Resenha Jose Miguez Bonino - Rostos Protestantismo

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FACULDADE TEOLÓGICA BATISTA DO PARANÁ Programa de Bacharelado em Teologia Ficha de Pesquisa apresentada por: LEIDMAR MAGNUS FESTA ANÁLISE DO PROTESTANTISMO LATINO-AMERICANO DE UM PONTO DE VISTA LATINO Ficha de leitura apresentada como requisito parcial para obtenção de nota na disciplina de História do Cristianismo do programa de Graduação da Faculdade Teológica Batista do Paraná Professor: Marlon Ronald Fluck CURITIBA 2008

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as dinâmicas e particularidades do protestantismo na América Latina

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FACULDADE TEOLÓGICA BATISTA DO PARANÁ

Programa de Bacharelado em Teologia

Ficha de Pesquisa apresentada por:

LEIDMAR MAGNUS FESTA

ANÁLISE DO PROTESTANTISMO LATINO-AMERICANO DE UM PONTO DE VISTA LATINO

Ficha de leitura apresentada como requisito

parcial para obtenção de nota na disciplina de

História do Cristianismo do programa de

Graduação da Faculdade Teológica Batista do

Paraná

Professor:

Marlon Ronald Fluck

CURITIBA

2008

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RESUMO

José Miguez Bonino nasceu em 1924, cursou Faculdade Evangélica de

Teologia de Buenos Aires e o Union Theological Seminary (Nova York). É ex-

reitor do Seminário Teológico Batista Internacional de Cali, na Colômbia, ex-

membro da comissão teológica do Conselho Latino-americano de Igrejas

(CLAI), e foi um dos oito observadores não católicos convidados pelo cardeal

Walter Kasper para participar da V Conferência Geral do Episcopado Latino-

americano e Caribenho, realizada em Aparecida, SP, em maio de 2007.

Atualmente é coordenador do Compromisso Cristão da Visão Mundial para a

América Latina e Caribe. Suas principais obras são “Concílio Abierto” (1968);

“Integración Humana y Unidad Cristiana” (1968), dentre outros.

Bonino inicia esta obra expondo o rosto liberal do protestantismo,

analisando neste primeiro capítulo a existência da relação histórica e ideológica

entre o protestantismo e o liberalismo político da América Latina sob a

influência dos EUA - argumenta que nesta região convergem três processos na

segunda metade do século passado: o projeto liberal, a presença dos EUA e a

entrada do protestantismo. As idéias de Jean-Pierre permeavam o campo da

“hipótese conspirativa”, na qual as missões protestantes apenas legitimaram

religiosamente a penetração econômica, política e cultural do primo rico na

área de domínio latino – esta hipótese é descartada pelo autor que toma como

certo que o projeto imperialista norte-americano foi iniciado somente em 1860

(após a guerra da secessão), quando os protestantes já estavam aqui. A

“hipótese associativa” formulada por Bastian considera que a entrada do

protestantismo se deve mais ao alinhamento deste com os setores latino-

americanos que desejavam a modernização liberal e com as “associações

libertárias” (lojas maçônicas e associações de operários dentre outras). Este

alinhamento foi promovido por missionários protestantes com formação pietista

- pertencentes a igrejas liberais – e ambos os lados tinham motivos, desde a

abertura para liberdade de culto e apoio para a luta clerical contra as reformas.

O Congresso Evangélico do Panamá (1916), realizado sob comando das

denominações histórico-liberais e delineador da estratégia da empresa

missionária, foi o divisor de águas na autoconsciência protestante latina. Este

congresso ocorreu em um tempo onde os EUA estavam propagando seu

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liberalismo – que iria substituir o já decadente mercantilismo da Grã-Bretanha e

França - até mesmo através da religião (a qual também estava vinculada a

intersses sociais, educacionais e econômicos), em um tempo onde a igreja

católica estava desorganizada e a nova elite estava desejosa de aproximar o

modelo norte-americano, conforme disse Van Alstyne: “há um forte cheiro de

farisaísmo na diplomacia norte-americana” (página 16).

