Susana Aparecida da Silva · pintor dentre os “ismos” estilísticos de fins do século XVI e...

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OS RETRATOS DE FELIPE IV DE DIEGO VELÁZQUEZ: REFLEXÕES SOBRE AS PERCEPÇÕES DE TEMPO NA PINTURA ESPANHOLA DO SÉCULO XVII Susana Aparecida da Silva Mestranda em História Social – UEL Fundação Araucária Em fins do século XVI nascia na Espanha o pintor que seria um dos grandes expoentes da arte Barroca. As pinturas por ele produzidas, em sua maioria, são parte de seu trabalho como pintor oficial da corte de Felipe IV, um Habsburgo. Destacando-se ao elaborar retratos, Diego Rodriguéz de Silva e Velázquez (1599-1660) é responsável pela perpetuação da imagem da monarquia espanhola em um período em que a coroa hispânica passava por conflitos que iam desde as lutas religiosas, como o avanço do protestantismo nos países Baixos e os conflitos de caráter religioso na Europa. Uma das telas mais famosas de Velázquez, o quadro “Las meninas”, atualmente fica exposto no Museu do Prado e representa a infanta Margarida de Áustria, filha de Felipe IV. Além deste, porém, há certa de 100 telas reconhecidas como sendo da autoria de Velázquez. Um dos objetivos deste trabalho é analisar como seis retratos do rei em vários momentos da vida, feitos por Velázquez podem auxiliar na reflexão a respeito da concepção de tempo na pintura barroca espanhola. Velázquez é conhecido por representar contrastes em suas telas. Parte-se então do princípio de que estudar os retratos do rei Felipe IV e sua corte, local em Velázquez vive grande parte de sua maturidade, auxilia na compreensão de percepções de Tempo, Poder, História, Religiosidade, família, entre tantos núcleos sociais a que pertencem o pintor. A maior parte dos biógrafos de Velázquez, embora o defina como participante das características fundamentais do Barroco tende a salientar a dificuldade de rotular o pintor dentre os “ismos” estilísticos de fins do século XVI e decorrer do século XVII, sejam eles o Maneirismo, Classicismo, Tenembrismo, Naturalismo, entre outros. Isto se dá devido à multiplicidade de elementos estéticos e históricos que compõem as suas criações. III Encontro Nacional de Estudos da Imagem 03 a 06 de maio de 2011 - Londrina - PR 2700

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OS RETRATOS DE FELIPE IV DE DIEGO VELÁZQUEZ: REFLEXÕES SOBRE

AS PERCEPÇÕES DE TEMPO NA PINTURA ESPANHOLA DO SÉCULO XVII

Susana Aparecida da Silva

Mestranda em História Social – UEL

Fundação Araucária

Em fins do século XVI nascia na Espanha o pintor que seria um dos grandes

expoentes da arte Barroca. As pinturas por ele produzidas, em sua maioria, são parte de

seu trabalho como pintor oficial da corte de Felipe IV, um Habsburgo. Destacando-se ao

elaborar retratos, Diego Rodriguéz de Silva e Velázquez (1599-1660) é responsável pela

perpetuação da imagem da monarquia espanhola em um período em que a coroa

hispânica passava por conflitos que iam desde as lutas religiosas, como o avanço do

protestantismo nos países Baixos e os conflitos de caráter religioso na Europa.

Uma das telas mais famosas de Velázquez, o quadro “Las meninas”, atualmente

fica exposto no Museu do Prado e representa a infanta Margarida de Áustria, filha de

Felipe IV. Além deste, porém, há certa de 100 telas reconhecidas como sendo da autoria

de Velázquez. Um dos objetivos deste trabalho é analisar como seis retratos do rei em

vários momentos da vida, feitos por Velázquez podem auxiliar na reflexão a respeito da

concepção de tempo na pintura barroca espanhola.

