Revista do Meio Ambiente 41

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AMBIENTE revista do meio Rebia Rede Brasileira de Informação Ambiental Acesse: www.portaldomeioambiente.org.br ano V • outubro 2011 41 9772236101004 ISSN 2236-1014 chora e sangra Ressurgência: fenômeno da vida Economia: entrevista com Suzana Kanh Cultura ecológica na Índia Porto do Açu: sustentabilidade capenga Xingu

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Edição 41 da Revista do Meio Ambiente

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Rebia – Rede Brasileira de Informação Ambiental: organização da sociedade civil, sem fi ns lucrativos, com a missão de contribuir para a formação e mobilização da Cidadania Ambiental planetária através da democratização da informação ambiental e da educação ambiental com atuação em todo o território nacional, editando e distribuindo gratuitamente a Revista do Meio Ambiente e o Portal do Meio Ambiente. CNPJ: 05.291.019/0001-58. Sede: Trav. Gonçalo Ferreira, 777 - casarão da Ponta da Ilha, Jurujuba - Niterói, RJ - 24370-290 – Site: www.rebia.org.br

Conselho Consultivo e EditorialAdalberto Marcondes, Ademar Leal Soares (61 3033.3654 [email protected]), Aristides Arthur Soffi ati, Bernardo Niskier, Carlos A. Muniz, David Man Wai Zee, Flávio L. de Souza, Keylah Tavares, Luiz A. Prado, Maurício Cabral, Paulo Braga, Raul Mazzei, Ricardo Harduim, Rogério Álvaro S. de Castro, Rogério Ruschel

Diretoria ExecutivaPresidente do Conselho Diretor: Vilmar Sidnei Demamam Berna, escritor e jornalista Presidente do Conselho Deliberativo: JC Moreira, jornalista Presidente do Conselho Fiscal: Flávio Lemos, psicólogo

Superintendente Executivo:Leonardo da Silva D. Berna, jornalista – ID 55*8*3824 – [email protected]

Moderadores dos Fóruns RebiaRebia Nacional ([email protected]): Fabrício Fonseca Ângelo, jornalista ambientalRebia Norte ([email protected]) – Rebia Acre: Evandro J. L. Ferreira, pesquisador do INPA/UFAC • Rebia Manaus: Demis Lima, gestor ambiental • Rebia Pará: José Varella, escritorRebia Nordeste ([email protected]) – Coordenador: Efraim Neto, jornalista ambiental • Rebia Bahia: Liliana Peixinho, jornalista ambiental e educadora ambiental • Rebia Alagoas: Carlos Roberto, jornalista ambiental • Rebia Ceará: Zacharias B. de Oliveira, jornalista, mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente • Rebia Piauí: Dionísio Carvalho, jornalista ambiental • Rebia Paraíba: Ronilson José da Paz, mestre em Biologia • Rebia Natal: Luciana Maia Xavier, jornalista ambientalRebia Centro-Oeste ([email protected]): Eric Fischer Rempe, consultor técnico (Brasília) e Ivan Ruela – gestor ambiental (Cuiabá) Rebia Sudeste ([email protected]) - Rebia Espírito Santo: Sebastião Francisco Alves, biólogo Rebia Sul ([email protected]) - Coordenador regional: Paulo Pizzi, biólogo • Rebia Paraná: Juliano Raramilho, biólogo • Rebia Santa Catarina: Germano Woehl Junior, mestre e doutor em Física.

Pessoa JurídicaA Rebia mantém parceria com uma rede solidária de OSCIPs (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) que respondem juridicamente pela fi nanças dos veículos de comunicação e projetos da Rebia:• Associação Ecológica PiratingaúnaCNPJ: 03.744.280/0001-30 • Sede: R. Maria Luiza Gonzaga, nº 217, Ano Bom - Barra Mansa, RJ • CEP: 27323-300 • Utilidade Pública Municipal e isenta das inscrições estadual e municipal • Prima – Mata Atlântica e Sustentabilidade(Ministério da Justiça - registro nº 08015.011781/2003-61) – CNPJ: 06.034.803/0001-43 • Sede: R. Fagundes Varela, nº 305/1032, Ingá, Niterói, RJ - CEP: 24210-520 • Inscrição estadual: Isenta e inscrição Municipal: 131974-0www.prima.org.br

Capa16 Xingu chora e sangra por Mônica Martins

Entrevista12 Economia, que te quero verde - Suzana Kanh por Vilmar Sidnei Demaman Berna

Denúncia18 Sustentabilidade capenga por Erika Enne e Martinho Santafé

Ciência ambiental22 Ressurgência: fenômeno da vida por Marcelo Tardelli Rodrigues

Destaque24 Cultura ecológica na Índia por Maurício Andrés Ribeiro

Os artigos, ensaios, análises e reportagens assinadas expressam a opinião de seus autores, não representando, necessariamente, o ponto de vista das organizações parceiras e da Rebia.

Redação: Tv. Gonçalo Ferreira, 777 - casarão da Ponta da Ilha, Jurujuba - Niterói, RJ - 24370-290 • Tel.: (21) 2610-2272Editor e Redator-chefe: Vilmar Sidnei Demamam Berna, escritor e jornalista. Em 1999 recebeu o Prêmio Global 500 da ONU para o Meio Ambiente e, em 2003, o Prêmio Verde das Américas • www.escritorvilmarberna.com.br http://escritorvilmarberna.blogspot.com/ Contatos: [email protected] • Celulares (21) 9994-7634 e 7883-5913 ID 12*88990Editor Científi co: Fabrício Fonseca Ângelo, jornalista, mestre em Ciência Ambiental, especialista em Informação Científi ca e Tecnológica em Saúde Pública • (21) 2710-5798 / 9509-3960 • MSN: [email protected] Skype: fabricioangelo • www.midiaemeioambiente.blogspot.comAssistente Técnica: Inês de Oliveira Berna – professora e bióloga Pós-graduada em Meio Ambiente • (21) 9994-7634 • [email protected]: Ricardo Paes • [email protected] • (21) 9475-3844/2537-0235Produção gráfi ca: Projeto gráfi co e diagramação: Estúdio Mutum • (11) 3852-5489 Skype: estudio.mutum • [email protected]ão: Imprinta Express Gráfi ca e Editora Ltda. ComercialDiretor: Leonardo da Silva Demamam Berna, jornalista • ID 55*8*3824 • [email protected] comercial: Célio Judson de Souza, jornalista político ambiental e do Terceiro Setor – (61) 9637-3867 / 9212-5800 [email protected][email protected] / [email protected]ção em Brasília: Minas de Ideias Comunicação Integrada (Emília Rabello e Agatha Carnielli • Brasília (61) 3408-4361 / 9556-4242Rio de Janeiro: (21) 2558-3751 / 9114-7707 • [email protected]: agatha.cn • www.minasdeideias.com.br

• O meio ambiente, os eleitores e as zonas de sacrifício

• O Criador, a criação e o princípio da precaução

• Tragédias climáticas e a tragédia da mídia

• Indústria brasileira

• Justifi cativa política para maquiar prejuízos ambientais

• Coluna Política Ambiental

• Sustentabilidade, contexto urbano e a Rio+20

• Não ao PLC 30/2011

• Alterações no Código à luz da Ciência e Tecnologia

• Criem bosques fl orestados, não tirem a serapilheira

• Crime ambiental nos lixões

• Guia do Meio Ambiente

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Revista ‘Neutra em Carbono’

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editorial

zonas de sacrifício

A sociedade precisa continuar pressionando por mais transparência para que as licenças sejam publicadas em seu inteiro teor, com todas as suas condicionantes – assim como os termos de ajuste de conduta de quando se renegocia diante de descumprimentos das condicionantes – in-dependente de qualquer pedido do público, pelo menos em Diário Oficial, e não apenas um pequeno resumo que pouco diz, como se faz hoje.

Até bem pouco tempo a ideia que as pessoas tinham de progresso era uma espécie de ilusão que prometia benefícios e vantagens para todos. Hoje, a ideia de progresso mudou. A sociedade reconhece que ele traz benefícios, sim, mas não para todos, e que produz impactos negativos distribuídos de maneira desigual. Enquanto uns ficam com os benefícios, outros precisam ser sacrificados. Para manter as cidades limpas, alguma área terá de ser sacrificada para receber o lixo de todos! Alguma parte do rio ou do mar será escolhida para receber os efluentes dos emissários e estações de tra-tamento! Alguma bacia aérea receberá a poluição das chaminés! O ‘bota-fora’ para a lama das dragagens ou dos solos contaminados terá de ser em algum lugar! Os técnicos tentam apontar através de estudos que áreas são mais ou menos sensíveis às agressões e como não será possível impacto ambiental zero, propõem medidas para minimizar ou reparar os danos e compensar a natureza e as comunidades afetadas de alguma forma.

A decisão final será política, sobre que populações serão mais ou menos atingidas, mais ou menos beneficiadas, e que medidas compensatórias de-verão compensar os desastres anunciados. Se o tomador de decisão for um político cujas promessas aos seus eleitores foi de produzir crescimento eco-nômico, então tenderá a minimizar os impactos socioambientais e aceitar com maior conforto que áreas ambientais e comunidades devam ser sacri-ficadas por um bem maior para a sociedade. Se for um político comprome-tido com o meio ambiente ou com a ideia da sustentabilidade, tenderá a

buscar um maior equilíbrio entre a viabilidade econômica do projeto com a sustentabilidade ambiental e a melhor justiça social possível.

O Brasil está mudando, e os eleitores e políti-cos também. Não é por um acaso que o Brasil pode contar hoje com uma legislação ambien-tal que não existia algumas décadas atrás. An-tes o progresso era imposto como um bem ab-soluto e, hoje, as leis exigem que os empreen-dedores apresentem previamente às comuni-dades que serão afetadas os impactos de suas atividades e que compensações oferecerão pe-los danos socioambientais. Entretanto, a legis-lação ambiental ainda apresenta lacunas. Uma delas é a necessidade de assegurar maior trans-parência nas decisões sobre as escolhas das zo-nas de sacrifício e sobre as negociações das me-didas mitigatórias, reparadoras e compensató-rias. Apesar de tais medidas serem propostas publicamente pelos empreendedores, nas au-diências públicas, e levando em consideração critérios técnicos e uma matriz dos impactos ambientais, as decisões ainda são negociadas politicamente a portas fechadas entre repre-sentantes dos interesses públicos e privados e, uma vez aprovadas, passam a fazer parte das condicionantes das licenças.

Quanto maiores os sacrifícios a serem im-postos, quanto mais sensíveis as áreas a se-rem impactadas, maiores serão as condicio-nantes e as negociações envolvidas no licen-ciamento de empreendimentos, tanto em ta-manho de valores quanto na importância dos políticos envolvidos na negociação. *Vilmar é escritor e jornalista, fundou a Rebia (www.rebia.org.br) e edita a Revista do Meio Ambiente e o Portal do Meio Ambiente (www.portaldomeioambiente.org.br). Em 1999, recebeu no Japão o Prêmio Global 500 da ONU Para o Meio Ambiente e, em 2003, o Prêmio Verde das Américas.

O meio ambiente, os eleitores e as

Separar o joio do trigo é uma tarefa importante que nós, eleitores, podemos e precisamos fazer. A natureza, os animais, o Planeta não votam. Então, temos de votar por eles

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o criador,No campo ambiental, sempre que se está diante de incertezas, a lei manda adotar o principio da precaução. Talvez seja prudente seguirmos o mesmo principio sobre o Criador e a Criação

Se existem criaturas, e se elas não podem criar a si mesmas, então, na falta de explica-ção melhor, a razão aponta para a existên-cia de um criador. Entretanto, restam outras questões que sempre desafiaram a humani-dade: quem é – ou quem são – esse criador? É ele ou ela ou nem uma coisa nem outra? Teve um propósito em criar ou criou por criar? Se podia criar desde sempre, então, por que esco-lheu um determinado tempo para dar inicio à Criação e não antes? Por que fez os humanos com consciência de si próprios, e capazes de imaginar um Criador, a Perfeição, o Bem, o In-finito, e às outras espécies não deu esta mes-ma capacidade? O que espera de nós? Temos um papel a desempenhar na Criação?

A questão pode não estar nas perguntas nem nas respostas, mas no quanto se conse-gue conviver com o conforto ou o desconforto do mistério.

Para os que crêem, o Sagrado não é uma ilu-são ou uma mera questão metafísica de acre-ditar ou não. Ao longo da história humana, desde quando ainda se confundia os fenôme-nos da natureza com deuses e diabos, a es-pécie humana tem mostrado uma tendência em dar sentido ao mundo buscando respostas para seus mistérios, quase como se fosse um desafio. Isso por que a percepção da realida-de depende do olhar do observador. A realida-de, embora seja a mesma para todos, é perce-bida diferentemente por cada um em função de sua cultura, informações, valores, necessi-dades espirituais e existenciais. Assim, o Sa-

a criação e o princípio da precauçãogrado assume um papel fundamental para aqueles que crêem ao dar sentido à realidade e um propósito para a própria existência. Nes-sa busca, a humanidade desenvolveu diferen-tes visões de mundo, em função de suas dife-rentes culturas, tempo e lugar, dando origem ao Cristianismo, Judaísmo, Hinduísmo, Budis-mo, Animismo, e muitos outros ramos e sub-ramos religiosos, todos se auto-proclamando os únicos verdadeiros, e são mesmo, para os que acreditam neles.

Para os que não acreditam – e ainda não de-sistiram de buscar pelas respostas - surgiram novas questões. Tudo o que existe existe des-de sempre, eternamente? Então não acabará nunca? Se teve um início, como o caos pode ter dado origem à ordem que existe na natureza? Antes de iniciar uma jornada na busca das respostas, talvez seja prudente pensar se pre-cisamos mesmo de respostas para vivermos a vida e ser felizes? Pensar se podemos conviver com o mistério! Aceitar que talvez não tenha-mos a capacidade e as ferramentas para en-contrar as respostas ou, se as encontrar, talvez não consigamos compreender!

No campo ambiental, sempre que se está dian-te de incertezas, a lei manda adotar o princípio da precaução. Talvez seja prudente seguirmos o mesmo principio sobre o Criador e a Criação. Se não podemos ter certezas das respostas, me-lhor viver a vida procurando fazer o bem, sen-do o melhor que pudermos para nós próprios e para os outros, cuidar da Criação como se não fosse nossa, por que não é mesmo!

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A mídia não tem conseguido ir além das circunstâncias e se mostra despre-parada para abordar aspectos técnicos e científicos do assunto. Se as áreas de risco fossem um paciente e a mídia o seu médico, diria que a medicina se volta para combater a febre sem nenhuma preocupação com a infecção que certamente a teria provocado.

