASSA, 2010).
Em Contracampo, Monassa no s volta Tropa de elitecomo menciona a influncia
sobre o segundo. Na mesma direo, Thiago Siqueira do Cinema com rapadura, revela que interessante notar que Padilha pega todas as crenas e certezas que Nascimento tinha no
primeiro filme e as desconstri de maneira brilhante aqui. Daniel Wajnberg, do Crticos,
corrobora com Siqueira em relao pegada mais leve do personagem: o capito
Nascimento de Tropa de Eliteprovocou meio mundo ao defender a teoria de que os fins
justificam os meios. Para fazer justia, no hesitou em praticar tortura no primeiro filme de
Jos Padilha. Nesse segundo exemplar, sua construo polmica foi aliviada (WAJNBERG,
2010).
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Paralelamente, observamos em cinco crticas, Cineclick, Cinema com rapadura,
Cintica,Cinereporter e Contracampo, o esforo de cotejar Tropa 2 e Padilha com outros
filmes e cineastas. Um exerccio de metalinguagem com o intuito de ilustrar algumas opes
estticas, de linguagem e narratolgicas feitas por Padilha. As comparaes ocorrem seguindo
trs caminhos distintose num dos textos o especialista consegue agregar mais de uma delas.
A primeira comparao correlaciona o protagonista, Nascimento, com outros personagens das
telonas. Heitor Augusto, doCineclick, ressuscita Antnio das Mortes em Deus e o Diabo na
Terra do Sol, aponta que, assim como a figura dramtica de Glauber Rocha, o personagem
de Wagner Moura vai de um lado a outro, percebendo que sua avaliao nunca sara da
superfcie. Para Siqueira, em Cinema com rapadura, A evoluo de Nascimento dialoga
diretamente com o clssico policial Srpico, inclusive na desconstruo de crenas dosprotagonistas de cada produo. Acreditem, Wagner Moura merece a comparao com Al
Pacino. Verssimo, de Cintica, vai alm e compara no s o coronel Nascimento com o
Batman beginscomo o capito do primeiro Tropacom oBatman de O cavaleiro das trevas,
para mostrar que
Nas sagas desses dois heris tumultuados, a necessidade de compreender o mundo sua volta prevalece sobre o desejo de agir por impulso ou condicionamento. a
partir do entendimento de que no um fuzil ou um maluco mascarado a mais quevo fazer a diferena nesse universo de muitas dvidas e poucas certezas que nossosheris traam suas novas estratgias, reveem suas posies, qualificam suasagendas. E se para o homem-morcego a perspectiva de viver na ilegalidade o preoa se pagar para ser "o heri que Gotham merece.
O segundo caminho foi trilhado por Carreiro em Cinereprtervisando discutir sobre
uma escolha narrativa presente no incio de Tropa 2.Diz ele: Seguindo a cartilha rezada por
Coppola em O Poderoso Chefo 3 (quando o futuro de cada membro da famlia Corleone
foi encenado de maneira lgica e correta), Padilha retorna a todos os personagens importantes
do primeiro filme. Logo depois, sublinhamos o texto de Monassa, para Contracampo, os
aspectos em que a analista busca similaridades com o estilo de Jonh Ford, e escreve sobre as
caractersticas presentes no longa de Padilha que a fez lembrar do mestre dos westerns6
Nascimento , sob vrios aspectos, um personagem fordiano (e seria ainda mais, nofosse esta identificao tornada obrigatria e o tom professoral adquirido por suanarrao excessivamente auto-consciente). Caminhando em direo a um isolamento
6O diretor Jonh Ford (1894 1973) definia-se de forma simples, dizia ele: meu nome Jonh Ford. Eu fao
Westerns. considerado na histria do cinema como o homem que criou o gnero Western. Um de seus maisfamosos personagens Cheyenne Harry (interpretado por Harry Carey) um bondoso fora da lei como foramem seguida quase todos os seus heris. Disponvel em: http://www.johnford.com.br/ . Acesso em: 05 de set. de2012.
