Resenha Karl Barth

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A ESSÊNCIA DA PREGAÇÃO Jorge Martins de Jesus 1 (Resenha) BARTH, Karl. A Proclamação do Evangelho. São Paulo: Novo Século, 1963. Karl Barth (1886-1968), notável teólogo alemão. Por sua posição antinazista foi obrigado a refugiar-se em Basiléia, onde desenvolveu seu ministério, tendo a fé reformada como confissão. Sua influência e contribuição foram exponenciais à Teologia, recebendo a alcunha de barthismo, ligando-a assim diretamente aos seus ensinos. Para Barth, a revelação de Deus é o objeto da Teologia, com isso concentrou todos os seus esforços na revelação e palavra de Deus na Bíblia, sendo a principal revelação de Deus o próprio Cristo. Pois segundo ele, a única palavra de Deus está em Jesus Cristo, sendo que toda a relação que Deus tem com o homem, se dá unicamente por meio de Cristo e em Cristo. Com essas características fica bem fácil entender porque Karl Barth fez parte da chamada Teologia Dialética junto a teólogos como Jurgen Moltmann, E. Brunner e outros. Pois a partir de uma compreensão que atravessa a totalidade do que é falado, o todo é desdobrado mostrando assim o seu sentido, de forma que a compreensão dos ouvintes é conduzida ao sentido exato do discurso. É tendo tais desafios como premissas, que a obra A Proclamação do Evangelho de Karl Barth vem ao encontro de teólogos, acadêmicos, estudantes, leigos e todo aquele que deseja um aprofundamento eficaz no anuncio do Evangelho. Barth busca elucidar algumas regras e sugestões de ordem prática, como também essenciais e dignas de serem meditadas, para a obtenção de uma pregação bíblica. Para isso, logo no primeiro momento Barth procura definir pregação, o que 1 Aluno da Universidade Metodista de São Paulo – Módulo EAD – Teologia - Pólo de Guaratinguetá-SP.

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A ESSÊNCIA DA PREGAÇÃO

Jorge Martins de Jesus1

(Resenha)

BARTH, Karl. A Proclamação do Evangelho. São Paulo: Novo Século, 1963.

Karl Barth (1886-1968), notável teólogo alemão. Por sua posição antinazista foi

obrigado a refugiar-se em Basiléia, onde desenvolveu seu ministério, tendo a fé

reformada como confissão.

Sua influência e contribuição foram exponenciais à Teologia, recebendo a

alcunha de barthismo, ligando-a assim diretamente aos seus ensinos. Para Barth, a

revelação de Deus é o objeto da Teologia, com isso concentrou todos os seus esforços

na revelação e palavra de Deus na Bíblia, sendo a principal revelação de Deus o

próprio Cristo. Pois segundo ele, a única palavra de Deus está em Jesus Cristo, sendo

que toda a relação que Deus tem com o homem, se dá unicamente por meio de Cristo e

em Cristo.

Com essas características fica bem fácil entender porque Karl Barth fez parte da

chamada Teologia Dialética junto a teólogos como Jurgen Moltmann, E. Brunner e

outros. Pois a partir de uma compreensão que atravessa a totalidade do que é falado, o

todo é desdobrado mostrando assim o seu sentido, de forma que a compreensão dos

ouvintes é conduzida ao sentido exato do discurso. É tendo tais desafios como

premissas, que a obra A Proclamação do Evangelho de Karl Barth vem ao encontro de

teólogos, acadêmicos, estudantes, leigos e todo aquele que deseja um aprofundamento

eficaz no anuncio do Evangelho.

Barth busca elucidar algumas regras e sugestões de ordem prática, como

também essenciais e dignas de serem meditadas, para a obtenção de uma pregação

bíblica. Para isso, logo no primeiro momento Barth procura definir pregação, o que

1 Aluno da Universidade Metodista de São Paulo – Módulo EAD – Teologia - Pólo de Guaratinguetá-SP.

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para ele significa a Palavra de Deus pronunciada pelo próprio Deus e sendo um

resultado direto da ordem Divina dada a Igreja para servir a Palavra.

Não obstante, o emprego de alguém vocacionado a esta tarefa é fundamental.

Tem assim a base para uma de suas principais proposições teológicas para a

substancia da pregação: Palavra de Deus e palavra humana.

Assim, as características essenciais da pregação irão decorrer do fato de que a

pregação deve ser conforme a Revelação, e esta Revelação não sendo algo articulado e

elaborado a partir das pretensões do pregador, mas sendo unicamente o resultado da

ação de Deus. Pois ao pregador não cabe a tarefa de estabelecer a realidade de Deus,

sua tarefa é construir o Reino de Deus e conduzir os ouvintes a uma decisão. Para

Barth, Deus não é um Deus ocioso, é Ele o autor da obra que se realiza e nós não

podemos agir senão em obediência a nossa tarefa, e não como pessoas que teriam dado

a si mesmas o seu programa e seu objetivo.

