Ribeirão Preto...7 Quanto à escolha de Ribeirão Preto, deveu-se ao fato de se buscar nessa cidade...
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INTRODUÇÃO.
Este trabalho trata da atuação dos comunistas e de sua
ligação com a União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, entre
1922 e 1947. O papel do movimento comunista na organização da classe
operária e na evolução político-social do Brasil, e a importância
econômica da região ribeiropretana no contexto nacional foram fatores
que contribuíram decisivamente para a escolha deste tema.
No período compreendido por esta pesquisa, o país passou
por modificações nas esferas mais altas da estrutura do poder. No final da
década de 20, o poder oligárquico _ estabelecido até então por intermédio
da “política café-com-leite” _ foi abalado pela crise de 1929 e pela
Revolução de 30, que levaram ao poder Getúlio Vargas. Os anos 30
foram marcados pelo aumento da tensão social e da repressão policial.
Enquanto o governo Vargas incentivava a industrialização do Brasil,
reprimia ao mesmo tempo, com violência, as formas autônomas de
organização operária, procurando manter sob seu controle os sindicatos
dos trabalhadores.
Na década de 30, em especial, o governo sustou
veementemente a ação de quaisquer movimentos, instituições ou pessoas
consideradas subversivas e perigosas para a manutenção da ordem
política e social. O Partido Comunista do Brasil, desde a sua fundação, foi
uma das agremiações partidárias que mais sofreram com essa repressão
policial. Criado sob a influência ideológica do movimento anarquista e da
Revolução Russa de 1917, o PCB tencionava transformar-se na força
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unificadora e catalisadora das insatisfações e reivindicações operárias,
implantando no Brasil os ideais revolucionários bolcheviques. Essas
pretensões fizeram do PCB, desde cedo _ apesar do pequeno número de
seus membros _, uma ameaça ao poder estabelecido, o qual tentava, de
todas as maneiras, coibir sua ação.
O trabalho de pesquisa sobre a história do Partido
Comunista do Brasil no período compreendido entre 1922 e 1947 é
bastante complexo, haja vista as grandes modificações políticas ocorridas
nessa época.
Ao escolher o ano de 1922 como ponto de partida desta
dissertação, consideramos a fundação do PCB, embora as duas décadas
anteriores tivessem sido palco de profundas modificações sociais,
econômicas e políticas, causadas pela industrialização do país. O grande
aumento do número de operários provocou tensões sociais, com uma
conseqüente atuação do PCB nesse processo. A análise destes
acontecimentos fez-nos determinar quais os passos a seguir para
elaborar este trabalho, cuja baliza final justifica-se por vários motivos.
Em 1947, encerrou-se o curto período de legalidade do PCB
e os comunistas passaram de novo a enfrentar a repressão policial,
diminuindo sensivelmente a atividade dos militantes. Ainda nesse
momento, Ribeirão Preto assistiu à primeira eleição municipal com
participação de candidatos comunistas. Por último, a partir da divulgação
do manifesto de Luís Carlos Prestes, em 1.º de agosto de 1950, o PCB
assumiu uma outra linha de procedimento, enquanto em Ribeirão surgia
uma nova geração de militantes, marcando o fim de três décadas de
atuação do grupo fundador do PCB na cidade.
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Quanto à escolha de Ribeirão Preto, deveu-se ao fato de se
buscar nessa cidade explicações sobre a importância das bases do
movimento sindical nacional e da organização interna do Partido
Comunista. A maior parte das obras historiográficas dá atenção especial à
atuação dos comunistas nas capitais, citando superficialmente a atividade
do PCB nas cidades do interior. Por isso, buscamos realizar nossa
pesquisa no interior do Estado de São Paulo, particularmente em Ribeirão
Preto, que desde o final do século passado caracterizou-se por ser uma
das regiões mais importantes do país, tanto política como
economicamente. Ademais, enquanto em São Paulo, durante a década de
20 e início dos anos 30, o Partido Comunista não conseguiu se firmar,
Ribeirão contou precocemente com importantes lideranças do PCB, como
Edmundo Moniz, Theotônio de Souza Lima, Henrique Couvre e Sebastião
Pintaúde, que fizeram parte da oposição de esquerda dentro do Partido e
exerceram grande influência sobre o movimento operário, organizando um
forte núcleo comunista na região.
Notória pelas grandes safras de café, especialmente na
década de 20, Ribeirão ficou conhecida como a “capital do café”. Os
“coronéis” controlavam a política regional e tinham influência no governo
estadual, e até mesmo no governo federal. Sua influência na cidade
também era visível no lento desenvolvimento sindical dos trabalhadores,
particularmente até meados da década de 20. A organização operária na
cidade cresceu tendo de enfrentar a resistência dos poderosos
cafeicultores que, temerosos com a possibilidade de perder seu controle
sobre os trabalhadores e a mão-de-obra barata, usavam seu poder
político e econômico para conter o avanço organizado dos operários. Nos
primeiros anos deste século, a cidade viu crescer embrionariamente o
movimento sindical, marcado por greves e movimentos liderados pelos
anarquistas. Entretanto, esse avanço só tomaria um impulso considerável
sob a influência comunista, a partir de 1922.
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O primeiro núcleo comunista surgiu na cidade por volta de
1922 e 1923. Todavia, só iniciaria sua atuação de maneira organizada
após a fundação da UGT - União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão
Preto. Criada em 1925 por ex-anarquistas, essa instituição serviu, durante
três décadas, como fomentadora e descobridora de novos militantes
comunistas, que atuaram decisivamente na organização sindical dos
trabalhadores na primeira metade do século XX. Os comunistas
ribeiropretanos estiveram ligados à UGT desde a sua fundação até
meados da década de 60, usando essa organização como fachada legal
para a sua militância política e sindical. Por conseguinte, o entendimento
da influência comunista nos movimentos operários e na sindicalização dos
trabalhadores em Ribeirão Preto apresenta-se como uma questão
essencial no estudo da formação da classe operária e da própria
sociedade ribeiropretana como um todo. A tática comunista de utilizar os
sindicatos para expandir os seus ideais entre os trabalhadores
caracterizou-se em Ribeirão pela já citada ligação entre os membros do
PCB e da UGT.
A impossibilidade de atuação legal vivida pelo Partido em
quase toda a sua história, associada à intensa repressão policial e ao
desconhecimento por parte dos trabalhadores das idéias bolcheviques,
dificultavam a organização de células nas indústrias e bairros na década
de 20. Portanto, os comunistas buscaram aumentar sua credibilidade
junto à população ribeiropretana por intermédio de uma instituição que
aparentemente não tinha fins políticos. Atuando dentro da UGT, os
comunistas puderam aumentar seu contato com os trabalhadores sem
despertar, inicialmente, a atenção da polícia.
Métodos como esse foram utilizados pelo PCB não só em
Ribeirão, mas também em âmbito nacional. O Partido Comunista
9
tencionava transformar-se no “primeiro e único partido operário do Brasil _
a vanguarda do proletariado”.1 Em Ribeirão, os militantes refletiam essa
intenção do Comitê Central Executivo tentando conquistar a hegemonia
do movimento operário por intermédio da UGT, ambicionando
“transformar os militantes sindicais em líderes políticos”.2 Essa relação
entre o movimento sindical e os comunistas apresentava bem complexa:
fatores diversos devem ser levados em conta para analisar a atuação dos
militantes e sua influência na organização do operariado. Esses fatores,
especialmente os de cunho ideológico, representam barreiras que serão
avaliadas nesta introdução.
As maiores barreiras enfrentadas pelo pesquisador da
História do Comunismo relacionam-se com questões práticas e
ideológicas do próprio desenvolvimento do Partido no Brasil e no mundo.
No que diz respeito às questões práticas da história do PCB, o principal
problema é o longo período em que o Partido atuou na ilegalidade. Tal
situação fez com que as fontes existentes, salvo algumas exceções, ou
fossem destruídas ou caíssem nas mãos da polícia. Portanto, a análise
dos documentos produzidos pelo Partido acaba tendo de sofrer a
intermediação da interpretação policial.
Logo, a opção por trabalhar com o corpo documental dos
arquivos do DEOPS-SP permitiu a análise do discurso da “repressão”,
enquanto as entrevistas realizadas com comunistas que atuaram nas
décadas de 40 e 50 trouxeram à tona o discurso do militante. Além destas
duas fontes principais, foi realizado um levantamento de artigos em
1 DULLES, J. W. F., Anarquistas e comunistas no Brasil, p. 244.2 BRANDÃO, O. Otávio Brandão (depoimento, 1977). Rio de Janeiro, FGV/CPDOC -
História Oral, 1993, p. 34.
10
jornais da cidade,3 entre 1905 e 1956, com a intenção de avaliar as
publicações da imprensa sobre o comunismo.
O DEOPS - SP4 foi criado em 1924, e teve seus arquivos
abertos ao público em dezembro de 1994. Seu acervo contém
documentos produzidos na tarefa de policiamento de setores
considerados perigosos pela ordem vigente. A inegável importância
desses documentos para o estudo da história brasileira deste século, está
ligada ao caráter político-social da documentação, possibilitando a
avaliação e a reavaliação de temas, como a ordem político-social, a
repressão policial, etc.
A documentação existente no arquivo do DEOPS-SP está
dividida em quatro séries,5 obedecendo às características dos
documentos dentro do acervo do arquivo. Cada série é formada por um
conjunto de pastas e por um fichário correspondente. São elas:
prontuários, dossiês, ordem política e ordem social.6 Os prontuários
possuem documentos mais antigos do que o próprio DEOPS, produzidos
pelo Gabinete de Investigações a partir de 1917, que foram juntados aos
prontuários do DEOPS quando este foi criado.
O trabalho de pesquisa realizado nesse acervo fixou-se nos
prontuários, pastas individuais que podem caracterizar a ação político- 3 O primeiro jornal pesquisado foi o Diário de Notícias, onde foram levantados artigos relacionados com a política ribeiropretana, dando especial atenção à atuação dos comunistas e à posição da igreja católica em relação ao comunismo. O jornal foi fundado em 1932, deixando de circular entre 1940 e 1945, quando voltou a ser publicado como propriedade da igreja católica. Outro jornal pesquisado foi o Diário da Manhã, fundado no final do século XIX e que circulou até 1991, quando faliu. Hoje, o acervo desse jornal encontra-se sob a guarda do Arquivo Municipal de Ribeirão Preto. Pesquisamos artigos escritos entre 1905 e 1950, procurando acompanhar a ação dos comunistas na cidade de Ribeirão Preto.4 Optamos por utilizar a sigla com a qual encerrou suas atividades em 1983.5 PIMENTA, J. P. G. Os arquivos do DEOPS - SP: Nota Preliminar, Revista de História,
São Paulo, n.º. 132, pp. 149 - 154, 1º. Semestre de 1995.
11
social de uma pessoa, uma instituição, um evento ou até mesmo ( em
casos mais raros ) um tema. Os prontuários contêm, de 1924 a 1964, a
maior porcentagem da documentação produzida em relação às outras
séries, que assumem um papel secundário em importância e quantidade
de documentos. Dessa maneira, foi escolhida essa série documental para
a realização deste trabalho de pesquisa.7
Realizamos o levantamento de 93 prontuários, inclusive o do
PCB (n.º 2.431, 16 volumes.) e o da União Geral dos Trabalhadores (n.º
23.250, 2 volumes), o que nos permitiu a observação da atuação política e
social dos principais membros do Partido Comunista do Brasil em
Ribeirão Preto, entre as décadas de 20 e 50. O primeiro prontuário
encontrado que trata da atuação de comunistas em Ribeirão data de
1929.8
Com a leitura desses documentos foi possível perceber o
outro lado da luta partidária, marcada pela repressão, e desvendar os
meandros da “reação” e os métodos de investigação policial.9 Além disso,
essa documentação forneceu dados que foram perdidos durante os
longos anos de ilegalidade que o Partido Comunista viveu. Foram
encontrados nos arquivos do DEOPS - SP, detalhes da atuação dos
comunistas, como registros de datas, e relatórios de acontecimentos de
grande importância política. Entretanto, existem alguns fatores que devem
6 Essa divisão ainda não esta bem definida pelos funcionários do arquivo do DEOPS -SP, que estão realizando a organização e catalogação dos documentos.7 PIMENTA, J. P. G., op. cit. pp. 149 - 154.8 Idem.9 Para compreender melhor a ação da polícia política no período compreendido pela pesquisa é preciso observar o conceito de segurança nacional, que se modificou desde o período da Proclamação da Independência até hoje. Tanto a ação policial, quanto o conceito de subversão formulado pelos órgãos de repressão modificaram-se de acordo com mudanças sócio-políticas vividas pela sociedade brasileira. Cabia à polícia criar o perfil do cidadão exemplar e o do criminoso que colocava em risco a ordem política e social por intermédio da ação subversiva.
12
ser levados em conta quando se trabalha com documentos produzidos
pela polícia política.
O primeiro deles é a caracterização dos prontuariados, pois
muitas das pessoas fichadas como comunistas pelo DEOPS eram na
verdade socialistas, sindicalistas, simples simpatizantes, pessoas que
cometeram abusos contra a economia popular e outras. Essa variedade
de prontuariados deve-se, em parte, à mudança no conceito de crime
político e social que acompanhou a própria mudança da sociedade
brasileira,10 e à enorme gama de atitudes políticas e sociais consideradas
pela polícia como subversivas.
O segundo fator a ser considerado é a interpretação própria
dada aos acontecimentos pelos órgãos oficiais, fato que deve ser
observado com atenção pelo pesquisador a fim de não reproduzir apenas
o discurso policial. Para não cair nesse radicalismo, utilizamos o recurso
das fontes orais, entrevistando comunistas que militaram e atuaram
ativamente na política ribeiropretana.
Obviamente, as entrevistas realizadas com militantes do
PCB que atuaram nas décadas de 40 e 50 também estão carregadas de
parcialidade, o que é próprio do discurso político. Não é o objetivo deste
trabalho eliminar as posições políticas de cada grupo, e sim analisar o
contexto em que esse posicionamento foi formado.
No caso das fontes orais, escutar as lembranças dos velhos
comunistas significa muito mais do que recompor parte da História Política
do Brasil; representa a oportunidade de avaliar os acontecimentos pelo
prisma de alguém que atuou não apenas como observador, mas como
10 PIMENTA, J. P. G. Os arquivos do DEOPS - SP: Nota preliminar. Revista de
História, p. 149 - 154.
13
sujeito nos movimentos políticos nacionais, abrindo oportunidades
diversas de análise, impossíveis de serem apreendidas somente nos
documentos escritos.
Procurando uma aproximação com esses militantes,
buscamos estabelecer uma relação de confiança com os entrevistados,
mantendo conversas informais que permitissem que as informações
brotassem de forma espontânea. Num segundo momento, realizamos
entrevistas mais programadas, visando ao cotidiano da militância
comunista, procurando estabelecer relações entre a atuação individual e o
trabalho coletivo do Partido. Não nos preocupamos com os lapsos de
memória, quanto a datas ou a acontecimentos esquecidos. Nosso
interesse estava nas lembranças que foram eleitas espontaneamente pelo
entrevistado, mesmo quando direcionávamos o tema da entrevista.11
Assim, o contato que foi estabelecido com esses comunistas permitiu a
formação de uma idéia do universo simbólico desse grupo político de
oposição.
A pesquisa iniciou-se com o contato com pessoas que
fizeram parte do movimento comunista no seu período de apogeu político
em Ribeirão Preto, na década de 40. Entre os entrevistados estão: o
Senhor Irineu de Morais, um dos fundadores do Comitê Municipal do PCB
em Ribeirão Preto; Antônio Girotto, militante do partido após 1945; José
Engrácia Garcia, um dos três primeiros vereadores eleitos pelo PCB da
cidade; Arlindo Teixeira, que foi militante em tempo integral por doze
anos; Hélio Borges, membro do Partido Socialista e antigo presidente da
UGT, que esteve ligado aos comunistas; e Luciano Lepera, jornalista e
militante. Os entrevistados foram militantes de destaque no período do
governo Vargas, e tiveram participação decisiva na organização de ligas
11 BOSI, E., Memória e sociedade: Lembranças de velhos, p. 37.
14
camponesas, sindicatos, greves, movimentos proletários em geral, enfim,
na organização dos trabalhadores da região de Ribeirão Preto.
A análise do discurso desses comunistas permitiu que se
chegasse a uma visão parcial do cotidiano de luta política desses
militantes e do universo de representações desenvolvido no decorrer de
suas vidas. A fala dos velhos pecebistas é dinâmica e rica em detalhes,
fruto de anos de lembranças remoídas no longo período de vivência
política. A função social mais marcante do velho é lembrar; guardiã da
memória da sua época, suas lembranças surgem como monumentos que
foram desgastados e modificados pela ação do meio social.12
Ecléa Bosi, em Memória e Sociedade, expressa como a
memória coletiva é permeada pelo universo simbólico, sobrepondo-se em
alguns casos à própria memória individual. Quando se trabalha com a
memória política, esse fenômeno é mais evidente. A memória individual
apareceu como um apêndice de tudo o que foi vivido pelo grupo político
em questão. Fatos marcantes foram relembrados por todos como o
sumário de uma vida dedicada à militância comunista. Ao militante,
particularmente antes da década de 40, não cabia contestar as diretrizes
do PCB. A devoção ao Partido e ao movimento comunista era total,
“Moscou sempre estava com a razão”. A influência bolchevique sobre os
comunistas brasileiros trazia consigo a idéia de que todos eram membros
de um “exército internacional” que marchava pela mesma causa: a
revolução mundial.13
Neste trabalho, a apresentação das questões ideológicas e
de suas fontes, tanto orais como escritas, foi cuidadosamente
programada. A leitura e a interpretação de artigos de jornais, de
12 Ibidem, pp. 81 - 91.13 HOBSBAWM, E. J. Revolucionários, pp. 15 - 22.
15
documentos contidos nos prontuários do DEOPS-SP e de entrevistas
constituiu-se num trabalho lento, exigindo que se estabelecessem
relações entre fatos e tipos de documentação encontrados. O trabalho de
interpretar e relacionar - que Foucault chamou de transformar o
“documento em monumento” - nos permitiu chegar ao conhecimento da
sua dinâmica interna, tornou-nos capazes de narrá-lo, descrevê-lo,
entendê-lo “por dentro”.14
Todo esse trabalho com as fontes revelou-se complexo e de
suma importância para a compreensão da atuação dos comunistas
ribeiropretanos dentro dos contextos históricos local e nacional. O
resultado foi o cruzamento das fontes orais e escritas, essencial para a
formação de um quadro de análise que pudesse abranger pontos de vista
diferenciados sobre a militância política.15
Outro fator complexo enfrentado pelos historiadores do
Partido Comunista é a análise da influência stalinista, predominante no
PCB até a década de 50. Essa influência chegava ao Brasil por intermédio
dos representantes da Internacional Comunista, ou de militantes que iam
à Rússia em busca de orientação política. A ascendência dos ideais
stalinistas sobre os comunistas brasileiros mantinha os militantes coesos
em torno do ideal de realização da revolução socialista. A vontade
individual do militante estava subordinada às orientações do Partido, que
por sua vez seguia as determinações do Komintern.16 Essa austeridade
presente na organização dos PCs evitava, de certa forma, cisões
partidárias estruturais.
14 FOUCAULT, Michel. Arqueologia do Saber, Passim. 15 Tanto os prontuários quanto as entrevistas possibilitam uma visão do cotidiano de militância política. Entretanto, esta visão é obviamente diferenciada pelos interesses também diferenciados da polícia e dos militantes do PCB.16 HOBSBAWM, E. J. Revolucionários, pp. 15 - 22.
16
A observação da influência bolchevique e stalinista sobre o
PCB é imprescindível para a realização de qualquer trabalho sobre a sua
história. A compreensão da organização partidária interna e de sua ação
política está intrinsecamente ligada à devoção dos seus adeptos ao
Partido e à Internacional Comunista, atestada pela aceitação da disciplina
rígida imposta aos militantes, sob a influência do stalinismo.
Todos esses fatores devem ser considerados na realização
de estudos sobre o PCB, tamanha a sua importância. No caso de Ribeirão
Preto, a atuação dos comunistas vai além do que se propõe nos limites
cronológicos deste trabalho. Entretanto, as questões complexas que
envolvem o tema e as fontes, já expostas nesta introdução, impossibilitam
a realização de um trabalho que abranja todo o tempo de atuação do
Partido Comunista na cidade, que se estende até os dias atuais. Contudo,
esta pesquisa pretende contribuir tanto para a história do PCB quanto
para a de Ribeirão Preto, já que o levantamento histórico da evolução dos
movimentos de esquerda no interior abre as portas para a compreensão
das bases do movimento operário no Brasil.
Alguns pesquisadores já realizaram importantes trabalhos
sobre a política e os movimentos operários em Ribeirão. É o caso de
Thomas W. Walker,17 que interpretou o desenvolvimento do coronelismo e
do populismo naquela cidade. Sua obra é de grande valor para a
compreensão das políticas ribeiropretana e nacional; todavia, ela não trata
do desenvolvimento e da importância dos partidos políticos de oposição,
como o PCB, na política local. O trabalho dá especial atenção ao PRP _
Partido Republicano Paulista _ dominado nas primeiras décadas do
século XX pelos cafeicultores. Esse trabalho é de fundamental
17 WALKER, Thomas W. From Coronelismo to Populismo: the evolution of politics in
a Brazilian Municipality, 1974.
17
importância para a contextualização histórica da política ribeiropretana
durante o período de domínio dos cafeicultores.
Outra obra interessante sobre a memória proletária em
Ribeirão foi desenvolvida por Sebastião Geraldo.18 Em seu trabalho, o
autor preocupou-se fundamentalmente em realizar um levantamento dos
movimentos grevistas na cidade, especialmente aqueles acontecidos no
campo. Os dados levantados pelo autor foram os primeiros a revelar a
relação, quase constante, entre a organização do operariado
ribeiropretano e o PCB. Contudo, sua experiência de pesquisa voltou-se
para a comunicação oral, não privilegiando a análise dos fatos que
determinaram a relação intrínseca entre os comunistas e a organização
operária na cidade.19
Fica claro que não é tarefa fácil realizar um levantamento
histórico sobre o Partido Comunista,20 especialmente no Brasil. As
lacunas apresentadas pelo corpo documental e a restrita produção
historiográfica sobre o PCB são alguns dos fatores que complicam o
trabalho do pesquisador interessado nesse assunto. Entretanto, são
encontradas obras de boa qualidade, como os trabalhos de Edgard
Carone,21 que analisam a importância do PCB na organização do
movimento operário brasileiro.
Edgard Carone, em seu livro Classes sociais e movimento
operário, afirma que a criação do Partido Comunista Brasileiro foi o
18 GERALDO, Sebastião. Comunicação oral: o resgate da memória proletária em
Ribeirão Preto. Dissertação apresentada na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, para obtenção do título de mestre em Ciências da Comunicação, São Paulo, 1990.
19 É importante esclarecer que o objetivo do autor era produzir um trabalho de comunicação oral, no qual buscava recuperar a memória do movimento proletário de Ribeirão Preto, mas sem pretensões de analisar os dados historiograficamente.20 HOBSBAUM, E. J. Revolucionários, p. 15 - 22.21 As obras de Edgard Carone estão relacionadas no final do trabalho.
18
resultado da conjunção de esforços entre movimentos operários de todo
país, dos quais uma parcela teria evoluído dos ideais anarquistas para
uma “corrente favorável a aplicar, entre nós, os métodos revolucionários
bolcheviques”.22
A maioria dos historiadores que estudam o comunismo
concorda que a organização do Partido Comunista no Brasil tem suas
raízes no movimento anarquista. Entre eles, encontram-se os norte -
americanos John Foster Dulles e Ronald H. Chilcote. Estes brasilianistas
fizeram um levantamento primoroso de dados em suas obras sobre a
política brasileira, especialmente John F. Dulles, em seus dois livros:
Anarquistas e Comunistas no Brasil e O comunismo no Brasil, essenciais
para qualquer pesquisador que pretenda iniciar um trabalho sobre o PCB.
Estas obras trazem informações imprescindíveis para compor a trajetória
dos comunistas no Brasil, caracterizando-se como verdadeiros manuais
sobre o assunto. Entretanto, este importante levantamento de
informações e fatos não é acompanhado de uma apreciação crítica,
necessária para a compreensão do processo histórico de formação do
Partido.
Outros historiadores têm dado consideráveis contribuições à
história da organização operária e do comunismo no Brasil. Entre eles,
Michel Zaidán, João Quartim de Moraes e Paulo Sérgio Pinheiro. Os
valiosos trabalhos de pesquisa produzidos por estes autores contribuíram
muito para a composição do quadro teórico desta pesquisa, possibilitando
a compreensão da evolução política do PCB e de sua atuação no âmbito
nacional. Permitiram-nos também efetuar um cruzamento das
informações e análises por eles apresentadas com as coletadas nesta
pesquisa, relativamente à atuação política dos comunistas em Ribeirão
Preto. 22 CARONE, Edgard. Classes Sociais e Movimento Operário, pp. 90.
19
O interesse pelo estudo do “político” vem crescendo nos
últimos anos, passando por alterações que levantam novas maneiras de
se analisar a política por meio da historiografia.23 A grande valorização do
Estado e de suas figuras representativas como determinantes de múltiplos
aspectos da realidade vem dando lugar a outras considerações. A busca
da ação e da construção política, com seus resultantes, permite recuperar
a importância do político na sociedade e no cotidiano do indivíduo. A
percepção dos meandros existentes entre a esfera pública e privada
possibilita, em parte, a compreensão da interação entre o político e a
produção cultural. Estas novas interpretações estão gradativamente
descartando as análises unilaterais, que caracterizaram nas décadas
passadas a História Política, provocando uma verdadeira onda de
descrédito em relação ao seu estudo.
Nesse sentido, este trabalho pretende apresentar um
estudo, não apenas da estrutura política na qual o PCB estava
engendrado, mas também pretende analisar a atuação do militante e a
influência do político sobre sua vida cotidiana. A compreensão da
influência comunista nos movimentos operários e na sindicalização dos
trabalhadores em Ribeirão Preto apresenta-se como uma questão
essencial no estudo da formação da classe operária e da própria
sociedade ribeiropretana, como um todo. Não há dúvidas quanto à
importância de se realizarem estudos que elucidem a história do Partido
Comunista do Brasil, tendo em vista o seu mérito na organização do
operariado brasileiro, fundamentalmente na primeira metade do século
XX. Esse momento foi essencial na formação e conscientização da classe
23 BORGES, Vavy Pacheco. “História e Política: laços permanentes”. Revista Brasil -
História, 23/ 24 - Política e Cultura. S/D.
20
trabalhadora, na preparação do movimento sindical e na consolidação do
pensamento de esquerda no Brasil.24
A estrutura desta obra acompanha a evolução da
organização comunista e sua influência junto aos trabalhadores de
Ribeirão Preto. Faz um levantamento historiográfico da atuação
comunista na cidade, especialmente no campo sindical e na organização
dos movimentos operários ribeiropretanos. Levando em conta a
importância da atuação de alguns militantes, esta pesquisa revela o
cotidiano dos membros do PCB, analisando sua participação individual e
coletiva na vida política e social ribeiropretana.
No primeiro capítulo, referimo-nos aos fatores que
determinaram a lenta evolução da organização sindical em Ribeirão. Para
tanto, foi necessário avaliar como o poder exercido pelos cafeicultores na
cidade e em toda a região _ particularmente entre os trabalhadores
rurais_ dificultou, nas primeiras décadas deste século, a consolidação dos
movimentos operários. Ainda nesse capítulo, analisamos a fundação da
União Geral dos Trabalhadores e as primeiras relações entre esta
organização e os comunistas, dentro do contexto de urbanização e
industrialização de Ribeirão Preto, e o conseqüente crescimento da classe
operária.
No segundo capítulo, continuamos apresentando a atuação
dos comunistas e a sua relação com a UGT, dando especial atenção à
organização do comitê municipal do PCB e à mudança nos estatutos da
União Geral dos Trabalhadores, em 1928/29, procedimento que deu total
24 João Quartim de Moraes, quando escreveu “a influência do Leninismo de Stalin no comunismo Brasileiro”, in História do Marxismo do Brasil, afirmou que a partir da III Internacional Comunista realizada de 2 a 6 de março de 1919, houve uma bolchevização dos Pcs de todo o mundo. Esta influência cresceu com a stalinização teórica empreendida nos anos 30 que permaneceu influenciando a política da esquerda brasileira até os dias atuais. Pp. 80-87.
21
poder aos comunistas dentro dessa instituição. O grande desenvolvimento
do Partido na região de Ribeirão Preto foi interrompido pela eclosão do
movimento de 1935. Como conseqüência, a atuação dos comunistas ficou
seriamente comprometida, já que, os principais líderes locais foram
presos nesse período. Para compreender a atuação dos comunistas
nesse momento crítico para o PCB, analisamos o trabalho de
sindicalização empreendido pelos militantes na cidade, que passaram a
agir com certa tolerância quanto às determinações para a organização de
sindicatos impostas pelo Ministério do Trabalho.
Finalmente, no terceiro capítulo, examinamos a fase de
reorganização do PCB em Ribeirão Preto e região após o período da
grande repressão empreendida pelo governo Vargas, na segunda metade
da década de 30. Durante o período de legalidade vivido pelo Partido
entre 1945 e 1947, procuramos analisar as modificações na ação dos
comunistas e a participação dos membros do Partido no processo eleitoral
de 1947.
22
Capítulo 1: Antecedentes da formação do Partido Comunista do
Brasil em Ribeirão Preto.
1.1. O poder político dos cafeicultores e a questão social.
O poder político dos cafeicultores, nas três primeiras
décadas do século XX, tem sido amplamente estudado pelos
historiadores brasileiros. Autores tradicionais analisaram o “coronelismo” e
a “política café-com-leite”, estruturas de poder essenciais para nortear a
interpretação da questão social nesse período. Os grandes fazendeiros
manipulavam a política utilizando mecanismos que os beneficiavam nos
âmbitos econômico e polìtico. Direta ou indiretamente, os rendimentos da
maior parte dos municípios, sob a influência dos cafeicultores, dependiam
das safras de café que serviam de alavanca para a indústria e para o
setor de prestação de serviços, tornando cidades do interior do Estado de
São Paulo verdadeiros pólos de atração populacional. Foi o que ocorreu
em Ribeirão Preto, capital regional do nordeste do Estado, que se
transformou na maior produtora de café do Brasil.25 A grande
concentração fundiária e econômica fortalecia o poder dos cafeicultores
na política local, dominada predominantemente, desde o final do século
passado, por dois homens: Francisco Schimidt, que deteve a maior área
produtora de café do mundo,26 e Joaquim da Cunha Diniz Junqueira, que
dominou a situação política em Ribeirão Preto no final dos anos 20,
25 Sobre a economia de Ribeirão Preto ver: Diagnóstico 1. 6ª região administrativa. Ribeirão Preto (São, agosto, 1972) coord. Roberto Ferreira do Amaral. IBGE 330.19 (816.12).26 WALKER, T. W. O surgimento do populismo no Brasil: um estudo do município de Ribeirão Preto. Revista de Ciência Política, Rio de Janeiro, vol. 21, n.º 4, pp. 73 - 94, out./ dez., 1978.