Ao finalizar sua primeira análise, o autor afirma que o projeto liberal

fracassou, primeiro devido a ambigüidade teológica e em também por não

conseguir se popularizar a ponto de um percentual razoável da população

aderir à ele. A intenção do liberalismo era um evangelho mais social focado em

questões como a defesa da liberdade religiosa e foram formados muitos líderes

com esta mentalidade, os quais criticaram este sistema, dentre osquais se

destaca Mackay dizendo que o Conselho Missionário Internacional “reproduz

os desejo e interesses da sociedade burguesa ocidental e vê o cristianismo

como a alma da sua cultura, mas não como seu juiz”.(página 24). Mas mesmo

que na América Latina o protestantismo liberal tenha sido tomado como

legitimador do capitalismo mais selvagem e também como ideologia de

ascensão social ou teologia de prosperidade não devemos repudiar a herança

deixada, pois se o fizéssemos estaríamos jogando fora todos os traços

benéficos, como caridade e amor ao próximo.

Na segunda parte de seu estudo, Bonino descreve o rosto evangélico,

dando a concepção de Mardsen que define evangélicos como “pessoas que

professam uma total confiança na Bíblia e se preocupam com a mensagem da

salvação que Deus oferece aos pecadores por meio da morte de Jesus Cristo

[...] e a aceitação do evangelho é a chave [...] para o céu [...] negar isso era

seguir para o inferno”. Esta teologia pietista do Grande Despertar (Whitefield e

Charles Finney) é geradora de conflitos entre arminianos e calvinistas, igrejas

protestantes e igreja católica e criou a necessidade de se iniciar novos estudos

de aprofundamento no conhecimento protestante para estes embates. Os

crentes também sentiram a necessidade de espaço social e passaram a se

preocupar com as condições políticas que lhes dessem liberdade religiosa.

Tudo isso levou a mudanças na teologia que se voltou para o combate

ao secularismo, com destaque para três aspectos: piedade evangélica, ética

social e defesa da fé. O autor também explana brevemente sobre o

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fundamentalismo e sua relação pré-milenista (reação contra-cultural que

esconde a escatologia do secularismo) e pós-milenista (o pensamento mais

comum no protestantismo norte-americano). A posição contra-guerra

evangélica também mudou em 1917, quando Bismark tornou a participação

cristã um dever e a nova onda de dualismo, espiritualismo e rigidez legalista

toma forma e se alinha com as aspirações de ascensão da classe burguesa.

Segundo o autor, até 1916 o protestantismo missionário latino era

basicamente de cunho evangélico (pois havia adotado o modelo do Segundo

Despertar dos EUA), o qual é individualista, cristológico, soteriológico (doutrina

da salvação), com ênfase na salvação e com um interesse social expressado

por meio de caridade e ajuda mútua mas que não possui estrutura política

(quando se trata da defesa de sua liberdade e da luta contra as

discriminações); portanto, nosso cristianismo é politicamente democrático e

liberal, mas não sustenta esta posição na fé professada e não inclui isso em

sua piedade. Isso nos leva a um padrão de cristianismo: dualista, espiritualista,

com uma regra de separação secular e com uma rigidez legalista. Isso tudo foi

produzido pelas classes burguesas que utilizavam o cristianismo para realizar

suas aspirações de ascensão.

O fundamentalismo extremo do protestantismo nos levou há alguns

pontos ruins:

• Nos vincula com os piores traços da ideologia política dos EUA;

• Na vida eclesiástica ocasionou separação e isolamento

denominacional;

• Uma biblidolatria hermenêuticamente errada.

