Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal
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Secretaria de Estado de Saúde do Distrito FederalHospital Regional da Asa Sul (HRAS)/Hospital Materno Infantil do Distrito Federal
(HMIB)/SES/DFUnidade de Terapia Intensiva Pediátrica do HRAS/HMIB
Sessão de Anatomia ClínicaCOQUELUCHE
Apresentação: Rodrigo Coelho Moreira ( R4 Terapia Intensiva Pediátrica)
Coordenação: Dra. Ana Paula, Alexandre Serafim, Waldete Cabral (Patologista)Brasília, 28 de maio de 2013www.paulomargotto.com.br
• 1-) IDENTIFICAÇÃO:P.M.G.L, sexo masculino, pardo, 7 meses
e vinte e nove dias de vida (DN: 27/10/2011), natural de Águas Lindas-GO.Procedência: Hospital Regional de Brazlândia.Internação na UTIP do HMIB: 20/06/2012
• 2-) HISTÓRIA CLÍNICA:Lactente admitido na Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do HMIB, às 2 horas e 50 minutos do dia 20 de junho de 2012, procedente do Hospital Regional de Brazlândia (HBRz) com quadro de insuficiência respiratória e choque séptico. Segundo relatório de transferência, o quadro clínico teve início há cerca de um mês e foi caracterizado como quadro gripal arrastado, tosse persistente e dificuldade respiratória progressiva.
Em revisão ao prontuário eletrônico do sistema TrakCare da SES-DF, observou-se o registro de quatro passagens do menor em emergências hospitalares, sendo duas no HMIB (18/11/11 e 05/06/12) e duas no HRBz (02/06 e 18/06/12). Em 02/06/12, o lactente permaneceu internado por três horas no HRBz, no qual foi identificado saturação de oxigênio de 98%, radiografia de tórax e hemograma normais. Recebeu alta com prescrição de Prednisolona por cinco dias, nebulização de 4/4 horas por sete dias e antitérmicos em caso de febre.
Há relato por parte da mãe de que o menor recebeu atendimento em várias oportunidades em prontos socorros infantis e fora medicado com broncodilatadores e dipropionato de beclometasona ( Clenil A) por três dias.
Em 18/06/12 foi internado no PS do HRBz com suspeita diagnóstica de H1N1 e iniciado Oseltamivir. Apresentava-se, à época, com tosse seca, estridor laríngeo e desconforto respiratório, sem febre. Foram colhidos esfregaços (swabs) de orofaringe e nasofaringe. Em 19/06/12 evoluiu com piora do padrão respiratório, descompensação hemodinâmica, má perfusão periférica, taquicardia e acidose metabólica. Recebeu expansão volêmica a 20ml/kg, correção com bicarbonato de sódio e antibioticoterapia com Cefepime e Vancomicina. Instituído oxigenoterapia por máscara e iniciada infusão de Dobutamina, a qual levou a taquicardia e foi suspensa logo em seguida.
A criança deu entrada na UTIP do HMIB acompanhada pela equipe do transporte aéreo, intubada (procedimento realizado pela equipe do transporte), ventilada com ambú, com dois acessos venosos periféricos (MSD e MSE), permeáveis e presença de diurese em fralda.
3-) ANTECEDENTES:Parto normal, a termo, sem pré-natal.
PN= 3.750g. Sem intercorrências no período neonatal. É o segundo filho do casal, tem uma irmã saudável de dois anos. O pai tem asma e, atualmente, a irmã e o seu pai estão, também, com quadro gripal. Vacinação atualizada, exceto da H1N1 e da poliomielite da campanha. Aleitamento materno exclusivo.
Exame Físico à admissão na UTIP-HMIB:P= 8 kg, SC= 0,39 m2; PI (12h)= 117ml; AE (12h)= 58,5mlFC= 155 bpm; PA= 106x63 (77)mmHgGEG, sedado, agitando-se ao manuseio, hidratado,
anictérico,acianótico, saliva fluida, edema +/4+ (edema palpebral discreto), acianótico, anictérico, hipocorado +/4+.
SN: Sedado, pupilas isocóricas e fotorreagentes;AR: MV+ e simétrico, com estertores crepitantes bilaterais;ACV: RCR em 2 T, sem sopros;Abdome: normotenso, com RHA presentes. Fígado à 2 cm RCDMembros: edema (+/4+); pulsos amplos e simétricos.
4-) HIPÓTESES DIAGNÓSTICAS:-Insuficiência respiratória Aguda: H1N1? ; Coqueluche?