23
controlando os representantes políticos locais, como o prefeito, os
vereadores e os juizes.27
O Partido Republicano Paulista, criado em 1873, era o órgão
de representação política dos “coronéis do café”. O PRP defendia o
aumento da autonomia municipal, que daria ao grupo dos cafeicultores
maior poder econômico para efetuar transações comerciais com o
mercado externo.28 Seus representantes negociavam com o governo
federal medidas que pudessem beneficiar os produtores de café, fundindo
os interesses econômicos pessoais com os interesses públicos, como
exemplifica a ata da sessão extraordinária da Câmara Municipal de
Ribeirão Preto, de 7 de julho de 1917. Na discussão, da qual participaram
os vereadores coronel Francisco Schmidt, doutor João Alves Meira Júnior,
doutor J. P. Veiga Miranda, coronel Manoel Maximiano Junqueira, coronel
Gabriel Junqueira, coronel José Martiniano da Silva, capitão Antônio
Ignácio da Costa, capitão José de Castro e o vereador Dr. Macedo
Bittencourt, o qual teceu considerações sobre os problemas que a lavoura
cafeeira e o mercado de café atravessavam, tendo em vista que esse era
o tema da sessão:
(...) A lavoura cafeeira atravessa um período de dificuldades, de
verdadeira apreensão pelas dificuldades de transporte do produto
para os mercados estrangeiros, pelas leis repressivas da importação
decretadas por outros países e finalmente pela guerra européia , que
desorganizou a vida econômica de todas as nações. A presente safra
de café, forçosamente será sacrificada se medidas não forem
tomadas que venham amparar contra as previstas especulações
mercantis resultantes principalmente da diminuição de mercados.
27 Ibidem. 28 A criação do PRP e a influência dos cafeicultores na política ribeiropretana são analisadas por José Antônio Acra Filho em sua dissertação de mestrado. A economia cafeeira e a política oligárquica do município de Ribeirão Preto: subsídios para o estudo das oligarquias cafeeiras paulistas, apresentada à Escola de Pós - Graduação de Ciências Sociais da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo.
24
Neste sentido a Sociedade Nacional de Agricultura, assim como a
Sociedade Promotora de Defesa do Café, recentemente fundadas na
Capital já oficializaram ao Senhor Presidente da República pedindo a
sua cooperação no sentido de serem decretadas medidas urgentes
que possam salvaguardar os interesses da lavoura. O Senhor
Presidente do Estado solícito como se mostra para resolver os
grandes problema econômicos que nos apertam, já se dirige também
ao Senhor Presidente da República pedindo-lhe igualmente que
amparasse com medidas eficazes a lavoura cafeeira. Sendo Ribeirão
Preto o município cafeeiro por excelência, cuja produção excede
bastante a qualquer outro, não pode tornar-se indiferente, antes deve
estudar com a maior solicitude solução do grave problema em
debate.(...)
Resolve secundar francamente a ação da lavoura e do Senhor
Presidente do Estado, telegrafando ao Senhor Presidente da
República para pedir-lhe que, em execução das autoridades
legislativas, forneça aos Estados produtores de café os recursos
necessários para a defesa de sua produção (...).29
Não é surpresa observar no texto transcrito que quatro dos nove
vereadores presentes à seção da Câmara Municipal ostentavam o título
de “coronel”, sendo dois da família Junqueira e um da família Schimidt.
Entre 1910 e 1928, 56,6% dos vereadores eleitos eram agricultores ou
filhos de agricultores, o que demonstra, apesar de alguns também
acumularem profissões urbanas, que os fazendeiros tinham supremacia
na Câmara Municipal.30 As esferas pública e privada fundiam-se na
atuação desses homens nos poderes legislativo e executivo.
Os “reis do café” detinham grandes extensões de terras. As
safras de café eram a base da movimentação financeira regional, dando 29 Ata da sessão extraordinária da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, 7 de julho de 1917.30 WALKER, T. W. op. cit., p. 83.
25
vida a um comércio variado. Os rendimentos do café e a importância
deste produto para a economia local concretizavam a influência dos
“coronéis” nos assuntos públicos.31
Nesse sentido, as crises atravessadas pela cafeicultura
transformavam-se em prioridades nas discussões da Câmara dos
Vereadores. Um exemplo disso é a preocupação demonstrada na Câmara
pela diminuição dos mercados consumidores, durante a Primeira Grande
Guerra Mundial. Essa crise intensificou-se em 1918, com a ocorrência de
uma geada que causou danos irreversíveis em cerca de 70% dos
cafezais da região. Fazendas, antes ocupadas unicamente por cafezais,
diversificaram sua produção agrícola, tentando outras lavouras, como a
do algodão. Paralelamente à diversificação agrícola, o número de
pequenas propriedades aumentava timidamente, sem conseguir, contudo,
sobrepujar a importância dos latifúndios.32
O período de instabilidade atravessado pelo setor cafeeiro -
durante a Primeira Guerra - foi superado com o aumento de consumo do
café na época entreguerras. Como conseqüência, houve um
aquecimento do mercado, responsável pelo boom econômico vivido pela
cafeicultura no início da década de 20.
O lento processo de diversificação agrícola, iniciado na
década de 10, foi acompanhado pelo crescimento das atividades fabris e
comerciais na cidade, mesmo com a resistência dos “barões do café”, que
temiam perder sua mão-de-obra. 33 Surgiram importantes indústrias, como
as cervejarias Antárctica e Paulista, inauguradas, respectivamente, em
31 LAGES, J. A. Ribeirão Preto: da Figueira à Barra do Retiro. Ribeirão Preto: VGA
Editora e Gráfica, 1996. 32 GERALDO, S. O Resgate da memória proletária em Ribeirão Preto. pp. 22/23. 33 GERALDO, S., pp. 35 - 36 .Sebastião Geraldo, em seu trabalho de pesquisa, analisa a importância da imigração para a ampliação das atividades comerciais, industriais e de prestação de serviços em Ribeirão Preto.
26
1911 e 1914. Ribeirão urbanizava-se, fenômeno que se intensificou nos
anos 20.
A crise econômica mundial, deflagrada em 1929, atingiu
duramente a economia brasileira e a sua principal atividade econômica, a
produção de café, provocando queda nas exportações e uma crise sem
precedentes no setor. Mesmo assim, alguns fazendeiros da região de
Ribeirão Preto continuaram aumentando a produção cafeeira até 1935,
garantidos pela política protecionista do governo e pelas lavouras novas
que tinham sido plantadas no período anterior à crise e que continuavam
produzindo café.
A manutenção do aumento da produção de café, a grande
malha ferroviária que cortava Ribeirão e a intensificação da diversificação
agrícola - que garantiu preços melhores aos produtores - atenuaram os
efeitos da crise, evitando o abandono das terras, como acontecera no
Vale do Paraíba. Portanto, mesmo com a decadência da cafeicultura, os
agricultores mantiveram sua influência política e econômica durante
quase toda a década de 30.
Contudo, em meados da década de 30 já era sentida uma
sensível mudança nas estruturas fundiária e política de Ribeirão Preto. Já
em 1933, mesmo com a política protecionista do governo, alguns
fazendeiros sentiam os efeitos da crise, representados no aumento do
número de pequenas propriedades, resultado do loteamento de grandes
latifúndios.34 Na política, os agricultores começavam a perder poder. Um
exemplo foi a emergência de representantes de categorias sociais
urbanas dentro da Câmara Municipal, que passou a ser composta por oito
vereadores com profissão liberal, um empregador ou gerente no comércio
ou na indústria, um com profissão mista (agricultor e profissão urbana) e
27
apenas três agricultores, sendo que até 1959 o número de agricultores -
vereadores na cidade diminuiu ainda mais.35
Seria precipitado avaliar a influência dos produtores de café
exclusivamente pela sua participação na Câmara Municipal. O poder
desses fazendeiros ia muito além da vereança local. Mesmo com a
ampliação de outros setores da economia, que provocou o crescimento do
poder econômico dos profissionais liberais, dos industriais e dos
comerciantes, os grandes fazendeiros continuaram a exercer expressiva
influência na cidade. Nas décadas que se seguiram à crise, Ribeirão Preto
viu suas áreas comercial e industrial se desenvolverem. Entretanto,
assistiu também à recuperação e à consolidação do poder dos
fazendeiros, que aplicaram seus recursos na policultura e posteriormente
na plantação de cana - de - açúcar, para a produção de açúcar e de
álcool.
O poder dos cafeicultores refletia-se no controle que
mantinham sobre os trabalhadores locais, especialmente aqueles do
campo. Os “reis do café” ocupavam um expressivo contigente de mão-
de-obra. Algumas fazendas chegavam a empregar mais de 8.000
trabalhadores,36 principalmente italianos. Esses imigrantes, vindos de um
país distante, desconhecedores da língua portuguesa e muitas vezes sem
recursos, eram submetidos ao jugo dos fazendeiros, que coibiam ao
máximo qualquer forma de organização que pudesse ameaçar seus
interesses econômicos. Entretanto, as péssimas condições de trabalho e
a influência anarquista presente no meio italiano favoreceram a ocorrência
de alguns movimentos de resistência entre os trabalhadores rurais.
34 Diário de Notícias, “A pequena propriedade”, Ribeirão Preto, 23 de março de 1933.35 WALKER, T. W, O surgimento do populismo no Brasil, p. 86. 36 GARCIA, M. A. As greves de 1912 e 1913 nas fazendas de café de Ribeirão Preto.
ESTUDOS DE HISTÓRIA, pp. 167 - 179, 1995.
28
1.1.1. O trabalhador das fazendas de café.
A região de Ribeirão Preto, a partir do século XIX, destacou-
se como expressivo pólo receptor de imigrantes, principalmente
italianos.37 As famílias eram trazidas para trabalhar nas fazendas de café
da região. Logo no início tiveram problemas de adaptação, dos quais dois
merecem destaque: o alto índice de analfabetismo entre os imigrantes e o
desconhecimento da língua portuguesa. Esses fatores contribuíam para
que os fazendeiros tirassem proveito dos contratos de trabalho, que
geralmente tornavam os imigrantes dependentes financeiramente dos
agricultores pelo endividamento nos armazéns das fazendas, onde os
preços altos dos alimentos contrastavam com os baixos salários dos
trabalhadores.
Todavia, os colonos também desfrutavam de alguns
benefícios, como a autorização para plantar cereais e legumes nas fileiras
entre os pés de café. Essa prática, além de suprir o sustento da família,
possibilitava a constituição de uma poupança que poderia garantir uma
futura independência financeira. Muitos imigrantes, depois de anos de
trabalho, conseguiram estabelecer-se como proprietários rurais em
Ribeirão Preto, ou como pequenos comerciantes e prestadores de serviço
na zona urbana.38
Apesar de uma minoria ter conseguido ascender
socialmente, as condições de trabalho dos imigrantes, em geral, não eram
satisfatórias. Os colonos ficavam à mercê das deliberações do patrão,
senhor dos direitos e deveres do trabalhador. Em caso de abusos
37VALADÃO, V. Imigração e introdução de novos hábitos habitacionais em Ribeirão
Preto. Estudos de História, pp. 253 - 268. Dos 58.220 habitantes registrados na cidade em 1912, 14.561 eram italianos.
38 Ibidem, p. 260.
29
cometidos pelos fazendeiros, poderiam recorrer ao consulado que,
embora defendesse os trabalhadores estrangeiros, mantinha uma atitude
conciliatória na maioria das vezes. Assim, os imigrantes eram,
normalmente, entregues à própria sorte, sujeitos às decisões dos
cafeicultores. Um exemplo foi a demissão coletiva de aproximadamente
cem húngaros, em 1925, colonos de uma fazenda de Orlândia, região de
Ribeirão Preto. Famílias inteiras que desconheciam a língua portuguesa
foram despejadas na estação de trem, ali ficando durante dias sem
comida e assistência médica.39 Casos de abusos como esse foram
comuns nas primeiras décadas do século XX. Entretanto, esses abusos
acabavam provocando movimentos de resistência por parte dos
trabalhadores rurais, manifestados em ações individualizadas ou, mais
raramente, em greves de grande repercussão.
Dois dos movimentos mais expressivos ocorridos em
Ribeirão foram as greves de 1912 e 1913, que envolveram milhares de
trabalhadores das fazendas de café. Infelizmente, a falta de
documentação não permite uma análise efetiva da organização estrutural
desses movimentos, como a identificação das lideranças e de suas
tendências ideológicas. No entanto, é possível tirar algumas conclusões
baseadas nas reivindicações dos trabalhadores: melhoria de salários e de
condições de trabalho, e terras para o cultivo de cereais.40
Uma das causas da eclosão dos movimentos de 1912 e
1913 foi a proibição, determinada por alguns fazendeiros, do cultivo de
cereais entre as fileiras de cafeeiros. Esse fato chocava-se com o sonho
do imigrante de se tornar independente financeiramente, podendo
consumir e vender o que plantasse. Esse sonho o imigrante alimentava
39 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 15 de dezembro de 1925, p. 1. 40 GARCIA, M. A. As greves de 1912 e 1913 nas fazendas de café de Ribeirão Preto,
pp.168-169.
30
desde sua viagem para o Brasil: a possibilidade de poupar para adquirir
seu “sítio”.
As reivindicações por melhores salários e pelo direito de
poder plantar para si próprios refletiam a preocupação dos grevistas com
a sua situação econômica. Isto parecia constituir-se no único propósito
dos trabalhadores, não transparecendo intenções políticas, nessas
greves, cujos objetivos, voltados tão-somente para a resolução de
problemas imediatos, podia denotar uma tendência anarco-sindicalista em
sua organização: “nada de ligação com o governo, nada de compromisso
político”. Os grevistas recorriam à “ação direta”: o proletariado deveria
buscar, por si mesmo, os seus direitos, “lutar contra a classe dominante,
não ter peias políticas e institucionais com a burguesia”.41
O grupo anarco-sindicalista, realizou o primeiro Congresso
Operário Brasileiro em 1906, o segundo em 1913, e o terceiro em 1920,
mostrando-se bastante ativo nos movimentos da classe trabalhadora. No
entanto, esbarramos, como sempre, na pouca documentação existente
para consulta, o que dificultou a análise da sua influência em Ribeirão
Preto. Porém, aparentemente, houve uma influência não apenas sobre
movimentos na zona rural, como também na área urbana nas greves
ocorridas entre 1907 e 1909.
41 CARONE, E. Classes Sociais e Movimento Operário, p. 41.
31
1.1.2. O crescimento urbano e a organização operária antes da
criação da União Geral dos Trabalhadores.
Ribeirão Preto viveu um grande crescimento populacional
desde o final do século XIX até a década de 30, responsável pelo
aumento da concentração de trabalhadores na zona urbana, fator
importante para a compreensão dos movimentos grevistas que ocorreram
antes do surgimento do primeiro núcleo comunista. A existência de um
volume razoável de operários favorecia a eclosão de greves por melhores
salários e condições de trabalho.
A cidade destacou-se como um importante pólo de atração
populacional nas três primeiras décadas do século XX. A grande
produção cafeeira e a diversificação da sua zona comercial atraíam
trabalhadores de outros lugares. Multiplicaram-se as oficinas e as lojas
comerciais, freqüentadas pela população de toda a região.
A necessidade de braços para a lavoura cafeeira, trouxe
para a cidade um contingente expressivo de imigrantes, aproveitados
predominantemente na atividade agrícola. Entretanto, muitos acabaram
fixando-se na cidade, em atividades comerciais e fabris, principalmente a
partir da década de 30, quando a economia ribeiropretana começou a
sentir os reflexos da crise econômica mundial que provocou, entre outras
coisas, a diminuição da produção de café e o êxodo de trabalhadores
rurais para o setor urbano.
O abalo econômico ocasionado pela crise diminuiu a
imigração, bem como a atração de trabalhadores pela região, até a
década de 40, quando a taxa de crescimento populacional atingiu a cifra
mínima de 0,27% ao ano. Nesse período, a cidade ainda sentia os
32
resquícios da crise, iniciada na década anterior: faltavam empregos e
gêneros alimentícios de primeira necessidade. Na década de 50, a
economia ribeiropretana já havia se reestruturado, provocando um novo
fluxo migratório para a região que, com a queda nas taxas de mortalidade,
provocou um aumento populacional de 16,69%.42
Mesmo com o crescimento progressivo da população nos
primeiros anos do século XX, o município contava com poucas empresas
com um número grande de funcionários.43 A maior parte dos operários
estava espalhada por dezenas de pequenas e médias oficinas. A cidade
desenvolveu um expressivo centro comercial e na primeira década do
século XX foram lá instalados 163 pequenos estabelecimentos industriais,
com um total de 642 operários.44 Se levar em conta a concentração de
trabalhadores em grandes fábricas como um pressuposto para a
organização de movimentos operários, pode-se dizer que a dispersão
geográfica do operariado ribeiropretano ( média de quatro operários por
empresa) pode ter sido um obstáculo nas primeiras décadas do século
para o desenvolvimento de sindicatos e associações de classe. A
organização operária nessa época, mostrava-se pouco expressiva e
pouco organizada, refletindo a própria realidade nacional. Sua liderança
era disputada entre socialistas, sindicalistas e anarco-sindicalistas. Não
existia uma liderança partidária, como ocorreria a partir da criação do
Partido Comunista do Brasil, em 1922.
Os primeiros movimentos grevistas e a formação da primeira
associação sindical de Ribeirão só aconteceram após a realização do 42 São Paulo, Governo de. Secretaria da economia e planejamento. Diagnóstico 1. 6ª Região Administrativa. Ribeirão Preto ( São Paulo, 1972) coord. Roberto Ferreira do Amaral. IBGE 330.19 (816.12) AS 239 e 6ª RA. A economia ribeiropretana sentiu mais intensamente a crise de 1929, no final da década de 30 e início da década de 40. O processo de desestruturação econômica foi agravado pelas conseqüências econômicas advindas da ocorrência da 2ª Guerra Mundial, que provocou, entre outros problemas, a escassez de gêneros alimentícios de primeira necessidade.43 A empresa que concentrava o maior número de funcionários no início do século XX era a Companhia Mogiana.
33
Primeiro Congresso Operário Brasileiro, que se deu na terceira semana
de abril de 1906, com a participação de socialistas, líderes trabalhistas e
anarquistas. As idéias destes últimos prevaleceram. Nesse evento, foi
recomendado ao operariado que “fizesse o máximo para impor as oito
horas de trabalho no dia 1º de maio de 1907”,45 já que a luta pela redução
da jornada de trabalho fazia parte das preocupações mais imediatas
naquele momento. Dentre as resoluções do Congresso, entendeu-se que
o operariado não estava pronto para uma ação política unificada, pois
encontrava-se “extremamente dividido pelas opiniões políticas e
religiosas”. A ação organizada do operariado só seria possível
considerando-se “os interesses econômicos comuns a toda a classe
operária”.46
Como conseqüência da agitação iniciada com o Primeiro
Congresso Operário, eclodiram movimentos grevistas em 1906 e 1907. O
primeiro deles aconteceu entre os dias 15 e 17 de maio de 1906, entre os
trabalhadores da Companhia Paulista de Estradas de Ferro de Campinas
e Jundiaí, local em que Edgard Leuenroth realizara um comício sobre o
Congresso, do qual participara. Refletindo esses acontecimentos, a greve
espalhou-se pela capital e arregimentou outras categorias. O movimento
terminou no fim do mês de maio, esmagado pela polícia, temerosa que a
greve se estendesse a outras companhias ferroviárias.
Em maio de 1907, movimentos grevistas explodiram
novamente em São Paulo. A greve teve repercussão rápida em Ribeirão
Preto, onde cerca de 300 trabalhadores de pequenas indústrias reuniram-
se na Sociedade União Italiana, no dia 15 de maio, e decidiram entrar em
greve no dia seguinte.47 Reivindicavam a redução na jornada de trabalho
44 GERALDO, S. O Resgate da memória proletária em Ribeirão Preto, p. 36. 45 DULLES, J. F. Anarquistas e comunistas no Brasil, p. 29. 46 Ibidem, p. 27.47 Diário da Manhã. Ribeirão Preto, 17 de maio de 1907.
34
e aumento de salário. Logo no primeiro dia de greve, um dos líderes
grevistas, o anarquista Alfredo Farina, responsável pela publicação dos
jornais IL Messagero ( 1906) e Lo Scuducio ( 1907 - 1927 ), foi preso e
mantido incomunicável.48 A Companhia Ferroviária Mogiana, uma das
maiores empregadoras da cidade, temendo a expansão da greve, acatou
a jornada de trabalho de oito horas, evitando que os seus funcionários
interrompessem o trabalho.49 Esses dois acontecimentos evitaram que a
greve tivesse maiores proporções, terminando sem grandes resultados
para os trabalhadores. Ribeirão participava dos “últimos anos da onda de
greves” que atingiu São Paulo, entre 1901 e 1908. 50
Tudo indica que, durante o movimento grevista de 1907, os
trabalhadores locais estavam organizados pela Liga Operária de Ribeirão
Preto. Azis Simão, em Sindicato e Estado, refere-se a existência da Liga,
fundada em 1907.51 Como em janeiro desse mesmo ano o governo
sancionara o Decreto 1.637 exigindo que os sindicatos fossem registrados
em Cartório _ nele depositando seus estatutos e a lista de nomes da
diretoria52 _, realizamos uma pesquisa nos cartórios mais antigos da
cidade, não conseguindo, entretanto, verificar registros dessa natureza.
A falta dos estatutos e de outros documentos da Liga
Operária dificultam a análise dos seu objetivos e da sua estrutura. De
qualquer forma, sua existência é atestada por jornais locais que
notificaram a Liga como responsável por publicações de manifestos,
principalmente em comemoração ao 1º de Maio.53 No período da sua
criação ocorria uma efervescência no movimento sindical, provocada 48 GERALDO, S. O Resgate da memória proletária em Ribeirão Preto, p. 81. 49 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, quinta - feira, 17 de maio de 1907. 50 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, p. 28. 51 SIMÃO, A. Sindicato e Estado. p. 211. O autor fez um belo trabalho de pesquisa, apresentando principalmente a organização e a estrutura dos sindicatos em São Paulo, a influência do Estado na formação do movimento sindical. 52 DULLES, J. W. F. Op. cit. , p. 28. 53 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, domingo, 1º de Maio de 1910.
35
pelos resultados do Primeiro Congresso Operário, realizado em 1906.
Infelizmente, pouco se sabe sobre a Liga.54 É possível, entretanto,
estabelecer uma ligação entre a greve de 1907 e essa organização, se
forem levadas em conta as orientações dadas pelo Primeiro Congresso
Operário para a organização de associações sindicais:
“...Considerando que a resistência ao patronato é a ação
essencial55, e que, sem ela, qualquer obra de beneficência,
mutualismo ou cooperativismo seria toda a cargo do operariado
facilitando mesmo ao patrão a imposição de suas condições; que
essas obras secundárias, embora trazendo ao Sindicato grande
número de aderentes, quase sempre sem iniciativa e sem espírito de
resistência, servem muitas vezes para embaraçar a ação da
sociedade que falta inteiramente ao fim para que fora constituída - a
resistência;
O Primeiro Congresso Operário Brasileiro aconselha, sobretudo,
resistência, sem outra caixa a não ser a destinada a esse fim e que,
para melhor sintetizar o seu objetivo, as associações operárias
adotem o nome de Sindicato”.56
A idéia de privilegiar a resistência ao patronato, refletida na
luta por melhores condições sócio-econômicas do trabalhador, como a
redução na jornada de trabalho, decorreu do movimento anarco-
sindicalista. Essa influência, percebida com clareza nos movimentos
54 SIMÃO, A. Op. cit. , p.211. 55 Grifo nosso. 56 SIMÃO, A. Op. cit., p. 163. Resoluções do Primeiro Congresso Operário Brasileiro, sobre Organização, tomo 1, pp. 9-10; no mesmo sentido: Boletim da comissão Executiva do III Congresso Operário Brasileiro, p. 10.
36
grevistas ocorridos nos primeiros anos do século XX, em Ribeirão, esvaiu-
se nas décadas posteriores.57
A luta pela redução da jornada de trabalho para oito horas
continuou durante os anos que se seguiram à greve de 1907. Nos anos
20, muitos lojistas e donos de oficinas ainda não respeitavam a jornada
reduzida, provocando a eclosão de greves isoladas, organizadas por
grupos independentes. Desse modo, os trabalhadores iniciaram uma
embrionária organização do operariado, criando associações operárias,
como a União dos Viajantes, em 21 de dezembro de 1913, a Associação
dos Empregados no Comércio de Ribeirão Preto, em 7 de julho de 1920,
e a Associação dos Condutores a Tração Animal, criada em 26 de
setembro de 1923. As duas últimas demonstravam preocupação com o
bem-estar do trabalhador, criando núcleos de assistência social e lutando
pelos direitos econômicos da classe trabalhadora. Essa preocupação
social foi aprofundada pela associação que teve a ação mais expressiva
na organização sindical em Ribeirão Preto, na primeira metade do século
XX: a União Geral dos Trabalhadores, criada em 6 de maio de 1925.58
57 Os anarco-sindicalistas acreditavam na criação de associações sindicais sem compromissos assistenciais com o trabalhador. Defendiam a idéia de que a formação de cooperativas ou caixas de socorro poderiam desviar a atenção do trabalhador da verdadeira luta: a resistência ao capitalismo e aos seus representantes: o patronato.58 Documentos do 1º. Cartório de Registro de Imóveis e anexos.
37
1.2. A fundação da UGT e os primeiros comunistas.
Durante a década de 20, os fazendeiros ribeiropretanos
encontravam-se bem organizados na defesa da manutenção do seu
poder, enquanto poucos setores tinham associações que defendessem os
interesses dos trabalhadores. A organização de movimentos operários era
dificultada pela repressão exercida durante o governo de Arthur
Bernardes, num momento em que a legislação trabalhista pouco
avançava e a “pequena burguesia” mostrava sua insatisfação por
intermédio das revoltas tenentistas.59
O PCB foi um dos grupos mais atingidos pela ação
repressiva do governo Bernardes, principalmente durante o estado de
sítio estabelecido de 5 de julho de 1924 a 31 de dezembro de 1926.60
Fundado em 1922, o Partido Comunista Brasileiro preocupou-se nos
primeiros anos em organizar-se internamente e ser reconhecido pela
Internacional Comunista, aspirando” à instalação direta do ‘regime
comunista’, sem considerar quaisquer outras mediações”.61 Além dessas
59 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, pp. 221 - 248. O início da
década de vinte foi marcado pela ocorrência dos movimentos tenentistas, em 1922, 1924 e pela formação da Coluna Prestes. Estes eventos acabaram provocando uma reação violenta por parte do governo Bernardes contra os comunistas.
60 CHILCOTE, R. H. Partido Comunista Brasileiro - Conflito e integração, p.63.61 VINHAS, M. O Partidão. A luta por um partido de massas ( 1922 - 1974 ), p.7.
Vinhas, no seu livro de memórias, relata sinteticamente a história do Partido Comunista Brasileiro. Afirma que nos primeiros anos de atuação do PCB, este desinteressou-se pela sucessão presidencial de 1922 e pelos principais fatos políticos que abalavam o país, como as revoltas tenentistas, denotando o grau de sectarismo e distanciamento da realidade que pautou seus primeiros passos.Questão semelhante é analisada por Ronald Chilcote, que justifica a ação política pouco expressiva do PCB nesse período pela intensa repressão policial e pela necessidade da conquista de um status no movimento comunista internacional (p. 63).
38
preocupações, procurava aumentar sua influência no movimento sindical
dominado por socialistas e anarco-sindicalistas.
As décadas de 20 e 30 foram marcadas pelo crescimento do
número de operários, pela repressão exercida contra os movimentos
populares e pela dificuldade organizatória enfrentada pelo Partido. Sua
atuação foi prejudicada por vários fatores, entre eles, a dispersão
geográfica dos operários, distribuídos entre os escassos estabelecimentos
industriais, tornando difícil a ação dos militantes comunistas. Outro
problema organizacional enfrentado pelos membros do Partido era o
recebimento de material em língua estrangeira, sendo que no Brasil boa
parte dos trabalhadores nem sequer sabia ler e escrever.
Entretanto, o fato de maior relevância que limitou a ação do
Partido, entre 1922 e 1928, foi seu reduzido número de militantes. A
dificuldade do PCB em arregimentar novos membros relacionava-se com
a constante repressão policial que dificultava a difusão das idéias
comunistas e intimidava a adesão de simpatizantes à ação direta de
militância. Na década de 20, o Partido contava com cerca de 700
militantes inscritos, sendo que em São Paulo encontravam-se apenas
80.62
A limitada, porém ativa atuação dos comunistas no
movimento operário,63 entre 1922 e 1925, fixou-se na propagação das
idéias comunistas e na luta contra socialistas e anarco-sindicalistas pela
hegemonia no movimento sindical. O trabalho para tornar o PCB o único
partido “capaz de liderar a massa operária” intensificou-se e passou a ter
maior expressão na segunda metade da década de 20, após a realização
62 CARONE, E. O PCB ( 1922 - 1943 ), p. 77, e “Movimento Operário e revolução,
percalços para o desenvolvimento do PCB”, in Classes Sociais e Movimento Operário, pp. 98 - 101.
63 CARONE, E. Classes Sociais e Movimento Operário. p. 130.
39
do II Congresso Comunista, quando foi constatado “o pouco resultado
obtido até aquele momento”.64
Mesmo com o reduzido número de militantes no Brasil,
principalmente no Estado de São Paulo, fato que provocava uma atuação
político-social restrita do Partido Comunista do Brasil, surgiu em Ribeirão
Preto um pequeno grupo de simpatizantes do comunismo, por volta de
1923.65 Esse grupo era formado por Guilherme Milani, Rômulo Pardini,
Gustavo Wierman66 e outros, sendo que os dois primeiros tinham saído
do movimento anarco-sindicalista. O grupo reunia-se na casa de Milani67
para discutir a organização do movimento operário e a criação de uma
associação de defesa dos interesses dos trabalhadores em Ribeirão
Preto. Como resultado da atuação desse grupo, fundou-se, em 30 de
março de 1925,68 a UGT _ União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão
Preto, tendo seus estatutos registrados em cartório no dia 6 de maio do
mesmo ano.69
64 Ibidem, pp. 123 - 125.65 Durante uma entrevista realizada com Antônio Girotto, simpatizante das idéias comunistas desde a década de 30 e militante a partir da década de 40, este afirmou que o primeiro grupo comunista surgiu em Ribeirão Preto por volta de 1922 e 1923, grupo que teria sido formado inicialmente por Guilherme Milani, Rômulo Pardini e Gustavo Wierman.66 Gustavo Wierman militou no PCB, comitê municipal de Ribeirão Preto, nas décadas de 20 e 30. Foi entrevistado pelo Dr. Sebastião Geraldo no final da década de 80, fornecendo importantes informações sobre os primeiros anos do grupo comunista na cidade de Ribeirão.67 Guilherme Milani residiu na capital antes de mudar-se para Ribeirão. Em São Paulo era conhecido pela polícia como um anarquista fervoroso. Seu nome consta em relatórios de um secreta enviado à Delegacia de Ordem Política e Social em 25 de setembro de 1929, já o indicando como um dos líderes comunistas de Ribeirão Preto. Registro Geral n.º 257.151, caixa 11, arquivo do DEOPS - SP. 68 O prédio utilizado localizava-se na rua Duque de Caxias, n.º 11, centro de Ribeirão Preto.69 Estatutos da “União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto”, Denominação e fins, artigo 1, registrado no 1.º Cartório de Registro de Imóveis e Anexo, 1925.
