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Haila Cristina Habes
RESPONSABILIDADE CIVIL POR ERRO MÉDICO
Centro Universitário Toledo
Araçatuba – SP
2017
Haila Cristina Habes
RESPONSABILIDADE CIVIL POR ERRO MÉDICO
Monografia apresentada para encerramento do curso de
graduação em Direito, sob a orientação do professor Dr.
Paulo Cavasana, como requisito parcial do Trabalho de
Conclusão de Curso de Bacharelado de Direito do
Centro Universitário Toledo.
Centro Universitário Toledo
Araçatuba – SP
2017
Primeiramente, dedico este trabalho a Deus por ter me
dado saúde e sabedoria para todos os argumentos
empregados; aos meus pais Alle Habes e Zelia Cristina
Pereira, que sempre me apoiaram e estiveram comigo,
ajudando e me dando todo alicerce possível. Também o
dedico ao meu orientador, professor Paulo Cavasana, meus
amigos Agnes, Beatriz, Daeane, Emerson, Marcos, Murielli
e Stella, que durante todo o curso permaneceram presentes
em minha vida. Aos amigos de minha cidade natal, General
Salgado, que estão sempre torcendo por mim. Todos eles
me proporcionaram muitas alegrias e mostraram o
verdadeiro valor de uma amizade. E por fim, ao meu
namorado que sempre esteve presente, me dando força, me
orientando e que nunca mediu esforços para me auxiliar.
RESUMO
Este trabalho visa apresentar e exemplificar, nas condutas corriqueiras de um profissional
médico, a culpa que poderá ser passível de indenização, formalizada por atos de negligência,
imprudência ou imperícia. Também analisará a composição dos diferentes tipos de erros que,
ao acarretar em lesão ao paciente, poderá gerar a obrigação de reparar, devendo o profissional
médico responder civilmente tanto na esfera contratual quanto na extracontratual.
Palavras-chave: dano, erro, indenização, médico, responsabilidade, paciente.
ABSTRACT
This work aims to present and exemplify, in a medical professional’s daily conducts, the fault
that could lead to an obligation to compensate, formalized by acts of negligence, imprudence
or malpractice. It will also analyse the composition of different types of errors that, when
prompt lesions on a patient, could lead to an obligation to compensate, whilst the medical
professional answers in the civil sphere, either in the contractual or extracontractual field.
Keywords: damage, error, compensation, medic, responsibility, patient.
SUMÁRIO ................................................................................................................................6
INTRODUÇÃO.........................................................................................................................7
I – RESPONSABILIDADE CIVIL ........................................................................................8
1.1 Responsabilidade Civil ........................................................................................................8
1.2 Responsabilidade Civil Subjetiva e Objetiva .......................................................................9
1.3 Responsabilidade Civil Contratual e Extracontratual ........................................................11
1.4 Responsabilidade de Meio e não de Resultado ..................................................................12
1.5 Negligência, Imprudência e Imperícia ...............................................................................15
1.6 A responsabilidade Civil e o Código de Defesa do Consumidor .......................................16
1.6.1 A inversão do ônus da prova ...........................................................................................19
1.7 Excludentes da responsabilidade .......................................................................................20
II – DANO E INDENIZAÇÃO .............................................................................................23
2.1 Conceito de Dano ...............................................................................................................23
2.2 Dano Material ....................................................................................................................24
2.2.1 Dano Emergente e Lucro Cessante .................................................................................25
2.3 Dano Moral ........................................................................................................................27
2.4 Dano Estético .....................................................................................................................29
2.5 Dano Médico ......................................................................................................................30
III – ERRO MÉDICO ............................................................................................................33
3.1 O Erro Médico ...................................................................................................................33
3.2 O Erro Profissional e Erro Culposo ...................................................................................34
3.2.1 Erro Grosseiro .................................................................................................................35
3.3 Iatrogenia e Erro escusável ................................................................................................36
3.4 Erro de Diagnóstico ...........................................................................................................38
3.5 Culpa do paciente ...............................................................................................................39
3.6 Perícia Médica ....................................................................................................................41
3.7 Risco ...................................................................................................................................42
3.8 Consentimento informado ..................................................................................................43
3.8.1 Dever de informar ...........................................................................................................46
CONCLUSÃO.........................................................................................................................48
BIBLIOGRAFIA ....................................................................................................................49
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho mostra, em diferentes aspectos, os casos em que a atuação do
profissional médico poderá gerar a obrigação de indenizar seu paciente, produzindo efeitos na
esfera cível.
O primeiro capítulo trata da responsabilidade civil, tanto no aspecto contratual quanto
no extracontratual. Demonstra o tipo de relação necessária para que a conduta do médico seja
passível de reparação.
Também aborda hipóteses em que inexiste o dever de resultado, pois o médico também pode
ser vítima de falhas, que por vezes são isentas de responsabilidade devido à sua
imprevisibilidade.
Por fim, aborda a relação entre médico e paciente na visão do Código de Defesa do
Consumidor, codex que introduz a teoria do risco, bem como a inversão do ônus da prova,
possível quando a alegação for verossímil ou o paciente se encontrar em situação de
hipossuficiência.
O segundo capítulo alude aos diversos tipos de danos decorrentes da atividade
profissional médica, sendo alguns deles sujeitos à indenização. Estes danos podem ser
cometidos por imprudência, negligência ou imperícia, relacionados à má prática ou força
maior. Ademais, tais danos poderão ferir o psíquico do paciente, seu patrimônio ou ambos.
O último capítulo compreende variados erros que, ao longo de sua trajetória
profissional, o médico pode vir a praticar. Alguns são denominados de “erros profissionais”,
modalidade menos reprovável pela sociedade. Outros, intitulados “erros repugnantes” ou
“grotescos”, são imperdoáveis, acarretando em alta rejeição social. Por fim, temos os “erros
de diagnóstico”, que podem levar o médico a cometer falhas, e a “culpa exclusiva do
paciente” quando este não seguiu corretamente o tratamento ou omitiu informações,
dificultando a atuação do profissional médico.
Apresenta, também, a possibilidade do pleito de indenização ao profissional médico,
nas hipóteses em que este omite informações relevantes acerca do tratamento e/ou
procedimento a ser adotado, ou age desprovido do consentimento de seu paciente.
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I – RESPONSABILIDADE CIVIL
1.1 Responsabilidade Civil
A priori, tudo que causar dano ou prejuízo a alguém gera o dever de indenizar, seja
pessoa física ou jurídica.
A responsabilidade civil, grosso modo, consiste de um dano causado por uma conduta
do agente, seja ela omissiva ou comissiva. Tal conduta acarreta em um dever de indenizar a
vítima, em virtude de regressão patrimonial ou violação à personalidade que sofrera. Logo,
para gerar um equilíbrio entre a conduta danosa e o dano, busca reparar-se o erro através da
indenização.
“[...] a noção jurídica de responsabilidade pressupõe a atividade danosa de alguém
que, atuando a priori ilicitamente, viola uma norma jurídica preexistente (legal ou contratual),
subordinando-se, dessa forma, às consequências do seu ato (obrigação de reparar)”.
(GAGLIANO et al, 2012, p.54)
A obrigação (de uma determinada prestação) surge por meio de um vínculo jurídico
entre dois indivíduos, denominados de sujeito ativo e passivo. Representa o principal tópico
no âmbito da responsabilidade civil, dando origem ao instituto propriamente dito. O dever de
indenizar exposto supra, por sua vez, consiste em um mero efeito secundário desta obrigação.
Segundo GONÇALVES (2014, p.21):
Não se confundem, pois, obrigação e responsabilidade. Está só surge se o devedor
não cumpre espontaneamente a primeira. A responsabilidade é, pois, a consequência
jurídica patrimonial do descumprimento da relação obrigacional.
Assim, demonstra o artigo 927 do Código Civil, que diz “Aquele que, por ato ilícito
(arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Logo, ao causar dano a
alguém este tem o dever de reparar a falha cometida.
Nessa concepção, ocorrendo um ato ilícito suas consequências estão disciplinadas de
acordo com a lei sendo imputados sobre o sujeito causador do dano, ou seja, quando o agente
fere o direito subjetivo da pessoa e lhe causa prejuízo terá a obrigação de reparar, pois
cometeu um ato ilícito.
9
Afirma o artigo 186 do Código Civil: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito”.
Não obstante, para obter a responsabilidade civil é necessário além do ato ilício o
abuso de poder, demonstrado no artigo 187 do mesmo Código “Também comete ato ilícito o
titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu
fim econômico e social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
Neste caso, para configurar o abuso de poder o douto juiz da causa analisará o fato e
proferirá decisão com base em seu entendimento técnico, bem como em eventual juízo de
valor.
1.2 Responsabilidade civil subjetiva e objetiva
A responsabilidade subdivide-se em duas teorias: a subjetiva e a objetiva. A primeira
tem como elemento essencial a culpa do agente em sentido amplo, pois sem ela não há o
dever indenizar. Então para configura-la é necessário provar o dano, o nexo com a pessoa que
sofreu o dano e a culpa do agente.
Explica Paulo Nader (2016, p.298):
Diz-se que a responsabilidade é subjetiva, quando pressupõe o elemento culpa no
comportamento do agente causador do fato. Responsabilidade objetiva é a que se
funda na teoria do risco e dispensa a culpa para a sua caracterização. Pode ser direta
se a responsabilidade de indenizar for a do autor do fato culposo causador do evento
e indireta, quando o responsável civilmente o for por atos de terceiro. Na direta a
responsabilidade é pelos próprios atos; na indireta, por atos de outrem. Os adeptos
da teoria objetiva argumentam que tal modalidade, em que alguém responde por
atos alheios, configura a responsabilidade objetiva, mas os adeptos da doutrina
oposta sustentam que se trata apenas de exceção e justificada, porque nestes casos há
sempre alguma parcela de culpa de quem empalma a responsabilidade.
A responsabilidade objetiva é a culpa em sentido estrito (negligencia, imprudência e
imperícia), fundada na teoria do risco e do dano objetivo, e possui como característica à
desnecessidade de provação de culpa para obter a reparação, bastando apenas a ação ou
omissão, o dano e o nexo de causalidade entre a conduta e o dano.
A lei impõe, entretanto, a certas pessoas, em determinadas situações, a reparação de
um dano independentemente de culpa. Quando isto acontece, diz-se que a
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responsabilidade é legal ou “objetiva”, porque prescinde da culpa e se satisfaz
apenas com o dano e o nexo de causalidade. Esta teoria, dita objetiva, ou do risco,
tem como postulado que todo dano é indenizável, e deve ser reparado por quem a ele
se liga por um nexo de causalidade independentemente de culpa. (ALVIM, apud
GONÇALVES, p.48)
Na responsabilidade objetiva, como regra, leva-se em conta o dano, em detrimento do
dolo ou da culpa. Desse modo, para o dever de indenizar, bastam o dano e o nexo causal,
prescindindo-se da prova da culpa. (VENOSA, 2014, p. 20)
O Código Civil de 2002 adota como regra a responsabilidade civil subjetiva, ou seja, a
existência de culpa, inclusive para o profissional da medicina, onde a vítima é responsável por
comprovar a culpa do profissional, afirma o artigo 927: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186
e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Mas isso não é uma regra absoluta,
visto que, em casos específicos como cita o parágrafo único do mencionado artigo, a
responsabilidade se dará pela precedência da culpa, ou seja, a responsabilidade civil objetiva.
Veja: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos
especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.
Aplica-se também a responsabilidade objetiva para culpa presumida, e neste caso
ocorre a inversão do ônus da prova, onde o réu terá que comprovar alguma excludente de
responsabilidade, para se livrar da indenização.
