Rodney Stark: Crescimento Cristianismo (Resenha )

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FACULDADE TEOLÓGICA BATISTA DO PARANÁ Programa de Bacharelado em Teologia Resenha apresentada por: LEIDMAR MAGNUS FESTA O CRESCIMENTO PALPÁVEL DO CRISTIANISMO E OS DOGMAS SOCIOLÓGICOS Resenha apresentada como requisito parcial para obtenção de nota na disciplina de História do Cristianismo do programa de Graduação da Faculdade Teológica Batista do Paraná Professor: Marlon Ronald Fluck CURITIBA 2008

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Um sociólogo analisa a expansão do cristianismo de um ponto de vista pouco abordado

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FACULDADE TEOLÓGICA BATISTA DO PARANÁ

Programa de Bacharelado em Teologia

Resenha apresentada por:

LEIDMAR MAGNUS FESTA

O CRESCIMENTO PALPÁVEL DO CRISTIANISMO E OS DOGMAS SOCIOLÓGICOS

Resenha apresentada como requisito parcial

para obtenção de nota na disciplina de História

do Cristianismo do programa de Graduação da

Faculdade Teológica Batista do Paraná

Professor:

Marlon Ronald Fluck

CURITIBA

2008

Page 2: Rodney Stark: Crescimento Cristianismo (Resenha )

ÍNDICE

1 ESCLARECIMENTOS PRÉVIOS ............................................................................................ 3

2 RESUMO ................................................................................................................................. 3

3 ANÁLISE E POSICIONAMENTO ......................................................................................... 11

4 APLICAÇÃO PRÁTICA E CONCLUSÃO ............................................................................. 14

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 16

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1 ESCLARECIMENTOS PRÉVIOS

Rodney Stark é um respeitado sociólogo da religião na atualidade e

realiza estudos neste campo desde meados da década de 60. Adepto

declarado do agnosticismo e professor da Washington University, procura

realizar suas pesquisas mantendo o foco em movimentos religiosos recentes

(como alguns citados no livro alvo desta resenha: mórmons e moonies).

Stark é o autor de livros como The Rise of Christianity: How the

Obscure, Marginal, Jesus Movement Became the Dominant Religious

Force(1997) e The Victory of Reason: How Christianity Led to Freedom,

Capitalism and Western Success (2006).

2 RESUMOAo iniciar a sua obra, o autor tenta explicar como ocorreu o crescimento

do cristianismo através de números (projeções que ele chama de “aritmética do

crescimento”), realiza a averiguação do processo sociológico da conversão de

pessoas a uma religião diferente da sua atual e discute teorias/metodologias

utilizadas para reconstruir a história sem informações adequadas. O autor

ainda afirma que tenta entender as ações humanas em termos humanos no

crescimento do cristianismo sem ser rebaixado a um sacrílego qualquer.

A idéia de se ter uma base quantitativa de quanto cresceu o cristianismo,

diz o autor, nos leva por dois caminhos:

se o cristianismo realmente cresceu de forma assustadora, então formula-se

teorias sobre a conversão

caso o crescimento não tenha sido tão grande, então deve-se propor teorias

testadas de formas empíricas.

Existe um consenso entre os estudiosos de que entre 250 e 300 A.D.

houve um salto no crescimento do cristianismo e também que a maior

concentração de cristãos era em cidades, e não na zona rural (Harnack , 1908

e Meeks 1983). Assim sabemos também o porque da palavra paganus que

significa camponês veio a se referir aos pagãos (não cristãos).

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Em suas projeções sobre o crescimento da população cristã, o autor

considera a hipótese de um o crescimento de 40% por década, o que

acarretaria uma população com cerca de 33 milhões de cristãos em 350 A.D.