40
1.2.1. Uma análise do primeiro estatuto da UGT
Foram analisados, até agora, fatores que caracterizaram
social e economicamente Ribeirão Preto como um ambiente político
conservador dominado, até a década de 30, pelos cafeicultores. O parco
movimento operário desse período ficou registrado nas poucas greves e
organizações operárias formadas na cidade até 1920. 70 Aparentemente,
as poucas greves ocorridas em Ribeirão Preto, entre 1907 e 1920, foram
de orientação anarquista. O grupo libertário teria influenciado também a
criação da Liga Operária, primeira instituição de defesa de classe criada
na cidade.
No ano de 1920, iniciaram-se no Brasil os desentendimentos
entre os anarquistas e os que viriam a fazer parte do PCB. Os primeiros
abriram uma fase de críticas em relação à Revolução Bolchevique,
quando informações mais verídicas sobre o acontecimento começaram a
chegar ao Brasil, desmentindo que a Revolução Russa teria sido um
movimento anarquista.71 O período de críticas e ataques aos comunistas
serviu, entre outras coisas, para definir as posições ideológicas dos dois
grupos e acirrar a disputa entre eles pela hegemonia dentro do
movimento sindical. Até 1925, uma das principais atividades dos
comunistas foi a tentativa de expurgar a influência anarquista ( e também
socialista ) das organizações sindicais.
70 Como já foi analisado anteriormente, aparentemente as poucas greves ocorridas em Ribeirão Preto, entre 1907 e 1920, foram de orientação anarquista. Este grupo também teria influenciado a criação da Liga Operária de Ribeirão Preto, primeira instituição de defesa de classe criada na cidade.71 CARONE, E. “ O PCB: a polêmica com os anarquistas ( 1922 - 1923 ). O
reconhecimento do PCB pela IC.” In Classes Sociais e Movimento Operário.Nesse capítulo, o autor analisa as rupturas e desentendimentos entre anarquistas e comunistas e a luta entre os dois grupos pela hegemonia do movimento operário.
41
No caso da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão
Preto, uma análise do seu primeiro estatuto permite inseri-la no contexto
do movimento sindical marcado por influências ideológicas variadas. De
acordo com Edgard Carone, entre os sindicatos da década de 20
proliferaram várias tendências, dividindo-os em “três categorias: os de
influência comunista, os de orientação anarquista e os denominados de
reformistas ou amarelos, considerados os mais significativos e
numerosos”.72 Avaliando o estatuto da UGT, de 1925, percebe-se um
misto de influências dessas três tendências, o que pode parecer um
paradoxo se for levado em conta o fato de seus principais fundadores
terem tendências comunistas, como já foi dito anteriormente. Contudo, a
convivência de simpatizantes comunistas numa organização com
tendências reformistas e anarco-sindicalistas é perfeitamente justificável,
já que “o Partido, de 1922 a 1928, circunstancialmente, aceita a tática
provisória de ligar-se a sindicatos de outra orientação ideológica”,
seguindo as determinações do Terceiro Congresso da Internacional
Comunista, que sugeria a ”política de Frente Única”.73
No capítulo 1 do seu primeiro estatuto, “Denominação e
fins”, a UGT é definida como uma “associação cooperativa e de recreação
tendo como objetivo promover a defesa e a solidariedade da classe e dos
associados, dando a estes a assistência, criando uma cooperativa de
gêneros alimentícios de consumo e de primeira necessidade e uma caixa
de socorros(...)”.74 O assistencialismo e o cooperativismo, presentes no
estatuto, despertavam atitudes avessas à sua implantação em
organizações sindicais, entre as correntes de atuação mais radical.
72 CARONE, E, “A política sindical” In Classes Sociais e Movimento Operário, pp. 158
- 168.73 Ibdem, p. 161.74 Estatutos da “União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto”, op. cit.
42
No caso dos anarco-sindicalistas existia uma tolerância em
relação ao assistencialismo, ainda que concordassem que fosse
prejudicial ao processo de pressão social, desviando a atenção do
principal objetivo dos sindicatos: “a resistência ao patronato”.75 Os
comunistas, de sua parte, também consideravam os programas
assistenciais estranhos ao movimento sindical; contudo, a política de “ide
às massas”, preconizada pela IC em seu Terceiro Congresso,
determinava a necessidade de conquistar “uma unidade tão completa
quanto possível das massas operárias no terreno da ação prática, de
acordo coma as condições particulares de cada país”.76 No caso do
operariado brasileiro, suas particularidades estavam ligadas às precárias
condições de vida, determinadas pela falta de proteção aos operários
idosos, doentes, desempregados, mulheres e crianças, e pela falta de
serviços médico-farmacêuticos gratuitos. Portanto, mesmo os comunistas
não combateram com afinco as atividades cooperativas e de assistência
ao operário dentro das instituições sindicais, pretendendo dessa forma
angariar a simpatia da massa trabalhadora.
Os socialistas, por sua vez, acreditavam que o operariado
deveria ser organizado em todas as esferas, inclusive nas áreas que lhes
permitissem melhorar seu nível de vida. “Ao nascer do século, os
socialistas se propunham criar em São Paulo, separadamente, uma série
de associações que iam desde as mais simples dos seguros mútuos até
75“Essa tolerância pode ser explicada por dois fatores. Primeiro, a existência de programas assistenciais ou cooperativismo dentro das organizações sindicais traziam muitos aderentes. Segundo, mesmo com a oposição dos anarquistas e anarco-sindicalistas à inclusão do mutualismo entre as finalidades dos sindicatos, estes tinham uma solidariedade grupal considerada sagrada, como observou Azis Simão. Esse sentimento de cooperação entre o grupo acabava impondo a necessidade de socorrer associados e militantes sindicais em caso de penúria”. SIMÃO, A., Sindicato e Estado,p. 163.76 CARONE, E. Classes Sociais e movimento operário, p. 161.
43
as associações de ofícios e as cooperativas de produção, consumo e
crédito”.77
Desse modo, se forem levados em conta apenas o estatuto
da UGT e a posição das três tendências em relação aos objetivos
propostos nesse documento, fica difícil identificar a corrente hegemônica
dentro dessa organização. Entretanto, as entrevistas realizadas com
militantes comunistas e as pesquisas nos arquivos do DEOPS,78 que
revelaram relatórios de policiais que trabalhavam disfarçados na União
Geral dos Trabalhadores, podem ajudar no esclarecimento dessa
questão.
Tanto militantes do PCB, que atuaram na década de 20,
como outros mais recentes, afirmam categoricamente que a UGT foi
fundada por comunistas. Entretanto, a polícia que atuou em meados da
década de 20 acreditava ser essa uma organização dominada por anarco-
sindicalistas, até 1928, quando teve seus estatutos reformados pelos
comunistas.79 Sabendo das dificuldades organizatórias enfrentadas pelo
PCB entre 1922 e 1928, chega-se à conclusão que a União Geral dos
Trabalhadores, provavelmente, teria sido fundada por simpatizantes
comunistas, sem vínculos oficiais com o Partido. Tal fato explicaria a
heterogeneidade do seu primeiro estatuto, que evidencia a presença de
outras correntes ideológicas, preservando, todavia, o ideal de “defesa e
solidariedade entre as classes”, que tomou corpo definitivamente após o
domínio completo dessa organização pelos militantes comunistas, em
1928.
77 SIMÃO, A. Sindicato e Estado, p. 164. Avanti, 1.12. 1900, Ano I, n.º 7.78 “União Geral dos Trabalhadores”, caixa 11. Arquivos DEOPS/ SP.79 A “ União Geral dos Trabalhadores” - Sob esse título foi fundada em 1925, conforme verifica-se pelos estatutos, pelos “anarco-sindicalistas”, e reformada em 1928 pelos comunistas, que ali organizaram um núcleo de agitação extremista, na cidade de Ribeirão Preto. Apesar de algumas diligências policiais, os dirigentes de tal núcleo não se adaptaram à legislação trabalhista ( sindical ), procurando conservar a “sindicalização livre”, conforme determina a “IC” e a “ISV”. Caixa 11. Arquivo DEOPS/SP.
44
Guilherme Milani. Reprodução de 1996 de foto tirada pelo DEOPS/SP em 1929.
Ricardo Pinatti. Reprodução de 1996 de foto tirada pelo DEOP/SP, em 1930.
45
1.2.1.1. A primeira diretoria.
A organização administrativa da UGT apresentava-se num
esquema hierárquico bem definido. A diretoria era eleita em assembléia-
geral, composta por um presidente, um vice - presidente, um secretário-
geral, um secretário de atas, um tesoureiro, uma comissão com dois
membros, que atuariam como suplentes de qualquer membro da diretoria,
e duas juntas: uma de socorros e outra de cooperativa. Reuniam-se uma
vez por semana para deliberar sobre os assuntos da organização.
Não foram encontrados documentos que revelassem se os
membros da diretoria recebiam pagamento pelo seu trabalho na UGT
Contudo, diante das características da instituição e pelo número reduzido
de atividades empreendidas nos primeiros anos de funcionamento, é
possível que o trabalho se realizasse gratuitamente, recebendo os
membros apenas uma ajuda de custo para alimentação e viagens a
mando da instituição.80
Entre os membros da primeira diretoria, dois eram,
comprovadamente simpatizantes do PCB, posteriormente transformando-
se em militantes: Guilherme Milani e Rômulo Pardini. Os dois eram
observados assiduamente pela polícia ribeiropretana, que os considerava,
juntamente com Gustavo Wierman, os líderes comunistas da cidade até o
final da década de 30, quando formou-se uma nova geração de militantes.
Outros membros da diretoria, como João Pontim, também começaram na
UGT como simpatizantes do comunismo, e mais tarde transformaram em
militantes de relevância.
80 Depoimento dado por Antonio Girotto.
46
Quanto aos demais componentes da primeira diretoria, não
existem dados que possam revelar sua tendência ideológica de forma
precisa. Entretanto, pode-se concluir _ pela estrutura do primeiro estatuto
e pelos depoimentos de militantes do PCB _ que, nos primeiros anos, os
comunistas conviveram com sócios da UGT que apresentavam
tendências diversas, fato explicado pela necessidade de ampliar o número
de membros.
A composição da 1ª diretoria da UGT pode ser observada
abaixo:
Quadro. 181
Auxiliares da Diretoria de 1925
Cargo Nome Responsabilidade
Junta cooperativa Pedro Pontim
Ettore Gerbi
Domingos Conella
João Crivelim
Moysés N. de Oliveira
Dirigir e administrar a
cooperativa, proporcionando
aos sócios a compra por
preços razoáveis de gêneros
de primeira necessidade,
fiscalizando as mensalidades e
contribuições.
Junta de Socorros Demétrio Conelli
Delmis Baboza
Manoel Roza
Aldo Mantovani
Francisco dos Santos
Proporcionar com o disponível
em caixa uma diária aos
sócios que caírem doentes.
Recebedor Nilo Donegá Recolher mensalidades
Quadro. 2
47
Membros da diretoria da UGT em 1925 Cargo Nome Responsabilidade
Presidente Guilherme Milani Representar a sociedade judicial e extrajudicialmente. Manter a ordem nas sessões, dirigindo as discussões. Convocar sessões extras Visar todos os papéis referentes à sociedade, como as contas, relações, e assinar e abrir correspondência, rubricar os livros de atas e da escrita da associação.
Vice - presidente João Pontim Auxiliar, substituir e exercer , em suas faltas, as funções do presidente.
Secretário- geral Ilegível.82 Inscrever novos sócios nos livros competentes. Fazer e responder à correspondência da sociedade. Ter sob sua guarda, para informar o presidente ou a assembléia, um livro das mensalidades pagas e que deverá corresponder a um igual do tesoureiro.
Secretário de Atas Orestes Raioli Redigir as atas das reuniões da diretoria e da assembléia e proceder à sua leitura nas sessões respectivas. Substituir o secretário geral se necessário.
Tesoureiro Romulo Pardini Guardar valores, dinheiro e títulos da Associação. Administrar recebimentos e pagamentos.Organizar balancetes trimestral e anual, demonstrando o movimento do caixa.
Comissão Armando Pardini
Raphael dos Santos
Tomar parte e votar na deliberação da diretoria. Substituir nas suas funções qualquer membro da diretoria.
Aparentemente, a cooperativa de alimentos começou a
funcionar definitivamente a partir de 1928 e 1929. Nesse período, já era 81 Estatutos da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, Cap. II, Da Diretoria, administração e representação, 1925.
48
controlada exclusivamente por comunistas, que conquistaram
gradativamente o poder dentro da UGT. Tanto a cooperativa quanto a
junta de socorros representaram uma preocupação da diretoria da União
em minimizar alguns dos principais problemas dos trabalhadores: o alto
preço dos gêneros alimentícios de primeira necessidade e a falta de
assistência médica para os enfermos.
Tanto anarco-sindicalistas como comunistas acreditavam
que o assistencialismo desviava a atenção dos trabalhadores do que
deveria ser a sua verdadeira causa: a mobilização contra a exploração
patronal e a organização política. Entretanto, as precárias condições do
operariado em geral, e a própria necessidade de atrair contingentes para
as organizações sindicais fizeram com que estas acabassem incluindo em
seus estatutos o assistencialismo.
1.2.1.2. A cooperativa e a caixa de socorros.83
82 O nome do Secretário geral está ilegível na documentação.83 Estatutos da UGT, capítulo III, artigos 7/ 8, 1925.
49
A estruturação de uma cooperativa de gêneros alimentícios
de primeira necessidade aparece no estatuto como um dos principais
objetivos da UGT, em sua primeira fase, quando se auto denominava uma
“associação cooperativa e de recreação”. A preocupação em criar uma
instituição que garantisse a compra e a revenda de produtos alimentícios
para os associados, a um preço inferior ao valor de mercado, pode ser
explicada pelo baixo nível de vida do trabalhador urbano e pela
dependência econômica do trabalhador rural em relação aos
fazendeiros.84 A viabilidade de comprar alimentos a preços razoáveis,
sem dúvida, era um grande atrativo para os trabalhadores de baixa renda,
possibilitando maior adesão de associados à União Geral de
Trabalhadores. Entretanto, nesse período a cooperativa parece não ter
alcançado os objetivos que se propusera atingir, não tendo suas
atividades se desenvolvido de forma satisfatória.
No caso da “junta de socorros” , a União comprometia-se a
ajudar financeiramente ( dentro das possibilidades da sua reserva
monetária) associados enfermos, por intermédio de uma diária. Não
estendia seus benefícios aos sócios desempregados ou vítimas de
epidemias.
Além dos serviços da “junta de socorros” e da cooperativa,
a UGT tencionava a dar aos trabalhadores ligados à organização uma
“assistência social, intelectual, moral e judicial”.85 A criação de escolas
noturnas e biblioteca, além da luta contra o alcoolismo foram iniciativas
84 A relação de dependência econômica dos camponeses em relação aos fazendeiros era caracterizada, entre outras coisas, pelo fornecimento de gêneros alimentícios em armazéns dentro das propriedades agrícolas. Os colonos acabavam endividando-se, em decorrência dos preços abusivos cobrados pelos donos das fazendas, que se aproveitavam dessa situação para manter o trabalhador sob seu poder.85 Estatutos da U.G.T., capítulo III, artigos 7/ 8, 1925.
50
que marcaram a atuação da associação nos seus primeiros anos de
funcionamento.
1.2.1.3. Os sócios.
51
Infelizmente, a escassez de documentos dificulta uma
avaliação minuciosa de certos aspectos que poderiam caracterizar o tipo
de sócio que a UGT atraiu quando começou a funcionar. Um dos
principais obstáculos com que nos deparamos é a falta de dados sobre o
número de sócios em todas as fases de atuação dessa organização, o
que acaba limitando a análise da sua influência sobre a classe
trabalhadora. Contudo, outros elementos suprem a falta de informações
quantitativas, permitindo que sejam esclarecidos alguns questionamentos
levantados.
A União Geral, entre 1925 e 1928, caracterizava-se por ser
uma instituição eclética, principalmente no que diz respeito à aceitação de
novos sócios. Bastava que fossem maiores de dezesseis anos e
pagassem regularmente as mensalidades, para que tivessem direito a
usufruir os benefícios concedidos pela União. O estatuto não classificava
os sócios quanto ao ofício ou classe social.
Esse ecletismo fica evidenciado quando se observam as
profissões de alguns dos primeiros diretores da UGT: sapateiros,
alfaiates, funcionários públicos, dentista, ourives, vendedores, advogados,
negociantes, professores, etc.86 A presença marcante de autônomos e
pequenos negociantes, ou seja, trabalhadores sem patrão, pode ser
explicada pela ausência da pressão patronal sobre essa categoria, o que
lhes permitia uma ação sindical mais independente. Outro fator que deve
ser considerado, é a dificuldade que se enfrentou na formação de grêmios
ou associações de ofício, em decorrência da dispersão dos trabalhadores,
caracterizada pela escassez de empresas que reunissem grande número
de funcionários de um mesmo ofício.87
86 Esses dados foram recolhidos em fontes variadas: prontuários do DEOPS, artigos de jornais e entrevistas.87 SIMÃO, A. Sindicato e Estado. Simão avalia o contexto sócio-econômico que permeou a criação das associações do tipo “União Geral”, pp. 176 - 199.
52
No que diz respeito à atuação dos sócios dentro da União
Geral, esta estabelecia uma série de exigências comportamentais. Um
dos deveres dos sócios era ter “bom procedimento na sociedade e fora
dela”88, evitando principalmente o alcoolismo. O desvio de comportamento
poderia implicar, entre outras coisas, a expulsão do sócio transgressor.
A idéia de promover a “solidariedade entre os sócios”
refletia-se na exigência, por parte dos estatutos, de todo membro ter de
contribuir financeiramente para o funeral dos associados, sendo
considerado um dever acompanhar os enterros.
Nesses primeiros anos de existência, a atuação da UGT foi
bastante limitada por fatores já avaliados anteriormente. Uma das suas
realizações era a organização de festas para arrecadação de fundos, já
que, aparentemente, a instituição enfrentava problemas financeiros.
Essas reuniões festivas eram sempre muito concorridas, utilizadas para
atrair novos membros.89 Além das festas, a União iniciou, na década de
20, um trabalho de conscientização dos trabalhadores, por meio de
distribuição de panfletos instrutivos e realização de reuniões semanais.
Outro movimento que se intensificou com a sua criação foi a
comemoração do dia 1.º de Maio, quando se faziam comícios e
passeatas.
88 Estatutos da UGT, Capítulo IV, Dos sócios, artigo 10, p. 7., 1925.89 Entrevista com Irineu de Moraes, 1996.
54
Capítulo 2. O PCB em Ribeirão Preto.
2.1. A repercussão da divulgação de A Classe Operária e do II
Congresso do PCB na região.
Mesmo com o seu caráter de “associação cooperativa e de
recreação”,90 a União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto _ UGT_
foi usada, desde a sua fundação em 1925, como área de atuação dos
comunistas ribeiropretanos. Entretanto, até 1928, a ação comunista
dentro da UGT não era hegemônica, e os militantes tinham que disputar
espaços dentro da instituição com associados com tendências ideológicas
variadas,91 especialmente a reformista. Essa disputa entre correntes
diferenciadas, dentro do meio sindical, fazia parte de um processo
nacional de consolidação da ação comunista no movimento operário. A
luta pelo controle dos sindicatos colocou o PCB em choque com os
dirigentes trabalhistas alheios as idéias anarco-sindicalistas e comunistas,
pessoas a que o Partido se referia como “amarelos ou reformistas”.92
Além de enfrentar a influência dos socialistas e anarquistas
no meio sindical durante os anos 20, o PCB enfrentava outro problema, a
falta de preparo ideológico dos militantes do Partido, resultante do
desconhecimento, pela maioria, das obras de Marx, que representavam o
fundamento doutrinário do PCB. As poucas publicações em português,
voltadas para fundamentar a ação do partido, eram traduzidas ou
elaboradas por Otávio Brandão. Na verdade, apesar de alguns exemplos
isolados, as obras de Marx só começaram a ser divulgadas no Brasil a
90 Estatutos da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, 1925, “Denominação e fins”, artigo1.91 Depoimento de Antônio Girotto.92 DULLES, J. F. W. Anarquistas e Comunistas no Brasil. p. 235.
55
partir da década de 30.93 Dessa maneira, o despreparo ideológico dos
membros do partido, a reação do governo contra a ação comunista e a
própria resistência dos trabalhadores em relação às idéias lançadas pelo
PCB acabaram resultando no “atraso da organização comunista”.94
Durante a realização do II Congresso do PCB, no Rio de
Janeiro, entre 16 e 18 de maio de 1925, constatou-se que,
numericamente, os sindicatos reformistas tinham mais força junto aos
trabalhadores do que os sindicatos anarquistas e comunistas95,
demonstrando que a ação do Partido Comunista tinha sido, até então,
pouco expressiva, e havia obtido poucos resultados, especialmente no
Estado de São Paulo.96
Em Ribeirão Preto a situação não era diferente. Entre 1922 e
1925, Guilherme Milani, Gustavo Wierman e Romulo Pardini saíam do
movimento anarquista para se tornarem os primeiros simpatizantes e
posteriormente, militantes comunistas da cidade,97 fundando e
organizando a UGT. Inicialmente, a União Geral aceitou em suas fileiras
membros de várias linhas ideológicas e ocupações profissionais,98 não
havendo exigências, nos estatutos de 1925, referentes à profissão dos
membros, determinando apenas que os sócios tivessem idade superior a
16 anos, pagassem uma espécie de taxa de adesão e acertassem
regularmente as mensalidades. Desse modo, os comunistas conviveram
93 MORAES Filho, Evaristo de. “A Proto - História do Marxismo no Brasil “, in História do
Marxismo no Brasil: o impacto das revoluções. pp. 9 - 15.94 CARONE, E. “Resolução sobre os relatórios do II Congresso do PCB”, in O PCB (1922
a 1943). pp. 37 - 38.95 VINHAS, Moisés. O Partidão. pp. 10 -11.96 CARONE, E. O PCB ( 1922 a 1943 ). pp. 37 - 38.97 Depoimento de Gustavo João Eugênio Wierman, 27 de junho de 1989, dado a Sebastião Geraldo.98 Estatutos da União Geral, op. cit., Capítulo IV, Dos Sócios.
56
com a influência reformista dentro da União e a combateram, a exemplo
do que ocorria nos meios sindicais em âmbito nacional.99
Essa aparente tolerância quanto à presença de membros
reformistas na UGT pode ser classificada como uma atitude de
cooperação para “organizar e reorganizar os trabalhadores”. Os
“amarelos” tinham maior influência junto à classe trabalhadora; portanto,
inicialmente, por intermédio da ação conjunta com esses líderes
trabalhistas, os comunistas poderiam ter maior facilidade na difusão e
propagação das suas idéias.100 Mas é preciso lembrar que o fato de
comunistas e reformistas atuarem juntos na União Geral, particularmente
entre 1925 e 1928, não eximia os dois grupos da tentativa constante de
conquistarem maior poder dentro da instituição, colocando-os, quase
sempre, em conflito de interesses.
O emprego da propaganda de forma mais acentuada e
elaborada foi outra das preocupações trazidas à tona durante o II
Congresso. As lideranças comunistas alertavam para a necessidade de
ampliar o raio de influência ideológica do PCB, aumentar o número de
membros e orientar sistematicamente os militantes na sua atuação,
objetivos difíceis de serem alcançados exclusivamente pela ação política.
Para equacionar o problema, o PCB criou, em 1925, um órgão oficial do
Partido, A Classe Operária, que favoreceu a consolidação e o
desenvolvimento da ação do Partido Comunista junto aos
trabalhadores.101
Nos seus primeiros números, A Classe Operária orientou os
militantes, repetidamente, ”na formação de uma grande frente única
operária no Brasil, na substituição dos sindicatos de ofícios pelos 99 C.f. nota 3. Dulles.100 CARONE, Edgard. Classes Sociais e movimento operário. pp. 124 - 125.
57
sindicatos de indústria e na importância de organizar melhor o movimento
sindical em São Paulo, considerado frouxo”.102 Essas orientações surtiram
efeitos práticos na região. Em Ribeirão, os comunistas, organizados em
uma fração sindical do Partido, preocuparam-se em consolidar sua
influência na UGT por meio de uma política de cooperação com outros
grupos. Igualmente, iniciaram a organização do sindicalismo local, nos
moldes propostos pelo órgão oficial do Partido Comunista do Brasil.
Mesmo com o trabalho de agitação e propaganda, iniciado
após o II Congresso, o movimento comunista em São Paulo pouco se
desenvolveu. No entanto, no interior do Estado, em Ribeirão Preto e em
Sertãozinho, o PCB formou núcleos de grande importância política e
sindical. Em Sertãozinho, as orientações do Partido, que chegavam à
região mediadas pelo semanário A Classe Operária, repercutiram com
mais força. Enquanto em Ribeirão Preto o núcleo comunista começava
embrionariamente a organizar-se e a atuar no meio sindical, Sertãozinho
já apresentava um ativo grupo de comunistas que se reunia na Liga
Operária Orestes Lascala.103 A Liga, comandada por Theotônio de Souza
Lima que, segundo Otávio Brandão, era um fabricante de foguetes que
aderiu ao Partido em 1925 depois de ter lido um exemplar de A Classe
Operária.104 A Liga tinha ideais comunistas bem definidos, difundidos no
seu órgão de imprensa de publicação quinzenal o 1.º DE MAIO, fundado
em maio de 1926 e dirigido por Thetônio.105 O núcleo de militantes reunia-
se periodicamente na sua sede, à Rua Barão do Rio Branco, n.º 15, para
discutir a ação comunista na cidade. A importância de Sertãozinho no 101 DULLES, J. F. W. Anarquistas e comunistas no Brasil, p. 227.102 Cf. nota 9.103 Prontuário de Guilherme Milani, caixa 11, Arquivo do DEOPS/SP.104BRANDÃO, Otávio. Otávio Brandão (depoimento, 1977). Rio de Janeiro,
FGV/CPDOC - História Oral, 1993, p. 110.105 DEL ROIO, José Luiz. 1.º de Maio, cem anos de luta - 1886 - 1986. Organizado pelo
Centro de Memória Sindical, São Paulo: Global, 1986. O livro traz cópias de edições comemorativas do 1.º de Maio, de jornais com tendências anarquistas e
58
movimento comunista da época é comprovada pela presença do
comerciário Sebastião Pintaúde na reorganização e fundação do novo
Comitê Regional do Partido Comunista em São Paulo, que se encontrava,
até então, desestruturado. Pintaúde tornou-se uma das principais
lideranças comunistas, compondo a oposição de esquerda dentro do
PCB.106
Além de Pintaúde, estavam entre os participantes da Liga
Operária: Carlos Guedes Vieira, Américo Marsilio, Carlos Gouveia,
Armando Chorati, Ângelo Chorati, Joaquim Freitas, José Guedes e o
próprio Theotônio Souza Lima, este último responsável pela publicação
do jornal.107 Ideologicamente mais amadurecido e coeso, o grupo de
Sertãozinho pretendia conquistar “para a luta nacional e internacional das
classes, os 15 mil trabalhadores da cidade”.108 O 1º de Maio atacava
sistematicamente o capitalismo e convocava o operariado para unir-se
contra o patronato, sem distinção de raça, credo ou profissão. No primeiro
número do jornal, Theotônio, líder do grupo, apresentou as
“Reivindicações e Palavras de ordem da Liga Operária”:
Primeira parte - Internacionais.Contra o pacto de segurança, que visa à intervenção na Rússia.
Contra a Liga das Nações, esteio da Inglaterra contra-revolucionária.
Contra a reação mundial. Contra o imperialismo, Contra a 2.ª
Internacional - esteio do imperialismo. Vitória completa da Rússia
sobre todos os seus inimigos. Independência dos povos coloniais. A
China liberta dos caudilhos e imperialistas. Frente única de todos os
trabalhadores das três Américas contra o imperialismo anglo-
americano. Unidade sindical internacional. Bloco mundial das massas
operárias e camponesas em torno da União Sovietista.
comunistas; entre eles foram encontradas duas edições do jornal publicado em Sertãozinho, encontrado pelo autor no acervo ASMOB, Milão.
106 CARONE, E. Classes Sociais e movimento operário. p. 148.107 Prontuário de Guilherme Milani, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.108 O 1.º DE MAIO, ANNO I, Sertãozinho, 22 de maio de 1926, número 2.
59
Segunda parte - nacionais. Econômicas: Baixa dos aluguéis, barateamento dos gêneros de
primeira necessidade. A grande propriedade sujeita ao imposto sobre
a renda.
Políticas: Restabelecimento das liberdades constitucionais. Prisão
política para os presos políticos. Voto secreto e obrigatório. Direito de
voto às mulheres. Facilidade do alistamento eleitoral.
Reconhecimento “de jure” da União Sovietista. Frente única dos
trabalhadores fabris, dos transportes e da lavoura. Aliança dos
operários municipais e do Estado, das mulheres trabalhadoras, dos
empregados pobres do comércio, dos correios, dos telégrafos e
telefones com o proletariado fabril sob a direção do PC. Apoio
Material e moral dos pequenos proprietários, das cidades e dos
campos, ao proletariado fabril, dirigido pelo PC. Contra a opressão do
governo de fazendeiros de café. Contra os partidos opressores do
proletariado. Contra o imperialismo anglo-americano e a 2.ª
Internacional que apóiam a atual reação brasileira. Contra os
capitalistas e os seus patrões imperialistas internacionais. Contra a
frente única socialista, amarela, anarquista, fascista e imperialista
visando à desagregação da vanguarda proletária. (...)109
O ataque veemente aos socialistas e ao imperialismo anglo -
americano mostram que o grupo comunista de Sertãozinho estava em
consonância com as resoluções do II Congresso, que orientava os
militantes a “levar por diante a luta ideológica tendente a despertar e
cristalizar a consciência de classe do proletariado. Estabelecer
nitidamente, em todas as lutas políticas do país, a diferenciação dos
interesses e da ideologia das classes. Combater energicamente erros,
desvios e ilusões tanto da extrema - esquerda anarquista como da direita
socialista”,110 mesmo atuando em forma de frente única com
trabalhadores dessas correntes ideológicas.
109 O 1º de Maio, Sertãozinho, número 1.110 CARONE, E. O PCB de 1922 a 1943. p. 39.
60
A Liga Operária de Sertãozinho iniciou sua atuação na
década de 20, tornando-se um importante núcleo de expansão dos ideais
comunistas no interior de São Paulo, num momento em que a ação do
PCB em São Paulo era limitada por seu reduzido número de militantes,
chegando a quase desaparecer. Entre 1925 e o início da década de 30, a
ligação entre os militantes da região de Ribeirão Preto (que inclui
Sertãozinho) e o grupo comunista paulistano estreitou-se. Membros das
duas cidades participaram da organização do Comitê Regional em 1927,
sendo responsáveis posteriormente pela fundação do BOC em Ribeirão.
A partir desse ano, as duas cidades despontaram como núcleos de
grande importância para o Partido, com atuação intensa no interior do
Estado.111 Em Ribeirão Preto, vários fatores combinados possibilitaram
que os comunistas conquistassem o poder hegemônico dentro da UGT,
expurgando a influência reformista e anarquista e tomando para si as
rédeas da sindicalização dos trabalhadores, ampliando e consolidando
sua influência política e sindical na região.