A atividade médica não está exposta ao perigo, logo ela não pode ser classificada
como atividade de risco, isto é, não é responsabilidade objetiva.
Na teoria do risco, o agente responde por danos independentemente de culpa causados
a terceiros, seja por atos lícitos ou ilícitos, por exercer uma atividade perigosa. E neste caso,
terá o réu que comprovar que empregou os recursos disponíveis para elidir ou mitigar o
sinistro.
Nesse sentido, Castro (2005, p. 26):
A responsabilidade civil do médico, por força de dispositivo legal
expresso, só se apura mediante culpa. Dadas as peculiaridades do
exercício da profissão medica, a prática de atos lícitos não enseja a
obrigação de o médico indenizar, pois a teoria do risco não se aplica.
Logo, o profissional da medicina não responderá pela responsabilidade objetiva, mas
terá que ter a comprovação da culpa, além do nexo causal do dano e a culpa, para só então
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gerar o dever de indenizar, ou seja, responsabilidade subjetiva. Não podendo ser aplicada a ele
a teoria do risco, como cita o autor supramencionado.
1.3 Responsabilidade civil contratual e extracontratual
Ademais, a responsabilidade civil ostenta natureza: contratual e extracontratual. A
responsabilidade contratual surge de um vínculo jurídico pactuado entre as partes, através de
um contrato. Neste, expressam suas vontades, bem como os deveres e obrigações recíprocos.
Quando tal contrato é rompido por uma das partes, acarretando em lesão para a outra, gera o
dever de indenizar, constituindo a responsabilidade civil contratual.
Define o artigo 389 do Código Civil: “Não cumprida a obrigação, responde o devedor
por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, e honorários de advogado”. Logo, a responsabilidade contratual possui como
alicerce o descumprimento de uma obrigação e não de um ato ilícito como apura no artigo
186 do Código.
É o que acontece no caso da responsabilidade extracontratual em que o agente que
comete ato ilícito (art. 186 C.C), descumprindo um dever legal, e não tem relação jurídica
prévia entre causador do dano com a vítima. Mas em ambas o causador do dano tem o dever
de reparar, se não cumpriu com seu dever legal.
Com relação ao ônus da prova, há entendimentos diversos. Há quem defenda que
quando o médico não age com sua obrigação, ou seja, não da assistência necessária para quem
precisa, no caso de acidentes, a vítima é quem deve produzir provas, perfazendo a
responsabilidade extracontratual. A responsabilidade contratual, no entanto, atribui o encargo
ao causador do dano (médico) de produzir provas, podendo este alegar as excludentes de
ilicitude, o paciente só demonstrará que a obrigação foi descumprida. Há também quem
defenda que mesmo o médico dando assistência responderá pelos danos causados se agir com
culpa em stricto sensu.
Veja as posições dos nobres doutrinadores:
“Se a responsabilidade é contratual, o credor só está obrigado a demonstrar que a
prestação foi descumprida. O devedor só não será condenado a reparar o dano se
provar a ocorrência de alguma das excludentes admitidas na lei: culpa, exclusiva da
vítima, caso fortuito ou força maior. Incumbe-lhe, pois, o ônus probandi”
(GONÇALVES, 2014, p. 46)
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“De qualquer modo, pouco importa a natureza do contrato que vincula o profissional
e o seu cliente, pouco importa que se trata de uma responsabilidade contratual ou
extracontratual; de qualquer modo, em se tratando de uma obrigação de meios, ao
prejudicado é que incumbe o ônus probatório da infringência dessas obrigações”.
(LOPES, 1964, apud KFOURI NETO, 2010, p. 76)
Há dúbio acerca do tema no que tange a responsabilidade contratual e extracontratual,
isto implica em diversas correntes doutrinarias sobre a existência ou não do contrato em
algumas situações de responsabilidade médica. Mas, há um entendimento pacificado que a
responsabilidade médica tem natureza contratual, que pode ser feita de modo escrito, verbal
ou tácito. E será de responsabilidade extracontratual quando for caso emergente, acidentes,
quando o médico não cumpre seus deveres gerais ou fica omisso. “A omissão de socorro é
uma causa de responsabilidade não contratual do médico. Acontratual também é a conduta
inadequada do médico por abuso moral ou físico, inclusive sexual, ao paciente”.
(ENZWEILER; PEREIRA, 2011, p. 134)
De acordo com Miguel Kfouri Neto (2010, p.74) “Apesar de o Código Civil Brasileiro
colocar a responsabilidade médica dentre os atos ilícitos, não mais acende controvérsias
caracterizar a responsabilidade médica como ex contractu”.
No mesmo raciocínio “Ora a natureza contratual da responsabilidade médica não nos
parece hoje objeto de dúvida (...). Acreditamos, pois, que a responsabilidade do médico é
contratual, não obstante sua colocação no capítulo dos atos ilícitos” (DIAS, 1979, p.281-282
apud KFOURI NETO, 2010, p.74).
Consolida Hélio do Valle Pereira e Romano José Enzweiler (coord) (2011, p.133)
“[...] a responsabilidade civil do médico geralmente é contratual, ou seja, decorre de ajuste de
vontades entre aquele e o paciente ou seus familiares por ele”.
A responsabilidade médico geralmente é contratual, pois com a relação médico-
paciente forma-se um vínculo, na qual ambos expressam suas vontades. Ao ser atendido pelo
profissional o paciente expressa sua vontade, consulta e o médico expõe suas ideias, seu
tratamento, formalizando assim essa relação.
1.4 Obrigação de meio e não de resultado
Assim, como qualquer outro profissional liberal, na maioria das vezes, a obrigação do
médico é de meio e não de resultado. Isto quer dizer que ele não tem o dever de curar ou
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salvar a vida de alguém, mas sim de empenhar de todos os meios possíveis para melhorar e
restaurar a saúde do paciente.
A obrigação de meio é “no sentido de usar de todos os meios para atingir m
determinado resultado sem, contudo, obrigatoriamente se vincular”. (GIOSTRI, 2006, p.149)
A partir do momento em que o paciente deposita sua confiança no profissional médico
(contratado), ele tem que usar de todo seu conhecimento, técnicas, aparelhos tecnológicos,
analisar todas as causas possíveis para curar a enfermidade, e ficar atento para todos os
eventos previsíveis. Caso não cumpra ou atue com culpa em sentido estrito (negligência,
imprudência e imperícia) deve reparar o dano.
“O médico não se compromete a curar, mas a proceder de acordo com as regras e os
métodos da profissão”. (KFOURI NETO, 2011, p. 75)
Ao contrário é a obrigação de resultado, em que o médico se compromete a obtê-lo, e
não o fazendo ele estará inadimplindo, rompendo ou não cumprindo com sua obrigação
vinculada. É o que acontece nas cirurgias plásticas, pois neste caso o médico se sujeita através
do contrato a satisfazê-lo.
“De um modo geral as obrigações de resultado têm como meta a obtenção de um
resultado predeterminado e pactuado adredemente, o que – se não efetivado – põe o devedor
em responsabilidade, salvo que se prove a interferência de caso fortuito ou força maior”
(GIOSTRI, 2006, p. 144). Logo, fica claro que o médico só afastará de sua responsabilidade
se demonstrar alguma excludente de responsabilidade.
Pode ocorrer, contudo, a imprevisibilidade tanto na obrigação de meio quanto na de
resultado, que nessa situação, o médico não responderá pela sua prestação, pois não agiu com
culpa e um ato imprevisível pode ocorrer com qualquer um, excluindo sua responsabilidade.
Segundo Hildegard Taggesell Giostri (2006, p. 128):
No campo médico, entende-se que este profissional não está obrigado a curar seu
paciente, mas a obter, para ele, o melhor resultado possível. Ou seja, está alijado a
uma obrigação de meio. Nesta, só os elementos da culpa, imperícia, imprudência e
negligência podem não criar responsabilidade se não adveio – por intermédio de
nenhum – um mau resultado para o paciente. O que se quer dizer é que de uma
conduta diligente pode advir um mau resultado, bem como não haver consequência
negativa de uma conduta negligente, imperícia ou imprudente.
Afirma Maria Helena Diniz (2009, p.206):
Obrigação de meio é aquela em que o devedor se obriga tão-somente a usar de
prudência e diligência normais na prestação de serviço para atingir um resultado,
14
sem, contudo, se vincular a obtê-lo. Infere-se daí que sua prestação não consiste num
resultado certo e determinado a ser conseguido pelo obrigado, mas tão-somente
numa atividade prudente e diligente deste em benefício do credor. Seu conteúdo é a
própria atividade do devedor, ou seja, os meios tendentes a produzir o escopo
almejado, de maneira que a inexecução da obrigação se caracteriza pela omissão do
devedor em tomar certas precauções, sem se cogitar do resultado final.
Para provar a culpa do médico na obrigação de resultado, basta o paciente demonstrar
que o resultado pactuado não chegou ao fim esperado. Já na responsabilidade de meio, o
médico não está vinculado a um dever de resultado, mas sim agir de modo prudente, de
acordo com sua obrigação de médico, levando consigo todo aprendizado no caso prático. Se
por ventura este não o fizer, deverá o paciente demonstrar que a conduta do mesmo foi eivada
de culpa.
Assegura o artigo 951 do Código Civil, in verbis:
Art. 951 - O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização
devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência,
imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe
lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.
Logo, resultará em ressarcimento dos danos, o médico que atuou com culpa
(negligência, imprudência ou imperícia) na sua prestação de serviço para com o paciente.
Outro ponto a acentuar diz respeito a inversão do ônus da prova. Se o juiz achar
adequado ao analisar a hipossuficiência do paciente frente a conhecimentos técnicos na área
médica, mesmo sendo de responsabilidade subjetiva, poderá fazer a inversão do ônus da
prova, prescrito no artigo 6º, VIII do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
[...]
VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da
prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a
alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de
experiências.
Essa inversão do ônus da prova poderá se dar visando à vulnerabilidade do paciente,
ora consumidor, frente aos conhecimentos do profissional da medicina, que possui um vasto
conhecimento técnico em seu campo comparado ao paciente que nada entende.
15
1.5 Negligência, imprudência e imperícia
A culpa em stricto sensu, também denominada “culpa em sentido estrito”, resta
caracterizada quando o agente, por descuido de algo previsível, acaba por lesionar outrem,
inexistindo dolo em sua conduta. Esta modalidade de culpa abarca a negligência, a
imprudência e a imperícia.
Imprudência pode ser definida como o ato de agir perigosamente, com falta de
moderação ou precaução. Em outras palavras, denota a prática de algo que demandava
cautela, mas que por algum momento o agente se absteve. Delton Croce e Delton Croce
Júnior (2002) citam exemplos de médico que avalia e receita por telefone, médico que
prescreve dose de remédios que causam dependência maior que necessário, expor o paciente
sem antes fazer exames adequados a anestesia geral etc. Outro exemplo, tanto mais grotesco,
seria esquecer o bisturi dentro da barriga do paciente e costurá-lo.
“Médicos prudentes são aqueles que, conhecendo os resultados da experiência e
também das regras delas extraídas, agem antevendo o evento que decorre daquela ação e
tomado depois as medidas acautelatórias necessárias a evitar o insucesso”. (KFOURI NETO,
1998, p.8, apud CASTRO, 2005, p.142)
Imperícia, por sua vez, é trabalhar de maneira oposta a técnica do profissional, que em
anos de estudo e com prática se adquire. Logo, se em sua atividade profissional o médico agir
com imperícia, estará fazendo o oposto do que foi instruído. Exemplos de imperícia seriam
queimaduras causadas pelo médico em procedimento de radioterapia, perfuração de outro
órgão em cirurgias, entre outros.