5-) CONDUTA:Aportes: Jejum + HV 100% HollidayInfeccioso: Troca do esquema antibiótico para
Ampicilina/Sulbactam (200mg/kg/dia) e Azitromicina (10mg/kg/dia). Mantido Oseltamivir
Sedação: Midazolam 0,1 mg/kg/hora e Fentanil 1mcg/kg/horaVentilação: Modo A/C, FiO2 40%, Ti 0,6; dP não descrito, PEEP
6, FR=25 irpm.
1° DIH na UTIP (20/06/12):11h 30min:
Criança encontra-se sedada, estável hemodinamicamente. Diurese preservada, TEC= 3 segundos; FC= 150 bpm; PA= 102 x 59 mmHg.
Em relação ao exame físico anterior, houve o surgimento de sibilos difusos bilaterais, à ausculta pulmonar.
CONDUTA:-Iniciado dieta por SNE (LMO 50ml de 3/3 horas) e
mantido demais.
Evoluiu estável do ponto de vista hemodinâmico durante todo o primeiro dia de internação na UTI, com PA satisfatória, afebril, porém taquicárdico e taquipneico (FC até 185 bpm e FR até 75 irpm). Discutido caso com a hematologia, que diante da hiperleucocitose, orientou hiperidratação (3.000ml/m2/SC), porém evoluiu à noite com sinais de hipervolemia (rebaixamento de fígado, congestão pulmonar).
Foi reduzido aporte hídrico. Coletado novo hemograma, além de painel viral (evnviado lâmina do hemograma para o serviço de hematologia, com o seguinte resultado: “ O aspecto é de provável reação ao quadro infeccioso grave, com leucocitose, às custas de neutrófilos e desvio à esquerda")
2° DIH na UTIP (21/06/12):-Dessaturou durante à noite, agitado. Necessitou push de sedação e aumento dos parâmetros ventilatórios. Iniciado Dobutamina.
EVOLUÇÃO:Criança segue sedada, desconfortável à VM,
mesmo após aumento das pressões na VM. Mantém taquicardia em torno de 190 bpm ( chegou a 230 bpm após instalação da Dobutamina, que já foi suspensa).
Diurese = 2,4ml/kg/hora e BH= + 429,2ml; Observado piora do edema.
EXAME FÍSICO: PA= 106 x 63(77) mmHgSedado, pouco reativo ao manuseio, hidratado, hipocorado
(+/4+), em anasarca. Pupilas isocóricas e fotorreagentes. MV+ com crepitações difusas bilateralmenteRCR em 2 T, sem sopros, FC= 180 bpmAbdome com fígado à 4 cm RCDEdema (+/4+), com pulsos amplos e simétricos CONDUTA:-Acesso central e indicado EST (2x a volemia e enviada amostra para o
banco de sangue).
18h29min:Lactente evoluiu com piora progressiva, sinais de ICC,
com taquicardia persistente ( até 210 bpm, com ritmo sinusal).
No início da tarde apresentava saturação venosa de oxigênio de 54%, com perfusão ruim de membros inferiores e PA inaudível. Foi prescrito Adrenalina ( 0,1), realizado expansão com Albumina e Furosemida. Foi puncionado novo acesso central em VSC esquerda, uma vez que o acesso central obtido pela manhã não ficou bem posicionado.
A Exsanguíneo não foi realizada até esse momento por falta de acesso venoso central “seguro”.
Durante a tarde, houve melhora da PA (100x45mmHg), da perfusão periférica e apresentou diurese. No final do plantão vespertino apresentou oscilação do quadro com queda de PA, sendo necessário titular a Adrenalina, que foi iniciada no início da tarde.
O estado geral é muito grave, desconfortável na VM, com FR alta (84 irpm), quando curarizado acopla com o ventilador e melhora as curvas da capnografia e da VM. Sedado, com RAMSAY 5, pouco reativo, hidratado, edemaciado (edema bipalpebral 2+/4+ e ambos os tornozelos), acianótico, anictérico, hipocorado (+/4+) e afebril.
Ausculta cardiopulmonar mantida.Gasometria arterial: pH= 7,138; PaO2 = 38,8 ; pCO2=
79,3, BE= -2,8; HCO3= 26,3, SatO2= 54%.
23h41min:Feito Exsanguíneo no início da noite (trocado 1000ml de sangue total).Recebeu Curare e Propofol e perdeu acesso de VSC esquerda. Evoluiu com redução da diurese, apesar do estímulo diurético (Furosemida) após o procedimento de exsanguíneotransfusão.PA inaudível, com pulsos filiformes e perfusão lentificada. Necessário aumento de parâmetros ventilatórios.Observou-se o surgimento de estertores à ausculta pulmonar. As pupilas nesse momento estavam mióticas e reagentes a luz.
CONDUTA: -Iniciado noradrenalina (0,1), deixado Adrenalina (0,4), além de
prescrição de Hidrocortisona devido ao choque.-Furosemida contínua (4,8 mg/kg/dia)-Solicitado nova radiografia de tórax.