111 Idem, Classes Sociais e movimentos operários, pp. 147 - 148.
61
2.2. Os comunistas e a conquista da hegemonia da “União Geral dos
Trabalhadores de Ribeirão Preto”.
A partir da fundação da União Geral dos Trabalhadores, as
possibilidades e o espaço de atuação dos comunistas aumentaram na
região. O trabalho dos militantes dentro da UGT permitia um contato
direto com os trabalhadores, imprescindível para aumentar a confiança no
PCB, já que os operários demonstravam certa resistência às idéias
comunistas. “Isso pode ser explicado pela constante propaganda negativa
em relação ao partido, responsável por divulgar a idéia de que os
comunistas representavam uma ameaça real. Aderir à sindicalização ou
ao comunismo era sinônimo, para os trabalhadores, do prenúncio do
desemprego e de problemas com a polícia”, o que de fato não estava
longe da verdade. 112
Os fazendeiros estavam entre os que mais resistiam ao
processo de sindicalização dos trabalhadores. Usavam, como mecanismo
de coerção, a ameaça de expulsão dos colonos de suas terras,
aproveitando-se da grande onda de desemprego que se abateu sobre a
região de Ribeirão Preto na década de 30, particularmente nos meios
rurais. O poder coercivo dos fazendeiros, a falta de trabalho no campo
motivada pela crise que atingiu o setor cafeeiro, a reação do governo
contra os comunistas e a desconfiança dos camponeses em relação ao
PCB, acabaram prejudicando e retardando a sindicalização no campo,
que só tomaria impulso nas décadas de 40 e 50.
Mesmo com todos os problemas enfrentados, a atuação do
grupo comunista ribeiropretano tornou-se mais ampla, a partir de 1927,
especialmente entre os trabalhadores urbanos. Esse aumento da
62
influência comunista nas cidades teria sido favorecido pelo crescimento e
pela diversificação das atividades urbanas, que possibilitaram o
surgimento de um número maior de trabalhadores autônomos, desligados
da relação patronal e, conseqüentemente, mais ativos no movimento de
sindicalização.113 A falta de vínculos patronais tornava os trabalhos
sindical e político menos ameaçadores, um exemplo disso é que os três
principais fundadores da UGT eram trabalhadores autônomos: Guilherme
Milani, vendedor; Romulo Pardini, sapateiro, e Gustavo Wiermann,
pedreiro.
Outros fatores também foram determinantes no aumento da
influência comunista na região de Ribeirão Preto. Entre eles, a realização
do Terceiro Congresso Nacional do PCB_ entre os dias 29 de dezembro
de 1928 e 4 de janeiro de 1929_, que lançou a palavra de ordem: “À
conquista de São Paulo”, e a fundação do novo Comitê Regional de São
Paulo, em maio de 1927, considerado até então, pelo partido,
praticamente inoperante. Entre os fundadores e responsáveis pela
reorganização do novo CR em São Paulo estavam Everardo Dias, Plínio
Melo, o sapateiro Pissuti, o garçom Texeda, e alguns representantes do
interior, como o comerciário Pintaúde, de Sertãozinho. Com a ampliação
das atividades do partido em São Paulo iniciou-se a criação de novas
células na capital e no interior, e um trabalho mais efetivo por parte do
Agitprop (Agitação e propaganda), cujo secretário era Aristides Lobo. As
atenções dos militantes, sob a orientação do CR de São Paulo, deveriam
estar voltadas para a propaganda individual, a difusão da literatura
comunista, a agitação nas fábricas, a implantação do BOC (Bloco
Operário e Camponês ) e a expansão da ação prática ilegal.114 Todo esse
trabalho culminou com a consolidação de núcleos comunistas de grande
112 Entrevista com Antônio Girotto.113 Sobre as conseqüências da crise de 1929 em Ribeirão Preto e a diversificação das atividades econômicas na cidade ver o Capítulo 1.114 CARONE, E. Classes Sociais e movimento operário, pp 145 - 148.
63
intensidade no interior do Estado, especialmente em Santos, Ribeirão
Preto e Sertãozinho.
Como um reflexo desse trabalho de ampliação da ação
partidária em São Paulo, houve a visita de membros do partido a Ribeirão
e Sertãozinho entre 1927 e 1929, visando orientar o desempenho dos
núcleos comunistas no interior do Estado. Entre os visitantes podemos
citar Manuel Medeiros, Antônio Ribeiro e João Occhineri, que estiveram
na Liga Operária Orestes Lascala e na UGT a convite de Guilherme
Milani.115
A conseqüência desse contanto foi a implantação, em
Ribeirão Preto, do BOC ( Bloco Operário e Camponês ), cujas reuniões
ocorriam na residência do próprio Milani, na Rua Prudente de Moraes, n.º
118, com a participação constante de Gustavo Wierman, colaborador de
Milani, que nesse período era presidente da União Geral dos
Trabalhadores.116 Inicialmente, o objetivo do PCB _ao coordenar a
formação de uma chapa de candidatos sob uma única plataforma_ era
suprir a falta de condições reais do partido em participar do processo
eleitoral com candidatos próprios, sendo necessário recorrer à política de
frente única. “A plataforma do BOC pedia que seus candidatos
subordinassem suas atividades ao controle das massas. Entre os pontos
apresentados estavam: legislação social regulando a jornada de oito
horas, 48 horas semanais, contratos coletivos de trabalho, salário mínimo,
proteção à mulher e às crianças, proibição do trabalho de menores de
quatorze anos; seus candidatos deviam trabalhar pela abertura das
relações com a União Soviética, a anistia a todos os prisioneiros políticos
e pelo pagamento de indenizações aos sobreviventes deportados para
Clevelândia ou as suas famílias”. O BOC, que foi criado para dar acesso
115 Prontuário de Guilherme Milani, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.116 Idem.
64
legal aos membros do PCB ao processo eleitoral_ depois da Lei celerada
de 1927, que privava o Partido Comunista de atuar publicamente _,
tecnicamente substituiu-o, criando sedes em São Paulo e em cidades do
interior, como Ribeirão Preto, passando a atuar como organização quase
exclusivamente comunista, contrariando os princípios de frente única. 117
A atuação do BOC na política ribeiropretana aparentemente
acompanhou as determinações do BOC de São Paulo que, em 1928,
orientou seus partidários, no Estado, a votar nos candidatos do Partido
Democrático, fato que irritou os membros do Comitê Central do Partido
Comunista, que pretendiam que o Bloco paulista lançasse candidatos
próprios.118
As distorções de atuação do Bloco Operário e Camponês
relativas às diretrizes do partido e ao crescimento do seu prestígio em
detrimento do próprio PCB, culminaram com sua separação do Partido
Comunista, depois da realização do Terceiro Congresso do partido em
dezembro de 1928. Desde esse momento, o BOC passou a ser uma
organização de frente entre outras no Brasil.119
A atuação do BOC em Ribeirão Preto esteve ligada ao
núcleo comunista e, conseqüentemente, à UGT até 1930, quando ainda
constatamos a ligação entre os seus candidatos e os militantes do PCB. O
relativo prestígio junto aos grupos políticos de esquerda, como o Partido
Democrático, conquistado com a atuação dos comunistas do Bloco
favoreceu a ampliação da ação partidária na organização sindical. Essa
117 “Brasil: Las fuerzas, las tendenciais y las perspectivas del movimiento sindical”. El Trabajador Latino Americano, ano 1, n.º 3, 15 de octubre de 1928, pp. 21-23. Transcrição do documento contido em PINHEIRO, P. S. e HALL, M. A Classe Operária no Brasil ( Documentos 1889 a 1930 ), pp. 285 - 291.118 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, pp. 291 - 293.119 PINHEIRO, Paulo Sérgio e HALL, Michael M. A Classe Operária no Brasil:
Documentos ( 1889 a 1930 ), p.291.
65
influência consolidou-se quando o núcleo comunista tornou-se
hegemônico na União Geral dos Trabalhadores, fato ocorrido no mesmo
período da realização do III Congresso Nacional do Partido. Nesse
momento, a UGT de Ribeirão e a Liga Operária Orestes Lascala, de
Sertãozinho, eram notadamente consideradas como organizações
revolucionárias, sob o total controle dos comunistas, e com importância
reconhecida pela imprensa internacional voltada ao movimento operário
latino-americano.120
Entre as resoluções do Congresso sobre a “atividade
comunista nos sindicatos operários”, foram feitas críticas ao “espírito
corporativista”, adotado até então, à influência anarco-sindicalista nos
sindicatos, e à “falta de um trabalho de conjunto metódico, sistemático e
coletivo”.121 Apoiados nessas resoluções e no contexto favorável de
relativa liberdade política, em fevereiro de 1929, os sócios da UGT
registraram em cartório novos estatutos que vinham sendo elaborados
desde o ano anterior, com clara influência comunista. A partir desse
momento, a ação comunista na UGT passou a ser declarada, tornando
essa instituição a sede do comitê municipal do Partido Comunista em
Ribeirão Preto.
A confirmação da influência comunista no movimento
operário na região de Ribeirão acompanhou um movimento de
consolidação nacional do PCB, que passou por uma reestruturação entre
os anos de 1928 e 1930, marcada pela mudança de tática e pela queda
de velhas lideranças do Comitê Central, como Astrojildo Pereira. Entre as
modificações ocorridas está o estabelecimento de um controle mais
acentuado da ação do partido por parte da Internacional Comunista, por
intermédio do Bureau Sul - americano, que passou a exercer grande 120 C.f. nota 27.
66
influência junto ao PCB. Esse controle teve como conseqüência a adoção,
pelo Partido Comunista do Brasil, a partir de 1930, do lema “classe contra
classe”, proposto no Sexto Congresso da IC, em 1928. Essa mudança,
que acabou com a política de “frente única” adotada até então, levou o
Partido a atuar de forma mais sectária e provocou profundas mudanças
no Comitê Central.
Em Ribeirão, essas medidas modificaram a atuação dos
militantes, que pode ser avaliada por intermédio dos novos estatutos,
elaborados em 1928 e oficializados em 1929.
121 CARONE, E. “O III Congresso (dezembro de 1928 - janeiro de 1929)”, in O PCB
(1922 a 1943), pp. 73 - 74.
67
2.2.1. A mudança nos estatutos.
Os comunistas, de 1922 a 1928, circunstancialmente
aceitaram a tática de ligar-se a sindicatos de outra orientação ideológica,
até porque, durante o III Congresso Nacional, o próprio partido admitiu
que a base da ação do PCB estava nos sindicatos, onde eram
encontrados os mais ativos militantes. Portanto, justificava-se a política de
cooperação adotada pelos comunistas com o intuito de conquistar espaço
de atuação no movimento sindical. 122
No final da década de 20, começavam a aparecer os
primeiros sinais da política de “classe contra classe”, fruto das resoluções
do Sexto Congresso da Internacional Comunista, realizado em 1928. A
linha ultra-esquerdista, que predominou na IC, passou a hostilizar os
movimentos democráticos e reformistas, acusando-os de serem agentes
do imperialismo. Essa posição oficializada pela IC influenciou
profundamente a posição ideológica do PCB; um dos resultados diretos
dessa influência foi a inviabilidade do convívio entre comunistas e
membros de outras correntes ideológicas dentro dos sindicatos. A
conseqüência foi o choque entre o PCB e os sindicalistas, provocando a
exclusão daqueles que tinham posições mais moderadas e não
desejavam a revolução armada.
Entre as décadas de 20 e 30, a UGT tornou-se a instituição
sindical de maior expressão em Ribeirão Preto, transformando-se numa
organização exclusivamente comunista. Os militantes do PCB
conseguiram expurgar as demais correntes ideológicas que atuavam
122 CARONE, E. Classes Sociais e Movimento Operário,pp 158 - 168.
68
dentro da organização, a exemplo do que já havia acontecido em
Sertãozinho com a Liga Operária Orestes Lascala, em 1926.
Assumiram a diretoria da União Geral dos Trabalhadores
homens reconhecidamente comunistas que passaram a atuar livremente
dentro da instituição. Alguns deles permaneceram na UGT até as décadas
de 40 e 50, como Pedro Campana, João e Angelo Pontim e Guilherme
Milani. Henrique Covre assumiria posição de destaque dentro da União
como militante comunista, arregimentando novos membros, distribuindo
jornais comunistas e servindo como contato entre o Comitê Regional de
São Paulo e o recém - constituído comitê ribeiropretano.
No quadro 1, podem-se observar as funções, os membros e
as responsabilidades da primeira diretoria da UGT depois da reformulação
dos estatutos. O número de membros foi reduzido de dezoito para sete,
tendo sido excluídas partes da diretoria, como a junta de socorros, a junta
cooperativa e o recebedor, responsável pelas cobranças. O secretário -
geral tornou-se membro de destaque na diretoria e assumiu uma função
representativa na instituição, ficando responsável por representá-la em
congressos e reivindicar, juntamente com os trabalhadores, direitos
econômicos, mediando as negociações entre o proletariado e o patronato.
Além das funções sindicais do secretário - geral, este deveria cuidar dos
interesses dos “camaradas” presos, providenciando recursos financeiros
para as famílias até sua liberação.
As atividades do presidente da União Geral dos
Trabalhadores ficaram restritas às funções legais de administração,
totalmente desligadas de qualquer atividade política que pudesse vincular
explicitamente a instituição ao PCB.
69
Quadro. 1123
Membros da diretoria da UGT em 1929.
Cargo Nome ResponsabilidadesPresidente Pedro Campana Dirigir o destino da União.
Presidir reuniões.
Convocar assembléias
Fiscalizar todos os membros
da diretoria.
Vice – presidente João Pontim Auxiliar e substituir o
presidente.
Tesoureiro Domingos Benetti Organizar as finanças da
instituição.
Secretário geral Angelo Pontim Inscrever novos sócios.
Mediar negociações com os
patrões.
Impetrar habeas corpus em
favor de sócios coagidos.
Lutar pela lei de férias com
propaganda direta.
Estar presente durante os
congressos.
Secretário de atas Guilherme Milani Redigir as atas.
Substituir o secretário-geral.
1.º Secretário de expediente Sic.124 Confeccionar convites para
reuniões.
Substituir o secretário de atas.
2.º Secretário de expediente Henrique Covre Receber as queixas dos
associados.
Auxiliar o 1.º secretário e
substituí-lo, se necessário.
123 Estatutos da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, Cap. 11, Da Diretoria, administração e representação, 16 de fevereiro de 1929.124 O nome do 1.º secretário de expediente está ilegível na documentação.
70
Guilherme Milani, militante de maior destaque na região, foi
o responsável pelo projeto de reformulação dos estatutos da União.
Depois de reformulados nos moldes necessários para facilitar a ação
comunista dentro da União Geral dos Trabalhadores, os estatutos foram
revisados por uma comissão formada por cinco militantes: Pedro
Campana, presidente da UGT em 1929; Cesar Tupynambá Roselino,
professor; Angelo De Gaetani, comunista atuante; Izaac Camargo e
Canuto Barbosa Vieira.125
No texto dos novos estatutos é possível perceber com
clareza a influência das idéias comunistas. A utilização de expressões
próprias desse grupo, como “camarada”, demonstram a despreocupação
com o sigilo das atividades. Entretanto, a mudança mais expressiva foi a
exclusão do texto do capítulo 1.º: “Denominação e fins”, do caráter de
associação cooperativa e recreativa da UGT, transformando-a numa
associação com a finalidade de promover a “defesa e solidariedade da
classe e dos associados, proporcionando a estes assistência econômica,
intelectual, moral, social e judiciária”.126
As atividades de recreação e a cooperativa de alimentos,
que anteriormente caracterizavam a UGT, passaram a ser desenvolvidas
a reboque da ação comunista. As festas e bailes promovidos pela
instituição começaram, desde então, a arrecadar fundos para a UGT, a
fim de socorrer os companheiros em dificuldades financeiras e para
financiar a confecção de panfletos para a “instrução” dos trabalhadores.127
Outra atividade realizada para promover o levantamento de fundos era a
arregimentação de colaborações entre os simpatizantes do partido.
125 Estatutos da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, p. 7.126 Estatutos da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, Cap. 1, Denominação e fins, art. 1.º, 1929, p. 1.127 Entrevista realizada com Irineu de Moraes em 1995.
71
Para executar esse trabalho era escolhido um militante com
bom relacionamento na cidade, o que facilitava o contato com os
colaboradores. Essa atividade, chamada de “fazer finanças” pelos
militantes, era de grande importância, pois o dinheiro obtido era utilizado,
entre outras coisas, para socorrer as famílias dos camaradas” presos.128
A exclusão do caráter de associação cooperativa da
denominação da UGT demonstra o interesse em não desviar a atenção
dos militantes do principal objetivo da instituição: lutar pela sindicalização
e pela organização política dos trabalhadores. Entretanto, a fundação de
uma cooperativa de consumo, mesmo que secundariamente, continuou
fazendo parte dos planos da UGT, fato consumado no mesmo período da
reestruturação dos estatutos.
Entre todas as funções já existentes na União desde 1925,
ano da sua fundação, a de secretário geral foi a que sofreu maiores
modificações. Enquanto ao presidente cabia dirigir os destinos da UGT e
responder judicialmente por ela (funções burocráticas dentro da
organização sindical), ao secretário-geral foram atribuídas funções
políticas e atividades ligadas diretamente à “agitação das massas”, como
“fazer a massa compreender a importância da Lei de Férias e ajudar os
sócios coagidos”. O escolhido para essa função foi Angelo Pontin, que
permaneceu atuando na UGT e militando pelo partido até a década de 40.
A presença da luta pela implantação da Lei de Férias nos estatutos da
UGT, como uma das principais funções do secretário-geral, demonstra o
posicionamento dessa instituição quanto à legislação social, fato que pode
ser explicado pela luta dos comunistas a favor das leis sociais junto ao
Departamento Nacional do Trabalho. Muitas organizações operárias
passaram a apoiar a aplicação da Lei de Férias, que enfrentava grande
resistência por parte dos industriais do Rio de Janeiro e de São Paulo. 128 Entrevista realizada com Luciano Lepera, militante comunista e jornalista, 1997.
72
Outra modificação efetuada nos estatutos foi a eliminação da
antiga “Junta de Socorros”, cuja comissão fazia parte da diretoria geral da
UGT. Em seu lugar foi criada uma “Caixa de Socorros” , com uma
diretoria paralela cuja única função era administrar fundos para socorrer
associados enfermos, sem o direito de voto na diretoria geral. O fato de a
UGT ter mantido o programa assistencial, representado pelo auxilio
financeiro aos enfermos, como pagamento a médicos, a farmácias,
enterro de associados e, posteriormente, assistência odontológica,
demontra a preocupação com o bem-estar social dos seus membros e
com a necessidade de criar atrativos para conquistar novos contingentes
para a organização sindical.
Entretanto, se a intenção era ampliar a quantidade de
sócios, as exigências para novas adesões tornaram-se muito mais rígidas.
Os estatutos de 1925 permitiam a adesão de qualquer pessoa maior de
dezesseis anos e que pagasse regularmente suas mensalidades, o que
possibilitava a formação de um quadro de associados bastante
heterogêneo.
Os estatutos de 1929 mantiveram a exigência de idade,
contudo havia um incentivo ao ingresso de membros jovens e de
mulheres para possibilitar a fundação das “seções feminina” e da
“juventude proletária”. O incentivo consistia na dispensa do pagamento da
“jóia”_ uma espécie de taxa de adesão _, e no oferecimento de escolas,
palestras, etc. Essa preocupação com a fundação de seções de mulheres
e, principalmente, de jovens, justifica-se pelas resoluções tomadas
durante a realização do II Congresso do PCB, em 1925, quando se
recomendou ao Partido que cuidasse da organização das “juventudes
comunistas”, importantes para a “conquista de jovens obreiros e
proletários”. A mesma preocupação perdurou no III Congresso, em 1928,
73
pois o desempenho e os trabalhos da juventude comunista, liderada por
Basbaum, não foram considerados satisfatórios. Como resultado dessas
orientações a seção comunista de Ribeirão Preto, que tinha como sede a
própria UGT, usou esta instituição como veículo para arregimentar e
organizar os jovens simpatizantes comunistas.129
Tendo a idade necessária, o pretendente a associado tinha
de cumprir outras exigências, entre elas, ter bons antecedentes e bom
comportamento social. Além disso, o secretário-geral, encarregado da
adesão de novos sócios, deveria restringir a inscrição de membros que
não vivessem de “salários ou ordenados” e que não fossem
“trabalhadores”. Seria prematuro avaliar essa exigência dos estatutos
como um primeiro sinal de proletarização do partido, que mais tarde seria
chamada de “obreirismo”. Afinal, entre 1928 e 1930, o Partido ainda
defendia a política de frente única e tinha muitos intelectuais em sua
direção, como Octávio Brandão e Astrojildo Pereira. Por outro lado, seria
difícil acreditar que as resoluções tomadas no VI Congresso da IC, onde
teve início o processo de proletarização do movimento comunista, teriam
chegado a Ribeirão antes mesmo de terem surtido na capital. Contudo,
mesmo havendo um núcleo do BOC em Ribeirão, o que caracterizava a
política de frente, nos finais da década de 20 já era possível sentir os
primeiros indícios, mesmo que embrionários, da política obreirista na
atuação do núcleo comunista em Ribeirão Preto.
Outro fator que deve ser analisado com cuidado é a
intenção, oficializada no texto do novo estatuto, de transformar a UGT
numa federação sindical de zona que deveria compor a futura Federação
Sindical de São Paulo, cuja criação estava sendo incentivada pelo porta -
voz do Partido paulista, o jornal O Internacional, que recebia amplo apoio
129 CARONE, E. O P.C.B. ( 1922 a 1943 ). pp. 41- 42.
74
do núcleo comunista ribeiropretano.130 A transformação da UGT em
federação sindical de zona não chegou a ser concretizada, porém mesmo
assim a sua influência no meio sindical regional cresceu no fim da década
de 20.
Na verdade, todas as modificações ocorridas nos estatutos
da UGT, tornando-a uma organização com claros fins políticos
influenciados pela ideologia comunista, são o resultado do crescimento do
núcleo comunista em Ribeirão Preto, do amadurecimento da ação do
PCB no âmbito nacional, e da própria radicalização do movimento, que
optou pela ofensiva direta. O objetivo era promover a conscientização da
massa trabalhadora do seu papel social de motor propulsor da revolução,
procurando mobilizá-la para essa meta.
As organizações sindicais, como a UGT, era usadas pelos
comunistas como ambiente de contato com os trabalhadores, que eram
incentivados pelos militantes a se sindicalizaram e a participarem da vida
do partido. Dessa maneira, a UGT tornava-se não apenas uma
organização de reivindicações com fins econômicos e sociais, mas
também uma instituição política, dominada, hegemonicamente pela fração
sindical do PCB de Ribeirão Preto, que objetivava, dentro dessa
instituição, introduzir os sócios na militância comunista.
130 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, pp. 288 -291.
75
2.3. A organização do comitê municipal do Partido Comunista do
Brasil em Ribeirão Preto.
O Partido Comunista do Brasil, a exemplo de outros partidos
políticos, tinha uma estrutura organizacional que lhe permitia orientar seus
quadros partidários quanto a objetivos políticos, metas e tarefas sujeitos a
um sistema hierárquico de autoridade e a uma distribuição de poder bem
definidos.
Tendo como elemento chave de atuação a disciplina rígida
dos seus militantes, o PCB lutou para transformar-se na instituição
representativa da classe operária. Sua estrutura vertical de poder
caracterizava-se por divisões: nacional, regionais e municipais. No âmbito
nacional atuavam o Comitê Central, que englobava a liderança mais alta
do Partido, e a Comissão Central Executiva ou Comissão Executiva, que
exercia efetivamente as decisões do Comitê Central. Da Comissão
Executiva era tirado o secretariado, autoridade máxima dentro do Partido,
cuja personalidade dominante era o secretário - geral. 131
Nos escalões intermediários de poder estavam o Comitê
Regional ou Estadual, o Comitê Municipal ou Zonal e as Células. Os
membros de cada nível tinham a responsabilidade de transmitir as
diretrizes do Partido, determinadas durante os Congressos Nacionais, e
organizar a ação partidária dentro da sua jurisdição. As células eram as
raízes do Partido, organizadas conforme os locais de trabalho ou de
moradia , com no mínimo três membros cada uma. Eram responsáveis
131 CHILCOTE, R. H. Partido Comunista Brasileiro: conflito e integração, pp. 163 - 164.
76
pela ampliação e renovação do quadro de militantes e pelo levantamento
de fundos, além de reunirem-se para discutir o marxismo - leninismo.
Fica difícil afirmar a existência de um Comitê Municipal
estruturado em Ribeirão Preto, entre 1922 e 1928. Todos os indícios
apontam para a atuação de militantes dispostos em células, nesse
período. Aos poucos, aumentaram sua ação e organização até que, no
final da década de 20, seriam os responsáveis pela composição do
Comitê Municipal ribeiropretano, com aproximadamente dez militantes
estabelecidos e atuando na sede da União Geral dos Trabalhadores.
A demora na formação de um Comitê Municipal pode ser
explicada pela dificuldade de atuação do partido, marcado por longos
períodos de ilegalidade, que acabaram favorecendo, nos primeiros anos,
o estabelecimento de estruturas menos complexas, como as células e as
frações. Assim, permitia-se a militância dentro de instituições sindicais,
fábricas e organizações camponesas de jovens e mulheres, tendo cada
fração o seu secretariado e um mínimo de três membros. 132 A fração
sindical do PCB em Ribeirão acabou se transformando num grupo
hegemônico, permanecendo assim até o final da década de 30.
O grupo comunista atuante em Sertãozinho, região de
Ribeirão, também militava dentro de uma organização operária, a Liga
Operária Orestes Lascala. Esse núcleo era mais estruturado e
ideologicamente melhor preparado, chegando a publicar um jornal
comunista na década de 20. Os grupos das duas cidades parecem ter
agido, até 1928, de forma distinta, sendo a Liga Operária mais ativa na
área de agitação e propaganda junto aos trabalhadores do meio rural,
enquanto o núcleo ribeiropretano preocupava-se em ganhar espaço
dentro do meio sindical urbano.
77
Entre janeiro e agosto de 1927, o Partido Comunista viveu
um curto período de legalidade,133 que acabou contribuindo para o
aumento do seu número de membros e da capacidade organizativa do
Partido em todo o país, possibilitando a fomentação da propaganda
partidária, a estruturação definitiva do Bloco Operário e Camponês e o
aumento da influência comunista em São Paulo, onde o Partido, até
então, encontrava-se pouco desenvolvido nos setores político e sindical.
Uma liberdade maior de atuação dos membros do Partido, favorecida pela
legalidade, e o crescente interesse dos comunistas pela “conquista de
São Paulo” estimularam e possibilitaram a instalação, em Ribeirão Preto,
de uma “fração” do Partido Comunista do Brasil. Ribeirão, uma das
cidades mais importantes do país em decorrência das grandes safras de
café, aparecia como campo fértil para a atuação dos comunistas, que
tinham a intenção de iniciar um “trabalho de base” com os trabalhadores
na “cartilha comunista”, por intermédio da distribuição de boletins de
propaganda e reuniões de “instrução”.134
A fim de realizar esse trabalho doutrinário junto aos
trabalhadores rurais, os militantes pediram aos membros do Comitê
Regional para lhes enviarem material de propaganda que tivesse uma
linguagem mais acessível aos trabalhadores rurais, que só assim
poderiam compreender melhor as idéias comunistas.135
Além do trabalho de propaganda política e revolucionária
efetuado com os camponeses da região, os militantes do PCB, atuantes
em Ribeirão e em Sertãozinho, passaram a provocar debates de fundo
econômico e social, forma de atrair para a causa comunista os
132 Ibidem, pp. 164 - 170.133 Ibidem. pp. 63.134 Prontuário de Henrique Covre, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.135 Prontuário de Caetano Scavone, n.º 273, caixa 17. Arquivo do DEOPS/SP.
78
trabalhadores rurais, num momento em que se iniciava um longo período
de desemprego e miséria crescentes motivado pela crise no setor
cafeeiro. Liderados por Theotônio de Souza Lima, os comunistas
organizaram a “marcha de camponeses”. Entre as principais
reivindicações estavam: a conquista da garantia e fiscalização, por parte
dos trabalhadores, sobre os contratos de trabalho; salários de acordo com
o custo de vida; oito horas de trabalho para os operários agrícolas e terra
para os que nela trabalhassem. Cartazes com essas reivindicações foram
espalhados pela área rural de Sertãozinho e Ribeirão, convocando os
trabalhadores rurais para uma reunião no dia 17 de novembro de 1929, na
Liga Orestes Lascala.
Para organizar esse encontro de trabalhadores rurais e
discutir a ação comunista na região, reuniam-se Theotônio de Souza Lima
e Pedro Siqueira Martins, de Sertãozinho; Gustavo Wierman e Angelo De
Gaetani, de Ribeirão, além de outros membros da Liga Operária, como
Carlos Guedes Vieira. Pedro Siqueira, então residente em Cafelândia, era
o responsável pelo recebimento do material de propaganda vindo do
Comitê Regional e pela organização de um novo núcleo comunista, já
com oito membros, na cidade onde residia. Os jornais “Jovem Proletário”
e “Classe Operária” chegavam a Ribeirão e região pelo correio, enviados
por Florêncio Tejeda, representante de São Paulo, ou eram retirados
pessoalmente por Pedro Siqueira na capital, no restaurante “Pátria”, na
Rua da Mooca, 431. Um membro da “Juventude Comunista” da região, F.
Gouveia, era o responsável pela distribuição e cobrança do material.
Gouveia, residente em Sertãozinho, em uma de suas cartas enviadas a
Pedro Siqueira, relatou que o partido estava ganhando terreno junto aos
jovens do centro de esportes e às mulheres, sendo que quatro estavam
participando das reuniões. Descreveu ainda a realização de uma reunião
79
“colosso”, em 1929, com a presença de membros do PCB de São
Paulo.136
A influência progressiva dos comunistas sobre os
camponeses e os trabalhadores urbanos na região de Ribeirão era
evidente, fato que acabou provocando uma conseqüente reação da
polícia. A Delegacia de Ordem Política e Social, ao ficar sabendo da
reunião programada para o dia 17 de novembro de 1929 enviou um
grupo de inspetores para investigar a ação do PCB. Essa diligência no
interior desmantelou a reunião da Liga Operária, e manteve detidos por
mais de um mês, no Gabinete de investigações, os líderes da Liga Carlos
Guedes Vieira e Armando Chorati.
Também foi possível, por parte da polícia, detectar o
crescimento evidente da ascendência comunista sobre os trabalhadores
da região de Ribeirão, tanto no meio rural quanto no urbano. Os policiais
também constataram o estreitamento dos laços entre os comunistas
ribeiropretanos e o Comitê Regional do Partido, com o qual os militantes
locais mantinham contatos periódicos, o que aguçou ainda mais o
interesse do DOPS pela região de Ribeirão Preto. Um exemplo disso são
as cartas enviadas ao PCB por Henrique Covre, eleito em 1929 para o
cargo de 2.º secretário de expediente da UGT. Elas mostram a ligação
explícita entre a UGT e o PCB, ao qual Covre informava sobre a atuação
do partido em Ribeirão, mantendo o Comitê Regional ciente do progresso
das atividades comunistas nesse local. Dentre as várias informações,
havia a da precária situação financeira da fração comunista na cidade,
demonstrada pela dificuldade em receber as mensalidades dos sócios da
UGT. Esse problema era o resultado da grave crise econômica enfrentada
pelos trabalhadores e por toda a economia a partir de 1929, quando os
preços do café _ principal produto da economia local _ começaram a cair, 136 Prontuário de Pedro Siqueira Martins, n.º 382. Arquivo do DEOPS/SP.