Proseguindo para a terceira parte do livro, teremos o rosto pentecostal,

quando Bonino informa que Carlos Mariátegui se expressou bem sobre a

estratégia protestante latina em 1928: “o protestantismo não consegue

penetrar na América Latina por obra de seu poder espiritual e religioso, mas de

seus serviços sociais. Este e outros sinais idicam que suas possibilidades de

expansão normal encontram-se esgotadas”, mas isso somente serviu para

aquela época. Após o I e II Grande Despertar é iniciado, com Willis C. Hoover

da igreja Metodista de Valparaíso no Chile, o movimento pentecostal que logo

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se expandiu e se apresentou como sendo o rosto do protestantismo na

América Latina.

Dentro do protestantismo latino-americano o pentecostalismo foi um

desafio, pois os protestantes viam nos pentecostais a sua própria teologia e

comportamento, mas as manifestações lhes eram estranhas e os deixavam

assustados – a sua primeira reação foi a rejeição e a acusação de

antimetodistas, contrários à ação do Espírito Santo e irracionais. Por concenso

da maioria dos estudiosos, considera-se que e teologia pentecostal se

concentra em quatro bases pricipais: salvação pela graça de Deus, batismo do

Espírito Santo, saúde divina como promessa para todos os crentes e

escatologia apocalíptica (bases que não negam as outras doutrinas clássicas

da fé). Em alguns estudos pode-se ainda notar um esquema teológico

pentecostal da América Latina, Sepúlveda (página 62) descreve cinco bases

ltinas: maniqueísta, determinismo e pessimismo antropológico, reconhecimento

das obras do Espírito Santo(desde línguas até a simples alegria), liberdade de

ler (comprendendo) e pregar a Bíblia e também a militância evangélica (na qual

Sepúlveda destaca que o pentecostal passa a buscar a sua identidade e ser

mais ativo na sociedade – não se enxergando mais como alguém excluído de

um mundo dominado por Satã). Isso os leva a três aspectos contraditórios:

serviço social de forma institucionalizada, formulação de um credo social e

crentes no meio da atividade política - os quais podem ser vulneráveis às

artimanhas devido à falta de experiência.

Ao iniciar a explanação sobre o rosto étnico, o autor descreve

brevemente três tipos de igrejas, duas das quais estavam em constante conflito

naquele tempo: existem as igrejas transplantadas, que são aquelas levadas de

um país, instaladas em outro e que conseguem membros nativos apesar de

manter rituais semelhantes aos de sua matriz eles são adaptados para o povo

nativo. As igrejas étnicas, no entanto, são mais complicadas pois apesar de

serem frutos de obras missionárias de seu país de origem elas realizam a

liturgia na língua estrangeira, são freqüentadas somente por descendentes de

seu povo, mantém costumes como uso de tabaco e bebidas alcoólicas e não

se comunicam com os povos ao seu redor. Já as igrejas missionárias (“livres”)

são proselitistas, puristas e possuem pregação mais inflamada. A distância

entre as igrejas étnicas e missionárias sempre foi gigantesca, e uma enxergava

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a outra com desconfiança. Este sentimento foi diminuído a partir de 1939 com a

Confederação de Igrejas Evangélicas do Rio da Prata que lançou bases para o

apoio da educação teológica. Hoje, a maioria esmagadora destas igrejas

compreendem que sua missão e sua responsabilidade independem da

etnicidade ou grupo específico – sendo que as ex-igrejas étnicas foram

integradas ao panorama religioso nacional por fatores sociológicos e históricos

(como casamentos mistos e a integração de seus membros na sociedade).

O evangelho de Lucas já aborda os temas etnia e missão, onde o Jesus

ressucitado propaga sua mensagem por além das fronteiras, até os confins da

terra. Em Gênesis são inclusas na promessa de bênção todas as famílias da

terra , ou seja, a etnicidade não é colocada como mérito e a graça universal é a

desconsideração da raça e a libertação do homem para o exercício do amor.