Opina Hildegard Taggesell Giostri (2005, p. 40):
Ao se sentir incapacitado frente a um quadro clínico ou cirúrgico, seja por
problemas pessoais, seja por falta de equipamento ou condições técnicas, o médico
deverá encaminhar o cliente para o outro colega – habilitado como ele, porém
melhor qualificado tecnicamente -, ao menos na especialidade que se faz necessária
para resolver o problema do momento. Em não agindo assim e advindo dano para o
paciente, sem dúvida, terá ele incorrido em uma conduta culposa à qual
convencionou-se chamar imperícia.
Por fim, negligência é o desleixo ou o descuido. É a precaução para evitar determinado
resultado que por ora seria previsível. O profissional da área da saúde, em seu cotidiano, pode
deixar de dedicar o devido zelo por algo que demanda atenção. Um dos exemplos de Miguel
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Kfouri Neto (2010, p. 94): “o médico clinico que deixar de dar o devido encaminhamento a
paciente que necessita de urgente intervenção cirúrgica”.
Declara sobre negligência Delton Croce e Delton Croce Júnior (2002, p. 23):
Consiste, em suma, na passividade corpórea ou subjetiva quando da execução de
determinado ato dando ocasião a resultados danosos que não sobreviriam se o agente
houvesse se conduzido com diligência, ou na não-diligência do homo medius
necessária para o cumprimento do mister.
Espera-se que o profissional médico haja de maneira prudente e adequada, agindo
como um profissional diligente. Se assim não o fizer, poderá ser considerado negligente.
1.6 A responsabilidade civil e o Código de Defesa do Consumidor
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) encontra-se na lei 8078/90, tem como
elementos da relação de consumo: o consumidor, o fornecedor e o produto ou serviço.
Apresenta como regra a responsabilidade objetiva para os fornecedores, que se
caracteriza pela teoria do risco, ou seja, desnecessidade de provação de culpa, devendo o
consumidor provar o dano (vício ou defeito) e o nexo da causalidade. Nessa sequência, o
fornecedor terá que ressarcir o consumidor dos prejuízos por ele causado.
Define o artigo 14 do CDC sobre a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviço
ou produto, in verbis:
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela
reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação
dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua
fruição e riscos.
Percebe-se que este artigo se aplica em relação médico-paciente, ligado ao princípio da
transparência, quando o primeiro deixa de informar o paciente sobre o procedimento que está
ocorrendo, bem como a tecnologia que está utilizando ou até mesmo sobre outros
procedimentos acessíveis.
Relaciona-se também o artigo 6º, inciso III, do CDC, in verbis:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
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III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com
especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos
incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
Logo, a falta de informação ou informação insuficiente pode ocasionar em uma
responsabilidade fundada pelo Código de Defesa do Consumidor. Assegura:
O dever de informar, previsto no art. 6, III, do Código de Defesa do Consumidor,
está ligado ao princípio da transparência e obriga o fornecedor a prestar todas as
informações acerca do produto e do serviço. Esse princípio é detalhado no art. 31,
que enfatiza a necessidade de serem fornecidas informações corretas, claras, precisas
e ostensivas sobre os serviços, “bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e
segurança dos consumidores”. O aludido dever abrange o de se informar o médico
acerca do progresso da ciência e sobre a composição e as propriedades das drogas
que administra, bem como sobre as condições particulares do paciente, realizando, o
mais perfeitamente possível, a completa anamnese. (GONÇALVES, 2014, p. 268)
Não obstante, se verifica que o artigo 14, parágrafo 4º do CDC fala sobre os
profissionais liberais e o médico está submetido a ele. Descreve abaixo, in verbis: “A
responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de
culpa”.
Fica claro neste artigo que a responsabilidade dos profissionais liberais, no que tange a
culpa, é subjetiva. Consequentemente, um médico no exercício de sua atividade individual
responderá pela provação de culpa. Difere, entretanto, do que ocorre nos casos em que há uma
pessoa jurídica prestando o serviço, como hospitais, unidade básica de saúde, convênios
particulares entre outros. Nestes casos, a responsabilidade se encontra no caput do artigo 14,
qualificado como fornecedor (art 3º), sendo objetiva, na qual independe de culpa.
Na opinião de Sílvio de Salvo Venosa (2014, p. 157) não exclui a responsabilidade a
responsabilidade objetiva do hospital:
Ocorre com frequência que médicos se utilizam de nosocômio sem manter vínculo
com o estabelecimento. A situação é de preposição que não afasta responsabilidade
da pessoa jurídica, salvo se formalizado contrato nesse sentido com o paciente ou
seu representante, com ressalva expressa.
Entretanto, os tribunais têm adotado posicionamentos divergentes no que tange a
responsabilidade dos hospitais. A seguir a jurisprudências nesse sentido:
Em ação de indenização contra hospital, ajuizada com base no Código de Defesa do
Consumidor, embora se trate de pessoa jurídica, a ela não se aplica a
responsabilidade objetiva, na medida em que o que se põe em exame é o próprio
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trabalho médico. Aplicável, pois, o § 4º do art. 14 do referido Código. (TJSP, rel.
Des. Marcos Cesar, RJTJSP – Lex 141/248)
Percebe-se que está jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
adota como posição que é preciso da comprovação da culpa médica para o hospital ser
responsabilizado, fugindo totalmente do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que diz
que tem que ser responsabilizado independentemente de culpa.
A responsabilidade dos hospitais, no que tange à atuação dos médicos que neles
trabalham é subjetiva, dependendo da demonstração da culpa destes profissionais,
aqui não evidenciada – Dano moral pelo acionamento da polícia militar – Injúria não
configurada Sentença mantida – Recurso a que se nega
provimento. (TJSP; Apelação 0042035-93.2005.8.26.0100; Relator (a): Luis Mario
Galbetti; Órgão Julgador: 20ª Câmara Extraordinária de Direito Privado; Foro
Central Cível - 37ª Vara Cível; Data do Julgamento: 27/07/2017; Data de Registro:
27/07/2017)
Observa-se que as duas jurisprudências acima vigem que para o hospital ser
responsabilizado há necessidade de saber se o médico agiu com culpa comprovada
(negligência, imprudência ou imperícia), visto que, deixa de ser responsabilidade objetiva e
passa a ser subjetiva. Logo, percebe-se é que as jurisprudências referidas, não estão adotando
como medida a responsabilidade do hospital mesmo em se tratando de pessoa jurídica, mas
está julgando individualmente os atos do médico aderindo à ressalva do art. 14, parágrafo 4º,
do Código de Defesa do Consumidor. Agora observe:
A relação entre paciente e hospital é de consumo, sendo o tratamento considerado
como prestação de serviço. É aplicável a teoria do risco do negócio, prevista no
artigo 14, do CDC, aos caos de erro médico, tratando-se de responsabilidade
objetiva do hospital. Comprovada a negligência médica, cabe ao Hospital indenizar
o paciente nos danos morais sofridos. Apelação cível conhecida e provida. (TJ-DF
20130110544145 0014345-45.2013.8.07.0001, Relator: SEBASTIÃO COELHO,
Data de Julgamento: 24/08/2016, 5ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação:
Publicado no DJE : 02/09/2016-Pág.:487/489)
Neste julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, adotou-se a teoria do risco,
estando totalmente de acordo com a regra do caput do artigo 14 do Código de Defesa do
Consumidor, que o hospital por ser pessoa jurídica, prestadora de serviço deverá indenizar o
paciente sendo irrelevante a culpa médica. Assim também, outro julgado:
AÇÃO DE REPARAÇÃO CIVIL – CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE
SERVIÇOS MÉDICO-HOSPITALARES – PROCEDIMENTO DE
COLONOSCOPIA COM POLIPECTOMIA – PERFURAÇÃO DO INTESTINO
GROSSO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO CENTRO DE
DIAGNÓSTICO PELOS DANOS MORAIS ADVINDOS DO EVENTO LESIVO –
RECONHECIMENTO – INTELIGÊNCIA DO ART. 14 DO CDC APELAÇÃO
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PROVIDA (TJSP; Apelação 0174458-80.2006.8.26.0100; Relator (a): Andrade
Neto; Órgão Julgador: 30ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 15ª Vara
Cível; Data do Julgamento: 03/05/2017; Data de Registro: 04/05/2017)
Os dois últimos julgados, por sua vez, demonstram a importância do art. 14 do CDC,
aplicando a responsabilidade objetivada do hospital. Nota-se que as Câmaras do Tribunal de
Justiça de São Paulo têm opiniões divergentes quanto a está ideia, adotando posicionamentos
diferentes, pois será verificada a conduta do preposto ou empregado para que o hospital seja
responsabilizado.
Poderá o hospital (prestadora de serviços) ao ser responsabilizado entrar com ação de
regresso contra o causador do dano se este agiu com culpa comprovada.
Denota o artigo 206, §3º, V, do Código Civil que o prazo prescricional para ingresso
com a ação de indenização é de três anos. Entretanto, o Código de Defesa do Consumidor, em
seu artigo 27, estabelece prazo maior, concedendo o prazo de cinco anos para a propositura da
ação destinada “à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço”.
Ante o exposto, conclui-se que o paciente lesado poderá ajuizar ação indenizatória em
desfavor do hospital ou do médico no lapso temporal de cinco anos, adotando como premissa
o Código de Defesa do Consumidor.
1.6.1 Inversão do ônus da prova
Em regra, o paciente, autor da ação, terá que provar (ônus da prova) que o médico
ocasionou-lhe um dano ou prejuízo e pedir a devida indenização. A culpa stricto sensu do
médico não pode ser presumida, pois sua responsabilidade é subjetiva. Contudo, em algumas
situações, o juiz poderá determinar a inversão do ônus probatório (ope judicis), como quando
verificar que a situação é verossímil e que o consumidor (paciente) passa por uma situação de
hipossuficiência. Esta prerrogativa tem como base a maior facilidade do médico em
comprovar determinado fato, mesmo sem culpa, já que ele se encontra dentro desta área de
atuação, ao contrário de seu paciente que, em tese, nada entende sobre o campo médico.
O artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor permite essa inversão:
“Art. 6º, VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da
prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou
quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. Logo essa
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inversão não passa de matéria processual, tendo o médico o ônus da prova, podendo ele
provar que não agiu com culpa.
Esclarece o Décio Policastro (2010, p. 130):
Sendo o médico o detentor do saber técnico-científico necessário ao tratamento do
enfermo, por conseguinte em melhor situação para abonar o acerto da sua conduta
profissional, a regra do ônus da prova pode ser invertida. O Código de Defesa do
Consumidor coloca entre os direitos básicos do consumidor a facilitação da defesa
de seus direitos possibilitando, destarte, a inversão do ônus da prova (art. 6º,VIII),
de modo que o prejudicado apenas precisará revelar o resultado danoso causado pela
atividade médica a que se submeteu.
De fato, a inversão do ônus da prova se estabelecerá pelo juiz de acordo com cada caso
concreto. E o médico ficará incumbido de demonstrar que não agiu com culpa e que cumpriu
o que lhe foi determinado.
De acordo com Jurandir Sebastião (2003, p. 306) o médico tem que agir de acordo
com os “artigos do Código de Ética Médica, ou seja, “é uma profissão a serviço da saúde do
ser humana e da coletividade” e, em benefício dos quais “deverá agir com o máximo de zelo e
o melhor de sua capacidade profissional”, consciente de que doente não é mercadoria!”.
Nessa afirmação, fica claro que o médico não deve tratar o paciente como um objeto
de valor, mas ter em mente que se trata de vida humana, trazendo por base o respeito para
cumprir sua atividade com muita dedicação e disposição.
