Resenha Crítica_Aula 1 - EAD- Entre Os Marcos Conceituais e Históricos e a Representação Do...

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EAD: entre os marcos conceituais e históricos e a representação do aluno autônomo  Resenha crítica Por Everton Luiz Renaud de Paula 1   A educação a distância tem sido pauta de muitos artigos e pesquisas atualmente. Há, também, um grande crescimento e expensão da EAD entre as grandes universidades brasileiras. Com isso muito se fala sobre o aluno da EAD, o professor neste contexto e o tipo de oferta. Diante deste cenário, Alessandra Menezes dos Santos, Mestre em Educação pela UFJF apresenta contribuições como artigo, baseado em sua dissertação, com o título “A autonomia do aluno no contexto da educação a distância”. E ainda, para a fundament ação sobre a história da educação a distância no Brasil e no mundo, Lucineia Alves, Doutora e Mestre em Ciências pelo Instituto Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, contribui com um mapeamento dos principais marcos históricos e conceituais da EAD. O eu interessado e o alter autônomo SERAFINI, Alessandra Menezes dos Santos. A AUTONOMIA DO ALUNO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA . Educação em Foco: Educação em Foco, Juíz de Fora, v. 12, p.61-82, out. 2012. Semestral. Disponível em: <http://www.ufjf.br/revistaedufoco/files/2013/05/artigo-031.pdf>. Acesso em: 18 set. 2014.  O pressuposto básico sobre o qual se estrutura a reflexão de Serafini (2012) é o de que há uma representação de aluno da EAD que não corresponde ao sujeito real que faz parte deste processo. Munida desta hipótese e interrogando-se sobre sua veracidade, a autora apresenta em seu artigo dois cenários, para tecer relações entre eles. Apresenta a imagem do aluno EAD com base nos autores contemporâneos da área e faz uma proposta de investigação do sentido epistemológico da autonomia com base em autores representantes do iluminismo, positivismo, construtivismo e pensamento liberal. Foram selecionados 4 autores para expressar o sentido de autonomia. De acordo com as classificações da autora, para a teoria iluminista da Rousseau a autonomia vem do homem natural que se desenvolve a partir de suas experiência. Existe neste caso apenas a figura do preceptor, que conduz o caminhar do aluno que é feito individualmente. Para Durkheim, são as normas sociais que regulamentam a autonomia, ou seja, é conhecendo e seguindo, por interesse próprio e expressão de internalização das regras sociais estabelecidas que o sujeito expressa sua autonomia.  A teoria construtiv ista de Piaget vai estabelecer que autonomia só pode ser desenvolvida nas relações humanas, e não apenas no seguimento individual de regras coletivas. E promovendo uma complementação, que não perde o caráter revolucionário, as formulações de Paulo Freire têm como foco o sujeito, as pessoas, na formação de um pensamento livre. É por meio das 1  Docente do Ensino Superior, Mestrando em Educação pela UFPR, pós-graduando em Gestão, Inovação e Docência na EAD pela Universidade Positivo. Setembro de 2014. 

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EAD: entre os marcos conceituais e histricos e a representao do aluno autnomoResenha crticaPor Everton Luiz Renaud de Paula[footnoteRef:0] [0: Docente do Ensino Superior, Mestrando em Educao pela UFPR, ps-graduando em Gesto, Inovao e Docncia na EAD pela Universidade Positivo. Setembro de 2014.]

A educao a distncia tem sido pauta de muitos artigos e pesquisas atualmente. H, tambm, um grande crescimento e expenso da EAD entre as grandes universidades brasileiras. Com isso muito se fala sobre o aluno da EAD, o professor neste contexto e o tipo de oferta. Diante deste cenrio, Alessandra Menezes dos Santos, Mestre em Educao pela UFJF apresenta contribuies como artigo, baseado em sua dissertao, com o ttulo A autonomia do aluno no contexto da educao a distncia. E ainda, para a fundamentao sobre a histria da educao a distncia no Brasil e no mundo, Lucineia Alves, Doutora e Mestre em Cincias pelo Instituto Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, contribui com um mapeamento dos principais marcos histricos e conceituais da EAD.

