Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

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Autos n° 064.10.008808-6 Ação: Outros/Infância e Juventude Requerente: Juizo da Infância e Juventude da Comarca de São José /SC "Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais." (art. 5º, do Estatuto da Criança e do Adolescente) Vistos etc. Trata-se de procedimento administrativo instaurado por este Juízo da Infância e da Juventude, para apuração de irregularidades em entidade governamental, em razão das diversas ilegalidades encontradas no centro de cumprimento de medida socioeducativa CER – São Lucas, situado nesta comarca de São José, descritas na Portaria que iniciou este processo, com o objetivo de apurar possíveis ilegalidades na referida entidade de aplicação de medida de internação, consoante os fatos nestes autos noticiados os quais encontram-se instruídos pelos documentos encartados. Inicialmente, ressalto que o procedimento que aqui se instaura, não é somente por um dever legal, mas, sobretudo por um dever ético e moral, pois, como já referido na portaria inaugural do presente procedimento, desde que aqui aportei nesta Vara da Infância e da Juventude desta comarca de São José, diversas foram as denúncias recebidas, efetuadas pelos próprios

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Autos n° 064.10.008808-6 Ação: Outros/Infância e Juventude Requerente: Juizo da Infância e Juventude da Comarca de São José /SC

"Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer

forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e

opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos

seus direitos fundamentais."

(art. 5º, do Estatuto da Criança e do Adolescente)

Vistos etc.

Trata-se de procedimento administrativo instaurado por este

Juízo da Infância e da Juventude, para apuração de irregularidades em entidade

governamental, em razão das diversas ilegalidades encontradas no centro de

cumprimento de medida socioeducativa CER – São Lucas, situado nesta

comarca de São José, descritas na Portaria que iniciou este processo, com o

objetivo de apurar possíveis ilegalidades na referida entidade de aplicação de

medida de internação, consoante os fatos nestes autos noticiados os quais

encontram-se instruídos pelos documentos encartados.

Inicialmente, ressalto que o procedimento que aqui se

instaura, não é somente por um dever legal, mas, sobretudo por um dever ético

e moral, pois, como já referido na portaria inaugural do presente procedimento,

desde que aqui aportei nesta Vara da Infância e da Juventude desta comarca

de São José, diversas foram as denúncias recebidas, efetuadas pelos próprios

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adolescentes internos no CER São Lucas, dentre as quais, aquelas que

instruem os presentes autos, dando conta de que estão sendo vítima de maus-

tratos, tortura, negligência e violação de seus direitos fundamentais, por parte

da referida entidade de aplicação de medida sócio educativa de internação.

Assim, na qualidade de Juíza correicional/fiscalizadora da

entidade CER – São Lucas (reafirmada após consulta pela Circular n. 65, de

20/10/2009), em atendimento ao art. 95, do ECA que determina que "As

entidades governamentais e não-governamentais referidas no art. 90

serão fiscalizadas pelo Judiciário, pelo Ministério Público e pelos

Conselhos Tutelares." , e, ainda, em consonância com o disposto no art. 191,

do mesmo Estatuto em que dispõe que "O procedimento de apuração de

irregularidades em entidade governamental e não governamental terá

início mediante portaria da autoridade judiciária ou representação do

Ministério Público ou Conselho Tutelar, onde conste, necessariamente,

resumo dos fatos.

Ainda, em atendimento ao art. 125, do mencionado Estatuto

que determina que "É dever do Estado zelar pela integridade física e mental

dos internos, cabendo-lhe adotar as medidas adequadas de contenção e

segurança."

Fundamenta o presente, também, o conteúdo das

conclusões a que chegou a Equipe Responsável pela elaboração do Relatório

Final do Levantamento da Atual Situação do CER São Lucas, no sentido de que

esta padece de condições sub-humanas de habitação e alojamentos insalubres

e completamente inadequados, o que, em virtude da grave situação assinalada

no referido Relatório foi realizada Inspeção Judicial in loco pela Egrégia

Corregedoria Geral da Justiça e por este Juizado da Infância e da Juventude,

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que na qualidade de Órgãos Correicionais da mencionada entidade de

atendimento (art. 95 do ECA), local em que se procedeu minuciosa vistoria das

instalações oferecidas pela dita Instituição, constatando-se através dela a

ocorrência de irregularidades graves no tocante especialmente ao

acondicionamento dos internos que abriga, tais como insalubridade das

dependências e péssimo estado de conservação das mesmas.

As situações acima retratadas configuram em tese

irregularidades tipificadas no artigo 94, incisos I, II, III, IV, VII, VIII, IX, X, XI, XII,

do Estatuto da Criança e do Adolescente, sujeitando a entidade Governamental

em epígrafe às sanções do art. 97 do aludido Diploma Legislativo, que variam

desde a advertência até fechamento da unidade, inclusive.

Cumpre-se, também com o presente procedimento a

Resolução n. 77, de 26/05/2009, do CNJ – Conselho Nacional de Justiça, que

dispõe sobre a inspeção nos estabelecimentos e entidades de atendimento ao

adolescente e sobre a implantação do cadastro nacional de adolescentes em

conflito com a lei, que em seu art. 1º, determina "aos juízes das varas da

infância e da juventude com competência para a matéria referente a

adolescentes em conflito com a lei que realizem pessoalmente inspeção

mensal nas entidades de atendimento sob sua responsabilidade e adotem

as providências necessárias para o seu adequado funcionamento."

Iniciado o procedimento pela Portaria de fls. 01/03, ouvida a

Representante do Ministério Público, esta ofertou manifestação (fls.129/161),

postulando pela decretação liminar de afastamento de VENICIO MACHADO

PEREIRA NETO novo dirigente (gerente) do CER São Lucas, com a

conseqüente comunicação à autoridade hierarquicamente superior a este

servidor, marcando-lhe o prazo de 03 dias para a substituição, nos termos do

art. 192, § 2º do ECA.

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Pugnou, também, pela citação do mesmo para, no prazo de

dez dias, oferecer resposta escrita, podendo juntar documentos e indicar as

provas a produzir. E após, se for necessário, a designação de audiência de

instrução, com a devida intimação das partes.

Requer, ao final, o afastamento definitivo do dirigente da

entidade, a interdição total do estabelecimento pela reiteração da barbárie que

nele se repete e, a determinação judicial para que a administração apresente

imediato cronograma para a implementação efetiva e real do que restou

recomendado no Relatório Final o Levantamento do Centro Educacional São

Lucas, com a remoção das irregularidades descritas nos autos e, após a vistoria

deste Juízo, seja levantada a interdição.

Postulou, ainda para que o òrgão Gestor Estadual informe a

este Juízo acerca do andamento da utilização dos recursos disponibilizados

para o Estado de Santa Catarina, pelo SINASE, para construção de Centros de

Atendimentos Socioeducativos.

Relatados. FUNDAMENTO E DECIDO:

Inicialmente, registro a grande parceria que encontrei no

Ministério Público, aqui nesta comarca de São José, na esperança (aquela

originada do verbo esperantar e não do verbo esperar!) da concretização da

mudança do paradigma da situação irregular para o da proteção integral.

Parceria essa iniciada com a Promotora Leda Maria Hermann e atualmente com

Promotora Márcia Aguiar Arend e com a antiga Gerente Margarete Sandrini,

rumando, todas, para o mesmo caminho: uma aplicação e execução de

medidas socioeducativas tal como preconizadas no ECA e no SINASE.

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Para uma melhor compreensão do desenrolar dos fatos que

vem ocorrendo no CER – São Lucas, imprescindível um escorço histórico de

sua existência, para que, como bem ressaltou a representante do Ministério

Público, se possa conhecer e compreender a extensão da barbárie que os autos

revelam. Assim, somando ao corpo desta decisão, pela excelência com que a

história fora relatada na manifestação ministerial, transcrevo-a, desta fazendo

parte integrante, conforme segue:

"A história do CER São Lucas.

O CER São Lucas tinha 30 (trinta) anos de tradição

menorista1quando a atual legislação infanto-juvenil2substituiu o extinto Código

de Menores. Conhecido no Estado inteiro como o "cadeião" dos "menores

delinqüentes de mais alta periculosidade " de Santa Catarina, o CER São Lucas

foi uma das muitas unidades de contenção brasileiras que permaneceu quase

duas décadas excluída da regência estatutária pautada na doutrina da proteção

integral, e atrelada à extinta doutrina da situação irregular.

O estigma reproduzido pela imprensa, o repúdio social e o

esquecimento estatal sinalizavam o desprezo pela clientela adolescente. O

prédio não recebia manutenção. A disciplina interna era ditada aleatoriamente

pelos monitores e pautada só na contenção e no isolamento. A gerência, cargo

de 3confiança, portanto de índole meramente política eleitoral, era ocupada por

indivíduos dos partidos da situação e o corpo técnico e funcional absolutamente

deficitário para a constante superlotação.

A "alta periculosidade" da clientela era alardeada pela mídia,

que tinha, e ainda tem, na referenciada instituição governamental uma

inesgotável fonte de notícias, sensacionalismos e especulações. Afinal,

rebeliões; fugas; apreensões de armas, drogas, celulares e espetos eram não

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constituem problemas para a reflexão das crises da nossa precária república,

mas engordam o cardápio de absurdos com os quais os sistemas de notícias

replicam as vendas e seus lucros. É que a violência tem mesmo forte potencial

sedutor: é um excelente artigo em termos de recepção no mercado consumidor

da informação.

Os arquivos institucionais registram óbitos (aparentemente)

suicidas por enforcamento, numa média de 02 (dois) ao ano, o último ocorrido

em janeiro de 2007.

A sociedade civil, incitada pela mídia, criticava governo e

gestão pelas fugas de elementos tão perigosos, exigindo medidas de contenção

mais rigorosas, muros mais altos, paredes mais grossas, trancas mais

reforçadas.

Os adolescentes infratores de todo o Estado tinham pavor

do São Lucas, relatando, corriqueiramente, que a comida era ruim, os

alojamentos eram úmidos, sujos e frios, banheiros entupidos, catres sem

colchão e monitores agressivos.

No ano de 2007 o senhor Ronaldo Benedet, então

Secretário Estadual de Segurança Pública e Defesa do Cidadão de Santa

Catarina, e assim o gestor máximo do sistema socioeducativo de alta

complexidade no Estado, ante os episódios de violência interna no Centro

Educacional São Lucas, reconheceu o esgotamento constitucional, legal e

operacional, do modelo de serviço prestado aos internos. Exercendo a

prerrogativa autorizada pelo artigo 227, caput da Constituição Federal e

ratificada pelo artigo 4º, caput do Estatuto da Criança e do Adolescente,

entendeu, ao reconhecer a própria deficiência do serviço prestado pelo governo,

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que era imperiosa a nomeação de pessoa apta, com perfil, formação

pedagógica e experiência em educação, para assumir a gerência. Admitiu, ao

que pareceu, que era inadiável a transformação do CER São Lucas numa

entidade comprometida com a aplicação das medidas sócioeducativas

preconizadas na Lei Federal e decorrentes dos princípios constitucionais.

Ao ato de nomeação de Margarete Sandrini, educadora

indicada pelo Centro Cultural Escrava Anastácia, seguiu-se a contratação, por

concurso público, de monitores e técnicos, ação que, à primeira vista,

regularizou o quadro funcional da casa.

Entretanto, tudo não passou de um aparente compromisso

de transformação, os vícios sistêmicos da estrutura não foram estirpados, e bem

cedo se descobriu que o concurso público para a contratação de monitores, foi

para ACTs, o que resultou na clara resistência da maioria da monitoria quanto

às mudanças que pareciam estar por ocorrer.

Apesar da resistência interna e da repercussão

sensacionalista promovida pela mídia, a nova gerente e os profissionais

técnicos somaram forças para enfrentar o desafio de transformar aquela

unidade, até então envolta na opacidade das próprias transgressões, para

acolhimento da doutrina da proteção integral no cotidiano da "casa".

Podemos mesmo dizer que, contabilizadas quatro décadas

de tradição menorista e quase duas de atraso em relação à ordem jurídica,

constitucional e legislativa, o CE São Lucas deu início, na metade de 2007, deu

início à concretização da sua identidade como unidade socioeducativa,

comprometida com a observância da Constituição de 1988 e do Estatuto

(vigente desde 1990), já sob a égide orientativa do SINASE, instituído em 2006

em nível federal.

Era mais que hora de mudar. Difícil era saber por onde

começar. Recuperação mínima das instalações, limpeza interna e externa,

reequipamento da cozinha, reativação da escola e improvisação de oficinas

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foram os passos objetivos iniciais. A humanização daí decorrente

paulatinamente acalmou a tensão de crise, aplacou a conduta hostil dos

adolescentes.

Transcorridos dois anos, o prédio foi reformado ( pinturas,

limpeza de fossas, banheiros e espaços externos). Desratizações e

dedetizações para eliminação de pragas. A cozinha foi reequipada. As

condições de habitabilidade dos alojamentos foram regularizadas quanto ao

fornecimento de colchões, cobertas e lençóis.

A escolarização foi retomada e frequentada por todos. As

oficinas de profissionalização, ativadas de improviso no ano de 2007, foram

regularizadas e operacionalizadas em 2008.

Seguindo recomendação do Ministério Público, os gestores

autorizaram e viabilizaram posse e uso de eletroeletrônicos (às expensas das

famílias) nos quartos e racionalizaram o longo período de isolamento noturno,

remanejando a disciplina interna e fixando horários coerentes para o

recolhimento aos quartos (22h) e para a ordem de silêncio (23h).

Com adesão e acompanhamento das equipes técnicas,

foram implementadas atividades externas3 Alojamentos coletivos foram

paulatinamente organizados e passaram a acomodar os adolescentes cujo

comportamento e fase da execução da medida permitisse convivência pacífica.4

A frequência de fugas e a entrada de drogas e de celulares

foi significativamente reduzida entre novembro de 2007 e abril de 2009.

Cessaram os eventos críticos (rebeliões), complexos (queimas de colchões) e

apreensão de armas.

As equipes técnicas, constituídas por expressivo número de

profissionais recém-admitidos por concurso público naquele ano de 2007,

atuavam em ritmo de parceria e de entendimento com a gerente, também

recém-empossada.

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Foram trabalhados e elaborados o Projeto Político

Pedagógico, um novo regimento interno e normas disciplinares alinhadas com

as diretrizes do SINASE, incrementado e fortalecido o atendimento técnico

multidisciplinar, elaborados e remetidos às respectivas comarcas relatórios

periódicos para fins de revisão e eventual substituição da medida privativa de

liberdadE.5

Conhecendo seus direitos os adolescentes passaram a

interagir com o Ministério Público e a indagar sobre o andamento processual da

execução das suas medidas socioeducativas.

A ação positiva deu bons frutos, mas não arrefeceu a

resistência cultural, fomentada no meio externo pela imprensa e no ambiente

institucional pelos monitores.

E as dificuldades de estabelecer o novo foram erodindo as

transformações positivas tão recentemente iniciadas. Assim, novos projetos,

como visitas intimas e capacitação continuada da equipe acabaram obstados

pelo clima conflitual que foi sendo ressuscitado.

As dificuldades que sobrevieram são frutos não só da

ignorância quanto às garantias constitucionais, normas legais estatutárias e

orientações do SINASE. O novo estava encontrando a resistência sócio-cultural

do velho e prevalente paradigma, especialmente focado no adolescente em

conflito com a lei como delinqüente que merece punição.

Os múltiplos e constantes enfrentamentos com a monitoria e

sua exploração midiática, somados aos efeitos doentios pela a

institucionalização, progressivamente desgastaram os técnicos, servidores e

gerente, multiplicando desavenças e esvaziando o implemento efetivo do PPP,

Regimento Interno e ordem disciplinar regulamentada.

As atividades externas foram exploradas pela imprensa

sensacionalista como ilegais e a pressão sobre os técnicos resultaram, por fim,

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em enfrentamentos sérios equipes versus gerente, culminando na suspensão

da ação pedagógica legal, legítima e recomendada expressamente no SINASE.

As oficinas artísticas, emergencialmente conduzidas por

monitores com talentos específicos, geraram protestos sindicais e acabaram

interrompidas.