Velázquez é conhecido por representar contrastes em suas telas. Parte-se então

do princípio de que estudar os retratos do rei Felipe IV e sua corte, local em Velázquez

vive grande parte de sua maturidade, auxilia na compreensão de percepções de Tempo,

Poder, História, Religiosidade, família, entre tantos núcleos sociais a que pertencem o

pintor.

A maior parte dos biógrafos de Velázquez, embora o defina como participante

das características fundamentais do Barroco tende a salientar a dificuldade de rotular o

pintor dentre os “ismos” estilísticos de fins do século XVI e decorrer do século XVII,

sejam eles o Maneirismo, Classicismo, Tenembrismo, Naturalismo, entre outros. Isto se

dá devido à multiplicidade de elementos estéticos e históricos que compõem as suas

criações.

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Por outro lado, no que concerne ao estilo Barroco das produções artísticas,

parece interessante relembrar algumas de suas principais características basilares:

“Mais tarde, na segunda metade do século passado, o crítico suíço

Heinrich Wölfflini e os seus seguidores deram à palavra um significado

mais objetivo. Referindo-se sempre à arte do século XVII e dos

princípios do século XVIII, definiram como barrocas aquelas obras em

que estavam presentes determinadas características: a procura do

movimento, quer real (uma parede ondulada, uma fonte, de onde a

água jorra em formas sempre novas), quer sugerido ( um personagem

retratado durante uma ação violenta ou sob um esforço); a tentativa de

representar ou de sugerir o infinito (uma alameda que se perde no

horizonte, um fresco que simula uma abóbada celeste, um jogo de

espelhos que altera e torna irreconhecíveis as perspectivas); a

importância dada às luzes e aos efeitos luminosos na percepção final e

na própria concepção da obra de arte; o gosto pelo teatral, pelo

cenográfico, pelo faustoso; a tendência para não respeitar os limites das

disciplinas, isto é, para misturar a arquitetura, a escultura e a pintura.ii

(CONTI, 1986,p.06)

Há muitos autores como críticos de arte, historiadores e filósofosiii que se

dedicam ao estudo das obras denominadas Barrocas na atualidade. No caso das pinturas

de Velázquez, há tentativas de relacioná-las com a literaturaiv, outros que logram fazer

um paralelo com conceitos filosóficosv. E trabalhando com a idéia de instantaneidade

em Velázquez, algo que se aproxima do tema deste trabalho, há a pesquisa do espanhol

Solísvi.

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Fontes

A seguir estão colocadas as fontes, materiais visuais a serem utilizados.

1.1 Felipe IV 1624-27 Óleo sobre tela, 210 x 102 cm

Museo del Prado, Madrid

1.2 Felipe IV com armadura (fragmento) c. 1628 Óleo sobre tela, 58 x 44,5 cm

Museo del Prado, Madrid

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1.3 Philip IV em Marrom e Prata 1631-32 Óleo sobre tela, 200 x 113 cm

National Gallery, London

1.4 Phillip IV em Fraga 1644

Óleo sobre tela, 133,5 x 95 cm Frick Collection, New York

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1.5 Philip IV c. 1655

Óleo sobre tela, 69 x 56 cm Museo del Prado, Madrid

2.0 Retrato de Felipe IV (fragmento) 1657-60

Óleo sobre tela, 40,5 X 32,5 cm Museo de Bellas Artes, Bilbao

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Para alguns historiadores da Arte, as “produções artísticas” que se estendem pela

Idade Média (séculos V ao XV) não possuem perspectiva. Outros colocam que haveria

uma perspectiva distinta das que a modernidade reconhece como tal.

A representação das formas dando a perceber profundidade, a que os

renascentistas tanto valorizavam, pode ser uma forma de revelar a percepção de Tempo

do artista que concebe determinada obra de arte e da sociedade em que vive. Isso se dá

pela forma como organiza o espaço, reservando aos objetos e pessoas proporções

diferentes de tamanho que pretendem sugerir a distância em que se localizam uns em

relação aos outros elementos da composição, fala-se aqui, prioritariamente, da pintura.