O eu interessado e o alter autnomo

SERAFINI, Alessandra Menezes dos Santos. A AUTONOMIA DO ALUNO NO CONTEXTO DA EDUCAO A DISTNCIA. Educao em Foco: Educao em Foco, Juz de Fora, v. 12, p.61-82, out. 2012. Semestral. Disponvel em: . Acesso em: 18 set. 2014.

O pressuposto bsico sobre o qual se estrutura a reflexo de Serafini (2012) o de que h uma representao de aluno da EAD que no corresponde ao sujeito real que faz parte deste processo. Munida desta hiptese e interrogando-se sobre sua veracidade, a autora apresenta em seu artigo dois cenrios, para tecer relaes entre eles. Apresenta a imagem do aluno EAD com base nos autores contemporneos da rea e faz uma proposta de investigao do sentido epistemolgico da autonomia com base em autores representantes do iluminismo, positivismo, construtivismo e pensamento liberal.

Foram selecionados 4 autores para expressar o sentido de autonomia. De acordo com as classificaes da autora, para a teoria iluminista da Rousseau a autonomia vem do homem natural que se desenvolve a partir de suas experincia. Existe neste caso apenas a figura do preceptor, que conduz o caminhar do aluno que feito individualmente. Para Durkheim, so as normas sociais que regulamentam a autonomia, ou seja, conhecendo e seguindo, por interesse prprio e expresso de internalizao das regras sociais estabelecidas que o sujeito expressa sua autonomia.

A teoria construtivista de Piaget vai estabelecer que autonomia s pode ser desenvolvida nas relaes humanas, e no apenas no seguimento individual de regras coletivas. E promovendo uma complementao, que no perde o carter revolucionrio, as formulaes de Paulo Freire tm como foco o sujeito, as pessoas, na formao de um pensamento livre. por meio das atividades cognitivas que o sujeito, enquanto ser, pode expressar sua liberdade e consquente autonomia.

A leitura de Serafini (2012) dos autores citados est fundamentada nos trilhos deixados por Aranha (2006), Durkheim (2008), Freire (1997), Libneo (1997), Rousseau (1995) e Taille (1992). Em seguida, a autora apresenta a imagem da autonomia pela via da educao a distncia. Para isso, constroi seu pensamento nas bases de Belloni (2009), Linard (2000), Moran (2000), Primo (2005), Silva (2003), Wissmam (2010) e Valente (2004). A construo do perfil da EAD se d pelo que se sabe da sua principal demanda, de oportunidade de acesso que supere as barreiras de tempo e espao, conforme apresenta Alves (2011) no segundo artigo resenhado.

A figura de um construtor do prprio saber e responsvel pela prpria aprendizagem est implcita na descrio do tipo de aluno esperado pelos cursos ofertado na modalidade a distncia. Alm disso, conforme ressaltado por Wissmam (2010), orbitam ao redor do aluno da EAD as necessidades de formao de um agenda que privilegie e expresse sua organizao para os estudos, o desenvolvimento e estabelecimento de um perfil pr-ativo, voltado para a iniciativa - o que influenciar suas pesquisas e interesses, e tambm a curiosidade, que ser propulsora de sua aprendizagem autnoma.

Contudo, Serafini (2012) destaca, no trnsito entre a primeira e segunda anlise, que se d justamente o contrrio da autonomia, ocorre uma heteronomia em muitas situaes que fruto de uma dependncia do aluno com o professor tutor na espera de instrues e realizao de atividades. Para ela, os modelos em geral geram uma ausncia de autonomia intelectual que permita aos alunos ser mais criativo e participativo no ambiente virtual de aprendizagem.

