SEMIÁRIDO BAHIANO - A DINÂMICA CONTRADITÓRIA DO DESENVOLVIMENTO
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Transcript of SEMIÁRIDO BAHIANO - A DINÂMICA CONTRADITÓRIA DO DESENVOLVIMENTO
São Paulo – 2015
i l d e s F e r r e i r A d e o l i v e i r A
Semiárido BaianoA dinâmicA contrAditóriA
do desenvolvimento
Copyright © 2015 by Editora Baraúna SE Ltda.
Criação de Capa Jacilene Moraes
Diagramação Camila C. Morais
Revisão Textual Priscila Loiola
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ ________________________________________________________________O45s
Oliveira, Ildes Ferreira de Semiárido baiano: a dinâmica contraditória do desenvolvimento / Ildes Ferreira de Oliveira.. - 1. ed. - São Paulo: Baraúna, 2015.
ISBN 978-85-437-0072-4
1. Sociologia política. 2. Ciências sociais. I. Título.
15-23210 CDD: 320 CDU: 32________________________________________________________________28/05/2015 03/06/2015
Impresso no BrasilPrinted in Brazil
DIREITOS CEDIDOS PARA ESTAEDIÇÃO À EDITORA BARAÚNA www.EditoraBarauna.com.br
Rua da Quitanda, 139 – 3º andarCEP 01012-010 – Centro – São Paulo – SPTel.: 11 3167.4261www.EditoraBarauna.com.br
Todos os direitos reservados.Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio, sem a expressa autorização da Editora e do autor. Caso deseje utilizar esta obra para outros fins, entre em contato com a Editora.
A Laudeci, Jara, Pablo, Eva e Iany pelo apoio e estímulo tão ne-cessários à empreitada que enfrentei;
A Maria Clara, Henrique, Giovanna e Melissa, netos, a quem espero que este trabalho possa servir de inspiração;
A todos sertanejos que, subjugados pelo Estado, explorados e es-poliados pelo capital, mas que souberam, ao longo da história, resistir e lutar por um novo dia, nutrindo a utopia da libertação.
[...] Faz pena o nortista, tão forte e tão bravo, morrer como escravo no norte e no sul.
Patativa do Assaré
PREFÁCIO
O trabalho de Ildes Oliveira funciona como uma inúbia1 cha-mando as pessoas para despertarem para esta questão essencial à iden-tidade brasileira. O semiárido não é uma questão local, mas uma par-te essencial da formação do Brasil, que precisa ser reconhecida pelos brasileiros. A briga pelo semiárido tem uma história. Com o desgaste da expressão desenvolvimento econômico, trata-se de encontrar cami-nhos para a valorização social e econômica da sociedade do semiárido.
Certa reanimação do debate sobre o Nordeste e sobre a região semiárida deixa hoje perceber a profunda complexidade desse imenso espaço heterogêneo que foi objeto de uma visão simplificadora gerada pelo pathos centralista deste país. Revela-se a tensão entre uma pers-pectiva utilitária,capturada pelo sistema de poder, que vê o semiárido como um espaço aberto para empreendimentos de altas taxas de retor-no; e manifestações de presença da sociedade que se formou nesse meio como resultado da ocupação colonial. Trata-se de reconhecer a necessi-
1 É o nome usado pelos nossos índios para um instrumento conhecido dos antigos judeus com o nome de shofar e hoje pelo pessoal do oeste com o nome de berrante. O indígena era mais curto, porém usado para chamar para a guerra. O berrante serve apenas para os atuais falsos sertanejos.
dade de um desenvolvimento emancipatório da sociedade sertaneja ou de avaliar possibilidades para negócios, rurais e de mineração.