1.7 Excludentes da responsabilidade
É possível que o sujeito passivo causador do dano escape do dever de indenizar,
provando umas das excludentes da responsabilidade que rompem o nexo causal, como o caso
fortuito, a força maior, a responsabilidade exclusiva da vítima, a culpa concorrente, o estado
de necessidade, a legítima defesa entre outros.
Segundo os artigos 186 e 927 do Código Civil o sujeito que causar dano a outrem fica
obrigado a reparar, vejamos:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito.
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Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa,
nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida
pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Na responsabilidade objetiva, baseada no CDC, sem a comprovação de culpa para
indenizar, o réu poderá alegar para se eximir da obrigação uma das excludentes da
responsabilidade.
Nem sempre o médico é o único ou exclusivo causador do dano e, nesse sentido, não
seria justo que sobre ele recaia o dever de indenizar. É o caso das excludentes da
responsabilidade.
Entende-se que na culpa concorrente, tanto o paciente quanto o médico concorreram
para um dado resultado. Logo, o correto seria indenizar de maneira justa e igualitária, de
acordo com o grau de culpa de cada um. Vide o art. 944 CC: “A indenização mede-se pela
extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da
culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização”.
Nem sempre o paciente cumpre as recomendações impostas pelo médico. Na hipótese
de violação destas, faz-se gerar resultados inesperados por aquela indisciplina. O médico,
sabendo disso, deverá alertar seu paciente, sob pena de concorrer com culpa para o resultado
danoso. “[...] a culpa da vítima, quando concorrente, é levada em consideração para exonerar
parcialmente o causador do dano”. (KFOURI NETO, 2010, p.77)
Apresenta o artigo 945 do Código Civil, in verbis: “Se a vítima tiver concorrido
culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a
gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano”.
Carlos Roberto Gonçalves (2014, p.332) nesse sentido também defende esta ideia:
“Não é correto falar em compensação de culpas, pois a compensação é um modo extintivo de
obrigações e, na hipótese, a culpa de um não extingue a do outro, mas a conduta de ambos
será valorada para se estabelecer a proporção do dano que cada um deverá suportar”.
Quanto à culpa exclusiva da vítima, como o próprio nome diz, a culpa é
exclusivamente do paciente. Inexistindo culpa por parte do médico, não há o dever de
indenizar, pois igualmente inexiste nexo causal entre conduta e dano.
Caso fortuito (fortuito interno) ou força maior (fortuito externo) abrange casos
imprevisíveis, em que não seria possível evitar determinado resultado, acarretando no
afastamento do nexo de causalidade. A força maior, mais especificamente, engloba eventos da
natureza: terremoto, tempestade, raio, inundação etc.
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Eles também excluem a responsabilidade, pois não se sabe quando acontecerá.
Todavia, há doutrinadores com posições divergentes no que tange a responsabilidade do caso
fortuito e da força maior.
Carlos Roberto Gonçalves (2014, p.484) defende que o caso fortuito não afasta a
responsabilidade do agente, pois para ele seria previsível.
Já para Edmilson de Almeida Barros Júnior (2007, p.45) “Caso fortuito seria evento
imprevisível e inevitável; se o evento for inevitável, ainda que previsível, por se tratar de fato
superior às forças do agente, estaremos em face da força maior”.
Assim, ficará a critério do magistrado e dos tribunais superiores adotar a melhor
posição, seja para excluir ou não a responsabilidade, isentada pelo caso fortuito ou força
maior.
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II – DANO E INDENIZAÇÃO
2.1 Conceito de Dano
O dano resulta do inadimplemento do dever legal, por meio de ato omissivo ou
comissivo, gerando uma lesão, ao passo que esta gera o dever de indenizar. Se o referido
descumprimento decorrer de uma violação contratual, as partes deverão agir de acordo com a
indicação do contrato e, se extracontratual, dependerá do caso concreto.
Alguns doutrinadores atribuem a ocorrência do dano ao descumprimento de um
preceito legal. Não bastaria a mera conduta do agente, lícita ou ilícita, mas sim que esta
conduta resultasse em dano.
“O dano não nasce do acaso. Não é um resultado aleatório. É sempre fruto de uma
falha humana nos deveres de conduta social” (SEBASTIÃO, 2003, p. 46).
Para uma melhor definição de dano: “Perda de qualidade; deterioração; avaria ou
prejuízo; toda e qualquer diminuição nos bens jurídicos de uma pessoa”. (HOUAISS, 2001, p.
908)
Quando um sujeito é lesionado, sofrendo prejuízo, há uma regressão em seu
patrimônio pecuniário ou em sua integridade moral, e o causador deste dano deverá repará-lo
para que volte ao seu status quo ante. O lesionado deverá comprovar o dano que sofrera, para
só assim conseguir recuperar seu prejuízo. Ademais, o dever de indenizar recai, em regra,
sobre quem causou o dano.
“Não basta o risco de dano, não basta a conduta ilícita. Sem uma consequência
concreta, lesiva ao patrimônio econômico ou moral, não se impõe o dever de reparar”.
(CAVALIERI FILHO, 2012, p. 77)
Diz ainda:
Indenização sem dano importaria enriquecimento ilícito; enriquecimento sem causa
para quem a recebesse e pena para quem a pagasse, porquanto o objetivo da
indenização, sabemos todos, é reparar o prejuízo sofrido pela vítima, reintegrá-la ao
estado em que se encontrava antes da prática do ato ilícito. E, se a vítima não sofreu
nenhum prejuízo, a toda evidência, não haverá o que ressarcir. Daí a afirmação,
comum praticamente a todos os autores, de que o dano é não somente o fato
constitutivo, mas, também, determinante do dever de indenizar.
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Conclui-se, portanto, que a razão de ser da indenização não é para gerar fortunas, mas
somente reparar o mal ocasionado pelo agente, atuando como mero ressarcimento ou
compensação.
Para o médico, o dano mais corriqueiro seria o físico ou corporal, visto que, por uma
negligência, imprudência ou imperícia, o paciente poderia ser lesionado em algum órgão ou
parte do seu corpo, inteira ou parcialmente, ou se houver piora do estado do paciente por
culpa do médico deverá repará-lo.
2.2 Dano Material
O dano material é o prejuízo econômico que uma pessoa sofre em razão de
determinada conduta de outrem, e busca-se a reparação em forma de pecúnia, ou seja,
dinheiro. A quantia oriunda da indenização servirá para que a vítima recupere o que gastou
com a reparação de seu déficit patrimonial.
A reparação pecuniária servirá para as eventuais despesas da vítima com hospital,
remédios, cirurgias entre outras, até que volte ao estado de riqueza normal que havia antes do
prejuízo econômico.
O dano material é aferido calculando-se a diferença entre o patrimônio da vítima no
presente momento, e o patrimônio que possuiria se não houvesse sofrido a lesão, constituindo
subtração facilmente calculável e determinada. Isso importa dizer que o causador do dano
deverá reparar a vítima na medida do dano causado.
No tocante ao quantum indenizável, o doutrinador Edmilson de Almeida Barros Júnior
(2007, p. 54) cita um exemplo:
“Em relação ao dano material indenizável à viúva e aos filhos menores, o termo
inicial do pagamento da pensão é aquele em que se deu o ato médico lesivo, e o
termo final corresponde à idade tida como limite médio de vida. Os civilistas
defendem que a pensão seja fixada com ase nos ganhos da vítima, devidamente
comprovados, e durante a sua sobrevida provável”. (BARROS JÚNIOR, 2007, p.54)
O prejuízo causado pelo dano patrimonial poderá ser parcial ou total. É necessária a
realização de cálculo matemático para que a devida indenização seja precisa no valor do
prejuízo.
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No comum, as jurisprudências não aceitam danos hipotéticos ou eventuais, pois o
Código Civil menciona apenas o dano direto e certo. Dessa forma, o artigo 403 do código, in
verbis: “Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só
incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem
prejuízo do disposto na lei processual”.
Portanto, para a configuração da indenização é necessário que o dano esteja
devidamente comprovado pelo autor da ação, para que só então possa ser ressarcido em seu
patrimônio.
2.2.1 Dano Emergente e Lucro Cessante
Entende-se que o dano emergente e o lucro cessante se relacionam com o direito
material, pois ambos envolvem consequências pecuniárias em seus prejuízos.
O dano emergente se dá quando ocorre um dano efetivo a vítima, por meio de perda ou
prejuízo patrimonial. Esta redução patrimonial decorrerá diretamente do ato ilícito que
ocasionou o dano, pois a vítima terá feito uso de seus próprios recursos para a reparação.
Contudo, é certo que a indenização deve ser referente ao montante de despesas
suportado pela vítima. Isso significa que: “Dano emergente é tudo aquilo que se perdeu, sendo
certo que a indenização haverá de ser suficiente para a restitutio in integrum” (CAVALIERI
FILHO, 2012, p.78).
O artigo 402 do Código Civil apresenta, in verbis: “Art. 402. Salvo as exceções
expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que
ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”.
Sendo assim, o artigo 402 nos mostra que a vítima será reparada não só pelo que
“efetivamente perdeu” que é o dano emergente como também o que “deixou de lucrar” no
tempo em que não pode continuar com seus trabalhos por conta do dano que sofrera (lucros
cessantes).
O lucro cessante refere-se a um evento futuro, em que a vítima estaria desenvolvendo
suas atividades normalmente se não houvesse sofrido dano, devido ao qual ela de fato não
pode mais exercer sua atividade. Por isso, a indenização deve se respaldar numa mera
projeção de ganhos e lucros advindos da atividade, consistindo numa avaliação razoável de
quanto a vítima deixou de acrescer ao seu patrimônio.
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Para Maria Helena Diniz (2009, p.70) “Trata-se não só de um eventual benefício
perdido, como também na perda da chance, de oportunidade ou de expectativa [...] a
indenização não seria um ganho que deixou de ter, mas, na verdade, da chance”. Então o lucro
cessante será uma indenização devido à pessoa que estaria perdendo a chance de obter suas
metas e conquistar seus objetivos, por decorrência única e exclusiva do dano que tivera.
Enfatiza-se que a indenização será baseada no quantum que a vítima ganharia no
decorrer do tempo que está privada de suas funções, a depender de cada caso concreto. Resta
ao juiz da causa analisar os fatos e determinar o montante devido, devidamente atualizado
(Súmula 562 do STF e artigo 404 do Código Civil).
Enfim, alguns exemplos para o melhor entendimento de dano emergente são:
“despesas efetuadas com o transporte ferido para o hospital, com o tratamento médico, com o
internamento até o completo restabelecimento da vítima, e serão lucro cessante os ganhos e as
vantagens que o agredido obteria se não tivesse sofrido a agressão” (DINIZ, 2009, p.71).
Outro exemplo é: “O médico ou advogado que, em razão de um acidente, fica
impossibilitado para o trabalho por vários meses, deve ser indenizado pelo que deixou de
ganhar durante esse período”. (CAVALIERI FILHO, 2012, p.79).
Entende-se que, para a obtenção de indenização por danos materiais (a título de dano
emergente e lucros cessantes), deve ficar comprovada a existência dos danos alegados. A
indenização não poderá ser obtida com base apenas em presunções.
O artigo 950 do Código Civil refere-se a indenização para o agente causador do dano,
hipótese na qual ele deverá ressarcir a vítima por todas as despesas que ele ocasionou, bem
como por lucros cessantes:
Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu
ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além
das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá
pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da
depreciação que ele sofreu.
Deve-se analisar se essas despesas foram de fato necessárias para a recuperação da
vítima, pois em alguns casos, a mesma poderia procurar profissionais renomados de alto
custo, sem necessidade alguma. Tais despesas deverão ser custeadas pela própria vítima.