(deixando até um ponto de interrogação sobre o argumento de Eusébio,

segundo o qual houve um real crescimento do cristianismo devido a conversão

de Constantino). Abaixo estão as projeções estimadas pelo autor:Ano Num de Cristãos Percentual da população* 40 1.000 0,001750 1.400 0,0023100 7.530 0,0126150 40.496 0,07200 217.795 0,36250 1.171.356 1,9300 6.299.832 10,5350 33.882.008 56,5*Baseado em uma população estimada em 60 milhões – Tabela da página 17 do livro

A estimativa acima tem somente o objetivo de deixar a cifra de

crescimento palpável e mostrar que não foi necessária uma taxa de conversão

miraculosa. Mesmo assim, em 350 A.D. o crescimento é insignificante, talvez

porque o cristianismo tenha crescido tanto que chegou ao ponto em que já

havia convertido uma grande parte da população.

Sobre a conversão, temos os argumentos de Eusébio, Ramsey

MacMullen (“Christianizing The Roman Empire”) e Agostinho que relatam sobre

as várias conversões em massa devido aos milagres e um crescimento em

proporções inconcebíveis. Contra isso, o autor cita suas projeções as quais

mostram que o número de cristãos poderia chegar a metade da população no

século IV sem quaisquer milagres ou conversões em larga escala.

Em estudos de campo (Stark e Bainbridge acompanharam um grupo

religioso chamado “Igreja da Unificação”, conhecidos como moonies), foram

observados alguns aspectos da conversão e formuladas algumas proposições

que são dignas de citação:

A proposição sociológica fundamental da conversão infere que ocorre a

conversão para um grupo dissidente (fora dos padrões vividos localmente)

quando o indivíduo possui ou desenvolve vínculos mais fortes com os já

convertidos do que aqueles vínculos que ele tem com os não-convertidos.

Outra proposição diz ainda que os fundadores de religiões bem sucedidos

convertem primeiro os seus parentes, devido aos fortes vínculos. Como

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exemplo temos: Maomé (converte sua esposa e depois seu primo e sua serva)

e Jesus Cristo (seus irmãos e sua mãe).

Em suas observações, o autor verificou que dentre todas as pessoas

contatadas pelos moonies (ao tentar disseminar sua própria fé), somente

aderiram ao movimento aquelas que possuíam fortes vínculos interpessoais

com os já convertidos, e estes vínculos eram mais fortes do que com os não

convertidos, ou seja, os indivíduos buscaram adequar o seu próprio

comportamento religioso ao de amigos e parentes, fato que configura uma

aplicação da “Teoria do Controle do Comportamento Dissidente” (Toby 1957;

Hirschi 1969) a qual afirma que algumas pessoas se tornam dissidentes

(violam leis, etc.) e outras se adaptam pois aquelas têm muito menos a perder

(padrões de adaptabilidade). Ao concluir, o autor afirma que para um

movimento religioso ter sucesso são necessários: a conversão e o crescimento

através de redes sociais.

A partir deste ponto, começa a exposição sobre as contribuições da

ciência social para a história, iniciando com a teoria social e a reconstrução

histórica, pontos nos quais o autor discorda de muitos estudos publicados para

preencher lacunas no registro histórico e arqueológico, considerando alguns

modelos como inadequados ou superficiais. Cita como exemplos Durkheim

(que “descobriu” que a religião é a sociedade adorando a si mesma) e Max

Weber (que no uso que este faz do termo carisma -dom divino no grego - ele

considera algo que o líder tem , algo divino e ponto final) . A discordância dos

autores acima é devido ao velho conceito de cientistas sociais que lidam mais

com metáforas e não com teorias científicas. Isso tudo cria obras sem

concisão.

Continuando, temos a classe fundamental do cristianismo primitivo ,

discussão na qual o consenso da maioria dos estudiosos do século XX foi de

que no início o cristianismo era constituído de escravos e pessoas destituídas

de seus direitos (Marx e Engels). Atualmente, através da análise dos escritos e

de descobertas arqueológicas um novo consenso surgiu e os historiadores

afirmam que haviam muitos indivíduos privilegiados em seu meio – apesar de

não haver como provar nenhuma das duas proposições acima.