A linha divisória entre propostas de desenvolvimento socialmen-te incorporado e de crescimento econômico seletivo ficou estabele-cida desde a década de 1950. A instalação do Escritório Técnico do Nordeste no Banco do Nordeste, em seus primeiros momentos, fez-se com o reconhecimento de dois trabalhos cruciais, que foram o relató-rio de Hans Singer nos anos 40 e o estudo de Stefan Robock nos 50, em que os dois afirmavam que o problema da região era de desenvol-vimento e que as secas poderiam ser enfrentadas de outros modos se houvesse vontade política para isso. Ou se trabalhava para criar um sistema produtivo adequado às condições de solo, clima e água, ou se investiria em irrigação. De todos os modos, formou-se um acervo de conhecimento técnico suficiente para montar políticas regionais significativas. No entanto, optou-se por soluções de contorno em pri-meiro lugar e por políticas de irrigação de qualidade duvidosa.
Acumularam-se brechas subterrâneas na plataforma das políticas regionais que, primeiro, ignoraram olimpicamente o conhecimento acumulado, desprezaram o conhecimento tradicional e operaciona-lizaram as políticas federais como artefatos a serviço da manutenção das elites políticas. Criaram-se duas dualidades fundamentais. Uma delas entre as condições práticas para realização de políticas federais para o desenvolvimento regional e outra pelo desempenho contradi-tório das políticas estaduais. Formaram-se alguns elementos de uma visão mitológica útil do semiárido, de que ele seria uma grande região homogênea e descartável, reconhecendo que ele se tornava a fonte de trabalho barato para a sociedade do litoral e que contribuía com tra-balhadores baratos para a agricultura do Sudeste do país.
Em tudo, sofrem-se ainda as consequências do golpe de Estado de 1964 que interrompeu o planejamento regional mais avançado da América Latina e instalou um processo de perda de memória do que se vinha fazen-do pelo desenvolvimento. Na Bahia perdeu-se o planejamento da década de 1950 que instalava um estilo de trabalho criativo e com claro sentido de interiorização do planejamento. Foi o primeiro desastre causado por um
governo estadual que, entretanto, não foi incidental. Naquele momento, 1961, a rejeição do PLANDEB marcava o início de uma aliança entre os novos capitais urbanos pretorianos e a renovação seletiva de grandes capi-tais rurais. Um modelo bem-sucedido que sustentou a expansão rápida de algumas poucas empresas modernizantes com uma nova concentração de capital rural. Essa aliança governou a Bahia durante 30 anos e costurou a aliança do bloco regional conservador com as peripécias da ditadura, com fôlego para emergir como liderança na chamada Nova República.
A captura do governo da Bahia por uma aliança conservadora ca-paz de se automodernizar traduziu-se em uma opção de política sobre o interior do estado, com as repetidas teses sobre as virtudes da agri-cultura monocultora do oeste e explorações de grande capital forâneo em áreas não secas, especialmente no sul do estado. Por oposição, o semiárido se torna mero espaço de controle político e um estorvo no movimento de modernização de grande capital. De fato, na visão empresarial predominante trata-se de avaliar potenciais para agrone-gócios do mesmo modo que se trata de avaliar potenciais turísticos de alto padrão e comercialização da cultura popular.
Não é prudente, portanto, pensar que haja uma solução heroi-ca para a sociedade sertaneja sem um abalo sísmico na composição conservadora do poder político que se apropria de siglas de partidos mediante a generalização de práticas imediatistas.
No entanto, é necessário esse esforço de esclarecimento que em-preende este trabalho de Ildes Oliveira. Deve alavancar debates re-generadores. Deve funcionar como aglutinador daquela razão ativa historicamente consciente de que fala o mestre Hegel. Ou como diria Dom Quijote, é preciso tentar.