A metáfora é boa. Num país em que governos e autoridades dos três poderes constituídos só combatem o “malfeito”, como reação a denúncias publicadas pela mídia, sobretudo pela mídia impressa, os problemas de alta complexida-de das áreas de risco só vão passar por evolução favorável quando seu médico se dedicar, com inteligência e determinação, ao combate das infecções capa-zes de produzir tanta febre nos últimos anos.

O mais recente exemplo dessa leniência da mídia ocorre em relação a Santa Catarina, onde a impetuosidade das chuvas voltou a provocar, sobretudo no Vale do Itajaí, o flagelo de milhares de famílias. Mais uma vez, o Brasil expor-tou para o mundo as suas fragilidades na prevenção dos dramas sociais que atingem as áreas de risco junto com a inépcia de seus governantes.

Vamos procurar entender um pouco melhor o que se passa no Vale do Itajaí, uma região industrializada e de atrações turísticas que a levam a ser um dos destinos prediletos da população do estado de São Paulo. São dois os rios – Ita-jaí-Açu e Itajaí-Mirim – transformados ao longo do tempo no “carrasco” das populações de municípios como Rio do Sul, Blumenau, Ilhota, Gaspar, Brus-que, Luiz Alves e Itajaí. São rios de itinerário curto e que deságuam na região portuária de Itajaí, à beira-mar. Quando chove forte nas cabeceiras, os dois rios começam a transbordar e inundam todos os municípios ribeirinhos.

O problema está em que as inundações ocorrem nos níveis assustadores desta última enchente, quando o mar, em Itajaí, pelo fenômeno de maré alta, começa a reter o caudal que desce das cabeceiras. Nesse caso, o problema se amplia em poucas horas e há cidades, como Blumenau, onde o rio fora do leito chega atingir mais de dez metros de altura. Quase toda Blumenau foi total-mente submersa nas várias enchentes dos últimos 25 anos.

A mídia cobre as enchentes do Vale do Itajaí factualmente, para usar um jar-gão dos jornalistas. Parece desconhecer que a Jica (da sigla em inglês, Japan In-ternational Cooperation Agency) estudou o fenômeno das enchentes no Vale do Itajaí e apontou como solução definitiva para os problemas a implantação de um “canal extravasor” que ligue Blumenau a um outro ponto e deságue no mar, na praia de Armação, alguns quilômetros acima da foz natural dos dois rios, na região portuária de Itajaí. O “canal extravasor” poderá permanecer fechado na maior parte do tempo e só será aberto por ocasião das chuvas mais fortes.

mídiaÉ trágica a cobertura que a mídia brasileira tem dedicado às tragédias climáticas nos últimos anos: rapidez, superficialidade, descompromisso, sensacionalismo; marcas de espaços dedicados ao tema, seja na mídia impressa, na eletrônica ou na digital

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jornalismo ambiental

Tragédias climáticas e a tragédia da

Ponte sobre o Riacho Garcia no bairro Progresso, em Blumenau, destruída durante os temporais no Vale do Itajaí (SC) em 2008W

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A perene letargiaQuem já cobriu as enchentes de Santa Cata-

rina, como eu, em 1983 e 1985, sabe dizer que a proposta japonesa tem uma lógica irrefutável; a área portuária de Itajaí é “entrolhada” por baía e reentrâncias e até os navios costumam representar obstáculos à vazão das águas. O ponto do litoral onde o “canal extravasor” des-pejaria suas águas é de mar aberto, em con-dições de dar vazão em regime de maré alta ou maré vazante. A vazão do Itajaí-Mirim, que tem produzido enchentes devastadoras ao mu-nicípio de Brusque, também seria beneficiada pela redução do volume de água do Itajaí-Açu. E há mais: o porto de Itajaí seria um grande be-neficiário da solução, pois sofre excessivamen-te com o volume de águas que desce de Blu-menau e que já foi capaz de deixá-lo semi-pa-ralisado por vários anos, recentemente.

A cada enchente, contudo, são atirados na lata do lixo, e ao cabo de grande sofrimento das popu-lações flageladas, recursos suficientes para que seja construído mais de um canal extravasor. E a mídia cobre mais uma enchente e passa ao largo das causas do problema. Não desfralda a bandei-ra da “solução definitiva”, seja pelo canal extrava-sor ou por outra que venha a ser apontada.

A população do Vale do Itajaí não merece con-viver por mais tempo com esse estigma, que tem tolhido a sua incrível capacidade de desen-volvimento. O projeto que possa libertá-la, en-tretanto, só vai sair da gaveta dos burocratas de plantão quando a mídia acordar de sua já quase perene letargia. * Dirceu Martins Pio é ex-diretor da Agência Estado e da Gazeta MercantilFonte: observatoriodaimprensa.com.br/news/view/-tragedias-climaticas-e-a-tragedia-da-midia

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sustentabilidade

brasileiraIndústria A lista dos impactos positivos pode ficar maior

Para um país que tira a maior parte de sua riqueza da terra e cuja indústria ainda é pre-dominantemente de base ou extrativista, os desafios em sustentabilidade começam e se confundem com aquilo que temos de mais rico, o território. É dele que o homem e qual-quer outra espécie viva retiram o que precisam para sobreviver, sendo, ainda, espaço de trans-formação ambiental, social, econômica e cultu-ral de uma sociedade, reunindo todas as suas características e seus conflitos.

Falar de sustentabilidade no Brasil é, portanto, ampliar a discussão que assombra as grandes cidades – como a emissão de CO2 pelos veícu-los – ou as sociedades cuja economia está pau-tada nos bens de consumo e em serviços, que estão preocupadas com desafios como logística reversa e reciclagem. Não que tais temas não sejam relevantes para o país, mas nossa lista de cuidados deve começar por assuntos como biodiversidade, uso e ocupação do solo, direitos humanos, erradicação da pobreza, educação e muitos outros que estão diretamente ligados às atividades econômicas que praticamos.

Levantamento recente sobre devastação am-biental e trabalho escravo na cadeia produtiva do aço aponta que, apesar de todos os cuida-dos que o setor vem empregando para asse-gurar práticas sustentáveis, os desafios para garantir que toda a cadeia siga os padrões de gestão e desempenho responsáveis ainda re-presentam um risco real para a indústria. E a repercussão acaba chegando até a outra ponta da cadeia, representada pelas montadoras de veículos e pelos fabricantes de eletrodomésti-cos, aviões e computadores.

Dessa forma, estabelecer o desenvolvimento territorial integrado, equilibrando as vertentes ambiental, social, econômica e cultural, dentro de um modelo de governança que extrapole o campo de decisão do conselho de administra-ção da empresa, estabelecendo o engajamento dos diversos atores que compõem o território – e isso inclui toda a cadeira produtiva – é o mo-delo de gestão que deve ser perseguido pelas corporações nos dias de hoje.

No final das contas, em termos empresariais estamos falando da usual avaliação de riscos e, por consequência, de oportunidades. Natu-ralmente que, na época da Revolução Indus-trial, o fator de risco para os negócios deveria passar muito mais pela capacidade produtiva que pela gestão dos recursos naturais e dos di-

reitos humanos e trabalhistas. Do contrário, milhares de hectares de florestas nativas da Europa não teriam sido derrubados, e mulhe-res e crianças não fariam jornadas de 14 horas de trabalho por dia.

Hoje, os riscos e oportunidades dos negócios estão atrelados, em grande medida, à capaci-dade que uma empresa tem de se perpetuar, ao menos para os acionistas que buscam ren-tabilidade de longo prazo. É o caso dos fundos de pensão, que dependem de seus investi-mentos para pagar aposentadorias, e sabem que é melhor investir em empresas que prio-rizam de fato práticas sustentáveis. Porque gerenciar com sustentabilidade significa di-minuir riscos que possam parar suas opera-ções, aumentar o valor de seus empréstimos

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brasileirae seguros, enfim, fatores que venham a arra-nhar a reputação da empresa e seu valor.

E já que sustentabilidade é uma importante componente que vem sendo mensurada pelo mercado, os critérios para esta avaliação vêm se refinando. Além dos já conhecidos índices de sustentabilidade empresarial, a veracidade do que as empresas comunicam como sustentabi-lidade também será medida.

Palavra da moda, na boca de dez em cada dez empresários quando vão falar sobre o diferen-cial de seus negócios, a sustentabilidade vem sendo usada, muitas vezes, como “greenwa-shing”, termo utilizado para designar um proce-dimento de marketing utilizado por uma orga-nização com o objetivo de passar para a opinião pública uma imagem ecologicamente respon-sável, muitas vezes sem comprovação.

Por esta razão, a partir de agosto deste ano, as propagandas veiculadas no Brasil não de-verão mais destacar atributos sustentáveis de produtos e serviços se as empresas não puderem comprovar sua eficiência. As regras foram estabelecidas pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Co-nar), que destacou o fato de tais propagandas muitas vezes não informarem e ainda con-fundirem o consumidor.

Diante de tantos desafios, a indústria brasilei-ra precisará mesmo é investir no material mais importante que ela tem: o humano, dentro e fora dela – empregados, comunidades, poder público, ONG’s, sindicatos – todos devem estar aptos para saber quais são seus papéis e res-ponsabilidades. São muitas as regiões de nosso país que não estão sequer preparadas para re-ceber investimentos e altos níveis de arrecada-ção de impostos. Caberá muitas vezes, portan-to, à empresa capacitar o poder público para esta gestão, qualificar a mão-de-obra local e de-senvolver os fornecedores.

Já foi o tempo em que a lista dos impactos negativos dos empreendimentos era neces-sariamente maior que a dos positivos. As primeiras décadas deste século serão defi-nitivas para o destino da humanidade, por esta razão é imprescindível que um número maior de pessoas esteja motivado em fazer com que a lista dos impactos positivos seja mais farta para todos nós.

Chamamos a atenção também para os processos de migração das fábri-cas, que se deslocam para o interior das grandes cidades, próximos de re-servas ecológicas e mananciais, usando como justificativa os benefícios trazidos a população, tais como: empregos, lucros com royalties, promessas de melhorias na saúde, educação e etc. Na verdade isso funciona como uma maquiagem política para as futuras consequências que virão a ocorrer.

Tomamos como exemplo o cimento, que está no centro dos problemas ambientais causados pelo concreto. Cerca de uma tonelada de dióxido de carbono (CO2), considerado como o principal responsável pelo efeito estufa; é emitido para cada tonelada de cimento produzido. Por isso, alguns pes-quisadores desejam eliminar completamente o uso de cimento e criar um concreto com emissão zero ou negativa.

A fabricação de cimento envolve basicamente a queima de pedra calcária e de outros minerais a cerca de 1.500°C, criando um produto intermediário cha-mado clinker. A indústria, particularmente nos EUA e na Europa, tem reduzi-do as emissões de dióxido de carbono por meio do uso de fornos especiais e de processos de fabricação mais eficientes. Contudo, cerca de metade do CO2 do cimento que é fabricado não pode ser eliminado – ele resulta de uma rea-ção chamada calcinação, que ocorre quando o calcário começa a queimar.

Para reduzir as emissões de carbono produzidas na fabricação do concreto a um nível zero, diferentes tipos de abordagens estão sendo testadas. Abor-damos a seguir, alguns exemplos de fabricação consciente.

Na Califórnia (EUA), próximo a uma usina elétrica a gás, a empresa Calera está desenvolvendo um processo que conduz os gases da chaminé através de um recipiente contendo água do mar. O CO2 cria bolhas que precipitam mine-rais carbonatos, que poderiam ser usados como cimento. Esse processo imita o que os corais e outros organismos marinhos calcificantes fazem. A Calera calcula que produzir uma tonelada desses minerais consumiria meia tonela-da de CO2, e por isso o concreto resultante teria emissões negativas – ou seja, reteria dióxido de carbono permanentemente.

A empresa britânica Novacem está desenvolvendo um cimento que não usa carbonatos e produz um concreto que absorve o dióxido de carbono. A canadense Carbon Sense Solutions espera injetar CO2 no cimento úmido, aprisionando o gás por meio de carbonização (um processo que ocorre na-turalmente, embora muito lentamente). Concluímos que falta fiscalização do uso e o controle da manutenção dos filtros de Mangas da moagem de cimento, filtro de Mangas para Escória do cimento, filtro de Mangas para Clínquer, Sistema Captação e Filtragem de Pó de Cal. Alertamos para o des-caso com a saúde dos habitantes do interior e das metrópoles também, que pensam que ficaram livres das consequências da fabricação desses produ-tos, mais logo sofrerão com os efeitos na natureza causados por ela. *Johnny cursa MBA em Meio Ambiente na Faculdade Integrada Jacarepaguá. O grupo de trabalho responsável por este texto teve como orientadora a Profª. Adriana

Estudantes da turma de MBA da FIJ, preocupados com a falta de atitudes em relação ao “consumo consciente”, e o descaso com a “vida”, alertam para os prejuízos causados pela poluição com concreto, cal e dejetos dos curtumes

* Marcia Dias é jornalista, coordenadora de Responsabilidade Socioambiental no Grupo EBX, atualmente responsável pela implantação do Plano de Sustentabilidade do Grupo.

ambientaisA justificativa política para a maquiagem dos prejuízos

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entrevista

Economia, que te quero

verdeO Rio de Janeiro é o primeiro Estado brasileiro a criar um cargo execu-tivo para tratar exclusivamente da implantação de políticas públicas que apoiem a Economia Verde. É a subsecretaria de Economia Verde, li-gada à Secretaria Estadual de Meio Ambiente, dirigida desde sua criação, em 2010, pela ambientalista Suzana Kahn, pesquisadora ligada à Coppe (UFRJ) e ex-presidente do Comitê Científico Brasileiro de Mudanças Cli-máticas, uma espécie de IPCC nacional.

Nesta conversa com o jornalista e também ambientalista Vilmar Berna, um dos poucos brasileiros a receber o prêmio Global 500 da ONU, Suzana conta como é o desafio de trabalhar dentro do governo para implantar ba-ses sólidas para uma economia verde. Comenta também as oportunidades que o Brasil e o Rio de Janeiro em particular terão sendo sede da Rio+20. Se-gundo ela, há uma série de interesses e discussões com relação à economia verde e sustentabilidade, muitos associados à questão de comércio interna-cional. Para Suzana, não devemos estagnar na discussão de como calcular emprego verde, ou dizer em tentar definir o que é verde e o que não é. “É mais importante que cada país trabalhe para encontrar seu caminho nessa nova economia, e então, assumir suas próprias metas em função daquilo que faz”, explica. Confira a entrevista.

Vilmar Berna: Que políticas públicas podem estimular a economia verde?Suzana Khan – Antes de definir as politicas públicas necessárias, é preciso entender o que está acontecendo. É nesse estágio que estamos: avaliando o que vem a ser a economia verde e como valorar os recursos ambientais. Para, então, traçar as políticas com potencial para corrigir as falhas de mercado que, por exemplo, desconsidera a questão ambiental, social e os custos asso-ciados à poluição, à perda de paisagem ou de biodiversidade. São coisas mui-to intangíveis, estamos trabalhando na valoração, ou seja, quanto vale um recurso natural? Não estamos tratando de todos, porque é muito complexo.

