Ribeirão Preto...7 Quanto à escolha de Ribeirão Preto, deveu-se ao fato de se buscar nessa cidade...

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INTRODUÇÃO.

Este trabalho trata da atuação dos comunistas e de sua

ligação com a União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, entre

1922 e 1947. O papel do movimento comunista na organização da classe

operária e na evolução político-social do Brasil, e a importância

econômica da região ribeiropretana no contexto nacional foram fatores

que contribuíram decisivamente para a escolha deste tema.

No período compreendido por esta pesquisa, o país passou

por modificações nas esferas mais altas da estrutura do poder. No final da

década de 20, o poder oligárquico _ estabelecido até então por intermédio

da “política café-com-leite” _ foi abalado pela crise de 1929 e pela

Revolução de 30, que levaram ao poder Getúlio Vargas. Os anos 30

foram marcados pelo aumento da tensão social e da repressão policial.

Enquanto o governo Vargas incentivava a industrialização do Brasil,

reprimia ao mesmo tempo, com violência, as formas autônomas de

organização operária, procurando manter sob seu controle os sindicatos

dos trabalhadores.

Na década de 30, em especial, o governo sustou

veementemente a ação de quaisquer movimentos, instituições ou pessoas

consideradas subversivas e perigosas para a manutenção da ordem

política e social. O Partido Comunista do Brasil, desde a sua fundação, foi

uma das agremiações partidárias que mais sofreram com essa repressão

policial. Criado sob a influência ideológica do movimento anarquista e da

Revolução Russa de 1917, o PCB tencionava transformar-se na força

6

unificadora e catalisadora das insatisfações e reivindicações operárias,

implantando no Brasil os ideais revolucionários bolcheviques. Essas

pretensões fizeram do PCB, desde cedo _ apesar do pequeno número de

seus membros _, uma ameaça ao poder estabelecido, o qual tentava, de

todas as maneiras, coibir sua ação.

O trabalho de pesquisa sobre a história do Partido

Comunista do Brasil no período compreendido entre 1922 e 1947 é

bastante complexo, haja vista as grandes modificações políticas ocorridas

nessa época.

Ao escolher o ano de 1922 como ponto de partida desta

dissertação, consideramos a fundação do PCB, embora as duas décadas

anteriores tivessem sido palco de profundas modificações sociais,

econômicas e políticas, causadas pela industrialização do país. O grande

aumento do número de operários provocou tensões sociais, com uma

conseqüente atuação do PCB nesse processo. A análise destes

acontecimentos fez-nos determinar quais os passos a seguir para

elaborar este trabalho, cuja baliza final justifica-se por vários motivos.

Em 1947, encerrou-se o curto período de legalidade do PCB

e os comunistas passaram de novo a enfrentar a repressão policial,

diminuindo sensivelmente a atividade dos militantes. Ainda nesse

momento, Ribeirão Preto assistiu à primeira eleição municipal com

participação de candidatos comunistas. Por último, a partir da divulgação

do manifesto de Luís Carlos Prestes, em 1.º de agosto de 1950, o PCB

assumiu uma outra linha de procedimento, enquanto em Ribeirão surgia

uma nova geração de militantes, marcando o fim de três décadas de

atuação do grupo fundador do PCB na cidade.

7

Quanto à escolha de Ribeirão Preto, deveu-se ao fato de se

buscar nessa cidade explicações sobre a importância das bases do

movimento sindical nacional e da organização interna do Partido

Comunista. A maior parte das obras historiográficas dá atenção especial à

atuação dos comunistas nas capitais, citando superficialmente a atividade

do PCB nas cidades do interior. Por isso, buscamos realizar nossa

pesquisa no interior do Estado de São Paulo, particularmente em Ribeirão

Preto, que desde o final do século passado caracterizou-se por ser uma

das regiões mais importantes do país, tanto política como

economicamente. Ademais, enquanto em São Paulo, durante a década de

20 e início dos anos 30, o Partido Comunista não conseguiu se firmar,

Ribeirão contou precocemente com importantes lideranças do PCB, como

Edmundo Moniz, Theotônio de Souza Lima, Henrique Couvre e Sebastião

Pintaúde, que fizeram parte da oposição de esquerda dentro do Partido e

exerceram grande influência sobre o movimento operário, organizando um

forte núcleo comunista na região.

Notória pelas grandes safras de café, especialmente na

década de 20, Ribeirão ficou conhecida como a “capital do café”. Os

“coronéis” controlavam a política regional e tinham influência no governo

estadual, e até mesmo no governo federal. Sua influência na cidade

também era visível no lento desenvolvimento sindical dos trabalhadores,

particularmente até meados da década de 20. A organização operária na

cidade cresceu tendo de enfrentar a resistência dos poderosos

cafeicultores que, temerosos com a possibilidade de perder seu controle

sobre os trabalhadores e a mão-de-obra barata, usavam seu poder

político e econômico para conter o avanço organizado dos operários. Nos

primeiros anos deste século, a cidade viu crescer embrionariamente o

movimento sindical, marcado por greves e movimentos liderados pelos

anarquistas. Entretanto, esse avanço só tomaria um impulso considerável

sob a influência comunista, a partir de 1922.

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O primeiro núcleo comunista surgiu na cidade por volta de

1922 e 1923. Todavia, só iniciaria sua atuação de maneira organizada

após a fundação da UGT - União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão

Preto. Criada em 1925 por ex-anarquistas, essa instituição serviu, durante

três décadas, como fomentadora e descobridora de novos militantes

comunistas, que atuaram decisivamente na organização sindical dos

trabalhadores na primeira metade do século XX. Os comunistas

ribeiropretanos estiveram ligados à UGT desde a sua fundação até

meados da década de 60, usando essa organização como fachada legal

para a sua militância política e sindical. Por conseguinte, o entendimento

da influência comunista nos movimentos operários e na sindicalização dos

trabalhadores em Ribeirão Preto apresenta-se como uma questão

essencial no estudo da formação da classe operária e da própria

sociedade ribeiropretana como um todo. A tática comunista de utilizar os

sindicatos para expandir os seus ideais entre os trabalhadores

caracterizou-se em Ribeirão pela já citada ligação entre os membros do

PCB e da UGT.

A impossibilidade de atuação legal vivida pelo Partido em

quase toda a sua história, associada à intensa repressão policial e ao

desconhecimento por parte dos trabalhadores das idéias bolcheviques,

dificultavam a organização de células nas indústrias e bairros na década

de 20. Portanto, os comunistas buscaram aumentar sua credibilidade

junto à população ribeiropretana por intermédio de uma instituição que

aparentemente não tinha fins políticos. Atuando dentro da UGT, os

comunistas puderam aumentar seu contato com os trabalhadores sem

despertar, inicialmente, a atenção da polícia.

Métodos como esse foram utilizados pelo PCB não só em

Ribeirão, mas também em âmbito nacional. O Partido Comunista

9

tencionava transformar-se no “primeiro e único partido operário do Brasil _

a vanguarda do proletariado”.1 Em Ribeirão, os militantes refletiam essa

intenção do Comitê Central Executivo tentando conquistar a hegemonia

do movimento operário por intermédio da UGT, ambicionando

“transformar os militantes sindicais em líderes políticos”.2 Essa relação

entre o movimento sindical e os comunistas apresentava bem complexa:

fatores diversos devem ser levados em conta para analisar a atuação dos

militantes e sua influência na organização do operariado. Esses fatores,

especialmente os de cunho ideológico, representam barreiras que serão

avaliadas nesta introdução.

As maiores barreiras enfrentadas pelo pesquisador da

História do Comunismo relacionam-se com questões práticas e

ideológicas do próprio desenvolvimento do Partido no Brasil e no mundo.

No que diz respeito às questões práticas da história do PCB, o principal

problema é o longo período em que o Partido atuou na ilegalidade. Tal

situação fez com que as fontes existentes, salvo algumas exceções, ou

fossem destruídas ou caíssem nas mãos da polícia. Portanto, a análise

dos documentos produzidos pelo Partido acaba tendo de sofrer a

intermediação da interpretação policial.

Logo, a opção por trabalhar com o corpo documental dos

arquivos do DEOPS-SP permitiu a análise do discurso da “repressão”,

enquanto as entrevistas realizadas com comunistas que atuaram nas

décadas de 40 e 50 trouxeram à tona o discurso do militante. Além destas

duas fontes principais, foi realizado um levantamento de artigos em

1 DULLES, J. W. F., Anarquistas e comunistas no Brasil, p. 244.2 BRANDÃO, O. Otávio Brandão (depoimento, 1977). Rio de Janeiro, FGV/CPDOC -

História Oral, 1993, p. 34.

10

jornais da cidade,3 entre 1905 e 1956, com a intenção de avaliar as

publicações da imprensa sobre o comunismo.

O DEOPS - SP4 foi criado em 1924, e teve seus arquivos

abertos ao público em dezembro de 1994. Seu acervo contém

documentos produzidos na tarefa de policiamento de setores

considerados perigosos pela ordem vigente. A inegável importância

desses documentos para o estudo da história brasileira deste século, está

ligada ao caráter político-social da documentação, possibilitando a

avaliação e a reavaliação de temas, como a ordem político-social, a

repressão policial, etc.

A documentação existente no arquivo do DEOPS-SP está

dividida em quatro séries,5 obedecendo às características dos

documentos dentro do acervo do arquivo. Cada série é formada por um

conjunto de pastas e por um fichário correspondente. São elas:

prontuários, dossiês, ordem política e ordem social.6 Os prontuários

possuem documentos mais antigos do que o próprio DEOPS, produzidos

pelo Gabinete de Investigações a partir de 1917, que foram juntados aos

prontuários do DEOPS quando este foi criado.

O trabalho de pesquisa realizado nesse acervo fixou-se nos

prontuários, pastas individuais que podem caracterizar a ação político- 3 O primeiro jornal pesquisado foi o Diário de Notícias, onde foram levantados artigos relacionados com a política ribeiropretana, dando especial atenção à atuação dos comunistas e à posição da igreja católica em relação ao comunismo. O jornal foi fundado em 1932, deixando de circular entre 1940 e 1945, quando voltou a ser publicado como propriedade da igreja católica. Outro jornal pesquisado foi o Diário da Manhã, fundado no final do século XIX e que circulou até 1991, quando faliu. Hoje, o acervo desse jornal encontra-se sob a guarda do Arquivo Municipal de Ribeirão Preto. Pesquisamos artigos escritos entre 1905 e 1950, procurando acompanhar a ação dos comunistas na cidade de Ribeirão Preto.4 Optamos por utilizar a sigla com a qual encerrou suas atividades em 1983.5 PIMENTA, J. P. G. Os arquivos do DEOPS - SP: Nota Preliminar, Revista de História,

São Paulo, n.º. 132, pp. 149 - 154, 1º. Semestre de 1995.

11

social de uma pessoa, uma instituição, um evento ou até mesmo ( em

casos mais raros ) um tema. Os prontuários contêm, de 1924 a 1964, a

maior porcentagem da documentação produzida em relação às outras

séries, que assumem um papel secundário em importância e quantidade

de documentos. Dessa maneira, foi escolhida essa série documental para

a realização deste trabalho de pesquisa.7

Realizamos o levantamento de 93 prontuários, inclusive o do

PCB (n.º 2.431, 16 volumes.) e o da União Geral dos Trabalhadores (n.º

23.250, 2 volumes), o que nos permitiu a observação da atuação política e

social dos principais membros do Partido Comunista do Brasil em

Ribeirão Preto, entre as décadas de 20 e 50. O primeiro prontuário

encontrado que trata da atuação de comunistas em Ribeirão data de

1929.8

Com a leitura desses documentos foi possível perceber o

outro lado da luta partidária, marcada pela repressão, e desvendar os

meandros da “reação” e os métodos de investigação policial.9 Além disso,

essa documentação forneceu dados que foram perdidos durante os

longos anos de ilegalidade que o Partido Comunista viveu. Foram

encontrados nos arquivos do DEOPS - SP, detalhes da atuação dos

comunistas, como registros de datas, e relatórios de acontecimentos de

grande importância política. Entretanto, existem alguns fatores que devem

6 Essa divisão ainda não esta bem definida pelos funcionários do arquivo do DEOPS -SP, que estão realizando a organização e catalogação dos documentos.7 PIMENTA, J. P. G., op. cit. pp. 149 - 154.8 Idem.9 Para compreender melhor a ação da polícia política no período compreendido pela pesquisa é preciso observar o conceito de segurança nacional, que se modificou desde o período da Proclamação da Independência até hoje. Tanto a ação policial, quanto o conceito de subversão formulado pelos órgãos de repressão modificaram-se de acordo com mudanças sócio-políticas vividas pela sociedade brasileira. Cabia à polícia criar o perfil do cidadão exemplar e o do criminoso que colocava em risco a ordem política e social por intermédio da ação subversiva.

12

ser levados em conta quando se trabalha com documentos produzidos

pela polícia política.

O primeiro deles é a caracterização dos prontuariados, pois

muitas das pessoas fichadas como comunistas pelo DEOPS eram na

verdade socialistas, sindicalistas, simples simpatizantes, pessoas que

cometeram abusos contra a economia popular e outras. Essa variedade

de prontuariados deve-se, em parte, à mudança no conceito de crime

político e social que acompanhou a própria mudança da sociedade

brasileira,10 e à enorme gama de atitudes políticas e sociais consideradas

pela polícia como subversivas.

O segundo fator a ser considerado é a interpretação própria

dada aos acontecimentos pelos órgãos oficiais, fato que deve ser

observado com atenção pelo pesquisador a fim de não reproduzir apenas

o discurso policial. Para não cair nesse radicalismo, utilizamos o recurso

das fontes orais, entrevistando comunistas que militaram e atuaram

ativamente na política ribeiropretana.

Obviamente, as entrevistas realizadas com militantes do

PCB que atuaram nas décadas de 40 e 50 também estão carregadas de

parcialidade, o que é próprio do discurso político. Não é o objetivo deste

trabalho eliminar as posições políticas de cada grupo, e sim analisar o

contexto em que esse posicionamento foi formado.

No caso das fontes orais, escutar as lembranças dos velhos

comunistas significa muito mais do que recompor parte da História Política

do Brasil; representa a oportunidade de avaliar os acontecimentos pelo

prisma de alguém que atuou não apenas como observador, mas como

10 PIMENTA, J. P. G. Os arquivos do DEOPS - SP: Nota preliminar. Revista de

História, p. 149 - 154.

13

sujeito nos movimentos políticos nacionais, abrindo oportunidades

diversas de análise, impossíveis de serem apreendidas somente nos

documentos escritos.

Procurando uma aproximação com esses militantes,

buscamos estabelecer uma relação de confiança com os entrevistados,

mantendo conversas informais que permitissem que as informações

brotassem de forma espontânea. Num segundo momento, realizamos

entrevistas mais programadas, visando ao cotidiano da militância

comunista, procurando estabelecer relações entre a atuação individual e o

trabalho coletivo do Partido. Não nos preocupamos com os lapsos de

memória, quanto a datas ou a acontecimentos esquecidos. Nosso

interesse estava nas lembranças que foram eleitas espontaneamente pelo

entrevistado, mesmo quando direcionávamos o tema da entrevista.11

Assim, o contato que foi estabelecido com esses comunistas permitiu a

formação de uma idéia do universo simbólico desse grupo político de

oposição.

A pesquisa iniciou-se com o contato com pessoas que

fizeram parte do movimento comunista no seu período de apogeu político

em Ribeirão Preto, na década de 40. Entre os entrevistados estão: o

Senhor Irineu de Morais, um dos fundadores do Comitê Municipal do PCB

em Ribeirão Preto; Antônio Girotto, militante do partido após 1945; José

Engrácia Garcia, um dos três primeiros vereadores eleitos pelo PCB da

cidade; Arlindo Teixeira, que foi militante em tempo integral por doze

anos; Hélio Borges, membro do Partido Socialista e antigo presidente da

UGT, que esteve ligado aos comunistas; e Luciano Lepera, jornalista e

militante. Os entrevistados foram militantes de destaque no período do

governo Vargas, e tiveram participação decisiva na organização de ligas

11 BOSI, E., Memória e sociedade: Lembranças de velhos, p. 37.

14

camponesas, sindicatos, greves, movimentos proletários em geral, enfim,

na organização dos trabalhadores da região de Ribeirão Preto.

A análise do discurso desses comunistas permitiu que se

chegasse a uma visão parcial do cotidiano de luta política desses

militantes e do universo de representações desenvolvido no decorrer de

suas vidas. A fala dos velhos pecebistas é dinâmica e rica em detalhes,

fruto de anos de lembranças remoídas no longo período de vivência

política. A função social mais marcante do velho é lembrar; guardiã da

memória da sua época, suas lembranças surgem como monumentos que

foram desgastados e modificados pela ação do meio social.12

Ecléa Bosi, em Memória e Sociedade, expressa como a

memória coletiva é permeada pelo universo simbólico, sobrepondo-se em

alguns casos à própria memória individual. Quando se trabalha com a

memória política, esse fenômeno é mais evidente. A memória individual

apareceu como um apêndice de tudo o que foi vivido pelo grupo político

em questão. Fatos marcantes foram relembrados por todos como o

sumário de uma vida dedicada à militância comunista. Ao militante,

particularmente antes da década de 40, não cabia contestar as diretrizes

do PCB. A devoção ao Partido e ao movimento comunista era total,

“Moscou sempre estava com a razão”. A influência bolchevique sobre os

comunistas brasileiros trazia consigo a idéia de que todos eram membros

de um “exército internacional” que marchava pela mesma causa: a

revolução mundial.13

Neste trabalho, a apresentação das questões ideológicas e

de suas fontes, tanto orais como escritas, foi cuidadosamente

programada. A leitura e a interpretação de artigos de jornais, de

12 Ibidem, pp. 81 - 91.13 HOBSBAWM, E. J. Revolucionários, pp. 15 - 22.

15

documentos contidos nos prontuários do DEOPS-SP e de entrevistas

constituiu-se num trabalho lento, exigindo que se estabelecessem

relações entre fatos e tipos de documentação encontrados. O trabalho de

interpretar e relacionar - que Foucault chamou de transformar o

“documento em monumento” - nos permitiu chegar ao conhecimento da

sua dinâmica interna, tornou-nos capazes de narrá-lo, descrevê-lo,

entendê-lo “por dentro”.14

Todo esse trabalho com as fontes revelou-se complexo e de

suma importância para a compreensão da atuação dos comunistas

ribeiropretanos dentro dos contextos históricos local e nacional. O

resultado foi o cruzamento das fontes orais e escritas, essencial para a

formação de um quadro de análise que pudesse abranger pontos de vista

diferenciados sobre a militância política.15

Outro fator complexo enfrentado pelos historiadores do

Partido Comunista é a análise da influência stalinista, predominante no

PCB até a década de 50. Essa influência chegava ao Brasil por intermédio

dos representantes da Internacional Comunista, ou de militantes que iam

à Rússia em busca de orientação política. A ascendência dos ideais

stalinistas sobre os comunistas brasileiros mantinha os militantes coesos

em torno do ideal de realização da revolução socialista. A vontade

individual do militante estava subordinada às orientações do Partido, que

por sua vez seguia as determinações do Komintern.16 Essa austeridade

presente na organização dos PCs evitava, de certa forma, cisões

partidárias estruturais.

14 FOUCAULT, Michel. Arqueologia do Saber, Passim. 15 Tanto os prontuários quanto as entrevistas possibilitam uma visão do cotidiano de militância política. Entretanto, esta visão é obviamente diferenciada pelos interesses também diferenciados da polícia e dos militantes do PCB.16 HOBSBAWM, E. J. Revolucionários, pp. 15 - 22.

16

A observação da influência bolchevique e stalinista sobre o

PCB é imprescindível para a realização de qualquer trabalho sobre a sua

história. A compreensão da organização partidária interna e de sua ação

política está intrinsecamente ligada à devoção dos seus adeptos ao

Partido e à Internacional Comunista, atestada pela aceitação da disciplina

rígida imposta aos militantes, sob a influência do stalinismo.

Todos esses fatores devem ser considerados na realização

de estudos sobre o PCB, tamanha a sua importância. No caso de Ribeirão

Preto, a atuação dos comunistas vai além do que se propõe nos limites

cronológicos deste trabalho. Entretanto, as questões complexas que

envolvem o tema e as fontes, já expostas nesta introdução, impossibilitam

a realização de um trabalho que abranja todo o tempo de atuação do

Partido Comunista na cidade, que se estende até os dias atuais. Contudo,

esta pesquisa pretende contribuir tanto para a história do PCB quanto

para a de Ribeirão Preto, já que o levantamento histórico da evolução dos

movimentos de esquerda no interior abre as portas para a compreensão

das bases do movimento operário no Brasil.

Alguns pesquisadores já realizaram importantes trabalhos

sobre a política e os movimentos operários em Ribeirão. É o caso de

Thomas W. Walker,17 que interpretou o desenvolvimento do coronelismo e

do populismo naquela cidade. Sua obra é de grande valor para a

compreensão das políticas ribeiropretana e nacional; todavia, ela não trata

do desenvolvimento e da importância dos partidos políticos de oposição,

como o PCB, na política local. O trabalho dá especial atenção ao PRP _

Partido Republicano Paulista _ dominado nas primeiras décadas do

século XX pelos cafeicultores. Esse trabalho é de fundamental

17 WALKER, Thomas W. From Coronelismo to Populismo: the evolution of politics in

a Brazilian Municipality, 1974.

17

importância para a contextualização histórica da política ribeiropretana

durante o período de domínio dos cafeicultores.

Outra obra interessante sobre a memória proletária em

Ribeirão foi desenvolvida por Sebastião Geraldo.18 Em seu trabalho, o

autor preocupou-se fundamentalmente em realizar um levantamento dos

movimentos grevistas na cidade, especialmente aqueles acontecidos no

campo. Os dados levantados pelo autor foram os primeiros a revelar a

relação, quase constante, entre a organização do operariado

ribeiropretano e o PCB. Contudo, sua experiência de pesquisa voltou-se

para a comunicação oral, não privilegiando a análise dos fatos que

determinaram a relação intrínseca entre os comunistas e a organização

operária na cidade.19

Fica claro que não é tarefa fácil realizar um levantamento

histórico sobre o Partido Comunista,20 especialmente no Brasil. As

lacunas apresentadas pelo corpo documental e a restrita produção

historiográfica sobre o PCB são alguns dos fatores que complicam o

trabalho do pesquisador interessado nesse assunto. Entretanto, são

encontradas obras de boa qualidade, como os trabalhos de Edgard

Carone,21 que analisam a importância do PCB na organização do

movimento operário brasileiro.

Edgard Carone, em seu livro Classes sociais e movimento

operário, afirma que a criação do Partido Comunista Brasileiro foi o

18 GERALDO, Sebastião. Comunicação oral: o resgate da memória proletária em

Ribeirão Preto. Dissertação apresentada na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, para obtenção do título de mestre em Ciências da Comunicação, São Paulo, 1990.

19 É importante esclarecer que o objetivo do autor era produzir um trabalho de comunicação oral, no qual buscava recuperar a memória do movimento proletário de Ribeirão Preto, mas sem pretensões de analisar os dados historiograficamente.20 HOBSBAUM, E. J. Revolucionários, p. 15 - 22.21 As obras de Edgard Carone estão relacionadas no final do trabalho.

18

resultado da conjunção de esforços entre movimentos operários de todo

país, dos quais uma parcela teria evoluído dos ideais anarquistas para

uma “corrente favorável a aplicar, entre nós, os métodos revolucionários

bolcheviques”.22

A maioria dos historiadores que estudam o comunismo

concorda que a organização do Partido Comunista no Brasil tem suas

raízes no movimento anarquista. Entre eles, encontram-se os norte -

americanos John Foster Dulles e Ronald H. Chilcote. Estes brasilianistas

fizeram um levantamento primoroso de dados em suas obras sobre a

política brasileira, especialmente John F. Dulles, em seus dois livros:

Anarquistas e Comunistas no Brasil e O comunismo no Brasil, essenciais

para qualquer pesquisador que pretenda iniciar um trabalho sobre o PCB.

Estas obras trazem informações imprescindíveis para compor a trajetória

dos comunistas no Brasil, caracterizando-se como verdadeiros manuais

sobre o assunto. Entretanto, este importante levantamento de

informações e fatos não é acompanhado de uma apreciação crítica,

necessária para a compreensão do processo histórico de formação do

Partido.

Outros historiadores têm dado consideráveis contribuições à

história da organização operária e do comunismo no Brasil. Entre eles,

Michel Zaidán, João Quartim de Moraes e Paulo Sérgio Pinheiro. Os

valiosos trabalhos de pesquisa produzidos por estes autores contribuíram

muito para a composição do quadro teórico desta pesquisa, possibilitando

a compreensão da evolução política do PCB e de sua atuação no âmbito

nacional. Permitiram-nos também efetuar um cruzamento das

informações e análises por eles apresentadas com as coletadas nesta

pesquisa, relativamente à atuação política dos comunistas em Ribeirão

Preto. 22 CARONE, Edgard. Classes Sociais e Movimento Operário, pp. 90.

19

O interesse pelo estudo do “político” vem crescendo nos

últimos anos, passando por alterações que levantam novas maneiras de

se analisar a política por meio da historiografia.23 A grande valorização do

Estado e de suas figuras representativas como determinantes de múltiplos

aspectos da realidade vem dando lugar a outras considerações. A busca

da ação e da construção política, com seus resultantes, permite recuperar

a importância do político na sociedade e no cotidiano do indivíduo. A

percepção dos meandros existentes entre a esfera pública e privada

possibilita, em parte, a compreensão da interação entre o político e a

produção cultural. Estas novas interpretações estão gradativamente

descartando as análises unilaterais, que caracterizaram nas décadas

passadas a História Política, provocando uma verdadeira onda de

descrédito em relação ao seu estudo.

Nesse sentido, este trabalho pretende apresentar um

estudo, não apenas da estrutura política na qual o PCB estava

engendrado, mas também pretende analisar a atuação do militante e a

influência do político sobre sua vida cotidiana. A compreensão da

influência comunista nos movimentos operários e na sindicalização dos

trabalhadores em Ribeirão Preto apresenta-se como uma questão

essencial no estudo da formação da classe operária e da própria

sociedade ribeiropretana, como um todo. Não há dúvidas quanto à

importância de se realizarem estudos que elucidem a história do Partido

Comunista do Brasil, tendo em vista o seu mérito na organização do

operariado brasileiro, fundamentalmente na primeira metade do século

XX. Esse momento foi essencial na formação e conscientização da classe

23 BORGES, Vavy Pacheco. “História e Política: laços permanentes”. Revista Brasil -

História, 23/ 24 - Política e Cultura. S/D.

20

trabalhadora, na preparação do movimento sindical e na consolidação do

pensamento de esquerda no Brasil.24

A estrutura desta obra acompanha a evolução da

organização comunista e sua influência junto aos trabalhadores de

Ribeirão Preto. Faz um levantamento historiográfico da atuação

comunista na cidade, especialmente no campo sindical e na organização

dos movimentos operários ribeiropretanos. Levando em conta a

importância da atuação de alguns militantes, esta pesquisa revela o

cotidiano dos membros do PCB, analisando sua participação individual e

coletiva na vida política e social ribeiropretana.

No primeiro capítulo, referimo-nos aos fatores que

determinaram a lenta evolução da organização sindical em Ribeirão. Para

tanto, foi necessário avaliar como o poder exercido pelos cafeicultores na

cidade e em toda a região _ particularmente entre os trabalhadores

rurais_ dificultou, nas primeiras décadas deste século, a consolidação dos

movimentos operários. Ainda nesse capítulo, analisamos a fundação da

União Geral dos Trabalhadores e as primeiras relações entre esta

organização e os comunistas, dentro do contexto de urbanização e

industrialização de Ribeirão Preto, e o conseqüente crescimento da classe

operária.

No segundo capítulo, continuamos apresentando a atuação

dos comunistas e a sua relação com a UGT, dando especial atenção à

organização do comitê municipal do PCB e à mudança nos estatutos da

União Geral dos Trabalhadores, em 1928/29, procedimento que deu total

24 João Quartim de Moraes, quando escreveu “a influência do Leninismo de Stalin no comunismo Brasileiro”, in História do Marxismo do Brasil, afirmou que a partir da III Internacional Comunista realizada de 2 a 6 de março de 1919, houve uma bolchevização dos Pcs de todo o mundo. Esta influência cresceu com a stalinização teórica empreendida nos anos 30 que permaneceu influenciando a política da esquerda brasileira até os dias atuais. Pp. 80-87.

21

poder aos comunistas dentro dessa instituição. O grande desenvolvimento

do Partido na região de Ribeirão Preto foi interrompido pela eclosão do

movimento de 1935. Como conseqüência, a atuação dos comunistas ficou

seriamente comprometida, já que, os principais líderes locais foram

presos nesse período. Para compreender a atuação dos comunistas

nesse momento crítico para o PCB, analisamos o trabalho de

sindicalização empreendido pelos militantes na cidade, que passaram a

agir com certa tolerância quanto às determinações para a organização de

sindicatos impostas pelo Ministério do Trabalho.

Finalmente, no terceiro capítulo, examinamos a fase de

reorganização do PCB em Ribeirão Preto e região após o período da

grande repressão empreendida pelo governo Vargas, na segunda metade

da década de 30. Durante o período de legalidade vivido pelo Partido

entre 1945 e 1947, procuramos analisar as modificações na ação dos

comunistas e a participação dos membros do Partido no processo eleitoral

de 1947.

22

Capítulo 1: Antecedentes da formação do Partido Comunista do

Brasil em Ribeirão Preto.

1.1. O poder político dos cafeicultores e a questão social.

O poder político dos cafeicultores, nas três primeiras

décadas do século XX, tem sido amplamente estudado pelos

historiadores brasileiros. Autores tradicionais analisaram o “coronelismo” e

a “política café-com-leite”, estruturas de poder essenciais para nortear a

interpretação da questão social nesse período. Os grandes fazendeiros

manipulavam a política utilizando mecanismos que os beneficiavam nos

âmbitos econômico e polìtico. Direta ou indiretamente, os rendimentos da

maior parte dos municípios, sob a influência dos cafeicultores, dependiam

das safras de café que serviam de alavanca para a indústria e para o

setor de prestação de serviços, tornando cidades do interior do Estado de

São Paulo verdadeiros pólos de atração populacional. Foi o que ocorreu

em Ribeirão Preto, capital regional do nordeste do Estado, que se

transformou na maior produtora de café do Brasil.25 A grande

concentração fundiária e econômica fortalecia o poder dos cafeicultores

na política local, dominada predominantemente, desde o final do século

passado, por dois homens: Francisco Schimidt, que deteve a maior área

produtora de café do mundo,26 e Joaquim da Cunha Diniz Junqueira, que

dominou a situação política em Ribeirão Preto no final dos anos 20,

25 Sobre a economia de Ribeirão Preto ver: Diagnóstico 1. 6ª região administrativa. Ribeirão Preto (São, agosto, 1972) coord. Roberto Ferreira do Amaral. IBGE 330.19 (816.12).26 WALKER, T. W. O surgimento do populismo no Brasil: um estudo do município de Ribeirão Preto. Revista de Ciência Política, Rio de Janeiro, vol. 21, n.º 4, pp. 73 - 94, out./ dez., 1978.