Fernando Pedrão
Sumário
INTRODUÇÃO ...............................................................................................15
CAPÍTULO 1 - secA: eXPlorAÇÃo e domÍnio PolÍtico .................................29
CAPÍTULO 2 - reGiÃo semiÁridA: UmA ABordAGem sociolóGicA ...............65
2.1 conceito de reGiÃo ....................................................................65
2.2 conceito de reGiÃo semiÁridA..................................................75
2.3 semiÁrido sertAnejo ..................................................................86
CAPÍTULO 3 - A ocUPAÇÃo do sertÃo ........................................................ 103
CAPÍTULO 4 - o Processo de desenvolvimento do semiÁrido ............ 117
4.1 A FormAÇÃo econômicA e sociAl do semiÁrido .................. 117
4.2 o sistemA ProdUtivo do semiÁrido ..................................... 128
4.3 A deGrAdAÇÃo AmBientAl: UmA novA AmeAÇA ...................... 157
4.4 semiÁrido BAiAno: PAlco de PoBrezA e riqUezA ................ 166
CAPÍTULO 5 - o desenvolvimento PeriFÉrico e A PersPectivA neoli-BerAl ................................................................................................. 205
5.1 qUestões conceitUAis ............................................................ 205
5.2 concePÇÃo neoliBerAl ........................................................... 211
5.3 desenvolvimento e sUBdesenvolvimento: enredos do mes-mo Filme .......................................................................................... 227
CAPÍTULO 6 - estrUtUrA e clAsses sociAis no semiÁrido ................... 239
6.1 sitUAndo A ideiA de clAsses sociAis .................................... 239
6.2 A estrUtUrA de clAsses no semiÁrido ................................ 255
6.3 A lUtA de clAsses .................................................................... 269
CAPÍTULO 7 - sociedAde civil e PolÍticAs PÚBlicAs ............................... 291
7.1 sociedAde civil: reFleXÃo conceitUAl ................................. 291
7.2 A sociedAde civil orGAnizAdA ............................................... 314
e As PolÍticAs PÚBlicAs ............................................................... 314
7.3 As PolÍticAs PÚBlicAs PArA o semiÁrido: ProPosiÇões dos PPAs .................................................................................................. 318
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 345
REFERÊNCIAS ........................................................................................... 377
AneXo A - mUnicÍPios qUe inteGrAm o semiÁrido BAiAno: ÁreA, PoPUlA-ÇÃo e PiB, 2010 .......................................................................................... 428
AneXo B - moBilizAÇÃo sociAl Por AÇões estrUtUrAntes e de convivên-ciA com o semiÁrido .................................................................................. 436
AneXo c - notA soBre A sitUAÇÃo dAs comUnidAdes rUrAis no norte dA BAhiA - secA PolÍticA oU PolÍticA secA? ................................................ 441
AneXo d - i viA-sAcrA dA secA do semiÁrido BAiAno FeirA de sAntAnA – BAhiA, 28 e 29 de mAio de 2013 - viA crUcis dos AGricUltores e AGricUl-torAs do semiÁrido BAiAno ..................................................................... 445
AneXo e - rePresentAÇÃo GrÁFicA do semiÁrido BrAsileiro ............ 457
15
INTRODUÇÃO
O semiárido brasileiro, com área superior à de países como Ale-manha, Dinamarca, Grécia, Portugal, Itália e Holanda, juntos, con-tinua sendo a região mais pobre do país, submetida a um aparente e secular descaso do Estado. Embora o impossível não exista, já que tudo, em tese, factível, é possível, em mais de meio milênio de histó-ria da civilização, os processos conduzidos pela colonização criaram e consolidaram mecanismos de exploração e pobreza que dificultam, nos dias atuais, implementar medidas para romper com as estruturas econômicas e políticas tradicionais e empreender procedimentos ca-pazes de impulsionar o processo de desenvolvimento voltado para a satisfação das necessidades da coletividade.
Até meados do século XIX, os problemas da área, hoje, corres-pondente ao Nordeste, eram praticamente ignorados; as elites esban-javam riqueza, a região liderava a economia nacional com a produção açucareira, a pecuária bovina, o algodão e a mineração, com um sis-tema exportador baseado no litoral. A partir de finais daquele século, mudanças importantes nos cenários internacional e nacional inter-feriram diretamente na economia regional, culminando com o blo-queio do sistema exportador na segunda década do século seguinte.