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2.3 Dano Moral
O dano moral consiste na lesão direcionada à personalidade, caráter ou imagem de
uma pessoa. Não é um prejuízo ao patrimônio material, mas sim à integridade e honra da
vítima.
Consiste num sentimento de dor, tristeza, sofrimento, desgosto, perda do brilho da
vida, autoestima de viver, uma infelicidade incalculável e que nenhuma riqueza calculável
seria capaz de ressarcir, mas apenas minimizar com os benefícios que o dinheiro traz a dor da
vítima.
E como diz Sílvio de Salvo Venosa (2014, p.51) “Por essas premissas, não há que se
identificar o dano moral exclusivamente com a dor física ou psíquica. Será moral o dano que
ocasiona um distúrbio anormal na vida do indivíduo”.
Como o dano moral não se relaciona com o patrimônio, a indenização em pecúnia
possui caráter estritamente compensatório, ou seja, oferece satisfação de bens materiais, mas
também visa evitar a impunidade do infrator, constituindo uma forma de pena. Cabe ao juiz
arbitrar o valor da indenização, e entende-se que o dano moral não é passível de prova,
ficando por uma mera presunção.
Sobre a reparação do dano moral: “Tem-se entendido hoje, com efeito, que a
indenização por dano moral representa uma compensação, ainda que pequena, pela tristeza
infligida injustamente a outrem” (GONÇALVES, 2014, p.400).
Muito se discute a cerca do dano moral na questão de ter convicção que sofreu. Por
vezes, uma pessoa pode sofrer dano moral, mas não levar o mesmo a sério, ou seja, não se
sentir prejudicada ou sequer afetada por ele. Porém há quem defenda que subsistirá ao
causador do dano a obrigação de indenizar, pois a dignidade e o respeito à vida devem ser
respeitados.
O doutrinador Sergio Cavalieri Filho (2012, p. 89-90) cita um julgado interessante:
Vem a propósito o caso julgado pela Primeira Turma do Superior Tribunal de
Justiça, relatora a Ministra Denise Arruda, envolvendo recém-nascido que teve o
braço amputado em virtude de erro médico. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
havia negado a indenização por dano moral por entender que uma criança pequena;
de tenra idade, não tinha condições intelectuais para compreender a falta que um
braço lhe faz e que, por isso, a verba relativa ao dano estético deveria englobar a do
dano moral. A Ministra ressaltou, ao acolher o recurso, que não merece prosperar a
tese de que o recém-nascido não é apto a sofrer dano moral por não possuir
capacidade intelectiva para avaliá-lo e sofrer abalos psíquicos.
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Observa-se que há conflitos entre posicionamentos. Parte da doutrina defende que por
não ter percepção do dano moral, a indenização não seria devida. Outra parcela postula que,
ainda que a vítima não possa apreciar o dano que lhe fora causado, persistirá seu direito à
reparação, por violação da dignidade da pessoa humana protegido em nossa Constituição
Federal.
O dano moral é amparado na Constituição Federal em seus artigos: 1º, inciso III, que
fala sobre a dignidade da pessoa humana, no artigo 5º, inciso V, assegura a indenização por
dano material, moral ou à imagem e no artigo 5º, inciso X, afirma a reparação contra a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas.
É de se notar que os casos conflituosos do cotidiano não são passíveis pelas
jurisprudências de indenização, sendo referidas como meros aborrecimentos. Para que reste
configurado o dano moral, deverão estar presentes motivos justos e que realmente tragam dor
e sofrimento para a vítima. “Assim, somente o dano moral razoavelmente grave deve ser
indenizado” (GONÇALVES, 2014, p.389).
Tais danos podem ocorrer de forma direta, atingindo a própria vítima, ou indireta,
impactando pessoas com que a vítima tinha fortes ligações. Portanto, elas também poderão
pleitear indenizações.
O dano por ricochete ou reflexo é aquele que atinge um terceiro, além da vítima. Por
exemplo: uma lesão causada por um médico que impossibilita o paciente de trabalhar, as
pessoas que dependiam da vítima materialmente também foram vítimas do dano, pois não
mais receberão aquele sustento.
Pois bem, o médico deverá ressarcir essas pessoas atingidas indiretamente pelo dano,
desde que seja devidamente comprovado que este terceiro foi prejudicado. Fazendo uma
analogia dos artigos 948 a 951 do Código Civil, percebe-se que se aplica a indenização
também para as pessoas que sofreram dano por ricochete, sendo cabível para elas pensão de
alimentos, pagamento de despesas entre outros.
Segundo a Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça “São cumuláveis as
indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato”. Isso acontece quando
há depreciação patrimonial, como gastos em virtude do erro médico em remédios e, ao
mesmo tempo, na parte psíquica do paciente, por ter ficado aflito e angustiado com a situação.
Também temos a figura doutrinária do dano moral em objetivo, que ocorre quando o
dano lesiona o vínculo social da vítima, ou seja, no seu ambiente de convívio e o dano moral
subjetivo que afeta seu interior, seu psicológico.
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O dano moral ocasionado pelo erro médico pode ser cumulável com qualquer outro
dano que o paciente tenha sofrido.
2.4 Dano Estético
Alguns doutrinadores enquadram o dano estético como dano moral, pois além da dor e
do sofrimento, este dano afeta a imagem externa da pessoa. A beleza externa da pessoa é
alterada, denegrindo sua imagem. É um prejuízo da aparência que esteticamente tornou-se
pior que seu estado anterior.
Há entendimentos que para haver o dano estético essa deterioração da imagem tem que
ser permanente, não podendo ser transitório ou modificativo conforme o tempo.
Entende-se que o médico, ao cometer um dano estético em seu paciente, ainda que não
possua a gravidade da perda de um membro, tais como defeitos, cicatrizes, marcas, deverá
indenizá-lo. Logo, qualquer modificação que resulta no afeamento ou em repulsa pode ser
passiva de dano estético.
A reparação ao dano estético seria uma compensação, com os lazeres da vida, pela
angústia suportada pelo paciente:
Em matéria de prejuízo estético, como prejuízo moral, não se pode falar em
reparação natural, nem em indenização propriamente dita. Nesses casos não há
ressarcimento e sim compensação ou benefício de ordem material, que permite ao
lesado obter confortos e distrações que, de algum modo, atenuam sua dor (LOPEZ,
p.115-116 apud KFOURI NETO, 2010, p.116)
Nenhum valor econômico seria capaz de reparar uma deformidade visual. Neste caso,
o juiz da causa deverá analisar, de acordo com cada caso concreto, a gravidade da
deformidade resultante, e se isso afetará para sempre a vítima, se a impedirá de exercer suas
funções, se afetou sua personalidade, se a deformidade foi total ou parcial, e até mesmo se é
possível a remoção. Há também quem entenda que a vítima deverá ser indenizada por danos
estéticos mesmo não perdendo sua capacidade laborativa.
Opina sobre a indenização do dano estético Carlos Roberto Gonçalves (2014, p.453-
454): “O que se indeniza, nesse caso, é a tristeza, o vexame, a humilhação, ou seja, o dano
moral decorrente da deformidade física. Não se trata, pois, de uma terceira espécie de dano,
ao lado do dano material e do dano moral, mas apenas de um aspecto deste”.
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Quando a vítima que sofreu um dano estético usava de sua aparência para o trabalho
ou até mesmo outros casos, poderá haver a cumulação de indenizações de danos materiais e
morais, pois seria um dano patrimonial indireto. Logo:
Se houver ofensas aos direitos do autor, à honra da pessoa, aos bens que integram a
sua intimidade, ao seu nome, à sua imagem ou à sua liberdade sexual, ter-se-á dano
moral, que poderá traduzir, também, um dano patrimonial indireto se impedirem ou
dificultarem, de qualquer modo, a atividade profissional da vítima. (DINIZ, 2009,
p.85)
Alguns doutrinadores entendem que a cumulação com o dano estético e o moral
configuraria bis in idem. Porém, a jurisprudência dominante entende que, como preceitua a
Súmula 387 do STJ: “É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral”,
pois a vítima, além de sofrer deformação visual, tem também um abalo em sua psique.
Porém, algumas vezes não será possível a cumulação de danos, visto que algumas
pessoas não sofrem a dor psíquica na deformação, e outros não sofrem a deformação em si,
mas são afetadas psiquicamente.
2.5 Dano Médico
O dano médico mais comum é o físico ou corporal, pois há probabilidade de ocorrer
lesões corporais, seja por causas naturais ou por erro médico, como uma intervenção
cirúrgica.
É verdade que o dano pode ocorrer por falha do médico, por achar que determinado
fato não ocorreria ou por ser de rara probabilidade, como em casos de exames pré-operatórios
para verificar se o paciente portava algo que poderia ocasionar risco durante a operação. Por
se tratar de algo previsível, pode acabar ocorrendo. Nesse caso, o médico agiu com culpa, não
podendo sair de sua obrigação de indenizar a vítima.
Por outro lado, pode ocorrer de o médico fazer o procedimento técnico profissional
correto, seguir categoricamente as normas da medicina, mas por causas naturais ou
complicações, o caso concreto ser agravado, advindo um dano. O médico, então, não será
responsabilizado por tais intervenções, visto que não foi sua culpa, mas sim a de causas
imprevisíveis.
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É bom frisar que essas complicações são diferentes de iatrogenia, explica Edmilson de
Almeida Barros Júnior (2007, p. 99-100):
Enquanto esta devida do ato médico correto, dentro dos parâmetros científicos,
aquelas se reportam a eventos danosos a paciente, oriundos não de ato médico
isolado, mas de uma série de fatores, tais como reação adversa do organismo da
pessoa, imunodeficiência, deficiências nutricionais, automedicações, uso de drogas
etc.
Entende-se que ambas não são passíveis de indenizações, pois não sucedem de uma
falha médica e sim de algo que é imprevisível e inevitável. Assim também, um remédio cujos
efeitos colaterais operam de forma diferente do que o esperado em um paciente. O médico
que o prescreveu também não deve ser responsabilizado pelo dano ocorrido, visto que foi uma
reação anormal.
Ademais, o avanço imoderado de uma doença que era imprevisível e inesperado pela
ciência médica não resultará no dever de indenizar se houver dano ao enfermo, pois é um caso
fortuito ou de força maior. Porém, deve ser confirmada pela perícia a veracidade da
afirmação.
Ocorrerá a ruptura contratual entre o médico e o paciente quando o último não seguir
as orientações impostas pelo primeiro, o que consequentemente rompe o nexo causal da
responsabilidade do médico entre a conduta e o dano. Isto, na realidade, é bem difícil de
comprovar no caso concreto, mas se assim for, poderá excluir total ou parcial a
responsabilidade do mesmo.
Cabe citar a obra de Castro (2005, p.42) que considera o dano pelo erro médico que:
“Para a quantificação do dano oriundo de erro médico, parâmetros médico-legais têm sido
propostos. São eles: a) incapacidade temporária; b) incapacidade permanente, inclusive
laborativa; c) o quantum doloris; d) o dano estético; e) prejuízo de afirmação pessoal”.
Alguns artigos do Código Civil reforçam o dano oriundo do erro médico, dentre eles o
artigo 951 do Código Civil, que possibilita a indenização cometida por erro médico. Este
artigo nos remete para três outros, os artigos 948, 949 e 950, também do Código Civil.
Observe, in verbis:
Art. 951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização
devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência,
imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe
lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.
32
O dispositivo 948 fala da reparação por homicídio, abrangendo o médico caso ele
cometa este dano. Deverá indenizar a família da vítima no que concerne aos prejuízos que
tivera.