23

controlando os representantes políticos locais, como o prefeito, os

vereadores e os juizes.27

O Partido Republicano Paulista, criado em 1873, era o órgão

de representação política dos “coronéis do café”. O PRP defendia o

aumento da autonomia municipal, que daria ao grupo dos cafeicultores

maior poder econômico para efetuar transações comerciais com o

mercado externo.28 Seus representantes negociavam com o governo

federal medidas que pudessem beneficiar os produtores de café, fundindo

os interesses econômicos pessoais com os interesses públicos, como

exemplifica a ata da sessão extraordinária da Câmara Municipal de

Ribeirão Preto, de 7 de julho de 1917. Na discussão, da qual participaram

os vereadores coronel Francisco Schmidt, doutor João Alves Meira Júnior,

doutor J. P. Veiga Miranda, coronel Manoel Maximiano Junqueira, coronel

Gabriel Junqueira, coronel José Martiniano da Silva, capitão Antônio

Ignácio da Costa, capitão José de Castro e o vereador Dr. Macedo

Bittencourt, o qual teceu considerações sobre os problemas que a lavoura

cafeeira e o mercado de café atravessavam, tendo em vista que esse era

o tema da sessão:

(...) A lavoura cafeeira atravessa um período de dificuldades, de

verdadeira apreensão pelas dificuldades de transporte do produto

para os mercados estrangeiros, pelas leis repressivas da importação

decretadas por outros países e finalmente pela guerra européia , que

desorganizou a vida econômica de todas as nações. A presente safra

de café, forçosamente será sacrificada se medidas não forem

tomadas que venham amparar contra as previstas especulações

mercantis resultantes principalmente da diminuição de mercados.

27 Ibidem. 28 A criação do PRP e a influência dos cafeicultores na política ribeiropretana são analisadas por José Antônio Acra Filho em sua dissertação de mestrado. A economia cafeeira e a política oligárquica do município de Ribeirão Preto: subsídios para o estudo das oligarquias cafeeiras paulistas, apresentada à Escola de Pós - Graduação de Ciências Sociais da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo.

24

Neste sentido a Sociedade Nacional de Agricultura, assim como a

Sociedade Promotora de Defesa do Café, recentemente fundadas na

Capital já oficializaram ao Senhor Presidente da República pedindo a

sua cooperação no sentido de serem decretadas medidas urgentes

que possam salvaguardar os interesses da lavoura. O Senhor

Presidente do Estado solícito como se mostra para resolver os

grandes problema econômicos que nos apertam, já se dirige também

ao Senhor Presidente da República pedindo-lhe igualmente que

amparasse com medidas eficazes a lavoura cafeeira. Sendo Ribeirão

Preto o município cafeeiro por excelência, cuja produção excede

bastante a qualquer outro, não pode tornar-se indiferente, antes deve

estudar com a maior solicitude solução do grave problema em

debate.(...)

Resolve secundar francamente a ação da lavoura e do Senhor

Presidente do Estado, telegrafando ao Senhor Presidente da

República para pedir-lhe que, em execução das autoridades

legislativas, forneça aos Estados produtores de café os recursos

necessários para a defesa de sua produção (...).29

Não é surpresa observar no texto transcrito que quatro dos nove

vereadores presentes à seção da Câmara Municipal ostentavam o título

de “coronel”, sendo dois da família Junqueira e um da família Schimidt.

Entre 1910 e 1928, 56,6% dos vereadores eleitos eram agricultores ou

filhos de agricultores, o que demonstra, apesar de alguns também

acumularem profissões urbanas, que os fazendeiros tinham supremacia

na Câmara Municipal.30 As esferas pública e privada fundiam-se na

atuação desses homens nos poderes legislativo e executivo.

Os “reis do café” detinham grandes extensões de terras. As

safras de café eram a base da movimentação financeira regional, dando 29 Ata da sessão extraordinária da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, 7 de julho de 1917.30 WALKER, T. W. op. cit., p. 83.

25

vida a um comércio variado. Os rendimentos do café e a importância

deste produto para a economia local concretizavam a influência dos

“coronéis” nos assuntos públicos.31

Nesse sentido, as crises atravessadas pela cafeicultura

transformavam-se em prioridades nas discussões da Câmara dos

Vereadores. Um exemplo disso é a preocupação demonstrada na Câmara

pela diminuição dos mercados consumidores, durante a Primeira Grande

Guerra Mundial. Essa crise intensificou-se em 1918, com a ocorrência de

uma geada que causou danos irreversíveis em cerca de 70% dos

cafezais da região. Fazendas, antes ocupadas unicamente por cafezais,

diversificaram sua produção agrícola, tentando outras lavouras, como a

do algodão. Paralelamente à diversificação agrícola, o número de

pequenas propriedades aumentava timidamente, sem conseguir, contudo,

sobrepujar a importância dos latifúndios.32

O período de instabilidade atravessado pelo setor cafeeiro -

durante a Primeira Guerra - foi superado com o aumento de consumo do

café na época entreguerras. Como conseqüência, houve um

aquecimento do mercado, responsável pelo boom econômico vivido pela

cafeicultura no início da década de 20.

O lento processo de diversificação agrícola, iniciado na

década de 10, foi acompanhado pelo crescimento das atividades fabris e

comerciais na cidade, mesmo com a resistência dos “barões do café”, que

temiam perder sua mão-de-obra. 33 Surgiram importantes indústrias, como

as cervejarias Antárctica e Paulista, inauguradas, respectivamente, em

31 LAGES, J. A. Ribeirão Preto: da Figueira à Barra do Retiro. Ribeirão Preto: VGA

Editora e Gráfica, 1996. 32 GERALDO, S. O Resgate da memória proletária em Ribeirão Preto. pp. 22/23. 33 GERALDO, S., pp. 35 - 36 .Sebastião Geraldo, em seu trabalho de pesquisa, analisa a importância da imigração para a ampliação das atividades comerciais, industriais e de prestação de serviços em Ribeirão Preto.

26

1911 e 1914. Ribeirão urbanizava-se, fenômeno que se intensificou nos

anos 20.

A crise econômica mundial, deflagrada em 1929, atingiu

duramente a economia brasileira e a sua principal atividade econômica, a

produção de café, provocando queda nas exportações e uma crise sem

precedentes no setor. Mesmo assim, alguns fazendeiros da região de

Ribeirão Preto continuaram aumentando a produção cafeeira até 1935,

garantidos pela política protecionista do governo e pelas lavouras novas

que tinham sido plantadas no período anterior à crise e que continuavam

produzindo café.

A manutenção do aumento da produção de café, a grande

malha ferroviária que cortava Ribeirão e a intensificação da diversificação

agrícola - que garantiu preços melhores aos produtores - atenuaram os

efeitos da crise, evitando o abandono das terras, como acontecera no

Vale do Paraíba. Portanto, mesmo com a decadência da cafeicultura, os

agricultores mantiveram sua influência política e econômica durante

quase toda a década de 30.

Contudo, em meados da década de 30 já era sentida uma

sensível mudança nas estruturas fundiária e política de Ribeirão Preto. Já

em 1933, mesmo com a política protecionista do governo, alguns

fazendeiros sentiam os efeitos da crise, representados no aumento do

número de pequenas propriedades, resultado do loteamento de grandes

latifúndios.34 Na política, os agricultores começavam a perder poder. Um

exemplo foi a emergência de representantes de categorias sociais

urbanas dentro da Câmara Municipal, que passou a ser composta por oito

vereadores com profissão liberal, um empregador ou gerente no comércio

ou na indústria, um com profissão mista (agricultor e profissão urbana) e

27

apenas três agricultores, sendo que até 1959 o número de agricultores -

vereadores na cidade diminuiu ainda mais.35

Seria precipitado avaliar a influência dos produtores de café

exclusivamente pela sua participação na Câmara Municipal. O poder

desses fazendeiros ia muito além da vereança local. Mesmo com a

ampliação de outros setores da economia, que provocou o crescimento do

poder econômico dos profissionais liberais, dos industriais e dos

comerciantes, os grandes fazendeiros continuaram a exercer expressiva

influência na cidade. Nas décadas que se seguiram à crise, Ribeirão Preto

viu suas áreas comercial e industrial se desenvolverem. Entretanto,

assistiu também à recuperação e à consolidação do poder dos

fazendeiros, que aplicaram seus recursos na policultura e posteriormente

na plantação de cana - de - açúcar, para a produção de açúcar e de

álcool.

O poder dos cafeicultores refletia-se no controle que

mantinham sobre os trabalhadores locais, especialmente aqueles do

campo. Os “reis do café” ocupavam um expressivo contigente de mão-

de-obra. Algumas fazendas chegavam a empregar mais de 8.000

trabalhadores,36 principalmente italianos. Esses imigrantes, vindos de um

país distante, desconhecedores da língua portuguesa e muitas vezes sem

recursos, eram submetidos ao jugo dos fazendeiros, que coibiam ao

máximo qualquer forma de organização que pudesse ameaçar seus

interesses econômicos. Entretanto, as péssimas condições de trabalho e

a influência anarquista presente no meio italiano favoreceram a ocorrência

de alguns movimentos de resistência entre os trabalhadores rurais.

34 Diário de Notícias, “A pequena propriedade”, Ribeirão Preto, 23 de março de 1933.35 WALKER, T. W, O surgimento do populismo no Brasil, p. 86. 36 GARCIA, M. A. As greves de 1912 e 1913 nas fazendas de café de Ribeirão Preto.

ESTUDOS DE HISTÓRIA, pp. 167 - 179, 1995.

28

1.1.1. O trabalhador das fazendas de café.

A região de Ribeirão Preto, a partir do século XIX, destacou-

se como expressivo pólo receptor de imigrantes, principalmente

italianos.37 As famílias eram trazidas para trabalhar nas fazendas de café

da região. Logo no início tiveram problemas de adaptação, dos quais dois

merecem destaque: o alto índice de analfabetismo entre os imigrantes e o

desconhecimento da língua portuguesa. Esses fatores contribuíam para

que os fazendeiros tirassem proveito dos contratos de trabalho, que

geralmente tornavam os imigrantes dependentes financeiramente dos

agricultores pelo endividamento nos armazéns das fazendas, onde os

preços altos dos alimentos contrastavam com os baixos salários dos

trabalhadores.

Todavia, os colonos também desfrutavam de alguns

benefícios, como a autorização para plantar cereais e legumes nas fileiras

entre os pés de café. Essa prática, além de suprir o sustento da família,

possibilitava a constituição de uma poupança que poderia garantir uma

futura independência financeira. Muitos imigrantes, depois de anos de

trabalho, conseguiram estabelecer-se como proprietários rurais em

Ribeirão Preto, ou como pequenos comerciantes e prestadores de serviço

na zona urbana.38

Apesar de uma minoria ter conseguido ascender

socialmente, as condições de trabalho dos imigrantes, em geral, não eram

satisfatórias. Os colonos ficavam à mercê das deliberações do patrão,

senhor dos direitos e deveres do trabalhador. Em caso de abusos

37VALADÃO, V. Imigração e introdução de novos hábitos habitacionais em Ribeirão

Preto. Estudos de História, pp. 253 - 268. Dos 58.220 habitantes registrados na cidade em 1912, 14.561 eram italianos.

38 Ibidem, p. 260.

29

cometidos pelos fazendeiros, poderiam recorrer ao consulado que,

embora defendesse os trabalhadores estrangeiros, mantinha uma atitude

conciliatória na maioria das vezes. Assim, os imigrantes eram,

normalmente, entregues à própria sorte, sujeitos às decisões dos

cafeicultores. Um exemplo foi a demissão coletiva de aproximadamente

cem húngaros, em 1925, colonos de uma fazenda de Orlândia, região de

Ribeirão Preto. Famílias inteiras que desconheciam a língua portuguesa

foram despejadas na estação de trem, ali ficando durante dias sem

comida e assistência médica.39 Casos de abusos como esse foram

comuns nas primeiras décadas do século XX. Entretanto, esses abusos

acabavam provocando movimentos de resistência por parte dos

trabalhadores rurais, manifestados em ações individualizadas ou, mais

raramente, em greves de grande repercussão.

Dois dos movimentos mais expressivos ocorridos em

Ribeirão foram as greves de 1912 e 1913, que envolveram milhares de

trabalhadores das fazendas de café. Infelizmente, a falta de

documentação não permite uma análise efetiva da organização estrutural

desses movimentos, como a identificação das lideranças e de suas

tendências ideológicas. No entanto, é possível tirar algumas conclusões

baseadas nas reivindicações dos trabalhadores: melhoria de salários e de

condições de trabalho, e terras para o cultivo de cereais.40

Uma das causas da eclosão dos movimentos de 1912 e

1913 foi a proibição, determinada por alguns fazendeiros, do cultivo de

cereais entre as fileiras de cafeeiros. Esse fato chocava-se com o sonho

do imigrante de se tornar independente financeiramente, podendo

consumir e vender o que plantasse. Esse sonho o imigrante alimentava

39 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 15 de dezembro de 1925, p. 1. 40 GARCIA, M. A. As greves de 1912 e 1913 nas fazendas de café de Ribeirão Preto,

pp.168-169.

30

desde sua viagem para o Brasil: a possibilidade de poupar para adquirir

seu “sítio”.

As reivindicações por melhores salários e pelo direito de

poder plantar para si próprios refletiam a preocupação dos grevistas com

a sua situação econômica. Isto parecia constituir-se no único propósito

dos trabalhadores, não transparecendo intenções políticas, nessas

greves, cujos objetivos, voltados tão-somente para a resolução de

problemas imediatos, podia denotar uma tendência anarco-sindicalista em

sua organização: “nada de ligação com o governo, nada de compromisso

político”. Os grevistas recorriam à “ação direta”: o proletariado deveria

buscar, por si mesmo, os seus direitos, “lutar contra a classe dominante,

não ter peias políticas e institucionais com a burguesia”.41

O grupo anarco-sindicalista, realizou o primeiro Congresso

Operário Brasileiro em 1906, o segundo em 1913, e o terceiro em 1920,

mostrando-se bastante ativo nos movimentos da classe trabalhadora. No

entanto, esbarramos, como sempre, na pouca documentação existente

para consulta, o que dificultou a análise da sua influência em Ribeirão

Preto. Porém, aparentemente, houve uma influência não apenas sobre

movimentos na zona rural, como também na área urbana nas greves

ocorridas entre 1907 e 1909.

41 CARONE, E. Classes Sociais e Movimento Operário, p. 41.

31

1.1.2. O crescimento urbano e a organização operária antes da

criação da União Geral dos Trabalhadores.

Ribeirão Preto viveu um grande crescimento populacional

desde o final do século XIX até a década de 30, responsável pelo

aumento da concentração de trabalhadores na zona urbana, fator

importante para a compreensão dos movimentos grevistas que ocorreram

antes do surgimento do primeiro núcleo comunista. A existência de um

volume razoável de operários favorecia a eclosão de greves por melhores

salários e condições de trabalho.

A cidade destacou-se como um importante pólo de atração

populacional nas três primeiras décadas do século XX. A grande

produção cafeeira e a diversificação da sua zona comercial atraíam

trabalhadores de outros lugares. Multiplicaram-se as oficinas e as lojas

comerciais, freqüentadas pela população de toda a região.

A necessidade de braços para a lavoura cafeeira, trouxe

para a cidade um contingente expressivo de imigrantes, aproveitados

predominantemente na atividade agrícola. Entretanto, muitos acabaram

fixando-se na cidade, em atividades comerciais e fabris, principalmente a

partir da década de 30, quando a economia ribeiropretana começou a

sentir os reflexos da crise econômica mundial que provocou, entre outras

coisas, a diminuição da produção de café e o êxodo de trabalhadores

rurais para o setor urbano.

O abalo econômico ocasionado pela crise diminuiu a

imigração, bem como a atração de trabalhadores pela região, até a

década de 40, quando a taxa de crescimento populacional atingiu a cifra

mínima de 0,27% ao ano. Nesse período, a cidade ainda sentia os

32

resquícios da crise, iniciada na década anterior: faltavam empregos e

gêneros alimentícios de primeira necessidade. Na década de 50, a

economia ribeiropretana já havia se reestruturado, provocando um novo

fluxo migratório para a região que, com a queda nas taxas de mortalidade,

provocou um aumento populacional de 16,69%.42

Mesmo com o crescimento progressivo da população nos

primeiros anos do século XX, o município contava com poucas empresas

com um número grande de funcionários.43 A maior parte dos operários

estava espalhada por dezenas de pequenas e médias oficinas. A cidade

desenvolveu um expressivo centro comercial e na primeira década do

século XX foram lá instalados 163 pequenos estabelecimentos industriais,

com um total de 642 operários.44 Se levar em conta a concentração de

trabalhadores em grandes fábricas como um pressuposto para a

organização de movimentos operários, pode-se dizer que a dispersão

geográfica do operariado ribeiropretano ( média de quatro operários por

empresa) pode ter sido um obstáculo nas primeiras décadas do século

para o desenvolvimento de sindicatos e associações de classe. A

organização operária nessa época, mostrava-se pouco expressiva e

pouco organizada, refletindo a própria realidade nacional. Sua liderança

era disputada entre socialistas, sindicalistas e anarco-sindicalistas. Não

existia uma liderança partidária, como ocorreria a partir da criação do

Partido Comunista do Brasil, em 1922.

Os primeiros movimentos grevistas e a formação da primeira

associação sindical de Ribeirão só aconteceram após a realização do 42 São Paulo, Governo de. Secretaria da economia e planejamento. Diagnóstico 1. 6ª Região Administrativa. Ribeirão Preto ( São Paulo, 1972) coord. Roberto Ferreira do Amaral. IBGE 330.19 (816.12) AS 239 e 6ª RA. A economia ribeiropretana sentiu mais intensamente a crise de 1929, no final da década de 30 e início da década de 40. O processo de desestruturação econômica foi agravado pelas conseqüências econômicas advindas da ocorrência da 2ª Guerra Mundial, que provocou, entre outros problemas, a escassez de gêneros alimentícios de primeira necessidade.43 A empresa que concentrava o maior número de funcionários no início do século XX era a Companhia Mogiana.

33

Primeiro Congresso Operário Brasileiro, que se deu na terceira semana

de abril de 1906, com a participação de socialistas, líderes trabalhistas e

anarquistas. As idéias destes últimos prevaleceram. Nesse evento, foi

recomendado ao operariado que “fizesse o máximo para impor as oito

horas de trabalho no dia 1º de maio de 1907”,45 já que a luta pela redução

da jornada de trabalho fazia parte das preocupações mais imediatas

naquele momento. Dentre as resoluções do Congresso, entendeu-se que

o operariado não estava pronto para uma ação política unificada, pois

encontrava-se “extremamente dividido pelas opiniões políticas e

religiosas”. A ação organizada do operariado só seria possível

considerando-se “os interesses econômicos comuns a toda a classe

operária”.46

Como conseqüência da agitação iniciada com o Primeiro

Congresso Operário, eclodiram movimentos grevistas em 1906 e 1907. O

primeiro deles aconteceu entre os dias 15 e 17 de maio de 1906, entre os

trabalhadores da Companhia Paulista de Estradas de Ferro de Campinas

e Jundiaí, local em que Edgard Leuenroth realizara um comício sobre o

Congresso, do qual participara. Refletindo esses acontecimentos, a greve

espalhou-se pela capital e arregimentou outras categorias. O movimento

terminou no fim do mês de maio, esmagado pela polícia, temerosa que a

greve se estendesse a outras companhias ferroviárias.

Em maio de 1907, movimentos grevistas explodiram

novamente em São Paulo. A greve teve repercussão rápida em Ribeirão

Preto, onde cerca de 300 trabalhadores de pequenas indústrias reuniram-

se na Sociedade União Italiana, no dia 15 de maio, e decidiram entrar em

greve no dia seguinte.47 Reivindicavam a redução na jornada de trabalho

44 GERALDO, S. O Resgate da memória proletária em Ribeirão Preto, p. 36. 45 DULLES, J. F. Anarquistas e comunistas no Brasil, p. 29. 46 Ibidem, p. 27.47 Diário da Manhã. Ribeirão Preto, 17 de maio de 1907.

34

e aumento de salário. Logo no primeiro dia de greve, um dos líderes

grevistas, o anarquista Alfredo Farina, responsável pela publicação dos

jornais IL Messagero ( 1906) e Lo Scuducio ( 1907 - 1927 ), foi preso e

mantido incomunicável.48 A Companhia Ferroviária Mogiana, uma das

maiores empregadoras da cidade, temendo a expansão da greve, acatou

a jornada de trabalho de oito horas, evitando que os seus funcionários

interrompessem o trabalho.49 Esses dois acontecimentos evitaram que a

greve tivesse maiores proporções, terminando sem grandes resultados

para os trabalhadores. Ribeirão participava dos “últimos anos da onda de

greves” que atingiu São Paulo, entre 1901 e 1908. 50

Tudo indica que, durante o movimento grevista de 1907, os

trabalhadores locais estavam organizados pela Liga Operária de Ribeirão

Preto. Azis Simão, em Sindicato e Estado, refere-se a existência da Liga,

fundada em 1907.51 Como em janeiro desse mesmo ano o governo

sancionara o Decreto 1.637 exigindo que os sindicatos fossem registrados

em Cartório _ nele depositando seus estatutos e a lista de nomes da

diretoria52 _, realizamos uma pesquisa nos cartórios mais antigos da

cidade, não conseguindo, entretanto, verificar registros dessa natureza.

A falta dos estatutos e de outros documentos da Liga

Operária dificultam a análise dos seu objetivos e da sua estrutura. De

qualquer forma, sua existência é atestada por jornais locais que

notificaram a Liga como responsável por publicações de manifestos,

principalmente em comemoração ao 1º de Maio.53 No período da sua

criação ocorria uma efervescência no movimento sindical, provocada 48 GERALDO, S. O Resgate da memória proletária em Ribeirão Preto, p. 81. 49 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, quinta - feira, 17 de maio de 1907. 50 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, p. 28. 51 SIMÃO, A. Sindicato e Estado. p. 211. O autor fez um belo trabalho de pesquisa, apresentando principalmente a organização e a estrutura dos sindicatos em São Paulo, a influência do Estado na formação do movimento sindical. 52 DULLES, J. W. F. Op. cit. , p. 28. 53 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, domingo, 1º de Maio de 1910.

35

pelos resultados do Primeiro Congresso Operário, realizado em 1906.

Infelizmente, pouco se sabe sobre a Liga.54 É possível, entretanto,

estabelecer uma ligação entre a greve de 1907 e essa organização, se

forem levadas em conta as orientações dadas pelo Primeiro Congresso

Operário para a organização de associações sindicais:

“...Considerando que a resistência ao patronato é a ação

essencial55, e que, sem ela, qualquer obra de beneficência,

mutualismo ou cooperativismo seria toda a cargo do operariado

facilitando mesmo ao patrão a imposição de suas condições; que

essas obras secundárias, embora trazendo ao Sindicato grande

número de aderentes, quase sempre sem iniciativa e sem espírito de

resistência, servem muitas vezes para embaraçar a ação da

sociedade que falta inteiramente ao fim para que fora constituída - a

resistência;

O Primeiro Congresso Operário Brasileiro aconselha, sobretudo,

resistência, sem outra caixa a não ser a destinada a esse fim e que,

para melhor sintetizar o seu objetivo, as associações operárias

adotem o nome de Sindicato”.56

A idéia de privilegiar a resistência ao patronato, refletida na

luta por melhores condições sócio-econômicas do trabalhador, como a

redução na jornada de trabalho, decorreu do movimento anarco-

sindicalista. Essa influência, percebida com clareza nos movimentos

54 SIMÃO, A. Op. cit. , p.211. 55 Grifo nosso. 56 SIMÃO, A. Op. cit., p. 163. Resoluções do Primeiro Congresso Operário Brasileiro, sobre Organização, tomo 1, pp. 9-10; no mesmo sentido: Boletim da comissão Executiva do III Congresso Operário Brasileiro, p. 10.

36

grevistas ocorridos nos primeiros anos do século XX, em Ribeirão, esvaiu-

se nas décadas posteriores.57

A luta pela redução da jornada de trabalho para oito horas

continuou durante os anos que se seguiram à greve de 1907. Nos anos

20, muitos lojistas e donos de oficinas ainda não respeitavam a jornada

reduzida, provocando a eclosão de greves isoladas, organizadas por

grupos independentes. Desse modo, os trabalhadores iniciaram uma

embrionária organização do operariado, criando associações operárias,

como a União dos Viajantes, em 21 de dezembro de 1913, a Associação

dos Empregados no Comércio de Ribeirão Preto, em 7 de julho de 1920,

e a Associação dos Condutores a Tração Animal, criada em 26 de

setembro de 1923. As duas últimas demonstravam preocupação com o

bem-estar do trabalhador, criando núcleos de assistência social e lutando

pelos direitos econômicos da classe trabalhadora. Essa preocupação

social foi aprofundada pela associação que teve a ação mais expressiva

na organização sindical em Ribeirão Preto, na primeira metade do século

XX: a União Geral dos Trabalhadores, criada em 6 de maio de 1925.58

57 Os anarco-sindicalistas acreditavam na criação de associações sindicais sem compromissos assistenciais com o trabalhador. Defendiam a idéia de que a formação de cooperativas ou caixas de socorro poderiam desviar a atenção do trabalhador da verdadeira luta: a resistência ao capitalismo e aos seus representantes: o patronato.58 Documentos do 1º. Cartório de Registro de Imóveis e anexos.

37

1.2. A fundação da UGT e os primeiros comunistas.

Durante a década de 20, os fazendeiros ribeiropretanos

encontravam-se bem organizados na defesa da manutenção do seu

poder, enquanto poucos setores tinham associações que defendessem os

interesses dos trabalhadores. A organização de movimentos operários era

dificultada pela repressão exercida durante o governo de Arthur

Bernardes, num momento em que a legislação trabalhista pouco

avançava e a “pequena burguesia” mostrava sua insatisfação por

intermédio das revoltas tenentistas.59

O PCB foi um dos grupos mais atingidos pela ação

repressiva do governo Bernardes, principalmente durante o estado de

sítio estabelecido de 5 de julho de 1924 a 31 de dezembro de 1926.60

Fundado em 1922, o Partido Comunista Brasileiro preocupou-se nos

primeiros anos em organizar-se internamente e ser reconhecido pela

Internacional Comunista, aspirando” à instalação direta do ‘regime

comunista’, sem considerar quaisquer outras mediações”.61 Além dessas

59 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, pp. 221 - 248. O início da

década de vinte foi marcado pela ocorrência dos movimentos tenentistas, em 1922, 1924 e pela formação da Coluna Prestes. Estes eventos acabaram provocando uma reação violenta por parte do governo Bernardes contra os comunistas.

60 CHILCOTE, R. H. Partido Comunista Brasileiro - Conflito e integração, p.63.61 VINHAS, M. O Partidão. A luta por um partido de massas ( 1922 - 1974 ), p.7.

Vinhas, no seu livro de memórias, relata sinteticamente a história do Partido Comunista Brasileiro. Afirma que nos primeiros anos de atuação do PCB, este desinteressou-se pela sucessão presidencial de 1922 e pelos principais fatos políticos que abalavam o país, como as revoltas tenentistas, denotando o grau de sectarismo e distanciamento da realidade que pautou seus primeiros passos.Questão semelhante é analisada por Ronald Chilcote, que justifica a ação política pouco expressiva do PCB nesse período pela intensa repressão policial e pela necessidade da conquista de um status no movimento comunista internacional (p. 63).

38

preocupações, procurava aumentar sua influência no movimento sindical

dominado por socialistas e anarco-sindicalistas.

As décadas de 20 e 30 foram marcadas pelo crescimento do

número de operários, pela repressão exercida contra os movimentos

populares e pela dificuldade organizatória enfrentada pelo Partido. Sua

atuação foi prejudicada por vários fatores, entre eles, a dispersão

geográfica dos operários, distribuídos entre os escassos estabelecimentos

industriais, tornando difícil a ação dos militantes comunistas. Outro

problema organizacional enfrentado pelos membros do Partido era o

recebimento de material em língua estrangeira, sendo que no Brasil boa

parte dos trabalhadores nem sequer sabia ler e escrever.

Entretanto, o fato de maior relevância que limitou a ação do

Partido, entre 1922 e 1928, foi seu reduzido número de militantes. A

dificuldade do PCB em arregimentar novos membros relacionava-se com

a constante repressão policial que dificultava a difusão das idéias

comunistas e intimidava a adesão de simpatizantes à ação direta de

militância. Na década de 20, o Partido contava com cerca de 700

militantes inscritos, sendo que em São Paulo encontravam-se apenas

80.62

A limitada, porém ativa atuação dos comunistas no

movimento operário,63 entre 1922 e 1925, fixou-se na propagação das

idéias comunistas e na luta contra socialistas e anarco-sindicalistas pela

hegemonia no movimento sindical. O trabalho para tornar o PCB o único

partido “capaz de liderar a massa operária” intensificou-se e passou a ter

maior expressão na segunda metade da década de 20, após a realização

62 CARONE, E. O PCB ( 1922 - 1943 ), p. 77, e “Movimento Operário e revolução,

percalços para o desenvolvimento do PCB”, in Classes Sociais e Movimento Operário, pp. 98 - 101.

63 CARONE, E. Classes Sociais e Movimento Operário. p. 130.

39

do II Congresso Comunista, quando foi constatado “o pouco resultado

obtido até aquele momento”.64

Mesmo com o reduzido número de militantes no Brasil,

principalmente no Estado de São Paulo, fato que provocava uma atuação

político-social restrita do Partido Comunista do Brasil, surgiu em Ribeirão

Preto um pequeno grupo de simpatizantes do comunismo, por volta de

1923.65 Esse grupo era formado por Guilherme Milani, Rômulo Pardini,

Gustavo Wierman66 e outros, sendo que os dois primeiros tinham saído

do movimento anarco-sindicalista. O grupo reunia-se na casa de Milani67

para discutir a organização do movimento operário e a criação de uma

associação de defesa dos interesses dos trabalhadores em Ribeirão

Preto. Como resultado da atuação desse grupo, fundou-se, em 30 de

março de 1925,68 a UGT _ União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão

Preto, tendo seus estatutos registrados em cartório no dia 6 de maio do

mesmo ano.69

64 Ibidem, pp. 123 - 125.65 Durante uma entrevista realizada com Antônio Girotto, simpatizante das idéias comunistas desde a década de 30 e militante a partir da década de 40, este afirmou que o primeiro grupo comunista surgiu em Ribeirão Preto por volta de 1922 e 1923, grupo que teria sido formado inicialmente por Guilherme Milani, Rômulo Pardini e Gustavo Wierman.66 Gustavo Wierman militou no PCB, comitê municipal de Ribeirão Preto, nas décadas de 20 e 30. Foi entrevistado pelo Dr. Sebastião Geraldo no final da década de 80, fornecendo importantes informações sobre os primeiros anos do grupo comunista na cidade de Ribeirão.67 Guilherme Milani residiu na capital antes de mudar-se para Ribeirão. Em São Paulo era conhecido pela polícia como um anarquista fervoroso. Seu nome consta em relatórios de um secreta enviado à Delegacia de Ordem Política e Social em 25 de setembro de 1929, já o indicando como um dos líderes comunistas de Ribeirão Preto. Registro Geral n.º 257.151, caixa 11, arquivo do DEOPS - SP. 68 O prédio utilizado localizava-se na rua Duque de Caxias, n.º 11, centro de Ribeirão Preto.69 Estatutos da “União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto”, Denominação e fins, artigo 1, registrado no 1.º Cartório de Registro de Imóveis e Anexo, 1925.