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inexorvel, ele termina sem lugar no mundo, pois no h espao capaz de abrigarseu mpeto. Ele ao mesmo tempo o escolhido e o condenado, aquele que encampaa misso de defender a sociedade (de si mesma?), mas que no poder nelapermanecer. Que ser expelido, renegado, uma vez tendo cumprido seu papel. Comoesprito determinado, ele no se contenta em apenas servir aos propsitos a que
designado, ele guiado por um imperativo moral que o impede de estabelecer taislimites e no ir parar, mesmo que o preo de defender a sociedade seja aniquil-la.A diferena de Nascimento para um heri de Ford que na obra do cineastaamericano h uma distncia fundamental entre a narrao do filme e a conscinciado personagem.
De volta crtica de Cintica, como havamos dito, Verssimo realiza outra
comparao com obras audiovisuais, afirmando que Tropa 2 encerra uma gama de
possibilidades da fico policial nacional e inaugura outros conceitos de gnero. ComNosso
Lar, por exemplo, o cinema brasileiro de gnero (o esprita, no caso) pareceu saltar vinte
anos em dois - levando em conta que a ltima empreitada no gnero, Bezerra de Menezes, foi
um fenmeno muito mais localizado (e excetuando Chico Xavier, que um produto de grife)
(VERSSIMO, 2010).
Ultrapassados os aspectos gerais que compem as crticas, adentramos nas
especificidades relacionadas Tropa 2. Esse entranhamento no discurso ocorre porque a
anlise crtica, de fato, pretende ir mais fundo, sendo basicamente a procura dos elementos
responsveis pelo aspecto e o significado da obra, unificados para formar um todo
indissolvel (CANDIDO, 2006 p. 14). So estes significados produzidos pela fita que nos
interessa conhecer e discutir, a fim de inaugurar um dilogo sobre a recepo flmica que
transponha a superficialidade das impresses e alcance aspectos dos sentidos produzidos.
3.2 De capito a coronel o arco dramtico de Nascimento
Antes de mergulharmos nos textos crticos, faamos uma breve introduo
importncia da personagem na narrativa ficcional. Escrevendo sobre o heri na literatura,
Janilton Andrade (2005, p.32) aponta que com o aparecimento da dramatis personae que
se inscreve a natureza ficcional. De outro modo, Rosenfeld, aponta ser a personagem que
com mais nitidez torna patente a fico, e atravs dela a camada imaginria se adensa e se
cristaliza (1998, p. 21). O autor explica ainda que a personagem que proporciona a adeso
intelectual e afetiva do leitor (ou do espectador no caso do cinema), atravs dos mecanismos
psicolgicos de projeo, transferncia, identificao, etc (ROSENFELD, 1998, p.51).
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H, entretanto, uma ligao imprescindvel do personagem com outros elementos
tambm considerados essenciais da construo narrativa e que atingem de forma direta o
leitor de tal modo que
Os trs elementos centrais dum desenvolvimento novelstico (o enredo e apersonagem, que representam a sua matria; as ideias que representam o seusignificado) s existem intimamente ligados, inseparveis, nos romances bemrealizados. No meio deles, avulta a personagem, que representa a possibilidade deadeso afetiva e intelectual do leitor, pelos mecanismos de identificao, projeo,transferncia, etc. As personagens vivem o enredo e as ideias, e os torna vivos(ROSENFELD, 1998, p.54)
Essa adeso ocorre de forma mais complexa no cinema, falando com Paulo Emlio
Sales Gomes a personagem de fico cinematogrfica, por mais fortes que sejam suas razesna realidade ou em fices pr-existentes, s vive quando encarnada numa pessoa, num ator
(1998, p.110). Quando, em diversas situaes, o ator ou a atriz que encarna a personagem
um velho conhecido do pblico (como o caso de Wagner Moura), sua presena se torna
mais forte e atrai maior ateno para si do que para o personagem que apresentado a ns
(Idem, p.110). Praticamente todos os textos crticos falam sobre a atuao de Moura.