No caso das pinturas da Idade Média, a diferença de tamanho geralmente

significava distintas hierarquias. Um rei certamente seria representado em dimensões

bem maiores do que seus servos, filhos ou mesmo sua esposa. E esta é uma

característica presente também na arte da antiguidade, onde é possível lembrar aqui as

pinturas em cerâmica, parietais e esculturas egípcias.

Iniciou-se refletindo sobre a prática da perspectiva na pintura, a fim de ensejar

visualizar de forma analítica alguns aspectos dos retratos pintados por Velázquez,

elementos visuais que levem o expectador a perscrutar destes retratos possíveis

significações. É Interessante salientar que estas inferências partem de uma análise

inicial, já que o trabalho se encontra em andamento.

Neste sentido, é possível notar no primeiro retrato o jovem rei em trajes negros,

retratado de corpo inteiro onde somente seu rosto e mãos recebem a cor alva. A razão

representada pela cabeça, e as mãos que dirigem o reino ganham destaque, esta é uma

das possibilidades de análise. É possível deduzir o espaço em que o rei posou, pois a luz

deixa entrever um móvel em que o rei parece se apoiar.

Na segunda imagem o rei Felipe IV aparece vestido com trajes de batalha,

remetendo aos conflitos da Cataluña que ocorriam no momento em que foi pintado

quadro. A representação do poder da realeza espanhola nestes suntuosos trajes em tons

prateado e vermelho pressupõe a personificação do poder político do monarca, a

intenção de afirmar seu caráter nobre e sua autoridade. Este mesma vertente pode ser

vista no retrato em Fraga, data de 1644. No entanto, aqui as marcas do tempo se

mostram evidentes no rosto de Felipe IV, é um rosto cansado que segura o cetro e

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ostenta o manto vermelho. Ele nos olha de perfil e não podemos ver seus pés, ou seja,

ele se sustém. Pode-se aqui fazer uma analogia com os rumores a respeito das

deficiências de autoridade do monarca em detrimento do destaque auferido pelo Conde

Duque de Olivares.

O rei Felipe IV do retrato de 1655 e do retrato pintado entre 1657-1660

apresenta significativas distinções do retrato “em marrom e prata” de 1631-32. Naqueles

há uma espécie de luz esfumaçada, que dá a impressão de que temos de limpar os olhos

para ver melhor. E, ao contrário do último acima citado, o monarca aparece de corpo

inteiro; pode-se perceber o ambiente em que está e a pompa de suas roupas reais, que

dão nome à tela.

No retrato de 1657-60 a relação entre claro-escuro permite que se visualize a

face melancólica, enfadada e envelhecida do rei. Velázquez vai compondo os retratos de

forma a esvaziar de formas e cores o plano de fundo dos retratos de acordo com a

passagem do tempo. Quanto à intencionalidade do pintor, isto é algo que se pode inferir

e não determinar.

O plano de fundo marcado pela cor negra pode querer remeter-se a indefinição

de perspectivas de futuro, ou mesmo a um passado que não possui “cores

significativas”. Já a face melancólica de Felipe IV que se repete nos retratos, leva a crer

que Velázquez intentou plasmar em suas telas o “rei sem alegria/personalidade” de que

alguns autores falam.

No ato de observação desta seqüência de retratos, tem-se a impressão de que o

Tempo para Velázquez é o tempo extremamente efêmero, o responsável pela brevidade

da vida. O tempo tem estas características até mesmo para a realeza, isto pode ser

pensado pela forma como desmitifica o “corpo” real ao representar enfado, melancolia e

o envelhecimento.

Velázquez representa então uma partícula de tempo, o instante. Todavia um

instante pode simbolizar o momento eterno, pois após mais de três séculos a figura de

Felipe IV e mesmo a de Velázquez produz reflexões, estudos e suscita questões relativas

ao momento em que viveram e que a sociedade contemporânea vivencia.