A lotação de instrutores para profissionalização pela

Secretaria de Estado da Educação, dever legal atribuído por natureza àquela e

concedida no ano letivo de 2008, não se repetiu em 2009, o que implicou sua

desativação desde o ano passado até agora.

A desavença entre técnicos e a gerente provocou isolamento

de parte a parte. Com isso as equipes multidisciplinares foram se isolando. O

vínculo da clientela centralizou-se na pessoa da gestora e o espírito de corpo

desintegrou-se.

Os profissionais técnicos começaram a se afastar por meio

de licenças ou de transferências internas; o quadro técnico esvaziou e os

profissionais que permaneceram na unidade, sobrecarregados e isolados,

perderam o entusiasmo do começo.

A manutenção do prédio, reposição de sanitários,

mobiliários, equipamentos e instalações elétricas e sanitárias não prosseguiram

regularmente depois da primeira reforma, como necessário; já ao final do ano

de 2009 era observável falta de conservação dos gramados, banheiros e

fossas, déficit na reposição de lâmpadas em ambientes de uso comum,

corredores e até nos quartos; sem pintura periódica para conservação, as

paredes voltaram a apresentar aspecto desagradável e sujo. Os ambientes de

uso comum e até os quartos retornaram paulatinamente à deplorável condição

anterior.

Maldosa e sensacionalista, a mídia eletrônica

(principalmente) fazia destacar qualquer festejo ou lazer oferecido aos internos,

apontado s pelos meios de comunicação como "mordomias" espúrias

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"descaracterizadoras da finalidade retributiva " (sic), facilitação "assistencialista"

, privilegiando "marginais" sem merecimento.

A rotulação anacrônica de "menores delinquentes de alta

periculosidade", ditava que o São Lucas era um lugar de segregação e castigo,

cujas "funções prioritárias seriam: proteger cidadãos de bem e garantir a

segurança pública externa". O discurso invertido era sempre explorado nas

manchetes; qualquer tentativa de contradiscurso era ignorada ou subvalorizada.

O maior foco interno de resistência foi e continua sendo o

corpo de monitores, cujo papel socioeducativo tem sido historicamente

subsumido pelo aculturamento herdado do modelo menorista, implicando, por

consequência, na continuidade do desmando e da crueldade, licenciosidade

implícita gerada pela rejeição macrossocial à clientela visada.

Mal capacitados, fortemente comprometidos com as

expectativas invertidas de proteção da sociedade e do patrimônio, e não do

adolescente estigmatizado por sua conduta transgressora e desviante, os

servidores da monitoria, vítimas de singular e tradicional alienação somada à

ignorância da Constituição, da lei e da sua real função, prosseguiram fazendo o

que sempre fizeram: disciplinamento indiscriminado; castigos físicos; práticas

cruéis compatíveis com tortura e tratamento cruel e desumano.

A reiterada certeza no silêncio dos adolescentes obtida pela

inflição do medo de represálias e torturas, tudo reforçado por uma, igualmente

doentia rotulação, estigmas e pelo histórico desvalor para com os internos -

fomentada pela imprensa sensacionalista e pela agressiva persecução policial

aos adolescentes- impôs a estes o exercício do sofrimento silente.

Reiteradamente esclarecidos sobre seus direitos e garantias,

foram os que melhor resistiram à crise interna, os que mais aprenderam com o

processo institucional, tanto que alguns começaram a noticiar agressões e

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humilhações, ameaças e contínuas punições cruéis. Mesmo pressionados,

retaliados e perseguidos, houve os que não se calaram.

É de supor que o silêncio imposto pelo medo de vendetas

seja, ainda, prevalente e majoritário; mas foi por sua voz que se revelaram as

práticas desumanas de parte de monitores, autorizando medidas judiciais e,

assim, estimulando novas falas e outras medidas.

Não temos dúvida de que o silêncio nutre o arbítrio. E

quando o que está encoberto é descoberto pode-se estabelecer o

revigoramento ético e solidário entre as pessoas e as instituições.

Cumpre agora detalhar as situações e fatos que chegaram

ao conhecimento desta Promotoria de Justiça, bem como os resultados obtidos

e as providências adotadas.

1. Dia 05 de abril de 2009: Agressão com "porretes" e

exposição a vexame (Tortura)

2. 07 de abril de 2009 : Agressões física pelos monitores

GERALDO TORRES DO NASCIMENTO e EVONIR DAL PIZZOL

O adolescente G.M., interno na unidade socioeducativa CER

São Lucas, referiu ao MM. Juiz Francisco José Rodrigues de Oliveira Neto,

titular da Vara da Infância da Capital (SC), agressão física pelos monitores

GERALDO TORRES DO NASCIMENTO e EVONIR DAL PIZZOL. Em atenção à

notícia, a Promotora de Justiça VANESSA WENDHAUSEN CAVALLAZZI

GOMES, então em exercício na Promotoria da Capital (SC), com atribuição

funcional compatível, realizou visita de fiscalização àquela casa no dia

09.04.2009, constatando lesões visíveis nos adolescentes G.M. e T.M.V.,

encaminhados para exame de corpo delito.

Tal a gravidade dos fatos que a própria promotora de justiça

registrou ocorrência junto à 2ª Delegacia de Polícia de São José, originando

assim o Inquérito Policial n° 183/09 (atualmente ação penal nº 064.09.011022-

0, em trâmite na 2ª Vara Criminal de São José). Os laudos comprobatórios da

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materialidade das lesões, prova inserta na ação penal, mais o relato de várias

testemunhas embasaram o ajuizamento também de Ação Civil Pública junto à

Vara Especializada, resultando deferimento de tutela antecipada para fins

de afastamento funcional dos dois monitores e determinação judicial.

As vítimas relataram na fase policial, com relevante

coerência e riqueza de detalhes, os sofrimentos que lhes foram impostos, de

forma deliberada e cruel, pelos indiciados. Do Termo de Declaração subscrito

pelo adolescente T.M.V. vale destacar:

(...) no CER/São Lucas foi agredido fisicamente pelos

monitores GERALDO e EVONIR, no dia 05/04/2009, pelas 14:00 horas; (...)

chegaram os referidos monitores dizendo que havia sumido uma colher, sendo

que o declarante afirma que foi uma desculpa para que houvesse a agressão

(...) "eles mandaram a gente cagar a colher"; que "eles mandaram a gente se

ajoelhar em frente ao vaso sanitário do quarto e colocar as nossas mãos lá

dentro e procurar a colher, sendo que alguns dos vasos sanitários estavam com

fezes dentro" (...) que, só puderam lavar as mãos à noite; que, em todo

momento, os dois monitores agrediam o declarante e seus colegas com porrete;

(...) os dois monitores mandaram que o declarante e os outros adolescentes

ficassem totalmente nus, dentro da jega (quarto), os dois monitores ficaram no

corredor, (...) iam chamando um adolescente por vez; que, cada um tinha que

se ajoelhar no chão do corredor e era agredido fisicamente pelos dois monitores

com um porrete (...) (fl. 16 do IP original - grifei).

Do termo firmado pelo adolescente G.M. se colhe relato

coerente com a descrição fática da outra vítima; como destaque:

... no dia 05/04/2009, pelas 14:00 horas, os monitores

GERALDO e EVONIR chagaram na Triagem acusando o declarante e os outros

adolescentes ali presentes de terem afanado uma colher (...); que, "daí eles

começaram a dar uma geral e bater em todo mundo"; que os dois monitores

portavam um pedaço de pau na mão; que EVONIR gritava: "vocês não querem

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me dizer onde está a colher, não digam, mas eu vou quebrar vocês de pau"; (...)

foram abrindo as portas dos quartos e passaram a agredir os adolescentes,

primeiro agrediram o declarante e o T.M.V.; que "os dois bateram na gente,

cada um batia um pouco depois eles trocavam"; que, o porrete em questão era

um pedaço de cabo de pá; (...); que, o EVONIR mandou que o declarante

desentupisse o vaso sanitário do quarto, com a caneca que o declarante

utilizava para tomar café; que o declarante desentupiu o vaso sanitário entupido

com fezes utilizando a própria caneca (...) depois o declarante lavou a caneca

com água e detergente (sem esponja) e o EVONIR obrigou o declarante a tomar

café naquela mesma caneca; (...) enquanto o declarante desentupia o vaso, os

monitores lhe agrediram fisicamente com porrete, tapas na nuca; que "na hora

em que eu estava tirando fezes com a caneca eles batiam na minha mão, e a

caneca cheia de fezes virava em cima do meu corpo, me sujando; (...) eles

colocaram o declarante dentro de uma cela, e iam na porta, de vez em quando,

abriam a "guela", que é uma entrada na porta na altura dos olhos, e zombavam

falando ao declarante: "e aí, cagadinho, ta bom aí, com cheiro de cocô!" (...) o

declarante estava sujo e só pode se lavar depois da janta, sendo que jantou

ainda sujo (...)" (fls. 19-20 – grifei).

Sinalizando publicamente a falta de preparo e animosidade

em desfavor dos internos, o monitor GERALDO TORRES DO NASCIMENTO

falou sobre os fatos à imprensa, tendo afirmado, segundo o texto jornalístico, o

seguinte: "(...) não nega que em certas ocasiões tem de usar a força,

principalmente quando os internos não querem ir para os quartos. 'Eles

nos respondem e nos enfrentam', justificou".

Providência: Ajuizamento de Ação Civil Pública visando

aplicação de medida disciplinar administrativa, constituição de obrigação

de fazer e tutela antecipada em face do ESTADO DE SANTA CATARINA; de

RONALDO BENEDET, Secretário da Segurança Pública e Defesa do

Cidadão do Estado; de GERALDO DO NASCIMENTO TORRES e de EVONIR

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DAL PIZZOL, os dois últimos monitores do CER São Lucas, por prática de

tortura contra dois adolescentes, com deferimento de tutela antecipada para

o imediato afastamento dos monitores das suas funções e determinação ao

segundo para instauração de processo administrativo no prazo de 05 (cinco) e

conclusão do mesmo nos 90 (noventa) dias subsequentes.

RESULTADO: Descumprido o prazo para a conclusão do

processo, com prazo esgotado.

3. Dia 17 de junho de 2009: Notícia de exibição de

ofendículos e agressão com gás de pimenta

A pedido dos adolescentes lotados no alojamento ("nível",

no jargão da instituição) 03, a Promotora da Infância da Comarca, Dra. LEDA

HERMANN, compareceu àquela instituição, reunindo-se com o grupo de

adolescentes, em total privacidade (sem monitores, guarda ou gerente) a partir

das 18h, na sala da monitoria.

Esclarecidos os adolescentes sobre seus direitos, garantido-

se o anonimato individual, passaram os mesmos a narrar informalmente os fatos

adiante detalhados:

Os adolescentes A.C. e W.E.F.S. noticiaram ofensa à sua

integridade física pelo monitor GILSON, consistente no uso de spray de

pimenta, substância que causa irritação nos olhos, comumente utilizada pela

polícia nas abordagens que exijam contenção, ou por particulares como meio de

autodefesa. A ofensa ocorrera na noite do domingo anterior, ou seja em 14 de

junho de 2009.

Já recolhidos ao quarto que compartilham naquelas

dependências, iniciaram discussão entre si, elevando inadvertidamente o tom

de voz. Em virtude disso, o monitor GILSON, de serviço naquela data, adentrou

bruscamente ao cômodo e borrifou spray de pimenta nos olhos dos dois,

causando-lhes forte irritação e desconforto.

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Os adolescentes vitimados afirmaram que não estava

ocorrendo agressão física recíproca ou contra o monitor, tratando-se de

discussão banal. Reconheceram que estavam, de fato, falando alto demais,

reclamando, todavia contra a atitude do monitor, reputada desnecessária e

abusiva não apenas pelos dois como pelo restante do grupo, que confirmou o

relato e asseverou que os efeitos do gás de pimenta foram sentidos também por

eles, dado à quantidade excessiva da substância que ficou no ar.

O grupo afirmou unanimemente que os monitores

GILSON, APOLO, MILTON e DÁRIO exibiam com frequência diária, visando

intimidar e ameaçar os adolescentes, frascos de spray de pimenta,

sacando parcialmente as embalagens dos bolsos, e que os monitores

GILSON e DÁRIO igualmente ostentavam máquinas de eletro choque,

exibidas de forma semelhante, também com propósitos intimidatórios.

Quanto a APOLO, lotado em outro alojamento, comparecia

àquele espaço regularmente e a pedido dos colegas, brandindo um cacetete e

proferindo ameaças verbais, quase sempre à hora de recolhimento para dormir.

Os adolescentes noticiaram também que o castigo indiscriminado denominado

"medida coletiva de quarto" lhes fora imposto pelos monitores por quase 03

(três) semanas consecutivas, asseverando que estavam sem banho de sol até o

dia da reunião.

No mesmo dia, encerrada a reunião com os internos, foram

perquiridos informalmente os monitores CARLOS, APOLO e MILTON, que

admitiram parcialmente a conduta. Advertidos sobre a ilegalidade da "medida

coletiva de quarto", inconstitucional, ilegal e proibida inclusive em âmbito

institucional, aduziram desconhecimento da norma regimental, confessando

aplicação recente desse abuso, posto ter sido encontrado, na sala da monitoria,

um torrão de maconha cuja propriedade não havia sido assumida por nenhum

dos internos.6

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4. Dia 20.11.2009: Ameaça com arma de fogo por monitor

contra adolescente dentro da unidade

A cultura da truculência e a imposição arbitrária do poder,

por parte dos monitores, calam a voz dos adolescentes agredidos pela força do

medo. Assim é que, embora a narrativa contida no item supra, houvesse gerado

representação ministerial fundamentada nos artigos 94, 95, 96, 97 e seguintes

do Estatuto da Criança e do Adolescente, endereçado ao Juízo especializado

da comarca de São José, o protocolo efetivo da peça não chegou a ocorrer na

época (junho de 2009), por falta de elementos de prova, já que os adolescentes

não ousaram reafirmar as notícias em Juízo.

Ademais, sobressaltados com a visita do Ministério Público,

os ofensores cessaram as condutas e deram sumiço aos instrumentos de

ameaça, conforme narrado posteriormente pelos próprios adolescentes,

inviabilizando medida de busca e apreensão. Mas o recrudescimento da

violência ativa, a certeza do desvalor social imputado às vítimas resultaram em

recidiva de conduta por parte de JAISSON APOLO MARTINS ESPINDOLA.

Em 11.12.2009 compareceu ao gabinete da 4ª. Promotoria

de São José, da Infância e Juventude, a então gerente da unidade CER São

Lucas, Margarete Sandrini, relatando que no dia 20 de novembro daquele ano,

fora procurada pelo monitor JAISSON APOLO MARTINS ESPINDOLA (um dos

nominados autores das ofensas perpetradas ao grupo do alojamento ou "nível"

03), que reclamou dos adolescentes M.J.M.C. e J.N.S., internos alocados no

"nível 05" por "conversarem" (sic) com os adolescentes alocados no "seu nível",

ou seja, naquele onde estava lotado em serviço (nível 02), no corredor onde

ficam as salas de aula, monitorado por câmera de segurança.

Ao conferir o conteúdo da fita filmada na mesma manhã pela

câmera de segurança, a gestora visualizou no vídeo a imagem de APOLO,

passando pelo meio de três adolescentes e, em seguida, sacando subitamente

da cintura arma de fogo, que aponta para o adolescente J.N.S. em inequívoca

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conduta ameaçadora. Em sequência o monitor guarda na cintura a arma, sai de

cena e em seguida retorna, apontando o dedo em riste para os adolescentes

(cópia em DVD anexa).

5. Dia 02.03.2010: Inspeção ministerial no "nível" 05

Visita de inspeção ministerial ao CER São Lucas em

02.03.2009, especialmente ao alojamento ("nível") 05 – ou "nível de proteção" –

que abriga adolescentes ameaçados de vendeta ou de morte por outros

internos, sendo constatadas várias irregularidades GRAVES, com pelo menos

duas (02) internações de adolescentes em quadro psicótico, um deles, RMKA,

com incapacidade mental reconhecida por sentença da MM. Juíza Andréia

Régis Vaz, reiterada por outro julgado datado de 30.11.2009, cuja retirada do

sistema partiu de ato judicial lavrado pelo Juíza da Infância e Juventude da

Comarca de São José (SC), que ora também subscreve este pedido, para

encaminhamento inicial ao Instituto Psiquiátrico - IPQ, em face do quadro de

surto iminente.