Em suas concluses a autora refora que a relao entre a representao a questo epistemolgica se d entre diversos fatores, tais como: a necessidade da formao de um professor interativo, volto para a criao de possibilidades de aprendizagem; a situaes tcnicas e tecnolgicas dos ambientes virtuais que geram dependncias, limitam possibilidades e oferecem materiais fechados em si mesmos; aspectos metodolgicos, que mesmo diante de determinadas possibilidades tcnicas se restringem em funo de um mtodo previamente desenhado;e por fim, o compromisso industrial com o ensino e sua replicabilidade, que muitas vezes no ser capaz de conhecer o sujeito por trs da tela, esperando dele somente uma autonomia, como se ela fosse capaz de ser construda por um caminho de mo nica.

Com base no que apresentado pela autora, vale destacar um entendimento possvel, e confirmado ao ser confrontado com a experincia docente, de que o aluno da EAD est submetido a uma imagem construda pelas teorias, quase todas as vezes do ponto de vista da oferta, e em poucos casos da demanda. Em geral, no partem de sistematizaes de prticas vivenciadas na realidade. Neste sentido, o texto de Serafini (2012) permite a compreenso de diversas situaes a partir de um novo olhar, o analtico.

Alm disto, o pensamento apresentado caracteriza uma importante contribuio, tanto para a rea de estudos sobre a educao a distncia, quanto para os professores e demais profissionais envolvidos com este contexto. Os professores podem desenvolver um novo olhar acerca de sua atividade e o seu modo de ser professor por trs das telas. Esta uma nova identidade e uma nova forma de executar a profisso. Os profissionais voltados para o planejamento e desenvolvimento de materiais e metodologias para EAD recebem, com estas reflexes, uma indicao importante do ponto que devem considerar - o aluno.

Esta leitura apresenta, tambm, a perspectiva contempornea de educao a distncia que refora a proposta freireana de foco no sujeito ativo da aprendizagem e no seu desenvolvimento e expresso. Divulgado entre os profissionais envolvidos na rea, o texto abrange muitos campos, e est construdo sob uma base terica pertinente, apoiando suas concluses na relao entre os fatos. O artigo, portanto, deixa claro apenas o posicionamento parcial da autora - que escreve o texto no decorrer de sua pesquisa de mestrado, relacionando os campos tericos estudados. No explicitada a existncia ou no, bem como preocupao com um estudo emprico que permita a reflexo dos dados luz das teorias articuladas.

EAD: uma prtica com construo profunda

ALVES, Lucineia. Educao a distncia: conceitos e histria no Brasil e no mundo. Revista Brasileira de Aprendizagem Aberta e A Distncia, Rio de Janeiro, v. 10, p.83-92, out. 2011. Anual. Disponvel em: . Acesso em: 18 set. 2014.

O segundo artigo, de Alves (2011) se apresenta com dois objetivos, simples para o leitor, mas fruto de uma investigao de grande envergadura. Apresentar uma breve reviso de conceitos da EAD e os principais marcos histricos do campo so os eixos principais do texto. A reviso conceitual est alicerada em 10 autores, sendo Dohmem (1967), Peters (1973), Moore (1973), Holmberg (1977), Keegan (1991), Chaves (1999), e ainda Preti, Litwin, Nunes e Moran. Entre os excertos apresentados das definies dos autores h um predomnio da viso da EAD como forma, mtodo e modelo de ensino, citando como modo de ao ou relao, ou ainda, forma de superao dos limites de tempo e espao.

A conceituao se encerra na apresentao do decreto 5.622/2005 que define, no Brasil, a EAD como:... modalidade educacional na qual a mediao didtico-pe- daggica nos processos de ensino e aprendi- zagem ocorre com a utilizao de meios e tecnologias de informao e comunicao,com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos (ALVES, 2011, p.85).