Ao definir seita e culto, o autor diz que a primeira é formada por

indivíduos de um movimento religioso que se afastam da fé praticada na sua

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forma convencional e tentam restaurar a religião em um nível mais elevado de

tensão com o ambiente e o segundo são novas crenças religiosas que iniciam

pequenas e começam a atrair novos adeptos da fé. Em suas abordagens está

destacado que indivíduos mais privilegiados aderem a novas religiões pois

estas implicam em interesse por novos usos, costumes e conhecimentos

culturais, e também a sua antiga religião talvez estivesse tão secularizada que

não conseguia mais satisfazer as suas necessidades de compensadores.

Chegando na história judaica, o destaque é para a opinião histórico-

acadêmica que afirma que a missão judaica fracassou. No entanto, na opinião

do autor, a tradição judaico-cristã teve papel fundamental mesmo após muito

tempo após o crescimento do cristianismo. Os judeus rejeitaram o cristianismo

(sabemos disso pois após a ascensão do cristianismo ainda existia uma grande

população judaica, as grandes sinagogas continuaram a funcionar no período

crítico e referências bíblicas advertindo os judeus), mas mesmo assim, o

cristianismo ofereceu aos judeus as mesmas coisas que a reforma judaica

ofereceu! As proposições são de que “as pessoas se dispõem a adotar uma

nova religião caso exista uma continuidade cultural em comparação com a sua

antiga religião” (página 68) e também que “os movimentos sociais crescem

mais rapidamente quando se disseminam em redes sociais preexistentes”

(página 69).

Os judeus helenizados da diáspora viviam uma crise: eram considerados

hereges e desertores do judaísmo (pois não cumpriam seus rituais) e também

não eram considerados cidadãos gregos (isolados pela sua lei, não podiam ter

direitos cíveis). Ao receber a boa nova, aconteceu o que se esperava: os

judeus cristãos saíram da Palestina e procuraram locais onde haviam judeus

helenizados para receber a boa nova. Mas porque no século II a conversão

judaica sumiu? Pois os fatos que se passaram nos séculos IV e V (ataques aos

judeus etc) foram uma fase do processo para consolidar uma “fé diversa e

diversificada em uma estrutura católica claramente definida” (página 81).

Sabemos então que os judeus da diáspora utilizaram a reforma judaica para

reagir à situação social na qual se encontravam, e o mesmo aconteceu em

relação ao cristianismo. O autor acredita que os fatos devem ter ocorrido desta

maneira, e que a “missão judaica teve sucesso considerável de longa duração”

(página 84).

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Expostas as possíveis contribuições que a sociologia pode prestar à

história, o autor passa a dar atenção aos fatores que convergiram para nosso

atual contexto histórico e religioso. O primeiro fator abordado são as epidemias

e pragas, as quais se configuravam como sendo as únicas rivais que podiam

derrotar exércitos inteiros sem muitos esforços. Sabendo-se que o paganismo

e a filosofia clássica não ofereciam explicações e nem mesmo valores

humanitários suficientes para que a população pudesse enfrentar estas

tragédias, podemos saber que o cristianismo ganhou muitos adeptos com isso,

pois “o ensinamento de sua fé tornava a vida significativa mesmo em meio a

morte brusca e imprevista” (MaNeill,1970). Não é surpresa e nem novidade que

as idéias cristãs eram revolucionárias no contexto pagão: Deus ama aqueles

que o amam (Aristótoles dizia que Deus não podia sentir amor em resposta ao

que lhe é oferecido), Deus ama a humanidade e devemos amar uns aos outros

e isso vai além da tribo ou da família de sangue, vai a todos que invocam a

Jesus Cristo (1 Co 1.2 e Mt 25.35-40) tudo isso em uma época marcada pelo

cinismo e mundanidade. Os cristãos cuidavam dos seus doentes debilitados

pelas epidemias, por este motivo a mortalidade cristã era menor, vários não

cristãos acabavam se convertendo e os pagãos sobreviventes tinham seus

vínculos com cristãos acrescidos. Assim o paganismo foi suficiente para os

impérios Romano e Helênico por séculos, mas não teve capacidade para lidar

com as crises sociais e espirituais causadas por estes elementos invisíveis

naquela época.