Somente quando a pregação é dirigida por essa relação é que ela pode ser

encarada como Kerigma, representando para Barth a boa nova anunciada por um

arauto que cumpre assim sua tarefa.

Dentro das características da pregação, Barth salienta o caráter eclesiástico da

pregação, indicando assim a ligação intrínseca que há entre a Igreja e a Pregação, pois

é no meio chamado Igreja que a pregação tem o seu devido lugar.

É na Igreja que a nossa relação com Deus e com o próximo é totalmente

esclarecida de sua forma adversa de todas as outras relações existentes, pois essa

relação aparece manchada de impurezas, contaminada, mergulhada na esfera da queda

e como tal, caindo sob o golpe do julgamento. Mas a mesma Palavra também nos diz

que o mal está curado e que todo o peso das conseqüências do pecado está retirado, é

nesta perspectiva que a Igreja tem a palavra da reconciliação, pois somente e mediante

a Revelação dada por Deus é que a pregação cria a reconciliação. Karl Barth diz que

onde os homens recebem essa pregação, aí está a Igreja, legitimando assim a

existência da Igreja e sua missão.

Barth ainda ressalta a importância do sacramento unido à pregação como

expressão do caráter eclesiástico da pregação, pois conforme lembra o autor citando a

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confissão de Augsburgo VII, a Igreja autentica é aquela que possui e anuncia o

Evangelho segundo a sã doutrina e administra retamente os sacramentos.

Pois a pregação tira sua substancia do sacramento que é uma referencia em ato,

ao evento da Revelação. Portanto a pregação é um comentário e interpretação do

sacramento, ela tem o mesmo sentido que ele, mas em palavras.

Barth também irá dissertar sobre a fidelidade doutrinária da pregação, a qual o

pregador deve se submeter. Dentro desse aspecto Barth relaciona a confissão de Fé e a

pregação, pois a pregação também resulta do que cremos, confessamos e recebemos.

Pois assim demonstramos que entendemos a Revelação, pois confissão é uma resposta

do homem ao que foi dito por Deus.

Não somente a fidelidade doutrinaria a pregação deve estar submetida, mas

também a fidelidade apostólica, a qual demonstra assim a legitimidade do pregador ou

da Igreja que cumpre sua missão. Neste ponto são tratadas algumas propostas que irão

dirimir as questões levantadas para saber se a Igreja é verdadeiramente a Igreja de

Cristo. Ou seja, se desde que a Palavra é anunciada e o homem a escute, a Palavra de

Deus é entendida e recebida pela ação do Espírito Santo no homem. Barth ainda

destaca que dentre as diferenças que o pregador tem dos apóstolos, reside o fato de que

é pela vontade da comunidade que o pregador esta colocado onde está, a função que

ele ocupa pertence a Ecclesia, sua função vem da comunidade e é exercida na

comunidade.

Dentro de tais características essenciais da pregação não pode haver dúvidas

quanto ao caráter bíblico da pregação, neste momento Barth destaca a necessidade da

pregação expositiva e tendo como principal objetivo, expor a justificação operada por

Deus e não um ensino pessoal, ideológico ou de qualquer natureza adversa da

Revelação Bíblica, não há nada então a dizer do que diz a escritura, afirma Barth.

Este caráter bíblico da pregação necessita obrigatoriamente estar unido

entranhavelmente a pessoa do pregador como um estado real em sua vida. Pois é o

homem pecador, justificado, perdoado, crucificado e ressuscitado em Cristo que irá

explicar aos seus contemporâneos a realidade da Palavra. Este conceito é primordial

para a originalidade da pregação, ou como Barth diz: o pastor não precisa ser como

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Lutero, Calvino, alguns dos profetas ou semelhantes, mas ele deve ser ele mesmo

quando explica o texto.

É tendo a consciência de tais observações que a Igreja, o pregador ou a pessoa

vocacionada ao ministério eclesiástico, se dirige à Bíblia à procura do texto sagrado

que será por Palavra da Revelação à comunidade. Neste auspicioso momento, o de

estar diante das sagradas escrituras à escolha de um texto, convém considerar duas

importantes premissas que devem encadear o preparo da proclamação: o que se deve

fazer e o que não temos o direito de fazer. Ou seja, obedecer a Palavra, ou desobedecer

a Palavra, o próprio Deus?

Uma devida e coerente importância devem ser dadas ao fato de que o texto não

pode ser tratado conforme os nossos desejos, ou seja, é o texto que comanda e não nós.