A respeito dos marcos histricos, a autora se apoia em Gouvea & Oliveira (2006) para apresentar os tpicos mundiais e em Maia & Mattar (2007), Marconcin (2010), Rodrigues (2010) e Santos (2010) para estabelecer os marcos brasileiros. A autoria apresenta um percurso composto por 45 datas e seus principais acontecimentos envolvendo a educao a distncia, entre os anos de 1728 e 2011. Apresenta at um fato curiosos, relativo forma de interpretao dos fatos, de que em alguns manuais as epstolas bblicas foram as primeiras iniciativas de educao a distncia. Contudo, oficialmente a primeira citao pblica caracterizada como ead pela oferta de curso por correspondncia foi em 1728, em Boston.

A autora consegue mostrar, ao longo do seu texto, o que afirma em suas concluses:A Educao a Distncia pode ser considerada a mais democrtica das modalidades de educao, pois se utilizando de tecnologias de informao e comunicao transpe obstculos conquista do conhecimento. [...] Globalmente, cada vez mais crescente a oferta de cursos formais e informais atravs da modalidade de Educao a Distncia. [...] embora avanos importantes tenham acontecido nos ltimos anos, ainda h um caminho a percorrer para que a Educao a Distncia possa ocupar um espao de destaque no meio educacional, em todos os nveis, vencendo, inclusive, o preconceito de que os cursos oferecidos na Educao a Distncia no possuem controle de aprendizado e no tm regulamentao adequada. [...] Esta modalidade de educao conceituada por diversos autores e cada um destes enfatiza alguma caracterstica especial no seu conceito. A nfase de cada autor, os diversos acontecimentos histricos e as variadas instituies, mencionadas neste trabalho, mostram que a Educao a Distncia oferece oportunidades que pelo modelo presencial se- ria difcil ou impossvel de atingir, pois possui uma ampla abrangncia e grandiosa magnitude no somente no nosso pas, mas em todo o mundo (ALVES, 2011. p. 90-91).

Sem dvidas, a obra apresenta contribuies importantes para pesquisadores da rea para que conheam a evoluo da EAD e possam consolidar conceitos e revisar preocupaes. A EAD, por este texto, se mostra com bases muito profundas e uma histria longa - s vezes, controversa, mas com razes cuja compreenso essencial para a avanar. Embora possa ser um texto importante para profissionais da rea de EAD, alm de pesquisadores, o maior impacto pode ser para os profissionais envolvidos com o planejamento da EAD, para que entendam em que momento se situam e a que concepo e contexto do prosseguimento ao mesmo tempo em que alargam seus discursos com as palavras novidade e inovao.

Do ponto de vista de sua coerncia interna o texto bem construdo e sua base terica est explcita, contudo existem lacunas no que se refere ao entrelaamento entre os autores, mais do que uma explicitao de conceitos de cada um. Alm disso, a opo por dividir os marcos histricos em dois sub tpicos diferentes pode proporcionar uma confuso intelectual e inclusive um retrabalho de leitura, uma vez que a ordem de um texto responsvel por desencadear determinados processos de pensamento, e no caso do texto apresentado, na forma como o ocorre a diviso, at que se retomem as datas o leitor pode ser conduzido a uma anlise prvia e frgil de que o Brasil estava alheio a todos os demais fatos e anos. Sendo assim, o entrelaamento e a relao entre as datas um trabalho importante e fica como uma lacuna a ser preenchida em um outro trabalho.Os dois textos lidos e analisados contribuem para a construo de um olhar importante para os professores e gestores da modalidade a distncia. As autoras, cada uma com seu estilo literrio e objetivo de pesquisa, entrelaa ideias que podem ser confrontadas com prtica online dos docentes e o processo de planejamento, desenvolvimento e avaliao do gestor. Mesmo nascendo como uma oportunidade de acesso e com um carter totalmente voltado para o ensino e os interesses educativos e acadmicos, como mostraram os textos, a EAD est hoje voltada para uma lgica industrial de ensino, que busca fazer mais por menos. Ter o mximo de alunos, com o menor investimento e maior replicabilidade. No possvel tornar esta uma afirmao categrica visto que h uma variedade de prticas e bases conceituais que as fundamental. Apenas possvel caracterizar uma anlise vivel e plausvel a respeito do tema.