6. Dias 08.09.2009 e 31.03.2010 - Facilitação de fugas –

dois episódios constatados

Episódio 01: Em visita de inspeção ministerial realizada em

08 de maio de 2009, a partir de 20h30min, constatou-se a evasão de 10 (dez)

adolescentes recolhidos na quela casa, ocupantes do "nível" 02, de maior

contenção na unidade.

Estavam em serviço os monitores RAFAEL PEREIRA

MARÇAL e DOUGLAS JOSÉ SOUZA, que disseram ter havido tentativa de fuga

por um dos internos naquela manhã, pelo que os adolescentes vinham sendo

mantidos sob contenção rigorosa, trancados nos quartos individuais.

Na tarde do mesmo dia os dois monitores resolveram

realizar trabalho emergencial de escoamento de um vaso sanitário com a ajuda

de 03 (três) internos. Enquanto os dois monitores e dois dos adolescentes

retiravam o conteúdo do vaso, depositando-o em baldes, o terceiro adolescente

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carreava os baldes cheios para despejo no lado externo, passando

repetidamente em frente à sala da monitoria (destrancada por defeito da

fechadura, danificada há meses, segundo os monitores) e transitando pelo

corredor dos quartos.

Ocorre que as chaves dos cubículos encontravam-se

guardadas numa gaveta (também destrancada) de um móvel, na sala da

monitoria, sendo provável que os internos já tivessem observado o fácil acesso

às mesmas.

Aproveitando-se do trânsito livre de supervisão pela sala de

monitoria e corredor dos quartos, o terceiro adolescente subtraiu o molho de

chaves e abriu os quartos de um dos lados do corredor. Os adolescentes

saíram e, de posse das chaves, abriram os demais cubículos, evadindo-se dez

deles. Apenas dois dos adolescentes daquele alojamento recusaram-se a aderir

à fuga.

Segundo os monitores, ao tentar deter os internos foram por

eles rendidos com estoques extraídos das alças dos baldes. Os fatos se deram

por volta de 18h.

Até a chegada da Representante do Ministério Público, 03

(três) dos adolescentes evadidos já haviam sido recapturados pela autoridade

policial.

Salienta-se que a operação de limpeza e escoamento de

dejetos foi imprudente, faltosa e reprovável, por vários e graves motivos:

a) Recrutar adolescentes internos para auxiliar em tarefa

insalubre, o qual nem os monitores deveriam ser submetidos, o que revela falha

nos níveis de gestão de 2º e 1º escalão, responsáveis pela manutenção

continuada das instalações e pela provisão respectiva dos necessários recursos

humanos;

b) Atribuir a um dos adolescentes, num dia que já registrara

uma tentativa de evasão pela manhã, o carreamento dos dejetos para fora, com

Page 20: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

passagens sucessivas, nas idas e vindas, pela sala da monitoria (destrancada),

onde guardavam o molho das chaves, numa gaveta (também destrancada),

sem qualquer supervisão porque fora do campo de visão dos monitores;

c) Guardar o molho de chaves dos alojamedntos em

dependência e gaveta destrancadas, quando deveriam ter sido mantidas sob

posse pessoal de um dos monitores, conduta da monitoria a ser muito bem

investigada em sua motivação e subjetividade, para afastar possível facilitação

dolosa.

Dentre as providências elencadas no Termo de Inspeção, a

mais relevante era a instauração de sindicância para apuração da conduta

funcional faltosa dos monitores, que, no mínimo culposamente, facilitaram a

fuga maciça daquele dia, pois deixaram sem supervisão toda a população e

permitiram livre e repetitivo trânsito de um deles por todo o corredor dos

quartos, com evidente risco de ingresso do menino à destrancada sala da

monitoria, por consequência, ao molho de chaves.

A facilitação daquele dia foi especialmente grave pela

tentativa de fuga anterior; pelo trânsito de um dos meninos em percurso

facilitador de subtração das chaves e pela falta de supervisão visual do corredor

dos adolescentes em isolamento celular, medida que sempre gera tensão em

ambientes de contenção. Mas a facilidade do acesso e subtração das chaves

era contínua, já que o molho ficava numa gaveta sem chave, dentro de sala

sem fechadura bem debaixo dos olhos dos meninos que, por óbvio, só

esperavam a ocasião adequada para subtraí-las e escapar.

Episódio 02: Em 30 de março de 2010, a partir das 16h, os

alojamentos passaram a ser percorridos por Vossa Excelência, acompanhada

pela Advogada Daniela Felix Teixeira (Vice Presidente da Organização

Advogados Sem Fronteiras - ASF-Brasil) e pela Promotora de Justiça Leda

Hermann.

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A delicada tarefa do grupo, também composto pelo Diretor

do Departamento de Justiça e Cidadania (DJUC), Sr. Itamar Bressan Benini,

órgão esse ligado diretamente à Secretaria Estadual de Segurança Pública e

Defesa do Cidadão de Santa Catarina (SSPSC) e, ainda, por profissionais

técnicas, era cientificar a clientela sobre iminentes mudanças na gestão direta

da casa30.

O grupo finalizava as visitas quando foi noticiada a fuga de

10 adolescentes do alojamento II, sendo verbalmente instaurada pela

Magistrada, de ofício e de imediato, procedimento judicial a ser depois

formalizado, para investigação de possível facilitação por funcionários, uma vez

que não houve arrombamento, escalada ou rendição dos monitores em serviço.

A Polícia Militar apresentou à portaria, dez minutos depois, o

primeiro adolescente reapreendido, perquirido lá mesmo, enquanto os outros

dois, reapreendidos após, também pela PM nas cercanias, foram recolhidos na

unidade e apresentados em juízo no dia subsequente.

As providências tomadas na ocasião foram: instauração de

ofício para apuração dos fatos e eventual facilitação de fuga por parte dos

monitores, com a oitiva de um adolescente na mesma data e na própria unidade

e dos demais em audiência judicial realizada no dia seguinte, no fórum de São

José, a partir das 14h.

7. Dia 31.03.2010: Espancamento dos adolescentes

reapreendidos – lesões constatadas

Quando de sua reapreensão pela PMSC, ocorrida em

31.03.2010 para a visita já referida, dois desses adolescentes, A. e F.,

apresentavam visíveis lesões corporais compatíveis com espancamento. Houve

a determinação para a apresentação em juízo no dia seguinte, 1º de abril,

incluídos os outros dois, que não apresentavam marcas visíveis.

Na audiência foram ouvidos todos os adolescentes. A

perseguição policial, narrada por F., causou impacto. Narrou que a PM disparou

Page 22: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

a arma em sua direção e, depois de rendê-lo, agrediu a socos provocando as

lesões evidenciadas.

A narrativa de A. foi coerente com a de F., ambos estando

visivelmente lesionados. O adolescente de constituição mais frágil e com 14

anos de idade, apresentava grandes hematomas e arranhões por todo o rosto,

em metade do tórax e nas costas.

A narrativa de três dos adolescentes ouvidos refere

facilitação para a evasão.

Providências encaminhadas: realização de exame de corpo-

delito, no mesmo processo indicado em item anterior, naquela mesma data.

Ainda aguarda-se laudo do Instituto Geral de Perícias (IGP/IML).

8. Dias 05 e 11.04.2010: Espancamentos do adolescente

C.A.R., por dois monitores e policial militar

Em 13 de abril de 2010 havia sido agendado atendimento, a

pedido, do adolescente C.A.R., 17 anos, interno da CER São Lucas, cuja

medida socioeducativa de internação, aplicada na comarca de Brusque (SC) e

deprecada para cumprimento na comarca de São José7, em virtude da

localização da unidade de internação.

O inopinado empossamento do monitor VENÍCIO PEREIRA

MACHADO NETO ao cargo de Gerente do CER São Lucas, por nomeação do

atual Secretário de Estado da Segurança Pública, Delegado ANDRÉ RICARDO

DA SILVEIRA, sem prévia conversação com a clientela da casa, já submetida à

tensão da mudança de gestão em curso, tornou necessária a presença da

Representante do Ministério Público na unidade socioeducativa.

Naquela casa, já no princípio da noite, a Promotora de

Justiça entrevistou o menino em total privacidade, obtendo antes referência

técnica da Sra. Assistente Social que o vinha acompanhando desde seu

ingresso. C., embora visivelmente amedrontado, fez o relato seguinte:

Page 23: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

- sob internação desde outubro de 2009, obteve licença para

saída temporária, com parecer técnico favorável, por ocasião dos feriados de

Páscoa. Retornou, como determinado, no domingo, dia 04 de abril deste ano,

ao entardecer. Admitiu que, faltando à disciplina da casa, introduziu um pacote

contendo pequena quantidade de maconha e dois celulares, que deu um jeito

de jogar no telhado antes da revista.

De volta ao alojamento, foi conduzido uma vez mais à

portaria da instituição, sendo arrastado pelo pescoço, e aos supetões, escadaria

acima, por monitor de nome TIAGO, que trabalha lotado no "nível 05".

Já na entrada da instituição, o Soldado PM Antonio José de

Oliveira, de serviço naquele dia, com o concurso do tal monitor TIAGO, obrigou

que ficasse nu e ambos lhe aplicaram uma surra como castigo pela falta

cometida. Depois, foi levado à Central de Polícia de São José para registro de

ocorrência em seu desfavor.

O policial civil de plantão constatou as lesões e expediu guia

de exame de corpo delito, que remeteu ao CER São Lucas. Na segunda feira,

dia 05, a assistente social tomou ciência dos fatos, registrando a negativa do

adolescente em registrar BO pela agressão.

Dia 07, quarta, foi submetido a exame de corpo-delito no

IML. O laudo, embora requerido, ainda não foi recebido. Por apresentar histórico

positivo, foi exarada recomendação técnica para substituição da internação por

medida menos gravosa, a semiliberdade, e este foi o vezo para efetiva proteção

de sua integridade física. Tanto mais que, no domingo anterior, 11 de abril, teve

os dentes da frente quebrados por um soco desferido pelo monitor

ALEXANDRE PAULI, sendo de altíssimo risco sua permanência na entidade.

Na mesma noite, em audiência realizada por Vossa

Excelência, e diante da emergência da situação, foram ouvidos o adolescente e

a profissional técnica, restando então substituída a medida. Para evitar maiores

riscos, o adolescente dormiu na Central de Polícia aquela noite, sendo

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conduzido na pela Sra. Comissária da Infância e Juventude de São José à casa

de semi-liberdade de Itajaí, em face da proximidade com o local de residência

da mãe, atualmente morando na cidade de Camboriú. A Sra. Comissária relatou

em peça escrita não ter conseguido recuperar os pertences, embora

reclamados; consta que os monitores responsáveis afirmaram não existir nada

na casa que fosse de sua propriedade, sequer peças de roupa.

DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO ATUAL

Conforme se verifica do relato fático apresentado,

retrocessos de toda ordem ameaçam a segurança e integridade física da

clientela, por desídia e desinformação do Estado gestor, exigindo providências

severas por outras esferas de poder e agências de proteção.

Abuso, desídia, barbárie e dor constituem a história do CER

São Lucas. O processo de transição foi interrompido. Tudo conduz ao retorno

da violência patrocinada pelos agentes da instituição de modo direto e

indiretamente pela administração superior.

A gestão socioeducativa de alta complexidade catarinense,

vintenariamente atrasada, equivocada e mal conduzida; para começar, por ter

sido vinculada à Secretaria de Estado sem perfil nem vocação, segue a mesma

trilha. E a ação socioeducativa, agregada ao sistema prisional, apenas

encarcera a clientela juvenil para o sistema prisional dos maiores de idade.

Tanto é assim que a capacitação do quadro funcional é feita

pela Academia de Polícia ACADEPOL, da Polícia Civil de Santa Catarina, o que

desvirtua conteúdos e, principalmente quanto aos monitores, formação,

tornando-os agentes de repressão e não de socialização.

O distanciamento entre a direção da instituição e os

adolescentes chancelam a violência e a ausência de projetos pedagógicos. Os

Técnicos, funcionários administrativos e monitores, manifestam medo dos

adolescentes, o que contribui para o reiterado uso de algemas, marca-passo e

constância de isolamento celular;

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Necessário lembrar que o SINASE preceitua, com clareza,

que a segurança deve ser conduzida no entorno, e é dever da polícia militar;

mas que no interior das unidades a prioridade é a interface socializadora e

educativa. Ao revés, no CER São Lucas os internos são seguem sendo

submetidos ao isolamento constante nos cubículos, sob chave, para prevenir

fugas, obsessão popular, midiática e funcional, colidindo e desvirtuando da

política de segurança.

É que os monitores se colocam como titulares da tarefa

disciplinadora; a punição padrão é a tal "medida de quarto", a definição de faltas

é casual e a punição não obedece norma regimental, nem o direito à defesa ou

à prévia definição normativa, tudo em prol da prevalência do arbítrio e da

desumanidade na disciplina. Assim, no espaço cercado pelos muros, fora do

olhar da vizinhança, porretes, cacetetes, sprays de pimenta, máquinas de

choque, espancamentos, vexames, fome, frio, sujeira, algemas, falta de sol,

nudez coletiva, segregação, formas diferentes de fazer o que já fizeram os

inquisidores, os feitores de escravos, os torturadores da ditadura militar,

privação de dignidade, tratamento desumano e cruel.

Na reunião realizada dia 30 de março deste ano, o diretor

Itamar Bressan Benini comunicou a decisão de instalar uma gestão colegiada,

formada por quatro profissionais técnicas (psicóloga, psicopedagoga, duas

assistentes sociais) e que realizariam estudo e diagnóstico para futura

indicação.

Os boatos de corredor referiam dois nomes especialmente

rejeitados pelos internos: os monitores VENÍCIO MACHADO PEREIRA NETO

e/ou Sandro, ambos mencionados como violentos e abusadores pela população

adolescente.

O Diretor do DJUC, Itamar Bressan Benini, garantiu tanto a

Vossa Excelência quanto à Promotora da Infância de São José, Dra. Leda

Hermann,que os boatos eram falsos, sendo que no dia seguinte, ficou

Page 26: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

assegurado ao Poder Judiciário e ao Ministério Público desta comarca que a

gerência não seria ocupada pelos cogitados monitores.

E mesmo assim, o novo Secretário de Estado da Segurança

Pública e Defesa do Cidadão, Delegado André Ricardo da Silveira Neto,

nomeou para a gerência da unidade justamente o temido monitor VENICIO

MACHADO PEREIRA NETO, que acabou empossado em 13 de abril de 2010.

Não resta dúvida a respeito do menoscabo à clientela da

instituição tanto quanto ao Judiciário e ao Ministério Público e os próprios co-

gestores, Secretário Executivo de Justiça e Cidadania, Sr. Justiniano Pedroso,

Diretor do DJUC, Itamar Bressan Benini, sem falar da equipe de transição,

técnicos e servidores da casa.

O contumaz desrespeito aos adolescentes prevaleceu com a

simples nomeação deste novo gerente.

A situação caótica ensejou a visita e a inspeção ocorrida no

dia 22 de abril, realizada pelo Poder Judiciário, por intermédio dos Juízes

Corregedor Geral de Justiça e deste Juízo da Infância de São José. E qual foi a

constatação: o gerente não estava presente; os adolescentes estavam

trancafiados nos cubículos e alguns dos internos apresentavam lesões

corporais visíveis a olho nú. Em suma, a violação reiterada dos direitos

humanos, que ainda não havia sido de todo afastada do CER São Lucas,

recrudesceu.

O saldo positivo que deve ser urgentemente honrado foi a

confiança amealhada junto à clientela. Toda a caminhada jurídica de reação e

visibilidade dos maus tratos e do arbítrio dos monitores foi trilhada a partir de

iniciativas inéditas de adolescentes em noticiar abusos, permitindo assim a

atuação do Ministério Público e do Judiciário.