O motivo que faz com que esse processo ocorra vincula-se ao fato de que a
cristalizao definitiva da personagem cinematogrfica fica condicionada ao contextovisual, e continuam vivas atravs de palavras e imagens com suas presenas excessivas.
Como assinala Paulo Emlio Salles Gomes (1998, p.111)
Essa definio fsica completa imposta pelo cinema reduz a quase nada a liberdadedo espectador nesse terreno. Num outro, porm, o da definio psicolgica, o filmemoderno pode assegurar ao consumidor de personagens uma liberdade bem maiordo que a concedida pelo romance tradicional. A nitidez espiritual das personagensdeste ltimo impe-se tanto quanto a presena fsica nos filmes (GOMES,1998, p.111).
O autor assinala ainda que a definio psicolgica das personagens cinematogrficas
sugere uma vantagem intrnseca ao cinema, que as aproxima particularmente das criaturas que
existem na realidade e seus mistrios, pois em diversas obras modernas e outras tantas
antigas, as personagens fogem s operaes ordenadoras da fico e prosseguem repletas de
indeterminao psquica (GOMES, 1998, p.112).
Sem buscar exaurir a complexidade de uma personagem, cujo conhecimento
fragmentrio, pois nada mais faz do que retomar, no plano da tcnica de caracterizao, amaneira fragmentria, insatisfatria, incompleta, com que elaboramos o conhecimento dos
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nossos semelhantes (CANDIDO, 1998, p. 58), partiremos para observar essas questes nas
crticas do filme Tropa de elite 2.
A primeira questo que despertou nossa ateno foi o posicionamento dos crticos em
relao s personagens, se as trataram nas suas individualidades, como conjunto ou se deram
destaque apenas para algumas. Rodrigo Carreiro, do Cinereporter, mostrou a escolha de
Padilha na apresentao dos personagens, fazendo uma diviso entre os que j vinham do
primeiro longa e as figurinhas novas. Diz ele,
Seguindo a cartilha rezada por Coppola em O Poderoso Chefo 3 (quando o futurode cada membro da famlia Corleone foi encenado de maneira lgica e correta),Padilha retorna a todos os personagens importantes do primeiro filme tambmesto l o ex-aspirante Andr Matias (Andr Ramiro), agora capito, e o capitoFbio (Milhem Cortaz), agora tenente-coronel com coerncia. Ele tambmacrescenta mais meia dzia de figuras importantes, incluindo uma jornalistainvestigativa (Tain Muller), figuras do primeiro escalo do poder estadual, novospoliciais corruptos e um apresentador de programa sensacionalista de TV (AndrMattos).
Em relao aos personagens egressos de Tropa de Elite os analistas se ocupam
basicamente em elogiar suas atuaes. Rodrigo Carreiro, do Cinereporoter, diz que o
desempenho de todos os atores uniformemente espetacular, cheio de energia e
naturalidade. J Fernando Verssimo, da Cintica afirma que O elemento central, aconquista principal a combinao feliz de talentos.O elenco simplesmente magnfico
afirma Thiago Siqueira, do Cinema com rapadura. Segundo o crtico
Milhem Cortaz diverte (e enoja) como o covarde e corrupto Coronel Fbio. Falandoem figuras detestveis e cmicas, Andr Mattos d um show como um demagogoapresentador de programa policial sensacionalista que se torna um poltico hipcrita.Sandro Rocha, que na primeira produo teve um papel pequeno, aqui retorna comoo Policial Rocha, grande antagonista de Nascimento e lder das milcias, nova facocriminosa que se apresenta. Perigoso, corrupto e sanguinrio, Rocha um