Também existe uma discussão sobre os coeficientes sexuais entre

cristãos e pagãos destacando a maioridade feminina no meio cristão, fato que

causou posteriormente uma alta taxa de natalidade e várias conversões

secundárias, que é a conversão onde um indivíduo adere a um movimento pela

influência de outro com o qual possui vínculos. Estas conversões se davam em

especial através de casamentos exogâmicos entre mulheres cristãs e maridos

ainda não convertidos.

Esta maioridade feminina foi causada devido ao status superior que a

mulher possuía no cristianismo em comparação ao seu status no mundo

clássico e também devido a várias outras ideologias do cristianismo como:

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• Repúdio do infanticídio e do aborto (os quais eram praticados nas

sociedades greco-romanas e recomendados por Aristótoles e Platão,

sendo que o aborto muitas vezes causava óbito da mulher);

• O sexo somente dentro do casamento tanto para mulheres e homens;

• A monogamia masculina (em oposto ao paganismo que permitia ao

homem manter relações com várias mulheres);

• As viúvas cristãs eram cuidadas pela igreja e podiam escolher casar ou

não (já as viúvas pagãs eram obrigadas a casar de novo);

Como já foi comentado, o cristianismo iniciou como um movimento

urbano, e um fator que merece destaque é a proximidade com as cidades de

referência Jerusalém e Roma. Em estudos foi possível notar que, no início do

movimento cristão, quanto mais próximo de Roma (e consequentemente mais

distante de Jerusalém) as cidades tinham um contingente menor de cristãos e

o oposto também era verdadeiro.

O cristianismo com o seu apelo social e suas ideologias, foi em especial

um movimento urbano que deu às cidades várias soluções práticas para os

problemas enfrentados, assim chegamos a outros fatores importantes: o caos

e a miséria urbana. Consideremos como exemplo Antioquia, que enfrentava

uma miséria crônica com altíssima densidade demográfica (estima-se algo em

torno de 195 pessoas por acre – sendo que a ilha de Manhattan em Nova

Iorque nos E.U.A possui um índice que figura em torno de 135 pessoas por

acre), prédios com no máximo cinco andares e com cômodos minúsculos

entulhados de famílias, muitos animais na cidade, as pessoas dependiam de

urinóis que eram esvaziados à noite pela janela ocasionando a existência de

urina e fezes nas ruas, falta de água (a qual somente era encanada para as

residências dos mais abastados), imundice, mal cheiro (por este motivo eles

adoravam incenso), proliferação de insetos e ratos. Com tudo isso, ainda

ocorriam as mortes em massa, e como haviam muitas mortes chegam muitas

pessoas novas à cidade (alta rotatividade de pessoas), fato que enfraquece os

vínculos interpessoais e aumenta a violência urbana. Não bastasse isso, ainda

estima-se que Antioquia era atingida por uma grande catástrofe, que causava

grandes estragos à cidade, a cada 15 anos (terremotos, incêndios e

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desabastecimento de alimentos). Note que as pessoas que vivem em um lugar

assim anseiam por libertação, esperança e até mesmo salvação. E o

cristianismo veio para proporcionar redes de relacionamento com novas

normas sociais, solidariedade e serviço social , chegando assim ao seu triunfo.