Pensamos que há várias questões básicas passíveis de serem feitas no momento

da análise das imagens, por exemplo: Qual a data aproximada de conclusão da obra;

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quem a fez, para quem a fez, qual seu suporte e sua dimensão; onde está atualmente: o

que retrata e de que forma retrata; qual o ambiente de fundo; o por quê da opção de

trabalhar com telas as de interior;semelhanças e diferenças entre as imagens e das outras

obras do pintor, entre outras.

Nossa análise se fará de forma a considerar o conjunto dos retratos e a relação

semelhança - diferença entre eles no que concerne à questão da percepção da categoria

Tempo por parte do pintor.

É interessante salientar que a utilização do conceito de paradigma “Indiciário”

não é em questão da análise de sua pincelada e sim que utilizarei como inspiração no

trabalho historiográfico, no foco da pesquisa que é a forma como Velázquez é um

indivíduo relacional, este um conceito moldado pelos micro-historiadores.

No sentido de como “ver uma imagem” nos inspiraremos na obra de autores

como Huyghevii, cujas reflexões partem prioritariamente da Psicologia para analisar os

“instintos” do pintor como indivíduo. Por outro lado Gombrichviii tem sua argumentação

voltada para uma análise fundamentalmente social das obras de arte. Procuraremos

articular um diálogo entre estes, os demais autores que pesquisamos e as fontes, que são

os retratos de Felipe IV feitos por Diego Velázquez.

Segundo René Huyghe, nos dias atuais a sociedade ocidental vem

experimentando uma espécie de “anestesia visual”, isto é, após ser assaltada diariamente

por uma numerosa quantidade de imagens, a forma como estas são vistas acaba por ser a

de passividade, o indivíduo vê, mas não faz uma análise do que vê. A respeito deste

fenômeno, nos diz René Huygheix:

Esta proliferación de la imagen, considerada como un

instrumento de información, precipita la tendencia del hombre

moderno a la pasividad: sin llegar a estas imagen que se hay

ensayado hacer pasar por la pantalla del cine demasiado

rápidamente para que sena advertidas, pero lo bastante, sin

embargo, para que impriman en nuestro inconsciente con un

poder de sugestión que nada pueda trabar, cabe afirmar que ese

asalto continuo a la mirada tiende a crear la inercia del

espectador.

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Neste excerto o autor se refere prioritariamente a respeito das imagens

publicitárias televisivas ou mesmo de cinema, revistas, jornais entre outros. Neste

sentido compreende o tipo de imagens, em movimento ou não, que se propõem a

convencer seu leitor/expectador de algo. Ocorre que uma olhar hipnótico acaba se

formando na sociedade ocidental.

Por outro lado, há as imagens artísticas, que segundo Huyghe:

He aquí donde el arte, que utiliza el mismo medio fundamental,

imagen, actúa como contraveneno providencial. Pues la imagen,

en él, es a la vez el signo y el fermento de ese contraveneno: la

libertad. Es su signo porque expresa el poder del artista de crear

una visión nueva que, en lugar de empobrecer el mundo

estereotipándolo, por el contrario lo enriquece y lo diversifica

mucho más de lo que el hombre medio podría esperar. Es

también su fermento porque actúa sobre el espectador al revés

que la publicidad, la televisión y el cine, que adormecen la

facultad de direción y provocan la docilidad de la atención.

É relevante salientar que com relação aos programas televisivos e ao cinema,

não se pode rotular de “manipulador” todo programa ou filme, no entanto o que se

pretende dizer é o fato de que ao assistir a determinadas imagens é necessário estar

ciente de que se trata de pontos de vista sendo passados. Cabe ao expectador, analisá-

los, não ter como verdade absoluta ou única fonte de conhecimento, já que toda

informação é produzida sócio-historicamente.

Segundo José Villalobosx há três principais formas de se analisar uma obra de

arte, uma destas formas se dá através do viés artístico onde é visualizada enquanto

experiência estética. No segundo caso há a análise partindo da filosofia, onde a obra de

arte, no nosso caso em particular, uma pintura, e sendo assim ele é vista enquanto uma

poética. Por último, segundo Villalobos, haveria a perspectiva histórica, onde a obra de

arte seria visualizada enquanto produto sócio-histórico.