E nem tudo no meio ambiente é capital, certo?Exatamente! Essa disfunção é muito interessante já que há uma resistência em relação à economia verde. Como esse é um conceito ainda abstrato, cada um dá o “tom de verde” que melhor preferir. Com a proximidade da Rio+20, que tratará do tema economia verde, tem havido resistência à adoção de cri-térios mais objetivos. Isto se dá porque muita gente ainda acha que é um modismo, que mudamos do “desenvolvimento sustentável” para um novo nome. Essa má compreensão precisa ser resolvida para fazer com que as pes-soas apostem na economia verde.

A economia verde não substitui o conceito de desenvolvimento sustentável?Não substitui. É um meio para se chegar ao desenvolvimento sustentável. Ali-ás, não é só isso, é uma forma de criar e promover ferramentas para chegar lá. Na economia tradicional quando são calculadas as metas, por exemplo, o PIB (produto interno bruto), a taxa de desemprego, não é considerada a questão ambiental, não é considerado o recurso natural, muito menos a qualidade de vida. Na economia tradicional a qualidade de vida não tem peso. Por exemplo,

quando você gera uma receita para um municí-pio ou um estado, não são avaliadas as formas como essa receita foi gerada. Seja consumindo mais gasolina, causando congestionamento, etc.

Beneficia o município, mas…Está aumentando o produto e, no entanto, é péssimo para a qualidade de vida da popula-ção, não permite a mobilidade adequada nas cidades. Não se captura essas questões quan-do a métrica usada é a da economia conven-cional. Da mesma forma, quando se tem der-ramamento de óleo na Baia de Guanabara é bom para economia antiga, porque é preciso gastar dinheiro, as pessoas precisam trabalhar para despoluir, enfim, mas isso é bom?

Se cair um avião aqui, o PIB cresce.Cresce porque terão de comprar um novo avião. É isso que a gente tem que deixar evidente. Uma vez que isso for evidenciado pelos toma-dores de decisão, todos verão que não é uma questão apenas para o meio ambiente. Econo-mia, desenvolvimento humano e recursos na-turais são parte da mesma equação.

O conceito de economia verde ainda é algo vago, mesmo para os economistas.Enquanto não houver a percepção da impor-tância desse conceito, a tomada de decisão po-lítica fica prejudicada. Tanto o Brasil quanto o Rio de Janeiro têm um capital natural muito grande só que não está valorado. A gente não dá valor a isso, e se o comércio degradá-lo pode até continuar tendo crescimento, mas estare-mos matando a galinha dos ovos de ouro, já que nosso estoque natural estará indo embo-ra. Este é o desafio aqui na Secretaria: construir um senso comum entre todos os secretários, to-madores de decisão, etc. Com isso será possível dar incentivos para os setores que vão benefi-ciar mais o estoque de capital natural. Temos

Suzana Kahn, pesquisadora ligada à Coppe (UFRJ) e ex-presidente do Comitê Científico Brasileiro de Mudanças Climáticas, conversa com o jornalista e

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de criar incentivos e desoneração, não para di-minuir a receita do Estado, mas para reorientar os processos de produção e de serviços.

A economia tradicional deve ajudar a economia verde. De que maneira isso pode ser feito?É perceber que o recurso natural é importante, que ele tem um valor. É valorizar atividades que antes eram pouco remuneradas e fazer com que pessoas que não estavam sendo incluídas nessas atividades possam ter oportunidades. O caso da pesca é um exemplo. O Brasil tem um li-toral enorme, mas a pesca e a manutenção dos recursos pesqueiros não estão sendo devida-mente valorados. O fato de ter ambientes natu-rais bonitos, como parques, é importante. Mas, quanto se paga para visitar parques? Nada, en-tão o parque não é mantido porque não tem re-curso para isso. Você não visita um parque nos Estados Unidos sem pagar. Não só nos Estados Unidos, no Quênia (África) também tem par-ques lindíssimos, muito bem mantidos, com vi-gilância e pessoas trabalhando ali.

Estamos falando, então, de usar e pagar pelos serviços ambientais?A gente não dá valor, por exemplo, para o turis-mo. O Brazil nunca foi ao Brasil, porque a gente não valoriza. Você visita o Pantanal e a Amazô-nia e encontra vários estrangeiros e poucos bra-sileiros. Tem grupos que gostam de viajar pra ver pássaros, no Brasil ninguém presta atenção a isso, a gente não dá valor. É preciso estimular o turismo interno e a economia criativa.

O que é economia criativa?Economia criativa está muito associada, por exemplo, à moda, ao teatro, ao audiovisual. Essa economia também impacta pouco em recurso natural a não ser a criatividade. A cultura tam-bém. Pode gerar muito recurso para o Rio de Ja-neiro, com pouquíssimo uso de recurso natural. Não precisa simplesmente fazer aço, o Estado pode ganhar muito dinheiro direcionando o seu crescimento mais criativo.

Quais exemplos de economia verde, em projetos e ações, que são importantes para a realidade brasileira?A indústria farmacêutica baseada em produ-tos agrícolas, fitoterápicos, tem um grande potencial, mas atividades que possam esti-mular a vida fora das grandes cidades tam-bém têm um impacto muito positivo. O ci-dadão das metrópoles é um voraz consumi-dor de energia e de transportes. Também es-tamos trabalhando para ampliar a oferta de

energias limpas no Rio de Janeiro. É preciso estimular as indústrias da cadeia produtiva das energias limpas e gerar mais empregos verdes.

Quem vai financiar?A economia tradicional tem que financiar a mudança. E isso já acontece com, por exemplo, os royalties do petróleo e da mineração. A indústria do petróleo paga uma certa quantia em royalties e no caso do pré-sal existe um fundo. Existe, também, o fundo clima, que é para promover iniciativas que visem re-dução na emissão de carbono. E, no Estado do Rio, tem o Invest-Rio. As agên-cias de fomento, existem, é preciso ter uma direção.

Como fazer com que outros órgãos do governo compreendam essa direção?Idealmente, a questão da economia verde deve estar em todas as instâncias de governo. Pensando em economia e em desenvolvimento, é preciso que todas as atividades, como a agricultura, a cultura, esporte e lazer, turismo e, principalmente, a economia, estejam alinhadas. Isso aconteceu quando como Plano Clima, que também ultrapassa as fronteiras ambientais. Agora no plano de economia verde deve acontecer da mesma maneira.Como a economia verde está relacionada com a comunicação ambiental e a educação ambiental?Acredito que educação ambiental não é simplesmente ensinar o que é um bio-ma, o que é ecossistema, etc. É preciso focar na mudança de hábitos de con-sumo, porque o país está crescendo e quando as pessoas passam a ter renda maior, tendem a copiar uma forma de consumo insustentável. Quando se fala da nova classe média, é o momento de trabalhar para que esse novo grupo consumidor entre no mercado com ideias e com hábitos de consumo mais sus-tentáveis. Eu vejo a geração dos meus filhos muito mais educada do que a mi-nha. Devemos seguir essa trilha de mudança de hábito, de reaproveitamento de água, de energia, enfim, vejo um grande potencial na educação ambiental.

Com relação à Rio+20, será uma oportunidade para o Brasil ser vanguarda de uma nova economia?Oportunidade tem, não sei se vamos ter sucesso (risos). Há muitos interesses e discussões com relação à economia verde e sustentabilidade, muitos asso-ciados à questão de comércio. O que é mais interessante para a Rio+20 é mui-to mais o entendimento desse conceito, de cada país, de acordo com as suas especificidades, assumir suas próprias metas em função daquilo que faz.

Estamos melhor do que há 20 anos sob o ponto de vista da economia verde?Eu acho que sim. Quantas pessoas falavam de aquecimento global? Pou-quíssimas, era um debate meio intelectual, acadêmico ou de relações inter-nacionais. Hoje em dia qualquer criança fala de aquecimento global, todo mundo sabe desse assunto, todo mundo entende. O primeiro passo para resolver qualquer coisa é reconhecer: temos um problema. Se você não re-conhece o problema não pode fazer nada. Da mesma maneira fazendo uma analogia, se não tem uma métrica, um indicador para medir a economia verde, não se pode traçar nenhuma política.

O Brasil precisa ter um cargo de governo específico para economia verde?Ah! Sou muito entusiasmada, eu acho que é sempre bom a gente renovar, abrir um espaço e provocar uma discussão, um debate, acho que isso me motiva.

Será que o exemplo da Secretaria de Economia Verde do Rio será multiplicado para o resto do Brasil?Eu espero que sim. Quanto mais a gente divulgar, procurar realmente es-palhar essa ideia, melhor. A Rio+20 é um palco para para dar mais desta-que a essa questão. Fonte: Envolverde

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Noticiando os fatos “verdes” que ocorrem no Congresso Nacional

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O presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), esteve em Paris/França, na Décima Conferência das Assembleias do G-8, cujo tema foi Energias do Futuro – O Papel dos Parlamentos. Estiveram presentes repre-sentantes da Alemanha, Japão, França, Estados Unidos, Canadá, Itália, Reino Unido e Rússia, além do Brasil e África do Sul, países convidados. Marco Maia disse que o Brasil hoje é um exemplo em fontes alternativas de energia na recomposição da matriz mundial energética, que utiliza combustíveis fós-seis como carvão, gás natural, petróleo, e que representam 87% de consumo da matriz energética mundial. No Brasil esses números são mais otimistas: temos quase 50% de utilização de fontes de energias renováveis, entre elé-trica, eólica e solar. O nosso grande destaque é o setor de transportes com os biocombustíveis como etanol e biodiesel. “O Brasil é o único país do mundo onde hoje o consumo do etanol é maior que a gasolina, pois o preço do eta-nol de cana de açúcar é competitivo com o preço dos derivados de petróleo, e ainda colabora com a preservação do meio ambiente. Reconheço que essa tecnologia é alta em custos, aos países mais pobres”, disse Marco Maia.

A Lei 12.305/10, da Política Nacional de Re-síduos Sólidos que determina que até Agos-to/2014 todos os resíduos sólidos devem ser tratados, reduzirá em 70% o volume de mate-rial depositado no meio ambiente, certamente acabará com os lixões-depósitos de lixo a céu aberto, usados em 63% das cidades brasileiras e que ficam proibidos pela atual legislação e trouxe a Brasília, em audiência pública na Co-missão de Meio Ambiente e Desenvolvimen-to Sustentável da Câmara dos Deputados, o presidente da CNM/ Confederação Nacional dos Municípios Paulo Ziulkoski, que disse não acreditar que as prefeituras, possam cumprir a nova lei até 2014, pois os municípios terão que implantar 100% de coleta de lixo seleti-va e 100% de compostagem de lixo orgânico e ainda estabelecerem em seus municípios um programa de educação ambiental. A realidade é que 40,7% dos municípios tem algum tipo de coleta seletiva que é realizada em 10% a 20% da área urbana. Mais de 80% dos municípios brasileiros não fazem compostagem e a Lei obriga, que o lixo orgânico não seja enviado para aterros sanitários. O grande desafio das prefeituras é obter recursos financeiros para o cumprimento da nova lei de preservação am-biental, ele acha que até 2014, é inviável para as prefeituras,o cumprimento da Lei.

O deputado federal Onofre Agostini (DEM-SC) está criando um projeto de lei que institui o Programa Nacional de Compensação de Serviços Ambientais e o Fundo Federal de Pagamentos por Serviços Ambien-tais. A proposta é um avanço na defesa e preservação do meio ambiente, por criar mecanismos à remuneração aos proprietários de terras preser-vadas. Agostini afirma que a legislação repressiva se mostrou ineficaz.

O presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sus-tentável da Câmara dos Deputados Giovani Cherini (PT/RS) anunciou acordo com a empresa Itaipu Binacional S/A para o plantio de 22 mil mu-das de árvores em todo o país. Os custos seriam bancados pela geradora de energia hidrelétrica, e seria uma forma da Comissão fazer o dever de casa dando o exemplo. “Devemos assumir o compromisso de liderar a transição de uma economia tradicional para uma economia verde, incentivo maior a preservação ambiental que ao desmatamento”, ressaltou Cherini.

Câmara em focoO deputado federal Assis Couto (PT/PR), coor-denador da Frente Parlamentar de Agricul-tura Familiar, pede o reconhecimento como “atividade de interesse social”, mediante aná-lise caso a caso, a permanência de pequenos agricultores, que já ocupavam áreas históricas, hoje, de preservação ambiental,justificando que essas famílias preservam as áreas am-bientais das quais retiram o sustento. O de-putado alega que isto faz parte do chamado ”desenvolvimento sustentável”, que há muitos anos é praticado por estas famílias que vivem em uma APA (área de preservação ambiental) há dezenas ou centenas de anos. Essas famí-lias devem permanecer onde estão; isto seria o reconhecimento da sociedade brasileira e do governo federal, pois elas são as guardiãs do meio ambiente e devem ser protegidas pelo novo Código Florestal.

Usina de etanol Vertente, em Guaraci (SP)

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Senado em pautaO senador Aníbal Diniz (PT-AC) informou que o governador Tião Via-na (PT-AC) lançou o programa “Florestas Plantadas”, com o plantio de 500 mil mudas de açaí, na região de Feijó, no Acre. O senador disse que o projeto é atingir um milhão de mudas da fruta, reduzindo o des-matamento. Há um programa em curso para modernizar as agroindús-trias existentes, cuja produção atual é em média 24 mil toneladas, em quatro anos esta produção se elevaria para 27 milhões de toneladas, com investimento de 4 milhões de reais, gerando 2000 empregos diretos.

O senador Casildo Maldaner (PMDB-SC) comemorou em plenário o sucesso da Em-presa de Pesquisa Agropecuária e Exten-são Rural de Santa Catarina (Epagri), na implantação do “Projeto Oliveiras”. Malda-ner, afirma que o Brasil importa quase 100% de azeite de oliveira que consome. Em análi-se realizada na Argentina, o azeite de olivei-ra extra virgem produzido em Santa Catari-na é de excelente qualidade, e em cinco anos o Estado estará produzindo em larga escala.

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Colheita oficial da azeitona, em São Lourenço do Oeste (SC), onde autoridades estaduais, regionais e municipais, bem como lideranças ligadas ao setor agrícola, prestigiaram o ocorrido que aconteceu na Unidade Experimental de Oliveiras, implantada junto ao Viveiro Municipal de Mudas

O relator do novo Código Florestal - PLC-30/11, tramitando no Senado Federal e aprovado recentemente na Câmara dos Deputados, senador Jorge Viana (PT-AC), afirmou que os senadores querem um código com desenvolvimento sustentável, produção de alimentos com respeito ao meio ambiente e ao homem do campo. O Brasil está devendo mais aten-ção a agricultura familiar e temos o dever de ouvir a sociedade e corrigir as distorções detectadas por ela.