Na quinta parte da obra, é realizada uma abordagem voltada para os

questionamentos, começando com item “o futuro do protestantismo”, no qual o

autor interroga sobre a possível subordinação do pentecostalismo aos

mecanismos de rotina e burocracia já presentes nas igrejas tradicionais, as

inferências sociológicas antigas que previam o fim do cristianismo e as atuais

que falam sobre como o cristianismo está inserido no meio social (em questões

como educação e assistência aos necessitados em regiões desamparadas) e

porque é impossível que ele venha a desfalecer e chegar ao seu fim neste

contexto. O papel real do protestantismo na América Latina que é dar

testemunho fiel do evangelho e a teologia trinaria (Deus trino) que deve

enriquecer e aprofundar a percepção cristológica dos fiéis.

Com relação à teologia trinaria ela é exposta iniciando por três riscos:

• Esquecer a que doutrina da trindade nunca esgota o conhecimento

sobre o Senhor e ela veio para somar nos estudos sobre a revelação;

• O número três não é mágico;

• Nunca poderemos sondar a mente de Deus, Ele é mistério.

O protestantismo latino-americano precisa cultivar mais o conhecimento

desta teologia lembrando que: a doutrina da santíssima trindade foi formulada

para que se pudesse entender o que a Bíblia diz sobre Deus e seu povo e que

existe uma unidade entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Estas afirmações

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podem acabar com o popular reducionismo (divisão de fenômenos em partes

menores que podem ser explicadas que ataca os conceitos protestantes),

fortalecem a fé em Jesus Cristo no mundo das religiões, leva o cristão a

praticar a caridade, a misericórdia e ao maior conhecimento sobre Jesus e o

Espírito Santo.

Em seu último capítulo, o autor tenta trazer um conceito unificador para

as missões protestantes respondendo qual é a relação entre missão e

colonialismo, como se expressa essa relação na teologia da missão e o que é

uma teologia de missão na visão trinária.

• Missão e colonialismo: no século 19 a evangelização latina

avança embalada pela expansão colonial, e por isso é

questionável até que ponto as missões da Europa de dos EUA

carregavam as marcas colonialistas.

• Buscar uma nova teologia da missão latino-americana lembrando

sempre que um grande perigo que até hoje não se conseguiu

evitar foi o monopólio eclesiástico e o triunfalismo eclesiástico,

que sempre geravam algo parecido com um imperialismo cristão.

É bom destacar que na opinião do autor o protestantismo latino-

americano confundiu a evangelização e missão, ou seja, acabou reduzindo

tudo o que envolve a missão de Deus para a simples tarefa de evangelizar,

tarefa esta que foi definida resumidamente como anunciar o plano da salvação

e convidar à conversão - e apesar da bênção de Deus sobre isso na América

Latina, ocorreu que nosso povo acabou se recusando a participar da plenitude

da missão. Para finalizar, vamos nos concentrar em três aspectos da

evangelização, que tem sido o enfoque no meio latino:

• Profetas e evangelistas: esta dicotomia acabou causando uma

separação eclesiástica entre serviço e evangelização, conversão e

busca da justiça, fé e responsabilidade social. Mas neste caso creio que

uma evangelização trinitária é “o convite a participar em fé da própria

vida do Deus trino e , por isso, da totalidade do que Deus fez, faz e fará

para cumprir seu propósito de ser tudo em todos” (página 128).

• Evangelização e crescimento da igreja: nesta questão sempre há

discussão sobre a relação “grande crescimento VS baixa qualidade de

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formação cristã”, mas isso pode com certeza ser resolvido através da

comunidade de fé (a igreja) que pode dar uma base sólida ao novo

convertido.

• Métodos e meios: as questões aqui dizem respeito aos métodos e meios

que estão sendo usados nos dias atuais, se eles estão gerando um

clima de liberdade e estão respeitando a capacidade de reflexão e

decisão de cada crente (quais são os limites de uso dos meios de

comunicação, cenários e equipamentos os quais podem vir a diminuir a

capacidade de reflexão e decisão), pois não basta apenas dizermos

“está tudo a serviço de Deus” para resolver isso.

Tudo gira em torno do risco da substituição da “razão evangélica” pela

“razão instrumental” que nunca deve acontecer, assim nosso fervor evangélico

latino se firmará, será purificado e expressará a plenitude da fé em nosso Deus

uno e trino.