Ele está acima de nós e nós, pregadores ou a Igreja, estamos aqui para servi-lo.

Ponderando sobre essas premissas, proporcionaremos condições para a

receptividade da Palavra, poderemos então “escutar” o que o texto bíblico esta

dizendo. E isso de forma eficaz, quando a leitura do texto em suas línguas originais,

pois as diversas traduções, segundo Barth, já representam um verdadeiro comentário.

Lembrando que nossa tarefa em traduzir não se limita somente à forma

lingüística do texto, mas também devemos traduzir a mensagem para as pessoas de

hoje, para a sociedade contemporânea, destacamos assim a necessidade da

contemporaneidade da pregação.

Por fim é necessário o devido valor e atenção na elaboração da estrutura ou

roteiro para a pregação, desde sua redação até a conclusão da pregação. A pregação

dever ser redigida palavra por palavra, pois o nosso discurso não poder ser atribuído

preguiçosamente ou a guisa de outras intenções, ao Espírito Santo, esperando assim

algum tipo de inspiração ou improviso no momento exato da pregação. E caso isso

ocorra, seja concludente o fato de que o discurso que será emitido não será uma

pregação cristã e sim pura tagarelice ou equívocos.

Diante do exposto, fica fácil entendemos o porquê da teologia de Karl Barth ser

considerada uma Teologia da Palavra, com vistas a sua prédica ou homilia.

Em, A Proclamação do Evangelho, Karl Barth nos trás de forma monumental, a

síntese da essência necessária à pregação do evangelho.

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Ainda que este livro não seja o resultado de uma intenção para editoração

literária, conforme o próprio Barth diz em sua introdução, mas uma incursão na

teologia prática; Sem dúvidas, é uma obra de profundo esmero e valor para a Teologia,

pois sete anos mais tarde, Karl Barth viria a falecer.

Um livro de tamanho médio e de poucas páginas, porém fecundo, onde o tema é

desenvolvido e divido em três partes: definições fundamentais da pregação,

características essenciais da pregação e preparação da pregação. Sua capa é fidedigna

ao conteúdo do livro, onde um destacado pregador discursa a ouvintes que

demonstram atitudes de reflexão e expectativas diante do que lhes é exposto. Seus

trajes são medievais, lembrando assim o aspecto da Reforma.

Em definições fundamentais da pregação, Barth define de forma segura e

íntegra o ato e a transcendência da pregação, delimitando seus aspectos em Palavra de

Deus e palavra do homem, onde se entende que a palavra da pregação que é

transmitida ou recebida, não se limita apenas ao discurso humano, mas é também

aquela Palavra transmitida e recebida na ação do Espírito Santo sobre o espírito

humano. Essa questão é de suma importância ao nosso entendimento hoje, quando

carecemos de tamanho equilíbrio e fundamento teológico para a reflexão e

contribuição à experiência da pregação.

Nas características fundamentais da pregação, Barth discorre de maneira

magistral sobre os vários aspectos que devem ser considerados e observados quanto ao

anuncio do evangelho. Destacamos entre eles, a relação salutar que o Teólogo

estabelece entre sacramento, pregação e Igreja, pois eles estão ligados entre si e como

sujeitos da Revelação de Deus em Cristo.

Barth neste ponto lembra do zelo dos reformadores com relação aos

sacramentos com ênfase na eucaristia e da necessidade da Igreja moderna procurando

assim interliga-los em importância ao necessário. Seria maravilhoso se a Igreja atual

assimilasse a devida importância aos sacramentos e pudesse assim de beneficiar de

seus maravilhosos resultados.

De forma magnífica é destacado que a Palavra de Deus é o acontecimento o

qual Deus fala e se revela ao homem através de Jesus Cristo tendo a Bíblia como

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testemunha escrita da revelação de Deus. Essa revelação se dá por meio da exposição

que o Antigo e o Novo Testamento falam sobre Jesus Cristo como o cordeiro de Deus.

Conta-se que desde seus primeiros anos como professor na Universidade de

Basiléia, Barth teve sobre sua mesa a pintura de Grunewald, em que João Batista

mostra Jesus Crucificado. Daí então, podemos imaginar a importância que o Teólogo

dava a sua mensagem.

Podemos concluir dizendo que a obra de Karl Barth neste livro é de muito valor

a Teologia, assim como de extrema necessidade e urgência em nosso meio acadêmico

e de seminários. Suas idéias, conceitos e propostas estão profundamente coesas às

escrituras e fundamentos teológicos, com poucas discrepâncias, causadas pela

distância cultural, social e teológica em que vivia o autor e a nossa mente pós-

moderna.

Tem-se a certeza de uma boa e proveitosa leitura.