RESPONSABILIDADE SOCIAL NA INDÚSTRIA...
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RESPONSABILIDADE SOCIAL NA INDÚSTRIA – APRECIAÇÃO DE RISCO EM
OPERAÇÃO DE PONTE ROLANTE VISANDO A INTEGRIDADE FÍSICA DO
TRABALHADOR
Eliezer Cesar de Carvalho (UNISAL)
Após a Revolução Industrial, as empresas precisaram inovar para serem competitivas,
podendo assim, garantir sua sobrevivência no mercado. Acontece que parte dessa inovação foi
a substituição do capital constante pelo capital variável, segundo a teoria de Karl Marx, ou
seja, as empresas passaram a substituir a mão de obra por máquinas para acelerar a busca do
excedente econômico. Essa substituição provocou um significativo aumento nos índices de
acidente de trabalho, inclusive aumentando a gravidade dos danos causados aos trabalhadores.
As pontes rolantes, por exemplo, facilitam a movimentação de cargas que antigamente
precisariam de centenas de homens para movimentar, porém é necessário tomar vários
cuidados para evitar acidentes que podem ser fatais. Portanto, visando a responsabilidade
social em garantir a integridade física do funcionário, para que o mesmo possa chegar a sua
casa em condições de dar atenção aos seus filhos, companheira(o), etc; existem vários
métodos aplicados na Engenharia de Segurança do Trabalho e Ergonomia, um deles é a
Apreciação de Risco, o qual será mencionado no decorrer desse artigo.
Palavras-chaves: 1. Responsabilidade social; 2. Apreciação de risco; 3. Segurança.
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1. Introdução
Ao longo da história da humanidade, as más condições de trabalho têm sido causa de
morte, doença e incapacidade para um número incalculável de trabalhadores. O Brasil, por
exemplo, “tem sido um dos países que mais sofreram com esse importante problema. As
condições de trabalho nas últimas décadas têm se constituído em um dos grandes problemas
brasileiros, com grande repercussão no exterior, devido ao elevado índice de ocorrência de
acidentes de trabalho” (MATTOS & MÁSCULO, 2011, p.24).
Com base nesse alto índice de acidentes, na década de 1990, desenvolver a cultura da
reponsabilidade social era fundamental para ter uma boa gestão do negócio e atender a
pressão da legislação junto ao mercado. Com isso, as empresas passaram a ter uma visão
voltada para a responsabilidade social, tratando o funcionário como o bem ativo mais precioso
do negócio, ou seja, as organizações com fins lucrativos além de se preocupar com prazo,
qualidade e custo, passaram a se preocupar também com a responsabilidade social. Com isso,
as organizações tiveram que se estruturar fisicamente e culturalmente para garantir segurança
aos funcionários, adotando diversas ferramentas desenvolvidas por profissionais da área da
saúde, segurança do trabalho e ergonomia.
Essa responsabilidade social organizacional passou a ser um dos requisitos para os
investidores, principalmente para os que atuam no mercado de ações nas bolsas de valores. Os
primeiros estudos sobre a responsabilidade social organizacional iniciaram em 1950, porém
foram destacados trabalhos desse gênero apenas a partir de 1970 (TENÓRIO, 2004).
Com isso, foram criadas e implementadas diversas ferramentas e métodos para
gerenciar os riscos envolvidos no ambiente de trabalho, visando a proteção da saúde e da
integridade física do funcionário. Tomam-se como foco nesse artigo a apreciação de risco e o
método HRN, aplicados numa operação de ponte rolante numa metalúrgica que atua no setor
de óleo e gás.
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2. Responsabilidade social organizacional
O Homem é um animal racional que passou por diversas fazes de evolução até chegar
à situação atual. Por se tratar de uma espécie, o Homem também precisa se socializar com o
ambiente interno e externo, sendo ele no trabalho, na escola, com a família, entre outros. Com
isso as crianças desde pequenas precisam aprender a diferença entre o bem e o mau, ético e
não ético, sagrado e profano, etc. Porém, infelizmente alguns fatores impedem essa formação
de cidadania, como por exemplo a desestruturação familiar, violência, má administração
política, entre outros. Muitas vezes essa má formação de cidadania da criança segue até sua
fase adulta, resultando em pessoas ambiciosas que só pensam em si mesmas e esquecem do
próximo.