40

1.2.1. Uma análise do primeiro estatuto da UGT

Foram analisados, até agora, fatores que caracterizaram

social e economicamente Ribeirão Preto como um ambiente político

conservador dominado, até a década de 30, pelos cafeicultores. O parco

movimento operário desse período ficou registrado nas poucas greves e

organizações operárias formadas na cidade até 1920. 70 Aparentemente,

as poucas greves ocorridas em Ribeirão Preto, entre 1907 e 1920, foram

de orientação anarquista. O grupo libertário teria influenciado também a

criação da Liga Operária, primeira instituição de defesa de classe criada

na cidade.

No ano de 1920, iniciaram-se no Brasil os desentendimentos

entre os anarquistas e os que viriam a fazer parte do PCB. Os primeiros

abriram uma fase de críticas em relação à Revolução Bolchevique,

quando informações mais verídicas sobre o acontecimento começaram a

chegar ao Brasil, desmentindo que a Revolução Russa teria sido um

movimento anarquista.71 O período de críticas e ataques aos comunistas

serviu, entre outras coisas, para definir as posições ideológicas dos dois

grupos e acirrar a disputa entre eles pela hegemonia dentro do

movimento sindical. Até 1925, uma das principais atividades dos

comunistas foi a tentativa de expurgar a influência anarquista ( e também

socialista ) das organizações sindicais.

70 Como já foi analisado anteriormente, aparentemente as poucas greves ocorridas em Ribeirão Preto, entre 1907 e 1920, foram de orientação anarquista. Este grupo também teria influenciado a criação da Liga Operária de Ribeirão Preto, primeira instituição de defesa de classe criada na cidade.71 CARONE, E. “ O PCB: a polêmica com os anarquistas ( 1922 - 1923 ). O

reconhecimento do PCB pela IC.” In Classes Sociais e Movimento Operário.Nesse capítulo, o autor analisa as rupturas e desentendimentos entre anarquistas e comunistas e a luta entre os dois grupos pela hegemonia do movimento operário.

41

No caso da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão

Preto, uma análise do seu primeiro estatuto permite inseri-la no contexto

do movimento sindical marcado por influências ideológicas variadas. De

acordo com Edgard Carone, entre os sindicatos da década de 20

proliferaram várias tendências, dividindo-os em “três categorias: os de

influência comunista, os de orientação anarquista e os denominados de

reformistas ou amarelos, considerados os mais significativos e

numerosos”.72 Avaliando o estatuto da UGT, de 1925, percebe-se um

misto de influências dessas três tendências, o que pode parecer um

paradoxo se for levado em conta o fato de seus principais fundadores

terem tendências comunistas, como já foi dito anteriormente. Contudo, a

convivência de simpatizantes comunistas numa organização com

tendências reformistas e anarco-sindicalistas é perfeitamente justificável,

já que “o Partido, de 1922 a 1928, circunstancialmente, aceita a tática

provisória de ligar-se a sindicatos de outra orientação ideológica”,

seguindo as determinações do Terceiro Congresso da Internacional

Comunista, que sugeria a ”política de Frente Única”.73

No capítulo 1 do seu primeiro estatuto, “Denominação e

fins”, a UGT é definida como uma “associação cooperativa e de recreação

tendo como objetivo promover a defesa e a solidariedade da classe e dos

associados, dando a estes a assistência, criando uma cooperativa de

gêneros alimentícios de consumo e de primeira necessidade e uma caixa

de socorros(...)”.74 O assistencialismo e o cooperativismo, presentes no

estatuto, despertavam atitudes avessas à sua implantação em

organizações sindicais, entre as correntes de atuação mais radical.

72 CARONE, E, “A política sindical” In Classes Sociais e Movimento Operário, pp. 158

- 168.73 Ibdem, p. 161.74 Estatutos da “União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto”, op. cit.

42

No caso dos anarco-sindicalistas existia uma tolerância em

relação ao assistencialismo, ainda que concordassem que fosse

prejudicial ao processo de pressão social, desviando a atenção do

principal objetivo dos sindicatos: “a resistência ao patronato”.75 Os

comunistas, de sua parte, também consideravam os programas

assistenciais estranhos ao movimento sindical; contudo, a política de “ide

às massas”, preconizada pela IC em seu Terceiro Congresso,

determinava a necessidade de conquistar “uma unidade tão completa

quanto possível das massas operárias no terreno da ação prática, de

acordo coma as condições particulares de cada país”.76 No caso do

operariado brasileiro, suas particularidades estavam ligadas às precárias

condições de vida, determinadas pela falta de proteção aos operários

idosos, doentes, desempregados, mulheres e crianças, e pela falta de

serviços médico-farmacêuticos gratuitos. Portanto, mesmo os comunistas

não combateram com afinco as atividades cooperativas e de assistência

ao operário dentro das instituições sindicais, pretendendo dessa forma

angariar a simpatia da massa trabalhadora.

Os socialistas, por sua vez, acreditavam que o operariado

deveria ser organizado em todas as esferas, inclusive nas áreas que lhes

permitissem melhorar seu nível de vida. “Ao nascer do século, os

socialistas se propunham criar em São Paulo, separadamente, uma série

de associações que iam desde as mais simples dos seguros mútuos até

75“Essa tolerância pode ser explicada por dois fatores. Primeiro, a existência de programas assistenciais ou cooperativismo dentro das organizações sindicais traziam muitos aderentes. Segundo, mesmo com a oposição dos anarquistas e anarco-sindicalistas à inclusão do mutualismo entre as finalidades dos sindicatos, estes tinham uma solidariedade grupal considerada sagrada, como observou Azis Simão. Esse sentimento de cooperação entre o grupo acabava impondo a necessidade de socorrer associados e militantes sindicais em caso de penúria”. SIMÃO, A., Sindicato e Estado,p. 163.76 CARONE, E. Classes Sociais e movimento operário, p. 161.

43

as associações de ofícios e as cooperativas de produção, consumo e

crédito”.77

Desse modo, se forem levados em conta apenas o estatuto

da UGT e a posição das três tendências em relação aos objetivos

propostos nesse documento, fica difícil identificar a corrente hegemônica

dentro dessa organização. Entretanto, as entrevistas realizadas com

militantes comunistas e as pesquisas nos arquivos do DEOPS,78 que

revelaram relatórios de policiais que trabalhavam disfarçados na União

Geral dos Trabalhadores, podem ajudar no esclarecimento dessa

questão.

Tanto militantes do PCB, que atuaram na década de 20,

como outros mais recentes, afirmam categoricamente que a UGT foi

fundada por comunistas. Entretanto, a polícia que atuou em meados da

década de 20 acreditava ser essa uma organização dominada por anarco-

sindicalistas, até 1928, quando teve seus estatutos reformados pelos

comunistas.79 Sabendo das dificuldades organizatórias enfrentadas pelo

PCB entre 1922 e 1928, chega-se à conclusão que a União Geral dos

Trabalhadores, provavelmente, teria sido fundada por simpatizantes

comunistas, sem vínculos oficiais com o Partido. Tal fato explicaria a

heterogeneidade do seu primeiro estatuto, que evidencia a presença de

outras correntes ideológicas, preservando, todavia, o ideal de “defesa e

solidariedade entre as classes”, que tomou corpo definitivamente após o

domínio completo dessa organização pelos militantes comunistas, em

1928.

77 SIMÃO, A. Sindicato e Estado, p. 164. Avanti, 1.12. 1900, Ano I, n.º 7.78 “União Geral dos Trabalhadores”, caixa 11. Arquivos DEOPS/ SP.79 A “ União Geral dos Trabalhadores” - Sob esse título foi fundada em 1925, conforme verifica-se pelos estatutos, pelos “anarco-sindicalistas”, e reformada em 1928 pelos comunistas, que ali organizaram um núcleo de agitação extremista, na cidade de Ribeirão Preto. Apesar de algumas diligências policiais, os dirigentes de tal núcleo não se adaptaram à legislação trabalhista ( sindical ), procurando conservar a “sindicalização livre”, conforme determina a “IC” e a “ISV”. Caixa 11. Arquivo DEOPS/SP.

44

Guilherme Milani. Reprodução de 1996 de foto tirada pelo DEOPS/SP em 1929.

Ricardo Pinatti. Reprodução de 1996 de foto tirada pelo DEOP/SP, em 1930.

45

1.2.1.1. A primeira diretoria.

A organização administrativa da UGT apresentava-se num

esquema hierárquico bem definido. A diretoria era eleita em assembléia-

geral, composta por um presidente, um vice - presidente, um secretário-

geral, um secretário de atas, um tesoureiro, uma comissão com dois

membros, que atuariam como suplentes de qualquer membro da diretoria,

e duas juntas: uma de socorros e outra de cooperativa. Reuniam-se uma

vez por semana para deliberar sobre os assuntos da organização.

Não foram encontrados documentos que revelassem se os

membros da diretoria recebiam pagamento pelo seu trabalho na UGT

Contudo, diante das características da instituição e pelo número reduzido

de atividades empreendidas nos primeiros anos de funcionamento, é

possível que o trabalho se realizasse gratuitamente, recebendo os

membros apenas uma ajuda de custo para alimentação e viagens a

mando da instituição.80

Entre os membros da primeira diretoria, dois eram,

comprovadamente simpatizantes do PCB, posteriormente transformando-

se em militantes: Guilherme Milani e Rômulo Pardini. Os dois eram

observados assiduamente pela polícia ribeiropretana, que os considerava,

juntamente com Gustavo Wierman, os líderes comunistas da cidade até o

final da década de 30, quando formou-se uma nova geração de militantes.

Outros membros da diretoria, como João Pontim, também começaram na

UGT como simpatizantes do comunismo, e mais tarde transformaram em

militantes de relevância.

80 Depoimento dado por Antonio Girotto.

46

Quanto aos demais componentes da primeira diretoria, não

existem dados que possam revelar sua tendência ideológica de forma

precisa. Entretanto, pode-se concluir _ pela estrutura do primeiro estatuto

e pelos depoimentos de militantes do PCB _ que, nos primeiros anos, os

comunistas conviveram com sócios da UGT que apresentavam

tendências diversas, fato explicado pela necessidade de ampliar o número

de membros.

A composição da 1ª diretoria da UGT pode ser observada

abaixo:

Quadro. 181

Auxiliares da Diretoria de 1925

Cargo Nome Responsabilidade

Junta cooperativa Pedro Pontim

Ettore Gerbi

Domingos Conella

João Crivelim

Moysés N. de Oliveira

Dirigir e administrar a

cooperativa, proporcionando

aos sócios a compra por

preços razoáveis de gêneros

de primeira necessidade,

fiscalizando as mensalidades e

contribuições.

Junta de Socorros Demétrio Conelli

Delmis Baboza

Manoel Roza

Aldo Mantovani

Francisco dos Santos

Proporcionar com o disponível

em caixa uma diária aos

sócios que caírem doentes.

Recebedor Nilo Donegá Recolher mensalidades

Quadro. 2

47

Membros da diretoria da UGT em 1925 Cargo Nome Responsabilidade

Presidente Guilherme Milani Representar a sociedade judicial e extrajudicialmente. Manter a ordem nas sessões, dirigindo as discussões. Convocar sessões extras Visar todos os papéis referentes à sociedade, como as contas, relações, e assinar e abrir correspondência, rubricar os livros de atas e da escrita da associação.

Vice - presidente João Pontim Auxiliar, substituir e exercer , em suas faltas, as funções do presidente.

Secretário- geral Ilegível.82 Inscrever novos sócios nos livros competentes. Fazer e responder à correspondência da sociedade. Ter sob sua guarda, para informar o presidente ou a assembléia, um livro das mensalidades pagas e que deverá corresponder a um igual do tesoureiro.

Secretário de Atas Orestes Raioli Redigir as atas das reuniões da diretoria e da assembléia e proceder à sua leitura nas sessões respectivas. Substituir o secretário geral se necessário.

Tesoureiro Romulo Pardini Guardar valores, dinheiro e títulos da Associação. Administrar recebimentos e pagamentos.Organizar balancetes trimestral e anual, demonstrando o movimento do caixa.

Comissão Armando Pardini

Raphael dos Santos

Tomar parte e votar na deliberação da diretoria. Substituir nas suas funções qualquer membro da diretoria.

Aparentemente, a cooperativa de alimentos começou a

funcionar definitivamente a partir de 1928 e 1929. Nesse período, já era 81 Estatutos da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, Cap. II, Da Diretoria, administração e representação, 1925.

48

controlada exclusivamente por comunistas, que conquistaram

gradativamente o poder dentro da UGT. Tanto a cooperativa quanto a

junta de socorros representaram uma preocupação da diretoria da União

em minimizar alguns dos principais problemas dos trabalhadores: o alto

preço dos gêneros alimentícios de primeira necessidade e a falta de

assistência médica para os enfermos.

Tanto anarco-sindicalistas como comunistas acreditavam

que o assistencialismo desviava a atenção dos trabalhadores do que

deveria ser a sua verdadeira causa: a mobilização contra a exploração

patronal e a organização política. Entretanto, as precárias condições do

operariado em geral, e a própria necessidade de atrair contingentes para

as organizações sindicais fizeram com que estas acabassem incluindo em

seus estatutos o assistencialismo.

1.2.1.2. A cooperativa e a caixa de socorros.83

82 O nome do Secretário geral está ilegível na documentação.83 Estatutos da UGT, capítulo III, artigos 7/ 8, 1925.

49

A estruturação de uma cooperativa de gêneros alimentícios

de primeira necessidade aparece no estatuto como um dos principais

objetivos da UGT, em sua primeira fase, quando se auto denominava uma

“associação cooperativa e de recreação”. A preocupação em criar uma

instituição que garantisse a compra e a revenda de produtos alimentícios

para os associados, a um preço inferior ao valor de mercado, pode ser

explicada pelo baixo nível de vida do trabalhador urbano e pela

dependência econômica do trabalhador rural em relação aos

fazendeiros.84 A viabilidade de comprar alimentos a preços razoáveis,

sem dúvida, era um grande atrativo para os trabalhadores de baixa renda,

possibilitando maior adesão de associados à União Geral de

Trabalhadores. Entretanto, nesse período a cooperativa parece não ter

alcançado os objetivos que se propusera atingir, não tendo suas

atividades se desenvolvido de forma satisfatória.

No caso da “junta de socorros” , a União comprometia-se a

ajudar financeiramente ( dentro das possibilidades da sua reserva

monetária) associados enfermos, por intermédio de uma diária. Não

estendia seus benefícios aos sócios desempregados ou vítimas de

epidemias.

Além dos serviços da “junta de socorros” e da cooperativa,

a UGT tencionava a dar aos trabalhadores ligados à organização uma

“assistência social, intelectual, moral e judicial”.85 A criação de escolas

noturnas e biblioteca, além da luta contra o alcoolismo foram iniciativas

84 A relação de dependência econômica dos camponeses em relação aos fazendeiros era caracterizada, entre outras coisas, pelo fornecimento de gêneros alimentícios em armazéns dentro das propriedades agrícolas. Os colonos acabavam endividando-se, em decorrência dos preços abusivos cobrados pelos donos das fazendas, que se aproveitavam dessa situação para manter o trabalhador sob seu poder.85 Estatutos da U.G.T., capítulo III, artigos 7/ 8, 1925.

50

que marcaram a atuação da associação nos seus primeiros anos de

funcionamento.

1.2.1.3. Os sócios.

51

Infelizmente, a escassez de documentos dificulta uma

avaliação minuciosa de certos aspectos que poderiam caracterizar o tipo

de sócio que a UGT atraiu quando começou a funcionar. Um dos

principais obstáculos com que nos deparamos é a falta de dados sobre o

número de sócios em todas as fases de atuação dessa organização, o

que acaba limitando a análise da sua influência sobre a classe

trabalhadora. Contudo, outros elementos suprem a falta de informações

quantitativas, permitindo que sejam esclarecidos alguns questionamentos

levantados.

A União Geral, entre 1925 e 1928, caracterizava-se por ser

uma instituição eclética, principalmente no que diz respeito à aceitação de

novos sócios. Bastava que fossem maiores de dezesseis anos e

pagassem regularmente as mensalidades, para que tivessem direito a

usufruir os benefícios concedidos pela União. O estatuto não classificava

os sócios quanto ao ofício ou classe social.

Esse ecletismo fica evidenciado quando se observam as

profissões de alguns dos primeiros diretores da UGT: sapateiros,

alfaiates, funcionários públicos, dentista, ourives, vendedores, advogados,

negociantes, professores, etc.86 A presença marcante de autônomos e

pequenos negociantes, ou seja, trabalhadores sem patrão, pode ser

explicada pela ausência da pressão patronal sobre essa categoria, o que

lhes permitia uma ação sindical mais independente. Outro fator que deve

ser considerado, é a dificuldade que se enfrentou na formação de grêmios

ou associações de ofício, em decorrência da dispersão dos trabalhadores,

caracterizada pela escassez de empresas que reunissem grande número

de funcionários de um mesmo ofício.87

86 Esses dados foram recolhidos em fontes variadas: prontuários do DEOPS, artigos de jornais e entrevistas.87 SIMÃO, A. Sindicato e Estado. Simão avalia o contexto sócio-econômico que permeou a criação das associações do tipo “União Geral”, pp. 176 - 199.

52

No que diz respeito à atuação dos sócios dentro da União

Geral, esta estabelecia uma série de exigências comportamentais. Um

dos deveres dos sócios era ter “bom procedimento na sociedade e fora

dela”88, evitando principalmente o alcoolismo. O desvio de comportamento

poderia implicar, entre outras coisas, a expulsão do sócio transgressor.

A idéia de promover a “solidariedade entre os sócios”

refletia-se na exigência, por parte dos estatutos, de todo membro ter de

contribuir financeiramente para o funeral dos associados, sendo

considerado um dever acompanhar os enterros.

Nesses primeiros anos de existência, a atuação da UGT foi

bastante limitada por fatores já avaliados anteriormente. Uma das suas

realizações era a organização de festas para arrecadação de fundos, já

que, aparentemente, a instituição enfrentava problemas financeiros.

Essas reuniões festivas eram sempre muito concorridas, utilizadas para

atrair novos membros.89 Além das festas, a União iniciou, na década de

20, um trabalho de conscientização dos trabalhadores, por meio de

distribuição de panfletos instrutivos e realização de reuniões semanais.

Outro movimento que se intensificou com a sua criação foi a

comemoração do dia 1.º de Maio, quando se faziam comícios e

passeatas.

88 Estatutos da UGT, Capítulo IV, Dos sócios, artigo 10, p. 7., 1925.89 Entrevista com Irineu de Moraes, 1996.

53

54

Capítulo 2. O PCB em Ribeirão Preto.

2.1. A repercussão da divulgação de A Classe Operária e do II

Congresso do PCB na região.

Mesmo com o seu caráter de “associação cooperativa e de

recreação”,90 a União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto _ UGT_

foi usada, desde a sua fundação em 1925, como área de atuação dos

comunistas ribeiropretanos. Entretanto, até 1928, a ação comunista

dentro da UGT não era hegemônica, e os militantes tinham que disputar

espaços dentro da instituição com associados com tendências ideológicas

variadas,91 especialmente a reformista. Essa disputa entre correntes

diferenciadas, dentro do meio sindical, fazia parte de um processo

nacional de consolidação da ação comunista no movimento operário. A

luta pelo controle dos sindicatos colocou o PCB em choque com os

dirigentes trabalhistas alheios as idéias anarco-sindicalistas e comunistas,

pessoas a que o Partido se referia como “amarelos ou reformistas”.92

Além de enfrentar a influência dos socialistas e anarquistas

no meio sindical durante os anos 20, o PCB enfrentava outro problema, a

falta de preparo ideológico dos militantes do Partido, resultante do

desconhecimento, pela maioria, das obras de Marx, que representavam o

fundamento doutrinário do PCB. As poucas publicações em português,

voltadas para fundamentar a ação do partido, eram traduzidas ou

elaboradas por Otávio Brandão. Na verdade, apesar de alguns exemplos

isolados, as obras de Marx só começaram a ser divulgadas no Brasil a

90 Estatutos da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, 1925, “Denominação e fins”, artigo1.91 Depoimento de Antônio Girotto.92 DULLES, J. F. W. Anarquistas e Comunistas no Brasil. p. 235.

55

partir da década de 30.93 Dessa maneira, o despreparo ideológico dos

membros do partido, a reação do governo contra a ação comunista e a

própria resistência dos trabalhadores em relação às idéias lançadas pelo

PCB acabaram resultando no “atraso da organização comunista”.94

Durante a realização do II Congresso do PCB, no Rio de

Janeiro, entre 16 e 18 de maio de 1925, constatou-se que,

numericamente, os sindicatos reformistas tinham mais força junto aos

trabalhadores do que os sindicatos anarquistas e comunistas95,

demonstrando que a ação do Partido Comunista tinha sido, até então,

pouco expressiva, e havia obtido poucos resultados, especialmente no

Estado de São Paulo.96

Em Ribeirão Preto a situação não era diferente. Entre 1922 e

1925, Guilherme Milani, Gustavo Wierman e Romulo Pardini saíam do

movimento anarquista para se tornarem os primeiros simpatizantes e

posteriormente, militantes comunistas da cidade,97 fundando e

organizando a UGT. Inicialmente, a União Geral aceitou em suas fileiras

membros de várias linhas ideológicas e ocupações profissionais,98 não

havendo exigências, nos estatutos de 1925, referentes à profissão dos

membros, determinando apenas que os sócios tivessem idade superior a

16 anos, pagassem uma espécie de taxa de adesão e acertassem

regularmente as mensalidades. Desse modo, os comunistas conviveram

93 MORAES Filho, Evaristo de. “A Proto - História do Marxismo no Brasil “, in História do

Marxismo no Brasil: o impacto das revoluções. pp. 9 - 15.94 CARONE, E. “Resolução sobre os relatórios do II Congresso do PCB”, in O PCB (1922

a 1943). pp. 37 - 38.95 VINHAS, Moisés. O Partidão. pp. 10 -11.96 CARONE, E. O PCB ( 1922 a 1943 ). pp. 37 - 38.97 Depoimento de Gustavo João Eugênio Wierman, 27 de junho de 1989, dado a Sebastião Geraldo.98 Estatutos da União Geral, op. cit., Capítulo IV, Dos Sócios.

56

com a influência reformista dentro da União e a combateram, a exemplo

do que ocorria nos meios sindicais em âmbito nacional.99

Essa aparente tolerância quanto à presença de membros

reformistas na UGT pode ser classificada como uma atitude de

cooperação para “organizar e reorganizar os trabalhadores”. Os

“amarelos” tinham maior influência junto à classe trabalhadora; portanto,

inicialmente, por intermédio da ação conjunta com esses líderes

trabalhistas, os comunistas poderiam ter maior facilidade na difusão e

propagação das suas idéias.100 Mas é preciso lembrar que o fato de

comunistas e reformistas atuarem juntos na União Geral, particularmente

entre 1925 e 1928, não eximia os dois grupos da tentativa constante de

conquistarem maior poder dentro da instituição, colocando-os, quase

sempre, em conflito de interesses.

O emprego da propaganda de forma mais acentuada e

elaborada foi outra das preocupações trazidas à tona durante o II

Congresso. As lideranças comunistas alertavam para a necessidade de

ampliar o raio de influência ideológica do PCB, aumentar o número de

membros e orientar sistematicamente os militantes na sua atuação,

objetivos difíceis de serem alcançados exclusivamente pela ação política.

Para equacionar o problema, o PCB criou, em 1925, um órgão oficial do

Partido, A Classe Operária, que favoreceu a consolidação e o

desenvolvimento da ação do Partido Comunista junto aos

trabalhadores.101

Nos seus primeiros números, A Classe Operária orientou os

militantes, repetidamente, ”na formação de uma grande frente única

operária no Brasil, na substituição dos sindicatos de ofícios pelos 99 C.f. nota 3. Dulles.100 CARONE, Edgard. Classes Sociais e movimento operário. pp. 124 - 125.

57

sindicatos de indústria e na importância de organizar melhor o movimento

sindical em São Paulo, considerado frouxo”.102 Essas orientações surtiram

efeitos práticos na região. Em Ribeirão, os comunistas, organizados em

uma fração sindical do Partido, preocuparam-se em consolidar sua

influência na UGT por meio de uma política de cooperação com outros

grupos. Igualmente, iniciaram a organização do sindicalismo local, nos

moldes propostos pelo órgão oficial do Partido Comunista do Brasil.

Mesmo com o trabalho de agitação e propaganda, iniciado

após o II Congresso, o movimento comunista em São Paulo pouco se

desenvolveu. No entanto, no interior do Estado, em Ribeirão Preto e em

Sertãozinho, o PCB formou núcleos de grande importância política e

sindical. Em Sertãozinho, as orientações do Partido, que chegavam à

região mediadas pelo semanário A Classe Operária, repercutiram com

mais força. Enquanto em Ribeirão Preto o núcleo comunista começava

embrionariamente a organizar-se e a atuar no meio sindical, Sertãozinho

já apresentava um ativo grupo de comunistas que se reunia na Liga

Operária Orestes Lascala.103 A Liga, comandada por Theotônio de Souza

Lima que, segundo Otávio Brandão, era um fabricante de foguetes que

aderiu ao Partido em 1925 depois de ter lido um exemplar de A Classe

Operária.104 A Liga tinha ideais comunistas bem definidos, difundidos no

seu órgão de imprensa de publicação quinzenal o 1.º DE MAIO, fundado

em maio de 1926 e dirigido por Thetônio.105 O núcleo de militantes reunia-

se periodicamente na sua sede, à Rua Barão do Rio Branco, n.º 15, para

discutir a ação comunista na cidade. A importância de Sertãozinho no 101 DULLES, J. F. W. Anarquistas e comunistas no Brasil, p. 227.102 Cf. nota 9.103 Prontuário de Guilherme Milani, caixa 11, Arquivo do DEOPS/SP.104BRANDÃO, Otávio. Otávio Brandão (depoimento, 1977). Rio de Janeiro,

FGV/CPDOC - História Oral, 1993, p. 110.105 DEL ROIO, José Luiz. 1.º de Maio, cem anos de luta - 1886 - 1986. Organizado pelo

Centro de Memória Sindical, São Paulo: Global, 1986. O livro traz cópias de edições comemorativas do 1.º de Maio, de jornais com tendências anarquistas e

58

movimento comunista da época é comprovada pela presença do

comerciário Sebastião Pintaúde na reorganização e fundação do novo

Comitê Regional do Partido Comunista em São Paulo, que se encontrava,

até então, desestruturado. Pintaúde tornou-se uma das principais

lideranças comunistas, compondo a oposição de esquerda dentro do

PCB.106

Além de Pintaúde, estavam entre os participantes da Liga

Operária: Carlos Guedes Vieira, Américo Marsilio, Carlos Gouveia,

Armando Chorati, Ângelo Chorati, Joaquim Freitas, José Guedes e o

próprio Theotônio Souza Lima, este último responsável pela publicação

do jornal.107 Ideologicamente mais amadurecido e coeso, o grupo de

Sertãozinho pretendia conquistar “para a luta nacional e internacional das

classes, os 15 mil trabalhadores da cidade”.108 O 1º de Maio atacava

sistematicamente o capitalismo e convocava o operariado para unir-se

contra o patronato, sem distinção de raça, credo ou profissão. No primeiro

número do jornal, Theotônio, líder do grupo, apresentou as

“Reivindicações e Palavras de ordem da Liga Operária”:

Primeira parte - Internacionais.Contra o pacto de segurança, que visa à intervenção na Rússia.

Contra a Liga das Nações, esteio da Inglaterra contra-revolucionária.

Contra a reação mundial. Contra o imperialismo, Contra a 2.ª

Internacional - esteio do imperialismo. Vitória completa da Rússia

sobre todos os seus inimigos. Independência dos povos coloniais. A

China liberta dos caudilhos e imperialistas. Frente única de todos os

trabalhadores das três Américas contra o imperialismo anglo-

americano. Unidade sindical internacional. Bloco mundial das massas

operárias e camponesas em torno da União Sovietista.

comunistas; entre eles foram encontradas duas edições do jornal publicado em Sertãozinho, encontrado pelo autor no acervo ASMOB, Milão.

106 CARONE, E. Classes Sociais e movimento operário. p. 148.107 Prontuário de Guilherme Milani, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.108 O 1.º DE MAIO, ANNO I, Sertãozinho, 22 de maio de 1926, número 2.

59

Segunda parte - nacionais. Econômicas: Baixa dos aluguéis, barateamento dos gêneros de

primeira necessidade. A grande propriedade sujeita ao imposto sobre

a renda.

Políticas: Restabelecimento das liberdades constitucionais. Prisão

política para os presos políticos. Voto secreto e obrigatório. Direito de

voto às mulheres. Facilidade do alistamento eleitoral.

Reconhecimento “de jure” da União Sovietista. Frente única dos

trabalhadores fabris, dos transportes e da lavoura. Aliança dos

operários municipais e do Estado, das mulheres trabalhadoras, dos

empregados pobres do comércio, dos correios, dos telégrafos e

telefones com o proletariado fabril sob a direção do PC. Apoio

Material e moral dos pequenos proprietários, das cidades e dos

campos, ao proletariado fabril, dirigido pelo PC. Contra a opressão do

governo de fazendeiros de café. Contra os partidos opressores do

proletariado. Contra o imperialismo anglo-americano e a 2.ª

Internacional que apóiam a atual reação brasileira. Contra os

capitalistas e os seus patrões imperialistas internacionais. Contra a

frente única socialista, amarela, anarquista, fascista e imperialista

visando à desagregação da vanguarda proletária. (...)109

O ataque veemente aos socialistas e ao imperialismo anglo -

americano mostram que o grupo comunista de Sertãozinho estava em

consonância com as resoluções do II Congresso, que orientava os

militantes a “levar por diante a luta ideológica tendente a despertar e

cristalizar a consciência de classe do proletariado. Estabelecer

nitidamente, em todas as lutas políticas do país, a diferenciação dos

interesses e da ideologia das classes. Combater energicamente erros,

desvios e ilusões tanto da extrema - esquerda anarquista como da direita

socialista”,110 mesmo atuando em forma de frente única com

trabalhadores dessas correntes ideológicas.

109 O 1º de Maio, Sertãozinho, número 1.110 CARONE, E. O PCB de 1922 a 1943. p. 39.

60

A Liga Operária de Sertãozinho iniciou sua atuação na

década de 20, tornando-se um importante núcleo de expansão dos ideais

comunistas no interior de São Paulo, num momento em que a ação do

PCB em São Paulo era limitada por seu reduzido número de militantes,

chegando a quase desaparecer. Entre 1925 e o início da década de 30, a

ligação entre os militantes da região de Ribeirão Preto (que inclui

Sertãozinho) e o grupo comunista paulistano estreitou-se. Membros das

duas cidades participaram da organização do Comitê Regional em 1927,

sendo responsáveis posteriormente pela fundação do BOC em Ribeirão.

A partir desse ano, as duas cidades despontaram como núcleos de

grande importância para o Partido, com atuação intensa no interior do

Estado.111 Em Ribeirão Preto, vários fatores combinados possibilitaram

que os comunistas conquistassem o poder hegemônico dentro da UGT,

expurgando a influência reformista e anarquista e tomando para si as

rédeas da sindicalização dos trabalhadores, ampliando e consolidando

sua influência política e sindical na região.