Homens do governo estadual, portanto servidores da

sociedade ocupantes de cargos públicos, omitiram-se, enquanto gestores;

diante da crueldade e preferiram a imprensa que ao explorar o medo urbano da

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violência que atormenta a sociedade, pode lhes garantir o prestígio pela

maquiagem da eficiência carcerária obtida às custas da violação de direitos e do

extermínio das civilidades.

Agora, segundo consta dos autos, os adolescentes voltaram

às mãos arbitrárias de um servidor de quem aprenderam a temer quando de

suas passagens pelo sistema. Um inimigo, pois o Gerente do estabelecimento

é, para eles, o cara que bate, que "dá medida" (tranca nos cubículos), que os

trancafia 24h por dia nos cubículos, que não conhece seus direitos legais, nem

o SINASE, nem a Constituição.

Tanto que, em termos de segurança, fala-se em "construir

uma guarita nos fundos"; que vai aos jornais mostrar o sucateamento da casa,

mas esquece de dizer que a verba pública é manejada somente nas instâncias

superiores de gestão, nem um centavo chega à gestão de ponta, e que permite

a exposição da imagem, inclusive o rosto, dos meninos em jornais

sensacionalistas da região, em irreverente prática de crime e de atos de

improbidade na medida em que não cumprem princípios e leis. E o Secretário

de Estado? Ordenando "fuga zero"! A que preço? E o Secretário Executivo?

Silente omissão. E o Diretor do Departamento de Justiça e Cidadania?

Desautorizado e submisso.

O CER São Lucas pode mesmo ser compreendido como o

ícone de um sistema estadual e que ao ser investigado, como acabou sendo

possível a partir da iniciativa deste ínclito juízo, permitiu reconhecer-se toda a

sorte de barbáries chancelada pelo próprio sistema estatal, seja por inépcia, por

ignorância, por preconceito ou por submissão à mídia demonizadora, que

estigmatiza a clientela juvenil, autoridades exercentes de cargos públicos e com

mandatos eleitorais decidiram dar ao encarceramento de jovens, na sofisticação

da invisibilidade planejada, um verdadeiro regime de exceção, pois atrás dos

muros, tinham certeza do desaparecimento da Constituição. Tinham e têm

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certeza da desintegração da lei. Os muros facultam a desumanidade entre

humanos."

Derradeiramente, ressalto que, desde que aqui cheguei, a

situação do CER – São Lucas somente piorou. Cheguei aqui em São José num

momento em que a ex-gerente Margareti Sandrini, Pedagoga, idealista e

lutadora, ainda que solitária, carregava consigo forças para lutar contra tudo e

contra todos na esperança de ver implementadas as regras estabelecidas pelo

ECA e pelo SINASE para o cumprimento das medidas socioeducativas. Parte

deste intento encontra-se consubstanciado nos pedidos de providências por ela

postulado junto ao DEJUC, encartados às fls. 186/231.

A cada dia que passava, novos boicotes iam surgindo para

que seu ideal não se tornasse realidade.... era a mídia a proferir que aquele

local não era um "educandário" e que aos "bandidos" somente cabia a punição.

Aliás, não se viu nenhuma indignação da imprensa quanto aos maus-tratos

perpetrados aos adolescentes no interior do CER – São Lucas, nem mesmo

quando um dos Monitores que fora afastado de suas funções, se dirige a um

dos jornais de grande circulação estadual e, publicamente confessa a prática de

agressões e torturas.

Estranhamente, a esta barbárie a nossa imprensa não se

insurgiu. Imprensa esta de quem gostaríamos de contar como grande parceira

na mobilização da opinião pública, em especial no sentido da indispensável

participação dos diversos segmentos da sociedade para a luta por uma

efetivação da elevação das crianças e adolescentes como sujeitos de direito,

mas não, essa imprensa apenas cuida da demonização do adolescente

enquanto sujeito. É indispensável que a imprensa faça uma discussão

aprofundada e contínua com a população em geral, por meio dos diversos

segmentos organizados, o que favorecerá a construção de uma sociedade

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mais tolerante e inclusiva, tendo em vista que sobre esses adolescentes recai

parte da hostilidade e do clamor por maior repressão, o que tem gerado

campanhas de incitação de desrespeito a princípios e direitos constitucionais

atribuídos a esse público. (SINASE p. 31).

A equipe técnica e a equipe de Monitores, salvo exceções

que encontramos, na sua grande maioria, acostumados, formados, formatados

e adeptos da cultura da extinta situação irregular, não concordava com a forma

respeitosa com que a referida Gerente dispensava aos adolescentes. Os

boicotes eram dos mais variados.... facilitação de fugas, torturas das mais

diversas espécies, que geralmente ocorriam na calada da noite, quando esta já

não mais se fazia presente. Barbáries essas que só puderam ser investigadas

quando alguns adolescentes resolveram revelar. Sabe-se que ocorreram num

número bem maior do que as que estão sendo investigadas, mas, alguns dos

adolescentes que foram agredidos, por medo à represálias, quedaram-se

silentes.

Também não poderia deixar de registrar todo o descaso da

Secretaria de Segurança Pública, órgão estadual a quem o CER São Lucas

encontra-se vinculado, seja através da omissão no sentido de tomar as devidas

providências que lhe competia, ainda mais quando ela própria produz os

relatórios de fls. 20/67, não só isso, pois a antiga gerente, consoante se vê dos

ofícios encartados a estes autos, por diversas vezes solicitava que fossem

tomadas providências, seja de ordem material, seja de ordem de recursos

humanos. Nada foi feito. O descaso foi total fazendo que o CER São Lucas

passasse de um centro de cumprimento de medida socioeducativa de

internação a um promotor e produtor tão somente de bárbarie.

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Um órgão gestor que reclama da interferência do Ministério

Público, conforme colhe-se do seguinte relato: "Outra questão apontada pela

equipe técnica do Cer. é a interferência da promotora de São José, Sra.

Leda, a qual dá suporte à maioria das ações da gerente. O Sr. Itamar afirma

que a gerente recorre a esta Promotora em variadas circunstâncias para

obter o seu apoio e justificar suas ações, quando deveria buscar suporto

no próprio DJUC, pois a execução de medida socioeducativa é

competência do Estado. Assim, o Sr. Itamar explicou que é preciso definir

as competências de cada órgão, pois está ocorrendo um empoderamento

do Ministério Público em questões que não são de sua responsabilidade."

(f.49), mas que nada fez!

Por muito tempo se esperou que o órgão estadual gestor da

unidade tomasse as providências cabíveis, contudo a omissão prevaleceu, por

esta razão, não restou a este Juízo outra opção, senão tomar as providências

que adiante seguirão, não só na qualidade de órgão fiscalizador da unidade,

mas, sobretudo na qualidade de garante dos direitos conferidos aos

adolescentes, que, segundo nossa carta cidadã, SÃO DE PRIORIDADE

ABSOLUTA!

1.0 - Dos Fundamentos legais para o cumprimento e

execução das medidas socioeducativas

A Constituição Federal, em seu art. 227, estabelece que "É

dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao

adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à

alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à

dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,

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além de colocálos a salvo de toda forma de negligência, discriminação,

exploração, violência, crueldade e opressão." (grifo meu)

Da norma acima, extrai-se que a Constituição Federal

preconiza que, as questões relativas à criança e ao adolescente terão absoluta

prioridade sobre as demais. Instituiu, ainda, uma co-responsabilidade entre a

família, a sociedade e o Estado para assegurar e garantir os direitos

fundamentais às crianças e adolescentes.

A Lei nº 8.069/90, ao instituir o Estatuto da Criança e do

Adolescente, introduziu consigo um novo paradigma, ao estabelecer como

fundamento a Doutrina da Proteção Integral, contrapondo-se ao velho

paradigma da situação irregular que sustentava o Código de Menores – Lei

nº6.697/79. O ECA, no plano legal, tem como uma dos principais fundamentos,

a opção da inclusão social do adolescente em conflito com a Lei, tratando-o,

agora como sujeito de direito e, não, como um mero objeto de intervenção

preconizado pelo extinto Código de Menores.

O Estatuto da Criança e do Adolescente expressa direitos da

população infanto-juvenil brasileira, pois afirma o valor intrínseco da criança e

do adolescente como ser humano, a necessidade de especial respeito à sua

condição de pessoa em desenvolvimento, o valor prospectivo da infância e

adolescência como portadoras de continuidade do seu povo e o reconhecimento

da sua situação de vulnerabilidade, o que torna as crianças e adolescentes

merecedores de proteção integral por parte da família, da sociedade e do

Estado; devendo este atuar mediante políticas públicas e sociais na promoção e

defesa de seus direitos. (SINASE – Sistema Nacional de Atendimento

Socioeducativo, p. 15).

Page 32: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

Em respeito a esse novo paradigma instituído pelo ECA, foi

que surgiu o SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, um

verdadeiro norte no que concerne à forma de como devem ser executadas as

medidas socioeducativas em todo o território Nacional. Esse valioso instrumento

surgiu orientado a nível nacional pela Constituição Federal e pelo Estatuto da

Criança e do Adolescente e, a nível internacional em atendimento às normativas

das quais o Brasil é signatário, quais sejam, Convenção da ONU sobre os

Direitos da Criança, Sistema Global e Sistema Interamericano dos Direitos

Humanos: Regras Mínimas das Nações Unidas para Administração da Justiça

Juvenil – Regras de Beijing – Regras Mínimas das Nações Unidas para a

proteção dos Jovens Privados de Liberdade.

Ainda acerca da importância do SINASE como instrumento

para a execução da medida socioeducativa, importante transcrever parte do

Discurso proferido no evento de inauguração do Centro Sócio-educativo de

Cariacica (ES), em 12 de maio de 2009, pelo secretário-adjunto da Secretaria

Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH/PR),

Rogério Sottil, trazido pelo Ministério Público em sua manifestação:

(...) O ano de 2006 tornou-se um marco histórico para os

direitos humanos e para a proteção dos direitos dos adolescentes na sociedade

brasileira. Naquele ano, o Governo Federal instituiu o SINASE – Sistema

Nacional de Atendimento Sócio-Educativo. Construção de muitas mãos e

mentes comprometidas, o SINASE significou uma importante transformação no

modo de tratar os direitos dos adolescentes brasileiros que pelos motivos mais

variados se encontram em situação de conflito com a lei. Refletindo o modelo

humanista do Estatuto da Criança e do Adolescente, e inspirado ainda pelos

compromissos assumidos internacionalmente pelo Brasil, o SINASE propõe,

antes de tudo, um novo modo de olhar nossos jovens. Um olhar que tem nos

direitos humanos o centro de sua intervenção. Ao contrário de "menores", eles

Page 33: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

passam a ser devidamente reconhecidos como sujeitos de direito, isto é: como

atores que recriam a realidade e que têm o devido direito de serem ouvidos e de

exigir de todos – Estado e sociedade – respeito, dignidade e participação social

em caráter prioritário. As ações do programa "Medida Certa" incluem, entre

outras iniciativas, a construção, reforma e equipagem das unidades de

internação – substituindo o antigo modelo prisional por um novo arquitetônico

alinhado com o propósito pedagógico da medida sócio-educativa, que jamais

deve ser confundida com uma pena . Prevêem, ainda, a expansão do número

de ações em meio aberto nos municípios a partir de 50 mil habitantes, bem

como apoio às defensorias e redes de defesa legal dos adolescentes, entre

outras iniciativas. Desde 2006, quando o SINASE foi aprovado, 54 unidades de

atendimento sócio-educativas já foram adaptadas aos novos padrões do

sistema, adaptações estas que foram garantidas com recursos do governo

federal da ordem de R$ 70 milhões de reais. Entre estas, 29 são unidades

novas, construídas inteiramente a partir do modelo SINASE.

Com a implantação da Agenda Social, o objetivo é que mais

23 unidades sejam construídas e outras 20 sejam adaptadas até 2010,

implicando um aporte extra de mais 199 milhões de reais do Governo Federal –

um orçamento jamais investido por nosso país nesta área. No total, de 2006 a

2010, 97 edificações próprias para os fins almejados pelo sistema sócio-

educativo, com dignidade e respeito aos jovens, terão sido edificadas. Um

marco para afirmação dos direitos humanos dos adolescentes brasileiros. Nos

últimos três anos, temos realizado frutíferas parcerias com o Espírito Santo, o

que já implicou, ao longo deste período, o repasse de recursos da ordem de R$

6 milhões para o Estado. Temos hoje, aqui no Espírito Santo, 8 municípios com

financiamento para a execução das ações em meio aberto. (...) Em primeiro

lugar, é preciso levar à sociedade a mensagem de que a opção pela medida de

privação de liberdade deve constituir-se uma excepcionalidade, e não a regra

para o tratamento das situações nas quais jovens entram em conflito com a lei.

Page 34: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

Devemos trabalhar, ainda, para que dentro de instalações físicas adequadas,

como esta que inauguramos agora, o processo de sócio-educação efetivamente

se concretize, e para que o princípio da brevidade seja o fundamento do

processo garantidor dos direitos dos adolescentes. Devemos ter sempre a

consciência de que o encarceramento, por si só, traduz apenas o caráter

retributivo, ou vingativo, da pena. Este não é o objetivo de uma medida

sócioeducativa. Medida sócio-educativa, repito, não é e jamais deverá ser

considerada uma pena. A liberdade não se aprende pelo encarceramento.

Assim, a privação desta liberdade, quando imprescindível, deve constituir-se em

pequeno recorte na trajetória do adolescente. Um tempo breve" . "

O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, em

seu art. 3º, preconiza que "A criança e o adolescente gozam de todos os

direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da

proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por

outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o

desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de

liberdade e de dignidade." No art. 5º, assegura que "Nenhuma criança ou

adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação,

exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei

qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais."

No seu art. 15, garante que "A criança e o adolescente têm direito à

liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo

de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais

garantidos na Constituição e nas leis."

O SINASE, ao tratar da incolumidade, integridade física e

segurança, refere que "A figura central na garantia do direito à segurança e

à integridade física e mental do adolescente privado de liberdade é o

Page 35: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

Poder Público, que tem a responsabilidade de adotar todas as medidas

para que de fato tais garantias sejam respeitadas. Esse dever do Poder

Público decorre, também, da própria responsabilidade objetiva do Estado,

isto é, o dever de reparar qualquer dano causado ao adolescente sob sua

custódia.

Incolumidade, integridade física e segurança abrangem

aspectos variados e alguns exemplos podem ser extraídos dos artigos 94

e 124 do ECA, que impõem às entidades garantir aos adolescentes o

direito a instalações físicas em condições adequadas de acessibilidade

(Lei nº 10.098, de 19/12/2000), habitabilidade, higiene, salubridade e

segurança, vestuário e alimentação suficientes e adequadas à faixa etária

dos adolescentes e cuidados médicos, odontológicos, farmacêuticos e

saúde mental." (p. 28).

Traçadas as linhas legais gerais, aqui o recorte que nos

interesssa é no que concerne aos princípios e marcos legais estabelecidos em

nosso ordenamento jurídico para o atendimento socioeducativo, em especial a

forma estabelecida para o cumprimento e execução das medidas

socioeducativas de internação, que nesta comarca são executadas pelo CER –

São Lucas.

Assim, passo a destacar, separadamente as ferramentas

legais para o cumprimento e execução das medidas socioeducativas, e os

respectivos fatos nestes autos apurados:

1.1- Da responsabilidade pela fiscalização pela

Autoridade Judiciária do centro de cumprimento de medidas

socioeducativas;

Page 36: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

Os fatos antes descritos, os que seguirão adiante nesta

decisão e os demais narrados à exordial, não só na esfera penal, devem,

também, obrigatoriamente ser apurados na via administrativa própria e perante

esta unidade jurisdicional, pois, consoante o art. 148 e seu inciso V, do ECA, "A

Justiça da Infância e da Juventude é competente para: (...) V- conhecer de

ações decorrentes de irregularidades em entidades de atendimento,

aplicando as medidas cabíveis;"

Já, o art. 191 e seu parágrafo único, da Lei 8.069/90 dispõe

que:

"O procedimento de apuração de irregularidades em

entidade governamental e não governamental terá início mediante portaria

da autoridade judiciária ou representação do Ministério Público ou

Conselho Tutelar, onde conste, necessariamente, resumo dos fatos.