3° DIH na UTIP (22/06/12):6h11min:
Permanece muito grave, taquicárdico (FC= 245 bpm), febril (até 38,7°C) e assincrônico com o respirador, PA = 133 x 44 mmHg. Foi reduzida nesse momento dose de Adrenalina (0,2) e posteriormente suspensa.Diurese (últimas 12h) = 1,37 ml/kg/h.BH (12h)= + 245ml.
11h55min:PA inaudível. Reiniciado Adrenalina. Trocado antibiótico (Ampicilina/Sulbactam para Meropenem). Perfusão muito lentificada.
Iniciado Curarização contínua, além de Furosemida (6) e Albumina (1)
Instalado Pai e puncionado novo acesso central em VSC esquerda. Durante o procedimento apresentou hipotensão, sendo necessário bolus de Noradrenalina. Feito reposição de Cálcio (Cálcio = 7,3)
Nesta mesma tarde, foi avaliado pela Cardiologista que realizou Ecocardiograma:
-Situs em levocardia; concordância venoatrial, atriventricular e ventrículo arterial; Septo atrial: forame oval patente de 4,0 mm, com shunt da direita para esquerda; Septo ventricular íntegro; Valva tricúspide com regurgitação em grau discreto, não sendo possível estimar a pressão pulmonar por limitação do aparelho. Demais valvas sem disfunção. Dilatação acetuada de ventrículo direito, que mede 20 mm, apresentado disfunção sistólica de grau moderado a acentuado. Ventrículo esquerdo de dimensões normais e boa função sistólica. Fração de ejeção: 69%. Arco aórtico desce à esquerda sem obstruções. Ausência de derrame pericárdico.
Conclusão: 1-)Hipertensão pulmonar de grau acentuado; 2-)Disfunção sistólica de VD de grau moderado a
acentuado;3-)Forame oval patente
Prescrito vasodilatador pulmonar (Sildenafil e Milrinona) e ajustado doses dos vasopressores (Noradrenalina e Adrenalina). Mantido hiperventilação com o objetivo de diminuir o CO2.
4° DIH na UTIP (23/06/12):1h:55min
Paciente não localiza dor, pupilas mióticas, não apresenta reflexo de tosse e não tem o reflexo córneo-palpebral ou óculo-vestibular, mesmo após a redução das doses de sedação e suspensão do Rocurônio.
Foi então suspenso a sedação já pensando em provável Morte Encefálica.
No final da tarde, foi reavaliado e o exame físico permaneceu inalterado, exceto a pupila que no momento estava midriática e fixa. Todos os reflexos testados anteriormente permenecem ausentes. No momento hipotenso, com PA= 48 x 18.
Estamos aguardando as 24 horas da suspensão da sedação para iniciarmos o protocolo de morte encefálica.
5° DIH na UTIP (24/06/12):12h:48minCriança segue em coma arreativo após 24 horas de
suspensão da sedação. Segue manutenção das funções orgânicas às custas de suporte ventilatório e hemodinâmico.
CD=-Iniciado protocolo de ME, sendo o 1° exame realizado
em 24/06 às 14h e notificado a Central de captação, com o 2° exame programado para 24 horas após o 1° exame.
Definição e Epidemiologia:
A Coqueluche é uma infecção causada pela bactéria Bordetella pertussis (bacteria gram -) e a transmissão ocorre de pessoa para pessoa através do contato com gotículas de aerossol. O período de incubação pode variar entre 6 e 21 dias, mas é tipicamente de 6-10 dias.
Coqueluche está classificada entre as 10 principais causas de mortalidade infantil, com cerca de 294.000 mortes a cada ano, principalmente entre as crianças ainda não vacinadas.Apesar da melhor cobertura vacinal ter diminuído a incidência de coqueluche dramaticamente ao longo da última década, muitos países desenvolvidos sofreram recentemente um ressurgimento da doença entre as crianças muito jovens, adolescentes e adultos.
Nos últimos anos, os casos notificados de coqueluche nos Estados Unidos aumentaram significativamente (1.010, em 1976, após a imunização generalizada na década de 1950, para um pico de 25.857 casos em 2004). Entre 2000-2008, foram notificados 127.672 casos de coqueluche segundo o CDC.
A imunidade após a vacina tem uma duração limitada.
Hospital Canadense (ano de 1999):- 48 casos-16 óbitos (33%), dos quais 8 foram submetidos a necrópsia, que mostraram hemorragia alveolar e pneumonite, com hipertensão pulmonar persistente.- Coração anóxico foi observado em 4 destes.- Falência de múltiplos orgãos foi encontrado em vários destes óbitos (não relatado com exatidão)-13 dos 16 óbitos foram no sexo feminino.- Evidência de cultura positiva foi observado em 4 casos (total de 8 casos que foram para necrópsia)
(Halperin et al).