111 Idem, Classes Sociais e movimentos operários, pp. 147 - 148.

61

2.2. Os comunistas e a conquista da hegemonia da “União Geral dos

Trabalhadores de Ribeirão Preto”.

A partir da fundação da União Geral dos Trabalhadores, as

possibilidades e o espaço de atuação dos comunistas aumentaram na

região. O trabalho dos militantes dentro da UGT permitia um contato

direto com os trabalhadores, imprescindível para aumentar a confiança no

PCB, já que os operários demonstravam certa resistência às idéias

comunistas. “Isso pode ser explicado pela constante propaganda negativa

em relação ao partido, responsável por divulgar a idéia de que os

comunistas representavam uma ameaça real. Aderir à sindicalização ou

ao comunismo era sinônimo, para os trabalhadores, do prenúncio do

desemprego e de problemas com a polícia”, o que de fato não estava

longe da verdade. 112

Os fazendeiros estavam entre os que mais resistiam ao

processo de sindicalização dos trabalhadores. Usavam, como mecanismo

de coerção, a ameaça de expulsão dos colonos de suas terras,

aproveitando-se da grande onda de desemprego que se abateu sobre a

região de Ribeirão Preto na década de 30, particularmente nos meios

rurais. O poder coercivo dos fazendeiros, a falta de trabalho no campo

motivada pela crise que atingiu o setor cafeeiro, a reação do governo

contra os comunistas e a desconfiança dos camponeses em relação ao

PCB, acabaram prejudicando e retardando a sindicalização no campo,

que só tomaria impulso nas décadas de 40 e 50.

Mesmo com todos os problemas enfrentados, a atuação do

grupo comunista ribeiropretano tornou-se mais ampla, a partir de 1927,

especialmente entre os trabalhadores urbanos. Esse aumento da

62

influência comunista nas cidades teria sido favorecido pelo crescimento e

pela diversificação das atividades urbanas, que possibilitaram o

surgimento de um número maior de trabalhadores autônomos, desligados

da relação patronal e, conseqüentemente, mais ativos no movimento de

sindicalização.113 A falta de vínculos patronais tornava os trabalhos

sindical e político menos ameaçadores, um exemplo disso é que os três

principais fundadores da UGT eram trabalhadores autônomos: Guilherme

Milani, vendedor; Romulo Pardini, sapateiro, e Gustavo Wiermann,

pedreiro.

Outros fatores também foram determinantes no aumento da

influência comunista na região de Ribeirão Preto. Entre eles, a realização

do Terceiro Congresso Nacional do PCB_ entre os dias 29 de dezembro

de 1928 e 4 de janeiro de 1929_, que lançou a palavra de ordem: “À

conquista de São Paulo”, e a fundação do novo Comitê Regional de São

Paulo, em maio de 1927, considerado até então, pelo partido,

praticamente inoperante. Entre os fundadores e responsáveis pela

reorganização do novo CR em São Paulo estavam Everardo Dias, Plínio

Melo, o sapateiro Pissuti, o garçom Texeda, e alguns representantes do

interior, como o comerciário Pintaúde, de Sertãozinho. Com a ampliação

das atividades do partido em São Paulo iniciou-se a criação de novas

células na capital e no interior, e um trabalho mais efetivo por parte do

Agitprop (Agitação e propaganda), cujo secretário era Aristides Lobo. As

atenções dos militantes, sob a orientação do CR de São Paulo, deveriam

estar voltadas para a propaganda individual, a difusão da literatura

comunista, a agitação nas fábricas, a implantação do BOC (Bloco

Operário e Camponês ) e a expansão da ação prática ilegal.114 Todo esse

trabalho culminou com a consolidação de núcleos comunistas de grande

112 Entrevista com Antônio Girotto.113 Sobre as conseqüências da crise de 1929 em Ribeirão Preto e a diversificação das atividades econômicas na cidade ver o Capítulo 1.114 CARONE, E. Classes Sociais e movimento operário, pp 145 - 148.

63

intensidade no interior do Estado, especialmente em Santos, Ribeirão

Preto e Sertãozinho.

Como um reflexo desse trabalho de ampliação da ação

partidária em São Paulo, houve a visita de membros do partido a Ribeirão

e Sertãozinho entre 1927 e 1929, visando orientar o desempenho dos

núcleos comunistas no interior do Estado. Entre os visitantes podemos

citar Manuel Medeiros, Antônio Ribeiro e João Occhineri, que estiveram

na Liga Operária Orestes Lascala e na UGT a convite de Guilherme

Milani.115

A conseqüência desse contanto foi a implantação, em

Ribeirão Preto, do BOC ( Bloco Operário e Camponês ), cujas reuniões

ocorriam na residência do próprio Milani, na Rua Prudente de Moraes, n.º

118, com a participação constante de Gustavo Wierman, colaborador de

Milani, que nesse período era presidente da União Geral dos

Trabalhadores.116 Inicialmente, o objetivo do PCB _ao coordenar a

formação de uma chapa de candidatos sob uma única plataforma_ era

suprir a falta de condições reais do partido em participar do processo

eleitoral com candidatos próprios, sendo necessário recorrer à política de

frente única. “A plataforma do BOC pedia que seus candidatos

subordinassem suas atividades ao controle das massas. Entre os pontos

apresentados estavam: legislação social regulando a jornada de oito

horas, 48 horas semanais, contratos coletivos de trabalho, salário mínimo,

proteção à mulher e às crianças, proibição do trabalho de menores de

quatorze anos; seus candidatos deviam trabalhar pela abertura das

relações com a União Soviética, a anistia a todos os prisioneiros políticos

e pelo pagamento de indenizações aos sobreviventes deportados para

Clevelândia ou as suas famílias”. O BOC, que foi criado para dar acesso

115 Prontuário de Guilherme Milani, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.116 Idem.

64

legal aos membros do PCB ao processo eleitoral_ depois da Lei celerada

de 1927, que privava o Partido Comunista de atuar publicamente _,

tecnicamente substituiu-o, criando sedes em São Paulo e em cidades do

interior, como Ribeirão Preto, passando a atuar como organização quase

exclusivamente comunista, contrariando os princípios de frente única. 117

A atuação do BOC na política ribeiropretana aparentemente

acompanhou as determinações do BOC de São Paulo que, em 1928,

orientou seus partidários, no Estado, a votar nos candidatos do Partido

Democrático, fato que irritou os membros do Comitê Central do Partido

Comunista, que pretendiam que o Bloco paulista lançasse candidatos

próprios.118

As distorções de atuação do Bloco Operário e Camponês

relativas às diretrizes do partido e ao crescimento do seu prestígio em

detrimento do próprio PCB, culminaram com sua separação do Partido

Comunista, depois da realização do Terceiro Congresso do partido em

dezembro de 1928. Desde esse momento, o BOC passou a ser uma

organização de frente entre outras no Brasil.119

A atuação do BOC em Ribeirão Preto esteve ligada ao

núcleo comunista e, conseqüentemente, à UGT até 1930, quando ainda

constatamos a ligação entre os seus candidatos e os militantes do PCB. O

relativo prestígio junto aos grupos políticos de esquerda, como o Partido

Democrático, conquistado com a atuação dos comunistas do Bloco

favoreceu a ampliação da ação partidária na organização sindical. Essa

117 “Brasil: Las fuerzas, las tendenciais y las perspectivas del movimiento sindical”. El Trabajador Latino Americano, ano 1, n.º 3, 15 de octubre de 1928, pp. 21-23. Transcrição do documento contido em PINHEIRO, P. S. e HALL, M. A Classe Operária no Brasil ( Documentos 1889 a 1930 ), pp. 285 - 291.118 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, pp. 291 - 293.119 PINHEIRO, Paulo Sérgio e HALL, Michael M. A Classe Operária no Brasil:

Documentos ( 1889 a 1930 ), p.291.

65

influência consolidou-se quando o núcleo comunista tornou-se

hegemônico na União Geral dos Trabalhadores, fato ocorrido no mesmo

período da realização do III Congresso Nacional do Partido. Nesse

momento, a UGT de Ribeirão e a Liga Operária Orestes Lascala, de

Sertãozinho, eram notadamente consideradas como organizações

revolucionárias, sob o total controle dos comunistas, e com importância

reconhecida pela imprensa internacional voltada ao movimento operário

latino-americano.120

Entre as resoluções do Congresso sobre a “atividade

comunista nos sindicatos operários”, foram feitas críticas ao “espírito

corporativista”, adotado até então, à influência anarco-sindicalista nos

sindicatos, e à “falta de um trabalho de conjunto metódico, sistemático e

coletivo”.121 Apoiados nessas resoluções e no contexto favorável de

relativa liberdade política, em fevereiro de 1929, os sócios da UGT

registraram em cartório novos estatutos que vinham sendo elaborados

desde o ano anterior, com clara influência comunista. A partir desse

momento, a ação comunista na UGT passou a ser declarada, tornando

essa instituição a sede do comitê municipal do Partido Comunista em

Ribeirão Preto.

A confirmação da influência comunista no movimento

operário na região de Ribeirão acompanhou um movimento de

consolidação nacional do PCB, que passou por uma reestruturação entre

os anos de 1928 e 1930, marcada pela mudança de tática e pela queda

de velhas lideranças do Comitê Central, como Astrojildo Pereira. Entre as

modificações ocorridas está o estabelecimento de um controle mais

acentuado da ação do partido por parte da Internacional Comunista, por

intermédio do Bureau Sul - americano, que passou a exercer grande 120 C.f. nota 27.

66

influência junto ao PCB. Esse controle teve como conseqüência a adoção,

pelo Partido Comunista do Brasil, a partir de 1930, do lema “classe contra

classe”, proposto no Sexto Congresso da IC, em 1928. Essa mudança,

que acabou com a política de “frente única” adotada até então, levou o

Partido a atuar de forma mais sectária e provocou profundas mudanças

no Comitê Central.

Em Ribeirão, essas medidas modificaram a atuação dos

militantes, que pode ser avaliada por intermédio dos novos estatutos,

elaborados em 1928 e oficializados em 1929.

121 CARONE, E. “O III Congresso (dezembro de 1928 - janeiro de 1929)”, in O PCB

(1922 a 1943), pp. 73 - 74.

67

2.2.1. A mudança nos estatutos.

Os comunistas, de 1922 a 1928, circunstancialmente

aceitaram a tática de ligar-se a sindicatos de outra orientação ideológica,

até porque, durante o III Congresso Nacional, o próprio partido admitiu

que a base da ação do PCB estava nos sindicatos, onde eram

encontrados os mais ativos militantes. Portanto, justificava-se a política de

cooperação adotada pelos comunistas com o intuito de conquistar espaço

de atuação no movimento sindical. 122

No final da década de 20, começavam a aparecer os

primeiros sinais da política de “classe contra classe”, fruto das resoluções

do Sexto Congresso da Internacional Comunista, realizado em 1928. A

linha ultra-esquerdista, que predominou na IC, passou a hostilizar os

movimentos democráticos e reformistas, acusando-os de serem agentes

do imperialismo. Essa posição oficializada pela IC influenciou

profundamente a posição ideológica do PCB; um dos resultados diretos

dessa influência foi a inviabilidade do convívio entre comunistas e

membros de outras correntes ideológicas dentro dos sindicatos. A

conseqüência foi o choque entre o PCB e os sindicalistas, provocando a

exclusão daqueles que tinham posições mais moderadas e não

desejavam a revolução armada.

Entre as décadas de 20 e 30, a UGT tornou-se a instituição

sindical de maior expressão em Ribeirão Preto, transformando-se numa

organização exclusivamente comunista. Os militantes do PCB

conseguiram expurgar as demais correntes ideológicas que atuavam

122 CARONE, E. Classes Sociais e Movimento Operário,pp 158 - 168.

68

dentro da organização, a exemplo do que já havia acontecido em

Sertãozinho com a Liga Operária Orestes Lascala, em 1926.

Assumiram a diretoria da União Geral dos Trabalhadores

homens reconhecidamente comunistas que passaram a atuar livremente

dentro da instituição. Alguns deles permaneceram na UGT até as décadas

de 40 e 50, como Pedro Campana, João e Angelo Pontim e Guilherme

Milani. Henrique Covre assumiria posição de destaque dentro da União

como militante comunista, arregimentando novos membros, distribuindo

jornais comunistas e servindo como contato entre o Comitê Regional de

São Paulo e o recém - constituído comitê ribeiropretano.

No quadro 1, podem-se observar as funções, os membros e

as responsabilidades da primeira diretoria da UGT depois da reformulação

dos estatutos. O número de membros foi reduzido de dezoito para sete,

tendo sido excluídas partes da diretoria, como a junta de socorros, a junta

cooperativa e o recebedor, responsável pelas cobranças. O secretário -

geral tornou-se membro de destaque na diretoria e assumiu uma função

representativa na instituição, ficando responsável por representá-la em

congressos e reivindicar, juntamente com os trabalhadores, direitos

econômicos, mediando as negociações entre o proletariado e o patronato.

Além das funções sindicais do secretário - geral, este deveria cuidar dos

interesses dos “camaradas” presos, providenciando recursos financeiros

para as famílias até sua liberação.

As atividades do presidente da União Geral dos

Trabalhadores ficaram restritas às funções legais de administração,

totalmente desligadas de qualquer atividade política que pudesse vincular

explicitamente a instituição ao PCB.

69

Quadro. 1123

Membros da diretoria da UGT em 1929.

Cargo Nome ResponsabilidadesPresidente Pedro Campana Dirigir o destino da União.

Presidir reuniões.

Convocar assembléias

Fiscalizar todos os membros

da diretoria.

Vice – presidente João Pontim Auxiliar e substituir o

presidente.

Tesoureiro Domingos Benetti Organizar as finanças da

instituição.

Secretário geral Angelo Pontim Inscrever novos sócios.

Mediar negociações com os

patrões.

Impetrar habeas corpus em

favor de sócios coagidos.

Lutar pela lei de férias com

propaganda direta.

Estar presente durante os

congressos.

Secretário de atas Guilherme Milani Redigir as atas.

Substituir o secretário-geral.

1.º Secretário de expediente Sic.124 Confeccionar convites para

reuniões.

Substituir o secretário de atas.

2.º Secretário de expediente Henrique Covre Receber as queixas dos

associados.

Auxiliar o 1.º secretário e

substituí-lo, se necessário.

123 Estatutos da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, Cap. 11, Da Diretoria, administração e representação, 16 de fevereiro de 1929.124 O nome do 1.º secretário de expediente está ilegível na documentação.

70

Guilherme Milani, militante de maior destaque na região, foi

o responsável pelo projeto de reformulação dos estatutos da União.

Depois de reformulados nos moldes necessários para facilitar a ação

comunista dentro da União Geral dos Trabalhadores, os estatutos foram

revisados por uma comissão formada por cinco militantes: Pedro

Campana, presidente da UGT em 1929; Cesar Tupynambá Roselino,

professor; Angelo De Gaetani, comunista atuante; Izaac Camargo e

Canuto Barbosa Vieira.125

No texto dos novos estatutos é possível perceber com

clareza a influência das idéias comunistas. A utilização de expressões

próprias desse grupo, como “camarada”, demonstram a despreocupação

com o sigilo das atividades. Entretanto, a mudança mais expressiva foi a

exclusão do texto do capítulo 1.º: “Denominação e fins”, do caráter de

associação cooperativa e recreativa da UGT, transformando-a numa

associação com a finalidade de promover a “defesa e solidariedade da

classe e dos associados, proporcionando a estes assistência econômica,

intelectual, moral, social e judiciária”.126

As atividades de recreação e a cooperativa de alimentos,

que anteriormente caracterizavam a UGT, passaram a ser desenvolvidas

a reboque da ação comunista. As festas e bailes promovidos pela

instituição começaram, desde então, a arrecadar fundos para a UGT, a

fim de socorrer os companheiros em dificuldades financeiras e para

financiar a confecção de panfletos para a “instrução” dos trabalhadores.127

Outra atividade realizada para promover o levantamento de fundos era a

arregimentação de colaborações entre os simpatizantes do partido.

125 Estatutos da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, p. 7.126 Estatutos da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, Cap. 1, Denominação e fins, art. 1.º, 1929, p. 1.127 Entrevista realizada com Irineu de Moraes em 1995.

71

Para executar esse trabalho era escolhido um militante com

bom relacionamento na cidade, o que facilitava o contato com os

colaboradores. Essa atividade, chamada de “fazer finanças” pelos

militantes, era de grande importância, pois o dinheiro obtido era utilizado,

entre outras coisas, para socorrer as famílias dos camaradas” presos.128

A exclusão do caráter de associação cooperativa da

denominação da UGT demonstra o interesse em não desviar a atenção

dos militantes do principal objetivo da instituição: lutar pela sindicalização

e pela organização política dos trabalhadores. Entretanto, a fundação de

uma cooperativa de consumo, mesmo que secundariamente, continuou

fazendo parte dos planos da UGT, fato consumado no mesmo período da

reestruturação dos estatutos.

Entre todas as funções já existentes na União desde 1925,

ano da sua fundação, a de secretário geral foi a que sofreu maiores

modificações. Enquanto ao presidente cabia dirigir os destinos da UGT e

responder judicialmente por ela (funções burocráticas dentro da

organização sindical), ao secretário-geral foram atribuídas funções

políticas e atividades ligadas diretamente à “agitação das massas”, como

“fazer a massa compreender a importância da Lei de Férias e ajudar os

sócios coagidos”. O escolhido para essa função foi Angelo Pontin, que

permaneceu atuando na UGT e militando pelo partido até a década de 40.

A presença da luta pela implantação da Lei de Férias nos estatutos da

UGT, como uma das principais funções do secretário-geral, demonstra o

posicionamento dessa instituição quanto à legislação social, fato que pode

ser explicado pela luta dos comunistas a favor das leis sociais junto ao

Departamento Nacional do Trabalho. Muitas organizações operárias

passaram a apoiar a aplicação da Lei de Férias, que enfrentava grande

resistência por parte dos industriais do Rio de Janeiro e de São Paulo. 128 Entrevista realizada com Luciano Lepera, militante comunista e jornalista, 1997.

72

Outra modificação efetuada nos estatutos foi a eliminação da

antiga “Junta de Socorros”, cuja comissão fazia parte da diretoria geral da

UGT. Em seu lugar foi criada uma “Caixa de Socorros” , com uma

diretoria paralela cuja única função era administrar fundos para socorrer

associados enfermos, sem o direito de voto na diretoria geral. O fato de a

UGT ter mantido o programa assistencial, representado pelo auxilio

financeiro aos enfermos, como pagamento a médicos, a farmácias,

enterro de associados e, posteriormente, assistência odontológica,

demontra a preocupação com o bem-estar social dos seus membros e

com a necessidade de criar atrativos para conquistar novos contingentes

para a organização sindical.

Entretanto, se a intenção era ampliar a quantidade de

sócios, as exigências para novas adesões tornaram-se muito mais rígidas.

Os estatutos de 1925 permitiam a adesão de qualquer pessoa maior de

dezesseis anos e que pagasse regularmente suas mensalidades, o que

possibilitava a formação de um quadro de associados bastante

heterogêneo.

Os estatutos de 1929 mantiveram a exigência de idade,

contudo havia um incentivo ao ingresso de membros jovens e de

mulheres para possibilitar a fundação das “seções feminina” e da

“juventude proletária”. O incentivo consistia na dispensa do pagamento da

“jóia”_ uma espécie de taxa de adesão _, e no oferecimento de escolas,

palestras, etc. Essa preocupação com a fundação de seções de mulheres

e, principalmente, de jovens, justifica-se pelas resoluções tomadas

durante a realização do II Congresso do PCB, em 1925, quando se

recomendou ao Partido que cuidasse da organização das “juventudes

comunistas”, importantes para a “conquista de jovens obreiros e

proletários”. A mesma preocupação perdurou no III Congresso, em 1928,

73

pois o desempenho e os trabalhos da juventude comunista, liderada por

Basbaum, não foram considerados satisfatórios. Como resultado dessas

orientações a seção comunista de Ribeirão Preto, que tinha como sede a

própria UGT, usou esta instituição como veículo para arregimentar e

organizar os jovens simpatizantes comunistas.129

Tendo a idade necessária, o pretendente a associado tinha

de cumprir outras exigências, entre elas, ter bons antecedentes e bom

comportamento social. Além disso, o secretário-geral, encarregado da

adesão de novos sócios, deveria restringir a inscrição de membros que

não vivessem de “salários ou ordenados” e que não fossem

“trabalhadores”. Seria prematuro avaliar essa exigência dos estatutos

como um primeiro sinal de proletarização do partido, que mais tarde seria

chamada de “obreirismo”. Afinal, entre 1928 e 1930, o Partido ainda

defendia a política de frente única e tinha muitos intelectuais em sua

direção, como Octávio Brandão e Astrojildo Pereira. Por outro lado, seria

difícil acreditar que as resoluções tomadas no VI Congresso da IC, onde

teve início o processo de proletarização do movimento comunista, teriam

chegado a Ribeirão antes mesmo de terem surtido na capital. Contudo,

mesmo havendo um núcleo do BOC em Ribeirão, o que caracterizava a

política de frente, nos finais da década de 20 já era possível sentir os

primeiros indícios, mesmo que embrionários, da política obreirista na

atuação do núcleo comunista em Ribeirão Preto.

Outro fator que deve ser analisado com cuidado é a

intenção, oficializada no texto do novo estatuto, de transformar a UGT

numa federação sindical de zona que deveria compor a futura Federação

Sindical de São Paulo, cuja criação estava sendo incentivada pelo porta -

voz do Partido paulista, o jornal O Internacional, que recebia amplo apoio

129 CARONE, E. O P.C.B. ( 1922 a 1943 ). pp. 41- 42.

74

do núcleo comunista ribeiropretano.130 A transformação da UGT em

federação sindical de zona não chegou a ser concretizada, porém mesmo

assim a sua influência no meio sindical regional cresceu no fim da década

de 20.

Na verdade, todas as modificações ocorridas nos estatutos

da UGT, tornando-a uma organização com claros fins políticos

influenciados pela ideologia comunista, são o resultado do crescimento do

núcleo comunista em Ribeirão Preto, do amadurecimento da ação do

PCB no âmbito nacional, e da própria radicalização do movimento, que

optou pela ofensiva direta. O objetivo era promover a conscientização da

massa trabalhadora do seu papel social de motor propulsor da revolução,

procurando mobilizá-la para essa meta.

As organizações sindicais, como a UGT, era usadas pelos

comunistas como ambiente de contato com os trabalhadores, que eram

incentivados pelos militantes a se sindicalizaram e a participarem da vida

do partido. Dessa maneira, a UGT tornava-se não apenas uma

organização de reivindicações com fins econômicos e sociais, mas

também uma instituição política, dominada, hegemonicamente pela fração

sindical do PCB de Ribeirão Preto, que objetivava, dentro dessa

instituição, introduzir os sócios na militância comunista.

130 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, pp. 288 -291.

75

2.3. A organização do comitê municipal do Partido Comunista do

Brasil em Ribeirão Preto.

O Partido Comunista do Brasil, a exemplo de outros partidos

políticos, tinha uma estrutura organizacional que lhe permitia orientar seus

quadros partidários quanto a objetivos políticos, metas e tarefas sujeitos a

um sistema hierárquico de autoridade e a uma distribuição de poder bem

definidos.

Tendo como elemento chave de atuação a disciplina rígida

dos seus militantes, o PCB lutou para transformar-se na instituição

representativa da classe operária. Sua estrutura vertical de poder

caracterizava-se por divisões: nacional, regionais e municipais. No âmbito

nacional atuavam o Comitê Central, que englobava a liderança mais alta

do Partido, e a Comissão Central Executiva ou Comissão Executiva, que

exercia efetivamente as decisões do Comitê Central. Da Comissão

Executiva era tirado o secretariado, autoridade máxima dentro do Partido,

cuja personalidade dominante era o secretário - geral. 131

Nos escalões intermediários de poder estavam o Comitê

Regional ou Estadual, o Comitê Municipal ou Zonal e as Células. Os

membros de cada nível tinham a responsabilidade de transmitir as

diretrizes do Partido, determinadas durante os Congressos Nacionais, e

organizar a ação partidária dentro da sua jurisdição. As células eram as

raízes do Partido, organizadas conforme os locais de trabalho ou de

moradia , com no mínimo três membros cada uma. Eram responsáveis

131 CHILCOTE, R. H. Partido Comunista Brasileiro: conflito e integração, pp. 163 - 164.

76

pela ampliação e renovação do quadro de militantes e pelo levantamento

de fundos, além de reunirem-se para discutir o marxismo - leninismo.

Fica difícil afirmar a existência de um Comitê Municipal

estruturado em Ribeirão Preto, entre 1922 e 1928. Todos os indícios

apontam para a atuação de militantes dispostos em células, nesse

período. Aos poucos, aumentaram sua ação e organização até que, no

final da década de 20, seriam os responsáveis pela composição do

Comitê Municipal ribeiropretano, com aproximadamente dez militantes

estabelecidos e atuando na sede da União Geral dos Trabalhadores.

A demora na formação de um Comitê Municipal pode ser

explicada pela dificuldade de atuação do partido, marcado por longos

períodos de ilegalidade, que acabaram favorecendo, nos primeiros anos,

o estabelecimento de estruturas menos complexas, como as células e as

frações. Assim, permitia-se a militância dentro de instituições sindicais,

fábricas e organizações camponesas de jovens e mulheres, tendo cada

fração o seu secretariado e um mínimo de três membros. 132 A fração

sindical do PCB em Ribeirão acabou se transformando num grupo

hegemônico, permanecendo assim até o final da década de 30.

O grupo comunista atuante em Sertãozinho, região de

Ribeirão, também militava dentro de uma organização operária, a Liga

Operária Orestes Lascala. Esse núcleo era mais estruturado e

ideologicamente melhor preparado, chegando a publicar um jornal

comunista na década de 20. Os grupos das duas cidades parecem ter

agido, até 1928, de forma distinta, sendo a Liga Operária mais ativa na

área de agitação e propaganda junto aos trabalhadores do meio rural,

enquanto o núcleo ribeiropretano preocupava-se em ganhar espaço

dentro do meio sindical urbano.

77

Entre janeiro e agosto de 1927, o Partido Comunista viveu

um curto período de legalidade,133 que acabou contribuindo para o

aumento do seu número de membros e da capacidade organizativa do

Partido em todo o país, possibilitando a fomentação da propaganda

partidária, a estruturação definitiva do Bloco Operário e Camponês e o

aumento da influência comunista em São Paulo, onde o Partido, até

então, encontrava-se pouco desenvolvido nos setores político e sindical.

Uma liberdade maior de atuação dos membros do Partido, favorecida pela

legalidade, e o crescente interesse dos comunistas pela “conquista de

São Paulo” estimularam e possibilitaram a instalação, em Ribeirão Preto,

de uma “fração” do Partido Comunista do Brasil. Ribeirão, uma das

cidades mais importantes do país em decorrência das grandes safras de

café, aparecia como campo fértil para a atuação dos comunistas, que

tinham a intenção de iniciar um “trabalho de base” com os trabalhadores

na “cartilha comunista”, por intermédio da distribuição de boletins de

propaganda e reuniões de “instrução”.134

A fim de realizar esse trabalho doutrinário junto aos

trabalhadores rurais, os militantes pediram aos membros do Comitê

Regional para lhes enviarem material de propaganda que tivesse uma

linguagem mais acessível aos trabalhadores rurais, que só assim

poderiam compreender melhor as idéias comunistas.135

Além do trabalho de propaganda política e revolucionária

efetuado com os camponeses da região, os militantes do PCB, atuantes

em Ribeirão e em Sertãozinho, passaram a provocar debates de fundo

econômico e social, forma de atrair para a causa comunista os

132 Ibidem, pp. 164 - 170.133 Ibidem. pp. 63.134 Prontuário de Henrique Covre, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.135 Prontuário de Caetano Scavone, n.º 273, caixa 17. Arquivo do DEOPS/SP.

78

trabalhadores rurais, num momento em que se iniciava um longo período

de desemprego e miséria crescentes motivado pela crise no setor

cafeeiro. Liderados por Theotônio de Souza Lima, os comunistas

organizaram a “marcha de camponeses”. Entre as principais

reivindicações estavam: a conquista da garantia e fiscalização, por parte

dos trabalhadores, sobre os contratos de trabalho; salários de acordo com

o custo de vida; oito horas de trabalho para os operários agrícolas e terra

para os que nela trabalhassem. Cartazes com essas reivindicações foram

espalhados pela área rural de Sertãozinho e Ribeirão, convocando os

trabalhadores rurais para uma reunião no dia 17 de novembro de 1929, na

Liga Orestes Lascala.

Para organizar esse encontro de trabalhadores rurais e

discutir a ação comunista na região, reuniam-se Theotônio de Souza Lima

e Pedro Siqueira Martins, de Sertãozinho; Gustavo Wierman e Angelo De

Gaetani, de Ribeirão, além de outros membros da Liga Operária, como

Carlos Guedes Vieira. Pedro Siqueira, então residente em Cafelândia, era

o responsável pelo recebimento do material de propaganda vindo do

Comitê Regional e pela organização de um novo núcleo comunista, já

com oito membros, na cidade onde residia. Os jornais “Jovem Proletário”

e “Classe Operária” chegavam a Ribeirão e região pelo correio, enviados

por Florêncio Tejeda, representante de São Paulo, ou eram retirados

pessoalmente por Pedro Siqueira na capital, no restaurante “Pátria”, na

Rua da Mooca, 431. Um membro da “Juventude Comunista” da região, F.

Gouveia, era o responsável pela distribuição e cobrança do material.

Gouveia, residente em Sertãozinho, em uma de suas cartas enviadas a

Pedro Siqueira, relatou que o partido estava ganhando terreno junto aos

jovens do centro de esportes e às mulheres, sendo que quatro estavam

participando das reuniões. Descreveu ainda a realização de uma reunião

79

“colosso”, em 1929, com a presença de membros do PCB de São

Paulo.136

A influência progressiva dos comunistas sobre os

camponeses e os trabalhadores urbanos na região de Ribeirão era

evidente, fato que acabou provocando uma conseqüente reação da

polícia. A Delegacia de Ordem Política e Social, ao ficar sabendo da

reunião programada para o dia 17 de novembro de 1929 enviou um

grupo de inspetores para investigar a ação do PCB. Essa diligência no

interior desmantelou a reunião da Liga Operária, e manteve detidos por

mais de um mês, no Gabinete de investigações, os líderes da Liga Carlos

Guedes Vieira e Armando Chorati.

Também foi possível, por parte da polícia, detectar o

crescimento evidente da ascendência comunista sobre os trabalhadores

da região de Ribeirão, tanto no meio rural quanto no urbano. Os policiais

também constataram o estreitamento dos laços entre os comunistas

ribeiropretanos e o Comitê Regional do Partido, com o qual os militantes

locais mantinham contatos periódicos, o que aguçou ainda mais o

interesse do DOPS pela região de Ribeirão Preto. Um exemplo disso são

as cartas enviadas ao PCB por Henrique Covre, eleito em 1929 para o

cargo de 2.º secretário de expediente da UGT. Elas mostram a ligação

explícita entre a UGT e o PCB, ao qual Covre informava sobre a atuação

do partido em Ribeirão, mantendo o Comitê Regional ciente do progresso

das atividades comunistas nesse local. Dentre as várias informações,

havia a da precária situação financeira da fração comunista na cidade,

demonstrada pela dificuldade em receber as mensalidades dos sócios da

UGT. Esse problema era o resultado da grave crise econômica enfrentada

pelos trabalhadores e por toda a economia a partir de 1929, quando os

preços do café _ principal produto da economia local _ começaram a cair, 136 Prontuário de Pedro Siqueira Martins, n.º 382. Arquivo do DEOPS/SP.