O artigo 949 também exige a reparação das despesas da vítima, mas aqui não houve
morte do paciente, mas sim alguma lesão, ou seja, um agravamento de seu estado anterior, in
verbis: “No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das
despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum
outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido”.
O artigo 950, por fim, dispõe sobre a lesão causada por erro médico que impossibilitou
a vítima, total ou parcialmente, de exercer seu trabalho. A resenha do dispositivo estabelece
que a indenização deverá ser no montante que a vítima percebia com seu labor, ou na
depreciação que ela sofreu, in verbis:
Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu
ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além
das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá
pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da
depreciação que ele sofreu.
Contudo, nenhuma dessas indenizações ficará submetida a taxatividade expressa nos
artigos, sendo cabível também outras formas de reparação. Exige-se apenas que a vítima
comprove as respectivas lesões que as embasam, e que estas decorreram do dano causado pelo
médico.
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III- ERRO MÉDICO
3.1 O Erro Médico
Na medicina, vários são os campos obscuros que precisam ser mais bem estudados, e
esta necessidade torna-se mais premente com o advento de novas gerações de micro-
organismos e doenças, bem como de mutações e evoluções de enfermidades preexistentes.
A atuação médica poderá resultar em reações inesperadas, resultados incomuns e afins,
o que, todavia, não ocorre por culpa do médico. As falhas da medicina nem sempre estão
associadas ao erro médico, sendo, portanto, vinculadas também à falta de estrutura na área
médica, como no caso de hospitais com déficit de medicamentos, aparelhos tecnológicos etc.
São exemplos de Décio Policastro (2010, p.1-2):
Uma terapia pode estar certa e a resposta decepcionar. Uma intervenção cirúrgica
pode redundar em fracasso embora realizada com aplicação rígida das técnicas
disponíveis. Um medicamento pode ter sido o melhor indicado na posologia correta
e produzir reação inesperada. Um serviço hospitalar pode ter sido modelarmente
prestado e suceder infecção ao paciente em razão do seu próprio estado de saúde.
É importante distinguir os fatos naturais acima referidos do erro médico. Com base
nos recentes avanços da medicina, o paciente passou a esperar a cura instantânea, e se este
resultado não ocorre, o paciente leigo passa a fazer suposições negativas relacionadas ao seu
médico.
“Erro médico, para Sálvio Teixeira, é a falha do profissional médico no exercício de
sua profissão. Ocorre que aquilo que muitos consideram erro na verdade é mero acidente ou
complicação”. (TEIXEIRA, 2000, p.195 apud EDMILSON, 2007, p.63)
Todavia, isso não exime a culpa médica quando este age fora dos parâmetros técnicos
aprendidos. Se outro médico agisse de maneira igual na mesma situação, a reparação não será
devida; do contrário, caberá indenização por parte do médico. No comum, o erro médico
resulta de culpa médica (negligência, imprudência e imperícia), na qual o profissional deixa
de observar algo importante, gerando dano ao paciente.
Na medicina, nada é exato: “Para caracterizar o erro, é necessária a referência do que
seja o certo ou, pelo menos, do que pode ser aceito como certo”. (MORAES, 1995, p.220).
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Por fim, é importante saber que o médico deverá empregar todos os meios, técnicas e
tecnologias disponíveis, prescrevendo, orientando, mencionando riscos e benefícios, se o
estado patológico do paciente é grave ou não, enfim, agir de acordo com a prática legal da
medicina. Se não o fizer e causar prejuízo, estará configurado o erro médico. Observe que o
mesmo deverá advir de culpa. Se o erro médico foi cometido com dolo, ou seja, com a
intenção de produzir o resultado danoso, entrará no âmbito penal.
3.2 Erro profissional e Erro culposo
O erro médico é dividido em erro profissional e erro culposo. O erro profissional é
aquele em que o profissional médico não será responsabilizado, não ensejando o dever de
indenizar, e o erro culposo é aquele causado por negligência, imprudência ou imperícia,
gerando a obrigação de indenizar.
É importante distinguir os casos de erro médico, para que o médico não seja acusado
injustamente. Pode ocorrer, por exemplo, de o profissional usar determinada técnica adequada
para o caso, mas não foi satisfatório para aquele determinado fato. Esta hipótese de erro é
denominada “erro de técnica”.
Deve-se analisar se o profissional agiu com cautela e zelo diante do caso concreto,
ainda que não tenha empregado a técnica correta.
A responsabilidade do médico vai muito além de prescrever remédios. Ele deve tratar
seus pacientes com todos os meios disponíveis, assistir, empenhar, cuidar e tentar salvar a
vida de outros, resguardando o princípio constitucional da Dignidade da Pessoa Humana (art.
1º, III, CF e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos art. 11, § 1º) que aduz: “Toda
pessoa humana tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade”.
Se assim o fizer, não ficará vulnerável a indenização.
O erro escusável consiste em uma modalidade erro profissional, no qual a técnica é
empregada de forma correta pela ciência, sendo usual e comum, e o resultado é amplamente
conhecido, mas pode vir a dar errado. A ausência do dever de indenizar é justificável, pois se
baseia na imprevisibilidade e na inconstância da arte médica.
No raciocínio de João Monteiro de Casto (2005, p. 139):
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Os erros em função do exercício da medicina podem ocorrer de quatro
circunstâncias principais:
a) diagnóstico;
b) escolha das explorações e do tratamento;
c) tratamento;
d) cuidados e atenções ao paciente.
Os órgãos jurisdicionais devem saber diferenciar no que tange o erro profissional e o
erro culpável, verificando cada caso com precaução, pois um permite o pleito de indenização,
ao passo que o outro, não. É assim porque o primeiro não tem nexo causal com o dano em
relação ao médico, representando limitação da medicina.
Diferentemente, o erro culpável:
“O erro médico supõe uma conduta profissional inadequada, associada à
inobservância de regra técnica, potencialmente capaz de produzir dano à vida ou
agravamento do estado de saúde de outrem, mediante imperícia, imprudência ou
negligência”. (CASTRO, 2005, p. 141)
Logo, é a imperícia do médico que acarreta em erro culpável. O profissional utiliza os
meios corretos para tratar do caso, agindo com a técnica correta, mas o faz de modo grosseiro,
atuando de maneira danosa, defeituosa, desastrosa e com desmazelo, causando dano ao
paciente.
3.2.1 Erro Grosseiro
O erro grosseiro é uma culpa médica maior do que as falhas esperadas por um
profissional que estudou aproximadamente uma década, sendo inaceitável o cometimento de
uma falha de tamanha gravidade.
O erro médico grosseiro é mais do que um erro previsível ou imprevisível, ou seja, que
a medicina tolera, pois é desastroso, tamanha a imprudência ou negligência que o acarreta.
Como exemplo, temos o médico que, para impedir agravamento de doença, deve amputar o pé
direito do paciente, mas, por desatenção, corta o esquerdo.
Outro exemplo é da doutrinadora Irany Novah Moraes (1995, p.226):
A título de curiosidade lembro que o erro mais grotesco de que tomei conhecimento,
foi o do médico do fim do século passado que, ao operar um abdome, deixou cair
seu pince-nez na cavidade peritoneal e, como sem ele tinha dificuldade de visão, não
o encontrou. Foi encontrado na autópsia!
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Este erro sem dúvidas recai sobre o médico, pois é resultado de sua conduta
negligente, imprudente ou imperita, que acaba por ferir os princípios éticos do médico,
fugindo totalmente da ação esperada por um profissional médico.
3.3 Iatrogenia e Erro escusável
Como já aludido neste trabalho, a medicina não é uma ciência exata, pois o médico,
mesmo empregando todos os meios/técnicas corretas e aderindo a todos os procedimentos
possíveis na medicina atual, pode causar resultado danoso e inesperado, hipótese denominada
“erro escusável”.
Para uma melhor definição:
O erro escusável é aquele que decorre de falha não imputável ao médico e que
depende das naturais limitações da Medicina. Pois o erro existe, é intrínseco às
deficiências da profissão e da natureza humana do paciente e do profissional, não
sendo culpa suscetível de ser atribuída ao médico. (FIGUEIREDO, 2000, p.196
apud BARROS JÚNIOR, 2007, p. 64)
Ademais: “Há erro escusável não punível quando o profissional, mesmo empregando
correta e oportunamente os conhecimentos técnicos de sua ciência, chega a uma conclusão
falsa e advenha um resultado danoso” (BARROS JÚNIOR, 2007, p.65). Percebe-se que o erro
escusável é justificável pelas situações e presunções da boa-fé do médico.
Para a aferição do erro escusável, é necessário que a conduta do médico seja
comparada com a de um profissional prudente que, naquela mesma situação, atuaria de forma
idêntica. Se o resultado vier a ser o mesmo, este não responderá por culpa, pois tange de um
erro justificável e perdoável.
Reforça o artigo 138 do Código Civil, in verbis: “Art. 138. São anuláveis os negócios
jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser
percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio”.
Por isso a ciência médica pode ser considerada imprevisível; apesar de toda tecnologia
empregada, o corpo humano é cheio de mistérios. Logo, neste caso de erro escusável, o
médico não será responsabilizado.
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Nas palavras de Hildegard Taggesell Giostri (2005, p. 128): “São chamados de
escusáveis, com base no fato de que todo procedimento técnico – mesmo corretamente
efetuado -, traz em si uma possibilidade de resposta adversa”.
Sobre a iatrogenia, entende-se que é um conjunto de reações decorrente de um
tratamento que altera o estado de saúde do paciente, porém nem sempre a modificação é
negativa. Apesar disso, as alterações não são explicitas que advém de um tratamento causado
pela má prática do profissional médico ou de outros profissionais. Às vezes, essas variações
podem ocorrer pelo efeito de determinado medicamento ministrado pelo médico.
É o que acontece quando o médico tenta se livrar de uma doença, mas torna-se
necessária a remoção de parte do corpo do paciente para evitar um dano maior, como a
amputação de um membro para o câncer não se espalhar. Segundo Policastro (2010, p.54)
“[...] seria previsível, mas inevitável. Ou imprevisível e, por isso mesmo, impossível de ser
evitado”.
Sendo esta uma maneira de salvar a vida do paciente, torna-se como um ato lícito,
desde que seja devidamente consentido e autorizado pelo responsável. Portanto, mesmo
havendo essa grave lesão, a longevidade do paciente prevalece.
João Monteiro de Castro (2005, p.30) expõe as modalidades de iatrogenia:
a) lesões previsíveis e esperadas, tendo em vista as sequelas resultantes do
procedimento proposto;
b) lesões previsíveis, porém inesperadas para o caso decorrentes de perigo inerente a
todo e qualquer procedimento, podendo ocorrer nos mais variados graus, do
irrelevante ao óbito;
c) lesões resultantes de falhas no comportamento humano no exercício da profissão
médica. É de se frisar que as sequelas podem ser reversíveis ou não.
A “Simples presunção de erro de procedimento não deve levar à acusação injusta.
Antes de responsabilizar o profissional da saúde, sempre será prudente realizar investigação
segura para constatar se o dano não derivou de causa iatrogênica ou escusável”.
(POLICASTRO, 2010, p.57)
Contudo, é importante observar que o médico, ao ser julgado por uma falha em seu
ambiente de trabalho, pode vir a ter sofrer grandes prejuízos, principalmente a sua imagem e a
sua carreira. Em razão disso, se o paciente o acusa com este objetivo, poderá responder pelos
danos que causou ao médico. Logo, o autor da ação deverá identificar se o médico realmente
agiu com culpa, se o erro foi escusável, ou se o profissional de fato cometeu um erro.
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3.4 Erro de Diagnóstico
É nítido que a demora ou erro no diagnóstico podem levar o paciente a morte.