Parágrafo único. Havendo motivo grave, poderá a

autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar liminarmente o

afastamento provisório do dirigente da entidade, mediante decisão

fundamentada."

Ainda que não fosse a norma legal acima positivada acerca

do dever de fiscalização por parte deste Juízo da Infância e da Juventude,

incumbe ao Magistrado, no exercício do controle difuso da legalidade e da

moralidade dos atos administrativos referentes à Administração Pública, zelar

não só pelo bom nome da instituição, mas, precipuamente, no caso em tela pela

segurança e integridade dos adolescentes internos, pois, a mão do Estado que

tem o dever de assegurar-lhes a integridade, não pode ser a mão que bate,

que barbariza, que tortura e que os submete à condições desumanas.

Page 37: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

Há que se ressaltar que, no cumprimento de uma medida

socioeducativa como a executada no CER – Centro Educacional São Lucas, o

que pode acontecer de mais grave ao adolescente é a restrição de sua

liberdade, ou em outras palavras sua internação que em muito se assemelha à

prisão e, - quase que desnecessário anotar-, por muito óbvio que, nada mais

além disso.

1.2-) Das normas e diretrizes para o atendimento

socioeducativo e das irregularidades encontradas na aplicação e execução

das medidas socioeducativas realizadas pelo CER – São Lucas:

Entidades como o CER – Centro Educacional São Lucas,

segundo o art. 94, do ECA, tem obrigações, como pode se ver:

Art. 94. As entidades que desenvolvem programas de

internação têm as seguintes obrigações, entre outras:

I - observar os direitos e garantias de que são titulares

os adolescentes;

II - não restringir nenhum direito que não tenha sido

objeto de restrição na decisão de internação;

III - oferecer atendimento personalizado, em pequenas

unidades e grupos reduzidos;

IV - preservar a identidade e oferecer ambiente de

respeito e dignidade ao adolescente;

V - diligenciar no sentido do restabelecimento e da

preservação dos vínculos familiares;

VI - comunicar à autoridade judiciária, periodicamente,

os casos em que se mostre inviável ou impossível o reatamento dos

vínculos familiares;

Page 38: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

VII - oferecer instalações físicas em condições

adequadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segurança e os

objetos necessários à higiene pessoal;

VIII - oferecer vestuário e alimentação suficientes e

adequados à faixa etária dos adolescentes atendidos;

IX - oferecer cuidados médicos, psicológicos,

odontológicos e farmacêuticos;

X - propiciar escolarização e profissionalização;

XI - propiciar atividades culturais, esportivas e de lazer;

XII - propiciar assistência religiosa àqueles que

desejarem, de acordo com suas crenças;

XIII - proceder a estudo social e pessoal de cada caso;

XIV - reavaliar periodicamente cada caso, com intervalo

máximo de seis meses, dando ciência dos resultados à autoridade

competente;

XV - informar, periodicamente, o adolescente internado

sobre sua situação processual;

XVI - comunicar às autoridades competentes todos os

casos de adolescentes portadores de moléstias infecto-contagiosas;

XVII - fornecer comprovante de depósito dos pertences

dos adolescentes;

XVIII - manter programas destinados ao apoio e

acompanhamento de egressos;

XIX - providenciar os documentos necessários ao

exercício da cidadania àqueles que não os tiverem;

XX - manter arquivo de anotações onde constem data e

circunstâncias do atendimento, nome do adolescente, seus pais ou

responsável, parentes, endereços, sexo, idade, acompanhamento da sua

Page 39: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

formação, relação de seus pertences e demais dados que possibilitem sua

identificação e a individualização do atendimento.

Já, o art. 124, do ECA, estabelecendo um sistema de

garantias e direitos, assegura que "São direitos do adolescente privado de

liberdade, entre outros, os seguintes:

I- entrevistar-se pessoalmente com o representante

do Ministério Público;

II- peticionar diretamente a qualquer autoridade;

III- avistar-se reservadamente com seu defensor;

IV- ser informado de sua situação processual,

sempre que solicitada;

V- ser tratado com respeito e dignidade;

VI- permanecer internado na mesma localidade ou

naquela mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável;

VII- receber visitas, ao menos, semanalmente;

VIII- corresponder-se com seus familiares e amigos;

IX- ter acesso aos objetos necessários à higiene e

asseio pessoal

X- habitar alojamento em condições adequadas de

higiene e salubridade;

XI- receber escolarização e profissionalização;

XII- realizar atividades culturais, esportivas e de lazer;

XIII- ter acesso aos meios de comunicação social;

XIV- receber assistência religiosa, segundo a sua

crença, e desde que assim o deseje;

XV- manter a posse de seus objetos pessoais e dispor

de local seguro para guardá-los, recebendo comprovante daqueles

porventura depositados em poder da entidade;

Page 40: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

XVI- receber, quando de sua desinternação, os

documentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade."

O SINASE, por sua vez estabelece que "Os programas de

execução de atendimento socioeducativo deverão ser articulados com os

demais serviços e programas que visem atender os direitos dos

adolescentes (saúde, defesa jurídica, trabalho, profissionalização,

escolarização etc). Dessa forma, as políticas sociais básicas, as políticas

de caráter universal, os serviços de assistência social e de proteção

devem estar articulados aos programas de execução das medidas

socioeducativas, visando assegurar aos adolescentes a proteção integral."

Dos autos, no que concerne à realidade encontrada no CER

São Lucas, seja pelo Departamento de Justiça e Cidadania, por este Juízo da

Vara da Infância e da Juventude em conjunto com a Corregedoria-Geral de

Justiça do Estado de Santa Catarina, ou, ainda, pela 28ª subseção local da

OAB/SC, constatou-se uma série de infringências e desrespeito aos

adolescentes lá internos, conforme seguem os trechos abaixo destacados:

Do Relatório Final do Levantamento da Atual Situação

do Centro Educacional Regional de São José (período de maio a

julho/2009) e as respectivas irregularidades na aplicação e execução das

medidas socioeducativas de internação, segundo regras preconizadas

pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pelo SINASE.

Inicialmente ressalto que este Juízo somente obteve acesso

ao relatório acima mencionado, quando após participação de reunião realizada

na sede do DJUC – Departamento de Justiça e Cidadania, teve notícia acerca

Page 41: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

da realização da intervenção, o que ensejou a requisição de cópia, consoante e-

mail encaminhado à f. 22.

De maio a julho de 2009, a Secretaria Executiva da Justiça e

Cidadania, através do DJUC – Departamento de Justiça e Cidadania, cria uma

comissão de intervenção, responsável pela elaboração do Plano de Intervenção

Institucional, que deveria ser o plano norteador das atividades que, da data

acima referida em diante, guiaria as ações positivas para melhora no

atendimento socioeducativo. Ele fora estabelecido, segundo relatório, "Em

razão dos últimos acontecimentos ocorridos no Centro Educacional de

São José, tais como: Relatório do Ministério Público, vistoria do Corpo de

Bombeiros, relatório do CEDCA, mobilização dos funcionários e últimas

notícias divulgadas na mídia, o Diretor do Departamento de Justiça e

Cidadania determinou que fosse criada uma comissão composta por

profissionais da assessoria técnica do departamento, com intuito de

acompanhar a rotina de trabalhos do centro e elaborar relatório apontando

possíveis problemas existentes e levantando possibilidades de melhoria

nos diversos setores da instituição." (fl. 23v.).

Após realizados os trabalhos, fora elaborado relatório

contendo diversas irregularidades, abaixo transcritas.

"A comissão questionou se há divisão entre os

adolescentes com internamento provisório dos adolescentes com medida

socioeducativa de internação. A gerente respondeu que já existiu, mas que

atualmente estão todos misturados pelos níveis, não existindo separação.

Também relatou que foi extinto o nível chamado triagem, local onde os

adolescentes ficavam somente nos quartos durante o cumprimento da

medida. (...) Verificou-se que o nível II possui as mesmas características

Page 42: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

daquele chamado anteriormente de triagem, demonstrando certa

contradição na fala da gerente." (fl. 24).

"Um dos pontos de maior destaque foi a inexistência do

sigilo das informações que os profissionais registram no prontuário do

adolescente. De acordo com a equipe técnica, todos tem acesso a tal

documento, em virtude do mesmo não estar em local adequado e seguro."

(f. 24, v.).

"Houve participação de alguns técnicos na construção

do Regimento Interno, mas no que se refere às medidas disciplinares,

tanto equipe técnica como gerência encontraram muita resistência por

parte da monitoria, o que ocasionou um recuo nas discussões sobre o

tema temporariamente, deixando este tópico em aberto." (f. 24, verso).

"O grupo ouvido apresentou consenso no que diz

respeito à precariedade da construção e infra-estrutura do CER São Lucas,

como também afirmou ser frágil e deficitária a segurança interna e

externa." (f. 25).

"(...) entretanto ressaltaram qualidades da atual

gerência, como o fato de atualmente a instituição estar mais limpa e

organizada, e que a gerente é "muito esforçada e comprometida".

Comentaram, ainda, que a mesma até pode estar bem intencionada, mas

que pode não estar conseguindo um resultado por questões maiores.

Houve um comentário afirmando que "a realidade do CER está mudando e

a estrutura não está acompanhando esta mudança." (f. 25).

Page 43: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

"Os monitores apresentaram descrédito, no primeiro

momento em relação à proposta de trabalho que foi apresentada,

demonstrando falta de credibilidade em ações que possam ser

desenvolvidas com o intuito de melhorar as relações de trabalho dentro do

Centro. (...) Outra fala que revelou consenso no grupo, foi que a monitoria

não existe para a Segurança Pública, pois acreditam que a Segurança

Pública considera somente os agentes prisionais como categoria, visto

que não tem acesso ao curso oferecido pela Secretaria Nacional de

Segurança Pública – SENASP; já solicitaram junto ao setor de capacitação

e até o presente momento não obtiveram nenhuma resposta. (f. 25, v.).

"Em relação aos encaminhamentos médicos e controle

de medicamentos dos adolescentes, responderam que isto é de

responsabilidade do setor de enfermagem e que é feito conforme

necessidade. Entretanto, não existe nenhum cuidado em relação às

doenças infecto-contagiosas. Também relataram a falta de materiais de

segurança e proteção, como luvas descartáveis." (f. 26).

"No que diz respeito às medidas de segurança

preventiva, respondera, que não existem regras pré-definidas de

segurança preventiva e nem padronização de procedimentos, bem como, o

espaço físico apresenta-se vulnerável, com telhas quebradas, furos nos

muros, falta de extintores de incêndio." (f. 26).

"Estes profissionais foram unânimes em afirmar que os

adolescentes apresentam 100% de freqüência escolar. Acreditam que esta

dedicação está diretamente relacionada à oportunidade de troca de níveis,

condicionada também ao bom desempenho escolar e a possibilidade de

estar num espaço diferente do seu nível.

Page 44: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

Uma professora elogiou a parceria estabelecida com os

pedagogos e assistentes sociais do CER, afirmando que estes estão

sempre em contato com as professoras e que estas, muitas vezes,

identificam as necessidades de atendimento para estes setores e são

prontamente ouvidas em sua solicitação."

"(...) As professoras ministram as aulas sozinhas com os

adolescentes. A monitoria permanece na parte de fora, interferindo

somente quando solicitada. Com a gerência relatam ter um bom

relacionamento e apoio na execução de seu trabalho."

(...) "As professoras sentem-se satisfeitas com os

resultados de seu trabalho quanto à alfabetização e evolução dos

adolescentes no contexto escolar." (f. 27).

"No tocante ao comportamento dos adolescentes em

sala de aula afirmaram que nunca foram desrespeitadas pelos

adolescentes, e que eles estabelecem relação de respeito e identificação

com elas. Sentem-se seguras em seu local de trabalho." (f.27, v.).

"A comissão de intervenção iniciou seus trabalhos com

o nivel II, que conta atualmente com catorze adolescentes internos e de

acordo com a orientação da monitoria do nível, dividiu-se o grupo de

adolescentes para a entrevista, em dois momentos distintos. (...) Este nível

apresenta características de triagem (alojamento onde os adolescentes

ficam a maior parte do tempo trancados nos quartos), devido à dinâmica

estabelecida com os adolescentes.

"(...) Os adolescentes afirmaram que estão cumprindo a

medida neste nível porque retornaram de fuga, ou por "castigo".

Acreditam ser este o critério para permanecerem fechados nos quartos a

maior parte do tempo. Saem apenas para freqüentar as aulas e fazer

Page 45: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

higiene pessoal, inclusive as refeições são feitas nos quartos. Afirmaram

ainda que não tem direito a banho de sol. Relatam que, no retorno da fuga,

ficam quinze dias sem receber visita dos familiares, também como forma

de punição."

"(...) Sentem-se "abandonados" no nível, dizem que as

vezes solicitam falar com a gerência e que esta também não os atende.

Percebemos que este nível, apesar de ter mudado de

nomenclatura, continua funcionando como triagem, onde os adolescentes

permanecem em um sistema de contenção, ou por faltas disciplinares que

cometeram nos níveis em que estavam, ou por retorno de fuga, podendo

ainda ser aplicada como período inicial na instituição, onde permanecem

em "observação"." (f. 27 v.).

"Com relação à monitoria, os adolescentes comentaram

que existem monitores "tranqüilos", mas que a maioria é rude na forma de

tratamento. Alegam que não é freqüente, mas já viram adolescentes serem

agredidos por monitores. Os adolescentes deste nível reclamaram que não

tem direito a banho de sol, e aproveitaram a visita da comissão para

solicitar ajuda nesse sentido. (fls. 27v. e 28).

Um adolescente comentou que seu advogado foi visitá-

lo e que foi impedido de entrar, e a maioria afirmou não ter conhecimento a

respeito de seu processo." (f.28).

"Quanto às medidas disciplinares, os adolescentes,

cumprem medida de quarto onde permanecem fechados por alguns dias."

(f.28).

"Com relação à estrutura física foram constatadas

muitas situações emergentes. O centro apresenta problemas com o

tratamento de esgoto, em alguns níveis a fossa séptica estava

Page 46: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

transbordando apresentando mau cheiro, assim como muitos banheiros

do CER apresentavam entupimentos. (...) A iluminação das salas de aula,

inclusive a sala de aula do nível II, é insatisfatória para a escolarização. As

instalações elétricas estão em péssimo estado, com fiações

desencapadas, e alguns equipamentos dos adolescentes (TV e DVD) sem

o plug, sendo acoplados todos no mesmo "T". Em alguns quartos, além

desta sobrecarga foram verificados vazamentos de água por baixo da

porta de ferro, sendo um fator de risco para a ocorrência de curto circuito

e descarga elétrica, tanto para os adolescentes como para os monitores.

(...) No nível agrícola, o mato está muito alto, comprometendo a segurança,

visto que a maioria dos adolescentes da instituição se evadem através

deste local. (...) Na cozinha(...) também foram identificadas instalações

elétricas irregulares. (f.29).

"Em relação à distribuição dos adolescentes no Centro,

constatou-se que não existe separação física entre CIP e CER, sendo que

os adolescentes estavam cumprindo internação provisória junto com os

adolescentes em medida de internação. Observou-se também que vários

adolescentes dividem quartos, sem estrutura para tanto, não por questão

de superlotação e sim porque existem quartos desativados que

apresentam problemas das mais variadas ordens." (f. 29).

"Os adolescentes do Nível II passam a maior parte do

tempo fechados nos quartos, sendo que alguns adolescentes permanecem

neste nível por trinta dias ou mais, com os horários de banho de sol

desrespeitado e em condições insalubres. Os adolescentes estão

desanimados, insatisfeitos e sem motivação, sentindo-se "abandonados"

e sem assistência." (f. 29).

Page 47: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

"Durante o período de execução do trabalho não foi

presenciada nenhuma agressão aos adolescentes, entretanto os mesmos

deixaram transparecer que esta prática existe na instituição." (f. 29v.).