80

levando vários fazendeiros à falência. O problema da falta de dinheiro

prejudicava a confecção de material de propaganda e,

conseqüentemente, dificultava a atuação dos militantes. Mesmo assim, e

com o trabalho penoso durante a ilegalidade partidária, a influência

comunista entre os ribeiropretanos continuou crescendo, favorecida pelo

método de ação direta e pela utilização da UGT como veículo legal de

atuação do Partido. A miséria enfrentada pelos trabalhadores era a

justificativa para a fomentação de idéias que pregavam uma mudança

radical na sociedade.137

A intensificação da ação comunista dentro da União Geral

dos Trabalhadores, a partir de 1928, despertou o interesse da polícia

também sobre essa instituição sindical, que havia passado despercebida

até então, justamente em decorrência da sua atuação pouco expressiva

dos pontos de vista político e sindical.138 Em 1929, logo após o registro

em cartório do segundo estatuto da UGT _ reformulado sob a influência

das idéias comunistas _, a Delegacia de Ordem Política e Social enviou a

Ribeirão Preto um “secreta” para investigar a atuação do PCB junto à

União Geral, fato que se tornou corriqueiro a partir de então. O “secreta”

apresentou-se na sede da UGT, na Rua Saldanha Marinho, n.º 154, como

representante do PCB proveniente do Rio de Janeiro. Por esse meio,

visitou a cooperativa de alimentos da sede, discutiu com Pedro Campana,

um dos líderes comunistas, a respeito da situação da UGT e do PCB em

Ribeirão, rumando depois para Sertãozinho, onde participou de reuniões

na Liga Operária Orestes Lascala. Assim conseguiu relacionar os nomes

dos principais militantes comunistas do interior e a importância das suas

atividades. Como resultado desse levantamento, a campanha policial

137 Prontuário de Henrique Covre, caixa 11, Arquivo do DEOPS/SP. 138 Não foram encontrados prontuários ou documentos nos Arquivos do DOPS, confeccionados no período anterior a 1929. Os prontuários mais antigos, que datam desse mesmo ano, são de Carlos Guedes Vieira, líder da Liga Operária Orestes Lascala, de Sertãozinho, e de Henrique Covre, um dos líderes da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto.

81

contra os comunistas do interior do Estado se intensificou, colocando as

atividades desenvolvidas pelos membros da UGT e da Liga Operária sob

suspeita, e dificultando a realização de manifestações e de comícios.

Também a militância sindical foi abalada, especialmente a de Guilherme

Milani (líder da fração ribeiropretana do partido e da UGT até o início da

década de 30), a de Henrique Covre (homem de ligação entre o núcleo

comunista de Ribeirão e o CR, que atuou em Ribeirão até meados da

década de 30, quando deslocou-se para o Rio Grande do Sul e

posteriormente para São Paulo, onde atuou no Comitê Regional), e a de

Carlos Guedes Vieira ( líder do grupo comunista de Sertãozinho).

A estrutura organizacional da fração comunista de Ribeirão

Preto e região seguia os moldes hierárquicos estabelecidos pelo Comitê

Central. No entanto, não apresentava um corpo independente, e usava

como fachada para a militância a estrutura da UGT e da Liga Operária

Orestes Lascala, atuando dentro das suas sedes.

Quanto à ação política do partido em Ribeirão, seu resultado

foi pouco expressivo. A atividade ilegal, a reação da polícia e a falta de

recursos impediam que a fração comunista tivesse grande influência no

processo eleitoral local até 1945. Restava aos militantes integrar outra

legenda, ou, até o final da década de 30, atuar por intermédio do BOC.

Com suas atividades organizadas em Ribeirão e região por

Guilherme Milani e Gustavo Wierman, o Bloco Operário e Camponês não

chegou a ter uma participação expressiva na política local. Seus membros

nem puderam comparecer ao comício 7 de novembro de 1929,

interrompido ao meio pela polícia139 na Praça Marechal Floriano, em São

Paulo, quando foi anunciado o nome de Minervino de Oliveira como

candidato do BOC para a Presidência da República, e para Deputado

82

Federal o do gráfico Mário Grazini, representante paulista,140 nem mesmo

realizaram comemorações do aniversário da revolução bolchevique, como

estava determinado pelo Partido. Este fato teve de ser explicado pelos

militantes locais ao Comitê Regional, que voltava suas atenções para

Ribeirão Preto, considerada uma cidade promissora para a ação

comunista, em decorrência da sua importância econômica e pelo seu

grande número de trabalhadores.141

Em plena campanha para as eleições de 1930, o Bloco

Operário e Camponês lançou o lema: “votar no PCB é votar pela

revolução”, que parece não ter motivado a classe operária, que em parte

apoiava a Aliança Liberal com o “PROGRAMA SOCIAL” de Vargas. Ao

mesmo tempo, a polícia fechava o cerco em torno dos candidatos do

BOC, impedindo comícios, manifestações e a distribuição de propaganda

partidária.142

Em busca dos votos do interior e da ampliação da ação

comunista entre os camponeses, foi programado pelo BOC e pelo PCB

(que participou ativamente da organização, convocando os principais

militantes do interior143) o “Congresso dos colonos e trabalhadores

agrícolas” para o dia 12 de janeiro de 1930, em Ribeirão Preto. O

congresso, presidido por Minervino de Oliveira, reuniu na sede da União

Geral dos Trabalhadores mais de 200 pessoas, na maioria colonos.

Compareceram também representantes comunistas de outras cidades,

nas quais o movimento operário avançava, como Cruzeiro, onde os

trabalhadores estavam organizados na Associação Operária 23 de

Agosto, sob a presidência de José Mendes de Moraes.144 Juntamente

139 Idem.140 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil. pp. 332 - 333.141 Prontuário de Henrique Covre, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.142 DULLES, J. W. F., op. cit., p. 338.143 Prontuário de José Mendes de Moraes, n.º 277. Arquivo do DEOPS/SP.144 Idem.

83

com Minervino, compunham a mesa, dirigindo as discussões da reunião,

alguns dos principais líderes comunistas locais: Ângelo De Gaetani,

Ricardo Pinatti, Guerino Benassi145 e Rômulo Pardini.

Antes que o congresso terminasse, a polícia invadiu o

recinto e prendeu todos os componentes da mesa, inclusive Minervino de

Oliveira, que foram enviados ao Gabinete de Investigações e ali

permaneceram presos. Com a prisão dos principais líderes

ribeiropretanos e a crise interna atravessada pelo PCB, as atividades

políticas dos comunistas em Ribeirão arrefeceram nos três primeiros anos

da década de 30.146

Em vista da dificuldade de ação política dos comunistas,

muitos optaram por atuar utilizando a legenda do Partido Socialista

Brasileiro. Ângelo De Gaetani, um dos militantes mais atuantes do PCB

na cidade, foi um dos primeiros a estabelecer um relacionamento político

entre o recém-criado PSB e os comunistas locais, chegando a fazer parte

do conselho consultivo do Partido Socialista147, sem, entretanto,

abandonar suas atividades junto ao núcleo comunista ribeiropretano.148

Nesse período, o PSB desenvolveu importante atividade em Ribeirão

Preto elegendo o Dr. André Veríssimo Rebouças como prefeito, e um

representante local, Antônio Alves Passig, para a chapa do partido que

concorreria às eleições para a Assembléia Constituinte. Também

organizou, em abril de 1933, o “Congresso dos Prefeitos Socialistas”,

quando se decidiu pela intensificação da propaganda socialista e pela

valorização do esclarecimento da doutrina, visando às eleições de 3 de

maio de 1933.149 Nesse período, esteve em Ribeirão Preto Edmundo

Moniz, líder comunista da capital. Em várias cartas enviadas de Ribeirão 145 Prontuário de Guerino Benassi, n.º 4.204. Arquivo do DEOPS/SP.146 Prontuário de Minervino de Oliveira, n.º 345. Arquivo do DEOPS/SP.147 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 12 de abril de 1933.148 Entrevista com Antônio Girotto.

84

ao Comitê Regional, Edmundo constatou que, nos primeiros anos da

década de 30, a grande maioria do operariado aderiu ao Partido

Socialista, que tinha o apoio do Delegado Regional de Polícia.150

Mesmo com as divergências ideológicas e táticas existentes

entre o PSB e o PCB, especialmente quanto à revolução armada _ com a

qual não concordavam os socialistas, chamados pelos comunistas de

“reformistas” _, militantes dos dois partidos estabeleceram ligações

estreitas que permitiam, ainda que de forma restrita, a atuação dos

comunistas no PSB.

Como a atuação da fração comunista era cada vez mais

difícil na política local, os militantes do PCB voltaram suas atenções, com

mais afinco, para o processo de sindicalização dos trabalhadores.

Seguindo orientações do Terceiro Congresso Nacional do Partido,

iniciaram a criação, a partir da UGT, de sindicatos de categorias

profissionais dos setores industriais, com o intuito de transformar a UGT

numa associação de grau superior no âmbito regional.151

149 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 26 de abril de 1933.150 Informação obtida de CAMPOS, Alzira Lobo de Arruda, conforme documentos do arquivo Lívio Barreto Xavier. CEDEM.151 SIMÃO, Azis. Sindicato e Estado, pp. 170 - 171.

85

2.4. O trabalho de sindicalização e a reação do governo contra os

comunistas após o movimento de 1935.

A necessidade de ampliar a influência dos comunistas no

processo de sindicalização dos trabalhadores foi uma das resoluções

tomadas durante a realização do Terceiro Congresso Nacional do Partido

Comunista do Brasil. Considerou-se, durante o congresso, ineficiente a

ação do Partido nas instituições sindicais, declarando-se a importância da

unicidade sindical baseada na formação de federações regionais.

Para o PCB, seus militantes estavam efetuando uma

atuação restrita que não ia além dos limites dos sindicatos, ignorando as

federações operárias e o próprio Partido.152 Essa orientação

desencadeou, na região de Ribeirão Preto, uma ação mais efetiva de

propaganda e de organização entre os trabalhadores rurais e urbanos,

que passaram a associar-se, em número considerável, à UGT e à Liga

Orestes Lascala. O auge dessas instituições ocorreu durante a realização

do Congresso de Colonos e Trabalhadores Agrícolas e da Conferência

Sindical Regional de São Paulo, nos quais a União Geral e a Liga tiveram

participação efetiva.

No entanto, as prisões de alguns dos principais líderes da

UGT, efetuadas em 1930, e de dois membros importantes da Liga

Operária de Sertãozinho, em 1929, como também de Pedro Siqueira

Martins e Henrique Covre, em 1931, abalaram o desempenho dos

militantes nessas instituições.153 Em 1932, a ação da UGT limitou-se às

comemorações do 1º de Maio, com a realização de uma passeata que

não teve grande repercussão, a exemplo das comemorações do 1º de

152 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, pp. 305.153 Ibidem, p. 398

86

Maio realizadas pelo PCB em São Paulo e no Rio de Janeiro.154 Essa

situação piorou com o engajamento de comunistas, como Ângelo Di

Gaetani, na Revolução de 32, fato que provocou a reação da polícia,

prejudicando ainda mais a ação do Partido.

Além dos problemas internos sofridos pelo Partido, o

governo provisório iniciou um programa social que atraiu a simpatia dos

trabalhadores, dificultando ainda mais a ação dos comunistas. A idéia do

progresso ligado à ordem serviu como ideologia para a definição das leis

sociais, sob a pressão do BIT ( Bureau Internacional do Trabalho ) e dos

proletários que reivindicavam melhores condições de vida.155 Dentro

desse programa de reformas sociais, um dos atos mais polêmicos foi a

promulgação do decreto que regularizava a sindicalização das classes

patronais e operárias. Esse decreto, de número 19.770, foi aprovado em

19 de março de 1931 por Oswaldo Aranha, Lindolfo Collor e Getúlio

Vargas. A Lei de Sindicalização, como ficou conhecido o decreto, tinha

como objetivo definir e regular a formação dos sindicatos, federações e

confederações, possibilitando a intervenção do Estado nos sindicatos e

determinando que estes mantivessem rigorosa neutralidade política. A

sindicalização dos trabalhadores deixava de ser uma ameaça para o

governo e passava a representar uma boa oportunidade para manter sob

controle o movimento operário, usando para isso os órgãos

representativos dos trabalhadores.156

O PCB foi contra a Lei de Sindicalização, denunciando o

caráter demagógico da ação do Ministério do Trabalho, sob a liderança de

Lindolfo Collor. O Partido acusava o governo de encher de promessas o

operariado enquanto cerceava seus direitos de liberdade de organização,

proibindo as reuniões e intensificando a reação contra as organizações 154 Diário da Manhã, 1º de maio de 1932: a data de hoje. 1. 5.32, pp. 6.155 CARONE, E. Brasil: Anos de Crise, p. 44.

87

operárias independentes. Contudo, apesar das críticas de comunistas e

anarquistas, o número de sindicatos _ apoiados e regulamentados pelo

Ministério do Trabalho _ cresceu rapidamente, ocorrendo a proliferação

de instituições sindicais regularizadas pelo governo:

Quadro. 1157

Sindicatos 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937Empregados 32 83 141 111 73 242 234 Empregadores 3 4 59 256 126 132 189 Profissionais liberais 1 ---- 3 20 20 30 19 Trab. Autônomos ---- 1 3 3 5 12 22

O aumento considerável de sindicatos, entre 1932 e 1933,

representa o período de campanha intensa pela sindicalização e

alistamento eleitoral dos trabalhadores, efetuada também em Ribeirão

pela imprensa local, que enaltecia a importância da sindicalização dos

trabalhadores. A queda em 1935 foi determinada pelo fechamento dos

sindicatos de esquerda, após o movimento comunista ocorrido em

novembro do mesmo ano. Em 1936, o número de sindicatos voltou a

crescer favorecido pela Constituição de 1934, que reformou o decreto de

1931, passando a vigorar a pluralidade sindical e ocorrendo um “inchaço”

dos sindicatos.158

A partir de 1936, o número de sindicatos “ministerialistas”

cresceu acima das expectativas do governo, chegando, em 1938 a 2.000

sindicatos, e atingindo o ápice de crescimento em 1940: 156 DULLES, J. W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil, pp. 373 - 376.157 Tabela retirada de CARONE, E. Brasil: Anos de crise, p. 53

88

Quadro. 2159

Tipos de Sindicatos número de sindicatos número de associados

Empregados 1 149 351 574 Empregadores 999 24 423 Profissões liberais 123 10 252 Por conta própria 83 2 895

Diante do contexto desfavorável para a sindicalização

independente e da crescente influência do governo sobre os sindicatos, o

PCB de São Paulo, em 1932 (posteriormente o PCB em nível nacional)

iniciou uma política de cooperação com os sindicatos reconhecidos pelo

Ministério do Trabalho, com o propósito de assegurar um possível

controle sobre eles.160

Como resposta a essa orientação do CC, os comunistas

ribeiropretanos, bastante desarticulados em razão da perseguição policial,

iniciaram um processo de sindicalização dentro da União Geral dos

Trabalhadores, que desempenhou papel de destaque na organização,

orientação e formação de sindicatos em Ribeirão Preto. Esta cidade

chegou a atingir a cifra de dez sindicatos regulamentados pelo Ministério

do Trabalho e reunidos sob a bandeira da “União dos Sindicatos”.161

158 CARONE, E., op. cit., p. 53159 CARONE, E., op. cit., p. 53.160 DULLES, J. W. F., Op. cit., pp. 416 - 417.161 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 1º. de julho de 1937, “União dos Sindicatos”.

89

90

2.4.1. A atuação dos comunistas na campanha de sindicalização dos

trabalhadores ribeiropretanos.

Já em 1932 apareceram os primeiros sinais da campanha

pela sindicalização dos trabalhadores, levada a cabo pelo Ministério do

Trabalho. De forma cautelosa, o “Diário de Notícias”, jornal local,

publicava alguns artigos que alertavam para os perigos e enumeravam os

benefícios da Lei de Sindicalização.162 A principal preocupação dos que

não concordavam com o decreto era a possibilidade de os sindicatos

servirem aos interesses políticos de uma minoria, crítica feita também

pelos comunistas. No entanto, quanto mais avançava a campanha

ministerialista e diminuía a liberdade de imprensa, mais os jornais locais

ressaltavam a importância da sindicalização dos trabalhadores como

forma de defesa dos direitos da classe operária, mesmo sob o controle

do governo.

O núcleo comunista local, abatido pela repressão efetuada

pelo governo após o movimento paulista de 1932, reconhecia a

importância de manter-se em contato com os trabalhadores, buscando

ampliar sua influência sobre suas organizações representativas. Para

tanto, os poucos militantes ainda atuantes engajaram-se na campanha de

sindicalização em massa, cujo início prático ocorreu em janeiro de 1933,

quando a UGT tornou-se oficialmente o órgão de sindicalização e

alistamento eleitoral do operariado. A expectativa local era atingir a meta

de 5.000 eleitores alistados em Ribeirão Preto até as eleições para a

Assembléia Constituinte.163

162 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 24 de fevereiro de 1932.163 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 1º. de janeiro de 1933 e 18 de fevereiro de 1933.

91

A campanha de sindicalização e alistamento, acompanhada

por funcionários do Ministério do Trabalho, foi apoiada pela Associação de

Comércio, pela imprensa local, pela Igreja Católica e pelo Partido

Socialista Brasileiro, que viam no sindicalismo a “base das organizações

futuras”.164

Nesse período, os comunistas perderam a presidência da

UGT. Guilherme Milani, líder da União desde 1925, um dos mais ativos

militantes comunistas, em 1933 aderiu à “Ação Integralista” ribeiropretana.

De acordo com Antônio Girotto, seu companheiro de atuação na UGT na

década de 50, Milani e muitos outros iludiram-se pelos ideais

nacionalistas dos integralistas, e mais tarde se decepcionaram com o

movimento. Em 1934, assumiu a presidência da instituição João Gomes

da Rocha, comerciante, dono de uma funerária, que tinha idéias

esquerdizantes moderadas, mas sem ligações com o Partido Comunista

nesse período. Como secretário-geral da instituição assumiu Vitaliano

Mauro, simpatizante do partido desde meados da década de 20.165

Mantinham-se ainda na UGT alguns militantes

remanescentes da década de 20: Ângelo De Gaetani, Rômulo Pardini e

Pedro Campanha. No entanto, o esquema de repressão policial e a

importância estratégica de manter a polícia longe da UGT, permitindo sua

atuação legal, fizeram com que esses velhos militantes e outros mais

novos, como Quinhonero, atuassem pelo partido em sigilo, distribuindo

boletins de propaganda comunista fora da instituição, e dentro dela

apoiando a sindicalização ministerialista.

Dessa maneira surgiu, em Ribeirão Preto uma dezena de

sindicatos, a maior parte deles com sede, inicialmente, na União Geral

164 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 29 de janeiro de 1933.165 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 12 de fevereiro de 1933.

92

dos Trabalhadores: Sindicato dos Sapateiros, Sindicato dos Alfaiates,

Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Mobiliária, Sindicato dos

Metalúrgicos, Sindicato dos Empregados em Hotel, Bar e

Estabelecimentos Congêneres, Sindicato dos Gráficos, Sindicato dos

Empregados em Indústrias de Bebidas, Sindicato da Construção Civil,

Sindicato dos Empregados em Panificação, Pastifícios e Similares. Além

desses, a UGT tentou a organização do Sindicato dos Operários em

Serraria e Carpintaria, bem como a do Sindicato dos Pintores e

Marmoristas, que não temos informações se estes foram oficializados.

Com a ampliação do movimento ministerialista, a intenção

inicial dos comunistas de obter o controle sobre os sindicatos legalizados

começou a fracassar, e também com a influência dos comunistas na

União Geral dos Trabalhadores. Os primeiros sinais de fracasso

apareceram já em 1933, quando vários membros do partido foram presos

pela polícia local depois das eleições para a Assembléia Constituinte.166

Nesse mesmo ano, o Supremo Tribunal Eleitoral negou a autorização

para o PCB atuar legalmente, fazendo com que os militantes recorressem

à legenda, já registrada, da União Operária e Camponesa,167 não

conseguindo eleger nenhum representante comunista para a

Assembléia.168

Mesmo com sua influência enfraquecida dentro da

instituição, os comunistas participaram ativamente da campanha de

arrecadação de fundos para a construção da sede própria da UGT,

inaugurada em 4 de janeiro de 1934, e construída pelos próprios

associados. No prédio da União passaram a atuar vários sindicatos

ministerialistas, que se mantiveram ligados a UGT até 1941. 166 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 22 de junho de 1933.167 A União Operária e Camponesa do Brasil foi organizada em Ribeirão Preto, Rio Claro, Campinas, Barretos e outras localidades do interior com a participação do PCB. Arquivo do DEOPS, prontuário 2431 do PCB, volume 1.

93

Foto comemorativa da fundação da sede própria da União Geral dos Trabalhadores de

Ribeirão Preto. 04 de janeiro de 1934. Acervo privado de Antônio Girotto.

Apesar da cooperação dos comunistas com o processo de

sindicalização ministerialista, eles foram bastante criticados pelo governo

em razão do seu sistema de organização dos trabalhadores. Enquanto os

membros do PCB tinham esperanças de obter o controle sobre os

sindicatos recém-criados, eles foram atuando em forma de cooperação

com o PSB e, inicialmente, até mesmo com os integralistas. No entanto,

entre 1934 e 1935, a política do PCB em relação à sindicalização ligada

ao Ministério do Trabalho modificou-se, assumindo uma posição contrária

ao governo provisório. O Partido organizou convenções de sindicatos

locais, tentando afastá-los da influência do governo.169 Durante as

convenções, aproveitava-se da situação de crise econômica do país para

frisar que Vargas não havia cumprido suas promessas de resolver os

problemas dos trabalhadores, dos quais um dos mais evidentes era o

desemprego.170

168 DULLES, J. W. F. Anarquistas e comunistas no Brasil, pp. 405 - 408.169 CHILCOTE, R. H. O Partido Comunista Brasileiro, pp. 76 - 77.170 DULLES, J. W. F. Anarquistas e comunistas no Brasil pp. 400 - 408.

94

A ação contra os sindicatos ministerialistas e o governo

Vargas intensificou-se nos anos posteriores à revolução de novembro,

tendo ocorrido lutas internas entre comunistas e governistas dentro da

União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, quando os membros do

PCB perderam o poder hegemônico sobre essa instituição.

95

2.4.2. A repressão policial contra os comunistas e a decadência da

atuação do Comitê Municipal em Ribeirão Preto.

A atividade de propaganda política do PCB tomou novo

fôlego em 1935, aparentando que o núcleo comunista ribeiropretano se

reorganizaria. Boletins de propaganda eram distribuídos nos sindicatos e

centros esportivos, pregando a revolução e a luta contra a “Ação

Integralista”, fundada no final de 1932.

A intensificação da militância relacionava-se com a mudança

de diretrizes do PCB. A política chamada de obreirismo, adotada nos

primeiros anos da década de 30, começou a dar sinais de arrefecimento

já em 1934. O Partido abandonou sua linha de ação sectária para dar

início a uma política de “frente popular”, envolvendo-se na formação da

Aliança Nacional Libertadora e na unificação do movimento operário, que

pretendia concentrar sob a liderança comunista.171 Essa mudança estava

ligada ao movimento mundial contra o nazi - fascismo, apoiado pela

URSS e adotado pela IC em 1935.

O resultado dessa tendência antifascista foi a execução, por

parte do Partido, de um programa intenso de propaganda contra os

integralistas, a partir de 1934, provocando choques entre a Ação

Integralista e o PCB. Em Ribeirão, a nova sede da UGT foi depredada em

março de 1935, sendo encontradas do lado de fora do prédio inscrições

de “fora, comunistas”. O atentado foi levado a cabo por um grupo de

jovens integralistas que acusavam a UGT de exercer atividades políticas e

abrigar militantes do PCB. O movimento integralista ganhava força na

171 CHILCOTE, R. H. Partido Comunista Brasileiro, pp. 70 - 80.

96

cidade, reunindo cada vez mais adeptos, especialmente entre os

jovens.172

Além dos choques com os integralistas, a fração sindical do

PCB teve de enfrentar a ampliação da ação repressiva da Delegacia

Regional de Polícia, que intensificou as investigações da atuação

comunista na UGT, mantendo essa instituição sob constante vigilância. A

situação agravou-se depois da organização da Aliança Nacional

Libertadora em Ribeirão Preto, em 6 de julho de 1935. Com sede na Rua

José Bonifácio, n.º 36, bem próxima à UGT, a ANL reuniu várias

agremiações no seu curto período de existência legal na cidade. O

presidente do diretório local, Antônio Campos, conseguiu a adesão oficial

da UGT, do PSB e dos comunistas. Durante a assembléia realizada para

eleger a diretoria, discursaram várias pessoas conhecidas na cidade:

Cezar Tupynambá Roselino, professor, membro da UGT e um dos

comunistas responsáveis pela reformulação dos estatutos de 1929; Emílio

José dos Campos, funcionário postal; José Alvarenga Ortiz, farmacêutico

e membro da UGT; João Vaz, garçom; Luiz Ladeira, eletricista; e Affonso

Rogerio (ou Affonso Victor Ruggiero), membro do PSB. Além deles,

participaram da ANL: Gustavo Wierman, membro da UGT e comunista;

Gercino Alves de Souza, guarda civil; Nicomedes Padilha, operário da

Cervejaria Antárctica, onde participava de um célula comunista

juntamente com Wierman; Rômulo Pardini, sapateiro, um dos fundadores

da UGT e um dos primeiros comunistas de Ribeirão, e Ângelo Di Gaetani,

pedreiro, também um dos membros fundadores da UGT e comunista

atuante.173 As informações sobre a quantidade de membros que a ANL

chegou a ter em Ribeirão são desencontradas; José Alvarenga Ortiz,

172 O decreto n.º 19.770, de 1931, e revisado em 1934, proibia as instituições sindicais de exercerem qualquer atividade política, visando coibir a ação dos comunistas nos sindicatos.173 Diário de Notícias, Ribeirão Preto, 6 de julho de 1935.

97

diretor da UGT, declarou que a Aliança chegou a ter mais de 50 membros,

incluindo João Gomes da Rocha, então presidente da UGT.174

Nesse período, o prestismo já havia se firmado como

tendência predominante entre os comunistas, com uma grande força

entre os membros da ANL, que elegeram Luís Carlos Prestes seu

presidente de honra, em março de 1935.175 A aproximação entre o PCB e

Prestes ocorrera de forma lenta, passando pelos primeiros contatos com

Astrojildo Pereira, em dezembro de 1927, quando Prestes recebeu do

secretário - geral do Partido Comunista “uma dúzia” de livros de autores

marxistas. A conversa entre os dois não surtiu efeitos práticos, entretanto,

serviu para aproximar o “Cavaleiro da Esperança” da teoria marxista.176

Mais tarde, em 1929, Luís Carlos Prestes encontrou-se com Leôncio

Basbaum, que lhe fez um convite para candidatar-se à Presidência da

República pelo PCB. Prestes não aceitou o convite, pois não concordava

com o programa político apresentado por Basbaum.177

A aproximação definitiva de Prestes com o comunismo

ocorreria em 1930, quando, por intermédio de um manifesto, ele se

declarou publicamente comunista. Mesmo estando por um período na

URSS, Prestes confirmou sua influência decisivamente durante a

realização da 1.ª Conferência Nacional do PCB, em julho de 1934,

quando Antônio Maciel Bonfim, de tendência nada sectária, assumiu o

cargo de secretário-geral do partido. Bonfim tornou oficial a adesão de

Luís Carlos Prestes ao PCB em 1.º de agosto do mesmo ano, afirmando a

linha prestista dentro do partido.178

174 Arquivo do DEOPS, prontuário n.º 3.735, de José Alvarenga Ortiz, vulgo Julinho.175 CHILCOTE, R. H., op. cit., pp. 70 - 79.176 PINHEIRO, Paulo Sérgio. Estratégias da ilusão: a revolução mundial e o Brasil,

1922 - 1935, pp. 210.177 Ibidem, p. 218.178 DULLES, J. W. F., op. cit., pp. 419 - 420.

98

Prestes voltou ao Brasil em abril de 1935, acompanhado de

membros do Komintern. Sua responsabilidade era organizar a revolução

proletária no Brasil sob a liderança do PCB. Da fase conhecida como

obreirismo _ quando os comunistas ribeiropretanos deixaram barba e

cabelo crescerem e assumiram uma posição sectária em relação a outras

facções dentro da UGT _, os militantes locais adotaram lentamente a

“política de frente” e tomariam, na segunda metade da década de 30,

posição favorável a Luís Carlos Prestes, inaugurando a fase que ficou

conhecida como “prestismo”, que se firmaria na década de 40.179

O ano de 1935 foi marcado por um trabalho de propaganda

revolucionária. O Bureau de Fração Sindical Nacional, em julho do mesmo

ano, enviou a todas as frações do partido circulares orientando a

militância, que deveria fixar-se nos seguintes pontos:

“A luta contra as tendência de recuo, que não acreditavam

na realização da revolução.

Os militantes deveriam engajar-se nas lutas reivindicatórias

dos trabalhadores pela resolução de problemas imediatos,

como o direito a oito horas de trabalho e aumento de salário.

Todos os militantes deveriam protestar contra o fechamento

da Aliança Nacional Libertadora, organizando

demonstrações de rua.

Insistir no funcionamento das frações como organismos que

levam a linha do partido na impulsão das massas. 179 Entrevista com Carlos Di Gaetani, filho de Ângelo Di Gaetani.

99

As frações devem ser responsáveis pela organização de

frentes de luta.”

Os militantes locais distribuíram essas orientações entre os

membros das células, especialmente nas mais importantes, como as das

Cervejarias Antárctica e Paulista, lideradas respectivamente por Gustavo

Wierman e Nicomedes Padilha.180

Com a militância já organizada no meio urbano, a maior

preocupação dos líderes era conquistar a confiança dos trabalhadores

rurais, junto aos quais os trabalhos partidário e sindical estavam pouco

desenvolvidos.

Quase nada se fizera desde a realização do Congresso dos

Colonos e Trabalhadores Agrícolas, em 1930, quando os comunistas

tentaram, sem sucesso, organizar os colonos e pequenos proprietários

agrícolas em uma frente única. Além da propaganda direta, realizada

com a distribuição de boletins, pouco fora feito pelos militantes locais a fim

de arregimentar os trabalhadores para o movimento revolucionário. Essa

dificuldade de atuação estava ligada à desarticulação entre os militantes e

à dificuldade em receber orientações mais detalhadas do Comitê

Regional. No dia 29 de julho de 1935, a polícia descobriu o local de

recebimento do material de propaganda: a caixa dos funcionários postais

na agência dos correios em Ribeirão Preto. O material chegava em nome

fictício José Alves da Silva, e era retirado pelo simpatizante do partido,

Joaquim Gonçalvez Piraí, funcionário da agência postal, e levado para

sua casa. Dante Sartori era o militante responsável pela retirada dos

100

boletins na casa de Piraí, e pela distribuição do material de propaganda

nas células.181

Com essa descoberta e com a prisão de Joaquim Gonçalvez

e Dante Sartori, tornou-se ainda mais difícil a comunicação entre a fração

comunista local e o CR de São Paulo. Em cartas enviadas ao Comitê

Regional, os líderes do núcleo comunista ribeiropretano pediam ajuda

para adiantar o trabalho entre os camponeses, explicando que este

encontrava-se atrasado e que não existia nenhum sindicato camponês na

região. A falta de conhecimento dos líderes do PCB em relação à situação

real de organização dos militantes em Ribeirão Preto era patente.