Atualmente, com a tecnologia disponível, fica mais fácil identificar doenças, suas causas e seu
estágio de desenvolvimento, facilitando o tratamento e cura do paciente. Outro ponto positivo
da tecnologia moderna é o seu emprego em cirurgias com meios menos agressivos e demais
procedimentos médicos.
É preciso que o profissional faça uso de toda a tecnologia disponível em favor do
paciente. O próprio Código de Ética Médica (CEM) no Capítulo V nos apresenta, in verbis:
“É vedado ao médico: Art. 32. Deixar de usar todos os meios disponíveis de diagnóstico e
tratamento, cientificamente reconhecidos e a seu alcance, em favor do paciente”. E no artigo
35, in verbis: “Art. 35. Exagerar a gravidade do diagnóstico ou do prognóstico, complicar a
terapêutica ou exceder-se no número de visitas, consultas ou quaisquer outros procedimentos
médicos”. Destarte, os médicos deverão ter como base também os princípios elencados pelo
Código de Ética Médica (CEM).
Entretanto, se, em um erro de diagnóstico, restar comprovado que qualquer outro
profissional técnico o cometeria, a culpa do médico tende a ser excluída, visto que o erro pode
ser considerado comum e imprescindível. Ademais, nem todo diagnóstico é preciso, pois o ser
humano é vulnerável a falhas, assim como a ciência médica não é perfeita. Logo, desde que
não seja uma falha extremamente grosseira, não será causa de indenização.
Cumpre ao médico, ao verificar que a primeira tentativa de identificar os males de um
paciente restou infrutífera, fazer um novo diagnóstico de seu quadro clínico, para obter
resultado mais idôneo. É possível que uma doença venha a ter sintomas muito parecidos com
os de outras, e em razão disso, a realização de múltiplos diagnósticos seja imperativa.
Vale lembrar que o erro de diagnóstico difere do erro de conduta, pois por vezes o
profissional pode errar no diagnóstico e acertar na conduta/técnica a ser empregada. Um
exemplo clássico é nos casos de cirurgia, o médico ao abrir um paciente para tratar de uma
enfermidade, se depara com outra moléstia. Porém apesar de serem diferentes ambos são
casos operatórios, assim poderá ele dar continuidade com a intervenção, pois a solução para
ambas é o procedimento na qual já está executando. Logo, mesmo em se tratando de doenças
distintas a conduta correta para as duas é similar. Nesse sentido, o médico ao abrir o paciente
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não ocasionou dano já que o tratamento foi satisfatório, mesmo com a identificação incorreta
do diagnóstico.
Dessa forma: “Os erros evitáveis derivados de diagnósticos afoitos, descuidados, sem
o respaldo de exames laboratoriais ou por imagens, incondizentes com princípios patogênicos
elementares, estes sim, são entendidos com produtos da negligência”. (POLICASTRO, 2010,
p.58).
Abaixo, há uma jurisprudência sobre o caso em que o profissional foi responsabilizado
por erro de diagnóstico:
APELAÇÃO CÍVEL - ERRO DE DIAGNÓSTICO MÉDICO - CULPA
PROFISSIONAL NÃO CARACTERIZADA CONDUTA COMPATÍVEL COM A
QUE SE ESPERA DE UM PROFISSIONAL DE RAZOÁVEL HABILIDADE E
PRUDÊNCIA - RECURSO IMPROVIDO. As limitações da ciência médica - que é
falível -, decorrentes da condição humana de seus profissionais e de infinita
variabilidade de seu objeto (o organismo humano), tornam delicada a operação de
diagnóstico, o qual nem sempre pode ser feito com a precisão idealizada. Por conta
disso, o erro de diagnóstico não se traduz, necessariamente, em imperícia, salvo se
houver erro grosseiro e injustificável, que se distancie do padrão de conduta de um
médico de razoável prudência e habilidade.
(TJ-SC - AC: 146111 SC 2008.014611-1, Relator: Jaime Luiz Vicari, Data de
Julgamento: 27/07/2009, Segunda Câmara de Direito Civil, Data de Publicação:
Apelação Cível n. ,de Camboriú)
Por fim, fica claro que os erros grosseiros de diagnóstico são passíveis de indenização,
como nos mostra a jurisprudência supra, pois se o médico age com negligência, é cristalino
que deve reparar seu erro, apesar de serem casos mais difícil elucidação.
3.5 Culpa do paciente
Uma grande parte dos indivíduos, quando consultados, omitem informações relevantes
ao médico, dificultando ainda mais seu trabalho de diagnosticar uma moléstia. O paciente
pode omitir detalhes importantes para o diagnóstico.
Ademais, o paciente às vezes cria muito expectativa em relação ao seu médico, e disso
pode decorrer uma grande frustação, pois o médico não tem o dever de curar.
Nesse mesmo pensamento, temos:
Segundo Roberto (2006, p.196), o profissional médico se obriga com o paciente por
uma relação de meios, uma vez que “ele não deve ser responsável se o cliente não se
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cura. Ele promete somente cuidados atenciosos, e o cliente deve provar a culpa do
médico e a relação causal entre a culpa e o ato danoso”. (ROBERTO, 2006, p. 196
apud ENZWEILER et al., 2011, p.338)
O profissional, com base nas informações prestadas, vai analisar o caso concreto.
Porém, se faltarem informações, dificilmente haverá resultado satisfatório. Logo, o bom
relacionamento médico-paciente é essencial para o diagnóstico correto. Ademais, é
inconveniente e desconfortável para o bom profissional responder processo sobre o tema:
E isto é profundamente lamentável, pois de um momento para o outro, profissionais
hábeis e dedicados vêem seu nome envolvido com a área judicial. Tirante o prejuízo
financeiro que isso lhes acarreta com advogados, perícia, custas etc., ainda há o dano
maior, que é a perda da tranquilidade para o seu trabalho, para o estudo, para a
pesquisa. (GIOSTRI, 2005, p. 129)
Se o paciente quer a solução para sua moléstia, deve contribuir e amparar o
profissional para que da intervenção médica advenha um bom resultado. Portanto, o paciente
deve colaborar e seguir fielmente as instruções de seu médico.
Porém, se o paciente não colaborar com o tratamento indicado, ou não seguir as
recomendações do médico, o profissional ficará isento do dever de indenizar, visto que a
culpa foi integralmente da vítima por descumprir as ordens médicas. Aprofundando o tema,
temos:
Dentro da responsabilização do paciente pelo mau resultado, deve-se provar que o
resultado final desastroso foi ocasionado pelo próprio paciente e, ainda, que o
médico passou todas as orientações necessárias, de forma falada e documentada no
prontuário médico do feito ou também na forma de prescrição escrita dos cuidados a
serem seguidos. (ENZWEILER –coord. et al., 2011, p.339)
Desse modo, o profissional poderá alegar, com base em suas anotações, fichas e
cadastro do paciente, que o tratamento prescrito ou ministrado foi o correto, e que o dano foi
culpa exclusiva do segundo.
Ainda convém lembrar que é totalmente possível o paciente buscar a opinião de outros
médicos. O profissional não poderá impedi-lo, pois o paciente tem a liberdade de escolher o
tratamento que entender melhor. Sendo assim, pode até mesmo o médico original se juntar a
outros em uma Conferência Médica para, em conjunto, analisarem o caso do paciente e
decidirem o que a solução mais viável.
Outro ponto a mencionar é a automedicação, prática que pode resultar em dano ao
paciente. Em regra, ocorre quando um indivíduo pesquisa sobre sua moléstia em sites que
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muitas vezes não são confiáveis, com autores despreparados e até mesmo contendo
informações que, uma vez aplicadas, atrapalham o tratamento do profissional médico.
Este tratamento diverso que o paciente opta por fazer, se encontra até mesmo
escondido do profissional. “No mais das vezes, essa perigosa atitude, como também indicar a
terceiro medicamento que lhe foi prescrito, pode causar agravamento à saúde, além de
comprometer a moléstia”. (POLICASTRO, p.7)
Se acaso tal conduta acarretar em resultado indesejado, não haverá responsabilidade
médica.
3.6 Perícia Médica
A forma correta de comprovação de um erro médico é o laudo pericial, que estabelece
com especificidade e precisão os conhecimentos técnicos empregados pelo médico.
Contudo, o juiz não está vinculado ao mesmo, e forma seu convencimento por meio da
análise do conjunto probatório como um todo, pois o Brasil adotado o sistema de Livre
Convencimento Motivado do Juiz.
Segue descrito o teor do artigo 479 do Código de Processo Civil de 2015, in verbis:
“Art. 479 O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na
sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do
laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito”. Este artigo ressalta a autonomia do
juiz em relação ao laudo pericial, podendo o magistrado até mesmo rejeitá-lo, desde que
empregue a devida fundamentação.
Sobre o tema, Sálvio de Figueiredo Teixeira – Coordenador (2000, p. 120) dispõe:
“A perícia não é uma superprova que se coloca acima das demais e que não permita
questionamento algum. Se fosse intangível a conclusão do técnico, este, e não o magistrado,
seria o verdadeiro juiz da causa e anulada restaria a função jurisdicional do último”.
Como se observa, a perícia não é uma prova absoluta, devendo ser valorada com o
restante do conjunto probatório. Aliás, todas as provas tem igual valor probatório; nenhuma
supera as demais.
Por isso, cabe ao juiz analisar o caso concreto com base na prova pericial e nas demais
provas produzidas, e julgar em conformidade com seu entendimento.
42
Como nenhuma prova é suprema, a prova pericial também é passível de imprecisões,
erros e falhas.
Como faz notar a observação do autor:
Outro fator importante, que deve ser cientificamente comprovado através da perícia,
é que o médico não responderá pelos danos causados pela evolução da enfermidade
– quando tais consequências sejam imprevisíveis ou inevitáveis e escapem do
domínio contemporâneo da ciência. (BARROS JÚNIOR, 2007, p. 66)
A perícia é espécie importante de prova, pois versa sobre o ponto controverso com
clareza e riqueza de detalhes que indubitavelmente influenciam a decisão judicial, como no
caso em que um suposto erro médico na verdade era hipótese de caso fortuito ou de força
maior, isto é, resultado inesperado e incontrolado, que acabou por isentar de responsabilidade
o profissional médico envolvido.
Na visão de Décio Policastro (2010, p.9):
Agindo com zelo e da maneira certa ao caso, o médico não será responsabilizado
pelo desempenho, mesmo quando o resultado desejado for desagradável. Para
propor uma demanda indenizatória, será insuficiente a mera frustação do paciente e
de seus familiares pela ineficácia do tratamento. Assim, somente será possível
considerar a hipótese da responsabilidade decorrente de falha médica, quando a
utilização de técnica intolerada pela prática médica ou a falta de prudência forem
apuradas pericialmente.
Logo, o médico que faz seu trabalho com postura e age da forma correta, não tem
porque se sentir intimidado em ser responsabilizado, pois é sabido que aquele que age com
zelo com seus compromissos não responderá por indenização, pois como já foi mencionado
para a medicina nem tudo ainda tem solução.
O médico que atua de forma correta, em tese, não deve se preocupar com a
possibilidade de ser responsabilizado. Apesar disso, nenhum profissional médico deseja
ocupar o sujeito passivo em um processo, ainda que a razão esteja em seu favor, pois a
sociedade ainda tem a visão pejorativa de processo judicial, e isso acaba por prejudicar o
médico cuidadoso e cauteloso com sua imagem, que sempre trabalhou de forma honesta e
correta.
3.7 Risco
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O risco está presente em todo e qualquer ambiente, não apenas na área médica, apesar
de ser mais comumente encontrado nesta. Em um atendimento clínico ou até mesmo em
cirurgias, sempre há risco de fracasso total ou parcial.