ANÁLISE E POSICIONAMENTO CRÍTICO

Em seus textos, Bonino demonstra simpatia por alguns ideais ligados às

lutas sociais latinas (provavelmente pela herança e ligação histórica que existe

da América Latina com personagens como Che Guevara – “hay que endurecer

pero sin perder la ternura jamás”). Isso pode ser visto quando são

mencionadas algumas críticas sobre a influência do liberalismo dos EUA, o

cristianismo como meio de difusão deste liberalismo (fato contestado pela

União das Ligas Juvenis Evangélicas, que declara lutar contra o sistema

capitalista, o qual é baseado na opressão e desigualdade econômica) e as

críticas feitas à classe burguesa da época, que devido as suas aspirações de

ascensão se aproximaram destas ideologias. Sobre isso menciona que “ao

olhar para a brutalidade do capitalismo desalmado e [...] um comunismo que

pregava a luta de classes estes líderes latinos viram o protestantismo como a

guarda desta democracia verdadeira” (página 24). Fica claro em algumas

passagens que o posicionamento do autor é contrário à presença do modelo

protestante norte-americano na América Latina, afirmando inclusive que no

passado manifestamos “os piores traços da ideologia e da política dos EUA”

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assumindo inclusive responsabilidades em movimentos que não eram nossos.

Apesar de tudo, ele defende que isso não invalida qualquer herança que

tenhamos dos primeiros cristãos latinos, pois foram eles que iniciaram o

movimento, coordenado acima de tudo por Deus e, que hoje se configura como

um gigantesco meio de propagação do evangelho.

O autor é categórico ao afirmar (na página 41) que “portanto [o

cristianismo latino-americano] tende a ser politicamente democrático e liberal,

mas sem sustentar tal opção em sua fé e sem fazer dela parte integrante de

sua piedade”. Esta afirmação nos revela uma opinião clara sobre o

protestantismo latino: onde se pregam ideais que não são praticados na sua

totalidade gerando uma doutrina legalista e ditatorial.

Em relação à coerência do texto, Bonino (ou o tradutor) se revela

relativamente prolixo e inconclusivo ou ainda ambíguo em muitas questões.

Iniciando pela página 46 onde diz “mas ainda: me atreveria a dizer que o futuro

do protestantismo latino-americano será evangélico ou não será” , aqui ele (ou

o tradutor) quis dizer que se o rosto do futuro não for o evangélico então não

haverá futuro? Ou quis dizer que ou será evangélico ou qualquer outro ? Mais

adiante existem outras questões, porém as mais agudas estão no capítulo

conclusivo do livro (páginas 132 e 133) onde temos muitas perguntas e

nenhum posicionamento pessoal sobre estas. Acredito no dito intelectual que

diz “você não precisa saber as respostas certas, e sim fazer as perguntas

certas”, mas quando apenas questionamos sem dar qualquer tipo de

posicionamento estamos apenas “jogando mais lenha na fogueira” e no final

com certeza restarão apenas cinzas.

É sensato destacar também que vários dos questionamentos feitos, nos

dois últimos capítulos do livro, já foram feitos por outros autores e Bonino

apenas os repete. Como exemplo, podemos citar na página 97 a pergunta

“será que as formas mais dinâmicas do protestantismo – fundamentalmente o

pentecostalismo – estão condenadas aos mecanismos de rotina e burocracia

descritos por Max Weber?”. Esta questão já foi levantada, inclusive de forma

mais ampla, no primeiro livro desta disciplina no qual o sociólogo Rodney Stark

faz algumas referências sobre a institucionalização das religiões, expondo as

necessidades organizacionais destas.

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É também visto que existe um certo ceticismo, por parte do autor, em

relação à atuação pentecostal no meio político. Ao expor suas idéias, existe um

questionamento sobre a capacidade dos representantes das igrejas realmente

conseguirem expressar na totalidade os anseios do povo pentecostal, será que

eles realmente conseguem obter êxito nesta tarefa? Ou estão apenas criando

um efeito de auto-destruição através do qual muitas pessoas serão

machucadas e deixarão o protestantismo de lado?