Também a falta de recursos financeiros e de militantes preparados fazia

com que o trabalho fosse pouco produtivo. As raras tentativas do PCB de

enviar gente para orientar o desempenho da fração acabaram em

fracasso.

Nena, militante paulista, foi encaminhada a Ribeirão para

organizar a juventude comunista; entretanto, sua inexperiência e as

suspeitas dos colegas de que fosse uma informante fizeram com que os

líderes da fração a mandassem de volta a São Paulo. O envio de

militantes despreparados para orientar o trabalho partidário em Ribeirão

Preto repetiu-se outras vezes, irritando os comunistas locais. Estes

reclamavam das orientações generalizadas dirigidas pelo Comitê

Regional, que não davam condições práticas para orientar de forma

pragmática a atuação dos militantes da fração sindical comunista. 182

As razões desse desencontro entre a fração ribeiropretana e

o Comitê Regional de São Paulo estão relacionadas com a intensificação

da repressão policial determinada pelo governo provisório, e com a falta 180 Prontuário de Gustavo Wierman, n.º 3.307. Arquivo do DEOPS/SP.181 Prontuário de José Alves da Silva, n.º 271. Arquivo do DEOPS/SP.

101

de condições materiais e humanas do Comitê Central do PCB,

responsável pela articulação da ação partidária em todos os níveis

hierárquicos do partido. Para os militantes ribeiropretanos, o resultado

desse processo de desarticulação foi a desinformação quanto à ação

revolucionária de tomada de poder que estava sendo elaborada pelos

líderes comunistas e aliancistas.

Enquanto no Rio de Janeiro Prestes e os seus aliados

organizavam um movimento revolucionário, em Ribeirão Preto, os

membros do PCB estavam às voltas com as eleições municipais,

distantes dos acontecimentos na capital federal. O Partido Republicano

Paulista e o Partido Constitucionalista entraram em contato com os

comunistas, pedindo apoio para as eleições. Os militantes do PCB

recusaram-se a fazer alianças partidárias, e por falta de orientação do CR

quanto a que partido deveriam apoiar, ficaram fora do processo eleitoral.

O Comitê Municipal do PCB em Ribeirão Preto acabou

ficando à margem do processo de elaboração do movimento

revolucionário, que vinha sendo desenvolvido sob a liderança do PCB. Em

outubro de 1935, os militantes ainda não tinham informações sobre a

presença de Prestes no Brasil e sobre a possibilidade de realização da

revolução ainda naquele ano. Nos dias 29 e 30 de novembro, cinco dias

depois do início do movimento no Nordeste, os comunistas

ribeiropretanos ajudaram a organizar o Sindicato dos Empregados em

Bebidas e o Sindicato dos Metalúrgicos, com os quais estavam

inteiramente envolvidos.183

182 Prontuário de Caetano Scavone, n.º 273. Arquivo do DEOPS/SP.183 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 29 e 30 de novembro de 1935.

102

Não é surpresa que os militantes locais não soubessem do

início do movimento, já que este pegou de surpresa até mesmo o

comando revolucionário instalado em São Paulo.

A falta de ligação dos militantes locais com o movimento

revolucionário não amenizou a ação da polícia, que iniciou uma série de

prisões. Entre os presos estavam simpatizantes comunistas, membros da

fração sindical em Ribeirão e membros da extinta Aliança Nacional

Libertadora. Entre novembro e dezembro de 1935 foram presas 16

pessoas, entre elas Rômulo Pardini, Gustavo Wierman e Nicomedes

Padilha. Pardini e Wierman, após a saída de Guilherme Milani do PCB,

representavam a liderança máxima do núcleo comunista na cidade,

juntamente com Ângelo Di Gaetani.

Os primeiros a ser presos foram Gustavo Wierman, José

Alvarenga Ortiz e Rômulo Pardini, todos membros de destaque da União

Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto. As prisões acabaram

abalando profundamente a influência comunista dentro da instituição, que

passou a ser constantemente vigiada pela Delegacia Regional de Polícia.

Na tabela a seguir estão relacionados os nomes das

pessoas presas logo após o movimento de novembro de 1935,

acompanhados de sua respectiva atuação política e datas das prisões. Quadro. 3184

Prisões efetuadas entre novembro e dezembro de 1935.

Nome Tendência partidária Data da prisão

Gustavo Wierman Comunista e membro da

UGT.

5 / 12 / 35

Affonso Victor Ruges ou

Afonso Rogério.

Membro do PSB e da

ANL.

5 / 12 / 35

184 Prontuário do PCB, n.º 237. Arquivo do DEOPS/SP.

103

Nicomedes Padilha Comunista participante

da célula da Cervejaria

Paulista.

Dez/35

Antônio Campos Presidente da ANL Dez/35

José Alvarenga Ortiz Vice-presidente da UGT,

simpatizante do PCB e

membro da ANL.

5 / 12 / 35

Aristides S. Coelho Membro da ANL. Dez/35

José Pardo membro da ANL Dez/35

Olympio Ribeiro de

Oliveira

Simpatizante do PCB,

lavrador em Pontal,

região de Ribeirão Preto.

31 / 12/ 35

Rômulo Pardini Líder da fração

comunista e membro da

UGT

8 / 12 / 35

Olívio de Souza membro da ANL 17 / 12 / 35

Nazareth Fábio membro da ANL 14 / 12 / 35

Gercino Alves de Souza Guarda Civil e membro

da ANL

05 / 12 / 35

José Patrocínio

Nascimento

Membro da ANL. 16 / 12 / 35

Esmerindo P. Silva Membro da ANL. 16 / 12 / 35

Clomiro F. Oliveira Membro da ANL. 16 / 12 / 35

Joaquim Freitas Membro da ANL. 31 / 12 / 35

104

Gustavo Wierman, reprodução de 1996 de fotos tiradas pelo DEOPS/SP para

qualificação, 1935

Rômulo Pardini, reprodução de 1996 de fotos tiradas pelo DEOPS/SP para qualificação,

1935

As prisões criaram um clima de medo em Ribeirão. A

repressão policial intensa representada nas sucessivas prisões deixaram

praticamente acéfalo o núcleo comunista local. Os poucos militantes que

continuaram atuando entre 1935 e 1940, entre eles Ângelo de Gaetani,

Pedro Campana, Vicente Quinhonero, Rômulo Pardini e Wierman _ estes

dois últimos entre uma prisão e outra _, resumiram suas atividades a

pichações de muros, especialmente da Igreja Matriz, com frases de vivas

ao comunismo, e distribuição de boletins de propaganda, que eram

jogados nas varandas das casas e nas ruas durante a noite, para evitar a

polícia.185

Em 1936 ocorreu uma nova onda de prisões. A polícia

capturou um grupo de simpatizantes comunistas que se reunia com Jacob

Benjamin Leipzig, membro da “tropa de choque” da Aliança Nacional

185 Diário da Manhã, 19 de abril de 1936.

105

Libertadora, em São Paulo, durante a revolta comunista, em novembro de

1935. Leipzig foi preso após o movimento; quando solto, rumou para

Ribeirão Preto, onde reunia-se com Aristides Esteves, Fioravante

Marighetti, José Ramos e Otávio Carvalho na residência de Emídio de

Carvalho, na tentativa de formar um núcleo de distribuição de

propaganda. Contudo, não chegaram a desenvolver atividade de

militância.

Depois de ter recebido a ficha policial de Leipzig, e

suspeitando de atividade comunista, a polícia arrombou a casa de Emídio

de Carvalho no dia 15 de maio de 1936, e levou os “camaradas” presos

para São Paulo. Após terem sido interrogados na Superintendência de

Ordem Política e Social, foram enviados para o presídio Maria Zélia, onde

estavam também, entre outros, Sebastião Francisco (líder do Comitê

Regional do PCB em São Paulo) e Clemente José da Silva (ferroviário da

Alta Mogiana, acusado de atividades subversivas).

Para conseguir o respaldo judicial para a prisão, a polícia

alegou ter encontrado “farto material subversivo” no local da apreensão, e

obteve, por intermédio de violentas formas de coerção, a confissão dos

presos. Leipzig foi colocado nu durante 24 horas numa cela, sendo

submetido constantemente a castigos físicos. Clemente, em

conseqüência das surras durante os 14 meses de prisão, ficou com

graves problemas pulmonares, vindo posteriormente a perder parte de um

pulmão.186 Em 1938, os acusados conseguiram o depoimento de José

Augusto Leomil, agente que participou da apreensão. Leomil declarou não

ter apreendido nada durante a diligência, desmascarando a farsa policial.

Sem provas suficientes contra os simpatizantes do PCB, o Juiz do

186 Entrevista realizada com Clemente José da Silva por Sebastião Geraldo em 30 de novembro de 1988.

106

Tribunal de Segurança Nacional absolveu os acusados, em 29 de julho de

1938.

Antes da absolvição, em 21 de abril de 1937, Leipzig,

juntamente com Sebastião Francisco, participou de uma tentativa de fuga

do presídio, que acabou numa verdadeira chacina. Jacob Benjamim

Leipzig teve concussões no osso malar e na espádua, e ficou com uma

perna esfolada. Sebastião Francisco foi ferido nos quadris. Cinco fugitivos

foram mortos sumariamente.187 Numa tentativa mais bem sucedida de

fuga, Henrique Couvre, detido no mesmo presídio, fugiu três dias depois,

em 24 de abril de 37, voltando a ser visto somente em 1945, quando foi

novamente detido juntamente com Paulo Lacerda.188

Enquanto as prisões se multiplicavam por todo o país,

respaldadas pelo “estado de guerra” estabelecido pelo governo de Getúlio

Vargas, durante todo o ano de 1937 a imprensa de Ribeirão Preto reuniu-

se num movimento que era chamado de “CONTRA O COMUNISMO”. A

emissora de rádio local PRA-7 e o Diário de Notícias encabeçaram a

propaganda anti-comunista patrocinada pelo Centro de Imprensa de

Ribeirão Preto. Durante a campanha eram frisados os malefícios do

comunismo e o perigo representado pelos “extremistas vermelhos”. A

propaganda ampliou a tensão entre a polícia e os poucos simpatizantes e

militantes do Partido que ainda residiam na cidade. Em outubro de 1937,

a polícia iniciou uma terceira onda de prisões. Capturou Luiz Ladeira e

Américo Costa, membros da guarda civil e simpatizantes do comunismo,

e Fioravante Marighetti, Aristides Esteves e Gustavo Wierman, que

respondiam em liberdade a processos judiciais por subversão.189

187 DULLES, J. F. W. Comunistas no Brasil, pp. 87 - 92.188 Prontuário de Henrique Couvre, caixa 11, Arquivo do DEOPS/SP.189 Prontuário de Jacob Benjamin Leipzig, Arquivo do DEOPS/ SP.

107

Jacob Leipzig, reprodução de 1996 de foto tirada pelo DEOPS/SP para qualificação, em

03.08.1936.

Fatos como esses desestimularam a militância comunista,

que se tornou praticamente nula até 1941. Os comunistas perderam o

controle sobre a UGT, que passou a ser controlada por João Gomes da

Rocha, então simpatizante não declarado do PCB, de atuação sindical

moderada, dentro das normas do Ministério do Trabalho. A influência da

UGT no meio sindical, nesse período, diminuiu. A instituição limitou-se a

alugar sua sede para os sindicatos devidamente legalizados pelo

Ministério de Trabalho, conhecidos como “Sindicatos Reunidos”, e realizar

festas de confraternização. O PCB só iniciaria sua restruturação, em

Ribeirão Preto, a partir de 1941, quando começaria a ser organizado o

108

Comitê Municipal na cidade. No mesmo período a atividade da União

Geral dos Trabalhadores também se intensificaria, mais uma vez nas

mãos dos comunistas.

109

Capítulo 3: A reorganização do núcleo comunista em Ribeirão Preto.

3.1. O choque entre a “União Geral dos Trabalhadores” e os

“Sindicatos Reunidos”.

A década de 30 foi marcada pelo crescimento da influência

stalinista no movimento comunista internacional. Isto ocorreu como

resultado da “stalinização” do Komintern, que determinou a predominância

das idéias e do poder de Stalin nos PCs de vários países, inclusive no

PCB. Em 1939, já se fazia sentir a forte influência stalinista entre os

comunistas brasileiros. Contudo, nesse mesmo ano, o pacto de não-

agressão entre Alemanha e URSS provocou uma manifestação de

repúdio, por parte de vários comunistas, contra a atitude de Stalin, e deu

munição aos trotskistas, que aproveitaram o pacto para atacar o

Komintern e o PCB.190 As restrições ao pacto de não-agressão e as

críticas dos trotskistas não chegaram a abalar profundamente a influência

stalinista sobre o PCB, que nos primeiros anos da década de 40 acabou

por consolidar-se.

Depois da quebra do pacto de não-agressão por parte da

Alemanha, ocorreu o aumento do prestígio soviético, particularmente em

decorrência da sua resistência tenaz aos ataques nazistas. No ano de

1941, entre outubro e dezembro, o exército alemão sofreu sua primeira

derrota em campo aberto, em território soviético.191

Nesse mesmo período, enquanto a URSS ganhava terreno

contra os nazistas, o PCB sofria duros golpes, desarticulando-se quase 190 DULLES, J. F. W. Comunistas no Brasil, pp. 196 - 200.

110

completamente. Em abril de 1940 ocorreram várias prisões de membros

do CC do PCB, entre eles a do líder do Partido, Bangu. No início de 1941

foi a vez dos membros do CR de São Paulo: entre 28 e 29 de março a

polícia deteve 31 pessoas, desmantelando o Comitê Regional.192 Esses

acontecimentos abalaram profundamente a organização do PCB,

deixando a impressão de que o Partido dificilmente se reorganizaria.193

No entanto, contrariando as expectativas, o Partido iniciou

um novo processo de reorganização. Em São Paulo, Caires Brito, Arruda

Câmara e Armênio Guedes fundaram, em 1941, a Comissão Executiva

Provisória do PCB, usando como palavras de ordem a “União Nacional

pela Guerra e Paz com Vargas”, que acabariam influenciando os

militantes do interior do Estado.194

Em Ribeirão Preto e região, a situação de desarticulação

dos militantes comunistas também era profunda, representando um

reflexo do que ocorria com o Partido em âmbito nacional. Entre os anos

de 1937 e 1940, a União Geral dos Trabalhadores, que havia servido até

então como sede do núcleo comunista na cidade, ficara sob o poder de

“moderados”, sem empreender nenhuma atividade expressiva na cidade,

“limitando-se à arrecadação das mensalidades de alguns sócios e à

prestação de pequenos benefícios aos seus membros, sem sequer

promover a realização de eleições para a diretoria”.195 A Delegacia

Regional de Polícia, por determinação do DOPS/SP, empreendia

constante vigilância sobre a conduta dos poucos comunistas ainda ativos

191 MORAES, João Quartim de. In História do Marxismo no Brasil: o impacto das

revoluções., pp. 47 - 87.192 DULLES, J. F. W., op. cit., p. 216.193 CARONE, E. Brasil: anos de crise ( 1930 - 1945 ), pp. 287 - 297.194 DULLES, J. F. W., op. cit., p. 237.195 Prontuário da União Geral dos Trabalhadores n.º 23.250. Arquivo do DEOPS/SP.

111

politicamente, como Ângelo Di Gaetani e a família Pontim, dificultando-

lhes qualquer tentativa de rearticulação.

A reorganização do grupo comunista ribeiropretano só

ocorreria a partir dos últimos meses de 1940, quando os militantes do

PCB, sócios da UGT, iniciaram uma disputa com os “ministerialistas” pela

liderança da instituição. A sede da UGT alugava suas salas para sete

sindicatos oficializados, criados sob a orientação sindical da própria União

Geral. A intensificação da ligação entre a diretoria da UGT _ liderada por

João Gomes da Rocha _ com os sindicatos ditos “ministerialistas”, e a

possibilidade, que vinha sendo cogitada pela diretoria, de transferir esse

patrimônio para tais sindicatos, detonou uma disputa entre os sindicatos

oficializados e os sócios declaradamente comunistas da UGT. No final de

1940 a hostilidade entre os dois grupos aumentou, culminando com a

depredação da sede da União realizada _ de acordo com os agentes

policiais _ por comunistas e por Guilherme Milani, ex-anarquista, ex-

comunista e ex-integralista, que nesse período apresentava tendências

políticas _ no mínimo _ pouco definidas.196

Como conseqüência dessa disputa, João Gomes da Rocha,

que mantinha uma posição conciliatória entre os dois grupos, afastou-se

da direção da UGT, evitando assim indispor-se com os membros do

partido.197 Vitaliano Mauro, simpatizante do PCB, foi aclamado presidente

até a eleição da nova diretoria. Juntamente com Vitaliano Mauro,

militantes do PCB, como Ângelo Pontim e João Ungaretti, assumiram

cargos de destaque dentro da União Geral dos Trabalhadores,

fortalecendo a influência comunista nessa instituição. Com maior poder de

196 Prontuário da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, n.º 23.250. Arquivo do DEOPS/SP.197 João Gomes da Rocha faria sua adesão oficial ao PCB em 1945, durante o período de legalidade.

112

decisão, os comunistas iniciaram uma campanha contra os “Sindicatos

Reunidos” que ocupavam a sede da União Geral.

A convivência pacífica entre os sindicatos legalizados e os

comunistas dentro da UGT pode ser explicada pelo apoio dado pelos

militantes do PCB à criação, durante a segunda metade da década de 30,

de sindicatos que estivessem de acordo com as normas do Ministério do

Trabalho, com a intenção de , posteriormente, exercerem influência sobre

eles. Mas não tiveram sucesso em seu objetivo. Os comunistas não

chegaram a obter o controle total desses sindicatos, cuja grande maioria

passou a ser controlada por sindicalistas, chamados pelos militantes do

PCB de “pelegos”.

A perda de terreno no campo sindical foi resultado da própria

desarticulação do Partido, que enfrentou um longo período de

perseguição policial entre 1935 e 1941, o que dificultou a prática da

propaganda comunista e a atuação dos militantes dentro dos sindicatos

legalizados. Essa situação agravou-se com a proibição, por parte do

Ministério do Trabalho, de qualquer envolvimento das instituições

sindicais com partidos políticos, com a pena de fechamento do sindicato.

O perigo da reação policial favoreceu a resistência dos sócios de

sindicatos legalizados quanto à presença de comunistas nos quadros de

liderança. Não conseguindo o poder hegemônico dentro dessas

instituições, os militantes do partido passaram a pregar a “sindicalização

livre”, concentrando sua atuação na UGT e estabelecendo uma situação

de enfrentamento em relação aos sindicatos legalizados.198 Um dos

únicos sindicatos que permaneceram sob a influência comunista foi o dos

trabalhadores nas indústrias de bebidas, graças à da existência, nas

198 Prontuário da União Geral dos Trabalhadores de Ribeirão Preto, n.º 23.250. Arquivo do DEOPS/SP.

113

cervejarias Antárctica e Paulista, das células comunistas mais atuantes,

lideradas por Gustavo Wierman e Nicomedes Padilha.

A hostilidade entre os dois grupos cresceu nos primeiros

meses de 1941. Nas reuniões semanais, os comunistas deixavam clara

sua posição, quando afirmavam que era preciso “expulsar os amigos do

cabresto, já que na UGT não havia lugar para os agentes patrimoniais e

ministerialistas”. A diretoria da UGT exigia que os sindicatos, sob a

direção de Guilherme Giro, sindicalista sem ligação com os comunistas,

deixassem de ocupar a sede da União, fato que ocorreria logo depois.199

Com o objetivo de escolher os novos diretores da União

Geral e de votar o projeto de mudança nos estatutos, foi marcada uma

assembléia geral para dia 15 de março de 1941. Os sócios elegeram a

diretoria _ que havia sido aclamada em 1940 _ com a participação de

vários militantes do partido, entre eles, Ângelo Pontim, reafirmando a

influência comunista na instituição. Essa diretoria aprovou os novos

estatutos, reformulados por Vitaliano Mauro.

A reformulação dos estatutos, a exemplo do que ocorreu em

1929, ocorreu sob a influência comunista. Entretanto, as modificações

foram feitas com o claro intuito de retirar a UGT da mira das constantes

investigações policiais, que dificultavam o trabalho dos militantes e de

adequar a atuação comunista às mais recentes diretrizes do CR: buscar

a “União Nacional” em torno de Vargas, contra a ameaça nazi-fascista. Os

novos estatutos foram apresentados sem os termos utilizados em 1929,

como, por exemplo, “camarada”. O texto propunha, como objetivo da

UGT, prestar assistência econômica, intelectual, moral, social e jurídica

aos associados, declarando-se como uma “sociedade beneficente,

199 Prontuário da União Geral dos Trabalhadores, n.º 23.250. Arquivo do DEOPS/SP.

114

recreativa, esportiva e cooperativa, tendo por fim reunir todos aqueles que

o trabalho seja o meio de sua subsistência”.200

Quadro. 1201

Membros da diretoria da UGT em 1941 Cargo Nome ResponsabilidadesPresidente Vitaliano Mauro -Dirigir os destinos da

“Associação”, representando-a judicialmente ou não. -Presidir reuniões. -Convocar Assembléias. -Fiscalizar todos os papéis.

Vice – presidente João Ungaretti -Auxiliar e substituir o presidente em suas faltas, exercendo todos as suas funções.

Secretário-geral Nazareno Mantovani -Inscrever os sócios. -Fazer a correspondência. -Ter sob sua guarda o livro caixa. -Fazer impetrar “habeas-corpus” em favor de associados coagidos. -Receber informações da comissão de sindicância.

Secretário de atas Antonio Gomes Palmeira -Redigir as atas das sessões. -Substituir o secretário geral.

1.º secretário Orlando Alves -Fazer convites para reuniões, festas, bem como circulares. -Ter sob sua guarda o expediente para as propostas de novos sócios. -Substituir o secretário de atas.

2.º secretário Ercio Rinatti -Auxiliar o 1.º secretário e substituí-lo se for preciso.

Tesoureiro Ângelo Pontim -Cuidar das finanças.

Comissão de sindicância Francisco Paiva Antônio Lopes João Gomes da Rocha Moacir Araújo

-Visitar sócios enfermos. -Dar parecer sobre os novos sócios.-Sindicar sobre qualquer questão que possa surgir dentro da União.

Quanto às responsabilidades da diretoria, foram feitas

modificações nas funções do secretário geral, cargo anteriormente

ocupado por Ângelo Pontim e assumido em 1941 por Nazareno

Mantovani. Foram excluídas as atividades relacionadas com o caráter

200 Estatutos da UGT de 1941.201 Prontuário da União Geral dos Trabalhadores, op. cit.

115

sindical e de defesa de classe, que estavam presentes nos estatutos de

1929. Além dessas funções, foram eliminadas: a mediação de

negociações entre patrões e empregados, a luta pela lei de férias - que

era uma reivindicação ligada às necessidades operárias no período do

estatuto anterior, de 1929 -, e a responsabilidade de participar de

congressos operários.202

A exclusão do caráter sindical e de defesa de classe dos

estatutos demonstra a intenção de fazer da UGT uma associação de

trabalhadores sem ligação oficial com o sindicalismo. Com essa manobra,

os comunistas conseguiram evitar o fechamento da instituição, cogitado

pela polícia há alguns anos.

Contudo, a mudança nos estatutos e a atuação moderada

dos comunistas não detiveram a ação policial. Após a assembléia geral de

1941, a polícia prendeu vários membros da UGT _ entre eles Vitaliano

Mauro _ e deu buscas na sua sede, localizada na Rua José Bonifácio,

procurando provas que dessem respaldo ao pedido de fechamento da

instituição impetrado pelo Delegado Regional de Polícia. Diante dos

depoimentos dos presos, que negaram a militância comunista, e a

inexistência de provas materiais, o caso foi encerrado e a União Geral dos

Trabalhadores permaneceu com permissão para atuar.

Mesmo com a modificação dos estatutos e a relativa

liberdade de atuação política, a reestruturação do núcleo comunista

ribeiropretano foi lenta, ocorrendo entre 1941 e 1945. Nesse período, a

militância caracterizou-se por ser mais individualizada, sem uma liderança

efetiva que comandasse a atuação do PCB na cidade. O contato com o

recém-organizado CR de São Paulo, entre 1941 e 1942, era quase nulo, 202 Estatutos da UGT de 1941.

116

faltando portanto orientação e material de propaganda para o trabalho de

militância. Nem mesmo as comemorações do Dia do Trabalho ganharam

muita atenção por parte dos comunistas, que se limitaram a soltar fogos

pela cidade, sem promover a realização de passeatas, comícios, ou

qualquer outro tipo de manifestação de massa. 203

Os primeiros sinais de aglutinação e reorganização

ocorreram com a retomada do controle da UGT pelos comunistas e,

posteriormente, com a chegada a Ribeirão de um representante do CR,

em 1942, Irineu de Moraes. O “Índio”, como era chamado Irineu, entrou

para o PCB em 1935. “Funcionário da Companhia de Força e Luz”, foi

transferido para Ribeirão em 1942. Instalado na cidade, iniciou contato

com os comunistas locais tencionando de promover a integração do

grupo, que se encontrava relativamente desagregado. Nessa época,

poucos militantes se destacavam, limitando-se a reuniões isoladas,

itinerantes, na casa de um ou outro, sem efetuar nenhuma ação concreta.

Havia o receio de se tornarem visados pela polícia, e isso prejudicava a

escolha de um líder para o grupo, que permanecia disperso. Irineu de

Moraes estabeleceu contatos com outros militantes, como Ângelo Di

Gaetani, Cezar Tupynambá, Vicente Quinhonero e a família Pontim, e

iniciou um trabalho de conscientização junto aos trabalhadores da “Força

e Luz” e aos estudantes locais, com vistas à reorganização do Partido em

Ribeirão Preto. Essa articulação só surtiria efeitos concretos em 1945,

quando houve um período de liberdade política e a legalização do PCB.204

203 “Diário da Manhã”, Ribeirão Preto. 1.º de maio de 1942.204 Depoimento de Irineu de Moraes, 20 de fevereiro de 1989. Irineu foi entrevistado, nesse ano, por Sebastião Geraldo. Como resultado dessas entrevistas Sebastião Geraldo publicou um livro de memórias “Lutas camponesas no interior paulista”.

117

118

3.2. A legalização do PCB e a o Comitê Municipal de Ribeirão Preto.

A intensa repressão policial contra os comunistas após o

movimento de 35, e a constante vigilância sobre as atividades da UGT,

tornaram difícil a existência de um Comitê Municipal organizado do PCB

em Ribeirão Preto. A atuação mais elaborada do Comitê limitou-se ao

período compreendido entre 1929 e 1935. A instalação de um novo

Comitê Municipal só ocorreria em 1945, quando o Partido passou a atuar

na legalidade, depois de um longo período de rearticulação.

Esse período de reorganização dos comunistas em Ribeirão,

entre 1940 e 1945, ocorreu simultaneamente aos efeitos retardados do

grande choque econômico que atingiu duramente o Brasil a partir de

1929. Em 1941, ainda eram sentidos os efeitos dessa crise. A decadência

do setor cafeeiro, motor da economia local, teve como conseqüência o

corte progressivo dos pés de café, iniciado no final da década de 30, e o

êxodo dos colonos para a área urbana. Como resultado direto da crise no

campo, a zona da “velha Mogiana” atravessou um processo de

despovoamento nunca antes visto, e a cidade, que passou a crescer

rapidamente com o êxodo rural, tornou-se o centro das tensões sociais

relacionadas com o problema do desemprego, da alta do custo de vida e

da falta de moradias.205 Aproveitando esse contexto de crise social, os

comunistas apoiaram as reivindicações imediatas dos trabalhadores,

buscando aumentar seu prestígio junto à classe operária ribeiropretana.

Com o prolongamento da 2.ª Grande Guerra Mundial, a

crises econômica e social agravaram ainda mais. Em 1944, a população

enfrentava o racionamento de produtos e um conseqüente aumento dos

preços de gêneros de primeira necessidade. O agravamento da questão

119

sócio-econômica da região de Ribeirão Preto teve lugar de destaque nos

jornais locais e entre àqueles que defendiam os interesses dos

trabalhadores.

A UGT, liderada pelos comunistas, e os sindicatos

legalizados uniram-se para pedir soluções da prefeitura para o aumento

da pobreza na região e para conter a alta dos preços dos alimentos. Essa

união entre dois grupos conflitantes, desde 1940, em torno da causa

social, teve frutos. Juntos, mobilizaram a população e organizaram

movimentos de protesto contra a carestia e os baixos salários.206

Aproveitando o ambiente de tensão social _ propício à

organização de movimentos populares _, a relativa liberdade política _

iniciada com a anistia de 148 presos políticos em 18 de abril de 1945 _ e

a mudança no código eleitoral de 28 de maio de 1945, o núcleo comunista

ribeiropretano ampliou seu contato com a massa trabalhadora e preparou

a reorganização do Comitê Municipal, arregimentando velhos comunistas

e buscando novos membros para o Partido.207

Toda a reorganização do PCB, em Ribeirão, ocorreu dentro

das novas diretrizes de atuação do partido, firmadas a partir de 1945.

Prestes, que se tornou a figura predominante dentro do PCB, propôs uma

política de “União Nacional” em torno de Vargas, causando

descontentamento em alguns comunistas do Rio de Janeiro e de São

Paulo. Entretanto, a linha prestista prevaleceu, influenciando diretamente

a linha de atuação dos comunistas, inclusive os ribeiropretanos. Durante o

comício de 23 de maio de 1945, no estádio Vasco da Gama, Prestes

declarou que a forma prática para criar uma frente operária pela “União

Nacional” era conclamar os trabalhadores a se juntarem à frente 205 “A Tarde”, Ribeirão Preto, 6 de agosto de 1941.206 “Diário da Manhã”, Ribeirão Preto, 10 de maio de 1944.

120

trabalhista do partido, o Movimento Unificador dos Trabalhadores

(MUT).208

Como resultado dessas novas orientações, os comunistas

lideraram, entre maio e agosto de 1945, uma série de movimentos

grevistas e, ao final destes, procuraram transformar o descontentamento

dos trabalhadores em apoio a Getúlio Vargas. Em Ribeirão, as diretrizes

determinadas por Prestes chegaram por intermédio de Irineu de Moraes,

responsável pela articulação de greves na cidade antes mesmo da

organização do Comitê Municipal. Esses movimentos populares,

insuflados pelos comunistas atingiram grandes dimensões, chegando, em

alguns casos, a sair do controle dos militantes.

207 DULLES, J. F. W. O comunismo no Brasil, pp. 261 - 177.208 CHILCOTE. R. H. Partido Comunista Brasileiro: conflito e integração, p. 95.

121

3.2.1. O saque da Casa Robin e a greve da Companhia Paulista de

Força e Luz.