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Apesar de considerarmos que estas e outras perspectivas de análise possam

aparecer muitas vezes interligadas, é relevante dizer que nosso estudo se insere

prioritariamente na análise historiográfica das obras de arte em questão, que são os seis

retratos de Felipe IV da Espanha.

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Considerações finais

Pretende-se estabelecer uma relação entre o momento político e sócio-histórico

em que Velázquez pintou os retratos em questão e as cores, representação da luz e

outros elementos estéticos da pintura de Velázquez que dêem conta de “contribuir” para

a elaboração de reflexões à respeito da concepção de Tempo para esse emblemático

pintor espanhol.

Neste sentido, os resultados obtidos das análises das imagens terão respaldo

teórico nos conceitos de Indivíduo e Sociedade, de Norbert Eliasxi, intentando

estabelecer um diálogo com o indivíduo Velázquez e a sociedade a que pertence.

Um dos trabalhos mais representativos Norbert Elias, esta obra trata da

problematização do conceito de Sociedade e de Indivíduo, sendo que o autor procura

evitar uma abordagem dicotômica no que se refere a tratar os dois conceitos como

pertencentes a instâncias completamente díspares. Sendo assim, o autor inicia seu texto

argumentando que a palavra sociedade, tão massivamente utilizada, acaba tendo seu

significado essencial incompreendido. Para ele as análises feitas sobre a sociedade ou

indivíduo, não contribuem para levar a crer que há uma rede de constantes relações

entre os mesmos e sim um abismo simbólico. Em muitas vertentes há uma insistência

em dar um destaque maior, hora a sociedade, hora a indivíduo.

Uma abordagem que tem origem nas características psicológicas do indivíduo,

inclusive crê que haja a possibilidade de existência do indivíduo isoladamente, como se

pudesse moldar-se sozinho. Porém, sabe-se que, embora haja livre arbítrio, as pessoas

nascem em sociedades que tem hábitos pré-estabelecidos (embora não planejados), ou

seja, o que se chama de individualidade é construído historicamente, por meio de

cadeias relacionais e por meio das funções exercidas pelos indivíduos sócio-

historicamente.

Outras vertentes que partem das idéias sociológicas do século XIX minimizam a

tal ponto a função do indivíduo na sociedade que esta se torna algo supra individual,

enquanto esse nasce e não tem poder algum de ação e transformação social. A fim de

problematizar esta idéia o autor diz que as sociedades não são estáticas e ao mesmo

tempo em que o indivíduo é moldado pela sociedade, ela é transformada por eles.

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A proposta do autor se configura como uma visão mediadora, se assim pode-se

dizer, ou seja, discute que pensar os conceitos em termos de relações e funções torna a

visualização não hierárquica dos dois campos: ambos coexistem. Para Elias a questão

que se coloca na atualidade está baseada no fato de não sugar as potencialidades

individuais em detrimento do social, tampouco, em favor de interesses individuais,

olvidar das questões relativas a coletividade destas Sociedades de Indivíduos.

Por sua vez, os elementos fundadores da perspectiva Micro-histórica, seus

principais “integrantes” e questões que suscitam são tema de Jacques Revelxii no texto

que comentaremos em seguida.

O autor define a micro-história, inicialmente não como uma disciplina, fechada

em preceitos e conceitos, todavia situa o início e fortalecimento de seus debates (através

de experiências de pesquisa), na década de na Itália de fins do século XX, como sendo

uma tentativa de questionamento da História Social quantitativista predominante

naquele período.

A obra do historiador italiano Carlo Ginzburgxiii e a bibliografia escrita

posteriormente sobre a mesma, é parte considerável do debate que faz apologia da

micro-história como método de análise ou narrativa. É possível citar aqui outros

historiadores simpatizantes desta metodologia, como Natalie Z. Davis, Giovani Levi,

Edoardo Grendi entre outros.