Ainda na discussão do Código Florestal, no Senado Federal, o sena-dor Acir Gurgacz (PDT-RO) disse que se deve avaliar a ocupação em área montanhosas e ribeirinhas, na cultura do café e do arroz e a exploração comercial de empresas de “pesque-pague” e hotéis pousadas no ramo do ecoturismo; deve-se levar em consideração a preservação ambiental mantida por essas unidades já construídas e que não prejudicam o meio ambiente.

O senador Blairo Maggi (PR-MT) disse que as disputas políticas de-vem ficar de fora da discussão do Código Florestal que tramita no Senado Federal e que precisamos preservar os ativos ambientais par o futuro mas acima de tudo, a nossa preocupação deve ser com o presen-te e respeitando o homem do campo que preserva o meio ambiente. As avaliações e análises e emendas ao Código devem ser em função do de-senvolvimento sustentável do país.

O senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), presidente da Comissão de Meio Ambien-te, defende juro zero para financiar a recu-peração ambiental. Ele afirma que as áreas de preservação permanente (apps) em re-cuperação de suas coberturas vegetais re-presentam um bem público, e é necessário garantir a qualidade da água de nossos cór-regos e rios nas terras de pequenos agricul-tores na agricultura familiar, incentivando a recomposição de matas ciliares e que são utilizadas em áreas de manejo. Muitas des-sas propriedades, centenárias, desenvolvem a agricultura nas áreas hoje consideradas de preservação ambiental.

Senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) destaca pesquisa com perfil do desmatamento na Amazônia

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Carta do Cacique Mutua a todos os povos da Terra

XinguO Sol me acordou dançando no meu rosto. Pela manhã, atravessou a palha da oca e brincou com meus olhos sonolentos. O irmão Vento, mensageiro do Grande Espírito, soprou meu nome, fazendo tremer as folhas das plantas lá fora.

Eu sou Mutua, cacique da aldeia dos Xavantes. Na nossa língua, Xingu quer dizer “água boa”, “água limpa”. É o nome do nosso rio sagrado.

Como guiso da serpente, o Vento anunciou perigo. Meu coração pesou como jaca madura, a garganta pediu saliva. Eu ouvi. O Grande Espírito da floresta estava bravo.

Xingu banha toda a floresta com a água da vida. Ele traz alegria e sorriso no rosto dos curumins da aldeia. Xingu traz alimento para nossa tribo.

Mas hoje nosso povo está triste. Xingu recebeu sentença de morte. Os caciques dos homens brancos vão matar nosso rio.

O lamento do Vento diz que logo vem uma tal de usina para nossa ter-ra. O nome dela é Belo Monte. No vilarejo de Altamira, vão construir a barragem. Vão tirar um monte de terra, mais do que fizeram lá longe, no canal do Panamá.

Enquanto inundam a floresta de um lado, prendem a água de outro. Xingu vai correr mais devagar. A floresta vai secar em volta. Os animais vão morrer. Vai diminuir a desova dos peixes. E se sobrar vida, ficará tris-te como o índio.

Como uma grande serpente prateada, Xingu desliza pelo Pará e Mato Gros-so, refrescando toda a floresta. Xingu vai longe… desembocar no Rio Ama-

zonas e alimentar outros povos distantes.Se o rio morre, a gente também morre, os

animais, a floresta, a roça, o peixe… tudo mor-re. Aprendi isso com meu pai, o grande caci-que Aritana, que me ensinou como fincar o peixe na água, usando a flecha, para servir nosso alimento. Se Xingu morre, o curumim do futuro dormirá para sempre no passado, levando o canto da sabedoria do nosso povo para o fundo das águas de sangue.

Hoje pela manhã, o Vento me levou para a floresta. O Espírito do Vento é apressado, tem de correr mundo, soprar o saber da alma da Natureza nos ouvidos dos outros pajés. Mas o homem branco está surdo e há muito tempo não ouve mais o Vento.

Eu falei com a Floresta, com o Vento, com o Céu e com o Xingu. Entendo a língua da arara, da onça, do macaco, do tamanduá, da anta e do tatu. O Sol, a Lua e a Terra são sa-grados para nós.

Quando um índio nasce, ele se torna par-te da Mãe Natureza. Nossos antepassados,

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muitos que partiram pela mão do homem branco, são sagrados para o meu povo.

É verdade que, depois que homem branco chegou, o homem vermelho nunca mais foi o mesmo. Ele trouxe o espírito da doença, a gripe que matou nosso povo. E o espírito da ganância que roubou nossas árvores e ma-tou nossos bichos. No passado, já fomos mi-lhões. Hoje, somos somente cinco mil índios à beira do Xingu, não sei por quanto tempo.

Na roça, ainda conseguimos plantar a mandioca, que é nosso principal alimento, junto com o peixe. Com ela, a gente faz o bei-ju. Conta a história que Mandioca nasceu do corpo branco de uma linda indiazinha, en-terrada numa oca, por causa das lágrimas de saudades dos seus pais caídas na terra que a guardava.

O Sol me acordou dançando no meu rosto. E o Vento trouxe o clamor do rio que está bra-vo. Sou corajoso guerreiro, não temo nada.

Caminharei sobre jacarés, enfrentarei o abraço de morte da jiboia e as garras terrí-veis da suçuarana. Por cima de todas as coi-sas pularei, se quiserem me segurar. Os espí-ritos têm sentimentos e não gostam de mui-to esperar.

Eu aprendi desde pequeno a falar com o Grande Espírito da floresta. Foi num dia de chuva, quando corria sozinho dentro da mata, e senti cócegas nos pés quando pisei as sementes de castanha do chão. O meu arco e flecha seguiam a caça, enquanto eu mesmo era caçado pelas sombras dos seres mágicos da floresta.

O espírito do Gavião Real agora aparece ro-dopiando com suas grandes asas no céu.

Com um grito agudo perguntou:– Quem foi o primeiro a ferir o corpo de

Xingu?Meu coração apertado como a polpa do pe-

qui não tem coragem de dizer que foi o re-presentante do reino dos homens.

O espírito do Gavião Real diz que se a arté-ria do Xingu for rompida por causa da barra-gem, a ira do rio se espalhará por toda a terra como sangue – e seu cheiro será o da morte.

O Sol me acordou brincando no meu rosto. O dia se abriu e me perguntou da vida do rio. Se matarem o Xingu, todos veremos o ali-mento virar areia.

A ave de cabeça majestosa me atraiu para a reunião dos espíritos sagrados na floresta. Pisando as folhas velhas do chão com cuida-do, pois a terra está grávida, segui a trilha do rio Xingu. Lembrei que, antes, a gente ia para a cidade e no caminho eu só via árvores.

Agora, o madeireiro e o fazendeiro espre-

meram o índio perto do rio com o cultivo de pastos para boi e plantações mergulhadas no veneno. A terra está estragada. Depois de matar a nossa floresta, nossos animais, sujar nossos rios e derrubar nossas árvores, que-rem matar Xingu.

O Sol me acordou brincando no meu ros-to. E no caminho do rio passei pela Grande Árvore e uma seiva vermelha deslizava pelo seu nódulo.

– Quem arrancou a pele da nossa mãe? – gemeu a velha senhora num sentimento profundo de dor.

As palavras faltaram na minha boca. Não ti-nha como explicar o mal que trarão à terra.

– Leve a nossa voz para os quatro cantos do mundo – clamou – O Vento ligeiro soprará até as conchas dos ouvidos amigos – venti-lou por último, usando a língua antiga, en-quanto as folhas no alto se debatiam.

Nosso povo tentou gritar contra os negócios dos homens. Levamos nossa gente para fa-lar com cacique dos brancos. Nossos caciques do Xingu viajaram preocupados e revoltados para Brasília. Eu estava lá, e vi tudo acontecer.

Os caciques caraíbas se escondem. Não querem olhar direto nos nossos olhos. Eles dizem que nos consultaram, mas ninguém foi ouvido.

O homem branco devia saber que nada cresce se não prestar reverência à vida e à natureza. Tudo que acontecer aqui vai voar com o Vento que não tem fronteiras. Recai-rá um dia em calor e sofrimento para outros povos distantes do mundo.

O tempo da verdade chegou e existe mis-são em cada estrela que brilha nas ondas do Rio Xingu. Pronta para desvendar seus mis-térios, tanto no mundo dos homens como na natureza. Eu sou o cacique Mutua e esta é minha palavra! Esta é minha dança! E este é o meu canto!

“Porta-voz da nossa tradição, vamos nos fortalecer. Casa de Rezas, vamos nos forta-lecer. Bicho-Espírito, vamos nos fortalecer. Maracá, vamos nos fortalecer. Vento, vamos nos fortalecer. Terra, vamos nos fortalecer.”

Rio Xingu! Vamos nos fortalecer!Leve minha mensagem nas suas ondas

para todo o mundo: a terra é fonte de toda vida, mas precisa de todos nós para dar vida e fazer tudo crescer.

Quando você avistar um reflexo mais bri-lhante nas águas de um rio, lago ou mar, é a mensagem de lamento do Xingu clamando por viver. * Mônica Martins é jornalista e criadora da personagem fictícia Cacique Mutua.

chora e sangra

Enquanto inundam a floresta de um lado, prendem a água de outro. Xingu vai correr mais devagar. A floresta vai secar em volta. Os animais vão morrer. Vai diminuir a desova dos peixes. E se sobrar vida, ficará triste como o índio

Índios dançam durante a festa do Quarup, na aldeia dos Yaualapiti, no Xingú, MT

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denúncia

capengaSão cerca de 1.500 famílias que vivem da terra, plantando aipim, ba-tata, couve, alface, tomate, coco, jiló, laranja, abacaxi, limão, entre outros produtos que abastecem parte do mercado de municípios vizi-nhos, como Campos dos Goytacazes, Macaé e Rio das Ostras, bem como os balneários de Atafona e Grussaí. Pequenos agricultores estabelecidos há mais de 200 anos na região do Açu, abrangendo o 4º e o 5º distritos de São João da Barra, nas localidades de Campo da Praia, Tombado, Pipeiras, Água Preta, Mato Escuro, Cajueiro e Azeitona.

Pessoas humildes que sobrevivem da agricultura familiar e convivem com a incerteza de seus futuros, pois boa parte dessa área, que corresponde a aproximadamente 1/3 de todo o território de São João da Barra, está sendo desapropriada para a construção do Super Porto do Açu (90 km²) e do dis-trito industrial (70 km²), além da chamada “Cidade X”, idealizada para aco-modar até 250 mil pessoas, população estimada para São João da Barra em 2025 quando o porto estiver operando em pleno vapor.

O Porto do Açu é um empreendimento logístico da empresa LLX Logística S.A., que faz parte de um projeto maior do grupo EBX, controlado pelo bilioná-rio Eike Batista, e prevê um modelo de condomínio industrial-logístico sem precedentes no País. A previsão é que lá seja instalada uma siderúrgica, duas cimenteiras, um polo metal-mecânico, usina termelétrica e pelo menos qua-tro usinas para pelotização de minério, que chegará ao porto por um minero-duto de 525 km de extensão que passa por 32 municípios em Minas e no Rio.

Alterações

Andando pela região é possível ver placas que já determinam a localiza-ção de alguns empreendimentos, como siderúrgica e construção naval. Se todas as negociações anunciadas se confirmarem, serão investidos mais de R$ 40 bilhões na região, alterando radicalmente o perfil demográfico, social e principalmente econômico de São João da Barra, cidade que hoje conta com 30 mil habitantes. Sob a justificativa de minimizar os impactos que os novos empreendimentos vão provocar, a empresa LLX, a prefeitura e o governo do Estado decidiram criar um distrito industrial para compensar a transformação de uma das fazendas adquiridas pela EBX em área de preser-vação ambiental, onde nenhum empreendimento poderá ser erguido. Para isso, o estado está desapropriando uma área de 70 Km², através da Codin (Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro).

E é aí que começa o problema: se por um lado está sendo articulado o cres-cimento econômico e a preservação ambiental, por outro não coloca o ser hu-mano como peça do tripé da sustentabilidade (o social, o ambiental e o econô-mico). Nessa região vivem milhares de produtores rurais que sustentam suas famílias com o que plantam ali e não querem deixar o local onde nasceram e cultivam para sua sobrevivência. Eles, que viveram décadas em uma região ca-rente de recursos, agora querem participar da “festa”, mas desde março, quan-do começaram a ser cumpridos os mandados de posse mediante desapropria-ção, os moradores dormem com medo de serem expulsos ao amanhecer.

Sustentabilidade Produtores convivem com a insegurança“Tem dias que a gente nem dorme. Ontem

mesmo levantei uma hora e não dormi mais. Meu marido diz que só sai daqui morto”, falou a produtora Maria Ribeiro Machado, 67 anos, nascida e criada no local. Ela tem uma peque-na propriedade com cerca de 30 alqueires, onde vive com o marido e filho. De um lado uma bela plantação de aipim. Do outro, pés de coco. Ao fundo, criação de porcos, algumas cabeças de gado e mais cultivos variados.

A casa principal ainda mantém sua arquitetu-ra tradicional, com figuras que adornam a pare-de. Próximo, uma cobertura abriga o maquinário da fazenda. A renda da família vem de sua pró-pria terra, onde também produz queijo, vendi-do para estabelecimentos de Grussaí e Atafona. “Essa casa vem dos meus bisavôs”, falou Dona Maria, temendo ter sua terra desapropriada.

Assim como Dona Maria, Valdeci da Silva Al-meida nasceu na região e também vive do que planta. O sítio é da família e é fonte de renda de doze irmãos e sua mãe, que vive na casa vizinha, junto com outro filho doente. Valdeci conta que suas terras estão localizadas no traçado da li-nha elétrica e terão que ser desapropriadas por conta disso. “Se eles tiram a gente daqui, o que vamos fazer? Eles não podem beneficiar quem vem de fora, enquanto nós, que moramos aqui, eles querem enxotar”, contou Valdeci, que nun-ca exerceu outro ofício senão o de lavrador e não quer deixar a profissão. “Nossa caneta de traba-lho é a enxada. Se não queremos vender nossas terras, eles têm que respeitar”, complementou.

O produtor rural e uma das lideranças da As-sociação dos Produtores Rurais e Moradores do 5º distrito (Asprim), Rodrigo Silva Santos ressal-tou o medo que os agricultores têm de perder suas terras e o sustento das famílias. Ele con-ta que tudo começou em 2007, quando a pre-feitura revisou o zoneamento de São João da Barra, transformando o 4º e 5º distritos de área rural para industrial, permitindo que o poder público desaproprie a área para fins de interes-se coletivo. “No dia 31 de dezembro de 2008, no apagar das luzes, a prefeitura publicou um de-creto de desapropriação sem consulta popular ou uma audiência pública”, criticou Rodrigo.