"Também foi possível observar incoerências na

aplicação das medidas disciplinares. Embora exista um documento

regulador das medidas disciplinares, este não é claro e nem utilizado na

prática. Na maioria das vezes, os monitores aplicam as medidas e

registram no relatório do nível.

(...) Quanto às faltas disciplinares aplicadas aos

adolescentes, o Regimento Interno afirma que Não haverá falta nem

sanção disciplinar sem expressa e anterior previsão legal ou regulamentar.

Estas regras e normas, que deveriam regular a aplicação das medidas

disciplinares, não estão claras e bem definidas, tanto os monitores como

os adolescentes não tem conhecimento. A monitoria alega que as regras

são variáveis conforme a situação e, principalmente, o adolescente

envolvido. Com relação a este aspecto ainda, o regime coloca que São

vedadas sanções que impliquem em tratamento cruel, desumano e

degradante. Constatou-se adolescentes no nível II permanecendo a maior

parte do dia trancados, inclusive com as refeições feitas dentro dos

quartos. Os adolescentes deste nível afirmam não ter horário de banho de

sol respeitado e poucos atendimentos técnicos, o que sugere tratamento

desumano." (f. 30 v.).

"(...) Quanto à sanção por falta disciplinar, a duração de

sessenta dias, ou mesmo trinta dias de quarto, constitui-se punição

exagerada e nada pedagógica." (f. 30 v.).

"Constatou-se que alguns direitos não estão sendo

respeitados, tais como:

Page 48: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

- A realização de atividades culturais, de lazer, e o

acesso a cursos profissionalizantes;

- -controle sobre os pertences dos adolescentes,

principalmente sobre objetos perfuro-cortantes,

ameaçando a segurança dos internos e dos

profissionais que os assistem;

- orientação sistemática sobre a situação processual e

acompanhamento do processo pelo advogado da

instituição;

- poucos atendimentos técnicos (psicologia e serviço

social);

- atendimento odontológico precário por falta de

materiais e apenas um profissional da área na

Instituição o qual, atualmente, está afastado para

tratamento de saúde.

A situação do adolescente em conflito com a lei não

restringe a aplicação do princípio constitucional de prioridade absoluta, de

modo que compete ao Estado, à sociedade e à família dedicar a máxima

atenção e cuidado a esse público, assim, todos os direitos garantidos pelo

ECA, ou seja, o direito à vida e à saúde, à liberdade, ao respeito e à

dignidade, à convivência familiar e comunitária." (fls. 31 e 31 v.).

"3.9.8- Uso da força física:

Em relação a este quesito, somente 10% dos cinqüenta e

três monitores responderam que existem situações de maus tratos, sendo

que 35% responderam que utilizam a força física somente quando

necessário. Entretanto dos onze integrantes da equipe técnica 38%

responderam que existem situações de maus tratos e 30% que

desconhecem. 100% da equipe técnica respondeu que existem

Page 49: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

adolescentes ameaçados em sua integridade física ou psicológica de

forma geral." (f.33).

"O CER São Lucas apresenta uma estrutura física

arcaica e deficiente, sofrendo ao longo do tempo algumas reformas e

modificações para ampliação do número de vagas. (...) A construção

permanece como foi idealizada na década de 70, quando era constituído

de duas unidades ( São Lucas e São Mhateus), os quais tinham como

objetivo abrigar crianças e adolescentes considerados em "situação

irregular". O sistema de esgoto permanece por longos períodos entupidos,

causando mau cheiro nos níveis e nos patios. As instalações elétricas

estão deterioradas, com fiações aparentes e iluminações inadequadas.

Existe uma sobrecarga de energia, devido à utilização de aparelhos de

som, tv, ventiladores, entre outros, utilizados nos quartos pelos

adolescentes internos. (...) Os equipamentos do Centro, tais como:

veículos, computadores e impressoras são antigos e insuficientes,

encontrando-se em estado precário." (f. 33 v.).

"O nivel II é intitulado por todo corpo funcional e

adolescente, como o nível do "castigo", onde os adolescentes

permanecem nos quartos praticamente 24hs, tendo como única atividade a

escolarização." (f. 33v.)

"Alguns adolescentes fizeram alusão ao abuso de poder

e maus tratos que recebem por parte de alguns monitores. Geralmente,

estas agressões são veladas e o segredo se instala, pois temem sofrerem

retaliações. O uso da violência, tanto física como psicológica denuncia a

ausência de política de inclusão social dos adolescentes em cumprimento

de medidas socioeducativas de privação de liberdade. Foram várias as

Page 50: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

reclamações da falta de sigilo com relação aos registros referentes à

evolução da medida socioeducativa dos internos." (f. 34v.).

"Refletindo acerca da dinâmica institucional observada

no Centro Educacional de São José neste período, utilizando como

norteadores do nosso trabalho o Estatuto e o SINASE, a comissão de

intervenção concluiu que este Centro, através de seu corpo funcional,

necessita rever muitas de suas práticas pedagógicas, bem como receber

investimento de várias ordens." (f. 34v.)

DA ATA DA REUNIÃO COM EQUIPE TÉCNICA DO

CENTRO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ (SÃO LUCAS) realizada dia

24/03/2010, colhe-se:

"Após desabafo, o Sr. Itamar explicou que o DEJUC tem

a intenção de efetivar uma ação de reestruturação do Cer. São Lucas de

acordo com as normativas do Sinase e atender às recomendações do

relatório elaborado pela assessoria técnica após supervisão no Cer.,

dentre elas: a saída da atual gerente, atendimento psicológico para os

monitores, curso de relacionamento interpessoal para todos os

funcionários, a criação de coordenações técnica,

administrativa/operacional e de monitoria, além de implantação e

implementação do Sipia/Sinase." (f. 48v.).

"Quanto às faltas administrativas, o Sr. Itamar falou que

serão instauradas sindicâncias e os problemas estruturais da unidade

serão resolvidos pelo diretor em conjunto com o Sr. Muller com o intuito

de promover algumas melhorias possíveis no prédio do atual Cer. São

Lucas." (f. 49).

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DO RELATÓRIO TÉCNICO DO CENTRO EDUCACIONAL

REGIONAL SÃO LUCAS/ SÃO JOSÉ elaborado pela equipe de transição

nomeada pelo DJUC – Departamento de Justiça e Cidadania referente ao

período de 05 a 13 de abril de 2010-06-09, colhe-se:

"O setor de enfermaria possui remédios em prateleiras

sem chave, contendo somente relaxante muscular e antiinflamatório. São

responsáveis por este setor dois profissionais técnicos de enfermagem

efetivos. O serviço odontológico encontra-se inexistente. Não obtivemos

informações precisas acerca do profissional e o consultório odontológico

foi fechado pela vigilância sanitária." (f. 54).

"Os professores apresentam dificuldades de reprodução

do material para os adolescentes. O material didático é escasso limitando-

se apenas a utilização do quadro negro e giz." (f.54).

"A iluminação da quadra é insuficiente. As redes estão

rasgadas. Existe somente uma bola de futebol de salão, uma de voleibol e

três de basquete. Não existe rede para jogar voleibol. A pintura da quadra

está apagada. Os vestiários encontram-se um sem condições de uso e o

outro serve como depósito para guardar os materiais de educação física."

(f54).

"Identificaram-se várias salas onde funcionava as

atividades pedagógicas e profissionalizantes abandonadas e ou sendo

utilizadas como nível sem condições para tal." (f.55)

Page 52: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

"Encontramos três alas inutilizadas, duas por falta de

condições físicas denominadas ultimamente como "agrícola" e "nível I" e

uma inacabada, necessitando somente de acabamento para utilização."

(f.55).

"Nível III: (...) Todos cumpriam medida coletiva de doze

dias de quarto, por tentativa de evasão coletiva, determinada pelos

agentes de plantão do dia." (f. 56).

"Nivel III: (...) Nesse período do cumprimento da medida

de quarto os adolescentes não estavam freqüentando as aulas, como

também não estavam recebendo visitas de seus familiares, por

determinação dos agentes de segurança socioeducativos de plantão, no

dia em que foi dada a medida." (f. 56).

"Nivel VI: Nesse nível não existia quarto individual,

somente um coletivo com capacidade para oito adolescentes sendo que

no momento da visita atendia seis adolescentes, pois um dos beliches

estava quebrado." (f.56).

"Nível II: (...) O nível apresentava corredores e quartos

sujos, com pintura deteriorada, paredes internas riscadas com buracos,

banheiros e ralos do chuveiro entupidos. O mau cheiro predominava o

ambiente. Nos corredores estavam espalhados os pertences dos

adolescentes que haviam se evadido." (f.57).

"Nível IV: (...) Apresentava problemas quanto à

iluminação interna, dois quartos, um dos corredores estavam inutilizados

com buracos e vasos sanitários entupidos e com vazamentos.

Encontramos um quarto onde havia três colchões, onde havia sido

permitido, pelo plantão anterior, que dois adolescentes permanecessem

Page 53: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

juntos sem justificativa. Os adolescentes reclamavam que não tem direito

ao pátio. A rouparia dos adolescentes que se evadiram estavam no

corredor. (...) Existiam somente dois chuveiros. Ao questionar-se o porquê

de não estar ligado na tomada, informou-se que os chuveiros não

possuem resistência, assim como nos outros níveis." (f. 57).

"Nivel V: O espaço que deveria ser considerado de

convivência protetiva, que no linguajar institucional é chamado de

"seguro", atendia quinze adolescentes divididos em três corredores de

cinco quartos.

"Nivel V:Observou-se quatro adolescentes tomando

banho de sol no campo, sem manutenção, agrupados em pares utilizando

algemas e marca passo. " (f. 58)

"Nivel V:Os adolescentes desse nível não estavam

recebendo atendimento pela equipe técnica aproximadamente dois meses.

Os agentes de plantão alegaram falta de segurança para o deslocamento

dos adolescentes até as salas técnicas." (f.58).

"Nivel V:Os adolescentes fazem as refeições no nível,

com a utilização de colheres de plástico." (f.58).

"Nivel V:Apresentava três adolescentes que

permanecem período integral nos quartos." (f.58).

"Nivel V: A escolarização é realizada no nível sendo que

naquela semana os adolescentes não estavam tendo aula, os agentes de

plantão não conseguiram explicar o porquê." (f.58).

Page 54: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

"Nivel V: No segundo dia após as evasões dos

adolescentes, solicitou-se os pertences dos adolescentes evadidos e os

agentes de segurança socioeducativo de plantão daqueles níveis,

disseram não saber o destino que se deu aos pertences." (f.58).

"Identificou-se um Centro Educacional com estruturas

precárias e apresentando condições desumanas habitacionais e

problemas de gestão. Com profissionais demonstrando baixa auto estima

e dificuldade de definição e execução de seus papéis." (f.58)

"Em contradição ao art. 123 da Lei federal 8069/90, os

adolescentes eram divididos nos níveis sem critérios definidos, salvo

critérios definidos pela gerência." (f.59)

"Encontrou-se agentes de segurança socioeducativa em

grande maioria resistente à mudança, com atitudes carcerárias e

violadoras de direitos." (f. 59).

"Percebeu-se ainda dificuldade de relacionamento, de

entendimento da legislação, discordância de posturas entre os agentes,

falta de comprometimento com o trabalho, apresentando fragilidades em

lidar com algumas situações problemas, vivenciadas com os internos,

sendo que o destaque era a preocupação com a segurança, deles, não dos

adolescentes.""(f.59).

"O centro possui carência dos mais diversos materiais.

De ordem de expediente, de limpeza, de enfermagem e de patrimônio." (f.

59).

"Refletindo acerca da prática adotada no centro,

identificamos que a escolarização é muito precária e pouco atraente aos

Page 55: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

olhos dos adolescentes, que pelas próprias características da idade,

exigem maior investimento de recurso, audiovisual e de professores com

capacidade para atenderem a demanda, além de moldar o conteúdo de

acordo com a faixa etária, realidade e interesse, extraído do aluno

observando o que ele tem de conhecimento, ouvindo-o e levando-o a

novas descobertas, fortalecendo e aumentando suas possibilidades de

escolhas. (f.60)

"Portanto, percebeu-se que o Centro Educacional São

Lucas, hoje, caracteriza-se simplesmente como centro de contenção, e

que diverge em aspectos físicos e pedagógicos do relatório de

intervenção, realizado." (f. 60)

DO RELATÓRIO DE INSPEÇÃO REALIZADA em

22/04/201, PELA CORREGEDORIA-GERAL DE JUSTIÇA,

COORDENADORIA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE E VARA DA INFÊNCIA

E DA JUVENTUDE DA COMARCA DE SÃO JOSÉ colhe-se:

"Em visita ao estabelecimento, verificou-se que as alas

são distribuídas em 06 níveis, separados com corredores com sete (07)

celas, onde os adolescentes são recolhidos em dupla, 14 por corredor,

com efetivo todos masculino de 65 adolescentes, sendo que estes

permanecem absolutamente reclusos e ociosos, com permissão de saída

para um banho por dia e banho de sol de alguns minutos, a refeição é

fornecida na própria cela." (f. 71).

"Nos níveis três (03) a cinco (05) encontram-se os

adolescentes que estão em regime fechado, sem permissão de sair de

suas celas, por medida administrativa, ou seja, não determinação judicial

que justifique a reclusão. Há neste nível adolescentes que estão há um

Page 56: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

ano nesse sistema e o contato é restrito ao companheiro de quarto e

eventualmente com os demais do mesmo corredor." (f.71)

"Havia, no nível 05, seis (06) adolescentes que estavam

na ala de isolamento denominada "seguro", sendo quatro provenientes da

comarca da Capital, 01 de Blumenau e 01 de Criciúma, em cela de 02

metros quadrados, totalmente isolados. Um adolescente relatou ao MM

Juiz Coordenador que sofrera agressões físicas praticadas por monitores

da instituição, mostrando as marcas na face e nas costas, conforme

fotografia em anexo." (f.71)

"São mais de sessenta adolescentes, entre 14 e 20 anos,

completamente reclusos, ociosos, pois não existe curso profissionalizante

e outras atividades pedagógicas." (f.71). "Indagado, o administrador

substituto (o nomeado não se encontrava no local) informou que os

menores recebem aulas regulamentares dentro do Centro. Apesar disso,

constatou-se que a sala destinada as aulas não apresentava sinais de

estar em funcionamento, pois as cadeiras estavam recuadas e não havia

cartaz ou outro sinal indicativo que estivesse em funcionamento." (f.72)

"De acordo com o relato dos adolescentes e a conclusão

da equipe técnica de intervenção (doc. em anexo), constatou-se que os

menores estão expostos a todo tipo de agressão moral, psicológica e até

mesmo física. Segundo relataram os adolescentes, são maltratados e

desrespeitados pelos monitores e alguns deles praticam agressões

físicas."(f.72)

"Foi informado que os adolescentes são atendidos por

médico de acordo com a necessidade. Não há atendimento odontológico.

Foi encontrado na cela do "seguro" no nível V, um adolescente que se

identificou como J.ªS, que estava com o braço quebrado. Este informou

que sofreu agressão física no PLIAT, e estava naquele nível há mais de 30

Page 57: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

dias, sem tratamento médico, pois tem crises de convulsão, é viciado em

crack e está em abstinência." (f.72)

"O estabelecimento não possui setor jurídico, tampouco

advogado." (f.73)

"A administração confecciona apenas o relatório da

situação do adolescente. Os adolescentes reclamaram que não são

informados a respeito dos seus processos e da medida a cumprir.

Verificou-se que não há controle efetivo da medida. O pedido mais

solicitado pelos adolescentes consiste em serem informados por quanto

tempo deverão permanecer internados"(f.73)

"Verificou-se que o espaço físico externo está exposto a

total abandono (o campo de futebol está desativado, assim como a horta),

e a falta de segurança impede a utilização pelos adolescentes para a

prática de esportes, oficinas de trabalho, cultivo em horta e outros ofícios

de conotação socioeducativa, como prevê a medida de internação. (f.73).