Há também o destaque para vários paradoxos que funcionam muito bem

dentro do pentecostalismo e que já foram muito debatidos, como por exemplo

os crentes evitam a política, mas muitas igrejas participam dele e são vistas

como interventoras sociais deste processo, ou ainda as mulheres que ocupam

um papel de liderança nas congregações mas sua posição subordinada é

justificada através da Bíblia, por fim, o aumento do status dos leigos através

dos dons espirituais, normalmente a pessoa detentora de um amplo

conhecimento bíblico é reconhecida no meio protestante como sábia e tem seu

status elevado, no pentecostalismo um meio de se elevar este status é através

da manifestação destes dons.

3 APLICAÇÃO PRÁTICA

O mesmo conceito que o autor descreve nas páginas 79 e 80, sobre a

visão que as igrejas étnicas tinham das igrejas missionárias, pode hoje ser

aplicado às igrejas pentecostais e as históricas. As históricas enxergam as

pentecostais com desconfiança e muitas vezes consideram seus membros

como visionários, fantasiosos e fanáticos que não têm qualquer ambição em

aprender sobre a Bíblia, apenas querem receber uma palavra simples e pronta

durante o domingo na igreja. A recíproca é verdadeira, já que os pentecostais

enxergam as igrejas históricas como sendo um antro de ceticismo, pessoas

cegas pelo racionalismo e sem qualquer tipo de contato direto com Deus

(alguns chegam a dizer que “congregavam em igrejas históricas, mas chegou

um momento em que precisavam experimentar muito mais do que o leite

espiritual – precisavam da picanha bem passada”). Apesar de não podermos

perder a capacidade de questionar, acredito que este tipo de posição somente

nos leve aos conflitos e às divisões. Sabemos que apesar das diferenças a

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nossa missão é a mesma (proclamar o evangelho e praticá-lo) e por este bem

maior precisamos sustentar uns aos outros.

A proposição trinitária feita ao longo do livro é realmente ampla e deve

ser cultivada pela Igreja. O fato de se propor algo que enriqueça a

compreensão cristológica (o estudo ou tratado a respeito da pessoa e da

doutrina de Cristo), soteriológica (doutrina relativa à obra de salvação realizada

por Jesus Cristo em favor da humanidade, o estudo do mistério da redenção

cristã) e pneumatológica (a doutrina dos seres espirituais, como o Espírito

Santo, anjos e demônios) é de sobremaneira revitalizador na vida do crente e o

direciona para as bases de sua fé, colaborando para seu crescimento pessoal

e espiritual.

Identifiquei-me com o autor no quesito sincretismo religioso, exposto na

página 107, onde ele informa que “temos visto o argueiro no olho do próximo”

(toda a idolatria e magia denunciadas no catolicismo) “mas não percebemos a

trave em nosso olho” (como a incorporação de elementos parecidos em nossa

religiosidade). Em meu modo de ver, nós crentes temos nos colocado como

juízes que julgam em causa própria, condenando os outros por qualquer tipo de

conduta que possa lembrar a idolatria e esquecemos de olhar para dentro de

nossas próprias denominações, onde os pastores oferecem sabonetes de

arruda, sal grosso, água do rio Jordão etc, e com o argumento de que “em

nossa cultura religiosa este tipo de coisa não é fundamental na salvação”

apenas estamos tapando o sol com a peneira e deixando os crentes que teriam

potencial para ser líderes se afoguem no mar de lama da idolatria gospel.

As maiores novidades para minha vida foram os posicionamentos do

autor e os fatos narrados sobre o imperialismo norte-americano e a sua

influência até mesmo no campo de missões. Nunca havia pensado por esta

perspectiva e fico mais tranqüilo em saber que as influências Marxistas e

Guevaristas também podem ser usadas como forma propagação do evangelho,

e não somente como pretexto para a perseguição aos cristãos.

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