De certa forma, hoje o Homem enxergou o quanto errou e tenta mudar esse cenário se
preocupando com a sociedade. Infelizmente muitas pessoas ainda não têm essa visão, mas
grande parte já está buscando melhorar, inclusive no mundo organizacional. Hoje é comum
ouvir das empresas o tema: Responsabilidade Social e Ambiental. Aliás, as empresas, através
dos seus processos produtivos, são as principais responsáveis pelo consumo dos recursos
naturais e de mão de obra humana (TAKATAMA et al, 2006). Infelizmente muitas empresas
mascaram suas ações e tentam mostrar para o mercado que se preocupam com a sociedade e
com o meio ambiente no intuito de ganhar espaço usando esses temas como marketing. Mas
por sorte, muitas começaram a valorizar de fato seus colaboradores preocupando-se com a
sociedade e o meio ambiente.
Teoricamente a responsabilidade social organizacional se divide em quatro pontos de
vista (CHAROUX, 2007):
Cumprir a legislação;
Ações filantrópicas como doações, por exemplo;
Investir na responsabilidade social empresarial em busca de agregar valor ao produto
ou serviço;
Responsabilidade social no cotidiano, envolvendo todo ambiente interno e externo
(funcionários, fornecedores, comunidade e meio ambiente).
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Um ponto interessante sobre a responsabilidade social empresarial é a estratégia do
ganha-ganha (win-win), ou seja, contribuir com a sociedade é contribuir com a saúde da
organização (CHAROUX, 2007).
3. Histórico de acidentes no Brasil x ferramentas para gerenciar o risco do
trabalho
Após a inclusão da responsabilidade social no tripé organizacional (prazo, qualidade e
custo), os índices de acidentes do trabalho diminuíram, porém ainda continuam muito altos
conforme mostram figuras 1 e 2:
Figura 1: Índice de acidentes do trabalho no Brasil (Fonte: adaptado do material criado pelo professor Luís
Francisco Casteletti - coordenador do curso técnico do UNISAL)
AnoTotal de
Acidentes
Total de
óbitos
% de
óbito/acidentes
1975 1.916.187 4.001 0,21
1980 1.464.211 4.824 0,33
1985 1.007.861 4.384 0,43
1990 693.572 5.355 0,77
1995 424.137 3.967 0,94
1996 395.455 4.488 1,13
1997 421.343 3.469 0,82
1998 414.341 4.144 1,00
1999 378.365 3.923 1,04
2000 343.996 3.094 0,90
Total 7.459.468 41.649 0,56
Índice de Acidentes do Trabalho no
Brasil
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Figura 2: Total de acidentes do trabalho no Brasil – visualização gráfica (Fonte: adaptado do material criado
pelo professor Luís Francisco Casteletti - coordenador do curso técnico do UNISAL)
A preocupação com a segurança do trabalho causou essa queda dos índices de
acidente, junto á implementação de diversas ferramentas e métodos, como a apreciação de
risco e o método HRN (Hazard Rating Number).
A apreciação de risco é uma ferramenta de suma importância aplicada pelas empresas
para levantar os riscos envolvidos em uma determinada função. Dentro das Normas
Regulamentadoras, existe a NR 9 que trata do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais
(PPRA), ou seja, a norma visa planos de ações que garantam a saúde e integridade física do
funcionário frente aos riscos envolvidos em suas atividades. As ações do PPRA devem ser
desenvolvidas pelas empresas em todas as áreas, sob responsabilidade do empregador e
participação dos trabalhadores (MATTOS & MÁSCULO, 2011). Vale ressaltar que os danos
que podem ser causados ao trabalhador, independente de ser temporários ou permanentes,
provém de eventos que provocam esse dano, denominando-os como perigos. O risco,
conceitualmente é a relação entre a probabilidade de um evento ocorrer (perigo) com o dano.