" Da mesma forma, as dependências internas são

insalubres, devido ao péssimo estado de conservação em termos de

edificação, saneamento básico, distribuição de espaço. O banheiro

coletivo apresenta-se em péssimo estado de conservação, além da falta de

higiene: havia papel higiênico usado espalhado pelo chão; o vaso

sanitário estava sujo, apresentando total falta de higiene." (f.74)

"No interior das celas constatamos a existência de duas

garrafas pet com água, uma aparentava estar com urina, conforme

fotografia anexo." (f.74)

"Nos corredores das celas foram verificados

vazamentos de água por baixo da porta de ferro." (f.74)

"O sistema de atendimento verificado é sem dúvida

muito mais duro que o aplicado em penitenciárias de adultos." (f.74)

Page 58: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

"Outro agravante é que em razão da natureza

estressante da atividade e a ausência de formação e de capacitação

profissional, na maioria das vezes, os monitores agem com violência, seja

física ou moral, já que o espaço físico apresenta-se vulnerável a evasões e

entradas de pessoas estranhas para resgate de adolescentes, conforme

relatado pelos monitores." (f. 74)

"A soma desses fatores impossibilita a perspectiva de

ressocialização ou cura dos internos, o internamento do modelo atual

produzirá efeito contrário, ou seja, os adolescentes retornarão à sociedade

totalmente desprovidos de princípios de cidadania, somando-se àqueles

que vivem na marginalidade e, como resposta, cometendo delitos de

proporções mais sérias e agressivas." (f.74).

"Por fim, observamos que as condições de atendimento

neste Centro Educacional ferem todos os princípios da Lei dos Direitos

Humanos e do preconizado no Estatuto da Criança e do Adolescente,

conforme retratam as fotografias em anexo." (f.74)

DO RELATÓRIO DE INSPEÇÃO REALIZADA em

28/04/2010, PELA 28ª SUBSEÇÃO DA OAB/SC DA COMARCA DE SÃO

JOSÉ colhe-se:

"A precariedade e insalubridade de todo o complexo

estavam desnudas para quem quisesse contemplar. São péssimas as

condições: elétricas, sanitárias, ventilação, iluminação natural,

físicas/construção, bem como todo espaço aberto (terreno)." (f.165).

"Acrescenta-se que o espaço físico está quase

cinqüenta por cento subutilizado, comprimindo todos os internos, que

frisa-se, não estão separados por qualquer forma de seleção (idade,

Page 59: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

periculosidade, porte físico, etc), o que afronta o art. 123 do Estatuto da

Criança e do Adolescente." (f. 165)

" Não há atividades profissionalizantes, artesanais,

culturais, esportivas, etc... Nesse diapasão, pergunta-se então: como

ressocializar estes internos?? Discorrendo... Há sala de informática,

entretanto não presenciamos seu uiso. Levando-se em consideração a

aparência da sala, dificilmente pode-se acreditar na utilização diária da

mesma. Há sala de aula, contudo não vimos nenhum aluno! Há espaço

para exploração agrícola, de criação de pequenos animais e até açude,

porém o que se viu foi muita sujeira, lixo e alto mato...Enfim o

encarceramento visto, não é somente físico, há o ENCARCEIRAMENTO

PSÍQUICO..." (f. 166).

" As aberrações constatadas no Centro de Internação

Provisória São Lucas – in loco – além de afrontar a dignidade humana

daqueles adolescentes lá internados pelo Estado, tornou-se ao mesmo

tempo – bis in idem – uma penúria aos seus familiares e amigos, quiçá a

comunidade em geral. Antecipamo-nos a dizer, que diante de amplos

gravames daquele Centro, torna-se cristalina a iminente inadequação, em

todos os sentidos! A precariedade e o ultraje imposto aos direitos

humanos daqueles que deveriam cumprir medidas sócio-educativas, nos

convidam a no mínimo, um gesto de soidariedade, quer seja em busca de

sensibilizar os governos federal e estadual, em possível consórcio com a

municipalidade, para plantarmos soluções aos desafios urgentes dos

quais reflitam transformações de ações e políticas públicas já assegurada

em Lei e na plena vihgência do Direiro; ou mesmo, em parcerias junto ao

Ministério Público e demais órgãos competentes para o exercício da

matéria...." (f. 167).

Page 60: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

"Em apertada síntese, constatou-se que o CIP São Lucas

sofre de graves e antigos problemas, tanto de ordem material, como

pessoal, representada não apenas pelas péssimas condições físicas em

que se encontra o prédio, como também, a falta de condições de higiene e

segurança a todos que ali se encontram, internos ou a trabalho, além da

própria vizinhança e o absurdo caos administrativo existente, fruto da

crise gerencial, que vai desde a ausência de secretaria razoavelmente

equipada e municiada de informações em seus arquivos, os desvios de

função dos servidores e a falta de capacitação do pessoal.

Vale destacar, inclusuive, que o ceário retratado reúne

motivos suficientes até mesmo para justificar a sua desativação para o

bem do serviço público, haja vista que não deveria continuar funcionando

nas precárias condições em que se encontra." (f.163)

A situação fática acima recortada da realidade do CER São

Lucas, situado nesta comarca de São José, demontram de forma cristalina o

desrespeito flagrante aos direitos e garantias conferidas aos adolescentes nos

artigos 3º, 5º, 94, seus incisos e parágrafos, 99, 100, 113, 123, 124, seus

incisos e parágrafos, 125, do Estatuto da Criança e Adolescente, bem como das

preconizações do SINASE, estipuladas para o cumprimento e execução das

medidas socioeducativas de internação., não restando outro caminho, senão

sua interdição total, podendo a mesma ser levantada, quando atendidas em sua

integralidade aos disposto no ECA e no SINASE.

3-) Da ausência no CER São Lucas do Quadro de

Pessoal exigido pelo SINASE para entidade de atendimento

socioeducativo de internação.

Page 61: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

Segundo o SINASE (p.45), para atendimento de medida

socioeducativa de internação, de até quarenta adolescentes, a equipe mínima

deve ser composta por:

- 01 Diretor

- 01 coordenador técnico (inexistente no CER São Lucas)

- 02 assistentes sociais

- 02 psicólogos (No CER São Lucas há apenas 01)

- 01 pedagogo

- 01 advogado para a defesa técnica (inexistente

atualmente no CER São Lucas, porque indevidamente

deslocado para outro órgão do Governo Estadual)

- Demais profissionais necessários para o

desenvolvimento de saúde, escolarização, esporte,

cultura, lazer, profissionalização e administração (quase

todos inexistentes no CER São Lucas)

- Socioeducadores ( no CER São Lucas não existem

socioeducadores com formação própria para o atendimento socioeducativo,

mas, sim, agentes de Segurança Socioeducativa (os Monitores), indevidamente

capacitados pela Acadepol – Academia de Polícia e, mesmo assim em número

insuficiente para o devido atendimento socioeducativo, pois, segundo o SINASE

(p.45), as atribuições dos socioeducadores deverão considerar o

profissional que desenvolva tanto tarefas relativas à preservação da

integridade física e psicológica dos adolescentes e dos funcionários

quanto às atividades pedagógicas. Este enfoque indica a necessidade da

presença de profissionais para o desenvolvimento de atividades

pedagógicas e profissionalizantes específicas.

A relação numérica de socioeducadores deverá

considerar a dinâmica institucional e os diferentes eventos internos, entre

Page 62: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

eles férias, licenças e afastamento dos socioeducadores,

encaminhamentos de adolescentes para atendimentos técnicos dentro e

fora dos programas socioeducativos, visitas de familiares, audiências

encaminhamentos para atendimento de saúde dentro e fora dos

programas, atividades externas dos adolescentes.(p.45). Dando seqüência

ao texto acima, o SINASE prescreve a relação numérica acerca de qual

necessidade de socioeducador/adolescente.

4-) Da funções atribuídas ao Gestor do centro de

cumprimento das medidas socioeducativas e do perfil do novo gestor

nomeado

No que se refere à Gestão dos Programas, no SINASE, o

conceito adotado é o da gestão participativa, que demanda autonomia

competente e participação consciente e implicada de todos atores que

integram a execução do atendimento socioeducativo. Está diretamente

associada ao compartilhamento de responsabilidades, mediante

compromisso coletivo com os resultados.

Independentemente do formato da estrutura

organizacional de cada Estado e Município, é fundamental a configuração

de uma organização que contemple a existência de um dirigente geral ou

responsável legal pela instituição, uma equipe diretiva e um corpo de

diretores e/ou coordenadores dos programas de atendimento

socioeducativo.

(...) O impacto social de seus serviços será maior ou

menor conforme a capacidade de planejar com eficiência, de definir sua

missão com clareza, de formatar seus serviços atendendo adequadamente

a necessidade de seus destinatários (os adolescentes)." (SINASE, p. 40).

Page 63: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

Ainda, segundo o SINASE, os Diretores de Unidades e/ou

programas de atendimento socioeducativo são os líderes das entidades e/ou

programas de atendimento socioeducativo e membros integrantes ao

Grupo Gestor; atores e articuladores da gestão democrática, participativa

e humanizadora do projeto pedagógico e do processo de reorientação e

transformação da instituição. Buscam apoio nos documentos orientadores

e normativos do sistema nacional/distrital e municipal, de forma a

concretizar as metas gerenciais.(p.41).

Não se pode esquecer, que o fim de uma entidade de

atendimento socioeducativo é a efetivação e concretização, dos direitos e

deveres preconizados pela Constituição Federal, pelo ECA e pelo SINASE à

clientela adolescente. Aliás, segundo o SINASE, na gestão participativa o

objetivo superior a ser alcançado é a comunidade sócioeducativa. Esta é

composta pelos profissionais e adolescentes das Unidades e/ou

programas de atendimento socioeducativo, opera, com transversalidade,

todas as operações de deliberação, planejamento, execução,

monitoramento, avaliação e redirecionamento das ações, que devem ser

compartilhadas, rotativas, solidárias, tendo como principal destinatário o

coletivo em questão, contemplando as peculiaridades e singularidades

dos participantes." (p. 41)

Registro aqui todo o descaso da Secretaria de Segurança

Pública, através da Diretoria de Justiça e Cidadania com este Juízo da Infância

e da Juventude e Ministério Público da comarca de São José, que,

flagrantemente deixaram de cumprir palavra firmada no que se refere à

mudança de gestão ocorrida, conforme colhe-se da ata da reunião realizada em

29/03/2010:

Page 64: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

"O objetivo da reunião foi discutir a situação de crise no

Cer São lucas com a saída da atual gerente, Sra. Margarete Sandrini e a

proposta de uma equipe de transição assumir temporariamente a Gerência

da unidade enquanto não se obtiver o nome de uma pessoa, em definitivo,

para gerenciar o Cer São Lucas." (f. 50).

" Será conversado com todos os adolescentes e

funcionários do Cer e será proposta uma capacitação (reciclagem) sobre

novo entendimento que precisa ter sobre o trabalho no Cer São Lucas."

(...) Enquanto não se define a nova Gerência do Cer São Lucas, a

assessora técnica do DJUC precisará entrar na unidade para explicar essa

situação de transição e identificar possíveis colaboradores para assumir

as coordenadorias." (f. 50).

"Com a chegada da Juíza e Promotora da Comarca de

São José, o Sr. Itamar fez uma apresentação da assessoria técnica e um

breve resumo sobre as dificuldades em relação ao Cer São Lucas

(descontentamento, fugas, maus-tratos, conflitos). Afirmou que as

questões administrativas estarão sendo resolvidas por meio de

sindicância e as demais questões técnicas serão resolvidas com base nas

recomendações feitas no relatório de supervisão, trabalho este realizado

pela assessoria técnica do DEJUC dentro do CER São Lucas. Uma das

recomendações trata da substituição da atual gerente do CER. Já foi

conversado com a Sra. Margarete e ela concordou em deixar a Gerência do

CER São Lucas e em contrapartida assumirá a Gerência de Proteção ao

Adolescente do DEJUC. O relatório de supervisão, também, propôs uma

nova organização de gestão, mais participativa e não centralizada, onde

além do gerente contará com três coordenadorias

(técnica/administrativa/operacional e de monitoria). O curso de

capacitação e reciclagem dos funcionários também foi abordado, pois é

Page 65: Stca interdicao sao_lucas_10_de_junho_de_2010

necessário um trabalho para melhorar o clima e o relacionamento

interpessoal dentro da unidade. O Sr. Itamar explanou sobre as possíveis

pessoas a assumirem o cargo de Gerência do CER. Explicou que há

grande rejeição quanto à Sra. Augusta por parte dos monitores e da

equipe técnica do CER. O Sr. Venício, também cogitado, não tem apoio da

direção do Departamento, e do Secretário de Justiça e Cidadania, pois

assim como o Sr. Sandro do Pliat, são conhecidos como "torturadores". A

Promotora lembra que existem filmagens de tortura contra adolescentes e

o Sr. Itamar afirmou que foram instauradas sindicâncias, mas que não

resultaram em nada." (...) relata que serão feitas algumas melhorias no

prédio do CER São Lucas com o intuito de humanizar o atendimento aos

adolescentes. (...) Também requerer apoio e atendimento para a equipe

técnica do CER São Lucas, pois estão ficando doentes. Foi designado à

equipe de transição que esta vai construir o perfil da pessoa que deve

assumir a Gerência do CER São Lucas. A decisão vai ser política, mas o

Sr. Itamar vai impor alguns critérios para evitar que uma pessoa

totalmente desconhecida do assunto seja promovida à Gerência. (...) Foi

acordado que no dia 30 de março de 2010, às 14 horas, ocorrerá um

encontro no CER São Lucas para anunciar aos funcionários e

adolescentes a transição. Estarão presentes o Sr. Itamar, a equipe de

transição e a promotora e juíza da comarca de São José. Para tanto, neste

mesmo dia, na parte da manhã, a Sra. Margarete irá comunicar sobre a

visita do Sr. Itamar, equipe de transição, promotora e juíza da comarca de

São José e que esta visita tratará de um assunto de interesse deles." (f.

50v.).

"O Sr. Itamar disse que também não concorda, neste

momento com o fato de a Sra. Augusta assumir a Gerência e nem com os

boatos que surgiram de que havia a possibilidade de o Sr. Sandro (gerente

do PLIAT) ou o Sr. Venício (gerente do CIP de Chapecó) concorrerem à

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Gerência. Relatou que não será saudável que o atual clima de regalias aos

adolescentes proporcionadas pela atual Gerente e Sra. Augusta passe

para uma metodologia mais repressiva e "Mão-de-ferro" praticada pelos

Sr(s) Sandro e Venício." (f. 49).

Consoante constata-se das atas das reuniões acima

realizadas, para tratar de uma transição de forma responsável e técnica da

Gerência do CER São Lucas, de surpresa fomos todos tomados com a

nomeação do Senhor Venício. Digo todos, pois, aqui há que se ressalvar toda

boa vontade demonstrada pelo Senhor Itamar Bonelli e a equipe por ele

nomeada para que fosse responsavelmente realizado um diagnóstico para a

substituição da antiga Gerente.

Contudo, em completo e flagrante desrespeito à Equipe

Técnica do DJUC nomeada para transição, de cima, verticalmente, sem

qualquer comprometimento com o trabalho realizado pela Equipe Técnica do

DJUC, e, com a contrariedade do Diretor do DJUC, Senhor Itamar Bonelli, é

imposta a nomeação deste novo gerente, que, segundo palavras dos próprios

integrantes do DJUC O Sr. Venício, também cogitado, não tem apoio da

direção do Departamento, e do Secretário de Justiça e Cidadania, pois

assim como o Sr. Sandro do Pliat, são conhecidos como "torturadores". (f.

50). Tal contrariedade fora expressa mais de uma vez, conforme se vê: "O Sr.

Itamar disse que também não concorda, neste momento com o fato de a

Sra. Augusta assumir a Gerência e nem com os boatos que surgiram de

que havia a possibilidade de o Sr. Sandro (gerente do PLIAT) ou o Sr.

Venício (gerente do CIP de Chapecó) concorrerem à Gerência. Relatou que

não será saudável que o atual clima de regalias aos adolescentes

proporcionadas pela atual Gerente e Sra. Augusta passe para uma

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metodologia mais repressiva e "Mão-de-ferro" praticada pelos Sr(s)

Sandro e Venício." (f. 49).