O martírio com certeza foi motivo de reavivamento de fé, deu à igreja

força moral para alavancar conversões e ajudou nos momentos de crises de

credibilidade. Os antigos conceitos sociológicos, que tinham o objetivo de

desacreditar a religião, afirmavam que os cristãos resistiam ao martírio através

do masoquismo (Riddle 1931, Manninger 1938 e Reik 1976), obviamente estes

conceitos já foram derrubados e sabe-se que o martírio (e também as demais

decisões no âmbito religioso) é mais uma decisão racional na qual entram em

jogo todos os compensadores (que são propósitos para obter uma

recompensa) e as recompensas (que são as coisas desejadas) que serão

avaliados pela pessoa a qual tomará uma decisão baseada nas perdas e

ganhos. Não podemos descartar ainda a capacidade humana de amar, que

também influi sobre a tomada de decisão. Sabe-se ainda que um compensador

religioso produzido ou consumido de forma coletiva tem seu valor mais

facilmente avaliado quando existem evidências (testemunhos) fidedignas de

seus benefícios tangíveis, pois eles passam maior credibilidade.

Um fator que se configura como um problema ao qual sempre estão

sujeitas as “ações coletivas” (religiões, seitas e movimentos de culto se

enquadram nesta classificação) é a questão dos aproveitadores, que são

pessoas que se aproximam do grupo apenas para usufruir dos benefícios e

dissipam a capacidade de se criar bens religiosos coletivos. Estas pessoas

geralmente são afastadas pelos sacrifícios (oportunidades das quais a pessoa

abre mão) e estigmas (aspectos diferentes do grupo que os separam da

sociedade), que aumentam o custo de ingresso no grupo, pois qualifica só os

dispostos a pagar o preço e valoriza a reunião do grupo – pois se o adepto fica

proibido de participar de atividades sociais como cinema, esportes, parques

etc. , o encontro social é valorizado e muito esperado.

Neste ponto, com o objetivo de comparar as características do

cristianismo com as religiões não exclusivas, o autor expõe sua teoria da

“economia religiosa”, a qual é constituída de um mercado de consumidores e

concorrentes e um conjunto de firmas religiosas que tentam atender a

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demanda. Nesta teoria, o autor explica que as firmas religiosas de

compromisso exclusivo (aquelas que exigem exclusividade de seus adeptos)

devem possuir atividades para todos os seus membros, criam também

recompensas que somente podem ser alcançadas pela exclusividade e

desencorajam os membros a buscar isso em outras religiões - e é este tipo de

firma que consegue fixar membros e torna-los assíduos colaboradores.

Do outro lado estão as firmas religiosas de compromisso não-exclusivo

(que não exigem exclusividade de seus membros, os quais são livres para

freqüentar outros tipos de cultos) que por sua vez possuem uma saúde mais

frágil e estão mais propensas a debandadas de membros.

Desta maneira, é possível inferir que: a igreja proporcionava a interação

entra as pessoas através de relacionamentos prolongados, estáveis, pessoais

e exclusivos; havia um comportamento padrão a ser seguido no meio cristão; o

cristão possuía IDENTIDADE (em oposto ao paganismo); os membros das

firmas não-exclusivas (pagãs da época) não se envolviam nos cultos e a

comunidade cristã era obstinada e influenciava todos em seu círculo de

relacionamentos.

Do outro lado estava o paganismo, que tombou perante o cristianismo e

o fato consumador disso foi a conversão de Constantino, mas também: o corte

da ajuda financeira do Estado para o paganismo; o poder político cristão (que

não é suficiente para explicar a queda do paganismo e nem a inicialização do

cristianismo como religião do Estado); a diversidade dos deuses e templos

encarecia os cultos; diversidade de filosofias de vida levando a relutância dos

indivíduos a aceitarem alguma delas e a pouca reverência pública demonstrada

pelos fiéis pagãos.

Em suma, assim começa a caminhada rumo ao monoteísmo, que é

apoiada pela proposição “quanto mais antiga e cosmopolitana a sociedade fica,

passam a adorar menos deuses de maior calibre e poder” (página 223). Mas o

resultado é um monoteísmo com o deus do MAL (este se faz essencial para a

concepção mais racional de divindade) e o deus do BEM.