As desapropriações estão sendo feitas pelo Governo do Estado, através da Codin, que no ano passado chegou a abrir um posto em Água Preta. A empresa confirmou a área de desapro-priação de 70 km², que abrange as localidades de Água Preta, Salgado, Açu, Campo da Praia,

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Produtores rurais de São João da Barra estão sendo pressionados a sair de suas propriedades centenárias para a criação do distrito industrial do Super Porto do Açu

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Cajueiro. A Condin garante que as posses das propriedades vão para o estado, e que o Distri-to Industrial é gerido pela companhia e não se relaciona com as obras da iniciativa privada do Porto do Açu. “Esta foi mais uma manobra do governo para legitimar a venda ilegal de parte da cidade de São João da Barra, sem sequer pen-sar que aqui vivem pessoas”, falou João.

Para tentar resistir, os produtores se uniram através da Asprim, que mantém uma sede onde acontecem reuniões regulares. Rodrigo frisou que a população não é contra a instalação do Porto do Açu, pois ela quer fazer parte do de-senvolvimento que o empreendimento vai pro-mover. Mas os produtores que vivem da terra e estão estabelecidos há anos no local, esses são contrários, sim, às desapropriações que estão acontecendo em suas terras para a criação do Distrito Industrial. “Não somos contra o porto, só não queremos deixar nossas casas. Ninguém aqui depende de prefeitura para sobreviver, pois vivemos do nosso trabalho e eles estão forçando as pessoas a deixarem suas vidas. E para ir para onde? Para fazer o que?”, desabafou Rodrigo.

João Batista, outra liderança comunitária, res-saltou que os produtores já tiveram duas con-quistas. Uma delas foi garantir, através da Câma-ra de Vereadores, o tombamento socioambien-tal de uma área do 5º distrito que equivale a sete mil campos de futebol. Outra foi a reintegração de posse concedida pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, permitindo que uma proprietária voltasse para a fazenda de quase 30 hectares.

Ambientalista aponta várias irregularidades Há tempos que o professor da UFF e ambien-

talista Aristides Soffi ati vem apontando irre-

gularidades no processo de implantação do Porto do Açu, começando pela ausência das comunidades afetadas na formulação dos Estudos Prévios de Impacto Ambiental. “Elas nem ao menos são informadas sobre os resulta-dos parciais dos estudos para opinarem. Por sua vez, as audiências públicas se tornaram uma farsa, pois, de antemão, mesmo antes da audiência públi-ca, o projeto já está aprovado pelo órgão governamental competente. Por mais que o auditório proteste e tenha um prazo adicional para se manifes-tar, o licenciamento não muda em nada”, falou.

Soffi ati observou que o grupo do empresário Eike Batista já havia tentado ins-talar este mesmo porto em Santa Catarina, mas o governo de lá não aceitou, já que os problemas ambientais e sociais seriam muito maiores do que os be-nefícios econômicos que o empreendimento traria para a região. Entre os im-pactos ambientais que as obras do Açu já estão provocando, Soffi ati chama a atenção para a mortandade de peixes, camarões e tartarugas marinhas devido à dragagem da areia. “Há informações de que muitos animais marinhos estão morrendo, pois quando eles sugam a areia, vem tudo junto”, alertou Soffi ati, destacando ainda os problemas para a pesca, já que as atividades do porto e seu entorno podem provocar a destruição dos ecossistemas restingas e lagoas, ambiente considerado um berçário natural e refúgio para muitas espécies.

“O estaleiro proibido em Santa Catarina é a obra mais impactante do comple-xo industrial-portuário do Açu. Ele cortará ao meio a parte íntegra da Lagoa do Veiga por um canal de 300 metros de largura por 18 metros de profundidade. Nem o Rio Paraíba do Sul tem uma foz com tais dimensões. O acesso ao mar será feito por um canal submarino que se ligará ao canal principal da ilha-por-to numa costa que não conta com uma ilha sequer. A abertura de ambos os ca-nais no fundo do mar já está causando danos à biota marinha, pois a areia reti-rada por uma enorme draga fl utuante e lançada em outro ponto do mar mata animais marinhos e muda suas condições de vida”, ressaltou Soffi ati.

Entendendo a questão Açu

O engenheiro e professor do IFF em Campos dos Goytacazes, Roberto Mora-es, explicou em seu blog – um dos mais conceituados e lidos da região -, no dia 26 de abril deste ano, algumas questões que estão nos bastidores da polêmica do Açu envolvendo a empresa de Eike Batista, o governo do Estado e a Prefei-tura de São João da Barra. Segundo Moraes, quando a EBX, a holding que con-grega os diversos empreendimentos, decidiu instalar no Açu uma unidade de benefi ciamento de minério de ferro adquiriu duas grandes propriedades: Saco Dantas e Caruara. “A própria EBX admitiu que a instalação no Açu deveu-se, basicamente, ao fato desta ser a única grande área litorânea disponível e barata, em toda a região Sudeste”. “E mais: as grandes áreas destas duas pro-priedades facilitava o processo de aquisição, difícil de ser negociadas, se fos-sem pequenas glebas, como as que circundavam estas duas grandes fazendas, em áreas de restinga com pouca utilização agrícola ou pecuária”.

“Assim – prossegue o blogueiro – foi dada a partida para os projetos do mi-neroduto, da ampliação da lavra no estado de Minas Gerais, do projeto do porto que, com a valorização do minério de ferro no mercado internacional, ganhou outras possibilidades, incluindo a agregação da geração de energia elétrica com o carvão retornado dos navios que levarão o minério, com as atividades de exploração de petróleo no litoral da região, com a entrada da empresa inglesa, Anglo American como sócia (49% da MMX) e do BNDES (12% da LLX) como sócios dos primeiros negócios, etc”.

“Dessa forma, o projeto da EBX se estendeu para a perspectiva da im-plantação do conceito de porto-indústria e do Complexo Logístico Indus-trial, hoje conhecido, com a defi nição do estaleiro para construção de plata-formas e dos navios para extração de petróleo no mar, das perspectivas de duas siderúrgicas, uma montadora de automóveis, etc”, complementa.

O secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico Julio Bueno afi rmou, no dia 24 de outubro, que o Porto do Açu deverá iniciar suas operações entre o fi m do ano de 2012 e início de 2013, durante a Comissão Especial da Alerj

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O aumento da frota de automóveis na cida-de de São Paulo tem contribuído para piorar aspectos de mobilidade urbana, qualidade do ar e consequentemente interferindo na qualidade de vida dos seus habitantes.

Hoje a velocidade média do tráfego paulista-no é de 10 km por hora, e doenças relacionadas à qualidade do ar, ou seja, o aumento de mor-tes por pneumonia e doenças respiratórias tem crescido exponencialmente mais que câncer e Aids, de acordo com o Dr. Paulo Saldiva.

O excesso de veículos tem aumentado a demanda por áreas para tráfego e estacio-namento, e como consequência a pavimen-tação, o que contribui para a impermeabi-lização do solo, facilitando a ocorrência de enchentes. Além disso, o calor retido por es-sas superfícies, somado ao calor gerado pe-los veículos, tem contribuído para o aumen-to da temperatura do ambiente por meio da formação de ilhas de calor, o que interfere no microclima da cidade.

São Paulo, apesar de ser a cidade mais rica do país, no âmbito do urbanismo e do plane-jamento urbano está entre as mais carentes, com a necessidade latente de uma reforma urbana ampla.

Os governos e prefeituras responsáveis pelo planejamento urbano da cidade e dos seus espaços públicos na maioria das vezes não conseguem absorver a expansão exponen-cial da cidade. Por isso, são de extrema im-portância as ações de intervenção no espaço urbano por organizações da Sociedade Civil, Fundações e Empresas.

Dessa forma, podemos perceber que a es-trutura das cidades determina a qualidade do espaço urbano e de vida de seus habitan-tes, tendo a qualidade expressa também no seu microclima, no consumo energético, na

sustentabilidade,gestão de água e de resíduos, em sua capacidade de adaptação aos even-tos climáticos, na garantia da saúde e da satisfação dos moradores.

Neste sentido, podemos considerar que o planejamento urbano muni-cipal é estratégico para a ordenação espacial do território e tem como principal instrumento o plano diretor, que, por sua vez, tem a função de ser um integrador, articulador das políticas setoriais para as cidades.

Neste cenário, o setor da construção civil como é extremamente relevan-te, principalmente as empresas de incorporação imobiliária, pois atuam como um dos agentes indutores na concepção espacial das cidades.

Esse setor, em especial o imobiliário, é responsável por articular parce-rias público-privadas cuja intenção é promover uma melhoria do ambien-te construído, influenciando na melhoria da qualidade de vida. Entretan-to, nem sempre o que está explícito nas legislações, ou o que foi previsto pelos investidores e governos, consegue atender à demanda social latente por infraestrutura de serviços, acesso à saúde, transporte e educação.

O setor da construção civil também poderá contribuir no processo de adaptação das cidades diante desses grandes desafios mundiais enfren-tados pelas cidades?

O modelo de desenvolvimento urbano de São Paulo é um exemplo de como existem lacunas que necessitam ser preenchidas, pois basta olhar para a cidade e ela nos mostra as questões relacionadas à mobilidade ur-bana, coleta de lixo domiciliar, enchentes, ocupações em áreas vulnerá-veis, entre outros problemas que fazem parte da agenda do município.

Como adaptar as cidades para a economia de recursos naturais e melhoria da qualidade de vida?

Neste quadro, a palavra “sustentabilidade” se apresenta como o tema do momento, em toda a sociedade, principalmente porque hoje a maior parte da população mundial vive nas grandes metrópoles.

A origem da palavra, ou seja, o seu significado etimológico, aponta que sustentabilidade “é a capacidade de fornecer ou garantir o necessário para a sobrevivência no planeta”.

Segundo o relatório “O estado do mundo”, divulgado em 2010 pela ONU - Organização das Nações Unidas, atualmente cerca de um sexto da população mundial é responsável por quase 80% do que é consumi-do mundialmente em termos de bens e serviços e 5 bilhões de pessoas ainda consomem um décimo do que compra um europeu médio. Hoje já consumimos 30% acima da capacidade de reposição da Terra; diaria-mente retiramos do planeta, em termos de recursos naturais, o equiva-lente a 112 prédios do Empire State, que tem 105 andares. É impossível continuarmos a agir da mesma maneira sem que tenhamos perdas.

Diante dessa conjuntura, só existe uma saída para o mundo: o desen-volvimento nas três esferas propostas pela sustentabilidade: econômi-ca, social e ambiental. Aliar o desenvolvimento sustentável de maneira a proporcionar condições de igualdade e inclusão social das classes menos privilegiadas é o grande desafio das nações.

O Professor Jurandir Macedo, especialista em comportamento e finanças, comenta que só existem dois erros em nossa vida financeira: “Ou economi-zamos muito e morremos cedo sem usufruir dos benefícios que o dinheiro pode nos proporcionar ou temos uma vida perdulária, gastando o que não

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temos e perdemos qualidade de vida”. Do pon-to de vista da sustentabilidade também fun-ciona da mesma maneira, ou seja, ou a socie-dade muda os padrões individuais de consu-mo e devastação ambiental ou teremos perdas irreversíveis à nossa saúde e à própria sobrevi-da no planeta. As pessoas ao redor do mundo precisam se conscientizar de que é necessário o equilíbrio ou não vamos ter planeta.

E como fazer isso, tendo em vista a proximidade da Rio+20 – Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, que será realizada em 2012?

A Rio+20 reunirá os esforços necessários para alcançar uma economia verde, inclusiva e de baixo carbono em busca do desenvolvimento sustentável. Seu eixo central está pautado na Green Economy, e para isso será necessário que o Brasil apresente suas experiências nas ques-tões relacionadas ao etanol e à Amazônia, além da nossa biodiversidade, que hoje abastece a ca-deia de produção e consumo em escala global.

O foco deverá ser colocado em torno de como a sustentabilidade se relaciona com países subdesenvolvidos, uma vez que só existe uma alternativa para eles: uma economia verde que proporcione a equidade. Na conferência Rio 92 falamos sobre os limites do planeta como algo intangível, entretanto agora é um grande ris-co para a economia, pois a biodiversidade está relacionada de maneira intrínseca ao desen-volvimento das nações.

A estratégia do governo para a conferência está voltada para a mobilização e o engaja-mento da sociedade, por isso ele vai fazer um grande esforço para mobilizar principalmen-te os jovens, porque eles é que terão de cobrar dos governantes e implementar ações que promovam a economia verde e inclusiva.

De acordo com o relatório intitulado Rumo a uma Economia Verde: Caminhos para o Desenvolvimento Sustentável e a Erradicação da Pobre-za, lançado pelo PNUMA em 2011, existem grandes oportunidades para desacoplar, por exemplo, a geração de resíduos do crescimento do PIB, incluindo em seu lugar ações de recuperação e reciclagem. Isso gera no Brasil retornos de 2 bilhões de dólares por ano, ao mesmo tempo que evi-ta a emissão de 10 milhões de toneladas de gases de efeito estufa; aqui, uma economia de reciclagem plena valeria 0,3% do PIB.

O Professor Ignacy Sachs apontou, durante oficina realizada pela Se-cretaria de Assuntos Estratégicos do Governo Federal, que a humanida-de entrou em uma nova era: geológica e antropocêntrica, e o que nos interessa agora é a era geológica, porque as atividades humanas come-çam a fazer a diferença no planeta. “Somos como aprendizes de feiticei-ro, entretanto ou criamos um roteiro para os geonautas se alinharem à Rio+20 ou caso contrário não teremos o Brasil e o mundo na rota social e ambientalmente includentes e sustentável.

Ou seja, será necessário reaprendermos a planejar”, disse o professor. Isto é, na visão de Sachs será necessário que os países se adaptem sob três grandes aspectos: pegada ecológica, geração de trabalho decente e gestão de um fundo de financiamentos para subsidiar a sustentabilida-de nos países em desenvolvimento.

O cientista nos propõe a criação do imposto sobre o carbono, pois caso contrário os empresários que não investirem em sustentabilidade fica-rão em desvantagem competitiva em relação ao preço de suas mercado-rias e em relação aos concorrentes que não incorporam sustentabilida-de e isso pode gerar mais desigualdade. Segundo Sachs, estamos viven-do uma grande crise econômica, e os consumidores vão comprar produ-tos mais baratos porque vão controlar o que entra e sai de recursos para sua subsistência. Na sua visão seria necessária a criação de pedágios para utilização dos oceanos, dos ares onde os países desenvolvidos deve-rão subsidiar a utilização dos recursos aos países em desenvolvimento, ou seja, quem utiliza mais paga mais.