80
levando vários fazendeiros à falência. O problema da falta de dinheiro
prejudicava a confecção de material de propaganda e,
conseqüentemente, dificultava a atuação dos militantes. Mesmo assim, e
com o trabalho penoso durante a ilegalidade partidária, a influência
comunista entre os ribeiropretanos continuou crescendo, favorecida pelo
método de ação direta e pela utilização da UGT como veículo legal de
atuação do Partido. A miséria enfrentada pelos trabalhadores era a
justificativa para a fomentação de idéias que pregavam uma mudança
radical na sociedade.137
A intensificação da ação comunista dentro da União Geral
dos Trabalhadores, a partir de 1928, despertou o interesse da polícia
também sobre essa instituição sindical, que havia passado despercebida
até então, justamente em decorrência da sua atuação pouco expressiva
dos pontos de vista político e sindical.138 Em 1929, logo após o registro
em cartório do segundo estatuto da UGT _ reformulado sob a influência
das idéias comunistas _, a Delegacia de Ordem Política e Social enviou a
Ribeirão Preto um “secreta” para investigar a atuação do PCB junto à
União Geral, fato que se tornou corriqueiro a partir de então. O “secreta”
apresentou-se na sede da UGT, na Rua Saldanha Marinho, n.º 154, como
representante do PCB proveniente do Rio de Janeiro. Por esse meio,
visitou a cooperativa de alimentos da sede, discutiu com Pedro Campana,
um dos líderes comunistas, a respeito da situação da UGT e do PCB em
Ribeirão, rumando depois para Sertãozinho, onde participou de reuniões
na Liga Operária Orestes Lascala. Assim conseguiu relacionar os nomes
dos principais militantes comunistas do interior e a importância das suas
atividades. Como resultado desse levantamento, a campanha policial
137 Prontuário de Henrique Covre, caixa 11, Arquivo do DEOPS/SP. 138 Não foram encontrados prontuários ou documentos nos Arquivos do DOPS, confeccionados no período anterior a 1929. Os prontuários mais antigos, que datam desse mesmo ano, são de Carlos Guedes Vieira, líder da Liga Operária Orestes Lascala, de Sertãozinho, e de Henrique Covre, um dos líderes da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto.
81
contra os comunistas do interior do Estado se intensificou, colocando as
atividades desenvolvidas pelos membros da UGT e da Liga Operária sob
suspeita, e dificultando a realização de manifestações e de comícios.
Também a militância sindical foi abalada, especialmente a de Guilherme
Milani (líder da fração ribeiropretana do partido e da UGT até o início da
década de 30), a de Henrique Covre (homem de ligação entre o núcleo
comunista de Ribeirão e o CR, que atuou em Ribeirão até meados da
década de 30, quando deslocou-se para o Rio Grande do Sul e
posteriormente para São Paulo, onde atuou no Comitê Regional), e a de
Carlos Guedes Vieira ( líder do grupo comunista de Sertãozinho).
A estrutura organizacional da fração comunista de Ribeirão
Preto e região seguia os moldes hierárquicos estabelecidos pelo Comitê
Central. No entanto, não apresentava um corpo independente, e usava
como fachada para a militância a estrutura da UGT e da Liga Operária
Orestes Lascala, atuando dentro das suas sedes.
Quanto à ação política do partido em Ribeirão, seu resultado
foi pouco expressivo. A atividade ilegal, a reação da polícia e a falta de
recursos impediam que a fração comunista tivesse grande influência no
processo eleitoral local até 1945. Restava aos militantes integrar outra
legenda, ou, até o final da década de 30, atuar por intermédio do BOC.
Com suas atividades organizadas em Ribeirão e região por
Guilherme Milani e Gustavo Wierman, o Bloco Operário e Camponês não
chegou a ter uma participação expressiva na política local. Seus membros
nem puderam comparecer ao comício 7 de novembro de 1929,
interrompido ao meio pela polícia139 na Praça Marechal Floriano, em São
Paulo, quando foi anunciado o nome de Minervino de Oliveira como
candidato do BOC para a Presidência da República, e para Deputado
82
Federal o do gráfico Mário Grazini, representante paulista,140 nem mesmo
realizaram comemorações do aniversário da revolução bolchevique, como
estava determinado pelo Partido. Este fato teve de ser explicado pelos
militantes locais ao Comitê Regional, que voltava suas atenções para
Ribeirão Preto, considerada uma cidade promissora para a ação
comunista, em decorrência da sua importância econômica e pelo seu
grande número de trabalhadores.141
Em plena campanha para as eleições de 1930, o Bloco
Operário e Camponês lançou o lema: “votar no PCB é votar pela
revolução”, que parece não ter motivado a classe operária, que em parte
apoiava a Aliança Liberal com o “PROGRAMA SOCIAL” de Vargas. Ao
mesmo tempo, a polícia fechava o cerco em torno dos candidatos do
BOC, impedindo comícios, manifestações e a distribuição de propaganda
partidária.142
Em busca dos votos do interior e da ampliação da ação
comunista entre os camponeses, foi programado pelo BOC e pelo PCB
(que participou ativamente da organização, convocando os principais
militantes do interior143) o “Congresso dos colonos e trabalhadores
agrícolas” para o dia 12 de janeiro de 1930, em Ribeirão Preto. O
congresso, presidido por Minervino de Oliveira, reuniu na sede da União
Geral dos Trabalhadores mais de 200 pessoas, na maioria colonos.
Compareceram também representantes comunistas de outras cidades,
nas quais o movimento operário avançava, como Cruzeiro, onde os
trabalhadores estavam organizados na Associação Operária 23 de
Agosto, sob a presidência de José Mendes de Moraes.144 Juntamente
139 Idem.140 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil. pp. 332 - 333.141 Prontuário de Henrique Covre, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.142 DULLES, J. W. F., op. cit., p. 338.143 Prontuário de José Mendes de Moraes, n.º 277. Arquivo do DEOPS/SP.144 Idem.
83
com Minervino, compunham a mesa, dirigindo as discussões da reunião,
alguns dos principais líderes comunistas locais: Ângelo De Gaetani,
Ricardo Pinatti, Guerino Benassi145 e Rômulo Pardini.
Antes que o congresso terminasse, a polícia invadiu o
recinto e prendeu todos os componentes da mesa, inclusive Minervino de
Oliveira, que foram enviados ao Gabinete de Investigações e ali
permaneceram presos. Com a prisão dos principais líderes
ribeiropretanos e a crise interna atravessada pelo PCB, as atividades
políticas dos comunistas em Ribeirão arrefeceram nos três primeiros anos
da década de 30.146
Em vista da dificuldade de ação política dos comunistas,
muitos optaram por atuar utilizando a legenda do Partido Socialista
Brasileiro. Ângelo De Gaetani, um dos militantes mais atuantes do PCB
na cidade, foi um dos primeiros a estabelecer um relacionamento político
entre o recém-criado PSB e os comunistas locais, chegando a fazer parte
do conselho consultivo do Partido Socialista147, sem, entretanto,
abandonar suas atividades junto ao núcleo comunista ribeiropretano.148
Nesse período, o PSB desenvolveu importante atividade em Ribeirão
Preto elegendo o Dr. André Veríssimo Rebouças como prefeito, e um
representante local, Antônio Alves Passig, para a chapa do partido que
concorreria às eleições para a Assembléia Constituinte. Também
organizou, em abril de 1933, o “Congresso dos Prefeitos Socialistas”,
quando se decidiu pela intensificação da propaganda socialista e pela
valorização do esclarecimento da doutrina, visando às eleições de 3 de
maio de 1933.149 Nesse período, esteve em Ribeirão Preto Edmundo
Moniz, líder comunista da capital. Em várias cartas enviadas de Ribeirão 145 Prontuário de Guerino Benassi, n.º 4.204. Arquivo do DEOPS/SP.146 Prontuário de Minervino de Oliveira, n.º 345. Arquivo do DEOPS/SP.147 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 12 de abril de 1933.148 Entrevista com Antônio Girotto.
84
ao Comitê Regional, Edmundo constatou que, nos primeiros anos da
década de 30, a grande maioria do operariado aderiu ao Partido
Socialista, que tinha o apoio do Delegado Regional de Polícia.150
Mesmo com as divergências ideológicas e táticas existentes
entre o PSB e o PCB, especialmente quanto à revolução armada _ com a
qual não concordavam os socialistas, chamados pelos comunistas de
“reformistas” _, militantes dos dois partidos estabeleceram ligações
estreitas que permitiam, ainda que de forma restrita, a atuação dos
comunistas no PSB.
Como a atuação da fração comunista era cada vez mais
difícil na política local, os militantes do PCB voltaram suas atenções, com
mais afinco, para o processo de sindicalização dos trabalhadores.
Seguindo orientações do Terceiro Congresso Nacional do Partido,
iniciaram a criação, a partir da UGT, de sindicatos de categorias
profissionais dos setores industriais, com o intuito de transformar a UGT
numa associação de grau superior no âmbito regional.151
149 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 26 de abril de 1933.150 Informação obtida de CAMPOS, Alzira Lobo de Arruda, conforme documentos do arquivo Lívio Barreto Xavier. CEDEM.151 SIMÃO, Azis. Sindicato e Estado, pp. 170 - 171.
85
2.4. O trabalho de sindicalização e a reação do governo contra os
comunistas após o movimento de 1935.
A necessidade de ampliar a influência dos comunistas no
processo de sindicalização dos trabalhadores foi uma das resoluções
tomadas durante a realização do Terceiro Congresso Nacional do Partido
Comunista do Brasil. Considerou-se, durante o congresso, ineficiente a
ação do Partido nas instituições sindicais, declarando-se a importância da
unicidade sindical baseada na formação de federações regionais.
Para o PCB, seus militantes estavam efetuando uma
atuação restrita que não ia além dos limites dos sindicatos, ignorando as
federações operárias e o próprio Partido.152 Essa orientação
desencadeou, na região de Ribeirão Preto, uma ação mais efetiva de
propaganda e de organização entre os trabalhadores rurais e urbanos,
que passaram a associar-se, em número considerável, à UGT e à Liga
Orestes Lascala. O auge dessas instituições ocorreu durante a realização
do Congresso de Colonos e Trabalhadores Agrícolas e da Conferência
Sindical Regional de São Paulo, nos quais a União Geral e a Liga tiveram
participação efetiva.
No entanto, as prisões de alguns dos principais líderes da
UGT, efetuadas em 1930, e de dois membros importantes da Liga
Operária de Sertãozinho, em 1929, como também de Pedro Siqueira
Martins e Henrique Covre, em 1931, abalaram o desempenho dos
militantes nessas instituições.153 Em 1932, a ação da UGT limitou-se às
comemorações do 1º de Maio, com a realização de uma passeata que
não teve grande repercussão, a exemplo das comemorações do 1º de
152 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, pp. 305.153 Ibidem, p. 398
86
Maio realizadas pelo PCB em São Paulo e no Rio de Janeiro.154 Essa
situação piorou com o engajamento de comunistas, como Ângelo Di
Gaetani, na Revolução de 32, fato que provocou a reação da polícia,
prejudicando ainda mais a ação do Partido.
Além dos problemas internos sofridos pelo Partido, o
governo provisório iniciou um programa social que atraiu a simpatia dos
trabalhadores, dificultando ainda mais a ação dos comunistas. A idéia do
progresso ligado à ordem serviu como ideologia para a definição das leis
sociais, sob a pressão do BIT ( Bureau Internacional do Trabalho ) e dos
proletários que reivindicavam melhores condições de vida.155 Dentro
desse programa de reformas sociais, um dos atos mais polêmicos foi a
promulgação do decreto que regularizava a sindicalização das classes
patronais e operárias. Esse decreto, de número 19.770, foi aprovado em
19 de março de 1931 por Oswaldo Aranha, Lindolfo Collor e Getúlio
Vargas. A Lei de Sindicalização, como ficou conhecido o decreto, tinha
como objetivo definir e regular a formação dos sindicatos, federações e
confederações, possibilitando a intervenção do Estado nos sindicatos e
determinando que estes mantivessem rigorosa neutralidade política. A
sindicalização dos trabalhadores deixava de ser uma ameaça para o
governo e passava a representar uma boa oportunidade para manter sob
controle o movimento operário, usando para isso os órgãos
representativos dos trabalhadores.156
O PCB foi contra a Lei de Sindicalização, denunciando o
caráter demagógico da ação do Ministério do Trabalho, sob a liderança de
Lindolfo Collor. O Partido acusava o governo de encher de promessas o
operariado enquanto cerceava seus direitos de liberdade de organização,
proibindo as reuniões e intensificando a reação contra as organizações 154 Diário da Manhã, 1º de maio de 1932: a data de hoje. 1. 5.32, pp. 6.155 CARONE, E. Brasil: Anos de Crise, p. 44.
87
operárias independentes. Contudo, apesar das críticas de comunistas e
anarquistas, o número de sindicatos _ apoiados e regulamentados pelo
Ministério do Trabalho _ cresceu rapidamente, ocorrendo a proliferação
de instituições sindicais regularizadas pelo governo:
Quadro. 1157
Sindicatos 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937Empregados 32 83 141 111 73 242 234 Empregadores 3 4 59 256 126 132 189 Profissionais liberais 1 ---- 3 20 20 30 19 Trab. Autônomos ---- 1 3 3 5 12 22
O aumento considerável de sindicatos, entre 1932 e 1933,
representa o período de campanha intensa pela sindicalização e
alistamento eleitoral dos trabalhadores, efetuada também em Ribeirão
pela imprensa local, que enaltecia a importância da sindicalização dos
trabalhadores. A queda em 1935 foi determinada pelo fechamento dos
sindicatos de esquerda, após o movimento comunista ocorrido em
novembro do mesmo ano. Em 1936, o número de sindicatos voltou a
crescer favorecido pela Constituição de 1934, que reformou o decreto de
1931, passando a vigorar a pluralidade sindical e ocorrendo um “inchaço”
dos sindicatos.158
A partir de 1936, o número de sindicatos “ministerialistas”
cresceu acima das expectativas do governo, chegando, em 1938 a 2.000
sindicatos, e atingindo o ápice de crescimento em 1940: 156 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, pp. 373 - 376.157 Tabela retirada de CARONE, E. Brasil: Anos de crise, p. 53
88
Quadro. 2159
Tipos de Sindicatos número de sindicatos número de associados
Empregados 1 149 351 574 Empregadores 999 24 423 Profissões liberais 123 10 252 Por conta própria 83 2 895
Diante do contexto desfavorável para a sindicalização
independente e da crescente influência do governo sobre os sindicatos, o
PCB de São Paulo, em 1932 (posteriormente o PCB em nível nacional)
iniciou uma política de cooperação com os sindicatos reconhecidos pelo
Ministério do Trabalho, com o propósito de assegurar um possível
controle sobre eles.160
Como resposta a essa orientação do CC, os comunistas
ribeiropretanos, bastante desarticulados em razão da perseguição policial,
iniciaram um processo de sindicalização dentro da União Geral dos
Trabalhadores, que desempenhou papel de destaque na organização,
orientação e formação de sindicatos em Ribeirão Preto. Esta cidade
chegou a atingir a cifra de dez sindicatos regulamentados pelo Ministério
do Trabalho e reunidos sob a bandeira da “União dos Sindicatos”.161
158 CARONE, E., op. cit., p. 53159 CARONE, E., op. cit., p. 53.160 DULLES, J. W. F., Op. cit., pp. 416 - 417.161 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 1º. de julho de 1937, “União dos Sindicatos”.
90
2.4.1. A atuação dos comunistas na campanha de sindicalização dos
trabalhadores ribeiropretanos.
Já em 1932 apareceram os primeiros sinais da campanha
pela sindicalização dos trabalhadores, levada a cabo pelo Ministério do
Trabalho. De forma cautelosa, o “Diário de Notícias”, jornal local,
publicava alguns artigos que alertavam para os perigos e enumeravam os
benefícios da Lei de Sindicalização.162 A principal preocupação dos que
não concordavam com o decreto era a possibilidade de os sindicatos
servirem aos interesses políticos de uma minoria, crítica feita também
pelos comunistas. No entanto, quanto mais avançava a campanha
ministerialista e diminuía a liberdade de imprensa, mais os jornais locais
ressaltavam a importância da sindicalização dos trabalhadores como
forma de defesa dos direitos da classe operária, mesmo sob o controle
do governo.
O núcleo comunista local, abatido pela repressão efetuada
pelo governo após o movimento paulista de 1932, reconhecia a
importância de manter-se em contato com os trabalhadores, buscando
ampliar sua influência sobre suas organizações representativas. Para
tanto, os poucos militantes ainda atuantes engajaram-se na campanha de
sindicalização em massa, cujo início prático ocorreu em janeiro de 1933,
quando a UGT tornou-se oficialmente o órgão de sindicalização e
alistamento eleitoral do operariado. A expectativa local era atingir a meta
de 5.000 eleitores alistados em Ribeirão Preto até as eleições para a
Assembléia Constituinte.163
162 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 24 de fevereiro de 1932.163 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 1º. de janeiro de 1933 e 18 de fevereiro de 1933.
91
A campanha de sindicalização e alistamento, acompanhada
por funcionários do Ministério do Trabalho, foi apoiada pela Associação de
Comércio, pela imprensa local, pela Igreja Católica e pelo Partido
Socialista Brasileiro, que viam no sindicalismo a “base das organizações
futuras”.164
Nesse período, os comunistas perderam a presidência da
UGT. Guilherme Milani, líder da União desde 1925, um dos mais ativos
militantes comunistas, em 1933 aderiu à “Ação Integralista” ribeiropretana.
De acordo com Antônio Girotto, seu companheiro de atuação na UGT na
década de 50, Milani e muitos outros iludiram-se pelos ideais
nacionalistas dos integralistas, e mais tarde se decepcionaram com o
movimento. Em 1934, assumiu a presidência da instituição João Gomes
da Rocha, comerciante, dono de uma funerária, que tinha idéias
esquerdizantes moderadas, mas sem ligações com o Partido Comunista
nesse período. Como secretário-geral da instituição assumiu Vitaliano
Mauro, simpatizante do partido desde meados da década de 20.165
Mantinham-se ainda na UGT alguns militantes
remanescentes da década de 20: Ângelo De Gaetani, Rômulo Pardini e
Pedro Campanha. No entanto, o esquema de repressão policial e a
importância estratégica de manter a polícia longe da UGT, permitindo sua
atuação legal, fizeram com que esses velhos militantes e outros mais
novos, como Quinhonero, atuassem pelo partido em sigilo, distribuindo
boletins de propaganda comunista fora da instituição, e dentro dela
apoiando a sindicalização ministerialista.
Dessa maneira surgiu, em Ribeirão Preto uma dezena de
sindicatos, a maior parte deles com sede, inicialmente, na União Geral
164 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 29 de janeiro de 1933.165 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 12 de fevereiro de 1933.
92
dos Trabalhadores: Sindicato dos Sapateiros, Sindicato dos Alfaiates,
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Mobiliária, Sindicato dos
Metalúrgicos, Sindicato dos Empregados em Hotel, Bar e
Estabelecimentos Congêneres, Sindicato dos Gráficos, Sindicato dos
Empregados em Indústrias de Bebidas, Sindicato da Construção Civil,
Sindicato dos Empregados em Panificação, Pastifícios e Similares. Além
desses, a UGT tentou a organização do Sindicato dos Operários em
Serraria e Carpintaria, bem como a do Sindicato dos Pintores e
Marmoristas, que não temos informações se estes foram oficializados.
Com a ampliação do movimento ministerialista, a intenção
inicial dos comunistas de obter o controle sobre os sindicatos legalizados
começou a fracassar, e também com a influência dos comunistas na
União Geral dos Trabalhadores. Os primeiros sinais de fracasso
apareceram já em 1933, quando vários membros do partido foram presos
pela polícia local depois das eleições para a Assembléia Constituinte.166
Nesse mesmo ano, o Supremo Tribunal Eleitoral negou a autorização
para o PCB atuar legalmente, fazendo com que os militantes recorressem
à legenda, já registrada, da União Operária e Camponesa,167 não
conseguindo eleger nenhum representante comunista para a
Assembléia.168
Mesmo com sua influência enfraquecida dentro da
instituição, os comunistas participaram ativamente da campanha de
arrecadação de fundos para a construção da sede própria da UGT,
inaugurada em 4 de janeiro de 1934, e construída pelos próprios
associados. No prédio da União passaram a atuar vários sindicatos
ministerialistas, que se mantiveram ligados a UGT até 1941. 166 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 22 de junho de 1933.167 A União Operária e Camponesa do Brasil foi organizada em Ribeirão Preto, Rio Claro, Campinas, Barretos e outras localidades do interior com a participação do PCB. Arquivo do DEOPS, prontuário 2431 do PCB, volume 1.
93
Foto comemorativa da fundação da sede própria da União Geral dos Trabalhadores de
Ribeirão Preto. 04 de janeiro de 1934. Acervo privado de Antônio Girotto.
Apesar da cooperação dos comunistas com o processo de
sindicalização ministerialista, eles foram bastante criticados pelo governo
em razão do seu sistema de organização dos trabalhadores. Enquanto os
membros do PCB tinham esperanças de obter o controle sobre os
sindicatos recém-criados, eles foram atuando em forma de cooperação
com o PSB e, inicialmente, até mesmo com os integralistas. No entanto,
entre 1934 e 1935, a política do PCB em relação à sindicalização ligada
ao Ministério do Trabalho modificou-se, assumindo uma posição contrária
ao governo provisório. O Partido organizou convenções de sindicatos
locais, tentando afastá-los da influência do governo.169 Durante as
convenções, aproveitava-se da situação de crise econômica do país para
frisar que Vargas não havia cumprido suas promessas de resolver os
problemas dos trabalhadores, dos quais um dos mais evidentes era o
desemprego.170
168 DULLES, J. W. F. Anarquistas e comunistas no Brasil, pp. 405 - 408.169 CHILCOTE, R. H. O Partido Comunista Brasileiro, pp. 76 - 77.170 DULLES, J. W. F. Anarquistas e comunistas no Brasil pp. 400 - 408.
94
A ação contra os sindicatos ministerialistas e o governo
Vargas intensificou-se nos anos posteriores à revolução de novembro,
tendo ocorrido lutas internas entre comunistas e governistas dentro da
União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, quando os membros do
PCB perderam o poder hegemônico sobre essa instituição.
95
2.4.2. A repressão policial contra os comunistas e a decadência da
atuação do Comitê Municipal em Ribeirão Preto.
A atividade de propaganda política do PCB tomou novo
fôlego em 1935, aparentando que o núcleo comunista ribeiropretano se
reorganizaria. Boletins de propaganda eram distribuídos nos sindicatos e
centros esportivos, pregando a revolução e a luta contra a “Ação
Integralista”, fundada no final de 1932.
A intensificação da militância relacionava-se com a mudança
de diretrizes do PCB. A política chamada de obreirismo, adotada nos
primeiros anos da década de 30, começou a dar sinais de arrefecimento
já em 1934. O Partido abandonou sua linha de ação sectária para dar
início a uma política de “frente popular”, envolvendo-se na formação da
Aliança Nacional Libertadora e na unificação do movimento operário, que
pretendia concentrar sob a liderança comunista.171 Essa mudança estava
ligada ao movimento mundial contra o nazi - fascismo, apoiado pela
URSS e adotado pela IC em 1935.
O resultado dessa tendência antifascista foi a execução, por
parte do Partido, de um programa intenso de propaganda contra os
integralistas, a partir de 1934, provocando choques entre a Ação
Integralista e o PCB. Em Ribeirão, a nova sede da UGT foi depredada em
março de 1935, sendo encontradas do lado de fora do prédio inscrições
de “fora, comunistas”. O atentado foi levado a cabo por um grupo de
jovens integralistas que acusavam a UGT de exercer atividades políticas e
abrigar militantes do PCB. O movimento integralista ganhava força na
171 CHILCOTE, R. H. Partido Comunista Brasileiro, pp. 70 - 80.
96
cidade, reunindo cada vez mais adeptos, especialmente entre os
jovens.172
Além dos choques com os integralistas, a fração sindical do
PCB teve de enfrentar a ampliação da ação repressiva da Delegacia
Regional de Polícia, que intensificou as investigações da atuação
comunista na UGT, mantendo essa instituição sob constante vigilância. A
situação agravou-se depois da organização da Aliança Nacional
Libertadora em Ribeirão Preto, em 6 de julho de 1935. Com sede na Rua
José Bonifácio, n.º 36, bem próxima à UGT, a ANL reuniu várias
agremiações no seu curto período de existência legal na cidade. O
presidente do diretório local, Antônio Campos, conseguiu a adesão oficial
da UGT, do PSB e dos comunistas. Durante a assembléia realizada para
eleger a diretoria, discursaram várias pessoas conhecidas na cidade:
Cezar Tupynambá Roselino, professor, membro da UGT e um dos
comunistas responsáveis pela reformulação dos estatutos de 1929; Emílio
José dos Campos, funcionário postal; José Alvarenga Ortiz, farmacêutico
e membro da UGT; João Vaz, garçom; Luiz Ladeira, eletricista; e Affonso
Rogerio (ou Affonso Victor Ruggiero), membro do PSB. Além deles,
participaram da ANL: Gustavo Wierman, membro da UGT e comunista;
Gercino Alves de Souza, guarda civil; Nicomedes Padilha, operário da
Cervejaria Antárctica, onde participava de um célula comunista
juntamente com Wierman; Rômulo Pardini, sapateiro, um dos fundadores
da UGT e um dos primeiros comunistas de Ribeirão, e Ângelo Di Gaetani,
pedreiro, também um dos membros fundadores da UGT e comunista
atuante.173 As informações sobre a quantidade de membros que a ANL
chegou a ter em Ribeirão são desencontradas; José Alvarenga Ortiz,
172 O decreto n.º 19.770, de 1931, e revisado em 1934, proibia as instituições sindicais de exercerem qualquer atividade política, visando coibir a ação dos comunistas nos sindicatos.173 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 6 de julho de 1935.
97
diretor da UGT, declarou que a Aliança chegou a ter mais de 50 membros,
incluindo João Gomes da Rocha, então presidente da UGT.174
Nesse período, o prestismo já havia se firmado como
tendência predominante entre os comunistas, com uma grande força
entre os membros da ANL, que elegeram Luís Carlos Prestes seu
presidente de honra, em março de 1935.175 A aproximação entre o PCB e
Prestes ocorrera de forma lenta, passando pelos primeiros contatos com
Astrojildo Pereira, em dezembro de 1927, quando Prestes recebeu do
secretário - geral do Partido Comunista “uma dúzia” de livros de autores
marxistas. A conversa entre os dois não surtiu efeitos práticos, entretanto,
serviu para aproximar o “Cavaleiro da Esperança” da teoria marxista.176
Mais tarde, em 1929, Luís Carlos Prestes encontrou-se com Leôncio
Basbaum, que lhe fez um convite para candidatar-se à Presidência da
República pelo PCB. Prestes não aceitou o convite, pois não concordava
com o programa político apresentado por Basbaum.177
A aproximação definitiva de Prestes com o comunismo
ocorreria em 1930, quando, por intermédio de um manifesto, ele se
declarou publicamente comunista. Mesmo estando por um período na
URSS, Prestes confirmou sua influência decisivamente durante a
realização da 1.ª Conferência Nacional do PCB, em julho de 1934,
quando Antônio Maciel Bonfim, de tendência nada sectária, assumiu o
cargo de secretário-geral do partido. Bonfim tornou oficial a adesão de
Luís Carlos Prestes ao PCB em 1.º de agosto do mesmo ano, afirmando a
linha prestista dentro do partido.178
174 Arquivo do DEOPS, prontuário n.º 3.735, de José Alvarenga Ortiz, vulgo Julinho.175 CHILCOTE, R. H., op. cit., pp. 70 - 79.176 PINHEIRO, Paulo Sérgio. Estratégias da ilusão: a revolução mundial e o Brasil,
1922 - 1935, pp. 210.177 Ibidem, p. 218.178 DULLES, J. W. F., op. cit., pp. 419 - 420.
98
Prestes voltou ao Brasil em abril de 1935, acompanhado de
membros do Komintern. Sua responsabilidade era organizar a revolução
proletária no Brasil sob a liderança do PCB. Da fase conhecida como
obreirismo _ quando os comunistas ribeiropretanos deixaram barba e
cabelo crescerem e assumiram uma posição sectária em relação a outras
facções dentro da UGT _, os militantes locais adotaram lentamente a
“política de frente” e tomariam, na segunda metade da década de 30,
posição favorável a Luís Carlos Prestes, inaugurando a fase que ficou
conhecida como “prestismo”, que se firmaria na década de 40.179
O ano de 1935 foi marcado por um trabalho de propaganda
revolucionária. O Bureau de Fração Sindical Nacional, em julho do mesmo
ano, enviou a todas as frações do partido circulares orientando a
militância, que deveria fixar-se nos seguintes pontos:
“A luta contra as tendência de recuo, que não acreditavam
na realização da revolução.
Os militantes deveriam engajar-se nas lutas reivindicatórias
dos trabalhadores pela resolução de problemas imediatos,
como o direito a oito horas de trabalho e aumento de salário.
Todos os militantes deveriam protestar contra o fechamento
da Aliança Nacional Libertadora, organizando
demonstrações de rua.
Insistir no funcionamento das frações como organismos que
levam a linha do partido na impulsão das massas. 179 Entrevista com Carlos Di Gaetani, filho de Ângelo Di Gaetani.
99
As frações devem ser responsáveis pela organização de
frentes de luta.”
Os militantes locais distribuíram essas orientações entre os
membros das células, especialmente nas mais importantes, como as das
Cervejarias Antárctica e Paulista, lideradas respectivamente por Gustavo
Wierman e Nicomedes Padilha.180
Com a militância já organizada no meio urbano, a maior
preocupação dos líderes era conquistar a confiança dos trabalhadores
rurais, junto aos quais os trabalhos partidário e sindical estavam pouco
desenvolvidos.
Quase nada se fizera desde a realização do Congresso dos
Colonos e Trabalhadores Agrícolas, em 1930, quando os comunistas
tentaram, sem sucesso, organizar os colonos e pequenos proprietários
agrícolas em uma frente única. Além da propaganda direta, realizada
com a distribuição de boletins, pouco fora feito pelos militantes locais a fim
de arregimentar os trabalhadores para o movimento revolucionário. Essa
dificuldade de atuação estava ligada à desarticulação entre os militantes e
à dificuldade em receber orientações mais detalhadas do Comitê
Regional. No dia 29 de julho de 1935, a polícia descobriu o local de
recebimento do material de propaganda: a caixa dos funcionários postais
na agência dos correios em Ribeirão Preto. O material chegava em nome
fictício José Alves da Silva, e era retirado pelo simpatizante do partido,
Joaquim Gonçalvez Piraí, funcionário da agência postal, e levado para
sua casa. Dante Sartori era o militante responsável pela retirada dos
100
boletins na casa de Piraí, e pela distribuição do material de propaganda
nas células.181
Com essa descoberta e com a prisão de Joaquim Gonçalvez
e Dante Sartori, tornou-se ainda mais difícil a comunicação entre a fração
comunista local e o CR de São Paulo. Em cartas enviadas ao Comitê
Regional, os líderes do núcleo comunista ribeiropretano pediam ajuda
para adiantar o trabalho entre os camponeses, explicando que este
encontrava-se atrasado e que não existia nenhum sindicato camponês na
região. A falta de conhecimento dos líderes do PCB em relação à situação
real de organização dos militantes em Ribeirão Preto era patente.