Com todas estas teorias e pesquisas apresentadas, o autor inicia sua

conclusão dizendo que “as doutrinas fundamentais do cristianismo estimularam

e sustentaram organizações e relações sociais atrativas, libertadoras e

efetivas” (página 236). O cristianismo começou a ensinar seus conceitos em

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meio ao caos cultural, à miséria urbana e o ceticismo filosófico, trazendo assim

uma grande novidade (que não eram as exigências de Deus e nem a

satisfação que Ele poderia dar ao homem, tudo isso já existia no paganismo). A

novidade foi que Deus ama aqueles que o amam! Este foi o grande choque

para as culturas daquela época, onde a o conceito dominante dizia que

“piedade e misericórdia são sentimentos patológicos – defeitos de caráter - que

o homem deve evitar [...] a piedade constitui defeito de caráter indigno do sábio

e perdoável só aqueles que ainda não cresceram. Reação impulsiva baseada

na ignorância” (página 238).

Por fim, o cristianismo revitalizou a caótica sociedade romana fazendo

com que todos fossem bem vindos, estimulando a igualdade dos sexos,

criando um novo conceito de humanidade para um mundo cheio de crueldade e

amor interesseiro e conseguiu implantar leis, usos e costumes que iam contra a

tradição de crueldade gratuita do paganismo. “Proporcionou então a

humanidade para os crentes, tendo na virtude a sua própria recompensa”

(página 238).

3 ANÁLISE E POSICIONAMENTODesde o início de sua obra o autor deixa claro que a sua intenção é

explicar de uma forma palpável como ocorreu o crescimento do cristianismo.

Esta tentativa é feita através da exposição de várias teorias de outros autores e

de suas próprias proposições e inferências a respeito deste tema. O autor não

se prende às narrativas bíblicas e procura sempre rechear o seu texto com

algumas explicações históricas bem como alguns usos e costumes que

possam dar ao leitor uma base mais palpável para entender o processo de

crescimento da população cristã – o porque disso pode ser entendido ao

levarmos em consideração que o autor segue a linha agnóstica.

Também fica claro que o foco das narrativas está na descrição do estilo

de vida das sociedades antigas (costumes, filosofia de vida dos povos

enquadrados neste tema), seguido de uma exposição das conseqüências deste

estilo de vida (o caminho que uma determinada sociedade percorreu) e o

provável desfecho (fatos históricos em decorrência deste estilo de vida). Por

fim, o autor acaba sempre mencionando as teorias e inferências sociológicas

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oriundas destes estilos de vida. Os personagens históricos são mencionados, e

algumas linhas são dedicadas a eles, porém não são o centro da narrativa.

Dentre tantas idéias encontradas neste livro, algumas nos chamam mais

a atenção, como as afirmações de que os cristãos puderam sobreviver melhor

às epidemias e pragas devido ao trato que prestavam aos seus doentes (e não

graças aos milagres) e também que as pessoas que não tinham crença alguma

na vida eterna (como exemplo o médico Galeno) e permaneciam nas cidades

ajudando os doentes tinham muito mais coragem do que os cristãos que o

faziam. Sobre a primeira podemos afirmar que a assistência prestada aos

doentes em tempos de crises sociais diminui a mortalidade, mas em momento

algum podemos descartar a “mão divina” que conduz qualquer situação. Em

relação à segunda afirmação do autor, apenas comento que sem conhecer a

história e os valores que norteiam a vida das pessoas, sendo elas cristãs ou

“pagãs” não podemos de forma alguma determinar o nível de coragem de

qualquer indivíduo.

Em uma verificação apurada do texto, podemos ver que um dos pontos

fortes é a explicação que o autor nos fornece a respeito dos compensadores

religiosos e as recompensas. Quando contextualizamos estes conceitos,

somos capazes de prever alguns comportamentos que ser tornam típicos

dependendo das características de cada pessoa que pertence a um grupo

religioso.