Outro aspecto apontado por Sachs está na necessidade de redefinir os eixos das cooperações técnicas a partir dos biomas, por exemplo: os cientistas que estudam as florestas tropicais no Brasil deverão fazer in-tercâmbios com os cientistas que estudam as florestas tropicais da Ín-dia, pois isso facilitaria a interlocução entre planos de cooperação téc-nico-científica e neste momento poderíamos dar um passo rumo ao de-senvolvimento includente e sustentável.

Sachs conclui que será necessário replanejar as agendas verde e azul, discutir formas de trabalho decente, olhar para a pegada ecológica e tra-balhar com programas de mutirão assistidos de habitação. Essas seriam as estratégias para colocarmos o Brasil na liderança do evento mais im-portante da ONU em 2012.

Hoje o Brasil possui uma quantidade significativa de recursos naturais, e é a partir desses recursos que extraímos toda a base da nossa econo-mia, mas se eles forem retirados de maneira predatória e indiscrimina-da, o que vai acontecer? A economia entrará em colapso. Portanto, hoje não é possível haver desenvolvimento social e ambiental se pensarmos apenas na geração de riquezas, como também não é possível pensarmos somente na preservação ambiental sem levarmos em conta a economia. Por isso é necessário o equilíbrio dessa equação similar ao equilíbrio da nossa vida financeira. Vivian Blaso é Relações Públicas (CNP), Doutoranda e Mestre em Ciências Sociais (PUC-SP), diretora da agência de Relações Públicas Conversa Sustentável, MBA em Gestão Estratégica de Marketing (UFMG) e Especialista em Sustentabilidade (FDC). Professora convidada do curso de Pós Graduação em Construções Sustentáveis (FAAP)Fonte: Conversa Sustentável

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Durante todo o ano, principalmente nos meses de primavera e verão, e quase sempre no período da manhã, os pescadores da região de Ar-raial do Cabo levam seus barcos para o mar para mais um dia de tra-balho. Quando amanhece, enquanto a maioria das pessoas ainda está dormindo, o trabalho desses homens do mar está apenas começando. Depois de vários dias de pescaria, pescadores retornam à costa e a praia com seus barcos, na maioria das vezes, carregados de uma grande quan-tidade e diversidade de pescado.

A maioria das pessoas apenas observa as espécies provenientes dessa pesca nas peixarias, nos mercados, nos restaurantes ou até na própria mesa, quase sempre sem ter ideia do esforço empregado pelos pescado-res para a obtenção desses recursos naturais, e que esses homens preci-sam saber e escolher os locais exatos para a execução de tal atividade. Esses conhecimentos e habilidades levam anos para serem adquiridos e dominados, características essas que são apenas assimiladas e executa-das com muita prática e experiência.

Quem vive especificamente da pesca, sabe muito bem que as áreas costeiras possuem uma grande quantidade e diversidade de espécies marinhas, devido ao fato de estarem próximas de regiões extremamen-te ricas em nutrientes, como é o caso das terras próximas da costa. Esses nutrientes são levados da terra para o mar, pela ação das chuvas e, prin-cipalmente, pelos rios que desembocam diretamente no mar. Algumas regiões costeiras são ainda mais ricas do que outras em nutrientes e, por esse motivo, são conhecidas como áreas de ressurgência.O que é e como funciona o fenômeno da ressurgência

Ressurgência (do inglês upwelling) é a subida, ascensão ou afloramento das águas frias e profundas ricas em nutrientes. Esse fenômeno só ocorre porque as águas dos mares e oceanos estão em constante movimentação, devido à força criada pelo movimento de rotação da Terra e pela ação dos ventos. O fenômeno da ressurgência funciona da seguinte maneira: 1 - o movimento de rotação da Terra faz com que as águas dos oceanos fiquem sempre em movimento e girando em grandes círculos; 2 - as correntes marinhas frias e ricas em nutrientes que se formam no pólo Norte e no pólo Sul, viajam pelo fundo oceânico até chegarem aos continentes; 3 - ao chegar, nas regiões costeiras, as águas frias provenientes dos pólos acompanham o relevo da costa numa profundidade maior que 200 ou 300 metros, permanecendo abaixo das correntes marinhas superficiais quentes; 4 - ventos fortes que sopram do continente em direção ao mar empur-ram as correntes marinhas superficiais de águas quentes para longe da costa, permitindo dessa forma, que as correntes marinhas profundas de águas frias aflorem em direção à superfície;

fenômeno da vidaressurgência: Ressurgência (do inglês upwelling) é a subida, ascensão ou afloramento das águas frias e profundas ricas em nutrientes. Esse fenômeno só ocorre porque as águas dos mares e oceanos estão em constante movimentação

5 - durante o movimento de subida, as corren-tes marinhas profundas de águas frias arras-tam uma grande quantidade de nutrientes presentes no fundo do oceano; 6 - esses nutrientes servirão de alimento para algas microscópicas (fitoplâncton), que por sua vez servirão de alimento para animais microscópicos (zooplâncton), que servirão de alimento para crustáceos, moluscos e peixes, que também por sua vez, servirão de alimen-to para peixes maiores e para espécies de aves e mamíferos marinhos, como baleias e golfi-nhos, além de outros animais.

Principais áreas de ressurgência no mundo

As principais áreas de ressurgência do mundo são: as costas do Peru e da Califór-nia (Estados Unidos), no Oceano Pacífico, as costas da Cidade do Cabo (África do Sul), do Senegal e do Marrocos (norte da África), no Oceano Atlântico, e a costa da Somália, no Oceano Índico.

De todas as regiões, a costa do Peru é con-siderada a mais importante, pois concentra cerca de um quinto de todo o pescado do mundo. O fenômeno da ressurgência tam-bém ocorre, eventualmente, em outras cos-tas e no meio do oceano. Mas nessas regiões, o fenômeno ocorre com menor intensidade.

A história da ressurgência em Cabo FrioNo Brasil, a ressurgência ocorre em uma

pequena faixa do litoral do Rio de Janeiro, próximo à cidade de Cabo Frio. É antiga a constatação de uma ressurgência na costa da região de Cabo Frio. No século XV, a car-ta marítima dos navegadores portugueses já

Ilha do Farol, Arraial do Cabo (RJ)

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mostrava na latitude 23ºS da costa brasileira uma região em forma de cabo, então chama-do de Capo Frígido, onde havia sido verifica-da uma anomalia térmica negativa, resul-tante de águas muito frias. Mas foi preciso esperar até 1936, ano da expedição do navio oceanográfico alemão Meteor, para se regis-trar cientificamente a ocorrência de tempe-raturas baixas na costa sudeste do Brasil, es-pecialmente nessa região.

O Brasil iniciou pesquisas referentes ao es-tudo da ressurgência em sua costa, somen-te na década de 1960, apesar de o conheci-mento da existência do fenômeno e de suas águas frias na região datarem do tempo das grandes navegações. Nas duas últimas déca-das, as pesquisas oceanográficas só se inten-sificaram graças, em grande parte, aos esfor-ços do Almirante Paulo de Castro Moreira da Silva, pesquisador pioneiro da oceanografia brasileira, que idealizou e implantou o Pro-jeto Cabo Frio, para estudar a ressurgência na região e sua aplicabilidade na produção de alimentos.

A importância do fenômenoAs pesquisas revelaram que, na região de Cabo Frio e de Arraial do Cabo,

três fatores importantes são responsáveis pelo afloramento ou subida das águas frias profundas ricas em nutrientes: o relevo e a inclinação do fundo do mar na região em relação à costa, a forma ou desenho do litoral e o aumento do vento de direção nordeste nos meses de primavera e verão.

Apesar do fenômeno da ressurgência ocorrer principalmente nos meses de primavera e de verão, na região de Cabo Frio e de Arraial do Cabo, isso é suficiente para transformar tais localidades em importantes áreas de pesca durante o ano inteiro. Estudos realizados em ambas as áreas, com-provaram que suas águas, apresentam uma grande quantidade e diversi-dade de nutrientes.

Apesar de a ressurgência ocorrer inicialmente na região de Cabo Frio e de Arraial do Cabo, as águas profundas e frias ricas em nutrientes, pro-venientes deste fenômeno alcançam grande amplitude, pois são levadas pelas correntes marinhas em direção à cidade do Rio de Janeiro, podendo até chegar às águas do Estado do Espírito Santo. Fontes:• Valentin, J. L., (1994). A Ressurgência – Fonte de Vida dos Oceanos. Revista Ciência Hoje, vol. 18, nº 102, pág. 19-25.• Ferreira, C. E. L. & Arruda, J, E, G., (2001). O Fenômeno da multiplicação dos peixes. Revista Ciência Hoje das Crianças, ano 14, nº 115, pág. 02-05.*Marcelo Tardelli Rodrigues é biólogo marinho e fotógrafo de natureza e vida selvagem, pesquisador do Grupo de Estudo e Pesquisa de Cetáceos de Arraial do Cabo

Principais áreas de ressurgência no mundo (em vermelho)

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O país é uma sociedade secular que aceita todas as religiões. Ali em parte se sonha e se vive na mitologia, em um universo sem limites e, em parte, há um pragmatismo quando pratica o espiritualismo experimental, o ver para crer

A Índia, a maior democracia do mundo, com mais de um bilhão de habitantes, tem grande diversidade de línguas, culturas, costumes e apresenta extremas desigualdades sociais e econômicas. Talvez seja, no mundo, o país mais diverso e a sociedade em que se experimentam mais explicitamente os extremos das grande-zas e as misérias da condição humana. Ela ab-sorveu, recebeu, metabolizou influências das inúmeras invasões que sofreu ao longo de sua história e as devolveu transformadas ao mun-do. Princípios de sua sabedoria, como o da não violência (ahimsa) e o das experiências com a verdade (satyagraha) foram aplicados por Mahatma Gandhi na luta pela independência.

É uma sociedade secular que aceita todas as religiões. Ali em parte se sonha e se vive na mitologia, em um universo sem limites e, em parte, há um pragmatismo quando pratica o espiritualismo experimental, o ver para crer. A espiritualidade é profundamente ancorada na matéria, ao valorizar os aspectos físicos e corporais, os aspectos mentais e emocionais. A cabeça e o espírito da sociedade estão nas nu-vens: voltar os olhos para o céu é preciso por-que os fenômenos climáticos, como as chuvas das monções, determinam o resultado da agri-cultura, básica na economia do subcontinente indiano. Mas os pés estão na terra e assentam-se na realidade material.

Ali encontra-se um patrimônio de reflexões sobre a consciência, abordado de uma forma abrangente e que extrapola visões limitadas de ramos dominantes da psicologia e da ciên-cia que não admitem a existência de dons ou de níveis mais altos da consciência, por não se-rem mensuráveis. Comportamentos individu-ais radicais, que seriam considerados loucura em outras partes, ali são socialmente tolerados, como sinais da busca de ligação com o sagra-do. Os sadhus, que circulam nus pelas ruas, os faquires, que mortificam o corpo de forma ra-dical, os sannyasins, que renunciam aos confor-tos materiais, são exemplos da diversidade de

caminhos e escolhas pessoais socialmente aceitos e valorizados. A sociedade nutre os que abandonaram o mundo material para se dedicar a essa busca.

A tradição hindu sacralizou bichos e os tratou como deuses (o elefante Ganesh, o macaco Hanuman, entre outros) e plantas. Um dos ideais sub-jetivos para a vida é o da inatividade, da vida contemplativa, com mínima interferência sobre a natureza. Reduzir ao mínimo a utilização dos recur-sos naturais, de objetos de consumo, alimentos, vestuário, espaço, energia e chegar à pura contemplação e observação da vida, da natureza e das coisas são meta interior ambiciosa com repercussões externas. Ela reduz os efei-tos degradadores da ação sobre os valores morais e o ambiente. Valoriza-se estilo de vida minimalista, que preserva a natureza dos danos do consumo desenfreado. Uma postura minimalista significa um máximo de satisfação, felicidade, alegria, com mínimo de objetos. A atitude de desprendimento e a postura contemplativa desenvolvem um relacionamento com o mundo exterior sem sentimentos de posse sobre ele.

No que se refere à ecologia e ao meio ambiente, a Índia apresenta feições contraditórias. Por um lado, tendo se libertado da colonização inglesa em 1947, o país ainda não foi capaz de suprir o déficit de infra-estrutura herda-do de séculos de exploração colonial: assim, há sujeira e falta de saneamen-to básico em toda parte. Por outro lado, é admirável a competência da socie-dade indiana para suprir necessidades materiais com mínima pressão so-bre o meio ambiente. Na alimentação, adotou-se o vegetarianismo, menos impactante sobre o ambiente e o clima do que outros hábitos alimentares: a quantidade de água, a quantidade de insumos agrícolas e a área de terra necessárias para alimentar vegetarianos é muito menor que as necessárias para alimentar carnívoros. Os estudos de ecologia energética revelam a su-perioridade dos alimentos de origem vegetal sobre os de origem animal quanto à produtividade energética. O vegetarianismo baseia-se no princí-pio do ahimsa, a não-violência estendida ao mundo animal.

Famílias de classe média e alta correspondem a apenas 20% da população. Mas nas 600 mil aldeias da Índia rural predomina um estilo de vida frugal, que demanda poucos objetos e bens de consumo para satisfazer as neces-sidades elementares. As pessoas educam posturas corporais para sentar-se ao chão e não utilizar cadeiras ou móveis. O mobiliário caseiro é, portan-to, reduzido. Também não são necessários objetos como talheres, pratos e outros utensílios pois o uso do corpo supre as necessidades. A mão direita, por exemplo, é usada para levar os alimentos à boca, dispensando talheres; enquanto a mão esquerda é usada na higiene pessoal. Esses hábitos, se-guidos por milhões de pessoas, reduzem significativamente o consumo de recursos naturais. Em relação ao vestuário, predominam para as mulheres, os modelos clássicos de sáris, confortáveis, que não se submetem às varia-ções da moda e para os homens, o dothi, um retângulo de tecido enrolado no corpo. A inexistência de modelagem sofisticada e complexa maximiza o aproveitamento dos tecidos, e o vestuário é em geral bastante adequado ao

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Í ndiaclima tropical. O uso de calçados apropriados e igualmente confortáveis e de material durá-vel, somado à tradição de andar descalço den-tro dos ambientes domésticos também reduz bastante o uso da energia elétrica e de mate-riais de limpeza intensivos em energia, além de facilitar o trabalho humano diário.

Esses são alguns exemplos de como a forma de vida individual e na família contribui para evitar a sobreutilização dos recursos naturais.