Também a falta de recursos financeiros e de militantes preparados fazia
com que o trabalho fosse pouco produtivo. As raras tentativas do PCB de
enviar gente para orientar o desempenho da fração acabaram em
fracasso.
Nena, militante paulista, foi encaminhada a Ribeirão para
organizar a juventude comunista; entretanto, sua inexperiência e as
suspeitas dos colegas de que fosse uma informante fizeram com que os
líderes da fração a mandassem de volta a São Paulo. O envio de
militantes despreparados para orientar o trabalho partidário em Ribeirão
Preto repetiu-se outras vezes, irritando os comunistas locais. Estes
reclamavam das orientações generalizadas dirigidas pelo Comitê
Regional, que não davam condições práticas para orientar de forma
pragmática a atuação dos militantes da fração sindical comunista. 182
As razões desse desencontro entre a fração ribeiropretana e
o Comitê Regional de São Paulo estão relacionadas com a intensificação
da repressão policial determinada pelo governo provisório, e com a falta 180 Prontuário de Gustavo Wierman, n.º 3.307. Arquivo do DEOPS/SP.181 Prontuário de José Alves da Silva, n.º 271. Arquivo do DEOPS/SP.
101
de condições materiais e humanas do Comitê Central do PCB,
responsável pela articulação da ação partidária em todos os níveis
hierárquicos do partido. Para os militantes ribeiropretanos, o resultado
desse processo de desarticulação foi a desinformação quanto à ação
revolucionária de tomada de poder que estava sendo elaborada pelos
líderes comunistas e aliancistas.
Enquanto no Rio de Janeiro Prestes e os seus aliados
organizavam um movimento revolucionário, em Ribeirão Preto, os
membros do PCB estavam às voltas com as eleições municipais,
distantes dos acontecimentos na capital federal. O Partido Republicano
Paulista e o Partido Constitucionalista entraram em contato com os
comunistas, pedindo apoio para as eleições. Os militantes do PCB
recusaram-se a fazer alianças partidárias, e por falta de orientação do CR
quanto a que partido deveriam apoiar, ficaram fora do processo eleitoral.
O Comitê Municipal do PCB em Ribeirão Preto acabou
ficando à margem do processo de elaboração do movimento
revolucionário, que vinha sendo desenvolvido sob a liderança do PCB. Em
outubro de 1935, os militantes ainda não tinham informações sobre a
presença de Prestes no Brasil e sobre a possibilidade de realização da
revolução ainda naquele ano. Nos dias 29 e 30 de novembro, cinco dias
depois do início do movimento no Nordeste, os comunistas
ribeiropretanos ajudaram a organizar o Sindicato dos Empregados em
Bebidas e o Sindicato dos Metalúrgicos, com os quais estavam
inteiramente envolvidos.183
182 Prontuário de Caetano Scavone, n.º 273. Arquivo do DEOPS/SP.183 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 29 e 30 de novembro de 1935.
102
Não é surpresa que os militantes locais não soubessem do
início do movimento, já que este pegou de surpresa até mesmo o
comando revolucionário instalado em São Paulo.
A falta de ligação dos militantes locais com o movimento
revolucionário não amenizou a ação da polícia, que iniciou uma série de
prisões. Entre os presos estavam simpatizantes comunistas, membros da
fração sindical em Ribeirão e membros da extinta Aliança Nacional
Libertadora. Entre novembro e dezembro de 1935 foram presas 16
pessoas, entre elas Rômulo Pardini, Gustavo Wierman e Nicomedes
Padilha. Pardini e Wierman, após a saída de Guilherme Milani do PCB,
representavam a liderança máxima do núcleo comunista na cidade,
juntamente com Ângelo Di Gaetani.
Os primeiros a ser presos foram Gustavo Wierman, José
Alvarenga Ortiz e Rômulo Pardini, todos membros de destaque da União
Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto. As prisões acabaram
abalando profundamente a influência comunista dentro da instituição, que
passou a ser constantemente vigiada pela Delegacia Regional de Polícia.
Na tabela a seguir estão relacionados os nomes das
pessoas presas logo após o movimento de novembro de 1935,
acompanhados de sua respectiva atuação política e datas das prisões. Quadro. 3184
Prisões efetuadas entre novembro e dezembro de 1935.
Nome Tendência partidária Data da prisão
Gustavo Wierman Comunista e membro da
UGT.
5 / 12 / 35
Affonso Victor Ruges ou
Afonso Rogério.
Membro do PSB e da
ANL.
5 / 12 / 35
184 Prontuário do PCB, n.º 237. Arquivo do DEOPS/SP.
103
Nicomedes Padilha Comunista participante
da célula da Cervejaria
Paulista.
Dez/35
Antônio Campos Presidente da ANL Dez/35
José Alvarenga Ortiz Vice-presidente da UGT,
simpatizante do PCB e
membro da ANL.
5 / 12 / 35
Aristides S. Coelho Membro da ANL. Dez/35
José Pardo membro da ANL Dez/35
Olympio Ribeiro de
Oliveira
Simpatizante do PCB,
lavrador em Pontal,
região de Ribeirão Preto.
31 / 12/ 35
Rômulo Pardini Líder da fração
comunista e membro da
UGT
8 / 12 / 35
Olívio de Souza membro da ANL 17 / 12 / 35
Nazareth Fábio membro da ANL 14 / 12 / 35
Gercino Alves de Souza Guarda Civil e membro
da ANL
05 / 12 / 35
José Patrocínio
Nascimento
Membro da ANL. 16 / 12 / 35
Esmerindo P. Silva Membro da ANL. 16 / 12 / 35
Clomiro F. Oliveira Membro da ANL. 16 / 12 / 35
Joaquim Freitas Membro da ANL. 31 / 12 / 35
104
Gustavo Wierman, reprodução de 1996 de fotos tiradas pelo DEOPS/SP para
qualificação, 1935
Rômulo Pardini, reprodução de 1996 de fotos tiradas pelo DEOPS/SP para qualificação,
1935
As prisões criaram um clima de medo em Ribeirão. A
repressão policial intensa representada nas sucessivas prisões deixaram
praticamente acéfalo o núcleo comunista local. Os poucos militantes que
continuaram atuando entre 1935 e 1940, entre eles Ângelo de Gaetani,
Pedro Campana, Vicente Quinhonero, Rômulo Pardini e Wierman _ estes
dois últimos entre uma prisão e outra _, resumiram suas atividades a
pichações de muros, especialmente da Igreja Matriz, com frases de vivas
ao comunismo, e distribuição de boletins de propaganda, que eram
jogados nas varandas das casas e nas ruas durante a noite, para evitar a
polícia.185
Em 1936 ocorreu uma nova onda de prisões. A polícia
capturou um grupo de simpatizantes comunistas que se reunia com Jacob
Benjamin Leipzig, membro da “tropa de choque” da Aliança Nacional
185 Diário da Manhã, 19 de abril de 1936.
105
Libertadora, em São Paulo, durante a revolta comunista, em novembro de
1935. Leipzig foi preso após o movimento; quando solto, rumou para
Ribeirão Preto, onde reunia-se com Aristides Esteves, Fioravante
Marighetti, José Ramos e Otávio Carvalho na residência de Emídio de
Carvalho, na tentativa de formar um núcleo de distribuição de
propaganda. Contudo, não chegaram a desenvolver atividade de
militância.
Depois de ter recebido a ficha policial de Leipzig, e
suspeitando de atividade comunista, a polícia arrombou a casa de Emídio
de Carvalho no dia 15 de maio de 1936, e levou os “camaradas” presos
para São Paulo. Após terem sido interrogados na Superintendência de
Ordem Política e Social, foram enviados para o presídio Maria Zélia, onde
estavam também, entre outros, Sebastião Francisco (líder do Comitê
Regional do PCB em São Paulo) e Clemente José da Silva (ferroviário da
Alta Mogiana, acusado de atividades subversivas).
Para conseguir o respaldo judicial para a prisão, a polícia
alegou ter encontrado “farto material subversivo” no local da apreensão, e
obteve, por intermédio de violentas formas de coerção, a confissão dos
presos. Leipzig foi colocado nu durante 24 horas numa cela, sendo
submetido constantemente a castigos físicos. Clemente, em
conseqüência das surras durante os 14 meses de prisão, ficou com
graves problemas pulmonares, vindo posteriormente a perder parte de um
pulmão.186 Em 1938, os acusados conseguiram o depoimento de José
Augusto Leomil, agente que participou da apreensão. Leomil declarou não
ter apreendido nada durante a diligência, desmascarando a farsa policial.
Sem provas suficientes contra os simpatizantes do PCB, o Juiz do
186 Entrevista realizada com Clemente José da Silva por Sebastião Geraldo em 30 de novembro de 1988.
106
Tribunal de Segurança Nacional absolveu os acusados, em 29 de julho de
1938.
Antes da absolvição, em 21 de abril de 1937, Leipzig,
juntamente com Sebastião Francisco, participou de uma tentativa de fuga
do presídio, que acabou numa verdadeira chacina. Jacob Benjamim
Leipzig teve concussões no osso malar e na espádua, e ficou com uma
perna esfolada. Sebastião Francisco foi ferido nos quadris. Cinco fugitivos
foram mortos sumariamente.187 Numa tentativa mais bem sucedida de
fuga, Henrique Couvre, detido no mesmo presídio, fugiu três dias depois,
em 24 de abril de 37, voltando a ser visto somente em 1945, quando foi
novamente detido juntamente com Paulo Lacerda.188
Enquanto as prisões se multiplicavam por todo o país,
respaldadas pelo “estado de guerra” estabelecido pelo governo de Getúlio
Vargas, durante todo o ano de 1937 a imprensa de Ribeirão Preto reuniu-
se num movimento que era chamado de “CONTRA O COMUNISMO”. A
emissora de rádio local PRA-7 e o Diário de Notícias encabeçaram a
propaganda anti-comunista patrocinada pelo Centro de Imprensa de
Ribeirão Preto. Durante a campanha eram frisados os malefícios do
comunismo e o perigo representado pelos “extremistas vermelhos”. A
propaganda ampliou a tensão entre a polícia e os poucos simpatizantes e
militantes do Partido que ainda residiam na cidade. Em outubro de 1937,
a polícia iniciou uma terceira onda de prisões. Capturou Luiz Ladeira e
Américo Costa, membros da guarda civil e simpatizantes do comunismo,
e Fioravante Marighetti, Aristides Esteves e Gustavo Wierman, que
respondiam em liberdade a processos judiciais por subversão.189
187 DULLES, J. F. W. Comunistas no Brasil, pp. 87 - 92.188 Prontuário de Henrique Couvre, caixa 11, Arquivo do DEOPS/SP.189 Prontuário de Jacob Benjamin Leipzig, Arquivo do DEOPS/ SP.
107
Jacob Leipzig, reprodução de 1996 de foto tirada pelo DEOPS/SP para qualificação, em
03.08.1936.
Fatos como esses desestimularam a militância comunista,
que se tornou praticamente nula até 1941. Os comunistas perderam o
controle sobre a UGT, que passou a ser controlada por João Gomes da
Rocha, então simpatizante não declarado do PCB, de atuação sindical
moderada, dentro das normas do Ministério do Trabalho. A influência da
UGT no meio sindical, nesse período, diminuiu. A instituição limitou-se a
alugar sua sede para os sindicatos devidamente legalizados pelo
Ministério de Trabalho, conhecidos como “Sindicatos Reunidos”, e realizar
festas de confraternização. O PCB só iniciaria sua restruturação, em
Ribeirão Preto, a partir de 1941, quando começaria a ser organizado o
108
Comitê Municipal na cidade. No mesmo período a atividade da União
Geral dos Trabalhadores também se intensificaria, mais uma vez nas
mãos dos comunistas.
109
Capítulo 3: A reorganização do núcleo comunista em Ribeirão Preto.
3.1. O choque entre a “União Geral dos Trabalhadores” e os
“Sindicatos Reunidos”.
A década de 30 foi marcada pelo crescimento da influência
stalinista no movimento comunista internacional. Isto ocorreu como
resultado da “stalinização” do Komintern, que determinou a predominância
das idéias e do poder de Stalin nos PCs de vários países, inclusive no
PCB. Em 1939, já se fazia sentir a forte influência stalinista entre os
comunistas brasileiros. Contudo, nesse mesmo ano, o pacto de não-
agressão entre Alemanha e URSS provocou uma manifestação de
repúdio, por parte de vários comunistas, contra a atitude de Stalin, e deu
munição aos trotskistas, que aproveitaram o pacto para atacar o
Komintern e o PCB.190 As restrições ao pacto de não-agressão e as
críticas dos trotskistas não chegaram a abalar profundamente a influência
stalinista sobre o PCB, que nos primeiros anos da década de 40 acabou
por consolidar-se.
Depois da quebra do pacto de não-agressão por parte da
Alemanha, ocorreu o aumento do prestígio soviético, particularmente em
decorrência da sua resistência tenaz aos ataques nazistas. No ano de
1941, entre outubro e dezembro, o exército alemão sofreu sua primeira
derrota em campo aberto, em território soviético.191
Nesse mesmo período, enquanto a URSS ganhava terreno
contra os nazistas, o PCB sofria duros golpes, desarticulando-se quase 190 DULLES, J. F. W. Comunistas no Brasil, pp. 196 - 200.
110
completamente. Em abril de 1940 ocorreram várias prisões de membros
do CC do PCB, entre eles a do líder do Partido, Bangu. No início de 1941
foi a vez dos membros do CR de São Paulo: entre 28 e 29 de março a
polícia deteve 31 pessoas, desmantelando o Comitê Regional.192 Esses
acontecimentos abalaram profundamente a organização do PCB,
deixando a impressão de que o Partido dificilmente se reorganizaria.193
No entanto, contrariando as expectativas, o Partido iniciou
um novo processo de reorganização. Em São Paulo, Caires Brito, Arruda
Câmara e Armênio Guedes fundaram, em 1941, a Comissão Executiva
Provisória do PCB, usando como palavras de ordem a “União Nacional
pela Guerra e Paz com Vargas”, que acabariam influenciando os
militantes do interior do Estado.194
Em Ribeirão Preto e região, a situação de desarticulação
dos militantes comunistas também era profunda, representando um
reflexo do que ocorria com o Partido em âmbito nacional. Entre os anos
de 1937 e 1940, a União Geral dos Trabalhadores, que havia servido até
então como sede do núcleo comunista na cidade, ficara sob o poder de
“moderados”, sem empreender nenhuma atividade expressiva na cidade,
“limitando-se à arrecadação das mensalidades de alguns sócios e à
prestação de pequenos benefícios aos seus membros, sem sequer
promover a realização de eleições para a diretoria”.195 A Delegacia
Regional de Polícia, por determinação do DOPS/SP, empreendia
constante vigilância sobre a conduta dos poucos comunistas ainda ativos
191 MORAES, João Quartim de. In História do Marxismo no Brasil: o impacto das
revoluções., pp. 47 - 87.192 DULLES, J. F. W., op. cit., p. 216.193 CARONE, E. Brasil: anos de crise ( 1930 - 1945 ), pp. 287 - 297.194 DULLES, J. F. W., op. cit., p. 237.195 Prontuário da União Geral dos Trabalhadores n.º 23.250. Arquivo do DEOPS/SP.
111
politicamente, como Ângelo Di Gaetani e a família Pontim, dificultando-
lhes qualquer tentativa de rearticulação.
A reorganização do grupo comunista ribeiropretano só
ocorreria a partir dos últimos meses de 1940, quando os militantes do
PCB, sócios da UGT, iniciaram uma disputa com os “ministerialistas” pela
liderança da instituição. A sede da UGT alugava suas salas para sete
sindicatos oficializados, criados sob a orientação sindical da própria União
Geral. A intensificação da ligação entre a diretoria da UGT _ liderada por
João Gomes da Rocha _ com os sindicatos ditos “ministerialistas”, e a
possibilidade, que vinha sendo cogitada pela diretoria, de transferir esse
patrimônio para tais sindicatos, detonou uma disputa entre os sindicatos
oficializados e os sócios declaradamente comunistas da UGT. No final de
1940 a hostilidade entre os dois grupos aumentou, culminando com a
depredação da sede da União realizada _ de acordo com os agentes
policiais _ por comunistas e por Guilherme Milani, ex-anarquista, ex-
comunista e ex-integralista, que nesse período apresentava tendências
políticas _ no mínimo _ pouco definidas.196
Como conseqüência dessa disputa, João Gomes da Rocha,
que mantinha uma posição conciliatória entre os dois grupos, afastou-se
da direção da UGT, evitando assim indispor-se com os membros do
partido.197 Vitaliano Mauro, simpatizante do PCB, foi aclamado presidente
até a eleição da nova diretoria. Juntamente com Vitaliano Mauro,
militantes do PCB, como Ângelo Pontim e João Ungaretti, assumiram
cargos de destaque dentro da União Geral dos Trabalhadores,
fortalecendo a influência comunista nessa instituição. Com maior poder de
196 Prontuário da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, n.º 23.250. Arquivo do DEOPS/SP.197 João Gomes da Rocha faria sua adesão oficial ao PCB em 1945, durante o período de legalidade.
112
decisão, os comunistas iniciaram uma campanha contra os “Sindicatos
Reunidos” que ocupavam a sede da União Geral.
A convivência pacífica entre os sindicatos legalizados e os
comunistas dentro da UGT pode ser explicada pelo apoio dado pelos
militantes do PCB à criação, durante a segunda metade da década de 30,
de sindicatos que estivessem de acordo com as normas do Ministério do
Trabalho, com a intenção de , posteriormente, exercerem influência sobre
eles. Mas não tiveram sucesso em seu objetivo. Os comunistas não
chegaram a obter o controle total desses sindicatos, cuja grande maioria
passou a ser controlada por sindicalistas, chamados pelos militantes do
PCB de “pelegos”.
A perda de terreno no campo sindical foi resultado da própria
desarticulação do Partido, que enfrentou um longo período de
perseguição policial entre 1935 e 1941, o que dificultou a prática da
propaganda comunista e a atuação dos militantes dentro dos sindicatos
legalizados. Essa situação agravou-se com a proibição, por parte do
Ministério do Trabalho, de qualquer envolvimento das instituições
sindicais com partidos políticos, com a pena de fechamento do sindicato.
O perigo da reação policial favoreceu a resistência dos sócios de
sindicatos legalizados quanto à presença de comunistas nos quadros de
liderança. Não conseguindo o poder hegemônico dentro dessas
instituições, os militantes do partido passaram a pregar a “sindicalização
livre”, concentrando sua atuação na UGT e estabelecendo uma situação
de enfrentamento em relação aos sindicatos legalizados.198 Um dos
únicos sindicatos que permaneceram sob a influência comunista foi o dos
trabalhadores nas indústrias de bebidas, graças à da existência, nas
198 Prontuário da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, n.º 23.250. Arquivo do DEOPS/SP.
113
cervejarias Antárctica e Paulista, das células comunistas mais atuantes,
lideradas por Gustavo Wierman e Nicomedes Padilha.
A hostilidade entre os dois grupos cresceu nos primeiros
meses de 1941. Nas reuniões semanais, os comunistas deixavam clara
sua posição, quando afirmavam que era preciso “expulsar os amigos do
cabresto, já que na UGT não havia lugar para os agentes patrimoniais e
ministerialistas”. A diretoria da UGT exigia que os sindicatos, sob a
direção de Guilherme Giro, sindicalista sem ligação com os comunistas,
deixassem de ocupar a sede da União, fato que ocorreria logo depois.199
Com o objetivo de escolher os novos diretores da União
Geral e de votar o projeto de mudança nos estatutos, foi marcada uma
assembléia geral para dia 15 de março de 1941. Os sócios elegeram a
diretoria _ que havia sido aclamada em 1940 _ com a participação de
vários militantes do partido, entre eles, Ângelo Pontim, reafirmando a
influência comunista na instituição. Essa diretoria aprovou os novos
estatutos, reformulados por Vitaliano Mauro.
A reformulação dos estatutos, a exemplo do que ocorreu em
1929, ocorreu sob a influência comunista. Entretanto, as modificações
foram feitas com o claro intuito de retirar a UGT da mira das constantes
investigações policiais, que dificultavam o trabalho dos militantes e de
adequar a atuação comunista às mais recentes diretrizes do CR: buscar
a “União Nacional” em torno de Vargas, contra a ameaça nazi-fascista. Os
novos estatutos foram apresentados sem os termos utilizados em 1929,
como, por exemplo, “camarada”. O texto propunha, como objetivo da
UGT, prestar assistência econômica, intelectual, moral, social e jurídica
aos associados, declarando-se como uma “sociedade beneficente,
199 Prontuário da União Geral dos Trabalhadores, n.º 23.250. Arquivo do DEOPS/SP.
114
recreativa, esportiva e cooperativa, tendo por fim reunir todos aqueles que
o trabalho seja o meio de sua subsistência”.200
Quadro. 1201
Membros da diretoria da UGT em 1941 Cargo Nome ResponsabilidadesPresidente Vitaliano Mauro -Dirigir os destinos da
“Associação”, representando-a judicialmente ou não. -Presidir reuniões. -Convocar Assembléias. -Fiscalizar todos os papéis.
Vice – presidente João Ungaretti -Auxiliar e substituir o presidente em suas faltas, exercendo todos as suas funções.
Secretário-geral Nazareno Mantovani -Inscrever os sócios. -Fazer a correspondência. -Ter sob sua guarda o livro caixa. -Fazer impetrar “habeas-corpus” em favor de associados coagidos. -Receber informações da comissão de sindicância.
Secretário de atas Antonio Gomes Palmeira -Redigir as atas das sessões. -Substituir o secretário geral.
1.º secretário Orlando Alves -Fazer convites para reuniões, festas, bem como circulares. -Ter sob sua guarda o expediente para as propostas de novos sócios. -Substituir o secretário de atas.
2.º secretário Ercio Rinatti -Auxiliar o 1.º secretário e substituí-lo se for preciso.
Tesoureiro Ângelo Pontim -Cuidar das finanças.
Comissão de sindicância Francisco Paiva Antônio Lopes João Gomes da Rocha Moacir Araújo
-Visitar sócios enfermos. -Dar parecer sobre os novos sócios.-Sindicar sobre qualquer questão que possa surgir dentro da União.
Quanto às responsabilidades da diretoria, foram feitas
modificações nas funções do secretário geral, cargo anteriormente
ocupado por Ângelo Pontim e assumido em 1941 por Nazareno
Mantovani. Foram excluídas as atividades relacionadas com o caráter
200 Estatutos da UGT de 1941.201 Prontuário da União Geral dos Trabalhadores, op. cit.
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sindical e de defesa de classe, que estavam presentes nos estatutos de
1929. Além dessas funções, foram eliminadas: a mediação de
negociações entre patrões e empregados, a luta pela lei de férias - que
era uma reivindicação ligada às necessidades operárias no período do
estatuto anterior, de 1929 -, e a responsabilidade de participar de
congressos operários.202
A exclusão do caráter sindical e de defesa de classe dos
estatutos demonstra a intenção de fazer da UGT uma associação de
trabalhadores sem ligação oficial com o sindicalismo. Com essa manobra,
os comunistas conseguiram evitar o fechamento da instituição, cogitado
pela polícia há alguns anos.
Contudo, a mudança nos estatutos e a atuação moderada
dos comunistas não detiveram a ação policial. Após a assembléia geral de
1941, a polícia prendeu vários membros da UGT _ entre eles Vitaliano
Mauro _ e deu buscas na sua sede, localizada na Rua José Bonifácio,
procurando provas que dessem respaldo ao pedido de fechamento da
instituição impetrado pelo Delegado Regional de Polícia. Diante dos
depoimentos dos presos, que negaram a militância comunista, e a
inexistência de provas materiais, o caso foi encerrado e a União Geral dos
Trabalhadores permaneceu com permissão para atuar.
Mesmo com a modificação dos estatutos e a relativa
liberdade de atuação política, a reestruturação do núcleo comunista
ribeiropretano foi lenta, ocorrendo entre 1941 e 1945. Nesse período, a
militância caracterizou-se por ser mais individualizada, sem uma liderança
efetiva que comandasse a atuação do PCB na cidade. O contato com o
recém-organizado CR de São Paulo, entre 1941 e 1942, era quase nulo, 202 Estatutos da UGT de 1941.
116
faltando portanto orientação e material de propaganda para o trabalho de
militância. Nem mesmo as comemorações do Dia do Trabalho ganharam
muita atenção por parte dos comunistas, que se limitaram a soltar fogos
pela cidade, sem promover a realização de passeatas, comícios, ou
qualquer outro tipo de manifestação de massa. 203
Os primeiros sinais de aglutinação e reorganização
ocorreram com a retomada do controle da UGT pelos comunistas e,
posteriormente, com a chegada a Ribeirão de um representante do CR,
em 1942, Irineu de Moraes. O “Índio”, como era chamado Irineu, entrou
para o PCB em 1935. “Funcionário da Companhia de Força e Luz”, foi
transferido para Ribeirão em 1942. Instalado na cidade, iniciou contato
com os comunistas locais tencionando de promover a integração do
grupo, que se encontrava relativamente desagregado. Nessa época,
poucos militantes se destacavam, limitando-se a reuniões isoladas,
itinerantes, na casa de um ou outro, sem efetuar nenhuma ação concreta.
Havia o receio de se tornarem visados pela polícia, e isso prejudicava a
escolha de um líder para o grupo, que permanecia disperso. Irineu de
Moraes estabeleceu contatos com outros militantes, como Ângelo Di
Gaetani, Cezar Tupynambá, Vicente Quinhonero e a família Pontim, e
iniciou um trabalho de conscientização junto aos trabalhadores da “Força
e Luz” e aos estudantes locais, com vistas à reorganização do Partido em
Ribeirão Preto. Essa articulação só surtiria efeitos concretos em 1945,
quando houve um período de liberdade política e a legalização do PCB.204
203 “Diário da Manhã”, Ribeirão Preto. 1.º de maio de 1942.204 Depoimento de Irineu de Moraes, 20 de fevereiro de 1989. Irineu foi entrevistado, nesse ano, por Sebastião Geraldo. Como resultado dessas entrevistas Sebastião Geraldo publicou um livro de memórias “Lutas camponesas no interior paulista”.
118
3.2. A legalização do PCB e a o Comitê Municipal de Ribeirão Preto.
A intensa repressão policial contra os comunistas após o
movimento de 35, e a constante vigilância sobre as atividades da UGT,
tornaram difícil a existência de um Comitê Municipal organizado do PCB
em Ribeirão Preto. A atuação mais elaborada do Comitê limitou-se ao
período compreendido entre 1929 e 1935. A instalação de um novo
Comitê Municipal só ocorreria em 1945, quando o Partido passou a atuar
na legalidade, depois de um longo período de rearticulação.
Esse período de reorganização dos comunistas em Ribeirão,
entre 1940 e 1945, ocorreu simultaneamente aos efeitos retardados do
grande choque econômico que atingiu duramente o Brasil a partir de
1929. Em 1941, ainda eram sentidos os efeitos dessa crise. A decadência
do setor cafeeiro, motor da economia local, teve como conseqüência o
corte progressivo dos pés de café, iniciado no final da década de 30, e o
êxodo dos colonos para a área urbana. Como resultado direto da crise no
campo, a zona da “velha Mogiana” atravessou um processo de
despovoamento nunca antes visto, e a cidade, que passou a crescer
rapidamente com o êxodo rural, tornou-se o centro das tensões sociais
relacionadas com o problema do desemprego, da alta do custo de vida e
da falta de moradias.205 Aproveitando esse contexto de crise social, os
comunistas apoiaram as reivindicações imediatas dos trabalhadores,
buscando aumentar seu prestígio junto à classe operária ribeiropretana.
Com o prolongamento da 2.ª Grande Guerra Mundial, a
crises econômica e social agravaram ainda mais. Em 1944, a população
enfrentava o racionamento de produtos e um conseqüente aumento dos
preços de gêneros de primeira necessidade. O agravamento da questão
119
sócio-econômica da região de Ribeirão Preto teve lugar de destaque nos
jornais locais e entre àqueles que defendiam os interesses dos
trabalhadores.
A UGT, liderada pelos comunistas, e os sindicatos
legalizados uniram-se para pedir soluções da prefeitura para o aumento
da pobreza na região e para conter a alta dos preços dos alimentos. Essa
união entre dois grupos conflitantes, desde 1940, em torno da causa
social, teve frutos. Juntos, mobilizaram a população e organizaram
movimentos de protesto contra a carestia e os baixos salários.206
Aproveitando o ambiente de tensão social _ propício à
organização de movimentos populares _, a relativa liberdade política _
iniciada com a anistia de 148 presos políticos em 18 de abril de 1945 _ e
a mudança no código eleitoral de 28 de maio de 1945, o núcleo comunista
ribeiropretano ampliou seu contato com a massa trabalhadora e preparou
a reorganização do Comitê Municipal, arregimentando velhos comunistas
e buscando novos membros para o Partido.207
Toda a reorganização do PCB, em Ribeirão, ocorreu dentro
das novas diretrizes de atuação do partido, firmadas a partir de 1945.
Prestes, que se tornou a figura predominante dentro do PCB, propôs uma
política de “União Nacional” em torno de Vargas, causando
descontentamento em alguns comunistas do Rio de Janeiro e de São
Paulo. Entretanto, a linha prestista prevaleceu, influenciando diretamente
a linha de atuação dos comunistas, inclusive os ribeiropretanos. Durante o
comício de 23 de maio de 1945, no estádio Vasco da Gama, Prestes
declarou que a forma prática para criar uma frente operária pela “União
Nacional” era conclamar os trabalhadores a se juntarem à frente 205 “A Tarde”, Ribeirão Preto, 6 de agosto de 1941.206 “Diário da Manhã”, Ribeirão Preto, 10 de maio de 1944.
120
trabalhista do partido, o Movimento Unificador dos Trabalhadores
(MUT).208
Como resultado dessas novas orientações, os comunistas
lideraram, entre maio e agosto de 1945, uma série de movimentos
grevistas e, ao final destes, procuraram transformar o descontentamento
dos trabalhadores em apoio a Getúlio Vargas. Em Ribeirão, as diretrizes
determinadas por Prestes chegaram por intermédio de Irineu de Moraes,
responsável pela articulação de greves na cidade antes mesmo da
organização do Comitê Municipal. Esses movimentos populares,
insuflados pelos comunistas atingiram grandes dimensões, chegando, em
alguns casos, a sair do controle dos militantes.
207 DULLES, J. F. W. O comunismo no Brasil, pp. 261 - 177.208 CHILCOTE. R. H. Partido Comunista Brasileiro: conflito e integração, p. 95.
121
3.2.1. O saque da Casa Robin e a greve da Companhia Paulista de
Força e Luz.