A afirmação feita pelo autor de que “com base em documentos antigos e

proposições sociológicas, a reconstrução dos fatos feita por ele é o que

realmente aconteceu” (página 64) com certeza é precipitada e de uma jactância

sem proporções mensuráveis. Sabemos que não se pode afirmar

categoricamente (mesmo que amparado por documentos que “supostamente”

são coerentes) que uma seqüência de fatos foi desencadeada exatamente

como está sendo descrita por um autor mais de um milênio depois dos

acontecimentos.

Em sua exposição a respeito das redes sociais e do processo da

conversão, Stark deixa claro que existe uma chance maior de um indivíduo se

converter a uma religião caso esteja inserido em uma rede social e possua

vínculos interpessoais com adeptos desta religião. Ao final, o indivíduo acaba

assimilando os usos e costumes de seu novo grupo de relacionamento. Esta

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idéia do autor nos remete ao tipo de evangelismo e discipulado mais eficaz que

existe: o relacionamento diário.

Existe uma explanação que causa polêmica mesmo nos dias de hoje: o

papel da mulher na igreja primitiva. Aqui podemos observar o resgate de dados

históricos e fatos que sugerem uma superioridade numérica feminina nos

círculos cristãos. Estas mulheres eram supostamente atraídas pelo elevado

status da mulher cristã (que era mais elevado quando comparado às culturas

seculares daquela época), e também pelas ideologias cristãs a respeito da

monogamia e proibição do infanticídio dentre outras. Algo também

esclarecedor é a descrição sobre as técnicas de aborto utilizadas no império

romano, pois através disso é possível verificar como o ser humano continua

cometendo as mesmas atrocidades continuamente (mesmo após séculos de

erros, nós ainda não conseguimos aprender). Um bom lembrete é que também

somos herdeiros do machismo do século XVIII praticado indiscriminadamente

como norma cultural (um grande exemplo é o termo “diaconiza” foi substituído

por “serva” na tradução inglesa da Bíblia).

Ao entrar no assunto martírio, logo surge o comentário de que existe

sempre uma avaliação prévia de causas/conseqüências racionais e

ganhos/perdas. Assim sendo, muitos abjuraram de sua fé, mas os que a

assumiram passaram por sofrimentos terríveis. Acredito que esta ligação feita

pelo autor é válida e com certeza levou muitos mártires a aceitação de seu

árduo caminho. Não podemos ser ingênuos e acreditar que um bispo passaria

pelo martírio e apenas pensaria em manter sua fé e ir para o céu, pelo

contrário, também existem pensamentos e causas humanas (mesmo que

secundárias) que os levaram a aceitar o martírio, que também estava ligado

diretamente com fama e honra.

Em sua descrição sobre a precariedade das estruturas urbanas (falta de

água, moradias apertadas, altíssima densidade demográfica, alta rotatividade

de pessoas levando a falta de vínculos que causa a alta criminalidade, etc.), e

das debilidades do paganismo (que era incapaz de dar as respostas para seus

adeptos durante as epidemias e os desastres) concordo com o autor que o

cristianismo acabou tendo grande aceitação por ter criado um caminho para a

revitalização da vida nas cidades através dos relacionamentos e vínculos

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interpessoais, a esperança e a caridade, o novo senso de família e a

solidariedade social.

Concordo também com a conclusão do autor que expõe a verdadeira

novidade do cristianismo o qual surge em uma sociedade impregnada pelos

conceitos filosóficos (onde é inconcebível que deus sinta amor por um ser

humano e onde a piedade e misericórdia são consideradas

falhas do caráter humano e devem ser evitadas por todo homem

racional). A novidade (ou ainda a revolucionária novidade) é que Deus ama os

que o amam. Concluo dizendo que em meio ao caos e a brutalidade

estabelecidos, o cristianismo foi adotado como via de recuperação e, porque

não, salvação para aqueles que desejavam uma vida nova, uma utopia para

aquele tempo.