A economia de meios para desempenhar as atividades diárias, em casa ou no trabalho, a economia de mobiliário, objetos e implemen-tos, os hábitos alimentares vegetarianos, o uso intensivo do corpo e o modo de relacionamento com os animais, tudo isso revela uma cultura que respeita o meio ambiente e evita desperdi-çar recursos naturais. Essas qualidades talvez sejam mais evidentes em uma aldeia indiana do que em qualquer outro tipo de assentamen-tos humanos, pois elas se abastecem em gran-de parte nas proximidades com água, energia, alimentos, materiais de construção etc.

Na Índia, levou-se a extremos de sofisticação a relação não violenta com a natureza. Aque-le país acumulou, durante milênios, amplo conhecimento de como lidar com a sustenta-bilidade, conceito que se encontra na raiz da palavra dharma, que tem múltiplos significa-dos. Dharma provém do sânscrito dhr, que sig-nifica sustentar, carregar: “É a lei, aquilo que sustenta, mantém unido ou erguido” observa

Heinrich Zimmer, no seu livro Filosofias da Índia.O Dharma ajuda a expli-car como aquela civilização se sustentou durante milênios e não entrou em colapso, como ocorreu com outras sociedades mais recentes. Ela acumula um tesouro de saberes úteis para um mundo em busca de sustentabilidade. O Dharma é um deles.

Pegada ecológicaAtualmente, usam-se indicadores para aferir o quanto uma pessoa, um

país ou uma sociedade é sustentável. Um dos principais indicadores é a pegada ecológica, que mostra quantos hectares de terra produtiva per ca-pita são necessários para sustentar o estilo de vida de um indivíduo, de uma cidade ou de um país. Um alemão médio necessita de 4,8 hectares; um brasileiro, de 2,2 ha; na China 1,6 ha; nos Estados Unidos 9,6 ha; na Ín-dia 0,7 ha.; no Japão 4,3 ha. A média mundial é de 2,3 hectares. A maior pe-gada ecológica é do cidadão norte-americano. Se toda a população do pla-neta adotasse estilo de vida similar, seriam necessários quatro planetas Terra. Comparada com outros países, a Índia tem uma pegada ecológica quatorze vezes mais leve do que a norte-americana e três vezes mais leve do que a média mundial.

Seria equivocado associar a pegada ecológica leve de um indiano com a miséria e o baixo consumo de bens materiais. A hipótese mais adequada para esse fato é a de que isso resulta das formas de organização social e familiar e de arquitetura funcional; de assentamentos humanos descen-tralizados e que se abastecem de alimentos, águas, energia e materiais nas proximidades, sem necessidade de grandes deslocamentos; da proximida-de casa-trabalho, da mobilidade a pé, movida a energia humana ou animal; do transporte ferroviário; da alimentação vegetariana e do consumo de ali-mentos produzidos localmente; dos hábitos frugais de consumo e conse-quente baixa geração per capita de resíduos. Em resumo, resulta do eco-design da sociedade, que reduz ao mínimo o uso dos recursos naturais, de objetos de consumo, alimentos, vestuário, espaço e energia. Tais comporta-mentos derivam de valores e ideias não utilitaristas – tais como a sacraliza-ção de bichos e plantas – e de consciência ecológica que se aprende cultu-ralmente desde o berço e torna-se parte dos costumes e usos sociais, redu-zindo a necessidade de que essa aprendizagem seja feita por meio da edu-cação formal escolar. Hábitos de vida frugais, associados a um design social inteligente, seguidos por milhões de pessoas na Índia, reduzem significati-vamente o consumo de recursos naturais e compõem a combinação de mo-tivos que ajuda a explicar a sua reduzida pegada ecológica (0,7ha/hab) e a torna portadora de tesouros culturais valiosos para a sustentabilidade.

Apenas uma pequena parte pegada ecológica é devida a necessidades fí-sicas do corpo. O maior peso de uma pegada ecológica deve-se a demandas geradas no campo da mente e das emoções, ou ao fato da organização espa-cial onde vivem as pessoas ser pouco funcional. Valores pós-materialistas ou neo-espiritualistas induzem atitudes de consumo material sustentável que ajudam a manter a saúde ambiental.

Se imaginarmos a possibilidade de que o planeta venha a ser socialmente mais justo, a Índia dispõe de uma margem de crescimento razoável de sua pegada ecológica, que lhe permitirá investir em infra-estrutura e sanar pro-blemas de saneamento sem pressionar significativamente os recursos do Planeta. Diferentemente de nações que precisaram colonizar outros territó-rios para se apropriarem de recursos para atender a suas demandas, a Índia nunca precisou expandir-se e dominar outros povos. Uma pegada ecológi-ca leve é uma qualidade valiosa em um mundo com recursos limitados e população crescente, no qual é cada vez mais necessário conservar energia, reduzir a emissão de gases de efeito estufa e descarbonizar a economia e ao mesmo tempo viver em paz e de forma não violenta. *Autor de Ecologizar e de Tesouros da Índia para a civilização sustentável. www.ecologizar.com.br

A tradição hindu sacralizou bichos e os tratou como deuses, como o elefante Ganesh

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A Associação Juízes para a Democracia - AJD, entidade não governamental e sem fins corporativos, que tem por finalidade trabalhar pelo império dos valores pró-prios do Estado Democrático de Direito e pela promoção e a defesa dos princípios da democracia pluralista, a propósito do PLC 30/2011, em trâmite no Senado Federal (PL 1876/99, aprovado na Câmara), vem a pú-blico manifestar o seguinte:

A tutela (“Preservação e Recuperação”) do meio ambiente e dos “processos ecológicos essenciais” e a provisão de manejos ecologi-camente sustentáveis são deveres incondi-cionais do Poder Público por determinação expressa da Constituição Federal, a teor do disposto em seu artigo 225. E um meio am-biente ecologicamente equilibrado é, por

não ao PLC 30/2011disposição constitucional, essencial à sadia qualidade de vida das pre-sentes e futuras gerações, motivo pelo qual induvidosa a condição de di-reito fundamental da tutela socioambiental, instrumento que é de efeti-vidade da dignidade da pessoa humana, sendo essa, por sua vez, funda-mento da República Federativa do Brasil (art. 1, III da CF/88).

É por isso que Constituição brasileira exige estudos prévios de impacto am-biental para qualquer obra ou atividade potencialmente causadora de sig-nificativa degradação ambiental, o que implica, inexoravelmente, a mesma exigência quando se trata da alteração de toda uma legislação protecionista das florestas brasileiras. Contudo, esse estudo, oficialmente, não existe.

O que existe é a tentativa desesperada da comunidade científica em ser ouvida para tentar impedir a aprovação do PLC 30/2011, que acarretará (a) riscos à própria continuidade da Floresta Amazônica, que tem influência na regulação do clima e na preservação dos recursos hídricos de todo o país, (b) a extinção de mais de 100 mil espécies em risco de extinção e de biomas inteiros, (c) a escassez dos recursos hídricos, (d) a desertificação, (e) a poten-cialização das enchentes e (f) desmoronamentos em áreas urbanas. Além disso, a aprovação desse projeto implicará a impossibilidade do cumpri-

Comissões de Ciência e Tecnologia (CCT); de Agricultura e Reforma Agrária CRA); e de Meio Ambiente (CMA) debatem, em audiência pública conjunta, os mecanismos econômicos que poderiam incentivar a preservação ambiental e viabilizar a aprovação do projeto do novo Código Florestal. Bancada: senador Luiz Henrique (PMDB-SC), relator do projeto do novo Código Florestal

Associação Juízes para a Democracia (AJD) divulga nota pública sobre o projeto de lei do novo Código Florestal

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Mais informações: José Henrique Rodrigues Torres, juiz de direito em Campinas/SP, Presidente do Conselho Executivo da Associação Juízes para Democracia. Fones: (19) 9174-7568 e (19) 3236-8222

e tecnologiaAlterações no Código à luz da Ciência

Cientistas afi rmam que não existe dilema entre conservar o meio ambiente e produzir alimentos

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPB) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) divulgaram em 11 de outubro um documen-to com propostas e considerações sobre as alterações no Código Flores-tal Brasileiro. As instituições concordam que seja necessário modifi car a legislação ambiental, mas defendem que as alterações devam ser feitas “à luz da ciência e tecnologia hoje disponível”.

O documento ressalta os pontos que o Senado deve atentar no projeto para, segundo afi rmam, “corrigir os equívocos verifi cados na votação da matéria na Câmara dos Deputados”.

Um dos pontos é o suposto dilema entre a produção de alimentos e a con-servação do meio ambiente, defendido por ruralistas. As duas instituições científi cas afi rmam que esse é um falso dilema e que o Brasil tem vocação agrícola e deve continuar aumentando a produção interna e para exporta-ção, mas precisa fazer isso de forma ambientalmente sustentável.

“O Brasil já dispõe de área agrícola sufi ciente para isso, desde que devida-mente tecnifi cada, e ainda dispõe de área natural sufi ciente para a conser-vação/preservação de nosso patrimônio biológico”, afi rmam.

Segundo o estudo “a grande limitação para a expansão da agricultura brasileira é a falta de adequação de sua política agrícola, com tecnifi ca-ção dos pequenos produtores, políticas de preços agrícolas, incluindo in-sumos, política de estoques reguladores, infraestrutura de escoamento e armazenamento dos produtos agrícolas etc., e não as restrições ambien-tais colocadas pelo Código Florestal brasileiro”.

APPsOutro ponto polêmico no projeto de lei que altera o Código Florestal são

as Áreas de Proteção Permanente (APP). A ABC e SPBC defendem que “to-das as APPs de beira de curso d’água devam ter sua vegetação preservada e naquelas em que essa vegetação foi degradada elas devem ser integral-mente restauradas”.

O documento critica a proposta que considera que as APPs desmatadas até a data de 22 de julho de 2008, para uso alternativo do solo, sejam de-fi nidas como atividades consolidadas. “A maioria dessas APPs foi desma-tada em desacordo com a legislação ambiental vigente na época: não há justifi cativa plausível para adotar a data da publicação da versão mais re-cente do regulamento da Lei de Crimes Ambientais”, afi rma.

Além disso, a defi nição dos limites das APPs nas áreas úmidas deve ser cal-culada a partir do nível mais alto da cheia conforme defi nição da Convenção de Ramsar (Convenção sobre Zonas Úmidas de Importância Internacional).

O documento também não recomenda a inclusão das APPs no cômputo das Reservas Legais, já que “APPs e Rls apresentam estruturas e funções dis-tintas e comunidades biológicas complementares”. Fonte: amazonia.org.br

Leia na íntegra as Propostas e Considerações da Sociedade Brasileira para Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) acerca da Reforma do Código Florestal (PLC 30/2011): www.amazonia.org.br/arquivos/396379.doc

mento da obrigação internacional que o Brasil já assumiu, na COP15 de Copenhagen, de redu-ção de emissão de CO2 na atmosfera.

Essas conclusões vêm dos estudos do grupo de trabalho formado pela SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e ABC – Academia Brasileira de Ciência1, das cartas publicadas por cientistas, em julho e setembro de 2010, na Revista Science (Legislação brasilei-ra: retrocesso em velocidade máxima? e Perda de Biodiversidade sem volta), e, ainda, do Co-municado n. 96 do IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada da Secretaria de Assun-tos Estratégicos do Governo Federal2.

E os cientistas também garantem que, pa-ralelamente aos impactos insanos do PLC 30/2011, os recursos naturais de que (ainda) dispomos têm grande valor econômico, ha-vendo inúmeras alternativas sustentáveis – e ainda mais rentáveis – à sua exploração, bastando, para isso, a implementação de po-líticas públicas de manejo sustentável, no-tadamente junto à agricultura familiar, tal como determina a Constituição Federal.

Além disso, esses cientistas garantem, ain-da, que a produção alimentícia brasileira só estará, de fato, ameaçada, se os recursos a ela imprescindíveis (solo, água, clima, bio-diversidade) não forem preservados. Ou al-guém duvida de que sem água e solos férteis faltará alimentos ao ser humano? Não há tempo para prosseguir com esse sistema de produção agropecuária que se desenvolve às custas das máquinas, dos venenos e, notada-mente, da degradação ambiental.

A hora de refletirmos é agora!A hora de ouvirmos as advertências alar-

mantes da ciência é agora!A AJD diz não ao PLC 30/2011, por sua patente

inconstitucionalidade material, à luz dos dados científi cos desvelados, e protesta por sua rejei-ção, ou, por ora, ao menos, que o Senado Fede-ral conceda à ciência o prazo solicitado (míni-mo de dois anos) para elaboração aprofundada de estudos técnicos de impactos ambientais, que sirvam de subsídios técnicos e públicos às alterações legislativas pretendidas.

1 http://www.sbpcnet.org.br/site/arquivos/arquivo_294.pdf2 http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=8810

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cidadania ambiental

a serapilheiraVamos já de início explicar o que é a serapilheira, e porque ela pode ser considerada o símbolo das medidas ditas não estruturais de combate às enchentes. Bem, de quebra vamos todos também saber que as medidas não estruturais são aquelas que, inteligentemente, atacam diretamente as causas das enchentes e não somente suas consequências.

Serapilheira é aquele espesso colchão de folhas caídas e restos vegetais que vai se acumulando no chão das florestas naturais. É a serapilheira que proporciona a proteção do solo contra a erosão, dá vida biológica ao solo e o enriquece agronomicamente, torna o solo mais fofo e permeável. Outra característica formidável da serapilheira é absorver ela própria de imediato uma grande quantidade de água das chuvas, reduzindo em mui-to o volume de água que escorre sobre a superfície do solo e que acabaria chegando aos cursos d’água.

Sobre as principais causas de nossas enchentes urbanas não há hoje mais a menor dúvida sobre quais sejam: a impermeabilização generalizada da cidade, o excesso de canalização de cursos d’água e a redução da capacidade de vazão de nossas drenagens pelo volumoso assoreamento provocado pelos milhões de metros cúbicos de sedimentos que anualmente provém dos intensos pro-cessos erosivos que ocorrem nas frentes periféricas de expansão urbana.

Esse quadro determina o que podemos chamar a equação das enchentes urbanas: “Volumes crescentemente maiores de água, em tempos sucessiva-mente menores, sendo escoados para drenagens naturais e construídas pro-gressivamente incapazes de lhes dar vazão”.

Para se ter uma ideia da dimensão desse problema da impermeabilização considere-se que o Coeficiente de Escoamento - índice que mostra a relação entre o volume da chuva que escoa superficialmente e o volume que infiltra no terreno - na cidade de São Paulo está em torno de 80%, ou seja, 80% do vo-lume de uma chuva escoa superficialmente e segue rapidamente para o siste-ma de drenagem. Em uma floresta, ou um bosque florestado urbano, acontece exatamente o contrário durante um temporal, o Coeficiente de Escoamento fica em torno de 20%, ou seja, cerca de 80% do volume das chuvas é retido.