Um desses movimentos ocorreu em junho de 1945 e fazia

parte do contexto nacional de reivindicações dos trabalhadores por

melhores condições de vida, e do descontentamento em relação à séria

crise no abastecimento de gêneros de primeira necessidade. Na tentativa

de canalizar as insatisfações populares para um movimento organizado,

os comunistas e os “Sindicatos Reunidos”209 planejaram um comício de

protesto contra as péssimas condições de vida dos trabalhadores.

Mesmo com as diferenças ideológicas existentes entre os líderes dos

sindicatos legalizados e os comunistas, esses últimos apoiaram o

comício, chegando a reunir-se periodicamente com os primeiros, para

planejar o movimento. Entretanto, a data escolhida para o comício pelos

sindicatos legalizados, 12 de junho, uma segunda-feira, logo de manhã,

causou profundo descontentamento entre os militantes do PCB, que

acreditavam que o apoio dado pelos “pelegos” aos movimentos sociais

não passava de uma atitude demagógica. Irineu de Moraes demonstrou

sua indignação quando afirmou que a real vontade dos sindicatos

legalizados era que o comício não se realizasse. “Um comício marcado

para segunda - feira, às 8:00 h, era justamente para não ir ninguém,

porque está todo mundo trabalhando”.210

Acusando os sindicalistas de “pelegos”, os comunistas

acionaram suas células mais fortes, localizadas nas Cervejarias Antárctica

e Paulista, para trabalhar junto aos funcionários, fazendo reuniões e

propagandas, na tentativa de evitar o fracasso do comício. Os militantes

conseguiram que os funcionários das duas fábricas parassem às sete

209 Representação dos sindicatos legalizados da cidade.210 Entrevista realizada com Irineu de Moraes em novembro de 1994.

122

horas, independente da aprovação dos patrões, e seguissem para o

comício, que se realizaria na Praça XV, centro da cidade. Os 2.000

trabalhadores das duas fábricas, no seu caminho em direção a praça, iam

forçando o fechamento de bares, restaurantes e lojas, engrossando o

movimento com os trabalhadores desses estabelecimentos, e parando

quase completamente o centro comercial da cidade. Os donos da maior

loja atacadista da região, a Casa Robin, recusaram-se a fechar as portas,

tentando impedir seus funcionários de irem ao comício. A multidão

enfurecida marchou para a loja, invadindo-a. Durante a invasão iniciou-se

o saque de mercadorias, que durou o dia todo. A destruição foi quase

completa. Os líderes do movimento, entre eles Irineu de Moraes, não

conseguiram deter a invasão. O corpo de bombeiros, a polícia e o exército

foram chamados, mas não tiveram sucesso contra a massa que saqueava

o estabelecimento, que só parou quando não restavam mais mantimentos

para serem carregados.211

O comício que havia sido planejado acabou não se

realizando. Mas os comunistas e os “Sindicatos Reunidos” aproveitaram o

movimento para forçar um acordo entre trabalhadores e patrões da

Antárctica, Paulista e do comércio. O sucesso do acordo era inédito na

cidade. Previa aumentos gerais de salários, inclusive para menores,

cancelamento dos aumentos de 10% nas tarifas de água, luz e esgotos, e

a proibição de novos aumentos dos gêneros de primeira necessidade. No

dia 14, a cidade já havia voltado à normalidade; contudo, outro

movimento, desta vez organizado apenas por comunistas, foi deflagrado,

aproveitando a sucessão dos acontecimentos. 212

Irineu de Moraes, aproveitando seu cargo de folguista da

Companhia de Força e Luz, que lhe permitia viajar pelo Estado, vinha

211 Idem.212 “Diário da Manhã”. Ribeirão Preto, 13, 14 e 15 de junho de 1945.

123

fazendo contato entre os funcionários das usinas hidrelétricas do interior

de São Paulo desde 1944. A idéia era programar a interrupção do

fornecimento de energia, simultaneamente, nas cidades da região, no dia

12 de junho, juntamente com a realização do comício, como forma de

ampliar a pressão dos trabalhadores. Contudo, o fracasso do comício e a

presença do exército na cidade forçaram o adiamento do corte de energia

para três dias depois.

A data para a realização da greve dos funcionários da

Companhia Paulista de Força e Luz foi marcada para o dia 15 de junho

de 1945. Às três horas da madrugada, os líderes das doze usinas da

Companhia interromperam o fornecimento de energia. Durante toda a

tarde foram feitas negociações entre Irineu de Moraes, líder do

movimento, e a diretoria da Força e Luz, presenciadas pelo Delegado da

Divisão Regional do Trabalho, Álvaro Marques. Entrando em acordo com

os “americanos” representantes da Companhia, os trabalhadores

conseguiram aumento de salários e a garantia de emprego aos grevistas.

O movimento havia sido um sucesso.213

Tanto o saque da Casa Robin como a Greve dos

funcionários da “Força e Luz” garantiram a Irineu de Moraes e aos

comunistas grande prestígio entre os trabalhadores, favorecendo uma

maior aceitação dos militantes entre os operários, como também a

organização do Partido na cidade. Desse modo, os comunistas

aproveitaram os meses de junho e julho de 1945 para promover um

processo de articulação política e estabelecer contatos regulares com o

Comitê Regional de São Paulo, pedindo orientações para a instalação

oficial do Comitê Municipal do Partido Comunista do Brasil em Ribeirão.

213 “Diário da Manhã”. Ribeirão Preto, 16 de junho de 1945.

124

A assembléia-geral para a eleição do novo secretariado foi

marcada para 12 de agosto, estrategicamente antes da realização da

primeira sessão plenária legal do PCB, que seria no dia 21 de agosto. O

líder do CR, Domingos Marques ( o “Vermelhinho ) que, mesmo

tuberculoso, havia mantido o Comitê Regional de São Paulo durante a

grande repressão e que, posteriormente, seria eleito membro do Comitê

Nacional do Partido, compareceu para presidir a assembléia, realizada no

prédio da UGT, que acabou se transformando na sede provisória do

Comitê Municipal. 214

A sessão de posse do novo secretariado teve como

oradores: Domingos Marques, Irineu de Moraes, Dr. Paulo Barra e

Sansão Lino Machado, sendo os dois últimos membros novos do Partido.

Dos comunistas atuantes durante a década de 20 em Ribeirão Preto,

foram eleitos Cezar Tupynambá Roselino, que participou da elaboração

dos estatutos da UGT em 1929, Vicente Quinhonero e Gustavo Wierman,

dois dos fundadores do Partido em Ribeirão, e Albino Tremeschini.215

Secretário político Irineu de Moraes.

Secretário de organização Hilário Soares da Silva.

Secretário de divulgação Cezar Tupynambá Roselino.

Secretário de finanças Albino Tremeschini.

Secretário Sindical Natal Gracchia.

Encarregado de trabalhos de campo Antonio Alagão.

Encarregado eleitoral Décio Fernandes.

Suplentes

Silvio Parpinelli

Vicente Quinhonero

Joaquim Marques dos Reis 214 DULLES, J. F. W. O comunismo no Brasil, pp. 272 - 273.

125

Abdêo Chaguri

Gustavo Wierman

Cezar Roselino foi escolhido para o cargo de secretário de

divulgação por ser professor e conhecedor da teoria marxista. Natal

Gracchia, camponês recém-chegado à cidade, tornou-se secretário

sindical, com a intenção de iniciar a organização de um sindicato rural.

A legalidade do Partido e as suas propostas para os

trabalhadores, além do prestígio da URSS após a guerra, trouxeram para

o PCB uma leva de novos membros. Nas palavras de Natal Gracchia,

“todos queriam ser comunistas, principalmente os sabidos, tudo parecia

às mil maravilhas. Só que veio gente boa e gente ruim. Veio a podridão do

capitalismo se infiltrar no Partido. Eles foram pegando a direção, sem

entender nada de partido, sem entender nada de marxismo... “.216 A partir

de 1945, o núcleo comunista ribeiropretano passou a ter uma composição

mais heterogênea, possibilitando a ocorrência de divergências mais

profundas, fato não observado em períodos anteriores.

Uma dessas divergências iniciou-se com o aumento do

prestígio de Gracchia dentro do Comitê: mal havia entrado para o Partido,

e já era eleito para secretário sindical. Logo depois, foi escolhido para

presidir o MUT, fundado em 14 de agosto de 1945, ocupando, juntamente

com o Comitê Municipal, a sede da UGT. Constituíram o secretariado do

Movimento Unificador dos Trabalhadores: Natal Gracchi, João Eufrásio

Fernandes, Carlos Pedro Canova, Tadeu Vieira, Abdeo Chaguri e Antonio

Cereia, todos militantes novos.

215 “Diário da Manhã”, Ribeirão Preto, 13 de agosto de 1945, n.º 14.815.216 Idem.

126

O líder do MUT, Gracchia, indispôs-se com Irineu de Moraes

desde a sua entrada para o Partido, e um acusou o outro de ter atitudes

truculentas e de ser “safado”. Gracchia era contrário às idéias

revolucionárias, como a tomada do poder por métodos violentos. Dizia

que o trabalhador que “pede por comida” não quer envolver-se em

questões partidárias. Essa era sua principal diferença com Irineu de

Moraes, que filiou-se ao Partido para “fazer a revolução”, ideal que

manteve mesmo quando se afastou. As diferenças entre Natal Gracchia,

Irineu de Moraes e outros membros do Partido acabaram provocando a

sua expulsão, na década de 50. 217

A partir da fundação do MUT, essa organização e o PCB,

mesmo com as divergências internas, passaram a atuar em prol do seu

candidato à presidência da República, Yeddo Fiúza. Toda a militância

nesse período voltou-se para esse objetivo. Contudo, a heterogeneidade

dos novos membros dificultava a união de interesses. Os antigos

militantes perdiam prestígio dentro do Partido e da UGT, saindo

gradativamente das cenas política e sindical. Desse modo, a partir de

1945 iniciou-se a formação de uma nova geração de líderes comunistas

em Ribeirão Preto, como Irineu de Moraes, Antônio Girotto e Luciano

Lepera, que acabaram substituindo Ângelo Di Gaetani, Rômulo Pardini,

Ricardo Pinatti e Gustavo Wierman, fundadores do partido com

tendências diferentes das dos novos militantes.

217 Entrevista com Natal Gracchia, em 1989, realizada por Sebastião Geraldo.

127

3.3. A participação dos comunistas nas eleições de 1945.

Após ter sido registrado oficialmente como Partido, em 10 de

novembro de 1945, o PCB indicou Yeddo Fiúza, engenheiro e antigo

prefeito de Petrópolis à presidência. A escolha de um candidato não -

comunista ia ao encontro do desejo de Prestes de dar o primeiro passo

para a “União Nacional”.218 Em Ribeirão, a candidatura de Yeddo Fiúza foi

bem aceita, especialmente a partir de 24 de novembro, quando chegaram

à cidade Caio Prado Júnior, Antônio Campos, Osvaldo Doria e Cândido

Portinari para a realização de um grande comício em prol do candidato

apoiado pelos comunistas.219

Durante o comício, os oradores defenderam a reforma

agrária, a luta pela erradicação da “miséria do povo” e a União Nacional,

diante de uma platéia animada, reunida na praça XV, centro da cidade.

Contudo, a realização do comício e o aumento da propaganda comunista

em Ribeirão despertaram a oposição acirrada dos católicos locais. A

Igreja, em resposta à campanha eleitoral comunista, iniciou uma

campanha anticomunista, usando como veículo de comunicação o seu

jornal, o “Diário de Notícias”, que havia comprado nesse mesmo ano. A

campanha católica, iniciada em 1945, continuou até 1949, não

conseguindo abalar efetivamente o prestígio dos comunistas entre os

trabalhadores católicos. No entanto, a troca de ofensas entre comunistas

e católicos, por intermédio da imprensa, ampliou a hostilidade entre os

dois grupos.

218 CHILCOTE, em seu livro Partido Comunista Brasileiro, analisa a posição de Prestes diante das eleições de 1945: o “Cavaleiro da Esperança” abandona o discurso radical e afirma que os marxistas não pretendem implantar o comunismo no Brasil, preferindo lutar por um governo de “União Nacional”.219 Diário da Manhã, n.º 14.936, Ribeirão Preto, 24 de novembro de 1945.

128

Contudo, mesmo diante da oposição fervorosa da Igreja, a

campanha teve boa aceitação entre a população ribeiropretana, a

exemplo do que ocorreu em outras cidades do Estado de São Paulo,

onde, particularmente nas cidades industriais, o PCB garantiu uma boa

votação. Apesar de a campanha ter passado por várias dificuldades,

inclusive um curto período de perseguição aos comunistas, o Partido

recebeu 9% do total de votos e elegeu catorze deputados e um senador.

Ribeirão Preto não lançou nenhum candidato, restringindo-se a apoiar

Prestes e os candidatos por ele indicados.220

Quadro. 2.221

As eleições presidenciais de 1945.

Total de

votos

recebidos

Eurico Dutra

(PSD)

Eduardo

Gomes

(UND)

Yeddo Fiúza

(PCB)

Total de

votos válidos

Guanabara 166.147 183.984 134.735 490.255

Minas Gerais 478.503 339.463 16.699 834.979

Rio Grande

do Sul

447,462 110.444 50.199 608.446

São Paulo 780.546 377.613 192.867 1.353.445

Total em 4

Estados

1.872.658

(56%)

1.11.504

(30%)

394.500

(12%)

3.287.125

(55,99%)

Total nacional 3.251.507

(55,3%)

2.039.341

(34,7%)

569.818

(9,7%)

5.870.667

(100%)

Observa-se no quadro que os Estados com maior volume de

votação para Yeddo Fiúza são justamente São Paulo e Guanabara, onde

220 CHILCOTE. R. Partido Comunista Brasileiro: conflito e integração, pp. 95 - 97.221 Idem.

129

o Partido tinha maior expressão. No caso de São Paulo, o interior teve

participação efetiva no total de votos. Em algumas cidades, como

Campinas, Santos e Sorocaba, o Partido recebeu a maioria dos votos

partidários.222

Infelizmente, não temos números que representem a

votação para Yeddo Fiúza em Ribeirão Preto. Entretanto, fica claro que a

campanha de 1945 teve papel decisivo para o crescimento do prestígio

dos comunistas na cidade, a partir de 1945, fato que viria a ter reflexos

diretos nas eleições municipais de 1947.

222 Ibidem, p. 98.

130

3.4. A participação dos comunistas nas eleições municipais de 1947.

O presidente Dutra, eleito em 1945, recebeu forte oposição

por parte do PCB que, durante o ano de 1946, permaneceu defendendo a

“União Nacional” e o fim do sectarismo, que afirmava estar presente ainda

entre os membros das bases do Partido. Prestes, durante uma sessão

plenário do Partido, em janeiro de 1946, lembrou a importância da ligação

com as massas, objetivo que deveria ser buscado veementemente pelos

membros do PCB.223

Como resultado das orientações de Prestes, e

diferentemente do que ocorria com o próprio Partido em âmbito nacional _

que se isolava dos trabalhadores por causa de sua política cautelosa em

relação às greves _, o Comitê Municipal em Ribeirão Preto instigou e

organizou greves e movimentos populares durante todo o ano de 1946,

período em que os comunistas puderam atuar relativamente livres da

repressão policial.224

Em dezembro de 1945, Irineu de Moraes liderou uma nova

greve na Companhia Paulista de Força e Luz, em solidariedade as outras

localidades do Estado que estavam mobilizadas. Ribeirão Preto ficou sem

energia elétrica entre 21:40 h da quinta - feira, dia 27, até 1:45 h da

madrugada do dia 30. A cidade viveu um verdadeiro caos. Hospitais,

casas comerciais e residências ficaram sem água e luz. Ao final de vários

dias de negociações, os funcionários da Companhia voltaram ao trabalho

223 CHILCOTE, O Partido Comunista Brasileiro, p. 98.224 Idem, p. 103.

131

sem que, entretanto, conseguissem ser atendidos em todas as suas

reivindicações.225

Dando continuidade à seqüência de greves, no dia 2 de

janeiro de 1946 a célula do Partido, na Cervejaria Antárctica, iniciou um

movimento liderado por Gustavo Weirman. Os trabalhadores

reivindicavam um aumento prometido no ano anterior, que ainda não

havia sido dado. Ao final de dois dias de greve, os trabalhadores

conseguiram ser atendidos e voltaram ao trabalho.226

Aproveitando o sucesso das greves dos funcionários da

“Força e Luz” e da Cervejaria Antárctica, os comunistas decidiram apoiar

a greve dos bancários, iniciada no dia 29 de janeiro, e que atingiu os

funcionários do Banco do Brasil e do Estado. A intenção dos militantes do

PCB era ampliar sua influência entre os bancários, setor no qual o Partido

não estava infiltrado.227

A participação dos comunistas nesses movimentos grevistas

colaborou de forma decisiva para o contato dos militantes com os

trabalhadores locais. Favorecidos pelo contexto de instabilidade social, os

comunistas mudaram a linha de atuação da União Geral dos

Trabalhadores, que havia excluído dos estatutos de 1941 o caráter

sindical da instituição. A UGT passou a atuar declaradamente em prol da

defesa da classe trabalhadora. Como resultado dessa mudança de

diretriz, no dia 10 de março de 1946 realizou-se uma assembléia-geral na

sede da União, com o objetivo de tratar das “reivindicações mínimas” dos

trabalhadores, entre elas a luta pela casa própria, o tabelamento dos

gêneros de primeira necessidade e a situação dos aposentados. Como

resultado da assembléia foram formadas três comissões: 225 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 1 de janeiro de 1946.226 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 3 de janeiro de 1946.

132

Comissão de sindicância: com o objetivo de sindicalizar

os trabalhadores para que os mesmos poderem pesar na

balança social, apresentando reivindicações de forma

pacífica.

Comissão de seguro social: para tratar de questões

ligadas ao instituto de aposentadorias e pensões,

principalmente no plano de construção de casas para

operários.

Comissão de preços: para estudar as altas dos preços de

gêneros alimentícios e de objetos de uso forçado, bem como

o estabelecimento dos preços dos mesmos, e elaboração e

fiscalização de tabelas com preços mínimos.228

Os comunistas seguiam as orientações da direção geral do

PCB: lutavam pelas reivindicações econômicas dos trabalhadores, e

assim podiam infiltrar-se na massa operária, objetivo considerado

prioritário por Irineu de Morais, secretário político do Comitê Municipal.

Com a intensificação das atuações política e sindical, o

prestígio dos comunistas crescia, não só em Ribeirão, mas também nas

cidades da região. Os militantes Antônio Girotto, Gabriel Tondela e Irineu

de Moraes realizaram comícios nas cidades vizinhas e em Ribeirão,

durante o ano de 1946, buscando ampliar as bases do Partido para as

eleições do ano seguinte.

Em Batatais, Girotto organizou um comício em prol da

sindicalização dos operários, com a presença de 200 pessoas, no dia 26

227 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 27 de janeiro de 1946.228 Diário da Manhã, Ribeirão Preto, 10 e 12 de março de 1946

133

de fevereiro de 1946. No dia 1.º de maio, outro comício foi organizado por

Antônio Girotto e Tondela em Batatais, dessa vez com a participação de

180 pessoas. Em Altinópolis, o Comitê de Ribeirão promoveu outro

comício, com a presença de 500 pessoas, mais uma vez organizado por

Tondela, Girotto e um membro do diretório local, Sebastião de Figueiredo

Moura, que acabou sendo eleito vereador. Concomitantemente, o Comitê

Municipal de Ribeirão também organizava as comemorações do 1.º de

Maio na cidade, com passeatas e a inauguração de um retrato de Prestes

na sede do partido.229

O Comitê Municipal de Ribeirão não chegou a publicar

nenhum jornal próprio durante a legalidade, mas recebia farto material do

Comitê Regional para ser utilizado em propaganda e para instruir os

militantes nos trabalhos político e sindical. Mensalmente, o Comitê do

Partido recebia 200 exemplares do jornal “O Hoje” e 200 do jornal

“Tribuna Popular”, semanalmente os militantes recebiam o jornal “Classe

operária”.230

O trabalho de distribuição de propaganda do Partido e a

atuação do Comitê Municipal na organização de comícios em outras

cidades tornaram Ribeirão Preto o pólo centralizador das atividades

comunistas na região. Cidades como Altinópolis, Batatais, Brodowiski,

Jardinópolis, Sertãozinho, Guaíra, entre outras, tinham sua ação partidária

orientada pelo Comitê Municipal Ribeiropretano.

Os comícios e o material de propaganda distribuído na

região faziam parte do processo preparatório para as eleições municipais

de 1947. Os comunistas articulavam-se para conseguir um bom resultado

229 Relação de comícios realizados na região de Ribeirão Preto durante o ano de 1946. Prontuário da Delagacia Regional de Polícia de Ribeirão Preto, n.º 548, vol. 1, caixa 37. Arquivo do DEOPS/SP.230 Radiotelegrama. Prontuário da Delegacia Regional de Polícia de R. P., n.º 548, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.

134

eleitoral, com a intenção de eleger seus primeiros representantes para a

Câmara Municipal.

Em pleno início do processo de propaganda eleitoral, foi

convocada uma assembléia-geral para junho de 1946, com o objetivo de

eleger a nova diretoria do Comitê Municipal do PCB em Ribeirão. Irineu

de Moraes confirmou sua influência sobre o grupo, tendo sido eleito,

novamente, para o cargo de secretário político, enquanto, dentre os

membros fundadores do Partido, restou apenas Gustavo Weirman, eleito

como suplente.

Composição da diretoria em 1946.231

Secretário Político Irineu de Moraes

Secretário de Organização Albino Tremeschini

Secretário de Divulgação José Engrácia Garcia

Secretário Sindical Natal Gracchia

Secretário de Finanças Joaquim Teixeira de Andradre

Secretário de Campo Antônio Alagão

Secretário eleitoral Décio Fernandes

Suplentes Aparecido Araújo

Gensen Martins

Abdeu Chaguri

Gustavo Weirman

Antônio Marques dos Reis

José Damaceno Neto.

231 Prontuário de Antônio Girotto, n.º 76. 139, Arquivo do DEOPS/SP.

135

A diretoria recém-eleita confirmou a influência da nova

geração de militantes e o distanciamento de velhos comunistas como

Ângelo Di Gaetani. As eleições também serviram para demonstrar o

aumento expressivo do número de militantes, já que a assembléia de 20

de junho de 1946 contou com os votos de 240 militantes e simpatizantes

do Partido na cidade, sendo 140 homens e 100 mulheres.232 O fato de as

mulheres representarem mais de 40% do número de eleitores é um fator

significativo. O núcleo feminino do Comitê teve importante atuação nos

movimentos sociais locais, desde a sua formação em 1929. As mulheres

davam assistência aos militantes fora de ação, cuidando de sua roupa e

comida, além de cuidarem das finanças e da organização do partido. Em

Ribeirão chegaram a organizar passeatas contra a carestia e o aumento

dos preços dos gêneros de primeira necessidade, em nome da “União das

Mulheres Democráticas”.233

Depois de um período de grande crescimento do PCB, tanto

em influência partidária quanto numericamente, o Partido iniciou o ano de

1947 ante um golpe: a possibilidade de cassação do registro do Partido

Comunista do Brasil. De fevereiro a maio de 1947, o fechamento do PCB

foi o assunto mais discutido na cidade. Luciano Lepera, então jovem e

talentoso jornalista, simpatizante do PCB, escreveu no “Diário da Manhã”:

“Está na ordem do dia esse assunto. Todos

esperam com maior ou menor emoção a notícia: o Partido

Comunista será fechado? Quando? Por que? (...) A massa

popular não se conformará com o fechamento do partido de

Prestes, antes das eleições (...). A opinião quase geral nas

232 Fichas de inscrição de filiados. Presentes nos autos de apreensão da Delegação Regional de Polícia de Ribeirão Preto. 25.5.47.233 Prontuário n.º 14.307, Arquivo do DEOPS/SP.

136

ruas é essa: elementos que nunca foram e nem poderiam ser

comunistas são contra o fechamento do partido vermelho.

O PCB poderá ser fechado(...), porém processo

algum conseguirá matar, dentro de cada cérebro comunista, a

idéia de que só o comunismo poderá salvar o Brasil do caos

dos dias presentes. (...) Na ilegalidade, as violências sofridas

servirão para fazer o comunismo crescer. O próprio cheiro de

sangue revolta, incentiva e anima o homem...

Que percam as esperanças os que pretendem

exterminar o comunismo. Essa medida ninguém a conseguirá

com violência. (...)”234

Mesmo com a discussão em torno da cassação do Partido,

os membros do Comitê Municipal continuavam a atuar, tanto

politicamente quanto no campo sindical, no prédio da UGT. O contato

entre a União Geral e os comunistas era explícito, como mostra a

composição da nova diretoria da UGT, eleita em 9.3.47:

Presidente Joaquim Teixeira de Andrade

Vice - presidente Albino Tremescchini

Secretário geral Fortunato Meneghetti

Secretário de atas Gustavo Wierman

Tesoureiro João Bezerra

1.º secretário de expediente Joaquim Marques dos Reis

2.º secretário de expediente Oscar Scusa Soares.

234 LEPERA, Luciano. Diário da Manhã, 17 de abril de 1947.

137

Mais uma vez os comunistas mantiveram a maioria absoluta

dentro da União, ocupando quase todos os cargos e fortalecendo ainda

mais sua influência no meio sindical local. Para o novo diretório da União,

foram eleitos comunistas que não lançariam seus nomes nas eleições no

final do ano, numa forma de proteger a instituição de possíveis ataques

por parte da polícia.

No dia 27 de abril de 1947, foi a vez do próprio Comitê

Municipal eleger uma nova direção, bem como os militantes que

participariam do IV Congresso do partido, a realizar-se no dia 23 de

maio.

Composição da diretoria em 1947.235

Secretário político Irineu de Moraes

Secretário de organização Jovino de Almeida Neves

Secretário sindical Aparecido Araújo

Secretário de massa eleitoral Décio Fernandes

Secretário de educação e propaganda José Engrácia Garcia

Membros efetivos Odilon Lino Machado

Claudemiro Alves Pereira

Suplentes Joaquim Marques dos Reis Filho

Joaquim Teixeira de Andrade.

Ricardo Pinatti

Antonio Pontim.

235 “ A Tarde “, Ribeirão Preto, 3 de maio e 1947.

138

Irineu de Moraes incontestavelmente firmou-se como o líder

máximo do Comitê durante o período de legalidade. A novidade no novo

diretório ficaria por conta da eleição de José Engrácia Garcia, dentista

erudito, para o cargo de secretário de educação e propaganda, e a

escolha de Aparecido Araújo, membro da célula das indústrias Matarazzo,

para secretário sindical, substituindo Natal Gracchia, que tinha

divergências ideológicas com Irineu de Moraes. Outra novidade foi o

retorno de Ricardo Pinatti e de Pontim à diretoria, depois de muitos anos

afastados. Como delegados para o IV Congresso, foram eleitos Décio

Fernandes e Irineu de Moraes. Entretanto, em decorrência do fechamento

do Partido, o Congresso foi adiado.236 Mesmo com o adiamento, as teses

foram publicadas e deixavam clara a posição anti-imperialista do Partido,

que provocou o aumento do antagonismo dos comunistas em relação aos

governos capitalistas, especialmente dos EUA.237

A cassação do registro do PCB, no dia 7 de maio,

interrompeu os planos eleitorais do Comitê Municipal, que pretendia

lançar candidatos próprios. Com o fechamento da sede do Partido em

Ribeirão, e dos diretórios em toda a região, foi dificultada a participação

dos militantes nas eleições. No entanto, depois de uma visita de Décio

Fernandes a Caio Prado Júnior, uma nova estratégia foi montada e os

comunistas decidiram lançar seus candidatos por outras legendas.

No processo de preparação para as eleições, os comunistas

passaram a usar outra legenda, PPP ( Partido Popular Progressista), na

tentativa de camuflar a ação dos membros do PCB. Os militantes

comunistas não conseguiram registrar a legenda do PPP, por isso

aliaram-se ao PSD (Partido Social Democrático), por intermédio do qual

concorreram às eleições.

236 “A Tarde”, Ribeirão Preto, 3 de maio de 1947.237 CHILCOTE, op. cit., p. 102.

139

O PPP, em entendimento com o PSD, lançou um programa

de 16 itens:

Defesa intransigente das Constituições Federal e Estadual em vigor no

regime democrático de forma a garantir os direitos e as liberdades

individuais e fundamentais do homem, quer se manifestando contra os

abusos e violações desses direitos e dessas liberdades, quer pugnando

pela regulamentação dos dispositivos constitucionais que se referem ao

assunto, ou ainda protestando, dentro dos limites da ética, contra a

cassação de mandatos dos legítimos representantes do povo, contra a

proibição de comícios e reuniões públicas.

Estudar a revisão do Contrato de Concessão atualmente entre a

Municipalidade e a Empresa de Águas e Esgotos desta cidade, de forma

a beneficiar a população, não só com o barateamento das taxas, mas

ainda, de forma a melhorar a distribuição da água, levando-a até os

bairros ainda não servidos e em condições de não vir a água a faltar à

população em geral.

Elaboração de um contrato, com a Cia. de Luz e Força, de forma a

atender aos interesses da coletividade, diminuindo o preço do KW-hora,

principalmente com relação aos estabelecimentos industriais;

melhoramento da iluminação pública e particular, ampliando-a de forma a

diminuir o número de casas sem energia elétrica e aumentando a

quantidade de energia elétrica para a cidade, facilitando, assim, a

instalação de novas indústrias;

Combate à carestia da vida, fixando preços nos gêneros de primeira

necessidade e instituindo feiras livres com isenção de impostos,

localizando-as, de preferência, em bairros operários;

Fomentar a criação de suínos dentro do município, de maneira a

aumentar o fornecimento de gordura animal à população, por preços mais

140

baixos, e proceder a uma racional distribuição do óleo vegetal evitando a

existência de filas.

Construção de um mercado municipal;

Estudar o aproveitamento de terras não cultivadas, próximas à cidade,

uma vez aprovada a regulamentação das disposições existentes a

respeito na Constituição Estadual;

Estudar, com o Governo Estadual, uma forma de instalar-se, na Escola

Prática de Agricultura, um posto de tratores e máquinas agrícolas que

servirão aos lavradores do município mediante uma taxa módica

destinada à conservação e custeio de maquinas;

Melhorar as estradas municipais e zelar pela sua boa conservação;

Instalação de telefones automáticos;

Lançamento de impostos progressivos sobre terrenos vagos urbanos e

revisão criteriosa de impostos prediais, a fim de serem incrementadas as

construções de casas residenciais;

Continuação do calçamento da cidade, iniciando desde logo o

pedregulhamento das ruas não calçadas e dos bairros, com a colocação

de guias e construção de galerias para águas pluviais;

Facilitar a construção de casas populares, mediante o fornecimento,

pela prefeitura, de plantas-padrões, e fiscalização das construções sem

dispêndio para o operário;

Incremento aos esportes em geral e construção de uma piscina pública,

a fim de evitar que menores se banhem nos córregos da cidade;

Ligação dos bairros Vila Tibério e Campos Elíseos, pela passagem que

já existiu e ora fechada pela Cia Mogiana, assim como dos bairros

Campos Elíseos e Campos das Cruzes, pela construção de uma ponte e

de aterro no Córrego Ribeirão Preto, à Rua Pernambuco;

141

Criação de Pronto Socorro e Assistência Médica aos trabalhadores

rurais, facilitando ainda, tanto quanto possível, a instalação de uma

maternidade.238

O programa, nada sectário, abrangia particularmente as

questões sociais. Contudo, também tentava atrair as classes média e alta,

prometendo negociar com a Cia. Paulista de Força e Luz menores taxas

para estabelecimentos industriais. Além disso, defendia a mecanização do

campo e melhorias para a agricultura, que passava por um período de

crise, programa avançado para a época, indo ao encontro tanto dos

interesses dos agricultores, como dos trabalhadores rurais.