Não fosse o empenho da palavra, ainda fomos todos juntos

(Sr. Itamar Bonelli, Equipe de transição, Promotora Leda e eu) ao CER São

Lucas, para dar a notícia da equipe de transição e afirmar aos adolescentes que

pudessem ficar tranqüilos que nem o Sr. Sandro, nem o Sr. Venício, seriam

nomeados como novos Diretores (f. 63/66). Palavra descumprida, parceria

desrespeitada, pois, ainda sou do tempo em que uma palavra afinçada, é uma

palavra que será cumprida, ainda mais em situações como tais em que o

descumprimento coloca em jogo a uma credibilidade de um considerável

números de pessoas e suas respectivas funções.

Aliás, O Senhor Venício inaugura sua gestão com um

flagrante desrepeito aos direitos daqueles a quem devia proteger, quando,

permite a divulgação de imagens dos adolescentes, infringindo a proibição legal

de tal conduta, prevista no art. 247 e seu §1º, do ECA, quando trata das

infrações administrativas, que assim dispõe: "Divulgar, total ou parcialmente,

sem autorização devida, por qualquer meio de comunicação, nome, ato ou

documento de procedimento policial, administrativo ou judicial relativo a

criança ou adolescente a que se atribua ato infracional: Pena – multa de

três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de

reincidência. §1º Incorre na mesma pena, quem exibe, total ou

parcialmente, fotografia de criança ou adolescente envolvido em ato

infracional, ou qualquer ilustração que lhe diga respeito ou se refira a atos

que lhe são atribuídos, de forma a permitir sua identificação, direta ou

indiretamente." . Tal irregularidade pode ser constatada no Jornal Notícias do

Dia, datado de 16 de abril de 2010, também encartado nos autos.

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Em diversos outros periódicos da imprensa apresenta-se

como "um disciplinador" (DC de 14/04/2010, p. 32), e promete reforçar a

segurança interna e externa da instituição o que consubstancia, sem nenhuma

sombra de dúvida, um descompasso àquilo que se espera de um Gestor

Socioeducador, conforme preconizado pelo SINASE e acima descrito. Aliás,

num completo desconhecimento dos rumos norteadores do ECA e do SINASE,

o que é imprescindível para exercer a função que ocupa, trata o sistema

socioeducativo apenas como uma questão de segurança pública, quando, na

verdade esta deve existir somente extramuros.

Promete, também enquanto Gestor da Instituição CER – São

Lucas, "fuga zero", o que vem conseguindo, barbarizando a estada dos

adolescentes na instituição, quando desumanamente os mantém trancafiados

quase que em tempo integral, conforme pode-se colher dos relatos das

inspeções que foram realizadas, como também da fala do próprio Senhor

Venício, que na imprensa justifica tal trancafiamento por conta da precariedade

no número do Monitores na instituição.

É importante frisar que o atual gerente está tão

desinformado, desinteressado e negligente, que relatou à 28ª subseção local da

OAB/SC, que "desconhecem a última visita do Judiciário ou do Ministério

Público ao Centro de Internação." (f.166), quando, na verdade, conforme

constata-se dos presentes autos, a última visita, realizada por esta unidade

jurisdicional juntamente com a egrégia Corregedoria-Geral de Justiça, havia

ocorrido há apenas uma semana. Por óbvio que o Gerente não sabia informar,

pois não se encontrava no seu local de trabalho neste momento. Aliás, ressalte-

se que o atual Gerente assume a Instituição num momento de grande crise e,

logo no início, por diversas vezes que este Juízo tentou com ele entrar em

contato, nos era passada a informação de que o mesmo lá não se encontrava, o

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que facilmente pode ser constatado em razão de que as correspondências

enviadas a este Juízo eram subscritas por outro funcionário, que não o Gerente.

Não só a inspeção acima, mas ainda há inclusive nos relatos

da própria DJUC, todo o acompanhamento que vinha sendo realizado quer por

este Juízo da Vara da Infância, quer pelo Ministério Público local.

Assim, diante dos fatos acima mencionados, não há outro

caminho a tomar, senão o afastamento liminar do atual gestor, secundando

requerimento ministerial, conforme autoriza o parágrafo único, do art. 191, do

ECA, que assim dispõe: "Havendo motivo grave, poderá a autoridade

judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar liminarmente o

afastamento provisório do dirigente da entidade, mediante decisão

fundamentada."

4-) Dos crimes de tortura imputados aos Monitores e

Policial Militar necessidade de seu afastamento e apuração pelo órgão

competente

Às fls. 80 a 126 destes autos, conta uma série de acusações

da perpetração do crime de tortura e agressões físicas, por parte dos Monitores

Thiago e Alexandre Pauli (fls. 92 e 93), contra o adolescente C. A.. R., que à

época era interno do CER - São Lucas, o que torna imperioso o afastamento

dos mesmos, enquanto o órgão estadual responsável instaure os respectivos

processos administrativos para apuração de tais crimes cometidos no exercício

de suas funções. Esses fatos e os demais narrados à exordial, não só na esfera

penal, devem obrigatoriamente ser apurados na via administrativa e, também

perante esta unidade jurisdicional, conforme o disposto no art. 191 e seu

parágrafo único, da Lei 8.069/90:

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"O procedimento de apuração de irregularidades em

entidade governamental e não governamental terá início mediante portaria

da autoridade judiciária ou representação do Ministério Público ou

Conselho Tutelar, onde conste, necessariamente, resumo dos fatos.

Parágrafo único. Havendo motivo grave, poderá a

autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar liminarmente o

afastamento provisório do dirigente da entidade, mediante decisão

fundamentada."

Ressalte-se que, quase que despiciendo registrar que, quem

pode o mais, pode o menos, o que, em outras palavras significa dizer que, se

por a norma antes citada este Juízo pode afastar os dirigentes da instituição,

com maior razão, também pode afastar seus subordinados.

Cabe, ainda a requisição ao Órgão Estadual Gestor do CER

São Lucas, para que, no prazo máximo de 90 (noventa) dias instaure o

competente processo administrativo para apuração destes fatos, contados da

efetiva intimação, cuja comprovação nos autos, deverá ser feita no prazo

máximo de 03(três) dias após o término do prazo de 90 dias acima referido, sob

pena de cominação de multa diária de R$3.000,00 (três mil reais), em caso de

descumprimento.

De outro lado, deve ser oficiado ao Comando da Polícia

Militar, para que no mesmo prazo acima seja instaurado o competente I.P.M.,

para apuração do delito imputado ao Policial Militar Soldado Antonio José de

Oliveira, no exercício de suas funções, devendo, igualmente o mesmo ser

afastado do CER São Lucas.

Derradeiramente, registro que, fatos como estes, em que um

representante do Estado, valendo-se da já não mais indignação da sociedade

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com o desrespeito aos direitos humanos é que tem feito surgir uma nova forma

de exclusão, segundo Mirian Guindani, a exclusão moral. Mencionada estudiosa

fala que " A não-indignação frente às violações dos direitos humanos e

sociais dos apenados brasileiros, pode ser, também, um indicador de um

processo de exclusão moral. Observa-se que essa exclusão ocorre

quando pessoas, que normalmente obedecem às leis e as respeitam,

aceitam ações bárbaras contra indivíduos ou grupos. Nesse processo,

certos grupos são colocados fora da comunidade moral e, como

conseqüência, as relações com eles não mais envolvem princípios

dejustiça. As racionalizações justificam os maus-tratos, humilhações,

torturas, sem que haja qualquer autocrítica e o reconhecimento de que isto

viola regras consensuais de justiça. Ao contrário, muitas vezes, esses

procedimentos tornam-se desejos sutilmente disfarçados. Um dos

sintomas da referida exclusão moral é a negação da responsabilidade

pessoal: deslocando-se a responsabilidade para outros (decisões

coletivas em que ninguém é responsável ), negando-se as conseqüências

desumanas do comportamento – "não houve massacre" -, culpando-se as

vítimas ou, ainda, desumanizando as vítimas: "são subumanos, não têm

sensibilidade, têm mais é que apanhar..." (in FILHOS & VÍTIMAS DO TEMPO

DA VIOLÊNCIA: a família, a criança e o adolescente. Curitiba:Juruá, 2009, 2ª

ed., p. 161).

5-) Da suposta facilicitação das fugas:

Ainda, de ofício, por este Juízo, na qualidade de Juíza

Correicional do CER – Centro Educacional São Lucas, fica determinado que, no

mesmo prazo estabelecido no item "4", se ainda não o foi, seja instaurado

processo administrativo para apuração de possível facilicitação de fugas de

internos por parte dos Monitores, vez que, segundo relatos uníssonos dos

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internos recapturados, houve facilicitação de suas fugas e, não há qualquer

registro de resistência ou violência no que se refere a sua perpetração pelos

adolescentes nos últimos dias.

Essas fugas, consoante colhe-se de diversos recortes

jornalísticos encartados nos autos, fora amplamente veiculada na imprensa e

noticiada nestes autos pela Representante do Ministério Público.

Assim, fixa-se ao Senhor Secretário de Estado, os mesmos

prazos para instauração e comprovação nos autos, bem como, a mesma multa

pecuniária do parágrafo anterior, no caso de descumprimento, fixados no item

"4".

Por derradeiro, não poderia deixar de registrar que o ator

principal justificador da existência de um Centro Socioeducativo é o processo

inclusivo e ressocializador do Adolescente enquanto sujeito de direitos, e não, a

segurança pública como tem se visto,pois, figura uma total inversão da ordem

legal.

DIANTE DO EXPOSTO, ao mais que dos autos consta,

em atendimento aos requerimentos da Representante do Ministério

Público, da 28ª Subseção local da OAB/SC, de ofício e, sobretudo em

respeito àqueles, cujos direitos a Constituição Federal atribui prioridade

absoluta, em caráter liminar DECIDO:

1-) diante do flagrante desrespeito às normas estabelecidas

nos artigos 3º, 5º, 94, seus incisos e parágrafos, 99, 100, 113, 123, 124, seus

incisos e parágrafos, 125, do Estatuto da Criança e Adolescente, bem como das

preconizações do SINASE, estipuladas para o cumprimento e execução das

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medidas socioeducativas de internação, não resta outro caminho, senão, com

fundamento no art. 97, I, "d", do Estatuto da Criança e do Adolescente,

DECRETAR, LIMINARMENTE, A INTERDIÇÃO TOTAL DO CER SÃO LUCAS,

situado nesta comarca de São José/SC, cuja interdição perdurará, até sua

completa adequação estrutural e de recursos humanos em atendimento às

disposições legais para seu funcionamento, estabelecidas no ECA e no

SINASE, fixando-se, desde já, a multa diária de r$3.000,00 (três mil reais), em

caso de descumprimento.

Saliento que para recambiamento dos adolescentes

atualmente internos no CER São Lucas, fica estipulado o prazo máximo de

15(quinze) dias, contudo, observo que os mesmos deverão ser acolhidos em

instituição adequada, que lhes preserve a dignidade humana e que não lhes

submeta, novamente a tratamento insalubre, cruel e desumano.

2-) com fundamento no parágrafo único, do art. 191, do

ECA, afastar o Senhor Venício Machado Pereira Neto, Gerente nomeado ao

CER São Lucas, com a imediata comunicação à autoridade hierarquicamente

superior a este servidor, marcando-lhe o prazo de 03 dias para a substituição,

nos termos do art. 192, § 2º do ECA., fixando-se, desde já, a multa diária de

R$3.000,00 (três mil reais), em caso de descumprimento.

Requista-se, ainda à autoridade hierarquimente superior,

que no prazo máximo de 90 (noventa) dias instaure o competente processo

administrativo para apuração do fato a ele imputado, narrado nesta decisão, em

especial a infração administrativa descrita no art. 247 e seu §1º, do ECA,

contados da efetiva intimação, cuja comprovação nos autos, deverá ser feita no

prazo máximo de 03(três) dias após o término do prazo de 90 dias acima

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referido, sob pena de cominação de multa diária de R$3.000,00 (três mil reais),

em caso de descumprimento.

Requisita-se, ainda, caso positivo, a remessa de cópias das

sindicâncias e ou processos administrativos que porventura tenham sido

instaurados em detrimento do funcionário Venício Machado Pereira Neto, no

exercício de suas funções, ainda que já estiverem arquivados, no prazo de 10

(dez) dias.

3-) Com fundamento no parágrafo único, do art. 191, do

ECA, por conta da imputação da prática de tortura e agressões contra os

adolescentes, AFASTAR os Monitores Thiago (que se encontrava trabalhando

na noite do dia 04/04/2010 e Alexandre de Pauli, com a imediata comunicação

à autoridade hierarquicamente superior a estes servidores, requisitando-se a

instauração de procedimento administrativo para apuração dos fatos, no prazo

máximo de 90 (noventa) dias, contados da efetiva intimação, cuja comprovação

nos autos, deverá ser feita no prazo máximo de 03(três) dias após o término do

prazo de 90 dias acima referido, sob pena de cominação de multa diária de

R$3.000,00 (três mil reais), em caso de descumprimento.

4-) CITAÇÃO E INTIMAÇÃO para cumprimento da

decisão acima das seguintes pessoas, ressaltando-se que o presente

processo será guiado pelo procedimento previsto nos artigos 191 a 193,

do ECA:

a-) o Estado de Santa Catarina na pessoa do Senhor Leonel

Pavan – Excelentíssimo Senhor Governador do Estado Estado de Santa

Catarina;

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b-) a Secretaria de Segurança Pública na pessoa do Senhor

André Ricardo da Silveira Neto - Secretário Estadual de Segurança Pública e

Defesa do Cidadão;

c-) a Secretaria Executiva de Justiça e Cidadania na pessoa

do Senhor Justiniano Pedroso – Secretário Executivo de Justiça e Cidadania;

d-) a Diretoria de Justiça e Ciadania na pessoa do Senhor

Itamar Bonelli - Diretor da DJUC - Diretoria De Justiça E Cidadania.

e-) Senhor Venício Pereira Machado Neto – Gerente

nomeado à Direção do CER São Lucas de São José

f-) Senhor Tiago de Tal, que no dia 04/04/2010 estava lotado

no Nível V do CER São Lucas – Monitor;

g-) Senhor Alexandre de Pauli – Monitor lotado no CER São

Lucas

5-) Deferir o requerimento ministerial para determinar que

as pessoas nominadas nas letras "a" a "d", do item "4" acima, informem a este

Juízo acerca do andamento da utilização dos recursos disponibilizados para o

Estado de Santa Catarina, pelo SINASE, para construção de Centros de

Atendimentos Socioeducativos.

6-) Em razão de que constam dos presentes autos

informações sigilosas de alguns adolescentes, o presente procedimento correrá

em SEGREDO DE JUSTIÇA, podendo ser facultado somente a cópia da

presente decisão, vez que ela preserva o sigilo em relação aos mesmos.

7-) Remetam-se cópia do presente procedimento, em sua

íntegra ao Conselho nacional de Justiça, nas pessoas de seu Presidente e

Corregedor Nacional de Justiça e à Subsecretaria de Promoção dos Direitos da

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Criança e do Adolescente, vinculada à Secretaria Especial de Direitos

Humanos.

Remetam-se cópia da presente decisão à egrégia

Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Santa Catarina e Coordenadoria da

Infância e da Juventude, a fim de instruir os autos CGJ-0181/2010, à Ordem dos

Advogados do Brasil, seção de Santa Catarina, à 28ª Subseção OAB/SC – São

José, à procuradoria Geral da Justiça do Ministério Público de Santa Catarina.

8-) Certifique a Sra. Escrivã quais dos processos de

execução de medida dos adolescentes internados, conforme relação de fls.

249/250, encontram-se em tramitação nesta comarca. Após, em relação

aqueles não remetidos a esta comarca, encaminhe-se, via e-mail, cópia da

presente decisão ao Magistrado da comarca onde está tramitando o processo,

para tomada de conhecimento e providências cabíveis.

09-) Intimem-se.

São José (SC),10 de junho de 2010.

Ana Cristina Borba Alves

Juíza de Direito.