Diante de um cenário assim colocado, qual seria a providência mais inteli-gente e imediata para combater as enchentes (e que estranhamente as admi-nistrações públicas, todas muito simpáticas às grandes obras e aos seus im-pactos político-eleitorais, não adotam)? Claro, sem dúvida, concentrar todos os esforços em reverter a impermeabilização das cidades fazendo com que toda a região urbanizada recupere sua capacidade original de reter as águas de chu-va, seja por infiltração, seja por acumulação. Concomitantemente, promover um intenso combate técnico à erosão provocada por obras pontuais ou gene-ralizadas de terraplenagem. Ou seja, fazer a lição de casa, parar de errar.

Para tanto, há que haver a necessária disposição de se promover uma ra-dical mudança na cultura técnica que vem até hoje comandando o cresci-mento de nossas cidades, e que confunde a noção de limpeza com a noção da impermeabilização, e que acha que os processos erosivos, frutos do uso in-tensivo da terraplenagem, são inevitáveis e até aceitáveis. Tomada a decisão dessa mudança cultural, haverá à mão, inteiramente já desenvolvido, um ver-dadeiro arsenal de expedientes e dispositivos técnicos para que esse esforço de redução do escoamento superficial das águas de chuva seja coroado de sucesso: calçadas e sarjetas drenantes, pátios e estacionamentos drenantes, valetas, trincheiras e poços drenantes, reservatórios para acumulação e in-

filtração de águas de chuva em prédios, empre-endimentos comerciais, industriais, esportivos, de lazer, multiplicação dos bosques florestados, ocupando com eles todos os espaços públicos e privados livres da cidade. E, para esse último caso, como marca de nossa inteligência, e sím-bolo da necessária mudança da cultura técni-ca urbana, esses bosques não mais teriam sua serapilheira absurdamente raspada, varrida e removida pelos serviços públicos e privados de limpeza pública, como hoje acontece, mas sim protegida, conservada e, porque não, reveren-ciada pelo bem que irá nos fazer.

Diga-se de passagem que a decisão de manu-tenção da serapilheira não exige nenhum dis-positivo legal para acontecer, é uma iniciativa que pode desde já didaticamente ser adotada por nossos paisagistas, arquitetos, urbanistas, líderes comunitários, ou quaisquer cidadãos que possam ter algum poder de influência so-bre um espaço urbano privado ou público. Ah..., aproveitem para também plantar mais algu-mas árvores, de forma a conformar um bosque florestado mais compacto quanto possível. * Álvaro é consultor em Geologia de Engenharia, Geotecnia e Meio Ambiente, membro do Conselho de Desenvolvimento das Cidades da Fecomércio, ex-diretor de Planejamento e Gestão do IPT e ex-diretor da divisão de Geologia. Autor dos livros Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática, A Grande Barreira da Serra do Mar, Diálogos Geológicos e Cubatão.

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Enchentes: criem bosques florestados, não tirem

A serapilheira, um colchão de restos vegetais no chão das florestas e bosques florestados, enriquece e torna o solo mais fofo e permeável e absorve grande parte das águas de chuva

A proteção do solo contra

a erosão

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nos liXÕes

A constatação foi feita por um grupo de am-bientalistas das ONGs Educa Mata Atlântica, Rebia, Nosso Vale Nossa Vida, Crescente Fértil e Associação Ecológica Piratingaúna, que visi-tou os lixões das duas cidades em setembro.

Para piorar, esses resíduos de saúde são mis-turados ao lixo doméstico, o que constitui cri-me ambiental. Luvas cirúrgicas, gaze com san-gue e até uma vértebra estavam expostas a céu aberto. Esse material contamina o lençol freático e acaba indo para os rios da região, oferecendo risco à saúde da população.

Vencedor do Prêmio Global 500 para o Meio Ambiente, oferecido pela ONU, Vilmar Berna, um dos mais respeitados ambientalistas do Brasil, se mostrou estarrecido com as cenas que presenciou. Ele ressalta que, ao contrário do que a população supõe, o problema não está exatamente no destino fi nal do lixo hos-pitalar, mas nas fontes geradoras.

“É difícil identifi car os responsáveis depois que se mistura a todo o resto do lixo da cida-de. Os “enterros” sanitários são uma vergonha e não passam de lixões, cujo líquido contami-nado continua comprometendo as nascentes dos rios Brandão e Cotiara, que fazem parte da bacia hidrográfi ca do Rio Paraíba do Sul, que abastece cerca de 80% da população fl umi-nense. Os hospitais e clínicas deveriam ser os maiores interessados em cuidar bem da saúde do meio ambiente e da população, mas, infe-lizmente, a maioria deles oculta-se no anoni-mato, enviando seus resíduos para os lixões da cidade”, revolta-se o ambientalista.

“Esse anonimato está com os dias contados agora que o Dr. Rodrigo da Costa Lines se com-prometeu com as ONGs em propor um novo TAC (Termo de Ajuste de Conduta) com as prefei-turas para criar o Cadastro das Fontes Geradoras de Resíduos de Saúde, para que sejam obrigadas a informar a quantidade e tipo de resíduos de saúde que geram, quem são os responsáveis pelo transporte, quem são os responsáveis pela inci-neração e onde serão dispostas as cinzas depois de inertizadas. Essas informações deverão estar disponibilizadas para o público através da inter-net e dos veículos de imprensa que cumprem o papel de imprensa ofi cial”, reivindica Berna.

Para o ambientalista, o correto seria os resídu-os de saúde serem incinerados em autoclaves e as cinzas dispostas em aterros, mas só depois

de constatado serem neutras de contaminantes. “Isso simplesmente não é feito, porque signifi ca custos e como hoje esses geradores não gastam nada para cuidar direito dos seus resíduos, qualquer coisa diferente de zero eles acham caro. Trata-se, portanto, de uma mera questão de mercado. Na origem do problema está a ganância e esperteza de alguns donos de hospitais e clí-nicas, infelizmente a maioria aqui na região, que, para economizar dinheiro e aumentar seus lucros, em vez de contratar empresas especializadas para o transporte e a incineração dos seus resíduos simplesmente transferiram o problema para as prefeituras das cidades, que mal conseguem lidar com o lixo das cidades e agora têm de também cuidar dos resíduos de saúde, que exigem um tratamento todo diferenciado para o qual as prefeituras não dispõem de estrutura. E pior, fazem isso com o dinheiro do contribuinte para cuidar de um problema que não é da prefeitura mas dos geradores desse tipo de resíduo. As prefeituras até poderiam assumir esse serviço, mas teriam de ter autoclaves e cobrar preço diferenciado pelo serviço”, explica Berna.

Construção do autoclave da prefeitura está atrasadaAntes da visita aos lixões, o grupo de ambientalistas se reuniu com o procura-

dor do Ministério Público Federal Rodrigo da Costa Lines. O objetivo era saber o que evoluiu desde a audiência pública realizada em maio, a pedido do vereador Jair Nogueira (PV), que também participou da reunião. Lines informou que, em Volta Redonda, apenas o Hospital da Unimed possui autoclave. Segundo ele, o Hospital Vita assinou um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) se comprometen-do de providenciá-lo. Em Barra Mansa, a Casa de Saúde Santa Maria também já dispõe do serviço, mas nem um nem outro apresentaram até agora os nomes das empresas que vão cuidar da coleta e autoclavagem dos seus resíduos.

“Continuamos atentos ao problema e cobrando uma solução dos envolvidos. Infelizmente, as pessoas ainda têm uma cultura do segredo, de não querer mos-trar o que faz. Mas todos nós temos o direito de saber o que é feito do lixo hos-pitalar. E vamos cobrar. Recentemente, a direção do Hinja, por exemplo, recla-mou que para autoclavar seus resíduos teria um gasto entre R$ 20 e R$ 30 mil. Ora, eles, que são os geradores do lixo hospitalar, não querem pagar, e quem paga é o povo, já que a coleta do lixo é feita pela prefeitura”, frisa o procurador.

Lines também se mostrou preocupado com o atraso nas obras de constru-ção do autoclave da prefeitura, que vai funcionar numa área do lixão de Volta Redonda. Pelo acordo fi rmado com o MPF, a obra deveria ser concluída dia 9 de outubro, mas é praticamente impossível esse cronograma ser cumprido, já que ainda há muito a ser feito. “Eles vão ter que dar um jeito”, diz Lines.

Resíduos de materiais de saúde de hospitais, casas de saúde e clínicas

continuam sendo destinados de forma inadequada em Volta

Redonda e Barra Mansa (RJ)

Crime ambiental

Leia mais em: www.avozdacidade.com/site/page/noticias_interna.asp?categoria=3&cod=7535

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Ambientalistas e vereador constatam má disposição dos resíduos de saúde no lixão de Volta Redonda (RJ)JC

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PROGRAMA RECLAMAR ADIANTA

RÁDIO BANDEIRANTESAM 1360 (RJ)COM ÁTILA NUNES FILHO E ÁTILA NUNES NETO

PROGRAMA RECLAMAR ADIANTARÁDIO BANDEIRANTES AM 1360 (RJ)

De 2ª à 6ª feira, entre 10h e meio dia,Acesse pela internet:

www.reclamaradianta.com.br Central telefônica 24h: (021) 3282-5588 [email protected]

Permitir que dezenas de ouvintes diariamente entrem no ar para reclamar, protestar, denun-ciar, sem censura. Essa é a fórmula do sucesso de audiência do Programa Reclamar Adianta que vai ao ar de segunda à sexta feira pela Rádio Bandeirantes AM 1360 (RJ). Na verdade, esse su-cesso é um resultado, e não o objetivo. O objetivo sempre foi – e é – de dar voz aos cidadãos que não têm acesso aos veículos de comunicação para externar seus pontos de vista.

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Curso de campo Mata Atlântica, Biologia Marinha e Sustentabilidade na Ilha Grande (RJ)

18, 19 e 20 de novembro de 2011Local: Hotel do Frade Golf Resort, Angra dos Reis (RJ)

Professora: dra. Raquel Muniz (mini currículo por e-mail )

Investimento: R$ 850,00

Ementa: (por e-mail )

Programação: 18/11/2011 14h embarque transporte no ponto de encontro 15h Embarque transporte no ponto de encontro 18h Check in hotel 20h Jantar de abertura

19/11/2011 8h Café da manhã 9h Embarque para Ilha Grande 9h30 Aula prática 13h30 Almoço 14h Aula de campo 18h Retorno para hotel 20h Jantar 22h Luau de confraternização

20/11/2011 8h café da manhã 9h Aula teórica 13h Almoço 14h Tarde livre 16h Check out 18h Retorno

Últimas vagas!

EmEnta módulo I - Curso Prático de Educação ambiental• Introdução: A mudança começa em nós• Educação Ambiental e cidadania• Educação Ambiental e cultura• Ecologizar a empresa

Curso Professor Pesquisador Nas Asas da Educação Ambiental

25 A 27 de mAio de 2012 LocAL: HoteL FAzendA GALo vermeLHo, vAssourAs (rJ)

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orGAnizAçãoonG núcleo de Articulação para Juventude – núcleoonG rede brasileira de informação Ambiental – rebia

estes cursos seguem os moldes de atividades com jovens, realizados em outros países. não se caracterizam como pacotes turísticos e tão pouco como programas de intercâmbio. o investimento pessoal realizado é revestido totalmente para o custeio do curso. Assim como: alimentação, transporte, professor e hospedagem. no curso de campo a hospedagem será no Hotel do Frade Golf resort e em quartos triplos. (www.hoteldofrade.com.br); no curso de professor pesquisador a hospedagem será no Hotel Fazenda Galo vermelho, em quartos duplos ou triplos, conforme disponibilidade (www.hotelfazendagalovermelho.com.br)

ProgramaçãoSexta-feira 9h Embarque no transporte no ponto de encontro (Cinema Icaraí, Niterói –RJ) 10h Embarque no transporte no ponto de encontro 13h Almoço de abertura 14h30 Workshop de abertura (com MSC José Mauro dos Santos Farias) 15h30 Tema Módulo I (com Ricardo Harduim) 16h30 Lanche16h45 Trabalho em grupo 18h Encerramento do dia 20h Jantar 21h Dinâmica da fogueira

SÁBaDO 8h Café 9h Tema módulo II (com Dr. Mauro Guimarães) 13h Almoço14h30 Tema do módulo III (com Prof Dr. Alexandre Pedrini) 16h Coffee break 16h15 trabalho em grupo 18h Encerramento do dia 20h Jantar

DOMiNGO 8h Café 9h Tema do IV módulo (com Vilmar Berna) 13h Almoço de encerramento 15h Check out 16h Retorno aos pontos de encontro

módulo II - Educação ambiental Formal• Princípios básicos• Conteúdo programático• Técnicas de Educação Ambiental (Ricardo Harduim)a) Corrida ecológicab) Quebra-cabeça ecológicoc) Jogo do slided) Presente da naturezae) Feira verde• Três técnicas de Educação Ambiental (Cetesb)a) Estudo do meiob) Estudo de casoc) Memória viva• Carta aos professores• Como organizar um passeio à floresta

módulo III - Educação ambiental não-formal• Como fazer um projeto de Educação Ambiental• Duas ideias para projetos• Educação Ambiental na empresa

módulo IV - Educação ambiental InformalComo utilizar a Revista do Meio Ambiente em sala de aula

Palestrantes: Prof. Dr. Mauro Guimarães (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro), Vilmar Berna (escritor e Prêmio Global 500 da ONU para o Meio Ambiente), Professor Dr. Alexandre Pedrini (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e Ricardo Harduim (Biólogo e Subsecretário Municipal de Meio Ambiente, Recursos Hídricos e Sustentabilidade de Niterói)

Investimento: R$ 850,00

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Guia do Meio Ambiente Aqui o seu anúncio é visto por quem se importa com o meio ambiente

CUPOM DO ASSINANTESIM, quero ser assinante-colaborador da REBIA – Rede Brasileira de Informação Ambiental, uma organização sem fins lucrativos, assegurando meu livre acesso ao conteúdo do PORTAL DO MEIO AMBIENTE (www.portaldomeioambiente.org.br) e o recebimento da versão impressa e gratuita da REVISTA DO MEIO AMBIENTE sempre que for editada. Declaro concordar com o pagamento de R$ 100,00 (cem reais) referentes às despesas de manuseio e de postagem de 12 (doze) edições impressas, que receberei uma a uma, independente do tempo que dure. Farei o pagamento através de depósito bancário na Caixa Econômica Federal, Agência 3092 OP 003, C/C 627-5, em favor da PRIMA – MATA ATLÂNTICA E SUSTENTABILIDADE – CNPJ nº 06.034.803/0001-43, parceira da REBIA neste projeto pela democratização da informação socioambiental no Brasil. Após o pagamento, informarei pelo e-mail [email protected] a data, hora e valor do depósito e os dados completos (nome completo, endereço completo) a fim de receber meus exemplares.

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Revista do Meio AmbienteRedação: Trav. Gonçalo

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