4 APLICAÇÃO PRÁTICA E CONCLUSÃOEm várias reflexões feitas sobre o conteúdo deste livro, pude chegar a

várias aplicações e lições que vou levar para minha vida.

Ao me deparar com a visão do autor sobre as redes sociais, e o

processo da conversão pude aprimorar meus conhecimentos nesta área e

entender algumas das técnicas utilizadas nas abordagens evangelísticas (tanto

aquelas que são “erradas” e as “corretas” de acordo com esta teoria) e também

nas abordagens de introdução de membros no corpo da igreja através do

discipulado, os quais têm no relacionamento interpessoal um fator

imprescindível para o seu sucesso.

Em relação ao crescimento palpável do cristianismo, todas as teorias e

estudos apresentados contribuem para o meu crescimento pessoal, pois

poderei utilizá-los futuramente em novos estudos. Humanamente falando,

cheguei à conclusão de que não se pode indicar um único fator como sendo a

causa da queda do paganismo clássico e a ascensão do cristianismo (um

movimento messiânico que inicialmente era pequeno e desorganizado) para

um movimento dominante no Império Romano e depois em todo o mundo.

O fato de se ter uma descrição pormenorizada dos principais fatores

conhecidos que contribuíram para esta ascensão (como a crise fundamental

cristã, a diáspora judaica, o papel da mulher na igreja primitiva, os coeficientes

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sexuais e o casamento exogâmico, dentre outros), não me deixa esquecer que

mesmo assim a mão de Deus esteve guiando os acontecimentos, pois

sabemos que nosso Senhor não precisa de efeitos especiais para fazer com

que a Sua vontade seja realizada na Terra, pelo contrário, Ele utiliza pequenas

coisas para cumprir seus propósitos e atingir seu objetivo.

Os conceitos de compensadores, recompensas, estigmas e sacrifícios

me foram muito úteis na compreensão (não apenas no âmbito religioso, mas

também no secular) dos usos e costumes de algumas religiões, seitas e tribos

urbanas. Através deste conceito é possível traçar um padrão comportamental

dos indivíduos, ao menos daqueles que estão realmente comprometidos com a

causa, de acordo com o grupo de relacionamento ao qual pertencem.

Obviamente existem exceções às regras, mas mesmo assim é possível ao

menos enumerar um conjunto de ações e reações às quais estes indivíduos

estarão sujeitos ao longo de sua vida. Este tipo de análise com certeza é muito

útil para qualquer grupo que deseja alcançar novos adeptos ou firmar o

compromisso daqueles que já aderiram a sua causa, pois através dela é

possível realizar e criar eventos de integração que sejam agradáveis para

vários tipos de pessoas ou direcionados para um único tipo de pessoas.

De um modo geral, meus olhos foram abertos para uma nova realidade,

na qual todos estão sujeitos a cometer erros. Assim sendo, sabemos que nem

todas as teorias sociológicas estão, ou estavam, corretas e que por mais

gabaritado e tradicional que seja um cientista (seja qual for a sua área de

atuação) ele também está sujeito a erros, os quais mesmo sendo grotescos

são aceitos como verdade devido à limitação do conhecimento na época, mas

depois são substituídos por conceitos que se aproximam mais da verdade. Isso

abre uma nova possibilidade em minha limitada visão: ter liberdade para criar e

teorizar sobre o comportamento humano dos primeiros cristãos e contextualizar

para nossos dias, desde que isso não venha ferir os conceitos que considero

como pilares da fé cristã.

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5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COLLINS, Harper. Sessão Authors, http://www.harpercollins.com/authors/ 9423/Rodney_Stark/index.aspx . Acesso em 10 out. 2008.

STARK, Rodney. O Crescimento do Cristianismo: Um Sociólogo Reconsidera a História. São Paulo: Paulinas 2006.

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