Ao questionar a estrutura narrativa da História Social do período, que em termos

gerais levava em consideração na construção do conhecimento o coletivo, o numeroso e,

por vezes o grandioso, a proposta fundadora dos historiadores da micro-história era a de

que a escala micro fosse uma das possibilidades de narrativa. Narrativas a respeito de

famílias, pequenos grupos ou mesmo indivíduos e que poderiam ter suas “tramas”

relacionadas com outras “histórias”, relações sociais, relações de poder, instituições e a

história social que enfocava o grande coletivo, inclusive.

Um dos aspectos que chamam a atenção no texto de Revel, é o modo como

alguns micro-historiadores tratam a questão do contexto histórico. Para ele, a

perspectiva a micro-história visualiza (onde alguns modelos de escrita da história vêem

um grande contexto) uma pluralidade de contextos e partindo desta hipótese de

pesquisa, desta forma a micro-história se contrapõe à máxima de que “o contexto

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explica o texto”, já que há uma multiplicidade de olhares dos sujeitos e grupos implícita

neste conceito.

Neste sentido, também questionam a hierarquização de História Nacional,

Regional, Local, já que na construção historiográfica as formas de exposição se

vinculam, compondo uma relação de escalas macro e micro.

Optamos por trabalhar com a idéia de individualidade relacional presente no

texto “Sociedade dos indivíduos” de Norbert Elias, pois vem ao encontro do elemento

analítico da micro-história no que diz respeito á forma como pequenos grupos sociais e

mesmo indivíduos, são visualizados. Estes fazem parte da cultura de sua época e local

em que estão inseridos, e ao mesmo carregam em si especificidades.

i WÖLFFLIN, Henrich. Conceitos Fundamentais da História da Arte: o problema da evolução dos estilos mais recentemente.Tradução: João Azenha Jr. São Paulo: Martins Fontes, 1989. 

ii CONTI, Flavio. Como reconhecer a arte Barroca. Martins Fontes: São Paulo, 1986. 

iii FARIA, Rodrigo Santos de. Velázquez e Veyne, e as articulações entre a pintura e a história: os processos relacionais na constituição da origem dos eventos históricos. Revista Mosaico, vol.2, n.1, p.26-34, jan./jun., 2009. Disponível em: <http://seer.ucg.br/index.php/mosaico/article/view/780/597> 

iv DONADA, Jaqueline Bohn. Insuspeitável Modernidade: criação e apreciação artística segundo As Meninas, de Diego Velázquez e Frankenstein, de Mary Shelley. Gláuks, vol.7.nº.1 (2007)186-198. Disponível: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/diaadia/diadia/arquivos/File/conteudo/artigos_teses/Ingles/donada(1).pdf> 

v Idem ao ii. vi SOLÍS, Francisco Arias. La instantaneidad de Velázquez. Letralia Tierra de Letras. Edición nº63, 1 de febrero de 1999. Cagua, Venezuela. Disponible en: <http://www.letralia.com/63/en01-063.htm> 

vii Ibid.i viii GOMBRICH, Ernst Hans. A História da arte. Trad.Álvaro Cabral.Editora LTC, 2000. 

ix HUYGHE, René. Los poderes de la imagen. Trad. Juan-Eduardo Cirlot. Barcelona: Editorial Labor, 1968. 

x DOMÍNGUEZ, José Villalobos. La creación poiética de Velázquez. Cuadernos sobre Vico 11-12 (1999-2000). Sevilla, España. Disponível em: <http://www.institucional.us.es/revistas/revistas/vico/pdf/numeros/vol.11-12/19.pdf> 

xi ELIAS, Norbert. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 1994. 

xii REVEL, J. (org.). “Jogos de escalas: a experiência da microanálise”. RJ: Editora FGV, 1998. 

xiii GINZBURG, Carlo. Mitos ,emblemas e sinais: morfologia e história. São Paulo, Companhia das letras, 1991.

 

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