Um desses movimentos ocorreu em junho de 1945 e fazia
parte do contexto nacional de reivindicações dos trabalhadores por
melhores condições de vida, e do descontentamento em relação à séria
crise no abastecimento de gêneros de primeira necessidade. Na tentativa
de canalizar as insatisfações populares para um movimento organizado,
os comunistas e os “Sindicatos Reunidos”209 planejaram um comício de
protesto contra as péssimas condições de vida dos trabalhadores.
Mesmo com as diferenças ideológicas existentes entre os líderes dos
sindicatos legalizados e os comunistas, esses últimos apoiaram o
comício, chegando a reunir-se periodicamente com os primeiros, para
planejar o movimento. Entretanto, a data escolhida para o comício pelos
sindicatos legalizados, 12 de junho, uma segunda-feira, logo de manhã,
causou profundo descontentamento entre os militantes do PCB, que
acreditavam que o apoio dado pelos “pelegos” aos movimentos sociais
não passava de uma atitude demagógica. Irineu de Moraes demonstrou
sua indignação quando afirmou que a real vontade dos sindicatos
legalizados era que o comício não se realizasse. “Um comício marcado
para segunda - feira, às 8:00 h, era justamente para não ir ninguém,
porque está todo mundo trabalhando”.210
Acusando os sindicalistas de “pelegos”, os comunistas
acionaram suas células mais fortes, localizadas nas Cervejarias Antárctica
e Paulista, para trabalhar junto aos funcionários, fazendo reuniões e
propagandas, na tentativa de evitar o fracasso do comício. Os militantes
conseguiram que os funcionários das duas fábricas parassem às sete
209 Representação dos sindicatos legalizados da cidade.210 Entrevista realizada com Irineu de Moraes em novembro de 1994.
122
horas, independente da aprovação dos patrões, e seguissem para o
comício, que se realizaria na Praça XV, centro da cidade. Os 2.000
trabalhadores das duas fábricas, no seu caminho em direção a praça, iam
forçando o fechamento de bares, restaurantes e lojas, engrossando o
movimento com os trabalhadores desses estabelecimentos, e parando
quase completamente o centro comercial da cidade. Os donos da maior
loja atacadista da região, a Casa Robin, recusaram-se a fechar as portas,
tentando impedir seus funcionários de irem ao comício. A multidão
enfurecida marchou para a loja, invadindo-a. Durante a invasão iniciou-se
o saque de mercadorias, que durou o dia todo. A destruição foi quase
completa. Os líderes do movimento, entre eles Irineu de Moraes, não
conseguiram deter a invasão. O corpo de bombeiros, a polícia e o exército
foram chamados, mas não tiveram sucesso contra a massa que saqueava
o estabelecimento, que só parou quando não restavam mais mantimentos
para serem carregados.211
O comício que havia sido planejado acabou não se
realizando. Mas os comunistas e os “Sindicatos Reunidos” aproveitaram o
movimento para forçar um acordo entre trabalhadores e patrões da
Antárctica, Paulista e do comércio. O sucesso do acordo era inédito na
cidade. Previa aumentos gerais de salários, inclusive para menores,
cancelamento dos aumentos de 10% nas tarifas de água, luz e esgotos, e
a proibição de novos aumentos dos gêneros de primeira necessidade. No
dia 14, a cidade já havia voltado à normalidade; contudo, outro
movimento, desta vez organizado apenas por comunistas, foi deflagrado,
aproveitando a sucessão dos acontecimentos. 212
Irineu de Moraes, aproveitando seu cargo de folguista da
Companhia de Força e Luz, que lhe permitia viajar pelo Estado, vinha
211 Idem.212 “Diário da Manhã”. Ribeirão Preto, 13, 14 e 15 de junho de 1945.
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fazendo contato entre os funcionários das usinas hidrelétricas do interior
de São Paulo desde 1944. A idéia era programar a interrupção do
fornecimento de energia, simultaneamente, nas cidades da região, no dia
12 de junho, juntamente com a realização do comício, como forma de
ampliar a pressão dos trabalhadores. Contudo, o fracasso do comício e a
presença do exército na cidade forçaram o adiamento do corte de energia
para três dias depois.
A data para a realização da greve dos funcionários da
Companhia Paulista de Força e Luz foi marcada para o dia 15 de junho
de 1945. Às três horas da madrugada, os líderes das doze usinas da
Companhia interromperam o fornecimento de energia. Durante toda a
tarde foram feitas negociações entre Irineu de Moraes, líder do
movimento, e a diretoria da Força e Luz, presenciadas pelo Delegado da
Divisão Regional do Trabalho, Álvaro Marques. Entrando em acordo com
os “americanos” representantes da Companhia, os trabalhadores
conseguiram aumento de salários e a garantia de emprego aos grevistas.
O movimento havia sido um sucesso.213
Tanto o saque da Casa Robin como a Greve dos
funcionários da “Força e Luz” garantiram a Irineu de Moraes e aos
comunistas grande prestígio entre os trabalhadores, favorecendo uma
maior aceitação dos militantes entre os operários, como também a
organização do Partido na cidade. Desse modo, os comunistas
aproveitaram os meses de junho e julho de 1945 para promover um
processo de articulação política e estabelecer contatos regulares com o
Comitê Regional de São Paulo, pedindo orientações para a instalação
oficial do Comitê Municipal do Partido Comunista do Brasil em Ribeirão.
213 “Diário da Manhã”. Ribeirão Preto, 16 de junho de 1945.
124
A assembléia-geral para a eleição do novo secretariado foi
marcada para 12 de agosto, estrategicamente antes da realização da
primeira sessão plenária legal do PCB, que seria no dia 21 de agosto. O
líder do CR, Domingos Marques ( o “Vermelhinho ) que, mesmo
tuberculoso, havia mantido o Comitê Regional de São Paulo durante a
grande repressão e que, posteriormente, seria eleito membro do Comitê
Nacional do Partido, compareceu para presidir a assembléia, realizada no
prédio da UGT, que acabou se transformando na sede provisória do
Comitê Municipal. 214
A sessão de posse do novo secretariado teve como
oradores: Domingos Marques, Irineu de Moraes, Dr. Paulo Barra e
Sansão Lino Machado, sendo os dois últimos membros novos do Partido.
Dos comunistas atuantes durante a década de 20 em Ribeirão Preto,
foram eleitos Cezar Tupynambá Roselino, que participou da elaboração
dos estatutos da UGT em 1929, Vicente Quinhonero e Gustavo Wierman,
dois dos fundadores do Partido em Ribeirão, e Albino Tremeschini.215
Secretário político Irineu de Moraes.
Secretário de organização Hilário Soares da Silva.
Secretário de divulgação Cezar Tupynambá Roselino.
Secretário de finanças Albino Tremeschini.
Secretário Sindical Natal Gracchia.
Encarregado de trabalhos de campo Antonio Alagão.
Encarregado eleitoral Décio Fernandes.
Suplentes
Silvio Parpinelli
Vicente Quinhonero
Joaquim Marques dos Reis 214 DULLES, J. F. W. O comunismo no Brasil, pp. 272 - 273.
125
Abdêo Chaguri
Gustavo Wierman
Cezar Roselino foi escolhido para o cargo de secretário de
divulgação por ser professor e conhecedor da teoria marxista. Natal
Gracchia, camponês recém-chegado à cidade, tornou-se secretário
sindical, com a intenção de iniciar a organização de um sindicato rural.
A legalidade do Partido e as suas propostas para os
trabalhadores, além do prestígio da URSS após a guerra, trouxeram para
o PCB uma leva de novos membros. Nas palavras de Natal Gracchia,
“todos queriam ser comunistas, principalmente os sabidos, tudo parecia
às mil maravilhas. Só que veio gente boa e gente ruim. Veio a podridão do
capitalismo se infiltrar no Partido. Eles foram pegando a direção, sem
entender nada de partido, sem entender nada de marxismo... “.216 A partir
de 1945, o núcleo comunista ribeiropretano passou a ter uma composição
mais heterogênea, possibilitando a ocorrência de divergências mais
profundas, fato não observado em períodos anteriores.
Uma dessas divergências iniciou-se com o aumento do
prestígio de Gracchia dentro do Comitê: mal havia entrado para o Partido,
e já era eleito para secretário sindical. Logo depois, foi escolhido para
presidir o MUT, fundado em 14 de agosto de 1945, ocupando, juntamente
com o Comitê Municipal, a sede da UGT. Constituíram o secretariado do
Movimento Unificador dos Trabalhadores: Natal Gracchi, João Eufrásio
Fernandes, Carlos Pedro Canova, Tadeu Vieira, Abdeo Chaguri e Antonio
Cereia, todos militantes novos.
215 “Diário da Manhã”, Ribeirão Preto, 13 de agosto de 1945, n.º 14.815.216 Idem.
126
O líder do MUT, Gracchia, indispôs-se com Irineu de Moraes
desde a sua entrada para o Partido, e um acusou o outro de ter atitudes
truculentas e de ser “safado”. Gracchia era contrário às idéias
revolucionárias, como a tomada do poder por métodos violentos. Dizia
que o trabalhador que “pede por comida” não quer envolver-se em
questões partidárias. Essa era sua principal diferença com Irineu de
Moraes, que filiou-se ao Partido para “fazer a revolução”, ideal que
manteve mesmo quando se afastou. As diferenças entre Natal Gracchia,
Irineu de Moraes e outros membros do Partido acabaram provocando a
sua expulsão, na década de 50. 217
A partir da fundação do MUT, essa organização e o PCB,
mesmo com as divergências internas, passaram a atuar em prol do seu
candidato à presidência da República, Yeddo Fiúza. Toda a militância
nesse período voltou-se para esse objetivo. Contudo, a heterogeneidade
dos novos membros dificultava a união de interesses. Os antigos
militantes perdiam prestígio dentro do Partido e da UGT, saindo
gradativamente das cenas política e sindical. Desse modo, a partir de
1945 iniciou-se a formação de uma nova geração de líderes comunistas
em Ribeirão Preto, como Irineu de Moraes, Antônio Girotto e Luciano
Lepera, que acabaram substituindo Ângelo Di Gaetani, Rômulo Pardini,
Ricardo Pinatti e Gustavo Wierman, fundadores do partido com
tendências diferentes das dos novos militantes.
217 Entrevista com Natal Gracchia, em 1989, realizada por Sebastião Geraldo.
127
3.3. A participação dos comunistas nas eleições de 1945.
Após ter sido registrado oficialmente como Partido, em 10 de
novembro de 1945, o PCB indicou Yeddo Fiúza, engenheiro e antigo
prefeito de Petrópolis à presidência. A escolha de um candidato não -
comunista ia ao encontro do desejo de Prestes de dar o primeiro passo
para a “União Nacional”.218 Em Ribeirão, a candidatura de Yeddo Fiúza foi
bem aceita, especialmente a partir de 24 de novembro, quando chegaram
à cidade Caio Prado Júnior, Antônio Campos, Osvaldo Doria e Cândido
Portinari para a realização de um grande comício em prol do candidato
apoiado pelos comunistas.219
Durante o comício, os oradores defenderam a reforma
agrária, a luta pela erradicação da “miséria do povo” e a União Nacional,
diante de uma platéia animada, reunida na praça XV, centro da cidade.
Contudo, a realização do comício e o aumento da propaganda comunista
em Ribeirão despertaram a oposição acirrada dos católicos locais. A
Igreja, em resposta à campanha eleitoral comunista, iniciou uma
campanha anticomunista, usando como veículo de comunicação o seu
jornal, o “Diário de Notícias”, que havia comprado nesse mesmo ano. A
campanha católica, iniciada em 1945, continuou até 1949, não
conseguindo abalar efetivamente o prestígio dos comunistas entre os
trabalhadores católicos. No entanto, a troca de ofensas entre comunistas
e católicos, por intermédio da imprensa, ampliou a hostilidade entre os
dois grupos.
218 CHILCOTE, em seu livro Partido Comunista Brasileiro, analisa a posição de Prestes diante das eleições de 1945: o “Cavaleiro da Esperança” abandona o discurso radical e afirma que os marxistas não pretendem implantar o comunismo no Brasil, preferindo lutar por um governo de “União Nacional”.219 Diário da Manhã, n.º 14.936, Ribeirão Preto, 24 de novembro de 1945.
128
Contudo, mesmo diante da oposição fervorosa da Igreja, a
campanha teve boa aceitação entre a população ribeiropretana, a
exemplo do que ocorreu em outras cidades do Estado de São Paulo,
onde, particularmente nas cidades industriais, o PCB garantiu uma boa
votação. Apesar de a campanha ter passado por várias dificuldades,
inclusive um curto período de perseguição aos comunistas, o Partido
recebeu 9% do total de votos e elegeu catorze deputados e um senador.
Ribeirão Preto não lançou nenhum candidato, restringindo-se a apoiar
Prestes e os candidatos por ele indicados.220
Quadro. 2.221
As eleições presidenciais de 1945.
Total de
votos
recebidos
Eurico Dutra
(PSD)
Eduardo
Gomes
(UND)
Yeddo Fiúza
(PCB)
Total de
votos válidos
Guanabara 166.147 183.984 134.735 490.255
Minas Gerais 478.503 339.463 16.699 834.979
Rio Grande
do Sul
447,462 110.444 50.199 608.446
São Paulo 780.546 377.613 192.867 1.353.445
Total em 4
Estados
1.872.658
(56%)
1.11.504
(30%)
394.500
(12%)
3.287.125
(55,99%)
Total nacional 3.251.507
(55,3%)
2.039.341
(34,7%)
569.818
(9,7%)
5.870.667
(100%)
Observa-se no quadro que os Estados com maior volume de
votação para Yeddo Fiúza são justamente São Paulo e Guanabara, onde
220 CHILCOTE. R. Partido Comunista Brasileiro: conflito e integração, pp. 95 - 97.221 Idem.
129
o Partido tinha maior expressão. No caso de São Paulo, o interior teve
participação efetiva no total de votos. Em algumas cidades, como
Campinas, Santos e Sorocaba, o Partido recebeu a maioria dos votos
partidários.222
Infelizmente, não temos números que representem a
votação para Yeddo Fiúza em Ribeirão Preto. Entretanto, fica claro que a
campanha de 1945 teve papel decisivo para o crescimento do prestígio
dos comunistas na cidade, a partir de 1945, fato que viria a ter reflexos
diretos nas eleições municipais de 1947.
222 Ibidem, p. 98.
130
3.4. A participação dos comunistas nas eleições municipais de 1947.
O presidente Dutra, eleito em 1945, recebeu forte oposição
por parte do PCB que, durante o ano de 1946, permaneceu defendendo a
“União Nacional” e o fim do sectarismo, que afirmava estar presente ainda
entre os membros das bases do Partido. Prestes, durante uma sessão
plenário do Partido, em janeiro de 1946, lembrou a importância da ligação
com as massas, objetivo que deveria ser buscado veementemente pelos
membros do PCB.223
Como resultado das orientações de Prestes, e
diferentemente do que ocorria com o próprio Partido em âmbito nacional _
que se isolava dos trabalhadores por causa de sua política cautelosa em
relação às greves _, o Comitê Municipal em Ribeirão Preto instigou e
organizou greves e movimentos populares durante todo o ano de 1946,
período em que os comunistas puderam atuar relativamente livres da
repressão policial.224
Em dezembro de 1945, Irineu de Moraes liderou uma nova
greve na Companhia Paulista de Força e Luz, em solidariedade as outras
localidades do Estado que estavam mobilizadas. Ribeirão Preto ficou sem
energia elétrica entre 21:40 h da quinta - feira, dia 27, até 1:45 h da
madrugada do dia 30. A cidade viveu um verdadeiro caos. Hospitais,
casas comerciais e residências ficaram sem água e luz. Ao final de vários
dias de negociações, os funcionários da Companhia voltaram ao trabalho
223 CHILCOTE, O Partido Comunista Brasileiro, p. 98.224 Idem, p. 103.
131
sem que, entretanto, conseguissem ser atendidos em todas as suas
reivindicações.225
Dando continuidade à seqüência de greves, no dia 2 de
janeiro de 1946 a célula do Partido, na Cervejaria Antárctica, iniciou um
movimento liderado por Gustavo Weirman. Os trabalhadores
reivindicavam um aumento prometido no ano anterior, que ainda não
havia sido dado. Ao final de dois dias de greve, os trabalhadores
conseguiram ser atendidos e voltaram ao trabalho.226
Aproveitando o sucesso das greves dos funcionários da
“Força e Luz” e da Cervejaria Antárctica, os comunistas decidiram apoiar
a greve dos bancários, iniciada no dia 29 de janeiro, e que atingiu os
funcionários do Banco do Brasil e do Estado. A intenção dos militantes do
PCB era ampliar sua influência entre os bancários, setor no qual o Partido
não estava infiltrado.227
A participação dos comunistas nesses movimentos grevistas
colaborou de forma decisiva para o contato dos militantes com os
trabalhadores locais. Favorecidos pelo contexto de instabilidade social, os
comunistas mudaram a linha de atuação da União Geral dos
Trabalhadores, que havia excluído dos estatutos de 1941 o caráter
sindical da instituição. A UGT passou a atuar declaradamente em prol da
defesa da classe trabalhadora. Como resultado dessa mudança de
diretriz, no dia 10 de março de 1946 realizou-se uma assembléia-geral na
sede da União, com o objetivo de tratar das “reivindicações mínimas” dos
trabalhadores, entre elas a luta pela casa própria, o tabelamento dos
gêneros de primeira necessidade e a situação dos aposentados. Como
resultado da assembléia foram formadas três comissões: 225 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 1 de janeiro de 1946.226 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 3 de janeiro de 1946.
132
Comissão de sindicância: com o objetivo de sindicalizar
os trabalhadores para que os mesmos poderem pesar na
balança social, apresentando reivindicações de forma
pacífica.
Comissão de seguro social: para tratar de questões
ligadas ao instituto de aposentadorias e pensões,
principalmente no plano de construção de casas para
operários.
Comissão de preços: para estudar as altas dos preços de
gêneros alimentícios e de objetos de uso forçado, bem como
o estabelecimento dos preços dos mesmos, e elaboração e
fiscalização de tabelas com preços mínimos.228
Os comunistas seguiam as orientações da direção geral do
PCB: lutavam pelas reivindicações econômicas dos trabalhadores, e
assim podiam infiltrar-se na massa operária, objetivo considerado
prioritário por Irineu de Morais, secretário político do Comitê Municipal.
Com a intensificação das atuações política e sindical, o
prestígio dos comunistas crescia, não só em Ribeirão, mas também nas
cidades da região. Os militantes Antônio Girotto, Gabriel Tondela e Irineu
de Moraes realizaram comícios nas cidades vizinhas e em Ribeirão,
durante o ano de 1946, buscando ampliar as bases do Partido para as
eleições do ano seguinte.
Em Batatais, Girotto organizou um comício em prol da
sindicalização dos operários, com a presença de 200 pessoas, no dia 26
227 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 27 de janeiro de 1946.228 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 10 e 12 de março de 1946
133
de fevereiro de 1946. No dia 1.º de maio, outro comício foi organizado por
Antônio Girotto e Tondela em Batatais, dessa vez com a participação de
180 pessoas. Em Altinópolis, o Comitê de Ribeirão promoveu outro
comício, com a presença de 500 pessoas, mais uma vez organizado por
Tondela, Girotto e um membro do diretório local, Sebastião de Figueiredo
Moura, que acabou sendo eleito vereador. Concomitantemente, o Comitê
Municipal de Ribeirão também organizava as comemorações do 1.º de
Maio na cidade, com passeatas e a inauguração de um retrato de Prestes
na sede do partido.229
O Comitê Municipal de Ribeirão não chegou a publicar
nenhum jornal próprio durante a legalidade, mas recebia farto material do
Comitê Regional para ser utilizado em propaganda e para instruir os
militantes nos trabalhos político e sindical. Mensalmente, o Comitê do
Partido recebia 200 exemplares do jornal “O Hoje” e 200 do jornal
“Tribuna Popular”, semanalmente os militantes recebiam o jornal “Classe
operária”.230
O trabalho de distribuição de propaganda do Partido e a
atuação do Comitê Municipal na organização de comícios em outras
cidades tornaram Ribeirão Preto o pólo centralizador das atividades
comunistas na região. Cidades como Altinópolis, Batatais, Brodowiski,
Jardinópolis, Sertãozinho, Guaíra, entre outras, tinham sua ação partidária
orientada pelo Comitê Municipal Ribeiropretano.
Os comícios e o material de propaganda distribuído na
região faziam parte do processo preparatório para as eleições municipais
de 1947. Os comunistas articulavam-se para conseguir um bom resultado
229 Relação de comícios realizados na região de Ribeirão Preto durante o ano de 1946. Prontuário da Delagacia Regional de Polícia de Ribeirão Preto, n.º 548, vol. 1, caixa 37. Arquivo do DEOPS/SP.230 Radiotelegrama. Prontuário da Delegacia Regional de Polícia de R. P., n.º 548, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.
134
eleitoral, com a intenção de eleger seus primeiros representantes para a
Câmara Municipal.
Em pleno início do processo de propaganda eleitoral, foi
convocada uma assembléia-geral para junho de 1946, com o objetivo de
eleger a nova diretoria do Comitê Municipal do PCB em Ribeirão. Irineu
de Moraes confirmou sua influência sobre o grupo, tendo sido eleito,
novamente, para o cargo de secretário político, enquanto, dentre os
membros fundadores do Partido, restou apenas Gustavo Weirman, eleito
como suplente.
Composição da diretoria em 1946.231
Secretário Político Irineu de Moraes
Secretário de Organização Albino Tremeschini
Secretário de Divulgação José Engrácia Garcia
Secretário Sindical Natal Gracchia
Secretário de Finanças Joaquim Teixeira de Andradre
Secretário de Campo Antônio Alagão
Secretário eleitoral Décio Fernandes
Suplentes Aparecido Araújo
Gensen Martins
Abdeu Chaguri
Gustavo Weirman
Antônio Marques dos Reis
José Damaceno Neto.
231 Prontuário de Antônio Girotto, n.º 76. 139, Arquivo do DEOPS/SP.
135
A diretoria recém-eleita confirmou a influência da nova
geração de militantes e o distanciamento de velhos comunistas como
Ângelo Di Gaetani. As eleições também serviram para demonstrar o
aumento expressivo do número de militantes, já que a assembléia de 20
de junho de 1946 contou com os votos de 240 militantes e simpatizantes
do Partido na cidade, sendo 140 homens e 100 mulheres.232 O fato de as
mulheres representarem mais de 40% do número de eleitores é um fator
significativo. O núcleo feminino do Comitê teve importante atuação nos
movimentos sociais locais, desde a sua formação em 1929. As mulheres
davam assistência aos militantes fora de ação, cuidando de sua roupa e
comida, além de cuidarem das finanças e da organização do partido. Em
Ribeirão chegaram a organizar passeatas contra a carestia e o aumento
dos preços dos gêneros de primeira necessidade, em nome da “União das
Mulheres Democráticas”.233
Depois de um período de grande crescimento do PCB, tanto
em influência partidária quanto numericamente, o Partido iniciou o ano de
1947 ante um golpe: a possibilidade de cassação do registro do Partido
Comunista do Brasil. De fevereiro a maio de 1947, o fechamento do PCB
foi o assunto mais discutido na cidade. Luciano Lepera, então jovem e
talentoso jornalista, simpatizante do PCB, escreveu no “Diário da Manhã”:
“Está na ordem do dia esse assunto. Todos
esperam com maior ou menor emoção a notícia: o Partido
Comunista será fechado? Quando? Por que? (...) A massa
popular não se conformará com o fechamento do partido de
Prestes, antes das eleições (...). A opinião quase geral nas
232 Fichas de inscrição de filiados. Presentes nos autos de apreensão da Delegação Regional de Polícia de Ribeirão Preto. 25.5.47.233 Prontuário n.º 14.307, Arquivo do DEOPS/SP.
136
ruas é essa: elementos que nunca foram e nem poderiam ser
comunistas são contra o fechamento do partido vermelho.
O PCB poderá ser fechado(...), porém processo
algum conseguirá matar, dentro de cada cérebro comunista, a
idéia de que só o comunismo poderá salvar o Brasil do caos
dos dias presentes. (...) Na ilegalidade, as violências sofridas
servirão para fazer o comunismo crescer. O próprio cheiro de
sangue revolta, incentiva e anima o homem...
Que percam as esperanças os que pretendem
exterminar o comunismo. Essa medida ninguém a conseguirá
com violência. (...)”234
Mesmo com a discussão em torno da cassação do Partido,
os membros do Comitê Municipal continuavam a atuar, tanto
politicamente quanto no campo sindical, no prédio da UGT. O contato
entre a União Geral e os comunistas era explícito, como mostra a
composição da nova diretoria da UGT, eleita em 9.3.47:
Presidente Joaquim Teixeira de Andrade
Vice - presidente Albino Tremescchini
Secretário geral Fortunato Meneghetti
Secretário de atas Gustavo Wierman
Tesoureiro João Bezerra
1.º secretário de expediente Joaquim Marques dos Reis
2.º secretário de expediente Oscar Scusa Soares.
234 LEPERA, Luciano. Diário da Manhã, 17 de abril de 1947.
137
Mais uma vez os comunistas mantiveram a maioria absoluta
dentro da União, ocupando quase todos os cargos e fortalecendo ainda
mais sua influência no meio sindical local. Para o novo diretório da União,
foram eleitos comunistas que não lançariam seus nomes nas eleições no
final do ano, numa forma de proteger a instituição de possíveis ataques
por parte da polícia.
No dia 27 de abril de 1947, foi a vez do próprio Comitê
Municipal eleger uma nova direção, bem como os militantes que
participariam do IV Congresso do partido, a realizar-se no dia 23 de
maio.
Composição da diretoria em 1947.235
Secretário político Irineu de Moraes
Secretário de organização Jovino de Almeida Neves
Secretário sindical Aparecido Araújo
Secretário de massa eleitoral Décio Fernandes
Secretário de educação e propaganda José Engrácia Garcia
Membros efetivos Odilon Lino Machado
Claudemiro Alves Pereira
Suplentes Joaquim Marques dos Reis Filho
Joaquim Teixeira de Andrade.
Ricardo Pinatti
Antonio Pontim.
235 “ A Tarde “, Ribeirão Preto, 3 de maio e 1947.
138
Irineu de Moraes incontestavelmente firmou-se como o líder
máximo do Comitê durante o período de legalidade. A novidade no novo
diretório ficaria por conta da eleição de José Engrácia Garcia, dentista
erudito, para o cargo de secretário de educação e propaganda, e a
escolha de Aparecido Araújo, membro da célula das indústrias Matarazzo,
para secretário sindical, substituindo Natal Gracchia, que tinha
divergências ideológicas com Irineu de Moraes. Outra novidade foi o
retorno de Ricardo Pinatti e de Pontim à diretoria, depois de muitos anos
afastados. Como delegados para o IV Congresso, foram eleitos Décio
Fernandes e Irineu de Moraes. Entretanto, em decorrência do fechamento
do Partido, o Congresso foi adiado.236 Mesmo com o adiamento, as teses
foram publicadas e deixavam clara a posição anti-imperialista do Partido,
que provocou o aumento do antagonismo dos comunistas em relação aos
governos capitalistas, especialmente dos EUA.237
A cassação do registro do PCB, no dia 7 de maio,
interrompeu os planos eleitorais do Comitê Municipal, que pretendia
lançar candidatos próprios. Com o fechamento da sede do Partido em
Ribeirão, e dos diretórios em toda a região, foi dificultada a participação
dos militantes nas eleições. No entanto, depois de uma visita de Décio
Fernandes a Caio Prado Júnior, uma nova estratégia foi montada e os
comunistas decidiram lançar seus candidatos por outras legendas.
No processo de preparação para as eleições, os comunistas
passaram a usar outra legenda, PPP ( Partido Popular Progressista), na
tentativa de camuflar a ação dos membros do PCB. Os militantes
comunistas não conseguiram registrar a legenda do PPP, por isso
aliaram-se ao PSD (Partido Social Democrático), por intermédio do qual
concorreram às eleições.
236 “A Tarde”, Ribeirão Preto, 3 de maio de 1947.237 CHILCOTE, op. cit., p. 102.
139
O PPP, em entendimento com o PSD, lançou um programa
de 16 itens:
Defesa intransigente das Constituições Federal e Estadual em vigor no
regime democrático de forma a garantir os direitos e as liberdades
individuais e fundamentais do homem, quer se manifestando contra os
abusos e violações desses direitos e dessas liberdades, quer pugnando
pela regulamentação dos dispositivos constitucionais que se referem ao
assunto, ou ainda protestando, dentro dos limites da ética, contra a
cassação de mandatos dos legítimos representantes do povo, contra a
proibição de comícios e reuniões públicas.
Estudar a revisão do Contrato de Concessão atualmente entre a
Municipalidade e a Empresa de Águas e Esgotos desta cidade, de forma
a beneficiar a população, não só com o barateamento das taxas, mas
ainda, de forma a melhorar a distribuição da água, levando-a até os
bairros ainda não servidos e em condições de não vir a água a faltar à
população em geral.
Elaboração de um contrato, com a Cia. de Luz e Força, de forma a
atender aos interesses da coletividade, diminuindo o preço do KW-hora,
principalmente com relação aos estabelecimentos industriais;
melhoramento da iluminação pública e particular, ampliando-a de forma a
diminuir o número de casas sem energia elétrica e aumentando a
quantidade de energia elétrica para a cidade, facilitando, assim, a
instalação de novas indústrias;
Combate à carestia da vida, fixando preços nos gêneros de primeira
necessidade e instituindo feiras livres com isenção de impostos,
localizando-as, de preferência, em bairros operários;
Fomentar a criação de suínos dentro do município, de maneira a
aumentar o fornecimento de gordura animal à população, por preços mais
140
baixos, e proceder a uma racional distribuição do óleo vegetal evitando a
existência de filas.
Construção de um mercado municipal;
Estudar o aproveitamento de terras não cultivadas, próximas à cidade,
uma vez aprovada a regulamentação das disposições existentes a
respeito na Constituição Estadual;
Estudar, com o Governo Estadual, uma forma de instalar-se, na Escola
Prática de Agricultura, um posto de tratores e máquinas agrícolas que
servirão aos lavradores do município mediante uma taxa módica
destinada à conservação e custeio de maquinas;
Melhorar as estradas municipais e zelar pela sua boa conservação;
Instalação de telefones automáticos;
Lançamento de impostos progressivos sobre terrenos vagos urbanos e
revisão criteriosa de impostos prediais, a fim de serem incrementadas as
construções de casas residenciais;
Continuação do calçamento da cidade, iniciando desde logo o
pedregulhamento das ruas não calçadas e dos bairros, com a colocação
de guias e construção de galerias para águas pluviais;
Facilitar a construção de casas populares, mediante o fornecimento,
pela prefeitura, de plantas-padrões, e fiscalização das construções sem
dispêndio para o operário;
Incremento aos esportes em geral e construção de uma piscina pública,
a fim de evitar que menores se banhem nos córregos da cidade;
Ligação dos bairros Vila Tibério e Campos Elíseos, pela passagem que
já existiu e ora fechada pela Cia Mogiana, assim como dos bairros
Campos Elíseos e Campos das Cruzes, pela construção de uma ponte e
de aterro no Córrego Ribeirão Preto, à Rua Pernambuco;
141
Criação de Pronto Socorro e Assistência Médica aos trabalhadores
rurais, facilitando ainda, tanto quanto possível, a instalação de uma
maternidade.238
O programa, nada sectário, abrangia particularmente as
questões sociais. Contudo, também tentava atrair as classes média e alta,
prometendo negociar com a Cia. Paulista de Força e Luz menores taxas
para estabelecimentos industriais. Além disso, defendia a mecanização do
campo e melhorias para a agricultura, que passava por um período de
crise, programa avançado para a época, indo ao encontro tanto dos
interesses dos agricultores, como dos trabalhadores rurais.