Com base nesse programa os comunistas, por intermédio do

Partido Popular Progressista, apresentaram o nome de Nelson Rodrigues

da Nóbrega para prefeito e, na chapa de candidatos à vereança na

legenda do PSD, dez nomes:

Dr. Henrique Crósio - Médico

José Engrácia Garcia - Dentista

Ophelio Russomano - Alfaiate

Décio Fernandes - Comerciário

Aparecido Araújo - Operário

Salvador Trovato - Proprietário

João Guerreiro - Camponês

238 Manifesto do Partido Popular Progressista (PPP), retirado do processo de cassação do mandato dos vereadores comunistas, novembro de 1947.

142

Albino Tremeschini - Sapateiro

Antonio Pontim - Alfaiate

Clemente José da Silva - Ferroviário da Mogiana.

A composição da chapa demonstra a intenção de atingir o

eleitorado ligado tanto às profissões liberais _ dentista e médico _, quanto

aos trabalhadores rurais, além, evidentemente, do operariado. Desse

modo, o programa amplo dos comunistas combinou com o ecletismo da

composição da chapa.

Nas propagandas eleitorais, incluindo panfletos, comícios e

reuniões, os militantes do PCB não se preocuparam em esconder sua

tendência ideológica, auto-intitulando-se “candidatos de Prestes”. O

declarado apoio de Prestes às candidaturas dos dez vereadores do PPP

confirmou-se no dia 25 de outubro de 1947, quando foi publicada a

seguinte carta do “Cavaleiro da Esperança”:

“ Carta de Luís Carlos Prestes ao povo de

Ribeirão Preto.

Companheiros de Ribeirão Preto.

O povo desse município escolherá a 9 de

novembro os homens e mulheres que vão

representá-lo na Assembléia Legislativa local, a

Câmara dos vereadores do município (ilegível) e

prefeito.

Para o povo é de grande importância que

na Câmara Municipal estejam seus (ilegível.)

representantes, honestos e corajosos, modestos e

trabalhadores, que sintam os (ilegível) do povo e

sejam capazes de defender os interesses da

143

população e de tudo (ilegível) progresso do

município.

Na Câmara Municipal serão discutidos

todos os problemas do município e será decidida a

melhor maneira de empregar o dinheiro do povo, os

impostos, (ilegível) paga pelo Governo Federal, os

dez por cento do imposto de renda que (ilegível.)

município em virtude do dispositivo constitucional

conseguido pelos comunistas na Constituinte

Nacional.

Como brasileiro e patriota, acompanho

com o maior interesse a sorte desse município, por

isso, venho lhes pedir os seus votos, os das pessoas

de suas famílias e de (ilegível.), para os meus

candidatos, porque estou certo que saberão

defender honesta e corajosamente os interesses do

povo na Câmara Municipal./.../

Saudações democráticas.

Luís Carlos Prestes.239

O sucesso da campanha eleitoral, determinado em parte

pelo apoio de Prestes, fez com que os resultados excedessem as

expectativas dos comunistas. A votação nos dez “candidatos de Prestes”,

pelo PSD, foi significativa:

Quadro 3240

Candidatos comunistas ao cargo de vereador na Câmara Municipal de

Ribeirão Preto, em 1947.

nome do candidato votos Quando data da observações.

239 Propaganda eleitoral do PPP, presente no processo de cassação dos candidatos comunistas ao cargo de vereador em 1947.240 Relação de vereadores da 1.ª legislatura ( de 1.1.1948 a 31.12.1951). Câmara Municipal dos vereadores de Ribeirão Preto. Os dados complementares foram tirados do prontuário da Delegacia Regional de Polícia de Ribeirão Preto, n.º 548, Arquivo do DEOPS/ SP.

144

eleito, a

data da

posse.

saída

Albino Tremeschini 92 Não foi eleito.

Aparecido Araújo 129 01.01.48 31.12.51

Décio Fernandes 222 01.01.48 01.04.48 Mandato cassado

pela mesa.

Henrique B. Crósio 209 Não tomou posse.

João Guerreiro 77 Não foi eleito.

José Engrácia Garcia 129 1950 31.12.51 Assumiu o lugar de

Décio Fernandes.

Antônio Pontim 103 1949 Suplente, assumiu

o lugar de

Aparecido Araújo.

Clemente José da

Silva

73 Não foi eleito.

Salvador Trovatto 106 1950 Suplente, assumiu

no lugar de José

Elias.

Ophélio Russomano 62 Não foi eleito.

Dos eleitos, Henrique Barbosa Crósio desistiu da posse por

problemas pessoais, tendo sido substituído por um suplente do PSD, mas

sem tendência comunista. Todos os candidatos comunistas, juntos,

conseguiram 1.199 votos, representando quase 65% do total de votos do

PSD, que teve 1.854 votos para os vereadores.241 Dos cinco vereadores

eleitos pelo PSD, três eram comunistas. Como suplentes ficaram Antônio

Pontim e José Engrácia Garcia, que assumiram depois do afastamento de

Aparecido Araújo e da cassação do mandato de Décio Fernandes.

241 “A Tarde “ Rib. Preto, 14 de novembro de 1947.

145

O PSD ficou com o quinto lugar na votação para vereadores,

sendo que seu número de votos representou mais de 50% do total do

primeiro colocado, a coligação UDN-PR, como mostra o quadro abaixo:

Quadro 4.242

Eleições de 1947, total de votos para vereadores.

Legenda votos n.º de

vereadores

UDNPR 3.142 11

PTB 3.067 7

PSP 2.584 5

PSD 1.854 4

PTN 2.067 4

A oposição, liderada pelo PTN, sentiu-se prejudicada com a

vitória dos vereadores comunistas. Para evitar a cerimônia de posse,

interpôs um recurso contra os candidatos do PSD, usando como prova o

material de propaganda de Décio Fernandes e Aparecido Araújo. Com a

cassação dos candidatos comunistas, o PTN teria direito a mais um

candidato na Câmara dos Vereadores.243

Depois de um longo processo eleitoral, a cassação dos

mandatos dos vereadores comunistas acabou não se confirmando. Os

comunistas agiram normalmente na Câmara Municipal de Ribeirão, tendo

sua atuação marcada pela defesa das questões sociais e do programa

exposto durante o período de propaganda eleitoral.

242 “A Tarde”, Ribeirão Preto, 14 de novembro de 1947.243 Ibidem, 17 de novembro de 1947.

146

O trabalho de propaganda, efetuado pelo Comitê Municipal

em cidades da região, mesmo enfrentando uma série de dificuldades

conseguiu eleger vereadores em oito cidades: Altinópolis, Brodowisk,

Franca, Guará, Igarapava, Miguelopólis, Morro Agudo e Pedregulho.244

Contudo, a continuidade no processo de articulação entre os

comunistas foi prejudicado pelo aumento da repressão policial, depois da

cassação do registro do PCB. Com a perseguição da polícia, os líderes do

Comitê Municipal aparentemente diminuíram a atividade partidária na

região, focalizando sua atenção nas candidaturas dos comunistas

ribeiropretanos.

Depois das eleições, a perseguição policial voltou a atingir

os membros do PCB. Décio Fernandes teve de permanecer alguns meses

escondido em decorrência do decreto de prisão preventiva, o que

provocou a cassação do seu mandato.245 Aparecido Araújo foi preso logo

depois das eleições, em 27 de dezembro de 1947, quando liderava uma

greve nas Indústrias Matarazzo. Antônio Girotto, um dos articuladores da

campanha eleitoral na região, e Arlindo Teixeira, militante e funcionário da

Alta Mogiana, foram presos no dia 27 abril de 1948, por estarem fazendo

“agitação política nos meios rurais”.

Todas essas prisões desfalcaram o Comitê Municipal. A

atuação comunista limitou-se à atuação moderada dos vereadores na

Câmara e à distribuição de panfletos e propaganda verbal contra o

imperialismo norte - americano e contra o governo Dutra.

Contudo, mesmo com as limitações de atuação, as idéias

comunistas atraíam gradativamente a população mais pobre, sofrida com 244 Comunicados da Delegacia Regional de Polícia de Ribeirão Preto para o DEOPS/SP, durante o mês de novembro. Prontuário n.º 548, caixa 11. Arquivo do DEOPS/SP.

147

o alto custo de vida, e que via nas propostas comunistas as respostas

para os seus problemas. Tornava-se cada vez mais comum ouvir-se pelas

ruas de Ribeirão Preto: “os comunistas tinham razão.”246

Depois das eleições, o ponto alto da atuação comunista foi a

“Campanha do Petróleo e pela Paz”. Com essas palavras de ordem, o

Comitê Municipal conseguiu se refazer parcialmente, atraindo para a

campanha novos simpatizantes.

Em novembro de 1948, em plena “Campanha do Petróleo”,

ocorreu um “Congresso Regional Municipalista” do Partido de

Representação Popular. Embora os participantes tivessem uma política

claramente anticomunista os militantes locais inscreveram-se para

participar das sessões, apresentando teses em defesa da classe

trabalhadora e em prol da legalização do PCB, além de desfecharem

acusações contra os membros do PRP, chamando-os de “galinhas verdes

fascistas”.247

Como resultado, a polícia iniciou uma verdadeira caçada,

prendendo Natal Gracchia e José Antônio Neves, que distribuíam boletins

comunistas, e decretando a prisão preventiva de Salvador Trovato, José

Engrácia Garcia e Aparecido Araújo. Com essas prisões, o Comitê

Municipal do PCB desarticulou-se, voltando a ter expressão na política

local a partir de 1951, quando ocorreram novas eleições municipais.

245 Entrevista com Antônio Girotto, 1997.246 Prontuário n.º 548, caixa 11. Ofício da Delegacia Regional de Polícia de Ribeirão Preto para o DEOPS/SP.247 Depoimento de José Engrácia Garcia, 1995.

148

Anexos: A utilização das fontes orais

Uma avaliação da utilização das entrevistas.

A proposta deste trabalho é o estudo da atuação dos

comunistas em Ribeirão Preto, entre 1922 e 1947. Entre as fontes

utilizadas estão entrevistas com militantes do PCB. A fim de realizar a

tarefa de entrevistar esses comunistas, enfrentamos sérios problemas,

entre eles a inexistência de militantes vivos que tenham atuado nas

décadas de 20 e 30. Para tentar suprir essa lacuna, durante as

entrevistas procuramos conversar com os comunistas sobre as suas

149

lembranças em relação aos “velhos militantes”, com os quais conviveram

na década de 40. Contudo, pouco foi conseguido nesse sentido.

Inicialmente, foram entrevistados dez militantes. Porém,

desses dez, apenas cinco puderam contribuir efetivamente para a

composição deste trabalho no período considerado: Irineu de Moraes,

Arlindo Teixeira, Antônio Girotto, Luciano Lepera e José Engrácia Garcia.

Esses militantes eram os únicos que tinham atuado a partir da década de

40, ou tinham convivido com militantes mais antigos.

Dos cinco entrevistados, o único que militou na década de

30 foi o Sr. Irineu de Moraes, contudo, em outra cidade, Araraquara.

Arlindo Teixeira teve atuação pouco expressiva na década de 40,

passando a ter maior expressão a partir dos anos 50. Luciano Lepera era

um simpatizante do Partido na década de 40, e a sua profissão de

jornalista garantiu-lhe uma participação mais acentuada nesse período.

Restaram José Engrácia Garcia e Antônio Girotto: ambos iniciaram sua

militância na década de 40, tendo suas entrevistas possibilitado uma

colaboração mais efetiva para este trabalho.

Além das entrevistas realizadas por nós, utilizamos

entrevistas efetuadas pelo pesquisador Sebastião Geraldo, no final da

década de 80, quando se dedicava a um trabalho de comunicação oral

sobre os movimentos operários em Ribeirão Preto. Alguns desses relatos

são preciosos e únicos, pois os entrevistados já faleceram. É o caso de

Irineu de Moraes, com quem tivemos tempo de ter apenas uma conversa.

Outro caso é o de Natal Gracchia, que faleceu antes mesmo do início

desta pesquisa, mas deixou relatos preciosos, registrados em fitas

guardadas por Sebastião Geraldo.

150

De toda forma, tendo sido feitas por nós ou por Sebastião

Geraldo, as entrevistas colaboraram sobremaneira para a realização

desta dissertação na sua última fase, compreendida entre 1940 e 1948.

Durante o trabalho, procuramos fazer o cruzamento entre as fontes

escritas e as orais, não só do ponto de vista do conteúdo, mas,

principalmente, para cruzar a visão do militante _ representada na

entrevista _ com a visão da polícia _ representada pelos prontuários do

DEOPS/SP.

Num primeiro momento, estabelecemos um contato

superficial com os entrevistados, permitindo que as informações

brotassem de forma espontânea. Num segundo momento, especialmente

com Antonio Girotto, realizamos entrevistas mais programadas visando à

própria militância e para atuação do grupo. O resultado desse trabalho foi

o cruzamento das fontes orais e escritas, essencial para formar um

quadro de análise que pudesse abranger pontos de vista diferenciados

sobre a militância política. Tanto os prontuários do DEOPS/SP quanto as

entrevistas possibilitaram uma visão do cotidiano do militante. Entretanto,

essa visão foi obviamente diferenciada pelos interesses diversos da

polícia e dos membros do PCB.

O fator mais relevante do trabalho com as fontes orais foi a

confirmação do que Ecléa Bosi discute em seu livro Memória e

Sociedade, sobre como a memória individual é submetida a memória

coletiva. Este fenômeno fica ainda mais evidente no trabalho com a

memória política, evidenciada nesta pesquisa. A memória individual

aparece como um apêndice de tudo o que foi vivido pelo grupo político em

questão. Fatos marcantes são relembrados por todos como o sumário de

uma vida dedicada à militância no PCB. Assim, o trabalho de construção

151

deste discurso histórico passa pela recomposição dos discursos

individuais, mas também pela análise das fontes documentais.248

Na sociedade capitalista, a principal função do velho é

lembrar, ser detentor da tradição oral. A fala desses velhos pecebistas é

dinâmica e rica em detalhes, fruto de anos de lembranças remoídas nos

longos anos de vivência. Suas lembranças surgem como monumentos

que foram desgastados e modificados pela ação do meio social e pela

própria limitação da capacidade de memória, imposta pela idade.249 No

caso dos entrevistados neste trabalho, as lembranças sofrem ainda a

ação da sua própria formação política. A ação, consciente ou

inconsciente, aparece constantemente na tentativa de deixar intacta a

imagem do PCB. Algumas vezes, fluem sentimentos que denotam

decepção ou mágoa em relação aos anos de perseguição policial e

privação individual.

Durante as entrevistas realizadas com José Engrácia Garcia,

dentista e militante destacado nas décadas de 40 e 50, sua narrativa foi

permeada por momentos de dor, como quando relatou o período em que

esteve na prisão, em 1948, depois do “congresso das municipalidades” :

“... aí vieram por cima de mim, me

bateram demais /.../. Eles judiavam da

gente. Tinha uma cela, acho que com

50 pessoas dormindo, um dormia

encostado no outro, me botaram com

vigaristas. Estava um danado, ele

(carcereiro ) ia lá, umas quatro ou cinco

248 BÓSI, E. Memória e sociedade: lembrança de velhos, p. 19.249 Ibidem,p. 18

152

vezes e jogava água, quer dizer, a

gente não dormia. Aquela água

gelada... “250

As lembranças de José Engrácia Garcia foram marcadas

por um sentimento que representou a sensação de tempo perdido, de

trabalho não frutificado, de mágoa com os velhos companheiros.

Com graves problemas de saúde, a dor de Engrácia foi

acompanhada de perto pela esposa, que convenceu o marido a

abandonar a militância na década de 60. Para as famílias desse e dos

outros militantes a vida foi muito difícil, marcada pela insegurança e pelo

medo da repressão, refletidos na frase da Sra. Garcia: “para que serviu

lutar tanto pelo Partido, hoje ele está aí...”. O nó na garganta impediu que

a esposa de Engrácia terminasse a frase. Com a expressão de amargura

marcada no rosto, retirou-se da sala onde se realizava a entrevista.251

Além das lembranças permeadas pelo sofrimento, como no

caso de José Engrácia Garcia, outra condição marcou as entrevistas

realizadas com pessoas que foram politicamente ativas. “Na memória

política, os juízos de valor intervêm com mais insistência. O sujeito não se

contenta em narrar como testemunha histórica ‘neutra’. Ele quer também

julgar, marcando bem sua posição ou matizando-ª”252

Esse fato pode ser observado com clareza na entrevista

realizada com Luciano Lepera. Durante todo o seu discurso, ele deixou

bem evidentes sua posição e seu julgamento sobre o assunto discutido, a

250 Entrevista realizada com José Engrácia Garcia.251 ROSA, Lilian Rodrigues de Oliveira. “Comunistas em Ribeirão Preto: uma experiência com História Oral”. Estudos de História, Franca, vol. 3, n.º 1, pp. 79 - 91, 1996.252 BOSI, E., op. cit., p. 453.

153

“Campanha pelo petróleo e pela paz”. Não se contentando em apenas

narrar os fatos, comentou-os e fez críticas:

“/.../ No final da década de 40 duas

coisas ‘galvanizaram’ a opinião pública:

a luta pelo monopólio estatal do

petróleo e a luta pela paz, uma

tentativa de impedir o avanço da

bomba atômica. /.../ Aquele que se

manifestava pela paz era taxado de

comunista /.../, os que falavam ‘o

petróleo é nosso’, também eram

taxados de comunistas. Os outros, nós

taxávamos de entreguistas, porque

queriam entregar o petróleo às

multinacionais/.../. Então ficou muito

claro, eles se julgavam patriotas porque

faziam uma campanha anticomunista, e

nós nos julgávamos, e somos patriotas,

porque defendíamos a indústria

nacional. “253

Esse juízo de valor está presente em todas as entrevistas,

em maior ou menor grau de intensidade. A posição política dos

entrevistados torna-se clara em cada frase. Eles apresentam uma

necessidade constante de reafirmar sua posição. Um caso típico é o do

Sr. Arlindo Teixeira. Militante com ideais revolucionários, durante a

entrevista rapidamente o diálogo progredia para um monólogo, no qual 253 Entrevista realizada com Luciano Lepera, 1997.

154

expressava vigorosamente suas memórias relacionadas com a militância

no Partido Comunista, evidenciando sua posição revolucionária e

desfechando críticas violentas contra aqueles que eram contra a

revolução.254

Todos esses elementos das narrativas dos entrevistados

serviram para dar vida aos documentos escritos. Durante todo o trabalho,

procuramos mesclar naturalmente os dados obtidos nos prontuários e

artigos de jornais com as experiências individuais e coletivas dos

militantes entrevistados, numa tentativa de promover o que chamados de

“humanização do documento histórico”.255

254 Entrevista com Arlindo Teixeira, 1995.255 ROSA, L. R. O., op. cit., pp. 79 - 91.

155

Um resumo da entrevista com Antônio Girotto.

“Sou natural de Batatais - SP, nasci na fazenda Desengano,

em 26 de outubro de 1914. Resido em Ribeirão Preto desde fevereiro de

1953. Entretanto, atuei pelo Comitê Municipal de Ribeirão e Batatais

desde 1945, quando o Partido iniciou um breve período de legalidade.

Sou casado com Maria de Lourdes Correa Girotto e tenho quatro filhos:

Walter, Terezinha, José Carlos e Carmem. Sou filho de imigrantes

italianos, Antônio Girotto e Eliza Cazarotti Girotto, da cidade de Vicensa.

Cursei a Escola Primária Rural da Fazenda Macaúba, em Batatais.

Trabalhei na zona rural, como colono de café até os catorze anos. Fui

para a cidade de Batatais, onde trabalhei na construção civil até os 17

anos e na fábrica de chapéus, de janeiro de 32 a outubro de 1948. A partir

de 1949, trabalhei como artesão na fabricação e restauração de chapéus.

Nesse período, ficou difícil encontrar emprego, distribuía jornais do

Partido e recebia uma ajuda de custo do Comitê Municipal, tornando-me

militante em tempo integral. Para complementar meus rendimentos, a

partir de 1959 transformei-me em representante comercial da firma Têxtil

Tabacow S.A., de São Paulo, no ramo de tapetes, onde permaneci até 31

de janeiro de 1981. Desde 1976 que encontro-me aposentado e essa é a

causa pela qual luto atualmente.

Desde criança ouvia falar da Revolução Russa e do PCB. Na

adolescência, passei a admirar a Coluna Prestes e o seu líder. No início

da década de 30, quando trabalhava na fábrica de chapéus, recebi as

primeiras orientações comunistas, quando encontrava-me revoltado com

meu patrão e com as condições de trabalho e perguntava-me: “o que

fazer?” Essas orientações vieram por parte de um companheiro de

trabalho, que fazia parte do núcleo comunista de Batatais, do qual faziam

parte Acácio Cristal e Guilherme Fleiman.

156

Em 1932 tornei-me militante na célula do Partido, em meu

local de trabalho. A partir de 1935, com a grande repressão da polícia,

fiquei afastado das atividades do partido, voltando a atuar em 1945, ligado

ao Comitê Municipal de Ribeirão Preto.

Durante a minha vida de militância cheguei a entrar em

contato várias vezes com a liderança do Partido Comunista do Brasil,

chegando a passar três meses estudando o marxismo - leninismo no Rio

de Janeiro, em 1954.

Fui preso três vezes em decorrência das minhas tendências

políticas: em 1948, durante minha participação no Congresso das

Municipalidades; em 1951, durante a campanha contra a ida de soldados

brasileiros para a guerra; e em 1954, preso por 23 dias como resultado da

minha atuação no sindicato rural de Franca.

Durante o período na prisão sofri as privações da cadeia e

os maus tratos da polícia, mas a “pressão psicológica” foi a que deixou

traumas mais profundos; eu tive o pior tratamento possível, mas o que eu

acho pior são as ofensas morais.

No final da década de 40, atuei nas Campanhas do Petróleo

e pela Paz em Ribeirão Preto e região e nas eleições de 1947, quando

organizei vários comícios pela região em prol da candidatura dos

comunistas.

Sou sócio-fundador da Associação dos Aposentados e

Pensionistas de Ribeirão Preto; tornei-me membro do conselho

deliberativo dessa entidade desde 1981. Fui secretário da diretoria

executiva de 84 a 86, elegendo-me presidente dessa entidade em 86,

157

sendo reeleito em 88. Neste ano deixei a presidência, mas continuei até

hoje trabalhando pela categoria, agora na Federação dos Aposentados e

Pensionistas do Estado de São Paulo. Recebi o título de cidadão

ribeiropretano na Câmara Municipal da cidade.”

158

5. Conclusões.

Os comunistas muito cedo se organizaram na região de

Ribeirão Preto, atuando na União Geral dos Trabalhadores dessa cidade.

Nesse sentido, contribuíram para a estruturação da classe operária

brasileira, criando lideranças de importância, como no caso de Irineu de

Morais, Theotônio de Souza Lima e Guilherme Milani.

De 1922, ano da fundação do PCB, a 1947, data em que o

Partido recaiu na ilegalidade, Ribeirão Preto viu aumentar a influência

comunista junto ao proletariado e mesmo entre os camponeses.

A escolha de um estudo regional demonstra a necessidade

de se analisar o PCB não apenas nos âmbitos nacional e internacional,

mas também nas feições que anuncia nas diferentes cidades em que

conseguiu se estabelecer, nos primórdios de sua história.

A trajetória dos comunistas em Ribeirão Preto passa pela

própria história da organização operária na região. Antes do

estabelecimento do primeiro núcleo comunista na cidade, o movimento

operário era dominado pelos anarquistas e apresentava-se desarticulado.

A forte dependência econômica dos trabalhadores rurais e das atividades

urbanas em relação à produção cafeeira fortalecia o poder dos

fazendeiros que, donos da política local e regional, desestruturavam

qualquer tentativa de organização dos trabalhadores, temendo que os

seus interesses fossem prejudicados.

159

Essa situação começou a modificar-se com a fundação da

União Geral dos Trabalhadores, por comunistas, em 1925. Mesmo com

um reduzido número de militantes e as dificuldades impostas pela atuação

na ilegalidade, a organização do PCB na região evoluiu de um pequeno

grupo de simpatizantes, entre 1922 e 1925, para um núcleo comunista

bem estruturado no final dos anos vinte, marcando o auge da importância

da região de Ribeirão Preto para o movimento operário estadual. Os

comunistas atuantes na UGT e na Liga Operária Orestes Lascala, em

Sertãozinho, segundo Otávio Brandão, representaram praticamente os

únicos militantes que conquistaram resultados concretos no meio político

sindical no Estado de São Paulo durante a década de vinte.256

Entre 1928 e 1930, a atuação dos comunistas em Ribeirão e

Sertãozinho tornou-se de importância nacional para o partido. Os líderes

locais chegaram a organizar grandes manifestações de colonos,

conquistando muitos membros entre os camponeses, estudantes e

trabalhadores urbanos, o que acabou despertando o interesse da polícia

que, em 1930, desmantelou a liderança comunista local.

Depois de um período de reestruturação, enfrentando o

aumento da influência dos socialistas entre os operários, que eram

apoiados pela polícia entre 1931 e 1933, os comunistas sofreram um novo

golpe, as perseguições resultantes do movimento de 1935.

Embora os militantes locais não tenham participado

ativamente desse movimento por problemas de comunicação com o

Comitê Regional, a reação foi dura com os membros da Aliança e com os

militantes do PCB. Os poucos comunistas que escaparam da prisão

perderam o controle hegemônico sobre a União Geral dos Trabalhadores,

256 BRANDÃO, Otávio. Otávio Brandão (depoimento, 1977). Rio de Janeiro,

FGV/CPDOC - História Oral, 1993.

160

que passou a ser controlada pelos chamados “ministerialistas”,

sindicalistas que atuavam de acordo com as regras do Ministério do

Trabalho. A atuação de um reduzido número de militantes, entre 1935 e

1940, resumiu-se na distribuição de boletins de propaganda comunista e

reuniões esporádicas que não surtiram nenhum efeito concreto.

Depois de terem perdido boa parte da sua influência no

campo sindical, os comunistas iniciaram um processo de reorganização

no início da década de 40. Em 1941, conquistaram novamente o poder

dentro da União Geral dos Trabalhadores, provocando nova reação da

polícia, que prendeu, entre outros, Vitaliano Mauro, presidente da UGT.

Em decorrência da ação policial e da própria desarticulação existente

entre os membros do Partido, a reestruturação do comitê municipal foi

lenta, consolidando-se somente em 1945, com a legalidade do PCB.

Com liberdade de atuação, os comunistas lideraram, em

Ribeirão Preto, greves e movimentos de repúdio à grave situação

financeira da população, conquistando, dessa maneira, grande influência

entre a classe trabalhadora. O número de membros do comitê regional

cresceu de uma dúzia de militantes para mais de duzentos, entre 1945 e

1946.257

O resultado direto do aumento da influência do PCB em

Ribeirão foi o resultado das eleições de 1947. Mesmo tendo seu registro

cassado, o Partido lançou dez candidatis pela legenda do PSD ( Partido

Social Democrático ). Entre eles, foram eleitos três vereadores, Aparecido

Araújo, Décio Fernandes e Henrique Barbosa Crósio, e os suplentes: José

Engrácia Garcia, Antônio Pontim e Salvador Trovatto.

257 Relação de militantes e simpatizantes do PCB em Ribeirão Preto. Prontuário de Antônio Girotto, Arquivo do DEOPS/SP. Arquivo do Estado.

161

No fim dos anos quarenta, uma nova onda de prisões

provocou o arrefecimento das atividades comunistas na cidade, tanto no

campo sindical como no político. Surgiram novos militantes e a antiga

geração de comunistas, muitos deles fundadores do partido em Ribeirão _

ou afastou da militância ou passou a ter pouca influência dentro do

Comitê Municipal e da União Geral dos Trabalhadores.

Além da importância dos comunistas na organização do

movimento operário no interior do Estado, outro fator merece a

formulação de algumas considerações conclusivas: o bloco coeso

formado pelo grupo comunista atuante na cidade. Não é intenção deste

trabalho afirmar que não houve divergências de caráter ideológico dentro

do núcleo comunista ribeiropretano, pelo contrário. Mas analisando as

duas gerações de comunistas, chegamos à conclusão de que não ocorreu

nenhuma divergência grave, que pudesse promover dissidências ou a

formação de núcleos rivais.

Durante todo o período compreendido por este trabalho, a

maior parte do grupo que formava o núcleo comunista local seguia a

tendência ideológica do Comitê Central do partido. Os pequenos

desentendimentos eram resolvidos com o afastamento do militante

descontente. Um exemplo de como o Comitê Municipal resolvia seus

problemas internos foi o caso do vereador comunista Décio Fernandes,

eleito em 1947 pelo PSD.

Logo depois de ser eleito, Décio Fernandes teria recebido

dos seus “camaradas” a informação de que teria sido declarada sua

162

prisão preventiva, fato que seria confirmado mais tarde. Como precaução,

ele se refugiou fora da cidade. Seus companheiros deveriam avisá-lo do

momento certo para retornar ao seu cargo de vereador, porém o aviso

não chegou. Como conseqüência do seu afastamento por sete meses das

sessões da Câmara de Vereadores, Décio teve seu mandato cassado.

Em entrevista dada ao Diário da Manhã, em 24 de dezembro de 1948,

declarou que, ao retornar a Ribeirão Preto, desconfiou que o pedido de

prisão preventiva não existia. Esse acontecimento fez com que ele

acreditasse que havia caído no desagrado dos companheiros de partido,

que teriam forçado sua ausência da cidade propositalmente. A

conseqüência desse acontecimento foi a saída de Décio Fernandes do

PCB e do cenário político. Numa entrevista realizada no dia 3 de agosto

de 1996 com Antônio Girotto, este evitou falar no assunto, dizendo que

isso ainda causava muita mágoa entre os companheiros, e disse que tudo

não passara de um mal-entendido. Décio teria se refugiado no Paraná, na

casa de um membro do Partido. A distância teria acabado por dificultar o

contato com os camaradas de Ribeirão, que não puderam avisá-lo sobre

a perda do mandato.

Fatos como esse demonstram que as divergências entre os

membros do Partido existiam, especialmente após meados dos anos

quarenta, quando o número de militantes cresceu muito. Os velhos

militantes acusavam a nova geração de oportunismo e de não quererem

mais estudar a teoria marxista-leninista, o que desagradava aos

comunistas fundadores do Partido em Ribeirão.

Contudo, os pequenos atritos que ocorreram entre os

comunistas, de 1922 a 1947, não chegaram a provocar “rachas” no núcleo

local que, predominante e independentemente das divergências dentro do

PCB ocorridas no âmbito nacional, atuou de forma coesa e com relativa

uniformidade ideológica.

163

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Entrevistas.

Albino Tremeschini.258

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Arlindo Teixeira, 1996.

Benônio Pitta, 1996.

Carlos Di Gaetani, 1996.

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Irineu Luiz de Moraes, 1996.

Luciano Lepera, 1996.

José Engrácia Garcia, 1996.

258 Entrevistado por Sebastião Geraldo.