Ao fazer uma apreciação de risco, é de suma importância classificar os perigos de
acordo com os riscos envolvidos, ou seja, o produto da gravidade com a probabilidade de um
evento ocorrer. Entretanto, existe o método HRN (Hazard Rating Number) que foi
desenvolvido especialmente para classificar os perigos, facilitando a montagem de um plano
de ação. O método HRN contribui para uma análise exaustiva do risco, verificando se o
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mesmo é tolerável ou não. Esse método simplificado de priorização baseia-se em quatro
fatores para o levantamento do índice HRN (CASAL et al, 2009):
Possibilidade de exposição ao perigo;
Frequência de exposição ao perigo;
Número de pessoas submetidas ao perigo;
Perda máxima provável (dano).
A figura3 mostra os parâmetros para calcular o índice de HRN:
Figura 3: Parâmetros para calcular HRN (Fonte: material disponibilizado pelo professor Adilson José
Marcorin em maio de 2015 aos alunos de Engenharia de Produção do UNISAL)
O produto desses quatro fatores forma o índice de HRN. Depois de formado todos
osíndices do estudo, cabe ao profissional que está fazendo a análise montar o plano de ação
necessário.
O método HRN classifica os riscos da seguinte forma:
[0,1]: risco raro (elencar riscos residuais)
]1,5]: risco baixo
]5,50]: atenção (tomar medidas de redução de risco)
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]50,100]: Significativo (tomar ações dentro de uma semana)
]100,500]: Alto (Tomar ações dentro de um dia)
> 500: Extremo (Ação imediata)
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4. Estudo de caso
4.1. Descrição da empresa e a área analisada
A empresa estudada é uma metalúrgica que atua no setor de óleo e gás, na fabricação
de válvulas de diversos tipos de fluídos, com bitolas entre duas polegadas até cinquenta e seis
polegadas. Por razões de política de privacidade, nesse artigo não foi divulgado o nome da
empresa estudada.
Por se tratar de uma metalúrgica, a movimentação das peças e componentes é feita
através de empilhadeiras, talhas e pontes rolantes.
O foco dessa apreciação de risco é no setor de usinagem, onde existem movimentações de
peças brutas, pré-usinadas e acabadas através de pontes rolantes. Portanto, essa apreciação de
risco foi feita no processo de movimentação de peças através de ponte rolante.
4.2. Processo analisado e seus riscos
Antes falar sobre segurança, saúde e melhorias no ambiente de trabalho eram assuntos
de poucas pessoas e/ou empresas; diferente de hoje, que inclusive as organizações têm
departamentos exclusivos para tratar desses assuntos (WACHOWICZ, 2007). A empresa
estudada nesse relatório não é diferente, existe um setor com um técnico de segurança do
trabalho que tem a função de cuidar da segurança e saúde dos funcionários e acompanhar
todos os processos para levantar os riscos eminentes de cada setor.
O processo de movimentação dos materiais através de ponte rolante é extremamente
perigoso, pois além do material estar suspenso durante a movimentação sob ação
gravitacional, muitas vezes o operador da ponte precisa ficar debaixo da ponte para guiar o
material, podendo ocorrer diversos acidentes. Além disso, o operador guia a peça com as
mãos, aumentando ainda mais a probabilidade de acidentes como cortes, esmagamentos, etc.
A empresa estudada optou por não ceder seus controles para serem esboçados nesse
relatório, porém sabe-se que existe um controle de acidentes e CAT (Comunicação de
Acidente de Trabalho) abertos de cada processo e setor.
Existem vários riscos nesse processo, porém para efeito de estudo, foram listados
apenas sete riscos potenciais, que de forma análoga, entende-se que ocorrem mais nas
empresas que têm pontes rolantes que movimentam materiais pesados.
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4.3. Apreciação de risco
A apreciação de risco do processo de movimentação de materiais através de ponte
rolante foi feita utilizando o método HRN (Hazard Rating Number), ou seja, em função da
dificuldade de ter os dados quantitativos, essa análise será qualitativa.