O médico, ao realizar procedimento, deve se atentar a todos os fatores que possam
causar algum risco ao paciente. Se houver algum fator perigoso, deverá alertar a família, e
mostrar as opções para ambos, a fim de que escolham o procedimento de sua preferência a ser
adotado.
“Os riscos devem ser avaliados pelo médico, dentro do contexto em que se encontra o
quadro clínico do paciente, sobrepesando todas as circunstâncias em que envolvem o caso em
si”. (ENZWEILER et al.,2011, p. 339)
Mesmo empregando uma técnica segura e com um nível de falhas extremamente
reduzido, o médico deve sempre se manter alerto para caso haja alguma imprevisibilidade.
Os riscos podem ser classificados em: inerentes e adquiridos. Os riscos inerentes são
subdivididos em esperados, previsíveis e presumíveis. Reconhecendo o possível surgimento
desses riscos, o médico deve ficar atento.
Já o risco adquirido está relacionado a um defeito. Não era previsível a priori; foi
adquirido, como algo que o médico não esperava, como por exemplo, a quebra de um
aparelho durante a cirurgia. Deste dano resulta o dever de indenizar, pois o agente não
cumpriu com seu dever de segurança.
3.8 Consentimento informado
O respeito mútuo entre médico e paciente é imprescindível para que possam ter uma
boa relação contratual.
Nesse sentido, é importante o respeito à vontade e decisão do paciente em relação a
determinados tratamento. Nas palavras de Kfouri Neto (2010, p.41): “Consentimento é o
comportamento mediante o qual se autoriza a alguém determinada atuação. No caso do
consentimento para o ato médico, uma atuação na esfera físico-psíquica do paciente, com o
propósito de melhoria da saúde do próprio enfermo ou de terceiro”.
Para Hélio do Valle Pereira e Romano José Enzweiler- Coord (2011, p.343):
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O consentimento informado constitui direito do paciente de participar de toda e
qualquer decisão sobre tratamento que possa afetar sua integridade psicofísica,
devendo ser alertado pelo médico dos risco e benefícios de todas as alternativas
envolvidas, sendo manifestação do reconhecimento de que o ser humana é capaz de
escolher o melhor para si sob o prima da igualdade de direitos e oportunidades.
É necessário que o médico informe corretamente o paciente de todos os procedimentos
cabíveis e esclareça seus riscos, para que o primeiro decida qual será realizado. Deve o
profissional expor todos os riscos da realização ou omissão de intervenção médica, bem como
os benefícios e vantagens que este procedimento trará. Esse consentimento precisa ser
concedido por escrito pelo paciente.
Esse procedimento deve ser seguido antes de todo e qualquer procedimento que traga
risco à saúde e integridade física ou moral do paciente. A obtenção de consentimento é
fundamental, pois só assim o médico ficará isento de responsabilização.
“O médico deve informar ao paciente o diagnóstico, prognóstico, riscos e objetivos do
tratamento. Haverá, também, de aconselhá-lo, prescrevendo cuidados que o enfermo deverá
adotar. O inadimplemento desse dever conduzirá à obrigação de indenizar”. (KFOURI NETO,
2010, p.45)
Diante disso, para que haja a responsabilidade civil do médico proporcionando o dever
de indenizar, é preciso do nexo de causalidade entre a conduta do médico de omitir
informações de seu paciente, não alertando adequadamente ou agindo sem consentimento, e o
dano advindo dessa omissão.
Para reverter esse quadro e não ser responsabilizado, o médico deverá provar o
consentimento do paciente, mediante atestado de permissão. Quando da notificação, o médico
deverá se proteger com esta prova documental escrita e assinada pelo paciente ou responsável.
Não é, entretanto, a única forma de comprovação do consentimento.
Se o médico interferir na integridade física da pessoa sem sua autorização, sua conduta
ferirá a liberdade pessoal de seu paciente. Contudo, em regra, o consentimento pode ser
parcial ou até mesmo revogável.
Será revogável quando trouxer risco de vida ao paciente. Tanto é assim que está
exposto no artigo 56 do Código de Ética Médica: “É vedado ao médico: Art. 56 - Desrespeitar
o direito do paciente de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou
terapêuticas, salvo em caso de iminente perigo de vida”.
E também no novo Código de Ética Médica (2010) em seu artigo 22, in verbis:
É vedado ao médico:
45
Art. 22. Deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal
após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco
iminente de morte.
Nota-se que este artigo resguarda o consentimento do paciente. Entretanto, se isso lhe
causar algum problema, o médico poderá tê-lo por seus responsáveis. Porém nada é absoluto,
pois se houver risco de vida poderá o médico agir mesmo assim.
Para maior reforço, o Código Civil também frisa o princípio da autonomia em seus
artigos 13 e 15, in verbis:
Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo,
quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons
costumes.
Art. 15. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a
tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.
É um direito do paciente decidir questão relativas ao seu próprio corpo, sobre seu
estado físico e saúde, devendo o médico respeitar sua vontade. Entretanto, o médico poderá
proceder sem o consentimento de seu paciente quando este corre risco de vida.
Um exemplo citado por Policastro (2010, p.65) é:
[...] quando no decorrer de uma operação se vê obrigado a ampliar a cirurgia a
extirpar membro ou órgão doente não detectado anteriormente que põe em perigo a
vida do doente ou que pode agravar a enfermidade. Neste caso, mesmo sem o
consentimento, o procedimento é lícito.
Da mesma forma, Jurandir Sebastião (2003, p.112): “Nas cirurgias, imprevistos de
toda ordem podem ocorrer. Em ocorrendo, cumpre ao chefe da equipe cirúrgica tomar a
decisão que o caso recomendar, sem qualquer preocupação com o “prévio consentimento””.
O quantum indenizável constitui questão controversa. É questionável no sentido de o
médico que intervém de forma e técnica correta, porém sem o consentimento do paciente,
advindo um dano imprevisível (de força maior). Todavia, este dano ocorreria mesmo se o
paciente tivesse dado seu consentimento. Nesta situação o médico responderia totalmente ou
parcialmente pela indenização?
A maior parte da doutrina defende a responsabilidade parcial do médico, respondendo
o profissional apenas pelo consentimento não informado, pois a lesão não resultou de falha
médica (culpa médica). O médico responderá apenas pela não permissão do paciente.
Assim conclui Miguel Kfouri Neto (2010, p. 49):
46
De qualquer forma, como o dano não foi causado por má prática médica, apesar da
ausência do consentimento informado, a indenização será menor que aquela
estabelecida na hipótese de dano diretamente ocasionado por imperícia, imprudência
ou negligência do profissional.
Concluindo, a indenização seria apenas para reparar os danos morais, por não
expressar sua vontade diante da ocorrência desse fato. Assim, o valor exigido não será
idêntico ao ressarcimento cobrado do médico que causou lesão culposa, será mais brando,
pois mesmo com a autorização da vítima esse dano seria inevitável.
Seria de indenização total, se além de não obter o consentimento da vítima o médico
ocasionasse dano de forma culposa (imprudência, negligência ou imperícia).
Portanto, caberá ao juiz analisar os fatos, principalmente se o profissional dispunha de
alternativas quanto ao tratamento, ou se a opção empregada era a única forma de lidar com a
enfermidade. Deverá também verificar se o estado de saúde do paciente permitia a realização
de cirurgia, se havia tratamento menos invasivo, etc.
3.8.1 Dever de informar
O médico, antes de submeter seu paciente a um tratamento, deve informá-lo de todas
as suas etapas. É seu dever explicar sobre a moléstia, seus efeitos, as reações do tratamento, o
procedimento e a probabilidade dos efeitos futuros.
Pode ainda o profissional tentar convencer seu paciente para a adoção deste ou daquele
tratamento, esclarecendo os benefícios de cada um, bem como as consequências da ausência
de intervenção. Por conseguinte, o paciente tem direito de ser informado sobre seu estado
patológico, se há opções, novos tratamentos etc.
As informações devem ser precisas e minuciosas, para que o paciente entenda
corretamente o procedimento que vai se subordinar. Há quem entenda que o médico não deve
dar falsas esperanças, mas é uníssono que o profissional não deve ser negativo ou incrédulo,
para não afetar psicologicamente seu paciente. O melhor caminho é ser verdadeiro e prudente.
O profissional precisa ser verídico, no sentido de incentivar o paciente a buscar outras
soluções, novos meios tecnológicos de possível cura, e não ficar vinculado apenas à opinião
de um único especialista, mas sim procurar consultar outros médicos acerca da moléstia.
47
Nesse sentido: “Quando o paciente consulta mais de um médico e todos são unânimes
no diagnóstico e tratamento da doença ou na recomendação do procedimento cirúrgico
irreversível, nunca há trauma, revolta ou acusação infundada ao médico que o executa”.
(SEBASTIÃO, 2003, p. 298)
Destarte, Délcio Policastro (2010, p.61) nos ensina:
Com o crescente despertar dos direitos dos pacientes, entre os quais o direito de
saber a verdade, que realça o seu protagonismo e autonomia, existe hoje uma
tendência crescente para que se adote uma postura aberta, honesta e verdadeira, ao
se revelar as condições de saúde do paciente.
O profissional, além de tudo, deve saber dialogar com seu paciente, para que a cultura,
os valores e as crenças do mesmo não sejam afetados. É por este motivo que o Código de
Ética Médica excepciona:
É vedado ao médico:
“Art. 34. Deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os
objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar
dano, devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal.
Verifica-se que, ao final, a exceção é clara no sentido de que a comunicação pode ser
feita por meio do representante legal, pois o paciente pode sofrer de algum distúrbio físico ou
mental que seja agravado pela comunicação. Ademais, se o paciente estiver impossibilitado
ou inconsciente para oferecer consentimento, isto deverá ser feito pela pessoa de um
representante legal.
O dever de informar está relacionado ao princípio da transparência, e embasado na
relação contratual. E o médico deve fazer tudo de maneira clara para não ser passível de
responsabilização.
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CONCLUSÃO
Diante do trabalho apresentado, mostra-se que, assim como qualquer outro
profissional, o médico também é passível de responsabilização na área civil, conquanto atue
com imprudência, negligência ou imperícia.
Quando o médico estabelece vínculo com um paciente, tem-se uma relação contratual,
e o descumprimento dessa relação, por qualquer das partes, gera à outra o direito de
ressarcimento.
Porém, para que a indenização seja devida, o autor da ação deverá demonstrar a culpa,
o dano e o nexo de causalidade entre a culpa e o dano médico, que perfazem os elementos da
responsabilidade civil subjetiva.
O profissional médico, salvo raras exceções, não se obriga a salvar a vida de seu
paciente, o que implicaria obrigação de resultado. Sua obrigação é limitada a empregar todos
os meios para que este recupere sua saúde, resultando na denominada obrigação de meio.
Isto deriva da instabilidade da medicina, visto que um número incontável de doenças,
tratamentos e afins são descobertos periodicamente.
Portanto, nem todo erro que acontece no campo médico é resultado de uma má
conduta médica; às vezes surgem reações inesperadas ou resultados imprevisíveis, oriundos
precipuamente de caso fortuito ou força maior. Assim, conclui-se que, não obstante a
importância da área médica na sociedade atual, o profissional médico é falho e passível de
erros. Tal constatação não isenta o médico de eventual responsabilização nas hipóteses legais,
mas reitera a ideia de que nem sempre o erro advindo de um médico é de sua inteira
responsabilidade, podendo decorrer também de outros fatores, como a insuficiência de
recursos, indisponibilidade de aparelhos, escassez de profissionais, entre outros.
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