• Quadro Clínico-Fase Catarral: 1 a 2 semanas. É a fase mais contagiosa e o quadro clínico é muito semelhante a uma infecção leve das vias aéreas superiores.-Fase Paroxística: 3 a 6 semanas. É caracterizada por crises de tosse com o grito característico, vômitos, cianose e apnéia. Geralmente é a fase que o paciente dá entrada na UTI.-Fase Convalescente: os sintomas regridem consideravelmente, porém podem durar meses.
A apresentação clinica depende da idade, imunocompetência e imunidade adquirida.A maioria das hospitalizacões e mortes ocorrem antes de 6 meses.
Quando indicar UTI na Coqueluche? -Faixa etária de risco (menores de 6 meses)
-Sintomas: Apnéia, bradicardia-Hiperleucocitose (> 50.000)
Estudo Neozelandês, com 72 criancas
admitidas em UTI entre 1991 e 2003 mostrou que apneia (70%) foi a grande causa da necessidade de UTI, seguido por bradicardia (63%) e pneumonia associada (28%)
Fisiopatologia:
-A bactéria invade e danifica o epitélio das vias respiratórias e alvéolos, através da ação combinada de vários fatores de virulência que interferem com o movimento normal ciliar.
-A Bordetella pertussis libera toxinas que levam a hiperleucocitose (quanto mais bactérias nas vias respiratórias inferiores, maior será a quantidade de toxina e maior será a leucocitose).
Recentemente, foi reconhecida uma associação importante entre hiperleucocitose e hipertensão pulmonar em crianças com quadro sugestivo de Coqueluche.
A hiperleucocitose causa uma diminuição do fluxo de sangue pulmonar, atráves do aumento da resistência vascular.
Outras causas de Hipertensão Pulmonar: -Faixa etária favorável (RN e lactentes jovens--> resistência vascular pulmonar aumentada)-Acidose ocasionada pelo quadro séptico (vasoconstricção pulmonar)-Pneumonia secundária
Resumindo
• Coqueluche--> Hipoxemia--> Acidose--> Vasoconstricção pulmonar
• Hiperleucocitose --> aumenta a viscosidade sanguínea e leva a restrição do fluxo sanguíneo pulmonar.
Diagnóstico-Clínico-Laboratorial
Hemograma sugestivo (leucocitose + linfocitose)Cultura de secreções nasofaríngeas (é mais positiva nas
fases iniciais. Pode negativar com o uso de antibiótico).PCR ( Na França, 218 adultos com tosse persistente.
Destes adultos, 70 tinham B. Pertussis, sendo que somente um foi confirmado por meio de cultura e 36 por meio de PCR. Entretanto, os testes de PCR requerem amostras adequadas e ainda experiência do laboratório. A sensibilidade diminui com a duração dos sintomas. O método é baseado na detecção do microorganismo.
Teste Sorológico (IgG e IgA)
Tratamento:
-Suporte Hemodinâmico e Ventilatório.-Antibioticoterapia-EST ( leucocitose acima de 50.000)
A-61-12• Informações do pedido de necrópsia :• PMGL, masculino, 7 meses, pardo, natural de Braslândia• Internado na UTI em 20-06-12• Óbito em 25-06-12• Quadro de tosse quintosa e persistente, febre alta e
dispneia progressiva e sinais de choque séptico
A-61-12
• Achados de necrópsia:• Masculino, pardo, medindo 70 cm, pesando 10500g
com idade correspondendo a 7 meses.• Bom estado de nutrição, anictérico, cianose em
mãos e unhas• Medida crânio caudal = 57cm
PULMÃO: Septos alveolares expandidos por infiltrado inflamatório. Espessamento da camada média de artérias.
A-61-12Diagnósticos finais
• Causa mortis: • Insuficiência respiratória• Choque séptico• Doenças principais :• Pneumonia viral, com superinfecção
bacteriana ( compatível com coqueluche )• Leptomeningite• Septicemia
A-61-12Diagnósticos finais
• Principais complicações das doenças principais:• Traqueíte aguda com ulceração• Pleuris crônica• CIVD• Cor pulmonale• Edema cerebral• Congestão crônica passiva de fígado • NTA
Consultem também!Caso Clínico: Coqueluche (link para profilaxia perinatal)Autor(es): Mariana Alves, Lisliê Capoulade
Coqueluche-Recomendações atuais do Ministério da SaúdeAutor(es): Departamento de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria
Coqueluche: a visão do Intensivista PediátricoAutor(es): Alexandre Peixoto Serafim
:: Coqueluche grave e cuidados intensivosAutor(es): Alexandre Peixoto Serafim
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