Após levantar alguns perigos do processo junto aos operadores, atribuíram-se notas de
probabilidade de ocorrência, frequência de exposição, grau de possível lesão e número de
pessoas envolvidas. Em seguida calculou-se o risco de cada perigo através do índice de HRN
que é o produto entre todas as variáveis citadas anteriormente. Após definir os HRN’s,
classificou-se do maior para o menor, facilitando assim, uma melhor visualização dos maiores
riscos envolvidos na operação. A figura 4 mostra a apreciação de risco desenvolvida na
operação de manuseio de ponte rolante:
Figura 4: Apreciação de risco realizada na operação de manuseio de ponte rolante (Fonte: autoria própria)
4.4. Causa raiz
Muitas vezes os profissionais que trabalham na área de saúde e segurança do trabalho
montam planos de ações que infelizmente agem no efeito e não na causa raiz. Com isso, para
propor um plano de ação nesse estudo, foram utilizados algumas ferramentas da qualidade,
dentre elas o teste dos cinco por quês's, ferramenta que possibilita encontrar a causa raiz de
um determinado problema. Seguindo o método HRN, os índices entre 5 e 50 precisam de
medida de redução de risco, portanto, para esse estudo, o plano de ação contemplou os cinco
primeiros riscos que ficaram com os índice de HRN entre 8 a 32.
O teste dos cinco por quê's foi feito com os operadores, premissa a qual possibilita
uma maior confiabilidade das informações, já que essas pessoas estão diretamente ligadas ao
processo, possuindo um conhecimento pleno da operação, o que contribui para o estudo em
questão. A figura 5 mostra os teste dos 5 por quê’s realizado:
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Figura 5: Teste dos 5 por quê’s realizado junto aos operadores de ponte rolante (Fonte: autoria própria)
4.5. Plano de ação
Muitas empresas utilizam modelos de planos de ações que não trazem todas as
informações necessárias para quem vai executar uma determinada ação. Portanto nesse
estudo, o plano de ação foi desenvolvido no modelo 5W2H (What Who
WhereWhenWhyHowHowMuch), conforme figura 6:
Figura 6: 5W2H desenvolvido como proposta de solução para os problemas priorizados (Fonte: autoria
própria)
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CONCLUSÃO
Conclui-se que ao estudar o processo e fazer uma apreciação de risco, é possível
montar um plano de ação para evitar vários acidentes que possam ocorrer durante a
movimentação de peças através de ponte rolante. Essa ferramenta auxilia as empresas a
trabalharem com o PPRA (norma regulamentadora descrita no capítulo 3), preocupando-se
com a saúde e integridade física do colaborador, tornando-a uma organização preocupante
com a responsabilidade social.
Ao fazer a apreciação de risco do manuseio de uma ponte rolante, é possível verificar
vários eventos que potencialmente poderiam causar diversos danos aos funcionários, os quais
muitas vezes passam abatidos na ausência de uma análise.
Outro fator importante é que a presença na fábrica facilitou o estudo, pois apenas com
a teoria seria quase impossível fazer a análise, já que a partir da observação dos operadores
trabalhando, foi possível colher informações mais precisas do processo.
As empresas precisam levar a sério esses estudos e fazê-los periodicamente não apenas
no intuito de serem aceitas em auditorias ou certificações, mas sim, garantir que seus
funcionários voltem no final do expediente às suas casas e possam disfrutar momentos
harmoniosos com suas famílias, amigos e sociedade.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CASAL, Joaquim; MONTIEL, Helena; PLANAS, Eulàlia; VÍLCHEZ, Juan A.
Análisisdelriesgo en instalacionesindustriales. Catalunya: EDICIONS UPC, 2009.
CHAROUX, Adriana Guazzelli. A ação social das empresas: quem ganha com isso?
São Paulo: Peirópolis, 2007.
MATTOS, Ubirajara Aluízio; MÁSCULO, Francisco Soares. Higiene e Segurança do
Trabalho. Rio de Janeiro: ELSEVIER, 2011.
TAKATAMA, Mineo; GOLDMANN, Vivian; BORGES, Renata Farahat;
BROCANELLI, Noelma; MAZZUCHELLI, Walter. Responsabilidade social das empresas: a
contribuição das universidades. São Paulo: Peirópolis, 2006.
TENÓRIO, Fernando Guilherme. Responsabilidade Social Empresarial: teoria e
prática. Rio de Janeiro: FGV, 2004.
WACHOWICS, Marta Cristina. Segurança, saúde & ergonomia. Curitiba: Ibpex,
2007.