Com base nesse programa os comunistas, por intermédio do
Partido Popular Progressista, apresentaram o nome de Nelson Rodrigues
da Nóbrega para prefeito e, na chapa de candidatos à vereança na
legenda do PSD, dez nomes:
Dr. Henrique Crósio - Médico
José Engrácia Garcia - Dentista
Ophelio Russomano - Alfaiate
Décio Fernandes - Comerciário
Aparecido Araújo - Operário
Salvador Trovato - Proprietário
João Guerreiro - Camponês
238 Manifesto do Partido Popular Progressista (PPP), retirado do processo de cassação do mandato dos vereadores comunistas, novembro de 1947.
142
Albino Tremeschini - Sapateiro
Antonio Pontim - Alfaiate
Clemente José da Silva - Ferroviário da Mogiana.
A composição da chapa demonstra a intenção de atingir o
eleitorado ligado tanto às profissões liberais _ dentista e médico _, quanto
aos trabalhadores rurais, além, evidentemente, do operariado. Desse
modo, o programa amplo dos comunistas combinou com o ecletismo da
composição da chapa.
Nas propagandas eleitorais, incluindo panfletos, comícios e
reuniões, os militantes do PCB não se preocuparam em esconder sua
tendência ideológica, auto-intitulando-se “candidatos de Prestes”. O
declarado apoio de Prestes às candidaturas dos dez vereadores do PPP
confirmou-se no dia 25 de outubro de 1947, quando foi publicada a
seguinte carta do “Cavaleiro da Esperança”:
“ Carta de Luís Carlos Prestes ao povo de
Ribeirão Preto.
Companheiros de Ribeirão Preto.
O povo desse município escolherá a 9 de
novembro os homens e mulheres que vão
representá-lo na Assembléia Legislativa local, a
Câmara dos vereadores do município (ilegível) e
prefeito.
Para o povo é de grande importância que
na Câmara Municipal estejam seus (ilegível.)
representantes, honestos e corajosos, modestos e
trabalhadores, que sintam os (ilegível) do povo e
sejam capazes de defender os interesses da
143
população e de tudo (ilegível) progresso do
município.
Na Câmara Municipal serão discutidos
todos os problemas do município e será decidida a
melhor maneira de empregar o dinheiro do povo, os
impostos, (ilegível) paga pelo Governo Federal, os
dez por cento do imposto de renda que (ilegível.)
município em virtude do dispositivo constitucional
conseguido pelos comunistas na Constituinte
Nacional.
Como brasileiro e patriota, acompanho
com o maior interesse a sorte desse município, por
isso, venho lhes pedir os seus votos, os das pessoas
de suas famílias e de (ilegível.), para os meus
candidatos, porque estou certo que saberão
defender honesta e corajosamente os interesses do
povo na Câmara Municipal./.../
Saudações democráticas.
Luís Carlos Prestes.239
O sucesso da campanha eleitoral, determinado em parte
pelo apoio de Prestes, fez com que os resultados excedessem as
expectativas dos comunistas. A votação nos dez “candidatos de Prestes”,
pelo PSD, foi significativa:
Quadro 3240
Candidatos comunistas ao cargo de vereador na Câmara Municipal de
Ribeirão Preto, em 1947.
nome do candidato votos Quando data da observações.
239 Propaganda eleitoral do PPP, presente no processo de cassação dos candidatos comunistas ao cargo de vereador em 1947.240 Relação de vereadores da 1.ª legislatura ( de 1.1.1948 a 31.12.1951). Câmara Municipal dos vereadores de Ribeirão Preto. Os dados complementares foram tirados do prontuário da Delegacia Regional de Polícia de Ribeirão Preto, n.º 548, Arquivo do DEOPS/ SP.
144
eleito, a
data da
posse.
saída
Albino Tremeschini 92 Não foi eleito.
Aparecido Araújo 129 01.01.48 31.12.51
Décio Fernandes 222 01.01.48 01.04.48 Mandato cassado
pela mesa.
Henrique B. Crósio 209 Não tomou posse.
João Guerreiro 77 Não foi eleito.
José Engrácia Garcia 129 1950 31.12.51 Assumiu o lugar de
Décio Fernandes.
Antônio Pontim 103 1949 Suplente, assumiu
o lugar de
Aparecido Araújo.
Clemente José da
Silva
73 Não foi eleito.
Salvador Trovatto 106 1950 Suplente, assumiu
no lugar de José
Elias.
Ophélio Russomano 62 Não foi eleito.
Dos eleitos, Henrique Barbosa Crósio desistiu da posse por
problemas pessoais, tendo sido substituído por um suplente do PSD, mas
sem tendência comunista. Todos os candidatos comunistas, juntos,
conseguiram 1.199 votos, representando quase 65% do total de votos do
PSD, que teve 1.854 votos para os vereadores.241 Dos cinco vereadores
eleitos pelo PSD, três eram comunistas. Como suplentes ficaram Antônio
Pontim e José Engrácia Garcia, que assumiram depois do afastamento de
Aparecido Araújo e da cassação do mandato de Décio Fernandes.
241 “A Tarde “ Rib. Preto, 14 de novembro de 1947.
145
O PSD ficou com o quinto lugar na votação para vereadores,
sendo que seu número de votos representou mais de 50% do total do
primeiro colocado, a coligação UDN-PR, como mostra o quadro abaixo:
Quadro 4.242
Eleições de 1947, total de votos para vereadores.
Legenda votos n.º de
vereadores
UDNPR 3.142 11
PTB 3.067 7
PSP 2.584 5
PSD 1.854 4
PTN 2.067 4
A oposição, liderada pelo PTN, sentiu-se prejudicada com a
vitória dos vereadores comunistas. Para evitar a cerimônia de posse,
interpôs um recurso contra os candidatos do PSD, usando como prova o
material de propaganda de Décio Fernandes e Aparecido Araújo. Com a
cassação dos candidatos comunistas, o PTN teria direito a mais um
candidato na Câmara dos Vereadores.243
Depois de um longo processo eleitoral, a cassação dos
mandatos dos vereadores comunistas acabou não se confirmando. Os
comunistas agiram normalmente na Câmara Municipal de Ribeirão, tendo
sua atuação marcada pela defesa das questões sociais e do programa
exposto durante o período de propaganda eleitoral.
242 “A Tarde”, Ribeirão Preto, 14 de novembro de 1947.243 Ibidem, 17 de novembro de 1947.
146
O trabalho de propaganda, efetuado pelo Comitê Municipal
em cidades da região, mesmo enfrentando uma série de dificuldades
conseguiu eleger vereadores em oito cidades: Altinópolis, Brodowisk,
Franca, Guará, Igarapava, Miguelopólis, Morro Agudo e Pedregulho.244
Contudo, a continuidade no processo de articulação entre os
comunistas foi prejudicado pelo aumento da repressão policial, depois da
cassação do registro do PCB. Com a perseguição da polícia, os líderes do
Comitê Municipal aparentemente diminuíram a atividade partidária na
região, focalizando sua atenção nas candidaturas dos comunistas
ribeiropretanos.
Depois das eleições, a perseguição policial voltou a atingir
os membros do PCB. Décio Fernandes teve de permanecer alguns meses
escondido em decorrência do decreto de prisão preventiva, o que
provocou a cassação do seu mandato.245 Aparecido Araújo foi preso logo
depois das eleições, em 27 de dezembro de 1947, quando liderava uma
greve nas Indústrias Matarazzo. Antônio Girotto, um dos articuladores da
campanha eleitoral na região, e Arlindo Teixeira, militante e funcionário da
Alta Mogiana, foram presos no dia 27 abril de 1948, por estarem fazendo
“agitação política nos meios rurais”.
Todas essas prisões desfalcaram o Comitê Municipal. A
atuação comunista limitou-se à atuação moderada dos vereadores na
Câmara e à distribuição de panfletos e propaganda verbal contra o
imperialismo norte - americano e contra o governo Dutra.
Contudo, mesmo com as limitações de atuação, as idéias
comunistas atraíam gradativamente a população mais pobre, sofrida com 244 Comunicados da Delegacia Regional de Polícia de Ribeirão Preto para o DEOPS/SP, durante o mês de novembro. Prontuário n.º 548, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.
147
o alto custo de vida, e que via nas propostas comunistas as respostas
para os seus problemas. Tornava-se cada vez mais comum ouvir-se pelas
ruas de Ribeirão Preto: “os comunistas tinham razão.”246
Depois das eleições, o ponto alto da atuação comunista foi a
“Campanha do Petróleo e pela Paz”. Com essas palavras de ordem, o
Comitê Municipal conseguiu se refazer parcialmente, atraindo para a
campanha novos simpatizantes.
Em novembro de 1948, em plena “Campanha do Petróleo”,
ocorreu um “Congresso Regional Municipalista” do Partido de
Representação Popular. Embora os participantes tivessem uma política
claramente anticomunista os militantes locais inscreveram-se para
participar das sessões, apresentando teses em defesa da classe
trabalhadora e em prol da legalização do PCB, além de desfecharem
acusações contra os membros do PRP, chamando-os de “galinhas verdes
fascistas”.247
Como resultado, a polícia iniciou uma verdadeira caçada,
prendendo Natal Gracchia e José Antônio Neves, que distribuíam boletins
comunistas, e decretando a prisão preventiva de Salvador Trovato, José
Engrácia Garcia e Aparecido Araújo. Com essas prisões, o Comitê
Municipal do PCB desarticulou-se, voltando a ter expressão na política
local a partir de 1951, quando ocorreram novas eleições municipais.
245 Entrevista com Antônio Girotto, 1997.246 Prontuário n.º 548, caixa 11. Ofício da Delegacia Regional de Polícia de Ribeirão Preto para o DEOPS/SP.247 Depoimento de José Engrácia Garcia, 1995.
148
Anexos: A utilização das fontes orais
Uma avaliação da utilização das entrevistas.
A proposta deste trabalho é o estudo da atuação dos
comunistas em Ribeirão Preto, entre 1922 e 1947. Entre as fontes
utilizadas estão entrevistas com militantes do PCB. A fim de realizar a
tarefa de entrevistar esses comunistas, enfrentamos sérios problemas,
entre eles a inexistência de militantes vivos que tenham atuado nas
décadas de 20 e 30. Para tentar suprir essa lacuna, durante as
entrevistas procuramos conversar com os comunistas sobre as suas
149
lembranças em relação aos “velhos militantes”, com os quais conviveram
na década de 40. Contudo, pouco foi conseguido nesse sentido.
Inicialmente, foram entrevistados dez militantes. Porém,
desses dez, apenas cinco puderam contribuir efetivamente para a
composição deste trabalho no período considerado: Irineu de Moraes,
Arlindo Teixeira, Antônio Girotto, Luciano Lepera e José Engrácia Garcia.
Esses militantes eram os únicos que tinham atuado a partir da década de
40, ou tinham convivido com militantes mais antigos.
Dos cinco entrevistados, o único que militou na década de
30 foi o Sr. Irineu de Moraes, contudo, em outra cidade, Araraquara.
Arlindo Teixeira teve atuação pouco expressiva na década de 40,
passando a ter maior expressão a partir dos anos 50. Luciano Lepera era
um simpatizante do Partido na década de 40, e a sua profissão de
jornalista garantiu-lhe uma participação mais acentuada nesse período.
Restaram José Engrácia Garcia e Antônio Girotto: ambos iniciaram sua
militância na década de 40, tendo suas entrevistas possibilitado uma
colaboração mais efetiva para este trabalho.
Além das entrevistas realizadas por nós, utilizamos
entrevistas efetuadas pelo pesquisador Sebastião Geraldo, no final da
década de 80, quando se dedicava a um trabalho de comunicação oral
sobre os movimentos operários em Ribeirão Preto. Alguns desses relatos
são preciosos e únicos, pois os entrevistados já faleceram. É o caso de
Irineu de Moraes, com quem tivemos tempo de ter apenas uma conversa.
Outro caso é o de Natal Gracchia, que faleceu antes mesmo do início
desta pesquisa, mas deixou relatos preciosos, registrados em fitas
guardadas por Sebastião Geraldo.
150
De toda forma, tendo sido feitas por nós ou por Sebastião
Geraldo, as entrevistas colaboraram sobremaneira para a realização
desta dissertação na sua última fase, compreendida entre 1940 e 1948.
Durante o trabalho, procuramos fazer o cruzamento entre as fontes
escritas e as orais, não só do ponto de vista do conteúdo, mas,
principalmente, para cruzar a visão do militante _ representada na
entrevista _ com a visão da polícia _ representada pelos prontuários do
DEOPS/SP.
Num primeiro momento, estabelecemos um contato
superficial com os entrevistados, permitindo que as informações
brotassem de forma espontânea. Num segundo momento, especialmente
com Antonio Girotto, realizamos entrevistas mais programadas visando à
própria militância e para atuação do grupo. O resultado desse trabalho foi
o cruzamento das fontes orais e escritas, essencial para formar um
quadro de análise que pudesse abranger pontos de vista diferenciados
sobre a militância política. Tanto os prontuários do DEOPS/SP quanto as
entrevistas possibilitaram uma visão do cotidiano do militante. Entretanto,
essa visão foi obviamente diferenciada pelos interesses diversos da
polícia e dos membros do PCB.
O fator mais relevante do trabalho com as fontes orais foi a
confirmação do que Ecléa Bosi discute em seu livro Memória e
Sociedade, sobre como a memória individual é submetida a memória
coletiva. Este fenômeno fica ainda mais evidente no trabalho com a
memória política, evidenciada nesta pesquisa. A memória individual
aparece como um apêndice de tudo o que foi vivido pelo grupo político em
questão. Fatos marcantes são relembrados por todos como o sumário de
uma vida dedicada à militância no PCB. Assim, o trabalho de construção
151
deste discurso histórico passa pela recomposição dos discursos
individuais, mas também pela análise das fontes documentais.248
Na sociedade capitalista, a principal função do velho é
lembrar, ser detentor da tradição oral. A fala desses velhos pecebistas é
dinâmica e rica em detalhes, fruto de anos de lembranças remoídas nos
longos anos de vivência. Suas lembranças surgem como monumentos
que foram desgastados e modificados pela ação do meio social e pela
própria limitação da capacidade de memória, imposta pela idade.249 No
caso dos entrevistados neste trabalho, as lembranças sofrem ainda a
ação da sua própria formação política. A ação, consciente ou
inconsciente, aparece constantemente na tentativa de deixar intacta a
imagem do PCB. Algumas vezes, fluem sentimentos que denotam
decepção ou mágoa em relação aos anos de perseguição policial e
privação individual.
Durante as entrevistas realizadas com José Engrácia Garcia,
dentista e militante destacado nas décadas de 40 e 50, sua narrativa foi
permeada por momentos de dor, como quando relatou o período em que
esteve na prisão, em 1948, depois do “congresso das municipalidades” :
“... aí vieram por cima de mim, me
bateram demais /.../. Eles judiavam da
gente. Tinha uma cela, acho que com
50 pessoas dormindo, um dormia
encostado no outro, me botaram com
vigaristas. Estava um danado, ele
(carcereiro ) ia lá, umas quatro ou cinco
248 BÓSI, E. Memória e sociedade: lembrança de velhos, p. 19.249 Ibidem,p. 18
152
vezes e jogava água, quer dizer, a
gente não dormia. Aquela água
gelada... “250
As lembranças de José Engrácia Garcia foram marcadas
por um sentimento que representou a sensação de tempo perdido, de
trabalho não frutificado, de mágoa com os velhos companheiros.
Com graves problemas de saúde, a dor de Engrácia foi
acompanhada de perto pela esposa, que convenceu o marido a
abandonar a militância na década de 60. Para as famílias desse e dos
outros militantes a vida foi muito difícil, marcada pela insegurança e pelo
medo da repressão, refletidos na frase da Sra. Garcia: “para que serviu
lutar tanto pelo Partido, hoje ele está aí...”. O nó na garganta impediu que
a esposa de Engrácia terminasse a frase. Com a expressão de amargura
marcada no rosto, retirou-se da sala onde se realizava a entrevista.251
Além das lembranças permeadas pelo sofrimento, como no
caso de José Engrácia Garcia, outra condição marcou as entrevistas
realizadas com pessoas que foram politicamente ativas. “Na memória
política, os juízos de valor intervêm com mais insistência. O sujeito não se
contenta em narrar como testemunha histórica ‘neutra’. Ele quer também
julgar, marcando bem sua posição ou matizando-ª”252
Esse fato pode ser observado com clareza na entrevista
realizada com Luciano Lepera. Durante todo o seu discurso, ele deixou
bem evidentes sua posição e seu julgamento sobre o assunto discutido, a
250 Entrevista realizada com José Engrácia Garcia.251 ROSA, Lilian Rodrigues de Oliveira. “Comunistas em Ribeirão Preto: uma experiência com História Oral”. Estudos de História, Franca, vol. 3, n.º 1, pp. 79 - 91, 1996.252 BOSI, E., op. cit., p. 453.
153
“Campanha pelo petróleo e pela paz”. Não se contentando em apenas
narrar os fatos, comentou-os e fez críticas:
“/.../ No final da década de 40 duas
coisas ‘galvanizaram’ a opinião pública:
a luta pelo monopólio estatal do
petróleo e a luta pela paz, uma
tentativa de impedir o avanço da
bomba atômica. /.../ Aquele que se
manifestava pela paz era taxado de
comunista /.../, os que falavam ‘o
petróleo é nosso’, também eram
taxados de comunistas. Os outros, nós
taxávamos de entreguistas, porque
queriam entregar o petróleo às
multinacionais/.../. Então ficou muito
claro, eles se julgavam patriotas porque
faziam uma campanha anticomunista, e
nós nos julgávamos, e somos patriotas,
porque defendíamos a indústria
nacional. “253
Esse juízo de valor está presente em todas as entrevistas,
em maior ou menor grau de intensidade. A posição política dos
entrevistados torna-se clara em cada frase. Eles apresentam uma
necessidade constante de reafirmar sua posição. Um caso típico é o do
Sr. Arlindo Teixeira. Militante com ideais revolucionários, durante a
entrevista rapidamente o diálogo progredia para um monólogo, no qual 253 Entrevista realizada com Luciano Lepera, 1997.
154
expressava vigorosamente suas memórias relacionadas com a militância
no Partido Comunista, evidenciando sua posição revolucionária e
desfechando críticas violentas contra aqueles que eram contra a
revolução.254
Todos esses elementos das narrativas dos entrevistados
serviram para dar vida aos documentos escritos. Durante todo o trabalho,
procuramos mesclar naturalmente os dados obtidos nos prontuários e
artigos de jornais com as experiências individuais e coletivas dos
militantes entrevistados, numa tentativa de promover o que chamados de
“humanização do documento histórico”.255
254 Entrevista com Arlindo Teixeira, 1995.255 ROSA, L. R. O., op. cit., pp. 79 - 91.
155
Um resumo da entrevista com Antônio Girotto.
“Sou natural de Batatais - SP, nasci na fazenda Desengano,
em 26 de outubro de 1914. Resido em Ribeirão Preto desde fevereiro de
1953. Entretanto, atuei pelo Comitê Municipal de Ribeirão e Batatais
desde 1945, quando o Partido iniciou um breve período de legalidade.
Sou casado com Maria de Lourdes Correa Girotto e tenho quatro filhos:
Walter, Terezinha, José Carlos e Carmem. Sou filho de imigrantes
italianos, Antônio Girotto e Eliza Cazarotti Girotto, da cidade de Vicensa.
Cursei a Escola Primária Rural da Fazenda Macaúba, em Batatais.
Trabalhei na zona rural, como colono de café até os catorze anos. Fui
para a cidade de Batatais, onde trabalhei na construção civil até os 17
anos e na fábrica de chapéus, de janeiro de 32 a outubro de 1948. A partir
de 1949, trabalhei como artesão na fabricação e restauração de chapéus.
Nesse período, ficou difícil encontrar emprego, distribuía jornais do
Partido e recebia uma ajuda de custo do Comitê Municipal, tornando-me
militante em tempo integral. Para complementar meus rendimentos, a
partir de 1959 transformei-me em representante comercial da firma Têxtil
Tabacow S.A., de São Paulo, no ramo de tapetes, onde permaneci até 31
de janeiro de 1981. Desde 1976 que encontro-me aposentado e essa é a
causa pela qual luto atualmente.
Desde criança ouvia falar da Revolução Russa e do PCB. Na
adolescência, passei a admirar a Coluna Prestes e o seu líder. No início
da década de 30, quando trabalhava na fábrica de chapéus, recebi as
primeiras orientações comunistas, quando encontrava-me revoltado com
meu patrão e com as condições de trabalho e perguntava-me: “o que
fazer?” Essas orientações vieram por parte de um companheiro de
trabalho, que fazia parte do núcleo comunista de Batatais, do qual faziam
parte Acácio Cristal e Guilherme Fleiman.
156
Em 1932 tornei-me militante na célula do Partido, em meu
local de trabalho. A partir de 1935, com a grande repressão da polícia,
fiquei afastado das atividades do partido, voltando a atuar em 1945, ligado
ao Comitê Municipal de Ribeirão Preto.
Durante a minha vida de militância cheguei a entrar em
contato várias vezes com a liderança do Partido Comunista do Brasil,
chegando a passar três meses estudando o marxismo - leninismo no Rio
de Janeiro, em 1954.
Fui preso três vezes em decorrência das minhas tendências
políticas: em 1948, durante minha participação no Congresso das
Municipalidades; em 1951, durante a campanha contra a ida de soldados
brasileiros para a guerra; e em 1954, preso por 23 dias como resultado da
minha atuação no sindicato rural de Franca.
Durante o período na prisão sofri as privações da cadeia e
os maus tratos da polícia, mas a “pressão psicológica” foi a que deixou
traumas mais profundos; eu tive o pior tratamento possível, mas o que eu
acho pior são as ofensas morais.
No final da década de 40, atuei nas Campanhas do Petróleo
e pela Paz em Ribeirão Preto e região e nas eleições de 1947, quando
organizei vários comícios pela região em prol da candidatura dos
comunistas.
Sou sócio-fundador da Associação dos Aposentados e
Pensionistas de Ribeirão Preto; tornei-me membro do conselho
deliberativo dessa entidade desde 1981. Fui secretário da diretoria
executiva de 84 a 86, elegendo-me presidente dessa entidade em 86,
157
sendo reeleito em 88. Neste ano deixei a presidência, mas continuei até
hoje trabalhando pela categoria, agora na Federação dos Aposentados e
Pensionistas do Estado de São Paulo. Recebi o título de cidadão
ribeiropretano na Câmara Municipal da cidade.”
158
5. Conclusões.
Os comunistas muito cedo se organizaram na região de
Ribeirão Preto, atuando na União Geral dos Trabalhadores dessa cidade.
Nesse sentido, contribuíram para a estruturação da classe operária
brasileira, criando lideranças de importância, como no caso de Irineu de
Morais, Theotônio de Souza Lima e Guilherme Milani.
De 1922, ano da fundação do PCB, a 1947, data em que o
Partido recaiu na ilegalidade, Ribeirão Preto viu aumentar a influência
comunista junto ao proletariado e mesmo entre os camponeses.
A escolha de um estudo regional demonstra a necessidade
de se analisar o PCB não apenas nos âmbitos nacional e internacional,
mas também nas feições que anuncia nas diferentes cidades em que
conseguiu se estabelecer, nos primórdios de sua história.
A trajetória dos comunistas em Ribeirão Preto passa pela
própria história da organização operária na região. Antes do
estabelecimento do primeiro núcleo comunista na cidade, o movimento
operário era dominado pelos anarquistas e apresentava-se desarticulado.
A forte dependência econômica dos trabalhadores rurais e das atividades
urbanas em relação à produção cafeeira fortalecia o poder dos
fazendeiros que, donos da política local e regional, desestruturavam
qualquer tentativa de organização dos trabalhadores, temendo que os
seus interesses fossem prejudicados.
159
Essa situação começou a modificar-se com a fundação da
União Geral dos Trabalhadores, por comunistas, em 1925. Mesmo com
um reduzido número de militantes e as dificuldades impostas pela atuação
na ilegalidade, a organização do PCB na região evoluiu de um pequeno
grupo de simpatizantes, entre 1922 e 1925, para um núcleo comunista
bem estruturado no final dos anos vinte, marcando o auge da importância
da região de Ribeirão Preto para o movimento operário estadual. Os
comunistas atuantes na UGT e na Liga Operária Orestes Lascala, em
Sertãozinho, segundo Otávio Brandão, representaram praticamente os
únicos militantes que conquistaram resultados concretos no meio político
sindical no Estado de São Paulo durante a década de vinte.256
Entre 1928 e 1930, a atuação dos comunistas em Ribeirão e
Sertãozinho tornou-se de importância nacional para o partido. Os líderes
locais chegaram a organizar grandes manifestações de colonos,
conquistando muitos membros entre os camponeses, estudantes e
trabalhadores urbanos, o que acabou despertando o interesse da polícia
que, em 1930, desmantelou a liderança comunista local.
Depois de um período de reestruturação, enfrentando o
aumento da influência dos socialistas entre os operários, que eram
apoiados pela polícia entre 1931 e 1933, os comunistas sofreram um novo
golpe, as perseguições resultantes do movimento de 1935.
Embora os militantes locais não tenham participado
ativamente desse movimento por problemas de comunicação com o
Comitê Regional, a reação foi dura com os membros da Aliança e com os
militantes do PCB. Os poucos comunistas que escaparam da prisão
perderam o controle hegemônico sobre a União Geral dos Trabalhadores,
256 BRANDÃO, Otávio. Otávio Brandão (depoimento, 1977). Rio de Janeiro,
FGV/CPDOC - História Oral, 1993.
160
que passou a ser controlada pelos chamados “ministerialistas”,
sindicalistas que atuavam de acordo com as regras do Ministério do
Trabalho. A atuação de um reduzido número de militantes, entre 1935 e
1940, resumiu-se na distribuição de boletins de propaganda comunista e
reuniões esporádicas que não surtiram nenhum efeito concreto.
Depois de terem perdido boa parte da sua influência no
campo sindical, os comunistas iniciaram um processo de reorganização
no início da década de 40. Em 1941, conquistaram novamente o poder
dentro da União Geral dos Trabalhadores, provocando nova reação da
polícia, que prendeu, entre outros, Vitaliano Mauro, presidente da UGT.
Em decorrência da ação policial e da própria desarticulação existente
entre os membros do Partido, a reestruturação do comitê municipal foi
lenta, consolidando-se somente em 1945, com a legalidade do PCB.
Com liberdade de atuação, os comunistas lideraram, em
Ribeirão Preto, greves e movimentos de repúdio à grave situação
financeira da população, conquistando, dessa maneira, grande influência
entre a classe trabalhadora. O número de membros do comitê regional
cresceu de uma dúzia de militantes para mais de duzentos, entre 1945 e
1946.257
O resultado direto do aumento da influência do PCB em
Ribeirão foi o resultado das eleições de 1947. Mesmo tendo seu registro
cassado, o Partido lançou dez candidatis pela legenda do PSD ( Partido
Social Democrático ). Entre eles, foram eleitos três vereadores, Aparecido
Araújo, Décio Fernandes e Henrique Barbosa Crósio, e os suplentes: José
Engrácia Garcia, Antônio Pontim e Salvador Trovatto.
257 Relação de militantes e simpatizantes do PCB em Ribeirão Preto. Prontuário de Antônio Girotto, Arquivo do DEOPS/SP. Arquivo do Estado.
161
No fim dos anos quarenta, uma nova onda de prisões
provocou o arrefecimento das atividades comunistas na cidade, tanto no
campo sindical como no político. Surgiram novos militantes e a antiga
geração de comunistas, muitos deles fundadores do partido em Ribeirão _
ou afastou da militância ou passou a ter pouca influência dentro do
Comitê Municipal e da União Geral dos Trabalhadores.
Além da importância dos comunistas na organização do
movimento operário no interior do Estado, outro fator merece a
formulação de algumas considerações conclusivas: o bloco coeso
formado pelo grupo comunista atuante na cidade. Não é intenção deste
trabalho afirmar que não houve divergências de caráter ideológico dentro
do núcleo comunista ribeiropretano, pelo contrário. Mas analisando as
duas gerações de comunistas, chegamos à conclusão de que não ocorreu
nenhuma divergência grave, que pudesse promover dissidências ou a
formação de núcleos rivais.
Durante todo o período compreendido por este trabalho, a
maior parte do grupo que formava o núcleo comunista local seguia a
tendência ideológica do Comitê Central do partido. Os pequenos
desentendimentos eram resolvidos com o afastamento do militante
descontente. Um exemplo de como o Comitê Municipal resolvia seus
problemas internos foi o caso do vereador comunista Décio Fernandes,
eleito em 1947 pelo PSD.
Logo depois de ser eleito, Décio Fernandes teria recebido
dos seus “camaradas” a informação de que teria sido declarada sua
162
prisão preventiva, fato que seria confirmado mais tarde. Como precaução,
ele se refugiou fora da cidade. Seus companheiros deveriam avisá-lo do
momento certo para retornar ao seu cargo de vereador, porém o aviso
não chegou. Como conseqüência do seu afastamento por sete meses das
sessões da Câmara de Vereadores, Décio teve seu mandato cassado.
Em entrevista dada ao Diário da Manhã, em 24 de dezembro de 1948,
declarou que, ao retornar a Ribeirão Preto, desconfiou que o pedido de
prisão preventiva não existia. Esse acontecimento fez com que ele
acreditasse que havia caído no desagrado dos companheiros de partido,
que teriam forçado sua ausência da cidade propositalmente. A
conseqüência desse acontecimento foi a saída de Décio Fernandes do
PCB e do cenário político. Numa entrevista realizada no dia 3 de agosto
de 1996 com Antônio Girotto, este evitou falar no assunto, dizendo que
isso ainda causava muita mágoa entre os companheiros, e disse que tudo
não passara de um mal-entendido. Décio teria se refugiado no Paraná, na
casa de um membro do Partido. A distância teria acabado por dificultar o
contato com os camaradas de Ribeirão, que não puderam avisá-lo sobre
a perda do mandato.
Fatos como esse demonstram que as divergências entre os
membros do Partido existiam, especialmente após meados dos anos
quarenta, quando o número de militantes cresceu muito. Os velhos
militantes acusavam a nova geração de oportunismo e de não quererem
mais estudar a teoria marxista-leninista, o que desagradava aos
comunistas fundadores do Partido em Ribeirão.
Contudo, os pequenos atritos que ocorreram entre os
comunistas, de 1922 a 1947, não chegaram a provocar “rachas” no núcleo
local que, predominante e independentemente das divergências dentro do
PCB ocorridas no âmbito nacional, atuou de forma coesa e com relativa
uniformidade ideológica.
163
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Entrevistas.
Albino Tremeschini.258
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Benônio Pitta, 1996.
Carlos Di Gaetani, 1996.
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Hélio Borges, 1996.
Irineu Luiz de Moraes, 1996.
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José Engrácia Garcia, 1996.
258 Entrevistado por Sebastião Geraldo.